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ALESSANDRA RESENDE DIAS BLAU
O “ouro vermelho” e a política de povoamento da
Capitania de Mato Grosso: 1752-1798
CUIABÁ-MT
2007
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ALESSANDRA RESENDE DIAS BLAU
O “ouro vermelho” e a política de povoamento da
Capitania de Mato Grosso: 1752-1798
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-graduação em História, do Instituto de Ciências
Humanas e Sociais da Universidade Federal de Mato
Grosso - UFMT, como requisito parcial para a obtenção
do título de Mestre em História.
Orientação: Profª. Drª. Leny Caselli Anzai.
CUIABÁ-MT
2007
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O “ouro vermelho” e a política de povoamento da
Capitania de Mato Grosso (1752-1798)
Alessandra Resende Dias Blau
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-graduação em História, do Instituto de Ciências
Humanas e Sociais da Universidade Federal de Mato
Grosso - UFMT, como requisito parcial para a obtenção
do título de Mestre em História.
________________________
Drª Leny Caselli Anzai (presidente)
____________________________________
Drª Maria Cristina Bohn (membro externo)
____________________________________
Drª Maria de Fátima Costa (membro interno)
____________________________________
Dr. Otávio Canavarros (Suplente)
4
Agradecimentos
Não poderia deixar de registrar aqui meu reconhecimento e infinita gratidão
a algumas pessoas que, de modo direto ou indireto, contribuíram para a
concretização deste trabalho.
Inicio meus agradecimentos louvando a Deus, pois foi Ele que me deu
forças para vencer mais uma difícil etapa da minha vida.
Durante o Mestrado, tive o imenso benefício de contar com diversos
colaboradores, aos quais desejo agradecer.
Ao Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal de
Mato Grosso, em especial, à professora Leny Caselli Anzai, pela orientação,
empréstimo de bibliografia e paciência. Obrigada por me ajudar a pensar os índios no
século XVIII, nesta parte do continente sul-americano.
Beijo a mão e agradeço a todos os professores do Mestrado, pois todos
foram responsáveis e transformaram, através do encontro, esse propósito em
realidade, em especial a professora Maria de Fátima Costa e ao professor Carlos
Alberto Rosa, presentes no exame de qualificação, pelas sugestões e críticas.
Tenho presente também pessoas que me ajudaram, seja emprestando livros
como o professor Otávio Canavarros, os colegas Maildes Delgado Sampaio e
Gilberto Brizola, do mestrado, e Glauce Oliveira Marques, da graduação em História
seja torcendo e orando por mim, como Fernando do Instituto de Linguagem da
UFMT e o colega Célio Marcos Pedraça, também do Mestrado. Ao Fernando, pela
ajuda na organização da documentação para a prova de proficiência em língua
estrangeira, e ao Célio por orar por mim antes de uma prova importante. Enfim, a
todos os amigos e colegas do Mestrado em História da UFMT que torceram por mim,
obrigada.
À Mônica, secretária do Mestrado, sempre tão atenciosa. Aos funcionários
do APMT e do NDIHR, em especial a Maria de Fátima Leão, sempre prestativa e
que muitas vezes me fez sorrir, apesar da vontade de chorar.
À minha mãe Maria Lúcia, que dividiu comigo os anseios do trabalho, me
ouviu e me deu força. A meu pai José, a minha irmã Adriana e meus sobrinhos
Matheus Felipe e Gabrielly Stephanny, por existirem. À Itacir Luiz, meu esposo, pois
se não fosse por ele teria desistido na inscrição do processo seletivo. Foi ele que
5
me incentivou a lutar quando havia desistido. Foi a razão e meu consolo. Meu
amor, muito obrigada.
Finalmente, agradeço ao Governo do Estado de Mato Grosso, que por
intermédio da SEDUC possibilitou a elaboração deste estudo, por meio de concessão
de licença integral e suporte financeiro.
Deus guarde a todos.
6
Resumo
Esta dissertação tem por objetivo discutir a utilização de grupos indígenas localizados na
repartição do Mato Grosso, na dinâmica de povoamento praticada pelo Estado português
na fronteira Oeste da América do Sul, no período compreendido entre 1752 ano da
fundação da vila capital, Vila Bela da Santíssima Trindade —, até 1798, quando foi
extinto o “Diretório dos Índios”. Neste estudo fronteira será interpretada como limite
entre as duas Coroas ibéricas, sem perder de vista as diversas outras conotações que
podem ser conferidas ao conceito.
Consideramos que as formações ameríndias, como quaisquer outras, não são imutáveis.
Assim sendo, além de analisarmos o modo pelo qual as diversas sociedades indígenas
participaram da dinâmica de povoamento, também buscamos desvendar as redes de
sociabilidade estabelecidas no entorno dos grupos indígenas da região. Iremos focar,
primeiramente, as estratégias colocadas em ação pelo Estado português, visando garantir
para si as sucessivas “conquistas” de territorialidades indígenas milenares. Em seguida
trataremos das tentativas de aldeamento de índios considerados “mansos”, e a chegada
dos bandeirantes em Cuiabá e Mato Grosso, além da política lusitana de inserção dos
nativos na ocupação e defesa da fronteira.
O estudo é beneficiário basicamente de documentação existente no Núcleo de
Documentação e Informação Histórica Regional - NDIHR, Arquivo Público do Estado
de Mato Grosso APMT, do “Diretório dos Índios”, das Instruções aos Capitães
Generais e dos “Anais de Vila Bela: 1734
1789”.
Correspondências oficiais, em sua
maioria, a documentação manuscrita foi transcrita, atualizando-se a grafia, tomando-se o
devido cuidado para o alterar o sentido original, procurando sempre colher, nas
entrelinhas, o modo pelo qual os índios foram representados nessa documentação.
Palavras-chaves: Índios, povoamento, Capitania de Mato Grosso, repartição do Mato
Grosso, fronteira.
7
Abstract
This essay has the objective of discussing the utilization of Indian groups located in the
Mato Grosso partition, in the settling dynamics practiced by the Portuguese state in the
west border of South America, between the period of 1752 the year of the foundation
of its capital, Vila Bela da Santíssima Trindade, until 1798, when the “Indian Directory”
(Diretório dos índios) was extinguished. In this study frontier” will be interpreted as
the boundaries between the two Iberian Crowns, not losing sight the diverse other
connotations that can be assigned to the concept.
Considering that the Amerindian formations, like any others, are not unchangeable. In
such case, besides analyzing the way the diverse Indian societies participated in the
settling dynamics, we also try to unveil the sociability system established around the
Indian groups of the region. We will focus, firstly, in the strategies put in action by the
Portuguese state, aiming to guarantee to themselves the successive “conquests” of
millenary Indian territories. Afterwards, we will deal with the attempts to settle the ones
considered “tamed” with villages, and the arrival of the “Bandeirantes (members of the
expedition called Bandeiras)” in Cuiaba and Mato Grosso, besides the Portuguese
politics to insert natives in the occupation and defense of the frontier.
This study is basically benefited by the existence of documentation in the Regional
Historical Information and Documentation Nucleus NDIHR, Public Archive of Mato
Grosso State APMT, of Indians Directory”, the instructions to the General Captains and
from the “Vila Bela historical records:1734-1789”. The official correspondence, which
was mostly handwritten, was transcribed, updating the spelling, being careful not to alter
the original meaning and trying always to perceive, within the implied sense, the way the
Indians were represented in this documentation.
Keywords: Indians, settling, Mato Grosso administrative division, Mato Grosso partition,
frontier.
8
Lista de abreviaturas
AHU – Arquivo Histórico Ultramarino
APMT – Arquivo Público do Estado de Mato Grosso
CU – Conselho Ultramarino
FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo
ICHS – Instituto de Ciências Humanas e Sociais
IHGMT - Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso
NDIHR – Núcleo de Documentação e Informação de História Regional
RIHGB – Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
SEDUC – Secretaria de Estado de Educação
RIHGMT – Revista do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso
UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso
UNIC – Universidade de Cuiabá
9
Sumário
Páginas
Introdução
13
Capítulo I
Em busca do “ouro vermelho”
1. Conquista e posse dos sertões de Cuiabá e Mato Grosso
2. As Instruções e os índios
23
31
38
Capítulo II
Mulheres índias e política de povoamento
1. O viver no extremo oeste
2. Casamentos versus concubinatos na Capitania de Mato
Grosso
3. Índios e negros nos quilombos
45
53
58
64
Capítulo III
Roubo de índios, fugas e ataques: o cenário na
fronteira oeste
1. Aldeia de Santa Rosa
2. As fugas
3. Os ataques
4. O descumprimento do Diretório
73
79
92
94
96
Considerações Finais
102
Fontes e bibliografia
107
Anexo
123
10
Lista de Ilustrações e Mapas
1 - “Figura de um soldado pedestre de Mato
Grosso”.................................................................................................................p. 100
2 - “Casal de índios espanhóis desertados de Santa
Ana”.......................................................................................................................p.100
3 - “Projeto de novo aposento para os Índios da Aldeia de São Miguel, na margem
do rio Guaporé, acima do Destacamento de Nossa Senhora Conceição quatro léguas;
mandado fazer pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor João Pedro da Câmara,
governador e capitão general desta capitania de Mato Grosso; feita no mês de
dezembro de 1765.”..............................................................................................p. 101
Mapa n° 1: Repartições do Cuiabá e do Mato Grosso – século XVIII..................p. 12
Mapa 2: Mapa de parte do Rio Guaporé, e dos rios Sararé, Galera, S.João e
Branco seus braços:.................................................................................................p. 72
Mapa n° 3: Mapa das repartições do Cuiabá e do Mato Grosso – século XVIII....p.79
11
Lista de tabela
Tabela 1 - Distrito do Forte de Bragança Capitania de Mato Grosso. Mapa do
estado civil da povoação do distrito - janeiro de1773.............................................p. 87
12
Mapa n° 1: Repartições do Cuiabá e do Mato Grosso – século XVIII
Fonte: FERNANDES, 2003. p. 83
13
Introdução
O índio ainda ocupa um espaço pequeno na historiografia brasileira, embora
nos últimos anos tenha havido certo crescimento na produção sobre o tema. No
entanto, as lacunas permanecem, principalmente se focarmos os livros didáticos dos
níveis escolares do Ensino Fundamental e Médio; na maioria dessas publicações, as
representações sobre os índios são ainda distorcidas e comprometedoras. Mesmo
havendo um aumento quantitativo e qualitativo na produção dos estudos acadêmicos,
o avanço nessa área ainda não atingiu de modo amplo os manuais didáticos. O
silêncio sobre o tema é quebrado, na maioria desses manuais, com algumas imagens
de índios apresentados como bárbaros ou exóticos. Seres diferentes” de nós,
“outros”.
Apesar dos problemas encontrados nos livros didáticos relacionados a uma
história indígena, outras produções, em larga medida baseadas nos pressupostos da
história cultural, abordam temáticas que ampliam o leque de problematizações acerca
da questão. Roger Chartier nos auxilia a compreender o processo de construção de
uma visão negativa acerca das culturas indígenas, ao afirmar que as lutas de
representações possuem tanta importância quanto as lutas econômicas, pois leva à
compreensão dos mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor a sua
concepção de mundo social, seus valores, a outros grupos
1
. Assim considerando,
torna-se possível apreender nos discursos dos colonizadores portugueses as tentativas
de inferiorizar os diversos grupos indígenas que ocupavam o território do centro
oeste sul americano no século XVIII. Ao procurar impor sua visão de mundo e
garantir seus interesses, ao conquistador restava reduzir a complexidade das práticas
culturais indígenas em manifestações de barbárie.
A partir do momento em que nos propomos a interpretar essas práticas
culturais em um contexto de circularidades e inter-relações com outras culturas,
alteramos a perspectiva de análise sobre essas problemáticas. Desse modo, uma
releitura de discursos que durante tanto tempo representaram os índios com os mais
nocivos e pejorativos adjetivos adquirem novos significados, pois elevam a primeiro
1
Cf. CHARTIER, 1990. p. 17
14
plano o universo histórico e cultural indígena, ressignificando historicamente não
apenas a imagem do índio, mas também a consciência.
Embora nos últimos anos tenha havido um razoável crescimento nos estudos
que abordam a história indígena colonial no Brasil
2
, especialmente sobre o século
XVIII, ainda são poucos os trabalhos que tratem especificamente dessa temática no
contexto da capitania de Mato Grosso
3
. Embora os estudos disponíveis ofereçam
importantes contribuições, evidentemente que deixam de abordar aspectos
importantes, como alguns que nos interessam, sobre os numerosos grupos indígenas
existentes no século XVIII, em função da amplitude do tema.
Considerando que o vasto território de fronteira pretendido pelos portugueses
embora contasse com colonos e escravos negros era ocupado majoritariamente
por ameríndios, alguns questionamentos nortearam a pesquisa. Considerando que os
portugueses já haviam estabelecido a necessidade de povoar a fronteira com grupos
indígenas, quais teriam sido as estratégias colocadas em prática para submeter essa
multiplicidade cultural e étnica, colocando-a a serviço da Coroa? que aos
administradores coloniais interessava o maior número possível de povoadores, o
crescimento da natalidade era fator importante. Diante disso, considerando que o
número de indígenas era imensamente maior que o de brancos ou negros, que
tratamento passou a ser dado ao índio e, em especial, às mulheres, visando o aumento
da população? Levando em conta as relações estabelecidas entre os habitantes de
uma fronteira política multiétnica, de que maneira se relacionavam índios, brancos e
negros? Como agiam administradores portugueses e espanhóis, quando o assunto
dizia respeito aos índios?
Partindo desses questionamentos, iremos focar o modo pelo qual as diversas
sociedades indígenas participaram da dinâmica de povoamento colocada em ação
pelo Estado português na fronteira Oeste de sua colônia americana
4
, em especial os
grupos que, naturalmente ou de modo forçado habitavam a repartição do Mato
Grosso (Mapa 1)
5
entre 1752 e 1798. O eixo norteador da pesquisa foi a premissa de
2
MONTEIRO, 1994; ALMEIDA, 1997; CUNHA, 1998; DOMINGUES, 2000; CARVALHO
JÚNIOR, 2005.
3
SILVA, 1995; MEIRELES, 1989; COSTA, 1999; PORTOCARRERO, 2001; CANOVA, 2003;
ANZAI, 2005; ALMEIDA, 2006.
4
Cf. ROSA, In: Territórios e Fronteiras (Revista do Programa de Pós-graduação em História da
UFMT). vol. I. n° 1, jul-dez/2000. p. 46.
5
Mapa n° 1 Repartições do Cuiabá e do Mato Grosso – século XVIII. p. 12
15
que as formações ameríndias, como quaisquer outras, não são imutáveis. Desse
modo, este estudo, além de analisar o modo pelo qual as diversas sociedades
indígenas participaram da dinâmica de povoamento colocada em ação pelo Estado
português na fronteira Oeste da América do Sul no período proposto, procura colocar
em evidência as redes de sociabilidade vigentes entre os diversos grupos da região.
No intercâmbio de experiências de contato, esses grupos reelaboraram sua
organização de vida em diálogos interculturais ricos, que a pesquisa histórica pode,
aos poucos, desvelar.
O marco inicial desse estudo, 1752, evidencia a escolha mais concreta da
preocupação do Estado luso com a fronteira Oeste: a fundação de Vila Bela da
Santíssima Trindade em terras pertencentes a Castela, indicando firme intenção de
fixação. Fundar vila implicava em povoar, e nisso residia um dos maiores entraves à
administração portuguesa, pois, de acordo com o Tratado de Madri, as fronteiras
entre os domínios ibéricos seriam definidas de acordo com o princípio do uti
possidetis, ou seja, do direito à posse pela comprovação da presença e ocupação dos
lugares. Portanto, era urgente manter ocupadas por vassalos da Coroa lusa as terras
da fronteira em litígio.
Vila Bela
6
localizava-se às margens do rio Guaporé, em ponto estratégico
para a consolidação do poder luso, pelo fato de se encontrar à beira de rio navegável,
facilitando a comunicação fluvial com o Grão-Pará via Guaporé-Mamoré-Madeira
7
.
Além do mais, estava próximo às missões religiosas de Chiquitos e Moxos, o que
significava, para os administradores portugueses, a possibilidade de conseguir mão-
de-obra habilitada ao trabalho sedentário, desejado pelo colonizador. A
importância dessa fronteira guaporeana para o governo metropolitano pode ser
avaliada pela Instrução Real enviada ao capitão general Rolim de Moura:
6
A extensão territorial de Vila Bela incluía todo o atual município de Pontes e Lacerda e grande parte
do atual estado de Rondônia. Por determinação da Lei 566 de 27 de setembro de 1911, a Vila
sofreu a primeira perda territorial para a formação do município de Santo Antonio do Rio Madeira
(Rondônia). Outra perda territorial aconteceu em 1979, pela Lei 4.167 de 29 de dezembro, que
resultou no desmembramento de toda a área sudeste, compreendida entre os altos cursos do Rio
Juruena e seu afluente Securi, do Rio Galera e do Rio Barbado, para a formação do município de
Pontes e Lacerda. Cf. BANDEIRA, 1988. p. 37.
7
Sobre o assunto consultar a dissertação de SILVA, João Bosco da. Vila Bela à época de Luís de
Albuquerque (1772-1789). Dissertação (Mestrado em História). Cuiabá, Instituto de Ciências
Humanas e Sociais (ICHS) – Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), 2005.
16
Por se ter entendido que Mato Grosso é a chave e o propugnáculo do sertão do
Brasil pela parte do Peru, e quanto é importante por essa causa que naquele
distrito se faça população numerosa, e haja forças bastantes a conservar os
confinantes em respeito, ordenei se fundasse naquela paragem uma vila, e
concedi diversos privilégios e isenções para convidar a gente que ali quisesse ir
estabelecer-se, e que para decência do governo e pronta execução das ordens se
levantasse uma companhia de dragões, e ultimamente determinei se erigisse
juiz-de-fora no mesmo distrito.
8
Ficava claro, na Instrução” enviada pela rainha D. Mariana de Áustria ao
primeiro capitão general da Capitania de Mato Grosso, D. Antonio Rolim de Moura,
que, embora o distrito do Cuiabá fosse mais povoado, o distrito do Mato Grosso
merecia maior vigilância, “por causa da vizinhança que tem”, alusão explícita aos
espanhóis
9
. Essa preocupação demonstra a importância da fundação de Vila Bela na
estratégia de ocupação de territórios espanhóis. Ocupar a região era uma necessidade
e um problema sério, devido ao pequeno número de colonos. Mas esse não era um
problema que dizia respeito apenas à capitania de Mato Grosso, já que havia outros
territórios cuja posse deveria ser assegurada em detrimento da Espanha.
Ciente da importância da mão-de-obra indígena, cuja política de proteção
vinha desde o século anterior, o Estado português lançou o “Diretório dos Índios”,
em 1757, peça jurídica que concedia ao índio um tratamento específico, visando
preparar trabalhadores e povoadores que estivessem a serviço da Coroa, povoando e
protegendo as terras da fronteira.
O Diretório caracterizava-se, primeiro, pelo modo da tutela exercida pelo
Estado; segundo, como regimento de trabalho entre índios e brancos; e, terceiro,
como plano de povoamento
10
. Criado de modo deliberado para manter os índios sob
controle, como peça jurídica o “Diretório” tornou-se uma carta de orientação que
determinava os procedimentos a serem tomados para a implantação e sustentação de
novas aldeias, por meio do qual os índios deveriam ser retirados de sua condição
original, transformados em associados portugueses; como vassalos, tornariam efetivo
8
Instrução da Rainha [D. Mariana de Áustria] para D. Antonio Rolim de Moura. Lisboa, 19 de janeiro
de 1749. In: INSTRUÇÕES aos Capitães-Generais. Publicações avulsas n° 27. Cuiabá: IHGMG,
2001.p.12.
9
Ibidem. p. 11-12.
10
Cf. ALMEIDA, op.cit., 1997. p. 152.
17
o direito português às terras que ocupavam
11
. Portanto, transformar os indígenas em
súditos leais e católicos fiéis, de modo a, “por um lado, criar um estrato camponês
ameríndio integrado na economia de mercado como assalariado e, por outro,
transformar os índios em veículos da colonização portuguesa”
12
. Além de “estratégia
ideológica para inserir o indígena no modelo de exploração colonial, o Diretório
buscava civilizar o indígena”
13
.
Para Ângela Domingues, a política do Diretório apresentava-se como “uma
alternativa ao sistema das missões”
14
. Ao prever a criação de povoações ao invés de
missões, o Diretório mantinha os índios alojados em um local determinado,
estrategicamente localizado, de modo que pudessem atender às necessidades do
processo de conquista e colonização, sem oferecer possibilidade de reforçar o poder
de uma ordem religiosa autônoma.
No entanto, a lei que buscava transformar os índios em vassalos da Coroa
foi promulgada dois anos antes do Diretório. Em 6 de junho de 1755 foi promulgada
uma lei que restituiu a liberdade aos índios que se encontravam em mãos de
particulares, transformando, segundo Ângela Domingues, os ameríndios em
vassalos”
15
. Esta premissa mostrava-se complexa, pois, se por um lado considerava o
índio pessoa livre, “tendendo a equipará-lo a qualquer vassalo luso-brasileiro”, por
outro lado, por meio de medidas civilizacionais e educativas, buscava “transformá-lo
em verdadeiro vassalo luso-brasileiro”, civilizando-o
16
. No dia seguinte ao da
promulgação da lei de liberdade, ou seja, em 7 de junho de 1755, outra lei retirou dos
missionários o poder de administrarem indígenas. Os índios passaram, desse modo, a
integrar os mesmos circuitos administrativos e jurídico-institucionais que os luso-
brasileiros, uma vez que deixavam de ter uma autoridade tutelar que os regesse na
administração das suas povoações”
17
.
No entanto, as leis de 6 e 7 de junho de 1755 foram colocadas em prática
apenas a partir do Diretório, que foi, nessa perspectiva, “uma forma de tornar o índio,
11
Cf. COELHO, In: Revista Campos 7 (1), ano 2006. p. 119.
12
Cf. DOMINGUES, op. cit. 2000, p. 68
13
COELHO, 2000. pp. 150-157.
14
DOMINGUES, op. cit. 2000, p. 20.
15
Ibidem. p. 38.
16
Ibidem.
17
Ibidem, p. 42.
18
a quem se tinha formalmente concedido o estatuto de vassalo, num verdadeiro
súdito, num luso-brasileiro ao serviço dos interesses da coroa e útil à política
colonial”. Apesar das garantias, o estatuto dos vassalos ameríndios era contrastante
com a situação que, de fato ocupavam, sendo comum a infração dos direitos básicos
estipulados na lei
18
.
A grande mudança promovida pelo Diretório foi o incentivo à miscigenação
e à presença de não índios no interior das aldeias, como medidas necessárias para
promover a assimilação, pelos índios, do modo de viver dos brancos. Porém, apesar
das mudanças, o Diretório manteve, em grande parte, as diretrizes básicas do
Regimento das Missões de 1686
19
, no que diz respeito à organização do trabalho
indígena e sua repartição, bem como aos direitos e obrigações dos índios aldeados. O
Regimento das Missões, de responsabilidade do Padre Antonio Vieira, ficou em
vigor até o estabelecimento do Diretório. Embora tenha sido elaborado
especificamente para a Amazônia, seus princípios mais gerais foram aplicados nas
demais aldeias jesuíticas da América portuguesa.
Deve-se levar em consideração que a política portuguesa foi variável no
tempo e no espaço, tanto no relacionamento dos colonos com as populações
indígenas, quanto em relação a outros espaços coloniais
20
. Embora da capital do
Império emanasse toda a política colonial, como bem enfatiza Ângela Domingues,
“os resultados desse discurso político dependeram das sociedades a que se
destinava”
21
. Desse modo, consideramos importante levantar dados que possam
informar sobre o modo pelo qual o Diretório foi aplicado na Capitania de Mato
Grosso, até o final de sua vigência, 1798, que dispomos de poucos estudos a
respeito, mesmo em outras partes da colônia.
Este estudo privilegia a região do Vale do Guaporé por ter sido ali fundada
a “cabeça do governo” da Capitania Vila Bela da Santíssima Trindade, à margem
direita do rio, na repartição do Mato Grosso. Desse modo, sempre que utilizarmos a
expressão “de Mato Grosso” estaremos nos referindo à Capitania de Mato Grosso, e,
quando constar “do Mato Grosso”, estaremos nos referindo à região banhada pelos
18
DOMINGUES, op.cit., 2000, p. 42-49.
19
Sobre este assunto, ver: PERRONE-MOISES. In: CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). 1998.
p.115-132.
20
Cf. DOMINGUES, op.cit., 2000. p. 7.
21
Ibidem. p. 18.
19
rios amazônicos, Vale do Guaporé, região que passou a ser mais freqüentada por
colonos após os registros de José Gonçalves da Fonseca
22
.
Do outro lado do Guaporé,
a poucas léguas de distância, estavam as missões religiosas de Chiquitos e de Moxos,
administradas por jesuítas, até 1767, nas quais milhares de índios se concentravam.
Conquistar as missões e seus índios fazia parte dos sonhos tanto de mercadores de
escravos quanto de capitães generais portugueses.
É importante frisar que, embora povoar o território estivesse ligado a uma
necessidade de defesa militar, abordaremos a construção de fortes e presídios apenas
quando esses temas se fizerem necessários para melhor explicitar nosso objeto de
estudo. Nas análises elaboradas, fronteira será interpretada como limite entre as duas
Coroas ibéricas, além das diversas outras conotações culturais que podem ser
conferidas ao conceito. Leva-se em consideração que os grupos indígenas dessa
fronteira “oficial” não a reconheciam, pois as suas fronteiras culturais faziam parte
de outros territórios, por sua vez reterritorializados pelos europeus. Os índios e a
América também foram inventados pela Europa, em especial por Espanha e Portugal,
e passaram a sofrer um processo de dominação “de graus variados de uma complexa
hegemonia”
23
.
O objetivo luso era povoar para manter o domínio sobre as terras. No século
XVIII, fundar povoação, segundo Rita Heloísa de Almeida, significava “ato de
povoamento, a ação de povoar, e não o resultado, o núcleo surgido, como costuma
ser empregada”
24
. O “fazer povoação” é registro freqüente na documentação, e era
praticada com grupos considerados “mansos”, como os Pareci, que foram descritos
pelo sertanista Antonio Pires de Campos como “os mais próprios para se admitir
civilização”
25
. Segundo Almir Diniz de Carvalho Júnior, na constituição de novas
identidades, ao lado da expressão “índios”, somaram-se outros indicativos
identitários, sendo distinguidos pelos europeus com algum traço mais particular,
como “mansos” ou “brutos”; selvagens; domésticos, etc., de modo que, das mais
variadas formas, afirmavam sua condição de “civilizados” ou “selvagens”. E
continua este autor: “os missionários católicos e as autoridades coloniais dos séculos
XVII e XVIII, diante da multiplicidade de etnias, aplicaram a forma mais simples
22
FONSECA, In: RIHGB. TOMO XXIX, p. 353-354.
23
SAID, 1990. p.17.
24
ALMEIDA, op.cit., 1997. p.138.
25
CAMPOS, 1975, p. 187-189.
20
para a sua identificação, que sempre girou em torno de aliados ou não aliados;
amigos ou inimigos”
26
. Portugal fundava aldeias, “povoações”, a partir da
concentração de “índios mansos”, e incorporação de índios fugitivos das missões
jesuíticas espanholas.
Diversos grupos indígenas eram obrigados a conviver nessas povoações, e
isso nos colocou uma questão de método. A documentação levantada, na maior parte
das vezes, não registra a origem das populações à qual se refere, e isso implica em
generalizações que dificultam a identificação de grupos específicos. Ao aceitarmos a
denominação “índios” aos habitantes das povoações, corremos o risco de tornarmos
homogêneas sua realidade étnica e identitária. No entanto, entre refletir sobre a
questão, e não fazê-lo, optamos pela segunda possibilidade. Conhecemos a
importância de se identificar os grupos indígenas em ação, considerando a
diversidade cultural, histórica e étnica de cada um dos grupos. No entanto, a
documentação levantada é majoritariamente oficial
27
; desse modo, a referência
constante a “índios” reflete a condição dessa documentação, embora procuremos
identificar os grupos sempre que a documentação o permitir. Baseando-nos em
Ângela Domingues
28
, arriscamo-nos a estudar um espaço a repartição do Mato
Grosso e não um grupo ou um caso. É nosso objetivo praticar uma “nova história
indígena” no sentido mais amplo da expressão, nos moldes preconizados por John
Manuel Monteiro, para quem
A poderosa imagem dos índios como eternos prisioneiros de formações
isoladas e primitivas tem dificultado a compreensão dos múltiplos processos
de transformação étnica que ajudariam a explicar uma parte considerável da
história social e cultural do país. [...] A tendência de definir grupos étnicos
26
Cf. CARVALHO JUNIOR, 2005. p. 2.
