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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E ECONÔMICAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO
MESTRADO EM ADMINISTRAÇÃO
GLÁUCIA TRISTÃO PUPIM
A presença da religiosidade no ambiente de
trabalho: um estudo de caso
VITÓRIA
2007
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GLÁUCIA TRISTÃO PUPIM
A presença da religiosidade no ambiente de trabalho:
um estudo de caso
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação do Curso de Administração - Centro
de Ciências Jurídicas e Econômicas da
Universidade Federal do Espírito Santo.
Orientadora: Profª Dr.ª Marilene Olivier Ferreira
de Oliveira.
VITÓRIA
2007
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Dados Internacionais de Catalogação-na-publicação (CIP)
(Biblioteca Central da Universidade Federal do Espírito Santo, ES, Brasil)
Bisi, Glaucia Tristão Pupim, 1982-
B622p A presença da religiosidade no ambiente de trabalho : um estudo de
caso / Glaucia Tristão Pupim Bisi. – 2007.
116 f. : il.
Orientadora: Marilene Olivier Ferreira de Oliveira.
Dissertação (mestrado) – Universidade Federal do Espírito Santo,
Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas.
1. Religiosidade. 2. Espiritualidade. 3. Valores. 4. Gestão de
empresas. 5. Trabalho - Aspectos religiosos. I Oliveira, Marilene Olivier
Ferreira de. II. Universidade Federal do Espírito Santo. Centro de Ciências
Jurídicas e Econômicas. III. Título.
CDU: 65
Agradeço à Deus por estar sempre presente em
minha vida, iluminando meu caminho e me
proporcionando a oportunidade da evolução moral
frente aos obstáculos.
Aos meus pais pelo apoio emocional e financeiro
para que mais esta fase de estudos pudesse se
concretizar.
Ao meu marido Patrick por participar com muito
carinho e compreensão de todas as etapas desta
verdadeira jornada do mestrado.
Aos meus amigos que sempre me incentivaram e
torceram para que tudo desse certo no final.
Aos gestores e funcionários da empresa pesquisada
pelo carinho e solicitude.
À minha querida orientadora Marilene, pela
dedicação e empenho em toda a trajetória desde a
sugestão pela minha entrada no mestrado até os
últimos momentos de finalização deste trabalho.
“Fé inabalável é somente aquela que pode
encarar a razão, face a face, em todas as
épocas da humanidade”.
Allan Kardec
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Entrevistas Realizadas.........................................................................24
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Organograma.........................................................................................78
SUMÁRIO
1 APRESENTAÇÃO...............................................................................................12
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO E PROBLEMA............................................................13
1.2 OBJETIVOS......................................................................................................14
1.3 JUSTIFICATIVA E RELEVÂNCIA DO ESTUDO..............................................15
1.4 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO...........................................................................15
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS........................................................................17
2.1 QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS..................................................................17
2.2 TIPO DE PESQUISA........................................................................................20
2.3 PRODUÇÃO DE DADOS.................................................................................23
2.4 ANÁLISE DOS DADOS....................................................................................26
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA..........................................................................29
3.1 A CONSOLIDAÇÃO DO MÉTODO CIENTÍFICO.............................................29
3.2 A CRISE DO PARADIGMA MATERIALISTA....................................................32
3.3 AS NOVAS PERSPECTIVAS CIENTÍFICAS....................................................35
3.4 O RETORNO DA RELIGIOSIDADE.................................................................39
3.5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS.......................................................................40
3.5.1 O conceito de religião.................................................................................41
3.5.2 O conceito de religiosidade........................................................................45
3.5.3 O conceito de espiritualidade.....................................................................47
3.5.4 Os conceitos de fé e teologia.....................................................................48
3.5.5 O conceito de conversão religiosa............................................................50
3.6 VALORES.........................................................................................................53
3.6.1 Valores pessoais..........................................................................................53
3.6.2 Valores organizacionais..............................................................................57
3.7 A RELIGIOSIDADE NAS ORGANIZAÇÕES....................................................60
3.7.1 Mapeando o campo de estudos.................................................................60
3.7.2 A religião e o ambiente de trabalho...........................................................65
3.7.3 Abordagens com ênfase em modelos.......................................................74
4 O ESTUDO DE CASO.........................................................................................77
4.1 A EMPRESA X..................................................................................................77
4.2 ANÁLISE DOS DADOS....................................................................................80
4.2.1 Categoria: Conversão Religiosa.................................................................80
4.2.2 Categoria: Relacionamento Interpessoal..................................................83
4.2.3 Categoria: Estilo de Gestão........................................................................86
4.2.4 Categoria: Recrutamento e Seleção..........................................................89
4.2.5 Categoria: Religiosidade no Ambiente de Trabalho................................93
5 CONSIDERAÇÕES AO FINAL DA PESQUISA...............................................102
5.1 REFLEXÕES FINAIS......................................................................................102
5.2 SUGESTÕES..................................................................................................104
6 REFERÊNCIAS.................................................................................................106
RESUMO
Esta dissertação tem como proposta compreender a presença da religiosidade no
ambiente de trabalho da empresa selecionada para o estudo de caso. Para isso
fez-se imprescindível levantar construções conceituais e reflexões teóricas
relacionadas ao tema. O método utilizado para a pesquisa parte da abordagem
qualitativa, recorrendo-se à entrevista não-estruturada e à observação não-
participante. Como resultado, constatou-se que a presença da religiosidade no
ambiente da organização pesquisada interfere no trabalho, em especial nos
relacionamentos interpessoais e nas práticas de gestão.
Palavras-chave: Religiosidade, Espiritualidade, Valores, Gestão de Empresas,
Trabalho _ aspectos religiosos.
ABSTRACT
This dissertation is intended to understand the religion's presence at a selected
company's workplace, chose for this specific purpose. To achieve this goal, it was
necessary to look for academic constructs related to the issue. The method used
for the research was the qualitative approach. To collect the informations, non-
structured questionary and non-active observation were used. As a result, the
conclusion was that the presence of the religious atmosphere in the organization
affects either the work itself and the relationships and management practices.
Keywords: Religion, Spirituality, Values, Management, Work.
12
1 APRESENTAÇÃO
A história da humanidade traz em suas transformações culturais a presença do
aspecto religioso em quase todas as grandes civilizações do mundo. Na busca do
ser humano por explicações sobre a realidade em que vivia, a argumentação
religiosa constituiu-se enquanto importante área do conhecimento, incluída no
plano do senso comum. Questionamentos existenciais em busca de respostas
para o sentido da vida, para as angústias, medos e para a morte, sustentaram o
desenvolvimento da religiosidade. Assim, as religiões se fundamentaram nos mais
diferentes pressupostos, mas sempre com a marca comum do relacionamento
com o sobrenatural.
Atualmente é possível destacar a existência de uma grande diversidade de
religiões e crenças. Espalhadas pelo mundo ou restritas a determinados locais,
com grande ou pequeno número de seguidores, antigas ou recentes, extintas ou
em atividade, com um único Deus ou muitos, com seus livros sagrados ou sem
eles, estruturadas por igrejas e regras ou com pouca estrutura, com orações e
cerimônias ou sem rituais preestabelecidos, enfim, as religiões estiveram e estão
presentes junto aos seres humanos, dando significado a diversos contextos em
suas vidas, norteando comportamentos e atitudes.
Assim, os preceitos religiosos podem se apresentar como elementos importantes
na formação dos valores do ser humano. Não obstante, em muitos casos a
conduta de vida é norteada por fundamentos baseados em algum tipo de crença
conhecida durante a socialização primária ou vivenciada em outras etapas da
vida. Logo, a religião pode contribuir no processo de configuração da subjetividade
individual, já que muitas das experiências e conhecimentos religiosos transmitidos
podem definir visões de mundo e modos de conduta. No ambiente de trabalho, o
aspecto religioso, que conforme salientado pode integrar a subjetividade
individual, é passível de se revelar em uma diversidade de atividades.
13
Partindo dessas premissas, a religião pode se manifestar de diferentes modos nas
organizações. Mesmo em locais onde ainda predomina o discurso da exclusão
desse tipo de assunto, há casos em que acontece de modo velado ou não
declarado. No entanto, algumas organizações vêm se posicionando no sentido de
permitir e até mesmo estimular a presença deste elemento da identidade humana.
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO E PROBLEMA
As publicações brasileiras sobre espiritualidade nas organizações vem crescendo
consideravelmente nos últimos anos. O interesse pelo tema provocou em países
como Estados Unidos e na Europa uma verdadeira avalanche de artigos, livros,
pesquisas e debates nesse novo campo de estudos. Isso demonstra a importância
da compreensão desse elemento presente no ambiente de trabalho, porém pouco
enfatizado nos textos técnicos sobre administração. Apesar das poucas
publicações no Brasil sobre o tema espiritualidade, as organizações enquanto
objeto de estudo têm fornecido vasto material para pesquisas e publicações.
O enfoque recentemente dado pelas análises brasileiras privilegiam abordagens
funcionalistas em que o estímulo da religiosidade ou da espiritualidade dos
funcionários e gestores se faz na busca por melhores resultados no trabalho.
Destacam-se nesse campo os modelos relacionados à liderança organizacional.
Em outras situações, traduções de construções conceituais estrangeiras se
tornam propostas viáveis em contextos um tanto quanto divergentes.
Diante das lacunas no conhecimento já produzido e da necessidade de
compreensão e aprofundamento da temática religiosidade nas organizações,
surgiu o interesse pela compreensão das características presentes na Empresa X
que apresentava indícios da presença dessas crenças.
14
1.2 OBJETIVOS
Diante do problema relatado foram levantados os objetivos que esta pesquisa
pretendeu alcançar. Além disso, buscou-se também contribuir para a discussão do
mundo do trabalho na atualidade, destacando a importância da compreensão dos
aspectos subjetivos humanos.
Assim, a pesquisa então teve como
objetivo primário:
Compreender de que maneira a religiosidade é vivenciada no ambiente de
trabalho da Empresa X, ou seja, entender que influências se dão nas relações
interpessoais e nas práticas de gestão.
A partir do objetivo primário surgiram
objetivos de natureza secundária, tais como:
Identificar as religiões dos entrevistados, formando um quadro de
referência;
Levantar o que representa a presença da religião na vida dos entrevistados
e o significado da conversão religiosa àqueles que vivenciaram esta
experiência;
Investigar as manifestações fenotípicas (simbólicas) mais evidentes de
religiosidade no ambiente de trabalho;
Investigar se há influência da religiosidade nos processos de gestão e de
que maneira isso pode ocorrer;
Identificar elementos de resistência e/ou facilitadores da expressão religiosa
no ambiente de trabalho;
Identificar se há conflitos decorrentes de divergências de crenças e de
intolerância religiosa em relação às minorias;
Compreender a influência da questão religiosa nos processos de
recrutamento e seleção.
15
1.3 JUSTIFICATIVA E RELEVÂNCIA DO ESTUDO
Pouco se sabe sobre como lidar com situações cotidianas envolvendo a
religiosidade no ambiente de trabalho já que a literatura desenvolvida no campo
da administração não privilegia esta questão. Esta lacuna pode ser preenchida a
partir de estudos como este, que tenham a finalidade de contribuir para as
discussões e reflexões sobre a problemática.
A partir de reflexões como esta, que consideram as características da realidade
brasileira, acredita-se que possam ser sistematizadas propostas de modelos
teóricos que ofereçam entendimentos adequados sobre a presença da religião nas
organizações. Buscou-se, portanto, estimular a produção de novas reflexões,
voltadas para os mais variados ambientes de trabalho. Além disso, a promoção do
debate sobre o tema faz-se fundamental num momento ainda de abertura desse
campo de estudo.
1.4 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO
Diante da impossibilidade em englobar todos os aspectos e facetas relacionados
ao tema selecionado para o estudo e da grande possibilidade de abrangência de
outros assuntos decorrentes, alguns cortes foram necessários.
Em relação ao fenômeno religioso, não se buscou adentrar a questão da fé nem
dos mecanismos que envolvem a promoção dessa convicção. Também não foram
objetos de estudo os dogmas ou as doutrinas religiosas bem como as diferenças
existentes entre religiões. Assim, não se pretendeu fazer juízo de valor sobre esta
ou aquela religião. O recorte foi feito sobre a manifestação de valores religiosos no
contexto da organização, quer seja por parte do dono, do gestor ou do
empregado. O sentido e significado desses valores foram analisados buscando
16
entender o espaço dessa crença na vida do ser humano, ou seja, como essa
relação acontecia.
Em relação aos conceitos de religião, religiosidade, espiritualidade e valores não
foram estabelecidas categorias pré-concebidas. Buscou-se a concepção dos
entrevistados sobre esses assuntos, suas percepções. O foco no ambiente de
trabalho desconsiderou um maior detalhamento das características das
instituições religiosas apontadas como norteadoras das doutrinas praticadas.
17
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS
2.1 QUESTÕES EPISTEMOLÓGICAS
O termo paradigma pode ser usado, dentre uma série de diferentes
conceituações, para definir formas de ver e estruturar o mundo, compartilhadas
por grupos de cientistas. Aos pesquisadores do grupo, atribui-se uma linguagem e
uma construção teórica em comum.
Burrel e Morgan (1979) conceituam paradigma enquanto pressupostos que se
consolidam num quadro de referência como um modo de teorizar e um modus
operandi de um grupo de pesquisadores. Assim, esses pesquisadores
identificaram quatro paradigmas da ciência social formados a partir da adoção de
um conjunto próprio de suposições tanto sobre a natureza da sociedade quanto
sobre a natureza da ciência. Essa divisão foi importante, sobretudo, para a
legitimação de um estado pluralístico da ciência organizacional, que tendia a uma
valorização da abordagem funcionalista. Também se mostrou como um
significativo posicionamento na questão da incomensurabilidade dos paradigmas
ao propor a exclusividade mútua entre eles.
Seguindo essa classificação, a presente pesquisa foi posicionada no paradigma
humanista radical. Isso porque os fins deste estudo não buscaram análises
relacionadas ao status quo no campo dos estudos organizacionais, mas uma nova
ótica, com considerações a partir desses novos olhares. Sobre as preocupações
desse paradigma, Carrieri e Luz (1998, p.4) afirmam que as pesquisas assim
classificadas tendem a apresentar um referencial teórico “comprometido com uma
visão de sociedade que enfatiza a importância de transcender os limites dos
arranjos sociais existentes”.
Com isso, foi admitida a possibilidade da presença da religiosidade em ambiente
no qual o discurso a relega. A pesquisa caminhou, então, em sentido oposto ao
das teorias organizacionais estruturadas e consolidadas que até o momento vêm
18
pregando a burocracia, a impessoalidade e o tecnicismo como os elementos
característicos e relevantes dos locais de trabalho. O enfoque buscou novas
perspectivas na maneira de se refletir e buscar conhecimentos dentro das
organizações.
Diante do posicionamento no paradigma humanista radical, foi possível então
discutir questões referentes à epistemologia desta pesquisa, classificada como
qualitativa. Sabe-se que no campo da gestão predominam produções teóricas,
modelos e reflexões que privilegiam um conceito de ciência focado na
quantificação de dados, verificação por meio de evidências observáveis, utilização
de elementos estatísticos. No entanto, este estudo não pretendeu medir nem
quantificar fenômenos e sim refletir, fundamentar, identificar limites e
possibilidades, colocando-se no interior dos limites e contradições da pesquisa
científica.
Nesse sentido, a proposta de González Rey (2005) apresentou-se como
importante norteador de processos já que situa a análise do qualitativo em uma
perspectiva epistemológica, definindo bases para aproximações no campo da
psicologia, bem como em outros estudos das ciências antropossociais. Em
especial, as argumentações foram apropriadas à compreensão de aspectos da
subjetividade do ser humano. Houve, portanto, uma oportuna união de interesses,
já que os valores religiosos pesquisados se enquadram enquanto componente da
subjetividade individual e social.
Para esse autor, a produção de sentido se articula de forma simultânea no sujeito
individual e na subjetividade social. Assim, a subjetividade é um sistema aberto,
que se expressa na ação. As configurações subjetivas se articulam, de forma
individual ou grupal, nos vários níveis da vida social. Essas configurações são
sempre fontes de produção de novas zonas de sentidos, ou seja, de novas formas
de inteligibilidade sobre a realidade.
19
Os princípios gerais de produção do conhecimento da proposta de epistemologia
qualitativa de González Rey (2005) envolvem três características centrais: o
caráter construtivo interpretativo do conhecimento; a legitimação do singular como
instância de produção do conhecimento científico; e o ato de compreender a
pesquisa, nas ciências antropossociais como um processo de comunicação, um
processo dialógico.
Diante dessas premissas fundamentais, esta pesquisa teve acesso parcial e
limitado à realidade, já que ao interferir no ambiente onde se buscaram os dados,
foi formado um novo campo da realidade. Desse modo, considerando que dados
não se coletam, mas se produzem, influenciaram o estudo: o estado das pessoas
estudadas, o contexto em que foram analisadas e seu envolvimento com a
pesquisa. Assim, partiu-se da premissa de que pesquisador e objeto interferem no
processo de construção e interpretação do conhecimento. Construção porque não
se pretendeu ir a campo com procedimentos sistematizados sem possibilidade de
redefinições e decisões metodológicas ao longo da consolidação progressiva do
modelo teórico.
A produção teórica privilegiou a produção de um corpo de conhecimentos a partir
da organização do material empírico conforme as fontes de saber preexistentes do
pesquisador e as novas construções que se fizeram ao longo do processo de
pesquisa. Dessa forma, considerou-se não só a implicação intelectual da
pesquisadora, mas também afetiva, emocional, política e psicológica.
Desse modo, rompeu-se com a dicotomia empírico-teórico e com a expectativa
racionalista de conhecimento do mundo de forma completa e progressiva. A
racionalidade foi responsável pela criação de espaços de inteligibilidade, não
esgotando a questão, mas abrindo possibilidades dentro do campo de produções
teóricas. A legitimidade se deu, portanto, na possibilidade de gerar novas zonas
de inteligibilidade sobre o enfoque adotado e na articulação deste modelo a ser
construído com outros preexistentes ou a serem gerados. Logo, não foram
20
utilizadas amostras com significação estatística para um universo populacional já
que isso ignoraria os sujeitos em sua condição diferenciada e impossibilitaria
alternativas em relação à sua composição. Ao longo do trabalho, a incorporação
de novos elementos à amostra foi feita na medida em que foi percebida a
necessidade. As exigências de informação quanto ao modelo em desenvolvimento
ditaram as demandas da pesquisa, que primou pela qualidade dos trechos de
informação a serem produzidos. Essa postura contrariou outro princípio arraigado
entre os pesquisadores ocidentais que diz respeito à aplicação seqüencial de
instrumentos metodológicos previamente determinados.
A comunicação foi privilegiada no conhecimento das configurações e processos
de sentido subjetivo dos sujeitos selecionados para a pesquisa. Isso permitiu
conhecer o modo como as condições sociais objetivas afetam a subjetividade dos
indivíduos nas organizações. A expressão simbólica também se constituiu como
importante fator no entendimento das manifestações dos sujeitos.
Para que se tornassem viáveis tais processos comunicativos, os sujeitos
pesquisados não foram cerceados por instrumentos de coleta de dados fechados.
Foi preciso conquistar a confiança dos envolvidos na pesquisa, estimulando a
expressão de pontos de vista a partir de campos de comunicação que fizessem
sentido para eles.
2.2 TIPO DE PESQUISA
Seguindo as considerações anteriores, a pesquisa teve caráter essencialmente
qualitativo. Em momento algum do processo de pesquisa foi dado enfoque à
quantificação ou mensuração dos fenômenos observados. A busca pelo
entendimento das relações em torno do tema e pela compreensão dos
significados das particularidades encontradas durante a pesquisa corroboram esta
classificação.
21
Na busca pelo referencial teórico da pesquisa não se optou pelo delineamento de
construções conceituais em torno de uma única área do conhecimento. A
constatação da necessidade da busca por elementos de diversos campos de
estudo e de publicações estrangeiras que pudessem dar suporte à pesquisa se
deu na medida em que as leituras dos materiais se sucediam. Isso porque foi
identificada a escassez de teorias consolidadas no campo organizacional que
tivessem como enfoque o contexto brasileiro e que pudessem fundamentar esta
temática.
Alguns dos estudos utilizados no referencial teórico se apresentavam em outras
línguas e foram traduzidos para facilitar a leitura deste material. Assim, as
traduções são de responsabilidade da autora deste estudo.
Concomitante à busca de informações que pudessem dar suporte ao referencial
teórico e colaborar para o entendimento do tema, foram sendo identificadas
potenciais organizações para a pesquisa. Tentativas foram empreendidas no
sentido de estabelecer contato com algumas associações de líderes religiosos tais
como Adhonep (Associação dos Empresários do Evangelho Pleno), ADCE
(Associação de Dirigentes Cristãos de Empresas) e ASPEC (Associação de
Profissionais e Empresários Cristãos). No entanto, não houve resposta aos e-
mails e telefonemas em que se solicitou contato. O comparecimento nas reuniões
sem o interesse e convite dos líderes foi desestimulado por pessoas com os quais
se conseguiu contato.
Partindo dessa dificuldade inicial, buscou-se um recorte de possíveis organizações
a serem pesquisadas. A partir da leitura de diversos estudos, em especial da
análise dos Censos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
notou-se o intenso crescimento do número de brasileiros que se declaravam
evangélicos ou protestantes. O aumento na proporção de seguidores, a constante
formação de novas denominações, a crescente participação e atuação na mídia e
22
na política, enfim, muitos eram os fatos que sinalizavam para este importante
fenômeno. Buscando entender um pouco mais do que significava “ser” evangélico,
foram notadas algumas similaridades entre as diversas denominações sob esse
título. Sendo a marca central desse tipo de culto as referências aos textos bíblicos,
que delimitam atitudes e decisões, notou-se que os evangélicos poderiam ter uma
postura diferenciada no ambiente de trabalho.
Desse modo, optou-se pelo estudo de caso, sendo selecionada como objeto de
estudo uma empresa em que o gestor, de religião evangélica, apresentava
evidências da presença latente da religiosidade no ambiente de trabalho. Na
entrevista exploratória inicial, constatou-se que se tratava de uma empresa de
pequeno porte, com membros da mesma família ocupando cargos de gerência. No
entanto, notou-se também que havia um estilo de gestão que impunha a
separação radical entre religião e trabalho. A fala do gestor mostrou que a
expressão de crenças religiosas naquele ambiente era coibida e que as regras de
mercado precisavam ser observadas antes de qualquer outro preceito.
