As propostas teóricas de Bakhtin presentes na obra publicada em (1929)
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sobre o dialogismo e a interação verbal
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como elementos constitutivos de todo ato de
comunicação, foram também levadas ao espaço escolar como um modismo. Geralmente os
livros didáticos de alguma forma adotam, emprestam ou remetem ao conceito de interação,
embora esse seja considerado num sentido restrito como é o caso da atividade analisada no
livro didático em que centraliza a interação somente como a presença do “outro” no
processo de comunicação.
Ao observarmos a proposta de atividade do livro “Linguagem e Vivência”,
há um entrecruzamento da teoria da comunicação com a da interação, que hoje seriam mais
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“Essa referência constante e necessária à instância de discurso constitui o traço que une a eu/tu uma série de
‘indicadores’ que pertencem, pela sua forma e pelas aptidões combinatórias, a classes diferentes. [...] É
identificando-se como pessoa única pronunciando eu que cada um dos locutores se propõe alternadamente
como ‘sujeito’. Assim, o emprego tem como condição a situação de discurso e nenhuma outra. Se cada
locutor, para exprimir o sentimento que tem da sua subjetividade irredutível, dispusesse de um ‘indicativo’
distinto [...] haveria praticamente tantas línguas quantos indivíduos e a comunicação se tornaria estritamente
impossível. [...] Quando o indivíduo se apropria dela, a linguagem se torna em instâncias de discurso,
caracterizadas por esse sistema de referências internas cuja chave é eu, e que define o indivíduo pela
construção lingüística particular de que ele se serve quando enuncia como locutor. Assim os indicadores eu e
tu não podem existir como signos virtuais, não existem a não ser na medida em que são atualizados na
instância de discurso, em que marcam para cada uma das suas próprias instâncias o processo de apropriação
pelo locutor. [...] A ‘terceira pessoa’ representa de fato o membro não marcado da correlação de pessoa. É por
isso que não há truísmo em afirmar que a não-pessoa é o único modo de enunciação possível para as
instâncias de discurso que não devam remeter a elas mesmas, mas que predicam o processo de não importa
quem ou não importa o que, exceto a própria instância, podendo sempre esse não importa quem ou não
importa o que ser munido de uma referência objetiva. Assim, na classe formal dos pronomes, os chamados de
‘terceira pessoa’ são inteiramente diferentes de eu e tu, pela sua função e pela sua natureza”. (Benveniste,
1995, p, 279-282, grifos do autor)
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A obra “Marxismo e Filosofia da Linguagem” foi originalmente publicada em russo com a assinatura de V.
N. Volochínov em Leningrado, 1929, em duas edições sucessivas sob o título de Marksizm i filossófia iaziká,
mas os tradutores Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira basearem-se, principalmente na tradução francesa de
(1977) e recorreram, contudo, constantemente à tradução americana de (1973). (Nota dos Tradutores, retirada
da obra reeditada em 1999).
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“Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de que procede de
alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui justamente o produto da interação do
locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de expressão a um em relação ao outro. Através da palavra, defino-
me em relação ao outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade. A palavra é uma espécie de
ponte lançada entre mim e os outros. Se ela se apóia sobre mim numa extremidade, na outra apóia-se sobre o
meu interlocutor. A palavra é o território comum do locutor e do interlocutor. [...] O diálogo, no sentido
estrito do termo, não constitui, é claro, senão uma das formas, é verdade que das mais importantes, da
interação verbal. Mas pode-se compreender a palavra ‘diálogo’ num sentido amplo, isto é, não apenas como
comunicação em voz alta, de pessoas colocadas face a face, mas toda comunicação verbal, de qualquer tipo
que seja”. (Bakhtin, 1999, 113-123, grifos do autor)
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