27
Cf. COELHO, In: Revista Campos 7 (1), ano 2006. p. 118. Em seu artigo o autor observou as
dificuldades que encontramos ao optarmos por pesquisar os processos históricos vividos pelas
populações indígenas, em períodos recuados, devido a escassez de documentos produzidos por essas
próprias populações. Além disso, como a documentação oficial trabalhada no artigo trata de grupos
que conviviam em unidades coloniais, os autores dessas documentações dificilmente registravam os
grupos específicos, dificultando sua identificação.
28
Cf. DOMINGUES, op.cit., 2000. p. 17. A autora optou por considerar as etnias da bacia
hidrográfica amazônica na sua globalidade, não especificando, na maioria das vezes, os grupos
indígenas, e justifica que como tal eram considerados na política indigenista dos Setecentos; por isso,
optou por estudar o espaço, e não um grupo ou um caso, de modo que também Ângela Domingues fez
referências constantes a expressão índios”. s também optamos em estudar a política de
povoamento de um espaço, e não um grupo; desse modo, como Domingues, utilizaremos a expressão
“índios” frequentemente, e faremos a identificação de grupos específicos sempre que a documentação
selecionada assim o permitir.
21
em categorias fixas serviu não apenas como instrumento de dominação,
como também de parâmetro para a sobrevivência étnica de grupos indígenas,
balizando uma variedade de estratégias geralmente enfeixadas num dos
pólos do inadequado binômio acomodação/ resistência.
29
Segundo Monteiro, atualmente os estudiosos vêm tratando da questão dos
etnônimos com mais cautela e rigor, sobretudo no que diz respeito à relação entre as
formas sociais pré-coloniais e as unidades sociais posteriores à instalação de
populações européias e africanas nas Américas
30
.
A presente dissertação beneficia-se basicamente de documentação existente
no Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional - NDIHR, do Arquivo
Público do Estado de Mato Grosso APMT, do “Diretório dos Índios”
31
, das
Instruções aos Capitães Generais
32
e dos “Anais de Vila Bela: 1734
1789”
33
.
Este
último
registra, dia a dia, o movimento na Vila capital, seus arraiais, e a fronteira, de
um modo geral. Portanto, analisamos basicamente correspondência oficial
manuscrita. Esses documentos foram transcritos com atualização da grafia, e
procuramos sempre colher, nas entrelinhas, representações elaboradas por seus
autores sobre os índios da capitania de Mato Grosso.
Para expor os resultados da pesquisa, organizamos a narrativa em três
capítulos. O “Capítulo I - Em busca do ‘ouro vermelho’ apresenta as principais
ações da Coroa lusa em relação aos índios, desde a primeira ocupação européia do
território pelos sertanistas, em busca de mão-de-obra indígena. Focalizamos,
também, as tentativas feitas para aldear índios “mansos”, e a chegada dos
bandeirantes a Cuiabá e Mato Grosso. Faz parte desse capítulo uma análise sobre a
política lusitana de inserção dos nativos na ocupação e defesa da fronteira Oeste.
No Capítulo II “Mulheres índias e política de povoamento” – procuramos,
nos interstícios da documentação, pela presença feminina, com o objetivo de destacar
a participação das índias na política de povoamento. Desde os primeiros contatos
29
MONTEIRO, 2001. p. 7. Disponível na página: http://venus.ifch.unicamp.br/ihb/ em 09/09/2006 às
16h50min..
30
Ibidem, p. 60.
31
Em ALMEIDA, op.cit., 1997.
32
INSTRUÇÕES aos Capitães-Generais. Publicações avulsas n° 27. Cuiabá: Instituto Histórico e
Geográfico do Estado de Mato Grosso, 2001.
33
AMADO & ANZAI (orgs.). 2006.
22
foram as mulheres indígenas aquelas que geraram os indivíduos mais adaptados e
desejados pelos administradores para “ocupar” o território, com o interesse de se
fazer o “povoamento” da Capitania de Mato Grosso. Nessa exposição, discutimos a
política pombalina de incentivo aos casamentos interétnicos como um dos meios de
promover o aumento da população da Capitania.
No Capítulo III “Roubo de índios, fugas e ataques: o cenário na fronteira
Oeste” abordamos a incorporação de índios das missões espanholas à proposta lusa
de povoamento e algumas formas de resistências indígenas diante da política
portuguesa. O objetivo é mostrar as estratégias lusas colocadas em prática para
conseguir índios das missões espanholas de Moxos e Chiquitos. Essas missões, após
a expulsão dos jesuítas, em 1767, passaram a representar alvos fáceis aos ataques de
portugueses, que levavam delas pessoas e produtos. Abordamos também, neste
capítulo, as práticas transgressoras que indicam resistências empreendidas por índios
na fronteira, além do descumprimento do “Diretório” por parte de funcionários da
Coroa.
Nas “Considerações finais”, retomamos as análises parciais de cada um dos
capítulos, colocando em destaque as questões levantadas inicialmente e as nossas
respostas, produzidas por meio de análise das fontes que escolhemos. Com isso,
esperamos poder contribuir com os estudos que se desenvolvem sobre história
indígena, apresentando dados ainda pouco discutidos que, ao se juntarem a outros,
podem oferecer contribuição à ainda pouco estudada história indígena da fronteira
Oeste do império luso na América.
23
Capítulo I
Em busca do “ouro vermelho”
Viviam milenarmente, nas terras que a partir do século XVI passaram a
chamar América, muitas nações de povos nativos. Segundo Adauto Novaes, “um
mundo jamais visto antes. Aos olhos da Europa, uma sociedade inquietante se
revela”. Equivocadamente, os europeus acreditaram que eram homens e mulheres
“sem lei, sem fé e sem rei, que habitavam a outra margem do Ocidente”
34
.
Esses grupos humanos de diferentes culturas possuíam também estágios
culturais diversos uns dos outros. Os portugueses, navegantes de continentes
diversos, conheceram costumes até então impensados, e múltiplos povos entraram
em contato. A surpresa dos primeiros encontros logo foi substituída pela intolerância,
principalmente a religiosa. “Aos primeiros contatos, seguiu-se a conquista espiritual
comandada por agentes da ortodoxia católica”
35
.
A chegada dos europeus alterou a relação de povos, entre si e em relação à
natureza. Grande número de sociedades indígenas foi destruído e, segundo Antonello
Gerbi, até mesmo “as melhores intenções com os indígenas terminavam por
confirmar-lhes a inferioridade e o avassalamento”
36
. Isso porque desde que
desembarcaram no “Novo Mundo”, os europeus viram nos indígenas uma
inferioridade nata em relação aos povos do “Velho Mundo”. À procura de
justificativas a essa pretensa inferioridade, pregavam os colonizadores que os índios
deveriam ser duplamente escravizados, por qualidades e por defeitos: “porque eram
robustos e ferozes e porque eram débeis e poltrões”
37
. Esse modo de classificar os
índios americanos estendia-se também ao ambiente, ao clima, às plantas e aos
34
NOVAES, 1999. p. 7.
35
FRAGOSO, João; BICALHO, Maria Fernanda e GOUVÊA, Maria de Fátima (Orgs.). O Antigo
Regime nos Trópicos: a dinâmica imperial portuguesa (séculos XVI-XVIII). Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2001. p. 227.
36
GERBI, 1996. p. 75.
37
Ibidem, p. 73.
24
animais
38
, assim os portugueses buscaram legitimar ou pelo menos justificar as suas
condutas.
Na fase inicial da colonização lusa na América, entre 1500 e 1530,
caracterizada pela presença de feitorias, a prática do escambo de certa maneira
amenizou as relações entre portugueses e índios, mas nos períodos posteriores, essas
relações foram se desgastando. A partir de 1530, com a implantação do sistema de
capitanias, foi enviada à colônia a expedição colonizadora comandada por Martim
Afonso de Souza, e em 1532 houve a fundação da Vila de São Vicente. Nas faixas de
terra que constituíam as Capitanias deveria ser utilizada a abundante mão-de-obra
indígena que então existia. Com as relações de trabalho que passaram a vigorar,
segundo John Manuel Monteiro, as “diversas e distintas sociedades indígenas
ficaram subordinadas a uma estrutura elaborada visando controlar e explorar a mão-
de-obra indígena”
39
.
Com o fracasso do sistema de Capitanias
40
e a implantação do Governo
Geral (1549) cujo primeiro governador foi Tomé de Souza (1549 a 1553) ,
passou a vigorar na colônia uma política destinada aos índios, cujo objetivo era
ensinar-lhes a língua portuguesa, doutriná-los segundo a católica, e empreender
“guerras justas”, caso fosse necessário, para transformá-los em mão-de-obra
qualificada.
Junto a Tomé de Souza vieram também os padres da Companhia de Jesus,
que chegaram à Colônia americana em março de 1549, e que foram responsáveis
pela implantação de “colégios”. Os jesuítas desenvolveram uma obra baseada em
aldeamentos de índios e aplicação de princípios norteadores da cultura ocidental.
Aliada dessa proposta civilizadora, a Igreja Católica contribuiu no processo de
transformação dos índios em trabalhadores produtivos, segundo os padrões europeus.
Para esses missionários, os ameríndios eram “vítimas das artimanhas de Lúcifer: se o
Diabo não lhes furtasse o bem da salvação, não provocasse discórdias, não lhes
incitasse a matar e comer uns aos outros, os nativos seriam homens felizes”
41
.
38
Ibidem, p. 73-74
39
MONTEIRO, op.cit., 1994. p. 9.
40
A completa abolição das capitanias hereditárias ocorreu em 1759, pelo Conde de Oeiras, futuro
Marquês de Pombal, substituindo-as pelas capitanias régias. Cf. FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA
(orgs.). 2001. op.cit., p. 302-303.
41
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA (orgs.). op.cit., p. 233.
25
O trabalho dos missionários dedicados à conversão dos índios pode ser
dividido em dois períodos: o das missões volantes e o dos aldeamentos. O primeiro
período, o das missões volantes foi bem curto, com duração de cerca de cerca de dez
anos. Acreditando que poderiam converter os índios mais rapidamente caso fossem
pregar diretamente nas aldeias, dirigiam-se a elas em um trabalho árduo e lento, que
não resultou naquilo que esperavam
42
. Desse modo, deu-se início a uma prática que
caracterizou a segunda fase do trabalho missionário: o estabelecimento de
aldeamentos.
Na fase inicial dos aldeamentos coube ao governador-geral Mem de
providenciar os deslocamentos de índios para locais escolhidos para recebê-los,
povoações sob a jurisdição temporal do governador-geral e jurisdição espiritual dos
missionários. Os índios eram forçados a se juntar nesses aldeamentos, e caso não
aceitassem deixar suas aldeias, seriam perseguidos podendo ser presos em guerras
justas
43
.
Esses primeiros aldeamentos foram criados “próximos aos povoados
portugueses, não junto a eles, a fim de não serem os indígenas afetados pelos maus
exemplos dos portugueses, conforme conselho de Nóbrega”
44
. A proximidade dos
aldeamentos deveria ser suficiente para que os índios observassem o funcionamento
dos povoados, porém não tão perto que permitisse a observação dos maus exemplos
dos portugueses.
A obra colonizadora do governo-geral visava, acima de tudo, assentar os
colonos, transformá-los em “moradores”, incentivando a implantação de engenhos, o
aldeamento dos índios “mansos” junto aos povoados e vilas dos brancos, o
estabelecimento de feiras semanais, com a presença do gentio
45
. No entanto, os
índios tinham excelentes razões para não quererem nem aldear nem trabalhar para os
portugueses, pois, vivendo a seu modo, obtinham caças, frutos, pescas, alimentos
muito mais fartos e adequados a eles.
Nos aldeamentos, ao menos durante o século XVI, foi mantida a divisão
sexual do trabalho segundo a estrutura mais geral do mundo indígena, na qual
42
Cf. MELATTI, Júlio Cezar. De Nóbrega a Rondon. Disponível na página:
http://www.geocities.com/juliomelatti/artigos/a-nobreg.htm em 26/12/2007 às 16h.
43
Ibidem.
44
FRANZEN, In: Revista História Unisinos. vol. 6, n° 5. 2002. p. 125.
45
Ibidem, p. 61.
26
mulheres e crianças executavam funções ligadas ao plantio e à colheita, ficando os
homens liberados para exercer funções mais especializadas. Mesmo assim, no
entanto, era uma prática homogeneizadora, considerando que eram obrigados a
conviver em espaços comuns povos das mais diversas culturas. O que se procurava,
por meio dos aldeamentos, era “oferecer, através da reestruturação das sociedades
indígenas, uma solução articulada para as questões da dominação e do trabalho
indígena”
46
. Após um período de treinamento, os índios poderiam ser contratados por
colonos, por tempo determinado e salário previamente combinado. Esses salários
ficavam bem abaixo dos custos de produção da força de trabalho, e acabavam sendo
absorvidos pelas próprias estruturas do aldeamento, nada sobrando para os índios.
O projeto jesuítico acelerou o processo de desintegração das comunidades
indígenas, embora isso não estivesse previsto. Acrescente-se que o contato das mais
diversas nações indígenas com o colonizador concorreu para a disseminação de
doenças para as quais os ameríndios não possuíam imunidade, provocando alta taxa
de mortalidade
47
.
O grande problema enfrentado pelos índios, dos séculos XVI ao XVIII, ao
se rebelarem e não aceitarem as imposições portuguesas relacionadas aos
aldeamentos era o fato de que aqueles que não aceitassem os aldeamentos e as
alianças com os portugueses seriam perseguidos e aprisionados, passando a ser
considerados escravos. Para Júlio Cezar Melatti, “A legislação portuguesa sempre
oscilou entre a liberdade e a escravidão dos índios, ficando muitas vezes no meio
termo, refletindo o interesse dos grupos que tinham influência no governo”
48
.
“Cativeiro justo” e guerra justa” foram noções que fizeram parte do
pensamento teológico e jurídico do império português e, de acordo com Hebe Maria
Mattos, embora houvesse uma orientação favorável à liberdade natural dos índios, “o
cativeiro legitimado pela guerra justa ao índio pagão e hostil permaneceu na América
portuguesa até o advento das reformas pombalinas”
49
.
Os sucessores de Tomé de Souza seguiram a mesma política de povoar a
terra e controlar o gentio, fosse por meio de guerras justas fosse pela catequese, até a
46
MONTEIRO, op.cit., 1994. p. 42.
47
Ver, a respeito: ANZAI. A mineração na América espanhola e seus efeitos no ambiente, In: Revista
Saúde e Ambiente. Cuiabá: EdUFMT, v. 1, n. 1, p. 90-110, 1998.
48
MELATTI, op.cit. p. s/n°.
49
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA (orgs.). op.cit., p. 146.
27
União das Coroas Ibéricas (1580 a 1640)
50
. A partir de então, o Tratado de
Tordesilhas, na prática, deixou de ter validade, o que favoreceu a entrada de
portugueses em territórios castelhanos
51
. Nesse período, do ponto de vista
institucional, duas medidas foram de grande importância: a publicação das
Ordenações Filipinas
52
, em 1603, e a criação do Estado do Maranhão e do Grão-Pará,
em 1621.
As Ordenações Filipinas, mandadas organizar durante a União Ibérica, por
Filipe II da Espanha (I em Portugal) tinham o objetivo de coordenar e sistematizar a
legislação vigente, mantendo, porém, o caráter português das leis, de modo a não
prejudicar os novos súditos. As Ordenações foram compostas de cinco livros, que
dispunham sobre uma variada gama de assuntos aplicados aos naturais do Reino
53
,
porém não aplicadas aos indígenas, que possuíam legislação própria.
A criação do Estado do Maranhão e do Grão-Pará se deu em decorrência
direta da fundação da Vila de Santa Maria do Belém do Pará, na foz do Amazonas. A
fundação desta vila aconteceu pelo medo da Espanha diante da possibilidade de
piratas ou colonos holandeses adentrarem o Amazonas até o Peru, chegando até as
minas de prata
54
. Desse modo, o território do Maranhão e do Grão-Pará foi, nesse
momento, “uma terra a ser anexada e dominada, no sentido utilitarista, de
fornecimento de riquezas que pudessem compensar a perda generalizada das
possessões portuguesas na Ásia”
55
.
50
Com a morte do jovem rei português, D. Sebastião, o trono luso foi ocupado por um velho tio, o
cardeal D. Henrique, que faleceu dois anos após. Com o trono vago, o legítimo sucessor passou a ser
Filipe II, da Espanha (Felipe I em Portugal). Sobre o assunto consultar: SILVA, Francisco Carlos
Teixeira da. Conquista e Colonização da América Portuguesa: O Brasil Colônia 1500/1750, In:
LINHARES, Maria Yedda (org.). História Geral do Brasil. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1990. p.
67.
51
O período de dominação espanhola, para Francisco Carlos Teixeira da Silva, deu origem a muitas
das instituições brasileiras, e “permitiu a sua pré-configuração territorial”. Ibidem, p. 67.
52
Ibidem, p. 68: “As Ordenações Filipinas estiveram em vigor no Brasil por mais de 300 anos,
sendo substituídas em 1917, pelo Código Civil brasileiro.”
53
Ordenações Filipinas, Livro II, Título LV. “Para que cessem as dúvidas, que podem suceder sobre
quais pessoas devam ser havidas por naturais destes Reinos de Portugal e Senhorios deles, para efeito
de gozarem dos privilégios, graças, mercês e liberdades concedidas aos naturais deles ordenamos e
mandamos, que as pessoas, que não nascerem nestes Reinos e Senhorios deles, não sejam havidas, por
naturais deles, posto que neles morem e residam, e casem com mulheres naturais deles, e neles vivam
continuadamente, e tenham seu domicílio e bens.” Disponível no site
http://www.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l2p489.htm, em 24/02/2007 as 11h31m.
54
Cf. SILVA, In: LINHARES, (org.) op.cit., 1990. p. 68.
55
FERREIRA, Isabella Fagundes Braga. Territorialidades de um império: a Amazônia colonial
(1751-1759). Dissertação (Mestrado em História). Brasília, UNB,2002. p. 33.
28
A partir do século XVIII as relações comerciais, por intermédio da
Companhia de Comércio do Grão Pará e Maranhão, entre o Grão Pará e Maranhão e
a repartição do Mato Grosso
56
estiveram muito presentes. Com o avanço de colonos
para as terras do interior do continente, a proibição de acesso à mão-de-obra indígena
aldeada levou a que os colonos traçassem estratégias para adquirir índios, entre as
quais duas foram bastante aplicadas: os casamentos e concubinatos, e as alianças
entre “brancos” e índios. Desse modo, além da subordinação por meio das armas, nas
guerras justas, essa ‘subordinação’ passou a envolver também negociações
57
. As
alianças ocorriam sempre que os índios percebiam vantagens na ligação com
portugueses contra grupos rivais. Para José Gledson Vieira, essas alianças entre
‘brancos’ com alguns grupos autóctones “foram decisivas no sentido de potencializar
a guerra entre eles. Os brancos’ não apenas participavam das expedições guerreiras
dos ‘aliados’, como adquiriam por meio da compra, os cativos da guerra”
58
.
Ao firmar essas alianças, os portugueses passavam a ter a possibilidade de
estabelecer relações amigáveis com alguns grupos indígenas e de escravizar outros
59
.
Porém, com o passar do tempo, essa prática começou a promover resultados
negativos, principalmente para os índios, que viram grupos inteiros serem dizimados
pela guerra, por epidemias ou pelo apetite insaciável dos portugueses por mão-de-
obra.
No século XVII, o Alvará de 17 de outubro de 1653, dirigido ao Maranhão e
Pará, determinava que a escravidão indígena seria legítima em alguns casos: quando
ocorresse por intermédio de guerra justa; na defesa das vidas e bens dos vassalos da
Coroa; quando o prisioneiro estivesse prestando ajuda aos inimigos do Reino; se o
índio fosse ladrão ou assassino; se não cumprisse as obrigações, tais como prestação
de serviços reais ou lutar contra os inimigos; se praticasse antropofagia em ditos
portugueses; se estivesse preso à corda para ser comido ou se fosse escravo no
próprio meio
60
. Este tipo de prática legal parece-nos que foi recorrente durante todo
56
Havia dois termos ou repartições: a repartição do Cuiabá, articulada com o Estado do Brasil, e a
repartição do Mato Grosso, articulada com o Estado do Grão Pará e Maranhão. Cf. ROSA, A Gazeta,
Cuiabá, 4 de março de 2002.
57
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA (orgs.).op.cit., p.58.
58
VIEIRA, José Gledson. A (im)pureza do sangue e o perigo da mistura: uma etnografia do grupo
indígena potyguara da Paraíba. Dissertação (Mestrado em Antropologia). Curitiba, UFPR, 2001. p.
25.
59
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA (orgs.). op.cit., p. 59.
60
Cf. SIQUEIRA, In: Universidade – Revista UFMT. Ano II, n. 1 – jan./abr. 1982. p. 29.
29
período colonial. Na aparência, ela proibia a escravidão indígena; porém, na essência
a permitia, isso porque à Coroa interessava contentar os múltiplos interesses gestados
na Colônia.
A política implantada para a inclusão dos índios no projeto civilizador, mais
do que civilizá-los favoreceu a diminuição desses povos, provocando desequilíbrio
tanto nos aldeamentos, quanto em suas aldeias de origem. Essa situação devia-se a
diversos fatores, entre os quais o aprisionamento em “guerras justas”; a opção por
tornar prisioneiras pessoas do sexo feminino; os acordos firmados entre portugueses
e índios sobre o aprisionamento e entrega, aos portugueses, dos capturados em
guerras intertribais; as doenças e maus-tratos sofridos pelos indígenas, entre outros.
A mão-de-obra escrava foi a base do desenvolvimento de prósperas plantações de
trigo nos séculos XVI ao XVII na vila de São Vicente, porém, não os vicentinos
capturavam índios, conquistados de procedências diversas, proprietárias de engenhos
também realizaram esse tipo de ação
61
.
A partir do século XVII, à medida que crescia a demanda por mão-de-obra,
a violência tornava-se um instrumento cada vez mais utilizado no apresamento de
cativos, a exemplo dos ataques dos bandeirantes paulistas contra as missões
jesuíticas espanholas, que congregavam grande parte dos índios Guarani
62
. Os índios
dessas missões eram desejados pelos paulistas por praticarem a agricultura e falarem
um idioma semelhante à ngua geral de São Paulo. Para combater os ataques
bandeirantes, os jesuítas armaram os índios das missões, e estes derrotaram os
bandeirantes em Mbororé
63
, em 1641. Na busca por soluções, os religiosos passaram
a concentrar as reduções ou aldeamentos em locais cada vez mais distantes. No
entanto, os colonos paulistas os perseguiam, embora a venda de índios que não
fossem adquiridos em guerras justas se constituísse em ato ilegal.
61
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA (orgs.).op.cit., p. 39.
62
Os Guarani estavam em território da América espanhola, segundo o Tratado de Tordesilhas de
1494. Na obra de HAUBERT (HAUBERT, 1990.) sobre as missões jesuíticas obtivemos informações
sobre o funcionamento delas, quais os procedimentos adotados para “convidar” os índios a fazer parte
dessas missões e, também, quais foram os procedimentos adotados para afastar os bandeirantes
paulistas das missões espanholas. Segundo Jacques Soustelle (prefácio) “... as missões jesuítas
serviram de base e de diques de resistência contra os bandeirantes, que, a partir do Brasil, penetravam
no Paraguai para raptar os índios e reduzi-los à escravidão.” p. 12.
Sobre os Guarani consultar a Dissertação de Mestrado de MARTINS, 1991, bem como, da mesma
autora, a tese de Doutorado de 1999.
63
Cf. MELATTI, op.cit. Disponível na página: http://www.geocities.com/juliomelatti/artigos/a-
nobreg.htm em 26/12/2007 às 16h.
30
Havia legislação referente às questões da guerra e do cativeiro indígena,
mas o mesmo não acontecia quanto à distribuição da mão-de-obra. Desse modo, para
resolver o impasse gerado quanto à aquisição de mão-de-obra nativa, os colonos
começaram a favorecer a apropriação direta do trabalhador indígena por intermédio
de expedições predatórias ao sertão. A justificativa apresentada era a de aumentar o
número de índios hostis para o seio da Igreja; no entanto, não raro traziam índios
considerados aliados, além de muitas mulheres e crianças. Isso se explica quando se
observa que havia falta de mulheres brancas na Colônia, e que as índias poderiam
servir a esses homens como suas mulheres, além de poderem trabalhar no plantio e
colheita das roças.
Esse procedimento de aprisionar mulheres e crianças de grupos indígenas
tidos por hostis era regulamentado, conforme se pode observar pela Carta Régia de
25 de outubro de 1707, que deixava explícito o fato de que, mesmo que se
rendessem, os índios capturados poderiam aspirar apenas à vida em cativeiro, e
mesmo assim apenas as mulheres e as crianças, que “os homens, capazes de se
rebelar novamente, devem ser mortos”
64
. Manter vivas mulheres e crianças era
estratégia muito utilizada, para aumentar o número de mão de obra, e para educar as
crianças segundo o modo de vida do colonizador. Além do mais, as meninas
continuariam servindo de mulheres para os seus senhores.
Com o movimento de adentrar os sertões, os portugueses adquiriram mão-
de-obra nativa e também liberavam as terras desses índios para futuras empreitadas
da empresa colonial. Esse movimento provocava a fuga de grupos inteiros, e aqueles
que fugiam dos ataques paulistas invadiam as terras de outros grupos, provocando
guerras intertribais, revides sangrentos, fome, doenças e mortes. Ao migrar,
forçavam outros grupos a se deslocar até outro território, nem sempre desocupado.
A partir da década de 40 do século XVII, as viagens para apresamento
passaram a ser mais freqüentes e mais dispersas em termos geográficos. Como se
buscava cativos em locais cada vez mais distantes, a presença ativa de índios nestas
expedições de apresamento se tornava cada vez mais necessária, que o sucesso da
expedição dependia muito do conhecimento indígena sobre os sertões.
Em 1692, a persistência expansionista foi recompensada com a descoberta
de jazidas em Minas. As minas de ouro atraíam bandeirantes como se fossem ímãs e,
64
Apud PERRONE-MOISÉS, In.: CUNHA (org.). op.cit., 1992. p.125.
31
em 1719, quando houve a notícia do descobrimento de ouro na região do Cuiabá,
muitos migraram de São Paulo em direção às novas lavras, deixando suas mulheres e
filhos.
Continuavam a caça aos índios e a procura por metais preciosos. As
reformas pombalinas de meados do século XVIII não acabaram com as guerras e
perseguições aos índios considerados hostis, e o Diretório, criado em 1757, aplicado
primeiramente no Norte, e a partir de 1758 no restante da colônia, apesar de
assegurar a liberdade dos índios, ainda permitia a punição aos rebelados.
1. Conquista e posse dos sertões de Cuiabá e Mato Grosso
No século XVI, a vila de São Vicente dependia muito da política de
alianças entre paulistas e índios
65
. A Coroa lusa, ao perceber que não conseguiria
chegar pelo sul às cobiçadas minas do Peru, de certo modo abandonou a vila
vicentina à própria sorte, restando à maioria de seus moradores a alternativa do
“negócio do sertão”, como era chamado o ofício da caça ao índio, que se transformou
em base da economia paulista até o século XVIII. Nessa busca pelo índio, encontrou-
se o ouro dos sertões do Cuiabá, em 1719, terras que oficialmente, pelo Tratado de
Tordesilhas, pertenciam à Coroa espanhola.
