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SANDRA ELEINE ROMAIS
A LITERATURA COMO FATO SOCIAL:
INSTÂNCIAS E INSTITUIÇÕES QUE CONSTROEM O LITERÁRIO
MARINGÁ - PR
2006
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS (MESTRADO)
ÁREAS DE CONCENTRAÇÃO: ESTUDOS LINGÜÍSTICOS E LITERÁRIOS
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SANDRA ELEINE ROMAIS
A LITERATURA COMO FATO SOCIAL:
INSTÂNCIAS E INSTITUIÇÕES QUE CONSTROEM O LITERÁRIO
Dissertação apresentada à Universidade Estadual
de Maringá, como requisito parcial para obtenção
do grau de Mestre em Letras, área de
concentração: Estudos Literários.
Orientadora: Drª Mirian Hisae Yaegashi Zappone
MARINGÁ - PR
2006
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Para meus pais Florentino e Aparecida Romais,
meus irmãos Sílvia e Márcio, Sabrina e Marcos, e
para meu namorado Vínícius Leonardi.
AGRADECIMENTOS
A mais perfeita tríade, Deus Pai, Autor da Vida, Deus Filho, materialização da Palavra
e Deus Espírito Santo, manifestação em nós.
A Profª DMirian H. Yaegashi Zappone, pela contribuição com seus conhecimentos,
criatividade, atenção e competência.
Aos colegas e professores da turma de mestrado 2004, pelas intensas discussões.
A Andréia Previate, secretária do PLE, pelo seu exemplo de profissionalismo e
dedicação.
A meus pais pelo sustento financeiro durante toda essa jornada.
A minha nova família Laudenir e Nancy Beal Galina, por me adotarem como filha
enquanto estive morando em Maringá.
Aos meus companheiros de república, Carolina Beal, Cleber, Luís e Cibele que
dividiram comigo bons momentos de convivência e amizade.
Ao meu amor Vinícius Leonardi, por caminhar comigo e me dar razões suficientes pra
vencer qualquer desafio.
A todas as pessoas que direta ou indiretamente contribuíram para concretização deste
trabalho, em especial Nelson e Nilsa Leonardi, Sílvia e Márcio Starke, o historiador Marcos
André, Sabrina, Marinet e João Maurício.
“Não será tempo de escrever uma história literária
perspectivada a partir das condições de produção
específicas e suas transformações? E não seria
também de levar em conta as condições em que a
literatura é lida e divulgada uma história literária
dos leitores e editores, e não apenas de autores e
das obras?”
Viktor Zmegac (1986)
RESUMO
A concepção de literatura, como hoje é entendida, está intrinsecamente relacionada à
revolução burguesa, movimento responsável pelo desencadeamento de todo o processo de
produção, distribuição e circulação do artefato literário e dos dispositivos necessários para a
divulgação e acolhimento deste material artístico. Desse modo, a literatura concretiza-se no
interior de uma prática social específica de leitura e escrita de uma sociedade necessariamente
formada aos moldes burgueses. A idéia que se tem de literatura é notadamente construída por
uma rede de elementos que se inter-cruzam e moldam conceitos conforme os valores vigentes
do contexto sócio-histórico. Tendo tais idéias como premissas, este trabalho teve como
objetivo geral identificar as instâncias essenciais que formatam os textos literários, dando-lhes
as proporções e o valor estético que os chancelam como literatura. Entre as instâncias
consideradas deste complexo e abrangente sistema literário, foram estudados: 1) o circuito de
produção e recepção, que se refere à constituição do autor e do público-leitor; 2) o circuito de
produção material dos textos, que trata da evolução das técnicas de impressão e das novas
tecnologias; 3) o sistema legislativo e econômico, desenvolvido para regulamentar o comércio
livreiro e os direitos autorais e editoriais; 4) as práticas discursivas e a atuação das instituições
como a Academia de Letras, a crítica e a história literária, na elaboração dos padrões ou
modelos de literatura; 5) o sistema educacional que forma o público-leitor (consumidor) e
divulga os valores da classe dominante, atuantes no sistema literário. Para alcance dos
objetivos, a dissertação realizou-se por meio de uma pesquisa de caráter bibliográfico, de
recorte sociológico e de fundo marxista na qual procurou-se enfatizar, sobretudo, a trajetória
histórico-social brasileira. Posteriormente, para averiguar a pertinência dos estudos
sociológicos como se expõe nesta dissertação, analisou-se o circuito de produção, distribuição
e consumo do livro didático. A análise propõe compreender o livro didático como um suporte
específico sob a perspectiva do sistema literário e investigar, por meio de exemplos práticos e
apontamentos críticos, como esse sistema se relaciona com a fatura do livro didático. No atual
contexto brasileiro, esta dissertação se justifica em virtude das relações que estabelece entre
literatura e sociedade, contribuindo para os estudos voltados à sociologia da literatura e, em
especial, às pesquisas relacionadas à formação do leitor. Pois, como conclui este trabalho,
enquanto ensina-se uma literatura superficial, ajustada e limitada aos padrões da escola e de
um grupo letrado que detém o poder, a literatura como um fato social tem alcançado
dimensões surpreendentes e avassaladoras, não restritas às questões artísticas ou estéticas,
mas, sobretudo, no meio social, político, econômico, ideológico e material. Tais relações o
podem ser ignoradas, mas compreendidas com precisão e crítica a fim de devolver (ou
atribuir) um significado pertinente à literatura, seus estudos e leitura, em vista dos novos
paradigmas da sociedade pós-moderna.
ABSTRACT
The current concept of literature is intrinsically related to the bourgeoisie revolution which is,
in its turn, accountable for the development of the process in production, distribution and
circulation of the literary construct and the necessary features for the spread and the
acceptance of all artistic material. Literature materializes within the specific social practice of
reading and writing, proper to a society inherently based on a bourgeois framework. A
common idea of literature has been built on a network of factors that are interlaced into one
another and which mould their concepts according to social and historical values. With these
premises in mind, current research identifies the essential instances that construct literary texts
and provide them proportion and aesthetic value that warrants them as literature. Among the
instances of such a complex and comprising literary system, the following items have been
analyzed: 1) the production and reception circuit, or rather, the constitution of the author and
the reading public; 2) the circuit of the material production of texts, or rather, the evolution of
printing techniques and new technologies; 3) the legislative and economical system which has
been developed to regulate book selling, authors’ and editors’ rights; 4) discursive practices
and the influence of such institutions as the Literary Academy and literary criticism and
history in the elaboration of literature standards or models; 5) the educational system which
trains the reading public or consumer and impart the values of the dominant class which affect
the literary system. A bibliographical research was undertaken so that the above aims could be
achieved. It has been foregrounded on sociological and Marxist bases in which the Brazilian
historical and social course has been mainly underlined. Further, the production, distribution
and consumption of the school textbook have been analyzed to verify the propriety of
sociological studies within the dissertation. In current analysis the textbook has been
understood to be a specific support within the perspective of the literary system. The manner
the system is related to the textbook is investigated through practical examples and critical
annotations. Current research is justified within the Brazilian context due to the relationships
that ensue between literature and society. It contributes towards studies on the sociology of
literature and, in a particular way, to research related to reader training. Results show that,
whereas a wholly superficial literature is taught, limited and restricted to school standards and
to an aesthetic power-maintaining group, literature as a social phenomenon has achieved
surprising and overreaching heights. These dimensions are not restricted to artistic or aesthetic
issues but, above all, comprise the social, political, economic, ideological and material
environment. These relationships may not be discarded but should be understood precisely
and critically so that a meaning may be provided (or attributed) to literature, its study and its
reading within the context of the new paradigms of a post-modern society.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 216..............157
Figura 2: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 279..............157
Gráfico 1: Estatística da abordagem metodológica do livro didático Português: Linguagens
(2003)......................................................................................................................................161
Figura 3: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 20................162
Figura 4: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 21................163
Figura 5: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 111..............164
Figura 6: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 112..............164
Figura 7: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 209..............165
Figura 8: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 40................167
Figura 9: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 40................168
Figura 10: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 45..............169
Figura 11: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 45..............169
Figura 12: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 45..............170
Figura 13: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 63..............173
Figura 14: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 63..............173
Figura 15: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 281............174
Figura 16: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 101............174
Figura 17: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 64..............175
Figura 18: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 464............177
Figura 19: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 164............177
Figura 20: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 225............180
Figura 21: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 253............181
Figura 22: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 129............182
Figura 23: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 109............186
Figura 24: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 297............188
Figura 25: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 175............188
Figura 26: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 165............189
Figura 27: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 188............189
Figura 28: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 411............190
Figura 29: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 395............191
Figura 30: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 387............192
Figura 31: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 297............192
Figura 32: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 35..............193
Figura 33: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 37..............194
Figura 34: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 53..............196
Figura 35: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 51..............197
Figura 36: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 31.............198
Figura 37: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 31..............199
Figura 38: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 31..............200
Figura 39: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 32..............200
Figura 40: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 32..............201
Figura 41: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 32..............203
Figura 42: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 33..............204
Figura 43: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 33..............205
Figura 44: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 33..............205
Figura 45: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34..............206
Figura 46: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34..............206
Figura 47: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34..............207
Figura 48: Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34..............207
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABDL Associação Brasileira de Difusão do Livro
ABDR Associação Brasileira de Direitos Reprográficos
ABEU Associação Brasileira de Editoras Universitárias
ABIGRAF Associação Brasileira de Indústrias Gráficas
ABL Academia Brasileira de Letras
ABNT Associação Brasileira de Normas e Técnicas
ABPDEA Associação Brasileira para Proteção dos Direitos Editoriais e Autorais
ABRALE Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos
ANE Associação Nacional dos Escritores
BNDE Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico
BRACELPA Associação Brasileira de Celulose e Papel
CBL mara Brasileira do Livro
CNE Conselho Nacional de Educação
ECT Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
FBN Fundação da Biblioteca Nacional
FCRB Fundação Casa Rui Barbosa
FICART Fundo de Investimento Cultural e Artístico
FNC Fundo Nacional da Cultura
FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
FNLIJ Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil
GEIL Grupo Executivo da Indústria do Livro
GEIPAG Grupo Executivo das Indústrias de Papel e Artes Gráficas
IBEP Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
INL Instituto Nacional do Livro
IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas
ISBN International Standard Book Number
ISO International Oganization for Standardization
LD Livro Didático
LDB Lei de Diretrizes e Bases
MCP Movimento de Cultura Popular
MEC Ministério da Educação
MinC Ministério da Cultura
PCNs Parâmetros Curriculares Nacionais
PNA Plano Nacional de Alfabetização
PNE Plano Nacional de Educação
PNLD Programa Nacional do Livro Didático
PNLEM Programa Nacional do Livro do Ensino Médio
PRONAC Programa Nacional de Apoio à Cultura
SAEB Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica
SEIF Secretaria de Educação Infantil e Fundamental
SEMTEC Secretaria de Educação Média e Tecnológica
Serpro Serviço de Processamento de Dados
SNBP Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas
SNEL Sindicato Nacional dos Editores de Livros
UBE União Brasileira de Escritores
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................. 13
I PARTE
CAPÍTULO I
1 - O CIRCUITO DE CRIAÇÃO E RECEPÇÃO ............................................................. 23
1.1 O autor .................................................................................................................. 23
1.2 Os públicos............................................................................................................ 30
1.3 Os escritores e os públicos no Brasil...................................................................... 35
CAPÍTULO II
2 - O CIRCUITO DE PRODUÇÃO MATERIAL DOS TEXTOS..................................... 39
2.1 O papel dos editores e livreiros no sistema literário ............................................... 44
2.2 O percurso das editoras e livrarias no Brasil .......................................................... 48
CAPÍTULO III
3 - OS SISTEMAS LEGISLATIVOS E ECONÔMICOS ................................................. 60
3.1 O valor atribuído às obras literárias ....................................................................... 61
3.2 Os direitos autorais e editoriais.............................................................................. 64
3.3 A legislação no Brasil............................................................................................ 68
3.4 Leis e decretos da produção e circulação de livros no Brasil .................................. 82
CAPÍTULO IV
4 - AS PRÁTICAS DISCURSIVAS E A ATUAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES.................... 96
4.1 Instituições brasileiras de incentivo à leitura.......................................................... 97
4.2 A historiografia literária ...................................................................................... 102
4.3 A questão do cânone............................................................................................ 106
4.4 As academias literárias ........................................................................................ 111
4.5 A crítica literária.................................................................................................. 114
CAPÍTULO V
5 - O SISTEMA EDUCACIONAL ................................................................................ 123
5. 1 A escola brasileira e o ensino da literatura .......................................................... 125
5. 2 As práticas de leitura escolar .............................................................................. 134
II PARTE
CAPÍTULO VI
6 - ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO .......................................................................... 143
6.1 Os Sistemas Legislativos e Econômicos............................................................... 144
6.2 O Circuito de Produção Material dos Textos........................................................ 153
6.3 O Circuito de Criação e Recepção ....................................................................... 160
6. 4 As instâncias discursivas e a atuação das instituições.......................................... 184
CAPÍTULO VII
7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 209
REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 213
APÊNDICES.................................................................................................................... 219
APÊNDICE A
NÚCLEOS DE AGENCIAMENTO LITERÁRIO E CONSULTORIA EDITORIAL NO BRASIL............ 220
APÊNDICE B
REPRESENTAÇÃO DO SISTEMA LITERÁRIO ....................................................................... 222
ANEXOS .......................................................................................................................... 224
ANEXO A
PUBLIQUE SEU LIVRO (EDITORA SCORTECCI) ................................................................... 225
ANEXO B
OS BENEFÍCIOS DOS DISTRIBUIDORES E LIVREIROS NO SISTEMA LITERÁRIO ....................... 227
ANEXO C
CURSOS DE EDITORAÇÃO NO BRASIL............................................................................... 229
ANEXO D
MAPA DE EDIÇÕES MONTEIRO LOBATO, 1934............................................................... 231
ANEXO E
ENTIDADES DO LIVRO ..................................................................................................... 233
ANEXO F
EXEMPLO DE “CONTRATO EDITORIAL NO SISTEMA MERCADOLÓGICO ............................. 236
ANEXO G
REVISTAS ESPECIALIZADAS DE LETRAS, LÍNGUAS, LINGÜÍSTICA E LITERATURA................ 238
ANEXO H
CALENDÁRIO DO LIVRO................................................................................................... 242
ANEXO I
LIVROS DIDÁTICOS PUBLICADOS NO PERÍODO DE 1890 A 1920 .......................................... 244
ANEXO J
PRÊMIOS LITERÁRIOS...................................................................................................... 246
ANEXO L
RESULTADO DAS NEGOCIAÇÕES DO PNLD/ 2005 ............................................................. 251
ANEXO M
RESENHA DO LIVRO PORTUGUÊS: LINGUAGENS PNLD/2005 ......................................... 253
ANEXO N
RESUMO DO LIVRO PORTUGUÊS: LINGUAGENS PNLD/ 2006.......................................... 259
ANEXO O
ESPECIFICAÇÃO DE CONTRATO - PNDL ........................................................................... 261
ANEXO P
AGRUPAMENTO DE GÊNEROS E PROGRESSÃO CURRICULAR ............................................... 264
ANEXO Q
EXEMPLO 2: OS LUSÍADAS ............................................................................................. 266
ANEXO R
ROTEIRO DE LEITURA...................................................................................................... 270
ANEXO S
EXEMPLO 2: QUENTAL X EÇA DE QUEIRÓS .................................................................... 274
ANEXO T
DADOS ESTATÍSTICOS DO LIVRO DIDÁTICO PORTUGUÊS: LINGUAGENS (2003)................... 280
ANEXO U
EXEMPLO DO LIVRO DIDÁTICO: TEXTO LITERÁRIO X TEXTO NÃO LITERÁRIO ...................... 282
13
INTRODUÇÃO
A concepção de literatura hoje é, simultaneamente, histórica, contraditória e
multifacetada. Ensina-se nas escolas uma literatura do passado, de autores mortos, de obras
consagradas pelos críticos, textos que o classificados em estilos e movimentos literários.
Por outro lado, tem-se literatura nas vitrines das livrarias, onde inúmeros gêneros são
permitidos: erótico, policial, futebolístico, entre outros. Seus autores estão vivíssimos,
comentando suas obras nas feiras de livros e bienais, em salas de bate-papo com os
internautas e, freqüentemente, fazendo dedicatórias e distribuindo autógrafos nos livros
adquiridos pelos leitores assíduos.
Alguns lêem por prazer, outros lêem como requisito obrigatório para o vestibular.
leitores que compram os livros, outros os emprestam das bibliotecas, alguns fotocopiam a
obra ou a possuem virtualmente em sites da Internet. Ao invés de se ler um livro, pode-se
“assisti-lo” no teatro, cinema ou televisão. Com alguns reais no bolso, é possível ter uma
adaptação de um grande clássico, em uma linguagem mais simples, rápida e barata.
Enquanto a maioria dos acadêmicos e estudiosos da área está entretida com novas
leituras, descobertas, interpretações possíveis nesta ou naquela linha teórica, algo com a
literatura e a sociedade acontece. Os estudos voltados à literatura pouco m atentado para
todo esse universo literário por detrás das letras universo este que tem modificado a própria
relação do leitor com o texto e o autor e que, paulatinamente, força os limites do literário.
Partindo da observação desses fatos, ou seja, da enorme gama de objetos que se tem
arrolado como literatura, esta pesquisa procura problematizar e atrair os olhares para a
complexidade do acontecimento literário, podendo, assim, contribuir, principalmente para os
debates em torno da concepção de literatura e da formação do leitor.
Nesse sentido, esta dissertação tem como objetivo principal apresentar a literatura
enquanto uma prática social específica e constituída por um complexo jogo de relações que se
constituem em um Sistema Literário. Tal sistema será discutido a partir das instâncias
essenciais que formatam os textos dando-lhes as proporções e o valor estético que os
14
chancelam como literatura, enfatizando-se o contexto histórico e social brasileiro.
Posteriormente, como forma de averiguar-se a pertinência deste referencial teórico, as idéias
fundamentais da teoria estudada serão articuladas através de análise do circuito de produção e
de consumo do livro didático.
A metodologia empregada é de caráter bibliográfico e se realizou por meio da leitura
de diversos textos de teoria, crítica e história literária. Para se exemplificarem as formas de
atuação e influência do sistema literário na formatação do conceito de literatura, utilizou-se o
livro didático de literatura
1
do Ensino Médio, Português: Linguagens (2003) de Cereja e
Magalhães, indicado pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNDL/ 2005)
2
.
Atualmente, no Brasil, são poucas as pesquisas e os autores que investigam a literatura
enquanto fato social, valendo-se dos fatores externos às obras literárias. Muitas das
abordagens sobre a literatura prendem-se mais enfaticamente a fatores relacionados ao texto e
mesmo as diversas correntes de crítica contemporâneas (teorias pós-estruturalistas,
desconstrucionistas, pós-colonialistas, feministas, estudos culturais, etc.) tendem a observar o
literário por diferentes recortes, sem, entretanto, considerar certos elementos externos ao
texto literário – que o circundam e que acabam por influenciá-lo também.
Sendo assim, esta pesquisa se justifica, pois pretende trabalhar com um recorte teórico
ainda pouco discutido, ou seja, uma abordagem sociológica da literatura nos moldes que se
passa a expor nesta dissertação. Tais pressupostos teóricos baseiam-se nos estudos de linha
sociológica, abordagem que possibilita um enfoque diferenciado sobre o fato literário,
propiciando uma compreensão mais abrangente sobre a construção do conceito de literatura.
Através de seu método rigoroso e adaptado ao contexto atual, a sociologia da literatura resgata
diversos elementos que influenciam direta ou indiretamente na vida literária, procurando
verificar o lugar ocupado pela literatura numa sociedade específica em um determinado
1
Deve-se destacar, aqui, que a escolha do livro didático de literatura deu-se em virtude de este material ser um
objeto mais presente no ambiente escolar, espaço social de bastante interesse desta pesquisadora. Entretanto, o
objeto escolhido para análise poderia ser outro qualquer relacionado com o sistema literário tal como: alguns
autores literários, a legislação relativa a livros (adaptados, traduzidos ou outro), alguma instituição fortemente
vinculada à seleção e disseminação do livro e da leitura, como exemplo a Fundação Nacional do Livro Infanto-
Juvenil ou outra, a própria crítica, etc.. Enfim, como se trata de um amplo e complexo sistema, haveria,
certamente, muitos outros aspectos que poderiam ser trabalhados como uma análise explicativa da teoria exposta
nesta dissertação, tendo-se optado, neste caso, pelo livro didático de literatura.
2
Dentre os nove livros didáticos de ensino de Língua Portuguesa e Literatura indicados pelo Catálogo do
Programa Nacional do Livro do Ensino Médio (2005), optou-se pelo livro didático Português: Linguagens de
Cereja e Magalhães, por conter em sua estrutura e propostas metodológicas aspectos tanto de uma literatura
tradicional, estudada a partir da historiografia literária, como de uma literatura na concepção moderna que
valoriza outras manifestações artísticas e culturais (popular, música, teatro, televisão). A maior parte do volume
deste livro didático é consagrado aos estudos literários e suas atividades visam à interação do aluno com o
contexto social. Enfim, em relação às resenhas críticas e de análise elaboradas dos nove livros indicados pelo
PNLEM, acredita-se que o livro Português:Linguagens enquadra-se melhor ao que se pretende exemplificar
segundo os estudos literários de visão sociológica.
15
momento histórico. Segundo Imbert (1971, p.117), “a sociologia literária estuda as formas da
acção recíproca entre todas as pessoas que intervêm no mundo da literatura” e observa as
condições materiais e as ideológicas envolvidas na constituição do literário.
Para discutir o jogo ideológico e de poder presentes na produção literária, este trabalho
apóia-se na crítica marxista, buscando não apenas analisar as condições históricas, mas
também compreendê-las:
A crítica marxista faz parte de um corpo mais amplo de análise teórica que
tem por objectivo a compreensão das ideologias – as idéias, valores e
sentimentos através dos quais os homens tomam consciência, em diversas
épocas, da sociedade em que vivem (EAGLETON, 1976, p. 11).
Eagleton (1976, p. 11) acrescenta ainda que “algumas dessas idéias, valores e
sentimentos nos são acessíveis na literatura”. A literatura tem conquistado seu espaço e
importância no embate das ciências sociais, exatamente devido à sua capacidade artística e
estética de proporcionar ao homem uma experiência com o mundo real através da leitura
ficcional.
A análise marxista, então, contribui para o estudo da história literária, analisando seu
passado e seu presente, fornecendo não uma história estática de fatos, mas uma história
dinâmica e inter-relacional: uma “história das lutas” entre dominante e dominado, para que se
identifiquem os meios de opressão e exploração. Dessa forma, compreendendo que a
literatura é parte do processo histórico da sociedade, pressupõe-se a luta de certos grupos
sociais em manter sua hegemonia através do controle e do julgamento das manifestações
artísticas e literárias.
No Brasil, o sociólogo e crítico literário Antonio Candido (1995, p. 242) ressalta a
importância de um panorama social e histórico nos estudos da literatura, que essa “aparece
claramente como manifestação universal de todos os homens em todos os tempos”. Assim,
todo homem está imerso de alguma forma no mundo ficcional, de fabulação ou devaneio,
como uma necessidade universal.
Segundo Candido (1995, p. 242), a literatura “é fator indispensável de humanização e,
sendo assim, confirma o homem na sua humanidade, inclusive porque atua em grande parte
no subconsciente e no inconsciente”. Para o crítico, a literatura possui, então, uma função
humanizadora e/ou alienadora que lhe permite ser um poderoso instrumento de educação e
instrução.
16
A afirmação de Candido justifica o fato de a literatura ser, em certos momentos,
controlada por uma elite detentora do poder, pois a literatura assume um papel político que
contribui para a formação de um leitor crítico e incita à reflexão e ao questionamento do
discurso ideologicamente dominante.
A literatura, como hoje é entendida, está intrinsecamente ligada à revolução burguesa
que desencadeou todo o processo de produção e distribuição do artefato literário, assim como
desenvolveu e incentivou os dispositivos necessários para a divulgação e acolhimento do
material artístico. Assim, a literatura concretiza-se no interior de uma prática social específica
de leitura e escrita de uma sociedade necessariamente formada aos moldes burgueses.
Segundo Lajolo e Zilberman (1991), dois aspectos próprios da literatura que a
tornam significativa em seu contexto: primeiro porque representa a sociedade, tematizando
seu processo de produção estética (interna à obra); segundo, porque o texto se abre para um
contexto cultural diverso inserido na produção da obra (externa à obra). Pressupondo,
portanto, esta relação externa da obra com a sociedade e seu contexto, abrem-se
possibilidades para uma reflexão em torno das propriedades que interferem e formatam a
concepção de literatura.
A concepção de literatura muda conforme o momento histórico e as correntes de
pensamento vigentes da época. Nomear a poesia e as produções artísticas em geral de
literatura, por exemplo, é uma prática recente. A denominação literatura originou-se da
palavra latina [littera], que significava toda escritura, erudição e conhecimento das letras
(MOISÉS, 1970):
Os critérios do que se considerava literatura eram, em outras palavras,
francamente ideológicos: os escritos que encerravam os valores e “gostos”
de uma determinada classe social eram considerados literatura, ao passo que
uma balada cantada nas ruas, um romance popular, e talvez até mesmo o
drama, não o eram. Nessa conjuntura histórica, portanto, o “conteúdo de
valor” do conceito de literatura era razoavelmente auto-evidente
(EAGLETON, 1997, p. 23).
Por relacionar-se com a forma escrita, considerava-se todo tipo de material impresso,
fosse ele filosófico, histórico ou científico, como sendo literário. Isso gerou questionamentos
sobre a verdadeira especificidade da literatura. Conseqüentemente, foi preciso que a teoria da
literatura, a crítica e a historiografia desenvolvessem suas técnicas e abordagens como uma
prática científica no campo das ciências humanas.
17
Assim, diversas correntes de teoria e crítica literária elaboraram conceitos e
investigaram o texto literário, considerando os elementos possíveis internos da obra.
Primeiramente, adotou-se a concepção clássica e aristotélica dos gêneros épico, lírico e
dramático. Porém, com o aparecimento do romance, este sistema se tornou insuficiente,
marcando uma nova fase para os estudos literários.
Distinguiu-se, então, a prosa do verso, compreendendo a tríade: romance, teatro e
poesia. Admitia-se o romance, pois este “se coadunava perfeitamente com o novo espírito
implantado em conseqüência do natural desgaste das estruturas sócio-culturais trazidas pela
Renascença” (MOISÉS, 1970, p. 164). O romance era a manifestação mais autêntica da
burguesia e de sua influência.
No século XX, inspirado pela nova lingüística de Saussure, Jakobson definiu a
literatura como uma linguagem poética, peculiar e diferente da linguagem cotidiana. Para os
formalistas russos, a linguagem literária possuía artifícios (desvios) que provocavam um
estranhamento, intensificando a experiência do leitor com o texto. Esse efeito, porém, o
poderia ser identificado e classificado, pois, a linguagem comum (cotidiana) diferenciava-se
segundo a utilização de determinados grupos sociais, podendo, assim, um elemento poético
ser ou não considerado um “desvio” para determinado grupo cultural lingüístico.
O estruturalismo, por sua vez, buscou teorizar um modelo fixo e configurado como
princípio de organização e/ou sistemas básicos, afastando de certa forma a relação com a
história e suas particularidades. Porém, o contexto também desperta o olhar para o mundo e a
compreensão da identidade do sujeito. Era preciso, portanto, equilibrar a análise de cunho
mais científico e a análise crítica que indaga a validade e a projeção da obra para a
experiência humana:
De fato, antes procurava-se mostrar que o valor e o significado de uma obra
dependiam de ela exprimir ou não certo aspecto da realidade, e que este
aspecto constituía o que ela tinha de essencial. Depois, chegou-se à posição
oposta, procurando-se mostrar que a matéria de uma obra é secundária, e que
a sua importância deriva das operações formais postas em jogo, conferindo-
lhe uma peculiaridade que a torna de fato independente de quaisquer
condicionamentos, sobretudo social, considerado inoperante como elemento
de compreensão (CANDIDO, 1967, p. 3- 4).
A Estética da Recepção, por outro lado, enfatiza o processo de leitura literária que
envolve o potencial artístico do autor revelado na obra e seu efeito estético obtido pela
atividade do leitor. O leitor participa da criação literária ao preencher os espaços vazios
sugeridos pelo autor. Tal interação torna cada leitura diferente e dinamizada, rompendo os
18
horizontes estabelecidos pelo conhecimento anterior do leitor e suas expectativas. Nesse
sentido, o texto possui um caráter dialógico, pois, instiga seu leitor a constituir novos sentidos
e, a partir deles, emancipar-se.
Com efeito, analisar os aspectos internos do texto, a tríade autor-obra-público,
contribuiu significantemente para a compreensão da literatura, porém, o fato de ignorar o
contexto em que esta era produzida tornou tais análises incompletas. Assim, diferente das
correntes estruturalistas e formalistas que optam em estudar a estrutura do texto literário, ou
da Estética da Recepção que prioriza, de certa maneira, o leitor, a sociologia da literatura
desenvolveu-se para analisar a idéia das trocas ou mediações entre os elementos envolvidos
no fato literário, atribuindo valor a todos esses fatores e instâncias que envolvem e efetivam
mediação entre o autor e o receptor da obra.
O escritor crítico Robert Escarpit formula, na década de 50, os conceitos fundamentais
que demarcam a corrente teórica da Sociologia da Literatura. Em sua obra Sociologie de la
littérature, publicada em 1958, o autor afirma:
Todo fato literário pressupõe escritores, livros e leitores ou, de uma maneira
geral, criadores, obras e um público. Constitui um circuito de trocas que, por
meio de um sistema de transmissão extremamente complexo, dizendo
respeito ao mesmo tempo à arte, à tecnologia e ao comércio, une indivíduos
bem definidos (aliás sempre bastante conhecidos) numa coletividade mais ou
menos anônima (mas limitada) (ESCARPIT, 1969, p. 9).
Na afirmação de Escarpit, pode-se entender que o fato literário constitui-se também de
elementos que se interpõem na relação autor-obra-público, possibilitando um “circuito de
trocas” próprio e específico num contexto capitalista.
O “circuito de trocas” diz respeito tanto às vias pelas quais o texto percorre até que
seja materializado, como aquelas trocas ideológicas e sociais presentes na constituição do
literário.
Desse modo, como afirma Escarpit (1969), a literatura depende de um sistema
complexo de relações que envolvem o valor estético e artístico de um determinado texto, da
tecnologia que promoverá a produção material desse texto e do comércio que é responsável
pela circulação do objeto literário. Tal esfera de “negociações” une indivíduos bem definidos:
os autores, os editores, os livreiros, os distribuidores, os agentes literários e publicitários, os
diversos públicos possíveis e reais, os críticos, os professores, e outros.
Ao concordar que a tríade constitui um “circuito de trocas”, o autor questiona a
concepção tradicional de literatura, descarta a idéia passiva do leitor como um simples
19
receptor, tornando, assim, os componentes da tríade igualmente significativos e ainda
incorpora uma função ao livro: meio de troca cultural e suporte físico materializado pela ação
da indústria, das tecnologias e do mercado.
Para Escarpit (1969), o escritor assume uma posição social que refletirá em sua escrita,
tornando-se não espelho do coletivo, mas também um intérprete da realidade que vivencia.
O leitor, como parte do sistema de comunicação, encontra-se igualmente influenciado pelos
valores sociais e ideológicos de seu meio, contexto e época. A obra, por sua vez, obedece às
normas impostas pelo grupo social dominante, como exemplo, o traço lingüístico padrão,
termos e experiências ligadas à realidade comum, para que seu sistema simbólico seja
expressivo e significativo ao seu leitor.
Escarpit (1969) acrescenta que o fato literário pressupõe, além dos três elementos
elencados anteriormente, os sistemas de produção, distribuição e consumo dos livros. Este
circuito envolve elementos que o desde as tecnologias utilizadas para sua fabricação, até as
relações sociais e institucionais de seu processo de circulação e comercialização.
Os sistemas de produção-distribuição-comercialização se inserem numa relação
orgânica que interfere na noção de literatura, uma vez que o livro passa a ser concebido como
“um produto manufacturado, distribuído comercialmente e portanto sujeito à lei da oferta e da
procura” (ESCARPIT, 1969, p. 11), sendo seus leitores considerados consumidores.
Tal relação concretizou-se a partir da descoberta da imprensa. A invenção da imprensa
de Guthemberg, no século XV, rompeu com os privilégios de uma minoria formada
predominantemente pelo clero e a pequena aristocracia, suscitando, assim, a ascensão da
burguesia na economia e na política e a democratização da cultura. Foi, especialmente, com a
criação da máquina a vapor, durante a Revolução Industrial que “a tipografia deixou de ser
um ofício artesanal, para alinhar-se ao modelo em curso da produção anônima e em série, raiz
da massificação” (ZILBERMAN, 2001, p. 31).
O novo contexto trouxe contribuições para as práticas de leitura, já que os textos
passaram a ter maior circulação, provocando, assim, um aumento do grau de letramento dos
leitores e, conseqüentemente, um maior investimento tecnológico que impulsionou, de vez, a
produção de materiais, mobilizando o mercado livreiro.
Nessa direção, Lajolo e Zilberman (1991, p. 9) consideram a literatura como objeto
social e argumentam que “a literatura enquanto prática social e específica de escrita e leitura”
supõe a existência “de um texto que recebe o atributo de literário”, ou seja, o aspecto de
literariedade de um texto o reside em sua própria fatura, mas em negociações de sentido
20
entre várias instâncias que acabam por produzir ou criar o sentido de literário para certos
textos.
Conseqüentemente, gera-se um “intercâmbio entre diferentes esferas, instâncias,
formações, tecnologias, saberes, instituições e projetos que integram e delimitam o campo
onde um texto se literaliza ou desliteraliza” (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p. 9). A
atribuição de literário, então, constitui-se durante o processo de produção-distribuição-
circulação da obra, dependendo, portanto, das instâncias que se interpõem na inter-relação
entre o autor, a obra e o público.
Nesse ponto, para melhor esclarecer a articulação e os mecanismos de funcionamento
do sistema literário, esta dissertação discute, em sua primeira parte, as cinco principais
instâncias responsáveis pela formatação da concepção da literatura, como se apresenta a
seguir.
O primeiro capítulo analisa o circuito da criação e recepção do texto literário, partindo
do pressuposto da tradicional tríade: autor-obra-leitor. Nesse, a pesquisa procura discutir a
posição social do autor, enquanto criador da obra literária e profissional das letras; e analisa a
constituição do público leitor e seus diferentes gostos. Em seguida, o texto enfatiza a
formação do público leitor e a manifestação dos escritores no Brasil, observando como a
literatura foi se configurando desde o período colonial até os dias de hoje.
A segunda instância estudada a da produção material dos textos - é apresentada no
segundo capítulo e demarca-se pela descoberta e evolução das técnicas de impressão. O
surgimento dos primeiros prelos e seu posterior desenvolvimento levou à padronização e à
produção em série de materiais de leitura, surgindo, assim, um novo espaço para a indústria,
dentro do que se costumou chamar a “era do livro” e da democratização da leitura.
Relacionada diretamente à instância anterior, nesse mesmo circuito, tem-se a
regulamentação legislativa própria e específica criada para um melhor funcionamento das
diversas etapas em que o objeto literário está sujeito dentro do processo econômico e judicial.
Assim, o terceiro capítulo, intitulado Os sistemas legislativos e econômicos, discute a questão
dos direitos autorais e editoriais, uma vez que o livro é um produto manufaturado que gera
lucros e possui também valor cultural regulado por leis e normas específicas.
A quarta instância, essencial para a realização da literatura como prática social, refere-
se à existência de práticas discursivas coesas e autônomas que possam legitimar e validar os
textos produzidos no circuito literário, tal como se discute no quarto capítulo. Esse discurso
enraíza valores na sociedade, definindo e universalizando um certo “gosto literário” e sua
aceitação que podem variar diacronicamente.
21
Finalmente, a formação de um público real foi possível devido à existência de
políticas educacionais elaboradas no seio da sociedade burguesa, com a finalidade de difundir
a escrita e a leitura, e formar o público-leitor. Como a sociedade burguesa é caracterizada pela
industrialização, as habilidades lingüísticas e o nível de letramento dos indivíduos
necessitavam cada vez mais atender às demandas capitalistas, tema discutido no quinto
capítulo da pesquisa.
Como se pode perceber, a concepção de literatura é, notadamente, construída por uma
rede de elementos que se inter-cruzam e moldam conceitos conforme os valores vigentes do
contexto sócio histórico. E nesta direção que se pode apontar, novamente, os objetivos desta
dissertação que procura, neste momento, desvendar e ampliar o olhar sobre a literatura – ver o
que além do autor, do texto e do leitor, e observar as vozes que cercam o fato literário.
Como afirma Escarpit (1969, p. 213), “[...] é preciso desmistificar a literatura, libertá-la dos
seus tabos sociais, penetrando no segredo da sua potencialidade”.
22
I PARTE
23
CAPÍTULO I
1 - O CIRCUITO DE CRIAÇÃO E RECEPÇÃO
Para que se possa ver “além do autor, do texto e do leitor”, é preciso deter o olhar
sobre esses três elementos fundamentais e indissolúveis e observar suas particularidades e
dimensões. A inexistência de qualquer um dos elementos da tríade autor-texto-leitor impede
que se ocorra um evento literário. Em outras palavras, pode-se dizer que a literatura existe
a partir da relação efetiva entre esses três componentes.
Desse modo, entender o circuito de criação e recepção dos textos literários, no
presente trabalho, significa construir as bases e as motivações pelas quais as demais instâncias
e instituições interagem, compondo o Sistema Literário.
1.1 O autor
A questão do autor foi demasiadamente abordada pela tradição dos estudos literários.
Acreditava-se que o sentido mais profundo do texto era o sentido que o autor lhe dava. Assim,
a intenção do autor era “o critério pedagógico ou acadêmico tradicional para estabelecer-se o
sentido literário” (COMPAGNON, 1999, p. 49).
A compreensão do texto, então, dependeria de um esforço específico que implicaria no
resgate da biografia do autor, de elementos da psicologia e da autocrítica, eliminando,
conseqüentemente, qualquer tentativa de interpretação ou crítica do texto pelo leitor. Ou seja,
haveria uma única leitura possível do texto, a saber, a intencionada pelo autor determinante
da obra literária.
24
Para Compagnon (1999, p. 49), “se o sentido é intencional, objetivo, histórico, não
mais necessidade nem da crítica”, nem da teoria da literatura. Deduz-se a partir da afirmação
que ao encontrar “o” sentido do texto, esse esgotaria por si só a sua leitura.
a crítica moderna posiciona-se contrariamente afirmando que a função do autor é
uma construção histórica e ideológica. Assim, a nova crítica anuncia a “morte do autor”
3
,
permitindo ao texto uma certa polissemia, ao leitor, a liberdade de interpretação e à crítica,
espaço e sentido para seus comentários e estudos.
A sociologia da literatura, por sua vez, interessa-se por todos os “índices de interação
entre todos os indivíduos que intervêm, directa ou indirectamente, na vida literária”
(IMBERT, 1971, p. 26). Isso inclui o lugar que o escritor ocupa em relação à sua obra, seu
público e contexto social e histórico.
Sendo assim, para os estudos sociológicos, o escritor está inserido num contexto social
específico, fazendo com que sua obra de arte seja expressão dessa realidade.
A literatura é uma produção social porque é elaborada por alguém que ocupa um lugar
definido na sociedade e dirige-se para um leitor igualmente constituído na, pela e para a
sociedade.
Segundo Jobim e Souza, a literatura:
[...] é uma produção social devido, entre outros, aos seguintes fatores: 1- a
língua que utiliza; 2- os temas de que trata; 3- os criadores e o momento da
criação; 4- os recursos artísticos disponíveis; 5- o ato da leitura (JOBIM;
SOUZA, 1987, p.17).
A afirmação acima remete às situações relacionadas ao posicionamento social do autor
e aos fatores internos e externos ao ato criador que o influenciam e encontram ressonância em
algum ponto nos estudos literários.
A língua, por exemplo, é a principal marca de identificação de uma determinada
sociedade (ou nacionalidade). Através do traço lingüístico, toda gama de discursos e trocas
sociais se torna possível. No caso da literatura, a caracterização da própria linguagem poética
se constitui na organização criativa dos signos, provocando, assim, o efeito estético e
apreciativo da obra.
3
A expressão morte do autor” ficou conhecida devido à publicação de um artigo de Roland Barthes, em 1968,
intitulado La Mort de l’Auteur. Um ano mais tarde, Foucault apresenta a mesma idéia em uma conferência
intitulada Qu’Est-ce qu’un Auteur?. Assim, a morte do autor, slogan anti-humanista, fundamentou os conceitos
da nova crítica em contraposição a noção tradicional da intenção do autor.
25
A língua, como marca oral de um grupo específico, pode ser representada, de forma
gráfica, na escrita. A capacidade de representar o mundo por meio da escrita constitui-se sinal
de hegemonia e poder de determinado grupo, que luta para manter sua cultura e história
através dos tempos. Portanto, a função de escritor já supõe sua integração num sistema
fechado e, de certa forma, dominante sobre as demais culturas. Ou seja, a disposição do autor
em produzir uma obra em determinada língua o posiciona como integrante da respectiva
cultura, assim como as escolhas das palavras o posiciona ideológica e politicamente em sua
época.
A literatura se difere de outras formas artísticas, como a pintura, escultura ou dança,
porque se configura na palavra, e não em objetos concretos como uma escultura em mármore
ou uma pintura a guache. É a palavra, a língua e seu significante, que marca o discurso,
resultado da racionalidade do ser humano. É, portanto, a palavra, sobretudo a impressa, que
conserva e determina o que é literatura a um público leitor, conforme o contexto histórico.
Os temas tratados na literatura também são inspirados pelo contexto social real em que
vive o autor. Assim, cabe ao autor selecionar e reinterpretar o universo histórico e social que o
rodeia.
Muitas vezes, os conflitos narrados de uma situação comum da vida cotidiana podem
revelar, no universo microcosmo, uma situação do macrocosmo, ou seja, a representação de
um conflito mundial generalizado
4
. Como afirma Lajolo (2001, p. 47), [...] embora
comprometida com o mundo do possível e não com o mundo do real, a criação literária nasce
de uma imaginação ancorada na realidade”.
E ainda, como indica róme Roger (2002, p. 124): “É certo que toda grande obra
implica uma visão crítica da sociedade uma vez que procede de um imaginário e de um
inconsciente individual”.
Porém, a intenção exacerbada do autor em expressar uma posição diante da realidade
resulta numa literatura engajada. Para Candido (1995, p. 250), “uma mensagem ética, política,
religiosa ou mais geralmente social, só tem eficiência quando for reduzida à estrutura literária,
à forma ordenadora”. Ou seja, o efeito da gratuidade deve sobressair a qualquer intenção
ideológica ou política de convencimento.
casos, segundo Candido (1995, p. 256), em que a temática da literatura: “[...] pode
ser um instrumento consciente de desmascaramento, pelo fato de focalizar as situações de
4
A discussão entre um homem e uma mulher, por exemplo, pode remeter a uma relação de dominante versus
dominado, o que, por sua vez, poderia ser relacionado com diferentes situações de conflito, como por exemplo,
as disputas entre EUA e Irã ou até mesmo, questões de gênero.
26
restrição dos direitos, ou de negação deles, como a miséria, a servidão, a mutilação
espiritual”.
Por outro lado, abordagens temáticas de valor universal, como por exemplo: o
amor, a morte, as viagens; sentimentos ou situações comuns à vivência do homem em todos
os tempos
5
.
Em todos os casos, a literatura tem auxiliado na (re)organização da sociedade, pois a
leitura ficcional, ao mesmo tempo imita padrões, reflete o comportamento e constituição
social, e propõe reflexões críticas acerca do real, podendo promover, sobretudo, mudanças e
reajustes na visão de mundo do indivíduo.
Os três últimos fatores citados por Jobim e Souza (1987), que justificam o caráter
social da literatura, os criadores e o momento da criação, os recursos artísticos disponíveis e
o ato da leitura, correspondem, mais enfaticamente, à proposta sociológica de análise
literária.
Antes que a literatura receba um aparato material para que chegue às mãos do leitor,
ou seja, antes que haja uma produção material, a literatura é produzida por um indivíduo o
autor, que escreve na intenção de ser lido. Cada autor investe em sua obra determinado
tempo, segundo as disposições internas e condições externas impostas pelo seu contexto.
Após a finalização de sua escrita, o autor deverá providenciar os meios e contatos editoriais
necessários para que sua obra seja publicada e alcance seu objetivo, o público leitor:
Enquanto projeto e trabalho do escritor, o livro espronto quando seu autor
assim o considera e o libera para ser publicado, para ser lido pelos leitores
que o concretizarão como obra de arte, como obra de linguagem
(PIACENTINI, 1991, p. 48).
As relações da literatura com os modos de produção, característica própria da
atualidade, desmistificaram a idéia de que o escritor é um ser marginal e isolado da vida
social, como se sua obra fosse resultado apenas de sua genialidade e dom.
Segundo Piacentini (1991), o aparecimento do escritor como uma categoria social,
provido, portanto, das implicações de ordem econômica e política, só se concretizou no século
XVIII, e tudo graças às condições propícias, como o desenvolvimento da impressão, da
indústria cultural e a presença suficiente de um público leitor, capaz de mobilizar, através do
comércio, as tiragens dos livros publicados pela indústria livreira.
5
Para alguns teóricos e críticos literários, muitos dos chamados clássicos expressam tais temas de forma
relevante para o espírito humano, fazendo com que os leitores, em todos os tempos, se apropriem e se
identifiquem com a obra em questão.
27
O papel do autor, porém, não é tão simples como parece. Segundo Escarpit:
Ele [o escritor] apenas adquire essa significação, apenas se define como
escritor após o momento em que um observador colocado ao nível do
público seja capaz de o sentir como tal. Só se é escritor em relação a alguém
e aos olhos de alguém (ESCARPIT, 1969, p. 52).
O encontro entre o autor e o leitor depende dos recursos materiais que permitirão a
concretização do texto, para que o leitor possa desfrutar da leitura. Para Escarpit (1969),
considerar um escritor como um simples “produtor de palavras” não consiste em qualquer
significado literário. Assim como a obra, o escritor também depende da relação e da
observação de um leitor. Ou seja, o escritor depende tanto da produção material quanto do
leitor, para que seja reconhecido como escritor.
É para defender tal princípio que Antonio Candido, em sua obra Literatura e
sociedade (1967), afirma que a criação literária deve ser considerada a partir da posição social
do escritor e da formação do público.
A posição do escritor é determinada, em primeiro lugar, pela concepção que o próprio
escritor tem de si mesmo, e em segundo, pelo conceito que o público formaa seu respeito,
após a leitura da obra literária.
Convém observar aqui que a posição geográfica do escritor pode determinar
perfeitamente o seu reconhecimento diante do social. Isso porque em todo mundo o sistema
hierárquico de poder funciona até mesmo nas questões de nacionalidade. Pode-se notar que os
escritores europeus ou norte-americanos são mais prestigiados no Brasil do que os próprios
autores brasileiros ou um africano, por exemplo. Considerando a extensão geográfica do
Brasil, conclui-se que os escritores das grandes capitais como São Paulo e Rio de Janeiro se
destacam em relação as outras cidades e estados
6
.
Dentre as concepções e motivações que o escritor formulará acerca de si mesmo,
encontram-se os fatores como a inspiração, vocação, senso de missão e, principalmente, a
responsabilidade profissional.
A profissionalização do escritor é um ponto delicado no circuito de produção e
recepção. Esse fenômeno no meio literário revolucionou as relações econômicas entre o
escritor e a sociedade, supondo, assim, problemas de financiamento (autofinanciamento e o
mecenato), aumentando o número de escritores e outros agentes envolvidos (editores,
6
Exceto no caso do estado do Rio Grande do Sul, que tem uma política diferenciada que procura valorizar suas
publicações locais, a fim de definir e defender sua própria cultura e ideologia. Tal pensamento relaciona-se com
seus ideais separatistas e políticos.
28
ilustradores, comentaristas, etc.). Tornaram-se comuns as obras feitas por encomenda a
pedido das editoras ou para agradar a um público já definido, evidenciando as técnicas de
escrita, esquemas e estruturas textuais. Apurou-se a questão da legislação, dos direitos
autorais e editorias dentro de um contexto da indústria livreira.
É claro que a remuneração do escritor já era observada na antiguidade através do
mecenato, porém, o contexto moderno, devido ao sistema capitalista e industrial, intensificou
tais relações, tornando-as comuns e totalmente necessárias no evento literário:
Não é indiferente à compreensão dos homens que escrever seja, actualmente,
uma profissão ou pelo menos uma actividade lucrativa que se exerce num
quadro de sistemas econômicos, cuja influência sobre a criação é inegável
(ESCARPIT, 1969, p. 11).
Como a afirmação de Escarpit mostra, a obra literária, hoje, é uma mercadoria, pois
faz parte de todo um sistema de produção industrial que gera capital às diversas instâncias
envolvidas na produção do livro. Dentre essas, encontra-se o escritor, o qual muitas vezes é
remunerado pelas editoras em razão de um texto publicado ou até mesmo “encomendado”
para suprir as necessidades específicas de um público já formado.
Segundo Wellershoff (1970, p. 44), a obra literária é uma mercadoria que o escritor
vende ao editor, o editor ao livreiro, o livreiro ao público”. Esse circuito lucrativo, porém, é
considerado diversas vezes como natural e periférico à própria formulação de conceitos de
literatura, o que equivale a dizer que nem sempre ao se analisar os conceitos de literatura, o
levados em conta outros fatores de ordem social que sobre eles atuam. A troca cultural, no
entanto, caracteriza a literatura moderna e influencia significativamente na concepção que se
forma sobre a literatura, uma vez que a obra depende da interação dos circuitos para que
chegue ao leitor.
A princípio, esse novo contexto proporcionou ao escritor certa liberdade: ele deixou de
viver sob tutela de uma nobreza que ditava as regras e o conteúdo (de exaltação e elogios aos
governantes) e ainda, fornecia ao escritor as condições necessárias de sobrevivência. Agora, o
escritor conta com um grande número de leitores, o público burguês:
[...] é o escritor que passa agora a ser a sua própria instância única e decisiva,
a fazer as suas leis; do mesmo modo já se lhe não põem quaisquer conteúdos
ou formas obrigatórias mas é a sua experiência íntima, a sua subjetividade
que decide (WELLERSHOFF, 1970, p. 45).
29
Há, porém, uma conflituosa contradição entre a arte e o mercado. A percepção dessa
realidade fez com que vários escritores se lançassem à boêmia ou à crítica da sociedade
burguesa, enquanto que outros se esforçavam para se adaptar e corresponder às necessidades
do público leitor.
As ações e iniciativas do mercado, hoje, o tão intensas quanto à promoção da arte.
Um exemplo disso é a criação de escolas próprias para formação de escritores. Essas escolas
buscam aperfeiçoar os talentos literários do indivíduo, assim como sua capacidade criadora,
sua argumentação e crítica, seu senso estético e conteúdo literário.
Iniciativas como essas devem ser sempre avaliadas e discutidas, pois esse tipo de
abertura para formação profissional credenciada por entidades do saber, como escola,
universidade, cursos de capacitação e outros, tendem a se tornar práticas obrigatórias e
essenciais para a execução de determinada função, neste caso, de escritor “profissional”. Não
seria estranho, levando em consideração o contexto capitalista burguês, se para ser um escritor
ou publicar um livro fosse antes necessário portar um título ou diploma que o autorize sê-lo.
Por outro lado, as indústrias gráficas têm proporcionado maior acesso ao público leigo,
sendo possível, inclusive, qualquer indivíduo publicar seu próprio livro (desde que pague para
isso)
7
.
As influências sociais exercidas sobre o autor, como se pode observar, partem do
plano econômico: as necessidades de publicação e circulação da obra para que seja
reconhecido e remunerado pelo seu trabalho; plano histórico, uma vez que o escritor está
imerso na atividade social através da família, escola, geografia, leituras, formação
profissional, política, relacionamentos e outros; e plano de sua criação, através da opinião do
público a que se dirige a obra, da crítica e instituições de reconhecimento do valor literário da
sua obra. À medida que o público se reconhece na obra, o escritor assume seu posicionamento
diante da sociedade.
Sendo assim, o escritor está condicionado pelo contexto e sociedade, refletindo-a,
exprimindo-a e procurando transformá-la (TADIÉ, 1992). A fim de concluir sua função de
escritor-autor, esse submete sua obra à contemplação do público-leitor que “supostamente”
encerrará o circuito, atribuindo um sentido à produção gerada no pólo do autor. O seguinte
tópico abordará as concepções e formações dos tais públicos de leitores.
7
Cf. Anexo A.
30
1.2 Os públicos
A POSSÍVEIS LEITORES
Este livro é como um livro qualquer.
Mas eu ficaria contente se fosse lido apenas
por pessoas de alma já formada.
Aquelas que sabem que a aproximação,
do que quer que seja, se faz gradualmente
e penosamente – atravessando inclusive
o oposto daquilo que se vai aproximar.
Aquelas pessoas que, só elas,
entenderão bem devagar que este livro
nada tira de ninguém.
A mim, por exemplo, o personagem G.H.
foi dando pouco a pouco uma alegria difícil;
mas chama-se alegria.
8
Clarice Lispector expressa, nessa introdução do seu romance A paixão segundo G.H.,
o desejo de como autora alcançar seu público ideal: “pessoas de alma já formada”. Da mesma
forma, cada escritor, ao realizar sua obra, imagina um leitor ideal. “Por outras palavras”,
como explica Escarpit (1969, p. 165), “existe um público interlocutor na própria origem da
criação literária”.
É importante frisar, porém, que dificilmente o público real, aquele a quem se dirige à
obra publicada, corresponde ao leitor ideal projetado pelo autor. A leitura do romance de
Lispector sugerida para uma prova de vestibular, por exemplo, poderá encontrar um público
numeroso de leitores. Entre esses leitores, encontrar-se-ão aqueles que lêem efetivamente a
obra como literatura, tirando dela experiências estéticas, e outros que apenas a lêem
tecnicamente (decodificando) a fim de memorizar possíveis registros pertinentes às questões
da prova.
Segundo Escarpit (1969, p. 39), “uma definição rigorosa da literatura supõe uma
convergência de intenções entre o leitor e o autor. Uma definição mais ampla exige, pelo
menos uma compatibilidade de intenções”.
O autor explica, na citação acima, que, de certa forma, as intenções originárias do
autor deveriam corresponder às intenções supostas pelo público. Para isso, a obra deverá,
primeiramente, vencer a fronteira da língua e encontrar um público alfabetizado, capaz de
compreender a linguagem utilizada pelo autor.
8
LISPECTOR, Clarice, 1925 -1977. A paixão segundo G.H. : romance/ Clarice Lispector. – Rio de Janeiro:
Rocco, 1998.
31
Todavia, leituras e leituras. Segundo Aguiar (2004), é possível observar algumas
fases de desenvolvimento na formação do leitor: a pré-leitura (mais visual e de poucas
palavras); a leitura compreensiva (decifração, leitura fácil e com fantasia); leitura
interpretativa (fantasia e capacidades de enumerar, classificar, ordenar e interpretar idéias do
texto); iniciação a leitura crítica (prefere aventuras e posiciona-se frente aos referenciais
éticos, morais e sociais) e a leitura crítica (sensível à estética da obra, critica, compara idéias,
observa as intertextualidades, conclui, constrói, reflete e busca soluções).
Respeitando a limitação de cada idade ou fase de aprendizagem do leitor, a leitura
literária ideal pressupõe um leitor crítico que estabeleça uma mediação entre a leitura
apreendida e o contexto social que vivencia:
Se um texto, quando trabalhado, não proporcionar o salto do leitor para o seu
contexto (isto é, para a intencionalidade social que determinou o objetivo, o
conteúdo e o modo de construção do texto), e mais, se o contexto do texto
lido não proporcionar uma compreensão mais profunda do contexto em que
o sujeito-leitor se situa ou busca se situar, então a leitura perde a sua
validade (SILVA, 1988, p.5).
Como, porém, distinguir os tipos de leitor e observar os possíveis públicos de uma
obra?
A princípio tentou-se rastrear a quantidade e a qualidade do público através do
consumo de livros e da efetiva leitura dos textos. Entretanto, nem sempre o consumo material,
ou seja, a compra de um livro, corresponde à sua leitura; assim como a não posse do livro não
indica, necessariamente, a ausência de leitura.
Fato semelhante, aliás, acontece também com os níveis de leitura: a leitura de um texto
pode não corresponder a uma leitura literária, aquela que, como foi visto, busca o prazer, a
gratuidade e a crítica à realidade.
Nesse sentido, Chartier (1994, p. 13) defende a idéia de que: “[...] contrastes,
igualmente, entre as normas e as convenções de leitura que definem, para cada comunidade de
leitores, os usos legítimos do livro, as maneiras de ler, os instrumentos e procedimentos da
interpretação”.
Entende-se que além de os leitores se diferenciarem entre si, devido às disposições das
ferramentas intelectuais, eles não possuem a mesma vivência e intimidade com o escrito. Isso
significa que os fatores externos como o social, cultural e histórico, interferem
significativamente nos modos de leitura.
32
Nesse sentido, Escarpit (1969) explica que cada grupo social possui necessidades
culturais diversas e diferentes entre si e, portanto, tem um gosto literário único e uma
literatura própria correspondente à sua formação cultural. Esses grupos sociais podem ser
identificados (teoricamente) pelo sexo, idade, classe social e outros fatores históricos. Porém,
o grupo social mais visível e definido, neste contexto de leitura, é o grupo cultural, pois possui
uma identidade literária. Escarpit identifica dois grandes blocos pertencentes ao grupo
cultural: o grupo de letrados e o grupo popular.
