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PATRÍCIA MONTEMEZZO
A PRUDÊNCIA AMBIENTAL E O PAPEL DO ESTADO
NOS DANOS GERADOS POR SUA OMISSÃO
MESTRADO EM DIREITO
UCS
CAXIAS DO SUL - RS
2008
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PATRÍCIA MONTEMEZZO
A PRUDÊNCIA AMBIENTAL E O PAPEL DO ESTADO
NOS DANOS GERADOS POR SUA OMISSÃO
Dissertação de Mestrado apresentada ao Curso
de Pós-gradução Strictu Sensu - Mestrado em
Direito da Universidade de Caxias do Sul,
como requisito parcial para obtenção do título
de Mestre em Direito.
Orientador: Prof. Dr. Jayme Paviani
CAXIAS DO SUL - RS
2008
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Refletir a natureza e os mistérios que a cercam, seu poder e o fascínio que exerce
sobre o homem, significa refletir a vida. Refletir a vida conduz a questionar a morte, temer a
morte, assim como se teme uma tempestade, que ao mesmo tempo em que fascina, é
assustadora, principalmente quando nos pega de surpresa. A vida é fascinante, um deleite. A
morte, um mistério. A única certeza que se tem na vida é a morte, e esta, é incerteza, e, por
isso, surpresa, lamento e saudade.
Dedico este trabalho ao homem que me trouxe ao mundo e me conduziu nele.
Ensinou-me as primeiras palavras, os primeiros passos. Aplicou-me corretivos, ensinou as
maiores lições. Levava-me na escola e sempre me incentivou a estudar. Brigava por mim e
comigo. Alegrou-se com minhas conquistas, chateou-se com minha personalidade forte, mas
sempre se identificou em mim, e por isso se orgulhava. Ensinou-me a viver, a amar a vida,
aproveitar o momento, pensar no futuro e aprender com o passado. Foi exemplo de homem,
de trabalhador, de pai, de coragem. Mostrou-me como sonhar, realizar e sonhar. Dedico esta
realização ao homem a quem mais admiro e admirei na vida, mesmo sem perceber.
3
Ao meu marido;
minha família;
meus colegas;
professora Raquel;
e, especialmente, meu orientador, professor Paviani.
4
RESUMO
A dissertação trata do princípio ambiental da prudência e da responsabilidade do Estado por
omissões lesivas ao meio ambiente. Verifica se a educação ambiental (formal, não-formal ou
informal) e o princípio da prudência interferem na responsabilização do Estado por omissões
lesivas ao meio ambiente. Defende a existência de grupos lógicos de princípios, a partir do
seu caráter finalístico. O princípio, ou grupo lógico, da prudência é explicado com base na
phronesis aristotélica, que consiste na prudência prática ou virtude da mediania, necessária
diante do contexto de riscos e incerteza científica que impede a aplicação isolada de
prevenção e precaução. A educação ambiental representa uma forma de prática da prudência
ambiental, já que a participação popular é corolário do Direito Ambiental e somente se
concretiza pela conscientização pública do papel do cidadão, da ecocidadania. É dever do
Estado promover a educação ambiental, bem como proteger o meio ambiente da ocorrência de
danos, podendo responder solidariamente com o poluidor direto, até mesmo quando omisso
no cumprimento deste dever. Sustenta-se a aplicação da teoria objetiva da responsabilidade
civil aos casos de omissões estatais lesivas ao meio ambiente, pois representa a violação do
dever específico de proteção do meio ambiente. A prudência ambiental orienta a subsunção
do Direito Ambiental, também quanto à aplicação de excludentes de responsabilidade ao
Estado. A educação ambiental contribui para a redução do ônus da responsabilidade estatal,
quer pela redução direta dos danos, quer pela possibilidade de fundamentar a incidência de
excludentes. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, valendo-se, ainda, de referências a
decisões judiciais e legislação. Adotam-se os métodos analítico, hermenêutico e dialético
(prevalecendo o primeiro); pois, além da demonstração dedutiva dos argumentos que
respondem ao problema de pesquisa, também serão interpretados, confrontados e mediados,
considerando-se os contextos social e legal atuais.
Palavras-chave: Direito Ambiental; princípios de direito ambiental; prudência; educação
ambiental; dano ambiental; responsabilidade civil do Estado.
5
ABSTRACT
The dissertation deals with the environmental principle of prudence and responsability of the
state for detrimental omissions to the environment. Verifies if the environmental education
(formal, non-formal or informal) and the principle of prudence interfer on the responsability
of the state for detrimental omissions to the environment. It defends the existence of logical
principle groupment from the finalistic character of the principles. The principle or the logical
principle groupment of prudence is explained based on the aristotelic phronesis, that consists
on the practical prudence or virtue of middle term necessary in front of the context of risks
and scientific uncertainty that prevents the isolated application of prevention and precaution.
The environmetal education represents a form to practice the environmental prudence, as the
popular participation is corollary from the Environmetal Law and is only made by public
awareness of the role of the citizen, and the eco citizenship. It´s duty of the state to promote
the environmetal education and to protect the environment from occurrence of damages and
can answer solidariment with the direct polluter even when omissive in fullfilling this duty. It
suports the application of the objective theory from civil responsibility to the cases of detri-
mental state omissions to the environment, because represents the violation of the specific
duty of environmental protection. The environmental prudence guides the subassumption of
the Environmetal Law, also on the application of excludents from responsability of the State.
The environmental education contributs to reduct the onus from the State responsibility, as
by direct reduction of the damages, or by the possibility to establishing the incidence of ex-
cludents. It´s a bibliographic research, using references to judicial decisions and legislation. It
´s used analytical, hermeneutic and dialetic methods (prevalent the first), because, in adition
to the deductive demonstration of the arguments that answer the problem of research, will
also be interpreted, faced and mediated considering the current legal and social contexts.
Key-words: Environmental Law; principles of environmetal law; environmetal education; en-
vironmetal damage; civil responsability of the State.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................8
1 DIREITO AMBIENTAL: A NATUREZA COMO PONTO DE PARTIDA................. 13
1.1 Natureza e Meio Ambiente..................................................................................... 13
1.2 Dano Ambiental e Responsabilidade...................................................................... 24
1.3 Os Riscos e os Princípios de Direito Ambiental..................................................... 34
1.3.1 Princípio do Desenvolvimento Sustentável..............................................40
1.3.2 Princípios da Prevenção e da Precaução.................................................. 43
1.3.3 Princípios do Poluidor-pagador e do Usuário-pagador............................ 45
2 PRUDÊNCIA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL.................................................................. 48
2.1 A Prudência como Princípio de Direito Ambiental................................................ 48
2.2 Educação: instrumento da prudência ambiental......................................................59
2.3 Educação Ambiental, Prudência e Estado...............................................................70
3 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL: O ESTADO E O DEVER DE PRUDÊNCIA81
3.1 Responsabilidade Civil Ambiental: aspectos teóricos............................................ 81
3.2 O Estado e os Danos Ambientais Gerados por sua Omissão.................................. 91
3.2 Prudência e Educação: analisando a omissão estatal.............................................. 99
CONCLUSÃO....................................................................................................................... 115
REFERÊNCIAS....................................................................................................................120
7
INTRODUÇÃO
A vida humana é uma existência dependente. Dependente de meios físicos e
biológicos para ser criada, para se desenvolver, para evoluir. Dependente de valores afetivos
que dêem suporte emocional. Co-dependente de outras vidas humanas, considerando-se sua
inserção em sociedade. A existência humana, por si só, não se basta, necessita de um
ambiente que lhe favoreça, o qual não é restrito ao meio que cerca o homem, mas é de
amplitude maior, compreendendo o conjunto de elementos do qual ele próprio é integrante.
Assim, uma concepção de meio ambiente pode ser obtida pela associação do ser humano aos
elementos da natureza e da cultura (aqui abrangidas também as obras criadas pelo homem, as
edificações).
Na realidade atual de constantes avanços científicos e tecnológicos, em que
diariamente novos produtos, serviços e descobertas são colocados à disposição da sociedade,
também se multiplicam os riscos ao meio ambiente e ao próprio homem, em razão do
desgaste dos recursos naturais, de novas formas de degradação destes ou de perigos à saúde e
vida humanas. Por isso, cada vez mais é debatida a qualidade de vida como um bem jurídico a
ser tutelado e protegido, eis que corolário de outros princípios fundamentais e universais, a
exemplo da dignidade da pessoa humana.
Em virtude disso, surge uma legislação em âmbito mundial que procura, senão
resolver o problema da poluição e degradação ambiental, ao menos manter sob controle as
atividades das empresas, do Estado e das pessoas para a melhoria da qualidade de vida, em
todas as suas formas, objetivando que as presentes gerações consigam atender às suas
necessidades sem comprometer as futuras, primando pelo equilíbrio ecológico.
Deste modo, ao mesmo tempo em que os riscos devem ser administrados a fim de se
proteger o meio ambiente e a qualidade de vida humana, também não se pode impedir toda e
qualquer atividade. A preservação ambiental não deve ser incondicional, mas equilibrada à
possibilidade de desenvolvimento social e econômico: desenvolvimento sustentável, para o
qual contribui a virtude da prudência.
Agir prudentemente significa considerar os riscos e ponderar a necessidade de assumi-
los diante dos benefícios que a atividade poderá gerar. De que forma é possível que isto seja
implementado? Acolhendo as possibilidades de evitar danos ao meio ambiente sem obstar o
8
crescimento social e econômico, através da consciência ambiental amparada em bases
educacionais sólidas, sejam formais ou não.
Ao mesmo tempo, diante dos constantes avanços científicos e tecnológicos, questiona-
se a existência de certezas científicas capazes de sustentar a ocorrência de danos ambientais
certos e precisos. O conhecimento não é absoluto, mas construído e desconstruído
constantemente. Uma conclusão científica persiste até que outra surja a substitua, o que incita
a integração entre os princípios da prevenção e da precaução, pois mesmo em uma situação
que, inicialmente, sabe-se que geraria dano ambiental, pode ser questionada e duvidada.
Assim, diante das incertezas atualmente existentes, tutelar com prudência as relações
do homem com o meio ambiente, em vistas à manutenção e preservação da qualidade de vida
das presentes e futuras gerações, é papel do Estado e também dos cidadãos, que devem ser
incentivados a adotar posturas ativas e positivas em favor disto, por meio da conscientização
ambiental, do fortalecimento da ecocidadania. A preservação do meio ambiente deixou de ser
apenas uma previsão tornando-se uma necessidade em face da realidade de riscos e da
emergência da qualidade de vida como bem jurídico.
Tanto a Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981, quanto a Constituição Federal de 1988
estabelecem a imposição da responsabilidade civil à pessoa física ou jurídica, de direito
público ou privado, que, direta ou indiretamente, causar degradação ambiental, respondendo
por esta conduta independentemente de culpa. Neste contexto, se ressalta a imposição ao
Poder Público de diversas práticas, descritas nos doze incisos do parágrafo primeiro do artigo
225 da Carta Constitucional, em defesa e preservação do meio ambiente.
O Estado possui o dever, juntamente com a população, de promover a preservação
ambiental, através de medidas administrativas preventivas e repressivas, fiscalizando a
atuação dos cidadãos. As medidas preventivas visam evitar danos ao meio ambiente, quer por
parte de particulares ou por agentes públicos, pessoas físicas e jurídicas entre as quais se
encontra o dever estatal de promover a educação ambiental. Condutas repressivas tendem a
abolir ou interromper as lesões ambientais. E, como instrumento de controle, quer de forma
preventiva, quer repressiva, o Poder Público dispõe da fiscalização, através do poder de
polícia que lhe é conferido.
O Estado tem papel fundamental na proteção ambiental, por ser o ente que detém o
poder de autorizar e controlar a atuação dos particulares sobre o meio ambiente. Ainda, é
quem elabora e pratica políticas públicas visando ao equilíbrio ecológico e à observância dos
9
princípios da precaução e prevenção. Por isso, se exige que o Poder Público tenha uma
atuação bastante eficaz, que é o único responsável por algumas práticas tão essenciais ao
meio ambiente, como a fiscalização, o licenciamento e a educação ambiental.
No entanto, algumas vezes podem ocorrer falhas na atuação estatal no exercício dessa
proteção ambiental, vindo direta ou indiretamente
1
a causar danos ao meio ambiente. A
realidade tem demonstrado, portanto, que o Estado pode ser omisso neste dever
constitucional, deixando de adotar medidas tendentes à proteção ambiental, quer preventivas
(pela educação ambiental, por exemplo), repressivas ou de fiscalização, o que gera o ônus
social da responsabilização por tal inação, vindo a ser condenado a reparar ou indenizar tais
danos.
A questão proposta na dissertação cinge-se a inquirir: qual o papel do Estado nos
danos ambientais causados por sua omissão, diante do princípio da prudência e do seu dever
de promover a educação ambiental?
O objetivo da pesquisa, portanto, é verificar se a educação ambiental (formal, não-
formal ou informal) e o princípio da prudência interferem na responsabilização do Estado por
omissões lesivas ao meio ambiente.
Trata-se de uma pesquisa bibliográfica, valendo-se, ainda, de referências a decisões
judiciais e legislação. Adota-se os métodos analítico, hermenêutico e dialético; pois, além da
demonstração dedutiva dos argumentos que respondem ao problema de pesquisa, também são
interpretados, confrontados e mediados, considerando-se os contextos social e legal atuais.
A dissertação estrutura-se em três capítulos, divididos em três seções. No primeiro
capítulo, contextualiza-se o problema, através da exposição dos conceitos fundamentais
ligados ao Direito Ambiental, a partir de natureza e de meio ambiente, relacionando o dano
ambiental com a necessária responsabilização, e, ainda, justificando a aplicação dos princípios
diante da atual realidade diretamente influenciada pela incerteza e risco sociais. Realiza-se,
assim, a análise semântica do discurso sobre estes conceitos.
Nesse capítulo, o tema é introduzido, objetivando-se abordar as relações entre os
conceitos básicos que se relacionam com o problema de pesquisa, a fim de situá-lo e justificá-
lo. Assim, a concepção holística de natureza, fruto da evolução histórica do pensamento
1
O Estado causará danos ambientais diretos quando as lesões decorrerem da sua esfera de ação, e indiretos,
quando for solidariamente responsabilizado ao poluidor direto, configurando-se sua omissão. Existe, outrossim,
divergência quanto à teoria aplicável a responsabilidade civil do Estado por omissão lesiva ao meio ambiente,
dividindo-se posições entre a objetiva e a subjetiva.
10
humano, oferece suporte ao Direito Ambiental como sistema essencial para a salvaguarda do
direito fundamental à qualidade de vida das presentes e futuras gerações. Pautada nisso, está a
abordagem do dano ambiental e da responsabilidade do seu causador, como uma forma de
proteção do meio ambiente, pelo caráter expiatório e preventivo presente no instituto. Ainda,
não pode ser ignorado o contexto de incerteza e risco característicos da sociedade
contemporânea, a embasar a formulação de princípios que sustentem as normas ambientais e,
especialmente, seu agrupamento para melhor eficácia na gestão destes desafios atuais.
No segundo capítulo, por meio do método hermenêutico, interpreta-se a definição de
phonesis elaborada por Aristóteles a fim de utilizá-la como fundamento teórico para o
princípio ambiental da prudência, este sendo o grupo lógico que abrange prevenção e
precaução. Adiante, trata-se, analiticamente, da educação ambiental e do papel do Estado na
sua promoção, a partir do discurso doutrinário e das proposições legais atinentes, elaborando-
se, ainda, uma análise funcional sobre como contribui para a concretização do princípio
ambiental da prudência, pela construção da ecocidadania.
A pesquisa, nesse ponto, apresenta uma nova concepção principiológica, na medida
em que insere o debate sobre a necessidade de elaboração de uma teoria capaz de oferecer
respostas ao problema da incerteza e do risco presentes na atualidade, fruto das constantes
inovações tecnológicas e científicas. Por não representar ponto central do problema de
pesquisa, mas apenas integrá-lo, não serão esgotadas as possibilidades de aplicação, uma vez
que exigiria pesquisa própria para este fim.
Aduzir a existência de um princípio ambiental da prudência, agrupador de duas formas
de princípios, prevenção e precaução, significa oferecer uma resposta simplificada, mas
completa, para situações reais cada vez mais complexas e efêmeras, observando-se a atual
tendência do direito pátrio, de adotar normas jurídicas abertas à interpretação e aplicação de
acordo com o caso concreto. Para isso, adentra-se à análise das proposições legais relativas à
função do Estado na prática da educação ambiental como instrumento da prudência.
Ao final, o terceiro capítulo confronta as teorias da responsabilidade civil ambiental do
Estado por omissões lesivas ao meio ambiente, mediante a metodologia dialética. O problema
central da pesquisa é objeto de análise, a fim de indicar-se uma posição resultante da
mediação, análise e interpretação da responsabilidade estatal frente aos aspectos tratados nos
capítulos anteriores.
11
O papel do Estado em face aos danos ambientais para os quais sua omissão contribui,
e a responsabilidade civil por isso, tendo em vista o dever constitucional de preservação do
meio ambiente e de fomento da educação e da conscientização coletiva, é o enfoque principal
do terceiro capítulo da dissertação. Mais uma vez através do método analítico de proposições,
decisões judiciais
2
são esquadrinhadas, a fim de exemplificar situações em que o ente estatal é
submetido à responsabilização solidária ao causador direto do dano, eis que omisso no seu
dever de proteção ambiental.
Igualmente, otodo dialético se presta a contrapor o princípio da prudência ao dano
ambiental por omissão do Estado, no tocante à educação ambiental, bem como a
responsabilidade extracontratual do ente público. Ao final, é sintetizada a importância de
observar ao princípio da prudência, consubstanciado através da educação ambiental, para a
redução dos danos ao meio ambiente frutos da omissão estatal e, conseqüentemente, sua
responsabilização.
Desse modo, muito além de simplesmente imputar ao Poder Público o ônus de, em
toda e qualquer situação, responder pela reparação ou indenização da lesão ambiental, na
dissertação é defendida a hipótese de que o princípio ambiental da prudência pode contribuir
para a redução dos danos causados pelo Estado por omissão e, da mesma forma, diminuir a
incidência da responsabilização.
Assim, além da relevância acadêmica inserida no debate teórico produzido pela
exposição hermenêutica do princípio ambiental da prudência e as relações atribuídas a ele,
também se ressalta a contribuição social da inclusão da educação ambiental como um
instrumento de redução da ocorrência de danos e do encargo estatal da responsabilidade civil.
2
As decisões judiciais objeto de análise foram escolhidas de acordo com as circunstâncias fáticas que envolvem,
bem como com os argumentos que fundamentam as condenações impostas, demonstrando a inexistência de
consenso na esfera judicial sobre a aplicabilidade das teorias objetiva ou subjetiva da responsabilidade, em
situações de omissão estatal.
12
1 DIREITO AMBIENTAL: A NATUREZA COMO PONTO DE PARTIDA
A abordagem sobre o significado de natureza contextualiza o debate sobre a
necessidade de proteção do meio ambiente da ocorrência de danos ambientais, diante da
importância da manutenção do equilíbrio ecológico para a preservação da qualidade de vida
das presentes e futuras gerações. A responsabilidade está relacionada a este fim, que, além
de representar uma sanção ao poluidor, também objetiva a reparação do dano, essencial
perante os riscos que caracterizam a sociedade atual, e que justificam a existência de grupos
lógicos de princípios que orientem sua gestão.
1.1 Natureza e Meio Ambiente
Bobbio (2004) escreve sobre a evolução do Direito, defendendo que os valores
jurídicos são justificados pelo momento histórico, ou seja, que é a realidade que oferece a
prova do consenso para sua criação e validade. Os fatos exigem leis que os regulem; por isso,
de acordo com o momento histórico, seria possível se falar em gerações de direitos; no
entanto, o termo é questionado por Wolkmer (2003), que sintetiza a visão de outros autores,
inclusive de Paulo Bonavides e Ingo Sarlet. Defende Wolkmer (2003), assim, a substituição
do termo gerações, que significaria um processo substitutivo, compartimentado e estanque,
pelo termo dimensões, já que esses direitos não são substituídos uns pelos outros (como induz
aquele termo), mas resultam de uma construção e uma complementação permanente.
A fim de sintetizar o debate acerca das teorias das gerações ou das dimensões dos
direitos, o importante é referir que inicialmente surgiram os direitos civis e políticos, seguidos
pelos sociais, econômicos e culturais decorrentes do princípio da igualdade e, em uma terceira
fase, os direitos mataindividuais, direitos coletivos e difusos, ou direitos de solidariedade. Tal
evolução, descrita por Wolkmer (2003), ainda pode ser continuada pelos direitos referentes à
biotecnologia, à bioética e à regulação da engenharia genética, e, ainda, pelos decorrentes das
tecnologias da informação, internet e da realidade virtual em geral. Bobbio (2004, p. 229)
assinala:
13
Os direitos da nova geração, como foram chamados, que vieram depois daquele em
que se encontravam as três correntes de idéias do nosso tempo, nascem todos dos
perigos à vida, à liberdade e à segurança, provenientes do aumento do progresso
tecnológico. Bastam estes três exemplos centrais no debate atual: o direito de viver em
um ambiente não poluído, do qual surgiram os movimentos ecológicos que abalaram a
vida política tanto dentro dos próprios Estados quanto no sistema internacional; o
direito à privacidade, que é colocado em sério risco pela possibilidade que os poderes
públicos têm de memorizar todos os dados relativos à vida de uma pessoa e, com isso,
controlar os seus comportamentos sem que ela perceba; o direito, o último de série,
que está levantando debates nas organizações internacionais, e a respeito do qual
provavelmente acontecerão os conflitos mais ferrenhos entre duas visões opostas da
natureza do homem: o direito à integridade do próprio patrimônio genético, que vai
bem mais além do que o direito à integridade física, afirmado nos artigos 2 e 3 da
Convenção Européia dos Direitos do Homem.
Seja qual for a classificação a que se queira aderir, de gerações ou de dimensões de
direitos, a questão é que atualmente, normas relativas ao meio ambiente estão inseridas na
legislação pátria, e a qualidade de vida passou a ser considerada um bem jurídico passível de
proteção legal. O direito de todos à qualidade do meio ambiente, ou a um ambiente não
poluído, integrariam a terceira geração ou dimensão dos direitos.
A partir da inserção de direitos relativos à proteção do meio ambiente nos
ordenamentos jurídicos, fala-se da ecologização das normas
3
, que foi manifestada
expressamente pela Constituição Federal de 1988, segundo Benjamin (2007), como fruto da
crise ambiental acirrada após a Segunda Guerra Mundial, quando a crescente industrialização
iniciou um processo de degradação do meio ambiente. Salienta que o texto constitucional
brasileiro atual possibilita a visão de um novo paradigma ético-jurídico
4
, mas também
político-econômico, caracterizado pela superação da clássica compreensão coisificadora,
exclusivista, individualista e fragmentária da biosfera, conferindo maior proteção jurídica aos
bens relativos ao meio ambiente.
Nesse contexto, fala-se em Direito Ambiental, que não teve seu marco inicial na
Constituição Federal de 1988, mas em leis ordinárias anteriores, como o Código Florestal
5
e a
Lei da Política Nacional do Meio Ambiente
6
, vindo a ser recepcionadas e consolidadas pelo
texto constitucional. Carvalho (2003) lembra que a legislação da natureza antecede muito
ao Direito Ambiental, o qual compreende um conjunto de princípios, normas e regras que
visam à tutela preventiva e reparadora do meio ambiente, do equilíbrio ecológico, do
patrimônio cultural, em vistas ao desenvolvimento harmônico e socialmente justo, através de
3
Ecologização significa incluir um caráter ecológico, de preservação ambiental, na norma jurídica. Empregar
maior valor jurídico ao meio ambiente.
4
Diante da ecologização das normas, esse novo paradigma é caracterizado pela proteção legal conferida ao meio
ambiente, que induz à inserção de novos valores e bens no contexto da ética e do Direito, e também da política e
da economia, pois os custos e os ônus da preservação ambiental igualmente passam a integrá-las.
5
Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965.
6
Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981.
14
medidas administrativas e judiciais. E, diante desta disciplina jurídica emergente, necessária a
compreensão de seu objeto de tutela: meio ambiente, para o qual se parte da noção de
natureza.
A concepção de natureza é difícil de ser construída, pois possui diversas definições, de
acordo com o momento histórico e social, bem como pelos aspectos que se considera:
filosóficos ou biológicos. Uma primeira noção, constante no Novo Dicionário Aurélio da
Língua Portuguesa (FERREIRA, 1987, p. 1.182) a define como “todos os seres vivos que
constituem o Universo”. Natureza seria, portanto, o conjunto formado pela flora e pela fauna,
que interagem, constituindo um único ente natural e equilibrado.
No entanto, somente os seres vivos, flora e fauna, sem se considerar o meio em que
estão inseridos, não são suficientes para conceituar natureza. Para que melhor se compreenda
este conceito, biologicamente tratado, considera-se a existência do ecossistema, que segundo
Batista Filho (1977, p. 13)
[...] é o ponto de partida para o entendimento mais amplo do meio ambiente e de sua
preservação através dos tempos. Ecossistema é todo conjunto formado por um
ambiente inanimado (solo, água, atmosfera) e os seres vivos que o habitam. O
ecossistema é integrado por dois componentes, o biótopo e a biocenose, aquele
constituído pelo meio físico e esta pelos seres vivos que habitam o espaço físico.
Desse modo, não somente os seres vivos, mas os demais elementos necessários para
sua sobrevivência, como o solo, a água e a atmosfera, também integram a natureza. E, tais
elementos associados, geram o que se chama de ecossistema.
Gonçalves (2001) aborda a integração da vida na ordem cósmica, ou seja, no conceito
de natureza e de ecossistema
7
, sustentando que a diversidade genética contribui positivamente
para a flexibilidade e capacidade de reorganização do ambiente quando afetado em seu
equilíbrio. “Assim como uma espécie perfeitamente adaptada às condições ambientais se
mostra mais frágil diante de reequilibrações necessárias, os ecossistemas diversificados estão
mais aptos a se reorganizarem” (GONÇALVES, 2001, p. 73).
A vida possui papel fundamental para o equilíbrio do ecossistema, já que quanto maior
a diversidade biológica dos seres que habitam o biótopo
8
, maior a capacidade deste de se
7
“Em ecologia, ecossistema é a unidade funcional básica, uma vez que inclui tanto organismos (comunidades
bióticas) como o ambiente abiótico, cada um deles influenciando as propriedades do outro, sendo ambos
necessários para a conservação da vida tal como existe na Terra”. (ODUM, 2001, p. 12).
“Podem ser consideradas ecossistema parcelas da biosfera de diferentes tamanhos, como, por exemplo, uma
pequena lagoa ou o oceano todo, desde que haja intercâmbio de matéria e de energia entre seus elementos. A
biosfera toda pode ser considerada um grande ecossistema”. (LOPES, 1999, p. 539-540).
8
Segundo Lopes (1999), bio significa vida e topos, lugar. Ainda, a definição de Batista Filho (1977), antes
transcrita, também explica biótopo como o meio físico que compõe um ecossistema.
15
adaptar a alterações e sobreviver a interferências maléficas. Mesmo que alguns seres vivos
não resistam, outros resistirão e contribuirão para a reconstrução do equilíbrio. Este contexto
induz à relação com a Teoria Gaia
9
de Lovelock (2000), pensada em meados de 1966, a qual
sustenta que a Terra é um organismo vivo, e equilibrado justamente pela existência da vida.
Lovelock (2000) utilizou a Terra como modelo paradigmático a fim de verificar a
possibilidade de existência de vida em Marte, comparando as superfícies dos dois planetas. A
conclusão que atingiu extrapolou os limites a que se propunha: não somente provou que
Marte era destituído de vida, mas também entendeu como a vida poderia ser viável na Terra.
Concluiu que o ar Terrestre o era apenas o meio ambiente adequado para a vida, mas uma
parte dela, pois somente isto explica o fato de ser a atmosfera composta por dois gases
altamente reativos à iluminação solar (oxigênio e metano)
10
. Ou seja, embora a instabilidade
da atmosfera, a vida é possível e existe. Nas palavras de Lovelock (2000, p. 81),
[...] parecia que a interação entre a vida e o ambiente, da qual o ar é uma parte, era tão
intensa, que o ar poderia ser considerado como uma pele de gato ou o revestimento de
um ninho de vespas: sem vida, mas feito por seres vivos para suportar um dado
ambiente.
O planeta, de acordo com a Teoria Gaia, é um organismo vivo, que tem a capacidade
de regular o seu clima e a sua composição química graças à interação existente entre a vida e
o meio que a possibilita, entre os seres e entes que compõem cada ecossistema, entre os
ecossistemas. Embora a atmosfera não tenha vida própria, os que a habitam têm, e estes,
portanto, é que são capazes de se adaptar ao meio, interagindo com ele e proporcionando o
equilíbrio necessário para a estabilidade atmosférica, impedindo reações químicas entre os
gases nela existentes.
Mesmo diante da importância da presença da vida para o equilíbrio ambiental da
atmosfera, não significa que o planeta possui condições suficientes para adaptação em
qualquer circunstância, inclusive diante do crescente quadro de degradação ambiental.
Embora não se pretenda abordar tal questão de forma a exauri-la, eis que alheia ao debate
proposto, é importante apenas referir que Lovelock (2000), na sua Teoria Gaia, prevê que,
apesar da robusta estrutura terrestre, a própria vida possivelmente esteja próxima de seu fim,
já que o aumento da temperatura atmosférica muito brevemente estará acima da capacidade de
controle ou de adaptação. Por isso, a participação do homem através da construção da
9
Gaia é um termo empregado pelos gregos para denominar a Terra, segundo Lovelock (2000).
10
A vida na Terra sustenta e é sustentada pelo desequilíbrio existente na atmosfera, pelas reações químicas de
seus componentes. Ao contrário, em Marte, onde não foram encontrados indícios de vida, a atmosfera é
equilibrada. Assim, na Terra uma espécie de desequilíbrio químico equilibrado, uma estabilidade, ou a auto-
regulação descrita por Lovelock (2000).
16
consciência ambiental pela educação e a responsabilização pelos danos ambientais são
essenciais para a reversão deste quadro finalístico.
Adepto à Teoria Gaia, Lutzenberger (2001) trata da Sinfonia da Evolução Orgânica,
que diferencia a Terra dos outros planetas do Sistema Solar. Trata-se da interferência da vida,
contribuindo para a harmonia da atmosfera, que, contrariando até mesmo a lei da
termodinâmica denominada Lei da Entropia
11
, a vida concentra energia, convertendo a
desordem em ordem. Dentre outras funções, é a vida vegetal que, através da fotossíntese,
renova o oxigênio, controlando a concentração de gás carbônico na atmosfera.
A diversidade biológica, ou a biodiversidade, contribui para o equilíbrio atmosférico,
como referido, na medida em que a complexidade da vida melhor se adapta e reorganiza.
Gaia, como um ecossistema amplo e complexo, mantém sua estabilidade em razão dessa
diversidade biológica, tendo a vida papel fundamental para este equilíbrio natural
12
, e, assim,
para a própria constituição da natureza.
De acordo com Paviani (2005, p. 11), etimologicamente, natureza é formada pela
palavra grega physis e pelo termo latino natura, o que conduz à idéia de primordialidade, ao
não construído, ao natural; como um processo evolutivo ordenado, uma totalidade ordenada.
Natureza pode ser tudo o que surge de forma espontânea, em decorrência de uma evolução
independente, sem alguma interferência humana. Não se trata de um objeto de estudo como
outro qualquer, por não ser um objeto inteiramente objeto, que integra e sustenta o próprio
sujeito que o quer definir. É o todo que surge e evolui juntamente com o homem, mas sem sua
participação direta, apenas como um fruto de tal evolução.
Natureza é tudo o que surge de forma ordenada, que evolui de acordo com a essência e
as necessidades biológicas dos seres vivos, por isso estes fazem parte do todo natural, do
ecossistema. Também neste sentido é a teoria biológica da Autopoiese, de Maturana e García
(1997), que considera os seres vivos um subsistema que se auto-reproduz, ou seja, que, a
partir de uma organização interna fechada (circular, clausurada), e recebendo influências
externas (dos demais seres vivos - biótopo -, e da biocenose), é capaz de se auto-regular, de se
auto-produzir, e, da mesma forma, o subsistema formado por este ser vivo também exerce um
11
Segundo Lutzenberger (2001), a Lei da Entropia diz que a energia sempre se dilui, se torna cada vez mais
inaproveitável, a ordem dá lugar à desordem.
12
Trata-se de uma estabilidade que, na verdade, é o limiar do caos, do desequilíbrio, que constantemente os
seres vivos alimentam as reações químicas na atmosfera, possíveis pela presença de substâncias reagentes. Sem
esse processo, cessam as condições para a vida, e, paradoxalmente, esse processo é mantido pela vida. (CAPRA,
1996)
17
papel no grande sistema que, portanto, pode ser considerado como sendo a natureza. A
natureza é um sistema, e a Teoria Gaia também assim a justifica.
Paviani (2005) afirma que o conceito de natureza é produto da História humana, das
culturas e da civilização, por isso o uma resposta definitiva, mas que está em constante
construção. No decorrer da história humana o conceito de natureza foi sendo construído,
formulado e reformulado, e assim será sempre, em decorrência de que o pensamento está em
constante transformação, em constante evolução. Atualmente, verifica-se a reformulação do
conceito de natureza, não mais a considerando um fator extrínseco ao ser humano. Surge uma
visão sistêmica, mais abrangente, sobre o que consiste natureza.
Merleau-Ponty (2000), ao tratar da natureza e da construção do seu conceito, cita
Descartes, que a tratou como um objeto de produtividade infinita e permanente em favor do
homem. Refere que Kant evolui o pensamento cartesiano, não apenas dissociando o homem
da natureza, mas colocando-o como ente central, para o qual os demais elementos da natureza
gravitam ao seu redor. Tratar-se-ia esta de uma concepção humanista, opondo o homem ao
Cosmo, e construindo um pensamento metafísico, a partir da idéia de que a natureza não fora
construída por Deus, mas pela razão humana. Ainda, Merleau-Ponty (2000) trata da
concepção romântica de natureza, a partir da elaboração de pensadores como Schelling, para
quem a natureza é a percepção que o homem tem, que se trata de algo surreal, baseado em
um empirismo filosófico.
Uma definição que considera os aspectos físicos e biológicos de natureza parece ser
consenso, quer pela Teoria Gaia, quer por outra a que se queira aderir. No entanto, a definição
filosófica exige a compreensão histórica da evolução do pensamento humano, o que é
elaborado por Merleau-Ponty (2000), mas também por outros autores. Lenoble (1990)
compila definições diversas para natureza, de acordo com o momento histórico que determina
o pensamento humano.
A natureza mágica, segundo Lenoble (1990), é a primeira idéia moral sobre natureza, e
está adaptada à moral humana, atormentada pelo temor e culpa. Surgiu na pré-história, e
justifica medos do homem em relação a fenômenos naturais, como a noite e temporais. O
milagre grego marcou o início de outra concepção, fundada na mitologia grega, que conferiu
objetividade à natureza, através de tentativas de compreendê-la e explicá-la. Adiante, os
chamados atomicistas Demócrito, Epicuro e Lucrécio inserem a ciência como influência na
construção do conceito de natureza, a qual é baseada no átomo, e, portanto, inicia um
raciocínio que integra todas as coisas, que compostas de átomos. Aborda a obra História
18
Natural, de Plínio, que segundo ele, supera o mecanicismo, pois traz uma visão mais
naturalista e descritiva da natureza, dando a ela o rosto que manteve durante mais de quinze
séculos. Lenoble (1990) trata da noção de natureza dos séculos XVI ao XVIII, sendo que, até
então, o natural era oposto ao homem e, a partir deste período, especialmente do
Renascimento (século XVI), com o desenvolvimento literário e artístico, houve a ruptura da
concepção religiosa de natureza. No século XVII, com a revolução mecanicista, reforçado
pelo pensamento de Galileu e Descartes, o conceito de natureza é objetivado, iniciando-se
uma visão antropocêntrica, de dominação humana sobre o natural, que seria sua missão,
designada por Deus. Por fim, a partir do ano de 1.700 surge a metafísica da natureza e do
homem, em lugar do mecanicismo; bem como um naturalismo ateu, dissociado de religião.
Autores como D'Alembert, através de conceitos como Natureza Matemática, e Diderot, com a
definição Mãe Natureza, sustentam que a natureza é transcendente, metafísica, e, por isso, o
homem passa a reconhecer sua dependência a ela e seu valor, carecendo revisar seus
costumes.