Descartada a viabilidade de conciliação do interesse de pesquisa com a primeira
organização visitada, identificou-se uma outra possível oportunidade de estudo.
Também se tratava de uma liderança de religião evangélica. A partir de uma
primeira conversa, de caráter bastante informal, foi possível identificar um pouco
da história dessa empresa, do funcionamento e divisão de tarefas, da história do
proprietário e da influência de sua religiosidade em algumas decisões
administrativas relatadas.
Conforme González Rey (2005) salienta, a apresentação do cenário de pesquisa é
fundamental na promoção do envolvimento dos participantes. Desse modo,
buscou-se salientar ao gestor os objetivos dessa proposta de estudo para que se
criasse um laço de cooperação. Inicialmente foi notado um pouco de resistência já
que, por meio do vocabulário utilizado nas conversas, notou-se que a
pesquisadora não era da mesma religião dos gestores. Aos poucos foi preciso
23
conquistar a confiança dos sócios, mostrando que não se tratava de um estudo
que interferisse na realidade analisada e que não seriam emitidos juízos de valor
sobre quaisquer das atitudes ou relatos vivenciados ao longo do processo de
pesquisa.
O interesse pela pesquisa empírica naquela organização cresceu na medida em
que foram notadas características que poderiam coadunar com as pretensões de
estudo. Assim, o estudo de caso mostrou-se instrumento apropriado, pois permitiu
um conhecimento suficientemente aprofundado daquela realidade singular.
Partindo disso, seguiram-se as outras etapas do processo de pesquisa.
2.3 PRODUÇÃO DE DADOS
A partir da opção pelo estudo de um único caso, determinou-se que as técnicas de
construção dos dados mais adequadas à pesquisa eram a entrevista semi-
estruturada e a observação não-participativa. Isso porque estas técnicas
permitiriam captar as informações necessárias aos objetivos da pesquisa nos
relatos dos entrevistados e nas observações durante o período de visitas à
empresa.
Para Ruiz (1993, p.51), a entrevista “[...] consiste no diálogo com o objetivo de
colher determinada fonte, de pessoa ou informante, dados relevantes para a
pesquisa em andamento”. Desse modo, a escolha pela entrevista semi-
estruturada deveu-se ao fato de que este instrumento possibilitou revelar não só
informações objetivas, mas também os dados subjetivos relacionados ao objetivo
da pesquisa. Por meio das conversas foi possível então captar atitudes, valores e
opiniões essenciais ao entendimento do tema no ambiente estudado. A partir da
exposição do cenário de pesquisa, foram empreendidas conversas em que o
pesquisador norteava o entrevistado baseando-se num roteiro de pesquisa
(APÊNDICE A).
24
Para Bêrni (2002, p.241) a característica central da entrevista semi-estruturada é
“[...] basear-se em um roteiro que apresenta questões com respostas abertas, não
previamente codificadas, nas quais o entrevistado pode discorrer livremente sobre
o tema ou pergunta proposta.”
Corroborando essa questão, Marconi e Lakatos (1990) propõe que as entrevistas
despadronizadas ou não-estruturadas constituem-se por uma conversação
informal que proporciona ao informante maior liberdade.
Foram entrevistados, além dos proprietários da empresa, todos os funcionários
diretos que compõem o quadro funcional, basicamente composto por funções
administrativas. Isso se tornou possível, pois se tratava de uma empresa com um
pequeno número de colaboradores. Apenas os representantes comerciais dessa
organização não foram entrevistados, pois os gestores não permitiram esse
contato. Cabe destacar que essa empresa selecionada é responsável pela
comercialização dos produtos fabricados por uma segunda organização, de
mesma formação societária, que não fez parte da análise deste trabalho por não
ter sido disponibilizada para a pesquisa.
A coleta de dados com sujeitos envolvidos em funções diversas constituiu-se
importante por oferecer diferentes pontos de vista em relação às questões
abordadas, proporcionando assim maior riqueza de informações. Assim,
participaram da pesquisa os sujeitos descritos na tabela a seguir.
25
TABELA 1
ENTREVISTAS REALIZADAS
Identificação Função Religião Tempo na Empresa
Funcionário A Sócio Assembléia de Deus 7 anos
Funcionário B Sócio Assembléia de Deus 7 anos
Funcionário C Administrador Católico 1ano e 4 meses
Funcionária D Crédito e Cobrança Assembléia de Deus 7 anos
Funcionário E Faturamento Assembléia de Deus 7 anos
Funcionário F Assist. Administrativo Assembléia de Deus 1 ano e 8 meses
Funcionário G Assist. Administrativo Assembléia de Deus 3 anos
Funcionária H Secretária Assembléia de Deus 6 anos
Funcionário I Supervisor de Vendas Católico não praticante 7 anos
Fonte: Elaborado pela autora.
Ao longo das entrevistas, não foram tomados como ponto de partida as
construções teóricas dos autores analisados no referencial teórico. As respostas
dos entrevistados forneceram, assim, apontamentos pessoais acerca das
questões levantadas. Ou seja, as indagações e pedidos de relato das experiências
vivenciadas proporcionaram uma maior liberdade de expressão aos entrevistados.
Além das entrevistas, a coleta de dados também incluiu a observação. De acordo
com Bêrni (2002, p.247), a posição do observador total, classificação adequada a
este estudo,
“[...] deixa claro para si e para as pessoas observadas que sua
relação é meramente a de um observador. Isto não impede que sua
atividade seja exercida de forma profunda, pela vivência conjunta de
acontecimentos importantes, dados os objetivos da pesquisa e do
acompanhamento de rotinas cotidianas”.
Assim, observaram-se as conversas informais nos corredores e áreas comuns da
empresa e as atitudes despretensiosas dos funcionários. O ambiente pesquisado
e elementos como frases de descanso de tela, adesivos com frases, vestimentas,
símbolos sobre as mesas, etc. também foram cuidadosamente observados. Tudo
26
isso forneceu subsídios para reforçar ou refutar o discurso dos entrevistados,
ajudar na compreensão dos relatos, além de fornecer maior riqueza de detalhes
sobre o tema pesquisado.
2.4 ANÁLISE DOS DADOS
Mediante análise do objetivo desta pesquisa e das informações levantadas, foi
possível notar que a sistematização dos dados era passível de tratamento pela
análise de conteúdo. Este conjunto de pressupostos, aplicável também em
análises quantitativas, tem se mostrado um importante norteador nas pesquisas
qualitativas já que “é um método muito empírico, dependente do tipo de fala a que
se dedica e do tipo de interpretação que se pretende com o objetivo.” (BARDIN,
1977, p.30)
Para Bardin (1977), a análise de conteúdo não se constitui em um conjunto de
normas rígidas a serem seguidas sem adaptação ao domínio e objetivos
pretendidos. Ao contrário disso, há algumas regras de base que caracterizam este
instrumento, cabendo ao investigador a adequação e reinvenção dos
procedimentos durante o processo de pesquisa. Essa flexibilidade do método
relaciona-se com a proposta epistemológica adotada na pesquisa já que optou-se
por instrumentos capazes de moldar a informação coletada ao longo do processo
de busca dos dados.
Esse conjunto de técnicas chamado análise de conteúdo é marcado pela grande
quantidade de formas e pela adaptabilidade a um vasto campo de domínios,
sendo aplicável, sobretudo, às comunicações. Desse modo, a análise “funciona
segundo procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens. Trata-se, portanto, de um tratamento da informação contida nas
mensagens.” (BARDIN, 1977, p.34)
27
No caso do presente estudo, o tratamento das informações obtidas nas entrevistas
também contou com o auxílio da observação não-participativa, que contribuiu para
um maior entendimento das nuances do processo de comunicação. A partir dos
dados simbólicos, entendidos enquanto comportamentos, representações e outros
conteúdos não-linguísticos, foi possível confirmar ou apontar contradições nas
mensagens. Isso permitiu uma maior segurança na interpretação dos dados
coletados e posteriormente delimitados em categorias.
Todas as entrevistas foram gravadas em formato digital e posteriormente
transcritas. A partir da seleção de trechos desse material foram sendo delineadas
as categorias em torno de temas comuns às respostas obtidas.
Mais do que estabelecer critérios de associação buscando uma ordem ou
coerência da totalidade das mensagens coletadas, a intenção do tratamento dos
dados foi compreender e estabelecer inferências sobre a presença da
religiosidade no ambiente de trabalho. A análise interpretativa das características
levantadas por meio dos instrumentos de coleta de dados selecionados para o
estudo permitiu tais proposições.
Corroborando esta questão, Laville e Dionne (1999) mostram que a análise de
conteúdo foi ampliada às abordagens qualitativas em que a lógica dos conteúdos
se dá pelo estudo das unidades de sentido, das relações entre elas e do que delas
emana. Cabe ao pesquisador decidir como se delineiam essas nuances de sentido
e de que forma elas podem criar elos lógicos entre as categorias.
Isso porque “[...] a significação de um conteúdo reside largamente na
especificidade de cada um de seus elementos e nas relações entre eles,
especificidade que escapa amiúde do domínio do mensurável”. (LAVILLE E
DIONE, 1999, p.227)
28
Desse modo, o instrumento utilizado no tratamento dos dados se mostrou eficaz já
que “a análise de conteúdo procura conhecer aquilo que está por trás das palavras
sobre as quais se debruça”. (BARDIN, 1977, p.44)
No início do capítulo que trata da análise dos dados foram feitas algumas
considerações sobre a Empresa X buscando compreender o ramo de atuação, as
atividades realizadas, o histórico e o funcionamento da organização pesquisada.
No entanto, alguns detalhes tais como número de funcionários indiretos,
faturamento, dentre outros dados solicitados aos gestores para descrever de
forma mais completa o funcionamento da empresa não foram respondidos. Os
sócios e o administrador preferiram não revelar esses elementos, talvez por
desconfiança em relação ao uso das informações. Em dificuldades como essa é
possível notar que não existe, ao menos nas empresas onde se tentou
empreender a pesquisa, o costume socialmente difundido de proporcionar aos
pesquisadores acadêmicos este tipo de oportunidade de estudo.
29
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A história das religiões mistura-se à história da humanidade. Mais do que isso, a
religião influenciou ao longo do tempo o modo pelo qual os seres humanos
enxergavam o mundo e com ele interagiam.
Na busca por um maior entendimento sobre o tema desta pesquisa, buscou-se
inicialmente: uma visão geral que permitisse o entendimento das transformações
sociais que permeiam a relação entre a religião e a ciência ocorridas ao longo da
história, bem como reflexões sobre o retorno da questão da religiosidade. Além
disso, foram levantadas construções conceituais que pudessem dar suporte ao
objeto central deste estudo.
3.1 A CONSOLIDAÇÃO DO MÉTODO CIENTÍFICO
Ao longo da história, a humanidade sempre buscou conhecer a realidade, explicar
os fenômenos e controlar os acontecimentos. Essa motivação por um
conhecimento que pudesse dar resposta às indagações mais diversas mostrou-se
uma constante necessidade do ser humano. Nesse contexto, a religião
representou uma importante área do conhecimento, proporcionando
interpretações sobre o mundo.
Com o advento do pensamento filosófico, que buscava princípios imutáveis que
fundamentassem o que podia ser percebido pela inteligência, foi aberto o caminho
para a consolidação de diversas áreas do saber. Os avanços em diferentes
campos da atividade humana forneciam um corpo de informações cada vez mais
sistematizado.
Durante a Idade Moderna as discussões sobre o conhecer se intensificaram,
substituindo a preocupação anterior somente com o conhecido. Surgem então os
30
questionamentos sobre o método ou caminho que a ciência deveria seguir na
investigação da verdade. Dentre os filósofos que dedicaram-se ao problema do
método estão Descartes, Bacon, Hume, Locke, Spinoza, Comte e Wundt. “O
método adquire um sentido de invenção e descoberta, e não mais uma
possibilidade de demonstração organizada do que já é sabido”. (ARANHA E
MARTINS, 1993, p.154)
As implicações das descobertas científicas, em especial a repercussão do método
científico newtoniano, consolidaram o modelo da física cartesiana. Os cientistas
passaram a procurar explicações das ocorrências do universo e do próprio
cosmos utilizando métodos capazes de controlar e prever mecanicamente
qualquer fenômeno e evento. As análises, centradas na perspectiva materialista e
objetiva, buscavam descobrir e estabelecer relações de causa e efeito entre
fenômenos. Essa acepção empírica se fazia apropriada justificando-se as
generalizações e teorizações com o teste da comprovação científica. O
conhecimento passou a ser validado na medida em que fosse atingido por meio do
controle e comprovação do método científico, distinguindo-se do senso comum por
sua ênfase em procedimentos e operações lógicas.
Desse modo, o método científico se ancorou na busca sistematizada e verificável
de conhecimentos racionais, cabendo ao fato empírico a confirmação da verdade.
Assim, postulava-se que o homem precisava libertar-se dos pré-conceitos,
incluindo aqui o senso comum e as explicações religiosas, que impediam a visão
da organização da natureza sob a forma de leis.
Ao longo dos anos, a ciência avançou seguindo esse método específico que
envolve a medição, quantificação e verificação. Este modelo, consolidado no
paradigma vigente, influenciou o modo como as pessoas interpretavam e
interpretam o mundo. A fragmentação do conhecimento em áreas distintas do
saber, o uso da racionalidade nas explicações do funcionamento do universo e
nas relações sociais alterou significativamente a identidade humana. Essa
31
revolução em termos de conhecimento possibilitou enormes avanços no saber e
implicou profundas mudanças na concepção dos indivíduos em relação ao mundo
em que vivem.
Sobre a transposição da visão científica que exigia dos cientistas a objetividade,
distanciamento, neutralidade e impessoalidade máximos para as relações sociais,
Cavalcanti (2005, p.38) mostra que
“Reforçando a mentalidade racionalista, o sucesso tecnológico e
científico e o progresso econômico moldaram de forma marcante a
vida consciente do homem, sem que ele disso se apercebesse. Com
o desenvolvimento da ciência e o êxito tecnológico, a visão científica
materialista ganhou absoluta predominância e foi determinante no
modo de relacionamento do homem com a natureza e com o seu
semelhante [...]”.
A ciência angariou, ao longo do tempo, cada vez maior prestígio e legitimidade na
consciência ocidental. A transposição da mentalidade científica para as áreas da
vida humana foi aos poucos construindo uma visão fragmentada da realidade. Na
medida em que as áreas do saber se dividiram em campos incompatíveis e
inconciliáveis, perpetuaram-se os dualismos como ciência/religião,
misticismo/razão, senso comum/verdade, fé/saber, objetivo/subjetivo,
corpo/mente, espírito/matéria dentre tantos outros. O pensamento passou a
caracterizar-se pela eclusão: ou/ou. (CAVALCANTI, 2005, p.60)
Cabe destacar aqui a referência dessas considerações ao mundo ocidental, já que
a ciência materialista não se estabeleceu da mesma forma no Oriente. É preciso
questionar se todos os universos religiosos e culturais reagiram da mesma forma
ao universalismo iluminista e às suas conseqüências.
32
3.2 A CRISE DO PARADIGMA MATERIALISTA
Conforme assinala Cavalcanti (2005) a visão materialista consolidada no
paradigma cartesiano ainda predomina nas pesquisas científicas e nas relações
sociais. A transposição desse modelo para as relações humanas favoreceu a
valorização do distanciamento afetivo, da objetividade e da impessoalidade e a
desvalorização das emoções, dos sentimentos. Na esfera do trabalho, a busca
desenfreada pelo aumento de lucratividade e produtividade reflete um
comportamento competitivo e, muitas vezes, desmedido. Em muitos casos,
valorizam-se os interesses imediatos, sobretudo materiais, favorecendo relações
oportunistas, ocasionais e sem laços de confiança.
Observa-se, portanto, uma valorização do ter em detrimento do ser. O consumo
ganha peso significativo nas culturas contemporâneas. O objetivo de vida de
muitas pessoas passa a ligar-se a questões essencialmente materiais e à
conquista de poder e status. Nessa busca, pouco importa o caminho percorrido, os
exemplos deixados.
Para Machado (2005) o desejo humano é transformado pela indústria dos
modismos numa ilusão de poder e a falta dele causa um vazio, cansaço,
impotência, descontentamento. Buscando suprir esses sentimentos, o ser humano
consome ainda mais. A hiperacelaração ou instantaneidade das sociedades
contemporâneas cria um distanciamento do ético. Como forma de localizar-se no
mundo, fragmenta-se a vida, setorizando-a. Com isso, fecham-se portas para
novas sensações, novos aprendizados, novas relações. Logo, perde-se a
capacidade de escolha, a autonomia. O consumo passa a ser ditado pela oferta
apontada como melhor opção.
Na proposta analítica de Giddens (2002), observou-se que o advento da
modernidade provocou mudanças no ambiente externo do indivíduo, afetando as
instituições. Novos riscos, novos perigos se colocaram. A ansiedade causada por
33
circunstâncias perturbadoras ou por ameaças se revela constante. O ritmo das
mudanças sociais torna-se mais acelerado e afeta as relações sociais e modos de
comportamento com maior amplitude e profundidade. Esse novo dinamismo nem
sempre é suportado, e provoca aumento na procura de terapias e publicações de
auto-ajuda.
Outra importante questão levantada pelo autor refere-se à segurança ontológica,
ou seja, ao sentido de continuidade e ordem nos eventos, inclusive daqueles que
não estão dentro do ambiente perceptual imediato do indivíduo. No entanto, diante
dessa necessidade humana, os indivíduos estariam exercitando a atitude natural
de por entre parênteses perguntas que devem ser respondidas para que se possa
enfrentar a atividade cotidiana. Essas indagações referem-se a si mesmo, aos
outros e ao mundo dos objetos. A consciência prática vivenciada implica um
ambiente de “faz de conta” em relação às questões existenciais fundamentais, que
são: a própria existência, ou consciência ontológica; as relações com o mundo
exterior e com a vida humana, consciência da finitude; a existência de outras
pessoas, ou seja, as interferências nos sentimentos e experiências dos outros a
partir dos seus; e a auto-identidade, aquilo de que o indivíduo está consciente, o
eu compreendido reflexivamente pela pessoa em termos de sua biografia.
Sobre a falta de noções de significado, princípios e valores e a necessidade de um
novo capitalismo que preze pela sustentabilidade, Zohar e Marshall (2006, p.14)
afirmam que
“[...] nossa cultura capitalista e suas práticas de negócios estão em
crise. Descrevo o presente mundo empresarial como “um monstro
que se autoconsome”, porque creio que o caráter primordial do
capitalismo e suas hipóteses básicas, junto com muitas práticas de
negócios dele derivados, são insustentáveis. Os modelos de
capitalismo e de mundo empresarial que conhecemos não têm um
futuro a longo prazo e limitam o futuro de nossa cultura.”
34
Isso porque a cultura do mundo dos negócios parte da premissa de que os seres
humanos são criaturas puramente econômicas, em busca de acúmulo de
riquezas. Com isso, desconsidera-se o desgaste emocional, o estresse gerado
pela exaustão dessa busca pelo crescimento financeiro, a falta de tempo para a
família, para momentos de relaxamento, para gozar a riqueza acumulada, para
realização no trabalho. Tudo isso gera um sentimento de falta de propósito na vida
já que os alicerces das antigas certezas são derrubados pelas mudanças
constantes.
Boff (2001, p.10-11) também aponta que essa crise que assola a humanidade e as
dimensões desse momento podem ser atestadas pela busca de grandes
empresários por questões espirituais. Ou seja, os bens materiais produzidos, as
lógicas produtivas incentivadas e o universo de valores que inspiram essas
práticas já não são suficientes, pois “Há um vazio profundo, um buraco imenso
dentro do seu ser, suscitando questões como gratuidade e espiritualidade, futuro
da vida e do seu sistema-Terra”.
Essa crise apontada não é somente característica de países em desenvolvimento,
pois “[...] mesmo nos países mais desenvolvidos cientificamente, é indubitável que
os seres humanos continuam a vivenciar o sofrimento, particularmente no nível
emocional e psicológico”. (BOFF,2001, p.11)
Weston (2002) propõe que o gradual aumento do debate sobre ética nos negócios
no Ocidente, também visto como uma resposta secular a valores, está focado na
tomada de decisão dentro de modelos atualmente aceitos de sistema econômico e
crescimento. No entanto, os interesses públicos em assuntos tais como
globalização, engenharia genética, proteção ambiental e qualidade de vida no
trabalho, são todos exemplos de um questionamento mais fundamental desses
modelos.
35
De acordo com Bellino (2002, p. 568), a dissociação entre fé e razão, ciência e
religião, levada às últimas conseqüências, produziu efeitos não-intencionais que
podem ameaçar a própria racionalidade. “O mundo pós-moderno, por sua vez,
torna a descobrir o nexo entre morte de Deus e morte da verdade racional e,
portanto, entre Deus e verdade, fé e razão, mesmo na distinção dos níveis lógicos
e experimentais”.
Assim, para o autor, essa separação entre o horizonte da fé e o da razão
acentuam a desorientação e a crise atual mais do que ajudam na compreensão e
superação desse momento. O clima da modernidade tardia ou pós-modernidade
estaria impulsionado, depois de séculos de separação, à exploração de uma
solidariedade originária.
Tudo leva a crer que o progresso atingido pelas sociedades industriais privilegiou
o mecanicismo, a visão mercadológica da competitividade e a lucratividade,
deixando profundas marcas nas relações sociais e no ambiente. O pragmatismo e
utilitarismo dessas práticas obscureceram valores humanos como a cooperação, o
senso de coletividade, de comunidade, de partilha de bens e informações. Isso
gerou no ser humano um vazio existencial, um sentimento de impotência diante da
vida.
3.3 AS NOVAS PERSPECTIVAS CIENTÍFICAS
Se de um lado tem-se a crise apontada pelos vários autores mencionados
anteriormente, de outro, novas perspectivas vêm mostrando possibilidades de
novos conceitos de ciência. A visão de que o universo se relaciona de maneira
mecânica, previsível, controlável e mensurável vai aos poucos sendo abalada
pelos novos modelos que surgem.
