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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA (Mestrado)
WILLIAM ANTONIO BORGES
A PERIFERIA DECORRENTE DA MOBILIDADE CENTRADA NO
TRABALHO: A QUESTÃO NO AGLOMERADO URBANO DE
MARINGÁ
MARINGÁ - PR
2004
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II
WILLIAM ANTONIO BORGES
A PERIFERIA DECORRENTE DA MOBILIDADE CENTRADA NO
TRABALHO: A QUESTÃO NO AGLOMERADO URBANO DE
MARINGÁ
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Geografia (Mestrado), área de
concentração: Análise Regional e Ambiental, do
Departamento de Geografia do Centro de
Ciências Humanas, Letras e Artes da
Universidade Estadual de Maringá, como
requisito para a obtenção do título de Mestre em
Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Márcio Mendes Rocha
MARINGÁ - PR
2004
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III
DEDICATÓRIA
Dedico à minha família – aos meus pais e irmãos, pelo amor que enobrece nossas
vidas. Mas também a cada um dos trabalhadores entrevistados, a cada depoimento e desabafo.
IV
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a força vital, a energia que comanda a vida.
Agradeço aos meus pais, irmãos, madrinha e afilhada – Antonio Borges, Marina Lúcia, Tânia,
Vagner e Micheline, Inha (Márcia) e Fernanda, por terem me incentivado. Esse apoio foi
fundamental e reforçou a minha escolha pela vida acadêmica.
Ao Professor Dr. Márcio Mendes Rocha, por ter me orientado na elaboração da dissertação,
ensinado sobre o rigor científico e posicionamento crítico. Mas principalmente pelos
momentos agradáveis de reflexões e reuniões muito produtivas.
À Professora Dr. Eliza Emília Rezende Bernardo Rocha, pelo apoio despendido para que eu
fizesse o mestrado na Geografia.
Agradeço a Professora Dr. Cláudia Souza Passador (eterna orientadora na Administração), por
sempre me incentivar e acreditar no meu potencial.
À Professora. Dr. Celene Tonella, pela oportunidade e prazer de ter sido seu orientando no
projeto de iniciação científica, o qual representa o meu início na atividade acadêmica como
pesquisador e, pela sua contribuição como membro da banca de qualificação. Suas sugestões
foram muito pertinentes para este trabalho.
Ao Prof. César Miranda Mendes, pelas sugestões na banca de qualificação e pela amizade.
Não poderia deixar de agradecer a minha amiga Gislaine E. Beloto, pelas divertidas conversas
e pelas densas reflexões regadas de café, as quais contribuíram muito para a minha
dissertação.
À Márcia Regina Ferreira, colega de profissão, amiga e verdadeira; por isso contribuiu muito
para que eu superasse o momento de maior conflito nestes dois anos. É a minha referência na
Administração.
A todos os meus professores do mestrado de Geografia e Economia, pela oportunidade, e
àqueles que fazem parte do programa de pós-graduação em Geografia, pelo acolhimento e
coleguismo. Em especial ao José Roberto e a Tatiane.
À Nalú, pelas longas conversas e momentos agradáveis. À Simone, pela ajuda no início da
pesquisa de campo. À Ana Lúcia, pela gentileza de me conceder dois importantes mapas
produzidos pela Ambiens/Prefeitura Municipal de Maringá.
Agradeço as Prefeituras dos três municípios pesquisados (Maringá, Sarandi e Paiçandu) pelo
apoio e interesse despendido. Assim como às Agências do Trabalhador de Sarandi e de
Paiçandu, pelo espaço concedido para a realização das entrevistas com os trabalhadores
desempregados.
Agradeço os trabalhadores entrevistados, pela disponibilidade e contribuição para com a
pesquisa, assim como às empresas que abriram suas portas para a realização deste trabalho.
E serei sempre grato às pessoas que fazem prevalecer seus ideais e que acreditam na periferia
como um estado efêmero. Mas que lutam ....
V
Ontem o menino que brincava me falou
que hoje é a semente do amanhã
para não ter medo que este tempo vai passar
não se desespere, nem pare de sonhar
nunca se entregue, nasça sempre com as
manhãs
deixe a luz do sol brilhar no céu do seu olhar
fé na vida, fé no homem, fé no que virá
nós podemos tudo
nós podemos mais
vamos lá fazer o que será
(GONZAGUINHA, 1984).
VI
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................................1
METODOLOGIA.......................................................................................................................5
1. CIDADE E REGIÃO: DO PÓLO À PERIFERIA ...............................................................13
1.1. O pólo e o centro ...........................................................................................................21
1.2. A região como espaço polarizado e desigual.................................................................29
1.3. Da conurbação ao aglomerado urbano ..........................................................................31
1.4. Os agentes produtores do espaço urbano e o desenvolvimento desigual ......................35
1.5. A periferia que está à margem e/ou na margem do espaço urbano...............................41
1.6. Relação pólo-periferia ...................................................................................................50
1.7. Cidades-satélites, periféricas ou dormitórios.................................................................51
2. MOBILIDADE CENTRADA NO TRABALHO.................................................................56
2.1. Economia política marxista ...........................................................................................57
2.2. Mobilidade centrada no trabalho e sua gênese ..............................................................63
3. A MOBILIDADE DO TRABALHO E O PROCESSO DE PERIFERIZAÇÃO NO
BRASIL....................................................................................................................................75
3.1. A modernização conservadora e a produção do espaço brasileiro................................82
3.1.1. Neoclássicos e marxistas: seus ideários pela modernização ..................................82
3.1.2. Conseqüências do modelo desenvolvimentista conservador..................................87
4. O AGLOMERADO URBANO DE MARINGÁ: A PERIFERIA DECORRENTE DA
MOBILIDADE CENTRADA NO TRABALHO ..................................................................105
4.1. O Norte do Paraná e sua colonização: uma breve elucidação histórica ......................106
4.2. A modernização conservadora no Paraná: uma ênfase no Norte Central........................109
4.3. A rede de cidades no Norte Central Paranaense: o eixo Londrina – Maringá.................113
4.4. Unidade/diversidade expressa no aglomerado urbano de Maringá.................................117
4.2. Retrato da realidade via depoimentos: a periferia decorrente da mobilidade do trabalho no
aglomerado urbano de Maringá..............................................................................................148
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................208
VII
LISTA DE ANEXOS
Anexo nº 01. Modelo do questionário....................................................................................221
LISTA DE QUADROS
QUADRO nº 1 Estabelecimentos e empregados por atividade econômica em Maringá,
Paiçandu e Sarandi - 2001 ......................................................................................................133
QUADRO nº 2 - Composição das Empresas e Número de Funcionários em Maringá - 2002
................................................................................................................................................134
QUADRO nº 3. Consumo de energia nos municípios de Maringá, Paiçandu e Sarandi – 1995
a 1999 e 2001..........................................................................................................................138
LISTA DE TABELAS
TABELA nº 1. Entrevistas: setores e empresas de Maringá – 2002 / 2003.............................11
TABELA nº 3. Taxas de crescimento anual do número de imóveis rurais segundo o tamanho
(% a.a.)......................................................................................................................................89
TABELA nº 4. A localização das maiores empresas por faturamento no Brasil: industriais e
prestadoras de serviços, 1994, 1998 e 2002 .............................................................................97
TABELA nº 5. Participação (%) dos pobres por estratos 1970, 1981, 1990 e 1999................98
TABELA nº 6. População, tamanho médio e taxa de crescimento dos diferentes portes e
categorias de cidades – 1991 e 2000 ........................................................................................99
TABELA nº 7. Regiões Metropolitanas da região sul do Brasil, polarizadas por cidades de
porte médio: rendimento médio de todos os trabalhos – 2000...............................................102
TABELA nº 8. Regiões Metropolitanas da região sul do Brasil, polarizadas por cidades de
porte médio: PEA, Pessoas Ocupadas, Desempregados, Taxa de Desemprego e Massa de
Rendimentos, 2000.................................................................................................................103
TABELA nº 9. Utilização das terras com lavouras temporárias na Microrregião de Maringá –
282, em 1970, 1975 e 1980 ....................................................................................................110
TABELA nº 10. Indicadores da modernização agrícola, no Estado do Paraná, em 1970, 1980 e
1985 ........................................................................................................................................111
TABELA nº 11. Mobilidade e crescimento populacional no Paraná: período de 1940 à 2000
................................................................................................................................................113
TABELA nº 12. Aglomerados urbanos: número de domicílios, renda inferior a 1 salário
mínimo e percentual da renda inferior a 1 s/m por total de domicílios - 2000.......................117
TABELA nº 13. População, densidade demográfica (2000) e taxa de crescimento
populacional (1980/1991/2000)..............................................................................................119
TABELA nº 14. Participação no valor adicionado.................................................................120
TABELA nº 15. Índices de exclusão social dos municípios do Aglomerado Urbano de
Maringá...................................................................................................................................120
TABELA nº 16. Crescimento populacional dos municípios que formam o aglomerado urbano
de Maringá – 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e 2000..............................................................122
VIII
TABELA nº 17. Representatividade da população de cada município frente ao total do
Aglomerado Urbano de Maringá – 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e 2000............................122
TABELA nº 18. Taxa de crescimento populacional de cada município do Aglomerado Urbano
de Maringá, por década: 1950/1960, 1960/1970, 1970/1980, 1980/1991, 1991/2000...........123
TABELA nº 19. Número de máquinas e equipamentos nas propriedades rurais nos municípios
de Maringá, Paiçandu e Sarandi – 1970, 1980 e 1996 ...........................................................127
TABELA nº 20. Crescimento do número de estabelecimentos industriais no município de
Maringá (1970 e 1985), AMUSEP (1996) e RMM (2001) ....................................................128
TABELA nº 21. Estabelecimentos e empregados por atividade econômica em Maringá,
Paiçandu e Sarandi - 2001 ......................................................................................................131
TABELA nº 22. Cidade de residência dos funcionários - 2002.............................................136
TABELA nº 23. Aglomerado Urbano de Maringá: População com idade ativa, população
economicamente ativa, ocupados, empregos formais, empregados em Maringá, outra situação
- 2002......................................................................................................................................137
TABELA nº 24 - Produto Interno Bruto – per capita dos municípios - 1996 .......................141
TABELA nº 25. Nível Educacional da População Adulta (25 anos ou mais) - 1991 e 2000.142
TABELA nº 26. Indicadores de Renda, Pobreza e Desigualdade - 1991 e 2000...................143
TABELA nº 27. Porcentagem da Renda Apropriada por Extratos da População - 1991 e 2000
................................................................................................................................................144
TABELA nº 28. Acesso a Bens de Consumo, 1991 e 2000...................................................144
TABELA nº 29. Aglomerado Urbano de Maringá: Índice de carência familiar - 1991 e 2000
................................................................................................................................................145
TABELA nº 30. Desenvolvimento Humano – 1991 e 2000 ..................................................146
TABELA nº 31. Favelas - 1991..............................................................................................146
LISTA DE FOTOS
FOTO nº 1 Vista Aérea do centro de Maringá - 2003..............................................................22
FOTO nº 2. Shopping Dom Pedro – Campinas/SP – 2003 ......................................................24
FOTO nº 3. Periferia social: a margem está no centro. São Paulo – 2000...............................46
FOTO nº 5. Aglomerado Urbano de Maringá - 2004.............................................................207
LISTA DE GRÁFICOS
GRÁFICO nº 1. Crescimento da população das Regiões Metropolitanas polarizadas por
metrópoles – 1991 - 2000.......................................................................................................100
GRÁFICO nº 2. Crescimento da população das Regiões Metropolitanas polarizadas por
centros regionais ou sub-regionais – 1991 - 2000 ..................................................................101
GRÁFICO nº 3. Número de pessoas pobres, por categoria de pólo, das Regiões
Metropolitanas do Brasil - 2000.............................................................................................101
GRÁFICO nº 4. Origem da força de trabalho que se emprega em Maringá - 2002...............135
IX
LISTA DE MAPAS
MAPA nº 1. Hierarquia urbana do Brasil - 1999 .....................................................................27
Mapa nº 2 – Aglomerado urbano............................................................................................118
MAPA nº 3. Crescimento geométrico da população total – Paraná – 1991/2000..................125
MAPA nº 4. Crescimento geométrico da população total – Aglomerado Urbano de Maringá -
1991/2000...............................................................................................................................125
MAPA n º 5. Maringá e sua centralidade – malha urbana e parques industriais - 2003 ........129
MAPA nº 6 – Predominância de renda dos responsáveis por domicílio em Maringá, Paiçandu
e Sarandi - 2003......................................................................................................................143
MAPA nº 7. Estado do Paraná, mesorregiões geográficas, estimativa de domicílios em favelas
- 1997......................................................................................................................................147
MAPA nº 8. Aglomerado Urbano de Maringá, estimativa de domicílios em favelas - 1997 147
X
LISTA DE SIGLAS
BNH – Banco Nacional de Habitação
CEEBJA – Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos
CES – Centro de Ensino Supletivo
CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas
COHAB – Companhia de Habitação
CTNP – Companhia de Terras Norte do Paraná
FEBRABAN – Federação Brasileira de Bancos
FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço
FPM – Fundo de Participação do Município
ICH – Índice de Carência Habitacional
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IES – Índice de Exclusão Social
IPARDES – Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano
ISO – Internacional Organization for Standardization (Organização Internacional para
Normatização)
METRONOR – Metrópole Linear do Norte
NESUR – Núcleo Interno de Economia Social Urbano e Regional
ONU – Organização das Nações Unidas
PIB – Produto Interno Bruto
PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
PROGER – Programa de Geração de Emprego e Renda
RAIS – Relação Anual de Informatizações Sociais
RM – Região Metropolitana
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SIG – Sistema de Informação Gerencial
TCA – Taxa de Crescimento Anual
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
XI
RESUMO
A presente dissertação tem como objetivo compreender o processo de periferização no
aglomerado urbano de Maringá, por meio da mobilidade centrada no trabalho. Com efeito,
parte-se da elucidação de conceitos que integram a geografia urbana, relacionados a dinâmica
pólo-periferia no âmbito regional. Em seguida é apresentado uma abordagem referente a
mobilidade centrada no trabalho, dando sustentabilidade conceitual a pesquisa. Buscou-se
perceber inicialmente o processo de periferização no Brasil, partindo-se de um resgate
histórico frente as conseqüências da modernização conservadora e do sistema neoliberal em
vigência, retratando no seu desfecho a territorialização da desigualdade em Regiões
Metropolitanas do sul do Brasil, polarizadas por cidades médias. A análise empírica resultou
de uma abordagem qualitativa, auferida por entrevistas semi-diretivas, realizadas em
empresas situadas em Maringá e com trabalhadores (empregados nestas empresas e
desempregados) das cidades de Paiçandu e Sarandi, com o propósito de retratar a dinâmica
entre a cidade pólo e os municípios investigados da periferia externa, no intuito de evidenciar
a inclusão perversa de trabalhadores na urbs onde prevalece o capital.
Palavras-chave: Periferização, Mobilidade Centrada no Trabalho, Aglomerado Urbano,
Gestão Pública, Condição Humana.
XII
ABSTRACT
This dissertation aims at understanding the periphery formation process in the urban crowd in
Maringá, through the work-centered mobility. In fact, it starts by showing some concepts
within urban geography which are related to the pole-periphery dynamics in the regional
context. Next, it presents a work-centered mobility approach giving conceptual support to the
research. First, it seeks to get to know the periphery formation process in Brazil by bringing
back its history towards the consequences of traditional modernization and of the present
neo-liberal system, portraying at its end, the inequality of territory formation in Brazil´s
southern metropolitan regions polarized by medium-sized cities. The empirical analyses
resulted in a qualitative approach, through semi-directive surveys conducted in some
companies in Maringá, and also, applied to some workers (people working in these companies
and unemployed people) in the cities of Paiçandu and Sarandi. The purpose of them was to
portray the dynamics between pole city and its outer periphery aiming at evidencing the
perverse inclusion of workers in urbes, where the capital prevails.
Key words: Periphery Formation, Work-centered Mobility, Urban Crowd, Public
Management, Human Condition.
1
INTRODUÇÃO
A construção da ciência deve ser permeada de ações que realmente contribuam
para o progresso social. Por seu turno, o homem, por meio de suas ações, deve lutar para
melhorar o ambiente onde vive e convive, para que assim consiga participar do processo de
desenvolvimento.
A cidade é o palco privilegiado das relações humanas. Deste modo, na
consciência de qualquer citadino deve imperar, sem medo de abusar de uma posição
determinista, a prática coletiva.
O homem, com o Estado de Direito, conquistou sua individualidade, sua
“liberdade”. Uma contestada liberdade, já que, pela prática capitalista, não prevaleceu o
respeito e a responsabilidade do indivíduo pelo homem. A natureza passa a fazer mau uso de
si mesma e o homem adquire a condição de consciência civilizada, porém na verdade se
apresenta completamente alienado como indivíduo, ou melhor, como homem do capital.
O capitalismo resultou, até a atualidade, na produção de inúmeras riquezas, o que
é indiscutível. Proporcionou avanço científico e tecnológico, sustentando uma melhor
condição de vida para a humanidade, porém, espoliou uma grande maioria de participar na
construção dessa riqueza, por fazer preponderar a instrumentalização das pessoas, com a
exploração daqueles que são detentores apenas de sua força de trabalho, com vista à
sustentação da acumulação do capital para atender aos interesses da minoria de poderosos,
donos dos meios de produção.
Em face dessa realidade, faz-se oportuna uma pergunta: que melhor condição de
vida tem aquele que é submetido às condições da exploração capitalista?
Certamente, a urbanização contribuiu para amenizar muitas precariedades, por
melhor viabilizar a prestação de serviços básicos por parte do poder público e pela melhor
infra-estrutura que se pode auferir com a aglomeração humana, e promover assim uma
condição mais favorável à higiene e prevenção de doenças, que, sem dúvida, contribuem para
o bem-estar social. Não obstante, o que se almeja como mínimas condições de urbanização
que contemple esse bem-estar não está representado no que se constata na efetivação da
cidade. As favelas em encostas, mangues ou fundos de vale, etc., a urbanização ilegal –
privilegiando a exploração imobiliária –, as invasões de áreas de risco, ou até mesmo imóveis
abandonados (que servem de moradia para os sem teto) localizados no centro das cidades e
bairros loteados com o cumprimento a uma legislação por vezes flexível, são deficiências
constatáveis na promoção de um espaço digno como morada de um cidadão. Na verdade,
2
constata-se uma configuração em que as áreas urbanas se apresentam como espaços sociais
pouco democráticos, os quais oferecem à grande massa de migrantes, desempregados, enfim,
de cidadãos, possuidores do direito à mínima condição de vida digna, condições muito
distantes das reais necessidades de sobrevivência.
Com efeito, se tem na cidade a maior expressão do desenvolvimento desigual e
combinado. Ela representa a estrutura legítima do sistema capitalista, o qual viabiliza o seu
desenvolvimento por meio da mobilidade do trabalho.
Em tempos em que o capitalismo se sustenta por ações que resgatam a defesa da
prática liberal, instaurando o neoliberalismo, se faz importante compreender a periferia
contemporânea às primeiras iniciativas neoliberais constatadas no movimento histórico do
capital. Justamente por ser esta uma pesquisa voltada para os problemas sociais e econômicos
do Brasil, se torna relevante compreender o processo de periferização por meio da mobilidade
do trabalho numa aglomeração urbana polarizada por uma cidade média. As cidades médias
retratam a nova dinâmica urbana decorrente das políticas que prevaleceram na pós-
modernização conservadora, pois foram as cidades de população entre 100.000 e 1.000.000 de
habitantes as que apresentaram, em média, a maior taxa de crescimento populacional no
Brasil.
Não obstante, a presente pesquisa tem o propósito de compreender a cidade sob a
ótica da mobilidade do trabalho, constatando a periferização como um processo que se
instaura no Brasil, com maior intensidade a partir das décadas de 1970 e 1980, em
decorrência das migrações e do êxodo rural. Com base na elucidação sobre a mobilidade
centrada no trabalho, as periferias se configuram como locais privilegiados onde se “aloja” a
classe trabalhadora e desempregada.
Para alcançar o mencionado propósito, é de fundamental importância
compreender a relação pólo-periferia, transcendendo a unidade urbana e adentrando num
ambiente segregado e desigual que apresenta um nexo territorial. Neste contexto, percebe-se
que a cidade se desenvolve por meio do capital, caracterizado por expressar a incessante
busca pela mais-valia.
O enfoque da luta de classes, inicialmente referenciada por Marx em seus estudos
sobre o capital, se apresenta, dentro de uma visão dialética, como uma forma de se estudar e
compreender a cidade num âmbito econômico e social, por evidenciar os conflitos existentes
nos espaços urbanos.
Ao se estudar uma cidade localizada em um país que se revelou extremamente
urbano pelo censo de 2000 realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
3
Estatística), e que expressa altos indicadores de desigualdade social, perceptíveis a “olho nu”,
se depara com a perversidade produzida pelo capitalismo.
Com efeito, o campo de pesquisa se delimita no aglomerado urbano de Maringá,
no qual, além da cidade que polariza este espaço, encontra-se Sarandi conurbada a ela e
Paiçandu e Marialva em processo de conurbação. Por sua vez, esse aglomerado urbano se
desenvolve sob prismas diferentes e complementares, produzindo extremas desigualdades.
Para se compreender o processo de periferização no aglomerado de Maringá, o
trabalho é composto de quatro capítulos. O primeiro revela uma preocupação em trabalhar os
conceitos que são determinantes para o bom entendimento da dinâmica urbana e do espaço
urbano, nos contextos social e econômico. Como elementos de referência e suporte à
composição desse capítulo, podem-se destacar as obras de Lúcio Kowarick, Marcelo Lopes de
Souza, Roberto Lobato Corrêa e Raquel Rolnik. Cabe ressaltar que o objeto de estudo deste
trabalho, a periferia, se apresenta como o principal conceito a ser compreendido, o qual se
sustenta como um sinônimo de pobreza, retratando ser esta uma periferia social, podendo ou
não estar na margem do espaço urbano.
No segundo capítulo busca-se a compreensão e análise da mobilidade centrada no
trabalho, à luz da teoria marxista, com base nas obras de Jean Paul de Gaudemar, Paul Singer
e Marcio M. Rocha. Para tal, a primeira parte centrou-se na leitura de obras de Marilena
Chauí, Atílio A. Boron, Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Helena Pires Martins. Na
segunda parte, buscou-se compreender a mobilidade do trabalho.
Ainda nesse capítulo, como “pano de fundo”, apresenta-se uma reflexão frente a
duas contradições, quais sejam: política x economia e trabalho x capital. Ambas são adotadas
como meio para se alcançar a compreensão da teoria marxista diante da mobilidade centrada
no trabalho.
No terceiro capítulo, introduz-se toda uma elucidação sobre o neoliberalismo, os
novos arranjos produtivos e as redes, com base nas obras de Georges Benko, Ricardo Antunes
e Alex Fiúza de Mello e, sobre a mobilidade do trabalho no Brasil a partir da década de 1970
ao retratar a modernização conservadora e as conseqüências deste modelo de
desenvolvimento defendido pelos neoclássicos e criticado pelos marxistas, com base em
bibliografias produzidas por pesquisadores da Unicamp, quais sejam: José Graziano da Silva,
Márcio Pochmann, Paulo Eduardo de Andrade Baltar, dentre outros; além da obra de Luis
Fernando de Oliveira Paulillo e de Montenegro. No final do terceiro capítulo é apresentada
uma abordagem que retrata o processo de periferização no Brasil, onde se constata a periferia
como “produto” da mobilidade centrada no trabalho. O intuito, nesse final de capítulo, é
4
retratar a produção do espaço e estado de periferia nos principais aglomerados urbanos,
aqueles com mais de 100.000 (cem mil) habitantes. Como fecho, no cumprimento do seu
propósito, parte-se para uma análise do desenvolvimento desigual e combinado, retratando as
desigualdades socioeconômicas, com base nos dados do IBGE, do Atlas de Desenvolvimento
Humano (PNUD/ONU) e do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPPUR –
Observatório Metrodata), referentes as Regiões Metropolitanas do sul do Brasil, polarizadas
por cidades médias.
Toda a parte empírica do trabalho se desenvolve no quarto capítulo, com base na
metodologia do materialismo histórico e dialético, e nela se buscou fazer um pequeno resgate
histórico da região Norte Central paranaense, retratando a modernização conservadora nesta
região e elucidando o eixo Londrina-Maringá, para assim enfocar o aglomerado urbano de
Maringá e seu entorno.
Posteriormente é desenvolvida uma análise da produção do espaço periférico à luz
do estado de pauperização do aglomerado de Maringá, percebido por meio de entrevistas
semidiretivas com trabalhadores de Sarandi e Paiçandu (desempregados e empregados em
empresas de Maringá) e com empresas (gerentes de recursos humanos ou de produção),
retratando o desenvolvimento desigual e combinado fruto da contradição capital x trabalho.
Compreender o processo de periferização no aglomerado urbano de Maringá por
meio da mobilidade centrada no trabalho é tecer uma contribuição à gestão pública destes
municípios e a Geografia Crítica como ciência.
5
METODOLOGIA
Para que o presente trabalho pudesse se desenvolver na busca do objetivo de
compreender o processo de periferização no aglomerado urbano de Maringá por meio da
mobilidade centrada no trabalho, optou-se por uma pesquisa pautada no método do
materialismo histórico e dialético, no intuito de avançar para além da simples descrição da
periferia e buscar a essência da sua produção sob a ótica geoeconômica.
Como elucida Triviños (1987, p. 129), a pesquisa qualitativa - como esta se
enquadra - tem como propósito compreender as causas da existência do fenômeno,
“...resgatando sua origem, suas relações, suas mudanças e se esforça por intuir as
conseqüências que terão para a vida humana”.
Deste modo, no contexto da pesquisa qualitativa com base no materialismo
dialético, é imprescindível o autor se posicionar perante uma realidade que existe
independentemente da sua consciência, ou seja, perceber que a sua consciência não retrata a
totalidade da realidade, a qual é muito mais complexa do que a melhor percepção que a
consciência humana possa atingir. Com esse posicionamento quanto a sua identificação, o
pesquisador retrata uma ação que induz à crença nesta realidade.
Por outro lado, como fenômeno, a realidade, tendo a sua essência percebida,
denota a prática dedutiva no contexto do exercício teórico, que, de acordo com Triviños
(1987, p. 129-130), só alcança validade à luz da prática social. Desse modo, “o fenômeno
social é explicado num processo dialético indutivo-dedutivo. E compreendido em sua
totalidade, inclusive, intuitivamente”.
Com efeito, a dedicação à prática dialética se constata na compreensão da
realidade com base tanto na sua aparência quanto na sua profundidade, pois, como se sabe,
frente à percepção da totalidade, se faz necessário, primeiro, realizar uma pretérita
identificação, para depois compreender sua complexidade com base na sua estrutura histórica.
Só assim é possível estabelecer a “coisa em si”, conforme argumenta Triviños (1987).
Vale ressaltar que, segundo Konder (2003, p. 37), a totalidade de fato, nunca é
percebida em plenitude, ou seja, esta percepção está sempre em desenvolvimento, por isso é
provisória. Neste contexto, a realidade nunca é esgotada. “A realidade é sempre mais rica do
que o conhecimento que a gente tem dela”. Como complemento, o mesmo autor elucida que
“a síntese é a visão de conjunto que permite ao homem descobrir a estrutura significativa da
realidade com que se defronta, numa situação dada. E é essa estrutura significativa – que a
visão de conjunto proporciona – que é chamada de totalidade”.
6
Para que haja uma modificação no todo, esta modificação tem de acontecer
primeiro em suas partes. Ao perceber as modificações na ordem quantitativa, constata-se num
dado momento uma ruptura, um salto qualitativo; ou seja, o último acréscimo de uma dada
quantidade se expressa como uma mudança qualitativa. Tem-se como exemplo a água, que
quando atinge 0ºC se solidifica, e quando está em processo de aquecimento e o aumento
quantitativo da temperatura alcança 100ºC, entra em ebulição, vira vapor e assume o estado
gasoso.
Essa transformação da quantidade para qualidade é uma das leis da dialética.
Assim, para se compreender a metodologia deste trabalho, faz-se importante saber o que é
dialética na concepção marxista.
Dialética, na concepção moderna, como observa Konder (2003, p. 8), é “o modo
de pensarmos as contradições da realidade como essencialmente contraditória e em
permanente transformação”. Desse modo percebe-se que a dialética valoriza o movimento
histórico, o sujeito coletivo como agente da sua autotransformação, a qual decorre do
desenvolvimento da sociedade enquanto forma de vida que envolve a prática do trabalho.
Em face da valorização da condição de movimento que se constata na prática
social, cabe aqui referenciar o conflito como legítima manifestação das contraditórias relações
humanas, enquanto o combustível que alimenta o movimento histórico. Konder (2003, p. 8),
ao citar Heráclito, argumenta que “tudo existe em constante mudança, que o conflito é o pai e
o rei de todas as coisas”.
A base desse movimento, como elucida Hegel (apud KONDER, 2003), é o
trabalho, pelo fato de este impulsionar o desenvolvimento humano. Em decorrência do
distanciamento do homem com o estado de natureza, ele se percebe como sujeito, embora
não deixe de ser também objeto natural. Essa relação sujeito-objeto é a fonte que viabiliza o
trabalho, ou seja, é o que retrata a ação trabalho.
Embora a importância da contribuição de Hegel para a dialética seja
inquestionável, fora percebida como equivocada por Karl Marx. Este nunca negou que o
trabalho seja a força propulsora do desenvolvimento humano, mas alegava que Hegel só
reconhecia o trabalho do espírito (abstrato). Essa concepção abstrata do trabalho levava Hegel
a fixar sua atenção exclusivamente na criatividade do trabalho, ignorando o lado negativo
dele, as deformações a que ele era submetido em sua realização material e social.
Cabe neste momento propor uma importante indagação, à qual esse trabalho se
dedica: será a periferia social uma “deformação”, o lado negativo, produzido pelas relações
que permeiam a questão do trabalho?
7
Vale retomar a Hegel para uma última ponderação feita por Marx, a qual se
expressa na percepção deste último quanto à ausência, nas argumentações do primeiro, de
uma reflexão sobre a alienação do trabalho no que se refere à divisão das classes sociais, as
quais sustentam e são sustentadas pelo modo de produção capitalista.
Faz-se importante aqui retratar a dialética no que se refere às classes sociais, pois,
como elucidado, estas sustentavam o modo de produção capitalista exatamente por meio de
suas diferenças (interesses opostos), ou seja, pela luta das classes. Marx acreditava que ambas
as classes, em decorrência da própria luta, iriam levar ao esgotamento do capitalismo e do
modo de produção vigente em sua época, por meio da revolução socialista.
Não obstante, é elucidativo ponderar, em concordância com Konder (2003, p. 32):
“As lutas de classes assumem formas extraordinariamente variadas. Elas se tornam
extremamente complexas e não cabem em interpretações simplistas. Nas sociedades
capitalistas, as lutas de classes tendem a assumir formas políticas cada vez mais
complicadas”.
Frente à percepção da luta de classes como uma totalidade, ao se propor estudá-la,
como sugere Konder (2003), a teoria dialética recomenda que de qualquer totalidade tem-se
de capturar o recheio, ou seja, a síntese que se expressa nas suas contradições, alcançando
assim uma simplificação de qualquer fenômeno que se apresente extremamente complexo.
Com efeito, deve-se considerar, ao determinar uma síntese (a concretude de uma
realidade), a sua fluidificação, conforme defendeu Marx. Esta se refere à dialética, a qual não
se equipara ao relativismo, já que o que diferencia entre ambos está na concepção reflexiva da
primeira (fluidificação do conceito), no contexto de perceber o conceito pelos dois lados da
realidade, como, por exemplo, a cara e a coroa como sendo as duas faces da moeda,
divergindo assim da relatividade, por “não admitir contraposições metafísicas, tais como
mudança/permanência, ou absoluto/relativo, ou finito/infinito, ou singular/universal, etc.”
(KONDER, 2003, p. 56).
Cabe retomar, neste momento, as leis da dialética de acordo com Marx. Como se
viu, a primeira, a que se refere à passagem da quantidade para a qualidade, já foi elucidada. A
segunda lei se expressa na argumentação de que “os diversos aspectos da realidade se
entrelaçam e, em diferentes níveis, dependem uns dos outros, de forma que as coisas não
podem ser compreendidas isoladamente”. Deste modo, a realidade se expressa em
contradição, e neste contexto, prevalece um lado ou outro desta contradição. “Os dois lados se
opõem e, no entanto, constituem uma unidade (e por isso esta lei já foi também chamada de
unidade e luta dos contrários)” (KONDER, 2003, p. 58-9).
8
Já a terceira lei, segundo Marx (apud KONDER, 2003), retrata a condição da
negação da negação, onde, frente à realidade, tanto a afirmação quanto a negação são
superadas (a contradição em si é superada) e o que prevalece é a negação da negação, sendo
esta a síntese. Mas vale elucidar que a nova síntese da realidade apresenta uma nova
contradição, e assim se dá o movimento histórico.
O objetivo desta dissertação é compreender o processo de periferização no
aglomerado urbano de Maringá, por meio da mobilidade do trabalho.
Por se tratar de uma pesquisa teórico-empírica, aparentemente o corpo do trabalho
se separa em dois blocos; mas somente na aparência, já que este caminho avança por meio de
um exercício dedutivo, apresentando uma fundamentação teórica, no propósito de elucidar e
refletir sobre os conceitos e demarcações teóricas implícitas na dinâmica do espaço empírico
analisado, sustentando posteriormente as próprias análises do empírico.
Com efeito, parte-se de um posicionamento elucidativo frente a conceitos que
sustentam toda a reflexão, principalmente o conceito de periferia, sob duas óticas: a do espaço
urbano e a da periferia social.
Apesar da inquestionável importância do tratamento dado aos conceitos, o
trabalho inicia o processo de sinergia quando se discorre, num primeiro momento, sobre a
compreensão da mobilidade do trabalho no campo da economia política marxista e, num
segundo momento, quando cumpre a elucidação da mobilidade do trabalho no Brasil. Neste
contexto a pesquisa apresenta duas contradições, já mencionadas: política x economia e
capital x trabalho.
Essas contradições viabilizam a reflexão por exercitarem a prática dialética no
intuito de validar a existência ou não da contradição.
Após a percepção da periferia como um “produto” da mobilidade do trabalho no
Brasil, parte-se para a pesquisa empírica, a qual se realiza por meio da análise com base em
dados primários (entrevistas qualitativas) e secundários (dados quantitativos), proporcionando
a compreensão do processo de periferização no aglomerado urbano de Maringá, mais
precisamente, nas cidades de Sarandi e Paiçandu.
Deste modo, buscou-se, com a análise de dados secundários (IBGE, Ipardes,
Amusep e Censo Econômico 2002 realizado pela Associação Comercial e Industrial de
Maringá - ACIM), compreender o processo de periferização do aglomerado, desde a
modernização conservadora até a dinâmica do trabalho vivenciada na atualidade.
Já a pesquisa empírica com base em dados primários teve como maior propósito a
realização de entrevistas na comunidade e em empresas, pelas quais se obtém uma pesquisa
9
de ordem qualitativa. Com efeito, estas resultam no principal método de análise, tendo o
propósito de perceber a mobilidade do trabalho nas três cidades em que se delimita o campo
de estudos, e, em decorrência, como se dá o processo de periferização.
Buscou-se selecionar a força de trabalho, bem como os empresários. Foram
realizadas entrevistas semidiretivas, de perfil qualitativo.
As 30 entrevistas se subdividem em duas fases: 1) 10 entrevistas (retratando a
periferia) nas Agências do Trabalhador em Paiçandu e Sarandi, sendo 5 desempregados em
cada cidade, no intuito de constatar a mobilidade do trabalho no decorrer da vida de cada
sujeito; 2) 20 entrevistas em 10 empresas em Maringá (retratando o pólo e a periferia), sendo
1 encarregado de Produção ou de Recursos Humanos, em cada empresa, para falar a respeito
da mobilidade do trabalho na organização e, 1 assalariado em cada empresa no propósito de
constatar a mobilidade do trabalho no decorrer de sua vida, sendo que dentre os 10
trabalhadores, 5 são moradores de Paiçandu e 5 moradores de Sarandi.
Cabe justificar que as entrevistas se deveram aos seguintes motivos: a) Aquelas
com os desempregados na agência do trabalhador foram feitas por se perceber que aquela era
a única agência de empregos em cada cidade pesquisada (Paiçandu e Sarandi) e se considerar
que as pessoas que utilizam os seus serviços retratam o estado de inclusão de forma perversa
no mercado de trabalho, o que, por sua vez, caracteriza uma situação perversa de inclusão
social. b) Os encarregados de produção ou de recursos humanos foram escolhidos para
entrevista por representarem os incluídos e por conseguirem identificar melhor a mobilidade
do trabalho na empresa, já que lidam diretamente com o sistema produtivo e o recrutamento
de novos funcionários, ou seja, atuam diretamente com as novas exigências profissionais e
tecnológicas para uma maior acumulação do capital, as quais decorrem da maximização dos
recursos, aumento de produtividade e conseqüente redução de custos. c) Os assalariados
foram escolhidos por representarem a inclusão que se apresenta perversa.
No contexto das empresas, foram selecionadas as maiores por setor: as indústrias
com mais de 100 funcionários e as prestadoras de serviços com mais de 50 funcionários
1
,
1
De acordo com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), são consideradas
grandes e médias empresas, por número de funcionários, aquelas que possuem respectivamente mais de 500 e
entre 100 e 499 empregados para o setor industrial e, mais de 100 e entre 50 e 99 empregados para os setores de
serviços e comércio. Foi delimitado este universo de médias e grandes empresas por se constatar nestas uma
maior capacidade de investimento e substituição de mão-de-obra por tecnologias, por justamente conseguirem
viabilizar a inserção de novos maquinários, por produzirem em alto escala, seja a indústria de maionese, seja
uma rede de hotéis ou uma grande loja de móveis e eletroeletrônicos. Uma micro ou pequena empresa não detém
uma escala suficiente para a incorporação de grandes máquinas, ou ao menos tecnologias que demandam um alto
investimento, por ainda apresentar um pequeno volume de produção. Por exemplo: um pequena loja consegue
fazer o controle de estoques com um simples microcomputador, se utilizando de programas como Excel ou
Acces; uma pequena fábrica de jeans não produz um número suficiente para investir em grandes máquinas de
10
com base no censo econômico 2002 realizado pela ACIM e nos cadernos estatísticos
municipais do IPARDES/2003. Buscou-se delimitar o mínimo de 10 anos de atuação na
cidade de Maringá, já que se está analisando a mobilidade do trabalho no decorrer da última
década (no mínimo).
Cabe elucidar que as médias e grandes empresas (por nº de funcionários)
empregam 38,6% do total do setor formal, uma participação significativa. As microempresas
(até 19 pessoas ocupadas, na indústria e, até 9 pessoas ocupadas no comércio ou serviços)
detêm 37,6% de participação e as pequenas empresas (20 à 99 pessoas, para a indústria e, 10 à
49 pessoas nos setores de serviços e comércio) participam com 23,8%.
Considerando-se que o setor da indústria emprega 26,9%, o comércio 29,9% e o
setor de serviços 43,2% dos trabalhadores no setor formal, partiu-se para o arredondamento
das porcentagens para cima ou para baixo, buscando considerar 40% e 30%, para assim
determinar o número de empresas por setor que deveriam ser entrevistadas para perfazer o
total de 10. Deste modo, a amostra ficou delineada da seguinte forma: 3 empresas da
indústria, 3 empresas do comércio e 4 empresas prestadoras de serviços.
alta produtividade, pelo fato de tal investimento significar “investir em ociosidade” (não existe uma escala
suficiente de produção).
11
TABELA nº 1. Entrevistas: setores e empresas de Maringá – 2002 / 2003
Setores/empresas Nº de empresas Nº de funcinários Represetatividade %
INDÚSTRIA - 22.082 26,9
Cooperativa
agroindustrial*
12
identificar os entrevistados pela situação no mercado de trabalho (trabalhador desempregado
ou trabalhador/empresa), cidade em que reside e idade. Na identificação da empresa, levaram-
se em conta o segmento da empresa.
Com efeito, após a realização da pesquisa de campo e do levantamento de
informações e dados secundários, parte-se para a análise em busca da compreensão do
processo de periferização por meio da mobilidade do trabalho no aglomerado urbano de
Maringá.
Como elucidado, a análise se efetiva por meio de deduções a partir das
informações coletadas e auferidas, já que, neste curso, busca-se justificar a periferia social
como “produto” da mobilidade do trabalho, no aglomerado urbano de Maringá, fazendo
alusão à mobilidade do trabalho no Paraná e no Brasil, que permeia toda a crítica ao sistema
neoliberal e ao modo de produção capitalista.
Enfim, para alcançar o objetivo geral proposto, o presente trabalho se desenvolveu
por meio de uma abordagem com base no materialismo histórico e dialético. Operou com uma
extensa compreensão das leituras direcionadas à fundamentação teórica - exposta de uma
forma crítica e interpretativa - referente aos temas pertinentes a este trabalho, e com uma
pesquisa de campo direcionada para a compreensão da mobilidade centrada no trabalho,
pesquisa que se realizou por meio de entrevistas, as quais possibilitaram auferir informações
de caráter qualitativo.
13
1. CIDADE E REGIÃO: DO PÓLO À PERIFERIA
As cidades, que abrigam grande parte da população do mundo, se apresentam de
vários tamanhos, várias formas, várias culturas, etc. A maioria delas se constituem como
simples sede de município; outras formas de cidade, talvez não reconhecidas como tais, se
estendem por vários municípios, originando um aglomerado, decorrente (ou não) de uma
conurbação, podendo resultar numa grande região metropolitana.
Com efeito, a cidade - política, religiosa, fútil e cheia de belezas naturais ou
artificiais - é quase sempre injusta e desigual, e se apresenta como um grande cenário onde se
trava a luta social, ou talvez, hoje, uma alienada luta individual.
O principal objeto de estudo deste trabalho é a cidade, pois este abrange ou até
mesmo origina ou reproduz os demais objetos a serem analisados, quais sejam: a periferia, o
pólo, o espaço urbano, a conurbação, o aglomerado urbano, a cidade-satélite, a cidade
periférica e a cidade-dormitório. Em contrapartida, a cidade também é produto desses
“objetos” ou dinâmicas, que são percebidos como campo de estudo e aos quais se dedica
inteiramente este capítulo, com o propósito de fazer com que o leitor possa se inteirar dos
conceitos e sanar algumas dúvidas.
Grosso modo, pode-se dizer que a cidade é um aglomerado de prédios, os quais
alojam empresas, atividades comerciais diversas, bancos, hospitais, escolas, residências, etc.,
pois, no imaginário da sociedade, a cidade representa o espaço da vida cotidiana conectado
com outros, ou outras cidades, retratando os ritos das mobilidades físicas decorrentes das
trocas comercias ou contatos sociais rotineiros ou esporádicos. As vias, ruas, trilhos e canais
também representam bem o cenário urbano, pois, sem eles, como se viabilizaria o transporte
de um grande contingente, senão de uma “massa” de citadinos, para suas ligações inter e
intra-urbanas?
A localidade urbana pode se apresentar de vários tamanhos. Pode ser uma
pequena “vila” percebida como cidade, por ser sede de município, por exemplo, Santa Inês
no Norte Central Paranaense. Pode ser também uma cidade pequena, como Mandaguari - PR,
Dracena - SP e Exu – PE, ou uma cidade média, como Maringá - PR, Caxias do Sul - RS, São
José do Rio Preto - SP e Campina Grande - PB. Pode ser, finalmente, uma grande cidade ou
metrópole – caso de Curitiba - PR, Belo Horizonte - MG, Porto Alegre - RS e Salvador - BA,
ou uma das metrópoles reconhecidas como megacidades, por possuírem mais de 10 milhões
de habitantes em todo o aglomerado, como São Paulo, Rio de Janeiro, Buenos Aires
(Argentina), Londres (Inglaterra), Nova Iorque (EUA), Cairo (Egito), Tóquio (Japão), Xangai
14
(China), dentre outras. Isso sem considerar as cidades antigas e medievais, além da função
que cada uma cumpre ou já cumpriu.
Em meio a tal diversidade, ao se trabalhar na compreensão da cidade, faz-se
imprescindível se aprofundar na realidade produzida e delimitada por cada país, para assim se
conseguir justificar as diferenças a que se faz necessário se submeter na utilização do conceito
de cidade e de sua legitimação. Em outras palavras, as cidades se diferenciam entre si por
representarem sociedades diferentes e conduzidas por diferentes leis, e por expressarem e
vivenciarem histórias diversas, além das diferenças de suas economias e propostas enquanto
espaços coletivos, dentre outros fatores que caracterizam o que é cidade. Assim, podem-se
encontrar cidades em um dado país cuja classificação as enquadraria como vilas num outro.
Com efeito, Souza (2003, p. 28-9) elucida que “cada país adota os seus próprios critérios
oficiais para estabelecer o que é uma cidade – ou, mais amplamente, um núcleo tido como
propriamente urbano -, distinguindo as cidades de núcleos rurais como aldeias e povoados”.
Embora o exposto retrate uma verdade, é possível perceber tal diferenciação num
mesmo país. Dependendo da complexidade e desigualdade existentes num território nacional,
o que é cidade para uma região – sede de um município – pode não o ser para outra,
apresentando-se como vila. Isto se dá no sentido de que uma vila que se revela como sede
distrital, no Brasil, pode ser maior do que a sede de um outro município, tida então como
cidade. Portanto, o status de cidade é definido politicamente.
Outra ponderação a ser feita está em relativizar a importância de uma cidade, a
qual pode sobressair como um centro regional num determinado estado, no contexto de uma
hierarquia urbana, mas não passaria de uma mera localidade se estivesse situada em outro
estado e em outro contexto. Basta imaginar a cidade de Ponta Porã, centro regional do Mato
Grosso do Sul, inserida no interior paulista. Aparentemente, não passaria de uma cidade
pequena e inexpressiva, se percebida apenas pelo seu tamanho. Fazendo-se esta relação sem
considerar o contexto em que a cidade está inserida não se alcança a percepção mais correta
de uma cidade, que só seria obtida mediante a análise da sua participação numa realidade
dinâmica, regional e funcionalmente única.
Não se pretende, com essa argumentação, excluir o quesito “população” do
exercício de identificar ou categorizar a cidade, conforme os quesitos que se faz necessário
apresentar, mas se propõe salientar que a cidade não se categoriza apenas pelo seu tamanho.
Desse modo, de acordo com Souza (2003), além da delimitação de um mínimo demográfico
como limite, é fundamental perceber critérios funcionais, embora muito vagos, para tal
identificação. Mesmo assim, evidencia-se nesta percepção, principalmente se tratando do
15
Brasil, um fato já elucidado, mas também valorizado pelo supracitado autor, referente ao fato
de que os núcleos urbanos, neste país, são as cidades e as vilas, sendo que as primeiras são
sedes de município e as segundas são sedes de distrito (subdivisões administrativas dos
municípios). Pergunta-se: tal definição corresponde à realidade? De fato, muitas vilas e até
mesmo cidades não reproduzem uma relação social do trabalho urbano, mas sim, rural. Deste
modo, faz-se muito oportuno, no que se refere ao espaço urbano e às relações de trabalho
citar, Souza (2003, p. 30):
“Em uma cidade (ou, mais amplamente, em um núcleo urbano) se
concentram classes sociais não vinculadas, diretamente, à agricultura ou à pecuária, como
os capitalistas, os trabalhadores (industriais, do comércio etc.) e os profissionais liberais.
Daí decorre que as atividades econômicas ali desenvolvidas serão diferentes das que se
pode encontrar em um mero povoado rural; já se viu que a vida econômica da aldeia e do
povoado gravita em torno da agricultura e da pecuária. (...) Na cidade a vida econômica é
diversificada, e tão mais diversificada quanto maior for a cidade”.
Com efeito percebe-se que, apesar de o tamanho da cidade influir no seu potencial
de consumo, interferindo assim na complexidade e dinamicidade de seu mercado, é
fundamental considerar o fator renda, pois cidades de porte médio como Lexington,
localizada no estado de Kentucky, nos Estados Unidos, ou Bordeaux, na França, são mercados
muito maiores, diversificados e especializados quanto a serviços de saúde, culturais,
financeiros, comerciais, etc. do que as brasileiras Maringá - PR, Uberaba - MG, Blumenau -
SC ou Bauru - SP, ou do que as argentinas Santa Fé ou Paraná (Paraná é uma cidade da
Argentina), as quais equivalem àquelas primeiras quanto à dimensão populacional. Verifica-
se nesse ponto a necessidade de evidenciar as diferenças em relação ao poder de compra, o
qual se revela dependente do PIB (produto interno bruto) nos municípios relacionados pela
tabela n.º 2. Conforme dados de 2001, referentes à pesquisa realizada pela Simonsen
Associados e publicada na Revista Amanhã do mês de novembro, constatam-se cidades que
apresentam dimensões populacionais equivalentes, mas representam mercados de diferentes
tamanhos. Verifica-se este caso quando se compara Curitiba - PR com Recife - PE, Londrina -
PR com Feira de Santana - BA ou Maringá - PR com Vitória da Conquista - BA, as quais
representam a diversidade e a desigualdade existentes no Brasil, pelo fato de as primeiras de
cada dupla sobressaírem como centros mais dinâmicos. Porém, há que se considerar que o
meio ou região em que estão inseridas são muito diferentes, reproduzindo uma situação
econômica única e por isso diversa entre elas.
16
TABELA Nº 2. Desigualdade entre as cidades de diferentes regiões brasileiras, percebidas por
meio da renda, poder de compra e IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) ano 2000
Cidades População/
2000
% do
Brasil
Renda per capita
média/2000
Poder de compra/
2000 (% do Brasil)
IDH/2000
Curitiba/PR 1.587.315 0,94 619,8 2,01 0,856
Recife/PE 1.422.905 0,84 392,5 1,12 0,797
Londrina/PR 447.065 0,26 439,4 0,43 0,824
Feira de
Santana/BA
480.949 0,28 207,0 0,22 0,740
Maringá/PR 288.653 0,17 465,4 0,28 0,841
Vitória da
Conquista/BA
262.494 0,15 204,9 0,11 0,708
Fonte: Revista Amanhã (NOV/2001) e IBGE (Censo 2000) e Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil –
PNUD/ONU
ORG.: BORGES W.A
Desse modo, fica claro que o tamanho da população não prepondera frente à
questão do potencial de consumo ou dimensão do mercado e sua diversificação, pois, segundo
Souza (2003), justamente a diversificação da atividade econômica da cidade se constitui
muito em função da renda de seus habitantes (tanto da renda média como da sua distribuição),
além de outros fatores que ele menciona como histórico-culturais.
Percebe-se que o conceito de cidade abrange uma diversidade de formas e
conteúdos, no sentido de que as várias localidades conhecidas como espaços urbanos são
completamente distintas, seja pelo tamanho, seja cultura, economia e costumes, mas mesmo
assim são agrupadas numa mesma categoria, ou seja, a categoria “cidade”.
Segundo Souza (2003), a dificuldade de definir o que é cidade está exatamente na
sua complexidade, principalmente quando se tenta generalizar o termo, não respeitando um
momento histórico particular.
A cidade vislumbra, no imaginário crítico, a coletividade, tendo os espaços
públicos (as ruas, praças e os parques) como grandes símbolos e pontos de encontro. Percebê-
la apenas pelos aspectos físico e estético, pela forma ou tamanho, revela e denuncia uma
acrítica e anti-social percepção da “urbs”, embora assim seja ela percebida na atualidade pela
grande maioria de observadores e vivenciadores da realidade urbana “sem conteúdo” (pelo
fato de estes não perceberem o conteúdo da cidade, sua história, sua arquitetura, etc, mas sim,
valorizarem seus shoppings e as maquiagens urbanas). O conceito de cidade que se apresenta,
segundo Souza (2003), ao senso comum, não ultrapassa os limites da idéia de que a cidade
nada mais é do que um aglomerado de casas e um grupo de indivíduos em constante
movimentação, a que se tem de acrescentar a presença de um shopping center.
Basta perceber o indivíduo, a sociedade, sua ação social e econômica no
transcorrer da história para descobrir o que é a cidade, ou melhor, o propósito da cidade. Não
17
é difícil! O que limita tal percepção é a idéia da cidade imposta pelos grupos hegemônicos,
sendo a ideologia um instrumento de dominação.
Embora se parta da pretérita elucidação afirmativa, como já posto, o presente
capítulo não se atém a um resgate histórico na compreensão da cidade.
Visualizar a cidade partindo da luta de classes leva a identificá-la como resultado
do movimento histórico. Com efeito, a cidade se identifica como configuração do espaço
criado pelas relações de trabalho e pelo que este produz. Neste contexto, impera o perfil
urbano viabilizado pela presença dos serviços públicos. Segundo George (1983, p. 62),
“Se percebermos no campo das generalidades elementares, a cidade define-
se por tudo o que pode ser qualificado por dados concretos sob o epíteto de urbano. É em
primeiro lugar a casa urbana, que pertence a uma série, alinhada em ruas nas cidades
tradicionais, em conjunto de edifícios dispostos em volta de pátios ou de espaços verdes
internos no urbanismo moderno. Pelo menos nas cidades européias e l4i-a eóras n,ci
aractcie(ólizaas)-4.1easmas reasacasrigutal asm2.9(ns o )-5. ale(tarao quclasfigu em )]TJJrviçal
18
há a igreja ou o templo a construir e manter, enfim há sempre na cidade uma dimensão
pública de vida coletiva, a ser organizada. Da necessidade de organização da vida pública
na cidade, emerge um poder urbano, autoridade político-administrativa encarregada de
sua gestão. Sua primeira forma, na história da cidade, é a de um poder altamente
centralizado e despótico: a realeza.(...) A cidade da realeza é a cidadela: recinto murado e
fortificado onde se encontram o palácio, o templo e o silo. (...) Sua manutenção provém
do trabalho de todos os súdito – por isso quem é morador da cidade está ao mesmo tempo
protegido e compelido por suas muralhas”.
Rolnik (1995) enfatiza a cidade como um espaço coletivo no qual prepondera a
necessidade de gestão, embora ela tenha se refeito e se autotransformado no decorrer da
história. Sem dúvida, fica difícil, ao procurar compreender e conceituar a(s) cidade(s), deixar
de utilizar ou introduzir menções à história, mas cabe esclarecer novamente que os pequenos
fragmentos históricos contidos nesse primeiro capítulo denunciam a importância de se fazer o
resgate do vivido para compreender apenas conceitos, os quais são imprescindíveis para se
situar no cenário do presente trabalho.
Como se vê, a gestão sempre foi a ação controladora do convívio social, mas de
certo modo a referida prática, transformada na ação urbana, apresenta-se numa unidade que
exerce o gerenciamento de um espaço de influência. Nesse ponto, a cidade, sob a ótica da
gestão, também se revela una, por se configurar como objeto a ser gerenciado (organizado)
justamente por ser coletivo.
Com efeito, Souza (2003) observa que, por uma vertente, a cidade é um centro de
gestão do território que desempenha um papel crucial na produção do espaço urbano,
caracterizando-se como um centro de poder.
Em uma segunda vertente, Souza (2003) elucida que a cidade é um centro de
gestão do território também enquanto sede do poder religioso e político. Desse modo, ela não
se presta apenas como sede de empresas que produzem e comercializam bens e empregam
pessoas, mas também como um local onde pessoas se organizam e se integram com base em
interesses e valores os mais diversos, formando grupos de afinidades.
De acordo com Rolnik (1995, p.21)
A origem da cidade se confunde com a origem do binômio diferenciação
social/centralização do poder. Este se coloca tanto internamente (para vários grupos ou
classes sociais da cidade em questão) quanto externamente, na conquista e ordenação dos
territórios sob seu poder”.
Com efeito, morar na cidade implica participar da vida política, mesmo como um
“indiferente” eleitor. A cidade política assim se traduziu em todas as já existentes, sendo que
19
nas mais antigas praticava-se uma política que relegava a democracia, ao sustentar o poder
absoluto do Rei e da Igreja. Assim, para Rolnik (1995, p. 22), “ser habitante de cidade
significa participar de alguma forma da vida pública, mesmo que em muitos casos esta
participação seja apenas a submissão a regras e regulamentos”. A cidade como espaço político
é muito bem representada pela polis – cidade-Estado grega, e pela civitas, cidade no sentido
de participação dos cidadão na vida pública, para os romanos.
Após breves elucidações e reflexões sobre o que vem a ser a cidade, essa se
revela, segundo Ferraz (1997), como efeito, e não como causa. Desta forma, a cidade se
reproduz à luz da sociedade que a origina. O homem, no discurso da liberdade, reproduziu-se
na cidade por meio das artes e da expressão individual, porém passou a se comportar com
respeito à ordem para a acumulação do capital, o que denota o respeito a uma ideologia.
No presente momento, faz-se oportuno traçar uma analogia: se a cidade fosse
efeito da ação humana enquanto interação social do trabalho, no campo de uma ação que
objetiva o bem-estar social em respeito à condição humana, poder-se-ia denominar a cidade
como uma organização, já que uma organização é legítima se duas ou mais pessoas trabalham
de forma estruturada em busca de um mesmo objetivo. Entretanto a cidade se revela como
uma grande massa de indivíduos portadores da “liberdade”, não detentores da consciência
coletiva e de um objetivo comum, justamente por imperar a ideologia que sustenta a
alienação. Desse modo, viu-se emergir a cidade das organizações, as quais se caracterizam
pela competição entre si, e só buscam ação cooperativa diante de uma vantagem competitiva
(economias de aglomeração).
Assim, as referidas organizações capitalistas representam várias unidades em
busca da mais-valia, sustentada pela força de trabalho que se rende em contradição à liberdade
“conquistada”; embora existam outras que se propõem seguir apenas ideologias. Como as
ideologias são emergentes, o contrapeso existe na proposta de instaurar uma luta entre a ética
social e a “antiética” do capital, na busca de disseminar na sociedade a consciência de que o
indivíduo é um sujeito coletivo e responsável pelo ambiente em que atua, ou seja, embora a
democracia no Brasil se faça por meio de representantes, o sujeito deve se portar como pró-
ativo, buscar uma participação efetiva, se tornar consciente da construção social e
principalmente atuar em prol da coletividade e em respeito à humanidade.
Apesar das diferenças, as quais já de início identificaram-se como características
da cidade, em vista dos estratos sociais e da divisão de classes (temas que serão melhor
abordados no segundo capítulo, quando se buscará a compreensão da mobilidade do trabalho
à luz da teoria marxista), a cidade se revela aparentemente una em suas tradições e costumes e
20
nas características de seu povo e passível de transformação, apesar de a suposta unidade
urbana refleti uma diversidade social.
A materialidade, o concreto, enquanto estrutura, se expressa como a lógica que
configura a cidade como um ambiente que sustenta a transmutação do trabalho arraigado à
“luta” pela permanência da submissão do trabalhador ao capital; ou seja, a tecnologia,
enquanto combustível desta relação, viabiliza a construção do espaço habitado e, aplicada na
construção dos edifícios, casas e fábricas, sustenta a sua auto-reprodução enquanto máquinas.
Como elucida Ferraz (1997, p. 19):
“Quando se procura estabelecer uma única lógica para a cidade, deve-se
colocar o foco das atenções de sua estrutura material, tecnológica – casas, máquinas,
edifícios, fábricas – para localizá-los sobre o homem que não apenas habita nela, mas está
inevitavelmente condicionado por sua tecnologia, isto é, por sua estrutura material”.
Por assim configurar uma espécie de dinâmica urbana, a cidade se legitima, de
uma forma evidente, na sua mais genuína concepção, como um espaço oposto ao rural, ou
seja, local onde não se reproduz uma interação social com base na subsistência de sua
produção familiar, mas sim na interação de grupos familiares articulados num mesmo
exercício de submissão ao capital, embora de alcance desigual.
Na cidade o capitalista rural comercializa sua produção, por este espaço urbano
intermediar o beneficiamento do produto para a exportação e dispor de um enorme mercado,
predisposto a consumir o excedente. Desse modo, Rolnik (1995, p. 16) esclarece que “a
cidade, enquanto local permanente de moradia e trabalho, se implanta quando a produção gera
um excedente, uma quantidade de produtos para além das necessidades de consumo
imediato”.
Com efeito, para o sociólogo Max Weber (apud SOUZA, 2003, p. 25), em um
escrito publicado em 1921, em que trata da natureza das cidades, sendo esse escrito parte de
uma coletânea organizada por Otávio Velho, a cidade é um local de mercado, embora nem
todo “local de mercado” se configure como uma cidade (mercados periódicos, freqüentes em
aldeias), pois os mercados não possuem uma característica essencialmente urbana.
A percepção da cidade como aglomeração urbana, formada por ruas, casas,
praças, etc., não se apresenta suficientemente como retrato de uma expressão socialmente
urbana. Com efeito, como observa Rolnik (1995, p. 12): “O espaço urbano deixou assim de se
restringir a um conjunto denso e definido de edificações para significar, de maneira mais
ampla, a predominância da cidade sobre o campo”.
21
Desse modo, a cidade, por se reproduzir, “toma posse do campo”, ou seja,
incorpora uma porção territorial marginal ao perímetro urbano, originando porções
suburbanas, periféricas, portadoras ou não de distritos industriais. Estes se viabilizam pela
existência de infra-estrutura, retrato do material urbano mencionado, como ruas, rodovias,
ferrovias, energia elétrica, etc., já viabilizado quando de interesse para o desenvolvimento
local e proliferação do capital. Desse modo, para Rolnik (1995, p.12), “Periferias, subúrbios,
distritos industriais, estradas e vias expressas recobrem e absorvem zonas agrícolas num
movimento incessante de urbanização. No limite, este movimento tende a devorar todo o
espaço, transformando em urbana a sociedade como um todo”.
Em continuidade à exposição do pensamento de Rolnik (1995) quanto ao
fenômeno de urbanização como expressão da cidade, elucida-se que a cidade lhe fez lembrar
um ímã, ou seja, fazendo analogia à cidade, um campo magnético que atrai, reúne e concentra
os homens, na sua ânsia de buscar um objeto que possa representar em si uma característica
essencial da cidade, independentemente da sua posição no tempo histórico. Neste sentido,
evidencia-se que a cidade concentra energias.
1.1. O pólo e o centro
O ímã de uma cidade, o qual se apresenta como o campo magnético que atrai as
pessoas e o capital, pode se expressar como sendo o pólo de atração, a grande “força maior”
que atrai os agentes que compõem e originam o dinamismo e a diversidade de um centro
econômico.
O pólo, como o grande chamariz, atrai muitos recursos e pessoas para seu campo
de ação, também conhecido como sua hinterlândia. Com efeito, revelando-se sustentável tanto
na melhoria da qualidade de vida da população quanto na melhoria no trato e respeito
ambiental, o pólo, percebido como relações sociais contraditórias que produzem o espaço,
emerge como possuidor de uma enorme responsabilidade social, pois, caso não seja planejado
ou seja mal planejado o seu papel e função, pode, por meio da sua dinâmica, criar uma cidade
ou até mesmo uma região problemática no contexto da cidadania e meio ambiente.
Assim, após revelar-se aqui uma preocupação com a necessidade de perceber a
realidade que permeia atualmente a ilusão sustentada pela sedução praticada pela beleza
construída, contada, potencializada ou vivenciada pelo consumismo da cidade, e sustentada
também pela busca de uma maior exploração da força de trabalho, alienada ao capital e aos
22
seus símbolos e ritmos urbanos, o pólo se introduz como objeto importante no discurso que se
propõe o presente trabalho, o qual começa com a identificação do centro e dos subcentros
existentes numa cidade.
A área central das cidades (de médio e grande porte) geralmente se apresenta de
forma verticalizada, como se visualiza na foto nº 1, do centro de Maringá (aglomeração
urbana de 420 mil habitantes, segundo dados do Censo Demográfico – IBGE/2000). Nessa
porção do território urbano, no qual se situa a maior parte do capital investido na cidade em
infra-estrutura e serviços, encontra-se o maior valor por metro quadrado, em decorrência do
investimento e do adensamento proporcionado pela vontade ou necessidade de ocupar a
região mais nobre e que representa ao citadino uma condição de status e de competitividade.
FOTO nº 1 Vista Aérea do centro de Maringá - 2003
Fonte: Prefeitura Municipal de Maringá www.maringa.pr.gov.br
Como toda suposta regra, as quais se invalidam pelas exceções - embora não se
tenha pretendido, com a pretérita argumentação, criar uma regra, o centro nem sempre se
encontra no centro. Isto se constata tanto sob a ótica de localizar-se no ponto mais central do
eixo cartesiano, o qual se revelaria como produto de um planejamento racionalizado, quanto
23
pela de se situar realmente no velho e conhecido “centro da cidade”, por nem sempre a cidade
possuir um único centro, ou o centro histórico não representar o centro financeiro e
econômico.
Para que se possa discorrer sobre ambas as ponderações como detentoras de
centralidade, é imprescindível elucidar o conteúdo daquilo que exerce um poder de
centralizar. Sendo assim, o centro pode compor-se de bancos, estabelecimentos comerciais em
geral, hospitais, universidades, escolas, órgãos públicos, centros de compras conhecidos como
Shopping Centers, igrejas ou templos, praças, áreas de conveniência, terminais de ônibus
intra-urbanos ou até mesmo interurbanos, etc. A centralidade pode também qualificar um
único equipamento desses mencionados, como um Shopping Center, uma grande
universidade, um hospital de referência, um hipermercado; ou até mesmo poderia se revelar
periodicamente, ou seja, mediante uma grande feira anual ou um evento internacional que
aconteça freqüentemente.
Com efeito, cabe citar Corrêa (2002, p. 38):
“(...) a área central constitui-se no foco principal não apenas da cidade mas
também de sua hinterlândia. Nela concentram-se as principais atividades comerciais, de
serviço, da gestão pública e privada, e os terminais de transportes inter-regionais e intra-
urbanos. Ela se destaca na paisagem da cidade pela sua verticalização”.
Após a breve elucidação, cabe retomar às disposições de centros e subcentros,
como espaços que se apresentam dotados de centralidade (constantemente ou
esporadicamente). A primeira argumentação, de que o “centro” não necessariamente se
localiza no centro, condiz com a produção de espaços mais recentes, que instauram um
processo de substituição ou de complementaridade ao centro tradicional. Isto se pode
evidenciar por meio de dois exemplos: o condomínio empresarial Alphaville, localizado na
Grande São Paulo, mais precisamente no município de Barueri, e o bairro da Barra da Tijuca,
Zona Oeste do Rio de Janeiro, os quais se apresentam hoje como centros independentes dos
respectivos centros tradicionais. Normalmente o policentrismo é caracterísco de grandes
metrópoles, pois um dos fatores que caracterizam um novo centro é o fator distância.