A construção do conceito de natureza, portanto, muito mais do que uma definição ou
uma teoria biológica, exige a adequação ao momento histórico em que o pensamento
filosófico é construído. Hoje, sabe-se que a natureza não é algo mágico ou mítico, embora
muito dela ainda seja desconhecido ao homem. Também, em decorrência da atual crise
ambiental, entende-se que não pode mais ser objeto de apropriação humana, pois sem a
natureza sua própria sobrevivência ficaria comprometida.
O movimento ambientalista
13
, tratado por Tavolaro (2001, p. 177-178), preconiza
justamente a chamada reconciliação entre homem e natureza:
Ao conferir tal status à natureza, a ponto de defini-la como um sujeito portador de
direitos, as associações ambientalistas sugerem um novo nível de moralidade que
precisa ser melhor investigado. Ao se “reconciliar com a natureza” - ou ao menos
almejar isso -, o movimento ambientalista parece não sugerir “misturar-se
indiferenciadamente com ela, rompendo com a idéia de natureza”, como quer Latour,
isto é, apagando toda e qualquer distinção entre o mundo humano e o mundo não-
humano. Trata-se, me parece, de uma nova definição do mundo natural em que, um
novo status lhe é conferido a partir de um processo cuja raiz acredito, encontra-se num
diferente patamar de moralidade próprio à modernidade avançada.
A conscientização para a necessidade de se superar a dissociação do homem e da
natureza, defendendo uma nova maneira de compreender e, principalmente, conviver com o
meio natural, são características do movimento ambientalista. Defende, tal movimento, a
visão de natureza como ente portador de direitos, que, embora estreitamente relacionado com
13
Movimento ambientalista pode ser definido como: "[...] entidades ambientalistas que emergem no interior da
sociedade civil (...) com o objetivo de defender a qualidade ambiental, seja na perspectiva conservacionista, ou,
no limite, na perspectiva ecocêntrica extrema". (TAVOLARO, 2001, p. 21).
19
o homem, não se confunde com ele. É um pensamento que surge e acompanha os avanços da
sociedade, que exige a renovação do conceito de natureza, a fim de sanar a crise ambiental,
gerada pela exploração desenfreada dos recursos naturais, impulsionada pela industrialização.
O movimento ambientalista, assim, surge em um momento histórico de degradação
ambiental, em que ocorre, além do início da reconciliação entre o homem e a natureza,
também o surgimento de uma definição de natureza como ente passível de direitos de
proteção. Neste sentido, Ost (1997) defende a necessidade de se superar a visão proprietária
do homem sobre a natureza, ou o que denomina natureza-objeto, mas não da forma
preconizada por Serres, como ecologia profunda: deep-ecology, natureza-sujeito de direitos.
Ost (1997) sustenta a visão de natureza-projeto, através da epistemologia da complexidade,
em que o homem e a natureza interajam, condicionando-se reciprocamente em um sistema, e
que, dialeticamente, se construa uma visão interdisciplinar entre as ciências sociais e as
naturais, para um tratamento diferenciado do patrimônio ambiental. Trata-se de uma nova
percepção da natureza, impondo-se regras coercitivas de controle, de limitação e de gestão,
objetivando preservar a herança (para as gerações futuras) ameaçada pelas gerações passadas.
Trata-se, a atual noção de natureza, de uma visão sistêmica e complexa que pode estar
embasada na Teoria da Autopoiese, e que é tratada por Capra (1996)
14
como sendo a teia da
vida, na qual o mundo vivo é uma rede de relações, em que não uma parte mais
fundamental que a outra, mas uma interdependência de tudo. A vida e o meio que a propicia
integram o mesmo conjunto, e um é indispensável para a manutenção do outro. Os seres
vivos, inclusive o homem, precisam do meio, e o meio precisa do homem e dos demais seres
vivos.
Embora formulada a nova concepção de natureza, verifica-se que não é uma definição
que integra a consciência popular. Apenas recentemente, após fenômenos climáticos graves
imputados às condutas humanas danosas, é que se passou a difundir que tais influências na
natureza geram drásticas conseqüências e, então, sua noção como rede de relações e
dependências entre todos os entes, sejam seres vivos, seja o meio em que vivem. Por isso é
que se pretende discutir o papel da educação na formação da conscientização cidadã em torno
da sua reconciliação com o ambiente natural.
14
Capra (1996) utiliza a teoria de Maturana e García (1997), da autopoiese, como sendo um dos três critérios que
considera fundamentais para a constituição de um sistema vivo: o padrão de organização que determina suas
características essenciais. A autopoiese representa o padrão da vida, para Capra (1996).
20
Esta recente visão sobre a natureza, para a qual contribuiu a crise ambiental, leva o
homem a compreender o seu papel e a sua posição perante ela. Morin e Kern (2003, p. 63), ao
defender o conceito de Terra-Pátria, expõem que a humanidade é algo planetário e biosférico:
A Terra não é a adição de um planeta físico, mais a biosfera, mais a humanidade. A
Terra é uma totalidade complexa física/ biológica/ antropológica, em que a vida é uma
emergência da história da terra, e o homem uma emergência da história da vida
terrestre.
O homem pertence à Terra, é fruto dela, da sua história, da sua evolução. Não é mais
possível dissociar o homem da natureza. Sua Pátria, no conceito defendido por Morin e Kern
(2003), é sua própria sobrevivência. A vida humana é dependente do meio em que está
inserida, e o equilíbrio deste meio natural, de acordo com a Teoria Gaia, também depende da
vida humana. Por isso, criou-se a noção de meio ambiente.
Meio ambiente, segundo Leite (2000, p. 74), exige a integração e interação de diversas
áreas do saber:
Esta visão de integração e interação é destacada por Vieira, que salienta que o tema
meio ambiente não serve para designar um objeto específico, mas, de fato, uma
relação de interdependência. Tal interdependência é verificada de maneira
incontestável pela relação homem-natureza, posto que não possibilidade de se
separar o homem da natureza, pelo simples fato da impossibilidade de existência
material, isto é, o homem depende da natureza para sobreviver. O meio ambiente é
conceito que deriva do homem, e a ele está relacionado; entretanto, interdepende da
natureza como duas partes de uma mesma fruta ou dois elos do mesmo feixe.
A definição de meio ambiente foi criada em função do papel que o homem ocupa
perante a natureza, mas não somente nela. Assim, ao passo que natureza é o conjunto de
elementos vivos e materiais que constitui um ecossistema, meio ambiente pode ser entendido
como a natureza, agregada aos elementos humanos, que possibilita a vida e o equilíbrio
ecológico. Natureza é o que é natural, que evoluiu de acordo com as necessidades biológicas
do ecossistema, e meio ambiente abrange mais do que isso.
Além da natureza, o meio ambiente é mais amplo, que se constitui do conjunto de
elementos que possibilita o desenvolvimento da vida. É o meio e ao mesmo tempo o ambiente
propício para este fim. Por isso, pode parecer um pleonasmo a expressão meio ambiente, já
que ambas as palavras possuem o mesmo significado. Butzske (2002, p. 119), diversamente,
defende a expressão:
É verdade que uma relação intrínseca, de coexistência obrigatória entre o ser e o
ambiente. Pode-se afirmar que não existe ser sem ambiente. Isso é facilmente
compreensível, quando se pensa o ambiente como o meio físico, o substrato onde o
ser obrigatoriamente se abriga, quer seja o ambiente representado pelo meio sólido
(solo, gelo), pelo meio líquido (água) ou pelo meio gasoso (ar).
21
Se a afirmativa acima está correta, correto também é afirmar que o meio se torna
ambiente em função do ser. Ao se inquirir sobre a existência de vida na Lua ou em
Marte, ou em outros planetas do nosso sistema solar ou em outros sistemas solares da
Via-Láctea ou fora dela, logo se haveria de ouvir a resposta em alguns planetas não
pode haver vida porque não há condições. Isso significa que não há ambiente.
[...]
Meio ambiente é, realmente, a expressão mais rica e não pleonástica de ambiente ou
de meio, porque o meio ambiente inclui o mundo referencial, o mundo ao entorno de:
o mundo-ambiente.
Meio ambiente pode ser entendido como o meio físico que possibilita o
desenvolvimento da vida. Por isso, considerando-se a diferença conceitual entre os termos
meio (elementos físicos, local em que a vida existe) e ambiente (elementos que possibilitam a
vida nesse local), é possível que se conclua pela inexistência de pleonasmo na expressão meio
ambiente.
O meio, isoladamente, não é ambiente, torna-se isto com a presença e a possibilidade
de abrigar a vida. O ambiente, portanto, pressupõe a vida, caso contrário, é unicamente um
meio, sem utilidade alguma. Ainda, no meio físico, não haveria somente a natureza, mas todos
os elementos que compõem tal meio, como as edificações, os procedimentos, rotinas, modos,
enfim, a cultura e as realizações humanas. A expressão meio ambiente, deste modo, justifica-
se pela complexidade que representa, ao possibilitar o desenvolvimento da vida e integrar-se a
ela.
As realizações, edificações e cultura humanas também são o local em que a vida se
torna possível. Hoje, um homem somente vive se observar certas regras de convivência,
elaboradas a partir de sua cultura. Da mesma forma, a sobrevivência humana depende das
condições de habitabilidade, quer na cidade, quer no campo, bem como de um trabalho. A
cidade e o local de trabalho são meio ambiente, embora não compostos apenas de elementos
naturais, de natureza.
Juridicamente, o conceito de meio ambiente está expresso no artigo 3º, inciso I, da Lei
6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente
15
. A
lei não refere a existência de bens corpóreos, como florestas, águas, animais, mas considera
meio ambiente o que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas, ou seja, um bem
incorpóreo. E, de acordo com Leite (2000), está correta a concepção legal, que adota uma
15
Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I - meio ambiente: o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica,
que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.
22
visão mais atual e ampla, aceitando como meio ambiente vários elementos, não restringindo-
se unicamente à proteção dos recursos naturais.
Na visão de Antunes (1998), não somente os recursos naturais, mas todos os
elementos que possibilitam a vida integram a noção de meio ambiente, que se torna um
conjunto bastante amplo, que consiste na integração ecológica de todos os componentes
que, isoladamente, podem ser identificados, tais como florestas, animais, ar, etc. Por isso, é
possível que se incluam as edificações, as cidades, a cultura e o local de trabalho como meio
ambiente, passível de proteção legal, que todos estes elementos são essenciais para a
sobrevivência humana e para o equilíbrio ecológico.
A crise ambiental é conseqüência não somente da devastação da natureza, mas
também dos danos gerados nas cidades, nas empresas, em todos os locais que abrigam a vida.
Ainda, a perda e a degradação da cultura também é fato que atinge a qualidade de vida
humana, por isso inserida na noção de meio ambiente.
Fink e Pereira (1996) definem que os elementos naturais são encontráveis em seu
estado natural, sem processo de transformação artificial, como o solo, a água, o ar, a flora e a
fauna. os elementos artificiais, são o espaço urbano construído, desde as edificações,
praças, rede de esgoto, ruas, áreas verdes e demais anexos e infra-estrutura de reflexos
urbanos. Os culturais podem ser naturais ou artificiais, que correspondem ao patrimônio
artístico, arquitetônico, histórico, turístico, paisagístico, arqueológico e espeleológico
16
.
Sustentam, ainda, que até mesmo o meio ambiente do trabalho está protegido legalmente, já
que existem relações entre o local de trabalho e o meio externo.
As classificações do meio ambiente são definidas de acordo com os elementos que se
considera para tal: se forem da natureza, meio ambiente natural; se edificados pelo homem,
meio ambiente artificial; se da cultura, naturais ou artificiais, meio ambiente cultural; e, se da
relação de trabalho e o meio que o cerca, meio ambiente do trabalho. Todos estes elementos
estão relacionados com a vida humana, por isso o conceito de meio ambiente foi criado em
função do homem e da sua qualidade de vida, que é o grande objetivo da proteção ambiental,
nos termos do artigo 225 da Constituição Federal de 1988:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e
à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
16
Espeleologia, segundo Ferreira (1986) é o estudo das cavernas ou cavidades naturais do solo.
23
O equilíbrio ambiental é essencial para a sadia qualidade de vida do homem, razão
pela qual a proteção do meio ambiente, sob todas as suas formas e elementos, é dever
constitucional de todos. Não somente a defesa da natureza, que possui uma definição aberta,
decorrente do desenvolvimento da história e do pensamento do homem, mas também do meio
ambiente, que abrange o meio natural, mas cujo conceito foi elaborado a partir das
necessidades humanas, é fundamental para a superação da crise atualmente verificada. Crise
decorrente dos danos ambientais causados pelas passadas e presentes gerações, que poderá
comprometer as futuras.
1.2 Dano Ambiental e Responsabilidade
A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, que definiu as bases da legislação e das
políticas ambientais no Brasil, apresentou, no artigo 3º, conceitos básicos na matéria; no
entanto, nada expõe sobre a definição de dano ambiental. A norma trata da degradação da
qualidade ambiental e da poluição, a primeira como sendo a alteração adversa das
características do meio ambiente, e a segunda, como uma espécie da mesma
17
. A poluição
pode ser classificada em algumas espécies, como a poluição do solo, rios, lençóis freáticos,
atmosférica, visual ou sonora, atingindo não somente os recursos naturais, mas também o
ambiente artificial e cultural. Para a compreensão efetiva do conceito legal de degradação e
poluição ambientais, a ecologia oferece seus estudos.
Ecologia, de acordo com Odum (2001), é uma ciência que teve um desenvolvimento
gradual ao longo da história, tendo sua denominação proposta pelo biólogo alemão Ernest
Haeckel, em 1869, sendo uma palavra que deriva da expressão grega oikos
18
. Em sentido
literal, ecologia significa o estudo dos organismos em sua casa, ou das relações dos
organismos e grupos de organismos com o seu ambiente. Conforme Odum (2001), é a ciência
das inter-relações que ligam os organismos vivos ao seu ambiente. A ecologia, assim, estuda
o meio ambiente e as relações dos seres vivos entre si e com este meio. Explica que
interação e dependência entre as espécies e com os fatores ambientais, como trata Branco
17
Poluição, assim, com base no artigo da Lei 6.938, de 1981, seria a degradação ambiental que prejudique a
saúde, a segurança e o bem-estar da população; que crie condições adversas às atividades sociais e econômicas;
que afete desfavoravelmente a biota ou as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; ou atividade que
lance matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos.
18
De acordo com Odum (2001), a tradução do termo oikos é casa ou lugar onde se vive.
24
(1997), de forma que a alteração nas condições do meio interfere na vida e modifica este
mesmo meio, podendo causar desequilíbrio.
Impactos ambientais, segundo Branco (1997), são uma espécie de trauma ecológico
que ocorre após uma ação ou obra humana em desarmonia com as características e o
equilíbrio do meio ambiente. Refere que, embora os ecossistemas tenham capacidade de auto-
regulação, ou seja, de responder positivamente, regenerando-se frente às variações naturais e
não perecendo, a interferência do homem pode provocar danos irreversíveis. Assim, diante da
interação existente na natureza, o basta proteger espécies em particular, mas é preciso
defender o ecossistema como um todo, que a extinção de uma daquelas, mesmo que pareça
insignificante, pode causar a destruição deste, diante do equilíbrio ecológico existente entre as
espécies.
A hipótese Gaia, mais uma vez, pode ser lembrada e reforçada, pois os impactos
ambientais negativos produzidos pelo homem podem causar sérias conseqüências ao Planeta,
diante da interação ecológica e do equilíbrio existente nos ecossistemas. A visão sistêmica e
complexa do meio ambiente, decorrente da atual concepção de natureza, na qual o homem vê-
se como integrante, parece ser dedutível também quando se aborda a questão dos impactos
ambientais e necessita ser difundida, a fim de fazê-lo cessar ou reduzir seus atos prejudiciais
ao meio ambiente.
A poluição pode ser considerada sinônimo de impacto ambiental, que de acordo
com a definição de Miranda (1995, p. 56-57) é “uma alteração ou modificação desfavorável
do meio natural, que aparece em parte ou em totalidade como sobproduto da atividade
humana”. Explica que os tipos de poluição podem ser sintetizados em três grupos, ou seja, a
poluição sica, a química e a biológica. O primeiro tipo, físico, trata-se da poluição térmica,
das radiações, dos ruídos, da atmosfera; a poluição química é causada por produtos naturais,
minerais ou orgânicos, substâncias de síntese antes inexistentes na natureza; e a última
categoria, biológica, refere-se a contaminações microbiológicas, introdução de espécies
exóticas, proliferação de determinadas espécies, dentre outras.
Seja qual for o tipo de poluição gerada, é evidente que causa sérios prejuízos ao meio
ambiente, tanto que juridicamente tal impacto foi classificado como dano ambiental. A
doutrina jurídica, como é o caso de Antunes (2002, p. 181), trata da matéria, definindo o dano
ambiental como sendo “a poluição que, ultrapassando os limites do desprezível, causa
alterações diversas no ambiente”. Leite (2000, p. 98) reforça que o dano ambiental:
25
[...] constitui uma expressão ambivalente, que designa, certas vezes,
alterações nocivas ao meio ambiente e outras, ainda, os efeitos que tal
alteração provoca na saúde das pessoas e em seus interesses. Dano ambiental
significa, em uma primeira acepção, uma alteração indesejável ao conjunto
de elementos chamados meio ambiente, como, por exemplo, a poluição
atmosférica; seria, assim, a lesão ao direito fundamental que todos têm de
gozar e aproveitar do meio ambiente apropriado. Contudo, em sua segunda
conceituação, dano ambiental engloba os efeitos que esta modificação gera
na saúde das pessoas e em seus interesses.
O dano ambiental, assim, não é juridicamente entendido unicamente como as
alterações causadas no meio ambiente, mas aquelas alterações impactantes à saúde humana,
quer diretamente, no caso de gerar prejuízos a alguém, quer indiretamente, por atingir o
direito subjetivo de todos ao equilíbrio ecológico. A dificuldade talvez resida na identificação
da nocividade do impacto, ou seja, difícil é localizar o marco inicial do dano, quando se
ultrapassa o limite do desprezível, vindo a provocar prejuízos.
Por isso, diante da necessidade de se identificar qual conduta gera um dano ambiental,
Montenegro (2005) aborda a necessidade uma norma legal que proíba certas atividades ou
proteja certos bens para se caracterizar tal dano. Tal norma é que estabelecerá, por exemplo,
os índices de tolerância e os padrões de alteração do ambiente para cada atividade,
configurando-se o dano ambiental quando forem ultrapassados os limites pré-fixados.
No Brasil, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente criou o Conselho Nacional do
Meio Ambiente (CONAMA), que é o órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional do
Meio Ambiente, responsável pela elaboração de normas e padrões compatíveis com o
equilíbrio ecológico. O CONAMA normatiza as atividades potencialmente poluidoras, através
de resoluções, impondo restrições e condições para o seu exercício, decorrentes do obrigatório
licenciamento ambiental a que estão submetidas.
Na visão de Lyra (1997), a partir do disposto no artigo 225 da Constituição Federal, é
possível que se perceba que a palavra-chave para a definição do dano ambiental é equilíbrio,
que a norma constitucional prevê o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, expressão esta que indica a extensão da proteção ambiental. Sob esta análise,
conclui que toda e qualquer atividade que cause alteração do ambiente, a ponto de afetar seu
equilíbrio ecológico, será considerada poluidora, e seu produto, dano ambiental. Da mesma
forma, não pode ser considerada danosa a atividade que, embora altere as condições
primitivas do ambiente natural, não atinja prejudicialmente e de forma significativa seu
equilíbrio.
26
A visão de Lyra (1997) não é oposta à de Leite (2000), antes exposta, mas são
complementares, que o primeiro condiciona a configuração de dano ambiental unicamente
à lesão ao equilíbrio ecológico, enquanto que este último defende que o dano ocorre quando a
atividade empreendida no meio é passível de impacto à saúde humana ou aos interesses
humanos na manutenção do equilíbrio do meio ambiente. No entanto, o que é comum a
ambos é que, efetivamente, a Constituição Federal tutela o direito subjetivo de todos ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado.
Importante que se esclareça, assim, a definição do bem ambiental protegido
juridicamente, a fim de que se mensure a abrangência da proteção legal, bem como a
caracterização do dano ambiental. A Constituição Federal prevê, em seu citado artigo 225,
caput, que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”. O texto constitucional dispõe sobre o
equilíbrio ambiental como pressuposto para o direito de todos à qualidade de vida, que é,
portanto, o bem jurídico tutelado.
Santilli (2007) segue o pensamento de Wolkmer (2003) quando salienta a existência
de novos direitos socioambientais, fruto de conquistas populares por meio de lutas
sociopolíticas democráticas, dentre os quais está o meio ambiente ecologicamente
equilibrado, que é um direito humano fundamental. Trata-se da ecologização das normas
legais, especialmente da Constituição Federal, conforme entendimento de Benjamin (2007), já
referido, quando diversos dispositivos constitucionais passaram a prever a proteção desta
nova categoria, geração ou dimensão de bens e direitos, ligados à qualidade do meio
ambiente.
O bem ambiental previsto constitucionalmente, para Piva (2000, p. 114), é “um valor
difuso, imaterial ou material, que sirva de objeto mediato a relações jurídicas de natureza
ambiental”. É difuso, porque sua titularidade é, indistintamente, de todos, da coletividade em
geral, ou, como explica, é direito metaindividual, sendo os titulares pessoas indeterminadas e
ligadas entre si por circunstâncias de fato. Não é, portanto, nem bem público, nem privado.
Pode ser material, quando se referir, por exemplo, a uma espécie vegetal protegida; ou
imaterial, quando se relacionar ao um direito, como é o caso do equilíbrio ecológico e da
qualidade de vida.
A concepção defendida por Piva (2000) define que bens ambientais não são
propriamente os recursos naturais, estes, bens materiais, mas o direito que todos têm a eles,
por serem necessários para o equilíbrio ecológico. Para a compreensão desta posição, mais
27
uma vez é necessário que se recorra a uma visão sistêmica. Da mesma forma como
atualmente se conceitua natureza como algo maior, que abrange o homem, ou igualmente
como a Teoria Gaia imprime a existência da teia da vida, para se compreender o bem
ambiental é preciso desvencilhar-se das antigas noções para aderir a esta nova. A Constituição
Federal protege o direito de todos à qualidade de vida, que somente se torna possível pelo
equilíbrio ambiental, e, inerente a isso, a conservação e preservação dos recursos naturais, por
exemplo.
Foi referido, no tópico anterior, que meio ambiente possui uma definição abrangente,
que se refere não somente aos recursos naturais, mas também aos demais elementos que
possibilitam e abarcam a vida humana, como o meio artificial, cultural e do trabalho. Diante
disso, o bem ambiental também pode ter seu conceito alargado pela noção de meio ambiente,
pois todos os elementos que cercam o homem e nos quais ele está inserido têm influência na
qualidade de vida. E, tratando-se a ecologia da ciência que estuda as relações dos seres vivos
entre si e com seu meio, parece possível se ampliar tal estudo também ao meio que não é
natural, mas que foi construído pelo homem, de forma que, quando a Constituição Federal
trata do necessário equilíbrio ecológico, também se refira à noção ampliada de meio ambiente,
incluindo o meio artificial, a cultura e o local de trabalho.
Abrangendo o bem ambiental não somente a natureza, mas os demais elementos que
permitem e abarcam a vida humana, o dano ambiental também atingirá tal amplitude. Este é o
pensamento de Mirra (2002, p. 89):
Dano ambiental pode ser definido como toda degradação do meio ambiente, incluindo
os aspectos naturais, culturais e artificiais que permitem e condicionam a vida, visto
como bem unitário imaterial coletivo e indivisível, e dos bens ambientais e seus
elementos corpóreos e incorpóreos específicos que o compõem, caracterizadora da
violação do direito difuso e fundamental de todos à sadia qualidade de vida em um
ambiente são e ecologicamente equilibrado.
O dano ambiental pode ser provocado em qualquer dos elementos que integram a
noção de meio ambiente, seja a natureza, seja o patrimônio cultural, seja o urbano, eis que a
tutela jurídica é do bem maior, unitário, imaterial, coletivo; ou seja, o direito difuso de todos à
qualidade de vida. Tudo isso decorre do fato de que o bem ambiental, como objeto de tutela
jurídica, possui características peculiares e especiais, inclusive a doutrina o classificando em
categoria de novos direitos, recentemente inserida no ordenamento jurídico pátrio. Ainda, por
tratar-se de direito essencial à sobrevivência humana, embora não seja o único, as lesões ou
danos a ele provocados também estão definidos doutrinária e legalmente.
28
De acordo com Souza Filho (1999), o dano ao meio ambiente existe não pela razão de
que gera algum prejuízo material ou patrimonial, mas porque viola a proteção do bem
ambiental. Cita o exemplo da derrubada de uma árvore, explicando que o dano reside não no
seu valor patrimonial para o proprietário, mas pela violação da norma de defesa da mesma.
Significa dizer que o prejuízo material, em si, não é determinante para a caracterização do
dano ambiental, mas a lesão que tal fato pode causar ao equilíbrio ecológico e à qualidade de
vida humana.
Embora a peculiaridade do dano ambiental de não implicar, necessariamente, em
prejuízo patrimonial a alguém, casos em que tal perda também está inserida nele,
configurado uma outra espécie do mesmo. Isto é possível em razão de que a doutrina pátria
considera a classificação dos danos ambientais de acordo com alguns critérios.
Cruz (1997) classifica os diferentes tipos de danos causados pela degradação do
ambiente em relação ao tipo de lesão que provocam, dividindo-os em três categorias: dano
patrimonial, dano não patrimonial e dano ecológico puro. Para ela, os danos patrimoniais e
não patrimoniais são aqueles que atingem diretamente à pessoa ou a um grupo de pessoas, por
isso, são danos pessoais, podendo, ou o, afetar o seu patrimônio hipótese, esta, em que
lesarão a honra subjetiva daquelas, configurando o dano moral ambiental. Já o dano ecológico
puro, é aquele em que a vítima não é um indivíduo, um grupo determinado ou uma
coletividade, mas aquele que atinge o ambiente como valor jurídico autônomo. A fim de
exemplificar, Cruz (1997, p. 7) escreve que:
A poluição de um rio pode causar danos na saúde dos banhistas desprevenidos, das
pessoas que bebam a água contaminada ou daquelas que consuma o peixe pescado
ou os produtos agrícolas cultivados nas suas margens; pode provocar danos
patrimoniais aos proprietários e aos agricultores ribeirinhos, aos pescadores cuja
subsistência dependa do rio inquinado ou aos operadores turísticos na região; como
causará igualmente danos ecológicos traduzidos na destruição da fauna e da flora do
rio, assim como na perda da qualidade da água, necessários ao normal equilíbrio
ecológico do ecossistema danificado.
Um mesmo dano ambiental, assim, pode causar prejuízos diferentes, de acordo com o
tipo de lesão que provoca. De outro lado, para configurar-se como tal dano, o é necessário
que estejam presentes as três categorias suscitadas por Cruz (1997), que, conforme Souza
Filho (1999) defende na posição antes mencionada, nem sempre é caracterizada uma lesão de
valor patrimonial.
Leite (2000) considera outros critérios para classificação do dano ambiental,
construindo quatro tipos de classificação diversos; no entanto, importa para a presente análise
29
uma das tipificações que leva em conta a amplitude do bem protegido, e que gera, como
espécies de danos, o ecológico puro (restrito), o dano ambiental (amplo) e o dano ambiental
individual ou reflexo (parcial).
O dano ecológico puro, para Leite (2000), tem definição mais restrita, e é aquele que
atinge os componentes naturais do ecossistema e não o patrimônio cultural ou artificial. o
dano ambiental, lato sensu, também relacionado com os interesses difusos da coletividade,
abrange todos os elementos do meio ambiente e não unicamente os naturais. Por fim,
denomina dano individual ambiental ou reflexo aquele que se refere aos interesses próprios do
lesado, não à tutela dos valores ambientais, por isso é parcial.
É possível, ainda, que ocorra, cumulativa ou alternativamente a qualquer tipo de dano
ambiental genericamente tratado
19
, o dano moral ambiental individual ou coletivo. O dano
moral ambiental, assim, pode corresponder ao dano individual, em que uma pessoa ou um
grupo certo poderão ser ressarcidos quando maculada sua honra subjetiva, como é o caso de
uma lesão grave à saúde, em que, além de despesas médicas, a qualidade de vida é afetada de
forma a interferir no dia-a-dia e nas condições psicológicas e sociais da vítima.
O dano moral ambiental também pode atingir a coletividade, ou seja, a sociedade
como um todo, e não unicamente um grupo certo e definido de pessoas. É o caso em que
ocorrem os chamados danos morais coletivos, e que visam ressarcir toda a sociedade por uma
lesão ambiental que comprometa o equilíbrio ecológico e a qualidade de vida das presentes e
futuras gerações. Tal possibilidade decorre do chamado direito privado coletivo, que é
explicado por Lorenzetti (2002, p. 140):
Em uma sociedade de massa, a atuação do indivíduo não é indiferente no que diz
respeito aos demais indivíduos e aos bens públicos. A consciência desta inter-relação
nos obriga a enfocar o problema do direito privado de outra maneira. necessidade
de superar a noção de “sujeito isolado” para chegar a uma idéia de “sujeito situado”.
Trata-se de relacionar o sujeito individual aos demais indivíduos e aos bens públicos,
analisando-o não isoladamente, mas inserido em seu grupo social. Lorenzetti (2002), assim,
defende a necessidade de uma tutela jurídica diferenciada, a qual, embora ainda não
sistematizada, existe e é decorrente do surgimento dos novos direitos coletivos e difusos.
Quanto ao dano moral ambiental coletivo, Steigleder (2004, p, 165) o relaciona ao
dano ecológico puro e afirma que
19
Neste contexto, o dano ambiental genericamente tratado pode ser tanto o dano ecológico puro, quanto o dano
ambiental, ou o dano ambiental individual, adotando-se a classificação de Leite (2000).
30
[...] deve-se perceber que este dano não consiste apenas e tão-somente na lesão ao
equilíbrio ecológico, afetando igualmente outros valores precípuos da coletividade a
ele ligados, tais como a qualidade de vida e a saúde, o sossego, o senso estético, os
valores culturais, históricos e paisagísticos. O próprio interesse difuso da sociedade
está sendo lesado, com o que se reconhece uma dimensão imaterial também ao dano
ecológico puro.
O aspecto subjetivo, portanto, está inerente ao dano ambiental, seja ele individual ou
coletivo. Valores humanos ligados à qualidade de vida e ao equilíbrio ecológico também
podem ser afetados e, portanto, ressarcidos. No entanto, para Lorenzetti (2002), “não se
reclama dinheiro como preço nem como reparação, mas como satisfação exigida do culpado,
a vindicta, a pena. O dano moral é uma sanção por algo imoral”. Assim, muito mais do que o
ressarcimento coletivo, o dano moral ambiental coletivo representa uma punição para o
poluidor.
O dano ambiental, sob qualquer de suas formas, deve ser reparado. A legislação
ambiental, em especial a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente prevê, no seu artigo 4°,
VI, que um dos objetivos desta política é a “imposição, ao poluidor e ao predador, da
obrigação de reparar e ou indenizar os danos causados”. Ainda, a Constituição Federal, no
artigo 225, § 3°, dispõe sobre a responsabilidade dos agentes por práticas lesivas ao meio
ambiente, sujeitando-os a sanções penais e administrativas, sem prejuízo da obrigação de
reparar os danos causados.
Segundo Ferreira (2004), a reparação do dano ambiental visa à recuperação,
reintegração ou substituição dos bens ambientais afetados e, além do caráter preventivo
inerente, também objetiva a supressão do dano, a fim de ficar restabelecido o estado de
equilíbrio dinâmico do sistema ecológico em momento posterior à reparação. Deste modo, a
reparação do dano ambiental deve, efetivamente, proporcionar a total recuperação do bem
lesado, o que, em casos de danos de grande monta que afetam todo um ecossistema, significa
restabelecer as capacidades do sistema se regenerar, regular e funcionar autonomamente.
Muitas vezes, o replantio de um certo número de árvores, ou a reposição de uma quantidade
de animais, por exemplo, não é suficiente para a reparação do dano, fazendo-se necessária a
adoção de medidas tendentes à efetiva reconstituição do ambiente lesado.
Para a reparação, que, juntamente com a prevenção do dano ambiental, é o fim
precípuo da legislação ambiental, aplica-se o instituto jurídico da responsabilidade. O
poluidor é o responsável pela reparação, e todos são responsáveis pela preservação do meio
ambiente.
31
Sampaio (1998) aborda o tema da responsabilidade definido-o como a solução que o
Direito oferece para os conflitos de interesses derivados do inadimplemento, ou
adimplemento defeituoso de uma obrigação. Seria o conjunto de sanções a que fica sujeito
quem descumpre uma obrigação. A obrigação em análise é a preservação ambiental, através
da não afetação negativa do equilíbrio ecológico, de forma que, havendo dano ambiental,
quem o causou será responsabilizado.
A responsabilidade pelo dano ambiental, no ordenamento jurídico brasileiro, ocorre
em três esferas distintas e independentes: a civil (que compreende a reparação do dano), a
penal e a administrativa
20
.
As funções clássicas da responsabilidade civil por danos ambientais, de acordo com
Benjamin (1998, p. 15), são a reparação do dano, “o estímulo à prevenção de danos futuros e
o envio de uma certa mensagem expiatória
21
. Ainda, introduz como novo fundamento para o
instituto o aspecto econômico do dano, que incorpora o preço da degradação nos custos do
poluidor, visando à operacionalização do princípio da precaução, pois, assim, “prevenir passa
a ser menos custoso que reparar” (1998, p. 17).
A reparação do dano ambiental é a finalidade primordial e principal da
responsabilidade, estando prevista no artigo 225, Parágrafo da Constituição Federal, além
de ser um dos objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, de acordo com o artigo 4º,
inciso VII da Lei 6.938, de 1981, o qual prescreve que tal política visará “à imposição, ao
poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados”. No
entanto, outras funções relacionadas com a prevenção de danos, o caráter sancionador e a
incorporação dos custos, conforme salientado por Benjamin, também estão presentes.
Como lembra Montenegro (2005), em matéria ambiental ocorrem situações em que o
dano não é certo e atual, mas se manifestará em tempo futuro, de forma que a
responsabilidade permite que sejam impostas obrigações de caráter inibitório, de fazer ou não
fazer. Assim, “não se requer [...] que o prejuízo esteja inteiramente realizado, bastando que se
tenha certeza de que se produzirá” (MONTENEGRO, 2005, p. 90).
A responsabilidade pelo dano ambiental, portanto, representa o conjunto de sanções
impostas àquele que descumpre a obrigação de preservação ambiental, visando à reparação do
ambiente lesado e à prevenção acerca da ocorrência de outros danos. As finalidades da
20
Na pesquisa será abordada unicamente a responsabilidade civil.
21
Grifo original do autor.
32
responsabilidade estão relacionadas com princípios do Direito Ambiental, especialmente do
poluidor-pagador, prevenção e precaução, que serão objeto de análise posterior.
Diante da gravidade dos danos ambientais e das conseqüências que podem acarretar,
afetando o equilíbrio ambiental essencial para a qualidade de vida de todos e, por isso,
constitucionalmente protegido, é latente a importância da responsabilização do agente
causador. Inclusive, remete-se para a noção de meio ambiente e natureza tratadas,
importando na sua compreensão sistêmica e integrativa com o homem, até mesmo porque os
danos ambientais muitas vezes não se restringem a um local, mas são trans-fronteiriços. A
poluição de um rio não afeta unicamente uma cidade, podendo se expandir para outros
domínios. Da mesma forma, não somente as presentes gerações podem ser lesadas, mas
também as futuras. É o caso da destruição de um bem cultural, que atinge mais as gerações
vindouras às atuais, que pode levar ao esquecimento ou perda de certo patrimônio
relacionado à cultura, jamais tal memória sendo recuperada. Por isso, urge uma visão de
responsabilidade universal, a exemplo da doutrinada por Dalai Lama (2000, p. 178):
Quando negligenciamos o bem-estar dos outros e ignoramos a dimensão universal de
nossos atos, fazemos uma distinção entre os nossos interesses e os interesses dos
outros. Não nos damos conta da uniformidade da família humana. [...]
