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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Daniela Maria Riquelme
A Proteção do Meio Ambiente sobre a Perspectiva das Fontes
Alternativas de Energia
São Paulo
2008
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Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Daniela Maria Riquelme
A Proteção do Meio Ambiente sobre a Perspectiva das Fontes
Alternativas de Energia
Dissertação apresentada à Banca Examinadora como
exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em
Direito das Relações Sociais, subárea de Direitos Difusos e
Coletivos, pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, sob a orientação do Prof. Doutor Sergio Seiji
Shimura
São Paulo
2008
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ii
Banca Examinadora
___________________________
___________________________
___________________________
iii
AUTORIZO A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO, POR
QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA FINS DE
ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
Ficha Catalográfica
Riquelme, Daniela Maria.
A Proteção do Meio Ambiente sobre a Perspectiva das Fontes Alternativas de
Energia / Daniela Maria Riquelme; orientador Sérgio Seiji Shimura
São Paulo, 2008.
Dissertação (Mestrado Universidade Pontifícia Católica de São Paulo
Área de Concentração: Relações Sociais, subárea: Direitos Difusos e
Coletivos.
iv
“Os desafios não são difíceis porque tentamos; é por não
tentarmos que são difíceis
v
Meus Sinceros Agradecimentos...
A Deus, que sempre me iluminou em momentos cruciais e
decisivos de minha jornada;
À minha querida família, pelo amor incondicional, mesmo nos
momentos de total ausência de minha parte;
A meu Pai, Homem que me ensina o verdadeiro significado da
palavra família, luta e perseverança;
À minha Mãe, exemplo de força de vontade em superar nossos
limites;
À minha Irmã, companheira de muitas conversas e divagações,
sempre com um conselho apropriado para me acalentar durante os momentos
difíceis;
Às pessoas mais próximas, as que eu chamo de Amigos: J.F.B;
A.B; M.A.S.; entre outros;
Aos Professores, Doutores, Regina Vera Villas Boas e Sérgio Seiji
Shimura, que sempre me ouviram com muita atenção e me orientaram, fazendo
jus ao nome de orientadores;
A todas as pessoas que me acompanharam em mais essa
empreitada, sem as quais não poderia ter seguido adiante;
Eu, sincera e humildemente, vos agradeço por estarem em minha
vida.
OBRIGADA!
vi
RESUMO
A presente dissertação pretende demonstrar que o meio ambiente é
um bem difuso pertencente a uma pluralidade indeterminada de sujeitos,
indivisíveis em relação aos seus titulares e cuja defesa incumbe tanto ao Poder
Público quanto a coletividade.
Desta forma, quando nos preocupamos com o consumo consciente
da energia, no caso presente das fontes alternativas de energia, estamos
cuidando do meio em que vivemos, tanto para nós quanto para as futuras
gerações respeitando, assim, nós mesmos como cidadãos e, as normas legais.
Palavras-chave: Direitos Difusos e Coletivos, Justiça, Bem, Meio ambiente,
Energias renováveis de fontes alternativas, gás natural, petróleo,
energia eólica, energia solar, energia hidrelétrica, energia
nuclear, madeira.
vii
ABSTRACT
This present work has the intention to present the environment as a
diffuse good belonging to an undetermined plurality of subjects, which are
undividable in relation to its holders and their protection is responsibility of Public
Power and also the collectivity.
Therefore, when we deal with sustainable energy consumption,
which is in the present case the alternative energy sources, we are preserving the
current environment for us and for the future generations, respecting ourselves as
citizens and the legal norms.
Key words: Diffuse and Collective rights; Justice; Immovable; Environment;
Renewable Energies from Alternative Sources; Natural gas;
Petroleum; Wind energy; Solar energy; Water power; Nuclear energy
Wood.
viii
Lista de Tabelas e Gráficos
Tabela 01 - Matriz Energética Brasileira ................................................................................... 88
Tabela 02 - Oferta de Energia Interna de Fontes Renováveis e Não-Renováveis no Brasil,
no Mundo e no OCDE .......................................................................................... 88
Tabela 03 - Oferta Interna de Energia – T Brasil, 2005 ............................................................ 89
Tabela 04 - Capacidade Instalada de Geração (MW) ............................................................... 90
Tabela 05 - Recursos e Reservas Energéticas Brasileiras ....................................................... 91
Tabela 06 - Reservas Medidas / Indicadas em Valores Absolutos ......................................... 139
Tabela 07 - Geração de Energia Elétrica a partir das Reservas Existentes no Brasil ............. 140
Tabela 08 - Centrais Eólicas Brasileiras ................................................................................. 160
Tabela 10 - Utilização da Madeira na Produção de Energia ................................................... 175
ix
Lista de Ilustrações
Figura 01 - Processo de Extração / Recuperação do Petróleo ............................................... 102
Figura 02 - Produtos Obtidos Pelo Refino .............................................................................. 104
Figura 03 - Jazida de Petróleo com Poço de Extração ........................................................... 107
Figura 04 - Jazida de Petróleo ............................................................................................... 108
Figura 05 - Gasbol – Gasoduto concentrado na Bolívia e no Brasil ........................................ 116
Figura 06 - Central Nuclear Almirante Alvaro Alberto ............................................................. 124
Figura 07 - Unidade quatro de Chernobyl ............................................................................... 126
Figura 08 - Reator PWR ......................................................................................................... 131
Figura 09 - Usina Nuclear de Three Mile Island, Pensilvânia (EUA) ....................................... 136
Figura 10 - Desenho de uma Hidrelétrica ............................................................................... 144
Figura 11 - Centro Brasileiro de Energia Eólica ...................................................................... 152
Figura 12 - Foto Ilustrativa - Fernando de Noronha ................................................................ 154
Figura 13 - Foto Ilustrativa – Fernando de Noronha ............................................................... 155
Figura 14 - Mapa do Brasil com a velocidade média anual do vento, a cinqüenta metros
de altura............................................................................................................. 157
Figura 15 - Croqui da Mecânica de um Moinho ...................................................................... 158
Figura 16 - Rotor de Darrieus ................................................................................................. 159
Figura 17 - Motor a Vapor Solar ............................................................................................. 165
Figura 18 - Foto da Central Solar de receptor – Central Solar Two em Barstow, Califórnia. ... 167
Figura 19 - Contexto Mundial da Utilização da Madeira para Energia .................................... 174
x
Lista de Siglas
ANEEL – Agência Nacional de energia Elétrica
APE – Auto Produtor de Energia Elétrica
BEN – Balanço Energético Nacional
CNAE – Conselho Nacional de Águas e Energia
CNEN – Comissão nacional de Energia Nuclear
GEE – Gases de Efeito Estufa
GLP - Gás liquefeito de petróleo
IAEA – International Atomic Energy Agency
IEA – Instituto de Energia Atômica
INB – Indústrias Nucleares do Brasil
IPEN - Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares
kW - Kilowatt
kWh - Kilowatt por hora
MME – Ministério de Minas e Energia
MW – Megawatt
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OIE - Oferta Interna de Energia
ONU – organização das Nações Unidas
PETROBRÁS – Petróleo Brasileiro S.A.
PROCEL – Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica
PROINFA – Programa de Incentivo as Fontes Alternativas de Energia Elétrica
Tep – Tonelada Equivalente de Petróleo
TWh - Tera Watt Hora
UTE – Usina Termelétrica
xi
SUMÁRIO
Agradecimentos .........................................................................................................................vi
Resumo ......................................................................................................................................vii
Abstract ......................................................................................................................................viii
Lista de Tabelas .........................................................................................................................ix
Lista de Ilustrações ....................................................................................................................x
Lista de Siglas ............................................................................................................................xi
CONSIDERAÇÕES GERAIS
.................................................................................................1
INTRODUÇÃO
.........................................................................................................................7
1. O QUE PODEMOS ENTENDER POR JUSTIÇA? ..................................................... 8
1.1. Breve panorama da evolução da justiça .........................................................................9
1.2. Da antiguidade à idade média ........................................................................................9
1.3. Idade moderna .............................................................................................................. 13
1.4. Idade contemporânea ................................................................................................... 14
1.5. Os muitos sentidos da justiça ....................................................................................... 15
1.6. O justo particular ........................................................................................................... 16
1.7. A Idéia de justiça na visão de Ross .............................................................................. 18
1.7.1. A justiça e o direito natural .................................................................................. 18
1.8. Análise da idéia de justiça ............................................................................................. 18
2. JUSTIÇA E BEM
............................................................................................................... 20
2.1. Justiça e bem comum ................................................................................................... 20
2.2. O Bem comum como a melhor vida possível segundo a visão de Aristóteles ............... 22
2.3. Princípio do bem comum. A primazia do bem comum sobre o bem particular .............. 26
2.4. Limites do princípio do bem comum .............................................................................. 30
3. DOS BENS SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO
........................................... 32
3.1. Da classificação dos bens no Código Civil brasileiro ..................................................... 32
3.2. Bens considerados em si mesmos ................................................................................ 33
xii
3.2.1. Bens corpóreos e incorpóreos............................................................................. 33
3.2.2. Bens imóveis e móveis........................................................................................ 33
3.2.3. Bens fungíveis e infungíveis ................................................................................ 35
3.2.4. Bens consumíveis e inconsumíveis ..................................................................... 35
3.2.5. Bens divisíveis e indivisíveis ............................................................................... 36
3.2.6. Bens singulares e coletivos ................................................................................. 37
3.2.7. Bens reciprocamente considerados .................................................................... 38
3.2.8. Bens considerados em relação ao titular do domínio .......................................... 39
4. INTERESSES E DIREITOS
............................................................................................. 41
4.1. Acepções dos interesses .............................................................................................. 41
4.2. Interesse social, pessoal e público ................................................................................ 43
4.3. Interesse público e privado ........................................................................................... 44
4.4. Interesse transindividual ............................................................................................... 46
4.5. Interesses difusos ......................................................................................................... 47
4.5.1. A origem dos interesses difusos .......................................................................... 47
4.5.2. Características .................................................................................................... 48
4.6. Interesses difusos e coletivos: jurisprudência do Supremo Tribunal Federal ................ 51
4.6.1. Aspectos gerais .................................................................................................. 51
4.7. A evolução doutrinária do conceito de interesses ......................................................... 52
4.8. O interesse visto em outros planos ............................................................................... 55
4.9. Interesses difusos e coletivos no Supremo Tribunal Federal ........................................ 58
4.10. A tutela dos interesses difusos no direito brasileiro ..................................................... 63
4.11. A Constituição Federal de 1988 .................................................................................. 64
4.12. Efetividade do sistema ................................................................................................ 66
4.13. Direitos difusos, coletivos e individuais homogéneos .................................................. 67
4.14. O meio ambiente e sua disciplina jurídica ................................................................... 70
4.15. Reflexividade sobre a tutela jurídico-ambiental ........................................................... 70
4.16. Definição de meio ambiente ........................................................................................ 72
4.17. O meio ambiente como interesse ou direito difuso ...................................................... 73
5. ENERGIA
........................................................................................................................... 75
5.1. Breve histórico .............................................................................................................. 76
5.2. As energias no Brasil ............................................................................................. 79
xiii
6. PETRÓLEO
....................................................................................................................... 92
6.1. No mundo ..................................................................................................................... 92
6.2. No Brasil ....................................................................................................................... 95
6.3. Obtenção do combustível ........................................................................................... 100
6.4. Política energética nacional e proteção ambiental ...................................................... 105
7. ENERGIA TERMELÉTRICA
.......................................................................................... 106
7.1. Funcionamento de uma termelétrica ........................................................................... 108
7.2. Termelétrica a carvão ................................................................................................. 110
7.3. Impactos ambientais das térmicas a carvão................................................................ 113
7.4. Termelétricas a gás .................................................................................................... 114
7.5. Antecedentes históricos do gás no Brasil .................................................................... 115
7.6. Impactos ambientais das termelétricas a gás .............................................................. 119
7.7. Termelétricas a óleo ................................................................................................... 120
7.8. Impactos ambientais das termelétricas a óleo ............................................................. 121
7.9. Impactos ambientais comuns das termelétricas .......................................................... 121
7.10. Desativação das termelétricas .................................................................................. 123
8. ENERGIA NUCLEAR
..................................................................................................... 124
8.1. História da energia nuclear ......................................................................................... 124
8.2. Energia nuclear no Brasil ............................................................................................ 128
8.3. Obtenção do combustível nuclear ............................................................................... 129
8.4. Funcionamento da usina nuclear ................................................................................ 130
8.5. Impactos ambientais da usina nuclear ........................................................................ 133
8.6. Aspecto ambiental ...................................................................................................... 134
8.7. O aspecto estratégico ................................................................................................. 138
8.8. Descomossionamento – desativação .......................................................................... 140
9. ENERGIA HIDRELÉTRICA
........................................................................................... 144
9.1. História da hidroeletricidade ........................................................................................ 144
9.2. Funcionamento da hidrelétrica .................................................................................... 147
9.3. Impactos ambientais de uma hidrelétrica .................................................................... 149
9.4. Desativação de uma hidrelétrica ................................................................................. 150
xiv
10. ENERGIA EÓLICA
....................................................................................................... 152
10.1. História da energia eólica .......................................................................................... 153
10.2. Impactos ambientais de um parque eólico ................................................................ 160
10.3. Desativação de um parque eólico ............................................................................. 161
11. ENERGIA SOLAR
........................................................................................................ 163
11.1. História da energia solar ........................................................................................... 164
11.2. Funcionamento de uma planta solar ......................................................................... 167
11.3. Impactos ambientais de uma célula fotoelétrica ........................................................ 170
11.4. Desativação de uma célula fotoelétrica ..................................................................... 171
12. BIOMASSA
.................................................................................................................... 172
12.1. Madeira ..................................................................................................................... 173
12.2. A energia no sistema constitucional brasileiro ........................................................... 176
12.3. Conceito e natureza jurídica do bem ambiental ........................................................ 179
12.4. Natureza jurídica da energia elétrica ......................................................................... 180
12.5. Competência material dos recursos energéticos ....................................................... 182
CONCLUSÃO
...................................................................................................................... 185
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
................................................................................. 190
ANEXOS
.............................................................................................................................. 204
Recurso Extraordinário do Supremo Tribunal Federal, nº 163.231-3
Lei nº 9.478, de 06 de agosto de 1997
1
CONSIDERAÇÕES GERAIS
“Na natureza nada se perde, nada se cria: tudo se transforma”.
Nessa lei, Antonie Laurent Lavoisier demonstrava que a natureza
reutilizava seus rejeitos e subprodutos, transformando-os em novos produtos, de
forma a atender ao equilíbrio dos ecossistemas. Os processos eram cíclicos e a
dissipação de energia era absorvida por outros sistemas produtivos.
A tendência ao equilíbrio promulgada por Lavoisier foi modificada a
partir do momento em que a raça humana consolidou sua civilização baseada na
utilização não planificada dos recursos naturais.
Sabemos que a energia, o ar e a água são ingredientes essenciais à
vida humana. Nas sociedades primitivas seu custo era praticamente zero. A
energia para aquecimento e atividades domésticas era obtida da lenha das
florestas.
Aos poucos, porém, o consumo de energia foi crescendo tanto que
outras fontes se tornaram necessárias.
Durante a Idade Média, as energias de cursos d’água e dos ventos
foram utilizadas, mas em quantidades insuficientes para suprir as necessidades
das populações crescentes, sobretudo nas cidades. Após a revolução industrial,
foi preciso usar mais carvão, petróleo e s, cuja produção e transporte até os
centros consumidores têm custo elevado.
O consumo de água também aumentou consideravelmente, tanto
que se tornou necessário cobrar pelo seu uso para pagar os custos para sua
purificação e transporte até os usuários.
No ano de 2003, quando a população mundial era de 6,27 bilhões de
habitantes, o consumo médio total de energia era de 1,69 tep per capita. Uma
tonelada de petróleo equivale a 10 milhões de quilocalorias (kcal), e o consumo
diário médio de energia é de 46.300 kcal por pessoa. Como comparação vale à
pena mencionar que 2.000 kcal é a energia que obtemos dos alimentos e que
2
permite que nos mantenhamos vivos e funcionando plenamente. O restante é
usado em transporte, gastos residenciais e industriais e perdas nos processos de
transformação energética
1
.
Os padrões atuais de produção e consumo de energia são baseados
nas fontes fósseis, o que gera emissão de poluentes locais, gases de efeito estufa
e põe em risco o suprimento de longo prazo no planeta. É preciso mudar esses
padrões estimulando as energias renováveis, e, nesse sentido, o Brasil apresenta
conduta bastante favorável em relação ao resto do mundo.
Energias renováveis representam quarenta e um rgula três por
cento do consumo total no Brasil, ao passo que no mundo são apenas quatorze
vírgula quatro por cento. O consumo médio de energia no Brasil é de um vírgula
zero nove tep por habitante por dia, um pouco abaixo da média mundial.
A energia elétrica, por exemplo, a partir da revolução industrial vem
ocupando papel fundamental na sociedade moderna, propiciando o crescimento
das indústrias, do comércio, da agricultura e da vida em sociedade.
Até meados do século XVI o trabalho realizado pelo homem era
baseado na sua força física, na tração animal, na energia das rodas d’água e na
energia fornecida pelos moinhos.
Inicialmente, ao emprego da força animal foi acrescida a energia
hidráulica, evoluindo para o uso dos derivados de petróleo e, posteriormente, da
energia elétrica.
A Europa pré-revolução industrial tinha uma agricultura ineficiente e
atrasada, entre outros motivos, por ser cultivada por servos e escravos. Os
senhores feudais exploravam o que podiam da população que os servia, em
muitos casos, até a morte.
As comunidades mercantis européias da época usavam o seu
poderio colonial para saquear os habitantes das Índias Orientais; as mercadorias
dali eram exportadas para a Europa e África, muitas vezes utilizadas na compra
de escravos obrigados a trabalhar nas plantações das Américas. De lá, saíam
1
GOLDEMBERG, J.; LUCON, O. Energia e meio ambiente no Brasil. Estudos Avançados, São
Paulo, v. 21, n. 59, jan./abr. 2007.
3
exportações de açúcar, algodão, etc. em grandes quantidades e com baixo custo
para os portos do Atlântico e do mar Norte, onde se fazia a redistribuição para o
leste da Europa.
Havia também o comércio tradicional entre a Europa Ocidental e a
Oriental: as manufaturas e mercadorias tradicionais, tais como os têxteis, o sal, o
vinho, dentre outros
2
.
O desenvolvimento das cidades, inicialmente na Inglaterra e
posteriormente no continente europeu, provocou a migração da população rural
para o meio urbano.
A urbanização ocasionou um aumento na demanda de produtos
para o consumo destas pessoas que agora se aglomeravam sem condições de
produzir os gêneros necessários para suprir suas próprias necessidades. Com
isso, o acréscimo na produção tornava-se iminente.
As origens da revolução industrial estão nos séculos XVI e XVII,
período no qual os países absolutistas criaram políticas de incentivo ao comércio.
No século XVIII, a necessidade de ampliar a oferta de mercadoria fez com que o
trabalho artesanal fosse, gradativamente, substituído pela produção em oficinas
que utilizavam máquinas para aumentar a capacidade produtiva. Este grande
avanço seria um marco tecnológico na história da humanidade.
A revolução industrial na Grã-Bretanha teve início no século XVIII e
pode ser adequadamente resumida na introdução generalizada de técnicas para a
exploração de uma nova fonte de energia – o carvão mineral – nas manufaturas e
no transporte
3
. No território inglês, as reservas de minério de carvão eram
abundantes.
Com a iniciativa da Grã-Bretanha, o mundo testemunhou o
surgimento de máquinas de fiação e tecelagem que produziam muito mais que as
mãos humanas. A substituição da energia animal pela energia mecânica e elétrica
foi o que pode ser chamado de desenvolvimento tecnológico.
2
HOBSBAWN, E. J. A era das revoluções: Europa 1789-1848. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
3
LEITE, A. Dias. A energia do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.
4
Com isto, os comerciantes burgueses acumularam riquezas e
patrocinaram a expansão marítima buscando a abertura de novos mercados para
atender às exigências cada vez maiores de mercadorias e de preços acessíveis.
Esta foi a reivindicação do homem que, desde então, direcionou seus interesses
para a produção em larga escala, para o trabalho assalariado e para os lucros
que este lhe proporciona, saindo do sistema feudal e dando início a um novo tipo
de economia, a capitalista.
A revolução industrial requereu profundas modificações qualitativas
no uso da energia. A devastação das florestas inglesas para a produção de
madeira e lenha para seus fornos havia se tornado fato grave no fim do século
XVII.
Até a metade do século XIX a revolução industrial esteve restrita
quase unicamente à Inglaterra. Somente a partir da segunda metade do século
XIX outros países começaram a seguir seus passos. Primeiro a Bélgica, na
seqüência a França, Europa Central, Rússia, América e, na Ásia, especialmente o
Japão. Nesse período ocorreu o desenvolvimento de novas fontes de energia, tais
como a derivada do petróleo e a hidrelétrica. Desde então, o homem vem
procurando desenvolver novas formas de geração de energia, diversificando
fontes e buscando alternativas mais baratas e não tão poluentes para o meio.
A distribuição do carvão explorado nas minas era feita em vagonetas
tracionadas, às vezes, por animais. Para isso, foram estendidos trilhos que iam da
mina até os centros consumidores.
Entre 1603 e 1604, Huntingdon Beaumont pôs trilhos de madeira
nas minas de carvão até o rio Severn
4
.
Ainda, segundo Henderson, nos anos de 1768 a 1771, Richard
Reynolds, da fundição Coalbrookdale, substituiu os trilhos de madeira por trilhos
de ferro fundido com um rebordo interior.
Em 1832, Faraday descobriu o princípio do dínamo, que permitia
converter a energia mecânica em energia elétrica. Isso possibilitou o uso da
eletricidade, inicialmente em telégrafos e, posteriormente, em novas máquinas.
4
HENDERSON, W. O. A revolução industrial 1780-1914. São Paulo: Ed. da Universidade de São
Paulo, 1979.
5
Entre 1850 e 1860, o crescimento contínuo da população, a
extensão da rede ferroviária, a introdução dos barcos a vapor, a abertura do canal
de Suez e uma renovada licitação de possessões coloniais beneficiaram a
consolidação do imenso comércio internacional.
5
Na segunda metade do século XIX, novos progressos tecnológicos
foram alcançados.
O dínamo elétrico, a maior realização de Werner Siemens, inventado
em 1866, quando ele tinha sessenta anos, foi descrito numa comunicação para a
Academia de Ciências de Berlim em 17 de janeiro de 1867. Em 1879, doze anos
depois do referido feito, a primeira estrada de ferro elétrica foi apresentada na
feira de comércio de Berlim e a primeira iluminação de rua foi instalada na mesma
cidade, em 1880, o primeiro elevador elétrico foi construído em Mannheim e, em
1881, o primeiro bonde elétrico do mundo entrou em serviço na linha Berlim-
Lichterfelde
6
.
Em 1870, o mecânico James Watt, acrescentando um condensador
a uma bomba a vapor de um motor, transformou um motor atmosférico sem
pistão em um motor a vapor. Em 1878 e 1879, Edison, nos Estados Unidos e
Swan, na Inglaterra, inventaram a lâmpada elétrica de filamento.
As primeiras grandes estações elétricas foram construídas por
Edison em Nova Iorque e por Ferranti em Londres. O primeiro cabo elétrico para
transmitir energia a longa distância foi instalado entre Lauffen e Frankfurt, sobre o
rio Necar, em 1891
7
.
Em função do suprimento de derivados do petróleo e da sua
variedade crescente, diversificou-se também o progresso tecnológico, com
importantes invenções no período 1878/97: os motores de combustão interna
desenvolvidos por Otto, Daimler e Diesel
8
.
5
HENDERSON, W. O. op. cit.
6
SIEMENS. A origem da Siemens. Biografia de Werner Von Siemens. Disponível em:
<www.siemens.com.br/templates/coluna1.aspx?channel=6424&channel>. Acesso em: ago.
2008.
7
HENDERSON, W. O. op. cit.
8
LEITE, A. Dias. op. cit.
6
A era do aço foi enobrecida pelo processo de Bessemer e Siemens-
Martin, a da eletricidade pelo dínamo e pelo carro elétrico de Werner Siemens, a
do automóvel pelo motor a gás de Otto, e da química moderna pela primeira
tintura de anilina de Perkin e pelo processo da amônia de Solvay para fazer a
soda.
7
INTRODUÇÃO
O presente trabalho acadêmico tem por escopo demonstrar que é
possível continuar numa escala crescente de consumo de energia de forma
consciente e respeitando o meio ambiente.
No capítulo I trataremos do tema “justiça” levando em consideração
seu conceito e o entendimento de filósofos como Aristóteles, Marx, Locke,
Rousseau e Ross. Abordaremos também o significado do termo “justiça” em suas
várias acepções.
Em seqüência e visando unir os temas, discorreremos sobre “justiça”
e “bem”, mostrando aos leitores a fusão dessas expressões, onde verificamos que
cada ação humana passa a ser um próprio bem, ao qual se destina a realizar;
sendo fundamental que cada membro da sociedade veja, no bem comum, a sua
própria realização.
no capítulo III procuramos classificar a “energia” como um bem,
seguindo as diretrizes do Código Civil Brasileiro.
Seguiremos, no capítulo IV, demonstrando que quando tratamos de
“interesse”, face ao “bem”, esses dois vocábulos se relacionam, se unem, para
podermos ter o bem comum. O interesse geral pelo bem comum reflete, no
presente trabalho, no consumo responsável da energia, preservando, assim, o
meio ambiente.
Por derradeiro, veremos, no capítulo V, a energia. Estudaremos
algumas fontes alternativas de energia demonstrando seus pontos positivos e
negativos face à preservação do meio ambiente, bem comum universal.
8
1. O QUE PODEMOS ENTENDER POR JUSTIÇA?
Aristóteles entendia por justiça aquela disposição de caráter que
torna as pessoas propensas a fazer o que é justo, que as faz agir justamente e a
desejar o que é justo.
Para o filósofo, justiça é a virtude completa, embora não de modo
absoluto, mas em relação ao próximo. Por isso, a justiça é muitas vezes
considerada a maior das virtudes, e ‘nem Vésper, nem a estrela-d’alva são tão
maravilhosas’; e proverbialmente, ‘na justiça se resumem todas as virtudes’. Com
efeito, a justiça é a virtude completa no mais próprio e pleno sentido do termo,
porque é o exercício atual da virtude completa”
9
.
Roberto Aguiar
10
define a justiça como sendo uma bailarina
inconstante e volúvel.
Ora a vemos bailar com os poderosos, ora com os fracos, ora
com os grandes senhores, ora com os pequenos e humildes.
Nesse jogo dinâmico, todos querem ser seu par... A justiça
sobrevive a todos os ritmos e pares, como se pairasse em um
lugar onde os choques e os conflitos não existissem...”.
Para referido autor, a justiça não será diáfana e distante, não será
de todos e de ninguém, não se porá acima dos circunstantes, mas entrará na
dança de mãos dadas com os que não podem dançar e, amante da maioria,
tomará o baile na luta e na invasão, pois essa justiça é irmã da esperança e filha
da contestação.
Em outras palavras, a justiça é o dever-ser da ordem para os
dirigentes, o dever-ser da esperança para os oprimidos, podendo também ser o
dever-ser da forma para o conhecimento oficial, enquanto é o dever-ser da
contestação para o saber jurídico.
9
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2004.
10
AGUIAR, Roberto A. R. de. O que é justiça: uma abordagem dialética. São Paulo: Alfa-
Omega,1982.
9
1.1. Breve panorama da evolução da justiça
A palavra justiça não suscita controvérsias em relação ao seu
significado, mas também à sua própria etimologia.
Para uns, as palavras jus, justitia e justum seriam derivadas do
radical ju (yu) do idioma sânscrito, antiga língua clássica da Índia. O ju significa
unir, atacar, dando origem em latim a jungere (jungir) e jugum (julgo, submissão,
opressão, autoridade). Outros, entretanto, referem-se à palavra h, também
sânscrita, que se encontra no livro dos Vedas
11
, e que corresponde à idéia
religiosa de salvação.
Na Idade Moderna, alguns filósofos associaram a idéia de jus a Zeus
ou Júpiter, as divindades supremas dos gregos e romanos.
Estas explicações não são necessariamente excludentes, revelando-
nos que a primeira noção de justiça expressou um relacionamento sob a proteção
divina.
1.2. Da antiguidade à idade média
Sem qualquer tipo de exceção, independentemente de épocas e
povos, sempre existiram os sistemas reguladores resultantes das condições
materiais e psíquicas dos componentes de cada grupo social, as quais ligavam
uns aos outros até mesmo pelo próprio esforço de sobreviverem. Ocorre que esse
sistema nem sempre foi enunciado expressamente, isto é, escrito.
Para os povos antigos, a idéia de justiça estava associada a uma
construção harmônica da natureza, presidida por uma divindade suprema,
podendo-se afirmar que a idéia de existência de uma lei da natureza, imutável,
universal e absoluta, que dirige as próprias relações entre os homens, surge a
partir do instante em que este procura encontrar explicações para o mundo em
que vive, dando-lhe um significado real.
11
Livro sagrado dos hindus.
10
Os homens não atribuíram a si mesmos a criação do mundo, mas
sim o conceberam como um arranjo dos deuses, graças aos quais foi possível o
ordenamento do caos em cosmos.
Na concepção do mundo da primeira grande civilização antiga, a
babilônica, o herói Marduk enfrenta Tiamat, que personifica o caos. Vencendo-o,
Marduk instaura o cosmos, isto é, a ordem do universo e, por conseguinte, a
justiça.
Quando em Atenas, no século quatro antes de Cristo, assistimos ao
crescimento da democracia grega, também percebemos a emergência do
pensamento sofista.
Com os sofistas temos a expressão de um pensar oriundo de uma
nova forma de articulação do poder, de um surto de desenvolvimento econômico,
o que também vai levar ao surgimento de novas concepções artísticas e de uma
visão de mundo não mais atrelada em fundamentos mágico-religiosos, mas num
racionalismo relativista que vai respaldar o entender do conhecimento e da
relação entre os homens.
12
No século cinco antes de Cristo, no apogeu da civilização grega, a
concepção acerca de uma lei da natureza se desenrolava claramente e, de
forma resumida, tratava que existe universalmente nas coisas da natureza uma
harmonia cósmica. Este princípio, assim dizendo, corresponderia nas relações
humanas à justiça.
Para os gregos, a idéia de justiça brota com a noção de sociedade.
Concebiam eles a sociedade como um fato natural, decorrente da natureza
sociável do homem, cuja organização baseava-se na necessidade de assegurar
que as relações entre os homens fossem justas. A função da polis era, portanto,
zelar pelo fiel cumprimento das leis.
Por mais paradoxal que possa parecer, ao mesmo tempo em que a
sociedade era concebida como um fato natural, por outro lado consideravam os
gregos que os homens eram naturalmente desiguais, e a harmonia social era
obtida à medida que cada indivíduo desempenhasse uma atividade conforme as
suas aptidões. Nesse sentido, o filósofo Platão, em sua obra A república (cujo
12
ROSS, Alf. Direito e justiça. Tradução Edson Bini. 1. reimpr. São Paulo: Edipro, 2003.
11
subtítulo é sobre a justiça) expõe aquilo que acreditava ser a sociedade
harmoniosa e justa, estabelecendo uma divisão entre trabalhadores, guerreiros e
filósofos, de acordo com a aptidão de cada indivíduo, ordenando a convivência
entre os desiguais devidamente hierarquizados, marca de um pensamento
fundamentalmente conservador e aristocrático.
Platão deu à justiça um sentido ético ao estabelecer que ela é a
virtude suprema, harmonizadora das demais virtudes, sempre ligada a uma visão
de harmonia, de equilíbrio, enquanto que Aristóteles deu-lhe um sentido formal,
realista, estabelecendo uma distinção entre a justiça distributiva e a corretiva, em
função do critério de uma repartição de bens proporcionais.
Apesar de seu ideal de justiça, os gregos encaravam a escravidão
como um fato natural; uma justiça das desigualdades. Em contraposição a esse
pensamento, os sofistas lutavam para coibir a escravidão, combatendo também a
distinção entre gregos e rbaros, antecipando uma visão internacionalista, além
de exigir a distribuição igualitária da propriedade ou, ainda, propor a abolição da
nobreza.
Mas quando um novo grupo social procura arrebatar o poder das
mãos dos velhos detentores, a concepção de mundo muda, que é fruto
ideológico de novos tempos e novos grupos; nesse contexto, Ross
13
afirma que
as leis humanas não são meramente arbitrárias, mas emanação de uma lei
universal sendo nutrida pelo mesmo poder do destino que domina tudo o que
existe.
Impossível tratarmos da justiça sem tratarmos da sua correlação
com o direito romano; mas difícil adentrar neste tema sem nos referirmos ao
estoicismo que se implica com os fundamentos desse mesmo direito.
O estoicismo revestiu-se de importância para o desenvolvimento de
uma teoria de direito natural, assim como para uma visão de justiça. A visão
estóica de mundo baseava-se no fato de que a razão humana não era somente
uma razão individual, mas uma pequena fração da razão cósmica e divina. Assim,
o homem, perecível, finito e imperfeito, tinha, por outro lado, participação dentro
do próprio cosmos, que ele era uma faísca dessa razão ordenadora do
13
ROSS, Alf. Sobre el derecho y la justicia. Buenos Aires: Eudeba, 1963.
12
universo. Desta forma, a conduta justa e sábia estaria respaldada na razão e na
natureza humana.
A filosofia estóica é profundamente marcada pela influência oriental,
adentrando em Roma, principalmente em seu meio culto, estendendo sua
influência para a compreensão do direito.
Necessário se faz destacar que os estóicos eram contra a
propriedade privada e a escravidão, o que gerou em Roma e nos juristas
clássicos a divisão do direito em jus civile e jus gentium, no direito positivo dos
pretores fundado no jus naturae, essa vertente também contribuiu para o
entendimento romano da justiça, traduzido pela expressão ars boni et aequi, onde
o bem e a eqüidade se respaldavam nesse cosmos divino.
Com essa breve explanação, entendemos o porquê de os romanos,
com sua praticidade e seu espírito comercial, não cogitarem dos aspectos formais
da justiça, mas de seu conteúdo.
Se os gregos filosofaram sobre a justiça, os romanos preferiram
indagar a experiência concreta do justo. Em relação àqueles, estes avançaram ao
entender os homens como essencialmente iguais, apesar de suas diferenças
étnicas ou de classes, mas, a exemplo dos gregos, aceitavam e justificavam a
escravatura como sendo uma das conseqüências do direito internacional, sob a
alegação de que na guerra os vencidos, aos quais se deixa a vida, tornam-se
escravos de quem os poupou da morte.
O jurisconsulto romano Ulpiano deu à justiça uma definição que
ainda tem grande aceitação. Justiça nada mais é do que suum cuique tribuendi
14
.
Essa definição de justiça, regra fundamental dos romanos, cuja
concepção apresenta-se como lei ou norma, faz com que a justiça e o direito se
tornem inseparáveis. A justiça é um valor que deve ser medido e, para este fim,
os romanos criaram uma ciência específica a jurisprudência que se destina a
estudar a experiência humana do justo.
Com o advento do cristianismo, a sociedade continua a ser
concebida como um fato natural, mas a idéia de justiça será vinculada a Deus.
14
Em português: dar a cada um o que é seu.
13
Para tanto, a idéia do pecado original é o marco divisório entre a sociedade
terrena justa e injusta.
Após a consumação do pecado original, a sociedade terrena torna-
se injusta e pecaminosa, e somente pela redenção do Cristo tornou-se possível,
para a sociedade cristã, alguma justiça na terra.
O desejável então era que o estado se subordinasse à sociedade
cristã. Assim é que São Tomás de Aquino formula o objetivo do estado, qual seja
assegurar imediatamente o bem comum, devendo também, imediatamente
auxiliar a igreja na sua missão de salvar os homens.
Para S. Tomás, ao mesmo tempo em que fundamenta a lei divina
por meio da fé, incorpora a idéia de lei natural, qual seja a razão, dos gregos.
Nesta perspectiva, o poder temporal se confunde com o espiritual, surgindo a
Teoria do Direito Divino dos Reis, segundo a qual a desobediência à autoridade
terrena seria a mesma coisa da desobediência a Deus.
1.3. Idade moderna
A velha ordem feudal, corroída por uma série de guerras, epidemias
e modificações na estrutura de classe, seria definitivamente destruída com o
advento do mercantilismo.
Aos poucos, libertam-se os indivíduos dos rigores da longa disciplina
católica medieval. Entretanto, o rompimento dar-se-ia em forma de guerras,
guerras estas que geraram, entre as minorias que se sentiam ameaçadas pelo
absolutismo dos governantes nas suas práticas e crenças religiosas, a ideologia
de resistência ao tirano. A idéia de soberania popular e da origem contratual do
poder forneceu o instrumento normativo.
Pela teoria contratualista, o poder passa a ser visto como uma
delegação de certas condições às quais está ele obrigado, sob pena de perder
sua legitimidade.
Esvaía-se a concepção do direito divino, e o estado laico tornava-se
cada vez mais a realidade.
14
1.4. Idade contemporânea
Nos séculos XVI e XVIII, encontramos o aprofundamento da
laicização burguesa do pensar. Esse pensar, que não mais respalda a reflexão
sobre a justiça numa ordem divina, se volta para a ordem natural, a natureza
humana e a razão.
As bases do pensamento liberal, lançadas pelo inglês John Locke no
final do século dezessete, foram o respaldo para a independência americana.
Locke concebeu que este estado era pacífico e cooperativo, mas
impreciso e vago na regulamentação dos direitos naturais, quer pela falta de
definições formais, quer pela vasta abrangência de sanções dos magistrados. No
intuito de explicitar os direitos de cada indivíduo, bem como de os regular
adequadamente por meio da lei, submetendo-os à supervisão dos magistrados,
adota-se o contrato social.
A idéia base é que o poder é uma delegação do povo ao rei,
devendo ser exercido a fim de proteger os direitos individuais e, assim, ser
legítimo.
Jean Jacques Rousseau, no século XVIII, tentando preservar os
direitos individuais, introduz em sua concepção de contrato social elementos
novos, quais sejam a preocupação em limitar os direitos individuais e a exigência
de igualdade social.
Para Rousseau, os homens devem obrigatoriamente orientar suas
vontades particulares de acordo com a vontade geral, que exprime o consenso
dos cidadãos.
Com o desenvolvimento do capitalismo industrial, no século XIX, as
teorias contratualistas e do direito natural foram rejeitadas.
O poder passou a ser concebido como o defensor da liberdade de
contrato. Tão somente deve se destinar à defesa dos direitos individuais. Na
prática, isso significou a institucionalização da exploração das classes
assalariadas pelos proprietários dos meios de produção.
15
Marx, cuja obra é fundamental para a reflexão sobre o problema da
justiça, embora não trate desse tema em separado, embute em sua obra A
miséria da filosofia toda a questão da justiça, denunciando as contradições e os
problemas da economia capitalista. Tenta o autor, em sua obra, desvendar
cientificamente essa economia a fim de que os proletários possam ter uma
ferramenta para sua ação libertadora.
A justiça se torna compromisso com os desvalidos, com os
espoliados, com os dominados. Justa sea conduta que acelerar a organização
dos dominados no rumo da tomada do poder e no estabelecimento de uma ordem
sócio-econômica que esteja a serviço das maiorias.
Assim, Marx concebe o direito como uma variável historicamente
dependente da base econômica. O filósofo entendia como base sócio-econômica
da sociedade as relações caracterizadas por meio do nível de técnica de
produção e as relações de propriedade dos mesmos produtores e consumidores
da sociedade. A classe proprietária dos meios de produção tem a capacidade de
introduzir a ordem de direito que desejar.
Para Marx, o direito, para ser justo, deve ser universalmente válido e
eterno, mas todo direito é particular, realizando apenas os interesses da classe
dominante, e não o interesse geral.
Hoje existem duas formas de se entender o que significa justiça: a
forma subjetiva, que entende a justiça como virtude, a virtude de dar a cada um o
seu direito, e a forma objetiva, que a encara como uma qualidade de uma ordem
social, podendo também se estender à própria legislação ou ao órgão ou poder
encarregado de sua aplicação.
1.5. Os muitos sentidos da justiça
Sabemos que o termo justiça é ambíguo. Presta-se para inúmeros
usos, casos, situações e estados semelhantes, aproximados, mas não idênticos.
16
No entanto, a homonímia não está a obstar a investigação da
multiplicidade de significados pois o que ocorre com as disposições, quais as da
justiça e da injustiça, não ocorre com as ciências.
De fato, as disposições que produzem um efeito e as que produzem
efeito contrário não são coincidentes, mas a ciência que investiga acerca dos
contrários é a mesma. Compreenda-se, pois, em quantos sentidos se diz o
homem injusto, para que se compreenda em quantos sentidos se diz o homem
justo. O homem injusto é ora aquele que não respeita a igualdade, ora aquele que
não respeita a lei, ora aquele que toma em excesso aquilo que é bom em sentido
absoluto e relativo
15
.
Para Aristóteles, a justiça total consiste na observância da lei, mas
com significado muito maior do que somente norma jurídica escrita, como o
costume, a convenção social, a tradição, a maneira de fazer que se imponha
primitivamente a todos os homens.
Nesta perspectiva tudo que é legítimo é justo, e o homem justo é
aquele que pratica atos que não transgridem as regras convencionais,
preservando de uma maneira geral a ordem que beneficia o todo em que está
inserido.
Se a nómos, prescrição de caráter genérico que a todos se vincula
em vista de um fim, está estatuída no seio da comunidade pelo legislador, deve
representar um fim próprio à comunidade e, como tal, um fim comum.
1.6. O justo particular
O termo justo particular trata apenas de uma parte da virtude e não a
ela em sua integridade, como ocorre com o justo universal ou total. De qualquer
forma, tanto o justo total como o particular se expressam no neutro.
Sendo assim, a justiça particular refere-se ao outro, singularmente,
no relacionamento direito entre as partes, diferença fundamental que permite se
15
BITTAR, Eduardo C. B. A justiça em Aristóteles. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001. p.
88.
17
encontrem as fronteiras de aplicação terminológica entre a justiça em sua
acepção particular e em sua acepção universal.
Justo particular é espécie de gênero de justo total, pois quem
comete um injusto particular não deixa de violar a lei e, como tal, praticar um
injusto no sentido mais genérico.
A título elucidativo, para Aristóteles o justo particular divide-se em
justo distributivo, que corresponde a todo tipo de distribuição levada a efeito na
constituição, seja dinheiro, sejam honras, cargos ou quaisquer outros bens
passíveis de serem participados aos governadores; e, justo corretivo, que
corresponde ao estabelecimento e à aplicação de um juízo corretivo das
transações entre indivíduos, mas biparte-se para abranger tanto as relações
baseadas na voluntariedade do nculo intersubjetivo, como as relações
estabelecidas involuntariamente, surgidas como conseqüência de uma
clandestinidade ou de uma violência que atingem uma ou ambas as partes.
Gabriel Chalita
16
, em sua obra citada, mais precisamente no quinto
mandamento viver a justiça , traduz de forma magistral o sentido de justiça,
qual seja ele:
...em sentido mais elevado, a justiça é a disposição da alma que
conduz as ações do indivíduo segundo as formas mais completas
da excelência moral. A prática da excelência moral é sobretudo
um processo individual, uma prática que estabelece os limites da
vida e das ações de cada pessoa. É uma atitude frente a todas as
ocasiões, os desafios que a vida apresenta. É a ação ou omissão.
