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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
JUSSARA ALMEIDA MIDLEJ SILVA
A INVESTIGAÇÃO-AÇÃO EDUCACIONAL
E AS AÇÕES DE LINGUAGEM
COMO PRINCÍPIOS FORMATIVOS DO SER
PROFESSOR
SALVADOR
2008
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JUSSARA ALMEIDA MIDLEJ SILVA
A INVESTIGAÇÃO-AÇÃO EDUCACIONAL
E AS AÇÕES DE LINGUAGEM
COMO PRINCÍPIOS FORMATIVOS DO SER
PROFESSOR
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Federal da Bahia para a obtenção do
título de doutor em Educação sob a orientação do
Professor Dr. Sérgio Coelho Borges Farias.
SALVADOR
2008
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Silva, Jussara Almeida Midlej.
S58 A investigação-ação educacional e as ações de linguagem
como princípios formativos do ser professor - Salvador, UFBA,
2008.
295p. il.; 30cm.
(Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da
Bahia para obtenção do título de doutor em Educação sob a
orientação da Prof
.
Dr. Sérgio Coelho Borges Farias).
1. Investigação-Ação educacional. 2. Docente-Formação 3. Práxis
pedagógica 4. Multirreferencialidade 5. Formação do professor-
Ações da linguagem I. Título.
CDD 372.21
TERMO DE APROVAÇÃO
JUSSARA ALMEIDA MIDLEJ SILVA
A INVESTIGAÇÃO-AÇÃO EDUCACIONAL E AS AÇÕES DE
LINGUAGEM COMO PRINCÍPIOS FORMATIVOS DO SER
PROFESSOR
Área de Concentração: Educação e Práxis Pedagógica
Linha de Pesquisa: Educação e Diversidade
Aprovada em 24/4/2008
BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Sérgio Coelho Borges Farias:
Doutor em Artes - Universidade de São Paulo - USP
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Prof. Dr. Dante Augusto Galeffi:
Doutor em Educação – Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Profª Drª. Leila Pio Mororó:
Doutora em Educação – Universidade Federal de São Carlos
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB)
Profª Drª Maria Helena da Rocha Besnosik:
Doutora em Educação - Universidade de São Paulo - USP
Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS)
Profª Drª. Teresinha Fróes Burnham:
Doutorado em Filosofia - University of Southampton - Inglaterra
PhD em Educação - University of London, UL - Inglaterra
Universidade Federal da Bahia (UFBA)
Ao meu companheiro, filhas, filho,
genros, nora e netas - por me sinalizarem que
a vida não pára, mesmo quando (e até por
isso) há uma tese a ser feita.
AGRADECIMENTOS
Eu não posso explicar meus encontros
Ninguém pode explicar a vida
Num samba curto.
Paulinho da Viola
Ao Criador do Universo, pela nova oportunidade evolutiva a mim concedida e pela
presença, nesta vida, de entes especiais que, como companheiros desta renovada trajetória,
trouxeram consigo o sentido da sua existencialização na minha história, as marcas da
presença, do apoio e da validação de minhas ações;
A meus pais pela acolhida e permissão do retorno a este Planeta; pelos cuidados aos meus
passos, até que eu adquirisse a autonomia de vôo;
Ao Dr. Salvador da Matta e a Regina Martins da Matta, sua filha e minha amiga, (in
memoriam), que me ensinaram a cultivar, desde muito cedo, um grande amor aos livros;
A Wilson Midlej, companheiro existente e pré-existente - cúmplice de viagem pelo orbe -
pela paciência e amor transcendente a mim;
Aos nossos filhos - grandes responsáveis por minha vontade de crescer - Liz, Sue, Wali e
Mila por terem vindo ao nosso encontro e, de algum modo, impulsionado o meu retorno
aos estudos;
A Luíza, Clara, Fernanda e Paula, netas queridas, pelo sopro renovado de infância e amor
na maturidade;
A Sérgio Farias, meu orientador, pelo acolhimento especial e pelas múltiplas conexões na
construção deste estudo;
A Felippe Serpa (in memoriam) pela disponibilidade estética de suas palavras, pelas
reverberações destas na Educação, na minha vida;
A Dante Galeffi pela provocação de novas maneiras de ver a vida, pelo milagre do pão e
do vinho repartidos em diálogos inquebrantáveis;
Aos meus colegas de curso - Hildete dos Anjos, Mariângela Matos e Vital - pela dinâmica
ressonante da amizade;
À equipe técnica da secretaria de pós-graduação da FACED, em especial a Nádia
Cerqueira, pela dedicação à nossa causa;
A Jackson Reis, pela ética, dignidade e determinação com que impulsiona a todas as
pessoas que o cercam; pela presença, comigo;
Às professoras-alunas pela acolhida-parceria dos meus movimentos de formação e
pesquisa em suas trajetórias;
Enfim, a todas as pessoas que se constituíram como amálgamas na construção desta minha
experiência de vida.
Trago dentro do meu coração,
Como num cofre que se não pode fechar de cheio
Todos os lugares onde estive,
Todos os portos a que cheguei,
Todas as paisagens que vi através de janelas ou vigias,
Ou de tombadilhos, sonhando,
E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que quero.
Álvaro de Campos
(Fernando Pessoa, 1890 - 1935).
RESUMO
Esta tese consiste numa investigação-ação educacional vinculada ao Curso de Licenciatura
Plena em Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental fruto de um convênio
firmado entre a Secretaria Municipal de Educação - SMED - de Vitória da Conquista, na
Bahia, e a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia - UESB. Teve um cunho formativo e
envolveu 37 professoras atuantes na educação infantil e em classes iniciais da educação básica
tendo ocorrido entre 2005 e 2007. Esta investigação-ação foi desenvolvida no âmbito da
UESB e encontra-se relacionada a quatro disciplinas ministradas por mim - Atividades de
Articulação Curricular I (2005.1), Psicologia do Desenvolvimento (2005.1), Psicologia da
Aprendizagem (2005.2) e Pesquisa e Prática docente I (2006.1). Seus objetivos conectam-se à
averiguação de como um processo investigativo/formativo é capaz de questionar concepções e
ações pedagógicas monossêmicas e mecanicistas que muitos professores têm da vida e do
trabalho pedagógico; a investigação de como se realiza, na escrita e, em situações
comunicativas, a reconceitualização de saberes e a revisão de atitudes pessoais e profissionais
em níveis renovados e mais complexos. Ao aproximar-se de atitudes indagativas nas
dimensões cognitiva e estético-hermenêutica e como experiência ontológica e
fenomenológica, este estudo vinculou-se ao pluralismo metodológico da multirrefencialidade
e aconteceu com ênfase no agir comunicativo a partir da sistematização de Ações de
linguagem sobre o vivido e em diálogos com as situações reais no cerne da Espiral auto-
reflexiva de conhecimento e ação. Nesse processo, os diários reflexivos, tangenciados pela
memória autobiográfica, funcionaram como instrumentos metodológicos para a auto-
avaliação da experiência empírica e dos saberes acadêmicos demonstrando que a agregação
de registros e discussões incita os professores a aguçarem suas percepções num sentido
crítico-emancipatório e a dilatarem os entendimentos de si e das situações pedagógicas. O
processo coletivo apresentou-se fecundo em conseqüências políticas, tendo emergido, deste,
novas possibilidades de se (re)pensar a formação docente, a epistemologia da práxis.
Finalmente, ao instaurar um diálogo fecundo entre a pesquisa acadêmica e a investigação das
ações pedagógicas, este estudo deu mostras de funcionar como elemento propulsor de um
diálogo fecundo entre o pensamento e a ação fornecendo subsídios à teorização da prática
educacional num sentido praxiológico. Pesquisas desta natureza podem auxiliar a decifrar os
sentidos aparentes, ou não, da sociedade e das realidades educacionais, favorecer a
(trans)formação do professor em investigador da própria prática, ampliar sua capacidade para
o exercício da docência e a configurar um espaço ainda quase inexistente nas Instituições de
Ensino Superior: o da pesquisa que produz o ensino e do ensino que produz a pesquisa.
Palavras-chave: Investigação-ação educacional. Formação docente. Práxis pedagógica
Multirreferencialidade.
ABSTRACT
This thesis consists of an educational action research linked to the graduated program on
Early Childhood Education that came up from an agreement between the Secretaria Municipal
de Educação - SMED - of Vitória da Conquista, Bahia, and Universidade Estadual do
Sudoeste da Bahia - UESB. It had an informative nature and involved 37 teachers of
childhood education and early lessons in elementary school, from 2005 to 2007. The random
sample was fixed in 12 components. This action research was developed in the context of
UESB and is related to four courses given by myself – Activities of Curriculum Articulation I
(2005.1), Development Psychology (2005.1), Psychology of Learning (2005.2) and Research
and Teaching Practice I (2006.1). Its objectives are connected with finding out how an
investigative/formative process is able to question conceptions, and monosemic and
mecanicist pedagogical actions that many teachers have about life and pedagogical work; the
investigation as it takes place, in the writing and, in communicative situations, to give new
concepts to the knowledge and the revision of personal and professional attitudes in renewed
and more complex levels. By approaching to indagative attitudes about cognitive and
esthetical-hermeneutical dimensions and as an ontological and phenomenological experience,
this study is linked to the methodological pluralism of the multireferenciality, and it happened
pointing out the communicative behavior from the systematization of language actions about
things lived and dialogues with the real situations in the nucleus of the Autoreflective spiral of
knowledge and action. In that process, the reflectives diaries, guided by the autobiographic
memory, will work as methodological instruments for the self-evaluation of the empirical
experience and academic knowledges, demonstrating that registers agregation and discussions
make more acute the teachersperceptions in a critical-emancipating way and to expand the
comprehension of themselves and the pedagogical situations. The collective process was
fertile in political consequences, generating new possibilities of (re)thinking the teacher
formation, the epistemology of the praxis. Finally, establishing a fertile dialogue between
academic research and pedagogical actions research, this study showed that works as a
propulsor element of a fertile dialogue between thoughts and actions, providing the theorizing
of educational practice with support in a praxiological way. This kind of works can help to
decode apparent meanings, or not, of the society and educational realities, to contribute to the
teacher’s (trans)formation in researcher of the pratice, to increase his capacity for teaching
and to configure an almost non-existent space in Institutions in Higher Education: for the
research that produces teaching and the teaching that produces research.
Key words: Educational action research. Teacher formation. Pedagogical praxis.
Multireferenciality.
LISTA DE SIGLAS
AC - Atividades de Coordenação
ACC - Atividades Acadêmico-Científico-Culturais
ANFOPE - Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação
DCN - Diretrizes Curriculares Nacionais
ANFOPE - Associação Nacional para a Formação de Professores
ANPAE - Associação Nacional de Política e Administração da Educação
ANPED - Associação Nacional de Pós–graduação e Pesquisa em Educação
BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento
BM - Banco Mundial
CARE - Centro de Pesquisa Aplicada à Educação (Centre for Applied Research in Education)
CC - Conteúdos Curriculares de Natureza Científico-Cultural
CES - Câmara de Educação Superior
CNE- Conselho Nacional de Educação
CNE/CP - Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação
CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
CPB - Confederação dos Professores do Brasil
CNTE - Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação
CP - Conselho Pleno
CNS - Curso Normal Superior
DOU - Diário Oficial da União
ECS - Estágio Curricular Supervisionado
ENRN - Escola Normal de Rio Novo
EUA - Estados Unidos da América do Norte
FACED - Faculdade de Educação
GRN - Ginásio de Rio Novo
LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LDB - Lei de Diretrizes e Bases
IAT - Instituto Anísio Teixeira
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
ISE - Instituto Superior de Educação
MCP - Movimento de Cultura Popular
MEC – Ministério da Educação
NEBE - Projeto de Educação Básica para o Nordeste
OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
PCC - Prática como componente curricular
PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação
PIB - Produto Interno Bruto
PISA - Programa Internacional para Avaliação de Alunos
PNE - Plano Nacional de Educação
SEC - Secretaria da Educação
SECR - Serviço de Extensão Cultural da Universidade do Recife
SEF - Secretaria do Ensino Fundamental
SMED - Secretaria Municipal de Educação
SESu - Secretaria de Ensino Superior
TV - Televisão
UESB - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia
UFBA - Universidade Federal da Bahia
UQAC - Université du Québec à Chicoutimi
VCA - Vitória da Conquista
USP - Universidade de São Paulo
ZPD - Zona Proximal de Desenvolvimento de Aprendizagem
LISTA DE FIGURAS E QUADROS
FIGURA I – Movimento investigativo-ativo como princípio de formação docente.
QUADRO 1 - Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação. Movimento
investigativo inter-relacionado às ações de linguagem.
QUADRO 2 - Cronograma de distribuição de vagas do Curso do Curso de
Licenciatura de Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental – Vitória
da Conquista.
QUADRO 3 - Distribuição de carga horária do Curso de Licenciatura de Educação
Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental – Vitória da Conquista.
QUADRO 4 - Organização das ações de linguagem como prática individual e
discursiva.
QUADRO 5 - Transcrição da cena pedagógica I - inter-relacionada às Ações de
linguagem e à Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação.
QUADRO 6 - Transcrição da cena pedagógica II - inter-relacionada às Ações de
linguagem e à Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação.
QUADRO 7 - Transcrição da cena pedagógica III - inter-relacionada às Ações de
linguagem e à Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação.
QUADRO 8 - Transcrição da cena pedagógica IV - inter-relacionada às Ações de
linguagem e à Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação.
158
52
171
171
208/
209
209/
210
212/
213
217/
218
220/
221
LISTAS DE GRÁFICOS
GRÁFICO 1 – Faixa etária
173
GRÁFICO 2 – Cor da pele 174
GRÁFICO 3 – Tempo de serviço como professora 176
GRÁFICO 4 – Renda familiar 178
GRÁFICO 5 – Posição econômico/financeira na família 179
GRÁFICO 6 – Estado civil 180
GRÁFICO 7 – Realização do ensino médio 183
GRÁFICO 8 – Pretensão de atuação profissional após a conclusão da licenciatura 188
GRÁFICO 9 – Expectativa com realização do curso 189
GRÁFICO 10 – Meios para se manter informada 190
GRÁFICO 11 – Tipos de literatura mais utilizada 191
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
17
1 PROBLEMÁTICA
24
1.1 Da origem da problemática deste estudo: fragmentos de história de vida
1.1.1 Da mudança de espaços de formação e atuação profissional
1.1.2 Da trajetória profissional para renovadas definições
26
32
40
1.2 Os sentidos investigativos enunciados
42
1.3 Objetivos
43
1.4 Justificativas e possíveis contribuições
44
1.5 Perspectivas da presente investigação-ação educacional
44
2 REVISÃO DE LITERATURA
47
2.1 Elementos do quadro teórico do estudo em questão
2.2 Pesquisa e investigação
2.2.1 A origem da pesquisa-ação
2.2.2 A reatualização da pesquisa-ação e a investigação-ação educacional
2.2.3 Investigação-ação: contextualização histórica no Brasil
47
48
50
53
57
2.3 Abordagens emancipatórias: renovados aportes conceituais
60
2.4 A escola, a pesquisa e a crise paradigmática
63
2.5 Políticas públicas educacionais e o trabalho docente
67
2.6 A formação de professores no cenário brasileiro
2.6.1 Novas Diretrizes para o Curso de Pedagogia
2.6.2 A profissão, a profissionalização docente
2.6.3 Formação do professor como um continuum
2.6.4 Conhecimento, subjetivação e construção da professoralidade
2.6.5 Aspectos da aquisição do conhecimento por pessoas adultas
70
74
77
85
89
91
2.7 Marcas que desassossegam
2.7.1 Marcas que conduzem
2.7.2 Marcas que se revigoram
2.7.3 Marcas que transcendem
96
99
105
110
2.8 Marcas na linguagem, no processo de reelaboração dialógica
2.8.1 Ações de linguagem e as possibilidades de evolução de conceitos
2.8.2 Construção de contextos discursivos
115
117
120
2.9 Os diários reflexivos e os processos metacognitivos
123
3 ELEMENTOS EPISTEMOLÓGICOS E METODOLÓGICOS
128
3.1 A pesquisa nas ciências humanas e sociais e esta investigação-ação
128
3.2 Questões éticas, epistemológicas e metodológicas
3.2.1 Procedimentos e instrumentos de coleta e análise dos dados
3.2.2 Critérios de vigor e rigor
129
130
132
3.3 Percursos de construção do objeto empírico do estudo: contextos, aportes
epistemológicos e metodológicos
135
3.4 Definição conjunta dos contornos da presente investigação-ação
137
3.5 Fortalecimento das bases epistemológicas da ação acadêmica
143
3.6 A formação da professoralidade
145
3.7 Ação e reflexão: caminhos em construção
151
3.8 Opercionalização dos ciclos espiralados e de ações de linguagem na
(re)construção do trabalho docente e na investigação
160
3.9 Ações de linguagem e sessões reflexivas
162
4 EIXOS DE ANÁLISE
164
4.1 A visibilidade da realidade: percursos híbridos
4.1.1 De onde vêm os enunciados?
4.1.2 Quem está falando?
166
167
172
4.2 Ações de linguagem na reflexividade sistematizada e intencional
4.2.1 A escritura dos diários
4.2.2 O processo reflexivo vivido na interação
192
197
201
4.3 A busca da densidade singular
204
4.4 A reflexão na ação e sobre a ação no aprendizado de pensar criticamente
206
CONSIDERAÇÕES FINAIS
227
REFERÊNCIAS
239
ANEXOS
270
ANEXO A: Questionário 271
ANEXO B: Memórias de Vida Pedagógica 273
17
INTRODUÇÃO
Flechas vivas
Em variados fluxos,
conexões, refluxos,
minhas marcas me conduzem.
Jussara Midlej, 2002.
Ao concluir meus estudos do Mestrado em Educação em 2004
1
minhas marcas me
conduziram a novas conexões de vida e estas, ao abrirem-se em múltiplas e imprevisíveis
direções, foram produzindo a realidade. (ROLNIK, 1993). Decidi, assim, investir em mais
uma etapa de pós-graduação num novo movimento de estudo acerca das políticas públicas
educacionais de formação docente num âmbito acadêmico. Ao trazer à pauta a
regulamentação que instituiu e normatizou a graduação plena de formação de professores da
educação básica
2
um novo projeto de pesquisa na área da Educação nasceu conectado às
experiências anteriores sobre a investigação da profissionalidade docente: outra vez, minha
trajetória de vida viria ao encontro de meu desejo de acompanhar professores em situações de
aprendizagem acadêmica entrelaçada ao trabalho docente. Este projeto referendou a minha
participação no Programa de Pós-graduação em Educação na UFBA (FACED) como aluna
regular do doutorado.
Concomitantemente, desde 2004, encontro-me vinculada ao quadro docente funcional
da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), especificamente ao campus de
Vitória da Conquista no Curso de Pedagogia dessa Instituição. Ao fazer novas escolhas na
intenção de buscar condições de desenvolver o referido projeto de pesquisa, vinculei-me (na
1
Mestrado em Educação pela Université du Québec à Chicoutimi. (UQAC). Fevereiro 2004.
2
Título VI da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9394/96) pelo Conselho Pleno do
Conselho Nacional de Educação na Resolução 02 de 19/2/02.
18
condição de formadora) ao Programa de Formação para Professores - Curso de Licenciatura
Plena em Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental - modalidade de Normal
Superior
3
. Fruto de um convênio realizado entre a Prefeitura Municipal de Vitória da
Conquista e a citada Autarquia este Programa desenvolve-se desde 2004 e tem como docentes
formadores os profissionais da própria UESB.
Nesse contexto, entre os anos de 2005 e 2007, de um modo aleatório, um grupo de 39
professoras-alunas
4
passou a dividir comigo a responsabilidade de abrigar, nas suas
conjunturas acadêmicas e escolares, um processo de investigação-ação educacional de cunho
emancipatório. Ele foi desenvolvido no âmbito da UESB, inicialmente atrelado a duas
disciplinas ministradas por mim - Atividades de Articulação Curricular I e Psicologia do
Desenvolvimento (2005.1)
5
em dois encontros semanais de cerca de 4 horas/aula cada um;
prosseguiu, em mais dois semestres, numa periodicidade de um encontro semanal de 4
horas/aula, com mais duas disciplinas: Psicologia da Aprendizagem (2005.2) e Pesquisa e
Prática docente I (2006.1).
6
A nova experiência instigou-me a prosseguir estranhando estruturas de legitimação e
produzindo diferenças, outros sentidos nas práticas discursivas do cotidiano (SPINK;
MEDRADO, 2000) concitando-me à redescoberta de múltiplas e renovadas possibilidades de
ressignificar e fortalecer coletivamente os rumos deste estudo, desde os seus primórdios.
No encaminhamento coletivo desta investigação-ação, no qual exerci uma liderança
compartilhada, as professoras-alunas exerceram o papel de parceiras, estudiosas do processo
educativo orientadas por perspectivas epistemológicas / metodológicas referendadas por
3
Ao longo deste estudo esta modalidade será tratada em mais detalhes.
4
Pelo desempenho dos papéis de docentes (professoras em efetivo exercício) e discentes (alunas do Curso em
questão), utilizo-me desta categoria híbrida. No início do processo houve as desistências de duas delas, tendo-se
concluído, este estudo, com 37 professoras-alunas.
5
Em decorrência de greves há um atraso acumulado de seis meses no calendário acadêmico da UESB. Assim, o
primeiro semestre letivo de 2005 iniciou-se em agosto (2005.1).
6
Ao não se esgotar com o encerramento das citadas disciplinas esta ação pesquisadora estendeu-se, em atos
complementares de coleta e triangulação de dados, até os primeiros meses de 2007.
19
múltiplos referenciais e em concepções crítico-interpretativas de saberes da profissão e
experiências do cotidiano escolar. Assim, este estudo se desenvolveu na inter-relação entre
conjunturas individuais, sociais, políticas e institucionais e no cerne de um contexto de
produção e de uso de saberes, pelo meio de diálogos permanentes em busca de
descentramento, interação e construção coletiva entre “[...] sujeitos interlocutores que
procuram a significação dos significados” (FREIRE, 1983c, p. 69), nem sempre simétricos e
harmoniosos. Tais movimentos foram permanentemente perpassados pela subjetividade e pela
emoção como imprescindíveis à construção de um conhecimento compreensivo e íntimo que,
aos poucos, nos uniu ao que estávamos a estudar.
A parceria e a co-responsabilidade das professoras-alunas deram-se no sentido de fazer
investimentos no refinamento e na revisão de conceitos tácitos, através de uma leitura plural
da realidade criando-se, também, com as estratégias citadas, possibilidades de interlocução
acerca das fundamentações epistemológicas, teóricas e multimetodológicas utilizadas ao
longo dos períodos em que este estudo se processou.
Assim, no entrelaçamento da conjuntura acadêmica e dos saberes e experiências das
professoras-alunas parceiras, dirigimos o foco deste estudo para a vivência de uma dinâmica
de formação e investigação acadêmicas baseada em situações e problemas de suas realidades
profissionais, tendo os seguintes objetivos gerais: a averiguação de como e se as ações de
linguagem, acionadas na inter-relação com a espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação,
poderão potencializar a tomada de consciência acerca de si e do processo pedagógico e de
promover a desfamiliarização crescente de concepções monossêmicas e mecanicistas que os
professores, porventura, possuam da vida e da profissão; e, ainda, a verificação das
possibilidades de acionamento de novas organizações discursivas na análise crítica das
práticas pedagógicas e as probabilidades de (re)construí-las em níveis mais complexos; por
20
fim, a investigação de como se realiza, na escrita e, como é verbalizada em situações
comunicativas, a provável reconceitualização de saberes e a revisão de atitudes.
Justifica-se a sua realização com a probabilidade de apresentar um contributo à
produção crítica do conhecimento científico e, este voltado para a complexidade do processo
de investigação e formação docente com um foco em ações de linguagem inter-relacionadas à
espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação (CARR E KEMMIS, 1988; KEMMIS &
MCTAGGART, 1988). Justifico-o, ainda, na expectativa de que este processo possa funcionar
como possível potencializador de criticidade e emancipação e gerar, com isso, uma
consciência profissional mais aberta aos aspectos educacionais éticos, estéticos e políticos da
ação docente; de uma provável ampliação da sensibilidade socioexistencial do professor na
sua condição de pessoa.
A partir de tais premissas esta investigação-ação educacional crítico-emancipatória foi
vivenciada como dialogicidade reflexiva e viabilizada por acordos comunicacionais
propostos, tendo a natureza dialógica da linguagem como viabilizadora de circunstâncias
constitutivas de possíveis profissionais críticos. Nessa direção, foi desenvolvida com base em
ações de linguagem (SMYTH, 1992) e, estas, agrupadas num processo de descrição,
informação/interpretação, confrontação e reconstrução, foram perpassadas pela polissemia da
linguagem (BAKHTIN, 1992, 1999) que, por sua vez, foi operacionalizada em suas
dimensões fenomênico-hermenêuticas. Além disso, o acionamento de elementos tangenciais
da vertente epistemológica relacionada às abordagens autobiográficas permitiu a vivência de
um processo de articulação entre a vida pessoal, o exercício docente e a pesquisa.
Em tais dimensões, o foco deste processo formativo/investigativo inseriu-se num agir
comunicativo (HABERMAS, 1987d, 1989) o que envolveu a construção de espaços para
reflexão, construção conjunta de caminhos e a intercompreensão de conceitos e experiências
com base no pressuposto de que é no discurso e pelo discurso que se elabora o conhecimento
21
e que se constroem caminhos de emancipação embasados no quadro da pesquisa sócio-
histórica e cultural. (VYGOTSKY, 1987).
Assim, o primeiro capítulo desta tese revela a sua problemática revisitada em
condições coletivas especialmente em seus sentidos investigativos e seus objetivos.
Inicialmente traz fragmentos de minha história de vida a provocarem a explicitação dos elos
que me habitam - de minhas redes de aprendizado, manifestações culturais, vivências e
organização de situações pedagógicas - que penso terem contribuído para me tornar o que sou
e se constituíram em razões que me levaram a esta investigação-ação.
O segundo capítulo apresenta a revisão de literatura contendo os elementos teóricos do
estudo em questão entrecruzados por olhares multirreferencializados. Traz à pauta uma
discussão acerca da pesquisa e da investigação, uma contextualização histórica da pesquisa-
ação e uma visão panorâmica dos principais autores que lidam com a sua reatualização; além
disso, resgata alguns aspectos gerais acerca da construção de contextos discursivos no sentido
de apreender os desdobramentos desta modalidade de pesquisa em âmbitos internacional e
nacional. Revelam-se ainda, neste capítulo, questões relacionadas às políticas públicas
educacionais brasileiras nesse início de milênio e suas repercussões para a instituição escolar,
a formação e a atuação docente. Há uma exploração de aspectos relacionados à aquisição do
conhecimento por pessoas adultas e das marcas que permitem o acesso à historicidade
pessoal na discussão de possibilidades de transformação e emancipação humanas. Por último,
há uma abordagem dos aspectos relacionados à reflexividade desenvolvida em dimensões
metapráxica e metacomunicativa
7
voltadas às itinerâncias de escrita dos diários reflexivos.
Seu terceiro capítulo abriga os pressupostos epistemológicos e metodológicos que
nortearam esta investigação-ação, com ênfase na natureza cooperativa do processo vivido,
inter-relacionado a um trabalho formativo; revela os procedimentos e instrumentos de coleta
7
Nessa investigação-ação, no sentido que lhe imprime Lash (1997, p. 169): “Uma teoria da reflexividade só se
torna uma teoria crítica quando afasta sua reflexão da experiência da vida cotidiana e dirige-se para o ‘sistema’.”
22
e análise de dados, enfatizando o suporte operacional da espiral de reflexão crítico-
emancipatória e as ações comunicativas voltadas para a tematização e possíveis melhorias da
prática. Nessa articulação entre teoria e prática há um destaque para o processo reflexivo,
intencional e sistematizado, que teve a linguagem como espaço para a reflexividade e a
negociação; este ao se apresentar através de diferentes procedimentos, como a escritura de
diários reflexivos e a organização acadêmica como sessões reflexivas, tangencia com as
narrativas de trajetórias de vivências pedagógicas e a construção do que Pereira, M. V. (2001)
denomina de professoralidade. Revela os meandros da negociação com as citadas
interlocutoras, tanto na tarefa investigativa quanto na elaboração de conhecimentos didáticos
pedagógicos sobre os sentidos do fazer profissional. Segue-se uma exposição de como se
processou a operacionalização entre a prática rotineira e a pesquisa acadêmica.
No quarto capítulo exponho processualmente os eixos de análise sistematizada da
presente investigação-ação e o acionamento dos fios condutores do universo representativo
dos dados coletados. Nos aspectos descritivos, destacam-se as análises dos conteúdos
manifestos e latentes dos diários reflexivos e de fragmentos colhidos nas narrativas
autobiográficas, a mobilização e os desdobramentos dos ciclos espiralados na prática docente
e no contexto acadêmico. Pontuo suas repercussões em cenários marcados pela condição
feminina e as considerações subjetivas sobre seus contextos da origem e suas experiências
como profissionais e como alunas. Assim, em linhas gerais, o processo
investigativo/formativo experienciado é revelado em seus significados e tensões como tramas
de criação e recriação de fatos, reconstrução de experiências e de teorização da prática que se
tornaram imprescindíveis ao escopo científico deste empreendimento.
As considerações finais trazem a interpretação dos condicionamentos da prática
político-pedagógica e, esta, submetida às contribuições, aos desafios e aos limites percebidos
23
no processo investigativo/formativo, resultando na qualificação do juízo crítico e suas
repercussões na construção das categorias basilares desta investigação-ação.
Divulgo que, ao viver esta experiência e ser por ela interpelada, senti, a exemplo de
Larrosa (2002, p. 5-6) que, desde o início do processo, me encontrava “[...] ex-posta às
vicissitudes de um território de passagem, algo como uma superfície sensível, daquilo que
acontece e afeta de algum modo, inscreve marcas, deixa alguns vestígios, alguns efeitos [...].”
Isso requereu de mim o cultivo da arte mais apurada da atenção e da delicadeza às aberturas
essenciais para as pessoas e para o desconhecido “[...] para o que não se pode antecipar nem
pré-ver, nem pré-dizer.” (LARROSA, 2002, p. 9). Nesse sentido, me fazendo mais atenta,
ousei conceber o mundo fora do contexto neoconservador, vivenciando o encantamento
(r)vigoroso de participar do fenômeno humano concretizado na complexidade da existência e,
mais particularmente, neste estudo.
Daí, nesse relato-narrativo sentir-me à vontade de mencionar a palavra do poeta Ferreira
Gullar (1998) e dizer
da vulnerabilidade e do risco de heideggerinianamente ex-por “[...] uma
parte de mim (que) pesa, pondera, outra parte (que) delira [...] outra (que) se espanta [...].” E,
assim, convivendo com as obscuridades contemporâneas, ousar abrir possibilidades de os
olhos e o coração continuarem a apreciar o crepitar das chamas...
24
1 PROBLEMÁTICA
Tudo ainda é tal e qual
E, no entanto, nada igual.
Caetano Veloso, 1976.
Nos últimos anos do século XX discutiu-se muito acerca da formação docente que,
historicamente, vem pautada numa visão determinista e atrelada a uma racionalidade técnica
que potencializou um modelo de treinamento onde se dá a prevalência da transmissão do
conhecimento formativo. Sob tais perspectivas, a educação do professor se processa de modo
descontextualizado e afastado de possibilidades relacionais, desprovido de relevância prática e
eivado por uma ausência de inquietação pesquisadora; desse modo, repercute num visível
desgaste da imagem social da escola e um questionamento acerca do trabalho docente
realizado.
A urgência em mudar o quadro da educação no nosso país dá indícios de apontar, de
um modo especial, para as políticas de profissionalização docente: as licenciaturas, nesse
contexto, essencialmente concebidas e produzidas através de um currículo linear e
hierarquizante - de cunho tecnicista – prosseguiram, no decorrer nas duas últimas décadas do
último século, disseminando cultos à mecanização da atividade docente, à homogeneização do
discurso e do modo de viver pela ideologia dominante. Há indícios de ter havido
intencionalidades na veiculação de saberes desconectados das experiências da profissão de
professor, uma “[...] notória má vontade de trabalhar com os espíritos improgramáveis, em
face da predominância das epistemologias normativas e violentas” (MACEDO, 2006, p. 96).
As mudanças políticas e sociais nesse início de século XXI (novas tecnologias,
diversidade, participação social, multiculturalidade, integração escolar de pessoas com
necessidades especiais...) criaram novas demandas na linha de um ensino mais participativo e,
assim, indicam a necessidade de uma formação docente menos padronizada e conectada à
25
racionalidade crítica no sentido de diagnosticar obstáculos formativos e avançar para outros
patamares filosóficos e políticos. (IMBERNÓN, 2007).
Para além dos diagnósticos e constatações, nunca é demais lembrar que muitos
professores lidam sem o devido preparo com suas próprias itinerâncias e os limites impostos
pela própria condição humana e, ainda, com as vidas e os sonhos de seus alunos: sonhos de
aceitação, de reconhecimento, de um futuro e de um mundo melhor, de uma sociedade mais
digna, mais humana e mais fraterna. No cerne deste contexto, a profissão docente traz em si
desafios cotidianos de criação e recriação social, de saberes mais elaborados, de capacidades
que os respaldem a lidar com as culturas nas suas diferenças de modo a proporcionar aos
alunos apreço aos valores e ideais coletivos, às buscas de soluções para os problemas desta
época, preparando-os para a autonomia de decisão, para a criatividade, para o mundo do
trabalho. E para que esses alunos sejam realmente transformadores da sua realidade, parece
ser inevitável o papel ativo do docente no propiciamento de oportunidades de legitimar o
conhecimento escolar e ampliar suas visões de mundo. No cerne dessa realidade, portanto,
encontra-se a profissão docente que apresenta indicativos de precisar ser valorizada para atrair
pessoas que, além da vocação, tiveram um melhor preparo para o seu exercício e possam
ganhar o suficiente para se sustentar e se aprimorar na carreira que escolheram.
Inevitavelmente, o tempo do limite é o mesmo das possibilidades. Assim, as
necessidades dos professores ainda se deparam com ações de formação docente que acabam
por minar seus anseios de qualificação e passam a gerar “[...] certo comodismo compartilhado
[...] certa desarticulação em produzir ações associadas [...]” (MACEDO, 2006, p. 100) que,
numa situação formativa, terminam por levá-los a uma assimilação superficial e
despreocupada dos conteúdos e não os prepara adequadamente para os desafios pedagógicos
crescentes.
26
Buscar respostas para questões relacionadas à formação e ao trabalho docentes tem se
constituído numa constante meta acadêmica para mim. Ao tornar-me profissional da área de
educação ao final da adolescência, mobilizou-me a realização de um mestrado na direção de
indagações acerca das políticas públicas de educação e os desdobramentos na problemática
docente. O referido estudo colocou-me novas perspectivas no fortalecimento do protagonismo
docente e nas novas dimensões da profissão alertando-me que o trabalho docente exige
questionamentos constantes e a procura de soluções criativas para os problemas levantados.
(MIDLEJ, 2004a). A partir daí, sentidas necessidades de ressignificação
8
do processo
formativo inicial, em efetivo exercício docente, levaram-me a investir num aprofundamento
de estudos voltados à cultura e aos modelos formativos relacionais e participativos.
1.1 Da origem da problemática deste estudo: fragmentos de história de vida
[...] que podemos cada um de nós fazer, sem
transformar nossa inquietude em história? [...]
cada um tenta dar sentido a si mesmo como um ser
de palavras a partir das palavras e dos vínculos
narrativos que recebeu [...]
Jorge Larrosa, 2002.
Pertenço
9
a uma geração de professores que iniciou suas tarefas docentes a partir
dos anos 70 em escolas públicas brasileiras e esta, talvez tenha sido a que mais foi chamada
ao treinamento
10
ora porque uma lei nova era promulgada, ora porque a formação inicial
8
Ressignificar aqui no sentido de “[...] introduzir ou recriar significados, de transformar modos de compreensão
de práticas educativas tradicionais em favor da construção de uma nova ordem social, política e cultural.”
(MÜHL; ESQUINSANI, 2004, p. 10, 11).
9
Este conceito interpenetra o território do habitus, ou seja, das disposições adquiridas como um conjunto de
esquemas apreendidos desde a infância e permanentemente atualizados ao longo da trajetória social da pessoa.
(SPINK, 2000b, p. 52).
10
Até meados dos anos 70 o termo usado para designar o trabalho de formação em serviço, quando acontecia,
era treinamento. Tal prática trazia subjacente a concepção de “encher a cabeça” do docente de conhecimentos e
técnicas de ensino.
27
apresentava falhas, ora porque surgiam modelos metodológicos ou programas em
substituição a outros quando um novo governante assumia o poder para tudo mudar,
mantendo, no entanto, a mesmice da escola e suas mazelas. (COLLARES et al, 1999, p. 202).
Como participante de inúmeros cursos oriundos de projetos ou programas de capacitação
11
primeiro, na qualidade de cursista, depois, a partir dos anos 80, como multiplicadora
12
e na
década de 90 na condição de formadora de professores
13
– rememoro muitas situações vividas
ao engendrar o presente estudo, e isto faz com que eu diga com Zambramo (1986, apud
ARROYO, 2000, p. 9) “que não é de todo infeliz aquele que pode contar a si mesmo a sua
própria história”.
Este estudo de doutoramento nasceu, portanto, implicado com as inquietações que me
acompanham desde o início de minha estada na instituição escolar: de modo especial, com a
tarefa docente. Permanece vivo na minha memória o acréscimo de ansiedade que me deu o
Curso de magistério no final dos anos sessenta, onde pude desvelar, a partir de minhas
próprias experiências, o hermetismo reinante também na então denominada Escola Normal.
Achava inadmissível que tantas coisas ocorressem na realidade, e nós, os alunos, não
tirássemos os olhos de livros didáticos que haviam servido até as gerações anteriores à nossa!