Segundo Escarpit, o público do grupo letrado pode ser constituído por pessoas que:
[...] receberam uma formação intelectual e uma educação estética
suficientemente aperfeiçoada para lhes permitir emitirem um juízo literário
pessoal, tendo tempo para ler e dispondo de recursos que permitam a compra
de livros (ESCARPIT, 1969, p. 125).
Nessa concepção, um tanto “idealizada”, está incutida um certo jogo de poder –
econômico e intelectual o qual implicaria, sem sombra de dúvidas, os aspectos e o contexto
proporcionado pela classe burguesa. Como afirma Escarpit (1969, p. 125), “a categoria dos
‘letrados’ está na origem da própria noção de literatura”. Não é de se estranhar que a maioria
dos escritores faz parte do próprio grupo letrado, de uma elite cultural
9
.
Assim, o grupo de letrados disponibiliza todos os indivíduos necessários para que se
concretize o fato literário, ou seja, é do grupo de letrados que se formam os críticos, editores,
os escritores e os leitores. Coincidentemente, são os sujeitos pertencentes a esse grupo que
monopolizam o capital para produção, circulação e divulgação de seu próprio meio literário.
Evidentemente, é o público de letrados que influencia, mais enfaticamente, as escolhas
do autor. Segundo Escarpit (1969, p. 168), os letrados se subdividem em “grupos sociais,
raciais, religiosos, profissionais, geográficos, históricos, em escolas de pensamento, em
capelas”. No interior de cada subgrupo idéias em comum, crenças e juízos de valor. Tais
concepções são manifestas em certos usos de linguagem (nível lingüístico), interesses
temáticos, preferências de gêneros e outros. A partir desses referenciais definidos pelo
público, o autor move-se em busca de satisfazer as necessidades do leitor e corresponder às
intenções (autor e leitor). Afinal, a coincidência de intenções entre o autor e o público é que
garante o sucesso literário da obra.
9
Escarpit (1969, p. 57) afirma que: “Há uma população de escritores que corresponde ao público ‘letrado’, é a
que nós conhecemos melhor e que nos revela o índice do manual de literatura [...]”. ou seja, tal grupo de
escritores pertence ao grupo de letrados e constitue o que se pode chamar de manual (história, teoria e crítica) de
literatura.
33
Porém, além desses conhecidos nomes, autores consagrados pelos livros escolares e
prateleiras de bibliotecas e livrarias, existem outros fenômenos literários circulando fora
desses “circuitos fechados”:
Os excluídos da tradição mais conservadora dos estudos literários têm agora
seus livros e seus cursos. E quase que sua academia. Nem sempre, no
entanto, com o mesmo prestígio, quase nunca com o mesmo capital
(LAJOLO, 2001, p. 110).
Esses “excluídos da tradição”, como ironiza Lajolo, correspondem ao grupo popular,
segundo a definição de Escarpit (1969). O grupo popular tem suas próprias necessidades
artísticas e literárias, manifesta-se culturalmente, com o mesmo grau de importância e valor
do grupo letrado. No entanto, o grupo popular não conta com os recursos financeiros
necessários para movimentação de mercado de trocas e, por isso não se encontra apto a entrar
no “jogo literário”
10
.
As instâncias direcionadas a esse público (popular) têm aparecido e se especializado,
apesar do gosto literário ainda ser um tanto intuitivo e sem emissão de julgamento de valor.
Hoje, tem-se, por exemplo, literatura para crianças e jovens, mulheres, negros, homossexuais,
índios, imigrantes, de caráter policial, científico, esotérico, auto-ajuda, religioso, de
reportagem, crônicas, e outros (LAJOLO, 2001). Cada uma destas literaturas possui o seu
sistema de troca particular, mas, embora existam revistas femininas, livrarias para crianças e
bibliotecas operárias, é necessário que cada uma disponha de instituições próprias”
(ESCARPIT, 1969, p. 124).
Talvez a literatura representativa do circuito letrado funciona efetivamente porque
conta com um público-leitor especializado que contribui na formação de opiniões acerca das
obras:
O crítico pertence ao mesmo meio social do leitor do circuito letrado, tem a
mesma formação. Apresenta-nos uma variedade de opiniões políticas,
religiosas, estéticas e uma diversidade de temperamentos semelhantes às que
nos são dadas pelo leitor (ESCARPIT, 1969, p. 138).
10
O termo “jogo literário” usado por Escarpit (1969, p. 127) remete-se ao jogo comercial, mercadológico e
ideológico que envolve o fato literário, se observado sob a ótica da classe burguesa capitalista tal como se
propõe esta pesquisa.
34
O crítico enquanto leitor passa pela experiência estética da gratuidade, simpatizando
ou o com a obra. Porém, este não deixa de, ao mesmo tempo, examinar a obra a fim de
elaborar um juízo crítico, baseando-se, principalmente, em seus conhecimentos literários.
Nesse contexto, Imbert (1971) chama a atenção para o fato do próprio escritor
constituir-se como o primeiro leitor de sua própria obra. Isso se por meio da autocrítica,
quando o autor desdobra-se num eu que produz e exprime um sentimento e num outro eu que
consome e vivencia uma experiência parecida, ou seja, a intencionada pelo autor, realizando
assim, o mesmo circuito social característico da literatura.
Como exemplo, na pesquisa elaborada por Piacentini (1991), a partir de depoimento
de vários escritores, especificamente, acerca da relação autor-leitor, Moacyr Scliar responde o
seguinte:
Todo escritor escreve para leitores. Meu primeiro leitor sou eu mesmo;
mostro meu trabalho para outras pessoas, mas na realidade, nenhuma me diz
algo que eu não sabia e que muitas vezes estou querendo negar
(especialmente quando o texto é ruim) (SCLIAR 1991 apud PIACENTINI,
1991, p. 91).
outros fatores que podem determinar certos públicos, como exemplo, a própria
materialidade do livro (suporte literário). Nessa perspectiva, Chartier explica que a o
material utilizado na concretização do livro pode influenciar nas expectativas dos leitores.
“Estas [formas materiais que o texto suporta], todavia, contribuem largamente para modelar
as expectativas do leitor, além de convidar à participação de outros públicos e incitar novos
usos” (CHARTIER, 1994, p. 18).
Uma nova edição de uma obra pode se direcionar a um novo público pelo simples fato
das escolhas materiais (papel, ilustração, cores), pois essas providências tendem a diminuir o
custo, tornando o livro acessível à camada mais popular da sociedade
11
.
A tentativa de delimitar a esfera dos públicos é generosamente comprometedora, uma
vez que os públicos estão em constante movimento. Esses podem se configurar de várias
maneiras, correspondendo ou o às expectativas do autor
12
. O público, ainda, pode
transcender o contexto histórico e social da obra ou do escritor: muitos escritores, por
exemplo, foram considerados após sua morte ou em determinados contextos temporais
(históricos).
11
Considerações mais aprofundadas sobre os aspectos da materialidade do livro e outros suportes serão
discutidas no próximo capítulo.
12
Segundo Escarpit (1969), o público real pode não corresponder ao público idealizado pelo autor mas, mesmo
assim, atender as expectativas do autor de forma positiva e inesperada.
35
Para Candido (1967, p. 88), o “público nunca é um grupo social, sendo sempre uma
coleção inorgânica de indivíduos, cujo denominador comum é o interesse por um fato”.
Nesse sentido, o próximo tópico tenta apontar certas particularidades dos leitores no
Brasil que, movidos por um interesse em comum, caracterizaram a cultura literária e a
formação do público leitor no País.
1.3 Os escritores e os públicos no Brasil
A literatura no Brasil configurou-se de diferentes maneiras conforme a situação
econômica, cultural e ideológica de cada momento pela qual passava o País. A princípio,
como Colônia, o escritor não ocupava nenhuma posição social, uma vez que a atividade era
considerada marginal, sem remuneração ou espaço para divulgação. O público também o
colaborou para a mudança dessa situação, já que ainda não se formara.
A formação do público no Brasil sempre esteve atrelada às condições de uma política
educacional
13
. Foi, inclusive, ao lado das primeiras propostas de reforma escolar que se
destacaram os primeiros escritores brasileiros como, por exemplo, Silva Avarenga e Francisco
de Melo Franco. Estes dois lutavam contra a ignorância do povo português residente na
colônia e contra a falta de incentivo à leitura e à educação. Para isto, redigiam sátiras realistas
e populares, que problematizavam as questões políticas da época:
Alvarenga e Melo Franco, falando do aqui e agora do leitor, propõem novos
padrões de criação e abrem caminho para outro tipo de diálogo entre o
escritor e o público, que é leigo e pertencente àqueles segmentos resultantes
da revolução burguesa na qual apostam ao endossarem as idéias de Pombal
(LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p. 44).
Esta nova investida numa linguagem simples e próxima da realidade do leitor
favoreceu o alargamento do público no Brasil
14
.
Com o mesmo espírito crítico, Gregório de Matos, Manuel Botelho de Oliveira, Nuno
Marques Pereira e Santa Maria Itaparica formam um grupo fechado de escritores que se
autopatrocinava e consumia seus próprios escritos. Mais tarde, a união resultou na formação
13
Cf. quinto capítulo desta primeira parte da dissertação.
14
Pode-se entender esse (primeiro) novo público no Brasil como um grupo de leitores delimitados por um
interesse comum, protestar contra as injustiças e a falta de investimentos na colônia por parte de Portugal.
36
de uma academia literária, solução em voga na Europa para legitimar a arte literária, publicar
obras e promover discussões literárias
15
.
Observa-se que nessa época, o reconhecimento do escritor dependia,
essencialmente, da produção material de sua obra e da leitura de um público:
[...] a percepção dos nossos escritores era mediada pelo objeto livro, assim
como sua maior ambição era [...] editar as próprias obras. [...] a concepção
de literatura dos acadêmicos confundia-se com a materialidade do livro, fato
curioso se se considera que, na época, esse objeto era raro em termos de
difusão e proibido em termos de produção (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991,
p. 32)
16
.
Os escritores brasileiros apostavam em certas estratégias como manipular as
expectativas do público e trazer elementos do cotidiano a fim de conquistar e reter a atenção
do leitor. Segundo Lajolo e Zilberman (1991), o público leitor desta época preferia distrair-se
com temas vulgares, extravagantes, farsescos e coloridos, aspectos esses que remetem às
manifestações do teatro popular e dos festejos de rua.
Na segunda metade do século XVIII, outro modelo de público é definido a partir das
manifestações da poesia árcade. Tem-se, como representante desse período, os poetas Cláudio
Manuel da Costa e Basílio da Gama, que inauguraram uma literatura mais intimista e emotiva,
que exige um “pacto emocional” entre autor e leitor, preferindo, assim, um público leitor mais
introspectivo
17
e participante do mesmo sofrimento exposto pelo poeta.
Segundo Lajolo e Zilberman (1991), a caracterização de um novo público no Brasil se
forma somente a partir de 1808, com a presença de D. João VI no Brasil e as formulações
intensas de um projeto de independência:
Apenas, portanto, no século XIX engendram-se no Brasil as primeiras e
novas formas de público que, inicialmente ralo e inconsciente, aos poucos
ganha personalidade e contorno diferenciado. Entre os anônimos leitores de
folhetim e os assíduos freqüentadores de teatros, circulam intelectuais,
homens de Letras, estudantes, jornalistas, algumas sinhás-moças e até
velhotas capazes de leitura (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p. 89-90).
A divulgação da arte literária ocorria periodicamente em reuniões, sermões ou eventos
de comemoração pública, contando, principalmente, com o público ouvinte. Os círculos
15
V. capítulo quarto da primeira parte desta dissertação.
16
A maioria dos escritores no Brasil, e amesmo o público leitor, era formado por pessoas da alta sociedade
que podiam recorrer à formação escolar e acadêmica na Europa, principalmente em Portugal.
17
Essa tendência de um modo de leitura mais individualista e reservado assemelha-se aos ideais da sociedade
burguesa, concretizados especialmente com a circulação dos romances de folhetins.
37
populares, da mesma maneira, eram pouco praticados, não encontrando assim, influência ou
ressonância na formação de um público específico (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991).
Foi especialmente a circulação dos romances em folhetins que popularizou a leitura e
propiciou a formação de novos públicos leitores.
Os românticos, então, constituíram o maior complexo de influência literária,
aumentando significativamente os públicos leitores, com o apoio das instituições
governamentais que, de certo modo, controlavam as exposições políticas e ideológicas dos
escritores.
Uma das grandes marcas entre o escritor e a formação de um público no Brasil é a
intervenção do Estado, responsável pela remuneração dos artistas e controlador dos conteúdos
abordados. A elite letrada é quem apoiava a publicação de obras. Os escritores, então,
dependiam da simpatia dessa minoria para garantir suas publicações. Candido (1967, p. 95)
acentua que as instituições governamentais, representadas na época pelo amparo oficial de
D.Pedro II, o Instituto Histórico e as Academias de Direito, tinham a função polar de “acolher
a atividade literária como função digna” e “podar as suas demasias, pela padronização
imposta ao comportamento do escritor, na medida em que era funcionário, pensionado,
agraciado, apoiado de qualquer modo”.
No fomento dos ideais republicanos, os escritores identificaram-se com a causa,
personificando-se como cidadãos patriotas em busca da liberdade da nação e dos seus direitos.
Dessa forma, conquistaram uma posição social relevante, com seus escritos inflamados e suas
críticas revolucionárias. O público despertou-se politicamente, incentivados pelos ideais dos
escritores brasileiros e intelectuais. Segundo Candido (1967, p. 92), “esta união da literatura à
política permitiu o primeiro contacto vivo do escritor com os leitores e auditores potenciais”.
No início do século XX, os escritores já tinham consciência de sua posição social e
importância para formação de opiniões (crítica e política) dos brasileiros nacionalistas. O
conteúdo temático dos textos literários passou a priorizar, então, o engajamento político a fim
de atrair o público leitor e transmitir valores, preservando, assim, as características românticas
do nacionalismo exagerado e do sentimentalismo, ou seja, uma literatura para ser lida ao
público com entusiasmo e em tom protestante. Desse modo, o público passou a exigir o
aspecto do amor à pátria e o sentimentalismo como critério de aceitação e reconhecimento
do escritor” (CANDIDO, 1967, p. 94):
Entre nós, nunca tendo havido consolidação da opinião literária, o grupo
literário nunca se especializou a ponto de diferenciar-se demasiadamente do
38
teor comum de vida e de opinião. Quase sempre produziu literatura como a
produziriam leigos inteligentes, pois, quase sempre a sua atividade se
elaborou à margem de outras, com que a sociedade a retribuía. Papel social
reconhecido ao escritor, mas pouca remuneração para o seu exercício
específico; público receptivo, mas restrito e pouco refinado. Conseqüência:
literatura acessível mas pouco difundida; consciência grupal do artista, mas
pouco refinamento artesanal (CANDIDO, 1967, p. 99-100).
Do ponto de vista histórico, foi preciso vencer as barreiras de uma literatura advinda
de Portugal, marcada desde a formação dos escritores
18
, para formar uma tradição literária
brasileira. Em outras palavras, a manifestação literária de um país, do ponto de vista
capitalista, é determinada pelo envolvimento de escritores, obras, leitores e ouvintes, em um
sistema articulado e orgânico onde o fenômeno literário se realiza
19
.
Para que um texto seja considerado literatura “é preciso algo mais do que interação
entre seu autor e seus leitores. A literatura tem de ser proclamada e os canais competentes
podem proclamar um texto ou um livro como literatura” (LAJOLO, 2001, p. 18). Sendo
assim, cabe considerar a seguir os meios de produção, distribuição e circulação dos textos
literários e compreender sua influência na vida literária.
18
Os escritores eram aqueles que tinham condições financeiras de estudar na Europa e que após concluírem seus
cursos, voltavam ao Brasil carregados de novas ideologias e tendências européias (pensamento e arte).
19
Realizar-se num contexto próprio e não “importado”, para que a literatura realmente reflita a sociedade em que
está inserida.
39
CAPÍTULO II
2 - O CIRCUITO DE PRODUÇÃO MATERIAL DOS TEXTOS
[...] a literatura, como fenômeno de civilização,
depende, para se constituir e caracterizar, do
entrelaçamento de vários fatôres sociais
(CANDIDO, 1967, p. 13).
É no plano concreto ou material, histórico e social que a obra passa a existir enquanto
objeto de significação, posicionando-se no universo literário.
O primeiro ato de materialização de um texto parte necessariamente do autor quando
este exprime sua arte. O autor, no entanto, escreve textos e o livros. A intenção do autor e
todas suas estratégias textuais tornam-se objetos escritos, manuscritos ou até informatizados,
por meio de um conjunto de dispositivos responsáveis por esta produção material.
Sendo assim, a obra literária, como hoje é entendida e enquanto parte de um sistema
literário, que se completa na leitura do leitor, depende tanto de seu criador como dos diversos
aparatos materiais que tornam possível sua circulação e sua chegada até o público. Como
afirma Chartier:
As obras, os discursos, só existem quando se tornam realidades físicas,
inscritas sobre as páginas de um livro, transmitidas por uma voz que lê ou
narra, declamadas num palco de teatro. Compreender os princípios que
governam a “ordem do discurso” pressupõe decifrar, com todo rigor, aqueles
outros que fundamentam os processos de produção, de comunicação e de
recepção dos livros (e de outros objetos que veiculem o escrito)
(CHARTIER, 1994, p. 8).
É certo que a literatura, vista como manifestação artística do homem, sempre esteve
presente em sua essência sonhadora, nas histórias, nas canções, rituais culturais e religiosos,
na contemplação da vida, do amor e da morte. Porém, a existência de uma vida literária só foi
40
possível a partir do registro escrito (ou impresso) das letras – representação
20
da oralidade: “A
escrita e especialmente a imprensa possibilitaram a continuidade da tradição literária e devem
ter feito muito para aumentar a unidade e a integridade das obras de arte” (WELLEK;
WARREN, 1995, p. 174).
As invenções da escrita e da imprensa são responsáveis pelo grande acervo literário e,
sobretudo, pela circulação das idéias sobre literatura, fazendo emergir a própria história e
crítica literárias.
Esse processo material, evidentemente, passou por diversas modificações ao longo do
tempo. fragmentos de escrita, símbolos ou códigos específicos de um povo em suportes
diversos como: pedras, marfim, barro, metal, madeira, pele de animal e outros. Os formatos
variavam de tábuas e rolos, e mais tarde substituídos pelo códice, o conhecido formato de
livro. Esse foi utilizado durante séculos, popularizando-se devido a sua forma mais
econômica, por conter vários caracteres da escrita em um único exemplar.
A manipulação de fibras vegetais, advindas dos papiros egípcios, resultou na
formulação do papel. O papel foi considerado um grande avanço para os manuscritos, pois
sua espessura e resistência permitiam a escrita grafada em ambos os lados da folha, sendo um
significativo investimento econômico, de fácil manuseio e de transporte.
Todas essas possibilidades materiais mobilizaram, segundo seu contexto e
circunstâncias, a formação de uma mão-de-obra especializada para seu preparo e meios de
distribuição. Para os pergaminhos, por exemplo, foi necessário ter produtores pecuaristas, que
fornecessem a pele do animal (principalmente de carneiro); assistentes que manipulassem as
técnicas de preparo, como a raspagem, a mistura na cal e a secagem. O distribuidor do
material deveria ter seus contatos com os gabinetes dos letrados, copistas, escritores e
escribas. Por outro lado, os fabricantes dos instrumentos e outros aparatos necessários para o
registro da letra, como o estilete, a pena de ganso, a tinta e a cera, deveriam, da mesma forma,
estabelecer seus centros comerciais e aperfeiçoar suas técnicas (ZILBERMAN, 2001;
EISENSTEIN, 1998).
Toda essa variedade material foi tomando forma e substância. Algumas técnicas foram
substituídas enquanto que outras foram sendo aperfeiçoadas e inseridas no ramo de produção
industrial.
20
Ou tentativa de representação, pois a escrita não apreende todos fatores relacionados à manifestação oral,
como, por exemplo, a intensidade e tonalidade da voz expressando certas intenções (irônicas, de afeto, etc.) ou a
própria grafia da palavra que nem sempre corresponde ao som (fonética) da mesma.
41
O caminho tecnológico da indústria livreira começa com a invenção da prensa
mecânica
21
e se expande rapidamente por toda Europa. Essa técnica ampliou o universo da
leitura, pois, em grandes tiragens, o papel impresso facilitou a divulgação das letras: Com a
expansão da prensa mecânica nascem as primeiras tipografias, amplia-se o comércio livreiro e
aumenta o público leitor, não mais restrito a letrados e sacerdotes” (ZILBERMAN, 2001, p.
21).
No século XVIII, com a Revolução Industrial, a Inglaterra moveu o mundo com seu
maior avanço tecnológico: a máquina a vapor. A tipografia, então, deixou de ser uma
atividade artesanal para ser fabricada no sistema industrial. Assim, as impressoras manuais
foram substituídas pelas mecânicas e de rotatórias.
Com efeito, o advento da imprensa e a possível materialização do objeto literário em
grande escala de produção, muitas vezes, são fatos que passam despercebidos nos estudos
históricos e literários, porém, implicam significativamente na reorganização mental e do
pensamento do homem ocidental. A partir deste momento é que a literatura, na concepção que
se tem hoje, passou a existir.
Eisenstein (1998) chama a atenção para o grande impacto que a imprensa e a
circulação dos livros e das idéias (neles contida) causaram nos campos de conhecimentos
como a política, economia, filosofia e outros. O acesso a uma variedade de escritos que
abrangiam todos esse conhecimentos mudou a maneira de aprender e de pensar o mundo.
Inevitavelmente, a organização do livro acabou por guiar os modos de leitura e o
pensamento do leitor, nesse sentido: “[...] o advento da imprensa era, muito naturalmente, um
dos pré-requisitos para o advento do ensino e da ciência modernos” (EISENSTEIN, 1998, p.
92).
Segundo Eisenstein (1998), todos os leitores, independente de sua profissão,
precisavam se familiarizar com as páginas numeradas em arábico, com os sinais de
pontuação, os índices, títulos e subtítulos que dividiam as seções conforme a especificidade
dos assuntos. Cada inovação, por mais simples ou banal, resultava sempre numa nova ordem
de pensamento e organização.
A cultura da imagem, dos ícones foi substituída pela cultura da palavra. As fórmulas
utilizadas na oralidade, como as rimas e cadências rítmicas, a fim de facilitar a memorização e
aprendizado, simplesmente tornaram-se desnecessárias diante dos registros escritos, a nova
forma de memória coletiva.
21
A prensa mecânica foi invenção do alemão Guthemberg por volta de 1450, na Europa.
42
A padronização disseminada pela imprensa modificou o sentido do individualismo,
característica muito marcada pelos manuscritos que apresentavam traços pessoais, desde a
escolha das obras aas anotações pessoais de leitura. Agora, as cópias são iguais e de fácil
acesso a todos, sendo escritas nas línguas vernáculas, alcançando um maior número de
leitores e ouvintes.
Para Eisenstein (1998), a imprensa tem papel estratégico também para a fixação das
línguas nacionais literárias. As letras vernáculas ganharam sua importância e espaço,
permitindo as trocas culturais e literárias através dos trabalhos de tradução. De certa forma, os
códigos lingüísticos fixaram-se mais em seus significados, padronizando o idioma para
escritores e leitores.
A imprensa colaborou para a preservação dos escritos e elaboração de leis e
regimentos, divulgando principalmente os ideais eclesiásticos, os rituais litúrgicos e a lei
canônica. A partir do momento que os textos antes restritos tornaram-se públicos, acessíveis a
leitores diversos, os discursos políticos e ideológicos definiram-se criando, muitas vezes,
discórdias e interpretações diferentes, ramificando-se e delimitando movimentos partidaristas.
Assim, é possível observar que a escrita conseguinte de sua divulgação e
popularização via imprensa atingiu todos os âmbitos do conhecimento do homem, seu
pensamento e, principalmente, foi determinante para sua política.
Devido ao grande número de obras impressas, foi preciso reorganizar todo um sistema
interno que disponibilizasse o material procurado pelo leitor. Assim, surgiram os manuais,
guias, referências, os índices, catálogos, as divisões em ordem alfabética e especializações de
áreas, temas e assuntos.
Ao mesmo tempo, novos setores comerciais se constituíram para melhorar e inovar os
catálogos de vendas, oferecendo não somente as listas de livros, mas disponibilizando
materiais próprios para suportar as grandes quantidades de livros, estantes, prateleiras para
bibliotecas e pontos de venda.
Nessa esfera burguesa, de luta pela igualdade, os escritores que publicavam suas obras
exigiam seus direitos e reconhecimento, fazendo-se necessário à criação de leis, como será
discutido mais detalhadamente no próximo capítulo.
Considerando todo esse universo capitalista conseqüente de uma nova estrutura
burguesa, a concepção da literatura aderiu ao seu principal suporte o livro. Essa relação é
tão automática e intensa que o aparecimento de novas técnicas e suportes abalaram o universo
literário. Cogitou-se até no possível fim da “era do livro” e do ensino da literatura:
43
A revolução do nosso presente é mais importante do que a de Gutenberg. Ela
não somente modifica a técnica de reprodução do texto, mas também as
estruturas e as próprias formas do suporte que comunica aos seus leitores
(CHARTIER, 1994, p. 97).
Desde que foi possível manipular tecnicamente toda produção material do objeto
literário, como por exemplo, a elaboração de livros ilustrados, coloridos e de diversos
formatos e tamanhos, muitos eventos contribuíram para a evolução e qualidade das obras
impressas. O papel, manipulado de forma industrial, poderia variar em tamanho, espessura,
textura e outros, como o simples papel-jornal.
Embora o livro seja o suporte material mais conhecido popularmente, hoje, conta-se
com as novas tecnologias, que com tamanha rapidez, substituem o papel. O petróleo, por
exemplo, o grande empreendimento dos séculos XX e XXI, tem sido aproveitado para a
elaboração do plástico, permitindo a formulação dos CDs Player, CD-ROMs, disquetes e
outros. O mundo informatizado pelas redes e sites da Internet transpassou, até mesmo, o
material físico para o virtual (ZILBERMAN, 2001).
A disponibilidade de textos diversos na tela do computador modifica a relação do
autor-obra-leitor. As possibilidades de interação com o texto são diferentes agora: a
intertextualidade, a facilidade de estar, ao mesmo tempo, em contato com outros textos
auxiliares para a leitura, moldam um novo estilo de apreensão do texto, um novo “ser leitor”:
[...] O leitor da idade eletrônica pode construir à vontade conjuntos textuais
originais, cuja existência e organização dependem dele. Mais ainda, ele
pode a todo o instante intervir sobre os textos, modificá-los, reescrevê-los,
fazê-los seus (CHARTIER, 1994, p. 104).
Não se deve, entretanto, deixar de relevar que tais interferências do leitor no texto
colocam em questão a propriedade literária, assim como a originalidade do ato criador do
autor
22
.
Por outro lado, a tecnologia disponibiliza um acervo universal no qual qualquer texto
pode ser traduzido e acessado por todos os leitores em todo o mundo. Chartier (1994) objeta a
necessidade de analisar e compreender as mudanças do suporte do livro, da literatura, e
principalmente:
22
A divulgação de textos via Internet, muitas vezes, tem causado problemas de autoria e defraudado os direitos
autorais devido às facilidades do leitor em recortar, copiar textos ou parafraseá-los. Cf. no terceiro capítulo da
primeira parte desta dissertação.
44
[...] redefinir as noções jurídicas (propriedade literária, direitos do autor,
copyright), regulamentares (depósito legal, biblioteca nacional) e
biblioteconômicas (catálogos, classificações, descrição bibliográfica, etc.)
que foram pensadas e construídas em relação a uma modalidade de
produção, de conservação e de comunicação do escrito (CHARTIER, 1994,
p. 107).
Assim, a inclusão de qualquer novo suporte material ou outro elemento relacionado ao
texto, sempre gera a necessidade da criação de outros aparatos (legais, materiais, sobretudo
conceptuais).
No mesmo plano, as adaptações literárias feitas para o teatro, cinema, rádio e televisão
têm sido cada vez mais praticadas e alcançado públicos diferenciados, divulgando e, muitas
vezes, até moldando o comércio de determinados textos.
Hoje é comum que um clássico seja redescoberto pelo cinema e, após o sucesso da
adaptação, as editoras investirem em novas edições, garantindo um público consumidor. Um
exemplo atual é a obra infantil do escritor C.S.Lewis (1898 - 1963), As Crônicas de Nárnia,
tendo sua adaptação cinematográfica realizada pela Disney e o texto reeditado e revisado pela
Martins Fontes em várias séries de diferentes capas ou em volume único.
Todos esses recursos materiais e tecnológicos estão sendo aperfeiçoados e integrados
no meio social pelo sistema de comercialização, que tem como objetivo veicular a produção
literária no sistema de distribuição e circulação, para que as obras alcancem o seu público e
realizem-se por meio do ato da leitura.
2.1 O papel dos editores e livreiros no sistema literário
O testemunho dos intermediários do livro poderia
ter um valor maior, porque editores, livreiros e
bibliotecários controlam as principais
rodas do mecanismo das trocas
(ESCARPIT, 1969, p. 44).
O segredo comercial e das decisões que influenciam todo sucesso ou fracasso das
obras encontram-se entre os editores e os livreiros.
A opinião e aceitação de uma obra pelo editor é o primeiro passo para o
reconhecimento do escritor e sua integração no ciclo econômico. São as editoras as
responsáveis pelos contratos e pagamentos dos escritores e de colocar em circulação, após a
materialização, o objeto literário.
45
O editor é um componente novo e extremamente eficiente e preciso para publicação de
uma obra inserida no contexto moderno e capitalista.
O ato da publicação supõe o desligamento da obra com seu autor, permitindo que essa
seja exposta, autônoma e livre, cumprindo assim, o circuito necessário da literatura. Escarpit
(1969) explica que a palavra latina publicare denota ao ato de tornar público um projeto de
natureza privada. Nesse sentido, até o século XIII, o termo era utilizado no contexto dos
negócios financeiros relacionados aos bens mobiliários significando “vender em leilão”. A
idéia de colocar à praça um produto para venda remete, ainda, a uma espécie de violência o
ato de prostituir-se. Em relação às obras literárias, Escarpit (1969, p. 99) compara o ato de
publicar com o ato do nascimento: “Esta violência criadora é a mesma dos partos:
rompimento, separação dolorosa de uma parte, colocação em circulação de um novo ser
autônomo e livre do outro”.
Aqui, o papel do editor é comparado ao de um parteiro, ou seja, ele não é a fonte de
vida (pressupondo que o autor a seja), mas é ele quem colabora, faz o trabalho para que a obra
possa ser concebida, anunciando sua existência.
Segundo Escarpit (1969), devido à crescente complexidade da indústria livreira, a
função técnica e administrativa antes realizada apenas pelo impressor, ou tipógrafo
responsável, passou a exigir a colaboração de outros membros, devido à evolução,
modernidade e inclusão no modelo de produção capitalista. Hoje, as tarefas se distinguem
entre o editor, operador das máquinas, o capista, o diagramador, revisor do texto, a gerência
comercial, de vendas e marketing, o livreiro e outros colaboradores.
O editor assume o papel de empresário, selecionando as obras que serão publicadas,
coordenando todas as seções que antecedem a publicação conforme a política adotada pela
empresa, controlando o número das tiragens e incentiva os meios de difusão.
No âmbito cultural, as iniciativas do editor influem na formação dos gostos e na
formação do público. O editor acaba por ter o atributo do julgamento de valor, já que sugere o
que certo público espera ou deseja como leitura. Ele também provoca hábitos e revoluciona
ou conserva gostos. O editor como meio conciliador entre o autor e o público, e vice-versa,
não desempenha necessariamente um papel passivo, mas procura priorizar aquilo que é
vendável, regulando tal comunicação.
Assim, como parte do jogo econômico e ideológico, a fabricação dos livros dirigidos
pelo editor acaba por decidir quais obras atingirão determinado grupo de leitores. A prática do
editor é evidenciada na escolha do número de tiragens (quantitativa) e no luxo do exemplar
(qualitativo), pois, dentro das fronteiras materiais, os livros se distinguem pela qualidade do
46
papel, da capa, nomes renomados em comentários na contracapa ou orelha do livro,
ilustrações (sem, com, colorida ou preto-e-branco), formato, processo do tipo gráfico,
encadernação e número de exemplares.
A preocupação maior do editor é encontrar o público teórico que imaginou para tal
obra, mantendo “a responsabilidade moral e comercial do conjunto” (ESCARPIT, 1969, p.
107). Para isso, investe nas técnicas publicitárias: propagandas, incentivos à leitura e a
formulação de catálogos de obras que informam livreiros, bibliotecários e interessados, os
títulos e obras publicadas. Essa prática relaciona-se diretamente às próximas instâncias que
serão analisadas, como a crítica literária, a escola, academias e prêmios literários, fato que
demonstra como cada instância se inter-cruza e depende uma das outras.
O livreiro também desempenha uma função seletiva guiando a leitura e os públicos.
Segundo Escarpit (1969, p. 128): “A seleção do livreiro difere da do editor pelo facto de o
público do editor ser um público teórico e o do livreiro um público real, que se manifesta
directamente, que o mesmo é dizer uma clientela”.
A função do livreiro, portanto, evidencia-se pela disposição do produto nos centros
comerciais, o destaque do livro na vitrine e quantidade nos estoques para venda. Como o
livreiro trabalha diretamente com o público real, muitas vezes, determinados livros só são
encontrados em certos centros comerciais
23
, exatamente por essa diferenciação de leitores
possíveis, respeitando a idéia de que até mesmo a posição geográfica distingue o social, por
exemplo, um livro fabricado para um público mais carente e popular possuirá atributos
próprios que diminuirão os custos do livro, tornando o preço mais acessível e estará
disponível ao público, provavelmente, em centros de comércio popular como mercados,
bancas de revistas e jornais, pequenas livrarias, nas periferias da cidade e na zona rural. Por
outro lado, um livro destinado à elite letrada, terá um valor maior, uma capa mais formulada,
um papel de qualidade e estará, preferencialmente, nas livrarias especializadas, de grande ou
médio porte como as mega-stores, nos centros urbanos das grandes metrópoles, cidades
universitárias e industrializadas.
O livreiro, ou seja, o comerciante dos livros, interessa-se praticamente pelas trocas
vendáveis que geram lucros é um sistema econômico, um ponto de venda que não se
preocupa com a literatura em si, em seu aspecto de gratuidade e importância social.
23
Por exemplo, uma livraria próxima à escola priorizará a venda dos livros didáticos e de literatura infanto-
juvenil, podendo dispor também dos materiais escolares pedidos pelas escolas. Por outro lado, as livrarias que
atendem os centros universitários disponibilizam os livros especializados de cada área ou disciplina.
47
Como se pode observar no Anexo B, Os benefícios dos distribuidores e livreiros no
sistema literário, a maior margem de lucro na produção do livro concentra-se no circuito de
comercialização. O livreiro recebe de 30 a 40% do produto vendido e tem os riscos de vendas
diminuídos devido aos termos de consignação e possível devolução dos livros não vendidos
para o editor.
A função do livreiro poderia ser associada apenas ao do indivíduo que efetua as trocas
mercadológicas. No entanto, sua função influencia sobremodo a própria seleção das leituras a
serem efetuadas pelo público, principalmente, por criar hierarquias ao dispor de certo modo os
objetos literários.
Cabe ao livreiro manipular os estoques de livros, orientar-se pela clientela que cerca
seu estabelecimento, prover as encomendas e organizar os livros segundo os assuntos, temas e
especificidade. A disposição dos livros nas prateleiras e vitrines é uma forma de propaganda e
pré-seleção que despertará o gosto do leitor. Ninguém comprará um produto a respeito do
qual nunca se ouviu falar.
O livreiro, de certa forma, auxilia a tarefa do editor de intuir os públicos possíveis,
uma vez que o comerciante de livros lida com dados concretos acerca da procura e venda das
obras.
Convém acrescentar aqui, observando esses fatos, que a liberdade do leitor acaba de
certa forma tornando-se fictícia e limitada pelos circuitos de produção e distribuição. O que o
leitor pode ter em mãos como literatura é, anteriormente, pré-selecionado e julgado por
elementos desse circuito – o editor e o livreiro, e todas as circunstâncias que envolvem o meio
e o contexto social, o econômico e o histórico.
Essa realidade propõe questões como a imposição ideológica e do domínio das elites
letradas do sistema burguês e capitalista. Como se pode observar, em diversos pontos do
circuito literário, apenas o interesse pelo capital torna-se evidente. A preocupação pela
literatura, enquanto gratuidade e atributo necessário para compreensão do mundo e do outro, é
secundária.
Considerando um país como o Brasil, tais fatos, infelizmente, continuam a contribuir
para a falta de cultura e desenvolvimento de leitores capazes e críticos, prejudicando, assim, a
própria formação do indivíduo. É preciso compreender os termos do mercado, da arte e
cultura para que as trocas sociais não ocorram de forma ingênua. As negociações
mercadológicas não devem sobrepujar o valor estético da literatura. Nesse sentido, a escola
tem o dever de resgatar a manifestação artística do homem e não a rebaixar aos moldes
48
industriais de produção, afinal, como se ressaltou anteriormente, a literatura é instrumento
de conscientização e questionamento social da ideologia dominante.
2.2 O percurso das editoras e livrarias no Brasil
Com base nos estudos de Laurence Hallewell em O Livro no Brasil (1985), o trabalho
editorial do Brasil hoje, apesar dos problemas de exportação e traduções de obras, é
comparado com os países de boa tradição em editoras.
Ter uma indústria editorial no país significa, de certa forma, autonomia política e
ideológica, uma vez que a produção, principalmente jornalística e literária, contribui para
identificação e afirmação da sociedade. Com certeza, os países de terceiro mundo, como o
Brasil e outros, não possuem tal desenvolvimento por reflexo histórico.
No Brasil Colônia, as primeiras tipografias eram construídas pelos índios, com blocos
de madeira, sob instrução dos jesuítas, como era comum no século XV
24
. Dificilmente um
profissional ou operador de tipografia se submetia à escassez e perigos das colônias, então, os
jesuítas ensinavam a xilografia a fim de obter material para seus ensinos lingüísticos e
religiosos.
Segundo Hallewell (1985), não existiu tipografia no Brasil durante quase todo o
período colonial. A indústria impressora nessa época era considerada desnecessária devido a
fatores como a pobre estrutura econômica e administrativa da colônia. A grande extensão
geográfica do território brasileiro dificultava o transporte e a comercialização de produtos,
entre esses do material impresso. Não obstante, o consumo de livros não garantia lucros aos
investimentos, pois a maioria da população era analfabeta.
Os holandeses foram os primeiros a tentarem introduzir a arte tipográfica no Brasil,
entre 1630 e 1655, no nordeste, mas não obtiveram êxito em manter um tipógrafo no Brasil.
Há indícios de que a primeira tipografia no Brasil, de prática ainda ilegal e logo destituída por
Lisboa, localizou no Recife, em torno de 1700, sendo, provavelmente, mantida por jesuítas
25
.
24
A presença das máquinas tipográficas em colônias asiáticas e africanas recém-descobertas justificava-se pela
necessidade dos jesuítas cristãos que investiam no ensino da língua (do dominador) para evangelização dos
colonos (índios e aborígenes) e assim, produziam também os manuais escolares (HALLEWELL, 1985).
25
Somente com o desenvolvimento das províncias, em torno de 1750, que se passou a encomendar as prensas
feitas na Inglaterra, França e Portugal, a fim de se constituir (mesmo que ilegalmente) os jornais para apoio
político e governamental (HALLEWELL, 1985).
49
A insistência em instaurar uma tipografia variava desde os interesses políticos e
econômicos advindos da prática, como também do desejo de formar e consolidar um público
leitor na nova nação. A produção do jornal, por exemplo, era prática extremamente necessária
para a construção e fortalecimento do novo contexto burguês.
O custo, porém, para se manter uma tipografia, até a metade do século XIX era
consideravelmente alto. No Brasil não havia ainda sequer mão de obra especializada para
operar os maquinários, não havia recursos materiais para a fabricação, como o papel e tinta
nem um sistema de distribuição favorável e demandas suficientes para uma circulação
lucrativa.
A primeira fábrica brasileira de papel, por exemplo, surgiu em 1808 em Andaraí
Pequeno no Rio de Janeiro a fim de manter a produção tipográfica da Impressão Régia, a
pedido da Corte portuguesa. A maioria das bricas que precedem a esta, produziam apenas
papel de embrulho. A mais importante fábrica de papel para impressão foi a de Orianda
(Petrópolis) em 1851, a qual se destacava por sua qualidade:
No século XIX, todo o papel brasileiro ainda era feito de trapos velhos de
algodão ou linho puros, o que o tornava consideravelmente mais caro que o
papel produzido a partir da madeira importado da Bélgica e de outros lugares
(HALLEWELL, 1985, p. 132).
No final do século XIX, surgiu a primeira fábrica de papel produzido a partir da
madeira: a Melhoramentos, que se transformou na maior indústria editorial de São Paulo, na
produção de papel, edição e impressão de livros:
A Melhoramentos continua hoje atuando nos setores editorial, gráfico e de
fabricação de papel. Recentemente tem tido grande sucesso publicando obras
infantis, como O menino maluquinho, de Ziraldo. Em 1994, outro livro
infantil de Ziraldo, Flicts, ganharia uma versão em CD-ROM (PAIXÃO,
1998, p. 76).
A partir de 1890, inicia-se a atividade da indústria de papel Klabin Irmãos Et Cia. em
São Paulo. Atualmente a fábrica da Klabin no Paraná é uma das maiores produtoras de papel e
celulose da América Latina, integrada no sistema de reflorestamento de pinheiros (PAIXÃO,
1998).
Para Hallewell (1985), as condições de aparecimento e de desenvolvimento da
literatura brasileira sempre estiveram condicionadas às circunstâncias econômicas, às práticas
50
de comercialização e às técnicas industriais de que dispunham as editoras. Nesse caso, o
atraso industrial certamente resultou no atraso cultural da nação.
Em 1747, o Rio de Janeiro contava com um dos maiores tipógrafos de Portugal,
Antônio Isidoro da Fonseca. Provavelmente, as encomendas de Fonseca eram apenas de
impressos oficiais, a pedido do governo local. Mesmo assim, a corte de Lisboa,
monopolizadora de toda licença necessária (civil e eclesiástica) para a impressão, logo proibiu
a prática no Brasil e deportou Fonseca para Portugal. Segundo Hallewell:
[...] qualquer pequeno escrito original que surgisse no Brasil colonial
deveria, forçosamente, ou ser publicado na Europa ou permanecer na forma
de manuscrito (HALLEWELL, 1985, p. 22).
Obras literárias como de Gonzaga e Gregório de Matos, levaram décadas para serem
publicadas. Muitas publicações em Portugal foram rejeitadas “por não se adaptar aos cânones
aceitos do gosto literário quanto por seu conteúdo de idéias” (HALLEWELL, 1985, p. 22).
Nota-se, aqui, como a produção material está diretamente relacionada com a formação de um
cânone e a manutenção de uma cultura dominante (letrada e burguesa), tanto que inúmeras
obras literárias foram perdidas, desvalorizadas e muitas sequer publicadas por não
corresponderem aos ideais da época, ou seja, aos ideais da classe detentora do poder.
Em 1808, com a chegada do príncipe regente D.João e o estabelecimento da
monarquia no Brasil, o comércio nos portos foi liberado. A impressão, porém, era controlada
pela censura. Alguns dos principais escritos jornalísticos como o Correio Brasiliense era
impresso na Inglaterra e outros na França, e circulavam ilegalmente em contrabandos no
Brasil. A atividade editorial francesa, por exemplo, forneceu trabalhos para o Brasil até 1930.
Para suprir as necessidades governamentais, o Império mandou trazer prelos para o
Brasil, e assim se firmou a Impressão Régia no Rio de Janeiro:
Os trabalhos produzidos, embora os recursos disponíveis fossem muito
limitados, atingiram um padrão técnico e artístico equivalente ao dos
melhores trabalhos que então se faziam em Londres ou Paris
(HALLEWELL, 1985, p. 35).
Essa realidade mostra o quanto a qualidade e as oportunidades de impressão estão
relacionadas a um poder econômico e político local. Um dos motivos em se instalar a
Impressão no Brasil, por exemplo, era para “auxiliar a expansão da educação pública”
(HALLEWELL, 1985, p. 36), ou seja, divulgar as letras a fim de se estabelecer uma ordem
51
social compatível ao governo. A grande maioria dos livros impressos no País era de interesse
do governo, como, política, medicina, geografia, e outros. Ainda assim, os custos para
impressão no Brasil eram demais elevados, fazendo de Portugal uma opção vantajosa para o
mercado livreiro
26
.
Próximo ao acontecimento da Independência, existia no Brasil cerca de sete
estabelecimentos tipográficos; particulares ou não, a maioria dedicava-se à impressão de
jornais, periódicos e traduções:
Toda esta crescente atividade é testemunho do súbito aumento da leitura
provocado pelo furioso interesse por política que acompanhou as lutas pela
independência do Brasil (HALLEWELL, 1985, p. 46).
Com a exigência do povo em obter mais leituras e informações acerca das revoluções
e situação da quase nação, o trabalho tipográfico decaiu por não haver suporte financeiro e
material. Enquanto que a Europa modernizava-se e a arte tipográfica adaptava-se as novas
técnicas, o Brasil lutava para estabelecer um mercado interno.
Após a independência, o Brasil desenvolveu o transporte marítimo a vapor na tentativa
de unir e estabelecer o comércio entre suas províncias. Nessa época (e não muito diferente de
hoje), o Rio de Janeiro, como capital, concentrava os talentos literários e intelectuais do país:
primeiro pela popularidade editorial de qualidade, em relação as outras províncias; segundo,
porque a posição geográfica favorecia o comércio devido à concentração populacional,
destacando uma certa elite de consumidores-leitores.
O Brasil, devido aos laços culturais com a França, recebeu a editora de Plancher, que
trouxe ao conhecimento do público brasileiro diversos autores franceses. A princípio,
Plancher trabalhava para o governo ao lado da Impressão gia, contribuindo com os
panfletarismos políticos, os periódicos e a ficção. Tornou-se conhecido por publicar a
primeira novela brasileira, Statira e Zoroastes, de Lucas José de Alvarenga em 1826 (cunho
didático e de política liberalista). A literatura brasileira, assim como a arte, política e costumes
sociais eram influenciados pela França - padrão de bom gosto.
Plancher dominou o cenário editorial no Rio com seus todos comerciais, livrarias e
tipografias. Trouxe também a técnica da litografia, que reduzia o custo e era própria para
ilustrações e partituras musicais.
26
O comércio livreiro no Brasil era abastecido pelas obras contrabandeadas, devido à censura e o monopólio
português. Praticamente não havia estabelecimentos de venda e nem quantidade de leitores para que se
mobilizasse um comércio mais certo. Por volta de 1792, por exemplo, o Rio de Janeiro, capital brasileira na
época, contava apenas com duas livrarias, sendo uma delas a de Paulo Martin (HALLEWELL, 1985).
52
O comércio brasileiro sofreu com a instabilidade política de D. Pedro I, em 1831.
Plancher vendeu a tipografia para Villeneuve e Mougenot e, mais tarde, a firma passou a José
Carlos Rodrigues que trouxe novas técnicas norte-americanas e um método editorial mais
moderno que aumentava o número de impressões de livros.
Paula Brito foi um dos maiores investidores da arte tipográfica. Abriu uma livraria e
papelaria, tendo em 1848, seis impressoras manuais e uma mecânica (a maior do Brasil na
época). Em sociedade com Teixeira e Sousa e Cândido Lopes, que foi o primeiro impressor
no Paraná, em 1853, começou a diferenciar o trabalho de um editor e de livreiro.
Foi, especialmente, Paula Brito que incentivou as publicações literárias nacionais.
“Paula Brito o apenas editava; ele foi também o primeiro editor a publicar trabalhos de
literatos brasileiros contemporâneos como empreendimento de risco” (HALLEWELL, 1985,
p. 88). Entre essas publicações tem-se: Teixeira e Sousa (O filho do pescador, 1843), primeiro
romance brasileiro de valor literário; Juvenal Galeno (poeta popular); Bruno Seabra; Casimiro
de Abreu e Machado de Assis. Publicou também poemas de Gonçalves Dias, Augusto Emílio
Zalvar, Constantino José Gomes de Sousa, Domingos José Gonçalves de Magalhães, Martins
Pena (comédia), entre outros. A editora contava com o apoio de D. Pedro II.
Com a independência, houve progressos nos âmbitos legais e sociais como a inclusão
da mulher no mercado de trabalho, a conquista da participação política por meio do direito ao
voto entre outros. A mulher, então, tornou-se um indivíduo potencialmente ativo na sociedade
capitalista, tendo condições financeiras para comprar e consumir o que lhe interessa.
Rapidamente, o público (leitor) feminino tornou-se numeroso. Em incentivo à alfabetização
das jovens de classe alta, apareceram as revistas femininas, em 1832, apresentando novos
temas ligados à vida familiar.
O Maranhão foi um centro cultural que cultivava a proximidade com a língua
portuguesa e sua literatura, recebendo influências diretas da Europa (comércio, costumes,
cultura) “criando assim uma classe alta que era nitidamente mais européia em seus pontos de
vista e em seus costumes do que os demais brasileiros” (HALLEWELL, 1985, p. 95).
Para Hallewell, essa concentração da aristocracia e das riquezas desempenhou um
papel importante no desenvolvimento social e intelectual da cidade, apesar da imprensa ter
sido pouco útil devido à falta de liberdade e partidarismo político.
O tipógrafo Frias publicou, em 1861, o Livro do Povo de Antônio Marques Rodrigues.
Seu objetivo era estimular a leitura. O livro bem ilustrado de mais de 200 páginas fez parte do
contexto escolar do nordeste. Em seguida, Antônio Rego escreveu o Livro dos meninos, curso
elementar d’instrução primária, em 1864, destinado às escolas. Frias imprimiu também obras
53
literárias de Seferiano Antônio de Azevedo, Aluísio Azevedo e traduções dos franceses como
Paul de Kock, Eugene Sue e Voltaire.
Outro destaque é a tipografia de Belarmino de Mattos, perfeccionista, publicou
trabalhos de qualidade, principalmente lembrado pelo equilíbrio tipográfico na diagramação.
Dentre as obras literárias que imprimiu estão: Joaquim Serra, A. Franca de Sá, livros escolares
de Francisco Sotero dos Reis, Luís Miguel Quadros, José Coriolano de Souza e Lima, o poeta
Firmino Cândido de Figueiredo e as obras póstumas de Gonçalves Dias. Imprimiu também
almanaques e romances traduzidos de Victor Hugo, Alfred de Vigny:
Na entrada do século XX, se podia comprar um bom livro no Rio de
Janeiro. Algumas firmas francesas em expansão estabeleciam suas filiais
entre as lojas elegantes da rua do Ouvidor, e os primeiros livreiros-editores
se aventuravam neste incerto negócio (PAIXÃO, 1998, p. 12).
No início do século XX, a atividade editorial no Brasil cresce sobremodo, atraindo as
empresas de outros países. As duas livrarias francesas Garnier e Laemmert monopolizaram o
comércio de livros durante décadas nos maiores pólos brasileiros, São Paulo e Rio de Janeiro.
Laemmert inicia sua atividade com a Livraria Universal e mais tarde se torna a bem
sucedida Typographia Universal (1837). Ficou conhecida principalmente pela publicação do
Almanack Laemmert, obra de caráter administrativo, mercantil e industrial e pelas obras
literárias traduzidas do francês e alemão. Foi pioneira na edição de livros infantis e didáticos.
A Garnier foi criada em 1844, sendo a maior colaboradora do desenvolvimento
editorial no Brasil, principalmente na área legislativa, com a iniciativa de zelar pelos direitos
autorais, remuneração dos tradutores, redatores, revisores e trabalhistas. Ela investiu na
literatura nacional e européia, sendo seu sucesso editorial a obra Canaã, de Graça Aranha e as
obras de Machado de Assis (PAIXÃO, 1998).
A livraria Garnier abriu em 1860 uma filial em São Paulo, chamada Casa Garraux,
que se destacou pelo lançamento do primeiro catálogo de livros e por reunir na década de 20,
a elite da sociedade paulista, políticos, intelectuais e modernistas.
As editoras francesas não sobreviveram no século XX. A Garnier foi vendida à
Ferdinand Briguiet e rebatizada como Briguiet-Garnier, resistindo até a década de 50.
Laemmert fecha na começo do século, negociando seu acervo com a Francisco Alves.
A Francisco Alves apostou no mercado promissor de livros didáticos e lutou por
melhoramentos na educação primária do Brasil. Chegou ao monopólio na área de livros
didáticos brasileiros devido aos baixos preços e a grande escala em tiragens em relação às
54
concorrentes. A editora era criticada por imprimir seus livros no exterior. Somente após a
Primeira Guerra
27
, A Francisco Alves comprou uma oficina gráfica por ser mais vantajoso no
momento de crise econômica do País. Com a morte de seu fundador e proprietário, um grupo
de funcionários, liderados por Paulo Azevedo, comprou a empresa chamando-a de Paulo
Azevedo Et Cia. (HALLEWELL, 1985; PAIXÃO, 1998).
A maioria das gráficas do Brasil oscilava entre a impressão de jornais, revistas e
almanaques. Monteiro Lobato, como editor, estabeleceu uma empresa com equipamentos
próprios e adequados à exclusiva produção de livros. Nessa época, com o movimento
modernista, os artistas brasileiros ousaram na renovação da linguagem literária, nas artes
plásticas, na pintura, música e escultura, dando originalidade às manifestações culturais do
Brasil, quebrando regras e tabus:
A história do livro no Brasil pode ser dividida em antes e depois de Monteiro
Lobato. O escritor paulista foi o responsável pelos primeiros investimentos
nacionais na área do livro, desde a Editora revista do Brasil, passando pelo
Monteiro Lobato Et Cia. e pela Cia. Editora Nacional, até chegar à editora
Brasiliense, que ajudou a fundar (PAIXÃO, 1998, p. 48).
As empresas portuguesas praticamente substituíram as francesas na década de 30. A
Grande Livraria Paulista, dos irmãos Texeira, em sociedade com José Vieira Pontes, por
exemplo, editou livros desde 1876 até a década de 60, guardando hoje a memória dos
primeiros livreiros paulistas:
A Livraria Texeira ficou também conhecida por ter iniciado as tardes de
autógrafos. [...] A partir de então, os novos lançamentos passaram a ter suas
tardes de autografo, a princípio freqüentadas pelos familiares dos autores e
pelo público anônimo, depois também por personalidades da política e da
sociedade (PAIXÃO, 1998, p. 34).
Outro destaque nessa época foi a Livraria Acadêmica, fundada por Joaquim Inácio da
Fonseca Saraiva, em 1914. Saraiva tornou-se um editor de prestígio na área jurídica e
diversificou sua linha de produção oferecendo também os clássicos da literatura, livros
didáticos, infantis e acadêmicos. A tradicional editora Saraiva conta ainda hoje com grande
porcentagem do mercado editorial no País.
27
Os conflitos da Primeira Guerra mundial dificultaram os acordos internacionais e, conseqüentemente, o setor
de importações. Segundo Paixão (1998, p. 46): “O setor editorial também se expandiu, e a capital tornou-se o
centro editorial da década. Em 1920 funcionavam na cidade cerca de vinte editoras, com uma produção de
duzentos títulos anuais e uma tiragem total de 1,9 milhão de exemplares”.
55
No início dos anos 20, Monteiro Lobato e seu sócio, Octalles Marcondes Ferreira,
criaram a Companhia Editora Nacional que dominou o mercado brasileiro por várias décadas.
Os livros, principalmente os infantis de Lobato, contribuíram para a construção da literatura
infanto-juvenil, resgatando a cultura e o folclore do povo brasileiro. Lobato também
aumentou os postos de venda do livro, incentivando todo tipo de estabelecimento comercial a
vender livros por consignação (HALLEWELL, 1985).
Octalles investiu na publicação das coleções como: coleção Paratodos, de romances
estrangeiros; a Biblioteca das Moças, literatura feminina; a Terramarear, de aventura juvenil;
a Biblioteca do Espírito Moderno, de clássicos pensadores, e outros. A maioria dos textos era
traduzida por Lobato.
A empresa Cia. Editora Nacional foi dirigida por Octalles após a morte de Lobato e
em 1973 foi vendida para a José Olympio, em parceria com o governo. Tornou-se propriedade
do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) e em 1980 foi adquirida pelo
Instituto Brasileiro de Edições Pedagógicas (IBEP).
A José Olympio foi uma famosa livraria e editora do Rio de Janeiro no período de
1930 a 1945. Muitos escritores, professores, literatos, historiadores, jornalistas e médicos
costumavam se reunir na José Olympio para fervorosos debates. Após a crise dos anos 50, a
editora só ressurge nos anos 60 com ênfase no mercado de livros didáticos.
A editora foi importante para o País, pois lançou autores novos, modificou a
apresentação gráfica dos livros, acrescentando críticas nas “orelhas” dos livros e adotando o
sistema de venda domiciliar (PAIXÃO, 1998). Sem preconceitos, a editora lançou autores de
diversas linhas de pensamento, desde o integralismo, o marxismo, textos ortodoxos,
anarquistas, militantes e outros.
Nessa mesma época, algumas editoras marcaram a história da literatura no Brasil com
a publicação de autores renomados, como por exemplo, a editora Schimidt, com as obras de
Jorge Amado, Rachel de Queiroz, Gilberto Freyre e Graciliano Ramos.
Em meio às lutas políticas e o Golpe de 64, o editor José de Barros Martins criou um
espaço cultural, disponibilizando em sua livraria coleções de autores franceses, americanos e
ingleses. Com a proibição das exportações, Martins dedicou-se em publicar autores brasileiros
obras de literatura e de críticos literários como Antonio Candido, Nelson Werneck Sodré,
Mario de Andrade e Roger Bastide. A editora tinha o cuidado de atrair o leitor com a
diagramação agradável e moderna, ilustrações e capas coloridas. Na década de 70, transfere
seus contratos para a editora Record.