A dimensão universal dos atos humanos é que precisa ser resgatada, a fim de que os
danos ambientais sejam evitados ao máximo e de forma consciente. Também para isso
contribui a responsabilidade, para a formulação da consciência ambiental, diante do caráter
educativo da sanção civil reparatória.
Steigleder (2004, p. 177) defende que “a responsabilidade civil pelo dano ambiental
possui uma função social que ultrapassa as finalidades punitiva, preventiva e reparatória,
normalmente atribuídas ao instituto”, pois serve à reparação do dano ambiental autônomo,
protegendo os ecossistemas. Trata-se da desvinculação da responsabilidade à única e restrita
utilidade humana, diante da importância que é conferida ao bem ambiental pela Constituição
Federal, ao não relacioná-lo unicamente com a qualidade de vida do homem, mas protegendo
o equilíbrio ecológico, precipuamente. A própria função de reparação assim o ilustra, pois
está voltada ao meio ambiente e não ao homem, que as medidas reparatórias serão
implementadas diretamente no bem afetado pelo dano: o bem ambiental. Eventuais danos
pessoais também podem ser objeto de responsabilização, quer de ordem moral, quer
patrimonial; no entanto, a reparação do ambiente lesado é a finalidade primeira.
33
A responsabilidade pelos danos ambientais é um dos aspectos principiológicos
relacionados à proteção do meio ambiente; no entanto, outros integram o ordenamento
jurídico pátrio, decorrentes da atual realidade de degradação e risco ambientais.
1.3 Os Riscos e os Princípios de Direito Ambiental
Os fundamentos para os princípios de Direito Ambiental podem ser relacionados à
teoria da sociedade de risco, defendida por Beck (2002). Distingue a primeira e a segunda
modernidade, sendo a primeira aquela decorrente da revolução industrial, baseada nos
estados-nação, em que as relações sociais se mantinham em um sentido territorial, e
caracterizada pelos pleitos coletivos, progresso e controlabilidade, pleno emprego e
exploração da natureza. a segunda modernidade, que não chega a ser uma pós-
modernidade, é aquela em que as características marcantes são a globalização, a
individualização, o subemprego e os riscos globais. Tais riscos, característicos desta segunda
etapa da modernidade, são essencialmente a crise ecológica e o colapso dos mercados
financeiros globais.
Para Beck (2002), a segunda modernidade é conseqüência do êxito da primeira, que
era simples, linear e industrial. Trata-se de uma evolução que não pôde ser detida, eis que
natural, embora imprevisível. Na atual modernidade, portanto, verificam-se a proliferação de
ameaças imprevisíveis, invisíveis, de forma que os sistemas de controle não estão preparados,
falhando freqüentemente e mostrando-se incapazes de prevê-las, de acordo com Leite e Ayala
(2004, p. 12):
[...] é uma característica tipicamente associada a um novo modelo de organização
social que se caracteriza por uma dinâmica de poder baseada nas relações
estabelecidas com o fenômeno da inovação, e que encontra suas origens em uma fase
do desenvolvimento da modernização, em que as transformações produzem
conseqüências que expõem as instituições de controle e proteção das sociedades
industriais à crítica, fato que constitui, para Beck, a sociedade de risco.
A segunda modernidade, de acordo com a visão transcrita, traz no seu bojo a evidência
da fragilidade das instituições de controle e proteção das sociedades industriais, uma vez que
não são capazes de prever os riscos que as inovações tecnológicas e científicas proporcionam.
A sociedade de risco, por esta teoria, demonstra a insegurança do conhecimento humano
34
diante das possibilidades que este próprio conhecimento pode gerar. As conseqüências dos
avanços científicos são imprevisíveis e descontroladas.
O risco, em linhas gerais e seguindo a construção teórica de Beck (2002), pode ser
compreendido como o conjunto das conseqüências futuras da ação humana, não desejadas,
fruto da modernização. Está relacionado com o processo de decisão tecno-econômica, pois em
períodos anteriores ao atual havia riscos, mas estes eram decorrentes de golpes do destino,
originados de fora e atribuídos a outros fatores que não o agir humano, como epidemias,
pragas e desastres naturais. Hoje, os riscos são decorrentes das novas tecnologias e do avanço
da ciência (BECK, 2002, p. 78).
Nesse aspecto, parece que a teoria de Beck (2002) apresenta uma contradição, pois
mesmo na primeira modernidade os riscos não eram previsíveis; ao contrário, não havia
nenhuma forma de se prevenir deles, até mesmo pelos poucos recursos tecnológicos e
científicos
22
. Atualmente, os riscos são frutos justamente dos avanços da ciência, e,
igualmente, muitas vezes não podem ser previstos. A diferença, portanto, não é propriamente
a previsibilidade dos riscos, mas sua origem, como referido, e sua quantidade, que talvez
sejam maiores.
Mesmo estando a sociedade de risco embasada no poder de decisão dos homens acerca
das conseqüências que certos atos podem gerar, a atual modernidade é caracterizada pelo
desconhecimento acerca de tais resultados; ou seja, o desconhecimento dos riscos
23
. Trata-se
de um paradoxo, pois o desenvolvimento da ciência depende da assunção dos riscos, e estes
somente poderão ser identificados através desse desenvolvimento. A evolução da ciência é
condição para a concretização, ou não, dos riscos e depende da decisão de assumi-los. Eis a
questão: não é possível conhecer os riscos, saber sua real extensão, mesmo assim é preciso
decidir acerca deles. Além disso, outro paradoxo é gerado, que, quanto mais a ciência
avança, mais riscos diversos surgem.
De Giorgi (1998, p. 191), ao tratar da insegurança e da indeterminação que atualmente
existem na sociedade, contribui para a compreensão do paradoxo que envolve o risco:
Se é verdade que estas indeterminações podiam ser evitadas, é mais verdade que a
estatística não nos diz nada, e que é possível evitá-las desde que esteja disposto a
tornar possíveis outras indeterminações que não se pode conhecer. O fato de se saber
que um reator nuclear pode explodir a cada milhão de anos, não exclui que isso possa
acontecer amanhã. Medidas ulteriores de segurança não são completamente capazes
22
Um terremoto violento capaz de devastar uma cidade, por exemplo, não podia ser previsto, pelos poucos
recursos tecnológicos e científicos, ao contrário do que acontece hoje.
23
Esta incerteza é denominada por Beck (2002) como incerteza fabricada.
35
de controlar as indeterminações que nascem em virtude da sua própria ativação e,
portanto, não dão qualquer segurança complementar: estas podem, somente, deslocar
o problema ou no tempo ou no espaço de produção destes eventos.
Algumas atividades econômicas, como o plantio e cultivo de plantas transgênicas, ou
modificadas geneticamente, bem exemplifica a paradoxal situação do risco, que muito
pouco se sabe acerca dos reflexos disso tanto ao meio ambiente quanto à saúde humana.
Desequilíbrio ecológico, empobrecimento do solo, desaparecimento de espécies vegetais e
animais ou mutações das mesmas, ou seja, danos ambientais são conseqüências cogitadas,
mas não certificadas cientificamente. Da mesma forma, não são comprovadamente
demonstrados, embora potenciais, os benefícios deste uso, como a redução no uso de
agrotóxicos e a melhora no rendimento e na produtividade. Assim mesmo, diariamente as
pessoas são obrigadas a decidir pelo cultivo ou consumo do produto.
Beck (2002) parece não oferecer soluções para a sociedade de risco, diante das
características de modernização reflexiva
24
e incerteza fabricada, embora a sociedade se auto-
critique e reconheça suas características. Por esta razão, De Giorgi (1998, p. 197) reflete que:
O risco não é uma condição existencial do homem, muito menos uma categoria
ontológica da sociedade moderna, e tampouco o resultado perverso do trabalho da
característica das decisões, uma modalidade da construção de estruturas através do
necessário tratamento das contingências. É uma modalidade da relação com o futuro:
é uma forma de determinação das indeterminações segundo a diferença de
probabilidade/ improbabilidade.
O risco é uma conseqüência da evolução da sociedade, sob o prisma temporal. É
resultado da relação entre o agir e o futuro, determinando o que certa conduta poderá gerar,
especialmente considerando-se o constante desenvolvimento da ciência. Ainda, é uma
modalidade de construção do futuro, pois considera as possibilidades de que alguma
conseqüência danosa se realize, não sendo meramente uma abordagem de contingências ou de
fatos atuais. Por esta razão é que o pensamento de De Giorgi (1998) contribui para a
compreensão acerca do desconhecimento dos riscos: estes não podem ser previstos, apenas
analisada a probabilidade de se concretizarem num dado momento.
A teoria de Beck (2002) não soluciona a questão porque se ocupa unicamente de
descrever e identificar a sociedade de risco. De Giorgi (1998) afirma que tal teoria não
fornece indicações de como se comportar ou decidir acerca das situações de risco, e, além
disso, trata-se de uma observação, mas que, no entanto, pode haver outras.
24
Modernização reflexiva refere-se à característica da sociedade de risco, segundo Beck (2002), de se auto-
criticar, percebendo-se como tal. A sociedade tem consciência da existência dos riscos, precisa decidir acerca
deles, mas não consegue identificar solução que os evite ou que reconheça seus reais reflexos.
36
Assim, embora as críticas possíveis à teoria da sociedade risco, defendida por Beck
(2002), a mesma se constitui de uma interessante observação da sociedade atual. Trata-se de
uma visão que diagnostica os riscos inerentes à realidade de crescente tecnologia e
desenvolvimento científico, conduzindo à reflexão sobre os meios necessários para gerenciá-
los; ou seja, justificando a finalidade dos princípios de Direito Ambiental como um
instrumento desta gestão.
Outro problema observado pela teoria da sociedade de risco é a irresponsabilidade
organizada. Como os riscos, na atual fase da modernidade, são generalizados, atingido
indiscriminadamente a sociedade, e, ainda, diante das falhas de segurança que caracterizam tal
realidade, surge a irresponsabilidade organizada. Para Leite e Ayala (2004), é a forma através
da qual as instituições organizam os mecanismos de explicação e justificação dos riscos, e é
por essa razão que escapam da percepção pública por meio do ocultamento social e
institucional de seus responsáveis.
Muitas vezes é difícil identificar os responsáveis pelo risco. O caso de um dano
ambiental decorrente de condutas repetidas e continuadas de um grande grupo de pessoas,
como a poluição de um rio através da agricultura familiar praticada por uma comunidade, por
exemplo, ilustra a situação. Torna-se difícil responsabilizar cada um dos agricultores, pois sua
conduta individual não seria suficiente para causar o dano ambiental; no entanto, somada ao
idêntico agir dos vizinhos, gera uma lesão de grandes proporções.
A irresponsabilidade organizada, que oculta a responsabilização, pode estar
relacionada às características de incerteza, indeterminação e desconhecimento acerca dos
riscos existentes na sociedade atual. Se não é possível identificar com clareza as
conseqüências de certas atividades e condutas, da mesma forma resta prejudicada a
responsabilização, quando os prejuízos se concretizam. Ou, ainda, não sendo certos os riscos,
é difícil que se responsabilizem os agentes causadores de danos incertos. Pode-se depreender
que a irresponsabilidade organizada abrange não somente os riscos, mas também os danos
decorrentes deles.
Nesse ponto, a teoria de Jonas (2006) pode ser associada, que defende a inserção da
responsabilidade na ética; ou seja, de uma ética da responsabilidade. Justifica sua posição no
fato de que atualmente a tecnologia é uma verdadeira ambição do homem, e não mais um
meio para a satisfação das suas necessidades. Tudo isso gerou um contexto de riscos e
perigos, especialmente diante da vulnerabilidade da natureza, o que conduz à reflexão do
caráter ético da responsabilidade.
37
A responsabilização pelos danos ambientais, além de visar a reparação da conduta
lesiva, pela repressão, também possui um caráter preventivo; que, através da sanção
inerente à mesma, induz à reflexão acerca do dano e do bem ambiental protegido. Deste
modo, o cenário de irresponsabilidade organizada, no qual está centrada a sociedade de risco,
interfere diretamente na proteção almejada pela legislação ambiental. Eventual incerteza ou
desconhecimento, característicos do atual momento social, não podem ser subterfúgios ao
rigor legal. Tanto é assim, que muitas das Constituições atuais, inclusive a brasileira,
abrangem a proteção desta nova categoria de direitos, os novos direitos socioambientais.
De acordo com Hermitte (2005), as Constituições mais recentes adaptaram-se à
sociedade de risco, limitando o princípio da liberdade de pesquisa à dignidade humana e ao
reconhecimento dos direitos do homem à saúde e ao meio ambiente. Há, assim, uma crescente
importância e necessidade de normas jurídicas limitadoras de algumas atividades ou condutas
arriscadas, embora De Giorgi (1998) entenda que o direito não é capaz de evitar o risco, mas
apenas retardá-lo, que calcado em hipóteses de probabilidade ou improbabilidade
vinculadas com o futuro.
A posição de Leite e Ayala (2004, p. 25) é clara no sentido da necessidade de um novo
modelo de organização estatal que abranja o aspecto ecológico:
A necessidade de superar a pretensão das instituições em não conhecer a realidade do
perigo, ocultar suas origens, negar sua existência, suas culpas e suas responsabilidades
na produção do perigo e pouco se importarem com seu controle e compensação, que
identificam o conceito de irresponsabilidade organizada, ganha grande destaque como
problema, perante a observação de que nas sociedades de risco produz-se profunda
modificação na própria consciência do perigo.
As normas de proteção ambiental devem estar adaptadas à realidade do risco, devendo
o Estado lidar com a crise instalada na esfera do meio ambiente levando em consideração essa
realidade. Os perigos não são mais localizados ou definidos territorialmente. O recente
contexto globalizado configura o desenvolvimento de uma sociedade mundial ou global do
risco, o que torna ainda mais relevante a atuação estatal em favor do meio ambiente, exigindo
uma postura mais marcante, positiva e ativa da Administração Pública.
O risco, especialmente considerando-se sua dimensão global, torna necessária a
adoção de práticas administrativas e políticas voltadas ao fortalecimento de meios
preventivos, de conscientização popular, de fomento da educação ambiental, mas também de
responsabilização e da prevalência de uma nova ética. Trata-se da construção de um novo
paradigma, designado por Singer (2002) como ética ambiental, a qual consideraria cada ação
prejudicial ao meio ambiente como duvidosa e errada eticamente, da mesma forma como o
38
consumo e a extravagância desnecessários. Essa ética ambiental que se quer construir lembra
dos interesses de todas as criaturas sencientes, inclusive as futuras gerações, de maneira que
“precisamos ter o cuidado de não infligir perdas igualmente irreparáveis às gerações que
vierem depois de nós” (SINGER, 2002, p. 288).
A ética ambiental implica na reformulação do pensamento humano sobre o meio
ambiente, conduzindo à adoção dos meios possíveis para a superação da crise ambiental,
agravada pelo contexto de risco que caracteriza a sociedade atual. Ética que pode ser
associada à da responsabilidade, teorizada por Jonas (2006), que ambos preocupam-se com
o futuro da humanidade. Para a concretização destes ideais, tanto relacionados à atuação do
Estado quanto dos próprios cidadãos, os princípios que fundamentam e instrumentalizam o
ordenamento jurídico ambiental, quer no âmbito legislativo, quer no jurisdicional ou no
teórico e doutrinário.
Princípios, de acordo com Ávila (2005) são uma das espécies de normas jurídicas de
ordem finalística, e não descritiva de uma conduta, como é o caso das regras. Os princípios
estabelecem um fim a ser atingido, que têm pretensão de complementar a aplicação das
regras, exigindo, para isso, uma avaliação “do estado de coisas a ser promovido e os efeitos
decorrentes da conduta havida como necessária à sua promoção” (ÁVILA, 2005, p. 70). Ou
seja, para a aplicabilidade de um princípio, deve ser avaliada a situação em questão e os
resultados que sua incidência pode gerar, a fim de constatar se é efetivamente aplicável ou
não. Trata-se de uma análise subjetiva da qual depende a opção por um ou outro princípio.
Ávila (2005), além de diferenciar princípio de regra, a qual se trata de norma
descritiva cuja aplicação depende da correspondência do seu conteúdo com uma situação
fática, também descreve a existência dos postulados normativos. Tais postulados podem se
assemelhar aos princípios; no entanto, a diferença substancial entre eles é, que enquanto estes
são normas imediatamente finalísticas, aqueles não estão ligados à persecução de um fim, mas
estruturam a aplicação deste dever (de promover um fim)
25
.
A diferenciação proposta por Ávila (2005) é importante para que se perceba que as
normas tratadas a seguir são verdadeiramente princípios, que não descrevem propriamente
condutas ou situações fáticas, tampouco estruturam a aplicação e a interpretação das normas;
contudo, contêm a finalidade tanto das regras em matéria ambiental, quanto do agir humano.
Aos princípios de Direito Ambiental correspondem regras constitucionais e
25
Ávila (2005) realiza uma abordagem mais aprofundada, inclusive referindo subdivisões entre as categorias de
normas, mas que, por pretender-se uma análise menos apurada, apenas ratificando a existência dos princípios de
Direito Ambiental, é dispensada.
39
infraconstitucionais, e, ainda, a eles podem ser aplicáveis os postulados normativos para que,
nos casos concretos, torne-se viável a opção por um ou outro.
Apesar dos princípios elaborados durante as Conferências Internacionais
26
, estes não
foram sistematizados, mas simplesmente descritos sob a forma de premissas. Ainda, a Lei da
Política Nacional do Meio Ambiente, Lei 6.938, de 1981, estabelece os princípios que regem
a preservação, a melhoria e a recuperação da qualidade ambiental na política de proteção que
a referida lei instituiu; e, ainda, os objetivos desta mesma política, os quais também oferecem
elementos principiológicos.
Antevendo-se que a abordagem não será exaustiva, pode-se considerar a existência de
grupos lógicos de princípios de Direito Ambiental. Tais grupos são justificáveis, pois os
princípios ambientais estão interligados e são decorrentes reciprocamente, mas possuem,
basicamente, três caráteres finalísticos: o desenvolvimento sustentável, a prevenção e a
precaução de danos ambientais, e a responsabilização por tais danos. Estes caráteres é que
fundamentam e diferem cada um dos agrupamentos.
Leite (2000) trata dos princípios estruturantes do Direito Ambiental, como sendo
aqueles que integram o núcleo essencial deste ramo jurídico, e assim classifica os princípios
da precaução e da atuação preventiva, da cooperação, e da responsabilização. Semelhante é a
classificação adiante proposta.
1.3.1 Princípio do Desenvolvimento Sustentável
O desenvolvimento sustentável foi um conceito descrito pela primeira vez no
Relatório Brundtland
27
, que se trata de um documento elaborado entre os anos de 1983 a
1987, pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, e que originou a
publicação da obra intitulada Nosso Futuro Comum. Neste documento, desenvolvimento
26
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente realizada em Estocolmo, em 1972, foi a primeira
conferência mundial sobre o tema. Em 1992, no Rio de Janeiro, foi realizada a Conferência das Nações Unidas
sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD Rio 92), também conhecida como Conferência da
Cúpula da Terra. Em ambos os encontros internacionais, foram elaboradas Declarações contendo as conclusões
debatidas para a crise ambiental e traçando princípios que deveriam nortear a atuação política governamental.
Estas Declarações embasarão a exposição dos princípios, adiante, pela abrangência que possuem.
27
O relatório recebeu este nome, pois a Comissão foi presidida pela primeira-ministra da Noruega, Gro Harlem
Brundtland. Constituída por representantes de vinte e um países, a Comissão relatou os problemas ambientais
existentes no mundo à época e formulou sugestões para o futuro.
40
sustentável foi traduzido como um mecanismo que permite uma relação harmoniosa em
matéria ambiental, aliada aos progressos social e econômico.
No contexto de degradação ambiental debatido a partir das Conferências
Internacionais, como a de Estocolmo e do Rio de Janeiro (Rio 92), traçaram-se linhas de ação
vinculadas à construção de um novo modelo de desenvolvimento econômico. Este modelo
visa adequar a preservação ambiental à necessidade e impossibilidade de estagnação da
economia. Durante a Rio 92, foi oficializada a Agenda 21, que se constitui de um plano de
ação, uma verdadeira cartilha básica do desenvolvimento sustentável, com objetivo de
preparar o mundo para os desafios do século XXI. Resultante da busca por harmonização
entre crescimento econômico, proteção ambiental e justiça social, a Agenda 21 traz em seu
bojo uma série de programas e ações a serem postas em prática na tentativa de concretização
de um novo modelo de desenvolvimento. Tal aspecto prático é que a difere dos demais
documentos até então elaborados em Conferências Internacionais.
Mirra (1996, p. 58-59) defende que a adoção de práticas coerentes ao princípio do
desenvolvimento sustentável exige a conciliação entre valores igualmente relevantes, como:
[...] o exercício das atividades produtivas e do direito de propriedade; o crescimento
econômico; a exploração dos recursos naturais; a garantia do pleno emprego; a
preservação e a restauração dos ecossistemas e dos processos ecológicos essenciais; a
utilização racional dos recursos ambientais; o controle das atividades potencialmente
poluidoras e a preservação da diversidade e da integridade do patrimônio genético dos
países.
Por isso é que o desenvolvimento sustentável é um princípio basilar, que se constitui
de um grupo principiológico que abrange outros aspectos, por muitos autores considerados
princípios apartados. A relevância da proteção ambiental (dada a atual concepção de natureza
e da proteção constitucional conferida à cultura, ao meio ambiente do trabalho, ao meio
ambiente urbano) induz à consideração de tal proteção como um bem de interesse público
indisponível.
Ainda, consectário do princípio do desenvolvimento sustentável e à indisponibilidade
do bem ambiental, a supremacia do interesse público, a obrigatoriedade da intervenção
estatal, a proteção da biodiversidade e a cooperação internacional. Todos estes elementos são
tratados como princípios isolados por Mirra (1996) e Gomes (1999); no entanto, a decorrência
destes aspectos ao desenvolvimento sustentável torna-o um norteador principiológico.
O bem ambiental, nos termos previstos pela Constituição Federal e conforme
definido, é o direito de todos ao meio ambiente equilibrado, e deve ser preservado para as
41
presentes e futuras gerações. Este é o fundamento tanto para a indisponibilidade do bem
ambiental, quanto para sua supremacia perante direitos individuais. A proteção do meio
ambiente não é uma opção, mas uma imposição constitucional, que se sobrepõe a qualquer
direito individual, inclusive a propriedade, a qual deve ser exercida em consonância a estes
preceitos. Ao Estado, igualmente, não é permitido ser omisso no seu dever de intervenção,
devendo adotar políticas de preservação e recuperação ambiental, e fiscalizando a atuação dos
particulares frente às normas por ele impostas.
A obrigatoriedade da intervenção estatal refere-se tanto ao aspecto preventivo quanto
no repressivo, que a função do Estado não é unicamente punir ou fazer cessar o dano
ambiental. As políticas públicas devem estar orientadas para a promoção da educação
ambiental, visando à construção de uma ecocidadania, que para a implementação e
viabilidade do desenvolvimento sustentável, a participação popular é essencial.
O Princípio 14 da Declaração de Estocolmo aborda o planejamento, que “constitui um
instrumento indispensável para conciliar as diferenças que possam surgir entre as exigências
do desenvolvimento e a necessidade de proteger e melhorar o meio ambiente”. E o Princípio 3
da Declaração do Rio de Janeiro prevê que “para alcançar o desenvolvimento sustentável, a
proteção ambiental deve constituir parte integrante do processo de desenvolvimento, e não
pode ser considerada isoladamente deste”. As Conferências Internacionais concluíram,
portanto, pela necessidade de um novo modelo de crescimento e desenvolvimento econômico,
no qual a proteção ambiental esteja incluída, como um dos elementos do planejamento.
Também para a viabilidade do desenvolvimento sustentável, a cooperação
internacional é um elemento de extrema importância, que os danos ambientais são trans-
fronteiriços, não gerando efeitos apenas localizados. Além disso, as Conferências
Internacionais reconheceram a necessidade de que os países mais desenvolvidos cooperem
com os menos desenvolvidos, auxiliando para o crescimento econômico, redução da pobreza
e melhora da qualidade de vida, que todos estes aspectos também integram a noção
contemporânea de meio ambiente.
As Declarações de Estocolmo e do Rio de Janeiro tornam perceptíveis os objetivos do
desenvolvimento sustentável, no sentido de promover uma justa parceria global em favor do
meio ambiente e do melhoramento da qualidade de vida das pessoas. Ainda, pode ser
classificado como o princípio fundamental do Direito Ambiental, por agregar elementos
comuns aos demais, concernentes à necessidade de adoção de um novo modelo de
42
crescimento e desenvolvimento, que priorize a qualidade de vida e a preservação ambiental,
especialmente no atual contexto de risco social.
Para que o desenvolvimento sustentável se concretize como ideal social, econômico e
ambiental, é necessário que todos os setores sociais, desde a economia privada até as políticas
públicas, primem e pratiquem esse planejamento. No entanto, não sendo uma atitude ou um
resultado natural dessas atividades, são necessários outros princípios que dêem suporte ao
modelo sustentável, e que visem à prevenção e à precaução da ocorrência de danos
ambientais.
1.3.2 Princípios da Prevenção e da Precaução
Anteriormente à elaboração da Declaração do Rio de Janeiro, durante a Rio 92, havia
certa dificuldade na distinção entre os princípios da prevenção e da precaução, sendo que
eram considerados como sinônimos. No entanto, durante a Conferência, foi compilada a
seguinte premissa:
Princípio 15 - De modo a proteger o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser
amplamente observado pelos Estados, de acordo com suas capacidades. Quando
houver ameaça de danos sérios ou irreversíveis, a ausência de absoluta certeza
científica não deve ser utilizada como razão para postergar medidas eficazes e
economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental.
Assim, restou pacificada a existência de distinções entre os dois princípios, de forma
que a precaução é caracterizada pela conduta que deve ser praticada quando não houver
conclusão científica se a atividade irá causar danos ambientais sérios ou irreversíveis. Ou seja,
mesmo não havendo comprovação de que certo ato causará prejuízo considerável ao meio
ambiente, mas estando presente este receio, tal incerteza não deve impulsionar sua prática, ao
contrário, deve obstaculizá-la.
Sampaio (2003) assevera que a precaução é o meio de gerenciamento de riscos que
estão presentes na realidade atual. Considerando-se a incerteza fabricada, fruto das novas
tecnologias e dos avanços da ciência, que marca o contexto atual, a precaução surge como um
instrumento para impedir o agravamento da crise ambiental.
A avaliação dos riscos, hoje, restringe-se à análise sobre a probabilidade de que estes
concretizem efeitos negativos, razão pela qual, de acordo com Hermitte (2005), o princípio da
43
precaução inspira uma decisão racional que equilibre as incertezas e controvérsias.
Atualmente, exige-se uma “avaliação científica dos riscos que antecede toda e qualquer
decisão política”, de forma que tal prática exigirá uma visão pautada na razoabilidade e na
prudência (HERMITTE, 2005, p. 27).
Prevenção difere de precaução, na medida em que representa que a atitude que
sabidamente causar dano ambiental não deve ser praticada. Neste caso, conhecem-se os
resultados da prática, bem como sua extensão, buscando-se evitar que se concretize a
degradação ao meio ambiente.
Na Declaração de Estocolmo, em diversas assertivas está presente o princípio da
prevenção, desde orientações para se “preservar e administrar judiciosamente o patrimônio
representado pela flora e fauna silvestres”
28
, até sugestões de apoio à “justa luta de todos os
povos contra a poluição”
29
. Transparecendo esta Declaração que seu objetivo maior seria
estabelecer metas para a manutenção da qualidade de vida do homem, a prevenção evidencia-
se como o maior e melhor instrumento para isso.
Sampaio (2003, p. 71) diferencia prevenção e precaução, afirmando que a primeira é
aplicável a impactos cujos resultados são conhecidos, e, portanto, durante o processo de
licenciamento ambiental das atividades potencialmente poluidoras é que ocorre a definição
dos parâmetros para sua prática, sendo este princípio que os orientará. Já nas decisões sobre a
execução de um ato para o qual há incerteza sobre possíveis resultados danosos, a precaução é
o princípio do qual se deverá lançar mão.
Assim, embora no capítulo seguinte se pretenda melhor explicitar sobre precaução e
prevenção, é importante frisar que ambos são princípios igualmente básicos do Direito
Ambiental, sem os quais nem o princípio do desenvolvimento sustentável se justifica. Para
que se concretizem é necessário, acima de tudo, a conscientização popular, para uma
participação ativa e efetiva na proteção do meio ambiente.
Prevenção e precaução, portanto, podem ser considerados um grupo lógico de
princípios, pois, embora sejam conceitos diversos, estão interligados e conjugados entre si, em
vistas a um fim comum: evitar a ocorrência de danos ambientais. Ainda, abrangem elementos
28
Princípio 4.
29
Princípio 6.
44
como a obrigatoriedade de estudo prévio de impacto ambiental, educação e informação
ambiental, e participação popular, por muitos considerados princípios apartados.
30
1.3.3 Princípios do Poluidor-pagador e do Usuário-pagador
Além do desenvolvimento sustentável como finalidade básica do Direito Ambiental,
nos planos teórico ou prático, e prevenção e precaução como fundamentos para isso, também
a responsabilidade pelos danos ambientais representa um importante instrumento na defesa do
meio ambiente. Ainda, foi abordada a finalidade da responsabilidade ante os danos
ambientais, que consiste não unicamente em reparar e restaurar o equilíbrio ecológico e
ambiental afetado, mas também possui caráter expiatório, visando, acima de tudo, a
prevenção dos danos.
A responsabilidade é um instrumento de concretização da proteção ambiental, na
medida em que através dela se oportuniza a reparação de danos causados, além da repressão
nela inserida, que incentiva condutas cautelosas em relação ao meio ambiente, especialmente
em razão de que algumas configuram crimes e infrações administrativas, passíveis de sanções.
Jonas (2006) defende que a prudência é imperativo da responsabilidade, levando-se em conta
a inexistência de projeções seguras sobre a realidade e sobre certas atividades. Assim, a
responsabilidade está relacionada diretamente com a preservação da ocorrência de danos
ambientais, pois o agir responsável pressupõe o agir prudente, especialmente perante os riscos
característicos da sociedade atual.
A Lei da Política Nacional do Meio Ambiente fixou a base legal para os princípios do
poluidor-pagador e do usuário-pagador no seu artigo 4º, que estabelece os objetivos dessa
política, com a imposição “ao poluidor e ao predador, da obrigação de recuperar e/ou
indenizar os danos causados e, ao usuário, da contribuição pela utilização de recursos
ambientais com fins econômicos”. Tal dispositivo foi recepcionado pela Constituição Federal
de 1988, que o parágrafo do artigo 225 dispõe sobre as condutas e atividades danosas ao
meio ambiente, prevendo que estas “sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a
sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos
30
Esta é a posição de Mirra (1996) e Gomes (1999), sendo que o primeiro classifica diversamente o princípio da
participação popular na proteção do meio ambiente; e, o segundo, o da educação ambiental. Ambos consideram a
obrigatoriedade de intervenção estatal princípio isolado, além de não diferenciarem prevenção e precaução.
45
causados”. Também no Princípio 16 da Declaração do Rio está exposto o dever do poluidor
de “arcar com o custo decorrente da poluição”.
Os dispositivos legais e da Declaração do Rio que fundamentam os princípios do
poluidor-pagador e do usuário-pagador (especialmente o primeiro), estão diretamente
relacionados com a responsabilidade pelos danos ambientais. No pensamento de Benjamin
(1993, p. 228), tal princípio impõe ao poluidor “o dever de arcar com as despesas de
prevenção, reparação e repressão da poluição”. Ou seja, monetariza a poluição, mas não com
a finalidade de instituir uma espécie de autorização ou compensação, mediante pagamento,
para praticá-la. Lyra (1997, p. 61) defende o pensamento de que tanto o poluidor quanto o
usuário, devem arcar com “os custos de prevenção, de reparação e de repressão do dano
ambiental, assim como aqueles outros relacionados com a própria utilização dos recursos
ambientais”, demonstrando que o objetivo dos princípios sob análise não é o de condicionar a
poluição ao seu pagamento, mas responsabilizar o agente que utiliza ou degrada os recursos
naturais.
A grande finalidade dos princípios sob análise é onerar as atividades poluidoras ou as
que utilizam recursos naturais para fins econômicos, visando que os custos disso não sejam
suportados pela sociedade ou pelo Estado, mas pelo próprio poluidor ou pelo usuário que
obtém lucros mediante a utilização do meio ambiente. Ainda, o caráter educativo inserido
nestes preceitos é evidente, pois através do ônus que instituem, contribuem para a mudança de
postura do homem, visando promover a utilização racional e consciente dos recursos naturais.
Tanto o princípio do poluidor-pagador, quanto o do usuário-pagador, possuem
características semelhantes, que ambos visam prevenir (e precaver) a ocorrência de danos
ambientais, incidindo, portanto, antes da sua ocorrência. No entanto, diante da vinculação
com a responsabilidade, o poluidor-pagador tem aplicação também após a concretização do
dano, objetivando sua reparação. Trata-se de um contraponto, ou uma medida contrária, à
irresponsabilidade organizada, que, através de instrumentos como o licenciamento
ambiental e o estudo de impacto ambiental, é possível que se identifique o poluidor e, assim,
torne possível a responsabilização deste pelos danos ambientais que vier a causar, caso não
observe as normas preventivas cabíveis.
Ainda, a relação existente entre os princípios de Direito Ambiental fica evidente
também na abordagem sob análise, de forma que um decorre e se justifica no outro. Poluidor-
pagador e usuário-pagador visam, precipuamente, a prevenção e precaução de danos
ambientais, e, através da responsabilização (que pressupõe reparação e repressão), objetivam
46
a manutenção do equilíbrio ecológico, que é corolário do desenvolvimento sustentável. Por
isso, justifica-se a construção de grupos lógicos de princípios, definidos de acordo com o
caráter básico de cada elemento: sustentabilidade, prevenção (e precaução) e
responsabilidade.
A atual concepção de natureza, que insere o homem como seu integrante e não mais
proprietário, introduz a visão ecocêntrica em substituição à antropocêntrica do meio
ambiente
31
. Os grupos lógicos de princípios, como fonte de Direito, exercem um importante
papel nas políticas públicas que visam evitar a ocorrência de danos ambientais. A partir disso,
a pesquisa dedicar-se-á ao estudo da prevenção e da precaução, que podem concretizar-se
através da participação popular, gerada com base em uma educação ambiental, e como isso
pode influenciar a atuação do Estado, especialmente para evitar a sua responsabilização e por
danos causados pela omissão deste.
31
A visão ecocêntrica é a que considera o Planeta e os seus recursos naturais como o centro, o aspecto principal
da concepção de meio ambiente, do qual o homem é apenas um integrante. a antropocêntrica têm caráter
utilitarista, tratando o meio ambiente como bem apropriável e disponível ao homem. A posição de Capra (2003,
p. 20), abordando a classificação de Arne Naess sobre ecologia rasa e profunda, também esclarece: “A ecologia
rasa é antropocêntrica. Considera que o homem, como fonte de todo valor, está acima ou fora da natureza e
atribui a esta um valor apenas instrumental ou utilitário. A ecologia profunda não separa o homem do ambiente;
na verdade, não separa nada do ambiente. [...] A ecologia profunda reconhece o valor intrínseco de todos os
seres vivos e encara o homem como apenas um dos filamentos da teia da vida”.
47
2 PRUDÊNCIA E EDUCAÇÃO AMBIENTAL
O atual contexto social de risco tecnológico e científico interfere na vida humana,
relativizando as conclusões científicas sobre a existência de danos ambientais, sua extensão e
a possibilidade de reparação. Por isso, a aplicação conjunta dos princípios da prevenção e da
precaução torna-se importante, e a phronesis aristotélica pode ser uma forma de justificação e
explicação da abordagem proposta. A educação, por fim, representa um instrumento do agir
prudente em relação ao meio ambiente.
2.1 A Prudência como Princípio de Direito Ambiental
Sustenta-se a existência de grupos lógicos, em razão de que os princípios ambientais
estão interligados e são decorrentes reciprocamente. Tais agrupamentos são definidos em
razão dos caráteres finalísticos presentes em cada princípio: o desenvolvimento sustentável, a
prevenção e a precaução de danos ambientais, e a responsabilização por tais danos.
