9
INTRODUÇÃO
A proposta buberiana
1
de refletir sobre a existência humana torna-se, de
certo modo, atípica porque é provocadora em sua simplicidade: “nada mais
simples, na verdade, conceber o homem como ser de relações”
2
. Sua proposta
filosófica está extremamente ligada com sua experiência de vida, experiência de
desencontro.
A casa na qual moravam meus avós tinha um pátio interno
grande e quadrangular, cercado por uma galeria de madeira no
térreo e nos demais pisos até o telhado, no qual se podia, em
cada pavimento, andar em volta da construção. Aí estava eu,
certa vez, no meu quarto ano de vida, com uma menina alguns
anos mais velha, filha de um vizinho, a cujos cuidados a avó me
tinha confiado. Nós nos debruçávamos na balaustrada. Não posso
me lembrar o que havia falado à minha pensativa companheira
sobre minha mãe. Mas ainda ouço como a menina mais velha que
eu me dizia: "Não, ela não volta nunca mais". Sei que fiquei
mudo, mas também que não nutri nenhuma dúvida quanto à
verdade da palavra dita. Ela permaneceu agarrada a mim e
agarrava-se, de ano a ano, sempre mais ao meu coração. Já
depois de mais ou menos dez anos, eu havia começado a senti-la
como algo que não dizia respeito somente a mim, mas também
ao ser humano. Mais tarde, apliquei a mim mesmo o sentido da
palavra "desencontro", através da qual estava descrito,
1
Martin Buber nasceu em Viena em 1878. Morou com os avós paternos em Lemberg, grande
centro cultural e religioso. Em 1896 iniciou os estudos de Filosofia e História da Arte na
Universidade de Viena e em 1901 entrou na Universidade de Berlim, onde teve como professores
Wilhelm Dilthey e Georg Simmel, publicou o artigo Uber Jakob Böhme (Sobre Jakob Böhme).
Tornou-se doutor em Filosofia pela Universidade de Berlim em 1904 . Suas principais obras foram:
1906: Publica Die Geschichten des Rabbi Nachman (Histórias do Rabi Nachman); 1908: Publica Die
Legende des Baalschem (A lenda de Baal Schem); 1913: Publica Daniel. Gespräche von der
Verwirklichung (Daniel. Colóquios sobre a Realização); 1917: Publica a Ereignisse und
begegnungen (Acontecimentos e Encontros); 1919: Gemeinschaft (Comunidade); 1923: Nomeado
professor de História de Religião e Ética Judaica na universidade de Frankfurt-am-Main. Publica a
mais importante obra Ich und Du (Eu e Tu); 1927: Publica Des Baal-schem Tov (Sobre a relação
com Deus); 1929: Publica Religion und Philosophie (Religião e Filosofia); 1932: Escreve
Zwiesprache (Diálogo); 1938: Publica Worte na die Jugent (Palavras à Juventude) e, em
conseqüência das pressões nazistas, vai morar na Palestina, onde assume a cadeira de Filosofia
Social na Universidade Hebraica de Jerusalém; 1947: Publica Dialogisches Leben: Gesammelt
philosophische und pägogische Schriften (A Vida do Diálogo. Coleção de Escritos Filosóficos e
Pedagógicos); 1950: Publica o resultado de quase cinqüenta anos de estudos e reflexão sobre
Filosofia Social sob o título: Pfade in Utopia (Caminhos e Utopia); 1951: Publica Bücher und
Menscher (Livros e Homens), Heilung aus der Begegnung (A cura a partir do Encontro. Uma troca
de Idéias com a Psicologia de C.G. Jung), Urdistanz und Beziehung (Distância e Relação). No
mesmo ano deixa sua cátedra na universidade Hebraica, dedica-se a formação de mestres e
professores; 1953: Publica Das echte Gespräch und die Möglichkeiten des friends (O diálogo
Autêntico e as Possibilidades da Paz); 1955: Der Mensch und Seuin Gebild (O Homen e sua
Imagem); 1961: Publica Begegnungen (Encontros), uma coleção de fragmentos autobiográficos.
Buber falece em Jerusalém em 13 de Junho de 1965.
2
ZUBEN, Newton Aquiles von. Martin Buber: cumplicidade e diálogo. Bauru: EDUSC, 2003, p.
166.