56
Pela falta de editores que publicassem livros, a maioria dos modernistas expressava
suas idéias em revistas e periódicos como: Klaxon, A Revista, Arco e Flexa, Verde, Arte e
Cultura e Estética. Os parques gráficos se especializaram e os artistas plásticos (modernistas)
passam a colaborar nos trabalhos literários, ilustrando as revistas e capas de livros.
Nessa época, algumas editoras começaram a valorizar o comércio de livros e,
principalmente, o lançamento de autores regionais. Em resultado desse esforço surgiram as
editoras: Itatiaia e Lê, em Belo Horizonte; a Guairá, no Paraná; na Bahia tem-se a Edições
Macunaíma, Editora Itapuã, Janaina e a Ágalma; no Recife, a livraria e editora Nordeste e as
gráficas Amador e Guararapes.
As livrarias, no geral, preservavam a tradição de alimentar em suas comodidades,
reuniões de discussões literárias, artísticas e políticas. Assim aconteceu com a Garnier e José
Olympio no Rio de Janeiro, a Casa Garraux e Civilização Brasileira em São Paulo e a Globo,
no Rio Grande do Sul. Entre essas, a livraria paulista Jaraguá, em 1942 destacou-se por
abrigar as discussões dos jovens intelectuais e poetas, sem interesse propriamente comercial.
O grupo de críticos também se reunia nas livrarias próximas como a Kosmos, a Palácio do
Livro e Triangulo (PAIXÃO, 1998).
As primeiras livrarias de interesse puramente econômico foram a Siciliano e a
Cultura, na década de 40. A livraria Siciliano possui atualmente cerca de setenta filiais
espalhadas pelo Brasil. a Cultura decidiu ampliar seus negócios investindo na área de
computação, marketing, arquitetura, idiomas e administração, sem abrir lojas pelo País:
“Preocupadas em vender livros, a Cultura e a Siciliano atingiram, por caminhos diferentes,
um padrão elevado de atendimento ao leitor. E com o tempo, passaram também a editar
livros” (PAIXÃO, 1998, p. 124).
Um empreendedor notável nas cadas de 50 e 60 foi Ênio Silveira, substituto de
Octalles da Editora Civilização Brasileira. Perseguido por insistir em publicar títulos contra
os ideais do governo, Ênio transfere seu patrimônio editorial nos anos 80 para a DIFEL e
Bertrand devido às crises econômicas.
No período dos anos 70 e 80, o chamado “milagre econômico” impulsionou o
crescimento da industria gráfica brasileira. Surgiram as editoras: Sabiá, dirigida por dois
escritores, Rubem Braga e Fernando Sabino; a Record se firmou publicando best-sellers
norte-americanos e ficção; a Editora Símbolo lançou novos contistas; a Alfa-Ômega realizou
um levantamento do conto no Brasil; a Nova Fronteira, dirigida pela família Lacerda, prioriza
a literatura e os contatos com o exterior, tendo como obra de referência o Dicionário de
Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda; a Moderna, a Ática, a FTD, a Editora
57
Brasil e a Ibep o especialistas na produção de livros didáticos e literatura infanto-juvenil; e
a editora gaúcha de maior projeção, a LEt PM. com títulos de diversas áreas (PAIXÃO, 1998).
No mercado de livros acadêmicos e universitários, seguindo o exemplo da Civilização
Brasileira, a editora Perspectiva lança a coleção Debates; a editora Rampa especializa-se em
literatura e história judaica; surge a DIFEL, com títulos universitários; a Paz e Terra, com
questões sociais e religiosas; a Zahar Editores, voltada posteriormente a filosofia e psicanálise
e a Cultrix, de teoria e história literária.
Nos anos 80, as editoras das próprias universidades ganharam força, como é o caso,
por exemplo, da UnB (Universidade de Brasília) e a Edusp (Universidade de São Paulo).
Hoje, praticamente todas as universidades de nível federal e estadual contam com sua própria
editora, voltada exclusivamente à produção de trabalhos acadêmicos, periódicos e revistas
especializadas.
As duas maiores editoras em assunto de ciências sociais e religião são a Editora Vozes
e a Paulinas que publicam títulos católicos e best-sellers cristãos. No meio evangélico e de
nível universitário tem-se a Editora Betânia, Vida e Ultimato e a Editora da ABU (Aliança
Bíblica Universitária). Na área do esoterismo e auto-ajuda tem-se a Pensamento.
Segundo os dados de Paixão (1998), a atividade editorial no Brasil hoje conta com
cerca de 600 editoras espalhadas pelo país, colocando o Brasil em sétimo no mercado
mundial. A produção livreira ultrapassa o número de 300 milhões de exemplares por ano,
competindo em quase igualdade com as empresas internacionais.
Todo esse sucesso pode ser comprovado pelas grandes bienais do livro, prêmios
literários
28
, feiras de livros, espaços e projetos culturais de incentivo à leitura. Cada vez mais
o livro tem deixado de ser um objeto elitizado, veiculando a cultura e a democratização em
todo mundo.
No início dos anos 90, o mercado editorial precisou inovar para atender a grande
diversidade de leitores brasileiros. Os leitores agora têm diferentes veis de escolaridade, de
faixa etária, de situação civil, de identidade sexual, de raças, etnias e culturas, de opção
religiosa e outras tendências.
O setor de produção, distribuição e comercialização também tem passado por um
processo de profissionalização. A arte e a tecnologia modificaram as relações com o texto, os
aspectos gráficos e materiais do objeto literário; as empresas de marketing e propaganda
28
Cf. Anexo J.
58
também oferecem seus serviços de forma mais direcionada; a novas entidades
profissionalizaram-se a fim de mediar as relações entre autor-editor-livreiro.
Uma figura importante hoje para as editoras é o agente literário representante do
escritor e responsável pelos contatos com as editoras. Em geral, o agente literário é um grande
facilitador no mercado editorial, pois, possui um conhecimento amplo sobre as tendências do
mercado, a política e o perfil de cada editora, encaminhando as obras dos autores que
representa, da melhor maneira possível. Assim, o agente acaba prestando também um serviço
às editoras, selecionando e colocando à disposição os textos literários propensos a um futuro
sucesso. O profissionalismo do agente literário auxilia nas discussões legais e contratuais com
as editoras. Segundo Mengozzi (S/D), “o agente negocia cláusulas, discute questões
contratuais, cobra respostas, resolve impasses, fecha negócios, coordena projetos”.
A remuneração do agente gira em torno de 10 a 20% dos ganhos do autor, ou seja, é o
autor o responsável pelo pagamento do serviço do agente.
A responsável pela divulgação e iniciação desse tipo de profissão nos países ibéricos,
foi a espanhola Carmen Balcells: “O fenômeno cultural colaborou para que o colombiano
Gabriel García Márquez ganhasse o Prêmio Nobel de Literatura, em 1982. Uma das arquitetas
do triunfo foi justamente uma agente: Carmen Balcells” (MENGOZZI, S/D).
Atualmente, a agência de Balcells é dirigida por Glória Gutiérrez, representante de
autores brasileiros como, Jorge Amado, Antônio Callado, Autran Dourado e Clarice
Lispector, nas negociações de caráter mundial.
No Brasil, ainda são poucas as agências literárias e de consultoria editorial
29
. Porém, a
idéia tem sido divulgada e melhor aceita tanto pelos autores, que como profissionais das letras
têm contado cada vez mais com as facilidades e a inclusão no mercado de trabalho, quanto
pelos editores, que preferem acertar contratos com alguém capacitado e de boas relações no
meio literário e industrial.
A necessidade de aperfeiçoamento na produção editorial no Brasil é uma das razões
que mobilizaram a criação de cursos de graduação na área editorial
30
. Hoje, destacam-se os
cursos de produção editorial da universidade de Anhembi Morumbi, coordenado por Maria
José Rosolino, e o curso de editoração da USP, coordenado por Plínio Martins Filho
(presidente da editora Edusp)
31
.
29
Cf. Apêndice A.
30
O surgimento do curso de editoração encontra respaldo na própria legislação governamental que apóia e
incentiva a criação de cursos de capacitação do trabalho editorial, gráfico e livreiro, como se observará no
próximo capítulo.
31
Cf. Anexo C.
59
O profissional de Editoração tem como função estabelecer um planejamento de
mercado que descreva todas as condições financeiras, materiais, qualidade técnica (tiragem,
quantidade, aspectos gráficos, etc.) e administrativas. A prática deste profissional varia entre
dois segmentos: a edição de texto, que envolve os preparativos para impressão e revisão; e a
edição de arte, que lida com a programação visual, gráfica, editoração de vídeo e outros
eletrônicos.
O profissional de editoração é bem visto pelo mercado, uma vez que os suportes de
textos (literários e outros) não se restringem mais ao formato livro. Além disso, outros setores
têm procurado seus serviços, que não as editoras, como projetos para ONGs, sindicatos,
partidos políticos e outras organizações que necessitam, de alguma forma, de publicações
impressas para propaganda e divulgação de seus ideais.
Nesse breve histórico foi possível observar que a produção de impressos no Brasil
marcou-se pelas dificuldades políticas e financeiras, porém, alcançou certos méritos, contando
hoje com um público de leitores considerável e de inúmeros perfis.
Para complementar a caminhada de autores e editores, foi necessário criar um sistema
legislativo a fim de ajustar as relações entre os envolvidos nos circuitos de produção,
distribuição e circulação do texto aos moldes capitalistas. O próximo capítulo trata
exatamente desse processo legal e jurídico necessário para o bom andamento do sistema
literário.
60
CAPÍTULO III
3 - OS SISTEMAS LEGISLATIVOS E ECONÔMICOS
A literatura é uma das principais manifestações artísticas do homem em relação à vida
social e seu momento histórico, por isso é impossível apreciar o texto literário apenas como
um objeto autônomo e divorciado de todo um quadro social de determinado tempo e meio.
Segundo Sodré (1976), o desenvolvimento e a formação da literatura são elementos
constitutivos do processo histórico total da sociedade. Dessa forma, foi inevitável que o
circuito literário fosse regido pelas mesmas leis vigentes do sistema capitalista: “A burguesia
é a nova força que impulsiona o progresso material e arrasta a sociedade para um quadro
histórico inteiramente diverso daquele que o mundo conhecido vinha apresentando” (SODRÉ,
1976, p. 33).
A literatura deixou, então, de ser produzida por um restrito número de escritores, em
produção artesanal e direcionada a uma minoria letrada. A leitura passou a ser democratizada
e seu público formado de inúmeros leitores com gostos diversificados.
Para atender a todo esse contingente, incrementou-se o número de escritores, editores
e livreiros, assim como uma indústria competente tecnologicamente se formou,
disponibilizando o material literário para venda:
[...] numa sociedade capitalista, tudo tem expressão econômica e financeira,
cabendo ao sujeito do trabalho que produziu a mercadoria no caso, a obra
de arte mostrar-se proprietário dela, cabendo à sociedade determinar seu
custo e lucratividade, a partir da relação entre demanda e oferta (LAJOLO;
ZILBERMAN, 2001, p. 20).
No novo contexto, o livro é um objeto de consumo e a literatura passou a ter valor de
troca – não só cultural mas, principalmente, econômico.
No momento em que a produção de livros converteu-se num segmento
economicamente viável e atuante no mercado, foi possível perceber, mais claramente,
61
elementos reguladores de duas naturezas: uma econômica, que intensifica a formulação de um
sistema legislativo e outra de natureza ideológica, de tendência conservadora e controladora
da manifestação artística e literária. Assim, para que o sistema legislativo existisse em relação
às obras e a todos os envolvidos em sua materialização, percorreu-se um caminho árduo no
plano econômico e ideológico, implicando, evidentemente, em princípios reguladores das
ações que pudessem envolver autores, editores e públicos, conforme se observará a seguir.
3.1 O valor atribuído às obras literárias
Propriedade e identidade – eis dois conceitos caros à
sociedade burguesa e capitalista e que ganham
significado peculiar no contexto da literatura e da arte
(LAJOLO; ZILBERMAN, 2001, p. 17).
Os direitos autorais podem ser discutidos a partir de considerações relacionadas,
primeiro com o valor da obra, ou seja, quem determina o valor literário e econômico, uma vez
que o livro insere-se no sistema capitalista; segundo, a quem pertence a obra literária, já que o
livro, objeto literário, é concebido pelo autor e materializado pelo circuito de produção que
envolve o editor e os circuitos de distribuição e circulação como os livreiros, bibliotecários e
outros.
Infelizmente, o mercado, muitas vezes, ignora o valor literário da obra, interessando-se
apenas pelas despesas da produção do livro e os lucros advindos das vendas do produto
literário:
É que a lei não vê no livro senão o objeto material e considera apenas o valor
da fabricação. Na verdade, seria preciso tomar em conta o valor real da troca
cultural em função de tal ou tal meio, de tal ou tal grupo. Conforme a
estrutura econômica-social de dois países, conforme o lugar que a função
cultural ocupa na sua hierarquia nacional, assim também um livro terá
diferente significação e difusão num e noutro (ESCARPIT, 1969, p. 124).
Mas o valor literário existe e a sua atribuição é confiada às instâncias discursivas,
como a crítica e as academias de letras. Essas, porém, são regidas por um ideal canônico que
posiciona as obras dentro de um sistema rígido e hierarquizado.
No entanto, são os valores sociais adotados em cada época da história que determinam
os critérios seletivos das obras literárias. Antigamente, por exemplo, uma boa obra literária
62
era aquela que seguia rigidamente os modelos clássicos de composição. Com a modernidade,
a crítica literária passou a privilegiar a originalidade e inovação do autor no meio literário.
o valor econômico da obra é regido, primeiramente pelo preço de custo e, em
seguida, pela aceitação do público e o valor atribuído pelas instâncias competentes, que
acrescentarão um valor literário refletido imediatamente na economia de venda.
De certa forma, o valor econômico é dependente do valor literário, logicamente dado
após a publicação. É nesse momento que o editor precisa concentrar-se nas técnicas de venda
e propaganda de seu produto a fim de chamar a atenção na mídia e da crítica literária, para
que seu produto se torne significativo em meio a tanta competitividade.
Atualmente, os editores têm percorrido o caminho inverso, ou seja, acrescentando
valores no “estado civil” do livro. O “estado civil”, segundo Lebvre e Martin (2000), são as
informações que atualmente o livro traz em suas primeiras páginas: o nome da obra, seu autor,
ano da publicação, a editora, o nome do editor, tradutor, ilustrador, o prefácio e um resumo
sobre o assunto ou tema da obra. Até o século XV, o havia a página de rosto com tais
informações nos livros impressos. Dificilmente havia informações sobre a origem dos
textos
32
.
Dessa maneira, os editores indicam nos livros certos valores literários antes mesmo
que a crítica e os canais competentes em legitimar a natureza literária o façam. Assim, os
livros reservam espaços como o verso ou a orelha do livro, os prefácios e outros, para
homenagear o autor ou indicar a obra a seus possíveis leitores. Normalmente, procuram-se
pessoas renomadas das áreas afins para comentar sobre a publicação da obra (LAJOLO;
ZILBERMAN, 2001).
Até a escolha da editora pode dar à obra certo status literário e, conseqüentemente,
repercutir no valor financeiro da obra: A marca tipográfica [...] não tarda a transformar-se
numa verdadeira ilustração publicitária, destinada não a indicar a origem do livro mas
também a ornamentá-lo e a afirmar a sua qualidade” (LEBVRE; MARTIN, 2000, p. 112).
Por outro lado, o valor da obra encontra-se também, e principalmente, nas negociações
do mercado. As relações entre o preço de custo e os seus componentes (matéria-prima, papel,
tinta, funcionários, impostos, etc.) variam conforme a época e a situação econômica do país.
32
A partir do momento em que o livro se inseriu num contexto regulado por certa legislação, ajustes foram
necessários visando à padronização. Nos dias de hoje é essencial que o livro tenha um registro civil, como
mostram as leis e decretos descritos no quarto tópico deste capítulo.
63
No início, os lucros advindos das vendas eram divididos igualmente ao tipógrafo
(responsável pela impressão) e ao livreiro (responsável pela encadernação e venda do
produto) e esses pagavam seus empregados e suas despesas.
As funções empregatícias relacionadas à produção do livro, porém, modificaram-se
conforme a necessidade e o surgimento de novas tecnologias. As funções comuns e manuais
como a de copista e encadernador foram substituídas pelos operadores de máquinas, o
impressor e seus empregados. O maior número de pessoas em serviço e em funções diferentes
provocou, conseqüentemente, o estabelecimento de novas jornadas de trabalho, contratos e
salários, como uma típica construção empregatícia aos moldes burgueses. Esse modelo torna
o livro cada vez mais imerso no complexo sistema capitalista.
Nos primeiros momentos da divulgação da escrita, os livros circulavam livres de
impostos com o intuito de suprir as necessidades urgentes de conhecimento e cultura dos
países. Com as primeiras cobranças, o comércio livreiro foi visto como um bom negócio,
exigindo, assim, uma legislação específica que regulamentasse toda a circulação do produto
de consumo denominado livro.
Assim, as questões econômicas exerciam força sobre a formulação de leis que
pudessem regular a ação dos envolvidos no processo de produção do impresso, a fim de
garantir um retorno financeiro satisfatório para todas as partes envolvidas no negócio do livro.
Ao lado dessas questões econômicas encontra-se o elemento regulador de caráter ideológico,
concentrado e exercido, quase que exclusivamente, pela Igreja e/ou pelo Estado.
O Estado, em praticamente todos os países, interveio imediatamente nas negociações
legais para obter privilégios, fazendo funcionar, assim, restrições ideológicas e econômicas
através de legislação relativa à produção e circulação de textos.
A Igreja e o Estado exerceram por rios séculos o controle exclusivo e autoridade
máxima sobre a nação, supervisionando e censurando o conteúdo permitido para as obras,
segundo os seus próprios interesses. A classe detentora do poder ideológico concentrava o
capital de giro, obrigando os escritores a depender de seus favores para realizar suas
publicações:
Com freqüência, bispos e cabidos financiam a impressão dos livros
litúrgicos. Os estados e as cidades fazem o mesmo com certas obras [...]
enfim, o sistema de privilégios e os monopólios concedidos pelo Estado a
diversos livreiros para algumas edições permitem encorajar grupos e
empresas nacionais ou locais; por este meio, o Estado intervém muitas vezes
no financiamento das edições; estimula sistematicamente as grandes
empresas e esforça-se, deste modo, por atrair os impressores e fazer deles
64
seus dóceis agentes – prontos a denunciar a publicação de maus livros. Deste
modo ainda, encontra-se reforçada no mercado do livro a importância dos
grandes livreiros-editores (LEBVRE; MARTIN, 2000, p. 176-177).
Além da ação direta do Estado:
[...] a ação censora tomará configurações ainda mais transparente quando,
em 1564, o papa Pio IV publica o Index Librorum Prohibitorum, instrumento
da Inquisição e permanente cutelo a intimidar os profissionais envolvidos
com o – já no século XVI – florescente e lucrativo mundo dos textos
impressos (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001, p. 31).
A censura exercida pela Igreja controlava o conteúdo dos livros e suas publicações. A
restrição apenas intensificou o comércio ilegal de livros, incentivando a pirataria e, até
mesmo, a circulação clandestina de livros proibidos. Apesar da lei assegurar os direitos do
impressor, aqueles que eram protegidos pelo Estado e correspondiam adequadamente aos seus
interesses e determinações foram prejudicados devido à concorrência com o mercado negro
de livros.
Entretanto, com o desenvolvimento e especialização de todo o circuito de produção,
distribuição e circulação do livro aos moldes do sistema capitalista, foi imprescindível
determinar uma legislação apropriada para regular o funcionamento dos processos
econômicos, considerando a complexidade das instâncias envolvidas na produção literária.
O autor, então, conquistou o direito de propriedade da obra, porém, deparou-se com
outros problemas como a liberdade de expressão em detrimento à atuação de outras instâncias
cerceadoras, movidas por causas econômicas e ideológicas.
3.2 Os direitos autorais e editoriais
Por fim, o último ofício ligado à imprensa e que nasceu
graças a ela: o ofício de autor, no sentido moderno,
isto é, aquele que aufere lucros pela venda dos
exemplares de uma obra escrita por ele próprio
(LEBVRE; MARTIN, 2000, p. 218).
No âmbito legal, os impressores foram os primeiros a conquistarem o direito exclusivo
de publicação de uma determinada obra, adquirindo seu monopólio. Diante da situação,
muitos escritores passaram a pagar pela impressão de seus livros, ficando responsáveis por
distribuir e vender os exemplares. A editora apenas prestava um serviço.
65
Somente no século XVII, os autores começam a formar as academias literárias e lutar
pelos seus direitos
33
. As reivindicações atingiam primeiramente o âmbito do reconhecimento
de uma obra literária, do seu autor e sua remuneração equivalente ao seu trabalho, ou pelo
bem proporcionado à sociedade:
Pouco a pouco, todavia, caminhava-se para a solução actual: o
reconhecimento jurídico de uma “propriedade literária” do autor sobre a sua
obra, durante um certo tempo, antes de cair no “domínio público”, e, em
todos os casos em que fosse praticamente possível, sob uma ou outra forma,
a participação do autor nos lucros realizados com a venda dos exemplares
(LEBVRE; MARTIN, 2000, p. 223).
É possível que a luta pelos direitos do autor tenha tardado devido à concepção dos
próprios autores em relação à arte
34
. Dificilmente um autor procurava assinar um contrato
com o livreiro para garantir seus direitos.
Os países europeus foram os primeiros a negociar os direitos dos envolvidos no
comércio livreiro. A Inglaterra, em especial, foi o berço das discussões e da concretização de
uma legislação sobre os direitos autorais. As efervescentes revoluções industriais e a
implantação do capitalismo na Europa afloraram as necessidades de regras para os comércios
de todo tipo, inclusive o livreiro.
Foi na Inglaterra, por exemplo, que se firmou o primeiro contrato com acordo
financeiro em 1667, entre John Milton e o editor Samuel Simmons, garantindo ao escritor
certa porcentagem por livro vendido (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001). Logo, alguns livreiros
começaram a comprar o direito da obra e cediam ao autor um valor a cada reimpressão.
A elaboração de uma legislação tem início em 1710, quando o Parlamento inglês
divulga o “Estatuto de Ana”, dando ao autor o direito sobre sua obra e sua impressão por 21
anos. A partir desse momento, o indivíduo que inscrevesse sua obra no registro oficial se
tornaria juridicamente o proprietário do texto literário em questão. Assim, a lei reconheceu ao
autor a propriedade da obra.
A idéia, porém, obrigava a cada autor ter um único editor, evitando, assim, a pirataria
e a venda do texto para concorrentes. Muitos protestaram contra essa lei, alegando que o
tratado era vantajoso apenas para os editores, restringindo os direitos do autor, do livreiro e do
próprio comércio e indústria do livro.
33
Até o início da era moderna, muitos escritores contentavam-se apenas com a publicação de sua obra,
entregando ao livreiro ou editor seus escritos sem nada receber em troca. Com o evidente lucro dos fabricantes e
distribuidores do livro, o escritor passou a repensar na sua participação e a exigir certos direitos sobre a obra
(LEBVRE; MARTIN, 2000).
34
Muitos acreditavam que a arte era um dom, inspiração, algo sublime e acima de qualquer remuneração.
66
Em 1732, o governo inglês concedeu, a pedido dos livreiros, um novo regimento que
legalizava a venda de livros, inclusive dos importados, apenas se realizado por meio dos
livreiros autorizados como profissionais. Entretanto, os livreiros tornaram-se mais
responsáveis pela circulação de livros indesejados (sátiras, protestos, livros proibidos),
correndo o risco, inclusive, de serem punidos.
Em agosto de 1777, são declarados os cinco decretos de regulamentação, completados
por um decreto posterior, o de 30 de julho de 1778:
Doravante, os autores gozam de privilégios indefinidos, e os livreiros de
privilégios temporários de (pelo menos) dez anos, que não podem ser
renovados, a menos que sejam aumentados de um quarto. Qualquer autor
que obtiver um privilégio tem o direito de vender o livro em sua casa e
poderá, às vezes que quiser, mandá-lo imprimir à sua custa pelo impressor
que escolher e mandá-lo vender pelo livreiro que escolher, sem que os
contratos ou acordos que tiver concluído possam ser considerados cessão de
privilégio (LEBVRE; MARTIN, 2000, p. 225).
Por outro lado, os norte-americanos, em 1783, aprovaram um estatuto sobre os direitos
autorais a fim de proteger e incentivar todo tipo de trabalho intelectual. Daí por diante, o
complexo industrial e capitalista e todos os colaboradores da existência material do livro
passaram a esforçar-se para harmonizar seus interesses dentro do quadro econômico e cultural
propiciado pela revolução burguesa.
Dez anos depois, o governo inglês ampliou os direitos do autor sobre qualquer forma
de adaptação, principalmente teatral, ou utilização da obra em outros textos. Segundo Lebvre
e Martin (2000), a lei serviu de base para a atual legislação, comum em quase todos os países
ocidentais, inclusive no Brasil. A lei declarava que:
[...] o autor tinha o direito de vender e distribuir as suas obras e de ceder a
sua propriedade, total ou parcialmente, e o direito de propriedade do autor
prolongava-se a favor dos seus herdeiros dez anos após a sua morte (prazo
elevado hoje para cinqüenta anos) (LEBVRE; MARTIN, 2000, p. 226).
No início do século XIX, o Parlamento inglês cedeu ao autor os direitos sobre a obra
por 28 anos ou até o resto da vida do autor. Em 1837, a lei se estendeu para até 60 anos após a
morte do autor, garantindo rendas para seus herdeiros.
Em geral, a remuneração do autor diferencia-se pela natureza do material produzido:
uma obra literária, ou científica, traduções ou outra. Havia, por exemplo, uma clara distinção
no pagamento de um romancista e de um poeta. Considerava-se a produção da poesia inferior
67
ou menos trabalhosa que a de um romance, além de possuir maior facilidade quanto aos seus
meios de divulgação (oral, em praças e recitais).
A obra de arte elaborada sem a finalidade de retorno financeiro fez parte do
pensamento da sociedade por décadas, muitas vezes até como forma de protesto ao
movimento capitalista. O prestígio que o autor tem após a divulgação de sua obra, porém, não
é o suficiente: muitos poetas enceraram suas vidas na miséria (LAJOLO; ZILBERMAN,
2001; LEBVRE; MARTIN, 2000).
O editor, além de arcar com as despesas materiais e de recursos humanos,
responsabiliza-se em fornecer catálogos de venda com títulos e obras atualizadas
35
. Algumas
anotações de controle pessoal de Monteiro Lobato (V. Anexo D), por exemplo, indicavam os
investimentos necessários da editora Companhia Editora Nacional, em 1934. Segundo o
inventário descrito, Monteiro e seu sócio já publicavam até a sétima reedição de alguns
títulos, contando com o mínimo de mil exemplares e no máximo quinze mil. Previa-se o
pagamento do tradutor e do impressor responsável. Além do custo tipográfico havia também
os gastos com os clichês e desenhos (arte da ilustração). A qualidade do papel e a
encadernação também influenciavam no preço final do livro. A editora pagava os direitos
autorais, de tradução e outros. A despesa de uma editora é relativa, pois varia conforme as
possibilidades financeiras do editor em determinado momento e da situação econômica do
país as taxas de impostos do material (papel, tinta, etc.), as importações, os contratos para
tradução de um livro estrangeiro, a qualidade do papel, o tipo de encadernação, o tradutor, e
outras variantes legislativas e econômicas.
Essas indicações permitem fazer uma idéia do capital necessário que o impressor
deveria dispor para se estabelecer. Segundo Lebvre e Martin (2000, p. 156), se “o impressor
era, ao mesmo tempo, livreiro e editor, o seu capital de livraria constituía um fundo
amplamente superior ao que representava a sua oficina”.
Os direitos relacionados à produção artística, hoje, seguem leis semelhantes, porém,
cada país estabelece acréscimos ou particularidades segundo as necessidades mais comuns das
relações e intercâmbios culturais.
35
Como observado no capítulo anterior, atualmente, a distribuição porcentual entre os envolvidos na produção
literária, nos países que sofreram influências norte-americana e inglesa, concede ao autor a remuneração de 10%
e ao editor 15%, sendo que o circuito de distribuição monopoliza a maior margem de lucro sobre a venda do
exemplar.
68
3.3 A legislação no Brasil
O Brasil teve praticamente dois momentos distintos em relação à formação de
princípios reguladores específicos relacionados às manifestações artísticas e culturais: um
primeiro momento como colônia de Portugal e, portanto, dependente das leis portuguesas e da
censura que essa exercia; um segundo momento, após o estabelecimento da República,
quando se estabelecem leis e criam-se instituições ligadas ao circuito da produção de livros.
O primeiro momento, ou período colonial tem início com a descoberta do Brasil e sua
decorrente colonização exploratória e se estende até o fim do período monárquico (1822 a
1889). A presença da Corte e da família real portuguesa no Brasil, em 1808, certamente
trouxe privilégios e a mesmo um avanço econômico à colônia. Porém, apesar da
proclamação da independência, em 1822, o Brasil continuou sendo regido por um governo
português e se submetendo às influências (legais e políticas) de Portugal. Por isso, considera-
se aqui como período colonial, o intervalo de tempo em que o Brasil foi regido pela
monarquia, pois a precariedade e a ideologia de exploração continuaram a fazer parte da vida
e da cultura do povo brasileiro.
Em Portugal, em 1508, a Coroa exercia forte controle sobre tudo o que era produzido e
impresso na região, tendo como base as doutrinas eclesiásticas e o interesse político do reino.
O governo, assim, exigia que o impressor tivesse condições financeiras necessárias para
exercer o ofício, e que sua educação fosse cristã e tradicional para evitar a publicação de
livros proibidos e a contaminação de outros valores morais, éticos e religiosos (não-cristãos)
(HALLEWELL, 1985).
O Brasil não havia ainda desenvolvido a arte tipográfica por proibição do governo
português, que fornecia as leituras ao povo brasileiro conforme o seus interesses políticos e
religiosos. Desse modo, Portugal limitou, tanto quanto possível, o desenvolvimento cultural e
econômico do Brasil, com o objetivo único de obter vantagens financeiras e a centralização do
poder, seja ele ideológico, moral, ético, econômico ou político.
Em 1808, a monarquia portuguesa foi obrigada a estabelecer uma política interna no
Brasil, pois até então, Portugal restringia todo tipo de comércio na colônia com altas taxas e
impostos. Agora, porém, a situação mudara com a presença do reino português. Assim, D.
João reduziu e aeliminou algumas leis de circulação e comércio. Providenciou a abertura
dos portos e o comércio com outros países, em especial, a Inglaterra e criou o Aparelho de
Estado como órgão do governo civil, administrativo, judiciário e militar.
69
Nesse inter-espaço, entre o estado de colônia e nação brasileira, ocorreu um processo
de independência que em muitos sentidos ainda não foi concluído. Enquanto Colônia, o
Brasil não desenvolveu nenhuma legislação que realmente causasse efeito na sociedade. No
âmbito da literatura, tem-se o registro do Artigo 39. do Decreto de 4 de julho de 1821, por
exemplo, que determinava a punição do autor, do editor e do impressor, caso fosse produzido
materialmente e colocado em circulação um livro considerado proibido pela Igreja ou Estado
(LAJOLO; ZILBERMAN, 2001). Além da ação cerceadora, a punição de todos os envolvidos
comprova a falta de compreensão sobre a questão da propriedade e responsabilidade do texto
escrito, ou seja, o impressor e o livreiro deveriam estar atentos quanto ao conteúdo dos livros
produto mercadológico, mas também ideológico para que não sofressem possíveis
punições pela distribuição do produto indesejável aos olhos dos governantes.
No Brasil, a censura era rigorosa e as obras deveriam ter uma permissão oficial para
serem impressas. Como mencionado no capítulo anterior, as poucas tipografias que existiam
no Brasil eram, exclusivamente, usadas e mantidas pelo governo para impressão de registros
oficiais e administrativos.
A independência do Brasil foi proclamada em 1822, porém, o reconhecimento do fato
por outros países, inclusive Portugal, demorou alguns anos:
Apesar da separação de Portugal, a intenção fracassou: a nova nação não
superou a organização importada da fase colonial, nem teve condições de se
modernizar. No plano cultural, persistiu a precariedade dos meios de
produção intelectual, de que adveio um profundo desencontro entre as
expectativas do projeto e seus resultados (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p.
11).
Durante o reinado de D. Pedro I (1822 a 1831), o Brasil ainda encontrava-se sobre o
julgo do governo português exercido em Portugal, do próprio regimento monárquico e da elite
portuguesa que se instalara no Brasil. Após a morte de D. João em Portugal, D. Pedro I foi
declarado rei e retornou à Europa, iniciando um período de instabilidade e crise política e
financeira no Brasil.
O novo país ainda não havia firmado uma política de Estado que realmente
funcionasse, além de haver diversas facções sociais que acentuavam a desigualdade entre
portugueses e brasileiros. Em 1830, por exemplo, havia um código criminal, o artigo 261 do
Império, que proibia qualquer impressão nas terras brasileiras e principalmente se esse texto
fosse composto por cidadãos brasileiros. Assim, dificilmente um autor brasileiro publicava no
Brasil, a o ser quando esses termos eram visivelmente violados. Com essa lei, Portugal
70
concentrava toda a produção de livros, desvalorizava a produção artística e literária brasileira,
dificultando, principalmente, a formação da identidade e de princípios ideológicos no Brasil.
No entanto, foi nesse período transitório que alguns intelectuais da época discutiram
questões importantíssimas sobre a manifestação e produção da arte literária. Almeida Garrett,
em 1839, após a aprovação de um artigo que garantia a propriedade ao criador da obra,
discutiu a natureza da propriedade literária. Para Garrett, não bastava a criação mental do
autor, era preciso que a sociedade a aceitasse e completasse o processo de comunicação
(LAJOLO; ZILBERMAN, 2001). A discussão propõe olhar para a obra o apenas como
objeto material e comercial, mas para o valor estético e artístico do texto, independente de seu
suporte físico.
A questão colocada por Garrett, sobre o valor estético da obra, é algo a ser analisado e
considerado até os dias de hoje. Os contratos editorias levam em conta o valor econômico,
proporcionando ao livro uma legibilidade a partir da absorção da materialidade do objeto
literário:
Em todos eles, a remuneração do escritor é calculada a partir da
materialidade de um conjunto de volumes, e não a partir de uma abstrata
noção de texto, imaterialidade sobre a qual se constroem os estudos literários
(LAJOLO; ZILBERMAN, 2001, p. 116).
D. Pedro II assume o trono brasileiro, em 1840, e cria o novo código criminal, contra
qualquer subversão política; reestabelece o Conselho de Estado, incluindo o cargo de Chefe
de Polícia, o Senado e a Câmara dos Deputados. As inovações seguiram o modelo inglês do
sistema parlamentarista, resolvendo, aparentemente, as crises e os protestos sociais constantes
na época.
Nesse período, em especial, notam-se algumas evoluções no sistema literário
legislativo e em sua produção e circulação, que começou a apontar por meio da liberação da
venda de jornais, periódicos, do incentivo à leitura e escolarização.
Na década de 1850, a preocupação era ampliar as relações do comércio livreiro com
outros países e concorrer com os lucros advindos da indústria editorial com as exportações
36
.
Em 1857, o político Quintino Bocaiúva lastimava a ausência de leis específicas e
relevantes para as produções artísticas e literárias do País. A rigidez da censura portuguesa
sobre sua colônia, entretanto, eram burladas evidentemente, com os plágios e a pirataria,
36
Até esse momento, Portugal monopolizava toda produção e circulação de livros e impressos no Brasil.
71
práticas comuns na época. Se delatadas poderiam responder a processos judiciais criminais
(HALLEWELL, 1985).
No âmbito econômico, a editora francesa Garnier foi a primeira empresa a tomar a
iniciativa de remunerar os tradutores e autores brasileiros, impulsionando e valorizando a
produção livreira no Brasil.
diversos tipos de documentos, como cartas de correspondência entre escritores,
amigos ou familiares, contratos editoriais e outros que desenham a situação econômica e
social do escritor brasileiro do século XIX. Lajolo e Zilberman (2001) analisam, por exemplo,
um contrato de 1858 entre João Batista Callógeras e o editor B.L.Garnier. O contrato
especifica as condições de impressão da obra, como o número de tiragens programadas para a
primeira edição e a data prevista da publicação. informações sobre os direitos do autor em
receber uma remuneração, que na época equivaleria ao trabalho de um ano de um professor, e
o direito de receber alguns exemplares para distribuição pessoal. O editor tinha o direito de
gozar de todos os benefícios advindos da primeira edição. Esse contrato contava
especialmente com a aprovação do Conselho da Instrução Pública, por ser uma obra de caráter
didático e indicado para o uso escolar.
Nem todos os escritores brasileiros, porém, contavam com a gentileza dos editores.
muitos documentos comprovando que os autores recorriam aos advogados a fim de reverter as
injustiças advindas dos contratos e compromissos.
Lajolo e Zilberman (2001) notam um contrato de 1867 entre Garnier e Joaquim
Noberto Sousa Silva, a cláusula que obriga o autor, caso necessário, acrescentar ou melhorar a
obra sem direito de exigir remuneração por esse trabalho.
No caso dos livros didáticos de literatura, foi preciso desenvolver leis específicas
que se utilizavam partes de textos literários de diversos autores sem, muitas vezes, haver
permissão para tais republicações. Esses e outros problemas inspiraram a criação de leis que
garantiriam os direitos do autor e das editoras.
No Brasil de 1880, a indústria editorial ainda não se firmara e os altos custos do papel
tornavam a produção estrangeira mais vantajosa. A desvalorização do trabalho editorial
brasileiro só compromete a emancipação política e cultural do País, adiando a formação
crítica do cidadão, a profissionalização do escritor e o desenvolvimento das instituições
literárias.
Cada casa editorial estabelecia sua política interna: Garnier, por exemplo, costumava
apenas publicar grandes nomes da velha geração por considerar as vendas seguras. Assim,
dificilmente os autores contemporâneos tinham a oportunidade de publicar suas obras, a não
72
ser que contassem com um apoio e a recomendação pessoal de um agente político ou escritor
renomado.
Para incentivar a leitura e a divulgação de autores brasileiros foram criadas algumas
instituições de fomento, como a Associação dos Homens de Letras do Brasil, em 1883, que
fazia propagandas e intercâmbios culturais (inicialmente com os países latino-americanos),
prestando homenagens aos grandes escritores brasileiros. Como instituição de interesses
específicos, lutava “sobretudo pela consolidação de normas legais que assegurem o estatuto
profissional do escritor e facilitem a impressão e circulação dos livros editados” (LAJOLO;
ZILBERMAN, 2001, p. 134).
Como se pode observar, durante o período colonial, o Brasil nada pôde realizar em
termos legais e comerciais devido ao forte controle da Coroa portuguesa, a não ser importar
leis e discutir projetos, que, no entanto, não contavam com nenhum órgão regulador e
fiscalizador. Alguns historiadores, literários e estudiosos dessa época demonstravam certos
interesses além da liberdade e proteção de suas produções textuais, buscando, sobretudo, a
liberdade política – elemento primordial para elaboração de novas leis.
O segundo momento distinto na formação de uma legislação brasileira teve, como
fator determinante, a proclamação da República (1889). O novo sistema de governo, apesar
das diversas crises, elaborou uma legislação sobre o comércio livreiro, aos moldes das leis
norte-americana e inglesa.
A inserção social do escritor está intrinsecamente ligada à revolução burguesa
experimentada pelo País. Segundo Lajolo e Zilberman (1991), essa experiência de
aburguesamento no Brasil ocorre de maneira parcial e incompleta, devido ao atraso cultural e,
principalmente, pelos frustrantes projetos de modernização.
O Brasil acompanhou as conquistas da convenção Pan-Americana de Direitos
Autorais, que se reuniu pela primeira vez em Montevidéu, em 1889, e aprovou a primeira lei
sobre os direitos autorais.
A iniciativa “[...] inspirou os criadores da nova Constituição Republicana de 1891 a
incluir uma cláusula relativa aos direitos do autor, mas esta só recebeu apoio legal com a Lei
946, de 1. de agosto de 1898, aprovada por causa da agitação liderada por Medeiros e
Albuquerque” (HALLEWELL, 1985, p. 171)
A convenção Pan-Americana era formada por diversos países e tinha como objetivo
discutir a criação de leis sobre as produções artísticas em geral. Segundo Hallewell (1985), a
convenção teve papel importante no incentivo e criação da legislação no Brasil,
principalmente, com a campanha realizada em Berna (Bruxelas), em 1896, onde os
73
participantes apoiaram pessoalmente os projetos de Medeiros e Albuquerque. Entretanto, o
revolucionário brasileiro não aceitou qualquer acordo internacional, pois estava interessado
apenas em garantir as obras dos cidadãos brasileiros e dos estrangeiros residentes no País,
controlando a produção livreira de cada estado com seus próprios autores. Nesse caso, os
direitos de um autor brasileiro que não residia em seu estado de origem, mas em qualquer
outro do País, tinha seus direitos incertos devido aos pedidos e interesses da editora local.
Praticamente todos os autores brasileiros não-residentes nos estados facilitadores como São
Paulo e Rio de Janeiro, simplesmente perderam seus direitos e a chance de publicar seus
trabalhos, pois dificilmente havia editoras e gráficas no restante do território brasileiro, se não
nas capitais.
Os direitos confinados aos autores portugueses, após a independência do Brasil, não se
concretizou, pelo contrário, as editoras brasileiras esforçavam-se, mesmo ilegalmente, para
reproduzir as obras portuguesas e inseri-las no contexto popular do Brasil. Essa realidade
encontra reflexo até hoje nos livros didáticos, nos quais autores portugueses e brasileiros se
confundem como autores da literatura portuguesa ou brasileira como, por exemplo, Antônio
Vieira, Almeida Garrett, Gregório de Matos e outros.
Para Hallewell (1985, p. 174), porém, “foi precisamente a ausência da proteção de
direitos autorais estrangeiros que salvou a nascente indústria editorial brasileira de ser
destruída [...]”.
Para o historiador, seria extremamente difícil para os autores brasileiros competirem
em grau de igualdade com as maiores potências internacionais como Portugal e França,
principais concorrentes da época.
As crises políticas e econômicas do País, nos primeiros anos de emancipação, foram as
principais causas da destruição dos acervos e livrarias, incêndios provocados e perseguições
pessoais ou das instituições tipográficas e jornais. Na década de 1890, os escritores deveriam
apresentar os mesmos ideais das classes dominantes – a saber, republicano – para que
pudessem ter a chance de penetrar nas elites literárias e artísticas. Assim, nota-se a presença
velada, mas real, de princípios reguladores da vida literária de cunhos estritamente
ideológicos.
Nessa mesma época, Pardal Mallet, jornalista gaúcho, redige algumas cartas abertas e
reivindicatórias sobre a questão da propriedade literária ou dos direitos autorais. Mallet
argumenta sobre o princípio da profissão artística que é um trabalho digno de remuneração;
denuncia os problemas advindos da falta de uma legislação como as traduções baratas,
transcrição de textos em compêndios escolares sem a devida permissão e remuneração do
74
autor, etc; sugere um projeto de leis que garanta os direitos do autor em vida e pós-morte, o
direito de explorar a obra no domínio literário e artístico, regulamentação do domínio público
e reprodução da obra apenas com autorização (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001).
As reivindicações têm alcance não apenas no âmbito judicial, mas para a renovação
dos conceitos do artista, agora como profissional e inserido no sistema moderno da economia
social:
[...] o livro tem um preço, qual seja, o valor de troca que detém no mercado.
Resultado de força de trabalho e de aplicações financeiras, ele deve propiciar
ganhos a todos os que participam de sua produção e circulação. Vinculado
ao mercado, supõe legislação específica, a que compete regular seu custo e
controlar sua circulação (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001, p. 160).
Os escritores brasileiros, porém, eram pouco lidos e valorizados. O restrito número de
leitores detinha-se em obras estrangeiras. Até 1930, os livros de autores brasileiros e
traduções eram impressos em outros países como a França, pois, os altos custos do papel,
tinta, encadernação, impostos, despesas publicitárias e outros, elevavam o preço do livro feito
no Brasil, impossibilitando a produção e aumentando o preço para o consumidor.
No século XX, no Brasil, a inexistência de leis eficientes e de órgãos interventores que
protegessem os direitos autorais facilitou a abertura e implantação das editoras em território
nacional.
A IV convenção Pan-americana de Direitos Autorais incentivou o congresso brasileiro
a decretar a lei 2.577 de 17 de janeiro de 1922, a qual prolongava a duração dos direitos
autorais até 60 anos após a morte do autor e 10 anos para traduções.
Em 1924, Brasil e Portugal suspendem as taxas alfandegárias de circulação de livros e
garantem os direitos autorais de ambos os países. Numa atitude otimista, o governo brasileiro
estabeleceu acordos sobre a produção e comércio de livros, com todos os países estrangeiros
membros da convenção dos Direitos Autorais, provocando, assim, cautela dos editores
brasileiros, devido à concorrência.
As casas editoriais passaram a preferir comprar os direitos totais e definitivos de uma
obra a ter que pagar pela porcentagem das vendas, correndo, muitas vezes, o risco de ter que
renegociar devido às ofertas de outras editoras. O fato prejudicou diversos autores de sucesso,
diminuindo as chances de obras serem traduzidas e divulgadas em outros países, por falta de
acordo entre as editoras. As obras de sucesso normalmente eram reeditadas como parte de
coleções de “autores célebres” da literatura brasileira, e os autores nada ganhavam com isso.
75
Em alguns estados brasileiros, em especial São Paulo e Rio de Janeiro, devido ao
desenvolvimento industrial e econômico do país, a vida intelectual, artística e literária, de
igual forma, passam a rivalizar certa competição em relação ao mercado livreiro, provocando
um renascimento da indústria editorial brasileira, caracterizada, principalmente, pelas
manifestações artísticas como o modernismo.
Apesar das atitudes defensivas das editoras brasileiras, devido à abertura do mercado
internacional, nos anos 30, o valor do produto industrial brasileiro cresceu significativamente.
Esse vertiginoso crescimento econômico patrocinou importantes mudanças no mundo
editorial, estabilizando o pagamento dos direitos autorais, das reedições, melhorando a
qualidade do comércio dos livros.
Juntando-se à melhora do quadro da produção editorial, tem-se, por outro lado, o
incremento e especialização do público leitor, patrocinado, sobretudo, pelas ações de
modernistas e dos autores de um catolicismo renascido e politicamente engajado que
ajudaram a definir os partidos de direita e esquerda (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001). A partir
de 1933, também se tornou possível a venda de livros sob encomenda pelos correios por meio
do sistema de reembolso postal - grande novidade da época e facilitadora no circuito de
distribuição do livro (PAIXÃO, 1998).
Nota-se que o elemento regulador de natureza ideológica continuou a influenciar na
vida literária, inclusive, na produção, circulação e distribuição de livros. Mesmo sem a ação
direta e visível de instituições como a Igreja, no período da inquisição, ou da nobreza, durante
as monarquias, a ideologia permanece atuando com outras roupagens, por meio de outras
instâncias discursivas (a crítica, a escola, as academias e outras).
A censura caracterizou a vida brasileira desde a queda do Império. Qualquer material
que contrariasse os ideais do estado e da igreja era proibido. Assim, a censura se justificava
como um bem necessário para a manutenção da ordem pública e evitava que pessoas,
principalmente ilustres e governantes, fossem alvos de comentários pejorativos e falsas
notícias.
Com a opressão do governo Vargas, a censura acabou colaborando para o comércio de
livros e para a formação de um diferenciado público de leitores que procuravam se instruir por
meio da crítica social encoberta, principalmente, em textos literários ficcionais e em letras de
músicas.
As editoras eram perseguidas por publicar obras de cunho comunista, integralista ou
fascista. Condenava-se também o uso da linguagem erótica ou de termos políticos, até mesmo
algumas obras infantis foram queimadas por serem consideradas subversivas. As perseguições
76
incluíam a deportação de autores, músicos e intelectuais suspeitos de implantarem novas
idéias contra o governo (HALLEWELL, 1985). Ainda na década de 50:
[...] o Artigo 666, parágrafo primeiro, do Código Civil permitia a um autor
incorporar partes de obras já publicadas a seu próprio texto, desde que este
fosse de natureza científica ou tivesse o propósito literário, didático ou
religioso – a assim chamada cláusula de “reprodução lícita” (HALLEWELL,
1985, p. 441).
A prática causou transtornos ao pagamento de autores que não eram remunerados por
ter partes de suas obras republicadas. A lei também abriu espaço para as cópias
mimeografadas de textos para os estudantes, diminuindo, assim, a venda de livros. Nota-se
que até hoje, muitos autores, de certa forma, são prejudicados pela lei que assegura a
reprodução de fragmentos das obras sem intenção de lucro: as fotocópias que invadem os
meios estudantis e acadêmicos e os próprios resumos elaborados pelo professor ou as críticas
das obras substituem as leituras integrais das obras, inferindo negativamente no ensino e na
formação de opinião crítica dos estudantes. O fato modificou a própria noção e forma de
aprendizagem das novas gerações.
Atualmente existem algumas associações como a Associação Brasileira de Direitos
Reprográficos (ABDR), fundada em 1922 e a Associação Brasileira para a Proteção dos
Direitos Editoriais e Autorais (ABPDEA)
37
, criada em 1999, que reúnem as mais importantes
editoras de livros no Brasil a fim de conscientizar a população sobre a necessidade de se
respeitar os direitos autorais. Essas associações funcionam como um espaço para discussões e
atuam na fiscalização e repressão contra a pirataria e a reprodução ilegal de obras publicadas
no Brasil. Desde abril de 2004, foi proibida a reprodução parcial ou integral de obras com o
intuito de lucro. Qualquer casa de cópias (xerocadoras ou fotocopiadoras) está sujeita à multa,
apreensão das quinas de fotocópia, papéis e outros materiais, caso não respeite o direito
autoral de edições de livros
38
.
No governo de Juscelino Kubitscheh (1956), reivindicou-se a redução dos impostos do
papel para impressão, e o direito de financiamento para as editoras como as demais empresas
industriais. A indústria editorial cresceu significativamente com a abertura e modernização do
parque gráfico. Os impostos alfandegários foram abolidos em 1957 tornando o comércio
brasileiro competitivo com o estrangeiro.
37
Cf. quarto capítulo desta dissertação.
38
Informações obtidas nos endereços eletrônico: <http://www.abdr.org.br/ e http://www.abdr.org.br/sent.html>.
Acesso em: 28 jan. 2006.
77
Em 1959, em decreto, constituiu-se um órgão no Ministério da Educação para estudar
os problemas da indústria editorial, o Grupo Executivo da Indústria do Livro (GEIL), formado
por representantes das editoras, livreiros, gráficas, instituições e os ministérios da Educação,
Fazenda e Transporte, a fim de agir coerentemente na política governamental (HALLEWELL,
1985).
Durante o governo de Kubitschek houve um crescimento na produção brasileira,
beneficiando o ramo editorial. Os anos a seguir, porém, acompanharam altos índices de
inflação, reforçado no sistema livreiro pela restrição das vendas e produção apenas no eixo
Rio - São Paulo.
Jânio Quadros, para inverter a política adotada anteriormente, “estendeu às
importações de papel as taxas de câmbio do mercado livre” e ainda “retirou o subsídio
compensatório aos fabricantes brasileiros de papel” (HALLEWELL, 1985, p. 457). A medida
elevou os preços do papel, dificultando a impressão de livros no Brasil, tornando a impressão
arriscada, o comércio escasso e a distribuição deficiente.
A seguir, o governo criou o Grupo Executivo das Indústrias de Papel e Artes Gráficas
(GEIPAG), um órgão próprio para auxiliar a indústria gráfica, o qual colaborou para a
formulação do decreto-lei n. 46, de 18 de novembro de 1966, que isentava os maquinários
novos para a produção industrial de livros das taxas alfandegárias. O Brasil, inclusive, passou
a contar até com o sistema offset e máquinas de acabamento.
Na cada de 70, seria o aumento do custo de energia e do transporte gerados pela
crise mundial do petróleo que atingiram a indústria editorial no Brasil. Também o preço do
papel subiu com o esgotamento das reservas de madeira e das leis de antipoluição. O
comércio de livros parte para o sistema crediário e apela para as vendas de porta em porta
atingindo os bairros mais pobres da população.
Nessa época o elemento ideológico ainda atuava e restringia a produção de livros e a
liberdade dos autores. O Brasil contava com cerca de 500 títulos proibidos amparados pelo
decreto-lei nº. 427, de 1977 da censura prévia ade livros importados. Muitos livros foram
confiscados por remeterem à doutrina socialista, marxista ou comunista, outros, porém,
circulavam por algum tempo com títulos enigmáticos enquanto que a maioria já era
perseguida antes mesmo de serem publicados. Por outro lado:
Na vastidão do Brasil existe uma outra indústria editorial, completamente
distinta, cujo público leitor se encontra principalmente entre as classes mais
humildes das pequenas cidades e da zona rural do país e, sobretudo, nas
regiões mais pobres e atrasadas (HALLEWELL, 1985, p. 534).
78
A literatura produzida por esses é a conhecida “literatura de cordel” ou folhetos de
feira”. No Brasil destaca-se a gráfica de Athayde (1935), como a mais prolífera editora de
folhetos de cordel do Nordeste. Os escritos desse gênero costumam trocar insultos, desafiar os
adversários com o canto e denunciar explorações políticas. O novo estado impôs também a
censura prévia para esse tipo de impresso, a fim de evitar comentários políticos indesejados.
Segundo Hallewell (1985), hoje é possível incluir a produção de cordel num sistema
econômico por meio dos métodos modernos de impressão e a consciência da preservação da
cultura brasileira. Até as leis dos direitos autorais têm permitido aos autores de cordéis
participarem dos rendimentos das vendas.
Na década de 80, o ramo livreiro prosperou e as editoras como Sciliano, Nova
Fronteira, Codecri, Alfa-Ômega, Globo, Brasiliense, Nórdica, Paz e Terra, Vozes e outras,
destacaram-se oferecendo variadas opções de leitura, tendo a Distribuidora Record de
Serviços de Imprensa Ltda, a maior editora de livros didáticos do País e a Melhoramentos de
literatura infantil:
Os livros didáticos proporcionam uma linha de vendas segura e permanente;
dão também ao editor nacional uma vantagem sobre competidores
estrangeiros, cujos produtos jamais podem adaptar-se tão bem às condições
ou currículos locais (HALLEWELL, 1985, p. 207).
O modelo escolar elitista estava sendo substituído pelo sistema de escola pública, o
que impulsionou a formulação de novos métodos educacionais e o mercado de livros
didáticos.
O surgimento e o desenvolvimento do ambiente estudantil sempre foi responsável pela
mudança política das editoras. A concretização da escola de Direito em São Paulo, por
exemplo, incentivou o aparecimento de livrarias e tipografias de impressão de livros
acadêmicos. Os momentos de crise e inconstância das escolas e universidades refletiam
diretamente na produção de livros, uma vez que os estudantes eram os principais
consumidores da produção livreira (HALLEWELL, 1985; PAIXÃO, 1998).
No final do século XX, as relações entre as editoras e os autores no Brasil, em relação
aos contratos e preservação dos direitos autorais, têm mostrado certa inconstância. Segundo
Piacentini (1991), normalmente, a editora e o autor assinam um contrato que estabelece um
valor pela compra da obra ou um salário definido, caso o investimento em tal escritor seja
79
considerado regular e seguro. No documento fica claro a duração e extensão do direito da
edição presente, assim como os direitos assegurados de cada uma das partes dos envolvidos.
A obra literária, antes de ser publicada ou aceita pela editora, é lida e revisada pelo
editor responsável e seus assistentes a fim de avaliar o interesse e o potencial comercial da
obra diante do mercado. Assim, dificilmente um editor arrisca-se em lançar um novo autor
devido às inconstâncias do mercado consumidor. Prefere-se, desse modo, a publicação de
livros best-sellers e clássicos, pois esses, geralmente, são indicados pela escola.
Apenas os meios intelectuais ou leitores específicos (e identificáveis) de certas áreas
do conhecimento podem ser relativamente previsíveis quanto ao próximo conteúdo a ser
lançado. Além disso, a maioria das livrarias ainda precisa selecionar as obras que as editoras
lhe dispõem a fim de atingir seus públicos.
Diversos fatores influem na escolha de determinadas obras, como, o grau de
escolaridade, a opinião crítica, a posição sócio-profissional, os hábitos, a idade, etc.. Em geral,
a escolha de um título se por indicação da escola, universidade ou trabalho e, depois, por
curiosidade, informação ou gosto pessoal.
A popularização de um autor ou de uma obra devido às propagandas e à crítica
também incentiva o consumo dessas obras. Além disso, a indústria editorial conta com grande
aliada: a imagem positiva do livro e da leitura. No geral, o objeto literário é símbolo de
riqueza cultural e prestígio, afinal é o livro que distingue as camadas intelectualizadas.
Piacentini (1991), ao tratar da relação dos autores brasileiros e editores, observa que a
maioria dos escritores encontra dificuldades no processo de inserção no universo editorial e
literário. Diversas obras foram negadas num primeiro momento e muitos contatos editoriais só
foram possíveis por meio da ajuda e/ou indicação de grandes autores, enquanto que outros
pagaram por suas estréias
39
.
Como declara Tânia Faillace:
A edição de livros depende muito mais de fatores extra-literários que
literários: amizades, recomendações ou apadrinhamentos, fator Moda,
projeção pessoal do autor, apoio universitário ou político, panelinhas
diversas (FAILLACE 1991 apud PIACENTINI, 1991, p. 60).
