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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
A Origem das Células de Defesa (hemócitos) em
Biomphalaria glabrata (Say, 1818)
SAMALY DOS SANTOS SOUZA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE CIËNCIAS DA SAÛDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM IMUNOLOGIA
Salvador Bahia Brasil
2006
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
INSTITUTO DE CIËNCIAS DA SAÛDE
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
CENTRO DE PESQUISAS GONÇALO MONIZ
Curso de Pós-Graduação em Imunologia
A Origem das Células de Defesa (hemócitos) em
Biomphalaria glabrata (Say, 1818)
SAMALY DOS SANTOS SOUZA
Orientador: Zilton de Araújo Andrade
Dissertação apresentada para
Obtenção do Grau de Mestre em
Imunologia.
Salvador - Bahia Brasil
2006
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Ficha Catalográfica elaborada pela
Biblioteca do CPqGM/FIOCRUZ - Salvador - Bahia.
Souza, Samaly Santos
S719e Estudo da origem das células de defesa (hemôcitos) em Biomphalaria
glabrata, cepa Feira de Santana, quando infectada pelo Schistosoma
mansoni [manuscrito] / por Samaly dos Santos Souza. 2006.
90 p.: il.
Datilografado (fotocópia)
Dissertação (Mestrado em Imunologia) Universidade
Federal da Bahia. Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz,
2006.
Orientador: Prof. Dr. Zilton de Araújo Andrade. Laboratório
de Patologia Experimental.
1. APO. 2. Hemöcitos. 3. S. mansoni. 4. B. glabrata. 5. Bahia
I. Título.
CDU: 616.995.122 (813.8)
A Origem das Células de Defesa (hemócitos) em
Biomphalaria glabrata (Say, 1818)
SAMALY DOS SANTOS SOUZA
Dissertação apresentada para obtenção do grau de mestre Salvador, 07
de Abril de 2006
Banca Examinadora
Membros Titulares:
_____________________________________
Dr. Zilton de Araújo Andrade (Professor Orientador)
Pesquisador Titular CPqGM FIOCRUZ
__________________________________
Membro 1
Prof. Dr. Paulo Marcos Zeck Coelho
_________________________________
Membro 2
Profa. Dra. Rita de Cássia Farani Assis
Membro Suplente:
___________________________________
Membro 3
Profa. Dra. Marlene Peso Campos de Aguiar
“É a combinação da vida a transformação lenta e serena do
progresso que faz da ciência tão fascinante e essencial”.
Michael Joseth.
Aos meus amados pais, Benedito & Lúcia, pelo apoio amigo e
exemplo de humildade e perseverança.
Meus eternos agradecimentos.
Aos meus queridos irmãos, Jônatas e Leandra, pelo apoio e
incentivo.
Amo muito vocês!
Ao Professor Dr. Zilton de Araújo Andrade pela orientação
esclarecedora e amiga, pelo seu bom humor de mestre, humildade
em transmitir seus conhecimentos e pela confiança a mim
depositada.
Agradecimentos
Ao Dr. Lobato Paraence. “Papa da Malacologia” por me ensinar as técnicas de
dissecção de caramujos do gênero Biomphalaria e pelo exemplo de lucidez e
profissionalismo. A Dra. Lígia Paraence pelo bom convívio e carinho demonstrado a
todo instante quando estagiei em seu Departamento de Malacologia- IOC/RJ.
A Dra. Silvana Carvalho Thiengo, Dra. Mônica Ammon Fernandez e toda sua
equipe (Eloísa, Aline, Fernanda, Márcio, André e Eduardo) pela humildade, incentivo
á pesquisa, orientações morfológicas, exemplo de profissionalismo, carinho e convívio
amigo.
Ao Dr. Paulo Marcos Zech Coelho e Dr. Omar dos Santos Carvalho e pela
colaboração em ceder alguns exemplares de Biomphalaria glabrata albinos.
A Dra. Tânia Correia pelo incentivo à pesquisa, profissionalismo e colaboração
nos trabalhos de Imuno-histoquímica. Linda e cheia de vida!
A Dra. Acácia por me receber com todo carinho em seu laboratório e
contribuição nas análises de imuno-histoquímica.
A Dra. Lúcia Menezes e ao Mestre Cláudio, pelo profissionalismo, apoio
constante nas análises de microscopia eletrônica, amizade conquistada e carinho
demonstrado a todo instante.
Ao Dr. Marcos André Vannier por me permitir fazer as análises ultra-estruturais
em seu laboratório e sua equipe, pelo bom humor freqüente, convívio amigo e carinho
demonstrado.
Aos professores do curso de Pós-graduação em Imunologia do ICS-UFBA,
que contribuíram para o aprendizado teórico/prático das disciplinas e para o
desenvolvimento do senso crítico inerente à pesquisa.
A secretária do colegiado, Dilcéia, mais do que uma excelente funcionária,
uma amiga, sempre disposta a minimizar e resolver qualquer problema relacionado
aos alunos, meus inestimáveis agradecimentos.
A CAPES- Instituição financiadora deste projeto, que possibilitou a conquista de
mais um sonho.
A Dra. Cláudia Maria da Cunha Borges, pela experiência em malacologia e
sobretudo seu espírito crítico.
A Cristina Mota, pelo carinho e exaustiva colaboração na preparação do
material histológico, excelência em dedicação e profissionalismo e a todos os
integrantes do Laboratório de Histopatologia.
As minhas amigas, Queli Teixeira Lemos, Isis Fernandes Magalhães, Márcia
Maria de Souza, pelo exemplo de ética, profissionalismo e carinho inestimáveis
demonstrado a todo instante.
Aos meus companheiros Glabrata (Carine, Rafael, Manuela (s), Igor), pelo bom
convívio e amizade.
A mestra Tininha pelo bom humor, amizade e orientação nas questões de
imuno-histoquímicas, bem como por toda atenção nos momentos necessários.
A Dra. Alena Andrade pelas instruções esclarecedoras nas análises de
microscopia eletrônica e carinho demonstrado a todo instante.
Aos meus amigos (Joaquim, Liliane, Zaira, Bárbara e Elisângela) pelo carinho,
troca de experiências e convívio constante.
Ao Sr. Antônio Carlos da Silva pelo convívio amigo, colaboração em todos os
momentos de sufoco, respeito, consideração e auxílio na manutenção dos moluscos e
ciclo, durante o desenvolvimento desse estudo. O senhor é muito especial!
Às Bibliotecárias, Ana Fiscina, Vânia, D. Edite, Eliana, Adelvan, Evany,
Rosângela e Renata; pelos auxílios nas correções bibliográficas e pela paciência em
nos atender sempre com disposição.
Ao Centro de Pesquisas Gonçalo Muniz, UFBA-ICS e CAPES, por financiar
parte do material para realização deste trabalho, toda a infra-estrutura, bem como
pelo suporte financeiro através da bolsa de mestrado cedida durante os dois anos e
por tornar possível a realização de um sonho.
A todos os colegas do LAPEX e LACEI - Laboratório de Patologia
Experimental e Laboratório de auto-imunidade/CPqGM, pelo apoio e incentivo durante
a Pós-Graduação.
Aos colegas da turma do Mestrado de 2004 do ICS/UFBA, por todos os
momentos de aprendizagem e distrações durante o curso.
A Sra. Telma, Elaine, Elenir David e Joilson Ramos, exemplo de humildade,
generosidade e vencedores. Amigos para as questões políticas, sociais, culturais e
religiosas nos últimos anos.
A todos meus eternos agradecimentos!