36
Antes de tudo, conforme destaca Cavalcanti (2005), é preciso distinguir os traços
marcantes que diferenciam a visão das culturas no Oriente e no Ocidente. Isso
porque se o homem ocidental é visto de forma fragmentada, separando as
dimensões física, mental e espiritual, o oriente tem como característica a
concepção da unidade e da inter-relação entre as coisas. A valorização da
abordagem racional-científica no Ocidente, que se impõe como verdadeira ao
excluir as possibilidades de erro pela comprovação, opõe-se à abordagem
intuitiva, afetiva e espiritual oriental que considera a possibilidade dos enganos. A
contribuição oriental com sua visão de mundo profunda e complexa, com suas
refinadas técnicas de desenvolvimento e ampliação da consciência na busca pela
autotransformação e evolução, vem sendo amplamente difundida na cultura
ocidental. Esse prestígio deve-se à visão orgânica, ecológica e holística dessas
práticas. Pode-se aqui citar o caso da acupuntura, técnica milenar oriental que se
tornou uma área de especialidade médica em muitos países ocidentais.
Para a autora, a física moderna foi a grande responsável pela introdução na
ciência de uma nova concepção do mundo, holística e totalizante. A nova física,
ou mecânica quântica, originou-se da teoria dos quanta de Max Plank no ano de
1990 e da teoria da relatividade de Albert Einstein de 1905. E desenvolveu-se com
Niels Bohr, Werner Heisenberg e outros físicos importantes, como Erwin
Schrödinger, Wolfang Pauli, Louis de Broglie e Paul Dirac.
A descoberta do quantum desafiava o senso comum, pois Bohr afirmou que o que
é verdade no mundo cotidiano, macrocósmico, pode não ser no mundo quântico.
Assim, surge uma nova concepção de universo e uma nova atitude em relação ao
mundo, que deixa de ser visto como uma máquina composta de uma infinidade de
objetos para ser um todo indivisível, dinâmico, cujas partes estão essencialmente
inter-relacionadas, sendo partes de um processo cósmico. Conseqüentemente,
superam-se os dualismos mente e corpo, sujeito e objeto, espaço e tempo,
energia e matéria, onda e partícula, etc.
37
Muitas das hipóteses quânticas podem ser vistas como redescobertas de antigas
formas de se abranger o conhecimento. A compreensão de áreas do
conhecimento aparentemente opostas, como a ciência, a arte, a física e a
metafísica, volta a ser um todo cujas partes se unem. A visão da totalidade implica
que todas as coisas estão conectadas e o que acontece numa das partes afeta o
todo. Conclusivamente, “Os conceitos de totalidade, união de opostos,
complementaridade e indeterminação são os pilares da concepção quântica do
mundo”. (CAVALCANTI, 2005, p.87)
Assim, é possível perceber uma conexão entre o pensamento oriental de
interconectividade do mundo e as implicações do novo modelo da física quântica.
Essa nova perspectiva científica aponta a necessidade de se modificar as relações
humanas e com o ambiente, promovendo um aumento da sensibilidade humana
em relação a seus valores fundamentais. Esse reconhecimento de que os seres
humanos são partes de um todo profundamente interconectado apontaria a
necessidade de se ampliarem as perspectivas e considerar os resultados a longo
prazo das atitudes vividas. Essa unicidade em torno da espécie humana seria
capaz de impedir que o egoísmo e a defesa dos interesses próprios obscureçam
os essenciais aspectos da existência humana.
Segundo Cavalcanti (2005), outra importante teoria, desta vez de outra área do
conhecimento, vem influenciando uma reformulação na visão de mundo
prevalecente. As primeiras sementes desta nova idéia foram plantadas pelo
médico e psiquiatra Richard Bucke entre o final do século passado e deste. Este
cientista buscava relacionar as áreas do conhecimento, concluindo que todo
homem pode vivenciar uma “consciência cósmica”, ou seja, um estado de
consciência intuitiva, altamente intensificada, que transcende os limites da
consciência individual. Ela permite perceber a alma como imortal e o cosmo como
uma presença vivente. O desenvolvimento dessa consciência estaria sendo
vivenciado pelo ser humano na atualidade e se firmaria até tornar-se rotineiro.
38
Para James (1985), filósofo e psicólogo, o universo superior é capaz de produzir
efeitos psicológicos e materiais no mundo fenomênico. A experiência religiosa, em
essência, constitui-se da conscientização desta parte superior acima dos limites
pessoais do universo e do estabelecimento, dessa forma, de um contato afetivo. O
pensamento racionalista seria limitado na explicação dessas experiências já que
tem como foco o sensorial e visível. Assim, este autor traça críticas à
desvalorização de outras formas de abordagem que desvalorizem a percepção e
que neguem o que não pode ser explicado por meio de sua abordagem.
Dentro dessa abertura de horizontes, já se fala, na própria administração, em um
paradigma holístico, cujo precursor foi Jean Christian Smuts:
“A palavra holismo _ derivada do grego hólos, totalidade _ foi
concebida por Smuts como a atividade sintética, organizadora e
reguladora do universo, que explica todos os agrupamentos e
sínteses estruturais nele existentes, desde o átomo e as estruturas
físico-químicas até a personalidade humana, passando pelas células,
pelos organismos e pela mente dos animais.” (CAVALCANTI, 2005,
p.98)
Essa totalidade estaria presente em toda natureza de maneira hierárquica. Assim,
o holismo mostra que o sentido profundo e a própria direção do universo estão no
impulso para a totalidade, que leva a conjuntos cada vez maiores e mais perfeitos.
Haveria, portanto, uma continuidade evolutiva entre matéria, vida e mente, que
aparecem como séries mais ou menos interligadas e progressivas do mesmo
grande processo.
Diante desses novos modelos que surgem diferenciando-se do método cartesiano,
pode-se perceber uma preocupação em explicar essa realidade tão ampla e
complexa que nem sempre é apreensível pela metodologia reducionista do
método científico consolidado. A nova dimensão integral, holística, abre uma
39
perspectiva mais ampla de entendimento da realidade, uma nova fase de
maturação psíquica, biológica e social da humanidade.
3.4 O RETORNO DA RELIGIOSIDADE
No mundo contemporâneo, é possível notar um processo que contraria a
secularização pregada na modernidade. Essa reespiritualização, apontada por
Rouanet (2003), coloca em xeque a questão da incompatibilidade entre ciência e
religião. A “perda de sentido” acarretada seria compensada graças aos recursos
fornecidos pela própria modernidade. A sociedade passa a ser bidimensional,
estruturada por uma dimensão positiva e por uma dimensão transcendente. Não
significa uma regressão à pré-modernidade com o saber dando lugar à crença,
mas que fé e ciência já não estão competindo, pois, conforme revelam as
pesquisas no campo da neurologia, ocupam diferentes hemisférios do cérebro e,
portanto, cada um possui funções próprias.
Para Derrida (2000) o tempo mostrou a impossibilidade de separar de um lado a
religião e de outro a razão, as luzes, a ciência, a crítica (marxista, nietzcheana,
freudiana e demais heranças), como se a existência de uma estivesse
condicionada ao desaparecimento da outra. Isso porque, ao contrário do que
acreditava-se no período iluminista, a luz dos filósofos não foi capaz de subtrair ou
opor-se à religião.
Ao contrário de opor a religião e a razão, a crítica ou a ciência e a religião, a
modernidade tecnocientífica e a religião, esse autor afirma que o desenvolvimento
imperturbável e interminável da razão crítica transporta, suporta e pressupõe a
religião. Assim, religião e razão teriam uma mesma fonte, desenvolvendo-se
juntas e a partir de recursos comuns.
40
A religião é, portanto, experimentada como um retorno, como o restabelecimento
presente de um vestígio adormecido. As razões apontadas por Vattimo (2000)
para esse retorno do religioso (como exigência, com nova vitalidade de igrejas,
seitas, como busca de doutrinas e práticas outras _ a “moda” das religiões
orientais, etc.) estariam relacionadas com a iminência de riscos globais que nos
parecem inéditos, sem precedentes na história da humanidade. Começou-se logo
depois da Segunda Guerra Mundial com medo da guerra nuclear, e hoje, que este
risco parece menos iminente por causa das novas condições das relações
internacionais, difunde-se o medo da proliferação descontrolada desse mesmo
tipo de arma e, de uma forma mais geral, a ansiedade diante das ameaças que
pesam sobre a ecologia planetária e os receios ligados às novas possibilidades de
manipulação genética. Outro medo, também bastante difundido, ao menos nas
sociedades mais avançadas, é o da perda do sentido da existência, do verdadeiro
tédio que parece acompanhar inevitavelmente o consumismo. O autor atenta para
o caráter radical desses riscos, que parecem ameaçar a espécie e sua própria
essência, como no caso de modificações no código genético.
Assim, as religiões sempre desempenharam importante papel ao longo da história.
Em nenhum momento foram deixadas por completo. Mesmo com diferentes
motivações, percebe-se um “boom” de religiosidade vivenciado na pós-
modernidade. O aumento na busca por questões espirituais parece decorrer,
primordialmente, de um momento de crise na busca por um sentido profundo, por
respostas a questões existenciais.
3.5 CONCEITOS FUNDAMENTAIS
Para os fins desta pesquisa, coube analisar cautelosamente alguns conceitos. O
entendimento do contexto teórico e das escolhas de delineamento em torno das
propostas dos autores é necessário diante da variedade de caracterização destes
termos no plano do senso comum.
41
3.5.1 O conceito de religião
No estudo dos significados relacionados ao conceito de religião, Vergote (1969) dá
atenção à dois enfoques: às vivências internas (dimensão da subjetividade) e às
“práticas”, aos rituais e às crenças coletivas (dimensão sociocultural). Para ele, os
“sentimentos religiosos” e as “experiências religiosas”, os mitos, as crenças, são
fenômenos parciais. Isso porque é possível haver uma atitude religiosa individual,
que não se expressa por meio de um rito socializado; mas também é possível que
um sujeito realize ritos sem aderir interiormente a seu sentido propriamente
cultural. Assim, tanto do ponto de vista objetivo das religiões existentes quanto
subjetivo do homem religioso, somente a realidade complexa, composta de
crenças, práxis e sentimentos orientados, realiza a intencionalidade religiosa.
Dentre as teorias referentes à essência da religião, há aquelas defendendo uma
religião interior e outras exterior. Assim, enquanto alguns a situam na ordem dos
sentimentos, outros identificam-na como o conjunto de crenças, de ritos e de
instituições que constituem uma sociedade (como afirma Durkheim). O encontro
com o divino pode se dar pela via do conhecimento interior, pela leitura simbólica
do mundo, pela escuta de uma palavra sagrada, por uma visão ou iluminação. A
religião é então um conjunto orientado e estruturado de sentimentos e
pensamentos por meio da qual o homem e a sociedade tomam consciência de seu
ser íntimo e último e, simultaneamente, nele se torna presente o poder do
sagrado.
Para küng (1986), a religião se refere à relação do homem com uma realidade
verdadeira e suprema, seja ela compreendida por Deus, o Absoluto, Nirvana,
Shûnyatâ, Tao, dentre outras crenças. As dimensões básicas a todas as religiões
são a questão da tradição e da comunidade; suas funções básicas são as
doutrinas, costumes e ritos; e suas preocupações básicas giram em torno da
transcendência seja para cima ou para dentro, no espaço e/ou no tempo, como
salvação, iluminação ou libertação.
42
“Religião é a realização socioindividual (em doutrina, costume,
freqüentemente ritos) de uma relação do homem com algo que o
transcende e a seu mundo, ou que abrange todo o mundo, que se
desdobra dentro de uma tradição ou de uma comunidade”. (KÜNG,
1986, p.8)
De acordo com Valle (1998), no que se refere ao conceito de religião, existem
diferentes linhas de pensamento. Uma delas considera apenas a dimensão
individual, considerando o conjunto de sentimentos, atos e experiências do
indivíduo humano, em sua solidão, enquanto se situa em uma relação com seja o
que for por ele considerado divino. Outra linha de pensamento, não aceita que o
social e o histórico sejam desconsiderados, propondo que religião é a relação do
ser humano com qualquer coisa que ele conceba como sendo a realidade última
dotada de significado. Existe ainda a posição de que o conceito precisa abarcar a
complexidade do fenômeno religioso em sua inextrincável trama de elementos
individuais e coletivos, propondo que a religião é uma relação vivida e praticada
(entre o ser humano) e o ser ou os seres supra-humanos nos quais ele crê; é um
sistema de crenças e sentimentos.
Nesse sentido, Valle (1998) considerou as religiões como mediadoras do
relacionamento com o sagrado na medida em que apresentam uma dimensão
oculta, a fé religiosa, jamais atingida ou explicada, apenas tangenciada pelos
símbolos religiosos. Sobre a experiência religiosa, o autor faz inicialmente uma
análise da palavra experiência, mostrando que pode significar algo profundo,
vivenciado e dotado de um sentido ou valor evidente em si para o sujeito; ou algo
com conotações e densidades mais corriqueiras, com certa conotação de
externalidade. No campo da experiência religiosa então é possível, por exemplo,
ter duas pessoas participando de uma mesma cerimônia religiosa: apesar de
ambas aparentemente comportarem-se observando, uma pode ser tocada
profundamente pela experiência transmitida no ambiente, pelos símbolos e pelas
palavras; enquanto a outra apenas assiste, sem ser atingida pelo que acontece.
Desse modo, os significados subjetivos são diferentes para cada uma delas.
43
Para Derrida (2000) é preciso considerar uma série de distinções na definição do
que é religião. Segundo este autor, o conceito tal como conhecido no Ocidente
está imbricado pela tradição cristã. Em relação em relação à etimologia da palavra
religio o autor aponta duas possíveis fontes: relegere, de legere (colher, juntar) e
religare, de ligare (ligar, religar). Além disso, seria indispensável diferenciar
religião de fé, crença, piedade, culto, teologia, teiologia, ontoteologia, ou ainda
religioso de divino, sagrado, salvo, santo, indene, imune. Cabe, portanto,
considerar a dimensão da religião enquanto
“[...] um aparelho instituído de dogmas ou artigos de fé determinados
e indissociáveis de um dado socius histórico (Igreja, clero, autoridade
socialmente legitimada, povo, partilha do idioma, comunidade de fiéis
comprometidos com a mesma fé e tornando crível a mesma história).”
(DERRIDA, 2000, p.79)
Enquanto isso, Boff (2001) afirma que o ser humano conhece as religiões, porque,
assim como em relação à linguagem, existe um relacionamento cultural com as
nossas religiões. Na medida em que toda religião promete ao ser humano a
salvação, defendendo a vida e abrindo caminho à eternidade, ela também mostra
o caminho para chegar a esta eternidade, que é o caminho da aceitação
doutrinária. Desse modo, as religiões não só anunciam prédicas como acentuam
práticas, sendo fontes de ética, de comportamento, pois
“As religiões todas fornecem assim uma visão sobre Deus, sobre o
céu, sobre quem é o ser humano e o que deve fazer neste mundo.
Elaboram doutrinas e apontam caminhos para a luz”. (BOFF,2001,
p.24)
De acordo com Libânio (2002), a religião situa-se na esfera cultural da clássica
distinção da sociedade em três níveis _ econômico, político e cultural. Dentro da
cultura, a realidade religiosa pode ser configurada em campos distintos.
44
“Um primeiro conjunto semântico refere-se ao mundo objetivo dos
ritos, dos símbolos, das doutrinas, das pertenças visibilizadas, das
celebrações. É a religião enquanto sistema, organização, corpo
social. Um segundo grupo semântico abrange mais elementos. É a
face subjetiva. Fala-se de religiosidade, de experiência religiosa, de
mística, de espiritualidade, de sentimento religioso. E finalmente um
terceiro complexo semântico deixa o campo da religião
estritamente dita e situa-se diante de uma Palavra de Deus, profética
ou escrita, que pede adesão. Trata-se propriamente da fé”.(LIBÂNIO,
2002, p.87-88)
Esta distinção faz-se necessária já que os campos se parecem e se confundem na
linguagem comum. Em nível concreto, há uma imbricação entre as três realidades,
pois cada uma delas influencia e é influenciada pelas demais. Ou seja, há um
relacionamento entre as esferas delineadas.
Ainda segundo a proposta de Libânio (2002), o termo religião permite duas
etimologias diferenciadas. Uma delas estaria ligada ao termo “religare” que
significa “religação” do ser humano com Deus. Por meio deste vínculo o ser
humano estaria unido e religado a Deus, reforçando o enfoque na dimensão
subjetiva. A outra vem de “relegere”, indicando uma cuidadosa veneração dos
deuses. Neste caso, considera-se a dimensão objetiva, institucional da religião
que estabelece ritos e cultos. Aqueles que consideravam cuidadosamente tudo o
que pertencia ao culto dos deuses eram chamados religiosos.
“A religião indica o caminho da razão, da experiência humana para
ligar-se com o divino. Institui um sistema de ritos, práticas, doutrinas,
constituições, organizações, tradições, mitos, artes que possibilitam
essa religação com o mundo divino. Configura um sistema de
representação, de orientação, de normatividade. Traduz uma
realidade objetiva, uma tradição acumulada e vivida por uma
45
comunidade. Mostra o lado visível da relação com o sagrado”
(LIBÂNIO, 2002, p.90)
A religião, na visão de Libânio (2002) é, portanto, um dispositivo ideológico, prático
e simbólico, pelo qual se constitui, se alimenta e se desenvolve o sentido
individual e coletivo de pertença a uma linha particular de crença. Por meio da
tradição, a identificação que age internamente no grupo é estabelecida e o
distingue externamente dos demais. É criada uma cadeia de memórias que vai
sendo organizada, preservada e reproduzida.
Na concepção de Alves (2003), a marca comum a todas as religiões, por mais que
tenham infinitas divergências, é o esforço em pensar a realidade a partir da
exigência de que a vida faça sentido. Para esse autor, as teias religiosas foram
tecidas em torno da expressão de problemas individuais e sociais tais como
promessas terapêuticas de paz, de harmonia íntima, de liberação da angústia, de
ordens sociais fraternas e justas e de uma boa convivência com a natureza.
Assim, a religião seria uma rede de símbolos, um certo tipo de fala, de discurso na
tentativa de promover uma conexão entre o sagrado e o profano. A importância da
linguagem religiosa é ressaltada na medida em que se refere a coisas além dos
sentidos comuns, acessíveis somente pela fé. O discurso religioso, portanto, teria
o papel de conferir sentido a esse relacionamento.
No entanto, sabe-se que no mundo contemporâneo, muitas instituições religiosas
acabam sendo espaços onde nem sempre o objetivo está no desenvolvimento da
espiritualidade. Assim, desvirtuando-se dessa idéia fundamental, tornam-se
espaços de luta por poder, de promoção de ideologias e de exploração do outro.
3.5.2 O conceito de religiosidade
A religiosidade, na proposta de Libânio (2002) está relacionada a um sentimento
de comunhão, sem precisar de doutrinas exatas. Ou seja, a religiosidade não se
46
vincula necessariamente a uma religião e, quando o faz, assume da religião os
elementos que a satisfazem tais como tradição e comunidade.
“A religiosidade aproxima-se de um vago sentimento religioso.
Corresponde à necessidade afetiva pessoal de estar ligado com algo
distinto de si mesmo. [...] Traduz um desejo de comunicar-se com as
forças sensíveis presentes e atuantes no universo. Casa-se com a
inclinação para o mistério. Prolonga uma afetividade sem objeto
preciso, satisfaz-se com vagas efusões, busca sensações e emoções
que lhe dão a ilusão do amor universal”. (LIBÂNIO, 2002, p.91-92)
Paralelo a este conceito, o autor propõe que a experiência religiosa é uma
percepção da presença do sagrado por parte do sujeito que a faz. Este sagrado
pode apresentar-se sob a face da sedução ou por seu temor misterioso. Este
fascínio está relacionado ao fato de arrancar-se do comum, da rotina, ao
transporte em direção a algo extraordinário, diferente, singular, misterioso, novo,
estranho. Algo que ultrapassa as experiências humanas comuns, que pertence a
outro tipo de realidade, carregado de força e poder.
“O sagrado, ao descentrar o ser humano, provoca a experiência
antagônica de presença e distância, de manifestação e ocultamento,
que se fundamenta na própria natureza da experiência transcendental
de Deus feita na existência humana”. (LIBÂNIO, 2002, p.92)
Desse modo, para o autor a religiosidade é uma dimensão estrutural, uma
característica inerente ao ser humano, considerado como homo religiosus. Haveria
então uma tendência ao sentimento da presença de um poder invisível e eficaz
que se manifesta por meio de um objeto ou de um ser. Sua descoberta
proporciona sentido à existência humana já que “A religiosidade é a pergunta. A
religião é a resposta”. (LIBÂNIO, 2002, p.100) Assim, a religião responde ao
clamor da religiosidade.
47
3.5.3 O conceito de espiritualidade
Para Libânio (2002), o termo espiritualidade adquiriu tal polissemia que apenas é
possível definir o que se entende por ele. Espiritualidade estaria relacionada com
uma “espiritualidade sem Deus”, ou seja, a doutrina perde a autoridade e o
conhecimento substitui a fé. Assim, o termo teria adquirido uma conotação
antiinstitucional, sendo freqüentemente vista como simples dimensão
antropológica.
“A espiritualidade, encarada dentro de perspectiva antropológica, é a
prerrogativa das pessoas autênticas que, em face do ideal e da
história, constataram uma escolha axiológica decisiva, fundamental e
unificante, capaz de dar sentido definitivo à existência”. (LIBÂNIO,
2002, p.95)
Libânio (2004) acredita na existência de uma nova vertente de entendimento do
fenômeno religioso. Neste pensamento, o termo espiritualidade substitui a palavra
fé. É a idéia da espiritualidade global, do acesso ao divino no interior de cada ser
humano e não por meio de realidades objetivas que as religiões tradicionais
oferecem tais como dogmas, sacramentos e ritos institucionalizados. Trata-se de
uma experiência de interioridade, intuitiva, contemplativa, do ser que transcende
no interior do ser. É a presença divina, sem necessariamente vincular-se a Deus.