A prevenção e a precaução possuem um objetivo comum, que é evitar a ocorrência de
danos ambientais, quer quando são conhecidos os resultados prejudiciais da atividade em
relação ao meio ambiente, quer quando não demonstração científica disso, mas apenas o
risco que aconteçam. De acordo com Sampaio (2003, p. 70), “a prevenção é a forma de
antecipar-se aos processos de degradação ambiental”, visando evitá-la, que se sabe que os
danos ambientais são de difícil, e muitas vezes impossível, reparação.
A ciência oferece um conhecimento válido sobre qualquer assunto; no entanto, não é
absoluto, pois pode, a qualquer momento, ser substituído por pesquisas mais avançadas,
recentes ou diferentes. Mesmo condutas para as quais haja demonstração científica de que não
geram danos ambientais, no futuro pode ser que se conclua em sentido contrário: que
provocam, sim, efeitos danosos ao meio ambiente. Isso se deve ao fato de que a ciência está
em constante evolução, e é uma característica da sociedade de risco.
48
Bombassaro (1994) trata da investigação científica e da evolução da ciência a partir do
pensamento de autores como Fleck, Popper e Kuhn, referindo que sempre que um
paradigma
32
científico é substituído por outro, tem-se um avanço. Explica, com base na teoria
de Kuhn, que realizações científicas passadas orientam a ciência normal, e que o
aperfeiçoamento do paradigma, no que denomina operações de limpeza, é que fortalece a ele
próprio e à ciência normal, que nem sempre oferece respostas a todos os problemas que lhe
são postos. Nessa dinâmica de testes, por assim se entender o processo de aplicação de um
paradigma, é que novos paradigmas surgem, substituindo anteriores.
Os constantes avanços científicos e a utilização de diferentes métodos tornam
possíveis questionamentos a conclusões embasadas cientificamente, quando novos
paradigmas surgem, em substituição a outros. No atual contexto de crescentes avanços
científicos e tecnológicos, novas realizações ocorrem com maior freqüência, gerando certa
insegurança ao sistema jurídico, que deve ser capaz de gerir tais situações.
Para Sampaio (2003, p. 72), “a complexidade dos ecossistemas sempre introduz algum
grau de incerteza, inclusive sobre danos supostamente conhecidos e previsíveis”. A incerteza,
para ele, decorre de fatores biológicos e estruturais do ecossistema, o qual, pela mesma
característica que proporciona sua recuperação, também gera dúvidas sobre a extensão ou
resultados de alguma conduta humana. Dificilmente a ciência desvendará integralmente o
funcionamento dos ecossistemas, diante da grande complexidade que os caracterizam, por
serem compostos de uma infinidade de espécies vegetais, animais e minerais. O pensamento
de Mirra (2001) é semelhante, pois defende que “são muitas ainda as incertezas científicas nas
questões relacionadas à proteção do meio ambiente, sobretudo no tocante ao funcionamento
dos sistemas naturais”.
Diante das incertezas que pairam até mesmo sobre as conclusões científicas, estreita-se
a relação entre os princípios da prevenção e da precaução; pois, inclusive os casos em que
inicialmente uma afirmação fundamentada cientificamente de que certa conduta não gera
um dano, poderão ser objeto de dúvidas, considerando-se os constantes avanços e mudanças
tecnológicas e científicas, além do surgimento de novos paradigmas. Precaução, assim, passa
a representar uma medida preventiva extensiva a todos os casos, e não mais somente aos que
não há conclusões científicas quanto aos seus resultados danosos, já que a prevenção é restrita
a situações em que há esta definição.
32
Sobre paradigmas, consultar: KUHN, Thomas S.. A estrutura das revoluções científicas. 9.ed. rev. São Paulo:
Perspectiva, 2003. Nesta concepção, paradigma refere-se a realizações e conclusões científicas passadas.
49
Wolfrum (2004) refere o texto da Convenção para Proteção do Ambiente Marítimo do
Nordeste Atlântico
33
, o qual demonstra que a aplicação do princípio da precaução será
implementada através de medidas preventivas tendentes a proteger o mar, sempre que alguma
atividade puder ser considerada perigosa à saúde humana, aos recursos vivos e aos
ecossistemas marinhos. Salienta que, de acordo com o disposto nesta Convenção,
semelhança entre os princípios da precaução e da prevenção, embora substancialmente
tenham diferenças. O fundamento, ou o caráter finalístico, de ambos os princípios é que é
semelhante, uma vez que ambos tendem a controlar o exercício de atividades prejudiciais ao
meio ambiente, evitando a concretização de danos ambientais.
Diferenças entre os princípios da prevenção e precaução existem, e estão relacionadas
à forma como um e outro são aplicados, que, como referido, a finalidade deles pode ser
idêntica. Leite e Ayala (2004, p. 73) definem que a incidência da prevenção pressupõe a
existência de elementos seguros que demonstrem “ser a atividade efetivamente perigosa, de
modo que não se pode mais pretender, nesta fase, a prevenção contra um perigo que deixou de
ser simplesmente potencial, mas real e atual”. A aplicação da prevenção, está relacionada à
existência de elementos seguros de que o dano ambiental ocorrerá, caso praticada a atividade.
A prevenção dispõe de medidas administrativas que a instrumentalizam, como é o
caso do licenciamento ambiental, que permitirá a execução de atividades potencialmente
poluidoras somente mediante certas condições que preservem o meio ambiente. Caso fique
comprovada a impossibilidade da mitigação ou inocorrência de danos ambientais, o Poder
Público tem o poder de não autorizar a atividade. Alves (2005) refere que o princípio da
prevenção se concretiza pela imposição de medidas administrativas impeditivas à
concretização do dano, já que são conhecidos os efeitos lesivos da atividade.
O princípio da precaução, por sua vez, tem condições de aplicação diversas. Heck
(2003, p. 117) diz que “a ação de precaução é a forma mais estrita da política ambiental da
prevenção”, pois quando não conclusão científica que assegure que certa atividade causará
dano, mas apenas a potencialidade disso, assim mesmo, deve ser evitada. Descreve a
existência de três condições de incidência do princípio: ausência de certeza absoluta
33
Assim dispõe: "As partes contratantes aplicarão: (a) o princípio da precaução, em virtude de quais medidas
preventivas devem ser tomadas quando bases razoáveis para considerar que substâncias ou energias
introduzidas, direta ou indiretamente, no ambiente marinho possam trazer perigos à saúde humana, prejudicar os
recursos vivos e ecossistemas marinhos, causar danos ou interferir em outros usos legítimos do mar, mesmo
quando não haja prova conclusiva de relação causal entre os insumos e os efeitos". (WOLFRUM, 2004, p. 16-
17)
50
científica
34
, a decisão deve ser fundamentada em avaliação científica rigorosa e as medidas
implementadas precisam ser proporcionais à gravidade do risco.
Não é em qualquer situação que a precaução é cabível, mas apenas naquelas em que,
embora não haja conclusão científica que demonstre, claramente, que certa atividade gera
dano ambiental, o receio fundado em fortes e concretas suspeitas. Ainda, a gravidade do
risco deve ser tal que impulsione a proibição da prática da atividade, evitando-se a
banalização.
Aplica-se, portanto, precaução, quando risco de que alguma atividade possa causar
danos graves ao meio ambiente, mas não existem conclusões científicas certas sobre isso.
Quanto mais acentuado é o risco e a gravidade das conseqüências que pode gerar, igualmente
proporcionais devem ser as medidas a evitar que se concretizem. E, não é qualquer suspeita de
dano, devendo esta estar embasada em uma avaliação científica séria, sob pena de se obstar
qualquer atividade, inadvertidamente.
Cortina (2004), ao tratar dos reflexos da biotecnologia no Direito, matéria em que o
princípio da precaução é muito discutido e aplicado, diante do desconhecimento que cerca o
tema, e, ainda, pelas influências que pode ter na vida humana, não se opõe às inovações
tecnológicas. Ao contrário, debate que a finalidade da precaução é incentivar propostas com
modos alternativos de desenvolvimento, que sejam compatíveis com a qualidade de vida das
presentes e futuras gerações. Afirma que devem ser observadas as condições de aplicação do
princípio, evitando-se que seja empregado abusivamente.
Assim, Cortina (2004) relaciona seis condições para que a precaução possa ser posta
em prática. A duas primeiras, a configuração de uma incerteza acerca do risco e que esta
incerteza esteja avaliada cientificamente. É necessária a existência de um risco potencial, e
não atual, como nos casos de aplicação da prevenção, e que este risco seja resultado de uma
demonstração científica, não meramente fruto da opinião pública. Deve haver, também,
perspectivas de que a atividade em análise possa causar um dano grave ou irreversível, quer a
curto ou a longo prazo, como efeito de uma cadeia de prejuízos menores. Há, ainda, a
exigência de proporcionalidade na aplicação do princípio da precaução, de forma que, embora
o objetivo primordial seja a proteção à saúde pública e ao meio ambiente, tal proteção não
34
Quando se aborda a questão da falta de certeza absoluta científica, pode-se lembrar do estudo de Bombassaro
(1994), antes citado, o qual defende que conclusões científicas, embora válidas, o são absolutas, podendo ser
modificadas constantemente diante do seu caráter evolutivo. O sentido empregado por Heck (2003), no entanto,
é que o princípio da precaução é aplicado quando não uma conclusão científica conhecida ou suficiente para
comprovar os resultados danosos da atividade.
51
deve tornar-se econômica e socialmente inviável, devendo-se optar sempre pela alternativa
que represente o menor custo econômico e social. E, as últimas condições para a utilização do
princípio, segundo Cortina (2004), são a transparência das medidas e a inversão do ônus da
prova. Significa que os critérios e procedimentos adotados pelo Poder Público devem ser
conhecidos pelos interessados e pela comunidade em geral, além de incumbir àquele que
pretende introduzir o produto ou desenvolver a atividade o dever de demonstrar os elementos
contrários à presunção do risco.
Em conseqüência à aplicabilidade da precaução, Wolfrum (2004, p. 20) defende a
necessidade de intensificação das atividades de pesquisa, a fim de possibilitar a revisão de
decisões impeditivas da prática de alguma atividade, e explica:
Se uma atividade foi proibida ou restrita com base no princípio da precaução, a
incerteza sob a qual esta decisão foi tomada deve ser reanalisada em intervalos
regulares. As novas descobertas, assim como os novos desenvolvimentos, devem ser
levados em consideração.
A aplicação do princípio da precaução, na visão exposta, pressupõe a obrigação de
utilização da melhor tecnologia disponível, pois somente isso possibilita que não ocorram
decisões equivocadas, bem como a constante atualização dessas decisões, de acordo com mais
recentes conclusões científicas. A importância disto é demonstrada até mesmo em razão de
que a precaução não deve representar um simples obstáculo ao exercício de alguma atividade,
mas um instrumento de adequação ao desenvolvimento sustentável, proteção da saúde
humana e do meio ambiente ecologicamente equilibrado, juntamente com o princípio da
prevenção.
Ao analisar tratados ambientais, Sands (2004, p. 33) diz que vários deles adotaram o
princípio da precaução ou suas orientações. Este é o caso da Convenção de Bamako de 1991,
no artigo 4, 3, f
35
, que sugere a adoção e execução do “preventivo enfoque da precaução para
a poluição”, visando que os países signatários cooperassem na prevenção da poluição, através
do princípio da precaução. Assim, fica claro o elo criado entre os enfoques de precaução e
prevenção.
Com base na análise de Sands (2004), é possível perceber as relações existentes entre
os princípios da prevenção e da precaução, quer implicitamente, pelo caráter finalístico
35
Na transcrição de Sands (2004, p. 33), o art. 4, 3, f, da Convenção de Bamako dispõe sobre a concordância dos
países signatários em adotar: “[...] o preventivo enfoque da precaução para poluição, que inclui inter alia impedir
a liberação, no meio ambiente, de substâncias que possam causar dano aos seres humanos ou ao meio ambiente,
sem esperar provas científicas a respeito de tal dano. As partes devem cooperar umas com as outras ao tomarem
medidas apropriadas para implementar o princípio da precaução a fim de prevenir a poluição, por meio da
aplicação de métodos de produção limpos”.
52
idêntico entre eles; quer de forma explícita, pela amplitude concedida à prevenção, de se
tornar aplicável também em casos em que não conclusão científica capaz de demonstrar
claramente eventuais resultados danosos. Tal abordagem tornaria possível interpretá-los e
aplicá-los conjuntamente; ou seja, como um grupo lógico de princípios.
Ainda, dúvidas podem estar presentes na aplicação jurisdicional do Direito Ambiental.
Quando situações reais são submetidas à apreciação judicial, o julgador poderá se deparar
com uma indecisão, que cada um dos litigantes apresentará sua versão, embasada em fortes
argumentos e até conclusões científicas. Nestes casos, embora haja fundamento
cientificamente demonstrado nos dois sentidos, pela existência e pela inexistência de dano
ambiental, incumbirá ao juiz decidir por um ou outro, e, portanto, poderá fazer uso do
princípio da precaução.
A precaução, assim, não se aplica somente em situações de incerteza, mas também
quando a autoridade que decidirá estiver diante de uma dúvida, como refere Sampaio (2003).
Inclusive, em esferas administrativas, quando são proferidas decisões no âmbito do
licenciamento ambiental, por exemplo, podem surgir dúvidas quando à existência, ou não do
risco de danos ambientais. Em tais casos, embora teoricamente o princípio aplicável seria o da
prevenção, diante das dúvidas, também a precaução pode ser utilizada, o que ilustra, mais
uma vez, a possibilidade de utilização e interpretação conjunta de ambos os princípios.
A concepção de prevenção e precaução como um grupo lógico de princípios, justifica-
se pela necessidade de uma maior intervenção jurídica na proteção do meio ambiente, surgida
principalmente em decorrência da configuração dos riscos. As incertezas presentes nas
conclusões científicas e na aplicação prática do Direito Ambiental, em relação ao meio
ambiente natural ou como resultado dos avanços constantes da tecnologia e da ciência, forçam
uma aplicação integrada e agrupada dos dois princípios. Talvez se possa ousar a afirmar que,
diante do contexto de incerteza e dúvida ou de certeza temporária atualmente debatido, a
utilização isolada da prevenção torna-se inviável.
Em sentido contrário, autores como Alves (2005) esforçam-se em diferenciar as
concepções, inclusive de conceitos como prudência e cautela, tratando cada um deles
diversamente. Para embasar suas distinções, detém-se no argumento de que as convenções
internacionais aprofundam os significados de prevenção e precaução, utilizando somente estes
dois termos, razão pela qual não admite a idéia que poderiam decorrer de um princípio único
de prudência, ou de cautela. No entanto, a partir da noção de phronesis, tratada por
53
Aristóteles, pretende-se expor a possibilidade da aplicação integrada dos princípios da
prevenção e da precaução.
O termo phronesis é de origem grega e, de acordo com Hermann (2007), não possui
uma tradução que expresse, de forma satisfatória, o significado que possuía na antiguidade; no
entanto, Aristóteles o empregava como sendo uma sabedoria prática, pois se refere à ação
humana em casos particulares, e esta o pode ser pensada com base na ciência teórica.
Abbagnano (2003, p. 863), em seu Dicionário de Filosofia, descreve que Aristóteles foi quem
distinguiu a sabedoria em dois tipos, a sabedoria teórica, sophia, e a sabedoria prática,
prudentia
36
, que “preside à ação virtuosa”.
A sabedoria prática, que é a que interessa à pesquisa, é o conceito aristotélico de
phronesis, prudentia ou prudência, estando ligado ao agir humano vinculado à virtude e não
ao conhecimento científico. Em Ética a Nicômaco, Aristóteles (2007, II, 6, 1107 a, p. 49),
define virtude como
[...] uma disposição de caráter relacionada com a escolha de ações e paixões, e
consistente numa mediania, isto é, a mediania relativa a nós, que é determinada por
um princípio racional próprio do homem dotado de sabedoria prática.
É através da virtude que o homem faz suas escolhas de como agir em busca do bem e
da felicidade, através de um meio-termo, ou mediania, entre dois vícios: um de excesso e
outro de carência. A virtude situa-se entre dois extremos, e é considerado virtuoso o homem
que é capaz de agir observando o caminho entre estes dois opostos. Por isso o filósofo grego
diz que “a natureza da virtude é visar à mediania nas paixões e nos atos” (ARISTÓTELES,
2007, II, 9, 20, p. 54), e aconselha que o meio-termo é digno de louvor, mas, que, para atingi-
lo, o homem precisa optar ora por um, ora por outro extremo, já que somente assim aprenderá
a atingir a virtude.
A virtude é fruto da sabedoria prática, no sentido de que esta sabedoria é que orienta
as escolhas certas e virtuosas que o homem precisa tomar. Tal sabedoria não é fruto do
intelecto prático, mas, de acordo com Aristóteles (2007, VI, 5, 5, p. 132), “uma capacidade
verdadeira e raciocinada de agir no tocante às coisas que são boas ou más para o homem”.
Seria uma característica inerente ao homem que o leva a tomar as decisões e definir as
escolhas buscando o caminho mediano. Tal capacidade, nos portadores dessa sabedoria
prática, não é unicamente em relação a escolhas de aspecto particular, mas com os bens
humanos, ou o bem geral.
36
Prudentia é a tradução latina pra phronesis, segundo Comte-Sponville (2004).
54
O homem virtuoso tem a facilidade de escolher e agir de acordo com o meio-termo,
em benefício não unicamente próprio, mas da sociedade. Por isso, a sabedoria prática como
virtude não pode ser ciência, mas uma característica interior do ser humano, e que diferencia
alguns homens, tanto que Aristóteles (2007, VI, 5, 10, p. 132) diz que os “dotados de tal
capacidade são bons administradores de suas casas e cidades
37
”, que, “podem ver o que é
bom para si mesmos e para os homens em geral”.
Aristóteles (2007, VI, 7, 25, p. 134) considera que não somente o homem, mas
também alguns animais podem possuir sabedoria prática, que está ligada não somente a
escolhas raciocinadas, mas também à ação. Por isso, animais que têm um certo poder de
previsão no que se refere a sua vida, e que os leva a decidir pelo meio-termo correto, também
podem ter a virtude. A possibilidade de compreender e prever resultados de uma ou outra
escolha de ação a ser tomada é que caracteriza a sabedoria prática, e neste aspecto é que
reside a identidade do termo com a prudência, considerada contemporaneamente como
“qualidade de quem age com moderação, comedimento, buscando evitar tudo o que acredita
ser fonte de erro ou de dano” (FERREIRA, 1986, p. 1014).
Escolher a forma de ação que evite o erro ou dano é a característica do homem
prudente, dotado de sabedoria prática, ou de phronesis. Assim, para Aristóteles (2007, VI, 13,
1145a-5, p. 144), a sabedoria prática é uma disposição que leva ao caminho do bem e das
boas escolhas, por isso, aquele que a possui, possuirá também todas as virtudes, uma vez que:
[...] a escolha não será acertada sem a sabedoria prática, como também não o seria
sem a virtude, pois uma (a sabedoria prática) determina o fim e a outra (a virtude) nos
leva a praticar as ações que conduzem ao fim.
Tendo em vista que a sabedoria prática conduz para o bem, baseado na escolha
mediana entre dois vícios e que beneficia não somente o homem individualmente, mas
também a sua coletividade, certo é que ela facilita o aparecimento de todas as outras virtudes,
pois estas também são um meio-termo entre outros extremos. O fim, que é o bem social, é o
objetivo da sabedoria prática, e através da virtude é possível atingi-lo, já que é o instrumento
para isso. Por esta razão é que pode ser considerada a principal das virtudes, a mais
importante para Aristóteles, segundo Andorno (2004, p. 17), e que defende, ainda, que “O
homem prudente é aquele que sabe enfrentar a realidade contingente e que, tendo perante si
distintas alternativas, sabe escolher a melhor, obtendo desta maneira o melhor bem possível”
38
.
37
Por isso, seria a característica dos políticos, segundo Aristóteles (2007, VI, 5, 10).
38
Tradução livre.
55
Hobuss (2007) trata da mediedade e da prudência aristotélica contrapondo Gauthier e
Barnes, que criticam o filósofo grego. Defende a doutrina da mediania não simplesmente
como um juízo analítico do meio, mas como a razão prática que induz a agir considerando o
momento determinado, correto. É a prudência que auxilia e define o meio, levando em conta o
momento oportuno para isso.
A mediedade e a prudência, para Hobuss (2007), são uma universalização
(generalização) e, portanto, não possuem conteúdo objetivo, adquirindo-o somente pelo
acesso às circunstâncias. Significa que as generalidades se limitam ao que acontece a maioria
das vezes e, ilustrando com as leis, regras ou normas, que também são genéricas, afirma que
“Por elas mesmas, podem ser opacas, mas podem também adquirir transparência no momento
em que o determinadas pelas circunstâncias, concretizadas pelo juízo particular, em
situação, do prudente” (HOBUSS, 2007, p. 56).
A prudência é que identifica as características e o momento oportuno para a aplicação
de uma regra jurídica, por exemplo. É a virtude a responsável por localizar as peculiaridades
que se adaptam às generalidades: a aplicação da norma ao caso concreto, como princípios da
prevenção e da precaução, que são regras genéricas e abstratas.
A noção atual de prudência, assim, representa a adaptação da phronesis e da sabedoria
prática aristotélica à sociedade contemporânea, em que a incerteza está presente a todo o
momento, especialmente nas questões ambientais. Por isso, o agir prudente é aquele que,
considerando as circunstâncias e o momento que se apresenta, é capaz de analisar as
peculiaridades fáticas e optar pela aplicação, ou não, dos princípios da prevenção e precaução.
É capaz de reconhecer a mediania, a melhor solução para o problema que se apresenta.
Nenhum ato humano em benefício do meio ambiente será efetivamente benéfico se
não estiver amparado na prudência, que é, de acordo com Comte-Sponville (2004, p. 41),
insubstituível, que orienta as decisões em caso de incerteza, de risco, de acaso e do
desconhecido, sendo que a phronesis vai além de simplesmente evitar os perigos, pois
determina:
[...] o que é necessário escolher e o que é necessário evitar. Ora, o perigo pertence, na
maioria dos casos, a esta última categoria; daí a prudência, no sentido moderno do
termo (a prudência como precaução). Todavia, riscos que é necessário correr,
perigos que é preciso enfrentar; daí a prudência, no sentido antigo (a prudência como
“virtude do risco e da decisão”).
O pensamento de Comte-Sponville (2004) elucida a noção grega e a recente sobre
phronesis, já que atualmente tem sua aplicabilidade voltada ao que se deve evitar,
56
especialmente tratando-se de questões ambientais, em que o dano deve ser extinto ou
minimizado ao máximo. No entanto, o próprio autor reconhece que uma concepção não
pretende extinguir a outra, que estão bastante relacionadas, apenas adequadas a momentos
históricos e sociais diversos.
A prudência não é capaz de afastar o risco ou o perigo, apenas orienta para que a
melhor decisão seja tomada, nessas situações. Essa é a virtude do homem prudente, dotado de
sabedoria prática, e que deve ser a preconizada pelo Direito Ambiental, diante da importância
que o meio ambiente possui na própria sobrevivência da espécie humana, e, considerando a
atual concepção de natureza, que define o planeta um grande sistema, do qual tudo e todos são
integrantes e responsáveis pelo equilíbrio. Reconhecer o papel de cada cidadão na
manutenção desse equilíbrio ambiental é uma forma de prática da phronesis.
Pardo (2004) reflete a responsabilidade do homem pelos riscos existentes na sociedade
atual, pois não se vive mais em uma realidade repleta de riscos naturais, como as pragas e as
pestes, mas de riscos gerados pelas tecnologias criadas pelo homem. Por isso, descreve que
hoje os perigos o resultados das decisões humanas, e ressalta que o Direito é chamado a
definir e orientar essas mesmas decisões. O Direito tem o desafio de decidir perante a
incerteza, e a prudência representa um critério importante neste processo.
As normas relativas ao risco presente na sociedade atual e a aplicação prática dessas
normas devem observar a prudência, como virtude orientada para a escolha mediana que
busca evitar o erro e o dano. No contexto de crise ambiental e de risco, que dificulta a
definição dos danos e as conclusões científicas sobre eles, não é fácil identificar claramente
uma atividade ou conduta prejudicial ao meio ambiente. Cada vez mais as autoridades
administrativas competentes e o próprio judiciário defrontam-se com situações de impasse,
nas quais a identificação do dano ambiental é difícil, por isso a necessidade de utilização do
conceito aristotélico de phronesis.
O Direito Ambiental deve conduzir ao meio-termo necessário, que é a proteção e
preservação do meio ambiente. Pelas características atuais da sociedade, fundadas no risco, a
prudência deve orientar a atuação do Estado e também dos particulares. A prudência
ambiental, hoje, não se resume à prevenção ou à precaução, mas em uma conjugação de
ambas, diante da complementaridade de uma em relação à outra.
O conceito aristotélico de phronesis justifica a adoção de uma concepção de grupo
lógico de princípios com a junção de prevenção e precaução, pois o caráter finalístico de
57
ambos os elementos é evitar a ocorrência do dano. A finalidade dos princípios em análise é
justamente o meio-termo, o caminho mediano para a superação da crise ambiental e defesa do
meio ambiente para as presentes e futuras gerações.
Importante que se ressalte que a proteção do bem ambiental visa priorizar a
preservação da qualidade de vida, a qual, para Derani (2001, p. 172), é o limite para a
aplicação do princípio da precaução: “o critério geral para a realização de determinada
atividade seria a sua ‘necessidade’ sob o ponto de vista de melhora e não prejudicialidade da
qualidade de vida”. Trata-se de imperativo constitucional, de forma que as justificativas e
objetivos de qualquer empreendimento devem observá-la.
A prudência ambiental, assim concebida como a aplicação conjunta dos princípios da
prevenção e da precaução, está fundamentada na necessidade de instrumentalização do
desenvolvimento sustentável, que o dano ambiental deve ser evitado ou mitigado ao
máximo, mas sem obstaculizar-se o desenvolvimento social e econômico. Por isso, por vezes
o princípio da prevenção, isolado, o dará conta disso, que as conclusões científicas nem
sempre oferecerão todas as respostas aos problemas que se apresentam, e em vistas à
sustentabilidade. Prudência nas decisões administrativas e judiciais no âmbito do meio
ambiente pressupõe análise complexa do caso concreto, de forma a melhor atender aos
anseios e necessidades da população, mas sem afetar o equilíbrio ecológico.
Sobre a análise do caso concreto, essencial para a mediania da prudência, Hobuss
(2007) lembra que a experiência é importante aliada, pois não é possível deliberar e conhecer
todos os particulares ou os detalhes, para isso seria necessário ir até o infinito das
possibilidades. No entanto, afirma que a prudência tem relação com os particulares, pois a
percepção que a integra, a qual pressupõe a experiência, assim o permite.
Compreende-se que princípios como a prevenção e, principalmente, precaução são
genéricos e, portanto, podem gerar falhas
39
na sua aplicação, como qualquer outra norma
jurídica. Para a correta incidência, necessária a análise prudente do caso concreto, das
particularidades às quais os princípios melhor se adequam. A experiência e a percepção
virtuosa contribuem positiva e de forma determinante para isso.
Assim, pode-se refletir sobre a forma com que a prudência é posta em prática, visando
ao desenvolvimento sustentável; ou seja, como pode ser concretizada sem falhas e sem
representar um obstáculo ao crescimento econômico e científico. A resposta para a questão
39
As falhas poderiam se consideradas injustiças, decorrentes da aplicação incorreta da norma ao caso concreto.
58
pode estar na ecocidadania, construída através de bases educacionais sólidas, visando a
geração de cidadãos efetivamente participativos e cumpridores do seu dever constitucional de
proteção ambiental.
2.2 Educação: instrumento da prudência ambiental
Havendo a necessidade de concretização do princípio da prudência, que consiste na
aplicação conjunta e integrada das concepções de prevenção e de precaução, insere-se a
educação como suporte para isso. A educação, assim, constrói a consciência ambiental que
embasa o agir prudente em relação ao meio ambiente, pois contribui positivamente para o
processo de construção das idéias e formas de pensar e agir do homem, na medida em que
pode suscitar reflexões.
Dias (2001) traça um histórico sobre a educação ambiental a nível mundial, referindo
que principalmente após a Revolução Industrial é que surgem as primeiras manifestações de
preocupação com o meio ambiente natural. No entanto, somente com catástrofes ambientais
40
que ilustraram a inadequação do estilo de vida do ser humano é que discussões tornaram-se
mais freqüentes. Lembra que, em 1962, Rachel Carson lançou o livro Primavera Silenciosa,
que gerou uma inquietação internacional, sendo considerado um clássico na história do
movimento ambientalista. O termo educação ambiental surgiu em 1965, durante a
Conferência em Educação na Universidade Keele, na Grã-Bretanha, quando foi aceito que ela
seria essencial na educação de todos os cidadãos, e correspondia a ecologia aplicada. Outros
eventos internacionais sobre o tema ocorreram, como o Encontro Internacional sobre
Educação Ambiental, em Belgrado, Iugoslávia (1975); a Conferência Intergovernamental
sobre Educação Ambiental, em Tbilisi, Geórgia (1977); e a Rio-92 (1992), quando foi
elaborado o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e
Responsabilidade Global. Nestes eventos, foram traçadas as premissas básicas em educação
ambiental
41
.
A educação ambiental enfoca a reflexão em torno do meio ambiente, e seu objetivo,
segundo Leonardi (2002) está relacionado à conservação da biodiversidade, através de
40
Dias (2001) refere o fato ocorrido em 1952 em Londres, quando o ar densamente poluído causou a morte de
1.600 pessoas. A partir de então, desencadearam-se discussões em outros países.
41
Histórico completo, inclusive em relação às medidas relativas à educação ambiental implementadas no Brasil,
é feito por Dias (2001).
59
processos que incentivem a melhoria ambiental e da qualidade de vida. Rodrigues (2004, p.
407) insere, como função desta educação, o conhecimento integral dos problemas
relacionados ao meio ambiente, visando não unicamente sua reprodução ou divulgação, mas
objetivando a “formação de uma consciência e de uma ética ambiental”.
Dias (2001), com base em conclusões da Conferência de Tbilisi, sintetiza que a
finalidade da educação ambiental é incentivar o entendimento e a importância da relação entre
os aspectos econômicos, políticos, sociais e ecológicos da sociedade, além de oportunizar o
conhecimento sobre a proteção do meio ambiente. Também, salienta que a educação induz a
novas formas de agir, individual e coletivamente, para a solução dos problemas ambientais e
melhora da qualidade de vida.
A educação, muito mais do que uma fonte de informação sobre os danos ambientais e
sua gravidade, ou sobre a necessidade e importância da manutenção do equilíbrio ecológico,
representa um instrumento de prudência, proporcionando uma visão complexa dos mais
diversos aspectos da sociedade, possibilitando a compreensão integrada dos vetores sociais.
Desenvolvimento sustentável significa não a opção radical pela proteção do meio ambiente,
impedindo toda e qualquer prática capaz, ou potencialmente capaz, de causar dano.
Representa adotar a opção que represente a melhor alternativa de preservação da qualidade
ambiental, o caminho do meio, a mediania virtuosa, conforme o pensamento aristotélico,
inclusive criando novas formas de agir, em consonância à defesa do meio ambiente. A
abordagem de prudência, sob o prisma de phronesis, induz justamente à escolha que melhor
traduza as necessidades de manutenção da qualidade de vida e da preservação ambiental.
O papel da educação, neste contexto, é oferecer o conhecimento capaz de induzir à
reflexão sobre de que forma o homem pode chegar à sabedoria prática, à prudência ambiental.
Desconhecendo a importância da preservação ambiental, ou, em contrapartida, não estando
apto a reconhecer a necessidade de não obstar o crescimento econômico, social e científico,
igualmente necessário para sua própria qualidade de vida, dificilmente a prudência ambiental,
na concepção aristotélica de virtude mediana, será alcançada.
Por isso é que a educação, muito mais do que apenas informar, possibilita a formação
de uma nova ética de proteção do meio ambiente. Trata-se da ética ambiental, defendida por
Singer (2002), e referida no capítulo anterior, que considera erradas eticamente todas as ações
prejudiciais meio ambiente. No mesmo sentido, Castells (1999, p.159) traça a necessidade do
surgimento de uma nova identidade, ao tratar do papel dos movimentos ambientalistas, que a
inspiram, a qual consiste em “uma identidade biológica, uma cultura de espécie humana como
60
componente da natureza”. É um pensamento que reforça a concepção complexa de natureza,
baseada também na Teoria Gaia, e que é fundamental para a superação da crise ambiental e
concretização do desenvolvimento sustentável, pois proporciona a inserção de novos valores
socioambientais na matriz econômica.
Assim, tanto a ética ambiental de Singer (2002), quanto a nova identidade de Castells
(1999), implicam na reformulação do pensamento humano sobre o meio ambiente, através da
educação, que assumiria a função de incentivar e promover a reflexão sobre essa
problemática, oferecendo soluções ambientalmente corretas, visando não obstruir o
crescimento econômico, social e científico. Por isso é que a ética ambiental e a nova
identidade devem apenas subsidiar uma concepção de desenvolvimento econômico diferente,
mas que não represente radicalismos a favor da preservação do meio ambiente.
Lima (2005) lembra que a educação pode possuir duas polaridades distintas: uma
conservadora da ordem social, através da reprodução de valores, ideologias e interesses
dominantes; e outra, emancipatória, promovendo a renovação cultural, política e ética da
sociedade. De acordo com Lima (2005, p. 120), “o processo educativo não é neutro e
objetivo, destituído de valores, interesses e ideologias”, mas, ao contrário, trata-se de
construção subjetiva, composta por “escolhas valorativas e de vontades políticas, dotada de
uma especial singularidade, que reside em sua capacidade reprodutiva dentro da sociedade”,
ou, como sintetiza, a educação significa uma “construção social estratégica”.
A educação, portanto, possibilita que se implementem políticas públicas tendentes à
manutenção de um pensamento, conservando-se idéias e estruturas dominantes, ou medidas
que visem grandes transformações, inserindo novas e renovadoras concepções. Políticas
voltadas à proteção ambiental poderão alcançar maior êxito, desde que amparadas por forte
incentivo de uma educação que dissemine valores relativos à defesa do meio ambiente, à ética
ambiental. A construção do pensamento social pode ser direcionada, de forma estratégica,
para a concretização do desenvolvimento sustentável, por exemplo, por meio da inclusão do
problema ambiental e dos seus custos na gestão administrativa das empresas. A educação
pode conter essa nova ideologia estratégica de prudência ambiental, basta que se escolha esta
opção valorativa.
A doutrina define a existência de tipos de educação, de acordo com a forma com que é
praticada e, com base nisso, Leonardi (2002) a classifica em: formal, não-formal e informal.
A educação formal é aquela executada na atividade escolar, possuindo conteúdos,
metodologia e meios de avaliação. A educação não-formal é praticada em diversos espaços da
61
vida social, exceto o universo escolar, sendo menos estruturada que a formal. Por fim, a
educação informal é semelhante à não-formal; no entanto, sua estruturação é ainda menor, não
possuindo compromisso com a continuidade, tampouco havendo definição acerca da sua
forma de ação, metodologia, etc. A diferença entre as duas últimas é de tal maneira tênue, que
muitos sequer as consideram categorias isoladas, mas uma só espécie.
42
A educação formal é praticada através de todos pedagógicos, inseridos nas
disciplinas ministradas no âmbito escolar, em qualquer nível, seja no ensino fundamental,
médio e até no superior. Já a educação não-formal e a informal, se caracterizam por
procedimentos que visam atingir a população que não freqüenta o ensino regular, e pode ser
concretizada por meio de campanhas publicitárias ou através de outros meios midiáticos que
divulguem informações educativas. O que diferencia estas duas últimas é o compromisso com
a continuidade e uma certa organização, sendo que a educação não-formal possui objetivos e
estratégias traçados, podendo ser considerada mais estruturada. No entanto, preocupando-se
ambas as espécies de educação com a formação da consciência ambiental, não é importante,
para análise proposta, a defesa ou a adoção de uma ou outra categoria, embora pareça
evidente que a formal e a não-formal, por apresentarem maior organização e estrutura, possam
alcançar melhores resultados.