Com freqüência eu me inquiria: Por que a ação docente acontecia tão distanciada dos reais
interesses dos alunos? Por que a maioria dos professores não via sentido em articular os
conhecimentos livrescos com a existência cotidiana? Por que a arte tinha tão pouca
importância no currículo? Aprender ali era só memorizar conteúdos, repassá-los para os testes
e as provas e... esquecê-los em seguida, até porque eles não tinham muita importância para a
vida? Não havia outros modos de ser professor a não ser fazendo planos minuciosos e dando
11
Nos anos 80 falava-se em capacitação e nesta, ainda era predominante a concepção de que esta ação serviria
para compensar as deficiências da formação profissional inicial.
12
Nomenclatura que passou a ser usada no final da década de 70 para designar aquele professor mais experiente
que “multiplicava ações”, ou seja, treinava outros colegas, supostamente menos experientes.
13
Na década de 90, numa revisão dessas idéias, começou-se a conceber a profissão de professor como a algo que
pressupõe uma prática complexa de reflexão e atualização permanentes. O termo que passou a predominar, a
partir dessa concepção foi “formação.”
28
aulas a alunos calados e passivos? E o reconhecimento da diversidade humana, da premência
de ampliar sua sensibilidade perante as palavras, a arte, a criação e a beleza? Por que as
disciplinas não poderiam ter as linguagens como fios condutores e, com estas, trazerem a vida
pra dentro da escola? Eu externava estas preocupações para alguns professores e, em tempos
de linearidade, não era nem um pouco bem vista. (MIDLEJ, 2007b, p. 290).
Mobilizava-me, desde já, o desejo de arquitetar uma escola diferente, mais dinâmica,
intensa, “[...] onde não houvesse limitação do lúdico a espaços e tempos exclusivos e onde os
alunos tivessem condições de pensar, criar, dizer, trazer suas vivências para a pauta.”
(MIDLEJ, 2007a, p. 27). Mobilizava-me, desde já, as questões relacionadas à formação
docente e suas ressonâncias na escola.
O terceiro ano no citado Curso chegou marcado por intensa preparação para o estágio
numa classe de 3ª série do antigo 1º grau: aulas prontas, palavra a palavra, em planos
fechados, cartazes elaborados a priori. Sem que eu me apercebesse, estava a reproduzir
atitudes semelhantes às da maior parte dos professores - de tão internalizado estava o modelo
de transmissão pura e simples do conhecimento!
Eu, tão pródiga em criticar a escola geradora de passividade, não sabia como fugir do
cerco e realizar de outro modo a minha tarefa: em classe, dava aulas de gramática normativa,
tomava as lições, a tabuada, inovava quase nada e era elogiada pela professora titular da
classe por seguir a sua linha. Para minha surpresa, a única diferença da escola multisseriada
em que eu estudara, era a ausência da palmatória. Hoje compreendo melhor que “era o
passado buscando sua expressão no presente” (GIDDENS, 1997, p. 91) e de modo emocional,
(in)consciente. Novamente, busco em Giddens (p. 92), um aporte para este fenômeno: “[...]
este não é um processo passivo, mas um processo ativo – embora em grande parte
inconsciente – atividade de recriação.”
29
Os sentimentos que perpassaram a minha alma de professora-estudante, nesse período,
foram os de impotência e frustração diante da incapacidade de reverter o que na escola e
dentro de mim (agora de modo explícito) estavam postos. As marcas de uma escola autoritária
continuavam vivas em mim, encontravam ressonância! A descoberta foi chocante: criticar eu
sabia, e fazer diferente?! Novamente, Giddens (1997, p. 92) me ajuda a esclarecer o que
ocorreu: “A repetição é uma maneira de ficar ‘no único mundo que conhecemos’, um meio de
evitar a exposição a ‘valores estranhos’ ou a maneiras de ser.” A criança que fui, ao chorar na
estrada,
14
tomava consciência das contradições e desejava conectar-se com outros fluxos,
esboçar novas composições de ser professora. Mas não sabia como. (MIDLEJ, 2007b, p. 290).
Ao concluir este período fui convidada a ministrar aulas de Sociologia Educacional
para normalistas do segundo ano do Curso de magistério na mesma Escola Normal de Rio
Novo. Surpreendi-me com o desafio de começar a ser professora “de verdade” e encarei-o
com um misto de alegria e apreensão: minhas férias foram passadas na Biblioteca do Ginásio
a estudar, fazer planos, imaginar possibilidades de atuar com uma metodologia mais aberta à
sensibilidade para a existencialidade, para o respeito às diversidades humanas e culturais.
A tarefa constituiu-se mais árdua do que eu pensara: a inexperiência trazia à pauta
aulas puramente magistrais, rabiscadas no quadro de giz, eu não sabia fazer diferente!
Novamente me desassossegava ao perceber que minhas marcas, como aluna, estavam a
proliferar e a me conduzir nessa recente professoralidade, a “[...] um estado de risco, de
desequilíbrio permanente” (PEREIRA, M. V. 2001, p. 32). Para complicar, os tempos eram de
truculência política, pós-golpe militar no Brasil, e meu discurso marxiano - em classe e fora
desta - criava conexões, me dava visibilidade. Nesse contexto político, fui levada a me afastar
compulsoriamente da docência. A fim de não beber, apenas dessa bebida amarga
15
passei a
14
PESSOA, Fernando. In: <http://www.cuidardoser.com.br/a-crianca-que-fui-chora-na-estrada.htm>
15
BUARQUE, Chico. Cálice. Cara Nova Editora Musical Ltda. São Paulo, 1973.
30
dedicar-me deliberadamente, por um tempo, a uma significativa experiência ligada ao teatro
infantil, de modo profissional.
Entretanto, fora do contexto pedagógico, em mim meus silêncios falavam mais do que
as palavras: a percepção era a de que, mais do que nunca, um desafio se impunha à instituição
escolar a fim de dar conta da complexidade da vida contemporânea. Para mim, fazia-se
premente que o currículo, como um processo de construção e transformação de pessoas, fosse
atravessado pela polissemia de linguagem,
16
como eixo de organização do mundo dos
indivíduos para que o currículo, através da atividade deliberada e do imaginário, pudesse
dialogar com outras realidades dentro e fora da escola. Seria preciso alavancar possibilidades
e cumprir a meta da formação de seres humanos mais autônomos, capazes de transformar e
transformar-se numa discutibilidade pública e sociável. (CASTORIADIS, 1992;
HABERMAS, 1989).
A atividade teatral me remetia a pensar no cotidiano da vida, e, mais especificamente,
nas relações educacionais e pedagógicas da sala de aula; passei a ensejar, também,
possibilidades de enriquecimento deste contexto com uma linguagem repleta de signos e
significações veiculados pelos jogos e estratégias teatrais como meios de construção
emancipatória do homem. E a minha experiência apenas me dizia que a realidade acrítica
(intencionada) impunha à escola uma prática perpassada por frustrações que prosseguiam
engessando o fazer pedagógico criativo e significativo.
Após dois anos retornei à docência, mais precisamente à rede pública municipal na
capital baiana e comecei a atuar com crianças em fase de alfabetização. Intuitivamente
busquei colocar, ao lado das cartilhas, múltiplas linguagens que, esperava, funcionassem
como articuladoras do desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças. Usava jogos
simbólicos, explorava a imaginação, cantava e promovia recreações, mas a incompletude dos
16
Polissemia de linguagem aqui como uma “abertura de si-para-si-mesmo, de si-para-com-o-outro e de si-para-
com-o-outro-para-o-mundo.” (FRÓES BURNHAM, 1993, p.6).
31
conhecimentos produzidos na formação do magistério não me garantia respaldo para a
sistematização da tarefa alfabetizadora, para a necessidade de promover a construção da lecto-
escrita. Não havia autonomia docente e eu me sentia, mais do que nunca, despreparada.
Colocada numa situação de retraimento e solidão, atuava com base no ensaio e erro,
resultando que poucos alunos concluíram o ano letivo decodificando a linguagem materna.
Avivou-se, em mim, o sentimento de desvalorização e aviltamento profissional que me
acompanhava nesse começo de carreira, refletido nos baixos salários, no descaso pela
qualificação e na insuficiência de acompanhamento do trabalho docente; no entanto, essa
sensação me encontrava num silêncio apenas relativo. Hoje, a lembrança, ao se concretizar
como ato social e político me remete a uma expressão de Demo (1996, p. 27): “Na arte da
manipulação a vítima sequer chega à consciência de que é vítima.” A cidadania organizada
estava em pleno processo de hibernação, no nosso país.
Em seguida, através de leituras, eu tomava conhecimento de que as críticas ao
paradigma tecnicista nas políticas educacionais das décadas de 60 e 70 já se faziam mais
pujantes. Havia notícias de um movimento nacional pela reformulação dos cursos de
formação dos professores - que lutava pela operacionalização de um processo formativo
continuado acoplado ao exercício profissional do magistério.
17
Já se sabia que programas com
o formato de treinamento, reciclagens ou encontros não davam conta da precariedade da
formação inicial para a atuação docente em contextos diversificados. Tratava-se do
reconhecimento do professor como um ser humano de conhecimentos que precisava vivenciar
novas possibilidades de formação e, concomitantemente, produzir saberes no seu trabalho
docente. Este movimento vinha a calhar com o processo que foi descrito acima; tomar
consciência dele me fortalecia profissionalmente.
17
Esse movimento culminou com a criação da ANFOPE – Associação Nacional pela Formação dos Profissionais
da Educação, em 1990.
32
Ao acompanhar a regionalização dessa mobilização, novamente vinha à tona a minha
experiência como alfabetizadora e de como esta poderia ter sido enriquecida se, associada ao
exercício profissional, eu tivesse tido acesso a inovações produzidas em outras esferas de
modo sistemático - acadêmica, escolar ou de pesquisa. Ficava a refletir como um processo
formativo num âmbito coletivo, em serviço, poderia ter me ajudado e aos colegas de profissão
a trazer os conhecimentos da prática para serem revisitados, refletidos, questionados,
avaliados e enriquecidos pela teoria, modificando as formas de experimentá-la e compreendê-
la. Presumo que, se eu estivesse mais bem preparada para os desafios da atividade docente, eu
poderia ter atuado de modo mais eficaz e evitado o fracasso de tantos que não conseguiram
aprender, não por serem deficientes, mas por inexperiência e inabilidade profissional minha.
1.1.1 Da mudança de espaços de formação e atuação profissional
[...] a prática genealógica transforma a história,
não mais vista como um julgamento sobre o
passado em nome de uma verdade do presente e
sim como uma ‘contra-memória’ que desafia
nossos modos existentes de verdade e justiça
ajudando-nos a compreender e a mudar o
presente, ao colocá-lo em uma nova realidade com
o passado.
Foucault, 1977.
No início dos anos 90, graduei-me em Pedagogia. Ao atuar profissionalmente como
coordenadora pedagógica, busquei incentivar ações docentes na direção de uma abordagem
educacional sistêmica
18
e, embora de modo incipiente, pude perceber que o fenômeno
educativo ganhava em abertura, vitalidade, fecundidade e imprevisibilidade (CORAZZA,
2002; ROSNAY, 2002).
18
A abordagem educacional sistêmica permite organizar os conhecimentos de maneira que a análise e a síntese
se complementem na busca do saber. (ROSNAY, J. 2002, p. 493-499).
33
No decorrer da primeira metade da década de 1990 fiz dois cursos de especialização: o
primeiro em Alfabetização e o outro em Ludopedagogia, no intuito de ampliar as
possibilidades de prosseguir trabalhando com professores dos anos iniciais. Hoje vejo que, ao
realizá-los, de algum modo fui ao encontro de fazer releituras do período em que atuei como
alfabetizadora e pouco consegui desempenhar: as marcas dessa experiência continuavam a
reverberar e encontrar ressonância na minha profissionalidade. Pude compreender, enfim, a
complexidade
19
que envolve a tarefa alfabetizadora e como inadvertidamente ela é
comumente entregue aos professores recém-chegados ao sistema escolar...
Concomitantemente, através de um concurso público atuei como docente na rede
pública estadual, numa experiência com professorandos de um Curso de magistério, no
decorrer de um ano letivo. Uma carga horária excessiva levou-me a ministrar aulas em 14
classes com uma média de cinqüenta alunos em cada uma, fazendo-me sentir, na própria pele,
o quanto a falta de condições operacionais diante desse cenário trazia a impossibilidade de o
professor realizar um trabalho sério e comprometido com a aprendizagem. Ali pude entender
melhor os principais motivos do despreparo dos docentes, formados em nível médio: o
aligeiramento, a precarização cultural, a falta de recursos e a desqualificação de sua formação
definitivamente não lhes forneciam os elementos necessários a uma tarefa educativa,
complexa, com crianças. Restou-me pouco a fazer naquele cenário desolador: em Psicologia
da Educação trouxe à pauta elementos da teoria do desenvolvimento humano de Jean Piaget, o
sócio-interacionismo de Vygotsky e seus colaboradores. No entanto, o que os professorandos
pediam eram as fórmulas mágicas de como alfabetizar os alunos em condições desfavoráveis.
Eles não desconheciam que, uma vez profissionais, na escola seriam alocados nessas classes
que os veteranos rejeitavam... Naquelas condições provoquei-os a pensar numa prática
19
“Não há de se confundir aqui, sistema complexo com complicação. Ao serem complexas, as coisas não se
tornam mais complicadas e sim, mais específicas em sua diferenciação: na complexidade pode-se passar de uma
configuração de pensamento e ação a outra, integrando dados diversos e interligando-os em combinações que
façam sentido, sem jamais se tornarem reducionistas.” (OSTROWER, 1989, p. 197-199).
34
cotidiana intencionada e comprometida com a superação da desigualdade social e com formas
de organização para a reação à pobreza política,
20
à falta de consciência dela mesma.
Em seguida, operei na condição de técnica do Instituto Anísio Teixeira (IAT)
21
e como
formadora de professores das séries iniciais no recém implantado Projeto de Educação Básica
para o Nordeste (NEBE III) no estado da Bahia.
22
O modelo de capacitação, em 80 horas
modulares para cada turma, era caracterizado por uma concepção de professor formador como
aplicador de propostas prontas e produzidas coletivamente para Programas de curta duração.
As linhas-mestras do NEBE III, de algum modo, foram emanadas das políticas educacionais
provindas do Banco Mundial (BM), o co-financiador do referido Programa no Brasil. Nesse
contexto, sua criação fez parte das estratégias dessa Agência, dentro de uma lógica econômica
(relações de custo-benefício) que recomenda priorizar a capacitação em serviço como mais
efetiva em termos de custo do que o investimento na formação inicial de professores.
Imediatamente engajada nas novas funções passei a respaldar tecnicamente a direção
geral do IAT no citado Programa e, ainda participar, na condição de capacitadora de
docentes, na grande Salvador e, em várias cidades do interior do estado,
23
até o final da
década de 1990. No processo, a realidade demonstrava a fragilidade dessa ação, apontando
para muitos fatores: a proletarização crescente da categoria agravada com o aviltamento
salarial, a falta de condições de trabalho, a face aguda da pobreza política aliada, em muitos
casos, ao baixo nível de desenvolvimento cognitivo/filosófico e a uma incompletude nos
conhecimentos básicos para o exercício da tarefa docente. A sistematização dos dados de
20
Segundo Demo (1996, p. 23) “[...] é politicamente pobre o cidadão que somente reclama, mas não se organiza
para reagir, não se associa para reivindicar, não se congrega para influir.”
21
Instituto Anísio Teixeira (IAT) órgão da Secretaria da Educação (SEC), responsável pelo planejamento e
coordenação de estudos e projetos referentes a ensino, pesquisa, experimentações educacionais e produção das
políticas públicas de formação docente da rede estadual de ensino da Bahia.
22
Convênio 97 (BRASIL. MEC/BIRD/SEC N. 6113/97). Sexto Projeto co-financiado pelo Banco Mundial com
uma contrapartida brasileira. Desenvolvido entre 1994 e 1999 nos 14 Núcleos de Capacitação do estado da Bahia
atendeu a 10.160 professores das séries iniciais do ensino fundamental que atuavam, tanto na rede pública
municipal, quanto na rede estadual de ensino.
23
Salvador e Região Metropolitana, Feira de Santana, Santo Antonio de Jesus, Valença, Jequié, Vitória da
Conquista, Paulo Afonso, Itabuna, Ilhéus.
35
pesquisa forneceu subsídios a dois relatórios gerais
24
para o Ministério da Educação (MEC) e
o Banco Mundial (BM). O primeiro relatório foi impresso e amplamente divulgado; o
segundo ficou num nível mais restrito de divulgação.
Estas pesquisas fizeram emergir as inúmeras questões sobre a qualidade do ensino e a
prática pedagógica de professores da rede pública de ensino no estado da Bahia. Desvelou-se
que esta ação, recomendada para ser realizada em dois módulos de trabalhos, esporádicos, de
40 horas cada um, não conseguia dar conta de articular a cultura cotidiana destes professores
com o conhecimento científico sistematizado: ao ocorrer de modo desarticulado e
descontextualizado, além de prescritivo, reduzia-se o processo formativo à aquisição de
conhecimentos específicos à profissão de professor contribuindo, assim, de modo bastante
precário para a profissionalização do magistério.
Nas premissas vigentes, pôde-se observar que a ênfase dos cursos parecia restringir-se,
quase sempre, à transmissão de informações teóricas aliadas a oficinas isoladas do contexto
de ensino – atos que apresentavam indícios de se dispersarem, após um tempo de retorno do
professor à solidão de sua sala de aula. Paradoxalmente, observou-se que, em muitos casos, as
ações de capacitação constituíram-se em aspectos limitadores para um maior avanço do
trabalho docente por não se processar de modo contínuo e acompanhado: elas apenas
informavam e, não raro, confundiam os professores, ainda sob o peso de estruturas mentais
sedimentadas
25
, fato que dificultava a introdução de mudanças nos padrões instituídos; o
processo de aprendizagem, ao exigir tempo e um acompanhamento em serviço para sua
sedimentação, acontecia desse modo, precariamente. (BAHIA, 1998, p. 91).
Sem dúvida, os indicadores de pesquisa do citado estudo levam a crer que o BM, ao
empenhar-se em promover políticas de formação de professores em tais circunstâncias e com
tais características, visava, antes de tudo, “[...] a priorizar a capacitação em serviço como mais
24
BAHIA. SEC/IAT. 1998 e 1999.
25
Este conceito será tratado mais adiante neste documento.
36
efetiva em termos de custo do que o investimento na formação inicial de professores”
(FASARELLA, 2004, p. 126). Visava a obtenção de maiores produtividades dos sistemas
educacionais dentro de uma concepção capitalista neoliberal no qual a educação é vista
apenas como instrumento de formação técnica com o objetivo de se obter sucesso na
formação do capital humano para que o país possa assumir seu papel no mercado mundial.
(FONSECA, M., 2001).
Evidenciou-se, portanto, que esses cursos aligeirados não vinham se constituindo
como estruturantes de uma nova concepção de homem e de mundo que, de algum modo já
desafiam a reestruturação do pensamento humano, da arte, da filosofia e das ciências.
(MIDLEJ, 2004a).
Ao concluir a segunda pesquisa (BAHIA, 1999), dentro de uma exigüidade de tempo
concedido pelos órgãos responsáveis para a elaboração do relatório final, constatei que dados
valiosos haviam ficado sem o devido aprofundamento, pelo motivo citado. Incontinenti, após
a entrega do último relatório técnico, decidi armazenar todo o material do estudo realizado no
último ano (1999) e aguardar um momento propício de explorá-lo mais detidamente num
Programa de pós-graduação, posteriormente.
No bojo dessa experiência passei a interessar-me mais pelo movimento da prática
reflexiva, do professor como prático reflexivo (SCHÖN, 1992) que dava indícios de ir se
tornando uma espécie de panacéia em todo o mundo, nos últimos anos da década de 1990.
Isto me provocou a realização de análises mais cuidadosas da literatura educacional nacional
produzida nessa direção (ANDRÉ, 1992; 1994a, b; DEMO, 1994a; LÜDKE, 1996) e
internacional (ALARCÃO, 1991; NÓVOA, 1992a, b; 1995a, b); pude vislumbrar que havia
uma argumentação em favor da combinação de pesquisa e da prática no trabalho e na
formação de professores, além de uma supervalorização da prática, uma excessiva ênfase da
experiência empírica, o que mais me instigava a pensar. Ao mesmo tempo, passei a ponderar,
37
de modo mais efetivo e direto, sobre a importância da validação da investigação sobre a
prática como um fator para possíveis movimentos de construção de uma formação docente de
melhor qualidade.
Com este propósito, antes de esboçar o novo projeto de pesquisa, analisei vários
outros trabalhos produzidos na década de 90 - de modo pontual na região nordestina
brasileira
26
- no sentido de aprofundar-me na temática de fortalecimento da profissionalidade
de professores das classes iniciais do ensino fundamental e contribuir para a elaboração de um
projeto de pesquisa nessa direção; assim, no final do ano de 2001 logrei aprovação na II turma
do curso de Pós-graduação em Educação oferecido pela Université du Quebec à Chicoutimi
(conveniada com a Universidade do Estado da Bahia – Campus VII, no município de Senhor
do Bonfim, na Bahia) e referencializei
27
este estudo numa amostragem aleatória e
significativa do material coletado na segunda pesquisa citada: outros questionamentos, novas
pautas, renovadas intenções delimitaram meu novo estudo; ao situar-me nesse contexto
indaguei-me, desde o início do processo, sobre o sentido histórico, social, político e técnico
do ato de pesquisar relacionado a uma atividade acadêmica. Pude ampliar minha percepção de
que possivelmente esta tarefa, ao se transformar em objeto da ciência, poderia dar margem à
produção cotidiana de conhecimentos que, se incorporados à escola, tenderiam a desvelar
substancialmente a situação educativa e, quiçá, ajudar a mobilizar mudanças no modelo
convencional de formação docente, sem dúvida um elemento de fundamental importância
para os professores. Assim, as finalidades deste estudo de mestrado encaminharam-se no
sentido de identificar que ações de formação docente poderiam funcionar como
potencializadoras de desenvolvimento pessoal e profissional e de renovação da práxis
26
BRASIL. MEC/BIRD. BASTOS, E. S. B; PORTELA, A. L. O (Des)Conhecido Universo da Sala de aula: Um
Estudo de Observação em Sala de Aula no Estado da Bahia. Brasília: Projeto Nordeste, 1998.
BARRETO, A. R. F. Professores de Ensino de 1º Grau: Quem São, Onde Estão e Quanto Ganham. In: Estudos
Em Avaliação Educacional.
São Paulo: Fundação Carlos Chagas, 1991.
27
Referencialização como a interrogação e a captação de movimentos e desdobramentos da realidade
antecedente em outros momentos, em tempos/espaços subseqüentes. (ARDOINO, J. BERGER, G. 1989).
38
pedagógica
28
de modo que a profissão pudesse ganhar maior credibilidade, dignidade e
prestígio. (MIDLEJ, 2004a).
Efetivamente, à medida que novos elementos foram emergindo da análise, estes me
proporcionaram oportunidades de reconhecer que o trabalho dos professores, nos contextos
específicos, não se reduzia a sua formação inicial ou continuada, mas deveria ser assunto
essencial a envolver a sociedade como um todo - e a vertente da educação de um modo
particular - não mais podendo continuar se restringindo a ações dispersas e pontuais. Nesse
contexto, havia a necessidade de levar em consideração os conhecimentos e as experiências
no exercício da docência, a autonomia pedagógica, a realidade em que o professor estava a
atuar como referenciais importantes na política de formação docente. E mais: que se fazia
premente prever tanto o aprendizado inicial para o exercício da profissão, bem como o
investimento maciço na sua atualização constante.
Os dados analisados reafirmaram que os Programas produzidos até a década de 1990
eram prioritariamente realizados sob o signo da transmissão de informações, de treinamento,
capacitação ou reciclagem, concepções que marcaram o ideário docente tornando difícil a
superação de práticas fragmentadas, descontextualizados e descontínuas de formação. Desse
modo, estas davam indicativos de contribuir apenas na promoção de certa atualização de
elementos metodológicos que permeavam o organismo escolar, não correspondendo às
exigências contemporâneas de formação de um profissional da educação num sentido crítico,
capaz de atuar como mediador de experiências de aprendizagem junto a seus alunos, de modo
autônomo. No decorrer do processo delineou-se mais: propositadamente, parecia haver uma
intencionalidade desse sistema em fazer executar currículos e programas moldados a priori
com uma acentuada fragmentação das disciplinas e das atividades oferecidas ao longo do
processo formativo; estes fatos acentuavam a ausência de articulação entre teoria e prática,
28
Inscrevo práxis pedagógica atrelada ao conceito marxiniano, como possibilidade de inter-relação criadora e
autocriadora. Aqui, essencialmente no sentido de o professor realizar um fazer criativo, transformador e realizar-
se como produtor da história.
39
entre o saber e o fazer, entre o ensino e a pesquisa, gerando dificuldades no processo
formativo e mantendo num estado de alienação um profissional que poderia estar
contribuindo muito mais para a ampliação dos níveis críticos e reflexivos da população mais
carente e excluída da sociedade.
Verifiquei que a ausência do respeito e da atenção efetivos à realidade do cenário
escolar, das idéias e concepções dos professores - como características desse modelo de
capacitação - estava a gerar um profissional despreparado para lidar com a heterogeneidade
das classes, a historicidade, a diversidade de estágios de desenvolvimento, a linguagem e os
saberes dos alunos e suas comunidades. Evidenciou-se, assim, uma realidade educacional,
formal, muito cruel: dificuldade ou até mesmo incapacidade destes em conciliar ou
aproximar-se de concepções que poderiam contribuir para a sua prática docente, falta de
material didático adequado para as funções, infra-estrutura precária nas escolas. Portanto, uma
ineficiência e perda de qualidade de trabalho inter-relacionada, também ao abandono
financeiro e institucional. Além disso, a falta do uso de resultados de pesquisa na
fundamentação, avaliação e/ou melhoria de tais Programas apresentou-se como um grave
coadjuvante - responsável por rupturas importantes na formação em foco e na má qualidade
do trabalho realizado. Tudo isso reforçado pela histórica inexistência de um plano de carreira
razoável e pela queda paulatina do salário-base desses profissionais. Destacou-se, assim, que
os recursos investidos resultaram em discretas mudanças na prática de sala de aula. (MIDLEJ,
2004a).
A visibilidade da docência - sem prazer, sem aprendizado real, porque sem significado
para a vida do aluno - apontaram para um trabalho com a marca da escola tradicional,
demonstrando que “[...] quem não estuda e experimenta, nem sempre tem aula para dar”
(DEMO, 2006).
40
A experiência de aprofundamento da pesquisa com o mestrado fez-me enxergar mais
densamente a gravidade da situação das políticas de formação de professores em vigência até
então, no Brasil. Estas, ao consumir recursos públicos valiosos, em quase nada estava a
modificar a situação das aulas ministradas. Tornaram-se, para mim, mais visíveis, alguns
aspectos de descaso com a educação, a necessidade de se repensar e reestruturar a formação
como um processo continuado concomitante com a atividade docente e a melhoria das
condições de trabalho dos profissionais da educação. Finalmente, evidenciou-se ser premente
a necessidade de romper a tradicional separação entre os que pensam e os que fazem, entre os
que planejam e os que executam as ações escolares. Transpareceu, ainda, o imperativo de
articulação do processo formativo com o projeto da escola, a valorização da experiência
profissional dos participantes vinculados a investimentos maciços em processos formativos
conectados ao ensino, à extensão e à pesquisa em instituições de nível superior. (MIDLEJ,
2004a).
1.1.2 Da trajetória profissional para renovadas definições
[...] Devemos visibilizar o que nos oprime na
sociedade para conseguir libertar. Esse foi o
legado que Paulo nos deixou - o legado da
esperança.
Moacir Gadotti, 2007.
Ao negar as políticas de formação de professores atreladas às prescrições autoritárias
em forma de teorias mágicas e soluções fragmentárias, este estudo orienta-se, portanto, por
uma visão prospectiva que não ignora as grandes mudanças que vêm ocorrendo na sociedade.
Assim, reconhece a ação crítica sobre a profissão docente, a vida das pessoas que se dedicam
a discutir e a programar a educação, a aprendizagem e a sua aplicabilidade à vida social, a
41
reflexividade
29
atrelada à socioepistemologia do pensar juntos
30
conforme a concebe o
biólogo Henri Atlan (1999).
Em tais aportes, a problemática inicial desta pesquisa foi revista e desdobrada
coletivamente em novas questões e estas compuseram e expressaram uma espiral de ciclos
nos quais a dinâmica dos processos foi pautando os elementos a serem incorporados,
descartados e/ou modificados em seus dados essenciais.
31
Ao propor este estudo em parceira com as professoras-alunas citadas parti dos
pressupostos de que:
a compreensão do contexto escolar parece ser imprescindível na formação e na
prática do professor; do mesmo modo, há indícios de que, em concomitância, as
teorias precisam estar em estreita vinculação à apreensão do trabalho docente e da
realidade pedagógica em foco;
a articulação do trabalho docente, a formação e a pesquisa parecem se desenvolver
melhor através do acionamento sistemático de ações de linguagem,
32
como
dispositivos, na explicitação de experiências do contexto escolar, intercâmbio de
conceitos, pontos de vista e problematizações, ampliando a compreensão da
realidade;
a interação entre as experiências vividas e a produção de conhecimento poderá
estabelecer conexões entre as necessidades formativas, o desenvolvimento pessoal
e profissional e a melhoria das práticas educativas.
29
Giddens e Beck (1997) pressupõem que a reflexividade é essencialmente cognitiva em sua natureza. Lash
(1997, p. 136-142), contudo, chama a atenção para a dimensão estética desse processo, anunciando-a envolvida
não apenas com a “arte elevada,” também com a cultura popular e a estética da vida cotidiana.
30
Tal concepção aparece eivada de diálogos com diferentes contextos de interesse formativo, de variados aportes
epistemológicos, de intercriticidade sobre a vida e o processo formativo. (ATLAN, H., 1999).
31
Tais processos serão explicitados nos subsídios epistemológicos e metodológicos deste relatório.
32
A compreensão da linguagem como prática discursiva e constitutiva de subjetividades será explorada nos
elementos teóricos deste relatório.
42
Conjecturei, ainda que, em havendo esta ampliação de possibilidades, os professores
se tornariam mais capazes de assumir a sua própria prática como uma força política
mobilizadora de capacidades de auto-regulação em situação profissional com probabilidades
de (re)construção de conhecimentos didáticos e pedagógicos em níveis mais elevados de
qualidade.
1.2 Os sentidos investigativos enunciados
A partir de um processo investigativo-em-ação e formativo
33
com base em ações de
linguagem e, estas, vinculadas aos ciclos sucessivos de práxis pedagógica - planejamento,
ação, observação/reflexão e replanejamento de situações pedagógicas - desenhou-se
coletivamente uma problemática de cunho híbrido (político e filosófico):
Quais as possibilidades de um processo formativo/investigativo, com tais
características, favorecer uma gradativa desfamiliarização com concepções e ações
pedagógicas monossêmicas e mecanicistas que muitos professores possuem da vida
e da ação pedagógica?
Em que medida este processo poderá acionar novas organizações discursivas que
permitam aos professores analisar criticamente sua própria condição
socioexistencial e suas práticas?
De que modo uma possível tomada de consciência crítica de si, em situação
profissional, aparece na organização dos discursos dos professores?
33
Estas três condutas de investigação, de ação e de formação mantêm entre si múltiplas relações as quais serão
exploradas no capítulo referente aos elementos epistemológicos e metodológicos deste estudo.
43
Como se realiza na escrita e como é verbalizada, em ações comunicativas, a
provável reconceitualização de saberes e a revisão de atitudes pessoais e
profissionais?
Assim, no entrelaçamento da conjuntura acadêmica e dos saberes e experiências das
professoras-alunas parceiras, dirigimos o foco deste estudo para a vivência de uma dinâmica
de formação e investigação acadêmicas baseada em situações e problemas de suas realidades
profissionais, tendo os seguintes objetivos gerais:
1.3 Objetivos
Averiguar como as ações de linguagem (SMYTH, 1992) acionadas na inter-relação
com a espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação (CARR E KEMMIS, 1988;
KEMMIS & MCTAGGART, 1988) poderão potencializar a tomada de consciência
acerca de si e do processo pedagógico, além de promover a desfamiliarização
crescente de concepções monossêmicas e mecanicistas que professores porventura
possuam da vida e da profissão;
Investigar como se realiza na escrita e como é verbalizada, em situações
comunicativas, a provável reconceitualização de saberes e a revisão de atitudes
pessoais e profissionais;
Aprofundar o conhecimento das possibilidades de acionamento de novas
organizações discursivas na análise crítica das práticas pedagógicas e as
probabilidades de (re)construí-las em níveis mais complexos.
44
1.4 Justificativas e possíveis contribuições
Justifico este estudo com a probabilidade de apresentar um contributo à produção
crítica do conhecimento científico voltado para a complexidade do processo de investigação e
formação docente e, este, com um foco em ações de linguagem inter-relacionadas à espiral
auto-reflexiva de conhecimento e ação. Justifico-o, também, na expectativa de que este
processo possa funcionar como possível potencializador de reflexão crítica
34
e gerar, com
isso, uma consciência profissional mais aberta aos aspectos educacionais éticos, estéticos e
políticos da ação docente e de uma provável ampliação da sensibilidade socioexistencial do
professor na sua condição de pessoa.
Tais justificativas e possíveis contribuições foram sendo acionados por mim, desde o
início do processo, a partir de meus universos de referência e até como fruto da insatisfação
com o já sabido acerca da profissão e da profissionalização docente.
1.5 Perspectivas da presente investigação-ação educacional
Se não se espera, não se encontrará o inesperado,
que é impenetrável e inacessível.
Heráclito de Éfeso, s/d.
A partir da abordagem crítica dos princípios da dialogicidade, reflexividade e
articulação de um amplo espectro de referenciais (FRÓES BURNHAM, 1993, p. 6) há a
expectativa de que esta ação híbrida possa ajudar os professores a serem “[...]
agentes/atores/produtores” (ARDOINO, 1998, p. 28) de sua própria formação. Assim, ele foi
articulado levando-se em conta:
34
Refletir criticamente sobre a própria vida e a prática pedagógica significa localizá-las em um contexto social e
político e confrontá-lo com um contexto de tradição. (KEMMIS, 1999).
45
a) a ação conjunta e produção mútua de conhecimento que se moveram nas relações
entre ciência e senso comum;
b) a criação de compromissos com a formação e a promoção de reelaboração das
concepções e saberes profissionais; de incremento de desfamiliarização de ações
rotineiras e possibilidades de reconstruções destas em níveis mais complexos;
c) a compreensão da linguagem como propiciadora da criação de contextos de análise
das práticas da e sobre a sala de aula, como espaço para a reflexão individual e
conjunta; como um meio no qual e pelo qual se constrói a intercompreensão entre
as participantes da ação;
d) a validade dos resultados de pesquisa serem acionados como conhecimento
educacional, como viabilizadores de práxis pedagógica e como fontes formativas,
criadoras de possibilidades emancipatórias na organização curricular de cursos de
formação para professores.
No contexto das citadas vertentes, vivenciei as expectativas de que a teoria ao servir
como referência à ação investigadora se revelasse como o nutriente dessa prática e estas, ao se
imbricarem, pudessem se realizar no sentido de promover atitudes de observação mais
acurada, de questionamentos, de reflexão sistemática e autônoma, de equacionamento de
problemas, tomadas de decisão requeridas pelo processo pedagógico e à avaliação de suas
conseqüências; e ainda: de que a aquisição de novos conceitos, conectada a um processo
reflexivo sistemático e intencional, tivesse condições de alimentar e redimensionar a
interpretação do cotidiano e possíveis espaços de tensão a serem (re)trabalhados.
Nesses sentidos, pressupunha de que a tomada de consciência crítica de ocasionais
contradições entre os padrões que as professoras-alunas elegeram como orientadores de seus
46
exercícios profissionais e seus desempenhos em aula suscitariam uma mudança desejável de
seus conceitos e de sua professoralidade.
35
A partir dessas teias de relações tais elementos serão expostos ao longo deste relatório
de pesquisa.
35
Professoralidade é como Pereira, M. V., (2001) denomina o processo de profissionalidade interligado à
profissão docente. Este conceito será retomado, no capítulo reservado à revisão de literatura, em suas minúcias.
47
2 REVISÃO DE LITERATURA
Assim como ensino e pesquisa se articulam em
vários sentidos, em outros, se diferenciam.
Assumir essas diferenças é essencial para que não
se gerem expectativas nem propósitos irreais ou
até equivocados.
Marli André, 2006.
2.1 Elementos do quadro teórico do estudo em questão
É pertinente começar este capítulo pela nomeação de elementos predominantes que
estão a permear este estudo e que aqui são tratados em suas minúcias. De caráter relativo,
parcial e provisório estes me ajudaram a distinguir entre o fundamental e o secundário, o
necessário e o fortuito como princípios epistemológicos que estruturam determinados
fenômenos. (FRIGOTTO, 1994, p. 80).
Desse modo, ao buscar apreender o caráter histórico-conceitual de algumas unidades
essenciais de análise buscarei complementá-las com noções pontuais de pesquisa,
investigação, investigação-ação educacional, reflexão, ação, formação e profissão (na
especificidade docente), profissionalização, profissionalidade e professoralidade, trabalho
docente, particularidades dos conhecimentos e saberes docentes experienciados e
ressignificados.
36
Tais conceitos aparecerão através das conexões com o desenvolvimento
pessoal e profissional e a complexidade da autonomia e da responsabilidade que envolve as
ações dos professores. Do mesmo modo, se faz presentes de modo substancial, em toda esta
trama dissertativa, a articulação de conceitos desenvolvidos por Ardoino
36
Ressignificado, aqui, compreendido como uma nova significação, construída a partir dos discursos existentes
no qual o sujeito construtor desses discursos passa a ser visto como sócio-histórico, que transforma e é
transformado pelo outro, pelo social e pela cultura. (LYNN, dissertação de Mestrado, 1998).
48
(multirrefencialidade), Bakhtin
37
(palavra, linguagem, dialogismo, interação, interlocutor,
atitude responsiva ativa, reelaboração dialógica, hibridização), Carr e Kemmis (espiral de
reflexão e ação), Freire (processo educacional dialógico-problematizador), Habermas (ação
comunicativa, emancipação, práxis, racionalidades técnica, prática e emancipatória),
Magalhães (sessões reflexivas), Morin (complexidade), Smyth (ações de linguagem) e
Vygotsky (funções psicológicas superiores, mediação, interações sociais, processo de
formação de conceitos e zonas proximais de desenvolvimento). Estas categorias emergiram
dos universos teóricos e da convergência de variados autores contemporâneos e estão citadas,
trabalhadas, ao longo deste documento. Nelas, prioritariamente, apoiou-se este estudo.
