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Manfred Pauls
A nacionalidade e a lei aplicável à pessoa
jurídica de direito privado.
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
Programa de Pós-Graduação em Direito
Econômico e Social
Curitiba, agosto de 2005
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS
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Manfred Pauls
A nacionalidade e a lei aplicável à pessoa jurídica de
direito privado.
Dissertação de Mestrado
Orientador: Prof. Dr. João Bosco Lee
Curitiba
Agosto de 2005
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA
DO PARANÁ
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Direito Econômico e
Social da PUC-PR como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em
Direito.
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Manfred Pauls
A nacionalidade e a lei aplicável à pessoa jurídica de
direito privado.
Dissertação de Mestrado
Prof. Dr. João Bosco Lee
Orientador
Centro de Ciências Jurídicas e Sociais PUCPR
Prof. Dr.__________________________________
Centro de Ciências Jurídicas e Sociais PUCPR
Prof. Dr.__________________________________
Curitiba, ____ de Agosto de 2005
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA
DO PARANÁ
Dissertação apresentada como requisito pa
rcial
para a obtenção do grau de Mestre pelo
Programa de Pós-Graduação em Direito
Econômico e Social da PUCPR. Aprovada pela
Comissão Examinadora abaixo assinada.
Manfred Pauls
Graduou-se em Direito na PUCPR (Pontifícia
Universidade Católica do Paraná) em 2002. É
advogado militante e professor universitário.
Ficha Catalográfica
Pauls, Manfred
P332n A nacionalidade e a lei aplicável à pessoa jurídica de
direito privado/2005
Manfred Pauls; orientador, João Bosco Lee. -- 2005.
v, 149 f.; 30 cm
Dissertação (mestrado) Pontifícia Universidade Católica do
Paraná.
Curitiba, 2005
Inclui bibliografia
1. Direito internacional privado. 2. Pessoa jurídica.
3. Direito comercial. 4. Sociedades anônimas Legislação.
I. Lee, João Bosco. II. Pontifícia Universidade Católica do
Paraná. Programa de Pós-Graduação em Direito. III. Título.
Doris - 4.ed. 342.3
342.2
342.225
Agradecimentos
Ao amigo e sócio Ricardo Augusto Menezes Yoshida, cuja paciência,
dedicação, apoio e confiança no projeto, eternamente serão lembrados.
Ao Professor Doutor João Bosco Lee pelo apoio e orientação na
consolidação do presente trabalho.
À Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) pela concessão da
bolsa de estudos, sem a qual a conclusão não seria possível.
À Direção do Curso de Mestrado pela compreensão diante das dificuldades
impostas por minha enfermidade; sem esquecer das secretárias Eva de
Fátima Curelo e Isabel Cristina Rosa e sua valiosa presença no pronto
atender das necessidades durante essa trajetória.
Ao colega MSc. Martinho Martins Botelho, pela crítica, colaboração na
pesquisa bibliográfica e disposição de sua biblioteca.
Ao jurista, historiador e imortal paranaense Valério Hoerner Júnior pela
revisão do trabalho.
Resumo
Pauls, Manfred; Lee, João Bosco (orientador). A nacionalidade e a
lei aplicável à pessoa jurídica de direito privado. Curitiba: 2005,
149 p. Dissertação de Mestrado Centro de Ciências Jurídicas e
Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
A nacionalidade de pessoas jurídicas é tema que gera discussões nos
meios acadêmicos, contrário sensu, no que diz respeito às pessoas físicas.
É assunto correlato a lei aplicável, vez que no âmbito do Direito
Internacional Privado é comum aplicar regras de Direito de outras nações.
Nesse sentido, o presente trabalho analisa a natureza e a capacidade
jurídica das pessoas jurídicas, complementado com breve histórico.
Discorre acerca das teorias negativa e positiva inerentes à existência no
mundo jurídico da pessoa jurídica. Apresenta as discussões doutrinárias
relativas às teorias de reconhecimento da nacionalidade de pessoas
jurídicas e do conceito de nacionalidade de pessoa jurídica, no âmbito
internacional, bem como para a doutrina brasileira. Trata de institutos
legais, brasileiros, inclusive projetos de lei, bem como tratados e
convenções internacionais que disciplinam a lei aplicável às pessoas
jurídicas, quando envolvidas em litígios de ordem internacional, seja sob
jurisdição estatal ou submetidos à arbitragem internacional. Analisa
conflitos internacionais que envolveram Estados soberanos e pessoas
jurídicas cuja nacionalidade não fora atribuída por esses.
Palavras-chave
pessoa jurídica, nacionalidade, lei aplicável, direito internacional
privado, direito societário.
Abstract
Pauls, Manfred; Lee, João Bosco (Advisor). The nationality and the
applicable law to the private right juridical person. Curitiba: 2005,
149 p. Master degree Dissertation Social and Juridical Science
Center, Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
The juridical people nationality is a subject that brings discussions in
academicals environments, in contrary to referring to physical people. It is
a subject connected to the applicable law. Thus in the International Private
Law it has used to apply another Nations Law rules. In the same aspect,
this present essay analyzes the juridical people nature and juridical
capability, in which it is added a brief historic. It lectures about negative
and positive theories that exist in the juridical person juridical world. It
also shows doctrinarian discussions related to the juridical people
nationality recognizing theories and the juridical person nationality
concept inside an international environment, as well as to Brazilian
doctrine. Furthermore, it relates legal Brazilian institutes, including some
law projects, as well as the International Tractates and Conventions which
discipline the applicable law to the juridical people, when the people are
involved in international order complications. These complications can be
over statue jurisdiction or submitted to the international arbitrage. This
essay analyzes international conflicts that involved soberer States and
juridical people which nationality were not attributed by them.
Keywords
juridical person, nationality, applicable law, International Private
Law, Societary Rights.
Zusammenfassung
Pauls, Manfred; Lee, João Bosco (Betreuer). Die Nationalität und
das angewandte Recht an einer juristischen Person. Curitiba: 2005,
149 Seiten. Master degree Dissertation Sozial- und
RechtswissenschaftszentrumPäpstlich katholische Universität von
Paraná.
Die Nationalität einer juristischen Person erfordert gegenüber der
einer natürlichen Personen eine besondere wissenschaftliche Betrachtung,
welche in den Bereich des angewandten Rechts fällt, da im Internationalen
Recht gewöhnlich andere nationale Gesetze angewandt werden. Diese
Arbeit beschäftigt sich daher mit einer Analyse der juristischen Stellung
und Leistungsfähigkeit einer juristischen Person und gibt einen kurzen
historischen Überblick. Es werden die negativen und positiven Annahmen
hinsichtlich der juristischen Stellung einer juristischen Person erörtert.
Die doktrinäre Diskussion bezüglich der Erkennung und dem Begriff der
Nationalität einer juristischen Person im internationalen Zusammenhang
und in der brasilianischen Lehre wird aufgezeigt. Ebenso werden
brasilianische Normen inklusiv einiger Rechts-Projekte sowie
internationale Konventionen und Verträge, welche das angewandte Recht
für juristischen Personen regeln, behandelt. In diesem Zusammenhang
wird die Zuständigkeiten der Stadtgerichte und der internationalen
Schiedsgerichte erklärt. Weiterhin werden in dieser Arbeit internationale
Konflikte zwischen souveränen Staaten und juristischen Personen, dessen
Nationalität ungeklärt ist, analysiert.
Schlüsselwörter
juristische Person, Nationalität, angewandtes Recht, Internationales
Privatrecht, Gesellschaftsrecht.
Resumen
Pauls, Manfred; Lee, João Bosco (orientador). La nacionalidad y la
ley aplicable a la persona jurídica de derecho privado. Curitiba:
2005, 149 p. Dissertação de Mestrado Centro de Ciências Jurídicas
e Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
La nacionalidad de personas jurídicas es asunto que genera
discusiones en el medio académico, contrario sensu, en lo que se refiere a
las personas físicas. Es asunto correlato a la ley aplicable, vez que en el
ámbito del Derecho Internacional Privado es corriente aplicar reglas de
Derecho de otras naciones. Así el presente trabajo analiza la naturaleza y
la capacidad jurídica de las personas jurídicas complementando con breve
histórico. Discurre sobre las teorías negativa y positiva inherentes a la
existencia en el mundo jurídico de la persona jurídica. Presenta
discusiones doctrinarias relativas a las teorías de reconocimiento de la
nacionalidad de personas jurídicas y del concepto de nacionalidad de
persona jurídica, en el ámbito internacional, así como para la doctrina
brasileña. Se trata de institutos legales, brasileños, incluso proyectos de
ley, así como tratado y convenciones internacionales que disciplinan la ley
aplicable a las personas jurídicas, cuando involucradas en litigios de orden
internacional, sea bajo jurisdicción estatal o sometidos al arbitraje
internacional. Analiza conflictos internacionales que involucraron Estados
soberanos e personas jurídicas cuya nacionalidad no fuera atribuida por
estos.
Palabras clave
persona jurídica, nacionalidad, ley aplicable, derecho internacional
privado, derecho societario.
Sumário
1 Introdução 15
2 Noções fundamentais sobre a pessoa jurídica 19
2.1 Definição de pessoa jurídica 19
2.2 Evolução histórica 22
2.3 Natureza jurídica 24
2.3.1 Teoria negativista 24
2.3.2 Teoria positivista 26
2.4 Aquisição de personalidade 29
2.5 Reconhecimento da pessoa jurídica de direito privado
estrangeira 31
3 A nacionalidade da pessoa jurídica 35
3.1 Conceito da nacionalidade 35
3.2 Efeitos da nacionalidade 35
3.2.1 Nas pessoas físicas 35
3.2.2 Nas pessoas jurídicas 36
3.3 Nacionalidade no direito comparado
38
3.4 Nacionalidade segundo a doutrina Irigoyen
41
3.5 Nacionalidade no Código de Bustamante
43
3.6 Função da nacionalidade: lei aplicável, controle, jurisdição
competente 44
3.7 Nacionalidade segundo critério da autorização, local da
constituição ou incorporação 46
3.8 Nacionalidade segundo a nacionalidade dos sócios
48
3.9 Nacionalidade segundo a propriedade do capital
48
3.10 Nacionalidade segundo o lugar de subscrição das ações
49
3.11 Nacionalidade segundo critério econômico 49
3.12 Nacionalidade segundo a sede social. Critérios para sua
determinação 51
3.12.1 Sede estatutária 53
3.12.2 Direção ou administração principal 54
3.12.3 Lugar principal dos negócios 54
3.13 Idéias dominantes na determinação da nacionalidade da
pessoa jurídica 56
3.13.1 Expansão econômica 57
3.13.2 Defesa econômica 57
3.13.3 Segurança 57
3.13.3.1 O aparecimento da teoria do controle. Primeira
Guerra Mundial 58
I) Inglaterra 58
II) França 59
III) Tratados de Versalhes 60
IV) Decisões arbitrais pós-Primeira Grande Guerra
60
3.13.3.2 Segunda Guerra Mundial 61
I) Estados Unidos e Alemanha 61
II) Espanha 61
III) Nas Américas 62
3.13.3.3 Em época de Paz
62
I) Jurisprudência francesa 63
II) A opinião de Niboyet 63
III) Posição de Henri Battifol 67
IV) Critério de Martin Wolff 68
3.14 A nacionalidade da pessoa jurídica no Brasil
69
3.14.1 Empresa Nacional à Luz da Constituição Federal de
1988 74
3.14.2 Nacionalidade no Código Civil brasileiro 78
4 Lei aplicável às pessoas jurídicas de direito privado 81
4.1 Critério da incorporação 83
4.2 Critério da sede social 83
4.3 Lei aplicável segundo a Lei de Introdução ao Código Civil
de 1942 85
4.3.1 Projeto de Lei Geral de Aplicação das Normas Jurídicas
de Haroldo Valladão de 1964 88
4.3.2 Projeto de Lei n.º 4.905/95 89
4.4 Lei aplicável segundo a Lei das Sociedades Anônimas
90
4.5 Lei aplicável nas fontes legislativas internacionais
92
4.5.1 Convenção de Direito Internacional Privado/Código de
Bustamante de 1928 92
4.5.2 Convenção Interamericana sobre conflitos de leis em
matéria de sociedades comerciais 95
4.5.3 Tratados de Montevidéu 96
4.5.4 Tratado de Roma de 1957 97
4.5.5 Convenção de Bruxelas de 1958 98
4.5.6 Convenção da Haia de 1956 99
4.5.7 Convenção de Estrasburgo de 1966 100
4.5.8 Convenções das Conferências Especializadas Interame -
ricanas sobre Direito Internacional Privado (CIDIPs)
100
4.5.9 Convenção do Banco Mundial 102
4.5.10 Tratado de Direito Comercial Internacional, 1889
102
4.5.11 Tratado de Direito Comercial Terrestre Internacional,
1940 103
4.6 Os limites da aplicação da lei estrangeira nas questões
concernentes às pessoas jurídicas 103
4.6.1 Limite jurídico da ordem pública e das normas
imperativas 104
4.6.2 As normas imperativas ou leis de polícia 108
4.7 Julgados internacionais concernentes à matéria 109
4.7.1 Caso Barcelona Traction,Light and Power Company
Limited 109
4.7.2 Caso Champion Trading Company 113
4.7.3 Caso Autopista Concesionada de Venezuela, C.A. 115
5 Considerações finais 117
6 Referências bibliográficas 121
7 Anexos 129
7.1 Lei de Introdução ao Código Civil de 1916 (excertos)
129
7.2 Lei de Introdução ao Código Civil de 1942 (excertos)
129
7.3 Projeto de Lei nº 4.905/95 (excertos) 130
7.4 Código de Bustamante de 1928 (excertos) 133
7.5 Convention on the Settlement of Investment disputes
between States and Nationals of other States (excertos) 135
7.6 Convenção Interamericana sobre conflitos de leis em
matéria de sociedades mercantis OEA Montevidéu 1979
136
7.7 Convenção Interamericana sobre Personalidade e
Capacidade de Pessoas Jurídicas no Direito Internacional
Privado OEA La Paz 1984 136
7.8 Projeto de Lei Geral de Aplicação das Normas Jurídicas de
Haroldo Valladão (excertos) 137
7.9 Convencion sobre el Reconocimiento de la Personeria
Juridica de las Sociedades, Asociaciones Y Fundaciones
Extranjeras 1956 138
7.10 Caso Barcelona Traction, 24 de julho 1964 141
7.11 Caso Barcelona Traction, 05 de fevereiro 1970 145
Die Mitgliedstaaten der EG können die
Wahrnehmung der Nierderlassungsfreheit durch
eine in einen anderen Mitgliedstaat wirksam
gegründete Gesellschaft nicht von Beachtung
ihres nationalen Gesellschafts-rechts abhängig
machen. In das Kollisionsrecht übersetzt heißt
dies: Gesellschaften sind im Staat ihrer
Niederlassung nach dem Gründungsrecht zu
behandeln.
Prof. Dr. Heribert Hirte, LL.M. (Berkeley),
Geschäfsführender Direktor, Universität
Hamburg.
1
Introdução
A principal função do Direito é regular as relações humanas, é
buscar a harmonia do convívio social. Sabemos que a sociedade está,
historicamente, em constante evolução e, nos últimos 50 anos, essa é
impulsionada principalmente pelo desenvolvimento tecnológico. As
relações sociais são fortemente ligadas ao fator econômico, que, por
sua vez, sofre alterações constantes, motivadas na sua grande maioria
pelos benefícios da tecnologia que apresenta inovações em larga
escala, reflexo direto do conhecer humano.
Esse crescimento rompe barreiras físicas, limites territoriais,
culturais e sociais em benefício de melhor situação financeira de
indivíduos, sociedades, comunidades e nações.
Atualmente, não se concebe mais a idéia de que cada grupo
social produza tudo que necessita para sua subsistência. Vivemos na
Era da especialidade. Cada comunidade produz, em grande escala,
produtos que não pode consumir e, assim, gera a necessidade de
comercializá-la com o objetivo de obter outros produtos de sua
necessidade e não produz.
Esse comércio nos traz uma nova realidade, denominada
globalização
1
. Nesse processo, Estados se unem para formar blocos
1
Sérgio Alberto de Souza, em sua crítica ao neoliberalismo, traz uma distinção entre
globalização e mundialização, a entende-os como dois conceitos diversos: “Fala-se de
mundialização ou da globalização como se ambos os termos tivessem o mesmo sentido.
Ora, eles são tão diferentes quanto o são uma descrição e uma ideologia. Não há
dúvida de que a Economia se mundializa: as grandes empresas traçam estratégias
mundiais e os mesmíssimos produtos materiais e imateriais espalham-se pelos cinco
continentes. Por outro lado, também não há dúvida de que os circuitos financeiros
permitem, a cada dia, movimentar US$ 1,4 trilhão no globo e de que as pessoas de
todos os países comunicam-se pela internet. Mas, do mesmo modo que a criação de
uma sociedade informatizada é evidente e de crucial importância para todos, assim
também é arbitrário depreender daí que surge, hoje, uma sociedade global, ou mesmo,
16
econômicos, cada qual defendendo seus interesses. Nesse contexto,
empresas unem forças no intuito de garantir sua própria sobrevivência
numa nova ordem social; nações necessitam das empresas para
promover o desenvolvimento sócio-econômico de seus membros. As
mais visadas são as de capital estrangeiro, ou ditas internacionais,
disputadas, principalmente, por países considerados emergentes que,
para receber investimentos de grande monta, oferecem subsídios
fiscais, condições e infra-estrutura; na maioria das vezes, não
ofertadas às indústrias de capital nacional
2
, ou até mesmo a grupos de
indivíduos que desejem explorar atividade econômica em solo
nacional.
Dessa forma, sem condições ou apoio econômico, as pequenas e
médias empresas ficam à mercê de empresas de maior poderio
econômico que as incorporam, na maioria das situações, em escala
internacional, ou seja, formam grandes grupos econômicos que detêm
empresas em diversos países.
3
como disse há tempos McLuahn, uma aldeia global.” SOUZA, Sérgio Alberto. Direito,
Globalização e Barbárie: Estudos críticos de temas de Direito do Trabalho e de Direitos
Humanos sob a ótica de uma leitura não-liberal.
2
No Brasil, o art. 171 da Constituição Federal de 1988, revogado pela emenda
constitucional de n.º 06/95, trazia dispositivos protecionistas para as empresas
brasileiras de capital nacional: “Art. 171, São consideradas: I- empresa brasileira a
constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País; II-
empresa brasileira de capital nacional aquela cujo controle efetivo esteja em caráter
permanente sob a titularidade direta ou indireta de pessoas físicas domiciliadas e
residentes no País ou de entidades de Direito público interno, entendendo-se controle
efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu capital votante e o exercício, de fato
e de direito, do poder decisório par gerir suas atividades. § 1º, A lei poderá, em relação
à empresa brasileira de capital nacional: I- conceder proteção e benefícios especiais
temporários para desenvolver atividades consideradas estratégicas para a defesa
nacional ou imprescindível ao desenvolvimento do País. § 2º, Na aquisição de bens e
serviços, o poder Público dará tratamento preferencial, nos termos da lei, à empresa
brasileira de capital nacional.” (nosso grifo). Fica claro que o legislador constituinte teve
a preocupação de proteger a empresa brasileira de capital nacional, oferecendo a esta,
por meio de determinação direta, quando usa o verbo, dará, o tratamento preferencial
no que diz respeito à aquisição de bens e serviços por parte do poder Público, ou seja,
esse tinha a obrigação de criar condições específicas para que bens e serviços do
poder Público fossem delegados à empresas brasileiras de capital nacional. Fato
insustentável para as pretensões de privatizar em grande parte a concessão do serviço,
pois desta forma as empresas que não se enquadrassem no quesito, as estrangeiras,
não poderiam receber essas concessões. Se analisarmos o contexto atual, podemos
afirmar que a grande maioria das concessões encontram-se no poder de capital
estrangeiro, direta ou indiretamente.
3
O Estado do Paraná, em meados dos anos noventa, na região metropolitana da
capital, Curitiba, foi protagonista da instalação de algumas empresas de renome
internacional, como a Renault, Volkswagen-Audi e Crysller. A primeira teve sua
instalação vinculada pelos jornais da época ao fechamento de uma unidade na Bélgica.
A última já encerrou suas atividades comerciais. Fatos estes que corroboram com as
críticas de movimentos sindicais e sociais organizados por trabalhadores quanto à
forma como o processo é conduzido.
17
Essa fusão econômica gera, à margem da cultura, dos costumes
e da legislação de cada região, conflitos internacionais de ordem
pública e de ordem privada. Ambos devem ser solucionados pelo
Direito.
Muito comum, na atualidade, empresas de uma determinada
nacionalidade estabelecer relações comerciais com diversas nações,
até considerando blocos econômicos, cujo comércio é efetuado por
empresas de diferentes nacionalidades dentro de um determinado
bloco, como Comunidade Européia, MERCOSUL, ALCA e outros que
certamente virão; bem como entre pessoas jurídicas que pertençam a
outros acordos de livre comércio. Exemplo é o comércio entre entes
coletivos do Brasil e da Itália, entre nações que ainda não participam
desses blocos, caso do Chile com a África do Sul, entre nações em
que pelo menos uma delas faz parte de um bloco econômico, por
exemplo, Brasil e o Chile.
Essas relações podem ser de ordem puramente comercial, ou
seja, a simples compra e venda de produtos, via comércio postal ou
eletrônico, ou por meio de instalação de filial para o comércio de seus
produtos. Neste último caso, no Brasil, faz-se necessário a autorização
do governo brasileiro para seu funcionamento, como reza o artigo 11 §
1º, da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, bem como o artigo
64 do Decreto-Lei n.º 2.627/40; ambos a ser analisados adiante.
A presente pesquisa aborda, no capítulo 2, o tema da pessoa
jurídica, quando desenvolve a discussão atinente à sua natureza
jurídica, especificamente, no que diz respeito às teorias negativa e
positiva de sua existência. Ambas, objeto de criação intelectual dentre
os mais diversos doutrinadores, principalmente na primeira metade do
século XX. No final do capítulo, entende-se por adequado argüir
acerca do reconhecimento das pessoas jurídicas, estranhas ao
ordenamento jurídico que pretendam atuar.
O capítulo 3 trata da nacionalidade da pessoa jurídica e das
discussões que envolvem o tema na doutrina, como conceito, efeitos,
teorias determinadoras da nacionalidade na doutrina estrangeira e
como sucede no Brasil.
18
O fortalecimento e o emprego de pessoas jurídicas, na transição
do século XIX para o XX, impulsionado pelo aprimoramento das
inovações tecnológicas e, dois conflitos armados, ainda na primeira
metade do século XX, muito contribuíram para a criação das mais
diversas teorias acerca da nacionalidade das pessoas jurídicas;
mormente, aliado à indefinição doutrinária da natureza jurídica, bem
como, às incertezas geradas pela I e II grandes guerras.
No contexto jurídico, a nacionalidade da pessoa jurídica
representa tema de vital importância para determinar a lei aplicável a
estas; destarte, no capítulo 4 trata-se do tema confrontado à
legislação pertinente no Brasil: Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro, Lei das Sociedades Anônimas, bem como Tratados que,
mesmo não ratificados pelo Brasil, representam importante fonte de
estudo de legislação internacional.
A legislação aplicável é regrada pela legislação interna de cada
Estado soberano que, por sua vez, dita os limites imperativos à
aplicação legal concernente à pessoa jurídica e aborda-se a questão
no mesmo capítulo que se encerra com a análise de casos
internacionais como o da Barcelona Traction,Light and Power
Company Limited, litígio de ordem internacional que envolveu
nacionalidade e lei aplicável atinentes à pessoa jurídica e apreciados
na Corte Internacional de Justiça e no Centro Internacional para
Solução de Controvérsias Relativas a Investimentos entre Estados e
Nacionais de outros Estados, do Banco Mundial.
2
Noções fundamentais sobre a pessoa jurídica
A concepção da pessoa jurídica, na atualidade a ser quase
unanimidade. Doutrinadores de outras épocas muito discutiram acerca
da existência da pessoa jurídica, mais precisamente da sua existência
no mundo jurídico.
Neste capítulo, pretende-se informar o leitor dessas discussões
doutrinárias no que tange, principalmente às teorias positivistas e
negativistas.
2.1
Definição de pessoa jurídica
A expressão pessoa jurídica
4
foi usada pela primeira vez por A.
Heise em 1807 e, conforme ensinamentos de Pontes de Miranda quem
auferiu notoriedade a ela foi Savigny, expressão essa que substituiu
outras denominações, como “pessoa mística” e “pessoa moral”
5
.
Do início, até meados do século passado, a doutrina ainda
discutia a essência da existência da pessoa jurídica. Várias teorias
foram elaboradas por diversos autores de renome internacional, por
4
“É a expressão adotada para a indicação da individualidade jurídica constituída pelo
homem. É empregada para designar as instituições, corporações, associações e
sociedades, que, por força ou determinação da lei, se personalizam, tomam
individualidade própria, para constituir uma entidade jurídica, distinta das pessoas que a
formam ou que a compõe.” PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico.
5
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado, p. 350.
Amílcar de Castro afirma que tantas outras, “não menos imperfeitas”, foram criadas
como: pessoas sociais, morais, civis, místicas, abstratas, intelectuais, universais,
compostas, de existência ideal. Direito Internacional Privado, p.325.
20
exemplo, da ficção
6
, orgânica
7
, homens destinatários
8
, homens
disponentes
9
, todas do suporte fático, segundo Pontes de Miranda.
Não obstante, José Lamartine Corrêa de Oliveira, chama a
atenção de seu leitor que o estudo do conceito da pessoa jurídica é
contemporâneo, a despeito das opiniões de Binder, que entendia ser
assunto resolvido no século XIX, e de Pinto Falcão, que afirmara ser a
pesquisa, neste sentido, desprovida de senso prático.
10
Leonardo Medeiros Régnier posiciona-se da mesma forma,
quando afirma ser o tema “atualíssimo”, e justifica sua opinião: “Diante
da enorme gama de modificações sociais ocorridas em especial no
decorrer do último século, que, se não viu nascer a revolução
industrial, ao menos a fez amadurecer e, de resto, abarcou outra
revolução, até mais vultosa: a tecnológica. Tudo, é claro, a comportar
questionamentos de relevada ordem para a pessoa jurídica.”
11
Historicamente, os indivíduos já civilizados não mediram esforços
para se associar com a maior gama de interesses, sejam eles sem fim
lucrativo, como, por exemplo, as associações religiosas, beneficentes,
etc.; com fim que visa o lucro e, no demais, sociedades comerciais em
geral e aquelas que, atualmente, no Brasil,
12
podem figurar em ambas
classificações: hospitais, clubes desportivos, etc.
13
A diferença se encontra no tocante ao objeto social dessas
instituições; a sociedade comercial tem por escopo de sua existência a
exploração mercantil, ou seja, habitualidade e profissionalismo no
6
Defendida por autores como Savigny, Puchta, Windscheid. Está teoria considera
apenas o homem, ser humano como pessoa abarcada pelo Direito. (MIRANDA, Pontes
de. op. cit., p. 383.)
7
Entre defensores desta, Beseler, Gierbe, Zitelmann, Regelsberger. Segundo Pontes de
Miranda eles acertaram o conteúdo da vontade coletiva, que há na pessoa jurídica, mas
erram em assimilá-la ao ser vivo. (MIRANDA, Pontes de. ibidem, p. 383.)
Maria Helena Diniz; afirma, “entretanto, essa concepção recai na ficção quando afirma
que a pessoa jurídica tem vontade própria, porque o fenômeno volitivo é peculiar ao ser
humano e não ao ente coletivo.” (DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à
Ciência do Direito, p. 468.)
8
IHERING citado por MIRANDA, Pontes de. ibidem, p. 383.
9
E. HÖLDER citado por MIRANDA, Pontes de. ibidem, p. 383
10
OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa. Conceito de Pessoa Jurídica, p. 7.
11
RÉGNIER, Leonardo Medeiros. Nacionalidade das Sociedades Comerciais, p. 53.
12
Em decorrência do regime fiscal optado pela sociedade.
13
CASTRO, Amílcar de. Direito Internacional Privado, p. 325.
21
exercício dos atos de comércio e, justamente nisso, se distinguem das
demais sociedades.
14
Pode-se entender a pessoa jurídica como se fosse uma pessoa
não natural que, após seu reconhecimento por ordenamento jurídico, é
revestida de capacidade jurídica e, assim, poderá exercer direitos e
deveres como sujeito de direito.
15
Haroldo Valladão entende que o termo pessoas jurídicas não é
adequado, pois as pessoas naturais também são criações do direito,
portanto jurídicas; destarte, prefere o termo pessoas singular e
coletiva, ou até mesmo, para a última, pessoa universal.
16
Pontes de Miranda assevera que a pessoa jurídica possui órgãos,
num paralelo às pessoas naturais, e esses fazem que ela funcione com
perfeição ou imperfeição, ou seja, o órgão poderá estar doente, no
caso da pessoa jurídica má administrada pelo seu representante. Para
o autor, quando a pessoa física, na direção da pessoa jurídica,
direciona suas ações aquém de suas funções ou do que lhes é
permitido, essas já não podem mais ser consideradas de pessoa
jurídica, e sim, ações restritas e imputáveis à pessoa natural.
17
A personalidade jurídica da pessoa moral não se confunde com a
de seus sócios ou dirigentes. Estes a representam e respondem pelos
atos praticados no exercício desta função. A pessoa jurídica sofre
algumas restrições, ou melhor, exceções, quanto a seus direitos e
deveres, como, por exemplo, uma empresa que não pode ser
condenada à pena de prisão, mas pode ser apenada com multa,
impedida de participar de licitações públicas, sofrer restrições
administrativas de seu exercício social, etc.
Ensina-nos Carlos Alberto da Motta Pinto, autor português, que a
capacidade das pessoas coletivas é limitada se comparadas com as
pessoas naturais
18
.
14
NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial, p. 203.
15
JO, Hee Moon. Moderno Direito Internacional Privado, p. 414.
16
VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado, p. 430.
17
MIRANDA,Pontes de. Tratado de Direito Privado, p. 352.
18
PINTO, Carlos Alberto da Motta. Teoria Geral do Direito Civil, p. 192. O autor designa
as pessoas singulares como sinônimo de pessoas físicas ou naturais.
22
De maneira que, podemos concluir, qualquer ação tomada por
pessoa singular no comando de um desses órgãos, é ela passível de
sanções administrativas e penais, se for o caso; a empresa poderá ser
punida, por atos impróprios, lícitos ou não, a ensejar, em casos
extremos, a decretação de falência e conseqüente encerramento de
suas atividades. Neste caso a punição é administrativa para a
empresa, sendo que seus representantes poderão responder,
inclusive, na esfera penal, por eventuais crimes cometidos na gestão
da pessoa jurídica sob sua responsabilidade.
Concorda-se com a posição de Haroldo Valladão, quando afirma
não ser o termo pessoa jurídica o mais adequado para definir os entes
coletivos, pois estes, como o indivíduo, tornam-se jurídicos em virtude
de disposição de Direito, observados os requisitos atinentes. De toda
sorte, opta-se pelo emprego corrente da expressão pessoa jurídica,
por respeito à didática.
2.2
Evolução histórica
Ensina Miguel Maria de Serpa Lopes, que a criação moderna da
pessoa jurídica advém da composição histórica da ideologia do Direito
romano, do Direito germânico e do Direito canônico, compreendidos na
disputa entre dois princípios, o da unidade e o da universalidade.
19
No Direito romano, após a transição, segundo o autor, da
universalidade, cuja individualidade das pessoas humanas
apresentava valor no grupo por eles formado; para a unidade, que por
sua vez representava a coletividade que agrega ao indivíduo,
autonomia e independência, à custa do valor individual da
universalidade. Esse Direito no princípio, por valorar o Estado e
entidades corporativas não estendia a estas característica de sujeito
de direito.
Surgem, posteriormente, duas espécies de pessoa jurídica:
universitates personarum, grupos individuais e, universitates bonorum,
19
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Comentários à Lei de Introdução ao Código Civil, p. 8
e ss.
23
estabelecimentos, fundações, hospitais entre outras. A societas não
fazia parte dessa classificação, pois se entendia que elas
representavam apenas um contrato, que vinculava os sócios, esses
sim sujeitos de Direito.
O conceito, após longo tempo, foi incrementado pelo Direito
germânico, que segundo o autor, dava preferência ao termo sociedade,
a preterir a pessoa jurídica. Afinal, esse povo valorava o senso de
juízo coletivo, no sentido moral da expressão e no sentido jurídico.
Definido pelo autor com a seguinte frase: “um por todos e todos por
um”.
O Direito canônico, sob influência da ideologia religiosa, que
considera a igreja um corpo místico, tratava suas instituições como
entes autônomos e independentes. Assim, coaduna-se com o Direito
romano, por tratar de revestimento unitário da pluralidade, uma
entidade autônoma em relação aos seus membros componentes,
divergindo a concepção canônica apenas quanto à idéia de
instituição...”, em contrário senso ao conceito germânico.
20
Pontes de Miranda ensina que a concepção de pessoa jurídica
tem seu início no Império Romano quando o Estado se vê frente à
necessidade de entrar no comércio. Assim, o municipium passa a ser
pessoa de direito privado e ao longo dos anos se aprimora o conceito
de pessoa jurídica, bem como, também, aprimorou-se o comércio.
21
Atualmente a idéia de comércio já não é mais concebida sem a
figura da pessoa jurídica, pois não mais se comercializa
individualmente o que se encontra na natureza, mas sim o que se
produz com ajuda dela; e a produção da maioria dos produtos depende
não mais de um só indivíduo, mas de uma coletividade cada vez maior
e bem organizada, ou seja, depende da organização de indivíduos,
representados por associações e sociedades, por isso a expressão
pessoas coletivas
22
.
20
LOPES, Miguel Maria de Serpa. op. cit, p. 10.
21
MIRANDA,Pontes de. Tratado de Direito Privado, p. 349.
22
A expressão “pessoas colectivas” é usada, entre outros, por Carlos Alberto da Motta
Pinto. Teoria Geral do Direito Civil.
24
2.3
Natureza jurídica
2.3.1
Teoria negativista
As correntes teóricas que se formaram a respeito da pessoa
jurídica podem ser divididas em duas: a negativista, dos que negam a
sua existência, a dos que consideram uma ficção do Direito e a
positivista, formada por diversos autores, doutrina dominante e atual,
que reconhecem a pessoa coletiva como sujeito de direitos e deveres,
criada pelos mais diversos ordenamentos jurídicos. Cada qual a seu
modo.
A nacionalidade da pessoa jurídica, tema adiante abordado, é
constantemente empregada para a discussão do assunto em questão;
existência ficta ou real da pessoa jurídica.
Nesse sentido a teoria da criação fictícia levada a extremos,
apresenta argumentos relacionados com a nacionalidade, cuja
capacidade de atribuição somente seria possível às pessoas
singulares, pois características como o amor à pátria estão presentes
apenas na capacidade intelectual, logicamente ausente na pessoa
coletiva.
23
A nacionalidade foi argumento utilizado em duas decisões, em 30
de setembro de 1920 e em 30 de novembro de 1923, pelo Tribunal
Arbitral misto franco-alemão, para negar nacionalidade à sociedade
anônima e outra em comandita, pois ela necessariamente conduziria a
direitos inaplicáveis às pessoas jurídicas, como direito a voto para
cargo eletivo, exercício de funções públicas, serviço militar, entre
outros.