39
Como observado anteriormente, as editoras contam com a leitura prévia de leitores contratados. Como
Piacentini (1991) afirma, esses grupos são normalmente formados por professores universitários, porém, as
escolhas se dão mais pelo retorno financeiro do que pela qualidade literária.
80
Alguns autores participam das propostas editoriais e outros contam com agentes
literários, encarregados de subsidiar os contratos, salários e outros. Após o reconhecimento do
autor no mercado, é mais fácil inclusive receber propostas das editoras.
Os lançamentos de obras e autores contam com o incentivo das bienais, feiras de livros
e prêmios literários, esses fomentos e críticas dão à obra um singular valor.
Piacentini (1991) critica o posicionamento das editoras em relação ao escritor, que não
esclarecem os critérios avaliativos da pré-seleção feita pela casa editorial, assim como não
estabelecem com o autor um diálogo produtivo quanto aos novos movimentos e
manifestações literárias atuais. Os resultados das avaliações de um texto para publicação são,
raramente, expressas ao autor.
O pagamento é feito de seis em seis meses sendo o direito do autor de 10% sobre o
preço do livro vendido no mercado. Segundo Piacentini (1991, p. 80), a “Lei n. 5998/73, que
trata dos Direitos Autorais no Brasil, não estabelece nem quantia, nem prazos, nem formas de
pagamento”.
Entretanto, na prática, o controle das vendas não existe. A maioria dos escritores
desconhece seus direitos e pouca ação por parte dos sindicatos, como o Sindicato dos
escritores do Rio de Janeiro, União Brasileira de Escritores (UBE), e outras entidades
relacionadas ao livro
40
.
A Lei ainda trata dos direitos morais do autor como:
[...] o direito à paternidade, o de conservar a obra inédita ou de publicá-la, o
de definir a forma final da obra, o direito ao renome autoral, o de modificar a
obra, o de publicá-la anonimamente ou sob pseudônimo, o direito de
arrependimento, estabelecendo também limites de exercício, que são os
direitos que o próprio autor concede a terceiros (PIACENTINI, 1991, p. 82).
As editoras precisam repensar seus contratos, estabelecer um diálogo entre as partes
envolvidas, tendo em vista as grandes potencialidades da obra no futuro. As relações entre
editora e autor devem ser revistas no sentido da necessidade da própria concretização da
“profissionalização” do escritor e suas relações com a indústria cultural.
Nesse sentido, faz-se necessário também revisar as leis que asseguram as adaptações
cinematográficas, musicais, teatrais, televisivas, radiofônicas, edições em microfilme, livros
de bolso, edições especiais, didáticas, populares, reimpressões, antologias, direitos de
fotocópias e outros. Os direitos o devem apenas tratar da reprodução e venda do produto,
40
Cf. Anexo E
81
mas sim, abranger e trabalhar com as futuras e eventuais transmutações, adaptações e
transformações que possam ser sofridas por um texto original, considerando, principalmente,
em tempos de grandes e inovadoras tecnologias.
A Editora Abril, por exemplo, foi uma das primeiras editoras a renovar o contexto
com as edições em fascículos, os quais o próprio leitor reunia e encadernava. Editou também
os gibis, histórias em quadrinhos e revistas femininas, técnicas, noticiários e política,
almanaques e guias de viagem, revistas culturais e didáticas sobre música, teatro, ciências,
história, curiosidades e línguas estrangeiras, todas em parceria com o grupo O Globo (editora
de revistas e rede televisiva Rede Globo). A produção era vendida especialmente nas bancas
de revistas autorizadas e através das campanhas publicitárias feitas na televisão
(HALLEWELL, 1985; PAIXÃO, 1998).
Outras leis foram compostas para dar conta de toda diversidade tecnológica e
problemas que surgiram em torno dos direitos autorais, como as traduções, adaptações, co-
autoria, livros específicos que reúne autores diferentes, etc..
A própria web pode ser considerada uma nova instância dentro do sistema literário,
pois, agrega um universo editorial virtual completo composto por livrarias, bibliotecas, sebos,
pontos de vendas virtuais e, portanto, regidos por diferente legislação. É uma forma diferente
de as instituições reais co-existirem no mercado. Nesse meio, porém, maiores índices de
violação dos direitos autorais.
Recentemente no Brasil, representantes do Ministério da Cultura (MinC), do Serviço
de Processamento de Dados (Serpro), do Ministério da Fazenda e entidades empresariais
ligadas à produção do livro, reuniram-se em São Paulo para definir os padrões tecnológicos
do livro digital. As normas estabelecidas, como o formato Daisy, deverão evitar a pirataria e
garantir uma qualidade digital nos materiais produzidos pelas editoras especializadas
41
. O
livro digital tem como objetivo ampliar o acesso à leitura de deficientes visuais e analfabetos
funcionais.
Como se pode ver, extrema dificuldade em conciliarem-se os aspectos literários e
artísticos com aspectos econômicos que influenciam, de forma importantíssima, o sistema
literário. A obra de arte necessita especificamente de sua produção em âmbito físico e
material para que exista e complete seu circuito por meio da leitura do leitor. Nesse espaço, os
sistemas legislativos agem a fim de garantir a materialização do livro enquanto objeto e
41
Informações disponíveis em: <http://www.abec.com.br/interna.asp?idCliente=35&acao=noticia&id=8844>.
Acesso em: 28 jan. 2006.
82
material rentável e o faz a partir de princípios, cujos aspectos ideológicos e políticos atuam
intensamente.
As relações entre os processos de regulação do mundo da produção do livro, com
todas as suas marcas ideológicas e os interesses econômicos vigentes - pois, afinal, o livro é
um produto afastam ou ao menos colocam em suspenso uma noção de literatura enquanto
arte desvinculada do mundo, fruto apenas da inspiração e da gratuidade do poeta.
3.4 Leis e decretos da produção e circulação de livros no Brasil
A seguir, um resumo comentado de leis e decretos significativos na recente história da
produção e circulação de livros e/ou impressos no Brasil.
DECRETO-LEI N° 824, DE 5 DE SETEMBRO DE 1969
Esse decreto foi assinado por Augusto Hamann Rademaker Grünewald, com o apoio
de Aurélio de Lyra Tavares e Márcio de Souza e Mello (ministros da marinha, do exército e
da aeronáutica), no ano de 1969.
Conforme o artigo 1º, “as editoras e gráficas brasileiras, situadas em qualquer parte do
território nacional, o obrigadas a remeter ao Instituto Nacional do Livro um exemplar de
cada obra que editarem, no prazo de 10 (dez) dias após o seu lançamento público”. A entrega
dos exemplares para o INL poderia ser feita gratuitamente pelos correios e o não
cumprimento da lei implicaria em multa.
Segundo o decreto, caberia ao Instituto Nacional do Livro divulgar em sua Biblioteca
Brasileira Mensal todas as obras recebidas em virtude do decreto. Para efeito de contribuição
e de apreensão, as obras estrangeiras seriam equiparadas às nacionais, desde que constasse a
indicação de editor domiciliado no Brasil.
Em 1987, o decreto é absorvido pela Fundação Nacional Pró-Leitura pela Lei n°
7.624. Posteriormente, com a fim da Fundação Nacional Pró-Leitura, as competências
originárias do INL foram transferidas para a Fundação Biblioteca Nacional. A Bibliografia
Brasileira é atualmente editada pelo Departamento Nacional do Livro da Fundação Biblioteca
Nacional, com periodicidade trimestral.
83
DECRETO Nº 75.699, DE 6 DE MAIO DE 1975
O decreto estipula a validade das leis elaboradas na Convenção de Berna em 1886 e
revista em Paris em 1971, para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, a vigor no
território nacional brasileiro a partir de 20 de abril de 1975, assinado pelo Presidente da
República, Ernesto Geisel, e aprovado pelo Congresso Nacional.
Os países que aprovam a lei participam em União para o cumprimento e proteção dos
direitos dos autores sobre suas obras literárias e artísticas. Segundo o decreto, entende-se por
obras literárias e artísticas:
[...] todas as produções do domínio literário, científico e artístico, qualquer
que seja o modo ou a forma de expressão, tais como os livros, brochuras e
outros escritos; as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma
natureza; as obras dramáticas ou dramático-musicais; as obras coreográficas
e as pantomimas; as composições musicais, com ou sem palavras; as obras
cinematográficas e as expressas por processo análogo ao da cinematografia;
as obras de desenho, de pintura, de arquitetura, de escultura, de gravura e de
litografia; as obras fotográficas e as expressas por processo análogo ao da
fotografia; as obras de arte aplicada; as ilustrações e os mapas geográficos;
os projetos, esboços e obras plásticas relativas à geografia, à topografia, à
arquitetura ou às ciências. (ARTIGO 2., PARÁGRAFO 1).
Cada país deverá especificar em legislação as categorias que não se beneficiam do
decreto enquanto não estiverem fixadas num suporte material.
As adaptações, traduções e compilações de obras literárias (enciclopédias e antologias,
por exemplo) são protegidas como obras originais, sem prejudicar os direitos do autor da obra
original.
A proteção não se aplica às notícias do dia ou ocorrências de caráter informativo de
imprensa (jornais e outros). Cabe aos países da União formular regimentos que estabeleçam
se as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza, pronunciadas em
público, poderão ser reproduzidas pela imprensa, transmitidas pelo rádio, pelo telégrafo para o
público e constituir objeto de comunicações públicas. A lei não proíbe do próprio autor reunir
seus discursos e publicá-los em coleção.
A Convenção compromete-se em proteger os direitos dos autores nacionais de um dos
países unionistas, quanto às suas obras, publicadas ou não. Protegerá também os autores não
nacionais, mas residentes no país unionista; e aos autores não nacionais que publicarem sua
obra em algum país pertencente à União.
Entende-se, segundo o decreto, como obras publicadas:
84
[...] as obras editadas com o consentimento de seus autores, seja qual for o
modo de fabricação dos exemplares, contanto que sejam postos à disposição
do público em quantidade suficiente para satisfazer-lhe as necessidades,
levando-se em conta a natureza da obra. Não constituem publicação a
representação de obras dramáticas, dramático-musicais ou cinematográficas,
a execução de obras musicais, a recitação pública de obras literárias, a
transmissão ou a radiodifusão de obras literárias ou artísticas, a exposição de
obras de arte e a construção de obras de arquitetura (ARTIGO 3.,
PARÁGRAFO 3.).
Para o decreto, o autor sempre conservará o direito de “reivindicar a paternidade da
obra e de se opor a toda deformação, mutilação ou outra modificação dessa obra, ou a
qualquer dano à mesma obra, prejudiciais à sua honra ou à sua reputação” (ARTIGO 6. BIS,
PARÁGRAFO 1.).
O decreto reconhece os direitos do autor depois de sua morte, podendo ser exercido
pelas pessoas físicas ou jurídicas indicadas por lei, mas prevê a inexistência da legislação
interna de alguns países para tal exercício, cabendo a esses explicitar o não direito após a
morte.
Segundo o decreto, a duração da proteção concedida pela Convenção corresponde à
vida do autor e cinqüenta anos depois de sua morte. Os países da União o são obrigados a
proteger os direitos de obras anônimas ou pseudônimas quando não reveladas a verdadeira
autoria. Em qualquer caso, a duração da proteção após a morte do autor será regulada por leis
de cada país independentemente.
O Brasil, então, passa a pertencer aos países da União, gozando dos direitos
estabelecidos pela Convenção.
DECRETO Nº 76.905, 28 DE DEZEMBRO DE 1975
O Presidente da República, Ernesto Geisel, sob aprovação do Congresso Nacional,
estabelece o Decreto Legislativo nº 55, de 28 de julho de 1975, da Convenção Universal sobre
Direito de Autor, revista em Paris, a 24 de julho de 1971.
Em especial, o decreto estabelece a apresentação de certas formalidades para que o
autor possa usufruir seus direitos, a saber, o registro, as certidões notariais, o pagamento de
taxas. O título do exemplar deve conter o símbolo © acompanhado do nome do titular, do
direito de autor e da indicação do ano da primeira publicação, indicando claramente haver
reservado o direito do autor.
85
A duração da proteção neste decreto corresponde ao período de vida do autor e vinte
cinco anos depois de sua morte. Cada país da Convenção pode determinar outra legislação,
variando por categoria da obra, porém, jamais deverá ser inferior aos vinte e cinco anos a
contar da data da primeira publicação ou do registro da obra, quando esse seja anterior à
publicação.
O autor ainda tem o direito exclusivo de autorizar a reprodução por um meio qualquer
que seja, a representação e a execução públicas e a radiodifusão:
A legislação nacional adotará as medidas apropriadas para que se assegure
ao titular do direito de tradução uma remuneração eqüitativa em
conformidade com as práticas internacionais, assim como para que se
efetuem o pagamento e a transferência da importância paga e ainda para que
se garanta uma tradução correta das obras. (ARTIGO V., PARÁGRAFO 2
D.).
O título original deverá constar nos impressos dos exemplares traduzidos, como até
hoje é observado.
DECRETO Nº 84.631, DE 9 DE ABRIL DE 1980
O Presidente da República, João Figueiredo, institui a Semana Nacional do Livro e da
Biblioteca e o Dia do Bibliotecário:
Fica instituída a Semana Nacional do Livro e da Biblioteca, com início a 23
de outubro e término a 29 do mesmo mês, data esta consagrada como o "Dia
Nacional do Livro", pela Lei nº 5.191 2, de 18 de dezembro de 1966.
(ARTIGO 1.).
Os festejos serão de caráter cultural e popular em todo o território nacional. Caberá ao
Ministério da Educação e Cultura coordenar as programações do evento, tendo a colaboração
da Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários e demais entidades e expressões da
vida nacional, vinculadas ao livro e às bibliotecas.
86
LEI Nº 8.313, DE 23 DE DEZEMBRO DE 1991
A lei restabelece os princípios da Lei 7.505, de 2 de julho de 1986, e institui o
Programa Nacional de Apoio à Cultura (PRONAC), com a finalidade de captar e canalizar
recursos para o setor cultural. Assinada pelo Presidente da República, a lei lista as atribuições
da PRONAC:
I - contribuir para facilitar, a todos, os meios para o livre acesso às fontes da
cultura e o pleno exercício dos direitos culturais;
II - promover e estimular a regionalização da produção cultural e artística
brasileira, com valorização de recursos humanos e conteúdos locais;
III - apoiar, valorizar e difundir o conjunto das manifestações culturais e seus
respectivos criadores;
IV - proteger as expressões culturais dos grupos formadores da sociedade
brasileira e responsáveis pelo pluralismo da cultura nacional;
V - salvaguardar a sobrevivência e o florescimento dos modos de criar, fazer
e viver da sociedade brasileira;
VI - preservar os bens materiais e imateriais do patrimônio cultural e
histórico brasileiro;
VII - desenvolver a consciência internacional e o respeito aos valores
culturais de outros povos ou nações;
VIII - estimular a produção e difusão de bens culturais de valor universal
formadores e informadores de conhecimento, cultura e memória;
IX - priorizar o produto cultural originário do País (ARTIGO 1.,
PARÁGRAFO I – IX).
O PRONAC será implementado através dos seguintes mecanismos: o Fundo Nacional
da Cultura (FNC); os Fundos de Investimento Cultural e Artístico (FICART) e Incentivos a
projetos culturais, sendo que esses deverão atender alguns objetivos como:
a) concessão de bolsas de estudo, pesquisa e trabalho, no Brasil ou no
exterior, a autores, artistas e técnicos brasileiros ou estrangeiros residentes
no Brasil;
b) concessão de prêmios a criadores, autores, artistas, técnicos e suas obras,
filmes, espetáculos musicais e de artes cênicas em concursos e festivais
realizados no Brasil;
c) instalação e manutenção de cursos de caráter cultural ou artístico,
destinados à formação, especialização e aperfeiçoamento de pessoal da área
da cultura, em estabelecimentos de ensino sem fins lucrativos (ARTIGO 3.,
PARÁGRAFO 1.).
As demais entidades de fomento à produção cultural e artística tinham a
responsabilidade de preservar e difundir os patrimônios cultural, artístico e histórico por meio
da ampliação dos acervos das bibliotecas, restauração de prédios e monumentos públicos,
87
obras de arte e imóveis de valor histórico e cultural; proteção do folclore, artesanato e
tradições populares; pesquisa e estudo das áreas culturais do Brasil e outros.
O Fundo Nacional de Cultura (FNC), fundo de natureza contábil e de prazo
indeterminado, foi criado para auxiliar com até oitenta por cento dos investimentos
financeiros de cada projeto proposto e aceito. A administração é responsabilidade do
Ministério da Cultura e os recursos do FNC deverão ser aplicados somente em projetos
culturais após aprovação do Ministro de Estado da Cultura.
O Fundo de Investimento Cultural e Artístico (FICART) é voltado ao apoio financeiro
para produção comercial de instrumentos musicais, discos, vídeos, filmes; promoção de
teatro, de dança, circo e outros; edição comercial de obras referentes a ciências, letras e artes;
e outras atividades comerciais ou industriais, de interesse cultural, assim consideradas pelo
Ministério da Cultura.
DECRETO N° 520, DE 13 DE MAIO DE 1992
Na década de noventa, o Presidente da República, Fernando Collor de Mello, institui o
Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), responsável em proporcionar à população
bibliotecas públicas de modo a favorecer a formação do hábito de leitura; fornecer
treinamentos de qualificação de recursos humanos para o melhor funcionamento das
bibliotecas em todo País.
A SNBP deverá “favorecer a ão dos coordenadores dos sistemas estaduais e
municipais, para que atuem como agentes culturais, em favor do livro e de uma política de
leitura no País” (ARTIGO 2., PARÁGRAFO VII); assessorar tecnicamente os sistemas
estaduais e municipais das bibliotecas; firmar convênios com outras entidades culturais;
oferecer cursos especializados na área de biblioteconomia nas universidades.
LEI Nº 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998
Assinada pelo Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em 1998, esta lei
regula os direitos autorais, assegurando-os aos estrangeiros domiciliados no exterior e
residentes no Brasil.
88
A divulgação da obra literária por outros meios como fotocópias, transmissão
televisiva, rádio, teatro, adaptações ou outros, devem ter consentimento do autor. Quanto à
obra, a lei caracteriza-a:
a) em co-autoria - quando é criada em comum, por dois ou mais autores;
b) anônima - quando não se indica o nome do autor, por sua vontade ou por
ser desconhecido;
c) pseudônima - quando o autor se oculta sob nome suposto;
d) inédita - a que não haja sido objeto de publicação;
e) póstuma - a que se publique após a morte do autor;
f) originária - a criação primígena;
g) derivada - a que, constituindo criação intelectual nova, resulta da
transformação de obra originária;
h) coletiva - a criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma
pessoa física ou jurídica, que a pública sob seu nome ou marca e que é
constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se
fundem numa criação autônoma;
i) audiovisual - a que resulta da fixação de imagens com ou sem som, que
tenha a finalidade de criar, por meio de sua reprodução, a impressão de
movimento, independentemente dos processos de sua captação, do suporte
usado inicial ou posteriormente para fixá-lo, bem como dos meios utilizados
para sua veiculação; (ARTIGO 5., PARÁGRAFO VIII).
O editor, pessoa física ou jurídica, tem o direito exclusivo de reprodução da obra e
deve divulgá-la no tempo previsto em contrato de edição.
A lei ainda especifica quais os tipos de manifestações artísticas e intelectuais
consideradas e protegidas pela legislação:
I - os textos de obras literárias, artísticas ou científicas;
II - as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza;
III - as obras dramáticas e dramático-musicais;
IV - as obras coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixa por
escrito ou por outra qualquer forma;
V - as composições musicais, tenham ou não letra;
VI - as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as
cinematográficas;
VII - as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao
da fotografia;
VIII - as obras de desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte
cinética;
IX - as ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza;
X - os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia,
engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência;
XI - as adaptações, traduções e outras transformações de obras originais,
apresentadas como criação intelectual nova;
XII - os programas de computador;
XIII - as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários,
bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou
89
disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual. (ARTIGO
7., PARÁGRAFO I – XIII).
Os programas de computador devem observar uma legislação específica.
O autor poderá usar, para se identificar como criador da obra literária, artística ou
científica, seu nome civil, completo ou abreviado, pseudônimo ou outro sinal convencional.
Após a caída da obra no domínio público, é considerado titular de direitos de autor
quem adapta, traduz, arranja ou orquestra a obra original.
Não é considerado co-autor aquele que auxilia o autor na produção da obra em tarefas
como revisão, atualização, fiscalização ou correção. O organizador de um conjunto de obras
coletivas possui os direitos patrimoniais o contrato, porém, deve especificar a contribuição
dos participantes e prever a remuneração de cada um dos envolvidos.
O autor deve registrar a sua obra no órgão público, definido no caput e no § do art.
17 da Lei 5.988, de 14 de dezembro de 1973. O autor, então terá os direitos morais sobre a
obra que lhe permite:
I - o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;
II - o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou
anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
III - o de conservar a obra inédita;
IV - o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer
modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-
la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
V - o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;
VI - o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de
utilização autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem
afronta à sua reputação e imagem;
VII - o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre
legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo
fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de
forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em
todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja
causado. (ARTIGO 24., PARÁGRAFO I – VIII).
Após a morte do autor, os direitos o transmitidos a seus sucessores e após a obra
caída em domínio público, compete ao Estado à defesa de sua integridade.
As reproduções e a quantidade de exemplares da obras serão informadas ao autor,
permitindo a fiscalização do aproveitamento econômica da exploração. O autor tem o direito
de receber no mínimo cinco por cento sobre o aumento do preço verificável na revenda de sua
obra.
90
O prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre as obras de caráter anônimo ou
pseudônimo será de setenta anos.
Não constitui ofensa aos direitos autorais a reprodução:
a) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo,
publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se
assinados, e da publicação de onde foram transcritos;
b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas
de qualquer natureza;
c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob
encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não
havendo a oposição da pessoa nele representada ou de seus herdeiros;
d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de
deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comercias, seja feita
mediante o sistema Braile ou outro procedimento em qualquer suporte para
esses destinatários;
II - a reprodução, em um exemplar de pequenos trechos, para uso privado
do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;
III - a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de
comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou
polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando-se o nome do
autor e a origem da obra;
IV - o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aquelas a quem
elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização
prévia e expressa de quem as ministrou;
V - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e
transmissão de rádio e televisão em estabelecimentos comerciais,
exclusivamente para demonstração à clientela, desde que esses
estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam
a sua utilização;
VI - a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no
recesso familiar ou, para fins exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos
de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro;
VII - a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para a reproduzir
prova judiciária ou administrativa;
VIII - a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras
preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes
plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da
obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida
nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.
(ARTIGO 46., PARÁGRAFO I – VII).
A cada exemplar publicado, o editor deverá mencionar o título da obra, seu autor, em
caso de tradução, o nome original da obra e autor, nome do tradutor, o ano de publicação, o
nome ou marca que identifique a editora. Na falta de especificidade do contrato, entende-se
que a edição consta de três mil exemplares.
91
O editor deve, quando solicitado, especificar o andamento da edição para o autor, fixar
o preço da venda e prestar contas mensalmente ao autor se a remuneração estiver
condicionada à venda da obra.
Uma edição da obra é considerada esgotada quando resta em estoque o número
inferior a dez por cento do total da edição. Se o editor não reeditar a obra por direito, o autor
poderá notificá-lo para que o faça em certo prazo, sob pena de perder o direito da edição da
obra.
DECRETO Nº 2.894, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1998
O decreto assinado pelo Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em
1998, regulamenta a emissão e o fornecimento de selo ou sinal de identificação dos
fonogramas e das obras audiovisuais. Há também, a alteração e consolidação das leis sobre os
direitos autorais.
O selo de controle, confeccionado pela Casa da Moeda do Brasil e fornecido pela
Secretaria da Receita Federal, deverá ser colocado obrigatoriamente nos fonogramas e nas
obras audiovisuais, após a comprovação do seu registro.
Será obrigatório registrar todo contrato de produção e cessão dos direitos de
exploração comercial, importação e exportação de obras audiovisuais em qualquer suporte ou
veículo, no órgão competente. O selo será devidamente numerado e fixado em cada exemplar
produzido, atendendo às exigências previstas no Regulamento do Imposto sobre Produtos
Industrializados.
Os selos de controle têm como objetivo identificar a origem do produto, garantindo a
qualidade ao consumidor e evitar as produções e importações feitas ilegalmente. Os autores
de livros ainda poderão dispor de outros mecanismos de fiscalização do seu aproveitamento
econômico, como firmar acordos com os editores.
O decreto contribuiu para fiscalização dos produtos literários e artísticos no território
brasileiro, principalmente, no que diz respeito ao plano econômico, evitando a pirataria e o
comércio ilegal. Quanto aos direitos autorais, o autor poderá ter a sua disposição dados acerca
das negociações e vendagem do livro (ou outro), facilitando, assim, o controle das vendas de
seu texto, independente do suporte em que se encontra e reprimindo os abusos editoriais e da
indústria do livro.
92
LEI Nº 10.753, DE 30 DE OUTUBRO DE 2003
A lei assinada pelo atual Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva,
em 2003, institui a Política Nacional do Livro. Segundo as diretrizes gerais sancionadas, a
Política Nacional do Livro tem como objetivo:
I - assegurar ao cidadão o pleno exercício do direito de acesso e uso do livro;
II - o livro é o meio principal e insubstituível da difusão da cultura e
transmissão do conhecimento, do fomento à pesquisa social e científica, da
conservação do patrimônio nacional, da transformação e aperfeiçoamento
social e da melhoria da qualidade de vida;
III - fomentar e apoiar a produção, a edição, a difusão, a distribuição e a
comercialização do livro;
IV - estimular a produção intelectual dos escritores e autores brasileiros,
tanto de obras científicas como culturais;
V - promover e incentivar o hábito da leitura;
VI - propiciar os meios para fazer do Brasil um grande centro editorial;
VII - competir no mercado internacional de livros, ampliando a exportação
de livros nacionais;
VIII - apoiar a livre circulação do livro no País;
IX - capacitar a população para o uso do livro como fator fundamental para
seu progresso econômico, político, social e promover a justa distribuição do
saber e da renda;
X - instalar e ampliar no País livrarias, bibliotecas e pontos de venda de
livro;
XI - propiciar aos autores, editores, distribuidores e livreiros as condições
necessárias ao cumprimento do disposto nesta Lei;
XII - assegurar às pessoas com deficiência visual o acesso à leitura.
(ARTIGO 1., PARÁGRAFO I –XII).
A lei considera como sendo livro, sobre o ponto de vista material, toda publicação de
textos escritos em fichas ou folhas, não periódica, grampeada, colada ou costurada, em
volume cartonado, encadernado ou em brochura, em capas avulsas, em qualquer formato e
acabamento. Assim, são equiparados a livro, os seguintes objetos:
I - fascículos, publicações de qualquer natureza que representem parte de
livro;
II - materiais avulsos relacionados com o livro, impressos em papel ou em
material similar;
III - roteiros de leitura para controle e estudo de literatura ou de obras
didáticas;
IV - álbuns para colorir, pintar, recortar ou armar;
V - atlas geográficos, históricos, anatômicos, mapas e cartogramas;
VI - textos derivados de livro ou originais, produzidos por editores, mediante
contrato de edição celebrado com o autor, com a utilização de qualquer
suporte;
93
VII - livros em meio digital, magnético e ótico, para uso exclusivo de
pessoas com deficiência visual;
VIII - livros impressos no Sistema Braille (ARTIGO 2., PARÁGRAFO
ÚNICO).
É considerado um “livro brasileiro” todo aquele que for publicado por uma editora
sediada no Brasil, não importando o idioma utilizado ou se sua impressão (ou fixação em
qualquer suporte) for realizada no exterior, desde que a mando de um editor sediado no Brasil.
A entrada de livros no Brasil, em língua estrangeira ou portuguesa, estará imune de
impostos e de tarifas alfandegárias prévias, sem prejuízo dos controles aduaneiros e de suas
taxas.
Sobre a editoração, distribuição e comercialização do livro, a lei classifica cada função
como:
I - autor: a pessoa física criadora de livros;
II - editor: a pessoa sica ou jurídica que adquire o direito de reprodução de
livros, dando a eles tratamento adequado à leitura;
III - distribuidor: a pessoa jurídica que opera no ramo de compra e venda de
livros por atacado;
IV - livreiro: a pessoa jurídica ou representante comercial autônomo que se
dedica à venda de livros (ARTIGO 5., PARÁGRAFO I –IV).
É obrigatório, na editoração do livro, adotar o Número Internacional Padronizado, bem
como a ficha de catalogação para publicação.
Caberá ao Poder Executivo estabelecer as formas de financiamento para as editoras e
para o sistema de distribuição de livro, por meio de criação de linhas de crédito específicas. O
Poder Executivo também deverá implementar programas anuais para manutenção e
atualização do acervo de bibliotecas públicas, universitárias e escolares, incluídas obras em
Sistema Braille.
Outro órgão de responsabilidade sobre o livro será a Fundação Biblioteca Nacional.
Esta deverá cadastrar, no Escritório de Direitos Autorais, todos os contratos firmados entre
autores e editores de livros para cessão de direitos autorais para publicação.
A fim de promover a difusão do livro, o Poder Executivo deve criar e executar
projetos de acesso ao livro e incentivo à leitura, ampliar os existentes e implementar,
isoladamente ou em parcerias públicas ou privadas, as seguintes ações em âmbito nacional:
I - criar parcerias, públicas ou privadas, para o desenvolvimento de
programas de incentivo à leitura, com a participação de entidades públicas e
privadas;
94
II - estimular a criação e execução de projetos voltados para o estímulo e a
consolidação do hábito de leitura, mediante:
a) revisão e ampliação do processo de alfabetização e leitura de textos de
literatura nas escolas;
b) introdução da hora de leitura diária nas escolas;
c) exigência pelos sistemas de ensino, para efeito de autorização de escolas,
de acervo mínimo de livros para as bibliotecas escolares;
III - instituir programas, em bases regulares, para a exportação e venda de
livros brasileiros em feiras e eventos internacionais;
IV - estabelecer tarifa postal preferencial, reduzida, para o livro brasileiro;
V - criar cursos de capacitação do trabalho editorial, gráfico e livreiro em
todo o território nacional. (ARTIGO 13., PARÁGRAFO I – V).
Observe que a lei atinge diretamente a relação da literatura com a escola,
principalmente, nos aspectos da promoção da leitura, introduzindo, obrigatoriamente, um
momento de leitura na escola, assim como a ampliação das bibliotecas escolares.
Por outro, incentiva-se a criação de cursos de capacitação do trabalho editorial, livreiro
e gráfico, com a finalidade de aperfeiçoar as técnicas e o pessoal especializado na área.
Cabe ao Poder Executivo, autorizar e promover o desenvolvimento de programas de
ampliação do número de livrarias e pontos de venda no País. Para isso, o governo conta com
as sugestões e intervenções dos setores administrativos estaduais e municipais. Os envolvidos
na tarefa, como a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão consignar em
seus respectivos orçamentos, verbas às bibliotecas para sua manutenção e aquisição de livros.
Ou seja, a participação é tanto administrativa quanto financeira.
LEI N° 10.994, DE 14 DE DEZEMBRO DE 2004
A lei, assinada pelo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, regulamenta o
depósito legal de publicações, na Biblioteca Nacional. Seu objetivo é assegurar o registro e a
guarda da produção intelectual nacional, além de possibilitar o controle, a elaboração e a
divulgação da bibliografia brasileira corrente, bem como a defesa e a preservação da ngua e
cultura nacionais.
Para isso, exige-se que seja depositado em instituições específicas, um ou mais
exemplares de todas as publicações (gratuitas ou para venda) elaboradas no Brasil.
Consideram-se como obras nacionais, as obras produzidas em território brasileiro e as
provenientes do estrangeiro que trouxerem indicações do editor ou vendedor domiciliado no
Brasil.
95
A Lei abrange as publicações oficiais dos níveis da administração federal, estadual e
municipal, compreendendo ainda as dos órgãos e entidades de administração direta e indireta,
e as fundações criadas, mantidas ou subvencionadas pelo poder público.
Cabe ao editor e ao autor verificar a efetivação do depósito legal que deverá ser feito
pelo impressor da obra. A medida estabelece o prazo de depósito em até 30 (trinta) dias após a
publicação da obra. O não-cumprimento do depósito, conforme o estabelecido pela lei,
acarretará em multa correspondente em até 100 (cem) vezes o valor da obra no mercado, a
apreensão de exemplares, e em se tratando de publicação oficial, a autoridade responsável por
sua edição responderá pessoalmente pelo descumprimento do disposto nessa lei.
* * *
As leis e decretos no Brasil vão sendo acrescentados conforme as necessidades,
normalmente, regidas pelo crescimento da indústria livreira e suas relações com o mercado.
Desse modo, faz-se necessário que os órgãos públicos e as demais instituições
credenciadas estejam sempre bem informados de seus direitos e deveres, para que as leis
existentes sejam cumpridas com eficiência e credibilidade.
Nesse contexto, até mesmo a escola, diante da legislação, como enfatiza a lei nº.
10.753, de 30 de outubro de 2003, tem grande responsabilidade de promover a leitura em seus
espaços recreativos e educacionais, contribuindo para a formação de leitores-consumidores,
elemento fundamental para a vida do sistema literário.
Como se pode observar, a elaboração de uma legislação brasileira acerca do livro, e
por conseqüência, dos textos literários, discutem, principalmente, os termos materiais do
objeto literário e sua posição legal diante do mercado financeiro, definindo rara e
superficialmente os elementos de natureza estética, que estabelece o valor literário da obra.
A atribuição de um valor literário e artístico para as obras é função primordial de
algumas instituições que, conforme o tempo e o momento histórico, ganharam credenciais
para legitimar e afiançar determinados valores sociais, ideológicos e culturais. Tais práticas
discursivas, fundamentais na constituição do sistema literário, serão assunto do próximo
capítulo.
96
CAPÍTULO IV
4 - AS PRÁTICAS DISCURSIVAS E A ATUAÇÃO DAS
INSTITUIÇÕES
Como foi discutido no capítulo anterior, a obra literária agrega duas distintas espécies
ou natureza de valor: uma de cunho econômico, advinda das despesas materiais de impressão
e produção do objeto literário; uma segunda, determinada por práticas discursivas que
atribuem um valor estético de beleza e relevância social, artística e literária para o texto em
questão. Nem sempre esta última instância é realmente movida pelos interesses literários, em
muitos casos, é determinada por questões financeiras:
Para que uma obra seja considerada parte integrante da tradição literária de
uma dada comunidade ou tradição cultural, é necessário que ela tenha o
endosso dos canais competentes aos quais compete a literarização de certos
textos [...] (LAJOLO, 2001, p. 18).
Como explica Lajolo, para que o objeto literário seja proclamado como literatura é
necessário que as instâncias discursivas operem como “canais competentes” de
reconhecimento e de atribuição de valor.
De forma geral, a produção de discursos avaliativos dos textos (para que sejam
considerados literários ou não) são realizados por indivíduos como professores, intelectuais,
críticos, um júri de concurso literário ou por setores especializados como uma editora de
prestígio, os cursos de letras, organizadores de programas escolares e de leitura, a própria
mídia, o jornal, a televisão, etc.. Porém, os discursos mais definidos, posicionados
politicamente e de maior acesso ao público o aqueles promovidos por instituições,
independente de seu caráter filantrópico, governamental ou (inter) nacional. Observam-se a
seguir, as principais instituições que, de alguma forma, patrocinam (ou patrocinaram) a leitura
no Brasil.
97
4.1 Instituições brasileiras de incentivo à leitura
No Brasil, têm-se diversas instituições promotoras da leitura. Na listagem abaixo,
encontram-se as principais instituições ligadas à promoção e conservação do acervo literário
brasileiro. Tais instituições, em sua maioria, traçam seus objetivos com o interesse de
defender os direitos legislativos e econômicos da indústria livreira no Brasil e os direitos do
autor, promovendo, assim, os circuitos de produção e distribuição do livro.
O incentivo dado por essas fundações e associações, em relação à leitura, passam por
um trabalho seletivo realizado por um corpo de especialistas e historiadores, que atribuem
importância em grau de valor literário e artístico para as obras impressas. Assim, a partir dos
livros selecionados, constituem-se os acervos literários nas bibliotecas e elaboram-se, a partir
dessas indicações e tendências, os livros didáticos escolares.
INSTITUTO NACIONAL DO LIVRO (INL)
O INL foi criado em 1937, por Gustavo Capanema, tendo como objetivo: editar as
obras literárias de interesse da população brasileira a fim de contribuir para a formação da
cultura nacional; elaborar um dicionário nacional e uma enciclopédia geral. Em especial, na
década de 40, contribuiu significativamente na expansão do número de bibliotecas públicas no
País e constituição de grandes acervos de livros técnicos e outros.
FUNDAÇÃO NACIONAL DO LIVRO INFANTIL - JUVENIL (FNLIJ)
Fundada em 1968, a FNLIJ tem como objetivo a promoção da leitura e divulgação do
livro de qualidade para crianças e jovens. Tem atuado na seleção de livros para crianças e
jovens, na formação profissional do educador, na publicação de livros infanto-juvenis e em
projetos (nacionais e internacionais) de leitura. A Fundação organiza ainda diversos concursos
para promover a leitura e oferece centros de documentação e pesquisa sobre a literatura
infantil, palestras para pais e professores e auxilia na montagem de bibliotecas locais. A atual
presidente é Gisele Zingore e as eleições do conselho ocorrem a cada três anos.
98
FUNDAÇÃO DA BIBLIOTECA NACIONAL (FBN)
A Fundação da Biblioteca Nacional foi criada em 1810, com a finalidade de reunir,
preservar e difundir todo patrimônio histórico-cultural brasileiro. A iniciativa partiu da
Família Real, em 1808, quando esses trouxeram o acervo da Biblioteca Real e Pública da
Corte. Hoje, a FBN possui um atendimento à distância, promovendo intercâmbios de
documentação, reprodução de obras, programas de capacitação, loja do livro, visita guiada e
outros. É na FBN que se faz o depósito legal de livros para registro oficial, consórcios e o
controle do ISBN - Sistema Internacional que identifica numericamente os livros impressos.
O atual presidente é Muniz Sodré.
CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO (CBL)
A CBL foi fundada em 1946 e tem como objetivo primordial estimular a leitura no
Brasil; promover a indústria e o comércio de livros; defender os interesses de seus associados,
que são em sua maioria livreiros e editores brasileiros; promover eventos e atividades para
difundir a produção editorial brasileira e organizar feiras de livros no País. Alguns de seus
eventos mais conhecidos são: a Bienal Internacional do Livro de São Paulo e o Prêmio Jabuti,
que destaca as melhores obras publicadas no ano. A CBL atua junto a instituições e órgãos
governamentais, apoiando campanhas de incentivo à leitura e à política do livro. Sua ampla
atuação nas políticas públicas de fomento à leitura e de desenvolvimento tecnológico dos
meios de produção livreira contribuiu para a redução de tarifas postais para os livros
escolares. Oswaldo Siciliano é o atual presidente reeleito da CBL.
FUNDAÇÃO CASA RUI BARBOSA (FCRB)
Criada em 1930, sua função é preservar livros e documentos, publicar livros, permitir
o acesso para consulta de livros e documentos, preservar e difundir o acervo bibliográfico e
documental do museu, sobretudo, homenagear seu patrono e reservar um espaço para o
trabalho intelectual e leitura. A FCRB patrocina a cultura brasileira cedendo espaço (teatro)
para apresentações de dança, música, literatura, teatro e cinema; realiza exposições,
congressos, seminários e cursos de formação e qualificação de pesquisadores. A Fundação
ainda desenvolve pesquisas e estudos em áreas de atuação e em cultura brasileira, publicando
99
seus projetos e resultados com a participação de pesquisadores em eventos acadêmicos e
científicos. A direção da casa está sob responsabilidade de José Almino Alencar.
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS ESCRITORES (ANE)
A associação teve início em 1963, com a primeira reunião entre Almeida Ficher, Cyro
dos Anjos, Pompeu de Sousa, Alphonsus de Guimarães Filho, Nelson Omegna, Victor Nunes
Leal, Afonso Felix de Sousa, Carlos Castello Branco, Christiano Martins e Cândido Motta
Filho – considerados fundadores da ANE. Hoje, encontra-se sob a direção de Napoleão
Valadares.
Os objetivos da ANE são: defender a herança literária, científica e artística das
tradições e da língua nacional; lutar pela livre manifestação do pensamento em todas as suas
formas de expressão; possibilitar o intercâmbio cultural, econômico e científico no Brasil;
solucionar problemas éticos e profissionais do escritor, como os direitos autorais e salariais;
disponibilizar bolsas de estudo, prestação de assistência cultural através de cursos populares,
de caráter gratuito sobre a literatura brasileira. A ANE também auxilia nos lançamentos de
livros, promovendo eventos, concursos, seminários e conferências, promovendo os encontros
entre escritores e editores, e quando necessário fazendo interferências nas questões de
interesse social, cultural e econômico.
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS (SNEL)
O Sindicato foi fundado por Themistocles Marcondes Ferreira, em 1940, com o intuito
de estudar e coordenar as atividades editoriais, protegendo e representando legalmente a
categoria de editores de livros e publicações culturais em todo o Brasil. Dirigido por Paulo
Roberto Rocco, o SNEL é também responsável pela organização da Bienal do Livro do Rio
de Janeiro um dos principais eventos da área editorial no Brasil, desde seu lançamento em
1983.
No setor administrativo, o SNEL assegura suporte técnico e assessoria nas áreas
trabalhistas, contábil e fiscal, de direitos autorais e biblioteconomia. Realiza articulações com
entidades governamentais, como a Fundação Biblioteca Nacional, o Departamento Nacional
do Livro e o Conselho da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. O Sindicato é ainda
100
responsável pelas cartas de exclusividade exigidas pela Lei de Licitação, como entidade
patronal da classe e contribui na elaboração de fichas catalográficas para os editores.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE CELULOSE E PAPEL (BRACELPA)
Fundada pelo Dr. Cícero da Silva Prado, em 1939, a associação presta serviços de
natureza institucional e política, baseada em uma sólida e confiável estrutura técnica. Dirigida
hoje por Horácio Lafer Piva, a BRACELPA oferece melhores condições de resultados a seus
associados, possibilitando a geração de empregos e benefícios sociais decorrentes do
crescimento e investimento econômico.
Apesar de estar atuando nas técnicas de produção e investimentos econômicos, a
BRACELPA promove campanhas e ões pelo incentivo à leitura através de parcerias com
diversas instituições.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS AUTORES DE LIVROS EDUCATIVOS
(ABRALE)
Criada em 1922, a ABRALE é um canal de comunicação entre os órgãos
governamentais, principalmente quando se refere à compra de livros didáticos e processos de
avaliação pelo MEC. A associação também oferece serviços de consulta jurídica, promove
discussões acerca do livro educativo, apresentando projetos e sugestões para a elaboração da
nova Lei do Direito Autoral. A ABRALE elaborou o Código de Ética vigente no País.
A Associação atua na defesa da dignidade profissional dos autores e educadores,
discute sobre a metodologia de ensino e procura incrementar a emergência de novos autores,
promovendo debates, viabilizando espaços de integração entre autores de livros didáticos e
paradidáticos.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PARA PROTEÇÃO DOS DIREITOS EDITORIAIS E
AUTORAIS (ABPDEA)
Foi criada a pedido da Lei. 9.610/98 em 1999, para esclarecer e orientar as
determinações dos direitos autorais e fiscalizar seu cumprimento, evitando, assim, a pirataria
editorial. O trabalho da instituição é desenvolvido junto às universidades, escolas, bibliotecas,
101
nas empresas editoriais e livreiras, com a finalidade de conscientizar quanto aos problemas de
reprodução ilegal de livros e sua conseqüente punição. Hoje, encontra-se associada a ABDR.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE INDÚSTRIAS GRÁFICAS (ABIGRAF)
A ABIGRAF é uma associação criada recentemente para: representar as Indústrias
Gráficas Brasileiras; identificar e defender os interesses gerais da industria gráfica livreira;
contribuir para o progresso econômico e tecnológico do setor e promover intercâmbios com
entidades nacionais e estrangeiras.
A associação, então, promove, coordena e incentiva a edição de material técnico e
bibliográfico, anuários, revistas e periódicos, que se referem às atividades gráficas no País.
Promove eventos de congraçamento e mobilização da categoria industrial gráfica.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EDITORAS UNIVERSITÁRIAS (ABEU)
A ABEU foi criada em 1987, com o objetivo de promover o desenvolvimento das
editoras universitárias e contribuir para o aperfeiçoamento dos processos de produção,
comercialização e divulgação das obras publicadas por suas associadas.
A Associação realiza atividades de aperfeiçoamento de recursos humanos no campo
da editoração, fomenta o intercâmbio com entidades internacionais e colabora para a
participação de suas associadas em feiras, bienais e outros eventos de divulgação. No setor
administrativo, a ABEU mantém serviços de informação comercial, jurídica e bibliográfica,
abrindo caminho para novos autores. Possui, também, uma política de divulgação editorial
universitária para a imprensa nacional e estrangeira.
Assim, a ABEU é conhecida por divulgar a produção científica das universidades,
resgatar documentos inéditos ou esgotados e por trazer ao público textos especializados e de
interesse restrito.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DIFUSÃO DO LIVRO (ABDL)
Criada em 1987, a ABDL tem como função: efetivar as campanhas e atividades
equiparadas para difusão e incremento do livro; elaborar pesquisas sobre o mercado do livro;
valorizar a imagem do vendedor de livros porta a porta como difusor da cultura; criar cursos
102
de capacitação para os comerciantes de livros, a fim de aprimorar suas técnicas de trabalho e
de venda. Tem participação efetiva nas feiras de livros com amplo respaldo aos profissionais
do livro; publica e reproduz material de apoio para os Associados e promove o inter-
relacionamento com entidades congêneres para introdução de técnicas novas e conhecimentos
que acrescentem na qualidade do livro.
De forma prática, a ABDL orienta e analisa os contratos entre as editoras e autores,
disponibiliza discussões e informações sobre os problemas dos direitos autorais e do Código
de Ética. Suas campanhas visam melhorar as formas de atuação do vendedor, fornecendo
manuais explicativos e atualizados sobre as técnicas de venda e orientações jurídicas,
entrevistas e notícias em geral.
* * *
Cada uma destas instituições possui sede administrativa, estatutos e regimentos
próprios para seu funcionamento. Essa política, elaborada por uma pequena elite pensante,
acaba impondo seus conceitos e formulações a respeito do que é ou não literatura, através da
valorização hierárquica das obras literárias.
Toda formulação elaborada pelas instituições, setores ou indivíduos renomados
reflete-se diretamente na constituição da crítica e da historiografia literária brasileira. Essas
atuam como entidades de maior confiabilidade no percurso da história e, principalmente, no
ensino da literatura no Brasil.
A formação formal do leitor tem seu princípio na escola, como instituição burguesa
numa sociedade capitalista e, portanto, toda concepção literária adquirida pelo indivíduo
depende do que lhe é ensinado, do modo como lhe é ensinado e do como se lhe ensina. Deste
modo, a compreensão daquilo que antecede qualquer fomentação acerca da literatura,
obrigatoriamente produzida por discursos institucionalizados, é válida para que se possa
propor e repensar o ensino da literatura, a fim de promover a leitura e uma melhor
compreensão de como os valores são nela instituídos.
4.2 A historiografia literária
A historiografia literária sofreu um significativo declínio, no século XX, por parte das
grandes correntes teóricas críticas. A história da literatura era uma disciplina acadêmica
lecionada no período áureo da história geral, mas por envolver fatos estéticos, tornou-se difícil
103
observar os princípios de causalidade, a objetividade e progressividade nos textos que
tentavam historiar a literatura. Assim, por apresentar tais problemas, seu estudo foi se
extinguindo, pois feria os princípios de cientificidade exigidos dentro dos moldes vigentes do
estudo da história.
Essa história “desatualizada”, no entanto, é a mesma presente nos livros didáticos de
ensino da literatura. Jauss critica abertamente esse modelo, afirmando que:
Como matéria obrigatória do currículo do ensino secundário, ela já quase
desapareceu na Alemanha. No mais, histórias da literatura podem ainda ser
encontradas, quando muito, nas estantes de livros da burguesia instruída,
burguesia que, na falta de um dicionário de literatura mais apropriado, as
consulta principalmente para solucionar charadas literárias (JAUSS, 1994, p.
5).
A crítica de Jauss, ao remeter-se à importância da história da literatura restrita à classe
burguesa, implica no efeito de estudos críticos como a Estética da Recepção e a própria
Sociologia da Literatura no âmbito histórico. A sociologia, ao considerar as relações sociais
com um todo, opõe-se à visão privilegiada de apenas uma classe dominante. Incentiva, assim,
as diversas manifestações culturais de todos os povos, etnias, nações, principalmente dos
marginalizados. A inclusão muda o olhar sobre a história, uma vez que essa consiste apenas
em um ponto de vista burguês.
Todo e qualquer discurso histórico está sujeito às questões de avaliação “na medida
em que qualquer levantamento ou relato é obrigatoriamente uma seleção de dados”
(PERRONE-MOISÉS, 1998, p. 26). No caso da história da literatura, um sistema de
valores prescritos pelo historiador-crítico, confirmando a idéia de que em todo discurso
histórico existe um julgamento de valor implícito. Nesse sentido, entende-se que a história
deve e é um ato crítico, o que não consiste em novidade alguma. Questionam-se, porém, os
valores e critérios que regem a tal crítica.
Nessa perspectiva, a história da literatura espera critérios que avaliem a amplitude da
manifestação literária. A história contribui para a valorização e esclarecimento das
experiências humanas com o mundo. No caso da história literária, ela ampliaria a experiência
e a fruição das obras.
O papel da historiografia literária é de extrema importância para a legitimação das
obras literárias no contexto capitalista de produção. Foi tal instância discursiva que assumiu,
primeiramente, o endosso de credenciar e apontar as obras de maior valor para a sociedade:
104
(...) faz falta uma instância que, com competência para tal, reconhece a
existência e o valor de autores e obras, reconhecimento sem o qual o
surgimento e a consolidação do discurso julgado literário pode não ser
visível. Em outras palavras, torna-se necessária a presença de um discurso
que legitime a literatura, papel que, no momento de consolidação da
literatura ocidentais modernas, foi cumprido pela história da literatura
(LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p. 95).
Em terras tropicais e sob a égide portuguesa, a historiografia literária no Brasil tem
origem com autores estrangeiros como o alemão Friedrich Bouterwek, que citou em sua obra
História da poesia e da eloqüência portuguesa (1805), alguns escritores brasileiros; o suíço
Simonde de Sismondi, em De la littérature du Midi de l’Europe (1813), inclui os nomes de
Cláudio Manuel da Costa, Antônio José e Silva Avarenga; o historiador francês Ferdinand
Dinis, autor da obra Resumé de l’histoire littéraire du Portugal, suivi du Resumé de l’histoire
littéraire du Brésil (1826); e o português Almeida Garrett, com a obra Bosquejos da história
da poesia e língua portuguesa (1826). Esses historiadores foram os primeiros a apontar
alguns nomes para um possível cânone literário brasileiro.
Em seguida, a historiografia literária brasileira passa a ser escrita por autores
nacionais. Januário da Cunha Barbosa, em Parnaso brasileiro ou Coleção das melhores
poesias do Brasil, tanto inéditas como impressas (1831), estimula as belas-artes através da
exposição de notícias biográficas e memórias dos escritores brasileiros; Joaquim Noberto de
Sousa Silva em Modulações poéticas (1841), descreve o panorama histórico, cultural e
literário, desde o descobrimento do Brasil até o século XIX, resgatando vários escritores
brasileiros, inferindo com críticas sutis às obras e incentivando os jovens ao amor à pátria, ao
belo e útil; João Manuel Pereira da Silva no Parnaso brasileiro (1843), completa os dados de
pesquisa de Barbosa e torna a leitura mais agradável e acessível ao público leitor. Há também
o trabalho Mosaico poético (1844) de Emílio Adet em parceria com Joaquim Noberto de
Sousa Silva; a obra de Francisco Adolfo de Varnhagem intitulada Florilégio da poesia
brasileira (1850), de caráter histórico e literário, acrescenta detalhes minuciosos sobre a vida
e obra de autores brasileiros; o método de Macedo Soares para selecionar os melhores cantos
e poesias classificando-as numa análise crítica em Harmonias brasileiras (1859); o livro
Lírica Nacional (1862), de Quintino Bocaiúva, propõe incentivos tecnológicos no mercado
livreiro para que o livro tenha um menor preço e circule mais facilmente, colaborando para a
formação do leitor brasileiro; e ainda Cônego Joaquim C. Fernandes Pinheiro, em Meandro
105
poético (1864), dedica aos jovens uma seleção de poemas de escritores nacionais e suas
respectivas biografias
42
.
Segundo Bosi (1994, p. 101), “foi Noberto um dos pilares em que se assentou a nossa
historiografia literária até a publicação das obras maduras de Sílvio Romero e José
Veríssimo”.
No final do século XIX, a crítica brasileira era coordenada pela tríade: Sílvio Romero,
José Veríssimo e Araripe Jr.. A crítica de Romero (1851- 1914) foi decisiva para a prática de
uma crítica sociológica e analítica no Brasil, pois seu espírito era voltado às campanhas
abolicionistas de ideais republicanos:
[...] o apaixonado labor histórico e crítico de Sílvio que, durante mais de
quarenta anos de publicações, vincou fundamente a cultura realista e nos deu
bases sólidas para construir uma história literária entendida como expressão
das raças, das classes e das vicissitudes do povo brasileiro (BOSI, 1994, p.
249, grifo do autor).
Ao seu lado, Tristão de Alencar Araripe Jr. (1848 1911) procurou sensibilizar-se
para os aspectos artísticos da literatura. Apesar de crítico militante, deixou-se levar por um
ecletismo oscilante entre o nacionalismo e o psicoestético. E José Veríssimo (1857 1916),
crítico de apreciação eclética e de caráter humanista, buscou reintegrar a literatura nos
âmbitos das belas artes procurando o equilíbrio entre a forma e as projeções psicológicas
como a imaginação e a fantasia.
O maior crítico do Simbolismo foi Nestor Vítor dos Santos (1868 1932), paranaense
que dedicou parte de sua vida literária à crítica voltada à exaltação dos simbolistas e a
inteligência dos novos. Gonzaga Duque, também nessa época, merece destaque por sua
especialidade crítica e pela valorização da cultura brasileira.
Entre os maiores críticos realistas e leigos da Primeira República encontram-se:
Euclides da Cunha; Lima Barreto; Monteiro Lobato; Vicente Licínio Cardoso e João Ribeiro,
poeta, crítico-historiador e filólogo, considerado precursor do Modernismo de 1922 (BOSI,
1994).
A fim de revisar os pressupostos da crítica anterior, surge, nos anos de 1930, a crítica
da Antropologia e da Sociologia de Artur Ramos, Roquette Pinto, Gilberto Freyre e Sérgio
Buarque de Holanda.
42
ZILBERMAN, R; MOREIRA, M. E. O berço do cânone: textos fundadores da história da literatura
brasileira. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1998.
106
O grande divisor de águas do século XX foi Tristão de Ataíde (pseudônimo de Alceu
de Amoroso Lima) com sua crítica de reconhecimento histórico e estético do movimento
modernista. Entre os estudiosos que, de certa forma, seguiram as análises éticas e ideológicas,
o fenômeno artístico e literário propostos por Ataíde, destacam-se: Álvaro Lins (1912- 1970),
Afrânio Coutinho, Antonio Candido, Augusto Meyer, Agripino Grieco, Nelson W. Sodré e os
estudos históricos de Otto Maria Carpeau (Viena, 1900 – Rio de Janeiro, 1978).
Atualmente, um dos livros mais populares sobre a história da literatura é de Alfredo
Bosi, História Concisa da literatura brasileira (1975). Os livros dedicados à história são
poucos e se dividem com os estudos de teoria e crítica literária. Na universidade, o espaço
dedicado aos estudos históricos é mínimo, apesar de a maioria dos trabalhos monográficos
constituírem de uma certa história da literatura, uma vez que fazem recortes de autores, obras,
movimentos ou escolas literárias e épocas.
No meio acadêmico, o historicismo foi, durante muito tempo, a melhor forma de
compreensão e avaliação de uma obra, pois as condições socioculturais dizem muito acerca
do momento da produção e recepção das obras. Daí o fato de a historiografia contribuir na
justificação do cânone nacional e fornecimento de critérios para a seleção de certas obras.
O papel da historiografia é duplo, pois, ao mesmo tempo, fornece a descrição do
passado, da ocorrência de diversas obras, autores e movimentos literários característicos
(papel histórico), e estipula, conseqüentemente, um cânone literário sustentado por um certo
padrão de gosto (papel político e ideológico).
4.3 A questão do cânone
O termo cânone, segundo Reis (1992, p. 70), origina-se do grego kanon que
significava “uma espécie de vara de medir”. Ao fazer parte do vocabulário das línguas
românicas, adquiriu o sentido de norma” ou “lei”. Hoje, mais precisamente, a palavra
recebeu “o sentido específico de conjunto de textos autorizados, exatos, modelares”
(PERRONE-MOISÉS, 1998, p. 61).
Porém, quais são os critérios e quem determina que certos textos literários sejam
considerados canônicos? Certamente, quando se opta por uma determinada seleção de textos,
imediatamente se pressupõe a exclusão de outros. Portanto, existem vozes discursivas que
avaliam os textos a partir de sua posição sócio-cultural e histórica, revestidas de autoridade e
107
de seus próprios interesses, mantendo presentes sua ideologia, intrinsecamente ligada às
questões do poder:
[...] por trás de noções como linguagem, cultura, escrita e literatura, mesmo
se não as tratarmos (como seria mais indicado) em termos históricos e menos
abrangentes, se esconde a noção de poder. Para trabalhar o conceito de
“cânon” é importante ter em mente este horizonte, pois o que se pretende, ao
se questionar o processo de canonização de obras literárias é, em última
instância, colocar em xeque os mecanismos de poder a ele subjacentes
(REIS, 1992, p. 68).