E apequena ou engrandece a natureza humana, dependendo da
disposição do agente. No caso da justiça, o valor é vislumbrado
fundamentalmente nessa busca da excelência moral voltada para
o bem do próximo. É a partilha da sociedade em que optou viver e
cujas regras discutidas em grupo, acordadas pelo bando, devem
ser respeitadas para que exista a paz”
.
16
CHALITA. Gabriel. Os dez mandamentos da ética. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2003.
18
1.7. A Idéia de justiça na visão de Ross
1.7.1. A justiça e o direito natural
O direito natural insiste que em nossa consciência reside uma idéia
simples e evidente, a idéia de justiça, que é o princípio mais elevado do direito em
oposição à moral.
A justiça é a idéia específica de direito. Está refletida em maior ou
menor grau de clareza ou distorção em todas as leis positivas e é a medida de
sua correção.
Paralelamente a essa idéia, em particular na filosofia mais antiga,
ocorre outro uso, de acordo com o qual a justiça significa virtude suprema, que
tudo abrange, sem distinção entre o direito e a moral. A justiça, segundo esse
modo de ver, é simplesmente a expressão do amor ao bem e a Deus.
Como princípio do direito, a justiça delimita e harmoniza os desejos,
pretensões e interesses conflitantes na vida social da comunidade.
No culo IV antes de Cristo, fora formulado pelos pitagóricos o
pensamento de que a justiça é igualdade, e esta era simbolizada com o número
quadrado. A idéia de justiça como igualdade, desde então, tem se apresentado
sob inumeráveis variantes.
Para Ross, a idéia de justiça parece ser clara e simples, dotada de
uma poderosa força motivadora.
1.8. Análise da idéia de justiça
Como pré-requisito para a aplicação da norma de igualdade e com
independência dela, é preciso que haja algum critério para determinar o que será
considerado igual; em outras palavras, a exigência de igualdade contida na idéia
de justiça não é dirigida de forma absoluta a todos e a cada um, mas a todos os
membros de uma classe determinada por certos critérios relevantes.
19
Como exemplo claro disso que estamos tratando, podemos
mencionar brocados do tipo: “a cada um segundo seu mérito”, “a cada um
segundo sua contribuição”, “a cada um segundo suas necessidades”, “a cada qual
segundo sua capacidade”, “a cada um segundo sua posição e condição”.
Indicamos esses exemplos não para discutir qual formulação do
princípio de justiça é a correta, mas para mostrar que a pura exigência formal de
igualdade não significa muito em si e que o conteúdo prático da exigência de
justiça depende de pressupostos que o externos ao princípio de igualdade, a
saber, os critérios que determinam as categorias às quais se deve aplicar a norma
de igualdade.
Por fim, ressalta o autor que é impossível ter uma discussão racional
com quem apela para a “justiça”, porque nada diz que possa receber
argumentação a favor ou contra. Suas palavras são persuasão, não argumentos.
A ideologia da justiça conduz à intolerância e ao conflito, visto que, por um lado,
incita à crença de que a exigência de alguém não é meramente a expressão de
certo interesse em conflito com interesses opostos, mas, sim, que possui uma
validade superior, de caráter absoluto; e, por outro lado, exclui todo argumento e
discussão racionais que visem a um acordo.
20
2. JUSTIÇA E BEM
Antes de adentrarmos o referido tema, o qual terá grande
importância para o desenvolvimento do presente trabalho, que discorreremos
sobre a energia, que é um bem, gostaríamos de entrelaçar o tema “justiça” com
“bem” e, para tanto, vamos ao próximo tópico.
2.1. Justiça e bem comum
Aristóteles, em A política, ensina-nos que o homem não quer apenas
viver, mas viver bem. Esta expressão não deve ser apenas interpretada no
sentido aparente de fruição de valores materiais; o bem a que o homem se
destina, e que lhe é conatural e próprio, diz respeito ao seu aperfeiçoamento
moral, como único ente, cujo ser é o seu dever ser, como tal capaz de modelar-se
segundo influências subjetivas e sociais, mas firmando sua liberdade instauradora
de algo original
17
.
Sendo o homem ser que exige o reconhecimento da correspondente
dignidade alheia, o bem do homem não pode deixar de ser a integração de duas
perspectivas, ou seja, o ego e o alter-ego.
Na realidade, o bem consiste em servir a um valor positivo sem
prejuízo de um valor mais alto, o bem social ideal que consistirá em servir ao todo
coletivo respeitando-se a personalidade de cada indivíduo, visto como parte
integrante de um todo.
Percebe-se, portanto, que se impõe preservar o bem do indivíduo
como ponto final a que se deve tender de maneira dominante; mas, ao mesmo
tempo, imprescindível salvaguardar e acrescer o bem do todo naquilo que o bem
social é condição do bem de cada qual.
No bem, temos dois aspectos, o social e o individual. O bem do
indivíduo constitui objeto da moral, e objetivo único da ética; o bem como valor
social é o que podemos chamar de justo, constituindo, assim, o valor fundamental
17
REALE, Miguel. Filosofia do direito, São Paulo: Saraiva, 1969.
21
do direito. Podemos assim concluir que o valor próprio do direito é a justiça, não
entendida como simples relação extrínseca ou formal dos atos humanos, mas sim
como a unidade concreta destes atos de modo a constituírem um bem
intersubjetivo ou, em outras palavras, o bem comum.
Com isso, a justiça pressupõe o valor transcendental da pessoa
humana e representa o pressuposto de toda a ordem jurídica.
Essa compreensão de justiça leva-nos a identificá-la com o bem
comum que pode ser concebido, concretamente, como um processo
incessante de composição de valoração e de interesses, tendo como base ou
fulcro o valor condicionante da liberdade espiritual, a pessoa como fonte
constitutiva da experiência ético-jurídica
18
.
Lendo obras clássicas como as de Aristóteles ou mesmo Santo
Tomás, encontramos a palavra justiça entendida no seu sentido subjetivo, sendo
certo que o termo é visto como inclinação, tendência, forma de querer; em suma,
algo que está no homem mesmo antes de se realizar na sociedade. Se o homem
médio age segundo a justiça, obedecendo àquele impulso subjetivo, instaura uma
dada ordem social, uma ordenação de convivência.
O ilustre doutrinador Miguel Reale, em obra citada, defende a tese
de que:
a justiça se reduz à realização do bem comum”
ou, mais precisamente:
é o bem comum `in fieri´ ”, como constante exigência histórica de
uma convivência social ordenada segundo os valores da liberdade
e da igualdade”.
18
REALE, Miguel. op. cit.
22
2.2. O Bem comum como a melhor vida possível segundo a visão de
Aristóteles
19
Partindo da crítica à teoria platônica das formas, Aristóteles abre um
novo horizonte para a filosofia, o que resulta na definição de diversos campos de
conhecimento tais quais aceitamos até hoje com poucas variações; a ética e a
política são dois dos campos privilegiados pelo estagirita, nos quais operará
mudanças significativas em relação às teses de seu mestre, Platão.
Platão estabeleceu o princípio de que o bom governo deveria
remeter, de forma direta ou indireta, à idéia universal de bem. Para este filósofo,
filosofia, ética e política não poderiam ser pensadas de maneira autônoma, uma
vez que somente a reflexão filosófica garantiria, em última instância, a felicidade
perfeita da polis.
Este modelo fica sujeito a algumas aporias, e a detecção destas
constituirá o ponto de partida de Aristóteles em sua filosofia prática.
Ocorre que na ética e na política Aristóteles está não tanto se
opondo ao trabalho da República, mas refazendo-o; é o que leva a crer a crítica à
teoria platônica das formas: em nenhum momento, Aristóteles abandona a idéia
de “bem” como elemento central para a vida coletiva; o que ele critica é
exatamente “qual o bem” a que deveríamos nos remeter; daí a afirmação de que
não existiria um bem, mas bens, e que todos esses teriam lugar em função de
um “bem supremo” e terreno: a felicidade.
Percebemos que os modelos platônicos e aristotélicos apresentam
um núcleo comum, exatamente a fundamentação positiva da vida coletiva, a
busca da melhor vida possível modelada a partir de uma vida ideal.
Aristóteles percebe que um dos problemas centrais do pensamento
platônico estava na superposição entre filosofia e política; enquanto não se
encarasse a última a partir de suas próprias finalidades, haveria uma inadequação
estrutural entre posições filosóficas e a realidade efetiva da ação política. Daí a
crítica à teoria platônica das formas: não que o estagirita recusasse a existência
19
TEIXEIRA, Felipe Charbel. A República bem ordenada. 2004. Dissertação (Mestrado) Pontifícia
Universidade Católica, PUC/RJ, Rio de Janeiro, 2004.
23
de um bem supra-sensível; apenas afirmava que, mesmo que tal princípio
existisse, não poderia constituir modelo para os homens. O foco da ética
aristotélica está no que é possível aos homens atingir, e a idéia do bem não seria
algo passível de conhecimento. Diz Aristóteles
20
:
...ainda que exista algum bem único que seja universalmente
predicável dos bens, ou capaz de existir separada e
independentemente, esse bem não poderia, é evidente, ser
realizado ou alcançado pelo homem; e o que buscamos aqui é
algo de inatingível”.
O “inatingível” se faz essencial, pois que, segundo o estagirita, o
bem universal não poderia ser alcançado pela reflexão. Cria-se, porém, um
impasse: se o bem em si não pode constituir um modelo, em que os homens
poderiam se basear com vistas à orientação de suas ações no mundo? Seria o
caso de retomar o “argumento sofistae defender que somente a força se faria
capaz de ordenar as coletividades? Procurando solucionar estes embaraços,
Aristóteles estabelece um tipo de finalismo, em que as ações praticadas pelo
homem constituiriam meios pelos quais poderíamos realizar nossos objetivos;
donde se conclui que “tudo o que existe é aplicável por aquilo em vista do que ele
existe”. Cada ação humana passa a ter um próprio bem, ao qual se destina
potencialmente realizar. Uma vez que as ações dos homens direcionam-se a fins,
e cada fim é um bem, não se pode falar de um bem universal, mas de “bens”
próprios a cada circunstância, executáveis por meio de escolhas intencionais do
possível, a proáiresis. A palavra bem se torna, deste modo, um vocábulo
equívoco:
Além disso, como o termo bem tem tantas acepções quantas o
termo ser (...) é evidente que o bem não pode ser algo único e
universalmente presente em todos os casos, pois se fosse assim,
ele não poderia ter sido predicado em todas as categorias, mas
apenas de uma” (Aristóteles, livro I, obra citada).
Os homens estabeleceriam objetivos cujas realizações potenciais
constituiriam bens visados, sempre relativos à ação e aos meios empregados.
Contudo, Aristóteles percebe que não poderia haver uma cadeia infinita de
finalidades; seria preciso que existisse um “bem supremo”, o qual todos
20
ARISTÓTELES. A política. São Paulo: Atena, 2004.
24
desejassem indistintamente. Segundo o filósofo, este princípio último seria a
felicidade: a “felicidade, mais que qualquer outro bem, é tida com este bem
supremo, pois a escolhemos sempre por si mesma e nunca por causa de algo
mais”.
Fica definido, portanto, o bem supremo almejado pelos homens em
geral; todas as ações práticas, todos os bens visados, teriam por finalidade
máxima uma vida feliz.
Aristóteles parte da observação dos próprios desígnios que os
homens se impõem, de suas condutas e ações, para constituir os fundamentos de
sua filosofia prática, que teria por alicerce a busca da verdade, em que esta não é
o fim, mas apenas um meio de vista do outro, ou seja, da ação, sempre situada
no tempo presente.
A filosofia prática se direcionaria para a realização dos bens
desejados pelos homens. Aliado a este caráter analítico dos interesses humanos,
existe um elemento prescrito, a definição do “dever ser” deste bem supremo.
Assim, no que concerne à distinção da felicidade como bem supremo teríamos
uma análise perspicaz dos próprios objetivos dos homens no mundo, a definição
da felicidade a que o filósofo se refere não é aquela do senso comum que tende
a identificar a vida feliz com a repleta de prazeres e riquezas, mas a adequação a
uma vida virtuosa, governada pela razão e pela sophrosyne.
Viver virtuosamente é escolher a felicidade suprema, optar,
deliberar, o que implica uma vida ativa, assim como a opção pelos meios
adequados com vistas ao equilíbrio entre a falta e o excesso. Sabemos que a
capacidade deliberativa do homem é colocada em primeiro plano; d a
importância da escolha e do caráter voluntário da ação dirigida a um fim possível.
Em Ética a Nicômaco, ao tratar da virtude, o autor deixa claro:
A virtude é, então, uma disposição de caráter relacionada com a
escolha de ações e paixões, e consistente numa mediania, isto é,
a mediania relativa a nós, que é determinada por um princípio
racional próprio do homem dotado de sabedoria prática. E é um
meio-termo entre dois vícios, um por excesso e outro por falta...”.
25
fora notado por diversos autores que as reflexões aristotélicas
sobre a natureza possuem uma estreita conexão com sua filosofia política; prova
disso é a celebre frase “o homem é um animal político”. Sendo assim, o mundo da
política, para o filósofo, implica contingência; a polis seria exatamente um tipo de
comunidade sujeita ao acaso e às mudanças repentinas, peculiares aos assuntos
humanos; seria vista como um dado da natureza, haja vista a naturalidade das
associações comunitárias entre os homens. E, entre as associações possíveis, a
mais perfeita seria exatamente a polis, pois que congrega os interesses
individuais visando ao bem comum; assim, o homem alcançaria a plenitude
para realizar sua natureza no âmbito da polis, o que significaria agir de acordo
com o que fosse melhor para a coletividade.
Aquele que não pode viver em sociedade, ou que de nada
precisa para bastar-se a si próprio, não faz parte do Estado; é um
bruto ou um deus.”
21
Nesta obra, percebemos que, em sua análise, Aristóteles não parte
do indivíduo separado, e sim de um homem sempre ligado aos outros como
parceiros de relação ou membros de uma determinada comunidade, visando ao
bem de todos, ou seja, ao bem comum.
Mas referido autor dava ao homem a escolha sobre a ação virtuosa;
aquele que optasse por essa via estaria de acordo com a razão, e para escolher
este caminho, seria necessário que desenvolvesse a virtude da prudência. Esta
corresponderia a uma percepção da verdade conforme o desejo concreto,
estando, assim, ligada à escolha de uma causa eficiente capaz de transformar um
desejo em um bem.
Ainda que a prudência tenha a ver com a contingência, ela não se
desliga do universal, uma vez que a delimitação de um bem supremo necessita
de uma referência imutável, não suscetível ao acaso. Assim, a prudência se liga
também ao bem geral, e, por conseguinte, ao bem do outro.
A prudência, portanto, é a disposição que coloca em prática as
virtudes morais; sua finalidade é exatamente a de tornar a conduta particular
21
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, cit.
26
adequada a uma arché: o bem de um deve ser o bem de todos; a prudência se
mostra capaz de adequar a ação individual às virtudes morais.
Visto que a ciência política utiliza as demais ciências e, ainda,
legisla sobre o que devemos fazer e sobre o que devemos nos
abster, a finalidade dessa ciência deve necessariamente abranger
a finalidade das outras, de maneira que essa finalidade deverá ser
o bem humano. Ainda que esse fim seja o mesmo para o
indivíduo e para a cidade-estado, o fim desta última parece ser
algo maior e mais completo, seja a atingir, seja a preservar; e
embora seja desejável atingir esse fim para um indivíduo só, é
mais nobre e mais divino alcançá-lo para uma nação ou para as
cidades-estados.”
22
(negrito nosso).
O bem comum se faz, portanto, não apenas de um modelo para a
ação política, mas também para a ética, uma vez que sua realização se apresenta
como a plenitude da vida virtuosa.
2.3. Princípio do bem comum. A primazia do bem comum sobre o bem
particular
O princípio do bem comum é um princípio objetivo, que decorre da
natureza das coisas e possui inúmeras conseqüências práticas para o convívio
social.
Comentando a Encíclica Mater et Magistra, Alceu Lima
23
afirma:
A alma do bem comum é a solidariedade. E a solidariedade é o
próprio princípio constitutivo de uma sociedade realmente
humana, e não apenas aristotélica, burguesa ou proletária. É um
princípio que deriva dessa natureza naturaliter socialis do ser
humano. três estados naturais do homem, que representam a
sua condição ao mesmo tempo individual e social: a existência, a
coexistência e a convivência. Isto vale para cada homem, como
para cada povo e cada nacionalidade”.
Ao se perquirir sobre o que seja bem comum, o Ives Gandra da Silva
Martins Filho
24
assevera que cinco noções básicas devem ser aprofundadas como
22
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco, cit.
23
LIMA, Alceu Amoroso. Introdução à encíclica Mater et Magistra, do Papa João XXIII. Rio de
Janeiro: Olympio, 1963.
24
MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. In: Revista jurídica virtual, Brasília, v. 2, n. 13, jun. 1999,
artigo escrito para a Presidência da República, casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos.
27
instrumento indispensável para a sua compreensão, quais sejam as noções de
finalidade, bondade, participação, comunidade e de ordem.
Segundo o Ives Gandra, a primeira noção básica para se
compreender o bem comum é a finalidade ou causa final. Aristóteles, em
Metafísica
25
, quando estudava o tema da causalidade, reduziu todas as possíveis
causas a quatro espécies: causa material do que a coisa é feita (matéria, como
princípio comum); causa formal qual a essência da coisa (o que a distingue das
demais); causa eficiente – qual a origem ou motor que colocou a coisa em
movimento; causa final – qual o fim ou objetivo da coisa.
S. Tomás
26
diz que bem é aquilo que a todos apetece. Apetece
porque possui uma perfeição capaz de atrair. Assim, o bem é o fim buscado pelo
agente, já que o atrai.
Nesse sentido, temos que a perfeição atua como fim para o qual
tende o ente: o bem que busca possuir. Isso posto, primeiro, e principalmente,
chama-se bem ao ser aperfeiçoador de outro a modo de fim. Quanto mais perfeito
e universal for o bem, a mais seres atraíram. O ser perfeito, diz-se que é por
essência; o que não é perfeito, mas tem perfeições, diz-se que é por participação.
Necessário se faz compreender, então, o que seja participação
como terceira noção básica para se delimitar o bem comum.
Etimologicamente, participar significa tomar uma parte; no entanto, a
melhor noção de participação vem da etimologia grega, que significa ter
conjuntamente ou ter com outro. Assim, o bem é difuso por si só, que atua
como causa final que atrai a que outros participem de sua bondade.
Sabemos que todo tipo de participação implica uma comunidade
entre os participantes em função do participado. Esta é a quarta noção básica e
está diretamente ligada à própria expressão de bem comum.
Diz S. Tomás de Aquino: “a comunidade é um certo todo”. Existindo
certa unidade entre os participantes, como integrantes de um todo: os homens,
por participarem da mesma natureza humana, formam uma comunidade, qual
25
ARISTÓTELES. Metafísica. Ciudad de México. Porrua: 1978.
26
AQUINO, S. Tomás de. El bien. Seleção de Textos, Introdução e Tradução de Jesús García
López. Pamplona: Universidad de Navarra, 1996.
28
seja comum união ou até mesmo comum unidade, uma união daqueles que
participam da mesma natureza e tendem a um mesmo fim.
Para se concluir os elementos que propiciam a compreensão do que
seja bem comum, precisamos entender a noção de ordem que desempenha papel
fundamental como a noção de finalidade.
Para haver ordem, são necessárias três coisas: distinção com
conveniência que haja multiplicidade de indivíduos, com um elemento
semelhante que os aglutine, mas com diferenças de talentos e perfeições
colocadas à disposição do todo; cooperação que aquilo que falte a um seja
suprido pelo que possui o outro; fim que exista um objetivo comum em torno do
qual se aglutinem todos os membros da comunidade.
Assim, uma comunidade não é um aglomerado de pessoas, mas um
todo orgânico, com uma ordem entre as partes, onde deve imperar a harmonia e
a concórdia.
Nesse mesmo raciocínio concluímos existir dois tipos de ordem: a
ordem das partes entre si (intrínseca) – subordinação de umas a outras, conforme
a hierarquia, e a ordem do todo ao fim (extrínseca) busca de todos pelo bem
comum.
A ordem intrínseca se subordina à extrínseca, como as partes se
subordinam ao todo: uma ordem interna se as partes convêm num fim
ordenador comum. A própria ordem do universo somente se explica em face
dessa dupla ordenação.
Podemos dizer, portanto, que o objetivo que une os homens em
sociedade e determina o modo como se organizarão é o bem comum que
pretendem alcançar, que se distingue do bem particular buscado por cada
indivíduo isoladamente.
Verificamos que nenhum indivíduo pode alcançar seu fim particular
senão como parte ou co-participante de um todo no qual está inserido, uma vez
que apenas colaborando na consecução do fim comum e ajudando os demais
membros da comunidade a alcançar seu bem particular se atinge o próprio bem,
já que se trata de um bem comum.
29
Após estas breves noções, podemos conjugá-las para chegar à
compreensão do que seja o bem comum.
Bem comum é o próprio bem particular de cada indivíduo, enquanto
este é parte de um todo ou de uma comunidade. O bem comum é o fim das
pessoas singulares que existem na comunidade, como o fim do todo é o fim de
qualquer de suas partes; ou seja, o bem da comunidade é o bem do próprio
indivíduo que a compõe. O indivíduo deseja o bem da comunidade, que ele
representa o seu próprio bem. Assim, o bem dos demais não é alheio ao bem
próprio.
Noção afim à de bem comum é a de interesse público. Mas, antes
de adentrarmos nesse ponto, cabe aqui uma breve noção do que seja interesse.
Interesse é a relação existente entre uma pessoa e um bem, na qual
este se mostra capaz de satisfazer uma necessidade daquela, ou seja, o
interesse é a ponte entre o sujeito e o bem, que os relaciona entre si, em que o
sujeito busca aquilo que reputa ser um bem capaz de satisfazê-lo.
Seguindo nessa esteira, temos que quando o sujeito busca um bem
para todos, é a comunidade que o está buscando. Nesse sentido, estamos diante
do que se denomina interesse público, que aparece como a relação entre a
sociedade e o bem comum que ela almeja, perseguido por aqueles que, na
comunidade, estão investidos de autoridade.
Numa sociedade politicamente organizada, caberá aos seus
dirigentes públicos promover o bem comum, externado por meio de suas ações e
comandos. Cabe ressaltar que, às vezes, o interesse blico pode não se
adequar ao bem comum da sociedade, principalmente quando houver
descompasso entre o direito positivo e o direito natural, ou seja, a lei positiva,
emanada da autoridade, vai de encontro aos direitos humanos fundamentais,
inalienáveis e que não cabe ao estado outorgar, mas apenas reconhecer, como
parte pré-existente, como inerente à dignidade da pessoa humana.
A moderna teoria dos interesses veio a ampliar o rol dos interesses
existentes na sociedade, fixada uma gradação entre o interesse público e o
privado, que inclui as noções de interesse difuso, coletivo e individual
homogêneo, que serão oportunamente tratados.
30
Compreendendo o que seja bem comum, podemos chegar a
algumas conclusões.
Se por um lado o bem comum é a potencialização do bem particular,
por outro tem primazia sobre o bem particular, pois o bem de muitos é melhor do
que o bem de um só. Assim, se cada componente da comunidade é bom, o
conjunto desses componentes é ótimo, uma vez que acresce ao bem particular de
cada um a perfeição do conjunto, isto porque, no bem do todo, está incluído o
bem de cada uma das partes. Por isso, devemos preferir o bem comum ao bem
próprio.
Em verdade, quando buscamos o bem comum, buscamos,
necessária e conseqüentemente, o próprio bem, pelo benefício que a parte
recebe do todo.
Ives Gandra afirma que:
o bem comum está para permitir aos indivíduos a consecução de
seus bens particulares, mas é superior a estes: o bem particular
de um indivíduo não pode ser buscado em detrimento do bem
comum da sociedade”.
2.4. Limites do princípio do bem comum
Por tudo que fora exposto até agora, podemos concluir que o bem
comum tem primazia sobre o bem particular. No entanto, essa primazia tem seus
limites, impostos pelo princípio da proporcionalidade, segundo duas vertentes: limite
qualitativo a primazia do bem comum sobre o particular só vale dentro da mesma
categoria de bens; e limite quantitativo – a prevalência do todo sobre a parte depende
da qualidade de indivíduos afetados pelo sacricio do bem pprio ao comum.
Portanto, citando como exemplo a questão tributária, na relação
entre o bem comum e o bem particular uma proporção conveniente entre o
volume de impostos exigidos para a manutenção do estado e a capacidade
contributiva de cada membro da sociedade. O mesmo se diga, no campo
trabalhista, entre o volume de produção e o nível salarial, quando se trata de
31
estabelecer a distribuição do produto social por meio de ajustamento entre preços
e salários
27
.
É fundamental, portanto, que cada membro da sociedade veja no
bem comum a sua própria realização e para isso colabore com simples condutas
como adquirir e praticar virtudes morais, exercer de forma competente a própria
profissão ou ofício, participar direta ou indiretamente na vida pública, fomentar a
união na vida social, entre tantas outras atividades plausíveis e possíveis de
serem realizadas.
E, corroborando com essa idéia, S. Tomás
28
vislumbra:
A vida eterna, além da visão de Deus, em sumo louvor e perfeita
segurança, consiste na gozosa sociedade de todos os bem-
aventurados; sociedade que será deleitável em grau máximo,
porque cada um amará ao outro como a si mesmo, e, por
conseguinte, se alegrará com o bem do outro como de seu próprio
bem, o que faz que aumente tanto a alegria e o gozo de um,
quanto é o gozo de todos”.
Como ensina Chalita
29
:
“o bem é a finalidade da ética, sendo que esta disciplina os meios
para se atingir o bem. O verdadeiro fim da sociedade é o seu bem
comum, o bem comum do corpo social, das pessoas humanas.
Este bem comum é a boa vida humana do todo social, de cada ser
formado por matéria e espírito”.
Segundo Thiago Valverde
30
, o bem comum de um determinado
grupo humano é a sua comunhão no bem-viver; é comum ao todo e às partes.
Sob pena de ir contra a própria natureza, o bem comum exige o reconhecimento
dos direitos fundamentais das pessoas e detém como valor principal a maior
possibilidade de acesso das pessoas à liberdade intrínseca de cada um de se
expandir e evoluir, bem como às manifestações de bem que por sua vez daí
procedem e se comunicam.
27
MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. A legitimidade do direito positivo. Rio de Janeiro:
Forense Universitária, 1992.
28
AQUINO, S. Tomás de. Suma teológica. Tradução de Alexandre Corrêa. Porto Alegre: Sulina,
1980.
29
CHALITA. Gabriel. op. cit.
30
VALVERDE, Thiago Pellegrini. O bem comum, o humanismo e os direitos humanos. Disponível
em: <www.direitonet.com.br>.
32
3. DOS BENS SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO
31
Agora que sabemos e entendemos o real significado da palavra
bem, podemos iniciar o estudo sobre bem na visão das nossas leis, interligando
aquele conceito com este que desenvolveremos a seguir, lembrando-nos sempre
que energia é um bem.
Quando afirmamos que energia é um bem, pensamos: de que tipo?
Responderemos a isso agora.
3.1. Da classificação dos bens no Código Civil brasileiro
Como bem, podemos entender todas as coisas materiais ou
imateriais que têm valor econômico e que podem servir de objeto a uma relação
jurídica.
Sendo assim, o Código Civil utiliza quatro critérios para classificar os
bens. Primeiramente, examinou-os, de modo objetivo, considerando-os em si
mesmos (arts. 79 a 91), sem qualquer relação com outros bens ou com o seu
titular, atendo-se à sua mobilidade, fungibilidade, consumibilidade, etc. Ao
classificar os bens em principais e acessórios, passou a examiná-los em relação
aos outros (arts. 92 a 97). Verificando sua relação com o titular do domínio,
distinguiu-os em públicos e particulares (arts. 98 a 103). Quanto à suscetibilidade
de serem negociados, pode-se dividi-los em coisas no comércio e fora do
comércio
32
.
Cada classificação baseia-se numa característica peculiar do bem.
Entretanto, este pode enquadrar-se em várias categorias, desde que tenha
múltiplos caracteres
33
.
31
No presente capítulo, com a devida vênia, não trataremos das seguintes classificações: dos bens
fora do comércio e do bem de família, por não fazerem parte da matéria aqui tratada.
32
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. v. 1.
33
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil. São Paulo: Saraiva, 1968.
33
3.2. Bens considerados em si mesmos
3.2.1. Bens corpóreos e incorpóreos
Desde os romanos, a doutrina classifica os bens em corpóreos e
incorpóreos. Os romanos diziam res corporales e res incorporales ou, como
prefere Justinianus, rebus corporalibus et incorporalibus
34
.
Os bens corpóreos são coisas que têm existência material, coisas
que podemos tocar, como uma casa, um terreno, uma jóia. São objetos do
direito
35
.
Os bens incorpóreos não têm existência tangível e o relativos aos
direitos que as pessoas físicas ou jurídicas têm sobre as coisas, sobre os
produtos do seu intelecto ou contra outra pessoa, apresentando valor econômico,
tais como os direitos reais, obrigacionais, autorais.
Portanto, são corpóreas as coisas que podem tocar e incorpóreas
aquelas que não têm existência material. São corpóreos, por exemplo, diz
Orlando Gomes
36
, fundamentado em Von Thur, a energia elétrica, a energia
térmica e a energia fonética e, baseado em Messineo, diz que os bens
incorpóreos são os não perceptíveis, tais como os produtos da atividade
intelectual, os direitos autorais e os direitos de patente.
Sendo assim, a energia é um bem incorpóreo.
3.2.2. Bens imóveis e móveis
Washington de Barros Monteiro leciona que essa classificação de
bens móveis e imóveis remonta à antiguidade, em substituição à clássica divisão
34
FAZANO, Haroldo Guilherme Vieira. Curso de direito civil brasileiro: parte geral. São Paulo: CS
Edições, 2006.
35
GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
36
Id. Ibid.
34
do direito romano, res mancipi e res nec mancipi, ou seja, coisas que requerem
ou não o uso da mancipatio para a sua transferência.
Desde a idade média o bem imóvel tem primazia, ficando o móvel
em posição secundária. Hodiernamente, o bem móvel vem assumindo grande
importância, principalmente pela vantagem de sua livre circulação e pelo seu alto
valor.
O atual Código Civil regulamenta os bens imóveis nos artigos 79, 80
e 81.
Segundo Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery
37
, os
bens imóveis, também por alguns denominados “bens de raiz”, são os que
absolutamente não se podem transportar sem alteração de sua essência, tais
como o solo, como uma superfície, com os seus acessórios e adjacências
naturais, compreendendo as árvores, os frutos pendentes, o espaço aéreo e o
subsolo.
os bens móveis estão disciplinados nos artigos 82, 83 e 84 do
mesmo diploma legal.
No artigo 83 encontramos os bens por destinação legal, que são
aqueles previstos em lei, e entre os incisos encontramos a tipificação de que
energia é um bem móvel; senão vejamos:
Art.83. Consideram-se móveis para os efeitos legais:
I – as energias que tenham valor econômico.
Maria Helena Diniz, em obra consultada, leciona que os bens móveis
por determinação de lei o as energias que tenham valor econômico, pois, pelo
Código Penal, art. 155 §3º, a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor
econômico (como a térmica, a nuclear, a eólica, a radioativa, a radiante, a solar, a
gravitacional, a das águas represadas, a sonora ou a hidrodinâmica) equiparam-
se à coisa móvel.
Em assim sendo, energia é um bem incorpóreo e móvel, até o
presente momento.
37
NERY JÚNIOR, Nelson; ANDRADE, Rosa Maria de. Código Civil comentado. São Paulo: Ed.
Revista dos Tribunais, 2007.
35
3.2.3. Bens fungíveis e infungíveis
O Código Civil, relativamente aos bens, formula outra classificação.
Ele trata, também, dos bens fungíveis e não fungíveis.
O próprio Código Civil define os bens fungíveis, estatuindo tratar-se
dos móveis que podem ser substituídos por outros da mesma espécie, qualidade
e quantidade (art. 85).
In Código civil comentado, por Nelson e Rosa Maria de Andrade
Nery, encontramos a seguinte explicação: “Fungíveis são as coisas que se
contam, se medem ou se pesam, e não se consideram objetivamente como
individualidades. Infungíveis são as coisas que, em determinada relação jurídica,
são consideradas tendo em vista sua específica individualidade (STF RT
806/116)”.
Nessa esteira, energia é um bem incorpóreo, móvel e infungível.
3.2.4. Bens consumíveis e inconsumíveis
Os bens consumíveis estão previstos no artigo 86 do Código Civil,
que estabelece: “São consumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição
imediata da própria substância, sendo também considerados tais os destinados à
alienação”.
Fazano
38
instrui que o consumíveis (quae usu consumuntur) os
bens que, após seu uso, se destroem ou perdem sua utilidade. E, continua o
autor, são inconsumíveis (quae non consumuntur) aqueles que, depois de
utilizados, podem continuar a ter a mesma utilidade.
A título elucidativo, trazemos à baila o que dispõe Luís Cabral
39
quando esclarece que uma forma de consumo ou consumação da coisa que
consiste na sua total destruição e perda da substância física, cujo processo
chama “consumo material” ou físico.
38
FAZANO, Haroldo Guilherme Vieira. op. cit.
39
MONCADA, Luís Cabral de. Lições de direito civil. Coimbra: Almedina, 1995.
36
Pelo que fora exposto até o presente, energia é um bem incorpóreo,
móvel, infungível e consumível (consumo material ou físico).
3.2.5. Bens divisíveis e indivisíveis
A divisibilidade dos bens, prevista nos artigos 87 e 88 do Código
Civil, não está relacionada com o conceito de divisibilidade física ou material
40
. As
coisas ou bens materiais são fisicamente divisíveis, como, por exemplo, um lote
de cento e vinte metros quadrados. Aliás, até o átomo é divisível.
O Código Civil, quando trata da divisibilidade dos bens, refere-se à
sua divisibilidade jurídica e econômica.
Assim, os bens divisíveis são aqueles que se podem fracionar sem
alteração na sua substância, diminuição considerável de valor ou prejuízo do uso
a que se destinam.
A respeito da divisibilidade dos bens, sob o aspecto econômico
(diminuição considerável de valor), temos a seguinte decisão:
“Coisa comum divisibilidade – inexistência diminuição do valor
econômico – inteligência do art. 53 nº I, do Código Civil [de 1916].
Dever-se-ão considerar como insuscetíveis de divisão cômoda os
bens que, para serem divididos, devam sofrer sensível redução no
seu valor, seja pelas despesas excessivas que se fizerem
necessárias para culminar o objetivo, tratando-se de edifícios, ou
pela redução das rendas respectivas, ou, ainda, pelas más
condições inevitáveis da divisão”.
Além disso, os bens divisíveis podem tornar-se indivisíveis por
determinação da lei ou pela vontade das partes.
A respeito, Luís Cabral de Moncada
41
esclarece: “Não podemos
deixar de notar aqui que não as coisas corpóreas, mas também incorpóreas,
são susceptíveis de se classificar como divisíveis e indivisíveis. Isto é: os direitos
podem também ser divisíveis ou indivisíveis. Contudo – e isto é o mais importante
– note-se que a divisibilidade ou indivisibilidade dos direitos não assenta no
40
FAZANO, Haroldo Guilherme Vieira. op. cit.
41
MONCADA, Luís Cabral de. op. cit.
37
mesmo critério que serve de base a esta divisão das coisas corpóreas; e note-se
ainda, além disso, que o critério em que assenta uma tal divisão das incorpóreas
também o é sempre o mesmo; pelo contrário, é múltiplo e varia consoante os
institutos jurídicos que se considerem”.
Desta forma, energia é um bem incorpóreo, móvel, infungível,
consumível e indivisível.
3.2.6. Bens singulares e coletivos
Os bens singulares e coletivos o importantes, o mais das vezes,
para estabelecer a natureza jurídica de situações que interessam para a
resolução dos problemas que surgem no dia-a-dia.
As coisas simples e compostas têm conceitos filosóficos. Os
romanos diziam que as coisas simples eram as coisas quae uno spiritu
continentur e as segundas res ex cohaarentibus ou ex distantibus
42
.
Conforme entendimento do artigo 89 do digo Civil, bens
singulares são os que, embora reunidos, se consideram de per si,
independentemente dos demais, enquanto os coletivos são aqueles que possuem
uma pluralidade de coisas singulares.
Maria Helena Diniz, em sua obra Curso de direito civil brasileiro,
assevera que o Código Civil de 1916 (art. 54, I e II) classificava as coisas
singulares em simples e compostas. Simples seriam as que formassem um todo
homogêneo, cujas partes componentes estariam unidas em virtude da própria
natureza ou da ão humana, sem reclamar quaisquer regulamentações
especiais por norma jurídica. Poderiam ser materiais (pedra, caneta-tinteiro, folha
de papel, cavalo) ou imateriais (crédito). As coisas compostas seriam aquelas
cujas partes heterogêneas fossem ligadas pelo engenho humano, caso em que
haveria objetos independentes unidos num todo sem desaparecer a condição
jurídica de cada parte. P.ex.: materiais de construção que estão ligados na
42
FAZANO, Haroldo Guilherme Vieira. op. cit.
38
edificação de uma casa. Didaticamente, nada obsta a que se mantenha tal
classificação, apesar da omissão no novel Código Civil.
E, continua a autora supra mencionada a dizer que as coisas
coletivas ou universais são as constituídas por várias coisas singulares,
consideradas em conjunto, formando um todo único, que passa a ter
individualidade própria, distinta da dos seus objetos componentes, que conservam
sua autonomia funcional. A esse respeito esclarece-nos Sylvio Marcondes que “as
universalidades são constituídas por uma pluralidade de coisas, que conservam
sua autonomia funcional, mas são unificadas em vista de uma particular
valoração, feita pelo sujeito ou reconhecida pelo direito”.
Com o que fora exposto, entendemos ser a energia um bem
incorpóreo, móvel, infungível, consumível, indivisível e singular.
3.2.7. Bens reciprocamente considerados
O próprio digo Civil, em seu artigo 92, conceitua a coisa principal
e a acessória ao prescrever: “Principal é o bem que existe sobre si, abstrata ou
concretamente; acessório, aquele cuja existência supõe a do principal”. De modo
que a coisa principal é a que existe por si, exercendo sua função e finalidade,
independentemente de outra.
Explica-nos Lacerda de Almeida
43
que a qualidade de acessório é
dada pela norma jurídica que, ante coisas incorpóreas ou unidas para certo fim,
estabelece o que é principal e o que é acessório. Nos imóveis o solo é o principal,
sendo acessório tudo o que nele se incorporar permanentemente, p.ex., uma
árvore plantada ou uma construção, que é impossível separar a idéia de árvore
plantada e de construção da idéia do solo. Nos móveis, principal é aquela para a
qual as outras se destinam, para fins de uso, enfeite ou complemento (p.ex.,
numa jóia, a pedra é acessório do colar). Não os bens corpóreos comportam
tal distinção; os incorpóreos também, pois um crédito é coisa principal, uma vez
43
ALMEIDA, Lacerda de. Direito das cousas. Rio de Janeiro, 1908. v. 1.
39
que tem autonomia e individualidade próprias, o mesmo não se dando com a
cláusula penal, que se subordina a uma obrigação principal.
Pontes de Miranda, Windscheid e Ferrara, com muita propriedade,
observam que a relação de acessoriedade é meramente funcional, estabelecendo
certa subordinação.
44
Do que fora exposto, percebemos que a energia é um bem principal
e, completando nosso entendimento, energia é um bem incorpóreo, móvel,
infungível, consumível, indivisível, singular e principal.
3.2.8. Bens considerados em relação ao titular do domínio
O Código Civil brasileiro, no seu artigo 98, classifica os bens em
públicos e particulares: “São públicos os bens do domínio nacional pertencentes
às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares,
seja qual for a pessoa a que pertencerem”.
Sobre os bens públicos em sentido amplo, esclarece Hely Lopes
Meirelles
45
que eles são todas as “coisas corpóreas ou incorpóreas, imóveis,
móveis e semoventes, créditos, direitos e ações, que pertençam a qualquer título,
às entidades estatais, autárquicas e paraestatais”.
Celso Antônio Bandeira de Mello
46
, no mesmo sentido, conceitua os
bens públicos como “todos os bens que pertencem às pessoas jurídicas de direito
público, isto é, união, estados, distrito federal, municípios, respectivas autarquias
e fundações de direito público, bem como os que, embora não pertencentes a tais
pessoas, estejam afetados à prestação de um serviço público. O conjunto de bens
públicos forma o ‘domínio público’, que inclui tanto bens imóveis como móveis”.
Os bens públicos são classificados em bens de uso comum do povo
ou do domínio público que é a forma mais completa da participação de um bem
na atividade da administração pública; bens de uso especial ou do patrimônio
44
DINIZ, Maria Helena. op. cit.
45
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. o Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,
1989.
46
MELLO, Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros Ed., 1997.
40
administrativo o aqueles que se destinam especialmente à execução dos
serviços públicos e, por isso mesmo, são considerados instrumentos desses
serviços - e, por fim, bens dominicais ou do patrimônio disponível que são
aqueles que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público,
como objeto de direito pessoal ou de direito real, de cada uma dessas entidades.
Por fim, caracterizamos a energia como um bem incorpóreo, móvel,
infungível, consumível, indivisível, singular, principal e público.
Após tratarmos da disposição legal no Código Civil Brasileiro, em
momento oportuno do presente trabalho estudaremos a energia no sistema
constitucional brasileiro.
41
4. INTERESSES E DIREITOS
Para melhor introduzirmos esse capítulo, trazemos a definição de
interesse em sua acepção jurídica, proferida em De Plácido e Silva
47
, o qual
revela a existência de uma “intimidade de relações entre a pessoa e coisas, de
modo que aquela tem sobre estas poderes, direitos, vantagens, faculdades ou
prerrogativas. Nessa razão, o interesse decorre dessa situação jurídica, de modo
que cada movimento ou mutação trazida às coisas provoca uma percussão ou
repercussão naqueles mesmos poderes, direitos, vantagens, faculdades ou
prerrogativas, geradas da intimidade existente entre ambas, para melhorá-los,
modificá-los, garanti-los, ampará-los ou prejudicá-los”.
4.1. Acepções dos interesses
Segundo a clássica definição de Capitant
48
, interesse é “um
avantage d’ordre pécuniaire ou moral”. Esse conceito nuclear nos mostra que o
interesse interliga uma pessoa a um bem de vida, em virtude de um determinado
valor que esse bem possa representar para aquela pessoa.
Para Carnellutti
49
o interesse aparece como um rapporto tra um
bisogno dell’uomo e um quid atto a soddisfarlo”.
Podemos então entender que o interesse brota espontaneamente da
realidade, ele é imanente à própria vida, é o mero foco de vantagem, constituído
independentemente de valoração ético-normativa.
Em sua expressão comum, os interesses representam a idéia de
“vantagem”; essa idéia nasce e se desenvolve nos limites psíquicos da própria
pessoa. O portador desse tipo de interesse apenas quer, deseja, aspira, almeja,
sem poder, porém, exigir a satisfação de tais anseios.