24
Theophilo de Azeredo Santos assevera que o equívoco daquele
que se baseia na teoria negativista é inserto na crença de que “o laço
de nacionalidade ocasiona, sempre, as mesmas conseqüências” e, ao
23
SANTOS, Theophilo de Azeredo. Regime Jurídico das Sociedades Comerciais, p. 27.
25
se tratar da nacionalidade da pessoa jurídica, não há intenção de se
atribuir a ela qualquer dos atributos atinentes à pessoa física. A
pretensão é apenas de inseri-las num contexto jurídico.
25
Haroldo Valladão afirma que “o delicadíssimo problema das
pessoas jurídicas de direito privado no DIP não comporta soluções
simplistas, nem radicais, decorrentes de extremismos doutrinários,
superadas teorias e doutrinas da ficção, organicista, etc...”
26
Segundo o mesmo autor, assumir a posição ficcionista é algo
inconcebível, pois “proclamar que as sociedades, associações e as
fundações não têm capacidade, quando estão em vigor, em todos os
países, dezenas de textos internacionais, constitucionais, legais e
regulamentares, que as consagram de maneira clara e positiva... A
assemelhação (e não identificação) às pessoas naturais é normal,
razoável, e foi a finalidade da criação das pessoas jurídicas.”
27
Amílcar de Castro, a interpretar Planiol e Ripert, afirma que estes
“negam a existência de pessoa, ou sujeito de direito, além do homem.
Começam por distinguir a propriedade coletiva da individual indivisa,
para chegar à conclusão de que a pessoa jurídica é uma concepção
tão falsa quanto inútil, arquitetada para se pôr em lugar dos sujeitos
reais da propriedade coletiva, como se esta fosse individual”.
28
Complementa o referido autor: “Para os grandes civilistas, uma
fortaleza, um couraçado, o Louvre, o British Museum, não pertencem
ao Estado, mas aos indivíduos que formam a nação; não à França, não
à Inglaterra, mas aos franceses, ou aos ingleses, os quais não podem
dispor desses bens, porque estão presos a um fim”.
29
Nesse universo,
Planiol e Ripert somente reconhecem o ser humano como sujeito titular
de direitos.
30
24
SANTOS, Theophilo de Azeredo. op. cit., p. 27.
25
SANTOS, Theophilo de Azeredo. ibidem, p. 31 e 32.
26
VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado, p. 430.
27
VALLADÃO, Haroldo. op. cit., p. 431.
28
CASTRO, Amílcar de. Direito Internacional Privado, p. 328.
29
CASTRO, Amílcar de. op. cit., p. 328.
30
CASTRO, Amílcar de, a citar Planiol e Ripert. Traité élementaire de droit civil. V. I, n.
3.005, p. 984-990, in fine. op. cit., p. 328.
26
Essas teorias perdem sua eficácia na doutrina contemporânea,
pois a existência da pessoa jurídica é inegável e completamente
necessária para a economia capitalista da atualidade; numa empresa a
personalidade não se confunde com a de seus sócios, bem como essa
é reconhecida pela maioria dos Estados da atualidade. Ela deve ser
capaz, tal qual a pessoa natural, conforme a lei que estabeleça estes
direitos e deveres.
Nesse sentido, a teoria da realidade das instituições jurídicas, de
Hauriou e Rènard
31
; a afirmarem ser o Direito que estabelece a
personalidade jurídica das pessoas naturais não vêem diferença
quanto a esta ser estabelecida para as sociedades, vez que são
formadas pela vontade de um grupo de pessoas naturais capazes de
associação.
No início do século XX, a doutrina deixava transparecer as
dúvidas que pairavam acerca da existência da pessoa jurídica. Alguns
afirmavam que ela não existia e outros defendiam ser esta tão real
quanto qualquer outro instituto jurídico. Nas palavras de Amílcar de
Castro é “com estes que está a razão”.
32
2.3.2
Teoria positivista
Ao longo do tempo, foram criadas várias teorias que consideram
a pessoa jurídica uma realidade. Estas podem ser classificadas
didaticamente na Teoria da Realidade Objetiva
33
ao considerar a
pessoa jurídica como necessidade real imposta pelas relações sociais.
Destarte, afirma João Grandino Rodas inexistir ficção da
personalidade jurídica, seja para ocultar patrimônio ou mesmo
indivíduos.
34
31
Citados por Maria Helena Diniz. (Compêndio de Introdução à Ciência do Direito, p.
468.)
32
CASTRO, Amílcar de. op.cit., p. 325.
33
Gierke (Teoria Organicista), Zitelmann (Teoria da Vontade) e, Bernatzik e Michoud (
Teoria do Direito Subjetivo).
34
RODAS, João Grandino. Sociedade Comercial e Estado, p. 23.
27
Nas palavras do autor:
As teorias ditas clássicas, embora variegadas,
coincidiam em um ponto: buscavam substrato
sociológico, a essência ontológica do que em direito se
denomina pessoa jurídica. Já as doutrinas
contemporâneas, cansadas de dogmatismos das
teorias clássicas, vêem a questão sob novo prisma,
mormente porque os instrumentos jurídicos tradicionais
não são aptos a enfrentar a conformação atual da
pessoa jurídica. São características das doutrinas
contemporâneas: o abandono da ultrapassada
concepção unitária e absoluta da personalidade, a
não-aceitação de construções apriorísticas e gerais, e
a consideração da personalidade jurídica com meio
técnico-jurídico de se alcançar certos objetivos.
35
Amílcar de Castro, numa visão moderna do instituto e da teoria
da pessoa jurídica, considera possível, doutrinariamente, eliminar a
instituição pessoa jurídica, pelo simples fato de ela ser uma criação do
Direito, portanto “inexistentes no mundo objetivo”. Para o autor, a
doutrina jurídica pode ser tanto favorável ao instituto da pessoa
jurídica, como desfavorável; já o questionamento acerca do tema “é
insolúvel por ser destituída de sentido”; mas deve ser inserto a seu
tempo histórico.
36
A crítica do referido autor faz-se aos que comparam ou
relacionam o ser humano com a pessoa, pois aquele existe no mundo
objetivo, mas esta é uma criação da ordem jurídica e ambos jamais
podem ser confundidos ou identificados como se fosse um só
elemento. Em sua concepção não existe sentido em eliminar a pessoa
jurídica pelas mesmas razões que não pretendemos eliminar outros
institutos criados pela ordem jurídica como, por exemplo, divórcio,
enfiteuse e compra e venda, pois se a pessoa jurídica é ficção, esses
também o são e nem por isso, fundado neste argumento, pretende-se
sua eliminação.
37
Leonardo Medeiros Régnier aborda o tema ao justificar evolução
da pessoa jurídica quando a esta foi atribuída personalidade jurídica e,
se o Direito “entende ser necessário o enquadramento das pessoas
35
RODAS, João Grandino. op. cit, p. 26.
36
CASTRO, Amílcar de. op.cit., p. 329.
37
CASTRO, Amílcar de. ibidem, p. 329.
28
jurídicas como sujeito, somos levados a concordar por alguns
aspectos em que a pessoa jurídica é, por conseguinte, uma criação
do Direito.”
38
Segue o autor:O Direito precisava encontrar alguma forma de
tutelar esses interesses comuns, vez que os interesses particulares,
das pessoas que compunham determinada sociedade, já estavam
tutelados e não se confundiam como os coletivos.”
39
José Lamartine Corrêa Oliveira, sustenta a necessidade da
previsibilidade legal do reconhecimento da pessoa jurídica, quando
argumenta que, “para que a lei reconheça, é preciso que reconheça
algo que, anteriormente ao reconhecimento, já possua as
características ontológicas necessárias ao reconhecimento.”
40
O autor
ainda conclui, “a lei não reconhece qualquer coisa”.
Sustenta José Lamartine Corrêa Oliveira, em sua obra:
A pessoa jurídica é realmente pessoa e não
ficticiamente pessoa. É, porém pessoa de modo
analógico. [...] Entretanto, ela não é substancial.
Depende, para existir, dos seres humanos, que estão
sob sua existência. Entretanto, é ser, pois o acidente é
ser. No fato de que o acidente existe como
complemento ou acabamento de outro ser encontramos
outra comprovação de que a pessoa jurídica é um ser
acidental. Acidental, pois que existe para complemento
do ser humano, que, sendo social, deseja os grupos
associativos, e recebe utilidade das fundações. Aí
está, portanto. Pessoa jurídica: realidade análoga à
pessoa humana, porque idêntica em inúmeros
aspectos e distinta no mais importante: a
substancialidade, que esta possui e aquela não. É
pessoa, portanto. Mas não no sentido pleno da palavra
e sim por analogia.
41
Concorda-se, assim, com a doutrina contemporânea e dominante.
A pessoa jurídica, não obstante ser uma criação do Direito, é real e
representa papel relevante no contexto sócio-econômico moderno a
ponto de, nos casos de corporações internacionais, não ser possível
identificar o laço de sua criação, mas apenas os atuais representantes
38
RÉGNIER, Leonardo Medeiros. Nacionalidade das Sociedades Comerciais, p. 54.
39
RÉGNIER, Leonardo Medeiros. ibidem, p. 54.
40
OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa. A Dupla Crise da Pessoa Jurídica, p. 17.
41
OLIVEIRA, José Lamartine Corrêa. Conceito de Pessoa Jurídica, p. 164 e 165.
29
da organização. Estes, por sua vez, em grande número de casos,
ocorre na figura de outro ente coletivo.
2.4
Aquisição de personalidade
A legislação brasileira estabelece o momento de aquisição da
personalidade jurídica com o registro civil da pessoa jurídica de direito
privado, disciplinada pelos artigos 45 e 46, por determinação do art.
985, do Código Civil Brasileiro
42
, bem como os artigos 114 e 121, da
Lei n.º 6015/73.
43
Cumpridos os requisitos legais, a sociedade passa a
fruir de direitos e obrigações com vida própria e sua personalidade não
se confunde com a de seus sócios, no caso de sociedade de
responsabilidade limitada
44
. Dessa forma, pode exercer seus direitos e
42
“Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a
inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de
autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as
alterações por que passar o ato constitutivo. Parágrafo único. Decai em três anos o
direito de anular a constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do
ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro.”
Art. 46. O registro declarará: I - a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e
o fundo social, quando houver; II - o nome e a individualização dos fundadores ou
instituidores, e dos diretores; III - o modo por que se administra e representa, ativa e
passivamente, judicial e extrajudicialmente; IV - se o ato constitutivo é reformável no
tocante à administração, e de que modo; V - se os membros respondem, ou não,
subsidiariamente, pelas obrigações sociais; VI - as condições de extinção da pessoa
jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso.”
Art. 985. A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro
próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos.”
Art. 993. O contrato social produz efeito somente entre os sócios, e a eventual
inscrição de seu instrumento em qualquer registro não confere personalidade jurídica à
sociedade.”
43
Lei de Registros Públicos: “Art. 114. No Registro Civil de Pessoas Jurídicas serão
inscritos: I - os contratos, os atos constitutivos, o estatuto ou compromissos das
sociedades civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias, bem como o das
fundações e das associações de utilidade pública; II - as sociedades civis que
revestirem as formas estabelecidas nas leis comerciais, salvo as anônimas; III - os atos
constitutivos e os estatutos dos partidos políticos.”
“Art. 121. Para o registro serão apresentadas duas vias do estatuto, compromisso ou
contrato, pelas quais far-se-á o registro mediante petição do representante legal da
sociedade, lançando o oficial, nas duas vias, a competente certidão do registro, com o
respectivo número de ordem, livro e folha. Uma das vias será entregue ao representante
e a outra arquivada em cartório, rubricando o oficial as folhas em que estiver impresso o
contrato, compromisso ou estatuto.”
44
Pode ocorrer a despersonificação da pessoa jurídica; tema disciplinado pelo Código
Civil Brasileiro:
”Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de
finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte,
ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de
certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares
dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”
“Art. 51. Nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu
funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua. § 1º
Far-se-á, no registro onde a pessoa jurídica estiver inscrita, a averbação de sua
30
adquire a nacionalidade brasileira,
45
salvo registro efetuado por
sociedade constituída no estrangeiro. Essa, além do registro,
necessita de autorização do governo brasileiro para atuar dentro do
território
46
, do mesmo modo que algumas empresas de setores
considerados estratégicos, a exemplo de seguradoras
47
ou suas
sucursais
48
, montepios, caixa econômicas e bolsas de valores
49
, salvo
cooperativas e sindicatos profissionais e agrícolas
50
.
dissolução. § 2º As disposições para a liquidação das sociedades aplicam-se, no que
couber, às demais pessoas jurídicas de direito privado. § 3º Encerrada a liquidação,
promover-se-á o cancelamento da inscrição da pessoa jurídica.”
“Art. 52. Aplica-se às pessoas jurídicas, no que couber, a proteção dos direitos da
personalidade.”
45 Desde que a sede efetiva da empresa também seja no Brasil, tema adiante
abordado.
46
Art. 11, § 1º da LICCb.
47
Dec. Lei N.º 2.063/40; Dec. Lei n.º 73/66, “art. 74. A autorização para funcionamento
será concedida através de Portaria do Ministro da Indústria e do Comércio, mediante
requerimento firmado pelos incorporadores, dirigido ao CNSP e apresentado por
intermédio da SUSEP.
48
Agências auxiliares da matriz, não se confundem com filiais, que tem vida própria, a
essa devem direta subordinação, funcionam como um braço da matriz em local diverso
da sede. Pode representar, inclusive, sucursal de empresa estrangeira que deseje atuar
em território diverso do de sua constituição e sede principal, portanto, no caso, esta
ainda teria que obter uma autorização específica por este motivo do governo brasileiro.
49
Lei n.º 4.728/65:
”Art. 7º Compete ao Conselho Monetário Nacional fixar as normas gerais a serem
observadas na constituição, organização e funcionamento das Bolsas de Valores, e
relativas a: I - condições de constituição e extinção; forma jurídica; órgãos de
administração e seu preenchimento; exercício de poder disciplinar sobre os membros da
Bolsa, imposição de penas e condições de exclusão; II - número de sociedades
corretoras membros da Bolsa, requisitos ou condições de admissão quanto à
idoneidade, capacidade financeira, habilitação técnica dos seus administradores e
forma de representação nas Bolsas; III - espécies de operações admitidas nas Bolsas;
normas, métodos e práticas a serem observados nessas operações; responsabilidade
das sociedades corretoras nas operações; IV - administração financeira das Bolsas;
emolumentos, comissões e quaisquer outros custos cobrados pelas Bolsas ou seus
membros; V - normas destinadas a evitar ou reprimir manipulações de preços e
operações fraudulentas; condições a serem observadas nas operações autorizadas de
sustentação de preços; VI - registro das operações a ser mantido pelas Bolsas e seus
membros; dados estatísticos a serem apurados pelas Bolsas e fornecidos ao Banco
Central; VII - fiscalização do cumprimento de obrigações legais pelas sociedades cujos
títulos sejam negociados na Bolsa; VIII - percentagem mínima do preço dos títulos
negociados a termo, que deverá ser obrigatoriamente liquidada à vista; IX - crédito para
aquisição de títulos e valores mobiliários no mercado de capitais. § 1º Exceto na
matéria prevista no inciso VIII, as normas a que se refere este artigo somente poderão
ser aprovadas pelo Conselho Monetário Nacional depois de publicadas para receber
sugestões durante 30 (trinta) dias. § 2º As sugestões referidas no parágrafo anterior
serão feitas por escrito, por intermédio do Banco Central.”
“Art. 8º A intermediação dos negócios nas Bolsas de Valores será exercida por
sociedades corretoras membros da Bolsa, cujo capital mínimo será fixado pelo
Conselho Monetário Nacional. § 1º Revogado. § 2º As sociedades referidas neste artigo
somente poderão funcionar depois de autorizadas pelo Banco Central, e a investidura
dos seus dirigentes estará sujeita às condições legais vigentes para os administradores
de instituições financeiras. § 3º Nas condições fixadas pelo Conselho Monetário
Nacional, a sociedade corretora poderá ser membro de mais de uma Bolsa de Valores.
§ 4º Os administradores das sociedades corretoras não poderão exercer qualquer cargo
administrativo, consultivo, fiscal ou deliberativo em outras empresas cujos títulos ou
valores mobiliários sejam negociados em Bolsa. § 5º As sociedades referidas neste
artigo, ainda que não revistam a forma anônima, são obrigadas a observar as normas
31
2.5
Reconhecimento da pessoa jurídica de direito privado
estrangeira
O reconhecimento da pessoa jurídica de direito privado
estrangeira é um problema a ser resolvido pelo Direito Internacional
Privado, pois ela ainda não goza dos direitos que as pessoas naturais
gozam.
Miguel Maria de Serpa Lopes afirma, em sua obra:
Todos quantos consideram as pessoas jurídicas como
realidades, sejam quais forem os fundamentos de onde
partam, atribuem os mais largos efeitos internacionais
a essas entidades, e se algumas restrições fazem,
concernem exclusivamente aos efeitos dêsse
reconhecimento, à condição do exercício dos direitos,
que, em princípio, lhe são reconhecidos.
51
A importância do reconhecimento pode ser extraída das palavras
de Hee Moon Jo:Qualquer pessoa jurídica tem o local de
incorporação no qual adquire personalidade jurídica. Para que essa
pessoa jurídica possa vir a atuar em outro país, deverá adquirir a
personalidade jurídica daquele país, ou então, ter sua personalidade
jurídica reconhecida naquele país”
52
.
Para Maria Helena Diniz:Pessoas jurídicas constituídas de
conformidade com a lei do lugar onde nasceram serão tidas como
válidas em outros Estados que as reconheçam”
53
.
A autora chama a atenção para a diferença entre reconhecer a
personalidade jurídica e a autorização para funcionar em país diverso
de sua nacionalidade. No primeiro caso, esse reconhecimento é feito
de que trata o art. 20, § 1º, "a", "b". § 6º O Conselho Monetário Nacional assegurará
aos atuais corretores de fundos públicos a faculdade de se registrarem no Banco
Central, para intermediar a negociação nas Bolsas de Valores, sob a forma da firma
individual, observados os mesmos requisitos estabelecidos para as sociedades
corretoras previstas neste artigo, e sob a condição de extinção da firma, por morte do
respectivo titular, ou pela participação deste em sociedade corretora.”
Resolução n.º 39/66; Lei n.º 6.385/76 e Lei n.º 6.404/76, Lei das Sociedades Anônimas.
50
CLT artigos 511 e seguintes; CF, art. 8º, I e II.
51
LOPES, Miguel Maria de Serpa. Comentários à Lei de Introdução ao Código Civil, p.
19.
52
JO, Hee Moon. Moderno Direito Internacional Privado, p. 416.
53
DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada, p.297.
32
pelo Estado de sua constituição e no segundo, depende do Estado
cuja empresa pretenda se instalar para exercer suas funções. Quando
da autorização deferida, a pessoa coletiva adquire o que a autora
chama de, “capacidade funcional”.
Eduardo Espinola argumenta que a personalidade jurídica das
pessoas físicas é aceita por todos os países do mundo civilizado, e
afirma que se trata de uma regra de Direito Internacional, embora
pondere que o mesmo não ocorre com as pessoas morais. Para o
autor, houve um grande movimento no final do século XIX no que diz
respeito às relações internacionais. Esse movimento atingiu o ápice no
século passado, que “devia necessariamente conduzir as sociedades
de toda a natureza constituídas num Estado a entrar em relações com
os indivíduos e as sociedades e empresas de outros Estados, em cujo
território teriam de fazer valer os seus direitos para praticar e exercer
os seus direitos privados em território estrangeiro, como a aquisição
de bens móveis e imóveis, a constituição de direitos creditórios
resultantes dos contratos de compra e venda internacionais, que todos
os dias se ajustam em número avultadíssimo, ou o recebimento de
bens por sucessão causa mortis.
54
Para o referido autor, o “fenômeno” do reconhecimento propicia
possibilidade das pessoas coletivas terem seus direitos reconhecidos
em “qualquer parte onde surjam dúvidas e controvérsias em torno das
relações jurídicas estabelecidas.”
55
Eduardo Espinola complementa seu raciocínio ao afirmar não
existir regra de direito internacional que reconheça a personalidade
jurídica das pessoas coletivas, mas de toda sorte não se encontra em
país algum a recusa absoluta da qualidade de sujeito de direitos a
essas.
56
54
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro, p. 139.
55
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. ibidem, p. 139.
56
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. ibidem, p. 139.
33
O reconhecimento de que não só a pessoa natural possui
personalidade jurídica é notório em quase todos os autores, dentre os
quais a doutrina francesa. Juntamente com aquele, o direito positivo
de países modernos reconhece a outros entes a qualidade de sujeito
de direito.
57
Jean-Pierre Niboyet, em análise do mundo contemporâneo,
escreve:
Desde um século, e, particularmente, depois de 1914,
o mundo se transformou. Por toda a parte,
desapareceram as empresas individuais diante das
sociedades de capitais. Hoje, no mundo, os indivíduos
agem sob a forma coletiva. Trate-se de interesses
profissionais, ou de outros, a associação se substitui à
ação individual. De nada serve negar essa
constatação. Não é singular que dois estrangeiros, se
agem individualmente, possam fazer reconhecer os
seus direitos, ao passo que, constituindo, no seu país,
uma pessoa jurídica, se arriscam a vê-la sem
personalidade fora da pátria?
58
Ainda, segundo Eduardo Espinola, os países obedecem a “dois
sistemas fundamentalmente distintos”. Há os que seguem a teoria da
ficção, que só admite o reconhecimento com autorização do Estado, e
os que seguem o princípio da realidade da pessoa jurídica. Nestes,
não há necessidade de qualquer tipo de reconhecimento, no tocante à
personalidade jurídica de pessoa jurídica de direito privado
estrangeira. O primeiro sistema está cada vez mais em desuso, pois os
países que ainda adotam a teoria da ficção tendem ao reconhecimento
automático. “Também quanto às sociedades civis estrangeiras, o
reconhecimento da sua personalidade jurídica está relacionado com o
caráter, que lhes atribui a lei do Estado, onde se constituíram. A
tendência, de modo geral, é para o reconhecimento de pleno direito,
independentemente de qualquer autorização”
59
.
Para Pontes de Miranda, “o reconhecimento das pessoas
jurídicas criadas noutro direito depende do direito interno de cada
57
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. op. cit., p. 122.
58
NIBOYET, Jean-Pierre. Traité de Droit International Privé, vol. 2º, 1938, p. 319, apud,
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. op. cit., p. 141.
59
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. op. cit., p. 142
34
Estado, onde se cria de novo”,
60
sendo assim no Brasil, segundo
Amílcar de Castro, a pessoa jurídica de direito privado estrangeira é
reconhecida pela lei brasileira, com base no princípio da continuidade
das leis, pois assim era vislumbrado no art. 19 da antiga lei de
introdução ao Código Civil Brasileiro,
61
a despeito deste não fazer
parte do texto da Lei de Introdução vigente, “consagrado pelo art. 2º
da mesma Lei de Introdução, uma vez que se harmoniza tanto com a
disposição do art. 11, como com a do art. 17, interpretado a contrario
sensu.”
62
Theophilo de Azeredo Santos segue o mesmo raciocínio. Para
este autor, a vigência do artigo 19 da antiga Lei de Introdução é
implícita pelo mesmo princípio supra citado, pois não houve a
revogação tácita ou expressa, na conformidade com o disposto no
artigo 2º da Lei de Introdução ao Código Civil, quando estipula a
validade de lei, não temporária, até o momento que outra a revogue ou
modifique.
A legislação brasileira não é clara quanto à distinção entre
nacionalidade e lei aplicável à pessoa jurídica, e apesar de serem
duas situações distintas, optou-se por subdividir o tema nesta, nos
próximos dois capítulos, sendo que o primeiro trata da nacionalidade
da pessoa jurídica e o segundo trata da lei aplicável, mas com forte
influência do tema da nacionalidade, pois se entende estar a
nacionalidade intimamente ligado à lei aplicável.
60
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Internacional Privado, p. 478.
61
Dispunha o artigo 19 da antiga lei de introdução ao código civil brasileiro: “São
reconhecidas as pessoas jurídicas estrangeiras.”
62
CASTRO, Amílcar de. Direito Internacional Privado, p. 347.
3
A nacionalidade da pessoa jurídica
3.1
Conceito da nacionalidade
A nacionalidade é um vínculo jurídico de direito público segundo
o qual uma pessoa é membro da comunidade política que um Estado
constitui, conforme o direito vigente no mesmo.
63
3.2
Efeitos da nacionalidade
O conceito da nacionalidade, se bem que referido à qualidade da
pessoa, faz alusão mais caracteristicamente à pessoa física. Isso se
observa nos seguintes efeitos, que relacionados aos indivíduos,
operam o vínculo da nacionalidade no direito interno e no direito
internacional.
64
3.2.1
Nas pessoas físicas
Analisa-se aqui, brevemente, os efeitos da nacionalidade nas
pessoas naturais, cujo cunho é possibilitar ao leitor a simples
comparação com os efeitos nas pessoas coletivas, adiante analisado.
63
DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado, p. 153. MACHADO, João Baptista.
Lições de Direito Internacional Privado, p. 100 e ss.
64
Obra completa sobre o tema: LOUSSOUARN, Yvon. Les Conflits de Lois em Matière
de Sociétés. A doutrina argentina também dá tratamento à questão, vide ROMERO Del
Prado, Víctor Nicolás. Manual de Derecho Internacional Privado.
36
a) Outorga a determinadas pessoas os direitos e os deveres
políticos e determina suas obrigações militares;
b) Faculta para o desempenho de determinadas funções públicas;
c) Autoriza a obtenção do passaporte, retorno e/ou repatriação.
d) Habilita para obter a proteção diplomática do Estado caso
interesses de seus nacionais sejam lesionados no estrangeiro. Por
outra parte, em matéria de direito privado, a nacionalidade serve de
ponto de conexão para regular o estatuto pessoal (estado e
capacidade das pessoas), certas relações de família e o regime
sucessório em países do grupo continental europeu e alguns
americanos (Costa Rica, Cuba e Venezuela).
Todos esses efeitos vinculam-se à qualidade individual, pessoa
física, do sujeito de direitos como conseqüência de sua condição de
nacional.
3.2.2
Nas pessoas jurídicas
O que ocorre em matéria de pessoas jurídicas?
No caso de atribuir-se nacionalidade, os efeitos mencionados nas
letras a, b e c, supra, direitos e deveres políticos, exercício de funções
públicas, direito ao passaporte, retorno e repatriação são atributivos
das pessoas físicas e não teriam relevância alguma em se tratando de
pessoas jurídicas.
65
Mais delicada é a solução relacionada à proteção diplomática
(letra d) no caso de interesses da pessoa jurídica serem aviltados no
estrangeiro. Isso provocaria um caso de responsabilidade internacional
do Estado, quando, e somente quando, tiver incorrido em injustiça,
decorrente de ato ilícito por parte do Estado estrangeiro, esgotado no
65
RECHSTEINER, Beat Walter. Direito Internacional Privado: teoria e prática, p. 143 e
ss. LOUSSOUARN, Yvon; BOUREL, Pierre. Droit International Privé, p. 653 e ss.
37
mesmo os recursos locais de administrar a Justiça. Nesses casos,
poderá intervir o Estado dos nacionais afetados.
66
Para Luiz Viana, se necessário diferenciar nacionais de
estrangeiros, por parte do Estado, a fim de excluir certos direitos da
égide dos forasteiros, torna-se incompreensível a idéia de não se
estender esse raciocínio a indivíduos no exercício de atividades sob a
forma coletiva, pois, por sua vez, essa sob ponto de vista econômico é
consideravelmente mais forte, o que importa em maior perigo para o
Estado. “Por esta razão, julgamos absolutamente indispensável
aplicar-se às sociedades a noção de nacionalidade, embora nessa não
possamos encontrar todas as características técnicas da
nacionalidade, em relação às pessoa físicas.”
67
Na classificação de pessoas jurídicas, as sociedades comerciais
desempenham um papel relevante. A importância dos capitais que
representam e a índole variada de sua atividade, fazem-nas um
elemento cuja atuação seja objeto da mais cuidadosa atenção por
parte do Estado. Este legisla, de forma prolixa, todos os requisitos de
vida, atuação, direitos, deveres e extinção das sociedades, vez que
66
Consultar CAICEDO Castilla, José Joaquín. Derecho Internacional Privado, p. 54 e
ss. O alcance de dita intervenção do Estado fora precisado por dois argentinos: Carlos
Calvo e Luis Maria Drago. O primeiro dizia, em seu tratado de Direito Internacional
(Paris, 1968), ao comentar as intervenções armadas francesas no México e franco-
inglesa no Rio da Prata: “Segundo o direito internacional estrito, a cobrança de créditos
e a gestão de reclamações privadas não justificam de plano a intervenção dos governos
e, como os Estados europeus seguem invariavelmente essa regra em suas relações
recíprocas, não tem razão para que não se lhe imponham também em suas relações
com os Estados do Novo Mundo.” Tal doutrina originou a chamada “Cláusula Calvo”;
incluída em certos contratos entre um Estado e uma pessoa de nacionalidade
estrangeira. A tese do Ministro das Relações Exteriores, Luis Maria Drago, fora
formulada em 1902 no plano do direito público internacional, ante as medidas de força
tomadas pela Alemanha, Grã-Bretanha e Itália contra a Venezuela. Dizia o Canciller na
nota dirigida ao representante argentino em Washington, em 29 de dezembro de 1902:
“...O único que a República Argentina sustenta e o que viria com a grande satisfação
consagrado com motivos dos sucessos da Venezuela... é o princípio já aceito de que
não pode haver expansão territorial na América, nem opressão dos povos desse
continente, porque uma desgraçada situação financeira pudesse levar a alguns deles a
diferir o cumprimento de seus compromissos; em uma palavra, o princípio que quisera
ver reconhecido é o de que a dívida pública não pode dar lugar à intervenção armada
nem à ocupação material do solo das nações americanas por uma potência
européia”.Na Declaração de princípio sobre solidariedade e cooperação americanas,
formulada em 21 de dezembro de 1936, na Conferência Extraordinária de Buenos Aires,
todos os Estados americanos expressaram, sem limitações, que “o princípio de que é
ilícito a cobrança compulsiva das obrigações pecuniárias” é aceito pela comunidade
internacional americana. RODAS, João Grandino. Sociedade Comercial e Estado, p. 359
e ss, mais especificamente quando trata do caso Barcelona Traction,Light and Power
Company Limited.
67
VIANA, Luiz. Da Nacionalidade das Sociedades, p. 19.
38
exerce sobre elas, por intermédio de seus órgãos administrativos
competentes, uma determinada supervisão. Isso, na ordem interna.
Quando a sociedade comercial se internacionaliza, vale dizer,
vincula seu campo de ação e atuação ao de duas ou mais soberanias
de igual hierarquia, mas diversas, sua importância e a índole de sua
atividade cobram uma transcendência maior.
Essa atividade será primordial quando afete interesses locais
vinculados ao desenvolvimento e ao crescimento econômico dos
países em que sociedades estrangeiras concorrem com seus capitais
para o exercício de atividades estreitamente vinculadas com aqueles
interesses e objetivos.
Entra-se, assim, no campo da extraterritorialidade das pessoas
jurídicas e, dentro delas, especialmente, das sociedades comerciais.
Em dito campo, que pertencem ao Direito Internacional Privado,
configura-se o meio mais adequado discutir a questão de sua
nacionalidade. Aqui haverá se elucidar os seguintes aspectos:
Em primeiro lugar, têm nacionalidade as sociedades comerciais?
Em caso afirmativo, que funções cumprem?
3.3
Nacionalidade no direito comparado
Relacionado ao primeiro aspecto, cabe distinguir dentro do direito
comparado os países do grupo continental europeu, que admitem, na
maioria de sua doutrina e jurisprudência, a nacionalidade das
sociedades. Alguns autores a objetam, pois se a nacionalidade é a
pertença legal à provação jurídica de um Estado, deve-se reconhecer
que a provação de um Estado se compõe de pessoas físicas e não de
pessoas morais. Estas seriam apenas um modo de atividade das
pessoas físicas.
68
68
BATTIFOL, Henri. Droit international privé, p. 221.
39
Para Jean-Pierre Niboyet, a verdadeira nacionalidade cria uma
relação de ordem política entre um indivíduo e um Estado. O Direito
Internacional não tem conhecido outra, e somente o indivíduo, a
pessoa física, é suscetível de possuir uma nacionalidade”. Se se trata
da conexão de uma sociedade com um Estado e por fim com suas leis,
juridicamente a palavra “estatuto” seria muito mais acertada que a de
nacionalidade. A sociedade não seria mais que um contrato, mais ou
menos regulamentado, e não poderia, como tal, engendrar um ente
dotado de nacionalidade, atributo eminentemente político.
69
Henri Battifol, ao contrário, indica que não é inexato falar de
nacionalidade de sociedades, a condição de que essa noção, pela
analogia que apresenta com a nacionalidade das pessoas físicas, deve
ser claramente distinguida. A atividade coletiva é controlada pelo
Estado como atividade individual e é, à vez, mais estreitamente
regulamentada em razão dos perigos com que intimida a autoridade do
Estado e a liberdade dos particulares. Agrega o citado autor que, se a
atividade individual dos estrangeiros na França está sujeita a uma
regulamentação própria, seria paradoxal que sua atividade coletiva
não estivesse submetida a um controle do mesmo gênero, mas mais
estreito, em razão do poderio desse modo de ação.
70
Em sentido inverso diz Henri Battifol o Estado exerce, no
estrangeiro, a proteção diplomática de seus nacionais; conclui
Tratados em seu proveito; pode então desinteressar-se da atividade
coletiva desses nacionais? É preciso, pois, discriminar os grupos
constitutivos de uma atividade estrangeira por oposição aqueles cuja
atividade se reputa francesa: é a noção da nacionalidade das
sociedades.
71
Segundo, ainda, Henri Battifol, a nacionalidade das pessoas
morais é, pois, uma noção bastante próxima à nacionalidade de
69
NIBOYET, Jean-Pierre. Traité de Droit international Privé Français, p. 34. NIBOYET,
Jean-Pierre. Princípios de Derecho Internacional Privado, p. 76.
70
BATTIFOL, Henri. Aspects Philosophiques du Droit International Privé, p. 55 e ss.
71
BATTIFOL, Henri. op. cit., p. 57.
40
navios, barcos e aeronaves, que expressam também as atividades
nacionais ou estrangeiras.
72
Existe, entretanto, entre ambas as categorias, a diferença de que
as pessoas morais constituem os sujeitos de direitos, enquanto que os
navios, barcos e aeronaves são os objetos de direitos. E se a idéia da
nacionalidade convém ao homem como sujeito de direitos, ela se volta
a encontrar na sociedade, que o Direito considera também como uma
pessoa. O navio, sem ser mais do que uma coisa, somente é a ocasião
de uma atividade humana que sua “nacionalidade” vincula a um país
determinado.
O princípio da nacionalidade das sociedades prevalece, tem-se
dito, no grupo continental europeu. Nos países anglo-saxões,
Inglaterra e Estados Unidos da América, como também no Brasil, Peru,
Cuba, Guatemela e Rússia não se estabelece o problema da
nacionalidade das corporações.