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS
LISTA DE FÍFURAS E GRÁFICOS
RESUMO
ABSTRACT
1 INTRODUÇÃO......................................................................19
1.1 REVISÃO DA LITERATURA.................................................20
2 JUSTIFICATIVA....................................................................25
3 OBJETIVOS..........................................................................26
3.1 OBJETIVO GERAL................................................................26
3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS..................................................26
4 MATERIAIS E MÉTODOS......................................................27
4.1 ANIMAIS UTILIZADOS...........................................................27
4.1.1 Grupos Experimentais..........................................................27
4.2 OBTENÇÃO DE INÓCULO..................................................28
4.3 INFECÇÃO DOS MOLUSCOS...........................................29
4.3.1 Exame de Positividade....................................................29
4.4 SACRIFÍCIO....................................................................30
.
4.5 CONTAGEM DOS HEMÓCITOS....................................31
4.6 ANÁLISE MORFOMÉTRICA DO APO............................32
4.7 IMUNO-HISTOQUÍMICA................................................32
4.7.1 Marcador imunológico anticorpo monoclonal contra o
antígeno Ki67..................................................................32
4.7.2 Marcador imunológico de organização nucleolar pela
Prata AgNOR..................................................................33
5 RESULTADOS...............................................................34
6 DISCUSSÃO..................................................................45
7 CONCLUSÃO................................................................51
REFEÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...........................................52
ANEXOS
LISTA DE ABREVIATURAS
AMEBÓCITOS =Hemócitos - células de defesa dos caramujos
APO Inglês (Amebocyte producing Órgão) “Órgão Produtor de Amebócitos”
AgNor Proteínas nucleolares impregnadas pela prata
CPqGM Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz
CPqRR Centro de Pesquisas René Rachou
FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz
LAPEX Laboratório de Patologia Experimental
NORs inglês (Nucleolar Organizer Regions) Região de Organização Nucleolar
Karnovisk Solução Fixadora
Ki67 Antígeno monoclonal contra proteína que não se expressa em
células na fase Go
LISTA DE FIGURAS E GRÁFICOS
Figura 1- Biomphalaria glabrata Normal
Figura 1: A Região do coração...............................................................................39
Figura 1: B APO......................................................................................................39
Figura 1: C Porção anterior do saco pericárdico com o APO ................................39
Figura 1: D Região do manto mostrando o APO...................................................39
Figuras (2, 3 & 4) Biomphalaria glabrata Infectada
Figura 2: A Coração com acúmulo de hemócitos..................................................40
Figura 2: B Maior detalhe dos hemócitos dentro do coração................................ 40
Figura 2: C Coração de um caramujo inoculado com miracídios irradiados...........40
Figura 2: D Coração com hemócitos de um exemplar normal...............................40
Figura 3: A APO......................................................................................................41
Figura 3: B Reação encapsulante próximo ao APO...............................................41
Figura 3: C Revestimento pericárdico com o APO e reações próximas.................41
Figura 3: D Maior detalhe do APO..........................................................................41
Figura 4: A Marcação com o (KI67) na região do ovoteste.....................................42
Figura 4: B Detalhe da marcação positiva com o Ki67...........................................42
Figura 4: C Células do APO marcadas - AgNOR...................................................42
Figura 4: D Hemócitos marcados - AgNOR...........................................................42
Figuras 5 (A, B, C & D) Micrografias eletrônicas do APO Normal..............................43
Gráficos- I Contagem dos hemócitos em caramujos infectados pelo S. mansoni e
seus controles não- infectados................................................................44
Gráfico- II Morfometria da extensão do APO de caramujos infectados pelo
S. mansoni e seus controles não- infectados........................................44
Gráfico- III Morfometria da espessura do APO de caramujos infectados pelo
S. mansoni e seus controles não- infectados...............................................45
RESUMO
A ORIGEM DAS CÉLULAS DE DEFESA (HEMÓCITOS) NA BIOMPHALARIA
GLABRATA. SAMALY DOS SANTOS SOUZA. As reações de defesa contra
microorganismos são realizadas nos moluscos do gênero Biomphalaria por um único tipo
de célula o hemócito ou amebócito. Estas células, fagocíticas e móveis, existem no
interior dos tecidos e circulam na hemolínfa. O seu local de origem ainda é incerto. Na
Biomphalaria glabrata, admite-se que essas células se originam em um órgão situado na
parede anterior do saco pericárdico denominado APO (“Amebocyte Producing Organ”). A
ocorrência de hiperplasia e mitoses no APO, durante a infecção pelo Schistosoma
mansoni, tem sido tomada como o principal argumento para considerá-lo um órgão
hematopoiético. O trabalho estuda a localização, forma, e comportamento do “APO” em B.
glabrata normal e após infecção pelo S.mansoni, no intuito de compreender o seu papel
nas reações de defesa. A investigação foi feita através de estudo histopatológico,
ultraestrutural e imuno-histoquímico. O APO apareceu representado por coleções de
células basófilas, com núcleos redondos, ricos em cromatina e citoplasma homogêneo,
escasso, formando grupos ou fileiras ao longo de uma estreita região da membrana
pericárdica, com raras variações entre infectados e não-infectados, e mitoses ocasionais. A
microscopia eletrônica revelou que o órgão é formado por células epiteliais justapostas,
unidas por interdigitações, e ricas em organelas. Os resultados com o anticorpo
monoclonal contra o antígeno Ki67, que revela fator de proliferação nuclear, deram forte
positividade para esporocistos e cercárias, mas não evidenciaram marcação nos tecidos e
APO. Nas preparações em que a técnica do “AgNOR” foi empregada, o resultado positivo,
revelador de atividade proliferativa nucleolar, apareceu como uma coloração castanho
dourada no interior do núcleolo das células em processo de divisão. Esta positividade
apareceu em células localizadas em vários sítios. A marcação foi expressa no APO e em
células de vários órgãos, especialmente naqueles com evidente proliferação celular, como
o ovo-testis e as glândulas digestivas, tanto em caramujos normais, como nos infectados.
Por outro lado, foram vistos acúmulos de hemócitos no interior de vários tecidos e nas
cavidades de vários órgãos, especialmente no coração, nos animais infectados. Estes
achados se correlacionaram melhor com a hipertrofia e hiperplasia das células dos
revestimentos dos espaços lacunares, do que com as escassas modificações presentes no
APO. Conclui-se que os presentes achados morfológicos apontam para uma origem
multicêntrica dos hemócitos da B. glabrata, a partir do endotélio dos espaços vasculares
(como sugerido nos estudos mais antigos).
Palavras Chaves: APO, Schistosoma mansoni, Biomphalaria glabrata, Hemócitos, Ki67.
ABSTRACT
THE ORIGIN OF THE CELLS OF DEFENSE (HEMOCYTES) IN BIOMPHALARIA
GLABRATA. SAMALY DOS SANTOS SOUZA. The defensive reactions against
micro-organisms in snails of the genus Biomphalaria are performed by a single cell type
the hemocyte or amebocyte. These cells, phagocytic and mobile, exist in the interior of
the tissues and circulate in the hemolymph. Its site of origin is still uncertain. It is
admitted that these cells in Biomphalaria glabrata originate in an organ situated in the
anterior wall of the pericardial sack denominated APO (“Amebocyte Producing Organ”).