2.2 Pesquisa e investigação
Não cabe atribuir à pesquisa um poder que ela
não tem: o de ditar regras para a prática docente.
Marli André, 2006.
De acordo com o dicionário de etimologia de Bueno (1975), pesquisa é indagação,
rebusca científica, literária, investigação metódica. Investigação, por sua vez, significa
pesquisa, seguir os vestígios de, procurar esclarecimentos. Pesquisador e investigador,
respectivamente, significam pessoa que faz a pesquisa científica, literária, investigador,
indagador, analista de laboratório e indivíduo pesquisador, inquiridor, encarregado de recolher
esclarecimentos.
Segundo o dicionário de Ferreira (1986), pesquisa é o ato ou efeito de pesquisar,
indagação ou busca minuciosa para averiguação da realidade, investigação e estudo
sistemático, com o fim de descobrir e esclarecer fatos ou princípios relativos a um campo
37
É importante ressaltar que as citações feitas aqui estao sempre em nome de Bakhtin, embora se refiram à
produção de todo o círculo de estudiosos que com ele trabalharam no período pós-revolucionário russo, já que a
própria questão de autoria foi amplamente discutida por eles.
49
qualquer de conhecimento e pesquisador é aquele que faz pesquisa. Investigação é o ato ou
efeito de investigar, busca, pesquisa, indagação minuciosa e investigador é aquele que
investiga.
Tal elenco conceitual se apresenta de forma bastante similar. As nuanças, para as quais
se devem atentar se apresentam ligadas a critérios relacionados ao ato de averiguar: se
herdados das abordagens experimentais e positivistas, pesquisar ou investigar transforma-se
em ato demasiado restritivo, estático, proporciona uma forma de estudo meticuloso de um
objeto visando a aquisição de um dado conhecimento. Quando estes se apresentam pautados à
ação ganham uma nova dinâmica e pressupõem transformações. Nesse paralelo, ao relacionar
tais conceitos à educação, vê-se a existência de duas formas de averiguação, nas Ciências
Humanas, cujas atividades são diferenciadas. A ação requer, além da utilização de
procedimentos científicos, movimentos participantes e apreensões descritivas densas “[...]
com uma multiplicidade de estruturas conceituais complexas, muitas sobrepostas às outras”
(GEERTZ, 1989, p. 7) colocando em sinergia o posicionamento epistemológico do
investigador. Desse modo, a natureza dos dados deve contribuir para as intervenções na
realidade no sentido em que produzam transformações e a emancipação humana. De acordo
com Gohier (2004, p. 29) trata-se de passar “[...] dos critérios científicos para critérios de
ordem ética onde o que é tido em conta é a relação com o outro, o respeito do seu ponto de
vista, a sua inclusão no processo de investigação [...].”
Para Bokdan e Biklen (1994, p. 293, 297) “A investigação-acção é um tipo de
investigação aplicada no qual o investigador se envolve activamente na causa da investigação
e pode servir como estratégia organizativa para agregar as pessoas activamente [...].” E ainda
(Op. cit, p. 292) “[...] como uma atitude – uma perspectiva que as pessoas tomam face a
objetos e a atividades [...] com o objectivo de apresentar recomendações tendentes à
mudança.” Neste estudo encontro-me sintonizada com tais conceitos.
50
2.2.1 A origem da pesquisa-ação
O pesquisador francês, René Barbier (2002), encontrou em Dewey e no Movimento da
Escola Nova um primeiro tipo de pesquisa-ação; no entanto, reconhece que nos trabalhos de
Kurt Lewin (1946 - 1952), são localizados os primeiros passos da construção de uma nova
concepção de pesquisa que, sem desprezar a objetividade e a validade, “[...] supõe uma
conversão epistemológica, isto é uma mudança de atitude na postura acadêmica de pesquisar
em Ciências Humanas.” (p. 32).
Lewin, psicólogo social de origem alemã, naturalizado americano, ao utilizar dinâmica
de grupos buscava integrar as minorias, especialmente étnicas, ao estabelecer as bases para a
cientificidade das ciências sociais e humanas, a partir de um trabalho empírico. Assim,
embora com pequenas divergências, é de consenso entre os autores que a pesquisa-ação,
desde a sua origem, (1946-1952) é apresentada como uma crítica ao trabalho intelectual
clássico, como uma crítica à metodologia tradicional de pesquisa nas citadas ciências. Assim,
com diferentes enfoques, esta modalidade não se limita a utilizar um saber existente, “[...]
como no caso da pesquisa aplicada; procura antes uma mudança no contexto concreto e
estuda as condições e os resultados da experiência efetuada.” (THIOLLENT, 1996, p. 163).
É importante ressaltar que, na época, a grande alusão para os trabalhos de
investigação-ação era Thiollent (1996). Entretanto, os pesquisadores brasileiros a exemplo de
Grabauska (1999) e Grabauska e De Bastos (2001) destacam que a proposta lewiniana
incorporada por este autor não se revestia “[...] de um componente emancipatório, mais tarde
desenvolvido por outras vertentes da investigação-ação [...]” (2001, p. 9) e estas pautadas
numa teoria educativa crítica que institui processos de auto-reflexão (MARCUSE, 1964;
51
ADORNO, 1976; HABERMAS, 1989, 1990). Ambos consideram necessário superar as
visões técnica e prática de investigação-ação e romper com o que Grabauska (1999) chamou
de fantasma de Thiollent. Os estudos e as obras publicadas pelos citados estudiosos brasileiros
argumentam em favor de um aspecto de investigação-ação intimamente relacionado ao
materialismo histórico e à Escola de Frankfurt (principalmente por meio do conceito de
práxis) e nas contribuições de Habermas cujo paradigma teórico/prático se fundamenta na
linguagem, no discurso argumentativo. Eles atuam em defesa da idéia de que “[...] a
investigação deve permitir uma crítica radical dos aspectos políticos, sociais e culturais da
sociedade a fim de provocar uma mudança social.” (ANADON, 2006, p. 32).
Nessa direção, a concepção inicial de pesquisa-ação teve certa influência em seu
tempo, dentro de uma abordagem experimental no âmbito educativo, “[...] mas foi absorvida
pelos enfoques tradicionais que separam a investigação da ação pedagógica.” (ROSA, D.,
2003, p. 173). Ela ganhou diferentes inclusões teóricas, posteriormente expandidas em suas
possibilidades, ao envolver questões relacionadas ao currículo e às condições institucionais
(ANDRÉ, 1995a) em inúmeras tendências desenvolvidas nas últimas décadas, todas elas
mantendo “[...] em comum aquilo que caracteriza a expressão que é a preocupação com a
melhora da prática.” (PEREIRA, E. M., 2000, p.163).
Seus princípios, na educação, caracterizam-se por “[...] uma proposta metodológica e
técnica que oferece subsídios para organizar a pesquisa social sem os excessos da postura
convencional.” (THIOLLENT, 1996, p. 24). Ao analisar a produção lewiniana, entretanto,
pode-se asseverar que este modelo de investigação não abandona a validade e a objetividade
do conhecimento para as Ciências Sociais e Humanas (MARROW, 1972), mas não carrega
um componente emancipatório
38
no seu nascedouro, mais tarde desenvolvido por outras
vertentes da pesquisa educacional. No entanto, uma elaboração que permanece empregada até
38
Aqui, no sentido que lhe imprime Habermas (1990 b) - como uma atitude humana de busca de questionamento
e fundamentação argumentativa, de liberação da coerção, através da reflexão.
52
hoje, inclusive naqueles que se filiam a uma perspectiva emancipatória, é a espiral auto-
reflexiva oriunda da notória versão da espiral lewiniana, a qual abriga em si “[...] uma
seqüência de fases, cada uma das quais compõem ciclos sucessivos de planejamento, ação e
averiguação de fatos referentes ao resultado da ação.” (LEWIN, 1946, p. 22). (Tradução
minha).
Tal espiral, modificada por Carr e Kemmis (1988), também é constituída por ciclos de
planejamento, ação, observação e reflexão enriquece-se de um replanejamento das ações
docentes e alinha-se diretamente com os estudos desta última década sobre a formação do
professor crítico-reflexivo e as dimensões praxiológicas do ato pedagógico. A sua
operacionalização processa-se em seqüências espiraladas e estas envolvem desde o
esclarecimento de uma dada situação, ao planejamento inicial de estratégias, atos de
observação, compreensão, reflexão e, por fim, de um novo planejamento de ações - conforme
explicitado no quadro abaixo:
Aclarar e diagnosticar uma situação prática; (diagnósticos realizados no contexto escolar
visando organizar intervenções).
Formular estratégias de ação; (formulação e realização, individuais, de planos de ação didática).
Desenvolver estratégias e avaliar sua eficiência; (observação,
39
análise e desenvolvimento de
situações pedagógicas).
Ampliar a compreensão da nova situação; (ações de linguagem acerca da realidade do
planejamento e da prática: socialização dos registros, teorização da prática).
Proceder os mesmos passos para a nova situação prática; (produção dos mesmos passos para
novas conjunturas).
QUADRO 1: Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação. (CARR e KEMMIS, 1988; KEMMIS &
MCTAGGART, 1988).
A linguagem funcionou no cerne desse processo como um elemento mediador das
atividades sociais, tendo sido acionada a partir da citada espiral auto-reflexiva de
conhecimento e ação e imbricada numa dinâmica reflexiva, crítica; o inter-relacionamento das
ações lingüístico-discursivas com a concepção espiralada descrita acima foi tomado como
39
Tomo a concepção de observação conforme BENINCÁ et al (1998, p. 132-133) a utilizam: “A observação,
como elemento metodológico [...] como proposta para provocar o professor a investigar a sua própria prática de
modo intencional [...].”
53
referência para organizar as sessões reflexivas. (MAGALHAES, 2004). A operacionalização
deste processo deu-se acoplado às ações de linguagem propostas por Smyth (1992) e
ressignificadas, no Brasil, por estudiosas em pesquisas na área a exemplo de Celani (2002,
2004), Horikawa (2004), Liberali (1999, 2004) e Magalhães (2002, 2004). Este processo será
descrito, em suas minúcias, nos elementos epistemológicos e metodológicos deste documento.
2.2.2 A reatualização da pesquisa-ação e a investigação-ação educacional
A necessidade de utilizar a investigação como recurso didático já era, portanto,
discutida desde a década de 1930, mas foi o pedagogo inglês Lawrence Stenhouse um dos
precursores na defesa do professor como profissional capaz de pesquisar e produzir
conhecimentos: ele jogou luz sobre o tema, 30 anos mais tarde, num contexto intelectual e
cultural muito diferente do norte-americano dos anos 1940-1950 e defendia que o currículo,
sustentado por teorias educativas, proporcionaria desenvolvimento profissional desde que
fosse permitida a sua recriação, por parte dos professores, pelo confronto com os problemas
encontrados em classe. Assim, em sua proposta, Stenhouse parte de uma concepção de
currículo não como um projeto, mas como o que ocorre em sala de aula, como processo.
Sua produção se situa nas décadas de 1960 e 1970, modificando-se, estruturalmente, a
partir da década de 1980, quando se incorporam aos seus pressupostos a perspectiva dialética
e a assunção da finalidade de melhoria da prática educativa docente. Stenhouse (1991) foi
pioneiro em defender a capacidade de os professores se desenvolverem profissionalmente
com base na pesquisa: ele afirmava que o ensino mais eficaz é baseado em pesquisa e em
descoberta.
54
A pesquisa, a partir desse ponto de vista, integra, num mesmo processo, a produção da
teoria e a prática docente com a proposta de partir desta e a esta retornar, aprimorando-a.
Nesse sentido, o citado autor assevera que um o ato de ensinar requer do professor uma
atitude investigadora, crítica e sistemática, perante o seu próprio ensino. (STENHOUSE,
1991, p. 211). Este estudioso propôs a metáfora do professor como um artista que
experimenta estratégias de ensino, até encontrar a melhor forma de expressá-las,
ultrapassando níveis individuais de ação Sua sugestão é que o professor tome atitudes de
artista ao buscar constantemente aperfeiçoar sua atuação num sentido investigatório. Ao
tornar-se um artista ele “[...] será capaz de utilizar-se a si mesmo como um instrumento de sua
investigação.” (STENHOUSE, 1996, p. 38). Assim, ele reitera que “[...] o centro da
investigação e do desenvolvimento é o professor: só o próprio professor pode transformar o
professor.” (p. 155). Ainda para o citado autor (p. 41) lidar com o currículo, nessa direção,
exige do professor uma sensibilidade e capacidade de reflexão e investigação educativa como
“[...] uma indagação sistemática e planejada, uma autocrítica que se encontra submetida à
crítica pública e às jurisdições empíricas onde estas resultem adequadas.” (Traduções livres,
minhas).
Para Stenhouse, na essência dessas ações realizadas pelos docentes está o currículo.
Sua obra sobre o currículo An introduction to curriculum research and developement (1975)
aborda a essencialidade do papel do professor na constituição da teoria curricular, na reflexão,
em fóruns coletivos, das idéias educativas centrada em temáticas da vida diária, postas em
ação. Ao se colocar contra a racionalidade técnica em todas as áreas da vida social e, em
especial na organização do planejamento curricular, ele deu a sua contribuição para que tal
prática se fizesse na inter-relação entre ensino e pesquisa. Nesta, ele defende que o currículo
deve ser redimensionado por teorias educativas a fim de proporcionar o desenvolvimento
profissional. Com uma ressalva: desde que fosse permitida a sua recriação pelos professores,
55
através do confronto com os problemas enfrentados em suas classes. Esta é a versão inglesa
do professor reflexivo, dos professores como pesquisadores, na qual houve um acoplamento
de uma intencionalidade prática ao processo formativo por meio do reconhecimento da
dimensão política da educação e da investigação educacional. (BARBIER, 2002; MION,
2001).
Fez-se fundamental, para tal enfoque anglo-saxônico, os trabalhos desenvolvidos pelo
Centro de Pesquisa Aplicada à Educação, o Centre for Applied Research in Education
40
em
East Anglia, na Inglaterra (CARE). Fundado por Stenhouse em 1970 junto com um grupo de
colegas, de 1972 a 1975, ele desenvolveu, a partir do CARE, projetos com escolas
envolvendo pesquisadores internos (professores da educação básica) e pesquisadores
externos (professores universitários). Até hoje este Centro tem como foco a necessidade de
desenvolver nos docentes da Educação Básica a consciência de que a investigação,
potencializada pela mútua colaboração entre pesquisadores acadêmicos e docentes -
desenvolvida na prática - auxilia o professor a modificar suas práticas a partir de suas próprias
reflexões, a criar seus próprios currículos escolares, suas próprias estratégias pedagógicas de
acordo com seus contextos.
Seu colega John Elliott acompanhava-o diretamente e, juntamente com Clem Adelman
(ambos sociólogos britânicos), propunham a investigação-ação como uma espiral reflexiva, na
perspectiva de exame das teorias implícitas nas práticas. Elliott (1990, p. 37) reforçou a
necessidade e a participação dos professores enfatizando a importância de uma pesquisa
educativa que considerasse “[...] os professores e os alunos como participantes ativos no
processo de investigação.”
40
Centre for Applied Research in Education, na Universidade de East Anglia, na cidade britânica de Norwich.
Os principais objetivos do CARE eram compreender os problemas da prática docente, sem perder de vista a idéia
do professor como pesquisador; também democratizar a pesquisa em Educação. No ano de 1975 escreveu An
Introduction to Curriculum Research and Development (Uma Introdução à Pesquisa e ao Desenvolvimento
Curricular), sua obra mais conhecida.
56
Stenhouse, ao morrer precocemente, teve em ambos, defensores e continuadores de
suas idéias. Especialmente Elliott (1993, 2000) utilizou-se dos princípios da pesquisa-ação
(action research) estabelecidos, nos EUA, pelo psicólogo prussiano Kurt Lewin (1946) para
caracterizar uma nova forma de pesquisar: a vivência de situações de diálogo, o caráter
investigativo diagnóstico, partilhado, o impulso democrático e a contribuição à mudança
social, de modo a facilitar a identificação e o trabalho dos eixos estruturantes de cada situação de
ensino amparados na criticidade.
Na década de 80, Donald Schön (1992, 2000), com base na teoria de John Dewey,
propôs, em sua tese de doutorado, a formação de profissionais reflexivos, produtores de
saberes acerca de sua prática. Seus estudos reavivaram muitas críticas à racionalidade técnica
embora a grande repercussão havida a partir nas propostas de reflexividade em tal processo
formativo. Sua perspectiva epistemológica concebe a prática profissional como um contexto
de aplicação de uma teoria e de uma técnica estudadas anteriormente.
Nos EUA, Zeichner (1998) - da Universidade de Winsconsin-Madison - sugere que a
investigação precisa centrar-se na prática contextualizada e refletida como prática social. Este
autor aponta para o estreitamento da reflexão proposta por Schön como um processo solitário
- sem considerar a dimensão contextual à qual as atividades docentes estão relacionadas.
Zeichner (1998) relaciona o desenvolvimento profissional do professor com a luta por justiça
social e reivindica a perspectiva do trabalho docente em práticas históricas concretas, num
movimento da prática para a condição de práxis com mais possibilidades de transformação.
Desse modo, no final dos anos 1980 e, no decorrer da década de 1990, o movimento
da pesquisa relacionada à reflexão encaminhou-se em múltiplas direções, através de
estudiosos ligados à denominada racionalidade prática. Em Portugal António Nóvoa (1992a,
b) e Isabel Alarcão (1996a e b), pesquisaram, discutiram em eventos e publicaram obras sobre
tais princípios. Foram seguidos na Espanha por Pérez Gómez (1992a) e Imbernón (2001).
57
Sob as citadas premissas o conceito da pesquisa-ação de Kurt Lewin (1946-1952)
ganhou diferentes inclusões teóricas, posteriormente ampliadas em suas possibilidades ao
envolver questões relacionadas ao currículo e inter-relacionadas com as condições
institucionais e sociais (ANDRÉ, 1994a e b; 1995a, b). Por exemplo, Wilfred Carr e Stephen
Kemmis (1988) - relacionados à vertente pesquisadora australiana e fundamentados na teoria
crítica da Escola de Frankfurt - desenvolveram os referenciais lewinianos para um enfoque
emancipatório na direção do marxismo e, de algum modo, do processo dialógico-
problematizador freiriano. Para estes, a formação e o trabalho docente deveriam se pautar
numa perspectiva dialética e emancipatória a serem empreendidos de modos individuais e em
práticas concretas e coletivas.
Nesse sentido, Carr e Kemmis (p. 202) asseveram: “[...] a investigação-ação é
essencialmente participativa; é colaborativa quando grupos de participantes trabalham
conjuntamente no estudo de sua própria práxis individual e quando estudam as interações
sociais entre elas [...]” (Tradução livre, minha).
2.2.3 Investigação-ação: contextualização histórica no Brasil
A literatura educacional aponta que, de um modo geral, as pesquisas com ênfase no
ensino e nos professores, no Brasil, foram pouco desenvolvidas até a década de 1950; com o
conteúdo visto como o centro do processo, não se abria espaço para a investigação da figura
dos protagonistas da ação pedagógica; a partir da década de 1960 e, no decorrer dos anos 70,
este campo se ampliou, embora com a predominância, ainda, de estudos de cunho quantitativo
na avaliação da eficácia do ensino. Estes abordavam “[...] as relações entre a medida dos
comportamentos dos professores em classe (os processos) e a aprendizagem dos alunos (os
58
produtos).” (GAUTHIER, 1998, p. 147). Tal enfoque, ao não avaliar as relações entre a
pesquisa e as ações mais complexas relativas ao fenômeno educativo, representou uma visão
simplificadora e unidimensional da formação e prática docentes numa predominância da
racionalidade técnica.
41
O questionamento da supervalorização da experiência empírica e
acrítica, no campo educacional, relaciona-se ao fato de, ao se esgotar o repertório teórico, os
meios e procedimentos construídos como referenciais, o profissional comumente fica sem
saber como lidar com a situação pedagógica.
A chegada dos anos 60, assim, encontrou Paulo Freire com todo o delineamento de um
pensamento político-pedagógico dialógico e libertador, sintonizado com atitudes indicativas
da autonomia e de influência mútua entre os professores e os alunos. Em sua ação havia um
rompimento com visões tradicionais da docência como uma atividade meramente
instrumental.
Nesse processo, o Movimento de Cultura Popular (MCP), o Serviço de Extensão
Cultural (SECR), da Universidade do Recife, a experiência de Angicos
42
e o Programa
Nacional de Alfabetização, do Ministério da Educação (MEC) constituíram-se em campos de
exercício da criatividade e das práticas pedagógicas freireanas, as quais defendiam a
mediação
43
do diálogo como atividade central da aula em oposição à instrução - a denominada
educação dialógico-problematizadora em oposição à educação bancária - através da
organização de temas geradores, como aqueles que se desdobram em outros temas num
desafio à compreensão da realidade. Suas idéias e práticas começaram a se tornar objetos de
41
A racionalidade técnica, como uma epistemologia da prática, deriva da filosofia positivista e pauta-se na
separação entre a teoria e a prática.
42
A experiência de Angicos, cidadezinha localizada no sertão do Rio Grande do Norte, no Brasil, foi
desenvolvida entre janeiro e março de 1963, e constituiu-se no mais expressivo esforço de alfabetização,
concretizado nesse país, empregando-se o seu famoso método de alfabetização de adultos. Esta provocou
polêmicas e deu visibilidade às possibilidades pedagógicas e políticas do método Paulo Freire e acirrou os
temores dos conservadores. (LYRA, 1996).
43
A mediação é compreendida, nesta investigação-ação, como sendo a introdução de uma ferramenta conceptual
(um terceiro elemento numa relação) no sentido de fazer avançar as funções psicológicas superiores
proporcionando condições para que essa relação deixe de ser direta, transformando-se, em presença deste
elemento (VYGOTSKY, 1991).
59
novas reflexões, também acerca da atuação docente com centralidade no diálogo; o método
abria renovadas possibilidades pedagógicas e políticas educacionais o que provocou temores
naqueles que deflagraram o golpe de estado no nosso país em 1964. A ameaça que significava
sua teoria da ação na área educacional levou-o à prisão e, em seguida, ao exílio por 16 anos. A
ditadura instalada no país durou 20 anos e entre outras tantas conseqüências nefastas –
censura à imprensa, perseguições políticas, prisões e torturas – houve danos irreparáveis à
área da Educação.
Desse modo, a vertente latino-americana, desenvolvida em concomitância com os
citados movimentos, foi marcada substancialmente pelas idéias de Paulo Freire (1981, 1983a,
b, c., 1993, 1996, 2000). Em nosso contexto, apenas no final dos anos 1980 e, em especial, no
decorrer dos anos 90 houve uma divulgação e um incremento nos conteúdos e na bibliografia
dos cursos de formação docente em direção do professor como investigador. Com tais
desdobramentos ganhou força o movimento que questionava o paradigma tradicional de
pesquisa educacional, também no nosso país. As influências de tais pressupostos se fizeram
presentes em estudos e publicações, a exemplo de André (1994b) que discute a perspectiva
didática da pesquisa na articulação entre o saber e a prática docente; Demo (1994c) que
defende a pesquisa como princípio científico e educativo; Garrido (2000) que, em sua tese de
livre docência, mostra possibilidades de pesquisa conjunta entre as universidades e as escolas
públicas; Fiorentini, Geraldi e Pereira (2000) os quais ressaltam a relevância de a pesquisa
educacional ser realizada por professores e esta se tornando constitutiva das próprias
atividades docentes; Lüdke (1993; 1996; 1997; 2000a, b, c; 2001a, b, c) que argumenta em
favor da inter-relação da pesquisa e da prática no trabalho na formação docente; Passos
(1997) que, em sua tese de doutorado, revela possibilidades de pesquisa em colaboração. De
um modo geral, os citados estudiosos brasileiros recomendam que a formação docente seja
realizada, no cerne de um processo de compartilhamento de pontos de vista, por professores e
60
pesquisadores acadêmicos, o que implica num aprender a fazer ciência educacional na
exploração dos entendimentos do trabalho docente cotidiano na escola.
Muito embora estes estudiosos ressaltem pontos diferentes suas proposições possuem
raízes comuns: defendem o impulso democrático e o caráter crítico-colaborativo da pesquisa
como princípio científico e educativo, atribuindo ao professor um papel ativo nesse processo.
A pesquisa, para estes, ao se constituir como parte integrante do trabalho docente e da ação
formativa deve ser realizada a partir da própria prática integrada a uma investigação-ação
educacional crítica, emancipatória e, sempre que possível, de modo colaborativo.
A partir destes princípios, eles advogam que as práticas não devem ser apenas lócus de
aplicação de um conhecimento científico e pedagógico apriorístico, mas espaço de
planejamento e produção de cenas pedagógicas que demandem articulações curriculares e
atos de identificação, análise e experimentação reflexiva sobre a ação. Esse processo abriga
uma concepção de que o conhecimento técnico comporta uma racionalidade técnica e o
conhecimento prático, em si, detém uma racionalidade prática. (HABERMAS, 1987a, b).
2.3 Abordagens emancipatórias: renovados aportes conceituais
Vê-se que, de um modo geral, muitas distinções podem ser feitas entre as abordagens
de pesquisa-ação existentes. Neste estudo, ao tomar como referência os canadenses Wilfred
Carr e Stephen Kemmis (1988) situam-se, aqui, alguns aspectos gerais que nos permitem
apreender os desdobramentos da pesquisa-ação no campo da educação desde as contribuições
do grupo inglês. Nessa perspectiva, vinculada a Habermas, os citados autores (1988, p. 142-
143), ao formularem sua concepção de pesquisa na educação, “reexaminam os postulados de
Kurt Lewin, dando-lhes um novo sentido. (BARBIER, 2002, p 58). Este autor (p. 59) afirma:
61
“Eles utilizam a noção de práxis de Jürgen Habermas [...] uma ação alicerçada numa teoria e
associada a uma estratégia.”
44
Assim, ao conceber a prática pedagógica como práxis social,
Carr e Kemmis demonstram que “[...] no processo do trabalho pedagógico os saberes tornam-
se relativos, mutáveis e assumem valores ético-políticos [...] na forma como se estabelece a
relação entre teoria-prática.” (FIORENTINI; SOUZA JR.; ALVES MELO, 2000, p.326).
Nessa direção, Carr e Kemmis (1988) defendem que a teoria educativa, para se fazer
emancipatória, deve estar atrelada a cinco exigências:
a) abdicar das noções positivistas de racionalidade, de objetividade e de verdade;
b) acolher a possibilidade de empregar as categorias interpretativas dos docentes;
c) achar meios para distinguir as interpretações que estão ideologicamente distorcidas
das que não estão, no sentido de proporcionar, também alguma orientação sobre
como superar os auto-entendimentos distorcidos;
d) identificar aspectos da ordem social existente que frustram a obtenção dos fins
racionais, na direção de oferecer explicações teóricas mediante as quais os docentes
vejam como eliminar ou superar tais aspectos;
e) reconhecer que a teoria educativa é prática no sentido de que a questão de sua
consideração educacional seja determinada pelo modo como se relaciona com a
prática.
Assim, na sintonia com Carr (1989) manifesto a preocupação de que a investigação-
ação se componha claramente como concepção, e não, apenas, como uma modalidade de
pesquisa, destacando o autoconhecimento reflexivamente adquirido como categoria
epistemológica; vou adiante ao concordar com o autor citado e apontar as potencialidades da
investigação-ação, além de mostrar seus limites, se ela for pensada dentro da racionalidade
positivista: neste sentido, Carr (1989) adverte que ela pode não ultrapassar o mero ativismo, o
44
De acordo com Habermas, a práxis social, tal como a entendia Marx, incluía tanto o “trabalho” como a
“interação” ou “ação comunicativa”, mas Marx tinha a tendência de reduzir “a práxis social a um de seus
momentos, ou seja, o trabalho.” (BOTTOMORE, T., 1988, p. 292 - 295).
62
que a reduz. Se, no entanto, for desenvolvida num contexto histórico determinado, tende a
aportar na racionalidade emancipatória, o que interessa a este estudo, particularmente.
Retomada e redirecionada, a pesquisa-ação apresenta-se, portanto, como um meio através do
qual os professores são capazes de compreender e desenvolver seus valores educativos
mediante uma reflexão sistemática sobre sua prática em aula. (ROSA. D, 2003).
Ao escapar da adaptação das minorias à sociedade, pretendida por Lewin (1946), a
pesquisa-ação começa a sair do âmbito das Ciências Sociais e a adquirir uma intencionalidade
claramente emancipatória vinculada aos pressupostos da pesquisa-ação, nos meios
educacionais, conectando-se à imagem do professor como investigador que, dialeticamente,
deve relacionar o teórico e o prático. E isto se realizou via o reconhecimento da dimensão
política da educação e da investigação educacional.
A partir daí, influenciada pelos citados estudiosos, a pesquisa-ação se apresenta
vinculada a uma vertente crítico-emancipatória, na área educacional, com um caráter
diagnóstico ao centrar-se inicialmente mais na imagem do docente e ancorar-se na vivência da
espiral auto-reflexiva ressignificada. Com eles ganhou força o movimento que questionava o
paradigma tradicional de pesquisa na educação e a complexa
45
relação entre o processo
formativo docente e a pesquisa educacional surgida como um elemento essencial na
apreensão da realidade profissional do professor.
Na atualidade,
46
delineiam-se mais algumas concepções que distanciam a pesquisa-
ação do classicismo das Ciências Sociais já descritos. Dentre outras, internacionalmente, há
duas novas releituras vinculadas à abordagem francesa e à canadense: a teoria da
complexidade de Edgar Morin (1997a, 2000b) e o viés sistêmico que, ao seu modo, René
45
Complexo, do latim plecto, plexi, complector, plexus. – trançado, enroscado, mas também cingido, enlaçado,
envolvido, apreendido, articulado (ARDOINO, J., 2002, p. 548).
46
Cada atualidade reúne movimentos de origem e de ritmo diferentes: o tempo de hoje data simultaneamente de
ontem, de anteontem, de outrora [...] o presente e o passado esclarecem-se mutuamente, com uma luz recíproca.
(BRAUDEL, 1989, p. 18-21).
63
Barbier (2002) lhe afere; também a teoria da ação comunicativa de Habermas, trazida por
Carr e Kemmis a este âmbito.
2.4 A escola, a pesquisa e a crise paradigmática
47
Estamos desarmados para a compreensão das
realidades complexas porque nossa educação
ensinou-nos a fragmentar a realidade, ver os
fenômenos isolados, fraturar e separar as coisas.
Edgar Morin, 1996.
Ainda distanciada da realidade e das coisas do mundo, a instituição escolar convive
com uma concepção de currículo pautada na uniformidade, na homogeneização e suas
diretrizes básicas acontecem no a priori; desse modo, segue a promover seres individualistas,
egocêntricos e com escassez de ética e solidariedade em sua formação, sem uma ampla
compreensão do universo como uma teia de relações evolutivas. Assim, a racionalidade
técnica, referendada pela visão de mundo cartesiana
48
vem, há muito, direcionando a
educação a retalhar a visão da realidade numa produção de currículo como um documento
burocrático no qual se organizam áreas, disciplinas, métodos, atividades educacionais. Há,
sem dúvida, um celeiro de tensões entre perspectivas conservadoras e emancipatórias sendo
que este fato leva essa instituição a conviver com um grandioso desafio que é estar, ainda,
atrelada como afirma Macedo (2007, p. 18) “[...] a um habitus sociopedagógico que dá
preferência ao modelo, à coisa e ao sistema pré-montado em detrimento das pessoas, suas
47
Paradigma - do grego, parádeigma, modelo, exemplo. Refere-se a uma constelação de convicções, modelos,
padrões, valores e conceitos que caracterizam uma determinada maneira de enxergar, perceber o mundo e
interagir com ele, partilhados pelos membros de uma comunidade científica. (ASSMAN,1999, p. 169;
MORAES, 2003, p. 142).
48
Representados pela clássica concepção mecanicista de mundo cartesiano-newtoniana racionalmente explicável
em suas leis naturais e imutáveis Descartes, (1596-1650), é considerado o pai do racionalismo moderno; Isaac
Newton (1642-1727) complementou o pensamento de Descartes e sua teoria foi considerada como o ponto
culminante da revolução científica moderna. (COELHO, 2000, p. 19).
64
demandas formativas, referências culturais e históricas” e encontrar-se inserida numa
sociedade que escapa a quaisquer tentativas de organização linear, em rápida transformação,
numa renovada etapa de desenvolvimento intelectual, científico, político e social.
Morin (2002a, p.10, 11) ao expor sua expectativa sobre essa problemática, aponta
caminhos: “É de se esperar que as transformações que começaram a arruinar a concepção
clássica da ciência vão continuar em verdadeira metamorfose [...] a ciência deve reatar com a
reflexão filosófica [...] com a consciência política e ética”.
Há um movimento que indica a necessidade de reatamentos, revisão de valores
humanos, de reforma das estruturas de pensamento, de formação de pessoas mais interativas,
autônomas, cooperativas, capazes de criar e ampliar conceitos em renovadas bases, construir e
reconstruir teorias e confrontá-las com a realidade, na geração de ambientes dialógicos,
polifônicos, de produção de conhecimentos mais valorativos, significativos, complexos e
rizomáticos.
49
Moraes (2003, p. 142) entra nesse diálogo; ao ampliar argumentações, reforça:
A visão sistêmica, complexa e transdisciplinar dos fenômenos, eventos e processos,
que caracteriza o quadro epistêmico atual, sinalizam que um novo paradigma está se
consolidando e uma nova maneira de pensar e compreender a realidade está
surgindo no horizonte.
Por sua vez, o cientista sistêmico Ervin Laszlo (1997) reafirma que estamos a viver
num momento de bifurcação em relação ao processo evolutivo da humanidade, onde ocorrem
aceleradas, grandiosas e surpreendentes transformações. Compreendo que, ao se estar no bojo
de um tempo grave de transição entre paradigmas tradicionais e paradigmas emergentes
50
vive-se uma necessidade premente de sintonização mais acurada de nossos pensamentos e
ações a uma nova concepção de vida – justamente a que vem sendo gestada nas atuais teorias
49
O processo de produção do conhecimento escolar imaginado como rizoma é criativo e envolve associações,
interconexões e multiplicidades que não possuem sujeito nem objeto. (DELEUZE e GUATTARI, 1995, p. 16).
50
Representado pela concepção sistêmica einsteiniana cuja realidade complexa (dissipativa, relacional) detém
uma ordem dinâmica- variáveis no tempo e no espaço e, portanto, não fixista. (ASSMAN, 1999, p.153).
65
da matéria no decorrer das duas últimas décadas do século XX e no curso destes novos século
e milênio.
Vêem-se necessidades de investimentos nas multiplicidades nascidas da não-
linearidade, mapeando outras formas de diálogo na diferença, nas interconexões, realizando
diferentes configurações. Em tais premissas, o essencial parece não ser mais a experiência
acumulada, a erudição, mas a adesão ao movimento, o que quer dizer passar do mundo das
pretensas certezas de ontem para o mundo das incertezas de hoje, constituído por uma abissal
trama de relações e integrações que atuam nos fundamentos de nosso viver, transcendendo as
atuais fronteiras disciplinares e conceituais, “algo que como um complexo contenha a
singularidade e se constitua no e com o plural.” (MACEDO, 2007, p. 56). Tais referências
estão intrinsecamente ligadas ao paradigma da complexidade que requer um pensamento
dialógico, recursivo e multidimensional onde ligar e problematizar caminham juntos.
(MORIN, 2002b). A teoria da complexidade diverge das correntes de pensamento que
acreditam que o conhecimento ocorre de forma linear e previsível. “Opondo-se aos
mecanismos reducionistas e simplificadores, considera as influências recebidas do ambiente
interno e externo, enfrenta a incerteza e a contradição e convive com a solidariedade entre os
fenômenos existentes.” (MORIN e MOIGNE, 2000b, p. 132-133). Exemplificando este
pensamento, Prigogine (1996) descreve que, no mundo quântico, todas as partículas estão
interligadas de forma tal que a alteração em qualquer uma delas determina algum tipo de
mudança em todas as outras; elas atuam em interação, ou, em termos matemáticos, como
sistemas integráveis.
Saber que somos processo e produto dessas relações, no interior de um pensamento
que possui, também, uma dimensão ecossistêmica, relacional e transdisciplinar
51
, é a nova
consciência mobilizadora a ser conquistada em todos os âmbitos desse universo; de ações
51
Transdisciplinar refere-se ao reconhecimento da existência de diferentes níveis de realidade, regidos por
lógicas diversas. (MACEDO, 2007).
66
atreladas a essa compreensão mais ampla da realidade parece depender, principalmente, a
sobrevivência da humanidade. (CAPRA, 1991; COELHO, 2000; LASZLO, 1997; MORAES,
1997; 2003; MORIN, 1997a, b; 2000; 2002a, b).
Por ora, vive-se e convive-se com base nos valores da Era Industrial, modelo que já se
encontra esgotado em suas possibilidades humanísticas. Assim, a escola, inserida nessa
sociedade como uma das mais fortes instituições responsáveis pela sistematização do saber
acumulado e pela preparação de seres humanos para a vida social, padece de uma
inadequação crônica frente às necessidades contemporâneas: ao estar centrada, ainda, na
figura do professor-autoridade que ensina e, no aluno que aprende, mantém, de certo modo,
um currículo predeterminado. Esta instituição permanece com a função de reprodutora dos
conteúdos culturais, incentivadora de um espírito competitivo; de um modo geral, ainda não
se encontra voltada para a organização de um ambiente de trabalho formativo-criativo como
acontecimento poemático-pedagógico
52
inter-relacionado e permanente.