O direito anglo-saxão regula as sociedades pelo direito do país
de onde têm sido incorporadas (teoria da incorporação). O fato de ter
sido incorporada uma sociedade ao direito de um Estado determinado
(por uma lei especial do Parlamento, pela lei de um corpo
administrativo ou por cumprimento de todos os requisitos
estabelecidos por uma lei geral), determinará, para dita sociedade, o
direito à proteção diplomática do Estado de onde foi incorporada.
Essa posição não é somente abonada por razões políticas, mas
que também coincide historicamente com o surgimento de concepções
antropomórficas para explicar a existência de entes privados. Entre
1868 e 1881, Gierke publica seus trabalhos em apoio da tese
organicista
73
, explicando às entidades coletivas como organismos
dotados de vontade e capacidade, com vida própria, independente de
toda intervenção estatal. Essa identificação com o homem não poderia
deixar de prolongar-se ao campo de sua atuação internacional; se o
nascimento em um território determinado é o mais comum dos meios
de aquisição de nacionalidade para as pessoas físicas, esse fato da
72
BATTIFOL, Henri. ibidem.
41
natureza devia ter sua correlação na incorporação das sociedades a
um ordenamento específico. E seguindo tais idéias, ter-lhes-ia
outorgado às pessoas jurídicas um nome, domicílio, patrimônio, falado
de sua morte e, é evidente, imputar-lhes uma determinada
nacionalidade.
Não se deve perder de vista, entretanto, que o conceito é
controvertido ainda para sua atribuição a seres humanos, desde o
momento em que os critérios variam de país para país (jus solis, jus
sanguinis). Quanto mais de sê-lo para entidades que possuem uma
estrutura diversa e mais completa, cuja atração pode efetivar-se
simultaneamente em territorium legis diferenciados, ao tempo que seu
controle o exercem nacionais de um deles, de um terceiro Estado ou
de membros de vários, ao mesmo tempo.
É importante, portanto, recordar qual tem de ser a particular
importância da atribuição de nacionalidade às pessoas jurídicas; isto
é, imputar certas conseqüências e se são verificados determinados
antecedentes.
3.4
Nacionalidade segundo a doutrina Irigoyen
Na América Latina, merece destacaque, em matéria de
nacionalidade das sociedades, a doutrina Irigoyen, formulada em 1876
pelo então ministro argentino de Relações Exteriores, Dr. Bernardo de
Irigoyen.
74
Nesse ano, havia-se implantado um grave conflito, entre a
província de Santa Fé, o Banco de Londres e o Rio da Prata. A
província havia ditado uma lei ordenando a conversão em ouro as
emissões de papel moeda autorizadas pelo governo local. Como o
Banco de Londres não realizara dita conversão e dispusera do ouro em
outras operações, o governo local tomou medidas sancionatórias
73
Intitulada Das deutsche genossenschaftrecht, em três volumes. Para mais detalhes,
consultar BALESTRA, Ricardo R. Las Sociedades en el Derecho Internacional Privado.
74
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 71 e ss. Vide também SANTOS, Antonio Marques
dos. Algumas reflexões sobre a Nacionalidade das Sociedades em Direito Internacional
Privado e em Direito Internacional Público, p. 12 e ss.
42
contra a sucursal e seus representantes. Isso deu origem a uma
reclamação diplomática do governo inglês a que respondeu o ministro
Irigoyen, nestes termos: “As pessoas jurídicas devem exclusivamente
sua existência à lei do país que as autoriza e por conseguinte elas não
são nacionais nem estrangeiras.
75
“A sociedade anônima é uma pessoa distinta dos indivíduos que a
formam e embora ela seja exclusivamente formada por cidadãos
estrangeiros, não tem direito à proteção diplomática.
76
A doutrina Irigoyen sustentada por numerosos países latino-
americanos, funda-se no interesse nacional dos países de imigração,
receptores de capital que, frente a sociedades de capital, poderosas
no amparo do anonimato de suas ações, poderiam ver-se outra vez
sujeitos a reclamações diplomáticas dos Estados exportadores de
capital, nos casos de atribuir-lhes aquelas sociedades tal ou qual
nacionalidade.
77
Na realidade, o então chanceler não generalizou seus conceitos,
limitando-os às sociedades anônimas. Em sua segunda e última nota,
indica que “se as ações se transferem, o que hoje é inglês pode
passar com facilidade a outros países”. O Banco de Londres, segundo
o direito inglês, possuía um vínculo que ressaltava os aspectos
pessoais dos sócios com mais firmeza que os estritos anônimos. A
reclamação britânica não deixou, então, de se fazer sentir. O fato é
que Irigoyen considerava as sociedades desse tipo como “união de
capitais” sem nacionalidade alguma, e em um mundo em que era
direito indiscutível dos Estados o oferecimento de proteção diplomática
aos seus súditos, negar essa vinculação era a única solução possível
diante do avanço da força britânica, solução que levou a uma extrema
generalização a outros tipos societários que não estiveram na intenção
do ministro incluí-los.
78
75
BALESTRA, Ricardo R. ibidem.
76
BALESTRA, Ricardo R. ibidem.
77
SANTOS, Antonio Marques dos. op. cit., p. 14.
78
SANTOS, Antonio Marques dos. ibidem.
43
Essa posição seria revisada, repetidamente, na América Latina ao
receber numerosos capitais estrangeiros e tornar-se necessário
diferenciar entre sociedades nacionais e estrangeiras.
3.5
Nacionalidade no Código de Bustamante
Um grupo de 15 países latino-americanos (Bolívia, Brasil, Costa
Rica, Cuba, Equador, Chile, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras,
Nicarágua, Peru, Panamá, República Dominicana e Venezuela),
assinaram e ratificaram, entre 1928 e 1933, o Código de Direito
Internacional Privado, preparado pelos doutores Matos, Octavio e
Antonio Sánchez de Bustamente y Sirvén, com redação do último
mencionado.
79
O mesmo se refere ao problema da nacionalidade no Capítulo I,
do Título Primeiro (Das pessoas), do Livro Primeiro, dedicado ao
Direito Civil Internacional. No artigo 9º, dispõe-se:
Cada Estado contratante aplicará seu próprio direito à
determinação da nacionalidade de origem de toda
pessoa individual ou jurídica e de sua aquisição,
perdida ou reintegração posterior, que se tenham
realizado dentro ou fora de seu território, quando uma
das nacionalidades sujeitas a controvérsias seja a de
dito Estado. Nos demais casos, regerão as disposições
que estabelecem os artigos restantes desse capítulo.
Para as sociedades civis, mercantis ou industriais que não sejam
anônimas, rege o artigo 18: terão a nacionalidade que estabeleça o
contrato social e, em seu caso, a do lugar onde radica habitualmente
sua gerência ou direção principal.
Relacionado às sociedades anônimas, preceitua o artigo 19 que
“determinar-se-á a nacionalidade pelo contrato social e, em seu caso,
pela lei do lugar em que se reúne normalmente a Junta Geral de
Acionistas e, em sua falta, pela do lugar em que radique sua principal
Junta ou Conselho diretivo ou administrativo”.
79
BALESTRA, Ricardo R. Las sociedades en el derecho internacional privado, p.
34.
44
Esses critérios não conformavam, entretanto, a unanimidade de
critérios dos membros da Sexta Conferência Internacional Americana
de 1928, em Havana. Por isso, agregou-se o art. 21 que estabeleceu:
“As disposições do art. 9, no que se refere a pessoas jurídicas e as
dos artigos 16 a 20, não serão aplicadas nos Estados contratantes que
não atribuam nacionalidade a ditas pessoas jurídicas”.
Entretanto, o grupo de Estados minoritário (Argentina, Paraguai,
Colômbia, Costa Rica e a República Dominicana) manteve-se fiel à
doutrina Irigoyen e formularam a seguinte reserva:Que não
entenderiam para nada, aprovar direta ou indiretamente as disposições
que são contrárias à regra de que as pessoas jurídicas devem
exclusivamente sua existência à lei do Estado que as autoriza e que
em conseqüência não são nem nacionais nem estrangeiras”.
80
Esse é o panorama geral do direito comparado quanto à
atribuição de nacionalidade às sociedades comerciais.
3.6
Função da nacionalidade: lei aplicável, controle e
jurisdição competente
Tem-se visto, ao tratar dos efeitos da nacionalidade em geral, o
direito dos nacionais e as pessoas jurídicas (sociedades inclusas) à
proteção diplomática do Estado de sua nacionalidade, caso seus
interesses sejam danificados no estrangeiro. Esse é um efeito próprio
do Direito Internacional Público. No campo do Direito Internacional
Privado, a atuação extraterritorial das sociedades estabelece três
ordens de problemas:
a) Determinar a lei aplicável à constituição e funcionamento de
sociedades estrangeiras e plurinacionais;
b) O alcance da regulamentação legal, administrativa e
jurisprudencial, de que dispõe um Estado para ordenar a atuação de
sociedades estrangeiras em seu território;
80
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 43.
45
c) A jurisdição competente para entender assuntos internos das
sociedades e entre elas e terceiros.
O primeiro constitui um problema estático: tem por base
elementos legais harmônicos ou conflituais.
O segundo e terceiro são de índole mais dinâmica e de criação
pelos poderes dos Estados soberanos. Eles estabelecem uma
normativa destinada, principalmente, à defesa dos interesses da
Nação.
Para os da atribuição de nacionalidade às sociedades, o domínio
do direito que deverá regular sua constituição e funcionamento será o
de sua lei nacional.
Os critérios, entretanto, para determinar a nacionalidade das
sociedades não são coincidentes.
a) Critérios atributivos de nacionalidade
Em primeiro lugar, alguns autores de Direito Internacional
Privado, como Trías Bes, na Espanha, sustenta que a nacionalidade
das sociedades depende exclusivamente da vontade de seus sócios.
81
Eles estabeleceriam, livremente, no contrato social, a nacionalidade da
sociedade. Observe-se que tal critério da autonomia tem sido seguido
pelo Código Bustamante, nos seus artigos 18 e 19, em matéria de
sociedades em geral e de sociedades anônimas.
b) Código Bustamante
É coerente com a posição adotada por seu autor na matéria
legislativa, ao dizer: “A liberdade alcança ao direito privado como ao
público e a sociedade política não impõe suas legislações às pessoas
quando não o requer seu próprio bem como entidade jurídica, nem
sequer ao bem coletivo”. Assim, como em matéria contratual faculta às
partes e eleger a lei aplicável à relação, não oferece reparos a uma
ação similar em direito societário.
81
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 50.
46
Essa teoria teve aceitação na Alemanha até meados da década
de trinta, quando fora acusada de favorecer a fraude. Não parece essa
crítica demasiada, pois prevalece desde o momento em que a tal
“fraude” não constitua senão o exercício de um direito acordado
legalmente.
Critica-se também essa concepção, vez que a natureza da
nacionalidade, vínculo de direito público, intimamente dependente da
soberania dos Estados, não seria suscetível de ser criada
contratualmente pelos particulares em função de sua conveniência, ou
com intenção fraudulenta.
3.7
Nacionalidade segundo critério da autorização, local da
constituição ou incorporação
Em segundo lugar, deve-se mencionar a teoria da autorização,
também referida na doutrina, como da constituição ou incorporação. A
mesma faz depender o estatuto regulador da sociedade do direito
daquele país ao que está vinculada. A ela tem-se referido ao tratar o
primeiro aspecto da questão da nacionalidade.
Para essa teoria, a nacionalidade deriva da lei que deu vida a
aquela. É a teoria adotada pelos países anglo-americanos, da
Common Law, Rússia, países da América Latina
82
e também pela
Alemanha.
83
Segundo Eduardo Espinola a teoria ainda encontra
defensores entre os italianos e alguns escritores franceses. É
considerado o Sistema de Pillet,
84
e adotado pelo Direito brasileiro
85
. A
82
Ver Código de Bustamante.
83
Exige-se também que a sede social seja no país da incorporação. O autor cita, “uma
decisão do Reichsgericht, de 9 de março de 1904, que, em relação a uma sociedade
fundada e organizada nos Estados Unidos, onde tinha a sua sede nominal, ao passo
que na Alemanha estava sua gestão definitiva, aí se reunindo as suas assembléias e
conselhos de administração, compostos de indivíduos domiciliados nesse país, declarou
serem determinados pela lei alemã os direitos de uma sociedade, fundada e organizada
no estrangeiro, quando a sua sede social é na Alemanha.” ESPINOLA, Eduardo;
ESPINOLA FILHO, Eduardo. op. cit., p. 129.
84
ROCHA, Osires. Curso de Direito Internacional Privado, p. 106.
Já Hee Moon Jo, diz ter sido esta teoria “desenvolvida na Inglaterra, no século XVIII.”
Moderno Direito Internacional Privado, p. 420.
85
Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro. “Art. 11. As organizações destinadas a
fins de interesse coletivo, como as sociedades e as fundações, obedecem à lei do
Estado em que se constituírem.”
47
teoria é uma conseqüência da doutrina da ficção: a pessoa jurídica
não é senão uma ficção que deve à autorização do Estado o começo
de sua existência.
Esse critério possui seus críticos,
86
pois, segundo estes, é
extremamente fácil de fraudar a lei quando da aplicação daquele.
Poderia a empresa ser constituída num país cujas leis prevejam
obrigações menos onerosas e assim, após sua constituição passar a
exercer suas atividades no país que preexistia seu interesse
comercial.
Um prestigioso autor alemão, professor em Oxford logo depois da
última guerra, Martin Wolff, indica e reconhece os inconvenientes
dessa posição. Efetivamente, indica Martin Wolff que “as razões pelas
quais os promotores que fazem negócio em seu próprio Estado
preferem submeter sua corporação a um direito diferente não são
sempre muito honradas.
87
O direito de seu Estado pode ser mais
rígido com respeito à sua responsabilidade para os acionistas ou
credores do que convém aos seus propósitos, ou pode conceder-lhes
uns poucos mais poderes, ou requerer estrito ajuste de contas anuais
ou assegurar a publicidade inconveniente de suas atividades, ou fazer
o ato de incorporação mais custoso que o Direito de outro Estado. Em
todos esses casos, a lei pessoal da corporação não é a lei da sede
real, mas a lei do Estado da incorporação. Como isso seria o ponto
débil da doutrina da incorporação tem-se buscado superar o problema
da fraude à lei (eleição de outra lei mais favorável sem conexão
alguma com o centro de atividades sociais)
88
por disposições da lei da
incorporação, concedendo personalidade somente àquelas sociedades
que estabelecem seu centro real de administração no território do
Estado.
Dar-se-ia, assim, uma real conexão entre o centro de
administração social e o país do que receberia nacionalidade a
sociedade.
86
Jacob Dolinger; cita Jean Derrupé como crítico a esse critério, “demasiadamente
formalista, dependente da vontade dos fundadores, permitindo, assim, escolhas
arbitrárias e abusivas.” (Direito Internacional Privado, p. 436.)
87
WOLFF, Martin. Derecho Internacional Privado, p. 45.
48
3.8
Nacionalidade segundo a nacionalidade dos sócios
Um terceiro critério seria a nacionalidade dos sócios para
determinar, por sua vez, a da sociedade. Mas, esta, tropeça no
inconveniente comum de sociedades de capital cujos membros têm
uma nacionalidade diferente, especialmente, as sociedades
anônimas.
89
3.9
Nacionalidade segundo a propriedade do capital
Em quarto lugar, Thaller sustenta, como critério atributivo de
nacionalidade, a propriedade do capital e a nacionalidade dos sócios.
Em um esboço de reforma da legislação de estrangeiros, nas relações
franco-alemãs sustentava, particularmente, que
90
:
a) nas sociedades francesas, mais da metade do capital deve
pertencer aos franceses;
b) cada sociedade deve indicar sua nacionalidade na
denominação de tal sociedade;
c) as ações ao portador devem ser absolutamente proibidas por
lei;
d) deve se fazer conhecer a nacionalidade da sociedade com o
ato formal de sua constituição e o depósito anual do elenco de sócios,
com indicação de sua nacionalidade.
O domicílio da sociedade, segundo havia sido sustentado em um
trabalho anterior por Thaller, determina a nacionalidade daquela. Esse
domicílio encontra-se no lugar de subscrição dos capitais. Frente a
88
ARAÚJO, Nádia de. Direito internacional privado: teoria e prática brasileira, p.
33.
89
Vide VICO, Carlos M. Curso de Derecho Internacional Privado Dictado en las
Facultades de Derecho de Buenos Aires y La Plata. t. III, p. 194 e 97, e Solá
CAÑIZARES, Aspectos de las Sociedades Anônimas en el Derecho Comparado, p. 395,
em favor da nacionalidade da sociedade segundo a nacionalidade dos sócios.
90
BALESTRA, Ricardo R. Las Sociedades en el Derecho Internacional Privado, p. 55.
49
isso, poderia aduzir-se que o de subscrição é um lugar contingente
que pode ou não coincidir com o de origem do capital.
Enquanto ao sistema do Esboço de Thaller, propiciado com
variantes por Lyon-Caen, em 1918 na Societé de Legislation
Comparée, tem sido seguido pelas legislações suecas de 14 de
setembro de 1944 sobre sociedades anônimas (“Todos os fundadores
de uma sociedade anônima devem ser cidadãos suecos que residam
na Suécia ou sociedades suecas”); o Código suíço (com respeito à
administração da sociedade na Suíça por suíços); a lei egípcia de
1954 e as disposições para sociedades de seguros da Iugoslávia,
Romênia, Portugal e Letônia.
91
3.10
Nacionalidade segundo o lugar de subscrição das ações
Em quinto lugar, há como ser citada a teoria formulada por
Pineau, em 1839: determina-se a nacionalidade da sociedade pelo
lugar de subscrição das ações. Caso sejam subscritas em diferentes
países, a nacionalidade ficaria fixada pelas primeiras subscrições que
coincidiriam com o domicílio social.
A recusa ao domicílio social mostra a insuficiência do lugar de
subscrição de ações como critério atributivo de nacionalidade. Por
outra parte, as primeiras subscrições podem não coincidir com o
domicílio social e, nesse caso, a concepção resulta insuficiente.
3.11.
Nacionalidade segundo critério econômico
Em sexto, a teoria econômica, segundo Eduardo Espinola, “para
os que se orientam pelo critério econômico, a determinação da
nacionalidade das pessoas jurídicas de direito privado pode fazer-se,
tomando-se em consideração o centro de exploração, o país da
91
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 57.
50
subscrição, ou do controle financeiro resultante dos sócios e
dirigentes.
92
Nesse critério, encontra-se lacunas e o centro de exploração
pode mudar de acordo com as necessidades da atividade desenvolvida
pela sociedade, a exemplo da produção de um produto qualquer que
por algum motivo (fornecimento de matéria-prima) não seja mais
interessante àquela permanecer em determinado local, sendo assim,
transfere-se para outro Estado.
O país da subscrição é outro problema: se a subscrição é feita
em países diversos, como saber qual nacionalidade atribuir? Aquela
que recebeu o maior montante, ou se teria uma sociedade com várias
nacionalidades? O controle financeiro resultante da nacionalidade dos
sócios ou dirigentes é conflitante. A maioria da doutrina expõe que a
personalidade jurídica das sociedades não se confunde com a de seus
sócios, ora porque então deveríamos aplicar critério diverso para
determinar a nacionalidade da sociedade? Sem mencionar que o
controle acionário, na maioria das situações, pode e muda várias
vezes por dia, em negociações no mercado financeiro. Ter-se-ia,
então, de determinar o exato instante em que algum tipo de conflito foi
gerado para saber qual a nacionalidade da sociedade! Isto chegaria às
raias do absurdo.
É certo que o critério tem seguidores, principalmente em tempos
de guerra, usado na primeira grande guerra
93
e com mais intensidade
92
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. op. cit., p. 130.
93
Foi citado o relato de Eduardo Espinola; “na Inglaterra, foi a notável questão da
‘Continental Tyre Rubber C.º’, que provocou o exame do problema da nacionalidade das
sociedades comerciais, em face das necessidades de guerra. Era o caso de uma
sociedade de responsabilidade ilimitada, incorporada em virtude de lei inglesa, com fim
de vender, na Inglaterra, pneumáticos fabricados na Alemanha pela sociedade matriz.
Esta, que era uma sociedade alemã, possuía 20.000 ações da sociedade inglesa. As
outras ações pertenciam a alemães, salvo uma única que era do secretário da
sociedade, o qual nascera na Alemanha, mas se naturalizara inglês em 1910 e residia
na Inglaterra. A Corte de Londres considerou inglesa a sociedade em questão, porque
não podia o seu caráter de sociedade, registrada de acordo com a lei inglesa, ser
modificado pelo fato de serem súditos inimigos os acionistas e os diretores. Essa
decisão determinou veementes protestos e produziu, nos círculos ingleses, uma emoção
considerável (em 1915). Contra a decisão da Corte de Londres pronuncio-se a Câmara
dos Lordes, em 30 de junho de 1916, declarando que uma sociedade pode tomar o
caráter inimigo, se os seus representantes, os diretores de suas operações residem no
estado inimigo, estão em contato com os súditos inimigos, a cujas instruções
obedecem. É verdade que o caráter acionista, em si e por si, não pode modificar o
caráter da sociedade. Mas se os acionistas inimigos são em tal número, e tão valioso o
capital que representam, que eliminados eles, o número dos acionistas, que ficam, é
51
na segunda.
94
O argumento favorável à teoria é a lealdade hipotética
dos nacionais,
95
ou o único meio de assegurá-la contra a troca de
mãos dos papéis das empresas. O uso desse critério traria à baila uma
verdadeira Sodoma e Gomorra jurídica! Ninguém saberia a quem e o
que alegar num eventual recurso.
Egberto Lacerda Teixeira sintetiza o uso dos critérios
nos sistemas em que predomina o liberalismo da
vontade individual dos contratantes, a determinação da
nacionalidade está vinculada à lei local da constituição
ou incorporação. Nos sistemas onde a personalidade
jurídica das sociedades comerciais como entidade
independente de seus membros prevalece, a
preferência é no sentido de dar à sede social caráter
predominante. Nos regimes em que o respeito à
autonomia e realidade da pessoa jurídica é menos
forte, esta se torna mais transparente, e o critério do
controle acionário ou gerencial é mais invocado
96
Ao tecer comentários acerca dos critérios de reconhecimento da
nacionalidade da pessoa jurídica, Haroldo Valladão, expõe: A
preferência deste ou daquele se liga aos objetivos das diversas
pessoas jurídicas, em face das necessidades de defesa da ordem
política, econômica e social de cada Estado.
97
3.12
Nacionalidade segundo a sede social. Critérios para sua
determinação
Em último lugar, merece destaque a concepção da sede social
como critério que prevalece na doutrina; para a atribuição de
nacionalidade (nos países que seguem o sistema do domicílio
insuficiente para permitir a reunião da assembléia geral, já o caráter de acionistas
assume grande importância e influi sobre o da sociedade. Foi para atender a essas
considerações que sofreu modificação o ‘Trading with the Enemy Act’, o qual investiu o
‘Board of Trade’ do poder de proibir o comércio e ordenar a liquidação dos negócios
geridos, por uma pessoa, firma ou sociedade, quando esses negócios, atendendo à
nacionalidade inimiga da pessoa, firma ou sociedade, são realizados, total ou
principalmente, em proveito, ou sob a direção de súditos inimigos.” op. cit., p. 131 e
132.
94
Entre nós as empresas nesta situação tiveram seu controle entre a brasileiros.
95
Notório o fato que atualmente os valores econômicos, quase sempre, se sobressaem
aos ideológicos.
96
TEIXEIRA, Egberto Lacerda. A Nacionalidade e as Sociedades Comerciais no Brasil e
no Estrangeiro, p. 20-37.
52
considera-se a sede social como determinante do mesmo para regular
o estatuto social nos aspectos de organização, qualidade comercial e
reconhecimento extraterritorial da sociedade).
Nesta teoria a nacionalidade da pessoa jurídica é determinada
pelo local onde se encontra a sede social da empresa, normalmente se
agregado a isso a necessidade das decisões serem tomadas neste
local; denominada também como sede efetiva. A teoria não admite
uma sede fictícia, ou seja, não pode ser a sede estatutária, pode esta
até coincidir, mas não subsiste por si só. Objetiva-se com esse
procedimento evitar fraude à lei.
Pode facilmente uma sociedade estipular sua sede num país cuja
legislação seja mais conveniente a seus propósitos e efetivamente
explorar seus negócios em outro? O sistema é adotado pela
legislação,
98
doutrina e jurisprudência
99
francesa, doutrina italiana, mas
encontra também adeptos na doutrina alemã. Na Bélgica, a Lei das
Sociedades considera a sede social que se sobrepuja, mesmo se
constituída a sociedade noutro país.
Jacob Dolinger relata a interpretação de Jean Schapira que,
segundo este, existe uma explicação do porque a França ter adotado
este sistema. Apresenta três requisitos, “realismo, sinceridade e
previsibilidade”.
1º) Elo efetivo entre a sociedade e o país cuja lei vai-se aplicar.
(realismo)
2º) Visa evitar que ocorram manipulações que objetivem fraudar a
lei, principalmente as normas fiscais. (sinceridade)
3º) Significa que o elo seja simples e estável.
100
(previsibilidade)
Ademais, pode a sociedade mudar sua sede. Acontecendo assim,
também mudará sua nacionalidade, o que parece trazer certa incerteza
97
VALLADÃO, Haroldo. Direito Internacional Privado, p. 432.
98
Segundo Jacob Dolinger; o Código Civil Francês, art. 1837, com redação determinada
pela Lei 78-9 de 04/01/78, determina que toda a empresa com sede social em França
submete-se a lei francesa. Direito Internacional Privado. p. 436.
99
Tanto a francesa quanto a belga consideram a sede social e o centro administrativo.
100
DOLINGER, Jacob. op. cit., p. 436.
53
jurídica quando à velocidade com que as mudanças são capazes de
ocorrer. Quando se trata de relações econômicas,
101
pode-se ter uma
sociedade em juízo cuja lei aplicável seja de nacionalidades diversas
para cada caso concreto.
Ter-se-ia uma sociedade com sede no país A, exercendo suas
atividades normalmente neste Estado, mas por força de circunstâncias,
irrelevante para o momento, muda sua sede social para o país B; pode
esta estar em juízo com relação a conflitos gerados da época em que
sua sede se situava no país A, mas ao mesmo tempo poderá se
apresentar em juízo por conflitos gerados já no país B. Caso esses
conflitos envolvam necessariamente a nacionalidade da sociedade e
com base nesta seja determinado à legislação aplicável para cada
caso, a confusão estará formada.
Desta feita, seria possível burlar inclusive legislações nacionais
protecionistas. Se um grupo tiver interesse em explorar atividade
exclusiva de empresa nacional, basta que mude sua sede social para o
Estado em questão para que, em tese, possa pleitear a concessão de
tal atividade.
3.12.1
Sede estatutária
O critério da sede social pode referir-se tanto à da sede
estatutária, quanto ao lugar da principal administração, ou direção, ou
centro real de exploração.
O critério da sede estatutária seguido pela doutrina da
incorporação do direito anglo-saxão presta-se a fraudem legis. Esse
critério é adotado pelos Países Baixos e o Código Italiano de 1942. Em
oposição a este, as leis alemãs, belga, luxemburguesa e francesa
101
O Direito sempre está pelo menos um passo atrás do ritmo das relações sociais,
principalmente no que tange a atividade comercial. Isto é extremamente salutar e
necessário, o Direito deve reger as relações sociais e não impô-las à sociedade, ou
seja, o papel do Direito é ser flexível para poder se adaptar a novas situações criadas
pelo convívio em sociedade; não pode ficar aquém dessas mudanças, sob o risco de
quando se ajustar já estar novamente defasado. Talvez seja justamente nas relações
comerciais, que o Direito seja ao mesmo tempo o mais flexível, ou seja, ele se adapta
facilmente a uma nova ordem econômica, e ao mesmo passo, frente à velocidade
imposta pelas mudanças, quase que diárias, ele também carece de mais dinamismo.
54
seguem o sistema da sede real, que outorga a uma sociedade a
nacionalidade do país onde existem os órgãos de administração,
embora a sociedade não se tenha constituído de acordo com as leis
desse país. Nesses últimos países, não se pode reconhecer
personalidade jurídica às sociedades que a tenham adquirido em um
país favorável ao sistema da incorporação.
3.12.2
Direção ou administração principal
Esse problema não se estabelece na América Latina. Têm-se
analisado a posição dos quinze países que ratificaram o Código
Bustamante de 1928 ao tratar, em geral, da nacionalidade das
sociedades comerciais (lugar estabelecido no contrato social e em seu
caso lugar de onde se reúna a Junta Geral de Acionistas para as
sociedades anônimas e direção ou administração principal para as
demais sociedades e, subsidiariamente, para as anônimas, artigos 18
e 19 do Código Bustamante).
3.12.3
Lugar principal dos negócios
Nos países que ratificaram o Tratado de Montevidéu de 1940
sobre direito comercial terrestre internacional (Argentina, Paraguai,
Uruguai, Colômbia), rege o princípio do domicílio comercial que,
segundo o art. 3; é o lugar onde o comerciante, ou a sociedade
comercial tem o lugar principal de seus negócios. Ao constituírem-se,
entretanto, em outro ou outros Estados, estabelecimentos, sucursais
ou agências, consideram-se domiciliados no lugar onde funcionem e
sujeitos à jurisdição das autoridades locais, no concernente às
operações que ali se pratiquem.
Rege-se pelo direito do Estado de onde se encontre esse
domicílio: A qualidade do documento que requer o contrato de
sociedade” (art. 6º); “o conteúdo do contrato social; e entre a mesma e
terceiros” (art. 7º); o art. 8º também faz reger as sociedades mercantis
pelas leis do Estado de seu domicílio comercial, como princípio geral;
55
superando por antecipação o problema do não reconhecimento de
personalidade jurídica às sociedades, suscitado entre os países do
Mercado Comum europeu, estabelece logo o art. 8º do tratado de 40
que: “as sociedades mercantis... serão reconhecidas de pleno direito
nos outros Estados contratantes e se reputarão hábeis para exercer
atos de comércio e comparecer em juízo”.
E, depois, limita sua capacidade de atuação extraterritorial,
repetindo a fórmula do art. 5º do Tratado de Direito Comercial de 1889,
semelhante também ao contido nos Tratados de Direito Civil
Internacional de 1889, no art. 4º, sobre pessoas jurídicas. Reza, o art.
8º... “Mas para o exercício habitual dos atos compreendidos no objeto
de sua instituição, sujeitaram-se às prescrições estabelecidas pelas
leis do Estado no qual pretendem realizá-los”. Tem-se entendido que
no exercício habitual de seu objeto comercial devem ter uma sorte tal
de vinculação jurídica com as leis locais que possibilite o controle de
sua atuação pelas autoridades locais.
Carlos J. Zavala Rodríguez, no seu trabalho sobre a
“Nacionalidade das sociedades”, cita a crítica de Pillet, na sessão da
Societé de legislation comparée, ao critério da sede social.
102
Disse o
mestre francês que esse critério adoece de superficialidade, pois
aquele que tem capital social é e será sempre o verdadeiro dominus da
sociedade, quaisquer que sejam os aparentes administradores. Em
conseqüência, parece mais lógico não fazer entrar a concepção de
nacionalidade no âmbito das sociedades.
Na enumeração dos diversos critérios atributivos de
nacionalidade, observamos os respectivos inconvenientes disso,
possibilidade de fraude legal, sócios de diversas nacionalidades,
lugares contingentes como o de subscrição de ações e não
necessariamente decisivos como a sede social. Daí o acerto dos
países que assinaram o Tratado de Montevidéu, ao regular o
funcionamento da Sociedade pelo direito de seu domicílio (nas
palavras de Savigny, “domínio do direito mais conforme com a sua
própria e essencial natureza”), sem recorrer à nacionalidade como os
102
BALESTRA, Ricardo R. Las sociedades en el derecho internacional privado, p.
55.
56
países europeus. O erro, talvez, que se incorreu em Montevidéu, fora
o critério atributivo de domicílio que se seguiu: lugar da principal sede
dos negócios.
O que ocorre com as companhias internacionais que possuem
várias sedes ou sucursais, como as companhias que exploram poços
petrolíferos em diversas partes do mundo? Parece mais lógico nesses
casos seguir o critério da direção ou administração principal,
considerando a condição de que a mesma seja séria e não fictícia,
para evitar fraude à lei. Nesse sentido, a doutrina de Thaller, atributiva
da nacionalidade segundo a propriedade do capital e a nacionalidade
dos sócios parece ser mais lógica. Mas, mais que um critério atributivo
da nacionalidade, ao estabelecer a obrigatoriedade da nominação das
ações, sua posse por determinado número ou proporção de nacionais
e a publicidade conseguinte, a doutrina de Thaller constitui uma
atitude defensiva de controle da sociedade por parte do Estado em que
aquela atua.
É o alcance da regulamentação legal, administrativa e
jurisprudencial de que dispõe um Estado para ordenar a atuação de
sociedades estrangeiras em seu território.
3.13
Idéias dominantes na determinação da nacionalidade da
pessoa jurídica
Esse segundo aspecto da função da nacionalidade em matéria de
sociedades tem cobrado singular importância em nossa época. Dizia
Maurice Travers, no curso que ditara em 1930 na Academia de Direito
da Haia (Recueil de Cours, t. 33) que a questão da nacionalidade das
sociedades comerciais está dominada por três idéias: a da expansão
econômica, da defesa econômica e a da segurança.
103
103
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 58.
57
3.13.1
Expansão econômica
Desde o ponto de vista da expansão econômica, contariam as
sociedades nacionais de um país determinado com a proteção
diplomática antes aludida do Estado de sua nacionalidade, no
exercício extraterritorial de seu objeto social. Essa primeira idéia
parecia então favorecer, em especial, às sociedades nacionais de
Estados economicamente fortes, quando desenvolvam sua atividade
no exterior, onde levariam o elemento dinâmico de seus capitais para
o progresso econômico de países menos evoluídos.
3.13.2
Defesa econômica
As outras idéias, ao contrário, parecem vincular-se mais aos
interesses locais do Estado onde a sociedade estrangeira cumpre suas
funções. Com o critério da defesa econômica, nenhuma sociedade
comercial poderia prevalecer-se, no país em que atua, de uma
proteção estrangeira e o governo local contaria com plena latitude
para resistir a toda “invasão” estrangeira.
De maneira que se poderia mencionar o discurso do ministro
venezuelano Seijas na sessão de 1891 do Instituto de Direito
Internacional de Hamburgo. Expressava-se o efeito pernicioso que
tinha significado, para os países da América, a outorga de
nacionalidade às sociedades comerciais dos Estados poderosos.
104
3.13.3
Segurança
Finalmente, fundado na idéia de segurança, não poderia permitir-
se que uma indústria essencial para a defesa nacional caia, sob
aparência de uma sociedade, nas mãos” de estrangeiros, que
104
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 59.
58
poderiam, eventualmente, se tornar inimigos.
105
Como exemplo, cite-se
Martin Wolff, quando ensina que a lei sueca de 30 de maio de 1916 e a
de 18 de junho de 1925 se posiciona contra a aquisição de terras e
minas por companhias que, constituídas na Suécia, são de fato
controladas por estrangeiros.
106
Os magnatas industriais alemães,
encobertos por companhias suecas e falsos nomes suecos, haviam
comprado bosques e minas em uma extensão prejudicial à economia
nacional daquele país.