A segunda argumentação - de que “nem sempre a cidade possui um único centro”
- está próxima da primeira, mas com um diferencial. Explica-se pela elucidação já há pouco
realizada, no que diz respeito a um equipamento revelar-se com centralidade, por atrair
público de toda uma cidade e região, para consumir produtos, serviços e/ou cultura. Têm-se
como exemplos de equipamentos urbanos que exercem centralidade, no Brasil: o Ribeirão
24
Shopping, na cidade de Ribeirão Preto - SP, localizado na saída para Araraquara, interligado
facilmente com outras principais avenidas e rodovias que servem à cidade, e o Shopping Dom
Pedro, em Campinas - SP, o maior da América do Sul, situado na Rodovia Dom Pedro,
servindo um público consumidor regional. Tem-se, ainda outros equipamentos, como o
Aeroporto de Cumbica, situado em Guarulhos, o qual pode até se revelar possuidor de uma
maior centralidade do que o próprio centro da cidade que o comporta.
FOTO nº 2. Shopping Dom Pedro – Campinas/SP – 2003
Fonte: Site da Abrasce: www.abasce.com.br
Outra categoria que se qualifica como detentora de centralidade, mas que não
necessariamente se legitima pela longa distância do centro tradicional e/ou hegemônico, é
representada pelos subcentros, assim denominados por Souza (2003, p.26), comuns também
em cidades médias. O referenciado autor baseou-se em C. C. Colby (apud SOUZA, 2003, p.
26), um autor norte-americano que, na década de 1930 usou as expressões “centrífugo” e
“centrípeto” para referir-se às forças que estimulam a descentralização das atividades
econômicas na escala da cidade, dando origem ao aparecimento dos chamados subcentros de
comércio e serviços. Esses podem corresponder aos pequenos centros de bairros, ou bairros
inteiros que ofereçam o abastecimento de produtos de primeiras necessidades, de serviços
básicos ou cotidianos, como por exemplo, supermercados, bancos, farmácias, papelarias,
padarias, serviços de correios, posto de saúde, etc. Quando os subcentros se enriquecem com
serviços ou comércios mais especializados, como livrarias, lojas de roupas e de
eletrodomésticos, hipermercados, butiques de marcas famosas, uma farta rede bancária,
25
clínicas de saúde e shopping centers, acabam exercendo um poder equivalente ao centro
tradicional, como é o caso do bairro de Copacabana, na cidade do Rio de Janeiro. Mas este,
por estar próximo do primeiro, acaba se configurando como uma extensão (centro expandido),
ou seja, conectado fisicamente ao centro tradicional, e não fragmentado territorialmente.
Outros exemplos de subcentros, característicos das médias e grandes cidades são: os
subcentros dos bairros do Portão e do Boqueirão em Curitiba, o subcentro da Praça da Árvore,
no bairro da Saúde (Zona Sul), em São Paulo, o jardim Alvorada em Maringá, ou mesmo
cidades satélites no contexto do aglomerado, como Sarandi (situada no aglomerado urbano de
Maringá), a qual desenvolveu uma centralidade complementar àquela exercida pelo centro
hegemônico da cidade-pólo.
Tratando-se da região da Berrini, na
26
maior ou menor de acordo com a sua centralidade – ou seja, de acordo com a quantidade
de bens e serviços que ela oferta, e que fazem com que ela atraia compradores apenas das
redondezas, de uma região inteira ou, mesmo, de acordo com o nível de sofisticação do
bem ou serviço, do país inteiro e até outros países”.
Com efeito, a cidade-pólo é portadora de uma centralidade, a qual a legitima como
um centro polarizador. Como fora brevemente elucidado, seu raio de abrangência responde às
prerrogativas de uma sociedade global.
Quanto às cidades-pólos, as quais exercem uma centralidade, Souza (2003, p. 57)
evidencia que
“A centralidade de uma cidade é função, acima de tudo, de sua capacidade
de ofertar bens e serviços para outros centros urbanos, estabelecendo, desse modo, uma
área de influência. Essa centralidade, portanto, é de natureza, acima de tudo, econômica.
Uma cidade será tanto mais complexa e possuirá uma posição tanto mais elevada na
27
MAPA nº 1. Hierarquia urbana do Brasil - 1999
Fonte: UNICAMP/IE/NESUR, IPEA e IBGE
Por vincular o pólo à cidade na sua plenitude, sua abrangência tem de envolver,
no mínimo, uma área municipal que esteja além dos seus próprios limites territoriais; ou seja,
a cidade-pólo tem de abarcar no seu campo de influência mais um município, caso contrário
não se legitima como centro polarizador, por se apresentar como um centro local.
Em complementaridade, a teoria da polarização econômica desenvolvida por
Perroux tem como ponto de partida os complexos industriais em determinados pontos de um
país (GRAU, 1974). A formação do pólo vinculado à instalação de indústrias se dá por meio
de uma força gerada pela dinâmica relação comercial que se instaura nessa localidade,
promovendo o seu desenvolvimento, embora desigual. Este desenvolvimento desigual, muito
evidente nos países subdesenvolvidos, foi muito bem trabalhado por Hirschman, o qual fez as
28
mesmas análises que Perroux, mas deu ênfase justamente aos países em desenvolvimento,
conforme elucida Sahr (2001).
Embora exista, por parte da Nova Geografia (Teorética e Quantitativa), uma maior
dedicação aos estudos dos pólos de crescimento percebidos como tais por meio das indústrias,
não se pode negar, de acordo com a Teoria dos Pólos de Crescimento de Perroux, existirem
pólos que se desenvolveram com base na atividade primária. Com efeito, existem grandes
indústrias totalmente dependentes de um ambiente rural, como o caso de cidades que possuem
uma economia agroindustrial, tendo como exemplo Maringá, no Estado do Paraná.
Segundo Friedman (apud PONTES, 2000), os pólos se constituem por meio das
indústrias motrizes, em decorrência dos fluxos existentes e necessários para sustentar seu
processo produtivo (relações de compra e venda, para a constituição do produto final e sua
comercialização), induzindo à formação e instalação de indústrias menores para dar
sustentação à motriz, com base numa relação de interdependência, porém hierarquizada.
Dessa forma, esse complexo industrial se constitui por influência da indústria
motriz, a qual promove uma estruturação deste complexo que se forma pela sua dependência
por complementaridade, ou seja, pela necessidade de ter próximos os fornecedores e demais
agentes do seu microambiente produtivo.
Desse modo, Wingo (apud PONTES, 2000, p. 19) justifica que:
“O pólo de crescimento está estritamente atrelado ao conceito de
dominância, na medida em que procura identificar relações interindustriais, processos de
formações de economias externas e propagação de inovações entrdam5inova59[(do18.275 9P18.495 -1.725 TD1.1007 Tchei)-ogêne.9(aslaçõe po)5.3(ier.9(esss”te prod12( )Tj2 284 -13o d62)]TJm72 -1.725 TD0 Tc-11.88.275 5.163D0 Tc0. )]TJ4.725 -1.725 TD38.725 TDN(t)obr re pode negar, de acorFw[(Dpel(Seg aco Fruma rela3o s)]TJ19.325 0 T[((1963(rciéexistentes ao pisra eomplexoa depend23.0em )Tj-28.14 -1..43 0 TD295.0007 Tdiscussãar, des de ruenfo(p)0.obruma re3.1ão )]TJ18.27.725 TD294005 Tcode2(tpubase ,de ipel)-5., des bido-s comuma re40.T6 1 Tf8.72D29505 Tc[(oegundo odo,on)óes 797 o6(e)5inova527.23o. )]TJ4.725 -1.]TJT*0.00006 Tc.5( ões entormaôstentacurs3(i)-1.7(ngo ()]T9.6.6( )]TJ17.1 0 TD0 Tc0 Tw(apud)Tj/TT2 *0.02525 TDSilvm)71976)c0 7 Tw( )T7 Tw286..7224açõ898.48 325 TD40 Tc2( )Tj2 295 -1239.9698.48 (. 0 Tc-12/TT)]TJ-13.55 -1.725 TD024006 TcA.0043 Toico-s 6(n)5.6ntorm5.6(ium)8.4(a odo,6m)7.deperban8(e)-1,5.6(iiz, 0018 To-s 6(de,rcep7(t)- da indústria )]TJ-4.725 -00725 TD21.001 Tcrmadonstite5582 Ts97 o-5. cidadido)-1( prom)81(4.9(t)-1.54s)]TJ19.3243 0 TD220001 Tcre in ,dpagro entaca in-(m)3.4e ru(na me odo,em)8.8(a)-0.1(54 )]TJ-4.725 -0143 0 TD03006 Tc0w[omt
29
atrair recursos, capital e trabalho. Sendo assim, por exercer uma centralidade regional, ou
seja, por ser um centro regional, a cidade acaba sendo denominada como pólo.
De acordo com Andrade (apud ROCHA, 1992, p. 48),
A idéia de região polarizada (...) resulta da observação da interdependência
existente entre as várias áreas, às vezes pertencentes a regiões homogêneas diversas,
devido a erradicação da influência comercial das aglomerações urbanas. O poder de
atração que uma cidade exerce em torno da área que a cerca, conseqüente das transações
comerciais que realiza com as áreas rurais, provoca a formação de áreas de influência e,
em conseqüência, regiões polarizadas”.
Sendo assim, quando se fala em pólo se faz menção a uma forte estrutura
produtiva, a qual não se legitima pela produção apenas industrial, mas também como
prestadora de serviços especializados e complementares ou por revelar-se portadora de um
diversificado setor comercial. Esse fato exprime que a conotação de pólo possui um maior
poder de influência do que o correspondente ao termo “centro”. Por isso reforça-se aqui a
posição de referir-se a uma cidade polarizadora como pólo, e não como centro. O centro
representa uma porção do espaço urbano que prepondera economicamente sobre as demais
área de uma cidade ou de todo um aglomerado; já o pólo prepondera enquanto referência para
a região.
1.2. A região como espaço polarizado e desigual
O pólo representa um ponto centralizador em uma determinada porção do
território, onde exerce a função de atração de pessoas e mercadorias, em busca de absorver
capital e distribuir bens e serviços para o seu exterior. Por essas trocas de fluxos (capital, bens
e serviços), Kaiser (apud GRAU, 1974) justifica que a região é um espaço polarizado e que
em determinadas regiões o que prepondera é a solidariedade como força propulsora do
desenvolvimento; mas, em contraposição ao citado autor, é concreto o processo de
desenvolvimento desigual no espaço regional.
Com base nas teorias de desenvolvimento econômico e núcleo/periferia, deu-se
ênfase na década de 1960, por meio de autores como Friedmam e Hirschmam, aos estudos das
desigualdades regionais compreendidas como resultantes de processos sociais e econômicos
(ROCHA, 1992).
30
Segundo Rocha (1992, p. 51), na década de 1970, a questão regional é
compreendida como decorrente de “condições concretas históricas, cujas abordagens críticas
desmascaram os estudos conservadores de planejamento regional, os quais desconsideram as
contradições sociais inerentes à gênese do espaço, a luta de classes”.
No contexto da abordagem crítica, de acordo com Lipietz (apud DUARTE, 1980,
p. 18), a desigualdade produzida em uma determinada região se perfaz pelas diferentes
relações sociais (polarizadas) que retratam a socialização do espaço e seu conteúdo, apesar de
que, para o autor, “a estruturação do espaço é a resultante da articulação de modos de
produção”.
Cabe dizer neste momento que a cidade sobressai no cenário regional como a
delimitação territorial (espaço urbano) onde o capital encontra melhores condições de se
instaurar como modo de produção.
Quanto ao trato conceitual do termo região, Lipietz (apud GOLDENSTEIN &
SEABRA, 1982, p. 24) o considera “como produto das relações inter-regionais e estas como
uma dimensão das relações sociais que polarizam riqueza e pobreza, dispondo-as
diferencialmente no espaço”. Deste modo, Goldenstein e Seabra questionam que “é preciso
explicar quais os mecanismos que levam à polarização das forças sociais e políticas”.
Neste contexto, de acordo com Rocha (1992, p 55), “Capitais de maior magnitude
controlam os de menor magnitude, na lógica de expansão do processo produtivo capitalista,
na sua fase monopolista. Observa-se a existência do controle político do território”.
Com efeito, o conceito de região, segundo Francisco de Oliveira, é pautado no
modo de produção capitalista, sustentado pela luta de classes, “... onde o econômico e o
político se fusionam e assumem uma forma espacial de aparecer no produto social e nos
pressupostos da reposição” (apud DUARTE, 1980, p. 20), sendo que a região em si representa
um espaço socioeconômico no qual se constata a prevalência de uma forma de reprodução
sobre as outras.
O recorte territorial da presente pesquisa, um aglomerado urbano, retrata a relação
de uma cidade-pólo (Maringá) com duas cidades na periferia externa
5
(Paiçandu e Sarandi).
Busca-se compreender o processo de periferização nas duas últimas por meio da mobilidade
5
Entende-se por periferia externa municípios que contíguos ou muito próximos a um município pólo, os quais
estabelecem com este relações de dependência a partir de um movimento desigual e combinado.
31
do trabalho percebido na relação pólo-periferia. Deste modo, a análise regional paira no
contexto do desenvolvimento desigual e combinado
6
.
Por justamente a contradição capital x trabalho ser fonte do movimento histórico,
a forma de reprodução que prepondera num espaço se apresenta efêmera, pois, no contexto de
um único modo de produção capitalista, as diferentes formas têm mobilidade exatamente por
se apresentarem como estágios do desenvolvimento do próprio modo de produção. Deste
modo, para Francisco de Oliveira, “A existência de uma região não é permanente. Ela tende a
desaparecer no processo de desenvolvimento capitalista. O capital tende a homogeneizar o
espaço de uma totalidade social”. Não obstante, segundo o autor, “pode-se regionalizar um
espaço total quando se identificam espaços ou regiões que expressam as características em
que está o modo de produção nos seus diferentes estágios, em uma formação social” (apud
DUARTE, 1980, p. 22).
Com efeito, o domínio por meio da luta de classes, no contexto da socialização do
espaço, decorre do modo de produção capitalista, o qual é dominante (LIPIETZ, apud
DUARTE, 1980), mas identificado em estágios de desenvolvimento distintos, configurando
diferentes regiões. A regionalização se transforma no decorrer do desenvolvimento do modo
de produção capitalista e, conforme avança em seu estágio, continua reproduzindo a
desigualdade, sendo esta intra-regional ou inter-regional.
1.3. Da conurbação ao aglomerado urbano
Uma microrregião (como se pode dizer em referência a uma fração regional) que
se apresente com um alto índice de urbanização, interdependência e dinamismo econômico,
composta por pelo menos uma cidade pólo e outras que figurem como periferia externa,
constitui uma interação interurbana, a qual potencializa o processo de conurbação, sendo
reconhecida como uma aglomeração urbana contínua ou descontínua.
Ao perceber a cidade como meio de acumulação e produto do modo de produção
capitalista, cabe afirmar que: 1) a urbanização em si gera capital; 2) o aumento da população
6
ROCHA, M. M. (1992, p. 57). “Na tradição marxista, o conceito de desenvolvimento desigual foi utilizado na
introdução dos GRUNDRISSE, de Marx, e também por Lênin; é importante lembrar a postulação de Trotski, que
define a “Lei do Desenvolvimento Desigual e Combinado”, em que a forma de reprodução diferencial que leva à
reprodução ampliada do capital. As disparidades são concretamente o sinal do desenvolvimento desigual das
forças produtivas e das especificidades na organização dos meios de produção, segundo um ritmo diferencial
ligado aos interesses do capital”.
32
sustenta o exército de reserva; 3) a produção capitalista encontra na cidade a viabilidade da
acumulação.
A dinâmica regional evidenciada pelos processos de conurbação e de aglomeração
revela que é importante elucidar cada uma dessas categorias, as quais representam uma
conexão e interação entre, ao menos, dois municípios, podendo se apresentar crescente diante
de um aumento de escala.
O processo de conurbação
7
retrata, basicamente, a união ou junção de duas malhas
urbanas, transformando-as numa única, a qual pode ser percebida como sendo uma cidade que
se estende sobre dois municípios. Não obstante, a existência de uma delimitação muito clara
na ordem política é determinante para a gestão do território. Além disso, essa delimitação
resgata a condição legal da existência de duas cidades, muitas vezes completamente desiguais,
chegando a representar uma contradição, pelo fato de a proximidade física revelar uma
enorme distância socioeconômica.
No Brasil, temos muitos casos de conurbação. Eles são muito comuns nos grandes
centros ou áreas metropolitanas, mas também ocorrem, em grande número, no seu interior dos
estados. Como exemplos de conurbação podem-se citar, dentre outros: no Paraná: Maringá
com Sarandi e Londrina com Cambé; em São Paulo: Campinas com Hortolândia, São José
dos Campos com Jacareí e Sorocaba com Votorantim; em Minas Gerais - Ipatinga com
Coronel Fabriciano; no Ceará: Juazeiro do Norte com Crato. Com efeito, algumas dessas
conurbações se estendem por mais cidades, as quais não foram citadas, como é o caso de
Campinas, pólo de um conjunto urbano formado por 5 processos de conurbação pela rodovia
Anhanguera, no sentido Limeira, envolvendo as cidades de Sumaré, Nova Odessa, Americana
e Santa Bárbara do Oeste.
Para Souza (2003, p. 32):
“(...) as cidade, muito freqüentemente, situam-se tão próximas umas das outras
que a interação entre elas vai, à medida que crescem e se relacionam mais e mais entre si,
sofrendo uma transformação importante. Com o tempo, já não se trata mais, apenas, de
que os bens produzidos em uma são vendidos na outra, ou de que os habitantes de uma
buscam certos serviços mais especializados na outra, ou, ainda, de que eventuais
7
Conurbação: termo criado pelo escocês Patrick Geddes (1854 – 1932), significa o resultado do “encontro”de
dois ou mais tecidos urbanos em expansão. Nesse caso, mesmo que os limites formais entre dois municípios
permaneçam, não há mais descontinuidade de tecido urbano edificado entre eles, pois os seus núcleos urbanos
principais cresceram até se tocarem e formarem uma verdadeira coalescência, uma mancha única de espaço
construído. (SOUZA, 2003, p. 169)
Diz-se quando duas ou mais cidades fundem-se num único tecido urbano. Termo criado pelo biólogo e sociólogo
escocês Patrick Geddes, que previu no início do século XX o espraiamento horizontal e a fusão de cidades.
“Precisamos criar um novo nome para definir essas cidades-regiões. Não podemos chama-las de constelação;
conglomerado soaria mais apropriado, mas que tal conurbação?, propôs ele em 1915. (MORENO, 2001, p.137)
33
instituições político-administrativas, legislativas, judiciárias, religiosas ou militares,
sediadas em uma, exerçam seu poder também sobre outra. O que vai ocorrendo é que elas
se situam tão próximas e os vínculos entre elas se tornam tão imensos que certos fluxos
passam a “costurá-las” muito fortemente e, no fundo, elas passam a existir como se
fossem uma só, ao menos sob vários aspectos. No caso, o fluxo mais significativo é o de
trabalhadores assalariados, que residem em uma cidade e trabalham em outra: é o que se
chama de movimento pendular diário (local de residência local de trabalho local de
residência), ou commuting em inglês. Em algumas situações, são os próprios tecidos
urbanos de uma e de outra que, dado momento, se encontram e se juntam; tem-se, então,
o fenômeno da conurbação
. A partir daí, está-se diante de uma única mancha urbana,
ainda que espraiada por dois ou mais municípios – o que significa que, formalmente,
continuam existindo várias cidades, cada uma sede de um município diferente”.
De acordo com George (1983), se a cidade com seus satélites espontâneos ou
planejados retratar uma conurbação, a sua periferia interdependente denuncia um verdadeiro
aglomerado.
“(...)os critérios mais comumente usados são vários, tais como a
continuidade de espaço construído, a importância quantitativa da população das áreas
suburbanas – utilização de um critério numérico para distinguir as áreas urbanas das áreas
rurais – a distribuição da população ativa entre os setores de atividade profissional e, mais
especialmente em benefício dos setores de atividades de tipo urbano (indústria, comércio,
atividades administrativas), o exercício da profissão do chefe de família ou de vários
membros da família em uma localidade que faz parte incontestavelmente do aglomerado
urbano ou da própria cidade central, a participação para o crescimento da população do
conjunto urbano e, particularmente, a aceleração deste crescimento, a presença de
construções tipicamente urbanas. Toda tentativa para adotar um critério sintético
fracassou”
(GEORGE, 1983, p. 83).
É importante enfatizar que, para considerar a aglomeração legítima, não é preciso
cumprir-se uma continuidade urbana. Segundo o material “Caracterização e tendência da rede
urbana no Brasil”, produzido em parceria entre o IBGE (Instituto de Brasileiro de Geografia e
Estatística), a Unicamp/IE/NESUR (Universidade Estadual de Campinas) e o IPEA (Instituto
de Pesquisa em Economia Aplicada) no ano de 1999, tem-se como exemplo de aglomerado
descontínuo de Cascavel com Toledo (eqüidistantes 37 quilômetros), no Paraná.
Deste modo, a aglomeração urbana retrata uma forte conectividade econômica,
cultural e social, entre duas ou mais cidades, sem necessariamente elas se apresentarem
conurbadas. Assim, o aglomerado pode se perfazer num continuum urbano ou mesmo por
uma descontinuidade urbana.
Fortalece-se o argumento ao se utilizar a contribuição de Souza (2003, p. 32-3),
no que se refere a aglomeração urbana:
34
“Uma aglomeração urbana se forma quando duas ou mais cidades passam a
atuar como um “minissistema urbano” em escala local, ou seja, seus vínculos se tornam
muitíssimo fortes, no sentido acima exposto. Em várias situações, tem lugar também uma
conurbação, embora não seja necessário que isso aconteça para se estar diante de uma
aglomeração. O importante é que nenhuma das cidades envolvidas pode ser muito grande,
a ponto de satelitizar completamente as demais à sua volta e possuir uma área de
influência regional (ou, às vezes, nacional e internacional). Aglomerações se compõem,
tipicamente, de duas ou mais cidades médias e pequenas”.
Em síntese, quanto a uma aglomeração urbana, esta melhor se identifica quando
existe um alto nível de interdependência, pautado num intenso fluxo de pessoas entre dois
núcleos urbanos (independentemente de haver conurbação), decorrente de uma mobilidade
relacionada ao trabalho, ou seja, de um deslocamento residência-trabalho-residência. A
mobilidade pendular exercida no campo do consumo também é legítima de uma
interdependência.
Deste modo, segundo Smith (apud IMAY, 1993, p. 13):
Se a escala urbana enquanto tal é a expressão necessária da centralização
do capital produtivo, os limites geográficos à escala urbana (que não se deve confundir
com os limites administrativos de uma cidade) são determinados em primeiro lugar, pelo
mercado de trabalho local e pelos limites ao deslocamento diário para o trabalho”
.
Sob a ótica da gestão, a cidade-pólo age como a mais influente nas diretrizes
tomadas, “distribuindo” empresas, empregados e desempregados para os municípios do seu
entorno. Nesse contexto, George (1983, p. 77-8) salienta que:
“À unidade da cidade opõe-se a multiplicidade da periferia. Há formação de
zona periférica cada vez que uma cidade, cercada de aldeias suscetíveis de servirem como
germes de urbanização, espalha uma parte de suas atividades e de sua população sem
tomar a iniciativa de uma unificação da gestão e da organização do conjunto urbano daí
resultante. Cada localidade da periferia, mesmo tendo a personalidade jurídica de uma
circunscrição em pleno exercício, com sua municipalidade, sua competência própria em
matéria de serviços públicos, de finanças, em certos casos mesmo de polícia, não é senão
uma fração da cidade no sentido em que ela só possui uma parte das atribuições da
cidade: uma atividade industrial, ou a função de moradia, às vezes mesmo uma função de
lazer (local de distração, de estada, de fim-de-semana e de férias)”.
A cidade, na sua percepção mais próxima do conceito de espaço urbano superando
a delimitação política, se estende por vários municípios, ao se perfazer por uma continuidade.
Isso denota a necessidade de uma gestão integrada.
Falar da cidade é permear uma extrema complexidade, principalmente no que se
refere ao urbano na atualidade, devido à forte tendência de homogeneização da forma de vida
viabilizada pelos meios de comunicação, mais especificamente pelas tecnologias, as quais
35
reduziram o espaço de relações ao campo virtual, com condição de se realizar em quase todo
o globo como facilitador do “contato humano”, o que se traduz em relações artificiais.
Dessa forma, em decorrência do crescimento urbano, primeiramente promovido
pela dinâmica produzida pelo centro hegemônico, o qual facilita o surgimento de uma
sociedade industrial capitalista em determinadas regiões do globo, manifesta-se o caos na
cidade. Esta apresenta como peculiar a existência de bairros inteiros carentes de infra-
estrutura e serviços necessários como transporte, abastecimento de água, esgotos, iluminação
36
meio da sua territorialização, em que a terra se apresenta como mercadoria, a qual se vincula a
um processo de especulação no intuito de se auferir uma maior renda.
“Quando pela lógica de crescimento da cidade algum elemento ou setor da
mesma desenvolve a possibilidade de abrigar usos que permitem a obtenção de elevados
valores de troca, então o capital trata de apropriá-lo e transformá-lo, ainda que seu valor
de uso seja elevado, ou seja, que preste um serviço para a população”
(Bellido e
Tamarit apud LEITÃO, 1999, p. 40).
Conforme elucida Corrêa (2002), os proprietários dos meios de produção se
revelam como grandes consumidores da cidade, justamente pela dimensão de suas atividades,
no intuito de satisfazer uma necessidade de localização industrial ou comercial e de auferir
mais-valia decorrente da utilização de uma ínfima parcela do espaço urbano. Não pertence a
seus interesses a especulação fundiária, devido ao fato de esta retratar uma valorização da
mercadoria (terra) por meio da sua retenção, que promove uma escassez da oferta,
impossibilitando obter o espaço necessário para a instalação de sua estrutura física.
De acordo com Corrêa (2002, p. 15),
“... os proprietários de terras atuam no sentido de obterem a maior renda fundiária de suas
propriedades, interessando-se em que estas tenham o uso que seja o mais, remunerador
possível, especialmente uso comercial e residencial de status. Estão particularmente
interessados na conversão da terra rural em terra urbana, ou seja, tem interesse na
expansão do espaço da cidade na medida em que a terra urbana é mais valorizada que a
rural. Isto significa que estão fundamentalmente interessados no valor de troca da terra e
não no seu valor de uso”.
A transformação de espaço rural em urbano permite ao proprietário fundiário
obter uma renda absoluta da terra (maior do que se a vendesse como um único lote - sítio,
chácara, ou fazenda -, ou se nela produzisse), justamente pelo fato de o fracionamento do solo
urbano proporcionar um preço maior do que o seu valor real, como elucida Leitão (1999).
Na concepção de Azevedo (apud LEITÃO, 1999), a especulação se apresenta
como um obstáculo ao desenvolvimento da produção capitalista de imóveis, devido a sua
indispensável presença neste processo. É sempre requisitado um novo espaço à medida que se
identifica oportunidade de lançamento de novos empreendimentos, levando a uma disputa
pelo solo urbano. Justamente pelo seu caráter monopolístico, os proprietários fundiários
obtêm uma renda da terra por meio da valorização decorrente do aumento da demanda, ou
seja, da especulação imobiliária.
37
Para efetuar essa transição da terra como meio de produção rural para lotes
urbanos (residenciais e comerciais), assim como a construção de um complexo comercial, na
maioria dos casos necessita-se de um promotor imobiliário para realizar os empreendimentos.
Para Corrêa (2002, p.19-20), por agentes produtores do espaço urbano entendem-se as
operações relacionadas a seguir:
a) incorporação, que é a operação-chave da promoção imobiliária; o incorporador
realiza a gestão do capital-dinheiro na fase de sua transformação em mercadoria, em
imóvel;
b) estudo técnico, realizado por economistas e arquitetos, visando verificar a viabilidade
técnica da obra dentro de parâmetros definidos anteriormente pelo incorporador e à
luz do código de obras;
c) construção ou produção física do imóvel, que se verifica pela atuação de firmas
especializadas nas mais diversas etapas do processo produtivo; a força de trabalho
está vinculada às firmas construtoras;
d) comercialização ou transformação do capital-mercadoria em capital-dinheiro, agora
acrescido de lucros: os corretores, os planejadores de vendas e os profissionais de
propaganda são os responsáveis por esta operação;
e) financiamento, ou seja, a partir da formação de recursos monetários provenientes de
pessoas físicas e jurídicas (agentes financeiros), verifica-se, de acordo com o
incorporador , o investimento visando à compra do terreno e a construção do imóvel.
Nesse contexto, percebe-se a dinâmica existente entre os produtores do espaço
urbano quando os papéis de um agente não se restringem à sua “principal” função. Por
exemplo. Os agentes financeiros se apresentam, na maioria das vezes, como promotores
imobiliários, ao investirem capital próprio para auferir um maior retorno em relação ao custo
de capital investido. Tal retorno é perceptível por meio de um planejamento estratégico, o
qual analisa a viabilidade financeira e a aceitação de mercado do empreendimento. Por outro
lado, o agente financeiro também se revela como parte das instituições financeiras, as quais
viabilizam os negócios propostos pelos incorporadores e se constituem, em grande parte, de
bancos públicos, como a Caixa Econômica Federal; o que caracteriza o Estado como um
agente financeiro.
O Estado tem como maior função regulamentar a gestão da ocupação do solo
urbano por meio da legislação urbanística, no intuito de produzir uma cidade melhor
distribuída e detentora de infra-estrutura e serviços prestados à população, sistema viário, etc.,
além de estabelecer junto à comunidade a cidadania para todos.
Apesar disto, Mendes & Negri (1998, p. 72) acreditam que “o estado age de
diversas formas no espaço urbano. Sua capacidade transformadora é basicamente usada com o
objetivo de favorecimento das classes ou grupos dominantes”.
38
Por prevalecer um jogo de interesses entre o Estado e os detentores de capital,
Ferreira (apud MENDES, 1992, p. 41) elucida: Não se entende o Estado de forma idealista,
que paira sobre a sociedade, disposta a resolver os problemas. Adotando-se uma postura mais
crítica, entende-se o Estado como representação das classes ou classe dominante,
constituindo-se num instrumento de divisão de classes dominadas.
Assim, o Estado pode atuar diretamente como grande industrial e consumidor de
espaço e de loc
39
de mudar-se e buscar outras áreas em desenvolvimento para retomar uma posição de
minimização dos custos diante da instalação da estrutura física industrial, sendo esta
compensadora em relação a outras condicionantes.
O fato de as empresas que se estabeleceram na região do ABC paulista estarem
hoje migrando para outras regiões constitui-se como uma busca por aproveitar os incentivos
fiscais e isenção dos impostos oferecidos pelo estado e município, dentre outros fatores.
Os velhos barracões industriais que retratam o espaço urbano se transformam em
shoppings centers, centros de convenções, hipermercados, mudando a paisagem e
revitalizando a economia local. A localização de um empreendimento numa determinada
região a beneficia e acarreta valorização dos imóveis, aumento das taxas públicas e impostos
cobrados pelo município. Essas conseqüências,, por sua vez, causam aumento do custo de
vida, mais precisamente um maior custo de moradia que o habitante local tem de despender.
Há que se considerar também a mobilidade social da força de trabalho que se
reproduz nas economias periféricas. O aumento do custo de moradia necessário para habitar
regiões que se valorizam levam as populações menos favorecidas a uma situação de
mobilidade. Essas pessoas terão que se mudar para outra região da cidade, mais periférica e
destituída dos recursos disponibilizados à região receptora do empreendimento. Os
moradores expulsos, afirmam Rocha e Guerra, irão engrossar a lista daqueles que vão, por não
disporem unicamente de um salário que lhes permite pouco mais do que a reprodução de sua
própria força de trabalho, ocupar periferias operárias dessas cidades (LEITÃO, 1999, p. 41).
Com os investimentos em infra-estrutura urbana nos bairros originários de
loteamentos periféricos, o poder público beneficia, quando não a si mesmo, os detentores de
terrenos ou áreas que se revelam como reserva de valor, por meio dos mencionados recursos
urbanos ligados à infra-estrutura e serviços, que obrigatoriamente têm de passar pelos vazios
deixados em meio à cidade. Segundo Corrêa (2002), tais loteamentos se iniciam na
ilegalidade, descumprindo a legislação urbana em vigor, mas em pouco tempo são legalizados
e conseguem melhorias (infra-estrutura e serviços), devido à pressão popular, o que acarreta a
valorização fundiária inclusive dos terrenos pertencentes aos proprietários fundiários que se
situam entre o loteamento e o espaço urbano contínuo.
Na periferia, cumprirão um importante papel no sistema de produção
imobiliária: o de colonos de áreas até então desocupadas, que se valorizarão na medida
em que forem implantados, ao longo do tempo, os diversos equipamentos de consumo
coletivo, atraindo, por esse motivo, estratos de renda mais elevada e assegurando grandes
40
lucros na comercialização dos terrenos estocados pelo promotor imobiliário” (LEITÃO,
1999, p. 41).
Na busca de valorização do tecido urbano, os agentes produtores deste espaço
(re)produzem uma dinâmica que tem o intuito de acumular capital. Ao mesmo tempo o Estado
regulamenta a ocupação do solo urbano por meio da legislação em vigor, tendo em vista um
desenvolvimento melhor estruturado do território. Também disponibiliza programas
habitacionais, construindo casas populares e loteamentos periféricos, aproveitando-se da
flexibilização e fragilidades das legislações dos municípios.
“A existência de uma demanda solvável saturada e de uma não-solvável
insatisfeita explica o interesse do capital imobiliário em obter ajuda do Estado, de modo a
permitir tornar viável a construção de residências para as camadas populares: créditos
para os promotores imobiliários, facilidades para desapropriação de terras, e créditos para
os futuros moradores. A criação de órgãos, como foi o caso do Banco Nacional da
Habitação (BNH) e das Cooperativas de Habitação (COHABs), e a criação de
mecanismos jurídicos e financeiros, como o Fundo de Garantia por Tempo de Serviços
(FGTS), visam viabilizar a acumulação capitalista via produção de habitações, cujo
acesso é agora ampliado”
(CORRÊA, 2002, p.23).
Esta contradição reflete uma sustentação da desigualdade, “empurrando” a classe
trabalhadora para a periferia, ao passo que sustenta a valorização da terra, atendendo aos
interesses dos agentes produtores do espaço urbano e detentores de capital, os quais lucram
por meio da reserva de valor.
Nessa perspectiva, Corrêa (2002, p. 26) assim se expressa:
A atuação do Estado se faz, fundamentalmente e em última análise, visando
criar condições de realização e reprodução da sociedade capitalista, isto é, condições que
viabilizem o processo de acumulação e a reprodução das classes sociais e suas frações.
Tendo em vista estes propósitos o Estado capitalista cria mecanismos que levam à
segregação residencial e à sua ratificação. Assim, os diferenciais de imposto territorial e
predial são um forte discriminante, afetando o preço da terra e dos imóveis e, como
conseqüência, incidindo na segregação social”
.
A segregação urbana mais acentuada e perceptível desde o início da década de
1990, quando se iniciou forte expansão de condomínios na periferia, divide espaços com
áreas degradadas que mencionam uma situação de exclusão, embora totalmente incluída, o
que simboliza o outro extremo do desenvolvimento desigual e combinado. Essa segregação
configura a situação do Brasil atual, o país dos desempregados, do setor informal e do tráfico.
Essas mazelas advêm principalmente da mobilidade funcional que sofreu o trabalho, e da
41
moradia, integrante do mercado imobiliário, totalmente submetido às especulações (que
favorecem o acúmulo de capital para os incluídos entre os beneficiados pelas políticas que
prevalecem) e aos programas de habitação promovidos pelo Estado.
Existe uma dinâmica inerente ao sistema capitalista, instaurada no mercado
imobiliário, pelo qual perpassa uma grande parte dos recursos financeiros, legitimada pelos
agentes produtores do espaço urbano. Essa dinâmica imobiliária se desenvolve por meio do
acúmulo de capital auferido pela renda da terra e consolidado pela valorização do espaço
urbano produzido.
Sendo assim, o desprovido de recursos financeiros se insere no espaço urbano de
uma forma perversa, sustentada pela ilegalidade produzida por ele (barracos ou favelas
construídas em espaços públicos) ou pelo Estado - por meio de conjuntos habitacionais, ou
por loteamentos periféricos desprovidos de recursos urbanos coletivos, instaurando assim um
processo de expansão da periferia.
Enfim, os agentes produtores do espaço urbano se apresentam como um suporte
para a discussão proposta pela presente pesquisa. Tal suporte se prende à compreensão do
processo de periferização pela ótica da mobilidade do trabalho; porém se faz necessário
desenvolver uma reflexão com base nos agentes produtores do espaço urbano desigual,
retratando neste contexto a periferia.
1.5. A periferia que está à margem e/ou na margem do espaço urbano
Por não atender às necessidades básicas quanto a moradia para a sociedade que a
habita, devido à falta de infra-estrutura, a periferia se revela como um importante problema a
ser trabalhado e solucionado pelo Estado e pela sociedade.
O presente trabalho tem o propósito de retratar a periferia como um ponto da
cidade muito distante do seu centro econômico e como um espaço degradado ou que retrate
uma condição de pobreza em meio aos bairros melhor estruturados, ou até mesmo centrais,
sustentando-a numa ótica social. Nessa contextualização, constata-se que a periferia retrata a
marginalização social, podendo estar ou não situada na margem urbana.
Desse modo, é fundamental compreender o que é periferia, espacializando o
contexto social e retratando exatamente a camada da população mais desprovida de recursos
monetários. Assim, a periferia se traduz como um espaço em que impera a subcidadania,
42
decorrente de um pauperismo urbano, espaço que se revela como moradia dos que estão à
margem da sociedade.
Adentrando-se em um aglomerado urbano, percebe-se, em muitos deles, uma
paisagem conflituosa, na qual se insere a propriedade rural ou “vazios” em meio ao espaço
urbano ainda esparsamente ocupado. Esse espraiamento se articula pautado na ordem
capitalista de reserva de valor, ou seja, existe um propósito de retorno financeiro (via
especulação), fruto da valorização da terra, proporcionada pela infra-estrutura implantada.
Com efeito, o subúrbio é o retrato da mescla urbano/rural, por se encontrar ainda
num primeiro estágio de urbanização, ausente de um ordenamento, porém, retratando a esfera
urbana como expressão da vida e da rotina da população que o habita.
Para George (2003, p. 76-7),
O subúrbio é, originalmente, e judicialmente, o bairro suburbano que escapa
às taxações e obrigações da cidade, mas também de seus privilégios e de sua proteção.
Num período de grande expansão econômica e urbana ele perde, progressivamente, esta
característica para tornar-se pura e simplesmente uma zona de crescimento urbano. (...)
Sendo o posto avançado da cidade numa via de acesso, às vezes do outro lado do rio que
marca o limite da cidade, o subúrbio é um primeiro ponto de parada, um lugar onde se
concentram locais de hospedagem, entrepostos, oficinas que não puderam localizar-se na
cidade, ou por serem consideradas indesejáveis, ou porque os regulamentos das
respectivas corporações exigiam este afastamento. (...) No limite da cidade terminavam as
franquias, os direitos, privilégios reservados apenas aos citadinos e, às vezes também,
obrigações e limitações. De qualquer maneira o que estava fora da cidade era diferente, ou
mesmo estranho. E é com um sentido pejorativo que durante muito tempo se falou do
subúrbio”.
Toda essa porção - onde se intercalam o meio urbano e o rural - conhecida como
subúrbio, pelo fato de ficar à margem do espaço urbano, se revela como sua periferia. Cabe
salientar que o termo subúrbio não é o mais coerente à realidade brasileira, por se tratar de um
conceito adotado por autores europeus, que retrata teoricamente uma territorialização fruto de
uma dinâmica que não se reproduz no Brasil. No entanto, nesta passagem o que se busca
pontuar é que o termo periferia no âmbito do espaço urbano se refere a porção territorial que
se encontra na margem.
A periferia do espaço urbano no Brasil, seja ela de alta densidade ou baixa
densidade populacional, é habitada, em sua maior parte, pelos habitantes mais pobres, mesmo
que receba investimentos como grandes shoppings, condomínios residenciais, etc.
Há quem diga que a periferia se identifica por sua longa distância até um ponto
mais central, uma espécie de afastamento da riqueza; mas às vezes esta não nos parece a única
forma de identificá-la.
43
Segundo Ultramari e Moura (1994), não se pode quantificar apenas pelas
distâncias físicas, mas também pelas distâncias decorrentes das diferenciadas condições
sociais existentes entre o centro e a periferia. Há que se considerar que existem no espaço
urbano várias periferias e vários centros. Essa discrepância que impera entre essas duas
realidades é o maior retrato da diversidade que uma cidade pode produzir. Nesse sentido, é
fundamental incorporar ao termo periferia as áreas degradadas às margens do espaço urbano,
os pequenos bolsões de pobreza em meio à cidade, as favelas os e prédios abandonados
ocupados por “sem teto”.
Para Serpa (2001, p. 36), o termo periferia absorveu uma conotação sociológica.
O autor sustenta sua argumentação ao se basear em Paviani, para quem periferia “é o lugar da
existência de parcelas da população caracterizadas como de baixa renda. Diferenciam-se do
resto da cidade pela precariedade da configuração espacial”.
Desse modo, em referência à periferia, cabe percebê-la tanto pela ótica do espaço
urbano (localizar-se na margem) quanto pela ótica social (espaço degradado, em estado de
carência ou à margem da sociedade), entre as quais a segunda é dominante. Sendo assim, as
regiões não periféricas podem estar na margem, distante do centro, mas nunca em estado de
carência ou em degradação.
Não obstante, a periferia, como qualquer outro espaço urbano, é local de
reprodução da vida humana. Como elucida Carlos (apud SERPA, 2001, p. 37), “O espaço não
se (re) produz sem conflitos e sem contradições inerentes a uma sociedade de classes”.
Percebe-se a cidade capitalista muito segregada, produzindo espaços que
evidenciam a existência de diferentes classes sociais, resultantes das desigualdades e lutas
incessantes pela sobrevivência. Para Rolnik (1995, p. 141), “é a este movimento de separação
das classes sociais e funções no espaço urbano que os estudiosos da cidade chamam de
segregação espacial”.
Essa é a realidade que prevalece em todas as cidades, com dinâmicas distintas,
uma vez que o próprio capitalismo se estrutura por meio de um desenvolvimento desigual e
combinado. Na periferia isso não é diferente, embora nela prevaleça um estado de
pauperização, em detrimento da ordem urbana. Ou será que a periferia é uma forma de a
cidade se organizar?
Com efeito, é importante frisar que na periferia urbana brasileira se encontra um
ambiente degradado, no qual prevalece a população não detentora de recursos suficientes para
arcar com o custo de vida de outras regiões menos periféricas. Faz-se importante elucidar
44
novamente que o trabalho aborda a periferia urbana carente de recursos, serviços e/ou
condições de vida.
A segregação espacial retrata a luta pela ocupação do espaço urbano, a qual se
efetiva por uma relação de troca, ou seja, a terra, como mercadoria, passa a ser cedida, pelo
incorporador, em troca de um valor monetário. Desse modo, o preço da terra é determinante
para a composição de uma “classe” que se apodera de um determinado espaço e se contrapõe
(socialmente) a outra que ocupa um espaço menos valorizado e mais denso.
A menor valorização é fruto da ausência de infra-estrutura e equipamentos
urbanos, como asfalto, serviço de transporte coletivo, rede de esgoto, rede de energia elétrica
e água, ou mesmo da ausência de estabelecimentos comerciais e prestadores de serviços,
como farmácias e bancos, shopping centers, universidades, etc.
Quanto à densidade, primeiramente cabe elucidar que é decorrente de um maior
aproveitamento do todo loteado, mediante a subdivisão de uma área em pequenos lotes. Por
outro lado, a ocupação se densifica ainda mais quando os lotes ainda são subdivididos para a
construção de outras residências, abrigando mais de uma família.
Desse modo, embora haja outras formas de ocupação, a periferia carente, quando
produzida legalmente, viabilizando o acesso à camada mais pobre da população, constitui-se,
em sua grande maioria, de pequenos lotes, por se tratar de mercadoria que precisa ser
lucrativa. Num loteamento destinado à classe pobre, uma forma de auferir um maior retorno
do capital, quando investido, está na quantidade de terrenos a serem comercializados, devido
à pequena capacidade de pagamento da classe à qual se destinam. O interesse que prepondera
para o incorporador, ao realizar um loteamento destinado à classe pobre e que viabiliza a
inserção legal dessa classe à cidade, consiste em auferir uma valorização dos espaços vazios
deixados como reserva de valor. A própria dinâmica social e econômica da localidade e os
investimentos públicos cobrados pelo bairro carente constituído favorecem a valorização
destas áreas, que se tornam interessantes para um mais rentável investimento imobiliário.
Retratando essa perspectiva, a periferia pode ser apresentar baixa densidade
populacional, conforme menciona Corrêa (2002, p. 43): “As atividades aí localizadas ocupam
prédios baixos, sendo fortemente consumidoras de espaço: por isso a zona periférica do centro
estende-se por ampla área, o que é possível pelo fato de o preço da terra ser aí menos elevado
que o do núcleo central”.
Ultramari e Moura (1994, p. 154) escrevem:
45
“...uma característica padrão das periferias expressa uma baixa densidade de
ocupação do solo e uma alta velocidade de expansão para áreas novas e mais
longínquas. Um aumento de distância que eleva os custos sociais da urbanização,
comprometendo a eficiência das administrações públicas e criando áreas onde os
problemas da cidade se avolumam”.
A periferia é percebida e se constitui tanto com baixa como com alta densidade
populacional, dependendo da forma de sua expansão e da área de sua localização. Apesar de
se alojar densamente sobre o território, o todo periférico pode se configurar como uma região
de baixa densidade populacional, quando as pequenas aglomerações de casas se distribuem de
uma forma esparsa, deixando espaços vazios, não caracterizando uma contigüidade urbana.
Já nas densas regiões periféricas localizadas na margem do espaço urbano,
identifica-se uma crítica situação de mobilidade pendular desse contingente para o centro
dinâmico, quando inexiste um transporte eficiente e eficaz. O mercado popular local emprega
poucos habitantes do bairro periférico, justamente por constituir-se geralmente de
“microempresas”, muitas delas não legalizadas, fazendo parte da informalidade. Contata-se
também a ausência de rede de esgoto, água tratada e coleta de lixo.
Desse modo, segundo Rolnik (1995, p. 42),
“Existem setores da cidade onde o lixo é recolhido duas ou mais vezes por
dia; outros, uma vez por semana; outros, ainda, onde o lixo, ao invés de recolhido, é
despejado. As imensas periferias sem água, luz, esgoto são evidências claras desta
política discriminatória por parte do poder público, um dos fortes elementos produtores
da segregação”
.
A compreensão do ambiente urbano leva a perceber que a alta densidade
populacional exige infra-estrutura – transporte e saneamento básico, em particular – fazendo
com que as carências nesse âmbito tornem as condições de vida dos mais pobres adversas,
subumanas, principalmente nas grandes aglomerações urbanas.
“Periferias, no plural. Isto porque são milhares de vilas e jardins. Também
porque são muito desiguais. Algumas mais consolidadas do ponto de vista urbanístico;
outras acompanhamentos destituídos de benfeitorias básicas. Mas, no geral, com graves
problemas de saneamento, transporte, serviços médicos e escolares, em zonas onde
predominam casas autoconstruídas, favelas ou aluguel de um cubículo situado no fundo
de um terreno em que se dividem as instalações sanitárias com outros moradores: é o
cortiço da periferia. Zonas que abrigam população pobre, onde se gastam várias horas por
dia no percurso entre a casa e o trabalho. Lá impera a violência. Dos bandidos, da polícia,
quando não dos “justiceiros”. Lá é por excelência o mundo da subcidadania”.
(
KOWARICK, 2000, p. 43).
46
A periferia pode também se apresentar como pequenos espaços em meio à cidade,
os quais são assim percebidos por apresentarem, geralmente, alta densidade populacional. Os
referidos espaços geralmente estão localizados na região central das metrópoles brasileiras,
não compondo a realidade das cidades de porte médio, como Maringá. Nesse sentido, a
população que ali reside se isenta do alto custo de transporte e também do alto custo de
moradia praticado no espaço urbano legalmente construído. Pode-se perceber melhor a
referida periferia na foto logo abaixo.
FOTO nº 3. Periferia social: a margem está no centro. São Paulo – 2000
Fonte: BORGES, W. A.
A periferia também se apresenta no centro, legitimada pela ocupação de
prédios abandonados nas regiões mais antigas das cidades. Constatam-se, nos grandes centros,
edifícios de grande porte que servem de moradia para os sem-teto, e alguns prédios velhos
situados em ruas marginalizadas, os quais têm apartamentos alugados ou vendidos por um
preço inferior ao praticado em longínquos bairros, localizados na periferia urbana. Isso ocorre
porque esse ambiente se revela como degradado e desvalorizado por ali imperar o medo da
violência urbana, a falta de conservação e a marginalização social (campo de droga e
prostituição).
A favela localizada no morro é outro exemplo de periferia no contexto social e de
alta densidade. Muitas cidades litorâneas possuem ocupações em encostas e mangues que
denunciam um ambiente degradado. Essas ocupações viabilizam um menor custo de vida para
47
seus habitantes, já que, na maioria das vezes em situação de risco, estão geralmente bem
localizadas, servindo de morada para grande parte da mão-de-obra barata, como é o caso das
empregadas domésticas, pintores, pedreiros, zeladores, motoristas, garis, etc., e de um grande
contingente de desempregados.
Não obstante, as periferias revelam uma situação de carência, como reflexo de
uma cidade que vivencia um processo constante de deterioração, pelo grande crescimento
dessas áreas, aumentando cada vez mais as demandas por serviços localizados na região
central.
O processo de periferização, fenômeno típico do capitalismo, se estendeu para
além dos limites municipais dos grandes e médios centros urbanos brasileiros, constituindo,
por meio das conurbações entre cidades vizinhas (municípios limítrofes), alguns aglomerados
urbanos possuidores de uma dinâmica própria. Esse fato revela uma interdependência entre as
cidades que constituem tais aglomerados, originando verdadeiras metrópoles. Como bem
lembra Kowarick (2000, p. 13), isso se deve, sobretudo, à “maneira como os moradores e
trabalhadores se organizavam para enfrentar os desafios das cidades, no nosso caso,
caracterizados por intensa segregação e desigualdade”.
Os centros urbanos conurbados podem apresentar realidades distintas, situando-se
nos extremos da riqueza e da pobreza. O processo de pauperização da cidade-satélite, a qual o
presente trabalho se dedica a compreender, viabiliza o desenvolvimento segregado da cidade-
pólo. Nesse caso, a cidade detentora de capital gera uma ilusão de desenvolvimento regional,
ao concentrar-se uma grande porção de miséria ou pobreza na cidade-satélite. Assim, o pólo
regional se fortalece como tal por concentrar renda e empobrecer o mercado consumidor em
seu entorno; conseqüentemente, acaba mantendo relações intra-urbanas mais intensas, na
ótica econômica, deixando os municípios limítrofes à margem do desenvolvimento local.
Na foto nº 4, visualiza-se a região de fronteira entre os municípios de Maringá e
Sarandi, localizados no Norte Central do Estado do Paraná, os quais possuem populações de
288.465 habitantes e 71.392 habitantes, respectivamente, conforme dados de 2000, do IBGE
Apenas pelo visual, para quem não as conhece, é praticamente impossível saber onde está o
limite de município.
48
FOTO nº 4. Vista aérea da fronteira municipal de Maringá/PR com Sarandi/PR – 2003
Fonte: MARQUES, Renato César
ORG: BORGES, W. A., ROCHA, M. M.
Tratando-se de aglomerações urbanas que se estendem em mais de um município,
pode-se considerar periférica tanto uma região limítrofe da cidade central quanto as áreas
mais afastadas das cidades circunvizinhas, ou mesmo estas próprias cidades como um todo.
Segundo Capel (apud NEGRI, 2001, p. 72), a periferia que se localiza no
município central se denomina periferia interna, já as áreas periféricas localizadas nos
municípios adjacentes são denominadas periferia externa.
“Periferia (do latim periferia, e este do grego, levar ao redor), é o contorno
de um círculo, de uma circunferência. Sob o ponto de vista arquitetônico, o autor diz que
a periferia pode ser entendida como desenhar o contorno da cidade e produzir uma
configuração urbana determinada: circular concêntrica, linear, etc. , o que permitiria uma
distinção entre uma periferia interna – que está subjacente, quando se fala em bairros
periféricos – e uma periferia externa (cidades satélites)”.
Enfim, constata-se que a população destas regiões, em sua maioria, mora em
habitações precárias (favelas, cortiços e casas autoconstruídas em terrenos destituídos de
serviços públicos ou em regiões centrais degradadas) e sobrevive com uma baixa renda
monetária por mês, revelando um acentuado grau de pauperismo e precárias condições
urbanas de existência.
Com efeito, percebe-se a periferia como uma extensa área com ocupações
irregulares, desordenadas, esparramando-se horizontalmente sobre o solo, seja densa seja
49
esparsamente. Na maioria das vezes tais não contam com nenhuma infra-estrutura,
denunciando uma situação de “pobreza urbana” que se multiplica territorialmente com uma
considerável rapidez, de diversas formas.
Justamente por ser característica dos grandes e médios centros urbanos, a periferia
representa as regiões fronteiriças das cidades conurbadas ou aglomerações urbanas, as quais,
muitas vezes, formam uma verdadeira metrópole, reproduzindo um grande espaço urbano
segregado.
Por ser literalmente multiforme, o que caracteriza a periferia é o seu estado de
carência, o pauperismo das grandes e pequenas porções urbanas, decorrente da posição de
seus habitantes como incluídos de forma perversa e/ou marginalizados do sistema capitalista.
Para Rolnik (1995, p. 68):
“Assim, ao mesmo tempo em que para os equipamentos de saúde há o
indivíduo saudável, para a legislação urbana há a casa saudável, o bairro saudável. As
casas e bairros de nossas cidades só podem ser construídos se obedecerem a um certo
padrão, completamente adaptado à ocupação capitalista da terra e à micropolítica familiar
burguesa. A reprodução infinita do projeto-padrão na cidade reforça a norma. Assim, para
o planejamento urbano, as favelas e áreas de invasão, assim como os cortiços e os
quintais, são habitações subnormais. Geralmente, o que o planejamento urbano chama de
subnormal, a polícia chama de marginal e o povo em geral de má vizinhança, que
desvaloriza o bairro”.
A diversidade é contemplada por Souza (2003, p. 82-3), quando menciona que:
“...
a pobreza urbana se reveste de peculiaridades, tanto por conta de suas
formas de expressão espacial características (favelas, periferias pobres, áreas de
obsolescência), quanto por causa das estratégias de sobrevivência, legais e ilegais, que a
ela se vinculam (do comércio ambulante ao tráfico de drogas de varejo)”.
Periferia é o retrato da marginalidade social e urbana. Inclui-se no espaço urbano
de uma forma perversa, como representante de um extremo social, que nunca vê efetivados os
seus direitos.
Com efeito, a periferia se generaliza, na ótica social, por se encontrar à margem da
sociedade, sendo percebida como todo e qualquer espaço urbano degradado onde se constata
um estado de pauperismo. Dessa forma ela pode estar localizada na margem do espaço
urbano, mas não se pode afirmar que toda margem deste espaço retrate um estado de carência.
Embora a periferia seja marginal, nem sempre os que estão à margem social habitam a
periferia do espaço urbano.
50
1.6. Relação pólo-periferia
A distância entre o centro e a periferia do espaço urbano muitas vezes não respeita
os limites municipais. Periferias avançam em territórios de outros municípios, estando muito
mais próximas do centro de um aglomerado urbano - tanto fisicamente quanto em decorrência
da sua integração à dinâmica promovida por este - do que do pequeno centro existente na sua
sede municipal. Segundo Ultramari e Moura (1994), podem-se denominar estas áreas como
continuidades de uma grande mancha urbana.
Esse avizinhamento significa a coexistência de uma cidade que exerce o
papel de pólo com inúmeras outras que gravitam em torno dela, ou seja, seus municípios
vizinhos. No caso, a periferia da cidade pólo não se restringe a seus limites oficiais,
apenas inicia dentro deles. Vai além, invadindo os municípios que as circunvizinham,
seguindo os trajetos de infra-estruturas econômicas já instaladas (ferrovias, rodovias,
velhos caminhos) que passam a funcionar como indutores da ocupação para uso
urbano”(ULTRAMARI E MOURA, 1994, p. 40).
A periferia, enquanto limite de um espaço urbano, está, muitas vezes, além dos
limites do município polarizador, ou seja, à margem de um aglomerado urbano, o qual
abrange áreas sob a gestão de diferentes prefeituras. Frente a essa questão, a periferização
urbana está diretamente ligada à atração exercida pela condição de pólo conferida a uma
cidade central, podendo este processo ocorrer em um outro município vizinho. Desta forma,
uma periferia pode ser formada pela totalidade ou por parte de uma cidade conurbada à
cidade-pólo. Essa situação pode gerar um complicador quanto à gestão dos problemas. Por
essa razão, segundo Secco e Squeff (2001), não se pode discutir o assunto como se periferia
fosse um problema local. Na verdade, o município se apresenta limitado para gerir problemas
que extravasam a sua alçada, os quais se projetam para uma gestão regional, microrregional
ou metropolitana, dependente de recursos federais e estaduais, pelo fato de os municípios
arrecadarem quantias insuficientes para suprir a demanda de compromissos que lhes cabe
assumir.
A complexidade se expressa também quando se estuda uma cidade, devido à
existência de uma unidade urbana que apresenta um ambiente de diversidades. Formada,
muitas vezes, por vários municípios, na unidade urbana se refletem problemas do seu entorno,
podendo degradar as condições que se apresentam ao seu redor (MOAS, 2002).
No entorno de um pólo, além dos limites municipais, verifica-se em muitos
casos uma grande proximidade entre as sedes dos municípios ou distritos circunvizinhos, a
51
qual contribui para o processo de conurbação. Esse fenômeno decorre da produção da
periferia intermunicipal, configurando um aglomerado urbano de grande extensão. Nos
municípios adjacentes à cidade-pólo existe uma maior facilidade de se produzirem espaços
“urbanos”, em face da flexibilidade decorrente da inexistência de uma forte e eficaz
regulamentação (leis) da produção e uso do solo. A ausência de leis mais adequadas barateia o
loteamento, principalmente quando se compara esta realidade periférica às regiões que
possuam uma maior infra-estrutura ou sejam foco de maior interesse de especulação
imobiliária.
Estas áreas periféricas, as quais muitas vezes se apresentam como uma cidade,
tornam-se o destino das pessoas de baixa renda, já que o custo de vida é inferior ao da cidade-
pólo.
Em decorrência desta situação, a relação entre pólo e periferia denuncia uma
problemática produção desigual deste aglomerado urbano formado por dois ou mais
municípios. Quando esta pequena região se apresenta polarizada, ou seja, existindo apenas um
pólo econômico, financeiro e prestador de serviços, existe a tendência de este monopolizar a
arrecadação referente à comercialização de produtos, além de a geração de riquezas se
concentrar em uma pequena porção deste território, instaurando um desenvolvimento
desigual. Aquele município adjacente à cidade-pólo que acolhe a população que chega ao
aglomerado em busca de oportunidades geralmente não gera riquezas, ou seja, não arrecada o
suficiente para conseguir se autodesenvolver e gerar renda e melhor condição de vida para
seus habitantes.
Enfim, nessa relação, os malefícios são conseqüências da desordem e das
deficiências existentes no espaço urbano, fruto das relações sociais produzidas pela ordem
capitalista, a qual sustenta a desordem da desigualdade, da espoliação urbana, para beneficiar
poucos. Com efeito, nesse emaranhado urbano, o pólo acaba sendo o gerador da
marginalidade crescente (a expulsão dos trabalhadores) e instaurando um processo de
periferização no seu entorno. Este entorno pode ser composto por três categorias de cidade,
quais sejam: cidade-satélite, cidade-periferia ou cidade-dormitório.
1.7. Cidades-satélites, periféricas ou dormitórios
Dentro de uma abordagem hierárquica e funcional entre as cidades, constata-se
que estas se arranjam e cumprem diferentes papéis, os quais variam de acordo com o
52
tamanho, localização e dinamismo econômico, dentro de uma interação interurbana que
denota uma relação de interdependência entre os centros urbanos. Nessa relação podem-se
constatar três categorias de cidade que interagem com o pólo dinâmico, como já referido: a
cidade-satélite, a cidade periférica e a cidade-dormitório.
Pode-se afirmar que quanto maior é a cidade maior é também a sua condição de
oferecer serviços especializados, por possuir um maior mercado consumidor. Isso se torna
verdade quando o fator renda não se apresenta abaixo da média regional. Caso isso aconteça,
o tamanho continua a influir no potencial de centralidade de uma cidade, mas não se revela
determinante, podendo haver um centro urbano menor que se destaque como o pólo principal
por possuir uma maior renda em relação à cidade mais populosa.
Embora o tamanho de uma cidade, em alguns casos, não lhe confira a condição de
pólo, com muita freqüência encontra-se a cidade-pólo como sendo a maior cidade, tendo em
seu entorno as cidades-satélites, com as quais mantém uma relação de interdependência, como
já elucidado.
As cidades-satélites podem se configurar como um espaço dinâmico, embora
estejam submissas à cidade-pólo. Podem-se revelar tanto como produtoras de riquezas, quanto
como um espaço urbano que se encontre em um estado de pauperismo e ausente de infra-
estrutura, que dependa economicamente da cidade-pólo. Podem ainda ser a fonte de emprego
e renda, embora possuidora de um expressivo número de habitantes, suficiente para gerar-lhe
um dinamismo econômico, mesmo em meio à pobreza.
Deste modo, a cidade-satélite assim se caracteriza quando possui uma dinâmica
própria, a qual busca na cidade-pólo uma complementaridade, principalmente quanto aos
serviços mais especializados. O nível de dependência da cidade-satélite para com a cidade-
pólo varia de acordo com o perfil e função que cada cidade possui e assume.
Com efeito, em face das diferentes categorias de cidade, Niterói - RJ poderia se
enquadrar como cidade-satélite, mas, por esse município se apresentar dinâmico, portador de
equipamentos de saúde, educação, financeiros, culturais etc. de grande especialidade e
desenvolvimento, principalmente no contexto da realidade brasileira, perfaz, juntamente com
a região Centro-Sul do Rio, o núcleo polarizador. Cabe, de fato, nesse contexto, classificar
como satélite a cidade de São Gonçalo, a qual revela possuir uma subordinação ao Rio de
Janeiro, embora seja possuidora de certa centralidade.
É importante ponderar que uma dada cidade-satélite, num contexto regional mais
populoso e dinâmico, pode se apresentar portadora de um maior número de equipamentos
53
urbanos que exercem influência a centralidade e poderio econômico do que cidades-pólos
regionais de porções territoriais menos densas e dinâmicas.
Como outro exemplo, pode-se citar como cidade-satélite Sertãozinho - SP, no
entorno de Ribeirão Preto - SP, a qual disponibiliza uma gama de serviços e estabelecimentos
comerciais que sustentam uma demanda por produtos/serviços básicos, e também é
possuidora de um parque industrial, compondo assim o perfil de uma cidade que mantém
relações de troca com o pólo regional, configurando-se como um centro local, e não como
uma “periferia carente”.
George (1983, p. 81) elucida:
Ao contrário, a evolução espontânea de uma rede urbana regional, visando
a autonomia do mercado de trabalho de cada cidade, pode gerar um verdadeiro sistema de
cidades-satélites que recebem seu impulso de uma metrópole regional. A distribuição das
matérias-primas nos centros especializados de transformação, o financiamento dos
investimentos regionais concebidos na escala de um conjunto de cidades e não de uma
cidade e seus anexos imediatos, mesmo deixando para a cidade grande as instituições de
nível elevado no domínio econômico, administrativo, cultural (universidade, teatros,
museus, bibliotecas gerais), dão origem a uma combinação urbana particular. Os
elementos desta combinação são cidades-satélites e não núcleos periféricos, ainda que elas
tenham em comum com estes a origem dos germes da urbanização e sua situação fora do
limite administrativo da cidade principal”.
A cidade-satélite pobre tem como maior característica a condição de subcidadania,
por retratar um crescimento marginal à cidade-pólo, como uma espécie de periferia que
viabiliza a moradia para a população de baixa remuneração ou em estado de desemprego e
carência, por esta não poder arcar com os elevados custos de moradia da cidade mais
desenvolvida e polarizadora. Por outro lado, em nenhum momento esta configuração de
cidade se legitima por revelar uma condição satisfatória da saúde urbana e social, ou seja, por
possuir um poderio econômico e por cumprir, por parte do poder público, todas as
necessidades da população, sem auferir recursos conquistados, os quais não são garantidos
pelo direto adquirido. Essa dificuldade decorre da insuficiência de recursos próprios para
suprir suas necessidades.
Podem-se ter como exemplos de cidade-satélite pobre as cidades de Colombo, na
Grande Curitiba, e Sarandi, no aglomerado urbano de Maringá.
Com efeito, George (1983, p. 79-80) define periferia como
“... unidades urbanas incompletas, no sentido em que lhes falta um ou vários elementos
indispensáveis a uma cidade. Ou são as atividades de produção que estão ausentes ou o
comércio que está representando de maneira embrionária. De todo modo, as zonas
54
periféricas são desprovidas de quadros financeiros, administrativos, culturais, acima da
escala estritamente local. Elas são, então, reatadas organicamente, por laços
complementares, com a cidade, ou formam complexos arbitrados pela cidade e no interior
dos quais se efetuam trocas de produtos e de serviços. Estes laços se materializam por
deslocamentos diários de população ativa entre cada localidade de periferia e a cidade
principal, ou de uma zona periférica para outra”.
Dessa forma, percebe-se que, embora retrate realidades diferentes, a cidade-
satélite é incondicionalmente participante direta da dinâmica econômica e populacional no
contexto regional, e não se encontra à margem desta dinâmica, como uma cidade periférica.
A cidade periférica se configura geralmente como uma cidade pequena, a qual se
encontra num estágio de estagnação. Pode inclusive apresentar perdas consideráveis quanto
ao seu dinamismo econômico e sua população, não vivenciando um processo de
desenvolvimento local, mesmo no contexto de uma região em pleno desenvolvimento.