Para Vilenna (2006, p.51) a espiritualidade também independe da religião já que
“[...] é a forma como o sujeito se relaciona com o Transcendente e como este
relacionamento reflete no seu modo de pensar e viver”.
Corroborando este pensamento, Fleck et al. (2003) propõem que a espiritualidade
coloca questões a respeito do significado da vida e da razão de viver, não estando
limitadas a alguns tipos de crenças ou práticas.
48
3.5.4 Os conceitos de fé religiosa e teologia
No sentido mais amplo da palavra, fé está relacionada à atitude de entrega a uma
realidade ou alguém. Esta relação se faz por meio da confiança. Para Libânio
(2004, p.12), a fé “é uma experiência humana fundamental que se faz entre as
pessoas e que se prolonga para coisas, mistérios e religiões”.
Assim, para o autor, crer é uma condição para existir no convívio humano já que
desde os primeiros movimentos instintivos do recém-nascido são de confiança no
outro que o acolhe, protege, cuida. No inconsciente da criança é criada uma
atitude espontânea de entrega, plantando assim a semente da fé humana ou da
resistência a ela. Dessa forma, há pessoas com mais dificuldade ou facilidade
para desenvolver a atitude de fé.
“A verdadeira experiência de fé humana exige de quem crê um gesto
de entrega, e daquele em que se crê a verdade de sua existência, a
veracidade de seu ser. A fé é sempre bilateral. De um lado há a
entrega; de outro, a aceitação merecida. Portanto, a fé humana se
opõe à ilusão, ao engano, à mentira, ao mito, à superstição”.
(LIBÂNIO, 2004, p.15)
Por conseguinte, a fé ancora-se em sinais de credibilidade que dependem de
elementos culturais, etários, históricos, existenciais e étnicos. Cada ser humano
constrói sinais de credibilidade buscados nas relações com o outro, o que implica
o maior uso da capacidade intuitiva se comparada à verificação empírica.
Já no campo do mistério, a fé religiosa irá operar além da esfera das relações
humanas. Mistério, para Libânio (2004), tem o sentido de uma realidade
provisória, do ainda desconhecido.
Neste sentido, o autor faz críticas ao cientificismo, ideologia de identificar a
realidade ao verificável, excluindo o mistério do campo do conhecimento. Fora do
49
escopo do verificável foram estabelecidos como elementos seculares o mito, a
superstição, a fábula, o sentimento e o campo religioso. A razão iluminista reduziu
o mistério à ignorância e crendice das pessoas, não deixando espaço à nenhuma
realidade transcendente ou sobrenatural. No entanto, atualmente as ciências se
tornam mais “modestas” ao deparar-se com o limite intrínseco ao conhecimento e
à inteligência humana que remete a outro sentido dessa palavra.
Mistério é, na visão do autor, uma realidade transcendente, não necessariamente
pessoal, que causa fascínio ao ser conhecido e que atrai sempre uma busca
incessante. Nesse contexto semântico, aparecem os termos sagrado, religioso,
tabu, numinoso, divino. Em geral estão relacionados a tudo aquilo, incluindo
pessoas, objetos, lugares, tempos, coisas, que nos permite ter a experiência do
divino e vivenciar a fé religiosa. “A fé religiosa implica, portanto, ligar-se com o
mundo divino e cuidar das coisas do culto. Implica a bipolaridade de dois
universos existenciais: o humano e o divino”. (LIBÂNIO, 2004, p. 24)
Na visão do autor, o relacionamento entre esses dois universos é saciado, na
dimensão religiosa pessoal, por meio da fé religiosa. O ser humano vivencia uma
realidade social e cultural de angústia, depressão, fadiga psíquica, tédio,
provocando a busca por onde e como resolver esses problemas. Na crença
religiosa estaria a possibilidade de ser encontrada a resposta gerando alívio e
consolo por meio da confiança numa realidade maior. “Há uma sede de fé
religiosa no meio do desgaste psico-humano provocado pela sociedade e cultura
modernas”. (LIBÂNIO, 2004, p.27)
Libânio (2002, p.99) ainda destaca que o discurso correspondente à fé recebe a
denominação teologia e “diverge dos discursos religiosos que tecem suas
reflexões sobre a experiência religiosa, prescindindo e até carecendo da dimensão
da fé”.
50
3.5.5 O conceito de conversão religiosa
Sob o enfoque da psicologia social da religião, Valle (2002) propõe a existência de
duas aproximações: uma que surgiu no século XIX e dedica-se ao que se passa
no interior do indivíduo que se converte; e outra iniciada no século XX que dedica
maior atenção ao nível psico-grupal e psico-sociológico.
Dentro da primeira linha teórica, destaca-se a experiência subjetiva do sagrado.
Para os autores dessa abordagem, a conversão é vista como um poderoso jogo
de motivações, necessidades e percepções psicológicas que acontecem na
intimidade do convertido. Assim, essa experiência emocional renova os potenciais
vitais, podendo ser um estado emocional de resistência, prazer ou sentido.
O segundo enfoque está relacionado ao surgimento, no início do século XX, de
novas teorias e disciplinas que apresentavam interesse pelos aspectos
perceptivos e psicoafetivos (sobretudo inconscientes) da conversão. Com o
avanço da sociologia e da antropologia, a preocupação voltou-se para aspectos de
natureza psicossocial e psicossociológica. Com isso, surgem teorias com maior
poder de compreensão e abrangência, capazes de reconhecer a importância dos
processos idiossincráticos presentes na conversão e na adesão a um grupo
religioso. Além disso, esses pesquisadores não perderam de vista as relações que
o comportamento religioso do ser humano tem com o pluralismo das culturas e a
feição que a globalização imprime à essa dimensão na atualidade.
“São câmbios de época que obrigam os estudiosos da conversão
religiosa a se preocuparem com os aspectos claramente históricos,
sociológicos e culturais que influenciam as religiões e incluem alguns
mecanismos relacionais, organizacionais e grupais que pesam na
adesão inicial e na posterior permanência do convertido em um dado
grupo religioso”. (VALLE, 2002, p. 56-57)
51
Assim, passou-se a considerar a questão não só da conversão, mas da pertença
religiosa. Ou seja, a atitude do convertido em relação ao novo grupo no qual se
insere vista em seus processos perceptivos, motivacionais e emocionais.
Conversão e pertença deixam de ser vistos, categorizados e classificados
somente com base em comportamentos externos e passam a representar uma
realidade psicossocial complexa da qual faz parte integral o itinerário do
convertido. Os esforços, contradições e avanços também passam a ser
considerados nesse processo.
Para Valle (2002), analisar o panorama da atual dinâmica sócio-religiosa brasileira
deve incluir a premissa da intensa mobilidade e pluralidade desse campo. Isso
porque o país estaria atravessando uma “onda conversionista” sem precedentes.
Para o autor, de modo geral, o comportamento religioso do brasileiro sempre foi
um tipo de "bricollage", ou seja, uma identidade religiosa formada por um mix
construído com materiais de procedências diferenciadas, mas que lhe apresentam
algum tipo de sentido. Essa organização mais livre talvez possa ser relacionada
ao caráter majoritariamente cultural de um catolicismo popular formado a partir de
várias culturas de base. No século XIX, com a entrada das religiões protestantes,
surgiram parâmetros e exigências de pertença mais definidos. Também dentro do
catolicismo deram-se movimentos que levaram as elites religiosas a uma maior
consciência de pertença e, em alguns casos, a experiências diretas de conversão
em massa.
No cenário brasileiro tão diversificado em termos de opções de trânsito religioso, é
comum observar a adesão a uma “nova” religião.
“Na situação de anomia, pluralismo e transição criada pelo consumo
e pelo "mercado" de ofertas religiosas, os indivíduos parecem
experimentar processos de busca que afetam sua emoção, seus
valores e seu comportamento, recentrando-os, de alguma forma, no
religioso e no espiritual. O religioso readquire uma função
52
reordenadora da percepção de si (auto-imagem, senso de identidade)
e do mundo (sentido e opções de vida) que havia sido (parcialmente,
ao menos) perdida com o desencantamento do mundo provocado ali
onde a razão secularizada adquiriu hegemonia. O religioso exerce,
além disto, uma função de inserção e/ou reinserção do indivíduo em
um grupo, respectivamente em um meio socio-cultural motivador e
dotado de sentido.” (VALLE, 2002, p.60-61)
Assim, a extensão e o modo como acontecem essas “passagens” religiosas se
conectam a situações culturais, econômicas e sociais concretas. Uma escolha em
determinada situação frente a tal pluralidade em permanente expansão pode ser
reavaliada no momento seguinte. A adesão a novos valores, mudança na visão de
mundo e adoção de novos modelos de conduta não implica, como em outras
épocas, ruptura social, cultural e da própria biografia. A conversão já não
representa um drama pessoal e familiar nem tampouco uma mudança drástica.
De modo prático e operacional, Valle (2002, p.65) aponta quatro elementos a
serem considerados pelos pesquisadores do tema conversão religiosa: a
consideração dos aspectos conscientes e inconscientes do psiquismo de cada
convertido dentro de sua evolução psico-religiosa individual; o levantamento das
características, inclusive psico-afetivas, do grupo ao qual a pessoa se afilia (clima
interno, regras, crenças, textos de referência, práticas, estilos de liderança); a
análise de fatores de natureza cultural que refletem realidades sociológicas,
econômicas e políticas mais amplas; e a consideração da classe social, idade,
sexo, profissão, dentre outras aspectos da vida do convertido tais como momentos
existenciais de tensão, luto, sofrimento e inquietação.
53
3.6 VALORES
De modo generalizado, valores são elementos norteadores de comportamento.
Eles estabelecem a importância na adoção de determinadas posturas diante dos
eventos, funcionando como guias de conduta.
Para Desjardins (2002), em sentido amplo, valores referem-se à relativa
importância de uma qualidade ou objeto. Para os fins desse estudo, serão
analisados diferentes apontamentos referentes a dois tipos básicos que são os
valores individuais e os organizacionais.
3.6.1 Valores pessoais
Valores são crenças pessoais que motivam determinada conduta ou
comportamento em detrimento de outro. Os valores são constituídos a partir da
experiência de vida, da personalidade e dos traços culturais do ambiente no qual o
sujeito está inserido. Apesar de se manterem em relativa estabilidade, os valores
podem mudar a partir de novas experiências.
Nas mais diferentes definições e estudos sobre valores é possível encontrar
pontos em comum. Schwartz (1994), propõe que os valores podem estar
relacionados a conceitos ou crenças; comportamentos ou estados desejáveis que
transcendem a situações específicas; guia de seleção ou avaliação de
comportamentos e eventos; ordenação por relativa importância.
Para Robbins (1998) valores representam convicções básicas de que um modo
específico de conduta ou estado supremo de existência é preferível pessoal ou
socialmente a outro oposto ou contrário. Eles contêm um elemento julgador que
conduz as idéias de um indivíduo ao que é certo, bom ou desejável. Desse modo,
os valores têm atributos de conteúdo, apontando que um modo de conduta ou
54
estado supremo de existência é importante; e de intensidade, especificando quão
importante ele é. A ordenação dos valores de um indivíduo em termos de suas
necessidades caracteriza o sistema de valores pessoais. Esse sistema é
identificado pela importância relativa que destina-se a cada um deles.
Conforme dito anteriormente, apesar de relativamente estáveis e duradouros, o
processo de questionar valores, é claro, pode resultar em mudança. A partir da
reflexão em torno de acontecimentos marcantes, de atitudes dos outros ou do
próprio auto-questionamento é possível decidir que essas convicções não são
mais aceitáveis. Obviamente, na maior parte do tempo os valores são apenas
reforçados a partir da reflexão.
A formação dos valores está fortemente relacionada às relações sociais do ser
humano. No processo de socialização, as interações com o outro são importantes
elementos dessa formação. Além disso, aspectos culturais influenciam a relativa
importância de determinados valores.
Assim, Robbins (1998, p.89-90) propõe que “os valores dos indivíduos diferem
mas tendem a refletir os valores sociais dos períodos nos quais eles cresceram”.
Nesta medida, cada cultura, ao longo do tempo, desenvolve certos que são
reforçados continuamente. Há a possibilidade de mudança, mas dentro de
processos lentos e graduais.
Por conseguinte, os valores diferem-se das atitudes, apesar de se apresentarem
inter-relacionados: “Atitudes são constatações avaliadoras _ tanto favoráveis
quanto desfavoráveis _ em relação a objetos, pessoas ou eventos. Elas refletem
como alguém se sente em relação a algo.” (ROBBINS, 1998, p.92) Assim, ao
contrário dos valores, as atitudes seriam categorias menos estáveis.
Rokeach (1973, p. 122) afirma que "O conhecimento dos valores de uma pessoa
nos deveria permitir predizer como ela se comportará em diversas situações
55
experimentais e da vida real". Devido a isso, muitas pesquisas são desenvolvidas
buscando determinar esse valor preditivo e estabelecer esta relação funcional em
relação ao comportamento e atitudes. Para o autor, os valores são os principais
fatores que influenciam e determinam o comportamento social, explicando o
interesse da psicologia social nesse campo. Logo, não haveriam dúvidas
relacionadas à influência determinante dos valores sobre o comportamento.
Sobre a existência de um sistema de valores, Rokeach (1973, p. 551) afirma que
seria "nada mais do que uma disposição hierárquica de valores, uma classificação
ordenada de valores ao longo de um contínuo de importância". No processo de
hierarquização dos valores, é considerada não só a postura do ser humano
enquanto observador, mas também enquanto participante da vida social. Desse
modo, os valores estão estritamente relacionados às preferências, à distinção
entre o que é importante para o indivíduo e o que é secundário, entre aquilo que
tem valor e o que não tem.
Além disso, a partir de seus estudos, Rokeach (1973) criou o Levantamento de
Valores de Rokeach (Rokeach Value Survey _ RVS). Com isso, foram
estabelecidos dois conjuntos de valores, cada um deles contendo 18 itens de
valores individuais. O primeiro conjunto denominou-se valores terminais, que
estavam relacionados a estados supremos de existência desejados. Seriam as
metas ou objetivos que uma pessoa gostaria de alcançar durante a vida. O
segundo conjunto ficou conhecido como valores instrumentais, que seriam os
modos de comportamento preferíveis, ou formas de atingir os valores terminais.
Desse modo, no campo empírico, pesquisas com diferentes metodologias
buscaram estabelecer a relação entre valores e comportamento. No campo da
Psicologia Organizacional, os estudos são crescentes nesse campo já que
acredita-se que a partir deles seja possível conhecer e alterar a cultura
organizacional e compreender os processos de mudança e suas formas de
resistência. (TAMAYO et al., 2000, p.290)
56
De acordo com Vilenna (2006, p.14)
“Valores são normas, princípios ou padrões difundidos por grupos
humanos, sociais, políticos ou religiosos, que são absorvidos pelos
indivíduos como elementos constitutivos de sua personalidade e que
contribuem para determinar suas atitudes e comportamento”.
Para Moscovici (2003, p.155), “Na família, no trabalho, na sociedade, no lazer os
valores atuantes moldam atitudes e comportamentos, norteiam e condicionam
relações entre as pessoas e as atividades”.
Conforme Barret (2000), valores são regras para a vida, são crenças arraigadas
de que um certo modo de ser ou resultado é preferível a outro e são
demonstrados externamente por meio de comportamentos.
Sobre as normas morais e suas variações em cada sociedade ao longo da
história, Alberoni (2000, p.10) afirma que
“No passado tínhamos a tendência de difundir nossos genes, mas,
com o desenvolvimento da cultura e do conhecimento, procuramos,
com igual vigor, difundir nossas idéias, as nossas crenças, os nossos
valores, afirmar a nossa religião, a nossa civilização”.
Assim, o discurso da moral sofre influência da visão religiosa, especialmente
quando se trata de preceitos cristãos. Além disso, a moral sofre mudanças em seu
padrão no tempo. A moral evolui com a sociedade. O autor cita o exemplo das
rígidas normas morais e crenças estabelecidas pela Igreja no passado e que hoje
encontram-se abrandadas como outras formas de comportamento.
Conclusivamente, Alberoni (2000) propõe que a evolução e as transformações da
ciência devem caminhar paralelas ao desenvolvimento e observância de valores
57
morais e éticos. É preciso derrubar os pressupostos de que a busca pelo racional
envolve somente ações egoístas, relações de custo-benefício, cálculos,
interesses. O reconhecimento do sujeito nas atitudes racionais é o primeiro passo
para mudar essa visão.
3.6.2 Valores organizacionais
Se no capítulo anterior o conceito de valores relacionava-se a características
fundamentais da personalidade do ser humano, como falar em valores
organizacionais? No sentido metafórico, considera-se que as organizações
também sejam portadoras de um conjunto de pressupostos que fundamentem as
ações daqueles que a compõem. Assim como os indivíduos, as organizações
teriam então componentes que formariam um conjunto de práticas baseadas em
objetivos designados estrategicamente.
Para Tamayo (1996), valores organizacionais são princípios ou crenças,
organizados hierarquicamente, relativos a estados de existência ou a modelos de
comportamento desejáveis que orientam a vida da empresa e estão à serviço de
interesses individuais, coletivos ou mistos.
Partindo dessa definição, em outro estudo, Tamayo e Gondim (1996) salientam
alguns aspectos importantes dessa definição:
O aspecto cognitivo dos valores organizacionais enquanto elemento
básico já que são crenças existentes na empresa ou formas de conhecer a
realidade social, respostas cognitivas prontas e privilegiadas aos problemas
organizacionais. Os valores são crenças valorizadas, enfatizadas pela
organização. Assim sendo, nem toda crença é um valor, somente aquelas
enfatizadas e socialmente aceitas como princípios que orientam a vida das
organizações. As crenças que constituem os valores estão em interação
58
entre si e com outras crenças, constituindo um sistema de valores
complexo e organizado hierarquicamente. Os valores funcionam, então,
como padrões para o julgamento e a justificação do comportamento de si e
dos outros.
O aspecto motivacional: a raiz dos valores organizacionais é motivacional
pois eles expressam interesses e desejos de algum membro da empresa ou
da coletividade. Desse modo, os valores organizacionais representam
metas mais ou menos conscientes da empresa.
A função dos valores, já que eles têm como função orientar a vida da
empresa, guiar o comportamento dos seus membros, sendo determinantes
da rotina diária na organização. Orientam a vida da pessoa e determinam a
sua forma de pensar, de agir e de sentir. Dessa forma, os valores
organizacionais podem fortemente influenciar o que as pessoas realmente
fazem. Não somente o comportamento do indivíduo é influenciado pelos
valores, mas também o julgamento que ele faz do comportamento dos
outros, pertinente ao sistema organizacional. Os valores têm a função de
vincular as pessoas, de modo que elas permaneçam dentro do sistema e
executem as funções que lhes foram atribuídas. Assim, os valores podem
ser considerados como um projeto para a organização e um esforço para
atingir as metas por ela fixadas. As normas organizacionais estão
enraizadas nos valores e podem ser consideradas como uma
operacionalização dos valores organizacionais. Os valores são mais
abrangentes que as normas e constituem uma espécie de ideologia. As
normas definem explicitamente as formas de comportamento esperado dos
membros de uma organização e os valores proporcionam uma justificação
mais elaborada e generalizada, tanto para o comportamento apropriado,
como para as atividades e funções do sistema.
A Hierarquia dos valores: considerando um sistema de valores, segundo
uma disposição hierárquica ou uma classificação ordenada de valores ao
longo de um continuum de importância. As pessoas, as organizações e as
culturas se diferenciam entre si, não tanto pelo fato de possuir valores
59
diferentes, mas pela organização hierárquica dos mesmos. Os valores
organizacionais implicam necessariamente uma preferência, uma distinção
entre o importante e o secundário, entre o que tem valor e o que não tem. A
organização hierárquica dos valores pressupõe que os membros da
organização são atores que participam, que tomam partido, que se
envolvem nele, que transformam o ambiente organizacional e tentam se
impor e se fazer reconhecer no meio social.
Buscando avaliar a importância dos valores para a cultura organizacional a partir
da percepção dos empregados, Hofstede (1980) elaborou um instrumento
psicométrico e concluiu que haviam 48 valores considerados como uma amostra
significativa dos valores organizacionais. Submetidos à análise fatorial, cinco
fatores foram encontrados: eficácia/eficiência, interação no trabalho, gestão,
inovação e respeito ao empregado.
Para Barret (2000), se as crenças e valores corporativos definidos pela Alta
Administração, forem muito diferentes dos valores individuais, a convivência dos
empregados no ambiente de trabalho será muito mais difícil, prejudicando o
desempenho da organização. Inversamente, quanto mais próximos forem os
valores de um indivíduo daqueles preconizados pela organização maior será a
produtividade para a mesma, além da promoção de um estado mais elevado de
realização das pessoas. Assim, para que as pessoas realmente estejam
comprometidas com a empresa é preciso que se tenha um alinhamento entre os
valores pessoais e organizacionais. Além disso, o autor afirma que a satisfação
das necessidades espirituais é a motivação mais forte do homem, a que libera
profunda criatividade e produtividade, não atingidas com recompensas exteriores.
Carvalho e Tonet (1994) afirmam que a cultura organizacional é composta de
vários elementos, entre os quais se destacam: os valores que seriam tudo aquilo
que a organização considera importante para preservar, realizar e manter a
60
imagem e o nível de sucesso desejado; e as crenças, percebidas a partir do
comportamento das pessoas e que estão ligadas à busca de eficiência.
Conforme é possível notar, há predominância nos estudos organizacionais de
abordagens de valores que privilegiam a dimensão utilitarista de análise. Buscam-
se formas de interferência no comportamento das pessoas envolvidas nas práticas
organizacionais, mudanças capazes de promover atitudes favoráveis apenas aos
interesses estratégicos da organização.
3.7 A RELIGIOSIDADE NAS ORGANIZAÇÕES
Mesmo predominando no ambiente organizacional as abordagens e práticas de
gestão com enfoques voltados ao aumento de produtividade e a interesses
estrategicamente delineados, é possível observar diferentes formas de se alcançar
esses resultados. As pessoas envolvidas no trabalho imprimem traços de sua
subjetividade, incluindo os valores constituídos ao longo da vida, nas mais
diversas atividades desempenhadas. Assim, é possível notar a presença de
aspectos da religiosidade no cotidiano das organizações.