107
3.13.3.1
O aparecimento da teoria do controle. Primeira Guerra
Mundial
A partir da guerra de 1914, as idéias de defesa econômica e
segurança dos Estados, assumiram um sentido prático de importância:
as leis ditadas com respeito aos súditos de Estados inimigos, por
exemplo, de seqüestro ou confisco de seus bens, interrupção de todo
tráfego ou interdição de ocorrer aos tribunais, fizeram-se extensivas às
sociedades.
Aparece assim um sentido novo na determinação da
nacionalidade das sociedades: a defesa dos interesses dos Estados
beligerantes aos que pertenciam as sociedades e cuja atuação,
dirigida pelos inimigos, poderia danificar aqueles interesses. Assim
responde ao denominado sistema de controle.
I) Inglaterra
Na Inglaterra, a fim de ampliar ou fazer extensiva ao campo
econômico a contenda militar, proibiu-se, durante a Primeira Guerra
Mundial, o comércio com os súditos estrangeiros e inimigos. A fim de
conhecer quem revestia o caráter de tais, elaborou-se a Statutory
black list, a investigar, nos diversos países, quais comerciantes eram
105
Entre nós, vide obra completa acerca dos temas que seguem. RODAS, João
Grandino. Sociedade Comercial e Estado.
106
WOLFF, Martin. Derecho Internacional Privado, p. 294.
107
WOLFF, Martin. op. cit., p. 295.
59
inimigos, a despeito de serem membros de Estados isolados ou
neutros.
108
Como os súditos inimigos escapavam, às vezes, à proibição de
comerciar, foi preciso estender a proibição às corporações, fazia-se
necessário, como indica Martin Wolff, alçar “o pano de fundo da
personalidade jurídica”. De modo que cabe mencionar o caso
suscitado em 1915: Daimler Co vs. Continental Tyre and Rubber
Co”.
109
Tratava de resolver se uma companhia incorporada na
Inglaterra e, portanto, britânica segundo o sistema jurídico inglês da
incorporation e com uma secretaria na Grã-Bretanha, com todas as
suas ações em mãos de estrangeiros inimigos, poder-se-ia considerá-
la como inimiga, ao efeito de fazer efetiva sobre ela a proibição de
comerciar negativamente. A Câmara dos Lords revogou a decisão.
Sustentava Lord Parker que a consideração da sociedade como
britânica, tendo como causa seu lugar de incorporação, não bastava
para resolver sobre seu caráter inimigo. A corporação, em si, era
incapaz de lealdade ou inimizade, pois tais qualidades de lealdade ou
inimizade são atribuíveis somente aos seres humanos; não poderia
então derivar-se seu caráter de leal ou inimigo senão do caráter, à sua
vez, predominante dos acionistas. E, estando esses em contato com o
inimigo, recebendo suas ordens senão do caráter à sua vez,
predominante dos acionistas. Estando esses em contato com o
inimigo, recebendo suas ordens e trabalhando sob sua direção,
outorgam à sociedade que integram o caráter de inimiga. Em
concordância com esses princípios e base na sentença mencionada
pela Câmara dos Lords, ditou-se, em 08 de agosto de 1918, a Trading
with the Enemy Amendment Act.
II) França.
Na França, ficou assente por uma circular do Ministério de Justiça
de 29 de fevereiro de 1916, o critério que devia se seguir para atribuir
a uma sociedade o caráter de inimiga; quando a direção ou o capital
de uma sociedade em sua totalidade, ou maioria, encontre-se
notoriamente em mãos de súditos inimigos, a mesma se revestiria do
108
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 60.
109
WOLFF, Martin. op. cit., p. 298.
60
caráter de inimiga. Poderiam, desse modo, os tribunais franceses
tomar medidas relacionadas aos bens de uma “sociedade inimiga”, não
obstante sua sede social (Centro de Administração) estivesse na
França. Esse sistema, disse Henri Battifol, foi seguido pelos tribunais
e provado ao parecer pela Corte de Cassação, na sentença de 27 de
maio de 1921.
110
III) Tratado de Versalhes.
O sistema ou teoria do controle teve sua consagração nos
Tratados de Paz de Versalhes, art. 297 b, e §3º, do apêndice III ao
título 244; Saint Germain, art. 249; Trianon, art. 232 e Neuilly, art. 186.
Nestes, reservam-se as potências aliadas e associadas o direito de
reter, aos súditos alemães, as sociedades controladas por eles, à data
de entrar em vigor o Tratado. A Alemanha, por sua vez, ficava
obrigada a indenizar as companhias, aparentemente alemãs, mas
controladas pelos nacionais dos países vitoriosos (art. 276 c, 297 a
298 do Tratado de Versalhes). As decisões judiciais não foram de todo
concordantes. O Tribunal da Cidade e o Tribunal Supremo de Nova
Iorque no caso de Fritz Schultz &. Co. vs. Raymes & Co. de 1917,
resolveram a questão em sentido oposto ao do controle.
IV) Decisões arbitrais pós-Primeira Grande Guerra.
Os Tribunais Arbitrais mistos, estabelecidos pelos Tratados de
Paz, discreparam em suas decisões. Aplicaram a teoria do controle no
Tribunal Arbitral misto franco-alemão nas sentenças de 31 de agosto
de 1920, de 30 de setembro de 1921, de 27 de novembro de 1923 e de
25 de fevereiro de 1924.
111
110
BATTIFOL, Henri. Droit international privé, p. 30.
111
Vide BATTIFOL, Henri. op. cit., p. 228.
61
A Espanha não aplicou a teoria do controle durante a Primeira
Guerra Mundial. A jurisprudência posterior à guerra abandonou esse
sistema e voltou a determinar a nacionalidade pelo lugar de onde
funcionava a sede social.
Assim, os Tratados comerciais franco-alemão de 1927, franco-
belga do mesmo ano e franco-polonês de 1922, entenderam que por
sociedades comerciais nacionais, seriam as que tinham sua sede
social em cada um dos países signatários.
3.13.3.2
Segunda Guerra Mundial
I) Estados Unidos e Alemanha.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o princípio do controle foi
aplicado em quase todos os países, ainda naqueles que na primeira
tinham-se mostrado resistentes a segui-lo. Os Estados Unidos, por
exemplo, haviam-se mantido fiel à determinação da nacionalidade das
sociedades pelo lugar de sua fundação (sistema da incorporação).
Na Segunda Guerra Mundial, ao contrário, foram promulgadas
nos Estados Unidos, as Freezing Orders (ordens de congelamento),
dispondo o bloqueio de bens que poderiam passar finalmente ao poder
dos países do Eixo.
Teve-se em conta para aplicar esses bloqueios a situação dos
acionistas e diretores da sociedade, entre outros motivos. Ao seu
turno, os Tribunais distinguiram, dentro de uma mesma empresa,
acionistas americanos não inimigos e acionistas inimigos. Alemanha,
ao contrário, não aplicou o princípio do controle e seguiu a doutrina da
nacionalidade, segundo o domicílio ou sede principal da sociedade.
112
II) Espanha.
Espanha, que durante a Primeira Guerra Mundial, havia seguido o
critério da nacionalidade, segundo o domicílio da sociedade, aplicou,
112
BALESTRA, Ricardo R. Las Sociedades en el Derecho Internacional Privado, p. 77.
62
pelo decreto-lei de 05 de março de 1945, os princípios da teoria do
controle recomendados na Resolução VI, adotada na Conferência
Financeira e Monetária das Nações Unidas em Bretton Woods, New
Hampshire. Dispunha, assim (art. 1º) o bloqueio de bens pertencentes
a estrangeiros súditos do Eixo, ou de países por este dominados. E,
entendia, no art. 2º, o citado decreto-lei por “bens de estrangeiros”,
todos aqueles bens e direitos patrimoniais em quaisquer de suas
manifestações que pertençam total ou parcialmente aos estrangeiros
aludidos no artigo primeiro; vale dizer, diretamente ou por meio de
pessoas físicas ou jurídicas interpostas com qualquer nacionalidade.
113
III) Nas Américas
Na América, a Terceira Reunião de Consulta dos Ministros de
Relações Exteriores das Repúblicas Americanas, de 1942, no Rio de
Janeiro, sancionou a Resolução V, e recomendou a ruptura de
relações diplomáticas com as potências do Eixo e a adoção de
medidas para interromper todo intercâmbio comercial ou financeiro
entre o hemisfério ocidental e aqueles três países. A Conferência
Interamericana sobre Problemas da Guerra e da Paz produziu, as mais
várias recomendações, dois acordos adotados no México em 06 de
março de 1945: a Ata de Chapultepec ou Resolução VIII, sobre
assistência recíproca e solidariedade americana e a Resolução IX
sobre reorganização, consolidação e fortalecimento do sistema
interamericano.
3.13.3.3
Em época de Paz
O direito comparado posterior a ambas as guerras mundiais tende
a abandonar, em certa medida, a teoria do controle. Os países
europeus retornam os do grupo continental pois, à regulação da
nacionalidade das sociedades por sua sede social. Assim, por
exemplo, na ordem internacional, os Tratados franco-polonês, de 06 de
fevereiro de 1922, franco-alemão de 17 de agosto de 1927, franco-
belga, de 29 de outubro, e franco-canadense, de 12 de março de 1933,
113
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 78.
63
entendiam por sociedades comerciais nacionais aquelas que tiveram
sua sede social em cada um dos países contratantes.
I) Jurisprudência francesa.
Do mesmo modo, manifestava-se a jurisprudência francesa. A
sentença da Chambre des requêts, de 24 de dezembro de 1928,
declarou francesa, para o benefício da lei sobre Les Baux
Commerciaux, a sociedade La Soie Artificielle, cuja sede estava na
França, embora seu capital se encontrasse, em sua maior parte, em
poder de ingleses.
114
No affaire Graf, resolvido pela sentença de 17 de
julho de 1930, declarou-se francesa uma sociedade coletiva por dois
suíços, mas esse caso foi resolvido pela Chambre des requêtes, como
nos que resolvera a Câmara Civil em reiteradas oportunidades, pois
estabeleceu-se que a sede social na França não autorizava, de pleno
direito, a uma sociedade cujos membros eram estrangeiros, a reclamar
as indenizações de danos de guerra reservadas aos franceses.
115
É interessante a distinção estabelecida, especialmente no caso
da Câmara Civil francesa que é contrária à aplicação do sistema do
controle. Não obstante, numa de suas falhas reiteradas, pronunciada
no dia 25 de julho de 1933, estabeleceu aquele critério distintivo entre
regulação social pelo lugar da sede social e os direitos atribuídos aos
franceses. Na espécie, tratava-se da sociedade Rozendaele, integrada
em forma coletiva por quatro holandeses.
É desejável a conservação do sistema do controle em tempos de
Paz para regular o funcionamento das sociedades estrangeiras?
II) A opinião de Jean-Pierre Niboyet.
Alguns autores, como Jean-Pierre Niboyet, sustentam a bondade
do sistema do controle no Direito positivo da pós-guerra. Indica esse
autor que é lamentável a tendência de contentar-se com a aparência
enganosa da nacionalidade, em vez de inclinar-se até a experiência
tão fecunda do sistema do controle, único sincero e justo nessa
matéria. Distingue logo entre sociedades de pessoas e de capital. No
114
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 78.
115
BALESTRA, Ricardo R. op. cit., p. 80.
64
caso das primeiras, a aplicação do sistema do controle não teria maior
inconveniente em exigir determinada nacionalidade aos associados, ou
à maioria deles.
A questão voltar-se-ia dificultosa em matéria de sociedades de
capital. Dentro das mesmas, divide Jean-Pierre Niboyet a
administração, do controle do capital e da influência sobre a
administração, indica que é muito fácil exigir que uma sociedade
francesa de capitais, por exemplo, esteja em mãos de franceses. Esse
é o caso da lei de 30 de março de 1924, que exige de empresa de
navegação aérea que pretendam a nacionalidade francesa, que o
presidente de seu Conselho de Administração, o administrador
delegado e duas terças partes dos administradores tenham tal
nacionalidade.
Sobre o controle do capital, estabelece-se o problema das ações
ao portador. Como controlá-las?
Sobre isso, menciona Jean-Pierre Niboyet a possibilidade de
suprimir os títulos ao portador ou exigir determinada nacionalidade à
metade dos associados, tomando como base os títulos nominativos.
116
Em todo caso, disse, haveria que assegurar o controle do capital, pois
seus possuidores são quem elegem os administradores, diretores da
empresa. E recorda um argumento de muita vigência para nosso
continente latino-americano: a intromissão financeira internacional nas
sociedades de certos países, especialmente em épocas de inflação
monetária, sendo que a depressão da moeda constitui um alicerce
para os capitalistas dos países de moeda reparada.
Quanto à influência exercitável dentro da sociedade por
indivíduos que não são seus administradores, nem representam a
maioria do capital, dá-se, por exemplo, mediante ações de voto plural,
ou no caso de uma minoria ativa que dirige a sociedade frente a uma
maioria dispersa.
Acredita Jean-Pierre Niboyet, definitivamente, que corresponde
aos juízes tomar em consideração esses três elementos de
116
NIBOYET, Jean-Pierre. Princípios de Derecho Internacional Privado, p. 45.
65
administração, capital e influência para determinar o controle da
sociedade.
117
Assim, parece-lhe visível a manutenção do critério estabelecido
nos Tratados de Paz da primeira pós-guerra sobre as sociedades
controladas pelo inimigo: aquelas sobre as que exerce um poder
efetivo e preponderante, a levar em consideração todos os fatos
suscetíveis de revelar essa influência. Em tempos de Paz, poder-se-ia
fazer extensivo esse critério às sociedades estrangeiras, na medida
em que sua atuação resultar prejudicial aos interesses nacionais.
Essa extensão seria, realizada por via judicial, correspondendo
aos juízes determinar o controle exercido sobre as sociedades.
Nas sociedades por ações, surge o inconveniente da
possibilidade de transferência das ações. A adoção do sistema do
controle, que adota o critério da nacionalidade de quem dirige a
sociedade, importaria a regulação do funcionamento social pelas
legislações nacionais cambiantes, segundo seja a nova nacionalidade
dos possuidores das ações? Jean-Pierre Niboyet sustenta que não.
Segundo ele, distingue-se entre as noções de regime jurídico da
sociedade e sua nacionalidade.
118
O contrato da sociedade segue-se pela lei do domicílio social. Em
conseqüência, a nacionalidade mutante dos possuidores das ações
não pode determinar a validade ou nulidade da sociedade pelo distinto
critério que possam seguir as legislações de seus respectivos países.
A idéia de nacionalidade tem de atuar sobre a sociedade para
determinar se essa gozará ou não, em determinada circunstância, dos
direitos civis, esteja ela, ou não, controlada por nacionais: Jean-Pierre
Niboyet vincula o tema do gozo dos direitos civis ao Direito Público do
país: reconhecimento da personalidade das sociedades, liberdade de
penetrar e circular no país, e assim por diante.
119
Sobre a liberdade da
circulação, disse, não pode haver problema para as sociedades,
destaca que uma sociedade o teria existência jurídica. Não poderia,
117
NIBOYET, Jean-Pierre. ibidem.
118
NIBOYET, Jean-Pierre. op. cit., p. 46 e 47
119
NIBOYET, Jean-Pierre. op. cit., p. 48.
66
portanto, comparecer em juízo como determinante, nem possuir bens,
nem contratar.
-se mais além, no texto, a vigência do problema do não
reconhecimento das sociedades com motivo da aplicação, nos países
da Comunidade Econômica Européia, do critério da alternativa entre a
sede estatutária e a sede real (contido no art. 58 do Tratado de Roma)
para conceder o direito de estabelecimento às sociedades constituídas
conforme a legislação de um Estado-membro. Quanto à relação entre a
nacionalidade e o domicílio social, segundo Jean-Pierre Niboyet, as
sociedades têm um domicílio cujo Direito as rege desde o ponto de
vista de seu funcionamento; esse domicílio não influenciaria sobre a
nacionalidade, mas determinaria, tão-somente, o estatuto jurídico que
regula a vida social.
120
Como conseqüência, a mudança de domicílio social não importa a
mudança de nacionalidade da sociedade. A nacionalidade somente
mudaria, para Jean-Pierre Niboyet, quando mudarem, os elementos
constitutivos do controle.
121
E, inversamente, pode se dar mudança de
nacionalidade ainda quando se mantenha inalterado o domicílio social.
É o caso, por exemplo, das sociedades domiciliadas em Alsácia e
Lorena, que passaram a ser sociedades francesas em 1948 (até então
eram alemãs), pelo art. 54, §3º, do Tratado de Versalhes. Nesse caso,
não havia mudado o domicílio da sociedade, nem sua regulamentação.
Esse exemplo demonstraria definitivamente, segundo Jean-Pierre
Niboyet, a diversidade de idéias e alcances que têm os conceitos de
nacionalidade e estatuto da sociedade, vinculado esse último ao
direito do domicílio.
122
120
NIBOYET, Jean-Pierre. op. cit., p. 49.
121
NIBOYET, Jean-Pierre. op. cit., p. 50.
122
NIBOYET, Jean-Pierre. op. cit., p. 51.
67
III) Posição de Henri Battifol.
Para Henri Battifol ao contrário, a distinção entre nacionalidade
da sociedade e regime jurídico, tem o inconveniente de dividir, sem
razão suficiente, o estatuto da sociedade.
123
Segundo esse autor, os direitos combinados às sociedades como
tais são econômicos e uma sociedade pode legitimamente ser tratada
como francesa se ela concerne à economia francesa, o que admitem
os tribunais quando a sede social está na França. Pareceria suficiente
descartar esse critério, no caso, excepcional, em que a lei tem em
mira mais diretamente as pessoas através da sociedade. Em todo
caso, seria desejável, segundo Henri Battifol, que os casos
excepcionais sejam enunciados legislativamente.
124
E agrega que “do
mesmo modo que o legislador está melhor qualificado que os tribunais
para decidir se os interesses da coletividade querem recusar um
direito a um estrangeiro, pessoa física, igualmente sua intervenção
deverá requerer-se para recusar o mesmo direito a uma sociedade
com sede francesa mas sob controle estrangeiro”.
Expõe o mesmo autor a grave incerteza que macula a noção de
controle, a dificuldade na prova da origem dos capitais e da influência
efetivamente determinante na direção.
De outro modo, crê Henri Battifol que frente a outro critério
elegido no Direto Comparado para regular a sociedade, o sistema da
incorporação nos países anglo-saxões, a teoria do controle priva a
França, caso a adotasse, de uma possível aproximação com o sistema
anglo-saxão.
125
Caberia então se ater, em geral, ao sistema da sede social como
determinante de nacionalidade, que somente cederia em virtude de
uma exceção escrita. Por exemplo, na França as leis sobre prêmios à
marinha mercante (07 de abril de 1902) e sobre concessões de energia
hidráulica (16 de outubro de 1919), dispõem que os prêmios e
concessões se resolvem às sociedades cujo pessoal diretivo é francês.
123
BATTIFOL, Henri. Droit International Privé, p. 180.
124
BATTIFOL, Henri. op. cit., p. 135.
68
Não obstante, indica, o mesmo Henri Battifol, que os Tratados
recentes celebrados pela França, definem a nacionalidade das
sociedades enquanto se trata de direitos que lhes são reconhecidos
e não do regime de seu funcionamento pela lei segundo haja se
constituído.
126
Assim reza o Tratado de Paz com a Itália, art. 78, §9º, e
o acordo franco-iugoslavo de 14 de abril de 1951.
IV) Critério de Martin Wolff.
Sem lugar a dúvidas, a solução do problema da regulação jurídica
do estatuto social em matéria de sociedades estrangeiras penetra em
delicadas considerações políticas. Martin Wolff indica que as
companhias internacionais que atuam por lucro são criadas sempre
como corpos nacionais, segundo o direito de um só Estado.
127
Os ramos estrangeiros não seriam mais que lugares de negócios
independentes, ou no caso de ser juridicamente independentes, as
ações da companhia subsidiária são possuídas por quem dirige a
companhia principal ou bem por uma companhia possuidora, terceira
protagonista no sistema, que operaria a unidade econômica por reunir
praticamente todas as ações das companhias locais.
Quanto aos cartéis internacionais,
128
indica Martin Wolff que
raramente tem personalidade jurídica.
129
A maioria deles são
simplesmente contratos que produzem uma série de obrigações entre
as partes contratantes, referidas à abstenção da competência entre
elas.
Esses contratos deveriam estar sujeitos ao seu próprio Direito,
derivado geralmente da intenção das partes. Mas a uniformidade de
tratamento jurídico de tais contratos encontra-se obstada pela
aplicação das regras nacionais sobre ordem pública que variavam em
sua amplitude nos diferentes países, sobretudo quanto a sua aplicação
125
BATTIFOL, Henri. op. cit., p. 139.
126
BATTIFOL, Henri. op. cit., p. 140.
127
WOLFF, Martin. Derecho Internacional Privado, p. 300.
128
Uniões com tendências monopólicas para a restrição da competência entre empresas
que conservam sua entidade separada.
129
WOLFF, Martin. op. cit., p. 302b.
69
à validade de restrições do comércio, ou às causas que autorizam a
uma parte rescindir o contrato.
Essas considerações políticas têm assumido um papel de
importância nos países europeus, como surge do interesse doutrinário
dos destacados autores precedentemente comentados.
Igual ou maior importância teria aqueles argumentos nos países
de um desenvolvimento econômico menor e nos que a atuação de
sociedades estrangeiras, ou internacionais possa funcionar como fator
primordial no progresso material de ditos países.
Surge, então, a questão de ser estabelecido qual será o alcance
jurídico das regulamentações da sociedade estrangeira que pode dar
certeza à sua atuação no território de determinado Estado, permitindo
o último ceder a essa sociedade estrangeira; o arbítrio de tomar certas
decisões de política econômica que fazem fundamentalmente ao
interesse público do Estado local.
No Direito Argentino, existem, em matéria comercial, de seguros
e bancos, disposições legais que vêm a efetivar o regime do controle
sobre a atuação de determinadas sociedades ou companhias.
3.14
A nacionalidade da pessoa jurídica no Brasil
A nacionalidade de pessoa jurídica é determinada de forma
diversa da pessoa física, embora se entenda que ambas são
recepcionadas pelo direito, ou seja, a pessoa física ou natural é
recepcionada
130
quando e tão-somente se nascer com vida.
131
Sem
esse fato concreto a pessoa natural jamais existiu, salvo parte final do
art. 2º do Código Civil Brasileiro, que se resolve com o natimorto.
130
Entende-se esta expressão como aquisição da personalidade civil da pessoa natural.
131
Art. 2º do Código Civil Brasileiro. “A personalidade civil da pessoa começa do
nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do
nascituro.”
70
Do mesmo modo, a pessoa jurídica de direito privado deriva de
um fato jurídico,
132
a vontade de pessoas naturais na constituição de
uma empresa, seja ela para fins econômicos ou não, essa vontade é
anterior ao ato de registro, que determina o início de sua existência
legal,
133
sendo que esta pode existir no mundo dos fatos sem o
registro, mas não será reconhecido como empresa legalmente
constituída pela legislação vigente.
Considera-se o momento do ato de registro, como para as
pessoas naturais que nascem com vida, o nascimento jurídico da
pessoa jurídica. Se esta nasce sob uma ordem jurídica, é
automaticamente reconhecida por esta, que será, considerada
subordinada à lei que a recepcionou.
Theophilo de Azeredo Santos, após análise da doutrina francesa,
assevera que “racionalmente, a nacionalidade impõe-se ainda mais
para as pessoas morais do que para as pessoas físicas, pois a
sociedade deve sua existência legal à lei, mais ainda do que o
indivíduo: sua criação é mais completa e, obra da lei, quase que
poderíamos dizer que ela deve dela obter caráter nacional”.
134
Têm-se mencionado vários critérios para determinar a
nacionalidade de pessoas coletivas e cada Estado adota um ou mais,
concomitantemente, para determinar a nacionalidade de empresas em
seu território.
Se compararmos o critério utilizado para determinar
nacionalidade de pessoa natural, este fato pode parecer um tanto
confuso, já que para estas existe quase uma unanimidade, aplica-se o
132
Segundo Humberto Theodoro Júnior, “para configurar fato jurídico é necessário que
o acontecimento seja relevante juridicamente. O fato em si lícito, mas que não acarrete
nenhum efeito jurídico, não pode ser tratado como fato jurídico; é fato simples, como
a preferência por um clube de futebol, a cortesia de remeter cartão de pêsames ou de
felicitações ao amigo, o ato de passear pela cidade, ou de repousar após almoço. Ditos
eventos, não criando nem alterando relações jurídicas, são fatos neutros ou
ajurídicos.”(grifos do autor). GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil, p. 238.
133
Art. 45 do Código Civil Brasileiro. “Começa a existência legal das pessoas jurídicas
de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida,
quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no
registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a constituição das pessoas
jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação
de sua inscrição no registro.”
134
Santos, Theophilo de Azeredo. Regime Jurídico das Sociedades Comerciais, p. 33.
71
jus solis em alguns casos o jus sanguinis.
135
Apesar do fato de alguém
nascer em um lugar não impor nacionalidade, esta depende da lei
constitucional local, o mesmo vale para a pessoa jurídica. Mas esta
confusão tem razão de ser.
Assevera, Theophilo de Azeredo Santos,
De tudo que foi dito, fica em evidência, que o conceito
de nacionalidade das sociedades mercantis é
conveniente, necessário, indispensável, representando
poderoso instrumento de defesa dos interesses do
país, determinando seus direitos e obrigações, não só
porque elas se colocam, em lugar de destaque, entre
fatores do desenvolvimento econômico, financeiro,
político e social de um país, mas ainda, pela
transcendência que sua atuação, no campo
internacional, pode alcançar.
136
Como já exposto, a pessoa jurídica é formada por pessoas
naturais e estas podem ter nacionalidades diversas e ainda assim
representar uma empresa de nacionalidade diversa à sua. O que cada
Estado pretende, de forma legítima, é proteger os interesses de seus
membros e é perfeitamente compreensível que os interesses das
pessoas naturais sobrepujem as das pessoas jurídicas, mesmo que se
reconheçam que sem estas, no atual contexto econômico, Estado
algum subsista.
Hee Moon Jo representa opinião contrária e conclui que a
nacionalidade da pessoa jurídica é irrelevante para o Direito
Internacional Privado:Não possui qualquer utilidade, mas apenas cria
certa confusão nas relações internacionais”. Expõe, assim, que “o
termo nacionalidade da pessoa jurídica tem sua utilidade na sociedade
internacional para a aplicação das normas de direito Internacional
Público”.
137
Para ele, a única finalidade é determinar qual a proteção
diplomática devida à pessoa jurídica e cita o caso Barcelona Traction,
de 1970.
138
135
No primeiro caso vale a lei do solo em que o indivíduo nasceu, ou pelo menos é
neste que os pais podem registrar o recém nascido, e no segundo caso a nacionalidade
é determina, também por meio de registro civil, mas admite-se que seja feito com base
na descendência sangüínea dos pais.
136
Santos, Theophilo de Azeredo. op. cit, p. 34.
137
JO, Hee Moon. Moderno Direito Internacional Privado, p. 418.
138
Análise do caso é feita no item 4.7.1.
72
Argumenta Amílcar de Castro:Nacionalidade da pessoa jurídica
não deixa de ser notada até certo ponto a proveniência, mas não é
nesta apenas que consiste sua qualidade de estrangeira, sim
principalmente na relação de subordinação em que se encontra com o
Estado que lhe deu origem, e a considera existente, como realidade
jurídica, na extensão de sua competência, com a qualidade de súdito
próprio, nacional, permanente”.
139
Maria Helena Diniz diz que, “não se pode negar a existência de
pessoa jurídicas nacionais e estrangeiras, uma vez que não podem ser
heimathlos,
140
por estarem ligadas a um país, cuja lei rege sua
constituição, suas funções, seus direitos e deveres, dando-lhes
personalidade jurídica”.
141
Jacob Dolinger assevera:A doutrina francesa sintetiza que as
sociedades dependem de sua lei nacional, daí ser necessário
determinar sua nacionalidade, para descobrir a lei que deve reger seu
estatuto”.
142
No entender deste autor, a pessoa jurídica precisa que
sua personalidade seja reconhecida por um direito para que possa ter
um domicílio e classifica este reconhecimento como “básico, originário,
universal e imutável” e, aos requisitos, para o reconhecimento, podem
ser adicionados outros conforme Estado que deseje atuar.
A pessoa jurídica como sujeito de direito e deveres num
ordenamento jurídico necessita, para funcionar adequadamente e sob
a égide de legislação válida e vigente, saber qual é a lei que ela deve
seguir, bem como saber a que Estado possa recorrer caso necessite
de proteção diplomática.
143
Miguel Maria de Serpa Lopes sustenta com propriedade sua
posição favorável à nacionalidade de pessoas jurídicas, quando chama
os contrários de “reacionários”.
139
CASTRO, Amílcar de. Direito Internacional Privado, p. 334.
140
Termo alemão que se refere a pessoas sem nacionalidade.
141
DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada, p.
297.
142
DOLINGER, Jacob. Direito Internacional Privado, p. 434.
143
Ver caso da Barcelona Traction Light and Power Company, Limited.
73
Segue a posição do autor:
Pra nós afigura-se-nos indenegável a presença de uma
nacionalidade na pessoa jurídica. As demais formas de
pessoas jurídicas existem em todos os países. Assim,
torna-se indiscutível que há entidades nacionais e
estrangeiras, e como estrangeiras pertencem a uma
dada nação. Muito embora possa suceder que o
critério da lei nacional, pròpriamente, não seja erigido
em estatuto pessoal, implicando a nacionalidade num
valor jurídico estatutário, contudo não é possível
apagar-se a sua nacionalidade, pelo menos como traço
distintivo entre a pessoa jurídica nacional e
estrangeira, e para o efeito de ser definida sua
condição extraterritorial.
144
Como mencionado anteriormente, a pessoa jurídica é reconhecida
como ente de um Estado. Logo se pode deduzir que ela é nacional de
um determinado Estado. A dificuldade para determinar-se a
nacionalidade de uma pessoa jurídica reside numa série de fatores,
especificamente no tocante aos critérios adotados internacionalmente,
que indicam quais os quesitos necessários para que uma pessoa
jurídica seja declarada nacional de um Estado, bem como, seja essa
reconhecida alienígena perante os outros Estados de Direito.
Na doutrina pátria, encontra-se uma série de critérios para
determinar a nacionalidade da pessoa jurídica privada estrangeira e
Irineu Strenger
145
demonstra a lista mais extensa dessas teorias:
1º) Nacionalidade do país que cria e autoriza a
sociedade.
2º) Nacionalidade dos sócios.
3º) Nacionalidade dos diretores e gerentes.
4º) Nacionalidade do lugar onde foi subscrito o capital
social.
5º) Nacionalidade do lugar de constituição.
6º) Nacionalidade do lugar de exploração.
7º) Nacionalidade determinada pelo domicílio social.
144
LOPES, Miguel de Serpa. Comentários à Lei de Introdução ao Código Civil, p. 36.
145
STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado, p. 537.
74
8º) Nacionalidade de onde se situa a direção efetiva
dos negócios sociais, isto é, do país ao qual
pertencem os dirigentes e seus capitais.
O mesmo autor acredita que “o critério mais razoável é considerar
que a pessoa jurídica tem a nacionalidade do Estado em cujo território
estabelece sua sede social e seu centro diretor ou de comando”.
146
Miguel Maria de Serpa Lopes demonstra que no Brasil existe
divergência legislativa, pois as sociedades por ações têm sua
nacionalidade definida segundo art. 60 da Lei das Sociedades
Anônimas: A regra do art. 11 da atual lei de introdução prevalece para
os demais casos de sociedades estrangeiras, para solucionar o
conflito interespacial, entre outras leis, que não no caso de uma
pessoa jurídica de nacionalidade brasileira, assim definida pelo
respectivo Direito interno”.
147
Hodiernamente, para as demais
sociedades comerciais, o Código Civil disciplina a matéria nos artigos
1126 e seguintes.
3.14.1
Empresa Nacional à Luz da Constituição Federal de 1988
Entende-se por bem utilizar o critério de determinar quem são as
consideradas empresas nacionais pelo ordenamento jurídico brasileiro,
para só então, por exclusão, se analisar quais são as empresas
estrangeiras para nosso Direito.
O revogado, por meio de emenda constitucional n.º 06/95, art.
171, da Constituição Federal vigente, estabelecia qual empresa
poderia ser considerada nacional;
Art. 171. São consideradas:
I empresa brasileira a constituída sob as leis
brasileiras e que tenham sua sede e administração no
País;
146
STRENGER, Irineu. op. cit., p. 537.
147
LOPES, Miguel Maria de Serpa. op. cit., p. 39.
75
II empresa brasileira de capital nacional aquela cujo
controle esteja em caráter permanente sob a
titularidade direta e indireta de pessoas físicas
domiciliadas e residentes no País ou entidades de
direito público interno, entendendo-se por controle
efetivo da empresa a titularidade da maioria de seu
capital votante e o exercício, de fato e de direito, do
poder decisório para gerir suas atividades.
Com este enunciado, fica claro que o legislador constituinte se
preocupou em definir os requisitos para determinar a nacionalidade
das empresas. Pode-se afirmar que ele se valeu de critérios já
previstos em nossa legislação, pois a Lei n.º 6.404/76, Das
Sociedades Anônimas, nos traz o critério da constituição cumulado
com a da sede social efetiva, tal qual verificamos no inciso I do
revogado artigo, em que aparecem dois critérios combinados, o da
constituição ou da incorporação e o da sede social, cumulado com a
administração, bem como da Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro, no art. 11, que estabelece o critério da constituição ou da
incorporação, se analisado em sentido indireto.
O inciso II apresenta outro critério, somando-se três para
determinar qual empresa pode ser considera de capital nacional. Este
critério é o do controle administrativo, não aplicado quanto a
nacionalidade das pessoas físicas que a dirigem, mas sim quanto aos
interesses de permanência em solo brasileiro dessas. Pode-se concluir
que a pessoa singular que estabelece domicílio e residência no Brasil
tem animus de efetivamente explorar atividades econômicas sob a
égide da legislação brasileira, inclusive estabelecer seus laços
familiares e seu convívio social no Brasil, ou seja, esse sujeito tem
boa intenção, não é um explorador, farsante ou eventual inimigo para
a nação. A idéia, então, é expor à lei brasileira os acionistas ou
controladores destas sociedades, e não à lei de sua nacionalidade.
A disposição deste inciso já era previsto na Lei n.º 7.232/84, a
antiga lei de informática, que dispunha benefícios a empresas de
capital nacional. O legislador constituinte, quase que, apenas compilou
as disposições legais já existentes à época. Mas como já mencionado,
o artigo fora revogado, portanto não cabe mais qualquer aplicação,
salvo como auxílio na interpretação dos dispositivos legais vigentes.
76
A composição deste artigo conduz à linha de raciocínio do
legislador constituinte. Ao que tudo indica se pode interpretar como
uma tendência futura de nossa Constituição, por ser jovem, e acima de
tudo moderna, traduzindo o momento histórico atual de nossa
sociedade.
Os valores sociais dessa forma de definir empresa, como
nacional, uma vez que o legislador procurou ofertar vantagens às
empresas nacionais, que já não subsistem no momento atual, ainda
podem ser encontrados, mesmo que parcialmente, no art. 170 inciso IX
da Constituição Federal.