47
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizado por Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela
Alves.
48
CAPITANT, Henri. Interesse. In: Vocabulário jurídico. Tradução de A.H. Guaglianone. Buenos
Aires: Depalma: 1973.
49
CARNELUTTI, Francesco. Lezioni di diritto processuale civile. Pádua: Cedam, 1926.
42
Nas doutrinas pesquisadas, o conceito de interesse não é pacífico.
Por vezes, a dimensão resulta do tipo de sistema jurídico adotado no país, o que
leva, por exemplo, Gordillo
50
a conceituar o interesse como o mero interesse que
cabe a todo cidadão de que a lei seja cumprida”; outras vezes a conceituação
toma por critério a indeterminação dos sujeitos, por influência do direito e da
concepção de tutela jurisdicional.
Para Mancuso
51
, os interesses caracterizam-se basicamente por três
aspectos, quais sejam: a) pela impossibilidade de projeção além do campo
psicológico do indivíduo, no sentido de que não são exigíveis, nem fazem derivar
certos comportamentos de terceiros; b) pela introjeção de seus efeitos, visto que
caberá sempre ao próprio indivíduo fruir da eventual obtenção da vantagem
desejada ou suportar os ônus da tentativa frustrada; c) pela postura de indiferença
que eles suscitam perante o Estado, bem como em face de terceiros.
O interesse pode, também, apresentar-se sob certas conotações
que tangenciam o social e o jurídico. Sob esse prisma, fala-se em interesse
social, público, geral, tendo todos esses termos por núcleo comum o fato de se
referirem a interesses metaindividuais, que transcendem o indivíduo isoladamente
considerado. Ocorre que essas expressões apresentam, por vezes, conteúdo tão
próximo que poderiam passar como sinônimas.
Sucede que, se tomamos tais expressões como sinônimas e as
utilizamos indistintamente, corremos o risco de, ao final, não sabermos
exatamente do que estamos tratando, isto é, de qual interesse, e em que nível.
Para evitar tais equívocos, examinaremos o conteúdo de algumas
expressões com o intuito de facilitar a compreensão do presente.
50
GORDILLO, Agustín. Princípios gerais de direito público. Tradução de Marcos Aurélio Greco.
São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1977.
51
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Interesses difusos: conceito e legitimação para agir. São
Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2004.
43
4.2. Interesse social, pessoal e público
Quando estamos falando de social, queremos mencionar algo que
interessa à sociedade ou que seja relativa a esta, mas o interesse social, no
sentido de interesse exclusivo de uma pessoa jurídica, é uma alocução indicadora
de interesses individuais, apenas exercidos coletivamente.
“Interesse social” no sentido que nos concerne é o interesse que
consulta à maioria da sociedade civil: o interesse que reflete o que esta sociedade
entende por “bem comum”; o anseio de proteção à res publica; a tutela daqueles
valores e bens elevados, os quais essa sociedade, espontaneamente, escolheu
com sendo os mais relevantes. Tornando-se o adjetivo de coletivo num sentido
amplo, poder-se-ia dizer que o interesse social equivale ao exercício coletivo de
interesses coletivos
52
.
No que tange ao interesse geral, José Vidal
53
cita como exemplos os
du commerce em général, de l’urbanisme, dês finances publiques”. Na
legislação, a lei francesa nº. 76.629, de 10 de julho de 1976, relativa à proteção
da natureza, declara que se compreendem na rubrica interesse geral: la
protection dês espaces naturels et s paysages, la préservation dês espèces
animales et végétales, maintie dês equilibres biologiques auxquels ils
participent et la protection dês ressources naturelles contre toutes lês causes de
dégradation”.
Estes subsídios sugerem que o interesse geral se aproxima, e muito,
do conteúdo do interesse social; é intuitivo que o geral se opõe ao individual, mas
isso ocorre também com o social em face desse mesmo individual.
Ao contrário do que ocorre com o interesse social e geral, ambos
estreitamente afetados às noções de coletividade, sociedade civil, aqui
predominará a presença do Estado.
Quando se ou se ouve a expressão interesse público, a primeira
coisa em que pensamos é no Estado.
52
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. op. cit.
53
VIDAL, José. La partie civile au procès pénal. Révue de Science Criminelle, 1958.
44
A jurista Ada Pellegrini observa que o interesse público constitui
interesse de que todos compartilham.
Para definirmos de forma clara o interesse blico, não podemos
pensar que o interesse público é a soma dos interesses particulares ou que o
interesse público nada tem a ver com os interesses individuais ou dos grupos
sociais em verdade, o interesse público pode ter como beneficiários finais os
homens nascidos ou a nascer.
E, sob esse prisma, o interesse público se apresenta como sendo
uma arbitragem entre os diversos interesses particulares, mas essa arbitragem
ora se prende a critério quantitativo (na construção de estradas, sacrifica-se o
interesse dos proprietários lindeiros, privilegiando-se os interesses dos que a
usarão), ora a critério qualitativo (os doentes pobres, de certa comunidade,
podem ser pouco numerosos, mas o valor do interesse à saúde pública prevalece
sobre os interesses pecuniários dos demais cidadãos saudáveis).
4.3. Interesse público e privado
Quando falamos em público, privado, coletivo e individual, pensamos
que tal confronto remonta à summa divisio, forjada nas origens do direito, onde
este aparecia regidamente dividido entre público e privado.
Tal separação era compreensível naquelas priscas eras, onde,
efetivamente, os dois únicos pólos de referência eram o indivíduo e o Estado, não
se podendo cogitar a presença de “corpos intermediários” que ameaçassem o
monopólio estatal.
Ao longo do período medieval, o Estado foi se enfraquecendo, por
um lado devido às guerras, por outro em face do surgimento de novos focos de
poder, chamados por Montesquieu de “corpos intermediários”. Estes se
manifestaram em diversas ordens: os feudos, que significavam a necessidade
que o soberano tinha de compartilhar seu poder com a nobreza; as grandes
corporações, que agrupavam os artesões, mestres e aprendizes e, como não
poderíamos esquecer, a igreja, que, por ação dos papas, manobrava habilmente
45
a Santa Inquisição como instrumento de poder político mediante processo de
intimidação geral.
Após toda a evolução histórica que decorreu desses fatos, restou,
porém, um importante corpo intermediário, o corporativismo, representado pelo
anseio dos indivíduos de participar do processo político-econômico. Esse anseio é
acompanhado da consciência do coletivo, que nada mais é do que a concepção
de que o indivíduo isolado pouco ou nada pode, mas que a reunião de indivíduos
de mesma condição e mesmas pretensões exerce uma influência considerável
aos centros de decisão.
Em verdade, a natureza humana aspira ao coletivo, tende ao grupo,
visto ser esse um ser gregário.
Para Mazzilli
54
, no estado democrático de direito, no instante em que
o legislador edita a lei, que o administrador e o juiz a aplicam, colima-se alcançar
o interesse da sociedade. Assim como as atividades legislativas, administrativas
ou jurisdicionais são exercidas sob a invocação do interesse da coletividade, o
próprio estado, por seus órgãos, chama para si a tarefa de dizer em que consiste
o interesse de todos.
Assim, percebemos que ao tomar decisões supostamente em
benefício de todos, não raro o estado confronta seus interesses com os dos
indivíduos.
Mister se faz compreender a distinção entre público e privado,
esclarecida em momento posterior, mas que, por sua importância, ressaltamos
que o interesse público consiste na contraposição do interesse do estado ao do
indivíduo e, por outro lado, o interesse privado consiste na contraposição entre os
indivíduos, em seu inter-relacionamento.
Entretanto, a expressão interesse público vem sendo muito criticada
porque se tornou equívoca quando passou a ser utilizada também para alcançar
os chamados interesses sociais, interesses indisponíveis do indivíduo e da
coletividade. O próprio legislador abandona o conceito em tela como interesse do
Estado e passa a identificá-lo com o bem geral, ou seja, o interesse geral da
sociedade, ou coletividade como um todo.
54
MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. São Paulo: Saraiva, 2006.
46
Entre nós, foi a partir dacada de 1970, com os trabalhos e
conferências de Mauro Cappelletti, que surgiu a exata consciência de que a
defesa judicial dos interesses de grupos apresentava peculiaridades, como, por
exemplo, como cuidar da representação ou substituição processual do grupo
lesado? Como estender a coisa julgada para além das partes que formais do
processo?
Todas essas dificuldades estavam a recomendar que os interesses
de grupos alcançassem uma disciplina processual própria para sua adequada
defesa em juízo e, no Brasil, a defesa dos interesses de grupos começou a ser
sistematizada com o advento da Lei de Ação Civil Pública e, em seguida, pelo
Código de Defesa do Consumidor, que distingue os interesses transindividuais em
difusos, coletivos e individuais homogêneos.
4.4. Interesse transindividual
“Situados numa posição intermediária entre o interesse público e o
interesse privado existem os interesses transindividuais, os quais
são compartilhados por grupos, classes ou categorias de pessoas.
São interesses que excedem o âmbito estritamente individual,
mas não chegam propriamente a constituir interesse público”
55
.
Atendendo a essa realidade, o Código de Defesa do Consumidor
passou a distingui-los segundo sua origem, ou seja, se o que une os interessados
determináveis, com interesses divisíveis, é a origem comum da lesão (v.g. os
consumidores que adquirem produtos fabricados em série com o mesmo defeito),
temos interesses individuais homogêneos, mas, se os interessados determináveis
estão sob a circunstância de compartilharem a mesma relação jurídica indivisível
(como os consumidores que se submetem à mesma cláusula ilegal em contrato
de adesão), temos interesses coletivos em sentido estrito, e, por fim, se o que une
os interessados indetermináveis é a mesma situação de fato, mas o dano é
individualmente indivisível (os que assistem pela televisão à mesma propaganda
enganosa), temos interesses difusos.
55
CAPPELLETTI, Mauro. Formazioni sociali e interesse di gruppo davanti allá giustizia civile.
Revista di Diritto Processuale, Milano, 1975.
47
Há, pois, interesses que envolvem uma categoria determinável de
pessoas (como os interesses individuais homogêneos e os interesses coletivos), e
outros que são compartilhados por grupo indeterminável de indivíduos ou por
grupo cujos integrantes são de difícil ou praticamente impossível determinação
(como os interesses difusos)
4.5. Interesses difusos
4.5.1. A origem dos interesses difusos
O primeiro fato que revelou esse interesse ocorreu com o advento
da revolução industrial e a conseqüente constatação de que os valores
tradicionais, individuais, do século dezenove, não sobreviveriam muito tempo,
sufocados ao peso de uma sociedade de massa
56
.
Na sociedade de massa não espaço para o homem enquanto
indivíduo isolado; ele é englobado pelos grandes grupos em que se decompõe a
sociedade; os indivíduos são agrupados em grandes classes ou categorias e,
como tais, normatizados.
Paralelamente à revolução industrial e à massificação da sociedade,
tivemos também o advento do sindicalismo, que contribuiu para aflorar, ainda
mais, a ordem coletiva.
Em virtude dessa radical transformação da sociedade tradicional
numa sociedade de massa, de tecnologia crescente, os valores alteraram-se,
interesses de outra ordem afloraram e passaram a clamar por proteção. Dentre
esses interesses novos, os coletivos receberam guarida e possibilidade de
expansão no seio das associações e sindicatos, bem como foram criados novos
instrumentos jurídicos de massa. Mais recentemente, verificou-se a necessidade
de tutelar os outros interesses, ou seja, os interesses difusos, que são aqueles
que passam à órbita dos grupos institucionalizados, pelo fato de que sua
indeterminação não permite sua captação em termos de exclusividade
56
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. op. cit.
48
4.5.2. Características
São quatro as características principais:
Indeterminação dos sujeitos
Essa característica deriva, em boa parte, do fato de que não um
vínculo jurídico a agregar os sujeitos afetados por esses interesses: eles se
agregam ocasionalmente, em virtude de certas contingências, como o fato de
habitarem certa região, de consumirem certo produto, de viverem em certa
comunidade.
Como explica Celso Bastos
57
:
“Quando nos referimos aos interesses difusos dos usuários de
automóveis, por exemplo, abarcamos uma indefinida massa de
indivíduos das mais variadas situações, esparsos por todo o país,
sem qualquer especial característica jurídica homogênea, que
apenas praticaram, aos milhares ou milhões, um mesmo ato
jurídico instantâneo, compra de um veículo”.
Podemos dizer então que se o interesse é sempre uma relação entre
uma pessoa e um bem, no caso dos interesses difusos essa relação é super ou
metaindividual, isto é, ela se estabelece entre certa coletividade e um dado bem
da vida difuso como objeto.
Aceitamos o argumento de que pode suceder que esse interesse,
num caso concreto, venha a ser veiculado, exteriorizado por um dos sujeitos ou
uma entidade, mas isso não altera a essência dos interesses, que permanecem
difusos, pelo fato de se referirem a toda uma coletividade, indistintamente.
Essa indeterminação de sujeitos revela-se também quanto à
natureza da lesão decorrente de afronta aos interesses difusos: essa lesão é
disseminada por um número indefinido de pessoas, tanto podendo ser uma
comunidade, como uma etnia ou mesmo toda a humanidade.
Os interesses difusos situam-se no extremo oposto dos direitos
subjetivos.
57
BASTOS, Celso. A tutela dos interesses difusos no direito constitucional brasileiro. Revista de
Processo, São Paulo, ano 6, n. 23, jul./set. 1981.
49
Indivisibilidade do objeto
São indivisíveis os interesses difusos no sentido de serem
insuscetíveis de partição em quotas atribuíveis a pessoas ou grupos
preestabelecidos. Trata-se, como bem diz Barbosa Moreira, de uma “espécie de
comunhão, tipificada pelo fato de que a satisfação de um implica, por força, a
satisfação de todos, assim como a lesão de um constitui, ipso facto, lesão da
inteira coletividade”.
Por fim, essa característica advém do fato de que os interesses
difusos apresentam uma estrutura peculiaríssima, dado que, como eles não têm
seus contornos definidos numa norma como o direito subjetivo , resulta que
sua existência não é afetada, nem alterada, pelo fato de virem a ser exercitados
ou não.
Intensa conflituosidade
Os interesses difusos são e estão soltos, desagregados,
disseminados entre segmentos sociais mais ou menos extensos; não têm vínculo
jurídico básico, mas exsurgem de aglutinações contingenciais.
E o que deflui desse entrechoque de massas de interesses são os
contornos diversos dos conflitos: não se trata de controvérsias envolvendo
situações jurídicas definidas v.g. A se julga credor de B, que resiste àquela
pretensão – mas de litígios que têm por causa remota verdadeiras escolhas
políticas. Podemos mencionar, como exemplo, a proteção dos recursos florestais
que conflita com os interesses da indústria madeireira e, por decorrência, com os
interesses dos lenhadores à mantença de seus empregos; entre tantos outros.
Duração efêmera
De fato, os interesses difusos não se apresentam jungidos a um
vínculo jurídico básico, mas a situações de fato, donde deriva a conseqüência de
que eles são mutáveis como essas mesmas situações de fato; e mesmo podem
fenecer e desaparecer, acompanhando o declínio e extinção dessas situações,
embora, pela mesma situação, possam reaparecer.
50
Em outras palavras, quando não exercidos a tempo e hora, os
interesses difusos modificam-se, acompanhando a transformação da situação
fática que os ensejou.
A essa notável transição ou, em outras palavras, natureza mutável
dos interesses difusos, segue-se a conseqüência da irreparabilidade da lesão, em
termos substancias. Com efeito, os interesses difusos dimanam dos valores mais
elevados para a sociedade, como a preservação do meio ambiente, direitos dos
consumidores, entre outros. Uma vez lesionados esses interesses, o direito não
poderá oferecer reparação integral, em espécie, porque não se trata de valores
fungíveis, suscetíveis de reparação por ressarcimento pecuniário.
Pelo que fora exposto, podemos definir os interesses difusos como
sendo interesses metaindividuais que, não tendo atingido o grau de agregação e
organização necessário à sua afetação institucional com certas entidades ou
órgãos representativos dos interesses socialmente definidos, restam em estado
fluido, dispersos pela sociedade civil como um todo por exemplo, o interesse à
pureza do ar –, podendo, por vezes, concernir a certas coletividades de conteúdo
numéricas indefinidas – v.g. os consumidores.
Nesse sentido, Hugo Mazzilli
58
afirma:
Difusos são interesses ou direitos transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e
ligadas por circunstâncias de fato. Os interesses difusos
compreendem grupos menos determinados de pessoas (melhor
do que pessoas indeterminadas, são antes pessoas
indetermináveis), entre as quais existe vínculo jurídico ou fático
preciso. São como um feixe ou conjunto de interesses individuais,
de objeto indivisível, compartilhados por pessoas indetermináveis,
que se encontram unidas por circunstâncias de fato conexas”.
58
MAZZILLI, Hugo Nigro. op. cit.
51
4.6. Interesses difusos e coletivos: jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal
59
4.6.1. Aspectos gerais
José Augusto Delgado, em artigo publicado in Revista de Processo,
traz à baila, de forma a aclarar os estudiosos do tema, a questão do conceito dos
direitos difusos e coletivos vista com os olhos daquela corte.
É sabido que a mutabilidade conceitual de determinadas entidades
processuais contribui, ao lado de outros fatores, para as dificuldades hoje
vivenciadas pelo direito formal moderno no tocante ao desempenho de sua
função instrumental, impedindo de desenvolver, de modo célere, eficaz e efetivo,
o papel dele esperado pela cidadania.
Percebemos que são inúmeras as tentativas dos doutrinadores, no
momento atual, de ditar os caminhos para que o direito formal afaste a não
confiabilidade presente a respeito de suas regras positivas e crie um sistema que
faça com que seus princípios sejam, realmente, efetivos e eficientes.
A partir do momento que consolidamos a estrutura, os limites e o
alcance de qualquer entidade de direito, pela doutrina e pela jurisprudência, a sua
aplicação passa a ser feita de forma mais rápida e segura, evitando-se polêmicas
que, embora sejam profundamente úteis no campo acadêmico, nenhuma
contribuição produzem no tocante ao aceleramento da entrega da prestação
jurisdicional.
No âmbito de tais aspectos, encontra-se o debate sobre o conceito
de ‘interesses difusos e coletivos’, que mereceu pronunciamento do Colendo
Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário de nº.
163232-3 - São Paulo, tendo por relator o min. Maurício Corrêa, adiante
comentado e anexado ao presente trabalho.
59
DELGADO, José Augusto. Interesses difusos e coletivos: evolução conceitual. Doutrina e
jurisprudência do STF. Revista de Processo, São Paulo, v. 25, n. 98, abr./jun. 2000.
52
4.7. A evolução doutrinária do conceito de interesses
O estudo do tema ora em tela deve seguir os caminhos trilhados
pelos doutrinadores que o vêm abordando.
Interesse, na sua expressão gramatical, atua como função
substantiva de significado amplo. Ora pode impor sentido de convivência, lucro
material, proveito de determinada situação ou vantagem oriunda de uma
transação ou de qualquer benefício.
Ao consultarmos o dicionário Michaelis, no verbete interesse, este
determina que referida palavra pode exprimir expressão de um sentido egoísta ou
de cobiça, impulsionado para alimentar desejo de um proveito pessoal que tudo
sacrifica para a obtenção de ganhos pecuniários.
Ainda no dicionário supracitado, a psicologia define ‘interesse’ como
sendo um sentimento que acompanha a atenção dirigida para um conteúdo
específico ou algo que invade o ser humano por força de uma relação ou enlace
entre um motivo e certo incentivo, ou classe de incentivos.
A ciência jurídica enfrenta dificuldades para fixar, com absoluta
segurança, o que deve ser entendido como ‘interesse’ para o mundo do direito.
Influenciada por essa concepção, acrescenta que o interesse
decorre desta situação jurídica, de modo que cada movimento ou mutação trazida
à coisa provoca uma percussão ou repercussão naqueles mesmos poderes,
direitos, vantagens, faculdades ou prerrogativas, gerados na intimidade existente
entre eles para melhorá-los, modificá-los, garanti-los, ampará-los ou prejudicá-los.
Em síntese, pode-se afirmar que o interesse jurídico tem uma forte
vinculação de efeito concreto com uma utilidade econômica buscada pelo agente,
como também ele pode atuar para criar uma vantagem moral. Esta, embora de
natureza abstrata, atua como elemento formador da honra, da dignidade, do
respeito ao homem e da sua cidadania.
Dessarte, cabe aqui breve menção à clássica definição de Henri
Capitant, segundo a qual o interesse é un avantage d’ordre pecuniaire ou moral”.
Esse conceito nuclear nos parece válido tanto para os interesses no mundo fático
53
como para os interesses no mundo jurídico: o interesse interliga uma pessoa a um
bem da vida, em virtude de um determinado valor que esse bem possa
representar para aquela pessoa
60
.
Mas a diferença entre os interesses lato sensu e o interesse jurídico
está em que o conteúdo axiológico daqueles primeiros é amplo e variável,
considerando-se que sua valoração é deixada ao livre arbítrio dos sujeitos; ao
passo que o interesse jurídico, por definição, tem seu conteúdo valorativo já
prefixado na norma.
A importância do verbete ora analisado é revelada pelas várias
modalidades como ele se apresenta, provocando acepções diferentes nos
diversos planos do conhecimento científico.
Prova disso são as diversas formas que pelas quais o verbete
interesse é estudado, que são:
Interesse de agir um dos assuntos mais estudados pela
doutrina, vista a dificuldade em atingir estabilidade na sua definição.
Sabemos que existe o interesse material de agir e o interesse
processual de agir. O interesse material é o que se refere ao direito substantivo, e
que exige, para propor ou contestar uma ação, existir interesse econômico ou
moral da parte de quem o faz. Mas o interesse processual é instrumental,
secundário e subsidiário, enquanto aquele outro é substancial ou primário.
Não basta ter o direito para propor uma ação, é preciso que ressalte
do pedido ou da contestação a necessidade de invocar o Poder Judiciário para
satisfazer a pretensão das partes, ou seja, a existência de uma lide no sentido em
que Carnelutti a definiu como sendo a pretensão resistida por uma das partes.
O interesse de agir é então a aspiração a uma justa composição da
lide, não o interesse em lide.
61
60
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. op. cit.
61
BUZAID, Alfredo. Do agravo de petição no sistema do Código de Processo Civil. São Paulo:
Saraiva, 1956.
54
Interesse eventual é o que se caracteriza por surgir em caráter
acidental e, por tal razão, passar a ser defendido por quem por ele se sente
beneficiado em determinado momento.
Mesmo sendo eventual, não perde sua condição de atual, surgindo
em decorrência de um fato, em regra, não previsto pelo agente.
Interesse social segundo Aurélio Buarque de Holanda
Ferreira
62
, a palavra “social” se acopla aos mais diversos nomes revelando então
diferentes mudanças de significação. Basicamente, “social” é o que interessa à
sociedade ou é relativo a esta.
A melhor definição que encontramos fora a do doutrinador
Mancuso
63
, que abaixo transcrevemos:
“Interesse social, no sentido que concerne ao presente estudo, é
aquele que consulta à maioria da sociedade civil: o interesse
reflete o que a sociedade entende por “bem comum”; o anseio de
proteção à res publica; a tutela daqueles valores e bens mais
elevados, os quais essa sociedade, espontaneamente, escolheu
como sendo os mais relevantes. Tomando-se o adjetivo “coletivo”
num sentido amplo, poder-se-ia dizer que o interesse social
equivale ao exercício coletivo de interesses coletivos”.
Interesse geral certo é que a expressão interesse geral, embora
muito aproximada do interesse social e público, vem amiúde relacionada a certos
segmentos sociais, representando um marco diferencial a afastá-lo daqueles dois
tipos.
Esse marco é o fato de que as expressões interesse geral e
interesse público apresentam conteúdo de tal forma aproximado ao de interesse
social, que melhor se afigura torná-las todas sinônimas. Certo é que interesse
geral relaciona-se com o interesse geral dos comerciantes, por exemplo; ao passo
que o interesse público é invocado quando se trata do interesse do Estado como
guardião da ordem pública. Mas essas conotações não apresentam um grau de
nitidez tal que permita a diferenciação nuclear entre esses interesses. Integram
62
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1980.
63
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. op. cit.
55
eles, assim, o gênero interesses pluri ou metaindividuais, com que se põe em
relevo seu conteúdo básico e se atinge uma desejável concreção terminológica.
64
Interesse público quando se ou se ouve a expressão
“interesse público”, a presença do Estado se nos afigura em primeiro plano. É
como se ao Estado coubesse não a ordenação normativa do “interesse
público”, mas também a soberana indicação de seu conteúdo.
É o que está vinculado a qualquer fato ou direito de proveito coletivo
ou geral.
O interesse público, contrário ao de natureza particular, apresenta-
se, em regra, envolvido pelo caráter de indisponibilidade, não podendo ter
soluções com vistas a atender reivindicações da iniciativa privada. Está vinculado
ao alcance do bem comum, envolvendo-se com a proteção ao trabalho, à
economia popular, aos direitos do cidadão, à poupança interna e externa, ao
funcionamento e manutenção das instituições, à proteção dos direitos e garantias
individuais, à valorização do regime democrático, aos fenômenos da justiça social,
entre tantos outros exemplos que poderiam aqui ser citados.
Ada Pellegrini
65
observa a esse respeito que o interesse blico “(à
ordem pública) constitui interesse de que todos compartilham. E o único problema
que pode suscitar ainda se coloca na perspectiva clássica do conflito indivíduo
contra Estado.”
4.8. O interesse visto em outros planos
As definições de interesses acima mencionadas contribuem para se
compreender o que significa, de forma objetiva, interesses difusos e coletivos.
64
DELGADO, José Augusto. op. cit.
65
GRINOVER, Ada Pellegrini. A problemática dos interesses difusos. In: ______ (Coord.). A tutela
dos interesses difusos. São Paulo: Max Limonad, 1984.
56
Para Mancuso
66
, os interesses e os direitos situam-se nos planos
diversos; aqueles surgem, desenvolvem e interagem livremente, porque estão no
plano fático, ao passo que os direitos se situam no plano ético-normativo,de modo
que eles surgem a partir dos valores escolhidos pela autoridade e condensados
na norma, ficando sua eficácia restrita aos limites e à vigência dessa norma.
Referido autor, em obra mencionada, leciona que:
“Posto seja imanente ao ser humano a busca da satisfação de
suas necessidades, por vezes essa busca fica ao largo do
processo jurídico, não sendo por este indireta, nem incentivada.
Tal ocorre com certos interesses sobre os quais não recaiu a
escolha procedida pelas autoridades; esta, ao joeirar os valores
existentes na comunidade, manifesta preferência por alguns e os
inscreve no ordenamento jurídico, dotando-os de atributividade e
coercitividade; há, todavia, valores outros que, se não vêm a
merecer o mesmo beneplácito, não exigem, porém, repressão ou
interdição. Estes valores menores, extremamente difundidos na
comunidade, formam o conteúdo dos interesses simples, ou de
fato ou interesses, tout court. A postura do Estado, com relação a
esses interesses, é de indiferença ou tolerância”.
Prade
67
expressa a respeito do tema o seguinte entendimento:
“Interesse jurídico significa a relevância de ordem material ou
instrumental, subjetiva ou não subjetiva, conferida pelo direito
positivo a determinadas situações respeitantes ao indivíduo
isolado, ao grupo ou à coletividade maior.
Interesse jurídico, em sentido substancial, corresponde ao núcleo
ou conteúdo de um direito subjetivo, existindo, no entanto,
interesses substanciais que escapam da esfera de subjetivação,
sendo conseqüência da aplicação da própria ordem jurídica. São
os simples interesses (substanciais não subjetivados, ou seja, não
se situam numa determinada pessoa), apenas reflexamente
protegidos, incorporados à temática dos interesses difusos.
Interesse jurídico, em sentido instrumental, corresponde ao
interesse de agir. Em decorrência da postura nitidamente
individualista do processo civil em vigor, não se superou, ainda, o
vínculo entre interesse de agir e interesse como núcleo de um
direito subjetivo, circunstância que representa outro obstáculo
(tanto nos domínios legislativos, quanto doutrinários) para a
formação autonômica de um sistema jurisdicional dos interesses
difusos”.
66
MANCUSO, Rodolfo de Camargo. op. cit.
67
PRADE, Péricles. Conceito de interesses difusos. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1987.
57
Do que fora transcrito, nota-se que interesse jurídico, para o direito
formal, significa interesse de agir.
E, a respeito disso, José Augusto Delgado, em artigo publicado na
Revista de Processo, diz que de se ficar atento para a diferenciação existente
entre o interesse de agir, de natureza processual, e o interesse substancial ou
material, que também, de modo subjetivo, ampara o atuar da parte em juízo.
No trato de tal diferenciação, mister se faz transcrever a lição de
Arruda Alvim
68
:
“O interesse de agir é, enquanto condição da ação, considerado
sob o ângulo exclusivamente processual. O art. do CPC
prescreve: ‘Para propor ou contestar ação, é necessário ter
interesse e legitimidade’. A lei, nesse artigo, não esclareceu qual o
interesse que se fez necessário, mas o art. 295, III, deixou
evidente que se trata de interesse processual. O interesse
processual ou de agir é diverso do interesse substancial ou
material, pois é aquele que leva alguém a procurar uma solução
judicial, sob pena de, não o fazendo, ver-se na contingência de
não poder ver satisfeita sua pretensão (o direito que é afirmado).
O interesse substancial é aquele diretamente protegido pelo
direito material; é um interesse de índole primária, dado que incide
diretamente sobre o bem. Assim, por exemplo, o interesse do
proprietário, pela coisa de que tem o domínio, é utilizar-se da
mesma em função dos direitos que lhe são inerentes; o do credor,
tendo em vista o seu crédito, é o de recebê-lo. Se o primeiro (o
dominus) puder fruir a coisa, alugá-la, dá-la em usufruto, etc., não
que cogitar de interesse processual; se o credor receber o seu
crédito, identicamente, não que se pensar em interesse
processual para acionar o seu devedor, que já terá pago”.
Essa transcrição fez-se necessária para que não confundamos o
interesse de agir processual com o interesse de natureza substancial que
acompanha o sujeito do processo em decorrência do direito subjetivo que lhe foi
outorgado pelo ordenamento jurídico.
68
ALVIM, Arruda. Manual de direito processual civil: parte geral. São Paulo: Ed. Revista dos
Tribunais, v. 1.
58
4.9. Interesses difusos e coletivos no Supremo Tribunal Federal
Prade cita em sua obra o autor de Giustizia Amministrativa, Mário
Nigro
69
, que afirmou:
“Os interesses difusos são interesses que pertencem de maneira
idêntica a uma pluralidade de sujeitos mais ou menos vasta e
mais ou menos determinada, a qual pode ser, ou não, unificada, e
unificada mais ou menos estreitamente, em uma coletividade.
A posição do direito com respeito a estes direitos pode ser uma
das três seguintes: ou estes interesses considerados de forma
seriada ou globalmente na sua soma ou no seu resultado são
apenas o fim objetivo do cuidado do ordenamento; ou o
ordenamento reconhece a entes ou a sujeitos exponenciais da
coletividade a titularidade dos interesses na sua globalidade, ou
então, qualquer interesse singular vem reconhecido como
suscetível de tutela por si e separadamente. A diferença entre o
primeiro caso e os outros dois é nítida; no primeiro, apenas
proteção objetiva do interesse ou dos interesses; no segundo e no
terceiro também subjetivação da tutela ou para a coletividade
ou para os sujeitos singulares. Dito em termos de situações
jurídicas subjetivas substanciais, no primeiro caso não
interesses legítimos, mas meros interesses de fato, no segundo
reconhece-se o interesse legítimo da coletividade ou da entidade
ou repartição exponencial; no terceiro, o interesse legítimo de
cada componente do grupo”.
O essencial, na discussão instalada no campo doutrinário a respeito
do tema, é a tendência de se estabelecer nítida diferenciação entre interesses
difusos e coletivos.
Prade
70
, defensor intransigente dessa diferenciação, mostra que ela
se concretiza pelo fato de os interesses difusos possuírem características próprias
que não estão presentes nos coletivos. Para o autor, essas características o a
ausência de vínculo associativo, alcance de uma cadeia abstrata de pessoas,
potencial e abrangente conflituosidade, ocorrência de lesões disseminadas em
massa, vínculo fático entre os titulares dos interesses.
Levando em consideração essas características, Prade define
interesses difusos da seguinte forma:
69
NIGRO, Mario. Giustizia amministrativa. Bologna: Il Mulino, 1994.
70
PRADE, Péricles. op. cit.
59
“Interesses difusos, tendo-se como parâmetro as características
arroladas no subitem precedente, são os titularizados por uma
cadeia abstrata de pessoas, ligadas por nculos fáticos
exsurgidos de alguma circunstancial identidade de situação,
passível de lesões disseminadas entre todos os titulares, de forma
pouco circunscrita e num quadro de abrangente conflituosidade”.
Nessa mesma esteira, Hugo Mazzili
71
aceita a definição de
interesses difusos que está consagrada no artigo oitenta e um, parágrafo único,
inciso primeiro do Código de Defesa do Consumidor. Afirma, a respeito que:
“Difusos são interesses ou direitos ‘transindividuais’, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e
ligadas por circunstâncias de fato. Compreendem grupos menos
determinados de pessoas, entre as quais inexiste vínculo jurídico
ou fático preciso. São como um conjunto de interesses individuais,
de pessoas indetermináveis, unidas por pontos conexos.
interesses difusos: a) tão abrangentes que coincidem com o
interesse público (como o meio ambiente); b) menos abrangentes
que o interesse público; c) em conflito com o interesse da
coletividade com um todo; d) em conflito com o interesse do
Estado, enquanto pessoa jurídica; e, e) atinentes a grupos que
mantêm conflitos entre si.
Neles, o objeto do interesse é indivisível. Assim, por exemplo, a
pretensão do meio ambiente hígido, posto compartilhada por
número indeterminável de pessoas, não pode ser quantificada ou
dividida entre os membros da coletividade.”
Ronaldo Campos
72
, em estudo sobre o tema ora em discussão,
apresentou interessante pesquisa sobre a conceituação de interesses difusos:
“...o interesse coletivo afasta-se do ‘difuso’ porquanto este reflete
necessidades de grupos de difícil identificação e de inexistente
organização.
Vicenzo Vigoritti entende que os interesses difusos e os coletivos
teriam o mesmo conteúdo (agrupamento de interesses). Todavia,
enquanto o coletivo se apresentava coordenado e dotado portanto
de organização, o difuso encontrava-se em uma fase onde a
coordenação não se obtivera ainda. Tratar-se-ia portanto de fases
de um mesmo fenômeno, o de agregação de interesses. A
posição de Vigoritti não se mostra isolada como noticia Grasso.
Contudo, a nosso sentir, marcar estes extremos ainda não seria
suficiente para a obtenção de um conceito de interesse coletivo.
Aqui tal conceito ainda seria uma hipótese de trabalho a ser
trabalhada no decorrer deste estudo.
71
MAZZILLI, Hugo Nigro. op. cit.
72
CAMPOS, Ronaldo Cunha. Ação civil pública. Rio de Janeiro: Aide, 1995.
60
A rigor, teríamos duas espécies de interesse coletivo, entendendo
este como interesse comum a um grupo.
A primeira espécie (no caso uma subespécie) resultaria apenas de
coordenação de interesses individuais. É a posição de Vigoritti
para quem o relacionamento de interesses dirigidos a um objetivo
comum atinge a ‘dignidade’ de interesse coletivo quando se prevê
uma coordenação das vontades dirigidas à perseguição do
referido escopo comum.
Percebe-se, assim, que nesta subespécie um dos interesses
individuais poderia obter satisfação isoladamente, e agregou-se a
outros tão-só no sentido de obter maior probabilidade de
satisfação.
Aceitamos as colocações de Vigoritti como idôneas à
caracterização de uma ‘subespécie’ de interesse coletivo, mas
não como adequada conceituação da espécie.
Grasso noticia a corrente doutrinária para a qual a indivisibilidade
caracteriza o interesse coletivo. Nesse sentido as necessidades
dos integrantes do grupo apenas se satisfazem em conjunto.
Carnelutti bem colocou a questão quando estabeleceu que no
interesse coletivo as necessidades dos integrantes do grupo
obtinham satisfação simultânea através do desfrute de um mesmo
bem, ou não logravam satisfação alguma.
Esta é a nosso ver a outra subespécie de interesse coletivo. O
interesse coletivo atende à necessidade de um grupo, sentidas
estas necessidades por todos e por cada um. Desta forma
colocamos o tema.
Por interesse difuso entender-se-á neste trabalho aquele
manifestado por grupos não organizados e cuja identificação
apresente dificuldades.
Um interesse considerado difuso pode representar uma fase na
evolução de um interesse coletivo que se organiza através da
coordenação das atividades de limiares de interesse particulares
afins e voltados para o mesmo escopo. Todavia, tal característica
não é necessária, ou seja, nem sempre esta figura se faz presente
nos chamados interesses difusos.
Barbosa Moreira observou que a expressão ‘interesses difusos’
não adquiriu até agora sentido preciso na linguagem jurídica. Ao
apresentar um de seus pronunciamentos sobre o tema sugere
duas notas essenciais ao conceito de interesse difuso. Uma
pertinente ao sujeito, outra ao objeto.
No que tange ao sujeito, o interesse não pertence à pessoa
determinada ou a grupo nitidamente delimitado. Eis aqui o ponto.
Ao ver do processualista, a titularidade do interesse encontrar-se-
ia em grupo cujos membros seriam de difícil ou impossível
determinação. Ademais, isto é de se sublinhar, inexistiria
necessariamente um vínculo jurídico entre estes componentes do
grupo, ao contrário do que ocorre, e.g., com uma sociedade
anônima.
61
Do ângulo do objeto, o interesse refere-se a um bem individual, de
tal sorte que a satisfação de um elemento do grupo implicaria a
satisfação dos demais.
A nosso sentir, a indivisibilidade não é característica indispensável
a um interesse coletivo e também não o seria quanto a um difuso.
No que concerne a interesses difusos, possível que se relacionem
a objeto divisível, a nosso sentir. Os consumidores de um
determinado produto podem sofrer prejuízo em virtude de defeito
de fabricação. Estes consumidores constituem grupo de difícil
identificação e apresentam o interesse comum na obtenção do
ressarcimento do dano sofrido. Entretanto, e este é o ponto, pode
um consumidor isoladamente obter do fabricante a indenização
pleiteada. O bem perseguido por este interesse comum não seria,
pois, indivisível.
No presente estudo, como hipótese de trabalho, consideramos o
interesse difuso como aquele cujo titular é um grupo de difícil ou
impossível identificação.
diversas outras manifestações sobre o conceito de interesses
difusos e coletivos.
Em virtude dessas vastas opções acerca de como conceituar os
interesses difusos e coletivos, houve grande vicissitude entre os profissionais da
ciência do direito, ensejando assim, no campo da jurisprudência, certa
instabilidade.
Nesta situação de revés, o Colendo Supremo Tribunal Federal, por
meio do Recurso Extraordinário número 163.232-3, de São Paulo, apreciou e
definiu o conceito de interesses difusos e coletivos.
Certo que cabe à doutrina analisar a referida decisão e lançar sobre
ela seu olhar crítico, com sugestões para o aperfeiçoamento conceitual. Ocorre
que, tendo tal evento ocorrido por via judicial, há de se homenagear o
entendimento posto pela mais alta Corte, porque lhe cabem a competência e
atribuição de interpretar e aplicar, de modo supremo, a Magna Carta.
Para melhor elucidar o que supramencionamos, transcrevo algumas
partes do referido recurso
73
que dispõe sobre a legitimidade do Ministério Público
do Estado de São Paulo para promover ação civil blica em defesa dos
interesses difusos, coletivos e homogêneos:
73
Referido recurso encontra-se em anexo ao presente trabalho.
62
Relatório – Ministro Maurício Corrêa
Quanto aos interesses em jogo, são efetivamente difusos, na
medida em que não se restringem a esfera de interesses de
número finito de indivíduos, senão a toda a coletividade,
alcançada pelo resultado que vier a ser ditado, não se sabendo
bem quais segmentos dessa coletividade. Daí a titulação – difusos
– no sentido de indistintos e indeterminados.
...
Em seu voto proferido, o ministro Maurício Corrêa, relator do
presente recurso, expõe:
“Como se sabe o termo difuso, do domínio público nos dias de
hoje, não foi criado modernamente, visto que tem a sua origem na
doutrina romanística. Vittorio Scialoja se referia ao conceito de
difuso, no século passado, ao mencionar que “direitos difusos,
que não se concentram no povo considerado como entidade, mas
que tem por próprio titular realmente cada um dos participantes da
comunidade” (Procedura Civile Romana, Anonima Romana
edtoriales, Roma 1932, parágrafo 69, pág. 345). Àquela ocasião,
todavia, não se havia estabelecido a diferença entre direitos
difusos e coletivos, não obstante alguns desses direitos sendo
coletivos fossem rotulados implicitamente como difusos. Por isso
mesmo Massimo Villone já houvesse concebido que interesse
difuso é ‘uma personagem absolutamente misteriosa” (La
colocazzione Instituzionale dell’interesse difuso in La Tutela Degli
Interessi Difusi nel Dirito Comparato, giufré, Milão, 1976, pág. 73.
Hoje as fronteiras dos dois interesses estão definitivamente
delimitadas, sendo difuso o interesse que abrange número
indeterminado de pessoas unidas pelo mesmo fato, enquanto
interesses coletivos seriam aqueles pertencentes a grupos ou
categorias de pessoas determináveis, possuindo uma só base
jurídica. Portanto, a indeterminidade seria a característica
fundamental dos interesses difusos, e a determinidade aqueles
interesses que envolvem os coletivos.
...
Nessa mesma esteira posiciona-se Édis Milarés:
“Embora a distinção entre interesses difusos e interesses coletivos
seja muito sutil por se referirem a situações em diversos
aspectos análogos tem-se que o principal divisor de águas está
na titularidade, certo que os primeiros pertencem a uma série
indeterminada e indeterminável de sujeitos, enquanto os últimos
se relacionam a uma parcela também indeterminada mas
determinável de pessoas. Funda-se, também, no vínculo
associativo entre os diversos titulares, que é típico dos interesses
coletivos ausentes nos interesse difusos”. (A Ação Civil Pública na
Nova Ordem Constitucional. Saraiva, 1990, págs. 27/28)
...
63
Quer se afirma na espécie interesses coletivos ou
particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos
estão nitidamente cingidos a uma mesma relação jurídica-base e
nascidos de uma mesma origem comum, sendo coletivos,
explicitamente dizendo, porque incluem grupos, que conquanto
atinjam as pessoas isoladamente, não se classificam como
direitos individuais, no sentido do alcance da ação civil pública,
posto que sua concepção finalística destina-se à proteção do
grupo.”
4.10. A tutela dos interesses difusos no direito brasileiro
74
O marco inicial mais significativo da tutela jurisdicional dos
interesses difusos no direito brasileiro foi, sem dúvida, a edição da Lei nº. 7.347,
de 24 de julho de 1985.