Assim, a linguagem literária é uma forma de representação da realidade e sua
manifestação (principalmente a canônica) se por agentes sociais que ocupam certa posição
ideológica, social e histórica, revestidos de autoridade e poder num determinado espaço
institucional.
Todo indivíduo leitor se constitui de pré-noções que acumula em suas várias leituras
e interpretações, textos que guiarão suas expectativas e comportamentos. Cada texto possui
um “espaço vazio” que será preenchido pelo leitor. A interpretação, portanto, está
condicionada pela posição do leitor, sua classe social, gostos, momento histórico e pela
inscrição social e histórica (ideológica e institucional) de quem escreve o texto.
Para Reis (1992), a literatura tem sido um eficaz meio de comunicação de massa e
dos aparelhos ideológicos do Estado, que transmitem a cultura, disseminando uma
regulamentação social e consolidação da hegemonia das elites letradas. Em geral:
A literatura tem sido uma das grandes instituições de reforço de fronteira
culturais e barreiras sociais, estabelecendo privilégios e recalques no interior
da sociedade. Ao olharmos para as obras canônicas da literatura ocidental
percebemos de imediato a exclusão de diversos grupos sociais, étnicos e
sexuais do cânon literário (REIS, 1992, p. 72).
Esse acervo literário ocidental não inclui as literaturas de outras culturas (não-
ocidentais) como a africana, asiática, indígena e mulçumana valorizando, tão somente, a
cultura da escrita, alfabetizada e civilizada:
Com efeito, a literatura tem sido usada para recalcar os escritos (ou
manifestações culturais não-escritas) dos segmentos culturalmente
marginalizados e politicamente reprimidos mulheres, etnias não-brancas,
as ditas minorias sexuais, culturas do chamado Terceiro Mundo (REIS,
1992, p. 73).
108
Além disso, o cânone incorpora apenas as bases conceituais ocidentais como o
patriarcalismo, o arianismo e a moral cristã. Nessa perspectiva, observa-se que o fato literário
sempre esteve associado a um julgamento de valor formulado pela voz do branco, europeu,
civilizado, letrado, adulto e masculino (LAJOLO, 2001).
No Brasil, nota-se que os autores pertencentes ao “cânone brasileiro” são, quase que
exclusivamente, membros de certa elite letrada, parceiros e amigos (entre si), freqüentadores
dos salões literários. Como a impressão e circulação da obra são fundamentais para o seu
reconhecimento, pelo público e pelas vozes discursivas que afiançam os textos literários,
dificilmente um escritor brasileiro conseguia imprimir sua obra se não fosse por indicação de
um membro político ou autor já consagrado pelo público.
As primeiras instituições que efetivaram o juízo de valor no Brasil para a formação do
cânone brasileiro no século XVIII foram: a Academia Brasileira de Letras, o Instituto
Histórico e Geográfico e o Colégio Pedro II, reforçados pelos comentários em jornais e
suplementos literários em revistas (REIS, 1992).
Foi, porém, o movimento do romantismo que mobilizou a formação do cânone
brasileiro tendendo ao indianismo, sertanismo e nacionalismo. A produção literária no Brasil,
nessa época, acaba configurando uma espécie de auto-retrato das elites que a reproduziam e
também consumiam. Segundo Reis (1992), o nacionalismo presente nesta produção é aquele
que interessa ao projeto de consolidação do Estado nacional.
O romance conquistou seu espaço porque era a manifestação mais autêntica da
burguesia e de sua influência. A nova classe persistiu com a concepção canônica,
estabelecendo, no entanto, as obras e escritores que encarnavam os seus valores e atendiam
aos novos projetos sociais.
Admitia-se o romance, pois este se coadunava perfeitamente com o novo espírito
implantado em conseqüência do natural desgaste das estruturas socio-culturais trazidas pela
Renascença” (MOISÉS, 1970, p. 164).
A aceitação do romance na lista de textos modelares, assim como de qualquer outro
gênero ou estilo literário, mostra que a questão em jogo o é apenas de qualidade literária,
mas trata-se de política, luta de classes e de poder.
Por outro lado, o modernismo tem espaço no cânone porque o movimento representa
uma “maturidade e maioridade” da literatura brasileira.
O sistema literário, hoje, é visto como uma manifestação cultural e ideológica que
envolve uma natureza social e, portanto, não está livre de apresentar variações, no tempo e no
espaço, quanto ao que se considera literário ou não (LAJOLO, 2001).
109
Segundo Alastain Fowler (1982 apud BLOOM, 1995, p. 28), “mudanças no gosto
literário podem muitas vezes estar relacionadas a reavaliações de gêneros que as obras
canônicas representam”.
Cada momento histórico encara um gênero como mais canônico que outro, pois “[...]
quando um gênero literário chega ao seu apogeu ele é canonizado, proposto como modelo
digno de ser imitado torna-se um ‘clássico’ na aceitação etimológica do termo”
(D’ONOFRIO, 1990, p 15).
Assim, aconteceu com as epopéias, por exemplo, que se utilizavam de certos
elementos estruturais imitados por séculos. Essas constantes imitações, porém, criavam um
automatismo e estereótipos definidos, desgastando a imaginação criadora dos autores,
gerando, assim, uma necessidade de mudanças e novos atrativos para o leitor:
[...] mas nunca consegue inventar um nero novo, pois o surgimento de
formas literárias é um fenômeno coletivo, fruto de uma longa gestação. Haja
vista o largo percurso que levou a passagem da poesia épica para o romance
(D’ONOFRIO, 1990, p. 15).
Da mesma forma, é muito raro que um novo nero (ou estilo) literário torne-se
parte de um cânone instaurado socialmente. Segundo Coutinho (1976, p. 57), “a epopéia
não encontrou ambiente para frutificar nas literaturas modernas” e, por isso, as teorias do
gênero foram sustentadas até onde foi possível. É evidente nessa seleção de textos, que a
classe de poder impõe hierarquia social de dominação.
A visão imposta pela classe detentora do poder é de que o cânone literário é um
patrimônio da humanidade, pois se acredita que “os monumentais clássicos contêm verdades
incontestáveis, atemporais e universais, transcendem o seu momento histórico e fornecem um
modelo a ser seguido” (REIS, 1992, p. 71). Ou seja, os clássicos (obras canonizadas) possuem
um certo valor estético literário que os diferem das demais obras, além de constituírem-se
como padrão do bom gosto literário.
Harold Bloom (1995), crítico literário e defensor do cânone ocidental, explica que na
escolha canônica critérios severamente artísticos, que valorizam a estética do texto e sua
estranheza diante do leitor. Bloom (1995, p. 25) afirma, ainda, que “o estético [...] é uma
preocupação mais individual que de sociedade” e que “a crítica literária, como arte, sempre
foi e sempre será um fenômeno elitista”:
O Cânone, assim que o tomemos como a relação de um leitor e escritor
individuais com o que se preservou do que se escreveu, e nos esqueçamos
110
dele como uma lista de livros de estudo obrigatório, será visto como idêntico
à literária Arte da Memória, não ao sentido religioso do termo. A memória é
sempre uma arte, mesmo quando atua involuntariamente (BLOOM, 1995, p.
25).
A favor ou não de um cânone, o problema não é incluir a literatura dos marginalizados
na estrutura canônica, mas questionar, esclarecer e, se for possível, desconstruir os vínculos
de poder na formação de todo processo canônico.
Afinal, se o estético é uma questão pessoal, quais são as razões de certas escolhas,
quem escolhe e por que, qual o público que procura atingir e quais são os seus interesses?
todo um contexto histórico, político, cultural, mercadológico e capitalista que influem nas
escolhas literárias. Como se pode observar no anúncio Planeta adquire passe do Best-seller
Paulo Coelho (V. Anexo F), os fatores que agem para que um escritor, como Paulo Coelho,
pudesse fazer parte da Academia Brasileira de Letras, parecem mover-se entre os números de
contratos e vendas de livros. Será que realmente as questões que influem nessas escolhas são
apenas estéticas?
Há, realmente, dúvidas sobre os critérios utilizados pelas instituições que
desempenham os processos seletivos como as academias literárias, os divulgadores como os
jornais, suplementos literários, resenhas e críticas literárias. Como se poderá observar no
capítulo a seguir, essas instituições têm adotado a concepção da historiografia literária e da
canonização de textos literários, reproduzindo conceitos ao invés de questioná-los.
Para solucionar o embate, Reis (1992) propõe a mudança na maneira de ler,
enfatizando, assim, uma leitura que faça emergir as diferenças, subvertendo a leitura canônica
e hierárquica.
Nesse sentido, o trabalho aqui proposto objetiva para uma visão mais ampla e
panorâmica da concepção de literatura, pois considera todo o sistema literário envolvido na
estruturação daquilo que se entende por literatura hoje. A percepção do social agindo sobre a
literatura, seja ele por meio do estético, das leis, do capital, dos membros intersectores da
propaganda, divulgação e venda dos livros literários, das instituições promotoras da leitura e
do conhecimento das artes, propõe a compreensão da literatura não como uma lista de livros e
autores consagrados, nem manifestações de determinado gênero ou época literária, mas
caracteriza a literatura como manifestação humana, reflexo da realidade, prazer e gratuidade
aos quais se mesclam fatores também materiais, ideológicos e econômicos. Literatura é arte,
sim, mas é também produto que se compra, se consome e que deleita.
111
4.4 As academias literárias
Devido às más condições de vida e da dependência financeira da nobreza, muitos
escritores e artistas começaram a se reunir e a organizar associações de proteção contra os
abusos e a falta de remuneração e apoio da sociedade em geral, as chamadas academias
literárias. Essas academias eram um modo seguro de obter reconhecimento do público, que
o escritor era considerado um indivíduo à margem da estrutura social, e conseguir por meios
legais um certo amparo do Estado:
A partir da Academia Francesa, concebida por Richelieu em 1635, durante o
reinado de Luís XIII, o letrado passou a gozar da respeitabilidade pública de
que carecia e que o tornou modelo e centro de expressão (LAJOLO;
ZILBERMAN, 2001, p. 34).
As academias francesas, do século XVII, desempenharam um papel importante para a
legitimação da literatura e do escritor, para correção da forma e harmonia da arte e
superioridade da língua. A França tornou-se, por vários séculos, padrão e modelo de bom
gosto em todo o mundo.
No século XVII, Portugal tinha uma cultura literária significativa, contando, inclusive,
com algumas academias literárias como a Academia dos Singulares, a dos Generosos, a dos
Solitários, a dos Únicos, a Instantânea e a dos Ilustrados
43
.
O Brasil, enquanto Colônia, não apresentava sequer uma organização que propiciasse
as condições para socializar o evento literário. Foi preciso que alguns centros urbanos e
comerciais se firmassem primeiro, como em Rio de Janeiro, Bahia e Minas Gerais, para que
as comunidades formadas por religiosos, militares, altos funcionários, desembargadores e
intelectuais interessados pudessem se reunir e formar grêmios literários para discussão e
apresentação de trabalhos (BOSI, 1994).
Segundo Bosi (1994, p. 48), as primeiras academias brasileiras foram o último centro
irradiador do barroco literário” e “o primeiro sinal de uma cultura humanística viva,
extraconventual, em nossa sociedade”, contribuindo, assim, principalmente para a história e a
erudição, enquanto disciplinas.
Sem condições de enfrentarem individualmente a falta de público e a
pobreza dos meios de produção intelectual, os baianos buscaram uma
43
Cf. História da Literatura Clássica, 2. época. Lisboa, 1922. In: BOSI, A. História concisa da Literatura
Brasileira, 36. ed. São Paulo: Cultrix, 1994. p. 48.
112
solução coletiva, também em voga na Europa civilizada: a criação das
academias, que reuniam os letrados locais sob a égide de um mecenas
(LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p. 50).
Entre as mais fecundas academias brasileiras baianas tem-se a Academia Brasílica dos
Esquecidos (1724 -1725), fundada pelo vice-rei Vasco Fernandes César de Meneses, com o
apoio de D. João V. Seu objetivo era estudar a história natural, a militar, a eclesiástica e a
política do Brasil e discutir versos elaborados pelos próprios acadêmicos. Seu principal
representante foi o Coronel Sebastião da Rocha Pita (1660 – 1738). A Academia Brasílica dos
Renascidos (1759) resgatou as prosas de valor documental. Seu símbolo era a Fênix, devido
aos seus objetivos de reviver os exemplos de cultismo da academia dos Esquecidos, como os
acrósticos, mesósticos, sonetos joco-sérios e outros engenhos pré-concretos (BOSI, 1994;
LAJOLO; ZILBERMAN, 1991).
No Rio de Janeiro destaca-se a Academia dos Felizes (1736 -1740), fundada pelo
Brigadeiro José da Silva Pais. Pouco se sabe sobre seus propósitos e atuações. Em seguida, foi
criada a Academia dos Seletos (1752), que priorizava as apresentações de atos acadêmicos,
sessões de comemoração de datas religiosas e exaltava os homens de prol no regime colonial,
provavelmente os mecenas (BOSI, 1994).
Segundo Lajolo e Zilberman (1991), os mecenas presentes nas academias tinham
como função não apenas financiar os trabalhos dos acadêmicos, mas prestigiar e proteger
socialmente as atividades oferecidas pelas academias para a própria legitimação destas.
As academias estavam fortemente ligadas às questões de poder, devido aos cargos
públicos que seus integrantes ocupavam e aos seus patrocinadores (mecenas e governantes),
moldando seus objetivos aos âmbitos ideológicos e políticos.
Nas esferas ética e cultural, as características mais comuns e ostensivas das Academias
eram:
[...] o meufanismo verbal, com toda a seqüela de discursos familiares e
acadêmicos; a anarquia individualista, que acaba convivendo muito bem
com o mais cego despotismo; a religiosidade dos dias de festa; a displicência
em matéria moral; o vício do genealógico e do heráldico nos conservadores;
o culto da aparência e do medalhão; o vezo dos títulos; a educaçao
bacharelesca das elites; os surtos de antiquarismo a que não escapam nem
mesmo alguns espíritos superiores (BOSI, 1994, p. 52).
Esses ideais se desenvolveram com as estruturas sociais que formavam a elite
brasileira da época. Assim, as academias ganhavam um status quo que legitimava suas
opiniões, críticas e resenhas sobre o que se pretendia literatura.
113
Como as opiniões variavam entre as academias literárias devido às diferenças
culturais, geográficas e ideológicas, foi criada a Academia Brasileira de Letras, considerada
como instituição máxima entre os literatos: “Algumas das vozes responsáveis pela
literarização ou desliterarização de um livro ou de um texto são nitidamente
institucionalizadas. A Academia Brasileira de Letras, por exemplo, tem sede tem uniforme,
regimento, estatutos” (LAJOLO, 2001, p. 19).
A Academia Brasileira de Letras foi fundada entre 1896 e 1897, tendo seus próprios
estatutos assinados por seu presidente, Machado de Assis, seus secretários Joaquim Nabuco e
Silva Ramos e o tesoureiro Inglês de Sousa
44
. Os estatutos originais, ainda hoje em vigor,
constam de dez artigos, entre esses estão os critérios de seleção para os quarenta membros
efetivos da academia:
[...] podem ser membros efetivos da Academia os brasileiros que tenham,
em qualquer dos gêneros de literatura, publicado obras de reconhecido
mérito ou, fora desses gêneros, livro de valor literário (ACADEMIA..., 1898
apud LAJOLO; ZILBERMAN, 1991, p. 150)
45
.
Assim, a Academia acaba por receber uma qualificação que lhe permite avaliar e
reconhecer a qualidade literária das produções artísticas no Brasil.
Segundo Lajolo e Zilberman (2001), existe uma aliança entre a academia e o mercado,
constituindo-se de uma remuneração do membro da academia não agraciado apenas pelo
seu trabalho intelectual, mas, principalmente pela griffe que sua posição acadêmica lhe
confere. O texto avaliado ganha um certo valor e status por ser adornado pela assinatura da
instituição de reconhecimento e respeito, que é a Academia.
O perigo dessa relação (financeira) está também em sua dependência e troca de
favores com o Estado, passando a ser, numa visão marxista, mais um dos aparelhos
ideológicos do Estado burguês.
A Academia não possui recursos financeiros próprios, aceitando, inclusive por aval do
regimento interno, contribuições do governo e de instituições privadas:
Nossas letras passaram a depender, de modo crescente, do favor
governamental. Em vez do público leitor, o Estado, simultaneamente agiota
e avalista, que empresta e garante, limitando o poder reivindicatório da
literatura e de seus agentes (LAJOLO; ZILBERMAN, 2001, p. 153).
44
Cf. Lajolo e Zilberman, 2001, p. 150.
45
ACADEMIA Brasileira de Letras. Estatutos e Regimentos. Rio de Janeiro: ABL, 1898. p. 5.
114
Nada mais evidente, que a atuação da Academia Literária contribuia
significativamente na literarização dos textos literários, fazendo parte do complexo sistema
literário como instância de poder e autoridade infelizmente, controlado por forças maiores,
como o Estado e as elites letradas brasileiras.
Hoje, nota-se que fatores como o econômico e mercadológico influenciam diretamente
na estrutura da Academia Brasileira. Um exemplo claro desta influência é a entrada do
escritor Paulo Coelho
46
. Seus livros de gênero esotérico, consumidos pelo público de massa
no Brasil e por leitores do mundo todo, principalmente na França, possuem realmente um
valor literário “espetacular” e significativo? Ou o que se conta é a quantidade de livros
vendidos? São questões desse nível que tem colocado em xeque o compromisso e a
confiabilidade da instituição acadêmica no Brasil.
4.5 A crítica literária
A crítica literária é uma prática singular de leitura que
inclui sempre uma concepção, mesmo que inconsciente
ou implícita, do que se chama de “a literatura”
(ROGER, 2002, p. 7).
A palavra crítica tem sua origem na palavra grega krino, que significa “eu escolho”,
“eu atribuo valor”. A primeira referência que se tem do pensamento crítico data de 334 e 323
a.C.. A Poética de Aristóteles que, apesar de não ser uma obra especificamente crítica,
inspirou diversas outras obras, além de guiar os primeiros estudos classificatórios da arte
literária (MOISÉS, 1970; ROGER, 2002).
Tendo a Poética como modelo, os estudos literários privilegiaram a estética da
linguagem e o estilo como critério de julgamento. O objeto da crítica ainda não estava
definido e a sua prática oscilava entre a descrição e a avaliação dos textos.
Foi no culo III, com a disciplina da filologia elaborada em Alexandrina (220- 143
a.C.), que a ciência literária se define e a crítica modela um cânone de autores escolhidos e
admitidos após exame. A filologia auxiliava na tarefa de analisar a língua e o seu sentido, e
interpretar o texto. A escrita gramaticalmente correta, como se pode observar, era decisiva
para a qualidade literária.
46
Ou de um político como José Sarney.
115
Por volta de 50 d.C., a hermenêutica e a exegese bíblicas ganharam forças,
especializando-se na interpretação em níveis: o literal, o alegórico, o moral e o analógico,
limitando, em conseqüência, a leitura livre.
No renascimento, a arte crítica deixa de referir-se ao ato de corrigir a filologia e a
gramática de textos, passando a significar uma apreciação pelo bom gosto (ROGER, 2002;
MOISÉS, 1970). Com o movimento da Reforma e a difusão do livro impresso, o contexto
exigiu um leitor novo e individual, livre para interpretar:
Para o homem ocidental das sociedades contemporâneas, a vontade
(Vernant, 1977) é uma das dimensões essenciais da pessoa. Por isso o eu”,
nas sociedades capitalistas, aparece como a origem da ação do sujeito
autônomo que se manifesta em atos. Não ação que não tenha um agente
individualizado que seja seu centro, sua fonte (ORLANDI, 1996, p. 49).
Essa nova noção de sujeito leitor, que é constituído historicamente, é resultado das
relações do homem com a linguagem e do individualismo provocado pelas instituições.
A crítica é essencial para a realização da literatura como prática social, pois é a criação
de um discurso coeso e autônomo que legitima e valida o literário para os textos. Esse
discurso enraíza valores na sociedade, definindo, reforçando, modificando e universalizando
um gosto literário e sua aceitação.
Para Escarpit (1969), o crítico é um elemento fundamental de ligação dentro do
circuito letrado, pois é ele quem “aconselha” o público, apresentando uma variedade de
opiniões estéticas, políticas e religiosas.
Com efeito, o pensamento crítico sempre foi exercido por uma aristocracia que
estimava e privilegiava sua própria cultura através da utilização de uma língua padrão e da
classificação dos gêneros literários, representando a sua estrutura social.
A fim de mudar esse quadro, a crítica francesa procurou, nas últimas décadas, prezar e
redescobrir as manifestações artísticas e literárias das minorias marginalizadas (a mulher, o
negro, a criança e outros), inovando em quatro abordagens analíticas de linhas filosóficas: o
existencialismo, o marxismo, a psicanálise e o estruturalismo.
A crítica, então, desenvolveu-se em vários aspectos: uma aceita a divisão aristotélica
dos gêneros; outra fiscaliza apenas as literaturas nacionais ou conjuntos fechados de
categorias lingüísticas, geográficas ou raciais; há aquela que procura as marcas no texto para o
classificar em gerações ou estirpes; outra procura as fontes históricas e contextuais do
escritor; outra, ainda, enlaça as formas da literatura com outras artes, reconstrói textos
116
perdidos, confronta redações e impressões sucessivas de uma mesma obra, investigando
traduções e imitações.
Em geral, o estudo da literatura se divide em Teoria, História e Crítica. A crítica
também se subdivide segundo o método avaliativo adotado pelo crítico. Para Thibaudet
(1930), por exemplo, a crítica divide-se em: crítica espontânea (leitor comum e jornalista),
crítica profissional (professores) e crítica artística (os próprios escritores). para Harold
Osborne (1955), a crítica pode ser psicológica, histórica, exegética ou impressionista. As
demais formas e classificações assemelham-se a essas variando em combinações
(THIBAUDET, 1930; OSBORNE, 1955 apud IMBERT, 1971).
Para Imbert (1971), o leitor é o encerramento do circuito literário, ou seja, é ele quem
o sentido final à literatura. Assim, o crítico se constitui como um desses leitores, porém,
especializado (e profissional) que reconhece, intui, compara, analisa e julga o caráter artístico
de uma obra.
Considerando, porém, o pressuposto de que o sistema literário é modular, a prática
discursiva do crítico não encerra em si a leitura de uma obra, pelo contrário, lhe dá nova vida,
promovendo discussões e novas formas de ser lida, interpretada e pensada.
Entende-se aqui como modular, a idéia que todas as relações estabelecidas e
pertencentes ao sistema literário são dependentes umas das outras. Como o sistema literário é
formado por um conjunto de fatores que regulam o conceito de literatura, como ilustra o
Apêndice B, cada produção literária parte da necessidade de uma das instâncias (ou em
conseqüência dessa), resultando a seguir uma “reação em cadeia”. Por exemplo, o movimento
feminista aparece em um determinado tempo num contexto social e forma um certo grupo de
pessoas. O grupo, mais ou menos definido, enquanto público, passa a desejar uma literatura
que corresponda às suas necessidade e expectativas, até mesmo para a própria formação do
pensamento do grupo. Assim, o autor escreve (inspirado pelo meio ou a pedido do editor, que
percebe o movimento e um possível público consumidor) e lança uma obra de cunho
feminista. Logo, as práticas discursivas, como a crítica literária, afiançam o texto e lhe
atribuem valor literário, e, portanto, social. O mercado investe nas propagandas e na
distribuição da obra, incentivando outros autores e conquistando leitores adeptos ao
movimento, e assim, por diante. Todas os fatores ajustam-se conforme o social determina, de
forma modular.
As funções da crítica confirmam a sua influência sobre os escritores, instituições e na
sociedade, pois, além de a crítica julgar, ela pode prever gostos do público e criar
necessidades.
117
Segundo Imbert (1971), a crítica, em geral, pode exercer várias funções, como, por
exemplo: informar sobre uma obra, ensinar, fazer uma propaganda, persuadir, guiar os
próprios escritores quanto às tendências do público, distinguir o belo do feio com autoridade,
reunir e comparar juízos de valor emitidos sobre a mesma obra e antecipar a opinião do
público ou desejos populares.
O crítico, porém, deve precaver-se de certos preconceitos para que possa formular
adequadamente seus juízos. Deve evitar, por exemplo, limitar-se a enquadrar obras em
gêneros, períodos ou escolas literárias; de acreditar em hierarquias de gênero; de procurar
valores morais, políticos, filosóficos ou ideológicos considerados superiores; seguir
modismos, gostos populares ou elitizados; condenar uma obra pela pouca representatividade
do seu escritor, ou ainda acreditar que um grande escritor sempre escreve grandes obras; ter
medo de comprometer-se (especialmente na política), confessar valores; desconfiar das
novidades; apegar-se ao tradicional ou o contrário, desvalorizar o passado em prol do
presente; abusar de um método inadequado à situação analítica.
A crítica do início do século XX deixou de questionar apenas o valor estético das
obras para discutir a própria noção de literatura. Dessa forma, o crítico se coloca em meio a
uma diversidade de disciplinas e ciências humanas e aborda as relações possíveis entre o
sujeito, o mundo e a linguagem.
Do ponto de vista marxista, Eagleton (1991, p. 3) analisa o surgimento da crítica na
Europa, afirmando que “a moderna crítica européia nasceu de uma luta contra o Estado
absolutista”. Nesse contexto, a burguesia começou a criar um espaço para si, um espaço
discursivo e específico: a esfera pública.
Essa esfera é formada por instituições sociais como clubes, jornais, periódicos, cafés
ou ponto de encontro de leitores onde indivíduos se reúnem para discutir e consolidar um
discurso racional de alcance político.
Num ponto de vista histórico, o conceito de crítica literária está “estreitamente ligado à
ascensão da esfera pública burguesa e liberal”, e a literatura colabora para o “movimento de
emancipação da classe média” (EAGLETON, 1991, p. 4), firmando-se com um discurso
democrático na luta contra o estado absolutista e hierárquico. Sabe-se que a crítica literária
não dissemina apenas os valores estéticos da obra, mas, de forma indireta e subjetiva, divulga
valores ideológicos, morais, éticos e políticos.
O conceito de crítica está ligado à esfera pública porque depende do intercâmbio da
opinião pública para conceber seus julgamentos.
118
Da mesma forma, a classe média burguesa serviu-se da literatura como instrumento de
articulação contra o estado absolutista e da hierarquia social, assim como antes servia como
forma de legitimação da aristocracia em seus salões de debates. A história é a mesma,
mudam-se, apenas, os nomes dos personagens.
A crítica iluminista, por exemplo, ironicamente lutava contra o absolutismo, ao mesmo
tempo ditava padrões conservadores e corretivos, punindo os desvios e reprimindo a
transgressão dos limites impostos.
Até o século XVIII, a crítica literária o era vista como um discurso especializado e
autônomo, pelo contrário, era apenas um setor humanista de reflexão moral, cultural e
religioso, determinado por uma ideologia social e de cultura dominante.
O crítico estava no centro da esfera difundindo e reciclando seu discurso como um
simbólico representante do domínio público. Sua função era, portanto, conduzir e mediar a
discussão geral como um porta-voz do grande público.
A esfera pública fomentava os ideais burgueses de liberdade e igualdade, formando,
aparentemente, uma comunidade discursiva de caráter universal, único e homogêneo. Porém,
na prática, as próprias revistas vendidas por assinatura, contavam com um público leitor
restrito, definido e de poder aquisitivo, formando nesse meio, diferentes discursos, centros
opositores de idéias.
Logo, os avanços tecnológicos de impressão e de publicação, a disseminação da
educação, o crescimento da população, o surgimento de um novo público da classe média e
baixa e o poder das editoras e dos livreiros subverteram as relações sociais de produção.
Ocorrendo uma “explosão” de periódicos literários, a profissão das letras se estabeleceu e
houve uma difusão da ciência literária e da arte.
O crítico, como profissional, no contexto moderno, ganhou um espaço nos periódicos
para apreciar as novas publicações de livros. Alguns comentários, porém, não eram
especializados e estavam associados ao pedantismo e a insultos pessoais a escritores.
Segundo Eagleton (1991), a desintegração gradual da esfera pública clássica, do ponto
de vista da história da crítica literária, tem duas razões. A primeira é de ordem econômica a
sociedade capitalista se desenvolve e controla o mercado fazendo com que os “produtos
literários” não dependam do debate racional, mas de forças externas à esfera pública mercantil
que potencializa o público. A segunda razão é de ordem política, que o direito de falar é
determinado pela racionalidade e é a comunidade de propriedade política, ideológica e
lingüística, que detém esse direito, evidenciando certo partidarismo no interior da esfera
pública.
119
No início do século XIX, a luta de classes resultou na construção de uma “contra-
esfera pública”, surgindo, assim, redes de oposição em jornais, clubes literários, panfletagens,
instituições e empresas. Ao mesmo tempo, uma propagação da leitura e as classes menos
favorecidas começam a ter acesso à educação e têm despertado o interesse pela crítica. Aos
poucos, a esfera pública se fragmenta e perde sua credibilidade ideológica.
Assim, a função da crítica como mediadora e instrutora entra em crise, devido à
diversificação do campo de leitura: o leitor é desigualmente educado, gerando níveis de
leitura e letramento totalmente diferentes.
As universidades tornam-se um veículo de autoridade cultural, especializando um
discurso mais científico, porém, alienado por não estar inserido nas práticas e vivências
sociais. No entanto, a crítica “academizada” ganha uma base institucional e se separa do
domínio público e político. Suas revistas especializadas se dirigem aos intelectuais da área e
seus estudos literários não visam ao contexto e às preocupações sociais
47
.
Surge a Nova Crítica norte-americana a fim de resgatar a experiência humana através
da análise textual, antes devastada pela industrialização cultural. Logo, houve tumultos sociais
e acadêmicos, pois as universidades estavam distanciadas demais da realidade social.
A teoria da literatura, então, é evidenciada no momento em que a crítica é colocada em
dúvida acusada de reproduzir as relações sociais dominantes, de ser idealista e
despolitizada, à margem do social. Esse humanismo literário, de certo modo, restabelecia os
parâmetros da ideologia burguesa clássica, totalmente incoerente ao contexto atual que exigia
um indivíduo ativo, versátil, múltiplo, coletivista e participativo (EAGLETON, 1991).
A fenomenologia, então, transformou a própria obra literária em tema de análise
epistemológica. A Estética da Recepção deu ênfase ao leitor, estabelecendo uma força
“democrática” e participativa do indivíduo, correspondendo a uma sociedade política, apesar
de descartar a objetividade textual. A crítica psicanalítica usou o texto como pretexto para um
exame interior e psicológico do leitor (IMBERT, 1971; ROGER, 2002).
De certa forma, a teoria da literatura ajudou a prover novos fundamentos para a crítica
que já estava desacreditada.
Em suma, o papel da crítica contemporânea, como afirma Eagleton (1991) é
“tradicional”, ou seja, é lutar não mais contra um Estado absolutista, mas contra o Estado
burguês. A crítica literária tem como tarefa primordial questionar o valor das obras e também
47
Cf. Anexo G.
120
os seus todos e noções de literatura, a fim de tornar-se como a própria literatura:
interminável.
O alcance da crítica, porém, de certa forma, está restrito ao circuito letrado, uma
clientela que é constituída basicamente pela alta burguesia educada, artistas, intelectuais e
profissionais liberais. Aliás, o próprio crítico pertence a esse meio social e possui,
praticamente, a mesma formação literária e opiniões, intuindo, assim, a certos critérios e
expectativas do público.
A crítica alimenta a história literária e confirma a formação de um cânone. Sendo o
cânone uma seleção de obras, a crítica contribui no sentido de estabelecer, igualmente, uma
pré-seleção: “[...] o simples facto de a crítica falar de certas obras e não de outras é já uma
escolha significativa: bom ou mau, um livro ‘de que se fala’ é um livro socialmente adaptado
ao grupo” (ESCARPIT, 1969, p. 138). A crítica, na realidade, expressa o gosto do público
letrado, fechado e ciente de suas convicções.
Não se deve, entretanto, deixar de ampliar a atuação da crítica no contexto
contemporâneo. Lajolo (2001), por exemplo, sustenta a idéia de que a crítica possui várias
caras e inúmeras vozes que se manifestam tanto em opiniões pessoais do crítico em relação ao
autor; nos estudos detalhistas de uma obra em artigos, revistas especializadas ou
universitárias; nas notas das editoras nas contra-capas ou orelhas de livros, e outros.
Hoje, paralelamente, há a crítica de massa que interfere na opinião crítica do público a
fim de atender aos interesses do mercado: são as propagandas publicitárias, as feiras de livros,
lançamentos de escritores como palestrantes, a própria mídia, as editoras, livrarias, etc.
A partir do período de 1980, a indústria editorial conta com as grandes bienais do livro
e feiras que aproximam o grande público, veiculando a democratização da leitura. Segundo
Paixão (1998, p. 195), “em 1970, a Câmara Brasileira do Livro realizou sua Bienal
Internacional, com 40 mil visitantes. Em 1994, esse público chegou a quase 1,2 milhões”. Na
última bienal em São Paulo (2006), em sua 19˚. edição, o público excedeu ao número de 800
mil, tendo à disposição cerca de 1,5 milhões de exemplares de livros e textos em outros
suportes mais modernos, e 3 mil novos títulos expostos, além de espaços culturais
alternativos
48
.
48
BIENAL DO LIVRO DE SÃO PAULO SUPERA EXPECTATIVA DE PÚBLICO E OBTÉM
APROVAÇÃO DE 86% DOS VISITANTES. Dia 20 de março de 2006. 19º Bienal Internacional do Livro de
São Paulo 2006. Disponível no endereço eletrônico:
<http://www.feirabienaldolivro.com.br/feirabienaldolivro_v3/index.asp>. Acesso em 20 de jun. 2006.
121
As noites de autógrafos também são muito comuns nas grandes feiras de livros.
Observa-se que até a televisão, pouco a pouco, tem disseminado em novelas a importância da
leitura, além, é claro, das propagandas e projetos elaborados pelo governo. A fim de promover
a idéia do livro e da leitura, criou-se um “calendário do livro”, com datas relacionadas aos
principais eventos e marcos da história do livro (V. Anexo H).
Nesse sentido, segundo Wellershoff (1970, p. 47), “a indústria cultural produz os
homens que lhe convém, inclusivamente os críticos”. Igualmente, Eagleton (1991, p. 1)
discute que, “a crítica atual perdeu toda sua relevância social” porque faz parte do ramo de
relações públicas da indústria literária, ou é uma questão inteiramente interna às academias”.
Nesse contexto de novas produções do mercado, as literaturas consideradas
marginalizadas conquistaram seu espaço e valor, devido ao crescimento diversificado do
público e dos gostos variados. Comercializam-se literatura de massa, romances policiais,
eróticos, de movimentos feministas ou homossexuais, para crianças, negros ou classes de
menor prestígio econômico e intelectual:
No entanto, fatores sociais contribuem para o aparecimento de novos textos.
A necessidade de crítica e a emergência das vozes minoritárias (como a da
mulher, do negro, das classes marginalizadas, da criança) dão origem a obras
novas, que redescobrem o Brasil urbano e rural no que ele tem de diferenças,
trazendo à luz traços culturais até então poucos explorados (AGUIAR, 2004,
p. 20).
Dificilmente o escritor e as editoras vêem o crítico com bons olhos, pois o seu
julgamento pode rebaixar um certo status desejado ou esperado pelo mercado livreiro. Por
outro lado, devido ao grande número de títulos publicados, atualmente, atura-se comentários
críticos, sejam eles bons ou maus, a favor ou contra, afinal, o que importa para muitos
editores e autores é que a obra esteja na mídia.
O trabalho do crítico é interessante se visto como um meio de se revelar as belezas
antes ofuscadas aos olhos do leitor comum, podendo, até mesmo, incentivar novos modos de
leitura.
Imbert (1971) explica a existência de uma relação indispensável na literatura entre o
escritor e o leitor que é a conversação. A crítica nasce para suprir essa necessidade humana,
pois todo leitor almeja expressar sua opinião publicamente sobre o que leu e os escritores, da
mesma forma, esperam ouvir comentários sobre suas obras. A crítica, então, media a relação
de conversação através da análise e sua exposição sobre o objeto literário.
122
A crítica literária atua, consideravelmente, nas instituições de ensino, revelando-se
por meio dos materiais pedagógicos, livros didáticos e nos livros infantis. Parte-se do
pressuposto que tais materiais estão inseridos numa escala de produção voltada à margem de
lucro, já que seu investimento é garantido e o comércio, promissor.
No capítulo seguinte, questiona-se o papel da escola, considerando-a como meio de
divulgação de valores e mantenedora das opiniões formuladas pelas instituições e práticas
discursivas aqui discutidas.
123
CAPÍTULO V
5 - O SISTEMA EDUCACIONAL
O conceito de educação é amplo e genérico, pois pressupõe um processo de
desenvolvimento dos aspectos físicos, intelectual e moral do indivíduo. Além disso, o
processo de educação pode ocorrer em diferentes espaços e por meio de práticas sociais
realizadas na família, na igreja, no trabalho, no lazer e em outros espaços. Como uma prática
social, a educação pode ser realizada de duas maneiras: por meio do ensino ou da doutrinação,
como supõe Aranha:
O ensino consiste na transmissão de conhecimentos, enquanto a doutrinação
é uma pseudo-educação que não respeita a liberdade do educando, impondo-
lhe conhecimentos e valores. Nesse processo, todos são submetidos a uma só
maneira de pensar e agir, destruindo-se o pensamento divergente e
mantendo-se a tutela e a hierarquia (ARANHA, 1989, p. 51, grifo do autor).
Desde o renascimento, a escola tornou-se o espaço privilegiado e formal de ensino-
aprendizagem, recebendo, inclusive, o encargo de mediar os saberes da humanidade e o
indivíduo-educando, a fim de integrá-lo ao meio e convívio social.
A educação, porém, não é um processo neutro de aquisição de conhecimento, mas está
comprometida com a ideologia, a política, a economia e os discursos de poder envoltos em
práticas sociais, conforme o momento histórico em que ela acontece.
A compreensão do sistema educacional, tal como se entende nesta dissertação, está
diretamente relacionada com o processo de aburguesamento, responsável pela consolidação
do sistema capitalista industrial, uma vez que é neste espaço que o sistema literário, abordado
neste trabalho, consolida-se de forma abrangente e significativa.
[...] apenas nas sociedades burguesas ou em processo de aburguesamento um
determinado tipo de escritura, circulando no interior de uma dada prática
social de leitura e escrita, assume traços específicos e identifica-se com o
que modernamente se chama de literatura (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991,
p. 7).
124
Nesse sentido, a discussão acerca da escola, enquanto instituição burguesa e
responsável pela educação da sociedade, torna-se relevante, na medida em que esta se associa
à complexidade do sistema literário atuando, de maneira decisiva, na formação de um dos
elementos-chaves desse mesmo sistema, a saber, o leitor.
O contato com a literatura é de importância fundamental para a formação de um
indivíduo crítico e questionador de sua realidade. Com efeito, o texto literário estabelece a
relação entre a realidade concreta e a imaginação, criando (ou possibilitando) um espaço de
transformação social:
Desse modo, a literatura assume um papel político muito mais amplo, pois
deixa de ser apenas sinal de erudição, para contribuir para a formação do
pensamento crítico e atuar como instrumento de reflexão, uma vez que pode
questionar, através de sua linguagem, a hegemonia do discurso oficial e o
consenso estabelecido pela ideologia dominante (YUNES; PONDÉ, 1988, p.
37).
Por essa razão, o estudo da literatura, enquanto disciplina curricular escolar, sempre
recebeu cuidados especiais por parte das classes dirigentes, pois a função educativa da
literatura na escola é muito mais que uma questão pedagógica que a literatura transmite
valores morais, ideológicos, políticos e culturais. Sua riqueza, assim como os fatos da vida,
podem ensinar tanto o bem quanto o mal, ela não corrompe, nem edifica, apenas intensifica as
experiências do leitor, como sugere Candido (1995).
Desse modo, o presente capítulo tratará sobre o percurso histórico da escola no Brasil
e como o ensino da literatura se configurava nesses períodos, uma vez que:
A educação, como prática social, está profundamente comprometida com a
realidade do país onde se desenvolve: realiza-se através de instituições
subordinadas ao sistema ideológico que legitima e justifica a sociedade
como um todo (FÁVERO, 1980, p. 22).
No caso do Brasil, é importante frisar o fato de que suas origens se constituem dentro
do processo histórico do capitalismo mundial, numa relação de dependência de outros centros
hegemônicos. Essa realidade se expressa na estrutura política do país e em suas construções
nas áreas de estudo científico, tecnológico e artístico-literário.
Destaca-se, nesse contexto, a presença e importância do livro didático inserido no
ambiente escolar, pois segundo Lajolo e Zilberman (1998, p. 121): “O livro didático interessa
125
igualmente a uma história da leitura porque ele, talvez mais ostensivamente que outras formas
escritas, forma o leitor”.
Além da função mediadora que o livro didático exerce entre o professor e o aluno, o
livro também veicula os valores e verdades que se pretende inculcar nos educandos. A
natureza ideológica do livro didático está presente na posição sócio-política de seu autor,
influenciando suas escolhas e seleções, e é reforçada pelo espaço no qual acontece tal
interação, ou seja, na escola.
No segundo tópico, pretende-se ampliar um pouco mais a discussão a fim de refletir
sobre as práticas de leitura, até hoje disseminadas pelas escolas. Acredita-se que tais
considerações contribuirão para melhor compreensão de como os textos literários se inserem
na sociedade, como são consumidos por esta e como um certo modo de leitura ensinado na
escola instiga a certos modos de recepção do texto literário, em especial, através do material
didático, objeto da análise desta dissertação.
5. 1 A escola brasileira e o ensino da literatura
A prática pedagógica real da literatura, encontrada nas
escolas, tem se caracterizado pela tentativa de formar a
identidade do sujeito-leitor segundo critérios de gosto ético-
estético determinados a priori, arbitrados de forma prescritiva,
estabelecidos verticalmente através de critérios sociais,
políticos e econômicos, via de regra destacados das múltiplas
realidades sociais (LEAHY-DIOS, 2000, p. 42).
As primeiras ações educacionais e pedagógicas no Brasil-Colônia foram promovidas
pelos jesuítas com a finalidade primordial de catequizar os índios. O interesse político e
ideológico, por detrás dessa prática, era, por meio do ensino da língua portuguesa, subjugar a
cultura indígena, escravizar os colonos e impor os ideais moralistas e religiosos do branco
europeu, considerados como padrão e exemplo de civilização:
Nesses 210 anos, consolidou-se a prática pedagógica talvez mais marcante e
bem documentada da história colonial brasileira, responsável pelo
estabelecimento das condições dentro das quais leitura e escrita, enquanto
modelos de ação coletivos e institucionais, firmaram-se entre nós (LAJOLO;
ZILBERMAN, 1991, p. 16)
49
.
49
Esses “210 anos” correspondem ao período de 1549, quando o governador geral Tomé de Sousa e os jesuítas
portugueses aportaram na Bahia e lançaram os primeiros projetos educacionais de ordem religiosa, a 1759,
126
Esse programa educacional era promovido e sustentado pela administração
portuguesa, que tinha o interesse de obter uma mão-de-obra escrava e submissa ao poder da
igreja, da qual os portugueses eram representantes ou “embaixadores”
50
. Até esse momento,
as crianças e jovens (brancos) não contavam com nenhum estabelecimento formal de
instrução ou de ensino. Alguns poucos pagavam aulas particulares a professores estrangeiros a
fim de aprender a ler, escrever e contar.
Enquanto isso, a Europa modernizava seu sistema educacional promovendo o acesso
democrático a ela. A ascensão da escola, nesse período, era parte fundamental para
concretização da revolução burguesa, porque correspondia em um desafio ao poder da
nobreza, que o estudo e a aquisição de diplomas acadêmicos proporcionavam população
burguesa) as condições necessárias para que se ocupassem determinados cargos e profissões
de prestígio no meio social:
As transformações provocadas pelo capitalismo, desde o século XV da nossa
era até o século XVIII, quando a Revolução Industrial acelerou a
modernização européia, requereram transformações radicais no ensino. A
burguesia disputava o poder com a nobreza e, como parte dessa luta, atribuía
à posse da educação a função de simbolizar a adequação da nova classe
emergente às funções dirigentes reivindicadas (ZILBERMAN, 2001, p. 69).
A educação, aos moldes burgueses, priorizava um ensino coletivo dividido em classes,
níveis, idade e sexo. O conteúdo era atualizado e se baseava nas novas descobertas científicas
e no estudo das línguas vernáculas, diferenciando-se dos estudos individualistas da nobreza
que conservava os padrões do passado e da língua grega e latina.
No século XVI, por meio da divulgação da imprensa, diversas obras de caráter
pedagógico passaram a ser elaboradas em toda Europa, para auxiliar e padronizar o ensino nas
escolas. Desde então, o livro didático
51
“engloba a tradição literária e atua como seu portador
mais credenciado” (ZILBERMAN, 2003, p. 247).
quando os jesuítas foram expulsos do Brasil Colônia por Marquês de Pombal, iniciando, assim, a primeira
reforma educacional.
50
A produção literária de maior destaque nesse contexto foi a obra Caramuru de Fr. José de Santa Rita Durão.
Sua estrutura era semelhante à epopéia camoniana, sua linguagem, porém, aproximava o leitor de seu tempo. A
narrativa exemplificava o projeto jesuítico e a religião empregada no resgate do selvagem (índio) de sua cultura
pagã, destrutiva e pecaminosa. A obra foi considerada modelo a ser seguido, na estrutura e ideologia. Percebe-se,
aqui, como a literatura servia como pretexto para os ensinamentos doutrinários da igreja (BOSI, 1994).
51
A elaboração de um manual didático como diretriz do ensino é uma prática muito antiga e considerada
essencial para o bom funcionamento de um sistema educacional. Pode-se considerar como sendo uma das
primeiras manifestações da modalidade pedagógica, a obra Poética de Aristóteles (séc. IV a.C.), que reunia
diversas notas acerca das aulas ministradas pelo filosofo; ou ainda, o Intituio oratoria de Marcus Fabius
127
Portugal, no entanto, era inflexível quanto aos padrões conservadores da igreja e
impedia a modernização no Brasil Colônia. A situação era precária, não havia escolas,
leitores, produção intelectual, tipografias, livrarias e outros meios necessários para que o
material impresso circulasse, satisfazendo as necessidades de leitura e educação.
A mudança ocorreu a partir da libertação do índio e da expulsão da administração
missionária jesuítica por Marquês de Pombal. Numa atitude crítica em relação à ignorância do
povo português que vivia na Colônia e ao sistema da velha escola, Pombal iniciou o projeto
de reforma educacional e de um novo currículo escolar, inspirado nos ideais iluministas de um
ensino público, leigo e universal.
A proposta elaborada por Verney (1741) para o currículo escolar era valorizar o estudo
da língua vernácula (portuguesa), sobretudo a gramática, e simplificar o estudo do latim. O
ensino da poesia
52
era condição essencial para a formação do gosto e para a identificação do
espírito nacional. Assim, sugeriu-se dar maior importância à literatura nacional (de língua
portuguesa) consagrada pelos críticos e historiadores portugueses, a fim de aproximar o
público leitor dos textos e de seus autores e, em segundo plano, o estudo da literatura latina:
Nada mais conveniente do que consagrar a língua dos poetas como a
nacional, desprezando os falares regionais e populares, e usar a escola como
seu veículo de difusão, apostando no prestígio da literatura para validar as
opções feitas (ZILBERMAN, 1990, p. 15).
Durante a administração pombalina, os setores reacionários da sociedade combateram
intensamente as propostas de ensino, impossibilitando a sua concretização, principalmente,
pela falta de apoio político das classes mais abastadas e de recursos financeiros para produzir
os materiais didáticos para os professores e para construir estabelecimentos escolares
(ARANHA, 1989).
Os colégios fundados, nesse período, eram de ordem religiosa e recebiam apenas a
burguesia interessada na formação eclesiástica. O regime era de internato e a disciplina era
extremamente rígida. O objetivo primordial da educação era inculcar aos alunos regras de
conduta moral, obediência e respeito pela ordem (hierárquica) social. Para isso, muitas vezes,
Quintiliano (séc.I d.C.) na qual o autor insere um resumo bibliográfico dos principais autores gregos e latinos da
época. Durante alguns séculos, os materiais didáticos eram voltados ao ensino da retórica, a fim de aperfeiçoar a
expressão pessoal do aluno e seu conhecimento sobre a língua e a literatura (LAJOLO; ZILBERMAN, 1998).
52
A denominação poesia, de certo modo, corresponde à concepção que se tem hoje do termo literatura (v.
introdução desta dissertação).
128
a aprendizagem era forçada por castigos corporais. Nesse contexto, a literatura endossava os
valores doutrinários, religiosos e conservadores, considerados superiores pela sociedade
53
.
Em 1808, com a vinda da família real portuguesa, o uso da tipografia deixou de ser
censurado, como acontecia anteriormente, além de serem criados alguns cursos de nível
superior, tornando o ensino ainda mais elitista. A pequena burguesia que se formara no Brasil
esforçava-se para alcançar uma formação e um certo status social estudando na Europa.
A Real Academia Militar, criada em 1810, recomendava aos alunos, como bibliografia
de leitura, os mais recentes lançamentos da Imprensa gia. Entre esses, encontravam-se:
Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga; O Uruguai, de Basílio da Gama; ensaios
críticos de Pope e estudos de geometria de Legendre e Euler (LAJOLO; ZILBERMAN,
1991). O consumo de livros pelos estudantes foi marco essencial para que o Brasil tivesse
condições de formar um público e investir em meios de circulação dos textos.
Entretanto, o acesso à cultura letrada, ainda no século XIX, era extremamente restrito.
Os altos preços dos livros, a atuação da censura, a dificuldade da indústria editorial e dos
meios de distribuição e comercialização do objeto literário limitavam a literatura aos círculos
elitistas da época, salões e academias literárias, salvo algumas primeiras revistas e jornais que
alcançavam outros segmentos da população.
Após a independência do Brasil (1822), o público leitor é mais bem identificado a
partir da literatura romanesca introduzida nos folhetins de circulação mais abrangente. A
leitura, porém, era pouco refinada e superficial. Segundo Lajolo e Zilberman (1991), saber
recitar poesias e versos, dançar e cantar eram apenas “prendas” que lustravam uma boa
educação burguesa.
Em 1823, decide-se por meio de uma Constituinte governamental priorizar a criação
de universidades e deixar, em segundo plano, o ensino básico de leitura e escrita. A medida
resultou na abertura de colégios e escolas particulares. Praticamente, o governo administrava
apenas o Colégio de Pedro II, considerado modelo para as demais escolas:
Não obstante tantos problemas, a inauguração do Colégio de Pedro II e a
presença de algumas outras escolas dispersas pela Corte e arredores criaram
as condições necessárias para que os livros didáticos fossem se tornando
uma presença regular na vida escolar brasileira (LAJOLO; ZILBERMAN,
1991, p. 136).
53
Com exceção das sátiras, críticas e insultos que circulavam fora do contexto educacional, ridicularizando a
situação de total ignorância do povo e da política cerceadora portuguesa. Entre as manifestações literárias dessa
modalidade têm-se as poesias e críticas de Gregório de Matos, Basílio da Gama, Santa Maria Itaparica, Manuel
Botelho de Oliveira e Nuno Marques Pereira – pequeno círculo de letrados, partidários de Pombal e criadores da
Academia Brasílica dos Esquecidos (1724), citada anteriormente no corpo da dissertação (BOSI, 1994).
129
Como havia poucos livros didáticos que circulavam nas escolas e a maioria era de
língua estrangeira ou portuguesa de Portugal, o que não mais correspondia com o linguajar
característico do Brasil, Januário da Cunha Barbosa propôs ao governo, em 1826, a criação de
um órgão centralizador da educação básica, o Instituto Imperial do Brasil. A função desse
instituto seria escolher e aprovar os livros elementares para o uso das escolas e incentivar a
criação de livros escolares por autores brasileiros e/ou traduções de compêndios
54
.
Nesse período, foram publicados os primeiros compêndios escolares brasileiros e,
principalmente, os livros de historiografia literária brasileira e portuguesa, dados como
suporte para as escolhas didáticas, credenciando e legitimando as produções literárias no
Brasil
55
.
A produção de livros didáticos teve seu efetivo desenvolvimento, a partir de 1890,
com o crescimento das indústrias gráficas e editoras, a massificação do ensino (público e
gratuito) e da formação da tradição literária no país (V. Anexo I).
Após a Proclamação da República, a escola foi reestruturada a fim de promover o
ensino e difundir as bases sociais, políticas e ideológicas para consolidação da nação
brasileira. A literatura, então, associou-se ao currículo escolar desprovida de seu caráter
estético para auxiliar o ensino institucionalizado e de cunho lingüístico, já que a língua
homogênea e nacional poderia construir e organizar o Estado burguês pretendido. Entretanto:
[...] a perspectiva política não desapareceu, tomou outro rumo: a literatura,
escrita no vernáculo julgado padrão pelas entidades culturais e educacionais,
tornou-se porta-voz de uma nacionalidade pré-estabelecida, determinada
pelo Estado, mas corporificada por ela. Por essa razão, na escola, a literatura
passa a ser identificada pelo gentílico que invariavelmente a acompanha
(ZILBERMAN, 1990, p. 15).
O governo central se responsabilizou pelo ensino primário, passando aos estados a
responsabilidade do ensino secundário e superior. No entanto, a educação continuou restrita a
uma pequena elite, pois os estados o tinham recursos financeiros suficientes para tal
encargo. Assim, os cursos eram oferecidos apenas pelas instituições privadas. Nessa época, o
54
O projeto de Barbosa foi aprovado e, inclusive, o governo promoveu concursos e prêmios para as melhores
obras escolares publicadas no Brasil, incentivando diversos novos autores brasileiros e em diversas modalidades
de ensino (LAJOLO; ZILBERMAN, 1991).
55
As primeiras iniciativas brasileiras, a favor de um ensino nacional, partiram do Cônego Fernandes Pinheiro
(1864) professor do Colégio de Pedro II: ele organizou uma seleção de poesias nacionais, o Meandro Poético,
publicada pela editora Garnier e recomendada para todas as escolas, educadores e pais de família
(ZILBERMAN, 2003).
130
governo buscava controlar a elaboração do currículo de toda instituição educacional e
enfatizava o ensino profissionalizante em escolas agrícolas e de artífices.
O objetivo primordial da escola, dentro do sistema capitalista burguês, é, justamente,
qualificar uma mão-de-obra especializada para que o próprio sistema instaurado funcione “em
harmonia”. Advêm daí um processo de massificação do ensino, no qual o ato de ler e escrever
torna-se uma atividade mecânica e de decodificação apenas, sem produção de sentido
56
.
Logo, o modelo educacional dos Estados Unidos, que buscava substituir a herança
elitista por uma educação pública e democratizada, começa a ter ecos no Brasil. Em São
Paulo, por exemplo, as missões protestantes norte-americanas realizaram notáveis progressos
e investimentos na educação, criando a Escola Americana e o Colégio Mackenzie
57
. O
governador paulista até contratou algumas professoras norte-americanas para implantar o
sistema escolar também nas escolas primárias (HALLEWELL, 1985).
Infelizmente, os projetos de um sistema educacional democrático, de livre acesso a
todos, sem distinção de classe social ou religião, não foram, e ainda não são, levados a efeito.
É possível constatar tal fato no contexto brasileiro, hoje, por exemplo, pelo fato de a escola
ser restrita; as instalações públicas serem precárias e não atenderem toda a população; a
qualidade do ensino ser questionável; os índices de evasão e repetência altíssimos; o corpo
docente mal remunerado; os pequenos índices de ingresso de ex-estudantes no mercado de
trabalho ou no ensino superior.
É preciso lembrar, no entanto, que os projetos da burguesia são discursos que o
coincidem com a realidade capitalista em sua essência, ou seja, a escola é necessária até certo
ponto, a saber, para formar trabalhadores aptos para o mercado industrial de produção, e não
para formar indivíduos que subvertam tal sistema.
Segundo Kleiman (1995, p. 8), “uma das formas mais efetivas de se tornar poderoso é
através do acesso e da manipulação da informação”. Assim, uma educação adequada e crítica
pode promover a igualdade e possibilitar o acesso ao poder. Logo, os métodos de ensino o
que se ensina, como se ensina e para quem se ensina são práticas controladas, estipuladas e
supervisionadas por um poder maior, a classe dominante, para que não ocorra uma subversão
desta estrutura social.
56
Cf. tópico seguinte sobre as práticas de leitura escolar.
57
A Escola Americana era, inicialmente, uma escolinha doméstica organizada pela esposa de um missionário
norte-americano, sra. Mary Anesley Chamberlain, em sua residência em São Paulo no ano de 1870. A escola se
expandiu e recebeu ajuda financeira do norte-americano John I.Mackenzie. A doação permitiu a instalação da
Escola de Engenharia do Mackenzie College, em 1896. Segundo Kawamura (1979), a Escola Mackenzie
instalou-se no Brasil a fim de atender os interesses dos grupos dominantes dos países capitalistas centrais, que
tinham como objetivo estender seu controle sobre as novas áreas de atividade industrial e econômica em
expansão.
131
Assim, a escola tradicional burguesa distinguiu-se entre o ensino técnico e
mecanicista, direcionado à população de massa, a quem repassava o código básico lingüístico
e matemático para familiarizar o aluno no sistema industrial de produção; e o ensino clássico,
restrito à educação da elite burguesa era responsável pela transmissão dos princípios
administrativos e legislativos, das letras e das artes, a fim de perpetuar o status quo da família
e do poder que esta exercia sobre as demais classes sociais (ARANHA, 1996).