Com base no modelo exposto, a escola parece ainda não ter condições de cumprir seu
papel de incentivar e fortalecer o potencial valorativo humano, ao persistir “com projetos e
programas desarticulados, conflituosos, que geram desperdício, ineficácia e desigualdade de
oportunidades.” (MORAES, 1997, p.13). Continua atrelada a um modelo de ciência associado
às várias correntes de pensamento presentes na cultura ocidental “cujas idéias e respectivos
sistemas éticos foram sendo formulados a partir dos séculos XVI, XVII, XVIIII e XIX,
durante a Revolução Científica, o Iluminismo e a Revolução Industrial.” (MORAES, 2003, p.
144). De algum modo, isso transparece subjacente à atuação dos professores e segue
influenciando fortemente uma prática pedagógica onde o aluno continua como mero
espectador ou repetidor de fórmulas prontas numa sociedade que lhe exige potenciação de um
agir criativo.
52
Expressão criada pelo Professor Doutor Dante Galeffi. Trata-se de um campo do fazer inventivo que se resolve
poeticamente, antes de resolver-se logicamente [...] onde o importante é um fazer-aprender a pensar de modo
inventivo, num filosofar rigoroso, nunca exato, nem rígido. (GALEFFI, 2001, p. 274, 275).
67
Há, como agravante neste paradigma, um baixo nível de exigência de escolarização da
categoria docente, fato que vem gerando e ampliando uma crescente desqualificação dos
profissionais da área. Por exemplo, o economista Gustavo Iosche (2008, p. 100, 101)
posiciona-se contrariamente à decisão do MEC em fechar cursos de Pedagogia que tenham
obtido baixa avaliação institucional, argumentando que “quando um aluno se matricula em
um curso barato [...] ele não está atrás de uma posição de presidente de empresa ou de
eminência intelectual: ele quer subir um pouco na vida, ganhar um pouco mais [...] se o aluno
não está em universidade melhor é sinal de que não tem condições intelectuais ou financeiras
de chegar lá [...]” E questiona, dentro desta visão: “É melhor que ele curse a faculdade da
esquina ou faculdade nenhuma?”
Há, ainda, a inexistência de um plano de carreira atrelado a salários dignos, o que
exige desses profissionais, já desmotivados, um esforço extra para garantir sua sobrevivência
pessoal e familiar além de manter-se informado e motivado para o exercício docente. Tais
problemas persistem há muitas décadas e esses fenômenos vêm ocorrendo de modo
interconectado o que torna o magistério uma área de pouco prestígio no mercado de trabalho.
2.5 Políticas públicas educacionais e o trabalho docente
A educação precisa ser refundada. As crianças
não gostam de ir para a escola e os professores
também não. [...] O professor desanima, o aluno
desanima, estuda pouco, trabalha pouco e esse
ambiente acaba deteriorando as relações sociais
humanas e, conseqüentemente, o ensino [...].
Moacir Gadotti, 2007
Aqueles que se encontram ligados às práticas escolares contemporâneas brasileiras
vivenciam com clareza o que a sociedade passou a reconhecer como a crise da educação. O
68
indício mais evidente dessa problemática é que boa parte da população de crianças que
ingressam na instituição escolar, especialmente a pública, não consegue concluir bem sua
jornada de oito anos mínimos e obrigatórios; um considerável número de pessoas, oriundas
desta, parece ter uma história de insucesso ou inadequação para relatar. Convencionou-se
denominar este processo de fracasso escolar. Nessa perspectiva, o sistema educacional
brasileiro amarga índices de retenção e evasão escolar semelhantes aos de países africanos
como a Nigéria e o Sudão, constituindo-se como um contra-senso o fato de que em questões
econômicas o Brasil possa ser comparado aos países europeus ou asiáticos e no quesito
educacional seja alocado no mesmo patamar de países castigados da África Subsaariana.
Nessa direção, dados do Programa Internacional para Avaliação de Alunos (PISA)
53
demonstram a vergonhosa posição ocupada, pelo Brasil, no ranking internacional.
54
Não se
têm dúvidas de que o nosso país carece melhorar a escolarização de seus habitantes e,
caminhar nessa direção, significa, dentre outras questões, investir na distribuição de renda e
elevação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Segundo o último estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE) direcionado para o setor, o Education at a Glance 2007, o Brasil é um
53
O PISA é um programa internacional de avaliação comparada, cuja principal finalidade é produzir indicadores
sobre a efetividade dos sistemas educacionais, avaliando o desempenho de alunos na faixa dos 15 anos, idade em
que se pressupõe o término da escolaridade básica obrigatória na maioria dos países. Esse programa é
desenvolvido e coordenado internacionalmente pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), havendo, nos 41 países participantes, uma coordenação nacional. No Brasil, o PISA é
coordenado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. As provas
incluem cadernos de questões e acontecem a cada três anos, com ênfases distintas em três áreas: Leitura,
Matemática e Ciências enfatizando não apenas o conteúdo em si, mas a capacidade de relacioná-lo e aplicá-lo na
prática. Em cada edição, o foco recai principalmente sobre uma dessas áreas. Em 2000, o foco deu-se na Leitura:
em 2003, foi a Matemática; em 2006, a ênfase foi em Ciências. A Prova foi aplicada a 400 mil estudantes.
In:<http://www.inep.gov.br/internacional/pisa/Novo/oquee.htm
> -
<http://www.inep.gov.br/download/internacional/pisa/result_pisa2003_resum_tec.pdf> Acesso em 05/12/2007
54
Os resultados do PISA 2006 mostram que a educação brasileira ainda tem muito a melhorar. Os dados revelam
que os jovens brasileiros de escolas públicas e particulares ficaram na 52ª posição entre 57 países e territórios,
com nota média de 390 pontos, na escala até 800. Com o sexto pior resultado, o Brasil está ficando lado a lado
com Catar, Quirguistão e Azerbaijão: piorou em Leitura e melhorou em Matemática, em comparação a 2003
(passou de 356 pontos, em 2003, para 370 pontos, em 2006). Já em Leitura, a nota caiu 10 pontos, passando de
403, em 2003, para 393, em 2006. Em Ciências manteve a média de 2003: 390, na escala até 800. A pesquisa
Pisa é liderada pela Finlândia. O grupo dos dez países melhor posicionados é completado por Hong Kong,
Canadá, Taiwan, Estônia, Japão, Nova Zelândia, Austrália, Holanda e Liechtenstein.
http://www.seed.se.gov.br/detalharNoticia.asp?acao=1&cmd=1&codNoticia=1795
http://www.ritla.net/index.php?option=com_content&task=view&id=2085&Itemid=149
69
dos países que menos investe na área, embora o relatório não inclua as nações mais pobres do
mundo, que não fazem parte da OCDE. Apesar de subir 0,1 pontos percentuais em relação a
2000, o volume de recursos do PIB (Produto Interno Bruto) aplicados em educação pelo país
em 2004, quando os dados foram apurados, é o antepenúltimo entre os 36 países pesquisados,
com 3,9%. O país ficou em último lugar em dois outros aspectos importantes: o valor
investido, anualmente, por aluno dos três níveis de ensino (fundamental, médio e superior) -
US$1.303 - e a porcentagem da população entre 25 e 64 anos que completou o ensino
superior, 8%. (VAZ, 2006).
Dados
55
demonstram que em 2007 o investimento na educação permanece sem
ultrapassar os 3,9%
56
de um PIB de R$ 2 trilhões. A divulgação das medidas do PDE (Plano
de Desenvolvimento da Educação) e dos resultados do IDEB (Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica) - novo indicador de qualidade do ensino - evidenciou mais uma vez em
2005, os índices precários da média de escolarização do povo brasileiro.
57
Há indícios, assim,
da necessidade premente de reformulação no setor com a constatação de que apenas 0,8% dos
municípios têm, hoje, patamares de qualidade considerados ideais.
55
O Brasil é o que menos gasta com educação dos 34 países analisados por um estudo da OCDE (Organização
para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgado nesta terça-feira. O Brasil é o que apresenta o
menor investimento por estudante (desde o primário até a universidade), gastando em média US$ 1.303 por ano
(cerca de R$ 2.488). In: http://www.estadao.com.br/nacional/not_nac53828,0.htm
. Acesso em 19/10/2007.
56
Segundo o relatório da OCDE, o total do PIB investido em educação chega a 3,9% no Brasil , ficando à frente
apenas da Rússia (3,6%) e da Grécia (3,4%). De acordo com este órgão, a porcentagem do PIB gasta em
educação demonstra a prioridade que este país dá à educação em relação a outros gastos de seu orçamento. Nos
Estados Unidos, os gastos com Educação correspondem a 7,4% do PIB, a maior proporção, e na Dinamarca e
Luxemburgo, ele corresponde a 7,2%.
In:http://www.estadao.com.br/nacional/not_nac53828,0.htm http://www.oecd.org/dataoecd/31/34/37393599.pdf
.
Acesso em 05 dez 2007.
57
Combinação de informações de desempenho em exames padronizados em 2005 apontam para índices na
ordem de 3,8 para os Anos Iniciais do Ensino Fundamental; 3,5 para os Anos Finais e 3,4 para o Ensino Médio.
In: http://ideb.inep.gov.br/Site/
Acesso em 26 out 2006 às 18h45min.
70
2.6 A formação
58
de professores no cenário brasileiro
Não só é impossível desvincular a pedagogia de
suas relações com a política, mas também é
teoricamente desonesto.
Peter McLaren, 1997.
O contexto descrito acima lança provocações a uma das instâncias responsáveis pela
preparação das pessoas para a vida social, que é a escola - uma instituição social onde se
realiza a sistematização do conhecimento construído pela humanidade e abriga o trabalho
docente. Desse modo, parece essencial haver um reconhecimento de que a educação, ao se
transformar em objeto da ciência, dá margem a que se produzam cotidianamente
conhecimentos que, se incorporados à escola, podem desvelar substancialmente a situação
educativa e quiçá ajudar a mobilizar processos tão urgentes quanto necessários à redefinição
do modelo convencional de formação profissional desta categoria.
Assim, em especial na última década do século XX, a produção acadêmica dessa
área
59
revela preocupações recorrentes acerca da instituição escolar, da revisão do sistema
educacional formal e seu currículo e aponta a intensa degradação das condições de formação,
trabalho e salário dos professores. Tais inquietações aparecem sempre centradas em questões
mais amplas envolvendo as políticas públicas educacionais, a formação profissional e os
saberes docentes.
O conjunto de reformas brasileiras que envolvem a educação, ao ocuparem o centro
deste cenário, dá visibilidade às lutas das entidades representativas dos citados profissionais,
constituindo-se a formação em nível superior um dos aspectos mais debatidos e enfatizados
58
Adoto, para formação, a perspectiva de Gadamer (1997, p. 48): “Formação integra o conceito de cultura, e
designa, especificamente, a maneira humana de aperfeiçoar suas aptidões e faculdades.” Sob estes prismas,
associo o conceito de formação docente à idéia de inconclusão do homem, como um processo, um percurso,
relacionando esta ação ao desenvolvimento pessoal e não, apenas ao profissional.
59
Alarcão (1996a, b,1998); André (1992, 1994a, b, 1995,1999); Carr (1996); Carr & Kemmis (1988); Castro,
Garcia e Carnoy, (1997); Elliot (1990, 1993, 2000); Fazenda (1994a, b,1999); Freire (1993, 1996); M. (1992);
Geraldi et al (2000); Giroux (1997); Kincheloe (1997); Libâneo (1999); Lüdke (1997); Nóvoa (1992a, b);
Pimenta e Ghedin (1999); Popkewitz (1990, 1997); Santos (1998); Schön (1992, 2000); Stenhouse (1991; 1996);
Tardif e Raymond (2000); Veiga (1998, 1999); Zabala (1998); Zabalza (1994); Zeichner (1992, 1993, 1998,
2000), Zelmelman (1994).
71
no processo de profissionalização de professores da educação básica. Por exemplo, ao
enfatizar a dimensão técnica do processo de formação presente na primeira metade da década
de 70, o documento “Referencial Pedagógico-Curricular para a Formação de Professores da
Educação Infantil e das Séries Iniciais do Ensino Fundamental.” (MEC, 1999). aponta na
direção, apenas de um processo de capacitação sem a preocupação com a articulação entre o
ensino, a pesquisa e a extensão. (PEREIRA, J.E.D., 2000). Seguindo tal tendência, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394/1996 (LDBEN/96) destaca-se e amplia o
leque de controvérsias ao estabelecer um novo contorno de formação desta categoria, o Curso
Normal Superior (CNS) não localizado somente numa ambiência universitária, mas também
em uma nova instituição, o Instituto Superior de Educação (ISE), encarregada desse processo
formativo pelo art. 62 da citada LDB/96. Sua normalização foi feita através da Resolução n.
01/99 do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação. (CNE/CP).
60
Nessa direção, o Plano Nacional de Educação (PNE) nos itens 12-14 ao atender às
disposições da Nova Lei e suas Resoluções, indicam normas e orientações para a organização
dos ISE e, em seguida, assessorado pela Secretaria de Ensino Superior (SESu), estabelecem as
Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Formação Inicial de Professores da Educação
Básica de Nível Superior, elaboradas e aprovadas pelo Conselho Nacional da Educação,
(CNE/CP), em agosto de 2001.
Tais Diretrizes formam “um conjunto de princípios, fundamentos e procedimentos a
serem observados na organização institucional e curricular de cada estabelecimento de ensino
e aplicam-se a todas as etapas e modalidades da Educação Básica”, conforme estabelece o
artigo 1º da Resolução aprovada pelo CNE/CP anexa ao Parecer n. 09/2001. Através deste,
regulamentou-se a exigência de que a formação dos professores do nível básico deveria
ocorrer no sentido de ampliar o domínio dos docentes nos conteúdos e assuntos concernentes
60
Desde o final de 1999, o Parecer n. 970/99 da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de
Educação deu base ao Decreto n. 3.276/99 dá competência de formação de professores dos anos iniciais e atribui
a tarefa de formulação de propostas do CNS a centros universitários ou faculdades isoladas.
72
a sua ação específica, além de desenvolver a compreensão e crescente autonomia profissional
para tomar decisões com base na avaliação de sua própria atuação, contextualizando-a
socialmente. Este documento enfatiza, ainda que “[...] o desenvolvimento de competências
requeridas do professor deverá ocorrer mediante uma ação teórico-prática, onde a
sistematização teórica esteja articulada com o fazer e este, com a reflexão.” (PARECER
CNE/CP 09/2001, p. 28).
Observa-se que a reflexão sobre a própria prática, ao aparecer, neste documento,
atrelada ao conceito de competência, vincula-se a uma concepção pragmatista e produtivista
constituindo-se como elemento acrítico e tecnicista nas políticas de formação. Além disso, o
texto faz uma separação nítida entre a pesquisa acadêmica ou científica e a pesquisa do
professor. André (2001, p. 67) posiciona-se acerca disto e argumenta: “Se o documento tinha
a boa intenção de valorizar a pesquisa na formação docente, acabou provocando uma reação
oposta ao reduzir o papel da ciência na formação docente, criando uma dicotomia entre
pesquisa acadêmica e pesquisa do professor [...].”
O referido texto diz que:
[...] a pesquisa (ou investigação) que se desenvolve no âmbito do trabalho do
professor não pode ser confundida com a pesquisa acadêmica ou pesquisa científica.
Refere-se, antes de mais nada, a uma atitude cotidiana de busca de compreensão dos
processos de aprendizagem e desenvolvimento de seus alunos e à autonomia na
interpretação da realidade e dos conhecimentos que constituem seus objetos de
estudo. (CNE/CP 2001, p. 19).
Como se pode ver, o referido documento faz uma distinção no ato pesquisador o que
dá margem a questionamentos: como se pode distinguir essa ou aquela pesquisa? Como
classificar a mais adequada para a melhoria da ação pedagógica?
No ano seguinte, a Resolução CNE/CP n. 2/2002 ao estabelecer uma carga horária
mínima de 2.800 horas para uma graduação plena de formação de professores da educação
73
básica em nível superior
61
volta a suscitar grandes polêmicas nos meios acadêmicos,
ampliando a dimensão política da atividade educativa. (WEBER, 2003). Acirrado o debate, os
participantes do Fórum em Defesa da Escola Pública e Gratuita a Confederação Nacional dos
Trabalhadores em Educação (CNTE) e as demais Associações
62
demarcaram espaços
contrários a respeito dessas questões, em especial acerca da criação de uma nova agência
formadora, o ISE e de um novo formato de preparação desta categoria profissional, “[...]
centrada no ensino e desvinculada da pesquisa, da extensão, rompendo assim com o princípio
da indissociabilidade entre essas funções.” (ANFOPE, 1997, p. 19). Ao apontar diretrizes
contrárias às expostas aos documentos produzidos pelo MEC para o Plano Nacional de
Educação (PNE), tais Entidades afirmam posicionamentos antagônicos aos defendidos
oficialmente, não admitindo, dentre outras questões, que a formação inicial do docente seja
feita em tão exíguo tempo e limitada às suas experiências. Nesta linha, defendem que ao
professor devam ser dadas as condições de superação de amadorismos e improvisações,
encaminhando-o para a aquisição de uma formação teórica sólida que lhe proporcione mais
tempo de formação, condições de criatividade, rigor filosófico e criticidade na forma de
compreender e trabalhar o conhecimento. (ANFOPE, 1997, p.2). Há argumentações e
reivindicações de que aos professores devam ser proporcionadas condições de pesquisa para
não apenas receber informações prontas, mas de colocá-los ante os fatos de modo crítico-
reflexivo no intuito de dar-lhes oportunidades de produzir saberes e pensar historicamente
essa realidade, capacitando-os a reagir a ela.
A despeito das controvérsias há, a partir da LDBEN/96, um incremento na promoção
de programas de formação para professores por instituições superiores públicas e institutos
61
Das 2.800 horas devem ser reservadas 400 para a prática e 400 horas para estágios supervisionados num
tempo de integralização do curso de, no mínimo, 03 (três) anos letivos.
62
Confederação dos Professores do Brasil (CPB); Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação
(CNTE); Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE); Associação Nacional de
Pós–graduação e Pesquisa em Educação (ANPED); Associação Nacional para a Formação de Professores
(ANFOPE).
74
superiores de educação localizados fora do contexto universitário em todo o país, embora
“[...] não explicite a função e o compromisso da universidade em realizar ou desenvolver
pesquisa e contribuir para o avanço do conhecimento [...] mencionando-se apenas, como
finalidade, incentivar o trabalho de pesquisa [...].” (HADDAD, 2003, p. 126). Assim, as
secretarias estaduais e municipais de educação ao firmarem convênios com estas,
incrementam graduações em menos tempo do que o exigido para as licenciaturas regulares
63
e
remuneram os ISE ou centros universitários para ministrarem aos seus professores cursos que
possuem um custo operacional muito alto se comparados aos regulares. A partir dessa
delimitação, pesquisadores da área protestaram e realizaram defesas acirradas de que tais
recursos públicos - empregados nessa modalidade formativa - poderiam estar sendo mais bem
utilizados se investidos em instituições públicas de ensino superior. Argumenta-se que se
contratando mais professores nas Academias e investindo na qualificação crescente destes, na
ampliação de seus espaços físicos, seus acervos bibliográficos e, concomitantemente no
aumento da oferta de vagas nos seus cursos de licenciatura, haverá um ganho qualitativo
crescente sob diversos aspectos.
2.6.1 Novas Diretrizes para o Curso de Pedagogia
Fruto de longas discussões, finalmente as Diretrizes Curriculares para o Curso de
Pedagogia foram instituídas pela Resolução n.1, de 15 de maio de 2006, do CNE. Tal fato
trouxe à tona, mais uma vez, o debate a respeito da identidade deste Curso e da sua finalidade
profissionalizante, agora instituída como licenciatura. Suas funções aproximam-se, ao menos
63
Em atendimento à Resolução CNE/CP n. 2, de 19/2/2002 a carga horária de tais cursos será efetivada em 3
anos mediante a integralização de 2800 horas, sendo que 200 horas do estágio curricular supervisionado poderão
ser reduzidas para alunos que exerçam a atividade docente. Nas licenciaturas regulares este tempo aumenta para
3200 horas que deverão ser integralizadas em 4 anos, incluindo 400 horas de efetivo estágio.
75
daquelas amplamente reivindicadas pelo movimento de educadores no que se refere à
superação da dicotomia entre licenciatura e bacharelado. Em 14 artigos, a Resolução define
princípios, condições de ensino e de aprendizagem e procedimentos que devem ser
observados pelas instituições de ensino superior no planejamento de cursos a partir da sua
publicação
64
.
Assim, as Diretrizes Curriculares determinaram as atividades próprias dos docentes,
tais como planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas
próprias do setor; e orientaram que o egresso do curso esteja apto, entre outras atividades, a
atuar com ética e compromisso pela construção de uma sociedade justa, equânime e
igualitária.
Firmou-se que o Curso de licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de
professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do
Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação
Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos
conhecimentos pedagógicos, a exemplo do desenvolvimento suplementar de competências
para atividades da gestão democrática escolar. O Curso tem a docência como base, sendo esta
compreendida como ação educativa e processo pedagógico metódico e intencional em
contextos escolares e não-escolares, construído em relações sociais, étnico-raciais e
produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da pedagogia. As atividades
docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e
instituições de ensino, englobando: planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e
avaliação de tarefas próprias do setor da Educação; planejamento, execução, coordenação,
acompanhamento e avaliação de projetos e experiências educativas não-escolares; produção e
64
Publicado no Diário Oficial da União (DOU) n.92, de 16.5.2006, Seção 1, p.11/12.
76
difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo educacional, em contextos
escolares e não-escolares. (BRASIL, 2005, p.7-8).
Sua organização curricular elaborada pela Comissão de Especialistas em 1999, retoma
a idéia de núcleos de estudos:
A organização curricular do curso de Pedagogia oferecerá um núcleo de estudos
básicos, um de aprofundamento e diversificação de estudos e outro de estudos
integradores que propiciem, ao mesmo tempo, amplitude e identidade institucional,
relativas à formação do licenciado. Compreenderá, além das aulas e dos estudos
individuais e coletivos, práticas de trabalho pedagógico, as de monitoria, as de
estágio curricular, as de pesquisa, as de extensão, as de participação em eventos e
em outras atividades acadêmico-científicas, que alarguem as experiências dos
estudantes e consolidem a sua formação (BRASIL, 2005, p.11).
Um aspecto relevante deu-se na ampliação da carga horária do Curso, ampliando as
possibilidades do denominado Curso Normal Superior: a formação dos professores passa das
atuais 2.800 horas para 3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico. A carga horária será assim
distribuída: 2.800 horas dedicadas à formação com aulas, seminários, pesquisas, consultas a
bibliotecas e centros de documentação, visitas a instituições educacionais e culturais,
atividades práticas, participação de grupos de estudos; 300 horas para estágio supervisionado
prioritariamente em educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental; 100 horas de
atividades de aprofundamento em áreas específicas de interesse dos alunos, tais como
iniciação científica, extensão e monitoria. Tais Diretrizes indicam também que a estrutura do
curso terá um núcleo de estudos básicos, respeitadas a diversidade nacional e a autonomia
pedagógica das instituições.
Na transição do modelo antigo para o novo, as instituições de ensino devem extinguir
as habilitações atuais a partir do período letivo seguinte à publicação dessa resolução; o
projeto pedagógico deve ser protocolado nos sistemas de ensino dentro de um ano; o novo
projeto alcançará todos os alunos que iniciarem o curso no próximo período letivo; sugere às
instituições introduzir alterações decorrentes do projeto pedagógico para as turmas em
andamento.
77
Ao menos em tese, o exposto indica que a formação no Curso de Pedagogia é mais
abrangente do que aquela oferecida no Curso Normal Superior. O desafio, agora, é estabelecer
uma formação teórica sólida, com base no conhecimento científico e na pesquisa consolidada,
e não ceder à incorporação da racionalidade técnica ou do praticismo pedagógico
predominante na epistemologia da reforma educacional oficial, na qual se vincula o
conhecimento formativo a uma prática imediatista. (SCHEIBE, 2007).
2.6.2 A profissão, a profissionalização docente
Ser um profissional da educação significará
participar na emancipação das pessoas.
Francisco Imbernón, 2001.
Os termos profissão, profissionalização, profissionalismo, profissionalidade, de um
modo geral, revelam-se complexos e ambíguos em relação a seus significados e, obviamente,
suas aplicações, universalmente a todos os contextos, torna-se difícil. (POPKEWITZ, 1990).
Todas as profissões são ofícios, ainda que o inverso não seja a realidade. Assim, o
conceito de profissão marca diferenças qualitativas com respeito ao ofício, à ocupação ou ao
emprego. Isso se dá desse modo porque se usa a denominação profissional para se referir a
grupos de pessoas com uma elevada preparação, competência ou especialização que prestam
serviço ao público. Para Carrasco (1988, p. 111) tal conceito diz respeito a um modo
particular de exercitar as ações sociais sendo que a atividade profissional se concentra em
torno de um corpo mais ou menos amplo de conhecimentos e saberes, independentemente de
sua natureza e validade. Há um caráter profissional específico do professor e uma dimensão
sociopolítica da escola. Assim é que, nas ocupações consideradas mais altamente
78
profissionalizadas (engenharia, arquitetura, medicina, advocacia etc.) os conhecimentos são
garantidos e validados mediante um discurso científico; em outras profissões, os
conhecimentos se limitam a meras generalizações da experiência e a um conjunto de regras
técnicas (torneiros mecânicos, balconistas, pintores de parede, vendedores etc.). De um modo
comum, o ofício de professor também é citado como uma semiprofissão, caracterizada por
uma semi-autonomia e por uma semi-responsabilidade. (PERRENOUD, 2002, p. 12).
Destaca-se, ainda como característica de uma profissão, o aspecto organizacional através da
existência de uma associação, a qual assume o papel social de cultivar e desenvolver os
conhecimentos de seu próprio campo e de levar a cabo as intervenções sociais que derivam de
tais saberes. Assim, uma das condições essenciais a toda profissão é a formalização dos
saberes necessários à execução das tarefas que lhe são próprias. Outro elemento refere-se ao
conjunto de critérios sociais mediante os quais se controlam as condições de pertencer a um
grupo profissional e se estabelecem as garantias mediante as quais as prestações de serviço se
mantêm dentro dos padrões exigidos pela sociedade. Penetra-se, com este conceito, no
território do habitus, das disposições adquiridas adaptadas às situações presentes, a partir da
pertença a determinados grupos sociais. (BOURDIEU, 1994 apud SPINK, 2000, p. 52).
Aliado ao exposto, há uma distinta característica social das profissões (decorrente das
anteriores), que diz respeito ao status que o grupo profissional goza junto ao sistema social.
Isto se manifesta com base em dois aspectos: um é o poder que o grupo profissional adquire
para o estabelecimento dos níveis de serviços que podem ser oferecidos profissionalmente; o
outro é a recompensa econômica. Essa recompensa tende a nivelar-se com o status adquirido
e a situar-se relativamente em seu mesmo nível, de tal maneira que pareceria curiosa a
existência de um elevado status profissional e um baixo nível de renda para os integrantes de
uma profissão. (RAMALHO et al, 1994, p. 50; CARRASCO, 1988, p. 111-114).
79
Nesse sentido, o conceito de trabalho humano orienta e pressupõe uma análise e
desenvolvimento do processo de trabalho e de suas formas de organização. Marx (1980, p. 15-
33) ao conceituar o trabalho, destaca a ação do homem sobre a natureza e dela sobre o homem
como pessoa livre responsável pela história da sociedade, responsável pela cultura. Ao
produzir meios de subsistência ele se objetiva, constrói a natureza e se autoconstrói em
constante atividade social utilizando-se da força do trabalho.
A partir dessas premissas, a profissionalização é um processo histórico e evolutivo que
acontece nas teias das relações sociais e refere-se ao conjunto de destrezas
65
que são validados
como próprios de um grupo profissional, no interior de uma estrutura de poder. Isso significa
afirmar que os processos de profissionalização ocorrem de modo dinâmico e ativo e se
relacionam estreitamente com tal estrutura no seio da sociedade, sendo a profissão muitas
vezes, aquela que categoriza os indivíduos. Ainda assim, envolve o esforço dos profissionais
quanto à ordenação normativa do exercício da atividade - legislação, associação - não se
produzindo, portanto, de uma forma endógena para efetivar mudanças tanto na especificidade
do trabalho que o profissional desenvolve quanto na sua posição na sociedade. Desse modo,
com um incremento na profissionalização a categoria melhora seu estatuto social, amplia sua
fundamentação crítico/científica, domina um saber específico nem sempre trivial, possui uma
autopercepção profissional clara em termos de identidade, eleva seu rendimento e aumenta
seu poder/autonomia; (CUNHA, 1999; GARCIA, 1992; NÓVOA, 1992a).
A profissionalização é, assim, algo que continuamente se faz e refaz nas inter-relações
que o sujeito, como construtor da história, vivencia nos seus espaços de exercício profissional.
Ela é constituída por um processo socializador de racionalização dos conhecimentos postos
em ação em determinadas circunstâncias. O profissional possui saberes operacionais capazes
de dar consistência a uma prática que se torna, no processo formativo, cada vez mais eficaz e
65
Aqui, na perspectiva de Garcia, (1992, p. 60-62) dizem respeito a habilidades cognitivas e metacognitivas
mais do que a destrezas de condutas.
80
rigorosa; mesmo em face de quaisquer novas situações isso ocorre - sendo capaz de refletir
sobre suas ações e decidir entre variadas demandas com eficácia, responsabilidade e
autonomia. Este é o modelo de profissionalização que está a fundamentar, atualmente, este
processo, de modo predominante. Nóvoa (1991, p. 24-30) se refere, inclusive, ao estatuto
social e econômico dos professores como o eixo estruturante do processo de
profissionalização desta categoria. Este autor explica que ele se desenvolve a partir de duas
dimensões em quatro etapas e estas dizem respeito ao corpo de conhecimentos relacionados
ao exercício da profissão docente, ao conjunto de normas e valores éticos que a regem. Tais
etapas são:
o exercício profissional docente, dentre outros, como a força de trabalho principal;
o estabelecimento de um suporte legal para tal atividade;
a criação de instituições específicas para a formação de professores;
a constituição de associações profissionais da categoria de professores.
Sob esses prismas, a profissionalização dos professores, numa perspectiva mais ampla
e mais dinâmica, define-se como um processo socializador de aquisição e desenvolvimento de
características da profissão com base nos valores de subsistência e cooperação, incluindo as
dimensões de ordens individual, estrutural e institucional. Seus componentes básicos –
formação e exercício profissional – como partes integrantes de um todo se caracteriza como
um processo imbricado, através do qual os trabalhadores melhoram seu estatuto, elevam seus
rendimentos e aumentam seus poderes/autonomia. (VEIGA, 1998, 2002; QUINTANA, 1989;
NÓVOA, 1992a).
A profissão docente comporta, assim, um conhecimento pedagógico específico e tem
um compromisso ético e moral com a sociedade, ao exercer uma influência importante sobre
outros seres humanos: ela se exerce a partir da adesão coletiva a um conjunto de crenças,
normas e valores e, quando comparada a outras, revela uma especificidade quanto ao
81
tratamento social, legal, institucional e econômico. Relacionada a este último aspecto, a
profissão docente ainda possui características que lhe conferem status de uma categoria
inferior: é consensual que a situação do magistério no Brasil, sobretudo na educação básica,
ainda é vista por uma marcada desvalorização sócio-econômica por não haver um
reconhecimento da complexidade do saber docente. Embora eu não pretenda desenvolver aqui
comparações com outros grupos profissionais, a profissão docente quando comparada en
passant com outras, revela uma especificidade quanto ao tratamento social, legal, institucional
e econômico que lhe é conferido, caracterizando-se historicamente como uma atividade de
categoria inferior. A visão, ainda vigente acerca do papel, status e função social da citada
profissão, gera um reforço institucional à desprofissionalização
66
e semiprofissionalização,
67
ou proletarização da categoria,
68
através do descaso de políticos legisladores e do sistema
educacional como um todo quanto à formação profissional rigorosa e específica e também aos
requisitos para o exercício da profissão. É consenso que a situação do magistério no Brasil,
sobretudo nas classes iniciais, é vista por marcada desvalorização e observa-se que o
problema básico, nesse grupamento, diz respeito à escassa profissionalização. (QUINTANA,
1989; NÓVOA, 1995a, b; RAMALHO, 1994; IMBERNÓN, 2001).
A autodesvalorização profissional vem no bojo desse processo pontuado por
indicadores como a ausência de auto-referência positiva do professor, a omissão do sistema
quanto à investigação operacional na sala de aula, ao tratamento das questões de análise da
própria prática escolar, do desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional. Tudo isso
como forma de minimização da exigência de fundamentação crítico-científica dentro de novos
66
A desprofissionalização ocorre ao não se considerar o contexto sociopolítico do ato educativo e ao enfatizar
habilidades técnicas de ensino, propiciando a construção de uma identidade profissional ora burocrática, ora
submissa e desconectada dos atos pedagógicos e políticos da educação. (VEIGA, 1998, p.78,79).
67
Dentro do paradigma tradicional que considera os professores como artesãos semiprofissionais que
desenvolvem competências por meio da experiência. (KINCHELOE, 1997, p. 200).
68
A condição de proletário é alcançada por meio de certa simplificação da complexidade da atividade docente.
(SANTOS, 1995, p.26).
82
parâmetros ético-estéticos e políticos que exigem o exercício da atividade docente
profissional.
Esse profissional para exercer a singularidade de seu ofício necessita de um amplo
corpo de conhecimentos especializados, devendo adquiri-lo durante um prolongado período
de formação e no exercício de sua profissão. O uso do termo prolongado pretende que a
formação deva ser considerada como um desenvolvimento contínuo e permanente a permear
toda a vida profissional; como um continuum, na expressão de Garcia (1992, p. 54, 55). Este
conceito, ligado intrinsecamente ao de desenvolvimento profissional de professores, ganha
uma conotação de integralidade e processualidade, a superar a tradicional justaposição entre
formação inicial e contínua, o que requer um trajeto de estudo, reflexão crítica
69
, discussão,
confrontação e trocas coletivas que ocorra, de preferência, como uma sutil e sistêmica tarefa
de sensibilização do intelecto na reconsideração de valores, crenças, hábitos, atitudes e jeito
de se relacionar com a vida.
Esta profissão, na sua especificidade e na de um contexto capitalista, parece construir-
se, também, no cotidiano da vida social e essencialmente no interior da escola - nessa
configuração contemporânea - desenvolvendo-se e transformando-se em variados tempos
históricos e múltiplas situações. Os saberes constitutivos desta profissão implicam
reflexividade, mentalidade aberta, consciência, exercício de criticidade, ampliação das
competências ou destrezas próprias da profissão, crescente responsabilidade, sensibilidade,
entusiasmo, capacidade de liderança, compromisso político, trabalho em grupo, abstração,
flexibilidade para se adaptar a novas situações, autonomia e predisposição para prosseguir
aprendendo. (CASTORIADIS, 1992; CAVAGNARI, 1998; ZEICHNER 1992; GARCIA,
1992; GARRIDO, PIMENTA e MOURA, 2000; PERRENOUD, 2002).
69
Refletir criticamente sobre a prática aqui, significa localizá-la num contexto social e político e confrontá-lo
com um contexto da tradição. (KEMMIS, 1987, apud MAGALHÃES, 2004, p. 77).
83
A ação do professor é considerada um trabalho
70
dentro das perspectivas apresentadas
e, é na docência, mais do que em outros campos, que se utilizam e se integram os diversos
conhecimentos sociais e culturais que o trabalhador possui como pessoa, além de sua
formação profissional. Transparecem de modo iniludível, na situação docente - passo a passo
- os saberes pessoais, as crenças que fundamentam sua vida. Ou seja, o conhecimento tácito
71
que possibilita ao professor interagir com seus alunos nas experiências de ensino e
aprendizagem. A prática docente, simultaneamente é expressão de esses saberes aliados aos
específicos, pedagógicos, construídos como fonte do desenvolvimento da profissão. António
Nóvoa (2001, p.14), numa entrevista à Revista Nova Escola diz, sobre isso, de modo
pertinente e incisivo: “[...] todo conhecimento só terá eficácia se o professor conseguir inseri-
lo em sua dinâmica pessoal e articulá-lo com seu processo de desenvolvimento profissional.”
As exigências contemporâneas, assim, parecem apontar para processos formadores de
uma nova profissionalidade docente não mais pautada apenas nas práticas de ensinar e na
racionalidade técnica (professores como meros executores de decisões alheias) como ocorria
comumente no passado. A perspectiva atual constitui o que se pode chamar de cultura
profissional em ação (ou seja, durante o desempenho de sua atividade profissional)
envolvendo os múltiplos determinantes da profissão e da ação. Sobre isso Henry Giroux
(1997) argumenta no sentido de que esta tarefa deverá envolver uma análise crítica das
diferentes esferas sociais e culturais que aponte para possibilidades concretas de mudança
criando formas novas e respostas aos diversos tipos de opressão e exploração. Corroborando
com tal posicionamento, Perrenoud (2002, p.12) sinaliza para a necessidade de os professores
assumirem riscos “[...] na escolha de suas estratégias didáticas e seus modos de avaliar e
deixar de usar a proteção do sistema, dos programas e dos textos dos livros didáticos e
70
O trabalho é um instrumento de que o Homem se utiliza para transformar a natureza e para transformar-se
também.
71
Refere-se a recursos intelectuais - conceitos, teorias, crenças, dados, procedimentos, técnicas. (PÉREZ
GÓMEZ, 1992 a, p. 103). Esta categoria será tratada mais detidamente, adiante.
84
redefinir suas obrigações contratuais em troca de maior autonomia e responsabilidade
pessoal.” Assim, parece não bastar ao desempenho competente da profissão docente o
conhecimento sobre fundamentos, teorias pedagógicas e conhecimentos específicos da
docência havendo uma premência de se fazer amplas relações, interpretações, inferências
entre situações práticas e os conhecimentos teóricos que lhes são necessários.
Nessa perspectiva, Garcia (1992, p. 54, 55) ressalta “[...] que a formação do professor
não é o único vetor de uma profissionalização progressiva do oficio docente.” É um dos
autores que melhor aborda o aspecto da profissionalidade docente imbricada no processo de
desenvolvimento permanente da pessoa e propõe que a formação promova um
desenvolvimento contínuo numa conotação de evolução e de continuidade que supere a
tradicional justaposição entre formação inicial e contínua.
