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venda por determinado tempo, pois, se a vende em bloco, de uma vez por todas,
então ele vende a si mesmo, transforma-se de homem livre em um escravo, de
possuidor de mercadoria em uma mercadoria. Como pessoa, ele tem de se relacionar
com sua força de trabalho como sua propriedade e, portanto, sua própria mercadoria,
e isso ele só pode à medida que ele a coloca à disposição do comprador apenas
provisoriamente, por um prazo de tempo determinado, deixando-a ao consumo,
portanto, sem renunciar à sua propriedade sobre ela por meio de sua alienação
(MARX, 1983a, p. 139, ).
A nova divisão social do trabalho é responsável pelo estranhamento que é o não
reconhecimento daquilo que se produz pelo trabalhador. No novo modelo, a produção é
planejada pelo capitalista que, afastando o trabalhador do processo de concepção,
transforma-o em mero executor de tarefas. O carvoeiro, que também trabalha sob a lógica do
novo capitalismo, é o detentor do conhecimento do processo produtivo do carvão vegetal.
Nem por isso deixou de operar-se o estranhamento do trabalho. Antunes reforça que na
nova fase do capital, da qual o toyotismo é a melhor expressão, re-transfere o
savoir-faire para o trabalho, mas o faz visando apropriar-se crescentemente da sua
dimensão intelectual, das suas capacidades cognitivas, procurando envolver mais
forte e intensamente a subjetividade operaria (ANTUNES , 1999, p. 131).
Sendo assim, o objetivo inicial do trabalho, que o fez transformar a matéria em
produto através da suas capacidades cognitivas, transforma-se em valor de troca. O
trabalhador, como na perspectiva de Marx, torna-se uma mercadoria, distanciando-se dos
meios de produção, do produto e de si mesmo. Essa condição promove a reificação, a
coisificação das relações de trabalho humanas. O produto é independente e indiferente ao
produtor, o que promove a degradação e a desvalorização do homem. Assim, o conhecimento
adquirido com o tempo e aplicado na atividade de carvoejamento, ou seja, o pensamento e as
capacidades cognitivas do carvoeiro são mercadorias quantificáveis e postas à venda – por um
preço irrisório – no mercado capitalista.
A visão mutilada que o Sr. Leonardo tem de si mesmo decorre do distanciamento em
relação ao produto de seu trabalho. Esse caráter fetichista das relações de trabalho no sistema
capitalista resulta do modo como se operam as relações humanas de produção e distribuição
da riqueza. O que resta ao trabalhador é transformar a sua força de trabalho – aquela mesma
que deveria humaniza-lo – em um meio de subsistência. A venda dessa força de trabalho
aliena o trabalhador, tornando-o estranho a si mesmo, ao próprio trabalho e ao produto. A
atividade como meio de subsistência massifica, deprime, exaure as forças do trabalhador e
acaba por não contribuir para a sua realização como homem.