Para que se compreenda o campo de estudos que surge diante dessa
constatação, cabe inicialmente analisar o que tem sido objeto de estudo dos
pesquisadores que se dedicam ao assunto.
3.7.1 Mapeando o campo de estudos
No artigo intitulado “Mapeando o terreno das pesquisas sobre espiritualidade nas
organizações”, Benefiel (2003) mostra que algumas questões podem dar forma ao
campo de estudo:
61
Como a espiritualidade pode ser definida?
Como a espiritualidade nas organizações pode ser definida?
Que métodos de pesquisa são mais apropriados para este trabalho:
quantitativos, qualitativos ou uma combinação de ambos?
É apropriado medir a espiritualidade em unidades quantitativas?
Há a necessidade de novos parâmetros de métodos de pesquisa além dos
limites do conhecimento de pesquisa em administração?
Diante dessas questões, a autora mostra quatro possíveis caminhos traçados
pelos pesquisadores.
O primeiro deles seria o campo quantitativo, que busca demonstrar como a
espiritualidade no ambiente de trabalho contribui para a performance
organizacional. Destacam-se os pesquisadores: Trott (1996), que descobriu uma
alta correlação entre bem-estar espiritual e franqueza, eficácia individual, e
comprometimento organizacional; Beazley (1997) que desenvolveu um
instrumento para medir a espiritualidade individual e encontrou uma correlação
entre espiritualidade e honestidade, humildade e serviço ao próximo; Ashmos e
Duchon (2000) que desenvolveram uma definição de espiritualidade no ambiente
de trabalho que, segundo seus estudos, é válida em nível individual para ganhos
de produtividade.
Para Benefiel (2003), ainda há um longo caminho na busca pela demonstração de
uma correlação positiva entre a espiritualidade e a performance organizacional. No
entanto, a abordagem quantitativa já pode ser considerada responsável por
proporcionar o diálogo entre pesquisadores da espiritualidade no ambiente de
trabalho e os teóricos da administração.
O segundo possível caminho seria a estrada do “por que” e do “como”. Enquanto
os pesquisadores da primeira proposta somente examinaram construções
conceituais já propostas e as testaram utilizando métodos de pesquisa
62
qualitativos, Mitroff e Denton (1999) utilizaram uma combinação entre quantitativo
e qualitativo para alcançar uma construção conceitual. Estes pesquisadores
buscavam responder a duas questões centrais: “Por que a espiritualidade deve
ser integrada nas organizações?” e “Como a espiritualidade pode ser integrada
nas organizações?”. Sobre a primeira pergunta, eles encontraram que as pessoas
percebem as organizações como “mais espirituais”, “mais lucrativas”, “mais
atenciosas” e “mais éticas”. A resposta para “quando” elas se encaixam em cada
uma das categorias necessitaria estudos adicionais. Sobre a segunda pergunta,
eles chegaram a composição de um modelo de cinco possibilidades mais
adequadas por meio de suas entrevistas, revisão de literatura e exame das
fraquezas e limitações de cada uma das práticas encontradas em campo.
Benefiel (2003) reconhece os avanços dos pesquisadores e propõe que este
trabalho seja aprofundado, e sua utilidade estendida, por meio de pesquisas
adicionais que privilegiem casos cotidianos de vivências de espiritualidade no
trabalho.
O terceiro caminho seria uma trilha mais aprofundada, buscando os destinos da
proposta anterior de “como” e “por que”. Esta trilha utiliza métodos qualitativos,
inicialmente para descobrir como a espiritualidade se manifesta dentro das
organizações e posteriormente para descobrir o impacto tanto na performance
individual quanto na organizacional. Milliman et al. (1999) descobriram como a
espiritualidade se manifesta dentro de uma organização, a Southest Airlines, e
propuseram três hipóteses sobre esse impacto. Craigie (1999) também buscou
entender como a espiritualidade se coloca, analisando conversas entre líderes da
área da saúde, negócios e governo, e fornecendo um modelo composto de três
etapas para guiar a questão do “como”.
Para Benefiel (2003), esses pesquisadores já avançaram no campo de estudos
mostrando a operacionalização da temática, no entanto é necessária a aplicação
destas propostas em outras organizações.
63
A quarta e última possibilidade seria o caminho do “por que” e “como” radicais.
Este caminho se coloca primeiramente sob teorias explanatórias de como a
transformação organizacional ocorre e posteriormente vai mais a fundo na questão
“por que” a espiritualidade deve ser integrada à rotina de trabalho. Lichtenstein
(1997) notou, durante as entrevistas com três teóricos que deram informações
detalhadas sobre a mudança organizacional, que foram usadas palavras tais como
“mágica”, “graça” e “milagre” ao descrever o momento de transformação,
conferindo um sentido de reverência e surpresa sobre as ocorrências. Neal (1999)
demonstrou algo similar para a transformação individual, formulando uma teoria
baseada em sua pesquisa e reconhecendo que a transformação usualmente não
segue uma trajetória linear, mas inclui interrupções, problemas e imprevisibilidade.
Para o segundo aspecto, Neal et al. (1999) fornecem um extenso contexto, indo
além da mera sobrevivência da organização em si. Eles argumentam que a
transformação organizacional é somente um aspecto das amplas mudanças da
sociedade que são necessárias à sobrevivência do planeta. No que se refere às
questões “como” e “por que” estes pesquisadores foram mais a fundo nas
motivações para esta mudança. Eles ajudaram as pessoas a entender que a
desordem e a imprevisibilidade são partes integrais do processo, e ajudaram na
aceitação dos inevitáveis problemas do caminho. Além disso, mostraram que
existem outras razões além da lucratividade para trazer a espiritualidade para as
organizações. Tudo isso estimulou uma conversa que necessitava ser iniciada,
delineando importantes linhas de discussão. Ao mesmo tempo, essas teorias
necessitam estudos adicionais e precisam encontrar maneiras de comunicar as
visões aos estudiosos da administração.
Assim, estes quatro caminhos representam um importante trabalho desenvolvido
sobre a espiritualidade nas organizações. É importante que muitos métodos
tenham sido explorados nesses anos de formação desse campo de estudos. Cada
um desses pioneiros contribuiu de alguma forma com informações valiosas e seus
64
trabalhos representam um bom começo para os iniciantes em pesquisas sobre a
espiritualidade nas organizações.
Sobre a questão do método, Benefiel (2003) ainda salienta que os pesquisadores
do campo da administração enfrentam o dilema de utilizarem abordagens
qualitativas ou quantitativas, trazidas em suas bagagens, nas pesquisas sobre
espiritualidade nas organizações. Isso deixa muitas perguntas sem resposta já
que o discurso da espiritualidade se difere fundamentalmente do discurso da
ciência organizacional. Muitos tendem a achar que estas abordagens perdem
importantes fatias do que eles estão buscando e pior, tratam a espiritualidade
como uma questão trivial. Já os pesquisadores em administração tendem a achar
que a discussão sobre ser ou não possível definir e medir em termos de ciência
organizacional é irrelevante à eficiência e ao efetivo funcionamento das propostas.
Este dilema pontua a nova fronteira das pesquisas sobre espiritualidade nas
organizações. Enquanto alguns trilham algum dos caminhos propostos pelos
pioneiros, o autor afirma ser importante mostrar o novo campo ainda inexplorado
que consiste em dois territórios inexplorados:
1. Trabalhos filosóficos que solucionem a problemática entre o discurso da
espiritualidade e o discurso da ciência organizacional.
2. Novos métodos de pesquisa a serem construídos sob embase filosófico,
métodos que irão mostrar seriamente a importância e validade da
espiritualidade em si e relacionada a elementos externos.
Para Benefiel (2003) este é o momento para a definição desse novo campo de
estudos da espiritualidade nas organizações e do caminho a ser seguido. Os
estudos iniciais foram importantes no sentido de traçar os caminhos que levarão
teóricos e práticos para este terreno. No entanto, ainda existem clamores já que
para a maturidade da temática é preciso continuar trilhando o caminho já
65
existente, aprofundar os estudos, explorar novos métodos de pesquisa e ajudar a
construir pontes para que as conversações se façam entre diferentes campos.
Também no sentido de mapear o campo de estudos sobre a espiritualidade no
ambiente de trabalho, Freshman (1999) já havia empreendido uma análise
exploratória de passagens de textos sobre o tema. Foram estudados grupos de
discussão via email, questionários e literatura relacionadas ao assunto. Este
estudo essencialmente quantitativo buscou documentar e sistematizar em
categorias o que estava sendo descoberto naquele momento das pesquisas.
3.7.2 A religião e o ambiente de trabalho
Diante das análises exploratórias sobre o campo de estudos da espiritualidade no
ambiente organizacional, cabe compreender o que vem sendo objeto de análise
das pesquisas com esse enfoque.
Buscando explicar a tendência desse tipo de estudo, Tischler (1999) delineou uma
proposta teórica baseada na teoria da hierarquia de necessidades de Maslow
(1943). No artigo, o autor pretendeu levar o modelo para um novo território,
aplicando a teoria ao nível social de atividade, como uma teoria de
conscientização e motivação social, ao invés do individual.
Segundo a teoria de Maslow (1943), há cinco níveis básicos de necessidades:
necessidades físicas ou de sobrevivência; necessidades de segurança;
necessidades sociais; necessidades de auto-estima; e necessidades de auto-
realização. Assim, o ser humano seria dotado de necessidades complexas e que
podem ser hierarquizadas. Quando uma necessidade menos complexa for
satisfeita, o indivíduo buscará alcançar a necessidade mais complexa que se
segue.
66
Para Tischler (1999), na medida em que a revolução industrial se processa nas
sociedades, a prosperidade produzida se difunde e grande parte das pessoas se
torna livre do foco em necessidades de sobrevivência e segurança
exclusivamente. Assim, a sociedade como um todo estaria se movendo em
direção aos níveis mais altos de necessidades: sociais, de auto-estima, de auto-
realização, incluindo a espiritualidade. É possível notar este processo nos Estados
Unidos e em países desenvolvidos da Europa. Para o autor, a tendência está no
nível social das necessidades humanas e esta proposta teórica de mudança
oferece novas formas de entender muitas das transformações sociais deste
tempo, incluindo o interesse pela espiritualidade nos negócios.
No entanto, essa proposta analítica parece não encontrar fundamentos sólidos na
prática já que países considerados em desenvolvimento, como no caso do Brasil,
apresentam evidências da presença da religiosidade no trabalho. A hipótese de
relação entre a busca de níveis de satisfação mais altos e a questão da
espiritualidade nos negócios requer pesquisas aprofundadas para que se mostre
legitimado no ambiente acadêmico.
Também analisando o crescimento dos estudos sobre o tema, Lampman (2003)
resgata que Patrícia Aburdene, co-autora do livro Megatrends propôs que esta
tendência estaria por se tornar uma mega-tendência por uma série de motivos,
dentre eles:
O enorme estresse que as pessoas vivenciam devido a crises econômicas
e de segurança nos últimos dois anos;
Os dados de pesquisas revelam um crescimento rápido do segmento por
meio da exposição de casos de sucesso;
Líderes de negócios com suas próprias noções de transformação pessoal
ou de trajetória espiritual agora as transpondo para as instituições;
A convergência dos movimentos de responsabilidade social e
espiritualidade.
67
Corroborando a questão do foco nessa temática, Conlin (1999), já havia proposto
que um retorno da espiritualidade vinha ocorrendo nas organizações americanas.
Executivos estavam misturando aspectos do misticismo ao gerenciamento,
importando para os corredores dos escritórios as lições usualmente ensinadas nas
igrejas, templos e mosteiros, e indo contra o antigo tabu sobre falar de Deus no
trabalho.
Segundo o artigo, havia naquele momento 10.000 grupos de oração e estudos da
Bíblia no ambiente de trabalho que se encontravam regularmente, verificados pela
Fellowship for Companies for Christ International. Poucos anos atrás, existia
somente uma conferência sobre espiritualidade no ambiente de trabalho, enquanto
em 1999 existiam cerca de trinta. No ambiente acadêmico também notou-se
crescimento: a Universidade de Denver, a Universidade de New Haven e a
Universidade de Minesota de St Thomas haviam aberto centros de pesquisa
dedicados ao assunto. O número de livros relacionados ao tema que chegavam às
prateleiras das lojas a cada ano tinha quadruplicado desde 1990.
Na verdade, o que estava acontecendo seria um reflexo de uma tendência mais
ampla. As pessoas estariam trabalhando o equivalente a um mês a mais por ano
do que faziam uma década atrás. Não era de surpreender que o ambiente de
trabalho _ e não as igrejas ou praças da cidade_ fosse onde o fenômeno social
americano estivesse se mostrando inicialmente. O escritório passava a ser onde
mais e mais pessoas comiam, se exercitavam, namoravam, deixavam suas
crianças, e até mesmo dormiam. Além disso, o influxo de imigrantes no local de
trabalho tinha aumentado a consciência sobre uma vasta gama de crenças
religiosas. Por todo o país cresciam o número, por exemplo, de Muslims que
desenrolavam seus tapetes de oração dentro dos escritórios.
Para Conlin (1999), com maior número de pessoas abertas à espiritualidade _
95% dos americanos declaravam acreditar em Deus ou em um espírito universal,
68
e 48% diziam que conversam sobre sua fé religiosa no trabalho, de acordo com a
Organização Gallup _ fazia sentido que, junto a seus laptops e pastas, as pessoas
levassem sua fé ao trabalho.
Mas talvez a questão mais importante dessa tendência, segundo a autora, fosse a
crescente evidência de que programas com enfoque na espiritualidade no
ambiente de trabalho seriam responsáveis não só por suavizar a psique dos
trabalhadores, mas também por proporcionar aumento na produtividade. Por outro
lado, céticos que preferiam não se utilizar desse tipo de discurso podiam encarar
este fenômeno como apenas outra moda passageira da administração.
No artigo foram citados vários casos de empresas que aceitaram a espiritualidade
e obtiveram efeitos positivos no ambiente de trabalho. No entanto, afirmou-se que
a implementação dessa abordagem não garantiria o fim dos conflitos no trabalho.
A autora revelou que muitas organizações preferiam manter ambientes seculares,
respeitando as crenças dos funcionários, porém sem incentivá-las.
É possível notar que, para essa autora, é possível utilizar a espiritualidade como
ferramenta para aumentar os ganhos em produtividade. As afirmações desse
artigo não se fundamentam em pesquisas nem sequer mostram-se
suficientemente apoiadas em argumentos sólidos. Ao que parece, trata-se de uma
proposta que propõe resultados ilusórios.
Ainda dentro da proposta de compreensão da presença da religião no ambiente de
trabalho, destaca-se o livro Religion and the Workplace de Hicks (2003). Suas
reflexões destinaram-se a pesquisadores do tema ou aos que se deparam com a
questão em seu cotidiano. Contrariou as publicações americanas, em grande
parte funcionalistas, que abordavam o relacionamento entre liderança e religião
nas organizações visando modelos que oferecessem resultados lucrativos.
69
No esforço em entender as relações da religião no ambiente de trabalho, o autor
utilizou pesquisadores de vários campos do conhecimento e buscou oferecer
idéias que pudessem capacitar a expansão de entendimentos sobre o ambiente
de trabalho como um importante contexto público no qual a religião, em toda sua
diversidade, opera. Além disso, convidou filósofos, teólogos e especialistas em
ética de tradições específicas a desenvolver perspectivas sobre trabalho, ética nos
negócios e liderança organizacional que se voltem ao desafio da diversidade da
força de trabalho. Encorajou pesquisadores da administração e dos estudos em
liderança a entender a religião, em suas múltiplas e potenciais formas de conflito,
como uma importante parte da identidade de muitos empregados que deve ser
respeitada ao invés de evitada, reduzida e explorada.
A proposta central da obra se relacionou à sugestão do modelo de respeito ao
pluralismo que, segundo o autor não resolveria todos os dilemas nem traçaria uma
descrição de toda a complexidade do tema, mas ajudaria a dar ênfase a uma
conversação crítica entre os pesquisadores e aqueles que vivenciam a questão,
sobre as formas nas quais a religião atua e deve atuar no ambiente de trabalho.
O modelo pluralístico sugerido criaria espaços onde empregados de vários níveis
hierárquicos da organização podem ser agentes morais e expressar perspectivas
diferentes no trabalho. Isso porque a espiritualidade ou religiosidade de um
ambiente de trabalho não obedeceria necessariamente à hierarquia da
organização. Os líderes, formais ou não, teriam um papel crucial em dar forma e
manter uma estrutura e cultura de respeito ao pluralismo, mas todos os
empregados ativamente se engajam em tal condição. Dessa forma, as lideranças
não seriam as únicas responsáveis pela criação de um processo e procedimento
no qual os empregados possam comunicar seus comprometimentos e crenças
substantivam, eles também devem gerar formas de expressão múltiplas, algumas
vezes complementares, e outras vezes competitivas.
70
Hicks (2003) traz algumas definições de religião e controvérsias em torno delas,
enfatizando a necessidade de maior precisão dos pesquisadores no uso dessas
expressões, na tentativa de capturar mais adequadamente as distintas realidades
das formas múltiplas de religião. Além disso, pelos casos estudados, são
apresentadas grandes variações referentes ao tema, o que requer análises mais
acuradas sobre as relações entre ambiente de trabalho e religião, considerando-se
o tamanho, a estrutura, a cultura e a história de cada organização.
Sobre a discussão das formas nas quais os empregados expressam suas
diferentes religiões no trabalho, é enfatizado que, funcionários de empresas com
lideranças que valorizem a participação tenderão a ver a espiritualidade de forma
diferente de empregados de organizações com uma história de desconfiança e
tensão no ambiente de trabalho. Assim, percebe-se que o discurso e as ações
relacionados à influência da religião nas organizações pode operar nas duas vias,
dependendo não só da natureza da religião, mas também da natureza da
organização.
Além disso, por meio de estudos comparativos entre diferentes nações é mostrado
que o contexto político e legal também atua de forma decisiva no entendimento da
religiosidade no ambiente de trabalho. Isso pode ser visto pelas diferentes
questões abordadas por pesquisadores em seus países tais como leis de direitos
civis e feriados nacionais religiosos.
Também faz parte da análise do livro a questão da importância de se entender o
conjunto de idéias religiosas na vida pública, não só no trabalho. Compreender as
formas nas quais, por exemplo, a religião, o estabelecimento cultural do
cristianismo, a espiritualidade em amplo sentido e o secularismo continuam a
competir em várias esferas da sociedade. Cabe destacar que a obra não
apresenta diferenciação entre aspectos de crenças ou práticas que são religiosos
daqueles que são espirituais. Isso porque, para o autor, não é indicado delinear
essa dicotomia.
71
Outro ponto importante a ser considerado é a cautela na diferenciação entre
assuntos em nível individual e institucional nas análises de quaisquer aspectos da
cultura e dos valores. A linguagem utilizada pelos teóricos que estudam a questão
da liderança relacionada à religião costuma ser pouco apropriada em grande
parte. O uso inadequado leva as organizações a encobrir diferenças religiosas,
espirituais e morais entre funcionários e exigir de seus empregados atitudes
conflitantes com suas convicções pessoais.
A abordagem do autor ainda enfatiza os potenciais conflitos entre os
comprometimentos religiosos, espirituais e morais de um lado e as
responsabilidades do empregador de outro. Para alguns empregadores trata-se de
uma competição de lealdades entre duas instituições: empresa e valores. É válido
que os pesquisadores e as pessoas que lidam com o fenômeno na prática reflitam
sobre a forma como os membros de comunidades religiosas em particular podem
e devem “levar sua fé ao trabalho”. Deve-se também atentar para o modo pelo
qual os conflitos internos são negociados quando as pressões competitivas
surgem. O enfoque do autor nos conflitos engloba não só as tensões que surgem
entre membros de uma força de trabalho diversificada, mas também a questão da
“competição de lealdades” dos indivíduos que buscam integrar suas várias esferas
de vida.
Antes mesmo da proposta analítica de Hicks (2003), White Jr (2002) propôs que
os líderes de sucesso já vinham reconhecendo que um ambiente de trabalho
espiritualmente saudável influencia positivamente a performance dos empregados
e da organização. A saúde espiritual levaria as pessoas a experimentarem um
nível de consciência mais profundo, melhorar suas habilidades intuitivas, encorajar
o trabalho em equipe, desenvolver maiores propósitos em direção à visão da
organização e impulsionar a inovação. Assim, as organizações que oferecem
metas de trabalho “espiritualmente orientadas” proporcionam aos seus
72
empregados oportunidades de vivenciar elevado senso de comprometimento e
significativo crescimento pessoal.
As limitações em encorajar a espiritualidade no ambiente de trabalho apontadas
pelo autor estão relacionadas à transformação das crenças em comportamentos,
podendo gerar conflitos. Isso porque os valores podem entrar em colisão, como
por exemplo, pessoas com significados divergentes sobre a espiritualidade. Em
muitos casos, o limite entre a crença espiritual e a crença religiosa é tênue e pode
provocar embates.
Desse modo, o desafio central para executivos e administradores diante dos
potenciais benefícios da espiritualidade no trabalho estaria em definir de que
forma implementar valores espirituais no ambiente de trabalho e ao mesmo tempo
minimizar os conflitos que podem surgir.
O autor ainda afirma que as pessoas buscam a espiritualidade de diferentes
maneiras. Alguns se voltam para métodos seculares para enriquecer suas vidas e
tornar sua experiência no trabalho mais produtiva. Nesse primeiro caso, é possível
citar a prática de exercícios de yoga durante o horário de almoço e sessões de
meditação para alívio do estresse. Há ainda os que empreendem essa busca por
meio da religião, se comportando de modos particulares buscando manter sua fé.
Como exemplos, há pessoas usando turbantes no trabalho e optando por fazer
horas extras durante a semana para sair mais cedo às sextas-feiras para práticas
religiosas.
Desse modo, quando os empregados transformam seus pensamentos espirituais
em comportamentos observáveis, especialmente quando isso envolve posturas
religiosas, conflitos podem ocorrer entre o direito do empregado de praticar sua
religião e o seu dever de eficiência na conduta do negócio sem excessos. Neste
contexto encontra-se a discussão dos direitos legais dos funcionários de falar e
associar-se em conformidade com suas crenças fundamentais.