Pesquisas realizadas no final do século XX, na Bahia,
72
reforçam o que está sendo
argumentado e demonstram que estes mesmos professores continuam agindo como agiam
antes - decorrido pouco tempo da participação em cursos, chamados à época, de capacitação
73
- ou seja, de acordo com práticas tradicionais de ensino e de aprendizagem. Os efeitos, nessa
práxis, de cursos em moldes, ainda, fragmentários e aligeirados, realizavam-se numa
perspectiva conteudista em que o modo de pensar, o fazer, o agir do trabalho escolar
constituem-se num produto cultural do pensamento clássico, principalmente da física e da
filosofia com base no pensamento científico dos séculos XVIII e XIX. Com um sério
agravante: sem posterior acompanhamento e continuidade, mesmo uns poucos avanços
decorrentes de teorias mais contemporâneas - porventura veiculadas nesses cursos -
72
BAHIA. SEC/IAT. Cursos de Aperfeiçoamento para Professores de 1ª a 4ª séries do Ensino Fundamental:
uma avaliação. Relatório publicado em 1998.
BAHIA. SEC/IAT Cursos de Capacitação para Professores das Classes Iniciais do Ensino Fundamental: um
olhar ampliado. Relatório restrito. Dez.1999.
MIDLEJ, J.,Dissertação de Mestrado. Fevereiro 2004 a.
73
Além de capacitação, ainda se fala muito em atualização e quando não em treinamento de professores
(AZEVEDO, 2001, p. 51).
85
permaneceram estranhos aos professores e se perderam na solidão da sala de aula para a qual
os docentes retornaram.
Vêem-se, nesses estudos, que permanecem estranhos ao pensamento e à ação
escolares, os avanços decorrentes da teoria da relatividade, da física quântica e seus
desdobramentos filosóficos e culturais - que esses cursos aligeirados não se constituíram
como estruturantes de concepções metodológicas sistêmicas
74
para a análise e
apreensão/captação da realidade, onde uma nova concepção de homem e de mundo já desafia
a reestruturação do pensamento humano, da arte, da filosofia e das ciências. Infelizmente,
decorrido um tempo das capacitações, os professores continuaram com suas práticas
arraigadas em conhecimentos que antecederam suas vivências como pessoas e que se faziam
presentes neles por meio dos modelos institucionais cristalizados, das normas, enfim, da
reprodução social que permanecem, definem e ampliam os repertórios de que dispunham para
produzir sentido em quaisquer âmbitos das suas vidas. Sente-se a necessidade, nesse ponto, de
se estudar aspectos relacionados à aquisição do conhecimento por pessoas
75
adultas, item que
será tratado adiante.
2.6.3 Formação do professor como um continuum
Reconhecer no estranho o que é próprio,
familiarizar-se com ele, eis o movimento
fundamental do espírito, cujo ser é apenas o
retorno a si mesmo, a partir do ser diferente.
Gadamer, 1997.
74
Onde se pode passar de uma configuração de pensamento e ação a outra, integrando dados diversos e
interligando-os em combinações que façam sentido. (OSTROWER, 1989, p. 197-199).
75
Há a intenção, ao adotar o conceito de pessoa, de sintonizar com Spink, (2000, p. 54) que dá ênfase à dialogia.
Ao mesmo tempo, ao empregá-lo, define-se por ampliar os conceitos de indivíduo e sujeito, neste contexto.
86
Nas décadas de 1980 e 1990, ocorreu em diferentes países (a exemplo de Portugal,
Espanha, França, Itália) um investimento substancial na qualificação dos professores no
entendimento de que a democratização e a melhoria do processo de ensino e aprendizagem
passam pelos profissionais da educação – sua qualificação, valorização profissional,
condições de trabalho e salário. Inúmeras pesquisas têm sido desenvolvidas configurando
estas novas concepções de professor e de ensino: prática reflexiva, formação de professores
orientada para a indagação, reflexão-na-ação, os docentes como controladores de si mesmos
(ELLIOT); como sujeitos reflexivos (PAULO FREIRE, SCHÖN, CRUICKSANK &
APPLEGATE; ZEICHNER); como pessoas que experimentam continuamente
(STRATEMEYER); professores adaptativos (HUNT); investigadores na ação (COREY &
SHUMSKY); como cientistas aplicados (BROPHY & EVERSTON; FREEMAN); como
sujeitos com um ofício moral e como sujeitos que resolvem problemas (JOYCE &
HAROOTUNIAN); como sujeitos que colocam hipóteses (COLADARCI); como indagadores
clínicos (SMYTH); professores auto-analíticos (O'DAY), como pedagogos radicais e
intelectuais transformadores (GIROUX); como artesãos políticos (KOHL) os professores
como tecnólogos do ensino (TARDIF) e professores como agentes sociais (VEIGA). (TOM,
1985, p. 36, apud VASCONCELOS, 1995; GARCIA, 1992, p. 59; PIMENTA, 1999, p. 10,
11; VEIGA; AMARAL, 2002, p. 71-85).
A metodologia que informa aos citados estudiosos insere-se no movimento das
investigações qualitativas em educação e, de um modo geral, estas pesquisas compreendem
que as transformações das práticas docentes só se efetivam na medida em que o professor
amplia sua consciência sobre a própria prática, no desenvolvimento de uma capacidade de
refletir em e sobre a sua ação. Reformas gestadas nas instituições, sem tomar estes
profissionais como parceiros/autores não vêm se concretizando sendo que os citados estudos
apontam para o professor como um dos maiores responsáveis por sua formação. Esse é um
87
processo pessoal, incompatível com planos gerais centralizadores, afirma Nóvoa (2001, p. 14)
em sua citada entrevista.
Daí, tais estudos evidenciarem a relevância de se considerar, nos processos de
formação/desenvolvimento/valorização profissional desta categoria, o desenvolvimento
pessoal (no sentido de produzir a vida do professor), o desenvolvimento profissional (produzir
a profissão docente) e o desenvolvimento institucional (produzir a escola) (NÓVOA, 1992b,
p. 15), numa perspectiva de educação crítica e emancipatória e, nesta, o conceito de
desenvolvimento é visto como processo de construção, dependente de aprendizagem nas
interações sociais. (VYGOTSKY, 1991).
Tomando como premissa os ditos acima, a valorização e a qualificação da profissão
docente passam por instâncias que auxiliem esses profissionais a compreender os contextos
histórico/sociais/políticos/culturais/organizacionais nos quais se dá sua atividade docente. Ao
admitir, portanto que a formação da profissão de professor tem início muito antes do seu
ingresso nos cursos de preparação para o magistério e prossegue no decorrer de sua prática
profissional, sintonizo-me com o movimento que está a repensar a dicotomia entre formação
inicial e contínua e denomino o processo formativo, simplesmente formação, concebendo-a
como uma prática social e um processo lógico de emancipação que contempla desde a
formação inicial e a contínua até as condições de trabalho, salário, carreira e organização da
categoria.
Aqui se faz necessário explorar a noção complexa do termo formação: é na língua
alemã que habita a sua essencialidade - Bildung - envolvendo reflexões sobre o homem e a
humanidade, sobre a ética, a criação, a sociedade e o Estado. Assim, não há formação no
sentido próprio do termo a não ser com referência a atividades sociais e visando a
competências concebidas como habilidades em situação socioprofissional. Isto revela o forte
vínculo entre formação e o espaço profissional.
88
Gadamer (1997, p. 51) se inspirou em Hegel para afirmar que a filosofia “tem na
formação a condição de sua existência.” Nessa dimensão, ele se refere à formação “como
elevação à universalidade” como uma tarefa humana, conceito plenamente assumido e
utilizado nesta investigação-ação.
No caso da língua portuguesa a terminologia formação amplia-se e se complexifica.
Particularmente relacionado à docência, refere-se à atualização científica, didática e
psicopedagógica de gosto instrumentalista, técnico-profissional, do professor. (MACEDO,
2000, p. 251; IMBERNÓN, 2001, p. 49; HAIDJI, 2001, p. 8). Na especificidade desse estudo,
abandono a perspectiva acima para adotar um conceito de formação profissional para o
magistério na perspectiva de uma educação crítica e emancipatória que consiste em
reconhecer o caráter profissional específico do professor e a existência de um espaço onde
este possa ser exercido. Implica ainda em reconhecer os professores como verdadeiros
agentes sociais, como “[...] sujeitos capazes de planejar e gerir o ensino-aprendizagem e de
intervir nos complexos sistemas que constituem a estrutura social e profissional.” (VEIGA,
2002, p. 84, 85); nessa perspectiva a formação acontece como ampliação de autonomia e
desenvolvimento de uma consciência crítica e crescente autonomia em ações de refletir,
problematizar, indagar, duvidar, criticar, descobrir, organizar, fundamentar, revisar e construir
a prática imbricada na teoria, “[...] pois é no terreno da práxis pedagógica que se encontram os
problemas e as possibilidades de se inventar novas soluções.” (p. 84).
Trabalho na direção, portanto, de que as atividades de formação - como um continuum
- não podem ocorrer de forma indissociável da vida, não se restringindo a momentos
estanques, fragmentados. Assim, na especificidade da formação docente, o sentido de
profissionalização vem da própria realidade complexa, mutável, freqüentemente conflituosa
em que o professor atua, exigindo-lhe capacidade de manejar a complexidade da ação
89
educativa e resolver problemas, por meio de uma interação inteligente e criativa. (CUNHA,
1999, p. 132).
Paralelamente e em estreita dependência com tudo o que foi dito acima, entendo que a
profissionalização do professor, num parâmetro de continuidade, supõe a valorização dos
profissionais e isto requer condições adequadas para o exercício da profissão, carreira e
desenvolvimento de uma política salarial compatível com as responsabilidades inerentes às
ações. Compreender este processo numa perspectiva social é entendê-lo essencialmente como
um direito inalienável desta categoria profissional. É superar o estágio de iniciativas
individuais e colocá-lo definitivamente no rol das políticas públicas de educação. De uma
verdadeira profissionalização. Em face disso, amplio e assumo nesse estudo, o âmbito da
formação como um continuum, centrada na escola e no exercício da profissão docente, como
um direito dos professores e um dever do Estado.
2.6.4 Conhecimento, subjetivação e construção da professoralidade
A subjetividade do professor, (deve estar)
associada à idéia da indissociabilidade do coletivo
e do individual.
Marcos Vinícius Pereira, 2001.
O conhecimento dos professores comporta um conhecimento pedagógico específico,
um compromisso ético e moral e a necessidade de dividir a responsabilidade com outros
agentes sociais, já que exerce influência sobre os seres humanos. É um saber que consiste em
gerir a informação disponível e adequá-la estrategicamente ao contexto da situação formativa
em que, em cada instante, se situa sem perder de vista os objetivos traçados: é um saber agir
em situação. Num outro prisma, não meramente acadêmico, racional, feito de fatos, noções e
90
teorias, também é um conhecimento feito de experiência individual, subjetiva, dentro de uma
coletividade, num campo de potencialidades. Nessa direção, com a práxis, o materialismo
imprime a noção de realidade a partir de um discurso estrutural, pré-existente à consciência
mesma que percebe a coisa, o mundo, as relações. Nesta, não existe o mundo sem a
consciência da pessoa que o elabora, o percebe e o define. Ao me posicionar assim, sintonizo
com a concepção de que, de algum modo, o que se está sendo, quando se é professor, é um
componente atualizado de diferentes vetores de forças do campo imanente de possibilidades
históricas e culturais que se circunscrevem e se atualizam
76
.
Acerca disso, Pereira, M. V. (2001, p. 23-41), ao problematizar e investigar “como se
é professor? Como é ser professor? Por que se é professor” ao invés de simplesmente inquirir
“o que é ser professor?” Ele justifica sua atitude ao revelar que, em tais direções, não está em
busca da identidade do professor e sim do processo de individuação que se configura em
estados individuados e singulares de ser e se atualizam em inúmeras possibilidades que
perfazem o campo da subjetividade. (PEREIRA, M. V., 2001, p. 24). Nessa direção ele
enuncia o que ele denomina de professoralidade: “Vir a ser professor é uma diferença de si
que o sujeito produz culturalmente (num campo coletivo) num dos seus inumeráveis
movimentos de ser no mundo.” (p. 23, 24). Ele busca, enfim, “[...] explicitar caminhos nos
processos de formação, caminhos que contribuam para considerar a inseparabilidade da
formação (e autoformação) profissional e produção da subjetividade.” (PEREIRA, M. V.,
2001, p. 38). O citado autor fundamenta-se em Deleuze (1988), Deleuze e Guattari (1995),
Foucault (1993, 1994), para a identificação dos modos e possibilidades de interferir nos
fluxos de atualização do “devir professor” e rejeita o modelo de identidade estática - na busca
da processualidade que compõe tais fluxos.
76
Na explicação de Pereira, M. V., (2001, p. 31) estratos como formações históricas, [...] feitos de coisas e
palavras, de ver e de falar, de visível e de dizível, de conteúdos e de expressões.
91
Ao tomar como referência, neste estudo, as produções epistêmicas de Pereira, M. V.
(2001) opero na direção da constituição subjetiva da professoralidade por compreender que, a
citada profissionalidade docente, a partir da concepção do citado autor, encontra-se “[...]
abalada por uma tensão desestruturante, depois de experimentar o caos das forças
interferentes e se organiza em uma nova forma existencial.” (p. 39). Em direção contrária ao
movimento identitário que assume uma “[...] configuração cristalizada de uma forma de ser.”
(p. 36).
Avanço a seguir, na direção de clarear a compreensão de como a pessoa se produz,
como ela se constitui e se constrói; em especial, de como a pessoa adulta elabora seus
conhecimentos.
2.6.5 Aspectos da aquisição do conhecimento por pessoas adultas
O passado não é o antecedente do presente, é a
sua fonte.
Bosi, 1983.
Reconhecer no estranho o que é próprio,
familiarizar-se como ele, eis o movimento
fundamental do espírito, cujo ser é apenas o
retorno a si mesmo a partir do ser diferente.
Gadamer, 1997.
Segundo Vygotsky, (1991) o processo de construção do conhecimento, de formação
de conceitos, envolve operações intelectuais complexas como atenção deliberada, memória
lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenciar e estas dependem da interação do
ser humano com o meio e com o outro.
92
As teorias piagetianas (1978) sobre a construção do conhecimento apontam para um
processo de equilibração/desequilibração das estruturas cognitivas de um aprendiz,
implicando em confrontos que geram movimentos de avanço e retrocesso entre o novo e o
estabelecido. A aprendizagem ocorrendo por este movimento de contradição, caracteriza-se
pelo esforço de elaboração de percursos de formação e autoformação. Especificamente nas
pessoas adultas há a questão de superação de estruturas mais ou menos rígidas que, de alguma
forma, já estão internalizadas porque neste há uma “[...] grande tendência da mente a manter-
se fiel ao que se lhe afigura familiar, defendendo-se de tudo o que lhe prometa perturbar
seriamente os seus próprios balanços e equilíbrios.” (BOHM, e PEAT, 1989, p. 36). Esse
fenômeno é particularmente potencializado no ser humano à medida que o tempo passa,
gerando condições de resistência às mudanças e apegos naturais a tudo que lhes seja
conhecido. Os citados autores (1989) denominam este movimento de infra-estrutura tácita do
conhecimento e dizem mais sobre ele:
Quando não se percebe o processo de aprendizagem como esse movimento de ir e
vir, de rupturas e de descontinuidades, de avanços e de retrocessos, tomam-se como
referência, as normatizações e padronizações, congela-se o movimento e afirma-se a
impossibilidade. [...] Com a afirmação da impossibilidade surgem as idéias de
deficiência, bem como a dificuldade que passa a ser entendida como impossibilidade
de avanço do sujeito e não como um momento do movimento de ir e vir natural ao
processo de aprendizagem. (BOHM; PEAT, 1989, p.35-45).
Pereira, M. V. (2001, p. 39) parece dialogar com os autores citados ao asseverar que
“[...] num procedimento identitário, o sujeito se fixa num modelo que o caracteriza como o
mesmo de si [...] a identidade é uma determinação, é uma redução das possibilidades de vir-a-
ser a um padrão que tende a se repetir.” Num sentido oposto, a assunção da condição humana
como construção subjetiva e processual, vincula-se à abertura de espaços para novas
estruturas de construção do conhecimento, traz em si avanços significativos acompanhados
de alguns retrocessos, fornecem indícios de exigir do formador de professores movimentos no
93
sentido de “[...] garantir uma relativa estabilidade [...]” (p. 38) num trabalho cuidadoso que se
demonstre mobilizador de rupturas: que tenha significado e funcionalidade a fim de
impulsionar os docentes, mobilizá-los mesmo, a repensar antigos conceitos e tomar
consciência da necessidade de por em jogo tudo o que sabem e avançarem, rumo a renovadas
construções cognitivas e afetivas dentro de um caráter expansivo.
Estudiosos revelam que o registro narrativo autobiográfico tem demonstrado como
capaz de desvelar aspectos de experiências formadoras e redescobertas de caminhos
percorridos, dando mostras de evidenciar o movimento que cada pessoa empreende no citado
ir e vir de aquisição do conhecimento, criando possibilidades de desvendamento de modelos e
princípios que estruturam discursos e cristalizam ações pedagógicas. Tal procedimento parece
indicar condições de repercutir na aprendizagem e na incorporação de novos conhecimentos
ao encaminhar a pessoa a rever cristalizações e padrões de aspectos relacionais e didáticos
vinculados ao trabalho docente. (DELORY-MOMBERGER, 2000, 2001; DOMINICÉ, 2000;
HOLLY, 1992b; JOSSO, 2004; NÓVOA, 1992b; PEREIRA, M. V., 2001).
Nessa direção, retorno ao processo de constituição da professoralidade - do modo
como Pereira M. V. (2001) o concebe - e encontro-o intimamente relacionado com as formas
pelas quais as pessoas assumem seus aprendizados e reagem frente às funções inerentes ao
papel social de ser professor. Ao assumir estas idéias presumo, a exemplo deste autor (p. 32)
“[...] que a escolha de ser professor passa, necessariamente, pela reconstituição de alguns
fatos que antecedem essa decisão.” Suas ações ao se assentarem num corpo de significados,
conscientes ou inconscientes, podem ter sua gênese nas experiências vividas na condição de
alunos, ao longo de sua carreira escolar. Há indicativos de que, para que a produção de
conhecimentos possa se processar de modo mais significativo, precisa estar fortemente
vinculado a contextos pessoais e subjetivos - tendo como ponto de partida a própria vida dos
envolvidos no processo, seus conhecimentos prévios sobre os diversos assuntos, criando
94
possibilidades de compreensão de como chegaram a formular aqueles conceitos, aquelas
opiniões. A escrita autobiográfica, ao permitir “[...] diferentes entradas sobre a constituição da
identidade docente, abre-se não só ao desenvolvimento pessoal e profissional, amplia formas
de compreensão e apropriação da cultura universitária e escolar.” (SOUZA; CORDEIRO,
2007, p. 48). Ao fertilizar retornos de si para si mesmo, os movimentos da história parecem
favorecer a mobilização das estruturas tácitas de pensamento e ampliação de conhecimentos,
num sentido de afloramento de desejos e necessidades de superar dificuldades, avançar em
hipóteses, quiçá ensejando renovadas atitudes perante a vida e perante o trabalho na
instituição escolar. Desse modo, embora atenta às idéias deleuzianas (1988) de que as
possibilidades de produzir-se a diferença são muito menores do que as possibilidades de
produzirem-se a repetição, optei por apostar na hipótese de que o desvelamento de
estereótipos e velhas certezas poderiam ensejar a produção de novas formas de
posicionamento relacionadas especialmente à função docente. (MIDLEJ, 2007a).
É preciso esclarecer que, embora as histórias de formação docente não tenham se
constituído no foco principal deste estudo, elas tangenciaram essa temática na sua relação
com a composição da docência. De fato, a decisão de introduzir este procedimento a
tangenciar esta investigação-ação deveu-se, também, ao entendimento de que,
[...] a superação dos limites impostos à construção [...] epistemológica do ser
professor se dará a partir do acesso ao conhecimento construído via pesquisa [...] do
que fazemos, como fazemos e por que fazemos [...] de modo consciente ou não
[...].” (IBIAPINA; FERREIRA, 2005, p. 26 - 27).
Houve, assim, uma intencionalidade de que essa tarefa de reconstrução do processo
formal de escolaridade se desse na direção de instigar a mobilização dos saberes da
experiência (DEWEY, 1979a, b; TARDIF, RAYMOND, 2000) que as professoras tiveram
como alunas, passando pela “[...] condição humana em sua processualidade, como sujeitos
95
subjetivados no interior de práticas coletivas, institucionais e sociais [...] no sentido de
explicitar caminhos de formação.” (PEREIRA, M. V., 2001, p. 38).
Desse modo, tendo como base a concepção de linguagem em Bakhtin (1999), a
produção da escrita autobiográfica responde a enunciações anteriores, refuta, confirma,
antecipa respostas, dialoga com futuros possíveis e promove visibilidades a processos de
como as pessoas se apropriam e se apropriaram dos saberes específicos da prática docente. A
primeira conseqüência desse acesso à historicidade pessoal, seus valores e crenças é que, “[...]
ao reconstituir a sua história, o narrador tece, continuadamente, passado e futuro, observa-se
em transformação e reinventa o presente na tentativa de compreender o que está sendo e
fazendo em/da sua vida [...]” (PASSEGI, 2007, p. 35) de modo a admitir outras possibilidades
de ser/estar na profissão. A história é compreendida, nessa abordagem, como memória
coletiva do passado, consciência crítica do presente e premissa operatória para o futuro
(FERRARROTI, 1982) a postular, em fluxos, a processualidade da condição humana e não
determinados papéis, a cristalização ou a estabilidade. (FOUCAULT, 1993; PEREIRA, M.
V., 2001). Para Heller (1970) os papéis são complexos de comportamentos cristalizados e as
estereotipias de funções são capazes, segundo ela, de impedir que o homem alcance sua
missão histórica de evoluir. Neste caso, quando a pessoa passa a desempenhar
burocraticamente um papel haverá como conseqüência a atrofia da sua consciência. E
atrelada a esta, geralmente, vem a alienação.
Assim, ao levar em conta a subjetividade daquele que escreve, Josso (2004); Pineau
(2004); Souza (2006); Souza; Cordeiro (2007) postulam que as histórias de vida, contadas
oralmente ou por escrito, mobilizam, na pessoa que narra, a capacidade de transformar as
representações de sua trajetória e o modo como elas interferem na sua forma de agir e de estar
no mundo. Nesse sentido, a narrativa autobiográfica é, para o narrador, lugar de reconstrução
de saberes profissionais subjetivados e torna-se, por essa mesma razão, um método
96
privilegiado para o pesquisador ter acesso ao universo “[...] de uma formação existencial
singular, uma emergência constituída num campo de coletividade, em constante iminência de
deixar de ser o que vem sendo para tornar-se diferente de si mesmo [...].” (PEREIRA, M. V.,
2001, p. 34).
Kramer et al (1996, p. 151, 152) asseveram acerca disso:
Recordar a prática quotidiana não é apenas uma questão de recordar fatos
conscientes, mas uma questão de ‘reviver’ certos acontecimentos, ser capaz de os
reordenar, dando nova forma a sentimentos, imaginando novas relações entre as
coisas bem conhecidas, ou mundo completamente novos.
A dimensão que se tem para a formação nessa perspectiva é aquela que leva em conta
as experiências recontadas, com possibilidade de transformação; que não seja praticada de
maneira impessoal e linear, mas como experiência compreendida e criticada, como criação de
linguagem humana, como produção da história. Na direção que lhe imprime Benjamin (1987)
ao afirmar que pela rememoração, na linguagem e na narrativa - passado, presente e futuro ao
se conectarem e se redimensionarem em sempre novas constelações, resgata o poder de ser
nessas três dimensões do tempo, possibilitando tecer o sentido da história, não mais como um
encadeamento cronológico, mas como um processo de re-criação do significado. Afirma
Kramer (1998, p. 23-24) que “[...] pela linguagem, revivemos e re-fazemos a experiência
vivida - a autobiografia. A narração da própria vida, a rememoração, são partes do processo
de fazer a história.” Esta historicidade pessoal compõe-se de marcas (BUENO et al., 2006) as
quais serão tratadas no próximo item deste capítulo.
2.7 Marcas que desassossegam
Sei que estou contando errado, pelos altos.
Desemendo. Mas não é por disfarçar, não pense.
[...] A lembrança da vida da gente se guarda em
97
trechos diversos, cada um com seu signo e
sentimento, uns com os outros acho que nem não
se misturam.
Guimarães Rosa, 1986
Pelo fato de sermos transcendentais no sentido da palavra, estamos incessantemente
produzindo marcas em nós e nos outros num tempo kairológico
77
... tendo estas a força de
serem reativadas a qualquer momento - por circunstâncias nem sempre ocasionais - e poderem
provocar, nessa reatualização, novas conexões e ressonâncias. Eventualmente, ao se
engendrarem no devir, elas tendem a desassossegar - porque são linhas de tempo que se
abrem e vão produzindo novas e inusitadas realidades em imprevisíveis direções, em todos os
planos da vida. Nesse sentido, comunicação não é aquilo que se diz, mas o que o outro pode
compreender a partir da multiplicidade de suas marcas... do diferente na diferença de seu ser.
Nesse viés, o diálogo ao constituir-se em condição da linguagem e do discurso
referenda-se como um elemento transformador do mundo e produtor de devires. Para Bakhtin
(1992), no signo lingüístico confrontam-se índices de valor contraditório, sendo a Língua,
nessa perspectiva, dialógica e complexa, desde quando nela se imprimem historicamente e
pelo uso, as relações dos discursos. Para o citado autor, “[...] ignorar tais relações é o mesmo
que apagar a ligação que existe entre a linguagem e a vida.” (BAKHTIN, 1999, p. 268).
Assim, ao tratar do diálogo entre interlocutores, ele aborda, de modo especial, o caráter das
percepções e da intersubjetividade num processo de dialogismo interacional, onde um
discurso mantém relação com outros discursos deixando-se ver ou entrever polifonicamente
em oposição aos textos monofônicos que escondem os textos que o constituem.
Concebidos desse modo, os discursos aproximam-se da noção de linguagens sociais e
são peculiares a segmentos específicos da sociedade - em contextos e momentos históricos
definidos - e terminam por moldar a forma das enunciações, dos gêneros de fala. (BAKHTIN,
1995). Nessa direção, o caráter relacional da linguagem, estando na base das práticas
77
Kairós – tempo histórico de vivências.
98
discursivas, faz emergir possibilidades de “[...] interanimação dialógica, situando-se no
espaço da interpessoalidade, da relação com o outro, esteja ele fisicamente presente ou não.”
(SPINK; MEDRADO, 2000, p. 60).
Na citada perspectiva, busco promover uma convocatória ao professor Felippe Serpa
78
a sair do casulo das conversas de aula - prolongadas pelos corredores e escadarias da
Faculdade de Educação (FACED) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) nos primeiros
idos de 2000. Desse modo, ao resgatar fragmentos de suas falas - cuidadosamente anotadas
por mim - e de minhas próprias reflexões a partir do que ouvi dele, saio à cata de um “diálogo
infinito e inacabado no qual nenhum sentido morre” (SPINK; MEDRADO 2000, p. 50); nessa
direção, coloco a alma em movimento no sentido de impulsionar o pensamento, lhe transmitir
a pressão da sensibilidade (DELEUZE, 1988) para trazer à tona o discurso polifônico do
Velho Pajé.
79
Especialmente, são retomadas de enunciações verbais produzidas em
circunstâncias individuais ou coletivas
80
e inseridas num dado momento histórico. Busco,
assim, agir na direção que Bosi (1994) imprime à memória - constatando que lembrar não é
reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências do
passado. (MIDLEJ, 2008).
Com isso, vislumbro possibilidades de que isto possa contribuir para a conjugação de
um processo de reflexão crítica de conceitos e revisão de atitudes individuais e coletivas no
âmbito educacional e, quiçá para o desenvolvimento de uma sensibilidade socioexistencial do
professor na sua condição de pessoa. Com este intuito trago à pauta, também, os ecos de suas
expressões em artigos
81
, comentários e réplicas contidos no Rascunho Digital
82
abrindo
78
Luís Felippe Perret Serpa – Professor Emérito pela UFBA. Professor, pesquisador e ex-reitor (1993-1998) da
Universidade Federal da Bahia. Sua estréia em educação foi na UFBA da década de 60, onde, quatro décadas
após, foi considerado "notório saber" pelo Colegiado de Pós-Graduação da Faculdade de Educação da Ufba
(FACED).
Faleceu em 15 de novembro de 2003, em plena atividade acadêmica.
79
Apelido carinhoso com o qual Felippe Serpa era tratado por alguns de seus alunos da FACED.
80
Bakhtin (1992).insere estes atos de fala ao campo da psicologia do corpo social que tem na interação verbal
sua materialização.
81
A exemplo de: Educação e tecnologias contemporâneas. 2001. In:
http://www.faced.ufba.br/~dept02/felipe/edc_tec_contemp.htm
> Acesso em 03 de junho 2003.
99
possibilidades de se fazer renovadas conexões relacionadas ao reconhecimento da
complexidade que caracteriza a produção do conhecimento emancipatório e a convivência
humana (HABERMAS, 1987b). Portanto, “como necessidade de captar a
multidimensionalidade, as interações, as solidariedades entre os inumeráveis processos
sociais” (MORIN; CIURANA; MOTTA, 2003, p. 57) vivenciados no decorrer de trabalhos
acadêmicos. Creio, finalmente, que esta revisão - com tais características - se justifica pela
perspectiva de que possa contribuir, também para o delineamento de novos desenhos para as
ações formativas, docentes.
Portanto, ao admitir que suas palavras prosseguem produzindo reverberações
importantes a provocarem-me devires inquietantes de pensament(o)ação
83
“[...] não apenas no
plano visível, o mais óbvio, mas também no invisível, igualmente real, embora menos óbvio”
(ROLNIK, 1993, p. 241) decido mergulhar na memória para buscar os fatos e recompor as
marcas que me deixaram seu vigoroso discurso; assim, convidá-lo a uma interlocução
interdimensional na busca de envolver a compreensão de construções lingüísticas dotadas de
sutis sentidos e seus desdobramentos epistemológicos na educação.
2.7.1 Marcas que conduzem
Cada marca tem a potencialidade de voltar a
reverberar quando atrai e é atraída por ambientes
onde encontra ressonância.
Suely Rolnik, 1993.
Uma construção topológica da diferença como fundante. 2001. In:
http://www.faced.ufba.br/~dept02/repege/revista_repege/diferenca_fundante.htm
>. Acesso em 23 de junho de
2003.
82
Ambiente digital <http://www.faced.ufba.br/rascunho_digital/> uma espécie de bloco de notas e comentários
de professores e alunos da UFBA. Criado pelo professor Menandro Ramos, teve em Serpa um entusiasta usuário.
Esses diálogos virtuais foram publicados pela Edufba, em janeiro de 2004.
83
Expressão de Ana Mae Barbosa (1993) ao referir-se à modalidade complexa de conhecimento que articula a
cognição, a intuição, a afetividade e a psicomotricidade.
100
Ao me sentir instigada pelas vigorosas afecções singulares e plurais das sinalizações
do professor Felippe Serpa, pela polissemia de sua mensagem, reflito sobre a diferença como
fundante; nesse sentido, realizo um movimento na direção de ampliar a compreensão para os
dispositivos detonadores de diferença e percebo que eles só ganham potência de ação no
âmago de cada ser ao acionar suas marcas próprias a partir de novos processos de
interiorização, integração e transcendência. As minhas, reativadas por tais ressonâncias
84
e
pelas circunstâncias, parecem se reatualizar no contexto de uma nova conexão levando-me a
ouvi-lo novamente, numa aula:
Há uma luta para homogeneizar as diferenças, mas cada ser humano é uma
totalidade de diferenças. [...] Somos, mesmo, equivalentes a um universo virtual de
particularidades e a homogeneização empobrece [...]
O seu jeito de se referir às tentativas de alguns em homogeneizar as diferenças traz à
pauta uma discussão contemporânea acerca das marcas subjetivas que constituem cada ser
humano e o une à corrente da vida: a particularidade de cada ser, ao realizar uma composição
única a se expressar ante outras particularidades, aponta para a premência da aceitação dos
antagonismos que criam tais subjetividades que devem dialogar entre si, sem excludências.
Conjecturo, entretanto, que apenas o reconhecimento das diferenças, sem a sua aceitação,
acaba por gerar a intransigência com o que há de peculiar no Outro
85
, possibilitando
exercícios de autoritarismo e violência, comumente.
Perscruto em suas palavras que a anuência desse Outro como uma pessoa peculiar - e
não como um mero diferente - implica em operar criticamente com a hibridização discursiva,
de estilos, de pontos de vista, num processo de superação dos congelamentos identitários e de
84
“As ressonâncias se configuram por combinações, parcerias, encontros [...] convergentes ou divergentes entre
manifestações subjetivas” (SERPA, 2002, p. 6). In: http://www.alb.com.br/anais16/sem12pdf/sm12ss08_07.pdf
85
O outro, seja indivíduo, seja grupo humano local ou regional, seja a cultura de cada um, é excluído da
sociedade humana, caso não se submeta à manipulação que conduz à assimilação ao território nacional,
instituinte do Estado e de sua cultura. (SERPA, 2004, p. 150).
101
acolhimento ao multimodal; este fato se desdobra em novas perspectivas epistemológicas de
construção do conhecimento, sobretudo no âmbito educativo institucionalizado, em
dimensões sistêmicas
86
ético-estético-políticas. Uma expressão de Santos, B. S. (2001)
87
sintetiza, de modo oportuno, esta tensão: "As pessoas e os grupos sociais têm o direito a ser
iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito a ser diferentes quando a igualdade os
descaracteriza". E acrescenta: "Este é, consabidamente, um imperativo muito difícil de atingir
e manter" (p. 10). Trago Candau (2002, p. 128, 129) para esta discussão:
Não se deve contrapor igualdade à diferença. [...] a igualdade não está oposta à
diferença, e sim à desigualdade, e diferença não se opõe à igualdade e sim à
padronização, à produção em série, à uniformidade, a sempre o ‘mesmo’, à
‘mesmice’ [...] A igualdade que queremos construir assume o reconhecimento dos
direitos básicos de todos.
Nesse ponto, Felippe Serpa (2004, p. 156) se pronuncia e complementa: “Uma nova
educação precisa ter a concepção de que o conhecimento é plural, multimodal [...] no
processo educativo necessitamos de uma nova ordem, com base nas múltiplas culturas dos
grupos humanos [...].” Presumo que essa nova ordem poderá representar um possível caminho
multiculturalmente comprometido com grupos étnicos que não se vêem contemplados nas
organizações curriculares. Caminhos de transformação da desigualdade educacional que
atinge a muitos. Ele diz mais numa conversa, chama à reflexão: “É preciso investir na
construção de espaços, de lugares, num sentido antropológico, voltados para uma ética da
diferença nas dimensões social, institucional, individual. E todos devem participar de novos
jogos.”
Pode-se perceber, em seu discurso, que ele envolve uma visão dialógica e complexa da
relação entre igualdade e diferença, a inclusão de questões relativas à diferença associadas à
afirmação da igualdade, num reconhecimento das diferenças como elementos presentes na
86
Sistêmica, da palavra sistema, “[...] conjunto organizado de partes diferentes, produtor de qualidades que não
existiriam se as partes estivessem isoladas umas das outras.” (MORIN, 1999, p. 21).
87
SANTOS, B. S. As tensões da Modernidade. Forum Social Mundial, Biblioteca das alternativas, 2001.
Disponível em <htpp//www.forumsocialmundial.org.br
>. Acesso em 17 nov. 2006 às 22h11min.
102
construção da igualdade. Com isso, Serpa (2004, p. 156, 157) admite claramente que “[...] a
base material para a elaboração de pedagogias que tenham como fundante a diferença na
diferença [...] estrutura-se num tempo espacializado, através da horizontalidade em rede num
continuum de possibilidades. A rede, como forma material do tempo espacializado, constitui-
se em um labirinto, de natureza altamente complexa (onde) [...] cada decisão envolvendo um
acontecimento, gera uma situação que exige uma nova decisão, a qual é independente da
situação anterior. Não há fio de Ariadne.” (SERPA, 2004, p. 156, 157).
Apreendo da sua inquietação acerca da realidade e da transformação educativa, uma
referência à escola única “[...] baseada na universalidade do conhecimento científico como
metanarrativa legitimadora do território [...] instituinte do Estado e do poder hegemônico
burguês” alertando, num momento de interlocução numa das escadarias da FACED:
É preciso haver na instituição escolar uma revisão de atitudes coletivas e individuais
em conexões que possam gerar novos lugares no sentido antropológico [...] tais
dinâmicas precisam ser ressonantes e criar novas configurações ético/estéticas,
políticas e culturais [...] geradoras de novos jogosjogantes [...] e nesse processo o
professor precisa sair da verticalidade para a horizontalidade [...]
Há, em seu discurso, um chamamento para a emergência, em especial no fenômeno
educativo formal, de revisões estruturais geradoras de possíveis renovações, de novos olhares
e novos lugares que possam ecoar e romper com o pensamento linear, unitário e reducionista
que ainda prevalece nos artefatos curriculares contemporâneos. Afinal, hoje “a necessidade de
um reconhecimento e valorização das diversas identidades culturais, de suas particularidades
e contribuições específicas à construção do país é cada vez mais afirmada." (CANDAU, 1997,
p. 241).
A conjugação da revisão de atitudes individuais e coletivas, de criação de redes de
múltiplas referências, ao instituir conexões com um sistema mais aberto, flexível e
interpenetrado, parece apresentar para o âmbito educacional, de modo geral, renovadas
possibilidades de geração de novos jogos, como ele afirma. Nesse ponto, observa-se que o
103
Velho Pajé traz para o cerne de seu discurso o professor e instiga-o a rever a hierarquização e
a verticalidade que ainda prevalecem nas teorias pedagógicas de caráter manipulativo, a
investirem numa pretensa homogeneidade social. Ao enfatizar a necessidade de investimentos
em níveis horizontais da profissão, ele chama a atenção para a legitimação da diferença do
Outro e a premência da instauração de um diálogo capaz de transformar a paisagem
curricular num objeto suscetível de convivência de múltiplas culturas - como um território de
lutas, num entre-lugar formado de resistências e abertura para um trabalho com as linguagens,
valores, crenças, poesia e dialogismo. Felippe Serpa (2004, p. 157) reafirma esta necessidade,
enfatizando: “[...] para qualquer pedagogia da diferença, são importantes o acontecimento, a
linguagem, a intensidade do acontecimento, a contextualização da linguagem e seu sentido e a
a intertextualidade e a singularidade de seres ou grupos de seres”.