Com efeito, primeiramente, pode-se dizer que a cidade periférica apresenta uma
condição de precarização ou estagnação econômica, quanto ao dinamismo ou geração de
renda. Além disso, nela pode imperar, para grande parte de seus moradores, uma condição de
subemprego, de desemprego ou emprego informal, pela dificuldade de esse tipo de cidade se
desenvolver e gerar mais postos de trabalho, já que só pode contar com os parcos recursos a
que tem acesso por direito adquirido.
Como elucidado, a terceira categoria de cidade, a cidade-dormitório, se revela
quando a grande maioria de sua população economicamente ativa trabalha na cidade-pólo ou
em outras cidades vizinhas, ou seja, cidades no entorno do pólo.
Quanto à cidade-dormitório, pode ser percebida sob três aspectos ou condições,
em que impera a mobilidade física (movimento pendular). Quanto ao primeiro, ela é
percebida enquanto uma cidade que se configurou como um município dinâmico no contexto
da produção e comercialização agrícola, fruto de um desenvolvimento regional, mas que se
encontra numa condição de cidade-dormitório em decorrência de uma mobilidade do trabalho.
Tal condição é característica dos reflexos sociais e econômicos produzidos pela modernização
conservadora, que é melhor compreendida no capítulo 3. O segundo aspecto permeia o
contexto que caracteriza uma cidade possuidora de infra-estrutura urbana, “escolhida” por
uma elite ou “classe média” para instalar moradia, acreditando possuir nessa localidade uma
melhor qualidade de vida. O terceiro aspecto está na constatação de cidades-dormitórios que
revelam um estado de pobreza e ausência de infra-estrutura urbana, desde sua fundação.
Nestas se percebe tanto uma dificuldade da população local em encontrar emprego no próprio
55
município quanto de a população que trabalha na cidade-pólo viabilizar nesta sua inserção,
buscando-a como moradia.
A tabela n.º 2, logo abaixo, se propõe, no campo da hierarquização, revelar as
categorias de cidades que foram há pouco mencionadas.
TABELA nº 2. Cidades pólo, cidades satélites (cidade semi-autônoma, cidade dormitório e cidade periférica) à
luz da população, nº de empresas e população ocupada no setor formal
.
CATEGORIAS
População
(censo
2000)
I
Nº de
empresas
(1998)
II
II/I
%
Pop.
Ocupada no
setor formal
(1998)
III
III/I
%
Assalariados
ocupados no
setor formal
(1998)
IV
IV/III
%
Cidade Pólo
Maringá
Curitiba
288.653
1.587.315
12.645
71.375
4,38
4,50
82.067
658.123
28,43
41,46
62.494
547.173
76,15
83,14
Cidade Satélite
Marialva*
Campo Largo**
28.702
92.782
703
2.355
2,45
2,54
4.033
16.439
14,05
17,72
2.938
12.840
72,85
78,11
Cidade Dormitório
Paiçandu*
Campo Magro**
30.764
20.409
429
237
1,40
1,16
2.123
1.304
6,90
6,39
1.564
961
73,67
73,70
Cidade Periférica
Floresta*
Bocaiúva do Sul**
5.122
9.050
137
197
2,67
2,18
446
844
8,71
9,32
323
541
72,42
64,10
Fonte: IBGE (Censos 1998 e 2000)
Org: BORGES, W. A
* Cidades localizadas na Região Metropolitana de Maringá
** Cidades Localizadas na Região Metropolitana de Curitiba
Destarte, as categorias de cidade evidenciadas pelo quadro emergem das relações
geoeconômicas configuradoras de outras categorias que retratam a condição de dependência
entre ou dentro das aglomerações urbanas, conurbadas ou não, ou já regiões metropolitanas.
No intuito de atingir o objetivo proposto, após toda a elucidação das categorias de
análise diretamente ligadas ao conceito de cidade, destacando-se o de periferia, cabe partir
para a contextualização quanto à mobilidade centrada no trabalho.
56
2. MOBILIDADE CENTRADA NO TRABALHO
Cidade, termo por demais complexo, configura o espaço da ação do sujeito
político num coletivo “delimitado”. Tem-se no conjunto urbano a percepção das contradições
sociais pautada na ação do indivíduo cumpridor da sua função na sociedade, dando origem,
por meio da sua interação com o outro, à cidade como espaço histórico e de vivência em
completo movimento, à espera da sua negação como a expressão da desigualdade.
Com efeito, no ideário “da melhor sociedade”, a cidade poderia retratar o espaço
da vontade geral, o qual retrataria o “norte” para onde se guia e caminha o esforço de todos os
citadinos.
Porém, pode-se dizer que a cidade representa uma luta diária de indivíduos
políticos, os quais se subdividem entre os pertencentes à classe dos incluídos e os integrantes
da classe dos incluídos de forma perversa (embora nem todos assim se percebam), onde a
grande maioria caminha na busca dos seus ideais de vitórias que, em grande parte, acontecem
sobre outro alguém.
A cidade do capital acaba sendo metáfora de uma organização privada, já que,
por mais que cada um busque conquistar os seus objetivos, constata-se a existência de um
soberano, o qual procura guiar as ações dos indivíduos segundo seus próprios interesses, que
se traduzem no lucro.
O objetivo maior da cidade do capital é exatamente o lucro, auferido pela elite
capitalista habitante da “urbs”?
Para se obter uma resposta à questão, qualquer pessoa que realmente almeje
responder a ela de uma forma sensata não pode ficar presa a sua percepção inicial da
realidade, pois, como já dito, a cidade é um espaço coletivo, que representa uma sociedade de
indivíduos dividida em duas classes fundamentais, embora não percebidas por muitos: os
oprimidos e os opressores.
Desse modo, para que o propósito seja alcançado, caberá primeiramente uma
reflexão sobre a negação da contradição política x economia, porém de uma forma bastante
sucinta, apresentando-se posteriormente a discussão sobre a contradição capital x trabalho.
57
2.1. Economia política marxista
Sabe-se que o liberalismo não respeitou o ideal liberal lockeano e sucumbiu aos
interesses exclusivos do capital, em detrimento de questões civis, políticas e democráticas.
Desse modo, conforme argumenta Boron (2003), a tradição socialista pós-Marx insistiu na
existência de uma contradição entre a economia e a política, mais especificamente entre as
instituições financeiras da sociedade capitalista e as instituições políticas da democracia.
Neste contexto, conforme Boron, as instituições financeiras da sociedade estão à
parte da questão política.
Evidentemente, a economia, como reflexo das relações humanas - as quais
decorrem de um comportamento político - não pode se movimentar como ação no contexto
puramente econômico. Poder-se-ia dizer que os equívocos das previsões feitas por
economistas geralmente acontecem devido à não-consideração de questões sociais e políticas,
forças que não são externas à economia, pois esta resulta destas forças no contexto das
relações sociais.
Como disse Marx (1984, p. 101), “o concreto é a síntese de múltiplas
determinações, portanto unidade do diverso”. Neste contexto, Boron (2003, p.56) argumenta:
“No tocante à visão de totalidade, é conveniente recordar as observações que
George Lukás – em seu célebre História e consciência de classe – teceu a propósito de
sua crítica à fragmentação e reificação das relações sociais na ideologia burguesa. O
fetichismo característico da sociedade capitalista teve como resultado, no plano teórico, a
construção da economia, política, cultura e sociedade como se tratasse de outras tantas
esferas separadas e diferentes da vida social, cada uma exigindo um saber próprio e
específico e independente dos demais. Contra essa operação, sustenta Lukás, “a dialética
afirma a unidade concreta do todo”, o que não significa, porém, fazer tabula rasa com
seus componentes ou reduzir “seus vários elementos a uniformidade indiferenciada, à
identidade”
.
Desde o cerne do desenvolvimento do modo de produção capitalista, pode-se
perceber que as contradições sociais se apresentam como conseqüências do sistema liberal, as
quais são o aumento da pobreza, a permanência de problemas sociais e econômicos, como
jornada de trabalho (de quatorze a dezesseis horas) e a concorrência da mão-de-obra das
mulheres e crianças (ARANHA e MARTINS, 1986).
Com efeito, “O ideal democrático reaparece na história, com roupas diferentes,
ora no liberalismo, ora exaltado na utopia rousseauniana, ora nos ideais socialistas e
anarquistas” (ARANHA e MARTINS, 1986, p. 208). A propósito, a Revolução Francesa, que
58
se fez sob o lema de “Igualdade, Liberdade, Fraternidade”, não passou de uma revolução que
visava interesses burgueses, e não populares.
Dentro desta percepção das desigualdades, tem-se, no campo das teorias, a teoria
socialista contrapondo o discurso liberal, primeiramente com o socialismo utópico e depois
com o socialismo conhecido como científico, de Marx e Engels, com a publicação, em 1848,
da obra “O Manifesto Comunista”, dando vida ao pensamento calcado no materialismo
histórico. Essa obra é posterior às internacionais operárias (a primeira em 1864) e à Comuna
de Paris (1871), o que evidencia acontecimentos reveladores da existência, nesse momento
histórico, de uma mobilização de idéias em busca de uma nova ordem, que se apresenta como
crítica ao Estado Burguês (ARANHA e MARTINS, 1986, p.254).
Embora tenha sido escrito antes de sistematizar o materialismo histórico, “O
Manifesto Comunista” já trazia esse modo de perceber a história como movimento, pelo qual
Marx acreditava na mobilização dos operários diante de uma revolta provocada pela
consciência de pertencerem à classe oprimida (SEYMOUR-SMITH, 2002).
No século XX, uma escola alemã de Filosofia, a Escola de Frankfurt, elaborou
uma concepção conhecida como Teoria Crítica, na qual distingue duas formas da razão: a
razão instrumental e a razão crítica (CHAUÍ, 1998, p.50). Essa escola pregava que
“A razão instrumental é a razão técnico-científica, que faz das ciências e das
técnicas não um meio de libertação dos seres humanos, mas um meio de intimidação,
medo, terror e desespero. Ao contrário, a razão crítica é aquela que analisa e interpreta os
limites e os perigos do pensamento instrumental e afirma que as mudanças sociais,
políticas e culturais só se realizarão verdadeiramente se tiverem como finalidade e
emancipação do gênero humano e não as idéias de controle e domínio técnico-científico
sobre a natureza, sociedade e a cultura”
(CHAUÍ, 1998, p. 50).
Não obstante, Marx, no final do século XIX, voltado para a economia e a política,
defendeu a emancipação da consciência do indivíduo, ao argumentar que é uma ilusão de
liberdade o que a sociedade vivencia e o pensar (racional e livremente) e o agir do indivíduo
não retratam uma decisão genuína, não fazem parte da nossa maior individualidade, pois ele
acredita que o indivíduo está envolvido por um poder invisível, que o força a pensar como
pensa e agir como age (CHAUÍ, 1998). O poder invisível, na concepção de Marx, é a
ideologia
8
.
8
“A função principal da ideologia é ocultar e dissimular as divisões sociais e políticas, dar-lhes a aparência de
indivisão e de diferenças naturais entre os seres humanos. Indivisão: apesar da divisão social das classes, somos
levados a crer que somo todos iguais porque participamos da idéia de “humanidade”, ou da idéia de “nação” e
“pátria”, ou de idéia de “raça”, etc. Diferenças naturais: somos levados a crer que as desigualdades sociais,
59
Seu pensamento advém de uma visão crítica da posição de George Wilheim
Friedrich Hegel, que apresenta uma leitura otimista da função do trabalho, partindo da relação
de dominação que existe nesse contexto. O maior exemplo desse pensamento hegeliano se
encontra na sua obra “Fenomenologia do espírito”, de 1807, exatamente na passagem do
“senhor e do escravo”. A obra retrata a relação de luta entre dois homens, onde um deles sai
vencedor. O vencedor tinha o direito de matar o vencido, mas não consuma esse ato, por
preferir fazer dele um servo, aquele que é sujeito às vontades do senhor, tendo de realizá-la
fazendo aquilo que lhe é pedido. Por assim proceder, o senhor, nessa condição, se percebe
como uma pessoa incapaz de vencer a natureza, por nunca mais ter precisado trabalhar, e
assim acaba na dependência do servo. Dessa forma, Hegel argumenta que o trabalho liberta o
homem, e que nesta relação a liberdade é melhor percebida no servo do que no senhor
incapaz.
“E, se num primeiro momento a natureza se apresenta aos homens como
destino, será o trabalho a condição da superação dos determinismos: esta transcendência é
propriamente a liberdade. Por isso, a liberdade não é alguma coisa que é dada ao homem,
mas é o resultado da sua ação transformadora sobre o mundo, segundo seus projetos”
(ARANHA e MARTINS, 1986, p. 56).
Embora Marx sempre tenha acreditado na liberdade do homem ao exercer a
prática do trabalho, criticou o otimismo hegeliano frente à relação de trabalho, por acreditar
que o objeto produzido pelo trabalhador lhe é estranho e não lhe pertence. Com essa
argumentação Marx retrata o estado de alienação, pelo simples fato de o trabalhador acreditar
na liberdade, mesmo que na condição de submisso às técnicas.
De acordo com Chauí (1998, p. 170),
“A alienação é o fenômeno pelo qual os homens criam e produzem alguma
coisa, dão independência a essa criatura como se ela existisse por si mesma e em si
mesma, deixam-se governar por ela como se ela tivesse poder em si e por si mesma, não
se reconhecem na obra que criaram, fazendo-a um ser-outro, separado dos homens,
superior a eles e com poder sobre eles”
.
Segundo Aranha e Martins (1986, p. 60), “etimologicamente a palavra alienação
vem do latim alienare, alienus, que significa “que pertence a um outro”. E outro é alius.
Alienar é tornar alheio, é transferir para outrem o que é seu”.
econômicas e políticas não são produzidas pala divisão social das classes, mas por diferenças individuais dos
talentos e das capacidades, da inteligência, da força de vontade maior e menor, etc.” (CHAUÍ, 1998, p. 174).
60
Conforme foi exposto e já elucidado, sabe-se que a condição humana não é a de
centro de uma sociedade alienada, como se percebe até hoje. Desse modo, a ação do
indivíduo, no campo da generalização, está voltada para o acúmulo de capital. Quando não,
retrata a sua luta pela sobrevivência. A busca pela técnica ganha enorme mobilização, num
esforço que se justifica em trazer mais conforto à humanidade, mas que só se realiza por se
revelar lucrativo.
Nesse contexto, dentro da concepção do liberalismo mercantil, a ideologia aliada à
alienação assegura seu papel de “manter a ordem”, ou seja, faz com que a sociedade aceite
suas condições, principalmente a classe operária, que tende a se iludir com a possibilidade de
ascender socialmente algum dia, não percebendo as desigualdades gritantes produzidas pelo
movimento histórico, o qual é determinante na medida em que interfere na condição social e
divisão das classes.
Infelizmente, “a maioria acredita que o fato de ser eleitor, pagar as dívidas e
contribuir com os impostos já nos faz cidadãos, sem considerar as condições concretas que
fazem alguns serem mais cidadãos do que outros. A função da ideologia é impedir-nos de
pensar nessas coisas” (CHAUÍ, 1998, p. 174).
A esse respeito, argumentam Aranha e Martins (1986, p. 62) que, embora não se
queira assumir a posição ingênua de criticar a técnica, é preciso preocupar-se com a sua
absolutização. Observam então que “a técnica se torna o princípio motor, o homem se
encontra mutilado, porque é reduzido ao anonimato, às ‘funções’ que desempenha, e nunca é
um fim, mas sempre meio para qualquer coisa que se acha fora dele”.
Com efeito, sentir-se alienado é sentir-se ausente de si mesmo, ou seja, “algo
como se sentir estranho, sentir-se desvinculado dos seus próprios valores”, como define
Seymour-Smith (2002, p. 488). O próprio autor argumenta que “o trabalhador se sente
apartado do seu trabalho porque não pode contribuir, com ele, para a comunidade. E desse
modo ele é apartado de si mesmo”.
No contexto teórico da alienação, Chauí (1998, p. 172) apresenta a existência de
três tipos, quais sejam: alienação social, alienação econômica e alienação intelectual.
A primeira delas, a alienação social, é “o desconhecimento das condições
histórico-sociais concretas em que vivemos, produzidas pela ação humana também sob o peso
de outras condições históricas anteriores e determinadas”. Chauí revela ainda dois tipos de
eventos que são elucidativos a respeito da alienação social. O primeiro se dá quando o homem
não se reconhece como o autor do aparato onde encena a sua vida, ou seja, as relações
sociopolíticas e as instituições. Já o segundo evidencia que o homem acredita na sua liberdade
61
e é um verdadeiro agente de mudança de sua própria vida, independentemente das questões
históricas. Ou seja, ele dissocia as mudanças de todo movimento histórico da sociedade. “No
primeiro caso, não percebem que instituem a sociedade; no segundo caso, ignoram que a
sociedade instituída determina seus pensamentos e ações” (CHAUÍ, 1998, p. 172).
No segundo tipo de alienação, a alienação econômica, o indivíduo não se percebe
nos produtos que produz. Essa alienação está tanto na ausência de um significado na produção
quanto na compra dos produtos, no sentido de que os indivíduos aceitam a sua condição de
não poder obtê-los mesmo os tendo produzido. Nesta concepção o homem é desumanizado e
transformado em mercadoria.
A terceira alienação é a intelectual, a qual, como elucida Chauí (1998, p. 173), é
“resultante da separação social entre trabalho material (que produz mercadorias) e trabalho
intelectual (que produz idéias)”. No comportamento alienado, o indivíduo não percebe que
suas idéias são fruto de valores e opiniões condizentes com a sua classe social e espaço social
de convívio, sejam as pessoas com as quais relaciona, o ambiente em que trabalha, os
ambientes que freqüenta ou mesmo o bairro em que mora. O ambiente em que o indivíduo
está inserido é completamente influente na sua percepção do que é a sociedade para ele, ou
seja, passa a ser determinante para a formação da sua realidade.
Como disse o próprio Marx, “Não é a consciência que determina a existência; é a
existência que determina a consciência” (SEYMOUR-SMITH, 2002, p. 486). Isso retrata que
Marx acredita que o indivíduo é determinado pela sociedade, a qual se deixa guiar pela
ideologia, como já foi colocado.
Na concepção de Marx, o indivíduo vencerá esta alienação quando trabalhar para
si, ou seja, quando o seu trabalho não beneficiar apenas o capitalista e não se configurar como
uma mercadoria. O benefício tem de ser social, voltado para a autoconstrução como homem
ou mulher e, acima de tudo, precisa ter de fato um significado.
Com efeito, Marx, ao se contrapor a Adam Smith, acreditava que a sociedade
estaria livre da distinção de classes quando alcançasse a vitória sobre o cenário econômico e a
produção industrial. Na sua concepção, não é justo o operário continuar dependente da mais-
valia do capitalista. Conforme elucida Seymour-Smith (2002, p. 487), Marx profetizava que
“a acumulação do valor excedente, juntamente com a luta competitiva pelo mercado, acabaria
por derrubar o capitalismo”, e assim se alcançaria o céu. O céu a que ele se refere seria o
comunismo.
De acordo com Marx, os modos de produção são os que produzem as condições
materiais da sociedade, seja a produção em si seja no contexto de fazer parte dela, e, em
62
decorrência disso constitui-se a história. Desse modo a história passa a ser compreendida
como a passagem de um modo de produção para outro. Essas mudanças são fruto das
condições econômicas, sociais e culturais. Sendo assim, o homem (sozinho) não tem liberdade
de se decidir por um caminho a percorrer, pois de fato a produção o direciona a percorrer este
novo caminho, instaurando um novo contexto social. Poder-se-ia afirmar que somente a
consciência social tem o poder de mudar o atual sistema em si ou as prioridades que emergem
dele.
É equivocado pensar que o indivíduo é somente aquilo que deseja ser, pois ele
sofre influências diretas da estrutura social, da organização econômica e política e também de
valores culturais.
Com efeito, Chauí (1998, p. 176) argumenta: “Em lugar de invalidar a razão, a
reflexão, o pensamento e a busca da verdade, as descobertas da ideologia fizeram o sujeito do
conhecimento conhecer as condições – psíquicas, sociais, históricas – nas quais o
conhecimento e o pensamento se realizam”. E assegura, como disseram os filósofos
existencialistas acerca dessas descobertas: “Encarnaram o sujeito num corpo vivido real e
numa história coletiva real, situaram o sujeito. Desvendando os obstáculos histórico-sociais
para o conhecimento, puseram em primeiro plano as relações entre pensar e agir, ou, como se
costuma dizer, entre a teoria e a prática”.
Assim se pode perceber o diferencial humano, conforme elucida um pequeno
resumo das palavras de Aranha e Martins (1986, p. 03-5), logo a seguir:
“Os animais que se situam nos níveis mais baixos da escala zoológica de
desenvolvimento, como, por exemplo, os insetos, têm a ação caracterizada sobretudo
pelos reflexos e instintos. A ação instintiva é regida por leis biológicas, idênticas na
espécie e invariáveis de indivíduo para indivíduo. Essa rigidez dá a ilusão da perfeição
quando animal, especializando em determinados atos, os executa com extrema habilidade.
Não há quem não tenha ainda observado com atenção e pasmo o “trabalho” paciente da
aranha tecendo a teia. Mas esses atos não têm história, não se renovam e são os mesmos
em todos os tempos, salvo as modificações determinadas pela evolução das espécies e as
decorrentes das mutações genéticas. No entanto, mesmo quando há essas modificações,
elas continuam valendo para todos os indivíduos da espécie e não permitem inovações,
passando a ser transmitidas hereditariamente. É costume dizer que os instintos são
“cegos”, ou seja, são uma atividade que ignora a finalidade da própria ação”. (...) Quanto
ao trabalho humano, ao contrário, é a ação dirigida por finalidades conscientes, a resposta
aos desafios da natureza, na luta pela sobrevivência. Ao produzir técnicas que outros
homens já usaram a ao inventar outras novas, a ação humana se torna fonte de idéias e ao
mesmo tempo uma experiência propriamente dita. A partir dessas colocações, concluímos
que as diferenças entre o homem e o animal não são apenas de grau, pois, enquanto o
animal permanece envolvido na natureza, o homem é capaz de transformá-la, tornando
possível a existência da cultura”
.
63
Com essa citação, cabe fazer menção à seguinte frase, que encerra este item: “O
homem não é sempre o mesmo, pois o trabalho altera a visão que ele tem do mundo e de si
mesmo” Aranha e Martins (1986, p. 56).
2.2. Mobilidade centrada no trabalho e sua gênese
A mobilidade do trabalho instaura mudanças nas relações sociais pautadas no
modo de produção, ou seja, se reflete na passagem de um modo de produção para outro, ou
mesmo, de simples - porém, importantes - mudanças de comportamentos “espontâneos” ou
legais da prática do trabalho.
Antes de se adentrar na mobilidade em si, faz-se importante conhecer a sua
gênese, ou seja, a sua manifestação. A princípio, partindo-se da mais simples percepção, a de
que o homem faz parte da natureza, conclui-se que a primeira ação de produção surge do
contato da natureza consigo mesma, ou seja, uma prática originária de objetos naturais, sendo
uma delas a força humana. A natureza, neste contexto, passa a ter um valor de uso.
Como observa Schmidt (apud NEIL SMITH, 1988, p. 51), “Nessa interação
metabólica, a natureza fornece ao trabalho tanto seu Sujeito quanto seu Objeto – o trabalhador
(com suas capacidades naturais e uma intenção propositada) de um lado, e o objeto do
trabalho (o material a ser transformado), de outro”.
Com efeito, a natureza se encontra numa prática dialética na produção do homem,
já que este se apresenta ao mesmo tempo como sujeito transformador consciente da própria
ação e como a própria natureza. Desse modo, o homem acaba se autotransformando por
modificar a natureza, ou seja, a si próprio (ENGELS apud NEIL SMITH, 1988, p. 52).
Como observa Marx (apud NEIL SMITH, 1988, p. 86), “A natureza não produz,
de um lado, proprietários de dinheiro e bens, e de outro lado, homens que não possuem nada
mais do que sua própria força de trabalho”. Esta relação, no entanto, não tem fundamentos
naturais.
Ao homem foi vedado o desfrute da liberdade por causa do mau uso desta por
parte da classe burguesa. Desse modo, Marx elucida: “É certo que a mobilidade do trabalho
conduz a uma liberdade dos homens, mas aquela que significa a sua emancipação de modos
de produção anteriores (feudal). Cessa aí esta liberdade, pela mercantilização da sua
capacidade de trabalho, que o novo modo de produção impõe” (GAUDEMAR, 1977, p. 208).
Neste momento , ao introduzir o exercício de se compreender a mobilidade do
trabalho na concepção marxista, sobrevém a preocupação de retratá-la mais uma vez (por ela
64
já ter sido retratada por muitos outros praticantes da ciência) como um embasamento de toda
uma reflexão que paira no processo de periferização social e urbana, no alcance do objetivo
deste trabalho. Tal preocupação é fruto da crença de que a sociedade necessita mudar sua
condição de vida e de produção, colocando o homem no centro das ações sociais.
O trabalho é a grande ação do homem que lhe permite instaurar o movimento
histórico, o qual retrata transformações sociais e econômicas da humanidade. “A etimologia
da palavra trabalho vem do vocábulo latino tripaliare, do substantivo tripalium, aparelho de
tortura formado por três paus, ao qual eram atados os condenados, ou que também servia para
manter presos os animais difíceis de ferrar”. Percebe-se que nessa conceituação se justifica a
associação do trabalho com tortura, sofrimento, pena, labuta (ARANHA e MARTINS, 1986,
p. 56).
Não obstante, compreender a mobilidade centrada no trabalho por meio de uma
abordagem marxista é tecer uma análise crítica ao modelo capitalista, o qual se apresenta em
contradição aos ideais defendidos no seu início, com os iluministas
9
. É perceber a apropriação
do homem pelo capital, revelar a sua força de trabalho como mercadoria, instaurando outras
duas mobilidades, em decorrência desta submissão: a mobilidade social e a mobilidade física.
Para Rocha (1998), a mobilidade social é entendida como mobilidade vertical, a
qual interpreta a mudança de status social dos indivíduos em face de sua mobilidade entre as
classes sociais, de sua posição na estrutura de classes e do movimento de polarização destas,
estando ligada diretamente à mobilidade do trabalho. A contribuição teórica para esta
9
"Chamamos de Iluminismo o movimento cultural que se desenvolveu na Inglaterra, Holanda e França, nos
séculos XVII e XVIII. Nessa época, o desenvolvimento intelectual, que vinha ocorrendo desde o Renascimento,
deu origem a idéias de liberdade política e econômica, defendidas pela burguesia. Os filósofos e economistas que
difundiam essas idéias julgavam-se propagadores da luz e do conhecimento, sendo, por isso, chamados de
iluministas.
O Iluminismo trouxe consigo grandes avanços que, juntamente com a Revolução Industrial, abriram espaço
para a profunda mudança política determinada pela Revolução Francesa. O precursor desse movimento foi o
matemático francês René Descartes (1596-1650), considerado o pai do racionalismo. Em sua obra “Discurso do
método”, ele recomenda, para se chegar à verdade, que se duvide de tudo, mesmo das coisas aparentemente
verdadeiras. A partir da dúvida racional pode-se alcançar a compreensão do mundo, e mesmo de Deus.
As principais características do Iluminismo eram:
• Valorização da razão, considerada o mais importante instrumento para se alcançar qualquer tipo de
conhecimento;
• valorização do questionamento, da investigação e da experiência como forma de conhecimento tanto da
natureza quanto da sociedade, política ou economia;
crença nas leis naturais, normas da natureza que regem todas as transformações que ocorrem no
comportamento humano, nas sociedades e na natureza;
crença nos direitos naturais, que todos os indivíduos possuem em relação à vida, à liberdade, à posse de bens
materiais;
• crítica ao absolutismo, ao mercantilismo e aos privilégios da nobreza e do clero;
• defesa da liberdade política e econômica e da igualdade de todos perante a lei;
• crítica à Igreja Católica, embora não se excluísse a crença em Deus. "
Site: http://www.saberhistoria.hpg.ig.com.br/nova_pagina_31.htm
65
abordagem, referente à mobilidade, partiu dos sociólogos marxistas, que, por meio de uma
reflexão crítica à escola de estratificação social, de cunho funcionalista, construíram um
referencial teórico capaz de não reduzi-la a uma questão econômica.
“A idéia de mobilidade social nasce da escola de estratificação social norte
americano de cunho funcionalista. Em linhas gerais esta corrente entende diferenças
sociais como um processo natural e não histórico, na medida que parte da distinção,
avaliação e seleção dos indivíduos nas posições sociais que correspondam a melhor de
suas capacidades, existem uma fluidez entre os níveis sociais. Para PARSON (1955) a
fluidez é estreitamente correlativa do fenômeno de mobilidade social, aonde os
indivíduos podem circular com maior ou menor liberdade no interior do sistema de
posições sociais. Esta noção pressupõe a hierarquia das posições sociais excluindo todos
os outros princípios de diferenciação social. A crítica marxista argumenta que a
sociologia americana da estratificação social é determinada pela natureza individual dos
agentes. (...) A mobilidade na abordagem marxista é vista pela contradições entre classes
sociais. As classes sociais não existem em si, ela pressupõe uma relação, e esta é
contraditória, ou seja só existem classes no contexto de lutas de classes. (...) A
determinação estrutural de classe diz respeito à luta econômico-político-ideológica de
classe e estas lutas se exprimem pelas posições de classe na conjuntura”
(ROCHA in
Boletim de Geografia/UEM, 1999, p. 63).
Enfim, a mobilidade social perpassa por uma crítica referente à histórica produção
desigual que advém do sistema capitalista, a qual, de acordo com a sua evolução, legitimou a
suposta existência de duas classes sociais, que só existem enquanto uma contradição,
identificada pela luta de classes. Essas duas classes são constituídas, respectivamente, dos
detentores de capital e dos detentores da força de trabalho, os quais, por meio destas
configurações instauradas pela luta econômico-político-ideológica, adquirem uma identidade
social.
Percebe-se aqui a existência da contradição capital x trabalho num contexto de
luta de classes frente a questões econômicas e políticas. Para que se possa compreender
melhor esta contradição, se faz importante elucidar a mobilidade física e a mobilidade
centrada no trabalho.
Para Rocha (1998), a mobilidade física se subdivide em micromobilidade física e
a macromobilidade física. A primeira representa a mobilidade referente a uma dinâmica
populacional local, dentro de um determinado aglomerado urbano, por exemplo, num simples
deslocamento da casa para o trabalho, ou seja, deslocamentos diários ou corriqueiros que
refletem o movimento da população. A segunda condiz com este movimento populacional em
uma escala maior, representada pelas migrações (emigrações e imigrações), revelando-se uma
dinâmica não corriqueira a todos os indivíduos, já que corresponde ao deslocamento entre
66
países, estados, regiões e municípios mais distantes, os quais não se entrelaçam numa
dinâmica própria.
“São mobilidades horizontais, ou seja, se reproduzem no espaço concreto,
físico apresentando um perfil histórico-geográfico. Funda-se nos estudos migratórios a
partir de uma avaliação histórica de tais fluxos. A macromobilidade física diz respeito aos
deslocamentos físicos praticados pelos indivíduos em escala internacional, nacional,
estadual e municipal. Nesta categoria a temporalidade dos deslocamentos não é cotidiana,
diz respeito aos fluxos demográficos. Quanto a micromobilidade física, a escala temporal
é curta, cotidiana, diz respeito aos deslocamentos diários de casa ao trabalho, às compras”
(ROCHA, 1998, p.14)
Deste modo, a mobilidade física, no campo conceitual, retrata uma abordagem
qualitativa dos estudos migratórios, levando em consideração os pressupostos da acumulação
capitalista como fator extremamente relacionado ao estudo referente à mobilidade centrada no
trabalho.
A mobilidade centrada no trabalho se apresenta como o processo de
mercantilização da força de trabalho, sendo esta uma mercadoria, submissa ao capital
(geográfica e funcionalmente), explorada pelo capitalista na busca pela mais-valia,
justificando-se, juntamente com a luta de classes, como uma mobilidade forçada.
“É uma mobilidade horizontal, ou seja, o deslocamento se dá no âmbito da qualificação
dos indivíduos, de seu status profissional, da produtividade do trabalho, de sua submissão
à lógica capitalista de acumulação. Esta mobilidade nasceu da reflexão de economistas
marxistas. A explicação parte da contradição entre trabalho e natureza da apropriação
histórica da natureza pelo homem. Esta força de trabalho é entendida como uma
mercadoria especial que se desloca em função da dinâmica do mercado”
(ROCHA,
1998, p.14).
Deste modo, a mobilidade centrada no trabalho se expressa por meio da
contradição capital x trabalho, principalmente na submissão do trabalho ao capital, já que o
segundo, no contexto de sua acumulação, representa o objetivo maior da classe dominante.
Esta tem o poder de dominar a relação capitalista, em decorrência da falta de organização da
grande massa de proletários, que se configura na sociedade como uma força promotora de
acumulação, enquanto 9 Tw[(6luta de)]T 375.625 0 T003 Tc-05241 1.6dissa de en fat9(ado capilho. )- 0 69.36 -1.725 TD7.3291 TwCodo m(al, elucbilialhoabendoos, qtlaçãodo m)7.8,
67
que, aquilo que foi revolucionário e transformador, rompendo coma as estruturas rígidas
da organização feudal, tornou-se, no capitalismo, modo de opressão”
(ROCHA, 1998,
p. 32).
De acordo com Gaudemar (1977, p. 265), o trabalhador passa a ser livre “para se
vender apenas ao capital; e passa a ser móvel, por ser capaz de ir sozinho no mercado para se
vender e se submeter à exploração capitalista”.
Cabe lembrar que no início das relações capitalistas não existia ainda mercado de
trabalho, mas sim, para Gaudemar (1977), um momento particular de transação. O mercado
de trabalho só passa a existir de fato, segundo Marx, quando o valor de troca da força de
trabalho se apresenta como o fator mais importante da produção, ou seja, quando o aumentam
número de empresas e a quantidade de produção, juntamente com o mercado, necessitando de
um maior volume de mão-de-obra, gerando assim uma dependência.
Com efeito, o autor supracitado elucida a formação do mercado de trabalho na
seguinte passagem:
“O desenvolvimento do valor de troca, estimulado por meio do dinheiro
acumulado, pelo corpo dos mercadores, dissolve a produção orientada essencialmente
para o valor de uso imediato, assim como as correspondentes formas da produtividade,
relação de trabalho com as suas condições objectivas, e leva assim à criação de um
mercado de trabalho que é muito distinto do mercado de escravos”
(GAUDEMAR,
1977, p. 266).
No capitalismo, a classe proletária, como observa Neil Smith (1988), não é
privada só dos bens que produz, mas também de todo o instrumental para poder produzir.
Neste contexto, é com o salário pago em troca da força de trabalho que se consome que a
relação capitalista consolida o valor de troca da mercadoria trabalho. Esse valor é o único que
o trabalhador consegue extrair, por não possuir nenhuma outra fonte de renda.
Com efeito, contrapondo-se à especialização, Marx (1980) argumenta que as
forças intelectuais se desenvolvem no âmbito da gestão, enquanto na produção elas
desaparecem, em decorrência da divisão do trabalho que congrega a grande massa. No
entanto, a especialização, ao invés de emancipar o trabalhador, possibilitando-lhe conhecer o
todo, o aliena e o faz “refém” de um confinamento que consiste em fazê-lo operar sem ao
menos compreender no que resulta a sua própria ação. Tal embrutecimento do comportamento
humano, via racionalização do operador (fruto da divisão do trabalho), consiste em enriquecer
a produtividade e limitar o saber da totalidade do processo de produção, o que se revela como
uma fonte de poder. Neste contexto, “esta cisão desenvolve-se na manufatura, que faz do
68
trabalhador uma parcela de si mesmo; e completa-se na grande indústria, que faz da ciência
uma força produtiva independente do trabalho e a coloca dependente do capital” (MARX,
1980, p.26), onde impera a razão instrumental.
A diferença entre a manufatura e a produção industrial, de acordo com Borges
(2003, p. 63), é que na primeira “o ponto de partida para revolucionar o modo de produção é a
força de trabalho”, enquanto na segunda tal ponto se encontra no instrumental de trabalho.
Em complemento à afirmação acima, Marx elucida que “É com a grande indústria
que o capital subordina realmente os produtores diretos através de um organismo de produção
completamente objetivo e impessoal” (PIGNON & QUERZOLA, 1980, p.124).
Com o desenvolvimento das ciências, as empresas ganham um maior potencial no
que confere ao processo produtivo de seu conjunto de máquinas, que possibilitam uma
produção mais eficiente e eficaz, levando o operário a ganhar mobilidade nesse “chão-de-
fábrica”, já que ele não encontra dificuldades em operar diversos tipos de máquina. Desse
modo, de acordo com Marx (1980, p. 30),
“Como o movimento de conjunto da fábrica parte não do operário, mas da
máquina, o pessoal pode mudar constantemente sem que haja interrupção do processo de
trabalho. Prova evidente disso é o sistema de turnos aplicado na Inglaterra durante a crise
de 1848-1850. Enfim, com a rapidez com a qual as crianças aprendem a trabalhar com as
máquinas suprime a necessidade de formar especialmente classes de operários para esse
trabalho”
.
Como se percebe, a produção capitalista, geradora do valor e também da mais-
valia, domina o trabalhador com a anulação de sua individualidade, transformando-o na fonte
de energia adquirida para dar movimento à produção na manufatura. Já na indústria, para
operar as máquinas, não lhe é exigido nada além da sua função como apêndice da máquina,
que realiza grande parte do trabalho por ele realizado antes do desenvolvimento da
automação, deixando-o como coadjuvante no sistema produtivo e desvalorizando sua força de
trabalho.
Faz-se importante, de acordo com Gorz (1980, p. 83), esclarecer que nem a
tecnologia nem a divisão capitalista do trabalho tiveram seu desenvolvimento calcado na
eficácia produtiva em si, mas sim, na eficácia no contexto do trabalho alienado e forçado,
visando tão-somente maximizar a produtividade para o capital, e não atender também aos
interesses do detentor da força de trabalho. Isso retrata uma possível síntese desta
contradição, pela qual imperaria a negação da negação.
69
Com efeito, em vista dos novos meios de produção, o homem, que produzia para a
simples subsistência, é incorporado pelas indústrias, que passam a tratá-lo como mercadoria
necessária para garantir sua lucratividade, já que a remuneração paga ao trabalhador (valor de
troca) é menor do que o valor que este produz para o detentor de capital (valor de uso).
Quando Marx elucida a questão dos valores de uso e de troca, revela suas
características de mercadoria, e acrescenta uma terceira, ou seja, a sua presença (mercadoria)
no mercado.
Percebe-se no discurso de Marx (apud DRUCKER, 1999) que a exploração na
sociedade capitalista era oculta e mascarada. Neste caso, sabe-se que ele se baseou na teoria
do trabalho elaborada por um dos principais representantes da economia política clássica,
David Ricardo (1772 – 1823). Para Ricardo (apud DRUCKER,1999), o custo da produção
determina o valor dos bens. Assim, uma determinada mercadoria terá um valor maior ou
menor em função da quantidade de trabalho socialmente necessária à produção desta; ou o
número de horas gastas na sua produção, em última instância, é que determina o valor dessa
mesma mercadoria.
Deste modo, como já elucidado, o trabalhador vende sua força de trabalho (para
subsistência) caracterizada como mercadoria para a produção de outras mercadorias, as quais
possuem um valor de troca contabilizado pelo tempo e trabalho empregados. Segundo Marx
(apud ROCHA, 1998), o valor de troca representa o total de trabalho socialmente despendido
para a produção de uma determinada mercadoria, revelando-se como uma despesa da força
humana medida por meio do fator tempo necessário para a produção. Em decorrência disso,
pode-se afirmar que a força de trabalho é uma mercadoria que transforma dinheiro em capital.
Segundo Gaudemar (1977, p.193), a produção da força de trabalho representa
“... o momento da aquisição da sua mobilidade, por parte do trabalhador anteriormente
submetido a outros modos de produção, por exemplo o momento de emancipação do
servo; sob o ponto de vista de conjunto, é aquilo a que Marx chama o momento de
acumulação primitiva, a transformação do dinheiro em capital e portanto da formação do
proletariado”.
Faz-se novamente importante pontuar que, em consonância com a reflexão
dedicada a este trabalho, para Gaudemar, a existência do detentor de capital (possuidor de
mercadorias) e dos detentores de sua própria força de trabalho não resulta de uma lei natural,
mas sim, de toda uma história das relações sociais, que teve como base a submissão da
mobilidade do trabalhador às exigências do capital. Tal posição parte da leitura e adoção da
teoria marxista.
70
Com efeito, ante a necessidade de otimizar os meios de produção e a
impossibilidade de aproveitar-se do trabalhador por 24 horas, surge a estruturação do processo
produtivo com o revezamento de equipes de trabalho, ou seja, as máquinas não param e várias
equipes as tocam (ROCHA, 1998. p. 54).
Pela explanação da situação acima percebe-se uma outra forma de mobilidade,
como elucida Rocha (1998), pela qual existe a necessidade de o operário adaptar-se às
mudanças semanais do horário da jornada de trabalho, em decorrência dos rodízios de
trabalho, os quais representam uma submissão do trabalhador ao capital. Desse modo, a
mobilidade, vista como “a capacidade que permite a força de trabalho adaptar-se às variações
da jornada de trabalho, à permutação dos postos de trabalho, aos efeitos de uma divisão do
trabalho cada vez maior”, de acordo com Gaudemar (1977. p.194), permite evidenciar que,
além de ser apêndice das máquinas, o homem passa a produzi-las.
Neste contexto, Gaudemar (1977, p. 245) observa que a divisão social do trabalho
se intensifica “à medida que as máquinas, com um número de funcionários relativamente
baixos, fazem aumentar a massa de matérias-primas, produtos meio fabricados, instrumentos
de trabalhos, etc., subdividindo-se em diferentes e numerosos ramos”. Assim, “quer
directamente na base do sistema mecânico, quer no seguimento das mudanças gerais que
aquele provoca na vida econômica, surgem novas indústrias e conseqüentemente outros tantos
novos campos de trabalho” (GAUDEMAR, 1977, p. 245).
Com efeito, é possível compreender a mobilidade centrada no trabalho por meio
de duas outras abordagens: 1) a mobilidade da atividade, a qual Rocha (1998) denomina de
funcional, e, 2) a mobilidade da força de trabalho em busca do capital, denominada de
geográfica, ambas mencionadas logo no início deste subitem, ao fazerem parte do conceito
proposto para mobilidade centrada no trabalho.
A primeira nos revela uma mobilidade que se legitima na busca pela mais-valia
por meio dos avanços tecnológicos e da requalificação da mão-de-obra. Por este meio surgem,
se extinguem ou se reproduzem diversas funções e cargos dentro de uma empresa numa
contínua readaptação às novas exigências do mercado, as quais impõem uma flexibilização da
atividade profissional. Isso se dá devido a uma preocupação e ânsia de auferir um maior
retorno do capital investido, maximizando o lucro.
Neste contexto, a força de trabalho se apresenta submissa ao capital, pois, a
inserção de tecnologias como meios de produção e um baixo crescimento econômico geram
uma enorme gama de desempregados (exército de reserva). Tal situação provoca uma intensa
relação de competitividade, forçada pela necessidade de se requalificar profissionalmente e se
71
submeter a baixos salários, denunciando uma situação de acúmulo de capital. O momento
que se vive hoje ilustra exatamente esta situação.
A segunda abordagem trata da busca do trabalho pelo homem (deslocamento
físico ou geográfico). Este é movido pela expectativa de ascensão social (proporcionar
melhores condições de vida à família), ou mesmo pela necessidade de subsistência, em
conseqüência do deslocamento da oferta de trabalho do campo para a cidade, decorrente do
processo de urbanização que se perpetuou nas economias capitalistas. Segundo Rocha (1998,
p. 47), “A idéias precedentes evidenciam como a mobilidade da força de trabalho é vista,
sendo esta a expressão de um processo de mercantilização da força de trabalho e de seu uso
produtivo pelo capital”.
Neste sentido, o homem e a indústria passam a compactuar um laço de
subsistência por meio de um contrato social de trabalho, sob remuneração assalariada,
alienando a força de trabalho enquanto mercadoria (ROCHA, 1998).
Com efeito, a mão-de-obra sempre foi um dos fatores determinantes de um
processo de produção, e justamente por isso ela sempre foi manipulada, em vista da
necessidade de auferir maiores lucros. Como se vê, a preocupação está sempre voltada para a
acumulação do capital.
“Até hoje, a economia política tem-nos ensinado que o trabalho é a fonte de
toda a riqueza e a medida de todos os valores, de tal modo que dois objetos cuja produção
custou o mesmo tempo de trabalho têm também o mesmo valor e, como em média só
valores iguais são cambiáveis entre si, devem também ser trocados um pelo outro. Mas,
ao mesmo tempo, ela ensina-nos que existe uma espécie de trabalho armazenado a que
chama capital; e que esse capital, pelos recursos que encerra, multiplica por cem e por mil
a produtividade do trabalho vivo e que, para isso, reclama uma certa indenização a que se
dá o nome de lucro ou ganho. Como todos sabemos, as coisas, na realidade, apresentam-
se assim: os lucros do trabalho morto armazenado são cada vez maiores, imensos, e os
capitais dos capitalistas cada vez maiores, enormes, ao passo que o salário do trabalhador
vivo é cada vez menor e a massa dos trabalhadores, que vive unicamente do seu salário, é
cada vez mais numerosa e mais pobre”
(ENGELS, 1868 apud RIFKIN,1995, p. 156)
Desse modo, parece válido afirmar que a mais-valia nada mais é do que o máximo
aproveitamento de recursos adquiridos por um determinado valor monetário; ou seja, quanto
menor o custo de produção, maior será o seu lucro, se mantido o preço de venda.
Em síntese, a mobilidade centrada do trabalho acontece principalmente na ordem
quantitativa, em decorrência da incorporação de mais força-de-trabalho na produção
inicialmente mediante a apropriação de camadas periféricas, como camponeses, mulheres e
crianças. No entanto ela se instaura também na ordem qualitativa, decorrente da inovação
72
tecnológica (transformações da composição orgânica do capital), aumentando a produtividade
e a intensidade do trabalho, e assim, a mais-valia relativa (GAUDEMAR, 1977).
Como elucida Paul Singer (1979, p. 17), com o progresso tecnológico e o
crescimento da mais-valia relativa, o emprego tende a se ampliar. Mas o próprio autor contra-
argumenta que “O exército industrial de reserva tenderia a esgotar-se, não fora a constante
substituição do homem pela máquina”.
Em concordância, Borges (2003, p. 64) analisa a contradição do trabalho e do
capital na seguinte passagem:
“No processo de produção de mais valia relativa, tem-se então, a subsunção
real do trabalho ao capital, quando as relações de produção entre proprietários do capital e
da força de trabalho se desenvolvem a ponto de o processo de trabalho já estar
transformado pela produção capitalista, podendo suportar a redução do trabalho
necessário em proveito do excedente e assim gerar a mais valia relativa”
.
Quanto ao exército de reserva, Marx o percebia na mesma situação que condiz
com a realidade atual, como observa Singer (1979, p. 17): “Ele é composto por
desempregados abertos (forma “líquida”), desempregados disfarçados no campo (forma
“latente”) e desempregados disfarçados em subempregados urbanos (forma “estagnada”)”
10
.
Faz-se importante retratar este último, o qual hoje se reconhece como desemprego estrutural.
Com efeito, Marx afirma que, ao passo que se acumula capital, aumenta a
demanda por força de trabalho. Neste contexto, por que o exército de reserva não se esgota, já
que no decorrer da história se percebe um grande crescimento do acúmulo de capital?
De acordo com Marx (apud SINGER, 1979), a demanda por FT não ultrapassa a
sua oferta devido à inserção de tecnologias, retratando exatamente a já elucidada manipulação
da FT. Neste contexto, como já se sabe, a tecnologia incorporada ao sistema produtivo tem a
função de fazer com que esse sistema utilize menos mão-de-obra por unidade de capital e de
10
“Marx distingue três formas do exército industrial de reserva: 1) líquida (desempregados no fluxo entre
empregos); 2) latente: “Tão logo ou na medida em que a produção capitalista se apodera da agricultura, diminui
com a acumulação do capital aí funcionante a procura pela população trabalhadora do campo em termos
absolutos, sem que sua repulsão seja complementada por uma maior atração, como na indústria não-agrícola.
Uma parte da população do campo se acha, em conseqüência, sempre preparada para se transferir ao proletariado
urbano ou industrial e à espera de circunstâncias favoráveis a esta passagem (Indústria aqui no sentido de todas
as atividades não-agrícolas).(...) Porém, seu fluxo (de população) constante às cidades pressupõe no campo
mesmo uma superpopulação sempre latente, cujo tamanho só se torna visível tão logo os canais de drenagem se
abrem de maneira extraordinária”; 3) estagnada “... constitui uma parte do exército ativo de trabalhadores, com
ocupação totalmente irregular. Ela oferece, assim, ao capital, um reservatório inesgotável de força de trabalho
disponível. Seu padrão de vida cai abaixo do nível médio normal da classe trabalhadora e exatamente isso a torna
uma ampla base de certos ramos de exploração do capital” (Marx, apud SINGER, 1979, p. 17).
73
reduzir o custo de mão-de-obra incorporado no custo do produto. Desse modo, surge outra
questão: quando inserir tecnologia?
No exercício de uma resposta, a mais provável e lógica está em se dizer que esse
momento é aquele em que for possível obter vantagem competitiva. Deste modo, mesmo que
de forma indutiva, o capital domina a ação humana e se apresenta como o centro das relações
sociais em detrimento do próprio homem. Este se contenta em acreditar que conquistou a
liberdade, o desenvolvimento, enquanto impera a razão instrumental, na ação forçada pelo
emprego do trabalho em troca da subsistência, reflexo da precarização do trabalho e da
desigualdade.
Com efeito, o processo produtivo ganha movimento pelo aumento de
produtividade como fruto de um desenvolvimento proporcionado pela redução do salário
relativo e aumento do capital, como observa Singer (1979). Deste modo, decresce o valor
relativo da mercadoria FT, pelo fato de o tempo gasto na produção representar uma maior
produtividade com a mesma energia e valor despendido.
Cabe considerar o papel do Estado neste contexto. Ele cumpre também a função
de regular o salário conforme o valor conveniente ao capitalista, além de “prolongar a jornada
de trabalho e manter o próprio trabalhador no grau de dependência pretendido”
(GAUDEMAR, 1977, p. 270). Assim, “numa nação livre em que a escravatura é proibida, a
riqueza mais segura consiste num grande número de trabalhadores pobres” (MANDEVILLE
in MARX apud GAUDEMAR, 1977, p. 282).
Para finalizar a abordagem marxista, parecem oportunas as palavras contidas em
Gaudemar, 1977, p. 279):
“Tudo o que fica dito conduz finalmente, e necessariamente, à luta do capital
contra a baixa tendencial da taxa de lucro. A mobilidade do trabalho que o capital se
esforça por fazer aproximar ao máximo da perfeição, está longe de desempenhar um
papel desprezível: permite uma baixa relativa do valor da força de trabalho, a redução da
mão-de-obra permanente, a submissão efectiva do trabalho às exigências sempre novas
do capital. O processo de circulação da mão-de-obra surge assim como elemento da
circulação do capital”.
Desse modo, o capital sempre alcança sua auto-reprodução por meio da
mobilidade do trabalho, tornando este o seu eterno exercício. Neste contexto se cumpre uma
tentativa de desvinculação da força de trabalho enquanto fator de dependência no campo do
modo de produção e da acumulação do capital.
74
A mobilidade do trabalho decorrente das inovações tecnológicas ocasionou a
substituição do homem pela máquina em países onde o capitalismo estava já desenvolvido e
fez com que o número de operários se tornasse supranumerário. Segundo Gaudemar (1977, p.
255), “No lugar onde se encontra uma parte da classe produtiva, a grande indústria necessita
de emigração, e conseqüentemente da colonização de regiões estrangeiras que se transformam
em celeiros de matérias-primas para a mãe-pátria”.
O desenvolvimento da sociedade capitalista se viabiliza com a exploração das
colônias, as quais passam a fornecer matéria-prima e “exportar” outras fontes de riquezas.
Como elucida Stuart Mill, a democracia, se é que ela existe, só se realiza nos países que
detêm o controle econômico.
Foi por interesse dos países hegemônicos que o desenrolar do modo de produção
capitalista alcançou o estágio flexível, o modelo toyotista, o qual teve início na transição das
décadas de 1960/1970. No Brasil, este modelo contribui para o aumento do processo de
periferização a partir da década de 1990.
75
3. A MOBILIDADE DO TRABALHO E O PROCESSO DE PERIFERIZAÇÃO NO
BRASIL
O que o mundo atualmente vivencia - desde os anos 1970, mas com maior
intensidade a partir da década de 1980 - é conhecido como processo de globalização, retrato
de uma abertura econômica, com a desregulamentação do mercado financeiro, a
intensificação das trocas comerciais e a fragmentação das grandes corporações pelos
territórios intercontinentais. Certamente o termo globalização acaba sendo muito generalista,
já que vários países ficam acuados ou fora desta dinâmica, por não se apresentarem atraentes
no contexto de mercado e no contexto político, pautados na gestão compartilhada entre países
e empresas, com o objetivo voltado à acumulação do capital.
Não obstante, neste contexto existe uma contradição, como salienta Sampaio
Júnior (apud HENRIQUE, 1998), a qual se expressa pelo avanço da transnacionalização do
capitalismo ao passo em que o Estado nacional luta pela sobrevivência. Frente a esta questão,
há que se considerar que cada indivíduo constitui o Estado. Deste modo, o fim do Estado
estaria no ápice da alienação do indivíduo, quando este passa a não se perceber como sujeito
coletivo. Com efeito, o Estado, como totalização das individualidades no cumprimento da
ação coletiva, perde legitimidade quando impera a ausência de consciência do sujeito de
pertencer e participar efetivamente na estrutura democrática, retratando um comportamento
preso à ordem e à passividade.
Mello (1999) observa que nas últimas décadas emergiram novas combinações
entre as antigas empresas multinacionais, conhecidas atualmente como transnacionais, em
decorrência da sua fragmentação pelo território, viabilizada por investimentos internacionais,
fusões, incorporações, joint ventures
11
ou privatizações e, principalmente, pela
desconcentração produtiva, instaurando uma nova divisão internacional do trabalho.
Para Cano (apud Henrique, 1998, p. 38), no intuito de vencer as barreiras, o
capitalismo se fortaleceu com a disseminação de uma ideologia pautada no neoliberalismo e
estruturada em três pressupostos básicos: a privatização de ativos públicos, a ruptura dos
monopólios públicos e a reestruturação produtiva global.
A mudança do cenário econômico, o qual se apresentava em crise nos anos 1970,
fez com que o modo de produção capitalista se viabilizasse por novas formas, mais
desterritorializadas, em decorrência de expandir o seu mercado e reduzir os custos de
produção. Nesta época o sistema de produção em massa, também conhecido como fordista, se
11
Joint venture é uma parceria formada por uma empresa de um país com uma empresa em outro país com a
finalidade de perseguir empreendimentos mutuamente desejáveis (CERTO, S. C., 2003, p. 552).
76
apresentava com dificuldades de expansão
12
. Segundo Piore & Sabel (apud BENKO, 1999),
isso ocorreu pelo fato de os mercados nos países mais desenvolvidos se apresentarem
saturados, procurando produtos mais diversificados. Neste contexto, o mercado, por meio de
seus gestores, vendo-se estagnado, buscou a flexibilização produtiva e se mostrou mais
atraente, sustentando a ilusão e o fetiche proporcionado pela mercadoria numa sociedade que
se transforma num aficionado mercado consumidor, onde o “TER” reforça ainda mais o
reinado em detrimento do “SER”.
Para Sampaio Júnior (apud Henrique, 1998, p. 25), “As reações das economias
centrais tem sido marcadas por um denominador comum: a subordinação irrestrita da política
econômica à tirania do capital internacional”.
Com efeito, o grande salto tecnológico criou condições para que o capital desse
resposta à crise que vivenciara o sistema capitalista na sua fase monopólica, na qual a classe
operária se encontrava fortalecida por meio dos sindicatos (ANTUNES, 2003).
De acordo com Antunes (2003, p. 31), “Como resposta à sua própria crise,
iniciou-se um processo de reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político de
dominação, cujos contornos mais evidentes foram o advento do neoliberalismo”. Isso se
deveu ao processo de privatização (desmontagem do setor produtivo estatal) e também à
desregulamentação dos direitos do trabalho. Somado a isso, o desenvolvimento tecnológico
cumpriu o papel de criar condições para que uma nova forma de acumulação capitalista
pudesse entrar em vigor, permitindo auferir uma maior mais-valia relativa, mediante a
substituição do trabalho vivo pelo trabalho morto.
Para ANTUNES (2003, p. 124), “A transferência de capacidades intelectuais para
a maquinaria informatizada, que se converte em linguagem da maquinaria própria da fase
12
O capitalismo a partir do início dos anos 70, começou a dar sinais de um quadro crítico, cujos traços
mais evidentes foram: 1) queda da taxa de lucro pelo aumento do preço da força de trabalho (dentre outros
elementos), conquistado durante o período pós-45 e pela intensificação das lutas sociais dos anos 60, que
objetivaram o controle social da produção. A conjugação desses elementos levou a uma redução dos níveis de
produtividade do capital, acentuando a tendência decrescente da taxa de lucro; 2) o esgotamento do padrão de
acumulação taylorista/fordista de produção (que me verdade era a expressão mais fenomênica da crise estrutural
do capital), dado pela incapacidade de responder à retração do consumo que se acentuava. Na verdade, tratava-se
de uma retração em resposta ao desemprego estrutural que então se iniciava; 3)hipertrofia da esfera financeira,
que ganhava relativa autonomia frente aos capitais produtivos, o que também já era expressão da própria crise
estrutural do capital e seu sistema de produção, colocando-se o capital financeiro como um campo prioritário
para a especulação, na nova fase do processo de internacionalização; 4) a maior concentração de capitais graças
às fusões entre as empresas monopolistas e oligopolistas; 5) a crise do welfare state ou do “Estado do bem-estar
social” e dos seus mecanismos de funcionamento, acarretando a crise fiscal do Estado capitalista e a necessidade
de retração dos gastos públicos e sua transferência para o capital privado; 6) incremento acentuado das
privatizações, tendências generalizada às desregulamentações e à flexibilização do processo produtivo, dos
mercados e da força de trabalho. ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a
negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2003. p. 29-30.
77
informacional, por meio dos computadores, acentua a tendência de redução e transformação
do trabalho vivo em trabalho morto”.
O processo de exploração do trabalho vivo buscou, nos confins do planeta Terra,
reduzir os custos de produção, com o discurso de instaurar o desenvolvimento local, sendo
que, no longo prazo, este transforma a maior parte dos países periféricos em economias
reflexas, completamente dependentes das economias dos países centrais - como na verdade
sempre foram.
Segundo Mello (2001, p. 202), “continua a ser a acumulação do capital (seu
movimento de concentração/centralização) o substrato básico de todo o processo em
andamento, o vetor de todo este novo surto de mundialização em curso”. Com efeito, de
acordo com O. Ianni (apud MELLO, 2001, p. 202) “a concentração e centralização
fundamentam o colonialismo e o imperialismo, indispensáveis à inteligência do globalismo”.
De fato, segundo Antunes (2003, p. 27), existe uma “tendência à redução do valor
de uso
13
das mercadorias, assim como a agilização necessária de seu ciclo reprodutivo e de
seu valor de troca, vem se acentuando desde os anos 70”. Assim, “sem desconhecer a dialética
das interações recíprocas, o sentido estruturalmente dominante do valor de troca acaba por
impor-se aos avanços científicos e tecnológicos” (TOSEL, apud ANTUNES, 2003, p. 123).
A mobilidade do trabalho intensifica-se devido a uma necessidade de sistematizar
o processo produtivo na busca de maior produtividade. Deste modo, as novas formas
capitalistas buscam diluir a centralidade do trabalho no processo de acumulação, mesmo
sabendo-se da dificuldade de se imaginar a ausência do trabalho vivo do modo de produção
capitalista. Apesar disso, quando Habermas (apud TEIXEIRA, 1998) diz que as
transformações operadas nos processos de produção fizeram implodir a teoria do valor, revela
como argumento o seguinte: a introdução da microeletrônica, da robótica, dos novos materiais
de produção e de novas fontes de energia nos processos de trabalho deslocou-os como
unidade dominante na produção da riqueza, onde continua a imperar a razão instrumental.
13
A indústria de computadores (...) mostra-se (...) exemplar dessa tendência depreciativa e decrescente do valor
de uso das mercadorias. Um sistema de softwares torna-se obsoleto e desatualizado em tempo bastante reduzido,
levando o consumidor à sua substituição, pois os novos sistemas não são compatíveis com os anteriores. As
empresas, em face da necessidade de reduzir o tempo entre produção e consumo ditada pela intensa competição
existente entre elas, incentivam ao limite essa tendência destrutiva do valor de uso das mercadorias.(...) Com
redução dos ciclos de vida útil dos produtos, os capitais não têm outra opção, para sua sobrevivência, senão
inovar ou correr o risco de ser ultrapassados pelas empresas concorrentes, conforme o exemplo da empresa
transnacional de computadores Hewlett Packard, que com a “inovação” constante de seu sistema computacional
reduziu enormemente o tempo de vida útil dos produtos.
ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio
sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2003. p. 51
78
Com efeito, a ciência/tecnologia é elevada à condição de primeira força produtiva.
Por isso, o trabalho passa por uma verdadeira mobilidade, no sentido de que doravante a
atividade produtiva passa a se fundar em conhecimentos técnico-científicos, em oposição ao
trabalho rotineiro, repetitivo e desqualificado que predominou na fase do capitalismo liberal e
nas primeiras décadas do século XX. Em conseqüência dessa revolução, o trabalhador não é
mais considerado como simples apêndice da máquina, porém ainda não se apresenta na
qualidade de sujeito que regula o processo de trabalho, por ainda se encontrar alienado. O
novo perfil do trabalhador é fruto da polarização das classes sociais, onde este se mostra
polivalente e qualificado, substituindo a grande massa de trabalhadores com pouca
qualificação e precarizado no mercado de trabalho.
Georges Benko (1999), em seu livro “Economia, Espaço e Globalização”,
evidencia que o fato de, na década de 1970, os mercados mais desenvolvidos se apresentarem
saturados, decretando o fim da produção em massa e substituindo-a por uma maior
diversificação e qualidade dos produtos, propiciou uma maior competitividade no âmbito das
pequenas empresas de apoio. Estas passaram a cumprir o papel de prestadoras de serviços
complementares à produção das grandes marcas; ou melhor, hoje cada empresa terceirizada
produz um fragmento do produto acabado, configurando uma produção mais flexível, pronta
para atender às mudanças e à competitividade do mercado.
Como exposto, o que caracteriza o sistema de produção contemporâneo (flexível),
é a desconcentração produtiva por meio das empresas terceirizadas, seja na produção
componentes/assessórios seja na prestação de serviços. Neste contexto, Antunes (2003)
elucida que “utiliza-se de novas técnicas de gestão da força de trabalho, do trabalho em
equipe, das “células de produção”, dos “times de trabalho”, dos grupos “semi-autônomos”,
além de requerer, ao menos no plano discursivo, o “envolvimento participativo” dos
trabalhadores”.
Sabe-se que o modelo de gestão participativa, sob a ótica da contradição capital x
trabalho, se apresenta como uma forma de manipulação, no intuito de preservar a condição de
trabalhador alienado. “O trabalhador ‘polivalente’, ‘multifuncional’, ‘qualificado’,
combinado com uma estrutura mais horizontalizada e integrada entre diversas empresas,
inclusive nas empresas terceirizadas, tem como finalidade a redução do tempo de trabalho”
(ANTUNES, 2003, p. 52).
A busca por uma maior flexibilização produtiva acentuou a dependência da força
de trabalho para com o capital; ou seja, os trabalhadores, embora representados por fortes
sindicatos, perderam espaço e força na luta pelo controle produtivo, devido à inserção de
79
tecnologias. Estas além de cumprirem o papel de diversificar a produção, fizeram aumentar o
contingente do exército de reserva, com o processo de substituição de mão-de-obra, fator que
garante um menor custo de produção. Por sua vez, os mercados, saturados, não esboçavam
nenhuma reação frente a um crescimento econômico, o que fez instaurar-se uma crise
estrutural, aumentando o desemprego. O caminho escolhido para a expansão do capital foi
defender o mercado liberal com a ausência do Estado regulador da economia.
Segundo Antunes, são exemplos de produção flexível as micro e pequenas
empresas que cooperam na fabricação de componentes de produtos fabricados para as grandes
marcas - como, por exemplo, os óculos da Beneton - situadas na região Norte/Nordeste da
Itália, conhecida como a “Terceira Itália”. Neste contexto, vale elucidar que estas empresas
são dotadas de alta tecnologia. Além da Itália, países como a Suécia, a Costa Rica e a Coréia
do Sul são berços de empresas que se posicionam de forma estratégica, na sustentabilidade da
forma flexível de operar do modo de produção capitalista. Apesar de estes países serem
referência para o atual paradigma de gestão produtiva (participativa e flexível), foi o sistema
toyotista (Japão) que ganhou maior notoriedade como modelo para se sair da crise da
produção em massa.
Na seguinte abordagem, realizada por Antunes (2003, p. 31), se constata
exatamente o que vem a ser o modelo Toyotista:
“Coriat fala em quatro fases que levaram ao advento do toyotismo. Primeira:
a introdução, na indústria automobilística japonesa, da experiência do ramo têxtil, dada
especialmente pela necessidade de o trabalhador operar simultaneamente com várias
máquinas. Segunda: a necessidade de a empresa responder à crise financeira, aumentando
a produção sem aumentar o número de trabalhadores. Terceira: a importação das técnicas
de gestão dos supermercados dos EUA, que deram origem ao Kanban. Segundo os termos
atribuídos a Toyota, presidente fundador da Toyota, “o ideal seria produzir somente o
necessário e faze-lo no melhor tempo”, baseando-se no modelo dos supermercados, de
reposição dos produtos somente depois da sua venda. Segundo Coriat, o método kanban
já existia desde 1962, de modo generalizado, nas partes essenciais da Toyota, embora o
toyotismo, como modelo mais geral, tenha sua origem a partir do pós-guerra. Quarta fase:
a expansão do método kanban para as empresas subcontratadas e fornecedoras (Coriat,
1992b, p. 27-30)”.
Neste contexto, mais precisamente à luz da Terceira Itália, Benko (1999, p. 115)
elucida que “as empresas menores e mais flexíveis que fabricavam e ofereciam bens e
serviços diversificados (...) começaram a tornar-se competitivas e deixavam pressagiar novo
modelo de desenvolvimento denominado especialização flexível”.