73
White Jr (2002) afirma que não existem guias definitivos para a decisão dentro de
padrões legais apropriados para essa questão. No entanto, contribuições de
pesquisas podem fornecer estruturas para um melhor entendimento desse
assunto tão controverso. Considerações inerentes a decisões pessoais sobre a
expressão religiosa podem ajudar na definição de limites e propor soluções para
impasses em diversos setores e organizações.
Dentro dessas propostas de contribuições às novas pesquisas, King e Crowter
(2004), na tentativa de acelerar a tendência dos estudos sobre espiritualidade e
religiosidade nas organizações, ofereceram uma análise de publicações da
psicologia da religião que, na visão dos autores, pode ser transposta para estudos
organizacionais. É salientada que a maior dificuldade a ser vencida será derrubar
a convenção sobre nunca discutir religião e política no ambiente de trabalho. Para
os autores, é quase certo que a religiosidade e a espiritualidade sempre tiveram
significativas influências nas atitudes e comportamentos individuais e o potencial
dessa influência em produzir efeito na e para a organização que os emprega
sempre existiu. O enfoque do artigo privilegia os instrumentos de medida utilizados
pelos pesquisadores da psicologia da religião e a discussão de assuntos
relacionados a estes métodos.
Sobre a relação entre espiritualidade e religiosidade, os autores mostraram que há
pesquisadores do tema que consideram estes construtos como indistintos e outros
que argumentam que existam diferenças significativas já que a religião se refere a
uma atividade em grupo que envolve comportamentos e características sociais,
doutrinárias e de denominações específicas. Alguns afirmam que a prática
religiosa encoraja o crescimento espiritual enquanto as práticas espirituais são
freqüentemente um aspecto salientado na participação religiosa. Outros já
preferem argumentar que é possível adotar o comportamento religioso exterior
sem desenvolver relacionamento com Deus. Isso demonstra a complexidade em
conceitualizar espiritualidade e religiosidade nos estudos.
74
3.7.3 Abordagens com ênfase em modelos
Diferenciando-se das análises que se dedicam à compreensão de diferentes
elementos relativos à presença desses conceitos no ambiente de trabalho, há
pesquisadores que dedicam-se à proposição de modelos de aplicação prática
sobre o assunto.
Nesse sentido, Zohar e Marshall (2006) apresentam a noção de capital espiritual.
Para os autores há urgência por uma noção de significado e valores e de um
propósito fundamental para que se tenha um capitalismo e uma sociedade
sustentáveis. Essas motivações e princípios não-sectários seriam encontrados em
qualquer ser humano, bastando desenvolvê-los nas organizações, comunidades e
culturas da atualidade. Assim, a inteligência espiritual, o mesmo que inteligência
moral, revela a capacidade inata de distinguir o certo do errado, exercitando a
bondade, a verdade, a beleza e a compaixão. É a canalização das mais profundas
e ricas dimensões da imaginação e do espírito para dentro da vida diária, das
famílias, das instituições e das organizações. Conceitualmente, capital espiritual
“[...] é a riqueza com a qual podemos viver, que enriquece os mais
profundos aspectos da vida. É a riqueza que extraímos de nossos
mais profundos valores e princípios, propósitos fundamentais e
motivações mais elevadas, na busca de um modo de encaixá-los em
nossa vida e em nosso trabalho.” (ZOHAR e MARSHALL, 2006, p.15)
Pode-se, portanto, distinguir o capital espiritual do capital material, típico da
sociedade capitalista e alcançado com a inteligência racional. O capital material
está relacionado ao dinheiro e àquilo que ele pode comprar: bens, investimentos,
vantagens materiais, poder e influência. O capital espiritual também se diferencia
do capital social, riqueza que cria oportunidades para as comunidades agirem com
eficiência na busca do bem-estar geral, relacionada à inteligência emocional
provocada nos relacionamentos.
75
Sem dúvida, as noções de capital espiritual e de inteligência espiritual desses
autores são importantes para o crescimento do debate em torno do assunto e para
um entendimento claro do papel potencial da espiritualidade no contexto atual. No
entanto, é afirmado nessa obra que as empresas podem acumular capital social e
o caminho para essa nova forma de gestão é descrito como se uma mudança na
cultura da empresa fosse apenas uma questão de propor novas práticas. Ora, se o
capital espiritual se relaciona a uma mudança de valores e visão dos indivíduos,
esse processo em nível coletivo pode não apresentar a eficácia apontada tão
rapidamente. A proposta é que os líderes empresariais, atuais e potenciais, ajam
com base em motivações mais elevadas, inventando e incorporando práticas de
vida e uma filosofia de negócios que proporcionem melhorias no mundo e abram
caminho para um capitalismo sustentável.
Segundo Zohar e Marshall (2006), as empresas que acumulam capital espiritual:
são conduzidas por sua visão e seus valores; têm um alto sentimento de holismo
ou conectividade; são compreensivas e piedosas; celebram a diversidade,
reconhecendo que todos os pontos de vista são necessários e que cada um deles
possui alguma validade; são independentes dentro de seu setor; estão sempre se
questionando e jamais se permitem ficar obcecadas por metas específicas, com o
que deveriam ter feito e não fizeram ou com as conseqüências das suas escolhas;
mostram-se sempre prontas à espontaneidade; buscam uma reação positiva
diante da adversidade; mantêm um sentimento de profunda humildade; e têm um
sentimento de vocação.
Seguindo o caminho das abordagens funcionalistas sobre o tema espiritualidade
nas organizações, Hawkins (1998) estabelece reflexões com o objetivo de ensinar
os executivos a conduzirem o crescimento pessoal e espiritual paralelo ao
profissional e financeiro. Por meio de técnicas práticas sobre a aplicação de
princípios espirituais à rotina profissional, a autora afirma proporcionar um novo
significado ao trabalho. Além disso, este modelo se estende às pessoas
76
envolvidas na organização, proporcionando mudanças, crescimento e progresso
por meio de princípios espirituais.
“Quando você aplicar os princípios espirituais no trabalho e encarar o
escritório como sua “igreja” ou “templo”, ficará mais calmo, mais
orientado para o interior de seu ser, e menos afetado pelas
circunstâncias. Pensará de forma mais clara, tomará decisões mais
sábias e atrairá pessoas positivas. Estará aberto a experiências que
alimentem seu crescimento espiritual. Saberá que há um Poder para
o bem em sua vida e que, com ele, pode realizar qualquer coisa”.
(HAWKINS, 1998, p. 177)
A autora utiliza em todo o livro metáforas comparando, por exemplo, “lojas” a
igrejas, “confiança” a fé, e até mesmo a “alta gerência” a Deus. São abordadas ao
longo dos capítulos várias explicações sobre como implementar o modelo em
várias situações cotidianas no trabalho.
Com tantos resultados positivos apontados diante da adoção dos modelos
propostos, estas publicações parecem, à primeira vista, ser uma excelente
solução de gerenciamento para qualquer organização. No entanto, percebe-se
que se trata de uma estratégia de apresentação do discurso já que, na prática, a
aplicação dessas “receitas” nem sempre é viável.
77
4 O ESTUDO DE CASO
4.1 A EMPRESA X
Constituída em 2000, a Empresa X está localizada na cidade de Cariacica, Estado
do Espírito Santo. Atua na comercialização de descartáveis em geral, com
destaque para os produtos: sacos de lixo para condomínios, restaurantes, limpeza
pública; sacos em rolo; espetos de bambu; flanelas; sacos plásticos para
embalagem de alimentos congelados; filmes em PVC; folhas de papel alumínio
para acondicionamento de produtos alimentícios; protetores de fogão de papel
alumínio; filtros para coifas; coadores de café e sacos para entulhos.
A formação societária da empresa divide-se entre dois irmãos, cada um com
metade das cotas. Além da Empresa X, os proprietários possuem uma segunda
empresa, localizada em bairro próximo, onde são fabricados os produtos. Parte do
gerenciamento desta fábrica é realizado nas dependências da Empresa X,
responsável pela representação e repasse dos produtos. Os sócios contam que a
parceria comercial surgiu com uma pequena empresa de distribuição de
embalagens, conforme relatado por um deles:
“Funcionava na casa de meu pai, onde eu morava ainda, num
quartinho de uns 10 metros quadrados. O meu irmão vendia e eu
entregava. Fazia entrega num Fusca. Depois começou a crescer e
nós abrimos uma empresa em 1994 e passamos a atender um
número maior de clientes, todo tipo de varejo, papelaria, lojas de
presentes, restaurantes, lanchonetes.” (Sócio A)
Com o crescimento da primeira empresa surgiram as dificuldades, principalmente
a inadimplência dos clientes. Assim, em 1999 os irmãos começaram a pensar na
hipótese da criação de uma marca própria e na fabricação dos produtos
comercializados. Em 2000 a idéia se concretizou e a antiga empresa foi vendida.
A nova organização contou com a mesma formação societária e passou a ter
78
como principais clientes os supermercados. Foi então adquirida a fábrica onde os
produtos foram sendo desenvolvidos e aos poucos surgiram novas criações,
agregadas ao catálogo de vendas. O principal produto atualmente comercializado
pela Empresa X são os sacos para lixo de uso doméstico. A venda dos produtos é
feita em supermercados e em pequenos mercados onde os representantes
comerciais fornecem mensalmente as mercadorias. A divulgação dos produtos é
realizada por meio dos catálogos de produtos levados aos responsáveis pela
negociação, em feiras e eventos do setor supermercadista.
Por tratar-se de uma empresa de pequeno porte, os sócios optaram por dividir
entre eles o gerenciamento da organização da seguinte forma: um deles ficou
responsável pela parte de compras, financeira e de assuntos administrativos de
escopo mais interno enquanto o outro optou por gerenciar a parte de vendas, os
representantes e demais assuntos externos.
Há cerca de um ano e quatro meses (da data desta entrevista, realizada em
novembro de 2006) os sócios identificaram a necessidade de contratação de um
administrador para cuidar da gestão dos funcionários, envolvendo os processos de
seleção, demissão, treinamento e remuneração. Esse funcionário, um antigo
amigo de um deles, passou a prestar serviços de gerência, imprimindo na
organização um maior “profissionalismo”, conforme entrevista com o Sócio A e B.
De acordo com o administrador contratado (Funcionário C), desde seu ingresso na
organização vem sendo trilhada uma mudança no gerenciamento de pessoas. Foi
destacada a promoção de reuniões semanais em que as opiniões dos funcionários
são escutadas e valorizadas, incentivando assim maior participação na gestão da
organização em seus mais diversos processos funcionais e à comunicação
interna. Além disso, os investimentos em desenvolvimento de pessoas também
foram salientados. Como exemplo foram citadas algumas das palestras proferidas
numa sala de treinamentos criada para abordagem de diversos temas relativos ao
trabalho desenvolvido na empresa.
79
Diante das considerações anteriores, a Empresa X conta atualmente com nove
funcionários internos (não inclusos os representantes comerciais, com os quais
não foram liberadas as entrevistas) e sua estrutura organizacional encontra-se
relatada a seguir:
SÓCIO A
RECEPÇÃO
FATURAMENTO
A
UXILIARES
A
DMINISTRATIVOS
CRÉDITO E
COBRANÇA
SUPERVISÃO DE
VENDAS
ADMINISTRADOR
REPRESENTANTES
COMERCIAIS
SÓCIO B
FIGURA 1: Organograma.
Fonte: Elaborado a partir de entrevistas.
A presença do aspecto religioso sempre esteve envolvida na existência da
Empresa X, desde sua fundação. De acordo com um dos sócios,
“[...] o maestro da
empresa sempre foi o Senhor, o próprio Deus”. (Sócio A)
O fato de a organização ter
atingido as estratégias e metas traçadas ao longo dos anos é atribuído à prática
da religiosidade dos sócios e de suas preocupações éticas e morais em suas
decisões.
Dos nove entrevistados, sete disseram ser da religião evangélica Assembléia de
Deus, um se declarou católico e outro católico não-praticante. A distribuição das
religiões professadas pelos integrantes da empresa pode ser vista na Tabela 1.
80
4.2 ANÁLISE DOS DADOS
A análise e tratamento dos dados dispostos neste capítulo são provenientes da
pesquisa realizada na Empresa X. Durante a produção dos dados, a prévia
compreensão das propostas utilizadas no referencial teórico relativas a cada um
dos assuntos abordados se mostrou importante no entendimento das zonas de
sentido reveladas por cada um dos entrevistados.
Todas as entrevistas gravadas foram posteriormente transcritas “ipis literis”. As
conversas informais, pequenos relatos após o desligamento do gravador e outras
informações baseadas na observação foram anotadas no diário de campo e se
mostraram importantes na confirmação ou refutação de dados, bem como no
entendimento mais profundo das relações. Em alguns casos, essas conversas
foram mais importantes do que a própria entrevista, em termos da qualidade das
informações fornecidas.
Partindo do relato das histórias de vida de cada um dos entrevistados foi montado
um relatório desse conjunto de informações. (APÊNDICE B)
A análise das informações coletadas sugeriu a constituição das seguintes
categorias: Conversão Religiosa; Relacionamento Interpessoal; Estilo de Gestão;
Recrutamento e Seleção; e Religiosidade no Ambiente de Trabalho.
4.2.1 Categoria: Conversão Religiosa
A categoria Conversão Religiosa foi notada a partir dos relatos de adesão e
permanência dos entrevistados em um dado grupo religioso que implicavam em
transformações de suas emoções, valores e comportamentos.
81
A inserção ou reinserção do ser humano no universo religioso pode implicar num
ritual de passagem ou mudança, alterando a percepção de si e do mundo. Logo,
foi possível apreender um pouco da trajetória das emoções e sentimentos
envolvidos nesse processo de transformação relatado por alguns dos
entrevistados.
Nas informações coletadas na Empresa X foi possível perceber que, para maior
parte dos entrevistados que relatavam ter passado pela conversão religiosa, o
processo implicou uma mudança considerável, ou seja, uma ruptura com a
situação anterior.
“A
mudança na minha vida foi completamente admirável. Quem me
conhecia
antigamente e me conhece hoje ficam meio passados”.
(Funcionário E)
“A minha
conduta de vida começa pela minha vida o que era antes e
o que é
hoje. Com Jesus e sem Jesus. Há uma grande diferença. Eu,
pessoa, sou
completamente diferente de antes”. (Funcionário B)
A motivação do ser humano na busca por um grupo religioso pode estar
relacionada a uma crise ou inquietação de caráter interior ou individual. Uma das
causas dessa questão foi relacionada à incompatibilidade de valores com
determinado grupo religioso. Também foi possível notar que, em muitos casos, a
conversão se deu num momento de dificuldades pessoais ou familiares.
“Era da Igreja Maranata. Depois fui pra Batista. Mas precisava ainda
de um avivamento, sentia que
faltava alguma coisa. Aí fui pra
Assembléia de Deus. [...] Depois foi com meu esposo, porque ele
tinha
perdido o emprego, tinha sido mandado embora”. (Funcionária
D)
“Eu era dessa Igreja (Assembléia de Deus) até uns sete anos de
idade. Aí
parei de freqüentar, passei a fumar, usar drogas. [...] com
82
uns 13 anos comecei a jogar futebol e tinha o sonho de virar jogador.
Aí fui
buscar na Igreja uma ajuda pra conseguir atingir essa meta.
Entrei dentro da Igreja e decidi que era ali que eu queria ficar”.
(Funcionário G)
Antes eu começava uma coisa e partia pra outra, não dava certo,
problemas em casa, problemas no trabalho, e nada dava certo”.
(Sócio B)
A conversão religiosa, no caso de uma das entrevistadas, foi motivada pelo clima
religioso no ambiente de trabalho e pela sugestão de um dos sócios da empresa.
Foi relatado pela Funcionária H que as orações realizadas semanalmente na
organização despertaram o interesse pela religião praticada pela maioria dos
colegas de profissão.
“Eu comecei a ir aos cultos, participar e foi entrando no meu coração.
Um dia, um dos donos da empresa [...] falou que o Senhor tinha
mandado dizer que era pra eu buscar uma Igreja de fogo, uma Igreja
avivada, que eu precisava disso e que o Senhor tinha mandado. E
que se eu cresse, que eu tomasse posse. E
eu recebi”. (Funcionária
H)
Como foi possível apreender em conversas informais, essa “Igreja avivada” à qual
a entrevistada se refere é a Assembléia de Deus, freqüentada pela maior parte
dos funcionários. Este grupo religioso é conhecido pela “doutrina de avivamento
espiritual” que resulta da proclamação da palavra de Deus e obediência a Ela.
(para outras informações sobre esta religião ver ANEXO A)
83
4.2.2 Categoria: Relacionamento Interpessoal
Nesta categoria foi analisada a interação entre as pessoas no ambiente de
trabalho. O bom relacionamento interpessoal está diretamente ligado à
cooperação, harmonia, respeito, reconhecimento do outro e autocontrole. Bons
resultados em organizações dependem da boa convivência entre aqueles que
fazem parte do grupo, amenizando potenciais conflitos.
Durante a coleta de dados desta pesquisa, notou-se a cordialidade entre os
funcionários da empresa e até mesmo a amizade entre alguns. A empatia nas
relações pôde ser notada nos depoimentos em que foram verbalizadas atitudes
como o controle emocional, mas também nas conversas informais nas quais
percebeu-se a preocupação com dificuldades e aspectos da vida pessoal dos
colegas de trabalho.
“As pessoas tentam sempre ter aquele cuidado pra não magoar o
outro e tal...e isso tem sido muito bom”. (Funcionária D)
“O
ambiente é completamente cordial, maravilhoso. A gente se
respeita, nos respeitamos e temos direitos. Existe uma liberdade de
expressão e tratamento”. (Funcionário I)
“Nós temos um
relacionamento de amizade, de respeito mútuo.
Vivemos num
ambiente muito bom. Me sinto muito bem e gostaria de
continuar vivenciando isso”. (Funcionário C)
O trabalho em equipe exige dos profissionais não só habilidades técnicas, mas
também a capacidade de relacionamento entre os participantes. No caso da
Empresa X, a maior parte dos funcionários é do sexo masculino, mas conforme
relatado por uma das entrevistadas não há discriminação com relação a esta
questão.
84
Aqui a gente não tem problema de assédio sexual. As mulheres são
minoria, mas todo mundo respeita. A gente sabe que nas outras
empresas acontece muita coisa e que as pessoas acabam saindo por
conta disso”. (Funcionária D)
De acordo com um dos gestores, o fato de se contratarem mais pessoas do sexo
masculino é acidental já que não se faz esse tipo de exigência durante os
processos de seleção de pessoal. É possível, no entanto, que o a disponibilidade
de pessoas para esse tipo de atividade seja uma configuração do próprio
mercado.
Sobre a existência de conflitos no ambiente de trabalho, foi relatado que o
comportamento relacional das pessoas mudou ao longo dos anos. Conforme
percebeu-se, foi desenvolvido o hábito de evitar discussões e impulsos em
momentos de instabilidade emocional. Muito desse autocontrole foi atribuído à
presença da religiosidade na vida dos funcionários.
“Aqui a gente brinca, nós temos um ambiente maravilhoso, sem essa
interferência (dos conflitos). Eu acho que você respeitando o espaço
do
outro, a crença do outro, eu acho maravilhoso. Nesses anos todos
pode contar no dedo uma, duas, três ou outras
briguinhas. Eu acho
muito interessante e acho que isso (o ambiente desta empresa) até
ajudaria as outras pessoas a entenderem melhor essa questão”.
(Funcionário I)
“Eu amadureci muito aqui dentro, mesmo sendo evangélica eu antes
discutia muito, em outras funções, já tive que pedir muita
desculpa. E
também na minha vida particular”. (Funcionária D)
“Às vezes as pessoas aqui
ficam calmas no momento em que iam
explodir”. (Funcionário G)
85
“Quando tenho vontade de estourar com algum funcionário eu
procuro
não conversar com essa pessoa. Não posso perder a calma,
a tranqüilidade”. (Sócio A)
“A pessoa, como eu, que chega do Rio sente a diferença. Lá o povo é
mais liberal, falam palavrões. Aqui na empresa a coisa muda um
pouco, as pessoas se
comportam melhor. Você não deve falar certas
coisas, deve-se pensar um pouquinho mais”. (Funcionário I)
Conforme é possível notar na última fala há uma comparação entre as demais
empresas em que o entrevistado trabalhou e a Empresa X, constatando-se que
existem diferenças na postura dos funcionários. De fato as evidências sugerem
que nesta organização há um cuidado com aquilo que se fala já que os gestores
assumem claramente sua exigência de respeito e bom senso. Mais do que isso,
há preocupação com o exemplo dado pelas lideranças.
“Eu não posso fazer aquilo que eu falo para não fazer. Então eu
tenho que tentar
viver o máximo possível aquilo que eu falo, aquilo
que eu
creio”. (Sócio A)
Corroborando essa questão, os gestores afirmaram preocupar-se com o
cumprimento de leis trabalhistas e com a legalidade das operações da empresa,
conforme atesta o trecho abaixo da entrevista com um deles.
“[...] jamais eu quero ter algum benefício sobre algum funcionário,
deixar de pagar alguma coisa pra ele. O que o funcionário tem pra
receber eu gosto de
pagar 101%. E se existir alguma coisa que ele
tenha a receber que não foi pago por algum erro, ele vai receber.
Se
ele trabalhou uma hora a mais, ele vai ter que receber”. (Sócio A)
Mesmo diante de informações que apontavam para a adequação legal, no
primeiro contato informal da pesquisadora com a Empresa X, um dos gestores
afirmou ter contratado recentemente um trabalho de consultoria buscando
86
sugestões no sentido de tornar a empresa totalmente legalizada. Segundo o Sócio
A, o pagamento integral da carga tributária brasileira inviabilizaria a lucratividade,
mesmo sendo esta a vontade dos donos do negócio.
Num segundo contato este mesmo sócio, desta em entrevista gravada, foi
afirmado que os trabalhos de consultoria se destinavam a proposições de
soluções de integração de programas de informática que viabilizassem um melhor
fluxo de informações.
“Agora teremos uma parte de informática, de rede, pra interligar a
empresa. Estou tentando melhorar pro ambiente ficar melhor ainda,
proporcionar
melhores ferramentas pros funcionários pra eles
poderem crescer e se desenvolver dentro das habilidades de cada
um”. (Sócio A)
4.2.3 Categoria: Estilo de Gestão
Esta categoria relaciona-se à forma pela qual a liderança é exercida na
organização, ou seja, de que maneira pessoas e grupos são conduzidos à atingir
os objetivos traçados pela empresa.