The occurrence of hyperplasia and mitoses within the APO during infection with
Schistosoma mansoni has been taken as the main argument to consider this organ as a
hematopoietic organ. This work looks at the location, form, and behavior of the APO in
normal and S. mansoni-infected B. glabrata, aiming at understanding its role in defense
reactions. The investigation was performed by means of a histopathological,
morphometrical, ultra-structural an immuno-histochemical study. The APO appeared
represented by collections of basophilic cells with round nucleus rich in chromatin, and a
homogenous cytoplasm, forming rows alongside a narrow region of the pericardial
membrane. There were mild variations in the APO of infected snails in comparison with
non-infected controls. Presence of mitoses was not a differential feature. Electron
microscopy revealed that the organ is formed by juxtaposed epithelial cells, rich in
organelles, united by inter-digitations. Monoclonal antibody against the Ki67 antigen,
which reveals a factor of nuclear proliferation, gave a strong positivity for sporocysts and
cercarias, but failed to be expressed on snail tissues, including the APO. In the
preparations where the AgNOR technique was applied, the positive results, indicative of
nucleolar proliferative activity, appeared with a golden brown color in the interior of the
nucleolus of cells in the process of division. The marking was expressed in APO and in
cells from various organs, especially in those with clear cellular proliferation, such as the
ovotestis and digestive glands, both in normal snails and in those infected. On the other
hand, accumulation of hemocytes in the interior of various tissues and cavities of various
organs, especially the heart, were observed in the animals infected. These findings
correlate better with hypertrophy and hyperplasia of the lining cells from the lacunar
spaces, than with the scarce modifications present in the APO.
Conclusion: Hemocytes in B. glabrata seem to originate from the endothelial lining of the
vascular spaces throughout the snail body, as suggested in earlier studies rather than
from a unique central organ, the APO.
Key words : APO, Schistosoma mansoni, Biomphalaria glabrata, Hemócitos, Ki67.
INTRODUÇÃO
O molusco Biomphalaria glabrata (SAY, 1918) é o principal hospedeiro
intermediário do Schistosoma mansoni SAMBON 1907, no Brasil. As relações entre o
verme e o seu hospedeiro intermediário constituem um importante elo da cadeia
epidemiológica da esquistossomose, pois o grau de susceptibilidade ou resistência
apresentado pelo molusco numa determinada área geográfica tem relação direta com
o grau de endemicidade e de gravidade da esquistossomose. Por isso, estas relações
têm sido muito estudadas. Os moluscos mais resistentes, aqueles que quando
infectados eliminam poucas cercarias, exibem nos seus tecidos uma forte reação
celular em torno dos esporocistos e cercarias em desenvolvimento. Essas reações de
defesa são feitas por um único tipo celular os hemócitos ou amebócitos que são
células móveis que fagocitam corpos estranhos, e também secretam moléculas ativas
contra os parasitos, lembrando na sua forma e função, os macrófagos dos
vertebrados. Estão por toda à parte do organismo, vagando no interior dos tecidos e
circulando na hemolinfa, mas o seu local de origem ainda é controvertido. Há duas
idéias em curso entre os pesquisadores. Uma, a mais antiga, admite que os
hemócitos tenham uma origem multicêntrica, a partir de células que compõem o
tecido conjuntivo do molusco; outra que propõe uma origem em um órgão especial,
localizado na parede da porção sacular do órgão renal, a qual forma parte do saco
pericárdico, e que foi denominado APO (uma sigla do inglês “Amebocyte Producing
Organ”). O principal argumento para considerá-lo órgão hematopoiético foi à
ocorrência de hiperplasia e mitose nas células do APO durante a infecção pelo S.
mansoni, relatado por alguns autores. Há também a suspeita da existência de células
20
blásticas entre as células do órgão. O APO funcionaria como um análogo da medula
óssea dos vertebrados. Estas idéias ganharam aceitação tácita, e hoje em dia vêm
sendo admitidas como um assunto já bem estabelecido.
No curso de exames microscópicos de moluscos normais e infectados pelo S.
mansoni, em que particular atenção foi dada para o exame do APO, vários aspectos
foram observados que sugerem terem os hemócitos uma origem multicêntrica. Estes
aspectos serão aqui descritos e discutidos.
1.1 REVISÃO DA LITERATURA
Os moluscos pertencentes ao gênero Biomphalaria, possuem na região entre o
pericárdio e o epitélio posterior da cavidade do manto, uma estrutura que é
considerada como o órgão principal para hematopoiese. Segundo alguns autores,
este órgão seria responsável pela produção de células circulantes, denominadas
genericamente de hemócitos ou amebócitos. Tais células, após sua formação, podem
ser encontradas tanto na hemolinfa quanto nos espaços intersticiais. Em caramujos
infectados, elas mobilizam-se em direção ás regiões onde aparecem as formas
parasitárias, acumulando-se ao seu redor e formando cápsulas ou complexos
encapsulantes (LIE et al., 1975).
BAECKER (1932) afirmou ser desconhecida a origem dos amebócitos nos
pulmonatas. Estudos realizados por HAUGHTON (1934) indicaram primariamente os
espaços sanguíneos dos invertebrados como sítio de produção destas células.
Segundo PAN (1958) os possíveis sítios normais de produção dos amebócitos seriam
os sinusóides sanguíneos e a parede da porção sacular do rim, os quais formam a
porção sacular do pericárdio. A parede da porção sacular do rim que margeia o
21
pericárdio é dito pôr este autor ser composto de tecido primitivo de provável origem
mesenquimatosa e é considerado como possível tecido hematopoiético, tendo os
componentes celulares, forma esférica ou oval, mas com perfil irregular e, em certas
condições patológicas, pode-se evidenciar a hiperplasia desse tecido.
PAN (1965) descreve tal estrutura como comparável a um tecido linfóide, que
se torna frequentemente hiperativa durante as cinco primeiras semanas de infecção,
mas que geralmente se tornava escassa de elementos celulares no momento em que
as respostas teciduais generalizadas apareciam.
Em B. glabrata e Bulinus sp., foi identificado um órgão localizado entre o
pericárdio e o epitélio posterior da cavidade do manto. A ultraestrutura desse órgão foi
descrita pela primeira vez por (JEONG et al., 1983; KINOTI, 1971). Em caramujos
controles o órgão se caracterizava como uma estrutura pequena e superficial,
constituída de células alongadas com citoplasma basófilo e núcleos que variavam de
ovais a alongados, provindas da membrana posterior da cavidade do manto, onde as
mitoses são poucas ou ausentes. Estas células são encontradas em pequenos grupos
ou nódulos variando em espessura de 25 á 40µm. Em caramujos infectados e re-
infectados com S. mansoni ou Echinostoma caproni, o APO foi observado
indistintamente maior, resultante tanto de hiperplasia quanto de hipertrofia, sendo que
as figuras mitóticas ficavam evidentes nos primeiros dias da infecção (1 3 dias). Os
nódulos de células proliferadas ficam confluentes formando uma massa celular, que
varia de espessura entre 230 á 400µm. Os parasitos nunca foram vistos neste órgão
(LIE & HEYNEMAN, 1975; JOKY & MATRICON - GONDRAN, 1985).
Durante a sensibilização da B. glabrata induzida por única infecção com
Echinostoma lindoense, os esporocistos deste trematódeo começaram a ser
encapsulados e destruídos pelos amebócitos. Esta reação apresentada pelo
22
hospedeiro foi associada à intensa atividade mitótica e ao aumento do APO. Quando
observado a porção sacular do rim e ocasionalmente, a região dorsal do reto, as
mitoses também foram vistas em caramujos sensibilizados, sendo constatado que os
amebócitos continuavam se dividindo em outras áreas do caramujo, formando locais
de produção como se fosse uma extensão do sítio produtor (APO), LIE et al. (1976).
Estas observações estão de acordo com os achados de SMINIA et al. (1974), que
mostraram que os amebócitos têm capacidade de se dividir na linfa e nos tecidos.
Em seu artigo KINOTI (1971) identificou um órgão similar nas espécies de
Bulinus examinadas: B. africanus Krauss, 1848; B. truncatus Audouin, 1827; B.
tropicus KrausS,1848; ao encontrado em B. glabrata, que em secções histológicas
apresentam núcleo grande com aproximadamente 7µm e citoplasma escasso. Estas
células migravam em direção aos sinusóides sanguíneos, central e periférico, de onde
eram transportadas para toda a parte do corpo.