Com efeito, Sassen (1998, p. 137) argumenta:
80
“Tem ocorrido transformações objetivas nas formas de organizar o setor manufatureiro,
com a presença cada vez maior de uma produção em pequenas quantidades, de pequenas
escalas, de elevada diferenciação do produto e de rápidas mudanças do produto final.
Esses elementos promoveram a subcontratação e o recurso a maneiras flexíveis de
organizar a produção. (...) Os fatos que indicam essas mudanças são o declínio dos
sindicatos no setor manufatureiro, a perda de várias proteções contratuais e o aumento de
trabalho involuntário, em turno parcial ou temporário, além de outras formas de trabalho
condicional. Uma indicação extrema desse rebaixamento é o crescimento das oficinas de
81
Cabe salientar que a tecnologia adentra a vida social com mais intensidade neste
novo século, afetando a população justamente no trabalho, por meio de uma vantagem
competitiva, e também roubando a cena do próprio homem na base de produção. Poder-se-ia
chamar de terceira revolução industrial esse processo de substituição da mão-de-obra por
máquinas, mais precisamente por tecnologias.
Justamente por introduzir uma substituição, embora não completa, a
ocidentalização do modelo toyotista contribuiu para o aumento do desemprego. Como elucida
Antunes (2003), o modo de produção flexível é uma resposta do capital para o trabalho,
retratando a determinante contradição geradora do movimento que instaura a desigualdade e o
processo de periferização, a periferia como sinônimo de pobreza.
“A conseqüência mais evidente é o distanciamento pleno de qualquer
alternativa para além do capital, à medida que se adota e postula uma ótica do mercado,
da produtividade, das empresas, não levando sequer em conta, com a devida seriedade,
entre tantos outros elementos tão graves e prementes como, exemplos, a questão do
desemprego estrutural, que atualmente esparrama-se por todo o mundo, em dimensões
impressionantes, e que não poupa nem mesmo o Japão, que nunca contou com excesso de
força de trabalho. Desemprego este que é o resultado dessas transformações no processo
produtivo, e que encontra, no modelo japonês, no toyotismo, aquele que tem causado
maior impacto, na ordem mundializada e globalizada do capital” (ANTUNES, 2003, p.
40-1).
Mesmo com os avanços tecnológicos, com a competitividade global e as novas
condições de vida que se apresentam à sociedade, a população continua a buscar as cidades
como morada e o mundo assiste a uma grande mobilidade de seus povos, principalmente
rumo aos centros urbanos produtivos. Isso teve como causa “a mobilidade dos trabalhadores
entre empresas, profissões e regiões, isto é, a mobilidade do emprego, a mobilidade
profissional e a mobilidade geográfica” (BENKO, 1999, p. 32).
A questão do trabalho e do emprego é tema extremamente importante, por se
tratar de uma necessidade básica de qualquer cidadão para viver dignamente na ordem
capitalista. Para atender à dinâmica trabalho-emprego urbano, a qual na atualidade sobressai
ao trabalho rural, pelo fato de a grande massa de trabalhadores brasileiros ter se dirigido para
os médios e grandes centros urbanos, têm-se as cidades-satélite e cidades-dormitório como as
grandes receptoras de pessoas originárias do campo. Essas pessoas chegam totalmente
desqualificadas e muitas vezes encontram estas cidades sem recursos para arcar com a
educação, a saúde e o emprego para um grande contingente de famílias migrantes, fruto da
modernização conservadora.
82
3.1. A modernização conservadora e a produção do espaço brasileiro
Crescimento e desigualdade é o retrato do desenrolar histórico da economia e da
sociedade brasileira. O Brasil, país possuidor de imensas riquezas, nada mais construiu do que
uma sociedade espoliada. Percebe-se que o desenvolvimento que sempre foi almejado nunca
chegou perto de acontecer, pois desenvolvimento sem melhora de condição de vida para todos
os que deveriam ser cidadãos ficou distante do ideário defendido pela proposta vencedora dos
neoclássicos.
Num primeiro momento, introduzindo a abordagem da modernização
conservadora, se faz importante uma pequena elucidação de duas correntes que dominaram a
discussão sobre o desenvolvimento nacional no pós-2ª Guerra Mundial. A primeira foi
representada pelos neoclássicos, os quais defendiam um desenvolvimento com base na
introdução de tecnologias e num modelo de agricultura mecanizada, na busca do aumento de
produtividade, porém totalmente voltada para a exportação. A segunda, marxista, defende o
desenvolvimento com reforma agrária, ou seja, embora defendesse a inserção de tecnologias
na produção agrícola, concomitantemente defendia a inclusão e permanência dos pequenos
proprietários rurais, por meio de acesso a créditos e benefícios voltados para subsidiar a
agricultura mecanizada.
A discussão que compõe o presente capítulo se propõe instigar uma contestação do
caminho escolhido para o desenvolvimento do Brasil na década de 1970, por ser este
totalmente excludente.
3.1.1. Neoclássicos e marxistas: seus ideários pela modernização
A modernização se apresentou fortemente como a grande temática de discussão,
partindo de duas vertentes com propostas diferentes, já na década de 1960. Como foi
elucidado, de um lado os neoclássicos defendiam a inserção de tecnologias sem mexer na
estrutura fundiária; do outro lado, os marxistas defendiam uma modernização que pregava
uma verdadeira reforma agrária – mudança estrutural.
Deste modo, segundo Neto (1997), durante a década de 1960 a questão agrária
brasileira esteve quase sempre, de uma forma ou de outra, atrelada ao debate sobre a
conveniência de se interferir ou não na estrutura da propriedade rural do país. Uns defendiam
uma reforma agrária que ampliasse a participação dos trabalhadores no acesso à terra; outros
83
porpugnavam a modernização agrícola como forma de promover o incremento da produção e
a melhoria das condições de vida do trabalhador rural, dispensando-se a reforma agrária.
A teoria da modernização agrícola se apóia basicamente na criação e difusão de
novas tecnologias, ou seja, na criação de novos conhecimentos e de novos insumos que
tragam aumento de produtividade dos fatores empregados nas atividades agrícolas, assim
como a geração adicional de renda. Por sua vez, estratégia do desenvolvimento agrícola se
assenta na intensificação de pesquisas que criem esses conhecimentos e esses insumos, e na
difusão dos mesmos para maior números de agricultores, pois desse modo se pode auferir
aumento de produção e de produtividade assim como a geração adicional de renda que
impulsione o crescimento econômico (NETO, 1997).
Esse entendimento, para Montenegro (1993), parte de uma determinada
concepção da história, que, no tocante às duas linhas do pensamento socioeconômico mais
preeminentes do final do século XIX ao XX, tem como fundamento a “filosofia da história da
consumação”. A idéia de progresso como inexorável se encontra tanto nos neoclássicos
quanto nos marxistas.
Nos neoclássicos a consumação da história seria atingir, em seu aspecto absoluto,
o liberalismo econômico e político, o ponto optimum em que o mercado, com “sua mão
invisível”, regularia e equilibraria todos os excessos e apararia todas as arestas, satisfazendo
assim as necessidades e interesses tanto dos consumidores quanto dos produtores
(MONTENEGRO, 1993).
Já para o marxismo, a consumação da história seria a concretização das utopias
socialistas: o estabelecimento do “reino” da igualdade, justiça, liberdade e solidariedade.
Diante dessas discussões, sob o pressuposto da análise científica, Montenegro
(1993) observa que se isolou a economia das questões morais, desprezando assim as questões
referentes às contradições existentes na sociedade capitalista e à tendência de crescimento da
desigualdade socioeconômica.
Tanto os neoclássicos, que produziram um conhecimento favorável à continuidade
e perpetuação da dominação capitalista, quanto os marxistas que viram na “necessidade do
progresso capitalista” a forma concreta, verdadeira, de se chegar ao socialismo, viram as
transformações que se processavam na agricultura como algo necessário.
A grande polêmica de fins da década de 1950 não ocorre em torno do tipo de
modernização, muito menos da necessidade ou não de modernização, mas em torno da
modernização da agricultura com ou sem reforma agrária, tendo perdido a primeira
alternativa.
84
Para Montenegro (1993), no Brasil, os princípios básicos da linha neoclássica de
pensamento se traduzem na defesa do sistema capitalista, entendido como a mais avançada
forma de organização socioeconômica que pode alcançar uma sociedade, e da concepção
liberal da economia, que passa pelas teorias gerais do equilíbrio e do desenvolvimento
econômico. Os neoclássicos compreendem o desenvolvimento econômico como resultado da
articulação do capital, das forças produtivas (fatores de produção) e do investimento.
Tratando-se da agricultura, é somente em meados do século XX que surge uma
análise neoclássica mais consistente, consubstanciada na teoria da organização econômica da
agricultura (1956) e da transformação da agricultura tradicional (1965) de Theodore W.
Schultz (1953) (MONTENEGRO, 1993).
Não obstante, devido às transformações que estavam se operando na economia e
na sociedade brasileira, colocava-se, em fins dos anos 1950, um acirrado debate acerca da
relação da industrialização brasileira e dos problemas apresentados pela agricultura.
Para Paulillo (1997), os trabalhos mais conhecidos no Brasil referentes à
modernização da agricultura foram os de Homem de Mello (1980), Pastore (1977) e Dias
(1976). Todos propunham e buscavam a transformação do setor agrícola tradicional para o
moderno e dinâmico, via mudanças tecnológicas, capazes de impulsionar o desenvolvimento
econômico. As modificações tecnológicas seriam proporcionadas pela adoção de insumos
modernos e melhoria no nível de educação do agricultor e trabalhador rural, que permitem
maiores produtividades dos fatores de produção e taxas de retorno mais elevadas, além do
crescente ritmo das inovações.
Com embasamento teórico neoclássico, a interpretação modernizante pouco
enfatiza as questões referentes à mudança na estrutura agrária, por aceitar que as forças de
mercado são capazes de promover a modernização da grande propriedade. Como observa
Paulillo (1997), quanto ao pequeno produtor, acreditava-se que este reagiria ao estímulo dos
preços para garantir sua subsistência. Assim não haveria necessidade de alterações na
estrutura agrária para promover o desenvolvimento da agricultura, bastando promover
políticas de viabilização da modernização como: crédito rural, preços mínimos, extensão e
pesquisa agropecuária, educação rural e desenvolvimento industrial, para garantir o
fornecimento de insumos e máquinas necessários à atividade produtiva.
Segundo Paulillo (1997), a base teórica neoclássica foi herdada dos trabalhos de
Schultz (1945), pioneiro e principal representante da vertente modernizante da agricultura,
como foi visto. Sua proposta de transformar a agricultura por meio da criação de novos
fatores de produção e investimento no capital humano (habilitação dos agricultores) foi
85
fortalecida por identificar na agricultura tradicional a decrescente produtividade de mão-de-
obra, o baixo retorno ao investimento no campo, as ineficiências significantes na distribuição
dos fatores de produção e o constante estado de falta de conhecimentos. A reduzida taxa de
retorno de utilização dos fatores produtivos – principal problema da agricultura tradicional –
poderia ser revertida pela melhoria da qualidade do capital, pela oferta de novos fatores e pelo
aprimoramento das habilidades dos agricultores.
Observa Montenegro (1993) que, em face dos problemas existentes na agricultura,
Gudin propunha a implantação de uma política que viabilizasse a superação desses problemas
por meio de incentivos creditícios e inovações tecnológicas que dispensassem a necessidade
de mudanças estruturais radicais.
Percebe-se a atração que exerce o elemento técnico sobre as análises
macroestruturais de origem neoclássica na proposta da modernização, a qual se apresenta
conservadora, já que em nenhum momento questiona os aspectos político e social dos
problemas agrários resultantes da estrutura fundiária.
Deste modo, a mudança de ênfase no papel da agricultura colocava apenas,
segundo Schuh, a necessidade de seu desenvolvimento de forma a responder às exigências
funcionais do crescimento econômico geral, entendido como desenvolvimento industrial.
Nesse novo papel, a agricultura poderia contribuir para o desenvolvimento econômico por
meio do aumento da produção (MONTENEGRO, 1993).
Destarte, segundo Montenegro (1993), é a partir da contribuição de Schuh para a
análise neoclássica da organização econômica da agricultura brasileira que vai surgir a
produção teórica especificamente voltada para a agricultura. São vários, no Brasil, os
estudiosos influenciados por Schuh, destacando-se como um dos grandes expoentes da
economia agrícola neoclássica o economista, professor e pesquisador Eliseu Roberto de
Andrade Alves.
Todos esses ilustres intelectuais brasileiros concordavam que, no tocante à
agricultura, as propostas de transformação numa estrutura de propriedade da terra eram
dispensáveis, desnecessárias. Entendiam
“Que, portanto, a superação de seu atraso, este medido pela sua baixa
competitividade ao nível do mercado externo e a sua ineficiência quanto abastecimento
alimentar, tinham como única resposta: a modernização tecnológica, mecanização ou
aumento do capital orgânico, utilização de insumos industriais (defensivos, fertilizantes,
adubos, sementes melhoradas, etc). Essa visão da modernização da agricultura é sinônima
de produtividade, ou seja, necessitava-se urgentemente de produtividade, e esta só seria
possível através da modernização tecnológica”
(MONTENEGRO, 1993, p. 75).
86
Dessa forma, segundo Neto (1997), a pregação modernizante da agricultura com o
intuito de aumento da produção (e da produtividade), respondendo aos estímulos e às
necessidades internas de abastecimento e de excedentes exportáveis, ou simplesmente de
produtos exportáveis, ganha novo reforço a partir da necessidade de equilíbrio da balança.
Aliado a este fator deve-se acrescentar outro: a escalada dos preços dos produtos agrícolas no
mercado internacional no período 1968-73, a qual, apesar da queda dos anos 1974-75, foi
determinante para os negócios para o restante da década.
Para Montenegro (1993), Andrade Alves tem como precípua, tratando-se da
questão agrária, a questão da produtividade. Só a produtividade dos fatores terra e trabalho
poderia solucionar as questões postas pelo crescimento econômico à agricultura. Só a
produtividade poderia fazer da agricultura um setor eficiente dentro das funções que uma
sociedade em via de industrialização lhe colocam pois, na sua compreensão, a agricultura tem
uma função a cumprir.
A produtividade é o argumento para a negação da reforma agrária, para a
justificativa dos créditos agrícolas subsidiados, assim como para a política governamental e a
de pesquisa privilegiarem os grandes e médios agricultores em detrimento do pequeno, para a
implementação de um processo de modernização excludente.
Uma questão que se coloca para a análise do conceito de modernização é a de esta
ser eminentemente política, explícita ou implicitamente ideológica. Nesse sentido, a sociedade
se deixa levar pela aparência das relações capitalistas, esquecendo-se da massificação e
secundarização que se dão às questões sociais mais preeminentes.
O crescimento populacional das cidades implicava uma demanda maior de
alimentos; nesse sentido havia toda uma pressão sobre a agricultura para que esta assumisse a
função de fornecedora de alimentos para os centros urbanos (MONTENEGRO, 1993).
Essa tendência de evolução da agricultura moderna apontava, já nos seus
primórdios, para a liberação de mão-de-obra, que ocorria quanto maior era o progresso
tecnológico introduzido, com o conseqüente aumento do que Marx chama “exército de
reserva”.
No início dos anos 1970, como observa Paulillo (1997), o sucesso das medidas de
resolução da questão agrícola brasileira e os reflexos políticos da ditadura militar em vigor
(1964-1985) propiciaram o escasseamento do debate em torno da questão agrária, mas a
realidade do campo continuou se desenvolvendo. Assim, no final da década de 1970, toma
forma e se afirma uma nova tendência no ideário de esquerda, que passa a tratar não mais da
87
“penetração” ou da “afirmação” do capitalismo no campo, mas do seu desenvolvimento no
setor (NETO, 1997).
Somente na década de 1980, como afirma Paulillo (1997), com o processo de
abertura política e o ressurgimento dos movimentos sociais no campo, se reacendeu o debate
sobre o desenvolvimento agrário no país, mas sob um prisma diferenciado:
(...)
não se trata mais de verificar se o capitalismo predomina ou não nas
relações sociais e de produção no campo, mas identificar a natureza e as diferenciações
existentes neste processo de desenvolvimento. Neste contexto, o debate se aprofundou
para a análise da natureza da reforma agrária: se de caráter capitalista e perfil reformista-
desenvolvimentista ou de caráter socialista e perfil revolucionário
(PAULILLO, 1997,
p. 559).
Segundo Graziano da Silva (apud NETO, 1997), três seriam as grandes
modificações que norteariam a agricultura nos anos 1980; o “fechamento” da fronteira
agrícola, historicamente a forma de expansão da agricultura brasileira; o aceleramento do
processo de modernização da agricultura no Centro-Sul do país; e, finalmente a crescente
presença de grandes empresas industriais, que tanto atuaram diretamente na produção
propriamente dita como fortaleceram sua presença no setor de processamento e no
fornecimento de insumos para a agricultura.
De acordo com Paulillo (1997), a conclusão da necessidade de uma reforma
agrária ampla evidencia seu perfil teórico marxista, priorizando o caráter desenvolvimentista
camponês, com a distribuição da terra (dos latifúndios) para exploração familiar.
Chegado o momento da efetivação de um modelo na busca do desenvolvimento
do Brasil, ganha o conservador, ou seja a elite brasileira. Implanta-se a construção de uma
agricultura mecanizada, mas sem mexer na estrutura fundiária.
3.1.2. Conseqüências do modelo desenvolvimentista conservador
Segundo Rocha (1998), ocorreu no Brasil, no final da década de 1960 e início dos
anos 1970, o estabelecimento de uma política econômica de modernização à custa de um forte
endividamento, acarretando a penetração mais intensiva de empresas multinacionais. Com
isso se gerou, no mercado brasileiro, um dinamismo da economia, onde se verifica um
aumento do parque industrial, principalmente nos setores de bens duráveis e não duráveis;
porém esta modernização é uma modernização conservadora, à medida que a dinamização da
88
economia é socialmente restritiva, os contrastes sociais aumentam e o usufruto do crescimento
econômico é restrito às camadas de maior poder aquisitivo.
Concomitante à industrialização, ocorreu uma mobilidade do trabalho rural
marcada pela ausência de reforma agrária, a qual, segundo Henrique (1998a), gerou
concentração de propriedades a partir de um intenso e desigual processo de modernização
agrícola nos anos 1960. Verificaram-se importantes transformações econômicas e sociais no
meio rural, porém continuou a se reproduzir a pobreza ligada à falta de acesso à terra, aos
baixos salários e à não-integração dos pequenos produtores aos circuitos mais modernos de
produção, distribuição e financiamento.
Neste ínterim, na agricultura, quatro fatores caracterizaram o domínio do interesse
do capital, quais sejam: 1) assalariamento dos operários agrícolas, predispondo à prática
capitalista; 2) a inserção de tecnologias no campo, para sustentar a indústria do setor; 3) a
expulsão do trabalhador do campo, com o conseqüente aumento do exército de reserva na
cidade; e 4) sustentação da geração de divisas por meio da exportação de produtos agrícolas,
como o soja.
Segundo Graziano da Silva (1982, p. 46), “Foi no final da fase de expansão do
ciclo da industrialização pesada brasileira que se instalaram no País as principais indústrias de
insumos agrícolas (em particular a indústria de tratores e máquinas agrícolas, fertilizantes
químicos, rações, medicamentos veterinários etc.)”.
Com base nesta perspectiva, que revela a agricultura e a indústria numa relação
interdependente, denota-se que a primeira passa a ganhar notoriedade na realidade econômica
nacional, como fonte de desenvolvimento atrelado ao modo de produção capitalista. A
agricultura, principalmente a partir da década de 1980, se transformou numa verdadeira
indústria, pois, além de consumir o artefato industrial (máquinas e insumos), se posiciona
como vendedora de produtos. Neste novo cenário, as grandes agroindustriais são o retrato de
um modelo de desenvolvimento no domínio dos latifúndios e da elite.
Cabe elucidar que a agricultura brasileira retrata uma forte aliança entre o capital e
a grande propriedade. Decorre disso a dificuldade de se fazer uma reforma agrária e
democratizar o acesso à terra. Um fator determinante para se dar a concentração das
propriedades foi o acesso ao crédito rural, já que apenas os grandes proprietários tinham como
dar garantia à dívida (GRAZIANO DA SILVA, 1982)
O reflexo disso se verifica no aumento da classe oprimida, identificada neste
trabalho como a classe incluída de forma perversa. Isso é decorrente de uma gestão do
Governo Federal que objetivou o crescimento econômico, se utilizando de um discurso que se
89
apresenta como busca do desenvolvimento. O próprio Delfim Neto defendia: “Vamos
primeiro fazer o bolo crescer para depois dividi-lo”. A divisão ainda não aconteceu! Continua
a imperar no Brasil a desigualdade!
Os propósitos da modernização da agricultura estão em sustentar o
desenvolvimento da indústria e aumentar a “produtividade” agrícola, tendo em vista a sua
utilidade como mercado consumidor, como exportador (na geração de divisas) e como fonte
de matéria-prima. Quanto à produtividade, cabe observar que, ainda que se consiga reduzir as
perdas na produção agrícola, o fato de agilizar o processo de cultivo não a faz aumentar.
Sendo a terra o recurso determinante e delimitador, numa determinada área a produção é
sempre a mesma, o que muda é a qualidade e a intensidade.
Pode-se perceber uma concentração agrária por meio da tabela n. º 3, a qual
referencia a taxa de crescimento anual do número de imóveis rurais por meio de duas frações
de tempo, totalizando 11 anos.
TABELA nº 3. Taxas de crescimento anual do número de imóveis rurais segundo o tamanho (%
a.a.)
Estrato de área total
(ha)
1967-72 1972-78
Menos de 10 - 4,5 -2,8
10 a menos de 100 0,0 -1,1
100 a menos de 1.000 1,0 0,2
1.000 a menos de 10.000 0,8 1,5
10.000 a menos de 100.000 4,3 4,3
100.000 e mais 6,0 9,2
Total de imóveis -1,4 -1,4
Área total 0,6 1,6
Fonte: Cadastros de Imóveis Rurais de 1967, 1972 e 1978 (apud GRAZIANO DA SILVA, 1982, p. 164).
Segundo Graziano da Silva (apud MORO, 1998), a modernização foi parcial,
conservadora e dolorosa. Parcial porque se limitou a algumas regiões do país, a alguns
produtos específicos e a certas fases da organização da produção; conservadora porque não
rompeu com a tradicional concentração fundiária; e, por fim, dolorosa porque concorreu para
expulsar do campo milhares de pessoas ligadas às atividades agropecuárias, acentuando o
êxodo rural.
A modernização é, na sua essência, um atributo do desenvolvimento capitalista,
mas não o é somente progresso técnico. Modernização é progresso técnico, mas é também
qualidade de renovação dos interesses capitalistas, é uma característica do capital. É um saber
90
científico e técnico que existe socialmente, mas é originalmente apropriado pela classe
capitalista, e, portanto, reprodutora, em sua natureza, das relações desiguais de produção.
Para Graziano, modernização da agricultura se define por inovação técnica
(mecanização, fertilizantes, defensivos, etc.) que, em termos econômicos, resulta em aumento
da produtividade, e em termos sociais, “ se faz acompanhar de unidades de produção cada vez
maiores, com uma conseqüente deterioração da distribuição da renda no setor agrícola”
(SILVA, 1982).
No entender de Graziano da Silva (apud MORO, 1998), uma vez consolidado o
processo de modernização da agricultura, que resultou no empobrecimento geral dos
trabalhadores rurais, a reforma agrária é, mais do que nunca, um direito legítimo dos
trabalhadores rurais brasileiros: pequenos produtores, posseiros, rendeiros, parceiros,
assalariados permanentes e/ou temporários, etc.
Esse direito advém das brutais conseqüências das mudanças provocadas pela
modernização da agricultura. Advém das condições de miserabilidade em que foram postos os
pequenos produtores agrícolas e trabalhadores rurais em geral (GRAZIANO DA SILVA,
1982).
Neste contexto, a modernização conservadora agravou a situação de pauperismo e
desigualdade no nosso país. Um país que cresceu mas não se desenvolveu, apenas se
dinamizou e lançou ao estado de inclusão perversa uma grande parte de seus habitantes.
Muitíssimos deles, como pequenos proprietários, não sobrevivem à nova ordem capitalista,
ocorrendo uma maior concentração fundiária no Brasil como um todo. O resultado, observa
Rocha (1998), é um intenso êxodo rural e a migração de pequenas cidades para centros
maiores, mobilidade que torna as cidades “inchadas” e sem condição de absorver as demandas
de trabalhadores.
Em síntese, a urbanização no Brasil ganha força justamente com a mecanização da
agricultura, que, nas décadas de 1970 e 1980, promove mais intensamente o êxodo rural,
ocasionando um grande processo migratório do campo e de pequenas cidades para os médios
e grandes centros urbanos, bem como o surgimento de novas regiões que se industrializam.
Logo de início, se faz oportuno revelar os números migratórios do rural para o urbano, que
foram os seguintes: na década de 1950,7 milhões; na de 1960, 12,3 milhões; e na de 1970,
15,8 milhões, de acordo com Martini & Garcia (apud OLIVEIRA, 1998).
O processo de urbanização impacta de forma significativa a mobilidade do
trabalho, e está associado a um maior dinamismo produtivo da economia brasileira.
91
De acordo com Pochmann (2001, p. 36), “Nos anos de 1950 até 1980, quando
houve o maior impulso à industrialização nacional, o país viveu um período de ouro, com taxa
média anual de expansão da produção de quase 7%”.
Percebe-se em tal época que o Estado atuava no planejamento e nas diretrizes do
desenvolvimento nacional, com um expressivo papel de gestor da nação e da máquina
produtiva estatal, como agente promotor do bem-estar social, fechado a qualquer especulação
externa, embora o Brasil nunca tenha vivido a política do bem-estar social como empreendida
na Europa.
Apesar do forte crescimento durante a década de 1970, a estagnação da economia
brasileira a partir do início dos anos 1980 se refletiu na insuficiente geração de empregos, que
freou o desenvolvimento profissional e a ascensão socioeconômica da população. Segundo
Baltar (1998), no desenrolar da crise, o Estado brasileiro perdeu progressivamente a
capacidade de regular o funcionamento da economia e promover o seu desenvolvimento. Por
outro lado, com a ausência do poder público abriu-se espaço para uma tentativa de reorientar
o desenvolvimento com uma participação bem menor do Estado na proteção e promoção da
produção nacional. Até o presente momento, essa reorientação tem significado,
principalmente, a desarticulação da estrutura da produção e o menor investimento na
ampliação da capacidade produtiva, estreitando ainda mais as possibilidades de integração
socioeconômica da população pelo emprego.
Já nas últimas décadas (1980 e 1990), o Brasil se apresenta mais industrializado,
urbano e adotando políticas neoliberais, com a abertura do mercado nacional à concorrência
internacional, se posicionando como fornecedor de mão-de-obra barata, mas consumidora da
produção realizada em seu próprio território (também), embora gerida pela elite capitalista
dominante norte-americana e européia, em sua maior parte.
Essas mudanças revelam uma mobilidade que se inicia no trabalho mas reflete
uma questão social, ou seja, o desemprego. Nessa perspectiva, é importante compreender
como se instaurou o processo evolutivo da economia brasileira e o seu reflexo na sociedade.
Conforme se faz perceber na obra de Márcio Pochmann “O emprego na
globalização”, a qual data de 2001, o Brasil vivenciou dois momentos opostos quanto ao
desenvolvimento econômico. Num primeiro momento, no decorrer das décadas de 1950, 1960
e 1970, o país teve um comportamento decepcionante logo na primeira década, mas alcançou
taxas elevadas de crescimento do emprego industrial nos anos 1960 e também nos anos 1970,
colhendo os frutos de tudo que fora investido no final da década de 1950. Nesse período, o
92
desenvolvimento industrial foi acompanhado de uma diversificação do emprego urbano e do
crescimento do setor terciário da economia.
A industrialização brasileira representou, para uma parcela restrita da população,
o acesso efetivo a padrões de consumo semelhantes aos das economias capitalistas avançadas,
e, para outros, os incluídos de forma perversa, o sonho, nem sempre alcançado, da ascensão
social e da melhoria de vida.
Dessa forma, apesar do dinamismo na geração de empregos, a velocidade do
processo de migração despejou nas cidades um contingente de população que não pôde ser
totalmente absorvido no mercado de trabalho formal.
Para Oliveira (1998), as regiões que pouco se beneficiaram das transformações
econômicas, ou seja, não se desenvolveram como as mais adiantadas e ficaram numa situação
de estagnação frente ao contexto nacional, tornaram-se imensos depósitos de população
pobre. Por outro lado, aquelas regiões que apresentaram um elevado dinamismo econômico
entre os anos 1950 e 1970 e tiveram uma concentração de renda e um rápido crescimento
populacional, também acabaram por reforçar o aumento de uma nova pobreza, cuja
concentração se dá em grande parte na periferia dos médios e grandes aglomerados urbanos.
Em um segundo momento, o Brasil, pós 1990, abre sua economia ao mercado
mundial, conforme os preceitos neoliberais, ajustando sua indústria a uma produção mais
flexível e subordinada ao capital financeiro, hegemônico. Tal contexto o levou à especulação
financeira e à flexibilização do trabalho, esta conquistada pela terceirização, projetos
modulares de produção e fragmentação do trabalho pelo território global, viabilizada pelas
telecomunicações e tecnologia da informação, seguindo o modelo toyotista.
Conforme Pochmann (2001, p. 42 - 3):
“Em parte a difusão do novo padrão tecnológico possibilitaria a passagem da fase de
mecanização e automação rígida (produção convencional), por exemplo, para a fase de
automação flexível (computador associado à máquina, robôs, sistemas CAD-CAM e
sistemas digitais de controle distribuído)
93
implantação do sistema just in time, controle estatístico de processo, lay out, logística, entre
outras medidas; na gestão de recursos humanos compreendeu terceirização da mão-de-obra,
redução de hierarquias funcionais (downsizing e reengenharia), treinamento de mão-de-obra,
incentivos monetários, entre outras; e na conduta empresarial englobou desverticalização da
produção, focalização, lançamento de novos e diversificados produtos, entre outras
estratégias.
Para Henrique (1998), o movimento econômico dos anos 1990 e seus impactos
sobre o emprego colocam, sem dúvida, grandes restrições a uma alteração positiva do quadro
histórico de pobreza e concentração de renda do país, com um considerável aumento dos
salários-base e das baixas rendas em geral. Deste modo, a década de 1990 foi marcada por
empregos de baixa qualidade, sendo estes informais ou, quando formais, proporcionando
baixa remuneração.
Com efeito, houve uma acentuada queda do nível do emprego formal no país a
partir do início da década de 1990, em parte pela mobilidade das formas de utilização do
trabalho, com a terceirização de atividades antes realizadas dentro das empresas, em parte
pela diminuição de oportunidades ocupacionais. No entender de Baltar (1998), essa
diminuição está associada à mudança na estrutura de produção, não somente por causa da
elevação da produtividade do trabalho, mas também devido a uma desintegração das cadeias
produtivas, abaladas pela importação crescente de bens intermediários. O emprego na
indústria de transformação caiu cerca de 15%, segundo ele, e não voltou a crescer com a
recuperação da economia, pois ocorreu uma diminuição do emprego formal em vários setores.
Nesse sentido, a mobilidade centrada no trabalho ocorrida no Brasil durante o
último século mudou completamente a estrutura social nacional, instaurando uma significativa
burguesia industrial e uma classe operária submissa ao capital. Em virtude desta submissão, a
dinâmica populacional fluía em decorrência da dinâmica especulativa do capital. No início da
década de 1990, com o governo Fernando Collor de Mello, o Brasil se deparou com um
mercado aberto, conhecido como neoliberal, no qual se instaurou uma concorrência global no
mercado local. Nesse momento as empresas nacionais estavam despossuídas das tecnologias
necessárias para auferir uma produtividade suficiente e coerente com o mercado internacional,
que pudessem reduzir os custos de produção e aumentar a qualidade, segundo as novas
exigências do mercado.
As indústrias que até então operavam no Brasil se haviam desenvolvido numa
economia fechada ao comércio exterior. Por não concorrerem com as competitivas empresas
americanas, européias e asiáticas, elas não se haviam preocupado em melhorar sua
94
produtividade e seu capital ia para aplicações financeiras, totalmente rentáveis num país que
possuía, até o início do Plano Real, uma inflação de altas cifras.
Frente ao novo cenário neoliberal, o qual dita como regra o processo de
internacionalização das economias locais, ascendendo o poder das transnacionais em
detrimento do suposto fim do Estado-nação, se tornou imprescindível a incorporação de
tecnologias pelas empresas nacionais, em busca de uma maior produtividade, de maneira a
poderem praticar preços mais competitivos no mercado global, mediante a redução dos custos
de produção.
Para Milton Santos (2000), a política agora é feita no mercado, sendo as empresas
verdadeiros atores inconseqüentes quanto à responsabilidade social. Como esse mercado não
tem uma posição ética, a empresa reina na ideologia do mercado global e domina o cenário,
usufruindo as leis do sistema vigente, anunciando o fim do Estado-nação.
Nessa perspectiva, a mobilidade centrada no trabalho se instaura em vista das
mudanças no mercado decorrentes dos avanços tecnológicos, da industrialização, das novas
políticas voltadas à integração ao comércio internacional. Tais mudanças interferem na
economia interna dos países, dos quais os menos desenvolvidos encontram dificuldade de
enfrentar a competitividade, por necessitarem de uma maior sustentação do poder público,
com recursos que, para serem disponibilizados, são transferidos dos serviços sociais para
viabilizar a sustentabilidade econômica e financeira. Esses subsídios acarretam, assim, um
maior custo para a camada mais carente, empobrecendo-a ainda mais. Com efeito, a razão
instrumental se apresenta como dominante e as ações empresariais sustentam um maior
acúmulo do capital se utilizando, como sempre, da força de trabalho como instrumento.
Com base na razão instrumental, o discurso atual se apresenta completamente
alienado das questões sociais. Não se pode deixar de considerar, nesse contexto, a importância
de uma requalificação da força de trabalho, que confira uma maior flexibilização, por meio de
novas habilidades, pois num ambiente sem empregos, que acarreta uma competição
desumana, é fundamental se apresentar empregável. Segundo Pochmann (1999, p. 97),
“Como a educação torna-se cada vez mais uma condição necessária para o emprego da mão-
de-obra, a oferta de trabalho tende a estar mais identificada com a busca de maior qualificação
profissional”.
No Brasil, quanto à qualificação, constata-se que as empresas têm buscado
oferecer cursos de reciclagem, já que passaram a ter dedução fiscal dos gastos com formação.
Já por parte do governo, tem sido ofertada uma variedade de programas aos desempregados,
95
sendo a participação em tais programas uma condição para se receber o seguro-desemprego
(GUIMARÃES, 1998a).
A mobilidade acontecida com os avanços tecnológicos no mercado brasileiro
instaurou, sem dúvida, uma maior exigência quanto à qualificação da força de trabalho, em
conseqüência da necessidade de novos conhecimentos para operar um sistema de produção.
Isso explica o desemprego - causado pelo aumento de produtividade obtido com as novas
tecnologias e pela concomitante estagnação do crescimento econômico do país.
De acordo com Pochmann (1999, p. 104),
“Entre 1989 e 1996, o desemprego cresceu relativamente mais: 1) para as
pessoas com mais de 11 anos de escolaridade; 2) para pessoas com idade mais avançada
(mais de 40 anos), para os homens; 3) para os não-chefes de família (cônjuge); 4) para as
pessoas negras; e 5) para os que buscam o primeiro emprego”
.
No entanto, há que se considerar que o problema da precarização do trabalho não
se resolve apenas com qualificação. A questão é estrutural
14
, de modelo de desenvolvimento.
Tem-se que sair de um modelo concentrador para um modelo descentralizador, com menores
distanciamentos sociais entre as classes. A permanência na pobreza absoluta de grande parte
da população urbana do país é a verdadeira expressão de uma situação de extrema
desigualdade e de polarização de classes.
Mesmo o país vivenciando décadas de estagnação econômica, constatou-se um
crescimento da demanda por bens e serviços. Deste modo, como elucida Baltar (1998), o
emprego formal permaneceu constante na administração pública e aumentou nos setores da
educação e saúde, alojamento, alimentação, reparação, manutenção, diversões e serviços
pessoais. Mesmo assim, o saldo do emprego ficou negativo no montante das últimas três
décadas, com uma redução de 7%.
Faz-se oportuno ressaltar que os setores primário e secundário perderam
participação relativa, de 10,3% e 3,4%, respectivamente, no que se refere à ocupação total,
enquanto o setor terciário cresceu 13,7%. (BALTAR, 1998)
A crise social atinge hoje níveis muito graves, com grande elevação dos índices
de crime e outras transgressões. A porcentagem dos domicílios brasileiros que se situam
abaixo da linha da pobreza passou de 17% para 20%, no período supracitado (CANO, 1998).
14
Para Pochmann (1998, p. 219), “por desemprego estrutural entende-se aquele originado pela inadequação da
estrutura econômica que opera sem utilizar plenamente a força de trabalho disponível. Decorre, na maior parte
das vezes, do baixo e prolongado dinamismo econômico, da destruição de ocupações tradicionais no campo, da
rápida mudança na base técnica, da carência educacional, da desregulação do mercado de trabalho, da abertura
inadequada da economia, etc”.
96
A pobreza urbana tornou-se um problema nacional, formando-se extensos bolsões
de miséria nas médias e grandes cidades, assim como nas metrópoles. Em matéria publicada
no jornal Folha de São Paulo em 07 de janeiro de 2001, constata-se que o número de favelas
cresceu 22,5% nos anos de 1991 até 2000. Com efeito, a diferenciação das grandes regiões
brasileiras associou-se a diferentes situações de pobreza, inclusive entre as áreas
metropolitanas, mas sem que nenhuma delas tivesse superado as desigualdades e a pobreza.
Da produção artesanal até os dias de hoje, o capitalismo criou uma mobilidade
que se legitima por meio da sua evolução. Essa evolução apresenta-se numa busca incessante
pela mais-valia, e todos os novos avanços são produtos desse modelo, que passa a integrar a
própria produção.
Essa produção, que recebeu as máquinas, estruturou-se em série (dando origem às
novas cidades e sociedades industriais), se reproduziu em outros países por meio das filiais e
está hoje fragmentada (fisicamente) pelo planeta, sempre se buscou a mais-valia. Tal fato
influenciou diretamente o comportamento da sociedade, forçando-a buscar na cidade o
emprego da industrialização nascente, devido à sua falta na zona rural, acarretada pela
mecanização e modernização da agricultura. Desse modo, a expansão da periferia apresenta-
se fortemente ligada à mobilidade centrada no trabalho. A periferia ilude com sua aparente
(re)produção espontânea, mesmo sendo forçada pelo desenvolvimento desigual e combinado,
se servindo de hábitat para o exército de reserva que sustenta o atual modelo econômico,
espoliado pela nova dinâmica do trabalho.
Atualmente, no Brasil, o aumento da competição internacional está pressionando
fortemente a base produtiva existente, não só pela presença de produtos importados mas
também pela necessidade de competir no mercado externo, forçando o sistema produtivo a
reduzir custos e melhorar a qualidade, como se verificou pouco acima. Em consonância, o
setor de serviços vem se consolidando como o maior empregador, embora prevaleça nesse
setor uma maior concentração de empregos em pequenas empresas e serviços autônomos.
Pode-se perceber que, na lista das 500 melhores e maiores empresas por
faturamento, publicada anualmente pela Revista Exame, as representantes do setor de serviços
têm aumentado sua participação, como ilustra a tabela n.º 4.
97
TABELA nº 4. A localização das maiores empresas por faturamento no Brasil: industriais e
prestadoras de serviços, 1994, 1998 e 2002
Itens
1994 1998 2002
BRASIL 500 500 500
Indústrias 382 317 298
Prestadoras de serviços 118 183 202
NORTE 13 15 20
NORDESTE 36 28 35
CENTRO-OESTE 09 14 17
SUDESTE 367 367 341
SUL 75 76 87
Fonte: Revista Exame Maiores e Melhores de 1995, 1999 e 2003.
ORG: BORGES W.A.
Pode-se perceber na tabela nº 4 uma real concentração das empresas nas regiões
Sul e Sudeste (85,6% em 2002). Desse modo, embora alguns dos estados que não possuíam
tradição na indústria tenham passado a sediar grandes matrizes, devido a uma competição
interestadual por meio de isenções fiscais e outros benefícios, a melhor infra-estrutura,
qualificação da mão-de-obra, centros de pesquisa e tecnologia e o maior mercado consumidor
ainda se localizam no Sul e principalmente no Sudeste, fazendo dessas regiões espaços mais
competitivos, principalmente para os pólos tecnológicos e de serviços, ou seja, para o
emprego de qualidade com base no conhecimento.
Com efeito, segundo Diniz (apud RIBEIRO, 2000), todo o processo de
flexibilização produtiva apresentado no presente trabalho tende a reforçar a região mais
desenvolvida do país, a qual ele delimita como o polígono e seu entorno definido por Belo
Horizonte – Uberlândia – Maringá – Porto Alegre – Florianópolis – São José dos Campos, e
salienta que nesse espaço está a maior parcela da base produtiva, que se moderniza mais
rapidamente, e também onde estão as melhores condições locais. Nesse contexto, tais regiões
se tornam pólos de atração, fazendo com que ocorra uma concentração da população nos
médios e grandes centros urbanos.
Com efeito, na relação entre o pólo e sua periferia, cabe a algumas das cidades de
uma região metropolitana cumprir a função de hospedar a mão-de-obra desqualificada, a qual
se configura como um exército de reserva e é muitas vezes incluída no mercado de trabalho
informal. Além disso, uma grande porção do sítio urbano e periurbano de tais cidades se
apresentar como um espaço precário quanto à infra-estrutura urbana, dependente do mercado
de trabalho e dos serviços (saúde e educação) prestados na cidade-pólo, e em alguns casos
dominado pelo “poder paralelo” do tráfico e da violência urbana. Essas cidades constituem
um outro extremo do desenvolvimento desigual e combinado e um espaço periférico e externo
98
à metrópole, principalmente pelos parcos recursos relativos garantidos a alguns municípios
metropolitanos (aqueles que sobrevivem de uma maior participação de recursos advindos do
IPTU e FPM – Fundo de Participação dos Municípios). O termo “relativo” foi empregado por
se considerar que o montante arrecadado se apresenta parco frente ao montante populacional e
aos problemas urbanos e sociais.
Desse modo, a mobilidade centrada no trabalho, a qual reproduziu uma nova
realidade, mais urbana, propiciou a expansão das periferias carentes, por imperar a lógica do
desenvolvimento desigual e combinado, como se verifica na tabela n.º 5.
Em 1970
apenas 18,8% da população pobre habitava os espaços metropolitanos,
enquanto 51,5% dos pobres estavam na zona rural. De 1970 até 1999 nota-se que a pobreza
rural perdeu participação, que passou a 20,4%, enquanto houve uma concentração nos núcleos
urbanos (45,4%) e espaços metropolitanos (34,2). Cabe ressaltar que no estrato urbano são
computados todos os centros urbanos não metropolitanos.
TABELA nº 5. Participação (%) dos pobres por estratos 1970, 1981, 1990 e 1999
Brasil e estratos 1970 1981 1990 1999
Brasil 100 100 100 100
Metropolitano 18,8 26,4 29,2 34,2
Urbano 29,7 38,0 41,7 45,4
Rural 51,5 35,6 29,1 20,4
Fonte: IBGE, Censo Demográfico (1) e Pnads (2). Tabulações especiais baseadas em linhas de pobreza derivadas
do Endef (apud ROCHA, Sonia, 2003, p. 180).
ORG: BORGES, W. A.
O último censo, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) no ano de 2000, revelou que as cidades de porte médio, ou seja, as que possuem uma
população de 50.000 até 500.000 habitantes, foram as que mais cresceram.
Observe-se que no presente trabalho as cidades médias são aquelas que
apresentam uma população entre 100.000 e 1.000.000 de habitantes. Foi escolhida essa
classificação pelo fato de se considerarem como cidades grandes (cidades que possuem
população acima de 1.000.000 de habitantes) apenas as grandes metrópoles nacionais e
regionais, além do Rio de Janeiro e São Paulo, as quais se configuram como metrópoles
globais, segundo o material publicado em parceria entre IPEA, IBGE e Unicamp/IE/NESUR
(1999). Apesar dessa constatação, sabe-se que as cidades metropolitanas e as capitais de
estado que se classificam como de porte médio foram as que contribuíram de forma mais
representativa para que a categoria “cidades médias” crescesse 3,08%. Com exceção de
algumas cidades médias do interior, como Uberlândia - MG (3,66%) e Foz do Iguaçu - PR
(3,61%), a grande maioria obteve uma taxa de crescimento muito inferior à de 3,08% ao ano.
99
A taxa média de crescimento anual das cidades médias do interior (não metropolitanas) é de
1,16%.
Com efeito, nas cidades metropolitanas mais carentes, as quais são compreendidas
neste trabalho como as que possuem uma renda per capita mensal inferior a R$ 300,00 (o
arredondamento para cima do salário mínimo – R$ 260,00) constatam-se, com freqüência,
extensas áreas que podem se classificar como espaços periféricos na margem urbana ou à
margem da sociedade, como já foi observado na contextualização da periferia.
É justamente nos municípios investigados da periferia externa ao pólo
metropolitano que se verifica uma maior taxa de crescimento populacional, conforme ilustra a
tabela n.º 6. Ou seja as cidades metropolitanas que apresentam baixa renda, índices
socioeconômicos evidenciadores de um estado de carência, além de uma precária e muitas
vezes ausente infra-estrutura urbana, superam a taxa média de crescimento das cidades
médias, alcançando a marca de 3,29% a.a..
TABELA nº 6. População, tamanho médio e taxa de crescimento dos diferentes portes e
categorias de cidades – 1991 e 2000
Itens* Pop. 2000 T. M. 2000 Pop. 1991 T. M. 1991 T.C.A.
2000/1991
TOTAL CIDADES MÉDIAS (224
municípios) 100.000 à 999.999
86.209.480 384.864 72.848.835 325.218 2,03% a.a.
TOTAL CIDADES GRANDES (12)
Acima de 1.000.000 habitantes
33.251.711 2.770.976 29.296.841 2.441.403 1,5% a.a.
CIDADES MÉDIAS - (129)
(não metropolitanas)
31.312.115 242.730 26.599.597 206.198 1,97% a.a.
TOTAL CAPITAIS DE PORTE MÉDIO
(15) 100.000 à 999.999 hab.
7.119.874 474.658 5.697.356 379.824 2,78% a.a.
TOTAL CIDADES MÉDIAS NO
INTERIOR (114) 100.000 à 999.999
hab.
24.192.241 212.212 20.902.241 183.353 1,16% a.a.
TOTAL CIDADES MÉDIAS
METROPOLITANAS (80)
(metropolitanas)
21.645.654 270.571 16.952.397 211.905 3,08% a.a.
CIDADES METROPOLITANAS (57)
(renda per capta inferior a R$ 300,00)
Acima de 100.000 habitantes
14.190.179 248.950 10.950.824 192.120 3,29% a.a.
Fonte: IBGE - Censo Demográfico 1991 e 2000
ORG: BORGES W. A
*Pop.: População; T.M.: Tamanho Médio; T.C.A.: Taxa de Crescimento Anual
Com efeito, para Rogers (apud RIFKIN, 1995), a exclusão social inclui não só a
falta de acesso a bens e serviços, mas também à segurança, à justiça, à cidadania; ou seja,
relaciona-se às desigualdades econômicas, políticas, culturais e étnicas. Pode-se estar excluído
do mercado de trabalho, do acesso a moradia adequada e a serviços comunitários, do acesso a
100
bens e serviços. A exclusão pode vir de dentro do mercado de trabalho, com empregos ruins e
instáveis, gerando renda insuficiente para garantir padrão de vida mínimo, como também da
falta de acesso à terra, à segurança e aos direitos humanos.
Essas grandes aglomerações urbanas da periferia, justamente em virtude de uma
urbanização desigual, apresentam hoje, invariavelmente, um absoluto quadro de pobreza,
percebendo-se um exagerado ritmo de seu crescimento em relação aos centros dinâmicos.
Os municípios investigados da periferia externa se desenvolvem subordinados ao
centro detentor de capital. Produz um novo espaço urbano, formado por meio da exploração,
por parte do mercado imobiliário, de áreas periféricas, viabilizada pela flexibilidade da
legislação que regulamenta o parcelamento do solo nessas localidades, que se apresentam,
muitas vezes, como sedes de município.
Tratando-se da periferia, nota-se nos gráficos nº 1 e nº 2, a seguir, referentes às regiões
metropolitanas do Brasil (MOURA, DELGADO, DESCHAMPS e CARDOSO, 2004), um
maior crescimento populacional das cidades que compõem a periferia externa ao pólo. As
cidades-pólo, por sua vez, experimentaram crescimentos menos expressivos no período de
1991 a 2000, com exceção de Londrina e Maceió, as quais detêm taxas de crescimento
maiores do que as apresentadas por suas periferias.
GRÁFICO nº 1. Crescimento da população das Regiões Metropolitanas polarizadas por
metrópoles – 1991 - 2000
Fontes: IBGE; IPARDES
101
GRÁFICO nº 2. Crescimento da população das Regiões Metropolitanas polarizadas por
centros regionais ou sub-regionais – 1991 - 2000
Fontes: IBGE; IPARDES
Com efeito, com exceção da categoria das RM’s polarizadas por centros sub-regionais, como,
por exemplo, as RM’s de Maringá, Joinville, etc., todas as demais tiveram um aumento da
pobreza, em números absolutos, como se verifica no gráfico nº 3.
GRÁFICO nº 3. Número de pessoas pobres, por categoria de pólo, das Regiões
Metropolitanas do Brasil - 2000
Fontes: PNUD; IPARDES
A cidade de Maringá e sua região metropolitana se apresentam como um lócus
desigual, o qual é composto por uma cidade concentradora das riquezas, que se sustenta do
102
pauperismo alojado em seu entorno, principalmente em dois municípios limítrofes - Sarandi e
Paiçandu. Essa desigualdade será o foco de análise do capítulo 4.
A desigualdade entre o pólo e os municípios investigados da sua periferia externa
se verifica num maior contraste na RM de Maringá, quando se compara com as demais RM’s
polarizadas por centros regionais ou sub-regionais da Região Sul.
Constata-se que o rendimento médio de todos os trabalhos auferido por Maringá
(R$ 841,11) é o segundo maior entre as cidades-pólos, perdendo apenas para Florianópolis
(R$ 1.146,36). Mas, quando se faz o mesmo levantamento para as RM’s, a região
Metropolitana de Maringá apresenta o menor rendimento, o qual se expressa em R$ 691,51.
Destarte, Maringá aparece como a segunda RM que apresenta maior desigualdade entre o
pólo e a periferia, a qual se expressa em 21,6%, perdendo para Florianópolis (25%). A
terceira pior é a região carbonífera polarizada por Criciúma, a qual apresenta uma diferença
bem inferior (14,2%).
Neste contexto, a região que se revelou menos desigual foi a polarizada por Itajaí
(Foz do Itajaí), com um índice de desigualdade de apenas 0,5%.
TABELA nº 7. Regiões Metropolitanas da região sul do Brasil, polarizadas por cidades de porte
médio: rendimento médio de todos os trabalhos – 2000
Rendimento Médio de Todos os Trabalhos
(R$) – 2000
REGIÃO METROPOLITANA
RM Pólo Pólo/RM - %
Carbonífera/SC* – polarizada por Criciúma 716,63 818,12 14,2
Florianópolis/SC* 916,76 1.146,36 25,0
Foz do Itajaí/SC* - polarizado por Itajaí 760,12 764,04 0,5
Londrina/PR 730,04 823,96 12,9
Maringá/PR 691,51 841,11 21,6
Norte/Nordeste Catarinense/SC* – polarizado por
Joinville
801,14 816,95 2,0
Vale do Itajaí/SC* – polarizado por Blumenau 731,25 789,79 8,0
Fonte: IBGE, Censo Demográfico, PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2003; IPPUR –
Observatório Metrodata – ICH 2004 (apud MOURA; DELGADO; DESCHAMPS e CARDOSO, 2004).
ORG: BORGES, W.A.
* Aglomerado da RM
Cumpre considerar a representatividade da cidade-pólo, já que, dentro de uma
lógica, quanto maior for a participação populacional da cidade-pólo em números absolutos,
maior a tendência do quadro se apresentar homogêneo. No entanto, a única região cujo pólo
apresenta uma alta representatividade populacional é o aglomerado de Joinville, com um
índice de 94,78%, conforme o Censo Demográfico (IBGE, 2000). As demais regiões
103
apresentam uma participação populacional da cidade-pólo, no contexto da população, que
varia entre 46,18% (apresentada pela RM Foz do Itajaí) a 65,94% (apresentada pela RM
Londrina).
Com efeito, na tabela n.º 8, a RM Maringá, considerando-se o montante da PEA, é
a que apresenta o pior rendimento, como já verificado, porém a taxa de desemprego não se
revela como das mais altas. Poder-se-ia indagar: por que seu rendimento é o mais baixo,
sendo que o seu exército de reserva não é o maior, proporcionalmente?
TABELA nº 8. Regiões Metropolitanas da região sul do Brasil, polarizadas por cidades de porte
médio: PEA, Pessoas Ocupadas, Desempregados, Taxa de Desemprego e Massa de Rendimentos,
2000
Pessoas Ocupadas
REGIÕES METROPOLITANAS PEA
Total
Ind.
Tranf.
Desempregados
Taxa de
Desemprego
(%)
Massa de
rendimento
(R$ 1000)
Carbonífera/SC* – polarizada por
Criciúma
137.353 121.629 33.309 15.724 11,45 101.917
Florianópolis/SC* 351.578 307.465 29.409 44.113 12,55 370.546
Foz do Itajaí/SC* - polarizado por Itajaí 153.716 133.258 22.195 20.458 13,31 130.099
Londrina/PR 347.137 300.825 49.847 46.312 13,34 260,069
Maringá/PR 246.895 215.176 37.835 31.719 12,85 176.127
Norte/Nordeste Catarinense/SC* –
polarizado por Joinville
218.107 184.137 59.483 33.970 15,57 179.474
Vale do Itajaí/SC* – polarizado por
Blumenau
217.484 198.582 79.514 18.902 8,69 171.883
Fontes: IBGE, Censo Demográfico, PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2003; IPPUR –
Observatório Metrodata – ICH 2004 (apud MOURA; DELGADO; DESCHAMPS e CARDOSO, 2004).
ORG: BORGES, W. A.
* Aglomerado da RM
Neste contexto se percebe que, por mais que o desemprego influencie a massa
salarial (principalmente no bolso do trabalhador), o preço do solo também se apresenta como
um dos fatores de influência. Numa cidade de alto custo de moradia, tendencialmente, seus
habitantes auferem salários mais altos do que os moradores de cidades que apresentam
menores custos. A dinâmica, porém, se pauta na lógica do capital, cuja acumulação, no
contexto do mercado imobiliário, se dá por meio da valorização deste espaço. Sendo assim, o
cumprimento da legislação urbana e da lógica do mercado imobiliário tem grande impacto na
massa salarial do trabalhador. Neste contexto, o que se teve na periferia externa da cidade de
Maringá, foi a exploração da flexibilidade da legislação nos municípios de Paiçandu e
Sarandi, produzindo espaços de baixo custo de vida, viabilizados pelo adensamento do
número de lotes decorrente de sua pequena dimensão.
104
Como revela Beloto (2003, p. 76):
“A nível local, o Poder Público administra esta situação de forma isolada,
aplicando políticas urbanas excludentes e ignorando os reflexos destas sobre os
municípios vizinhos. A maior parte do ônus gerado por este tipo de administração recai
sobre a estruturação do espaço urbano das cidades menores – na verdade cidades-
dormitórios ou cidades-satélites – como conseqüência desta política aplicada pelas
cidades-pólo. (...) Entretanto, diferenças na infra-estrutura mínima obrigatória para a
aprovação de loteamentos, assim como a reduzida largura das vias, aliado à certeza de
regularização do empreendimento com lotes menores do que os permitidos por lei, são
chamarizes que a cidade de Sarandi oferece para o setor imobiliário investir em novos
projetos de loteamentos, contudo, sem haver a preocupação com a qualidade urbana
gerada e os futuros encargos que estes loteamentos darão ao Poder Público e
conseqüentemente à sociedade como um todo. (...) Quando comparado a Sarandi, a malha
urbana de Maringá realça a diferença na qualidade espacial entre ambas, resultado de
políticas urbanas com objetivos distintos. Este cenário segregado, entre outras coisas,
materializa a dependência econômica de uma cidade em relação a outra, com a expulsão
da população para uma periferia, onde a terra urbana torna-se mais acessível”.
Deste modo, a maneira como se deu a construção dos espaços periféricos na
cidade de Maringá, por exemplo, fez com que nessa região a dinâmica do apreçamento da
mão-de-obra sofresse um nivelamento para baixo, decorrente de um custo de vida mais baixo
na periferia pauperizada. A cidade de Maringá se segrega em decorrência das práticas nos
municípios circunvizinhos, os quais acolhem a população, o que retrata a “expulsão” realizada
pelo pólo. O emprego da palavra expulsão se torna adequado, porquanto se percebem agentes
maringaenses atuando na produção da periferia externa, forçando a constituição de um espaço
desigual.
Com efeito, estudar e compreender a expansão da periferia é mergulhar numa
extremidade da complexa produção social do capitalismo, é percebê-lo por um outro prisma, o
qual revela o oposto do desejável. Justamente por ninguém desejar essa periferia, ela cresce,
multiplica-se, não precisando de marketing algum para se vender, pois as pessoas acabam
nela.
Buscou-se até aqui compreender a modernização conservadora - a qual, como a
própria denominação denuncia, aconteceu com a efetivação do ideário neoclássico e ausente
de uma reforma estrutural da propriedade fundiária - e a flexibilização produtiva na nova
ordem neoliberal. Doravante buscar-se-á entender o processo de periferização no aglomerado
urbano de Maringá decorrente da mobilidade centrada no trabalho.
105
4. O AGLOMERADO URBANO DE MARINGÁ: A PERIFERIA DECORRENTE DA
MOBILIDADE CENTRADA NO TRABALHO
Estudar o processo de periferização no aglomerado urbano de Maringá é tomar
contato com o fenômeno de crescimento dos espaços urbanos de médio porte no Brasil. A
reprodução do urbano nestes espaços retrata a mesma condição de desigualdade vivenciada
pela metrópole, por mais que estas últimas apresentem dinâmicas diferentes ou mais intensas.
Deste modo, este fenômeno é também decorrente do processo de desconcentração das grandes
metrópoles tradicionais, São Paulo e Rio de Janeiro.
A cidade pode ser olhada a partir de vários ângulos, haja vista a complexidade
existente no lócus urbano, fruto da vivência humana, na construção e reprodução de uma
estrutura de vida social complexa e contraditória. A cidade poderia ser a expressão coletiva
emancipada e desejável, decorrente de um significado, porém, se reproduz com base na
acumulação capitalista decorrente do desenvolvimento desigual e combinado, o que, por sua
vez, resulta na produção da periferia.
Com efeito, observa Ciccollela & Mignaqui,; Sassen citado por Cariola e Lacabana
(2003, p. 7):
Diversos estúdios que ponen el énfasis en los procesos de reestructuración, en la
producción y el consumo asociados a la globalización apuntan hacia la conformación de
metrópolis duales, donde el avance de procesos de especialización funcional lleva a
articular plenamente ciertos fragmentos de la ciudad a la economía global, mientras otros
están totalmente marginados de ésta y se vinculan directamente a la economía de la
pobreza” (Ciccollela & Mignaqui, 2000; Sassen, 1999).
Pelo simples fato de a ordem capitalista instaurar a desigualdade, o indivíduo
poder-se-ia contentar com o destino, acreditando que o processo de periferização constitui
uma normalidade, um problema que sempre estará presente na sociedade.
Embora exista um descontentamento da sociedade, a acomodação pactuada das
classes dominantes - as detentoras de capital e possuidoras da voz ativa - determina as ações
públicas no país e no mundo, expressa uma ganância de auferir um maior acúmulo,
sustentando a mais-valia, ao passo que sustenta a depreciada mão-de-obra excluída.
A periferia é o reflexo da espoliação urbana, retrato das mazelas produzidas pela
cidade capitalista. Segundo Kowarick (2000, p. 22),
“...espoliação urbana é a somatória de extorsões que se opera pela inexistência ou
precariedade de serviços de consumo coletivo, que juntamente ao acesso à terra e à
moradia apresentam-se como socialmente necessários para a reprodução dos
106
trabalhadores e aguçam ainda mais a dilapidação decorrente da exploração do trabalho
ou, o que é pior, da falta desta” (sic)
.
A periferia dos centros urbanos brasileiros representa uma insustentável condição
de vida, na qual não se preza a cidadania e impera o individualismo, a ganância pelo acúmulo,
ficando patente a ausência do Estado na regulação das relações sociais na perspectiva da
construção da cidadania.
A cidade que incute a esperança no imaginário da força de trabalho lhe
proporciona as mazelas e o “prazer” de habitar um dos símbolos do capitalismo (a cidade
caótica e atraente), mesmo para aquele que mora na periferia.
Na conformação dos espaços, estes são regidos pelo modo de produção capitalista,
a partir de suas novas formas. A população, por sua vez, conforma-se com as leis de
acumulação de capital, embora isso não deixa de ser uma estratégia de vida. Os espaços
periféricos devem ser vistos como resultado de um processo de produção do espaço urbano, e
também como reflexo da sustentabilidade da nova estrutura laboral flexível que viabiliza a
nova lógica do capital.
Com efeito, para se efetuar a análise do aglomerado urbano de Maringá, faz-se
importante começar pela história de sua região.
4.1. O Norte do Paraná e sua colonização: uma breve elucidação histórica
A convite do governo brasileiro, que sabia do interesse da Inglaterra por terras
para a produção de algodão, destinado abastecer dessa matéria-prima o mercado inglês, um
grupo liderado por Lord Simon Lovat adquiriu uma grande gleba de terras no Norte do
Paraná, deslumbrado pela sua qualidade e riqueza.
O referido grupo não obteve sucesso no empreendimento, devido à má qualidade
das sementes de algodão, como observam Carvalho e Mendes (1999). Isso levou os membros
da Brazil Plantations Syndicate a liderar um empreendimento imobiliário, dando origem à
Paraná Plantations Company, que teve como subsidiária no Brasil a Companhia de Terras
Norte do Paraná. O grupo obteve facilidades em adquirir terras na região por parte do governo
estadual, que empreendia na época (final da década de 1920) um processo de colonização da
porção a oeste do rio Tibagi, na região do Norte do Paraná mais tarde conhecida como Norte
Novo e Norte Novíssimo. O interesse do Governo era manter o domínio sobre as referidas
107
terras, aliás devolutas, e proceder à colonização da área, já que, além disso, o Estado do
Paraná obteria uma maior arrecadação.
A cultura que viabilizou o desenvolvimento da região foi o café. Para viabilizar o
empreendimento foi necessária uma forte divulgação em todo o país, forçando assim uma
rápida colonização. Para tal feito e sua sustentabilidade, os lotes foram vendidos a baixo
preço. Além disso, como elucida Negri (2001), para garantir o desenvolvimento das cidades, a
Companhia doava terrenos urbanos para o poder público ali instalar suas repartições. Ainda
segundo o autor: “A mercantilização da economia nacional aliada a acumulação de capitais
produtivos e comerciais oriundos do café aprofundara a divisão técnica do trabalho no campo
e nas cidades, cedendo espaço para novos tipos de capital, industrial e bancário”. (NEGRI,
2001, p. 28)
Para Heidecke (2001, p. 34), “a própria política da companhia colonizadora
estabelecia que deveria favorecer-se e dar apoio aos pequenos fazendeiros, sem por isso
deixar de levar em consideração aqueles que dispunham de maiores recursos.
A Companhia de Terras Norte do Paraná iniciou o processo de colonização
fundando a cidade de Londrina, onde instalou a sede da empresa. Toda a área adquirida pela
companhia representava uma porção de 515.000 alqueires paulistas. Os loteamentos foram
tanto rurais como urbanos. Os lotes rurais eram de pequena dimensão (10, 15 e 20 alqueires),
promovendo uma reforma agrária voltada para a pequena propriedade. Com essa política a
Companhia objetivava fortalecer relações comerciais entre as cidades fundadas da própria
região (sustentando o seu desenvolvimento), já que, pelo pequeno volume de sua produção, os
produtores rurais teriam dificuldade em comercializar seus produtos nos grandes centros,
como São Paulo, como lembram Carvalho e Mendes (1999).
Juntamente com os loteamentos rurais foram disponibilizados lotes em futuros
núcleos urbanos, pois o plano era fundar cidades com a função de prestar serviços à
população rural. Foram projetadas e se desenvolveram cidades no corredor que se formou ao
longo da estrada de ferro que adentrou a região do Norte do Paraná em continuidade aos
trilhos que haviam partido de São Paulo em direção ao interior (Sorocaba e Ourinhos), e
também ao longo da paralela rodovia que vinha ligando os mencionados loteamentos. Estes
núcleos urbano distavam aproximadamente 15 km uns dos outros, e a cada 100km,
obedecendo ao planejamento, se localizaria uma cidade-pólo, destinada a concentrar a
comercialização regional e prestar serviços mais especializados, não encontrados nos
pequenos núcleos urbanos.
108
Padis (apud ENDLICH in Boletim de Geografia, 1999, p. 7) afirma: “Ao mesmo
tempo em que eram construídas estradas que recortavam a área a ser colonizada, cuidava-se
da construção da rodovia em direção a São Paulo e, sobretudo, da aquisição, em 1928, da Cia.
Ferroviária São Paulo-Paraná”.
Com o início da Segunda Guerra Mundial, por precaução, o Governo Brasileiro
impediu a permanência de capital externo em território nacional, o que acarretou a venda da
Companhia de Terras Norte do Paraná (CTNP) para um grupo de empresários paulistas e
mineiros (Carvalho e Mendes, 1999). Essa nova empresa, que passou a se chamar Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná, dando continuidade ao empreendimento de colonização da
região, adquiriu uma nova porção de terras (30.000 alqueires paulistas). Vale ressaltar que a
referida companhia não era a única presente no território norte-paranaense, mas era a maior
delas.
O projeto de colonização seguiu observando as distâncias entre os centros urbanos
que vinham sendo fundados, e as cidades criadas para exercer a função de pólo foram
Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama. Dentre essas, nos dias atuais, apenas as duas
primeiras exercem a função, com destaque para a grande ascensão da segunda, que se
consolidou como um centro universitário e prestador de serviços.
