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Um dos momentos mais importantes por nós detectado para a compreensão da
problemática agrária ao seio do Senado correspondeu à sessão do dia 31 de maio de 1887,
quando se discutiu o projeto n. 57, relativo à “venda, aforamento e concessão gratuita de
terras devolutas
534
”. Devemos ter em mente o então acelerado processo de extinção da
escravidão. Já aprovado pela Câmara dos Deputados com algumas emendas, o projeto
535
, de
iniciativa do gabinete conservador presidido pelo Barão de Cotegipe (presidente do Conselho
de Ministros entre 1885 e 1888
536
), era apoiado pelo paulista Antônio da Silva Prado (1840-
1929
537
) e por Rodrigo Augusto da Silva, ambos ligados ao setor imigrantista de São Paulo.
Mantinha uma grande semelhança com o projeto de Buarque de Macedo, no sentido de que,
assim como este último, facilitava o acesso a terra por segmentos de pequenos trabalhadores
rurais, sobretudo os imigrantes. A questão da imigração, com efeito, fundamentou grande
parte dessa iniciativa governamental, que foi alvo de críticas de deputados pelo Norte,
contrários a uma política imigratória que, para eles, somente beneficiava as regiões do Sul do
Império
538
, especialmente a província de São Paulo, conforme denunciado pelo senador Meira
de Vasconcellos. Antônio Prado descreveu a reforma proposta como sendo “a pedra angular
sobre o que deve assentar-se o edifício da imigração
539
”. Prado, de acordo com Paula
Beiguelman
540
e Evaldo Cabral de Mello
541
, foi um dos representantes do grupo imigrantista.
Este grupo pregava o estímulo à imigração espontânea – em contraposição à imigração
dirigida -, que seria facilitada através do custeio das passagens dos imigrantes pelo Estado.
Podemos entender, então, a crítica quanto à tal política favorecer mais São Paulo, principal
foco da política de imigração para as grandes fazendas, tanto mais que a influência desse
grupo cresceu significativamente na década de 80, chegando a controlar a política da
província paulista
542
. O acesso à terra pelo imigrante, nesse contexto, poderia constituir-se
534
O debate foi registrado em dois livros dos Anais do Senado: em Discurso, Volume I, de 1887 (páginas 3 a 10) e no Livro
I, volume I, (páginas 208 a 212). No Discurso I, o texto corresponde ao que foi reproduzido, de forma resumida, entre as
páginas 208 e 210 do Livro I. Optamos por fazer uso do conteúdo de Discurso e em seguida do Livro I, o qual registrou, a
partir da página 210, a resposta de Antônio Prado a Meira de Vasconcellos, não incluída no livro dos discursos.
535
Cf. Por ser muito extensa, a íntegra do projeto foi inserida junto aos anexos, bem como as emendas apresentadas pela
Câmara dos Deputados, pelo Senado e pelo parecer da Comissão Especial, de que falaremos mais adiante.
536
Cf. NOGUEIRA, Octaciano e FIRMO, João Sereno. Parlamentares do Império. Brasília: Senado Federal, 1973, p. 671.
537
Cf. FARIA, Sheila de Castro. Verbete: “Antônio da Silva Prado”, in: Dicionário do Brasil Imperial. Direção: Ronaldo
Vainfas. Rio de Janeiro: Objetiva, 2002, p. 49-50.
538
Cf. MELLO, Evaldo Cabral de. O Norte Agrário e o Império: 1871-1889. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.
539
Cf. Anais do Senado, 1887, volume I, p. 211.
540
Cf. BEIGUELMAN, Paula. A crise do escravismo e a grande imigração. 4. ed. São Paulo: Brasiliense, 1987.
541
Cf. MELLO, Evaldo Cabral de. O Norte Agrário e o Império: 1871-1889.2. ed. rev.Rio de Janeiro: Topbooks, 1999.
542
Para José Murilo de Carvalho, porém, o controle do poder político pelo grupo dos proprietários, sob o Império, não foi de
alcance nacional, de modo que possibilitasse aplicar uma política nacional de imigração subvencionada. Apenas em São
Paulo, no final da Monarquia, é que, pelo controle assumido na província, os proprietários teriam condições de aplicar tal
política. Cf. A Construção da Ordem: a elite política imperial / Teatro de Sombras: a política imperial. 2. ed. rev. Rio de
Janeiro: Relume Dumará / UFRJ, 1996, parte II, capítulo 3, p.320.