Um órgão “linfóide” de similar localização foi também descrito em várias
espécies de Lymnaea (RONDELAUD & BARTHE, 1981, 1982; RUELLAN &
RONDELAUD, 1992); especialmente em L. truncatula MULLER, 1774. Tal órgão está
localizado entre o pericárdio e o rim; possui uma extremidade anterior afilando-se na
direção do ducto conectivo dos túbulos renais e o pericárdio, tendo uma face
pericárdica que é lisa e ligeiramente curvada, e uma face renal, que é frequentemente
protraída e às vezes angular. A extremidade posterior do órgão tem limites indefinidos
com o tecido conjuntivo adjacente. Os autores citam que as dimensões do órgão são
pequenas em caramujos controle; o comprimento não excede 150µm, com largura
que varia entre 30 e 60µm. O percentual de células do tecido conjuntivo é
predominante em 65%; estas células possuem núcleo redondo ou oval, às vezes em
forma de rim e sua posição nas células é frequentemente central, ou excêntrico.
23
Quanto ao citoplasma, é arredondado, ligeiramente granular e espesso, onde as
mitoses são raras. Quando exposto à infecção pela Fasciola hepatica, o órgão
aumenta de volume, chegando a alcançar 300µm, com largura média de 150µm;
apresentando numerosas mitoses, que também foram vistas nos tecidos conjuntivos e
em várias formações nodulares entre as glândulas digestivas, em complexos
encapsulantes formados em torno dos trematódeos presentes, envolvendo ambas as
células, maduras e jovens (RONDELAUD & BARTHE, 1981).
Estudos ultraestruturais desta região em Lymnaea truncatula exibem uma típica
estrutura de um órgão de filtração - o rim; similar ao APO, observado em B. glabrata
(MATRICON-GONDRAN, 1990A; MONTEIL & MATRICON-GONDRAN, 1991).
Portanto a parte proximal do rim de L. truncatula difere do APO de B. glabrata. De
acordo com os autores, a origem dos hemócitos nesta espécie parece ser difusa.
Estes achados estão em acordo com dados pertinentes, observados por (SMINIA et
al., 1972,1974) em Lymnaea stagnalis. Em exames prévios, SMINIA em 1972, na
estrutura dos componentes (células e fibras do tecido conectivo), evidenciou que
células do sangue (amebócitos) ocorrem não somente na circulação sanguínea, mas
também nos tecidos conjuntivos. A presente observação mostrou que os amebócitos
nos tecidos não possuem características que lembrem células embrionárias,
sugerindo que amebócitos do sangue e dos tecidos não diferem essencialmente em
estrutura e função, não observando assim, a presença de órgão hematopoiético bem
definido em L. stagnalis, indicando que os tecidos conectivos e o sangue circulante
estão envolvidos na formação dos amebócitos.
Nos moluscos gastrópodes e bivalves não é mencionada a presença de um
órgão hematopoiético especializado (CHENG & RIFKIN, 1970; NARAIN, 1973);
existindo assim, uma indicação de que nestes animais, as células do sangue são
24
formadas por todo o corpo. Os autores sugerem, que a presença de amebócitos se
dividindo, tanto na circulação sanguínea como no tecido conectivo, favorece o grande
sucesso adaptativo destas espécies, que ocupam posição de destaque no filo
Mollusca (CUENOT, 1892; GEORGE & FERGUSON, 1950; BROWN & BROWN,
1965).
25
2. JUSTIFICATIVA
Os invertebrados são animais muito adaptáveis, por isso têm sobrevivido
em ambientes os mais variados. O seu sistema de defesa é primitivo, mas encerra
ainda aspectos pouco estudados, e que são importantes para os estudos básicos de
biologia comparada. Suas reações de defesa se fazem primordialmente através de
um único tipo celular o hemócito. Apesar da importância de tal célula, ainda hoje se
discute a sua origem. O presente estudo visa contribuir para esclarecer a origem dos
hemócitos na B. glabrata, o molusco hospedeiro intermediário do S. mansoni,
causador da esquistossomose humana. Há duas correntes de estudos: uma mais
antiga, que considera que os hemócitos possam se formar em vários sítios do
organismo, e outra mais recente, que postula uma origem focal, em um órgão
especial, que foi denominado APO (da sigla em inglês “Amebocyte Producing
Organ”). O presente estudo confronta estas duas possibilidades e traz subsídios que
favorecem uma origem multicêntrica dos hemócitos.
26
3. OBJETIVOS
3.1 OBJETIVO GERAL
Contribuir para o entendimento das reações de defesa da B. glabrata na sua
interação como hospedeiro intermediário do S. mansoni.
3.2. OBJETIVOS ESPECIFICOS
A - Identificar através de análises histopatológicas, imuno-histoquímica e de
microscopia eletrônica, a localização, forma e comportamento do “APO” em B.
glabrata normal e após infecção pelo S.mansoni, no intuito de compreender o seu
papel nas reações de defesa.
B Considerar a alternativa dos hemócitos poderem ter uma origem em vários órgão,
através da participação das células endoteliais do revestimento dos espaços
vasculares, empregando a mesma metodologia da usada para a análise do APO.
27
4. MATERIAIS E MÉTODOS
4.1 ANIMAIS UTILIZADOS
Foram utilizados exemplares de B. glabrata provenientes da linhagem de Feira
de Santana. Esta linhagem é mantida há vários anos no moluscário do CPqGM e
utilizada até hoje na rotina de manutenção do ciclo do S. mansoni. Além disso, foram
usados espécimes de B. glabrata albino provenientes de Belo Horizonte CPqRR
(infectados pela cepa LE dos S. mansoni), cedidos pelo Dr. Paulo Marcos Zech
Coelho e Dr. Omar Carvalho. Estes exemplares foram incluídos na esperança de
virem a apresentar reações celulares em torno de esporocistos e cercárias, e por
serem albinos, pois a presença de pigmentação dificulta a leitura das lâminas
preparadas com técnicas imuno-histoquímicas.
4.1.1 Grupos Experimentais
Os animais foram divididos em dois grupos:
1- Grupo experimental - 50 caramujos medindo entre 11-13mm (40-60 dias)
selecionados aleatoriamente dos aquários de criação foram expostos a 20 miracídios
do S. mansoni (cepa FS- ANDRADE & SADIGURKY, 1985). Estes animais foram
28
divididos de acordo com a duração da infecção, a qual variou de 1, 5, 15, 35 e 45
dias.
2- Grupo controle - 25 caramujos medindo entre 11-13mm, não infectados,
sacrificados ao mesmo tempo que os animais do grupo anterior.
4.2 OBTENÇÃO DE INÓCULO
Oito (8) camundongos suíços Mus musculus (JACOBY et al.,2002), com no
mínimo 50 dias de infecção pelo S. mansoni, foram anestesiados com éter etílico e
sacrificados pelo deslocamento da coluna cervical. Após tal procedimento foram
feitas as retirada dos fígados os quais foram esmagados em um tamis Granutest,
USBS 40, com abertura de 0,42mm número 35, colocando-se, então, o material em
um cálice de sedimentação, completando com salina á 0,85% e levando-se à
geladeira por 50 minutos.