Em passado o muito distante, as questões ambientais e os
conflitos de massa não se apresentavam com tanta intensidade ou, pelo menos,
não eram captados com nível de conscientização e de premência suficientes para
sensibilizar o legislador. A tutela, nesse campo, limitava-se à repressão
administrativa ou penal de certas condutas, tais como, entre outras, as previstas
no Código Penal, artigos 165, 270, 271; ou o artigo 38 da Lei das Contravenções
Penais.
Com a edição da Lei nº. 6.939, de 31 de agosto de 1981, foi
instituída a “Política Nacional do Meio Ambiente”, cujos mecanismos de tutela
continuavam essencialmente os de repressão administrativa (artigo 14), não
obstante o estabelecimento de responsabilidade civil objetiva do poluidor do meio
ambiente e a legitimação do Ministério Público para propor a respectiva ação de
responsabilidade.
A experiência demonstrava, no entanto, que a repressão
administrativa ou penal era insuficiente e praticamente ineficaz para a proteção
dos bens e valores mencionados, fazendo-se urgente e indispensável a criação
de novos mecanismos de tutela civil, no sentido da obtenção de provimentos
cautelares e reparatórios.
74
Material selecionado da palestra apresentada em 05 de setembro de 1992, no 1º Encontro entre
Juízes Federais Brasileiros e Juízes Uruguaios, em Montevidéu.
64
Preocupados com esta situação, os juristas brasileiros buscavam
fórmulas para ensejar, também no campo civil, a proteção dos interesses difusos.
A maior dificuldade residia na questão da legitimação ativa, dado que o
ajuizamento de ação em defesa de direito que não fosse próprio dependia de
expressa autorização em lei. Assim, à falta de legislação própria e específica que
servisse de instrumento para a defesa de interesses transindividuais, como são os
interesses difusos, certa corrente doutrinária preconizava a utilização, com aquela
finalidade, da ação popular.
O debate doutrinário da época, no entanto, serviu para despertar o
anseio por uma legislação adequada e moderna sobre a matéria. Serviu, também,
para sedimentar alguns conceitos básicos, inclusive os de interesses difusos e de
interesses coletivos, posteriormente adotados no texto legal. o frutos dos
estudos da época, com efeito, as definições hoje estampadas no parágrafo único
do artigo 81, da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, segundo o qual
interesses ou direitos difusos o “os transindividuais, de natureza indivisível, de
que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato”;
e interesses ou direitos coletivos “os transindividuais, de natureza indivisível, de
que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a
parte contrária por uma relação jurídica base”.
4.11. A Constituição Federal de 1988
A promulgação da Constituição em 05 de outubro de 1988 veio
trazer à tutela dos interesses difusos consagração superlativa, tanto do ponto de
vista material como do instrumental.
O meio ambiente ganhou capítulo específico, do seguinte teor:
Artigo 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o
dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras
gerações.
Parágrafo primeiro para assegurar a efetividade desse direito,
incumbe ao Poder Público:
65
I preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e
prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético
do país e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e
manipulação de material genético;
III definir, em todas as Unidades da Federação, espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente
protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente
através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade
potencialmente causadora de significativa degradação do meio
ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará
publicidade;
V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de
técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida,
a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino
e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente;
VII proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as
práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem
a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.
Parágrafo segundo Aquele que explorar recursos minerais fica
obrigado a recuperar o meio ambiente degradado, de acordo com
solução técnica exigida pelo órgão público competente, na forma
da lei.
Parágrafo terceiro As condutas e atividades consideradas
lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas
ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Parágrafo quarto A Floresta Amazônica brasileira, a Mata
Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona
Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na
forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação
do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
Parágrafo quinto São indisponíveis as terras devolutas ou
arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias,
necessárias à proteção dos ecossistemas naturais.
Parágrafo sexto As usinas que operem com reator nuclear
deverão ter sua localização definida em lei federal, sem o que não
poderão ser instaladas.”
Além disso, a defesa do meio ambiente foi, assim como a do
consumidor, insculpida entre os princípios norteadores da ordem econômica, ou
seja:
66
Artigo 170 A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a
todos existência digna, conforme os ditames da justiça social,
observados os seguintes princípios:
...
VI defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e
serviços e de seus processos de elaboração e prestação.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº. 42, de 19 de
dezembro de 2003).”
No que se refere aos instrumentos processuais para defesa dos
interesses difusos, o constituinte avançou notavelmente. Ampliou-se o objeto da
ação popular, para nele incluir alguns interesses daquela natureza, conforme se
vê no artigo 5º, inciso LXXIII:
“Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que
vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de
que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio
ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor,
salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência”.
No artigo 129, inciso III, arrolou-se, como função institucional do
Ministério Público, “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a
proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses
difusos e coletivos”, sem prejuízo da legitimação concorrente de terceiros,
previstas na Constituição ou em lei (artigo 129, §1º).
4.12. Efetividade do sistema
Esta visão descritiva permite que se reconheça no atual sistema de
defesa jurisdicional dos interesses difusos, notadamente no que diz respeito aos
respectivos instrumentos processuais de tutela, um sistema adequado e moderno.
Caberá, agora, dar-lhe efetividade, ou seja, dar-lhe eficácia social, extrair dele os
efeitos concretos programados pelo legislador. A efetividade de um sistema desta
natureza não é fenômeno instantâneo. É um processo que demanda
67
conscientização e mudança de padrões culturais, além de um mínimo
aparelhamento técnico e material.
São escassas, por exemplo, as iniciativas judiciais de promoção de
ação civil pública por parte de associações civis. O Ministério Público tem tido, na
prática, o monopólio destas providências. É preciso, portanto, que se tempo
para que também a sociedade civil se organize e se aparelhe, de modo a que
adquira as condições concretas para utilizar os poderosos instrumentos que o
legislador colocou à sua disposição. Enfim, a efetividade do sistema depende
da cooperação de todas as forças sociais e, notadamente, daqueles que detêm
liderança comunitária ou que exercem o poder institucionalizado. Neste contexto,
papel de especial realce está reservado ao Poder Judiciário, que a efetividade
de qualquer sistema de direito dependerá, em grande parte, da qualidade dos
juízes e das suas sentenças. Bem a propósito, cabe invocar a lição de Eduardo J.
Couture
75
: De la dignidad del juez depende la dignidad del derecho. El derecho
valdrá, em um país y em um momento histórico determinados, lo que valgan los
jueces como hombres.”
4.13. Direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos
Para Ada Pellegrini
76
, o Estado não é mais visto como garantidor
externo da sociedade, não é mais visto como regulador da disciplina das relações
interindividuais, torna-se parte ativa no processo econômico e social, cabendo-lhe
a tarefa de organizar e recompor diretamente a sociedade civil mediante a
redistribuição da plus valia a camadas cada vez mais amplas da população.
Assevera, ainda, que o neoliberalismo se propõe, assim, a tutela de
valores sociais, e não mais os do indivíduo abstratamente considerado. À medida
que o fenômeno econômico perde suas leis naturais e reclama a ação dirigista do
homem, a economia torna-se a resultante de intervenções manifestamente
políticas. De outro lado, solicitações institucionais e sociais provocam tendências
75
COUTURE, Eduardo, J. Introducción al estudio del proceso civil. Buenos Aires: Depalma, 1988.
76
GRINOVER, Ada Pellegrini. A tutela jurisdicional dos interesses difusos. Revista de Processo,
São Paulo, ano 4, n. 14/15, set. 1979.
68
antagônicas com relação às classes dominantes, num panorama de
conscientização das classes emergentes.
Soçobra, com isso, o que fora considerado como o instituto mais
representativo do sistema jurídico clássico burguês: o direito subjetivo.
O direito subjetivo, era a manifestação da igualdade, legitimando a
desigualdade substancial; a expressão da liberdade formal, legitimando a sujeição
substancial; o símbolo de pacífica convivência, legitimando agressões e prejuízos
à esfera privada alheia. Centro de todo o sistema era o indivíduo formal e
individualmente livre, formal e individualmente igual, formal e individualmente
pacífico.
Em um quadro político, econômico e social estruturalmente
renovado, a figura exclusiva do direito subjetivo, em seu enfoque tradicional, não
mais pode prevalecer.
Surgem os interesses difusos, ou seja, aspirações espalhadas e
informais à tutela de necessidades coletivas, sinteticamente referidas à qualidade
de vida. Necessidades e interesses que sofrem constantes investidas e
agressões, também de massa, e que põem à mostra a existência de outros
conflitos meta-individuais que esperam soluções, na sociedade e, exatamente por
sua configuração coletiva e de massa, são típicos das escolhas políticas e
indicam a necessidade de se adotarem novas formas de participação.
A característica fundamental do interesse difuso
77
parece residir, à
primeira vista, em sua meta-individualidade.
Trata-se de interesses comuns a uma coletividade de pessoas, que
não repousam necessariamente sobre uma relação base, mas sobre um vínculo
jurídico bem definido que as congregue. Tal vínculo pode até não existir ou ser
extremamente genérico, reduzindo-se, eventualmente, à pura e simples
pertinência à mesma comunidade política.
77
Diante da fluidez do próprio conceito de interesses difusos, a terminologia é ainda imprecisa.
Fala-se, às vezes, em interesses difusos e coletivos, como sinônimos; por outras, tenta-se uma
distinção, falando-se de interesses coletivos quando existe um grupo de pessoas, com
interesses comuns que só seriam comunitariamente persecutórios, ao passo que o interesse
difuso não se caracterizaria por qualquer momento associativo.
69
Nem todos os interesses meta-individuais configuram interesses
difusos. O interesse à ordem pública, à defesa comum ou à segurança pública,
por exemplo, conquanto seja indiscutivelmente um interesse supra-subjetivo, não
é considerado interesse difuso, como o é, ao contrário, o interesse à defesa do
ambiente e das cidades, à defesa do consumidor, à informação correta e
completa, à lisura financeira ou bancária, à integração pacífica das diversas
componentes raciais e sociais, entre tantos outros exemplos que poderíamos
mencionar.
A diferença reside no fato de que a ordem pública (ou a segurança
pública, a defesa comum) constitui interesse de que todos compartilham. O único
problema que esses interesses podem suscitar situa-se na perspectiva clássica
do conflito autoridade versus indivíduo.
Diversa é a situação com relação aos interesses difusos. Aqui, além
da contraposição clássica indivíduo versus autoridade, um conflito de
interesses de caráter meta-individual: o interesse à contenção dos custos de
produção e dos preços contrapõe-se ao interesse à criação de novos postos de
trabalho, à duração dos bens colocados no comércio, etc. O interesse à
preservação das belezas naturais contrapõe-se ao interesse da indústria edilícia,
ou à destinação de áreas verdes a outras finalidades; o interesse ao transporte
automobilístico não poluente e barato contrapõe-se ao interesse por um
determinado tipo de combustível.
Enfim, o interesse difuso caracteriza-se por sua ampla área de
conflitos. Conflituosidade essa que não se coloca necessariamente ou apenas no
clássico contraste indivíduo versus autoridade, mas que é típica das escolhas
políticas.
Sob esse aspecto, o interesse difuso é aquele interesse para cuja
tutela os procedimentos de mediação do sistema político ainda não atuaram, ou
atuam insatisfatoriamente.
O problema fundamental da proteção desses novos interesses
reside, assim, na correta colocação institucional dos procedimentos de mediação
que têm por objeto a solução de conflitos meta-individuais.
70
Quer promane de normas constitucionais expressas, quer deflua do
próprio sistema, o reconhecimento de necessidades coletivas a serem satisfeitas
e tuteladas deu margem à criação de numerosos órgãos governamentais,
altamente especializados, encarregados dessa tutela no plano administrativo:
assim, na Suécia, o “ombudsman do consumidor, contra abusos comerciais e
publicitários; na Inglaterra, o Director General of Fair Trading, contra o abuso do
poder econômico; ainda na Inglaterra, o Race Relations Board, contra a
discriminação racial. Nos EUA, o Attorney General foi subdividido em numerosos
departamentos especializados em assuntos de welfare, civil rights, antitrust, tutela
dos consumidores e do ambiente.
No Brasil, órgãos governamentais foram criados visando à tutela de
interesses difusos: assim, por exemplo, o Conselho de Defesa dos Direitos
Humanos; o Conselho Administrativo de Defesa Econômica; Conselho de Defesa
do Consumidor; organismos de proteção do meio ambiente, entre outros.
4.14. O meio ambiente e sua disciplina jurídica
Por estarmos falando da tutela dos interesses difusos, exporemos
nesse momento algumas observações sobre o meio ambiente que se fazem
necessárias para o melhor desenvolvimento do presente estudo visando unir
todos os pontos à energia.
4.15. Reflexividade sobre a tutela jurídico-ambiental
Ao jurista do tempo presente é instado confrontar “um conjunto
amplo e ainda inacabado de reflexões acerca do direito, sua função social e sua
interpretação”
78
. Portanto, tal reflexividade coloca para a ciência jurídica a
premente questão de sua eficácia social
79
.
78
BARROSO, Luís Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional
brasileiro: pós-modernidade, teoria crítica e pós-positivismo. In: CUNHA, Sérgio Sérvulo da;
GRAU, Eros Roberto (Orgs.). Estudos de direito constitucional: em homenagem a José Afonso
da Silva. São Paulo: Malheiros, 2003.
79
MORRISON, Wayne. Filosofia do direito: dos gregos ao pós-modernismo. São Paulo: Martins
Fontes, 2006.
71
Significa, então, para Francisco Amaral
80
, “que o direito em particular
e a sociedade em geral começam a interessar-se pela eficácia das normas e dos
institutos vigentes, não no tocante ao controle ou disciplina social, mas
também no que diz respeito à organização e direção da sociedade”.
Com efeito, o princípio da sustentabilidade ambiental integra o
ideário jurídico na pós-modernidade, consubstanciando dimensão atribuída ao
Estado de Direito, conquanto este tenha se transformado em Estado de Direito
Democrático-Ambiental, haja vista o direito ao meio ambiente admitido como fim
do Estado
81
.
E outra não poderia ser a postura do direito tendo em conta a
crescente degradação ambiental e a ameaça para o futuro da vida no planeta,
senão a intervenção visando equacionar os direitos das presentes e futuras
gerações; não obstante, esta atuação jurídica vem sempre acompanhada de
dúvidas e incertezas, da necessidade de interação entre conhecimento teórico e
experiências práticas e do problema de sua legitimação política
82
.
A evolução técnica e os avanços científicos revelam, em última
análise, os alicerces da enunciada e preocupante conjuntura ambiental na
denominada sociedade do risco, que aumentou enormemente as situações de
danos ao meio ambiente, fruto do crescimento econômico em detrimento do
desenvolvimento sustentável
83
.
Diante disso, a tutela jurídico-ambiental exibe diversas
características e princípios, refletindo a multiplicidade dos traços essenciais que a
distinguem das demais áreas da investigação jurídica, o que pode comprometer o
seu núcleo central, assim também retirar-lhe a capacidade disciplinadora da
realidade envolvente, da imprescindível tarefa de tornar precisas as noções em
torno de suas definições, natureza, bens e institutos
84
.
80
AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
81
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Protecção do ambiente e direito de propriedade: crítica de
jurisprudência ambiental. Coimbra: Coimbra Ed., 1995.
82
GARCIA, Maria da Glória F. P. D. O Lugar do direito na protecção do ambiente. Coimbra:
Almedina, 2007.
83
BARROSO, Lucas Abreu. A obrigação de indenizar e a determinação da responsabilidade civil
por dano ambiental. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
84
GASPAR, Pedro Portugal. O estado de emergência ambiental. Coimbra: Almedina, 2005.
72
4.16. Definição de meio ambiente
Para Marcos Catalan
85
, a expressão meio ambiente guarda em si
uma imprecisão, visto que meio e ambiente são termos sinônimos, havendo,
assim, uma impropriedade em sua composição etimológica.
No entanto, a expressão foi inserida em nosso contexto lingüístico,
não apenas no que se refere ao aspecto cotidiano, pois a “expressão meio
ambiente se consagrou e foi incorporada amplamente à Constituição da
República Federativa do Brasil, bem como em várias legislações esparsas”.
86
A Lei 6.938, de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio
Ambiente, no artigo 3º, I, assim define: “Para os fins previstos nesta Lei, entende-
se por: I meio ambiente, o conjunto de condições, influências e interações de
ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as
suas formas”.
Com isso, percebemos que o direito positivo tem conceituado o meio
ambiente de forma bastante abrangente. Celso Antônio Pacheco Fiorillo
87
assinala que, além da amplitude conceitual atribuída ao meio ambiente pelo
legislador ordinário, este “optou por trazer um conceito jurídico indeterminado, a
fim de criar um espaço positivo de incidência da norma”.
Em pertinente comentário ao preceituado no citado dispositivo, José
Eduardo Ramos Rodrigues
88
assim se manifesta: “Exatamente por permitir,
abrigar e reger a vida em todas as formas, é que o meio ambiente inclui áreas
naturais intocadas ou degradadas, mares e terras, áreas rurais e urbanas, pois
em todos esses espaços encontramos formas de vida.”
85
CATALAN, Marcos. Proteção constitucional do meio ambiente e seus mecanismos de tutela. São
Paulo: Método, 2008.
86
LEITE, José Rubens Morato. Introdução ao conceito jurídico de meio ambiente. In: VARELLA,
Marcelo Dias; BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro (Orgs.). O novo em direito ambiental. Belo
Horizonte: Del Rey, 1998.
87
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva,
2003.
88
RODRIGUES, José Eduardo Ramos. A evolução da proteção do patrimônio cultural: crimes
contra o ordenamento urbano e o patrimônio cultural. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, n.
11, jul./set. 1998.
73
4.17. O meio ambiente como interesse ou direito difuso
A tutela jurídica do meio ambiente o coloca na condição de direito
metaindividual ou coletivo lato sensu, ou seja, daquele que está acima dos
interesses individuais.
Vale ressaltar, recordando Hugo Nigro Mazzilli
89
, que, a priori, os
direitos metaindividuais “são interesses que excedem o âmbito estritamente
individual mas não chegam a constituir interesse público”.
A classificação dos interesses ou direitos metaindividuais como
difusos, coletivos stricto sensu e individuais homogêneos, entre nós, é dada pelo
artigo 81, parágrafo único, I a III, do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor,
como outrora estudado.
O meio ambiente encontra-se alocado entre os direitos difusos, pois
ultrapassa o plano dos interesses de cada pessoa ou grupo, caracterizando-se
por sua indivisibilidade, isto é, seu objeto diz respeito a todos os membros da
sociedade, ao mesmo tempo em que não é destinado a alguém exclusivamente, e
possuindo titulares indeterminados, cuja relação entre estes tem origem em uma
situação de fato.
Ademais, trazemos à colação o entendimento de Roberto Senise
Lisboa
90
: “O interesse difuso é necessidade de toda a sociedade, e não de grupos
sociais determinados [...] Por se tratar de necessidade de todos, não é
necessidade apenas do Estado, mas inclusive dele, que, contudo, poderá vir a ser
demandado para satisfação do direito subjetivo concernente”.
Em sendo o direito ambiental uma necessidade de toda a sociedade,
e em razão das interações que este suscita com muito dos demais campos de
estudo do direito, preleva a idéia de sua interdisciplinaridade, porquanto,
lembrando Michel Prieur, sendo um direito horizontal, caracteriza-se “por penetrar
nas diversas estruturas jurídicas para nelas introduzir a matéria ambiental”.
91
89
MAZZILLI, Hugo Nigro. op. cit.
90
LISBOA, Roberto Senise. Contratos difusos e coletivos. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,
1997.
91
BARROSO, Lucas Abreu. Direito agrário/direito ambiental: inter-relação e autonomia. Informativo
Consulex, Brasília, n. 49, 7 dez. 1998.
74
Com isso, percebemos a importância crescente em proteger o meio
em que vivemos, utilizando, assim, fontes alternativas de energia, visando
respeitar preceito constitucional bem como a “Vida.
75
5. ENERGIA
A definição de energia, segundo o dicionário Aurélio
92
, é a maneira
como se exerce a força, ou, na acepção de Houaiss
93
, é a capacidade de trabalho
de um corpo ou substância. Na ciência física, é definida como a capacidade de
gerar trabalho sob diversas formas: caloríficas, cinética, elétrica, eletromagnética,
mecânica, potencial, química e radiante, transformáveis uma nas outras, sendo
capazes de provocar fenômenos bem determinados e característicos nos
sistemas físicos
94
.
Assevera Walisiewicz
95
que a energia não pode ser vista e não tem
substância física. Sabe-se de sua existência apenas por seus efeitos e somente
podemos avaliá-la pelo que pode fazer por nós.
Para referido autor, é cil ver o movimento de um taco de golfe
transferir energia porque consegue deslocar uma bola pelo campo. Essa forma de
energia para deslocar as coisas é conhecida como energia cinética. Outra forma é
a energia potencial: a água contida por uma barragem pode não estar se
movendo, mas certamente tem potencial para realizar trabalho quando é liberada.
Outros tipos de energia térmica, química, elétrica e nuclear podem ser vistos
como formas de energia cinética ou potencial.
Um objeto fica quente porque seus átomos constituintes estão
realizando um movimento mais rápido do que aqueles de um objeto frio; o
petróleo armazena energia química porque suas ligações moleculares têm
energia potencial; a energia elétrica produzida por um gerador é o fluxo de
elétrons se movimentando dentro de um fio
96
.
Agora que temos a noção da palavra energia, podemos tratar das
energias renováveis e não-renováveis.
92
FERREIRA, Aurélio Buarque Holanda. Dicionário Aurélio. São Paulo: Nova Fronteira, 1999.
93
HOUAISS, Antonio. Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.
94
FERREIRA, Ana Maria. Viabilização e essencialidade da energia elétrica no contexto do direito
ambiental brasileiro. 2005. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica, São Paulo,
2005.
95
WALISIEWICZ, Marek. Energia alternativa. São Paulo: Publifolha, 2008.
96
Id. Ibid.
76
As energias renováveis são todas aquelas cuja taxa de utilização é
inferior à sua taxa de renovação. São energias que se originam de fontes
permanentes e inesgotáveis, fundamentalmente a solar, seja direta ou
indiretamente, com exceção das energias geotérmicas e das marés.
As energias não renováveis, de seu turno, têm origem fóssil e
tendem, um dia, a findar, não sendo, portanto, eternas.
As energias não-renováveis têm por fontes os seguintes elementos:
petróleo, gás natural, carvão natural, urânio, enquanto que as energias renováveis
têm por fonte as águas, os ventos, o sol, o hidrogênio, o álcool, o biogás, a lenha,
os resíduos orgânicos em geral (biomassa), os mares e a terra.
Sendo assim, fontes de energia são as formas em que a energia é
encontrada na natureza. Essas fontes são processadas e convertidas em vetores
que, por sua vez, são armazenados ou distribuídos para os consumidores finais
97
.
A partir de agora, falaremos de algumas dessas fontes, que são
diversas as fontes de energias renováveis.
5.1. Breve histórico
O uso da energia no mundo sempre esteve associado ao grau de
desenvolvimento das civilizações. Os períodos paleolítico (3.500.000 a 10.000
a.C.) e neolítico (10.000 a 5.000 a.C.) foram marcados por descobertas
revolucionárias como a produção de ferramentas, o controle do fogo e o
desenvolvimento de formas de cultivo. As principais fontes de energia eram a
biomassa, a força humana e animal, os ventos e a água. Com o tempo, o homem
aprimorou cada vez mais suas técnicas de conversão de energia, culminando
com o uso do carvão mineral durante a revolução industrial, no século XVIII
98
. A
era do carvão foi marcada por um intenso crescimento industrial associado às
importantes descobertas tecnológicas, como a máquina a vapor.
97
AZEVEDO, Mariangela Garcia de Lacerda. O direito tributário e as energias renováveis de
fontes alternativas. 2004. Dissertação (Mestrado) Pontifícia Universidade Católica, São Paulo,
2004.
98
MABOGUNJE, A. State fo the earth: contemporary geographic perspectives. UK: Blackweel
Publishers and UNESCO, 1997. v. 2.
77
Após a descoberta do petróleo, no final do século XIX, e
posteriormente do gás natural, o carvão deixa de ser a principal fonte de energia
consumida, mas continua exercendo um papel importante na matriz energética
global. O domínio do uso da eletricidade novo impulso ao desenvolvimento
tecnológico e gera uma relação de forte dependência dos combustíveis fósseis
para geração.
No século XX, o petróleo intensifica ainda mais o processo de
industrialização e de desenvolvimento econômico, ocasionando uma intensa
modificação e “artificialização” do espaço ocupado pelo homem
99
. Na cada de
setenta, os preços do petróleo tornam-se elevados frente às fortes crises
presenciadas em 1973 e 1979-80. Com isso, muitos países procuram reduzir a
dependência internacional de suas economias às oscilações drásticas de preços.
As principais estratégias foram aumentar a eficiência energética dos processos de
conservação da energia e substituir o consumo de óleo combustível em usinas
convencionais (ciclo a vapor) por outros tipos de combustíveis ou de usinas.
Desta forma, a geração termelétrica a carvão e nuclear foi priorizada
em muitos países. Após a década de oitenta, o gás natural passou a ser
legalmente utilizado para geração elétrica em ciclo combinado, aumentando em
muito a sua potência final. Outras fontes de energia, tais como a eólica, solar e
biomassa, começaram a ocupar nichos específicos de mercado em alguns
países.
100
Além disso, muitos países investiram maciçamente em programas de
conservação da energia. Outra forma de proteção encontrada foi firmar contratos
bilaterais de compra e venda do petróleo e ampliar a exploração interna.
Apesar dos mecanismos de proteção citados e da iminente escassez
de petróleo para as próximas cadas, observa-se que tanto a oferta quanto o
consumo mundial de energia são intensamente dependentes de petróleo. O
mesmo ocorre com o carvão mineral e o gás natural
101
.
99
SANTOS, M. Técnica, espaço, tempo: globalização e meio técnico-científico informacional. São
Paulo: Hucitec, 1997.
100
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
101
STRAPASSON, A. B. A energia térmica e o paradoxo da eficiência energética: desafios para um
novo modelo de planejamento energético. 2004. Dissertação (Mestrado) - Instituto de
Eletrotécnica e Energia, Universidade de São Paulo, 2004.
78
Em relação à geração elétrica, os combustíveis sseis também são
as fontes mais consumidas. Além disso, pode-se também observar que o modelo
de geração elétrica mundial possui base mista, ou seja, abrange vários tipos de
fontes de energia. Apesar de todo esforço mundial em reduzir as emissões de
gases de efeito estufa e estimular o aumento das fontes de energias renováveis,
as energias solar e eólica, a biomassa e outras fontes renováveis, excetuando-se
a hidroeletricidade, ainda apresentam uma participação muito baixa, menos de
um vírgula seis por cento, em relação ao total. Um dos principais motivos é a não
internalização dos custos ambientais inerentes à geração de energia,
ocasionando uma competição econômica desleal entre as energias renováveis e
os combustíveis fósseis.
Apesar da perspectiva concreta de que as reservas de gás natural e
carvão mineral irão perdurar por um tempo maior do que as petrolíferas
102
, a
grande dependência mundial de petróleo tem gerado uma acentuada tensão
mundial frente a sua iminente escassez, agravada pela forte pressão ambiental
contra o uso de combustíveis fósseis. A disponibilidade de recursos energéticos e
o domínio tecnológico tornam-se fatores fundamentais ao desenvolvimento
econômico, o que gerou uma forte relação de interdependência entre os países.
Segundo Hertz
103
, as empresas de energia e tecnologia adquiriram um poder
ímpar na história, uma vez que as regras passaram a ser ditadas por elas, à
revelia dos anseios da população e da real democracia. Para Castells
104
, a
sustentabilidade energética tornou-se um desafio árduo sobre a ótica do modelo
neoliberal, em que alguns países são fortemente privilegiados, enquanto outros
ficam à margem do desenvolvimento, sem perspectivas mínimas de crescimento
econômico.
102
BP - BRITISH PETROLEUM. Statistical Report. United Kingdom: BP, 2003.
103
HERTZ, N. The silent takeover: global capitalism and the death of democracy. UK: Arrow Books,
2003.
104
CASTELLS, M. A. Sociedade em rede: a era da informação economia, sociedade e cultura.
São Paulo: Paz e Terra, 1999.
79
5.2. As energias no Brasil
Em nosso país, a derrubada das florestas esteve, na grande maioria
das vezes, relacionada à ocupação da terra para a implantação da agricultura e
da pecuária extensiva.
Até a vinda da família real para o Brasil, em 1808, o transporte
terrestre era baseado na tração animal, o recurso energético dominante era a
lenha, a iluminação nos poucos centros “urbanos” era feita com azeite de peixe e,
nas demais ocupações, era feita com velas de gordura dos animais.
A grande colônia de Portugal entrava no século XIX como a
sociedade da lenha e da escravatura, com os portos fechados ao comércio
internacional e a proibição de atividades manufatureiras em solo brasileiro
decretada pela coroa
105
.
Com a chegada de D. João VI, houve a abertura dos portos e a
permissão de atividades manufatureiras, antes proibidas. Os produtos
manufaturados exportados eram a borracha e o açúcar. Mesmo com a abertura
dos portos, o país desenvolveu a indústria têxtil porque havia a produção de
algodão. Os demais produtos, como o ouro e o café, continuavam a ser
exportados na forma de pepitas e grãos, respectivamente.
Na segunda metade do período imperial, com a ajuda da Inglaterra,
o Brasil começou a ter acesso às transações comerciais e financeiras externas,
havendo comedido aumento na diversificação industrial, contudo as máquinas
ainda eram movidas a vapor, nas quais a lenha era o combustível usado nas
caldeiras, e a roda d’água muito utilizada.
O barão de Mauá, entre 1846 e 1854, decidiu industrializar o país.
Com sua riqueza, adquiriu uma pequena fundição e um estaleiro em Niterói,
ganhou a concorrência pública para a iluminação com gás em substituição ao
carvão mineral, o que originou a empresa Societé Anonyme Du Gaz. Além disso,
conseguiu o privilégio de construir a estrada de ferro que sairia do Rio de Janeiro,
passando pelo Vale do Paraíba, e iria até Minas Gerais. O trecho inicial foi
105
LEITE, A. Dias. op. cit.
80
inaugurado em 1854, com a primeira locomotiva a vapor trazida para o Brasil, a
“Baronesa”
106
. Quando o imperador D. Pedro II assumiu o trono, ele, que era um
monarca interessado pela ciência e pela cultura, se opôs aos projetos do barão de
Mauá, por não acreditar que estes podiam impulsionar o progresso do país.
Dias Leite, em sua obra, salienta que o imperador criou a Floresta da
Tijuca com o objetivo de proteger os mananciais que abasteciam a cidade do Rio
de Janeiro.
Em 1879, D. Pedro II concedeu a Thomas Alva Edison o privilégio de
introduzir no país aparelhos e processos de sua invenção destinados à utilização
da eletricidade na iluminação pública. Com isso foi inaugurada na Estação Central
da Estrada de Ferro D. Pedro II, atual Estrada de Ferro Central do Brasil, a
primeira instalação de iluminação elétrica permanente, que ficava situada na parte
interna da estação central da Ferrovia D. Pedro II (hoje Central do Brasil)
107
.
Em 1881, a Diretoria Geral dos Telégrafos instalou, na cidade do Rio
de Janeiro, a primeira iluminação externa pública do país em trecho da atual
Praça da República
108
.
Em 1883, entrou em operação a primeira usina hidrelétrica no país,
localizada no Ribeirão do Inferno, afluente do rio Jequitinhonha, na cidade de
Diamantina. Neste mesmo ano, D. Pedro II inaugurou na cidade de Campos o
primeiro serviço público municipal de iluminação elétrica pública do Brasil e da
América do Sul, sendo instalada uma usina térmica de cinqüenta cavalos-vapor
para abastecê-la
109
.
Em 1889, foi concluída em Minas Gerais a hidrelétrica de Marmelos
da Companhia Mineira de Eletricidade, pertencente ao industrial Bernardo
Mascarenhas, construída para abastecer a cidade de Juiz de Fora. Em 1892, a
Societé Anonymé Du Gaz trouxe a iluminação pública a querosene, substituindo
lamparinas e velas. Em 1892, foi inaugurada, no Rio de Janeiro, pela Companhia
Ferro-Carril do Jardim Botânico, a primeira linha de bondes elétricos instalada em
caráter permanente no país.
106
LEITE, A. Dias. op. cit.
107
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001). Memória da Eletricidade,
2001.
108
Id. Ibid.
109
Id. Ibid.
81
Em 1895, ocorreu a união de empresários e técnicos canadenses,
políticos e outros influentes paulistas, para fundar a São Paulo Railway Light and
Power Co. Ltda., para instalar e gerenciar, na cidade de São Paulo, o transporte
urbano em veículos elétricos.
Assim, em 1901, para suprir o sistema de transporte, foi construída a
usina hidrelétrica de Santana de Parnaíba, atual Edgar de Souza, no rio Tietê,
com potência de dois mil kW.
No ano de 1903, a população brasileira era de 17.438.434
habitantes, as importações eram de 101,6 e as exportações eram de 179.3
milhões de dólares.
110
Nesse cenário foi aprovado pelo Congresso Nacional o
primeiro texto de lei disciplinando o uso de energia elétrica no país.
111
Em 1904, Alexandre Mackenzie, representando o grupo paulista,
inaugura no Rio de Janeiro a Rio de Janeiro Tramway Light and Power Co. Ltda.,
e, para dar suporte a ela, foi construída a hidrelétrica de Fontes, concluída em
1908 com doze mil kW de capacidade.
Em 1912, as empresas do grupo Light do Rio de Janeiro e de São
Paulo foram unidas, passando a se chamar Brazilian Traction, Light and Power
Empresa Cliente Ltda. No mesmo ano, em ampliações sucessivas, a Usina de
Santana de Parnaíba atingiu sua capacidade de geração nominal de dezesseis
mil kW. Para manter essa capacidade geradora foi necessário regularizar a vazão
do rio Tietê, pela construção, iniciada em 1906, do Reservatório de Guarapiranga.
Em 1913, entra em operação a Usina Hidrelétrica Delmiro Gouveia,
a primeira do nordeste, construída para aproveitar o potencial da Cachoeira de
Paulo Afonso, no rio São Francisco.
Até o início da Primeira Grande Guerra, o país ainda vivia da
exportação da borracha e da importação do carvão para abastecer as fábricas, no
entanto a lenha ainda tinha papel fundamental, bem como a energia hidráulica.
Para alimentar as locomotivas a vapor, a pequena indústria siderúrgica e as
indústrias de forma geral, foram exploradas as florestas mais homogêneas
existentes, principalmente as de araucária e as de palmeira de babaçu. Esta
110
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/>.
111
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001), cit.
82
exploração foi causada pelo fato de o Brasil o possuir reservas de carvão
mineral conhecidas.
Os serviços estavam concentrados em uma área territorial mínima,
onde se localizavam as duas cidades mais populosas do país e a maior parte da
indústria. Outras obras para a geração de energia foram realizadas, com a
concepção e execução do engenheiro Asa Billings, com destaque para a
hidrelétrica Ilhas dos Pombos, no rio Paraíba do Sul, inaugurada em 1924 e que,
em 1929, atingiu a potência de setenta e três mil kW, duplicando a capacidade de
atendimento ao Rio de Janeiro; e a usina hidrelétrica de Cubatão, a mais
importante iniciativa do período, inaugurada em 1926, com potência de vinte e
oito mil kW; logo depois ampliada para setenta e seis mil kW.
Em 1927, a American and Foreign Power Empresa Cliente
AMFORP iniciou suas atividades no país, adquirindo o controle de dezenas de
concessionárias que atuavam no interior de São Paulo.
Em 1934 foi promulgado pelo então Presidente Getúlio Vargas o
Código de Águas, assegurando ao Poder Público a possibilidade de controlar
rigorosamente as concessionárias de energia elétrica. Em 1939, criou, ainda, o
Conselho Nacional de Águas e Energia CNAE para sanear os problemas de
suprimento, regulamentação e tarifa referentes à indústria de energia elétrica do
país. E, em 1949, foi regulamentada a situação das usinas termelétricas do país,
mediante sua integração às disposições do Código de Águas.
112
Sob pressão, o Estado Novo teve que revogar alguns obstáculos
legais impostos pela Constituição de 1937, tais como: o aproveitamento das
quedas d’água, proibido em 1934 pelo Código das Águas; permissão de novos
investimentos, independentemente da revisão de contrato, sanção e autorização
de reajustes de tarifas a título precário.
113
Em 1945, foi criada no Rio de Janeiro a primeira empresa de
eletricidade de âmbito federal, a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco
CHESF.
112
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001), cit.
113
LEITE, A. Dias. op. cit.
83
Em 1954, entrou em operação a primeira grande hidrelétrica
construída no rio São Francisco, a Usina Hidrelétrica Paulo Afonso I, pertencente
à CHESF. No mesmo ano, começou a operar a Usina Termelétrica Piratininga, a
óleo combustível, primeira termelétrica de grande porte no Brasil. Entrou também
em vigor o Imposto Único sobre Energia Elétrica, o qual vinculava vinte e cinco
por cento da arrecadação cadente do imposto único ao programa de petróleo.
Esta era uma forma de incentivar o capital estrangeiro a investir no Brasil, que
se almejava ter auto-suficiência. Nos seguintes anos, foi elaborado o projeto de lei
que viria definir a política do petróleo
114
.
Quando fora feito estudo orçamentário, verificou-se que os recursos
necessários eram bem superiores aos previstos inicialmente. Daí a decisão do
governo de elaborar dois projetos de lei: um que se destinava a criar a Petróleo
Brasileiro S/A (Petrobrás) e outro relativo aos recursos tributários essenciais à
sustentação do programa nacional de combustíveis líquidos.
Em assim sendo, no mês de outubro do ano de 1953, foi sancionada
a Lei nº. 2.004, que instituiu a Petróleo Brasileiro S/A como monopólio estatal de
pesquisa e lavra, refino e transporte do petróleo e seus derivados
115
. A Petróleo
Brasileiro S/A iniciou suas atividades com o acervo recebido do antigo Conselho
Nacional do Petróleo (CNP), que manteve sua função fiscalizadora sobre o setor.
Em 1957, foi criada a Comissão Interestadual da Bacia do Paraná-
Uruguai, CIBPU, que realizou um estudo preliminar sobre o potencial hidrelétrico
de Sete Quedas, no rio Paraná. No mesmo ano um relatório foi entregue e assim
autorizado o prosseguimento dos trabalhos. O Serviço de Navegação do Rio da
Prata ficou encarregado de construir uma usina piloto em Sete Quedas, que foi
inaugurada pelo Presidente Juscelino Kubitschek.
116
Em 1962, um relatório foi
entregue com a conclusão de que em Sete Quedas havia um potencial de dez
milhões de kW. A exploração do rio Paraná interessava também ao Paraguai.
No mesmo ano o inauguradas outras duas usinas termelétricas: a
primeira em Capivari, Santa Catarina, com potência de cem mW, e a segunda em
Figueira, Estado do Paraná, com potência de vinte mW, ambas a carvão.
114
LEITE, A. Dias. op. cit.
115
VOGT, C. COMCIÊNCIA. História do petróleo no Brasil. Disponível em:
<www.comciencia.br/reportagens/petroleo/pet06.shtml>. Acesso em: ago. 2008.
116
LEITE, A. Dias. op. cit.
84
Em 1957 foi criada a Central Elétrica de Furnas S/A, com o objetivo
expresso de aproveitar o potencial hidrelétrico do rio Grande para solucionar a
crise de energia na região sudeste. Em 1960, com o desdobramento da política
desenvolvimentista do Presidente Juscelino K., conhecida como Plano de Metas,
foi criado o Ministério das Minas e Energia – MME. E, em 1961, durante a
presidência de Jânio Quadros, foi criada a Eletrobrás, constituída em 1962 pelo
Presidente João Goulart, para coordenar o setor de energia elétrica brasileiro.
Referida estatal promoveria estudos e projetos de construção e
operação de usinas geradoras, linhas de transmissão e subestações destinadas
ao suprimento de energia elétrica do país, a Eletrobrás adquiriu características de
holding, controlando empresas de geração e transmissão de energia elétrica.
Também no ano de 1962, entrou em operação a Usina Termelétrica
de Charqueada, no Rio Grande do Sul, com potência de setenta e dois mW,
movida a carvão. Esta foi construída por ocasião da substituição das locomotivas
a vapor pelas elétricas, o que ocasionou a diminuição do consumo de carvão.
Com isso, era necessário que se aumentasse a oferta de energia elétrica para
abastecer os trens
117
.
Em 1963, entrou em operação a Usina Hidrelétrica de Furnas, maior
usina do Brasil na época de sua construção. No período, para integração dos
sistemas de geradores elétricos, das regiões Nordeste, Sul e Sudeste, foram
contratadas empresas internacionais de engenharia, o consórcio foi denominado
Canambra.
Em 1965, começa a operar a Usina Termelétrica Jorge Lacerda I, a
qual atualmente faz parte do maior complexo termelétrico a carvão vapor do
Brasil.
Em 1968, entrou em operação a maior termelétrica do país, a Usina
Termelétrica Santa Cruz, de Furnas Centrais Elétricas S/A.
Em 1972 é realizada a Conferência de Estocolmo, que decidiu a
dimensão ambiental como condicionadora e limitadora do modelo tradicional de
117
GUENA, Ana Maria de Oliveira. Avaliação ambiental de diferentes formas de geração de
energia elétrica. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares, São
Paulo.
85
crescimento econômico e do uso de recursos naturais
118
. Dessa reunião
resultaram vinte e um princípios relacionados ao controle da poluição hídrica. Na
época, as preocupações demonstradas pelos países dos hemisférios norte e sul
mostraram grande disparidade. Os do norte, de maioria desenvolvida,
preocupavam-se com a poluição da água, ar, solo, priorizando ações voltadas à
restauração de sua qualidade anterior, enquanto que os do sul, em sua grande
maioria países em desenvolvimento, tinham como maior preocupação a gestão
dos recursos naturais objetivando o desenvolvimento sócio-econômico
119
.
Em 1973, como conseqüência do tratado firmado entre Brasil e
Paraguai, regulando a construção e operação de hidrelétricas no rio Paraná, foi
criada a Itaipu Binacional – ITAIPU.
A construção da Usina Termelétrica Presidente Médici aconteceu em
duas etapas. A primeira fase da usina, com duas unidades de 63 mW cada, foi
inaugurada em 1974, quando foi integrada ao Sistema Interligado Brasileiro
120
.
No ano de 1975, iniciaram-se as negociações com o Paraguai para a
construção de Itaipu, que entrou em operação em 1984.
Nos anos que se seguiram, o país passou por um período de
inflação muito alta, o que desvalorizava produtos e serviços. O setor elétrico, por
ser controlado pelo governo federal e excessivamente regulamentado, foi muito
prejudicado pela inflação, a falta de reajustes dos preços fazia com que os valores
recebidos fossem somente suficientes para pagar as despesas com a geração,
sobrando muito pouco para investir no aumento da produção. Segundo Leite Dias,
em 1980 o setor energético trabalhava com dois terços de dívida e um terço de
capital próprio.
Em 1981, no governo de João Figueiredo, foi instituída a Política
Nacional do Meio Ambiente e o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sema) e
criado o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).
118
NOVAES, E. S. Antecedentes. Disponível em:
<www.mre.gov.br/CDBRASIL/ITAMARATY/WEB/port/meioamb/agenda21/anteced/index.htm>.