A educação formal, a informal e a não-formal proporcionam a construção da
prudência ambiental, uma vez que não é somente no ambiente escolar que novos valores ou
ideais são lançados à reflexão. Através da mídia, hoje se verifica que uma série de
informações é transmitida, mesmo que de forma subliminar, e que pode suscitar uma
renovação cultural, política e ética na sociedade. O papel dos meios de comunicação também
pode ser ressaltado na formação da opinião e da conduta da sociedade. Nalini (2003) defende
que a educação ambiental não pode ser resumir à educação formal, pois é preciso que todas as
pessoas sejam consideradas seres educandos, e que um projeto mais abrangente de educação
continuada seja implementado, o qual se dirija a toda e qualquer pessoa, seja ou não
freqüentadora do ambiente escolar. Por isso, a mera inclusão de uma nova disciplina nas
escolas não é suficiente, devendo atingir a totalidade da sociedade, já que a prudência é dever
de todos, pelo comando constitucional do artigo 225.
Fala-se em gestão democrática, que é característica presente na essência do Direito
Ambiental, pois somente com a participação popular na defesa do meio ambiente se
42
A pesquisa não pretende aprofundar o debate sobre a classificação da educação ambiental, que a abordagem
proposta abrange ambas as espécies. Análise mais detalhada sobre a educação, inclusive aspectos históricos e
fundamentos filosóficos, sugere-se: ROSA, Vladimir d. A Punibilidade às infrações ao Meio Ambiente e seus
benefícios à Educação Ambiental. Porto alegre: Imprensa Livre, 2006..
62
alcançarão os objetivos de prudência, previstos pelas normas desta espécie. Exemplo disso é o
Estatuto da Cidade (Lei 10.257, de 10 de Julho de 2001), que regulamenta os artigos 182 e
183 da Constituição Federal e estabelece a necessidade do planejamento da cidade pautado,
dentre outros meios, na gestão participativa, em que a população tem relevante papel na
ordenação e no planejamento urbano. Inclusive, a participação popular, nestes casos, através
de debates, audiências e consultas públicas, é condição obrigatória para aprovação de algumas
normas.
Embora, na prática, alguns instrumentos de gestão democrática apenas tenham caráter
consultivo e sirvam para legitimar os atos do Poder Público, que, dificilmente, a população
poderá deliberar decisivamente sobre algum aspecto, não se pode olvidar que oferecem um
importante espaço para manifestação e participação popular. Se bem utilizados podem, sim,
ser utilizados como meios de pressão em favor do meio ambiente e da qualidade de vida, por
parte dos cidadãos.
A gestão democrática da cidade ilustra a importância da participação popular nos
processos decisórios e de planejamento ambiental, através dos quais é possível que se pratique
a prudência ambiental. Para a qualificação desta participação popular, a educação é
fundamental.
Existe, no Brasil, a Lei 9.795, de 27 de Abril de 1999 estabeleceu a Política Nacional
de Educação Ambiental, a qual prevê, em seu artigo 2º, que deve ser “um componente
permanente da educação nacional”, em todos os níveis de ensino, quer seja ele formal ou não-
formal
43
. A lei determina como deve ser praticada a educação tanto no âmbito escolar (público
e privado), quanto em demais práticas voltadas à coletividade em geral. Dispõe, ainda, no
artigo 3º, sobre o direito de todos a esta educação, frisando, no inciso VI, que incumbe à
sociedade “manter atenção permanente à formação de valores, atitudes e habilidades que
propiciem a atuação individual e coletiva voltada para a prevenção, a identificação e a solução
de problemas ambientais”. Além do dever do Poder Público, das instituições educativas, dos
órgãos do Sistema Nacional de Meio Ambiente, dos meios de comunicação, das empresas,
entidades de classe e das instituições públicas, também à sociedade como um todo é imposta a
obrigação de participar qualificadamente em benefício do meio ambiente. Tal dispositivo se
coaduna com a gestão democrática característica do Direito Ambiental.
43
A Lei em referência nada refere quanto à educação informal, tratando-a conjuntamente com a educação não-
formal, tanto que assim é definido no artigo 13: "Entendem-se por educação ambiental não-formal as ações e
práticas educativas voltadas à sensibilização da coletividade sobre as questões ambientais e à sua organização e
participação na defesa da qualidade do meio ambiente".
63
Há, ainda, meios jurisdicionais disponíveis ao cidadão, através dos quais é possível a
prática da prudência ambiental, como é o caso da Ação Popular, Ação Civil Pública, Mandado
de Segurança, entre outros. Sempre que verificar a ocorrência de um dano ambiental, a
população possui instrumentos a sua disposição, e instituições, como o Ministério Público e a
Brigada Militar, pela Patrulha Ambiental, que estão aptas a tomar as medidas pertinentes.
Neste aspecto, se ressalta a importância da participação ativa de todos os cidadãos, desde que
motivados e conscientes dos seus deveres e dos meios disponíveis para isso.
Importante a visão de Layrargues (2000), ao sustentar que a educação ambiental é um
conceito que vem em substituição à educação conservacionista, que possuía cunho
tecnocrático, limitando-se a oferecer conhecimentos sobre o ambiente não humano. Assim,
insere-se o ambiente humano na abordagem educativa, “transcendendo a perspectiva da
abordagem de conteúdos meramente biologizantes das ciências naturais, e engloba aspectos
socioeconômicos, políticos e culturais das ciências sociais e humanas”. (LAYRARGUES,
2000, p. 90). A educação ambiental representa um avanço, na medida em que possibilita, além
do mero entendimento das informações transmitidas, também a reflexão e a conscientização,
favorecendo a participação e a tomada de decisão por parte de quem a recebe.
A educação pode promover a proteção e preservação ambiental, bem como sua
recuperação, através da participação dos indivíduos, isoladamente ou em grupos comunitários,
influenciando, ainda, as políticas públicas e a economia. A participação da sociedade civil é
reforçada por Lima (2005, p. 113), ao analisar a teoria de Beck (2002), o qual incentiva a
necessidade de inserção popular nos processos de discussão, negociação e formulação de
políticas científicas e tecnológicas, de definição dos níveis toleráveis de risco”. A educação,
para ele, é um instrumento capaz de responder à problemática dos riscos na sociedade atual,
pois fundamenta e qualifica a participação cidadã. É possível, deste modo, que os riscos sejam
geridos com base em critérios de prudência ambiental, para isso contribuindo a educação
ambiental.
Dentre os objetivos da Política Nacional de Educação Ambiental
44
, também está o
incentivo à participação popular, individual e coletiva, na preservação do equilíbrio
ambiental, sendo esta conduta considerada “como um valor inseparável do exercício da
cidadania”. Sparemberger e Rolim (2005) ressaltam este objetivo legal, salientando, ainda,
que visa resgatar a sensibilização comunitária, desenvolvendo uma cidadania efetivamente
participativa e consciente dos valores humanos e ambientais. A lei parece buscar, assim, a
44
Tais objetivos constam na Lei 9.795, de 1999, no artigo 5º.
64
sensibilização necessária para impulsionar o agir humano, fazendo o cidadão transitar da
inércia social e política para a real e efetiva gestão democrática.
A cidadania está estreitamente relacionada à educação e, para Loureiro (2005), não é
algo que possui origem divina, natural ou é fornecida por governantes, mas é construída a
partir do momento em que o indivíduo concede significado a sua participação em uma
sociedade. A participação da pessoa no grupo social a que pertence, de alguma forma, é que
lhe constitui cidadão.
A participação popular, além de possibilitar a gestão democrática do meio ambiente,
na visão de Oliveira e Guimarães (2004) também significa uma forma de concretização do
princípio da dignidade da pessoa humana, que caracteriza Constituições como a brasileira,
baseadas no Estado Democrático de Direito. A partir deste princípio é que o cidadão é
respeitado pelos demais, por seu valor como pessoa, e possibilita que o mesmo intervenha nos
destinos sociais e nas decisões do Estado, especialmente naquelas relacionadas com a
qualidade de vida, individual ou coletiva. A cidadania, assim, como corolário do princípio da
dignidade da pessoa humana, deve integrar os processos educativos, visando a melhor
formação do cidadão, para que sua participação na sociedade, além de efetiva, seja qualificada
e positiva.
Layrargues (2000) defende a existência de um subconjunto da educação ambiental,
que não é diferente dela, mas que avança para a dimensão do desenvolvimento da cidadania e
da democracia ambiental. Este subconjunto é denominado educação para a gestão ambiental,
e trata-se de uma educação política, que não centraliza o poder decisório ao Estado, mas
oportuniza a participação do cidadão.
Gerir os problemas e a crise ambiental que hoje caracterizam a sociedade, e os riscos
inerentes a isso, é o desafio. A gestão ambiental pressupõe sustentabilidade; por isso, nas
decisões administrativas, públicas ou privadas, torna-se necessária a análise sobre os reflexos
de cada medida ao meio ambiente. A instalação de uma fábrica, uma obra pública, a
construção de um prédio, o planejamento urbano; ou seja, todos os atos humanos que possam
afetar de alguma forma um ecossistema devem ser refletidos com vistas ao desenvolvimento
sustentável, até mesmo durante o processo de licenciamento ambiental, quando exigido. Por
isso, a participação popular, pela cidadania, deve estar orientada pela educação ambiental, ou
por seu subconjunto: educação para a gestão ambiental.
65
O atual contexto social de risco, incerteza e crise ambiental é que justifica a
necessidade do fortalecimento da cidadania orientada para o meio ambiente. É fundamental
que o cidadão reconheça e assuma seu papel na prática da prudência ambiental, e à educação
incumbe a disseminação e a orientação deste pensamento. Por isso, no aspecto formal da
educação se fala em ecopedagogia, que, de acordo com Ruscheinsky (2002, p. 67), seria
uma proposta pedagógica nova, que ultrapassa a dimensão da mera despoluição ou
preservação, para abranger o desenvolvimento social e sustentável:
A ecopedagogia visa à consolidação de uma consciência ecológica ampla, profunda e
difusa. Para tanto, de se investir em mudanças culturais que afetam a mentalidade,
o comportamento como modo de pensar e agir, a cultura política, a visão de mundo, as
representações sociais, a solidariedade e a participação. É a tentativa de desenhar e
arquitetar a adoção de pontos de vista, de práticas e de movimentos sociais, assim
como projetos políticos que dêem conta dos dilemas ambientais da atualidade.
A ecopedagogia ocupa-se de construir uma educação ambiental ampla, que abranja a
formação da consciência ecológica e incentive a participação popular ativa, através de práticas
individuais e de movimentos sociais. Além disso, visa orientar projetos políticos que sejam
capazes de gerir a crise ambiental e os problemas característicos da sociedade de risco.
Sabendo-se do papel emancipatório da educação, capaz produzir renovação cultural, política e
ética da sociedade, a ecopedagogia representa a consolidação deste novo método educacional,
visando justamente à construção de novos valores relativos à consciência e à prudência
ambiental.
Neste mesmo sentido, Leff (2002) defende uma nova linha de conhecimento, o saber
ambiental, que preconiza a reapropriação social da natureza, para superação da crise atual. É o
saber que induz à participação direta das comunidades na apropriação e transformação de seus
recursos ambientais, diante do desenvolvimento sustentável. A gestão participativa propõe,
além da oportunidade de reverter os custos ecológicos e sociais da crise ambiental, a
integração da população, aproveitando o potencial ecológico de seus recursos e respeitando
suas identidades. Surgem, portanto, iniciativas descentralizadas, que se adequam às
características das comunidades, em favor da reapropriação da natureza.
A ecopedagogia deve orientar a educação para a concretização do saber ambiental,
através de métodos como a alfabetização ecológica
45
, em que os alunos são submetidos a
novas metodologias de ensino, que insiram, desde já, noções de meio ambiente e cidadania. O
45
Capra (2003) narra a experiência do Centro de Ecoalfabetização da Califórnia, no qual é fundador e diretor. No
instituto é desenvolvido um sistema de educação para uma vida sustentável, nos níveis escolares primários e
secundários, baseado em uma pedagogia centrada na compreensão da vida e em experiências de aprendizagem
que suscitem o interesse e a participação dos alunos na defesa do meio ambiente, como a horta escolar e a
agricultura orgânica.
66
papel da escola, portanto, é latente, e ressaltado por Castro e Baeta (2005), uma vez que é
capaz de construir pessoas capazes de exercitar a cidadania, que coopera e favorece a
construção da autonomia intelectual. É necessário que o ensino escolar prime pela ética
ambiental, já que contribui decisivamente para a formação do ecocidadão
46
.
Além da educação formal, também a informal e a não-formal têm papel importante na
formação da cidadania ambiental, que esta consciência não é unicamente uma disciplina
escolar, mas um projeto de âmbito planetário. Prado (2000) aborda a cidadania ambiental e
planetária com base na necessidade de uma visão cósmica e convergente de todos os seres.
Lembra que, ainda na década de 60, ao prever a revolução eletrônica que globalizaria os
acontecimentos cotidianos, Marshall McLuhan falava em aldeia global e cidadão planetário.
Prado (2000, p. 41) afirma que a dimensão planetária fundamenta-se numa premissa básica
que exige que os equilíbrios dinâmicos e interdependentes da natureza sejam harmonicamente
integrados ao desenvolvimento humano”, e, conseqüentemente, enfatiza as “interconexões
entre os seres humanos, os fenômenos sociais e os naturais”.
Sabe-se que um dano ambiental pode ter dimensões que extrapolam limites territoriais.
Por isso, a necessidade de se considerar a dimensão planetária do meio ambiente, a qual
não se restringe à natureza, mas também aos demais elementos ligados ao desenvolvimento
humano, como as cidades, o patrimônio cultural, o ambiente de trabalho, enfim, tudo o que
influencia na qualidade de vida.
A relação ecológica planetária, com base na Teoria Gaia, abrange aspectos naturais,
mas também o homem e as influências que este gera no meio em que vive, inclusive os
aspectos sociais. Por isso, o pensamento de Loureiro (2005, p. 75) auxilia a compreensão do
papel do homem como cidadão planetário:
Ecocidadania/ cidadania planetária é um conceito utilizado para expressar a inserção
da ética ecológica e seus desdobramentos no cotidiano, em um contexto que
possibilita a tomada de consciência individual e coletiva das responsabilidades tanto
locais e comunitárias quanto globais, tendo como eixo central o respeito à vida e a
defesa do direito a esta em um mundo sem fronteiras geopolíticas.
O cidadão planetário é aquele que reconhece a sua função não somente restrita ao
meio social em que vive, mas também global, que sabe que sua postura gera efeitos
transfronteiriços, e que podem não estar adstritos no tempo, mas lesar as futuras gerações. Por
se estar em um mundo sem fronteiras geopolíticas, tendo o homem responsabilidade tanto
46
Ecocidadania é sinônimo de cidadania ambiental e cidadania planetária. Significa a inserção dos valores
ambientais na prática cidadã.
67
local e comunitária quanto global, a adoção de uma postura prudente em relação ao meio
ambiente é cada vez mais necessária.
A ética ambiental deve estar inserida na educação formal, mas não apenas nesta,
também em todas as formas educativas capazes de contribuir para a formação da consciência
do cidadão, em vistas ao agir prudente. A ecocidadania, ou a cidadania planetária, exige a
visão de compromisso com a vida, como defende Sorrentino (2005), que as tendências do
desenvolvimento sustentável estão relacionadas à proposição de soluções para a necessidade
de preservação da biodiversidade, conservação dos recursos naturais, desenvolvimento local e
diminuição de recursos naturais, através da adoção de mecanismos econômicos e de políticas
públicas
47
, ou por meio da participação popular. O fortalecimento da atuação cidadã, portanto,
seria uma segunda tendência da sustentabilidade, e esta proposta “se limita à formulação de
propostas regionais, pois a exigência de participação de todos a torna pequena e artesanal”
(SORRENTINO, 2005, p. 19).
O desenvolvimento sustentável pode ser alcançado com políticas públicas e
econômicas de grande vulto, envolvendo tratados internacionais, gestões administrativas
diferenciadas em grandes empresas, dentre tantas outras providências; mas também através da
participação individual do cidadão, mesmo que de forma pequena e aparentemente
insignificante. Muitas vezes, danos ambientais graves são gerados pelo somatório de condutas
discretas, da mesma forma como grandes medidas protetoras e prudentes são atingidas com
atos simples, mas conjuntos, como economia domiciliar de água e destinação correta dos
resíduos. De pouco adiantam ações estatais grandiosas e custosas, tendentes a reduzir ou
amenizar prejuízos ambientais nas cidades, se não houver a participação dos cidadãos.
Depredações do patrimônio cultural, geração de lixo, poluição e desperdício de água,
são alguns exemplos de situações simples, mas que, se evitadas por toda a população, além de
reduzirem gastos do Poder Público, também contribuem para a preservação ambiental (e
ilustram a prudência). Igualmente, a fiscalização por parte do cidadão, denunciando danos
ambientais e utilizando os instrumentos disponíveis para isso, exemplifica a importância da
participação popular na defesa do meio ambiente.
Nalini (2003) trata do papel do cidadão na implementação da lei ambiental, frisando
que pode agir sozinho, através de denúncia às autoridades competentes ou à mídia, ou pode
organizar-se em movimentos sociais, pois no Estado Democrático de Direito o cidadão tem
47
Sorrentino (2005, p. 19) refere que esta primeira tendência se concretiza "por meio de novas tecnologias,
políticas compensatórias, tratados internacionais de cooperação e de compromissos multilaterais, estímulos ao
ecoturismo, certificação verde de mercados alternativos, entre outros".
68
voto, voz e vez. A motivação para os atos públicos de proteção ao meio ambiente parte da
comunidade, pois, para Nalini (2003, p. 303):
Ela é que precisa motivar a polícia para que as infrações sejam apuradas. Motivar o
Ministério Público, o único titular da ação penal pública, para que ações penais sejam
iniciadas contra os criminosos ambientais. Motivar o Judiciário para que as questões
ambientais sejam efetivamente apuradas nas esferas cível e criminal.
A participação popular na gestão do meio ambiente, além de consectário do Estado
Democrático de Direito, é fundamental para a concretização do desenvolvimento sustentável.
Esta sustentabilidade, portanto, se atinge com medidas vultuosas, que aliem o crescimento
social e econômico com preservação ambiental, como referido, mas também é conquistado
através da participação popular, da gestão democrática qualificada pela educação capaz de
formar cidadãos conscientes do seu papel no cotidiano. A educação ambiental, assim, objetiva
o fortalecimento e a formação da cidadania e de suas decorrências: ecocidadania, cidadania
ambiental, educação para gestão ambiental e outras denominações sinonímias.
Para que a educação ambiental atinja seus objetivos, deve atentar para novos modelos
de prática, que, de acordo com Layrargues (2000), constata-se uma relativa falência de
alguns métodos. Reflete que um dos argumentos que justificam este fracasso é o de que a
educação ambiental esteve “tradicionalmente calcada sobre o uso de valores afetivos
positivos”; ou seja, que buscou desenvolver a afetividade pela natureza, deslocando-a para a
posição de sujeito e não de objeto apropriável pelo homem. O correto, para ele, seria o
“desenvolvimento de valores afetivos negativos”, pois sustenta que “alguns estudos concluem
haver um engajamento ativo na proteção ambiental por parte de sujeitos afetados após
episódios de perda de serviços ambientais”, quando, então, é possível enfatizar a relação de
causalidade entre as ões humanas na natureza e as conseqüências destes atos ao próprio
homem (LAYRARGUES, 2000, p, 144-145).
A educação ambiental muito mais do que apenas desenvolver e refletir a concepção de
natureza e meio ambiente, buscando suscitar valores afetivos de apego e amor no homem,
deve deter-se a aspectos práticos dos reflexos das ações antrópicas na qualidade de vida
humana. Parece que resultados melhores são atingidos quando considerados os efeitos
funestos dos danos ambientais. Tanto é verdadeiro, que somente quando alterações climáticas
passaram a ser associadas à poluição e à falta de cuidado por parte da humanidade com a
natureza, e isso divulgado pela mídia, é que as questões ambientais passaram a ser discutidas
e refletidas com maior seriedade, gerando certa preocupação e comoção social.
69
Trevisol (2003, p. 139) afirma que participação popular na esfera pública é que
qualifica a cidadania, que as práticas cidadãs são capazes de instituir o novo. Sem elas a
EA
48
e a cidadania não passam de discursos romantizados”. Sem aplicação prática, a educação
e a cidadania não têm razão de ser, não passam de meros debates teóricos sem reflexos
positivos para o meio ambiente. No entanto, para a concretização efetiva da participação
popular, a educação deve ser capaz de suscitar a reflexão e construir a ecocidadania fundada
na prudência ambiental, não apenas através do desenvolvimento de valores afetivos no
homem, mas por meio de informações e conhecimento acerca das conseqüências dos atos
prejudiciais ao meio ambiente.
A prudência ambiental, como uma forma de sabedoria prática, é resultado de atitudes
cidadãs de cuidado com o meio ambiente, mas depende, ainda, da atuação do Estado, como
principal promotor e incentivador da educação formal, informal ou não-formal.
2.3 Educação Ambiental, Prudência e Estado
As bases e os objetivos da educação ambiental, conforme tratado, estão relacionados à
concretização da prudência ambiental, que processos educativos contribuem para a
formação de cidadãos conscientes da importância da proteção do meio ambiente. No entanto,
problemas são verificados quando da sua implementação, gerados por inúmeros motivos,
desde pedagógicos e teóricos, até práticos, decorrentes de uma carência de atuação estatal
eficiente. Por isso, importante que se conheça os desafios e as tarefas inerentes a este processo
de construção da prudência, pela ecocidadania.
Os desafios da educação ambiental são decorrentes de fatores relacionados com a
dimensão ética que abrange e com as pluralidades culturais que caracterizam um país de
dimensões continentais, como é o caso do Brasil. Inserir certos aspectos éticos nos mais
diferentes grupos sociais não é tarefa fácil, e essas dificuldades são enumeradas por Tristão
(2002) como desafios
49
.
48
EA é a abreviação que o autor utiliza para Educação Ambiental.
49
Os desafios enumerados por Tristão (2002) estão relacionados mais com a educação formal, que seus
estudos são dirigidos ao papel do educador na escola. No entanto, a abordagem pode ser aplicada às demais
formas educacionais, que aquele (seja um indivíduo ou uma instituição) que promove a educação ambiental,
qualquer que seja sua forma, pode ser considerado educador.
70
Segundo Tristão (2002), o primeiro desafio é enfrentar a multiplicidade de visões,
decorrente da diversidade cultural existente no país, cabendo à educação traçar a conexão
entre as culturas, já que o ensino ambiental exige a visão complexa, pela interligação existente
entre os conceitos que envolvem meio ambiente. A atual concepção de natureza, ligada à
Teoria Gaia, exemplifica o desafio do educador em transmitir conhecimento que seja
acessível às mais diversas visões criadas pela pluralidade cultural do Brasil.
O segundo desafio é superar a visão do especialista, visando “quebrar a barreira entre
o conhecimento alienante para conseguir articular saber e viver, razão e emoção” (TRISTÃO,
2002, p. 174). A educação ambiental deve romper o conhecimento apenas teórico,
especializado e conceitual inserindo nele aspectos de cidadania e de compreensão complexa
da realidade, através de uma abordagem interdisciplinar.
Superar a pedagogia das certezas é o terceiro desafio, promovendo a reflexão e
incentivando a crítica. De acordo com Tristão (2002), os pressupostos epistemológicos da
pedagogia devem ser revistos, acrescentando a compreensão de uma sociedade plural e
contraditória, que a aprendizagem extrapola os limites da escola, tornando-se a mídia forte
canal de comunicação e de informação. A educação deve conseguir formar pessoas capazes
de analisar e compreender criticamente as informações que recebem dentro e fora da escola.
O quarto e último desafio descrito por Tristão (2002) é superar a lógica da exclusão,
de forma a abolir as desigualdades sociais, visando a extinção da pobreza e a garantia de
desenvolvimento a todos. Significa que, além das variáveis econômicas, deve-se inserir a ética
socioambiental, incorporando saúde, educação e qualidade de vida. Para isso, é preciso
compreender a relação de causalidade e a interdependência entre os aspectos sociais e
ambientais mundiais.
Os desafios listados por Tristão (2002) estão relacionados entre si, ilustrando
simultaneamente objetivos e dificuldades que a educação ambiental deve confrontar. Ao
mesmo tempo em que o enfrentamento da multiplicidade de visões, da visão especialista, da
pedagogia das certezas e da lógica da exclusão são meios para se atingir uma ecocidadania,
igualmente são obstáculos a ela, que a verdadeira e eficaz participação popular na proteção
do meio ambiente pressupõe a superação destes fatores. Uma abordagem que considere a
pluralidade cultural, inserindo valores éticos em análises conceituais para possibilitar a
reflexão sobre conhecimentos tidos como verdades e atingir uma melhor qualidade de vida, é
o objetivo da educação ambiental.
71
O que visa a educação é possibilitar que o cidadão aja favoravelmente no seu meio
social, de forma que leve em conta não somente valores econômicos, mas também sociais e
ambientais; ou seja, que pratique a prudência. Para isso, processos educativos devem ser
capazes de atingir a todos e superar pensamentos contrários arraigados.
Trevisol (2003) aborda a educação ambiental no contexto da sociedade de risco,
referindo que a crise ambiental fruto dessa realidade impõe-lhe tarefas. A alfabetização
ecológica
50
por meio da percepção dos riscos seria uma primeira tarefa, tendente a gerar o
reconhecimento sobre a crise real que envolve o indivíduo, levando-o ao consumo sustentável
atingido pela mudança de consciência e de atitudes, implicando na ciência dos impactos das
ações cotidianas do homem sobre os recursos naturais e a sociedade. Essa consciência de
riscos pode ser construída tanto através da educação formal quando da não-formal ou da
informal.
A segunda tarefa, para Trevisol (2003), seria a consciência da planetaridade, de que
cada indivíduo faz parte de uma totalidade altamente complexa e interdependente, de forma
que toda ação produz efeitos positivos ou negativos sobre a totalidade que o cerca. Trata-se de
uma concepção que sobressai o papel do homem na manutenção do equilíbrio planetário.
A sustentabilidade é defendida como a terceira grande tarefa, para Trevisol (2003),
que somente é atingida através da educação, sendo a chave para a transformação das
consciências, valores e atitudes das pessoas. Propõe novas orientações, práticas e conteúdos,
com uma dimensão ética de proteção ao meio ambiente.
Por fim, Trevisol (2003) define como quarta tarefa da educação ambiental a
construção de uma cidadania planetária, que significa um movimento simultaneamente local e
global, através do qual cada cidadão assume as responsabilidades que lhe cabem,
independentemente do país em que vive, da sua cultura ou da sua etnia. São atributos
indispensáveis dessa cidadania a responsabilidade, o cuidado e a solidariedade que conduzem
à sustentabilidade tanto ambiental quanto social.
A função principal da educação ambiental é a construção da ecocidadania, capaz de
motivar o indivíduo a assumir seu papel local e globalmente na proteção do meio ambiente.
Perceber e conhecer a realidade de riscos em que se está inserido e, além disso, gerenciá-la
para a prática do desenvolvimento sustentável, com prudência, além de objetivos são os
50
Trevisol (2003) utiliza o termo alfabetização ecológica com o sentido de ser um ponto de partida, uma pré-
condição ou um estágio cognitivo inicial que embasa o desenvolvimento da educação ambiental.
72
próprios desafios da educação ambiental. Neste aspecto é que a síntese de Trevisol (2003) se
aproxima da formulada por Tristão (2002)
51
. Ambas as abordagens traçam o caminho a ser
percorrido para que se atinja a ecocidadania.
O princípio ambiental da prudência, fundamentado nos ideais agrupados de prevenção
e precaução, é elemento intrínseco da ecocidadania, pois a finalidade da participação popular
qualificada é a proteção do meio ambiente da ocorrência de danos. Ou seja, o cidadão assume
seu papel local e globalmente, com base em ideais de sustentabilidade, para a concretização
da prudência. O que se debate, no entanto, são as dificuldades na implementação da educação
ambiental, especialmente considerando-se seus desafios e suas tarefas.
Loureiro (2005) sistematiza o que denomina receita de bolo para a prática da educação
ambiental afirmando que, em primeiro lugar, a educação não é a única solução, mas está
inserida em um contexto maior, exigindo também modificações políticas, sociais, econômicas
e culturais. Em segundo lugar, sustenta que é preciso esclarecer a responsabilidade do cidadão
em agir de forma ecologicamente correta. Em terceiro lugar, defende a adoção de projetos que
articulem processos educativos formais às demais atividades sociais, ou seja, relacionando o
trabalho escolar à comunidade. Em quarto lugar, fortalecer a atuação de instâncias coletivas e
organizadas, como é o caso das ONGs, entidades assistenciais e filantrópicas, dentre outras.
Em quinto lugar, informar ao cidadão da disponibilidade do Ministério Público para
representá-lo judicialmente no pleito por um meio ambiente ecologicamente equilibrado
52
.
A receita de bolo de Loureiro (2005) parece sistematizar alguns passos para a
ecocidadania, oportunizando o conhecimento dos instrumentos disponíveis à população para
que reconheça e assuma seu papel na sociedade, individual e coletivamente, por meio de
grupos representativos ou de instituições como o Ministério Público. É preciso que se
reconheça que a educação, sozinha, não poderá ser a solução para a crise ambiental e para a
gestão dos riscos de danos ao meio ambiente, mas é o instrumento de informação necessário
para que cada indivíduo conheça sua responsabilidade global e pratique a prudência
ambiental.
A associação das modalidades de educação, integrando o ensino escolar com
atividades comunitárias é uma forma prática e eficaz de aprendizado, além de representar a
51
A diferença entre as abordagens de Tristão (2002) e Trevisol (2003) é que esta parece referir-se a todas as
formas de educação, enquanto aquela é mais direcionada a aspectos formais da educação.
52
A abordagem de Loureiro (2005) refere-se tanto à educação não-formal e à informal, quanto à formal,
especialmente porque uma de suas sugestões visa a associação de processos educativos escolares com outras
atividades sociais.
73
difusão de conhecimento para a comunidade. Não basta que nos bancos escolares seja
debatida a ecocidadania, é preciso que esta transponha a sala de aula e atinja a família e a
comunidade dos estudantes, pois resultados imediatos são necessários e os frutos da educação
formal demandam maior tempo.
A atuação de instâncias sociais organizadas tem papel relevante na concretização da
prudência e do desenvolvimento sustentável, que, chamada à participação, a população tem
voz ativa na defesa do meio ambiente e para que seja efetivamente ouvida pelo Estado, meios
de pressão são essenciais. Por isso, entidades coletivas de representação são muito
importantes, já que podem gerar repercussão perante o Poder Público.
Analisar conjuntamente os desafios, as tarefas e as sugestões de Tristão (2002),
Trevisol (2003) e Loureiro (2005) permite traçar as dificuldades da educação ambiental, mas,
igualmente, perceber qual caminho deve ser seguido. Para desafios relativos a aspectos
formais como os levantados pelo primeiro autor, consistentes no enfrentamento da
multiplicidade de visões, inclusive a especialista e a pedagogia das certezas, e a superação da
lógica da exclusão, afigura-se necessária a formação de profissionais educadores capazes de
utilizar a polaridade emancipatória da educação, inserindo novas e renovadoras concepções ao
ensino regular das disciplinas. Fundamental a adoção de meios educativos, nas escolas, que
suscitem a reflexão e a introdução da ética e da prudência ambiental em todos os
desdobramentos da sociedade, visando ao desenvolvimento sustentável.
Relativamente às tarefas da educação, expostas por Trevisol (2003), também precisa-
se da adoção e do investimento em métodos educativos formais emancipatórios, que
instiguem a reflexão sobre os riscos de certas atitudes prejudiciais ao meio ambiente,
desenvolvendo a consciência da planetaridade, da sustentabilidade e da cidadania. No entanto,
para estas finalidades, também as sugestões de Loureiro (2005), amparadas em aspectos
simples e práticos, para a difusão de informação mediante a associação das educações formal,
não-formal e informal, são importantes e representam uma alternativa viável.
Deste modo, é certo que a educação ambiental representa uma ferramenta eficaz de
proteção ao meio ambiente, por instrumentalizar e difundir a prudência. Ainda, é correto que
não é um procedimento cil, mas possui desafios e obstáculos. É oportuno, portanto, que se
debata o papel do Estado na sua implementação.
Jacobi (2007) trata de educação ambiental como instrumento de cidadania e
sustentabilidade, referindo a importância de que o Poder Público adote uma postura indutiva
74
nos conteúdos educacionais relacionados ao meio ambiente. Para a superação da crise
ambiental, é preciso suscitar a participação e o envolvimento dos cidadãos, através de uma
nova cultura baseada na motivação e na gestão democrática, pois somente isso corrige a
postura de dependência e desresponsabilização da sociedade, que é fruto da falta de
informação. A educação ambiental que vem sendo praticada no país, na visão de Jacobi
(2007), é muito diversa e restrita, ainda, a presença do Estado como articulador e promotor de
ações voltadas à participação popular.
A função estatal, no campo do Direito Ambiental, além de normatizar, fiscalizar e
punir, é motivar a sociedade a assumir sua postura participativa e protetiva do meio ambiente.
Não se trata de deslocar ao Poder Público o dever de, sozinho, fazer cumprir a legislação
ambiental, mas, ao contrário, suscitar que a população o faça, que todos são responsáveis
por isso. O princípio da prudência se concretiza através da adoção de medidas que evitem a
geração de danos e este pode ser um comportamento induzido pela educação ambiental.
No que se refere às políticas públicas em torno da educação ambiental, Dias (2001)
ressalta que pouco o Brasil investiu nessa área, em razão da falta de compromisso e seriedade
dos governantes. Exemplifica com o caso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), que, embora criado para, dentre outras finalidades,
estimular a educação ambiental, nunca o fez por absoluta carência de estrutura e pessoal
qualificado.
Posição semelhante é a de Leonardi (2002) ao sustentar que o Estado se mostra
ausente, salvo raras exceções, na articulação, coordenação e promoção de ações educativas na
área ambiental. Assim mesmo, afirma que à educação, unicamente, não se pode delegar a
solução para todos os problemas ambientais. Embora tenham ocorrido progressos na
sensibilização ecológica de praticamente todas as sociedades, mudanças nos padrões de
conduta interferem em poderosos interesses econômicos e políticos.
Vive-se em uma sociedade em que o poder econômico mostra-se imperativo, que é
o critério elementar de qualquer atividade; por isso, este obstáculo deve ser contornado
através de medidas que o envolvam e que tornem a proteção ambiental também atrativa
economicamente. Trata-se da aplicação do pensamento de Layrargues (2000), que sustenta a
necessidade de calcar a educação em valores afetivos negativos, demonstrando à população e
aos articuladores do poder econômico os prejuízos que os danos ambientais podem causar.
75
se referiu que em 1975, 1977 e 1992
53
foram realizados encontros internacionais
nos quais foram debatidas a educação ambiental e as medidas que cada país participante
deveria adotar para este fim. Ainda, a Constituição Federal de 1988 recepciona o contido na
Lei de Política Nacional do Meio Ambiente
54
e define o papel do Poder Público em relação à
educação ambiental, estabelecendo que é dever do Estado “promover a educação ambiental
em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente”
55
. Por isso, o dever do Estado em promover a educação ambiental é imperativo
constitucional.
Apesar das Declarações Internacionais, que desde a década de 70 pregam a
necessidade de políticas públicas voltadas à educação ambiental, e do dispositivo
constitucional impondo a necessidade da sua implementação, foi somente em abril de 1999
que o Brasil promulgou a Lei 9.795, formalizando a Política Nacional de Educação
Ambiental. Esta lei, já referida anteriormente, trata das diretrizes educacionais em relação ao
meio ambiente e como se organiza e estrutura nos âmbitos formal, não-formal ou informal.
Ao Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental
56
, dirigido pelos Ministros de
Estado do Meio Ambiente e da Educação, foram atribuídas atividades relacionadas com o
planejamento de diretrizes em âmbito nacional, além da articulação, coordenação, supervisão
e participação na negociação de financiamentos relacionados a planos, programas e projetos
de educação ambiental.
A terceira edição do Programa Nacional de Educação Ambiental (ProNEA), publicado
pelo Ministério do Meio Ambiente em 2005, o qual foi elaborado conjuntamente com o
Ministério da Educação, narra os antecedentes das políticas adotadas pelo governo federal.
Pelo histórico contido no documento, percebe-se que ações relativas à educação ambiental
iniciaram pela Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, em 1981, sendo criadas as
primeiras redes de educação ambiental em 1988. Alguns encontros nacionais e a formação de
comissões interinstitucionais, além de alterações na estrutura governamental que tratava do
tema, ocorreram. Em 1994 foi elaborado o primeiro Programa Nacional de Educação
Ambiental (PRONEA)
57
, que previa a capacitação de gestores e educadores, o
53
Encontro Internacional sobre Educação Ambiental, em Belgrado, Iugoslávia (1975); Conferência
Intergovernamental sobre Educação Ambiental, em Tbilisi, Geórgia (1977); Rio-92 (1992).