Decorrido este tempo o sobrenadante foi desprezado e adicionado a este, nova
salina a 0,85%; levando-se novamente à geladeira por mais 50 minutos. O
sobrenadante foi novamente descartado e adicionado água destilada ao recipiente,
despejando-se todo o conteúdo do cálice em um vasilhame de boca larga (tipo
cristalizador) que foi deixado sob luz intensa (3 lâmpadas de 60 watts) por 30
minutos. Em seguida, o líquido foi transferido para um balão volumétrico envolto em
papel escuro, deixando-se apenas o gargalo descoberto, por um tempo de 10 a 20
minutos exposto à luz, de onde 1 ml do líquido do gargalo foi retirado e, após
contagem do número de miracídios, ajustou-se o inóculo necessário para obtenção
de 20 miracídios/ ml, usado para infecção dos moluscos.
29
4. 3 INFECÇÃO DOS MOLUSCOS
Os animais foram colocados em pequenos poços em placa de cultura
contendo 1/ml do inoculo (20 miracídios do S. mansoni) e adicionado água, o
suficiente para que cada animal pudesse ficar totalmente submerso durante 4 horas.
Após exposição os caramujos foram acondicionados em aquários contendo três litros
de água descolorada e um pouco de terra.
4. 3.1 Exame de Positividade
Após quatro semanas de infecção os moluscos foram lavados em água
corrente e colocados, individualmente, em tubos de plásticos pequenos de 50ml, com
cerca de 4ml de água e exposto a um foco de luz (3 lâmpadas de 60W), durante 1
hora e 30 minutos, para verificar a positividade através da eliminação de cercárias.
Decorrido este tempo de exposição, foram retirados 1ml da água e colocando-a em
placas de vidro escavadas de 20 poços onde foi acrescentada 1 gota de Lugol 1%
para fixação e coloração das cercárias. A contagem das cercárias coradas foi
realizada com o auxílio de uma lupa estereoscópica e um contador manual de
células.
30
4.4 SACRIFÍCIO
Os moluscos foram sacrificados com 1, 5, 15, 35 e 45 dias pós - infecção. Os
animais foram colocados em uma cuba com água e cristais de mentol (anestésico),
pôr no mínimo 3 a 4 horas. Depois do tempo estabelecido, retirou-se o excesso da
água com papel toalha e, com uma haste com algodão umedecido em álcool a 70%
completou-se a limpeza da concha com a retirada dos detritos aí aderidos. As
conchas dos exemplares foram perfuradas com agulha de 13 x 4 mm, próximo à
região cefalopodal a fim de coletar a hemolinfa extravasada. Com uma pipeta
automática, 20µl da hemolinfa foi coletada e transferida para tubos ependorffs
estéries devidamente etiquetados e mantidos no gelo, deixando-se sedimentar por 5
mim para deposição dos resíduos da concha.
Após tal procedimento, os caramujos foram dissecados sob visualização em
um microscópio estereoscópico. Com uma lâmina de vidro a concha do molusco foi
fragmentada e com uma pinça as partes moles foram removidas. Foi feita uma
dissecção, começando com uma incisão no lado esquerdo da região renal, com o
auxílio de um estilete, a fim de localizar o coração, que era removido e daí se isolava
a região do APO, a qual era processada para análise em microscopia eletrônica e
óptica. Para microscopia óptica, o APO e outros órgãos foram colocados em uma
solução de Formol Salina a 10% onde permanecia por 2-4 horas. Decorrido este
tempo, o material foi transferido para o álcool a 70% até o momento da inclusão em
blocos de parafina, para realização de cortes seriados (5 micrômetros de espessura)
para coloração em hematoxilina-eosina e imunomarcação.
31
Para Microscopia Eletrônica, os APOS foram fixados em solução de Karnovisk
durante duas horas em temperatura ambiente, sofrendo em seguida lavagens rápidas
em tampão cacodilato a 0,2M. Para pós-fixação foi utilizada uma mistura de tetróxido
de ósmio a 2% + cacodilato 0,2M na proporção de 1:1, por uma hora em temperatura
ambiente no vácuo. Decorrido este tempo, o material foi lavado em cacodilato a 0,2M
à temperatura ambiente e desidratado em ordem crescente de acetona
(30%,50%,70%,90% e 100%). O material foi colocado em uma mistura de resina
Poly-bed 812 sem DMP3 e acetona por 12 horas ou da noite para o dia, à
temperatura ambiente, seguindo impregnação, por 7 horas em resina com DMP3 no
vácuo e temperatura ambiente e posterior emblocamento em moldes plástico para
secar em estufa a 60ºC a fim de que a resina polimerizasse. Após polimerização,
estes blocos foram cortados em ultramicrótomo de marca Reichert-Supernova. Foram
feitos cortes semi-finos de 1µm e selecionados os melhores para posterior realização
dos cortes ultrafinos (50nm), os quais foram contrastados com acetato de uranila, e
depois em citrato de chumbo para análise ao microscópio eletrônico da marca Zeiss,
sob voltagem de 50mV.
4.5 CONTAGEM DOS HEMÓCITOS
Amostra de 10µl de hemolinfa de cada animal foi coletada e misturada em 90µl
de corante vermelho neutro a 1%. Desta solução, foram retirados 10µl e colocados
em câmara de Naubauer e observadas ao microscópio óptico da marca Leica Galen
III para contagem e verificação dos subtipos celulares em objetiva de 40X. Esta
contagem foi realizada sistematicamente por dois observadores.
32
4.6 ANÁLISE MORFOMÉTRICA DO APO
Foram examinadas secções randômicas de cortes do APO, através da análise
morfométrica automática utilizando-se um Sistema Processador e Analisador de
Imagens em microscópio (Zeiss Axioskop 2, Alemanha) com sistema de câmera
acoplada (JVC TK-128OU, Japão) utilizando software Axiovision 2.0 Zeiss. Para os
estudos morfométricos, foram verificadas a extensão e espessura dos APOs.
O sistema foi calibrado para uma ampliação com aumento de 10x e 40x,
utilizando-se o foto-microscópio Axioskop 2-Zeiss, medindo-se a extensão e largura
do APO em µm². Os dados obtidos das várias medições e dos vários animais foram
avaliados através do teste de Kruskal Walles com intervalo de confiança de 95%, com
o auxílio do sofwear Bioestat.
4.7 IMUNO-HISTOQUÍMICA
4.7.1 Marcador Imunológico Anticorpo Monoclonal contra o Antígeno
Ki67
Cortes seriados (5µm) de caramujos normais e infectados contendo o APO
foram obtidos em lâminas silanizadas e após desparafinização em xilol e hidratação
em concentrações decrescentes de álcool etílico foram submetidos à exposição
antigênica pelo calor úmido em tampão citrato pH 6.0. O bloqueio da peroxidase
endógena foi feito com metanol e peróxido de hidrogênio a 3%. O anticorpo primário
monoclonal anti-Ki67 humano (DAKO, Carpinteria, USA) clone MIB-1 foi utilizado na
33
diluição de 1:100 e incubado em câmera úmida a 4ºC por 16h. Seguiu-se de
incubações com o anticorpo secundário biotinilado e estreptoavidina - peroxidase com
o Kit LSAB + HRP (DAKO) e a revelação da reação foi feita com diaminobenzidina
(DAB/H
2
O
2
- DAKO), conforme especificações do fabricante. A contra-coloração foi
feita com hematoxilina de Harris ou verde metila.
4.7.2 Histoquímica utilizando a técnica de coloração pela prata, para
evidenciar regiões organizadoras de nucléolos (Agnor)
Cortes seriados (5µm) de caramujos normais e infectados contendo o APO
foram obtidos em lâminas silanizadas e após desparafinização em xilol e hidratação
em concentrações decrescentes de álcool etílico foram submetidos a duas gotas da
solução de gelatina 2% + ácido fórmico 1% e quatro gotas da solução de nitrato de
prata. As lâminas foram cobertas com lamínula e levadas para estufa á 60ºC por 3-4
minutos até atingir a cor marrom dourada. Depois de retirada da estufa as lâminas
passaram por lavagens rápidas em água corrente e apirogênica, em seguida foram
submetidas a solução de tiossulfato de sódio 5% por 3 minutos e contra-coradas com
giemsa diluído em PBS 3:1 por 10 minutos e montadas com bálsamo do Canadá.