No redesenhamento desse mapa, segundo ele, o ranço do autoritarismo, do
academicismo, a hierarquização das relações que compõem as estruturas básicas dessa
instituição, tanto no aspecto epistemológico, quanto no sociopolítico, precisam ser
transmutados. Ele aponta premências de formação de um professor multiculturalmente
orientado, de abertura de espaços para o aprendizado do trabalho em parceria, para atitudes de
partilha e de reflexão colegiada, de redescoberta do lugar da poesia nos processos docentes de
modo a alterar as forças que constituem as teias hegemônicas na escola; com tais
posicionamentos, ele alinha-se ao pensamento de Certeau (2001, p. 201) na necessidade da
“[...] busca de espaços-tempos como lugares praticados em comunidades compartilhadas.”
Nessa rota, isso significa repensar a organização do trabalho pedagógico que, ao se
apresentar num caráter monocultural, apóia-se na compartimentalização das áreas e na não-
valorização dos trânsitos entre os campos dos saberes, da diferença e do pluralismo sócio-
cultural – estas últimas muito mais condizentes com as exigências contemporâneas. Nesse
sentido, Pérez Gómez (1993, p. 80) afirma que a escola deveria ser concebida como um
104
espaço de “[...] cruzamento de culturas e exercer uma função de mediação reflexiva daquelas
influências plurais que as diferentes culturas exercem de forma permanente sobre as novas
gerações.” Partindo dessas premissas, a prática pedagógica deve ser tecida intencionalmente
num contexto relacional que permita às pessoas, a partir de referenciais diferentes,
interagirem, acolherem-se e entenderem-se favorecendo a aprendizagem. Tais atitudes,
voltadas para uma educação plural, multicultural
88
, não são uma realidade nas escolas e,
portanto devem ser construídas, estimuladas, rompendo com as ditaduras do imposto e das
definições apriorísticas. (CANDAU, 1997; LINHARES, 2001; MOREIRA, 2002).
A crise profunda pela qual passa a educação pública brasileira possui uma densa
correlação - embora não seja a única - com a formação de professores e suas proficiências.
Assim, tem se tornado cada vez mais importante repensar uma formação docente que busque,
em seus pressupostos e atividades, uma reflexão e uma sensibilização dos futuros professores
à diversidade e à construção/constituição das diferenças no contexto escolar. Isto aponta para
o imperativo de uma nova educação constituída de múltiplas escolas “[...] cada uma tendo
como substrato a cultura do grupo humano respectivo produzindo conhecimento, e, assim,
apropriando-se do espaço sincronizado como produtor e consumidor.” (SERPA, 2004, p.
157). Com a ampliação dos espaços interlocutivos e problematizadores “[...] o Outro e o Eu
conviverão no entre-lugar das suas culturas e formas de vida, no interior de um território
planetarizado. (Op. cit, 2004, p. 156). Em tais premissas há a necessidade de uma nova ordem
na área de educação que opere a partir de referenciais que privilegiem a cultura da diversidade
do coletivo, onde a homogeneização, o culto às estabilidades e a reprodução em forma de
prescrições se distanciem das experiências aprendentes. No cerne dessas argumentações há
uma premência de se desenvolver práticas pedagógicas conectadas a uma sensibilidade
88
"[...] a perspectiva multicultural focaliza caminhos teóricos e estratégias pedagógicas para a preparação de
professores aptos a atuarem no contexto multicultural e desigual em que se insere a educação de forma a
valorizar a pluralidade cultural e desafiar estereótipos e preconceitos a ela relacionados." (CANEN, A; XAVIER,
G., 2005, p. 334).
105
ontológica e histórica que ampliem as probabilidades de solidarização de saberes constituídos
por movimentos sociais e culturais, tendo as pessoas como mediadoras e produtoras de idéias
e conhecimentos.
Os docentes, na perspectiva de intelectuais transformadores, (GIROUX, 1997)
parecem se tornar mais capacitados a lidar com sua prática de modo intercrítico e refutar o
autoritarismo, ainda reinante na escola, a fragmentação do currículo, o trabalho de cunho
tecnicista, a homogeneização do discurso e do modo de viver pela ideologia dominante. E,
nessa condição, encontrar meios de abrir espaços entre o pensar e o agir, admitir rupturas e
superações de atitudes conservadoristas, na perspectiva de passar a ser vistos não como meros
executores ou técnicos, e sim como trabalhadores culturais, responsáveis por desenvolver um
discurso/ação que una perspectivas de múltiplas realizações na escola. Nesse sentido, será
preciso ir contra todas as formas de discriminação e injustiça, ampliar demandas de
valorização de seus universos culturais e de seus alunos, de suas atividades de contestação e
da sua luta para clarificar e modificar as redes de poder existentes. Nessa ordem, a
constituição de renovados espaços para o desenvolvimento de práticas e estratégias
pedagógicas não-discriminatórias, problematizadoras de metodologias, discursos, conteúdos,
atitudes e valores, que minimizem a desigualdade e a injustiça social, ainda reinantes em
nossa sociedade - necessita não apenas serem abertos - mas essencialmente percorridos.
2.7.2 Marcas que se revigoram
[...] Uma vez que é posta em circuito, uma marca
continua viva, quer dizer, ela continua a existir
como exigência de criação que pode
eventualmente ser reativada a qualquer momento.
Suely Rolnik, 1993.
106
No reconhecimento da escola e da sala de aula como ambientes sempre instáveis,
Felippe fala da artesania de ser professor na sensibilidade de lidar com o currículo como
artefato social e individual, na sua tarefa de compor renovadas práxis humanas a partir da
reinterpretação de cada situação peculiar: de um professor capaz de compreender o
conhecimento e a ação curricular como processos discursivos, marcados por relações de poder
desiguais e, nessa direção, tomar como substrato a cultura do grupo humano respectivo, na
elaboração do currículo. Ao buscar avançar em tais reflexões, presumo que uma proposta de
formação docente, que focalize o ensino e a pesquisa numa perspectiva multicultural, poderá
desencadear alternativas de problematização da realidade e teorização da prática em
movimentos de superação de concepções pedagógicas que, ainda presidem as ações docentes.
Estou inclinada a dizer que esta artesania da profissão docente, à qual Felippe se refere, passa
por possibilidades de eles se tornarem agentes-atores-autores (ARDOINO, 1998, p. 28) na
assunção de sua própria prática como uma força política capaz de mobilizar exercícios mais
comprometidos e autônomos da profissão.
Há indícios de que a produção de conhecimento e enriquecimento cultural agregados à
subjetividade docente, ao serem tratados sob um prisma ético-estético-político tende a dilatar
as possibilidades de expressão do ser-no-mundo não se dissociando das dimensões práticas da
vida, sejam elas de ordem cognitiva, afetiva, ética ou política. Entra-se aqui no que se
denomina contemporaneamente de estética da sensibilidade, onde “[...] o comportamento
moral racional é inseparável das questões da felicidade e da auto-realização humana [...]”
(EAGLETON, 1990, p. 23). A razão, ao se inter-relacionar harmoniosamente com tais
dimensões, oportuniza condições de desenvolvimento da criatividade humana vinculada a um
espírito inventivo capaz de suportar a inquietação, conviver com o imprevisível, com o
diferente “[...] construindo uma itinerância [...] na incerteza (que) nos acompanha e (n)a
esperança (que) nos impulsiona.” (MORIN; CIURANA; MOTA, 2003, p. 99).
107
É preciso reconhecer que a escola da contemporaneidade, no entanto, sofre à deriva
com graves problemas de variadas ordens a dificultar a construção de saberes “em situação”:
pela conjugação de problemas culturais, políticos e econômicos que percorrem a sociedade,
pelas excessivas regulamentações e a conseqüente perda de autonomia, pelas emergências e
antagonismos existentes no seu interior. Além disso, por esta possuir, ainda um currículo
cristalizado na disciplinaridade, num saber cumulativo dissociado da vida e próspero em
homogeneizações, a conviver com as dificuldades da legitimidade de diferentes sistemas de
referências humanas e da multiplicidade de atalhos que a vida possui. As práticas
educacionais formais prosseguem expressas pela planetarização do Mercado e perpetuando a
geração de pessoas que, ao vivenciarem as experiências de si mesmas, sentem-se muitas vezes
despreparadas para as estratégias ímpares e híbridas de encontro consigo e das inter-relações
humanas no sentido da abertura, da tolerância e da sinergia. Tornar os currículos orientados
nessas direções, formando professores para essa artesania, para a adoção de uma postura
multicultural crítica
89
tanto nas escolas e nas salas de aula dos sistemas formais de ensino,
quanto em projetos que correm em paralelo ao sistema oficial, parecem constituir-se em
grandes e prementes desafios para a Pedagogia.
Nessa perspectiva, retomo o discurso de Felippe no qual ele reafirma conceitos e
aponta necessidades, instigando-nos a pensar em caminhos que possam viabilizar outras
formas de organização do trabalho pedagógico:
[...] aprender é horizontal. Ensinar é vertical. O professor deve expressar-se por
novas configurações do aprender nos entre-lugares investindo em dimensões éticas,
estéticas, políticas e culturais [...] Atuar na diferença é criar paixão porque o ensino
sem sentido é triste!
Observa-se que o que ele chama de verticalidade inscreve-se, obviamente, numa
ordem hierárquica; nesse viés, ele desafia e concita o professor a atuar na diferença, a ocupar
89
Para Tomaz Tadeu da Silva (1999), o multiculturalismo crítico caracteriza-se por não conceber as diferenças
culturais separadamente de relações de poder.
108
os entre-lugares como espaços políticos e de poder e apregoarem, em suas vozes, o imperativo
de um coletivo feito de parcerias, intercâmbios, compartilhamentos, bem como de instauração
de um novo coletivo escolar que possa superar o "não-lugar”
90
ocupado, ainda por este
profissional. Ao conclamar o professor a expressar-se de outros modos e atuar com paixão,
ele certamente fala em movimento, construção de valores, estruturação de crenças, atitudes e
ações em função de um tipo de eixo pessoal/profissional que o distingue dos outros
profissionais.
Inquieto-me com seu discurso: de que modo o professor poderá sair da verticalidade
para encarar a horizontalidade do subjetivismo da ação curricular contemporânea, com a
formação que ele tem desde que se tornou aluno? Se as marcas são conducentes, ele se
transmutou em professor assemelhando-se aos modelos que teve ao longo da vida; nessa
vertente, entram as dimensões do currículo autoritário com fortes tendências de
homogeneização cultural, das posturas professorais, dos conteúdos e processos avaliativos
dissociados do universo de significação das pessoas que recebeu como legado. Por outro lado,
reflito: Quem poderá propor soluções para a instituição escolar, a não ser aqueles que a
habitam e vivenciam o seu cotidiano? (MIDLEJ, 2008).
Interpenetra-se, com estas questões, na demanda da formação da profissionalidade
docente
91
muitas vezes calcada em modelos que ainda não romperam com concepções
referendadas num sistema educacional excludente, massificador e reprodutivista com o “[...]
predomínio de formas culturais produzidas e veiculadas pelos meios de comunicação de
massa, nas quais aparecem de forma destacada as produções estadunidenses." (SILVA, 1999,
p. 85).
90
Os não-lugares “[...] são tanto as instalações necessárias à circulação acelerada das pessoas e bens (vias
expressas, trevos rodoviários, aeroportos) [...] quanto os próprios meios de transporte e os grandes centros
comerciais [...] Não-lugar por oposição à noção sociológica de lugar [...] um espaço que não pode se definir nem
como identitário, nem como relacional, nem como histórico [...].” (AUGÉ, 1994, p. 36,37, 73).
91
Profissionalidade como características e capacidades específicas da profissão; profissão em ação: condições e
situações que incidem no caráter profissional do trabalho docente. (RAMALHO et al, 1994).
109
Pérez Gómez (1997, p. 31, 32) amplia a discussão: “Há um conhecimento profissional
acumulado ao longo das décadas e séculos por um processo de ensaio e de erro, saturado de
sentido comum [...] que se encontra impregnado de vícios e obstáculos epistemológicos [...].”
Reconhece-se, assim que os saberes docentes, muitas vezes retroalimentados por uma
formação contagiada de racionalidade técnica, herdada do positivismo, vêm prevalecendo
nessa contemporaneidade e servindo de referência para a maioria dos profissionais em geral e
dos docentes em particular. Essa perspectiva reduz a atuação prática a uma mera atividade
instrumental, sem levar, muitas vezes, em conta, o caráter moral e político de todo
desempenho profissional inter-relacionado à resolução dos problemas humanos.
(HABERMAS, 1987a).
Felippe Serpa (2004, p. 272) comenta isso:
Vê-se que a escola, nesse contexto, acaba por arcar com as conseqüências nefastas
provocadas por um processo dessa natureza, compartimentado em uma formação
teórica e prática, sem dar centralidade à práxis em cujas vertentes [...] a formação
teórica vai circundando a prática à medida que surge a necessidade.
Ele parece apontar para um processo formativo voltado à realidade sócio-cultural do
trabalho pedagógico com o respaldo do instrumental da Ciência relacionado à atividade
humana. Nesse sentido, Canen (2003 a, b) reafirma que uma ação desta natureza não
representa a anulação de Ciência: ela advoga pela premência de ações formadoras que
busquem tensionar verdades pré-estabelecidas, estruturar e ressignificar os princípios de
ensinar e aprender interligados à valorização da pluralidade cultural e questionamentos sobre
a construção de preconceitos e discursos que reforcem discriminações e estereótipos. A
referida autora argumenta nas citadas obras, em favor de uma formação docente que una o
global e o local em sínteses e hibridizações criativas a conexões com o modelo de professor
pesquisador multiculturalmente comprometido.
110
Sabe-se, porém que há uma “[...] imensa dificuldade em romper com o solipsismo e a
insalubridade disciplinares que fazem da experiência do aprendizado um delírio em
fragmentos [...]” (MACEDO, 2006, p. 96) e nesse sentido, quaisquer movimentos que
envolvam atos de transformação, não se processam sem dificuldades e lutas.
Nesse ponto trago à pauta mais questões acerca desta temática, que me inquietam:
Como (re)construir noutros níveis um processo secular didático-pedagógico, ainda
contaminado por epistemologias normativas? Como ampliar possibilidades de renovadas
formas de tratar-se a produção de conhecimentos na presença da concepção hegemônica
mecanicista, fragmentária, que muitos ainda têm da vida? De que modo, com a escola que se
tem, é possível tornar viável uma ação docente mais integrada, inventiva e autônoma? Em que
medida as dimensões horizontais da profissão e a criação de entre-lugares poderão ser
acionadas na formação docente e na práxis pedagógica? Como, com essas descontinuidades,
sem resolvê-las ou ressignificá-las, provocar o surgimento de algo novo nesse âmbito?
Inquieto-me na busca por uma educação que se sobreponha aos desafios apontados. Mais
ainda quando estes apontam para uma crescente desvalorização profissional e pessoal do
professor aliada ao sucateamento das instituições públicas, a desarticulação das políticas
públicas brasileiras, a alienação e desmotivação por parte de um grande contingente de
professores e alunos.
2.7.3 Marcas que transcendem
A marca conserva vivo seu potencial de
proliferação, como uma espécie de ovo que pode
sempre engendrar outros devires: um ovo de
linhas de tempo.
Suely Rolnik, 1993.
111
Ao enfatizar a necessidade de dar centralidade à práxis, Serpa (2004, p.133) assinala
caminhos na direção da “[...] arte de ser professor” e revela que esta especial composição
pode encontrar-se na possibilidade de expressão de singularidades em instâncias
participativas, na proposição de atividades próprias num sentido sociohistórico. Busco, por
minha vez, vertentes que possam me ajudar a interpretar sua proposição e encontro em
Habermas (1987 a, b) a necessidade de um investimento numa ciência social crítica que
contenha, em si, aportes humanísticos que possam auxiliar os professores a informarem-se a
respeito de si mesmos e sobre as ações que precisam cultivar e empreender a fim de
sobrepujar suas limitações.
Ao ampliar leituras acerca da temática, ao mesmo tempo, releio as falas de Felippe,
anotadas, e seus escritos extemporâneos - em busca de fissuras na direção de criar
possibilidades de rompimento com o estabelecido, propositadamente, por um plano
estratificado. Procuro, nesse campo específico, vislumbrar algumas saídas. Ao mesmo tempo,
ajo no sentido de enveredar por uma cultura da complexidade e do multiculturalismo crítico
ou revolucionário
92
(McLAREN, 1997, 2000) estendendo-os, progressivamente e de modo
sistêmico, às minhas ações como formadora docente. Agora, instigada por esse processo, ajo
na perspectiva de produzir e consumir conhecimento nos entre-lugares das culturas diversas e
dos modos de viver dos professores entendendo-os como agentes revolucionários "dentro de
uma política de crítica e compromisso com a justiça social." (McLAREN, 2000, p. 123). Nas
palavras do Velho Pajé encontro ressonâncias a referendarem as minhas posições e vislumbro
a expectativa de que, a despeito das voltas do caminho, há indicações de que a formação de
professores precisa ser realizada na direção de prosseguir encorajando-os às resistências de
92
Fundamentado na Pedagogia Crítica, McLaren (2000) vem trabalhando questões discutidas
contemporaneamente pela chamada perspectiva pós-moderna. Referindo-se ao multiculturalismo, pauta quatro
tendências: multiculturalismo conservador, multiculturalismo humanista liberal, multiculturalismo liberal de
esquerda e multiculturalismo crítico ou revolucionário.
112
enquadramento da profissão docente a determinados padrões não-conflitivos, harmoniosos ou
consensuais.
Ele deseja que a escola possa constituir-se num território de abertura para a
diversidade, num lugar de partilha e de reflexão coletiva, num locus de diálogo entre os
saberes, num ambiente propiciador de dinâmicas de transformação humana e social
participada, integrando-a ao espaço cultural da cidade. Posso vislumbrar em seu discurso a
conclamação aos professores para que evitem os estereótipos e os enquadramentos
profissionais impregnados de ações positivistas, cartesianas
93
oriundos das esferas políticas
instituídas. Ao estimulá-los a empregar dinâmicas ressonantes, provocar fissuras no sistema e
redução do controle hierárquico, Serpa (2004) parece incitá-los a criar processos
participativos de adquirir uma atitude investigativa como uma dimensão da prática, a analisar,
refletir a realidade da escola (retirando-a de um lugar abstrato). Nesse sentido, convoca os
professores a ampliar o papel desta instituição, a fazer o diferente, criar movimentos de
minimização das relações competitivas, corporativas, autoritárias, abrindo-se à diversidade
cultural, étnica e de gênero. E, ainda: através da socialização da informação, da discussão
sobre as diferenças, articular a escola com a vida da cidade, agregar pessoas, a fim de superar
a tradicional dicotomia entre a educação formal e a educação não-formal.
Ao posicionar-se em favor da adoção de uma postura multicultural, em que uma
política da diferença conviva em tensão com uma política da igualdade ele aponta para a
necessidade de se trabalhar com teorias que favoreçam análises mais elaboradas dessa
produção de articulação entre os diferentes. Santos (2001, p. 21) amplia a perspectiva do
discurso de Serpa com suas contundentes palavras: “É a emergência das lutas contra estas
formas de discriminação que veio a trazer a política da diferença. E a política da diferença não
se resolve progressisticamente pela redistribuição: resolve-se por reconhecimento”.
93
A perspectiva epistemológica positivista é marcada pela visão elementarista e determinista sobre a realidade,
próprias à física newtoniana, na qual a metáfora utilizada para descrever o universo, como uma máquina perfeita,
é marcada pelo pensamento cartesiano. (CAPRA, 1991, p. 49-69).
113
Ambos parecem chamar a atenção para a necessidade de se impedir que a focalização
nas diferenças contribua para isolar grupos, para criar guetos e, conseqüentemente, para
ampliar, na coletividade, a fragmentação que se deseja suprimir. O que é preciso é que o
professor “[...] não seja o instrumento do poder hegemônico de caráter universal [...].”
(SERPA, 2004, p. 168).
Particularmente, o sentimento é o de vê-lo sinalizando-me para o acionamento de
diferentes olhares/marcas para o meu objeto de estudo ao fazer-me vislumbrar renovadas
vertentes de investigação/ação/reflexão - voltadas para um compromisso a ser assumido
coletivamente com professores parceiros desta tarefa, com centralidade na práxis. Pude
compreender, nesse diálogo, que a caminhada investigativa não deveria apenas desvelar ou
interpretar a realidade, mas ao mesmo tempo, num jogo de puro amor à vida, contribuir para a
reinvenção da escola que aí estava. Enquanto eu refletia nas possibilidades de ressignificação
dessa tarefa, nas aulas, ele repetia, de modo incansável: “[...] é preciso reconstruir a existência
humana, conviver com o diferente, dar voz a quem nunca teve palavra, abrir espaços de
convivência auto-organizativa na trama da sociedade mais ampla [...] para que essas vozes
possam ressoar e celebrar a diferença nesse jogojogante [...].” E mais me instigava a seguir
inventando novos caminhos, a prosseguir reinterpretando novos referenciais de análise na
(a)ventura do conhecimento, a partir das minhas singularidades.
Como professor e pesquisador atento, Felippe Serpa fez-nos compreender mais
detidamente os seus propósitos quando se referia “[...] ao tempo e às circunstâncias que
pedem a direção atenta do olhar docente e, em especial a sua ação [...],” à importância de a
Universidade ser um espaço aprendente das diferenças e precisar trabalhar mais detidamente
os valores das culturas múltiplas e das lutas humanas: com isso, transformar-se numa
Comuniversidade (Comunidade mais Universidade). Seu propósito, claro, é o de criar
114
condições de “[...] a comunidade transversalizar a escola e com o tempo, esta passar a ser a
própria comunidade [...].”
A sua vida dedicada à ética, a sua presença imanente em minhas ações como
pesquisadora acadêmica e formadora de professores, instiga-me incansavelmente para o
jogojogante e a vida vivente voltada para a luta hegemônica, mercadológica, que existe na
sociedade no sentido de homogeneizar as diferenças a fim de manter o sujeito como
consumidor passivo, domesticado e “[...] cego de olhar certas coisas da cidade.” (GADOTTI,
2005).
94
O pensamento complexo de Serpa, ao atribuir à incerteza um lugar e uma
legitimidade multirreferencial nas hostes escolares, nos convida incessantemente a ressaltar a
relatividade das certezas, a pluralidade de olhares, ao exercício de significações mestiças e
enriquecedoras, a uma profunda reforma de pensamento e tomada de posições
epistemológicas transgressoras - de religação de saberes e experiências.
Hoje me sinto mais capaz de perceber o seu discurso e de constatar que as afecções
produzidas por este, nos espaços aprendentes da FACED significam, para mim, uma espécie
de argamassa no resgate da alegria e do prazer em aprender em ambientes escolares, na
construção de sentidos de maior tolerância e respeito ao Outro. E mais: de compreensão e
busca de sermos capazes de comungar com o que nos ultrapassa. (MORIN, 2002). Nessa
direção, relembrar suas palavras e compreender que parece ser “[...] no investimento numa
Pedagogia que conviva com a multiplicidade, com um universo imanente de diferenças que
muitos jogos jogados poderão ser virados [...].”
95
E assim, trazer para a ação cotidiana o desassossego das ações que aprendi com ele: a
revisar atitudes individuais e coletivas, dar centralidade à vida, ao aprender, à ética do
aprender em novos territórios - nos entre-lugares – e, com isso, encontrar motivações para,
94
GADOTTI, Moacir. A questão da educação formal e não-formal. Disponível em:
http://www.paulofreire.org/Moacir_Gadotti/Artigos/Portugues/Educacao_Popular_e_EJA/Educacao_formal_nao
_formal_2005.pdf Acesso em: 21 dez 2006 às 10h30min.
95
Serpa (2000), comunicação oral.
115
penetrando pelas fissuras, purgar a ansiedade, a mediocridade e a banalização a que a
existência está submetida em muitas instâncias. Nessas ações conscientes, cumprir suas
expectativas de transfigurar o real enquanto potencializador das capacidades de afirmação da
vida. E seguir, como ele queria, numa práxis do movimento relacionado à linguagem, gerando
desenvolvimento auto-reflexivo e auto-organizações importantes. Anuncio que, de um modo
mais pontual, isto será exposto no item que se segue a este.
Finalmente, a partir das vigorosas marcas que em mim deixou, ouço-o nos entre-
lugares existenciais a inspirar-me com apelos à ação, à incorporação de novos engajamentos
no que se refere à diferença nesse interminável processo de construção da profissionalidade
docente, quem sabe numa perspectiva multicultural. Ao instigar-me, vejo que não tem a
pretensão de propor respostas certas e definitivas, mas provocar-me à abertura para novas
perguntas e renovadas leituras da realidade, ao enfrentamento dos obstáculos, à construção de
superações no campo dos possíveis ao fazer render em mim as marcas que insistem em
proliferar incessantemente... De minha parte, por acreditar que “somos apenas os vazios entre
os nós da rede”
96
freirinianamente convoco-o ao prosseguimento do diálogo, à manutenção
dessa chama acesa, a crepitar... Nesse convite, apóio-me no grande Guimarães Rosa (1986, p.
319) que diz, magicamente: “As coisas assim a gente mesmo não pega nem abarca. Cabem é
no brilho da noite. Aragem do sagrado. Absolutas estrelas.”
2.8 Marcas na linguagem, no processo de reelaboração dialógica
Todas as esferas da atividade humana por mais
variadas que sejam, estão relacionadas com a
utilização da língua. Não é de surpreender que o
caráter e os modos dessa utilização sejam tão
variados como as próprias esferas da atividade
humana.
Bakhtin, 1992.
96
BICARATO, Paulo. In: http://www.alfarrabio.org/ Acesso em 10 nov. 2006 às 23h45min.
116
A partir das anotações realizadas neste item anterior reconheço outro conceito
essencial presente na obra de Bakhtin (1992, 1999): o processo de reelaboração dialógica
pelo qual passam as palavras
97
alheias até que se tornem próprias do novo enunciador. É o
que o citado autor (1999) chama de vozes que se mantém prenhes da expressividade alheia,
mas à medida que vão se relacionando com outras vozes - no campo da subjetividade - vão
assumindo a expressividade do novo enunciador. Nesse movimento, a linguagem
98
se
referenda como um elemento que carrega ideologias, concepções de mundo, percepções e
crenças e medeiam as atividades sociais nas quais os conhecimentos dos seres humanos se
modificam. (BAKHTIN, 1999; VYGOTSKY, 1991).
Adentra por tal discussão, a teoria da ação comunicativa como aventada por Habermas
(1987d). Ela fornece ao lado das demais teorias, um quadro teórico relevante ao enfocar a
constituição da pessoa na condição de avaliadora de suas próprias ações através da linguagem
e em construção conjunta. A intersubjetividade funciona como a mola de sua teoria, uma vez
que a linguagem, como discutida por Habermas (1987d) constitui a categoria fundante para o
restabelecimento da razão no interior do pensamento e do conhecimento contemporâneos.
Conforme ele salienta, é no agir comunicativo, na relação, portanto, entre a linguagem e a
ação, que se dá e se renova o padrão de convivência entre as pessoas em pretensões de
questionamentos, argumentações e contra-argumentações. Estes atos consistem em tornar a
linguagem a sua categoria central, não negando as condições sociais, culturais, subjetivas e
históricas dos sujeitos. Nessa ótica, prescinde-se de ficar separados do saber pré-teórico que
se tem: não há necessariamente que se ficar nem limitados ao saber do mundo e da vida,
tampouco isolados artificialmente da ciência. Assim, a ação comunicativa é eminentemente
97
Para Bakhtin (1999, p. 36, 127) “a palavra é o fenômeno ideológico por excelência” [...] e a língua “constitui
um processo de evolução ininterrupta que se realiza através da interação verbal social de locutores.”
98
Em seus estudos Bakhtin (1999) assevera que a linguagem não pode ser investigada dissociada do contexto
social onde ela ocorre, onde ela se realiza.
117
interativa, nasce do coletivo, da equipe, é dialógica e emerge do mundo vivido. É comunitária,
busca o entendimento, persegue a negociação, o acordo; busca o consenso; é axiológica
porque acredita na validade das normas discutidas. Habermas (2002, p. 30) reafirma isso ao
indicar como constituintes desse sistema de representação: o mundo objetivo, o mundo social
e o mundo subjetivo - como meios de alcançar o entendimento recíproco acerca de algo: “[...]
somos sujeitos capazes de linguagem e de ação, nós temos, antes de qualquer ciência, um
acesso interno ao mundo da vida simbolicamente estruturado, ou seja, aos produtos e
competências de indivíduos socializados.” O agir comunicativo, pressupõe, assim, acordos
comunicacionais para que se proceda ao acionamento dos três mundos citados.
Ao trazer para o âmbito educacional e mais especificamente, para o escolar, tais
conceitos, posiciono-me pelo foco em ações de linguagem em cursos de formação nos quais
professores formadores e pesquisadores, envolvam-se em negociações e na construção de
ambientes de análise e intercompreensão das práticas discursivas da e sobre a sala de aula.
2.8.1 Ações de linguagem e as possibilidades de evolução de conceitos
O próprio locutor como tal é, em certo grau, um
respondente, pois não é o primeiro locutor, que
rompe pela primeira vez o eterno silêncio de um
mundo mudo [...].
Bakhtin, 1999.
[...] todo texto é absorção e transformação de
outro texto. No lugar da noção de
intersubjetividade instala-se a noção de
intertextualidade.
Kristeva, 1993.
Ao aprofundar as premissas expostas acima, Smyth (1992), parece sintonizar-se com
as discussões de Freire (1983b) e operacionaliza o processo crítico reflexivo propondo um
118
trabalho que leve em consideração quatro formas de ações de linguagem que estão ligadas a
um outro conceito desenvolvido por Bakhtin (1999): o processo de reelaboração dialógica.
Neste, as palavras são reconhecidas como palavras alheias até serem apropriadas pelo
falante/locutor ou interlocutor. Neste sentido “o locutor [...] pressupõe não só a existência da
língua que utiliza, mas também a existência dos enunciados anteriores.” (BAKHTIN, 1999, p.
291).
Assim, pesquisas foram realizadas tendo a essencialidade de ações de linguagem na
análise de situações escolares (LIBERALI, 1999; 2004; CELANI, 2002; 2004; ROMERO,
2004; HORIKAWA, 2004); estas revelam a importância da organização discursiva na
construção do processo de reflexão crítica sobre os contextos sociais e políticos que envolvem
o discurso de um falante; revelam a constituição de subjetividades que podem se manter
carregadas de expressividades alheias. Esse processo, descrito pelas palavras de Habermas
(1990 b, p. 297), diz mais: “À medida que os planos e ações de diversos atores se envolvem
no uso da língua e este orientado para a comunicação no tempo histórico e sobre o espaço
social, as tomadas de posição [...] ganham uma função chave para a prática do cotidiano.”
Vygotsky (1991, p. 92-94), por sua vez, dá uma contribuição essencial ao
entendimento dialético desses processos vinculados a fenômenos humanos:
Ao forçar sua lenta trajetória para cima, um conceito cotidiano abre caminho para
um conceito científico e o seu desenvolvimento descendente. Cria uma série de
estruturas necessárias para a evolução dos aspectos mais primitivos e elementares de
um conceito, que lhe dão corpo e vitalidade. Os conceitos científicos, por sua vez,
fornecem estruturas para o desenvolvimento ascendente dos conceitos espontâneos
da criança em relação à consciência e ao uso deliberado.
Nessa constituição o ambiente escolar demonstra que é essencial para a evolução dos
conceitos que estão em desenvolvimento. A linguagem ao se constituir um veículo de
construção social, compõe com o pensamento e permite um funcionamento psicológico
119
superior - pensamento abstrato, memorização, atenção voluntária, ações conscientemente
controladas, planejamento, associações, intenções, comparações. (VYGOTSKY, 1987, 1991).
Vygotsky (1991, p. 59-65) afirma que no desenvolvimento cultural do indivíduo todas
as funções aparecem duas vezes: primeiro no nível social e depois no nível individual;
inicialmente entre as pessoas (interpsicológica ou social) e depois no seu interior -
intrapsicológica ou pessoal, colocando em destaque, assim, o lugar das interações sociais
como espaço privilegiado de construção de sentidos, especialmente se houver a interação e a
intermediação, através de atividades mediadas do outro. Acerca disso ele afirma:
Todas as funções superiores originam-se das relações reais entre os indivíduos
humanos. [...] O aprendizado desperta vários processos internos de
desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando o indivíduo interage
com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros.
(VYGOTSKY, 1991, p. 64, 101).
Vê-se que na concepção sociohistórica é dada uma importância especial à interação
entre as pessoas, assim, também à escola: o aluno precisa do professor (mediador mais
experiente) e dos colegas para exercer sua ação sobre o meio social e cultural,
sistematicamente. Numa relação dialética
99
com estes, numa intervenção deliberada, ele deve
se tornar capaz de desenvolver e potencializar sua percepção, organizar os elementos
percebidos, compreender o inter-relacionamento das ações humanas e dos fenômenos
naturais, desenvolvendo funções psicológicas cada vez mais sofisticadas. Sob esse prisma, o
uso da linguagem se constitui na condição mais importante do desenvolvimento das citadas
funções.
Assim, desenvolve-se porque se aprende. É com base nessa relação de unidade - não
de identidade - entre aprendizagem e desenvolvimento, que Vygotsky criou o conceito de
zona proximal de desenvolvimento de aprendizagem (ZPD) que significa,
99
Dialético aqui entendido como o modo de compreensão da realidade como essencialmente contraditória e em
permanente contradição. (KONDER, 1986).
120
[...] a distância entre o nível de desnvolvimento real, que se costuma determinar
através da solução independente de problemas e o nível de desenvolvimento
potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um
adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. (VYGOTSKY, 1991, p.
97).
Para a viabilização desse processo precisa ocorrer o mecanismo da internalização
envolvendo as interações que foram descritas acima - interpsicológica e intrapsicológica. O
papel do professor, nessa concepção teórica, reveste-se de novos e sutis contornos e
aproxima-se de outros teóricos: exige dele níveis mais ampliados de intervenção e,
conseqüentemente, de contextos discursivos pautados em atos dialógico-problematizadores
(FREIRE, 1983a, b, c e d; 1993; 1996a; 2000) que envolvam o processo de reelaboração
dialógica (BAKHTIN, 1992, 1999) já analisado neste capítulo.
2.8.2 Construção de contextos discursivos
[...] ver tudo com os olhos recém-abertos, de
maneira que o que é velho e familiar se funde com
as novidades que se vêem em uma unidade de
várias estratificações.
Gadamer, 1997.
Este estudo, ao dirigir seu foco para o professor na averiguação do emprego de
dispositivos de formação docente emancipatórios e suas condições de viabilização e
explicitação dos saberes e experiências, buscou analisar as possibilidades de acionamento de
novas organizações discursivas que permitissem a este profissional analisar criticamente suas
práticas e reconstruí-las em outros níveis. Verificou as possibilidades de (re)construção de
conhecimentos didáticos pedagógicos e de desenvolvimento de uma sensibilidade existencial
e histórica do professor na sua condição socioexistencial.
121
Assim, as ações de linguagem, acionadas nesta investigação-ação e abordadas a partir
das discussões freirianas (FREIRE, 1983b) e da operacionalização de Smyth (1992)
encontram-se associadas a questões que a conduzem e estão descritas em pormenores nos
capítulos da problemática e dos elementos epistemológicos e metodológicos deste documento.
Conceitualmente, elas se organizam na direção de imbricar o cotidiano e o científico
(VYGOTSKY, 1993) visando a produção de novos conhecimentos (a prática relaciona-se
com a teoria formal criando possibilidades de transformação). O citado processo envolve
quatro formas de ação (SMYTH, 1992) que estão associadas a questões condutoras e são
propostas para acontecerem em sessões reflexivas. (MAGALHÃES, 2004). Devem orientar os
professores ao longo de um trabalho investigativo:
Descrever (O que fiz? O que faço?). Esta ação caracteriza-se pelo uso de verbos
concretos, poucas expressões de opinião;
Informar (O que agir desse modo, significa? Qual o significado de minhas ações?).
Caracteriza-se pelo uso de expressões explicativas;
Confrontar (Como cheguei a agir assim?). Caracteriza-se pelo uso de expressões
de opinião e argumentação;
Reconstruir (Como posso agir de modo diferente?) Caracteriza-se pelo uso de
verbos no futuro do pretérito.
Ao operar com tais ações Smyth (1992) entende que, para se conceder poder
emancipatório ao professor, é necessário questionar a validade ética de certas práticas e
crenças, como meio de restituir ao professor seu papel de intelectual. A idéia basilar é que os
participantes, numa tarefa conjunta com o coordenador do processo, se voltem para suas
próprias ações, envolvam-se com elas, analisem-nas, reflitam acerca delas e com elas,
aprendam a melhorá-las, melhorando-se. Este processo vivenciado como “a reorganização ou
122
reconstrução de experiências que permitem novos entendimentos de determinada situação ou
ação.” Grimmet e Erickson (1988, apud ROMERO, 2004, p. 190-191).
Ao sistematizar tal procedimento, tanto um quanto o outro, devem criar oportunidades
para discutir os registros elaborados em tentativas de entender, questionar, explicitar e
expandir as temáticas envolvidas na realidade prática.
As sessões nomeadas reflexivas constituem-se como uma nova organização discursiva
que se iniciou a partir da necessidade de proporcionar contextos interativos críticos-reflexivos
para a formação de professores. Elas têm como meta, além dessa, a contextualização da inter-
relação “[...] entre a teoria vista no curso e a prática na sala de aula, uma vez que o professor
vivencia os papéis de avaliador das práticas didáticas do colega e o de avaliado pelo colega.”
(MAGALHÃES, 2004, p. 82).