54
Artigo 2º, X, da Lei 6.938, de 1981.
55
Artigo 225, parágrafo primeiro, inciso VI. Pode-se interpretar que a Constituição trata da educação formal
(educação ambiental em todos os níveis de ensino), e da não-formal e informal (conscientização pública para a
preservação do meio ambiente).
56
O Órgão Gestor foi regulamentado pelo Decreto nº 4.281, de 25 de Junho de 2002.
57
PRONEA é a sigla do primeiro Programa Nacional de Educação Ambiental; a partir do instituído em 1999,
adotou-se a forma ProNEA.
76
desenvolvimento de ações educativas e desenvolvimento de instrumentos e metodologias
educacionais. 1997 foi o ano em que se criou o curso de Introdução à Educação no Processo
de Gestão Ambiental, pelo IBAMA, voltado a grupos envolvidos com gestão ambiental. As
bases para a execução da Política Nacional de Educação Ambiental, no entanto, foram
estabelecidas somente em 2002, quando da regulamentação da lei para este fim
58
.
Deste modo, o próprio relatório ministerial do ProNEA reconhece que, embora
medidas normativas e institucionais em âmbito federal estejam sendo tomadas desde 1981,
quando da instituição da Política Nacional do Meio Ambiente, somente a partir de 2002 é que
práticas de educação ambiental se tornaram exeqüíveis. Sem haver, até então, um órgão gestor
para o tema, não havia como se instrumentalizar a atuação dos demais entes federativos,
tampouco fiscalizá-la.
O documento do ProNEA nada refere quanto a resultados práticos dos encontros
nacionais realizados ou da atuação das redes de educação e das comissões interinstitucionais,
levando a crer que trataram-se de medidas formais, com resultados bastante restritos. Tanto é
verdadeiro, que autores como Jacobi (2007), Dias (2001) e Leonardi (2002) ratificam a visão
de que a educação ambiental no Brasil é aplicada de maneira bastante diversa da que deveria
ser, pois o Estado mostra-se omisso ou deficiente na execução de políticas educativas.
O atual ProNEA, vigente desde 2005, possui uma série de objetivos que parecem
muito bem elaborados, visando a implementação de sua missão: “a educação ambiental
contribuindo para a construção de sociedades sustentáveis com pessoas atuantes e felizes em
todo o Brasil”. Tais objetivos, sinteticamente, referem-se à inserção de valores humanistas na
educação para a participação cidadã, além de contribuir para a organização de grupos que
atuem em educação ambiental, da inclusão da educação na formulação e execução de
atividades passíveis de licenciamento ambiental, da inserção da educação em programas
ambientais como os de gerenciamento dos riscos e danos, do fomento a todas as modalidades
de educação ambiental (como campanhas nos meios de comunicação de massa e programas
destinados a trabalhadores), da difusão da legislação ambiental, do estímulo à gestão
democrática, da valorização da cultura, da inclusão digital para dinamizar o acesso a
informação, de pesquisas científicas em novas tecnologias ambientalmente seguras, do
estímulo à organização por meio das redes de educação, e da produção e aplicação de
instrumentos de acompanhamento das ações do Programa.
58
As bases para a execução da política foram criadas pelo Decreto que regulamentou o Órgão Gestor, Decreto
4.281/2002.
77
O ProNEA estabelece, ainda, cinco linhas de ação e estratégias. A primeira é
relacionada com a gestão e planejamento da educação ambiental no país. A segunda linha de
ação é a formação de educadores ambientais, de forma continuada, no âmbito formal e não-
formal. A terceira, relaciona a comunicação e a tecnologia na produção e elaboração de
materiais educativos e didático-pedagógicos. A quarta linha refere-se à inclusão desta
modalidade educativa nas instituições de ensino, por meio de projetos político-pedagógicos.
E, a quinta linha de ação é o monitoramento e avaliação de políticas, programas e projetos de
educação ambiental, por meio da construção de indicadores.
As linhas de ação do ProNEA contêm a descrição das estratégias de como
implementar tais ações, prevendo uma série de possibilidades e instrumentos para prática da
educação ambiental e dos objetivos do Programa
59
. Uma das prioridades parece ser a
transversalidade, que consiste na articulação das políticas com a educação e entre os entes
federativos, partindo do Órgão Gestor o incentivo para isso, através de projetos específicos e
financiamentos. Trata-se de estímulos a atuações localizadas a serem implementadas tanto por
parte dos Municípios, quanto por grupos organizados neste mesmo âmbito, já que terão
melhor penetração, tanto no aspecto formal quanto no não-formal ou informal, que
promovidas de acordo com as peculiaridades locais.
Considerando-se, ainda, a forte influência do poder econômico, que, como referido,
constitui-se um obstáculo para a construção de valores afetivos com o meio ambiente que
induzam a sua preservação, deve-se adotar medidas de inclusão da educação ambiental em
outras políticas públicas. Carece-se de criatividade para que os entes federativos, observando
suas competências, façam da educação um componente a mais na sua atuação. Exemplo disso
é a estratégia do ProNEA de inclusão da educação nos projetos públicos e privados que
causem impactos ambientais e que, portanto, estão sujeitos ao licenciamento. Em tais
situações, a concessão das licenças
60
poderia envolver um elemento a mais, voltado à
promoção de educação. Além de vincular-se o agente econômico ao compromisso
constitucional de proteção ambiental, que é de todos, também se estaria obtendo recursos e
fomentando a educação.
Inúmeras vezes, verifica-se que, no processo de licenciamento ambiental, os recursos
naturais são preteridos diante do aspecto econômico. Mesmo que certo empreendimento
venha a causar impacto ambiental, o Poder Público opta por autorizá-lo diante de benefícios
59
Evitou-se a descrição minuciosa das estratégias, por tratar-se de elenco extenso. O texto integral do ProNEA
está disponível em http://www.mma.gov.br ou http://www.mec.gov.br.
60
Licença prévia, licença de instalação e licença de operação.
78
financeiros e arrecadatórios ou sociais. Caso típico e ambivalente é o da construção de uma
usina hidrelétrica, que exige a inundação de grande área, e destruição de inúmeros
ecossistemas, além de atingir patrimônio paisagístico, em muitos casos. Tudo isso gera, sem
dúvida, grande impacto ambiental. o crescimento das cidades, por exemplo, contribui para
o surgimento de novas necessidades que satisfaçam a qualidade de vida da população, como o
abastecimento de energia elétrica. E, a carência deste bem energético também poderá causar
impacto no ambiente urbano, prejudicando-o drasticamente, por ser fundamental ao
funcionamento de inúmeras atividades, inclusive hospitalares e de geração e conservação de
alimentos
61
.
A prudência, nesses casos ambivalentes, orienta a adotar-se o caminho mediano,
aquele que melhor reflita a satisfação das necessidades do grupo social atingido, analisando-se
e gerenciando-se os riscos inerentes a uma ou outra decisão. Para se conhecer, portanto, qual é
a opção mais prudente, a participação popular é fundamental, para que o Estado, como
responsável pela autorização ou não do empreendimento, conheça seus anseios.
A prática do desenvolvimento sustentável e da prudência ambiental exige que se
observe o direito à informação, assegurado constitucionalmente a todos, e previsto ainda no
artigo 9º, XI da Lei que instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente. Se a população não
for informada sobre as decisões que precisam ser tomadas pelo Poder Público, e que se
relacionam diretamente com aspectos da sua qualidade de vida, não poderá opinar ou
participar nos moldes previstos pela gestão democrática, no Direito Ambiental.
Jucovsky (2007) aborda a questão da informação ambiental referindo também a
situação do estudo de impacto ambiental, em que a população e a Administração Pública
participam da proteção ambiental. Salienta que todo o procedimento de licenciamento
ambiental deve ser publicado na imprensa, podendo ser realizadas audiências públicas, a fim
de oportunizar a efetiva participação popular. No entanto, refere que a publicidade do estudo
de impacto ambiental ainda não ocorre da forma ideal, muitas vezes restando ferido o direito à
informação do cidadão, que se dá, via de regra, apenas pela disponibilização da documentação
nas repartições públicas.
Assim, possuindo a educação também o condão de informar o cidadão sobre a atuação
do Estado e oportunizando sua participação nos processos decisórios, mais uma vez mostra-se
61
Lembre-se a definição de dano ambiental, o qual não é restrito ao dano ecológico puro, mas também podendo
atingir outros aspectos relacionados à concepção de meio ambiente, que interfiram na qualidade de vida humana
e no equilíbrio ecológico, como a cidade, a cultura e o local trabalho, conforme tratado na seção 1.2, e de acordo
com a classificação proposta por Leite (2000).
79
como importante meio de proteção ambiental. Pela análise, mesmo que superficial, do
ProNEA e pela Lei da Política Nacional de Educação Ambiental, verifica-se que há, no Brasil,
instrumentos legalmente previstos suficientes para um incremento significativo nos processos
educacionais, sejam formais ou não.
Mesmo diante do poderio econômico que frustra, muitas vezes, a concretização do
princípio ambiental da prudência, ressalta-se a necessidade de uma atuação estatal tendente a
articular esta tendência com os instrumentos disponíveis, como os incentivos fiscais e o
estabelecimento de certos critérios no licenciamento ambiental. A prática, porém, demonstra
grande deficiência na implementação de tão valiosas estratégias
62
.
As medidas estatais relacionadas à educação ambiental não terão o condão de imputar
ao Poder Público o ônus da preservação do meio ambiente, mas, ao contrário, de estimular o
cumprimento da legislação ambiental pelo cidadão. A educação refletirá até mesmo nos casos
em que o Estado é responsabilizado juntamente com o particular, podendo diminuir
sensivelmente essas situações, que representam a transferência do ônus pelo dano ambiental a
toda a sociedade.
62
Foi abordada unicamente a legislação federal sobre o tema, mas é importante referir que há a Lei 11.730, de 09
de janeiro de 2002, que instituiu a Programa Estadual de Educação Ambiental no âmbito do Estado do Rio
Grande do Sul. Esta lei foi regulamentada pelo Decreto nº 43.957, de 08 de agosto de 2005. A opção, no entanto,
foi considerar a legislação e o Programa nacionais sobre o tema.
80
3 RESPONSABILIDADE AMBIENTAL: O ESTADO E O DEVER DE PRUDÊNCIA
O Direito Ambiental prevê que o causador do dano deve ser responsabilizado,
reparando-o ou indenizando-o. A responsabilidade aplicável é baseada na teoria objetiva, do
risco criado, sendo imputada solidariamente ao poluidor direto e ao indireto, e podendo ser
estendida também ao Estado. Trata-se da responsabilidade civil ambiental, que será objeto de
análise, com ênfase a sua aplicabilidade ao Poder Público quando, em razão da sua omissão,
for gerado um dano ambiental. A existência de situações de lesão ao meio ambiente nas quais
é reconhecida a responsabilidade solidária do Estado será confrontada à importância da
prática da educação ambiental como instrumento de prudência e forma de afastamento deste
ônus estatal.
3.1 Responsabilidade Civil Ambiental: aspectos teóricos
foi tratado anteriormente sobre a responsabilidade civil por danos ambientais,
referindo-se que suas funções clássicas são a reparação do dano, o incentivo à preservação do
meio ambiente, além de possuir um caráter sancionador. Hoje, de acordo com Benjamin
(1998), a responsabilidade também tende a incorporar o preço da degradação nos custos do
poluidor. Aspectos econômicos, relacionados com os princípios do usuário-pagador e
poluidor-pagador, integram a responsabilidade ambiental, na concepção de grupo lógico de
princípios.
Poluidor-pagador e usuário-pagador visam, precipuamente, a prudência ambiental,
evitando que ocorram danos ambientais, através da imputação desse ônus financeiro àquele
que polui, degrada ou utiliza os recursos naturais com fins econômicos. A responsabilidade
possibilita a manutenção do equilíbrio ecológico, já que ela gera a repressão e a reparação dos
danos ambientais, sendo o caráter finalístico que justifica o grupo lógico que une os princípios
do poluidor-pagador e do usuário-pagador. Tal imputação pode ser aplicável também ao
Estado, quando estiver envolvido em situações de dano ambiental.
À responsabilidade ambiental, o Brasil adotou um regime legal especial, por referir-se
à proteção de bem jurídico de grande relevância, relacionado à qualidade de vida humana das
81
presentes e futuras gerações. A regra geral para a responsabilidade civil é a aplicação da teoria
subjetiva; no entanto, no âmbito do Direito Ambiental, é adotada a teoria objetiva, a qual
prescinde da comprovação da culpa do agente.
63
A responsabilidade objetiva é aplicável apenas a casos especificados em lei, tendo sido
incluídos os danos ambientais a esta hipótese através da Lei 6.938, de 1981
64
. Tal norma,
associada ao comando Constitucional expresso no artigo 225, prevê a obrigação do poluidor
direto ou indireto, seja pessoasica ou jurídica, de direito público ou privado, a indenizar ou
reparar os danos ambientais, independentemente da existência de culpa, sem prejuízo das
demais sanções penais ou administrativas.
As justificativas para a adoção da responsabilidade objetiva são inúmeras, sendo
algumas delas tratadas por Benjamin (1998). Inicialmente, deve-se ao fato de que a proteção
do meio ambiente salvaguarda também a vida e suas bases em todas as dimensões e não
unicamente a vida humana, mas também o suporte planetário dos seres vivos, o que outorga
grande importância ao bem jurídico tutelado. Defende a existência de dificuldades que exigem
a adoção do regime especial para a responsabilidade ambiental, que são desde os problemas
na definição clara e precisa do poluidor e da vítima, na reparação do dano, além do obstáculo
gerado pela prova tanto do dano quanto do nexo de causalidade, que muitas vezes é difícil.
O dano ambiental, não raras oportunidades, é causado por uma pluralidade de agentes
e atinge vítimas pulverizadas, de difícil identificação. Também, este dano pode referir-se a
aspectos morais, ou, ainda, ter conseqüências não apenas no momento presente, como
também no futuro, o que dificulta sobremaneira sua reparação. Além disso, a incerteza nas
conclusões científicas que caracterizam o atual contexto social também ilustra as dificuldades
que permeiam a responsabilização ambiental, justificando a adoção de um regime especial e
fundado na teoria objetiva.
Mesmo em legislações em que a responsabilidade ambiental é baseada na teoria
subjetiva, como é o caso do Chile
65
, a doutrina reconhece as desvantagens de tal regime e a
tendência da sua objetivação. González (1999) explica que a legislação chilena funda a
responsabilidade na teoria subjetiva, em virtude da carência legal para a adoção da objetiva, já
63
A responsabilidade subjetiva é também denominada responsabilidade aquiliana, eis que decorre da Lex Aquilia
(Lei Aquília), que foi o primeiro ordenamento jurídico a estabelecer um princípio geral regulador do dano
(GONÇALVES, 2005).
64
A previsão legal da responsabilidade objetiva está presente no artigo 14, §da Lei 6.938/81, e no artigo 225,
§ da Constituição Federal, os quais, embora não referiram expressamente a responsabilidade objetiva,
demonstra o sistema repressivo adotado ante os danos ambientais.
65
A responsabilidade ambiental no Chile é regida pela Lei 19.300, em vigor desde 1994.
82
que esta é aplicável a matérias estritamente previstas e reguladas, o que não existe naquele
país. Justifica que a responsabilidade fundada na culpa é mais indicada a países em
desenvolvimento, que pode contrariar a iniciativa empresarial. No entanto, reconhece as
dificuldades na comprovação da culpa, embora a lei local preveja algumas hipóteses de
presunção, e entende que a tendência é, realmente, a objetivação da responsabilidade
ambiental, por meio da teoria do risco. Esta responsabilidade seria fundamentada na justiça e
na eqüidade, de forma que o prejudicado não deve ser obrigado a suportar o dano em antítese
à conseqüente impunidade e ao benefício do poluidor.
A responsabilidade objetiva, portanto, implica na alternativa mais adequada à proteção
do meio ambiente, diante das dificuldades na comprovação da culpa do poluidor, pelos
aspectos suscitados por Benjamin (1998). De outro lado, pela importância do bem ambiental e
em vistas ao princípio do desenvolvimento sustentável, o argumento de que a objetivação da
responsabilidade implica em um obstáculo à iniciativa empresarial não parece adequado.
Cada vez mais devem ser incentivados mecanismos limpos nas atividades econômicas, o que
não impede, de forma alguma, seu desenvolvimento, apenas exige uma postura do poder
econômico baseada na prudência ambiental.
Considerando o regime da responsabilidade objetiva adotado pelo Brasil, o poluidor
será responsabilizado sempre que ficar comprovado que sua ação ou omissão causou um dano
ambiental. Tais pressupostos são explicados por Rizzardo (2007), ao traçar a trajetória da
responsabilidade, que abrange: a ação ou omissão do agente, por ação própria ou de terceiros
que agem em seu nome
66
; o nexo causal entre a violação da norma e o dano; e o dano em si.
Como se vislumbra, aplicabilidade da teoria objetiva da responsabilidade por danos
ambientais é consenso e está claramente prevista no ordenamento jurídico brasileiro. No
entanto, pode ser questionada a possibilidade, ou não, de existirem excludentes que afastem o
nexo causal, isentando a incidência da responsabilidade.
De acordo com Cavalieri Filho (2007, p. 63), as hipóteses de afastamento do nexo
causal da responsabilidade são os “casos de impossibilidade superveniente do cumprimento
da obrigação não imputáveis ao devedor ou agente”. Situações decorrentes de caso fortuito,
força maior e culpa exclusiva da vítima ou de terceiro muitas vezes podem excluir a relação
66
A ação ou omissão que causar dano ambiental pode ser de forma direta ou indireta, como no caso de preposto
que age ou deixa de agir em nome da empresa ou de seu empregador, ou do agente público, pela Administração
Pública. Nesses casos pode haver, também, a responsabilidade individual do poluidor direto (preposto ou agente
público), diante da possibilidade de responsabilização solidária de ambos, como adiante será tratado.
83
de causalidade e, portanto, isentar a responsabilidade, pois “ninguém pode responder por um
resultado a que não tenha dado causa” (CAVALIERI FILHO, 2007, p. 63).
67
Quanto à responsabilidade ambiental, por não haver previsão legal que esclareça a
controvérsia sobre a possibilidade da aplicação de excludentes, ainda não existe consenso na
doutrina, embora seja provável que mais adequada é a posição em sentido positivo. Este é o
caso de Sampaio (1998), o qual defende que para que o poluidor seja responsabilizado é
necessária, além do ato ou fato danoso, do dano evidenciado e do liame de causalidade entre
eles (nexo causal) a comprovação de que o dano foi proveniente do risco criado por tal ato ou
fato. A modalidade do risco, assim, pode ser o marco teórico a definir os critérios da
responsabilidade objetiva no que se refere à aplicação de excludentes.
A doutrina que trata dos critérios para a responsabilidade civil objetiva é vasta,
abrangendo várias espécies de riscos e também sob aspectos diferentes
68
. Adota-se a
classificação que diferencia os riscos em risco-proveito, risco criado e risco integral e que
também é a opção de Lyra (1997). O primeiro, segundo Cavalieri Filho (2007), define que
aquele que tira proveito de atividade deve arcar com os danos, não havendo definição certa
para o que seja este proveito, mas não estando restrito ao aspecto econômico. O risco criado é
aquele gerado pela atividade ou profissão capaz de gerar um perigo e difere do primeiro tipo;
pois, neste não se cogita da existência do proveito. Significa que, no caso do risco criado, o
que enseja a responsabilidade é a atividade em si e não a vantagem auferida pelo agente. Por
fim, Cavalieri Filho (2007) define o risco integral como uma modalidade extrema, que
justifica o dever de indenizar mesmo se não demonstrado o nexo causal
69
.
Tratando-se das teorias do risco-proveito e do risco criado, é possível que se admita a
aplicação de excludentes de responsabilidade, enquanto que no risco integral, por ser
modalidade específica, sempre haverá a imputação do ônus ao agente. Seria uma aplicação
por exclusão; pois, se somente a última teoria não admite tais excludentes, as demais
permitem.
67
Descrição sobre as excludentes de responsabilidade (caso fortuito, força maior e fato exclusivo da vítima ou de
terceiro) em: CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. São Paulo: Atlas, 2007
68
Exemplificativa é a posição de Gonçalves (2005), que não diferencia os riscos, mas fundamenta a
responsabilidade objetiva na teoria do risco e na teoria do dano objetivo, sendo que esta última não admitiria
excludentes, e o risco seria uma concepção contemporânea de culpa, mas como uma mera conseqüência das
atividades econômicas. Noronha (1999), ao elaborar uma versão coetânea da teoria da responsabilidade civil,
justifica a teoria objetiva nos riscos de empresa, administrativo e risco-perigo, os quais estão mais relacionados
com o tipo de atividade danosa, relegando a outra abordagem a questão das excludentes: a distinção entre
responsabilidade objetiva comum e agravada, que adiante será referida.
69
O autor trata ainda do risco profissional e do risco excepcional, o primeiro relacionado ao perigo a que a
vítima está exposta em seu local de trabalho, e o segundo, a algum fato que é alheio à atividade comum da
vítima. No entanto, podem, ambos ser incluídos nas categorias de risco-proveito ou risco criado, que apenas
altera-se o enfoque para o causador do dano, ao invés da vítima.
84
No que se refere à aplicação das teorias sob análise ao Direito Ambiental, Ferraz
(1979), que foi um dos precursores na doutrina da responsabilidade por danos ambientais,
abordando a questão antes da Lei 6.938, de 1981, e da Constituição Federal (portanto, sem
considerá-las) defendeu a adoção do critério do risco integral. Igualmente, pela
impossibilidade de excludentes de responsabilidade, são as posições adotadas por Lyra (1997)
e Benjamin (1998). Ambos os autores apegam-se no perfil constitucional do bem jurídico
tutelado, como um direito difuso essencial à sadia qualidade de vida não só das presentes, mas
também das futuras gerações, razão pela qual a responsabilidade deve ser implacável. Além
disso, para eles, a comprovação do nexo de causalidade e do dano, por si só, representam um
obstáculo à responsabilização, pela subjetividade que podem envolver, recomendando-se,
assim, o maior rigor possível para a efetiva imputação ao poluidor.
Pensamento diverso é defendido por autores como Rizzardo (2007) e Mukai (2004).
Para eles, o parágrafo do artigo 14 da Lei 6.938, de 1981, afasta a teoria do risco integral;
pois, condiciona o dever de reparar ou indenizar os danos causados ao meio ambiente e a
terceiros à atividade direta ou indireta do poluidor. Somente havendo atividade lesiva
imputada ao agente é que este poderá ser responsabilizado, o que afasta situações em que o
dano tenha sido causado por terceiros ou pela própria vítima, de caso fortuito e de força
maior.
Embora o perfil constitucional assegurado ao bem ambiental, não se pode olvidar que
uma responsabilidade que não admita excludentes seria imprópria, já que existem situações de
dano em que o agente não deu causa, como uma queimada gerada pela queda de um raio, no
exemplo citado por Rizzardo (2007). Nesta hipótese, constatando que não houve culpa do
proprietário do local em evitar o dano ou seu agravamento, mas que este esteve fora da sua
esfera de ação, evidente a impossibilidade sua responsabilização.
Baracho Junior (1999) manifesta sua preocupação quanto a um sistema de
responsabilidade civil ambiental que não admita excludentes, uma vez que decorreria
unicamente do fato danoso, excluindo-se qualquer outro fator externo a ele e que possa ser
determinante. Entende ser questionável a submissão dos aspectos morais, éticos e pragmáticos
da responsabilidade à objetivação restrita, o que ocorre na teoria do risco integral. Defende,
no entanto, que os direitos e garantias individuais o podem ser ignorados, mas sua
concretização deva se adequar aos casos concretos, de forma que, muitas vezes, embora
configurado o dano, a responsabilidade precise ser afastada por força deles.
85
A prudência ambiental orienta à proteção ambiental, à reparação dos danos, à
responsabilidade; porém, também é prudente reconhecer a possibilidade de situações
específicas em que excludentes inibem o dever de indenizar ou reparar. A teoria da
responsabilidade objetiva pelo risco criado ou pelo risco-proveito, em situações específicas
70
,
demonstra ser a mais adequada para o Direito Ambiental, sendo desta forma interpretada por
grande parte da doutrina pátria.
Sob uma visão mais contemporânea da teoria da responsabilidade civil, Noronha
(1999) apresenta novos fundamentos para sua objetivação, o que é tendência do Direito atual.
Justifica teoricamente a aplicação ou a impossibilidade de excludentes não com base em uma
das teorias do risco, mas no que denomina de responsabilidade objetiva comum e
responsabilidade objetiva agravada. No primeiro caso, embora não seja necessária a
comprovação da culpa, deve estar demonstrado que o dano foi resultante de ação ou omissão
do responsável, de pessoa a ele ligada ou do fato de coisas que detém
71
. No segundo caso, de
caráter excepcionalíssimo, significa que a obrigação de reparar ocorre mesmo se o agente não
causou o dano, tendo sido gerado por terceiros ou pela própria vítima, e nos casos fortuitos e
de força maior. Em outras palavras, tratam-se de danos meramente ocorridos durante a
atividade que o responsável desenvolve e de tal forma ligados a esta atividade que sejam
considerados riscos próprios ou típicos dela.
Aplicando a teoria da Noronha (1999) ao Direito Ambiental, Birnfeld (2004) defende
uma responsabilidade integral, agravada, pois nas hipóteses em que restar comprovado que a
conduta poluente foi causada exclusivamente por terceiro, esta seria uma excludente natural,
que ninguém pode ser responsabilizado por aquilo que não fez. Citando como exemplo um
acidente de trânsito em que um dos veículos envolvidos transportava carga extremamente
poluente e, mesmo não sendo ele o culpado direto um dano ambiental, sustenta que é caso
típico de uma responsabilidade solidária de todos os que lucram com a atividade, e conclui
(2004, p. 372):
Assim, tanto soa fora do razoável responsabilizar exclusivamente terceiro por dano do
qual foi apenas co-autor (senão mero partícipe), como constitui injustiça onerar a
sociedade com a recuperação de área ambiental cuja degradação só ocorreu porque, no
interesse privado, foi criada uma situação de risco até então inexistente.
70
No caso do dano ambiental, a teoria mais correta parece ser a do risco criado em detrimento ao risco-proveito,
primeiro, diante das dificuldades de se definir e demonstrar o proveito no caso concreto; e, segundo, porque o
risco criado pode ser mais genérico, abrangendo maiores possibilidades, e, inclusive, o próprio proveito
decorrente do exercício de atividade econômica ou profissional, por exemplo. Isso se deve ao fato de que
qualquer atividade potencialmente poluidora, gerando ou o benefício ou proveito ao agente, tem em si a
vinculada possibilidade de causar o dano.
71
É aplicável em situações excepcionais.
86
Com base neste raciocínio, Birnfeld (2004) justifica a responsabilidade objetiva
agravada, ou baseada na teoria do risco integral, sem que se admitam excludentes, por
considerar excludente natural a ausência de atividade, ão ou omissão imputável ao agente.
No entanto, confrontando-se o pensamento de Noronha (1999) ao de Birnfeld (2004) parece
haver certa incongruência na associação proposta por este último.
Noronha (1999) considera responsabilidade objetiva agravada aquela que prescinde da
existência de uma ação imputável ao responsável, o qual responde independentemente da
demonstração do nexo causal. Birnfeld (2004), no entanto, defende que a ausência deão ou
omissão do agente é uma excludente natural da responsabilidade. A análise conjunta duas
posições induz à conclusão de que a tese de Noronha (1999) não é adequada à aplicação
proposta por Birnfeld (2004), pois este admite excludente, seja considerada natural ou o.
Inclusive, esta excludente natural tanto pode ser fato de terceiro ou da vítima, caso fortuito ou
força maior; ou seja, é capaz de afastar o nexo de causalidade e, portanto, de isentar o agente
da responsabilidade.
Assim sendo, embora Birnfeld (2004, p. 373) conclua pela aplicabilidade ao Direito
Ambiental da responsabilidade objetiva na sua forma agravada, com base no risco integral
sempre que “de qualquer forma, a atividade empresarial tenha contribuído para o resultado
lesivo”, sua concepção é idêntica à teoria objetiva pelo risco criado, pela admissão de
excludentes, sejam, ou não, denominadas naturais. Mostra-se mais adequada à
responsabilidade ambiental a teoria objetiva comum, concebida por Noronha (1999), que se
equivale à teoria do risco criado, da doutrina tradicional.
Prosseguindo-se na análise da responsabilidade civil ambiental pela teoria do risco
criado, é importante referir que a licitude da atividade não pode representar uma excludente.
Neste sentido, Milaré (1996) refere que, no Direito Ambiental brasileiro, a sistemática
adotada não é de uma responsabilidade civil típica, mas independe de ofensa de norma ou de
regulamentação específica. Significa que não é passível de responsabilização unicamente um
ato ilícito que cause dano ambiental, mas também os lícitos. A ilicitude é gerada pelo dano em
si e não pelo ato, ou omissão, que o antecede, de forma que mesmo a atividade devidamente
licenciada pelo Poder Público pode sujeitar o agente ao dever de reparar ou indenizar, se
causar um dano.
O CONAMA, órgão responsável pelo regramento das atividades potencialmente
poluidoras, deliberando normas e padrões compatíveis com o equilíbrio ecológico, estabelece
certos parâmetros para a configuração do dano ambiental. No entanto, é possível que se
87
conclua que, mesmo estando a atividade empreendida em consonância com os padrões
normativos estabelecidos pelo órgão, vindo a configurar-se o dano ambiental a
responsabilidade do agente não pode ser afastada, diante da concepção de que o sistema
brasileiro não exige a ilicitude da atividade para a imposição do dever de reparar ou indenizar.
Embora lícita, se a atividade causar lesão ao equilíbrio ecológico, impacto à saúde
humana ou aos interesses humanos na manutenção do meio ambiente sadio à qualidade de
vida, não se pode olvidar da responsabilização do agente. A dificuldade, no caso concreto,
será a comprovação da efetiva ocorrência do dano, especialmente diante dos riscos que
caracterizam a sociedade atual, e que são frutos dos freqüentes avanços científicos. Isso
justifica o sistema normativo brasileiro que confere proteção ambiental absoluta.
No exercício de alguma atividade lícita, embora potencialmente poluidora e que tenha
sido licenciada pelo Estado, pode-se cogitar da responsabilização solidária do ente estatal, se
gerar resultados danosos. A solidariedade na responsabilidade ambiental está prevista pela Lei
6.938, de 1981, quando define como poluidor tanto o responsável direto pela lesão quanto o
indireto. Benjamin (1998) exemplifica com o fazendeiro, o industrial, o madeireiro, o
minerador e o especulador, que podem ser diretamente responsáveis pelo dano, mas que o
banco, o órgão público licenciador, o engenheiro, o arquiteto, o incorporador, o corretor e o
transportador são alguns dos indiretamente responsáveis, em certos casos.
Insere-se, portanto, o Estado como um dos entes que podem ser responsabilizados por
danos ambientais quando figurar como poluidor indireto, por meio da solidariedade. Todas as
disposições relativas à responsabilidade ambiental genérica são aplicáveis ao Estado,
respondendo juntamente com o particular de forma objetiva; porém, podendo incidir as
excludentes
72
.
A pluralidade de sujeitos passivos da obrigação ambiental é fundamental, pois muitas
vezes não é possível individualizar o agente causador do dano, como quando a lesão decorre
da associação de diversas condutas. Fato que exemplifica a situação é a poluição de um rio
gerada pelo descarte indevido de resíduos industriais de diversas empresas localizadas no seu
entorno. Neste caso, pode ser impossível a individualização do dano de cada uma das
empresas, pois todas contribuíram para a poluição gerada e devem ser responsabilizadas
solidariamente.
72
Para o Estado, existe uma teoria própria que fundamenta a responsabilidade objetiva, que é a teoria do risco
administrativo, mas que tem limites idênticos à do risco criado e do risco proveito, admitindo a aplicação das
excludentes. (DI PIETRO, 2000).
88
Mirra (2004) defende a solidariedade dos agentes causadores do dano quando,
havendo uma pluralidade de atos que, associados, geram um mesmo dano ambiental e o é
possível dissociar-se cada uma das suas causas. Na situação sob exame, qualquer dos
poluidores responderá por todo o dano, o que não persiste se for possível identificar os efeitos
decorrentes de cada uma das causas do dano. Ou seja, a solidariedade torna todos os
poluidores responsáveis, individual ou conjuntamente, pela reparação ou indenização do dano,
não podendo este fato representar o afastamento da responsabilidade de qualquer um deles,
que compartilham do mesmo nexo causal que gerou a lesão.
De acordo com Benjamin (1998, p. 38), “o modelo jurídico-ambiental, portanto, não
aproveita a solidariedade do Direito Civil Clássico, como a amplia, dando-lhe feições
peculiares”. Abrange não somente situações em que relação direta entre os sujeitos
responsáveis ou pela atividade que desenvolvem, mas em razão da indivisibilidade do dano,
por tratar-se o meio ambiente de uma unidade que não pode ser fragmentada.
O Estado pode ser incluído na posição de responsável solidário, pois a Constituição
Federal estabelece no parágrafo do artigo 225 o rol das atividades que incumbem ao Poder
Público, para a proteção ambiental
73
. Além disso, o comando exposto no caput do mesmo
dispositivo constitucional inclui tanto o particular quanto o ente público como responsáveis
pela manutenção do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Tratam-se, portanto, de
deveres legalmente impostos ao Estado e dos quais não pode eximir-se, sob pena de, em
sendo gerado dano ambiental, ser responsabilizado solidariamente.
Se o Estado compartilhar com o particular o nexo causal do dano, pode ser
responsabilizado. Tal compartilhamento pode ocorrer quando o Poder Público autorizar
indevidamente uma atividade lesiva ao meio ambiente, por exemplo, como também em casos
de omissão no seu dever de fiscalização. A responsabilidade estatal, assim, pode decorrer
tanto de atos comissivos quanto omissivos.
73
Dispõe o § do artigo 225 da Constituição Federal que: Para assegurar a efetividade desse direito,
incumbe ao Poder Público: I- preservar e restaurar a os processos ecológicos essenciais e prover o manejo
ecológico das espécies e ecossistemas; II- preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País
e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético; III- definir, em todas as
unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a
alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; IV- exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou
atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto
ambiental, a que se da publicidade; V- controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas,
métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente; VI- promover a
educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio
ambiente; VII- proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função
ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade".
89
A finalidade de um sistema de responsabilidade abrangente, sujeitando também os
indiretamente relacionados ao dano ambiental, inclusive o Estado, visa evitar que a lesão
ambiental não seja reparada. Sabe-se que a identificação do sujeito causador do dano muitas
vezes é difícil ou, quando este é localizado, pode estar insolvente, o que culmina com a
impossibilidade de recuperação do bem lesado.
Quanto ao controle estatal sobre as atividades potencialmente poluidoras, Wold (2003)
defende a existência de um princípio da responsabilidade estatal, através do qual cada país
pode ser responsabilizado pelo descumprimento de suas obrigações ambientais internacionais.
Significa que se algum particular praticar um dano ambiental que venha a atingir outro país, o
prejudicado pode buscar ressarcimento e reparação através das Cortes Internacionais. Para
isso, precisa restar demonstrado que o Estado foi omisso ou ineficiente no exercício de
jurisdição ou controle sobre seus nacionais e, ainda, o nexo de causalidade entre esta falta e o
dano causado a outro Estado. Ressalta que não será surpresa se algum país prejudicado pelo
aquecimento global, e que esteja sofrendo as conseqüências das mudanças climáticas, decidir
procurar responsabilizar internacionalmente os Estados Unidos pelos danos ambientais que
venha a sofrer em decorrência disso.
Assim, a posição de Wold (2003) ilustra a importância da atuação estatal efetiva e
favorável ao meio ambiente, uma vez que, além de assim se resguardar o equilíbrio ecológico,
também se evita sua responsabilização; quer solidária pelo direito pátrio, nas situações em que
compartilhar o nexo causal com o agente direto causador do dano; quer internacionalmente,
quando o dano extrapolar as fronteiras nacionais.