34
5. RESULTADOS
As análises feitas através da microscopia óptica revelaram que a estrutura tida
como órgão central formador de amebócitos no molusco B. glabrata o chamado
APO- apresentou características histológicas que não diferiram essencialmente
daquelas presentes nos exemplares não infectados.
Na região próxima à porção sacular dos túbulos renais foi observada a
presença de um coração com seus dois átrios e um ventrículo, envolto pelo saco
pericárdico. Aí foi identificado o APO, o qual se apresentou como uma camada fina e
longa de células epiteliais basófilas, compactamente arrumadas, com núcleos
redondos, ricos em cromatina e com citoplasma homogêneo e escasso (Fig. 1: A, B,
C & D). As células geralmente formavam grupos ou fileiras ao longo de uma estreita
região da membrana pericárdica. Além da investigação ser feita no APO, a pesquisa
foi dirigida também para a área do coração e outros órgãos, tais como glândulas
digestivas, ovoteste e túbulos renais.
O acúmulo de células hemocitárias ocorreu particularmente no coração, tendo-
se aí encontrado, tanto em animais controles como infectados, compactas coleções
de células arredondadas, isoladas, com núcleos fortemente corados e citoplasma
levemente eosinofílico. Foi possível observar algumas células em estágio de mitose
no interior da cavidade ventricular, bem como nas proximidades da região sacular do
rim (Fig. 2: A, B, C & D).
Nos tecidos dos animais infectados foram vistas numerosos esporocistos e
cercárias em diferentes fases de desenvolvimento, com ou sem reação evidente em
torno dos mesmos. Mesmo no interior do APO tais achados foram observados.
35
Nestes casos, foi possível se verificar estruturas parasitárias envolvidas por reações
encapsulantes, sem que as células do APO mostrassem reações evidentes e sem
que a faixa ocupada por essa estrutura estivesse alargada ou hiperplásica (Fig 3: A,
B, C & D). Estes achados de disseminada proliferação de esporocistos e cercárias,
em vários estágios de desenvolvimento, sem reação nos tecidos do hospedeiro foram
observados em animais do presente experimento, denunciando a presença de alta
susceptibilidade da cepa dos moluscos ao S. mansoni. Por outro lado, alguns animais
deste mesmo grupo exibiam um padrão morfológico característico de animais
resistentes, com proliferação de hemócitos e formação de estruturas granulomatosas
encapsulantes, em torno de esporocistos bem desenvolvidos. Todavia, mesmo nestes
animais, com reações encapsulantes presentes nas proximidades e até mesmo no
interior do APO, tais reações gerais ou hiperplásicas não foram observadas no APO
destes mesmos animais, embora tenha sido detectada a presença de eventuais
figuras de mitose em alguns deles.
O número de hemócitos circulantes entre os caramujos normais e os
infectados variou de forma discreta, apresentando uma média em torno de 0,25x 105
á 1,70x 105 e 1,35 x 105 á 4,32 x 105, respectivamente. No Pós-teste de Dunn’s esta
variação não foi estatisticamente significante, com exceção do número de hemócitos
do grupo com cinco dias de infecção, quando comparado ao do grupo normal, que
apresentou um pH 0.05 (Gráfico I).
Na hemolinfa coletada de caramujos normais e infectados, foram identificados
dois tipos de hemócitos: os hialinócitos e os granulócitos. Os hialinócitos
apresentaram-se como células imaturas, esféricas e pequenas, ao passo que os
granulócitos exibiram núcleo excêntrico e citoplasma expandido em finos
prolongamentos citoplasmáticos.
36
A análise morfométrica do APO nos animais controles demonstrou que a
extensão do APO variava entre 287,92 µm a 885,17 µm; com espessura de 21,17µm
a 35,17µm. Em animais infectados variou de 390,5 µm a 975,83 µm; com espessura
de 29,16µm a 57,17µm (Gráfico II & III). As diferenças não tiveram significado
estatístico.
Para se verificar a presença de mitoses no APO de caramujos normais e
infectados com S. mansoni, além da histologia clássica com lâminas coradas em H &
E, foi utilizado também um marcador imuno-histoquímico, o Ki67, que é uma proteína
de localização nuclear que se expressa durante a divisão nuclear. Trata-se de um
indicador de proliferação celular, com expressão específica nos estágios de G1, S, G2
e M. A reação de imunoperoxidase indireta revelada pelo cromógeno DAB, evidenciou
nos sítios de ligação antígeno-anticorpo, uma cor castanho-dourada. Ela foi negativa
para a presença do antígeno Ki67 no APO tanto dos animais infectados quanto nos
animais não infectados, bem como em todos os outros tecidos do molusco. No
entanto, foi positiva nos esporocistos e, com menor freqüência, nos estágios
evolutivos das cercárias (Fig. 4: A & B).
Nas preparações em que a técnica do “AgNOR” foi empregada, o resultado
positivo, revelador de atividade proliferativa nucleolar, apareceu como uma coloração
castanho dourada no interior do núcleolo das células em processo de divisão. Esta
positividade apareceu em células localizadas em vários sítios. A marcação foi
expressa no APO e em células de vários órgãos, especialmente naqueles com
evidente proliferação celular, como o ovo-testis e as glândulas digestivas, tanto em
caramujos normais, como nos infectados (Fig. 4: C & D).
37
A microscopia eletrônica revelou que o APO possui muitas organelas, tendo
características típicas de células epiteliais justapostas, apresentando microvilosidades
na sua superfície livre. Puderam ser observados núcleos excêntricos com cromatina
condensada. O citoplasma denso exibia retículo endoplasmático liso e, sobretudo,
rugoso, complexo de Golgi e numerosas mitocôndrias e raros lisossomos. Na
membrana externa, a presença de inúmeras interdigitações e alguns desmossomos
delimitava e ancorava uma célula com outra (Fig. 5: A, B, C & D). Foi possível verificar
também, vacúolos de gordura, rosetas de glicogênio e microtúbulos. O APO possui
lâmina basal espessa e subjacente a esta estrutura, é possível verificar-se um tecido
conectivo contendo fibras musculares lisas com finos filamentos de actina e de para-
miosina, estes um pouco mais espessos. Alguns amebócitos foram vistos no interior
do APO e um número maior deles no tecido conjuntivo, logo abaixo da membrana
basal que delimita o APO.
38
1
A
Região
do coração de
B. glabrata
normal, mostrando o revestimento pericárdico
com o APO (seta) o coração com o ventrículo
único (V) e os dois átrios (A), próximos aos
túbulos renais (asteriscos). Microscopia
óptica, Hematoxilina & Eosina, X100.
®
©
©
APO
V
A
*
APO
Prancha 1
1
B
APO
-
“ Òrgão Produtor de
Amebócitos” de um exemplar normal de
B.
glabrata (FS/BA) formado por células
arredondadas e basofílicas (seta) entre a
região sacular do rim (®) e o coração (©).
Microscopia óptica, Hematoxilina &
Eosina, X200.
1C
Porção anterior do sacular pericárdico
mostrando o APO em maior detalhe. APO
composto por células basofílicas
compactamente arrumadas em fileiras, ao
longo da fita
pericárdica (seta). Animal
normal. Hematoxilina & Eosina, X200.
1D
Região anterior do manto onde se vê
o APO formado por células arredondadas,
coradas fortemente pela Hematoxilina &
Eosina, (seta), e com núcleos excêntricos.