A escola contemporânea burguesa, como hoje é conhecida, o se difere tanto desse
modelo restrito às elites. Nas décadas de 20 e 30, o ideário liberal da chamada escola nova
lutou pela abolição dos privilégios da pequena elite burguesa, defendendo a escola pública,
gratuita e popular. Até os anos 50 e 60, as escolas particulares católicas eram consideradas
superiores na qualidade e na formação integral do aluno.
O maior movimento para a educação popular aconteceu nos anos 60, com grupos em
todo o país. Destacam-se entre estes, o Movimento de Cultura Popular (MCP), liderado pelo
educador Paulo Freire, e o Plano Nacional de Alfabetização (PNA), dirigido pelo governo
brasileiro. Essas tentativas foram liquidadas com o golpe de 64, acusadas de subversão da
ordem social no país:
As reformas educacionais de 1968 (para a universidade) e de 1971 (para o
ensino médio) foram desastrosas para a educação popular. A lei n. 5.692/71
acenava para a profissionalização universal e compulsória do grau e não
foi seguida à risca pelas escolas de elite, capazes de boicotar a implantação
da lei. O mesmo não aconteceu com a escola pública, abandonada à mercê
de uma política que interessava à ditadura militar por estar voltada,
sobretudo, para a despolitização das massas (ARANHA, 1989, p. 82).
As disciplinas como comunicação e expressão, história, geografia, física, química e
biologia foram aglutinadas em matérias denominadas: estudos sociais, ciências e língua. Para
suprir as necessidades do ensino, o governo criou algumas instituições de apoio como o
Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), e o Projeto Minerva, que oferecia o
curso supletivo de 1º grau, via rádio e televisão.
Nas décadas de 70, ocorreu a privatização de algumas instituições de ensino, fazendo
das escolas e faculdades particulares um investimento rentável. O método de ensino da
literatura em sala de aula insistia nas leituras coletivas e em voz alta e declamações de versos,
reforçando a tradição oral da cultura brasileira. Entretanto, tais métodos não passavam de uma
leitura mimética e sem repercussões na experiência do leitor.
132
Os anos 80 conquistaram novamente a liberdade e a democracia, aentão sufocadas
pelo regime militar. A Constituição Federal, de 1988, então, exigiu do Estado, ao lado da
família e da sociedade, o dever de garantir o acesso de todos à escola pública e gratuita.
Embora algumas tentativas realizadas por parte de educadores, pedagogos, projetos
governamentais e outros, o Brasil continua reproduzindo, efetivamente no sistema
educacional, a divisão de classes e os ideais conservadores de uma elite letrada e dominante:
O sistema sob o qual estamos vivendo caracteriza-se pela concentração, cada
vez maior, de riquezas e benefícios nas mãos de uns poucos privilegiados.
Na última década, as disparidades entre as situações de vida de uma pequena
minoria privilegiada aumentaram tanto que muito contribuíram para um
verdadeiro fosso entre as classes dominantes e as camadas subalternas. Essas
desigualdades persistem, tanto no Brasil como nos demais países latino-
americanos, por terem sido geradas historicamente pelo sistema. E sobretudo
porque os setores mais deserdados estão subordinados a uma ordenação
social compulsória que mantém incólume a estrutura social (FÁVERO,
1980, p. 24).
Nesse contexto, a escola o pode ser apenas um lugar de transmissão de saber e
conhecimentos, recebidos passivamente, mas deve promover um lugar crítico, onde seja
possível questionar os valores vigentes e buscar outros rumos para a sociedade de forma
participativa.
Hoje, o sistema educacional brasileiro procura aperfeiçoar sua legislação específica a
fim de beneficiar um maior número de alunos em todo território nacional. Segundo dados do
último Censo Escolar realizado pelo Inep, em 2004, o Brasil oferece os seguintes níveis e
modalidades de ensino: educação infantil, educação fundamental, ensino médio, educação
especial, educação de jovens e adultos e educação profissionalizante vel técnico. Esses
representam o universo da educação básica brasileira, que corresponde a 210.094
estabelecimentos de ensino em 5.560 municípios, contabilizando 56.174.997 matrículas de
alunos em todo país. O governo, por meio da realização do censo escolar, tem os dados e as
informações necessárias sobre o rendimento escolar, os índices de reprovação e evasão dos
alunos, a idade, sexo, número de séries, de turmas, meios de transporte utilizados,
estabelecimentos, corpo docente e outros.
A função da escola continua (e ainda mais intensivamente) voltada para a preparação
de indivíduos capacitados e especializados para o mercado. Um dos problemas mais recentes
e ameaçadores para o ensino de literatura no Ensino Médio é a abordagem da literatura
voltada, exclusivamente, às questões do vestibular. Praticamente, todo o Ensino Médio tem
133
buscado preparar o aluno para os exames eliminatórios e seletivos necessários para o ingresso
em curso superior ou em concursos.
Assim, a literatura tem-se limitado ao estudo dos clássicos brasileiros, antologias e
valores críticos determinados – cabendo ao aluno, apenas a função de memorizar e reproduzir
as informações fornecidas por professores ou livros didáticos ou mesmo pelos famosos
resumos de textos elaborados por professores de cursinhos, numa falsa preparação para um
estágio de escolarização que quase nunca se concretiza na vida da maior parte dos estudantes
brasileiros:
Não é preciso dizer que a leitura de ficção na escola pública feita como
preparação para o vestibular é uma balela, pois a quase totalidade dos alunos
não fará vestibular da universidade pública e muitos não farão nenhum
vestibular. O ensino público está programado para condená-los ao fracasso
antecipado, não importa a boa vontade de muitos ótimos professores, que
ainda existem apesar de tudo (HANSEN, 2005, p. 43).
Hansen ressalta, nessa citação, que a maioria dos jovens brasileiros não terão
oportunidade de fazer o vestibular. Nessa perspectiva, a literatura não cumpre nem seu papel
humanizador e de gratuidade, nem uma função utilitária (vestibular). São essas e outras
questões que fazem da escola uma instituição avalista, conservadora, no sentido de transmitir
certa herança literária sem questionamentos e críticas.
Segundo Lajolo (1982), a compreensão do trajeto educacional não se encontra
somente na análise de sua legislação e nas teorias pedagógicas, mas principalmente, na práxis
educativa, ou seja, nos manuais e livros didáticos, textos que materializam o modo de ensino e
aprendizagem colocados em ação em uma sociedade.
Para essa autora, o livro didático revela dados importantíssimos sobre o cotidiano
escolar e da própria história dos direcionamentos pedagógicos e políticos que tiveram a
educação no Brasil. Infelizmente, esse rico material não tem recebido a devida atenção como
objeto de pesquisa e análise pelas universidades e centros educacionais. Sua pesquisa ainda é
custosa devido ao difícil acesso aos materiais didáticos do passado.
A constante renovação e substituição do livro didático são, de certa forma, resultados
da flexibilidade do sistema literário, que se move conforme as condições sociais, históricas,
ideológicas, políticas e culturais, aceitando e rejeitando dinamicamente os aspectos da
literarização das obras literárias:
O livro didático [...] é poderosa fonte de conhecimento da história de uma
nação, que, por intermédio de sua trajetória de publicações e leituras, dá a
entender que rumos seus governantes escolheram para a educação,
134
desenvolvimento e capacitação intelectual e profissional dos habitantes de
um país (LAJOLO; ZILBERMAN, 1998, p. 121).
É por essa razão que a escola, como instituição burguesa, busca por meio dos livros
didáticos, padronizar e uniformizar os valores morais, éticos e ideológicos a partir dos padrões
predeterminados pela classe dominante. Como aponta Zilberman (1991), o ensino da literatura
nas escolas precisa se responsabilizar pela formação do leitor, ao invés de preocupar-se com a
transmissão do patrimônio literário, constituído e consagrado, por uma minoria que sequer
sabe sobre a realidade humana e social da maioria.
Visualizar a amplitude do contexto educacional e suas configurações no decorrer da
história do Brasil ajuda a compreender o universo em que a literatura se insere, uma vez que a
escola é o espaço privilegiado de ensino literário, não obstante, é ela que propicia as
condições para o letramento dos indivíduos, dissemina a prática da leitura e, com ela, um
“gosto” e um saber literário, o que, conseqüentemente, amplia e mobiliza o mercado livreiro
consumidor.
A escolha do livro didático, como objeto explicativo ou exemplificativo do corpo de
idéias apresentados neste trabalho de pesquisa, justifica-se por suas qualidades de produto
formulado sob interferência das diversas instâncias do sistema literário, aqui abordadas, e por
ser, em conseqüência disso, o principal veículo de difusão do que se entende por literatura
hoje. Considerando, portanto, a análise do livro didático um modo explicativo ou uma
aplicação da abordagem sociológica aqui exposta, realizar-se-á, na segunda parte deste
trabalho, a análise de uma coleção de livros didáticos direcionada ao Ensino Médio, fase de
escolarização na qual acontece, mais enfaticamente, o ensino da literatura brasileira nas
escolas.
5. 2 As práticas de leitura escolar
Discutir o processo de leitura aplicado à formação do leitor contribui, no contexto
desta dissertação, para a compreensão acerca da leitura que se propõe do texto literário no
contexto da escola, principal instituição responsável pela educação literária. Nota-se que a
escola prioriza, quase que exclusivamente, a leitura a partir do texto escrito e, portanto, esse
tópico abordará com maior ênfase a leitura enquanto um processo cognitivo de decodificação
e produção de sentido, segundo Kleiman (1989):
135
De fato, a compreensão de um texto escrito envolve a compreensão de frases
e sentenças, de argumentos, de intenções, muitas vezes de ações e de
motivações, isto é, abrange muitas das possíveis dimensões do ato de
compreender [...] (KLEIMAN, 1989, p. 10).
Para essa autora, a leitura do texto escrito é significativa e coerente se seu leitor for
capaz de produzir para ele sentidos. Para isso, o leitor deve ter em mente certas estratégias de
leitura que o auxiliarão nesta produção de sentido. Essas estratégias seriam, segundo Kleiman
(1989): utilizar o conhecimento prévio (lingüístico, textual, de mundo e outros), considerando
a leitura como um processo interativo; estabelecer claramente os objetivos e propósitos para
tal leitura, a fim de manter a atenção em determinados aspectos textuais, formular hipóteses e
testá-las, refletir e ter um controle consciente sobre o próprio conhecimento e produção de
sentido; e procurar recuperar a intenção do autor através das estratégias de processamento do
texto, ou seja, na observação dos elementos lingüísticos (lexicais, sintáticos, semânticos),
estruturais, gráficos e extra-lingüísticos (coerência, temática, linearidade, relevância, etc.).
A leitura, sob essa perspectiva, necessita da reciprocidade por parte do leitor e do
autor, pois “ambos têm a zelar para que os pontos de contato sejam mantidos, apesar das
divergências possíveis em opiniões e objetivos” (KLEIMAN, 1989, p. 65). Assim, para
reconstrução do significado e da intenção comunicativa, o leitor deve estar desprovido de suas
pré-concepções e preconceitos, a fim de percorrer o caminho mapeado por pistas dadas pelo
autor no próprio texto, pois “[...] a reconstrução de uma argumentação com base em pistas
objetivas é essencial para a interpretação crítica da intenção argumentativa do autor, própria
da leitura como interação [...]” (KLEIMAN, 1989, p. 79).
Kleiman aprofunda a questão da leitura por meio das análises do conceito de
letramento, a partir de estudos realizados por lingüistas como Heath (1986), Rama (1980),
Scribner e Cole (1981), Street (1984), e os brasileiros, Terzi (1995), Hansen (2005) e outros,
observando, em contraponto, as práticas de alfabetização na escola, que essas não têm
propiciado a formação de um leitor crítico, segundo a concepção de leitura interativa descrita
acima. A definição de letramento pode ser assim pontuada:
Podemos definir hoje o letramento como um conjunto de práticas sociais que
usam a escrita, enquanto sistema simbólico e enquanto tecnologia, em
contextos específicos, para objetivos específicos (KLEIMAN, 1995, p. 19).
136
O fenômeno do letramento, segundo Kleiman (1995), extrapola o mundo da escrita e
do contexto escolar, fazendo-se presente em diversos contextos como na família, em clubes,
na igreja, no trabalho e outros ambientes que envolvem uma interação social impactada de
inúmeras maneiras por práticas ou efeitos da escrita. Em outras palavras, o letramento o
implica somente a prática de uso da escrita observada na escola, como se poderia supor, mas
práticas em todos espaços e contextos diversos.
A escola, entretanto, é a principal agência de letramento, pois é nela, sobretudo nos
dias atuais, que se desenvolve a principal tecnologia de escrita a alfabetização, por meio da
qual se realiza o tipo de letramento dominante que tem como objetivo introduzir o indivíduo
no mundo da escrita:
Pode-se afirmar que a escola, a mais importante das agências de letramento,
preocupa-se, não com o letramento, prática social, mas com apenas um tipo
de prática de letramento, a alfabetização, o processo de aquisição de códigos
(alfabético, numérico), processo geralmente concebido em termos de uma
competência individual necessária para o sucesso e promoção na escola
(KLEIMAN, 1995, p. 20, grifo da autora).
Essa concepção de letramento, denominada modelo autônomo, segundo Kleiman
(1995), disseminada pela escola, difere-se do chamado modelo ideológico, ou seja, práticas de
letramento no plural, onde a escrita recebe certos atributos conforme sua realização, inserção
em determinado grupo social e nas estruturas de poder. Ou seja, a prática de letramento,
segundo o modelo ideológico, é resultante dos aspectos culturais e ideológicos do grupo
social onde a escrita é praticada ou adquirida.
O modelo autônomo de letramento é caracterizado por desenvolver as capacidades
cognitivas, como decodificar a língua, memorizar informações, classificar e categorizar
elementos, e por propor atividades de leitura centralizadas unicamente no texto escrito. A
característica da autonomia refere-se ao fato de o texto escrito ser considerado um produto
completo em si mesmo, cujo funcionamento lógico interno garantiria sua interpretação sem
que se levem em consideração as questões contextuais, os sujeitos envolvidos no processo da
leitura autor/leitor e suas identidades. Assim, as práticas de leitura realizadas na escola não
se preocupam com os modos de como o texto ou a escrita produz sentido para o aluno. Antes,
preocupam-se, apenas, em observar se o aluno conseguiu decodificar o texto, trabalhando
exclusivamente com o aspecto da inteligibilidade dos textos que se propõe a ler, sem ocupar-
se dos sentidos, que são resultados de um processo de interação mais complexo.
137
Desta forma, o modelo autônomo enfatiza o texto escrito considerando-o suficiente
para produzir significado, o que pressupõe que o sentido esteja atrelado à própria estrutura
textual, organização e elementos lingüísticos do texto. Esse modelo reproduzido nas escolas
desde os projetos de uma educação de massas, dicotomiza as práticas da oralidade e da
escrita; do indivíduo escolarizado e, portanto, alfabetizado versus o não-letrado; e
supervaloriza o domínio da escrita como um indicativo de poder e ascensão social e
econômica.
Esses contrapontos agravam as diferenças sociais, discriminando acentuadamente os
grupos marginalizados e de baixo poder aquisitivo e, ainda, rompem com as formas mais
comuns e atuantes de produção de sentido adquiridos na convivência natural dos indivíduos
nos ambientes diversos de prática de letramento.
Para Kleiman (1995), as deficiências do sistema educacional na formação de leitores
(letrados e críticos) decorrem, principalmente, da aplicação do modelo autônomo como forma
ideal e única de letramento escolar. Nesse modelo, por exemplo, as atividades de leitura de
texto são caracteristicamente realizadas a partir daquilo que Terzi (1995) chamou de
estratégia de pareamento, na qual os alunos identificam em lugares pontuais do texto as
respostas solicitadas pelo professor ou pelo livro didático sem se preocupar com o sentido
dessas perguntas ou respostas:
O texto é visto por elas (crianças) como um conjunto de “palavras” cujo
significado não interessa, a leitura é vista como apenas decodificação dessas
“palavras”, e compreender o texto nada mais é que usar a estratégia de
pareamento e mecanicamente localizar a resposta. (TERZI, 1995, p. 104).
Nessa perspectiva, é possível averiguar, na análise do livro didático, no capítulo a
seguir, como o modelo autônomo de letramento reproduzido pelas escolas relaciona-se
diretamente com as práticas de leitura do texto literário, como alguns teóricos denominam,
letramento literário. Para melhor compreender a questão do letramento literário, propõe-se
tecer algumas reflexões, tendo como princípio norteador os conceitos descritos por Hansen
(2005), em seu artigo intitulado Reorientações no campo da leitura literária (2005).
A partir do conceito de letramento, é possível apropriar-se de tal concepção e aplicá-la
na análise da prática de leitura específica do texto literário, uma vez que a literatura também
integra o conjunto de práticas sociais que utilizam-se da escrita como um sistema simbólico
significativo.
138
Para compreender os estudos literários sob a perspectiva do letramento, deve-se
identificar, primeiramente, a especificidade da escrita (e leitura) literária. Hansen (2005)
aponta que o caráter ficcional da escrita literária é que especifica a qualidade do que se
entende por literário.
A essência ficcional da literatura, entretanto, implica em certas considerações acerca
do texto e de seu leitor:
[...] no caso da ficção literária definida como produto de um ato de fingir, e
aqui retorna a questão da leitura, não evidentemente uma interpretação
correta, no sentido de interpretação verdadeira e outras falsas, pois a ficção é
metáfora. Mas evidentemente, como venho repetindo, interpretações
adequadas que refazem os procedimentos técnicos do ato de fingir e serão
melhores quanto mais forem exaustivas dele ou adequadas a ele (HANSEN,
2005, p. 18).
Hansen explica que o ato da leitura pressupõe várias interpretações, porém,
interpretações mais adequadas que outras, a saber, aquelas que refazem os procedimentos
técnicos do ato de fingir. Pode-se inferir a partir desse pressuposto que a escola, ao se propor
estudar e ensinar um conhecimento sobre as questões literárias deveria, sim, ater-se à
identificação e aprendizagem desses procedimentos técnicos que, teoricamente, seriam
instrumentos fundamentais para compreensão do texto literário. Em contrapartida, descartar-
se-ia a hipótese de que há apenas uma interpretação correta da obra literária.
Há, entretanto, um fator histórico-social que se interpõe na questão da ficcionalidade
literária. A princípio, mais especificamente ao século XVIII, os critérios para realização do
ato de fingir ou imitar (mimese) encontravam-se baseados na “relação natural, substancial ou
motivada de signo, consciência e realidade” (HANSEN, 2005, p. 18). Porém, a partir da
revolução romântica, que precedeu os movimentos modernistas e pós-modernistas (como hoje
se caracteriza), destruíram-se:
[...] os sistemas de verossimilhança semântica, mantendo apenas o
verossímil sintático, quando passa a dissolver unidades postas até então
como essenciais, ou seja, quando passa a dissolver a expressão do eu como
unidade do cogito, a designação do real como totalidade natural e social e a
significação como transcendência do significado fundado em uma palavra
essencial, Deus [...] (HANSEN, 2005, p. 18)
58
.
58
Segundo Ferreira (1986, p. 426), a palavra latina cogito, significa penso”, enfatizando o ato próprio de um
indivíduo (“penso, logo existo”), essa idéia remete à “verdade firme e assegurada, de que o se pode duvidar,
princípio primeiro do cartesianismo”.
139
Em outras palavras, a concepção de mundo a partir do “eu” (egocentrismo) ou de
“Deus” (teocentrismo) ou a partir do real (natural ou social) o são cabíveis na visão
ideológica, (filosófica, social entre outras) da modernidade. Desse modo, a desconstrução dos
princípios que regem a própria concepção de mundo, como a apreensão da realidade a partir
da oposição do irreal, do verdadeiro ou falso, do natural ou sobrenatural, confundiu ou até
mesmo invalidou, conseqüentemente, os critérios miméticos norteadores da ficção literária
59
.
A partir do Romantismo, o signo lingüístico (e as relações semânticas que estabelece),
considerado o núcleo da ficção literária, agora é imotivado, pois:
[...] suas asserções não implicam a identidade entre o discurso e a
materialidade das coisas e dos estados de coisas figurados nele. A
materialidade das coisas é posicionada, situada, perspectivada ou
dramatizada: o texto efetua uma materialidade auto-referencial ou pseudo-
referencial, pois a existência real das coisas ou eventos representados nele
não é pertinente para sua significação [...] (HANSEN, 2005, p. 19).
Pode-se arriscar dizer, tendo em vista as considerações de Hansen (2005), que a
apropriação de um texto literário (ficcional) até o século XVIII era feita de determinada
maneira, com base na concepção de mundo que se admitia no referido contexto histórico
social e ideológico – o que se difere significativamente das apropriações que se fazem hoje do
texto ficcional. Tudo indica que os procedimentos, técnicas e convenções necessários para
interpretação adequada do texto literário já não são os mesmos:
Para que uma leitura se especifique como leitura literária, é consensual que o
leitor deva ser capaz de ocupar a posição semiótica do destinatário do texto,
refazendo os processos autorais de invenção que produzem o efeito de
fingimento. Idealmente, o leitor deve coincidir com o destinatário para
receber a informação de modo adequado. Essa coincidência é prescrita pelos
modelos dos gêneros e pelos estilos, que funcionam como reguladores
sociais da recepção, compondo destinatários específicos dotados de
competências diversificadas; mas a coincidência é apenas teórica, quando
observamos o intervalo temporal e semântico existente entre destinatário e
leitor. Assim, a leitura literária é uma poética parcial ou uma produção
assimétrica de sentido (HANSEN, 2005, p. 20).
Com efeito, cabe averiguar se os aspectos como o intervalo temporal, sobretudo o
semântico, são levados em conta nos estudos literários propostos pela escola. Ou seja,
certos códigos e convenções implicadas no texto literário e predeterminadas pela época e
59
Entende-se que o ato de fingir é a “imitação” ou recriação daquilo que se compreende como real. No entanto,
mudou-se o “que se compreende como real”, logo, o ato de fingir imita o quê? Qual realidade?
140
contexto social em que o texto foi produzido. Pressupõe-se, no entanto, que o leitor
desconhece tais convenções, o apenas suas particularidades, mas também a sua própria
existência.
Nesse ponto, os conceitos de modelo autônomo e de modelo ideológico de letramentos
(KLEIMAN, 1995) poderiam ser aplicados na concepção de letramento literário a partir do
questionamento da natureza organizacional dessas convenções presentes no texto literário. As
convenções da escrita literária, como conjunto de práticas sociais, incluem suas
particularidades e determinações segundo o contexto histórico e a atuação das instituições
sociais e suas relações de poder. Nesse caso, as convenções (regras, códigos e outros) mais
visíveis e, portanto, autônomas, são aquelas organizadas pela crítica literária. Assim, o
modelo autônomo de letramento literário seria o prescrito pela voz da crítica e que circula
predominantemente no contexto escolar (a agência do letramento literário).
O modelo autônomo de letramento literário assemelha-se ao modelo autônomo de
letramento, segundo Kleiman (1995), pois também considera a autonomia do escrito como
fonte suficiente para a produção de sentido. Desse modo, o sentido é apreendido a partir das
convenções dadas (ou permitidas) pela crítica literária, resultando a um único modo de leitura
e compreensão do texto literário. Entretanto, questiona-se se tais convenções e regras
(lingüística, semiótica, gramatical, retórica, e principalmente estética), mesmo que limitadas à
visão unívoca da crítica literária, estão sendo ensinadas para o aluno
60
, confirmando assim a
imposição de um modelo (autônomo) de letramento literário. E ainda, se o ensino da literatura
no ambiente escolar admite (ou ao menos reconhece) outras formas de letramento (o que
corresponderia ao modelo ideológico de letramento literário) em contraposição ou associação
àquele formulado pela crítica literária.
A admissão do modelo ideológico proporcionaria ao aluno-leitor diferentes domínios
das convenções implicadas ao texto literário, uma vez que considera os espaços e relações
sociais como práticas no plural. A característica da pluralidade social abarca diferentes
contextos de apropriação dos textos literários como: adaptações do teatro, novela, televisão,
rádio, cinema etc., as manifestações artísticas reveladas na oralidade, nas comunidades
minoritárias, culturais, populares, excluídas, de diferentes formações ideológicas e religiosas,
enfim, inúmeras formas não presas à forma escrita, enformada e padronizada apenas pelas
instituições de maior influência (no momento, a crítica literária).
60
No caso afirmativo, poderia se pensar se os alunos conseguem refazer os procedimentos de construção do
texto a partir da compreensão e apreensão dessas técnicas de leitura literária o que resultaria em outro estudo
dissertativo.
141
Mesmo que o letramento literário seja, ainda, um campo de estudo a ser investigado e
explorado, pode-se apontar suas perspectivas teóricas à análise exemplificativa proposta a
seguir. Tem-se, porém, como intuito principal instigar o interesse de professores e
pesquisadores da área
61
para o modo como se realiza a leitura do texto literário e, também,
confirmar a relevância de uma análise a partir da visão sociológica sobre o fato literário, já
que essa apresenta elementos (internos e externos ao texto) que influenciam tanto a
compreensão como a apreensão do que se entende como literário.
61
Sobretudo os motivados pelo interesse na formação do leitor.
142
II PARTE
143
CAPÍTULO VI
6 - ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO
O sistema literário compreendido nesta dissertação oferece uma visão panorâmica da
literatura, observada como reflexo de um sistema complexo de relações entre instâncias
regulamentadoras e promotoras do próprio conceito de literatura. O objetivo da análise do
livro didático é, justamente, averiguar por meio de exemplos práticos e apontamentos críticos
a pertinência do referencial teórico da pesquisa no circuito de produção e circulação do
material didático.
Como o sistema literário é um sistema modular e inter-relacionado, a análise do livro
didático abordará as quatro primeiras instâncias citadas nesta primeira parte da dissertação,
porém, o na mesma seqüência ordenada, que no caso do livro didático, algumas
instâncias parecem exercer maior influência do que outras.
Para que a produção do livro didático doravante LD - encontre sentido e significado
social, ele deve, concomitantemente, circular no contexto escolar e corresponder às
necessidades educacionais atuais. Assim, a quinta instância intitulada O sistema educacional,
instância dentro da qual se insere o LD e que emoldura as condições de sua existência, tendo
já sido abordada no corpo da dissertação, será apenas pressuposta nesta análise.
O LD, em toda sua história, foi visto como veículo de todo saber legitimado pelas
entidades controladoras do conhecimento e de suas ideologias intrínsecas. Nesse sentido, a
produção material do LD, na sociedade burguesa e capitalista, sempre esteve e continua
condicionada a certas exigências políticas e ideológicas formuladas pelo Estado.
Assim, os circuitos de produção, distribuição e comercialização do LD, no Brasil,
dependem dos regulamentos e diretrizes estabelecidos pelo governo. São estes condicionantes
que ditam as regras de formulação dos compêndios, manuais, cartilhas pedagógicas e LDs.
Por essa razão, esta análise enfatiza, no primeiro tópico, a instância Os sistemas
legislativos, que trata, especificamente, da legislação educacional que norteia e sanciona as
diretrizes para o conteúdo dos LDs, assim como autoriza os modos de criação, produção e
circulação desses.
144
A partir da perspectiva do primeiro tópico, é possível discutir O circuito de produção
material dos textos, que este é determinado e condicionado pela legislação educacional. O
segundo tópico, então, procura relacionar as políticas editoriais, os programas governamentais
e as implicações desta produção material no ensino da literatura.
O terceiro tópico, por sua vez, discute O circuito de criação e recepção, verificando a
complexidade da relação da tríade autor-obra-público constituída no LD.
Na seqüência, o quarto, e último tópico evidencia As práticas discursivas e a atuação
das instituições, exemplificando, nas atividades de leitura e conteúdo do LD de literatura, as
modalidades de discurso canônico representadas pela crítica e pela historiografia literária.
Deste modo, a metodologia proposta acima concentra os dois primeiros tópicos como
sendo os princípios elementares e gerais para a produção material do LD, enquanto um
suporte que circulará nas escolas, e os dois últimos tópicos relacionam-se, mais
especificamente, com a fatura do LD, ou seja, com o modo de apresentação e seleção dos
textos, com os exercícios pedagógicos, enfim, com a organização textual e visual do LD.
O corpus analisado compreende os estudos literários da coleção Português:
Linguagens (2003), de William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães
62
, própria para o
Ensino Médio.
Considera-se, nesse estudo, a organização e a seleção de textos proposta pelos autores
como reflexo do discurso acadêmico e da própria crítica literária e, portanto, pertencentes à
classe dominante.
O que se espera é compreender o LD de ensino da literatura sob a perspectiva do
sistema literário, investigando como este sistema se relaciona com a fatura do LD.
6.1 Os Sistemas Legislativos e Econômicos
O LD, como hoje é conhecido, é um produto cultural e manufaturado construído
dentro do e para o sistema capitalista. A partir do estabelecimento do sistema educacional aos
62
William Roberto Cereja é professor graduado em Português e Lingüística, licenciado em Português pela
Universidade de o Paulo. Cereja é mestre em Teoria Literária também pela Universidade de o Paulo e
doutorando em Lingüística Aplicada e Análise do Discurso na PUC-SP. Atualmente, é professor da rede
particular de ensino em São Paulo, capital. Thereza Cochar Magalhães é professora graduada em Português e
Francês, licenciada pela FFCL de Araraquara, o Paulo. É mestre em Estudos Literários pela Unesp e atua
como professora da rede pública de ensino em Araraquara (SP).
145
moldes burgueses, o LD deixou de ser um objeto de apoio de uso exclusivo do professor,
passando a constituir o universo de cada aluno
63
.
A fim de atender um contingente maior de consumidores, a indústria livreira
incrementou as técnicas de produção de livros didáticos e pedagógicos e as equipes
especializadas de intelectuais, educadores e profissionais para auxiliar na elaboração do
conteúdo dos compêndios escolares. Para ajustar as editoras às particularidades e
necessidades dos livros escolares no sistema educacional, em relação ao conteúdo e enquanto
suporte material de acesso a todos, foi preciso que o governo efetivasse determinadas leis.
Segundo a Lei 9.610 de 1998, citada no corpo investigativo da dissertação, o LD
pode ser definido como: uma coletânea ou compilação, pois reúne dados de outras obras,
sendo que a disposição, organização e seleção desses dados lhe garantem o atributo de criação
intelectual. O LD também pode ser entendido como uma obra coletiva, pois, em sua maioria,
é organizado por iniciativa de uma pessoa física ou jurídica que recebe o nome de autor, mas
conta com a participação de diferentes autores colaboradores.
Para a Lei 10.753 de 2003, autor é a pessoa física criadora de livros. O LD, nessa
mesma lei, encaixa-se na definição de livro, pois é uma publicação de textos escritos,
impressos e encadernado. O LD analisado está corretamente regulamentado segundo a
validade dessa lei, observada por meio da presença do número internacional padronizado
(ISBN) e exigido para a ficha de catalogação e publicação.
A questão da autoria no LD de literatura, entretanto, é muito mais delicada. O livro
analisado, Português:Linguagens (2003), por exemplo, possui dois autores, William Cereja e
Thereza Magalhães. Na ficha técnica, tem-se, também, uma lista de colaboradores e de uma
equipe editorial, como o ilustrador, projetista, copidesque, revisor de texto, pesquisador
iconográfico e outros. Conforme a Lei 9.610 de 1998, a equipe que auxilia o autor em
tarefas como revisão, atualização, fiscalização ou correção o é considerada co-autora do
livro publicado. Entretanto, cabe ao autor especificar, no contrato de edição, a remuneração de
cada um dos envolvidos na formulação do livro. Ou seja, parte da remuneração do autor, em
acordo com a editora, é reservada aos seus colaboradores.
Por outro lado, o LD de literatura é uma seleção de vários outros textos literários de
diferentes autores. Entre esses textos literários, estão aqueles que já caíram em domínio
63
Segundo Bittencourt (2004), o livro didático era produzido, primeiramente, para o uso do professor, que ditava
ou transcrevia partes do livro para o aluno. Somente a partir do século XIX, que o livro didático passou a ser
elaborado também para o uso do aluno em sala de aula. Assim, os autores e editores do livro didático foram
obrigados a adaptar a linguagem utilizada nos compêndios e acrescentar estratégias de ensino-aprendizagem,
como ilustrações dos conteúdos estudados, para atender o novo público e consumidor do livro didático nas
escolas.
146
público e podem ser reproduzidos sem implicar em problemas autorais, e outros que
necessitam da permissão do autor para reprodução e possíveis acertos financeiros garantidos
pelos direitos autorais. Como se pôde observar no referencial teórico desta dissertação, as
obras literárias possuem uma legislação nacional que garante os direitos autorais e protege a
reprodução das obras por outros meios de comunicação que visem ao lucro. Porém, como o
LD tem função pedagógica e de ensino-aprendizagem, a reprodução de fragmentos, citações
ou passagens de qualquer obra, não constitui ofensa aos direitos autorais, segundo a Lei
9.610 de 1998.
Nesse caso, a vantagem para o autor do texto literário citado no compêndio o é
financeiramente significativa. Não obstante, o LD confirma a consagração da obra pela crítica
literária, atribuindo-lhe um valor estético diante da tradição artística brasileira e da sociedade.
Assim, o LD se torna uma espécie de “propaganda” das obras literárias, propiciando um
possível comércio dos textos nele apresentados.
Os projetos internacionais atuais propõem a uniformização do LD, a supressão da
figura de seu autor, substituindo-o por uma equipe de especialistas que reformularão diversos
textos comprados por inúmeros autores. As medidas têm como objetivo sanar a problemática
relacionada às questões de propriedade do LD e dos direitos autorais (BITTENCOURT,
2004).
Para controlar e supervisionar as relações entre a demanda e a oferta do LD, desde a
sua confecção até o seu conteúdo básico programático e metodológico, o governo brasileiro
instituiu uma legislação educacional específica. Tanto os organizadores do LD como as
editoras e distribuidores devem, então, atentar-se para o cumprimento das normas segundo os
programas oficiais da política educacional e de sua legislação vigente.
As principais leis funcionais da educação, atualmente, são: a Lei de Diretrizes e Bases
(LDB) que controla o conteúdo e as formas metodológicas dos livros através da delegação de
funções a outras entidades responsáveis como o Plano Nacional de Educação (PNE) e os
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs); e o Programa Nacional do Livro Didático
(PNLD)
64
, que seleciona, indica e intervém nos contratos editoriais feitos pelo Estado.
64
Entende-se que o PNLD funciona como um órgão governamental sancionador e está presente no interior da
política educacional como apoio à legislação implementada pelo Estado brasileiro e, mais especificamente, às
determinações da Constituição de 1988, onde cabe ao Estado garantir o material didático-escolar, transporte,
alimentação e assistência à saúde dos alunos do ensino fundamental, através de programas suplementares (Cf.
HÖFLING, 2000).
147
LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO NACIONAL (LDB)
A Lei nº. 9.394 de 20 de dezembro de 1996, firmada no governo de Fernando
Henrique Cardoso, trata das diretrizes e bases da educação nacional. Segundo essa lei, a
educação escolar brasileira deverá vincular-se ao mundo de trabalho e à prática social. A lei
garante o ensino público e gratuito das séries fundamentais e do ensino médio, sendo os pais
os responsáveis em matricular a criança a partir dos sete anos de idade
65
.
A lei institui à União, formada pelos Estados, Distrito Federal e os Municípios, a
responsabilidade de organizar alguns sistemas de ação para o ensino, como o Plano Nacional
de Educação (PNE), elaborar as competências e diretrizes para a educação infantil,
fundamental e média, nortear os currículos e os conteúdos mínimos, e disponibilizar os meios
para reconhecer, credenciar, avaliar e supervisionar as instituições de ensino.
Segundo a LDB, o Ensino dio tem como finalidade consolidar e aprofundar os
conhecimentos adquiridos no Ensino Fundamental, preparar o aluno para o trabalho e para o
exercício da cidadania, incluindo a formação ética, intelectual e crítica. O currículo desta fase
de escolarização deverá destacar a educação tecnológica básica (ciências, letras e artes), tendo
a língua portuguesa como instrumento de comunicação, acesso ao conhecimento e cidadania.
Como respaldo legal, o governo determina o decreto nº. 2.208, de 17 de abril de 1997 que
reforça a idéia de integrar o jovem ao mercado de trabalho promovendo o ensino de
habilidades gerais e específicas para o exercício de atividades produtivas.
Em relação à legislação educacional que atinge o Ensino Médio, tem-se a Lei
nº.10.639, que trata do Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão colegiado integrante da
estrutura de administração direta do MEC, cuja função é supervisionar, aprimorar e consolidar
a educação nacional buscando alternativas e mecanismos institucionais. É esse órgão o
responsável pela formulação e avaliação da Política Nacional da Educação. Sua ação zela pelo
cumprimento da legislação educacional baseada na LDB.
Outra lei, de igual importância para a legislação educacional, é a 10.639, de 9 de
janeiro de 2003, pois altera a Lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e inclui nas diretrizes
e bases da educação nacional o currículo oficial da Rede de Ensino que acrescenta a temática
“História e Cultura Afro-Brasileira”. Assim, o Ensino dio deve arrolar em seu currículo
mínimo escolar, em especial, nas áreas de Educação Artística, Literatura e História
65
A lei 11.274 de 2006, revoga a idade de sete anos e institui a idade de seis, para o ingresso ao ensino
fundamental.
148
Brasileiras, os conteúdos referentes à cultura afro-brasileira. Tal inclusão nos currículos
brasileiros da educação aponta, cada vez mais, para as metodologias e teorias dos Estudos
Culturais. Esse discurso propõe a inserção de outras culturas e literaturas marginalizadas pelas
“clássicas e predominantes” ideologias, sem, entretanto, sobrepor ou substituir umas pelas
outras.
Em 1996, a Lei nº. 9.394 estabeleceu as Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
determinando nos artigos 9º e 87º, a responsabilidade da União em elaborar um novo Plano
66
.
Em 10 de fevereiro de 1998, o Deputado Ivan Valente apresentou no Plenário da Câmara dos
Deputados, o projeto de lei nº. 4.155 de 1998 que aprovava o (PNE) Plano Nacional de
Educação, com validade de dez anos.
O PNE tem como objetivos elevar o vel de escolaridade da população, melhorar a
qualidade do ensino, reduzir as desigualdades sociais e regionais e democratizar a gestão do
ensino público. Diante do processo de modernização do país, o PNE prioriza a formação de
cidadãos qualificados profissionalmente.
Os dados relacionados no PNE, de 1997, mostram que a freqüência e o número de
matrículas de alunos eram baixos em relação ao ideal populacional no Brasil. A contagem da
população, na época, correspondia a 16.580.383 habitantes na faixa etária de 15 a 19 anos,
sendo que os alunos matriculados no Ensino Médio somavam apenas 5.933.401 estudantes.
Mais preocupantes, ainda, eram os índices de reprovação e evasão dos alunos do ensino
fundamental, o que resultava no ingresso tardio de alunos, alterando, assim, a faixa etária
ideal para o Ensino Médio.
Hoje, a situação é semelhante. Segundo o INEP
67
, o número de matriculados, em
2005, no Ensino Fundamental foi de 33.534.561 alunos, enquanto que no Ensino Médio foi de
9.031.302 estudantes. Isso significa que dentre dez alunos que concluem o Ensino
Fundamental, apenas três continuam os estudos, ingressando no Ensino Médio. Para agravar a
situação, o maior percentual de abandono da escola é no Ensino Médio, onde 15,3% dos
alunos sequer concluem o ano letivo
68
.
O PNE é responsável, também, pelo controle e supervisão do Sistema Nacional de
Avaliação da Educação sica (SAEB), que aplica as provas do Exame Nacional do Ensino
Médio (ENEM). Em geral, o PNE exerce suas atividades em parceria com o Poder
66
O primeiro Plano Nacional de Educação surgiu em 1962, elaborado na vigência da primeira Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (Lei 4.024, de 1961). Esse sofreu revisões em 1965 e em 1966, onde passou a
chamar Plano Complementar de Educação.
67
Informações disponíveis em: <http://www.inep.gov.br/basica/censo/dados.asp>. Acesso em: 8 jun. 2006.
68
Fonte: INEP/MEC–Censo Escolar 2005, disponível em: <http://inep.gov.br/informativo/informativo131.htm>.
Acesso em: 8 jun. 2006.
149
Legislativo, por intermédio das comissões de Educação, Cultura e Desporto da Câmara dos
Deputados e da Comissão de Educação do Senado Federal
69
.
Ao seu lado, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) tem a finalidade de
delimitar, de forma interativa, as áreas de conhecimento conforme as propostas do Ensino
Médio presentes nas diretrizes registradas na Lei nº. 9.394/96 e no Parecer do Conselho
Regional da Educação/Câmara de Educação Básica 15/98. Tais propostas visam à
formação escolar do aluno para o contexto do mundo contemporâneo e a criação de uma
identidade para a escola média brasileira.
Nas descrições dos PCNs (1999), o ensino de literatura integra-se ao capítulo:
Linguagens, Códigos e suas tecnologias, no qual se encontram descritas as competências e
habilidades de Língua Portuguesa, Língua Estrangeira moderna, Educação Física, Arte e
Informática.
Segundo os PCNs, a linguagem é uma competência fundamental para a compreensão
de toda ciência, técnicas e conhecimentos veiculados pela escola. Seu estudo deve destacar a
natureza social e interativa da linguagem, incentivando a verbalização da linguagem
interiorizada do aluno e de outras práticas sociais. A literatura, nesse contexto, equipara-se a
outras formas de expressão lingüística:
Os conteúdos tradicionais de ensino de língua, ou seja, nomenclatura
gramatical e história da literatura, são deslocados para um segundo plano. O
estudo da gramática passa a ser uma estratégia para
compreensão/interpretação/produção de textos e a literatura integra-se à área
de leitura (PCNs, 1999, p. 139).
Os PCNs defendem a idéia de distinguir os recursos expressivos, gêneros discursivos e
outros, a fim de incentivar o aluno a inter-relacionar e a diferenciar os movimentos artísticos,
sem perder a visão do todo. O gosto literário individual é, de certa forma, submetido a um
“preparo para aprender a gostar”, pois é preciso, primeiramente, “conhecer e analisar as
perspectivas autorizadas” (PCNs, 1999, p. 129) para então construir as escolhas individuais.
Deste modo, os parâmetros justificam a atuação da crítica literária, pois ela é o canal
competente para dizer as “formas autorizadas” daquilo que é ou não literatura.
Desse modo, os PCNs têm se revelado como uma tendência dominante no ambiente
escolar, repercutindo no processo de difusão e apropriação do fato literário.
69
Informações disponíveis em: <http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/pne.pdf>. Acesso em: 19 abr. 2006.
150
PROGRAMA NACIONAL DO LIVRO DIDÁTICO (PNLD)
O Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) foi criado, em 1985, com a
finalidade de promover uma educação de qualidade e igualitária. Sua ação atinge diretamente
os sistemas de produção, distribuição e circulação do LD.
O PNLD é responsável pela distribuição dos livros, legado que, até 2003, limitava-se a
atender apenas os alunos do Ensino Fundamental. O PNLD conta com a parceria do Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), responsável pela administração do
projeto.
Segundo dados do Ministério da Educação
70
, entre os anos de 1994 e 2003, o
Programa Nacional do Livro Didático distribuiu um total de 915,2 milhões de unidades de
livros para uma média anual de 30,8 milhões de alunos matriculados em 172,8 mil escolas de
rede pública do Ensino Fundamental. O investimento do PNLD girou em torno de 3,2 bilhões
de reais. Até o momento atual, o Programa sofreu diversas modificações a fim de melhorar
seu sistema de distribuição e atendimento às escolas brasileiras. Hoje, por exemplo, o PNLD
investiu na distribuição de LDs também para o Ensino Médio, por meio do Programa
Nacional do Livro do Ensino Médio (PNLEM)
71
.
O Programa admite duas formas de execução: a centralizada, quando as ações estão a
cargo do FNDE, e a descentralizada
72
, quando as ações são realizadas pelas Unidades da
Federação, mediante repasses de recursos do Governo Federal por meio de convênios com o
FNDE.
Para as editoras participarem do Programa de seleção e indicação de obras didáticas
para compor o catálogo do PNLD distribuído às escolas (cadastradas no Censo Escolar), o
PNLD lança o edital, publicado no Diário oficial da União e na Internet, determinando os
prazos de inscrição e entrega dos projetos para avaliação.
Para análise dos LDs inscritos, o PNLD conta com a parceria do Instituto de Pesquisas
tecnológicas (IPT) e da Secretaria de Educação Infantil e Fundamental (SEIF), responsáveis
pela avaliação das obras previamente selecionadas, a fim de certificar a competência
pedagógica aplicada no LD. Após a aprovação dos LDs, esses aparecem no Guia de Livros
70
Disponível em: < http://www.fnde.gov.br/programas/pnld/index.html >. Acesso em: 19 abr. 2006.
71
Cf. Anexo L, a tabela demonstrativa dos resultados das negociações do PNLD referentes aos livros
distribuídos ao Ensino Fundamental em contraponto com os últimos investimentos do PNLEM.
72
Atualmente, o Paulo é o único estado que optou pela descentralização. Assim, o FNDE repassa os recursos
financeiros à Secretaria de Educação de São Paulo, que se responsabiliza pela execução do programa em toda
extensão de seu estado.
151
Didáticos, com indicação do nível de aprovação do livro pelo governo. As escolas, então, em
ação conjunta aos professores, devem escolher os LDs que serão utilizados nos próximos três
anos da disciplina específica. Os pedidos podem ser feitos via Internet ou pelos correios.
No caso dos LDs do Ensino Médio, escolas e professores contam com o Catálogo do
Programa Nacional do Livro do Ensino Médio. Entretanto, as políticas de indicação, seguidas
da distribuição dos livros escolhidos pelas escolas, tal como funcionam no ensino
fundamental, estão em processo de implantação.
O Catálogo do Programa Nacional do Livro do Ensino Médio PNLEM/ 2005, de
Língua Portuguesa, é assinado pelo presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio
Lula da Silva; pelo Ministro de Estado da Educação, Tarso Genro e o Secretário-Executivo,
Fernando Haddad. O projeto conta com o apoio de diversas equipes administrativas,
coordenadores e responsáveis pela produção e distribuição do livro, todos integrantes do
FNDE.
O catálogo do PNDL apresenta uma carta ao professor, os critérios e orientações para
a escolha do material didático e resenhas dos livros de língua portuguesa. O livro escolhido
pelo professor ou instituição escolar deverá ser utilizado durante os anos de 2005, 2006 e
2007.
Segundo as instruções do PNLD, a formação dos alunos no Ensino Médio deve
priorizar fatores como o respeito ao contexto social, à diversidade e à pluralidade. As
atividades propostas devem promover o desenvolvimento das capacidades de inferir,
pesquisar, produzir e argumentar. Toda prática escolar deverá ser norteada pela LDB (1999).
Compete, portanto, aos livros didáticos selecionados propiciar:
I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no
ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento dos estudos;
II - a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para
continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade
às novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;
III - o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a
formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do
pensamento crítico;
IV - a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos
produtivos, relacionando a teoria e a prática, no ensino de cada disciplina
(PNLD, 2005, p. 9).
Os critérios de avaliação consideram o cumprimento de três exigências principais: o
LD precisa corrigir as informações, conceitos e procedimentos que integram o componente
curricular; adequar sua proposta pedagógica à situação de ensino-aprendizagem e aos
152
objetivos visados; e estar devidamente em sintonia com a legislação e os demais instrumentos
oficiais de regulamentação e orientação da Educação Nacional.
O LD, então, não pode: privilegiar nenhum grupo, camada social ou região do país;
veicular preconceito de origem, cor, condição econômica, etnia, gênero, linguagem ou outro;
divulgar conceitos contrários da legislação da criança e do adolescente sobre fumo, bebidas
alcoólicas, drogas, armamento e outros; fazer publicidade de organizações comerciais, salvos
os discursos didático-pedagógicos; e fazer doutrinação religiosa.
Para que haja coerência interna, o LD deve explicitar as escolhas teórico-
metodológicas. Espera-se que essas contribuam para a construção de conhecimentos
relevantes e para o desenvolvimento de diferentes capacidades cognitivas, como:
memorização, compreensão, síntese, análise, formulação de hipóteses, e outras.
A fundamentação teórica deverá ser apresentada no livro (ou seção) dirigido ao
professor. A orientação ao professor precisa descrever a estrutura geral da obra, explicando os
objetivos e articulações entre cada unidade ou capítulo do LD; sugerir atividades
complementares, técnicas de aprendizagem, informar o professor a respeito de conhecimentos
atualizados ou especializados, e de inserção do aluno no mercado de trabalho.
As resenhas elaboradas pelo PNLD têm como finalidade mostrar aos professores ou
instituição de ensino (que realizarão a escolha do livro), os aspectos gerais da obra e auxiliar
na mediação em maior ou menor grau do professor em sala de aula, apontando as
necessidades de intervenção ou valorizando a adequação do conteúdo
73
. A escolha do livro
deverá levar em conta o contexto geográfico e sócio-econômico do aluno e da escola.
* * *
Como se observa, o LD, mesmo sendo um suporte muito específico e particular de
textos literários, não prescinde de uma legislação própria que regulamente seus conteúdos e
objetivos, bem como sua materialidade. Assim, como todos os outros textos literários e não-
literários, essujeito às leis relativas ao mundo editorial como também político, em virtude
de sua natureza didática.
O tópico seguinte discutirá como o circuito de produção de textos funciona no caso
dos LDs. Observa-se que é este Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) que coordena
73
Cf. Anexo M, a resenha do livro Português:Linguagens de Cereja e Magalhães e os formulários de avaliação
de literatura propostos pelo PNLD em 2005, e no Anexo N, o resumo deste livro para “propaganda” do governo
em 2006. Tais considerações poderão auxiliar na compreensão do LD específico em relação às determinações do
governo e às leis de diretrizes e bases para a educação brasileira no Ensino Médio.
153
todo o processo de produção e circulação dos LDs até as escolas públicas em todo território
nacional.
6.2 O Circuito de Produção Material dos Textos
Como o LD é um material de circulação escolar, seus modos de produção material e
de conteúdo estão diretamente relacionados à política governamental instituída pela legislação
educacional. O Estado exerce certo controle sobre o sistema educacional, pois, supostamente,
é de seu interesse garantir a formação de cidadãos, trabalhadores, leitores e indivíduos
segundo os padrões capitalistas e segundo a ordem social pré-estabelecida como ideal. Em
particular, o LD pode ser visto como um meio de exercício desse controle.
Para melhor compreensão do circuito de produção material, este tópico analítico
aponta dois aspectos distintos, porém, inter-relacionados: o primeiro diz respeito à produção
material do LD, enquanto produto manufaturado e suporte dos textos literários; o segundo,
refere-se à influência deste suporte o LD que porta textos literários, sobre o ensino de
literatura.
Quanto ao primeiro aspecto, o modo de elaboração do LD diferencia-se dos modos de
produção do livro literário. Embora contenha textos literários, o LD não se posiciona no
universo literário, pois sua essência não é literária, mas didática, portanto, constitui-se em um
compêndio de vários textos literários.
O LD possui um custo de produção extremamente elevado em relação a um livro
literário de circulação comum. Para o comércio livreiro, a produção editorial é a principal
responsável pelo encarecimento do material didático no Brasil. O fato não é de se estranhar, já
que as indústrias brasileiras fabricam LDs de boa qualidade material, ou seja, coloridos,
com diferentes diagramações, capas bem ilustradas, papel branco de qualidade e perfeito
acabamento.
Apesar de ser um mercado promissor, devido a um público vasto e garantido, a
indústria livreira de didáticos no Brasil é restrita, pois a função exige um investimento inicial
significativamente alto. O número de tiragens do LD precisa suprir uma grande quantidade de
alunos em território nacional. Além do mais, o retorno financeiro pode tardar devido às
políticas de aprovação e reprovação do material didático feito pelo Estado, principal
154
consumidor de LDs
74
. Isso faz com que as empresas editoriais que se propõem a produzir o
LD necessitem de capital de giro suficiente e suporte tecnológico adequado para investir na
produção de LDs (BRAGANÇA, 2001).
O faturamento da produção do LD, em geral, é dividido de forma semelhante ao livro
comum, no qual a maior parcela dos lucros fica retida nas mãos dos livreiros e dos
distribuidores, ou seja, em torno de 80% do preço unitário. Os direitos autorais e editoriais
giram em torno de 20% sobre o valor de venda. Se o LD for encomendado pelo governo, o
seu preço de mercado diminui
75
, o que significa que a margem de lucro reservada aos direitos
autorais cai consideravelmente, podendo chegar a 4% do valor unitário. Nesses casos, os
livreiros também são prejudicados, pois é o próprio governo quem agiliza as formas de
distribuição direta do LD até o público consumidor. Quanto aos distribuidores, o governo abre
um edital e analisa as propostas de empresas especializadas e as contrata. Observa-se no
Anexo O, que as exigências para as contratações pelo PNDL, como os modos de embalagem,
de paletização, de entrega e postagem dos materiais didáticos produzidos, são,
detalhadamente, descritas nos editais.
O processo de produção do LD até sua distribuição nas escolas, no caso das
encomendas realizadas pelo governo, passa por cinco etapas fundamentais controladas pela
legislação educacional por meio do PNDL
76
. Na primeira etapa, o FNDE recebe os pedidos
feitos em formulários pelas escolas e inicia o processo de negociação com as editoras, com
licitações previstas na Lei nº. 8.666/93. Na segunda etapa, o FNDE firma o contrato com as
editoras, informando a quantidade de exemplares e a localidade para as entregas. Na terceira
etapa, o FNDE contrata o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para realizar a
fiscalização das características físicas dos livros, como a adequação das cnicas da
Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e das normas ISO. A próxima etapa diz
respeito à distribuição dos LDs feita diretamente pelas editoras por meio de contratos entre a
FNDE e a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Todo o processo de produção e
distribuição é supervisionado por técnicos do FNDE e por agentes das Secretarias Estaduais
de Educação. Na quinta e última etapa, os livros devem chegar às escolas entre os meses de
outubro e dezembro, para que os alunos iniciem o próximo ano letivo supridos do material
74
Estima-se que a redação primeira dos livros didáticos até sua edição, impressão e distribuição pode demorar no
mínimo seis anos, sendo que o mais aceitável é prever o período de dez anos se considerar os preliminares como
o recrutamento do pessoal e equipe, a planificação de tarefas e outros (GÉRARD; ROEGIERS, 1998).
75
Segundo Gérard e Roegiers (1998, p. 27), “o preço aparente da revenda do livro é reduzido, mas a diferença de
custo é suportada pelo Estado, que subsidia o papel e, logo, por todos os contribuintes através do mecanismo de
impostos”.
76
Disponível em:< http://www.fnde.gov.br/programas/pnld/index.html >. Acesso em: 19 abr. 2006.
155
didático. As prefeituras ou secretarias municipais da educação ainda recebem os livros
reservados às escolas rurais, responsabilizando-se pela entrega conforme o período
estabelecido.
O sucesso do PNLD na produção e distribuição de LDs em todo País estendeu-se para
a distribuição de dicionários de Língua Portuguesa e livros em Braile para os alunos com
deficiências visuais. Desde 2003, o Ministério da Educação instituiu, pela Resolução
CD/FNDE nº.38, a distribuição gratuita de LDs também para as escolas públicas de Ensino
Médio, pelo PNLD. O projeto piloto, coordenado pelo FNDE, pela Secretaria de Educação
Média e Tecnológica (SEMTEC) e Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, foi
realizado, no ano de 2005, contando com a distribuição de livros de Português e Matemática
para o primeiro ano do Ensino Médio nas escolas do norte e nordeste.
O governo federal distribuiu, no ano de 2005, 12.581.620 livros didáticos de português
e matemática para os alunos do Ensino Médio utilizarem no ano letivo de 2006, como
anunciado nas campanhas publicitárias televisivas
77
.
Contudo, deve-se considerar que dentre os livros destinados às escolas públicas, parte
se perde por má conservação, extravio durante o processo de distribuição, ou ainda, no caso
dos livros reaproveitáveis
78
, quando não são devolvidos pelos alunos. O mercado do LD é
garantido por essas perdas, somadas ao seu caráter “descartável”, acentuado, principalmente,
pela necessidade constante de revisão conceitual e atualização das informações, conforme
exige a legislação educacional.
O constante processo de avaliação e indicação de LDs pelo governo leva os editores
do LD a um papel diferenciado do trabalho editorial convencional. O editor do livro literário,
por exemplo, tem a função de selecionar e coordenar as seções que antecedem a publicação
do livro, escolhendo a qualidade do papel, o tipo de encadernação, o preço de venda e outros.
Ao contrário, o editor do LD observa unicamente as regras de formatação estipuladas pelas
leis e políticas de estado.
Quanto aos meios de troca mercadológica, o editor do livro literário preocupa-se,
especialmente, com as vendas de seu produto, investindo, assim, em técnicas comerciais e na
adequação do objeto literário ao público que pretende atingir. Diferentemente, a produção
77
A aquisição para PNLEM/2007 ocorrerá no semestre deste ano de 2006 (MARUNO. Publicação eletrônica
[mensagem pessoal]. Mensagem recebida por <COPED@fnde.gov.br>. Acesso em: 29 jun. 2006.
78
Determinados livros didáticos, distribuídos pelo governo, devem ser utilizados por um aluno e no final do ano
letivo, esse aluno devedevolvê-los à escola, para que outro aluno possa reutilizá-los. Normalmente, espera-se
que o círculo de reaproveitamento do LD dure três anos consecutivos. Algumas editoras têm renovado essa
concepção, publicando em volume único as três séries do Ensino Médio, para que o mesmo aluno possa
conservar e utilizar o mesmo livro.
156
didática tem destino e público certo: as escolas e estudantes de todo país. Desse modo, os
investimentos das editoras do LD em propagandas são voltados, exclusivamente, ao governo e
aos professores, responsáveis pela seleção e pedidos dos livros pedagógicos. O segredo de
venda é conquistar a aprovação governamental e o público docente para que este adote o livro
para o uso escolar.