Sabe-se que exercer a gestão de uma organização é um processo dinâmico e
dependente das habilidades do líder. Alguns traços ou características tais como
inteligência, fluência verbal, conhecimentos em diversas áreas e capacidade de
motivação podem ser facilitadores nesse processo.
Sobre a postura ou estilo de gestão adotado na Empresa X foram evidenciadas
algumas peculiaridades que parecem ter contribuído para o crescimento e
desenvolvimento da organização. Em primeiro lugar foi possível notar um intenso
empenho e comprometimento dos sócios pelo bom desempenho da empresa.
Também se observou que existe uma relação de confiança entre os sócios,
87
destacada pelo fato de serem irmãos, mas também pela sólida relação de
transparência estabelecida ao longo dos anos.
“Eu não sei o que são trinta dias de férias”. (Sócio B)
“Ele se
envolve muito pouco na minha (gestão) e eu quase nada na
dele. Nós temos uma
estratégia de trabalho que funciona como
sociedade da melhor qualidade. Antes de qualquer coisa nós nos
colocamos um de frente pro outro,
nunca tem o eu, a gente nunca se
coloca acima de nada. Estamos como
sócios há seis anos e nunca
tivemos um atrito.” (Sócio B)
“Qualquer organização, se for familiar, tem que ter o respeito, acima
de qualquer coisa, e a
união. Estamos sempre em comunhão um com
o outro”. (Sócio A)
“Aqui nós não trancamos porta pra conversar. Ele pode participar de
qualquer conversa, qualquer reunião. Nós
não temos qualquer tipo de
segredo em nada”. (Sócio B)
Apesar das demonstrações, em vários momentos das entrevistas, de que há uma
busca pela separação entre vida familiar e profissional, verificou-se na fala de um
dos gestores que há uma inevitável interposição entre estes aspectos.
“Quando eu pego um produto bom pra vender, eu fico uns dois, três
dias estudando o que aquele produto tem de bom,
quase não durmo”.
“Eu vivo esse
problema dentro de casa, e é uma coisa que eu estou
tentando me policiar. Eu levo aquilo que eu quero fazer, aquela
ansiedade, às vezes estou em frente à televisão, tem uma pessoa
falando comigo, mas eu não estou nem ouvindo nada. Não que eu
leve
problemas da empresa pra casa, mas eu vivo aquilo no meu
interior. É o meu jeito de conduzir as coisas”. (Sócio B)
88
Durante as entrevistas, foi destacado pelos sócios e pelo administrador da
Empresa X a preocupação em adequar-se a um mercado cada vez mais
competitivo em termos de capacitação pessoal. Foi relatado que os sócios
freqüentam seminários e cursos para manterem-se atualizados, e também
procuram trazer à empresa palestrantes para que os funcionários estejam sempre
em constante aperfeiçoamento profissional.
Também foi salientado durante as entrevistas o clima de integração entre os
sócios e seus subordinados e a preocupação com aspectos da vida pessoal dos
funcionários. Durante as refeições e nas conversas de corredor foi possível
perceber que em vários momentos de encontro entre os gestores e os
funcionários, estes foram questionados sobre problemas dentro e fora da
organização. Ao que parece, existe o hábito desse tipo de diálogo que extrapola
as atribuições profissionais.
“Nós somos muito focados em ouvir o funcionário. Temos o costume
de
saber o que está acontecendo”. (Sócio B)
Sobre a delegação de tarefas, os sócios afirmaram que buscam dar autonomia ao
funcionário. Além disso, a confiança nas pessoas que ocupam cargos
administrativos foi apontada como facilitador para o desempenho de outras
atividades de negócios por parte dos sócios tais como representação de produtos
fabricados por outras empresas e venda de planos especiais de telefonia digital.
“Nós conseguimos agregar valores dentro da empresa. Nos serviços
as pessoas
agregam o valor que ela tem. Nós damos um cargo e a
pessoa
administra aquilo como se fosse dele. Ele tem aquela tarefa e
nós não temos que nos preocupar com isso”. (Sócio B)
Ao que parece, o administrador da empresa possui autonomia para tomar
decisões sobre o gerenciamento de pessoal. Foi relatado à pesquisadora, em
conversa informal, que já houve um caso em que um funcionário precisou ser
89
demitido pelo administrador, recém contratado nesta época. Nos dias que se
sucederam à demissão surgiram conversas de corredor em que se criticava a
decisão. Para resolver o problema, ele convocou todos a comparecerem à sua
sala, de dois em dois, e disse que não haveria espaço para fofocas dentro da
organização e que caso alguém tivesse alguma reclamação a fazer que o fizesse
naquele momento. Segundo ele, muitos utilizaram-se de trechos bíblicos para
criticar sua postura e deixavam transparecer a insatisfação e a incompreensão de
tal atitude. Cabe destacar que o administrador não é da mesma religião da maior
parte dos empregados e, portanto, precisou, nas palavras dele, “conquistá-los aos
poucos”.
4.2.4 Categoria: Recrutamento e Seleção
Na categoria “Recrutamento e Seleção” foram observadas questões relativas ao
processo de contratação de pessoal e as influências da questão religiosa nesses
processos face às características exigidas pela Empresa X. Por meio das
entrevistas, especialmente com o administrador, buscou-se avaliar as habilidades
requeridas no perfil dos empregados procurados, identificando as aptidões
necessárias à convergência entre interesses individuais e da organização.
O processo de recrutamento e seleção de pessoas requer a capacidade do
entrevistador em identificar o candidato potencialmente mais apto a adaptar-se a
certo tipo e ambiente de trabalho. Para isso, usualmente é traçado um perfil de
características desejáveis a serem procuradas entre aqueles que buscam o
emprego. Na Empresa X, os dados apontaram para a exigência nos processos de
seleção, acima de outras questões, do comportamento ético.
“Nós levamos muito em conta o caráter da pessoa”. (Sócio B)
“Se tem uma coisa que a gente
procura evitar dentro da empresa são
os
agressivos, os que têm vícios. Tem pessoas que têm um
90
temperamento que é que nem você colocar uma laranja podre no
meio das boas”. (Sócio A)
“A conduta de vida da pessoa mostra muito quem ele era e quem ele
é”. (Sócio B)
A questão da busca por pessoas de mesma preferência religiosa dos proprietários
da empresa durante os processos de seleção foi levantada durante as entrevistas.
De acordo com os gestores, não há discriminação ou exigência de que os
contratados sejam da religião praticada por eles. No entanto, haveria a preferência
por evangélicos já que eles acreditam na menor possibilidade de problemas
decorrentes, por exemplo, de vícios e alcoolismo, com essas pessoas.
“Não procuramos
selecionar nem por religião, nem por sexo, nem por
nada”. (Sócio B)
Não é que eu contrate só pessoas evangélicas, mas é uma
qualidade a mais que conta ponto na hora que eu vou contratar
porque sabe que é uma pessoa que tem um
risco muito pequeno de
acontecer um
problema [...]”. (Sócio A)
“Com
evangélico a gente economiza muitos aborrecimentos na
realidade. Não quer dizer que todas as pessoas não vão dar
problemas, mas a gente economiza bastante problemas que
poderiam acontecer e que
nós já tivemos e que preferimos não ter
mais”. (Sócio A)
Conforme pode-se notar na última fala, foi relatada uma experiência de problemas
envolvendo funcionários. Durante as entrevistas foram citados casos de
empregados que foram desligados da organização devido à inadequação em
relação às expectativas e valores da empresa. Foi mencionado, por exemplo, o
caso de um funcionário com o problema do alcoolismo que foi demitido por chegar
sempre atrasado e causar repetidos conflitos no ambiente de trabalho. De acordo
91
com um dos sócios, este funcionário demitido ameaçou entrar na justiça, pois
achava-se prejudicado de exercer suas atividades profissionais naquela
organização por não ser da religião praticada pelos donos.
Apesar do discurso dos sócios da empresa apontar para a inexistência de regras
no sentido de exigir o perfil religioso dos candidatos, verificou-se que grande parte
dos empregados foram contratados por serem conhecidos nas instituições
religiosas freqüentadas pelos proprietários. Isso não foge às técnicas de
recrutamento e seleção, pois na atualidade aceita-se plenamente a indicação de
amigos, por exemplo, por se acreditar que uma pessoa referenciada por outra cujo
comportamento é conhecido pela empresa, pode resultar em economia de tempo
e redução da margem de erro na contratação. Neste caso, analogamente, o
ambiente religioso torna-se a referência.
“Geralmente a gente tem um princípio que é tentar unir referência,
competência, qualificação da pessoa com o fato de conhecer a
pessoa, porque se a gente conhece fica muito mais fácil”. (Sócio A)
“Fui contratada por causa da religião, fui conhecida na Igreja. Não
freqüento a mesma Igreja, mas é a mesma denominação”.
(Funcionária D)
“Eu acompanho a trajetória desde o início, pois
fui chamado por um
dos sócios e estou aqui até hoje”. (Funcionário I)
“De alguma forma me ajudou sim porque foi
na Igreja que um dos
sócios
me conheceu e me chamou pra trabalhar aqui”. (Funcionário
G)
As falas acima corroboram a afirmação de um dos sócios de que é dada
preferência, no momento da seleção, àquelas pessoas sobre as quais se tem
informações sobre a história de vida e o passado profissional. Também foi
relatado um caso em que um dos funcionários indicou a contratação de um amigo
92
que freqüentava sua instituição religiosa, já que este encontrava dificuldades para
a entrada no mercado de trabalho. Este empregado foi contratado como estagiário
e atualmente encontra-se efetivado como auxiliar administrativo.
Desse modo, foi possível notar que, na maior parte das contratações de
funcionários, foram seguidos critérios que demonstram a presença de elementos
intuitivos desenvolvidos pelos gestores ao longo dos anos de experiência de
trabalho, imbricados em sua religião. Isso demonstra que, no processo de seleção,
são avaliados aspectos que extrapolam a investigação de competências técnicas
e de habilidades no relacionamento interpessoal. O perfil buscado no
delineamento das características pessoais parece privilegiar aspectos da
personalidade do candidato tais como comportamento ético, controle emocional,
respeito ao próximo e capacidade de adaptação ao ambiente da empresa onde
existem pessoas religiosas.
Outro elemento apreendido nas entrevistas diz respeito à contratação de
familiares. De acordo com os sócios, foi acordado entre eles, desde a fundação da
empresa, que nenhum parente faria parte do quadro de funcionários da
organização. Isso porque entre eles há um consenso de que esta postura evitaria
conflitos e a interferência de problemas familiares no ambiente de trabalho. Foi
relatado que devido aos bons resultados financeiros é possível proporcionar às
famílias sustento e qualidade de vida sem que seja preciso inseri-los na empresa.
“Porque tem vários estudos que com a família dentro da empresa o
relacionamento familiar não fica bom. Setenta porcento dos casos há
atrito. Então nós não temos esse problema na nossa empresa”.
(Sócio B)
93
4.2.5 Categoria: Religiosidade no Ambiente de Trabalho
Na categoria Religiosidade no Ambiente de Trabalho foram observados aspectos
relacionados à presença da religião no cotidiano dos entrevistados na Empresa X.
Ou seja, buscou-se compreender de que forma a religiosidade e a espiritualidade
dos trabalhadores e sócios se manifestam no trabalho.
De acordo com os sócios, os preceitos éticos são fundamentais elementos
norteadores das práticas de gestão na Empresa X. Este fato foi relacionado à
presença da religião em suas vidas e à importância da conciliação dessas práticas
com os valores individuais.
“Toda decisão que a gente tem que tomar sempre eu oro antes. Eu
oro a Deus primeiro pra ele me dar direção, pra ele conduzir a
semana que vai acontecer. Quando existem
problemas a serem
resolvidos, eu
coloco diante D’Ele e confio mesmo”. (Sócio A)
“[...]
o maestro dessa empresa é o próprio Senhor, o próprio Deus,
porque ele que tem
dado a direção naquilo que a gente vai fazer,
naquilo que a gente vai
decidir, naquilo que a gente vai projetar,
naquilo que a gente vai fazer uma
estratégia, uma decisão”. (Sócio B)
A religião está presente não só nas atitudes e comportamentos dos funcionários e
gestores, mas também em elementos simbólicos notados no ambiente de
trabalho. A presença de adesivos com frases evangélicas afixados em várias
portas dos escritórios e de frases de proteção de tela com motivos religiosos foram
alguns dos elementos identificados nas dependências da Empresa X.
“Eu acho que esse fato de ter essas mensagens, passa um ambiente
gostoso, uma coisa gostosa. Porque às vezes a pessoa chega assim
meio cheio de arrogância, prepotência e aí vê uma palavra, vê
outra...poxa, só vê palavras boas. Então
a pessoa já vê que é um
94
ambiente diferente, não é daqueles que eu está acostumada, porque
às vezes a pessoa é estourada, agressiva. Então é
com o objetivo
assim de saber que Deus existe, que Ele é maior, e que Ele pensa no
bem-estar da gente”. (Funcionária H)
Durante as entrevistas foi possível notar que vários funcionários escutavam hinos
de louvor por meio de seus computadores. Alguns com fones de ouvido e outros
em baixo volume. De acordo com a Funcionária D, acontece com freqüência o fato
de um fornecedor ou cliente ligar para a empresa e perguntar sobre a religião
deles ao escutar os hinos. A partir dessas conversas, em alguns casos, é criada
uma relação de companheirismo a partir da identidade de valores religiosos.
“Aqui a gente canta, louva o senhor, ora. Os irmãos louvam, até
mesmo eu louvo. Tem
a palavra de Deus também que é uma
bênção”. (Funcionária D)
Também foi relatado que semanalmente acontece nas dependências da Empresa
X um culto religioso durante o horário de almoço. Durante o culto são feitas
orações e explanações sobre capítulos da Bíblia. Na maior parte das vezes esta
celebração é conduzida por um dos sócios, que está concluindo o curso de pastor
da Igreja Assembléia de Deus e por um funcionário que é pastor de uma outra
Igreja dessa mesma religião. Em outros casos são convidados celebrantes que
não pertencem à organização.
“Dentro da empresa nós temos um culto, que faz com que as pessoas
se aproximem mais um do outro”. (Sócio B)
“[...] tem um dia aqui que é segunda feira que a gente tem o culto. É
um período de uma hora, de onze a meio dia e aí todo
mundo...assim,
quem gosta e até quem não é evangélico também
participa. Quem tiver aqui na hora é convidado. Eu acho que isso
influencia no lado bom”. (Funcionária H)
95
“O dono da empresa ele
dá espaço mesmo pra que o Senhor esteja
aqui em nosso meio. Até porque vai depender da presença do
Senhor, de Deus, ele sente isso e
dá liberdade pra gente cultuar”.
(Funcionária D)
Conforme é possível notar nos relatos anteriormente transcritos, a maior parte dos
funcionários participa do culto realizado na Empresa X, pois se identifica com a
religião e as orações proferidas e, além disso, acredita que este momento de
oração seja de grande importância para a manutenção de um bom relacionamento
entre as pessoas. Uma das funcionárias entrevistadas relatou que a participação
nos cultos é bem vista pela maioria, mesmo sendo realizada em horário de
almoço, o que poderia ser visto como “perda do tempo livre”.
“Sobre o fato da empresa ter um culto, essa religiosidade na
empresa, eu acho que se toda empresa tiver um momento para o
funcionário, esse
momento assim de libertação, de falar com Deus,
eu acho
muito importante. Porque a gente precisa desse momento. O
funcionário
trabalha mais feliz, porque estão sentindo a presença do
Senhor, sente
motivação pra poder estar trabalhando. Tudo se torna
mais fácil. É tão gostoso aquele momento ali. Você vê, é no nosso
horário de almoço e não tem nenhuma dificuldade”. (Funcionária H)
É importante registrar que dois dos entrevistados (Funcionário C e Funcionário I)
não pertencem à religião evangélica e relataram que nem sempre estão presentes
nos cultos porque em algumas situações não existe identidade com as pregações.
“Meu corpo é meu templo. Eu já participei, eu gosto de participar e
participo
quando são eles. Quando é o Sócio A, quando é o pastor
que é o Funcionário E. Agora quando vem
pessoas de fora eu não
vejo...
não acho um bom negócio. Não vou mesmo, nem que me
pague. Eu acho que são umas coisas muito...E outra coisa, eu vou
quando eu tenho
vontade. Acho que eu estou aqui porque eu sou útil,
96
se ele não me quisesse aqui eu não estaria. Não existe pressão. As
poucas vezes que eu fui foi de
coração aberto”. (Funcionário I)
Por meio deste relato foi possível notar que não existe coerção no sentido de
exigir a presença de todos os funcionários nos cultos. Os funcionários que não são
evangélicos afirmaram que não são pressionados a participarem das celebrações
e que o não comparecimento não acarreta conseqüências em nível profissional.
Os sócios também afirmaram que há liberdade de escolha em relação à
participação nos cultos, conforme a fala abaixo.
“A pessoa não se sente obrigada a assumir a opção que os sócios
têm, porque não é assim. O culto é
aberto, quem quiser participar do
culto participa normal.
Até os próprios evangélicos eles têm livre
arbítrio. Se eles quiserem participar, participam”. (Sócio A)
Sobre a questão da diversidade religiosa no ambiente de trabalho, todos os
entrevistados afirmaram que o respeito à crença do outro é característica comum
na organização.
“Eu acho que outras religiões no mesmo ambiente de trabalho não
interfere em nada. Pelo contrário,
soma. Você vai aprendendo um
pouco de cada uma, você vai
sabendo como é o pensamento”. (
Funcionário I)
“Se você tem um companheiro de trabalho, respeitar. Se eu ouço um
hino,
boto baixinho porque o outro pode não gostar. Ou coloco o meu
fone de ouvido. Porque
cada um tem o seu lado”. (Funcionário F)
Foi notado em vários trechos das entrevistas que há uma norma implícita de que
não se pode misturar vida profissional e preferência religiosa. Por meio das
conversas e relatos não foi possível apreender se esta questão surgiu dentro da
organização ou se esta convicção vem de uma norma socialmente estabelecida e
97
que perpassou as relações entre diferentes ambientes. A interpenetração das
esferas religiosa e profissional é vista como sinônimo de conflito, de falta de
profissionalismo. Esse discurso contraria a presença claramente percebida de
características religiosas no cotidiano da organização.
“Eu acho que a religião
não se deve misturar com o ambiente de
trabalho. Porque
aqui não se mistura”. (Funcionário I)
“Pra pessoa botar a religião sempre
gera conflito. Então sempre é
legal não botar a religião no meio”. (Funcionário F)
“Eu penso assim a gente não pode misturar. Por exemplo, o “fulano”
não é da mesma religião que eu, mas eu
respeito ele. Dentro do
trabalho eu
não gosto de estar misturando as coisas”. (Funcionário G)
“A gente procura não misturar muito, porque também tem que
respeitar as regras”. (Funcionária H)
Conforme pode ser notado no último relato, foi citada a palavra “regras”. No
entanto o entrevistado não soube afirmar se existe algum tipo de regulamento
interno, declarado ou não, que estabeleça a questão.
Sobre a expressão religiosa no ambiente de trabalho, todos afirmaram que têm
liberdade, desde que não atrapalhe o exercício profissional e não incomode aos
demais funcionários.
“[...] a minha fé eu não deixo de expressar. Às vezes eu até ouço e
canto alguns hinos. E as pessoas perguntam porque eu sou tão
alegre. Às vezes chega alguém triste e eu
levo uma palavra e tal e a
pessoa fica alegre, então acho que
isso ajuda”. (Funcionário G)
98
“Eu sou muito reservado, em horários reservados, como almoço eu
leio a minha Bíblia. Já teve gente aqui de ficar pregando no meio do
ambiente de trabalho e atrapalhava”. (Funcionário E)
Conforme pode-se notar na última fala, foi relatado este caso em que surgiram
problemas decorrentes da incompreensão da liberdade religiosa deste ambiente
de trabalho. Nas palavras do Sócio A, a empresa já teve outros casos em que
alguns funcionários não souberam “usar do bom-senso” e deixaram que suas
opiniões e crenças religiosas causassem algum tipo de conflito no ambiente de
trabalho. No entanto, foi possível observar, em muitos casos, que a religiosidade
foi citada como um elemento importante na criação de um clima de entendimento
mútuo no trabalho.
“Às vezes as pessoas aqui ficam caladas no momento de explodir. As
pessoas até me perguntam como eu consigo ter um comportamento
tão calmo. Porque a Bíblia diz muito claro em Filipinos 1:29 “Por vós
foi concedido, por amor de Cristo, não somente o crer nEle, como
também o padecer por Ele”. Então
a gente padece, fica padecendo
de certa forma no dia a dia, no trabalho, então a gente acaba
aprendendo a padecer e a ser participante desse sofrimento. A gente
não foi crucificado como Jesus mas
de certa forma a gente é
humilhado, a gente agüenta muita coisa, sofrimento, suporta”.
(Funcionário E)
Conforme pode ser visto no relato anterior, em vários momentos das entrevistas
foram utilizados trechos da Bíblia nas respostas dadas. No caso do Funcionário E
as referências se revelaram mais freqüentes, talvez isso se explique por sua
trajetória como pastor na Assembléia de Deus. De acordo com a Funcionária H,
este é um costume evangélico de buscar divulgar em todos os momentos a
Palavra de Deus.
99
O funcionário E também relatou que passou por uma situação de conflito entre sua
crença religiosa e as exigências profissionais nesta organização. Como o
funcionário assume as funções de pastor em uma Igreja, precisa deixar o trabalho
no horário todos os dias da semana, já que os cultos desta religião são diários.
Quando solicitado a fazer hora-extra devido ao aumento sazonal nas vendas, o
Funcionário E se recusou a ficar depois do horário devido a seu compromisso
religioso e recebeu críticas dos gestores da organização.
Durante as entrevistas, foi possível notar que para um entrevistado, o Funcionário
I, a religião tem um papel sobretudo de socialização e as instituições religiosas
são uma forma de se encontrar as pessoas, estabelecer contatos. Com isso,
verificou-se que existem diferentes visões sobre o conceito de religião.