Microscopia óptica. X400.
39
Prancha 2
2
A
Coração de
B. glabrata
infectada pelo
S. mansoni, onde se observa um acúmulo
de hemócitos no interior da cavidade
ventricular, que se estende entre as fibras
cardíacas (asterisco). Microscopia óptica.
Hematoxilina & Eosina, X200.
*
¯
¯
2
B
Maior detalhe dos hemócitos no
interior do coração, (seta). Estas células
parecem estar em deslocamento
progressivo a partir do revestimento
endotelial para o interior dos espaços
vasculares. Microscopia óptica,
Hematoxilina & Eosina, X400.
2
C
Coração de um caramujo inoculado
com miracídios irradiados. Observa-se a
formação de nódulos hemocitários na
cavidade ventricular (asteriscos).
Microscopia óptica. Hematoxilina & Eosina,
X200. (Foto por gentileza da colega Carine
Azevedo).
2
D
Coleção de hemócitos dentro da
cavidade ventricular vista em um caramujo
não infectado (seta longa).Microscopia
óptica. Hematoxilina & Eosina, X100.
40
Prancha 3
©
APO
3A
APO de
B. glabrata
infectada pelo
S.
mansoni
. As células do APO estão
arrumadas em
fileiras, ao longo do
pericárdio (seta vazada), sem evidência de
proliferação. Nota-se a presença de
esporocistos próximos ao APO (seta longa)b
e coração (©). Hematoxilina & Eosina, X100.
3C
Revestimento pericárdico onde se vê o
APO de um caramujo infectado pelo S.
mansoni, constituído por um grupo de células
compactamente arrumadas (seta longa).
Próximo a essa região vê-se uma reação em
torno de parasitas (seta listrada). Observa-se
ainda, que não há evidências de hiperplasia
no APO. Microscopia óptica. Hematoxilina &
Eosina X100.
3B
APO de dimensões dentro dos
limites
normais, mas onde é possível se observar
uma reação encapsulante em torno á
parasitas em degeneração, (seta).
Microscopia óptica. Hematoxilina & Eosina,
X200.
3D
Maior detalhe do APO, com suas
células esféricas e basofílicas. Nota-
se a
presença de material amorf
o pigmentado
entre as células, provavelmente derivado de
parasitas, (seta). Microscopia óptica.
Hematoxilina & Eosina X400.
41
Prancha 4
4A
Região do ovoteste de
B. glabrata
infectada pelo S. mansoni
(FS/BA).
Observar a marcação em castanho dourado
nos esporocistos e nas cercárias e sua
ausência no restante do tecido, (seta).
Imunohistoquímica com monoclonal contra o
antígeno Ki67, X200.
4B
Maior detalhe do ovoteste
mostrando a marcação positiva no
esporocisto e cercaria bem desenvolvida.
Imunohistoquímica com Ki67, X200.
4C
Células do APO, onde se observa a
marcação nucleolar em castanho-escuro
pela impregnação pela prata, (seta).
AgNOR, X400.
4D
Coleção de hemócitos no ovoteste,
marcados pela prata, (seta). AgNOR,
X400.
42
Prancha 5
5A
Aspectos das células epiteliais
justapostas, apresentando microvilosidades
na sua superfície livre (seta longa), retículo
endoplasmático rugoso (seta curta) e
desmossomos (seta larga).
5B
Células do APO contendo material de
secreção aparentemente em processo de
eliminação (seta branca).
5C
Maior detalhe da figura anterior. Notar
interdigitações de membrana celular (seta
longa) e a presença de mitocôndrias,
vacúolos e grumos de glicogênio.
5D
Mitocôndrias do APO em maior
aumento. A membrana interna está
organizada em cristas (seta vazada).
Observar a presença de DNA mitocôndrial
(seta larga).
43
Normal 1dpe 5dpe 15dpe 30dpe 45dpe
0
250
500
750
1000
Tempo de Infecção
Extensão APO (
µ
m)
Gráficos (I, II & III)
Gráfico: 01
Média de hemócitos obtidos em diferentes períodos da
infecção. Hemolinfa fresca, (10µl). Observação nos 4 campos da câmara
de Naubauer. Teste Kruskal Walles com intervalo de confiança 95%.
Normal 1dpe 5dpe 15dpe 30dpe 45dpe
0
1
2
3
4
5
Tempo de Infecção
Nº células (x 10
5)
Gráfico: 02
Análise morfométrica dos APOs de caramujos infectados
em diferentes dias, pelo S. mansoni, e seus controles não-infectados.
Cada coluna representa o comprimento dos APOs. Teste Kruskal
Walles. Intervalo de confiança 95%.
44
Normal 1dpe 5dpe 15dpe 30dpe 45dpe
0
25
50
75
Tempo de Infecção
Espessura APO (µm)
Gráfico: 03
-
Análise morfométrica dos APOs de caramujos normais
e infectados em diferentes dias, pelo S. mansoni
. As colunas
representam a espessura dos APOs. Teste Kruskal Walles. Intervalo
de confiança 95%.
45
6. DISCUSSÃO
Embora a tendência atual seja a de admitir que os hemócitos na B. glabrata
tenham uma origem comum em um órgão central o APO que seria uma espécie
de medula óssea, gerando as células circulantes responsáveis pela defesa do
organismo, os nossos achados não demonstraram evidências que apoiassem esta
possibilidade.
Segundo JEONG & HEYNEMAN (1983), o APO funcionaria como um análogo
da medula óssea dos vertebrados. Esse autor, concordando com SULLIVAN et al
(1984, 1990, 2004, 2005) utiliza como principal argumento o fato de se observar
hiperplasia e mitoses em células do APO durante a infecção pelo S. mansoni. Outro
tipo de evidência para mostrar o APO como o local onde se originam os hemócitos,
tem sido tentado com uma técnica de transplante de um APO de um animal
resistente para outro suceptível ao S. mansoni. SULLIVAN & SPENCE (1994),
relataram sucesso em tais experimentos. Todavia, existem várias limitações.
O APO é uma estrutura difícil de ser dissecada e isolada. Ela exibiu uma
distribuição focal e, como ocupava uma faixa muito estreita, o seu encontro ficava
dificultado em secções tomadas aleatoriamente, o que exigia cortes escalonados ou
seriados da região, para ser encontrada. As dissecções facilitavam a tarefa de se
obter blocos com maiores chances de se localizar o APO. Mas, deve-se considerar
que, além do fragmento que contem o APO ser muito pequeno, ele é friável, e requer
cuidados especiais para o seu isolamento e sua inclusão em parafina, para que seja
possível obter cortes seriados contendo todo o APO e regiões próximas. Nas
46
preparações obtidas nunca foram vistas grandes coleções de hemócitos no interior
ou nas proximidades imediatas do APO. Entretanto, tais coleções foram encontradas
nos revestimentos dos espaços vasculares de outros órgãos e estas células exibiam
sinais de multiplicação, a saber, aumento numérico e evidência morfológica de
descolamento progressivo a partir do revestimento endotelial para o interior dos
espaços vasculares.
Em algumas tentativas de que temos conhecimento, quando o produto da
dissecção foi analisado histologicamente, estava representado pelo coração. Assim
tais transplantes podem levar muitos hemócitos do caramujo resistente além do
APO. Alguns controles podem diminuir tais problemas, mas são muito difíceis de
serem avaliados.
O APO tem sido observado também em Echinostoma lindoense e
Echinostoma caproni (JEONG et al, 1980; JOKY & MATRICON-GONDRAN, 1985;
LIE et al, 1976), e na Lymnaea truncatula (MONTEIL & MATRICON-GONDRAN,
1991; RONDELAUD & BARTHE 1982). Nesta última espécie, os autores não
concordam que o APO seja o órgão formador de hemócitos e sim um local de
filtração da linfa.