Nesse sentido, o editor não pode abdicar do uso de recurso tecnológicos da indústria
livreira para aumentar a quantidade e a qualidade dos LDs. Tais recursos propiciam maior
interação entre o aluno e o próprio livro em sala de aula.
A modernidade e a inovação nos aspectos gráficos e na editoração são facilmente
percebidas no LD analisado. A presença de quadros com explicações complementares ao
conteúdo estudado, por exemplo, remetem à estrutura e às relações possíveis na tela do
computador e na Internet. Em termos técnicos, a diagramação e a inserção de imagens
coloridas, como a reprodução de quadros, fotos e outros, ampliam o universo comunicativo do
LD.
Outra maneira de as editoras constituírem o universo escolar é justamente publicar os
clássicos e as obras canonizadas indicadas pelo LD. Atualmente, os livros pedidos como
leitura obrigatória para os exames de seleção para as universidades também têm mobilizado
grande parte do mercado livreiro. Nesse sentido, pode-se observar, no LD analisado, a
inserção - quase que publicitária - de “produtos”, no caso, livros, para mobilizar o comércio e
divulgar as empresas editoriais brasileiras. Isso é feito por meio das sugestões de leitura extra-
classe, das imagens de livros e outros.
EXEMPLO 1
157
Figura 1 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), de Cereja e Magalhães, página 216.
EXEMPLO 2
Figura 2 Fragmento extraído do livro Português:Linguagens (2003), página 279.
Um dos aspectos mais importantes e característicos da materialidade do LD de
literatura é a fragmentação dos textos literários. Ela é necessária porque o LD não possui uma
estrutura física para comportar os textos literários de forma integral. É, justamente, a
fragmentação dos textos literários no suporte didático e sua função pedagógica que apontam
para o segundo aspecto deste tópico analítico, problematizando o ensino da literatura
vinculado ao LD.
158
Deve-se lembrar que “a obra não é jamais a mesma quando inscrita em formas
distintas, ela carrega, a cada vez, um outro significado” (CHARTIER, 1999, p. 71). Assim, o
LD e suas particularidades materiais, em especial sua forma fragmentária de apresentação de
textos, condicionam ou atribuem ao texto literário novos significados e novos modos de
receptividade.
A fragmentação do texto literário no LD torna-se uma problemática para o ensino da
literatura, principalmente porque se tem a liberdade ou mobilidade para incitar e modelar as
expectativas de seu leitor. Nesse sentido, Chartier (1994) explica que a leitura fragmentada de
textos em unidades separadas reencontra, por meio de uma articulação visual da página,
outras conexões intelectuais e discursivas possíveis ao raciocínio.
Desse modo, é mais fácil “controlar” ou sugerir linhas de raciocínio e interpretação ao
leitor, por meio da manipulação dos limites da informação dada.
Entretanto, a fragmentação dos textos literários não acontece apenas por uma questão
de ordem material, mas também, porque a legislação educacional, através das LDB e dos
PCNs, exige que se ensine a tradição literária brasileira. Isso significa que o número de obras
literárias é excessivo, pois consta de uma lista historiográfica legitimada pela crítica literária.
A jornada dos estudantes em sala de aula o suportaria, em termos de temporalidade, a
leitura de todos os textos literários propostos no ensino da literatura.
Para uma democratização da leitura literária, situação ideal, as bibliotecas escolares
deveriam disponibilizar os títulos sugeridos para leitura literária e em quantidade suficiente
para atender o contingente de estudantes. Infelizmente, o é o que acontece na maioria das
escolas públicas e/ou particulares brasileiras. uma grande defasagem quanto ao acervo
literário disponível nas escolas e no município, dificultando o acesso ao livro literário,
restando apenas a alternativa da compra desse, solução nem sempre possível à maioria dos
estudantes brasileiros.
Por outro lado, especialmente para o grupo de leitores de renda baixa, o que não exclui
outros segmentos sociais, a disponibilidade de textos literários no LD, mesmo que
fragmentados, diminui a necessidade de compra do livro literário propriamente dito. Nota-se,
portanto, a substituição do livro literário pelo LD. Segundo os apontamentos de Zilberman
(2003, p. 258), “o conceito de literatura proposto isola uma parte o texto do todo, o
livro, produto material que congrega autor e obra, sociedade e mundo representado, cultura e
economia”.
A discussão em torno do circuito de produção material do LD de literatura torna-se
relevante ao se considerarem as condições de acessibilidade do leitor ao livro literário. Como
159
observado no referencial teórico, a grande extensão geográfica do território brasileiro e o
difícil acesso a certas regiões impedem que o livro chegue a toda população.
diversos outros fatores de ordem econômica que agravam a situação e impedem o
acesso ao impresso, como por exemplo, a falta de recursos financeiros dos leitores para
comprar um livro; a falta de independência econômica e tecnológica das empresas gráficas;
falta de suporte cultural público (bibliotecas, feiras de livros). Somados a esses, as
intolerâncias ideológicas, religiosas, políticas e culturais; e a supremacia de uma cultura oral
(e analfabeta) no Brasil.
A padronização do LD, ainda, reforça a inacessibilidade deste, pois não leva em
consideração as diferenças regionais, culturais e lingüísticas do Brasil. A maioria das
produções didáticas brasileiras adota o sistema cultural, político e ideológico dos grandes
centros como São Paulo, provocando, assim, uma homogeneização no conteúdo, nas formas
de abordagem e modos de leitura.
Nesse contexto, o LD é um material privilegiado por circular nas escolas e por ser
barateado pelo governo, que se esforça em distribuir o material para todas as escolas do País.
Sendo assim, o LD é peça fundamental para o acesso à leitura no contexto brasileiro, acesso
este extremamente deficitário e restrito. Em muitos casos, o LD chega a ser o único contato
do aluno com o texto literário e, por isso, mesmo que de forma fragmentada e, ainda, mediada
por vozes que se interpõem à relação leitor-autor
79
, o LD contribui para a formação do leitor
escolar no Brasil
80
.
Para concluir, cabe ressaltar que os textos não existem por si só, mas dependem de um
suporte materializado. Além disso, cada forma material, suas propriedades físicas, técnicas, de
composição, disposição, entre outros, provocam efeitos na receptividade do leitor. Chartier
(1994, p. 8) complementa a idéia afirmando que: “[...] os livros são objetos cujas formas
comandam, se não a imposição de um sentido ao texto que carregam, ao menos os usos de que
podem ser investidos e as apropriações às quais são suscetíveis”.
Desse modo, a análise sociológica não dispensa o devido cuidado e atenção às
características físicas, visuais e técnicas, no caso do livro didático, pois são essas
materialidades que organizam um certo modo de leitura, o qual atinge o seu leitor.
79
Como se observará no tópico seguinte.
80
Em especial, os alunos que têm o livro didático como único veículo de leitura disponível.
160
6.3 O Circuito de Criação e Recepção
O LD estabelece uma relação diferenciada e única entre a tradicional tríade autor-
obra-público. Tal relação pode ser entendida a partir de três aspectos essenciais e
característicos do LD: sua composição autoral; a fragmentação do texto literário; e o perfil
definido do público leitor.
Num sentido geral, o LD possui um autor, uma vez que compreende um texto
estruturado e organizado por um indivíduo de forma pessoal e autônoma quanto às suas
escolhas e propostas. No entanto, conforme a idéia de autor trabalhada nesta pesquisa,
considera-se como autor o sujeito que, por inspiração, arte ou profissionalismo, realiza uma
obra de importância literária e artística, reconhecida por leitores e, portanto, veiculada por
alguma forma materializada, seja impressa ou publicada em outros meios de comunicação
acessíveis ao público.
Neste caso, distinguir-se-ão os escritores das obras literárias utilizadas no LD como
sendo autores, e os autores do LD como organizadores. No livro Português: Linguagens
(2003), Cereja e Magalhães revelam sua voz a partir de suas seleções de textos, das propostas
de atividades de leitura e da ênfase dada a determinados conteúdos e assuntos. Os
organizadores, então, não produzem textos literários, mas sim, traçam um roteiro de estudo
sobre a literatura. Por isso, serem compreendidos e nomeados como organizadores.
O LD é um objeto de leitura muito específico, pois a relação entre o leitor e o autor do
texto literário é mediada pelo(s) organizador(es) do próprio LD. Em outras palavras, uma
sobreposição de autores: o autor do LD (organizador) e o autor do texto literário.
Esta sobreposição de autores é inevitável, uma vez que o LD está inserido no contexto
escolar e sua utilização se de forma sistematizada, necessitando, assim, de uma
organização condizente com a produção, circulação e apropriação do conhecimento
legitimado pela escola.
Sendo assim, o organizador do LD é responsável por apresentar ao leitor o texto
literário, como objeto de análise do conhecimento específico. Essa mediação que o
organizador estabelece entre o leitor e o autor é reforçada pelo segundo aspecto do LD,
decorrente de sua materialidade: a fragmentação do texto literário.
A função do organizador do LD, então, é selecionar e disponibilizar certas partes do
texto literário que lhe convêm, justificando sua mediação como um dispositivo necessário
para compreensão do texto pelo leitor.
161
Cabe, todavia, ressaltar que a seleção dos fragmentos textuais não é aleatória ou
arbitrária. As escolhas devem, necessariamente, encontrar respaldo na legitimação da crítica e
da historiografia literária e, ainda, corresponder às propostas metodológicas e aos objetivos de
atividade pedagógica. Essas propostas, no entanto, têm reproduzido certas práticas de leitura,
interpretação e raciocínio, compreendidas como reflexo de convenções e concepções
81
intrínsecas à própria estrutura do sistema educacional burguês.
O ensino sistemático da literatura na escola tem início nas primeiras séries do Ensino
Médio, segundo as diretrizes estipuladas pelo governo brasileiro. O organizador do LD deve,
então, abordar adequadamente os conteúdos obrigatórios indicados pelo currículo escolar.
Como se pode observar na tabela abaixo, o LD analisado não aborda exclusivamente o
ensino da literatura, mas sim, divide espaço com os estudos da língua portuguesa e de
produção de texto.
EXEMPLO 1
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
1ª série 2ª série 3ª série
Língua: uso e
reflexão
Produção de texto
Literatura
Gráfico 1 Estatística da abordagem metodológica do livro didático Português: Linguagens (2003)
82
.
81
Concepções essas como um ensino estruturalista, de cunho mecanicista, de operações cartesianas, raciocínio
lógico matemático de operações e outros, advindo, principalmente dos primeiros estudos baseados nos ideais
iluministas. Essas concepções e métodos podem ser melhor visualizados, no caso das práticas de leitura,
sobretudo, a literária, se observados pela perspectiva teórica descrita por Kleiman (2004) do modelo autônomo
de letramento, citado no corpo da dissertação e retomado nesta análise do LD.
82
O livro didático analisado é um volume único, ou seja, contem todos os capítulos e unidades referentes aos três
anos do curso médio. O livro se divide em três unidades por série, totalizando, assim, nove unidades. Cada
unidade apresenta determinados capítulos dedicados a essas três modalidades: ensino de língua (seu uso e
reflexão), produção de texto e literatura.
162
O número de capítulos do LD dedicados à literatura corresponde a 50% do total, sendo
19% à abordagem da língua, seu uso e reflexão, e 31% para a produção de texto.
Entretanto, apesar de os estudos propriamente literários terem seu espaço (ou
capítulos) reservado para ensino-aprendizagem, Cereja e Magalhães ainda utilizam diversas
composições literárias para exemplificar casos do uso de ngua e estimular a produção de
textos. Nesses casos, em especial, os organizadores do LD sobrepõem-se sobre a autoria dos
textos literários, tornando a literatura utilitária, através das propostas e dos direcionamentos
dados à leitura que antecedem a própria leitura do texto literário. Observam-se os exemplos:
Atividades propostas nos capítulos intitulados Língua: uso e reflexão
nove capítulos distribuídos entre as nove unidades do livro Português: Linguagens
(2003) que tratam especificamente da ngua, seu uso e reflexão. O estudo da língua, em
muitos casos, procura auxiliar na compreensão da linguagem literária. Em geral, mesmo não
tendo relações diretas com a abordagem da literatura, os organizadores do LD inserem textos
literários nos exercícios de fixação da temática abordada, como se evidencia nos exemplos
abaixo:
EXEMPLO A
Figura 3 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 20.
163
Esse fragmento é um trecho do texto literário do escritor Olavo Bilac é utilizado num
exercício sobre semântica, a fim de exemplificar a variedade lingüística da época do poeta, e
estimular a produção de um novo texto feito pelo leitor. Observa-se os exercícios propostos
para compreensão do texto:
Figura 4 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 21.
Com base nas atividades propostas acima, os organizadores do LD pedem,
primeiramente, que o aluno caracterize a variedade lingüística do texto de Bilac, a fim de
constatar a formalidade empregada pelo autor do texto. Notadamente, essa atividade está
voltada ao ensino da semântica.
Na segunda questão (letra b), Cereja e Magalhães afirmam que o texto literário de
Olavo Bilac é um bom exemplo de como as declarações amorosas eram feitas na época
correspondente aos séculos XIX e XX. Para tal afirmação, os organizadores deveriam
encontrar respaldo em vestígios históricos da época, pois a literatura é uma interpretação da
realidade e, portanto, uma estrutura frágil em designar fatos concretos sobre a história e a vida
real.
Na segunda parte desse mesmo exercício, os organizadores propõem ao leitor que se
coloque no lugar do poeta, reescreva o texto, mantenha o conteúdo e empregue outra
variedade lingüística do tempo atual. Essa proposta subestima o poder de criação, de
interpretação e de interação do leitor com o texto literário, levando-o ao marasmo e à mera
repetição estrutura, de termos e palavras.
Observa-se o próximo exemplo sobre a intertextualidade:
EXEMPLO B
164
Figura 5 Fragmento extraído do livro Português:Linguagens (2003), página 111.
Os textos de Casimiro de Abreu e de Oswald de Andrade são colocados a fim de
exemplificar um caso de intertextualidade. Após a comparação dos textos, os organizadores
enunciam uma possível interpretação dos textos literários, resgatando a idéia da paródia.
Figura 6 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens( 2003), página 112.
Devido à instância legitimadora do LD como portador do conhecimento, os
comentários interpretativos dos organizadores do LD podem ser recebidos pelo leitor do LD
165
como uma única leitura correta do texto literário, uma vez que o texto e, sobretudo escrito, no
espaço escolar, possui um status de valorização extrema. A interpretação sugerida pelos
organizadores passa ao aluno a impressão de que a literatura possui um caráter de
objetividade, assim como uma verdade científica e, portanto, inquestionável, irrevogável,
absoluta e correta. Esse tipo de abordagem considera a autonomia do escrito como fonte
suficientemente capaz de produzir (em si mesmo) sentidos para o texto. Diferentemente, a
interação oral entre os indivíduos permite que os sentidos sejam construídos e negociados no
contexto dialógico, prática mais freqüente entre os alunos antes (ou fora) do ambiente
escolarizado (KLEIMAN, 2004).
Essa mediação dos organizadores desconsidera tudo o que a literatura significa e
envolve, incluindo as subjetividades de autor e leitor. Ler, sob esse prisma, significa a adoção
de uma perspectiva, a dos organizadores do LD, o que implica a redução do papel do leitor,
como afirma Comitti (2001, p. 152), “ao aceitar como verdade as proposições do texto, o
leitor abdica de si mesmo, em favor do outro”, no caso, em favor da opinião dos
organizadores do LD. Assim, observa-se, no livro didático de literatura uma ênfase ainda
maior do modelo autônomo de letramento, pois se a escrita comum é neste valorizada em sua
autonomia, no texto literário, esse aspecto da autonomia se torna ainda mais forte, e os
sentidos para ele propostos, mais fechados.
EXEMPLO C
166
Figura 7 Fragmento extraído do livro Português:Linguagens (2003), página 209.
Neste exemplo, o poema de Mario Quintana é usado apenas como um pretexto para a
identificação de elementos de ligação, predicativo do sujeito e complementos verbais, ou seja,
conteúdos estritamente voltados ao estudo da língua e seu funcionamento. Como se pode
notar na abordagem acima, não existe nenhuma referência quanto à importância literária do
poema o que, por sua vez, promove uma leitura de consumo e, não uma leitura que garante o
encontro entre o leitor e a literatura e os sentidos por ela sugeridos.
A utilização de textos literários no decorrer do LD, principalmente em momentos em
que os organizadores propõem o ensino da língua ou a produção de texto, enfraquece o caráter
estético do texto literário, pois sua presença não se justifica em análise literária ou uma leitura
crítica, muito embora a intenção dos organizadores possa ser a de proporcionar maior contato
do aluno com a literatura, como se a simples leitura do texto literário, ou seja, sua
decodificação proporcionasse, por si só, a produção dos sentidos velados ou subjacentes pela
estrutura das formas, gêneros e convenções literárias e lingüísticas. Deve-se lembrar que a
dimensão quantitativa (ler mais ou menos textos) não corresponde, necessariamente, a uma
dimensão qualitativa (boa ou leitura). É, portanto, mais aconselhável e eficiente trabalhar
com menos textos literários, porém considerando-os como tal, a utilizá-los como pretexto para
outras atividades pedagógicas.
Atividades propostas nos capítulos intitulados Produção de texto:
167
O LD analisado reserva à Produção de texto quinze capítulos. Cada capítulo estuda as
questões dos gêneros como: o poema, o relato, a crônica, a crítica, o conto e outros
83
. Segundo
Cereja e Magalhães, “a produção textual organiza-se pela perspectiva de um trabalho
sistematizado e em gradação espiral de gêneros textuais ou discursivos” (MANUAL DO
PROFESSOR, 2003, p. 16)
84
. Tal perspectiva parte dos pressupostos do teórico lingüista
Mikhail Bakhtin, autor adotado pelos organizadores do LD em questão e cuja leitura é
indicada pelos PCNs (1999).
O primeiro gênero textual trabalhado pelos organizadores é o poema.
EXEMPLO A
83
Coincidentemente, os gêneros trabalhados na Produção de texto são aqueles considerados gêneros menores
segundo as concepções da crítica literária.
84
Cf. Anexo P.
168
Figura 8 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 40.
Nesse fragmento, os organizadores do LD direcionam o modo de leitura para o leitor,
ou seja, ler em voz alta, focar a atenção para os sons e ritmos do poema e responder questões.
As duas primeiras questões propostas estão voltadas, exclusivamente, à identificação de
elementos estruturais e sonoros do verso. As demais questões são de interpretação, entretanto,
as respostas acabam sendo direcionadas pelo modo como são feitas as perguntas:
Figura 9 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 41.
A questão 5, por exemplo, possui até alternativas de resposta. As opções dadas pelo
organizador do LD limitam a leitura crítica e conclusiva do aluno. Assim, os organizadores
chamam a atenção do leitor apenas para os aspectos que julgam indispensáveis, imputando
uma única visão sobre o texto literário.
Observa-se o poema de Manuel Bandeira e as questões propostas pelos organizadores:
EXEMPLO B
169
Figura 10 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 45.
Figura 11 Fragmento extraído do livro português: Linguagens (2003), página 45.
Mais uma vez, o texto literário é apenas citado como pretexto para o exercício de
identificação de recursos sonoros. Esse tipo de abordagem empobrece o texto literário,
favorecendo o leitor acrítico e desatento, uma vez que as atividades propostas não instigam o
leitor a raciocinar, relacionar, contestar, inferir, argumentar e confrontar as idéias sugeridas
pelo texto.
Nessa mesma seção, os organizadores iniciam um novo enfoque acerca dos recursos
empregados nos poemas, ou seja, a questão da imagem sugerida pela disposição gráfica do
texto literário. Para isso, os organizadores retomam o Soneto de contrição de Vinícius de
Morais, anteriormente analisado (p. 40), e o interpretam a fim de exemplificar os possíveis
usos de figuras de linguagem.
EXEMPLO C
170
Figura 12 Fragmento extraído do livro Português:Linguagens (2003), página 45.
Contudo, o LD, enquanto livro composto de vários outros livros (ou melhor, de obras
fragmentadas) oferece um espaço de interação entre diversos autores e obras literárias. Assim,
uma complexidade de vozes que necessitam ser bem identificadas e entrelaçadas, mas
também, distintas e independentes entre si.
Entretanto, observa-se, no exemplo acima, que os organizadores referem-se ao escritor
Vinícius de Morais como “poeta” e, em seguida, tratam como “poeta” todo e qualquer escritor
literário. Não uma distinção clara entre os autores trabalhados nesse momento, ou o que se
entende como autor/poeta. Até mesmo os textos escolhidos para exemplificar o caso da poesia
concreta (que, no caso, não apresentam uma relação clara com a poesia de Vinícius de
Morais) são obras de dois autores diferentes: Augusto de Campos e Millôr Fernandes. Desse
modo, para cumprir a proposta pedagógica, não há um devido respeito pela identidade autoral.
A condição de produtor do texto chancela, por si só, a condição de autoria, desconsiderando
os aspectos estéticos, sociológicos, mercadológicos, etc., implícitos no processo de construção
da autoria literária. Assim, desassocia-se o autor de sua natureza social, histórica e estética.
Vale ressaltar, aqui, à luz do caso citado, que a abordagem feita do texto literário nem
sempre corresponde ao modelo textual representado pela obra. O texto literário,
simplesmente, é abordado com o intuito único de alcançar determinados objetivos, em sua
maioria, voltados às questões metodológicas ou de teoria literária e não da prática da leitura
enquanto gratuidade ou mesmo como uma atividade de produção de sentido.
Segundo o Programa Nacional do Livro Didático (PNDL), a utilização de textos,
independentemente de seu valor literário, científico, informativo, jornalístico ou pedagógico,
171
justifica-se pela proposta metodológica aplicada e pelo esforço de alcançar os objetivos
traçados para aquele conteúdo específico. Sendo assim, nada mais justo do que um exemplo
literário para auxiliar na compreensão e apreensão de certo conhecimento exposto na relação
ensino-aprendizagem. Porém, é preciso considerar que, em geral, o ensino da literatura na
escola tem se configurado apenas pelo caráter funcional e imediatista, servindo, muitas vezes,
como pretexto para a aprendizagem de gramática ou teoria literária, perdendo sua gratuidade e
sua função humanizadora:
Estudar literatura tem se caracterizado por decodificar níveis elementares de
organização lingüística, de forma utilitária; a relação ficcional com o mundo,
função estética da linguagem, tem sido limitada ao estudo da biografia do
autor, ou à exegese do texto. O leitor ainda não foi devidamente resgatado
em sua importância crítica (LEAHY-DIOS, 2000, p. 44).
* * *
Quanto ao ensino da literatura (propriamente dita) o LD aborda, nos primeiros
capítulos referentes ao primeiro ano do Ensino Médio, as questões sobre a linguagem,
sobretudo a literária; a diferença entre os gêneros textuais e literários e os estilos de época; e
inicia os estudos literários segundo o modelo historiográfico, partindo das origens da literatura
portuguesa e brasileira (Classicismo, Quinhentismo no Brasil, Barroco e Arcadismo).
A segunda e a terceira séries seguem a mesma seqüência historiográfica das
manifestações literárias diferenciadas por movimentos e estilos literários (Romantismo,
Realismo, Naturalismo, Parnasianismo, Simbolismo, Modernismo e a literatura
contemporânea) representados por uma lista canonizada de autores e obras significativos da
época estudada.
É interessante atentar que, nesse espaço reservado ao estudo da literatura, enfatiza-se o
ensino da historiografia literária, as características dos gêneros e estilos de época e a biografia
dos autores. Os elementos necessários e antecedentes à compreensão do texto literário são
abordados de forma artificial, ou seja, tais concepções são estanques e pressupõem um pré-
conhecimento do leitor. Nota-se esse fragmento explicativo:
Egocentrismo: a maior parte dos poetas românticos volta-se
predominantemente para o próprio eu, numa postura tipicamente narcisista
[...].
85
85
Fragmento extraído do livro Português: Linguagens, de Cereja e Magalhães, página 174.
172
Para compreender o termo “narcisista”, é preciso ter uma gama de conhecimentos
literários, em especial, de elementos da mitologia grega, para que a própria significação de
egocentrismo produza sentido ao leitor-aluno.
O LD apresenta, sim, um jargão específico adotado pela crítica, teoria e história
literárias, como termos e descrições de fenômenos do campo de saber literário. Porém, o
aluno, nesse contexto, não é levado a refletir sobre esse conhecimento e, muito menos,
preparado a identificá-lo nos textos literários lidos. O sistema escolar valoriza, sobretudo, o
domínio (memorização) desses conjuntos de princípios teóricos, e não a reflexão e aplicação
destes na leitura literária, item fundamental para compreensão crítica do texto.
De acordo com a abordagem dada pelos organizadores à obra Os Lusíadas de Camões,
no Exemplo 2, em Anexo Q, percebe-se que o contexto histórico aparece de forma resumida
e, em seguida, Cereja e Magalhães anunciam a estrutura da obra (introdução, narração e
epílogo), colocando pequenos exemplos e outros dados de análise da obra. Nota-se como os
organizadores destramam todo o enredo da obra, apresentando-a de forma pronta, interpretada
e analisada, muito embora esse texto não produza sentido algum para o aluno. Na maioria dos
casos, o aluno sequer tem acesso a essa obra integral, o que dificulta a visualização,
constatação e apreensão da estrutura explicada por meio do LD.
Logo, a literatura tal como apresentada no LD é uma literatura morta, não porque faz
parte do passado, mas porque não produz sentido para os leitores. Nesse contexto, os
organizadores oferecem ao aluno uma análise literária sentenciada pela crítica literária,
expressa pela voz dos organizadores.
diversos casos como esse, em que o fragmento analisado necessita ser
contextualizado para melhor compreensão do leitor. Os organizadores, então, proporcionam
um pequeno resumo explicativo sobre o enredo da obra proposta, mediando assim a leitura
literária.
No item Leitura, os organizadores sugerem a leitura de dois fragmentos literários da
obra Os Lusíadas e, em seguida, elaboram seis questões que variam entre interpretação do
texto e identificação de elementos constitutivos do verso:
173
Figura 13 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 63.
Figura 14 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 63.
Esse exemplo demonstra como as questões de interpretação do texto literário são
visivelmente direcionadas, inclusive, com indicações dos parágrafos, versos ou estrofes onde,
possivelmente, se encontrarão as respostas, evidenciando, claramente, a estratégia de
pareamento da qual fala Terzi (1995)
86
. A noção de conhecimento enfatizada nos LDs está
submetida às concepções cartesianas, de fragmentação e hierarquias, reveladas claramente
através das divisões temáticas e na evolução das habilidades cognitivas, característica própria
da elaboração de conceitos e métodos advindos da classe burguesa.
Em geral, o LD resume seus exercícios de compreensão do conteúdo com o esquema
perguntas-respostas
87
. Dificilmente questões que sensibilizem a criticidade ou o ato
reflexivo do leitor. A preocupação se limita a meras formalidades como saber identificar a
resposta no texto, apontar ou descrever informações objetivas, o que não exige do leitor a
efetuação de atividades como inferências, comparações, criação de hipóteses, testagem de
hipóteses, estabelecimento de relações entre o texto e o conhecimento prévio do leitor, e
outros.
86
Conceito mencionado anteriormente, no quinto capítulo da primeira parte desta dissertação.
87
Estratégia de pareamento, típica do modelo autônomo de letramento,
174
A literatura, nessa perspectiva, não encontra razão de ser, que sua função é
exatamente extrapolar o raciocínio lógico e as convenções sociais, a fim de compreender,
relacionar, transformar a realidade através da experiência ficcional e humanizadora. A
mediação dos organizadores do LD e a fragmentação dos textos literários restringem
significativamente a potencialidade da manifestação literária.
EXEMPLO 3
Figura 15 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 281.
Figura 16 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 101.
175
Figura 17 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 64.
Em diversos momentos, como apontam os exemplos acima, a conclusão do estudo de
obras e autores literários resume-se ao esquema de características comparativas de
movimentos literários. Sendo assim, o autor do texto literário nada mais é do que um
representante, exemplo a ser imitado de certa época e escola literária. A ênfase em
movimentos e épocas, normalmente delimitadas por datas do primeiro impresso de certo
estilo, transmite uma visão parcial do que seria literatura para o aluno
88
.
Além disso, a idéia da história, ou seja, uma constituição do passado, traz a sensação
ao aluno que a produção literária é elaborada apenas por “gênios” da arte, escritores do
passado, escritos que encarnam o seu contexto e situação sócio-histórica de forma exata e
significativa. Este repertório da literatura escolar reproduz um estudo academizado, fechado e
tradicionalmente celebrado. Porém, a literatura o é um objeto pré-histórico a ser exibido
88
Ainda mais, se considerada a perspectiva sociológica que sugere esta dissertação.
176
numa redoma de vidro, mas, sim, uma manifestação viva e que caracteriza os homens em
todos os tempos. Assim, a produção literária escolar contrasta com as produções artísticas
mais comuns e presentes no contexto do aluno, como as manifestações populares, culturais e
espontâneas.
O método historiográfico remete à “sacralização” do autor e de sua obra, pois se torna
um ideal inalcançável e característico do passado, de outra realidade e circunstâncias que não
a próxima do leitor. Como afirma Lajolo (1982, p. 51): “Além de diretivo (sempre ordenado,
comandado, proibindo...), aos olhos dos alunos o fazer literário foi tarefa de outras gerações”.
Isso faz com que o leitor se afaste do autor e de sua obra, pois a leitura torna-se passiva, uma
vez que o texto é praticamente “impermeável” a qualquer opinião, e interpretação que o
educando elabore.
Nota-se, no exemplo abaixo, a concepção dada pelos organizadores do LD sobre os
atributos do escritor e seu possível status profissional:
Como qualquer arte, a literatura exige, da parte do escritor, técnicas,
conhecimentos, sensibilidade e paciência. Esse trabalho às vezes se
assemelha a uma luta, às vezes, a um vício (CEREJA; MAGALHÃES, 2003,
p. 31).
Nessa explicação sobre o que é literatura, Cereja e Magalhães remetem, mesmo que
superficialmente, a idéia de que o escritor, para produzir um texto literário, necessita de certas
técnicas e conhecimento, o que faz de um escritor um profissional, mas, também, de
sensibilidade e paciência, ou seja, algo mais inspirativo.
O escritor como profissional é um conceito tipicamente burguês, pois, valoriza o
trabalho, o esforço, as técnicas e o posterior reconhecimento (social e financeiro) de seu
esforço. Mas como o leitor-real está imerso nesse tipo de relação capitalista, a idéia da
profissionalização do escritor talvez seja algo considerado evidente, lógico e politicamente
correto. O LD não traz informações acerca das relações sociais existentes na complexidade do
sistema literário como o público de cada época concebia o texto literário, como se realizava
a leitura, o que era preciso para produzir um livro, e outros. É claro que o aluno o precisa,
necessariamente, saber tudo sobre a vida literária (interna e externa ao texto em si), mas certas
noções, até mesmo históricas, poderiam, sim, ajudá-lo na compreensão do texto e de seu
autor, sem deixar de perceber a literatura enquanto manifestação do indivíduo como um ser
social.
177
Conforme os exemplos abaixo, é possível perceber mais algumas estratégias de leitura
mediada pelos organizadores.
EXEMPLO 4
Figura 18 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 464.
Figura 19 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 164.
Tem-se, nesses exemplos, a presença de imagens (fotos, quadros artísticos, cenas
televisivas, gravuras e outras), não originais da obra literária, pressupondo uma intermediação
dos organizadores do LD para um certo modo de leitura que estimula ou inibe a imaginação
criadora do leitor.
As imagens apregoam, muitas vezes, um mundo imaginário imutável, relativamente
coerente, justo e belo, ou seja, estereotipado e idealizado sem problemas de ordem social ou
natural. Cabe, portanto, ao professor, não ignorar os demais atrativos, especialmente visuais,
mas sim, avaliar as condições de relação desses com o texto literário abordado a fim de evitar
a aceitação passiva e/ou alienada de qualquer objeto (seja imagem, comentários ou outro)
acrescido à leitura literária mediada no LD.
Nota-se, também, que a maioria dos fragmentos de textos literários veiculados no LD
recebe como suporte de leitura um pequeno dicionário ou glossário, o que não é comum nos
178
textos literários veiculados em seu formato original. O recurso empregado pelos
organizadores do LD, suposto facilitador da leitura e compreensão do texto literário, na
verdade, surge numa tentativa de preencher ou solucionar a falta de certos elementos
fundamentais para a compreensão dos textos literários, elementos estes, que deveriam estar
presentes no leitor, como resultante de uma formação literária adequada e proficiente:
Interpretar o texto literário é um conceito ideológico que requer, mais que
habilidade inata, um conhecimento profundo de formas de produção de
sentido (Scholes, p. 33). A questão da intencionalidade do texto passa pela
situação do leitor, sujeito histórico localizado em um ponto específico da
tradição cultural, alguém a quem se pede a decodificação de sinais em
campos semânticos, isto é, a interpretação de signos construídos em tempo e
espaço distintos dos seus. se localiza a movimentação triangular
transdisciplinar, ferramenta indispensável para a compreensão da arte da
palavra em tempos e espaços histórico-sociais variados (LEAHY-DIOS,
2000, p. 46).
Sem adentrar nos méritos da questão teórica defendida por Leahy-Dios, na citação
acima, percebe-se que todo aparato usado estrategicamente pelos organizadores do LD,
mediando, assim, a relação entre a tríade autor-obra-público, procura suprir deficiências
provindas da formação do leitor, conseqüência de um processo de escolarização literária
que não consegue oferecer a ele o conhecimento profundo das formas de produção de sentido
e de signos lingüístico-literários construídos em tempos e espaços distintos dos seus, aos quais
se refere Leahy-Dios.
Tais concepções equivalem aos conceitos elaborados por Hansen (2005), os quais
apregoam que o leitor precisa conhecer certos códigos e convenções (gêneros, técnicas de
escrita e invenções) para que possa interpretar e compreender o texto literário lido. A leitura
literária necessita de um leitor formado capaz de ocupar a posição do destinatário do texto,
efetivando, por meio dos processos autorais, o ato de fingir.
Tudo indica, com base nos exemplos levantados nessa análise, as convenções
necessárias para leitura e compreensão do texto literário, não são abordadas no LD. Pelo
contrário, o que se observa são explicações superficiais e automatizadas de conceitos (ou
convenções) preescritas apenas pela visão da crítica literária. Dentre essas convenções,
equiparadas ao modelo autônomo de letramento literário, não é característico que o aluno
saiba refazer os procedimentos de construção de sentido do texto, uma vez que esses estão
estanques e pré-determinados.
A especificidade do LD se configura, também, devido a seu público, sobretudo porque
ele é delimitado, bem definido e suficientemente vasto para assegurar o consumo do LD.
179
Todavia, cabe assinalar que o público certo e definido para o LD nem sempre corresponde ao
público desejado pela obra literária veiculada por este.
Diferentemente do autor do texto literário, que não define seu leitor real, mas constrói
em seu texto um leitor implícito, os organizadores estabelecem para o LD uma dupla
destinação: ao público leitor educando e ao público leitor docente, ou educador. para o
texto literário, a concepção de público é muito mais ampla e indefinida.
No caso da literatura, o autor, ao realizar sua obra, tem em mente um leitor ideal, o
que, na realidade, corresponde a um certo público mais ou menos definido. Em contrapartida,
o direcionamento e a função pedagógica do LD acabam “forçando” uma interação do leitor
com o texto que nem sempre corresponde à expectativa deste leitor, menos ainda do autor,
que este busca uma leitura de gratuidade.
Isto ocorre, principalmente, porque não é o leitor quem escolhe a obra que será lida,
ela é simplesmente determinada e imposta pelo organizador do LD. Em decorrência disto, a
obra literária veiculada no LD não alcança sua função, pois encontra um leitor desinteressado
que, em muitos casos, realiza apenas uma leitura obrigatória. O prazer da leitura está,
também, na fase que antecede a própria leitura literária, ou seja, no desejo de esvaecer-se e na
liberdade de escolher a leitura que lhe agrada.
Em geral, o LD é produzido para um grupo de leitores específicos, a saber, estudantes
do Ensino Médio das escolas brasileiras. O grupo ideal é constituído, basicamente, pela faixa
etária de 15 a 18 anos, sendo a maioria estudantes pertencentes à classe média ou alta.
Dificilmente um estudante de classe baixa consegue chegar ao Ensino Fundamental e Médio –
realidade intensificada pela falta de recursos financeiros, e pela necessidade imediata do
ingresso ao mercado de trabalho.
Há, entretanto, aspectos culturais, sociais e geográficos que diferenciam os tipos de
leitores presentes na escola média, o que não é evidenciado ou considerado no LD. O LD é
totalmente padronizado e, por isso, não consegue dar conta das diferenças individuais.
A experiência com a leitura também é diversificada e imprevisível em cada leitor,
nem todos demonstram as mesmas facilidades, desempenho ou perspectivas sobre o que lhe
cai nas mãos. Conforme o assunto ou tema tratado em determinado texto literário, alguns
leitores vão assimilar e atribuir sentido com maior ou menor facilidade, segundo suas
vivências, contexto e experiências com o mundo físico e social ou, como se tentou mostrar
anteriormente, não produzirá sentido algum para os textos.
180
Além disso, o modelo historiográfico não distingue níveis de dificuldade de leituras,
de complexidade do tema ou linguagem, apenas seguem a produção literária em seqüência
temporal.
Uma forma criativa de amenizar a situação é a interação que os organizadores
procuraram estabelecer com seu público, através da inserção de assuntos e novidades do
interesse do adolescente. Como se nota abaixo:
EXEMPLO 5
Figura 20 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 225.
Uma das maneiras de estabelecer essa interação com o cotidiano de seu público se
por meio da inserção de músicas, do contexto moderno e jovem, e pelas imagens ilustrativas
que acompanham os textos literários.
A interação do jovem com os diversos meios de comunicação obrigaram a escola e,
principalmente, os recursos didáticos pedagógicos a se adaptarem. Dessa maneira, os
organizadores do LD, em busca de apresentar novas propostas de leitura, coerentes aos
dispositivos atuais, inserem novos “gêneros literários, imagens e adaptações das obras
literárias no cinema, teatro e televisão:
EXEMPLO 6
181
Figura 21 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 253.
Por outro lado, o LD analisado dirige-se, abertamente, a um suposto sub-grupo de
leitores caracterizados pela posição sócio econômica e geográfica que ocupam. Observe o
exemplo.
EXEMPLO 7
182
Figura 22 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003) , página 129.
A seção Fique ligado!Pesquise! presente na abertura de cada unidade do LD
analisado, sugere uma lista de vídeos, livros, músicas, visitas ao museu e outros, como
atividades complementares às lições seguintes. A idéia é interessante, pois complementa as
atividades propostas pelo LD. Entretanto, a sugestão pressupõe que certos alunos (de
condições financeiras favoráveis e bem localizados geograficamente) poderão pesquisar” e
ampliar seus conhecimentos extra-classe. Lamentavelmente, atividades como as visitas em
museus em Ouro Preto, Olinda, Recife, São Paulo e Rio de Janeiro, ou a aquisição do CD-
ROM como guia eletrônico e a de livros é uma realidade inviável à grande maioria dos
estudantes brasileiros.
Quanto ao público docente, o LD possui uma versão exclusiva para o uso do professor.
O chamado manual do professor, então, busca responder todas as eventuais dúvidas do
183
professor em sua prática em sala de aula. Assim, além de trazer os exercícios resolvidos, o
manual sugere atividades extra-classe, bibliografias complementares ou formas de abordagem
metodológica para determinado assunto ou tema. Esse espaço é previsto pelo PNLD como
requisito para aprovação e indicação do LD para as escolas.
Com base no exemplo 9, em Anexo R, Cereja e Magalhães oferecem um roteiro de
leitura para “unificar” os trabalhos literários realizados em grupo. Assim, os organizadores
intervêm de forma direta ou indireta na vida literária e na formação da concepção de
literatura, pois fazem a mediação entre o leitor e autor do texto literário moldando e
direcionando o que o aluno deverá compreender ou concluir acerca do que lhe é dado.
Sob essa perspectiva, é possível concluir que o conceito formado pelo público do LD a
respeito do escritor e de sua obra será elaborado por dois vieses: um pela leitura da obra em si
e seus efeitos em cada indivíduo; e outro pela visão adquirida pelos modos de leitura, relações
e questões sugeridas pelos organizadores do LD e, pelos professores. Considerando, contudo,
o contexto escolar e suas predisposições sistemáticas e formais, as interferências dos
organizadores na leitura das obras literárias terão maior influência na expectativa dos leitores,
na formação conceitual de literatura, na emissão de valores, e outros, do que a experiência
estética pessoal e crítica do indivíduo.
Em vista destas considerações acerca da criação e recepção do texto literário veiculado
no suporte didático, o LD assume um papel moderador e modalizador da interação autor-
leitor. A leitura e a gratuidade são comedidas por essa função moderadora, que acaba por
reduzir ou restringir os efeitos próprios de uma leitura integral e direta da obra pelo leitor.
Novas características do LD podem ser acrescidas a estas se vistas a partir das
inferências das instituições discursivas, como propõe os apontamentos analíticos a seguir.
184
6. 4 As instâncias discursivas e a atuação das instituições
Os textos literários selecionados para compor o LD de ensino da literatura são
aconselhados pela legislação educacional descritas nos PCNs. Segundo os PCNs (1999), o
aluno tem o direito de usufruir do patrimônio cultural que, no caso da literatura, é
representada pela historiografia literária brasileira. Essa, por sua vez, traz as obras e autores
que marcaram o percurso literário de uma sociedade, como a própria crítica os consagrou.
Para a escola, o aluno deve conhecer e estudar esse conjunto de livros literários
prescritos no âmbito escolar para que lhe seja confiado determinado grau de instrução,
escolaridade e reconhecimento de sua formação de leitor literário.
O sistema literário, porém, é modular, permitindo, assim, que os mecanismos de
inclusão e exclusão dos textos literários no chamado cânone variem conforme as pré-
determinações e influências sociais, políticas e ideológicas sancionadas pelas novas obras e
autores que nascem (ou são redescobertos) e despertam os interesses da crítica e do público
leitor.
A ideologia da educação, hoje, tem apontado para a inclusão das culturas minoritárias
e populares, de sua literatura e do respeito e aceitação das diferenças. Os estudos culturais têm
norteado grande parte das propostas educativas, a fim de formar cidadãos e leitores críticos. É
claro que tais propostas dificilmente têm um alcance satisfatório, uma vez que o corpo de
docentes, a política da escola e outros fomentos necessitam de um preparo, técnicas e projetos
para que colaborem de forma prática e eficiente para a concretização dos ideais culturais.
Essas mudanças de paradigmas no sistema escolar surgem com a finalidade de sanar
as dificuldades que enfrenta o próprio sistema diante de um mundo de informações que
afetam diretamente a vida do aluno, principalmente, fora do contexto escolar. No caso da
literatura, a indústria cultural tem patrocinado outras modalidades de leitura, que não a
canônica e a dos gêneros consagrados pela crítica. Essa nova e ampla realidade de leituras
possíveis colocam em xeque a formação escolar restrita e unidirecional.
Por esse ângulo, percebe-se que o LD analisado confronta-se entre dois horizontes
contraditórios: incluir novas leituras ou perpetuar o cânone estabelecido. O LD
Português:Linguagens (2003) revela claramente a desintegração da esfera da crítica literária
tradicional e clássica, como previa Eagleton (1991)
89
, provocada, mais enfaticamente, pelos
89
Cf. na primeira parte desta dissertação, no segundo capítulo sobre a crítica literária. Observa-se que a realidade
descrita por Eagleton (1991) tem como base os acontecimentos ocorridos na Europa. Sabe-se que no Brasil,
algumas tendências demoram a se concretizar na esfera pública.
185
setores econômicos e políticos da sociedade. Assim, as instâncias discursivas movem-se no
LD por duas correntes: uma conservadora, representada pela tradicional historiografia
literária, tida pelo leitor como a versão da verdade legitimada e uma corrente mais moderna
que atua por meio da(s) crítica(s), inserida(s) em quadros explicativos (boxes) com uma
função complementativa à leitura realizada.
Como se observou no capítulo anterior, a elaboração dos manuais escolares contavam,
principalmente, com a listagem de obras e escritores significativos arrolados nos livros de
história da literatura (portuguesa e brasileira). Da mesma forma, até os dias de hoje, a
literatura estudada nas escolas parte dos referenciais históricos
90
como legitimadores de um
cânone literário brasileiro.
Em decorrência disto, excluem-se várias e diferentes formas de manifestação literária
que não correspondam àquela “credenciada” pela voz da crítica, como por exemplo, a
literatura oral, a popular e das minorias sociais:
O que predomina, na realidade, é o não-reconhecimento autorizado de
determinadas leituras, aquelas que leitores comuns costumam fazer e que,
destituídas de validação, criam um espaço do nada, um espaço de não-
leitura, um morfema zero pedagógico-literário. O espaço da negatividade se
alimenta da reverência ao cânone e ao modelo dominante de classificação do
que é literário (LEAHY-DIOS, 2000, p. 45).
Assim, o LD, quando aborda as manifestações que não pertencem ao cânone literário
brasileiro, o faz de maneira superficial, conservando, ainda, dentre essas, as obras que
possuem certo reconhecimento em sua modalidade, ou seja, privilegiam uma espécie de
“cânone” dos excluídos.
EXEMPLO 1
90
Entende-se que os relatos de uma história da literatura coexistem aos apontamentos da crítica literária, que
destaca certas obras e autores, com maior precisão do gosto do público leitor.
186
Figura 23 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 109.
A música não é um texto prestigiado como literatura no meio dos estudiosos e críticos
literários. No entanto, quando enxertado no LD, como texto literário, ele recebe o endosso de
uma “crítica da modalidade” que confere, por exemplo, à canção Águas de março, de Tom
Jobim, o crédito de um “clássico” da música popular brasileira. Se o LD pode ou deve conter
um exemplo de relato, então, que seja de Gabriel García Márquez; se pode comportar uma
crônica, que seja de Fernando Sabino; um conto, que seja de Rachel de Queiroz, e assim por
diante.
Outro fato que corrobora a exclusão é a hierarquização que existe dentro do sistema
canônico de obras. Desse modo, o autor do texto literário, no LD, é abordado de forma
tradicional, conforme seu grau de importância na listagem canônica, oferecendo-lhe maior ou
menor espaço de análise, maiores ou menores fragmentos de textos e maior ou menor
quantidade de dados biográficos.
Observa-se, no Exemplo 2, no Anexo S, a diferença de espaço físico dedicado pelo
LD a cada um desses autores: Antero de Quental é citado em apenas uma página, enquanto
que Eça de Queirós recebe quatro páginas, entre uma reprodução privilegiada de um
fragmento de sua obra.
Pode-se inferir, a partir dos dados estatísticos que avaliam a presença material de
textos literários no LD, algumas possíveis concepções que a crítica (clássica) e a
historiografia defendem e que, por sua vez, justificariam os enfoques e abordagens do texto
literário no LD.
Segundo o levantamento estatístico
91
do LD analisado, os organizadores utilizam, com
maior freqüência, os textos considerados poesia (64%), em relação a prosa (36%). Entretanto,
91
Cf. Anexo T. Este levantamento estatístico foi elaborado pela pesquisadora da dissertação. Foram
contabilizados 209 fragmentos de textos literários presentes no LD analisado. As características observadas
187
cabe notar que os fragmentos da prosa recebem maior espaço e atenção, compondo a maioria
dos fragmentos considerados de tamanho médio ou grande. Por outro lado, a poesia tem a
vantagem de, em muitos casos, estar transcrita de forma completa.
Nesse sentido, ainda, o maior número de incidências de fragmentos consideravelmente
grandes está na abordagem do Romantismo, Realismo e Modernismo. Alguns autores como
Manuel Antônio de Almeida (Memórias de um sargento de milícias), Álvares de Azevedo
(Noite na taverna), Machado de Assis (contos), a de Queiros (O primo Basílio), Mario de
Andrade (Macunaíma), Raquel de Queiroz (contos), Graciliano Ramos (São Bernardo) e
Clarice Lispector (conto), chegam a ocupar entre duas a três páginas do LD em transcrições
de fragmentos de suas obras.
O Gráfico 1 também mostra que a ênfase nos estudos literários é maior na segunda
série do Ensino Médio, que, coincidentemente, corresponde à abordagem do Romantismo a
arte da burguesia.
Quanto às características do autor do texto literário, 91,3% são autores masculinos,
5,7% femininos, 2% anônimos e 0,9% possuem dupla autoria (masculina e feminina) é o
caso, de algumas letras de músicas, consideradas, neste estudo, como literatura. E, ainda,
77,9% dos autores o brasileiros, 19,31% portugueses e 2,8% de outras nacionalidades. Em
geral, os autores pertencentes a outras nacionalidades correspondem àqueles consagrados pelo
cânone ocidental:
EXEMPLO 3
correspondem àquelas descritas no gráfico, como a diferença entre os gêneros, qualidades dos autores dos textos
literários e forma de abordagem pelos organizadores (com comentários acerca do texto ou sua utilização para
exercícios). Os critérios para avaliação do tamanho do fragmento, correspondem à proporção ocupada pelo texto
em relação ao espaço da folha do LD, ou seja, pequeno quando menor que 50%, médio, de 50% a 80% do
espaço da folha, e grande, quando o texto excede a 80% da folha. O levantamento é apenas um inventário
complementativo à pesquisa a fim de obter dados quantitativos mais palpáveis sobre os textos literários
veiculados no LD analisado.
188
Figura 24 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 297.
O aparecimento de fragmentos de textos desses autores pertencentes ao cânone
ocidental é raro, ainda mais porque não é objetivo do estudo da literatura, conforme
estipulado pelas Diretrizes. Contudo, seus nomes e obras são muito bem citados como dicas
de leitura complementar (por exemplo, no espaço Fique Ligado! Pesquise!) e como influência
direta para características do escritor ou movimento literário estudados.
EXEMPLO 4
Figura 25 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 175.
189
Figura 26 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 175.
Figura 27 Fragmento extraído do livro Português:Linguagens (2003), página 188.
Por outro lado, tem-se a voz da crítica literária, com uma função, aparentemente,
paralela à atuação da história literária. Os comentários críticos presentes no decorrer do LD
assumem a postura de “conselheiros” do público ou indicadores de novas propostas de leitura
e relações a partir do tema estudado no LD. A crítica, nessa perspectiva, surge como porta-
voz da cultura e da sociedade - caráter típico da tendência teórica dos estudos culturais.
190
Sendo assim, pode-se notar, segundo a classificação de Thibaudet (1930 apud
IMBERT, 1971)
92
, a presença de três modalidades críticas. A primeira é a crítica profissional
elaborada pela voz de um crítico renomado e, portanto, de grande valor e reconhecimento:
EXEMPLO 4
Figura 28 Fragmento extraído do livro Português: Lingugens (2003), página 411.
A segunda é a crítica artística, ou seja, aquela comentada pelo próprio artista:
EXEMPLO 5
92
Cf. ao segundo capítulo da dissertação, no tópico quarto, onde se trata da crítica literária.
191
Figura 29 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 395.
E a última crítica presente seria a dos organizadores do LD, que poderia ser
classificada como uma mescla da crítica profissional, porque esses não deixam de ser
profissionais professores da área, e de uma crítica espontânea, que em muitos momentos,
esses reproduzem certas concepções da crítica de massa, modismos e outros.
EXEMPLO 6
192
Figura 30 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 387.
Figura 31 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 297.
A crítica que se percebe no LD possui “várias caras e inúmeras vozes”, como afirmava
Lajolo (2001). Por outro lado, apesar da variedade, a forma como essas vozes se manifestam,
não abre espaço para que o aluno reflita sobre os motivos que levaram tais obras a comporem
193
o quadro de estudo da literatura, ou por quem são feitas tais escolhas, por quê, para qual
público, ou ainda, qual a pertinência de tais textos e seus sentidos para a vida.
Essa tendência inovadora dos organizadores do LD, de permitir a coexistência de duas
concepções, a tradicional e a moderna (Estudos Culturais), torna alguns conceitos
contraditórios.
A palavra gênero, por exemplo, segundo a teoria bakhtiniana, perspectiva adotada por
Cereja e Magalhães, teria um sentido mais amplo do que a classificação aristotélica (lírico,
épico e dramático) e moderna (romance, novela, conto, drama, etc.). Para o pesquisador, o
gênero refere-se aos tipos textuais que se emprega em diversas situações cotidianas de
comunicação. Assim, os gêneros textuais abrangem os textos orais e escritos, e podem ser
identificados por três aspectos básicos: o assunto, a estrutura e o estilo. Essa abordagem o
descarta os tipos textuais tradicionais, a narração, a descrição e a dissertação, mas os
incorpora numa perspectiva mais ampla (MANUAL DO PROFESSOR, 2003). Entretanto, a
maneira como esse método é estudado no LD é um tanto equivocada, principalmente, sob a
ótica do aluno
93
. Observa-se, no fragmento abaixo, como os organizadores explicam ao aluno
a questão do gênero.
EXEMPLO 7
Figura 32 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 35.
93
Segundo Terzi (1995), a escola pressupõe uma certa familiaridade do aluno com a escrita, o que em muitos
casos, pode dificultar na compreensão daquilo que se anuncia ou se pede ao aluno no LD, simplesmente porque
ele ainda não tem o domínio de certo linguajar, termos e expressões.
194
Nota-se que a definição da palavra gênero não aparece na explicação dada ao aluno, o
que supõe que ele saiba o que significa “gênero”
94
(ou, ao menos, estabeleça relação com o
vocabulário empregado na biologia). A definição dos organizadores não descreve de forma
clara a distinção entre os gêneros textuais e literários, uma vez que o texto literário também é
textual (adjetivo relativo a texto) e, portanto, poderia incluir-se na definição de gênero textual.
Nesse mesmo raciocínio, pressupõe-se que os gêneros literários, por serem organizados em
“gêneros”, como a própria palavra denota, compartilhem de fatores semelhantes, podendo
corresponder à “estrutura, estilo ou assunto”. Ou seja, essa definição é redundante, vazia de
significado e não produz sentido algum ao leitor-iniciante.
A situação torna-se mais constrangedora quando os organizadores utilizam uma
linguagem mais simples para tentar explicar o conceito de verso e prosa: “textos em versos
são poemas, isto é, aqueles construídos com versos, cada verso corresponde a uma linha do
poema” [grifo nosso], mais uma vez, não se explica o que é poema e tampouco o que é verso.
E neste, ainda: “textos em prosa são aqueles construídos em linha reta, ocupando todo o
espaço da folha de papel, e organizados geralmente em frases, parágrafos, capítulos, partes”
[grifo nosso]. Essa explicação é visual, e ainda utiliza conceitos cartesianos (linha reta), ora,
tal conceito não se aplica sequer às novas modalidades e suportes (que não a “folha de papel”)
que a literatura hoje se encontra, como na tela de computador, ou outro.
Em seguida, os organizadores citam a classificação aristotélica e exemplificam cada
um dos gêneros: lírico, épico e dramático. Logo após, acrescentam a visão moderna sobre os
gêneros:
EXEMPLO 8
Figura 33 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 37.
94
Segundo Moisés (1970, p. 34), a palavra gênero vem do latim e significa família, raça ou agrupamento de
indivíduos ou seres portadores de características em comum. Em literatura, deve designar famílias de obras
dotadas de atributos iguais ou semelhantes.
195
Os organizadores concluem dizendo que os gêneros literários, tradicionais e
modernos” [grifo nosso] serão aprofundados conforme o desenvolvimento do estudo da
literatura e nas aulas de Produção de texto. Os organizadores não explicam que os gêneros
textuais (o poema, o relato, o texto teatral, argumentativo oral e escrito, a notícia, a
reportagem, a crônica, a crítica, texto publicitário, o conto, a carta argumentativa, o texto
dissertativo-argumentativo, a informatividade e o senso comum), abordados exclusivamente
nas aulas de Produção de texto, confundem-se com a denominação dos gêneros modernos
(conto, crônica e outros) e, ainda, com textos considerados não-literários. Ou seja, a intenção
de expor várias teorias literárias para o aluno, como se fosse uma atitude democrática,
sincrônica e intertextual, acaba por prejudicar a compreensão do próprio aluno acerca dos
termos elementares da teoria literária.
Além disso, os gêneros literários clássicos e modernos (romance) são estudados como
literatura, recebendo o endosso credenciado pela historiografia e crítica literária. Os outros
gêneros textuais (ou gêneros menores, segundo a concepção clássica da crítica literária) são
estudados nos capítulos de Produção de texto, ou seja, esses gêneros “menores” podem ser
reproduzidos ou recriados pelos alunos, porém, os gêneros “maiores”, não:
Os gêneros literários são apresentados teoricamente como formas pré-
definidas e limitadas, nas quais presume-se que todas as possibilidades de
escrita literária devem se esgotar. Os movimentos e escolas de escritura
literária são ensinados como blocos monolíticos delimitados pelas
características históricas de cada época, abordadas de modo superficial e
linear (LEAHY-DIOS, 2000, p. 44).
A maneira de se apresentar o texto literário e suas características são artificiais e não
produzem sentido algum ao leitor iniciante. Observa-se isso na transcrição de um exercício
sobre o Trovadorismo português. O texto literário que antecede as questões é uma cantiga de
amigo de autoria de Fernando Esguio, que viveu entre os séculos XIII e XIV.
EXEMPLO 9
196
Figura 34 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 53
O exercício proposto é extremamente maçante. É preciso, o tempo todo, buscar as
coordenadas de versos e estrofes no texto literário. Apreender a definição do primeiro
conceito de estrutura paralelística e estabelecer relações com o conceito de leixa-pren, para
então, identificar, esse último conceito, nas duas propostas de exercício. Evidentemente, esses
dois conceitos não irão ser retomados, observados ou identificados em outros textos literários,
que podem apresentar tais características, ou semelhantes, como exemplo o final dos versos
de Álvares Azevedo: Por ti as noites eu velei chorando/ Por ti nos sonhos morrerei
sorrindo!”