Importante que se refira que a possibilidade de responsabilização do Estado pode gerar
outro problema, pois a sociedade é quem acaba suportando o ônus do dano ambiental, a qual,
indiretamente, estará financiando-o. Por outro lado, diante do perfil constitucional concedido
ao bem ambiental, como essencial à sadia qualidade de vida, não se pode admitir que, por
conta disso, não seja reparado ou indenizado, que este é o interesse maior do instituto da
responsabilidade.
Diante disso, atenção deve ser dada à responsabilidade Estatal, evitando-se sua
incidência indiscriminada e desprovida de critérios, pois onera a sociedade e pode deixar
desamparadas certas situações de danos, os quais acabarão não sendo reparados. Prudência é
necessária também na aplicação da responsabilidade do Estado, especialmente quando o dano
for causado por sua omissão.
90
3.2 O Estado e os Danos Ambientais Gerados por sua Omissão
A Constituição Federal de 1988 dedica capítulo especial à Administração Pública, no
título dedicado à organização Estado, sendo que, no parágrafo do artigo 37
74
estabelece a
responsabilidade objetiva pelos danos causados por seus agentes. Trata-se da responsabilidade
extracontratual do Estado, a qual se regula pela teoria do risco administrativo (DI PIETRO,
2000).
Sempre que o ente estatal causar dano a terceiro responderá objetivamente, podendo,
no entanto, tal responsabilidade ser afastada em caso de culpa de outrem, caso fortuito e força
maior. Di Pietro (2000) trata da culpa do serviço público, a qual não está vinculada à culpa do
agente público, mas ocorre quando o Estado é omisso ou o serviço não foi bem executado,
seja por atraso na sua execução ou por mau funcionamento. Nestas hipóteses, refere que fica
configurada ou a culpa (falta) do serviço ou o acidente administrativo, por meio da teoria do
risco
75
.
O risco administrativo, para Cavalieri Filho (2007), pode ser sintetizado como o ônus
que impõe ao Estado o dever de reparar danos causados em decorrência do risco criado pela
sua atividade administrativa. Diferencia-o do risco integral e do acidente administrativo
afirmando que não se confundem, justificando ser o risco administrativo a teoria mais
adequada; pois, embora prescinda da configuração da culpa ou do dolo por parte do agente
público, permite que a responsabilidade seja afastada pelas excludentes. Refere que é
importante a distinção proposta para que se evite ser o Estado responsabilizado
indevidamente, nos casos em que o dano não decorre direta ou indiretamente da atividade
administrativa.
No tocante aos danos ambientais, situações em que o Estado deles participa de forma
direta, através de ato comissivo, mesmo que lícito, são consenso quanto à aplicação
responsabilidade objetiva baseada no risco administrativo. Se, durante a execução de uma
obra pública, por exemplo, o Poder Público vier a causar algum tipo de poluição, responderá
independentemente da licitude da atividade ou da culpa do agente. Diversamente, não
74
Dispõe o § do artigo 37 que: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de
serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o
direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
75
Di Pietro (2000) não diferencia risco administrativo, risco integral e acidente administrativo, afirmando
tratarem-se apenas de diferenças terminológicas, que a doutrina que analisa considera que a responsabilidade
do Estado é, efetivamente, objetiva, admitindo excludentes e atenuantes.
91
consenso na doutrina pátria para os casos em que o dano é causado de forma indireta ou por
omissão no exercício da atuação estatal.
Mirra (2003, p. 36) cita as situações em que resta caracterizada a omissão do Estado
em questões relacionadas ao meio ambiente:
Em primeiro lugar, as omissões do Poder Público no controle e na fiscalização das
atividades potencialmente degradadoras - hipótese em que a Administração deixa de
exercer ou exerce inadequadamente o poder de polícia ambiental, incluindo os casos
em que a Administração licencia ou autoriza indevidamente atividades degradadoras.
Em segundo lugar, as omissões do Poder Público na adoção de providências
administrativas necessárias à preservação e à restauração de bens e recursos
ambientais - hipótese em que o descumprimento de normas constitucionais e
infraconstitucionais que impõem ao administrador público determinadas condutas e
atividades de proteção a bens e recursos ambientais.
O Estado pode causar dano ambiental quando falhar no seu dever de fiscalizar, que é
corolário do poder de polícia administrativa. Tal poder, especialmente relacionado ao
licenciamento ambiental, no qual está incluída a obrigação de fiscalizar, é exclusivo do ente
estatal, incumbindo-lhe o ônus de controlar o exercício das atividades econômicas
potencialmente poluidoras, estabelecendo condições para estas práticas e exigindo o seu
cumprimento. A atuação do Poder Público, portanto, limita a ação dos particulares em vistas
ao interesse maior da coletividade e é bem sintetizada por Freitas (2002, p. 88): “O objeto do
poder de polícia é conciliar as atividades do cidadão, assegurando-lhe o exercício das
liberdades públicas, porém acomodando-o com o interesse público”.
O licenciamento ambiental é um importante instrumento de controle dos danos
ambientais, pois sujeita o exercício de certas atividades à autorização do Poder Público
quando, por sua natureza, representam risco de dano ambiental. Tal autorização pode não ser
concedida, caso fique comprovado que efetivamente o dano não será evitado ou trará sérias e
irreversíveis conseqüências. Ainda, a atividade pode vir a ser autorizada mediante a
imposição de condições que visem a manutenção do equilíbrio ecológico ou a mitigação dos
riscos ou reflexos dos danos.
A atuação estatal eficiente durante o licenciamento ambiental e também após ele,
através da fiscalização sobre o atendimento e observância às normas estabelecidas, é
fundamental para que lesões ao meio ambiente sejam evitadas. Falhas na fiscalização podem
induzir à responsabilidade solidária do Estado, já que indiretamente responsável pelo dano.
De outro lado, foi referido que o artigo 225 da Constituição Federal estabelece um
rol de obrigações à Administração Pública, em vistas à preservação do bem ambiental,
92
havendo, ainda, outras leis específicas que igualmente impõem ao Estado ônus desta ordem.
A omissão na prática das condutas objeto de normas jurídicas pode sujeitar o Estado à
responsabilização. Nesta hipótese, poderá figurar como responsável direto quando o dano
decorrer da sua esfera de ação; ou indireto, quando a sua omissão contribuir para danos
causados por terceiros.
Figurando o Estado como sujeito passivo da obrigação ambiental imputada pela
responsabilidade por atos omissivos, cabe questionar se subsistirá a teoria objetiva; pois, em
caso positivo, poderá significar a imputação ao Poder Público da obrigação de reparar grande
parte dos danos ambientais que ocorrem. Defendendo a adoção de critérios para a
responsabilidade estatal decorrente de omissões, Mello (2000) sustenta que solução diversa
levaria à prática de absurdos. Sustenta que “em princípio, cumpre ao Estado prover a todos os
interesses da coletividade” de forma que, diante de qualquer fato ou evento lesivo causado por
terceiro, poderia ensejá-la, como “um assalto em via pública, uma enchente qualquer, uma
agressão sofrida em local público, o lesado poderia sempre argüir que o ‘serviço não
funcionou’”. (MELLO, 2000, p. 797)
A aplicação indiscriminada da responsabilidade objetiva do Estado pode levá-lo à
condição de um “segurador universal”, pois em muitos casos não há qualquer falha na atuação
do ente público e, se houvesse, seria inquestionável a possibilidade de responsabilizá-lo, eis
que presente a antijuridicidade provocada pelo dolo ou pela culpa tipificada na negligência,
imprudência ou imperícia (MELLO, 2000). A responsabilidade do Estado, assim, ficaria
adstrita aos casos em que efetivamente configurada a culpa, em seu sentido lato, pela omissão
lesiva.
Jucovsky (2000) trata especificamente dos casos relacionados ao licenciamento
ambiental em que, assim mesmo, são gerados danos. Considera importante a
responsabilização do Estado sempre que houver dano e for configurada sua culpa in
omittendo, uma vez que todas as atividades potencialmente poluidoras estão subordinadas a
ele, sob a forma de fiscalização, vigilância ou controle. Assim, entende que, se o dano é
resultado da concessão de uma licença ilegal, é aplicável a teoria da responsabilidade
subjetiva. Se, mesmo tendo sido legal o licenciamento, o particular abusar ou extrapolar os
limites concedidos, no exercício de sua atividade, também será necessário comprovar a culpa
estatal pela omissão administrativa na fiscalização. Afirma que o licenciamento ambiental
acarreta a responsabilidade solidária da Administração pela teoria objetiva apenas se houver
dano ou sacrifício especial ao ambiente.
93
A visão de Jucovsky (2000) equivale à de Mello (2000), pois ambos sujeitam a
responsabilidade solidária do Estado a uma omissão inescusável, incidindo a teoria subjetiva.
Semelhante é a posição de Mukai (2004, p. 76-77), ao defender a possibilidade de
responsabilização do Estado somente quando configurada culpa grave que cause dano
ambiental, e prossegue:
[...] a responsabilidade solidária pode exsurgir no caso de licenças (ou autorizações)
legais, pelo critério da teoria objetiva, desde que haja um dano especial (sacrifício
especial) ao meio ambiente, afetando certas e determinadas pessoas da comunidade;
idem, pelo critério da teoria subjetiva, se o ato administrativo de licença for ilegal e
inescusável, a indicar manifestamente o mau funcionamento do serviço; idem, pelo
critério da culpa, se o ato de licença for ilegal, atribuível a um mau funcionamento
normal do serviço, desde que o dano seja especial e o comportando uma “margem
de tolerabilidade”; idem, pelo critério da culpa, quando a licença é legal, mas o
particular, ao implantar o empreendimento, o faz ao arrepio daquela, tendo em vista a
existência aí de culpa in vigilando ou in omittendo da Administração.
76
Para Mukai (2004) a regra é da responsabilidade subjetiva do Estado por ato omissivo
lesivo ao meio ambiente, devendo ser comprovada a culpa do agente público tanto na
concessão de licença ilegal quanto na legal, desde que o dano ambiental o seja especial,
mas inserido no que denomina de “margem de tolerabilidade”. Quando, no entanto, a omissão
provocar um dano especial ou um sacrifício especial ao meio ambiente, incidirá a
responsabilidade objetiva. O problema, porém, reside na identificação de uma “margem de
tolerabilidade” que torna o dano ou um sacrifício especial.
A importância do bem ambiental, por seu caráter essencial para a manutenção da
qualidade de vida das presentes e futuras gerações, por si só, faz com que qualquer dano seja
especial e um sacrifício. Não se vislumbra possibilidade de aplicação clara e correta dos
critérios de Mukai (2004), pela dificuldade de definição teórica de uma “margem de
tolerabilidade” para a omissão estatal. Se for praticada sua proposta, corre-se o risco de
estabelecer-se um marco inicial de alta tolerância, em que dificilmente poder-se-ia
responsabilizar solidariamente o Estado. Além disso, também há a possibilidade de instituição
de uma baixa tolerância, de forma que qualquer dano ambiental lhe seria imputado. Ambos os
extremos seriam ineficientes, um pela carência e outro pelo excesso, causando ainda maiores
prejuízos à sociedade, porque muitos danos ficariam descobertos de proteção (e reparação) e,
ainda, o ônus da responsabilidade seria transferido à sociedade, que é a mais prejudicada pela
lesão ambiental.
76
Sobre os critérios para a definição de atos escusáveis ou inescusáveis, verificar: MUKAI, Toshio. Direito
Ambiental Sistematizado. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.
94
Difícil é o estabelecimento de critérios objetivos para uma tolerabilidade das omissões
lesivas ao meio ambiente, pois o dano ambiental envolve uma série de peculiaridades, as
quais somente podem ser aferidas e mensuradas caso a caso.
Há, especialmente na doutrina estrangeira, críticas à responsabilidade objetiva por
danos ambientais, como a posição anteriormente referida, de autores chilenos. Semelhante é o
pensamento de Pantaleón (2001), o qual ilustra que também no Direito espanhol certa
resistência à responsabilidade solidária do Estado sem a comprovação da culpa na sua
atuação. Considera um despropósito o Poder Público ser responsabilizado de forma objetiva,
que naquele ordenamento jurídico a regra é a da teoria subjetiva. Entende que a forma
objetiva não é capaz de extirpar o dano do mundo, sendo simplesmente seu ônus transferido,
muitas vezes para inocentes, que restam obrigados a arcar com ele, tornando-os também
vítimas (neste caso, o Estado).
Embora Pantaleón (2001) argumente com base em legislação diversa da brasileira, na
qual o critério para a responsabilidade dos agentes privados é o da teoria subjetiva, diferente é
o sistema brasileiro, em que tanto os particulares quanto o Estado estão sujeitos ao regime da
responsabilidade objetiva por danos ambientais
77
. Com base neste argumento, alguns autores
defendem que, mesmo tratando-se de atos omissivos, deve o Estado responder objetivamente.
Schonardie (2005) sustenta que, em qualquer hipótese, deve o Estado responder se, em
decorrência da sua omissão, for gerado dano ambiental. Justifica que a finalidade desta
imputação é inibir condutas danosas ao meio ambiente, bem como retribuir o mau por elas
causado, pretendendo-se que o Poder Público efetive as práticas a ele impostas pela
Constituição Federal. Defende que duas ações são necessárias por parte do Estado, a primeira
refere-se a sua responsabilidade objetiva por omissões lesivas, e a segunda, é não permitir que
as normas protetoras do meio ambiente sejam violadas. Vindo a ocorrer tal violação, deve o
ente estatal aplicar as medidas sancionadoras efetivas, em vistas à reparação do dano. Ou seja,
para Schonardie (2005, p. 107), é diante da posição do ente público de “provedor e garantidor
do Estado de direito que não se pode ignorar a sua responsabilidade civil em relação aos
danos sofridos ao meio ambiente oriundos da omissão da administração pública”.
No mesmo sentido, Ferraz (1979, p. 38) defende a adoção da teoria do risco integral,
afirmando que:
77
A afirmação considera a regra para atos comissivos, ressalvando-se que para atos omissivos do Poder Público
persiste o debate em análise sobre a aplicação da responsabilidade objetiva ou a subjetiva.
95
[...] em termos de dano ecológico, não se pode pensar em outra colocação que não seja
a do risco integral. Não se pode pensar em outra malha senão a malha realmente bem
apertada que possa, na primeira jogada da rede, colher todo e qualquer possível
responsável pelo prejuízo ambiental. É importante que, pelo simples fato de ter havido
a omissão, seja possível enredar agente administrativo e particulares, todos aqueles
que de alguma maneira possam ser imputados ao prejuízo provocado para a
coletividade.
Embora se tenha tratado que a teoria do risco criado é a adotada pelo Direito
Ambiental brasileiro, a posição de Ferraz (1979) é importante, pois ilustra o pensamento de
parte da doutrina pátria, que defende o dever o Estado em reparar o dano mesmo que por
omissão. A finalidade da responsabilidade ambiental é que o dano não fique desprovido de
repressão, mas que todo aquele que tiver contribuído, de alguma forma, para sua
concretização, seja colhido pela malha legal.
Tanto Schonardie (2005) quanto Ferraz (1979), a exemplo de outros autores,
defendem um rigoroso sistema de responsabilidade civil diante da gravidade que os danos
ambientais encerram e, também, e mais enfaticamente, em razão do dever que é imposto ao
Estado de proteger e evitar os danos ambientais. Tanto é, que a Constituição Federal de 1988,
a qual o texto de Ferraz (1979) antecede, assim o prevê, impondo um rol de ações que
incumbem ao Poder Público, a fim de proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Qualquer infração ao dever do Estado, constitucionalmente previsto, de preservação
ambiental ou tendente a evitar a ocorrência de danos pode ser considerada ato ilícito e,
portanto, gerar sua responsabilização solidária e objetiva. Esta é a posição de Gandini e
Salomão (2003)
78
, pois concluem que havia um dever de agir imposto pela norma, e, diante da
omissão, foi violado. Analisando a doutrina
79
e a jurisprudência pátrias, concluem que o
pensamento majoritário é no sentido da responsabilidade estatal objetiva por conduta
omissiva, pois tal comportamento deve ser considerado como causa do dano e não simples
condição deste. Ainda, pois o parágrafo do artigo 37 da Constituição Federal contempla
não apenas a responsabilidade por atos comissivos, mas também omissivos.
Sobre a diferença entre causa e condição, Mello (2000, p. 796) explica que “Causa é o
fator que positivamente gera um resultado. Condição é o evento que não ocorreu, mas que, se
houvera ocorrido, teria impedido o resultado”. A omissão do Estado, portanto, não seria uma
causa para o dano, mas uma condição e, prevendo o parágrafo do artigo 37 da Constituição
78
Embora, no texto, os autores não tratem propriamente da responsabilidade ambiental, mas a genérica, sua
abordagem pode ser abrangida na análise proposta.
79
Gandini e Salomão (2003) enumeram que dentre os que defendem a natureza objetiva da responsabilidade
estatal por omissão estão Yussef Said Cahali, Odete Medauar, Álvaro Lazzarini, Carvalho Filho e Celso Ribeiro
Bastos; e, pela natureza subjetiva, Celso Antônio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Lucia
Valle Figueiredo.
96
Federal a responsabilidade do Estado pelos danos que “causar” e não os que “condicionar”.
Deste modo, a teoria objetiva seria aplicável, na visão de Mello (2000), somente aos atos
comissivos.
Contrariando a posição de Mello (2000), Gandini e Salomão (2003) afirmam que a
evolução da responsabilidade do Estado para a teoria objetiva
80
visou, acima de tudo, evitar
que o lesado tenha que provar a culpa do agente, diante da dificuldade que isso envolve.
Assim, considerando que ainda mais difícil é a prova da omissão, seria um contra-senso
admitir-se a aplicação da teoria subjetiva e exigir-se a prova da culpa do agente público. Por
isso, basta que o ente estatal prove que não tinha o dever de agir ou demonstre alguma das
excludentes para que sua responsabilidade seja afastada. Tais argumentos frustrariam a
alegação de que a teoria objetiva erige o Estado a segurador universal.
O raciocínio semântico do parágrafo 6º do artigo 37 da Constituição Federal, relativo à
diferença entre causa e condição e, portanto, sua aplicabilidade somente para condutas
comissivas, demonstra não se sustentar diante da evolução da responsabilidade estatal, a qual
afastou o critério da culpa. No entanto, admitir-se uma amplitude sem critérios para a
responsabilidade do Estado por omissões lesivas ao meio ambiente, talvez o seja a melhor
alternativa, impondo-se que seja aplicada e analisada com razoabilidade, no caso concreto.
Tratando do dever estatal de evitar excessos e omissões, e, inclusive, referindo a teoria
aristotélica da virtude, que orienta para o justo meio, Freitas (2005) defende a adoção de
critérios de proporcionalidade. Expõe argumentos em favor de uma teoria da responsabilidade
objetiva proporcional, a qual preconiza não a adoção do risco integral, mas uma análise do
caso concreto, para aferição da sua incidência em casos de omissões lesivas ao meio
ambiente
81
. Sustenta que o princípio da proporcionalidade veda tanto os excessos quanto as
inoperâncias, sendo mais recomendável uma responsabilidade mitigada por ele para que se
evitem tanto um quanto outro: sejam os danos gerados pela omissão ou os excessos que
transformam o Estado em segurador universal.
A proporcionalidade na análise do caso concreto possibilita que se vislumbrem
situações em que, embora presente a omissão do Estado, podem ser aplicadas excludentes de
80
Anteriormente à teoria objetiva pelo risco administrativo, aplicava-se uma teoria da "faute du service", oriunda
do direito francês e que era traduzida como falta ou culpa do serviço. Por esta teoria, a responsabilidade do
Estado ficava sujeita à comprovação da culpa, a qual veio em substituição a regime ainda mais antigo, que não
admitia a responsabilização, sob uma premissa de infalibilidade do Poder Público.
81
Embora o autor considere que toda omissão pode ser considerada um ato antijurídico, pois, no mínimo, viola o
princípio da proporcionalidade, defende que deve ser punida “a omissão despida de motivos plausíveis”, diante
do dever do Estado em zelar pela eficácia dos direitos fundamentais. (FREITAS, 2005, p. 36).
97
responsabilidade, as quais, tratando-se de dano ambiental, ensejam uma análise proporcional.
Assim, a teoria da responsabilidade objetiva pode ser aplicada, também, aos danos gerados
por omissão estatal, baseada no risco administrativo.
Teoria que detalha os tipos de omissão e a correspondente responsabilidade é tratada
por alguns autores, como é o caso de Cavalieri Filho (2007), que considera a diferença entre
omissão genérica e omissão específica. A omissão específica se configura quando “o Estado,
por omissão sua, crie a situação propícia para a ocorrência do evento em situação que tinha o
dever de agir para impedi-lo” (CAVALIERI FILHO, 2007, p. 231). Entretanto, não havendo
prescrição de um dever específico e individualizado, a omissão seria genérica, para a qual se
impõe a responsabilidade subjetiva, enquanto que para a específica, a objetiva.
Tratando-se de dano ambiental, sem dúvida que um dever específico da atuação
estatal em vistas a evitá-lo, pela previsão constitucional neste sentido, razão pela qual é
possível que, também por este argumento, adote-se a teoria objetiva da responsabilidade do
Estado por danos ambientais que decorrem de sua omissão. Deve estar demonstrado o nexo
causal entre o dano e a omissão do ente estatal, bem como se atentar para a aplicabilidade de
critérios de proporcionalidade que orientem a incidência de excludentes.
O Poder Público tem o dever específico de fiscalizar a atuação particular, visando à
proteção do bem ambiental, bem como de adotar políticas públicas com a mesma finalidade.
Existe, por exemplo, o dever individualizado de promover a educação ambiental, em todos os
níveis de ensino, bem como a conscientização pública sobre a defesa do meio ambiente, do
qual existem dúvidas se efetivamente está sendo observado ou se o Poder Público se mostra
omisso.
Assim, parece mais adequada a aplicação da responsabilidade objetiva ao Estado tanto
quando o dano decorrer de ato comissivo, quanto omissivo. A análise do caso concreto,
amparada em critérios de prudência, permitirá a aplicação de excludentes e o conseqüente
afastamento do ônus ao ente estatal.
Considerando-se que muitas vezes os danos ambientais são gerados por
desconhecimento ou por falta de consciência popular, ressalta-se a importância da educação
como instrumento de concretização da prudência e como prática efetiva dos princípios da
prevenção e da precaução.
98
Diante das tímidas políticas públicas voltadas para a educação ambiental, seria
possível imputar ao Estado o ônus de todo e qualquer dano ambiental? Poderia o Estado ser
responsabilizado se, em razão da sua omissão específica em educação ambiental, o bem
ambiental é lesado?
3.3 Prudência e Educação: analisando a omissão estatal
A responsabilidade ambiental, no ordenamento jurídico brasileiro, muito mais do que
apenas representar uma sanção ao poluidor, visa reparar o dano que atinge uma categoria
especial de bens jurídicos, relacionados à qualidade de vida. Pode-se afirmar que seu objetivo
primordial é prevenir que tais danos se concretizem, razão pela qual se admite a solidariedade
do Estado também quando for omisso no seu dever constitucional de proteção ambiental.
A responsabilidade estatal abrange todos os entes da federação, e pode ser imputada a
mais de um deles em um mesmo caso de dano ambiental, se existirem condições fáticas para
tanto. Passar-se-á à análise de algumas decisões judiciais que ilustram hipóteses de
responsabilização solidária do Estado, decorrentes de omissões.
O 1º Grupo de Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul
deu provimento ao recurso de Embargos Infringentes (EI n. 70001620772) oriundos de Ação
Civil Pública proposta pelo Ministério Público contra a empresa Plastimix Indústria e
Comércio de Plásticos Ltda.
82
e, também, o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de
Porto Alegre. Tratava-se de um caso de dano ambiental causado pelo despejo de água
contaminada em um valo cujo destino final era o Rio Guaíba. A sentença condenou
solidariamente os demandados, vindo, em sede recursal, a ser afastados ambos os entes
estatais, em acórdão não unânime, o que ensejou os Embargos em referência.
O voto divergente proferido na Apelação Cível, que acabou sendo o adotado pela
maioria dos julgadores nos Embargos Infringentes, admitiu a responsabilidade tanto do
Estado quanto do Município pelo dano provocado pela empresa, de forma que ambos os réus
foram condenados a repará-lo. Neste caso, o Tribunal aplicou a teoria da responsabilidade
subjetiva aos entes estatais, ficando caracterizada, no entendimento dos desembargadores, sua
82
Empresa responsável pela reciclagem de plásticos (polietileno) para a fabricação das embalagens do
desinfetante de nome comercial Q-boa.
99
culpa pela negligência na adoção de medidas que evitassem o dano em questão e, portanto,
pela falha do poder de polícia.
A decisão fundamentou-se no fato de que, mesmo tendo sido instaurado expediente
administrativo pelo Ministério Público e enviados ofícios à Fundação Estadual de Proteção
Ambiental (FEPAM)
83
requisitando informações sobre a existência de licenciamento
ambiental exigido à empresa poluidora, nada havia e nenhuma medida foi tomada. Quanto ao
Município de Porto Alegre, igualmente a decisão reconhece sua negligência, pois chegou a
autuar a empresa, mas não foi aplicada sanção, apenas concluído que sua conduta
caracterizava falta de seriedade e compromisso no que se refere à destinação dos seus
efluentes.
No acórdão; porém, o Desembargador Élvio Schuch Pinto, presidente da seção, afirma
que, embora reconheça a eficiência do Ministério Público da defesa ambiental, em certos
casos comente excessos, como o que entende ocorrer no processo sob julgamento. Declara
que a empresa era de pequeno porte, razão pela qual não era evidente o potencial poluente,
igualmente não gerando presunção ou suspeição de impacto ambiental. Assim mesmo, a
maioria dos julgadores optou pelo reconhecimento da culpa do Estado e do Município.
Na decisão examinada, a prova pericial não parece ter sido conclusiva, pois
obscuridade quanto aos danos causados pela lavagem do polietileno, divergindo os julgadores
neste aspecto. A situação ilustra a incerteza que permeia o contexto atual e a qual muitas
vezes é submetido o Judiciário. Se aplicado unicamente o princípio da prevenção, poderia se
afirmar que a inexistência de conclusão rigorosa sobre as conseqüências da atividade impede
sua proibição. No entanto, diante da dúvida, necessária a aplicação, também, do princípio da
precaução. A situação examinada comprova a tese de que atualmente é difícil, ou impossível,
a aplicação isolada dos princípios da prevenção e da precaução, justificando a prudência como
um grupo lógico destes princípios.
Retomando-se a análise da posição do Judiciário, o Superior Tribunal de Justiça (STJ)
mostra entendimentos divergentes, um deles no sentido da aplicação da teoria subjetiva em
casos de danos ambientais que haja a participação do Estado em caráter omissivo. No
julgamento do Recurso Especial oriundo de Ação Civil Pública ingressada contra a União, o
Estado de Santa Catarina e algumas empresas e seus representantes legais (REsp 647.493-
SC), em razão de poluição causada por atividades mineradoras, essa foi a posição adotada.
83
Órgão administrativo do Estado do Rio Grande do Sul, sem personalidade jurídica, por isso a ação foi proposta
contra o Estado.
100
Inicialmente, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina modificou a sentença,
afastando a responsabilidade do Estado, mantendo unicamente a da União, prevalecendo o
entendimento de que houve comprovação de uma atuação intensa em prol do meio ambiente
por parte daquele. O STJ, assim, reforçou a responsabilidade da União, uma vez que é seu
dever constitucional a fiscalização de atividades mineradoras, inexistindo discricionariedade,
“mas obrigatoriedade de cumprimento de conduta impositiva” (REsp 647.493-SC)
84
.
Pela aplicabilidade da responsabilidade objetiva nos casos em que o Estado for omisso
no seu dever de proteção ambiental, o Recurso Especial que envolve o Estado do Paraná, o
IBAMA e o Município de Foz do Iguaçu, em decorrência de danos causados por obra pública
executada pela municipalidade e financiada pelo governo estadual, assim ilustra (REsp
604.725-PR). Neste processo, o nexo de causalidade a imputar a responsabilidade solidária e
objetiva dos réus ficou caracterizado pela não exigência de Estudo de Impacto Ambiental,
que apenas fora concedida uma licença pelo IBAMA, quando na verdade a competência para
isso era do Estado do Paraná.
O STJ decidiu que os parágrafos do artigo 225 da Constituição Federal definem as
diretrizes para a defesa do meio ambiente por parte do Estado, bem como as conseqüências da
inobservância e a natureza objetiva da responsabilidade nesses casos (REsp 604.725-PR).
Neste sentido, quando o ente estatal deixar de cumprir o determinado pela norma
constitucional e sua inação vier a contribuir para um dano ambiental, deverá ser
responsabilizado de forma solidária e objetiva com o causador direto do dano.
Entendimento semelhante foi exposto no julgamento de Agravo de Instrumento (AI
822.764-MG) em que, além do Estado de Minas Gerais, também a Fundação Estadual do
Meio Ambiente FEMA, o IBAMA, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social BNDES, o Departamento Nacional de Produção Mineral DNPM e o Instituto
Mineiro de Gestão das Águas foram acionados juntamente com a empresa que diretamente
causou o dano e seu representante legal. Todos os réus foram condenados solidariamente e,
para fundamentar o dever do Estado, são repetidos os argumentos do Recurso Especial antes
citado (REsp 604.725-PR).
Como se vê, as decisões judiciais ilustram que não existe consenso no Judiciário sobre
a aplicabilidade da teoria objetiva ou subjetiva nos casos de omissão estatal lesiva ao meio
ambiente. No entanto, o rigor em questões ambientais parece evidente, pois mesmo nos casos
84
Neste caso, a responsabilidade da União decorre, também, do comando infraconstitucional do Decreto-Lei
227/67, que lhe confere competência privativa para fiscalizar a atividade mineradora.
101
em que admitido o critério subjetivo, e examinada a culpa do Estado, esta restou configurada,
culminando com a aplicação da responsabilidade.
Nas decisões sob exame, a Justiça acolheu como válidas as provas existentes nos autos
relativamente à culpa do Estado. Na primeira, proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul, a condenação decorreu do fato de que, embora tendo sido levada ao
conhecimento dos entes estatais a poluição ou sua potencialidade (já que o Ministério Público
instaurou procedimento administrativo), estes foram omissos, não tomando nenhuma
providência fiscalizatória, sequer para verificar a procedência dos fatos.
Ocorre que situações em que a prova da culpa do Poder Público é difícil ou
impossível. Além disso, estando sujeita à análise do julgador, que decidirá com base nas suas
convicções, pode vir a ser considerada insuficiente ou inexistente para ensejar uma
condenação. Portanto, haverá casos de afastamento total da responsabilidade do Estado,
mesmo tendo sido omisso no seu dever de proteção ambiental. Por esta razão é que se defende
a adoção da teoria objetiva, que a inércia do ente estatal configura omissão específica, pelo
desrespeito do disposto nas normas constitucionais.
A aplicação da teoria objetiva tanto para os casos de ações quanto de omissões lesivas
ao meio ambiente não representa a submissão do Estado à condição de segurador universal, já
que permanece admissível a incidência de alguma das excludentes: culpa da vítima ou de
terceiro, caso fortuito ou força maior. Deste modo, apenas estar-se outorgando ao Estado o
mesmo regime de responsabilidade aplicável aos particulares, diante do dever constitucional
que lhe é imposto, especificamente.
Assim, na análise do caso concreto é que será verificada a possibilidade de
responsabilização do ente estatal, sendo-lhe oportunizada a oposição das excludentes. O
julgamento dos fatos deverá pautar-se em critérios de razoabilidade e, principalmente, de
prudência, pois é o princípio responsável pela opção da mediania adequada a cada situação.
Hobuss (2007) refere que a prudência é o que orienta a virtude, mas ela depende da
experiência e da percepção para sanar falhas, que são fruto da generalidade das leis. foi
mencionado o seu entendimento no sentido de que as leis são uma universalização e, portanto,
não possuem conteúdo objetivo, adquirindo-o somente na sua aplicação prática, pelo acesso
às circunstâncias, já que elas limitam-se ao que acontece a maioria das vezes.
102
A característica de generalidade é inerente às normas jurídicas, pois não é possível que
prevejam cada caso, especificamente, mas devem ser adequáveis às mais diversas situações,
embora impossível que pressuponham todas as hipóteses com perfeição. A virtude,
conseqüentemente, está em aplicar corretamente a norma ao caso concreto, evitando que
ocorram falhas nessa dinâmica.
Na análise da responsabilidade do Estado por danos decorrentes da sua omissão,
devem ser considerados os extremos (responsabilização e não responsabilização), bem como
analisadas as possíveis condições que excluiriam esse ônus, e, através da prudência
85
, optar-se
pela mediania mais adequada, pela aplicação ou pela isenção do dever de reparar ou
indenizar. É no caso concreto que se definirá a possibilidade de responsabilizar o ente estatal
pela omissão lesiva ao meio ambiente, equilibrando as imposições constitucionais de atuação
positiva e efetiva (dever específico), com o cuidado de não gerar abusos e levá-lo à condição
de segurador universal.
Por isso, Hobuss (2007) trata da experiência como importante aliada da prudência,
pois não é possível deliberar e conhecer todos os particulares ou os detalhes de cada caso, mas
esta virtude é relacionada com os particulares, pois pressupõe a percepção e a experiência. O
agir prudente analisa, através da percepção, as circunstâncias que definirão o caminho do
meio, a melhor decisão para a situação. A experiência é fruto da percepção aplicada.
No atual contexto social de incerteza científica, o qual é teorizado na concepção de
sociedade de risco, a necessidade da prudência como princípio do Direito Ambiental é
evidente. Já se mencionou que a aplicação isolada dos princípios da prevenção e da precaução
não é adequada para a regulação das situações que se apresentam no atual conjunto de
constantes inovações tecnológicas e científicas, exigindo-se a utilização integrada de ambos,
como um grupo lógico
86
.
O que orientará as ações que interferem no meio ambiente é a prudência, como meio
para apuração da responsabilidade do Estado, que utilizada na aferição da incidência das
excludentes de responsabilidade em casos de omissões lesivas. Ainda, serve como princípio
85
A análise dos extremos é sugerida com base na teoria aristotélica de phronesis como virtude da mediania.
86
A decisão judicial antes referida (EI n. 70001620772) ilustra a situação, pois a mesma prova pericial conduziu
a entendimentos divergentes, não apresentando uma conclusão certa sobre a poluição pela atividade
desenvolvida pela empresa demandada na ação. Neste caso, aplicável o princípio da prudência, a fim de orientar
o julgamento do caso, em busca da mediania que melhor atenda à situação.
103
orientador que agrupa prevenção e precaução, representando os limites da proteção ambiental,
sem que isso figure como um obstáculo ao desenvolvimento econômico
87
.
A prudência poderá ter nuances e aplicações diversas, mas, em qualquer âmbito,
denota a orientação para a mediania, o princípio que auxiliará a decisão sobre os riscos e
incertezas que permeiam a atual sociedade. Através da análise das circunstâncias, pela
percepção e pela experiência, representando a prudência um conceito geral e universal,
permite-se que se adapte às mais diversas situações e esteja em constante renovação. Significa
que uma atividade que, em um momento, deveria ser evitada, em outro talvez não mais o seja,
uma vez que novos conhecimentos ou uma experiência anterior sugiram orientação contrária.
O princípio da prudência fornece os meios necessários para que o Judiciário verifique
a possibilidade de responsabilizar o Estado por omissões lesivas ao bem ambiental,
considerando a incidência de excludentes. Na análise dos casos concretos é que se construirá a
aplicação do princípio, pois somente desta forma será possível a proteção ao meio ambiente
sem o cometimento de excessos que imputem ao ente estatal a responsabilidade por todo e
qualquer dano ambiental.
Utilizar a prudência, destarte, exige capacidade de reconhecer a mediania no caso
concreto, optar pela decisão correta, que melhor atenda às peculiaridades da situação, com
base na experiência e no conhecimento. A prudência permite interpretar e subsumir
corretamente o Direito Ambiental.
Schonardie (2005, p. 107), ao defender a responsabilidade objetiva do Estado quando,
por omissão, causar dano ambiental, apresenta uma reflexão que se harmoniza com o debate:
A complexidade dos modernos problemas ambientais está não apenas no problema de
se imputar a alguém a responsabilidade pelo dano causado ao meio ambiente, mas em
demonstrar o porquê de dever responder por este dano e indenizar a coletividade.
Desse modo, estar-se-á impulsionando uma conscientização a respeito da importância
da tutela ambiental, bem como do equilíbrio ecológico na vida de todos os seres
humanos, ou, pelo menos, na maioria deles.