“Às vezes eu vou meio por um compromisso social. Como eu acho
que eles (os evangélicos) também vão por isso. [...] Meu corpo é meu
templo”. (Funcionário I)
Por fim, por meio de uma conversa informal na recepção da Empresa X, é
importante relatar que foi possível identificar que uma das funcionárias desta
organização vinha sofrendo um processo de assédio moral por motivos religiosos.
A pesquisadora deste estudo, por ter realizado alguns estudos sobre esse tema,
conseguiu apreender nas palavras de desabafo o sofrimento causado pelo
assédio.
Segundo relatado, há alguns meses a Funcionária D optou por freqüentar o
ambiente de trabalho usando calças compridas porque se sentia mais confortável
desta forma. No entanto, de acordo com o hábito das pessoas da religião
Assembléia de Deus as mulheres devem usar saias compridas e não devem
utilizar maquiagens, cabelos tingidos e acessórios. De acordo com a funcionária,
que se disse muito cuidadosa com sua aparência, ela decidiu que aquela
mudança de comportamento não iria interferir na sua fé.
100
No entanto, desde o dia em que passou a usar calças compridas, tingir o cabelo,
utilizar brincos e outros acessórios no ambiente de trabalho, ela passou a ouvir
comentários do tipo “você está desvirtuando”, “evangélico não deve utilizar essas
coisas mundanas”, “você largou a Igreja?”. Para esta funcionária, que revelou
estas informações demonstrando muita tristeza, este sofrimento tem provocado
questionamentos dos demais membros da organização sobre sua moral que a
desagradam, interferem em sua vida profissional e causam prejuízos psicológicos
devido à repetição diária.
Cabe destacar que o assédio moral é a exposição repetitiva e prolongada do(a)
trabalhador(a) a situações humilhantes ou constrangedoras no trabalho e que
podem causar a desestabilização emocional da vítima. No caso da Funcionária D,
o assédio partiu dos companheiros de trabalho de mesmo nível hierárquico.
A conduta abusiva do assédio moral pode se manifestar de maneira diversa, de
forma declarada ou não, tais como olhares, gestos, comportamentos, atitudes. A
sucessão destas condutas podem atentar contra a dignidade ou integridade
psíquica ou física do ser humano e ameaçar seu emprego. Algumas organizações
já implementaram códigos de ética em suas regras de gestão visando coibir o
assédio moral.
Talvez por tratar-se de uma empresa de pequeno porte, a Empresa X não possui
códigos ou regras que se destinem a proteger o funcionário diante de situações
como a descrita. Não foi possível identificar se os sócios da organização estão
cientes do assédio moral a esta funcionária tampouco se participam do processo
de assédio.
Segundo Pupim (2004), o assédio moral por motivos religiosos é uma das
possíveis configurações que a literatura sobre o fenômeno apresenta e pode ser
desencadeado, por exemplo, por divergências sobre vestimentas, feriados
101
religiosos, postura religiosa diferenciada no ambiente de trabalho, dentre tantas
outras motivações.
Assim, o ambiente de trabalho da Empresa X revelou importantes informações
passíveis de estudos mais aprofundados, conforme serão propostos no próximo
capítulo.
102
5 CONSIDERAÇÕES AO FINAL DA PESQUISA
5.1 REFLEXÕES FINAIS
Ao final deste estudo, mesmo com a riqueza de dados coletados e de informações
pesquisadas, seria pretensioso propor conclusões. Isso porque ainda não se pode
afirmar que existam construções teóricas consistentes que tratem da religiosidade
nas organizações tendo como referência o contexto brasileiro. As propostas e
modelos que sustentam esta pesquisa são, em sua maioria, estrangeiros.
Portanto, seria imprudente dissertar de forma conclusiva sobre um assunto que
ainda requer compreensão aprofundada na realidade brasileira.
Cabe destacar que em várias das publicações americanas utilizadas no referencial
teórico foi mostrado que o tema religiosidade/espiritualidade nas organizações já
se constitui em um campo de estudo legitimado e em crescimento no ambiente
acadêmico nos Estados Unidos e Europa. No Brasil, os pesquisadores começam a
dar ênfase nesta temática, grande parte com publicações que privilegiam
abordagens funcionalistas do assunto. Muitas dessas verdadeiras “receitas” sobre
como tornar o ambiente de trabalho mais espiritualizado e obter resultados
financeiros precisam ser analisados criticamente. Além disso, a tradução de obras
americanas não implica sua validade de aplicação indiscriminada ao contexto
brasileiro.
No que se refere ao recorte dos fenômenos ao qual se teve acesso por meio desta
pesquisa, é possível traçar algumas considerações. Primeiramente, é preciso
derrubar a afirmativa de que o ser humano deve deixar “de fora” do ambiente de
trabalho assuntos relativos à religiosidade, espiritualidade e religião. Não se trata
simplesmente de uma mudança no discurso e da inserção de um novo “modismo”
enquanto facilitador dessa discussão nas organizações visando ganhos de
produtividade. É necessário que se compreenda que as preferências relacionadas
à religiosidade do ser humano são elementos de sua subjetividade, e
103
conseqüentemente não são passíveis de serem desvencilhadas do conjunto de
valores, emoções, experiências e práticas sociais apreendidas ao longo da vida e
que se colocam no trabalho diário. Buscar entender o ambiente de trabalho em
toda sua complexidade no que se refere à forma pela qual esse aspecto da vida
do ser humano se coloca talvez seja o primeiro passo para esta discussão.
Sobre a empresa pesquisada, foi possível perceber que a religiosidade se faz
presente de maneira enfática no trabalho: na forma de se vestir, nos adesivos com
frases religiosas, nas proteções de tela com dizeres bíblicos, nos hinos escutados
durante o trabalho, nas orações coletivas realizadas semanalmente, no
comportamento consoante com as diretrizes da doutrina religiosa, dentre outros
tantos elementos descritos neste relatório. Apesar de muitos dos entrevistados
terem afirmado que buscam “não misturar o trabalho” com aspectos da vida
pessoal, incluindo preferências religiosas, pode-se afirmar que a religiosidade é
característica marcante nos relacionamentos habituais na Empresa X.
Sobre a presença da religião na vida das pessoas, destacam-se os relatos sobre a
conversão religiosa e as implicações decorrentes dessa experiência na vida dos
entrevistados. Na emoção das descrições desse momento de mudança, grande
muitos salientaram a importância do processo de conversão e a transformação de
comportamento e conduta de vida.
Notou-se que na Empresa X existe um clima de cordialidade e até mesmo
amizade entre as pessoas. Há preocupação com o respeito ao outro, com a
manutenção de um ambiente harmônico, que parece decorrente das “normas de
conduta” que a religião preconiza. Os conflitos existem, conforme relatado, mas
não interferem no clima de cooperação. A diversidade religiosa encontrada não foi
apontada como motivação para nenhum tipo de impasse. As evidências também
apontaram o tratamento igualitário por parte dos sócios da organização em
relação às minorias.
104
No que se refere à gestão das lideranças da Empresa X, percebeu-se que os
sócios da organização buscam adequar-se às exigências do mercado sem perder
suas características particulares de administração do negócio. Nos processos de
contratação, por exemplo, elementos intuitivos são utilizados ao lado de requisitos
formais estabelecidos. Aspectos da religiosidade dos candidatos consoantes com
a doutrina praticada pelos sócios parecem ser valorizados nas seleções.
A integração entre gestores e funcionários revelou a presença da confiança nas
relações. Confiança não só em aspectos relacionados ao trabalho, mas em
características comportamentais. Além disso, aspectos da vida pessoal dos
funcionários, tais como dificuldades enfrentadas, fazem parte das conversas entre
os sócios e seus subordinados. Nestes diálogos, que extrapolam as atividades
profissionais, muitos buscam a ajuda dos gestores.
Assim, de fato as informações coletadas na Empresa X evidenciaram que se trata
de uma organização que se destaca pela presença da religiosidade no ambiente
de trabalho. A análise dos dados encontrados revelou rotinas, comportamentos,
atitudes e influências das atividades diárias dessa organização. A compreensão
das relações desse ambiente singular proporcionou a articulação de reflexões que
poderão colaborar para a configuração de um modelo teórico mais abrangente
sobre o tema, considerando as particularidades da realidade brasileira.
5.2 SUGESTÕES
Na impossibilidade de abranger um tema tão amplo como se revelou a
espiritualidade nas organizações, ficam a seguir algumas propostas de estudo.
Conforme destacado anteriormente, faz-se necessário analisar criticamente as
atuais publicações brasileiras sobre o tema. Estudos exploratórios sobre esse
novo campo de estudos fazem-se necessários.
105
Análises que se destinem especificamente à compreensão das decorrências da
presença de diversas religiões num mesmo ambiente de trabalho também podem
ser importantes já que o cenário brasileiro é composto por grande variedade de
opções em termos de religião e de busca espiritual.
A questão do assédio moral no ambiente de trabalho por motivos religiosos
também pode ser foco de futuras pesquisas, contribuindo para a discussão da
questão da discriminação, da violência moral.
Enfim, os estudos e análises com diferentes enfoques no campo da religiosidade e
em variados tipos de organizações poderão constituir-se em importantes subsídios
para a configuração de um modelo teórico sobre o tema.
106
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111
APÊNDICE A
Roteiro das entrevistas
- Qual é a sua religião? Desde quando freqüenta esta religião? O que motivou sua
escolha por esta religião?
Traçar um quadro de referência sobre as religiões praticadas pelos entrevistados;
entender as motivações para a escolha religiosa; compreender como foram os
processos de conversão dos entrevistados, quando for relatado.
- O que representa em sua vida a presença da religião?
Entender o significado da prática religiosa para cada entrevistado.
- Você expressa sua religiosidade no ambiente de trabalho? De que forma? Há
liberdade para este tipo de expressão?
Compreender se há manifestações de religiosidade no ambiente de trabalho e de
que forma esta expressão se apresenta na rotina diária de trabalho; identificar as
manifestações simbólicas relacionadas à religião no ambiente de trabalho;
entender se há liberdade para a expressão da religiosidade ou se há algum tipo de
repressão ou obstáculos em relação a este tipo de comportamento.
- Você acredita que a religiosidade tenha influência no trabalho nessa
organização? Como?
Para saber de que forma a religiosidade permeia o trabalho individual, coletivo, os
relacionamentos e o ambiente de trabalho de modo geral.
- Como foi seu processo de seleção para entrada na empresa?(para os
funcionários) De que maneira a religiosidade do entrevistado influencia no
processo de recrutamento e seleção de pessoal? (para os gestores)
112
Compreender a influência da religião nos processos de recrutamento e seleção de
pessoal.
- Cite exemplos sobre a presença da religiosidade nas práticas de gestão.
Para estabelecer conexão entre valores religiosos e práticas de gestão; caso o
entrevistado não se recorde de nenhum fato serão oferecidas alguns parâmetros
tais como recrutamento e seleção, remuneração, benefícios e incentivos,
treinamento, relacionamento interpessoal, qualidade de vida no trabalho, dentre
outros.
- De que maneira se lida com a diversidade religiosa dentro da empresa? As
crenças e valores pessoais são questões discutidas abertamente?
Compreender se existe resistência em relação às minorias religiosas (já que em
pesquisa exploratória inicial notou-se que existe um pequeno grupo que não
pertence à religião da maioria) e a forma como se lida com a diversidade de
crenças no ambiente de trabalho; entender como a questão da religião se coloca
nos diálogos dentro da organização.
113
APÊNDICE B
Histórias de vida dos entrevistados
Diário de campo das entrevistas realizadas em 07/11/06.
Sócio A
Desde a fundação
Religião: Assembléia de Deus
Afirmou que não freqüentava instituições religiosas há cerca de nove anos,
mesmo tendo formação em família católica. Tornou-se evangélico e passou a
freqüentar a Igreja Assembléia de Deus, onde conheceu sua esposa e se casou.
Atualmente está se preparando para tornar-se pastor. Lidera alguns dos cultos
praticados na empresa, levando a palavra do Senhor aos seus funcionários.
Acredita que esse ambiente religioso seja fundamental para o sucesso da
empresa.
Sócio B
Desde a fundação
Religião: Assembléia de Deus
Era católico e há oito anos se converteu e é crente. Sua vida até oito anos atrás
era uma, de oito anos pra cá foi outra. Só após a conversão conseguiu aprumar
em todos os sentidos de sua vida: financeiro, como pai, como patrão, tudo. Deus
simplesmente tirou um cara ignorante, sem paciência, o jogou pra baixo e ele
nasceu de novo, virou uma outra pessoa. Não tinha visão ampla daquilo que ia
falar, às vezes falava por impulso e hoje pensa no que vai fazer. Já mudou de
ramo de trabalho várias vezes, mas depois que conheceu Jesus só conseguiu
ficar em um. Antes começava uma coisa e partia pra outra, não dava certo,
problemas em casa, problemas no trabalho, e nada dava certo. Afirmou que tem
os problemas de toda sociedade, mas que se espelha em Jesus. Jesus levou a
palavra e conseguiu que o mundo conhecesse o mundo, o que era bom e o que
era ruim. Ele conseguiu fazer um marketing.
Afirmou que o nome da empresa foi sugerido por um amigo evangélico, um nome
que seria o marketing da empresa. Disse que ele e o outro sócio só conseguiram
sucesso depois que colocaram Deus acima de todas as coisas, colocaram Ele na
frente, pois tudo depende da vontade de Deus. Antes eram vários irmãos,
posteriormente a empresa foi dividida e terminaram essa outra sociedade e
começaram quase do zero.
114
Funcionário C
Função: Administrador da empresa
Religião: Católico não-praticante
Foi criado no catolicismo, mas não freqüenta a Igreja. Se considera uma pessoa
religiosa mesmo não indo regularmente a uma instituição religiosa. Acredita que é
mais importante praticar o bem no dia-a-dia, procurar entender as pessoas e
pensar no próximo. Procura ajudar às pessoas quando pode, tratar qualquer
funcionário bem, seja ele o sócio da empresa ou o estagiário.
Funcionária D
Função: Crédito e Cobrança (contas a receber)
Está na empresa desde 2000 (desde a fundação)
Religião: Assembléia de Deus.
Relatou que desde pequena é evangélica, mas não tinha tanta responsabilidade.
À medida que foi crescendo, na adolescência, se distanciou, mas retornou junto a
seu marido e filha. Em sua família quase todos são evangélicos, alguns de outras
denominações, como quadrangular. Afirmou que não é pelo fato de freqüentar
uma Igreja todo dia que significa que uma pessoa seja cristão de fato. Disse que
amadureceu muito dentro da empresa, pois mesmo sendo evangélica quando
ocupava outras funções discutia muito. Afirmou que já teve que pedir muita
desculpa no trabalho e em sua vida particular.
Funcionário E
Função: Faturamento
Na empresa desde 2000
Religião: Assembléia de Deus
Entrou aos 23 anos de idade na Igreja Assembléia de Deus. Em suas palavras,
aceitou. A mudança em sua vida foi considerada completamente admirável. Quem
o conhecia antigamente e o conhece hoje notam que é completamente diferente.
Disse que mudou seu comportamento, caráter, e passou a enxergar com outros
olhos. Para ele, o bom testemunho muitas vezes vale mais do que mil palavras.
Se a pessoa tiver um bom testemunho, todo mundo poderá ver Deus na sua vida.
E isso seria fundamental, importante. As pessoas observariam que essa pessoa é
diferente.
Funcionário F
Auxiliar Administrativo
Na empresa desde 05/05
Religião: Assembléia de Deus
Era evangélico desde criança. Na adolescência deixou de frequentar e há alguns
anos retornou por causa de sua mãe. Atualmente seu irmão também se converteu.
Disse que a religião faz muita diferença em sua vida, pois mesmo quando
115
pequeno, tinha várias tentações em sua vida, como por exemplo, as drogas. E
depois que Deus fez parte de sua vida, tenta sempre deixar Ele em sua frente,
guiando seu caminho.
Funcionário G
Auxiliar Administrativo
Na empresa desde 2003, antes na parte operacional (fábrica)
Religião: Assembléia de Deus
Era da Igreja Assembléia de Deus até uns sete anos de idade, por influência
familiar. Parou de freqüentar, passou a fumar, usar drogas. Sua mãe o mandou
pra morar com seu pai, que são separados. Sentiu falta de sua mãe, resolveu
voltar pra casa depois de um tempo, por volta dos treze anos. Começou a jogar
futebol e tinha o sonho de virar jogador. Foi buscar na Igreja ajuda pra conseguir
atingir essa meta. Entrou para a Assembléia de Deus e decidiu que era ali que
queria ficar. Disse que da noite pro dia Deus entrou em sua vida e o fez largar o
futebol. Decidiu largar seu sonho pra servir ao Senhor. Atualmente faz parte da
banda da Igreja junto com seu colega de trabalho, o Funcionário F. Pretende sair
do emprego em Fevereiro para ser missionário, mudar pra Minas Gerais e estudar
numa escola de formação de missionários durante quatro anos para ir pregar a
palavra de Deus para pessoas que sequer conhecem Seu significado. Pretende ir
a diversos lugares, povoados espalhados pelo mundo, na África e em outros
países. Disse que sairá da instituição em Minas Gerais formado com o título de
bacharel em Missiologia, que seria uma faculdade. Segundo ele, quando voltar
poderá trabalhar dando palestras, o que gosta de fazer. Afirmou que quando vê
alguém sofrendo, sofre junto. Disse que já está acostumado a largar tudo.
Funcionária H
Recepcionista e Telefonista
Na empresa desde 1999
Religião: Assembléia de Deus
Era da Igreja Maranata. Depois foi pra Batista. Mas precisava ainda de um
avivamento. Aí foi pra Assembléia de Deus. Conheceu a Assembléia de Deus por
meio do trabalho na empresa, apresentada por um dos sócios. Quando foi
trabalhar na organização era Batista e não tinha o costume do avivamento, das
orações na empresa. Começou a ir aos cultos, participar e aquilo foi entrando em
seu coração. Um dia o Sócio A, que não era de ir à empresa às quartas-feiras, foi
porque tinha uma mensagem do Senhor para ela. O Sócio teria saído da Igreja e
ido diretamente para onde ela estava, ficando até meio sem jeito ao chegar.
Afirmou que ela sabia que ele queria dizer algo. Ele falou que o Senhor tinha
mandado dizer que era pra ela buscar uma Igreja de fogo, uma Igreja avivada, que
ela precisava disso e que o Senhor tinha mandado. E que se ela cresse, que
tomasse posse. E ela recebeu. Chegou em casa, comentou com me esposo que
tinha recebido uma mensagem de Deus. O casal se considerava batistas muito
tradicionais. Ela tinha um irmão que também era da mesma Igreja Assembléia de
Deus e lhe convidou pra um evento em que viria uma pessoa de fora, do Ceará,
116
pra pregar. Na hora se lembrou da mensagem de seu chefe e resolveu ir com o
marido. Chegou lá, e naquele domingo, ela afirma que o Senhor usou a boca do
pastor pra falar com ela e o esposo. Chegando lá ela diz ter murmurado, falado:
nossa o que eu estou fazendo aqui, um monte de gente feia, fedendo a mofo, o
que estou fazendo aqui. Foi chegando num cantinho, o pregador no meio da
pregação falou: ei, Deus mandou você fechar a sua boca e parar de murmurar. E
ela diz ter se calado na hora. Pensou: podia ter ido dormir sem essa. Depois foi
com seu esposo, porque ele tinha perdido o emprego, tinha sido mandado
embora. E Deus usou o pastor pra falar com seu esposo dizendo: porta que eu
abro ninguém mais fecha. Segundo ela, ninguém sabia que tinha acontecido isso
com seu marido, ninguém os conhecia. E o pastor falou assim: conta de hoje até
sexta feira que ele vai retornar à empresa e será honrado. E teria acontecido do
jeito que o pastor falou. Aí eles passaram a freqüentar. Se tornaram membros. Ela
se batizou, porque antes não tinha aquela certeza dentro de si que queria. E foi
uma bênção, uma maravilha, um avivamento em sua vida e uma experiência muito
boa.
Funcionário I
Supervisor de Vendas
Na empresa desde a fundação em 2000
Religião: Católico não praticante
É católico por formação familiar. Afirmou que vai à Igreja quando necessário. Para
ele, a Igreja é uma espécie de ponto de encontro. E é possível conversar com Ele
interiormente, pedir, ouvir, por meio do coração. Não se vê na obrigação de
freqüentar uma instituição religiosa de maneira nenhuma. Às vezes vai por
compromisso social. Acredita que as pessoas que trabalham com ele e que
freqüentam a Assembléia de Deus vão à Igreja pelo mesmo motivo. Afirmou ser
crente em Deus e procurar ajudar ao próximo, o que seria uma obrigação do ser
humano. Aqueles que não o fazem poderiam ser chamados de maus.
117
ANEXO A
Sobre a religião Assembléia de Deus
A Igreja Assembléia de Deus surgiu em Belém do Pará e atualmente está
presente na maior parte das cidades brasileiras, em especial nos grandes centros
urbanos. Possui em torno de 3,5 milhões de membros, podendo ser considerada
uma das maiores igrejas evangélicas do Brasil. A fundação em 1918 é atribuída a
dois suecos, Daniel Berg e Gunnar Vingren, que chegaram ao Brasil em 19 de
Novembro de 1910, vindos dos EUA onde surgiram os primeiros indícios dessa
doutrina. A Assembléia de Deus é uma igreja evangélica pentecostal (acreditam
na presença do Espírito Santo na vida do crente por meio de sinais ou dons do
Espírito Santo, tais como falar em línguas estranhas, curas, milagres, visões, etc.)
que prima pela ortodoxia doutrinária (Jesus Cristo como chefe único da Igreja,
sem comparsas ou legatários), tendo a Bíblia como sua regra de fé e prática.
Realça: a salvação pela fé no sacrifício vicário de Cristo; a atualidade do batismo
no Espírito Santo e dos dons espirituais; e a bendita esperança na segunda vinda
do Senhor Jesus. Acredita na obrigação de proclamar o Evangelho de Cristo e
promover espiritual, moral e socialmente o povo. Com isso, protesta contra as
iniqüidades sociais, tendo considerável poder político.
Fonte: O QUE É ASSEMBLÉIA DE DEUS
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