artísticas. Enquanto houver tal necessidade, as rimas e ritmos futuristas, mais flexíveis, mais audaciosos e
mais variados, constituem uma conquista segura e válida. E a sua influência já ultrapassou os grupos
puramente futuristas. As conquistas do futurismo, na orquestração do verso, são totalmente indiscutíveis.
Não se deve esquecer que o som de uma palavra representa o acompanhamento acústico do sentido. Se os
futuristas pecaram e pecam ainda na sua preferência quase monstruosa pelo som contra o sentido, trata-se
somente de um entusiasmo, da doença infantil do esquerdismo, e se deve rejeitar como delírio de uma
nova escola poética que sentiu de um modo novo e com ouvido agudo o som em oposição à rotina
cansativa das palavras. A maioria esmagadora dos operários, hoje,não se Interessa certamente por essas
questões.A maior parte da vanguarda da classe operária, com tarefas mais urgentes, está igualmente muito
ocupada. Mas há amanhã. E esse amanhã exigirá uma atitude mais atenta e mais precisa,mais sábia e maIs
artística diante da lInguagem como um instrumento fundamental da cultura - não somente diante da
linguagem dd verso como da linguagem da prosa, particularmente da prosa. Uma palavra nunca encerra,
precisamente, um conceito com toda a significação concreta com que o homem concebe em cada caso.
Uma palavra, por outro lado, possui um som e uma forma não só para o nosso ouvido e para os nossos
olhos, mas também para a nossa lógica e nossa imaginação. O pensamento só terá possibilidade de tornar-
se mais preciso através de cuidadosa seleção de palavras, isto é, depois de pesá-las de todos os modos, o
que significa também do ponto de vista da acústica, e combiná-las da maneira mais expressiva. Não
convém, nesse terreno, proceder às cegas. Fazem-se necessários instrumentos micrométricos. A rotina, a
tradição, o hábito e a negligência devem dar lugar a um trabalho sistemático em profundidade. O
futurismo, no seu melhor aspecto, traduz um protesto contra a atividade empírica, ao acaso, que forma
poderosa escola literária e tem representantes muito influentes em todos os campos. Numa obra ainda
inédita do camarada Gorlov, que a meu ver, descreve erroneamente a origem internacional do futurismo,
viola a perspectiva histórica e o identifica com a poesia proletária, resumem -se as realizações daquela
escola de maneira conscienciosa e sistemática. Gorlov destaca, corretamente, que a revolução futurista na
forma, nascida de uma rebelião contra a antiga estética, reflete, no plano da teoria, a revolta contra a vida
estagnada e fétida, que produziu aquela estética. Essa vida também provocou em Maiakovsky, o maior
poeta do futurismo, e nos seus amigos mais íntimos, uma revolta contra a ordem social que engendrou
essa vida e essa estética repulsivas. Eis por que esses poetas estão, organicamente, ligados a Outubro. O
esquema de Gorlov é correto. Terá, porém, que se precisar e se definir ainda mais. É verdade que novas
palavras e novas combinações de palavras, novas rimas e novos ritmos tornaram-se necessários, porque o
futurismo, com a sua concepção do mundo, reagrupou acontecimentos e fatos, estabeleceu novas relações
entre eles e as descobriu para si mesmo. O futurismo é contra o misticismo, a deificação passiva da
natureza, a preguiça aristocrática ou de qualquer outra espécie, contra o devaneio e as lamúrias. É pela
técnica, pela organização científica, pela máquina, pela planificação, pela vontade, pela coragem, pela
rapidez, pela precisão e pelo novo homem, armado de todas essas coisas. A conexão entre essa "revolta"
estética e a revolta social e moral é direta: todas as duas se inserem, completamente, na experiência de
vida da nova, jovem, ativa e não-domesticada fração da intelligentsia de esquerda, dos boêmios criadores.
A rebeldia contra o caráter limitado e contra a vulgaridade da antiga vida criou um novo estilo artístico
como um meio de escape, um meio de liquidá-la. Em diferentes combinações e sobre diferentes bases
históricas, vimos a rebeldia da intelligentsia produzir mais um novo estilo. E terminava sempre assim.
Mas, desta vez, a Revolução proletária apanhou o futurismo num certo estágio de seu crescimento e
empurrou-o para a frente. Os futuristas tornaram-se comunistas. E, pelo mesmo ato, entraram na esfera
dos problemas e das relações mais profundas, que transcendem os limites de seu próprio pequeno mundo,
ainda não-elaborado, organicamente, no seu espírito. Por isso, os futuristas, inclusive Maiakovsky, são
mais fracos, no plano da arte, aí onde aparecem melhor como comunistas. A causa não está tanto na sua
origem social quanto no seu passado espiritual. Os poetas futuristas não dominaram, suficientemente, os
elementos da concepção e da atitude mundial do comunismo, para dar-lhes expressão orgânica pó r meio
de palavras. Essa concepção e essa atitude, por assim dizer, não lhes entraram no sangue. Daí por que,
freqüentemente, marcham para derrotas artísticas e psicológicas, com pompas e muito barulho por nada.
O futurismo, nas suas obras revolucionárias mais extravagantes, torna-se estilização. O jovem poeta
Bezimensky, que tanto deve a Maiakovsky. dá todavia uma expressão realmente verdadeira aos pontos de