A responsabilidade, além de unicamente punir o agente ou reparar o dano, visa
suscitar a reflexão sobre a importância da proteção do bem ambiental. A inserção do Estado
como responsável solidário quando for omisso no seu dever de preservação do meio
ambiente, muito mais do que lhe transferir o ônus da degradação, é uma forma de impulsionar
87
Lembre-se que talvez o maior desafio da precaução seja o estabelecimento dos critérios para sua
aplicabilidade, sem que represente um obstáculo ao crescimento econômico e desenvolvimento científico, que
é aplicável em casos de incerteza. Implementar o modelo de desenvolvimento sustentável, equilibrado e que
satisfaça às necessidades sociais, econômicas e ambientais é a dificuldade.
104
a ação voltada a políticas públicas mais eficientes, evitando a reiteração da sua inércia e
provocando a conscientização sobre isso. Esta reflexão também é importante para a
concretização da prudência ambiental, por meio da atuação estatal fiscalizatória através do
poder de polícia ou promovendo iniciativas de fortalecimento da ecocidadania.
Trata-se de difundir os valores afetivos negativos, conforme o pensamento de
Layrargues (2000) antes referido; ou seja, os ônus decorrentes da inércia estatal no seu dever
constitucional de evitar a utilização irracional dos recursos naturais e a degradação do bem
ambiental, pelos particulares. A finalidade da responsabilidade, além de reparar o bem
jurídico de valor imensurável e essencial para a sadia qualidade de vida do homem, também é
impulsionar a reflexão e a conscientização sobre a importância de preservá-lo, mais do que
apenas remediar os males a ele causados.
A responsabilidade, atualmente, assume uma nova dimensão, diante da realidade de
risco e de incerteza, que exige avaliação e ação de acordo com imperativos de prudência, de
defesa da vida. É a ética da responsabilidade, defendida por Jonas (2006), e exigida pelos
perigos decorrentes dos avanços científicos e tecnológicos.
De acordo com Jonas (2006), a vulnerabilidade da natureza e os perigos decorrentes da
tecnologia como vocação da humanidade, justificam o deslocamento da responsabilidade para
o centro da ética, o que não ocorria anteriormente em razão de nunca ter aparecido como
elemento afetivo da constituição da vontade. Recentemente, em razão das mudanças que
envolvem os avanços científicos, verifica-se que a preocupação com o futuro envolve outros
problemas, mais graves dos que em tempos remotos se apresentavam. A responsabilidade
assume papel central na moral, porque passa do querer para o dever, que é obrigação do
homem controlar o poder sobre sua vontade. Não é mais uma opção, é obrigação.
O poder do homem, emancipado pelo arbítrio e pelo saber, tornou-se uma importante
ferramenta de manipulação do seu destino, razão pela qual Jonas (2006) defende a
necessidade de autocontrole, de exercício consciente deste poder, a fim de evitar
conseqüências drásticas para o futuro da humanidade. Por isso é que afirma que a
responsabilidade é fruto da união do poder com a razão, e “O poder e o perigo revelam um
dever, o qual, por meio da solidariedade imperativa com o resto do mundo animal, se estende
do nosso Ser para o conjunto, independentemente do nosso consentimento” (JONAS, 2006, p.
231).
105
A responsabilidade, como um elemento da ética, é um imperativo da atual sociedade,
uma vez que o poder do homem sobre as coisas é destrutivo e contribuiu para a necessidade
de expansão da mesma. Não é mais opção, agir com responsabilidade é um dever. É dever
controlar o poder que o ser humano possui e a responsabilidade é justamente a racionalização
disso, em vistas aos perigos inerentes às presentes e futuras gerações.
A solidariedade imperativa do homem com o resto do mundo animal não é mais
resultado do seu consentimento, mas um ônus que integra a moral. Os avanços científicos e
tecnológicos, que podem provocar sérias conseqüências presentes e também futuras, é que
transformam a responsabilidade em um valor afetivo, não possuindo apenas um fundamento
racional, mas também psicológico, capaz de influenciar a vontade e controlar o poder do
homem. Assim, para Jonas (2006), a necessidade de que os prognósticos pessimistas e
maus, devam prevalecer, provocando um certo temor sobre esse poder e sobre as dimensões
que pode atingir, vindo a responsabilidade a obter a dimensão de um sentimento, um valor
afetivo.
Para que o homem assuma o dever ético de responsabilidade que os tempos atuais
exigem, a prevalência dos valores afetivos negativos mostra-se como a melhor alternativa,
pois este dever assumirá a condição de sentimento e integrará sua postura e seu agir. Será
uma responsabilidade determinada pelos fins, uma ética da responsabilidade futura, de
responsabilidade do homem perante o próprio homem, reciprocamente, ocupando espaço
central na ética. Somente será ético quem for responsável.
Agir de forma irresponsável para Jonas (2006), significa exercitar o poder sem
observar o dever. Cita como exemplo o caso do pai de família que arrisca no cassino todos os
seus bens, situação que se reverte caso o jogador não tenha filhos. A responsabilidade de ter
de sustentar e manter uma família (dever) é que exige a racionalização do poder, tendo
presente o sentimento ou o valor subjetivo da sua obrigação. O homem contemporâneo tem o
dever de preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras
gerações, de forma que precisa vislumbrar esta obrigação sempre que tomar alguma atitude ou
que exercitar seu poder. Será irresponsável se não observar isso, eis que imprudente.
O Estado tem o dever constitucional de preservar o meio ambiente, de promover a
educação ambiental. Se, no exercício de suas atividades, não cumprir essa obrigação, esta
sendo irresponsável, agindo contrariamente à ética da responsabilidade.
106
A ética da responsabilidade, no entanto, não pode ser restringida única e
exclusivamente ao aspecto ambiental. Deve ser o primeiro elemento a orientar as políticas
públicas visando a restrição de certas atividades desnecessariamente poluidoras e prejudiciais,
mas não o único elemento, que o bem ambiental corresponde ao direito de todos à sadia
qualidade de vida, o que inclui aspectos sócio-econômicos. se referiu a visão de Derani
(2001), no sentido da abrangência do significado da proteção constitucional da qualidade de
vida, que é corolário do princípio do desenvolvimento sustentável.
A atuação estatal deve estar pautada nesse novo modelo sustentável de
desenvolvimento, baseado no equilíbrio entre os aspectos sócio-econômicos e ambientais.
Mais uma vez justifica-se a adoção de critérios de prudência para a aferição da
responsabilidade do Estado por omissão, pois mesmo assumindo um papel no centro da ética,
o ônus de reparar ou indenizar o dano ambiental deve ser sopesado em face dos demais
interesses e valores que integram a noção constitucional de qualidade de vida.
Schonardie (2005, p. 98) aborda o pensamento de Derani (2001) defendendo que a
precaução não está unicamente pautada no risco da atividade, mas na necessidade da
sociedade assumi-los sem ferir sua qualidade de vida, concluindo que:
A precaução, como referido anteriormente, não está assoalhada no risco, mas em se
saber se para determinada comunidade a atividade de risco para o meio ambiente a ser
empreendida é necessária ou não. Se a resposta for afirmativa, deve-se considerar até
que ponto serão tolerados pela sociedade seus efeitos danosos e como tais efeitos
serão neutralizados por essa sociedade.
Na atuação estatal, não é somente o risco da atividade que deve ser considerado, mas
sua necessidade para a satisfação da qualidade de vida social. Sendo dever do Estado
controlar, regular e fiscalizar os particulares e suas condutas potencialmente lesivas ao meio
ambiente, a ética da responsabilidade parece orientada de acordo com a responsabilidade
objetiva. Requer, porém, atenção na aplicação de excludentes, levando-se em conta a
abrangência e o perfil constitucional do bem ambiental, ao qual estão inseridos os aspectos
sócio-econômicos.
Políticas públicas eficientes são as que consideram o princípio do desenvolvimento
sustentável, de forma que a omissão estatal, para ser alvo de responsabilidade objetiva, deve
também infringi-lo. Nos casos judiciais examinados anteriormente, não foi analisado
explicitamente se havia a efetiva necessidade da prática das atividades, a ponto de justificar a
assunção dos riscos e a passividade do Estado. No entanto, ficou configurada a gravidade do
dano, sendo responsabilizado o ente estatal solidariamente com os particulares.
107
Kuiava (2007) reflete a responsabilidade de acordo com a teoria de Jonas (2006),
sustentando que atualmente ela representa o princípio orientador para as decisões que
interferem nas diferentes formas de vida, em razão dos avanços tecnológicos e científicos que
oferecem riscos ao futuro da humanidade, inclusive, quanto à sobrevivência das mesmas.
Assim, a responsabilidade não é fruto de uma boa vontade, mas de uma exigência, uma
resposta a um chamado.
O chamado da responsabilidade é feito pela necessidade de gerir os riscos diante da
preservação da qualidade de vida das presentes e futuras gerações, sendo fundamental para
isso a defesa do meio ambiente, mas sem obstaculizar o desenvolvimento social e econômico.
Kuiava (2007) transpõe para a Administração Pública a ética da responsabilidade, defendendo
que o poder deve ser exercido para os outros e não sobre os outros; ou seja, as políticas
públicas devem estar voltadas à premissa da responsabilidade, a qual é um dever do homem
para com o homem. O Estado deve agir em vistas ao interesse social e não sobre este
interesse, por isso é que Kuiava (2007, p. 58) afirma que o princípio ético de Jonas (2006) é
aplicável não somente ao particular, e conclui que:
[...] mister se faz, no campo da gestão pública, criar projetos difusores da justiça social
em que a dimensão ética seja incorporada ao lado dos saberes técnicos ou legais para
o favorecimento de todos. O princípio da responsabilidade de Jonas, nesse sentido, é
uma orientação para uma política responsável. Trata-se de um convite a cada ser
humano para ampliar os horizontes da ética e da política e ajude a construir um mundo
mais humano para todos.
Também com base na ética da responsabilidade, de Jonas (2006), é possível que se
fundamente a responsabilidade objetiva do Estado por omissões lesivas ao meio ambiente. É
dever objetivo de todos, inclusive do ente estatal, construir um mundo mais humano, fundado
na responsabilidade do homem em relação ao próprio homem para assegurar a qualidade de
vida também das futuras gerações, exercendo o poder em favor da sociedade e não sobre ela.
Neste sentido é que o Poder Público deve agir positivamente, inserindo valores éticos na sua
atuação, por meio de políticas responsáveis e que favoreçam a difusão da ética.
O Estado deve pautar seus atos administrativos na ética da responsabilidade, pois cabe
a ele regular a atuação dos particulares, dispondo de instrumentos para isso, como o
licenciamento ambiental. Os casos judiciais analisados bem ilustram, pois apesar dos recursos
à disposição, naquelas situações o Poder Público foi omisso de tal forma que danos
ambientais graves ocorreram. Não deve ser proibida toda e qualquer atividade que cause
impacto ambiental, mas analisados com prudência os fatos, a fim de que a atuação estatal seja
de acordo com o chamamento à responsabilidade que os riscos exigem.
108
Sugere-se uma análise complexa da atuação do Poder Público no caso concreto, com
base em critérios de prudência e considerando os aspectos sócio-econômicos da atividade. Isto
permitirá a aplicação segura da responsabilidade objetiva, mesmo em situações em que a sua
omissão contribuir para a ocorrência de danos ambientais, evitando que lesões fiquem sem
reparação e dando-se efetividade ao dever constitucional imposto ao Estado, mas sem permitir
que assuma a posição de segurador universal. Além disso, também se estará possibilitando a
construção de uma reflexão capaz de induzir à conscientização sobre a importância da tutela
ambiental.
O papel do Estado na proteção do meio ambiente é fundamental, que a defesa da
qualidade de vida depende de políticas públicas comprometidas com o interesse social e que
observem a ética da responsabilidade. Responsabilidade que não tem somente caráter
expiatório, mas uma finalidade maior, ligada ao estímulo da prevenção de danos futuros e,
assim, concretizando o princípio da prudência, pela construção de uma consciência ambiental
coletiva, sob a abordagem dos valores afetivos negativos inerentes ao rigor da
responsabilização.
A educação, conforme tratado no capítulo anterior, pode ser uma forma prática da
prudência ambiental, na medida em que proporciona uma visão complexa dos mais diversos
aspectos da sociedade, possibilitando a compreensão integrada dos vetores sociais. A
educação não visa apenas informar, mas oferecer o conhecimento capaz de induzir à reflexão
sobre de que forma o homem pode praticar o desenvolvimento sustentável optando pela
mediania capaz de preservar sua qualidade de vida e o equilíbrio ecológico. Desconhecendo a
importância da preservação ambiental ou estando inapto a reconhecer a necessidade de o
obstar o crescimento econômico, social e científico, dificilmente a prudência ambiental, na
concepção aristotélica de virtude mediana, será alcançada.
É possível, portanto, que se vincule o princípio da responsabilidade de Jonas com a
educação ambiental, relação que é construída por Hoepers (2005) ao defender a necessidade
de um trabalho conjunto da ética e da educação, fundada na construção de uma consciência
temerária capaz de se contrapor ao excesso de poder. Para ele, a prudência é que impulsiona
um estudo aprofundado dos impactos dos atos humanos.
A consciência baseada no temor ou a prevalência dos maus prognósticos em relação
aos resultados das atividades que o homem realiza na natureza, contribui para sua
conscientização e para a inserção da ética no conhecimento técnico e científico, o que deve
ser priorizado também pela educação. Neste sentido, Hoepers (2005, p. 71):
109
A educação tem um papel significativo nesta maximização do conhecimento das
conseqüências, unindo um saber objetivo-técnico-científico com um saber ético-
valorativo. Dessa maneira, poderá ser mais eficaz um discernimento que possa prever
e impedir riscos futuros para a humanidade e para o planeta. A educação, com certeza,
tem muito a contribuir nesse processo de precaução e ajudar a alertar para os
verdadeiros perigos de uma técnica sem responsabilidade.
A educação contribui para a inserção da ética da responsabilidade no saber técnico,
sendo fundamental para a proteção do bem ambiental ante os riscos inerentes ao
desenvolvimento científico e tecnológico para as presentes e futuras gerações. É
imprescindível que o homem seja capaz de reconhecer o perigo que certas condutas podem
gerar, para que aja com responsabilidade perante si e a sociedade.
Com base nessa relação entre a ética da responsabilidade, de Jonas (2006), e a
educação ambiental, esta última sendo uma aliada para a difusão daquela, retorna-se às tarefas
listadas por Trevisol (2003), dentre as quais salienta a alfabetização ecológica por meio da
percepção dos riscos. Uma das missões da educação é justamente fazer o homem reconhecer a
crise real que o envolve, induzindo-o ao consumo sustentável. Isto será fruto de uma mudança
de consciência e de atitudes, através do conhecimento dos impactos que suas ações cotidianas
podem gerar sobre os recursos naturais.
Tanto pela educação formal, quanto pela informal e não-formal, permite-se que o
cidadão conheça os riscos das atividades impactantes ao bem ambiental, assumindo uma
postura ativa e participativa; ou seja, responsável. Esta responsabilidade, no pensamento de
Boff (2005), refere-se à postura ética que o homem deve adotar diante dos problemas sociais e
ecológicos, harmonizando-se a justiça ambiental com a social, que um aspecto está
marcado e depende do outro
88
. A formação de uma ética sócio-ambiental voltada à cidadania
participativa, como um elemento da gestão democrática do meio ambiente, exige políticas
públicas responsáveis.
O Estado é o promotor, por excelência, da ecocidadania; pois, embora a Constituição
Federal determine que seja dever de todos, há a tarefa específica imposta a ele, de promover a
educação ambiental. Aos cidadãos, conscientes do seu papel e da responsabilidade que
possuem, incumbe a obrigação de preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado, que
é essencial para a sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações, sendo a
participação direta do cidadão uma característica do Estado Democrático de Direito.
88
Inclusive, o autor trata da existência de uma ecoecologia integral, a qual abrange questões econômicas,
políticas, sociais, educacionais, urbanísticas e agrícolas. Trata-se de uma ecologia social, que o homem está
inserido na ecologia, sendo este complexo ecológico composto pela sociedade e pela cultura.
110
Santos (2000) trata da democracia ante os recentes problemas sociais que representam
uma possível crise no sistema civilizacional
89
, afirmando que, embora o capitalismo tenha
introduzido a democracia, esta não é suficientemente democrática. Diante do atual contexto
social, é necessária renovação desta teoria, a fim de que seus critérios não fiquem restritos ao
ato de votar, passando-se de uma democracia representativa para uma democracia
participativa. Santos reflete que (2000, p. 276):
A nova teoria de democracia que também poderíamos designar por teoria
democrática pós-moderna tem, pois, por objectivo alargar e aprofundar o campo
político em todos os espaços estruturais da interação social. No processo, o próprio
espaço político liberal, o espaço da cidadania, sofre uma transformação de novos
exercícios de democracia e de novos critérios democráticos para avaliar as diferentes
formas de participação política. E as transformações prolongam-se no conceito de
cidadania, no sentido de eliminar os novos mecanismos de exclusão da cidadania, de
combinar formas individuais com formas colectivas de cidadania e, finalmente, no
sentido de ampliar esse conceito para além do princípio da reciprocidade e simetria
entre direitos e deveres.
Atualmente, é necessário o fortalecimento da cidadania, eliminando-se os fatores que a
prejudicam, para que o cidadão possa, efetivamente, participar da gestão pública, valorizando-
se as iniciativas coletivas e organizadas, ultrapassando-se o mero princípio de igualdade entre
direitos e deveres. A ética da responsabilidade, frente aos desafios que os riscos oferecem,
sugere justamente esta emancipação pregada por Santos (2000), uma vez que novas formas de
relação entre os homens e destes com o Estado devem ser pensadas e praticadas.
De acordo com Santos (2000), a nova cidadania implica em obrigações políticas
verticais, entre os cidadãos e o Estado; e horizontais, entre os próprios cidadãos. Atualmente,
não pode ser imputado unicamente ao Poder Público o ônus de gerir e regular as situações de
risco criadas pelas atividades econômicas, científicas, tecnológicas, enfim, pelas condutas dos
particulares. Trata-se de adotar medidas que fortaleçam mudanças na forma de pensar e de
agir do homem; ou seja, que incentivem a participação popular e a ecocidadania.
Deve o Estado agir positivamente e evitar omissões lesivas ao meio ambiente, que
isso pode conduzi-lo à responsabilização solidária (ao poluidor direto) e objetiva, para a
reparação ou indenização dos danos a que contribuir, assim determinando o perfil
constitucional do bem ambiental. Por outro lado, não pode o Poder Público ser
responsabilizado pela inércia dos cidadãos em cumprir seu dever de agir de acordo com a
89
Sobre os problemas da atual sociedade, suas origens, ou a caracterização de modernidade e pós-modernidade,
consultar SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São
Paulo: Cortez, 2000.
111
manutenção da qualidade de vida das presentes e futuras gerações. No entanto, incentivar e
promover a democracia participativa, a ecocidadania, é tarefa estatal, primordialmente
90
.
A cidadania participativa pressupõe uma educação em vistas a um futuro responsável,
incitando o dever de toda a sociedade refletir e reconhecer o excesso de poder e os perigos de
certas condutas e atividades. Isto significa aceitar que o progresso tecnológico não é um fim
em si mesmo, bem como que a humanidade seja educada com base no interesse da própria
preservação, “regulamentando, normatizando e garantindo um futuro viável, frente às
ameaças de nosso próprio poder” (HOEPERS, 2005, p. 100).
O princípio da responsabilidade encontra na educação uma importante aliada a fim de
suscitar a reflexão dos cidadãos para este novo imperativo da sociedade atual, mergulhada em
um cenário de riscos e incertezas, característicos dos constantes avanços científicos e
tecnológicos. Responsabilidade e prudência parecem depender-se reciprocamente, que o
agir responsável exige o agir prudente, e vice-versa. São duas faces de uma mesma conduta.
A educação, deste modo, tem a missão de renovar-se, para inserir nos conteúdos
educativos as noções éticas de responsabilidade e de prudência. Morin (2004) compila os
saberes necessários à educação do futuro, como o caminho que esta deve seguir para atender
às necessidades atuais
91
. A educação do futuro é pautada na transdisciplinaridade capaz de
fundir a ciência e os valores humanos, de suscitar a reflexão sobre a identidade terrena, a
terra-pátria, a fim de se administrar as incertezas e os riscos, tendo como prioridade, assim, o
ensino de uma ética de compreensão planetária. A fragmentação do ensino não mais se
capaz de sanar os complexos problemas da sociedade contemporânea, exigindo-se a inserção
da ética e dos princípios ambientais nas disciplinas tradicionais.
Capra (1996), ao final da exposição da sua teoria sobre a teia da vida, analisa a
necessidade de uma alfabetização ecológica ou uma eco-alfabetização, que permitirá ao
homem conhecer e entender os princípios de organização dos ecossistemas, utilizando-os para
criar comunidades humanas sustentáveis. Afirma que “Não podemos aprender algo sobre
valores e fraquezas humanas a partir de ecossistemas. Mas o que podemos aprender, e
devemos aprender com eles é como viver de maneira sustentável” (CAPRA, 1996, p. 231).
90
Não se pode esquecer que a Lei 9.795, de 1999 (Lei da Política Nacional de Educação Ambiental) prevê que
não é do Estado, mas também de todas as instituições de ensino, órgãos do Sistema Nacional do Meio
Ambiente, da mídia e da sociedade em geral o dever de promover a educação ambiental. No entanto, diante das
poucas iniciativas que se vê, defende-se a necessidade de uma atuação estatal mais incisiva neste sentido,
exigindo o cumprimento da Lei, que, inclusive, comando constitucional impondo-lhe o dever de promover
a educação ambiental e a conscientização coletiva (art. 225, §1º, VI).
91
A proposta de Morin (2004) é bastante complexa e dirigida a aspectos pedagógicos, de educação formal.
112
De acordo com esse pensamento, os administradores e empresários, além dos líderes
políticos, devem ser ecologicamente alfabetizados, a fim de que implementem nas suas
atividades princípios como o da natureza cíclica dos processos ecológicos, e não linear
92
. Isto
se traduz em, por exemplo, economia e reaproveitamento energético, compreendendo-se a
importância e a necessidade do uso racional de certos recursos naturais, prolongando-se sua
durabilidade. A sustentabilidade do sistema natural, segundo Capra (1996), é que possibilita
tal prática. Afirma que, à medida em que a sociedade avança, “[...] a sobrevivência da
humanidade dependerá de nossa alfabetização ecológica, da nossa capacidade para entender
esses princípios da ecologia e viver em conformidade com eles” (CAPRA, 1996, p. 235).
Através do conteúdo ético presente nos conteúdos educativos e da informação também
sobre a atuação do Estado, ao cidadão é oportunizada a participação nos processos decisórios,
diante da gestão democrática característica do Direito Ambiental. Por isso, a exemplo da
reflexão de Capra (1996), é justificável a necessidade de maiores investimentos em educação
ambiental, para a alfabetização ecológica e para a construção da consciência ambiental, já que
instrumentos legais para isso existem, como se demonstrou pela análise, mesmo que
superficial, de programas como o ProNEA, que oferece uma série de diretrizes e estratégias
neste sentido. A atuação estatal deve articular esta tendência com os instrumentos disponíveis,
não sendo, no entanto, a realidade que se vislumbra.
Ponderando-se a educação como meio através do qual se construirá a ecocidadania, a
conscientização pública do papel de cada indivíduo e do Estado na proteção e defesa do meio
ambiente será capaz de conduzir à prudência necessária para que danos ambientais sejam
evitados. Ainda, considerando-se a possibilidade de responsabilização solidária do Poder
Público ao poluidor direto, os resultados positivos da educação refletirão nisso, de forma que
reduzirá este ônus estatal.
A inexistência de políticas públicas voltadas à promoção da educação ambiental, ao
mesmo tempo em que não contribuirá para a conscientização popular tendente a reduzir a
ocorrência de danos ao meio ambiente, também poderá agravar a responsabilidade solidária
do Estado. Além da omissão na fiscalização ou na adoção de medidas que diretamente
poderiam evitar o dano, também o Poder Público poderá ser penalizado pela inércia no seu
dever constitucional de promover a educação, representando, assim, elemento agravante na
aferição do nexo de causalidade da sua responsabilidade indireta e objetiva.
92
Capra (1996) refere todos os princípios dos ecossistemas, desenvolvidos e explicados ao longo da obra,
relacionando-os com a sociedade e justificando a possibilidade da sua adoção como modelo para a construção de
comunidades sustentáveis.
113
Na análise razoável e prudente da incidência das excludentes de responsabilidade
estatal, a prática efetiva da educação ambiental também poderá ser considerada, vindo a
afastar o ônus ao Poder Público. Nos casos judiciais expostos nas páginas anteriores,
poderiam os Tribunais ter considerado que a atuação do Estado não teria sido negligente, se
houvesse políticas públicas eficazes em matéria de educação ambiental. Inclusive, em um dos
Recursos Especiais (REsp 647.493-SC, p. 2), é referido que foi afastada a responsabilidade do
Estado de Santa Catarina, pois “restou comprovado que após 1988, o Estado de Santa
Catarina, através da FATMA, teve intensa atuação em prol do meio ambiente”; ao contrário
dos demais entes públicos demandados, que não demonstraram conduta semelhante e sendo,
portanto, condenados pela omissão.
O investimento e a real valorização de práticas educativas mostram-se importantes até
mesmo na aferição da prática da prudência por parte do Estado, podendo contribuir positiva
ou negativamente para a aplicação das excludentes de responsabilidade, caso suas omissões
participem da geração do dano ambiental. Assim, as medidas estatais relacionadas à educação
ambiental não terão o condão de imputar ao Poder Público o ônus da preservação do meio
ambiente, individualmente, mas, ao contrário, de estimular o cumprimento da legislação
ambiental por quem diretamente o polui, concretizando o ideal da ecocidadania.
114
CONCLUSÃO
O homem, na maioria das vezes, não é capaz de refletir antecipadamente sobre as
conseqüências de seus atos. Ponderar sobre o dano ambiental antes que ocorra não é fácil. O
comum é que somente após a concretização do prejuízo é que se constate a real extensão de
um dano. Tendo em vista que muitas vezes este tipo de lesão não gera resultados imediatos,
podendo demandar certo tempo, ainda mais difícil é a ponderação antecipada sobre uma
atividade potencialmente danosa. Agrava-se esta situação em razão do contexto de incerteza e
riscos, derivado dos constantes avanços científicos e tecnológicos.
A responsabilidade civil ambiental se sobressai como instrumento não apenas
expiatório, mas de prevenção da ocorrência de danos, além do inerente caráter reparatório,
essencial, tratando-se de lesões a bem jurídico de tal relevância. Importante o exame do papel
do Estado na promoção da educação ambiental como uma forma de prática da prudência e
representando uma estratégia bem sucedida para a não ocorrência de danos ambientais,
podendo reduzir, inclusive, o ônus da responsabilização.
A prudência ambiental, defendida como um grupo lógico que envolve os princípios da
prevenção e da precaução, não é capaz de afastar o risco ou a incerteza que caracterizam o
atual contexto social. Orienta, no entanto, para a ponderação sobre a melhor decisão a ser
tomada, antes da ocorrência do dano. Trata-se da mediania, da virtude do homem prudente,
dotado de sabedoria prática, fundada na atual concepção de natureza que define o planeta
como um grande sistema, do qual tudo e todos são integrantes e responsáveis pelo equilíbrio.
O Direito Ambiental, portanto, observa este meio-termo e reconhece o papel de cada cidadão
na manutenção do equilíbrio ecológico, conduzindo a cidadania a uma forma prática da
phronesis.
Os constantes avanços científicos e a utilização de diferentes métodos tornam
possíveis questionamentos a conclusões embasadas cientificamente, quando novos
paradigmas surgem em substituição a anteriores. Hoje, os crescentes avanços científicos e
tecnológicos contribuem para que novas realizações ocorram com maior freqüência, gerando
certa insegurança ao sistema jurídico, que deve ser capaz de gerir tais situações. Igualmente, o
Judiciário depara-se com casos muitas vezes contraditórios, em que a volatilidade do
conhecimento o apresenta respostas certas sobre a ocorrência de danos ambientais. Este
contexto torna insuficiente a aplicação isolada do princípio da prevenção, o qual deve ser
115
conjugado à precaução para que se obtenha uma solução mais adequada aos preceitos do
desenvolvimento sustentável.
Por isso é que os recentes ordenamentos jurídicos optam por formatos legais abertos à
interpretação de acordo com o caso concreto. Normas essencialmente subjetivas, que
conferem ao julgador a possibilidade de adequação às mais diversas situações são comuns. É
o caso do princípio ambiental da prudência, que, por representar o agrupamento de outras
duas formas principiológicas, assume amplitude tal que possibilita a melhor aplicação das
normas que visam reprimir a ocorrência de danos ambientais, mas ponderando as
necessidades econômicas e sociais que também interferem na qualidade de vida.
O Direito Ambiental pre uma função estatal que transcende unicamente os deveres
de normatizar, fiscalizar ou punir, abrangendo a motivação da sociedade a assumir sua postura
participativa na proteção do meio ambiente. Não é dever exclusivo do Poder Público o
cumprimento da legislação ambiental, mas lhe incumbe suscitar que a população o faça,
que todos são responsáveis por isso.
A gestão democrática do meio ambiente é uma característica e uma necessidade da
legislação do meio ambiente, tanto a nível constitucional quanto infraconstitucional. A
participação popular é fundamental para a manutenção do equilíbrio ecológico, de forma que
a prudência ambiental consiste na adoção de medidas que evitem a geração de danos, podendo
este ser um comportamento induzido pela educação ambiental.
Carece de criatividade a atuação estatal, para que os entes federativos, no exercício de
suas competências, façam da educação um componente a mais, incluindo-a em outras
políticas públicas. A Lei da Política Nacional de Educação Ambiental e o próprio ProNEA
definem uma série de ações que poderiam ser praticadas e que incentivariam a
conscientização popular e a cidadania participativa; no entanto, muito pouco é praticado neste
sentido. A mídia parece ser a maior responsável por informações educativas sobre o meio
ambiente, sem que se vislumbre uma atuação estatal relevante, tanto em educação formal,
quanto informal e não-formal. Assim mesmo, a proteção do meio ambiente mostra-se restrita
ao discurso teórico de ambientalistas, sem medidas que atinjam resultados maciços e
satisfatórios para o controle da crise ambiental.
Até o momento, apenas o licenciamento ambiental é uma medida de destaque
praticada pelo Poder Público, muito pouco sendo implementado a nível tributário, por
116
exemplo, como a concessão de incentivos fiscais ou outros benefícios financeiros que
considerem os custos ambientais na produção e nas atividades econômicas.
Para que o desenvolvimento sustentável se torne uma realidade, com a qualidade de
vida assumindo efetivamente a condição de bem jurídico, a prudência, como virtude mediana,
deve estar presente. E, para isso, a participação popular consciente, ativa e positiva é
fundamental, mas deve estar amparada em bases educativas sólidas e corretas.
A função da educação ambiental, muito além de apenas fornecer informação, é
oferecer o conhecimento capaz de induzir à reflexão sobre de que forma o homem pode
chegar à sabedoria prática, à prudência ambiental. Desconhecendo a importância da
preservação ambiental ou não estando apto a reconhecer a necessidade de não obstar o
crescimento econômico, social e científico, igualmente necessário para sua própria qualidade
de vida, dificilmente a prudência ambiental será alcançada.
A educação é um meio pelo qual podem ser implementadas políticas públicas capazes
de gerar transformações sociais, inserindo novas e renovadoras concepções relacionadas a
valores éticos de responsabilidade ambiental. o importante papel do Estado nessa
construção, como principal promotor e incentivador da educação, que muitos desafios são
impostos a esta modalidade educativa voltada à inserção de aspectos sócio-ambientais na
formação cidadã.
Além da educação, também a responsabilidade possui uma importante função na
proteção ambiental, na medida em que através da imputação deste ônus àquele que polui ou
degrada, contribui-se para certa dose de conscientização. A responsabilidade, assim,
possibilita a manutenção do equilíbrio ecológico, que visa reprimir e reparar os danos
ambientais, sendo o caráter finalístico que justifica o grupo lógico de princípios que une as
noções de poluidor-pagador e usuário-pagador.
Tal imputação pode ser aplicável também ao Estado, quando estiver envolvido em
situações de dano ambiental. Atualmente, além das funções clássicas da responsabilidade
civil, como a reparação do dano e o incentivo à preservação do meio ambiente, também a
inserção do preço da poluição nos custos daquele que degrada, pois os aspectos econômicos
relacionados com os princípios do usuário-pagador e poluidor-pagador integram a
responsabilidade ambiental.
117
Ao Estado também deve ser aplicado o mesmo regime jurídico dos particulares, de
uma responsabilidade civil objetiva, mesmo quando o dano for causado por sua omissão,
diante da gravidade da lesão ambiental, bem como pelo perfil legal do equilíbrio ecológico.
Além disso, a Constituição Federal define a existência de um dever específico do Poder
Público de promover a proteção ambiental, não cabendo qualquer discricionariedade nesta
obrigação.
Não há dúvidas, no entanto, que para a responsabilização do Estado por omissão lesiva
ao meio ambiente, deve estar demonstrado o nexo causal entre o dano e a dita omissão, bem
como se atentar para a possibilidade de incidência de excludentes de responsabilidade. A
análise do caso concreto, amparada em critérios de prudência permitirá o afastamento do ônus
ao ente estatal.
Assim, a adoção da teoria objetiva tanto para os casos de ação quanto de omissão
lesivas ao meio ambiente não representa a submissão do Estado à condição de segurador
universal, que admissíveis excludentes. Apenas estar-se á outorgando ao Estado o mesmo
regime de responsabilidade aplicável aos particulares, diante do dever constitucional que lhe é
imposto, especificamente.
Na análise da possibilidade de responsabilização do Estado por danos ambientais para
os quais sua omissão contribui, o julgamento dos fatos deverá pautar-se em critérios de
razoabilidade e, principalmente, de prudência, pois é o princípio responsável pela opção da
mediania adequada a cada situação. Aplicar a prudência, destarte, exige capacidade de
reconhecer o meio-termo no caso concreto e optar pela decisão correta, que melhor atenda às
peculiaridades da situação. A prudência permite interpretar e subsumir corretamente o Direito
Ambiental.
A aplicação da teoria objetiva para a responsabilidade estatal, mesmo que por atos
omissivos lesivos ao meio ambiente decorre, ainda, da possibilidade de inserção do instituto
como um elemento da ética. A ética da responsabilidade é imperativo da atual sociedade,
caracterizada por riscos e incertezas decorrentes dos avanços científicos e tecnológicos. É um
dever do homem frente à necessidade de manutenção da qualidade de vida para as presentes e
futuras gerações. Neste sentido é que o Poder Público deve agir positivamente, inserindo
valores éticos na sua atuação, através de uma política responsável e que favoreça a difusão da
ecocidadania.
118
O princípio ético da responsabilidade encontra na educação uma importante aliada,
pois ela suscita a reflexão dos cidadãos para este dever de todos frente aos riscos de danos,
fornecendo os meios para concretização do agir pautado na responsabilidade ética e na
prudência. A educação é um instrumento para a ecocidadania, para a conscientização pública
do papel individual e do Estado na proteção e defesa do meio ambiente, contribuindo com a
redução dos danos ambientais. Assim, considerando-se a possibilidade de responsabilização
solidária do Poder Público com o poluidor direto, os resultados positivos da educação
refletirão nisso, de forma que reduzirá este ônus estatal.
Em sentido oposto, a omissão do Estado na implementação de políticas públicas
voltadas à educação ambiental, ao mesmo tempo em que não contribuirá para a
conscientização popular e redução de danos ao meio ambiente, também pode agravar a
responsabilidade do Estado. Além da omissão na fiscalização ou na adoção de medidas que
diretamente poderiam evitar o dano, o Poder Público poderá ser penalizado pela inércia no seu
dever constitucional de promover a educação.
Em síntese, o papel do Estado é, sem dúvida, proteger o meio ambiente
ecologicamente equilibrado para que não ocorram danos, mas sem obstaculizar o
desenvolvimento social e econômico, que, juntamente com o aspecto ambiental, ambos são
necessários para a qualidade de vida. Para isso, deve praticar a prudência ambiental e
estimulá-la através de políticas públicas voltadas à educação ambiental e à conscientização
popular, pois a gestão democrática e a ecocidadania representam formas virtuosas, de
sabedoria prática, de phronesis, frente aos desafios, incertezas e riscos da sociedade atual.
119
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