148
Determinado pela mesma emenda constitucional que revogou o
art. 171, prevê tratamento diferenciado para as empresas de pequeno
porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e
administração no País. Ora, a Carta Magna continua a determinar o
que vem a ser uma empresa nacional, se não explicitamente, ao
menos de forma indireta; aliada à vontade implícita do texto original,
propicia uma boa margem de interpretação neste sentido, ou seja,
pode-se concluir que para ser considerada brasileira a pessoa coletiva
que atua em nosso país deve estar organizada juridicamente sob
império da lei brasileira e ter sua sede social efetiva instalada em solo
pátrio; mesmo que tal conclusão não se encontre literalmente esta
disposição no texto constitucional.
Outra menção à empresa nacional que se encontra em nossa
carta magna, está disposta no art. 176, § 1º,
149
que trata da pesquisa e
148
“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da
justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional; II - propriedade privada; III - função social da propriedade; IV -
livre concorrência; V - defesa do consumidor; VI - defesa do meio ambiente; VII -
redução das desigualdades regionais e sociais; VIII - busca do pleno emprego; IX -
tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis
brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade
econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos
previstos em lei.”
149
“Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de
energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração
ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do
produto da lavra.
§ 1º. A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que
se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou
concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob
77
lavra de recursos minerais, só será autorizado a brasileiros e à
empresa constituída sob as leis brasileiras que tenham sua sede e
administração no Brasil.
Como o constituinte determinou, especificamente, “brasileiros”,
conclui-se que as empresas que preenchem os requisitos
estabelecidos no referido artigo serão consideradas nacionais, logo
para que a pessoa coletiva no Brasil seja nacional, é imperioso que ela
seja constituída em conformidade com a legislação brasileira e
mantenha no País a sua sede social efetiva, concomitantemente.
A seguir esse raciocínio, pode-se afirmar que o Brasil adota dois
critérios para determinar a nacionalidade de suas pessoas jurídicas,
que devem ser aplicados simultaneamente, acrescenta ao qual já se
defendeu, o da sede efetiva.
É quando Eduardo Espinola menciona “como em tantas outras
legislações, não se encontra na brasileira uma regra geral, que se
destine, de modo preciso, a estabelecer o critério, segundo o qual se
possa determinar se uma pessoa jurídica de direito privado é nacional,
ou estrangeira”.
150
De qualquer forma verificar-se que o Brasil dá grande importância
ao lugar da constituição, como em análise já feita a equiparar-se a
incorporação de pessoa jurídica ao nascimento de pessoa física.
Recebe assim o direito à nacionalidade a empresa que “nasce” sob a
égide da norma brasileira, desde que mantenha em território nacional
sua sede administrativa.
as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que
estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em
faixa da fronteira ou terras indígenas.
§ 2º. É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na
forma e no valor que dispuser a lei.
§ 3º. A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as autorizações
e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou transferidas, total ou
parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.
§ 4º. Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do potencial de
energia renovável de capacidade reduzida.”
150
ESPINOLA, Eduardo; ESPINOLA FILHO, Eduardo. Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro, p. 134.
78
3.14.2
Nacionalidade no Código Civil brasileiro
Com a promulgação da lei civil brasileira de 2002, as sociedades
comerciais passam a possuir nacionalidade, vez que o legislador pátrio
inclui tal disposição no artigo 1.126 da Lei n.º 10.406/02, com a
seguinte redação:
Art. 1.126. É nacional a sociedade organizada de
conformidade com a lei brasileira e que tenha no País
a sede de sua administração.
Parágrafo único. Quando a lei exigir que todos ou
alguns sócios sejam brasileiros, as ações da
sociedade anônima revestirão, no silêncio da lei, a
forma nominativa. Qualquer que seja o tipo da
sociedade, na sua sede ficará arquivada cópia
autêntica do documento comprobatório da
nacionalidade dos sócios.
Note-se que as disposições da lei ordinária e as do revogado
artigo 171 e seus incisos da Constituição Federal, dispõe de redação
quase idêntica. Ao analisar o Projeto de Lei n.º 634/75, Ante projeto do
Código Civil, mais especificamente a Emenda n.º 119, de 17 de
Setembro de 1984
151
, pretendeu-se a inclusão de mais um critério, um
terceiro inciso, “ter capital votante sob o controle de brasileiro ou de
sociedade nacional”
152
, mas a lei civil foi promulgada sem a
modificação, por ironia na mesma pessoa de quem houvera proposto a
Emenda, neste ato na condição de Presidente da República.
O legislador pátrio demonstra a clara intenção de atribuir
nacionalidade às sociedades, o artigo 1.127 da referida lei alude a
possibilidade da troca de nacionalidade, sob a condição do
consentimento unânime dos sócios ou acionistas. Desta forma, no
Brasil de admite o instituto da nacionalidade aos entes coletivos, bem
como, se possibilita a mudança desta, pelo mesmo critério que admite
a existência das pessoas jurídicas, o elemento volitivo, quer seja ele
para constituir uma pessoa coletiva e atribuir-lhe a nacionalidade
brasileira, ou para mudá-la, desde que observados os requisitos
151
Apresentada por Fernando Henrique Cardoso, na condição de Congressista.
79
legais. O artigo 1.141 da mesma lei possibilita à sociedade estrangeira
nacionalizar-se, mediante requerimento e autorização do Poder
Executivo e a conseqüente transferência de sua sede administrativa
para o território nacional.
Decorre de lógica que a nacionalidade atribuída pela lei, a
empregar o critério da incorporação e sede administrativa
cumulativamente, não se estende as demais pessoas jurídicas,
associações e fundações. O legislador pátrio optou pela inserção
dessas disposições quando trata do Direito de Empresa, logo, parece
lógico concluir que as pretendia apenas para sociedades que se
revestem da forma comercial. Para essas prevalece a Lei de
Introdução ao Código Civil, que não contempla a nacionalidade
diretamente, alude apenas a lei que lhes será aplicável, neste caso a
de sua constituição.
Por todo já exposto, mesmo que de forma implícita, entende-se
sem sentido a discussão que pretende classificar pessoas jurídicas. Na
acepção da palavra todas são entes coletivos, sejam sociedades,
associações ou fundações, formadas por pessoas naturais sob a égide
legal de um determinado Estado. Fundadores, dirigentes, etc. possuem
personalidade distinta da pessoa jurídica, logo estas não se fundem ou
confundem.
Leonardo Medeiros Régnier, explica que a sociedade se forma
pela vontade de pessoas naturais de se associarem, só então surge
pessoa jurídica, com o devido registro no órgão competente, e após o
início de suas atividades, em conformidade com seu fim, no caso das
sociedades comerciais, o lucro, adquire a forma de empresa.
153
152
BRASIL, Câmara dos Deputados, Projeto de Lei n.º 634/75.
153
RÉGNIER, Leonardo Medeiros. Nacionalidade das Sociedades Comerciais, p. 43 e
ss.
80
O artigo 1.134 lei civil brasileira inicia a Seção III, Da Sociedade
Estrangeira, e condiciona a autorização do Poder Executivo às
atividades de sociedades comerciais estrangeiras no Brasil. Essa
disposição, não difere da Lei de Introdução, analisada no próximo
capítulo, que trata da lei aplicável. Nos artigos seguintes a legislação
disciplina a matéria atinente à autorização.
No capítulo seguinte trata-se da lei aplicável, intimamente ligado
ao conceito da nacionalidade, aborda-se os institutos legais vigentes
no Brasil, bem como os de interesse, decorrente de possíveis relações
internacionais que envolvam pessoas jurídicas nacionais ou
estrangeiras.
4
Lei aplicável às pessoas jurídicas de direito
privado
A aplicação do estatuto pessoal da pessoa jurídica no direito
internacional privado dá-se através de regras jurídicas específicas.
154
Ao estatuto pessoal da pessoa jurídica cabe a determinação do
direito aplicável nas relações jurídicas internacionais realizadas por
aquela pessoa.
Doutrinariamente, esse procedimento chama-se lex
societatis e regula a natureza jurídica da pessoa
jurídica, a sua constituição, a sua dissolução e
liquidação, bem como a sua capacidade de gozo ou de
direito (Rechtsfähigkeit), aquela de exercício ou de
fato (Handlungsfähigkeit), o seu nome comercial, a sua
organização interna, particularmente da sociedade com
os seus sócios, o regime jurídico da responsabilidade
civil pela violação de normas do direito societário, a
responsabilidade jurídica pelas dívidas da pessoa
jurídica, a sua administração, gestão e funcionamento,
a sua representação perante terceiros, a emissão de
títulos e seu regime jurídico.
155
Conforme Hee Moon Jo:A lei aplicável à personalidade da
pessoa jurídica (tanto nacional quanto estrangeira) decide todas as
questões jurídicas a ela pertinentes, desde a sua constituição até a
dissolução”.
156
O mesmo autor salienta que para revestir as transações
comerciais com segurança, existem limites legais para que se aplique
a lex societatis, expondo os seguintes:
154
RECHSTEINER, Beat Walter. Direito internacional privado: teoria e prática, p. 143.
155
RECHSTINER, Beat Walter. op. cit., p. 144.
156
JO, Hee Moon. Moderno Direito Internacional Privado, p. 426.
82
Constituição Todas as questões relacionadas à
constituição da pessoa jurídica, como as condições
substanciais e formais para a constituição, as causas
de nulidade da constituição, os seus efeitos, etc., são
determinadas pela lex societatis.
Estrutura interna A lex societatis determina todas as
questões relacionadas à formação e ao funcionamento
dos diversos órgãos da pessoa jurídica, como seus
tipos, as suas características, o número dos membros
de cada órgão, as eleições, as demissões, as relações
com os seus funcionários, direitos e deveres dos
funcionários, a alteração de carta constitutiva, etc.
Emissões de ações A lex societatis determina todas
as questões jurídicas relacionadas à parte acionária da
pessoa jurídica, tais como a possibilidade de emissão
de ações, a modalidade desta, as espécies de ações,
suas características, a transferência, etc.
Dissolução e liquidação A lex societatis também
determina as questões jurídicas sobre a dissolução da
pessoa jurídica, como as razões para a sua
dissolução, o procedimento a ser seguido, os efeitos
desta, etc.
Capacidade processual A lex societatis dispõe sobre
a capacidade processual da pessoa jurídica, ou seja, a
capacidade desta de ser parte em processo judiciário.
Limitação à Aplicação da “Lex Societatis”: Este é um
tema muito delicado, sendo necessária sempre a
análise individual do caso. Referentemente às
questões de capacidade individual da pessoa jurídica,
aplica-se a lei aplicável a cada ato jurídico específico.
As questões referentes a atos ilícitos atribuíveis à
pessoa jurídica são sempre determinadas pela lei do
local do ato. Com relação à capacidade processual do
órgão representativo da pessoa jurídica, esta é
decidida pela lex fori, como uma questão processual
do forum.
157
Condizente às tendências legislativas para a determinação do
estatuto das pessoas jurídicas de direito privado, basicamente, são
levados em consideração dois critérios: o da incorporação e o da sede
social.
157
JO, Hee Moon. op. cit., p. 427 e 428.
83
4.1
Critério da incorporação
De acordo com esse critério, a lei do lugar da constituição da
pessoa jurídica é a que determina a lei aplicável à mesma.
No âmbito interno de cada país, é determinado o conteúdo da lei,
ou seja, cada legislação nacional apresenta os seus requisitos
próprios relacionados à publicidade e ao registro da sociedade.
Uma vez cumpridos os requisitos exigidos, passa a capacidade
jurídica da pessoa jurídica de direito privado a ser reconhecida como
existente, assim como o direito aplicável que vai ser do próprio lugar
de constituição.
Assim, conforme a teoria da incorporação,
os sócios fundadores possuem a faculdade de
constituir a pessoa jurídica conforme o direito de sua
escolha, ainda que está não desenvolva as suas
principais atividades no país da sua constituição. É
sempre decisiva a sede estatutária ou aquela
designada no contrato social da pessoa jurídica. A
sede social ou efetiva, ou seja, aquela da sua
administração real, não é relevante.
158
Contrária à teoria da constituição, existe a teoria da sede social.
4.2
Critério da sede social
O critério da sede social estabelece como direito aplicável o do
lugar da sede da pessoa jurídica. Vale dizer, o local da sua
administração real.
Destarte, a sede levada em consideração por esse critério não é
a determinada no contrato social, mas a chamada sede efetiva da
pessoa jurídica.
158
RECHSTEINER, Beat Walter. op. cit., p. 145.
84
Ao analisar as duas teorias, conforme os mais adeptos da teoria
da incorporação, esta favorece a certeza do direito (securité de droit).
Assim, a teoria da incorporação traz uma melhor estabilidade na
questão da pessoa jurídica no direito internacional, principalmente
para a segurança dos credores.
A opção pela teoria da sede social, por outro lado, induz a uma
estabilidade na existência das sociedades irregulares,
posto que, em muitos casos, a sede estatutária ou a
sede designada no contrato social da pessoa jurídica
não coincide de fato com a sua sede social ou efetiva,
inclusive, quando uma sociedade resolve transferir a
sua administração por determinadas razões,
provisoriamente, para o estrangeiro.
159
Neste capítulo, há de se tratar de legislação pertinente à lei
aplicável no âmbito brasileiro,
160
sendo , para tanto, deve-se tratar aqui
também algumas questões referentes à nacionalidade da pessoa
jurídica,
161
pois os dois temas são distintos, é bem verdade, mas estão
certamente intimamente ligados. O Brasil adota como critério para lei
aplicável, o da incorporação, e para o da nacionalidade, o da
incorporação cumulado com o da sede efetiva e, em alguns casos,
ainda, o do controle. Como a legislação não trata do tema de forma
específica, direta, e sim sempre indiretamente, achamos por
conveniente utilizar a nacionalidade como matéria de apoio para
discutir o assunto da lei aplicável em território brasileiro.
No âmbito da legislação nacional, o tratamento dado às pessoas
jurídicas de direito internacional privado é disciplinado na Lei de
Introdução ao Código Civil de 1942 e em outras normas esparsas de
lege ferenda .
159
RECHSTEINER, Beat Walter. op. cit., p. 145.
160
Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, Lei das Sociedades Anônimas, Código
de Bustamante e Convenção Interamericana sobre Conflito de Leis em Matéria de
Sociedades Comerciais.
161
Como parâmetro internacional, tratamos do caso Barcelona Traction, julgado pela
Corte Internacional de Justiça.
85
4.3
Lei aplicável segundo a Lei de Introdução ao Código Civil
de 1942
Segundo disposição do Decreto-Lei n.º 4.657, de 4 de setembro
de 1942, que editou a Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro,
está assim no seu artigo 11:
Art. 11. As organizações destinadas a fins de interesse
coletivo, como as sociedades e as fundações,
obedecem à lei do Estado em que se constituírem.
§ 1º. Não poderão, entretanto, ter no Brasil filiais,
agências ou estabelecimentos antes de serem os atos
constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro,
ficando sujeitas à lei brasileira.
§ 2º. Os Governos estrangeiros, bem como as
organizações de qualquer natureza, que eles tenham
constituído, dirijam ou hajam investido de funções
públicas, não poderão adquirir no Brasil bens imóveis
ou suscetíveis de desapropriação.
§ 3º. Os Governos estrangeiros podem adquirir a
propriedade dos prédios necessários à sede dos
representantes diplomáticos ou dos agentes
consulares.
Ao interpretar o caput do artigo, conclui-se que o legislador
brasileiro optou pela teoria da incorporação para definir qual a lei que
deve ser aplicada à organização estrangeira. A doutrina tem discutido
acerca da falta de clareza do legislador, pois falta ao artigo a palavra
pessoa jurídica, aludindo à teoria da ficção. Encontra-se, portanto, na
doutrina, comparação ao texto da antiga lei de introdução que era mais
específica e trazia a referência direta à pessoa jurídica, ou, mais
precisamente, o reconhecimento da nacionalidade da pessoa jurídica.
Entende-se que não há qualquer necessidade do rigor literário e é
evidente que se trata de uma regra Direito Internacional, pois visa
contemplar, não só as organizações, sociedades e fundações, mas, de
forma genérica, as entidades que são conhecidas como pessoas
jurídicas, ou coletivas. Como exemplo, tem-se a sociedade por quotas
de responsabilidade limitada que, após seu registro na Junta
Comercial, passará a ser uma pessoa jurídica de pleno direito, isto se
86
for registrada em território brasileiro e tiver sua sede efetiva aqui
instalada.
Segundo análise do capítulo anterior, será essa de nacionalidade
brasileira, mesmo que atual lei de introdução, não seja explícita. Basta
que, para tanto, se faça uma análise mais abrangente, ou mais
flexível, afim de melhor aplicar o direito vigente, ou seja, poder admitir
que a lei de introdução abarca a nacionalidade, ou a admite, quando
faz referência à aplicação da lei do Estado de constituição das
entidades estrangeiras, quando assim se fizer necessário em território
nacional.
No caso de se indicar lei de outro Estado a ser aplicada, e sendo
a lei do Estado de sua constituição, tem-se que o aplicador, mesmo
sendo omisso à questão de nacionalidade, usa de forma indireta o
conceito da teoria de incorporação para definir a nacionalidade de
pessoa estrangeira.
Para Maria Helena Diniz, vale no Brasil o disposto no artigo 11 da
lei de introdução que é a lei do local de sua constituição para definir a
lei aplicável à pessoa jurídica. Sinaliza como sendo esse critério o
mais adequado.
162
Ainda, segundo a autora, a lei de introdução,
“apesar de desprezar o critério da nacionalidade, do domicílio dos
sócios ou dos fundadores, do país da subscrição, do capital social, da
sede empresarial, da autonomia da vontade, não veio, contudo, a
quebrar o princípio da lei domiciliar”.
163
Diante desse raciocínio, pode-se perfeitamente adequar a
interpretação do dispositivo legal à Constituição Federal, uma vez que
aplica os dois princípios, o do local de constituição e o do domicílio, ou
seja, da sede efetiva. Para tal conclusão, de se interpretar a carta
magna com certa flexibilidade,
164
não sistemática.
162
DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Interpretada. passim.
163
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p. 296.
164
Se o legislador constituinte admite favorecer as empresas de pequeno porte
constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País,
conforme o art. 170 inciso IX e art. 176 § 1º, que faz a mesma alusão, com exceção da
referência as de pequeno porte; interpreta-se que o contrário vale no mesmo sentido, ou
seja, as empresas que não se enquadrarem nestes quesitos, serão consideradas
estrangeiras, pois está clara a intenção do legislador em dar privilégios à pessoas
jurídicas de nacionalidade brasileira.
87
O parágrafo primeiro, da Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro, estabelece a regra da autorização governamental para que
uma empresa, cuja organização acontecera em outro Estado, possa,
no Brasil, estabelecer-se e exercer suas atividades conforme seu
estatuto.
O legislador visa garantir que empresa alguma venha a atuar no
Brasil com fins ilícitos, ou com o propósito de apenas explorar suas
atividades sem recolher os impostos devidos.
Fica a critério do governo brasileiro aprovar o estatuto registrado
em Estado diverso de maneira discricionária, cabendo aos órgãos
administrativos autorizarem a empresa estrangeira a exercer suas
atividades no Brasil. Caso seja autorizada, fica ela sujeita às leis
brasileiras.
No entender de Maria Helena Diniz, se a pessoa jurídica
conservar sede no exterior e aqui não se estabelecer pode fazer
negócios no Brasil sem autorização do governo brasileiro, até recorrer
aos Tribunais brasileiros, pois a pessoa jurídica, não pretendendo aqui
se instalar, deseja apenas continuar sob a égide da lei do Estado de
sua constituição. Mas se a empresa se instalar no Brasil, para não
fraudar a lei, deverá obter autorização do governo brasileiro e assim
se sujeita à lei nacional.
165
Dessa forma, não se nacionaliza a pessoa jurídica, “apenas se
determina o exercício de seus direitos, com as restrições
estabelecidas pela ordem pública e bons costumes”.
166
A autora, Maria
Helena Diniz, posiciona-se e afirma serem coisas distintas o
reconhecimento da personalidade jurídica de uma empresa e a
autorização, ou capacidade para aqui funcionar, a personalidade
reconhecida pelo Estado de sua constituição. A isto, chama ela de
“capacidade funcional”.
165
DINIZ, Maria Helena. op. cit., passim.
166
DINIZ, Maria Helena. op. cit., p. 300.
88
4.3.1
Projeto de Lei Geral de Aplicação das Normas Jurídicas de
Haroldo Valladão de 1964
O Projeto ou Anteprojeto como preferem alguns doutrinadores
de Lei Geral de Aplicação das Normas Jurídicas do professor Haroldo
Valladão
167
teve a intenção de abandonar o critério de conexão pelo
domicílio, aplicando regras distintas para categorias mais específicas.
Dispõe a Exposição de Motivos do Anteprojeto, a respeito:
Em matéria de critério internacional privado, o
Anteprojeto deixou de lado os critérios simplistas e
superados de lei nacional ou de lei de domicílio,
sistematicamente para grandes grupos de relações
jurídicas; disciplinou-as em categorias mais restritas,
buscando outros critérios menos lógicos porém mais
justos, eqüitativos, práticos e efetivos, da lei da
residência habitual, da lei da situação, principalmente
dos imóveis, regendo pela lei brasileira a sucessão
quanto aos aqui situados, da lei do lugar da execução,
da lei mais favorável aos atos, ao filho, ao incapaz, ao
alimentando, etc., da lei brasileira em defesa dos
interesses do país e dos brasileiros, etc.
168
Quanto à existência e à capacidade das pessoas jurídicas
estrangeiras, o anteprojeto opta pela lei do lugar da constituição, com
o limite que essa capacidade no quesito do conteúdo não poderia
exceder a lex fori brasileira.
169
Ademais, outra condição imposta pelo Anteprojeto foi a
autorização anterior do governo brasileiro para o funcionamento das
empresas estrangeiras no Brasil, seja diretamente ou por meio de
filiais, agências ou estabelecimentos de quaisquer natureza.
O art. 28 do referido Anteprojeto estabelece, diretamente, que a
lei aplicável para reger a existência e a capacidade das pessoas
jurídicas brasileiras é, sempre, a lex fori.
167
Lei Geral de Aplicação de Normas Jurídicas Anteprojeto oficial de reforma da Lei
de Introdução ao Código Civil, apresentando pelo professor Haroldo Valladão ao Senhor
Ministro da Justiça e Negócios Interiores.
168
Exposição de motivos, p. 5.
169
art. 27 caput do Anteprojeto.
89
4.3.2
Projeto de Lei n.º 4.905/95
No final do ano de 1994, a presidência da República Brasileira
enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei n.º 4.905, de 1995, que
dispõe sobre a aplicação das normas jurídicas, com objetivo de
substituir a Lei de Introdução ao Código Civil de 1942.
Nesse Projeto, na questão das pessoas jurídicas, propõe-se, no
art. 20 a seguinte redação: “As pessoas jurídicas serão regidas pela lei
do país em que se estiverem constituído”, sempre com a devida
autorização do governo brasileiro, conforme seu parágrafo único.
Esse Projeto recebeu parecer favorável do relator da Comissão
de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Não obstante,
antes de ser votado, o governo desconsiderou o projeto “tendo em
vista a necessidade de reexame da matéria”.
O Projeto tinha como objetivo substituir a Lei de Introdução ao
Código Civil de 1942, estabelecendo regras para a aplicação das
normas jurídicas. Vale dizer, regras de direito internacional privado e
de direito intertemporal.
Conforme Jacob Dolinger,
a doutrina advoga que se projete duas leis autônomas,
uma de direito internacional privado, e outra para
aplicação das normas jurídicas, que cuidaria dos
aspectos gerais e intertemporais, reclamando que não
se admite a promulgação de um novo Código Civil
brasileiro, sem que se tenha sequer iniciado o
procedimento para a substituição de sua lei
introdutória.
170
Mesmo assim, o referido Projeto representaria uma evolução para
o sistema de direito internacional privado brasileiro, a integrar
disposições mais adequadas aos negócios jurídicos internacionais da
nossa época.
170
DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado, p. 331. Consultar, NUSSBAUM,
Arthur. Princípios de derecho internacional privado, p. 10 e ss. Sobre a parte geral do
direito internacional privado, consultar MACHADO, João Baptista. Lições de direito
90
4.4
Lei aplicável segundo a Lei das Sociedades Anônimas
Em conformidade com o Decreto-Lei n.º 2.627, de 26 de
Setembro de 1940, ou mais precisamente do que restou dele, pois a
maior parte de seu texto legal foi revogado pela Lei n.º 6.404, de 15 de
Dezembro de 1976,
171
conhecida como Lei das Sociedades Anônimas,
temos a seguinte disposição legal:
Art. 60. São nacionais as sociedades organizadas na
conformidade da lei brasileira e que têm no país a
sede de sua administração.
Parágrafo único. Quando a lei exigir que todos os
acionistas ou certo número deles sejam brasileiros, as
ações da companhia ou sociedade anônima revestirão
a forma nominativa. Na sede da sociedade ficará
arquivada uma cópia autêntica do documento
comprobatório da nacionalidade.
Art. 68. As sociedades anônimas estrangeiras
autorizadas a funcionar ficarão sujeitas às leis e aos
tribunais brasileiros quanto aos atos ou operações que
praticarem no Brasil.
O artigo 60 deixa claro que no Brasil existe a diferença entre
empresa nacional e estrangeira. A própria norma reconhece a
nacionalidade de pessoas jurídicas e para tanto usa cumulativamente
dois critérios, o da incorporação e o da sede efetiva. Se as nacionais
são organizadas em conformidade às leis brasileiras, temos por lógico
que as estrangeiras só podem ter sido organizadas sob lei de outro
Estado.
A doutrina sistêmica reza que pelo fato de ser lei específica, ou
seja, lei que se aplica às sociedades por ações, ou sociedades
anônimas, somente para estas pode haver interpretação da lei como
admitindo empresas estrangeiras. Volta-se à questão já discutida, a
considerar que nesse caso a lei específica se aplica para as outras
entidades coletivas, ou seja, de forma genérica a todas as pessoas
internacional privado. Além de: SOUTO, Cláudio. Introdução crítica ao direito
internacional privado.
171
Esta não revogou os artigos 59 a 70 daquela.
91
jurídicas. Não faz sentido distinguir as empresas pelo tipo de
sociedade que ela escolheu, ao menos no caso específico de
nacionalidade, que incide diretamente em como definir a lei que a ela
compete.
O Decreto-Lei n.º 2.627/40 disciplina a autorização de empresa
estrangeira para funcionar no Brasil e no art. 66
172
traz a possibilidade
desta acrescentar, em território brasileiro a denominação “do Brasil”
ou “para o Brasil”, em seu nome original. Mais uma vez a autorização
seria discricionária, face ao governo brasileiro, pois a sociedade só
poderá funcionar se atender a requisitos econômicos e sociais, estes a
critério do governo e do momento sócio-político-econômico vivido pela
sociedade brasileira quando do pedido de funcionamento.
O artigo 71
173
traz a possibilidade de a sociedade autorizada a
funcionar em território nacional, de nacionalizar-se. Isto quer dizer que
este artigo acaba em definitivo com qualquer dúvida quanto ao sistema
legal brasileiro que distingue e reconhece nacionalidade a pessoas
jurídicas.
O artigo 68
174
pode ser interpretado da mesma forma que o § 1º
do art. 11, do Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro. Diz-se que
se a empresa estrangeira for autorizada a funcionar no Brasil ficará
automaticamente sujeita à lei brasileira, no que tange os atos ou
operações aqui praticados. Não resta dúvida que nos demais casos,
como um eventual litígio que verse acerca do estatuto dessa pessoa
jurídica, quanto à sua constituição ou forma de funcionar, administrar
172
“Art. 66. As sociedades anônimas estrangeiras funcionarão no território nacional com
a mesma denominação que tiverem no seu país de origem, podendo, entretanto,
acrescentar as palavras - "do Brasil" ou "para o Brasil".”
173
“Art. 71. A sociedade anônima estrangeira, autorizada a funcionar no país, pode,
mediante autorização do Governo Federal, nacionalizar-se, transferindo sua sede para o
Brasil.
§ 1º Para esse fim, deverá, por seus representantes habilitados, oferecer, com o
requerimento, os documentos exigidos no artigo 64, parágrafo único, letras a, b e c,
sem a exceção admitida nesta letra, e f, a prova da realização do capital, pela forma
declarada nos estatutos, e a ata da assembléia geral em que foi resolvida a
nacionalização.
§ 2º O Governo Federal poderá impor as condições que julgar convenientes à defesa
dos interesses nacionais.
§ 3º Aceitas pelo representante habilitado as condições, expedirá o Governo Federal o
decreto de nacionalização, observando-se, em seguida, o disposto nos parágrafos 3º e
4º do artigo 61.”
92
ou gerir seus órgãos, será submetido à lei do local de sua constituição,
como é explícito o art. 11 da Lei de Introdução ao Código Civil
Brasileiro.
4.5
Lei aplicável nas fontes legislativas internacionais
Curioso é estudar o critério adotado pelo direito convencional no
que tange aos instrumentos legais dos Tratados e das Convenções.
Essa análise, naturalmente, dar-se-á no intuito de conhecer a lei que
se deve aplicar às pessoas jurídicas de direito privado.
Não obstante, os Tratados e Convenções mencionados a seguir
não se referem, categoricamente, à nacionalidade da pessoa jurídica
de direito privado de maneira direta. Apesar disso, o enquadramento
de determinada sociedade à lei de certo país (a lex societatis)
corresponde, exatamente, à nacionalidade da sociedade.
175
4.5.1
Convenção de Direito Internacional Privado/Código de
Bustamante de 1928
O sistema jurídico brasileiro é integrado por um Tratado
promulgado no Brasil em 13 de Agosto de 1929, pelo Decreto n.º
18.871, que é o Código de Direito Internacional Privado, mais
conhecido como o Código de Bustamante. O tratado foi ratificado por
outros quatorze países americanos, Bolívia, Chile, Costa Rica, Cuba,
Equador, Guatemala, Haiti, Honduras, Panamá, Peru, República
Dominicana, El Salvador, e Venezuela. Mais cinco nações foram
signatárias, mas não ratificaram o acordo, Argentina, Colômbia,
México, Paraguai e Uruguai. Os Estados Unidos da América também
presenciaram a Convenção que aprovou o Código, mas se abstiveram
da subscrição.
174
“ Art. 68. As sociedades anônimas estrangeiras autorizadas a funcionar ficarão
sujeitas às leis e aos tribunais brasileiros quanto aos atos ou operações que praticarem
no Brasil.”
175
DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado, p. 492.
93
Entre o Brasil e os países que ratificaram o tratado, vale o que
dispõe justamente o Código de Bustamante para redimir litígios que a
ele dizem respeito, entre os países que o ratificaram. Entre o Brasil e
outros países que não os citados, este código vale apenas como fonte
subsidiária. Suas disposições podem eventualmente ser consideradas,
mas para tal deverá ser eleito pelas partes como norma reguladora.
Entre os países que ratificaram o acordo, ou mais precisamente,
entre estes e o Brasil, não se vislumbra grande diferença do disposto
na legislação que se considera genérica valendo para empresas de
nacionalidade diversa da brasileira, de maneira geral.
O Código de Bustamante traz a idéia nítida de nacionalidade
aplicada à pessoa jurídica. Com base nisto, tem-se a legislação que
deverá ser aplicada a cada caso concreto, inclusive admitindo a
naturalização e regulando esses casos. Em seu artigo 19, determina a
forma com que a sociedade anônima pode obter sua nacionalidade.
Pela eleição, conforme estatuto, isso abre a possibilidade de a
empresa registrar seu estatuto no Brasil, mas eleger a nacionalidade
boliviana. Entende-se que mesmo entre o Brasil e os países que
ratificaram o Código de Bustamante, as disposições do ordenamento
jurídico brasileiro, mais precisamente a Lei de Introdução ao Código
Civil Brasileiro e a Lei das Sociedades Anônimas, serão aplicadas nos
litígios originados, frente empresas alienígenas. O referido código é
minucioso e bem detalhado. As leis posteriores ao código
simplificaram o texto daquele.
O Código de Bustamante faz menção expressa à nacionalidade
das pessoas jurídicas, mas refere-se a critérios diferentes para os
diversos tipos de classificação das pessoas jurídicas.
176
176
ARAUJO, Nádia de. Direito internacional privado: teoria e prática brasileira, p. 69.
Segundo a autora, o Código Bustamante sempre foi uma legislação pouco conhecida e
pouco usada pelos tribunais brasileiros. Também consultar GUZMÁN Latorre, Diego;
MILLÁN Simpfendörfer, Marta. Curso de Derecho Internacional Privado, p. 340 e ss.
94
Segundo essa Convenção, para as corporações, fundações e
associações, valerá a regra da nacionalidade de origem determinada
pela lei do país que autorize, ou aprove, o seu funcionamento,
conforme os artigos 16 e 17. É o chamado critério da incorporação,
conforme vimos ut retro.
Já o art. 18 estabelece que as sociedades civis, mercantis ou
industriais terão as suas nacionalidades determinadas na escritura
social. É o chamado critério da autonomia da vontade.
Subsidiariamente, na mesma situação, valerá a lei do lugar onde tenha
gerência ou direção principal habituais, conhecido, pelo critério da
sede social.
Para as Sociedades Anônimas, segundo o art. 19, o Código
dispõe que sua nacionalidade será determinada pelo contrato social
(critério da autonomia da vontade) e, sendo o caso, pela lei do lugar
em que, geralmente, ocorra a reunião geral de acionistas ou, na sua
falta, pelo do lugar onde funcione o seu principal Conselho
Administrativo ou Junta Diretiva (critério da sede social).
Antonio Sanches de Bustamante y Sirven, que foi autor do
Código, homenageado pela inclusão do seu nome no mesmo Código
de Bustamante esclarece que as associações de direito público em
que seus associados exercem o direito público de associação para fins
lícitos, de acordo com as garantias individuais não podem ser
estranhas ao país em que tiverem sido registradas ou inscritas.
177
No condizente às pessoas jurídicas constituídas para objetivos
civis, mercantis ou industriais, de caráter privado, segundo Antonio
Sanches de Bustamente y Sirven, apresentam, com mais freqüência,
atividades de natureza internacional.
178
É por essa razão que o Código de Bustamante separou por
distinção as corporações, fundações e associações de uma maneira
177
BUSTAMENTE y SIRVEN, Antonio Sanches de. Derecho Internacional Privado, p.
247.
178
BUSTAMENTE y SIRVEN, Antonio Sanches de. op. cit., p. 248.
95
artigos 16 e 17, e as sociedades civis, mercantis, industriais
(anônimas e demais categorias) de outra maneira artigos 18 e 19.
179
4.5.2
Convenção Interamericana sobre conflitos de leis em
matéria de sociedades comerciais
A Convenção Interamericana sobre Conflito de Leis em Matéria
de Sociedades Comerciais entrou em vigor no âmbito internacional no
dia 14 de junho de 1980. No Brasil sua vigência data de 21 de
novembro de 1997, quando de sua publicação no Diário Oficial da
União. Atualmente são oito Estados vinculados à Convenção;
Argentina, Brasil, Guatemala, México, Paraguai, Peru, Uruguai e
Venezuela. O Uruguai e a Guatemala, apresentaram reservas, sendo
que o Uruguai se refere ao artigo 7, ressalva que a “ordem pública”, no
seu entender, é no âmbito internacional e não necessariamente quanto
à ordem pública interna de cada Estado. Já a Guatemala fez duas
reservas, uma ao artigo 4 e outra ao artigo 5.