119
REIS, L. B.; SILVEIRA, S. Energia elétrica para o desenvolvimento sustentável. São Paulo:
Edusp, 2001.
120
CGTEE Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica. Disponível em:
<www.cgtee.gov.br/content/unidades/ute_presidente_medici.php>.
86
Em 1983 foi estabelecida, na ONU, a Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, presidida pela então primeira ministra da Noruega,
Gro Harlem Brundtland
121
. A finalidade desta conferência era fazer um exame da
questão ambiental relacionando-a com o desenvolvimento e os padrões de
consumo e produção, propondo um programa de ação mundial.
Em 1984, foi concluída a primeira parte da interligação do sistema
norte-nordeste, permitindo a transferência de energia da Bacia Amazônica para a
região nordeste. Nesse mesmo ano, entrou em operação a Usina Hidrelétrica
Itaipu, maior hidrelétrica do mundo na época com doze mil e seiscentos mW de
capacidade instalada, bem como a Usina Hidrelétrica Tucuruí, da Eletronorte,
primeira hidrelétrica de grande porte da Amazônia.
122
Em 1985 foi constituído o Programa Nacional de Conservação de
Energia Elétrica PROCEL, com o objetivo de incentivar a racionalização do uso
da energia elétrica.
No final de 1986, entrou em operação a segunda fase da Usina
Termelétrica Presidente Médici, com duas unidades de cento e sessenta mW
cada.
Em 1992, realizou-se no Rio de Janeiro a Conferência das Nações
Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ficou conhecida como Rio-
92, com a participação de cento e setenta e cinco países. A conferência resultou
em importantes documentos: a Convenção sobre a Mudança de Clima, a
Convenção sobre a Biodiversidade, a Declaração sobre as Florestas, a
Declaração do Rio e a Agenda 21.
Somente em setembro de 1993 foi formado um consórcio entre
cessionários e autoprodutores para exploração e construção de usinas
hidrelétricas. Foi instituído também o Sistema Nacional de Transmissão de
Energia Elétrica (Sintrel) para facilitar o intercâmbio entre os concessionários e os
produtores independentes.
123
121
CAPRILES, R. Meio século de lutas: uma visão histórica da água. Disponível em:
<www.ambientebrasil.com.br/composer.php3?base=/agua/doce/index.html&conteudo=./agua/doc
e/artigos/historico.html>.
122
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001), cit.
123
LEITE, A. Dias. op. cit.
87
Em 2001, o nosso país vivenciou sua maior crise de energia elétrica,
potencializada pelas condições hidrológicas extremamente desfavoráveis
verificadas nas regiões sudeste e nordeste. Com a gravidade da situação, o
governo federal criou, no mês de maio, a Câmara de Gestão da Crise de Energia
Elétrica CGE com o objetivo de propor e implantar medidas de natureza
emergencial para compatibilizar a demanda e a oferta de energia elétrica, de
forma a evitar interrupções intempestivas ou imprevistas do suprimento de
energia elétrica. Em junho, foi implantado o programa de racionamento nas
regiões sudeste, centro-oeste e nordeste e, em agosto, em parte da região norte.
Em dezembro, terminou o racionamento de energia na região norte e, em
fevereiro de 2002, nas regiões sudeste, centro-oeste e nordeste.
124
No Brasil, a busca por novas fontes de geração tem grande
importância, uma vez que o potencial para instalação no sistema de hidrelétricas
de grande porte está esgotado. E a ampliação da geração de hidroeletricidade
se restringe à construção de pequenas centrais hidrelétricas, o que impossibilita
suprir a necessidade energética nacional com este tipo de geração.
Geograficamente a maior capacidade de geração, ainda pouco
explorada, está na região norte, que é pouco populosa e menos desenvolvida
industrialmente. Contudo, sua geografia é desfavorável, por ser uma planície, e o
lago da usina hidrelétrica teria uma extensão muito grande, impactando o
ecossistema local.
A nossa matriz energética é composta basicamente por energias
renováveis conforme dispomos na tabela abaixo:
124
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001), cit.
88
FONTE
2005 (%) 2004 (%)
Hidráulica
77,1 75,5
Nuclear
2,2 2,7
Gás natural
4,1 4,5
Carvão mineral
1,6 1,6
Derivados de petróleo
2,8 2,9
3,9 3,9
Importação
8,3 8,8
Tabela 01 - Nota: Inclui autoprodutores e a parcela paraguaia de Itaipu.
PCHs – Potência igual ou inferior a 30 mW.
Fonte: Ministério de Minas e Energias – BEM 2006.
No próximo gráfico, apresentamos a estrutura da oferta de energia
interna de fontes renováveis e não-renováveis no Brasil, no mundo e na
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Fonte: BEN, 2006.
Tabela 02 – Oferta interna de fontes renováveis e não renováveis no Brasil, no Mundo e no OCDE.
No Brasil, a oferta interna de energia tende a igualar-se à da matriz
energética mundial, onde uma maior participação de gás natural e uma menor
participação de hidráulica, entretanto ainda apresenta situação privilegiada em
termos de utilização de fontes renováveis de energia, conforme podemos
constatar abaixo:
89
Fonte: BEN, 2006
Tabela 03 – Oferta Interna de Energia – T Brasil, 2005.
Os países com grande geração térmica apresentam perdas totais de
transformação e distribuição entre vinte e cinco e trinta por cento da OIE (Oferta
Interna de Energia).
No Brasil estas perdas são de apenas sete por cento dada a alta
participação da geração hidráulica. Esta vantagem, complementada pela grande
utilização de biomassa, faz com que o Brasil apresente baixa taxa de emissão de
CO2 1,62 ton CO2/tep pela utilização de combustíveis, quando comparada
com a média mundial de 2,32 ton CO2/tep.
125
A oferta interna de energia, em 2004, foi de duzentos e treze vírgula
quatro milhões de toneladas equivalentes de petróleo tep, montante duzentos e
dezenove por cento superior ao de 1970 e equivalente a dois por cento da
demanda mundial. Importante setor da infra-estrutura econômica, a indústria de
energia no Brasil responde pelo abastecimento de oitenta e sete por cento do
consumo nacional. Os treze por cento restantes são importados, na forma de
petróleo, carvão mineral, gás natural e energia elétrica.
126
A próxima figura nos mostra a capacidade de geração instalada:
125
BALANÇO ENERGÉTICO NACIONAL (BEN). Disponível em:
<www.ben.epe.gov.br/BEN2007.anexos.atpx>.
126
Id. Ibid.
90
Fonte: BEN, 2006.
Tabela 04 – Capacidade Instalada de Geração (mW).
A geração pública e de autoprodutores do Brasil atingiu trezentos e
quarenta e quatro vírgula seis TWh (Tera Watt hora) em 2002, resultado quatro
vírgula nove por cento superior ao de 2001. Configuram este resultado a geração
hidráulica pública de duzentos e setenta e oitorgula sete TWh, a geração
térmica pública de trinta e seis vírgula sete TWh e a geração de autoprodutores
de vinte e nove vírgula três TWh.
127
Na próxima figura, apresentamos a estrutura dos recursos e
reservas energéticas brasileiras em 2004, em que o petróleo representa
1.600.000; o gás natural, 400.000; o carvão mineral, 2.700.000; a hidráulica,
300.000 e a energia nuclear, 1.400.000:
127
BALANÇO ENERGÉTICO NACIONAL (BEN). Disponível em:
<www.ben.epe.gov.br/BEN2007.anexos.atpx>.
91
Tep – Tonelada equivalente de petróleo.
Fonte: BEN, 2005.
Tabela 05 – Recursos e Reservas Energéticas Brasileiras.
O planejamento energético busca soluções diversificadas para a
geração de energia elétrica visando atender à demanda socioeconômica e
causando os menores danos possíveis ao meio ambiente.
Sabemos que a concentração de dióxido de carbono é mais alta
agora do que em todo o tempo de vida do planeta e a expectativa é que ela
continue se elevando, acarretando um aumento significativo na temperatura
média do planeta ao final do século. Cerca de cinqüenta por cento do aumento
de concentração de dióxido de carbono ocorreu nos últimos anos devido,
principalmente, às atividades humanas.
Implantar sistemas que possam atender a essa demanda social com
o maior rendimento e a menor perda de carga, causando o mínimo impacto
ambiental, é obrigação da sociedade tecnológica do culo XXI, uma vez que o
consumo de energia elétrica e o bem-estar social estão intimamente ligados.
Para compor o presente trabalho, serão estudadas cinco formas
diferentes de geração de energia, incluindo seu funcionamento, assim como a
desativação das correspondentes unidades geradoras. Todas as etapas descritas
são associadas com o impacto que podem causar ao meio ambiente, entenda-se
humanidade de forma geral. Além disso, discutiremos as questões ambientais
associadas à implantação, ao fornecimento e à desativação para as formas de
geração a seguir expostas.
92
6. PETRÓLEO
6.1. No mundo
Apesar de o primeiro poço de petróleo comercial ter sido perfurado
em Titusville, Pensilvânia, em 1859, a utilização do petróleo na medicina, em
lâmpadas e em outras aplicações remonta aos tempos bíblicos. O piche de asfalto
era utilizado no antigo Egito e na Babilônia por volta de 2.500 a.C. para
impermeabilização e em ruas; os gregos e os romanos o usavam em suas armas.
Os chineses perfuravam poços atrás de petróleo e gás antes de 1.000 a.C. e os
utilizavam para aquecimento e iluminação. O uso do petróleo aumentou bastante
a partir de 1859, pois ele passou a ser utilizado como substituto do óleo de baleia,
devido a sua dizimação
128
.
Segundo Souza
129
, a ocupação de territórios desérticos forçou a
obtenção de água a partir de poços artesianos. Com isto, desenvolveu-se uma
indústria de perfuração. Dos poços de água para a perfuração de poços de
petróleo foi um pequeno passo.
Os primeiros campos de petróleo foram descobertos perfurando-se
onde havia indicações de óleo na superfície. Em geral, foram encontrados por
sondadores com bons conhecimentos mecânicos e noções rudimentares sobre
geologia adquiridas na prática. No entanto, com a falta de indícios à superfície,
tudo era válido: o uso da forquilha, jogar o chapéu para o alto e perfurar onde
caísse, etc., qualquer desculpa que permitisse aplacar aquela febre.
130
Com mais erros do que acertos, a indústria foi se consolidando. Aos
poucos os especialistas foram se aperfeiçoando e, apesar de todo o empirismo,
foi descoberta, desse modo, a maior parte das províncias petrolíferas americanas.
Para Souza, os pioneiros na abertura dos poços de petróleo
conseguiram em pouco tempo eleger os princípios sicos que controlavam a
128
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. Energia e meio ambiente. São Paulo: Pioneira; Thomson,
2003.
129
SOUZA, R. G. Petróleo: histórias das descobertas e o potencial brasileiro. Rio de Janeiro:
Muiraquitã, 1997.
130
Id. Ibid.
93
existência ou o habitat do petróleo e que podem ser considerados os teoremas da
exploração, os quais são relatados:
a) O petróleo somente ocorria em bacias sedimentares. Nas áreas
onde o embasamento cristalino aflorava não havia possibilidade petrolífera.
b) As exsudações naturais demonstravam que o petróleo migrava
do fundo do subsolo para a superfície. Desta forma, entendia-se que o petróleo
era um elemento dinâmico. Visualmente mais leve do que a água, flutuava sobre
esta e tendia a subir, parando quando houvesse uma barreira no caminho.
Assim, era fundamental procurar nas bacias sedimentares as armadilhas ou
trapas (do inglês trap) que aprisionassem o petróleo.
c) O petróleo armazena-se nos poros das rochas, geralmente
presentes em arenitos ou calcários. A produtividade dos poços dependia das
qualidades de porosidade e permeabilidade destes reservatórios.
d) Alguns tipos de rocha, tais como os folhelhos, se mostravam
impermeáveis e, como tal, não se constituíam como rochas-reservatório, a não
ser quando fraturados.
e) Nas áreas de ocorrência de petróleo, ou nas proximidades,
existiam folhelhos negros, ricos em matéria orgânica, às vezes impregnados de
hidrocarbonetos.
As tórias posteriores, apesar de todo o avanço científico, não
questionaram tais postulados. A descoberta de limites horizontais entre o óleo e a
água e entre o gás e o óleo exigia que os poços para o desenvolvimento das
acumulações fossem perfurados de modo a atingir o reservatório na profundidade
correta, sem o que produziriam água ou gás.
131
A descoberta de uma maior utilidade para o petróleo nasceu da
intuição de um americano chamado George Bissel, que previu que o uso desse
produto teria usos mais importantes do que os até então conhecidos. Em 1851,
Bissel, junto com Eveleth, seu sócio num escritório de advocacia, funda a primeira
empresa dedicada ao petróleo.
131
SOUZA, R. G. op. cit.
94
O passo inicial dessa empresa foi o de contratar a consultoria de um
eminente químico para analisar o petróleo e sugerir utilizações mais nobres que
pudessem ser atrativas economicamente. Benjamin Silliman Jr., professor da
Universidade de Yale, foi o encarregado da empreitada, descobrindo que, ao
destilar o petróleo, o aquecimento diferenciado originava diversos subprodutos,
entre eles o querosene. A análise do querosene mostrou que ele possuía
qualidades muito boas como iluminante, bem melhor que a cara e tradicional vela
e o malcheiroso óleo de baleia.
132
Nesse período, o preço do óleo de baleia,
utilizado para iluminação, começou a aumentar devido ao crescimento do
consumo e à dizimação das baleias. Uma vez encontrada utilização para o
petróleo, era necessário produzi-lo comercialmente.
Embora o consumo do petróleo crescesse vertiginosamente, a
produção tinha saltos desordenados. A superprodução e a escassez alteravam-se
sem nenhum controle. O barril de petróleo, que em 1860 valia vinte dólares, era
vendido um ano depois a dez centavos. Isto colaborou para que os milionários em
um ano se tornassem miseráveis nos outros.
O transporte do petróleo era realizado em barris de madeira levados
da boca do poço para os terminais ferroviários e então distribuídos para os
centros consumidores. Com o crescimento da produção, o número de carroças
utilizadas para o transporte era tão grande que congestionava as precárias
estradas. Com o surgimento dos oleodutos, os carroceiros que levavam o petróleo
ficaram desempregados, a partir disso a sabotagem à nova forma de transporte
foi iniciada, instalando o terror naquelas terras antes pacíficas.
133
O cenário era caótico quando John D. Rockefeller, jovem nova-
iorquino, instalou a pequena refinaria em Cleveland, Ohio, sintetizando os
princípios que regiam a nascente indústria do petróleo, subdividindo-a em quatro
segmentos: exploração/produção, transporte, refino e comercialização.
Rockefeller estabeleceu uma marca confiável, um produto com
padrão de qualidade que os usuários sabiam não ser fraudado. Dentro desse
princípio de padrão de qualidade, fundou em 1870 a sua Standard Oil Company,
chamando para serem seus sócios outros refinadores menores que aceitassem a
132
SOUZA, R. G. op. cit.
133
Id. Ibid.
95
sua filosofia empresarial, guardando para si vinte e sete por cento das ações e o
total domínio administrativo, ou seja, seu objetivo era o monopólio.
134
Uma vez introduzido o uso de derivados de petróleo, este passou a
ser um produto indispensável para as populações de todo o mundo, com o
consumo cada vez mais crescente. Entretanto, existia uma fonte de
abastecimento confiável na América do Norte. As alternativas russas, romenas ou
polacas, únicas conhecidas fora dos Estados Unidos, no final do século passado,
não eram confiáveis por terem produções irregulares, ou por não disporem de um
meio de transporte barato. Por outro lado, não existiam refinarias suficientes para
o abastecimento de um mercado em expansão. Os americanos, por meio da
STANDARD, colocavam os seus produtos no mundo a preços mais baixos e com
melhor qualidade.
135
6.2. No Brasil
Hoje aproximadamente noventa por cento das fontes comerciais de
energia utilizadas no mundo são oriundas de combustíveis fósseis – carvão,
petróleo e gás natural. Entretanto, com exceção do carvão, as reservas destes
combustíveis, com as taxas de utilização atuais, podem não durar mais do que o
tempo de vida das pessoas vivas atualmente.
Segundo Souza, a partir de 1860, o petróleo virou notícia; logo
vieram os cientistas estrangeiros para avaliar o potencial brasileiro. As primeiras
análises não foram otimistas que as costeiras, devido à pequena extensão de
terra firme ou por não apresentarem sedimentos marinhos (únicos geradores de
petróleo, segundo os falsos conceitos à época) não eram muito rentáveis.
As demais bacias interiores eram remotas e aparentemente
insignificantes. Mas, talvez para aqueles sábios, o que mais prejudicava o
potencial brasileiro não estava, precisamente, na geologia desfavorável e sim no
perigo de que se descobrisse uma ocorrência que viesse concorrer com a
produção dos seus patrões, os donos mundiais do negócio.
134
SOUZA, R. G. op. cit.
135
Id. Ibid.
96
Segundo o mesmo autor, após essas concessões pioneiras feitas a
cientistas estrangeiros, segue-se uma fase de diversos registros de direitos para
petróleo: em 1864, na própria Bahia, em Camamu e em Ilhéus; em 1867, nas
bacias costeiras de São Luís e Barreirinhas, no Maranhão; em 1872 e 1874, no
interior de São Paulo, na bacia do Paraná; em 1881, no vale do Paraíba. Em
1882, era inaugurado o abastecimento de gás para a iluminação pública de
Taubaté, São Paulo, graças ao aproveitamento industrial dos folhelhos
betuminosos encontrados na bacia terciária do vale do Paraíba.
De posse de tão valioso parecer técnico, Ferreira Camargo não
mediu gastos para concretizar o seu sonho. Comprou um equipamento de
perfuração, contratou um experiente sondador americano e começou o poço na
estrutura de Bofete. Referido poço foi perfurado em 1892 até a profundidade de
quatrocentos e oitenta e oito metros, sendo o primeiro poço para petróleo
executado no Brasil. Dele, ter-se-iam extraído dois barris de óleo pouco, é
verdade, nem de longe poderia ser chamada de descoberta –, mas o importante
foi que se encontrou óleo no primeiro poço exploratório perfurado no país.
136
Com o advento da República, pouco antes da perfuração do poço de
Bofete, a febre de requisição de concessões sofreu um impacto: a nova
constituição colocava o subsolo como direito do proprietário da terra, repetindo,
assim, a legislação americana.
Ainda nos tempos do regime monárquico, sem qualquer ajuda
governamental, Ferreira Camargo contratou um eminente cientista belga, Dr.
Auguste Collon, para assessorá-lo na pesquisa. O Dr. Collon executou o que se
poderia chamar de primeiro trabalho geológico para petróleo no Brasil prevendo a
sua presença na bacia do Paraná e sugerindo dois sítios nos quais deveriam ser
perfurados poços profundos: Bofete e Porto Martins, no interior de São Paulo.
Dentre as principais tentativas dos órgãos públicos de organizar e
profissionalizar a atividade de perfuração de poços de petróleo no país estão a
criação do Serviço Geológico e Mineralógico Brasileiro (SGMB), em 1907, o
136
SOUZA, R. G. op. cit.
97
Departamento Nacional da Produção Mineral, órgão do Ministério de Agricultura,
em 1933, e as contribuições do Governo do Estado de São Paulo
137
.
A Primeira Grande Guerra trouxe como uma das conseqüências a
conscientização da sociedade brasileira sobre a necessidade de o país possuir as
suas próprias reservas de petróleo. Na Europa, a importância estratégica do
combustível foi demonstrada pelos resultados das batalhas e com o aumento do
consumo, afetando as balanças comerciais dos países que não possuíam
reservas.
Finalmente, no início da década de 1930, dois baianos, Manoel
Inácio Bastos e Oscar Cordeiro, por iniciativa particular, relatavam a ocorrência de
petróleo nos subúrbios de Salvador. Em Lobato, havia uma exsudação de óleo
que incomodava os moradores devido à contaminação das águas dos poços.
Inácio Bastos, investigando a ocorrência, verificou que era petróleo natural a
mazela que prejudicava a população local.
138
O petróleo jorrou no dia 21 de
janeiro de 1939 e logo a seguir foi estabelecida, por proposta do recém-criado
Conselho Nacional do Petróleo, a constituição de uma reserva petrolífera nacional
delimitada por uma circunferência de sessenta km de raio em torno do famoso
poço de Lobato
139
.
O reforço com a criação da Petrobrás, em 1953, melhorou o
desempenho da equipe, mas não foi suficiente para a indústria petrolífera ganhar
impulso. O Brasil continuaria a ser um grande importador de petróleo.
O autor Souza, em sua obra, continua relatando que Walter Link, um
geólogo recém saído da ESSO, foi um dos responsáveis pelos sucessos
internacionais da companhia. Assumindo o posto de chefe da exploração da
Petrobrás logo após a sua criação, foi responsável pela procura de petróleo na
maior área de concessão de uma só companhia de todo o mundo. Ninguém
jamais tivera sob o seu domínio exclusivo tamanha extensão de bacias
sedimentares. Entretanto, tal imensidão constituía-se num enorme deserto de
informações (quase nada se sabia sobre a maior parte da sua geologia).
137
VOGT, C. COMCIÊNCIA. op. cit.
138
SOUZA, R. G. op. cit.
139
LEITE, A. Dias. op. cit.
98
A primeira providência de Link foi organizar os trabalhos feitos pelo
Conselho, utilizando como modelo a ESSO. Todos os trabalhos passaram a ser
padronizados; relatórios periódicos tornaram-se obrigatórios, todos com tópicos
preestabelecidos; manuais para cada especialidade obrigavam os especialistas a
trabalhar dentro de um mesmo estilo. Este sistema era eficiente desde que o
arquivamento de dados permitisse o cil acesso às informações e impedisse a
perda da memória técnica. Os geólogos passaram a se especializar aprimorando
a qualidade do trabalho desenvolvido.
Houve a centralização nos escritórios do Rio de Janeiro, onde foram
traçadas as diretrizes exploratórias, ficando com os distritos os trabalhos
operacionais. Esse modelo de organização era apropriado para um sistema de
livre concorrência, mas para o Brasil, onde o sistema era de monopólio, a
centralização impedia a livre concorrência de idéias.
As notícias de descobertas no mar, em diversas partes do mundo,
ganhavam destaques nas publicações especializadas. O sucesso exploratório no
golfo do México, nos Estados Unidos, servia como exemplo para os exploradores
de todo o mundo, principalmente para os brasileiros, que tinham a indústria
americana como modelo. A idéia de exploração na costa estava sendo difundida e
poderia ser uma opção para os problemas petrolíferos brasileiros.
Com Carlos Walter Campos na presidência da Petrobrás, a
plataforma de perfuração marítima iniciou em 1968 suas atividades na costa do
Espírito Santo, com um poço cujo objetivo era descobrir se as feições perfurantes
na seção sedimentar eram causadas por diapirismo
140
salino ou por intrusões de
rochas ígneas. Foi encontrado sal, o que era significativo. Em seguida, a sonda
dirigiu-se para Sergipe, onde, naquele mesmo ano, perfurou o poço Sergipe
Submarino n.º 1, encontrando óleo, uma jazida pequena, mas foi o primeiro poço
na plataforma continental a encontrar petróleo.
141
Entre 1969 e 1973, o uso do petróleo na geração termelétrica
cresceu a uma taxa média de dezenove por cento ao ano, chegando a constituir
vinte e seis por cento de toda a geração de eletricidade no mundo. Em alguns
países, como o Japão, Dinamarca, Itália, Irlanda e Portugal, chegaram a
140
Dobra anticlinal em que o núcleo perfura as camadas superiores.
141
SOUZA, R. G. op. cit.
99
representar sessenta por cento. Aproximadamente quatro quintos da capacidade
instalada em plantas termelétricas a óleo diesel ou combustível estão
concentrados em seis países, entre os quais Estados Unidos e Japão, que
somam juntos cinqüenta e cinco por cento da capacidade instalada no mundo.
Entre outros, destacam-se a Itália e o México, onde os derivados de petróleo
representam cerca de cinqüenta por cento de toda a energia elétrica gerada.
142
Um marco na história da Petrobrás foi a decisão de explorar petróleo
no mar. Em 1969, foi descoberto o campo de Guaricema, em Sergipe. Entretanto,
foi em Campos, no litoral fluminense, que a Petrobrás encontrou a bacia que se
tornou a maior produtora de petróleo do país. O campo inicial foi o de Garoupa,
em 1974, seguido pelos campos gigantes de Marlim, Albacora, Barracuda e
Roncador.
143
Após a inversão dos motores a diesel para gasolina, o petróleo
ganhou maior dimensão no cenário mundial. Em 1970, o consumo mundial de
petróleo para o transporte (óleo diesel, óleo combustível e gasolina) foi de doze
milhões e trezentos e quarenta e quatro mil tep (toneladas equivalentes de
petróleo), enquanto o setor energético consumiu um milhão e trezentos e noventa
e sete mil tep
144
, o que tornou grande propulsor da economia. Em 2003, sessenta
e seis por cento da energia elétrica produzida no mundo era proveniente de
combustíveis fósseis.
145
Em 1973, em conseqüência disso, o barril de petróleo subiu de dois
vírgula noventa dólares (em setembro) para onze vírgula sessenta e cinco dólares
(em dezembro), afetando também o Brasil
146
.
Reagindo a isso, em 1981, o governo americano liberou o preço do
petróleo, causando, assim, um aumento na produção do país. No resto do mundo
há o desenvolvimento de novas fontes de energia.
142
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
143
PETROBRÁS. Disponível em: <http://www2.petrobras.com.br/portugues/index.asp>.
144
BALANÇO ENERGÉTICO NACIONAL (BEN). Disponível em:
<www.ben.epe.gov.br/BEN2007.anexos.atpx>.
145
Instituto de Energia Atômica.
146
DW-World.De, DEUTSCHE WELLE. 1973: crise do petróleo pára o trânsito na Alemanha.
Disponível em: <www.dw-World.de/dw/article/0,2144,681185,00.html>.
100
Com estas medidas o preço do petróleo começa a cair, em 1986
caiu para um terço do valor de 1981. Quando o Iraque invadiu o Kuwait, em 1990,
o preço do barril tem nova alta, desta vez atingindo o maior preço do mercado
mundial em oito anos.
A partir de 2002, a Petrobrás ampliou sua área de prospecção,
buscando novas frentes exploratórias nas bacias de Santos e Espírito Santo e em
bacias ainda pouco exploradas em suas águas profundas, como as localizadas na
costa sul da Bahia, Sergipe, Alagoas e da margem equatoriana brasileira. O ano
de 2003 foi considerado um marco na história da Petrobrás. Além do expressivo
volume do petróleo descoberto, foram identificadas novas províncias de óleo de
excelente qualidade, gás natural e condensado, permitindo que as reservas e a
produção da companhia começassem a mudar para um perfil de maior valor no
mercado mundial de petróleo
147
.
No Brasil, de acordo com a Agência Nacional de Petróleo, as
reservas provadas em terra eram de 1.354,73 milhões de barris e no mar, de
14.777,57 milhões de barris e as reservas brasileiras somam 16.132,30 milhões
de barris. As reservas de gás natural são da ordem de 454.453,54 milhões de
metros cúbicos. Cerca de noventa por cento das reservas estão localizadas no
mar, principalmente na bacia de Campos, Estado do Rio de Janeiro.
148
6.3. Obtenção do combustível
O petróleo é uma mistura de óleo cru, gás natural em solução e
semi-sólidos asfálticos espessos e pesados. Todos os depósitos de petróleo
contêm gás natural, mas nem todos os depósitos de gás natural contêm óleo.
O petróleo bruto deve passar por uma série de estágios durante o
processo de refinação para que seja convertido em produtos úteis. tipos leves
e claros como a gasolina, outros marrons, amarelos, verdes, alguns ainda pretos
e outros verde-escuros. Petróleos ácidos ou acres são os que possuem
147
PETROBRÁS. Espaço conhecer. Disponível em: <www.petrobrás.com.br/portugues/index.asp>.
148
AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS. ANP.
Disponível em: <http://www.anp.gov.br/>.
101
compostos de enxofre em alta porcentagem, tendo odor peculiar, contendo gás
sulfídrico em concentração acima de trezentos e oitenta ml por cem litros, sendo
perigosamente tóxicos. os óleos doces não contêm gás sulfídrico, pois contam
com baixo teor de enxofre.
149
O petróleo é extraído, de forma comum ou primária, por dutos que
vão do poço a a superfície da terra ou mar, dependendo da localização da
jazida, e é bombeado até a superfície ajudado pela mobilidade do líquido e, por
sua pressão interna. Para ser extraído por esse método, é necessário que haja
gás dissolvido no óleo para que este borbulhe acima das camadas de óleo e de
água. Desta forma, são recuperados de quinze a vinte por cento do volume original de
óleo do reservatório, sendo esta a forma de extrão priria.
150
A partir daí, se utiliza a forma secundária, com aplicação de outras
técnicas de retirada do petróleo existente na jazida. Um método muito utilizado
consiste em injetar água pressurizada no poço, fazendo com que o óleo flutue,
pois sua densidade é inferior à da água, facilitando assim a retirada deste. A água
destinada à injeção pode ser doce ou salgada; é indispensável, porém, que seja
limpa. Para isso se faz a filtragem, que visa à eliminação de sólidos em
suspensão, bem como do tratamento com produtos químicos bactericidas e
inibidores de corrosão.
151
O método mais comum de extração terciária é utilização de
processos térmicos. A injeção de vapor d’água no poço aquece e diminui a
viscosidade do óleo, facilitando o seu bombeamento. Pode ser de injeção cíclica,
que consiste em injetar vapor no poço produtor (cerca de uma semana), fechá-lo
durante alguns dias para se dar a troca de calor com a jazida e colocá-lo em
atividade por vários meses, até quando a vazão do petróleo começar a declinar. A
operação deve ser repetida enquanto o aumento de produção compense os
gastos. Pode haver também a injeção contínua de vapor neste processo que é
semelhante ao da injeção de água.
152
Outro método é o que envolve a injeção de gás carbônico ou
nitrogênio diretamente no petróleo, para aumentar a pressão no reservatório e
149
NEIVA, J. Conheça o petróleo. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1986.
150
Id. Ibid.
151
Id. Ibid.
152
Id. Ibid.
102
liberar o produto da rocha. Outra forma também empregada é a utilização de
produtos químicos, tais como polímeros em vez de gases, para forçar as
moléculas dos componentes de petróleo para fora das rochas do reservatório. Na
figura abaixo, mostramos os três processos de extração / recuperação do
petróleo:
Figura 01 - Processo de Extração / Recuperação do Petróleo
103
Os processos normalmente empregados nas refinarias modernas
para o processamento do petróleo são: destilação, craqueamento, polimerização,
alquilação, dessulfurização, dessalinização, desidratação e hidrogenação.
153
A destilação separa as frações do petróleo usando para isso os seus
diferentes pontos de ebulição. O petróleo é inicialmente aquecido e depois entra
numa torre de fracionamento. Os diversos derivados de petróleo são
condensados a diferentes temperaturas na torre para serem coletados. Os
produtos mais pesados se acumulam na parte inferior, enquanto que a gasolina
bruta é condensada no topo.
154
Os vapores, ao se elevarem, condensam-se nos pratos
correspondentes a temperaturas de condensação. Esse resíduo é então
reaquecido e levado para outra torre, onde seu fracionamento ocorrerá a uma
pressão abaixo da atmosférica. Nesta torre é extraída mais uma parcela de óleo
diesel e um produto chamado, genericamente, de gasóleo, que não constitui um
produto pronto.
155
Ele serve como matéria-prima para a produção de gases
combustíveis, gasolinas e outros. As frações de ponto de ebulição mais elevadas
são retiradas pelo fundo da torre, na forma de asfalto. Esses poderão ser usados
para o craqueamento catalítico ou, ainda, processados para a fabricação de óleos
lubrificantes.
156
Nessa etapa são extraídos, por ordem crescente de densidade,
gases combustíveis, GLP
157
, gasolina, nafta, solventes e querosene, óleo diesel e
um óleo pesado, chamado resíduo atmosférico, que é extraído do fundo da torre.
Na próxima figura, temos o esquema dos produtos obtidos pelo refino.
153
PETROBRÁS. Disponível em: <http://www2.petrobras.com.br/portugues/index.asp>.
154
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
155
PETROBRÁS. Disponível em: <http://www2.petrobras.com.br/portugues/index.asp>.
156
NEIVA, J. op. cit.
157
Gás liquefeito de petróleo.
104
Figura 02 - Produtos Obtidos Pelo Refino
Fonte: Hinrichs, Roger A.
A maior parte dos derivados que saem da torre sofrem um
tratamento químico e/ou térmico posterior, para fornecer produtos tais como a
gasolina, óleo para aquecimento, combustível de aviação, óleo diesel, parafinas e
asfalto.
158
A produção da refinaria pode ser ajustada de acordo com o consumo
e a necessidade da indústria química, que precisa de insumos tais como metano,
etano, benzeno e tolueno. Estes são utilizados na produção de fertilizantes
plásticos, solventes, náilon, borracha sintética, etc.
159
No craqueamento a quebra das moléculas de hidrocarbonetos
pesados, convertendo-as em gasolina e outros destilados com maior valor
comercial.
O objetivo do processo de polimerização é produzir gasolina com
alto teor de octano, que possui elevado valor comercial.
Olhando o petróleo como fonte de energia, parece-nos que só nos
traz coisas aproveitáveis, mas essa afirmativa o é cem por cento assertiva,
visto os males que sua exploração causa ao meio ambiente.
158
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
159
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
105
6.4. Política energética nacional e proteção ambiental
O ano de 2001 foi marcado por uma importantíssima alteração nos
hábitos de consumo de energia dos brasileiros, pois nele ocorreu o fenômeno que
ficou conhecido como apagão. O apagão foi o nome popular de um grave
problema de abastecimento de energia elétrica, conseqüência de vários e
diferentes fatores políticos, sociais, econômicos e climatológicos. Após este
incidente, a produção e o consumo de energia se tornaram uma das questões
ambientais mais relevantes e, qualquer que seja a configuração da matriz
energética de um país, as suas repercussões sobre o meio ambiente serão
sempre importantes e significativas.
Prova dessa importância é a Lei n. 9.478
160
, de agosto de 1997,
principal norma jurídica nacional que dispõe sobre a política energética nacional.
Mas cabe aqui pequena ressalva, que esta lei está voltada fundamentalmente
para o setor petrolífero do grande complexo energético que compõe a nossa
matriz. A mencionada lei dispõe sobre a política energética nacional, as atividades
relativas ao monopólio do petróleo e institui o Conselho Nacional de Política
Energética (CNPE) e a Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Em momento oportuno, num item próprio, discutiremos sobre a
energia no sistema constitucional brasileiro.
160
Lei anexada ao presente estudo.
106
7. ENERGIA TERMELÉTRICA
O processo de formação dos combustíveis fósseis decorre do
soterramento de florestas, mares e grandes lagos, juntamente com suas plantas e
animais e pela ação decompositora de bactérias que necessitam de pouco ou
nenhum oxigênio para sobreviver.
Este processo de decomposição durou milhares de anos e contava
com condições muito particulares que, provavelmente, não se repetirão. Pode-se
atribuir idade às jazidas petrolíferas, às mais novas, a existência de dez milhões
de anos e, às mais antigas, cerca de quatrocentos milhões
161
.
Os combustíveis sseis são normalmente constituídos por longas
cadeias de hidrocarbonetos, isto é, moléculas de carbono e hidrogênio, enxofre e
alguns metais, formados por reações químicas que servem de reserva de energia
solar.
Existem reservas de carvão, petróleo e gás natural que podem
ocorrer à presença de dois elementos, por exemplo, petróleo e gás natural,
caracterizados por serem de mais fácil extração.
Por mera curiosidade, lembramos que existem outras formas de
combustíveis fósseis, tais como a turfa, óleo de xisto e alcatrão, menos
conhecidos e menos utilizados por influência de fatores econômicos e
tecnológicos.
Todos os depósitos de petróleo contêm gás natural, mas nem todos
os depósitos de gás natural contêm o óleo. Ele também contém pequenas
porcentagens de compostos de vanádio, níquel e enxofre.
162
O petróleo é encontrado nas rochas-reservatório, tais como arenito e
basalto, que são porosas e absorvem assim o petróleo. Importante se faz que
este reservatório tenha como cobertura uma camada de rocha impermeável ou
mesmo rocha não porosa, impedindo assim o escape do petróleo para a
superfície.
161
NEIVA, J. op. cit.
162
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
107
Pois bem, o peso de uma camada sedimentar sobre a outra causa a
compressão do líquido e do gás, compressão esta que origina o escoamento do
petróleo de um local para outro, através dos poros ou fraturas da rocha, devido a
sua fluidez.
163
Fonte: Neiva, 1986.
Figura 03 – Jazida de Petróleo com Poço de Extração.
A migração através das argilas é extremamente vagarosa, sendo
comparável a uma ultrafiltração. As moléculas de menor tamanho e mais leves
precedem as pesadas e as grandes. Assim, são originados os depósitos de
condensado (nafta levemente amarelada, quase pura) existentes no Irã (Pérsia
antiga), admitindo-se, para sua formação, muitos milhares de séculos de
filtração.
164
Na figura abaixo, temos uma jazida de petróleo que está próxima à
superfície e existe um lençol d’água na sua parte inferir, a título de ilustração.
163
NEIVA, J. op. cit.
164
Id. Ibid.
108
Fonte: Neiva, 1986.
Figura 04 – Jazida de Petróleo.
Existem vários lugares do mundo em que é mais favorável a
ocorrência do petróleo, tais como o Oriente dio, nas proximidades do
Mediterrâneo, o golfo rsico e o golfo do México, os mares Vermelho, Cáspio e
Negro, o Irã, o Iraque, a Arábia Saudita e o Kuwait.
165
As reservas são divididas, normalmente, em comprovadas – aquelas
passíveis de produção a partir de reservatórios conhecidos, sob condições
econômicas e tecnológicas existentes; as indicadas são quantidades
recuperáveis de jazidas conhecidas a partir do melhoramento das técnicas de
recuperação e as inferidas – são os depósitos esperados em jazidas identificadas,
porém ainda não qualificadas.
166
7.1. Funcionamento de uma termelétrica
As usinas termelétricas utilizam combustíveis do tipo fóssil (carvão
mineral e os derivados do petróleo, como o óleo ou o gás natural), nucleares
(elementos radioativos: urânio, tório, plutônio) e biomassa (extraído de florestas
energéticas e do bagaço de cana-de-açúcar) como fonte de energia elétrica.
O funcionamento básico se faz pela queima do combustível que
aquece a água que passa através de tubos por dentro do forno transformando-se
em vapor e é encaminhada à turbina e a faz girar transformando o calor em
energia cinética. A água que vai até o forno pertence ao circuito primário, que é
165
NEIVA, J. op. cit.
166
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
109
fechado. Depois de passar pela turbina a água é resfriada no condensador, e este
utiliza a água do circuito secundário.
Em usinas com turbina a gás, o gás de combustão é usado
diretamente para girar a turbina e em seguida é liberado para o ar
167
.
O processo de funcionamento de uma termelétrica dá-se da seguinte
maneira: o combustível é queimado na fornalha da caldeira, nas superfícies de
aquecimento há a transformação da água em vapor. Esta deixa a caldeira a
temperaturas acima de quinhentos graus Celsius e entra na turbina, passando por
bicos injetores.
168
O vapor condensa nas superfícies dos tubos condensadores, sendo
o calor latente removido utilizando água de resfriamento de uma fonte fria que é
levada ao condensador pelas bombas de circulação
169
.
O vapor a alta velocidade atinge as lâminas da turbina, fazendo girar
um eixo ou rotor sobre o qual são montadas espirais. À medida que o vapor
atravessa a turbina, sua pressão e densidade diminuem, de forma que as lâminas
progressivamente maiores são necessárias para capturar a energia decrescente
do vapor.
170
Este vapor do circuito primário, que está em alta pressão, se
expande para uma pressão menor do que a atmosférica, fazendo girar a turbina,
acionando, assim, o gerador elétrico. Após isto, condensa-se o vapor, que está a
uma temperatura de aproximadamente quinhentos graus Celsius, transferindo o
resíduo da energia térmica para um circuito de refrigeração ou torre de
resfriamento, que faz a água retornar ao início do ciclo.
A água morna condensada é devolvida ao rio ou lago ou passa por
uma torre de resfriamento, com um aumento de temperatura de aproximadamente
dez graus Celsius acima da temperatura ambiente.
167
ISHIGURO, Y. A energia nuclear para o Brasil. São Paulo: Makron Books, 2002.
168
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
169
LORA, E. E. S; NASCIMENTO, M. A. R. Geração termelétrica: planejamento, projeto e
operação. Rio de Janeiro: Interciência, 2004.
170
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
110
Por causa dos impactos ecológicos da poluição térmica, leis
recentes determinaram que outros métodos para a disposição de resíduos de
calor devem ser utilizados, em vez da descarga direta no ecossistema aquático.
7.2. Termelétrica a carvão
O uso de carvão mineral antecede o cristianismo, os povos da
antiguidade já o utilizavam para diferentes finalidades.
Foram encontradas gravações que indicavam a existência de um
material conhecido como “carvão vegetal de rocha” ou “carvão vegetal gelado”
que era usado em 1.100 a.C. para fundir o ferro e o cobre
171
.
O betume era largamente utilizado no mundo antigo, sendo
empregado na fabricação de esquifes, cisternas, esgoto e até mesmo na
iluminação noturna: as tochas que ardiam nas residências, ou mesmo nas ruas
das cidades egípcias, eram construídas de feixes de palha embebidos de
petróleo. Na cremação dos mortos, os corpos eram untados de betume, o que
facilitava o trabalho das chamas.
172
O piche de asfalto era utilizado no antigo
Egito e Babilônia por volta de 2.500 a.C. para a impermeabilização e vedação; os
gregos e os romanos o usavam para fundir as suas armas, por causa do seu alto
poder calorífico. Os chineses perfuravam poços atrás de petróleo e gás antes de
1.000 a.C. e o utilizavam para aquecimento e iluminação.
173
O carvão é uma substância orgânica, formada basicamente pelo
carbono e variando as proporções de hidrogênio, oxigênio, nitrogênio e enxofre.
(Lindberg & Provorse, 1980).
O soterramento de grandes florestas na era paleozóica, de período
carbonífero, formou uma camada em que a decomposição vegetal, deposição e
soterramento, dos movimentos da crosta terrestre e das forças da erosão,
171
LINDBERG, K.; PROVORSE, B. Coal: a contemporary energy story. New York: Mc Graw-Hill,
1980.
172
NEIVA, J. op. cit.
173
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
111
originaram o carvão. Por comparação, acredita-se que os produtos de petróleo
são derivados da compressão de resíduos de organismos marinhos.
174
São quatro os tipos de carvão, classificados de acordo com a
quantidade de carbono: os lignitos o os carvões mais jovens, com alto teor de
água e baixo poder calorífico; os sub-betuminosos possuem pouco enxofre e o
custo da mineração é relativamente baixo, porém ainda possui alto teor de água;
os betuminosos, mais abundantes, com alto poder calorífico, possuem alto teor de
enxofre, mais de dois por cento em massa, e o antracito, com alto poder
calorífico, é muito duro, não produz poeira nem fuligem e sua queima é mais
demorada.
