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possível resposta a partir de um novo prisma
532
. Nesse sentido, BARATTA
533
defende a
construção de uma teoria materialista (econômico-política) da desviação, quando afirma:
Construir uma teoria materialista (econômico-política) do desvio, dos
comportamentos socialmente negativos e da criminalização, e elaborar as linhas de
uma política criminal alternativa, de uma política das classes subalternas no setor do
desvio: estas são as principais tarefas que incumbem aos representantes da
criminologia crítica, que partem de um enfoque materialista e estão convencidos de
que só uma análise radical dos mecanismos e das funções reais do sistema penal, na
sociedade, tardo-capitalista, pode permitir uma estratégia autônoma e alternativa no
setor do controle social do desvio, ou seja, uma “política criminal” das classes
atualmente subordinadas.
Com efeito, os minimalistas radicais insurgem-se contra a utilização do paradigma
etiológico
534
no estudo da Criminologia, o que acaba por corroborar o sistema posto,
concedendo ares de perpetuidade ao Sistema Penal. Na medida em que não só o Direito Penal,
mas o Sistema Penal como um todo, deve ser pensado como relativo e provisório, uma
Política Criminal que busca suas bases em uma Criminologia orientada por tal paradigma
dificilmente poderia superar o obstáculo de se pensar em uma profunda reforma social e,
conseqüentemente, uma reforma penal.
532
A proposta é de uma “mudança de paradigma”, conforme defende Baratta, ao obtemperar que “sobre a base
do paradigma etiológico a criminologia se converteu em sinônimo de ciência das causas da criminalidade.
Este paradigma com o qual nasceu a criminologia positivista perto do final do século passado, constitui a base
de toda a criminologia ‘tradicional’, mesmo de suas correntes mais modernas...” In: BARATTA, A., ibid, p.
209. O paradigma que deve informar a Criminologia, que acabará orientando, conseqüentemente, a Política
Criminal, não pode ter o seu objeto restringido ao simples estudo do delito e do delinqüente, mas, para além
disso, deve ocupar-se, também, da reação e do controle social aos mesmos. Em outras palavras, a
Criminologia não pode restringir-se à racionalidade ou a justiça da ordem legal e das instituições que
integram o sistema penal, objeto típico de uma Criminologia positivista informada por um paradigma
sintomatológico ou etiológico-explicativo, que supõe uma noção ontológica de criminalidade, entendida,
assim, como uma realidade pré-constituída às definições e, portanto, também à reação social, institucional ou
não institucional, que põe em marcha essas definições. Desta forma, não pode cingir-se, a Criminologia
crítica, ao estudo da realidade oficial, tomando por dada a ideologia dominante, que acaba por dar sustentação
e legitimação à ordem estabelecida. Para além disso, o que propõe os defensores de uma Criminologia Crítica
é que, mais do que o estudo das causas dadas pelo sistema, para o surgimento do delito e do delinqüente,
questione-se e investigue-se até onde o próprio sistema não fomenta, ele mesmo, tais fenômenos, ou seja, até
onde o próprio sistema pode ser adjetivado de criminógeno, ou seja, que sejam incluídos como objeto de
estudo da Criminologia a reflexão sobre as normas jurídicos ou sociais, a ação das instâncias oficiais, a reação
social respectiva, bem como, os mecanismos institucionais e sociais através dos quais se realiza a definição de
certos comportamentos qualificados de criminosos. A respeito vide também BATISTA, N. Introdução
crítica ao direito penal brasileiro. 8ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002; QUEIROZ, P. S. Direito penal:
introdução crítica. São Paulo: Saraiva, 2001.
533
ibid., p. 197.
534
“A criminologia tradicional etiológica, mesmo em suas versões mais atualizadas (através da aproximação
‘multifatorial’) tem, por natureza, uma função imediata e diretamente auxiliar em relação ao sistema penal
existente e à política criminal oficial. Seu universo de referência e seu horizonte de ação lhe são impostos,
sempre, pelo sistema penal existente. É por isso que está obrigada a tomar emprestado do sistema penal a
definição de seu próprio objeto de investigação: a ‘criminalidade’ enquanto definida pelas normas e as
estatísticas, os ‘criminosos’ como indivíduos selecionados e estigmatizados (e, assim, disponíveis para a
observação clínica) através da instituição da prisão.” In: BARATTA, A., ibid., p. 215.