Observatório da Imprensa
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Sob o apropriado título de “Marcha insensata”, a Folha, no domingo, chama a atenção para os riscos
crescentes de xenofobia, algo que para historiadores portugueses não seria novidade a uma certa altura do
processo de “globalização”, que começou precisamente em Portugal, no século 15, com as Viagens de
Descobrimento. Denuncia políticos e jornalistas, nos Estados Unidos e fora dele, defendendo uma
“relativização” dos direitos civis, sob argumentos aparentemente razoáveis, além do discurso sumário de
Bush, reeditando Reagan na briga do “Bem contra o Mal”.
O Estado, com seus editoriais na página 2, em vez de análises traz justificativas para o que Bush já anunciou
como “retaliação” – embora, como já aconteceu antes, não se saiba exatamente a quem retaliar. Que
crianças, jovens, adultos e velhos, nos Estados Unidos, tenham sido vítimas de uma violência enorme é
profundamente lamentável. Mas é lamentável que crianças, jovens, adultos e velhos em qualquer parte do
mundo sofram qualquer tipo de violência, como será um bombardeio indiscriminado do Afeganistão. Aqui a
ciência está presente sob a forma de história, antropologia, sociologia, além de ética e estética, na alçada da
filosofia e da moral. Que atos de ofensa uma criança afegã teria cometido para receber um castigo tão grande
sobre sua cabeça, além de ter nascido no Afeganistão? Mais que nunca é preciso um mínimo de
racionalidade para não se compensar, por irracionalidade e truculência, qualidades que o principal jornal
americano, o New York Times, não enxergou em Bush no dia da tragédia.
Verdades a recuperar
Como resultado de um impacto tecnológico recente, a mídia, especialmente impressa, passa por uma crise
de qualidade, refletindo dificuldades de identidade. A complexidade dos problemas neste pequeno mundo
orbitando um dos braços alados da Galáxia já não é pouca. O terrorismo só veio aumentar essas
dificuldades, o que, para muitos pensadores, era apenas uma questão de tempo. De qualquer forma, este
tempo chegou e, ainda que parcialmente previsto, trouxe o desconcerto, a desolação e a estupefação que,
inevitavelmente, acompanham a morte. Por tudo isso, e se quiser continuar desempenhando o papel que teve
desde que Gutenberg sistematizou os tipos móveis e assim ajudou a demolir a Idade Média, a imprensa deve
mudar. Aos menos os segmentos mais atrasados, do ponto de vista da capacidade de interpretar
contemporaneamente os acontecimentos.
Mais que nunca, como sugerem intelectuais do porte de Chomsky, é preciso analisar os fatos buscando o
novo, e não justificativas para a memória. Mesmo que o novo soe como um paradoxo, para repetir as palavras
dele: “A Europa passou por guerras sangrentas, mas foram internas. O Sul – que hoje chamamos de Terceiro
Mundo, as ex-colônias – nunca atacou a Europa, mas foi atacado por ela por centenas de anos. Esta é,