A presente Convenção, ora em vigor no Brasil, obriga o sistema a
ela; quanto aos outros sete países, está de acordo com legislação
vigente, especificamente com o artigo 11 da Lei de Introdução ao
Código Civil Brasileiro, privilegia a teoria da constituição para
determinar a lei aplicável à pessoa jurídica. Desta feita não houve no
País qualquer impedimento legal para sua ratificação, conforme
comentário no projeto de mensagem enviado ao Presidente da
República, pelo Ministro de Estado das Relações Exteriores, ao
Congresso Nacional, João Grandino Rodas;
Nesse documento encontra-se ressaltado que: 1. a lei
reguladora da existência, de capacidade, do
funcionamento e da dissolução adotada pela
Convenção estava em harmonia com o disposto
‘explicitamente’ no artigo 11 da Lei de Introdução ao
Código Civil de 1942; 2. o problema do
reconhecimento extraterritorial da personalidade
jurídica das sociedades comerciais corresponde aos
‘princípios similares adotados em outros Tratados e
179
BUSTAMANTE y SIRVEN, Antonio Sanches de. op. cit., p. 300 e 301. Ademais, vide
artigos 32 a 34 e 247 a 252 do Código de Bustamante. Segundo o professor Jacob
Dolinger, tais regras têm caráter repetitivo e, muitas vezes, contraditórias. op. cit., p.
493, nota de rodapé 23.
96
Convenções internacionais’; e 3. a solução dada pela
Convenção à questão do funcionamento extraterritorial
da sociedade comercial, está em consonância com o
art. 301 do Código Comercial e com o artigo 11, § 1
da referida Lei de Introdução.
180
A Convenção no seu artigo 7º aborda o que se pode chamar de
Lei de Polícia,
181
quando abre a possibilidade ao Estado-Parte, deixar
de aplicar a lei aplicável pertinente, quando esse entender que é
“manifestamente contrária à sua ordem pública”. O que mostra o
necessário respeito à soberania e autonomia de cada Estado, mesmo
em momentos como o atual, ao que parece, no contexto econômico
mundial, serem esses conceitos desprezados em nome do
fortalecimento econômico dos países ditos de “primeiro mundo”, em
detrimento dos países “emergentes”.
4.5.3
Tratados de Montevidéu
O Tratado de Direito Comercial de Montevidéu, de 1889,
estabeleceu, no seu art. 4º, que o “contrato social se rege tanto em
sua forma, como quanto às relações jurídicas entre os sócios e entre a
sociedade e terceiros, pela lei do país em que ela tem seu domicílio
comercial”, somando o art. 5º que “as sociedades ou associações que
tenham caráter de pessoa jurídica serão regidas pela lei do país de
seu domicílio; serão reconhecidas de pleno direito como tais nos
Estados e consideradas habilitadas para exercer neles os direitos civis
e reivindicar seu reconhecimento perante os tribunais”.
182
O Tratado de Direito Comercial Terrestre internacional de
Montevidéu de 1940 estabelece, no seu art. 8º, que “as sociedades
mercantis serão regidas pelas leis do Estado de seu domicílio
comercial; serão reconhecidas de pleno direito nos outros Estados
180
RODAS, João Grandino. Convenção Internacional sobre Conflitos de Leis em Matéria
de Sociedades Comerciais.
181
Assim denominado por BOGGIANO, Antonio. Curso de Derecho Internacional
Privado. A obra possui tópico específico acerca do tema.
182
Interessante disposição sobre as teorias da época no tratamento da pessoa jurídica
pelo direito internacional privado é dada por FIORE, Pasquale. Derecho Internacional
Privado. Ademais, sobre as aspectos filosóficos e sociais do tratamento da pessoa
jurídica pelo direito internacional privado pode ser estudado em BATTIFOL, Henri.
Aspects Philosophiques du Droit International Privé.
97
contratantes e serão considerados habilitadas para exercer os atos de
comércio e comparecer em juízo”, somando o art. 9º que “as
sociedades ou corporações de um tipo desconhecido pelas leis de
outro Estado podem neste exercer atos de comércio, desde que se
submetam às prescrições legais”.
Jacob DOLINGER lembra que:
ambos Tratados foram ratificados pela Argentina,
Paraguai e Uruguai, recordando-se o ensinamento de
Werner Goldschmidt, que, escrevendo sobre o sistema
do DIP latino-americano, observou que a nacionalidade
e o domicílio da pessoa jurídica confundem, pois
possuem elas a nacionalidade do país em que são
domiciliadas.
183
4.5.4
Tratado de Roma de 1957
Em 1957, fora instituída a Comunidade Econômica Européia,
atual União Européia, pelo chamado Tratado de Roma, em seu art. 52.
O referido artigo estipulava que os Países-Membros da até então
Comunidade Econômica Européia extinguiriam, progressivamente, as
restrições à liberdade de estabelecimento de nacionais de um
determinado Estado-membro em outro Estado que fizesse parte da
mesma Comunidade.
Ainda, a respeito, o art. 58 ressalta que “as companhias ou firmas
constituídas de conformidade com a legislação de um Estado-membro,
e tendo sua sede estatutária, sua administração central ou seu
principal estabelecimento dentro da Comunidade, são equiparadas,
para aplicação das disposições do presente capítulo, às pessoas
físicas nacionais dos Estados-membros”.
Segundo Jacob Dolinger, essa norma “visa reconhecer a
personalidade da sociedade que tenha adquirido a nacionalidade de
um dos Estados-membros da União nos demais Estados”.
184
183
DOLINGER, Jacop. Direito Internacional Privado, p. 492.
184
DOLINGER, Jacop. op.cit., p. 494.
98
No intuito de adquirir essa nacionalidade, a pessoa jurídica de
direito privado na União Européia deverá se constituir de acordo com a
legislação de um dos Estados-membros além de ter um destes três
requisitos: sede social, administração central ou estabelecimento
principal dentro da região comunitária.
Além disso, o art. 220 do Tratado de Roma estabelece que os
Estados-membros cumpram com medidas necessárias para garantir o
reconhecimento recíproco das sociedades dentro da União Européia,
conforme art. 58, resulta assim, a Convenção sobre o Reconhecimento
Mútuo das Sociedades no Mercado Comum, de 29 de fevereiro de
1968.
4.5.5
Convenção de Bruxelas de 1958
Conforme o disposto no Tratado de Roma, os Países-membros da
até então Comunidade Econômica Européia, em 1968, elaboraram a
Convenção de Bruxelas sobre o Reconhecimento Mútuo de Sociedades
e Pessoas Jurídicas. Esse tratado estabelece no seu art. 1º o
reconhecimento das sociedades de direito civil ou comercial
constituídas de acordo com a legislação de um Estado contratante que
reconheça a elas a capacidade de serem titulares de direitos e
obrigações e que tenham sede estatutária nos territórios onde se
aplica a Convenção.
185
O art. 3º estabelece que qualquer Estado contratante pode
mencionar que não será aplicada a Convenção às sociedades ou
pessoas jurídicas que, mesmo enquadradas nos requisitos
determinados, tenham sua sede social fora dos países que
correspondem a Comunidade se não tiverem algum vínculo econômico
com esses territórios. É o chamado princípio da proximidade, cada vez
mais utilizado nos sistemas de Direito Internacional Privado.
Já o art. 4º, determina que qualquer Estado contratante pode
declarar que serão aplicadas as disposições da sua própria lei no que
185
DOLINGER, Jacop. op. cit., p. 494.
99
se considerar essencial às sociedades e às pessoas jurídicas cuja
sede se encontre no seu território, mesmo que instituídas de acordo
com a lei de outro Estado contratante.
No art. 5º da Convenção, previu-se que a sede real das pessoas
jurídicas de direito privado é o lugar onde mantém a sua administração
central.
Segundo Jacob Dolinger, “autores europeus reconhecem que o
critério adotado em suas legislações internas limita a liberdade de
estabelecimento garantida nos artigos 52 e 58 do Tratado de Roma,
pois referido critério não admite o reconhecimento de companhias
organizadas sob a lei de um Estado membro”.
186
4.5.6
Convenção da Haia de 1956
A Convenção de Haia
187
que trata sobre o Reconhecimento de
Personalidade Jurídica das Sociedades, Associações e Fundações
Estrangeiras de 1956, tem disposição pertinente ao tema no seu art.
1º.
Esse artigo dispõe que a personalidade jurídica adquirida por
uma sociedade, uma associação ou uma fundação, em razão de uma
lei do Estado contratante, será reconhecida nos outros Estados
contratantes, incluindo as formalidades de registro e/ou de publicidade
atendidas no qual se encontre a sede social.
Diante disto, aos Estados contratantes ficou possibilitada a
prerrogativa de não reconhecer a personalidade de uma entidade
coletiva formada segundo o art. 1º, caso esse Estado leve em
consideração a sede real e essa se encontre no seu território ou no
186
DOLINGER, Jacob. op. cit., p. 495. O mesmo autor exemplifica com o caso Daily
Mail, no qual a Corte de Justiça da Comunidade Européia em 1988 decidiu que os
Países-membros possuem o direito de pleitear que uma companhia nacional tenha sua
principal administração em seu território, e que uma companhia que foi incorporada em
um País-membro não tem o direito de transferir a sua administração central a outro
Estado-membro e continuar o seu status de companhia nacional do país em que foi
incorporado.
187
Sobre as Convenções de Haia, consultar ARAÚJO, Nádia de. Direito internacional
privado: teoria e prática brasileira, p. 49-53.
100
território de outro Estado, que também leva em consideração a sede
real.
No caso, a sede real é o lugar onde está situada a administração
central segundo a Convenção de Haia de 1956.
4.5.7
Convenção de Estrasburgo de 1966
Essa Convenção fora implementada no Conselho da Europa,
visando reconhecer a existência das pessoas jurídicas de direito
privado constituídas no território de uma das partes contratantes de
acordo com sua legislação e que tenham sua sede estatutária sobre
seu território.
As Convenções européias caracterizam, portanto, a nacionalidade
de uma sociedade pelo critério do local de sua constituição composto
com a sede estatutária ou com a sede real.
188
4.5.8
Convenções das Conferências Especializadas
Interamericanas sobre Direito Internacional Privado
(CIDIPs)
Em 1979 e em 1984, surgiram duas Convenções elaboradas em
sede da Organização dos Estados Americanos (OEA) nas 2ª e 3ª
Conferências Especializadas Interamericanas sobre Direito
Internacional Privado em Montevidéu e em La Paz, respectivamente.
189
Em 1979, foi aprovada a Convenção sobre Conflito de Leis
Relativas a Companhias Comerciais
190
e, em 1984, a Convenção sobre
188
DOLINGER, Jacob. op. cit., p. 496.
189
Sobre as CIDIPs, consultar ARAÚJO, Nádia de. op. cit., p. 66-78.
190
Essa Convenção fora ratificada pelos seguintes Estados: Argentina, Brasil, México,
Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. No Brasil, foi promulgada pelo Decreto nº 2400,
de 24/11/1997.
101
Personalidade e Capacidade das Pessoas Jurídicas no Direito
Internacional Privado.
191
As duas Convenções escolheram o critério da incorporação, sem
outras exigências ou restrições.
O art. 2º da Convenção de 1979 estabelece que “a existência,
capacidade, atividade, operação e dissolução das companhias
comerciais será regida pela lei do lugar de sua constituição”,
detalhando, na alínea 2ª, que a lei do lugar da constituição significa “a
lei do Estado onde se cumprem os requisitos de forma e de fundo
necessários para a criação de tais sociedades”.
O art. 3º da mesma Convenção dispõe que as companhias
regularmente constituídas em determinado Estado serão reconhecidas
em outro Estado.
Além da constituição, não foi condicionado a qualquer outro
requisito como aconteceu no direito convencional europeu, o quel
estabelece, o art. 5º, que as companhias que tiverem sido constituídas
em um país e que pretendam estabelecer “a sede efetiva de sua
administração central” em outro Estado, poderão ter de cumprir os
requisitos estabelecidos nas leis de outro Estado.
Além dos requisitos para o reconhecimento da pessoa jurídica, os
países também exigem condições adicionais de funcionamento dentro
do seu território.
A Convenção Interamericana de 1984 apresenta as mesmas
disposições, apenas ampliando a regra do art. 2º que dispõe que “a
existência, a capacidade para ser titular de direitos e obrigações, o
funcionamento, a dissolução e a fusão das pessoas jurídicas de
caráter privado serão regidos pela lei do lugar de sua constituição”.
191
A Convenção sobre personalidade e capacidade das pessoas jurídicas no direito
internacional privado foi ratificada pelo Brasil, Guatemala, México e Nicarágua. No
Brasil, foi promulgada pelo Decreto nº 2.427, de 17/12/1997.
102
4.5.9
Convenção do Banco Mundial
O Banco Mundial (ou Banco Interamericano para Reconstrução e
Desenvolvimento) possui, em Washington, um Centro Internacional
para Solução de Controvérsias Relativas a Investimentos entre
Estados e Nacionais de outros Estados.
192
Nesse caso, nacionais de outros Estados compreendem tanto as
pessoas físicas quanto as pessoas jurídicas nacionais de um outro
Estado que tenha assinado a Convenção. Naturalmente, do ponto de
vista material, o desentendimento deve versar sobre investimentos
com um outro Estado signatário da mesma Convenção.
A Convenção estabelece que, ao acontecer uma divergência
entre um Estado e uma pessoa jurídica de nacionalidade estabelecida
nesse mesmo Estado, mas com controle administrativo implementado
por estrangeiros, pode-se chamar a aplicação da Convenção. Em
outras palavras, nessa hipótese, as partes podem considerar a pessoa
jurídica como nacional de outro Estado com a finalidade de submeter a
controvérsia ao Centro de Solução do Banco Mundial.
193
4.5.10
Tratado de Direito Comercial Internacional, 1889
A Convenção fora assinada na cidade de Montevidéu, foi
ratificada por Argentina, Paraguai e Uruguai. Apresenta uso misto de
critério para determinação de lei aplicável, pois conforme segue,
emprega o da incorporação e sede de negócios.
Art. 4º El contrato social se rige tanto em su forma,
como respecto a las relaciones jurídicas entre los
socios y entre entre la sociedad y los terceros, por la
ley del país en que ésta tiene su domicilio comercial.
192
Esse Centro de Solução de Controvérsias é conhecida como ICSID, sendo regido
pela Convenção assinada em Washington em 18 de março de 1965, em vigor a partir de
14 de outubro de 1966. O Brasil ainda não é parte nessa Convenção.
193
Art. 25, alínea 2, letra b da Convenção.
103
Art. 5º Las sociedades o asociaciones que tengan
caráter de persona jurídica se regirán por las leyes del
país de su domicilio; serám reconocidas de pleno
derecho como tales en los Estados, y hábiles para
ejercitar en ellos derechos civiles y gestionar su
reconocimiento ante los tribunales. Mas, para el
ejercicio de actos comprendidos en el objecto de su
institución se sujetarán a las prescriciones
estabelecidas en el Estado en cual intenten realizarlos.
4.5.11
Tratado de Direito Comercial Terrestre Internacional, 1940
Da mesma forma que a Convenção anterior, essa seguiu o
mesmo procedimento, sendo vigente entre os países supra
mencionados. Nesse caso, as previsões legais da Convenção são as
mesmas, ou seja, emprego do critério da incorporação para determinar
a lei aplicável em caso de conflito atinente ao estatuto pessoal da
sociedade comercial e, nos demais casos a lei do centro de negócios.
Art. 8º Las sociedades mercantiles se regirán por las
leyes del Estado de su domicilio comercial; serán
reconocidas de pleno derecho en los otros Estados
contratantes y se reputarán hábiles para ejercer actos
de comércio y comparecer en juicio. Más, para el
ejercicio habitual de los actos comprendidos en el
objeto de su institución se sujetarán a las
prescripciones estabelecidas por la leyes del Estado
en el cual intentam realizarlos. Los representantes de
dichas sociedades contraen para con terceros, las
mismas responsabilidades que los administradores de
las sociedades locales.
Art. 9º Las sociedades o corporaciones constituidas en
un Estado, bajo una especie desconocida por las leyes
de otro, pueden ejercer, en este último, actos de
comercio sujetándose a las prescripciones locales.
4.6
Os limites da aplicação da lei estrangeira nas questões
concernentes às pessoas jurídicas
Desconhece-se sistema jurídico hodierno, cuja previsão legal
para o conflito de leis não seja abarcado; desta feita, cabe ao
104
aplicador do Direito a escolha, frente a normas de Direito Internacional
Privado, da lei aplicável ao litígio instaurado.
194
Identificada a lei que regerá o conflito, poderá ser ela afastada
por exceção de ordem pública, caso aquela confronte ou fira a ordem
pública da lex fori, a causar um efeito negativo. A este, ensina Nádia
de Araújo, “sucede, como conseqüência, um efeito positivo: a
utilização da regra adequada à situação.
195
Além da exceção à ordem pública do foro, pode ocorrer a
necessidade de aplicação imediata de uma norma interna;
diferentemente da exceção à ordem pública, aplicada após a
identificada à lei aplicável, afastando esta por intermédio da exceção,
não corresponde ao mesmo procedimento quando da incidência da
norma imperativa, pois esta será aplicada de imediato.
196
Não obstante, nossa Lei de Introdução menciona apenas a ordem
pública, art. 17, sem qualquer ocorrência a normas de aplicação
imediata.
4.6.1
Limite jurídico da ordem pública e das normas imperativas
Na aplicação do método conflitual do direito internacional privado,
vale dizer, no caso, da determinação da lei aplicável às pessoas
jurídicas, pois o juiz aplica as normas de direito internacional privado
da lei do foro (ou a lex fori).
197
Essas normas, solucionam, apenas parcialmente, os conflitos de
leis no espaço (entre os sistemas jurídicos),
198
isto é, determinam qual
o direito aplicável a uma relação jurídica de direito privado com
conexão internacional.
194
ARAÚJO, Nádia de. op. cit., p. 95.
195
ARAÚJO, Nádia de. op. cit., p. 97.
196
ARAÚJO, Nádia de. op. cit., p. 97-98.
197
PALLIERI, Giorgio Balladore. Diritto Internazionale Privato, p. 56 e ss. MACHADO,
João Baptista. Lições de direito internacional privado, p. 57 e ss.
198
Uma visão comparativa entre os sistemas jurídicos pode ser tida na clássica obra de
DAVID, René. Les Grands Systèmes de Droit Contemporains.
105
Caso seja aplicável o direito estrangeiro, o direito internacional
privado da lex fori, a princípio, não considera o conteúdo material
desse direito.
Se esse direito estrangeiro violar a ordem pública do foro, os
juízes deixam de aplicá-lo no caso concreto.
199
É o que também acontece na situação do estatuto pessoal das
pessoas jurídicas.
No direito internacional privado brasileiro, a reserva de ordem
pública é considerada e estabelecida no art. 17 da Lei de Introdução
ao Código Civil de 1942, que dispõe: “As leis, atos e sentenças de
outro país, bem como quaisquer declarações de vontade, não terão
eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a ordem
pública e os bons costumes”.
A chamada reserva de ordem pública consiste em uma cláusula
de exceção que tem como finalidade a correção da aplicação do direito
estrangeiro, quando esse leva, no caso concreto, a um resultado
incompatível com os princípios fundamentais da ordem jurídica
nacional.
200
Esse entendimento da ordem pública é considerado também no
direito brasileiro. Haroldo Valladão ensina que “denega-se, no Brasil,
efeito ao direito estrangeiro que choca concepções básicas do foro,
que estabelece normas absolutamente incompatíveis com os princípios
essenciais da ordem pública do foro, fundados nos conceitos de
justiça, de moral, de religião, de economia e mesmo de política, que ali
orientam a respectiva legislação. É uma noção fluida, relativíssima,
que se molda a cada sistema jurídico, em cada época, e fica entregue
à jurisprudência em cada caso”.
201
No Brasil, a legislação se refere, categoricamente, à soberania
nacional e aos bons costumes para caracterizar a ordem pública (art.
199
ARAÚJO, Nádia de. op. cit., p. 95 e ss. Consultar: NIBOYET, Jean-Pierre. Princípios
de Derecho Internacional Privado, p. 380 e ss.
200
MAJOROS, Ferenc. Le Droit International Privé, p. 74 e ss.
201
VALLADÃO, Haroldo. Direito internacional privado, p. 496.
106
17 LICC/42; além do art. 216 do Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal).
Esse entendimento, entretanto, já abrange os casos de violação
da soberania nacional e dos bons costumes pela aplicação do direito
estrangeiro no Brasil.
Diz Beat Walter Rechsteiner que
a ordem pública é um conceito relativo com variações
no tempo e no espaço. É também um conceito aberto
que, necessariamente, precisa ser concretizado pelo
juiz, quando este julga uma causa de direito privado
com conexão internacional, à qual é aplicável o direito
estrangeiro, conforme as normas do direito
internacional privado da lex fori”. Quanto mais próxima
e intimamente vinculada à lex fori estiver uma relação
jurídica, embora aplicável o direito estrangeiro no caso
concreto, tanto mais o juiz leva em consideração a
compatibilidade desse direito com a ordem pública. A
conexão mais próxima ou distante da relação jurídica
concreta com a lex fori, que influi na aplicação da
reserva da ordem pública pelo juiz, é denominada,
pela doutrina alemã, Binnenbeziehung.
202
Caso o direito estrangeiro não seja o direito aplicável na relação
jurídica concreta, por violar a ordem pública, a regra é que o juiz
aplique a lex fori.
203
A doutrina jurídica vem distinguindo as reservas gerais das
reservas especiais de ordem pública.
As primeiras intervêm sempre que é aplicável o direito
estrangeiro a uma relação jurídica de caráter privado com conexão
internacional. É o caso do art. 17 da Lei de Introdução ao Código Civil,
de 1942.
Quando a reserva se refere a algum tema especial, fala-se em
reserva especial de ordem pública. É o caso do art. 7º, §6 da mesma
Lei; apenas como exemplo, pois não se aplica à matéria e questão.
Ademais, existe uma diferenciação doutrinária de reserva de
ordem pública negativa e de ordem positiva.
202
RECHSTEINER, Beat Walter. Direito internacional privado: teoria e prática, p. 156.
203
DOLINGER, Jacob. Direito internacional privado, p. 344-345.
107
A primeira consiste na aplicação do direito estrangeiro, aplicável
conforme as normas do direito internacional privado da lex fori, quando
os seus pressupostos estão cumpridos no caso concreto.
A ordem pública positiva refere-se às leis de aplicação imediata,
ou lois de police, na doutrina francesa.
Cada nação considera, no seu ordenamento jurídico, normas de
direito público que reivindicam a sua aplicação imediata, por força de
seu conteúdo imperativo e cogente, independentemente do direito
aplicável a uma relação jurídica de direito privado com operação
internacional.
204
Na doutrina de direito internacional, são essas normas especiais
as quais chamamos de leis de aplicação imediata.
205
Quando uma norma de aplicação imediata intervém, portanto, em
uma relação jurídica de direito privado com conexão internacional, não
é necessário verificar o conteúdo do direito estrangeiro e verificar, em
seguida, para saber se ele viola a ordem pública. As normas da lex fori
são aplicáveis de imediato em função de seu caráter imperativo e
cogente.
Os Tratados internacionais, geralmente, prevêem controles da lei
aplicável a uma relação jurídica internacional com disposições de
reserva à ordem pública nos seus textos.
Beat Walter RECHSTEINER distingue que
as Convenções elaboradas pela Conferência de Haia
utilizam a fórmula ‘manifestamente incompatível’
(manifestment incompatible, manifestly incompatible,
offensichtlich unvereinbar), enquanto aquelas das
Conferências Interamericanas Especializadas
costumam utilizar a expressão ‘manifestamente
contrária’, delimitando o seu campo de aplicação
referente à cláusula de ordem pública. A Convenção
Interamericana sobre Normas Gerais de Direito
Internacional Privado de 8 de maio de 1979, celebrada
204
Análise profunda sobre as normas de aplicação imediata foi feita por SANTOS,
Antonio Marques dos. As Normas de Aplicação Imediata no Direito Internacional
Privado. LOUSSOUARN, Yvon; BOUREL, Pierre. Droit International Privé, p. 114 e ss.
205
Lois d’application immédiate, lois de police, dipositions impératives, norme
impérative, norme di applicazione necessaria, mandatoru rules, Gezetze von streng
Sachnormen.
108
em Montevidéu, estabelece o seu art. 5º, em termos
gerais, que ‘a lei declarada aplicável por uma
convenção de direito internacional privado pode ser
recusada no território de um Estado signatário que a
considere manifestamente contrária aos princípios de
sua ordem pública’. As Convenções pretendem
salientar, com as fórmulas citadas, que a reserva de
ordem pública é uma cláusula de exceção, aplicada,
tão-somente, em casos de extrema desarmonia com os
princípios básicos da ordem pública jurídica interna.
206
Vale dizer que a reserva de ordem pública intervém na aplicação
do direito material estrangeiro, no reconhecimento e na execução de
decisões judiciais estrangeiras, denomina-se, nos últimos casos,
ordem pública processual.
207
4.6.2
As normas imperativas ou leis de polícia
Pode ocorrer que a lei alienígena não possa ser aplicada, mesmo
que ela seja a indicada por força de lei, como no caso do art. 11, da
Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro. Isto acontece quando ao
caso concreto incide uma norma de polícia,
208
são as leis que
sobrepujam a outras de mesmo nível hierárquico, que visam, por sua
vez, proteger a ordem econômico-social de um determinado Estado.
Segundo o autor latino Antonio Boggiano, “se han propuesto
diversas terminologías para denominar a una categoría de normas que,
inspiradas en rigurosas consideraciones de orden público, excluyen el
funcionamiento de las normas de conflicto y de toda otra norma”.
209
Quando se refere ao legislador que elabora a norma de polícia,
Antonio Boggiano, diz que estas normas devem ser indeterminadas,
cabe assim ao juiz que aplicar a lei exercer com eqüidade sua
jurisdição, sempre de forma a adequar a norma de polícia ao caso
206
RECHSTEINER, Beat Walter. Direito internacional privado: teoria e prática, p. 157.
Para o conteúdo das Convenções, vide DOLINGER, Jacob; TIBÚRCIO, Carmen. Direito
internacional privado: vade-mécum.
207
Vide art. 216 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.
208
Assim denominada por Antonio Boggiano. op. cit., p. 245. O autor ainda nos traz
denominações encontradas em outras culturas jurídicas: “lois d´application immediate”,
“norme com apposita delimitazione della sfera di efficacia”, spacially conditioned rules”,
“peremptory norms”, “normas rigidas”, “exclusivsätze”, “lois de police”.
209
BOGGIANO, Antonio. op. cit., p. 245.
109
concreto. Lembra o autor, “las normas de policía autolimita el ámbito
de aplicación del derecho material del juez (lex fori). Esta
autolimitación se consigue técnicamente mediante la indicación de
conexiones del caso multinacional com el territorio nacional”.
210
As normas de polícia podem incidir em várias formas de relação
jurídica, ou sobre os mais variados litígios, mas quase sempre teremos
um conflito legal de normas ditas de ordem pública, e de ordem
privada. Como exemplo, o contrato para fornecer um determinado
produto ao mercado consumidor, não pode a empresa fornecedora
recorrer a um contrato elaborado ou até mesmo negociado com o
consumidor cujas cláusulas contratuais, direta ou indiretamente,
determinem condições contrárias ou inferiores às já previstas no
Código de Defesa do Consumidor.
211
Esta claro que essa norma de polícia não será sequer aventada,
pois, como já se viu empresas estrangeiras que aqui queiram se
estabelecer devem, para não fraudar a lei, receber autorização do
governo brasileiro e se sujeitar às leis de nosso País.
4.7
Julgados internacionais concernentes à matéria
4.7.1
Caso Barcelona Traction, Light and Power Company
Limited
É famoso o caso da Barcelona Traction, Ligh and Power
Company, Limited,
212
que se trata de uma empresa constituída em
1911, sob égide da legislação do Canadá, e sede em Toronto, capital
210
BOGGIANO, Antonio. op. cit., p. 252.
211
Lei n.º 8078/90. Reza o caput do Art. 12. “O fabricante, o produtor, o construtor,
nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência
de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação,
apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações
insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.” É uma norma de polícia,
que não pode ser aviltada, por uma cláusula contratual firmada entre fornecedor e
consumidor.
212
Caso na íntegra: “Barcelona Traction, Light and Power Company, Limited,
Judgement”, in ICJ Reports, 1970.
110
canadense. Era uma sociedade por ações que possuía diversas
empresas sob sua responsabilidade, algumas das quais incorporadas
no Canadá e outras com registro na Espanha. As ações da Barcelona
Traction, estavam, na sua maioria, em mãos de investidores belgas, na
data de 12 de fevereiro de 1948, quando essa teve sua falência
decretada pelo Tribunal de Réus, da província de Tarragona na
Espanha.
Com a liquidação, os bens da Barcelona Traction, na Espanha,
foram adquiridos pela FECSA-Fuerzas Elétricas de Cataluña, S.A., da
Espanha. Fato: a falência foi motivada, segundo reclamações dos
governos da Bélgica, Canadá, Inglaterra e Estados Unidos da América,
por atos e omissões do governo espanhol.
Uma série de ações e procedimentos judiciais se iniciaram, por
intermédio de algumas filiais da Barcelona Traction, já que esta não
recorreu da sentença declaratória de falência. O caso se arrastou por
vários anos,
213
foi inclusive formada uma comissão
214
para estudar o
caso, cujo Governo belga não teve autorizada sua participação, porque
desejava submeter a questão a arbitragem.
Desta feita, o Governo belga, com o firme propósito de oferecer
proteção diplomática aos acionistas de sua nacionalidade, inicia,
unilateralmente, em 15 de setembro de 1958, procedimento na Corte
Internacional de Justiça. A petição do Governo belga foi assim
sumariada por João Grandino Rodas
215
:
I. O governo espanhol era responsável pelos prejuízos
que seus órgãos causaram à Barcelona Traction, por
ter sido a ação dos mesmos contrária ao direito
internacional.
II. O Estado espanhol devia restabelecer a Barcelona
Traction em seus bens, direitos e interesses, tais como
na data de 12 de fevereiro de 1948, além de indenizar
por demais prejuízos, consoante determinasse a
perícia.
213
Em 1952, os bens da Barcelona Traction, já haviam sido incorporados a FECSA e em
1958 ainda haviam ações judiciais pendentes no caso.
214
Formada por especialistas: um britânico, um canadense e dois espanhóis.
215
RODAS, João Grandino. Sociedade Comercial e Estado, p. 361.
111
III. Na medida em que a restituição acima fosse
impossibilitada em virtude de obstáculos
constitucionais, o Estado espanhol deveria pagar o
equivalente de bens, direitos e interesses, sob a forma
de indenização, além do ressarcimento por outros
prejuízos.
IV. Caso o Tribunal considerasse que o Governo belga,
inobstante o domínio de seus nacionais na sociedade,
não podia buscar o prejuízo sofrido pela própria
companhia, as indenizações referidas na alínea III
deveriam ser pagas na proporção do capital possuído
por seus nacionais em 12 de fevereiro de 1948.
O Governo espanhol apresentou sua defesa, em 21 de maio de
1960, cujas alegações foram exceções preliminares, entre elas a de
que o Governo belga não era parte ativa legítima para peticionar, lhe
faltava o jus standi,
216
a fim de ver seus nacionais ressarcidos nos
danos sofridos por uma sociedade canadense. Com a finalidade de
permitir acordos por parte de grupos privados, o Governo belga
desiste da ação, em 23 de março de 1961, sendo que o pedido foi
homologado em 10 de abril de 1961. Frustrada a possibilidade de
acordo, em 18 de junho de 1962, o Governo belga, protocola nova
ação na Corte Internacional de Justiça. O Governo espanhol volta a se
defender por meio de exceções preliminares, as mesmas que tinha
apresentado na primeira contestação.
Dos fatos que se sucederam no processo, o que apresenta
particular interesse, é a posição dos governos belga e espanhol, no
tocante à legitimidade ativa do Governo belga. A Espanha defende que
o Governo belga, que pretende proteger seus nacionais, na verdade
tenta proteger diplomaticamente uma sociedade canadense; esta pór
sua vez possuía, inclusive, bom relacionamento com o Governo
canadense. Por sinal este, nos últimos 50 anos, havia defendido a
sociedade em questão.
Já a Bélgica, alega que seus nacionais possuíam mais de 88%
das ações da sociedade, tanto na época da falência, como na data do
protocolo da ação. Defendia ainda que cada Estado tinha o direito
discricionário de defender ou negar defesa diplomática; alegava a falta
216
Direito de comparecer em juízo para peticionar.
112
de norma de direito internacional que proibisse a defesa de acionistas
da sociedade, cuja nacionalidade é diversa das partes, e apresentava
ainda decisões arbitrais que acolheram a proteção à acionistas.
A Bélgica teve seu pedido negado, em 5 de fevereiro de 1970,
pela Corte Internacional de Justiça, por quinze votos a um, sendo que
o único voto favorável à Bélgica foi o do juiz ad hoc Riphagen, que
fora indicado pelo Governo Belga. As outras exceções viram-se
prejudicadas, uma vez que a Corte Internacional de Justiça concluiu
pela falta de legitimidade ativa da Bélgica. Segundo esta decisão,
quem teria a legitimidade ativa para proteger diplomaticamente a
sociedade seria o Estado de sua nacionalidade. Logo, caberia ao
Canadá este direito.
A nacionalidade canadense da sociedade fora reconhecida pela
Bélgica e Espanha no decorrer do processo. A Bélgica baseou seu
pedido no reconhecimento de proteção diplomática a acionistas, com
base na nacionalidade destes, independentemente da nacionalidade
daquela pela Corte Internacional de Justiça. Em momento algum, a
nacionalidade da Barcelona Traction foi objeto de discussão.
A decisão da Corte Internacional de Justiça, demonstra com
clareza o conceito predominante quanto aos critérios para
reconhecimento de nacionalidade de pessoas jurídicas. Primou esta
por aplicar cumulativamente o critério da incorporação e da sede
efetiva.
Observa-se que o legislador brasileiro, segue as tendências
mundiais do direito quando se vale de princípios semelhantes, como
por exemplo: nossa Constituição Federal prescreve o uso cumulativo
de dois critérios, da incorporação e da sede efetiva. A Lei de
Introdução ao Código Civil Brasileiro, muito anterior ao caso citado,
usa o critério da incorporação, para eleger a lei que será aplicada às
pessoas jurídicas de nacionalidade diversa da brasileira,
evidentemente apenas nas situações que ela não se sujeite, por
determinação legal, à lei brasileira. A Lei das Sociedades Anônimas,
quando mantém as disposições do Decreto-lei n.º 2.627/40, expresso
113
no artigo 300, da Lei n.º 6404/76, privilegia os mesmos critérios
adotados pelo constituinte.
Fator de vital importância é determinar o âmbito de aplicação da
lei pessoal da pessoa jurídica (lex societatis). Já se viu que no Brasil
uma empresa alienígena pode se instalar e funcionar, desde que
obtenha autorização do governo brasileiro.
217
Neste caso ela deverá se
submeter à legislação brasileira, mas seu estatuto social obedece à lei
do Estado de sua constituição, conforme previsão do artigo 11, da Lei
de Introdução ao Código Brasileiro.