As jazidas de carvão podem ser de dois tipos: as minas a céu aberto
e as subterrâneas, dependendo da formação da jazida, com determinação por
parâmetros geológicos. Somente o depósito que ocorre relativamente próximo à
superfície é usado como mina a céu aberto.
As minas a céu aberto têm um custo menor e um melhor
aproveitamento do carvão do que as subterrâneas. Em minas a céu aberto,
utiliza-se o método de lavra em tiras e sua produtividade é oito vezes maior do
que a de minas subterrâneas.
As minas subterrâneas têm custo de operação às vezes muito
próximo das de céu aberto, porém o valor total de seu produto é maior. A mão-de-
obra para esse tipo de empreendimento deve ser especializada.
No Brasil, foram descobertas reservas em 1795, na região do baixo
Jacuí, Rio Grande do Sul, por técnicos ingleses que construíam ferrovias. O
carvão ocorre associado a folhelhos, siltitos e arenitos da formação do rio Bonito
do período perminiano. A bacia carbonífera de Candiota, no Rio Grande do Sul, é
a maior de todas e conta com cerca de doze vezes dez à nona toneladas de
carvão essencialmente utilizado como carvão energético.
As principais características do carvão brasileiro são: o elevado teor
de inertes; a alta velocidade de queima; a elevada reatividade; baixo poder
calorífico, conferindo a ele baixa qualidade. Por possuir muito enxofre sua queima
174
LINDBERG, K.; PROVORSE, B. op. cit.
112
gera muita cinza. Para cada quilo de carvão nacional queimado, ele produz meio
quilo de cinza e gera um kWh
175
.
No Brasil, o carvão mineral é encontrado em cinco grandes regiões:
alto Amazonas, rio Fresco, Tocantins-Araguaia, Piauí ocidental e Brasil
meridional
176
.
As termelétricas a carvão são responsáveis por quase quarenta por
cento da energia total gerada no mundo.
O carvão é triturado avirar um fino e é soprado para dentro da
fornalha conectada a um gerador de vapor. Ali ele se mistura com o ar pré-
aquecido e queima para liberar a energia utilizada na produção de vapor.
177
Após
isto, o processo é igual às outras usinas termelétricas.
O carvão mineral, para ser utilizado em usinas térmicas, precisa
passar por um pré-tratamento caro e complexo, a pulverização, pois sem isso
haverá a emissão de óxidos de enxofre, óxido de nitrogênio e particulados, e
exige também a instalação de sistema de limpeza de gases
178
. Após os gases de
combustão resfriados deixarem a fornalha, passam por dispositivos de controle de
poluição antes de serem liberados na atmosfera através de altas chaminés.
179
As usinas termelétricas brasileiras são instaladas próximas a jazidas
de carvão, fazendo com que o custo de geração e o impacto ambiental sejam
minimizados, pois não perda do produto no transporte, diminuindo o risco de o
material cair, contaminando o local.
O Brasil possui as seguintes usinas térmicas a carvão: o complexo
termelétrico Presidente Médici; a termelétrica de São Jerônimo; a de Nutepa; a de
Charqueadas, todas no RS; a Jorge Lacerda em SC e a de Figueira (PR). O Brasil
tem 1.644 mW gerados por térmicas a carvão.
175
Kilowatt por hora.
176
REIS, L. B. Geração de energia elétrica: tecnologia, inserção ambiental, planejamento,
operação e análise de viabilidade. São Paulo: Manole, 2003.
177
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
178
LORA, E. E. S; NASCIMENTO, M. A. R. op. cit.
179
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
113
7.3. Impactos ambientais das térmicas a carvão
A lavra a céu aberto provoca, de imediato, impacto visual,
modificando a paisagem local. Ocorrem, associados aos problemas de erosão,
geração de poeiras, ruídos, vibrações e gases emanados das detonações e
deposição de rejeitos e estéril.
As minas a céu aberto provocam impactos ambientais no lençol
freático, conflitos no uso da terra, danos à saúde dos trabalhadores, a poluição de
águas superficiais, além da poeira e material particulado emitidos.
Secundariamente, esse conjunto de atividades pode causar problemas na água
em torno da mineração decorrentes da drenagem ácida da mina, sedimentação,
poluentes químicos, metais-traço e sólidos dissolvidos ou suspensos.
Em minas subterrâneas os impactos o menores, porém
significativos. Pode-se realçar a subsidência do terreno, a alteração do regime
hidrológico com rebaixamento do lençol freático, a geração de vibrações
ocasionadas pela detonação dos explosivos, poeiras, gases e liberação de
metano no subsolo, deposição de estéril e rejeito na superfície. A remoção do
material pode causar pequenos terremotos ou desmoronamentos.
As explosões ocorridas em minas subterrâneas devem-se à alta
concentração de metano.
A mineração do carvão pode alterar o suprimento de água local, bem
como a drenagem desta. Em decorrência disto, as áreas onde houve minas a céu
aberto de exploração de carvão podem não ser viáveis ao reflorestamento, ou
melhor, à recuperação da área com vegetação, por ausência de água. Neste
caso, um gravame, o carvão se combina com oxigênio e o vapor de água da
atmosfera e forma o ácido sulfúrico, responsável pela chuva ácida.
A chuva ácida pode ter muitos efeitos nocivos, incluindo a
acidificação dos lagos (com o declínio significativo da população dos peixes e
outros tipos de vida aquática) e danos à vegetação das florestas, corrosão de
construções e, possivelmente, danos à saúde humana.
180
180
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
114
O carvão contém até seis por cento de enxofre em seu peso, e a sua
queima responde pela maior parte das emissões de dióxido de enxofre,
aproximadamente vinte milhões de toneladas por ano.
181
Tanto as cinzas leves, conhecidas como “fly ash”, quanto as
pesadas, “bottom ash”, e as volantes emitidas são altamente poluidoras e
contaminantes do solo, da água e do ar. O lançamento de óxido de enxofre pelas
chaminés das usinas contamina o ambiente e os corpos d’água. As pilhas de
carvão a serem queimadas contaminam não somente o lençol freático, mas
também o ar.
7.4. Termelétricas a gás
O gás natural é formado por hidrocarbonetos leves que, à
temperatura e pressão atmosféricas ambientes, permanecem em estado gasoso.
Assim como o petróleo bruto, ele é formado a partir da decomposição de matéria
orgânica.
Na natureza, ele é originariamente encontrado em acumulações de
rochas porosas no subsolo (terrestre ou marinho).
Pode ser descoberto de duas formas: associado e não-associado. O
primeiro é quando ele está junto com petróleo na jazida, neste caso, tem que ser
separado; enquanto que, no segundo caso, a jazida contém o gás, existindo
pouca ou nenhuma quantidade de óleo.
Tem em sua composição também etano, propano, butano, metais
pesados, nitrogênio, água, ácido clorídrico, metano, algumas impurezas, dióxido
de carbono e gás sulfídrico que são removidos antes da comercialização.
O primeiro poço perfurado nos Estados Unidos em busca de gás
natural, em 1821, ficava próximo às margens do lago Erie, em Freedonia, Nova
York. Porém, antes que a indústria pudesse se expandir, era necessário que
gasodutos fossem desenvolvidos para que o combustível chegasse ao
consumidor.
181
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
115
Do final da Segunda Guerra até os anos setenta, o uso de gás
natural nos EUA teve um crescimento fenomenal. O consumo quadruplicou entre
1950 e 1970, o que representa o dobro da taxa de crescimento do consumo de
petróleo
182
.
Quando da crise de petróleo, em 1973 e 1979, o gás passou a
substituí-lo em algumas aplicações.
O gás natural é de baixo custo, tem queima limpa e alta
disponibilidade. Trata-se de um ótimo substituto do petróleo, além de ter muitos
usos: calefação, aquecimento de água, como combustível de caldeiras (industriais
e utilitárias), no transporte, e como matéria-prima para a indústria química.
Aproveitando as datas acima mencionadas, peço venia para um
pequeno parêntese.
7.5. Antecedentes históricos do gás no Brasil
A indústria do gás no Brasil iniciou-se no século XIX com a produção
de gás a partir do carvão, principalmente para a iluminação pública. Nessa
primeira fase, foram construídas empresas como a CEG (distribuidora de gás da
cidade do Rio de Janeiro) e a Comgás (hoje a principal distribuidora do Estado de
São Paulo). Todavia, com a introdução da eletricidade, em 1882, a expansão da
indústria a gás foi detida. A exceção ficou por conta do GLP (gás liquefeito do
petróleo), produzido a partir do petróleo e usado quase exclusivamente para a
cocção nos centros urbanos, que apresentou importante expansão ao longo do
século XX, atingindo uma penetração superior a noventa por cento dos lares
brasileiros
183
.
No final dos anos 1970 e início dos anos 1980, foram ensaiadas
algumas tentativas de introdução do gás natural na matriz energética brasileira.
Destacando-se, entre outras, o início da oferta de gás nacional, produzido em
associação com o petróleo fornecido tanto pelo sudeste como pelo nordeste do
182
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
183
SANTOS, E. M.; FAGÁ, M. T. W.; BARUFI, C. B.; POULALLION, P. L. Gás natural: a construção
de uma nova civilização. Estudos Avançados, São Paulo, v. 21, n. 59, jan./abr. 2007.
116
país. Houve, igualmente, as negociações frustradas da Comgás para a
importação de GNL (gás natural liquefeito) da Argélia. No início dos anos 1980, a
Confederação Nacional da Indústria (CNI) estimulou o uso do gás pelas
indústrias. Porém, foi no início da década de 1990 que o Brasil despertou
novamente para o potencial do gás.
Apesar da concorrência com seu principal negócio, a venda de
derivados de petróleo, a Petrobrás Petróleo Brasileiro S.A. passou a dar mais
relevância para a produção e o suprimento de gás. A companhia encontrou mais
reservas de gás nas bacias sedimentares brasileiras e valorizou economicamente
esse recurso natural por meio de investimentos específicos em infra-estrutura e
na criação de uma demanda para o gás.
A partir de 1990, o Brasil também assumiu compromissos mais
firmes com a integração econômica regional, principalmente com a criação da
zona de livre-comércio do Mercosul. Essa abertura política se materializou com a
construção de um gasoduto concentrado na Bolívia e no Brasil, o Gasbol.
Figura 05 – O Gasbol e seu papel integrador entre o Sistema de Gasodutos das regiões sul,
sudeste e centro-oeste do Brasil com os demais países do cone sul.
117
Posto isto, voltemos ao ponto ora em análise.
As máquinas de combustão a gás podem ser: máquinas a pistão e
máquinas sem pistão, conhecidas como ciclo de Brayton. Atualmente, as maiores
turbinas a gás chegam a trezentos e trinta mW de potência e os rendimentos
térmicos atingem quarenta e dois por cento
184
.
O gás natural é recebido via gasoduto e é usado imediatamente, a
uma taxa determinada pela demanda de eletricidade. Não é necessária a
armazenagem.
185
No setor elétrico o uso mais generalizado dessa tecnologia ocorreu
somente nos últimos quinze ou vinte anos. Ainda assim, com restrições de oferta
de gás natural, pois seu baixo rendimento térmico nas turbinas e os custos de
capitais relativamente altos foram, durante muito tempo, as principais razões para
o baixo grau de difusão dessa tecnologia no âmbito do setor elétrico.
As principais propriedades do gás natural são a sua baixa densidade
em relação ao ar, o baixo poder calorífico, os baixos teores de carbono, dióxido
de carbono, hidrogênio, oxigênio e compostos sulfurosos. Outras características
intrínsecas importantes são os baixos índices de emissão de poluentes, em
comparação a outros combustíveis fósseis, rápida dispersão em caso de
vazamento, os baixos índices de calor e de contaminantes.
186
O gás natural tem aumentado seu papel estratégico como fonte de
energia para o mundo, principalmente em razão de seu menor impacto ambiental
em comparação com as demais fontes fósseis.
Outra vantagem deste tipo de geração de energia é que o gás
possibilita uma combustão com elevado rendimento térmico, bem como controle e
regulagem simples da chama
187
e o fato de as usinas poderem ser construídas
próximas ao mercado consumidor. As desvantagens são os altos custos da
matéria-prima, que o gás é um derivado do petróleo, e o alto consumo de água
para o resfriamento.
184
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Banco de Informação de Geração.
Disponível em: <www.aneel.gov.br/15.htm>.
185
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
186
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
187
SANTOS, E. M.; FAGÁ, M. T. W.; BARUFI, C. B.; POULALLION, P. L. op. cit.
118
Ainda em relação a outros combustíveis fósseis, o gás natural
apresenta maior flexibilidade, tanto em termos de transporte como de
aproveitamento.
188
Entre as vantagens adicionais da geração termelétrica a gás
natural estão o prazo relativamente curto de maturação do empreendimento e a
flexibilidade para o atendimento de cargas de ponta.
As unidades de geração movidas a gás são menos danosas ao meio
ambiente, elas praticamente não produzem dióxido de enxofre e apenas um terço
de dióxido de carbono quando comparado com o emitido em uma usina do
mesmo porte movida a carvão. Com o crescimento e o desenvolvimento industrial
um aumento no uso dos combustíveis. Com isso, temos uma piora na
qualidade do ar, devido à emissão em grande quantidade de dióxido de enxofre e
particulado
189
.
No Brasil, especialmente em razão de uma política de preços e de
diferenças tributárias entre os combustíveis, o gás natural apresentou um grande
aumento de consumo para fins automotivos, em especial nas frotas de táxi,
substituindo a gasolina. Entre janeiro de 2001 e novembro de 2006, o consumo de
gás natural veicular (GNV) aumentou um rgula trinta e cinco milhão para seis
vírgula setenta e um milhões de metros cúbicos, representando um crescimento
anual de aproximadamente trinta e oito por cento
190
.
As termelétricas que funcionam com turbinas a gás de ciclo
combinado geram em torno de quarenta por cento mais eletricidade, com a
mesma quantidade de combustível, que o sistema de geração convencional.
A vantagem da geração termelétrica é o seu custo de produção ser
relativamente baixo. Quando a necessidade de aumento rápido na produção,
por ocasião de um pico de consumo, esta é uma operação que pode ser
executada, desde que a capacidade instalada permita.
O inconveniente das turbinas a gás é a sua sensibilidade às
condições climáticas, principalmente à temperatura ambiente, e seu rendimento é
comprometido quando têm que trabalhar com carga baixa.
188
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
189
LOPES, J. L.; MANDUJANO, C. Estimation of the impact in the air quality by the use of clean
fuels (fuel oil versus natural gás). Catalysis Today, n. 106, 2005.
190
REVISTA Brasil Energia, 2006.
119
Porém, ela possui um alto custo de operação e o combustível
depende da oferta no mercado, e, quando importado, da cotação do dólar.
As principais usinas de ciclo simples são: Três Lagoas, UTE
Camaçari, UTE Campos, Juiz de Fora, Eletrobolt, Macaé Merchant, Termobahia,
Termoceará e Termopernambuco.
E as de ciclo combinado são: Nova Piratininga, Canoas, Araucária,
Cuiabá, Termorio, Norte Fluminense, Piratininga, Uruguaiana, Fortaleza.
7.6. Impactos ambientais das termelétricas a gás
O gás natural oferece risco de acidente principalmente nas etapas
de extração (exploração/perfuração/produção) e devido aos possíveis
vazamentos na rede de distribuição, geralmente com ocorrência de explosões
191
.
No processo de geração de energia elétrica com gás natural, a
combustão é o principal responsável pela emissão de poluentes.
Quando a turbina opera com baixa carga, uma emissão maior de
hidrocarbonetos e monóxido de carbono, contudo a emissão de fumaça e óxidos
de nitrogênio é insignificante. Contudo, quando a potência chega ao máximo, a
emissão de hidrocarbonetos e monóxido de carbono é baixa, entretanto os óxidos
de nitrogênio e a fumaça são muito altos. Com isso, temos que a concentração da
maioria dos poluentes de interesse nos gases de escape das turbinas a gás pode
estar relacionada com a temperatura e com o tempo de permanência dos gases
na câmara de combustão.
192
Em geral, as termelétricas necessitam de um sistema de
resfriamento, em que normalmente se usa a água. Nesse caso, mais de noventa
por cento do uso de água de uma central termelétrica pode ser destinado ao
sistema de resfriamento.
191
RASHAD, S.M.; HAMMAD, F.H. Nuclear power and environment: comparative assessment of
environment and health impacts of electricity-generating systems. Applied Energy, n. 65, p. 221-
229, 2000.
192
LORA, E. E. S; NASCIMENTO, M. A. R. op. cit.
120
Em termos de poluição atmosférica, destacam-se as emissões de
óxidos de nitrogênio, entre os quais o dióxido de nitrogênio, responsável pelo
efeito smog
193
, e o óxido nitroso, que provoca a chuva ácida e os óxidos de
enxofre. Ambos têm efeitos negativos sobre a vegetação e a saúde humana. Ele
também emite o monóxido de carbono, hidrocarbonetos, fumaça e material
particulado.
7.7. Termelétricas a óleo
A maioria das usinas termelétricas a óleo queima o óleo combustível
residual, que é a parte que resta na refinaria após a remoção das frações mais
leves.
194
O óleo combustível usado possui peso molecular elevado, pois é
constituído, principalmente, de resinas e asfalteno. É obtido a partir do resíduo da
destilação a vácuo e em unidades de desasfaltação a propano.
195
Esses resíduos
são muito viscosos, sendo necessário adicionar a eles óleo mais leve de modo a
enquadrar a viscosidade do óleo combustível na faixa exigida pela legislação
vigente.
196
Mas existem as usinas que queimam óleo diesel. Essas usinas têm
baixa potência e são empregadas, principalmente, em locais de difícil acesso ou
que não estão interligados à rede de distribuição de energia elétrica.
O óleo combustível é transportado até a usina elétrica por trem,
caminhão, oleoduto ou avião-tanque, sendo, então, armazenado em grandes
tanques. Por causa de sua viscosidade é normalmente aquecido antes da
queima, para ser manuseado, facilitando sua nebulização e o seu escoamento.
Na vaporização utilizam-se queimadores ou maçaricos, isto é feito
para reduzir o óleo a gotículas que melhoram a sua mistura com o ar. O processo
de atomização pode ser feito mecanicamente ou com o uso de um fluido dispersor
como vapor ou ar comprimido.
197
193
OS EFEITOS dos smogs. Disponível em: <http://cave.cave.com.br/fio/smog/smog.htm>.
194
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
195
LORA, E. E. S; NASCIMENTO, M. A. R. op. cit.
196
Id. Ibid.
197
Id. Ibid.
121
O óleo é pulverizado para dentro da fornalha, onde ele se mistura ao
ar que entra para a combustão.
7.8. Impactos ambientais das termelétricas a óleo
Podem ocorrer acidentes principalmente durante o transporte e a
carga/descarga do produto, além dos riscos de incêndio e explosões na extração,
transporte e armazenagem do óleo.
198
As principais emissões do óleo são o monóxido de carbono, óxidos
de nitrogênio, hidrocarbonetos não queimados ou queimados parcialmente,
óxidos de enxofre e particulados. Estas emissões são relacionadas à qualidade
do combustível, operação do motor e organização da combustão.
A deposição ácida é causada principalmente pelo dióxido de
enxofre, óxido de nitrogênio e amônia. Para as emissões atmosféricas, o arsênio,
o cádmio, o chumbo e o mercúrio são os principais responsáveis pelos prejuízos à
saúde humana. também a emissão de dióxido de carbono e o metano, que
contribuem para o efeito estufa, e o óxido nitroso, que colabora com a chuva
ácida.
Esses poluentes são nocivos para grande mero de espécies de
plantas e animais que vivem em áreas próximas às usinas, afetando também a
saúde dos trabalhadores das termelétricas e da população local.
Porém, a utilização de filtros cerâmicos e de mangas, ciclones e
precipitadores eletrostáticos vem diminuindo a emissão destes poluentes.
7.9. Impactos ambientais comuns das termelétricas
Os efluentes líquidos podem afetar física e quimicamente o solo,
bem como as águas superficiais e subterrâneas. A água do sistema de
refrigeração de circulação direta pode afetar a fauna e a flora por conta da alta
198
RASHAD, S.M.; HAMMAD, F.H. op. cit.
122
temperatura em que ela é lançada no meio ambiente, pois diminui sua capacidade
de reter oxigênio. O lançamento de efluentes contendo nitrogênio e fósforo pode
contribuir para o aumento do crescimento de plantas aquáticas, alterando os
padrões reprodutivos, comportamentais e de crescimento ao longo de toda a
cadeia alimentar aquática.
A água utilizada no sistema de resfriamento tem que ser
desmineralizada e misturada a produtos químicos, para que sejam retirados os
sólidos em suspensão, para que o ocorra a formação de incrustações. Essa
purga é contínua e altamente poluidora do solo e cursos hídricos. A água é
lançada ao meio ambiente pelo vapor d’água, sendo prejudicial à agricultura por
conter cromatos que foram adicionados para evitar a corrosão do sistema.
Para gerar mil mW, uma termelétrica a carvão emite anualmente de
seis a oito megatoneladas de dióxido de carbono, uma termelétrica a gás emite
vinte e cinco por cento menos do que isso e a emissão de uma termelétrica a gás
de ciclo combinado é cinqüenta por cento menor
199
.
As termelétricas a carvão têm um fator de emissão de poluentes
duas vezes maior do que as a gás. A emissão de gases derivados da combustão,
principalmente os óxidos de carbono, os óxidos de enxofre e os óxidos de
nitrogênio afetam a reprodução e a sobrevivência da fauna e da flora em muitos
lagos, rios e florestas. também a emissão de material particulado, que oferece
risco ao meio ambiente afetando a temperatura do solo e o crescimento das
plantas
200
.
Existe, contudo, uma dificuldade de se estabelecer uma ligação mais
efetiva entre as emissões de gases na atmosfera e os impactos diretos no
ecossistema, mas estes danos são bastante reais, não se conhece com
profundidade sua extensão sobre o meio ambiente.
199
HERZOG, H. J; GOLOMB, D. Carbon capture and storage from fossil fuel use. In:
ENCYCLOPEDIA of Energy, 2004. v. 1.
200
VILLELA, I. A. C.; SILVEIRA, J. L. Ecological efficiency in thermoelectric power plants. Applied
Thermal Engineering, n. 27, p. 840-847, 2007.
123
7.10. Desativação das termelétricas
A desativação de uma central termelétrica apresenta problemas
análogos aos das indústrias, incluindo a possibilidade de contaminação dos solos,
a necessidade de desmontagem das instalações e a eventual demolição dos
edifícios para reutilização do terreno.
124
8. ENERGIA NUCLEAR
Foto 06 - Central Nuclear Almirante Álvaro Alberto, localizada na região de Angra dos Reis – Rio
de Janeiro.
O urânio é um minério encontrado na natureza e extraído da mesma
forma que se extraem os outros minérios metálicos, em minas a céu aberto ou
subterrâneas. Encontrado em formações rochosas da crosta terrestre. No Brasil,
as principais ocorrências de urânio estão nos estados da Bahia, Ceará, Paraná e
Minas Gerais.
8.1. História da energia nuclear
A fissão foi descoberta em 1939, no bombeamento de urânio com
nêutrons de baixa energia para produzir um núcleo mais pesado, quando foi
encontrado o bário, que é um elemento mais leve que o urânio. Notou-se que
urânio havia se dividido, essa divisão do urânio (235U) resultou em dois
elementos mais leves: o bário e o criptônio.
125
A reação de fissão do 235U, que dura certa de dez elevado a menos
sete segundos, emite em média três nêutrons que causam a fissão de outros
átomos de urânio liberando mais energia, deflagrando a chamada reação em
cadeia, primeiramente identificada para o urânio.
A primeira reação em cadeia auto-sustentada foi produzida em 1942,
em um pequeno reator construído na Universidade de Chicago.
201
A partir de
1940, foram desenvolvidas pesquisas para produzir quantidades suficientes de
material físsil para a construção da bomba atômica.
O reator da Universidade de Chicago serviu como protótipo para o
desenvolvimento de geradores para a produção de energia elétrica. Em 1951, foi
gerada, pela primeira vez, eletricidade no reator Experimenta Breeder Reactor”,
próximo a Detroit. Em 1953, foi construído o submarino Nautillus, movido a
energia nuclear e, em 1957, o primeiro reator a produzir eletricidade
comercialmente foi completado em Shippingport, Pensilvânia, Estados Unidos.
202
A partir de então, acreditou-se que a energia nuclear substituiria os
combustíveis fósseis, cujo exaurimento das reservas vinha sendo anunciado
havia algum tempo. Em 1979, o acidente em Three Mile Island, na Pensilvânia,
apesar de não ter deixado vítimas, gerou uma incerteza quanto à segurança
nuclear.
Em 1986, o acidente de Chernobyl, na ex-URSS, abalou a confiança
na energia nuclear. A unidade quatro de Chernobyl empregava um projeto de
reator tipo RMBK, significativamente diferente dos reatores em qualquer outra
parte do mundo. O reator gerava mil mW e foi completado em 1983. Os
elementos combustíveis do RMBK localizam-se em tubos de pressão separados,
colocados em um bloco moderador de grafite. A água passava através dos tubos
e seguia para os geradores de vapor; embora o reator incorporasse uma série de
barreiras entre a radioatividade e o ambiente, não havia um vaso de contenção
adequado para suportar uma explosão no núcleo provocada pela formação de
uma bolha de hidrogênio, gerada pelo ataque da água ao metal superaquecido
das varetas dos elementos combustíveis.
201
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
202
Id. Ibid.
126
Fonte: Agência Reuters – 26/04/1998.
Foto 07 - Desastre Nuclear de Chernobyl.
A explosão no reator do tipo RMBK causou a evasão de cem mil
pessoas no raio de trinta quilômetros de ação da nuvem radioativa. A explosão foi
causada pelo desligamento do sistema de emergência para a realização de testes
no gerador elétrico. Quando se abaixa a potência deste tipo de reator ele se torna
instável. Repentinamente a potência aumentou cem vezes o valor máximo. A
temperatura subiu rapidamente, ocasionando o derretimento dos elementos
combustíveis, aumentando a quantidade de gases e explodindo o topo do gerador
127
(o vaso de contenção desse reator não era adequando para suportar uma
explosão).
203
A explosão no reator gerou, aproximadamente, cem milhões de
Curries
204
. A nuvem radioativa foi levada na direção noroeste e localidades na
Suécia registraram níveis cem vezes maiores do que a radiação de fundo. O
acidente de Chernobyl provocou trinta e uma mortes humanas e foi considerado
de pequenas proporções quando comparado a outras catástrofes provocadas
pelo homem. Por exemplo, no acidente com uma fábrica de pesticidas, ocorrido
no ano de 1984, em Bhopal, Índia, morreram quinze mil pessoas; na China, em
1975, o rompimento de uma represa matou duzentas e trinta pessoas
205
.
Os habitantes do hemisfério norte, durante o primeiro ano após o
acidente de Chernobyl, receberam uma dose média de radiação de 0,045mSv,
isso significa menos que dois por cento da média anual de dose natural (2,4
mSv/ano). Nos próximos setenta anos eles serão expostos a uma dose total,
resultante do acidente nuclear, de aproximadamente 0,14 mSv.
206
O cientista Carly Martins, professor adjunto do Departamento de
Física Nuclear e Altas Energias da Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UERJ, em entrevista concedida a Estudos Avançados
207
, defende que o acidente
de Chernobyl, na Rússia, em 1986, fora causado pelo desligamento de
dispositivos específicos de segurança para o estudo de um perfil de acidente. Os
operadores não souberam identificar o tempo próprio de intervenção no sistema
e, após uma seqüência de erros, perderam o controle do reator. Continua o
cientista: “Cabe ressaltar que a unidade do complexo nuclear de Chernobyl,
responsável pelo acidente, era um reator de tecnologia totalmente ultrapassada,
que já não deveria estar em funcionamento naquela época”.
Hoje, o reator está coberto por uma massa de trezentas mil
toneladas de concreto, com uma altura equivalente à de um edifício de dez
andares. O material radioativo ainda está decaindo, o solo não está
impermeabilizado, podendo haver contaminação dos lençóis d’água.
203
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
204
Dez vezes mais radiação que a bomba de Hiroshima.
205
JAWOROWSKI, Z. Chernobyl, the fear of the unknown. Int. J. Low Radiation, v. 3, n. 4, 2006.
206
Id. Ibid.
207
MARTINS, Carly. Entrevista. Controle e segurança dos reatores nucleares. Estudos Avançados,
São Paulo, v. 21, n. 59, jan./abr. 2007.
128
Portanto, se levarmos em conta os mais de quatrocentos reatores
nucleares em funcionamento no mundo e o reduzido número de acidentes
significativos ocorridos ao longo dos anos, podemos concluir que a história da
geração de energia pela fissão do núcleo atômico é muito satisfatória, tendo os
especialistas da área um aprofundado conhecimento técnico e científico dessa
tecnologia.
8.2. Energia nuclear no Brasil
O Brasil, em 1945, assinou um acordo com os Estados Unidos pelo
qual se comprometia a uma consulta prévia na exploração de materiais nucleares,
pois se sabia que existiam jazidas de tório e de areias monazíticas no território
brasileiro. O tório é um elemento fértil, ou seja, capaz de se transformar em
material físsil, no caso o urânio 233, que o tornava muito interessante para o
desenvolvimento de um programa nuclear.
Em 1946, instalou-se a Comissão de Energia Nuclear das Nações
Unidas, formada pelos países que detinham a tecnologia nuclear e pelos que
possuíam reservas de minerais radioativos. Ela possuía como objetivo ter uma
posição de neutralidade perante os países membros, controlar as reservas de
materiais radioativos e impedir a geração de armas nucleares.
No período de 1950 a 1967 foram criados vários institutos ligados ao
estudo da energia nuclear: o Instituto de Pesquisas Radioativas (IPR), em Belo
Horizonte, Minas Gerais (1953); Escola Nacional de Engenharia da Universidade
do Brasil, hoje UFRJ (1954); Instituto Militar de Engenharia (IME, em 1954), e
Instituto de Energia Atômica (IEA), em São Paulo, no ano de 1956. (Dias Leite,
1997). As atividades desenvolvidas nesse período foram do domínio da
tecnologia, aperfeiçoamento de pessoal, pesquisa dos minerais atômicos e
estudos sobre como a energia nuclear poderia contribuir para o progresso
econômico do país.
Em 1968, o governo brasileiro resolveu investir no campo da
produção de nucleoelétricas e decidiu instalar uma usina nuclear no Estado do
Rio de Janeiro. Para isso incumbiu a Eletrobrás e a Furnas Centrais Elétricas S.A.
129
de organizarem uma concorrência pública para a aquisição de uma usina
termonuclear. No mesmo ano, após o recebimento de cinco propostas de
reatores, em 1969, Furnas declara a Westinghouse, empresa americana,
vencedora e assina o contrato com ela para o fornecimento do reator do tipo
PWR, que comporá o conjunto das usinas nucleares brasileiras.
208
Referida
empresa fora contratada para construir em Angra dos Reis, Rio de Janeiro, sua
primeira usina nuclear, mas sua execução fora marcada por diversas
paralisações, ocasionadas por decisões governamentais e técnicas e somente em
1985 Angra I iniciou sua operação comercial.
Ainda com Angra I em construção, em 1975, o Brasil firmou um
contrato com a Alemanha que compreendia, além de várias atividades
relacionadas à produção de energia nuclear, a construção de oito usinas
nucleares de mil e trezentos mW cada uma.
209
Em 1997, foi criada a Eletrobrás Termonuclear S.A. eletronuclear,
empresa que passou a ser a responsável pelos projetos das usinas
termonucleares brasileiras. Também foi constituído um novo órgão regulador do
setor de energia elétrica sob a denominação de Agência Nacional de Energia
Elétrica – ANEEL.
210
A Constituição Federal dispõe no artigo 21, inciso XIII, alíneas a,b,c,
os princípios norteadores da utilização da energia nuclear, mas estes devem ser
harmonizados com princípios fundamentais da República e incorporados aos
mandamentos esculpidos no artigo 225 também da Carta Magna, que define a
proteção constitucional do meio ambiente.
8.3. Obtenção do combustível nuclear
Como fora dito, a extração do urânio é feita da mesma maneira
que se faz a extração de outros tipos de minérios a céu aberto ou no subterrâneo.
208
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001), cit.
209
LORA, E. E. S; NASCIMENTO, M. A. R. op. cit.
210
ELETROBRÁS. Energia elétrica no Brasil: breve histórico (1880-2001), cit.
130
Quando da sua extração, ele é separado dos demais minérios, por possuir
propriedades químicas que o difere dos outros minérios.
211
O processo de beneficiamento do minério de urânio é de lixiviação
em pilhas. Depois de britado, o minério é disposto em pilhas e irrigado com
solução de ácido sulfúrico para a retirada do urânio nele contido. Essa técnica
dispensa fases de moagem, agitação mecânica e filtração. Desse processo se
obtém o sulfato de uranilo, após isto, é feita a purificação com a tri-octil amina. A
purificação do urânio é importante para a eliminação de impurezas que possam
absorver nêutrons do sistema e outras impurezas que possam comprometer suas
propriedades cerâmicas e mecânicas. A concentração do urânio é realizada pelo
processo de extração com solventes orgânicos, seguida da separação por
precipitação, secagem e acondicionamento em tambores.
212
Na próxima etapa o urânio é misturado à amônia formando um
concentrado, o yellow cake. Essa “torta” é então dissolvida e tratada para dar
origem ao urânio nuclearmente puro. A seguir, é convertido em hexafluoreto de
urânio – forma gasosa mais estável do urânio – para que se possa fazer o
enriquecimento isotópico.
213
O método de enriquecimento adotado pelo Brasil, o da
ultracentrifugação, foi desenvolvido por um convênio formado entre o IPEN
214
e o
Centro Tecnológico da Marinha (CTMSP). As partículas são submetidas a um
movimento circular, então as de maior massa se movem em direção aos maiores
raios. O método de ultracentrifugação apresenta um fator de separação de urânio
melhor que os demais, mas requer uma engenharia mais precisa.
215
8.4. Funcionamento da usina nuclear
A produção de energia elétrica por usinas termonucleares é baseada
no resfriamento do núcleo do reator, utilizando-se de um circuito primário fechado
211
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
212
INDÚSTRIAS NUCLEARES DO BRASIL. INB. Disponível em: <http://www.inb.gov.br/>.
213
Id. Ibid.
214
Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares.
215
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
131
(circuito fechado de água pressurizada) para remoção do calor gerado pela
reação de fissão nuclear, que atinge temperaturas acima de trezentos graus
Celsius, que não se transforma em vapor devido à alta pressão de trabalho. O
circuito primário passa pelo trocador de calor, ou gerador de vapor, do circuito
secundário, cuja água é transformada em vapor e que também circula em outro
circuito fechado. O vapor do circuito secundário passa pela turbina acionando-a,
em seguida o vapor passa pelo condensador que o resfria e o faz voltar a trocar
de calor. A condensação do vapor é obtida em um trocador de calor resfriado com
água.
O núcleo do reator é construído dentro de um recipiente de aço. Os
novos reatores são projetados para reduzir o risco de um acidente e seu
envoltório deve suportar a força exercida pelo impacto de um avião. No caso de
um desastre, o núcleo do reator é projetado para evitar o tipo de acidente que
ocorreu em Chernobyl
216
. Nele estão as varetas com os elementos combustível e
as barras para o controle da criticidade do reator. Estas últimas são colocadas e
retiradas do núcleo, conforme a necessidade de estabilizar a reação: variação de
corrente, controlando o ritmo de fissão no núcleo. Na figura abaixo (08), temos um
reator PWR, usado na usina de Angra I.
Figura 08 - Reator PWR
216
FROIS, B. Advances in nuclear energy. Nuclear Physics, n. 752, p. 611-622, 2005.
132
Existem diversos tipos de reatores, quais sejam: a) ADS
Accelerator Driven System; b) CANDU Canada Deuterium Uranium; c) FBR
Fast Breeder Reactors; d) HTGR Higt Temperature Gas-cooled Reactor; e)
LWR – Light Water Reactors; f) RBMK – Reactor Bolshoy Moshchnosty Kanalny.
Os tipos de combustíveis são: urânio 235, urânio 238, plutônio 239,
tório 232 ou os óxidos de urânio e plutônio.
Para evitar o escapamento de radiação gama e nêutrons rápidos, é
feita a blindagem que utiliza a construção: o concreto de alta densidade, o
chumbo, o aço e a água.
Para neutralizar a reação em cadeia e manter o reator sob controle,
alguns materiais absorvedores de nêutrons são usados, entre eles o cádmio e o
boro.
A energia resultante da fissão nuclear gera o calor que é utilizado
para aquecer a água e produzir vapor. Esse vapor movimenta a turbina que está
acoplada ao gerador elétrico e após isto é condensado em um trocador de calor, o
condensador.
217
Neste processo, a água utilizada deve ser desmineralizada, tratada
quimicamente e pressurizada. A temperatura e a pressão devem ser controladas
para que esta água, que é usada para a refrigeração, não sofra evaporação. A
energia gerada é levada para os consumidores finais através das redes de
distribuição.
Atualmente existem em operação quatrocentas e quarenta e três
usinas nucleares em todo o mundo, localizadas em trinta países, dentre eles o
Brasil, que possui a sexta maior reserva mundial de urânio, cerca de trezentas mil
toneladas.
218
Importante salientar que até o momento somente um terço do
território nacional foi mapeado.
No Brasil, a produção de energia nuclear é feita por usinas
termonucleares do tipo PWR, onde, no resfriamento do núcleo do reator, usa-se
água leve pressurizada. As usinas nucleares apresentam problemas bem
específicos devido à contaminação de seus componentes em função da
217
ISHIGURO, Y. op. cit.
218
INTERNATIONAL ATOMIC ENERGY AGENCY (IAEA). Disponível em: <http://www.iaea.org/>.
133
radioatividade. A desativação desse tipo de instalação deu margem a uma vasta
literatura técnica, ao desenvolvimento de experimentos e a poucas experiências
em escala real.
As vantagens desse tipo de usina são: baixa exposição do meio
ambiente à radioatividade; seu rendimento elétrico é o maior dentre todas as
formas rmicas de geração de energia; seu resíduo é bem compactado e de fácil
transporte; podem ser instaladas próximas aos centros consumidores; toda
tecnologia do seu ciclo é dominada; possui elevado rendimento energético, alto
nível de segurança e, principalmente, não emite poluentes gasosos para o meio
ambiente.
8.5. Impactos ambientais da usina nuclear
A mineração do urânio, que ocorre em concentrações muito baixas,
provoca impactos no solo, na água e na saúde dos trabalhadores.
A operação do reator apresenta alto custo de investimento nos
sistemas de segurança de contenção e de emergência para o funcionamento da
usina. Bem como no treinamento e aperfeiçoamento constante dos trabalhadores
ligados às atividades da e na usina.
O armazenamento dos resíduos radioativos deve ter local,
segurança e monitoramento apropriados e, principalmente, segurança contra
vazamentos de material radioativo.
A destinação final do rejeito radioativo ainda é um grande problema
mundial. Inicialmente ele é encapsulado em recipientes cerâmicos ou de vidro
(que são capazes de suportar o calor do decaimento). Estes resíduos serão
colocados em tonéis de aço inoxidável para armazenamento no subsolo em uma
grande caverna. Os salões do repositório serão revestidos por um
impermeabilizante capaz de retardar a penetração da água; estes salões de
134
armazenagem o localizados em formações geológicas estáveis, o terceiro
componente de um sistema multibarreiras.
219
Opções adicionais propostas para o gerenciamento final dos
resíduos de alto teor de radioatividade são isolamento em outras áreas
geologicamente estáveis (minas de sal, leito marinho, rocha dura cristalina ou
calotas polares) e eliminação total por transmutação (alteração da natureza do
radioisótopo pelo bombardeamento com nêutrons de um reator ou com partículas
carregadas provenientes de um acelerador) ou descarte no espaço exterior.
A maioria dos países pressupõe a possibilidade do
reprocessamento. Após esta etapa os seus resíduos radioativos são
armazenados como líquidos por um período de tempo limitado, sendo, então,
solidificados e imobilizados quimicamente em vidro. A armazenagem em rocha de
granito está sendo considerada.
Na Grã-Bretanha, resíduos líquidos de alto teor são armazenados
em tanques, pois os locais para os tios definitivos ainda estão sendo
procurados.
220
Qualquer que seja o repositório escolhido, os combustíveis
queimados armazenados nas piscinas das usinas nucleares serão transportados
para o repositório na forma sólida em tonéis blindados; estes, por sua vez, foram
projetados e testados para suportar graves acidentes sem que haja a liberação de
material radioativo.
221
8.6. Aspecto ambiental
As objeções ambientais à energia nuclear diminuíram de intensidade
nos últimos anos.
A razão principal da atenuação da oposição à energia nuclear está
relacionada à percepção de que a questão dos resíduos de longa duração não se
restringe às usinas nucleares, mas atinge o conjunto das energias térmicas
219
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
220
Id. Ibid.
221
Id. Ibid.
135
quando se inclui a emissão dos gases formadores do efeito estufa. Como se
sabe, a geração nuclear não provoca emissão direta desses gases.
Para se ter uma idéia da massa e volume envolvidos nos rejeitos de
uma usina nuclear e de uma térmica convencional, tem-se que a operação de
uma usina nuclear de 1,3 GW durante um ano (oitenta por cento de fator de
capacidade) se faz com a reposição de cinqüenta e quatro toneladas de
combustível (ou seja, urânio enriquecido), que é um terço de sua carga total, e o
volume dessa terça parte é cerca de cinqüenta metros cúbicos. A geração de
igual quantidade de eletricidade (cerca de nove TWh) produziria cerca de dois a
três milhões de toneladas por ano de CO2 (usina de gás natural ou carvão),
despejando um volume aproximado de 1 a 1,5 bilhão de metros cúbicos na
atmosfera. Os seja, existe uma relação de cerca de cinqüenta mil entre as
massas de rejeitos de uma usina térmica e uma nuclear
222
.
Os riscos ambientais da energia nuclear podem ser esquematizados
em quatro aspectos:
a) Riscos na operação normal da usina.
b) Riscos em caso de acidente.
c) Riscos no ciclo do combustível (produção da mina ao
combustível).
d) Risco no armazenamento dos rejeitos.
No primeiro aspecto, a operação normal de uma central nuclear do
tipo PWR (Pressurized Water Reactor), adotado no Brasil (centrais atuais e
programadas), pode ser considerada como relativamente limpa em relação aos
demais tipos de usinas de geração rmica, não existindo objeções relevantes da
população local às centrais instaladas no Brasil e no mundo.
A principal preocupação das populações vizinhas e das análises
ambientais relaciona-se com possíveis acidentes por falhas nas usinas e,
ultimamente, no caso de atos terroristas.
222
ALVIM, Carlos F.; EIDELMAN, Frida; MAFRA, Olga; FERREIRA, Omar C. Energia nuclear em
um cenário de trinta anos. Estudos Avançados, São Paulo, v. 21, n. 59, jan./abr. 2007.
136
No que concerne aos reatores do tipo PWR, não foi registrado no
seu funcionamento nenhum acidente com danos ambientais significativos. O mais
grave deles, o de Three Mile Island, não teve conseqüências diretas ambientais,
mas levou ao aperfeiçoamento dos reatores atuais e a consideráveis
modificações que serão incorporadas na próxima geração de reatores.