O ouro de Cuiabá foi descoberto por acaso. As bandeiras que chegaram à
região inicialmente, tanto a chefiada por Antonio Pires de Campos quanto a de
Pascoal Moreira Cabral tinham o objetivo de capturar índios para conduzi-los a São
Paulo, onde seriam vendidos. Essa movimentação bandeirante em busca do índio foi
registrada por Barboza de e, segundo o cronista, os bandeirantes deixavam suas
famílias, mas levavam consigo nas expedições número considerável de negros e
índios para a execução dos mais diversos trabalhos
66
, e disso também nos dão conta
os Anais de Vila Bela:
65
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA (orgs.). op.cit., p. 302. “A extinção da capitania de São
Vicente [ocorrida] em 1709 resultou do restabelecimento da capitania de São Paulo e Minas do Ouro,
então tornada independente em relação à do Rio de Janeiro. ”
66
SÁ, 1975. p. 9-12.
32
Com aquele empenho com que os naturais de serra acima, chamados os
paulistas, por ter a sua capital cidade de São Paulo, costumavam curvar os
sertões à conquista do gentio, de cujo serviço tinham ainda mais ambição do
que do ouro, por cujo respeito se foram descobrindo e habitando os sertões
interiores deste Brasil, e daí se seguiram os descobrimentos das minas.
67
Os rios pantaneiros foram transformados em caminhos das monções,
conforme Costa “provocando a instalação dos primeiros núcleos de povoamento
mameluco na região”
68
. A região do atual Pantanal, de meados do
século XVI e
primeira metade do século XVII,
foi objeto de várias entradas conquistadoras e
algumas colonizadoras, realizadas por incursões castelhanas e por empresas
religiosas, notadamente jesuíticas”
69
:
Cristãos eram e assim se denominaram os conquistadores que entre os séculos
XVI e XVII avançaram sobre a bacia do rio Paraguai. Na busca de riquezas e
em nome de Deus, guerrearam, dominaram e submeteram aqueles que
reconheciam como bárbaros e selvagens: os indígenas. Nosso Senhor Jesus
Cristo os acompanhava, castigando ou os abençoando pelos seus atos.
70
Para o Cuiabá, a colonização efetiva deu-se a partir de 1722, quando foram
descobertas as lavras de Miguel Sutil
71
. Em 1727 o arraial do Cuiabá foi elevado à
categoria de Vila pelo capitão-general da capitania de São Paulo, Rodrigo César de
Meneses
72
, passando a ser designada Vila Real do Senhor Bom Jesus do Cuiabá. O
ordenamento da Vila foi retirado das Ordenações do Reino e das normas
eclesiásticas, e seu funcionamento regulado pela Câmara. Instalou-se na nova vila a
Provedoria da Fazenda Real, um ouvidor consultor, juiz eclesiástico, além do Senado
da Câmara, com seus vereadores, juízes ordinários, procuradores e fiscais, seguindo
67
Anal de Vila Bela desde o primeiro descobrimento do sertão do Mato Grosso no ano de 1734, In
AMADO & ANZAI (orgs.). op.cit., 2006. p.39.
68
COSTA, 1999. p. 47.
69
Idem, 2000, p. 63.
70
Ibidem, p. 64-65.
71
Localizadas, à época, em Cuiabá, na atual Avenida da Prainha, próximo às igrejas do Rosário e de
São Benedito.
72
Para maiores informações sobre Rodrigo César, consultar: SOUZA, 2006 (Capítulo 7. Morrer em
colônias: Rodrigo César de Meneses, entre o mar e o sertão. p. 284-326).
33
as normas do urbano português
73
. Para abastecer a região, utilizaram-se das
monções
74
.
Chegar até o Cuiabá não era nada fácil, pois além das dificuldades naturais
do caminho, os Paiaguá, no rio Paraguai, assaltavam as embarcações dos paulistas.
Os primeiros registros de assaltos desses índios se deram em 1725, 1726 e 1727.
Após o massacre de uma monção, os portugueses declararam guerra aos Paiaguá.
A partir de Cuiabá mais se adentrou o sertão em busca de novas lavras
75
. O
ouro de Cuiabá era de aluvião, e a partir de 1730 houve uma diminuição em sua
extração, levando a que parte da população saísse em busca de outras minas.
Saiu da Vila do Cuiabá Fernando Paes de Barros com seu irmão Artur Pais,
naturais de Sorocaba e, sendo o gentio Pareci naquele tempo o mais
procurado e quase extinto, depois de conquistarem alguns nas suas vastas
campanhas, cursaram mais ao poente delas, com o mesmo instinto; e
arrancharam-se em ribeirão que deságua no rio Galera o qual corre do
nascente a buscar o rio Guaporé , e aquele nasce das fraldas da serra
chamadas hoje chapada de São Francisco Xavier de Mato Grosso, da parte
oriental. Fazendo experiência de ouro, tiraram nela três quartos de uma
oitava, na era de 1734.
76
Nas proximidades das novas lavras descobertas, em território dos índios
Pareci, no vale do Guaporé
77
, fundaram-se arraiais. Sobre os índios, Antonio Pires de
Campos teceu algumas considerações; o bandeirante os considerou “muito asseados
e perfeitos em tudo, que até as suas estradas fazem mui direitas e largas, e as
conservam tão limpas e consertadas que se lhe não achará nem uma folha”. Sobre as
índias, registrou o seguinte:
Este gentio feminino é o mais parecido que se tem visto, porque são muito
claras e bem feitas de pé e perna, e com todas as feições perfeitas, e tão ágeis
73
ROSA & JESUS (orgs.). 2003 . p. 17.
74
Sobre as monções paulistas rumo ao oeste da colônia, contamos com o estudo clássico de
HOLANDA. Monções. São Paulo, Editora Brasiliense, 1990.
75
CANAVARROS, 2004. p.181
76
Anal de Vila Bela desde o primeiro descobrimento do sertão do Mato Grosso no ano de 1734, In
AMADO & ANZAI, op.cit., p. 39.
77
“Guaporé”, segundo Denise Maldi Meireles, é palavra indígena, provavelmente “originada de
‘Uaraporé’ ou ‘Guaraporé’, que apareceu em algumas crônicas como o nome de uma nação’ que
vivia nas suas margens”. MEIRELES, op.cit., 1989. p.14.
34
e habilidosas que nada se lhes mostra que não imitem com a melhor
perfeição, e o mesmo se acha nos homens. [...] são os que me parece se
acharem mais hábeis entre todos os mais para se instruírem na católica
[...].
78
Embora os Pareci não se enquadrassem nos casos sobre os quais se pudesse
fazer guerra justa, foi uma das sociedades que sabemos ter sido mais perseguida e
aprisionada, provavelmente pelas qualidades descritas por Pires de Campos. Loiva
Canova considera os escritos de Pires de Campos formadores de opinião, pois as
descrições feitas pelo sertanista criaram uma memória detalhada sobre essa nação, e
definiu suas características culturais e suas territorialidades, sendo, segundo relato, os
mais próprios para admitirem a civilização. Essas expressões pontuais enobrecedoras
de Pires de Campos diferenciam os Pareci de outros grupos, por ele denominados
“selvagens”
79
.
A intensa movimentação na fronteira Oeste devido à descoberta de ouro na
região do Mato Grosso levou a Coroa lusa a tomar medidas para se apossar de fato
da região. Um passo nessa direção foi dado com a criação, em 1748, da Capitania de
Mato Grosso. Com isso, procurava-se criar “uma barreira ou raia dos limites de Sua
Majestade e da Coroa de Castela por essa parte da América”
80
. O Estado
metropolitano impunha sua presença, para “não somente impor obrigações aos
súditos, como também consolidar posições políticas em defesa de seu patrimônio”
81
.
Nas “Instruções” de 1749, a Rainha
D. Mariana de Áustria, ao nomear capitão
general a Dom Antonio Rolim de Moura, reforçou a importância da recém criada
capitania:
Fui servida criar uma capitania geral com nome de Mato Grosso, e nas terras
que medeiam entre este governo e o das Minas Gerais, outra capitania geral
chamada de Goiás. E como o governo de Mato Grosso, pela grande distância
em que fica, pela sua situação confinante com as províncias do Peru, e por
muitas outras circunstâncias, requeria ser administrada por pessoa de grande
zelo e prudência, houve por bem escolher-vos, para a irdes estabelecer,
78
CAMPOS, 1975. op. cit., p 187-189.
79
Cf. CANOVA, 2003. p. 10.
80
APMT. D. Antonio Rolim de M. Tavares. Ano (1): 1750-1758, Lata A, 107 documentos.
81
CANAVARROS, op. cit., 2004. p.198.
35
esperando que tudo sabereis completamente desempenhar a minha
expectação.
82
Rolim de Moura observou ponto por ponto os itens das “Instruções”:
fundou a vila capital, instalou governo, organizou reduções para os índios, armou
corpos militares. Durante seu longo mandato à frente da Capitania, graças a esse
documento, teve perfeita clareza das prioridades de Portugal para a região
83
.
Especificamente em relação aos Pareci, o parágrafo 21 das mesmas “Instruções”
informava sobre as providências que deveriam ser tomadas para evitar os distúrbios
cometidos pelos sertanistas:
Nas terras que medeiam entre o Cuiabá e o Mato Grosso se encontrou
alguns anos a nação dos índios Pareci, mui próprios para domesticar-se, com
muitos princípios de civilidade, e outras nações de que se poderiam ter
formado aldeias numerosas e úteis; e com sumo desprazer, soube que os
sertanejos do Cuiabá não lhes destruíram as povoações, mas que
totalmente têm dissipado os meus índios com tratamentos indignos de se
praticarem por homens cristãos.
84
A preocupação da Coroa justificava-se, pois tratar mal aos índios ia contra
os interesses metropolitanos. Antonio Rolim de Moura, primeiro governador foi um
fiel executor da política da Coroa de “proteção” ao índio
85
, sistematizada por
Sebastião José de Carvalho e Melo, o conde de Oeiras, futuro Marques de Pombal
86
,
enquanto ministro de D. José I (1750-1777).
A partir da fundação de Vila Bela cresceu o número de aldeias e “lugares”
utilizando índios, atendendo às instruções reais. A Vila capital foi fundada, em 19 de
março de 1752, em região com habitantes majoritariamente indígenas, na qual,
82
Instrução da Rainha [D. Mariana de Áustria] para D. Antonio Rolim de Moura. Lisboa, 19 de
janeiro de 1749. In: INSTRUÇÕES aos Capitães-generais, op.cit., p. 11.
83
CANAVARROS, op.cit., 2004. p. 316.
84
Instrução da Rainha [D. Mariana de Áustria] para D. Antonio Rolim de Moura. Lisboa, 19 de
janeiro de 1749. In: INSTRUÇÕES aos Capitães-generais, op.cit., p.16.
85
MOURA, Carlos Francisco. D. Antonio Rolim de Moura, primeiro Conde de Azambuja; biografia.
(Coleção Documentos Ibéricos Série: Capitães-Generais, 1); Edição comemorativa do bicentenário
de seu falecimento (1782-1982). Cuiabá: UFMT - Imprensa Universitária, 1982. p. 37-38.
86
O título de Marquês de Pombal lhe foi conferido em 1769, quando Sebastião Jode Carvalho e
Melo contava 71 anos de idade.
36
segundo Rolim havia poucos pretos, que começaram a chegar em maior número a
partir da criação da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, em
1755.
O governador Rolim de Moura concedeu privilégios e incentivos para os que
se deslocassem para a região guaporeana, com vistas a uma política de povoamento,
que visava ocupar as margens dos rios Guaporé e Madeira, fazendo a ligação da
Capitania de Mato Grosso com a do Pará. Ao longo dos rios, deveriam ser criados
pontos de parada para socorros dos comboieiros
87
. Outra medida adotada pelo
governador foi o incentivo aos casamentos interétnicos, para inserção de índios e
negros na política de povoamento e defesa da fronteira, “empurrando” as linhas
demarcadoras “continente adentro, estabelecendo de facto a soberania de Portugal
sobre vastas áreas”
88
. Nesse processo, grupos indígenas eram obrigados a participar,
submetidos ao mando português. Iniciada no governo de Rolim de Moura, e seguida
pelos demais capitães-generais e governadores da Capitania de Mato Grosso, essa
prática povoadora começou a surtir algum efeito, como pudemos verificar nos Anais
de Vila Bela do ano de 1755:
Neste ano, mais que nos outros, se edificaram muitas casas nesta Vila,
cobertas de telha. E com as duas igrejas, se contam, ao presente, 26 edifícios
desses, entre grandes e pequenos. São mais de trinta as casas que se acham
ainda cobertas de palha. Ao que parece, terá esta Vila, dentro em si, e pelos
sítios que ao redor cultiva quinhentas almas, pouco mais ou menos, entre
brancos e negros e índios, e um e outro sexo, fora a gente que habita pelos
arraiais e minas deste Mato Grosso.
89
Uma das metas dos colonizadores era estabelecer rotas de navegação rumo
a Belém, via Guaporé e Madeira; para isso, havia necessidade de fixar o povoamento
em pontos estratégicos. Nessa dinâmica, algumas práticas foram constantes, as
“fixas” e as “móveis”, conforme as classifica Isabella Fagundes Braga. As “práticas
fixas” consistiram na criação de fortalezas, vilas e fixação de população; as “práticas
móveis” foram ações de intervenção no território: “deslocamentos oficiais, como as
diligências, as viagens, e especialmente, nesse período, do evento da subida da
87
SILVA, op.cit., 1995. p. 26.
88
MAXWELL, 1996. p. 52
89
Anal de Vila Bela do ano de 1755, In AMADO & ANZAI, op.cit., p. 60.
37
Comissão Demarcadora do Tratado de Limites”
90
. Nosso estudo compartilha com
Braga a análise das “práticas fixas”, como a fundação de povoações com a utilização
de índios.
Assinada por D. José I, em 3 de maio de 1757, o “Diretório que se deve
observar nas povoações dos Índios do Pará e Maranhão”, elaborado por Mendonça
Furtado irmão do futuro Marquês de Pombal , teve suas diretrizes aprovadas pelo
Alvará de 17 de agosto de 1758, que estendia a obrigatoriedade de sua obediência a
toda a colônia, embora cada região o interpretasse conforme suas necessidades. Já se
pode observar, no Diretório, os resultados de uma política pombalina anti-jesuítica,
concretizada na expulsão da Ordem contida no Alvará Régio de 3 de setembro, e da
Carta Régia de 4 de outubro de 1759
91
.
O “Diretório” vigorou de 1757 a 1798, e previa a retirada dos índios da tutela
religiosa, redistribuindo-os em povoações, nas quais estariam sob o comando de um
administrador, cuja função seria zelar por sua educação e demais interesses da Coroa.
Nessas povoações, os índios deveriam produzir para o sustento de sua família, e
também um excedente, além de serem obrigados a prestar serviços para o Estado em
atividades ligadas a obras, públicas e particulares; trabalhavam, sobretudo, como
remeiros, atividades pelas quais deveriam receber pagamento, o que raramente
acontecia. O Diretório lançou as bases, de uma política assimilacionista
92
, cuja
intenção era transformar as aldeias em vilas e lugares portugueses, e os índios em
vassalos do rei, sem distinção, teoricamente, em relação aos demais vassalos. Pelo
Diretório, a denominação “negro”, que na primeira fase da colonização era aplicada
tanto aos escravos africanos quanto aos índios, passou a ser proibida quando se
tratasse de índio, que passariam a ter nomes e sobrenomes de brancos; vassalos,
portanto.
Em todo o processo, sem deixar de destacar o trabalho de escravos negros
93
,
muito se deve aos “negros da terra”
94
na fundação de vilas e arraiais e manutenção do
território da fronteira Oeste.
90
FERREIRA, op.cit., 2002. p. 3.
91
Ius Lusitaniae. Fontes Históricas do Direito Português. http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt/. em
19/05/2007 às 22h 18m.
92
Cf. ALMEIDA, disponível na página:
http://www.historiacolonial.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=381&sid=51,
em 09/03/2007 às 09h02m.
93
BANDEIRA, op.cit., 1988. p. 85.
38
2. As “Instruções” e os índios
Os procedimentos geopolíticos que os capitães-generais de Mato Grosso
deveriam seguir, relacionados à proteção e integração dos índios estavam contidos
nas “Instruções Régias”, assim como os procedimentos administrativos e militares.
Por muitas vezes, os capitães-generais, ao serem substituídos, repassavam para seus
sucessores, independentemente de novas ordens recebidas de Lisboa, as instruções
que haviam recebido do governador anterior, orientando assim o seu substituto sobre
problemas administrativos e militares, e ainda sobre os problemas geopolíticos de
interesse da Coroa e da Capitania. As “Instruções” de 1749, enviadas à Capitania de
Mato Grosso para D. Antonio Rolim de Moura foram as mais importantes, e os
sucessores de Rolim continuaram a observá-las “em tudo e por tudo”
95
. Nelas, a
rainha apresenta a importância do Mato Grosso e a necessidade de uma política de
povoamento que consolidasse o território, evitando o avanço dos espanhóis:
A proximidade em que está Mato Grosso das missões espanholas dos
Chiquitos e dos Moxos, e do governo de Santa Cruz de La Sierra, que é
dependência de Peru, se faz preciso que em vós e em vossos sucessores haja
a maior circunspecção, para evitar toda a queixa, e castigar toda a desordem
que os súditos do vosso governo cometerem contra os espanhóis, e
juntamente a maior vigilância para não consentir que os mesmos espanhóis
se adiantem para a nossa parte ou cometam violência alguma contra os meus
vassalos.
96
Essas Instruções previam também o tratamento que deveria ser dispensado
às nações indígenas consideradas mansas e que se achavam dispersas ou mesmo os
que estavam sob administração de particulares.
94
Cf. MONTEIRO, op.cit., 1994. p. 8.
95
Carta Instrução de [Martinho de Mello e Castro] para Luiz de Albuquerque de Melo Pereira e
Cáceres. Palácio de Belém, 13 de agosto de 1771. In INSTRUÇÕES aos Capitães-Generais. op. cit.,
p.85.
96
Instrução da Rainha [D. Mariana de Áustria] para D. Antonio Rolim de Moura. Lisboa, 19 de
janeiro 1749. In INSTRUÇÕES aos Capitães-Generais. op. cit., p. 13.
39
Pelo que toca aos Índios das nações mansas, que se acham dispersos
servindo aos moradores a título de administração, escolhereis sítios nas
mesmas terras donde foram tirados, nas quais se possam conservar aldeados,
e os fareis recolher todos às aldeias, tirando-os aos chamados
administradores, e pedireis ao provincial da Companhia de Jesus do Brasil
vos mande missionários para lhes administrarem a doutrina e sacramento.
Igualmente lhes pedireis para a administração de qualquer aldeia ou nação
que novamente se descubra, não consentindo que se dissipem os índios ou se
tirem das suas naturalidades ou se lhes faça dano ou violência alguma, antes
se apliquem todos os meios de suavidade e indústria para os civilizar,
doutrinar, em tudo como pede a caridade cristã.
97
Seguindo as Instruções, os padres Estevão de Castro e Agostinho Lourenço,
missionários da Companhia de Jesus, conforme as ordens régias deveriam fundar
aldeias de índios mansos, que se achavam distribuídos pelos moradores do Cuiabá e
também do Mato Grosso. Sobre este assunto Barbosa de Sá esclarece:
Trouxe o general [Rolim de Moura] consigo dois missionários apostólicos da
Companhia de Jesus, o Padre Estevão de Castro e Agostinho Lourenço. E
entendendo-se que vinha a fazer missão aos gentios circunvizinhos, como
nos anos antecedentes, o requereu e pediu ao Senado da Câmara e Sua
Majestade, para que entrassem aos sertões, a congregar e aldear os infiéis
para aumento do cristianismo e extensão destes Estados, como o fizeram os
da mesma religião nas Províncias do Paraguai e Peru, por onde adquiriu
Espanha tantos domínios, e a igreja santa tantos filhos.
98
Com os índios “convencidos” a seguir Estevão de Castro para fazer parte do
grêmio da igreja, procedeu-se, em 1751, a fundação de uma aldeia, debaixo da
invocação de Santa Ana, que sucessivamente se foi aumentando”
99
. Rolim de
Moura, desejando averiguar o que os sertanistas haviam feito aos gentios, trouxe
consigo o padre Agostinho Lourenço, para o mesmo fim.
... ordenou ao sobredito padre rodasse pelo Guaporé, naquele tempo mui
freqüentado, permitindo-lhe também licença para entrar nas missões de
97
Ibidem, p. 16.
98
SÁ, op.cit., 1975. p. 46.
99
Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI, op. cit., p. 72.
40
Castela, mandando por ele, nessa ocasião, oito índios que por vários
incidentes dali tinham sido extraídos.
100
Na parte ocidental do rio Guaporé o padre Agostinho Lourenço fundou, em
fins do ano de 1754, a aldeia de São José
101
.
Chegando nesse tempo o dito padre, situando-se como fica dito, foi a sua
primeira diligência levantar, de pau-a-pique, uma capela coberta de palha em
que locou uma estampa de São José, pondo debaixo da proteção do mesmo
santo a missão a que dava princípio, pelos fins do ano de 1754. Na dita
capela ajuntava os índios e lhes explicava, pelo modo possível, o catecismo
de sua missão, e exercitava os mais ministérios de missionário. Estavam os
índios tão pouco acostumados a semelhantes coisas, que fugiam quando o
padre lhes mostrava o seu crucifixo de latão, barbaridade que pouco a pouco
se foi vencendo, com ajuda do mesmo Senhor. Uma das coisas que se deu
providência foi reduzir
aquela tal qual povoação, muitos homens de gentios
daquelas mesmas nações que andavam pelo sertão, o que se ia conseguindo
com não pequeno trabalho. O maior [mal] eram as doenças que de tal sorte
os acometiam que, morrendo muitos, nunca pode crescer o número de almas
juntas a mais de duzentos e cinqüenta.
102
Como o local era considerado doentio, e possivelmente tenha sofrido
pressões dos castelhanos, o padre Agostinho Lourenço tratou logo de mudar a aldeia
para a barra do rio dos Mequéns.
Determinou mudar-se, o que fez em julho de 1756, para o sítio em que foi e
está a freguesia de São José, pouco acima da barra do rio dos Mequéns. É ele
mui conveniente pela bondade e extensão das terras, abundância de caça e
pesca, mas, se o primeiro sítio era doentio, se experimentou não ser menor
100
Ibidem, p. 73.
101
A fundação da Aldeia de São Jo desrespeitou as disposições do tratado divisional de Madri
(1750) que garantia a margem ocidental do rio Guaporé para os espanhóis, cf. p. 76 “ ... o missionário
[Agostinho Lourenço] também diz ser aquele sítio da banda ocidental, que conforme o tratado
divisional, havia de ficar para a Espanha.”. Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI,
op. cit., p. 76.
102
Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI, op. cit., p. 75-76.
41
este segundo, sucedendo em um ano morrerem, no mês de dezembro, 48
pessoas.
103
Embora a mortalidade de índios fosse alta, o capitão general Rolim de
Moura afirmava que “se as epidemias não continuarem, não falta no sertão por
aquela banda gentio com que se povoe, não a dita missão [de São José], mas
muitas outras”
104
.
A missão de São José cresceu, e era grande o número de índios das
cercanias que buscavam nela proteção. Quando a procura deixou de ser espontânea, o
missionário resolveu “entrar com a conquista de uma numerosa nação, a que chamam
Guatirias, na serrania”
105
, utilizando-se de descimentos dos “índios silvestres”.
Os descimentos se faziam por meio das transferências de onde os índios
habitavam, para outras regiões que tivessem importância estratégica e econômica
para a política de colonização portuguesa. Explica Carvalho Júnior, que os
descimentos,
... além dos resgates e guerras justas, eram expedições organizadas pelo
governo e, muitas vezes, com participação de religiosos, normalmente
jesuítas, visando o deslocamento de populações indígenas, que viviam em
tribos distantes dos centros coloniais, para mais próximas desses. Eram
utilizados diversos recursos para conseguirem tal intento.
106
Para os “descimentos”, o trabalho dos “línguas” indígenas foi fundamental,
já que o índio intérprete, que podia ser do mesmo grupo ou não, sabia melhor
persuadir, por dominar a língua, por empregar os mesmos conceitos, e por ser um
exemplo da convivência entre luso-brasileiros e ameríndios
107
. Para a conquista dos
Guatirias, para conseguir intérpretes, o padre enviou algumas pessoas de sua
confiança “em forma de bandeira, a beirar uma das suas povoações e trazer dali,
pelos meios menos violentos que se pudessem, alguns rapazes, para que, aprendendo
103
Ibidem, p. 76.
104
PAIVA; SOUSA; GEREMIAS. vol. 3. 1983. p.99.
105
Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI, op. cit. p. 76.
106
CARVALHO JÚNIOR, 2005. op.cit., p. 3 (nota 3).
107
Cf. DOMINGUES, op.cit., 2000. p, 239.
42
estes a língua portuguesa, pudessem ao depois servir de intérpretes”
108
. Os enviados
do padre entraram na aldeia, onde encontraram,
... em uma pequena rancharia, em que não acharam mais que mulheres, das
quais conseguiram, por ações e por meio de contas de vidro, visto não o
poderem usar de palavras, deixassem vir em sua companhia duas moças, de
15 até vinte anos, aa missão [São José], onde, como primícias daquela
nação, foram oferecidas a Jesus Cristo; e com tão bom serviço que estão
quase instruídas na língua portuguesa e mistérios da nossa santa fé. Também
[ilegível]... que se resolvendo no mesmo ano mandar segunda expedição à
mesma gente, e querendo levá-las por línguas, se esconderam no dia da
partida e, sendo achadas, se despediram com grimas das pessoas que delas
tinham tratado.
À vista dessas circunstâncias se percebeu facilmente ser
o gentio dessa nação não diverso do de outra deste sertão, mas ser
para fazer neles progressos à fé; por cuja razão, sendo trazidos, na
segunda expedição, alguns rapazes, foram enviados a esta Vila para
aprenderem a falar, o que brevemente conseguiram.
109
Um dos objetivos para o ensinamento e uso da língua portuguesa era o fato
de que, por se expressar na língua do colonizador, os índios seriam equiparáveis a
qualquer pessoa do Reino, vassalos de Sua Majestade. Para Lygia Maria Gonçalves
Trouche, a preocupação de Portugal com o ensino da língua portuguesa aos índios
demonstra “a estreita ligação entre língua e domínio imperial, entre língua e espaço
português, entendido este último como uma identidade cuja coesão interna o
defenderia contra a corrupção externa”
110
. Além do mais, o uso da língua favoreceria
a que os índios compreendessem as tarefas que deveriam desenvolver.
Aparentemente, a aldeia de São José, comandada por Agostinho Lourenço,
padre da Companhia de Jesus prosperava. Porém, em 1759, o padre jesuíta foi
avisado pelo governador da Capitania de Mato Grosso, Antonio Rolim de Moura,
que seria substituído:
108
Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI, op. cit. p. 76.
109
Ibidem.
110
TROUCHE, disponível na página http://www.filologia.org.br/anais/anais%20iv/civ12_9.htm em
26/05/2007 as 09h38m.
43
... tendo se formado na Corte novo sistema sobre a conversão do gentilismo
e seu governo, depois de aldeado, era um dos pontos dele não tivesse religião
alguma missão própria, mas se nomeassem pelos bispos os párocos,
indiferentemente, como para qualquer freguesia de brancos; e que, com
efeito, estava nomeado, por primeiro pároco para a dita missão, com o título
de Freguesia de São José, o Reverendo padre Domingos Gomes da Costa,
presbítero do hábito de São Pedro.
111
De posse desta notícia, Agostinho Lourenço deixou São José em 19 de
fevereiro de 1759, após quatro anos e meio de serviços prestados. Interessante
observar algumas ações que apontavam para a expulsão dos jesuítas nesse episódio,
sete meses antes da promulgação do Alvará Régio de 3 de setembro e da Carta Régia
de 4 de outubro de 1759, que concretizavam a expulsão.
O “Anal de Vila Bela para o ano de 1759” continua a expor questões
relacionadas aos índios:
Esse vastíssimo terreno era povoado antigamente por numerosa gentilidade.
Entrando, pouco a pouco, os sertanistas, pela banda do Mato Grosso, e os
missionários de Espanha, pela parte oposta, se foi despovoando, com a
diferença. Por isso que o gentio que dali livraram os missionários, se acha
hoje muita parte dele estabelecida da banda ocidental em três missões: São
Simão, São Miguel e Santa Rosa. Mas, o que conquistaram os nossos
sertanistas, quase se extinguiu. Principalmente sabemos se acabou a nação
dos Curicharas, Amios, Mabas e outros, sem que no presente
estabelecimento da missão se achasse um deles, nem em Mato Grosso, mais
que um ou outro indivíduo. Das nações de que havia maiores relíquias eram
os Guajuratãs, Mequéns, que, por serem nações numerosas e últimas na
conquista, não tinham experimentado total ruína.