4.7.2
Caso Champion Trading Company
O caso em questão envolveu uma disputa entre a Champion
Trading Company, Ameritrade International, Inc., e as pessoas
naturais, James T. Wahba, John B. Wahba e Timothy T. Wahba, na
condição de reclamantes, versus, a República Arábica do Egito
218
,
reclamada; foi submetido à solução de controvérsia, por intermédio de
arbitragem, sob a égide da Convenção do Banco Mundial, mais
especificamente ao Centro Internacional para Solução de
Controvérsias Relativas a Investimentos entre Estados e Nacionais de
outros Estados (ICSID).
O litígio envolve a National Cotton Company, empresa criada e
incorporada no Egito, sob a égide da lei egípcia, em 1994; as ações
dessa empresa estavam divididas entre a família Wahba, o fundo de
pensão do empregados, 5% das cotas e o Banco Nacional do Egito
que detinha 20% do total das ações.
No ano de 1997 o Banco Nacional do Egito transfere suas ações
para a Champion Trading Company. A nova acionista é uma empresa
constituída sob as leis do Estado de Delaware nos Estados Unidos. As
217
Hee Moon Jo; “ uma pessoa jurídica estrangeira deve ser efetivamente reconhecida
para que possa exercer a sua atividade e estabelecer-se fisicamente no país em
questão. O reconhecimento não é um ato constitutivo da sua nova personalidade
jurídica, mas sim um ato declaratório, pelo qual ela passa a ter validade no seu
território.” Moderno Direito Internacional Privado, p. 432.
218
Caso n.º Arb/02/9 disponível no sítio eletrônico do Banco Mundial:
<www.worldbank.org/icsid/cases/champion-decision.pdf> Acesso em: 11de jul. 2005.
114
ações do fundo de pensão são transferidas para a Ameritrade
International, Inc., como no caso da empresa anterior, também
constituída no Estado de Delaware.
A controvérsia de interesse reside no conflito jurisdicional
avocado no Tribunal Arbitral pela República Arábica do Egito; os
reclamantes, pessoas naturais, os Wahba’s, segundo o reclamado,
seriam cidadãos egípcios, filhos de pai egípcio e mãe americana,
nascidos nos Estados Unidos da América. O Egito, no exercício de sua
soberania, adota o jus sanguinis para determinar a nacionalidade de
seus cidadãos, ou seja, mesmo que os filhos do Sr. Mahmoud Ahmed
Mohamed Wahba, nunca tivessem exercido a cidadania egípcia,
seriam detentores de dupla nacionalidade, americana jus solis e
egípcia jus sanguinis. A alegação do Estado egípcio foi acatada e
confirmada pelo Tribunal Arbitral.
O objetivo era afastar a jurisdição do Centro Internacional para
Solução de Controvérsias Relativas a Investimentos entre Estados e
Nacionais de outros Estados, pois segundo a Convenção do Banco
Mundial, artigo 25 (2) (a), nacionais não podem submeter-se à
jurisdição contra o Estado que lhes outorgou a nacionalidade. Com
base neste dispositivo os Wahba’s foram afastados da lide pelo
Tribunal.
Com a mesma argumentação, o Egito tenta afastar da lide as
empresas, cujas ações, pertencem aos Wahba’s. Pretende a confusão
das personalidades jurídicas, de pessoas físicas, detentoras das cotas
dos entes coletivos, com a das empresas reclamantes, envolvidos na
disputa. Evidente alusão à teoria do controle acionário, para
determinar a nacionalidade da pessoa jurídica.
O Tribunal Arbitral se posiciona quanto a validade de sua
jurisdição frente a lide, considera a Champion Trading Company e a
Ameritrade International, Inc. partes legítimas, fundado no artigo 25 (2)
(b) da Convenção do Banco Mundial, que trata da nacionalidade das
pessoas jurídicas, adota assim o critério da incorporação como
elemento determinante de nacionalidade dos entes coletivos.
115
A considerar a contemporaneidade da decisão, evidencia-se o
reconhecimento da nacionalidade da pessoa jurídica, distinta de seus
acionistas, bem como a importância da determinação da
nacionalidade; não só para proteção diplomática, como defendida por
alguns, mas para determinar-se a lei aplicável nos litígios que
envolvam os entes coletivos, cada vez mais sujeitos as diversas
jurisdições, dada a interação da economia mundial.
4.7.3
Caso Autopista Concesionada de Venezuela, C.A.
Esta disputa foi integrada pela Autopista Concesionada de
Venezuela, C.A. (Aucoven), demandante, versus, a República
Bolivariana da Venezuela
219
, demandada. O interesse neste litígio
reside na questão de competência do Tribunal Arbitral do Centro
Internacional para Solução de Controvérsias Relativas a Investimentos
entre Estados e Nacionais de outros Estados (ICSID).
Autopista Concesionada de Venezuela, C.A. é uma empresa
constituída segundo as leis venezuelanas, onde mantém sua sede
social.
No primeiro momento parece óbvia a argüição de incompetência
jurisdicional do Tribunal Arbitral; com base no caso anteriormente
analisado, não é possível a nacionais representar contra o Estado que
lhe outorgou a nacionalidade. Pelo critério da incorporação, a
demandante é nacional da Venezuela, raciocínio reforçado pelo seu
domicílio social, teoria da sede social.
A Convenção do Banco Mundial no artigo 25 (2) (b), in fine,
permite que pessoas jurídicas demandem contra o Estado de sua
nacionalidade, se ambos, ente coletivo e Estado, assim acordarem e,
cumulativamente o controle da pessoa jurídica seja estrangeiro.
Observa-se a alusão à teoria do controle, por via da exceção
voluntária das partes.
219
Caso n.º Arb/00/5 disponível no sítio eletrônico do Banco Mundial:
<www.worldbank.org/icsid/cases/aucov-s.pdf> Acesso em: 11de jul. 2005.
116
A Aucoven foi constituída no ano de 1996, com total de 99% de
suas cotas pertencentes à ICA, empresa mexicana de engenharia, que
por sua vez era subsidiária da ICA Sociedad Controladora, S.A. (ICA
Holding), um conglomerado mexicano de mais de 140 empresas; 1%
restante pertencia a Baninsa, banco de investimentos venezuelano.
No ano de 1998 a Icatech Corporation empresa constituída no
Estado da Flórida, Estados Unidos da América, logo de nacionalidade
americana, controlada pela ICA Holding, adquire 75% das ações da
Aucoven; a transferência das ações foi autorizada pelo governo
venezuelano.
A Aucoven e o governo venezuelano firmaram um contrato, sua
cláusula de n.º 63 previa que eventuais disputas seriam submetidas à
arbitragem ad hoc sob a égide do Código de Processo Civil
venezuelano e da Lei Modelo da UNCITRAL. A cláusula seguinte
previa que as partes se submeteriam à arbitragem do Centro
Internacional para Solução de Controvérsias Relativas a Investimentos
entre Estados e Nacionais de outros Estados. Destarte, é afastada a
arbitragem ad hoc.
A cláusula n.º 64 condicionava sua aplicabilidade à transferência
de controle da Aucoven a estrangeiros. O fato se deu com a
transferência de 75% das ações para a Icatech Corporation, de
nacionalidade americana.
O Tribunal Arbitral em sua decisão acerca da argüição de
incompetência apresentada pela Venezuela, entende que houve
efetivamente a transferência, que as condições de aplicabilidade da
cláusula foram observados, bem como, a conformidade com o artigo 25
(2) (b) da Convenção do Banco Mundial. Declara-se assim competente
para apreciar a demanda.
Na decisão o Tribunal Arbitral ratifica o emprego do critério da
incorporação para determinar a nacionalidade da Icatech Corporation,
quando dita, no § 134 da decisão sobre competência: de acuerdo con
el criterio relativo a la constitución que se utiliza comúnmente para
determinar la nacionalidad de una sociedad”. Afirmação que é
reiteradamente empregada no dispositivo da decisão.
5
Considerações finais
A pessoa jurídica de direito privado
220
é criada pelo direito, da
mesma forma que a pessoa natural o é; adquire sua personalidade no
ato de seu registro, deriva de uma vontade anterior de pessoas
naturais, associadas com fins de explorar atividade comercial ou
prestar serviços à comunidade, sem o fim de obter lucros e
recepcionada pelo ordenamento jurídico. Fica assim subordinada
diplomaticamente a este. Sua personalidade não se confunde com as
de seus sócios. A pessoa jurídica, artificial por excelência, é
independente, com direitos e deveres, regidos pela lei nacional que a
incorporou ou autorizou seu funcionamento
221
.
A legislação brasileira reconhece a personalidade jurídica da
pessoa jurídica, seja ela nacional, caso esta possua seus estatutos
registrados em conformidade com as leis brasileiras e mantenha sua
sede efetiva no território nacional, ou estrangeira, sendo que esta
necessita da autorização para funcionar no país. Para obter tal
autorização, terá que submeter seus estatutos à análise do governo
brasileiro, que possui o poder discricionário para autorizar ou não a
empresa estrangeira que pretenda aqui se estabelecer.
A Constituição Federal não aborda mais, de forma direta, a
questão de empresa nacional, mas se pode afirmar que esta continua
a fazer a distinção quando estabelece privilégios a empresas de
pequeno porte, bem como critérios, cujo objeto seja a nacionalidade,
para exploração de atividade econômica considerada estratégica. Ela
220
As de Direito Público, são representadas no Brasil, pela União, Estados e
Municípios, bem como nações alienígenas e organizações internacionais, por exemplo,
ONU - Organização das Nações Unidas.
221
Entende-se como o registro válido de empresa sob égide da legislação, como
autorização tácita para exercício de suas funções estatutárias.
118
se vale de critérios para determinar a nacionalidade de empresas no
Brasil: o da incorporação cumulado com o da sede efetiva. Para
atividades de exploração estratégica emprega o critério do controle da
sociedade, sem prejuízo dos demais. No Brasil é empresa nacional
aquela que foi organizada conforme a lei nacional e possuir sede
efetiva no Brasil.
O Direito não pode se basear em pré-posições, ou ficar
totalmente à mercê de pessoas naturais, estejam elas de boa-fé ou
-fé. O Direito necessita de um critério que seja válido em todas as
situações e por todo o exposto, acerca da pessoa jurídica, teorias,
reconhecimento, personalidade jurídica, não comunicabilidade das
personalidades singulares e coletivas, fatores que influenciam as
relações sociais que devem ser regulamentadas pelo Direito. Não cabe
outro julgamento senão o da aplicação do critério da incorporação.
A única forma de determinar essa nacionalidade com precisão e
de forma inequívoca se dá por meio desse critério, pois, este age com
o mesmo princípio que se determina a personalidade de uma pessoa
natural com o nascimento, que é abrigado pelo Direito, quando do
registro, e assim conferindo-lhe a personalidade e a nacionalidade.
A nacionalidade da pessoa jurídica depende tão somente da lei
que formaliza o ato de sua constituição, que recepciona a vontade de
pessoas naturais, que podem ser de diversas nacionalidades,
formarem uma entidade privada, com intuito de auferir lucros ou não, e
que o reconhecimento de sua nacionalidade não implica,
necessariamente, em aplicar sua lei nacional para o seu
funcionamento
222
.
222
Caso das empresas estrangeiras que desejam se instalar e funcionar no Brasil:
poderão fazê-lo após autorização do governo brasileiro, e isso não quer dizer que houve
perda da nacionalidade por parte daquela.
119
Não se pretende, com tal afirmação que as fraudes à lei sejam
liberadas e que não exista mais controle algum. Este, pode e deve ser
feito por Estado, segundo critérios estabelecidos em sua constituição
e/ou outras leis afins. Toda pessoa jurídica para atuar em Estado
diverso do de sua nacionalidade, deve obter autorização para
funcionar. É de se refletir quanto a qual seria o momento mais
oportuno para que os Estados fiscalizem a documentação desse ente
coletivo, para após isso, autorizar ou não o seu funcionamento? A
pessoa jurídica terá seu estatuto aprovado, reprovado ou terá que se
sujeitar a restrições ou adequações, segundo a previsão de cada
legislação. Cabe ao governo de cada Estado, em caráter
discricionário, aprovar e autorizar os entes coletivos a funcionar e
operar em seu território.
O que cada Estado deve e faz, é primar para que a pessoa
jurídica de direito privado estrangeira busque efetivamente contribuir
para o desenvolvimento social e econômico da nação na qual atue.
Cada Estado deve criar seus mecanismos para promover o controle de
seus entes, pois ele tem toda a independência para realizar esse
controle. Cabe, portanto, a cada nação aceitar ou não uma entidade
estrangeira. Se aceitar, deve respeitar a condição de estrangeiro e lhe
dar o direito de aplicar a legislação pátria nos casos em que esta
couber.
No caso de guerra, e na atualidade, mesmo assim o interesse
econômico se mostra acima de qualquer interesse de ordem idealista,
o Estado pode e deve controlar seus interesses frente a essas pessoas
jurídicas de direito privado estrangeiras. Pode fazê-lo por meio de
intervenção arbitrária, como previsto em nossa Constituição Federal,
art. 137, inciso II,
223
que versa sobre o estado de sítio em caso de
declaração de estado guerra ou resposta a agressão armada
223
“Art. 137. O Presidente da República pode, ouvidos o Conselho da República e o
Conselho de Defesa Nacional, solicitar ao Congresso Nacional autorização para
decretar o estado de sítio nos casos de:
I - comoção grave de repercussão nacional ou ocorrência de fatos que comprovem a
ineficácia de medida tomada durante o estado de defesa;
II - declaração de estado de guerra ou resposta à agressão armada estrangeira.
Parágrafo único. O Presidente da República, ao solicitar autorização para decretar o
estado de sítio ou sua prorrogação, relatará os motivos determinantes do pedido,
devendo o Congresso Nacional decidir por maioria absoluta.”
120
estrangeira. Não se vislumbra qualquer dificuldade da intervenção em
empresa estrangeira domiciliada no Brasil, caso seja de interesse
nacional, em eventual conflito armado, quando do país sob o estado de
exceção. Basta a governo determinar a intervenção e pessoas físicas
nacionais passam a gerenciar a pessoa jurídica durante tempo
necessário; após o término do evento que deflagrou aquela, o controle
da sociedade volta a quem de direito. Cabem às instituições
governamentais fiscalizar e controlar as sociedades estrangeiras,
autorizadas a funcionar no solo pátrio, afim de que estas cumpram sua
função social de forma satisfatória, de acordo com a política social
vigente.
A Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, estabelece, com
base no critério da incorporação, que a lei aplicável à pessoa jurídica
é a do país onde esta se constituiu. Em análise indireta, o Estado de
sua nacionalidade. Mesmo a utilizar apenas um critério, não se choca
com a constituição. O Brasil ratificou Tratados internacionais
referentes ao tema, mas estes não inserem novidade frente à
legislação já vigente entre nós.
Quando a lei aplicável ao caso concreto for conflitante com uma
norma imperativa, ou seja, Lei de Polícia, esta deixará de ser aplicada.
Destarte, prevalece a norma imperativa do Estado.
Os julgados internacionais analisados demonstram, no âmbito
internacional e contemporâneo, seja na Corte Internacional de Justiça
ou nos Tribunais Arbitrais, o reconhecimento e a existência da
nacionalidade das pessoas jurídicas. Prevalece o critério incorporação
como fato determinador da nacionalidade e, por conseguinte, o da lei
aplicável.
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Paulo 1980.
7
Anexos
7.1
Lei de Introdução ao Código Civil de 1916 (excertos)
Art. 19. São reconhecidas as pessoas jurídicas estrangeiras.
Art. 20. As pessoas jurídicas de direito público externo não podem adquirir, ou
possuir, por qualquer título, propriedade imóvel no Brasil, nem direitos suscetíveis de
desapropriação, salvo os prédios necessários para estabelecimento das legações ou
consulados.
Parágrafo único. Dependem de aprovação do governo federal os estatutos ou
compromissos das sociedades estrangeiras por ações e de intuitos não econômicos,
para poderem funcionar no Brasil, por si mesmo, ou por filiais, agências,
estabelecimentos que as representem, ficando sujeitas às leis e aos tribunais
brasileiros.
Art. 21. A lei nacional das pessoas jurídicas determina-lhes a capacidade.
7.2
Lei de Introdução ao Código Civil de 1942 (excertos)
Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a
modifique ou revogue.
§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando
seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei
anterior.
§ 2º A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já
existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
§ 3º Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei
revogadora perdido a vigência.
Art. 11. As organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as
sociedades e as fundações, obedecem à lei do Estado em que se constituírem.
§ 1º Não poderão, entretanto, ter no Brasil filiais, agências ou estabelecimentos
antes de serem os atos constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro, ficando
sujeitas à lei brasileira.
§ 2º Os Governos estrangeiros, bem como as organizações de qualquer
natureza, que eles tenham constituído, dirijam ou hajam investido de funções públicas,
não poderão adquirir no Brasil bens imóveis ou suscetíveis de desapropriação.
130
§ 3º Os Governos estrangeiros podem adquirir a propriedade dos prédios
necessários à sede dos representantes diplomáticos ou dos agentes consulares.
Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer
declarações de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania
nacional, a ordem pública e os bons costumes.
7.3
Projeto de Lei nº 4.905/95 (excertos)
Dispõe sobre a aplicação das normas jurídicas
Capítulo III
DO DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO
SEÇÃO A
REGRAS DE CONEXÃO
Artigo 8º Estatuto pessoal A personalidade, o nome, a capacidade e os direitos
de família são regidos pela lei do domicílio. Ante a inexistência de domicílio ou na
impossibilidade de sua localização, aplicar-se-ão sucessivamente a lei da residência
habitual e a lei da residência atual.
§1º As formalidades de celebração do casamento obedecerão à lei do local de
sua realização.
§2º As pessoas domiciliadas no Brasil que se casarem no exterior, atenderão,
antes ou depois do casamento, às formalidades para habilitação reguladas no Código
Civil Brasileiro, podendo registra-la na forma prevista na lei de Registros Públicos. As
pessoas domiciliadas no exterior que se casarem no Brasil provarão seu
desimpedimento de acordo com sua lei pessoal.
§3º O casamento entre brasileiros no exterior poderá ser celebrado perante
autoridade consular brasileira, atendidas as formalidades de habilitação previstas no
parágrafo anterior. O casamento entre estrangeiros de mesma nacionalidade poderá
ser celebrado no Brasil perante respectiva autoridade diplomática ou consular.
§4º A autoridade consular brasileira é competente para lavrar atos de registro
civil referentes a brasileiros na jurisdição do consulado, podendo igualmente lavrar
autos notariais, atendidos em todos os casos os requisitos da lei brasileira.
§5º Se os cônjuges tiverem domicílios ou residências diversos, será aplicada aos
efeitos pessoais do casamento a lei que com os mesmos tiver vínculos mais estreitos.
§6º Os menores e os incapazes são regidos pela lei do domicílio de seus pais ou
responsáveis; tendo os pais do menor domicílios diversos, regerá a lei que lhe seja
mais benéfica.
Artigo 9º Regime matrimonial de bens O regime de bens obedece à lei do país
do primeiro domicílio conjugal, ressalvada a aplicação da lei brasileira para os bens
situados no Brasil que tenham sido adquiridos após a transferência do domicílio
conjugal.
Parágrafo único Será respeitado o regime de bens fixado por convenção, que
tenha atendido à legislação competente, podendo os cônjuges que transferirem seu
domicílio para o Brasil adotar, por documento hábil, o regime da comunhão parcial,
sem prejuízo de sua situação.
Artigo 10 Bens e direitos reais Os bens e os direitos reais são qualificados e
regidos pela lei do local de sua situação.
Artigo 11 Obrigações contratuais As obrigações contratuais são regidas pela
lei escolhidas pelas partes. Essa escolha será expressa ou tácita, regidas pela lei
131
escolhida pelas partes. Essa escolha será expressa ou tácita, sendo alterável a
qualquer tempo, respeitados os direitos de terceiros.
§1º Caso não tenha havido escolha ou se a escolha não for eficaz, o contrato
será regido pela lei do país com o qual mantenha os vínculos mais estreitos.
§2º Se uma parte do contrato for separável do restante, e mantiver conexão mais
estreita com a lei de outro país, poderá esta aplicar-se em caráter excepcional.
§3º A forma dos atos e contratos rege-se pela lei do lugar de sua celebração,
permitida a adoção de outra forma aceita em direito, que tenha vinculação com o ato
ou contrato.
§4º Os contratos realizados no exterior sobre bens situados no País, ou direitos
a eles relativos, serão registrados no Brasil desde que atendidos os requisitos de
forma estabelecidos no parágrafo anterior.
Artigo 12 Obrigações por atos ilícitos As obrigações resultantes de atos ilícitos
serão regidas pela lei que com eles tenha vinculação mais estreita, seja a lei do local
da prática do ato ou do local onde se verificou o prejuízo.
Artigo 13 Herança A sucessão por morte ou ausência é regida pela lei do país
do domicílio do falecido à data do óbito, qualquer que seja a natureza e a situação dos
bens.
Parágrafo único A sucessão de bens situados no Brasil será regulada pela lei
brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, assim como dos herdeiros
domiciliados no País, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do
falecido.
SEÇÃO B
APLICAÇÃO DO DIREITO ESTRANGEIRO
Artigo 14 Lei estrangeira A lei estrangeira indicada pelo Direito Internacional
Privado Brasileiro será aplicada ex officio; essa aplicação, a prova e a interpretação
far-se-ão em conformidade com o direito estrangeiro.
Parágrafo único O juiz poderá determinar á parte interessada que colabore na
comprovação do texto, da vigência e do sentido da lei estrangeira aplicável.
Artigo 15 Reenvio Se a lei estrangeira, indicada pelas regras de conexão desta
lei, determinar a aplicação da lei brasileira, esta será aplicada.
§1º Se, porém, determinar a aplicação da lei de outro país, esta última somente
prevalecerá se também estabelecer que é competente.
§2º Caso a lei do terceiro país não se considerar competente, aplicar-se-á a lei
estrangeira inicialmente indicada pelas regras de conexão desta Lei.
Artigo 16 Qualificação A qualificação destinada à determinação da lei aplicável
será feita de acordo com a lei brasileira.
Artigo 17 Fraude à lei Não será aplicada a lei de um país cuja conexão resultar
de vínculo fraudulentamente estabelecido.
Artigo 18 Direitos adquiridos no exterior Os direitos adquiridos em país
estrangeiro serão reconhecidos no Brasil, com a ressalva decorrente do artigo anterior.
Artigo 19 Ordem pública As leis, atos públicos e privados, bem como as
heranças de outro país, não terão eficácia no Brasil se forem manifestamente
contrários à ordem pública brasileira.
132
SEÇÃO C
PESSOAS JURÍDICAS
Artigo 20 Pessoas jurídicas As pessoas jurídicas serão regidas pela lei do país
em que se tiverem constituído.
Parágrafo único Para funcionar no Brasil, por meio de quaisquer
estabelecimentos, as pessoas jurídicas estrangeiras deverão obter a autorização que
se fizer necessária, ficando sujeitas à lei brasileira.
Artigo 21 Aquisição de imóveis por pessoas jurídicas de direito público
estrangeiras ou internacionais As pessoas jurídicas de direito público, estrangeiras
ou internacionais, bem como as entidades de qualquer natureza por elas constituídas
ou dirigidas, não poderão adquirir no Brasil bens imóveis ou direitos a eles relativos.
§1º Com base no princípio da reciprocidade e mediante prévia e expressa
concordância do Governo brasileiro, podem os governos estrangeiros adquirir os
prédios urbanos destinados às chancelarias de suas missões diplomáticas e
repartições consulares de carreira, bem como os destinados a residências oficiais de
seus representantes diplomáticos e agentes consulares, nas cidades das respectivas
sedes.
§2º As organizações internacionais intergovernamentais sediadas no Brasil ou
nele representadas, poderão adquirir, mediante prévia e expressa concordância do
Governo brasileiro, os prédios destinados aos seus escritórios e às residências de
seus representantes e funcionários, nas cidades das respectivas sedes, nos termos
dos acordos pertinentes.
SEÇÃO D
COOPERAÇÃO JURÍDICA INTERNACIONAL
Artigo 22 Homologação de sentença estrangeira As sentenças judiciais, laudos
arbitrais e atos com força de sentença judicial, oriundos de país estrangeiro, para
terem efeito ou serem executados no Brasil, deverão ser homologados pelo Supremo
Tribunal Federal, atendidos os seguintes requisitos:
I haverem sido proferidos por autoridade com competência internacional;
II ter o réu, uma vez citado, oferecido defesa ou haver-se mantido revel;
III tratando-se de sentença judicial ou ato equivalente, ter transitado em
julgado nos termos da lei local;
IV na hipótese de laudo arbitral, ter sido homologado judicialmente, se a lei
estrangeiro o exigir;
V estarem revestidos das formalidades necessárias para serem executadas no
país de origem;
VI estarem traduzidos por intérprete público ou autorizado;
VII estarem autenticados pela autoridade consular brasileira.
Artigo 23 Medidas cautelares Poderão ser concedidas, no foro brasileiro
competente para a execução, medidas cautelares destinadas a garantir a eficácia de
ações judiciais em curso em país estrangeiro.
Artigo 24 Cartas rogatórias Serão atendidos os pedidos oriundos de Justiça
estrangeira, mediante carta rogatória, observadas as leis do Estado rogante quanto ao
objeto e à forma das diligências, desde que não atentatórias a princípios fundamentais
da lei brasileira. A carta rogatória, oficialmente traduzida, poderá ser apresentada
diretamente à autoridade rogada.
Artigo 25 Fica revogado o Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942, e
demais disposições em contrário.
133
7.4
Código de Bustamante de 1928 (excertos)
Deste código nos interessam alguns artigos do capítulo I, com o nome de
Nacionalidade e Naturalização, do Livro Primeiro, Título Primeiro, e do Capítulo II,
Domicílio, no mesmo Título e Livro.
Art. 9º. Cada Estado contratante aplicará o seu direito próprio à determinação de
nacionalidade de origem de toda pessoa individual ou jurídica e à sua aquisição, perda
ou recuperação posterior, realizadas dentro ou fora do seu território, quando uma das
nacionalidades sujeitas à controvérsia seja a do dito Estado. Os demais casos serão
regidos pelas disposições que se acham estabelecidas nos restantes artigos deste
capítulo.
Art. 10. Às questões sobre nacionalidade de origem em que não esteja
interessado o Estado em que elas se debatem, aplicar-se-á a lei daquela das
nacionalidades discutidas em que tiver domicílio a pessoa de que se trate.
Art. 11. Na falta desse domicílio, aplicar-se-ão ao caso previsto no artigo
anterior os princípios aceitos pela lei do julgador.
Art. 13. Às naturalizações coletivas, no caso de independência de um Estado,
aplicar-se-á a lei do Estrado novo, se tiver sido reconhecido pelo Estado julgador, e na
sua falta, a do antigo, tudo sem prejuízo das estipulações contratuais entre os dois
Estados interessados, as quais terão sempre preferência.
Art. 16. A nacionalidade de origem das corporações e fundações será
determinada pela lei do Estado, que as autorize ou as aprove.
Art. 17. A nacionalidade de origem das associações será a do país em que se
constituam, e nele devem ser registradas ou inscritas se a legislação local exigir esse
requisito.
Art. 18. As sociedades civis, mercantis ou industriais, que não sejam anônimas,
terão a nacionalidade estipulada na escritura social e , em sua falta, a do lugar onde
tenham sede habitualmente a sua gerência ou direção principal.
Art. 19. A nacionalidade das sociedades anônimas será determinada pelo
contrato social e, eventualmente, pela lei do lugar em que normalmente se reuna a
junta geral de acionista ou, em sua falta, pela do lugar onde funcione o seu principal
Conselho administrativo ou junta diretiva.
Art. 20. A mudança de nacionalidade das corporações, fundações, associações e
sociedades, salvo casos de variação de soberania territorial, terá que se sujeitar às
condições exigidas pela sua lei antiga e pela nova. Se mudar a soberania territorial, no
caso de independência, aplicar-se-á a regra estabelecida no art. 13 para as
naturalizações coletivas.
Art. 21. As disposições do art. 9º, no que se referem a pessoas jurídicas, e as
dos artigos 16 a 20 não serão aplicadas nos Estados contratantes, que não atribuam
nacionalidade às ditas pessoas jurídicas.
Art. 22. O conceito, aquisição, perda e reaquisição do domicílio geral e especial
das pessoas naturais ou jurídicas reger-se-ão pela lei territorial.
Art. 25. As questões sobre a mudança de domicílio das pessoas naturais ou
jurídicas serão resolvidas de acordo com a lei do tribunal, se este for de um dos
Estados interessados, e, se não, pela do lugar em que se pretenda ter adquirido o
último domicílio.
Art. 31. Cada Estado contratante, no seu caráter de pessoa jurídica, tem
capacidade para adquirir e exercer direitos civis e contrair obrigações da mesma
134
natureza no território dos demais, sem outras restrições, senão as estabelecidas
expressamente pelo direito local.
Art. 32. O conceito e reconhecimento das pessoas jurídicas serão regidos pela
lei territorial.
Art. 33. Salvo as restrições estabelecidas nos dois artigos precedentes, a
capacidade civil das corporações é regida pela lei que as tiver criado ou reconhecido;
a das fundações, pelas regras da sai instituição, aprovadas pela autoridade
correspondente, se o exigir o seu direito nacional; e a das associações, pelos seus
estatutos, em iguais condições.
Art. 34. Com as mesmas restrições, a capacidade civil das sociedades civis,
comerciais ou industriais é regida pelas disposições relativas ao contrato da
sociedade.
Art. 35. A lei local aplicar-se-á aos bens das pessoas jurídicas que deixem de
existir, a menos que o caso esteja previsto de outro moo, nos seus estatutos, nas suas
cláusulas básicas ou no direito em vigor referente às sociedades.”
O Código ainda reserva em seu Capítulo I, do Título II, Das Companhias
Comerciais, quase que dedicado ao Direito Comercial Internacional:
“Art. 247. O caráter comercial de uma sociedade coletiva ou comandatária
determina-se pela lei que tiver submetido o contrato social e, na sua falta, pela do
lugar em que tiver o seu domicílio comercial.
Se essas leis não distinguirem entre sociedades comerciais e civis, aplicar-se-á
o direito do país em que a questão for submetida a juízo.
Art. 248. O caráter mercantil de uma sociedade anônima depende da lei do
contrato social, na falta deste, a do lugar em que se efetuem as assembléias gerais de
acionistas, e em sua falta a do em que normalmente resida o seu Conselho ou Junta
diretiva.
Se essas leis não distinguirem entre sociedades comerciais e civis, terá um ou
outro caráter, conforme esteja ou não inscrita no registro comercial do país onde a
questão deva ser julgada. Em falta de registro mercantil, aplicar-se-á o direito local
deste último país.
Art. 249. Tudo quanto se relacione com a constituição e maneira de funcionar
das sociedades mercantis e com a responsabilidade dos seus órgãos está sujeito ao
contrato social, e, eventualmente, à lei que o reja.
Art. 250. A emissão de ações e obrigações em um Estado contratante, as formas
e garantias de publicidade e a responsabilidade dos gerentes de agências e sucursais,
a respeito de terceiros, submetem-se à lei territorial.
Art. 251. São também territoriais as leis que subordinam a sociedade a um
regime especial, em vista das suas operações.
Art. 252. As sociedades mercantis, devidamente constituídas em m Estado
contratante, gozarão da mesma personalidade jurídica nos demais, salvas as
limitações do direito territorial.
Art. 253. São territoriais as disposições que se referem à criação, funcionamento
e privilégios dos bancos de emissão e desconto, companhias de armazéns gerais de
depósitos, e outras análogas.
135
7.5
Convention on the Settlement of Investment disputes
between States and Nationals of other States (excertos)
Article 25
(1) The jurisdiction of the Centre shall extend to any legal disputearising directly
out of an investment, between a Contracting State (or any constituent subdivision or
agency of a Contracting State designated to the Centre by that State) and a national of
another Contracting State, which the parties to the dispute consent in writing to submit
to the Centre.When the parties have given their consent, no party may withdraw its
consent unilaterally.
(2) “National of another Contracting State” means: (a) any natural person who
had the nationality of a Contracting State other than the State party to the dispute on
the date on which the parties consented to submit such dispute to conciliation or
arbitration as well as on the date on which the request was registered pursuant to
paragraph (3) of Article 28 or paragraph (3) of Article 36, but does not include any
person who on either date also had the nationality of the Contracting State party to the
dispute; and (b) any juridical person which had the nationality of a Contracting State
other than the State party to the dispute on the date on which the parties consented to
submit such dispute to conciliation or arbitration and any juridical person which had the
nationality of the Contracting State party to the dispute on that date and which,
because of foreign control, the parties have agreed should be treated as a national of
another Contracting State for the purposes of this Convention.
(3) Consent by a constituent subdivision or agency of a Contracting State shall
require the approval of that State unless that State notifies the Centre that no such
approval is required.
(4) Any Contracting State may, at the time of ratification, acceptance or approval
of this Convention or at any time thereafter, notify the Centre of the class or classes of
disputes which it would or would not consider submitting to the jurisdiction of the
Centre. The Secretary-General shall forthwith transmit such notification to all
Contracting 18 Convention on the Settlement of Investment Disputes between States
and Nationals of Other States States. Such notification shall not constitute the consent
required by paragraph (1).
Article 26
Consent of the parties to arbitration under this Convention shall, unless
otherwise stated, be deemed consent to such arbitration to the exclusion of any other
remedy. A Contracting State may require the exhaustion of local administrative or
judicial remedies as a condition of its consent to arbitration under this Convention.
Article 27
(1) No Contracting State shall give diplomatic protection, or bring an
international claim, in respect of a dispute which one of its nationals and another
Contracting State shall have consented to submit or shall have submitted to arbitration
under this Convention, unless such other Contracting State shall have failed to abide
by and comply with the award rendered in such dispute.
(2) Diplomatic protection, for the purposes of paragraph (1), shall not include
informal diplomatic exchanges for the sole purpose of facilitating a settlement of the
dispute.
136
7.6
Convenção Interamericana sobre conflitos de leis em
matéria de sociedades mercantis OEA Montevidéu
1979
Artigo 1 Esta Convenção aplicar-se-á às sociedades mercantis constituídas em
qualquer dos Estados Partes.
Artigo 2 A existência, a capacidade, o funcionamento e a dissolução das
sociedades mercantis regem-se pela lei do lugar de sua constituição.
Entende-se por “lei do lugar de sua constituição” a lei do Estado onde se
cumpram os requisitos de forma e de fundo necessários para a criação de tais
sociedades.
Artigo 3 As sociedades mercantis devidamente constituídas em um Estado serão
reconhecidas de pleno direito nos demais Estados.
O reconhecimento de pleno direito não exclui a faculdade do Estado de exigir
comprovação da existência da sociedade de acordo com a lei do lugar de sua
constituição.
Em nenhum caso, a capacidade reconhecida às sociedades constituídas em um
Estado poderá ser maior do que a capacidade que a lei do Estado do reconhecimento
outorga às sociedades constituídas neste último Estado.
Artigo 4 Para o exercício direto ou indireto dos atos compreendidos no objeto
social das sociedades mercantis, estas ficarão sujeitas à lei do Estado onde os
praticarem.
A mesma lei aplicar-se-á ao controle que uma sociedade mercantil, que exerça o
comércio em um Estado, obtenha sobre uma sociedade constituída em outro Estado.
Artigo 5 As sociedades constituídas em um Estado, que pretendam estabelecer a
sede efetiva de sua administração central em outro Estado, poderão ser obrigadas a
cumprir os requisitos estabelecidos na legislação deste último.