Foto 09 - Usina Nuclear de Three Mile Island, na Pensilvânia (EUA). Derretimento parcial do
reator.
Fonte: Agência France Presse. 28/03/1979.
A perspectiva atual é que haja um crescimento da geração nuclear
no mundo de trinta e um por cento entre 2003 e 2030, e que essa tendência pode
ainda superar o valor projetado no caso de preços superiores de combustíveis e
de incremento da aplicação do Protocolo de Kyoto.
As maiores oportunidades de risco de contaminação estão no ciclo
de combustível, sendo as mais graves de acidentes do tipo criticalidade acidental,
como o ocorrido na fábrica de combustíveis em Tokaymura, em 1999, no Japão.
Esses acidentes são mais comuns em plantas militares ou que operam em
enriquecimento muito acima dos reatores de tipo PWR e resultam geralmente das
137
quebras de procedimentos de segurança. São normalmente acidentes de
curtíssima duração (a expansão térmica geralmente paralisa a reação), que
afetam os operadores diretos. O acidente de Tokaymura foi uma exceção, tendo
durado algumas horas. O ambiente próximo à fábrica foi afetado por radiações,
mas a contaminação externa não foi tão grave. Um acidente de conseqüências
muito graves pode advir da dispersão acidental ou provocada de plutônio oriundo
das usinas de reprocessamento. Esses dois tipos de acidentes têm pouquíssima
possibilidade de ocorrer no Brasil, que os enriquecimentos são relativamente
baixos (cerca de quatro por cento) e o reprocessamento de combustíveis não
existe nem está nos planos brasileiros para as próximas décadas
223
.
Deve-se lembrar que, como em toda atividade, esse tipo de acidente
deve ser comparado aos acidentes nos demais ciclos de combustíveis. Os mais
conhecidos são os relacionados à mineração do carvão e os de incêndios em
instalações petrolíferas e no transporte de combustíveis líquidos ou gasosos.
Quanto aos rejeitos de baixa e média atividade, atualmente
armazenados no próprio local da Usina de Angra, uma solução definitiva deverá
ser alcançada preliminarmente à expansão do programa nuclear. A solução do
problema não apresenta dificuldades tecnológicas, sendo uma questão de
decisão política e de aceitação pública.
Existe, finalmente, o problema maior do repositório definitivo dos
rejeitos de dia e alta atividade cuja solução técnica parece ser a disposição
subterrânea em local com condições geológicas naturais adequadas ao
repositório definitivo, mas guardando para as gerações futuras e atuais a
possibilidade de uma eventual intervenção.
Sempre é bom lembrar que um repositório definitivo para os rejeitos
nucleares deve ser capaz de conter rejeitos radioativos por muitos milhares de
anos, e esse é um problema em relação ao qual a humanidade não tem
experiência e a solução está baseada no comportamento geológico passado.
223
ALVIM, Carlos F.; EIDELMAN, Frida; MAFRA, Olga; FERREIRA, Omar C. op. cit.
138
8.7. O aspecto estratégico
Neste item podemos destacar dois pontos: o primeiro, relativo à
disponibilidade de reservas energéticas nacionais e à perspectiva de dependência
energética, e o segundo se relaciona com a política de o-proliferação de armas
nucleares e das tecnologias a elas associadas.
Quanto ao primeiro ponto, as reservas e os recursos energéticos
brasileiros são publicados anualmente no Balanço Energético Nacional (BEN),
pela EPE/MME, que, ao final de 2005, apresentava a tabela aqui reproduzida,
onde foram incluídos os valores de R/P (reserva/ produção) e R/C
(reserva/consumo).
Dos combustíveis não-renováveis, o carvão mineral é o que
apresenta maior valor de reservas e a maior razão R/P e R/C. Essas razões foram
tomadas a partir do consumo de carvão vapor e não incluem o carvão
metalúrgico, de que o Brasil é quase inteiramente dependente de importações. A
energia nuclear vem em seguida, mesmo adotando-se o critério do não-
aproveitamento das energias residuais do urânio e plutônio nos combustíveis
irradiados. Quanto ao gás natural, o Brasil é dependente de abastecimento
externo e é o energético não-renovável com menor razão R/C. A geração elétrica
térmica preferencialmente com gás natural deverá continuar sendo feita em
grande parte com gás importado de nossos vizinhos.
139
Reservas Produção Consumo (1) R/P R/C Consumo (2)
10* tep 10* tep/ano 10*tep/ano Anos Anos
Petróleo
1668 84,3 87,7 20 19 3%
Gás
natural
(3)
304 14,8 22,7 21 13 18%
Carvão
mineral
(4)
2.756 2,3 2,3 1174 1204 83%
Energia
nuclear
1.236 1,3 2,5 944 498 100%
Tabela 06 – Reservas medidas/indicadas em valores absolutos e relativos à produção e ao
consumo em 2005.
Legenda: * - dez elevado à sexta; (1) – Inclui transformação; (2) – No caso do petróleo, geração
elétrica a partir dos derivados; (3) - A produção do GN exclui reinjeção, o consumo inclui
perdas;(4) – Considerado como carvão vapor.
Na próxima tabela, infere-se que, do ponto de vista de maior
independência energética, as gerações a carvão e a nuclear são as mais
indicadas dentre os combustíveis o-renováveis. O carvão nacional, que contém
um grande volume de cinzas, se presta à geração na boca da mina,
restringindo-se, portanto, às usinas localizadas na região sul, ficando evidente,
ainda, quando se incorporam as reservas inferidas e estimadas, que a opção pela
geração térmica a partir do gás natural é uma opção estratégica de aproveitar os
recursos naturais de nossos vizinhos em relação à qual o Brasil está em posição
privilegiada.
140
Reservas
medidas/indic
adas
Para uso
na
geração
elétrica
Reservas
utilizáveis
na geração
Eficiência na
geração de
eletricidade
Geração reservas
medidas/indicadas
Geração
incluindo
reservas
inferidas/
estimadas
10* tep 10*tep 10*tep TWh TWh
Petróleo 1.668 5% 83 0,38 32 368 505
Gás natural 304 30% 91 0,41 37 435 645
Carvão
mineral
2.756 85% 2.343 0,29 679 7900 25303
Energia
nuclear
1.236 100% 1.236 0,34 420 4888 8519
Tabela 07– Geração de energia elétrica a partir das reservas existentes no Brasil.
Da análise das reservas, fica claro que o carvão vapor e o nuclear
são opções importantes dentro da geração.
8.8. Descomossionamento – desativação
O descomissioamento de uma usina nuclear é realizado com
atividades de desmontagem, descontaminação e restauração, com três diferentes
níveis ou estágios. A desativação é realizada segundo as categorias adotadas
pela IAEA – International Atomic Energy Agency; ou seja:
i) Nenhuma ação – implica a manutenção da mesma situação.
ii) Longo tempo de estocagem segura – implica a introdução de
modificações na instalação para estabilizar a estrutura que deverá abrigar o
material radioativo por um longo período. Isto permite o decaimento radioativo
141
para a redução da quantidade de radionuclídeos na usina nuclear visando a uma
eventual desmontagem e liberação da área.
iii) Desmontagem imediata consiste na desmontagem das
instalações em curto prazo, liberando a área para uso incondicional após certo
prazo de tempo durante o qual há a necessidade de vigilância
224
.
Ainda o problema do resíduo radioativo, cuja estocagem
necessita de períodos muitos longos, embora existam pesquisas para a
reutilização deste na geração de energia elétrica
225
.
O descomissioamento de uma usina nuclear requer total isolamento
do local da central, bem como o monitoramento e a segurança vinte e quatro
horas durante todo o período que o material utilizado na geração de energia levar
para decair a níveis que não comprometam o meio ambiente. O tempo estimado
para isso ocorrer supera os cem anos.
Existem três tipos de desativação disponíveis: desmontagem
imediata, envelhecimento (mothball) e entubamento (entombment). No
envelhecimento, espera-se até que a usina atinja o nível de decaimento aceitável
par ser desmontada. No entubamento, faz-se o cercamento da usina por paredes
de concreto, mantendo-se a vigilância aque os níveis de radiação decaiam. Os
setores contaminados da usina são removidos nas duas primeiras opções e
enviados para um depósito de resíduos de baixo teor. Os escombros incluem os
núcleos dos reatores, os suportes de concreto e a tubulação e válvulas
metálicas.
226
Estatal vai cuidar do lixo nuclear
227
“O novo programa nuclear brasileiro, em estudo no governo, prevê
a criação de uma estatal para gerenciar os rejeitos radioativos,
que tem o nome provisório de Empresa Brasileira de Rejeitos. De
acordo com técnicos do setor, a nova companhia poderia até
vender o combustível nuclear utilizado nas usinas brasileiras para
países que dominam a tecnologia de reprocessamento de rejeitos.
224
BOND, A.; PALERM, J.; HAIGH, P. Public participation in EIA of nuclear power plant
decommissioning projects: a case study analysis. Environmental Impact Assessment Review, n.
24, p. 614-617, 2004.
225
HANNUM, W. H.; MARCH, G. E.; STANFORD, G. S. Lixo nuclear. Scientific American, ano 4, n.
46, Mar. 2006.
226
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
227
PAMPLONA, Nicola. Estatal vai cuidar de lixo nuclear. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 27 jul.
2008.
142
A questão dos rejeitos é o principal entrave colocado pelo Instituto
Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
(Ibama) à construção de Angra 3, projeto com potência de 1,3 mil
mW, suspenso desde a década de setenta. Na licença prévia
emitida na quarta-feira, o Ibama determinou que a Eletronuclear
defina um destino definitivo para o combustível utilizado pelas
usinas.
O presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen),
Odair Dias Gonçalves, porém, diz que a criação da nova estatal
ainda depende de avaliação do Governo e do Congresso e, por
isso, não deve ser concluída no curto prazo. O novo programa
nuclear brasileiro prevê a construção de até oito novas usinas no
país, além da criação de uma agência reguladora do setor, e de
medidas que envolvem outros usos da tecnologia nuclear: Ainda
não pra ter uma solução definitiva, porque não temos a
dimensão do que sairá do novo programa nuclear”, afirmou o
executivo.
Atualmente os rejeitos da alta radioatividade ou seja, o
combustível nuclear utilizado ficam armazenados em piscinas
especialmente construídas dentro das usinas para este fim. As
piscinas têm capacidade para armazenar todo o combustível
utilizado durante a vida útil de uma usina.
O presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben),
Francisco Rondinelle, diz que a solução é adotada em todo o
mundo, enquanto as novas tecnologias de reprocessamento para
geração de energia estão em desenvolvimento. O combustível
nuclear sai da usina ainda com 40% da energia original, o que
torna economicamente viável o reuso.
A França, por exemplo, é uma das pioneiras em pesquisas sobre
o tema e recicla combustível nuclear nas unidades de
reprocessamento em La Hague e Marcoulle. Mesmo assim, o país
ainda discute o problema do destino definitivo dos rejeitos. O país
estuda a construção de um depósito geológico em rochas de
granito, onde os rejeitos de alta densidade poderão ser
armazenados definitivamente.
Enquanto não decisão sobre o destino dos rejeitos brasileiros,
a Cnen trabalha em um protótipo de estoque definitivo para o
combustível nuclear usado. Segundo Gonçalves, o uso de
cavernas em rochas de granito é uma das alternativas. O primeiro
protótipo terá o formato de uma colméia forrada de aço, onde os
elementos combustíveis poderão ser enfiados em casulos
lacrados, e deve estar pronto em 2013.
Não nenhuma definição, porém, sobre quando um depósito
definitivo poderá entrar em operação nem sobre sua localização.
Para Gonçalves, o governo tem tempo para tomar essas decisões,
uma vez que as piscinas da central nuclear de Angra podem
armazenar os rejeitos por, pelo menos, 40 anos. As novas usinas
do programa nuclear, caso sejam construídas, também deverão
ter piscinas para armazenagem temporária.
...
143
A empresa estatal proposta pelos autores do programa nuclear
seria responsável também pelo gerenciamento dos rejeitos de
baixa e média densidade, como roupas e ferramentas usadas nas
usinas nucleares e rejeitos hospitalares, por exemplo. A idéia é
que a armazenagem e o transporte dos rejeitos sejam pagos pelos
usuários dos serviços.
O novo programa nuclear brasileiro es sendo avaliado por um
grupo formado por técnicos dos ministérios da Defesa, Fazenda,
Minas e Energia, Planejamento, Casa Civil e Ciência e
Tecnologia. O ministro de Minas e Energias, Edison Lobão, disse
na semana passada, porém, que o governo já planeja licitar novas
usinas nucleares construídas em parceria entre a Eletronuclear e
a iniciativa privada, a partir do ano que vem”.
144
9. ENERGIA HIDRELÉTRICA
Figura 10 - Desenho de uma Hidrelétrica
A geração de energia hidrelétrica consiste em utilizar a energia
potencial gravitacional da água represada em energia cinética de rotação, ou seja,
aproveitar o potencial hidráulico. É necessário que se tenha um desnível para a
implantação de uma hidrelétrica, quanto maior o desnível, maior o aproveitamento
hidráulico, maior o potencial de geração.
9.1. História da hidroeletricidade
Após a construção das hidrelétricas de Ribeirão do Inferno, Ribeirão
dos Macacos e Marmelos, a primeira hidrelétrica de grande porte foi construída no
rio Tietê, a usina de Parnaíba.
Em 1910 veio ao Brasil o engenheiro F.S.Pearson, da Pearson
Engeneering Corporation, de Nova York, para estudar a viabilidade da construção
de mais uma hidrelétrica no rio Tietê à jusante de Parnaíba, mas ele optou pela
construção da usina Itupararanga, no rio Sorocaba
228
.
Em 1912, depois de ampliações, a usina de Parnaíba atingiu uma
capacidade nominal de dezesseis kW; para geração desse potencial, foi
necessário regularizar a vazão do rio Tietê pela construção do Reservatório
228
VARGAS, M. História da construção hidroelétrica no Brasil. Engenharia: revista do Instituto de
Engenharia, São Paulo, n. 505, 1994.
145
Guarapiranga à montante do rio Pinheiros, um mil e seiscentos metros de
comprimento e dezoito metros de altura.
229
Em 1914 a usina de Itupararanga operava com capacidade nominal
de trinta mil kW; essa energia era transmitida para São Paulo, via Parnaíba. A
partir de 1919, essa usina começou a fornecer energia elétrica para a Companhia
Paulista de Estradas de Ferro.
A partir de 1923, os engenheiros Billings e R.S. Hyde começaram a
estudar a construção da usina de Cubatão, onde foram revertidas as águas do rio
Grande para o mar, através do rio das Pedras, que descia a Serra do Mar.
230
Em 1924 houve uma séria crise energética em São Paulo,
ocasionada por um lado pelo crescimento da demanda industrial e do outro pelo
período seco que se vinha desde 1919. Conseqüentemente houve falta de
energia hidráulica e a Light, hoje Eletropaulo, viu-se obrigada a aumentar a
capacidade da usina de Itupararanga e da rmica de Paulo Souza e, ainda,
construiu em tempo recorde a hidrelétrica de Rasgão, inaugurada em novembro
de 1925.
Em 1926 a barragem do rio das Pedras estava pronta e foi iniciada a
barragem do rio Grande, com isso formou-se o reservatório do rio Grande hoje
represa Billings –, que atingia local bem próximo do reservatório do rio das
Pedras.
231
No mesmo ano é inaugurada a primeira unidade da usina hidrelétrica
Henry Borden, as demais foram instaladas até 1950, num total de oito grupo
geradores, com capacidade instalada de 469 mW. Cada gerador é movido por
duas turbinas tipo Pelton, acionadas pelas águas conduzidas do reservatório do
rio das Pedras, que atingem a casa de válvulas, onde, após passarem por duas
válvulas borboleta através de condutos forçados, descem a encosta atingindo as
suas respectivas turbinas, perfazendo uma distância de aproximadamente mil e
quinhentos metros. Na parte subterrânea ela é composta de seis grupos
geradores, instalados no interior do maciço rochoso da Serra do Mar, em uma
caverna de cento e vinte metros de comprimento e vinte e um metros de largura
229
VARGAS, M. op. cit.
230
Id. Ibid.
231
Id. Ibid.
146
por trinta e nove de altura, cuja capacidade instalada é de quatrocentos e vinte
mW. O primeiro grupo gerador entrou em operação em 1956. Cada gerador é
movido por uma turbina Pelton acionada por quatro jatos d’água.
232
No início dos anos 40, iniciou-se o desvio de parte da água do rio
Tietê e seus afluentes para o reservatório Billings, a fim de aumentar a vazão da
represa e, conseqüentemente, ampliar a capacidade de geração de energia
elétrica na UHE Henry Borden. Este processo foi viabilizado graças à reversão do
curso do rio Pinheiros, com a construção das usinas elevatórias de Pedreira e
Traição, ambas em seu leito. Essa operação, que objetivava o aumento da
produção de energia elétrica, também se mostrou útil para as ações de controle
das enchentes e de afastamento dos efluentes industriais e do esgoto gerado pela
cidade em crescimento
233
.
O bombeamento das águas do Tietê para a Billings, no entanto,
começou a mostrar suas graves conseqüências ambientais poucos anos depois.
O crescimento da cidade de São Paulo e a falta de coleta e tratamento de esgoto
levaram à intensificação da poluição do rio Tietê e de seus afluentes que, por sua
vez, passaram a comprometer a qualidade da água da represa Billings. Nos
primeiros anos da década de 70, a Cetesb
234
é obrigada a iniciar as operações de
remoção da mancha anaeróbica presente na represa.
Em 1982, devido à grande quantidade de esgotos, que resultaram
em sérios problemas de contaminação por algas cianofíceas, algumas
potencialmente tóxicas, surge a necessidade de interceptação total do braço do
rio Grande, com a construção da Barragem Anchieta, para garantir o
abastecimento de água no ABC, iniciado em 1958.
235
232
EMPRESA METROPOLITANA DE ÁGUAS E ENERGIA S.A. EMAE. Disponível em:
<http://www.emae.com.br/>.
233
CAPOBIANCO, J. P. R.; WHATELY, M. Ameaças e perspectivas para o maior reservatório de
água da Região Metropolitana de São Paulo. São Paulo: Instituto socioambiental, 2002.
234
Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental.
235
CAPOBIANCO, J. P. R.; WHATELY, M. op. cit.
147
9.2. Funcionamento da hidrelétrica
Uma usina hidrelétrica é constituída de barragem, sistema de
captação e adução de água, casa de força, descarregadores de fundo, tomadas
de água, vertedouro e sistema de restituição de água ao leito natural do rio.
As tomadas de água são constituídas de grades de proteção e
comportas. As primeiras são responsáveis pelo impedimento da passagem de
materiais que possam danificar as turbinas. A comporta é responsável pela
liberação ou impedimento da passagem de água para os condutos, variando de
acordo com a necessidade de geração.
Os vertedouros são responsáveis pela liberação do excesso de
água, quando o reservatório atinge sua capacidade xima. É constituído de
comportas que abrem ou fecham dependendo da necessidade.
Para remover o material depositado no lago, existem os
descarregadores de fundo.
Faz-se a captação a montante no lago da barragem, conduzindo a
água através dos condutos forçados até a turbina hidráulica, que é constituída por
pás que se abrem quando a necessidade de aumentar a potência e se fecham
quando precisa diminuí-la. A massa de água recebida faz rotacionar o eixo da
turbina onde estão as pás, esse movimento giratório é a energia cinética, que é
conduzida ao rotor na forma de torque. Depois de passar pelo rotor, a água é
conduzida ao tubo de sucção onde é despejada a jusante do rio. Do rotor a
energia cinética é conduzida a um gerador que está acoplado mecanicamente a
ela. No gerador a energia cinética é transformada em energia elétrica. Após isto, a
água é conduzida através do leito de fuga onde é restituída ao curso natural do
rio.
A energia gerada é guiada por cabos ou barras condutoras dos
terminais do gerador a o transformador para que sua voltagem seja
adequadamente elevada e transformada em corrente contínua, então conduzida
pelas linhas de transmissão até os centros consumidores. Nos centros
consumidores uma nova transformação na tensão e em corrente alternada
para níveis adequados para os usuários.
148
As turbinas hidráulicas podem ser de dois tipos: a de ação e a de
reação. Nas primeiras, a água incide sobre as s do rotor; nestas, a água tem
que vir através de dutos, onde há diferença de nível entre captação e o local onde
está a turbina, implicando uma energia cinética inicial antes de ela atingir a
turbina. Na segunda, o rotor está submerso e a água passa pelas pás do rotor, a
energia cinética é extraída pela perda de velocidade de água.
De acordo com a International Energy Agency, em 2003, a energia
hidrelétrica foi responsável por cerca de dezesseis vírgula vinte e oito por cento
do total gerado no mundo, deste total o Brasil representa cerca de quatorze
vírgula quarenta e quatro por cento.
236
A vantagem ambiental das usinas hidrelétricas é o fato de se utilizar
um bem natural renovável e uma tecnologia limpa. Além de não produzir resíduo
e seu custo de geração ser baixo, ela pode armazenar energia. Pode também
auxiliar na navegação e na irrigação.
Além da irrigação e da geração de energia elétrica, as represas são
necessárias para o suprimento de água para a população das cidades. Quando
há um período de estiagem, ela armazena água em seu reservatório para a
geração de energia. Todavia, em época de chuvas controla-se o volume de água
do reservatório pela abertura e fechamento das comportas controlando o nível do
reservatório, para que a segurança da usina não seja comprometida.
O interessante das hidrelétricas brasileiras é que, além de sua
matéria-prima ser gratuita, boa parte das usinas já pagou o investimento da
construção e de impacto ambiental gerado por ela.
Como desvantagem deste tipo de geração é o seu alto custo de
investimento e o elevado tempo de construção. Muitas vezes as usinas são
construídas distantes dos centros consumidores.
Por ser uma forma de energia renovável, depende totalmente da
natureza.
236
INTERNATIONAL ENERGY AGENCY. IEA. Disponível em: <http://www.iea.org/>.
149
9.3. Impactos ambientais de uma hidrelétrica
A necessidade de garantir o fornecimento em períodos de estiagem
fez com que se projetassem reservatórios cada vez maiores para suprir a
demanda. Para a construção de uma usina hidrelétrica, muitas vezes é
necessário que se faça o desvio do leito do rio. Esse desvio pode ser na fase de
construção, que tem um impacto momentâneo no ecossistema local, ou pode ser
que a água tenha que atravessar a barragem para o funcionamento da usina,
neste caso, para a formação do reservatório, o leito original também é alagado.
Este lago implicará a perda da reserva biológica e de áreas férteis,
com isso, quanto maior a extensão do reservatório, maior a perda. Pode haver o
problema de o lago atingir áreas de patrimônio arqueológico ou áreas urbanas,
como ocorreram nas cidades de Boa Esperança, no Piauí, e Sobradinho, na
Bahia, que tiveram que remover a população que ficaria totalmente submersa.
A vegetação que irá ser coberta pelo lago poderá ter sido removida
parcialmente ou não, retirando-se apenas árvores das quais a madeira possa ser
utilizada, deixando arbustos e plantas rasteiras, ou, ainda, pode ser deixada
totalmente intacta. De qualquer forma, a remoção total de material orgânico que
irá se decompor é impossível. A importância da retirada deste material é que, por
decomposição anaeróbica, será emitido o metano e o nitrogênio e,
secundariamente, o dióxido de carbono. Estes gases são os principais
responsáveis pelo efeito estufa. No período imediatamente após o enchimento do
reservatório, a produção de gás sulfídrico, que libera um odor muito forte,
afastando animais terrestres e aquáticos. A quantidade de gases produzida
depende do tipo de vegetação decomposta após o alagamento
237
.
O alagamento de material orgânico pode ainda alterar o pH da água
e/ou a quantidade de oxigênio presente nela, alterando a quantidade de espécies
de peixes e sua reprodução, uma vez que há a decomposição de sedimentos no
fundo do reservatório. Este material orgânico pode facilitar o aparecimento de
237
SALVARLI, H. Some aspects on hydraulic energy and environment in Turkey. Energy Policy, n.
34, p. 3398-3401, 2006.
150
algas, provocando a eutrofização do corpo d’água e vetores causadores de
doenças, já que há uma estratificação térmica e/ou perda de oxigênio.
A formação do lago altera o equilíbrio do ecossistema aquático. O
microclima e a temperatura na região passarão por adaptações que poderão
atingir a fauna local devido a uma maior evaporação de água.
Dependendo do terreno onde se constrói o lago, a acomodação
do local, podendo ocorrer pequenos tremores de terra.
O acidente mais grave que pode ocorrer em uma barragem é o
rompimento desta, que causa uma onda com grande potencial destrutivo capaz
de arrastar consigo o que encontrar pela sua frente.
O gerenciamento de hidrelétricas passou a ser um problema nos rios
brasileiros, pois o barramento aplicado compromete a reprodução de muitas
espécies de animais aquáticos, principalmente de peixes que sobem o rio para se
reproduzir no período de piracema.
Tudo isso pode acarretar perda de habitats e biodiversidade,
representada pela pêra de vegetação aquática, diminuição da qualidade da água,
desaparecimento de algumas comunidades de peixes, alteração da paisagem,
acumulação de sedimentos e de matéria orgânica nos reservatórios
238
.
Também devem ser consideradas as alterações na economia local
provocadas pela construção da represa, devido às novas condições que levam à
diversificação das atividades econômicas. Atividades associadas ao turismo e ao
lazer são geralmente desenvolvidas nos territórios vizinhos, alterando
significativamente o perfil sócio-econômico da região.
9.4. Desativação de uma hidrelétrica
A maior preocupação com uma barragem é na etapa inicial, durante
a construção. Depois disso, não demonstração de regra ou critério no que diz
238
ALMEIDA, A. T.; MOURA, P. S.; MARQUES, A. S.; ALMEIDA, J. L. Multi-impact evaluation of
new large hydropower plants in Portugal center region. Renewable & Sustainable Energy
Reviews, n. 6, p. 149-167, 2005.
151
respeito a sua desativação. Quando se trata de uma obra de grande porte, com
reservatório volumoso, a barragem não pode ser simplesmente abandonada.
A National Hydropower Association, que reúne nos Estados Unidos
as empresas produtoras de energia de origem hidrelétrica, reconhece quatro
causas que poderiam tornar uma barragem obsoleta e, portanto, passível de
desativação: estrutural devido a erros de projeto e construção, a estrutura pode
apresentar problemas de segurança; operacional devido à manutenção ou às
condições de operação inadequadas; natural devido a fenômenos naturais, tais
como terremotos, que podem danificá-la; econômica porque os custos de
operação, manutenção ou reparação podem tornar-se superiores aos benefícios
econômicos.
O período considerado é da ordem de cinqüenta anos para as
barragens hidrelétricas, não significando que transcorrido este prazo se deva
desativá-la. Mas, a partir deste prazo, suas estruturas e equipamentos podem ser
renovados e reparados, desde que o investimento compense.
152
10. ENERGIA EÓLICA
Denomina-se energia eólica a energia cinética contida nas massas
de ar em movimento (vento). Seu aproveitamento ocorre por meio da conversão
da energia cinética de translação em energia cinética de rotação, com o emprego
de turbinas eólicas, também denominadas aerogeradores, para a geração de
eletricidade, ou cata-ventos (e moinhos), para trabalhos mecânicos como
bombeamento d’água.
Figura 11 - Centro Brasileiro de Energia Eólica
Fonte: CENTRO BRASILEIRO DE ENERGIA EÓLICA – CBEE / UFPE. 2003. Disponível em:
www.eolica.com.br.
Calcula-se que o Brasil tenha um potencial por volta de sessenta mil
mW, mas esse resultado não é confiável pelas diferentes metodologias
empregadas e a falta de informações.
239
O interesse em aproveitar os ventos certamente não é novo; eles
foram uma das primeiras fontes naturais de energia a serem utilizadas. Existem
indícios de que os moinhos de vento foram utilizados na Babilônia e na China
entre dois mil e mil e setecentos antes de Cristo, para bombear água e moer
grãos.
239
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
153
10.1. História da energia eólica
O interesse em aproveitar os ventos certamente não é novo; eles
foram uma das primeiras fontes naturais de energia a serem utilizadas na
Babilônia e na China entre 2.000 e 1.700 a.C. para bombear água e moer grãos.
Os moinhos de vento foram introduzidos na Europa por volta do
século XVII e, em 1750, a Holanda tinha oito mil deles e a Inglaterra, dez mil. Sua
utilização entrou em declínio após a introdução do motor a vapor de Watt no final
do século XVIII e este declínio foi acelerado no início do século XX como
resultado da disponibilidade de combustíveis sseis baratos e confiáveis, assim
como da energia hidráulica.
240
Para a geração de eletricidade, as primeiras tentativas surgiram no
final do século XIX, mas somente um século depois, com a crise internacional do
petróleo (década de setenta), é que houve interesse em investimentos suficientes
para viabilizar o desenvolvimento e aplicação de equipamentos em escala
comercial. A primeira turbina lica comercial ligada à rede elétrica pública foi
instalada em 1976, na Dinamarca. Atualmente existe mais de trinta mil turbinas
eólicas em operação no mundo.
241
O tamanho das turbinas de vento aumentou na década de noventa,
passando de unidades de cem kW para outras de mil kW. O aumento no tamanho
das turbinas provocou uma diminuição drástica dos custos. Os pequenos
geradores têm diâmetros de dezesseis metros, produzindo kW, e grandes
aerogeradores que chegam a atingir diâmetros de quarenta e oito vírgula um
metros com capacidade de mW
242
.
O primeiro aerogerador instalado no Brasil foi resultado de um
convênio da Companhia Energética de Pernambuco CELPE e a entidade
dinamarquesa Folkcenter e o grupo de energia eólica da Universidade Federal de
Pernambuco. A turbina eólica foi instalada em Fernando de Noronha, em 1992. A
240
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
241
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
242
MUYLAERT, M. S.; PEREIRA, A. S.; ROSA, L. P.; FREITAS. M. A. V.; MIGUEZ, J. D. G.
Consumo de energia e aquecimento do planeta. Rio de Janeiro: COPPE/UFRJ, 2001.
154
primeira tentativa de funcionamento fracassou. O problema foi solucionado por
técnicos brasileiros, após três meses da primeira tentativa.
243
A turbina possui um gerador assíncrono de setenta e cinco kW, rotor
de dezessete metros de diâmetro e torre de vinte e três metros de altura. Na
época em que foi instalada, a geração de eletricidade correspondia a dez por
cento da energia gerada na ilha, proporcionando uma economia de
aproximadamente setenta mil litros de óleo diesel por ano. A segunda turbina foi
instalada em maio de 2000 e entrou em operação em 2001. O projeto foi realizado
pelo CBEE, com a colaboração do RISO National Laboratory da Dinamarca e
financiado pela ANEEL. Juntas, as duas turbinas geram até vinte e cinco por
cento da eletricidade consumida na ilha. Esses projetos tornaram Fernando de
Noronha o maior sistema híbrido eólico – diesel do Brasil.
244
Figura 12 - Foto Ilustrativa - Fernando de Noronha
243
MUYLAERT, M. S.; PEREIRA, A. S.; ROSA, L. P.; FREITAS. M. A. V.; MIGUEZ, J. D. G. op. cit.
244
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
155
Figura 13 - Foto Ilustrativa – Fernando de Noronha
O desenvolvimento de novas tecnologias fez com que as pás dos
rotores fossem mais leves e fortes, possibilitando a construção de torres mais
altas, o que implica um aumento do potencial de geração, pois quanto mais alto,
mais veloz é o vento. As usinas eólicas são constituídas por muitos geradores
independentes, que estão conectados a um sistema central de controle, que faz o
fornecimento para a rede de distribuição.
A energia lica é totalmente dependente da força dos ventos, pois
este varia com o cubo da velocidade deste com a área varrida pelas pás.
O sistema de controle é constituído por uma série de sensores
(sensor de vento, rotação do rotor, carga de bateria, etc.), que fornecem os dados
que permitem o funcionamento harmônico e seguro de todo o sistema, com o
melhor aproveitamento possível do vento.
245
O sistema de armazenamento de energia é composto por baterias,
que captam a energia excedente que não foi consumida, podendo ser utilizada de
acordo com a necessidade.
Um aumento na velocidade do vento de aproximadamente oito km/h
para vinte e quatro km/h irá gerar vinte e sete vezes mais força na turbina. Sendo
assim, a localização da turbina de vento é muito importante. Apesar de algumas
245
REIS, L. B. op. cit.
156
localizações serem claramente melhores que outras em função da disponibilidade
de vento, existe uma considerável variação na velocidade do vento de um dia
para o outro e de ano para ano. Características topográficas locais influenciam
fortemente os ventos e, às vezes, ocorrem grandes variações de velocidades em
uma área pequena.
A torre de sustentação da turbina tem que ser a mais alta possível,
porque a velocidade do vento aumenta à medida que nos afastamos do solo.
Boas turbinas de vento são aquelas que podem utilizar ventos de alta velocidade
de forma eficiente, que a produção de energia está relacionada com o cubo da
velocidade do vento. Geradores com menos lâminas, de duas ou três, são muito
mais eficientes que os de múltiplas pás, os quais são bons em baixas velocidades
de vento.
Até o final de 2002, mais de quarenta mil geradores eólicos entraram
em operação no mundo, com capacidade instalada de trinta e dois mil e
quinhentos mW. Mais de cinqüenta mil novos empregos foram criados e uma
sólida indústria de componentes e equipamentos foi desenvolvida. A indústria de
geradores eólicos cresce atualmente trinta por cento ao ano, com um retorno de
dois bilhões de dólares por ano. A previsão para 2007 é que a capacidade
instalada chegue a cinqüenta e oito mil, seiscentos e trinta e dois mW. Na Europa
a expectativa é que chegue a dez por cento de toda a energia gerada até 2003
246
.
No Brasil, o uso da energia eólica ainda é em pequena escala,
especialmente considerando o seu grande potencial. Em 2001, o Ministério de
Minas e Energia, por meio do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica, publicou o
Atlas Eólico do Brasil, com informações sobre o comportamento do vento em todo
o país.
Na foto abaixo, temos a velocidade média anual do vento a
cinqüenta metros de altura:
246
ARAÚJO, M. S. M. de; FREITAS, M. A. V. de. Aceptance of renewable energy innovatios in
Brazil – case study of wind energy. Renewable & sustainable Energy Reviews, 2006.
157
Figura 14 - Mapa do Brasil com a velocidade média anual do vento, a cinqüenta metros de altura
Fonte: FEITOSA, E.A.N. et al. Panorama Eólico no Brasil: Dupligráfica, 2003 (adaptado).
Em condições normais de ventos fortes, o rotor deve destacar ou
dispensar o excesso de força que o gerador o consiga processar, sem,
contudo, danificá-lo. Isto é normalmente chamado de feathering, ou seja, inclinar
as lâminas da turbina de forma que muito pouco de suas áreas entrem em contato
com o vento e, desta forma, extraiam menos forças destes.
247
247
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
158
Figura 15 - Croqui da Mecânica de um Moinho
Fonte: Centro Brasileiro de Energia Eólica – CBEE/UFPE. 2000. Disponível em:
<www.eolica.com.br> (adaptado para o presente trabalho)
As turbinas de vento são classificadas em função da orientação do
eixo do rotor. Existem turbinas de eixo horizontal (tipo hélice) e as turbinas de eixo
vertical (Darrieus). Estas podem ser instaladas em terra (onshore) ou no mar
(offshore).
Os tipos mais comuns são aqueles com eixos horizontais e lâminas
verticais. O propulsor de duas (ou três) lâminas é o mais eficiente para a geração
de eletricidade e é também o mais comum por causa de seu tamanho. Apesar de
sua eficiência, nenhum modelo consegue extrair toda a energia existente no
vento. A eficiência teórica máxima da conversão de energia lica em elétrica de
um rotor ideal é de no máximo sessenta por cento.
248
248
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
159
O rotor de Darrieus possui formato parecido com o de uma
batedeira. Rotores de eixo vertical possuem a vantagem de não terem que mudar
de posição quando o vento muda de direção. Eles também têm sua caixa de
câmbio e seu gerador montados no solo e não no alto da torre, o que reduz seu
custo com estrutura e manutenção. Contudo, eles são difíceis de serem
instalados por causa da altura de suas torres, que aproveitam as maiores
velocidades do vento, tornando-o menos interessante comercialmente.
249
Figura 16 - Rotor de Darrieus
Fonte: <www.aondevamos.erg.br/textos/galeria01.htm>.
Energia Eólica – Galeria de Fotos.
Um gerador acionado pelo vento possui uma determinada produção
em watts, a qual ocorre com uma dada velocidade do vento. Para que a produção
de energia em um determinado sistema seja atingida, ventos devem ter uma
velocidade próxima dos trinta km/h, caso estejam com velocidade superior, a
inclinação das lâminas tem de ser modificada para evitar que a turbina de vento
produza mais energia mecânica do que o gerador esteja projetado para suportar.
O impacto ambiental da energia eólica é praticamente insignificante,
sendo seu principal problema a poluição visual, apesar de existirem algumas
preocupações com relação ao barulho, acidente com as aves migratórias e
249
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
160
interferência em aparelhos eletrônicos. Outras características positivas das
turbinas de vento são o seu curto período de construção, o tamanho reduzido de
suas unidades em relação às de outros tipos de geradores de eletricidade e a sua
capacidade de serem adaptadas sob medida aos usos e às localizações
específicas. Outra vantagem da energia lica, especialmente no caso da
utilização residencial, é que ela é um excelente complemento para a energia
solar: dias com pouco sol geralmente são aqueles com ventos acima da média.
250
Na tabela abaixo (09), encontramos as centrais eólicas no Brasil no
ano de 2003.
Tabela 08 - Centrais Eólicas Brasileiras
Fonte: Agência Nacional de Energia Eólica – ANEEL. Banco de Informações de Geração – BIG
2003. (adaptado)
10.2. Impactos ambientais de um parque eólico
As principais vantagens das usinas eólicas são: a não geração de
material poluente e a utilização de uma fonte limpa, renovável e abundante de
acordo com o lugar em que vai ser implantada. Porém, uma das maiores
dificuldades deste tipo de usina é encontrar um terreno com condições de ventos
250
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
161
adequados para sua construção, apesar de sua implantação ser relativamente
fácil.
As principais desvantagens desse tipo de energia é que ela se
restringe a poucas áreas, pois a turbina tem uma faixa ótima para que seu
funcionamento seja satisfatório. Quando a velocidade do vento está abaixo de
três m/s (velocidade necessária para a partida do rotor), o funcionamento da
turbina é interrompido. Acima de trinta m/s, as pás do rotor são alinhadas na
direção do vento, para evitar danos mecânicos ao aerogerador
251
. A manutenção
das unidades geradoras é cara e demorada. O aspecto visual do parque eólico é
considerado desagradável, bem como o ruído provocado por ele.
252
Quando
próximos às áreas habitadas ou reservas florestais, causa estresse nas
populações locais. Os geradores de eixo horizontal o mais silenciosos do que
os de eixo vertical.
Outro impacto negativo das centrais eólicas é a possibilidade de
interferências eletromagnéticas, que podem causar perturbações nos sistemas de
comunicação e transmissão de dados. Também a possível interferência na rota
de aves deve ser devidamente considerada nos estudos e relatórios de impactos
ambientais.
Há, também, o problema de que a energia eólica necessita de
formas de armazenamento nem sempre baratas ou mesmo eficazes. As formas
mais conhecidas e viáveis o os armazenamentos em baterias, no
bombeamento hidráulico e por injeção na rede.
253
O armazenamento em baterias
é o mais versátil e eficiente, porém apresenta problemas com relação à
manutenção e à disposição final destas baterias.
10.3. Desativação de um parque eólico
Na desativação de usinas eólicas o material empregado nas torres é
considerado sucata. O grande problema são as baterias empregadas no
251
FARRET, F. A. Aproveitamento de pequenas fontes de energia elétrica. Santa Maria: UFSM,
1990.
252
ARAÚJO, M. S. M. de; FREITAS, M. A. V. de. op. cit.
253
FARRET, F. A. op. cit.
162
armazenamento da energia, pois contêm chumbo, cádmio, cobre, zinco,
manganês, níquel, lítio e mercúrio, que são materiais tóxicos. Estes materiais,
quando a sua destinação for correta, podem ser reciclados sem apresentar riscos
ao meio ambiente.
Quanto ao local onde o parque eólico está instalado, pode ser feita
uma recuperação da área, fazendo-se um reflorestamento ou uma adequação a
outro tipo de atividade necessária à região.
163
11. ENERGIA SOLAR
O Sol é uma fonte perene, gratuita, não poluente de energia e
responsável por todas as formas de vida no planeta.
A energia eólica é o recurso energético cuja utilização aumenta mais
rapidamente no mundo hoje.
Na década de noventa, ela apresentou um impressionante
crescimento de trinta e sete por cento ao ano na Europa. Em seguida vem a
energia fotovoltaica, com vinte e quatro por cento de crescimento por ano no
mundo. Por sua vez, a energia hidrelétrica fornece dezenove por cento da energia
consumida no planeta atualmente. Alguns estudos recentes indicam que as fontes
renováveis devem aumentar sua participação para trinta a quarenta por cento do
total em 2050, pressupondo os esforços globais em termos de políticas públicas
voltadas para as questões ambientais, especialmente as relacionadas com a
mudança do clima
254
.
As fontes ou recursos energéticos renováveis podem ser
categorizados nas formas solar, lica, hídrica, biomassa e geotérmica. A energia
hidrelétrica é a maior contribuinte em termos de recursos renováveis. A biomassa
(madeira e resíduos agrícolas) também é muito importante, especialmente em
termos globais. A energia solar radiante é utilizada para o aquecimento de
edificações, de água para consumo residencial e para a produção de eletricidade
por meio de células solares e geradoras de calor.
As usinas solares podem ser constituídas por lulas fotovoltaicas
que transformam a energia solar em eletricidade com rendimento variado entre
três e vinte e cinco por cento, ela comporta-se como uma bateria de baixa tensão,
utilizada em geração de pequena escala. Nas regiões próximas ao equador, o sol
incide sobre a terra uma energia de seis vírgula quatro kW/m2/dia.
255
254
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
255
Id. Ibid.
164
11.1. História da energia solar
O uso da energia solar para aquecimento remete à antiguidade.
Arquimedes, em duzentos e doze antes de Cristo, usou a capacidade de reflexão
de um escudo de bronze polido dos guerreiros gregos para atear fogo aos navios
romanos. O espelho incendiou as velas dos navios a uma distância de algumas
dezenas de metros
256
.
Nos séculos XVII e XVIII, cientistas concentravam os raios solares
com espelhos e lentes para derreter metais. Antoine Lavoisier, frequentemente
chamado pai da química moderna, atingiu temperaturas próximas de mil e
setecentos graus Celsius usando a radiação solar, temperaturas estas mais altas
do que as obtidas por qualquer um naquela época.
257
Aquecedores solares de vapor foram desenvolvidos no final do
século XIX para movimentar motores. O francês August Mouchot fez funcionar,
em 1878, uma quina de impressão usando vapor produzido por um artefato
semelhante ao mostrado na figura abaixo.
256
BOYLE, G. Renewable energy: power for a sustainable future. London: Oxford, United Kingdom,
2004.