112
Os “Anais de Vila Bela” registraram, ainda, os tratamentos dispensados
pelos preadores de índios:
A autoridade com que os sertanistas faziam essas conquistas era a cobiça. O
método ou leis que seguiam era a desumanidade, porque, abeirando as
rancharias em que viviam os bárbaros, acabavam nas bocas do fogo todos os
111
Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI, op. cit. , p. 77.
112
Ibidem, p. 75.
44
que naturalmente pegam em arcos para a sua defesa. Metiam-se os rendidos
em correntes ou gargalheiras. Depois se repartiam pelos conquistadores, que
os remetiam para as novas povoações, em contrato de vendas.
113
O castigo, segundo o vereador escrevente dos “Anais”, era que a justiça
divina se manifestara, que nenhum dos cruéis sertanistas havia enriquecido,
vivendo “em lastimosa pobreza. Não só não tinham casas em que morar; nem
plantas, nem roças, nem camisas com que se cobrissem”. Também não era melhor a
situação espiritual desses matadores de índios, pois “como estavam tão distantes de
povoado, nem ouviam missa nem se confessavam, senão raras vezes, sucedendo
comumente morrerem alguns sem confissão”. Por sua vez, os índios que porventura
se encontravam em poder dessas pessoas “viviam na sua natural barbaridade,
observavam os costumes nativos, sem conhecimento algum dos mistérios da fé”
114
.
Os registros do vereador escrevente do “Anal de Vila Bela do ano de 1759”
indicam os caminhos a serem tomados: aldear os índios, protegê-los da sanha dos
preadores, evangelizá-los, para salvar suas almas.
O “ouro vermelho”
115
, riqueza adquirida com sangue e energia dos índios,
despertou nos bandeirantes o desejo de acumular grandes tesouros, e qualquer forma
de resistência indígena passava a ser vistas como desvios de e ameaça à expansão
territorial lusitana. Na maioria das expedições, os indígenas foram o que de mais
precioso os paulistas encontraram, que havia uma quantidade bem maior deles em
relação aos metais e pedras preciosas. Apesar de não contarmos com dados
quantitativos, muitos dos capturados, segundo relatos de contemporâneos, devem ter
morrido no caminho até São Paulo, devido à falta de zelo dos bandeirantes, à
violência empregada e às doenças.
A política voltada aos índios na segunda metade do século XVIII preconizava
que se deveria agir em relação aos índios “evitando a todo o custo ‘vexá-los’ com
maus tratos que poderiam esvaziar as aldeias e prejudicar o projeto colonial como um
todo”
116
.
113
Ibidem
80
Anal de Vila Bela do ano de 1759, In AMADO & ANZAI, op. cit., p. 75
115
Expressão de Antonio Vieira em MONTEIRO, op.cit., 1994. p. 96.
116
PERRONE-MOISÉS, In: CUNHA, op. cit., 1998. p. 122.
45
Capítulo II
Mulheres índias e política de povoamento
Nessa época [os primeiros contatos] dormiam
livremente com as moças, [...]. Depois,
começaram a dizer que não mais podiam ficar
com as moças, assim sem mais nem menos, que
Deus somente permitia que as possuíssem depois
do casamento, e que eles não podiam casar sem
que elas fossem batizadas.
117
Desde o início da colonização que europeus amancebavam-se com índias.
Dessas relações nasciam filhos mestiços, que adotavam boa parte dos costumes
indígenas. Nas regiões das minas do Cuiabá e do Mato Grosso não foi diferente, e a
chegada dos primeiros escravos africanos, oficialmente a partir de 1719, tornou ainda
mais complexas as misturas, de sangues e de culturas. Essas relações interétnicas
contribuíam para o aumento do número de habitantes, já que a permanência de
moradores na linha de fronteira era importante para a manutenção e posse das terras.
Antes da fundação da “cabeça do governo”, Rolim de Moura, em carta de
1751 a Diogo de Mendonça Corte Real informava que havia no local destinado à
futura capital da capitania cerca de setenta brancos, e que ele, governador, tinha
sérias dúvidas relacionadas ao aumento do número de pessoas na região contando
apenas com incentivos reais. O capitão general enfatizava a importância da fundação
da vila capital, por sua vizinhança com as missões de Castela, e registrava o fato dos
missionários jesuítas estarem se aproximando demais das raias lusas, inclusive com
fundação de três aldeias assentadas do lado português do Guaporé. Para Rolim, o
mais adequado para o Mato Grosso seria
117
Palavras do chefe Tupinambá de Pernambuco, Momboré-Uaçú, conforme relato de Claude
d’Albeville, em “História da missão dos padres capuchinhos na ilha do Maranhão e terras
circunvizinhas”, de 1614. In: CUNHA, op.cit., 1998. p. 98.
46
... usar Sua Majestade com ele o que usou com Rio Grande e Santa Catarina,
pois é também fronteira, e nos redundará maior prejuízo de se adiantarem os
castelhanos por esta parte do que pela aquela. A navegação do Rio da
Madeira dá facilidade à condução dos casais [ilegível] e como no Mato
Grosso boas terras de planta, é certo que com o seu trabalho e indústria,
em que são diligentes hão de causar abundância e fortuna, com grande
cômodo e conveniência para os mineiros e para todos.
118
O que o governador Rolim de Moura pretendia era que fossem enviados
casais brancos para a capitania, em especial para a vila capital. Como essa não era
tarefa fácil, e considerando que à época, na Capitania havia um enorme contingente
de índias, poucos escravos negros, em sua maioria homens, e poucos brancos
119
,
caberia às nativas a tarefa de aumentar a população. Cabia aos administradores
incentivar o povoamento da fronteira Oeste, mesmo “que por intermédio de pecados”
120
, tolerando-se situações como a mancebia e a mestiçagem.
Pelo que toca aos pretos, os mais que procuram índias são cativos. Tem suas
conseqüências, mais assim por ficar uma pessoa livre sujeita à sorte de outra
cativa. Porque as negras que procuram casar com índios, não é fácil, e muito
menos as brancas nem mulatas, e assim admitindo-se os primeiros
casamentos, ficam os índios machos sem terem com quem casar.
121
É explicável a união de negros com índias, que proporcionalmente havia
menos mulheres negras à época, na Capitania
122
. Interessante a informação de Rolim,
de que as mulheres, fossem negras, brancas ou mulatas, não escolhiam índios para se
casar, situação que deixava os homens índios sem opções. Isso, evidentemente, no
caso de uniões estáveis, desejadas, mas nem sempre conseguidas. Considerando
ainda que havia poucas mulheres negras e brancas na Capitania, certamente haviam
relações endogâmicas negras com negros, brancas com brancos e mulatas com
118
PAIVA; SOUSA; GEREMIAS. vol. 1. 1982. p. 31-32.
119
Cf. SILVA, op. cit., 1995. p. 187.
120
VAINFAS, 1997. p. 41.
121
1759, Novembro, 29, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão general da capitania de Mato
Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretario de estado da Marinha e Ultramar] Tomé
Joaquim da Costa Corte Real. Anexo: Certidão 2ª via.CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 10, Doc. 607.
122
Cf. SILVA, op. cit., 1995. p. 247.
47
mulatos, pois havia muito espaço e possibilidades para as diversas formas de inter-
relações.
Na Capitania de Mato Grosso, no século XVIII, na época áurea da
mineração, ao contrário do que acontecia na capitania de São Paulo
123
, havia um
número muito superior de homens em relação às mulheres. Isso se explica pelo fato
dos homens paulistas se deslocarem para as regiões mineradoras, deixando suas
mulheres e filhos em seus locais de origem. Essa situação facilitava os contatos
sexuais entre mineradores e índias, embora Torres-Lodoño afirme que “os homens na
colônia relacionavam-se sexualmente com mulheres que não eram suas esposas, em
qualquer época da sua vida, sem que isso os abalasse ou significasse perda de
privilégios ou de status
124
.
Os colonos, advindos de diversas partes, sem laços familiares ou afetivos
estabelecidos, diante da facilidade em encontrar mulheres índias, com elas se
relacionavam. Para Jovam Vilela da Silva, “nesse processo de interação étnica, a
mulher indígena foi o elo no desenvolvimento, nas relações sócio-econômicas e
políticas, de parentesco e povoamento”
125
.
As correspondências de Rolim de Moura e demais governadores da
Capitania apresentam algumas constantes no que diz respeito aos casamentos
interétnicos e à melhor adaptação dos mestiços na Capitania. Seguindo as instruções
contidas no Diretório, houve um grande incentivo, a partir da segunda metade do
século XVIII, aos casamentos mistos, e eram premiados com doações diversas, como
armas e dinheiro, os soldados que se casassem com índias
126
. Acreditava-se que esses
casamentos mistos auxiliariam a firmar a presença portuguesa na fronteira, e
estabeleceria uma espécie de ponte entre os brancos e a população nativa. Aliado a
isso, estava o projeto de civilização dos índios, cuja meta era transformá-los em
trabalhadores produtivos, incentivando-os na constituição de casamentos
interétnicos, tornando-os definitivamente “guardiões da fronteira” entre os domínios
ibéricos, “na parte mais interior da América austral”
127
.
123
Cf. TORRES-LONDOÑO, 1999.
124
Ibidem, p.72.
125
SILVA, op. cit., 1995. p. 273.
126
Cf. MEIRELES, op. cit., 1989. p.155.
127
SÁ, op.cit., 1975. p. 20.
48
Assim, o espírito prático de Rolim de Moura aliado à própria natureza dos
colonos, concluiu que, ao invés de insistir apenas na inserção dos índios na política
de povoamento da Capitania de Mato Grosso em especial a região que fazia
fronteira com a parte espanhola , o melhor seria “mistura-los” aos negros ou aos
brancos, considerando que
... os índios puros só por si não são capazes de fazer povoação, porque é uma
gente sem dependência, sem paixões, sem ambição e sem discurso, e assim
não neles por onde possa ligar-se à sociedade civil. De sorte que,
misturando-se com negros ou com brancos é que os filhos destes casamentos
saem já menos inúteis à República. Também posso assegurar a Vossa
Excelência que a simples persuasão é meio débil para os reduzir, se a esta se
não ajunta algum temor, ao que de ordinário somente se sujeitam.
128
Rolim considerava difícil manter os índios segundo os preceitos da fé
católica e os interesses da Coroa. O capitão general acreditava que, se fossem
deixados livres, os índios voltariam a viver “como animais, o que se lhe não pode
prometer, nem observar”, e que sempre havia necessidade “de pessoa que os mande e
os administre”
129
. Necessário “ajuntar algum temor” para persuadi-los a aceitar os
preceitos da Coroa e da Igreja, artifício eficaz para obrigá-los a se aldear. Além do
temor dos castigos físicos, era preciso que tivessem também medo do inferno e dos
demônios, introduzido pelos colonizadores: “ao trazer Deus, o conquistador
introduz também o Diabo e seus signos”
130
.
Em outra correspondência, Rolim de Moura reafirmava a necessidade das
uniões interétnicas como forma de “melhorar” e aumentar a população da Capitania:
Mudando a espécie por meio da mistura com os brancos e os pretos, menos
inábeis ficam, e destes ordinariamente se fazem os capitães do mato e os
pedestres, e outros aprendem ofícios, em que servem a República, ainda que
pela maior parte se ressentem da origem que têm. Mas entendo o dariam a
conhecer, se fossem filhos de legítimo matrimônio, e o bastardos, como
128
1756, Julho, 14, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão general da Capitania de Mato
Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [Secretário de Estado da Marinha e Ultramar] Diogo de
Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 9-10, Doc. 527; MF 125, doc. 1337.
129
1759, Novembro, 29, Vila Bela. OFÍCIO, op. cit.
130
COSTA, op.cit., 2000. p. 65.
49
são quase todos. Mas, enquanto aos brancos é preciso que percam primeiro a
vergonha para se resolverem a casar com as índias, que é raríssima a que
guarda lealdade a seu marido, e assim de ordinário não bom fim a estes
casamentos.
131
Esses dados apresentados por Rolim são reveladores, principalmente no que
diz respeito às mulheres indígenas. As observações do governador homogeiniza as
práticas culturais dos diversos grupos, que não especifica o grupo que praticava
bigamia, por exemplo.
Outro ponto importante no registro de Rolim refere-se à utilização do termo
“bastardo”, dando a entender que seriam fruto de casamentos não constituídos
legalmente segundo os padrões da Igreja. Porém, o próprio Rolim de Moura, em
outra correspondência
132
, afirmava que bastardo era entendido como filho de branco
com índio.
Esse ponto exige maior reflexão. Na Capitania de Mato Grosso o termo
“bastardo”, não dizia respeito apenas a filhos ilegítimos, mas também a uma
categoria social
133
. Para Jovam Vilela, embora “bastardo” em geral fosse utilizado
para se referir a filhos ilegítimos, na Capitania de São Paulo e na de Mato Grosso era
utilizado com o mesmo sentido que “mameluco” ou seja, os nascidos de brancos e
índias
134
. Para John Manuel Monteiro, a diferença consistia em que os chamados
“mamelucos” eram reconhecidos pelos pais publicamente, enquanto que os bastardos
mantinham-se “vinculados ao segmento indígena da população, seguindo a condição
materna. no século XVIII, o termo ‘mameluco’ caiu em desuso, enquanto que
‘bastardo’ passava a designar, genericamente qualquer um de descendência
indígena”
135
. Portanto, no Setecentos “bastardo” não deve ser identificado de
imediato como condição de ilegitimidade.
Para facilitar as uniões matrimoniais, o próprio “Diretório dos Índios”
retirou o “caráter infamante” que acompanhava os casamentos entre brancos e índios.
Ao liberar legalmente os casais da vergonha, procurava-se também integrar o índio e
131
1759, Novembro, 29, Vila Bela. OFÍCIO, op. cit.
132
PAIVA; SOUSA; GEREMIAS, op. cit, vol. 3. 1983. p.47.
133
Cf. SILVA, op.cit.,1995. p.177.
134
Idem p. 63.
135
MONTEIRO. op.cit., 1994. p. 167.
50
seus filhos ao Estado português. A mulher índia passaria a morar na casa do marido,
de quem utilizaria o sobrenome, e adotaria os hábitos dos brancos assumindo, desse
modo, nova identidade
136
. Desse modo, havia freqüente encorajamento aos
casamentos entre brancos e índios, sempre “no interesse de aumentar a
população”
137
.
Para facilitar os ditos matrimônios, empregarão os diretores toda a eficácia
do seu zelo em persuadir a todas as pessoas brancas, que assistirem nas
povoações, que os índios tanto não são de inferior qualidade a respeito delas,
que dignando-se Sua Majestade de os habilitar para todas aquelas honras
competentes as graduações dos seus postos, conseqüentemente ficam
logrando os mesmos privilégios as pessoas que casarem com os ditos índios;
desterrando-se por este modo as prejudicialíssimas imaginações dos
moradores deste Estado, que sempre reputaram por infâmias semelhantes
matrimônios. Mas como as providências, ainda sendo reguladas pelos
ditames da reflexão, e da prudência, produzem muitas vezes fins contrários,
e pode suceder, que, contraídos estes matrimônios, degenere o vínculo em
desprezo, e em discórdia a mesma união; vindo por este modo a transformar-
se em instrumentos de ruína os mesmos meios que deverão conduzir para a
concórdia; recomendo muito aos diretores, que apenas forem informados de
que algumas pessoas, sendo casadas, desprezam os seus maridos, ou as suas
mulheres, por concorrer neles a qualidade de índios, o participem logo ao
governador do Estado, para que sejão secretamente castigados, como
fomentadores das antigas discórdias, e perturbadores da paz, e união
pública.
138
No entanto, não há, no “Diretório”, incentivo a casamentos entre negros e
índios; essa medida prática foi tomada para se adaptar à realidade da região, que
contava com poucos brancos.
A documentação produzida por Rolim de Moura é muito esclarecedora
quanto aos tipos étnicos dos moradores da capitania, como as informações contidas
136
Cf. COELHO, In: Revista de História Regional 5(2). Inverno 2000. p. 159.
137
MAXWELL, op.cit., 1996. p.139.
138
Fonte: "Coleção da legislação portuguesa desde a última compilação das Ordenações redigida pelo
desembargador Antonio Delgado da Silva”. Legislação de 1750 a 1762. Lisboa: Tipografia
Maigrense, 1830. In: Ius Lusitaniae - Fontes Históricas do Direito
Português.
http://www.iuslusitaniae.fcsh.unl.pt/ acesso 3 de junho de 2007, 11h 24m.
51
na carta que enviou a D. José I à respeito dos soldados pedestres
139
, em 25 de
fevereiro de 1757:
Os soldados pedestres desta capitania são enquanto ajustou [sic] das
qualidades seguintes: bastardos (por isto na América se entende filho de
branco com índio), mulatos, caribocas (isto é, filho de preto e índio, e estes
são ordinariamente os que melhor provam), e também se admite algum índio
puro, principalmente Bororos, pela habilidade que têm de serem bons
rastejadores, o que é de grande utilidade nas diligências. Andam sempre
descalços de e perna, o seu único vestido é um jaleco e umas bombachas.
140
Em uma “instrução”, Rolim de Moura, já Conde de Azambuja, observava a
João Pedro da Câmara, então governador da Capitania de Mato Grosso, que era
problemático encontrar pessoas para servir como soldados, assim como era difícil
transformar índios em soldados. Segundo o Conde de Azambuja,
... levantar as lutas por força dentro da Capitania tem os seus inconvenientes.
Se obrigarem os que chegam de fora, é o meio de virem poucos ou nenhum
para cá, e como não têm nela quem lhes doa, e são homens de capa em colo,
também sendo violentados a servir, há neles pouca segurança. Os naturais da
terra, em Mato Grosso são pouquíssimos [soldados], e estando procriando-se
faria muito mau efeito tirar por força aos homens os filhos e partir, para os
fazer soldados.
141
Rolim fazia referência ao pequeno número de soldados índios, pelo fato dos
pais resistirem a entregar seus filhos para as lides militares, pois eram conhecidos os
problemas provocados pela mudança brusca no ritmo de vida, que trazia sérios
problemas à saúde e aumentava em muito o índice de mortes, além de exigir
obediência a normas rígidas de comportamento.
Havia também incentivo para que os índios se casassem entre si,
oficializando as uniões. disso um exemplo em documento que trata da Povoação
139
Consultar “Figura de um soldado pedestre de Mato Grosso”, p. 100.
140
PAIVA; SOUSA; GEREMIAS, op. cit, vol. 3. 1983. p.47
141
Instrução do Conde de Azambuja para D. João Pedro da Câmara, Pará, 8 de Janeiro de 1765. In:
Instruções, op. cit. 2001. p.27.
52
Regular de Casalvasco
142
. O então capitão general João de Albuquerque de Melo
Pereira e Cáceres havia ordenado que os índios solteiros ou viúvos da povoação se
casassem. Havia em Casalvasco quatro índias, das quais três eram viúvas Josélia,
Manoela e Juliana , e uma era solteira a “pequena Maria”, que sofria do “mal da
gota” (epilepsia). Também moravam em Casalvasco quatro índios, e houve um
empenho especial de Francisco Pedro de Melo, responsável pelo cumprimento das
ordens, para que as índias se casassem com os quatro índios solteiros.
O problema que se apresentava é os quatro índios solteiros não possuíam
suas próprias canoas, requisito fundamental para que pudessem se casar. Quanto às
viúvas, Josélia e Manoela, não queriam se casar de modo algum. A “pequena Maria”,
“prontamente disse que queria [casar] fosse com quem fosse”
143
. Juliana, uma das
índias viúvas, aceitava casar, mas apenas com o muchacho Bernardino, embora
tivesse acertado com Francisco Pedro de Melo que se casaria com o índio Matias. No
entanto, Bernardino “quis a dita Maria Pequena, do mal de gota”
144
. Juliana, de
acordo com Francisco Pedro de Melo, disse que havia concordado em casar com
Matias por ter ficado com medo dele - Francisco
145
.
Não conhecemos, até o momento, o desfecho dessa trama, mas um ponto
interessante referente ao “mal da gota” (epilepsia), do qual padecia Maria, doença
que sempre vinha acompanhada de preconceitos. O fato do índio Bernardino preferir
se casar com a índia Maria, a do “mal da gota”, ao invés de Juliana, abre espaço para
estudos que discutam o significado, para os índios, de doenças que entre os brancos
eram estigmatizantes.
142
Para maiores informações sobre a povoação consultar a dissertação de OLIVEIRA, 2003.
143
APMT. Fundo Defesa; Ano 1795; Data 12/1/1795; Lata B; Doc. 57.
144
Ibidem.
145
Ibidem.
53
1. O viver no extremo oeste
Em carta datada de 31 de janeiro de 1755, enviada por Rolim de Moura a
Diogo de Mendonça Corte Real, Secretário de Estado da Marinha e Ultramar, um
comentário do governador sobre alguns dos problemas que assolavam a região do
Mato Grosso: os altos preços praticados pelos comerciantes; a falta de mão de obra
escrava negra; e a grande ambição dos clérigos. Rolim fazia aos clérigos as mesmas
críticas que Camões havia feito: se esqueciam da caridade, ambicionavam altos
postos, e não legislavam em favor do povo
146
. Rolim registrou que muitos dos
clérigos da capitania não hesitavam em vender e comprar índios, “sem embaraço de
ser expresso contra as constituições do bispado, com pena de excomunhão”
147
. Na
mesma carta, o capitão general expunha suas opiniões a respeito da capacidade de
aprendizagem dos índios, e justificava a existência de tutores:
Não dúvida que alguns índios chegam a aprender a ler e a escrever, ainda
dos que estão em mãos particulares, e no Cuiabá me consta haver um que até
sabe contar; porém, o ordinário é não terem capacidade para isso, e até
muitas vezes entro em dúvida se a maior parte deles chega a ter uso da razão.
E isso é a causa da prática que se lhe tem introduzido as aldeias [tutor], e
tratar em tudo como menores, sendo isso preciso ainda para conservarem a
e a doutrina, porque de outra forma, com a mesma facilidade com que
recebem se esquecem dela, o que se está vendo em alguns, que depois de
muitos anos de confissão e comunhão fogem pelo mato, e tornam a viver
como antes.
148
146
“Vê que aqueles que devem à pobreza / Amor divino, e ao povo caridade, / Amam somente
mandos e riqueza, / Simulando justiça e integridade./ Da fea tirania e de aspereza / Fazem direito e
severidade. / Leis em favor do rei se estabelecem;/ As em favor do povo só perecem”. CAMÕES, Luis
de. Os Lusíadas.. Canto Nono A Ilha dos Amores. Coleção General Benício; v. 354. Ed. comentada.
Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1980 (reimp. 1999). p. 538.
147
PAIVA; SOUSA;GEREMIAS, vol. 2. 1983. p. 52-53.
148
Ibidem, p.54.
54
Em 1755, com o início da atuação da “Companhia Geral do Comércio do
Grão-Pará e Maranhão”
149
, a região do Mato Grosso passou a ser abastecida com
gêneros alimentícios, ferramentas e escravos negros até 1778, o que, de certa
maneira, liberou, a mão de obra indígena para o projeto de povoamento, iniciado a
partir da segunda metade do século XVIII. No entanto, mesmo com a entrada dos
escravos negros, havia carência de gente para trabalhar nas terras Capitania:
“também é certo que este estado inteiro se acha arruinado, porque nele o pretos
com que se cultivem as terras”
150
.
Rolim de Moura, apesar do empenho do futuro Marquês de Pombal em
reconhecer a liberdade dos índios, em fins de 1759 ainda não havia publicado a lei de
liberdade, e explicava o motivo, em carta enviada a Tomé Joaquim da Costa Corte
Real:
... não me tenho resolvido publicar ainda as leis da liberdade dos índios,
porque esta gente, por liberdade, entende uma liberdade licenciosa, sem
gênero nenhum de sujeição, tal como a costumam ter nas suas terras, em que
não conhecem outra lei mais que o seu apetite. Pelo que receei, que das ditas
leis tomassem motivo para se alvoroçarem ainda mais, e assim reservo a dita
publicação para depois que me constar estão de todo sossegados, e a
autoridade do novo pároco bem estabelecida.
Somente os Paiaguás são
reputados por cativos por provisões antigas, e como tais pagam capitação, e
como esta nação nos tem feito sempre e está fazendo atualmente guerra, fico
em dúvida se a liberdade se deve também estender com estes, visto não os
expressar formalmente. E no caso de se estender a eles, se de ter efeito
com os mesmos, que foram cativados legitimamente, por haver sido em
guerra justa e com faculdade real, e debaixo dessa terem passado alguns a
terceiros possuidores.
151
Nesse caso estavam mulheres e crianças feitas cativas em guerras contra os
Paiaguá, em 1736, “pelos insultos, destroços, e mortes que haviam feito”, cujo
149
A Companhia de Comércio funcionou de 1756 até 1778, quando uma junta foi encarregada da
liquidação de suas contas. Porém, mesmo extinta, ainda continuou a funcionar com o nome de Extinta
Companhia do Grão-Pará, até 1803. Para mais informações sobre a Companhia consultar: DIAS,
Manuel Nunes. Fomento e Mercantilismo: A Companhia Geral do Grão Pará e Maranhão (1755-
1778). Coleção Amazônia, Série José Veríssimo. 1° vol. Universidade Federal do Pará, 1970.
150
APMT. D. Antonio Rolim de M. Tavares, Ano (1): 1750-1758, Lata A, 107 documentos.
151
MOURA, Antonio Rolim de. Correspondências. Vol. 4, Carta 129.
55
resultado foi que “toda nação Paiaguá ficou extinta, passando-se a espada todos os
homens, e fazendo prisioneiras todas as mulheres e crianças”
152
. Ressalte-se que os
Paiaguá não foram extintos, e continuaram atacando os portugueses ao longo do
século XVIII, conforme registros nas correspondências dos governadores.
Aprisionar mulheres e crianças índias constava das Instruções Régias (Carta
Régia de 25 de outubro de 1707), que determinava que mulheres e crianças
capturadas em “guerra justa” tornar-se-iam cativas, provavelmente mão de obra
utilizada em trabalhos domésticos ou atividades artesanais, e até mesmo como
concubinas. No entanto, Rolim de Moura poderia enfrentar problemas: caso
concedesse liberdade aos índios capturados em guerras justas, como proceder em
relação àqueles repassados a terceiros? A captura de mulheres e crianças não
acontecia somente com as índias de nações consideradas hostis, pois as índias das
missões espanholas também foram alvo dessas ações, que o aliciamento ou roubo
de índios das missões espanholas já aconteciam antes da chegada de Rolim de Moura
à Capitania de Mato Grosso.
Logo que souberam da chegada de Dom Antonio Rolim, os jesuítas que
dirigiam as missões espanholas de Moxos haviam-lhe escrito queixando-se
do bárbaro procedimento dos sertanistas portugueses, que causavam natural
desânimo às ditas missões, roubando índios reduzidos e mesmo os
batizados, e até haviam levado mulheres casadas.
153
Os índios do lado português, por mais que aumentasse seu número, não
eram considerados trabalhadores produtivos, por não atenderem às necessidades
comerciais dos portugueses
154
. Em ofício enviado em 1758 por Rolim de Moura a
Francisco Xavier de Mendonça Furtado, o governador observava:
A grande brutalidade, e falta de raciocínio dos índios faz recear que não
tirem deles todo o proveito, que aliás se devia esperar. Mas, se por este meio
se não reduzirem à civilidade e racionalidade das mais nações, pode
assentar-se que o não há. O despertar-lhe as paixões da vaidade, da ambição,
do desejo de adquirir, e viver com cômodo, como Vossa Excelência procura
152
MF 12, Doc. 160-161. 1736, Abril, 18. Parecer do Conselho Ultramarino à Manoel Rodrigues de
Carvalho. (AHU) – NDIHR/UFMT.
153
MELGAÇO, 1949. p. 243.
154
Cf. SILVA, op. cit., 1995. p. 163.
56
fazer por via do Diretório, reputo pelo meio mais eficaz. Ainda que sejam
vícios, eles são pela maior parte os que obrigam aos homens a trabalhar, a
instruir-se, a associar-se e a viver em uma necessária dependência uns dos
outros, e se eles não fossem estariam os brancos hoje no mesmo estado em
que vemos os índios.
