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Se vamos à essência da nossa formação, veremos que na realidade nos constituímos para
fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros, mais tarde ouro e diamantes, depois,
algodão e, em seguida, café, para o comércio europeu. Nada mais do que isto. É com tal
objetivo, objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que
não fossem o interesse daquele comércio, que se organizarão a sociedade e a economia
brasileiras. Tudo se disporá naquele sentido: a estrutura, bem como as atividades do País.
Virá o branco europeu para especular, realizar um negócio; inverterá seus cabedais e
recrutará a mão-de-obra de que precisa: indígenas ou negros importados. Com tais
elementos, articulados numa organização puramente produtora, industrial, se constituirá a
colônia brasileira.
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O sistema de plantation foi uma realidade agrícola no Brasil colonial, mas não a única. Em
trabalhos historiográficos mais recentes
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, busca-se superar a prevalência da lógica externa, visando
um equilíbrio entre as decisões da metrópole e as respostas da colônia, sua lógica peculiar, sua
dinâmica interna, que não foi exclusivamente determinada pela política colonizadora lusitana.
Nesse sentido, é um exagero limitar a economia da época colonial apenas ao setor
exportador. Ao lado da grande propriedade, existiam, em escalas variadas, outras formas de
organização da produção baseadas em pequenas propriedades, com trabalho compulsório ou livre,
voltada para o mercado interno ou simples subsistência local. Existiam, portanto, lavradores
independentes que produziam milho, trigo, mandioca, feijão, arroz etc. Criadores de gado também
faziam parte da cena colonial, produzindo charque e artefatos de couro. Comerciantes – reinóis ou
mesmo colonos – foram atuantes neste período, quer no comércio interno, quer como agenciadores
de produtos vindos do reino, como vinagre, azeite, vinho, bacalhau, azeitonas, pimenta-do-reino,
tecidos, ferramentas, sal etc. Principalmente no século XVIII, uma variedade de pessoas ocupava-se
de diferentes trabalhos, na mineração, em pequenas roças, alfaiates, doceiras, açougueiros,
aguadeiros, ferreiros, mascates, mestres-escolas, médicos, pedreiros, escultores, pintores, músicos,
donas de casas, prostitutas, cozinheiras, estalajadeiros, cirurgiões, barbeiros, boticários, padres e
muitos outros.
Com o adensamento populacional e o desbravamento de outras áreas, a economia do
Brasil, certamente, cada vez menos podia ser reduzida a plantation, escravos, açúcar, tabaco, ouro e
diamantes.
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PRADO JÚNIOR, Caio, op. cit., p. 31-32.
81
Ver principalmente CARDOSO, Ciro Flamarion. Escravo ou camponês? O protocampesinato negro nas Américas.
São Paulo: Brasiliense, 1987. GORENDER, J. O escravismo colonial. 5. ed. São Paulo: Ática, 1988. FRAGOSO, João,
et al. A economia colonial brasileira. São Paulo: Atual, 1998. FARIA, Sheila de Castro. A colônia brasileira: economia
e diversidade. São Paulo: Moderna, 1997. FLORENTINO, Manolo. Em costas negras: uma história do tráfico de
escravos entre a África e o Rio de Janeiro. São Paulo: Cia. das Letras, 1997. ANASTASIA, Carla Maria Junho.
Vassalos rebeldes: violência coletiva nas Minas na primeira metade do século XVIII. Belo Horizonte: Editora C/Arte,
1998.