A cultura do café, embora tenha sustentado o desenvolvimento regional, entrou em
decadência na década de 1970. Motivo disso foi um forte incentivo por parte do Governo
Estadual para substituí-la por soja, trigo e milho, na intenção de modernizar a agricultura e
instaurar a mecanização para o aumento da produtividade de commodities mais rentáveis
voltadas à exportação. Outro fator prejudicial à produção cafeeira foram as sucessivas geadas
que se abateram sobre a região, especialmente a de 1975.
Negri (2001) observa que o desenvolvimento da agroindústria na região resultou
da mudança da base de produção agrícola, a qual levou à reorganização das cidades. Estas
passaram a desenvolver o comércio, que se tornou mais intenso e dinâmico, e a prestar
serviços especializados.
Desse modo, os centros urbanos sofreram o reflexo da mudança da produção
agrícola. Esta passou a ser totalmente mecanizada, o que acarretou uma mobilidade no
trabalho e uma intensa redução de empregos no setor, desviando o destino da mão-de-obra
excedente, que precisou ir em busca de emprego na cidade.
Para melhor compreender o processo de urbanização na região do Norte Central
paranaense, onde se insere a dinâmica do aglomerado urbano polarizado por Maringá, busca-
se resgatar a modernização conservadora nesta porção territorial.
109
4.2. A modernização conservadora no Paraná: uma ênfase no Norte Central
Por volta do final dos anos 1960, a sociedade paranaense era constituída
fundamentalmente de pequenos produtores, proprietários ou não, já que no Norte do estado
era grande o número de meeiros e colonos. Nas cidades, o que predominava era o comércio e
os serviços ligados à agricultura, enquanto a indústria era inexpressiva e rudimentar.
Conseqüentemente, era reduzido o número de trabalhadores assalariados, tanto no campo
como nas cidades.
A partir de meados dos anos 1960, esse tipo de sociedade começa a apresentar
sinais de transformações profundas, que inicialmente aparecem de forma lenta, mas se
aceleram na década de 1970 (IPARDES, 1982).
Enquanto nos anos 1960 era crescente o número de estabelecimentos agrícolas no
Paraná, ao longo da década de 1970 esse número diminui consideravelmente, em razão da
quase-inexistência de terras livres em termos legais e da modernização da agricultura
(CARNEIRO LEÃO, 1989).
Assim, para Moro (1998), verificou-se um acentuado processo de concentração da
posse da terra no Paraná, principalmente no Norte do estado. Esse processo, em conjunto
com outros fatores, gerou uma intensa mobilidade física da população paranaense, com
acentuado agravamento do êxodo rural, por esta região apresentar, até então, uma verdadeira
reforma agrária. Isso se deveu à substituição, em larga escala, da cafeicultura por pastagens e
pelo sistema agrícola de rotação de culturas soja-trigo.
Com efeito, a região do Grande Norte apresentava condições propícias à
implantação da mecanização da agricultura, já que, com base no desenvolvimento auferido
pelo ciclo cafeeiro, a região estava dotada de capitalistas do café e de uma classe de
produtores familiares mercantis, o que propiciara a existência de uma infra-estrutura de
produção no que se refere a meios de transporte, armazenamento, bancos e uma rede de
prestadores de serviços, uma organização política entre os produtores rurais e um movimento
cooperativista (MARTINE E GARCIA, 1987, p. 132).
No quadro abaixo pode-se perceber a mudança das culturas desenvolvidas, as
quais caracterizam a modernização na agricultura, no que se refere à microrregião de
Maringá.
110
TABELA nº 9. Utilização das terras com lavouras temporárias na Microrregião de Maringá –
282, em 1970, 1975 e 1980
Ano 1970 1975 1980
Produto Quantidade Área Quantidade Área Quantidade Área
Soja 63.627 49.095 280.018 129.989 302.716 125.893
Trigo 6.892 8.458 10.125 23.205 88.345 82.647
Algodão 14.997 13.989 1.781 1.185 11.514 6.150
Amendoim 6.163 5.920 184 186 1.244 121
Arroz 19.719 22.150 11.560 12.779 4.126 3.556
Cana 81.671 1.480 58.329 1.390 357.088 4.574
Feijão 3.414 7.371 1.270 2.630 2.445 4.224
Mandioca 1.340 191 260 31 1.784 196
Milho 76.592 53.806 30.055 23.021 52.219 23.304
Fonte: Censos Agropecuários do Paraná: 1970 – 1975 – 1980
ORG: CAIO, Claudinei Pedro de, 1994, p. 26.
Deste modo, dada a sua natureza, o processo de modernização resulta em
expressivos aumentos na produtividade do trabalho. Em outras palavras, a “industrialização
do campo” implica na substituição da mão-de-obra por máquinas e equipamentos, o que
evidentemente reduz a quantidade de trabalho utilizado por área cultivada. Este é o motivo
principal da violenta queda na taxa de crescimento da população paranaense na década de
1980, tendo ocorrido inclusive diminuição absoluta de população em determinadas
microrregiões do Estado (IPARDES, 1982).
A análise da modernização agrícola no Estado do Paraná, em 1970, 1980 e 1985,
permite avaliar a evolução deste processo. Genericamente, os maiores índices percentuais da
modernização agrícola se verificam durante a década de 1970, salvo no caso do consumo de
energia elétrica (MORO, 1998).
111
TABELA nº 10. Indicadores da modernização agrícola, no Estado do Paraná, em 1970, 1980 e
1985
INDICADORES 1970 1980 1985 % 70/80 % 80/85
Arados – Tração animal 283.215 289.122 306.617 + 2,1 + 6,1
Arados – Tração mecânica 18.883 90.526 97.570 + 379,4 + 7,8
Área média por trator (ha) 785 200 165 + 292,5 - 21,2
Área integrada (há) 9.176 28.092 31.477 + 206,1 + 12,0
Consumo de energia elétrica – mil kwk 34.286 50.402 396.996 + 47,0 + 687,6
Consumo de óleo diesel – mil l. 40.831 287.838 332.523 + 604,9 + 15,5
Estabelecimentos com práticas de
conservação do solo
... 114.926 149.792 + 60,0 + 30,3
Estabelecimentos com prática de
irrigação
... 4.497 6.030 ... + 34,0
Estabelecimentos com uso de agrotóxicos ... 336.664 340.245 ... + 1,1
Estabelecimentos com uso de fertilizantes 89.828 219.824 248.166 + 114,7 + 12,9
Estabelecimentos com uso de força
mecânica
16.285 201.108 203.490 + 1.134,9 + 1,2
Máquinas de plantio e colheita ... 87.838 96.607 ... + 10,0
Tratores 18.619 81.620 100.919 + 338,3 + 23,6
Fonte: IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
ORG: MORO, D. A.
Entre os indicadores que evidenciam o nível da oferta de emprego no campo
destacam-se: o número de tratores, que revela um crescimento significativo, reduzindo a área
média de trator por hectare de 785, em 1970, para 165, em 1985; o número de arados de
tração mecânica, que aponta um crescimento de 379,4% entre 1970 e 1985; e o número de
estabelecimentos com uso de força mecânica, acusando um crescimento de 1.134,3%.
Segundo Martine e Garcia (1999, p. 153), o Paraná vivenciou nesse momento
histórico (década de 1970) um intenso processo de urbanização, ao passo que era promovida a
integração econômica e regional do estado, principalmente no que se refere à malha
rodoviária. Esta era necessária para o escoamento da produção agrícola e facilitou a dinâmica
migratória, consolidando as maiores cidades como pólos regionais - Londrina, Maringá, Ponta
Grossa, Cascavel, Guarapuava - e a constituição do processo de metropolização de Curitiba.
Neste contexto, no que concerne ao Norte Central paranaense, as cidades do
eixo Londrina - Maringá tornaram-se, em graus diferentes, receptoras de um contingente de
ex-pequenos proprietários, meeiros, parceiros, arrendatários, etc., embora estes migrantes
tenham continuado a depender ainda do trabalho agrícola temporário, como observam
Martine e Garcia (1987). Segundo Rocha (1998), parte desta mão-de-obra agrícola é
desclassificada para funções tipicamente urbanas e será absorvida na construção civil ou ainda
em atividades rurais.
As conseqüências das políticas de modernização são assim expressas por Libardi e
Delgado (1999, p. 53):
112
No Paraná, este contingente populacional representa ainda mais de 20% de
sua população. Objetivamente, a “função”de fornecer braços para o crescimento urbano-
industrial tornou-se obsoleta e transformou-se em fonte de mais desemprego,
precarização das condições de vida e em inchaço urbano, concentrado nas médias e
grandes cidades”
.
O “boom” industrial dos anos 1970 fez surgir parques agroindustriais na região.
Deste modo, as transformações pautadas no desenvolvimento dos setores secundário e
terciário, que substituíram o setor primário no que concerne à empregabilidade, implicaram
em transformações sociais nas cidades.
O novo tipo de indústria que passou a se instalar no Norte do Paraná teve sua
produção concentrada em poucas empresas e plantas produtivas. Por outro lado, o comércio e
serviços ligados à agricultura também se modernizaram e passaram a ser exercidos por
grandes empresas. Assim, as grandes indústrias, as grandes companhias comerciais e de
serviços e as grandes cooperativas foram, por m006 Tc -1io coorrên(rc,[( m)8.4(i)-5(ngrao osra)-0.1acongos7( )]TJ-14.32 -1.725 TD0.0207 Tc-0.2397 T[(prosetore” industriais idosea qs”)Tj3.16514 0 TD0 Tc29 Tw[(ias com)7.8(e)-1.3(rcfons (IPARDES,os 82)ão. )]TJm)8.14 -1.725 TD0.0003 Tc0.1397 TwNuçãe otamentetoao oas pcepaspo do deordernidução cçosseodora(o, quea e tduziuor)]TJ16942 0 TD0.2504 Twis n paoe mos nin[(sduçço)6.7( )]TJ-16925 -1.72 TD0.0006 Tc.00485 Tw[(ná cnologtrir nsiDesram)8.aas produtado laciol(osuçãfoan)]TJ270785 0 TD0.102 Tc0.1048 Twive ficingente8(a absorveceaas gran rim)8.a(0062Tcstrie )]TJ-27.405 -1.725 TD0.0006 Tc049485 Tw[(iar9(e)4(tirto)3.cfons do c(e)4(a(0066(ram)8.7(pe)4(adoexclupo)5.í(e)-6[(i s)4. -1is propo)5.ç(e)4(ã(0066(nts ato)3.í(e)-6cola,po)5. n rim)4(agabiz po)5.u)066(-ados à)4( rim)4(a(e)-0.5[(cas cie )]TT*-0.0004 TD-0.3397 To dontnts(iasncen(iao urbas.( )Tj4.725 -1.725 TD0.0007 Tc047679 Tw[(D( se m)5.6(o)7[(eaaá cnificiduç8(, )]T1-22942 0 TD047391 Twaoad)5. elevaceaas prad)5.odutirad)5.ao doad)5.6(o)7 e tbalho,ad)5. oop( m)8.4entrie )]TJ 2151554 -1.725 TD0.0002 Tc053279 Twara8.9liiduçãlida(0( [(produçid)2(as co8.9uco8.ria aconcidad)2( se 0.9(0[(por)]T21.00785 0 TD0.0008 Tc058043 Tw[dste m)8.ã(0064(a-de-or b.ad)4. Coe m)8. eo )-5.f(m)3.eit(do,ão creecto e )]TJ1.00784 -1.725 TD01 Tc0147 Tw[ferletde e tbalho e sstaliodo)8.5suçãi s)2( (m)3.8e tduz n)r
113
tiveram tempo nem recursos para se equipar e atender com dignidade os retirantes do campo
no tocante à instauração da cidadania neste espaço social que é a cidade.
TABELA nº 11. Mobilidade e crescimento populacional no Paraná: período de 1940 à 2000
Recenseamentos População Porcentagem
Da população
brasileira
População
urbana
% População
rural
%
1940 1.236.276 3,00 302.272 24,45 934.004 75,55
1950 2.115.547 4,07 528.288 24,97 1.587.259 75,03
1960 4.296.375 6,05 1.327.982 30,91 2.968.393 69,09
1970 6.997.682 7,40 2.546.899 36,40 4.450.783 63,60
1980 7.749.752 6,40 4.566.755 58,93 3.182.997 41,07
1991 8.443.299 5,75 6.192.976 73,35 2.250.323 26,65
2000 9.563.458 5,63 7.786.084 81,41 1.777.374 18,59
Fonte: IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
ORG: BORGES, W. A.
Deve-se frisar que este processo migratório ocorreu de forma caótica e os
emigrantes de parcos recursos encontraram dificuldades em seus deslocamentos. Como já
visto, parte significativa do contingente que deixou o campo no decorrer das décadas de 1960
e, principalmente, 1970 e 1980 se dirigiu, preferencialmente, às cidades-pólos regionais,
instaurando um processo de periferização externa nos dois principais núcleos urbanos do
interior do Paraná, Londrina e Maringá.
4.3. A rede de cidades no Norte Central Paranaense: o eixo Londrina – Maringá
Na explanação histórica referente à região, contatou-se que as cidades que
integram o eixo Londrina - Maringá foram criadas por duas companhias colonizadoras, e não
surgiram de uma forma espontânea, em decorrência de um posto comercial numa antiga
fazenda, ou entroncamento de rodovias, ou estação ferroviária, etc., como se deu com muitas
cidades.
Segundo Rocha (1999), observa-se nesse eixo o estabelecimento de dois núcleos
dinâmicos fundamentais, Londrina e Maringá, que formam uma zona de influência,
polarizando capital e força de trabalho; e adjacentes a esses pólos se encontram cidades-
satélites, reservatórios de mão-de-obra desqualificada que busca no centro hegemônico um
emprego sazonal e precário.
De acordo com Andrade (1987), a existência de vários pólos, ligados uns aos
outros por estradas e ocupando todos uma área dinâmica, tem repercussão sobre todas as
114
atividades econômicas regionais e forma aquilo que ele chama de zonas de desenvolvimento.
As cidades se transformam não apenas pelo impulso do seu próprio dinamismo local, mas,
cada vez mais, por efeito dos circuitos dinâmicos das atividades e de estímulos que resultam
de decisões e iniciativas que as ultrapassam (MOURA,1997).
Os centros urbanos que integram a pretensa metrópole linear – Ibiporã, Londrina,
Cambé, Rolândia, Arapongas, Apucarana, Cambira, Jandaia do Sul, Mandaguari, Marialva,
Sarandi, Maringá e Paiçandu – totalizam um contingente de 1.297.369 habitantes (segundo o
censo 2000) e representam uma dinâmica região bipolar:
“Esse processo revelou-se mais uma iniciativa política para a metropolização
do interior paranaense. O complexo Metropolitano Londrina/Maringá vem se
consolidando como um dos núcleos de drenagem do capital regional, assim como, centro
de inovações do meio técnico científico, centro universitário, econômico e populacional e
saúde da Região Sul”
(HEIDECKE, 2000, p. 39).
Segundo Moura (1997), a generalização do fenômeno das aglomerações urbanas,
com ocupação contínua que agrega mais de um município, introduz periferias distantes - na
maioria das vezes permeadas por vazios -, expande perímetros urbanos sobre áreas rurais
circundantes – eixos de intensa complexidade - e vê reforçado seu grau de complexidade e
intensificada a sua dinâmica.
Andrade (1987, p.66), elucida:
“Para Perroux o pólo de desenvolvimento não existe como unidade isolada,
mas está ligado à sua região pelos canais por onde se propagam os preços, os fluxos e as
antecipações. Ocorre, porém, que para ele a noção de pólo de desenvolvimento “só tem
valor no momento em que se torna instrumento de análise rigorosa e a ferramenta de uma
política”. Daí dizer que o pólo de desenvolvimento se distingue do pólo de crescimento
por ser um pólo desejado. Ainda acha o mestre francês que o desenvolvimento de um
conjunto de territórios e de sua população só é obtido pela propagação consciente dos
efeitos dos pólos de desenvolvimento. Esta propagação feita por um caminho que liga dois
pólos dá origem ao que ele chama de eixo de desenvolvimento, salientando porém que o
eixo não é apenas uma estrada, um caminho e que, além disso, ligada à estrada, deve haver
todo um conjunto de atividades complexas que indicam ‘orientações determinadas e
duráveis de desenvolvimento territorial e dependem sobretudo da capacidade de
investimento adicional”. Assim, os eixos pressupõem a presença de outros bens
complementares, como energia, crédito e competência técnica”
.
A complexidade de um eixo dinâmico pode ser considerada em relação aos
múltiplos papéis que cada centro da rede desempenha, em face da divisão do trabalho entre os
centros, conforme aponta Santos (apud Corrêa in CARLOS, 1999).
115
Nesse dinâmico e complexo eixo pré-metropolitano
15
, as cidades de Londrina e
Maringá dividem a liderança da região, situando-se cada uma num extremo do complexo. São
cidades terciárias, ou seja, prestadoras de serviços, e drenam o capital de toda a área
polarizada, se beneficiando e desenvolvendo o setor industrial voltado para a agroindústria,
indústria mecânica, indústrias leves — couro, móveis, e têxtil — e de montagem de produtos
eletrônicos e similares. O complexo pré-metropolitano do Norte apresenta um grande
potencial, com um poder aquisitivo que denuncia a predominância da classe média,
permitindo o desenvolvimento de um forte núcleo de serviços, comércio e microempresas.
Com efeito, o eixo Londrina - Maringá, com respeito aos ensaios de modelos de
gestão, conforme elucidam Deschamps, Moura e Kleinke (1999), nunca foi tratado como uma
unidade, embora tenha havido tentativas como o Metronor
16
(Metrópole Linear do Norte) e o
Metroplan
17
.
A região se encontra hoje dividida em duas regiões metropolitanas, a RM de
Londrina e a RM de Maringá. Ambas foram instituídas por razões relacionadas ao
desenvolvimento local, e buscam cumprir seu papel. Lembram a data de 17 de julho de 1998
como o dia em que o então governador Jaime Lerner sancionou as leis complementares n.º 81,
que criou a Região Metropolitana de Londrina, e n.º 83, que criou a Região Metropolitana de
Maringá.
Neste universo regional, Maringá é conhecida por sua beleza urbanística -
decorrente do seu planejamento - e pelas áreas verdes (parques, praças e extensos canteiros
15
Pré-metropolitano: este conceito é empregado pelos técnicos da Emplasa, os quais desenvolvem estudos para
melhor definição, estruturação e caracterização do Complexo Metropolitano Expandido de São Paulo. No
documento CME - Complexo Metropolitano Expandido - Apresentação Geral, elaborado pela Emplasa em 1996,
constam as seguintes denominações de unidades regionais componentes: a)Vale do Paraíba (Macroeixo):
Aglomeração Urbana pré-metropolitana
, com eixo urbano-industrial diversificado com forte presença de
segmentos dinâmicos da indústria e destacada produção científico/tecnológica no campo aeroespacial; b)
Sorocaba: Aglomeração Urbana pré-metropolitana
, com forte presença de segmentos dinâmicos e intermediários
da indústria. www.emplasa.sp.gov.br/metropoles/
, consultado em 16/08/2003.
16
Com o propósito de integrar a região com vista ao fortalecimento político, buscou-se, por meio de um
planejamento regional (METRONOR), inserir este espaço como um pólo de atração de investimentos. Esse
projeto acabou não dando certo, por mais que fosse do interesse das lideranças e instituições (dentre elas as
universidades) locais, já que dependia do financiamento do estado, recursos que nunca foram liberados
(DESCHAMPS, MOURA e KLEINKE, 1999).
17
O Metroplan (Consórcio Intermunicipal) resulta de um planejamento regional, que compreendia o que hoje se
reconhece como o aglomerado urbano de Maringá, o qual buscava integrar a dinâmica socioeconômica dos
municípios de Marialva, Maringá, Paiçandu e Sarandi, em busca de se instituir uma região metropolitana. A
maior proposta deste projeto foi a implantação de um novo meio de transporte, uma espécie de metrô de
superfície – veículos leves sobre trilhos - , ligando as quatro cidades. A descontinuidade administrativa levou a
sua extinção em 1992 (DESCHAMPS, MOURA e KLEINKE, 1999).
116
centrais arborizados). É um forte núcleo prestador de serviços especializados, se destacando
como um importante centro educacional, comercial e agroindustrial. Sua população, quando
do censo 2000, realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), era de
288.653 habitantes. Dentre todos os municípios do Norte do Paraná, o de Maringá foi
classificado pela ONU (Organização das Nações Unidas) como detentor do melhor índice de
desenvolvimento humano. Com base no Atlas de Desenvolvimento Humano (PNUD-ONU)
18
,
disponibilizado pela Fundação João Pinheiro, o município, dentre os maiores do estado,
aparece como o menos carente: 8,3% da população são pobres, contra 9,1% em Curitiba,
12,8% em Londrina, 19,1% em Cascavel, 20,8% em Ponta Grossa e 21,1% em Foz do Iguaçu.
Reafirmando esta liderança positiva nos índices de qualidade, cabe lembrar que,
dentre as regiões metropolitanas polarizadas por centros regionais ou sub-regionais, a cidade
de Maringá se apresentou, como é retratado no capítulo terceiro, como o segundo pólo que
detém a maior massa salarial per capita.
Por outro lado, embora Maringá expresse dados favoráveis no contexto regional e
estadual, seu aglomerado se apresenta muito desigual. Percebe-se que no entorno desta
cidade-pólo se “esconde” um número significativo de portadores de carência. Deste modo,
não fugindo à “regra” das consagradas metrópoles nacionais, no aglomerado urbano de
Maringá se identificam cidades que nasceram cidades-dormitório e, de certo modo, ainda
exercem essa função, retratando um espaço urbano degradado.
De acordo com a tabela nº 12, pela qual se busca retratar comparativamente a
desigualdade no aglomerado urbano de Maringá, verifica-se que o maior percentual de
pobreza entre as três maiores aglomerações urbanas do Paraná foi apresentado pelo
aglomerado urbano de Londrina, no qual 19,13% dos domicílios possuem uma renda inferior
a 1 (um) salário-mínimo, vindo em seguida o aglomerado de Maringá, com 17,91%, e por
último o aglomerado de Curitiba, com 14,47%. Porém, quando se analisa o município-pólo
separado daqueles que integram a periferia externa, contata-se uma maior desigualdade na
aglomeração urbana de Maringá. Nesse aspecto a cidade-pólo expressa o segundo melhor
índice - 14,08% -, perdendo para Curitiba, com 12,46%, ao passo que sua periferia externa é o
locus que revela a pior situação no quesito pobreza, apresentando o maior índice: 26,68% (a
periferia de Londrina se revela com 21,64% e a de Curitiba com 17,51%).
18
Projeto das Nações Unidas para o Desenvolvmento.
117
TABELA nº 12. Aglomerados urbanos: número de domicílios, renda inferior a 1 salário mínimo
e percentual da renda inferior a 1 s/m por total de domicílios - 2000
Número de domicílios com renda
inferior a 1 s/m
Percentual em relação ao
total de cada aglomerado
Localidades
Número
de
domicílios
Nº total Percentual % % do Total
% da Renda
– 1 s/m*
Aglomerado urbano de
Curitiba
782.774 113.257 14,47 100 100
Curitiba 471.163 58.698 12,46 60,19 51,83
Periferia externa de
Curitiba
311.611 54.559 17,51 39,81 49,17
Aglomerado Urbano de
Londrina
238.343 45.606 19,13 100 100
Londrina 127.692 21.659 16,96 53,57 47,49
Periferia externa de
Londrina
110.651 23.947 21,64 46,43 52,51
Aglomerado urbano de
Maringá
120.906 21.651 17,91 100 100
Maringá 84.208 11.861 14,08 69,65 54,78
Periferia externa de
Maringá
36.698 9.790 26,68 40,35 45,22
Fonte: IBGE (Censo Demográfico, 2000).
ORG: BORGES, W. A.
* salário mínimo
Não obstante, embora exista um maior número de domicílios em estado de
pobreza em Maringá do que na sua periferia externa, esta última se apresenta mais
pauperizada em relação ao pólo. Isso se deve à representatividade populacional de cada
espaço no aglomerado.
4.4. Unidade/diversidade expressa no aglomerado urbano de Maringá
O aglomerado urbano de Maringá passou a se constituir em decorrência do êxodo
rural, a partir da década de 1970; no entanto, o planejamento executado na região, com a
criação de cidades distantes em média 15 quilômetros umas das outras, facilitou a
aglomeração.
Esse território é formado pelos municípios de Marialva, Maringá, Sarandi e
Paiçandu, como foi exposto. Dentro dele, o aglomerado se constitui de uma mancha urbana
contínua, retratando uma conurbação entre Maringá e Sarandi.
118
Mapa nº 2 – Aglomerado urbano
119
TABELA nº 13. População, densidade demográfica (2000) e taxa de crescimento populacional
(1980/1991/2000)
Município Pop 2000 hab/km2
TCA* 80-91
%
TCA 91-00
%
Ângulo 2.840 27,05 - -
Iguaraçu 3.598 21,67 -1,51 -4,97
Floresta 5.122 32,21 0,58 1,38
Mandaguaçu 16.828 57,43 0,53 1,52
Mandaguari 31.395 93,72 1,54 1,25
Marialva 28.702 60,43 -6,73 2,68
Maringá 288.653 589,09 4,04 2,06
Paiçandu 30.764 179,91 7,10 3,69
Sarandi 71.422 686,75 - 4,52
RM Maringá 479.324 214,51 4,02 2,44
FONTE: AMUSEP, 2000
* TCA - Taxa de crescimento anual
Com base na última década, constata-se que os municípios que tiveram a maior
taxa de crescimento, Sarandi (4,52% a.a.) e Paiçandu (3,69 % a.a.), são respectivamente o 2º e
o 4º mais populosos da Região Metropolitana. Além disso, as duas cidades, que se situam
respectivamente nos limites leste e oeste do município de Maringá, sendo que Sarandi se
encontra conurbada (por meio de bairros residenciais) e Paiçandu em processo de conurbação
(por meio do setor industrial), cresceram num ritmo cerca de duas vezes maior que o da
cidade-pólo, Maringá, e bem acima do crescimento experimentado pela 4º cidade do
aglomerado – Marialva.
No contexto do aglomerado, Maringá foi a cidade que, proporcionalmente, menos
cresceu demograficamente, embora tenha agregado mais habitante do que as demais cidades
da Região Metropolitana.
Com efeito, as cidades que mais cresceram são as duas que detêm os menores
índices de valor adicionado dentre os municípios do aglomerado. Logo abaixo, na tabela nº
14, pode-se identificar Marialva como a segunda de maior expressão. Mesmo tendo
praticamente a mesma população que Paiçandu, Marialva apresenta o dobro de participação, e
tendo menos da metade da população de Sarandi, possui 0,0820 pontos percentuais a mais de
participação no valor adicionado.
120
TABELA nº 14. Participação no valor adicionado
Município %
Marialva 0,2300
Maringa 2,8880
Paicandu 0,1110
Sarandi 0,1480
Fonte: AMUSEP, 2000
ORG: BORGES, W. A.
Os municípios de Sarandi e Paiçandu deixam perceber que no aglomerado urbano
se constata um acentuado processo de periferização externa à cidade de Maringá. Isso se
confirma quando se depara com altos indicadores de exclusão social (IES), expressos pelos
baixos índices de desenvolvimento social apresentados por estas localidades, principalmente
quando comparadas com o pólo. Veja a tabela nº 15.
TABELA nº 15. Índices de exclusão social dos municípios do Aglomerado Urbano de Maringá
Municípios Posição no
Ranking*
IES
Marialva 823º 0,540
Maringá 27º 0,671
Paiçandu 1682º 0,493
Sarandi 1566º 0,500
Fonte: POCHMANN, Márcio; AMORIN,
Ricardo. Atlas de exclusão social no Brasil.
São Paulo: Cortez, 2003.
ORG: BORGES, W. A.
* a partir da melhor situação social – dentre todos os municípios do Brasil (total de 5507)
É oportuno destacar que a presente pesquisa, na realização de suas análises, não se
utiliza do termo exclusão social, por considerar que os pretensos excluídos estão inseridos na
dinâmica, justamente por sustentarem os mais beneficiados pelo atual sistema. Não há como
excluí-los do contexto social. Entretanto, é pertinente destacar os indicadores do IES.
Cumpre considerar que, por mais distante que se encontre o pólo dos demais
municípios do aglomerado (representando estes a sua periferia externa), não se tem nessa
aglomeração urbana o extremo de riqueza nem o extremo de pobreza identificados no Brasil.
Como está pontuado no ranking do Atlas de Exclusão Social no Brasil
19
, Maringá ocupa uma
boa posição (sendo a 27º melhor) e os municípios adjacentes ao pólo (Marialva, Sarandi e
Paiçandu) ocupam posições intermediárias (823º, 1566º e 1682º); porém, se constatam
19
Apenas no intuito de elucidar, o índice de exclusão social é um composto expresso pela média dos índices de:
pobreza, juventude, alfabetização, escolaridade, violência e desigualdade. O material congrega o Atlas da
Exclusão Social no Brasil, organizado por Márcio Pochmann e Ricardo Amorim em quatro volumes.
121
espaços homogêneos (intraurbanos), mas completamente segregados entre si (interurbanos),
um retrato da desigualdade nacional.
Com isso, faz-se importante pontuar que a periferia como estado de pobreza numa
determinada região pode se revelar em situação melhor (ou menos ruim) que a da cidade-pólo
de regiões mais atrasadas, no que tange ao desenvolvimento econômico e social.
Não obstante, é perceptível que Sarandi e Paiçandu são municípios que se
apresentam com os piores indicadores de condições socioeconômicas do aglomerado urbano
de Maringá. Por esse fato, aliado as altas taxas de crescimento populacional não compensadas
pelo incremento e dinamismo econômico no mesmo ritmo, eles se constituem como periferia
do aglomerado.
Para uma melhor compreensão da condição apresentada, cabe uma análise do
crescimento populacional no decorrer da história dos municípios de Maringá, Paiçandu e
Sarandi, no propósito de adentrar na compreensão do processo de periferização neste
aglomerado urbano, por meio da mobilidade centrada no trabalho.
Como visto, a cidade de Maringá foi fundada em 1947 pela Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná. Logo em 1950, neste então distrito (o qual veio a delimitar o
seu recorte municipal em 1951, com sua emancipação do município de Mandaguari), a
população já atingia 38.588 habitantes, mas com apenas 7.270 habitantes no núcleo urbano.
Nesse período, com a disseminação da cultura do café por toda a região colonizada, a
população se encontrava principalmente no campo, em pequenas propriedades.
Com o crescimento da região e conseqüente adensamento populacional, o centro
urbano de Maringá ganhou em representatividade do total da população, apesar de o
contingente que habitava a zona rural ter continuado a crescer até a década de 1960.
A partir da década de 1960 consta-se que a população urbana no aglomerado
ganha representatividade. Esse fato decorreu da modernização conservadora (inserção de
máquinas e tecnologias no campo, crédito acessível aos grandes e médios proprietários) e do
ideário urbano, que valorizava a cidade como o melhor lugar para se viver, por oferecer uma
melhor infra-estrutura e proximidade a bens e serviços.
Neste contexto, cabe observar que as cidades de Paiçandu e Sarandi adentraram
no dinâmico ritmo de crescimento populacional e de desenvolvimento após a década de 1970,
como se pode verificar nos números apresentados pela tabela n.º 16 .
122
TABELA nº 16. Crescimento populacional dos municípios que formam o aglomerado urbano de
Maringá – 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e 2000
Localid. 1950 % 1960 % 1970 % 1980 % 1991 % 2000 %
Maringá
38.588 100 104.231 100 121.374 100 168.194 100 239.930 100 288.653 100
Urbano 7.270 18,8 47.592 45,7 100.100 82,5 160.645 95,5 233.732 97,4 283.978 98,4
Rural 31.318 81,2 56.639 54,3 21.274 17,5 7.549 4,5 6.198 2,6 4.675 1.6
Sarandi*
... ** ... ** 7.389 100 7.507 100 21.797 100 47.981 100 71.422 100
Urbano ... ** ... ** 2.058 27,8 2.139 28,5 19.742 90,6 46.208 96,3 69.493 97,3
Rural ... ** ... ** 5.331 72,2 5.368 71,5 2.055 9,4 1.773 3,7 1.929 2.7
Paiçandu
... ... ... ... 12.093 100 11.955 100 22.197 100 30.727 100
Urbano .... ... ... ... 3.406 28,2 8.839 73,9 20.997 94,6 29.584 96,3
Rural ... ... ... ... 8.637 71.2 3.116 26.1 1.200 5.4 1.1143 3.7
Fonte: IBGE (Censos Demográficos).
ORG: BORGES, W. A.
* Até o censo de 1980, Sarandi era distrito de Marialva;
** O censo de 1950 não divulgou estas informações.
Após a década de 1970, o incremento populacional nos municípios de Sarandi e
Paiçandu passou a ser significativo, pois apresentaram taxas de crescimento urbano (tabela nº
17) maiores do que as de Maringá. Deste modo, ao passo que a população urbana ia ganhando
representatividade, as cidades de Paiçandu e Sarandi também. Isso denota que o maior ritmo
da expansão urbana destes municípios se revela como um processo de periferização do espaço
urbano.
TABELA nº 17. Representatividade da população de cada município frente ao total do
Aglomerado Urbano de Maringá – 1950, 1960, 1970, 1980, 1991 e 2000.
Localid. 1950 % 1960 % 1970 % 1980 % 1991 % 2000 %
Maringá
38.588 100 104.231 93,4 121.374 86,1 168.194 83,3 239.930 77,4 288.653 73,9
Urbano 7.270 18,8 47.592 42,6 100.100 71,0 160.645 79,6 233.732 75,4 283.978 72,7
Rural 31.318 81,2 56.639 50,7 21.274 15,1 7.549 3,7 6.198 2,0 4.675 1,2
Sarandi
... ** ... ** 7.389 6,6 7.507 5,3 21.797 10,8 47.981 15,5 71.422 18,3
Urbano ... ** ... ** 2.058 1,8 2.139 1,5 19.742 9,8 46.208 14,9 69.493 17,8
Rural ... ** ... ** 5.331 4,8 5.368 3,8 2.055 1,0 1.773 0,6 1.929 0,5
Paiçandu
... ... ... ... 12.093 8,6 11.955 5,9 22.197 7,1 30.727 7,9
Urbano .... ... ... ... 3.406 2,4 8.839 4,4 20.997 6,8 29.584 7,6
Rural ... ... ... ... 8.637 6,1 3.116 1,5 1.200 0,3 1.143 0,3
TOTAL 38.588 100 111.620 100 140.974 100 201.946 100 310.108 100 390.802 100
Fonte: IBGE (Censos Demográficos).
ORG: BORGES, W. A.
Como referido, houve um crescente processo de urbanização e,
concomitantemente, um crescente processo de periferização; porém, a taxa de crescimento
econômico do município, após a década de 1980, decresceu em Sarandi. Em Paiçandu cresceu
subitamente de 1980 a 1991 e decresceu na década seguinte. Já em Maringá, a taxa teve uma
ligeira alta de 1980 a 1991 e voltou a cair consideravelmente entre 1991 e 2000.
No contexto do núcleo urbano, as taxas de crescimento populacional de Maringá
tiveram um comportamento decrescente desde a sua fundação. No entanto o decréscimo da
123
população da zona rural foi o fator que mais interferiu na redução da taxa de crescimento do
município. Após a década de 1960, com o início da mecanização agrícola, o município perdeu
população rural em grande escala, até a década de 1990. A partir desse período, com uma
redução da taxa de decréscimo populacional do meio rural, houve uma recuperação da taxa
total de crescimento do município, a qual voltou a cair na última década, devido à redução do
ritmo de crescimento tanto no espaço urbano quanto no rural.
Quanto ao caso de Sarandi, constata-se que esse município veio crescendo com
altas taxas a partir da década de 1970 (cabe elucidar que Sarandi se tornou município apenas
em 1983, antes disso, se limitava a uma porção territorial/distrital do município de Marialva),
embora a cada década estas se tenham apresentado decrescentes, assim como em Maringá.
Com o êxodo rural, Sarandi perdeu 61,7% de sua população rural na década de 1970, porém o
ritmo desta perda populacional se reduziu nos anos 1980, chegando a apresentar uma taxa
positiva de crescimento da população rural na última década.
O município de Paiçandu foi o que obteve um ritmo de crescimento mais regular,
embora decrescente a partir da década de 1970. A cidade nunca chegou a taxas de
crescimento exorbitantes como as apresentadas por Maringá na década de 1950 (554,6%) e
Sarandi na década de 1970 (822,9%), porém, na década de 1980 foi a que mais cresceu
(137,5%). A perda da população rural também foi gradativa, porém nesse município
continuou intenso o êxodo rural na década de 1980, quando nos municípios de Maringá e
Sarandi o decréscimo evidenciava um ritmo menos acelerado de perda populacional. A partir
da década de 1990, o êxodo rural no município de Paiçandu perde ritmo e passa a apresentar
baixos índices.
TABELA nº 18. Taxa de crescimento populacional de cada município do Aglomerado Urbano de
Maringá, por década: 1950/1960, 1960/1970, 1970/1980, 1980/1991, 1991/2000
Localidades
1950/60 1960/70 1970/80 1980/91 1991/2000
Maringá 170,1% 16,4% 38,6% 42,6% 20,3%
Urbano 554,6% 110,3% 60,5% 45,9% 21,5%
Rural 80,8% - 62,4% - 64,5% - 17,9% - 24,6%
Sarandi ... ** 1,6% 190,3% 120,1% 48,8%
Urbano ... ** 3,9% 822,9% 134,1 50,4%
Rural ... ** 0,7 - 61,7% - 13,7 8,7%
Paiçandu ... ... - 1,1% 85,7% 38,4%
Urbano .... ... 159,5% 137,5% 40,9%
Rural ... ... - 63,9% - 61,5% - 4,7%
Fonte: IBGE (Censos Demográficos).
ORG: BORGES, W. A.
Conforme dados do censo demográfico de 2000, a população total do aglomerado
urbano de Maringá é de 419.541 habitantes. Considerando-se apenas as cidades de Maringá,
124
Paiçandu e Sarandi, a população computada é de 390.802 habitantes, ou seja, 93,15% do total
do aglomerado. Deste subtotal, a população de Maringá representa 73,9%, a de Sarandi 18,3%
e a de Paiçandu 7,9%. No entanto, nota-se na tabela nº 18, que Maringá vem perdendo
representatividade, e, como ilustra o mapa nº 3, logo abaixo, os municípios de Sarandi e
Paiçandu estão entre os que mais crescem no Estado do Paraná.
125
MAPA nº 3. Crescimento geométrico da população total – Paraná – 1991/2000
Fonte: IPARDES
MAPA nº 4. Crescimento geométrico da população total – Aglomerado Urbano de
Maringá - 1991/2000
.
Fonte: Observatório/IPPUR, 2003
ORG: BORGES, W. A.
MARINGÁ
PAIÇANDU
SARANDI
MARIALVA
126
O êxodo rural foi menos intenso na década de 1980, porém continuou muito
intenso o fluxo migratório das pequenas cidades em direção aos pólos regionais. Em face da
falta de infra-estrutura urbana e condições de empregar todo o contingente que demandava as
cidades-pólos, os conglomerados urbanos vivenciaram um processo de pauperização, em que
passou a imperar uma imensa desigualdade social, fato que deu origem a um dinâmico
processo de mobilidade física de uma parte da população. Muitos habitantes da cidade-pólo e
a maioria dos imigrantes passaram a ocupar o solo dos municípios limítrofes, urbanizados por
meio de loteamentos que não ofereciam infra-estrutura, tendo os empreendedores apenas o
propósito de lucrar com os espaços vazios preservados como reserva de valor.
Esta situação foi a principal causa da constituição de uma aglomeração tão
desigual. Por isso, vincular a desigualdade social no cenário local e nacional à modernização
conservadora é principalmente chamar à responsabilidade a elite, que sempre governou o país
para uma minoria, inclusive ao “viabilizar” a inserção de uma grande contingente nas
precárias condições da vida urbana. Por outro lado, evidencia a necessidade da participação
efetiva de todos os brasileiros em todas as esferas de gestão, pela busca do desperta da
consciência.
A visão utilitarista, pautada na razão instrumental, onde a força de trabalho rural
viabilizaria o processo de industrialização, mesmo que, em grande parte, como exército de
reserva, leva à percepção de uma mobilidade forçada geográfica e funcionalmente. Tal
mobilidade é pautada na mudança da condição de homem do campo para a de uma força de
trabalho desqualificada e sujeita às flutuações do mercado de trabalho, além de precarizada
pela ausência de amparo legal e pela instabilidade no emprego. Destarte, o caminho que o
sujeito submisso percorre é forçado pela mobilidade do capital.
Como se constata na tabela nº 19, o êxodo rural resultou da modernização
conservadora trazida pela mecanização agrícola. Nos municípios de Maringá, Paiçandu e
Sarandi, entre os anos de 1970 a 1996, observa-se considerável aumento do número de
tratores, arados de tração mecânica e colheitadeiras, ao passo que se reduz enormemente o
número de arados de tração animal.
127
TABELA nº 19. Número de máquinas e equipamentos nas propriedades rurais nos municípios
de Maringá, Paiçandu e Sarandi – 1970, 1980 e 1996
NÚMERO DE MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS NAS PROPRIEDADES RURAIS
ARADOS
ANO / MUNICÍPIO
N° DE TRATORES
TRAÇÃO ANIMAL TRAÇÃO MECÂNICA COLHEITADEIRAS*
1970 Maringá 231 1470 125 82
Paiçandu 44 795 51 50
Sarandi _ _ _ _
1980 Maringá 719 635 690 127
Paiçandu 196 340 248 47
Sarandi _ _ _
1996 Maringá 1037 182 1037 271
Paiçandu 364 54 269 104
Sarandi 252 17 129 57
Fonte: IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
ORG: BORGES, W. A.
* Automotrizes e combinadas
A modernização conservadora teve como uma de suas justificativas - já que se
tratou de uma política do Governo Federal - liberar mão-de-obra para o trabalho urbano.
Neste contexto, conforme a tabela n.º 20, verifica-se que, concomitantemente com a
mecanização da agricultura, a região de Maringá se industrializou, passando de 3.499 postos
de trabalho na indústria, no ano de 1970, para 15.091 em 1985. De 1970 a 1985, a
microrregião de Maringá foi, dentre os principais pólos industriais, o 3º que mais cresceu,
com 10,2% ao ano, só perdendo para Manaus e Vitória, com respectivamente 12,8% e 10,5%
(DINIZ, 1995).
Não obstante, esse expressivo crescimento não foi suficiente para atender à
demanda por empregos por parte dos trabalhadores rurais que foram expulsos do campo. Na
década de 1980, como fruto deste quadro de dificuldades encontrado na transição do trabalho
do meio rural para o meio urbano, muitos paranaenses migraram para outras regiões do país,
principalmente para o Centro-Oeste (Mato Grosso e Mato Grosso do Sul), Rondônia e São
Paulo (capital e interior).
128
TABELA nº 20. Crescimento do número de estabelecimentos industriais no município de
Maringá (1970 e 1985), AMUSEP (1996) e RMM (2001)
ANO
MUNICÍPIO
1970
1985
Cresc.
85/70
1996 2001
Maringá 3.499* 15.091* 331,29% 30.041** 37.835***
Fonte: IBGE – Censos Industriais 1970 e 1985, apud DINIZ e CROCCO, In DINIZ,
1995.
* Microrregião homogênea renomeada segundo a cidade mais importante em termos de
emprego industrial.
** AMUSEP, Associação dos Municípios do Setentrião Paranaense, polarizado por Maringá;
*** Região Metropolitana de Maringá.
Como se verifica na tabela acima, conquanto o recorte não represente a mesma
delimitação de 1970 e 1985, em 1996, enquanto a AMUSEP - Associação dos Municípios
do Setentrião Paranaense (com 29 municípios, entre os quais Maringá) apresentava 30.041
trabalhadores ocupados no setor industrial, em 2001, num recorte menor, no contexto da
Região Metropolitana de Maringá (constituída por 9 municípios integrantes da AMUSEP)
37.835 empregos eram gerados pela indústria.
Deste modo, como foi observado, o processo de conurbação, que ainda se
consolida nesse espaço urbano, teve como maior impulso a mobilidade expressa pelo êxodo
rural. Esse fenômeno levou um grande contingente desempregado no campo a buscar a cidade
no intuito de se inserir novamente no mercado de trabalho, “motivado” pelo ideário urbano, o
qual tinha a cidade como um ambiente de qualidade de vida e de oportunidades, com o
processo de industrialização.
Com efeito, no aglomerado urbano de Maringá, após a década de 1970, contata-se
um avanço no processo de industrialização, sendo a indústria o setor que passou a contribui
mais para o montante da arrecadação municipal, embora, até hoje, não se apresente como o
maior empregador.
Mesmo assim, como elucida Tonella e Rodrigues (2003, p. 7):
“A composição do PIB a partir dos anos 70, se modificou até a ponto de
chegarmos ao final dos anos 90 com a atividade industrial representando o maior peso na
economia de Maringá. Conforme dados do IPEA, em 1970, o comércio participava com
42%, os serviços com 27%, a indústria com 26% e agro-pecuária com 5%; em 1980,
temos a indústria com 37%, seguida dos serviços, 36%, comércio com 25% e agro 2%;
em 1990 a indústria representa 47%, os serviços 36%, o comércio 16% e atividades agro-
pecuárias 1% e em 1998 a indústria representa 51% das atividades econômicas em
129
Maringá seguida dos serviços 35%, do comércio 13% e das atividades agro-pecuárias
com 1% de participação”.
Deste modo, o processo de periferização externa ao pólo acompanhou o aumento
do dinamismo de sua economia, que resultou principalmente do processo de industrialização.
Parte da classe operária que trabalha em Maringá e grande parte do seu exército de reserva,
principalmente aqueles que buscavam adquirir a sua casa própria, conseguiram se inserir neste
espaço urbano, passando a habitar as cidades de Paiçandu e Sarandi, ambas muito próximas
dos dois principais parques industriais da cidade-pólo.
MAPA n º 5. Maringá e sua centralidade – malha urbana e parques industriais - 2003
Com efeito, as cidades de Sarandi e Paiçandu apresentaram dois importantes
desdobramentos. O primeiro deles era viabilizar a inserção da força de trabalho demandada
130
pelas indústrias e empresas em geral que se instalaram na cidade-pólo, assim como abrigar os
potenciais trabalhadores que compunham o exército de reserva, os quais alimentavam a
expectativa de realização do sonho provocado pela fábula da vida urbana. Esses espaços
periféricos cresceram como reflexo das políticas de gestão empreendidas por um rodízio de
sucessivos mandatos comandados pela elite maringaense, que cumpria o propósito de impedir
a pauperização do espaço urbano compreendido pelo município de Maringá. O segundo
desdobramento foi o incentivo às incorporadoras e loteadoras maringaenses a atuar em
espaços muito próximos ao centro dinâmico, beneficiadas pela fragilidade das legislações
urbanas de Sarandi e Paiçandu. O fato propiciou loteamentos dotados de uma infra-estrutura
mínima, de baixo custo, que permitia a comercialização dos lotes a preços baixos e,
concomitantemente, a prática de reserva de valor, fonte de especulação imobiliária de áreas
com potencial de valorização decorrente dos investimentos públicos que passariam a ser
exigidos pelos próprios moradores, como foi observado no capítulo 3.
Neste sentido, cabe citar Tonella e Rodrigues (2003, p. 6)
“Diante desse quadro é possível compreender as relações entre a
manutenção/reafirmação das configurações espaciais urbanas de Maringá e região, sem
perder de vista a ocupação inicialmente planejada. A periferização das camadas populares
se acentuou, no processo de crescimento da indústria e conseqüentemente da mão-de-obra
demandada pela nova atividade econômica. Ou seja, o incremento na economia
demandou a vinda de população cujas rendas são auferidas nas ocupações não
especializadas, portanto baixas. Mesmo assim, não houve um processo de degradação do
espaço urbano maringaense, o que mostra claramente amplo controle do poder público
sobre o seu uso e ocupação”.
Para compreender melhor o processo de periferização urbana no aglomerado
urbano de Maringá é imprescindível dimensionar o mercado de trabalho nos três municípios,
com o que se elucidará a desigualdade da distribuição das empresas e dos empregos neste
território.
Primeiramente se tem a composição de dois quadros baseados nos dados colhidos
no Ipardes, os quais se referem aos três municípios do aglomerado. Logo após, é retratada a
divisão pelos setores da indústria, comércio e prestação de serviços no município de Maringá,
tendo como fonte o censo econômico realizado pela ACIM (Associação Comercial e
Industrial de Maringá) em 2002, onde foi possível trabalhar com dados mais atualizados.
Como se constata na tabela nº 21, o município de Maringá detém 73,9% da
população total do aglomerado e concentra, de acordo com dados do IPARDES (2003),
131
90,94% das empresas e 91,57% do total de empregos. Na periferia se têm Sarandi, com 18,3%
da população e apenas 6,42% das empresas e 6,48% dos empregos, e Paiçandu, com 7,9% da
população, 2,64% do total de empresas e 1,94% dos empregos. Concomitantemente, existe
uma força centrípeta exercida pelo pólo, ao concentrar capital em seu território, e uma força
centrífuga, do pólo para sua periferia externa
20
, no que tange à migração de trabalhadores,
retratando uma produção da mobilidade pendular.
TABELA nº 21. Estabelecimentos e empregados por atividade econômica em Maringá, Paiçandu
e Sarandi - 2001
ESTABELECIMENTOS EMPREGADOS
VARIÁVEL
MGÁ
(1)
PDU
(1)
SDI
(1)
MGÁ PDU SDI
INDÚSTRIA 1.372 60 171 17.553 475 1.954
Extração de Minerais 4 - - 90 - -
Ind Prod Minerais não metal 48 3 11 454 6 45
Indústria Metalúrgica 147 12 23 1418 87 170
Indústria Mecânica 61 3 6 749 4 171
Ind Mat Eletr e Comunicação 24 3 2 440 7 9
Ind Materiais Transporte 36 3 7 449 8 565
Ind da Madeira e do Mobiliário 135 8 42 1452 43 416
Ind Papel, Papelão, Edt, Gráfica 111 1 7 997 1 21
Ind Borracha, Fumo, Couros, Simil 64 3 9 802 44 76
Quim, Farm, Vetr, Perf, Sap, Outro 101 5 7 970 15 70
Ind Têxtil, Vest, Artef Tecido 469 7 38 6368 186 360
Industria de Calçados 8 3 3 59 60 15
Prod Alim, Bebidas e Alc Etílico 161 9 16 3291 14 36
Serv. Ind. De Utilidade Pública 3 - - 14 - -
CONSTRUÇÃO CIVIL 533 8 25 6.630 23 113
COMÉRCIO 4.126 115 315 20.469 341 1.142
Comércio Varejista 3570 102 303 17315 250 1060
Comércio Atacadista 556 13 12 3154 91 82
SERVIÇOS 3.564 53 146 28.130 203 735
Ind Créd, Seguro, Capitalização 122 4 5 1570 23 32
Adm, tec Prof, Aux Ativ Econ 1381 21 36 5716 15 110
Transporte e Comunicações 297 7 23 3903 78 103
Serv Aloj, Alim, Radio Dif, TV 941 14 45 7459 37 220
Serviços Médicos, Odonto, Veter 666 5 27 3220 32 182
Ensino 157 2 10 6262 18 88
Adm Pública Direta e Indireta 9 3 3 6230 586 1542
AGRICULTURA E PECUÁRIA 315 49 40 637 58 132
Agric, Silv, Criação Animais 315 49 40 637 58 132
ADM. PÚBL. DIRETO E IND. 9 3 3 6.230 586 1.542
ATIVIDADE ECONÔMICA - TOTAL 9.919 288 700 79379 1686 5618
Proporção em relação a AU
(2)
90,94% 2,64% 6,42% 91,57% 1,94% 6,48%
Fontes: Cadernos estatísticos municipais (Maringá, Paiçandu e Sarandi), IPARDES, 2003 (Dados de 2001).
ORG: BORGES, W. A.
(1) MGÁ = Maringá / PDU = Paiçandu / SDI = Sarandi
(2) Aglomerado Urbano
20
Entendem-se por periferia externa municípios que, contíguos ou muito próximos a um município-pólo,
estabelecem com este relações de dependência a partir de um movimento desigual e combinado.
132
Conforme se constata no quadro nº 1, se faz importante destacar a participação do
setor da indústria, do comércio e da prestação de serviços em cada um dos três municípios,
mas também em relação ao total do aglomerado.
Neste sentido, quanto ao setor industrial, se tem como destaque a menor
participação da cidade-pólo (85,6% dos estabelecimentos e 87,8% dos empregados) em
relação ao aglomerado, quando comparado com os demais setores. Isso se justifica pelo fato
de as cidades da periferia externa de Maringá terem esse setor como o maior empregador:
Sarandi, com uma participação de 10,7% do total de empresas e 9,8% do total de empregados,
e Paiçandu, com uma participação de 3,7% do total de indústrias e 2,4% do total de
empregados.
No entanto, por mais que o setor da indústria amenize a desigualdade entre as
cidades do aglomerado, no que concerne ao número de estabelecimentos empresariais e de
postos de trabalho (empregos formais), a participação dos municípios investigados da
periferia externa ao pólo fica aquém da participação de suas populações em relação ao
montante populacional do aglomerado. Deste modo, mesmo quanto à indústria, se constata
uma concentração na cidade de Maringá.
Já nos setores do comércio e de serviços, Maringá se apresenta ainda mais
concentradora dos estabelecimentos empresariais e dos postos de trabalho, detendo,
respectivamente, 90,6% e 93,2% no setor comercial e 94,7% e 93,2% no setor de serviços.
Com efeito, as cidades Paiçandu e Sarandi só conseguem mostrar maior
participação neste cenário do mercado de trabalho no setor de administração pública direta e
indireta (prefeitura municipal e agregados), com respectivamente 7% e 18,5% no que
concerne aos empregados, e 20% em ambas no que se refere aos estabelecimentos.
As cidades que integram a periferia externa revelam sua fragilidade econômica
justamente quando, na análise dos dados do quadro abaixo, se tem o setor de administração
pública como o que mais emprega no município de Paiçandu, com uma participação de
34,8%, superando a própria indústria, e o segundo que mais emprega no município de
Sarandi, perdendo para o setor da indústria, com uma participação de 27,4%. Evidencia-se a
grande participação desse setor nessas cidades quando se observam os dados referentes a
Maringá, os quais apresentam 7,8% de participação da administração pública no total do
número de empregados neste município.
133
QUADRO nº 1 Estabelecimentos e empregados por atividade econômica em Maringá,
Paiçandu e Sarandi - 2001
ESTABELECIMENTOS EMPREGADOS
MGÁ PDU SDI MGÁ PDU SDI
VARIÁVEL
Nº % % % % % %
INDÚSTRIA
1.372 13,8 60 20,8 171 24,4 17.553 22,1 475 28,2 1.954 34,8
Proporção em relação a AU*
85,6% 3,7% 10,7% 87,8% 2,4% 9,8%
COMÉRCIO
4.126 41,6 115 39,9 315 45 20.469 25,9 341 20,2 1.142 20,3
Proporção em relação a AU*
90,6% 2,5% 6,9% 93,2% 1,6% 5,2%
SERVIÇOS
3.564 35,9 53 18,4 146 20,9 28.130 35,4 203 12,0 735 13,1
Proporção em relação a AU*
94,7% 1,4% 3,9% 96,8% 0,7% 2,5%
ADM PÚBL DIRETA E
INDIRETA
9 0,1 3 1,1 3 0,4 6.230 7,8 586 34,8 1.542 27,4
Proporção em relação a AU*
60% 20% 20% 74,5% 7,0% 18,5%
CONSTRUÇÃO CIVIL
533 5,4 8 2,8 25 3,6 6.360 8 23 1,4 113 2,0
Proporção em relação a AU*
94,2% 1,4% 4,4% 97,9% 0,4% 1,7%
AGR, SILV, CRIAÇÃO
DE ANIMAIS
315 3,2 49 17,0 40 5,7 637 0,8 58 3,4 132 2,4
Proporção em relação a AU*
78,0% 12,1% 9,9% 77,0% 7,0% 16%
ATIVIDADE
ECONÔMICA – TOTAL
9.919 100 296 100 725 100 79.379 100 1686 100 5618 100
Proporção em relação a AU*
90,94% 2,64% 6,42% 91,57% 1,94% 6,48%
FONTE: Cadernos estatísticos municipais (Maringá, Paiçandu e Sarandi), IPARDES, 2003 (Dados de 2001).
ORG: BORGES, W. A.
* Aglomerado Urbano
A distribuição das empresas e dos postos de trabalho no aglomerado urbano de
Maringá apresenta um perfil de desigualdade, com concentração no pólo.
Deste modo, os centros das cidades de Sarandi e Paiçandu se caracterizam como
subcentros no aglomerado urbano, ao passo que o centro hegemônico se encontra no centro
tradicional e nos equipamentos, que exercem centralidade em Maringá, fazendo desta a
cidade-pólo.
Quanto ao mercado de trabalho da cidade-pólo, nota-se, conforme o censo
econômico 2002, a existência de 13.032 empresas. Destas, 90,2% são microempresas, as
quais respondem por 37,6% dos empregos; 6,6% são pequenas empresas, que empregam
23,8% dos trabalhadores ocupados no setor formal; 1,1% corresponde a empresas de porte
médio, que representam 18% do mercado de empregos formais; e apenas 15 empresas,
134
correspondentes a 0,1%, são classificadas como de grande porte, porém contribuem com
20,6% dos empregos gerados no mercado de trabalho formal.
Neste contexto, 10,2% são indústrias, 42,6% são do setor comercial e 47,2% são
prestadoras de serviços. No entanto, o setor que mais emprega é o de serviços, com 43,2%,
seguido do comércio, com 29,9%, vindo em terceiro lugar a indústria, com 26,9%. Tais dados
estão expressos no quadro nº 2, logo abaixo.
QUADRO nº 2 - Composição das Empresas e Número de Funcionários em Maringá -
2002
A
A
A
T
T
T
I
I
I
V
V
V
I
I
I
D
D
D
A
A
A
D
D
D
E
E
E
S
S
S
E
E
E
M
M
M
P
P
P
R
R
R
E
E
E
S
S
S
A
A
A
S
S
S
%
%
%
F
F
F
U
U
U
N
N
N
C
C
C
I
I
I
O
O
O
N
N
N
Á
Á
Á
R
R
R
I
I
I
O
O
O
S
S
S
%
%
%
Indústria
1.327 10,2 22.082 26,9
Comércio
5.553 42,6 24.471 29,9
Setor
Serviços
6.152 47,2 35.465 43,2
Formal
9.172 70,4 77.073 94,0
Tipo
Informal
3.860 29,6 4.945 6,0
Pública
201 1,5 6.577 8,0
Privada
12.831 98,5 75.441 92,0
Naturez
Micro
12.016 92,2 30.868 37,6
Pequena
859 6,6 19.526 23,8
Média
142 1,1 14.746 18,0
Porte
Grande
15 0,1 16.878 20,6
Total
13.032 100 87.737 100
Fonte: ACIM (Censo Econômico 2002)
Com base no Censo Econômico 2002, o qual revelou onde residem as pessoas que
trabalham em Maringá, constata-se que 17,0% da força de trabalho empregada nessa cidade
moram em municípios circunvizinhos, sendo que 7,7% (6.756 pessoas) são de Sarandi e 3,7%
(3.246 pessoas) são provenientes de Paiçandu. Considerando-se que o mercado local
empregava 87.737 trabalhadores em 2002, 14.915 praticavam a mobilidade pendular, já que
moravam em outros municípios.
Conquanto seja evidente que Maringá polariza uma região na qual se constata a
aglomeração urbana caracterizada pela interdependência intermunicipal, a cidade-pólo
possivelmente atrai mais pessoas destinadas ao consumo do que trabalhadores. É
significativo o número de pessoas que se dirigem diariamente a Maringá a trabalho, porém a
proporção não é tão expressiva, quando se observa que 83% dos trabalhadores habitam
Maringá.
135
GRÁFICO nº 4. Origem da força de trabalho que se emprega em Maringá - 2002
Fonte: ACIM (Censo Econômico 2002)
Considerando-se que a cidade tem 73,9% da população do aglomerado formado
em conjunto com Sarandi e Paiçandu, e que em Maringá se localiza o centro dinâmico e
grande parte das indústrias, o nível de interdependência poderia ser maior. Isso é ainda mais
preocupante pelo fato de os municípios adjacentes não apresentarem um mercado de trabalho
amplo, empregando menos trabalhadores habitantes da localidade do que a cidade-pólo. Neste
caso, onde estão trabalhando as pessoas economicamente ativas? No mercado informal? Em
outras cidades? É preciso considerar que muitos são autônomos, empresários ou
microempresários, e muitos outros, desempregados.
Conforme ilustra a tabela n.º 22 , apesar de Sarandi e Paiçandu serem as cidades
que mais possuem trabalhadores empregados em Maringá, o item “outras cidades” aparece em
terceiro lugar, com 3,4%, na frente da quarta cidade que constitui o aglomerado urbano de
Maringá, Marialva, donde vem 0,7% dos trabalhadores ocupados no mercado formal de
Maringá.
Como mostra a análise com base nos setores considerados, a indústria é o que
mais ocupa trabalhadores de outras cidades - 35% (7.729 trabalhadores) - seguido do
comércio, com 13,2% (3.230 trabalhadores) e do setor de serviços, com 12,5% (4.433
pessoas).
Neste contexto, dentre as cidades que formam a periferia externa ao pólo, Sarandi
e Paiçandu detêm uma expressiva participação da mão-de-obra empregada nas indústrias,
83,0%
7,7%
3,7%
0,7%
0,7%
0,8%
3,4%
Maringá
Sarandi
Paiçandu
Marialva
Mandaguu
Mandaguari
Outras cidades
Origem da força de trabalho
136
representando respectivamente 14,9% e 7,9% e ao todo, 22,8%. Isso pode estar relacionado à
qualidade dos empregos ofertados pelas indústrias, os quais não requerem uma mão-de-obra
altamente qualificada (compreendem tarefas em rotinas pouco complexas), e ao fator
localização, pois, como já foi referido, as cidades mencionadas ficam muito próximas de dois
grandes parques industriais de Maringá. Os habitantes de Maringá detêm uma participação de
apenas 65% no setor da indústria, bem abaixo dos 83% de todo o mercado de trabalho.
TABELA nº 22. Cidade de residência dos funcionários - 2002
% relativo
Itens
Indústria Comércio Serviço Total
MARINGÁ 65,0 86,8 87,5 83,0
REGIÃO 35,0 13,2 12,5 17,0
Sarandi 14,9 6,2 5,7 7,7
Paiçandu 7,9 2,9 2,7 3,7
Marialva 1,5 0,6 0,5 0,7
Mandaguaçú 0,9 0,8 0,6 0,7
Mandaguari 0,6 1,0 0,6 0,8
Ângulo 0,0 0,0 0,0 0,0
Iguaraçu 0,2 0,0 0,0 0,0
Outras cidades 9,0 1,7 2,4 3,4
Fonte: ACIM (Censo Econômico, 2002).
Para compreender melhor a periferia, vale dedicar uma breve análise aos números
referentes ao mercado de trabalho de Maringá, Paiçandu e Sarandi. Neste contexto, cabe fazer
uma análise comparativa entre os três municípios quanto aos respectivos níveis de
empregabilidade.
A cidade de Paiçandu emprega no setor formal 2.123 pessoas, enquanto 3.246 de
seus habitantes trabalham em Maringá. Somados os números, se têm 5.369 pessoas
trabalhando no mercado formal. Há que se considerar que nem todos os empregados em
Paiçandu residem nessa cidade. A população economicamente ativa desse município é de
14.812 pessoas, 14.018 das quais estão ocupadas em alguma atividade. Com este cenário,
constata-se que apenas 38,30% dos ocupados estão no mercado de trabalho formal em
empresas de Maringá (60,46%) e de Paiçandu (39,54%). Sendo assim, ao menos, 62,70%
delas são constituídos de autônomos (atuantes no mercado informal), empresários
(microempresários, principalmente), bóias-frias, ou ainda trabalhadores de empresas de outros
municípios da região.
No outro extremo do aglomerado, Sarandi revela um cenário parecido, porém
menos dependente de Maringá e um pouco menos informal, quando se compara com
Paiçandu. A cidade emprega no setor formal 6.648 pessoas, enquanto 6.756 de seus habitantes
trabalham em Maringá. Somados os números, se têm 13.404 pessoas trabalhando no mercado
137
formal. A população economicamente ativa desse município é de 32.828 pessoas, das quais,
31.068 estão ocupadas em alguma atividade. Com este cenário, constata-se que apenas
43,14% dos ocupados estão no mercado de trabalho formal em empresas de Maringá
(50,40%) e de Sarandi (49,60%), além do fato de que nem todos que trabalham em Sarandi
(assim como verificado em Paiçandu) habitam a cidade. Os restantes 56,86% trabalham na
informalidade - em Maringá, em Sarandi ou em outras cidades da região - ou são donos de
empresas e/ou propriedades rurais.
TABELA nº 23. Aglomerado Urbano de Maringá: População com idade ativa, população
economicamente ativa, ocupados, empregos formais, empregados em Maringá, outra situação -
2002
PAIÇANDU MARINGÁ SARANDI
Total da
Aglomeração
Urbana
LOCALIDADES
CATEGORIAS
% do
total
% do
total
% do
total
% do
total
PIA 21.398 7,37 221.316 76,28 47.425 16,35 290.139 100%
PEA 14.812 7,37 153.195 76,28 32.828 16,35 200.835 100%
Ocupados 14.018 7,37 144.984 76,28 31.068 16,35 190.070 100%
Empregos formais 2.123 2,34 82.067 90,34 6.648 7,32 90.838 100%
Empregados em Mgá* 3.246 3,70 72.822 83,00 6.756 7,70 87.737 100%
Se encontra em outra
situação (ocupados)
8.649 8,78 72.162 73,28 17.664 17,94 98.475 100%
Fontes: IBGE (Censo Demográfico 2000); ACIM (Censo Econômico 2002).
* Dados do Censo Econômico realizado pela Associação Comercial e Industrial de Maringá.
Uma preciosa fonte, quando se busca conhecer a dinâmica de crescimento de um
núcleo urbano, é o consumo de energia elétrica, já que esta representa o combustível de toda
forma de produção urbana, seja ela residencial, industrial ou comercial.
Não obstante, apesar de ser muito oportuno efetuar a leitura e análise do consumo
de energia do aglomerado urbano para se compreender o processo de periferização, cabe
ponderar que este não é o principal meio de análise da pesquisa, mas somente um meio
complementar. O presente trabalho tem como proposta uma pesquisa qualitativa, voltada à
compreensão da mobilidade do trabalho por meio de entrevistas semidiretivas com
trabalhadores e encarregados de recursos humanos ou gerentes de produção.