155
Isso aumentava a necessidade, segundo o Diretório, da introdução de casais
de “brancos”, que pudessem influenciar os índios na aceitação da cultura lusa,
considerada a melhor maneira de oferecer aos índios noções de civilidade, doutrina
cristã e aprendizado para o trabalho
156
. Entretanto, Rolim observava que por meio do
Diretório poderia haver mudanças de comportamentos por parte dos índios:
Nestas minas se acha um índio Pareci casado, que vive sobre si com roça e
criações, sem ter nem necessitar de administração de ninguém. No Cuia
também outro que não vive sobre si, mas tem um escravo seu em uma
venda por sua conta. E o padre Agostinho Lourenço me contou que não sei
que Padre espanhol lhe assegurara que no Peru havia um letrado com
escritório público, que era índio puro. Pelo que se não oferece dúvida, que
Vossa Excelência vença a dificuldade de os seduzir a viverem como homens
racionais, principalmente aplicando-lhes os meios mais aptos para esse fim
com tanta discrição, atividade e zelo.
157
Percebe-se que todas as medidas tinham por objetivo convencer os índios a
se civilizarem, para viverem como se brancos fossem. Mais do que isso, era
conseguir que os índios aceitassem os padrões europeus, garantindo assim para a
Coroa portuguesa, uma população desejável e necessária para se ocupar as regiões de
fronteira, assegurando a posse desses territórios.
Em 8 de março [de 1762] se fez também público o bando, ou as ordens que
Sua Majestade mandou, a respeito dos índios brasílicos, cujas eram: de sorte
nenhuma fossem tratados como cativos, mas como libertos que eram;
155
1758, Novembro, 15, Vila Bela. OFICIO do [governador e capitão general da capitania de Mato
Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [governador e capitão general da Capitania do Grão
Pará] Francisco Xavier de Mendonça Furtado. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 10, Doc. 585.
156
Cf. ALMEIDA, op.cit., 1997. p.138.
157
1758, Dezembro, 14, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão general da capitania de Mato
Grosso] Antonio Rolim de Moura ao [governador e capitão general da capitania do Grão Pará]
Francisco Xavier de Mendonça Furtado. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 10, Doc. 596.
57
poderiam ocupar postos honrosos, segundo o tratamento que tivessem, e se
admitissem nas Câmaras, naqueles empregos que costumam pôr, em grau de
nobreza, os sujeitos beneméritos.
158
Assim, as reformas preconizadas pelo Diretório pretendiam incutir junto das
comunidades indígenas não o padrão de comportamento moral europeu como
ainda introduzia hábitos de trabalho próprios dos europeus
159
.
Em instrução enviada por Rolim de Moura, Conde de Azambuja, a João
Pedro da Câmara em 1765, informava que continuava o problema do aumento da
população da Capitania de Mato Grosso: “ela é, por território, das mais extensas;
mas, por gente, muito diminuta”
160
. Carlos A. Rosa, ao analisar o povoamento nas
duas repartições, não observou aumento expressivo no Mato Grosso promovido pelos
incentivos reais nos primeiros vinte anos da implantação da capitania: os incentivos
“não foram suficientes para sustentar ali povoamento mais expressivo que o do
Cuiabá”
161
. Isso, apesar da “permissão” das mancebias, dos aliciamentos dos índios
das missões espanholas, além dos descimentos de índios silvestres. Considere-se o
alto grau de mortalidade ao qual os índios estavam sujeitos fora de seus domicílios,
além das “continuadas fugas a que sua libertinagem os inclina”
162
.
158
Anal desta vila do ano de 1762, In: AMADO & ANZAI, op. cit., p. 85-86.
159
Cf. DOMINGUES, op.cit., 2000. p. 73.
160
Instrução do Conde de Azambuja para D. João Pedro da Câmara, Pará, 8 de Janeiro de 1765. In:
INSTRUÇÕES aos Capitães-generais, op.cit., p.21.
161
ROSA, op.cit., 2000. p.46.
162
Cf. Instrução de Dom Luís Pinto de Souza para Luís de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres,
Vila Bela, 24 de Dezembro de 1772. In: INSTRUÇÕES aos Capitães-generais, op.cit., p. 49.
58
2. Casamentos versus concubinatos na Capitania de Mato Grosso
Uma das estratégias utilizadas desde o século XVI para garantir a presença
portuguesa entre os índios foram os casamentos ou concubinatos, conferindo aos
colonos certo prestígio dentro das estruturas indígenas”
163
. Casamentos e
concubinatos implicavam obrigações mútuas, buscando-se estabelecer relações
sócio-políticas entre brancos e indígenas, que acabavam por instituir a mistura dos
sangues dos filhos destas relações. Além disso, ofereciam a oportunidade de pessoas
de “fora” do grupo conviverem com pessoas de “dentro” do grupo indígena, havendo
assim, uma “troca” de experiências e culturas.
As relações ilícitas no período colonial eram muitas e se explicam, também,
pela falta de mulheres brancas na Colônia. Mesmo as relações com as índias
ocorrendo desde o século XVI, os colonos procuraram, na maioria das vezes, casar-
se legalmente com as brancas do Reino; buscavam, assim, estabelecer a descendência
legítima e ampliação do patrimônio familiar. É certo que isso não significou a
monogamia, pois além das mulheres legítimas, havia grande possibilidade de
concubinas, com as quais era comum que os homens tivessem filhos ilegítimos.
Nisso incorriam também os padres; muitos foram acusados de vida libertina, de
andarem com as índias e de terem, inclusive, filhos com estas
164
.
Nos livros de “Assentos e Batismos” de Cuiabá (1736-1744)” encontramos
algumas informações sobre as práticas de relacionamentos da população. Nesse
documento podemos obter informações do dia, mês e ano do nascimento, do
batizando, local onde foi realizado o batismo, se houve ou não a unção com os santos
óleos, o nome da criança, assim como os nomes dos pais e padrinhos. Em alguns
casos, os pais e padrinhos, por serem pessoas importantes na sociedade, tinham
registradas suas profissões e, no caso da mulher, registrava-se o tratamento de Dona
antes do nome
165
.
163
MONTEIRO, op.cit., 1994. p.34
164
Sobre o assunto consultar RESENDE, In. Estudos Ibero-Americanos. Revista do Departamento de
História.PUCRS, v. XXX, n.2, p.1-133, dezembro de 2004.
165
Consultar: PERARO, 2001.
59
Porém, neste estudo, selecionamos os registros de batismos nos quais havia
informações dos pais do tipo “bastardos”, “pardos” e do “gentio da terra”. Nos
registros abaixo citados, a cada um deles cabe uma análise, que procuraremos fazer
ao longo dos capítulos:
Aos quatro dias do mês de março de 1736 anos, nesta Igreja Matriz do
Senhor Bom Jesus das Minas do Cuiabá batizei e pus os Santos Óleos, a
Maria, inocente, filha de Filipe ... [ mãe ....] bastarda forra.
Aos 2 dias do mês de fevereiro de 1737, nesta Igreja Matriz do Cuiabá
batizei e pus os Santos Óleos a João, inocente, filho de Ana, mulher parda,
forra, e de pai incógnito.
Aos 21 dias do mês de junho de 1737, nesta Igreja Matriz batizei e pus os
Santos Óleos a Ana, filha inocente de Antonia Rodrigues, mulher solteira,
parda forra, e de pai incógnito.
Aos 25 dias do mês de outubro de 1737 anos, nesta Igreja Matriz do Senhor
Bom Jesus do Cuiabá batizei e pus os Santos Óleos a Josefa, inocente, filha
de Helena, parda forra e pai incógnito.
Aos vinte e quatro dias do mês de janeiro de 1742, nesta Igreja Matriz do
Senhor Bom Jesus da Vila do Cuiabá batizou, de minha licença, o Padre
Dom José Denton a Inácio, filho de Bernarda Fagundes, parda forra, solteira,
e lhe pôs os Santos Óleos.
Aos oito dias do mês de abril de 1742 anos, nesta Igreja Matriz do Senhor
Bom Jesus, Vila do Cuiabá batizou, o Padre Coadjutor Manoel Ribeiro de
Cobellos, a Ana, inocente, filha legítima de Antonio Cordeiro de Macedo e
de sua mulher, Venturosa Correa, pardos forros, e lhe pôs os Santos Óleos.
Aos dez dias do mês de abril de 1742 anos, nesta Igreja Matriz do Senhor
Bom Jesus, Vila do Cuiabá batizou, o Padre Coadjutor Manoel Ribeiro de
Cobellos, a Francisco, inocente, filho de ... [mãe...] parda, forra, e pai
incógnito, solteira, e lhe pôs os Santos Óleos
Aos dezesseis dias do mês de abril de 1742 anos, nesta Igreja Matriz do
Senhor Bom Jesus, Vila do Cuiabá batizou o Padre Coadjutor Manoel
Ribeiro de Cobellos a Salvador, inocente, filho legítimo de Inácio Dias de
60
Mendonça e de sua mulher Ângela Pinta, pardos forros, e lhe pôs os Santos
Óleos.
Aos vinte e dois dias do mês de abril de 1742 anos, nesta Igreja Matriz do
Senhor Bom Jesus Vila do Cuiabá batizei a Joana, inocente, filha legítima de
João da Silva, pardo forro, e de sua mulher, Josefa Cordeira, bastarda forra, e
lhe pus os Santos Óleos,
Aos trinta dias do mês de maio de 1742 anos, nesta Igreja Matriz do Senhor
Bom Jesus, Vila do Cuiabá batizei a Rosa, inocente, filha legítima de Félix
Leme e de sua mulher, Páscoa Pimenta, forros do gentio da terra, e lhe pus
os Santos Óleos.
Ao primeiro dia do mês de setembro de 1742 anos. nesta Igreja Matriz do
Senhor Bom Jesus, Vila do Cuiabá batizei a Rita, inocente, filha legítima de
Manoel da Costa Ferra e de sua mulher, Paula Gomes, pardos forros.
Aos seis dias do mês de setembro de 1742 anos, na Capela de Santo Antonio
Rio Abaixo batizou, da minha licença, o Padre Pedro Leme do Prado a José,
inocente, filho de Rosa, bastarda, solteira, e pai incógnito.
166
Como se pode observar há um número considerável de bastardos registrados
no livro de batismo. Conforme explicado, “bastardos”, nesta parte da América,
eram denominados os filhos de brancos com índias.
o termo “pardo” teve seu significado ampliado, na medida em que as
misturas étnicas foram se tornando mais complexas, e as designações “preto”,
aplicável ao escravo ou ex escravo vindo da África, e “crioulo”, aplicável àqueles
negros nascidos no Brasil, já não davam conta de expressar a realidade étnica.
“pardo livre” sinalizava para “a ascendência escrava africana, assim
como a designação “cristão-novo” sinalizara para a ascendência judaica
167
. Hebe
Matos exemplifica, com um caso específico, o de Lourenço, “homem pardo”, e
considera que provavelmente a identificação “pardo” era motivada pelo fato de haver
nascido livre, e não por ser mestiço
168
. No entanto, Nauk Maria de Jesus cita o caso
do cirurgião José da Silva Vasconcelos, morador da Vila do Cuiabá, identificado
166
MESQUITA, 1936-1937. p. 139-174.
167
FRAGOSO; BICALHO & GOUVÊA, p. 154-155.
168
Ibidem, p. 155.
61
como “pardo forro”, e que era filho de português com uma negra de Angola,
concluindo que pardo designaria “mestiço de ascendência negra”, ao contrário de
outros autores que a consideram designativa de filhos de índios
169
. Diante disso,
concordamos e compartilhamos da análise de John Manuel Monteiro, para quem o
termo possuía sentido diferenciado em cada região da colônia
170
.
ainda batismos de filhos legítimos, cujos pais eram pardos ou do gentio
da terra. Isso mostra o controle da Igreja Católica sobre a vida privada dos moradores
da Capitania, mais precisamente na repartição do Cuiabá, que possuía os registros
dos casamentos legalmente constituídos à época. Já o termo “pai incógnito” devia-se,
possivelmente, à não declaração do nome paterno no ato do batismo. Este fato nos
indica possível relutância de alguns pais em reconhecer seus filhos, e é possível que
isso ocorresse por dúvida quanto à paternidade ou pelo fato desses filhos serem fruto
de relações instáveis, com homens constantemente em trânsito. O fato das mães
declararem “incógnitos” os pais de seus filhos no livro de Assentos e Batismos,
certamente colocava em dúvida seu comportamento moral, em uma sociedade
patriarcal. Do olhar masculino partiram algumas considerações sobre o
comportamento de algumas mulheres da Vila Real do Cuiabá, como as de Manuel
Leite Pereira:
Andando alguma mulher forra ou cativa prenha, e havendo notícia falsa ou
verdadeira de que esta tem tratos ilícitos com alguns homens, logo as mães
dizem que a prenhidão é daquele homem mais abastado de bens ou de quem
elas querem, sendo muitas vezes prenha de outro homem esquecendo
daqueles adágios: vaca do campo não tem touro certo.
171
O interessante a se analisar nos Assentos e Batismos no caso dos mestiços
fossem eles bastardos pardos ou ainda os filhos destes mestiços , é que acabavam
se tornando mais um “vassalo” do rei. Isso se deve ao fato de não constar a
denominação que se dava à criança batizada: filho de bastardo seria bastardo ou
índio? E filho de pardo com bastardo, como seria denominado? Essa identidade, se é
que havia, perdeu-se nos documentos oficiais.
169
JESUS, In: ROSA e JESUS, 2003. p. 143.
170
Cf. MONTEIRO, op. cit., 1994. p. 256 (nota 43).
171
Ver ROSA, 1996. p. 205.
62
Até o momento são poucas as fontes disponíveis sobre casamentos ou
concubinatos na repartição do Mato Grosso, sendo os casos expostos neste estudo
referentes ao Cuiabá
172
. O que se pode afirmar, segundo estudos disponíveis, é que
os matrimônios legalmente constituídos na Capitania de Mato Grosso foram poucos,
graças também aos preços exorbitantes cobrados pelos padres. Isso promoveu uma
grande quantidade de mancebias, que eram combatidas pela Igreja, mas justificável
diante da situação que se colocava. De acordo com Jovam Vilela da Silva, “o
casamento quase não acontecia, vivia-se de portas adentro, em função da
característica volante da população masculina, e ainda porque quase não havia
párocos, e quando as igrejas os alojavam, as custas da cerimônia religiosa
inviabilizavam o enlace”. Essas custas, segundo Vilela, alcançavam também “os
batizados e os enterros da população em geral e dos indígenas administrados”
173
.
Essa mesma opinião é compartilhada por Torres-Lodoño, para quem, durante todo o
século XVIII, as pessoas não se casavam por não poderem arcar com as custas dos
casamentos
174
. Ainda segundo Torres-Lodoño, o concubinato era chegar ao
casamento pela porta dos fundos”
175
, pois muitos, apesar de viverem em
concubinato, levavam vida de casados, podendo mesmo legalizar a união
posteriormente.
Consideramos que essa questão seja mais complexa, sendo necessário
considerar também o pequeno número de párocos na região, a população masculina
superior à feminina, e a existência de muitas pessoas que eram casadas em seus
locais de origem. Também consideramos necessário relativizar a colocação de
Ronaldo Vainfas, para quem os pobres não se casavam não pelos altos custos da
cerimônia, mas por falta de opção,
... por viverem, em sua grande maioria, num mundo instável e precário, onde
o estar concubinado era contingência da desclassificação, resultado de não
ter bens ou ofício, da fome e da falta de recursos, não para pagar a cerimônia
172
SILVA, op.cit., 1995.
173
Idem, 2001. p.93.
174
TORRES-LODOÑO, op. cit., p. 53.
175
Ibidem, p. 100.
63
de casamento, mas para almejar uma vida conjugal minimamente alicerçada
segundo os costumes sociais e a ética oficial.
176
As afirmações de Vainfas são generalizantes; essas pessoas poderiam viver
em um mundo instável e precário se comparado a hoje, mas não à época, quando não
se conseguia muito mais do que aquilo que se possuía. O que importava aos
administradores era que dessas relações entre índios, brancos e negros, nascessem
“os mais próprios para povoar sertão tão doentio, de matas fechadas e rios
caudalosos”
177
.
Um exemplo de relacionamento entre homem branco e mulher índia é o de
Ricardo Franco de Almeida Serra, engenheiro demarcador, grande conhecedor das
terras da capitania, que em seu leito de morte, no Forte de Coimbra, reconheceu os
dois filhos que teve com Mariana, uma índia Guaná
178
. As mulheres Guaná
mereceram a seguinte descrição: “bem feitas de corpo, possuidoras de rosto
interessante, os olhos ordinariamente apertados e um tanto oblíquos, o nariz pequeno,
afilado, boca no comum grande, lábios grossos, dentes claros e bem implantados”
179
.
A relação entre os dois teve início quando Mariana procurou abrigo no Forte de
Coimbra. Lá, Ricardo Franco lhe ensinou português e latim, e quando a menina fez
14 anos tornou-se sua mulher provavelmente numa relação de concubinato ,
recebendo o nome de Mariana Luiza. O casal teve dois filhos: Ricarda Manuela de
Santa Rita e Augusto Martiniano de Almeida Serra
180
.
A legalização dos casamentos foi uma das preocupações do Marquês de
Pombal:
Entre os meios mais proporcionados para se conseguir tão virtuoso, útil, e
santo fim, nenhum é mais eficaz que procurar, por via de casamentos, esta
176
VAINFAS, op. cit. p. 94.
177
SILVA, op. cit., 1995. p.140.
178
Cf. MEIRELES, op.cit., p. 179.
179
Viagem de Porto Feliz a cidade de Cuiabá, 22 de junho de 1826. In: Revista Trimestral do Instituto
Histórico, Geográfico e Etnográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: Tomo XXXVIII, Parte Primeira,
1875.p.425.
180
Cf. ALENCAR, 1999. p. 139-140. A filha Ricarda nasceu provavelmente em 1803, e faleceu com
73 anos de idade, sendo sepultada em Portugal, no cemitério do Porto. Foi casada com Vicente
Tibúrcio de Sousa, com quem teve oito filhos: Ricardo Franco, Maria, Mariana, José, João, Jerônimo,
Emília e Vicente. o filho Augusto nasceu por volta de 1808, falecendo aos 25 anos de idade,
solteiro e sem filhos.
64
importantíssima união, pelo que recomendo aos Diretores que apliquem um
incessante cuidado em facilitar e promover pela sua parte os matrimônios
entre os brancos, e os índios, para que, por meio deste sagrado vínculo, se
acabe de extinguir totalmente aquela odiosíssima distinção, que as nações
mais polidas do mundo abominaram sempre, como inimigo comum do seu
verdadeiro e fundamental estabelecimento.
181
Sem dúvida, o mestiço foi o tipo físico mais desejado, o que melhor se
adaptou à região, conhecida por suas doenças e falta de condições materiais, e nesse
processo a mulher índia representou importante papel.
3. Índios e negros nos quilombos
Nem todos aceitavam ser vassalos do rei; muitos resistiram, atacando os
portugueses, fugindo para os matos ou para as missões espanholas. Nessas fugas
temos a presença marcante dos negros que acabavam recebendo proteção dos padres
espanhóis, e contamos ainda com diversas referências de índios e negros convivendo
em quilombos. Se a condição dos índios não era boa, a dos negros pode ter sido pior.
Considerados mercadoria, muitos sofriam extrema violência, fugiam para locais
distantes, onde se aquilombavam. Nesses locais reunia-se um grupo étnico
diversificado negros, índios, mestiços que, fugindo à opressão, buscavam viver
em liberdade. Os quilombos “simbolizavam ao mesmo tempo espaço de transgressão
e resistência”
182
.
Nos Anais de Vila Bela, a primeira menção a quilombos foi feita no
governo de Luís Pinto de Sousa Coutinho:
181
Diretório que se deve observar nas Povoações dos Índios do Pará, e Maranhão em quanto Sua
Majestade não mandar o contrário. Apud ALMEIDA, op. cit. 1997. Apêndice. p. 37.
182
SIQUEIRA, In. MELLO, 2001. p. 7
65
O Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor General, sendo informado das
muitas e continuadas fugas que atualmente faziam os escravos dos
moradores desta terra, para os matos, muito principalmente para o quilombo
chamado Grande, e desejoso de evitar tão grande dano, o melhor e mais
acertado meio que pôde descobrir foi o criar de novo uma companhia de
soldados ligeiros para o sertão e mato, com oficiais competentes, sendo
sargento-mor dela Inácio Leme da Silva, a quem deu jurisdição ampla para o
castigo dos soldados respectivos à mesma companhia.
183
O funcionamento do quilombo Grande foi retratado no “Anal de 1770”,
onde encontramos informações preciosas sobre a atuação da rainha do quilombo,
Tereza de Benguela:
Era esse quilombo muito antigo. Segundo as notícias que dão os negros, foi
fabricado pouco depois do descobrimento destas minas. Teve rei e rainha. O
rei era falecido há anos. Por seu falecimento, ficou a rainha governando, com
poder tão absoluto que, não só chegou a mandar enforcar, mas também
quebrar pernas e braços e enterrar vivos aqueles que, arrependidos da fuga,
queriam tornar para a casa de seus senhores, sem que para semelhantes e
outros castigos fosse preciso legal prova. Bastavam leves indícios para serem
punidos quaisquer réus de semelhantes delitos. Isso, além de outro, que
mandava fazer muito ao seu paladar. Chamavam esta muito intitulada rainha
Teresa. Era de nação Benguela, escrava do capitão Timóteo Pereira Gomes.
Era assistida e servida de todas as mais negras e índias, ainda melhor de que
se fossem suas cativas, a quem diariamente castigava, rigorosamente, por
qualquer coisa. Tanto era temida que nem machos nem fêmeas eram ousados
a levantar os olhos diante dela.
184
Os Anais de Vila Bela trazem informações de como foi feito o ataque ao
quilombo, e quais foram os procedimentos adotados, mas há um dado interessante:
Depois de aquartelado, foi expandindo escoltas para várias partes daquele
sertão e esconderijos. Seguindo os soldados as trilhas, foram abalroando em
várias malocas daqueles inimigos, dos quais alguns se punham em
resistência, de forma que os soldados, em sua necessária defesa, se viram
183
Anal do ano de 1770, In: AMADO & ANZAI, op.cit., p. 138.
184
Anal do ano de 1770, In AMADO & ANZAI, op.cit., p.139-140.
66
obrigados a fazerem-lhe tiro para salvarem as suas vidas. Sendo os encontros
muitos, e muitas as resistências, não houve da nossa parte perigo algum de
vida. Da parte daqueles infiéis morreram a tiro nove, dos quais foram
apresentadas ao Senado 18 orelhas.
Compunha-se esse quilombo de 69 pessoas do gentio de Guiné, entre
machos e fêmeas, dos quais vieram acorrentados e presos 41, e nove mortos;
perfazem cinqüenta; e os 37 que faltam, para o total dos escravos, ficaram
desarvorados pelos matos. Achavam-se no mesmo quilombo trinta e tantas
índias, que os tais negros tinham apanhado no sertão, onde matavam os
machos e traziam as fêmeas para delas usar como de mulheres próprias.
185
O fato que chama a atenção é sem dúvida o registro de rapto de mulheres
índias feito por negros. Pode-se supor, caso fosse real, que tal atitude se desse pela
falta de mulheres negras para se unirem aos negros. Este fato fortalece a afirmativa
de Jovam Vilela da Silva, que diz que as mulheres indígenas foram as responsáveis
pela política de parentesco na Capitania de Mato Grosso, devido à grande quantidade
delas vivendo na Capitania. que se esclarecer, também, se as índias encontradas
no quilombo não seriam também fugitivas. Considere-se que aos soldados que
destruíram o quilombo interessava apresentar os negros aquilombados como raptores
de mulheres, criminosos. A aplicação da lei aos escravos fugidos era dura:
Eu, El Rei, faço saber aos que este Alvará em forma de Lei virem, que
sendo-me presentes os insultos, que no Brasil cometem os escravos fugidos,
a que vulgarmente chamam quilombolas, passando a fazer o excesso de se
juntarem em quilombos; e sendo preciso acudir com remédios, que evitem
esta desordem: Hei por bem, que a todos os negros, que forem achados em
quilombos, estando neles voluntariamente, se lhes ponha com fogo uma
marca em uma espádua com a letra F, que para este efeito haverá nas
Câmaras; e se quando se for a executar esta pena, for achado com a
mesma marca, se lhe cortauma orelha, tudo por simples mandado do juiz
de Fora, ou ordinário da terra, ou do Ouvidor da Comarca, sem processo
algum, e só pela notoriedade do fato, logo que do quilombo for trazido, antes
de entrar para a cadeia.
186
185
Ibidem, p.139.
186
Lei Real impressa em 1741, Lisboa, referindo-se às penalidades a que estavam sujeitos os escravos
que se juntassem em Quilombos. In. RANDAZZO, 1977. p. 29-30
67
Os Anais de Vila Bela reforçam que escravos negros e índios resistiam,
fosse fugindo para os domínios da Espanha, adentrando as matas ou fundando
quilombos. Nas terras dos índios Pareci, região do Quilombo Grande foram feitas
duas investidas para sua destruição, uma em 1770 e outra em 1795. O objetivo era
fazer com que os moradores da Capitania recuperassem seus escravos. No ataque aos
quilombos de 1795
187
, em terras vizinhas ao rio Guaporé encontrou-se, em diversos
quilombolas, alguns índios,
... que tranquilamente existiam aquilombados na escarpa da extensa serra dos
Parecis, derramada pelos terrenos de que nascem os rios Piolho (hoje de São
João), Galera, Sararé, Pindaituba e outros, segundo sua constante notícia.
188
Na busca por fugitivos, uma bandeira entrou nos sertões dos Pareci,
contando com a ajuda de um “preto forro e que fora apreendido há muitos anos no
quilombo do Piolho”
189
. Porém, o dito preto desconheceu a região de rio Branco, e
em 5 de junho, seguindo rumo ao sul, chegaram no dia 15 à margem do rio Piolho.
No dia 16, avistaram “fogos e rastos de gente, que se julgava ser de gentios, se
marchou com mais vagar e indagações”
190
, e seguindo essas pistas encontraram três
índios, um negro e um caburé, sendo que somente um índio conseguiu fugir, os
demais foram aprisionados. Seguindo o índio fugitivo, encontraram o quilombo.
Este quilombo foi formado com os remanescentes do antigo quilombo
Grande, governado por Tereza de Benguela, os que haviam fugido pelo mato quando
da destruição do quilombo. Foram presos três negros e mais 32 pessoas, entre
homens, mulheres, rapazes e raparigas, índios e caburés. Faltavam ainda mais três
negros e mais 16 pessoas
191
. Segundo informação do comandante da Bandeira:
O quilombo do Piolho, que deu este nome ao rio em que está situado, foi
atacado e destruído haverá 25 anos, pelo sargento mor João Leme do Prado,
187
APMT, Fundo Defesa; Ano 1795 A; Lata B; Doc. 25. Há ainda a publicação de parte deste
documento em MELLO, 2001. Porém, nesta publicação optou-se em não transcrever o que estava no
manuscrito original selecionado em uma espécie de quadro. outra publicação mais completa em
ARAÚJO, 2003. Porém, nesta publicação a presença de falhas na impressão da última linha das
páginas 214, 215 (foi impresso novamente na página 216) e 216. Contudo é a que mais completa está,
apresentando, porém, algumas divergências entre as duas publicações e o manuscrito original.
188
ARAÚJO, (transcrição). op.cit., p.213.
189
Ibidem, p. 215.
190
Idem, p. 216.
191
Ibidem.
68
onde apreendeu numerosa escravatura; ficando naquele lugar ainda muitos
escravos escondidos pelos matos, que pela ausência daquela Bandeira se
tornaram a restabelecer nas vizinhanças do antigo lugar. Destes escravos
novamente aquilombados morreram muitos, uns de velhice outros às mãos
do gentio Cabixis, com que tinham continuada guerra, a fim de lhe furtarem
as mulheres, das quais criaram os filhos caburés que mostra a relação.