Para operacionalizar a ação descrita acima, utilizamos como ferramenta para a
reflexão crítica (LIBERALLI, 2004), instrumentos de registro denominados por Zabalza
(1994) de Diários de aula e por Alarcão (1991; 1996a; 1996b; 1998a; 1998b; 2004) e André e
Darsie, (1999)
100
de Diários reflexivos. Eles foram empregados como expressão
101
e
mobilizou atos de escritura na direção de informar e interpretar os fatos e os dados, a
aprofundar observações e análises em situações concretas no/do cotidiano;
102
além disso,
registrar e relatar caminhos de ida e volta, em movimentos reflexivos, intencionais “[...]
necessários para permitir uma base comum e provisória para que as discussões e certo
entendimento tivessem lugar.” (MAGALHÃES, 2004, p. 74).
A escritura dos diários reflexivos foi acionada, portanto, como instrumento para o
registro sobre a prática desenvolvida pelos professores, como ferramenta para a construção
100
Assumidos por mim com a denominação de diários reflexivos, eles se caracterizaram, durante todo o
processo, como instrumentos de registro da própria prática desenvolvida pelas professoras-alunas.
101
Bakhtin (1988, p. 111) aponta que expressão “[...] é tudo aquilo que, tendo se formado e determinado de
alguma maneira no psiquismo do indivíduo, exterioriza-se objetivamente para outrem com a ajuda de algum
código de signos exteriores.”
102
O cotidiano, aqui, na perspectiva de Heller (1970) encontra-se impregnado de ações espontâneas, mecânicas,
rotineiras.
123
interna e externa da reflexão crítica. Desse modo, com este procedimento buscou-se “[...] a
compreensão das formas pelas quais o professor enfrenta a complexidade da sala de aula,
utiliza as ferramentas teóricas e reconstrói estratégias e recursos.” (HORIKAWA, 2004, p.
123). Seus aspectos operacionais, neste estudo, serão tratados no capítulo referente aos
elementos epistemológicos e metodológicos; por ora, no práximo item, será abordada a
utilização do diário reflexivo na sua condição de dispositivo de linguagem. (ALARCÃO,
1991, 1996 a e b, 2004)
2.9 Os diários reflexivos e a metacognição
Os diários tornam os educadores metacognitivos
sobre suas ações ao se definirem o que sabem, o
que sentem, o que fazem e por que o fazem.
Zeichner, 1981.
O estudo dos processos metacognitivos
103
, através dos quais se aborda a estrutura do
pensamento das pessoas e que envolve a reflexividade em dimensões metapráxica e
metacomunicativa, tem utilizado conceitos diferentes para designar os mesmos componentes
das teorias implícitas destes. Para configurar este aspecto do saber dos profissionais da
educação como agentes sociais, têm sido utilizados termos diversos como: conhecimento
prático pessoal, reflexão como experiência de construções e reconstruções pessoais,
epistemologia da ação, da reflexão e do conhecimento em ação, modos pessoais de entender,
filosofias instrucionais, teorias da ação, ação comunicacional, sabedoria prática, metáforas,
crenças, lucidez. (MIDLEJ, 2004b).
Qualquer que seja o vocábulo ou a expressão, ele/a designa, de modo implícito, uma
forma de reflexividade quando o sujeito toma sua própria ação, seus próprios funcionamentos
103
Ao fazer uso da metacognição, a pessoa torna-se uma espectadora de seus próprios modos de pensar e das
estratégias que emprega para resolver problemas, buscando identificar como aprimorá-los. (DAVIS et al, 2005).
124
psíquicos como objeto de sua observação e de sua análise, tentando perceber e compreender
sua própria maneira de pensar e agir. Por meio de interiorizações progressivas, condutas de
desvelamento das experiências e das percepções, explicação, argumentação, dá-se o “[...]
pensar sobre o pensar entrelaçado à reflexão-na-ação e à reflexão-sobre-a-ação-na-ação
educativa.” (SCHÖN, 1992, p. 80-91) envolvendo, em termos vygostskianos, uma interação
mediatizada e ativa entre os diversos elementos multifacetados da sociedade. Ainda que tais
conceitos se apresentem como recentes, as origens desta perspectiva remontam a John Dewey
(1979a, p. 25), o qual, em 1933, defendia que no ensino reflexivo ensejava “o exame ativo,
persistente e cuidadoso de todas as crenças ou supostas formas de conhecimento à luz dos
fundamentos que as sustentam e das conclusões para as quais tendem”. De seu pensamento,
portanto, deriva a necessidade de formação de profissionais da educação que venham a refletir
sobre a sua própria prática na expectativa de que tal ação venha a se constituir num
instrumento de desenvolvimento do pensamento e da sua atividade.
Donald Schön (1992, 2000) foi quem mais diretamente retomou tais conceitos, foi um
dos autores que teve maior peso na difusão do conceito de reflexão ligado à ação,
contribuindo sua obra para popularizar e estender ao campo da Educação as teorias sobre a
epistemologia da prática. Desse modo, a partir da noção de reflective action de Dewey, ele
argumenta favoravelmente a essa ação no exercício profissional, afirmando que, na medida
em que a pessoa conversa com a situação e ouve o que ela tem a dizer, verbaliza os seus
próprios processos de reflexão e tende a avançar na concepção e na realização de seu fazer. A
teoria de Schön (1992, p. 80-91) é centrada em noções fundamentais que caracterizam a
reflexão sobre a prática do dia-a-dia. A primeira delas é o conhecimento-na-ação que se refere
ao conhecimento demonstrado na execução da prática, o que se denomina aqui de saber
experienciado, um a priori. É a inteligência manifestada no know how, na experiência. A
descrição do que se praticou correspondente à reflexão que ocorre simultânea à ação, ele a
125
denomina de reflexão-na-ação. Há, nesse caso, apenas um distanciamento breve da situação e
os profissionais aprendem a partir da análise e interpretação de sua própria atividade. Schön
(1992, p. 85) afirma que esse processo tem a ver com incerteza e confusão, enfatizando muito
bem que aprender sem ficar confuso é impossível.
A reflexão, realizada a partir da reconstrução mental da ação, é chamada por ele de
reflexão-sobre-a-ação e refere-se às análises que a pessoa realiza a posteriori sobre as
características e processos de sua própria atividade, o que lhe permite refletir a partir de
retrospectivas do vivenciado, configurando-se, aí, numa tomada de consciência sobre seu
autodesenvolvimento. Este autor, ao referir-se à profissão docente sob a ótica da
reflexividade, afirma:
[...] um professor reflexivo tem a tarefa de encorajar e reconhecer, e mesmo de dar
valor à confusão de seus alunos. Mas, também parte das suas incumbências
encorajar e dar valor à sua própria confusão [...] se não ficar confuso jamais poderá
reconhecer o problema que necessita de explicação. (SCHÖN, 1992, p. 85).
Segundo Schön, o exercício da indagação reflexiva, ao proporcionar um retorno ao
que foi realizado, produz um efeito reverberador no sujeito, que o faz repensar a ação
praticada, dando-lhe novos subsídios para reformulá-la em outros níveis, se for o caso. É a
reflexão-sobre-a-reflexão-na-ação ato que ultrapassa os primeiros movimentos reflexivos e
que facilita ao profissional uma tomada de consciência dos problemas da práxis educacional,
superando os limites didáticos da própria aula. (SCHÖN, 1992, p. 54-59).
É relevante ressaltar que as ações cognitivas e metacognitivas remetem ao
desenvolvimento das funções mentais superiores, constituindo-se num dos pontos centrais da
teoria vygostkiniana: as funções psicológicas superiores são de origem sócio-cultural e
emergem de processos psicológicos elementares, de origem biológica, como estruturas
orgânicas. (REGO, 1995, p. 26).
Assim sendo, a primeira atitude necessária para uma postura reflexiva é a mentalidade
aberta e flexível que não limite a mente e a impeça de considerar novos problemas e de
126
assumir novas idéias. Nesse sentido, a pessoa integra um desejo ativo de escutar mais do que
um lado, de acolher de modo crítico os fatos independentemente da sua fonte, de prestar mais
atenção e ampliar o olhar sem melindres a todas as alternativas, de reconhecer o erro,
admitindo a possibilidade de relativizar mesmo aquilo em que mais acredita. (DEWEY, 1979
b). Esta atitude conduz, portanto, a identificar e a respeitar diferentes nuanças, a prestar
atenção nas alternativas disponíveis, a indagar das possibilidades de errância, ao aceitar
cometer erros e a considerá-los como inerentes ao aprendizado. Além disso, a assumir riscos,
a administrar incertezas, a examinar as razões do que se passa na sua ação educativa, a
investigar evidências conflituosas, a procurar várias respostas para a mesma pergunta, a
refletir sobre a forma de melhorar o que já existe. (CHARLIER, 2001).
Falar de ações reflexivas e de profissionais reflexivos remete-nos a novos estudos que
têm superado os pressupostos da racionalidade técnica, de algum modo impregnado nas idéias
de Schön e se voltado em direção a uma racionalidade crítica. Tais estudos, ao revalorizarem
a articulação entre teoria e prática no processo formativo docente reconhecem a importância
dos saberes da experiência que, intensificados pela reflexão crítica se reconstrói em
ressignificados diálogos na prática social. (MIDLEJ, 2004b).
Na perspectiva emancipatória tem-se, nos estudos do pesquisador norte-americano
Kenneth Zeichner a defesa da luta em favor da justiça social
104
e “[...] de programas que
eduquem professores para serem pensadores autônomos e práticos reflexivos [...] e tratem
seriamente o conhecimento produzido por estes [...].” (ZEICHNER, 2000, p. 208 e 220). Ele
enfatiza a reflexão que incorpora critérios morais e éticos no discurso sobre a ação, a
considerar que os formadores de professores têm como principal desafio ajudá-los a enxergar
as conexões entre a sala de aula e os contextos sociais e políticos nos quais ela se insere.
(ZEICHNER, 1993).
104
Para ele, justiça social implica o compromisso de a escola oferecer iguais oportunidades de acesso e educação
de qualidade para todos os alunos.
127
Kemmis (1999) por sua vez advoga que a reflexão implica num processo de auto-
avaliação que coloca a pessoa dentro da situação como partícipe ativo da atividade social,
posicionando-se. A reflexão crítica, para o citado autor, implica uma visão da prática como
práxis, uma ação informada que leva em conta tanto o pensamento quanto a ação. Nesse
sentido, os denominados diários reflexivos, pelas suas características lingüísticas e
discursivas, são compreendidos como instrumentos essenciais da reflexão crítica porque
recupera a prática “[...] pela descrição das ações, discussão das teorias que embasam essas
ações, autocrítica e proposta de reconstrução destas.” (LIBERALI, 2004, p. 102).
Com base em tais pressupostos, aposto na articulação entre pesquisa e formação,
valorizando, nesse processo, diferentes abordagens teóricas e o trabalho com o diário
reflexivo, também na perspectiva de desenvolver a percepção dos professores para a
importância da reflexão intencional, sistematizada e crítica. Assim, posiciono-me, a exemplo
de De Bastos (1995), a favor dos métodos de pesquisa que superem a tradição empirista da
ciência, que buscam caminhos que levem à constituição de uma comunidade de
investigadores ativo-críticos - voltada para as transformações tanto individuais, quanto
coletivas do ser humano. Em tais direções, a singularidade do objeto deste estudo permite a
sua conexão a um pluralismo metodológico: nele encontram-se imbricadas a matriz
epistemológica da investigação-ação emancipatória com a prática educacional dialógica-
problematizadora como parâmetros para um projeto encaminhado de modo cooperativo. Suas
bases epistemológicas e metodológicas serão explicitadas no capítulo vindouro.
128
3 ELEMENTOS EPISTEMOLÓGICOS E METODOLÓGICOS
Optar pela linha emancipatória significa
considerar a pesquisa como instância, não
somente de intervenção e formação, mas também
como procedimento de produção de saberes
científicos.
Ivana Ibiapina, 2007.
O que nos resta é termos a coragem de nos
arriscar, pois o que está visto está visto, nada
trazendo de novo.
Regina Leite Garcia, 2001.
3.1 A pesquisa nas ciências humanas e sociais e esta investigação-ação
Pesquisar nas ciências humanas e sociais pressupõe um sujeito “[...] que é objeto de si
próprio, que reflete sobre si mesmo e suas relações e, nessas relações, constrói seus
conhecimentos [...] Não há um sujeito que olha para um objeto.” (KRAMER, 1998, p. 21). O
conhecimento produzido socialmente situa-se, assim, na história e na interculturalidade, em
múltiplas processualidade e dialogicidade – vivas, complexas e inacabadas; não há como se
praticar uma dissensão entre sujeito e objeto, nem como negar a cientificidade das ciências
humanas, mas afastar-se do sentido positivista de se fazer ciência, construindo outras formas
intricadas de produção de conhecimento “[...] na tensão entre o universal e o particular.”
(BENJAMIM, 1984, p. 53). Em vista disso, este autor (1984) postula que é necessário
construir outro referencial teórico-metodológico para as ciências humanas, no encalço de um
conhecimento que pense a si próprio de modo articulado, sem relações hierárquicas.
Pensar o homem e a pesquisa no cerne dessas concepções trouxe para esta
investigação-ação o referencial benjaminiano que compreende as ciências humanas pautada
num modelo epistemológico inter-relacionado com uma proposta teórico-metodológica a
129
permear a construção do conhecimento. A teoria, que embasa o referencial metodológico, ao
não se cristalizar, mas se redimensionar é, também objeto de investigação, num processo
constante de “complexificação da prática e de ressignificação teórica.” (DICKEL, 2001b, p.
14). Ao trazer a marca do provisório, os conhecimentos produzidos não são considerados
definitivos. Pelo contrário, na processualidade eles são submetidos a reavaliações constantes.
Nessa direção, invisto na exposição que compõe este capítulo e busco ordenar a
miscelânea de elementos epistemológicos e metodológicos multirreferenciais, estratégias e
abordagens no intento de dar conta da tarefa complexa adotada neste estudo. Para uma
abordagem multirreferencial, uma tarefa complexa jamais pode ser considerada complicada.
“Ser complexo é considerar o projeto sempre de uma perspectiva inconclusa, e a obra como
produto de um imaginário sempre em devir.” (MACEDO, 2000, p. 95).
3.2 Questões éticas, epistemológicas e metodológicas
A posição teórica escolhida para este estudo foi a da investigação-ação educacional
com um enfoque crítico-emancipatório (CARR e KEMMIS, 1988; CARR, 1996; ELLIOTT,
2000; ZEICHNER, 2000; 2002), revestido de características dialógico-problematizadoras
(FREIRE, 1983a, b, c; d; 1993; 1996a; 2000) numa modalidade de pesquisa não sobre a
educação, e sim para a educação. (CARR e KEMMIS, 1988, p. 167). A posição
fenomenológico-hermenêutica
105
me remeteu a uma perspectiva de investigação que coloca o
pesquisador (professor universitário) em situação de co-construção com os práticos
(professores em exercício na educação básica) a “[...] utilizar técnicas como entrevistas,
105
Tal posição dá ênfase ao mundo da vida cotidiana e envolve um ciclo de compreensão/interpretação/nova
compreensão em sentidos múltiplos. Aqui, sob o enfoque do filósofo alemão Hans-Georg Gadamer, (1997) este
processo será mais bem explicitado nos eixos de análise deste estudo.
130
depoimentos, vivências, narrações, histórias de vida e análise do discurso.” (GAMBOA,
1994, p. 95).
Nestes aspectos, a concepção de professor reflexivo/investigativo aliou-se, na ação, ao
compromisso do formar e investigar com ética, o respeito à integridade das professoras-alunas
participantes e às múltiplas referências teóricas, epistemológicas e metodológicas acionadas
no processo que se seguiu. Os suportes teóricos, as experiências e as produções de
conhecimento, assim, serviram como instrumentos de apoio valioso à concretização das
estratégias metodológicas utilizadas e, também visaram atender adequadamente aos objetivos
da pesquisa. Nesse sentido, tal construção se legitimou, neste estudo, como atividade teórica
representando um processo vivo, interativo. Afinal, havia e há a consciência de que “a
complexidade alicia a inquietação teórica, semeia a angústia do método” (MACEDO, 2000, p.
95) e que fazer ciência exige prudência e o exercício do rigor profundo, um cuidado rigoroso
de planejar, observar, analisar, refletir, avaliar e replanejar numa “[...] dialogicidade autêntica
e esperançosa de que a verdade possa, em algum momento, abrir o seu caminho.” (p. 95).
3.2.1 Procedimentos e instrumentos de coleta e análise dos dados
Na organização das ações formativas, específicas, do Curso de Licenciatura em
Educação Infantil e Séries iniciais do Ensino Fundamental (SMED-VCA/UESB), um ponto
delicado e essencial constituiu-se nas negociações
106
realizadas com as professoras-alunas
visando a minha permanência intencionada e prolongada no campo formativo/investigativo.
Assim, na primeira etapa do processo, ao lado de um processo de observação participante
ativa, de registros de notas pessoais – em forma de memória ativa descritiva (ANDRÉ,
106
Neste sentido, as negociações são tidas como ferramentas para a formação do professor, como proposto por
Schneuwly, 1994.
131
LÜDKE, 1986), houve o emprego de um questionário socioantropológico e,
concomitantemente, um processo de escuta sensível com apoio na empatia, no universo
afetivo, imaginário e cognitivo do outro. (BARBIER, 1998; 2002).
Em seguida, foram empregados procedimentos e estratégias metodológicas de modo a
ampliar as possibilidades formadoras e investigativas da experiência, a exemplo de:
Narrativas de fragmentos de história de vida pedagógica, como reapropriação do
universo sociocultural da condição discente; descrição e interpretação de realidades
discentes e docentes; definição de experiências e de construção de maneiras de ser e
estar na profissão, as quais tangenciam este estudo. (DELORY-MOMBERGER,
2000; LE GRAND, PINEAU, 1993; PINEAU, 2004; NÓVOA, 1992b; PEREIRA,
M.V., 2001).
Sessões reflexivas (SMYTH, 1992; MAGALHÃES, 2004) com interações face a
face em dois encontros acadêmicos, formativos, semanais, com duração de 4
horas/aula, cada um;
Espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação (CARR E KEMMIS, 1988;
KEMMIS & MCTAGGART, 1988) envolvendo diagnóstico de situações,
planejamento; atuação; investigação; reflexão; socialização; teorização da prática;
ressignificação; replanejamento de cenas pedagógicas; (re)ajustes de ações às
necessidades individuais e coletivas; novas reflexões sobre as práticas comuns e
identificação do que é preciso melhorar e, assim, sucessivamente...
Organização das ações de linguagem como componentes do processo reflexivo com
o objetivo de criar contextos de compreensão dos significados de suas escolhas
didáticas, os interesses que as servem, concepções a que estão atreladas (SMYTH,
1992; MAGALHÃES, 2004);
132
A partir do material coletado, houve de minha parte, em especial, a realização de
leituras densas dos dados, impregnação e triangulação de dados visando a análise dos dados
coletados, a estruturação dos conceitos e concepções mais abrangentes e a elaboração da
presente tese.
As citadas estratégias e instrumentos metodológicos, ao serem tomados como
essenciais neste estudo, se constituíram como elementos fundantes na articulação entre a
docência, a formação e a investigação-ação como pontos nucleares, nos conhecimentos
teóricos e na discussão da prática educativa - em direção ao conhecimento da realidade.
Proporcionaram, além de um relacionamento dos elementos teóricos e epistemológicos, uma
investigação didática e de intervenção sobre as situações problemáticas, tanto na condição de
alunas, quanto na de professoras.
3.2.2 Critérios de vigor e rigor
Nesta investigação-ação os critérios de validade científica, ao serem substituídos por
critérios de rigor metodológico de credibilidade, transmissibilidade, de fiabilidade e de
confirmação de dados - conforme definidos por Guba e Lincoln (1985) - tiveram como
implicação não apenas o vigor de minha presença prolongada com as professoras-alunas
parceiras, como também as destas nos locais onde se davam seus próprios exercícios
profissionais com descrições ricas e pormenorizadas dos contextos e situações pedagógicas
dialógicas-problematizadoras. (FREIRE, 1983a, b). As descrições foram trazidas para o
coletivo discente em situações de compreensão mais ampla do trabalho docente e produção do
conhecimento. A partir de tais premissas, este estudo está, também, relacionado a critérios de
subjetividade, ao conceito de validade dialógica e à clareza das idéias expressas.
133
Nesse processo, foram coletadas evidências a respeito das práticas docentes e
pressupostos críticos, crenças e valores subjacentes a elas. (ELLIOTT, 1993). Estas, ao serem
trazidas para as sessões reflexivas, em discussões coletivas, forneciam subsídios ao
movimento da espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação (CARR e KEMMIS, 1988;
KEMMIS & MCTAGGART, 1988) e às ações de teorização da prática.
No cumprimento dessas metas ampliei os subsídios para que a checagem dos
elementos obtidos em situações variadas e em momentos diferentes fossem confrontados com
diversos pontos de vista, apoiados numa variedade de fontes de dados e na busca de valores
que se encontravam subjacentes às comunicações; e, ainda comparando as interpretações
dadas ao mesmo fenômeno como importantes estruturas formais que representam resultados
científicos fundamentais, sobretudo se pautados na realidade natural. (ANDRÉ, 1994a, 1995a,
b; ANDRÉ, LÜDKE, 1986, 1995; DEMO, 1994a, b, c).
Aliado a tudo isso, por minha vez, utilizei-me de uma memória ativa descritiva (diário
de campo) (ANDRÉ, LÜDKE, 1986, p 48-49) como critério metodológico no sentido de
garantir crescentes rigor, vigor e credibilidade ao processo de construção do relatório final do
trabalho. Assim, procurei descer a detalhes nas descrições de fatos, ancorados na realidade e
na dinâmica acadêmica, criando possibilidades de compreender/descrever as diversas
situações observadas, dando relevância ao contexto
107
e levando em conta as dimensões
sociais, culturais e institucionais da realidade focada. Tais descrições densas ajudaram-me a
estruturar o quadro configurativo da investigação e encaminharam minhas pautas de
observação, também, na direção de caminhos de inferência: com o cuidado para não cair num
empirismo vazio busquei captar os movimentos que se configuraram na dinâmica das trocas
entre as pessoas que refletiam os valores, as crenças, os pressupostos que se encontravam
subjacentes às suas práticas pedagógicas, os caminhos de busca de respostas e soluções para
107
No seu sentido literal: onde as coisas são trançadas juntas e onde os fatos fazem sentido. (KINCHELOE,
1997, p. 167).
134
os problemas enfrentados diariamente no ambiente escolar. Estes dados constituíram-se como
valiosos na estratégia da triangulação. O processo de impregnação
108
realizou-se através
desses registros pessoais, de leituras densas dos diários reflexivos, no sentido de desvelar as
marcas e as dimensões mais relevantes do processo. Inter-relacionando elementos e
procedimentos citados, eu os considerei dentro de um conjunto e estive sempre atenta à
explicitação dos múltiplos significados que as interações foram produzindo “[...] na busca de
superar a percepção imediata, as impressões primeiras, a análise mecânica e empiricista.”
(FRIGOTTO, 1994, p. 88).
Por fim, atos de análise e a interpretação dos dados acompanharam todo o percurso de
investigação da realidade, sempre que possível, em constante parceria com o grupo
pesquisado. Em quatro ocasiões diferentes, estes foram trazidos às sessões reflexivas, por
mim, através de slides projetados em aparelho de datashow, com vistas à análise conjunta e
ganharam sugestivos e importantes acréscimos coletivos. Propostas foram, sempre, colocadas
em discussão, registradas e, nesse processo, acolhidas ou não. Além disso, por quatro vezes,
seus resultados parciais foram apresentados em eventos
109
em Vitória da Conquista, contando
com as presenças das professoras-alunas parceiras; posteriormente as comunicações
retornavam às análises e discussões nas sessões reflexivas. Ao agir com base em tais
premissas e lidar com o contexto com uma sensibilidade cultural, franqueza, rigor profundo e
flexível
110
aliado a compromissos ético-políticos (MACEDO, 2000) busquei encontrar pistas
108
No processo de análise inicialmente foi realizada uma primeira classificação dos dados, de acordo com as
categorias teóricas iniciais, preparando uma etapa de classificação e organização mais complexa de análise
destes. (ANDRÉ & LÜDKE, 1986, p. 48).
109
Apresentação dos seguintes trabalhos:
a) MIDLEJ, J. Pesquisa-ação, formação e práxis. Comunicação oral. IV Congresso de Educação de Vitória da
Conquista, em 2006 com publicação de resumo nos Anais.
b) MIDLEJ, J. Espirais de pesquisa-ação e produção de conhecimentos. Comunicação oral. IV Congresso
Educação de Vitória da Conquista, Bahia, em 2006, com publicação de resumo nos Anais;
c) MIDLEJ, J. Sentidos Políticos e Pedagógicos da Formação de Professoras-investigadoras-em-ação.
Comunicação oral. II Seminário de Educação de Pessoas Jovens e Adultas e I Seminário de Políticas Públicas,
Gestão e Práxis Educacionais, em Vitória da Conquista, Bahia, 2006, com publicação de resumo nos Anais;
d) MIDLEJ, J. A poética do cotidiano e a escola. Comunicação Oral. II Seminário de Teoria e História Literária
do Museu Pedagógico, em Vitória da Conquista, Bahia, em 2006, com publicação de resumo nos Anais;
110
O rigor flexível ressalta a presença do imponderável na pesquisa sem anular a ação do pesquisador.
135
de análise e interpretação nos diversos significados e diferentes pontos de vista das
participantes do fenômeno estudado.
3.3 Percursos de construção do objeto empírico do estudo: contextos, aportes
epistemológicos e metodológicos
O único sentido no qual a ciência é exemplar é o
de que ela é um modelo de solidariedade humana.
Rorty, 2002.
O reconhecimento de que a realidade do tempo contemporâneo é muito mais rica e
complexa do que o que está codificado na lógica dos fenômenos sociais traz novas demandas
de olhar e captar o significado do ato de pesquisar, principalmente, no presente cenário
educacional brasileiro e, em particular na Região Nordeste. Nesta, os problemas do contexto
social (massas urbanas e rurais espoliadas, pobreza, desigualdade, exclusão) incidem
diretamente na vida dos que freqüentam o sistema escolar público marginalizando-os do
sistema produtivo. Paulo Freire, (1996b, p. 21) afirma que “[...] a ideologia fatalista,
imobilizante, que anima o discurso neoliberal anda solta no mundo [...].” A emergência em
mudar este quadro parece exigir a ampliação do olhar para além dos diagnósticos e
constatações e que se persiga um trabalho que, através da pesquisa e da intervenção na
realidade se saia à cata de superação dos problemas que atingem frontalmente o sistema
público de educação brasileiro.
Assim, diante da complexidade do mundo atual assumo com Najamonovich (2001, p.
97) que “[...] se vive numa época de transformações aceleradas, de mutações vertiginosas,
onde nada tem a solidez de antes e tanto as dúvidas quanto as interrogações são muito mais
interessantes do que as certezas e as respostas.”
136
Nessa perspectiva, a análise de estudos sobre formação de professores (ANDRÉ, 1999,
2001; BRZEZINSKI, 2001, 2003; GARRIDO, 2000) tem indicado que as possibilidades para
a abordagem desta realidade vêm evoluindo de modo significativo. Nesse âmbito, esta ação
sintonizada com a pesquisa vem ganhando uma dimensão crítica e ativando o interesse em
estudar questões em torno da ação docente pesquisadora - imbricada com o meio acadêmico e
dentro do princípio de articulação entre teoria e prática. Para isso, as referidas análises
apontam para a necessidade de se buscar uma ação metodológica “[...] que encontre raízes
profundas nas práticas e nos saberes de experiência dos professores.” (POULIN, 2006, p. 52).
Este estudo articula-se, assim, com a multirreferencialidade em suas perspectivas da
leitura plural dos fenômenos e dos fatos educacionais; de métodos de pesquisa em ciências
humanas que superam a tradição empirista da ciência, que buscam caminhos alternativos de
investigação afinados com os pressupostos da teoria crítica do conhecimento - no
reconhecimento de que esta vem ocupando espaços pela ruptura das tradições cartesianas e
clamando por novas estratégias de produção do conhecimento. Em consonância com a
perspectiva que admite possibilidades de trabalhar com uma multiplicidade de referenciais
aceitos numa lógica de complementaridade antagônica. (ARDOINO, 1998; BARBOSA,
1998a, b; BORBA, 1998; FRÓES BURNHAM, 1993, 1998, 2000; 2004; MORIN, 2002b).
Na admissão da práxis educacional como “[...] a ação do homem sobre a matéria e a
criação e, através dela, de (construção de) uma nova realidade humanizada” (VÁZQUEZ,
1977, p. 245) fiz a opção de operar na investigação-ação educacional crítico-emancipatória
por esta possuir princípios como participação, cooperação, dialogicidade, problematização e
contextualização no quadro da pesquisa em formação de professores. Além disso, ao operar
com esse sistema de referências distintas, este estudo encaminhou-se alinhado a ações de
linguagem que são compreendidas como constitutivas de significações de si, de outros, de
contextos interacionistas sócio-discursivos; nesta abordagem de múltiplas perspectivas "[...]
137
como prática que se desenvolve em contextos reais carregada de intenções e interpretações
subjectivas, construída por diversos atores e refletida em usos de natureza prática [...].”
(SACRISTÁN, 1995, p. 79). Nesse sentido, a modalidade investigativa em pauta deu-se a
partir de processos reflexivos intencionais e sistematizados, em compasso com a educação
dialógica-problematizadora, de cunho freiriano, como configuração do ato educativo
concretizado numa constante revisão e sistematização de teorias educativas. Na direção que
aponta MION (2001, p. 123):
O conhecimento crítico elaborado não é individual, também e, sobretudo por isso,
não se constrói solitariamente. Existe a dialeticidade entre o pensamento e a ação,
bem como o indivíduo e a sociedade. O processo reflexivo é um processo político,
pois envolve um coletivo e é dele que resulta a produção do conhecimento crítico,
mais informado e comprometido com as mudanças na prática.
Assim, na produção do conhecimento crítico, fruto da experiência reflexiva crítica em
torno da própria prática, houve a agregação e a reelaboração do conhecimento técnico
111
a
partir dos desdobramentos teóricos veiculados na ação. Este processo será descrito a seguir.
3.4 Definição conjunta dos contornos da presente investigação-ação
Cada vez que a linguagem se volta sobre si mesma
para produzir prazer – não apenas conteúdos e
significados – neste momento nós temos poesia.
Paulo Leminski, 1986.
Ao assumir a docência, no citado contexto acadêmico, escolhi deliberadamente a
disciplina Atividades de Articulação Curricular I (2005.1) como primeira possibilidade de
vincular a produção individual e coletiva do conhecimento acadêmico ao trabalho docente
realizado em contextos da educação básica e educação infantil. A conexão com a prática, ao
111
Bazin (1977 apud Mion, 2001, p. 124) coloca o conhecimento técnico como um componente da autonomia e,
portanto, do conhecimento crítico, da emancipação.
138
envolver a compreensão da realidade servia ao questionamento das razões e das formas como
esta se processava. Além disso, as probabilidades de se apresentar meios para uma ação
diferente e a detecção de possíveis dificuldades que poderiam se interpor como limitadoras de
transformações, de algum modo, ajudou-nos a formatar e a constituir o processo investigativo
no qual eu estava a assumir o papel de mediadora, em 4 h/aula semanais. Como suporte
teórico às negociações, utilizei as idéias de Bakhtin (1992, 1999) as quais se referem à criação
de condições para uma compreensão responsiva ativa, onde as pessoas, ao concordarem ou
discordarem de situações propostas, referendam, complementam e/ou adaptam posicionando-
se criticamente diante das perspectivas de estas serem operacionalizadas; assim, desde o início
do processo preocupei-me em criar um ambiente propício ao diálogo, às trocas, à cooperação
e à apreensão cognitivo-emocional das novas situações.
O delineamento do plano acadêmico de trabalho foi apresentado a partir da ementa da
disciplina
112
e de núcleos temáticos (MION; ANGIOTTI; DE BASTOS, 2001, p. 77) que
deveriam servir para a definição de blocos de conteúdos a serem definidos a partir das
necessidades, interesses e problemas da/na coletividade. Tais núcleos temáticos foram
acionados na perspectiva de abrir possibilidades coletivas de desdobramentos em outros
tantos temas na busca da compreensão da realidade:
Relação cooperativa e articulação de um processo investigativo educacional;
Produção de cenas pedagógicas, no ambiente docente, a partir de temas geradores
(FREIRE, 1983b); Situações de registro, interação e diálogo;
Condições de ensino, de discussões das práticas, possíveis transformação de
situações pedagógicas;
Práxis educacional;
Processos de reflexão crítica com base nas experiências docentes.
112
Concepções sobre o conhecimento, o aluno, o currículo, a profissionalidade docente. Conhecimentos teórico-
práticos e promoção da práxis educacional. Exercício de ação/reflexão/ação.
139
Ao apostar no caráter participativo do planejamento dessa ação, considerei as
professoras-alunas na perspectiva de agentes sociais com um investimento no relacional e
numa vinculação ao movimento em favor da profissionalização docente regido pela ética, pela
estética e pelo político. Assim, concomitantemente, apresentei-lhes a intenção de tê-las como
parceiras num estudo acadêmico a partir do contexto formativo.
Assim, nas primeiras sessões coletivas, espaços foram reservados para as discussões
coletivas do plano de trabalho acadêmico acoplado à problemática deste estudo, revigorando-
o a partir dessas novas dimensões da coletividade; esta dinâmica ocorreu, tamm com as
demais disciplinas ministradas por mim, com este grupo.
Ao ousar fazer diferente, adiantei-lhes que havia uma pretensão, de minha parte, de
redimensionamento conjunto das linhas básicas da pesquisa delineada em seus aspectos gerais
“[...] na direção de um projeto investigativo cooperativo [...]” (FIORENTINI, 2004, p. 66) e
que seria muito importante contar com parceria e participação do grupo naquela tarefa que
começava a (re)definir-se ali, a partir dos reajustes feitos no plano de trabalho da disciplina
em curso. Concitei-as a ampliar leituras para uma melhor compreensão do fenômeno, a
assumir riscos, dividir responsabilidades e a tomar iniciativas. É preciso registrar que, embora
não tenha sido fácil equilibrar as necessidades de condução do estudo com a construção da
confiança necessária ao desencadeamento da tarefa em pauta, a paridade no relacionamento
demonstrou ser essencial no respeito ao outro que contribuía com conhecimentos diferentes.
Assim, após as definições, começamos a trabalhar com constituições teórico-práticas
de autores cujas investidas conceituais tinham vertentes epistêmicas convergentes à ementa
em pauta.
113
Por exemplo, o texto de Dickel (2002, p. 65-82) revelou-nos importantes
113
CAIMI, F. E. A interação dialógica em sala de aula: as contribuições da teoria da linguagem e da
aprendizagem. In: MÜHL, E. H.; ESQUINSANI, V. A. (Org.). O diálogo: ressignificando o cotidiano escolar.
Passo Fundo: UPF, 2004, p. 22-37.
140
referenciais teóricos de alternativas epistemológicas de pesquisa e deu-nos acesso a uma
abordagem com característica social, entrelaçada a uma dimensão praxiológica
114
a partir de
“[...] experiências e reflexões radicadas na proposta de formação de professores como
profissionais capazes de refletir e de produzir conhecimentos sobre o seu trabalho” (p. 65). O
referido texto (2002) me ajudou a chamar-lhes a atenção para o fato de que, ao acatarem a
proposta de (re)configuração do plano e cooperação com o processo investigativo, suas
práticas não seriam apenas locus de aplicação de um conhecimento científico e pedagógico,
mas espaço dialógico/problematizador (FREIRE, 1983b) de planejamento e produção de
cenas pedagógicas. Acordamos, assim que as elaborações das cenas propostas deveriam
envolver um diagnóstico da situação pedagógica, uma problematização inicial envolta numa
organização do conhecimento e aplicação deste conhecimento: um processo que deveria
abranger uma dimensão coletiva, tanto na academia quanto na escola, envolvendo análises do
que estava a ser realizado acionando-se as quatro formas de ações de linguagem (SMYTH,
1992) em registros (com descrições e informações) e experimentações reflexivas
(confrontações e possíveis reorganizações das ações). Na combinação de tais elementos,
começamos um processo de instrumentalização para o agir em torno dos eventos vivenciados
no fazer docente.
Ao ficar patente a proposição para que se tornassem parceiras, usuárias e co-autoras de
uma pesquisa educacional em tais condições, propus à Coordenação do Programa e às
DICKEL, A. Buscando referências para a discussão sobre a formação do professor-pesquisador: contribuições
para o debate. In: BENINCÁ, E. (Org). Formação de professores: um diálogo entre a teoria e a prática. Passo
Fundo, RS: UPF, 2002, p. 65-82.
GARCIA, R. L. (Org.). Para quem investigamos, para quem escrevemos: reflexões sobre a responsabilidade
social do pesquisador. In: MOREIRA, A. F. et al. Para quem pesquisamos, para quem escrevemos: o impasse
dos intelectuais. São Paulo: Cortez, 2001, p.11-36.
LÜDKE, M. (Org.). O professor e a pesquisa. São Paulo: Papirus, 2001, p. 9-23.
MIDLEJ, J. Os diários reflexivos e os processos metacognitivos na práxis pedagógica. In: Caderno Aprender.
Ano II. N 3. Vitória da Conquista: Edições UESB, 2004 b, p. 49-61.
NASCIMENTO, A. R. Registro reflexivo da prática pedagógica: uma possibilidade para a autoria de
conhecimentos. São Paulo: Criança da Educação Infantil, 2002, p.8-11.
114
Dimensão praxiológica entendida como “[...] uma maneira consciente e crítica de atuação pedagógica e que
possui como principal objetivo a transformação do existente pelo processo dialético de ação-reflexão-ação.”
(BENINCÁ et al, 2004, p. 65).