Com efeito, o quadro nº 3 traz dados referentes ao total de megaWhatts e do
número de consumidores, porém quando eles são expressos por categoria de consumidor, só
foram considerados os setores residência, indústria e comércio/serviços, não fora computado o
138
consumo de centros religiosos, repartições públicas, etc., a não ser na totalização do consumo
da cidade.
QUADRO nº 3. Consumo de energia nos municípios de Maringá, Paiçandu e Sarandi –
1995 a 1999 e 2001
Município Categorias 1995 1996 1997 1998 1999 Partic.*
1999
2001 Cresc.**
%
MWh 503.557 528.828 550.180 - - - 638.246 26,74
Residências 160903 174157 183194 193638 199479 37,4% - 23,97
Indústria 165642 164809 166629 188320 199360 37,4% - 20,36
Comércio 99446 108812 118307 126293 134325 25,2% - 35,07
Nº de
Consumidores
88.070 91.050 93.924 - - - 110.907 25,93
Residências 74808 77132 79862 83731 86664 86,5% - 15,85
Indústrias 1679 1661 1719 1631 1804 1,8% - 7,44
Comércio 10135 10542 10839 11290 11674 11,7% - 15,18
Consumo per
capitã
5,72 5,81 5,85 - -
-
5,75
Residências 2,15 2,26 2,29 2,31 2,30 - -
Indústria 98,65 99,22 96,93 115,46 110,51 - -
MARINGÁ
Comércio 9,81 10,32 10,91 11,18 11,51 - -
MWh 16.367 17.767 19.107 - - 23.228 41,92
Residências 8554 9899 10607 11192 11517 73,4% - 34,64
Indústria 2502 1933 1919 2034 2093 13,3% - (19,54)***
Comércio 1316 1534 1708 1919 2091 13,3% - 58,89
Nº de
Consumidores
7.150 7.636 8.151 - - 9.945 39,09
Residências 6337 6611 7267 7484 8010 92,5% - 26,40
Indústrias 59 79 82 101 105 1,2% - 77,97
Comércio 412 440 477 502 543 6,3% - 31,80
Consumo per
capitã
2,29 2,33 2,34 - -
-
2,34
Residências 1,35 1,50 1,46 1,49 1,44 - -
Indústrias 42,41 24,47 23,40 20,14 19,93 - -
PAIÇANDU
Comércio 3,19 3,49 3,58 3,82 3,85 - -
MWh 51.396 55.824 60.123 - - 63.590 23,72
Residências 21043 23908 25576 27285 28473 51,0% - 35,31
Indústria 17701 18832 20609 22039 19624 35,2% - 10,86
Comércio 5358 5905 6718 7001 7675 13,8% - 43,24
Nº de
Consumidores
16.619 17.931 19.182 - - - 22.814 37, 28
Residências 15012 16117 17243 18308 18926 91,0% - 26,07
Indústrias 255 303 329 351 376 1,8% - 47,45
Comércio 1140 1276 1375 1452 1505 7,2% - 32,02
Consumo per
capitã
3,09 3,11 3,13 - -
-
2,79
Residências 1,40 1,48 1,48 1,49 1,50 - -
Indústrias 69,42 62,15 62,64 62,79 52,19 - -
SARANDI
Comércio 4,70 4,63 4,89 4,82 5,10 - -
Fonte: IPARDES (Apud COPEL), 2003; AMUSEP, 2000
ORG: BORGES, W.A.
* Participação
** A taxa de crescimento é auferida pela divisão do dado mais recente pelo primeiro, o qual data 1995.
*** Taxa de crescimento negativo
139
O consumo de energia dos municípios elencados ilustra uma constituição
territorial desigual. Em Maringá, percebe-se que existe uma melhor distribuição do consumo
entre os setores: residência (37,4%), comércio (25,2%) e indústria (37,4%). Em Sarandi,
quanto à participação do consumo, se percebe uma maior concentração nas residências
(51,0%); no entanto, a participação conjunta da indústria (35,2%) e do comércio, (13,8%),
totalizando 49%, mostra que esta cidade não se caracteriza mais como simples cidade-
dormitório. Já Paiçandu se apresenta em grande parte como dormitório, pois o consumo de
energia pelas residências chega a 73,4%, tendo a indústria e o comércio uma pequena
participação: 13,3% cada um.
No que se refere à quantidade de consumidores, o quadro se repete, tendo Maringá
como a cidade onde as residências possuem uma menor participação (86,5%), sendo que em
Paiçandu e Sarandi as residências detêm, respectivamente, a participação de 92,5% e 91,0%
das unidades consumidoras.
Pelo fato ser uma cidade-pólo, a mais dinâmica e rica do aglomerado, Maringá
apresenta um maior poder de consumo per capita nas três categorias analisadas. Tratando-se
do consumo per capita, houve crescimento no consumo em todos os setores na cidade-pólo
(de 1995 a 1999).
Com efeito, houve um maior crescimento no consumo de energia no setor do
comércio/serviços (35,07%); porém, em número de consumidores, o setor residencial obteve
o maior crescimento -15,85% - um pouco acima do setor comercial (15,18%).
Seguem os principais apontamentos verificados em Paiçandu e Sarandi.
Paiçandu: 1) As residências concentram o consumo de energia (73,35%); 2) é
menor o consumo per capita; 3) é maior o crescimento do consumo total; 4) é maior a taxa de
crescimento comercial no consumo (58,89%) e maior a taxa de crescimento industrial quanto
ao número de consumidores (77,97%); 5) cresceu o consumo per capita das residências e do
comércio, mas houve um alto decréscimo do consumo per capita das indústrias. Neste último
apontamento, nota-se que o número de consumidores cresceu muito, enquanto o consumo de
energia industrial decresceu consideravelmente, levando a concluir, em hipótese, que em
Paiçandu foram abertas pequenas fábricas concomitantemente com o fechamento ou perda de
volume de produção (o que demanda energia) de outras fábricas maiores.
Sarandi: 1) As residências concentram o consumo de energia (51,05%); 2) o
consumo per capita é baixo, comparado ao de Maringá; 3) há menor crescimento de
consumo; 4) dentre as categorias, o comércio apresentou a maior taxa de crescimento do
consumo (43,24%) e a indústria a maior taxa de crescimento do número de consumidores
140
(47,45%); 5); o município apresentou um crescimento do consumo per capita por parte das
residências e do comércio, mas, em relação à indústria, se constata que houve um decréscimo
do consumo por unidade, o que denota uma maior participação de pequenas empresas.
Com efeito, Maringá se apresenta como um espaço reservado da elite gestora
local. Esta elite, além de lucrar com os empreendimentos imobiliários situados no perímetro
urbano (por meio da preservação do espaço urbano da degradação e pauperização), obteve
lucro com a valorização de áreas situadas nas periféricas cidades de Sarandi e Paiçandu,
mediante loteamentos realizados por um simples e precário parcelamento do solo. Isso levou
essas cidades a se apresentarem como a única condição de habitação para os excluídos. Suas
áreas são desprovidas de recursos urbanos e de empregos, pois se constituíram como espaços
urbanos sem poderio econômico, sem recursos para financiar o seu desenvolvimento, ficando
essas cidades destinadas a uma posição de cidade-satélite (Sarandi) e dormitório para
(Paiçandu).
Segundo dados já mostrados, a cidade de Maringá está entre as menos
excludentes, ao passo que Sarandi (8 quilômetros) e Paiçandu (14 quilômetros) estão muito
distantes da cidade-pólo no que se refere aos índices de exclusão social. Essa desigualdade já
foi atestada, porém é reforçada pelos dados referentes ao consumo de energia, os quais
apontaram para Maringá 58,62% a mais no valor per capita do consumo residencial em
relação à média deste consumo verificada pelas demais cidades do aglomerado. A residência é
a melhor categoria para se constatar o desigual poder de consumo entre as localidades. Deste
modo, a diferença no consumo per capita residencial entre Maringá e os municípios
investigados da periferia externa se situa em 53,33% acima em relação a Sarandi e 59,72%
em relação a Paiçandu.
Na indústria, o consumo per capita de Maringá representou mais do que o dobro
do revelado por Sarandi e o sêxtuplo do alcançado por Paiçandu. Por último, em relação ao
comércio, Maringá apresentou o dobro de Sarandi e o triplo de Paiçandu no que concerne ao
consumo per capita de energia, que evidencia que Maringá possui maiores empresas tanto no
setor da indústria quanto no comércio.
Neste contexto de desigualdade, pode-se considerar o PIB per capita dos três
municípios como indicador, como se apresenta na tabela nº 24, referente ao ano de 1996.
141
TABELA nº 24 - Produto Interno Bruto – per capita dos municípios - 1996
Município População/96 PIB/96 U$ PIB per capita
Maringá 267.942 2.118.144.668 7.905,23
Paiçandu 27.119 51.020.665 1.881,36
Sarandi 60.212 115.041.165 1.910,60
Fonte: IBGE e IPEA.
ORG: BORGES, W. A.
O aglomerado urbano revela uma evolução pautada no desenvolvimento desigual,
como mostra a análise realizada com base nos índices de exclusão social, consumo de energia
e o PIB per capita.
Em complementaridade, a desigualdade pode ser melhor percebida quando se
analisam o nível de educação, a renda per capita média, os indicadores de pobreza,
desigualdade e exclusão social, acesso a bens de consumo, vulnerabilidade das famílias, o que
resulta no índice de desenvolvimento humano.
Quanto a estes dados, cabe elucidar que, quando se busca evidenciar a pobreza por
meio do índice de desenvolvimento humano
21
, de acordo com Sônia Rocha (2003), estão se
evidenciando as necessidades básicas, tendo esse índice como base expectativa de vida, o
nível de educação e o PIB per capita. Por outro lado, quando se busca retratar a pobreza
somente por meio da renda (pobreza absoluta
22
ou relativa
23
), ela pode ser medida com base
na linha de indigência (quando se faz referência ao caráter essencial das necessidades
alimentares), ou na linha de pobreza (um conjunto mais amplo de necessidades que congrega:
alimentação, habitação, vestuário, etc.).
Com base na tabela nº 25, se identifica um quadro desigual que marca a relação
entre pólo e periferia no tocante aos municípios considerados no aglomerado urbano de
Maringá. A cidade-pólo é detentora da menor taxa de analfabetismo adulto (mais de 25 anos),
com 6,4%, sendo esta quase a metade da apresentada por Sarandi (12,5%) e menos da metade
da apresentada por Paiçandu (15,3%). Isso reforça o perfil de cidades em estado de periferia
em que se encontram Sarandi e Paiçandu.
21
O chamado índice de desenvolvimento humano (IDH), proposto pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (Pnud) e divulgado pela primeira vez no Relatório do desenvolvimento humano de 1990,
sintetiza de certa forma a discussão sobre índices sintéticos de desenvolvimento, ocorrida nos 30 anos
precedentes (SÔNIA ROCHA, 2003, p. 11).
22
Pobreza absoluta está estreitamente vinculada às questões de sobrevivência física; portanto, ao não-
atendimento das necessidades vinculadas ao mínimo vital (SÔNIA ROCHA, 2003, p. 11).
23
O conceito de pobreza relativa define necessidades a serem satisfeitas em função do modo de vida
predominante na sociedade em questão, o que significa incorporar a redução das desigualdades de meios entre
indivíduos como objetivo social. Implica, conseqüentemente, delimitar um conjunto de indivíduos
“relativamente pobres” em sociedades onde o mínimo vital já é garantido a todos (SÔNIA ROCHA, 2003, p.
11).
142
Percebe-se que Maringá detém uma mão-de-obra mais qualificada quando se
considera o número de anos de estudo, que é de 7,5 anos, enquanto para Sarandi esse número
é 4,8 anos e para Paiçandu, de 4,2 anos. Estas duas cidades acabam cumprindo a função de
dormitório, para uma parte de sua população, que sustenta, como força de trabalho, a
acumulação de pequenos ou grandes capitalistas da cidade-pólo.
TABELA nº 25. Nível Educacional da População Adulta (25 anos ou mais) - 1991 e 2000
PAIÇANDU
MARINGÁ
SARANDI
LOCALIDADES
INDICADORES
1991 2000 1991 2000 1991 2000
Taxa de analfabetismo 25,7 15,3 11,9 6,4 23,2 12,5
%com menos de 4 anos
de estudo
54,2 38,7 32,4 21,5 54,0 36,0
% com menos de 8 anos
de estudo
88,2 75,1 61,7 48,2 86,8 75,3
Média de anos de
estudo
3,3 4,2 6,2 7,5 3,4 4,8
Fonte: PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000
Com efeito, quando se parte para analisar a renda per capita média dos três
municípios, tem-se Maringá com a maior renda, R$ 465,40, 2,5 vezes maior do que as
apresentadas por Sarandi (R$ 187,10) e Paiçandu (R$ 182,20). Por outro lado, a desigualdade
aumentou, já que a renda per capita média da cidade-pólo cresceu mais (42,28%), na última
década, do que a renda dos municípios investigados da periferia externa (a renda de Sarandi
cresceu 29,30% e a de Paiçandu 35,56%).
Tais taxas de crescimento denotam uma concentração de renda na cidade-pólo.
Constata-se que a proporção de pobres nos três municípios diminuiu, porém é preciso
considerar que o demarcador da pobreza é o fator renda, e esta, por mais que tenha aumentado
em números absolutos, devido ao próprio aumento do salário-mínimo, tem um poder de
compra menor, pelo fato de a inflação ter sido mais alta do que o aumento do nível de renda
da classe mais pobre.
143
TABELA nº 26. Indicadores de Renda, Pobreza e Desigualdade - 1991 e 2000
PAIÇANDU
MARINGÁ
SARANDI
LOCALIDADES
INDICADORES
1991 2000 1991 2000 1991 2000
Renda per capita média
134,4 182,2 327,1 465,4 144,7 187,1
Proporção de pobres (%) 30,5 23,1 10,8 8,3 29,2 20,6
Índice de Gini* 0,37 0,43 0,51 0,56 0,40 0,43
Fonte: PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000
* Trata-se de um índice de desigualdade proposto por Corrado Gini em 1914, freqüentemente utilizado para
expressar o grau de desigualdade de renda.
MAPA nº 6 – Predominância de renda dos responsáveis por domicílio em Maringá,
Paiçandu e Sarandi - 2003
Além do índice de Gini, no contexto da desigualdade, observa-se, por meio dos
extratos apresentados pela tabela nº 26, conforme já expresso, que o município de Maringá é o
que se apresenta mais desigual, porém, isso se explica pela maior concentração na cidade-pólo
da classe detentora de um nível de renda mais elevado, ou seja, a elite do aglomerado urbano.
Em Maringá, segundo o Atlas de Exclusão Social (V. 3, 2004), 1.970 famílias são
consideradas ricas (aquelas que auferiam em setembro de 2003 uma renda de R$ 10.982,00),
o que coloca a cidade em 53º lugar no mapa dos ricos, apesar de este município ser o 68º
mais populoso do Brasil.
144
Por outro lado, embora as cidades de Paiçandu e Sarandi se revelem menos
desiguais, isso se justifica pela maior homogeneidade da renda auferida pelos seus
trabalhadores, o que não acontece em Maringá. Poder-se-ia dizer que Sarandi e Paiçandu se
constituem da classe dos incluídos de forma perversa no espaço urbano (salvo poucos), e
Maringá, como o pólo onde se concentra a classe dominante. Embora a cidade-pólo contenha
também, na sua periferia interna, uma classe de incluídos de forma perversa, esta classe detém
uma renda média um pouco melhor, o que lhe possibilita ocupar um espaço no meio urbano
mais próximo do centro dinâmico.
TABELA nº 27. Porcentagem da Renda Apropriada por Extratos da População - 1991 e 2000
PAIÇANDU
MARINGÁ
SARANDI
LOCALIDADES
INDICADORES
1991 2000 1991 2000 1991 2000
20% mais pobres
6,3 4,9 4,3 3,4 6,0 4,5
40% mais pobres
17,8 15,2 12,2 10,3 16,8 15,1
60% mais pobres
33,9 30,5 24,3 20,9 32,1 30,4
80% mais pobres
56,6 51,2 43,8 39,0 53,5 51,3
20% mais ricos
43,4 48,8 56,2 61,0 46,5 48,7
Fonte: PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000
Com efeito, conquanto exista a pobreza em todos os municípios, a maior
incidência se encontra nas cidades da periferia externa. Conforme a tabela nº 28, verifica-se
que, quanto ao número de telefones e computadores, a periferia externa é carente, quando
comparada ao pólo. Enquanto Maringá possui 76,4% das casas com telefone e 21,2% com ao
menos 1 computador, Sarandi possui apenas 24,6% das casas com telefone e 3% com
computador; e numa condição parecida está Paiçandu, tendo esta 19,9% das casas com
telefone e 3,4% das casas com computador.
TABELA nº 28. Acesso a Bens de Consumo, 1991 e 2000
PAIÇANDU
MARINGÁ
SARANDI
LOCALIDADES
INDICADORES
1991 2000 1991 2000 1991 2000
Geladeira 72,1 94,2 93,8 98,6 79,4 94,6
Televisão 70,7 90,5 90,1 95,9 78,3 90,4
Telefone 7,0 19,9 42,7 76,4 7,5 24,6
Computador ND* 3,4 ND* 21,2 ND* 3,0
Fonte: PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000
* ND – Não disponível
Outro dado muito importante, quando se busca compreender a periferia, é o índice
de carência familiar, o qual expressa o percentual de crianças vivendo em famílias com renda
145
inferior a ½ salário-mínimo ao mês. No aglomerado urbano de Maringá se tem a cidade-pólo
com 12,7% de todas as crianças vivendo em famílias com renda inferior a ½ salário mínimo,
enquanto na periferia externa este índice salta para 28,1% em Sarandi e para 31,5% em
Paiçandu.
Neste contexto é relevante mencionar que Maringá é a melhor cidade dentre as
maiores do Estado do Paraná, apresentando o menor índice
24
.
TABELA nº 29. Aglomerado Urbano de Maringá: Índice de carência familiar - 1991 e 2000
PAIÇANDU
MARINGÁ
SARANDI
AGLOMERADO
URBANO
LOCALIDADES
INDICADORES
1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000
% de crianças em
famílias com renda
inferior à 1/2 salário
mínimo
41,1 31,5 15,7 12,7 37,9 28,1 20,95 16,99
Número absoluto 9.123 9.679 37.669 36.659 18.185 20.069 64.977 66.407
Representatividade % 14,04 14,58 57,97 55,20 27,99 30,22 100 100
Crescimento % - 6,09 - - 2,75 - 10,36 - 2,20
Fonte: PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000.
Em números absolutos, aumentou a quantidade de crianças vivendo em famílias
com ½ salário-mínimo no aglomerado urbano de Maringá. Dentre os três municípios, Sarandi
e Paiçandu obtiveram um crescimento respectivamente de 10,36% e 6,09%, enquanto a
cidade-pólo experimentou uma redução deste número de - 2,75%.
Esse comportamento denota a ocorrência do processo de periferização no
aglomerado urbano de Maringá pautado na periferia externa ao município polarizador.
O desenvolvimento desigual é percebido também pela evolução do índice de
desenvolvimento humano (o índice varia de zero a um) no decorrer da última década. Com
base na tabela nº 30, percebe-se que a cidade de Maringá detém um índice muito superior aos
das cidades de Sarandi e Paiçandu. O IDH até 0,499 denota um desenvolvimento humano
baixo, os índices entre 0,500 e 0,799 são considerados de médio desenvolvimento humano e o
IDH superior a 0,800 caracteriza desenvolvimento humano considerado alto
25
.
O mais relevante no contexto da desigualdade é perceber que a cidade de Maringá
vem se desenvolvendo mais do que a cidade de Sarandi. Enquanto Maringá subiu 0,079
pontos na última década, Sarandi somou mais 0,072 pontos. Já Paiçandu foi a que mais
avançou neste aspecto (0,086 pontos), mas mesmo assim continua como o município que
24
Maringá 12,7%, Curitiba 15,2%, Londrina 20,4%, Cascavel 27,3%, Foz do Iguaçu 29,1% e Ponta Grossa
31,1%.
25
http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI152578-EI306,00.html em 19/08/2004.
146
apresenta o pior índice no aglomerado (0,746).
TABELA nº 30. Desenvolvimento Humano – 1991 e 2000
PAIÇANDU
MARINGÁ
SARANDI
LOCALIDADES
INDICADORES
1991 2000 1991 2000 1991 2000
Índice de
Desenvolvimento Humano
Municipal
0,660 0,746 0,762 0,841 0,696 0,768
Educação 0,722 0,852 0,854 0,938 0,745 0,858
Longevidade 0,666 0,745 0,692 0,787 0,741 0,799
Renda 0,591 0,642 0,739 0,798 0,603 0,646
Fonte: PNUD – Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil, 2000.
Dentre os indicadores que congregam o Índice de Desenvolvimento Humano, só o
de longevidade ilustra Sarandi com um melhor índice do que Maringá, no mais, a cidade pólo
é melhor. Neste contexto, vale um aprofundamento no indicador renda, já que por este se
constata uma maior desigualdade.
Com efeito, Maringá melhorou 0,049 pontos, enquanto nos municípios
investigados da periferia externa a melhora foi de 0,51 em Paiçandu e 0,43 em Sarandi. Neste
quadro, nota-se que a cidade que mais se desenvolveu nos índices foi Paiçandu; porém esta
continua com os piores, ao passo que Sarandi é a que menos se desenvolveu, o que mostra que
neste município a periferia vem se reproduzindo com maior intensidade.
No aglomerado urbano de Maringá, no que se refere à segregação, as cidades de
Sarandi e Paiçandu possuem favelas, o que não se verifica na cidade-pólo, como se constata
na tabela nº 31.
TABELA nº 31. Favelas - 1991
Municípios Famílias Faveladas Número de Favelados
Maringá 0 0
Paiçandu 10 41
Sarandi 194 797
FONTE: AMUSEP
O mapa nº 7, ilustra exatamente Paiçandu e Sarandi como os municípios do
aglomerado urbano com favelas, embora não se encontrem entre os maiores detentores do
Estado do Paraná. Quando se considera a Região Metropolitana de Maringá, o município de
Mandaguari compõe, juntamente com estas duas cidades, o universo de favelados.
147
MAPA nº 7. Estado do Paraná, mesorregiões geográficas, estimativa de domicílios em
favelas - 1997
MAPA nº 8. Aglomerado Urbano de Maringá, estimativa de domicílios em favelas - 1997
Fonte: Observatório/IPPUR, 2003
ORG: BORGES, W. A.
MARINGÁ
PAIÇANDU
SARANDI
MARIALVA
148
Deste modo, percebe-se que Sarandi ensaia um desenvolvimento, apesar dos
escassos recursos de que a gestão municipal dispõe para gerir a cidade, principalmente por ela
apresentar uma alta taxa de crescimento populacional, a maior do aglomerado e uma das
maiores do estado, o que leva à proliferação da pobreza neste município. Já Paiçandu ainda se
configura como uma cidade-dormitório, retratando uma situação de exclusão mais perversa do
que Sarandi; porém este município vem apresentando a melhora mais significativa dos índices
que medem o desenvolvimento. Ambas são o retrato do modelo desenvolvimentista e
conservador implementado pela elite brasileira, o qual delegou às cidades o exercício de
promover uma melhor condição de vida para todos, mesmo não possuindo recursos e infra-
estrutura para isso.
4.2. Retrato da realidade via depoimentos: a periferia decorrente da mobilidade do
trabalho no aglomerado urbano de Maringá
Conforme a metodologia proposta, a pesquisa de campo, realizada por meio de
entrevistas, abarcou os setores industrial (3 entrevistas), comercial (3 entrevistas) e prestador
de serviços (4 entrevistas). No entanto, cada organização industrial deve, como requisito,
empregar 100 ou mais funcionários e cada organização comercial ou de serviços, 50 ou mais
funcionários. Em todos os casos as empresas devem estar operando há mais de 10 anos na
cidade de Maringá - PR, por se configurar esse período como um recorte que denota um
movimento histórico numa década de grandes mudanças no sistema produtivo.
Só foram realizadas entrevistas em empresas que operam em Maringá em vista do
propósito de se perceber a dinâmica pólo-periferia (onde se tem o trabalho na cidade-pólo e o
trabalhador habitante da periferia). O universo dos trabalhadores se constitui de 5 habitantes
de Paiçandu e 5 habitantes de Sarandi.
O trabalho de campo se cumpriu com a realização das entrevistas com
desempregados habitantes de Sarandi e Paiçandu, por meio dos quais se buscou auferir uma
leitura da mobilidade do trabalho, social e física, em suas vidas.
Cabe pontuar que todas as questões estão direta ou indiretamente ligadas à
mobilidade centrada no trabalho, o que denota uma preocupação em compreender este
movimento e o que dele se pode relacionar ao processo de periferização.
Como foi elucidado, as 10 entrevistas semidiretivas nas empresas foram realizadas
por meio de depoimentos de encarregados dos setores de recursos humanos ou produção.
149
Neste conjunto, constatou-se que a maior parte das empresas aumentou seu
quadro de funcionários na última década, mesmo computando-se um aumento de
produtividade. Deste modo, a expansão de empregos formais é decorrente de 4 fatores
identificados: 1) abertura de novas unidades (filiais) na cidade, sendo este o caso de uma
empresa mista varejista/atacadista (rede de lojas de eletroeletrônicos e móveis), e também de
uma varejista (rede de supermercado); 2) o crescimento populacional das cidades de Maringá,
Paiçandu e Sarandi, do qual decorreu um aumento da frota de ônibus da empresa que
monopoliza os serviços de transporte coletivo, a qual passou a empregar mais (motoristas e
cobradores); 3) abertura de novos cursos e novas sedes da Universidade Estadual de Maringá,
que demandou um maior número de funcionários (servidores e professores), embora sejam
estes servidores não estatutários (celetistas) e professores colaboradores; 4) o aumento de
140% do quadro de funcionários, nos dois últimos anos, de uma indústria alimentícia, por esta
expandir suas exportações.
Como se pode perceber nas palavras dos encarregados ou gerentes de produção ou
de recursos humanos das empresas entrevistadas, apenas uma rede bancária e um hotel não
apresentaram aumento do quadro de funcionários. Pelo contrário, nestas unidades
empresariais houve uma redução, que foi muito expressiva no primeiro e pouco expressiva no
segundo.
Deste modo, percebe-se que, embora o setor de serviços cresça em
representatividade, enquanto empregador, no setor bancário e hoteleiro o ritmo de inserção de
tecnologias ou aumento de produtividade tem sido mais intenso do que o ritmo da expansão
das unidades empresariais. Cabe elucidar que os entrevistados destas organizações
responderam à pergunta à luz de uma única unidade da corporação.
Com base no cenário econômico atual, é oportuno ressaltar o aumento do quadro
de funcionários da indústria de alimentos, decorrente as exportações, e o caso da redução
drástica do número de funcionário de uma prestadora de serviços, por ser esta uma agência
bancária.
QUESTÃO Nº 1. Aumentou o número de funcionários na empresa, no decorrer da última
década? Devido a quê?
Indústria alimentícia
R: O número de funcionários aumentou por causa do aumento de produção mesmo. Quando
conseguimos a exportação
, que não é uma coisa fácil de ter, então tem a certificadora, temos que
ter um certificado para poder estar exportando, a partir desse momento a produção aumentou
muito.
Agência bancária
R: Não, diminuiu.
Bastante, devido ao avanço em tecnologia.
150
Até o final da década de 1980, o Brasil se apresentava como um país pouco
competitivo (como foi elucidado no capítulo 3). Suas indústrias eram de baixa produtividade e
incapazes de concorrer com outras de capital internacional; eram voltadas para o mercado
interno, sustentando lucratividade por meio de aplicações financeiras em tempos de altos
índices de inflação. Com a abertura econômica do governo Collor, em decorrência da baixa
competitividade das empresas nacionais, o Brasil passou a importar produtos acabados sem
conseguir se inserir num mesmo nível de comercialização de produtos no mercado de
exportação, dando continuidade ao modelo exportador de matérias-primas. Além disso, houve
agravamento da crise interna, que elevou os índices de desemprego. Isso resultou do aumento
de produtividade das grandes corporações multinacionais, as quais adotaram modelos
flexíveis; pautados no Just-in-time/Kanban; e resultou também do fechamento ou busca
forçada de aumento de produtividade das empresas nacionais imposto por um mercado mais
exigente.
QUESTÃO Nº 2. Houve aumento de produtividade? Devido a quê?
Indústria de confecções
R: Hoje a produção triplicou com a tecnologia, e a mão-de-obra, nós aumentamos porque
ganhamos algum mercado a mais, é isso. Na década de 1980 a indústria de confecções do Brasil
estavava muito atrasada.
Cooperativa agroindustrial
R: Houve uma demanda do aumento da força produtiva. Por exemplo, com a nova fábrica de sucos
e maioneses, apesar de ter aumentado os postos de trabalho, praticamente não tem aquele número
de funcionários que se imagina numa fábrica. Por que? É tudo automatizado, é tudo informatizado.
Então você entra e...: cadê os funcionários? São poucos. Poucos por uma grandiosidade e por
tantos produtos que a gente fabrica. Realmente o pessoal pergunta: só tem isso de funcionários?
Nas outras fábricas eu não percebo que houve um número de demissão, em virtude do incremento
tecnológico. Agora esta
nova fábrica é uma nova realidade. Porque ela já começou desta forma,
com tecnologia. É a fábrica mais avançada de sucos no Brasil. Realmente o número de pessoas que
entrou foi reduzido.
Agência bancária
R: Essa agência que eu estou gerenciando hoje, já teve mais de 200 funcionários trabalhando aqui.
Hoje nós estamos com um quadro perto de 30 funcionários e a produtividade da agência é maior.
Empresa varejista I
R: Novos equipamentos, funções diferente, que antes não tinha, gerente de categorias. Gera mais
produtividade.
O gerente de categorias faz todo o estudo das gôndolas, para verificar o que se consome mais, qual
é a preferência do consumidor (freqüência de reposição).
Nós temos os promotores. A Sadia constantemente tem promotores na loja (a maior parte das
empresas repõem seus próprios produtos). (...) Não diminui o número de repositores. A pessoa que
fica na degustação, já cuida do setor que está representando.
O novo modo de produção retrata uma fábrica baseada em tecnologias, mas ainda
dependente de uma força de trabalho técnica, porém, igualmente especializada.
Como se pode perceber nos casos da cooperativa agroindustrial e da empresa
varejista, a tecnificação (por meio da inserção de novas tecnologias) e a especialização
151
(decorrente das novas necessidades na prestação de serviços) representam o modo de
produção atual.
Neste contexto, na cooperativa, a grandiosidade da estrutura produtiva passou a
empregar muito menos trabalhadores do que empregava até o início da década de 1990.
Obviamente as mudanças não respeitam uma precisão no tempo, já que uma das unidades
produtivas desta empresa, que se apresenta completamente enxuta, em conseqüência da
produção flexível, se contrapõe a arranjos produtivos existentes em outras unidades que
demandam uma maior quantidade de mão-de-obra, por retratarem o modelo fordista de
produção, embora em mudanças. Já no segundo caso, na empresa varejista, o gerente de
categorias de uma rede de supermercados se apresenta como um especialista em fazer a
leitura do comportamento do consumidor (no intuito de saber sua preferência), hábitos de
compra e gerenciamento de reposição e disposição dos produtos nas gôndolas.
O setor de serviços, devido à competitividade e à conseqüente necessidade de
lidar com um consumidor mais exigente, instaura uma gestão totalmente dedicada ao bom
atendimento, pautada na antecipação aos desejos do consumidor, em grande parte,
manipulando e criando estes desejos.
As mudanças instauraram uma nova geografia econômica, por meio dos novos
modelos de gestão. Estes foram concebidos para se tornarem mais flexíveis, e com eles a
sociedade capitalista ganha um outro ritmo e comportamento; um comportamento que tende a
homogeneizar o território global, por meio da cultura de massa.
Conforme observa Milton Santos em sua obra “Por uma outra globalização”
(2000), a cultura de massa só se revela superficial no contexto em que se percebe a expressão
da cultura popular, podendo a segunda se utilizar da primeira para se manifestar.
Mesmo assim, é a cultura de massa produzida pela mídia que promove o capital
que permite o investimento em sistemas produtivos flexíveis, para atender às “necessidades”,
mas principalmente aos desejos de uma sociedade obcecada pelo consumo. Esta percebe no
consumo um momento de felicidade, ou , um meio de conquistar a felicidade.
Com efeito, grande parte das empresas pesquisadas revelou um ganho de escala,
decorrente da incorporação de novos produtos num mesmo negócio, ao passo em que se
multiplicam as unidades produtivas ou comerciais. A produtividade, desta forma, não reduz o
número de funcionários nestas organizações que se encontram em expansão de unidades,
porém, por unidade ou setor, o enxugamento do quadro é notório. Sendo assim, o crescimento
do número de lojas de uma empresa varejista, por exemplo, é maior do que o crescimento do
número de funcionários. Cada unidade mais agrega produtos do que contrata.
152
QUESTÃO Nº 2. Houve um aumento de produtividade? Devido ao que?
Empresa Atacadista/varejista
R: Principalmente devido à dinâmica da empresa, o desenvolvimento da empresa. Ela trabalhava
com uma linha pequena, só no atacado, quando começou; diversificou quando entrou no varejo,
aumentou o mix de produtos, aumentou as filiais, principalmente quando entrou na capital
(Curitiba). Com isso a gente vai pegando mais público. Inicialmente nós trabalhávamos com uma
linha reduzida, agora a gente trabalha com toda a linha de eletrodomésticos, móveis e, atualmente
entramos com outra linha de serviços, que é a parte de garantia complementar, é parte de vendas
de telefonia celular, serviços de telefonia também, conseqüentemente vai aumentando a
produtividade.
No campo da gestão, o que viabiliza uma maior acumulação de capital é o
aumento de produtividade. Esta se obtém por meio da mais-valia absoluta (ganho na
utilização de recursos, porém, não do tempo), mas principalmente por meio da mais-valia
relativa, ou seja, com base na inserção de novas tecnologias eletrônicas. Estas propiciam a
substituição da força de trabalho do homem por máquinas ou softwares, precarizando ainda
mais a condição do trabalhador e contribuindo para sua maior alienação, pautada no complexo
modelo de especialista polivalente.
Neste contexto, o sistema de informação gerencial
26
(SIG) possibilitou uma
dinâmica imaterial, a qual transformou as relações no tempo e no espaço. O tempo passou a
153
QUESTÃO Nº 3. Houve inserção de tecnologias? Com isso não se estão reduzindo os postos
de trabalho?
Empresa atacadista/varejista
R: De dez anos para cá, principalmente na parte comercial, a empresa desenvolveu um
departamento interno de informática, onde eles criam os programas e administram os programas
aí, que são utilizados nas lojas. Então, em termos de hardware e software, houve um grande salto
de uma década para cá, principalmente se a gente for falar em controle. Foram adquiridas uma
série de sistemas de controles tanto na área comercial quanto na área administrativa. Houve e está
havendo uma grande implementação de tecnologias na empresa.
A empresa está crescendo né, quando você abre mais filiais, conseqüentemente você precisa de
mais gente para controlar aquilo. Então eu acredito que não houve diminuição. Se você adquire
uma empilhadeira, uma empilhadeira tiraria vários postos de trabalho no depósito. Mas aqui não
ocorreu isso, porque, conforme a gente foi adquirindo as filiais foram crescendo, então com isso
aumenta o fluxo de mercadoria, aumenta o fluxo de serviços (no depósito).
Empresa Varejista I
R: Há pouco tempo, nós tivemos uma regressão. Tinha pessoas que eram contratadas como
etiquetadores. No ano passado, devido uma liminar, o supermercado foi obrigado a etiquetar toda a
mercadoria, nós não tivemos de aumentar o nosso quadro, enquanto ia repondo ia etiquetando.
Hoje, em Maringá não está sendo obrigatório. Em Paranavaí é obrigado 100% da loja.
O Código de barra (foi a grande inovação tecnologia), máquinas de padaria, etc. (...) Agora, dá
para eu fechar o caixa, por causa do aumento de produtividade? Não dá! apesar que em são Paulo
já tem o auto-atendimento no Pão de Açúcar (caixa automático para o pagamento da compra).
No entanto, o funcionário polivalente acaba assumindo várias funções pouco
enriquecedoras, as quais só se apropriam mais de sua força de trabalho, sem lhe retribuir com
salários melhores. É o que ocorre com o repositor de supermercado, no caso da empresa
varejista. Com a liminar que obriga à etiquetação dos preços em todos os produtos, a empresa
não voltou a contratar os antigos etiquetadores, pois passou a função aos repositores,
permitindo no máximo um tempo de treinamento na prática, para estes se familiarizarem e
ganhar ritmo na nova função.
Outra questão pertinente ao contexto do setor supermercadista, apresentada no
momento em que a entrevistada coloca como exemplo o setor de caixas, se verifica quando
lhe é perguntado se a inserção de tecnologias não reduz o número de funcionários. Sua
resposta foi negativa, porém ela admitiu que nas grandes redes - como o Pão-de-Açúcar, em
São Paulo - já vêm sendo testados os caixas de auto-atendimento para o pagamento da
compra. Até mesmo em funções em que isto seria inimaginável já está havendo um ensaio da
substituição do homem pela tecnologia/máquina, pautada na redução de custos, pela busca de
uma maior acumulação de capital. Entretanto, será que este novo caixa se mostra funcional?
Mesmo que assim se revele, o ambiente em que se busca inserir este novo modelo de caixa
não se é o mais propício, principalmente devido ao desemprego.
Não obstante, a humanidade tende a chegar num limite de robotização, pois,
mesmo que alienadas, a cada dia as pessoas se sentem mais isoladas e coisificadas, perdendo a
154
graça a superficialidade auferida com a tecnologia. As relações humanas de fato, devem
imperar!
Existem organizações que expressam uma concepção ainda mais híbrida, na qual
se depara com uma diversificada aplicação tecnológica e a interação tecnologia/força de
trabalho. Um exemplo é a universidade. Conforme a entrevista realizada na universidade,
pode-se perceber que, enquanto são inseridas tecnologias, independentemente da expansão de
sua estrutura, estas tecnologias são utilizadas para o enriquecimento de tarefas nas quais se
requer a presença da força de trabalho.
Com efeito, cabe ressaltar duas realidades que predominam neste tipo de
organização. A primeira está no contexto dos servidores, onde a tecnologia viabiliza uma
melhor execução do trabalho. Por exemplo, os radiotransmissores contribuem para uma
melhor e mais ágil comunicação entre os vigilantes, como também daqueles que trabalham na
fazenda experimental da instituição e se reportam ao setor gestor da vigilância, centralizado
no campus de Maringá. Na segunda realidade, a tecnologia contribui com o trabalho dos
operários do conhecimento desta organização burocrática e profissional
28
, onde os professores
se transmutam no exercício da sua profissão adotando recursos que lhes possibilitem
dinamizar o momento da transmissão do conteúdo de uma forma didática, assim como na
construção do próprio conhecimento como pesquisador.
QUESTÃO Nº 3. Houve inserção de tecnologias? Com isso não se estão reduzindo os postos
de trabalho?
155
por outro se utiliza do mesmo homem como instrumento, ao instaurar novos níveis de
exigência. Constitui-se numa força propulsora do desenvolvimento econômico, no entanto é
também fator de aumento da desigualdade, por inviabilizar o acesso de todos ao campo de
trabalho. Além disso, tem contribuído para a especialização do conhecimento apenas na
superficialidade da operação do instrumento, o que resulta em que o indivíduo não reconheça
o todo enquanto processo de trabalho, pois a empresa exige dele um comportamento
polivalente, porém polivalente nas técnicas em si, e não na interpretação do seu uso.
QUESTÃO Nº 3. Houve inserção de tecnologias? Com isso não se estao reduzindo os postos
de trabalho?
Agência bancária
R: A tecnologia avançou e o banco X é o primeiro banco em tecnologia. Ele investe muito mesmo,
porque reduz substancialmente o custo, e com isso a rentabilidade é maior. O quadro de
funcionário vem se aperfeiçoando a cada dia, as pessoas se preocupando muito na última década
em estudar, muitos voltaram para os bancos de escolas, principalmente das universidades. Quem já
era graduado, se preocupou em fazer uma pós, ou até mesmo um mestrado, até gente com um
doutorado aí. Então essa preocupação em estar se especializando, em estar se aprimorando, tudo
isso também volta em benefício da própria empresa que traduz em produtividade. Pessoas mais
comprometidas, né. O próprio banco, a credibilidade do banco, hoje a marca X é a marca mais
valiosa que tem no mercado, né, então essa credibilidade do banco faz com que o banco se
expanda cada vez mais, o número de clientes cresça, e com isso também é base de produtos,
também levando um aumento da produção e também da rentabilidade.
O indivíduo se transforma num polivalente em técnicas, porém sem conteúdo ou
propenso a aceitar a condição de sempre ter de se adequar às necessidades da organização
formal. Caso contrário, lhe resta como opção ingressar no exército de reserva.
Sendo assim, a qualificação profissional passa a ser uma condição para o sujeito
empregável, porém especializado numa técnica efêmera, a qual exige deste sujeito a constante
busca pelo aperfeiçoamento, em um ritmo que o leva a não se perceber no contexto como um
ser independente do “ter que ser”.
Deste modo, no que tange à qualificação, as empresas exigem aumento da
escolaridade. As organizações passaram a exigir mais como condição para contratação, já que
as novas técnicas alienantes e trabalhos desenvolvidos em equipe requerem pessoas melhor
preparadas. Apesar disso, no ideário do encarregado do recursos humanos do hotel, a maior
exigência se pauta na evolução da sociedade, pois, se antes era exigido apenas o primário
(quando exigido), hoje se deve exigir mais.
Esta argumentação é positiva, porém é preciso convir que, com a maior exigência,
não se tem como objetivo o desenvolvimento da condição humana, mas acumular mais, se
utilizando de uma melhor força de trabalho. Neste sentido, o discurso se apresenta cínico, no
156
momento em que o capital seduz e força o trabalhador a se instruir enquanto se aliena e se
conforma, pelo menos aparentemente. Mas será que o trabalhador acredita?
QUESTÃO Nº 4) Houve alteração no nível de escolaridade dos funcionários da empresa?
Isso se deveu a uma exigência ou intervenção da empresa?
Agência bancária
R: Com certeza, o pessoal vem se especializando, hoje é difícil você não encontrar o funcionário
com uma graduação no mínimo. O banco valoriza muito esta questão da pessoa, quanto mais
estudo você tem, mais você tem chance de crescimento no banco. O mínimo é a graduação.
Hotel
R: Devido à tecnologia, o bom atendimento aos clientes, que é importante, né. Hoje toda empresa
está buscando melhor qualificação no mercado. As pessoas que não estão buscando se aprimorar,
estão ficando fora das organizações. Há trinta anos atrás era difícil encontrar alguém qualificado
no mercado. Hoje tem gente qualificada no mercado. Hoje é uma obrigação contratarmos num
nível melhor. No mínimo hoje, para os serviços gerais, tem de estar pelo menos concluindo o
ensino médio. E na parte administrativa, pelo menos cursando o nível superior. Infelizmente com o
nível abaixo do ensino médio, não tem mais como contratar. Uma pessoa tendo um nível melhor
de escolaridade, com certeza o resultado dela vai ser bem maior.
Universidade
R: Nem exigência da instituição e nem do mercado de trabalho. Em 1997, a lei 11.713 criou o
nosso plano de carreira, e o plano de carreira traz o que a gente chama de incentivos à titulação. Se
ele (servidor), para fazer o concurso precisou de 1º a 4º série, e aí ele concluiu o 1º grau, ele ganha
um nível, ele ganha pouco, ele ganha 2,5% de acréscimo salarial, mas é 2,5% no salário. Mas ele
sabe que se ele fizer o 2º grau, ele ganha mais um. Ele vai fazer o 2 grau! Se ele fizer uma
faculdade, ele tem dois níveis. Ele vai fazer a faculdade!
Mesmo no contexto da razão instrumental, os posicionamentos das empresas
diferem entre si no que tange à busca por qualificar seus funcionários. Conforme as respostas
de duas indústrias a seguir, verifica-se que não se constatou ainda a necessidade de se
qualificar o operário, já que, nestes sistemas produtivos, a operacionalização das máquinas (na
indústria de confecção) e das facas (na indústria de alimentos) requer habilidades manuais ou
o conhecimento da prática.
Nestes casos, verifica-se a predominância do modelo fordista, por existir uma
grande massa de trabalhadores no chão-de-fábrica, os quais operam em uma disposição
complementar entre as tarefas, tendo cada operário que despender do esforço da repetição de
um único exercício/movimento. No entanto, em empresas de menor porte ou em regiões em
que se tem uma força de trabalho de baixo custo, a inserção de tecnologias não se generaliza,
por não se apresentar uma vantagem competitiva, ainda. Cumpre ponderar que inserir
tecnologia é investir a longo prazo, assim como instaurar ou respeitar um modo de produção.
QUESTÃO Nº 4. Houve alteração no nível de escolaridade dos funcionários da empresa?
Isso se deveu a uma exigência ou intervenção da empresa?
Indústria alimentícia
R: Não, isso é uma coisa que até então a gente não cobrava, ta?. Não estamos cobrando também
agora, nós estamos começando de primeira a quarta série, nunca foi cobrado o segundo grau ou
alguma escolaridade, porque as pessoas aqui, o tipo de trabalho é mais manual mesmo, então as
157
pessoas têm que ter mais habilidade, questão de responsabilidade, ou até estrutura, porque as
pessoas mexem mais com faca aqui, tanto é que as questões das máquinas que você colocou,
maquinários é importante mas não consegue tirar a mão-de-obra das pessoas de dentro do posto de
serviço porque é faca, está desossando, é carregamento, é no abate, está tirando o couro. Então são
coisas que a máquina ainda não faz, precisa de ajuda de serra, de algumas coisas assim, mas não
consegue estar tirando o funcionário ou a pessoa do setor do trabalho. Está começando a acontecer
uma maior exigência frente à escolaridade, por isso que nós estamos trazendo de primeira a quarta
(para ser ofertado na empresa).
Indústria de confecções
R: Na área administrativa até que houve, já na área operário, melhorou muito pouco. Em alguns
setores nós temos, nós temos já os cargos pré-determinados com o grau de escolaridade, em outros
setores não. Vamos pegar, nossa indústria de confecções: nós temos um setor que é o de costureira.
Costureira tem que ser alfabetizada, porque é uma classe que, sabendo ler e escrever, para nós está
tudo certo, então não exige algo mais. Aí você pega já as pessoas que faz cronoanálise – marca os
tempos das roupas – , aí ela é uma pessoa que tem que ter um grau de escolaridade já de 2º grau,
pelo menos, tem que estar completo, e já tem que ter um curso de informática e etc. Isso mudou de
uns três anos para cá.
Cooperativa agroindustrial
R: Bastante alteração. A empresa vem sendo certificada, algumas fábricas já estão certificadas pela
ISO, pela qualidade. E um dos requisitos da qualidade, o qual foi proposto por nós mesmos, do
Recursos Humanos, é o grau de escolaridade. Temos pessoas analfabetas trabalhando? Tínhamos,
já não temos mais, porque estas pessoas estão sendo alfabetizadas e instruídas aqui no próprio
campus da empresa. Nós temos a escola aqui dentro. Quem não quer esse crescimento pessoal,
infelizmente muitas pessoa vão ser desligadas e já foram desligados. Hoje, para um nível
operacional, braçal, produção mesmo, se exige pelo menos o primeiro grau. Contrata pessoa com
menos do que o 1º grau? Até que contrata. Mas a gente firma já na hora da assinatura dos papéis,
ali no RH, a inscrição dela no CES
. A pessoa não estuda no horário de trabalho, é um horário
complementar; tem aula de manhã, tarde e noite, são horários complementares. A empresa oferece
vale de transporte para ela vir estudar.
(...) Foi uma verificação da própria empresa, que esta questão da qualidade atenderia a ISO, mas
não só a isso, mas atenderia mais a qualidade de trabalho, pessoas mais esclarecidas, pessoas que
tenha um linguajar um pouco diferenciado, ela tenha capacidade de entender, isso repercute, ...,
resultados né.
A gente oferece oportunidade para as pessoas, mas infelizmente as pessoas não se interessam. Eu
falo assim, olha, você tem interesse, você quer voltar a estudar? Ai dona, eu não sirvo mais para
isso. Ele vai embora sem o trabalho.
Empresa varejista I
R: Há um tempo atrás, primeiro grau. Ninguém colocava a escolaridade como requisito,.Hoje a
escolaridade é um requisito, em todas as funções, nós procuramos ter os funcionários com o
segundo grau completo. Nós conseguimos uma parceria com o CES, nós conseguimos colocar os
funcionários, realmente, pelo menos com o 2º grau completo. Nós vamos retomar esta parceria
com o CES
estão tentando oferecer os cursos dentro da empresa. Agente vai tentar fazer esta
parceria.
Eu acho que é o mercado. Por mais que a gente tenta contratar dentro do requisito, é muito difícil,
como um açougueiro; é muito difícil encontrar um com segundo grau completo. A questão das
novas tecnologias, você precisa de pessoas que estejam capacitadas realmente, precisam saber ler
bem,; a questão da comunicação, o supermercado hoje é auto-serviço, a gente procura fazer com
que o nosso atendente não seja apenas um repositor, mas que ele saiba atender.
Pode-se perceber que o modelo toyotista de produção, o qual se pauta na
qualidade e na flexibilidade de gestão, impera entre as empresas analisadas, embora elas não
tenham abandonado por completo os antigos modelos.
158
Conforme se verifica na cooperativa e na empresa varejista/atacadista (rede de
supermercado), as ações relativas aos programas da ISO 9000
29
contribuem para o aumento
do nível de escolaridade nas empresas, pois isto constitui uma condição para a permanência
dos funcionários ou a contratação dos candidatos. Outra postura identificada que retrata estas
ações voltadas a elevar o nível de escolaridade dos trabalhadores são as parcerias realizadas
com o antigo CES (Centro de Estudos Supletivos), atualmente denominado no Paraná de
CEEBJA (Centro Estadual de Educação Básica para Jovens e Adultos).
Um fator preocupante, por mais que se revele facilitador, é o fato de as empresas
passarem a disponibilizar um verdadeiro campus escolar, no intuito de alfabetizar seus
funcionários. Elas têm o controle de todo este processo de aprendizado, tirando do Estado sua
responsabilidade. Com isso elas vinculam ainda mais o trabalhador a seus interesses,
submetendo-o essa condição, sem escolhas. Não se pretende negar à empresa o direito de se
posicionar de maneira assistencialista, em cooperação com outras organizações que cumprem
este papel, mas quer-se alertar que este exercício de cooperação adentra a questão do jogo de
interesses no contexto da manipulação e controle social (jogo de poder).
Segundo as empresas, muitos trabalhadores não aceitam freqüentar escola e
perdem as oportunidades oferecidas, as quais, segundo seu próprio discurso, proporcionam
para eles o poder se desenvolver como ser humano. Entretanto, por mais que, no interpretar
29
“As normas ISO série 9000 são normas que dizem respeito apenas ao sistema de gestão da qualidade de uma
empresa, e não às especificações dos produtos fabricados por esta empresa. Ou seja, o fato de um produto ser
fabricado por um processo certificado segundo as normas ISO 9000 não significa que este produto terá maior ou
menor qualidade que um outro similar. Significa apenas que todos os produtos fabricados segundo este processo
apresentarão as mesmas características e o mesmo padrão de qualidade. As normas ISO 9000 não conferem
qualidade extra à um produto (ou serviço), garantem apenas que o produto (ou serviço) apresentará sempre as
mesmas características.As normas individuais da série ISO 9000 podem ser divididas em dois tipos:
a)Diretrizes para seleção e uso das normas (ISO 9000) e para a implementação de um sistema de gestão de
qualidade (ISO 9004). Esta última usa frases do tipo: “O sistema de qualidade deve...”. b)Normas contratuais
(ISO 9001, ISO 9002, ISO 9003). Chamadas assim por se tratarem de modelos para contratos entre fornecedor
(que é a empresa em questão) e cliente. Utilizam frases do tipo: “O fornecedor deve...”. É importante salientar
que as empresas só podem ser certificadas em relação às normas contratuais, ou seja, ISO 9001, ISO 9002 e ISO
9003. Segue uma breve descrição de cada uma das normas contratuais: 1)ISO
9001: esta norma é um modelo de
garantia da qualidade que engloba as áreas de projeto/desenvolvimento, produção, instalação e assistência
técnica; 2)ISO
9002: esta norma é um modelo de garantia da qualidade que engloba a produção e a instalação; 3)
ISO 9003: esta norma é um modelo de garantia da qualidade em inspeção e ensaios finais. Pode-se dizer que a
ISO série 9000 é um modelo de três camadas em que a ISO 9001 engloba a ISO 9002 que, por sua vez, engloba a
ISO 9003.A decisão sobre qual das normas contratuais da série ISO 9000 utilizar depende da finalidade das
atividades da indústria em questão. A ISO 9002 é a mais apropriada para a maioria das fábricas baseadas em
processos de manufatura bem estabelecidos. A ISO 9001 por sua vez é mais apropriada para processos que
envolvem atividades de pesquisa e desenvolvimento. A ISO 9003 engloba somente a inspeção e ensaios finais e,
por isso, tem um valor limitado. Na prática esta norma não é mais utilizada. (ISRAELIAN, E.; BECKER, K. S..;
SAMPAIO, M. de L. Uma Introdução às Normas da Série ISO 9000,
allchemy.iq.usp.br/pub/metabolizando/bd6c001z.doc, em 19/08/2004.
159
da mente menos crítica, isso possa parecer humanista, a maneira como é imposto acaba
representando uma mobilidade forçada, com base numa situação que respeita o interesse do
capital, o qual é apresentado como o mesmo do trabalhador. No entanto, o capital não
consulta e não busca saber as razões da desistência ou rebeldia do trabalhador em não aceitar
a obrigatoriedade do estudo. Ao capitalista, oferecer condições de estudo lhe parece algo tão
sensato, que o faz atribuir ao requerente do emprego a condição de ignorante ou preguiçoso,
quando este não aceita suas condições. No fundo, o próprio trabalhador pode se julgar a si
mesmo como o julga o encarregado da empresa, mas mal percebe ele (em meio ao ambiente
alienante e condicionador) que o esforço requerido pela dedicação de seu tempo de lazer e sua
desilusão não o instigam a essa busca, pois, no decorrer da vida, quando atendidas as
exigências, não houve nenhuma recompensa que lhe proporcionasse sair da condição.
Com efeito, a preocupação com o nível de qualidade nunca esteve pautada na
intenção de contribuir para que o sujeito tomasse consciência de si enquanto dono de suas
ações. Só houve uma busca da empresa por qualificar ou requalificar o indivíduo, quando
este, percebido sempre como instrumento (razão instrumental – Escola de Frankfurt),
necessitou ser moldado e capacitado para viabilizar o aumento de produtividade e
conseqüentemente contribuir para uma maior acumulação do capital.
No âmbito da gestão da indústria de confecções buscou-se qualificar melhor os
funcionários devido, justamente, a uma exigência de mercado, que é a certificação da ISO
9000, como se constatou na empresa de transporte coletivo e na cooperativa. Neste contexto,
os esforços que a indústria alimentícia vem fazendo para oferecer cursos de ensino
fundamental dentro da empresa, atendem ao objetivo de aplicar o sistema 5S
30
, o qual se
coaduna na mesma lógica.
30
O 5S “é um método de trabalho de mudanças comportamentais, fundamentado no comprometimento das
pessoas, que, combinando suas ações profissionais e pessoais, criam um ambiente com qualidade para a melhor
qualidade de vida. O método tem como principais objetivos mudar comportamentos e aprimorar atitudes, trocar
informações entre funcionários e/ou áreas, contribuindo para uma administração mais participativa e de maior
responsabilidade de todos com as condições de trabalho da empresa. Os 5s são: senso de utilização, senso de
organização, senso de limpeza, senso de conservação e senso de
autodisciplina. 1) Senso de Utilização: separar e manter no local de trabalho somente os materiais, máquinas e
equipamentos necessários, descartando ou eliminando os desnecessários; 2) Senso de Organização: definir a
forma correta e o local adequado para a guarda de materiais, máquinas e equipamentos, tornando seu acesso
rápido e fácil; 3) Senso de Limpeza: eliminar a sujeira de materiais, máquinas e equipamentos do local de
trabalho, atacando as fontes do problema; 4) Senso de Conservação: garantir a continuidade das condições
físicas e da saúde no local de trabalho; 5) Senso de Autodisciplina: cumprir os procedimentos e as normas
mantendo o hábito naturalmente” (FREITAS, Maria Fernanda (Coord.),
http://www.husfp.ucpel.tche.br/programa_qualidade.htm#1
, em 19/08/2004).
160
QUESTÃO Nº 5. A empresa oferta cursos de requalificação profissional ou treinamentos?
Indústria de confecções
R: Constantemente. Depois que nós instalamos a ISO 9001
, nós não paramos mais de fazer
treinamentos. Os nossos treinamentos são para aumentar a capacidade do profissional como um
todo. Nós treinamos, esse treinamento serve para ele aqui ou para outra empresa, mas não só pelo
aquilo que ele faz, para abrir a cabeça um pouco mais: há treinamento aqui para ele participar mais
da empresa com idéias, executar algumas coisas a mais do que só aquilo que é mandado fazer.
Indústria de alimentos
R: Sim, nós estamos implantando agora o 5S,
que é um programa de qualidade muito importante, e
a ISO
também. Então com a implantação de novos programas a gente tem dado treinamentos para
os funcionários.
Empresa de transporte
R: Sim, dentro da nossa atividade nós temos alguns módulos de qualificação do motorista e do
cobrador. Nós temo, mesmo porque isso faz parte de um programa que nós temos, que é a gestão
da qualidade, da certificação da ISO 9000:2000
. Nós temos postura de atendimento, direção
econômica, tudo que envolve qualidade e prestação de serviço, ele é visado e trabalhado dentro da
empresa.
Cooperativa agroindustrial
R: Conforme a entrevista, é determinada uma porcentagem de treinamentos frente à carga horária
trabalhada, (0,6% de hora trabalhada e 80 % de efetivação após o período de experiência), isso
devido à ISO.
Como se vê, o interesse do capitalista é utilizar o homem como instrumento. Com
efeito, aquele passa a contribuir com o funcionário, dando-lhe um apoio para seu
aprimoramento e formação à medida que percebe uma melhor condição de auferir mais renda
com a capacitação proporcionada. Neste caso, o custo de um curso pago ao funcionário é
irrelevante diante de quanto este rende ao capitalista como instrumento, pois a economia de
escala auferida pela padronização produtiva ou da prestação de serviços, como o exemplo do
sistema McDonald’s e do hotel entrevistado, repercute em menores custos variáveis (varia
conforme o aumento ou redução da quantidade produzida).
QUESTÃO Nº 5. A empresa oferta cursos de requalificação profissional ou treinamentos?
Hotel
R: Nós temos treinamentos constantes. Estes treinamentos vêm de Curitiba. Principalmente na
parte de padronizações de produtos e serviços. O operacional é o nosso foco maior.
Mesmo considerando-se o nível de desemprego no Brasil e, como foi mostrado,
nas regiões metropolitanas polarizadas por cidades de porte médio da Região Sul, existem
oportunidades para trabalhadores desempregados. Estas, porém, não se encontram na
localidade em que se requer a força de trabalho. Desde modo, conforme as entrevistas, pôde-
se constatar a existência de uma demanda por profissionais escassos na região. Essa realidade
representa um potencial de mobilidade forçada geograficamente, no que se refere ao
trabalhador se deslocar, muitas vezes saindo da sua terra natal para os confins do território
nacional, em busca de viabilizar sua condição de independência e sustento.
161
Por outro lado, muitas vezes as oportunidades estão próximas. Entretanto, são de
fato oportunidades, se se exige um perfil profissional que para a região se torna destoante
daquele que o mercado tem disponível? Dentro deste contexto, muitos destes casos (escassez
que leva à macromobilidade física) assim se dão por causa do poder de barganha com vista a
uma maior mais-valia, na conquista de uma força de trabalho qualificada para a execução de
tarefas muito simples e técnicas, ou seja, proporcionando à empresa um valor de uso
sobrevalorizado em relação ao valor de troca. O indivíduo que acata o discurso de se tornar
empregável acaba se submetendo a sua própria desvalorização.
QUESTÃO Nº 6. Existe escassez de mão-de-obra qualificada no mercado de trabalho da
região? Para qual função ou tarefa?
Indústria de confecções
R: Olha, escassez de mão-de-obra, numa empresa que não está se atrofiando, sempre está em
necessidade de uma mão-de-obra melhorada. E nós necessitamos de muitos profissionais
qualificados, sempre vai ter essa falta no mercado. Agora, quais são os lugares que têm mais falta?
Na classe operária, são as costureiras polivalentes, que operam várias máquinas. Na classe
administrativa, sempre falta a pessoa que tem uma visão comercial ampla dentro da empresa. E
não um auxiliar de escritório, mas uma pessoa que parte hoje para o lado de executivo.
Por questão política da empresa nós preparamos os nossos colaboradores.
Empresa varejista I
R: Bastante! Apesar de Maringá e região ter um número muito grande de faculdades, por
exemplo, você tem uma vaga, mas você não quer que a pessoa não apure só os dados, balanços,
mas tenha uma visão geral, ter vontade de aprender mais. Na área administrativa a gente tem
dificuldade. Você tem pessoas que estão lá na graduação de contábeis ou administração, mas vêm
para fazer um teste no excel, mas sabem mal alimentar uma planilha. Eu preciso também que as
pessoas criem planilhas. As pessoas confundem um pouco, achando que só a graduação vai ajudá-
las a conseguir uma posição no mercado de trabalho, mas ela precisa ter algo mais para mostrar, e
não só o comum.
Na área gerencial a gente contrata (de fora).
Como se constata, a necessidade vai desde o setor produtivo até executivos. O
setor produtivo demanda pessoas que, além de deterem uma habilidade advinda da prática,
saibam operar diversas máquinas para evitar o rodízio interno em face de um
comprometimento da equipe, facilitando as substituições e encorajando os operários a assumir
um maior número de tarefas.
Para os mais bem-qualificados, a exigência está na compreensão do complexo
cenário econômico decorrente do surgimento de uma dinâmica mobilidade do capital após um
período de forte estagnação (ainda não superado completamente), e ao mesmo tempo se
condiciona à especialização do conhecimento. Transparece nisso um discurso contraditório, o
qual, na verdade, se produzem excelentes profissionais no uso da técnica e da interpretação de
cenários, porém pouco críticos no que se refere à condição humana.
Existem casos de completa alienação, no que concerne à exigência profissional,
como o apresentado pela rede de supermercados. Não se deseja negar a importância da
162
técnica, mas a empresa aparentemente valoriza aquilo que é mais fácil de se conquistar, que é
o conhecimento do esforço repetitivo e operacional, mesmo se tratando de montar planilhas
de excel. Essa é uma habilidade conquistada na aplicação prática, justamente por ser muito
simples e repetitiva e não se valorizar a ponto de se apresentar como delimitador de
contratação, quando se buscam profissionais de visão e conhecimento do todo organizacional.
Com efeito, a contradição entre capital e trabalho leva o empresário a agir
conforme o interesse de acumulação. Esse interesse é disfarçado quando se ouve e sente o tom
de preocupação com o bem-estar das pessoas - clientes, consumidores, portadores do dinheiro
- as quais se rendem mais à troca do que ao uso. No entanto, a segmentação e especialização
são formas de se fazer com que o valor de uso da força de trabalho renda muito mais em
relação ao mísero valor de troca acordado entre as partes, respeitando o valor de mercado.
Esse valor, por sua vez, é mantido baixo pelo crescente exército de reserva e pelo sentimento
incutido no indivíduo que o faz se julgar um despreparado que recebe uma oportunidade.
Em face da escassez, muitas empresas, principalmente as maiores, partiram para
programas internos de formação de gerentes e executivos, mais conhecidos como programas
de treinee. O objetivo é facilitar, quando requisitado, a alocação de um profissional para
ocupar uma nova função ou substituir um funcionário que abandone a empresa ou seja
mandado embora por receber um alto salário, em decorrência do tempo de serviço. Isso se
revela, nas palavras utilizadas pela entrevistada (cooperativa agroindustrial) que faz alusão a
um jogo de cartas, onde é sempre importante ter uma carta na manga.
Por mais que a proposta seja interessante para o trabalhador, o grande propósito
está na acumulação do capital, justamente na forma em que este envolve o empregado nas
suas armadilhas e ilusões.
QUESTÃO Nº 6. Existe escassez de mão-de-obra qualificada no mercado de trabalho da
região? Para qual função ou tarefa?
Cooperativa agroindustrial
R: Nós temos um programa Treinee. No começo do ano eu contratei 4 engenheiros recém-
formados: um engenheiro de alimentos, um engenheiro de produção, um engenheiro mecânico e
um engenheiro industrial, sem experiência nenhuma. Os 4 estão no programa treinee, na fábrica de
óleo, sendo treinados. Vão ser treinados por um ano e meio. Daqui uma ano e meio, considera-se,
né, que eles estão prontos para assumir alguma função de gestão da fábrica e serem os futuros
gerentes da fábrica. Nem sempre buscamos de fora, pronto, às vezes precisa buscar pronto. Mas
sempre estamos tentando se antecipar e deixando na manga
. Precisamos trazer de fora um gerente
industrial. Nós o contratamos da Lacta.
Hotel
R: Se eu preciso contratar um cozinheiro, existe uma dificuldade enorme. A pessoa pode ser um
excelente cozinheiro, mas barra na escolaridade, é uma norma da empresa. Então infelizmente a
pessoa fica fora do mercado. Se eu preciso de uma pessoa que entenda de vinhos, também não vou
achar na cidade de Maringá. Nós vamos treinando aqueles que temos. A gente acaba trazendo
pessoas de fora para treinar as pessoas aqui.
163
Em outros casos, como o apresentado pela entrevista realizada no hotel, se
percebe que a empresa se “engessa”, chegando ao ponto de perder bons funcionários, por
respeitar demasiadamente as normas, as quais obrigam à contratação de pessoas com no
mínimo o segundo grau. Este caso ilustra a ideologia dominando o seu próprio disseminador –
o capitalista, o qual se aprisiona a normas incoerentes com a realidade, pelo simples fato de
ser uma aparente exigência da prática, em grande parte levada em conta por muitas empresas.
QUESTÃO Nº 6. Existe escassez de mão-de-obra qualificada no mercado de trabalho da
região? Para qual função ou tarefa?