192
Basicamente todos foram capturados e conduzidos pelo paisano Geraldo
Ortiz de Camargo para Vila Bela. No dia 24 de setembro chegaram à capital os
abaixo relacionados:
Relação dos Pretos, Índios e Caburés
que compunham o quilombo do Piolho
PRETOS IDADE
1- Clemente Congo 40
2- José Benguela 45
3- João Mina 70
4- José Matervo 70
5- José Cabange 70
6- José Cabadengo 75
ÍNDIOS IDADE
1- Lourenço 30
2- Salvador 40
3- Manoel 16
4- Antonio 25
5- Miguel 22
6- Francisco 40
7- Francisco 9
8- Simão 7
ÍNDIAS
1- Helena 25
2- Rosa 70
3- Domingas 24
4- Arcângela 40
5- Esperança 40
6- Mariana 11
7- Páscoa 3
8- Joana 40
9- Catarina 23
10- Quitéria 2
11- Ana 3
12- Marcela 40
13- Damiana 11
14- Izabel 20
15- Justiniana 80
16- Maria 10
17- Feliciana 12
18- Aurora 30
19- Maria 30
192
ARAÚJO, (transcrição). op.cit., p. 217.
69
CABURÉS FÊMEAS IDADE
1- Viríssima 2
2- Inácia 2
3- Ana 1
4- Rosa 3
5- Maria 6
6- Antonia 16
7- Tereza 7
8- Dorotea 7
9- Benedita 12
10- Ivete 6
11- Luiza 12
CABURÉS IDADE
1- Felipe 18
2- Antonio 16
3- Adão 10
4- Ignácio 9
5- Antonio José 8
6- Gonçalo 4
7- André 2
8- Luiz 1
9- Vicente 1
10- Domingos 1
SOMA TOTAL
Negros 6
Índios 8
Índias 19
Caburés 10
Caburés Fêmeas 11
TOTAL GERAL 54
Fonte: ARAÚJO, 2003. p. 218.
Alguns fatores chamam a atenção. Na composição do quilombo constam 27
índios (homens e mulheres), que representam 50% em relação à população total
capturada; 21 mestiços (caburés e caburés meas), que representam 38,89%, e
apenas 6 negros, que representam 11,11%. Um fato curioso é o não registro de
mulheres negras, sendo possivelmente as índias e algumas “caburés fêmeas” as
mulheres dos negros.
É interessante reafirmar que, no caso dos índios e índias, a liberdade destes
estava “garantida” desde 1755. Contudo, o Diretório (1757-1798), apesar de
continuar a garantir a liberdade, dava ainda condições de se manter, em alguns casos,
a escravidão dos índios, devendo ser esse o motivo principal dos índios se
aquilombarem.
Continuando a análise, observa-se uma população feminina (índias e
caburés fêmeas) de 30 mulheres, independente da idade, que corresponde a 55,56%,
enquanto que a masculina (negros, índios e caburés) de 24 homens, também
70
independente da idade, corresponde a 44,44%. O fato de haver mais mulheres do que
homens se deve, provavelmente, à luta entre negros e índios Cabixis, que disputavam
as índias. Nessa disputa muitos índios e também negros morreram.
Pode-se observar também que os negros eram em sua maioria idosos; os
índios, de idade mediana, variando entre 20 a 40 anos; no caso dos mestiços
(caburés) tanto os meninos quanto as meninas, eram crianças. Quanto às índias, um
número razoável estava em idade fértil, gerando filhos com os negros, os caburés. O
fato dos negros serem idosos é bem curioso, pois os caburés eram, provavelmente,
filhos destes mesmos negros com as índias. O porquê das índias manterem relações
com esses negros idosos, e não com os índios de idade mediana é instigante, pois não
se sabe se era por escolha ou por imposição.
No caso dos menores, considerando de 0 a 12 anos, havia 26 pessoas que se
enquadram nessa faixa etária, sendo: 8 índios “puros” (mulheres e homens) o que
equivale a 30,77%; e 18 caburés (mulheres e homens) o que equivale a 69,23%. De
posse desses quilombolas, o comandante da bandeira explica:
Logo que esta gente chegou a Vila Bela, vendo Sua Excelência que todos os
caburés e índios de menos idade sabiam alguma doutrina cristã, que
aprenderam com os negros, e que se instruíram nelas suficientemente e com
gosto nesta capital, onde se lhe acabou de ensinar, e ainda alguns índios
adultos, pois todos falavam português com a mesma inteligência e pronúncia
dos pretos, de que aprenderam, e como todos estavam prontos para receber o
batismo, foi pessoalmente assistir a este sacramento, sendo padrinho de
alguns; assim como de outros, as primeiras pessoas desta vila, cuja função se
celebrou no dia 6 de outubro, recebendo este sacramento todos os de menor
idade, e alguns maiores, que estavam mais imbuídos na religião.
193
Certificando o comandante da bandeira que na região próxima ao quilombo,
“havia algumas aldeias de índios mansos, aos quais se ofereceram reduzir à nossa
sociedade os novos batizados”, foram convidados a participar.
Mandou Sua Excelência todos estes caburés, índios e pretos que houve modo
de se formarem e sem os quais os ditos índios e caburés não podiam
presentemente passar, assim por serem alguns caburés seus filhos, como para
193
ARAÚJO, (transcrição). op.cit.,p.219.
71
lhes ensinar a cultivar as terras, para o mesmo lugar em que foram
apreendidos, que ficava 30 e tantas léguas a Norte de Vila Bela, dando-lhes
ordem e auxílio para firmarem uma aldeia, que se ficará chamada aldeia
Carlota, em memória da nossa sereníssima princesa; e ao rio antigamente
denominado Piolho, se lhe pôs o nome de rio de São João.
194
João de Albuquerque governador da Capitania de Mato Grosso
preocupado com a formação de novos quilombos na região do rio São João (onde
localizava o quilombo), resolveu fundar uma aldeia no lugar, a aldeia Carlota
195
(consultar Mapa n° 2), em homenagem à rainha de Portugal
196
. As pessoas que
haviam sido aprisionadas no quilombo partiram para a nova aldeia no dia 7 de
outubro, levando, além de mantimentos, muitos grãos e sementes para plantar.
Levaram também ferramentas, porcos, patos e galinhas para criação.
A questão estratégica da fundação da aldeia foi, sem dúvida, que a região do
antigo quilombo era vizinha das terras espanholas, e a cada dia mais escravos negros
fugiam, inclusive, para o lado espanhol. Isso concorria para que aquelas terras da
Coroa lusa na América fossem se “despovoando”, não se conseguindo, desse modo,
ocupa-las para garantir a conquista. Ao estabelecer uma aldeia na região, a intenção
era fazer mais um estabelecimento para favorecer a comunicação por terra da capital
Vila Bela até o Forte do Príncipe da Beira
197
.
Além disso, o fato de aldear estes índios, caburés e negros possibilitava a
ocupação do local com pessoas que se “reduziam à amizade” e interesse da Coroa,
garantindo assim as terras, além da possibilidade destes produzirem e levarem seus
produtos para serem comercializados em Vila Bela. Outro fator de interesse era a
possibilidade da descoberta de boas amostras de ouro na região da aldeia.
194
ARAÚJO, (transcrição). op.cit.,. p.219.
195
Consultar “Mapa de parte do Rio Guaporé, e dos rios Sararé, Galera, S.João e Branco seus braços.”
p. 72.
196
Cf. SIQUEIRA, 2002. p. 123.
197
Para maiores informações sobre o Forte do Príncipe da Beira consultar: FERNANDES, 2003.
Mapa n° 2: Mapa de parte do Rio Guaporé, e dos rios Sararé, Galera, S.João e Branco seus braços
Fonte: http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_cartografia/cart540231.jpg
Aldeia Carlota
Santa Ana
Vila Bela
Cazal Vasco
Capítulo III
Roubo de índios, fugas e ataques:
o cenário da fronteira Oeste
Na tentativa de justificar o domínio e defender o território, a Coroa
portuguesa passou a considerar importante a consolidação de sua presença nas zonas
de fronteira, fossem estas constituídas pela orla ou pelo sertão. Com a assinatura do
Tratado de Madri entre as duas metrópoles ibéricas, as terras da América portuguesa
diminuíram no Sul, porém, aumentaram no Norte, em conseqüência dos acordos
firmados entre Portugal e Espanha
198
.
No planejamento da área de fronteira, que acontecia tanto no lado espanhol
quanto no português, “os índios tiveram uma importância estratégica enquanto meio
de implantação do direito de uti possidetis
199
, parte do programa geopolítico e
civilizacional previsto pela própria Coroa no território
200
, em diferentes fases,
durante o Setecentos.
A forte presença indígena reduzida organizada nas missões jesuíticas de
Moxos e Chiquitos
201
até a expulsão da Ordem de possessões espanholas, em 1767
, existente na fronteira oeste luso-espanhola, exigia dos portugueses, além da
fundação de vilas e arraiais, que também procurasse “regular a liberdade concedida
aos índios”, encaminhando-os “para os fins almejados tornando-os habitantes
estáveis das diversas povoações coloniais e agentes produtores das riquezas
esperadas”
202
. Após a expulsão dos jesuítas os grupos de reduções passaram a ser
198
Além da América, Espanha possuía territórios coloniais também na Ásia e na África, posses
negociadas com Portugal durante a elaboração do Tratado de Madri (1750), e do Tratado de Santo
Ildefonso (1777).
199
Cf. DOMINGUES, op.cit., 2000. p. 85 e 213.
200
Ibidem, p. 136.
201
Sobre essas missões ver: MEIRELES, op. cit., 1989; COSTA, José Eduardo Fernandes Moreira da.
2006; ANZAI, 2005; SILVA, Joana Fernandes e ROCHA, Leandro Mendes, 2005.
202
COELHO, op.cit. 2006. p. 119.
74
administrados por curas, e conforme Mesa & Gisbert, não se pode negar “el
desastroso destino de los pueblos misionales cuando fueron abandonados por los
jesuitas, forzados por la expulsión del rey”
203
.
O principal objetivo das missões, do ponto de vista espanhol, segundo
Denise Maldi Meireles “era o de transformar comunidades ‘sem lei nem governo’ em
comunidades que refletissem as concepções de uma sociedade ordenada no século
XVIII”
204
. Além de exercerem funções catequéticas sobre povos indígenas, os
missionários também disciplinariam a utilização da mão-de-obra, bastante atingida
pela insaciável demanda dos colonizadores
205
. As missões não foram criadas à
revelia do Estado espanhol, que as autoridades coloniais indicavam jesuítas
“através de ordens reais, e a administração espanhola prestava toda a ajuda
necessária para a criação das reduções, situação que se manteve até meados do
século XVIII”
206
, pois interessava à administração espanhola o estabelecimento
dessas missões em zonas estrategicamente importante à Espanha.
Mesmo com a assinatura do Tratado de Madri a questão da fronteira ainda
não estava totalmente resolvida e consolidada, até mesmo porque muito se
considerou as fronteiras geográficas naturais como demarcação. Não sendo esta a
única forma que se usou para demarcar houve ainda outras questões que se levaram
em consideração, como por exemplo, o próprio interesse político e econômico de
ambas as Coroas portuguesa e espanhola quanto a determinado território. Os
jesuítas das missões de Chiquitos e Moxos passaram a armar os índios, fazendo deles
verdadeiros “guardiões da fronteira” espanhola. Os confrontos eram inevitáveis: “o
encontro entre os portugueses e as missões espanholas assinalou o antagonismo que
passou a ser o grande articulador das relações direcionadas dentro da condição
inexorável da região: a fronteira”
207
.
Em diversas correspondências, conforme veremos no decorrer deste
capítulo, encontramos referências aos índios missioneiros da Província de
203
MESA & GISBERT. In: Historia de Bolivia. 2003. p.248.
204
MEIRELES, op.cit., p.85.
205
Cf. CANAVARROS, op.cit., p. 276-278.
206
ANZAI, 1999; 2005. v. 1. p. 1-8.
207
MEIRELES, op.cit.,p. 10.
75
Chiquitos
208
e Província de Moxos, assim como informações sobre as providências
tomadas por capitães generais portugueses para incentivar as fugas e mantê-los no
lado português da fronteira.
Ricardo Franco de Almeida Serra informava, em uma “memória ou
informação” sobre a Província de Chiquitos e Moxos:
A Província e Governo de Chiquitos, povoada por vinte mil almas, é como
uma barreira, que cobre por Sul, e por não pequena extensão, os
estabelecimentos portugueses adjacentes a Vila Bela, como a Província de
Moxos é outro terreno, que semelhantemente cobre a extrema do forte do
Príncipe da Beira, e a navegação portuguesa do Guaporé e rio Madeira, para
a cidade do Pará. A Província de Chiquitos é saudável, tem gado vacum e
cavalar, belas terras para cultura, sendo os índios que a povoam menos
hábeis do que os de Moxos.
209
O estabelecimento de missões do lado português e mesmo as aldeias de
índios “selvagens” auxiliariam os portugueses na luta pela posse do território para a
Coroa lusa. Em carta enviada por Rolim de Moura ao Padre Nicolas Altogradi, de
Moxos, datada de 3 de novembro de 1757, em resposta a uma correspondência
enviada pelo missionário reclamando que havia sido hostilizado pelos índios Topoaia
quando havia tentado entrar em suas aldeias, localizadas em terras que considerava
espanholas, para catequese, a resposta do governador português não deixava margem
a dúvidas sobre a quem pertenciam as terras das aldeias:
... se o dito gentio Topoaia tivesse feito hostilidades aos portugueses,
necessariamente deviam proceder estas diligências; porém, como eles nos
não têm feito a nós hostilidades, senão a Vossa Reverendíssima, não tenho
208
Em novembro de 2005, viajamos até a Província de Velasco, cuja capital é San Ignácio, e nos
municípios de San Rafael, San Miguel e Santa Ana, remanescentes das missões jesuíticas do século
XVIII. As belas igrejas foram restauradas, e evidenciam o alto grau artístico dos índios dessas,
levando-nos a especular sobre o nível dos índios de Moxos, cuja arquitetura foi, em sua maioria,
destruída, a exigir estudos arqueológicos. A igreja de Santa Ana, a mais próxima da fronteira lusa e de
Vila Bela, possui uma particularidade: teve sua construção iniciada durante a presença jesuítica, e
ainda não havia sido terminada quando chegou a ordem de expulsão da Ordem, em 1767. Os índios
Chiquito terminaram a construção, que ficou muito mais singela que as demais, mas não menos
bonita. O povo boliviano é, em sua maioria, muito religioso, e se orgulha de seu patrimônio
arquitetônico. Sobre as missões religiosas de Chiquitos Consultar: ANZAI, 2005, v. 01. COSTA, Jo
Eduardo Fernández Moreira da. 2006.
209
SERRA, In: RIHGB, n° 5, ano 1840. p. 19-48 . http://documenta.incubadora.fapesp.br - 27/01/2006
ás 15h
76
eu autoridade para lhe mandar fazer guerra de minha cabeça, e o posso
fazer em virtude do tratamento requerido por Vossa Reverendíssima.
210
Desse modo, Rolim marcava a presença do Estado luso. Certamente
também incentivava os ataques dos Topoaia aos padres espanhóis, barrando suas
intenções de acesso ao território ocupado por portugueses. Foram freqüentes as
trocas de correspondências deste mesmo teor entre Rolim de Moura e padres das
missões espanholas, evidenciando que os roubos de índios das missões era prática
comum, conforme podemos observar em carta que Rolim de Moura enviou ao padre
Ramon Laines, em 10 de janeiro de 1752, em resposta à carta que havia recebido do
padre, com data de 2 de julho de 1751:
Chegando a este Distrito de Mato Grosso, a dezenove do mês passado, me
deram daí alguns dias a carta de vinte e dois de julho de mil setecentos e
cinqüenta e um, em que se queixa de que alguns sertanistas portugueses têm
roubado vários índios dessas missões trazendo algumas mulheres casadas, a
quem ficaram nas mesmas missões os maridos. E, asseguro, tenho sentido
muito esses distúrbios, tanto pelo dano, que diz recebem as mesmas missões,
como também pelas grandes recomendações que tenho de conservar boa
harmonia com vossos padres evitando o motivo de escândalo.
211
Alguns pontos desta carta se destacam, um dos quais o fato dos sertanistas
terem roubado mulheres. Conforme discutido no primeiro capítulo deste estudo,
essa prática era, até de certa forma comum, já que nos aldeamentos os padres
procuraram seguir a divisão sexual do trabalho presente na maioria das comunidades
indígenas, o que significava que às mulheres e às crianças cabiam o plantio e colheita
das roças. Porém, no caso de regiões de minas havia um outro fator importante: a
predominância da população masculina. Na Capitania de Mato Grosso não era
diferente, havia muito mais homens do que mulheres e, provavelmente, os sertanistas
roubavam mulheres índias para fazê-las trabalhar, nas roças ou em atividades
domésticas, possibilitando mesmo fazerem delas suas mulheres.
Em nome da manutenção da “boa harmonia” com Espanha, a resposta de
Rolim ía ao encontro das intenções portuguesas de investigar o modo pelo qual
210
PAIVA; SOUSA & GEREMIAS. op.cit., vol. 3. p. 81
211
PAIVA; SOUSA & GEREMIAS. op.cit. vol. 1. p. 62.
77
funcionavam as missões jesuíticas e, desse modo utilizou o pretexto diplomático de
devolver as índias roubadas, que se encontravam sob domínio de particulares,
conforme se pode observar na carta enviada ao ministro Diogo de Mendonça Corte
Real (28 de maio de 1752):
Para o fim deste mês mando um dos padres da Companhia que trouxe
comigo à dita Aldeia de São Miguel, com o pretexto de os visitar e levar-
lhes as índias que se acharam pertencentes às missões castelhanas, e
juntamente para tomar conhecimento da economia e governo delas, pois é
certo excedem nisso muito as nossas.
212
O governador ainda esclareceu ao ministro: “Fico na averiguação do que me
representa para obrar nisto o que for justo, e quanto às mulheres casadas está uma
em depósito, e outra, assegurou Antonio de Almeida, a ia entregar”
213
.
Provavelmente não seriam somente duas mulheres, e quanto a ficar uma
“em depósito”, isso pode dever-se às negociações entre o governador e os padres,
uma garantia, talvez uma troca de favores. No outro caso, o da mulher que estava
com Antonio de Almeida, embora tenha havido promessa de entrega, não
conseguimos confirmação na documentação pesquisada.
E o roubo de mulheres das missões espanholas continuava. A Aldeia de São
Miguel foi alvo de assédio às índias, conforme documento de 1765, no qual o
governador da Capitania de Mato Grosso, João Pedro da Câmara, informava:
A aldeia de São Miguel, composta dos índios que no tempo de guerra
passaram para a nossa parte, das minas castelhanas que se queimou, e de
outros que fugiram e vinham fugindo das mais desordens, ficou situada a
pouca distância deste destacamento, porque naquele tempo se não podia dar
outra melhor providência. Quis meu antecessor mudá-la, para evitar os
distúrbios que cometiam os soldados desta guarnição com as índias, e os
contínuos furtos que faziam nas plantações e criações dos mesmos índios.
Porém, alguns obstáculos dilataram tão justo e santo projeto. Eu tenho
trabalhado em vencê-los e, com efeito, consegui mudar a referida aldeia para
212
PAIVA.; SOUSA & GEREMIAS. op.cit., vol. 1.p. 70
213
Ibidem, p.62.
78
outro sítio rio acima, quatro léguas distante da primeira, de muito bons ares e
largueza bastante.
214
Não é difícil inferir, baseando-nos nas palavras escritas pelo capitão general,
que índios e índias utilizados como mão-de-obra pelos colonos eram em geral
tratados com violência, nisso incluídos os freqüentes abusos sexuais sofridos pelas
índias. Os criminosos, quando identificados, eram julgados em tribunal, e as penas
impostas consistiam no degredo para fora do termo da povoação ou no trabalho em
obras de fortificações que se iam construindo
215
.
Havia motivos também para a fuga consentida. Como aos índios não faziam
sentido as fronteiras estabelecidas pelos europeus, poderiam passar para o lado
português por seus interesses familiares ou religiosos. Desse modo, podiam lançar
mão das estratégias lusas para facilitar sua passagem, em um processo no qual fica
claro seu poder de negociação e de decisão, mesmo em um contexto, no geral,
desfavorável a ele. Ao adentrar territórios portugueses “acabavam sendo
incorporados ao processo colonizador lusitano”
216
. Aos portugueses, que
necessitavam aumentar a população, de preferência com mão de obra especializada
das missões, essa era uma prática desejável. Quanto maior fosse a ocupação da
fronteira do lado luso, maior também a possibilidade de rechaçar os avanços
espanhóis para a parte oriental do Guaporé. Esta estratégia fazia parte “da segunda
face do plano de civilização dos índios contidos no Diretório: a consideração política
de seu lugar na colonização”
217
.
214
1765, Dezembro, 16, Nossa Senhora da Conceição. OFÍCIO do [governador e capital general da
capitania de MT], João Pedro da Câmara Coutinho ao [secretario de estado da Marinha e Ultramar]
Francisco Xavier de Mendonça Furtado. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 13, Doc. 768.
215
Cf. DOMINGUES, 2000. op.cit., p. 254-255.
216
ANZAI, op.cit., (prelo).
217
ALMEIDA, op.cit., 1997. p. 249.
79
1. Aldeia de Santa Rosa
Mapa n° 3: Mapa das repartições do Cuiabá e do Mato Grosso – século XVIII
Fonte: ROSA, & JESUS. (orgs.), 2003. p. 64
Conforme já discutido, havia aldeias espanholas localizadas no lado oriental
do rio Guaporé que, com a assinatura do Tratado de Madri, em 1750, passaria a
pertencer a Portugal. Desse modo, as aldeias espanholas de São Miguel
218
, São
Simão e Santa Rosa, seriam portuguesas. Especificamente sobre Santa Rosa, uma
Instrução Real ainda de 1749 chamava a atenção para a necessidade de prudência no
trato da questão, já que estavam envolvidas minas de ouro:
É tão sujeita a produzir contendas, conseqüência gravíssima, que enquanto
não se faz amigavelmente a respeito dela alguma transação que as evite para
o futuro, ficando os limites das duas monarquias pelo rio Guaporé, deveis,
por todo o cuidado para que ao menos não cresça o mal que dali pode
resultar. Por detrás daquela aldeia se descobriram ultimamente as minas dos
Arinos, e em um ribeirão que está antes de chegar a ela, na mesma margem
218
Consultar Figura 3 - “Projeto de novo aposento para os Índios da Aldeia de São Miguel, na
margem do rio Guaporé, acima do Destacamento de Nossa Senhora Conceição quatro léguas;
mandado fazer pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor João Pedro da Câmara, governador e capitão
general desta capitania de Mato Grosso; feita no mês de dezembro de 1765.” p. 101.
Forte N. Srª. da
Conceição
80
oriental, se tinha alguns anos feito outro descobrimento, e é provável
que naquelas vizinhanças se vão achando minas diversas.
219
As orientações reais que Rolim de Moura devia seguir eram precisas:
Enquanto esta dependência se não ajusta com a corte de Madrid, o remédio
que por ora deveis aplicar é persuadir moradores, que vão situar-se no
círculo daquela aldeia a não muitas léguas de distância, dando-lhes
sesmarias, para assim evitar que os índios da mesma aldeia se alarguem nos
seus contornos. E deveis defender eficazmente os sesmeiros de qualquer
insulto e moléstia dos mesmos índios.
220
Observe-se que conceder sesmarias era visto como estratégia eficaz para
evitar que os índios reestabelecessem suas territorialidades tradicionais, e caso
houvesse perigo aos sesmeiros o governador deveria protegê-los.
Logo após a assinatura do Tratado de Madri, os padres espanhóis
resolveram mudara a Aldeia de Santa Rosa para a outra margem do rio, ou seja, o
lado ocidental, espanhol, e tentaram levar consigo os índios que se encontravam
aldeados. Esse fato deu início a longas discussões e negociações, pois, segundo o
Tratado, os padres deveriam deixar a mudança ou não a critério dos índios. Em carta
a Francisco Xavier de Mendonça Furtado, de 2 de setembro de 1760, Rolim de
Moura explicava:
Vamos agora mostrar que as mesmas terras em que estiveram fundadas as
Aldeias, ou Povoações de Santa Rosa, São Miguel e São Simão, são
presentemente do domínio de Portugal, em virtude das cláusulas do Tratado
de Limites. Diz este, no artigo 14, que Sua Majestade Católica [Espanha]
cede de presente a Aldeia de Santa Rosa, e outra qualquer que se possa ter
estabelecido por parte da Espanha, na parte oriental do Rio Guaporé. De
onde se vê logo, pelo mesmo Tratado, nos foi conferido jus cederem as ditas
aldeias. Isto suposto, vendo os Padres da Companhia que, pelo Artigo 16 se
deixa na liberdade dos índios das ditas aldeias passarem para a outra parte ou
ficarem nas mesmas aldeias, e sendo certo moralmente que haviam antes
escolher o ficar, pelo grande apego que têm às terras, se fossem perguntadas
219
Instrução da Rainha [D. Mariana de Áustria] para D. Antonio Rolim de Moura. Lisboa, 19 de
janeiro 1749. In: INSTRUÇÕES aos Capitães-Generais, op.cit.p. 14.
220
Ibidem.
81
pelos comissários, com o que não somente perderiam os índios, mas também
os bens que lhes pertencessem; logo, com a primeira notícia do Tratado,
entraram a mudar as aldeias; o que concluíram no ano de 1754, deixando-as
não somente desertas, mas queimadas.
221
Como se viu, os padres espanhóis, diante da cláusula do Tratado colocaram
fogo em tudo, acabando com as plantações, com o objetivo de fazer com que os
índios se mudassem; forçaram os índios à mudança, atravessaram o rio Guaporé e
fundaram, em frente à antiga aldeia, uma nova povoação com o mesmo nome, Santa
Rosa, que passou a ser denominada “Santa Rosa Nova”, do lado ocidental do rio
Guaporé, em contraposição à do lado oriental do rio, portuguesa, “Santa Rosa
Velha”.
Não se contentaram os padres da Companhia com passarem violentamente
os índios para a outra banda, contra as ordens de Sua Majestade Católica,
sendo certo que, nestas mudanças perdem muitos as vidas, e outros fogem
para os matos, pelo desgosto que tomam de os tirarem das suas terras; mas
também sem escrúpulo nenhum lançaram fogo aos edifícios e às plantas a
que a Coroa Portuguesa havia adquirido jus. E o Padre Medenilha, por
aproveitar as portas da igreja, deixou esta exposta a servir de curral de éguas,
como, com efeito, esteve servindo enquanto se conservou em pé, o que eu vi
com os meus olhos, no ano de 1755, pois querendo-me, mostrar o padre
Francisco Xavier Pozobonelli, não pudemos passar da porta, por se achar a
dita igreja cheia e atestada de esterco.
222
No entanto, os índios levados para Santa Rosa Nova, quiseram voltar para
as suas antigas terras, conforme constam nas correspondências de Rolim de Moura.
Ora as cartas de Rolim de Moura parecem estar bem fundamentadas ora as acusações
dos padres das missões espanholas parecem ser verdadeiras quanto aos roubos de
índios. Para Rolim, os roubos de índios realizados por portugueses em Santa Rosa
Nova eram calúnias lançadas pelos espanhóis, e afirmava que havia presenciado
muitos índios manifestarem o desejo de passarem para o lado português, apesar dos
esforços dos padres espanhóis.
221
MOURA, Antonio Rolim de. Correspondências.Vol 4 , Carta 146.
222
Ibidem.
82
Os mesmos padres sabem muito bem o grande apego que esta gente tem às
terras em que nasceram e se criaram, e por conhecer isso é que se mudaram
sem esperar pelos Comissários, e queimaram as povoações, para lhes tirarem
o sentido de tornar para elas. E como tudo isto foi violentíssimo aos mesmos
índios, esta é a causa verdadeira das suas fugas, que os padres agora, sem
fundamento algum, como o seu louvável costume, querem atribuir aos
portugueses. E se estes trouxeram para a nossa banda os índios por força,
que é que lhes embaraça o tornarem para lá? Não estão vivendo fora, e longe
da Guarda? Não saem a pescar cada vez que lhes parece? Pois que embaraço
têm para fugir de cá? Que portugueses obrigaram os muitos que haviam
fugido para o mato, como acima disse? Com também os de São Pedro o
fizeram para a Guarda? O que suposto, e ser a intenção de Sua Majestade
Católica que fique na liberdade dos índios passarem para a banda de
Espanha ou ficarem nos domínios de Portugal, como se no Artigo 16. É
contra a dita intenção do mesmo Senhor, e contra a determinação do Tratado
entregá-los eu contra sua vontade. Além de que, quando eu cheguei a este
Mato Grosso, remeti aos padres todos os índios que aqui se achavam, de que
tive notícia pertencerem às suas missões, mandando vir, para esse efeito, até
do Cuiabá, um índio. Porém, sucedendo, depois disso, fugirem de cá alguns
índios, e escravos para lá, nem uma nem outra coisa quiseram entregar.