Artigo 6 As sociedades mercantis constituídas em um Estado para o exercício
direto ou indireto dos atos compreendidos em seu objeto social ficarão sujeitas aos
órgãos jurisdicionais do Estado onde os praticarem.
Artigo 7 A lei declarada aplicável por esta Convenção poderá não ser aplicada
no território do Estado que a considere manifestamente contrária à sua ordem pública.
7.7
Convenção Interamericana sobre Personalidade e
Capacidade de Pessoas Jurídicas no Direito Internacional
Privado OEA La Paz 1984
Artigo 1 Esta Convenção aplicar-se-á às pessoas jurídicas constituídas em
qualquer dos Estados Partes, entendendo-se por pessoa jurídica toda entidade que
tenha existência e responsabilidade próprias, distintas da dos seus membros ou
fundadores e que seja qualificada como pessoa jurídica segundo a lei do lugar de sua
constituição.
Esta Convenção será aplicada sem prejuízo de Convenções específicas que
tenham por objeto categorias especiais de pessoas jurídicas.
137
Artigo 2 A existência, a dissolução e a fusão das pessoas jurídicas de caráter
privado serão regidos pela lei do lugar de sua constituição.
Entender-se-á por “lei do lugar de sua constituição” a do Estado Parte em que
forem cumpridos os requisitos de forma e fundo necessários à criação das referidas
pessoas.
Artigo 3 As pessoas jurídicas privadas devidamente constituídas num Estado
Parte serão reconhecidas de pleno direito nos demais Estados Partes. O
reconhecimento de pleno direito não exclui a faculdade do Estado Parte de exigir
comprovação de que a pessoa jurídica existe conforme a lei do lugar de sua
constituição.
Em caso algum a capacidade reconhecida às pessoas jurídicas privadas
constituídas num Estado Parte que as reconheça outorgue às pessoas jurídicas
constituídas neste último.
Artigo 4 À realização de atos compreendidos no objeto social das pessoas
jurídicas privadas aplicar-se-á a lei do Estado Parte em que se realizem tais atos.
Artigo 5 As pessoas jurídicas privadas constituídas num Estado Parte que
pretendam estabelecer a sede efetiva de sua administração em outro Estado Parte
poderão ser obrigadas a cumprir os requisitos estabelecidos no legislação deste
último.
Artigo 6 Quando uma pessoa jurídica privada atuar por intermédio de
representante em Estado Parte que não seja o de sua constituição, entender-se-á que
esse representante, ou quem o substituir, poderá responder, de pleno direito, às
reclamações e demandas que contra a referida pessoas se intentem por motivo de atos
de que se trate.
Artigo 7 Cada Estado Parte e demais pessoas jurídicas de direito público
organizadas de acordo com sua lei gozarão de personalidade jurídica privada de pleno
direito e poderão adquirir direitos e contrair obrigações no território dos demais
Estados Partes, com as restrições estabelecidas por essa lei e pelas leis destes
últimos, especialmente no que se refere aos atos jurídicos a direitos reais e sem
prejuízo de invocar, quando for o caso, imunidade de jurisdição.
Artigo 8 As pessoas jurídicas internacionais criadas por um acordo internacional
entre Estados Partes ou por uma resolução de organização internacional reger-se-ão
pelas disposições do acordo ou resolução de sua criação e serão reconhecidas de
pleno direito como sujeitos de direito privado em todos os Estados Partes da mesma
foram que as pessoas jurídicas privadas e sem prejuízo de invocar, quando for o caso,
imunidade de jurisdição.
Artigo 9 A lei declarada aplicável por esta Convenção poderá não ser aplicada
no território do Estado Parte que a considerar manifestamente contrária à sua ordem
pública.
7.8
Projeto de Lei Geral de Aplicação das Normas Jurídicas de
Haroldo Valladão (excertos)
Existência e capacidade das pessoas jurídicas
Art. 27. A existência e a capacidade das pessoas jurídicas estrangeiras de
direito privado regem-se segundo a lei de sua constituição, não podendo tal
capacidade exceder a das correspondentes pessoas jurídicas brasileiras.
138
Parágrafo único. Não poderão, entretanto, funcionar no Brasil por si mesmas, ou
por filiais, agências ou estabelecimentos que as representem sem a prévia aprovação
pelo Governo Federal de seus atos constitutivos, ficando sujeitas às leis e aos
tribunais brasileiros.
Art. 28. A existência e a capacidade das pessoas jurídicas brasileiras regem-se,
sempre, segundo a lei brasileira.
7.9
Convencion sobre el Reconocimiento de la Personeria
Juridica de las Sociedades, Asociaciones Y Fundaciones
Extranjeras 1956
Los Estados signatarios de la presente Convención:
Deseando establecer disposiciones comunes sobre el reconocimiento de la
personería jurídica de las sociedades, asociaciones, y fundaciones extranjeras.
Resuelven concluir una Convención a este efecto y convienen las siguientes
disposiciones:
Artículo 1
La personería jurídica adquirida por una sociedad, una asociación o una
fundación, en virtud de la Legislación del Estado contratante en el que han sido
cumplidas las formalidades de registro o de publicidad y en el que se encuentra su
sede estatutaria, será reconocida de pleno derecho en los otros países contratantes,
siempre que implique, además de la capacidad para promover acción judicial, por lo
menos la capacidad de poseer bienes y de concluir contratos y otros actos jurídicos.
La personería jurídica adquirida sin las formalidades de registro o de publicidad,
será reconocida de pleno derecho, bajo las mismas condiciones, si la sociedad, la
asociación o la fundación hubiera sido constituida de conformidad con la legislación
que la rige.
Artículo 2
La personería jurídica adquirida conforme a las disposiciones del Artículo 1,
podrá no ser reconocida en otro Estado contratante cuya legislación tome en
consideración la sede real, si esa sede es considerada como encontrándose en su
territorio.
La personería podrá no ser reconocida en otro Estado contratante cuya
legislación tome en consideración la sede real, si esa sede es considerada allí como
encontrándose en un Estado cuya legislación la toma igualmente en consideración.
La sociedad, la asociación o la fundación será considerada como teniendo su
sede real en el lugar en que haya establecido su administración central.
Las disposiciones de los apartados 1 y 2 no serán aplicables si la sociedad, la
asociación o la fundación traslada, dentro de un plazo razonable, su sede real a un
Estado que concede la personería sin tener en cuenta a esa sede.
Artículo 3
La continuidad de la personería será reconocida en todos los Estados
contratantes, en caso de traslado de la sede estatutaria de uno a otro Estado
contratante, si esa personería es reconocida en ambos Estados interesados.
Las disposiciones de los apartados 1 y 2 del Artículo 2 no serán aplicables si la
sociedad, la asociación o la fundación traslada su sede estatutaria al Estado de sede
real dentro de un plazo razonable.
Artículo 4
139
La fusión entre sociedades, asociaciones o fundaciones, que hayan adquirido la
personería en el mismo Estado contratante, que se produzca en ese Estado, será
reconocida en los otros Estados contratantes.
La fusión de una sociedad, una asociación o una fundación que haya obtenido la
personería en uno de los Estados contratantes, con una sociedad, una asociación o
una fundación que haya obtenido la personería en otro Estado contratante, será
reconocida en todos los Estados contratantes en caso de que ésta sea reconocida en
los Estados interesados.
Artículo 5
El reconocimiento de la personería jurídica implica la capacidad que le atribuye
la ley en virtud de la cual ésta ha sido adquirida.
No obstante, podrán ser denegados los derechos que la ley del Estado de
reconocimiento no concede a las sociedades, a las asociaciones y a las fundaciones de
tipo equivalente.
El Estado de reconocimiento podrá también reglamentar el alcance de la
capacidad de poseer bienes en su territorio.
La personería implicará en todos los casos, capacidad para la acción judicial;
tanto en calidad de demandante como de demandado, de conformidad con la
legislación del territorio.
Artículo 6
Las sociedades, las asociaciones y las fundaciones a las que la ley que las rige
no concede la personería, tendrán, en el territorio de los otros Estados contratantes, la
situación jurídica que les reconoce esta ley, especialmente en lo que se refiere a la
capacidad para promover acción judicial y la relación con los acreedores.
Estas no podrán pretender tener un tratamiento jurídico más favorable en los
otros Estados contratantes, aun cuando reúnan todas las condiciones que garantizan
en esos Estados el beneficio de la personería.
Sin embargo, les podrán ser denegados los derechos que la legislación de esos
Estados no concede a las sociedades, a las asociaciones y a las fundaciones de tipo
equivalente.
Estos Estados podrán también reglamentar el alcance de la capacidad de poseer
bienes en su territorio.
Artículo 7
La aprobación para el establecimiento, el funcionamiento y en general del
ejercicio permanente de la actividad social, se regirá en el territorio del Estado de
reconocimiento por la ley de ese Estado.
Artículo 8
En cada uno de los Estados contratantes, la aplicación de las disposiciones de
la presente Convención podrán ser rechazadas por motivos de orden público.
Artículo 9
Al firmar o ratificar la presente Convención, o al adherir a la misma, cada Estado
contratante podrá reservarse el derecho de limitar el alcance de su aplicación, tal
como resulta del Artículo 1.
El Estado que haya hecho uso del derecho previsto en el apartado precedente,
no podrá pretender la aplicación de la presente Convención por parte de los otros
Estados contratantes a las categorías que él haya excluido.
Artículo 10
La presente Convención queda abierta a la firma de los Estados representados
ante la Séptima Sesión de la Conferencia de La Haya sobre Derecho Internacional
Privado.
140
Esta será ratificada y los instrumentos de ratificación serán depositados ante el
Ministerio de Relaciones Exteriores de los Países Bajos.
Se labrará un acta de todos los depósitos de instrumentos de ratificación y una
copia de la misma, certificada conforme, será enviada por vía diplomática a cada uno
de los Estados signatarios.
Artículo 11
La presente Convención entrará en vigencia sesenta días después del depósito
del quinto instrumento de ratificación previsto en el Artículo 10, Apartado 2.
Para cada Estado Signatario que ratifique posteriormente la Convención, ésta
entrará en vigencia sesenta días después de la fecha del depósito de su instrumento
de ratificación.
Artículo 12
La presente Convención se aplicará de pleno derecho a los territorios
metropolitanos de los Estados contratantes.
Si un Estado contratante deseara su puesta en vigencia en todos los otros
territorios, o en alguno de los otros territorios en los que él garantiza las relaciones
internacionales, deberá notificar su intención a este efecto mediante un acta que será
depositada en el Ministerio de Relaciones Exteriores de los Países Bajos. Este último
enviará por vía diplomática una copia certificada conforme, a cada uno de los Estados
contratantes. La presente Convención entrará en vigencia para esos territorios sesenta
días después de la fecha del depósito del acta de notificación indicada
precedentemente.
Queda entendido que la notificación prevista en el Apartado 2 del presente
Artículo, sólo podrá tener efecto con posterioridad a la entrada en vigencia de la
presente Convención, en virtud de su Artículo 11, Apartado 1.
Artículo 13
Todo Estado no representado ante la Séptima Sesión de la Conferencia de La
Haya sobre Derecho Internacional Privado, podrá adherir a la presente Convención.
Los instrumentos de adhesión serán depositados ante el Ministerio de
Relaciones Exteriores de los Países Bajos.
Este enviará por vía diplomática una copia certificada conforme a cada uno de
los Estados contratantes.
La adhesión sólo tendrá efecto en las relaciones entre el Estado adherente y los
Estados que no presenten objeción, durante los seis meses subsiguientes a esta
comunicación.
Queda entendido que el depósito del acta de adhesión sólo podrá hacerse
después de la entrada en vigencia de la presente Convención, en virtud del Artículo
11, Apartado 1.
Artículo 14
La presente Convención tendrá vigencia por un período de cinco años a partir de
la fecha indicada en el Artículo 11, Apartado 1 de la presente Convención. Este
período comenzará a correr a partir de esa fecha, aún para los Estados que lo hayan
ratificado o que hayan adherido al mismo con posterioridad.
La Convención será renovada tácitamente cada cinco años, salvo denuncia.
La denuncia deberá ser notificada, por lo menos seis meses antes de la
expiración del período, al Ministerio de Relaciones Exteriores de los Países Bajos, el
que lo comunicará a todos los otros Estados contratantes.
La denuncia podrá limitarse a los territorios o a algunos de los territorios
indicados en una notificación hecha en virtud del Artículo 12, Apartado 2.
La denuncia sólo tendrá efecto para el Estado que la haya notificado. La
Convención seguirá en vigencia para los otros Estados contratantes.
141
En fe de lo cual, los abajo firmantes, debidamente autorizados por sus
respectivos gobiernos, firmaron la presente Convención.
Hecho en La Haya el 1 de junio de 1956, en un solo ejemplar que será
depositado en los archivos del Gobierno de los Países Bajos y del cual una copia
certificada conforme será enviada a cada uno de los Estados representados ante la
Séptima Sesión de la Conferencia de La Haya sobre Derecho Internacional Privado.
7.10
Caso Barcelona Traction, 24 de julho 1964
CASE CONCERNING THE BARCELONA TRACTION,
LIGHT AND POWER COMPANY, LIMITED
(PRELIMINARY OBJECTIONS)
Judgment of 24 July 1964
Proceedings in the case concerning the Barcelona Traction, Light and Power
Company, Limited (Belgium v. Spain) were instituted by an Application of 19 June 1962
in which the Belgian Government sought reparation for damage claimed to have been
caused to Belgian nationals, shareholders in the Canadian Barcelona Traction
Company, by the conduct of various organs of the Spanish State. The Spanish
Government raised four Preliminary Objections.
The Court rejected the first Preliminary Objection by 12 votes to 4, and the
second by 10 votes to 6. It joined the third Objection to the merits by 9 votes to 7 and
the fourth by 10 votes to 6.
President Sir Percy Spender and Judges Spiropoulos, Koretsky and Jessup
appended Declarations to the Judgment.
Vice-President Wellington Koo and Judges Tanaka and Bustamante y Rivero
appended Separate Opinions.
Judge Morelli and Judge ad hoc Armand-Ugon appended Dissenting Opinions.
*
First Preliminary Objection
In its Judgment, the Court recalled that Belgium had on 23 September 1958 filed
with the Court an earlier Application against Spain in respect of the same facts, and
Spain had then raised three Preliminary Objections. On 23 March 1961 the Applicant,
availing itself of the right conferred upon it by Article 69, paragraph 2, of the Rules of
Court, had informed the Court that it was not going on with the proceedings;
notification having been received from the Respondent that it had no objection, the
Court had removed the case from its List (10 April 1961). In its first Preliminary
Objection, the Respondent contended that this discontinuance precluded the Applicant
from bringing the present proceedings and advanced five arguments in support of its
contention.
The Court accepted the first argument, to the effect that discontinuance is a
purely procedural act the real significance of which must be sought in the attendant
circumstances.
On the other hand, the Court was unable to accept the second argument namely
that a discontinuance must always be taken as signifying a renunciation of any further
right of action unless the right to start new proceedings is expressly reserved. As the
Applicant's notice of discontinuance contained no motivation and was very clearly
confined to the proceedings instituted by the first Application, the Court considered
that the onus of establishing that the discontinuance meant something more than a
decision to terminate those proceedings was placed upon the Respondent.
142
The Respondent, as its third argument, asserted that there had been an
understanding between the Parties; it recalled that the representatives of the private
Belgian interests concerned had made an approach with a view to opening negotiations
and that the representatives of the Spanish interests had laid down as a prior condition
the final withdrawal of the claim. According to the Respondent what was meant by this
was that the discontinuance would put an end to any further right of action, but the
Applicant denied that anything more was intended than the termination of the then
current proceedings. The Court was unable to find at the governmental level any
evidence of any such understanding as was alleged by the Respondent; it seemed that
the problem had been deliberately avoided lest the foundation of the interchanges be
shattered. Nor had the Respondent, on whom lay the onus of making its position clear,
expressed any condition when it indicated that it did not object to the discontinuance.
The Respondent Government then advanced a fourth argument, having the
character of a plea of estoppel, to the effect that, independently of the existence of any
understanding, the Applicant had by its conduct misled the Respondent about the
import of the discontinuance, but for which the Respondent would not have agreed to it,
and would not thereby have suffered prejudice. The Court did not consider that the
alleged misleading Belgian misrepresentations had been established and could not see
what the Respondent stood to lose by agreeing to negotiate on the basis of a simple
discontinuance; if it had not agreed to the discontinuance, the previous proceedings
would simply have continued, whereas negotiations offered a possibility of finally
settling the dispute. Moreover, if the negotiations were not successful and the case
started again, it would still be possible once more to put forward the previous
Preliminary Objections. Certainly the Applicant had framed its second Application with
a foreknowledge of the probable nature of the Respondent's reply and taking it into
account but, if the original proceedings had continued, the Applicant could likewise
always have modified its submissions.
The final argument was of a different order. The Respondent alleged that the
present proceedings were contrary to the spirit of the Hispano-Belgian Treaty of
Conciliation, Judicial Settlement and Arbitration of 19 July 1927 which, according to the
Applicant, conferred competence on the Court. The preliminary stages provided for by
the Treaty having already been gone through in connection with the original
proceedings, the Treaty could not be invoked a second time to seise the Court of the
same complaints. The Court considered that the Treaty processes could not be
regarded as exhausted so long as the right to bring new proceedings otherwise existed
and until the case had been prosecuted to judgment.
For these reasons, the Court rejected the first Preliminary Objection.
Second Preliminary Objection
To found the jurisdiction of the Court the Applicant relied on the combined effect
of Article 17 (4) of the 1927 Treaty between Belgium and Spain, according to which if
the other methods of settlement provided for in that Treaty failed either party could
bring any dispute of a legal nature before the Permanent Court of International Justice,
and Article 37 of the Statute of the International Court of Justice, which reads as
follows:
"Whenever a treaty or convention in force provides for
reference of a matter. to the Permanent Court of International
Justice, the matter shall, as between the parties to the present
Statute, be referred to the International Court of Justice."
As the principal aspect of its objection, the Respondent maintained that although
the 1927 Treaty might still be in force, Article 17 (4) had lapsed in April 1946 on the
dissolution of the Permanent Court to which that article referred. No substitution of the
143
present for the former Court had been effected in that article before the dissolution,
Spain not being then a party to the Statute; in consequence, the 1927 Treaty had
ceased to contain any valid jurisdictional clause when Spain was admitted to the United
Nations and became ipso facto a party to the Statute (December 1955). In other words
Article 37 applied only between States which had become parties to the Statute
previous to the dissolution of the Permanent Court, and that dissolution had brought
about the extinction of jurisdictional clauses providing for recourse to the Permanent
Court unless they had previously been transformed by the operation of Article 37 into
clauses providing for recourse to the present Court.
The Court found that this line of reasoning had first been advanced by the
Respondent after the decision given by the Court on 26 May 1959 in the case
concerning the Aerial Incident of 27 July 1955 (Israel v. Bulgaria). But that case had
been concerned with a unilateral declaration in acceptance of the compulsory
jurisdiction of the Permanent Court and not with a treaty. It thus had reference not to
Article 37 but to Article 36, paragraph 5, of the Statute.
As regards Article 37, the Court recalled that in 1945 its drafters had intended to
preserve as many jurisdictional clauses as possible from becoming inoperative by
reason of the prospective dissolution of the Permanent Court. It was thus difficult to
suppose that they would willingly have contemplated that the nullification of the
jurisdictional clauses whose continuation it was desired to preserve would be brought
about by the very event the effects of which Article 37 was intended to parry.
Only three conditions were actually stated in Article 37. They were that there
should be a treaty in force; that it should contain a provision for the reference of a
matter to the Permanent Court; and that the dispute should be between States parties
to the Statute. In the present case the conclusion must be that the 1927 Treaty being in
force and containing a provision for reference to the Permanent Court, and the parties
to the dispute being parties to the Statute, the matter was one to be referred to the
International Court of Justice, which was the competent forum.
It was objected that this view led to a situation in which the jurisdictional clause
concerned was inoperative and then after a gap of years became operative again, and
it was asked whether in those circumstances any true consent could have been given
by the Respondent to the Court's jurisdiction. The Court observed that the notion of
rights and obligations that are in abeyance but not extinguished was common; States
becoming parties to the Statute after the dissolution of the Permanent Court must be
taken to have known that one of the results of their admission would be the reactivation
by reason of Article 37 of certain jurisdictional clauses. The contrary position
maintained by the Respondent would create discrimination between States according as
to whether they became parties to the Statute before or after the dissolution of the
Permanent Court.
As regards Article 17 (4) more particularly, the Court considered that it was an
integral part of the 1927 Treaty. It would be difficult to assert that the basic obligation
to submit to compulsory adjudication provided for in the Treaty was exclusively
dependent on the existence of a particular forum. If it happened that the forum went out
of existence, the obligation became inoperative but remained substantively in existence
and could be rendered operative once more if a new tribunal was supplied by the
automatic operation of some other instrument. Article 37 of the Statute had precisely
that effect. Accordingly, "International Court of Justice" must now be read for
"Permanent Court of International Justice".
As a subsidiary plea, the Respondent contended that if Article 37 of the Statute
operated to reactivate Article 17 (4) of the Treaty in December 1955, what came into
existence at that date was a new obligation between the Parties; and that just as the
144
original applied only to disputes arising after the Treaty date, so the new obligation
could apply only to disputes arising after December 1955. The dispute was accordingly
not covered since it had arisen previous to December 1955. In the opinion of the Court,
when the obligation to submit to compulsory adjudication was revived as to its
operation, it could only function in accordance with the Treaty providing for it and it
continued to relate to any disputes arising after the Treaty date.
For these reasons the Court rejected the second Preliminary Objection both in its
principal and in its subsidiary aspects.
Third and Fourth Preliminary Objections
The Respondent's third and fourth Preliminary Objections involved the question
of whether the claim was admissible. The Applicant had submitted alternative pleas
that these objections, unless rejected by the Court, should be joined to the merits.
By its third Preliminary Objection the Respondent denied the legal capacity of
the Applicant to protect the Belgian interests on behalf of which it had submitted its
claim. The acts complained of had taken place not in relation to any Belgian natural or
juristic person but in relation to the Barcelona Traction Company, a juristic entity
registered in Canada, the Belgian interests concerned being in the nature of
shareholding interests in that company. The Respondent contended that international
law does not recognize, in respect of injury caused by a State to the foreign company,
any diplomatic protection of shareholders exercised by a State other than the national
State of the company. The Applicant contested this view.
The Court found that the question of the jus standi of a government to protect the
interests of shareholders raised an antecedent question of what was the juridical
situation in respect of shareholding interests, as recognized by international law. The
Applicant thus necessarily invoked rights which, so it contended, were conferred on it
in respect of its nationals by the rules of international law concerning the treatment of
foreigners. Hence a finding by the Court that it had no jus standi would be tantamount
to a finding that those rights did not exist and that the claim was not well-founded in
substance.
The third Objection had certain aspects which were of a preliminary character,
but involved a number of closely interwoven strands of mixed law, fact and status to a
degree such that the Court could not pronounce upon it at the present stage in full
confidence that it was in possession of all the elements that might have a bearing on
its decisions. The proceedings on the merits would thus place the Court in a better
position to adjudicate with a full knowledge of the facts.
The foregoing considerations applied a fortiori to the fourth Preliminary
Objection, wherein the Respondent alleged failure to exhaust local remedies. This
allegation was in fact inextricably interwoven with the issues of denial of justice which
constituted the major part of the merits of the case.
Accordingly, the Court joined the third and fourth Preliminary Objections to the
merits.
145
7.11
Caso Barcelona Traction, 05 de fevereiro 1970
CONCERNING THE BARCELONA TRACTION,
LIGHT AND POWER COMPANY, LIMITED
(SECOND PHASE)
Judgment of 5 February 1970
In its judgment in the second phase of the case concerning the Barcelona
Traction, Light and Power Company, Limited (New Application: 1962) (Belgium v.
Spain), the Court rejected Belgium's claim by fifteen votes to one.
The claim, which was brought before the Court on 19 June 1962, arose out of the
adjudication in bankruptcy in Spain of Barcelona Traction, a company incorporated in
Canada. Its object was to seek reparation for damage alleged by Belgium to have been
sustained by Belgian nationals, shareholders in the company, as a result of acts said to
be contrary to international law committed towards the company by organs of the
Spanish State.
The Court found that Belgium lacked jus standi to exercise diplomatic protection
of shareholders in a Canadian company with respect to measures taken against that
company in Spain.
Judges Petrén and Onyeama appended a joint declaration to the Judgment;
Judge Lachs appended a declaration. President Bustamante y Rivero and Judges Sir
Gerald Fitzmaurice, Tanka, Jessup, Morelli, Padilla Nervo, Gros and Ammoun appended
Separate Opinions.
Judge ad hoc Riphagen appended a Dissenting Opinion.
Background of Events in the Case
(paras. 8-24 of the Judgment)
The Barcelona Traction, Light and Power Company, Limited, was incorporated in
1911 in Toronto (Canada), where it has its head office. For the purpose of creating and
developing an electric power production and distribution system in Catalonia (Spain) it
formed a number of subsidiary companies, of which some had their registered offices in
Canada and the others in Spain. In 1936 the subsidiary companies supplied the major
part of Catalonia's electricity requirements. According to the Belgian Government,
some years after the first world war Barcelona Traction share capital came to be very
largely held by Belgian nationals, but the Spanish Government contends that the
Belgian nationality of the shareholders is not proven.
Barcelona Traction issued several series of bonds, principally in sterling. The
sterling bonds were serviced out of transfers to Barcelona Traction effected by the
subsidiary companies operating in Spain. In 1936 the servicing of the Barcelona
Traction bonds was suspended on account of the Spanish civil war. After that war the
Spanish exchange control authorities refused to authorize the transfer of the foreign
currency necessary for the resumption of the servicing of the sterling bonds.
Subsequently, when the Belgian Government complained of this, the Spanish
Government stated that the transfers could not be authorized unless it were shown that
the foreign currency was to be used to repay debts arising from the genuine importation
of foreign capital into Spain and that this had not been established.
In 1948 three Spanish holders of recently acquired Barcelona Traction sterling
bonds petitioned the court of Reus (Province of Tarragona) for a declaration adjudging
the company bankrupt, on account of failure to pay the interest on the bonds. On 12
February 1948 a judgment was given declaring the company bankrupt and ordering the
146
seizure of the assets of Barcelona Traction and of two of its subsidiary companies.
Pursuant to this judgment the principal management personnel of the two companies
were dismissed and Spanish directors appointed. Shortly afterwards, these measures
were extended to the other subsidiary companies. New shares of the subsidiary
companies were created, which were sold by public auction in 1952 to a newly-formed
company, Fuerzas Electricas de Cataluna, S.A. (Fecsa), which thereupon acquired
complete control of the undertaking in Spain.
Proceedings were brought without success in the Spanish courts by various
companies or persons. According to the Spanish Government, 2,736 orders were made
in the case and 494 judgments given by lower and 37 by higher courts before it was
submitted to the International Court of Justice. The Court found that in 1948 Barcelona
Traction, which had not received a judicial notice of the bankruptcy proceedings, and
was not represented before the Reus court, took no proceedings in the Spanish courts
until 18 June and thus did not enter a plea of opposition against the bankruptcy
judgment within the time-limit of eight days from the date of publication of the judgment
laid down in Spanish legislation. The Belgian Government contends, however, that the
notification and publication did not comply with the relevant legal requirements and that
the eight-day time-limit never began to run.
Representations were made to the Spanish Government by the British, Canadian,
United States and Belgian Governments as from 1948 or 1949. The interposition of the
Canadian Government ceased entirely in 1955.
Proceedings before the International Court and the Nature of the Claim
(paras. 1-7 and 26-31 of the Judgment)
The Belgian Government filed a first Application with the Court against the
Spanish Government in 1958. In 1961 it gave notice of discontinuance of the
proceedings, with a view to negotiations between the representatives of the private
interests concerned, and the case was removed from the Court's General List. The
negotiations having failed, the Belgian Government on 19 June 1962 submitted to the
Court a new Application. In 1963 the Spanish Government raised four preliminary
objections to this Application. By its Judgment of 24 July 1964, the Court rejected the
first and second objections and joined the third and fourth to the merits.
In the subsequent written and oral proceedings the Parties supplied abundant
material and information. The Court observed that the unusual length of the
proceedings was due to the very long time-limits requested by the Parties for the
preparation of their written pleadings and to their repeated requests for an extension of
chose limits. The Court did not find that it should refuse those requests, but it
remained convinced that it was in the interest of the authority of international justice
for cases to be decided without unwarranted delay.
The claim submitted to the Court had been presented on behalf of natural and
juristic persons, alleged to be Belgian nationals and shareholders in Barcelona
Traction, a company incorporated in Canada and having its head office there. The
object of the Application was reparation for damage allegedly caused to those persons
by the conduct, said to be contrary to international law, of various organs of the
Spanish State towards that company.
The third preliminary objection of the Spanish Government, which had been
joined to the merits, was to the effect that the Belgian Government lacked capacity to
submit any claim in respect of wrongs done to a Canadian company even if the
shareholders were Belgian. The fourth preliminary objection, which was also joined to
the merits, was to the effect that local remedies available in Spain had not been
exhausted.
147
The case submitted to the Court principally concerned three States, Belgium,
Spain and Canada, and it was accordingly necessary to deal with a series of problems
arising out of this triangular relationship.
The Belgian Government's jus standi
(paras. 32-101 of the Judgment)
The Court first addressed itself to the question, raised by the third preliminary
objection, which had been joined to the merits, of the right of Belgium to exercise
diplomatic protection of Belgian shareholders in a company incorporated in Canada, the
measures complained of having been taken in relation not to any Belgian national but
to the company itself.
The Court observed that when a State admitted into its territory foreign
investments or foreign nationals it was bound to extend to them the protection of the
law and assumed obligations concerning the treatment to be afforded them. But such
obligations were not absolute. In order to bring a claim in respect of the breach of such
an obligation, a State must first establish its right to do so.
In the field of diplomatic protection, international law was in continuous evolution
and was called upon to recognize institutions of municipal law. In municipal law, the
concept of the company was founded on a firm distinction between the rights of the
company and those of the shareholder. Only the company, which was endowed with
legal personality, could take action in respect of matters that were of a corporate
character. A wrong done to the company frequently caused prejudice to its
shareholders, but this did not imply that both were entitled to claim compensation.
Whenever a shareholder's interests were harmed by an act done to the company, it was
to the latter that he had to look to institute appropriate action. An act infringing only
the company's rights did not involve responsibility towards the shareholders, even if
their interests were affected. In order for the situation to be different, the act
complained of must be aimed at the direct rights of the shareholder as such (which was
not the case here since the Belgian Government had itself admitted that it had not
based its claim on an infringement of the direct rights of the shareholders).
International law had to refer to those rules generally accepted by municipal
legal systems. An injury to the shareholder's interests resulting from an injury to the
rights of the company was insufficient to found a claim. Where it was a question of an
unlawful act committed against a company representing foreign capital, the general rule
of international law authorized the national State of the company alone to exercise
diplomatic protection for the purpose of seeking redress. No rule of international law
expressly conferred such a right on the shareholder's national State.
The Court considered whether there might not be, in the present case, special
circumstances for which the general rule might not take effect. Two situations needed
to be studied: (a) the case of the company having ceased to exist, and (b) the case of
the protecting State of the company lacking capacity to take action. As regards the first
of these possibilities, the Court observed that whilst Barcelona Traction had lost all its
assets in Spain and been placed in receivership in Canada, it could not be contended
that the corporate entity of the company had ceased to exist or that it had lost its
capacity to take corporate action. So far as the second possibility was concerned, it
was not disputed that the company had been incorporated in Canada and had its
registered office in that country, and its Canadian nationality had received general
recognition. The Canadian Government had exercised the protection of Barcelona
Traction for a number of years. If at a certain point the Canadian Government ceased
to act on behalf of Barcelona Traction, it nonetheless retained its capacity to do so,
which the Spanish Government had not questioned. Whatever the reasons for the
148
Canadian Government's change of attitude, that fact could not constitute a justification
for the exercise of diplomatic protection by another government.
It had been maintained that a State could make a claim when investments by its
nationals abroad, such investments being part of a State's national economic
resources, were prejudicially affected in violation of the right of the State itself to have
its nationals enjoy a certain treatment. But, in the present state of affairs, such a right
could only result from a treaty or special agreement. And no instrument of such a kind
was in force between Belgium and Spain.
It had also been maintained that, for reasons of equity, a State should be able, in
certain cases, to take up the protection of its nationals, shareholders in a company
which had been the victim of a violation of international law. The Court considered that
the adoption of the theory of diplomatic protection of shareholders as such would open
the door to competing claims on the part of different States, which could create an
atmosphere of insecurity in international economic relations. In the particular
circumstances of the present case, where the company's national State was able to act,
the Court was not of the opinion that jus standi was conferred on the Belgian
Government by considerations of equity.
The Court's Decision
(paras. 102 and 103 of the Judgment)
The Court took cognizance of the great amount of documentary and other
evidence submitted by the Parties and fully appreciated the importance of the legal
problems raised by the allegation which was at the root of the Belgian claim and which
concerned denials of justice allegedly committed by organs of the Spanish State.
However, the possession by the Belgian Government of a right of protection was a
prerequisite for the examination of such problems. Since no jus standi before the Court
had been established, it was not for the Court to pronounce upon any other aspect of
the case.
Accordingly, the Court rejected the Belgian Government's claim by 15 votes to 1,
12 votes of the majority being based on the reasons set out above.
DECLARATIONS AND SEPARATE AND
DISSENTING OPINIONS
Judge ad hoc Riphagen appended to the Judgment a Dissenting Opinion in which
he stated that he was unable to concur in the Judgment as the legal reasoning followed
by the Court appeared to him to fail to appreciate the nature of the rules of customary
public international law applicable in the present case.
Among the fifteen members of the majority, three supported the operative
provisions of the Judgment (rejecting the Belgian Government's claim) for different
reasons, and appended Separate Opinions to the Judgment. Judge Tanka stated that
the two preliminary objections joined to the merits ought to have been dismissed, but
that the Belgian Government's allegation concerning denials of justice was unfounded.
Judge Jessup came to the conclusion that a State, under certain circumstances, had a
right to present a diplomatic claim on behalf of shareholders who were its nationals but
that Belgium had not succeeded in proving the Belgian nationality, between the critical
dates, of those natural and juristic persons on whose behalf it had sought to claim.
Judge Gros held that it was the State whose national economy was adversely affected
that possessed the right to take action but that proof of Barcelona Traction
appurtenance to the Belgian economy had not been produced.
Among the twelve members of the majority who supported the operative provision
of the Judgment on the basis of the reasoning set out in the Judgment (lack of jus
standi on the part of the shareholders' national State), President Bustamante y Rivero
and Judges Sir Gerald Fitzmaurice, Morelli, Padilla Nervo and Ammoun (Separate
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Opinions) and Judges Padrone and Onyeama (joint declaration) and Judge Lachs
(declaration) stated that nevertheless there were certain differences between their
reasoning and that contained in the Judgment, or that there were certain observations
which they wished to add.
(Judge Sir Muhammad Zafrulla Khan had informed the President at the beginning
of the Preliminary Objections stage that, having been consulted by one of the Parties
concerning the case before his election as a Member of the Court, he considered that
he ought not to participate in its decision.)
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