Agência bancária
R: Funcionários para atendimento até que tem, agora capacitados mesmo, já é mais reduzido. Para
determinadas áreas do banco tem que ter uma formação, tem que estar entendendo de cenários,
cenário econômico, micro e macroeconômicos. O banco X trabalha muito segmentado, trabalha
com o mercado varejo, mercado pessoa jurídica, empresa. É bem segmentado até para dar um
atendimento mais personalizado para o cliente. Então quanto mais segmentado, mais exigência
tem.
O exemplo acima da agência bancária mostra que a especialização ou
segmentação contribui para a escassez de profissionais. Neste caso, busca-se exigir do
trabalhador uma melhor prestação de seu serviço, num exercício de afunilamento do
conhecimento numa especificidade, ao invés de exigir uma leitura do mercado como um todo.
Isso força o trabalhador a uma prestação de serviços eficaz, porém condicionada.
Embora, aparentemente, a escassez denote, no imaginário da maioria das pessoas,
a falta de mão-de-obra altamente qualificada, no que se refere ao grau de instrução e formação
profissional, os casos referidos retratam uma outra realidade também: a exigência de uma
mão-de-obra hábil (experiente), mas mal-remunerada. Isto se verifica na indústria de
alimentos, logo a seguir.
Nessa organização se contata uma prática que chega a denunciar uma total
submissão do trabalhador ao capital, quando a entrevistada relata que a empresa tem uma
“república” especialmente para abrigar trabalhadores trazidos de fora. Por mais que isso
represente uma grande oportunidade para estes empregados, o fato de eles morarem em um
alojamento os coloca numa condição de rendição ao capital. É um assistencialismo que
possibilita à empresa explorar os trabalhadores.
Com base nesta prática, cabe citar Manuel Castells (2000, p 226): “No local onde
a indústria coloniza o espaço, necessita organizar, ainda que em nível de acampamento, a
residência da mão-de-obra necessária”. Deste modo, o autor complementa, “a industrialização
aproveita a mão-de-obra potencial, que já reside no lugar e suscita em seguida um forte
164
movimento migratório (...) Assim a penúria das moradias (...) resultam do aumento brusco da
concentração urbana, num processo dominado pela lógica da industrialização”.
QUESTÃO Nº 6. Existe escassez de mão-de-obra qualificada no mercado de trabalho da
região? Para qual função ou tarefa?
Indústria de alimentos
R: Muito, principalmente os desossadores, que é a minha mão-de-obra que é a principal aqui
dentro e não é fácil de estar encontrando, porque a gente precisaria estar treinando essas pessoas, e
no momento não estamos tendo essa possibilidade (...) pelo tempo até, e porque a pessoa precisa
ter uma certa habilidade também. Vamos treinando pessoas que estão aqui dentro que já têm um
certo tempo de frigoríficos e que às vezes demonstram até habilidade, está aprendendo e
crescendo. Trazemos várias pessoas de fora, tanto é que temos duas repúblicas, e essas repúblicas
ficam em Paiçandu, para estar acolhendo as pessoas que vêm de fora.
Empresa Atacadista/Varejista
R: Com certeza existe, principalmente na área de vendas. A gente tem optado por treinar as
pessoas. Agente contrata pessoas que têm uma fluência verbal e uma boa comunicação, mas nunca
trabalhou com vendas, mas a gente tem optado por treinar as pessoas, dar todo o material
necessário. Elas participam de eventos internos, participam de treinamentos, todos na área
comercial, e daí nós temos lapidado essas pessoas para serem vendedores.
Com efeito, verifica-se que as empresas passaram a perceber a necessidade de
realizar treinamentos e, de certa forma, se dedicar mais aos trabalhadores. Num mercado em
que impera a mutabilidade, as tarefas e funções constantemente estão sendo adaptadas às
novas tecnologias e, as novas formas de gestão. Estas são pautadas num modelo
organizacional flexível, que passa a inserir no seu discurso a expressão, “organização que
aprende”, incutindo a necessidade de o empregado se adaptar às mudanças, mas
principalmente de não resistir a elas. Para tanto instigam o sentimento de apropriação da
empresa e participação. Na grande maioria dos casos, tais políticas constituem uma forma de
fazer o indivíduo acreditar num discurso mais humanista, porém essencialmente voltado para
o capital. Este atinge seu objetivo quando tem um colaborador motivado. Cabe salientar que,
no universo das produções acadêmicas da administração, alguns autores, mais comprometidos
com o respeito à condição humana, como, por exemplo, Omar Aktouf, não reproduzem esse
discurso de maneira leviana.
Conforme o exposto, faz-se imprescindível considerar que, conquanto muitas
empresas invistam nos funcionários, ou mesmo exijam dos trabalhadores uma melhor
qualificação, o baixo nível salarial é sustentado pela grande massa de desempregados (no
contexto da dinâmica local). E, o pior está em que os cursos de especialização realizados pelo
trabalhador, na maioria das vezes, pouco o ajudarão quando da busca de um outro emprego ou
para ascensão do seu próprio nível salarial. Isso se constata principalmente quando a própria
empresa oferece cursos, pelo fato de esses cursos estarem diretamente relacionados com as
165
especificidades das funções que o trabalhador exerce no momento. Isso será melhor
percebido com a análise dos trabalhadores de Sarandi e Paiçandu.
Mesmo assim, conforme as entrevistas com empresas maringaenses, ou situadas
nesta cidade, com exceção da universidade e da empresa atacadista/varejista (a qual remunera
seus vendedores com base em comissões, o que denota uma possível melhora salarial, quando
melhorado o mix de produtos), nenhuma das 10 entrevistadas tem valorizado o
aperfeiçoamento dos funcionários, com aumento de salário, nem mesmo parcialmente, em
relação ao aumento de produtividade (lógico).
O que acontece é vincularem o salário à quantidade produzida, o que força o
trabalhador a se dedicar ao máximo, empregando o melhor ritmo de trabalho. Com efeito, não
se remuneram os funcionários com um valor fixo para posteriormente compartilhar com eles o
lucro auferido com o aumento de produtividade. Na verdade, sempre é respeitado o dissídio
conforme os sindicatos ou órgãos responsáveis pela delimitação de salários-base, quando o
salário é fixado em categorias.
QUESTÃO Nº 7. A média salarial na empresa tem aumentado?
Empresa de transporte
R: Aí é uma questão, né. Se você for analisar os índices de inflação, a nossa empresa tem
corrigido.
Agência bancária
R: Olha, vem de acordo com o que a FEBRABAM vem dando aí, né, no decorrer desses últimos
anos aí, que fica em torno da média de 3% e 5%. Agora o banco X, tudo que você faz ele te
remunera, então a pessoa ganha aquilo que ela produz. Ganha premiação pelo destaque nas vendas,
se trabalha um minuto a mais ganha hora extra. E também tudo o que ele faz o banco paga pela
produtividade. Então o funcionário chega a fazer o seu salário, porque se ele trabalhar direitinho
tem um percentual grande que ele pode ganhar em cima do salário dele.
O caso acima retrata uma mobilidade de trabalho forçada, como um tratamento de
reforço em que, por mais que se qualifique e exija do funcionário uma visão do mercado
global, este é submetido a um exercício desumano de execução para a sustentação do
trabalho, ou seja, uma condição alienante, pautada na ideologia capitalista, na qual o
trabalhador se encontra poucas vezes consigo mesmo.
QUESTÃO Nº 7. A média salarial na empresa tem aumentado?
Cooperativa agroindustrial
R: O que a empresa tem praticado não é o aumento salarial, é o aumento dos benefícios. Uma
coisa que tem ajudado bastante é o bônus alimentação. Foi implantado em 2003. É um crédito que
você tem na verdade. É um percentual em relação ao seu salário, que complementa a cesta básica.
O menor valor que nós temos hoje é R$40,00, e aí, conforme o salário ele vai aumentando.
Com a ausência de um aumento salarial, se constata que a prática das empresas
referente à oferta de benefícios, visam ao enriquecimento do pacote pago ao trabalhador, já
166
que sai mais barato do que assumir os encargos do governo. Neste ponto, há que convir que o
Estado contribui com a atual condição de desemprego e de baixos salários.
Não obstante, quanto aos benefícios pagos pela cooperativa, não se justifica a
desigualdade, já que tanto os operários como os executivos, no supermercado, se deparam
com as mesmas necessidades. Deste modo, o bônus-alimentação praticado pela empresa
poderia contribuir para a redução, e não para a sustentação da realidade injusta. O montante
destinado a esta finalidade poderia ser dividido em partes iguais. O que vem sendo praticado
disponibiliza mais crédito (dinheiro) para quem ganha mais.
Quando se tem uma empresa que procura incentivar a conquista do conhecimento
proporcionando ao trabalhador a condição de iniciar um curso superior, em se tratando da
própria universidade se constatam baixos e desiguais salários reproduzindo o quadro de
pobreza atual.
QUESTÃO Nº 7. A média salarial na empresa tem aumentado?
Universidade
R: A instituição pública, principalmente as universidades, a gente trabalha com tabela salarial. (...)
Em termos de governo do estado, a única diferença que nós tivemos, foi devido à greve de 6 meses
de 2000/2001, que houve reajuste diferenciado,. Então um professor teve em média 13,5%,
enquanto o pessoal de manutenção, pessoal de obra, ajudante geral e zeladoria tiveram em média
50%. Só que nós ficamos de 1997, quando foi implantado o plano de carreira atual, que nós
tivemos 30% lá em 1997, só viemos ter esta equalização aqui em 2001. E de 2001 até agora nós
não tivemos nada. O menor salário hoje é R$ 287,00 e o maior é R$ 1.700,00 dos técnicos, final de
carreira (salário base).
No contexto do modelo toyotista de produção, além do sistema just-in-time, o
nível de terceirização nas empresas aumentou, viabilizando a formação de regiões dinâmicas
como clusters de pequenas empresas de alta tecnologia, com a função de funcionar como
agentes produtivos complementares das grandes empresas, ou, se comprometendo com a
produção para as grandes marcas, a exemplo da Terceira Itália.
No âmbito das empresas que atuam em Maringá, percebe-se que esse processo
(terceirização) se encontra de forma ainda um tanto excipiente, mesmo nas grandes indústrias,
como se verifica logo abaixo. Vale ressaltar que a maior parte dessas organizações busca
terceirizar os setores de vigilância e zeladoria, apenas na Universidade Estadual de Maringá
não existe a prática da terceirização. A empresa varejista II terceiriza o serviço de entrega. A
empresa que mais aderiu a essa postura e modelo descentralizado foi a indústria de
confecções, embora tenha apenas duas atividades produtivas, como se pode constatar logo
abaixo.
167
QUESTÃO Nº 8. Aumentou a utilização de serviços terceirizados?
Indústria de alimentos
R: Terceirizado só temos a portaria. Depois que eu entrei no frigorífico, que tem o Departamento
de Recursos Humanos agora, diminuiu muito.
Indústria de confecções
R: Não, nós terceirizamos algumas coisas só. Nossa terceirização é só estamparia, bordados.
Agência bancária
R: A nível de agência não. São: o pessoal de vigilância, de serviços aí, de zeladoria. Neste sentido
não mudou, sempre foi assim mesmo.
Hotel
R: A parte de eventos, nós terceirizamos as aparelhagem.
Empresa Varejista II
R: Entregas (uma empresa terceirizada).
Como foi observado o capitalista procura, por variados meios e modelos de
gestão, acumular e/ou se auto-reproduzir se utilizando da força de trabalho. No entanto, no
contexto da responsabilidade social, as empresas acabam atuando de forma a instaurar uma
compensação pelas precariedades produzidas por elas mesmas, em cooperação com os
programas do Estado. Com tal comportamento, a empresa procura amenizar uma situação
com que ela própria compactua, ao fortalecer o estado de carência social, retrato da
desigualdade produzida pela contradição capital x trabalho.
QUESTÃO Nº 9. A empresa assume a responsabilidade social?
Indústria de alimentos
R: Assume. A empresa faz campanhas, faz doações, apoio e até a doações de sangue. Ajuda muito
sim.
Indústria de confecções
R: Sempre; temos responsabilidade social internamente e externamente. A empresa atende os
funcionários em questão,... nós temos um comitê que vê a necessidade de cesta básica em algumas
famílias, então nós atendemos mensal. E nós temos aqui uma alimentação subsidiado, café da
manhã e almoço, subsidiados. E nós temos um atendimento com um psicólogo aqui, semanal, com
as pessoas.
Agência bancária
R: A empresa X é um banco extremamente social. Tem a fundação muito premiada, agora mesmo
está de novo com a edição escrevendo o futuro que envolve as escolas públicas, incentivando a
meninada participar através de redações. O Brasil sem fome, o banco está sempre envolvido em
ações sociais, ..., é a macro, não são muito regionalizado, são atividades que envolve o banco
como um todo.
Universidade
R: Responsabilidade social dentro da própria instituição. Por exemplo, nós temos o que a gente
chama de comitê da cidadania. O que faz esse comitê da cidadania? Tem servidores que ganha
salário tão baixo, que ele não consegue. Daí vai a assistente social na casa dele, vê a situação dele,
então a gente fornece a cesta básica, ou o caso de pagar luz, água, a pessoa estava com luz cortada
e água cortada, aí o comitê foi lá fez avaliação, viu realmente a necessidade do servidor. Então tem
esse trabalho que é feito. Então tem pessoas que todo mês recebe uma cesta básica do comitê,
senão ele não consegue sobreviver. Então tem esse lado social que agente faz. Atendimento
psicológico, e aí, não só para servidor como também para acadêmico. E não atende só funcionário
não, professor também é atendido. É voltado também para a comunidade externa.
Empresa varejista I
R: Nós estamos com uma proposta de um instituto social. Nós temos o projeto do sopão no Branca
Vieira (bairro de Maringá). São duas ou três vezes por semana. Então o excedente do hortifruti da
nossa rede, eles passam e recolhem e levam para lá. Arrecadação de alimentos. Recentemente
168
fizemos uma campanha de agasalho interna, para os colaboradores que estavam precisando de
agasalho. A gente vê a questão da sociedade e também a questão interna (orientação com a saúde).
Com efeito, a responsabilidade social, quando não percebida como uma ação
assistencialista, voltada para a comunidade, como participação de campanhas ou doações, é
identificada como uma compensação pelas péssimas condições de vida (financeira) em que os
próprios funcionários se encontram. Assim, constata-se a imensa alienação do trabalhador,
quando este se vangloria da generosa ajuda prestada pela empresa, que ainda lhe dá emprego.
O que impera neste ambiente é a contradição mascarada por fábulas e ideologias
cada vez mais convincentes. Ou será que o indivíduo se apresenta cada vez menos consciente?
Conforme o direcionamento que a presente análise denota tomar, por meio de uma
percepção da fragilidade das questões humanitárias e de justiça social, incutidas em defesa de
um ambiente mais igualitário, faz-se imprescindível ressaltar que, no contexto da rede urbana
e da dinâmica regional, no caso de Maringá e seu entorno, impera uma hierarquia não só de
tamanhos, mas também de diferentes escalas de desenvolvimento econômico entre as cidades.
Essa hierarquia produz um espaço regional desigual, cabendo às pessoas que habitam a
periferia externa ao pólo se submeter, além das distâncias físico-territoriais, a empregos de
baixa qualidade e remuneração, sendo-lhes possível sobreviver por causa do menor custo-
moradia ali encontrado. Essa mobilidade pendular denota dois comportamentos de submissão
do trabalhador ao capital. O primeiro é o fato de o portador da força de trabalho habitar a
periferia, por apenas assim conseguir se inserir no espaço urbano, precarizando a sua condição
de habitar a cidade. Já o segundo comportamento se verifica quando o trabalhador se submete
a empregos precários, os quais o condenam à permanência no estado em que se encontra, ao
passo que o capitalista continua acumulando.
Com uma periferia carente instituída, o mercado de trabalho tira proveito dessa
forma de vida precária (baixo custo de vida), o que contribui para o baixo preço salarial.
Numa mesma lógica, vista de um outro ângulo, o próprio mercado institucionaliza estes meios
de vida em estado de pauperização. Segundo Castells (2000, p. 226), “quanto maior é a taxa
de crescimento capitalista, mais intenso é o crescimento urbano, maior é tendência à
concentração em grandes aglomerações e maior é a penúria de moradias como também a
deterioração do patrimônio imobiliário”. Cabe observar que Castells escreveu a abordagem
citada em 1942, retratando a dinâmica da industrialização. No entanto, o momento em que
ocorreu e vem ocorrendo a transição do trabalho rural para o urbano no aglomerado urbano de
Maringá, exemplifica esta lógica, pautada na reprodução do capital, que gera crescimento
populacional, principalmente na periferia.
169
Por outro lado, em respeito a uma outra lógica, o habitante da periferia externa ao
núcleo polarizador enfrenta uma séria desvantagem quando a gestão intermunicipal ou
metropolitana não é eficiente, pois a conseqüência, entre outras, é o encarecimento do meio de
locomoção.
Cabe salientar o exemplo do transporte urbano, principalmente aquele que atua na
ligação dos municípios que congregam a aglomeração urbana de Maringá. Tanto as linhas
para Sarandi quanto aquelas para Paiçandu não estão integradas às linhas de Maringá nem
integradas entre si. Isso significa que estes habitantes das cidades adjacentes não conseguem
tomar dois ônibus pagando uma única passagem, como acontece com os usuários do
transporte em Maringá. A situação se agrava ainda mais se considerarmos que as três
empresas de transporte compõem o mesmo grupo, ou seja, são do mesmo dono.
Pelo fato de o empregador ter de pagar quatro passagens diárias ao invés de duas,
os trabalhadores de Sarandi e Paiçandu são impedidos, em muitos casos, de trabalhar nas
empresas da cidade-pólo. Isso acontece, por exemplo, quando a empresa se localiza no
extremo oposto da cidade-satélite, pelo fato de o trabalhador não conseguir se deslocar de
ônibus utilizando uma única linha. Quase todas as linhas no aglomerado urbano de Maringá
partem de um extremo em direção ao centro e vice-versa. A única exceção é a linha Coca-
Cola, de responsabilidade da empresa que liga Sarandi a Maringá, não tendo como seu ponto
final o centro de Maringá, mas sim, um bairro periférico da cidade na Zona Oeste (Sarandi
fica a leste).
QUESTÃO Nº 10. É significativa a procura de emprego por moradores de Sarandi e
Paiçandu? Existem na empresa trabalhadores de Sarandi ou de Paiçandu?
Empresa atacadista/varejista
R: Existe, nós temos um monte de funcionários, principalmente aqui na matriz, que são de
Paiçandu, devido a proximidade, né. Sarandi não muito. Sarandi..., acho até que por causa da
distância, né, tem de pegar dois transporte para se locomover. Temos bastante pessoas nas lojas,
tem bastante procura, tem bastante candidatos de Sarandi e Paiçandu, principalmente para a área
operacional. Sarandi a gente evita, porque, devido à não-integração, não é passe integrado como
tem em Maringá, né, então o custo com o vale transporte é dobrado para esse funcionário. Então a
gente evita, principalmente aqui na matriz. Para as lojas não, porque é um ônibus, pega em Sarandi
e pára no centro. Problema que deveria já ter resolvido já, tendo em vista a proximidade das duas
cidades, é a mesma empresa, tudo mais, e não há integração do vale transporte.
Empresa Varejista I
R: A gente sempre vai dar preferência para quem mora perto. Tem bastante procura. Aqui em
Maringá a gente contrata mais nas lojas da Brasil e Tamandaré (avenidas), que são próximas dos
terminais. Nas outras lojas eu tenho gente de Marialva de Mandaguari. Bastante gente de
Mandaguari. Mais por questão de vale transporte. Tem de pagar o dobro, às vezes pode sair mais
caro o vale transporte do que o funcionário né, dependendo a localidade
.
Apesar de o transporte coletivo retratar um problema de gestão integrada em meio
a uma região metropolitana institucionalizada, denota a ausência de uma gestão metropolitana
170
efetiva. Mesmo assim, cabe salientar que o grupo proprietário das três empresas que
monopolizam este serviço no aglomerado urbano de Maringá adotou uma política de valorizar
as cidades em que atua, fazendo destas a sua sede. Com isso busca-se empregar apenas
moradores das cidades que a empresa tem como sede. Deste modo, a empresa que atua em
Maringá só contrata moradores desta cidade, a que faz a ligação de Sarandi a Maringá só
emprega moradores de Sarandi e a que faz as linhas de Paiçandu para Maringá só aceita como
funcionários pessoas que morem em Paiçandu.
171
Empresa varejista II
R: Uns 20%. Depende das nossas lojas. Na loja da Brasil que é mais próximo de Paiçandu tem
mais currículos de Paiçandu
.
Como se verifica, as entrevistas realizadas nas empresas revelaram as
contradições entre capital e trabalho, pautadas nas práticas empregadas por essas empresas, na
construção e perpetuação de uma ideologia que sustenta a desigualdade. Neste contexto,
conquanto se possam perceber ações aparentemente benéficas aos trabalhadores, estas, na
realidade, sustentam uma total submissão.
Outra questão a se pontuar diz respeito ao modelo de produção vigente, o qual
retrata um caminhar para o modelo pautado na flexibilidade e na qualidade, o que se constata
como realidade em algumas empresas e como uma busca em outras. No entanto, a efetivação
deste modelo reproduz um estado de precarização no mundo do trabalho, individualizando
mais as pessoas, na crença de que a realização e o sucesso dependem de cada indivíduo
isoladamente, e não de um pensar coletivo. Neste sentido a manipulação se encontra no
emergir do ideário da seguinte frase: basta cada um aproveitar as oportunidades oferecidas
pelas empresas responsáveis.
Desta forma, se a luta de classes se legitima na percepção da existência da classe
em si e para si, o atual quadro evidencia um estado de letargia desta luta. Talvez, no contexto
da luta de classes, se tenha atualmente a configuração de uma potencial luta efetiva, a qual se
assenta na desigualdade, que leva os incluídos a espoliar uma grande massa de trabalhadores
e sujeitá-los ao estado de inclusão perversa, o que retrata uma condição de opressão. O
movimento das classes se dinamiza pelo grau de conflituosidade.
Neste momento cabe resgatar o que Chauí denomina alienação social e alienação
intelectual. A primeira, para a autora, se evidencia no momento em que o homem não se
reconhece no contexto social, organizacional ou institucional instituído por ele próprio, como
participante de uma coletividade, mas se percebe apenas como indivíduo e acredita na sua
posição como agente de mudança, como fonte de toda solução da sua própria vida (por mais
que também seja uma verdade, desde que dentro da coletividade, em respeito ao movimento
em que está inserido). A segunda, a alienação intelectual, se caracteriza quando o indivíduo
não percebe que suas idéias e valores são influenciados pela realidade em que está inserido,
seja esta a comunidade do bairro, as relações de trabalho ou mesmo os ambientes que ele
freqüenta (CHAUÍ, 1998, p. 173).
172
Destarte, o capitalismo prolifera por meio da contradição capital x trabalho, em
detrimento da questão humana, se utilizando, por meio do próprio homem, da ciência e da
técnica como meios de manipulação e alienação, em respeito à razão instrumental. Como
observa Bauer (1999, p. 29), “Na óptica dos Frakfurtianos, caminharam o saber, a ciência e a
técnica para pôr-se a serviço a massificação, da manipulação das consciências, da
degenerescência cultural e da repressão da natureza humana.” O autor ainda observa, quando
cita Horkheimer, que o progresso da ciência e das técnicas não se traduz no avanço da
humanidade. “A estrutura de procedimento básica da ciência, de mera metodologia,
transformou-se num valor em si, em algo que não era mais visto como fruto de condicionantes
culturais e históricas – uma ideologia portanto.
Segundo Herbert Marcuse (apud BAUER, 1999, p. 29), tanto a tecnologia quanto
a ciência representam a nova alienação do homem, “uma espécie de entrave cognitivo que faz
com que uma opressiva realidade exterior seja percebida como criação autônoma de sua
própria consciência.” Deste modo, ele elucida que o estado de “alienação se propaga numa
sociedade cujo sistema produtivo já não é orientado para a satisfação de necessidades reais,
mas para a geração de falsas necessidades, e que induz à crença em um “trabalho feliz”.
Com efeito, cabe efetuar a análise dos depoimentos prestados pelos trabalhadores
das empresas entrevistadas e pelos trabalhadores desempregados, todos habitantes de Sarandi
ou de Paiçandu.
Estado de periferia, retrato do pauperismo no meio de vida urbano, é uma
condição em que muitos trabalhadores empregados ou desempregados se encontram ao
habitar o espaço urbano.
Quando se busca compreender o processo de periferização por meio da
mobilidade do trabalho, coloca-se uma primeira questão, a qual resgata o conceito de
macromobilidade física, para conhecer a origem dos entrevistados e percorrer o itinerário que
eles cumpriram até alcançar sua situação atual.
A macromobilidade física, conforme uma breve elucidação realizada no capítulo
2, se refere à dinâmica populacional, mais precisamente, às mudanças de cidade,
deslocamentos não rotineiros que retratam o exercício da migração.
Compondo o quadro de entrevistas, as perguntas voltadas para este tipo de
mobilidade buscaram perceber como as pessoas chegaram até as periferias externas à
Maringá, Sarandi e Paiçandu.
173
Conforme se constata a seguir, o retrato obtido ilustra os seguintes
comportamentos migratórios:
1) Paiçandu – a) 70% dos entrevistados nasceram ou residiram em outros estados (30%
nasceram em outro estado e 40% ao menos moraram em outro estado); b) identificou-se uma
dinâmica migratória com São Paulo (6), Mato Grosso (3), Alagoas (2), Mato Grosso do Sul
(1) e Minas Gerais (1); c) 50% saíram de Maringá para Paiçandu; 40% migraram de uma
cidade pequena para Paiçandu e d) 10% migraram de São Paulo (capital); d) 70% dos
migrantes moraram ou nasceram em Maringá (30% nasceram e 40% ao menos moraram em
Maringá).
2) Sarandi – a) 100% dos entrevistados nasceram no Paraná, dentre os quais, 50% no
aglomerado urbano de Maringá (25% em Maringá, 12,5% em Sarandi e 12,5% em Marialva);
b) identificou-se uma dinâmica migratória com São Paulo (4) e Rio de janeiro (1); c) 70%
vieram de médios ou grandes centros urbanos (exceções: um caso de Marialva, uma pessoa
que nasceu em Sarandi e um trabalhador que se mudou de Rondon - PR para Sarandi) – dentre
os quais 40% de São Paulo; d) 50% moraram ou nasceram em Maringá (40% saíram de
Maringá para Sarandi).
174
QUADRO nº 4. Macromobilidade física: Paiçandu e Sarandi – 2004
A periferia decorrente da mobilidade centrada no trabalho: a questão no aglomerado urbano de Maringá.
MACROMOBILIDADE FÍSICA
Perguntas: Nº 1. Onde você nasceu?
Nº 2. Qual foi o seu Itinerário até chegar aqui na cidade?
PAIÇANDU
Itinerário
A B
Maringá – sítios na região (café) – Paiçandu – interior de São Paulo – Paiçandu.
5 sim
Laranjeiras do Sul – Curitiba – Paranavaí – São PauloNova Andradina/MT – Paiçandu
6 sim
São Sebastião/AL – Santa Inês – Mato Grosso do Sul (chácara)Arthur Nogueira/SPDiadema SP
Diamantino/MT – Paiçandu.
7 sim
Maringá – Paiçandu – Matupá/MT – Paiçandu.
4 sim
Pitanga – Paiçandu.
2 não
Ituiutaba/MGSanto André/SP – Maringá – Paranavaí – Maringá – Paiçandu.
6 sim
Arapiraca/AL – Sertãozinho/Peabiru – Engenheiro Beltrão – Maringá – Paiçandu.
5 sim
Cruzeiro do Oeste – Sta Izabel do Ivaí – Altonia – Iporã – Maringá – Paiçandu.
6 não
Maringá – Paiçandu – São Paulo – Paiçandu
4 sim
Corbélia – Maringá – Paiçandu
3 não
SARANDI
Itinerário
A B
Pérola – Cianorte – Maringá – Sarandi – Itu/SP – Sarandi
6 sim
Maringá – Rio de JaneiroSão Paulo – Sarandi
4 sim
Maringá – Sarandi.
2 não
Curitiba – Maringá – Sarandi.
3 não
Marialva – Sarandi.
2 não
Terra Boa – Maringá – Sarandi.
3 não
Sarandi
1 não
Ibiporã – São Paulo – Sarandi .
3 sim
Sarandi – Jundiaí/SP – Sarandi
3 sim
Terra Boa – Goio-Ere – Moreira Sales – Sarandi – Rondon – Sarandi.
6 não
Fonte: Pesquisa de campo
A: Número de cidades
B: Itinerário entre Estados
É curioso o fato de as entrevistas não terem revelado uma relação entre as duas
cidades pesquisadas, retratando uma mobilidade de Sarandi para Paiçandu ou vice-versa, já
que elas se encontram muito próximas (22 quilômetros).
Conforme a abordagem do pólo e da periferia, constata-se que no aglomerado
urbano de Maringá, como já referido, predomina uma força centrípeta no que concerne à
centralização do capital e uma força centrífuga de pessoas. Muitas destas acabam encontrando
nos municípios circunvizinhos a oportunidade de se inserir na dinâmica urbana, em vista de
175
seus salários serem incompatíveis com os preços praticados pelo mercado imobiliário da
cidade-pólo (o acesso aos imóveis não é democratizado). Essa migração assim se dá
principalmente quando estas pessoas buscam adquirir a casa própria. Cabe ressaltar que
muitos migrantes que buscam um emprego em Maringá não chegam a se instalar na cidade,
viabilizando sua inserção ao ocupar sua periferia externa pobre.
Cabe aqui lembrar as palavras de Henri Lefebvre (2001, p. 14) em menção à obra
“A situação da classe operária na Inglaterra” de Engels: “A centralização centuplicou o poder
desses milhares de homens” (daqueles que se encontravam na cidade de Londres),
“multiplicou a eficácia de seus meios. A contrapartida desta prodigiosa riqueza social,
realizada pela égide econômica e política da burguesia inglesa: os sacrifícios”. Ao mencionar
os sacrifícios, o autor faz menção a exploração de muitos operários para se construir e
instaurar “os milagres da civilização”.
Como já foi referido, o ideário urbano disseminado na década de 1970, no intuito
de vencer a resistência dos pequenos proprietários rurais, se apresenta no discurso dos
trabalhadores e desempregados entrevistados. Mas sabe-se que a modernização conservadora
foi a prática e política desenvolvimentista que expulsou a grande massa de agricultores e
produtores rurais.
Conforme o depoimento de um trabalhador desempregado de Paiçandu, a
mecanização da agricultura, substituindo a cultura do café pelo binômio soja-trigo, fez com
que muitos buscassem as cidades como morada, no intuito de conseguir ao menos uma casa e
condições de viabilizar financeiramente sua vida. Para tanto, a cidade-pólo se apresentou
como um lócus de atração, exercendo uma força centrípeta ao sustentar o ideário concernente
à percepção de maiores oportunidades.
Nesse período, após os anos 1970, a urbanização foi generalizada no aglomerado
urbano de Maringá, principalmente com o crescimento da sua periferia externa (Paiçandu e
Sarandi). Estas cidades no entorno do pólo representaram para estes trabalhadores migrantes a
oportunidade de adquirir uma moradia.
Cabe elucidar, por meio dos dados logo abaixo que, Paiçandu e Sarandi detém
mais pessoas morando em casa própria do que Maringá. No entanto, a quantidade de
moradores por residência também é maior (densidade).
176
TABELA nº 33. Aglomerado urbano de Maringá: domicílios próprios – 1991 e 2000
Município
Percentual de pessoas
que vivem em
domicílios com
densidade acima de 2
pessoas por
dormitório, 1991
Percentual de pessoas
que vivem em
domicílios com
densidade acima de 2
pessoas por
dormitório, 2000
Percentual de pessoas
que vivem em
domicílios e terrenos
próprios e quitados,
1991
Percentual de pessoas
que vivem em
domicílios e terrenos
próprios e quitados,
2000
Marialva (PR) 11,13 9,42 55,48 64,81
Maringá (PR) 10,23 7,14 58,57 63,58
Paiçandu (PR) 24,26 13,93 67,93 75,13
Sarandi (PR) 22,57 15,87 63,4 70,07
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil – PNUD/ONU, dados dos Censos Demográficos 1991 e
2000.
Em Paiçandu se verifica uma maior facilidade (em relação a Maringá) de se
comprar uma casa, ou ao menos um terreno, onde posteriormente esses trabalhadores
construíram. Alguns até possuem duas casas atualmente, como é o caso do trabalhador da
indústria de alimentos (um senhor de 55 anos), podendo auferir um complemento de renda
com o aluguel.
Deste modo, cabe elucidar algumas respostas auferidas:
QUESTÃO Nº 3. Qual o motivo das mudanças de cidade?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 54 anos:
R: As mudanças de cidades, sempre a gente procurando uma melhora, procurando uma residência
fixa, onde a gente pudesse adquirir uma pequena propriedade, no caso uma moradia, conseguisse
comprar um terreno para montar pelo menos uma casinha, simples que fosse, mas que fosse da
gente. Foi acabando o café, foi dificultando a vida do agricultor né, e a gente foi procurando mais
se aproximar da cidade grande, cidade maior, onde parece que oferecia emprego, tinha mais
espaço parece, para a gente poder trabalhar.
Trabalhadora de Paiçandu na indústria de alimentos, 51 anos:
R: De Sertãozinho (distrito de Peabiru) eu mudei para Engenheiro Beltrão. De Engenheiro para
Maringá. Porque eu sai do serviço lá, né. Eu trabalhei sete anos no posto lá. Aí, sabe como é que é,
houve um desentendimento com o patrão, ele me mandou embora, e aí eu vim para Maringá. Eu
busquei um lugar melhor, né (Maringá). De Maringá para Paiçandu porque lá eu pagava aluguel e
ali eu construí uma casinha, em Paiçandu. Lá em Maringá eu não consegui não, é muito caro em
Maringá, né, e ali eu consegui. (...) É porque é para pobre, né. Aí eu consegui ali, né, é mais fácil,
né. Eu tenho essa casa onde eu moro e tenho uma outra. Eu aluguei uma e moro na outra
.
Trabalhadora de Paiçandu na Universidade, 48 anos:
R: Por que meu pai mexia com lavoura e faleceu. Desde então minha mãe mudou para Sta Izabel
do Ivaí para ficar perto dos parentes. Perto dos parentes não é legal, quando mais longe dos
parentes melhor, né. A gente morava em cidade pequena, pagava aluguel, trabalhava de doméstica,
serviços assim comum, né. E depois, finalmente viemos para Maringá, cidade maior, tinha mais
emprego, mais chance, né. Bom ,daí em 1986, eu fiz o concurso na Universidade, passei, e em
Paiçandu eu fui morar porque eu consegui comprar uma casa lá, sendo que aqui a gente vivia de
aluguel. Então, daí mudamos para Paiçandu porque a gente conseguiu comprar uma casa lá, e não
aqui.
Trabalhadora de Paiçandu na empresa varejista I, 42 anos:
R: Quando eu era pequena, meus pais vieram para Maringá, quando eu casei fui para Paiçandu.
Comprei um direito de casa lá, era mais em conta.
Como se verifica, os entrevistados que buscaram em Maringá oportunidades que a
“grande cidade” insinuava no seu ideário referem uma ação pautada na ideologia que se
177
constituiu na realidade atual, a qual retrata a desigualdade entre a cidade-pólo e as cidades
satélite (Sarandi) e dormitório (Paiçandu), sendo estas a periferia externa.
Os entrevistados de Sarandi demonstram, assim como os de Paiçandu, ter buscado
Maringá por acreditarem em melhores oportunidades, já que se trata do grande centro da
região. No entanto, outros buscaram grandes metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, em
busca de uma ascensão social, como foi o caso de um trabalhador desempregado de Sarandi, o
qual acabou voltando após um período de frustração, na esperança de encontrar algo melhor
em Maringá. Como ele relata, chegou a morar em favela nas duas cidades. Seu retorno se
deveu à família. Por outro lado, seus parcos recursos o obrigaram a morar em Sarandi.
Tanto Sarandi quanto Paiçandu são procuradas por pessoas que desejam comprar
um terreno para construir, ou uma casa mais acessível. Isso se confirma em praticamente
todas as entrevistas. Deste modo, as pessoas mais pobres saem de Maringá para viabilizar sua
casa própria, e não por simplesmente pagar um aluguel mais barato.
QUESTÃO Nº 3. Qual o motivo das mudanças de cidade?
Trabalhadora desempregada de Sarandi, 43 anos:
R: Motivo foi dificuldade financeira. A gente trabalhou com lavoura de café, estava fraco, então a
gente pegou e veio para a cidade.
Por que veio para Sarandi?:
Por causa que a gente construiu casa, comprou a data e construiu a casa. Aqui é mais em conta a
moradia.
Trabalhador desempregado de Sarandi, 33 anos:
R: Sempre morei em favela, né (Rio de Janeiro e São Paulo). As mudanças foram para tentar uma
vida melhor, né, só que São Paulo também está piorando, eu acho, eu sempre morei em favela. Né.
Aí meus pais moram aqui em Maringá, ai eu falei para minha mulher: vamos para Maringá, quem
sabe lá está melhor. Mas está pior, pior do que São Paulo.
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: De Terra Boa para Maringá foi por ser uma cidade maior, para emprego, por ter mais condições
de crescer na vida. E de Maringá para Sarandi foi porque eu queria uma residência e aqui em
Maringá os imóveis são assim, em relação ao padrão de cidade, são bem mais caros do que em
Sarandi. Eu fui comprar em Sarandi, porque eu comprei o mesmo padrão de casa que eu compraria
aqui, mas pela metade do preço, o mesmo tempo que eu gastava da minha casa para o serviço eu
estou gastando de lá até aqui.
QUESTÃO Nº 4. Porque o Sr. ou a Sra. optou por esta cidade?
Trabalhador desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: A questão de Sarandi é porque é uma cidade boa, eu diria uma coisa, se agente fosse pioneiro
de 15 anos atrás, nesta cidade, muita gente se dava bem. Hoje está sendo valorizado. Hoje pode-se
dizer que Sarandi é igualada a quase 100 mil habitantes, quase igual a Campo Mourão, só que a
arrecadação esta menor, porque as pessoas aqui são carentes, pessoas assim de periferia, cidade
periférica, pessoas que têm muito baixa renda. Sarandi, porque uma cidade grande como Maringá,
só não fiquei para morar lá, porque é uma cidade muito exigente, na área social, comércio, questão
de dinheiro, questão de tudo, profissionalismo também. Mas só que a cidade de Sarandi também é.
A única diferença de Sarandi com Maringá é o custo de vida. Você paga água aqui mais barato,
você tem carência de baixa renda de luz, as coisas aqui são mais perto do centro. Quando você tem
uma carência, você tem que buscar o lado mais fácil (...) Eu comprei aqui uma data bem mais
barato do que lá, agora eu estou construindo aqui, seria bem mais fácil do que lá também. Então
tudo é carência, o que seria, a renda que dá possibilidade para se viver na cidade.
178
Além da casa própria, um trabalhador desempregado de 31 anos coloca que em
Sarandi a água é mais barata e existe uma carência da taxa de luz para as pessoas de baixa
renda. Também é lembrada a facilidade decorrente das menores distâncias, de maneira que,
somado tudo, resulta um custo de vida mais baixo. É justamente o custo de vida a grande
diferença ente Sarandi e Maringá, como afirma o entrevistado.
Como elucidado, embora existam migrantes que buscam Paiçandu e Sarandi para
morar de aluguel, predomina a intenção de comprar um terreno e construir. Como relatou o
trabalhador desempregado de Sarandi (logo abaixo), um terreno nessa cidade pode ser
adquirido por R$ 2.000,00 (dois mil reais).
QUESTÃO Nº 5. O S.r ou a Sra. gostaria de voltar para seu lugar de origem?
Trabalhador desempregado de Sarandi, 33 anos:
R: Vontade eu tenho, só que o aluguel lá em Maringá é mais caro, né, muita gente vem de lá para
cá por que o aluguel aqui acha muita casa barata, o terreno é barato. Que nem, agora eu vou
emprestar um dinheiro e vou comprar um terreno, com 2 mil reais eu compro um terreninho
barato, para ver se eu saio do aluguel.
Embora todos que buscaram a cidade-pólo (acreditando no imaginário incutido
por meio de ações manipuladoras de interesse dos grandes capitalistas) tenham se desiludido
(justamente pelas representações urbanas desiguais e periferizadas), quando se perguntou aos
entrevistados se tinham intenção ou simples desejo de voltar para a cidade de origem, a maior
parte respondeu que sim, quando esta cidade era Maringá. Os advindos de cidades pequenas e
de regiões distantes responderam de forma negativa. Neste contexto, a grande maioria deseja
habitar Maringá, independentemente de esta ser ou não a cidade de origem.
Na verdade, o que expressam estes trabalhadores, em face das dificuldades que
enfrentam na luta pelo direito à cidade que os emprega, não é o desejo de morar em Maringá,
de fato, mas o desejo de conquistar a cidadania, e principalmente a condição de igualdade. É
um desejo de inserção territorial! O lugar mais carente de recursos se apresenta como não
desejado justamente pela precariedade de suas condições. Mas algumas vezes a identificação
do habitante com a sua cidade também é lembrada e valorizada. É por isso que a cidade,
símbolo do desejo, não é em si desejada por todos; é, de fato, a representação de um estado
que todos desejam vivenciar. O desejo está no que faz da cidade aquilo que cada um deseja
(representações, símbolos e superficialidades).
QUESTÃO Nº 5. O S.r ou a Sra. gostaria de voltar para seu lugar de origem?
Trabalhador desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Gostaria, mas aí dependeria do caso de Maringá ser igual a Sarandi, menos preconceituoso. Por
exemplo, eu vou dizer assim, a Sanepar é muito cara, a Copel, luz é muito caro, as coisas lá são
muito caro, é muito longe as coisas. Mas enquanto eu não tenho condições eu prefiro Sarandi. (...)
179
Se eu tivesse oportunidade de voltar para Maringá eu voltaria; agora a minha esposa não, ela foi
criada, ela gostou daqui. Depende muito da criação.
Indiscutivelmente, o que permeia as justificativas da atual condição e dos desejos
está, na maioria dos discursos, diretamente relacionado à questão financeira. Isso denota que o
trabalhador se aliena também por ficar preso à submissão ao trabalho, por não ter direito de se
perceber quando fala de seus desejos e anseios, pois o ter-que-ser e o simples ter ditam o
movimento pautado na contradição capital x trabalho.
Tratando-se de uma aglomeração urbana sustentada pela micromobilidade física
(aquela que se expressa pela mobilidade pendular, da casa ao trabalho, o que denota um
deslocamento de rotina), é importante discorrer sobre o comportamento humano que reproduz
o valor de troca. Neste sentido, a pessoa vivencia o lugar onde trabalha, e não cria vínculos e
motivos para se comprometer com a cidade que habita, pelo simples fato de “apenas” habitar
a cidade. O citadino se presta a viver e se comportar completamente dependente do
movimento do capital. Ele trabalha, compra, se endivida, etc., mas não mora na cidade. Poder-
se-ia questionar que o não-comprometimento do indivíduo com o seu lugar representa uma
fuga de si mesmo, uma fuga da condição em que se encontra, de total submissão.
Por um outro prisma, isso representa o estado de alienação, o qual faz com que o
indivíduo se perceba somente na cidade em que seu comportamento se molda com base no
valor de troca, e não na cidade que ele utiliza, ele habita, ele usa.
Não obstante, exercitando a dialética, a própria condição do trabalhador de habitar
a periferia externa reproduz a segregação e a valorização do pólo como espaço desejado, pois,
se não houvesse a periferia externa pobre, o que seria o pólo?
QUESTÃO Nº 5. O Sr. ou a Sra. gostaria de voltar para seu lugar de origem?
Trabalhadora de Paiçandu na Universidade, 48 anos:
R: Para Maringá sim, eu trabalho aqui eu dependo daqui da Universidade, eu dependo de Maringá,
eu faço compra em Maringá, eu trabalho em Maringá, meu dinheiro fica em Maringá. Eu só durmo
em Paiçandu, então não tem nem porque eu morar lá.
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: Se eu conseguir com certeza gostaria de voltar morar aqui em Maringá, por que eu só vou para
lá para dormir.
Trabalhadora de Paiçandu na empresa varejista I, 42 anos:
R: Se eu tivesse condições de comprar uma casa aqui (Maringá) eu voltaria, mas ainda não tive
condições
.
Um posicionamento frente ao que representa o trabalhar e o habitar denuncia o
descomprometimento do indivíduo como um sujeito coletivo e usuário da cidade, ao passo
que o conformismo chega ao estado de indiferença.
180
QUESTÃO Nº 5. O S.r ou a Sra. gostaria de voltar para seu lugar de origem?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 53 anos:
R: Não gostaria de voltar para Maringá. É que Paiçandu e Maringá é junto.
O que permite conclusões mais otimistas desta reflexão e, conseqüentemente,
contesta a desumanização provocada pelo capital, quando este toma conta da vida do
indivíduo que luta pela sua condição de sujeito, é a constatação de que muitas pessoas se
valorizam como seres humanos ao defenderem o seu lugar, a cidade que lhes oferece o valor
de uso, mesmo que à base de troca. Isso não quer dizer que as pessoas devam se obrigar a
gostar da sua cidade, mas sim, aceitar e valorizar aquilo que constitui a base do que elas são,
nada mais do que suas raízes, sua história, seu território, sua cultura, etc.
Apesar disso, quando existe uma conexão intensa entre duas cidades, ou melhor,
duas “propostas” de cidade, porém não declaradas, e quando os espaços se aproximam por
meio dos fluxos sustentados e viabilizados pelos meios de transporte, se constata, em alguns
casos, uma força que os desconecta, no que concerne ao desejo de habitar o núcleo ou de
deixar de habitar o percebido como extensão, periferia, etc.
Enquanto isso não se apresenta possível, a mobilidade centrada no trabalho
(mobilidade física) é o exercício que une os espaços urbanos numa única e interdependente
dinâmica, mas respeitando as diferenças e interesses das partes, segregadas pelos limites
impostos pela classe opressora e gestora e pelo marco político divisor, o qual, na percepção do
sujeito que se move de um lugar ao outro, se resume numa placa.
O transporte de massa no aglomerado urbano de Maringá só é realizado por
ônibus. Conforme o censo econômico de 2002 realizado pela ACIM, a maior parte dos
trabalhadores (53,6%) utiliza carro próprio para se deslocar da casa para o trabalho. Em
segundo lugar aparece o transporte coletivo (ônibus), com 44,1%. Porém, faz-se importante
salientar que para os trabalhadores das indústrias o ônibus se apresenta como o meio de
transporte mais utilizado, com 44,8%, contra 44,5% daqueles que utilizam o carro próprio. É
justamente nas indústrias que está a maior parte dos trabalhadores de Sarandi e Paiçandu que
se deslocam para Maringá diariamente para trabalhar.
Outro meio de transporte muito utilizado pelos trabalhadores da indústria é a
bicicleta (28,1%). Como foi constatado nas entrevistas, muitos trabalhadores de Paiçandu se
deslocam até Maringá de bicicleta, principalmente pelo fato de entre estas duas cidades,
existir uma ciclovia que as liga. Faz-se importante pontuar que muitos trabalhadores de
Sarandi também utilizam este meio de transporte para se deslocar até a cidade-pólo. O centro
de Sarandi está apenas a 9 quilômetros do centro de Maringá.
181
A tabela nº 34 traz a representatividade de cada meio de transporte utilizado pelas
pessoas que trabalham em empresas de Maringá, contemplando também os que habitam
outros municípios da região.
TABELA nº 34 . Meio de transporte utilizado pelos funcionários em Maringá - 2002
% relativo
Itens
Indústria Comércio Serviço Total
Carro próprio 44,5 52,2 57,0 53,6
Ônibus de linha 44,8 44,5 43,5 44,1
A pé 23,7 21,5 19,0 20,6
Moto 22,2 16,0 14,2 15,8
Bicicleta 28,1 13,4 12,6 14,6
Ônibus fretado pela empresa 1,4 0,7 0,9 0,9
Carona 0,0 0,2 0,1 0,1
Caminhão 0,0 0,1 0,2 0,1
Van 0,0 0,1 0,0 0,0
Fonte: ACIM (Censo Econômico – 2002)
Como foi observado nas entrevistas com trabalhadores e desempregados, o
transporte coletivo e a bicicleta são os meios de locomoção mais freqüentes, assim como foi
revelado pelo censo econômico 2002. Cabe pontuar que as entrevistas não tiveram como
propósito quantificar dados.
Buscou-se saber se melhoraram as condições de deslocamento entre as cidades, no
caso, entre Sarandi e Maringá e Paiçandu e Maringá. Para a maior parte das respostas ocorreu
melhoria, principalmente no que tange à renovação da frota de ônibus e um maior número de
horários e pela ciclovia construída entre Maringá e Paiçandu. Mas um morador de Sarandi
reivindicou uma ciclovia para proporcionar uma maior segurança àqueles que utilizam a
bicicleta ao se deslocar entre Sarandi e Maringá.
Além das respostas auferidas que respeitam aos propósitos das perguntas, houve
uma, excepcionalmente, que retratou uma realidade paralela à questão do transporte, a qual se
acredita ser a realidade de muitos trabalhadores. Um desempregado de Paiçandu lembrou que,
quando ele e sua esposa trabalhavam em Maringá, os passes recebidos por ele eram
repassados a ela, que recebia em dinheiro o valor dos mesmos, já que trabalhava como
diarista. Deste modo, o trabalhador se deslocava de bicicleta e o casal utilizava o dinheiro
recebido pela mulher para completar o orçamento familiar, em vista dos baixos salários
recebidos, os quais não eram suficientes.
Outra resposta valeu como denúncia de descumprimento da obrigação de
disponibilizar ao trabalhador os meios para que este se locomova da sua casa para o trabalho.
182
É um direito que lhe foi negado! Neste caso, só são pagas pela organização duas passagens
por dia. A trabalhadora se desloca da sua casa até o terminal, de ônibus, mas é obrigada a
percorrer a pé o trecho do terminal até a instituição, pois é necessário, para vencer o trajeto,
tomar dois ônibus. Para um dia de trabalho, são necessárias 4 passagens (ida e volta).
QUESTÃO Nº 6. Qual o tipo de transporte que você utiliza para ir e voltar do trabalho?
QUESTÃO Nº 7. Desde que está na cidade, as condições de deslocamento melhoraram ou
pioraram? Por quê?
Trabalhador desempregado de Sarandi 44 anos:
R: Transporte: bicicleta
Piorou, devido à insegurança que aumentou. Deveria ter uma ciclovia.
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 53 anos:
R: Deslocava de bicicleta (quando trabalhava em Maringá)
Eu acredito que melhorou por causa do ônibus, né. A circular tem bastante, agora tem a pista
ciclista, então melhorou um pouco nessa área.
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 37 anos:
R: Transporte: bicicleta
O transporte melhorou sim, mas só que hoje nós trabalhamos para essas firmas aí ... Cocamar
ganhávamos R$ 220,00, ganhava o vale transporte, minha esposa trabalhava em Maringá, a patroa
dela dava dinheiro para ela vim, pagava em dinheiro a passagem. Aí eu ia trabalhar de bicicleta e
ela usava os passes e o dinheiro a gente consumia em casa. Era o meio de vida da gente, né ,
porque, se eu não usasse os passes, ia usar o dinheiro.
Trabalhadora de Paiçandu na Universidade, 48 anos:
R: De circular e a pé. Eu vou até o terminal a pé e retorno a pé; então dentro da cidade eu tenho
que andar a pé, ou pagar, mas com o meu salário não tem condições. Está uma briga por causa da
circular, porque a empresa tem obrigação de levar o funcionário de casa ao trabalho, eles só me
levam no meio do caminho. Eu e o pessoal de Sarandi. Todos param no terminal e vêm a pé. Pode
estar chovendo... O transporte ficou na mesma. Eu andava a pé da outra vez, antes, e continuo
andando a pé até agora. Não piorou e não melhorou.
Além de o direito do trabalhador ser desrespeitado, este se sente forçado e se
submete a tais condições em troca de um pequeno salário, que, por menor que seja, o deixa
contente. Talvez isso represente não a conformidade, mas a desilusão gerada por anos de
privação. Mesmo poucos anos já são suficientes para entristecer qualquer pessoa que se
encontre em uma posição de dificuldade, de extrema submissão, na condição de sustentar sua
sobrevivência, de lutar para não passar fome.
QUESTÃO Nº 8. Há quanto tempo o Sr. Ou a Sra. trabalha?
QUESTÃO Nº 9. Em que atividades o Sr. Ou a Sra. já trabalhou?
Trabalhadora de Paiçandu na Universidade, 48 anos:
R: Ah, eu trabalhei de doméstica, eu trabalhei finalmente de zeladora. E eu vou ficar aqui para
sempre porque se eu sair daqui eu vou sair com a mão na frente e outra atrás, porque eu sou
estatutária, não tem acerto, não temos fundo de garantia, não temos nenhum benefício. Se eu sair
daqui eu vou sair só com o salário, férias e 13º, mais nada, então eu vou ter de ficar aqui para
sempre até a aposentadoria.
Teve um tempo que eu estava fazendo magistério nas cidadezinhas, eu dei aula durante uns 5 anos.
Daí eu parei de estudar, mudei para Maringá, e daí fiz concurso aqui, o salário era bem melhor.
183
“O salário era bem melhor”. Esta é a frase de muitos trabalhadores que se
encontram na luta por uma condição básica de vida e acesso a moradia, a bens e serviços
necessários para o exercício da cidadania. A mobilidade pelo trabalho se apresenta forçada e,
embora cheia de esperanças, está também muito próxima da desilusão.
O que se revela espantoso é a pluralidade dos trabalhos já desenvolvidos por estas
pessoas (mobilidade funcional) e a quantidade de cidades (mobilidade geográfica) que elas
passaram. Isso só reforça a condição de mobilidade forçada, decorrente da submissão do
trabalhador ao capital.
QUESTÃO Nº 8. Há quanto tempo o Sr. Ou a Sra. trabalha?
QUESTÃO Nº 9. Em que atividades o Sr. Ou a Sra. já trabalhou?
Trabalhador desempregado Sarandi, 33 anos:
R: Trabalho há uns 20 anos (office-boy, entregador de material de construção, operador de
máquinas injetoras, marcenaria, repositor em supermercado, ajudante de pedreiro).
Trabalhadora de Paiçandu na empresa varejista I, 42 anos:
R: Muitos anos. Eu já trabalhei de diarista, lavadeira de hospital, cozinheira, autônoma, frentista,
confeiteira.
Ao passo que as pessoas vão se moldando às necessidades ou oportunidades do
mercado de trabalho, as tarefas e exigências com que os trabalhadores se deparam se
apresentam como dificuldades, o que muitas vezes os afasta, devido às limitações da condição
humana em se transformar constantemente. Mas isso se deve, principalmente, ao fato de o
indivíduo não respeitar a si próprio e não se perceber como detentor de direitos. Não existe
nenhum significado no emprego e na realização de um trabalho, só sendo percebida a
agressão realizada a si mesmo (não se entra no mérito da subsistência). Por mais idealista que
a reflexão se revele, representa apenas a dificuldade que o sujeito tem de superar tal condição,
isso quando ele se apercebe dela.
Quando resiste às oportunidades de trabalho (à necessidade de empregar sua mão-
de-obra para o seu próprio sustento), o sujeito é constantemente percebido ou julgado como
“vagabundo” ou preguiçoso. Estas ações ou posturas são poucas vezes respeitadas como
ideologias.
Em último caso, o trabalhador se encontra em um estado de total submissão a
qualquer oportunidade, pelo estado de precariedade a que chegaram as condições de trabalho,
sustentado pelo excesso de exigências e pelo direito de escolha por parte do empregador em
meio a um amplo exército de reserva e uma dinâmica urbana propícia, por se apresentar
desigual.
184
QUESTÃO Nº 8. Háquanto tempo o Sr. Oua Sra. trabalha?
QUESTÃO Nº 9. Em que atividades o Sr. ou a Sra. já trabalhou?
Trabalhador desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Começou a trabalhar com 11 anos.
O primeiro emprego, eu trabalhei na universidade, eu trabalhei de guarda mirim. Eu estudei lá
dentro, fiz cursos, a guard- mirim me ajudou muito. Aí depois eu comecei a trabalhar em
escritório, construção civil, servente (1989), instalação telefônica, auxiliar de cozinha,
telemarketing. Hoje eu trabalho com portaria e vigia. Eu estou querendo mudar. A questão é muito
exigente nesta área. Eu acabei de ser entrevistado por uma empresa, onde eu não estou acostumado
a trabalhar, a fazer o trabalho, o que seria noturno, eu sempre trabalhei de dia. Para mim seria
inviável, porque eu teria de trabalhar sábado, domingo e feriado à noite. A questão também salarial
está defasado, está muito baixa. Ofereceram R$ 280,00 em Campo Mourão para trabalhar de vigia
à noite.
Eu estou pensando em mudar para a área de gráfica, auxiliar de impressora. Um amigo meu está
vendo para mim.
Embora aqueles que se encontram em estado de desemprego se sintam preteridos,
nem todos se submetem às condições impostas.
Frente à mobilidade do trabalho, delineada por meio das entrevistas, se têm dois
grupos. O primeiro é o de pessoas que começaram a trabalhar no campo, e o segundo, o de
pessoas que detêm um perfil de trabalhador eminentemente urbano, como já foi elucidado.
Os trabalhadores que hoje se encontram desempregados começaram a trabalhar no
campo. Conforme as respectivas colocações, se constata que os trabalhos desenvolvidos por
eles passaram a ser realizados por tratores e outras máquinas. Um desempregado de Paiçandu
chegou a ser tratorista e um outro só teve contato com o setor primário, na época da cultura
do café, tendo ele começado aos 4 anos a colher café.
Faz-se oportuno elucidar que a maior parte destes trabalhadores começou a
trabalhar ainda enquanto crianças. Dos entrevistados que tiveram passagem pelo trabalho do
campo, a maior parte é de Paiçandu.
Deste modo, as ocupações que mais foram identificadas entre os desempregados
de Paiçandu respeitam a uma mobilidade que começa no campo, decorrente da modernização
dolorosa, passando para um trabalho urbano, na agroindústria, na construção civil e no setor
de transportes.
A fragilização dos contratos de trabalho, a qual permitiu às empresas otimizar
ainda mais o uso da mão-de-obra, resultou no barateamento do valor de troca, como elucida
um trabalhador de Paiçandu (37 anos) que se encontra desempregado, ao mencionar as
dificuldades em se submeter a empregos que dependam da safra.
185
QUESTÃO Nº 8. Há quanto tempo o Sr. ou a Sra. trabalha?
QUESTÃO Nº 9. Em que atividades o Sr. Ou a Sra. já trabalhou?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 37 anos:
R: Eu comecei trabalhar eu tinha..., assim que eu me alistei e fui dispensado do exército, comecei a
trabalhar na Sperafico – rural – na fazenda e trabalhava com trator (tratorista e secador foram os
trabalhos que ele desenvolveu. Trabalhou em Maringá como secador de grãos na Cocamar -sua
profissão - e servente de pedreiro).
Está ficando uma área muito fraca para este tipo de serviço, só tem serviço na safra, acabou a safra
eles dispensam o pessoal.
Trabalhadora de Paiçandu na cooperativa agroindustrial, 36 anos:
R: Antes da cooperativa eu trabalhava na roça, cortando cana. Depois trabalhei na rede de
supermercados. Depois eu entrei na cooperativa (operadora de máquinas - massaroqueira).
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 54 anos:
R: Trabalha desde os 7 , hoje está com 54 anos.
Eu já trabalhei, de início, na época em que não existia tanto asfalto, na minha adolescência, a gente
era “belto estrada”, com carrocinha, eu acho que não é do seu conhecimento, ..,naquela época não
existia tanto tratores, era belto braçal, então a gente já começou a trabalhar com sete anos de idade
nesta atividade aí, é.. misturado junto com aqueles homens já pessoas de idade. Eu era
praticamente criança, ... e então agente foi crescendo e trabalhando em outras coisas, eu trabalhei
em forno de cal em Curitiba, ... , mas eu trabalhei em forno de cal, em lavoura, trabalhei em
empresa de ônibus, e agora de uma época para cá, eu entrei na construção civil. E agora,
atualmente, a gente tá desempregado, né, tá dificultando dia por dia o emprego, né, tá ficando
difícil, eu não sei se é pela idade da gente, o que que é que está acontecendo.
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 53 anos:
R: Trabalhei muito em Maringá. Construí muito em Maringá. Trabalhei mais ou menos uns 8 anos,
de 1982 a 1990.
Eu comecei com 4 anos carpindo café em Maringá e Paiçandu.
Roça - sítio, motorista, servente de pedreiro, pedreiro, motorista, comércio – fim da história.
Por outro lado, foram expostas histórias de vida de muitos trabalhadores que só
tiveram contato com trabalho urbano, mesmo dentre aqueles mais velhos, que já trabalhavam
na época das extensas plantações de café.
Com efeito, são as mulheres e os mais jovens que melhor representam o trabalho
urbano, o qual revela suas precariedades, principalmente por ter se generalizado enquanto
fonte de subsistência.
Como as pessoas passaram a se submeter à condição de trabalhar para comprar
inclusive alimentos, o capital se consolidou como o objetivo maior das relações
socioeconômicas. Em decorrência desta busca desenfreada, a condição de se posicionar no
mercado a contento do capitalista levou as pessoas a se submeterem, como já foi visto, a um
número exorbitante de atividades, não dando importância ao seu significado, já que, antes de
qualquer coisa, buscam viabilizar o sustento familiar.
Devido aos baixos salários e à necessidade de se conservar um exército de
reserva, as mulheres passaram a dividir o mercado de trabalho com os homens, em poucos
anos. Com efeito, por mais que a igualdade assim se represente, tendo todos o direito e a
condição de seres independentes, muitas mulheres, ainda jovens, adentraram neste cenário de
exploração por um único motivo: complementar a renda familiar.
186
Não obstante, a coação que parte da classe opressora nunca deixou de existir, só
que hoje ela se apresenta como uma fábula, porém cínica, ao invés de se apresentar de uma
maneira declarada, como aconteceu nos governos ditatoriais.
Tem-se como um exemplo de fábula o ideário urbano, vendido como a melhor
forma de vida, a que proporciona melhores condições de vida. Porém, é indiscutível que o
espaço urbano, por melhor que seja, se constituiu no Brasil com o propósito de viabilizar a
acumulação das empresas capitalistas. Um espaço de interação social pautado no trabalho e
completamente segregado e hierarquizado, como em núcleos sociais. Desta forma, a cidade
contribui para a civilização, ao passo que a coage docemente. No entanto, a cidade ainda luta
para ser um espaço democrático, por mais que sua essência e forma aludam a um espaço de
debates e participação. A passividade do homem urbano brasileiro se sustenta na ignorância
quanto ao sonho urbano, ao sentir apenas o bom e o belo no espaço urbano, sem procurar
tornar esse espaço realmente democrático. Neste contexto, impera a alienação social.
Muitos dos que buscaram a cidade grande como o locus da realização dos sonhos
e das potencialidades, voltaram para o lugar de origem. Este é o caso de um trabalhador
maringaense que se mudou para São Paulo e que hoje, como já referido, após ter se casado,
voltou para morar em Sarandi, pois foi nessa cidade que conseguiu se inserir na dinâmica
polarizada por Maringá. A crença na mobilidade social repousa na alienação intelectual.
QUESTÃO Nº 8. Há quanto tempo o Sr. ou a Sra. trabalha?
QUESTÃO Nº 9. Em que atividades o Sr. ou a Sra. já trabalhou?
Trabalhadora desempregada de Paiçandu, 31 anos:
R: Atividades: gráfica, vendedora, auxiliar de costura, caixa.
Trabalhadora desempregada de Paiçandu, 19 anos:
R: Trabalhei em Maringá de babá e na prefeitura como estagiária (analisadora de projetos).
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: Desde 82 eu tenho registro em carteira, já tem 22 anos.
Eu já fui vendedora
, trabalhava na Pernambucanas com vendas, e da Pernambucanas eu vim para
cá como bancária
.
Trabalhador de Paiçandu na empresa atacadista/varejista, 24 anos:
R: De carteira registrada eu já tenho 8 anos. Eu vou fazer 24 agora.
Eu trabalhei na madeireira
do meu pai, fiquei um ano lá, (...), trabalhava meio período. Depois eu
parei e fiquei fazendo bico, vendendo laranja
a 1 real o saco, vendendo peixe junto com o meu pai,
trabalhei no escritório do meu tio, de contabilidade. Aqui eu sou auxiliar do departamento
financeiro.
Trabalhadora de Paiçandu na indústria de alimentos, 51 anos:
R: Desde moleque, desde pequenininho, sempre de frentista
.
Moro em Paiçandu 30 anos, só trabalhei em Paiçandu 5 anos, no posto Pinheirão. O restante desse
tempo em Maringá.
Trabalhador de Sarandi na empresa de transporte, 42 anos:
R: Eu estou para me aposentar daqui a três anos. Eu contribuo com o INSS há 26 anos. Eu tenho
42 anos. Eu trabalhei com indústria moveleira (Arapongas), daí eu fui para São Paulo para
trabalhar com móveis
, mas aí não deu certo, daí comecei a trabalhar lá como segurança, eu era
vigilante de carro forte. Aí trabalhei lá, durante 4 anos, aí quando eu voltei para o Paraná, aqui na
cidade de Sarandi, entrei no transporte coletivo
, e estou até hoje, há 17 anos nesta empresa.
187
Apesar disso, muitos trabalhadores conquistaram uma posição mais digna, no que
concerne ao retorno dado pela empresa capitalista (um maior respeito), e vivenciam um
momento de busca pelo êxito profissional. Este é o caso de dois trabalhadores, um de 24 anos,
que já atuou no mercado informal vendendo laranja para ajudar seu pai, e uma trabalhadora de
41 anos, que de vendedora, passou a trabalhar no setor operacional de uma agência bancária, a
qual lhe paga um salário satisfatório. Neste último caso, a própria trabalhadora chega a esta
conclusão, por avaliar sua situação em meio às dificuldades que o trabalhador brasileiro vem
enfrentando em tempos de desemprego e, conseqüentemente, de baixos salários.
Os mais velhos, por terem se formado no contexto social rural, apresentam, ainda
hoje, uma baixa escolaridade, o que lhes dificulta o acesso a empregos. É este o caso do
desempregado de Sarandi (32 anos), que estudou até a 5º série do ensino fundamental e
encontra dificuldades por conta da exigência do mercado de trabalho, que lhe cobra ao menos
a 8º série, mas principalmente, o ensino médio completo. Com efeito, é explícito o seu
arrependimento.