223
A aldeia de Santa Rosa Nova rapidamente se despovoava, obrigando mais
uma vez os padres jesuítas a mudarem rapidamente os poucos índios que restavam
para São Pedro
224
. Quanto aos índios que passaram para o lado oriental do rio
Guaporé, Rolim de Moura explicou o modo como procedeu:
Aos ditos índios que para passaram, mandei situar cousa de uma légua
distante deste Destacamento, na mesma paragem em que lhes haviam
plantado, quando aqui vim no ano de sessenta. E ordenei equipassem sempre
com algumas canoas que andam na condução do mantimento de Vila Bela
para cá, e este trabalho se lhes paga com baetas, principalmente encarnadas,
bombachas e chapéus, de que eles gostam muito, ao que se acrescentem
algumas quinquilharias ou ferramentas, se eles as necessitam. Isto sai mais
barato do que os pretos de aluguel, e serve-lhe para se vestirem e plantarem.
Mas, a maior utilidade que daqui se tira é tê-los contentes, pelo apreço que
223
MOURA, Antonio Rolim de. Correspondências. Vol. 4, Carta 146.
224
Ibidem, Carta 172.
83
fazem destas cousas, e vendo-lhes os índios das missões de Castela com os
quais se comunicam, quando por aqui passam ou pelos padres ou
encontrando-se no rio, quando vão às suas pescarias, se movem a passar para
nós.
225
Porém, os padres insistiam nas acusações de roubo de índios das missões
espanholas por portugueses. Em Carta a Tomé Francisco da Costa Corte Real, em 26
de agosto de 1760, Rolim de Moura respondeu às acusações de que os portugueses
foram buscar violentamente as mulheres dos índios:
Tudo quanto nela lhe digo é a mesma verdade. Como também é calúnia
manifesta, a que o padre superior nos quer atribuir, de que foram à Aldeia de
Santa Rosa os portugueses buscar violentamente as mulheres dos índios,
pois, além do que, na mesma carta lhe digo da filha do Canavarro. O que
mais houve foi que, depois de se haverem passado para a nossa banda,
alguns, voluntariamente, querendo ultimamente vir um lote maior de índios,
passaram a uma ilha, e daí avisaram a guarda que os fossem buscar, por o
terem canoas para virem, o que assim se fez, segundo a parte que me deu o
alferes de dragões, que havia ficado para comboiar a canoa que trouxe
apetechos do Pará..
226
Nesta correspondência, o governador da Capitania de Mato Grosso diz que
“alguns” índios passaram voluntariamente, o que significa dizer que não foram todos.
E os que não passaram “voluntariamente”? Teriam passado à força? A justificativa
que Rolim de Moura deu para a “passagem voluntária” dos índios espanhóis para o
lado luso, consta no ofício que se segue:
Com que estão naquele sítio presentemente alguns noventa índios, que eram
da Missão de Santa Rosa, e os padres, para que os outros lhe não fugissem,
os passaram muito depressa para São Pedro, para onde entendo mais ou
enganados ou violentados do que por sua vontade. Pois, estando eu ainda em
Santa Rosa Velha, diziam eles muitas vezes quando vinha, que o padre os
queria mudar, mas que em querendo dar princípio a isso, que eles todos
225
Ibidem.
226
1760, Agosto, 26, Vila Bela. OFÍCIO, do [governador e capitão-general da capitania de Mato
Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [Secretário de Estado da Marinha e Ultramar] Tomé
Joaquim da Costa Corte Real, sobre a carta do superior das missões de Moxos [Juan de Beingoolea].
CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 11, Doc. 622
84
haviam de vir gritar da outra banda do rio que os fossem logo buscar. E
todos eles andavam bastantemente abalados, e já alguns haviam passado para
a nossa banda antes que eu me retirasse, assim pela inclinação natural que
têm às suas terras, como por algum jeito que se lhe deu, pretendendo-os
algumas das coisas de que eles gostam, como verônicas e outras
semelhantes.
227
A devolução ou não de índios e escravos que se encontrassem na parte
portuguesa ou espanhola da América dependia muito de acordos e obrigações
mútuas. Se uma das partes não cumpria, a outra também se sentia no direito de não
cumprir, como consta do ofício a seguir:
... tenho mostrado bem patentemente, desde que aqui estou, o quanto
procurei fazer boa vizinhança; porém, tem-me isso sido tão mal
correspondido, que não somente vários padres, como o padre Medenilha,
antecessor de Vossa Reverendíssima, e o padre Ramos Laynes, se ficaram
com os índios que da parte de Portugal passaram para as suas missões, mais
nelas, e nas mais se lhe está francamente dando couto a todos os escravos
fugidos de Mato Grosso, nem sendo lhes requerido, por várias vezes, se têm
entregue nenhum. E havendo eu escrito mais de um ano uma carta de
ofício sobre esta matéria, ao padre vice superior, até agora ainda não tive
resposta dela. O que tudo me parece, essa me desobrigaria de mandar
entregar a índia, em que Vossa Reverendíssima me fala, ainda que não
houvesse a razão primeiramente apontada.
228
Rolim de Moura deixa claro que, como não havia sido atendido na
devolução de índios e escravos que fugiam do lado português, ele julgava que não
tinha o dever de devolver os que fugiram do lado espanhol. Além disso, no caso da
índia casada, conforme veremos a seguir, justificava que a mesma gostaria que
trouxessem o seu marido, que havia ficado na missão espanhola de San Nicolas, o
que era muito cômodo para a política portuguesa, um casal especializado para
aumentar a população de Mato Grosso:
227
MOURA, Antonio Rolim de. Correspondências. Vol. 4, Carta 141. Ver também 1760, Agosto, 26,
Vila Bela. OFÍCIO, (citado).
228
1760, Agosto, 7, Vila Bela. OFÍCIO. op.cit.
85
... logo que cheguei a Mato Grosso mandei ajuntar todos os índios de que
tive notícia pertencerem às missões espanholas, e os remeti pelo padre
Agostinho Lourenço que, segundo a minha lembrança foram nove, que
alguns sertanistas tinham conduzido para Mato Grosso, segundo eles diziam,
e depois me constou, não sem faculdade e insinuação de um religioso da
mesma religião de Vossa Reverendíssima, o qual se achava na Missão do
Patrocínio, quando os índios dela se levantavam contra os seus padres, e
fugiram para o Mato Grosso, o que insinuou o dito Padre aos ditos
sertanistas os fossem abalroar, como fizeram. Não remeti estes, não
havendo obrigação disso, pelo que fica dito, mas ainda achava [uma índia]
na Missão de S. Ana, por me dizerem pertencia a Missão de S. Nicolas,
espanhola, e que era casada, sendo que era mais natural, como a mesma
índia requeria, que o marido fosse para onde ela estava, pois podia fazer
aquela viagem com menos descômodo, e risco; e também era governada por
um jesuíta: mas como o padre Magi [sic] não quis convir nisto, a mandei
entregar remetendo-a mesmo dentro das missões espanholas.
229
Para a maioria dos índios pouco importava as fronteiras políticas, preferiam
seus territórios tradicionais, e esse fato influía na política ibérica relacionada aos
grupos indígenas da área em litígio. Caso não houvesse tratamento adequado, muitos
grupos empreenderiam fuga e, de acordo com Ângela Domingues, a indefinição das
fronteiras estava relacionada às hesitações de cada Coroa em relação à política a ser
adotada. As definições estabelecidas pelas duas Coroas nada significavam aos índios,
“que tinham familiares, amigos e trocas comerciais em áreas pertencentes à potência
rival e que facilmente transitavam para cada lado da divisão convencionada”
230
.
No início do mês de fevereiro de 1754, logo após a conclusão da retirada
dos índios da Aldeia de Santa Rosa Velha, Rolim de Moura estabeleceu uma guarda
na região para tentar evitar a fundação de novas aldeias espanholas do lado
português, e também para evitar a captura de “índios portugueses” pelos espanhóis.
Havia também a preocupação de prevenir contra a fuga de escravos negros para o
lado espanhol.
229
Ibidem.
230
DOMINGUES, op. cit., 2000. p. 244.
86
Em 1761 o Tratado de Madri foi substituído pelo de El Pardo, que, em
relação à demarcação de fronteiras, anulou o de Madri
231
. Voltaram a vigorar,
então, as disposições do Tratado de Tordesilhas e, desse modo, as repartições do
Cuiabá e do Mato Grosso ficavam novamente pertencendo a Sua Majestade Católica,
promovendo, desta forma, a possibilidade de guerra entre as duas Coroas, o que veio
a acontecer a partir de 1763.
Em 1777 foi assinado o Tratado de Santo Ildefonso. No entanto, a questão
das fronteiras ainda não estava bem definida, conforme fica explícito nas colocações
do tenente-coronel Ricardo Franco:
A capital da Capitania de Mato Grosso ficaria do domínio espanhol, e da
mesma forma Cazal Vasco e outros antigos estabelecimentos, mandados
conservar pelo artigo 16°; sendo estes terrenos, com os cultivados da
margem do Guaporé, fronteira a Vila Bela, e os dos rios, Alegre e Barbados,
com as minas de Santa Bárbara ou Aguapeí; e quanto ocupa a Coroa de
Portugal no distrito de Mato Grosso, e dele para Oriente, terrenos, que a
Coroa de Espanha, pelo artigo 20° cede, renuncia, e traspassa toda a posse e
direito que possa ter ou alegar a eles; e de outra sorte, admitindo-se esta
implicatória linha, ficaria a Coroa de Espanha de melhor partido no mesmo
terreno que expressamente cede, e os espanhóis nunca viram, nem
povoaram.
232
Desde 1762 que a guarda estabelecida em Santa Rosa Velha havia se
transformado em presídio, o de Nossa Senhora da Conceição (consultar Mapa 3),
que deveria, segundo Rolim de Moura, se transformar em um forte, pretensão
materializada seis anos após, no Forte de Bragança, construído durante o governo de
João Pedro da Câmara.
Fazia parte da política lusa a criação, nessas fronteiras, de referências
alusivas ao Reino. Desse modo, “a autoridade da coroa sobre o território exerce-se
através de uma presença efetiva e por referências simbólicas”
233
, que podemos
observar nos Anais de Vila Bela do ano de 1769:
231
APMT. Governo: Antonio Rolim de Moura; Ano: 1759-1764; Lata: 02; Fundo: Defesa, 1761, doc.
78.
232
SERRA, In: RIHGB, 5, ano 1840. pp. 19-48. http://documenta.incubadora.fapesp.br -
27/01/2006 ás 15h.
233
DOMINGUES, op.cit., 2000. p. 78.
87
Em 15 de março se deram às aldeias de índios deste Estado, por um bando
público, as denominações das povoações do Reino, em conformidade com as
ordens de Sua Majestade, apelidando-se o forte da Conceição, Bragança;
Aldeia de São João, Lugar de Lamego; Destacamento das Pedras, Palmela; o
Lugar de São José, Leomil; e o de Santa Ana, no distrito do Cuiabá, Lugar
de Guimarães.
234
O Forte de Bragança desabou em 1771, em conseqüência de uma enchente,
e teve parte do seu material aproveitado na construção do Forte do Príncipe da Beira.
O Forte de Bragança, em larga medida, tornou-se um pólo de atração de
índios migrados de Mojos. Pelos dados oficiais dos capitães-generais, os
maiores contingentes vinham das missões de San Martin, San Nicolas, Santa
Magdalena e Exaltación. Como essas migrações tiveram lugar, sobretudo
entre os anos de 1770-1780, esses contingentes devem ter sido formados
principalmente de índios Txapakura, Baure, Itonama e Cajubaba.
235
Sobre o estado civil da população do Forte de Bragança, no ano de 1773,
temos as seguintes informações:
Tabela 1
Distrito do Forte de Bragança – Capitania de Mato Grosso
236
Mapa do estado civil da povoação do distrito - janeiro de 1773
Casamento no ano de 1772 7
Mortos no dito ano 25
Nascimento no dito ano 11
Homens de 50 anos para cima 27
De 16 até 50 164
Rapazes de 8 até 15 20
Meninos de 1 até 7 16
Mulheres de 40 anos para cima 16
De 15 até 40 62
Raparigas de 8 até 14 11
Meninas de 1 até 7 14
Somas totais 330
Escravos compreendidos na soma total 127
Famílias ou fogos das povoações 52
Fonte: 1773, Janeiro. MAPA do estado civil da povoação do distrito do Forte de Bragança.
CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 16, Doc.1015.
234
Suplemento que se anexa ao Anal de 1769, que contêm nele as coisas seguintes, In: AMADO &
ANZAI, op.cit., p. 133.
235
MEIRELES, op.cit., p. 173.
236
Optamos por transcrever somente o distrito de Bragança, porém o Mapa apresenta também a
população de outros locais, como Lugar de Lamego, Lugar de Leomil, Destacamento de Palmela, e
Lugar de Balsemão.
88
Analisando os dados apresentados na tabela anterior, observa-se que a
quantidade de mulheres era bem inferior à de homens, no Forte. O número de
mulheres que já poderiam constituir família, isto é, entre 15 e 40 anos, é bem inferior
em relação aos homens na faixa etária de 16 a 50 anos. Essas mulheres que
ocupavam o Forte, provavelmente trabalhavam em serviços domésticos, além da
tecelagem ou produção de roças. Podiam, também, servir de mulheres para esses
homens.
Segundo Denise Maldi Meireles, não havia dúvida quanto ao gosto dos
portugueses no acolhimento dos índios fugidos das missões, “familiarizados com o
trabalho, do que os índios que vinham das aldeias ‘selvagens’. Os espanhóis
reagiram a essas acolhidas recebendo os escravos fugidos da margem direita”
237
.
Nessas acusações de roubo de mulheres e índios que, segundo informações
portuguesas passaram voluntariamente para as terras lusitanas, temos um dado novo
que é o caso da filha do Canavarro, citado por Rolim de Moura. É possível obter
em outra correspondência maior informação sobre esse assunto. Em carta ao padre
Nicolas Sarmento, de 27 de março de 1760, Rolim de Moura informa:
Recebi a carta de Vossa Reverendíssima, escrita no dia de hoje, na Missão
de Santa Rosa Nova, na qual me faz Vossa Reverendíssima duas queixas da
comitiva que aqui se acha neste sitio: a primeira de haver ela colhido algum
mantimento e cana que se achava plantado pelos índios dessa missão; e a
segunda de haver apanhado uma rapariga da mesma missão. Começando por
esta última, me consta que a dita rapariga é filha de Manoel José Canavarro,
que aqui se acha e a tem em seu poder. E como ela é já de 8 anos, conforme
o direito, pertence a seu pai. E assim, contra sua vontade, nem devo nem
posso obrigá-lo a largá-la.
238
Em outra carta, ao padre Juan de Beingoolea, de 18 de agosto de 1760,
Rolim de Moura descreveu o caso da filha de Canavarro. Apesar de ser uma citação
longa, vale a pena conhecer o documento:
237
MEIRELES, op. cit., p., 177.
238
1760, Agosto, 7, Vila Bela. OFÍCIO. op.cit.
89
E enquanto a Vossa Reverendíssima disser que os índios de Santa Rosa
passavam para a nossa banda porque os portugueses lhe foram buscar
violentamente as mulheres, posso assegurar a Vossa Reverendíssima não
que o informaram nisso falsamente, senão com grande cavilação.
É de saber que Manoel José Canavarro, hoje soldado aventureiro no
destacamento de Santa Rosa Velha assistiu muito tempo naquela mesma
paragem, no princípio do estabelecimento da dita Missão de Santa Rosa, em
companhia do padre Amâncio, cura da mesma missão, e por mandado do
dito padre recolheu ele a maior parte dos índios com que ela se achava, que
não foram catequizados com o Cristo na mão, mas sim, tirados das suas
terras violentamente e à força de armas.
Na dita assistência, teve o dito Manoel José Canavarro uma filha, de uma
índia da missão, o que é notório, e os índios da mesma missão o
confessavam, como eu presenciei, e mais o padre capelão do Destacamento,
e a sua vista dela, pela cor e pelo cabelo, dá a conhecer ser filha de mulato, e
não índia pura, pois sabem todos os que têm algum uso e experiência de
índios, que não nenhum que seja puramente índio com o cabelo crespo,
como ela é.
Pelo que, indo o dito Manoel José Canavarro buscar madeira para os
quartéis, lhe trouxeram a falar com ele os mesmos índios, e ele, com o
direito de pai pegou ela e a trouxe consigo, em que me parece obrou o que
tinha de obrigação, por ela se achar com 8 anos, e ser certo e sem dúvida,
que o padre Nicolas Sarmento lhe não havia de nunca entregar, por mais
manifesto que fosse o seu jus, para a haver a si.
Excelência, aqui as mulheres todas que os portugueses tiraram da Aldeia de
Santa Rosa, que consistem em uma rapariga de 8 anos, que seu pai houve a
si, de forma que fica dito o que posso assegurar com todas [ilegível] por
haver passado isto ao tempo que eu me achava em Santa Rosa Velha, e tanto
nessa ocasião como depois disso, nunca português algum tirou por força
índios nenhum, macho nem fêmea da dita missão; mas todos os que dela
passaram para a nossa banda foi muito por sua livre vontade. Nem isso deve
fazer admiração, pois se Vossa Reverendíssima quiser informar-se de
conhecer a grande repugnância que tiveram todos os índios que se achavam
nas três missões de S. Simão, S. Miguel, e Santa Rosa, para passarem para a
outra banda, e que foi preciso valerem-se os padres que as administravam de
90
portugueses, pelo meio dos quais obrigavam violentamente os índios para a
dita passagem.
239
Supondo que fosse uma menina mulata ou caburé (filha de negro com
índia), aí está a dúvida quanto ao reino ao qual ela pertenceria, já que era filha de um
negro ou mulato pertencente à Coroa lusitana, com uma índia da missão espanhola.
Segundo Antonio Manuel Hespanha, o direito português se aplicou aos naturais, e
conforme as Ordenações Filipinas, os nativos foram regidos por direitos
específicos
240
. Hespanha esclarece que, no século XVII, com base no Regimento das
aldeias e capitães das aldeias, “no Brasil, os capitães das aldeias decidiam as
questões das comunidades índias, segundo um modelo de justiça patriarcal”
241
. Pode
ser que, baseado nesse modelo de justiça, Rolim de Moura justificava o fato da
menina ter ficado com o pai, pois o Diretório não previa essa questão. Como pode ser
também que a menina tenha nascido em Santa Rosa Velha, portanto, à época,
território luso, despertando em Rolim um sentimento de “posse” pelos nascidos em
território português.
Bruna Sirtori, com objetivo de pesquisar as relações econômicas e sobretudo
sociais estabelecidas no Aldeamento de Nossa Senhora dos Anjos, no Rio Grande de
São Pedro, às margens do Rio Gravataí, chama a atenção para a “transcrição de
registros batismais pelo Padre Bernardo Lopes da Silva e sua concepção de ‘índio’
(1765-1783)”. Nos registros de batizado que elaborou este padre, onde havia ao
menos um antepassado nomeado como indígena, foram considerados “não-
índios”
242
. Entendemos que pode também ter sido esse o mesmo princípio utilizado
para a filha do Canavarro, onde filho mestiço de índio não é índio, é mestiço, logo,
um tipo mais adaptado para a região, e também mais um vassalo real sendo
incorporado à sociedade colonial.
Entretanto, temos que considerar também que, se a mãe da menina pertencia
a um grupo matrilinear, a criança deveria ficar com ela. Se entendermos pelo viés de
que filha de índia, independente do pai ser índio é índia, Rolim de Moura acobertou o
roubo da menina.
239
MOURA, Antonio Rolim de. Correspondências. vol. 4, Carta 140.
240
HESPANHA, In: FRAGOSO; BICALHO & GOUA (orgs.). op.cit., p. 173.
241
Ibidem, p. 173 (nota 14).
242
SIRTORI, 2006. p. 2.
91
Manoel José Canavarro deveria ser mulato ou negro, e em condição melhor
que muito outros mulatos e negros, e na mesma correspondência informações
sobre o seu papel como administrador de índios:
... porém aqueles que livremente passassem para a nossa parte os recolhesse,
o que não somente é conforme ao que determina o Tratado de Limites, mas
também ao que Vossa Reverendíssima mesmo tem praticado comigo;
porque, fugindo para a Missão de Santa Rosa [Nova?] uns índios que
estavam na administração de Manoel José Canavarro, nunca o padre Nicolas
de Medenilha os quis mais entregar.
243
Alguns dados chamam a atenção. Em 1760 os jesuítas já haviam sido
expulsos dos domínios lusitanos (1759), porém, a expulsão dos territórios espanhóis
aconteceu em 1767. O Diretório era o que regulamentava as ações entre índios e
portugueses. Outra questão que se coloca é a situação da mãe da criança: teria ela
passado da missão de Santa Rosa Velha para a missão de Santa Rosa Nova? E se isso
realmente aconteceu, qual teria sido o motivo da fuga, que Rolim de Moura dizia
que os índios espanhóis eram muito bem tratados no lado português? Considerando
que o Diretório estava em vigor, o mais razoável é que Manoel José Canavarro
tenha roubado a menina.
A confirmação da paternidade da filha de Canavarro deu-se por intermédio
de pistas, evidências, como a cor da pele e o tipo de cabelo, não sendo, portanto,
“índia pura”, era mestiça. De acordo com Rolim de Moura, o mestiço provindo da
mistura de negros com índios era o tipo mais adequado para povoar a região. A filha
de Manoel Canavarro se enquadrava nesta característica.
No caso da região da missão de Santa Rosa Velha, depois Forte de
Bragança, as acusações feitas pelos espanhóis de que os portugueses roubavam as
mulheres dos índios deve ter procedência, se analisarmos pelo viés de que na falta de
mulheres, iam buscá-las onde as havia em abundância, ou seja, do lado espanhol.
Porém, apesar das investidas em roubos, as mulheres continuaram sendo minoria.
243
MOURA, Antonio Rolim de. Correspondências.Vol. 4 (prelo). Carta 140.
92
2. As fugas
São mútuas as acusações de roubo de índios, tanto os do domínio espanhol
quanto os do domínio português. Nas correspondências de Rolim de Moura
diversas reclamações sobre padres espanhóis que adentravam as terras lusitanas em
busca de índios para suas missões. Também são recorrentes as acusações dos padres
espanhóis sobre portugueses que retiravam violentamente índios das missões
espanholas.
também informações sobre escravos negros que fugiam do lado
português e recebiam abrigo do lado espanhol e que, mesmo cobrados, não eram
devolvidos pelos padres espanhóis. Da mesma maneira, portugueses não devolviam
os índios espanhóis que haviam fugidos das missões e que se encontravam em seu
poder.
Chegaram presos do registro do Jauru, em 18 do mesmo mês [janeiro de
1779], um Pedro Taques, com alguns pardos, bastardos e escravos, em que
entravam umas mulheres, que tendo fugido de Vila Maria do Paraguai, se
encaminhavam para os domínios de Espanha, dentro dos quais já foram
apanhados. Foram aqui castigados com açoites e galés.
244
Foi no governo de Luiz de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres (1772 a
1789), o capitão general que mais tempo permaneceu na Capitania de Mato Grosso,
que houve maior incentivo no desenvolvimento de aldeias, lugares e vilas com a
população nativa, em período pós-jesuítico, dando continuidade à política iniciada no
governo de Antonio Rolim de Moura. Em relação aos índios das missões espanholas,
não mais jesuíticas, segundo Meireles, seu governo “foi marcado por uma política
que, seguindo instruções reais, difere fundamentalmente dos governos anteriores,
sobretudo no que se refere às relações com os espanhóis”
245
. No período da
administração de Luiz Albuquerque muitos índios fugiram das missões de Moxos e
Chiquitos e se estabeleceram em terras da Capitania de Mato Grosso. Utilizando-se
244
Anal de 1779. In: AMADO & ANZAI, op.cit., p. 219.
245
MEIRELES, op.cit., p. 165.
93
desses índios, Luiz de Albuquerque fundou, por exemplo, Vila Maria do Paraguai
246
,
sobre a qual os Anais de Vila Bela nos dão as seguintes informações:
Em 31 de agosto [de 1778] mandou Sua Excelência a esta Câmara o termo
de fundação de Vila Maria do Paraguai; e que, por ordem e direção sua,
havia feito, a 6 de agosto, o tenente-de-dragões Antônio Pinto do Rego o
caminho na margem esquerda e oriental do rio Paraguai, onde o registro
do ouro. Foi posto o seu nome em obséquio da nossa augusta soberana. Na
dita povoação se acham 161 pessoas de ambos os sexos, em que entram
[ilegível]... perto de cem índios de ambos os sexos que haviam desertado
este ano, por várias vezes, da missão de São João, da província de Chiquitos,
pela porta do Jauru. Fica a povoação no meio do caminho desta Vila para a
de Cuiabá e [ilegível]... de muito cômodo para o comércio e correspondência
de ambas as vilas.
247
A partir do governo de Luiz de Albuquerque, o Forte de Bragança tornou-se
um pólo para atração de índios vindos de Moxos, e os capitães-generais receberam
com muito gosto estes migrantes. Porém, com as vindas cada vez mais constantes,
criaram-se novos problemas, sendo o mais grave a falta de mantimentos. Segundo
Meireles, chegavam em canoas, sem qualquer outro bem, e recebiam no Forte aquilo
que necessitavam, em geral, roupas e ferramentas. No entanto, tornavam-se
“devedores da Fazenda Real. A dívida era posteriormente descontada do seu
‘produto’ e, em alguns casos, passaram a ser credores, saldada a dívida inicial”
248
.
Esses índios eram vistos com bons olhos pelos portugueses:
Nos fins desse mês [novembro de 1775] entraram nesta Capitania 12 índios
pelo Registro do Jauru, fugindo da missão de São João de Chiquitos. Foram
eles os primeiros que entraram por aquela parte. Pouco depois vieram outros
índios. Sendo uns e outros recebidos com agasalho, foram mandados por
sábia providência de Sua Excelência para a aldeia da Chapada do Cuiabá, em
que índios portugueses e também castelhanos vindos da missão de
246
Para maiores informações sobre a fundação da Vila, consultar MORAES, 2003. Ver também
Figura 2: “Casal de índios espanhóis desertados de Santa Ana”, p. 100.
247
Anal do ano de 1778. In: AMADO & ANZAI, op.cit., p. 216-217.
248
MEIRELES, op.cit., p. 173-175.
94
Exaltação e de outras, a fim de que não dêm tão facilmente execução à
variedade de sentimentos que faz o seu caráter.
249
No entanto, muitos deles fugiam novamente para o lado espanhol. O fato de
se tornarem devedores da Fazenda Real poderia levá-los para prisão, o que fazia com
que fugissem novamente.
3. Os ataques
Apesar de todas as medidas tomadas pelos portugueses sobre a necessidade
dos índios se civilizarem aumentando assim a população desejada pela Coroa lusa,
muitos deles resistiram.
Nesse mesmo mês [março] chegou a infausta notícia de que nele repetiram
os índios Caiapós, vizinhos da Vila do Cuiabá, os seus cruciantes insultos,
matando 12 pessoas nas imediações da mesma vila, havendo, aliás, também
a notícia de que os mesmos, em menos de dois anos, haviam proximamente
morto perto de duzentas pessoas por aquelas vizinhanças.
250
Contudo, não era apenas os Caiapó que cometiam ataques aos demais
moradores, os Paiaguá, os Mura, além de outros, também eram considerados hostis
pelo mesmo motivo:
A nação do gentio Mura, que habita as margens do rio Madeira faz um
grande mal ao desenvolvimento do comércio e impossibilita a regularidade
dos correios. Porém, este impedimento, só a Capitania do Pará o pode
remover, estabelecendo uma povoação presidida junto à foz do rio Jamariz, e
afugentando aquele gentio indomável com uma expedição de guerra..
251
Em 1775, os Paiaguá atacaram novamente:
249
Anal de 1775. In: AMADO & ANZAI, op.cit., p.201.
