magistrado, como primeiros elementos da felicidade de um povo.
Os indivíduos que, por sua excelente organização, têm o direito de se tornarem geradores, ou
geratrizes, Se unem segundo os ensinamentos da filosofia. Platão acha que isso deve realizar-se tirando a
sorte, a fim de que os que são afastados das mulheres mais belas não fiquem odiando os magistrados; e
diz que devem ser enganados no ato de tirar a sorte, os que não são merecedores de supremas belezas, de
maneira que obtenham, não as mais desejadas, mas as mais convenientes. Esse engano, porém, é
inteiramente inútil para os habitantes solares, pois que entre eles não existe deformidade. Além disso,
como as mulheres se aplicam continuamente a diferentes trabalhos, adquirem uma cor vivaz, membros
robustos, grandes, e ágeis, consistindo a beleza unicamente na altura e no vigor das pessoas. Incorreria,
pois, na pena capital aquela que embelezasse o rosto para parecer bela, ou usasse calçado alto para
parecer maior, ou vestido comprido para cobrir pés disformes. Mas, mesmo que alguma manifestasse
propensão para fazer essas coisas, não o conseguiria, porque ninguém lhe reconheceria a faculdade.
Asseveram eles que tais enganos são frutos, entre nós, da ociosidade e da indolência das mulheres, o que
faz com que, deformando-se, empalidecendo e tornando-se fracas e pequenas, precisem de cores, de
calçado, de vestidos compridos, e gostem mais de parecer belas por uma inerte delicadeza do que por
uma vigorosa saúde, prejudicando-se a se próprias e à prole.
Quando um indivíduo se apaixona violentamente por uma mulher, permitem-lhe colóquios,
divertimentos e recíprocos presentes de flores e de poesias. Se, porém, a geração corre perigo, não se
permite nunca que se unam, salvo quando a mulher já se acha grávida de um feto pertencente a outro, ou
quando já tenha sido declarada estéril; estes, porém, só conhecem o amor de exclusiva concupiscência e a
amizade. Não se preocupam muito com questões familiares e comestíveis, pois cada um recebe de acordo
com a própria necessidade, a não ser quando se trate de honrar alguém. Então, e especialmente nos dias
de festa, costumam distribuir-se, aos heróis e às heroínas, à hora do jantar, em sinal de honra, diferentes
presentes, como grinaldas multicores, alimentos agradáveis, roupas elegantes, etc.
Se bem que, durante o dia e na cidade, todos usem roupas brancas, à noite e fora da cidade trajam
vestes vermelhas, de lã ou de seda. Detestam, porém, e desprezam a cor preta, em oposição aos
japoneses, que preferem essa tinta. A soberba é julgada o mais execrando dos vícios, e todo ato de
soberba é punido com as mais cruéis humilhações. Ninguém se considera diminuído ao servir à mesa, na
cozinha ou nas enfermarias: cada função é tida como um mister, e, a seu ver, todos os atos praticados
pelas diferentes partes do corpo humano são igualmente honrosos.
Não têm o sórdido costume de possuir servos, bastando-lhes e, muitas vezes, sendo até excessivo, o
próprio trabalho. Entre nós, infelizmente, vemos o oposto.
Nápoles tem uma população de setenta mil pessoas, mas só quinze mil trabalham e são logo
aniquiladas pelo excesso de fadiga. As restantes estão arruinadas pelo ócio, pela preguiça, pela avareza,
pela enfermidade, pela lascívia, pela usura, etc., e, para maior desventura, contaminam e corrompem um
infinito número de homens, sujeitando-os a servir, a adular, a participar dos próprios vícios, com grave
dano para as funções públicas. Os campos, a milícia, as artes, ou são desprezadas ou, com ingentes
sacrifícios, pessimamente cultivadas por alguns. Na Cidade do Sol, ao contrário, havendo igual
distribuição dos misteres, das artes, dos empregos, das fadigas, cada indivíduo não trabalha mais de
quatro horas por dia, consagrando o restante ao estudo, à leitura, às discussões científicas, ao escrever, à
conversação, aos passeios, em suma, a toda sorte de exercícios agradáveis e úteis ao corpo e à mente.
Não se permitem jogos que obriguem a ficar sentado, como dados, xadrez e outros, divertindo-se todos
com a pela, o balão, o pião, a corrida, a luta, o arco, o arcabuz, etc. Afirmam, além disso, que a pobreza é
a razão principal de se tornarem os homens vis, velhacos, fraudulentos, ladrões, intrigantes, vagabundos,
mentirosos, falsos testemunhos, etc., produzindo a riqueza os insolentes, os soberbos, os ignorantes, os
traidores, os presunçosos, os falsários, os vaidosos, os egoístas, etc. A comunidade, ao contrário, coloca
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