95
. Nota-se que os conceitos e definições preescritos no LD são fechados e fazem
apenas uma relação imediata com o texto que exemplifica tal concepção. Logo depois, o
aluno não observa esses conceitos nem os identifica em outros textos, o que faz crer que,
dificilmente, as informações teóricas sobre literatura não se fixem na história de leitura do
aluno, de forma que, embora ele as tenha “visto” como conteúdo, elas pouco significam
para ele e nem se constituem em memória de leitura que possa ser ativada a cada nova leitura
quando os mesmos recursos, processos, convenções forem encontradas. A memória
proporcionada pelos exercícios do livro didático o momentâneas, passageiras e
completamente supérfluas para o aluno:
Estudar literatura tem correspondido habitualmente a memorizar o supérfluo,
sem desenvolver instrumentos de apreciação estética da arte literária.
Estaremos perdendo alunos, leitores e críticos enquanto ensinar e aprender
literatura não corresponder a valorizar competências de leitura, deixando de
mediar a construção do conhecimento inerente à educação literária”
(LEAHY-DIOS, 2000, p. 44).
95
Texto presente no livro didático Português:Linguagens (2003), página 189.
197
Nesse sentido, as características de cada movimento literário o, minuciosamente,
esquematizadas em quadros comparativos para que as informações “principais” sobre o tema
abordado sejam memorizadas pelo aluno:
EXEMPLO 10
Figura 35 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 51.
Percebe-se, nesse caso (e em tantos outros), que o LD veicula, caracteristicamente, os
discursos da crítica e história literárias. Tudo o que se diz e que se afirma no LD está
relacionado diretamente com aquilo que a crítica e a historiografia pregam. Porém, a forma
com que isto é feito revela que o LD é uma espécie de vulgarização ou reverberação desses
valores. As práticas de leitura do texto literário no LD são equivalentes às situações simuladas
de leitura, assim como a interpretação e compreensão do que é lido – o LD finge que explicou
e o aluno finge que entendeu.
Sob essa perspectiva, avaliar-se-á a concepção de literatura transmitida no segundo
capítulo do LD analisado, intitulado Introdução à literatura.
Num primeiro momento, os organizadores do LD anunciam “a plurissignificação da
linguagem literária: denotação e conotação”, abordando o tema com exercício de observação
dos exemplos de textos, para, em seguida, concluir, num quadro comparativo, as distinções
entre denotação e conotação.
Após definirem superficialmente a diferença entre um texto literário e não-literário, os
organizadores contrapõem dois textos: Descuidar do lixo é sujeira (Revista Veja) e O bicho
(Manuel Bandeira) (V. Anexo U). Em seguida, há quatro questões de interpretação. As
questões formuladas para interpretação do texto seguem o modelo de pareamento, pois,
198
praticamente, enunciam a resposta ao aluno
96
. Percebe-se, também, que a linguagem
empregada pelos organizadores já pressupõe um leitor iniciado nos estudos da literatura
(locutor, referencial, eu lírico, etc.). Além do mais, a discussão sobre a diferença entre um
texto literário e não literário, segundo a abordagem realizada pelos organizadores, não
conta de todos os tipos de manifestações artísticas que se encontram na sociedade hoje, e do
caráter mutável da literatura, que “um texto pode vir a ser ou deixar de ser literatura ao
longo do tempo” (LAJOLO, 2001, p. 13).
Nesse sentido, uma análise sobre a concepção de literatura, conforme a linha
sociológica, certamente ampliaria o universo literário, podendo, inclusive, resgatar as
manifestações populares e culturais do contexto do aluno para sala de aula. Tal atividade, sim,
seria uma prática democrática e de incentivo à cidadania, como propõe os PCNs.
Ainda neste capítulo, os organizadores questionam a função da literatura em um tópico
intitulado O que é literatura?,e oferecem algumas respostas pontuais, destacando as relações
entre a literatura e a comunicação, a plurissignificação, a sociedade, a imaginação, o prazer e
a história literária. Observa-se cada visão proposta pelos organizadores:
EXEMPLO 11
96
Nota-se como a questão número dois descreve os dois tipos de linguagem empregados pelos textos
(respectivamente), cabendo ao aluno apenas a função de identificar qual texto corresponde a descrição dos
organizadores. Nessa atividade não há reflexão sobre aquilo que se lê. O aluno não percebe por si só as
diferenças textuais.
199
Figura 36 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 31.
Neste tópico, define-se a literatura como “arte da palavra”, em comparação aos
instrumentos que outras artes se utilizam, e destaca-se a função do autor do texto. A palavra,
porém, é rica em significados, pois está em relação ao ser humano e, portanto, seus sentidos
se modificam conforme as inter-relações e negociações” que os indivíduos, por meio da
linguagem, estabelecem. Para ampliar tal concepção, os organizadores acrescentam um tópico
sobre a literatura e a comunicação.
EXEMPLO 12
Figura 37 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 31.
Ressalta-se, aqui, a importância da língua e da função comunicativa e interativa da
linguagem literária. A literatura tem um papel social de “transmitir os conhecimentos e a
cultura de uma comunidade”, não se questiona, portanto, a que cultura e à qual comunidade a
literatura que se estuda na escola pertence e por que apenas esta literatura é legitimada como a
“melhor, credenciada e correta” para a formação do leitor. Ainda, nesse sentido, os
organizadores acrescentam um tópico que fala sobre as relações entre literatura e sua
plurissignificação.
EXEMPLO 13
200
Figura 38 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 31.
Figura 39 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 32.
Neste fragmento, Cereja e Magalhães citam uma definição de literatura segundo o
poeta e crítico Ezra Pound, e chamam a atenção para a plurissignificação das palavras quando
parte de um texto literário. Entretanto, cabe assinalar aqui, que a definição de Pound
compreende a literatura em detrimento de uma “grande literatura”, ou seja, pressupõe-se,
neste conceito, a qualidade estética (ou outra) de uma obra sobre outra e, portanto, a
existência de critérios e instâncias competentes para selecionar e apontar quais as “melhores e
grandes” obras da literatura, embora essas mediações não sejam abordadas pelo LD. A seguir,
há um tópico que trata sobre literatura e sociedade:
EXEMPLO 14
201
Figura 40 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 32.
Tal definição, congruente às idéias trabalhadas nesta pesquisa, relaciona a literatura
com a sociedade, apenas no nível da criação e recepção do texto. Entretanto, o LD chama a
atenção para alguns detalhes um tanto equívocos. Enfatiza-se, por exemplo, o fato do escritor
pertencer à sociedade e vivenciar os problemas comuns de sua época. Dizer, entretanto, que
“não há artistas completamente indiferentes à realidade, pois, de alguma forma, todos
participam dos problemas vividos pela sociedade apesar das diferenças de interesses e de
classe social” [grifo nosso], pressupõe-se que artistas bastante indiferentes (mas não
completamente), e que estes não participam de todos os problemas sociais, mas de alguns,
a saber, aqueles que convergem a sua classe e posição social. Essa definição parece um tanto
limitadora, pois descreve o artista ou escritor como um ser não muito ou pouco social, quase
alienado da realidade.
202
No segundo parágrafo deste fragmento, os organizadores discutem sobre a criação
ficcional do escritor que parte, necessariamente, de suas experiências pessoais e sociais. Logo,
“[...] a reação do público à obra também pode modificar as atitudes futuras do artista”. Nesse
momento, não fica claro o porquê das reações do público, como esse público se manifesta em
relação à obra, como o escritor toma posse disto (das opiniões expressas pelo público) e como
tais atitudes interferem na próxima criação deste escritor. Nessa perspectiva, falta evidenciar
os mecanismos externos à obra literária, que fazem a mediação entre as opiniões e críticas dos
leitores em relação ao autor do texto. Provavelmente, compreender esta afirmação,
pressupondo que o aluno esteja vivenciando suas primeiras experiências literárias por meio do
livro didático, e produzir sentido a partir desta seria uma tarefa bastante árdua, uma vez que a
maioria dos autores citados no LD pertence a outras gerações (passadas), o que tornaria
inviável a “reação do público” modificar as atitudes do autor do texto. Ou seja, é
imprescindível, neste ponto, discutir e estabelecer relações com o momento atual vivido pelos
alunos, procurando evidenciar para eles casos ou situações contemporâneas nos quais, outros
elementos do sistema literário, não apenas o público, mas também os críticos, editores, os
concursos literários e outros, atuam decisivamente para valorizar ou desvalorizar textos e
autores.
Quando os organizadores afirmam que “a obra literária é resultado das relações
dinâmicas entre escritor, público e sociedade”, tal oração pode soar ambígua e sem sentido ao
leitor-aluno, uma vez que esse não sabe se se identifica como público (pois desconhece suas
dimensões enquanto um leitor literário) ou sociedade, (a conclusão do período de
escolarização, hoje, é passaporte para que o indivíduo exerça um papel social, no trabalho e
como cidadão). Seria conveniente substituir a palavra sociedade
97
por “trocas sociais” ou
outro termo que reflita sobre os elementos externos que atuam na formulação da literatura.
Outra sugestão seria, então, reforçar a idéia de sociedade segundo a concepção da sociologia,
que concebe a palavra sociedade como “[...] corpo orgânico estruturado em todos os níveis da
vida social, com base na reunião de indivíduos que vivem sob determinado sistema
econômico de produção, distribuição e consumo, sob um dado regime político, e obedientes a
normas, leis e instituições necessárias à reprodução da sociedade como um todo [...]”
(FERREIRA, 1986, p. 1602). Tal concepção abrange os sistemas materiais, ideológicos,
políticos e outros que atuam na relação dinâmica da tríade autor-obra-público.
97
Pressupõe-se que o sentido imediato da palavra sociedade estabelecido pelo aluno seja a concepção mais
comum e informal do signo, ou seja, a idéia de agrupamento de pessoas o que, neste caso, seria um tanto
redundante falar sobre público e sociedade.
203
Adiante, nesse mesmo fragmento, os organizadores do LD acrescentam a questão da
interferência e do poder de transformação social que a literatura possui. Seria interessante,
nesse momento, discutir sobre a função humanizadora e/ou alienante da literatura, sugerindo
ao aluno a importância de uma leitura crítica, e não apenas funcional como a escola tem se
prontificado a oferecer.
Para finalizar esse tópico, os organizadores exemplificam as formas de participação
social por meio da criação de uma literatura engajada. Nota-se que falar sobre literatura e
sociedade tem sido erroneamente relacionado (imediatamente) com a questão da literatura
engajada. Sabe-se, portanto, que os estudos acerca das relações entre a literatura e a sociedade
são muito mais abrangentes e complexos, como esta dissertação tem tentado mostrar. Não se
podem considerar apenas as questões estritamente políticas e ideológicas, pois diferentes
instâncias que envolvem a materialidade do texto, sua legislação, os discursos que promovem
leituras, sistemas e fomentos de apoio a formação de leitores e inúmeros fatores que
corroboram para uma certa concepção de literatura em uma determinada sociedade e em
determinado contexto.
Apesar da abordagem sociológica ter sido empobrecida na versão didática, é possível
ao professor realizar inferências significativas neste fragmento, numa tentativa de discutir
com o aluno questões como a função social da literatura (segundo Candido), a importância da
materialidade dos textos, as instâncias que discursam sobre o fato literário apregoando valor a
certas obras, as várias formas de leitura do texto literário. A partir do pressuposto da relação
dinâmica entre escritor e público, poder-se-ia propor atividades de interação dos alunos com
autores contemporâneos por meio de cartas, emails, palestra ou outro. Enfim, a perspectiva
sociológica trabalhada em sala de aula pode promover diversas descobertas, relações e
interações.
EXEMPLO 15
Figura 41 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 32.
204
Figura 42 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 33.
Com base na Estética da Recepção, os organizadores falam sobre a liberdade que o
leitor tem para interpretar e recriar o texto lido. Porém, conforme as características do LD
analisado, o modo como a leitura do texto é direcionada pelos exercícios, comentários e
fragmentação, é possível concluir que tal liberdade é condicionada e moderada no LD e no
contexto escolar.
EXEMPLO 16
205
Figura 43 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 33.
A questão do prazer, ou gratuidade (como define Escarpit, 1969), está relacionada
diretamente com a estrutura rítmica, sonora e visual do texto literário, com a forma de
construção dos personagens, da instância narrativa etc, ou seja, com elementos que causam
efeitos à sensibilidade humana. O prazer da leitura, no entanto, não está apenas preso à sua
forma, mas depende de como o leitor estabelece sua relação com o texto e seu autor. Até
mesmo a escolha de um livro para ler pode causar prazer, ou a descoberta de um segredo
escondido pelo autor e revivido pelo leitor no ato da leitura (quando o leitor conhece as
convenções necessárias para seguir adequadamente as pistas deixadas pelo autor).
EXEMPLO 17
Figura 44 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 33.
206
Neste tópico, os organizadores escolhem sua forma de analisar a literatura, isto é, a
partir das descrições da historiografia literária. Aparentemente, as concepções citadas
anteriormente são feitas apenas para conhecimento de sua existência e não para que sejam
refletidas ou consideradas no decorrer do LD.
As idéias trabalhadas sobre “o que é literatura” são sintetizadas por Cereja e
Magalhães por meio da exposição de quatro textos críticos seguidos de questões de
interpretação.
Esses recortes de textos críticos também perdem seu valor quando não analisados
como um todo, e sem o conhecimento das linhas teóricas que tais autores defendem ou se
utilizam como parâmetro de análise. Assim, é possível perceber que esses fragmentos
foram escolhidos porque apresentam certos conceitos-chaves que os autores trabalharam.
EXEMPLO 18
Figura 45 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34.
Texto I: “(...) o homem continua cada vez mais incomunicável (porque deturpou o
termo Comunicação)...” – enfatiza a questão da comunicação.
Figura 46 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34.
207
Texto II: conhecimento e prazer fundem-se na literatura (...) enfatiza o prazer
proporcionado pela literatura.
Figura 47 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34.
Texto III: (...) os escritores (...) têm uma função social definida, exatamente
proporcional à sua competência (...)” enfatiza a sociedade (e imaginação, por parte do
escritor).
Figura 48 Fragmento extraído do livro Português: Linguagens (2003), página 34.
Texto IV: (...) atividade que possibilita a participação do homem na vida em
sociedade (...)” – enfatiza, mais uma vez, a questão da sociedade.
Assim, estabelece-se uma relação superficial sobre a função da literatura. No decorrer
do LD trabalha-se, unicamente, com os textos pré-selecionados pela crítica e história
literárias, de forma que o sentido final da escrita literária já é dado pelos modos como deve
ser lido o texto, entendido e interpretado, transmitindo-se a idéia que a literatura é
fragmentada, estática e inquestionável. Mais uma vez, o que se quer ressaltar é que há,
portanto, uma predominância no modelo autônomo de letramento literário, que o texto fala
por si sem que seja levado em consideração o próprio contexto de produção da leitura
tampouco a identidade dos elementos envolvidos no processo de comunicação leitor/autor
208
que a leitura abarca. Assim, conclui-se, o ensino de literatura na escola, sobretudo no LD
revela-se dominante, a serviço da manutenção de estrutura sócio-cultural.
Os discursos metodológicos dos organizadores o baseados nos estudos culturais,
entretanto, a palavra cultura ainda não foi concebida em suas generosas proporções pela
escola:
É [...] uma práxis da classe dominante, um mecanismo de preservação e
reprodução da estrutura social. É nesse sentido restrito, marcadamente
ideológico e dominante, que adquire a palavra cultura quando a escola se
proclama sua produtora e difusora” (LAJOLO, 1982, p. 21).
um discurso de “interação”, “cidadania”, e “inclusão”, no entanto, esse discurso
não saiu das quatro paredes do sistema escolar burguês. Infelizmente, o que se percebe é, que
na escola, a “[...] literatura é o que quer que uma dada sociedade trata como literatura um
conjunto de textos que os árbitros culturais reconhecem como pertencentes à literatura”
(CULLER, 1999, p. 29).
Enfim, a presença marcante da historiografia e da crítica literárias no LD evidenciam
um modo muito particular de patrocinar-se uma concepção de literatura e um modo de ler
onde a autonomia e a história dos sujeitos leitores pouco importam. Ao contrário, esses
funcionam apenas como actantes de um processo no qual cabe acatar valores, textos, autores,
modos de ler que, aceitos passivamente, contribuem para o acesso ao mundo da cultura, muito
embora essa possa nada significar para alunos e professores.
Evidentemente, não se pretende abolir cânones nem mesmo valores culturais
construídos ao longo da história ocidental ou nacional. A literatura canônica deve, sim, ser
estudada e lida na escola. O que se questiona, neste texto, é a validade dos modos como se
tem praticado essa leitura na escola e, particularmente, no texto analisado. Talvez se os
estudantes pudessem problematizar as questões aqui mencionadas, o lugar da literatura na
escola não fosse tão vazio e a crítica funcionasse como um modo de pensar as relações entre o
homem e como ele erige sua cultura.
209
CAPÍTULO VII
7 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
A compreensão da literatura a partir da perspectiva sociológica, como apresentada
nesta dissertação, permite destacar algumas características e aspectos relevantes e de interesse
para os estudos voltados à literatura (crítica e história) e à formação do leitor.
Em geral, o estudo da história e crítica literárias interessa-se pelas questões
relacionadas à estrutura e valor estéticos dos textos, seus autores e representatividade em
determinadas épocas, enquanto que a linha de investigação da formação do leitor preocupa-se
com os modos de leitura, apropriação e interpretação dos textos literários pelo leitor. Na
perspectiva sociológica, por sua vez, associam-se as questões históricas, de crítica discursiva e
recepção de textos relacionando-as como parte integrante e igualmente constitutiva do
processo de construção da noção de literário.
Assim, observando-se tal perspectiva, o primeiro aspecto a ser destacado é a noção de
literatura não restrita à tradicional tríade autor-obra-leitor, ainda que esses sejam elementos
fundamentais e imprescindíveis para a realização do fato literário, mas não únicos, que a
literatura é pressuposta como uma prática social e específica que deve ser observada a partir
do contexto em que se insere.
Para que a literatura aconteça ou exista é necessário que se produza o texto, como um
ato criador mas, também, materializado. Para isso, há autores, editores, tecnologias, legislação
e todo aparato de distribuição, divulgação e circulação do produto. Para completar o percurso
literário, formam-se leitores, um gosto literário com base nas influências das instituições e
instâncias discursivas.
Nesse sentido, esta pesquisa procurou estudar as cinco instâncias fundamentais
enquanto parte contextual e histórica de um complexo sistema de relações do meio literário.
Não únicas porque os estudos acerca da constituição do sistema literário ainda são
incipientes, sobretudo no Brasil, e, portanto, acredita-se que é possível identificar em outras
pesquisas diferentes instâncias que se relacionam com a construção do conceito de literário.
Isso poderia ser averiguado pelo fato de as manifestações literárias serem muito mais amplas
que o circuito dos textos escritos e canônicos – priorizados neste trabalho.
210
Por outro lado, inúmeros “mini-sistemas” que funcionam dentro dessas cinco
instâncias citadas e que apresentam modos de produção e circulação específicos como
exemplificou a análise do livro didático nesta dissertação.
Um segundo aspecto é que a idéia de uma literatura como prática social não atinge
somente os âmbitos das relações literárias, mas também sociais, possibilitando, portanto, um
olhar crítico sobre os modos de produção, circulação, leitura e consumo dos textos literários,
perspectiva que, acredita-se, pode ser bastante esclarecedora sobre a situação da literatura, e
da leitura dos textos literários nos dias de hoje.
Essa conclusiva pode ser melhor visualizada em vista do referencial teórico da
pesquisa e a análise do livro didático proposta nesta dissertação. Enquanto ensina-se uma
literatura superficial, ajustada e limitada aos padrões da escola e de um grupo letrado que
detém o poder, a literatura como fato social tem alcançado dimensões surpreendentes e
avassaladoras não restritas às questões artísticas ou estéticas, mas social, política, econômica,
material e ideológica. Tais relações não podem ser ignoradas, mas compreendidas com
precisão e crítica a fim de desenvolver ou atribuir um significado pertinente à literatura.
Observar a literatura a partir da visão sociológica permite, também, compreender
certos aspectos relativos ao funcionamento e à natureza da literatura. Como a pesquisa tentou
mostrar, o sistema literário relaciona-se de maneira dinâmica revelando instâncias e
instituições que influenciam e constroem a concepção de literatura enquanto expressão de
uma sociedade. A literatura, assim, é uma prática social não apenas porque envolve
indivíduos sociais, mas porque sua existência (cultural e material) está condicionada pelas
normas, leis, regras, valores prescritos por uma sociedade específica.
No aspecto relativo à história literária, a contribuição de uma análise sociológica é de
extrema importância tanto para uma revisão dos estudos literários quanto para se pensar a
inserção da leitura literária no Brasil.
A história da colonização e independência do Brasil revela uma sociedade cada vez
mais estratificada, massificada e excluída. As condições de produção livreira no País
justificam certas falhas no sistema educacional, na formação de leitores e incentivo aos
escritores, editores e livreiros. Esta dissertação, por exemplo, apontou uma série de fatores
sociais e históricos que rompem com certas concepções ingênuas e errôneas sobre a literatura,
como por exemplo, a idéia de que os escritores românticos eram mais criativos e capacitados
porque apresentam maior número de obras publicadas e público significativo. Como a
pesquisa mostrou, as produções do período colonial no Brasil o são mais ou igualmente
numerosas porque os escritores dessa fase não viveram em um meio que lhes dessem as
211
condições necessárias para criação e produção de textos, pelo contrário, a ação censora da
igreja e estado agia fortemente dificultando o acesso à indústria livreira (tipografias e papel) e
não incentivavam as escolas, formadoras do público leitor. Isso não quer dizer que as obras
românticas ou modernas sejam melhores que as produções barrocas, arcadistas e outras.
Conseguinte, também não significa que as produções escritas, publicadas e divulgadas tenham
maior relevância estética ou valor do que a poesia feita à mão e guardada na gaveta ou
pendurada nos varais de venda da região nordeste. Assim, esta pesquisa, somada a uma visão
marxista, objetiva contribuir com as discussões que questionam os valores e critérios
perpetuados por uma tradição literária e desvendam seus mecanismos de poder e exclusão ao
apontar para outros elementos do sistema literário que podem mostrar como esses
mecanismos funcionam.
Os conceitos que se tem são historicamente condicionados, por isso, não devem ser
apenas (re)transmitidos de forma estanque e cristalizada, mas compreendidos a partir das
relações que se estabelecem em seu tempo e seu meio.
A escola, responsável em ensinar as convenções de leitura literária, tem se calcado na
reprodução de informações, embevecida ante à literatura do passado e de regras chanceladas
pelas instituições como a crítica literária, elevando um modelo a ser imitado por todos.
Entretanto, o ensino da literatura na escola não conta das manifestações literárias de hoje,
como as adaptações e as traduções – afinal, como conceber o papel e a função do autor nesses
casos? Como analisar, interpretar e produzir sentido a partir das frases e composições de
protesto e poesia pixadas nos muros da cidade? Como relacionar uma obra literária e sua
adaptação no cinema? Definitivamente, é hora de os acadêmicos, professores e mestres
repensarem a literatura, principalmente a sua forma de divulgação (ou inculcação) como é
realizada pela escola – a instância primeira de formação do leitor.
Nesse ponto, justifica-se a escolha do livro didático para exemplificar a teoria exposta
nesta dissertação. A análise não foi proposta para dizer o que é bom ou ruim no livro didático,
nem intensificar problemas de elaboração e métodos. A análise apenas comprova que a
formulação do livro didático e sua visão de literatura são historicamente construídas e
condicionadas pelo sistema literário de sua época. O livro didático possui um modo particular
e específico de produção e circulação de textos literários. Sua circulação, atualmente, é a uma
das (se não a) mais importante para a formação do leitor no Brasil. O livro didático tem suas
vantagens, afinal, como tantos leitores teriam acesso ao grande número de obras e autores
como concentra esse material didático?
212
Acredita-se que o leitor é o principal lugar onde ocorre a verdadeira influência social
da literatura. Para ele, o texto é criado e produzido, é nele que a literatura encontra sentido,
por isso, nada mais correto do que perceber e entender como o texto tem lhe chegado às mãos
e quais os fatores que lhe modificam a apreensão do texto por meio do que lhe ensinam (como
ler) e como lhe determinam (o que ler). Enfim, como se viu, é preciso matizar o olhar sobre a
literatura, observando questões que, em conjunto, podem oferecer uma visão mais complexa
do fato literário, permitindo a compreensão do processo de instituição de certos textos, autores
e produções como literários ou não, num movimento que, sabe-se, muda como mudam os
tempos, como já dizia o grande mestre Camões.
213
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<http://www.abdr.org.br/>. Acesso em: 28 jan. 2006.
ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS ESCRITORES. Disponível em:
<http://www.anenet.com.br/>. Acesso em 19 jun. 2006.
BIENAL DO LIVRO DE SÃO PAULO [...]. 19º Bienal Internacional do Livro de São
Paulo 2006. Disponível em:
<http://www.feirabienaldolivro.com.br/feirabienaldolivro_v3/index.asp>. Acesso em: 20 jun.
2006.
BRACELPA: ASSOCIAÇAO BRASILEIRA DE CELULOSE E PAPEL. Disponível em:
<http://www.bracelpa.org.br/br/index.htm> Acesso em: 19 jun. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Decreto-lei nº 824, de 5 de setembro de 1969. Dispõe sobre a
remessa de obras impressas ao Instituto Nacional do Livro. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=492> Acesso em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Decreto nº 75.699, de 6 de maio de 1975. Promulga a Convenção
de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, de 9 de setembro de 1886, Revista
em Paris, a 24 de julho de 1971. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=493>. Acesso em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Decreto nº 76.905, de dezembro de 1975. Promulga a Convenção
Universal sobre o Direito de Autor, Revisão de Paris, 1971. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=494> Acesso em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Decreto nº 84.631, de 9 de abril de 1980. Institui a Semana
Nacional do Livro e da Biblioteca e o Dia do Bibliotecário. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=495>. Acesso em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Lei nº 8.313, de 23 de dezembro de 1991. Restabelece princípios
da Lei nº 7.505, de 2 de julho de 1986, institui o Programa Nacional de Apoio à Cultura -
PRONAC e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=496>. Acesso dia 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Decreto nº 520, de 13 de maio de 1992. Institui o Sistema
Nacional de Bibliotecas Públicas, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=497>. Acesso em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Altera, atualiza e
consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=498>. Acesso em: 28 jan. 2006.
218
BRASIL. Leis e Decretos. Decreto nº 2.894, de 22 de dezembro de 1998. Regulamenta a
emissão e o fornecimento de selo ou sinal de identificação dos fonogramas e das obras
audiovisuais, previstos no art. 113 da Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, que altera,
atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências. Disponível
em: <http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=499>. Acesso em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Lei nº 10.753, de 30 de outubro de 2003. Institui a Política
Nacional do Livro. Disponível em: <http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=501>. Acesso
em: 28 jan. 2006.
BRASIL. Leis e Decretos. Lei nº 10.994, de 14 de dezembro de 2004. Dispõe sobre o
depósito legal de publicações, na Biblioteca Nacional, e dá outras providências. Disponível
em: <http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=1546>. Acesso em: 28 jan. 2006.
CÂMARA BRASILEIRA DO LIVRO. Disponível em: <http://www.cbl.org.br/>. Acesso em:
28 jan. 2006.
DIRETRIZES DO ESTADO NOVO (1937-1945): EDUCAÇÂO, CULTURA E
FUNDAÇÃO CASA DE RUI BARBOSA. Disponível em:
<http://www.casaruibarbosa.gov.br/>. Acesso em: 28 jan. 2006.
FUNDAÇAO BIBLIOTECA NACIONAL. Disponível em:
<http://www.bn.br/site/default.htm>. Acesso em: 28 jan. 2006.
FUNDAÇÃO NACIONAL DO LIVRO INFANTIL E JUVENIL. Disponível em:
<http://www.fnlij.org.br/>. Acesso em: 19 jun. 2006.
MENGOZZI, F. Os empresários da literatura. S/D. Disponível em:
<http://revistaepoca.globo.com/época/0.6993,EPT28373-1661-1.00html>. Acesso em: 28 jan.
2006.
PROPAGANDA. Instituto Nacional do Livro. Disponível em:
<http://www.cpdoc.fgv.br/nav_historia/htm/anos37-45/ev_ecp_inl.htm>. Acesso em: 28 jan.
2006.
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS. Disponível em:
<http://www.snel.org.br/>. Acesso em: 19 jun. 2006.
219
APÊNDICES
220
APÊNDICE A
Núcleos de Agenciamento Literário e Consultoria Editorial no
Brasil
221
Núcleos de Agenciamento Literário e Consultoria Editorial no Brasil
98
A) AMS Agenciamentos:
Representa autores como: Edy Lima, Fausto Wolff, Heloísa Maranhão,
Márcia Frazão, Maria Lúcia Dahl, Paulo Affonso Grisolli, Ruth Rocha e
Sílvio Fiorani.
B) Agência BMSR :
Representa autores como: Ana Maria Machado, Ariano Suassuna, Carlos
Drummond de Andrade, Érico Veríssimo, Fernando Sabino, Lya Luft e
Lygia F. Telles.
C) Página da Cultura:
Representa autores como: Adaçgisa Nery, Antonieta Dias de Moraes,
Claudia Matarazzo, João Gilberto Noll, Menalton Braff e Ulisses Tavares.
D) Solombra Books:
Representa autores como: Antônio Olindo, Aurélio Buarque de Holanda,
Cecília Meirelles, Esdras do Nascimento, Ledo Ivo, Manuel Bandeira,
Orígenes Lessa e Pedro Bloch.
98
MENGOZZI, F. Os empresários da literatura. S/D. Disponível em:
<http://revistaepoca.globo.com/época/0.6993,EPT28373-1661-1.00html>. Acesso em: 28 jan.
2006.
222
APÊNDICE B
Representação do Sistema Literário
223
Representação do Sistema Literário
224
ANEXOS
225
ANEXO A
Publique seu livro (Editora Scortecci)
226
REVISTA SCORTECCI. Grupo Editorial Scortecci. Folheto de propaganda e divulgação,
2006, p. 26.
227
ANEXO B
Os benefícios dos distribuidores e livreiros no Sistema Literário
228
Os benefícios dos distribuidores e livreiros no sistema literário
99
:
1) Maior margem de lucro: a melhor fatia do negócio do livro fica com a
comercialização 30 a 40% ao livreiro, 20 a 30% ao distribuidor (dos 50/ 60% do
distribuidor é que são retiradas as porcentagens do livreiro), contra 10% do autor e
15% do editor, em média;
2) Inexistência de risco: livreiros e distribuidores se beneficiam, na maioria dos casos,
da consignação ou da venda em conta firme onde os livros não vendidos são
devolvidos ao editor e transformados em crédito;
3) Inexistência de despesas adicionais: toda a divulgação da obra corre por conta do
editor, desde os livros doados também pelos distribuidores e livreiros, até os catálogos,
anúncios, cartas, circulares, etc.;
4) Inexistência de investimentos: estes e os riscos deles decorrentes são transferidos ao
editor.
5) Inexistência de capital de giro: o livreiro recebe o livro pronto para comercialização
imediata, o que dispensa a necessidade de capital de giro;
6) Trabalho com capital alheio: tanto o distribuidor quanto o livreiro vendem à vista o
que adquirem a prazo, podendo, assim, investir em novas compras com o dinheiro do
editor, que movimentarão enquanto não se esgotarem os prazos. Podem, também,
devolver os livros o vendidos, o que leva à prática de adquirir números mínimos de
exemplares para que o risco seja menor ainda. Com o lucro da venda desses poucos
livros, outros exemplares podem ser repostos.
autor
editor
distribuidor
livreiro
outros
99
Texto de Amaral Vieira In: PIACENTINI, Tânia. Literatura: O universo brasileiro por trás dos livros.
Florianópolis: UFSC, 1991. p. 100.
229
ANEXO C
Cursos de Editoração no Brasil
230
CALGARO, Fernanda. Editoração faz livros ganharem vida. Folha de São Paulo. São Paulo,
p. 6 (especial), maio, 2006.
231
ANEXO D
Mapa de Edições – Monteiro Lobato, 1934
232
“Mapa de Edições” da Companhia Editora Nacional, do mês de março de 1934. In: PAIXÃO,
Fernando. Momentos do livro no Brasil. São Paulo: Ática, 1998.
233
ANEXO E
Entidades do Livro
234
Entidades do Livro
100
Bienal Internacional do Livro em São Paulo
ABDL – Associação Brasileira de Difusão do Livro
ABDR – Associação Brasileira de Direitos Reprográficos
ABEC – Associação Brasileira de Editores Cristãos
ABEU – Associação Brasileira de Editoras Universitárias
ABIGRAF – Associação Brasileira das Indústrias Gráficas
ABL – Academia Brasileira de Letras
ABRALE – Associação Brasileira de Autores de Livros Educativos
ABRELIVROS - Academia Paulista de Letras
ALB - Asssociação de Leitura do Brasil
American Library
Amigos do Livro
ANL - Associação Nacional de Livrarias
ANLE - Associação Nacional de Livrarias Evangélicas
Associações Internacionais
Biblioteca Nacional
Biblioteca Virtual de Literatura
BookWeb - American Booksellers Association
Câmara Catarinense do Livro
Câmara Riograndese do Livro
Casa de Cultura Mario Quintana
CERLALC – Cooperação de direitos autorais
Eco Futuro
Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários
FILU - Feira Internacional do Livro Universitário
100
Informações obtidas no endereço eletrônico: http://www.cbl.org.br/links.php?page=3
235
Frankfurt Book Fair
Fundação do Livro Infantil e Juvenil
Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
Imprensa Oficial
International Publishers Association
IPLB - Instituto Portugês do Livro e da Biblioteca
Kopinor - Organização de Direitos de Reprodução da Noruega
Leitores e Livros
Lendo e Aprendendo
Libre - Liga Brasileira das Editoras
Libreros
Literatura Online
Ministério da Cultura
Ministério da Educação
Parceiros do Livro
Portal Literal
Prêmio ABEC
Prêmio Casa de Cultura Mário Quintana
Prêmio Juca Pato
Prêmio União Latina
PublishNews
República do Livro
Secretaria da Educação do Estado de São Paulo
SNEL - Sindicato Nacional dos Editores de Livros
Super Pedido
União Brasileira dos Escritores
Viagem Nestlé pela Literatura
Vivaleitura
236
ANEXO F
Exemplo de “Contrato Editorial” no sistema mercadológico
237
Exemplo de “Contrato editorial” no sistema mercadológico
101
PLANETA ADQUIRE PASSE DO BEST-SELLER PAULO COELHO
Contrato é de US$ 800 mil e tem duração de quatro anos
Paulo Coelho, um dos escritores brasileiros mais famosos e “bem
vendidos” no exterior, passará a ter suas obras editadas no País
pela Editora Planeta do Brasil e não mais pela Rocco. A
negociação da transferência foi feita em Barcelona, onde o
escritor acertou um contrato de US$ 800 mil com duração de
quatro anos.
A Editora Planeta, principal grupo editorial na Espanha e sétimo
no mundo, agora passará a editar a obra de Coelho em todos os
países onde tem representação. Somente no Brasil os livros do
escritor chegavam às prateleiras sob outra chancela, a Rocco, que
havia fisgado o autor de O Alquimista da Objetiva por R$ 600
mil em 2002.
Com direito a publicar 14 títulos de Paulo Coelho, a Planeta do Brasil acaba de
arrematar o passe do segundo autor que mais vendeu livros em 2005 em todo o mundo,
totalizando nove milhões de exemplares com O Zahir. O escritor está à frente do norte-
americano Dan Brown, autor de O Código de Vinci e logo atrás da inglesa J. K.
Rowling, autora da saga Harry Potter. O Zahir, até agora, vendeu 10% mais que a obra
anterior do brasileiro.
Com um “tesouro” destes nas mãos, a Planeta do Brasil está otimista com relação a
2006, quando pretende instituir um prêmio para autores nacionais e lançar cerca de 120
títulos, muitos deles na Bienal do Livro de São Paulo.
14/12/2005 - BIENAL
101
PLANETA ADQUIRE PASSE DO BEST-SELLER PAULO COELHO, 14/12/2005 – BIENAL. Disponível
em: http://www.feirabienaldolivro.com.br/feirabienaldolivro_v3/index.asp, acessado dia 28 de jan. 2006.
238
ANEXO G
Revistas especializadas de Letras, Línguas, Lingüística e
Literatura
239
Revistas especializadas de Letras, Línguas, Lingüística e Literatura
102
:
Alfa: Revista de Lingüística
Editora da UNESP
Site: http://www.editora.unesp.br/revistas.html
Características: Publicação destinada à divulgação de artigos e resenhas inéditos nos vários
níveis da análise lingüística, fonética, morfologia, sintaxe e semântica, elaborados por
docentes da UNESP e por outros especialistas da área. Além de um tema central, traz seções
de tema livre, documentos e índices (Anual. ISSN 0002-5216).
Boletim Abralin
Associação Brasileira de Lingüística – Instituto de Letras da UFBa
Site: http://www.ufba.br
Características: Publica trabalhos apresentados nos encontros promovidos pela Abralin ou nas
reuniões anuais da SBPC, com temática variada, abrangendo todas as áreas da lingüística,
sejam elas as teóricas sicas (fonética, fonologia, morfologia, sintaxe, semântica, análise do
discurso), as teóricas interdisciplinares (psicolingüística, sociolingüística) ou as aplicadas
(ensino de línguas, ensino de leitura, alfabetização). especial atenção às línguas indígenas
brasileiras (Anual. ISSN 0102-7158).
Cadernos de Letras
Núcleo de Estudos Lingüísticos/ DEALC
Site: http://ufpel.br
Características: Destinada a alunos e professores da área de letras e lingüística,
publica relatos de experiências didáticas, traduções, trabalhos literários e trabalhos de
lingüística, elaborados por docentes da universidade (Anual. ISSN 0102-9576).
Claritas
Departamento de Inglês da PUC – SP
Site: http://www.pucsp.br
Características: Seu objetivo central é a língua inglesa, vista sob diferentes ângulos e
abordagens teóricas e/ou práticas. Suas áreas de interesse incluem a literatura, a tradução, o
ensino de línguas, a lingüística, a cultura e a educação. Abrange também uma rede
interdisciplinar que relaciona o idioma inglês a outras línguas e suas respectivas culturas
(Anual. ISSN 1414-5243).
Clássica
Sociedade Brasileira de Estudos Clássicos
Site: http://www.exmachina.com.br/sbec/
Características: Publicação destinada a estudos sobre a Antiguidade em diversas linhas de
pesquisa. Veículo próprio da Sociedade, está aberta a colaboração sujeitas ao conselho
editorial (Anual).
Confluência
Instituto de Língua Portuguesa – liceu Literário Português
Fax: (21) 533-3044
Características: Destinada a universitários e instituições culturais, traz artigos abordando
questões lingüísticas (Semestral. ISSN 1415-7403).
102
Informações IN: SEVERINO, Antonio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 22.ed. rev. e ampl. de
acordo com a ABNT – São Paulo: Cortez, 2002. p. 257 a 262.
240
DELTA – Revista de Documentação de Estudos em Lingüística Teórica e Aplicada
Programa de Pós-Graduaçao em Ensino de Língua da PUC –SP
Site: http://www.pucsp.br
Características: O objetivo central é permitir o conhecimento do que ocorre na área no país e
no exterior. Publica trabalhos inéditos em lingüística teórica e aplicada, em todas as áreas,
com artigos de pesquisa originais, resenhas, retrospectivas, debates e informações de eventos
e novas publicações nacionais e estrangeiras (Semestral. ISSN 0102-4450).
The ESPecialist
Centro de Pesquisa, Recursos e Informação em Leitura – CEPRIL
Site: http://www.pucsp.br
Características: Aberta a colaboradores de todas as partes do pis e do exterior, interessados em
questões relativas a línguas para fins específicos, inclui em suas áreas de interesse:
abordagens teóricas e aplicadas ao ensino e à aprendizagem de línguas maternas e formação
de professores e coordenadores de programas de ensino de línguas; descrições teóricas e
aplicadas de comunicação verbal em contextos específicos e relatos de experiência docente
sistematizada (Semestral. ISSN 0102-7077).
Ilha do Desterro: A Journal of Language and Literature
Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC
Site: http://www.ufsc.br
Características: Revista de língua e literatura inglesa destinada à publicação dos trabalhos dos
docentes e especialistas do Programa de Pós-Graduação em Inglês da UFSC (Semestral. ISSN
0101-4846).
Leitura: Teoria e Prática
Associação de Leitura do Brasil – ALB
Faculdade de Educação da UNICAMP
Site: http://www.unicamp.br
Características: Veicula reflexões sobre diferentes aspectos de leitura, principalmente aqueles
relacionados com o contexto escolar. Seções: entrevista, artigos voltados para a teoria e
prática da leitura, resenhas, atualização e pesquisas (em andamento e concluídas). Tem como
propósito básico a transformação da prática da leitura na sociedade brasileira (Semestral.
ISSN 0102-387X).
Letras
Curso de Pós-Graduação em Letras da PUCCAMP
Site: http://www.puccamp.br
Características: Veicula a produção científica dos docentes e pesquisadores do Instituto de
Letras e respectivo programa de pós-graduação, nas áreas de lingüística teórica, lingüística
aplicada, literatura e áreas afins, por meio de artigos e outros escritos que atendam
principalmente as necessidades dos estudantes de letras (Trimestral. ISSN 0102-0250).
Letras de Hoje
Pós-Graduação em Letras da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Site: http://www.pucrs.br/edipucrs
Características: Publica trabalhos que versam a respeito de pesquisas lingüísticas e literárias
sobre metodologia de ensino da língua portuguesa e da literatura. Tem abordado também
temas monográficos como literatura infantil e literatura rio-grandense (Trimestral. ISSN
0101-3335).
241
Língua e Literatura
Seção de Publicações da FFLCH/USP
Site: http://www.fflch.usp.br
Características: Revista interdepartamental, é feita pelos docentes da unidade. Apresenta
várias seções com eixos temáticos ou livres (Anual. ISSN 0101-4862).
Linha D’Água
Associação de Professores de Língua e Literatura
Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da FFLCH – USP
Site: http://www.fflch.usp.br
Características: Publica trabalhos dos pesquisadores, da equipe editorial, da APLL e da
Humanitas (FFLCH-USP) que tratem de estudos lingüísticos e literários sobre línguas
clássicas e modernas. Estudos sobre o ensino de língua e literatura, resenhas e recensões
críticas de obras científicas (Semestral. ISSN 0103-3638).
Rencontres
Departamento de Francês da PUC-SP
Site: http://www.pucsp.br
Características: Publica artigos em português e francês, voltados não só ao FLE (Francês
Língua Estrangeira), mas também a outras especialidades do ensino ou da pesquisa cientifica
relativos à língua e literaturas de expressão francesa (Anual. ISSN 1414-5898).
Revista de Letras
Editora da UNESP
Site: http://www.editora.unesp.br/revistas.html
Características: tem por finalidade publicar e divulgar trabalhos inéditos sobre literatura,
elaborados por docentes da UNESP e por outros especialistas no assunto (Anual. ISSN 0101-
3505).
Trabalhos em Lingüística Aplicada
Instituto de Estudos da Linguagem – IEL/ UNICAMP
Site: http://www.unicamp.br
Características: Publicação do IEL, com colaborações de pesquisadores de outras instituições,
em português, inglês, espanhol e francês. Os volumes se organizam em torno de temas,
abordados mediante artigos, notas, resenhas, questões e problemas (Semestral. ISSN 0103-
1813).
Travessia
Editora da Universidade Federal de Santa Catarina/ Campus Universitário Trindade
Site: http://www.ufsc.br
Características: Revista de literatura brasileira (Semestral. ISSN0101-9570).
Uniletras
Departamento de Letras/ Universidade Estadual de Ponta Grossa
Site: http://www.uepg.br/uepg.htm
Características: Tem por objetivo a publicação de trabalhos relacionados com a área de letras,
enfocando, sob a forma de ensaio, artigos, resenhas e relatos de pesquisa, temas ligados à
lingüística, filosofia, literatura e educação. Divulga também contos e poesias inéditos (Anual.
ISSN 0101-8698).
242
ANEXO H
Calendário do livro
243
Calendário do Livro
103
JANEIRO
Dia 05 - Criação da Primeira Tipografia no Brasil
Dia 07 - Dia do Leitor
Dia 17 - Fundação da UBE (ano de 1958)
FEVEREIRO
Dia 07 - Dia do Gráfico
Dia 27 - Dia Nacional do Livro Didático
MARÇO
Dia 12 - Dia do Bibliotecário
Dia 14 - Dia do Vendedor de Livros
Dia 14 - Dia Nacional da Poesia
Dia 19 - Dia do Livro
Dia 21 - Dia Mundial da Poesia
Dia 28 - Dia do Diagramador e do Revisor
ABRIL
Dia 02 - Dia Internacional do Livro Infanto-juvenil
(Hans Cristian, Dinamarca, 1805 - pioneiro literatura infanto-juvenil)
Dia 04 - Dia do Livreiro Católico
Dia 18 - Dia Nacional do Livro Infantil - (Nascimento Monteiro Lobato, 1882)
Dia 23 - Dia Mundial do Livro e do Direito Autoral
MAIO
Dia 01 - Dia da Literatura Brasileira
Dia 13 - Dia da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
Dia 21 - Dia da Língua Nacional
JUNHO
Dia 10 - Dia da Língua Portuguesa
JULHO
Dia 18 - Dia do Trovador (Homenagem a Gilson de Castro (Luiz Otávio).
Dia 25 - Dia do Escritor
SETEMBRO
Dia 02 - Dia Internacional do Livro Infantil
Dia 08 - Dia Internacional da Alfabetização
Dia 30 - Dia Mundial do Tradutor
OUTUBRO
Dia 04 - Dia do Poeta
Dia 29 - Dia Nacional do Livro
NOVEMBRO
Dia 05 - Dia Nacional da Cultura
Dia 15 - Dia Nacional da Alfabetização
Dia 23 - Dia Internacional do Livro
103
Disponível em: http://www.cbl.org.br
244
ANEXO I
Livros didáticos publicados no período de 1890 a 1920
245
LIVROS DIDÁTICOS PUBLICADOS NO PERÍODO DE 1890 A 1920
104
:
AFONSO CELSO : Por que me ufano de meu país.
ALBERTO DE OLIVEIRA: Céu, terra e mar.
ALCINDO GUANABARA: Contos para crianças.
ARNALDO BARRETO: Primeiras leituras.
ARNALDO BARRETO e RAMON PUIGGARI: Livro de leitura.
CARLOS DE LAET e FAUSTO BARRETO: Antologia nacional.
COELHO NETO: Compendio de literatura brasileira.
FELIZBERTO DE CARVALHO: Exercícios de estilo e redação; Gramática; Livro de leitura
(cinco volumes); Seleta de autores modernos; Exercícios de língua portuguesa; Dicionário
gramatical.
FRANCISCO VIANA: Leituras infantis; Primeiros passos na leitura.
JOÃO DO RIO e VIRIATO CORREIA: Era uma vez... (contos para crianças).
JOÃO KOPKE: Leituras morais e instrutivas; Leituras práticas.
JOÃO RIBEIRO: História do Brasil (curso médio); História do Brasil (curso primário);
Livro de exercícios.
JÚLIO SILVA: Aprendei a língua vernácula.
OLAVO BILAC: Poesias infantis.
OLAVO BILAC e COELHO NETO: A pátria brasileira; Contos pátrios, Teatro infantil.
OLAVO BILAC e GUIMARÃES PASSOS: Tratado de versificação.
OLAVO BILAC e MANUEL BONFIM: Através do Brasil; Livro de composição; Livro de
leitura.
RAMON PUIGGARI e ARNALDO BARRETO: Livro de leitura.
RODRIGO OTÁVIO: Festas nacionais.
SÍLVIO ROMERO: História do Brasil ensinada pela biografia de seus heróis.
VENTURA BÔSCOLI: Lições de literatura brasileira; Análise gramatical.
104
Zilberman, Regina. Letramento Literário: não ao texto, sim ao livro. In: PAIVA, Ap. Literatura e
letramento: espaços, suportes e interfaces (o jogo do livro). Belo Horizonte: Autêntica/Ceale/FaE/ UFMG,
2003.
246
ANEXO J
Prêmios Literários
247
PRÊMIOS LITERÁRIOS
105
PRÊMIO UNIÃO LATINA DE TRADUÇÃO ESPECIALIZADA
Criado em 2000 com o intuito de promover a língua portuguesa, o Prêmio União Latina de
Tradução Especializada (antigo Prêmio União Latina- CBL de Tradução Científica e Técnica)
é promovido pela União Latina, organização intergovernamental e internacional de vocação
lingüística, científica, técnica e cultural, com apoio da mara Brasileira do Livro. O prêmio
visa valorizar as traduções de boa qualidade que tenham contribuído para o enriquecimento da
terminologia científico-técnica em língua portuguesa, estimulando também a profissão do
tradutor especializado.
PRÊMIO ARETÉ DA LITERATURA
105
PRÊMIOS LITERÁRIOS. Câmara Nacional do Livro. Disponível em:
< http://www.cbl.org.br/pages.php?recid=535> Acesso em 25 de junho, 2006.
248
Entregue pela primeira vez em 1991, o Prêmio Areté - antigo prêmio ABEC - busca
incentivar a produção editorial cristã protestante no Brasil, reconhecendo as principais
publicações do gênero em 27 categorias.
PRÊMIO CASA DE CULTURA MARIO QUINTANA
O Prêmio Casa de Cultura Mario Quintana é um concurso de abrangência nacional, aberto a
qualquer escritor brasileiro, residente ou não no Brasil, e tem o objetivo de revelar textos
inéditos. Em 2003, ocorreu a primeira edição do concurso, com a categoria romance. Em
2004, o gênero contemplado foi o conto. E, em 2005, foi a vez da literatura juvenil.
PRÊMIO JUCA PATO
Criado em 1962, por proposta de Marcos Rey, um dos fundadores e então vice-presidente da
UBE, o concurso é realizado anualmente, em parceria com o jornal Folha de São Paulo. O
prêmio é a estatueta que reproduz o Juca Pato, personagem criado pelo chargista Belmonte,
que simboliza o espírito crítico e o inconformismo. Podem concorrer autores de livro
publicado no ano anterior, em qualquer modalidade, que contribua ao debate de idéias, desde
que inscritos através de uma lista assinada por 30 sócios da UBE.
CONCURSO FNLIJ
A Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil FNLIJ, seção brasileira do International
Board on Books for Young People, criou, em 1994, o concurso “Os Melhores Programas de
249
Incentivo à Leitura junto a Crianças e Jovens” com o objetivo de valorizar o empenho de
pessoas e entidades engajadas em iniciativas de promoção de leitura, divulgar suas ões,
facilitar a troca de informação e de conhecimento entre os que se dedicam a essa área.
PRÊMIO RIBEIRÃO DAS LETRAS DE LITERATURA
O Prêmio Ribeirão das Letras de Literatura é uma realização da Prefeitura Municipal de
Ribeirão Preto, por meio da Fundação Instituto do Livro, e conta com o apoio da Secretaria
Municipal da Cultura. O concurso divide-se em quatro categorias: Nacional, Regional,
Municipal e Estudantil Municipal.
PRÊMIO NESTLÉ DE LITERATURA
A Fundação Nestlé de Cultura promoveu em 1982 a primeira edição da Bienal Nestlé de
Literatura Brasileira, com o intuito de incentivar o surgimento de novos nomes no cenário
literário nacional e fomentar a produção dos escritores contemporâneos. Ao longo das sete
edições da Bienal, que passou a se chamar Prêmio Nestlé de Literatura Brasileira a partir de
1993, desfilaram nomes essenciais para nossa história: Rachel de Queiroz, Jorge Amado,
Mario Quintana e Lygia Fagundes Telles, contemplados com a prestigiada Homenagem
Nestlé de Cultura. Por outro lado, despontaram talentos inegáveis, como Álvaro Cardoso
Gomes, Marçal Aquino, Luiz Alfredo Garcia-Roza e Antonio Cícero.
PRÊMIO SESC DE LITERATURA
Promovido pelo Departamento Nacional do Sesc, o Prêmio Sesc de Literatura tem como
objetivo premiar textos inéditos, escritos em ngua portuguesa, por autores brasileiros ou
estrangeiros residentes no Brasil.
250
PRÊMIO PASSO FUNDO ZAFFARI & BOURBON DE LITERATURA
O concurso destina-se a autores de romances escritos em língua portuguesa, sendo
que cada autor pode concorrer com apenas um único romance. A inscrição poderá ser feita
pelo próprio escritor ou por sua editora.
CONCURSO NACIONAL DE CONTOS JOSUÉ GUIMARÃES
Por meio deste concurso, os promotores prentedem homenagear o escritor Josué Guimarães,
bem como estimular e valorizar a criação literária no Brasil. Destina-se a contistas iniciantes e
a contistas com obras publicadas ou não, mas que apresentem textos inéditos.
PRÊMIO PORTUGAL TELECOM DE LITERATURA BRASILEIRA
Oferecido aos escritores do País, o Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira foi
instituído em 2002 para celebrar a língua e a literatura brasileira, premiando obras de criação
literária romances, contos, crônicas, poesia e dramaturgia - editadas em português, escritas
por autores brasileiro.
PRÊMIO DE LITERATURA INFANTIL E JUVENIL BARCO A VAPOR
Promovido pela Edições SM, o Prêmio Barco a Vapor é uma iniciativa que pretende valorizar
os escritores de literatura infantil e juvenil. Iniciativa única e pioneira no mercado editorial
brasileiro, o Prêmio é concedido anualmente ao melhor original inédito em língua portuguesa,
escolhido por um júri composto de especialistas e escritores de reconhecido prestígio.
251
ANEXO L
Resultado das negociações do PNLD/ 2005
252
253
ANEXO M
Resenha do livro Português: Linguagens – PNLD/2005
254
255
256
257
258
259
ANEXO N
Resumo do livro Português: Linguagens – PNLD/ 2006
260
EXEMPLO:
Consulta Livro
Livro: PORTUGUÊS LINGUAGENS
Autor: WILLIAM ROBERTO CEREJA / THEREZA
ANALIA COCHAR MAGALHÃES
Editora: ATUAL
Resenha: A coleção Português: linguagens, reconhecida por
professores e alunos como a mais completa e inovadora,
apresenta-se agora em nova edição, reformulada e atualizada.
O trabalho de leitura, que, segundo a avaliação do MEC no
PNLD, constituía um dos aspectos mais destacados na obra,
ganha maior consistência com a inclusão de textos do
cotidiano, como, charges, folhetos de campanha publicitária,
pichações e grafites, gráficos e estatísticas.
O estudo da gramática, que já se caracterizava por uma
proposta inovadora voltada para o texto, a semântica e o
discurso, incorpora outras contribuições recentes da
Lingüística e da Teoria do Discurso, como a noção de discurso,
de avaliação apreciativa e de discurso citado.
A produção de texto, se antes já era marcada pela diversidade
de textos e pela preocupação com a textualidade, aprofunda
agora o enfoque relacionado aos gêneros textuais e aos
aspectos enunciativos da produção textual, tais como quem é o
interlocutor, a finalidade principal do gênero, a variedade
lingüística mais adequada, etc. Esses aspectos são
caracterizados a partir da relação de projetos – produções de
livros, revistas, jornais, murais, mostras, saraus –, que tornam
reais as condições da produção.
261
ANEXO O
Especificação de contrato - PNDL
262
EDITAL DE PREGÃO - PROCESSO ADMINISTRATIVO
263
EDITAL DE PREGÃO 02/2003. PROCESSO ADMINISTRATIVO
23034.035380/2002-81. Tipo: Menos preço global. Disponível em: http://www.fnde,gov.br
Acesso em 19 abr. 2006.
264
ANEXO P
Agrupamento de gêneros e progressão curricular
265
MANUAL DO PROFESSOR. In: Português: Linguagens (2003)
266
ANEXO Q
Exemplo 2: Os Lusíadas
267
268
269
270
ANEXO R
Roteiro de Leitura
271
272
273
274
ANEXO S
Exemplo 2: Quental x Eça de Queirós
275
276
277
278
279
280
ANEXO T
Dados estatísticos do livro didático Português: Linguagens (2003)
281
DADOS ESTATÍSTICOS DO LIVRO DIDÁTICO: Português: Linguagens (2003).
0
20
40
60
80
100
120
140
160
180
200
Livro Ditico
Prosa
Poesia
Língua
Prodão
Literatura
Masculino
Feminino
Anônimo
Brasileiro
Português
Outro
Pequeno
Médio
Grande
Completo
Antes
Depois
Não há
Exercício
Com Imagem
Sem Imagem
Com Vocab.
Sem Vocab.
Ilustração 4 O gráfico descreve a qualidade de 209 textos literários presentes no livro didático
Português:Linguagens (2003) de Cereja e Magalhães. Entre esses, observou-se as seguintes
características:
1. O gênero literário, prosa ou poesia;
2. Em qual unidade do LD o texto se encontra: Língua (uso e reflexão), Produção de
texto ou literatura;
3. Se o autor do texto era: masculino, feminino ou anônimo;
4. Se o autor do texto era: brasileiro, português ou outra nacionalidade;
5. Se o tamanho do fragmento do texto observado era: pequeno, dio ou grande, ou
ainda completo (como a maioria dos poemas);
6. Se os organizadores apresentavam (ou o) um comentário antes ou depois do
fragmento do texto literário, ou ainda se o texto encontrava-se inserido em propostas
de exercício;
7. Se o texto literário recebia (ou não) o acréscimo de imagens e vocabulário.
282
ANEXO U
Exemplo do livro didático: texto literário x texto não literário
283
284
Livros Grátis
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