QUESTÃO Nº 10. Qual é o seu grau de instrução?
Trabalhador desempregado Sarandi, 32 anos:
R: Meu maior arrependimento foi porque eu parei na 4º série. Eu tô querendo voltar a estudar
agora, fazer mobral e supletivo, né.
A maior parte dos empregos que foi procurar pedia a 8º série ou 2º grau.
Embora o trabalhador desempregado pudesse ter estudado, ele se culpa e não
percebe que esta condição lhe é imposta. No entanto, ele não respeita a sua história de vida, a
sua formação, e aceita passivamente o seu estado de incoerência frente ao modo de produção
capitalista vigente e exigente.
QUESTÃO Nº 10. Qual é o seu grau de instrução?
QUESTÃO Nº 11. Os estudos influenciaram na melhoria de seu emprego?
Trabalhador desempregado de Sarandi, 42 anos:
R: 8º série
Acho que deveria estudar mais, na correria do dia-a-dia a gente não se deixa, a gente tem várias
possibilidades de curso, (...) Eu acho que agente deveria se esforçar mais para estudar mais. (...)
Agora para frente quanto menos estudo pior é. As pessoas estão sendo prejudicadas por ter só isso.
Eu deveria ter pelo menos o segundo grau.
Trabalhador desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Eu tenho o 1º grau completo
.
Um grande problema que eu enfrento é que você tem que ter o 2º grau completo, o mercado cada
vez está exigindo mais. Hoje em dia o mercado está exigente porque. (...) A empregada doméstica
tem que ter pelo menos um estudo, para que a pessoa quando for dar recado, marcar alguma coisa,
a empregada ter escrito numa agenda. Então tudo hoje no mercado cresceu a globalização, você
tem que ter informática, inglês e espanhol. Hoje eu sou um porteiro, o porteiro é como ser um
recepcionista. Digamos que eu trabalhe num hotel, a qualificação de um hotel para se trabalhar,
seria você ser um recepcionista, você ter um ensino médio, ter um curso, e principalmente saber
188
falar o inglês e o espanhol para recepcionar um turista. A globalização está grande. Cada vez mais
você tem que ter informações e cursos.
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 53 anos:
R: Escolaridade: não tenho, eu fiz o mobral uma vez até o terceiro ano, mas depois nasceu a
criança, chorava muito, não agüentei a roça e o estudo e não dormia de noite, então daí parei de
estudar, aí eu esqueci tudo, só lembra o nome da gente.
Na época em que agente era mais novo, não exigia o estudo, exigia o trabalho. Hoje, eles exigem o
estudo e não o trabalho, tudo hoje é o segundo grau, então, se você tem uma caneta boa você
trabalha se não você não vai.
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 37 anos:
R: Estudou até a 5º série.
“Sim, isso ai é uma coisa que, acho que estão exigindo muito por um serviço que não é necessário.
Hoje você, numa empresa que nem a Cooperativa, ela quer o segundo grau para você carpir dentro
da Cooperativa.
Acho que a escolaridade ela serve para quem mexe com a caneta, mexe com..., ali não tem , ali
dentro no caso que eu trabalhava ...nem na caneta eu colocava a mão ... eu acho que nesse ponto
ai, explora muito.
A situação é ainda mais grave quando se percebe que, conforme avança a
mobilidade do trabalho, o Estado perde participação e contribui com a atual lógica, deixando
o cidadão à mercê do capital. Nesse momento, o indivíduo se culpa por não ser aceito. Mas, a
gravidade da questão é que o Estado é formado por todos os brasileiros, os quais se deixam
governar pelo interesse hegemônico de acumulação de capital, perdendo sua condição de
sujeito e passando a atuar como o indivíduo empregável e submisso.
QUESTÃO Nº 11. Os estudos influíramna melhoria de seu emprego?
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: Poderia ter influenciado mais se eu estivesse terminado a faculdade, mas na época que eu entrei
no banco, não era uma exigência que você tivesse o vel superior. Hoje sim, e às vezes eles até
questionam de você voltar a fazer uma faculdade, mas no momento eu não estou com esse pique
de fazer faculdade não.
Trabalhador de Sarandi na empresa de transporte, 42 anos:
R: Eu cursei até a 8º série.
Eu não estudei muito, mas fiz muitos cursos de aperfeiçoamento. Hoje em dia é muito importante,
tudo que você vai fazer hoje você tem que ter estudo. Isso tem de ajudar.
Conforme o exposto, em nenhum momento se busca negar o modo de produção
em si, mas sim, o modo como ele se perpetuou, pautado na exploração do trabalhador coagido
por uma fábula. Conseqüentemente, a lógica capitalista assim se apresenta explorando o
homem! Deste modo, não se identifica preocupação, ou ao menos respeito com a condição
humana (salvo poucas práticas empresariais). A lógica em si apenas seduz o indivíduo por
meio das fábulas motivacionais. Isso reforça o estado de ilusão em que vive esta sociedade,
acreditando no bem-estar em meio ao caminhar individualista.
As empresas, na busca de criar uma relação ainda mais interdependente, passaram
a desenvolver programas de treinamento e a se utilizar deste benefício como meio de
manipulação. Mostram ao trabalhador quanto ele é notado e valorizado, procurando
189
compensar assim o baixo valor dos salários pagos, decorrente dos altos encargos sociais
incidentes sobre eles. Conquanto os brasileiros não tenham vivenciado o estado de bem-estar-
social, havia uma melhor condição, em termos de empregabilidade, nos tempos de inflação.
Além do mais, a abertura econômica realizada pelo governo Collor inseriu um país pouco
competitivo na carnificina praticada e instigada pelas corporações grandes e/ou competitivas.
Neste contexto, as regiões passaram a disputar espaços na busca por sediar a base
produtiva, seja como sede de uma unidade das transnacionais, seja como territórios dotados de
pequenas e médias empresas que se inserem como terceirizadas, no complemento produtivo
das corporações dominantes do mercado.
O Brasil, em plenos anos 1990, tinha como base econômica, como foi exposto no
capítulo terceiro, indústrias pouco lucrativas e multinacionais voltadas para o mercado
interno, pouco preocupadas com o aumento de produtividade num país onde não havia carros
japoneses de baixo custo para forçar tal empreitada.
Quando o país, no governo Itamar Franco, implantou o Plano Real, por meio do
então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, se transformou num mercado atraente
não só para as empresas venderem seus produtos, mas também para, pagando baixos salários,
se utilizarem de um exército de reserva que crescia em face da introdução de tecnologias em
indústrias que buscavam se inserir no mercado global, para se apresentarem competitivas no
mercado nacional.
O Interior sente o reflexo destas políticas públicas e privadas. A tecnologia
desenvolvida pelos centros de pesquisas e pela indústria, na busca de transformar a dinâmica
agroindustrial pelo aumento de produtividade, instaura um ambiente rural urbanizado e
industrializado, dinâmico e mais exigente, demandando mão-de-obra melhor qualificada, ao
passo que desemprega em suas unidades. Isso se constata no depoimento do trabalhador de
Sarandi de 25 anos.
QUESTÃO Nº 12. Nos locais onde o Sr. ou a Sra. trabalhou foi dada a possibilidade de fazer
cursos ou estágios?
QUESTÃO Nº 13. Se sim, esta qualificação contribuiu para uma melhoria de sua
remuneração?
QUESTÃO Nº 14. Esta qualificação facilitou quando da mudança de emprego?
Trabalhador de Sarandi na empresa varejista II, 25 anos:
R: Olha, na fazenda que eu falei para você, de cana-de-açúcar, lá eles me deram cursos, mas é para
lavoura, cursos de herbicidas e outros, aqui (empresa varejista II) eles deram de empilhadeira, para
nós termos mais noção.
Quando eu fui para Rondon, por causa desse curso eu consegui vários serviços lá. Fui trabalhar
inclusive como tratorista, etc... (facilidade quando da mudança de emprego).
190
Como as agroindústrias se encontram em expansão, a abertura de novas unidades
produtivas acabou contratando um volume significativo de mão-de-obra, o que amenizou a
generalização de altas taxas de desemprego para o interior agrário brasileiro.
A indústria passou a exigir mais dos trabalhadores, por ter direito de escolher em
meio ao exército de desempregados. A agricultura também se torna exigente, embora por
vezes respeite políticas compensatórias subsidiadas pelos governos, os quais proíbem a
mecanização para a colheita de algumas culturas que demandam uma significativa quantidade
de mão-de-obra, como por exemplo, a cana-de-açúcar na região de Maringá (colheita
subsidiada pelo governo do Estado do Paraná).
As empresas, ao mesmo tempo que podem reduzir o valor de sua oferta salarial,
acabam tendo de treinar pessoas. Os trabalhos disponíveis são muito especializados, porém
complementares uns aos outros, o que demanda o conhecimento técnico em meio ao processo
produtivo. Isso ocorre devido às políticas de redução de custos concomitantes com as práticas
de aumento de produtividade, que alocam um mesmo funcionário para o desenvolvimento de
várias tarefas complementares, muitas vezes, respeitando um rodízio, o que facilita para a
empresa a substituição na ausência de um “colaborador”.
Para tanto, a oferta de treinamentos ou cursos de requalificação profissional tem
sido constante nas empresas, porém esses cursos são muito específicos e pouco significam
quando a pessoa muda de setor ou de emprego. Como mencionado, isto é muito utilizado para
favorecer a elevação do moral, como fonte de manipulação para fazer com que o funcionário
se motive sem ao menos compreender o que faz, ou seja, para que faz. O que prevalece é a
razão instrumental!
Apesar disso, muitos desempregados, no intuito de acompanhar a mobilidade do
trabalho, buscam, por conta própria, se requalificar, na esperança de conseguir um emprego.
No entanto, muitas vezes não se requalificam por falta de dinheiro, o que acarreta a
impossibilidade de pagar pela “democratização” das técnicas.
Além das técnicas, e justamente por causa delas, as empresas cobram dos recém-
formados uma experiência ainda não adquirida por eles. Com efeito, o desânimo toma conta
em meio às dificuldades, o que contribui para a redução da auto-estima do cidadão, que passa
a se culpar pela vida que leva e à qual submete a sua família, como se o culpado fosse só ele.
191
QUESTÃO Nº 12. Nos locais onde o Sr. ou a Sra. trabalhou foi dada a possibilidade de fazer
cursos ou estágios?
QUESTÃO Nº 13. Se sim, esta qualificação contribuiu para uma melhoria de sua
remuneração?
QUESTÃO Nº 14. Esta qualificação facilitou quando da mudança de emprego?
Trabalhador desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Sim, fiz, de portaria.
R: Ficou a mesma coisa, o que manda hoje é registro em carteira ou ter um padrinho. Sinto-me
forçado, porque eu vou ficar fora do mercado de trabalho (se acaso não fizer cursos). O curso mais
simples de vigilante é R$ 500,00.
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: No banco X, muito mais do que na Pernambucanas.
É por cargos que a gente faz os cursos. Então quando eu era tesoureira era relativo à tesouraria,
hoje que eu sou CONEG, que é chefe de controle de negócios, eu faço cursos com relação ao meu
trabalho para aprimorar isso daqui.
R: De caixa para tesouraria sim, aqui não. (complementaridade dos cursos)
R: Não, são cursos que você faz para se atualizar, vamos dizer assim, dentro do seu serviço, mas
não para aumento de salário não.
Não, porque são coisas totalmente distintas.
Trabalhadora de Paiçandu na Universidade, 48 anos:
R: Já fiz vários cursos aqui na universidade. O último que eu fiz foi de detergente, quer dizer, fazer
material de limpeza: sabão, sabão líquido, detergente, desinfetante. Ah, fizemos cursos de como
lidar com as pessoas, comunicação, várias coisas.
R: Melhoria de remuneração, acho que não. Eu já estou no último nível, né, sou nível onze, já tem
uns 10 anos que eu sou nível onze. Então, não alterou em nada. Alteraria sim, se tivesse uma nova
carreira, que continuasse as carreiras, porque, conforme o número de cursos que você faz, sobe o
nível. O fato de eu ter o primeiro grau, ter começado o segundo grau, serviu para eu ter uns níveis
a mais, tanto é que eu subi para o nível onze, muito antes de pessoas que estão aqui há mais tempo
do que eu, né. Tinha pessoas que tinha 24 anos aqui e só tinha o nível dez.
R: Eu acredito que sim, né, muitas pessoas fizeram o concurso comigo e não passaram, né.
O indivíduo só não perde seu lado humano e reconhece sua condição de sujeito
coletivo quando se sente responsável pela família e a tem como o maior dos objetivos.
QUESTÃO Nº 12. Nos locais onde o Sr. ou a Sra. trabalhou foi dada a possibilidade de fazer
cursos ou estágios?
QUESTÃO Nº 13. Se sim, esta qualificação contribuiu para uma melhoria de sua
remunerasabão,b74 -1.1497 TD0290004 Tc0.026uiuÃ(d)4(T)9.saacae oadatoa an(aa)orian64 T( doa)oriaa
192
É evidente que ninguém é obrigado a se limitar ao mercado formal de empregos,
mas o crescimento do setor informal como condição de os indivíduos viabilizarem suas vidas
é uma expressão do descaso ou da crise que vivencia o país. Tal crise, que compromete sua
condição de vida, não se refere apenas à economia, mas também ao que a própria população
proporciona a uma minoria – o poder de decisão para o eleito como representante do povo.
Isso acontece quando o indivíduo, acreditando na democracia de que participa, delegando a
outrem o poder de decidir por ele, mediante voto às vezes entregue por algo em troca. O verbo
participar parece mal empregado em tal prática!
A rendição da grande massa à submissão ao capital, há pouco elucidada, retrata
uma mobilidade do trabalho (geográfico ou funcional) à qual o trabalhador se submete por
falta de organização, onde se tem a classe oprimida desiludida e obediente à classe opressora.
O cenário desenhado pelo neoliberalismo, instaurado como modelo econômico após a queda
do muro de Berlim e a desintegração da União Soviética, transformou a sociedade numa
bipolarização sem identidade, não percebida, ao menos por parte dos oprimidos, a não ser por
meio da cultura popular, que se utiliza da cultura de massa para se manifestar (Milton Santos,
2000).
Na verdade, na luta entre capital e trabalho a cultura de massa se transformou num
trunfo do capitalismo frente aos ideais da classe trabalhadora. É dessa forma que ocorre a
opressão, articulada como fábula.
Somadas a perda de poder das organizações da classe trabalhadora (sindicatos) e a
decomposição das concentrações de massa de trabalhadores por meio dos novos arranjos
industriais/empresariais, a cultura de massa contribui para a ausência da autopercepção da
pessoa como sujeito coletivo, relegando os problemas sociais ao governo, percebido como
outrem. É pura alienação social.
Deste modo, o sujeito coletivo sede espaço ao individualismo, o qual acredita que
a transformação para melhorar sua própria vida depende só dele, pois os que comandam o
Estado não se importam com sua precária condição de vida. Neste ponto, conforme relata um
trabalhador de Sarandi de 25 anos (empresa varejista II), o problema do desemprego é
atribuído à falta de interesse do próprio funcionário.
QUESTÃO Nº 15. A que o Sr. ou a Sra. atribui o desemprego?
Trabalhador de Sarandi na empresa varejista II, 25 anos:
Desemprego: falta do interesse do próprio funcionário
.
193
Com base nessa reflexão, não se pretende dizer que a gestão pública esteja isenta
de responsabilidade. O próprio governo Lula, que defende a democracia, expulsou filiados do
partido eleitos para o atual governo, pelo simples fato de não se posicionarem em
concordância com a prática de gestão que se delineava. O governo não tem sinalizado para
ações voltadas à instauração de políticas que reduzam a desigualdade social, como, por
exemplo, as reformas tributária e previdenciária.
“Os gastos sociais no Brasil – que inclui a totalidade dos gastos da
previdência, da saúde, da educação – equivalente a cerca de 20% do PIB. É evidente que
a persistência da pobreza não está vinculada à insuficiência do gasto público, e que, por
conseqüência, não se trata apenas da mobilização de recursos adicionais, mas na natureza
do gasto social e de melhoria da sua eficiência, em geral. Isso suscita questões de
operacionalização pura e simples, mas também questões distributivas complexas do ponto
de vista político, como aquelas relativas às características do gasto previdenciário”
(SONIA ROCHA, 2003, p. 192).
O principal fato, pelo menos o mais citado pelos entrevistados quando
estimulados a dizer qual a causa do desemprego hoje e concomitantemente a solução, se
delineia justamente nas questões tributária e previdenciária, no que se refere às altas taxações
e impostos pagos pelas organizações empresariais, principalmente pelas micro e pequenas
empresas. Porém, o desemprego no Brasil é estrutural, pois é enorme a quantidade de
desempregados disfarçados como subempregados urbanos – empregados na informalidade.
Segundo Sonia Rocha (2003, p. 186), o desemprego é fruto da especialização do
mercado de trabalho formal brasileiro, que leva a um número insuficiente de postos de
trabalho, ao passo que se tem um aumento relativo da participação da mão-de-obra
qualificada. “O resultado tem sido a expansão da informalidade e a exclusão do mercado de
trabalho dos trabalhadores com baixo nível de escolaridade”.
QUESTÃO Nº 15. A que o Sr. ou a Sra. atribui o desemprego?
QUESTÃO Nº 16. O que deveria ser feito para se reverter esta situação?
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: Eu acho que atual situação econômica que a gente vive, os impostos que nesse país são coisas
assim absurdas. Porque eu acho que se o nosso país tivesse uma redução desses impostos, onde o
empresário, ou pequeno empresário pudesse abrir novos postos de trabalho, porque, o que ele paga
um tanto de impostos como são taxados no nosso país, quantas pessoas poderiam estar sendo
empregadas. Em vez de pagar dez impostos reduzisse por exemplo para dois, três, mas que fosse
uma quantia compatível com aquilo que ela pudesse pagar, eu acho que ela estaria gerando muito
mais empregos do que na atualidade.
R: Eu acho que é a redução de impostos. Hoje em dia o que tem muito é fabriquetas de fundo de
quintal onde as pessoas tentam até burlar. Acabam sendo subempregos. Não é emprego com
carteira registrada. Quanto mais você tem carteira registrada mais impostos você tem (o governo
arrecada).
Trabalhador desempregado de Sarandi 44 anos:
194
R: Acho que um pouco é o governo, né; falta de mais liberação com os empresários para geração
de mais empregos, né, um pouco, se houvesse mais um repasse de verba para a pequena empresa.
Para a gente trabalhar por conta é uma coisa até mesmo muito complicada; se fosse uma coisa
mais simples, diminuiria mais o desemprego.
R: Para reverter: mais financiamentos,(..) menos complicação na parte financeira, liberar de 1000 a
5000 reais. Menos burocrático para poder melhorar, né.
Você tem que lutar e vencer as barreiras para seguir em frente, você tem que tentar melhorar a si
mesmo. Foi o que eu não vim fazendo, um pouco por falta de oportunidade e um pouco por falta
de vontade também. Agora eu estou tentando tocar um negocinho por conta, acho que vai ser
melhor do que tentar arrumar um emprego.
Como em Maringá mesmo, eu trabalhei 86 dias e eles me mandaram embora, não me pagaram o
ordenado, me pagaram o dia trabalhado, eu acho que ajuda muito a parte do empregador e não do
empregado. Por isso que eu desanimei. Eu já trabalhei em três firmas e em nenhuma eu passei dos
90 dias, porque eles mandam embora e contratam outro carpinteiro. Eu acho que não deveria ter os
90 dias de experiência.
A nova configuração do mercado de trabalho repercutiu no aumento da pobreza,
ao limitar as possibilidades de crescimento econômico e de aumento de renda, o que leva a
aumentar ainda mais a desigualdade (SONIA ROCHA, 2003).
Conforme a autora, para se reverter este quadro, dentre outras medidas, deve-se
“centrar os esforços para a inserção no mercado de trabalho dos jovens de menos de 25 anos
com baixa qualificação”. Essa prioridade “é devido tanto pela ótica da funcionalidade do
mercado de trabalho como pela da redução da pobreza” (SONIA ROCHA, 2003, p. 187).
Percebe-se que, com as dificuldades existentes para se conseguir um emprego,
ganham espaço os programas desenvolvidos com o propósito de se trabalhar com políticas de
incentivo ao empreendedorismo. São ofertados cursos e destinados recursos para a abertura de
pequenas empresas, uma prática neoliberal para tentar formalizar as relações e condições de
trabalho.
O Projeto Geração de Emprego e Renda (PROGER), desenvolvido pelo Governo
do Estado do Paraná, é um exemplo que busca selecionar potenciais empreendedores. O
processo começa com a oferta de cursos de capacitação, finalizado com o desenvolvimento de
um plano de negócios. Caso aprovado o plano de viabilidade, é liberada uma quantia para que
o indivíduo possa abrir a sua empresa.
Por mais que pareça uma solução para o desemprego, no Brasil, as micro e
pequenas empresas que são abertas diariamente apresentam uma alta taxa de mortalidade. De
acordo com o SEBRAE (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas), as
principais causas destes insucessos são: 1) a falta de preparo do candidato a empreendedor e
2) a falta de recursos e de planejamento (os recursos investidos são insuficientes para
sustentar a empresa no primeiro ano de vida). No entanto, são recursos públicos investidos em
projetos pouco eficazes quanto ao combate à pobreza.
195
Com efeito, o desfecho das opiniões colhidas faz menção à reprodução da
desigualdade, em que os ricos, no comando do poder, acabam governando para si, para a
acumulação do capital. Mas esse estado de auto-reprodução da riqueza sustentada pela auto-
reprodução da pobreza também se sustenta pelo fato de quem nasce em meio às melhores
condições ter mais facilidades de se tornar “alguém na vida”, comparado a outros que
necessitam, antes de tudo, lutar pela sobrevivência.
QUESTÃO Nº 15. A que o Sr. oua Sra. atribui o desemprego?
QUESTÃO Nº 16. O que deveria ser feito para se reverter esta situação?
Trabalhador Desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Por causa do mau investimento que o governo faz, em todas as áreas, principalmente o salário.
Eu digo uma coisa, quem é rico, quem é milionário, se ele souber investir, cada vez mais ele fica
rico. Agora, questão das pessoas carentes e pobres, pessoas assim miseráveis, cada vez mais, por
que não têm campo para ele. Porque se uma pessoa é rica, desde o berço até ele se formar, ele tem
tudo, porque os pais dão educação, pagam universidade para ele, ajudam ele, eles não têm que
procurar para trabalhar.
R: Para reverter, eu diria uma coisa, seria mais investimento e menos corrupção. Se pelo menos
ajudasse na reforma agrária, na área social, se dão emprego e dignidade com salário bom de
600,00 a 800,00 reais, assim seria um salári- mínimo para os empregados, porque, através disso
eles vão consumir mais, consumindo mais, vai gerar mais emprego. Eu estava até agora pouco
conversando com a minha esposa, ela disse que a loja estava parada. Não é por questão de vender,
é porque ninguém tem dinheiro. Se a política melhorar no país, não ter essa robalheira, o dinheiro
que vai para os bancos, para salvar empresas grandes; se o governo investir certo, cortar o círculo
contra os grandes empresários. Deveria mudar todos do senado. Eu diria que o Brasil deveria ser
uma monarquia, deveria ter um rei e uma rainha para cuidar desse país, não ter tanta corrupção.
As políticas pautadas na abertura de microempresas acabam contribuindo para a
geração de empregos sem qualidade e estabilidade, o que leva a conservar o atual quadro de
desemprego. Além disso, não se poderia deixar de pontuar que a grande vilã e causadora do
desemprego, em um país que não consegue gerar um crescimento econômico, é a tecnologia,
que acaba só substituindo o homem na linha de produção ou na prestação de alguns serviços.
Isso se deve ao fato de, em grande parte as tecnologias serem importadas e não gerarem
empregos no Brasil com sua fabricação. Na verdade o Brasil é um país que investe muito
pouco em ciência e tecnologia.
É evidente que isso acontece pelo fato de a competitividade das empresas se
apresentar como prioridade. O capital é a grande meta da sociedade capitalista! No entanto, o
processo de periferização é decorrente desta prioridade em detrimento da condição humana
emancipada. Não se pretende instaurar uma abordagem pessimista, mas sim uma abordagem
realista, alimentada por ideais que valorizam as condições de desenvolvimento humano.
Deste modo, a tecnologia, que passou a dar forma a um novo modo de produção
tem como maior propósito, além do aumento de produtividade, impedir a proliferação das
grandes massas de proletários, fortalecendo o capitalista com o aumento do exército de
196
reserva (reprimindo o salário). Instaurou-se uma fase menos conturbada no que se refere às
lutas de classes porque, em decorrência das políticas neoliberais e conseqüente mudança das
grandes unidades produtivas para os países periféricos, os países centrais, hegemônicos na
economia global, passaram a gerar empregos de melhor qualidade, embora não tenham
conseguido vencer o desemprego. Tais empregos, ligados à gestão, são possíveis pelo simples
fato de essas empresas terem transformado os países emergentes em verdadeiros sistemas
produtivos de baixo custo.
Ao passo que os empregos gerados vão ganhando novas configurações, o sistema
educacional brasileiro “avançou”, principalmente com a abertura de um grande número de
instituições de ensino superior sem qualidade, possibilitando a existência de um grande
número de profissionais em algumas áreas, principalmente a de ciências sociais aplicadas. O
aglomerado urbano de Maringá é um exemplo disso. São oito instituições de ensino superior
com menos de dez anos de vida. Apesar disso, os empregos de qualidade são poucos no
Brasil, havendo uma maior demanda pela área operacional.
Como existe grande quantidade de pessoas teoricamente qualificadas ocupadas em
tarefas operacionais, a empresa passa a exigir mais dos candidatos, levando muitos a buscar o
ensino superior para conquista do título ou profissão, mesmo não se concebendo como um
profissional de fato. Além da qualidade profissional, a empresa se sente disposta a cobrar
experiência, limitando o mercado de trabalho àqueles que não se encontram nos dois estágios
mais críticos: 1) o jovem recém-formado que busca o primeiro emprego, e 2) o adulto de uma
certa idade que sabe de seus direitos e se apresenta pouco flexível.
QUESTÃO Nº 15. A que o Sr. Ou a Sra. atribui o desemprego?
QUESTÃO Nº 16. O que deveria ser feito para se reverter esta situação?
Trabalhadora de Paiçandu na indústria de alimentos, 51 anos:
R: É o seguinte
: no sítio foi o maquinário, né, e na cidade foi o computador. Mudou tudo, ninguém faz mais nada
no manual. No posto de gasolina, lá, o caixa é feito tudo nisso aí (computador) oh. As bombas
antes não eram coligadas no computador, era manual, agora estão coligadas. Quem não
acompanha isso aí fica para trás.
R: Ah, aí, pegar gente de idade. Fica complicado. O que eu tenho é tudo suado, não é roubado de
ninguém. Isso aí varia muito. Não depende só da pessoa. Tem uma vizinha minha que é advogada,
formada, mas não vê resultado, não adianta nada. É mesma coisa que ser analfabeta, não é
verdade?.
Trabalhadora desempregada de Paiçandu, 31 anos:
R: Acho que é mais a parte de especialização mesmo, que você não é especializado naquela vaga
você não pega. O estudo, ..., antigamente o pessoal quase não estudava. A coisa está se
dificultando. Quem não pode hoje em dia se especializar, fazer um curso de computação, naquela
área, também não consegue, se você não estiver especializado.
R: Seria, acho que, ... , às vezes a pessoa quando tem vontade ela consegue aprender. As pessoas
deveriam dar chances para essas pessoas, ou investirem mais cursos assim que atendessem estas
pessoas que não podem pagar, né... porque quem pode, tudo bem, quem não pode vai continuar
197
não podendo. né, porque não tem como pagar para você fazer esses cursos hoje em dia, porque
quem trabalha, paga luz e comida, como você vai pagar um curso hoje em dia?! Não tem como.
Trabalhador de Paiçandu na empresa Atacadista/Varejista, 24 anos:
R: Falta de qualificação das pessoas, e a outra é que o empresário é exigente demais. O empresário
pode contratar o cara, ajudar o cara a se qualificar.
R: Qualificação dos funcionários por iniciativa própria e uma ajuda dos empresários tamm,
porque a parte social de uma nação não tem de depender só da nação, tem de depender um pouco
da atividade privada.
Falta também por causa da mecanização das coisas.
Trabalhadora de Paiçandu na cooperativa agroindustrial, 36 anos:
R: Porque não tem oportunidade mesmo. A pessoa vai procurar emprego, só pega se tem
experiência.
Deveriam dar oportunidade para as pessoas aprenderem.
O individualismo como base da alienação social se expressa principalmente, como
já verificado, quando as pessoas passam a se responsabilizar pela sua ação para garantir a sua
condição de cidadania. De acordo com os depoimentos logo abaixo, o conformismo expresso
abala qualquer anseio por mudança com base numa mobilização social. Apesar disso, são
pessoas que, por vivenciarem as dificuldades, estão no limite deste estado de conformismo.
QUESTÃO Nº 15. A que o Sr. ou a Sra. atribui o desemprego?
QUESTÃO Nº 16. O que deveria ser feito para se reverter esta situação?
Trabalhadora de Paiçandu na empresa varejista I, 42 anos:
R: Eu acho assim , o desemprego existe, mas se as pessoas, por exemplo, se ele é um balconista, e
hoje está desempregado, mas se ele não quiser se humilhar e pegar aquele ..., as pessoas tem que
saber baixar e subir. Se der um jeitinho consegue sobreviver. Eu tive no Chico Neto (ginásio de
esportes do município de Maringá) em formatura, vendendo água mineral, estive no Willye Davids
(estádio de futebol) vendendo água mineral, como diz o ditado: “ quando a água bate na bunda
você sai nadando” .
R: Sempre dar uma chance para alguém. Saber repartir, contribuir.
Trabalhador de Sarandi no Hotel, 19 anos:
R: Falta de estudos é uma coisa que hoje em dia está pesando bastante, e força de vontade também.
R: O cidadão deveria tomar consciência para fazer um curso, fazer alguma coisa para poder subir.
Deste modo, a periferia representa o lócus da angústia social, da vontade de
aparecer como beneficiário das ações e práticas públicas, que cada vez mais se privatizam ou
se limitam a interesses de minorias.
Diante de uma situação de desemprego estrutural, quando se perguntou aos
entrevistados como eles percebem esta situação quando pensa em seus filhos, as respostas
delinearam quais são suas percepções em relação ao futuro.
A maior parte não se apresentou muito otimista e espera por maiores dificuldades.
Uma trabalhadora de Sarandi, de 41 anos, acredita que as pessoas que saíram do campo estão
voltando para tentar, ao menos, garantir a sobrevivência.
198
QUESTÃO Nº 17. Como você vê esta situação quando pensa em seus filhos?
Trabalhadora de Sarandi na agência bancária, 41 anos:
R: A situação hoje já está meio complicada, muito assim para frente. Se o governo não tomar outra
direção, eu acho que em parte de tributos, essa parte da tributação as coisas irão ficar muito mais
difícil, acho que cada vez vai tendo mais subemprego. Cada vez as pessoas vão tentar abrir seus
próprios negócios, tentar se estabelecer, porque, por causa também que está havendo uma
reversão, as pessoas que vieram do campo para a cidade estão voltando para o campo de novo, sei
lá, para tentar uma melhoria de vida, tentar uma sobrevivência. Para essa geração que está vindo aí
é preocupante.
Trabalhador de Paiçandu na empresa atacadista/varejista, 24 anos:
R: Eu acredito que mais para frente vai estar mais concorrido o mercado de trabalho. Eu espero
que ela (sobrinha) faça o terceiro grau, se puder até mestrado e doutorado.
Por outro lado, dois trabalhadores se mostraram otimistas. Suas crenças refletem
duas óticas: 1º) aquela que espera que o governo faça o que o povo deseja, caso contrário,
visualiza inclusive uma revolução, mesmo percebendo o Estado como sendo sempre o outro, e
a si próprio como somente um indivíduo; 2º) uma concepção pautada na razão instrumental,
onde se espera preparar o jovem de hoje, numa espécie de antecipação das novas técnicas,
para que no amanhã ele não encontre dificuldades em operacionalizá-las ou geri-las. A
entrevistada (trabalhadora de 42 anos, habitante de Sarandi) se utiliza do termo “engrenados
no mercado de trabalho”, o que denota uma alienação que respeita à preparação (capacitação)
da pessoa, transformando-a num objeto, ou melhor, “coisificando” o sujeito com potencial de
ser coletivo. Além disso, a mesma trabalhadora se utiliza do termo conscientizar no mesmo
tom de conformismo (aceitar a realidade imposta), e do termo alienar.
QUESTÃO Nº 17. Como você vê esta situação quando pensa em seus filhos?
Trabalhador Desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Eu sou otimista. Eu diria assim: numa família bem estruturada, a criança até chegar adulto, ele
vai ter um exemplo bom. Eu diria o seguinte, na minha perspectiva para o meu filho ou minha
filha é estabilizar até lá, á dar o melhor para ele, o que seria? É a educação em primeiro lugar, que
começa dentro da família.
Se esse país ficar do jeito que está, este país não vai melhorar nunca. Agora se houver mudanças.
(...) Eu acredito que pode mudar, a nação brasileira está de saco cheio destes políticos que falam
que vai mudar e não melhora. Eu acho que já deram a última chance para o Lula tentar mudar, se
ele não mudar nesse mandato, eu acredito que possa haver uma revolução.
Trabalhadora de Sarandi na indústria de confecções, 42 anos:
Eu acredito que com o estudo que se tem agora, as crianças terão empregos melhores, vai ter mais
emprego. Para eles eu acredito que vai ter um mundo melhor, mas desde que se comece a se
conscientizar agora. Começar treinar mais sedo, para que a hora que eles forem engrenados no
mercado de trabalho eles estejam mais preparados do que o pessoal que estão agora. (...) A
empresa deveria também oferecer, conscientizar, mostrar para eles que o estudo é importante, tem
várias empresas fazendo isso. Se eles começarem a estudar a educação também vai mudar.
A descrença em um futuro melhor, percebida pelas palavras dos entrevistados,
advém da história de vida de cada um, já que estes não notaram nenhuma melhora na sua
condição de vida em relação à de seus pais e, inclusive, no contexto da sua própria mobilidade
social.
199
Como exceções, uma trabalhadora de Sarandi e um trabalhador de Paiçandu
afirmaram estar em melhores condições hoje do que antes; porém apenas um senhor de
Paiçandu se sente em melhor condição de vida do que seu pai.
Nas palavras de uma senhora constata-se uma tentativa de avaliação de suas
condições em que ela não conseguiu dizer se a sua situação hoje é melhor do que a que
detinha quando da existência de seu pai; mas conseguiu exprimir oportunamente que, na sua
infância e juventude, morava no sítio, onde, “plantava, colhia e comia bem”. Com o
falecimento de seu pai, sua família encontrou muitas dificuldades. A partir de então, sua vida
tomou o caminho do espaço urbano.
Em uma pequena cidade, esta trabalhadora de 48 anos chegou a exercer a
profissão de professora, no ensino fundamental, a qual proporcionava uma remuneração muito
aquém de suas necessidades, o que a fez buscar uma cidade maior, com mais oportunidades
de emprego. Foi em Maringá que conseguiu viabilizar sua vida, após ter passado num
concurso público para zeladora da universidade; porém teve de recorrer a Paiçandu para se
inserir neste espaço urbano, pois foi onde conseguiu comprar uma casa.
QUESTÃO Nº 18. Hoje você está em melhores condições financeiras do que o seu pai?
QUESTÃO Nº 19. Na evolução de sua vida houve mudanças em sua posição social?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 53 anos:
R: Mais ou menos igual, porque ele tinha uma casa e eu tenho uma casa.
Não mudou a minha posição social, eu sempre fui muito humilde e continuo assim.
Trabalhadora desempregada de Paiçandu, 31 anos:
R: Financeira não. Porque você trabalha para o sustento mesmo, para aquelas continhas básicas.
Trabalhadora de Paiçandu na universidade, 48 anos:
R: Sim. Ah, não sei. Sim e não sei porque quando a gente morava no sítio, época do meu pai, a
gente vivia até bem, razoavelmente bem, a gente plantava, colhia, comia bem. Mas depois ele
faleceu, daí as coisas ficou preta, bem preta, porque nós não tínhamos ele para sobreviver, tivemos
que sobreviver sozinhos, foi a mãe, foi a mãe e o pai dos filhos. Como a gente passou por todas
essas dificuldades, estamos melhor agora. Minha mãe é aposentada, tem o salário dela, eu tenho o
meu salário que não é essas coisas, mas dá para viver, né.
R: Sim, melhorou a condição de vida sim, porque eu tenho um salário mais razoável. Então
melhorou sim, bastante. Se você for analisar pela profissão, quando eu era professora eu tinha um
nome, hoje eu sou zeladora, eu tenho outro nome. Porque, zeladora não tem valor. O aluno quer
chegar na escola e a escola tem de estar limpa, o professor vai chegar na escola e a escola tem de
estar limpa, só que ele não sabe que foi a zeladora que limpou, tanto faz para ele, a zeladora como
nada é igual. E se você é professor você tem um nome, você ganha inferior, mas você tem um
nome, então como salário melhorou, mas como posição social piorou.
Já o trabalhador de Paiçandu, de 51 anos, percebe uma melhora da sua condição
de vida em relação à de seu pai e no contexto da sua própria mobilidade social (ascensão
social). Este homem se apresenta satisfeito, valorizando suas conquistas em meio às
dificuldades.
200
QUESTÃO Nº 18. Hoje você está em melhores condições financeiras do que o seu pai?
QUESTÃO Nº 19. Na evolução de sua vida houve mudanças em sua posição social?
Trabalhadora de Paiçandu na indústria de alimentos, 51 anos:
R: Estou melhor, “viche”. Bem melhor, graças a Deus.
Graças a Deus, eu tenho as minhas coisinhas, e dá para mim viver, graças a Deus, o meu
empreguinho. Tudo bem, venho remando, né. Não tenho o que reclamar não.
Por mais que as dificuldades se generalizam, como se pode verificar nos
depoimentos auferidos pelas entrevistas, a ideologia expressa pela ausência de um
posicionamento crítico, pautado num comportamento social manipulado por uma cultura de
massa, leva alguns a não perceberem o desrespeito da sociedade para com a condição
humana, evidente nas suas próprias percepções quanto a se sentir respeitado.
QUESTÃO Nº 20. Na evolução de sua vida você se sente mais ou menos respeitado?,Por quê?
Trabalhadora de Paiçandu na indústria de alimentos, 51 anos:
R: Por que eu sou uma pessoa que sei respeitar os outros, trabalho tudo certinho, não faço nada de
errado, o que manda eu fazer eu faço, não sou dono de firma ,sou empregado, é isso aí. Sinto-me
mais respeitado.
Como evidencia a declaração supra, devido às dificuldades e à valorização das
conquistas pautadas na razão instrumental, o indivíduo acaba percebendo e conseqüentemente
aceitando a sua condição de instrumento. Ele se apega às conquistas auferidas, o que denota o
domínio do capital sobre a rebeldia consciente do trabalhador, instaurando um estado de
alienação e crença na existência de um respeito à condição humana. Cabe fazer uma ressalva:
o mencionado trabalhador respondeu às questões na sala do encarregado de recursos
humanos, na sua presença.
Por outro lado, a maior parte consegue perceber o desrespeito, consegue
interpretar a aplicação da razão instrumental, o domínio do capital sobre o trabalho(ador)
decorrente da rendição do trabalhador consciente.
Como observou um desempregado de Paiçandu, o desrespeito vai da exploração
nas relações organizacionais até aos direitos não assegurados pelas relações de trabalho,
como, por exemplo, o descaso em relação ao contrato formal com registro em carteira.
Quando o trabalhador é contestado impera a ameaça e a coação.
Outra interpretação que retrata uma percepção da falta de respeito se revela em
relação às instâncias de governo, no que tange aos serviços precários de saúde e educação. No
entanto, de acordo com o depoimento de uma trabalhadora de Paiçandu (48 anos), o
desrespeito está no tratamento diferenciado que as pessoas recebem conforme a profissão que
têm. Em seu caso, enquanto era professora se sentia mais respeitada do que hoje como
zeladora.
201
QUESTÃO Nº 20. Na evolução de sua vida você se sente mais ou menos respeitado? Por quê?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 37 anos:
R: Olha, eu acho que em termos de firma a gente se sente menos respeitado. Naquele tempo se
tinha mais respeito, as firmas respeitavam a gente melhor. Hoje o desrespeito na rua está grande
demais. Você fala alguma coisa na firma, tem cinco ou seis que montam em cima de você. Eu
estava trabalhando numa firma sem registrar, nós estávamos numas 15 pessoas, tudo trabalhando
sem registrar. Se você fala alguma coisa os outros mesmo fala na hora: “ então sai e vai embora” .
Então hoje é difícil, aquela união não tem.
Trabalhadora desempregada de Paiçandu, 31 anos:
R: Frente o governo, acho que não. O governo está deixando o povão muito de lado. Deveria
investir mais, porque está realmente precário.
É área de saúde, da educação. É um desrespeito muito grande frente às pessoas.
Trabalhadora de Paiçandu na universidade, 48 anos:
R: Se você tem um cargo bom você é mais respeitado, se você tem um cargo inferior você é menos
respeitado.
Pautada na contradição trabalho x capital, a mobilidade centrada no trabalho fez
instaurar-se uma sociedade que valoriza aqueles que ocupam o topo da hierarquia. Suscita em
todos o desejo de conquistar postos de prestígio, mesmo que esses postos não tenham
nenhum outro significado que respeite à condição humana e principalmente a sua própria
ideologia. O que norteia essa luta ainda é o capital. Quem sabe um dia possa ser a
humanidade, a comunidade.
Quando, não obstante, os entrevistados foram questionados quanto ao que é
importante para se vencer na vida e ter qualidade de vida, a questão do trabalho, no que se
refere à renda auferida, direta ou indiretamente aparece nas palavras de todos.
As pessoas se referem também à dedicação (ao trabalho e aos estudos), à
criatividade (o que denota uma pessoa mais flexível, polivalente e empreendedora) e a buscar
o trabalho onde existirem oportunidades (mobilidade geográfica). Para os mais pobres, um
mísero salário já gera contentamento, desde que seja maior do que o atual ou melhor do que o
nada.
Por outro lado, a família foi muito lembrada nas respostas quanto à qualidade de
vida, além de apego a Deus e à fé. A esperança está sempre presente, mesmo nas palavras
daqueles menos otimistas.
Infelizmente, se constata no ideário dos trabalhadores, empregados ou não, a
relação de qualidade de vida com a aquisição de bens e de momentos conquistados por meio
da relação de troca. É evidente que, para as pessoas que se encontram em estado de maior
pauperismo, a necessidade das condições básicas as instiga a pensar primeiro em casa,
comida, ou seja, num mínimo conforto domiciliar. Grande parte das respostas se limita ao
lócus familiar. Entretanto, não foi identificado um pensar coletivo. Além do mais, o desejo se
202
expressa pela conquista da passividade social, no momento em que o indivíduo conquista a
condição de poder viver financeiramente bem. Ele se esquece de que o aparente “viver-bem
não se esgota na sua redoma e, quando alguns o conquistam, outros se pauperizam.
Não obstante, a “boa vida”, um bom emprego, são muitas vezes sustentados por
crises emocionais e tensões profissionais relacionadas às cobranças e opressão vivenciadas
no ambiente de trabalho. Tudo pelo capital e pela ilusão de uma vida romântica americana.
QUESTÃO Nº 21. O que é importante para uma pessoa vencer na vida?
QUESTAO Nº 22. O que é preciso para se ter qualidade de vida?
Trabalhador desempregado Sarandi, 32 anos:
R: Vencer na vida? Tem que estudar muito. Acho que está envolvido o estudo também, e força de
vontade e fé, e nunca desistir de seu objetivo.
Qualidade de vida? Primeiramente ...., uma moradia, um emprego digno, decente, né.
Trabalhador desempregado de Sarandi, 31 anos:
R: Para vencer na vida, as pessoas em todos os âmbitos têm de estar bem. O que seria vencer na
vida. No meu vencer na vida seria: questão 1º: familiar; questão 2º: a renda; questão 3º: adquirir
bens.
Ter qualidade de vida é ter saúde. Agora qualidade de vida seria receber um bom salário, é ter as
coisas que você deseja, ter o que você quer ou, digamos assim, uma boa vida, um lazer para a sua
família. Por exemplo, você trabalha de segunda a sexta num horário de 44 horas ou 40 horas
semanais; daí chega no sábado, domingo ou no feriado você ter um descanso, você poder curtir a
sua família, curtir seus filhos, você sair para tomar um sorvete, sair para poder ir num cinema, sair
para uma festa. Agora hoje, como é que você vai fazer tudo isso se você não tem um salário?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 37 anos:
R: Tem que trabalhar, né. Tem que batalhar na vida... tem que correr. Não dá certo aqui tem que
partir para outra cidade, lugar ... fazenda. Eu não sei não se esse ano eu não vou até embora daqui,
voltar para o Mato Grosso de volta.
R: Um emprego bom, né, um empreguinho fixo, um empreguinho de 400, 500 contos por mês já
se endireitava a vida da gente bem, não precisava mais do que isso não. Isso é uma coisa que não
tem aqui, né ... é bem difícil , se tem 200, 300 contos, tem de fazer milagre com ele.
Trabalhador de Sarandi na empresa de transporte, 42 anos:
R: Eu acho que é dedicação ao trabalho, é procurar fazer as coisas bem feitinha, existir da tua parte
colaboração com os demais companheiros de trabalho, e procurar aprender as coisas, né? Ser
curioso é bom, ajuda muito.
R: Eu acho que hoje você tem que ter um bom emprego, em primeiro lugar, você tem que ter
moradia própria, você tem que ter um meio de locomoção próprio, e viver bem com a família. Se
você não ganha o suficiente para você manter a sua família eu acho que nada dá certo, né. A
situação financeira é muito importante.
Trabalhadora de Paiçandu na cooperativa agroindustrial, 36 anos:
R: Eu acho que ela tem que ter muita força de vontade
.
R: A gente tem que ter um emprego, um bom salário, eu acho que amizade também.
A precariedade é tanta que um baixo salário se apresenta desejado, conforme se
constata no depoimento do trabalhador desempregado de Paiçandu. Para ele, quatrocentos ou
quinhentos reais já estaria bom, “já endireitava a vida”. Como em Paiçandu ou em Maringá
não se consegue esse salário, ele cogita em voltar para Mato Grosso.
Por outro lado, cabe evidenciar as palavras da trabalhadora de Paiçandu (48 anos)
no momento em que ela indaga se com um salário de R$ 474,00 (maior do que o auferido
203
como alfabetizadora numa pequena cidade do interior do Paraná) pode-se ter qualidade de
vida.
Com efeito, se seu salário não lhe permite acesso a diversão num barzinho mais
requintado, à aquisição de um pacote turístico ou a uma bela e confortável residência, sua
revolta está na precariedade da sua condição de vida decorrente da escassez de renda.
QUESTÃO Nº 21. O que é importante para uma pessoa vencer na vida?
QUESTAO Nº 22. O que é preciso para se ter qualidade de vida?
Trabalhadora de Paiçandu na universidade, 48 anos:
R: Estudar e ser alguém. Se você é só uma zeladora, eu valorizo, muitos não valorizam. Se eu sou
um auxiliar administrativo, eu sou alguém, eu sou reconhecida; agora se eu sou zeladora, eu não
sou reconhecida.
Aí sinceramente eu não sei, ...Para começar um bom salário, O salário da universidade... aqui eu
tenho dezoito anos que eu trabalho aqui, eu estou com um salário de 474 reais. Isso é qualidade de
vida? Você acha que com 474 reais dá para mim sobreviver com uma qualidade de vida? Não dá,
né? Para você ter qualidade de vida você tem de ter um salário decente, porque senão você não
pode sair, você não pode gastar, você tem que gastar o mínimo possível, porque,senão não vai nem
sobreviver.
A desilusão leva muitos ao desabafo, como se constata nas entrevistas de dois
desempregados de Paiçandu.
A primeira cobra uma maior atenção do governo, reforçando aquilo que já foi
pontuado, no que se refere ao indivíduo não se perceber como agente político, fazendo parte
do Estado, da democracia conquistada. Essa visão faz com que a pessoa se coloque como
expectadora do movimento histórico e atue de maneira pacífica, porém como um reclamante.
Já o segundo, não fugindo a este comportamento e acreditando no veículo de
comunicação que estava a sua frente, ou seja, a produção deste próprio trabalho, pediu aos
congressistas e ao Presidente mais atenção para com o povo, principalmente aos mais idosos,
categoria em que acaba se enquadrando. Seu apelo teve um tom dramático, carregado de
emoção, e se expressa de uma forma comovente quando exclama que “o idoso também come
e bebe”! Essa situação é percebida pelo trabalhador que se encontre desempregado como uma
conseqüência das políticas (centradas no trabalho) que sustentam a desigualdade no lócus
urbano, ou melhor, entre Paiçandu e Maringá. Neste contexto, ele contesta a ilusão incutida
no imaginário do trabalhador que migrou para o meio urbano, mas hoje se encontra na
periferia à espera de um emprego.
QUESTÃO Nº 21. O que é importante para uma pessoa vencer na vida?
QUESTAO Nº 22. O que é preciso para se ter qualidade de vida?
Trabalhador desempregado de Paiçandu, 54 anos:
R: Você veja bem que quase não existe respeito, não existe consideração um pelo outro, cada um
quer se aparecer melhor. Então eu acho que enquanto continuar este tipo de coisa tá se
204
dificultando;então se nós obedecer, eu colaborar com você, comigo, eu com um outro, com o meu
vizinho, eu acho que melhora.
Para se ter qualidade de vida é o amor de Deus, o amor a Deus e o amor ao próximo.
Eu gostaria de pedir aos nossos congressistas, senadores e deputados, ao nosso presidente Lula,
que prometeu, que eles olhem mais pelo pessoal, pelo povo já idoso igual eu, tão difícil para
arranjar um emprego na idade que eu estou, um serviço registrado. Então eles devem de saber que
a pessoa idosa também come e bebe, tem despesa! O menor não arruma o serviço porque é menor,
o velho não arruma porque é velho. E daí, como é que fica, eu pergunto para você, como que fica,
o que vai fazer com os velhos, com as pessoas idosas?
Então você veja bem, a maioria, né, não vou dizer só de Paiçandu, mas a maioria do pessoal de
Paiçandu trabalha em Maringá, né. Meu Deus do Céu, por,que que não procuram um meio de
gerar emprego, só procuram meio, como se diz (?), de fazer uma fantasia na nossa frente, querendo
cobrir o sol com a peneira. Eu acho que não deveria ser assim, eu acho que o pessoal deve “tirar”
(colocar) o pé do (no) chão, né?
Conquanto o termo participação na gestão pública em nenhum momento tenha
sido mencionado - o que denota que o indivíduo não se percebe como sujeito coletivo e
agente político e atuante nas decisões públicas - estes trabalhadores estão cobertos de razão
quando cobram do governo. Estes, que são seus representantes, no mínimo deveriam defender
a reparação das conseqüências sofridas por estes espoliados. Eles acreditaram ou foram
envolvidos na proposta de um desenvolvimento que nunca foi alcançado com igualdade, por
ter se pautado na exploração do capital sobre o trabalho, levando o trabalhador a habitar a
periferia do espaço urbano e social.
Com efeito, o aglomerado urbano de Maringá revela uma periferia externa à
cidade-pólo habitada por pessoas descomprometidas com esse espaço, que em grande parte
mora ali por falta de opção, pela prática de exclusão territorial, que ocorre, principalmente, no
momento da aquisição da casa própria em um município da periferia. Essa unidade urbana
apresenta diversidade de condições de vida; no entanto, acomoda muitos que não têm o
mínimo de condições para viabilizar sua própria vida.
205
206
207
A cidade-pólo, por meio do mercado de trabalho, dificulta a inserção do
trabalhador espoliado nesse espaço desigual. A periferia se apresenta como o indesejável que
em algum lugar acaba se produzindo, mesmo que distante do espaço segregado, do lócus
dinâmico da aglomeração urbana, onde se acumula o capital.
Embora possa existir segregação do espaço urbano, coexistem na totalidade
urbana espaços desiguais, seja numa única cidade seja mesmo num aglomerado. A hierarquia
social se projeta para uma hierarquia intra ou interurbana, constituída pela riqueza e pelo
pauperismo, a qual decorre da luta de classes, que, por mais que assim os indivíduos não a
percebam, é uma legítima luta entre a classe opressora e a classe oprimida pelo capital. A
primeira luta para garantir o poder; para a segunda, por sobreviver, bem ou precariamente.
O aglomerado urbano de Maringá é mais um lócus em que este comportamento,
que retrata um movimento pautado na contradição capital x trabalho, territorializa a
espoliação urbana, o processo de periferização. Ao mesmo tempo gera riquezas,
modernidades e facilidades, proporcionadas pelo próprio esforço e criatividade humana. O
desenvolvimento desigual e combinado, fundado na contradição capital x trabalho, além de
ser a expressão de um estado de alienação quanto aos meios utilizados para se construir a
cidade, a tecnologia, o conforto, traz também o desconforto da segregação, da exclusão
territorial, do estado de scriao do trabalh( queo e)Tj98.2 0 TD0.047 Tw[ capitais mo SPÓSITO,e
208
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Compreender o processo de periferização por meio da mobilidade centrada no
trabalho no aglomerado urbano de Maringá foi se deparar com a história e o movimento que
retratam o florescer deste espaço, a constituição de um ambiente urbano desigual, que se
constitui de uma hierarquia social entre as cidades, entre os incluídos e os incluídos de forma
perversa, fruto da concentração do capital em Maringá e dos trabalhadores (empregados e
desempregados) espoliados em Paiçandu e Sarandi (periferia externa), o que configura uma
desorganização das cidades.
Deste modo, esta abordagem teve o propósito de introduzir dois posicionamentos
que passaram a sustentar a dissertação: 1) a periferia se generaliza no âmbito social
(representa estar na margem do espaço urbano ou à margem da sociedade); 2) considera-se
como pólo o conjunto de equipamentos que exercem centralidades da principal cidade (de
uma determinada região), o qual abarca outros menos expressivos (de outras cidades).
No intuito de compreender a dinâmica regional (aglomeração urbana), partiu-se
para um resgate da economia política marxista, ao se trabalhar com o conceito e compreensão
da mobilidade centrada no trabalho, além de se contextualizar a mobilidade física e a
mobilidade social. Esta abordagem contribuiu para fundamentar a análise pautada na
contradição trabalho x capital.
Posteriormente a esta elucidação, viu-se como oportuno e complementar analisar a
mobilidade centrada no trabalho vivenciada no Brasil. O objetivo foi perceber as mazelas e
desigualdades produzidas pelo desenvolvimento desigual e combinado pautado na razão
instrumental. Como se viu, essa razão instrumental decorreu, a princípio, de políticas de
modernização conservadora, voltadas para a industrialização do país, mas perdura na
atualidade com os novos modos de produção e configuração do trabalho, os quais provocaram
novos fluxos migratórios, tendo as cidades médias (principalmente as cidades metropolitanas)
como as grandes receptoras.
Neste contexto, é perceptível a desigualdade apresentada pela aglomeração
urbana de Maringá, na medida em que a cidade-pólo se revela detentora da segunda maior
renda média dentre os municípios das regiões metropolitanas do Sul do Brasil polarizadas por
cidades médias, enquanto sua região metropolitana apresenta a renda mais baixa entre as 8
RM’s enfocadas. Dentre os municípios que integram a RM de Maringá, Paiçandu e Sarandi
são os detentores das menores rendas.
209
A desigualdade se revelou no momento da análise do objeto (aglomerado urbano
de Maringá), quando se trabalhou com dados secundários para medir o crescimento
populacional dos municípios, índice de exclusão social e outros que compõem o IDH. Ficou
evidente o estado de pauperização da periferia externa à Maringá, constituída das cidades de
Sarandi e Paiçandu. Em ambas se verificou melhora de todos os índices, ao passo que suas
taxas de crescimento populacional se apresentaram decrescentes, embora se tenham mantido
muito acima das da cidade-pólo e de outras circunvizinhas.
No cumprimento da pesquisa de campo, com a realização de entrevistas
semidiretivas com trabalhadores de Paiçandu e Sarandi (empregados e desempregados) e com
as empresas de Maringá, as respostas colhidas reafirmaram o cenário delineado com a análise
dos dados secundários.
Com relação às empresas, constatou-se que prevalece a busca pela maior
produtividade e a exigência de uma maior capacitação dos trabalhadores, o que é notório para
a sociedade. Apesar disso, em sua maioria, elas estão contratando mais do que demitindo, por
se encontrarem num momento de expansão. Deste modo, os funcionários que deixam um
determinado setor em decorrência da inserção de tecnologias são realocados em outros.
Apesar de os relatos terem evidenciado um saldo positivo no tocante à
empregabilidade, os salários somente são corrigidos quando os trabalhadores passam a
exercer novas funções e assumir mais responsabilidades.
Deparou-se com um fator agravante, o qual se expressa pela gestão do ensino
oferecido por algumas empresas. Estas oferecem cursos de ensino fundamental e médio na
própria sede, como uma condição para assegurar o emprego dos funcionários, exigindo destes
sua freqüência em horários em que não estão trabalhando.
Com efeito, tais exigências se referem à busca pela qualificação dos funcionários,
pois os programas que as empresas desenvolvem se destinam a garantir o certificado de
qualidade total.
Apesar de existir uma ação organizacional preocupada com a qualidade, esta está
voltada à sustentação do capital, porém pouco envolvida e comprometida com a condição
humana. Disso resulta a precarização do trabalho, em que o capital espolia o trabalhador, por
remunerá-lo mal, adestrá-lo, percebê-lo como um recurso. Impera a razão instrumental no
ambiente empresarial, que busca a especialização na utilização das técnicas, embora seu
discurso dissemine a visão do todo. O trabalhador que opera a máquina ou exerce funções
delimitadas perde a referência de si próprio, obrigando-se a se comportar conforme a empresa
dita ou prega, a se submeter a um modelo missionário de gestão. O trabalhador, embora se
210
encontre com maior grau de escolaridade, concomitantemente se revela ainda mais alienado e
submisso à condição imposta pelas empresas.
As empresas acabam agindo e se conduzindo de maneira pouco responsável, por
mais que prestem assistência. Apesar de se envolverem em campanhas de alimentos ou de
agasalho, ou de oportunamente oferecerem serviços como assistência psicológica ou cursos
para os próprios funcionários, precarizam a condição de vida do trabalhador, por sempre se
apropriarem mais de sua força de trabalho, aliená-lo e remunerá-lo muito mal.
A submissão é tamanha, que se apresenta como uma mobilidade forçada,
identificada pela quantidade de pessoas de cidades circunvizinhas que demandam a cidade-
pólo em busca de emprego. A participação de currículos de trabalhadores desempregados das
cidades de Paiçandu e Sarandi nas empresas pesquisadas que se situam em Maringá chega a
40% e 50%, o que evidencia uma forte dinâmica entre o pólo e a periferia, no que se refere à
tentativa de inclusão daqueles que se encontram na margem do espaço urbano e à margem da
sociedade. Entretanto, a participação dos trabalhadores vindos da região (principalmente de
Sarandi e Paiçandu) para trabalhar em Maringá é inferior à quantidade que busca se inserir.
Não se verificou o propósito de atuação na sociedade em prol da dignidade
humana; pelo contrário, o capital encontra espaço para se reproduzir vendendo mercadoria
para a periferia e ao mesmo tempo constituindo os espaços periféricos. Isso se verifica quando
as incorporadoras loteiam espaços barateados com o respaldo da flexibilidade da legislação
urbana, assegurada pela esfera pública. A sociedade se reproduz de forma desigual, no
entanto, a atuação é de todos.
Apesar disso, não foi essa a percepção constatada nos relatos das entrevistas com
trabalhadores, mas sim, uma visão individualista, tanto no âmbito da cobrança relativa às
211
percebem participantes de um movimento conduzido por uma gestão da sociedade em que,
embora cada sujeito se apresente como um indivíduo e resguardado pelo espaço privado,
prevalece a interação social e o avanço na composição e elaboração de novas técnicas. Esse
quadro não leva ao desenvolvimento da concepção humana, pois o movimento, fruto desta
gestão, se sustenta por meio da espoliação, da periferização, do aumento da desigualdade.
Neste contexto, sua história de vida é esquecida. Suas origens são percebidas como um
problema causador das dificuldades encontradas hoje, no momento em que não percebem os
rompimentos instaurados docemente por promessas de uma vida melhor na cidade, no
comércio, nos serviços (entretenimentos), da indústria, etc.
Este discurso se apresenta fortalecido pela cultura de massa, a qual sustenta a
sociedade do consumo ao buscar uma homogeneização desse consumo. A cultura de massa
manipula as pessoas quanto à criação de necessidades que se transformam em desejos por
superfluidades, em detrimento da percepção de quão importante é a cultura popular, a história
do lugar e a dignidade e condição humanas. A potencial consciência de sujeito coletivo e
crítico é impedida de se disseminar pela sociedade devido ao fato do cidadão ser
erroneamente compreendido como agente do consumo, por imperar a ideologia criadora de
um desenvolvimento desigual. Deste modo, os incluídos de forma perversa se encontram
dominados pela passividade assegurada pela alienação.
Como retrato do desenvolvimento desigual e combinado, o aglomerado urbano de
Maringá se configura como uma desorganização, por não existir um objetivo comum e a
integração entre as cidades. O que prevalece é a esfera privada na gestão dos envolvidos na
dinâmica local. O cenário degradado se revelou como o pauperismo decorrente da contradição
capital x trabalho. Tal pauperismo se traduz na condição de espoliação urbana generalizada na
periferia externa, que a gestão pública, inclusive por falta de interesse e participação do
cidadão, não consegue dotar de infra-estrutura, em face do intenso crescimento populacional e
físico-territorial. Mesmo assim, a esfera pública respalda e valida a precariedade dos espaços
criados, por estes representarem a condição de acesso do trabalhador à cidade. Por sua vez, as
respostas dos trabalhadores retratam esta condição. Eles buscaram Paiçandu e Sarandi, em
grande parte, por terem conseguido viabilizar a casa própria nestas cidades. Nelas é menor o
custo moradia em relação a Maringá, onde prevalece uma legislação urbana mais exigente.
Neste contexto, de acordo com os trabalhadores, o trabalho e a moradia se
revelaram como os dois principais fatores de uma boa qualidade de vida.
Com efeito, sabe-se que a cidade, como um espaço coletivo, deve se constituir
como uma unidade, porém, repleta de contradições e de conflitos pautados no exercício de
212
uma efetiva participação de todos na política e na gestão, para o alcance do êxito da
democracia. Deste modo, a transformação das cidades que se encontram no aglomerado
urbano de Maringá, depende de uma gestão metropolitana efetivamente integrada, com o
propósito de combater a periferia como sinônimo de pobreza, no exercer a consciência
coletiva em respeito à condição humana.
É fundamental acreditar na construção de uma sociedade e de uma cidade melhor,
numa aglomeração urbana menos desigual. Enfim, acreditar que é possível conquistar a
participação efetiva no âmbito da gestão metropolitana democrática, no intuito de lutar contra
o processo de periferização.
A humanidade vale mais do que o
capital. Precisamos acreditar
nisso.
213
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Anexo nº 01. Modelo do questionário
ENTREVISTAS COM AS EMPRESAS (INDÚSTRIAS, COMÉRCIO, SERVIÇOS) DA CIDADE DE
MARINGÁ
QUESTÃO Nº 1. Aumentou o número de funcionários na empresa, no decorrer da última década? Devido a quê?
QUESTÃO Nº 2. Houve aumento de produtividade? Devido a quê?
QUESTÃO Nº 3. Houve inserção de tecnologias? Com isso não se estão reduzindo os postos de trabalho?
QUESTÃO Nº 4. Houve alteração no nível de escolaridade dos funcionários da empresa? Isso se deveu a uma
exigência ou intervenção da empresa?
QUESTÃO Nº 5. A empresa oferta cursos de requalificação profissional ou treinamentos?
QUESTÃO Nº 6. Existe escassez de mão-de-obra qualificada no mercado de trabalho da região? Para qual
função ou tarefa?
QUESTÃO Nº 7. A média salarial na empresa tem aumentado?
QUESTÃO Nº 8. Aumentou a utilização de serviços terceirizados?
QUESTÃO Nº 9. A empresa assume a responsabilidade social?
QUESTÃO Nº 10. É significativa a procura de emprego por moradores de Sarandi e Paiçandu? Existem na
empresa trabalhadores de Sarandi ou de Paiçandu?
ENTREVISTAS COM OS TRABALHADORES (EMPREGADOS E DESEMPREGADOS) DE
SARANDI E PAIÇANDU
QUESTÃO Nº 1. Onde você nasceu?
QUESTÃO Nº 2. Qual foi o seu itinerário até chegar aqui na cidade?
QUESTÃO Nº 3. Qual o motivo das mudanças de cidade?
QUESTÃO Nº 4. Porque o Sr. ou a Sra. optou por esta cidade?
QUESTÃO Nº 5. O S.r ou a Sra. gostaria de voltar para seu lugar de origem?
QUESTÃO Nº 6. Qual o tipo de transporte que você utiliza para ir e voltar do trabalho?
QUESTÃO Nº 7. Desde que está na cidade, as condições de deslocamento melhoraram ou pioraram? Por quê?
QUESTÃO Nº 8. Há quanto tempo o Sr. Ou a Sra. trabalha?
QUESTÃO Nº 9. Em que atividades o Sr. Ou a Sra. já trabalhou?
QUESTÃO Nº10. Qual é o seu grau de instrução?
QUESTÃO Nº 11. Os estudos influenciaram na melhoria de seu emprego?
QUESTÃO Nº 12. Nos locais onde o Sr. ou a Sra. trabalhou foi dada a possibilidade de fazer cursos ou estágios?
QUESTÃO Nº 13. Se sim, esta qualificação contribuiu para uma melhoria de sua remuneração?
QUESTÃO Nº 14. Esta qualificação facilitou quando da mudança de emprego?
QUESTÃO Nº 15. A que o Sr. ou a Sra. atribui o desemprego?
QUESTÃO Nº 16. O que deveria ser feito para se reverter esta situação?
QUESTÃO Nº 17. Como você vê esta situação quando pensa em seus filhos?
QUESTÃO Nº 18. Hoje você está em melhores condições financeiras do que o seu pai?
QUESTÃO Nº 19. Na evolução de sua vida houve mudanças em sua posição social?
QUESTÃO Nº 20. Na evolução de sua vida você se sente mais ou menos respeitado?,Por quê?
QUESTÃO Nº 21. O que é importante para uma pessoa vencer na vida?
QUESTAO Nº 22. O que é preciso para se ter qualidade de vida?
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