257
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
165
Figura 17 - Motor a Vapor Solar
Motor a vapor solar, Paris, 1878. A água aquecida pelo Sol no foco do prato/disco concentrador
(A). O vapor produzido era utilizado para fazer funcionar um motor a vapor (B), cuja produção de
energia mecânica fazia funcionar uma máquina de impressão. A água era fornecida por um tanque
(C). Fonte: Hinrichs, Roger A.
Um interessante empreendimento comercial da década de 1910, no
Egito, usou uma caldeira solar para fornecer vapor para a operação de bombas
de irrigação.
258
Outro grande projeto que usou os raios solares para aquecimento
ocorreu na década de 1870 no Chile, onde um engenho solar de quatro mil
seiscentos e quarenta e cinco metros quadrados foi construído para fornecer
cento e setenta e sete mil litros de água fresca. Este projeto utilizava telhados de
vidro instalados sobre bandejas de água salgada; a água evaporava das
bandejas, condensava nos vidros e escorria para receptáculos coletores.
259
No início do século XX, nos EUA, o empresário Frank Schuman
aplicou o mesmo princípio, desta vez com um grande coletor parabólico. Ele o fez
com um potencial melhor de iluminação solar. Após ter construído vários
protótipos, angariou apoio financeiro suficiente para o grande projeto Meady no
Egito, no geral usou cinco coletores parabólicos, cada um com oitenta metros de
258
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
259
Id. Ibid.
166
comprimento e quatro metros de largura. Em 1913, este sistema, que produziu
cinqüenta e cinco cavalos-vapor, foi demonstrado para um grupo de pessoas
importantes da época, incluindo o primeiro ministro britânico Lord Fitchener.
260
A engenharia solar reapareceu com a era espacial, quando, em
1945, o cientista britânico Arthur C. Clarke descreveu uma futura possibilidade do
satélite geoestacionário, do qual ele enviaria sinais de televisão para todo o
mundo, emitidos por uma máquina movida a energia solar. De fato, o tal satélite
materializou-se, vinte e cinco anos mais tarde, por células fotovoltaicas, que foram
desenvolvidas como fonte confiável de geração de eletricidade.
261
Durante a década de oitenta, foram construídos os primeiros
grandes arranjos experimentais para a geração de eletricidade com o emprego de
altas temperaturas. Foram desenvolvidos diferentes sistemas de receptores
centrais ou do tipo torre de energia. O sistema Solar One de dez mW em Barstow,
Califórnia, é um exemplo. Ele usa um campo heliostático que reflete os raios do
sol em uma caldeira no topo de uma torre central.
262
Inicialmente a planta de Barstow usou óleos sintéticos especiais
resistentes à alta temperatura para alimentar o aquecimento da caldeira. Nos
anos de 1990, ela foi reconstruída como Solar Two, conforme foto abaixo, e entre
1996 e 1999 operou incluindo o armazenamento de calor com o uso de sal
fundido acima de quinhentos graus Celsius. Isto permitiu a produção de
eletricidade potencial por vinte e quatro horas. Um projeto novo da torre está
sendo construído perto de Sevilha, Espanha, para explorar o uso de ar
superaquecido como meio de transferência de calor.
263
260
BOYLE, G. op. cit.
261
Id. Ibid.
262
Id. Ibid.
263
Id. Ibid.
167
Figura 18 - Foto da central solar de receptor - Central Solar Two em Barstow, Califórnia.
Fonte: www.palha.org/work/ist/fen.pdf.
A maior parte da eletricidade solar gerada em grande escala no
mundo é produzida pela Luz International, instalada em Kramer Junction, no
deserto de Mojave, na Califórnia. Entre os anos de 1984 e 1990, Luz instalou
nove novos sistemas de geração de eletricidade solar em série SEGS Solar
Electricity Generating Systems , gerando de treze a oitenta mW. Trata-se de
sistema híbrido, que opera com auxílio de gás natural, que atende à demanda em
horários de baixa incidência solar.
11.2. Funcionamento de uma planta solar
O princípio por trás do uso direto da energia solar para a produção
de eletricidade foi descoberto em 1887 por Heinrich Hertz e explicado em 1905
por Albert Einstein. Foi observado que, quando a luz atinge determinados metais,
elétrons são emitidos. Este fenômeno é conhecido como efeito fotoelétrico.
Quando a luz brilha na placa negativa, elétrons são emitidos com uma quantidade
168
de energia cinética inversamente proporcional ao comprimento de onda da luz
incidente.
264
A maior parte das células solares é feita pelo agrupamento de duas
camadas muito finas de silício cristalino que passaram por um tratamento
especial. Por meio de um processo chamado dopagem, são adicionadas
impurezas ao silício, alterando suas propriedades e tornando-o um bom
condutor.
265
O aproveitamento da energia solar utiliza sistemas que requerem
temperaturas elevadas conseguidas por meio de concentradores, cuja finalidade é
captar a energia incidente numa área relativamente grande e é concentrada numa
área muito menor, de modo que a temperatura desta última aumenta
substancialmente.
266
Existem dois tipos de sistemas de geração de energia elétrica solar:
os fotovoltaicos autônomos transformam a energia solar em elétrica diretamente e
os termossolares usam a energia solar para gerar vapor, acionando, assim, uma
termelétrica a vapor.
267
O sistema fotovoltaico autônomo é constituído por um agrupamento
de painéis fotovoltaicos (formando um conjunto), um regulador de tensão, um
sistema de armazenamento de energia e inversor de corrente contínua (também
conhecida como corrente alternada).
Os sistemas termossolares convertem energia solar em energia
térmica e essa em elétrica. o constituídos pelo coletor, receptor,
transporte/armazenamento e conversão elétrica. O coletor capta a energia solar
incidente enquanto o receptor absorve e converte esta energia. O sistema de
transporte/armazenagem, onde o fluido é transferido para o sistema em que a
energia térmica converte-se em energia mecânica por meio de ciclos básicos
termodinâmicos (vapor ou gás), depende da temperatura e da natureza do
264
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. op. cit.
265
Id. Ibid.
266
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA. ANNEL. Disponível em:
<http://www.aneel.gov.br/>.
267
REIS, L. B. op. cit.
169
fluido.
268
A escolha do fluido depende da temperatura em que o sistema vai
operar.
Na Alemanha, estão sendo desenvolvidos experimentos com
espelhos parabólicos; em vez dos espelhos de vidro pesado, estão sendo usadas
folhas circulares de película plástica aluminizada, criando um vácuo parcial atrás
da película, podendo ser dobrado em forma de parabólica. Isto cria um espelho de
pouco peso, que requer uma estrutura leve para suportá-lo.
Outra forma de produção solar térmica de eletricidade é a lagoa
solar, que usa um grande lago, sal e um coletor de placa lisa. O lago deve ter
certo gradiente de concentração de sal (água salgada no fundo e água pura no
topo) e água limpa suficiente para absorver a energia solar que é conduzida até o
fundo da lagoa.
269
Referida forma é indicada para as áreas desérticas.
As camadas superiores do lago agem eficazmente como cobertor
isolando a água do fundo da lagoa onde a temperatura pode alcançar até noventa
graus Celsius, sendo alto o suficiente para funcionar como um motor do ciclo
Rankine (vapor).
270
Uma das vantagens deste sistema é que a grande massa
térmica da lagoa age como um armazenador de calor, e a geração de eletricidade
pode funcionar de dia ou de noite, conforme necessário.
Na prática, o sistema tem algumas desvantagens. As grandes
quantidades de água fresca e uma localização apropriada para a lagoa solar são
difíceis de encontrar num deserto, mas estes são requisitos para manter o
gradiente salino e o funcionamento do sistema.
271
Na verdade, o melhor uso para
a lagoa solar é gerar calor para sistemas dessalinizadores de água, mantendo a
produção de água pura e o fornecimento de água potável.
As conseqüências ambientais de plantas térmicas solares são um
tanto complexas. O problema principal é a grande área requerida para a
implantação. Uma planta nova feita sob medida ocupa de três a quatro
quilômetros quadrados. As lagoas e as chaminés solares possuem baixa
268
REIS, L. B. op. cit.
269
BOYLE, G. op. cit.
270
Id. Ibid.
271
Id. Ibid.
170
eficiência termodinâmica, para compensar isto elas necessitam de maiores áreas
planas para a sua implantação.
Para estes tipos de sistemas, os desertos ensolarados são indicados
para atender às grandes demandas urbanas de eletricidade, porém muitas vezes
se tem o inconveniente das grandes distâncias entre eles e os centros
consumidores.
272
Os benefícios da energia solar são os de não ser poluente, de ser
renovável, de ter vida útil de aproximadamente trinta anos e não ser necessária a
concentração de células em um só lugar, bem como turbinas e geradores.
273
11.3. Impactos ambientais de uma célula fotoelétrica
As lulas solares são seladas, podem ser constituídas ou
associadas em módulos com potências variando de Watts a mW. Não poluem o
meio ambiente e sua fonte é renovável e abundante. Porém, o seu rendimento é
em torno de vinte e oito por cento, seu custo de fabricação é muito alto e seus
painéis ocupam grandes áreas para gerar uma pequena quantidade de energia.
Quando comparado o espaço utilizado, estes provocam sombras que poderão
influenciar o ecossistema local. Ainda existe o problema de ser restrito a áreas
com grande insolação anual.
Existem os impactos da produção, quando se faz a análise do ciclo
da vida ou numa comparação mais ampla de tecnologias de geração, o que
englobaria também o impacto na produção dos equipamentos.
274
As baterias empregadas podem ser de chumbo ácido, mais
baratas e encontradas facilmente, ou de níquel cádmio, cujo custo é muito
elevado. Deve-se ressaltar que qualquer que seja a opção de bateria, o material
empregado é altamente poluente.
272
BOYLE, G. op. cit.
273
REIS, L. B. op. cit.
274
Id. Ibid.
171
Alguns todos de fabricação de células fotovoltaicas utilizam
materiais perigosos, como o seleneto de hidrogênio e solventes, similares àqueles
usados na produção de outros semicondutores.
275
A destruição dos módulos que contêm cádmio ou outros metais
pesados poderia criar danos ao meio ambiente, no entanto, os módulos
descartados podem ser economicamente reciclados minimizando os problemas
de destruição.
276
Seu custo ainda é muito alto e também ainda não consegue atender
à demanda. A utilização de material tóxico como o chumbo nos painéis implica um
importante impacto ao meio ambiente.
11.4. Desativação de uma célula fotoelétrica
A remoção de uma célula fotoelétrica não acarreta qualquer prejuízo
para o meio ambiente, pois o usa material poluente; em contrapartida as
baterias empregadas devem ter destinação para que não haja contaminação no
meio ambiente.
275
REIS, L. B. op. cit.
276
Id. Ibid.
172
12. BIOMASSA
Um dos maiores receios dos seres humanos, sem exceção, é ficar
sem os combustíveis convencionais como o petróleo e o gás natural, em vista
disso alternativas que forneçam a utilidade, flexibilidade, limpeza e economia
desses recursos vêm sendo procuradas muitos anos. Uma dessas alternativas
está ao nosso lado, sim, literalmente, ao lado; mais precisamente na lixeira da
cozinha e nas plantas do lado de fora. É a biomassa.
Por biomassa entendemos a energia derivada de matéria viva como
os grãos (milho, trigo), as árvores e as plantas aquáticas; esta matéria viva
também é encontrada nos resíduos agrícolas e florestais (incluindo os restos de
colheita e os estrumes).
A biomassa pode ser utilizada como combustível em três formas:
como combustível sólido como as lascas de madeira; combustível líquido
produzido a partir da ação química ou biológica sobre a biomassa sólida e/ou da
conversão de açúcares vegetais em etanol ou metanol; e combustíveis gasosos
produzidos por meio de processamento com alta temperatura e pressão.
Atualmente abastece três vírgula seis por cento das necessidades
energéticas norte-americanas e pode fornecer várias vezes mais energia que a
esperada de fontes eólicas e fotovoltaicas. A Suécia e a Irlanda utilizam a
biomassa para treze por cento de suas demandas e a Finlândia abastece
quatorze por cento desta maneira
277
.
A biomassa pode ser convertida em combustíveis líquidos e gasosos
em diversas etapas e a combustão direta para a produção de vapor ou
eletricidade já é bastante popular.
No presente estudo trataremos apenas da energia obtida da
madeira, tendo em vista a grande complexidade do tema biomassa.
277
HINRICHS, R. A; KLEINBACH, M. Energia e meio ambiente.
173
12.1. Madeira
Para o Brito
278
, a evolução do consumo mundial de energia, baseada
em combustíveis sseis, conduziu a humanidade para uma matriz energética
insegura, cara e, sobretudo, bastante negativa para o meio ambiente. Isso tem
levado muitos países a considerar a necessidade de profundas mudanças,
incluindo a intensificação do aproveitamento de outras fontes energéticas,
sobretudo as renováveis, incluindo-se a madeira.
No campo energético, a madeira é tradicionalmente chamada de
lenha e, nessa forma, sempre ofereceu histórica contribuição para o
desenvolvimento da humanidade, tendo sido sua primeira fonte de energia,
inicialmente empregada para aquecimento e cocção de alimentos. Ao longo dos
tempos, passou a ser utilizada como combustível lido, líquido e gasoso, em
processos para a geração de energia térmica, mecânica e elétrica.
A utilização da madeira é afetada por variáveis como o nível de
desenvolvimento do país, disponibilidade de florestas, questões ambientais e sua
competição econômica com outras fontes energéticas, como o petróleo, gás
natural, hidreletricidade, energia nuclear, etc.
Na figura abaixo (19) temos o contexto mundial da utilização da
madeira para energia. Percebemos que são os países em desenvolvimento que a
utilizam em larga escala.
278
BRITO, José Otávio. O uso energético da madeira. Estudos Avançados, São Paulo, v. 21, n. 59,
jan./abr. 2007. Professor titular na escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiróz”
(ESALQ/USP), Piracicaba (SP).
174
Figura 19 - Contexto Mundial da Utilização da Madeira para Energia
Fonte: World Research Institute. Earth Trends. The Environmental Portal. Disponível em:
http://www.earthtrends.wri.org.
Sabemos que a madeira, na sua forma direta como lenha ou do seu
derivado, o carvão vegetal, é combustível vital para o preparo de alimento para
inúmeras pessoas em comunidades diversas do mundo. Estima-se que, a cada
seis pessoas, duas utilizam a madeira como principal fonte de energia,
particularmente para as famílias de países em desenvolvimento, sustentando
processos de secagens, cozimento, fermentações, produções de eletricidade, etc.
O uso da madeira para energia engloba a dependência energética
externa e uma maior segurança quanto ao suprimento da demanda, algo que
muitos dos combustíveis hoje empregados não proporcionam.
Faz relativamente pouco tempo que a madeira deixou de ser a
principal fonte de energia primária em nosso país, quando, no século passado,
mais precisamente durante a década de setenta, ela foi suplantada pelo petróleo
e, em seguida, pela hidreletricidade. A participação da madeira no balanço
energético brasileiro veio decrescendo ao longo do tempo, sobretudo porque
houve um incentivo maior para o uso de derivados de petróleo e hidreletricidade
para atendimento das novas demandas energéticas. Nos últimos dez anos,
contudo, pode-se constatar uma forte reversão nessa tendência, conforme
ilustrado nos gráficos abaixo. Referida alteração pode ter sido motivada pelas
175
incertezas quanto à oferta de outras fontes e, sobretudo, pelas vantagens
econômicas e oportunidades ambientais e estratégicas oferecidas pelo uso da
madeira.
Tabela 10 - Utilização da Madeira na Produção de Energia
Fonte: Ministério das Minas e Energia, disponível no site: <http://www.brasil-
rounds.gov.br/geral/balanco_energetico/ben_p03.pdf>.
Segundo informações do próprio Ministério das Minas e Energias, o
volume de madeira atualmente consumido para energia é da ordem de duzentos
e vinte milhões de metros cúbicos anuais; também, segundo fontes
governamentais e de instituições ligadas a setores de aplicação de madeira no
Brasil
279
, o seu consumo anual como matéria-prima industrial atinge cento e
quarenta e dois vírgula sete milhões de metros cúbicos, compreendendo a
produção de celulose e papel, serraria, chapas e painéis. Desse modo, conclui-se
que sessenta e nove por cento da madeira usada no Brasil têm destinação
energética, o que, sem nenhuma contestação, representa o maior volume de
madeira vinculada a um determinado uso no país.
A madeira para energia em nosso país tem sido historicamente
relacionada à produção de carvão vegetal, aos consumos residenciais, industriais
e agropecuários
280
.
No consumo energético da madeira para energia, a produção de
carvão vegetal se destaca em decorrência da demanda existente pelo produto no
279
SOCIEDADE BRASILEIRA DE SILVICULTURA. Disponível em:
<http://www.ipef.br/estatisticas/relatorios/SBS-2005.pdf>.
280
BRITO, José Otávio. op. cit.
176
setor siderúrgico. O Brasil é o maior produtor mundial de aço produzido com o
emprego do carvão vegetal para fins de redução do minério de ferro.
Mostrando uma evolução significativa quanto ao atendimento da
demanda por ações visando à sustentabilidade do setor, o uso de carvão vegetal
proveniente de madeira de florestas vem apresentando um franco crescimento.
Conforme trabalho publicado pelo professor Brito, se em 1990 esse valor era de
apenas trinta por cento, atualmente ele representa mais de setenta por cento
do volume consumido.
Como segundo importante consumidor de madeira para energia no
Brasil, temos o setor residencial. Nesse setor, a madeira é fortemente usada para
cocção de alimentos e, em menor escala, para aquecimento domiciliar. Trata-se
de um consumo particularmente atrelado à evolução de consumo de gás liquefeito
de petróleo, seu substituto natural na maioria das residências brasileiras e para o
qual, ao contrário da madeira, políticas oficiais de incentivos sempre se fizeram
presentes.
O terceiro mais importante consumo de madeira para energia no
Brasil encontra-se disperso em uma série de componentes atrelados ao ramo
industrial, representado pelos milhares de empreendimentos industriais do ramo
do cimento, químico, alimentos e bebidas, papel e celulose e cerâmicas. O grande
destaque situa-se no ramo de alimentos e bebidas e no ramo cerâmico,
representando mais de sessenta por cento do consumo.
Por fim, o setor agrícola coloca-se como o quarto grande
demandador de madeira para energia no país e, apesar da não existência de um
diagnóstico preciso sobre a distribuição desse consumo, acredita-se que a
dependência concentra-se na secagem de grãos.
12.2. A energia no sistema constitucional brasileiro
Sabemos que em torno do homem gravita a proteção da tutela
jurídica prevista pelo legislador constitucional pátrio principalmente ao indicá-lo
como titular máximo do direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, à
177
sadia qualidade de vida como fundamento do Estado Democrático de Direito,
dirigindo-se não apenas à presente, mas também às futuras gerações, o que
levou o constitucionalista a adotar a visão antropocêntrica de inspiração na
filosofia humanística.
A opção do legislador constitucional pelo antropocentrismo não
indica rigidez formal, mas ao destinatário da norma, visando, especialmente,
proteger tudo o que importa ao bem-estar humano, em sentido amplo. Muito sábia
a afirmação de Maria Garcia, em sua prelação em aula, sobre o fato de o Estado
Brasileiro, ao desejar “construir uma sociedade livre, justa e solidária”, consoante
o artigo 3º da Constituição Federal, trazer em seu bojo um convite à humanização
do ser humano. Este aspira ao bem-estar, vive-o e o procura. É da sua essência
viver bem ao seu modo, ter direito a evoluir e estar plenamente em paz com o seu
espírito, equilibrado mental e fisicamente. Para alcançar esta plenitude, o
legislador fundamentou a ordem política mandamental no Estado Democrático de
Direito
281
.
Esse ideal é expresso como fraternidade, igualdade, dignidade, que
são os direitos fundamentais do homem, vindo a ser garantidos e concretizados
na vivência digna, livre e plural, igual para todos. Singular a síntese de José
Afonso da Silva
282
ao inferir que:
Direitos fundamentais do homem constituem a expressão mais
adequada a este estudo, porque, além de referir-se a princípios
que resumem a concepção do mundo e informam a ideologia
política de cada ordenamento jurídico, são reservadas para
designar, no nível do direito positivo, aquelas prerrogativas e
instituições que ele concretiza em garantias de uma convivência
digna, livre e igual de todas as pessoas. No qualificativo
fundamentais acha-se a indicação de que não se realiza, não
convive e, às vezes, nem mesmo sobrevive; fundamentais do
homem no sentido de que todos, por igual, devem ser não apenas
formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente
efetivados”.
A aplicação desses princípios fundamentais concretiza o projeto
social do Estado, norteando a materialização do que seja o direito de todos a
meio ambiente ecologicamente equilibrado, vinculado o termo ‘ecologicamente’ ao
281
FERREIRA, Ana Maria. op. cit.
282
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros Ed., 2004.
178
equilíbrio psicofísico e social do homem, a tudo aquilo que rege a vida sob todas
as suas formas, na expressão preconizada pela Política Nacional do Meio
Ambiente, artigo 3º da Lei 6.938, de 1981, recepcionada pela Carta Magna.
Nesse passo, o antropocentrismo clássico levaria a uma rigidez
formal, considerados os princípios previstos na Constituição, e esta, na doutrina
de Jorge Miranda, sendo norma integradora cuja função principal é a criação e
manutenção contínua da unidade política e da unidade do ordenamento jurídico
intenção e tarefa que se cumprem com a ligação constante à realidade do
momento presente’
283
.
O homem vive em um meio ambiente em constante mutação e
degradação, porém estas nem sempre são causadas pela ação humana. O
homem, no centro da imputação jurídica, é o titular do direito, ao mesmo tempo de
dever de proteger e preservar o meio ambiente que abriga a vida em todas as
suas formas, o que permite concluir que o antropocentrismo abarca elementos
biocêntricos nesta proteção, o que a doutrina portuguesa denomina de
antropocentrismo alargado
284
.
Contudo, observa-se que o ordenamento adotou elementos da visão
biocêntrica, é o que se extrai dos incisos I e V, do artigo 3º, da Lei 6.938/91:
Art. 3º. – Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite,
abriga e rege a vida em todas as suas formas;
...
V recursos ambientais: a atmosfera, as águas interiores,
superficiais e subterrâneas, os estuários, o mar territorial, o solo, o
subsolo, os elementos da biosfera, a fauna e a flora”.
Celso Pacheco
285
leciona que a primeira questão a ser analisada
refere-se ao objeto da tutela do direito ambiental, ou seja, se o direito ambiental
seria destinado à pessoa humana ou à vida em todas as suas formas. O
doutrinador assevera que o meio ambiente é voltado para a satisfação das
283
MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Rio de Janeiro: Forense, 2003.
284
SENDIM, José de Souza Cunhal. Responsabilidade civil por danos ecológicos: da reparação do
dano através de restauração ambiental. Lisboa: Coimbra, 1998.
285
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. op. cit.
179
necessidades humanas, e que isso não impede que ele proteja a vida em todas
as suas formas, conforme determina o artigo 3º da PNMA
286
e que este foi
inteiramente recepcionado pelo artigo 225 da Constituição Federal, protegendo
todos os bens ambientais, neles incluídos o bem material e o imaterial.
Consuelo Yatsuda
287
sintetiza o que ora trouxemos da seguinte
forma:
... a tutela jurídica do meio ambiente não é um fim em si mesma,
ela não se exaure nela mesma. A proteção ambiental ganha maior
relevância jurídica quando se pensa que da qualidade do meio
ambiente depende a fruição dos direitos e valores fundamentais
da pessoa humana, a começar da própria vida. O que a
Constituição busca assegurar, em última análise, é o direito
fundamental à vida e à dignidade humana e sua efetividade (art.
225, caput, e §1º), pela tutela do ambiente. (negrito da autora).
12.3. Conceito e natureza jurídica do bem ambiental
Bem ambiental é um valor difuso, material ou imaterial, que serve de
objeto imediato a relações jurídicas de natureza ambiental. É um bem autônomo,
de uso comum do povo, não é de ninguém mas é de todos, elemento necessário
à sadia qualidade de vida, ecologicamente equilibrada. O titular do bem ambiental
é uma coletividade de pessoas indefinidas
288
.
A Constituição Federal, no artigo 225, identifica o bem ambiental
como bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida. Se for de
todos, não é de ninguém em particular, não havendo titulariedade individual, nem
se cogita se é público ou particular na visão tradicional. Ver, nesse sentido, Celso
A.P. Fiorillo, Rui Piva
289
, Marcelo Abelha Rodrigues
290
.
Sendo assim, bem ambiental é o todo que compõe o universo,
acrescido da obra e criação humana, fornecendo ao ser humano, como
286
Lei 6.938/81.
287
YOSHIDA, Consuelo Yatsuda Moromizato. Poluição em face das cidades no direito ambiental
brasileiro: a relação entre degradação social e degradação ambiental. 2001. Tese (Doutorado)
Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2001.
288
FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. op. cit.
289
PIVA, Rui Carvahlo. Bem ambiental. São Paulo: Max Limonad, 2000.
290
RODRIGUES, Marcelo Abelha. Instituições de direito ambiental. São Paulo: Max Limonad,
2002.
180
destinatário final, bens naturais e artificiais, necessários à sua vivência digna e ao
bem estar, de uso comum de todos. E estes conjuntos de bens tutelados pelo
direito transcendem a vontade estatal e a individual.
12.4. Natureza jurídica da energia elétrica
A Constituição Brasileira preconiza no artigo 225 que todos têm
direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do
povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo o dever ao Poder Público e
à coletividade de preservá-lo para esta e futuras gerações. O legislador
constitucional não restringiu o alcance do meio ambiente, ao contrário, fê-lo da
maneira mais extensível ao meio em que vive o homem, o todo, nele incluindo os
bens naturais, artificiais, históricos e paisagísticos. É neste sentido que manifesta
a doutrina de José Afonso Silva
291
, na sua clássica definição de meio ambiente.
Marcelo Abelha
292
leciona que “foi o próprio legislador constitucional que deu as
diretrizes para definir a natureza jurídica do bem ambiental ao dizer que ele é o
bem de uso comum do povo”, nele incluindo a energia elétrica, pela sua
apropriação de recursos naturais e sua imbricação na geração, transmissão e
distribuição, riquezas indispensáveis ao meio ambiente artificial e cultural.
Essa natureza singular da energia elétrica que é ao mesmo tempo
um bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida, cujo acesso
deve ser propiciado a todos, tendo, portanto, características de natureza pública,
mas com matizes privadas, a partir da constatação de que a energia poderá ser
produzida e transformada para consumo particular, sem interferência do Poder
Público; nem por isso, perde a energia sua característica de ser bem de interesse
difuso, em função de que nas situações de emergência ou escassez, o particular
que produz para consumo próprio poderá ser instado a dispor dela para atender
ao interesse público.
293
291
SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. São Paulo: Malheiros Ed., 2004.
292
RODRIGUES, Marcelo Abelha. op. cit.
293
FERREIRA, Ana Maria. op. cit.
181
Constata-se que uma parte da doutrina que considera a energia
como instituto de direito civil, tomando-a como bem móvel. Clever Campos
294
dispõe que:
Energia elétrica é resultado de conversões energéticas, a partir
de fontes de origem diversas (hidráulica, térmica, solar, eólica,
etc.), em eletricidade realizada por geradores, e transportada até o
centro de consumo, através de linhas de transmissão e
distribuição, tendo, portanto, bem clara sua característica de bem
móvel”.
Tal definição decorre do disposto nos artigos 82 e 83 do Código
Civil, instituto este já por nós examinado.
A natureza da energia será ao mesmo tempo bem de uso comum do
povo, imaterial e de caráter difuso. É um bem essencial à sadia qualidade de vida,
e participa de toda a cadeia que completa o que Celso Fiorillo, em obra
mencionada, denomina de Piso Vital Mínimo, indicado no artigo 6º da Constituição
Federal e, completa o autor, que o bem essencial à sadia qualidade de vida, são
todos aqueles que fundamentam a República Federativa do Brasil, são essenciais
à garantia da dignidade da pessoa humana”.
Para definir a natureza jurídica da energia, o conceito proposto é de
que a energia é um bem essencial à sadia qualidade de vida, ao bem-estar e à
segurança de todos, bem difuso que visa não apenas à pessoa humana, mas ao
seu aproveitamento econômico, que serve aos interesses de toda a coletividade.
A doutrina italiana reconhece que a energia tem natureza jurídica de
direito público; a questão não envolve apenas esse ramo, mas repercute no
direito civil e isso o autoriza dizer que seja um direito puramente privado
295
, da
mesma forma ocorrendo na doutrina de Ramón Martin
296
, que oscila na posição
mista entre público e privado, o que ele atribui a raras monografias sobre o
assunto.
294
CAMPOS, Clever M. Introdução ao direito de energia elétrica. São Paulo: Ícone, 2001.
295
GENTILE, Giovanni G. Lezioni di diritto dell’energia. Roma, 1987.
296
MATEO, Ramon Martin. Nuevo derecho energético. Madrid: Instituto de Estudios de
Administración Local, 1982.
182
12.5. Competência material dos recursos energéticos
Constituem entre os bens da união os potenciais de energia
hidráulica, as jazidas e/ou recursos minerais, estando sujeitos a um regime
especial de propriedade, dispondo a Magna Carta que esses bens têm
titulariedade distinta da do solo, do subsolo e dos recursos naturais. O interesse a
ser tutelado ao distinguir a propriedade do solo com os recursos naturais visa
assegurar a continuidade e o uso para benefício comum dos brasileiros e
estrangeiros residentes no país.
Ao definir que uma categoria de bens está sujeita a um regime
especial na sua titulariedade, cotejando-os como bens públicos, na visão clássica
da propriedade de bens públicos e privados, a Constituição Federal inclui outros
valores que devem superar essa divisão, em especial ao inserir a tutela do meio
ambiente como um todo harmônico, assegurando a todos os direitos de fruição do
equilíbrio ecológico, competindo a todos e ao Poder Público a sua manutenção.
Decorre, então, a necessidade de inserção de um novo ingrediente a função
social, que não se dedica apenas à propriedade, mas a toda classe de bens,
incluindo os poderes formadores do Estado.
Ao tratar dos recursos energéticos, a Constituição Federal de 1969,
artigo , inciso XV, alínea ‘b’, previa a competência da união para exploração
direta ou mediante concessão. A novel Carta foi mais abrangente, incluindo entre
os bens da união os potenciais de energia hidráulica artigo 20, inciso VIII –, os
recursos minerais, inclusive os do subsolo artigo 20, inciso IX -, e, por
conseguinte, à união compete explorar diretamente ou mediante autorização,
concessão ou permissão, os serviços e instalações de energia elétrica e o
aproveitamento energético dos cursos d’água, em articulação com os estados
onde se situam os potenciais hidroenergéticos.
O aproveitamento desses recursos está condicionado ao interesse
nacional, conforme o disposto no § 1º do artigo 176, que dispõe:
Art. 176 As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos
minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem
propriedade distinta do solo, para efeito de exploração ou
aproveitamento, e pertencem à união, garantida ao concessionário
a propriedade do produto da lavra.
183
§1º - A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o
aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo
somente poderão ser efetuados mediante autorização ou
concessão da união, no interesse nacional, por brasileiros ou
empresas constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua
sede e administração no país, na forma da lei, que estabelecerá
as condições especificadas quando essas atividades se
desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas”.
O legislador constituinte não pretendeu classificar os potenciais
energéticos quanto às suas fontes, porém o parágrafo 4º do artigo transcrito prevê
que não dependerá de autorização a concessão de aproveitamento do potencial
de energia renovável de capacidade reduzida.
Desta forma, ao prescindir de autorização ou concessão, a
exploração de potencial de energia de fonte renovável, mesmo sendo “reduzido”
não estaria afeto a gerar economia de escala nem mesmo interesse público; mas
resta saber o que seria capacidade reduzida. Essa disposição foi inspirada no
Código de Águas, em seu artigo 139, §§2º e 3º:
Art. 139 – o aproveitamento industrial de quedas de águas e
outras fontes de energia hidráulica, quer do domínio público, quer
do domínio particular, far-se-á pelo regime de autorizações e
concessões neste Código.
...
§2º - Também ficam excetuados os potenciais de quedas d’água
de potência inferior a 50 kW para uso exclusivo do respectivo
proprietário;
§3º - Dos aproveitamentos de energia hidráulica que, nos termos
do parágrafo anterior, não dependam de autorização, deve ser
todavia notificado o sérico de águas do Departamento Nacional de
Produção Mineral do Ministério da Agricultura, para fins
estatísticos”.
um evidente equivoco semântico, que a energia em escala
reduzida, com potencial inferior a 50 kW, a exemplo da energia eólica ou mesmo
a solar, independentemente da degradação que causará na sua apropriação e
transformação, estaria isenta de autorização ou concessão para se produzir, mas
não isenta de licença ambiental, ainda que simplificada. O imaginário do operador
do direito não pode se escudar das transformações que se operam na
sociedade, com a multiplicação de pequenos negócios, cooperativas interligadas,
184
ou mesmo terceirizações, que possuem uma função social e podem não
corresponder ao interesse público, sob o ponto de vista do bem produzido como
indispensável à sadia qualidade de vida, bem ambiental de uso comum, que
poderá ser suscetível de apropriação, atendendo ao princípio da propriedade
privada, mas nunca olvidando de sua função social
297
.
A exploração dos recursos minerais, do petróleo ou do gás natural,
dos potenciais hidráulicos para a geração de energia elétrica, por constituírem
bens da união, é assegurada aos estados, Distrito Federal e aos municípios, bem
como a órgãos da administração direta da união, participação nos resultados
dessa exploração, ou então compensação financeira, a teor do disposto no artigo
20, §1º da Magna Carta.
A união tem competência privativa pra legislar sobre águas, energia
artigo 22, inciso IV, da CF e os estados, se autorizados por lei complementar,
poderão legislar sobre questões específicas dessa matéria, consoante o disposto
no parágrafo único do artigo 22 do referido diploma legal. No entanto, a
competência é comum – em matéria de proteção ao meio ambiente e ao combate
da poluição para a união, estados, Distrito Federal e municípios. Envolvendo o
bem ambiental energia que interfere no meio ambiente, os entes federados
poderão legislar complementarmente no interesse local, mas não no que diz
respeito ao uso dos potenciais hidroenergéticos para geração de energia.
Por outro lado, o artigo 23, inciso XI, da Constituição Federal, dispõe
que é da competência comum da união, dos estados, do Distrito Federal e dos
municípios registrar, acompanhar e fiscalizar as concessões dos direitos de
pesquisa e exploração dos recursos hídricos e minerais em seus territórios. Tal
disposição está consentânea com o disposto no artigo 225, que impõe ao Poder
Público o dever de defender e proteger o meio ambiente ecologicamente
equilibrado e, ao mesmo tempo, conceder retribuição na repartição da receita ou
compensação financeira pela atividade de vigilância – artigo 2º, §1º.
297
FERREIRA, Ana Maria. op. cit.
185
CONCLUSÃO
A preservação do meio ambiente é de suma importância para a
preservação da própria vida e depende da colaboração de todos os membros da
sociedade, os maiores beneficiados com a manutenção do equilíbrio ecológico e
os maiores prejudicados com o seu desequilíbrio.
Quando falamos em bem difuso no presente trabalho, logo
associamos ao meio ambiente. A proteção ao meio ambiente visa regular as
relações entre os seres humanos e a interação destes com o meio em que vivem,
buscando, assim, o bem estar social. O meio ambiente é, devido a sua
incontestável importância, um bem de natureza irrenunciável, imprescritível e
indisponível. É um bem do qual nem mesmo o Estado é titular.
Sabemos que a indivisibilidade é a primeira característica do objeto
do bem difuso. Em relação ao meio ambiente, pela própria natureza do direito
questionado, a indivisibilidade há de ser essencial.
Os bens difusos são também irrenunciáveis, ou seja, não os
podemos perder voluntariamente nem abrir mão do direito de -los preservados
ao nosso redor.
A proteção dos direitos difusos e coletivos exige uma reavaliação da
cultura jurídica tradicional, com a criação de novos procedimentos e,
principalmente, com o exercício da ordem constitucional, enquanto instrumento da
ordem social, capaz de revitalizar o processo de democratização econômica e
social.
Os recursos energéticos renováveis oferecem muitas vantagens
para um mundo carente de energia. Eles podem ser usados de muitas maneiras,
gerando problemas ambientais mínimos e podem ser controlados com tecnologias
apropriadas. Oferecem esperança particularmente para os países em
desenvolvimento, cujas taxas de desenvolvimento econômico são seriamente
comprometidas pelos altos custos da energia.
As eficiências térmicas das diferentes formas de geração de energia
elétrica estão na faixa compreendida entre trinta e quarenta por cento, ou seja, de
186
certa forma elas são equivalentes. Neste caso, o que as diferencia são a
disponibilidade do combustível e os impactos gerados.
Analisando o potencial de geração pela área ocupada, a maior
produção de energia por metro quadrado é a da energia nuclear. A energia
térmica a gás e a térmica a óleo apresentam valores bem próximos da térmica
nuclear. A térmica a carvão tem uma potência por área instalada cerca de seis
vezes menor do que a térmica nuclear e cinco vezes menor do que as térmicas a
gás e a óleo.
Aspectos relevantes entre as formas de geração de energia
a) Existência de um ciclo do combustível associado
As diversas formas de geração de energia apresentadas neste
trabalho, notadamente as energias dependentes de um ciclo de combustível, ou
seja, térmica a carvão, a gás, a óleo e nuclear, são as de uso mais amplo por
terem domínio de seus processos tecnológicos mais tempo, porém são
oriundas de fontes não renováveis. As usinas hidrelétricas, embora não o sejam,
têm limites naturais de crescimento. Resta a busca de combustíveis renováveis,
dos biocombustíveis e dos resultantes das grandes movimentações naturais de
massa e de energia, como a eólica e a solar, que têm sido a alternativa para o
esgotamento das fontes não renováveis. No caso em que dependem de um ciclo
de combustíveis, existe uma seqüência de operações associadas à extração e ao
beneficiamento da matéria-prima que, via de regra, representa um risco
ambiental.
b) Área ocupada pela unidade geradora
Neste caso a hidrelétrica é a pior, haja vista a imensa área
necessária para a formação dos lagos. É sabido que a biota da região é afetada
pela eliminação de parte dela por afogamento, pela impossibilidade dos peixes de
seguirem seus caminhos naturais e pela separação territorial acarretada pela
grande área alagada. A energia solar, com seus imensos painéis capazes de
criarem microclimas diferenciados pelas sombras formadas, também tem um
impacto razoável sob este aspecto. A energia eólica é um meio termo entre uma
área concentrada e outra um pouco mais dispersa, estes resultados são
concordantes com os encontrados para o norte da América (Gagnon, langer,
187
Uchiyama, 2002). O problema para a geração de energias renováveis como a
eólica, a solar e até a biomassa não são somente as vastas áreas de terra
imobilizadas para isso, mas também a necessidade de grandes quantidades de
água.
c) Quantidade gerada de gases de efeito estufa – GEE
Neste aspecto a nuclear, a solar, a eólica e a hidrelétrica têm uma
enorme vantagem sobre as demais, embora a hidrelétrica favoreça a formação do
gás metano durante os dez primeiros anos de funcionamento. Mesmo entre as
formadoras de GEE existe uma hierarquia. A térmica e a gás são menos
poluentes do que a de óleos e, esta, menos do que a térmica e a carvão, o que
também influencia na escolha do processo de produção.
d) Dependência de fatores sazonais na produção de energia
Neste caso, a de origem hidrelétrica depende do regime de chuvas
para manter a produção constante, embora a formação das grandes represas
também vise à minimização do impacto desta variável. A energia eólica depende
de um regime de ventos constantes e o rendimento da produção de energia solar
é diretamente influenciado pela formação de nuvens e chuvas. As outras formas
de geração, que utilizam material combustível, não são afetadas por fatores
sazonais, como regime de ventos, chuvas e insolação.
e) Impactos causados pela matéria-prima
A extração e o beneficiamento do carvão, do óleo, do gás e do
combustível nuclear pressupõem a poluição ambiental associada a essas
atividades. O ciclo da vida do combustível nuclear é o mais preocupante para o
meio ambiente, haja vista o longo tempo necessário para que este se torne
radiologicamente inofensivo. A mineração de carvão sempre foi razão de
preocupação para a saúde do trabalhador e os vazamentos no transporte de
petróleo e seus derivados têm as conseqüências das suas ocorrências divulgadas
em uma freqüência muito maior do que a tolerada pela sociedade moderna.
f) Bem não-renovável e matéria-prima usada para obtenção da
energia elétrica
188
Neste caso, as térmicas de carvão, a gás, a óleo e a nuclear fazem
uso de material não renovável, cujos estoques finitos criam cenários em que estas
formas de geração deixarão de ser usadas. No caso dos combustíveis fósseis, a
situação é mais dramática em razão de estes também terem inúmeras outras
aplicações industriais, o que acelera ainda mais o seu uso intensivo e a
conseqüente extinção.
g) Possibilidade da instalação da unidade geradora perto dos
centros consumidores
No final do ano de 2006, o mundo estava com metade da sua
população situada nos centros urbanos, no caso do Brasil a população urbana
chega a oitenta por cento. Este adensamento populacional exige que as fontes de
energia estejam mais próximas dos centros de consumo. Isto não só pela questão
da gestão, mas, também, para evitar a perda ocasionada pela dissipação na
transmissão para longas distâncias. As gerações de energia que dependem de
situações geográficas favoráveis, como a hidrelétrica, eólica e solar, são
desfavorecidas quando comparadas com aquelas que podem ser instaladas em
qualquer região, uma vez que o combustível utilizado pode ser transportado até o
local sem maiores problemas. São favorecidas as térmicas a carvão, a gás, a óleo
e a nuclear.
h) Perfil de geração
Neste aspecto a energia solar, por razões óbvias, não tem a mesma
capacidade geradora durante as vinte e quatro horas do dia, nem mesmo nos
trezentos e sessenta e cinco dias do ano. A energia eólica tem o seu pico de
geração após as vinte horas. Neste caso, a solar e a eólica têm seu potencial
máximo de geração atingido fora do horário de pico de consumo, das dezoito às
vinte e uma horas. A vantagem das térmicas a carvão, a gás, a óleo e a nuclear é
que a produção de energia pode ser modulada diminuindo o consumo de
combustível nos horários de menor demanda. No caso da hidrelétrica, esta
modulação não pode ser feita, a menos que as turbinas sejam revertidas, o que
não significa economia de equipamento.
189
Os impactos ambientais provocados pelas energias renováveis
dependem, sobretudo, de especificações técnicas e dos modos de operação, dos
materiais utilizados e da disponibilidade de fontes renováveis.
Desta forma, as projeções do consumo futuro de energia
dependerão criticamente do tipo de desenvolvimento e crescimento econômico
que o país terá.
As decisões de um país na área de energia não podem ser calcadas
em meros modelos. A matriz energética brasileira depende dos rumos que o
desenvolvimento econômico do país vier a seguir. A necessidade de uma política
energética que reconheça esse fato fundamental é crescente, visto que parte do
sistema energético foi privatizado e depende, portanto, de investimentos não
governamentais que não ocorrerão a o ser que regras claras sejam
estabelecidas.
Em todos os casos, o licenciamento ambiental de empreendimentos
deve ser obedecido. É possível mitigar muitos dos impactos e, com políticas
corretas e transparente estudo do impacto ambiental, proceder a compensações
ambientais futuras.
190
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