Como vimos nossos achados demonstraram ausência de modificações
apreciáveis do APO, mesmo quando estruturas parasitárias foram encontradas no
seu interior. Também dados morfométricos falharam em demonstrar diferenças
significativas no numero de células, no comprimento e na largura do APO, em
animais infectados quando comparados com os controles normais. Estes dados
discordam dos achados observados por RONDELAUD & BARTHE (1981), que
evidenciaram uma extensão aumentada no APO de caramujos infectados pela F.
hepática, apresentando comprimento entre 90µm a 310µm com 1 e 2 dias de
47
infecção e alargamento entre os dias 7 e 14, quando comparados com os caramujos
controles. Já as mitoses, estas foram encontradas na presente investigação apenas
ocasionalmente e após pesquisas exaustivas. Todavía, JOKY & MATRICON-
GONDRAN et al. (1985), observaram intensa atividade mitótica no APO de B.
glabrata no primeiro e terceiro dias pós-infecção, e declínio após o quarto dia de
exposição. Os autores descreveram ainda que o APO foi o único lugar onde
numerosas divisões celulares ocorreram durante a resposta de caramujos resistentes
à infecção trematódea. Isso difere dos dados observados no presente estudo, em
que as mitoses podiam ser encontradas raramente, tanto no APO como em outros
órgãos, como glândulas digestivas e túbulos renais. Estas observações estão de
acordo com os achados de SMINIA (1972), que mostraram que os hemócitos têm
capacidade de se dividir na linfa e nos tecidos.
A origem dos hemócitos foi inicialmente discutida por PAN & CHING-TUNG
(1958, 1963, 1965), como tendo lugar não só nas paredes da porção sacular do
órgão renal, a qual forma parte do saco pericárdico, como nos seios venosos e no
tecido conectivo frouxo. Assim, ele postula uma origem multicêntrica para os
hemócitos a partir do revestimento dos espaços vasculares. Este revestimento existe
por todos os órgãos, já que o molusco tem uma circulação aberta, mas a proliferação
ocorre focalmente, toda vez que um estímulo adequado se faz presente. Todavia,
LIE et al., (1975) consideraram a primeira região mencionada por Pan como um
órgão hematopoiético ou linfóide e deu-lhe a denominação de APO, a qual foi
adotada por muitos deste então.
A favor de ser os espaços vasculares, o local de formação dos hemócitos,
temos no presente estudo a observação de proliferação focal em vários órgãos,
sendo a mais impressionante aquela observada no coração, tal como podemos ver
48
na figura (2: A). Tivesse uma proliferação semelhante ocorrido no interior do APO, tal
seria mais convincente para justificar um órgão central hemocitário, do que a
propalada hiperplasia ou as eventuais figuras de mitose.
Se quisermos olhar com um olho prático, podemos deduzir que a proliferação
focal de hemócitos surge como mais adequada para a defesa, já que a circulação da
linfa é vagarosa e se faz em espaços vasculares muito numerosos e relativamente
amplos. Poder-se-ia argumentar que a ausência de modificação no APO observada
no presente estudo foi devida ao uso de caramujos muito susceptíveis, que
praticamente não respondem com proliferação hemocitária à invasão pelo S.
mansoni. De fato, na maioria das vezes as respostas proliferativas em torno dos
parasitos eram quase inexistentes. Todavia, alguns casos apresentaram reação,
inclusive aquela que preencheu a cavidade ventricular com numerosos hemócitos,
sem que o APO exibisse modificações apreciáveis. Por outro lado, foram
encontradas coleções de hemócitos nos revestimentos dos espaços vasculares de
outros órgãos tais como glândula digestiva, túbulos renais e especialmente o
coração. Estes elementos celulares apresentavam-se tumefeitos, com núcleos
proeminentes, fortemente corados pela hematoxilina. Estas células se dispunham
formando agrupamentos ou nódulos, alguns dos quais exibindo mitoses.
Também seria de se esperar que, havendo um órgão central formador de
hemócitos, tais hemócitos aí originados teriam que trafegar pela corrente da hemo-
linfa para se concentrar nos locais de reação. Teríamos assim uma maior
concentração deles nos animais infectados, o que consistiria numa espécie de
leucocitose”. Os dados até aqui publicados não permitem deduzir que tal aconteça.
Embora JOKY & MATRICON-GONDRAN (1985), RONDELAUD & BARTHE (1980) e
JEONG et al., (1980), tenham verificado um ligeiro aumento no numero de hemócitos
49
circulantes nos primeiros dias da infecção pelo S. mansoni, seguido de uma
diminuição logo após. Outros pesquisadores não conseguiram demonstrar um
achado consistente entre resposta tecidual e sua repercussão nas células da
hemolinfa (REIS et al., 1995; BORGES et al., 2005 In press). Aliás, nossos achados
aqui apresentados estão concordantes com os destes últimos autores.
Adicionalmente, no presente estudo, foi constatado que os hemócitos
presentes nos tecidos e no APO exibiam características de um único tipo celular, os
granulócitos. Estes resultados ratificam os resultados descritos por SMINIA &
BARENDSEN (1980) e JEONG et al., (1983).
Como visto por LIE et al., (1975 & 1976), o presente estudo também registrou
a presença em alguns exemplares infectados pelo S. mansoni e inoculados com
miracídios irradiados, a formação de agregados amebocitários em alguns órgãos,
especialmente no lúmem do ventrículo do coração, e nódulos celulares na região do
manto, glândulas digestivas e túbulos renais, sugerindo aí uma origem focal dos
hemócitos.
Também, como já notado pela primeira vez por JEONG et al., (1983), os
nossos achados ultra-estruturais mostraram o APO como uma estrutura complexa
composta de células justapostas com características epiteliais, com microvilosidades
em sua superfície livre. Estas células ricas em organelas sugerem uma função
metabólica importante e também de secreção e filtração, mas não dão indícios de
diferenciação em células livres (hemócitos). Foram vistos hemócitos no tecido
conjuntivo, logo abaixo da membrana basal do APO, mas sem que se evidenciassem
as formas transicionais a partir de células no interior do APO.
Em conclusão, nossos achados favorecem uma origem multicêntrica para os
hemócitos da B. glabrata, os quais poderiam se formar em qualquer órgão, inclusive
50
no APO, a partir de células dos revestimentos dos seios venosos e, talvez, também
de células situadas no interior do tecido conjuntivo frouxo.
51
7. CONCLUSÕES
1- Nossos estudos são consistentes com a origem multicêntrica dos hemócitos,
células de defesa do molusco Biomphalaria glabrata, a partir dos revestimentos dos
espaços vasculares, especialmente no coração e porção sacular do rim, ao mesmo
tempo em que não confirmam ser o APO (amebocyte-producing organ) o único ou
principal local de origem dos hemócitos.
2- O estudo histológico do APO não mostrou alterações apreciáveis quando sua
estrutura geral foi comparada em caramujos infectados pelo Schistosoma mansoni
com os controles não-infectados.
3- A análise morfométrica do APO, feita em caramujos infectados pelo Schistosoma
mansoni, mostrou que o comprimento e a largura do órgão não variaram de maneira
estatisticamente significante quando comparados com seus controles não infectados.
4- A microscopia eletrônica revelou que o APO possui características típicas de um
tecido epitelial, com células justapostas, com pontos de aderências entre si, com
microvilosidades na superfície livre, algumas contendo material de secreção, e ricas
em organelas, tais como, retículo endoplasmático liso e rugoso, complexo de Golgi,
lisossomos e numerosas mitocôndrias.
52
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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