250
Anal de 1773. In: AMADO & ANZAI, op.cit., p. 187-188.
251
INSTRUÇÕES aos Capitães-generais. op.cit., p. 39.
95
Ao mesmo mês [maio de 1775] entrou gentio Paiaguás no sítio de passagem
do Paraguai e matou oito pessoas brancas e vinte escravos. Degolaram
alguns e deixaram as cabeças em pontas de pau; roubaram e queimaram as
casas dos mesmos sítios.
252
Como se verifica, havia resistência acirrada dos grupos indígenas à entrada
do colonizador, e à sua insistência em civilizá-los. O fato de alguns grupos aceitarem
sua integração nos aldeamentos coloniais, pode ter sido uma tática de resistência:
através da condição de “índios aldeados”, tais grupos poderiam pleitear os direitos
outorgados aos “súditos reais”, buscando assim negociar, de forma mais vantajosa, as
perdas sofridas.
Aqui se diz se haverá de fazer uma povoação para cômodo dos que viajam
por este rio Guaporé, ficando em meia viagem da fortaleza da Conceição.
Quando Sua Excelência passou pela cachoeira da Bananeira, apareceu na
margem ocidental do rio Mamoré um lote de quarenta índios silvestres,
chamados Pacanauas. Nesse número entraram algumas mulheres e crianças.
Como mostravam vontade de admitir civilização, Sua Excelência os mandou
convidar e socorrer com algum mantimento e gêneros da sua inclinação;
consistia em ferramentas e quinquilharias de todos os índios. Vieram em 4
de maio [de 1774] para a fortaleza e ali foram vestidos com as competentes
roupas.
253
Segundo Rita Heloísa de Almeida, “é preciso saber que o Diretório,
regulamentando as condições em que se fazia legítima a liberdade dos índios, ainda
deu margem à continuidade de certas práticas de escravidão”
254
. Pequenas ou
grandes seriam as punições aos índios que não agissem conforme impunha o governo
português. Diz o Diretório:
... e aos Principais, no caso de haver neles alguma negligência ou descuido,
a indispensável obrigação que têm por conta dos seus empregos, de castigar
os delitos públicos com a severidade que pedir a deformidade do insulto, e a
circunstância do escândalo, persuadindo-lhes, que na igualdade do prêmio, e
do castigo, consiste o equilíbrio da Justiça e bom governo das Repúblicas.
252
Anal de 1775. In: AMADO & ANZAI, op.cit., p. 197.
253
Anal de 1774. In: AMADO & ANZAI, op.cit., p. 193.
254
ALMEIDA, op.cit., p. 15.
96
Vendo porém, os Diretores, que são infrutuosas as suas advertências, e que
não basta a eficácia da sua direção para que os ditos Juízes Ordinários, e
Principais, castiguem exemplarmente os culpados; para que não aconteça,
como regularmente sucede, que a dissimulação dos delitos pequenos seja a
causa de se cometerem culpas maiores, o participarão logo ao Governador
do Estado, e Ministro da Justiça, que procederão nesta matéria na forma das
Reais Leis de Sua Majestade, nas quais recomenda o mesmo Senhor, que
nos castigos das referidas culpas se pratique toda aquela suavidade e
brandura que as mesmas Leis permitirem, para que o horror do castigo os
não obrigue a desamparar as suas povoações, tornando para os escandalosos
erros da gentilidade.
255
4. O descumprimento do Diretório
A presença do Diretório foi constante durante todo o período estudado. Ele
visava normatizar a relação do colonizador com as populações indígenas envolvidas
na definição de fronteiras. Os índios, considerados “livres”, “vassalos” da Coroa,
deveriam ficar concentrados em povoações sob o controle de um administrador, que
deveria zelar por seus interesses. Nessas aldeias havia imposição da língua
portuguesa, e se organizava o trabalho dos índios. Os administradores eram
remunerados com a sexta parte da produção indígena, o que levou a excessos na
exploração da mão-de-obra, provocando muitas fugas e levantes. Os índios também
eram alugados a particulares, mediante diárias, podiam trabalhar em expedições,
como remeiros, trabalhar em obras públicas. Esses aldeamentos localizavam-se em
lugares estratégicos, ao longo do Madeira e do Guaporé, e serviam como ponto de
apoio para os viajantes. O Diretório incentivava a distribuição dos índios por
lavouras familiares, nas quais deviam plantar mandioca, feijão, milho, arroz, algodão
e o tabaco, explorar os “negócios do sertão”, que consistia na coleta raízes,
folhagens, sementes, cascas etc, além de retirar do trabalho seu sustento e um
excedente comerciável. Tudo deveria ser desenvolvido próximo às “povoações”;
255
Ibidem, Apêndice. p. 2.
97
cada uma delas contava com um diretor, um pároco e um principal, e muitos deles
utilizavam o trabalho dos índios em benefício próprio. Os índios respondiam a essa
exploração com fugas constantes, não estando satisfeitos com as condições impostas
pelos diretores dos índios, o que anunciava a futura falência da lei. D. Francisco de
Souza Coutinho denunciava as atitudes dos diretores e o descumprimento do
Diretório:
... no atual a que os diretores reduziram os índios e as povoações deles,
isto é, no pé de considerarem os índios como servos ou escravos, e a
povoação como curral deles, no de nem respeitarem a sua vontade, o seu
interesse, a sua propriedade, a sua vida, pode ser que os viajantes
encontrassem sabendo cometer ao diretor bons partidos. Mas, se esta
povoação se reduzisse aos termos que prescrevem as leis; se fosse possível
haver um diretor que não abusasse das suas disposições e da confiança que
fazem dele, reconhecer-se-á por mui incerta outra vantagem aos viajantes
mais que a de acharem descanso, víveres e reforço, e muito por acaso uma
vez ou outra alguns indivíduos, que por conveniência própria os queiram
servir largando o seu estabelecimento, grande ou pequeno, e a sua família,
para empreenderem uma viagem, que ainda daquela situação para diante é
dilatada, ou mesmo para somente se arriscarem a violentíssimos trabalhos na
passagem das cachoeiras, sendo de mais a mais, tais trabalhos e tais viagens
em climas tão funestos aos mesmos índios.
256
As manifestações de insatisfação com a aplicação do Diretório eram cada
vez mais constantes, como no caso da Povoação de Casalvasco:
Os índios moradores desta povoação, depois de aqui estar bastante tempo, os
conheci mais hábeis e satisfeitos, e agora cada vez mais mal satisfeitos, não
obstante tratarem-se com menos sujeição. Sucede que quando os mando
avisar para a equipação desta igarité, que precisamente anda na Câmara
desta povoação, para se a fazer, olham muito, dizendo que não são cativos, e
que se lhes o pagam. O mesmo sucede com os que estão empregados no
serviço do gado, que sempre mandam requerendo que os tire dele, porque
[ilegível] lição que tem o sábado e o domingo, e os dias de serviço que
256
COUTINHO, In: RIHGB, 7, Outubro de 1840. pp. 281-304.
http://documenta.incubadora.fapesp.br - 8/03/2006 às 18h.
98
trabalham como querem. É que o sábado são obrigados ir para onde o
fazendeiro os mandar, seja a hora que for, sem ganhar nada.
257
Esses documentos demonstram bem o descumprimento do Diretório apesar
da “garantida” liberdade dos índios, ainda continuavam sendo tratados como cativos,
e mais, a regularização do trabalho e pagamento dos índios foi algo que praticamente
não se cumpriu. Para Ângela Domingues, “o estatuto dos vassalos ameríndios do
monarca português era contrastante com a situação que, de fato, ocupavam, sendo
um procedimento corrente a infração dos direitos básicos estipulados na lei da
liberdade”. Além do mais, segundo Domingues, os diretores eram acusados de
explorar os índios em benefício próprio “ou em benefício dos seus amigos e
apaniguados, não lhes pagando os salários devidos e fazendo-os trabalhar nos
serviços de moradores mais tempo do que aquele prescrito por lei”
258
.
O naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira denunciou, em seus registros, o
descumprimento da legislação contida no “Diretório dos Índios”, não concordando
com o tratamento que lhes era prestado. O naturalista criticava em especial os
diretores de aldeia, “por considerar que não aplicavam as leis como deviam. Na
realidade, Ferreira não era contrário à utilização da mão-de-obra indígena, mas ao
modo pela qual era aplicada a lei”
259
. A lei previa que esse trabalho não poderia
exceder a seis meses, que os mesmos índios deveriam cuidar de suas roças e
família. Mas isso dificilmente era obedecido, o que levava a que os índios
praticamente abandonassem suas famílias, promovendo desequilíbrio na divisão das
tarefas das aldeias.
O naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira foi um dos que mais denunciou
a situação dos índios. Ferreira denunciou que os índios eram requisitados como
remeiros para expedições diversas, e que não havia para eles intervalo legal entre
uma e outra. Em geral as expedições duravam cerca de seis meses; no entanto, assim
que chegavam de uma viagem, os índios eram requisitados para outra, à revelia
das portarias que definiam que deveria haver uma permanência de outros seis meses
em suas casas, trabalhando em suas roças
260
. Alexandre Rodrigues denunciava o
257
APMT, Fundo: Defesa, Ano: 1795, Data: 12/01/1975, Doc.: 57, Lata: B.
258
DOMINGUES, 2000. op.cit., p. 49-50.
259
ANZAI, In: SALOMON; SILVA & ROCHA (orgs.) . 2005. p. 273.
260
Ibidem, p. 276.
99
excesso de trabalho exigido dos índios, que os deixava doentes. Explicitou melhor o
trabalho dos índios remeiros, que sofriam com as picadas de insetos que
infeccionavam, além de obstrução, apoplexia, hidropisia, a asma, as febres, e a
“corrupção”, sendo esta última a que mais os amedrontava, fazendo com que não
viajassem sem um estoque de pimenta, considerada um dos medicamentos
preventivos da doença. Para o naturalista, além do excesso de trabalho, contribuíam
para deixá-los doentes a falta de agasalhos e a alimentação deficiente
261
.
Isso levou, em agosto de 1797, a D. Francisco de Souza Coutinho,
governador da Capitania do Grão-Pará e Maranhão, enviar a Portugal seu “Plano
para a Civilização dos Índios”. Coutinho denunciou os baixos índices de produção
agrícola, a instabilidade demográfica dos povoados, a “rudeza e a ociosidade
contumaz dos índios”, debitando tudo na conta dos excessos cometidos por diretores
e demais funcionários. Esses problemas seriam os responsáveis pelo fracasso do
Diretório enquanto projeto de civilização
262
.
Devemos observar que o Diretório foi uma lei que se baseou, em grande
medida, nas diretrizes básicas do Regimento das Missões, de 1686, corrigindo-as em
alguns pontos, inovando em outros, de modo que melhor se adaptasse as
necessidades daquele momento histórico em que foi implantado. Do mesmo modo o
“Plano para a Civilização dos Índios” utilizou-se de princípios previstos no Diretório,
e que também buscou corrigir as falhas, principalmente no que dizia respeito a
questão da utilização da mão-de-obra indígena, que, segundo Coutinho, não atendia
as necessidades da época. Dessa forma, entendemos que nem o Diretório nem o
“Plano” foram leis totalmente inovadoras, simplesmente buscavam corrigir as falhas
observadas, permanecendo, tanto em um quanto no outro, aqueles princípios que se
julgavam ter sido exitosos. Um exemplo disso é que apesar das críticas de Coutinho
ao Diretório, alguns de seus princípios permaneceram, como os incentivos aos
casamentos interétnicos.
Ressaltamos que a aplicação do Diretório em Mato Grosso levou a Coroa
lusa a conseguir seu intento o aumento de uma população desejável para a
repartição do Mato Grosso – garantindo a posse efetiva das terras da fronteira com os
espanhóis.
261
Sobre o assunto consultar: ANZAI, 2004, op. cit., p. 117.
262
Cf. SAMPAIO, In. PRIORE & GOMES (orgs.). 2003. pp. 127-128.
100
1 - “Figura de um soldado pedestre de Mato Grosso”.
Fonte: AMADO & ANZAI, 2006, p. 289
2: “Casal de índios espanhóis desertados de Santa Ana”
Fonte: AMADO & ANZAI, 2006, p. 289
3 - “Projeto de novo aposento para os Índios da Aldeia de São Miguel, na margem do rio Guaporé, acima do Destacamento de Nossa Senhora Conceição quatro léguas;
mandado fazer pelo Ilustríssimo e Excelentíssimo Senhor João Pedro da Câmara, governador e capitão general desta capitania de Mato Grosso; feita no mês de dezembro
de 1765.”
Fonte: AHU, Pará, 1787 – ICO/MS (2)
Considerações finais
O interesse em estudar os índios resulta de um preconceito de infância.
Desde criança ouvia e repetia que os índios eram preguiçosos e que não necessitavam
de tantas terras, que não trabalhavam nelas. Não gostava quando ouvia pessoas de
outros estados dizerem que em Mato Grosso só havia índios; isso, para mim, era uma
ofensa. Sempre estudei em escolas públicas, e não me lembro de ter ouvido ou lido
na escola, seja no Ensino Fundamental ou Médio, assuntos que mostrassem os índios
como seres relevantes para a história, eles apenas surgiam como meros atores
coadjuvantes.
Quando comecei o curso de graduação em História, em fins da década de
90, meu interesse em relação aos índios foi mudando. Nessa época eram muito
freqüentes as discussões sobre os 500 anos do “Descobrimento” do Brasil. Foram
diversas as publicações sobre o “Descobrimento” e sobre os primeiros moradores das
“terras americanas” os índios. Comecei, então, a aproximar-me da bibliografia
sobre os denominados “bárbaros” e me encantei. no Mestrado aprendi a pensar na
participação de índios e índias para o povoamento da Capitania de Mato Grosso, na
segunda metade do século XVIII. E o desfecho disso tudo se materializou nesta
dissertação.
Nesse trabalho, intitulado “O ‘ouro vermelho’ e a política de povoamento da
Capitania de Mato Grosso: 1752-1798”, o objetivo principal foi discutir o papel
representado pelos grupos indígenas localizados na repartição do Mato Grosso, na
dinâmica de povoamento colocada em movimento pelo Estado português, no período
em questão. Procuramos compreender as redes estabelecidas entre os interesses luso-
espanhóis e os indígenas, na fronteira entre as duas nações ibéricas na América do
Sul, iluminando alguns aspectos que nos parecem importantes para a construção do
conhecimento histórico sobre a região.
As análises foram centradas no termo do Mato Grosso, cuja vila principal
era capital da capitania, Vila Bela da Santíssima Trindade, fundada em 1752 pelo
primeiro governador da capitania de Mato Grosso, D. Antonio Rolim de Moura.
Optamos por observar, nessa região de fronteira multicultural e étnica, as estratégias
de convivência utilizadas tanto por europeus quanto por índios.
103
Ao organizar a narrativa em três capítulos, nosso objetivo foi apresentar os
resultados da pesquisa de modo dinâmico, de maneira que se pudesse vislumbrar a
euforia provocada pela descoberta de ouro nos “dilatados sertões” do Cuiabá, e a
necessidade de ocupar um território litigioso entre as nações ibéricas, na segunda
metade do século XVIII.
Discutimos, no primeiro capítulo, a utilização da mão de obra indígena
pelos portugueses em sua colônia americana desde os primeiros tempos de ocupação,
com a intenção de acompanhar os modos dessa utilização e os debates que
provocavam, por exemplo, as posições conflitantes entre os padres e os colonos, e as
alterações legais que foram surgindo. Ainda neste primeiro capítulo discutimos o
processo de conquista e posse dos sertões do interior da colônia, a procura pelo “ouro
vermelho”, que levou à descoberta de minas de ouro no Cuiabá e no Mato Grosso, e
o processo de fixação do poder metropolitano na fronteira luso-espanhola.
Evidenciamos que, para tudo na fronteira fazia-se necessário o trabalho indígena.
No segundo capítulo, procuramos lançar luz sobre o papel que representou a
mulher índia na ocupação humana dos espaços da fronteira, discutimos o incentivo
aos casamentos interétnicos, e as inquietações que geravam. Levantamos, na
documentação, os tipos físicos surgidos, e os interesses portugueses nessas uniões,
principalmente pelo fato de considerarem ser o mestiço o tipo ideal para ocupar a
fronteira. Acompanhamos também, na documentação, as tramas políticas dos
governadores, padres e colonos, as transgressões, as resistências.
Dedicamos o terceiro capítulo ao acompanhamento das questões
diplomáticas entre portugueses e espanhóis, em disputa pelos aldeamentos da
fronteira e pela dominação dos índios que as habitavam, a depender dos tratados de
limites entre as duas potências. Procuramos demonstrar a dinâmica nessa fronteira,
enfocando especialmente os índios, objeto dessa pesquisa. Desse modo, demos
especial atenção ao Diretório dos índios, aparato legal que norteava a relação entre
colonos e índios.
A pesquisa foi pensada de modo a destacar a importância do trabalho
indígena para a manutenção das terras da fronteira oeste para o império português.
Ainda são poucos os estudos que enfatizam este aspecto, pois em geral, quando se
pensa em mão de obra escrava a primeira referência é a dos escravos negros. No
entanto, embora escravos africanos tenham representado papel importantíssimo
também nas minas da fronteira oeste, sem a o de obra indígena não teria sido
104
possível ocupar os vastos territórios cortado por rios imensos e densas matas, tão
bem conhecidos pelos índios. A exploração da mão de obra indígena foi tão intensa,
que o naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira advertia que se não diminuíssem os
maus tratos a eles, a Coroa perderia uma mão de obra fundamental; dizia que, se os
trabalhos escravos eram importantes nas minas da capitania, mas que o trabalho
indígena era fundamental para a travessia dos rios e exploração dos recursos naturais
contidos nas matas. Ferreira justificava as fugas dos índios, e dizia que os negros não
fugiam para a África apenas porque não tinham meios para fazê-lo por estarem
distantes do mar.
Na Capitania de Mato Grosso, a aplicação do Diretório voltou-se à
utilização dos grupos indígenas como forma de garantir a posse efetiva das terras da
fronteira com os espanhóis. Uma das formas utilizadas pela Coroa lusa para
conseguir o seu intento – o aumento de uma população desejável para a repartição do
Mato Grosso –, definido no pensamento político da época, se baseou em três grandes
pontos: os casamentos mistos, a educação dos índios e o ensino da língua portuguesa.
Os casamentos mistos, sejam eles índias com “brancos” ou com negros,
foram incentivados como meio de “melhorar” a população da Capitania de Mato
Grosso, por se acreditar que os filhos mestiços nascidos destas uniões eram mais
adaptados à região, além da necessidade inquestionável de aumentar a quantidade de
súditos para a Coroa lusa. a educação indígena, bem como o ensino da língua
portuguesa foram medidas tomadas na tentativa de tornar os índios trabalhadores
produtivos, educados conforme as exigências do mundo do trabalho à época, já que o
uso da língua favoreceria aos índios na compreensão das tarefas que deveriam
desenvolver. Um dos objetivos para o ensinamento e uso da língua portuguesa era o
fato de que, por se expressar na ngua do colonizador, os índios seriam equiparáveis
a qualquer pessoa do Reino, sendo mais um “vassalo” de Sua Majestade, povoando a
fronteira com uma população educada segundo os padrões europeus, falando o
idioma do Reino, igual a qualquer luso-brasileiro.
A partir da documentação pesquisada, podemos perceber que a participação
de diversos grupos indígenas em Mato Grosso utilizados para se “fazer povoações”,
no século XVIII, adquiriu feições próprias, numa Capitania distante da Corte, e que
precisava consolidar-se como território português. Ao longo de todo século XVIII os
índios, “mansos” e “bravos”, ocuparam as páginas das cartas e ofícios de
governadores da Capitania. Eles ganharam visibilidade nos textos, ora sendo
105
“amigos” ou “súditos” da Coroa, ora sendo “bárbaros” ou inimigos mortais.
Entretanto, observou-se que as hostilidades indígenas feitas aos espanhóis
contribuíram para mantê-los afastados dos domínios portugueses, assim como o
contrário.
Embora atualmente a população de Vila Bela seja identificada mais com a
cultura negra africana, em sua gênese, contou com uma maioria de índios; negros e
poucos “brancos”. que se considerar, no entanto, que a documentação pesquisada
indica que o movimento de ocupação “branca” concorreu para a dizimação de muitos
povos, que já não existem nos nossos “arquivos da memória”:
... continuando aqueles aventureiros as suas conquistas, chegaram a navegar
o rio Paraguai, descendo uns pelo Coxim, outros pelo Embotetei, outros pelo
Cahy, [...] e entrando pelas grandes baias [...] foram achando tantas nações
de gentes que não cabem nos arquivos da memória e me lembram as
seguintes: Corayas, Taquasentes, Xixibes, Xanites, Porrudos, Xacorores,
Aragones, Coxipones, Pocones, Aripocones, Mocos, Guatós, Araviras,
Beripocones, Arapares, Hytapores, Iaymes, Guaicurus, Bororos, Paiaguas,
Xarayés, Penacuicas e outros.
263
Muitos desses grupos indígenas não existem, são nomes que nos soam
estranho. Outros, como os Bororo, permaneceram. E alguns devem ter garantido por
meio da miscigenação a continuidade de seu povo.
Não é novidade estudos sobre a política de povoamento da Capitania de
Mato Grosso e a predominância da população mestiça, proveniente, sobretudo, da
descendência de índias com “brancos” ou com negros. Contudo, este trabalho
procurou contribuir para o levantamento de fontes, sejam manuscritas ou impressas,
sobre o tema, que suscitem outras pesquisas, como por exemplo, sobre as aldeias de
São José, Santa Rosa, e Carlota.
Sabemos que, ao terminar um trabalho de pesquisa nos damos conta de que
muitas questões ainda mereceriam maiores explicações. No entanto, esse é nosso
“motor” para continuarmos pesquisando, procurando nos interstícios da
documentação outras possíveis respostas. Nos limites impostos por esta dissertação,
procuramos, refletir sobre as relações e os conflitos vivenciados pelos habitantes da
263
SÁ, op.cit. p.10.
106
fronteira Oeste do centro sul americano no Setecentos, com enfoque especial no
modo como os diferentes grupos indígenas foram utilizados para a legitimação do
poder luso em terras americanas, e as estratégias utilizadas pelos índios para garantir
espaços de negociação.
107
Fontes e bibliografia
Fontes manuscritas
APMT
Diretoria Geral dos Índios (1848-1860)
a) Lata A, Anos: 133 a 1796, Assuntos: Carta Régia e Ordem régia
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Pará; Ano: out./1790, Doc. 5
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Pará; Ano: 1/7/1796, Doc. 16
b) D. Antonio Rolim de Moura; Anos: 1750-1758; 107 Documentos, Rolo 01
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: São Miguel; Ano: 1754, Rolo
01, Doc. 32
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Ano: 1754, Rolo 01, Doc. 37
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Pará; Ano: 15/05/1754, Rolo
01, Doc. 72
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Pará; Ano: 19/09/1754, Rolo
01, Doc. 81
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Pará; Ano: 12/08/1757, Rolo
01, Doc. 83
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Pará; Ano: 26/02/1757, Rolo
01, Doc. 87
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Barcelos; Ano: 24/09/1758,
Rolo 01, Doc. 91
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Barcelos; Ano: 30/05/1758,
Rolo 01, Doc. 94
Fundo: Governadoria; Série: Correspondência; Local: Vila Bela; Ano: 12/12/1758,
Rolo 01, Doc. 107
c) Governo: Antonio Rolim de Moura; Ano: 1759-1764; Lata: 02, Rolo 01
Fundo: Fazenda; Série: Correspondência ativa; Ano: 1763, Doc. 106
Fundo: Justiça; Série: Correspondência ativa; Local: Vila Bela; Ano: 1763, Doc. 113
Fundo: Justiça; Série: Correspondência ativa; Local: Vila Bela; Ano: 1764, Doc. 123
108
Fundo: Defesa; Série: Correspondência passiva; Local: Sitio de Nossa Senhora da
Ajuda; Ano: 1761, Doc. 78
d) Governo: João de Albuquerque de Melo Pereira e Cáceres;
Fundo: Defesa; Ano 1795 A; Lata B; Doc. 25.
Fundo: Defesa; Ano 1795; Data: 12/1/1795; Lata B; Doc. 57.
NDIHR (Micro-Fichas)
MF 02 doc. 9. 11 de Março de 1728. Carta do governador Rodrigo César de Meneses
a S. Majestade.
MF 12 doc. 160-161. 18 de Abril de 1736. Parecer do Conselho Ultramarino à
Manoel Roiz de Carvalho.
MF 103 e 103 A doc. 1113 e 1118. 24 de Dezembro de 1756. Aldeia de índios
Bororo Aravirá.
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casamentos interétnicos.
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de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao rei [D. José]. CT: AHU-ACL-
CU-010, Cx. 07, Doc. 441
1754, Agosto, 02, Lisboa. OFÍCIO (minuta) do [secretário de estado da Marinha e
Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real ao [governador e capitão-general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares. CT; AHU-ACL-CU-
010, Cx 07, Doc. 450
1755, Janeiro, 31, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão-general da capitania
de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretario de estado da
Marinha e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx
07, Doc. 472
1755, Maio, 10, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão-general da capitania de
Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretário de estado da Marinha
109
e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 08, Doc.
489
1755, Maio, 22, Vila Bela. CARTA dos oficiais da Câmara de Vila Bela ao rei [D.
José]. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 08, Doc. 496
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AHU-ACL-CU-010, Cx 08, Doc. 501.
1756, Junho, 26, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão-general da capitania
de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretário de estado da
Marinha e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx
08, Doc. 518
1756, Junho, 27, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão-general da capitania
de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretário de estado da
Marinha e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx
08, Doc. 519
1756, Junho, 29, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão-general da capitania
de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretário de estado da
Marinha e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx
08, Doc. 522
1756, Junho, 30, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão-general da capitania
de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretário de estado da
Marinha e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real.CT: AHU-ACL-CU-010, Cx
08, Doc. 525
1756, Julho, 14, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão general da Capitania de
Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretário de estado da Marinha
e Ultramar] Diogo de Mendonça Corte Real. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 9-10,
Doc. 527
1757, Fevereiro, 25, Vila Bela. CARTA do [governador e capitão-general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao rei [D. José]. CT:
AHU-ACL-CU-010, Cx 09, Doc. 539
1758, Agosto, 22, Lisboa. CARTA (cópia) do [secretário de estado da Marinha e
Ultramar] Tomé Joaquim da Costa Corte Real ao [governador e capitão-general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares.CT: AHU-ACL-CU-
010, Cx 10, Doc. 580
1758, Agosto, 31, Lisboa. OFÍCIO (cópia) do [secretário de estado da Marinha e
Ultramar] Tomé Joaquim da Costa Corte Real ao [governador e capitão-general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares. CT: AHU-ACL-CU-
010, Cx 10, Doc. 583.
1758, Novembro, 15, Vila Bela. OFICIO do [governador e capitão general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [governador e
capitão general da Capitania do Grão Pará] Francisco Xavier de Mendonça Furtado.
CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 10, Doc. 585.
110
1758, Dezembro, 06, Vila Bela. OFÍCIO do ao [governador e capitão-general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [governador e
capitão-general da capitania do Grão-Pará] Francisco Xavier de Mendonça Furtado.
CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 10, Doc. 590
1758, Dezembro, 14, Vila Bela. OFÍCIO do ao [governador e capitão-general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [governador e
capitão-general da capitania do Grão-Pará] Francisco Xavier de Mendonça Furtado.
CT: AHU-ACL-CU-010, Cx 10, Doc. 596
1759, Novembro, 29, Vila Bela.OFÍCIO do [governador e capitão general da
capitania de Mato Grosso] Antonio Rolim de Moura Tavares ao [secretario de estado
da Marinha e Ultramar] Tomé Joaquim da Costa Corte Real. Anexo: Certidão
via.CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 10, Doc. 607.
1760, Agosto, 7, Vila Bela. OFÍCIO do [governador e capitão general da Capitania
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Marinha e Ultramar] Tomé Joaquim da Costa Corte Real. Anexo: 8 cópias de ofício e
2ª vias. CT: AHU-ACL-CU-010, Cx. 11, Doc. 621
1760, Agosto, 26, Vila Bela. OFÍCIO, do [governador e capitão-general da capitania
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Marinha e Ultramar] Tomé Joaquim da Costa Corte Real sobre a carta do superior
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