141
professoras-alunas, concomitantemente, a ampliação da minha ação docente ainda nesse I
semestre, para mais uma disciplina de 60 horas o que significaria mais 4 horas/aula semanais
de convivência com o mesmo grupo. As alunas e a coordenação do Curso aquiesceram e, ao
analisar a ementa de Psicologia do Desenvolvimento
115
vislumbrei que ela iria nos
proporcionar elementos teóricos valiosos e necessários ao andamento da presente
investigação-ação. Desse modo, construímos paulatinamente seus eixos estruturadores – e, em
seguida, selecionei textos,
116
na condição de elemento mais experiente do grupo, dentro da
dinâmica descrita acima:
Concepções de Psicologia, sujeito epistêmico, cognição, ciclos de vida,
desenvolvimento humano e aprendizagem;
Bases psicológicas dos processos de desenvolvimento na infância, na adolescência:
os aspectos cognitivos (relação entre pensamento e linguagem) e afetivos
(inteligência e afetividade);
Repertórios conceituais básicos de Jean Piaget e Lev S. Vygotsky: similitudes e
diferenças entre vidas, obras, conceitos e princípios;
Escola e constituição do sujeito epistêmico na práxis pedagógica. Os papéis da
escolarização e da intencionalidade do ato educativo;
Situação histórico-cultural e o desenvolvimento individual;
Algumas questões sobre a idade adulta como um ciclo de vida.
Nos objetivos das duas disciplinas ficaram claras as intenções de integrar
procedimentos de problematização de conceitos - veiculados no curso como um todo, e não
115
Psicologia e educação. O âmbito psicológico do processo pedagógico e suas relações, dimensões e
especificidades. Bases psicológicas dos processos de desenvolvimento na infância e na adolescência: os aspectos
cognitivos da relação entre pensamento e linguagem; Aspectos afetivos e cognição (inteligência e afetividade).
Psicologia do desenvolvimento e trabalho docente.
116
Dentre estes, destacam-se: BOCK, A.; FURTADO, O.; TEIXEIRA, M. L. Psicologias. Uma introdução ao
estudo de Psicologia. 13 ed. rev. e aum. São Paulo: Saraiva, 2002. Capítulos 6 e 8.
CAMPOS, D. S. Psicología da aprendizagem. 24 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1996.
MIDLEJ, J. Piaget e Vygotsky: dos encontros e desencontros entre vidas e obras, às contribuições de seus
conceitos para a educação contemporânea. Produção técnica, 2005. 16 p.
REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 3 ed. Petrópolis, Vozes, 1995.
142
apenas, nestas - em movimentos de conectar esta ação acadêmica ao citado projeto de
investigação. Em tais direções, tendo a investigação como eixo ou núcleo das disciplinas
acadêmicas, prosseguimos a investir em condições de propiciamento de um ambiente
formativo referencializado numa dinâmica de interação dialógica
117
e de reflexividade na
realização de ações conjuntas e de comum acordo; assim, tivemos o “[...] o cuidado para não
transformar a pesquisa em mera reprodução do senso comum ou da tradição.” (NÓVOA,
2003, p. 27).
Como já externado, não foi fácil dar início a essa tarefa: houve tensões de variados
aspectos que precisaram de tempo e de negociações delicadas para que a parceria na revisão
conjunta da problemática do estudo acontecesse. As resistências e o enfrentamento de
situações-limite demonstraram-me que seria necessário insistir numa ambiência de liderança
compartilhada, vigorosa e flexível, de co-responsabilidade. Hall e Wallace (1993, apud
FIORENTINI, 2004, p. 50) ao desenvolverem, em ações semelhantes a essa, ao apontarem
“[...] uma tipologia de formas de trabalho coletivo apresentando um continuum que vai do
conflito à colaboração, passando por fases intermediárias de competição, coordenação e
cooperação [...]” inspiraram-me e fortaleceram-me a prosseguir em tais bases. Como na visão
de Ventura (2001, p. 50), busquei negociar com sensibilidade, compreendendo que, para
entrar em acordos de ação conjunta e cooperativa tornava-se essencial “[...] trocar o medo da
insegurança pela arte do dom inteligente.” (Tradução minha).
Nessa direção, as resistências ao novo, que persistiram por um tempo, indicaram a
necessidade de uma incursão firme e, ao mesmo tempo sutil, pelas idéias de Freire (2000).
Assim, no exercício da escuta sensível, (BARBIER, 2002) percebi que elas se referiam
117
O dialogismo, aqui adotado “como princípio constitutivo da linguagem e a interação como realidade
fundamental desta.” (BAKHTIN, 1988, p. 71-88).
143
comumente à teoria freiriana que estava sendo explorada, sob a mediação de um colega
118
da
Universidade, também docente do Programa. Conversei com elas e decidimos trazer a obra de
Freire (2000) para ser revisitada, em novos ângulos, nas nossas sessões reflexivas, num
aprofundamento voltado para a compreensão dos fatos vivenciados por nós. A centralização
nas idéias freirianas e nas necessidades funcionais da investigação-ação em pauta, ao
proporcionar maior entendimento do que estava sendo proposto, ajudou-me a incrementar a
ambiência de entrosamento e a incentivar posturas mais participativas, num sentido
crescentemente cooperativo. Assim, as negociações para o envolvimento do grupo e sua
participação nesta experiência foram balizadas, durante todo o percurso, pelos mesmos
fundamentos que nortearam, todo o tempo, este estudo: diálogo e problematização.
A partir dessas ações, o grupo, gradativamente familiarizado com a abordagem
multimetodológica em processo, passou a envolver-se mais efetivamente, enquanto se dava a
ampliação da sintonia com uma corrente de participação mais direta no processo formativo e
na investigação-ação demarcadas pelo “[...] diálogo como elemento de ordenação do
pensamento e como potencializador da elevação dos patamares de compreensão na arte de
construção do conhecimento.” (CAIMI, 2004, p. 23).
3.5 Fortalecimento das bases epistemológicas da ação acadêmica
No semestre subseqüente, (2005.2), essa ação híbrida desenvolveu-se especialmente
acoplada a mais duas disciplinas, as quais fortaleceram, sobremaneira, o processo interativo-
reflexivo que estávamos a vivenciar. A primeira, Psicologia da Aprendizagem, a qual teve sua
118
Didática - sob a responsabilidade do Prof. Dr. Reginaldo de Souza Silva docente da UESB; nesse caso
específico, tendo por base a obra de FREIRE, P. Pedagogia da autonomia. Saberes necessários à prática
educativa. 15 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000. (Coleção Leitura).
144
ementa
119
desdobrada, coletivamente, em eixos estruturadores a partir de um elenco de textos
subsidiadores
120
explorados, gradativamente, através de leituras e discussões, proporcionando-
nos mais condições de prosseguir na tarefa investigativo-formativa em parceria:
Contribuições epistemológicas para a compreensão dos fenômenos educacionais:
concepções de educação e práticas pedagógicas;
Prática pedagógica da sala de aula: princípios e métodos de uma ação dialógica;
A Psicologia do Desenvolvimento e sua importância para a função do educador;
A aprendizagem sob diversas perspectivas teóricas: a epistemologia genética de
Piaget, a perspectiva sócio-histórica de Vygotsky, a pedagogia crítica de Freire;
A motivação no processo de ensino e aprendizagem. Processos e características de
aprendizagem e desenvolvimento em pessoas adultas.
Os seminários temáticos, constantes nos planos dessa disciplina, ao serem organizados
e realizados pelas diversas equipes, ajudaram-nas a compreender melhor as nuanças da
investigação-ação como forma de fazer ciência educacional nitidamente interessada nas
análises de ações pessoais em contextos histórico-sociais, na valorização do cotidiano e na
aquisição de mais autonomia profissional e emancipação das pessoas, como amplamente
favorável à transformação da realidade. (BENINCÁ et al., 1998; GRABAUSKA; DE
BASTOS, 2001; FRANCO, 2008; FREIRE, 1983a, b, c, 2000; IMBERNÓN, 2001). A partir
destes seminários os aportes conceituais da investigação-ação educacional passaram a fazer
119
Conceitos de ensino e aprendizagem. Natureza da aprendizagem. Motivação e aprendizagem. Pensamento
reflexivo. Teorias da aprendizagem.
120
Entre estes, destacam-se: COUTINHO, M. T., MOREIRA, M. Psicologia da educação: um estudo dos
processos psicológicos de desenvolvimento e aprendizagem humanos voltados para a educação. 6 ed. Belo
Horizonte, Ed. Lê, 1998.
CAMPOS, D. S. Psicología da aprendizagem. 24 ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1996.
COLEÇÃO Memória da Pedagogia. N. 2 Lev Vygostsky, uma educação dialética. Rio de Janeiro: Ediouro,
2005.
PIAGET, J. Seis estudos de Psicologia. Rio de Janeiro. Forense, 1967.
VYGOTSKY, L. Pensamento e linguagem. São Paulo. Martins Fontes, 1987.
______. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo:
Martins Fontes, 1991.
145
parte de modo natural e espontâneo, do vocabulário das professoras-alunas, constituindo-se
num reforço à ação colaborativa em curso.
3.6 A formação da professoralidade
Somos um arquipélago de subjetividades que se
combinam diferentemente sob múltiplas
circunstâncias pessoais e coletivas. Somos, de
manhã cedo, privilegiados membros de família,
durante o dia de trabalho somos classe, lemos o
jornal como indivíduos e assistimos ao jogo da
equipe nacional como nação. Nunca somos uma
subjetividade em exclusivo, mas atribuímos a cada
uma delas, consoante as condições, o privilégio de
organizar a combinação com as demais.
Boaventura de Souza Santos, 1988.
A disciplina Pesquisa e Prática Docente I, com uma carga horária de 75 horas a ser
ministrada nesse mesmo semestre (2005.2), proporcionou maiores possibilidades de
mobilização do processo formativo-investigativo. Sua ementa
121
, ao encontrar-se sintonizada
com o Projeto de pesquisa em pauta, deu-me a chance de organizar a metodologia sistemática
de indagação e reflexão e de integrar, de modo mais efetivo, a formação e as situações de
trabalho docente.
Ao mesmo tempo, seus objetivos, acionados, também, a partir de uma base teórica,
122
ao incorporar a idéia de percurso formativo, não como uma trajetória linear, mas como
evolução, abriu perspectivas de se estudar a composição de docências:
121
Identificação e delimitação de problemas relativos à prática docente. Análise contextual da realidade escolar e
diagnóstico. Relatório de análise da realidade.
122
MORIN; CIURANA; MOTA. Educar na era planetária: o pensamento complexo como método de
aprendizagem no erro e na incerteza humana. Trad. Sandra Trabucco Valenzuela. São Paulo: Cortez; Brasília,
DF: UNESCO, 2003.
MÜHL; ESQUINSANI. Diálogo: ressignificação da prática pedagógica no cotidiano escolar. In: ______ (Orgs).
O diálogo ressignificando o cotidiano escolar. Passo Fundo: UPF Editora, 2004, p. 7-14.
146
Discutir e compreender conceitos de profissão, professor, cotidiano, prática, teoria,
práxis pedagógica, professor investigador de sua própria prática;
Discutir, analisar e vivenciar experiências de pesquisa em educação;
Elaborar registros de aula e cenas pedagógicas;
Pôr em discussão as situações formativas do e no cotidiano escolar; Diagnosticar e
analisar a realidade sócio-educacional;
Contribuir para a compreensão do processo de organização da aprendizagem numa
perspectiva interativa, motivacional, dialógica, crítica e emancipatória, valorizando
e teorizando o saber da experiência;
Produzir narrativas de vida pedagógica como um processo de reconstituição da
gênese
123
de ser professor, de recriação/reinvenção da prática docente atual, através
dos registros e das análises dos trajetos discentes e tramas constitutivas da
professoralidade.
Aqui, em particular, a base da tarefa docente reflexiva apoiou-se em pressupostos do
pensamento de John Dewey (1979b, p. 13-21); de um modo peculiar, com a conexão que este
autor faz entre educação e experiência pessoal
124
. Nessa perspectiva, levei em consideração
que estudiosos como Nóvoa (1992b) defendem a análise do saber experiencial de professores
como um novo campo de possibilidades interpretativas para a pesquisa em educação, através
de materiais escritos por estes, acerca de si e da percepção da realidade sócio-política da
profissão.
PEREIRA, M.V. Nos supostos para pensar formação e autoformação: a professoralidade produzida no caminho
da subjetivação. In: FRAZÃO, C. et al. Ensinar e aprender: sujeitos, saberes e pesquisa. 2 ed. Rio de Janeiro:
Dp&A., 2001, p. 23-41.
SANTOS, J. J. R. dos, et al. Educação dialógica: um olhar reflexivo-propositivo com base no cotidiano
socioeducacional. In: TEDESCO (Org.). Usos de memórias. Política, educação e identidade. Passo Fundo, RS:
UFP Editora, 2002, p. 88-109.
ZEICHNER; DINIZ. Pesquisa dos educadores e formação docente voltada para a transformação social. In:
Caderno de Pesquisa. Vol.35, N.125. São Paulo, mai/ago, 2005.
123
Gênese como sistema dinâmico, em constante movimento e tensão. (PEREIRA, M. V., 2001, p. 35).
124
Eu me encontrava atenta aos pressupostos deweyanos: “Não basta insistir na necessidade de experiência, nem
mesmo em atividade do tipo de experiência. Tudo depende da qualidade da experiência por que se passa.”
(DEWEY, J., 1979 b, p. 16).
147
A singularidade desta experiência, ao se encontrar relacionada com a minha própria
história de vida, exigiu um investimento no caráter interativo de métodos e estratégias que
estudam os fenômenos sociais e humanos. Assim, agi na intenção de examinar alguns
aspectos das condições subjetivas ligadas à docência e suas condições objetivas de ocorrência
e estes se processaram como descrições e narrativas de um processo individual e social a
acionar elucidações das “[...] experiências constitutivas da professoralidade (PEREIRA, M.
V., 2001, p. 23-41) nas denominadas fontes pré-profissionais do saber ensinar”. Crenças
anteriores sobre o processo de ensino/aprendizagem expressaram-se nos fenômenos e
experiências como discentes, bem como a partir dos modelos de docência que lhes foram
proporcionados no percurso escolar. (DELORY-MOMBERGER, 2000; DOMINICÉ, 2000;
FERRAROTTI, 1982; PINEAU, LE GRAND, 1996).
Em tais premissas, ao propor a utilização dos resgastes de fragmentos das histórias de
vida pedagógica havia, de minha parte, a pretensão de que, através da rememoração fossem
criadas possibilidades de que as professoras-alunas desvelassem canais de diálogo entre a
realidade vivida e interpretada e indicassem mecanismos construtores / transformadores da
própria prática docente em crescentes sentidos subjetivos e provisórios. Nesta direção,
apoiei-me, também em idéias de Dominicé (2000, p.167), para o qual “[...] o exame dos
processos de formação, entendidos como dinâmica de aprendizagem e de mudança, não pode
se fazer sem referência explícita à forma como o adulto vivenciou as situações concretas de
seu próprio percurso educativo.” Não como um encadeamento cronológico, mas como um
processo de recriação de significado. Como afirma Benjamin (1987), passado, presente e
futuro se conectam e se redimensionam em sempre novas constelações “[...] a fim de produzir
algo que ainda não existe.” (PEREIRA, M. V., 2001, p. 35).
Nessas bases teórico-epistemológicas, nossa ação delineou-se e, aos poucos,
emergiram revelações de que a resistência inicial em escrever acerca de si e, em especial,
148
acerca das experiências pedagógicas, se devia ao medo de desnudamentos que produziram
marcas, crenças e tradições. Elas vislumbraram que a escritura de si e as discussões coletivas
poderiam torná-las vulneráveis, já que iriam inexoravelmente mexer com o status quo, com
padrões identitários
125
, clarear compreensões de como se constituíram dentro das práticas
escolares, forçar rupturas no cotidiano, e eu presumia: provavelmente produzir afecções.
126
Nessa direção se efetivaram ações na expectativa de que, em sua concretude e
diversidade, o procedimento da abordagem autobiográfica, vinculada aos pressupostos
teóricos já explicitados, se desse na perspectiva de acioná-la como expressão de vida, como
um terreno fértil para o enraizamento da investigação-ação emancipatória. Na expectativa de
que os fragmentos de histórias de vida, com suas considerações críticas acerca dos contextos
de origem, as trajetórias discentes e como professoras, pudessem mobilizar capacidades de
transformação das representações
127
da docência e quiçá funcionar como lugar de
reconstrução de novas posturas profissionais. (DELORY-MOMBERGER, 2000; NÓVOA,
1992b; PINEAU; LE GRAND, 1996). Estes ao serem considerados “[...] como tramas
invisíveis de forças subjetivas” (PEREIRA, M. V., 2001, p. 33), que trazem, em si, produtos
de intersecção de diferentes componentes, das histórias particulares ou das famílias, dos
discursos culturais e suas condições materiais e não-materiais,“[...] na inseparabilidade da
formação e autoformação profissional [...].” (p. 38).
Em tais circunstâncias, ao ser aceita e incrementada em tais dimensões, a narrativa
autobiográfica, o processo de recuperação de fragmentos das histórias de vida, especialmente
aqueles ligados ao ato pedagógico formal, deu demonstrativos de funcionar como um
instrumento metodológico da investigação-ação “[...] como um valioso recurso para uma
125
Opero na direção que dá a esta questão, Pereira, M. V. (2001, p. 37): “Quando pensamos a construção de
identidades, também somos perseguidos por esse modelo de estabilidade, de harmonia e de cristalização como
padrão desejado.”
126
Afecções, segundo Pereira, M. V. (2001, p. 28), “são encontros de forças que produzem marcas novas,
reacendem marcas dormidas [...] para logo a seguir suscitar a constituição de novas figuras [...].”
127
As representações inscrevem-se nas escolhas que se fazem e estas revelam aos interlocutores, possíveis
interpretações de nossas crenças e significações acerca do mundo físico, normativo e subjetivo. (HABERMAS,
1987d, 1990b).
149
auto-avaliação do processo pedagógico e intelectual vivido durante determinados períodos da
vida.” (BENINCÁ et al, 2004, p. 63). A trama narrativa ao comportar a coragem de
confrontarem-se consigo mesmas, numa teia de práticas de si (FOUCALT, 1994) demonstrou
possuir um papel importante na maneira como as pessoas passaram a refletir o tipo de relação
que elas têm consigo e com suas classes na definição de novas relações com o saber e com a
formação. (DELORY-MOMBERGER, 2001, 2006).
Este procedimento, ao apresentar indícios de contribuir para uma revisitação ao
passado, tal como ele submergiu, passou a funcionar como um fio condutor das experiências e
partilhas intersubjetivas dos princípios norteadores da história socioprofissional de cada uma
delas; seus registros, socializados, enriqueceram, sobremaneira, as discussões teóricas nas
sessões reflexivas - ajudando-as a analisar e compreender aspectos teórico-práticos
relacionados ao processo de ensino e aprendizagem vivenciados, ao longo da vida, por elas.
Uma pequena amostragem representativa, aleatória, deste material está contida nos anexos
deste documento e alguns trechos são trazidos, para espaço como forma de legitimar as
discussões realizadas neste item:
Memória de vida pedagógica da professora-aluna MF:
Os alunos da 5ª série estavam ansiosos pela chegada da professora de
Português que havia marcado um debate na aula anterior; ao chegar, o
silêncio tomou conta da sala, foi feita a chamada e em seguida o sorteio de
dois grupos: um deveria ficar de frente para o outro (em pé), cada
componente do grupo A fazia uma pergunta ao componente do grupo B. Ao
término das perguntas invertia-se o papel dos grupos. A professora olhava
(antes de iniciar o debate) as mãos de cada aluno para ver se havia algo
anotado (cola, pesca). Eram momentos de tortura aguardar ser chamado, pois
o medo de errar tomava conta da maioria dos alunos.
Hoje, analisando essa situação, vejo que ela se enquadra perfeitamente na
abordagem tradicional de ensino quando a metodologia utilizada (antes e
depois do debate) constava de aulas expositivas e alunos ouvintes; a
professora utilizava o exercício de repetição para que acontecesse a
memorização, não existia motivação nas aulas. Era exigida a exatidão da
reprodução do conteúdo estudado na sala de aula, podendo caracterizar essa
atitude, como diz Paulo freire, de educação bancária, onde o professor se
considera o detentor do saber, depositante de conhecimento e o aluno é
meramente o receptor desse conhecimento.
Para Paulo Freire a missão do professor é possibilitar a criação e a produção
do conhecimento.
150
Memórias de vida pedagógica da professora-aluna IS:
Entrei na escola com sete anos na 1ª série. A minha turma era dividida em
dois grupos: a 1ª série fraca e a 1ª série forte. Comecei no grupo considerado
fraco, tinha uma discriminação por parte dos educandos que pertenciam ao
grupo forte e também por parte da educadora, a atenção maior era dirigida
aos considerados fortes.
Eu me sentia discriminada e inferior, mas não desisti, pelo contrário,
procurei prestar mais atenção quando a educadora explicava para os dois
lados e no meio do ano avancei para o lado dos mais fortes. No ano seguinte
já fui para a 2ª série.
A educadora agiu de maneira inatista, poderia até ter trabalhado de forma
diferente, mas não precisava falar que ocorria essa divisão. Cada criança tem
o tempo próprio para aprender e isso ocorre à medida que ela estiver pronta.
Cabe a nós, educadores, respeitar esse tempo e criar situações de mediação,
intervenção para que elas avancem em seus níveis de percepção e aprendam
mais e melhor.
Memória de vida pedagógica da professora-aluna MG:
[...] Teve um fato que me marcou muito: quando terminava a unidade
a professora dividia a sala com uma corda no meio. À medida em que
ele entregava os resultados aos alunos, quem ficava quem alcançava a
média ficava de um lado, quem não conseguia ficava de outro lado:
essa divisão ficava durante umas duas semanas [...]
Memória de vida pedagógica da professora-aluna SF:
Quando Piaget fala que influências e estimulações ambientais alteram os
padrões de comportamento do indivíduo, eu associo às situações vividas por
mim: eu era capaz de subir e descer ladeiras no Poço Escuro buscando água
com minha mãe, mas sentia medo de andar de carro por ser uma situação que
não fazia parte da minha experiência de vida. [...]
Aos 8 anos, a professora Arlete e eu nos dávamos muito bem: acho que este
período foi o que mais me marcou, eu com minha timidez e a mania de
perfeição me soltei mais, porque a minha professora valorizava os meus
desenhos, ela costumava mostrá-los nas outras turmas, me fazia elogios
sobre a leitura e as atividades. A teoria piagetiana fica clara nesse ponto, pois
permite a construção da autonomia moral: é o estabelecimento da
cooperação ao invés da coação e do respeito mútuo no lugar do respeito
unilateral. [...] Todas as experiências (na escola) vêm confirmar a teoria
sociointeracionista de Vygotsky: ele entende que o desenvolvimento humano
é fruto de uma grande influência, das experiências do indivíduo e nos alerta
que a pessoa só aprende quando as informações fazem sentido para ela.
[...] No ano seguinte foi mais fácil enfrentar a 8ª série, já tinha me adaptado
ao ritmo dos professores e tudo corria (sic) sem muita dificuldade a não ser
em Química por causa da professora Terezinha que mantinha uma distância
entre os alunos; e, por não permitir uma aproximação e não explicar bem o
151
assunto as dúvidas iam se acumulando. Eu não tinha coragem para fazer
perguntas, surgiu então a dificuldade na aprendizagem que pode ser
explicada através da teoria de Piaget quando ele diz que o professor deve
proporcionar um conflito cognitivo para que novos conhecimentos sejam
produzidos e não deixar que o aluno aja sozinho, pois desse modo ele não
crescerá e ocasionará o desinteresse justamente por não entender o assunto.
Como se pode ver, as escrituras de si resgatadas a partir da cultura acadêmica,
inscrevem-se na subjetividade e, ao estabelecerem uma ampliação dos significados da prática
didático-pedagógica, possibilitaram às pessoas em formação entrarem em contato com suas
lembranças sobre suas aprendizagens, valorizando discursos, histórias e vivências
pedagógicas construídas no espaço escolar ao longo da vida. Neste estudo, a produção e a
socialização dos fragmentos de histórias de vida pedagógica, entretanto, ultrapassaram o
domínio da pura evocação e alcançaram a curiosidade epistemológica acerca da qual escreve
Paulo Freire (2000). Assim, elas compuseram a rememoração do experienciado como
estudantes e, ao mesmo tempo, ampliaram a sistematização de um processo de construções
sociais de conhecimento vinculadas a aportes teóricos explorados no Curso.
3.7 Ação e reflexão: caminhos em construção
A formação do pesquisador, desde cedo, precisaria
desenvolver o compromisso de ir além – além do
que os livros já falam, além das possibilidades que
lhe são oferecidas, além dos problemas mais
conhecidos.
Ivani Fazenda, 1994.
Na condição de pesquisadora acadêmica e coordenadora desse processo
formativo/investigativo, ao convidar as professoras-alunas a fazerem parte de uma ação dessa
natureza eu tinha consciência de que esta se principiava a partir de uma denominada
colegialidade artificial (HARGREAVES, 1998) na qual as situações de reciprocidade, no
geral, ao não evoluírem espontaneamente, necessitam de negociações como parte integrante
152
desta tarefa híbrida. Nessa direção, havia uma consciência, de minha parte, de que seria
preciso expandir as possibilidades cooperativas da ação empreendida, discutindo expectativas
para as diversas tarefas e negociando responsabilidades a serem assumidas por cada uma das
participantes. A cooperação, de acordo com Fiorentini (2004, p. 50) consiste numa fase de
trabalho coletivo que ainda não chega a ser efetivamente colaborativo; nesse processo, apesar
da realização de ações conjuntas e de comum acordo, o grupo nem sempre tem autonomia e
poder de decisão sobre elas.
Embora a presente ação tenha se caracterizado como cooperativa, busquei ampliar
suas perspectivas e, desde o início, explicitei que ela se encontrava pautada na premissa de o
conhecimento não ser considerado domínio exclusivo de pesquisadores acadêmicos. Havia
um reconhecimento de que as professoras-alunas possuíam suas teorias as quais embasavam
rotineiramente a sua prática: portanto, o movimento foi de validação e fortalecimento deste
saber e, assim, aproximou-se de um conhecimento compartilhado, tecido numa estrutura
interacional de crescente confiança e comprometimento, onde os apoios mútuos ajudaram a
criar uma ambiência de sustentação do crescimento sistematizado e, paulatinamente,
legitimado. (ZEICHNER, 1993). Havia, nesse agir comunicativo, a consciência e uma
vontade de superação das tendências individualistas na escola e nas atividades acadêmicas;
assim, a busca do envolvimento gradativo teve sua importância, nesse contexto de um
aprender a fazer ciência educacional.
Assim, se no início do processo elas precisaram ser persuadidas a atuar em parceria,
progressivamente, foram ocorrendo oportunidades de ações colaborativas, de participações
voluntárias: a exploração de conhecimentos técnicos acoplados à problematização de
conjunturas empíricas ajudou-nos a ampliar possibilidades de acontecer os atos voluntários,
espontâneos, de colaboração. (HARGREAVES, 1998). Desse modo, a instrumentalização
para a percepção consciente das forças que moviam a gestão do processo educativo necessitou
153
passar pelas situações pedagógicas, entremeadas, pelo que Zeichner (1993, p. 21) denomina
de “teorias práticas do professor:” estas precisaram se transformar em objeto de reflexão
docente na perspectiva da compreensão mais ampla e profunda do trabalho docente e da
constituição de renovadas práticas. Em tais premissas, este movimento investigativo apontou
na direção de se pensar o cotidiano escolar imbricado com a formação como um processo
reflexivo, com ênfase na necessidade de formar profissionais para o desempenho de papéis
ativos, tanto no planejamento, quanto na execução de suas funções. (ZEICHNER, 1993).
Em tais direções, a sistematização desse processo de reflexão na e sobre a ação, sobre
o trabalho docente e as condições sociais que o produziram, precisou aparecer numa relação
dialógica – a teoria e a prática informando-se mutuamente: ao defender, diante delas, meu
ponto de vista de que a prática não seria apenas locus de aplicação de um conhecimento
científico e pedagógico, mas, essencialmente um espaço de reflexão e criação, concitei-as a
anotar suas percepções e aprendizagens acerca das atividades acadêmicas entrelaçadas com o
exercício docente em instrumentos denominados de diários reflexivos. (ALARCÃO, 1991;
1996a; 1996b; 1998a; 1998b; 2004; ZABALZA, 1994).
Desse modo, a natureza qualitativa
128
deste estudo, sob a abordagem de perspectivas
múltiplas, comportou, além das ações de linguagem (SMYTH, 1992), a espiral lewiniana
(1946) - na notória versão modificada por Carr e Kemmis (1988), cujas principais premissas
encontram-se explicitadas neste documento. Assim, foi mencionado e sugerido às
professoras-alunas um movimento investigativo que deveria acontecer conectado às ações de
planejar, agir, observar e refletir a realidade concreta em que este se operacionalizasse; em tal
movimento elas deveriam trabalhar o conhecimento já existente e procurar estabelecer
relações entre a teoria, a ação e o contexto particular; as situações problematizadoras a serem
pesquisadas surgiriam da prática, portanto. Nesta conjunção, a leitura e a exploração de um
128
Este termo tem o inconveniente de sugerir uma falsa oposição entre qualitativo e quantitativo, que deve de
início, ser descartada: a questão é da ênfase e não da exclusividade.
154
texto da professora Elisabete Monteiro Pereira (2000, p. 153-182) ajudou-as a ampliar a
compreensão acerca da espiral auto-reflexiva de conhecimento e ação (CARR e KEMMIS,
1988; KEMMIS & MCTAGGART, 1988) e a vivenciar os princípios e as características da
investigação-ação educacional. Com isso, os problemas a serem pesquisados brotaram com a
produção e a operacionalização de cenas pedagógicas vinculadas à citada espiral envolvendo
as ações de linguagem (SMYTH, 1992) e nas sessões reflexivas (MAGALHÃES, 2004)
começaram a ocorrer as relações propostas e desejadas. A princípio, de modo incipiente, as
citadas sessões passaram a ocorrer como um movimento de caráter metacognitivo em relação
à própria experiência profissional: um movimento, como afirma Freire (1981), de tomar
distância para ver melhor a si mesmo, a ação, ao outro e abrir espaço para a produção crítica
do conhecimento.
A proposta da operacionalização de tais ações às parceiras deste processo híbrido deu-
se claramente: os registros de trabalho docente e acerca da (re)construção de conhecimentos
pedagógicos deveriam instaurar um diálogo fecundo entre a pesquisa acadêmica e a
investigação sobre as próprias ações pedagógicas, na expectativa de este procedimento
constituir-se num procedimento individual e coletivo de conseqüências sócio-políticas.
(CARR e KEMMIS, 1988). Assim, como base para a emergência de uma nova epistemologia
da práxis,
129
acordamos que o citado movimento investigativo estaria imbricado com as ações
de linguagem – a partir dos registros, da partilha dos achados, das produções e das reflexões
em planos coletivos na direção do “[...] reconhecimento do outro como sujeito de desejo, de
estratégia, de intencionalidade, de possibilidade solidária [...] na assunção da negociação e do
conflito [...] da mediação e do desafio na dinâmica da pesquisa.” (BARBIER, 2002, p. 71).
Desse modo, as leituras e discussões viriam vinculadas às problematizações da práxis
pedagógica no sentido de criar possibilidades de renovadas condições de acontecer uma teoria
129
Concepção que integra em uma unidade dinâmica e dialética a prática social e sua pertinente análise e
compreensão teórica, a relação entre a prática, a ação, a luta transformadora e a teoria que orienta e ajuda a
conduzir a ação. (HURTADO, 1992, p. 173).
155
da ação. (FREIRE, 1983b; GRABAUSKA; DE BASTOS, 2001). Nessa vertente, as situações
concretas deveriam acontecer como possíveis elementos propulsores de um processo de
produção de conhecimento, de ordem social que se transforma continuamente, como ciência
da práxis produzida numa concepção participativa e voltada à colaboração ativa. Isso “[...]
envolveu um trabalho hábil, honesto e franco de persuasão e de relação de confiança [...].”
(MACEDO, 2000, p. 158).
Com tais procedimentos, a organização e a operacionalização das citadas ações de
linguagem (SMYTH, 1992) - como prática individual e discursiva – foram realizadas na
perspectiva de registrar in loco e analisar criticamente, no coletivo, os contextos
sociohistóricos de explicitação e (re)elaboração do pedagógico da e sobre a sala de aula na
ambiência formativa:
Descrição - (O que faço?) esta ação proporcionava o transparer da observação e do
desenvolvimento de discursos sobre as próprias tarefas numa focalização da rotina
escolar rotineira, dos problemas e/ou relatos dos fatos vivenciados no ato
pedagógico levando o grupo à inquirição e reflexão acerca dos acontecimentos em
classe;
Informação – (O que isso significa?) esta ação abriu espaço para um entendimento
das teorias formais que, de algum modo dão aporte às ações, para os princípos
conscientes, ou não, que influenciam o quefazer pedagógico buscando evidências
de teorias e princípios empregados (explícitos ou não); além disso, ampliou a
reflexão acerca das razões das escolhas feitas. Constituiu-se, enfim, em momentos
de retomada com o grupo, de teorias de ensino/aprendizagem. A ação de informar
adquiria um patamar superior de reflexão quando a sessão reflexiva trazia à pauta
156
uma associação das práticas com as teorias e destas com as práticas e abria espaços
para as discussões, o confronto das ações. (HORIKAWA, 2004);
Confronto – (O que me leva a agir dessa forma?) A que interesses a minha prática
está servindo? Nesta ação de linguagem a ênfase se dava na interrogação das ações
realizadas; da compreensão das práticas, princípios e teorias presentes no contexto
escolar; ligava-se à avaliação crítica e ao entendimento das teorias formais que
sustentam as ações e à submissão destas a questionamentos. Envolvia, ainda, a
busca das insconsistências da prática: com esta ação descrevia-se, avaliava-se e,
comumente, percebia-se melhor a situação, os acontecimentos;
Reconstrução – (Como posso agir de modo diferente?) - Abria perspectivas de
encontrar alternativas para as ações voltando-se à ação, redescrevendo-a de modo
embasado e informado. Relacionava-se com a possibilidade de reorganização do
próprio agir e envolvia um maior controle da situação com a autocompreensão dos
fatos. Isto criava perspectivas de retomadas de ações rotinizadas arraigadas ao
processo pedagógico, as quais geravam automatismos comportamentais. Pôde-se
ver que a proposta de emancipação e autogerenciamento de ações possui um
relacionamento estreito com este ato.
As citadas ações, ao serem sistematizadas e associadas às seqüências espiraladas de
Carr e Kemmis (1988), foram sendo acionadas através de “[...] óticas e sistemas de referência
diferentes (entre si) aceitos como definitivamente irredutíveis uns aos outros e traduzidos por
linguagens distintas” (FRÓES BURNHAM, 1993, p. 7), constituindo-se em possibilidades de
ativar acontecimentos intersubjetivos e (re)construtivos e envolvendo a crítica da
reconstrução. Nesse sentido, a instrumentalização das professoras-alunas nas ações do
processo reflexivo se processou de modo intermitente enfocando atividades com a escritura de
157
diários reflexivos e a organização das sessões reflexivas, as quais centralizaram o trabalho
coletivo com a linguagem.
Assim, nos acordos comunicacionais propostos houve, de minha parte, o intento de
incentivar a intercompreensão do trabalho auto-reflexivo e a (re)construção de ações
pedagógicas individuais (problematizadas coletivamente) emveis qualitativos crescentes.
Nesta direção, ao investir no potencial organizativo da investigação-ação educacional
enriquecida com mais esta perspectiva busquei, ao mesmo tempo, potencializar as condições
de compreensão dos problemas emergentes e, concomitantemente, enlear as pessoas em
renovadas investidas e operacionalizações do fenômeno pedagógico.
Ao agir assim, aconteceu uma sintonia intencional com um importante princípio da
complexidade, qual seja a “[...] a reunião de elementos heterogêneos (que se encontram)
inseparavelmente associados” (MORIN; CIURANA; MOTTA, 2003, p. 44) já que levei em
conta, também a racionalidade técnica embutida na proposta de Thiollent (1996) e uma
racionalidade prática defendida, entre outros, por Schön (1992, 2000), Zeichner (1998),
Nóvoa (1995a e b), Elliot (1990 e 2000). Nessas inter-relações foi preciso construir uma
racionalidade emancipatória sócio-cultural no emprego de uma categorização hermenêutica
influenciada em Habermas (1987a) a qual exigiu reflexão, reconstrução racional sobre a
história, tradições e costumes que compõem nossa cultura e que marcam os processos
identititários e constitutivos das práticas educacionais.
130
Ao tomar como uma das referências deste estudo a epistemologia da complexidade
tive a intenção de realizar um intenso envolvimento como prática de produção e de errância,
tanto no contexto acadêmico, quanto na inter-relação entre pesquisa e prática pedagógica.
Naquilo que Malglaive (1997) denomina como formação em alternância, como movimentos
que aliam a formação teórica à formação prática. Isto, de algum modo, ajudou a fortalecer o
130
Tal como está posta na teoria da ação comunicativa de Habermas (1987 a), os sujeitos se constroem através
da linguagem e sua discutibilidade pública e socializável, portanto política.
158
efeito retroalimentador da ação pesquisadora, como se verá adiante. Assim, com o tempo, as
parceiras foram percebendo que “seriam valorizados, tanto os conhecimentos produzidos por
teorias que recortam a realidade, como aqueles saberes complexos construídos reflexivamente
pelo professor ao produzir o trabalho docente.” (FIORENTINI; SOUZA JR.; MELO, 2000, p.
325-326).
No ambiente acadêmico prosseguia, desse modo, a busca pela constituição de
momentos de construção de empatia e confiança mútua, necessários à criação de uma
ambiência para um processo de investigação-ação educacional como processo formativo e na
perspectiva de, ao mesmo tempo, conhecer e atuar no contexto concreto.
De certo modo, o movimento investigativo-ativo proposto e descrito pode ser
visualizado através da figura abaixo:
FIGURA 1 – Movimento investigativo-ativo como princípio de formação docente
A realização de um estudo com tais características aproximou-o da hermenêutica
como experiência ontológica e fenomenológica,
131
dada a ênfase sobre o vivido e acerca das
experiências subjetivas descritas, informadas, confrontadas e reconstruídas. Nesse sentido,
131
O significado de fenômeno vem da expressão grega fainemon que significa “mostrar-se a si mesmo.”
Significa algo que pode tornar-se manifesto, visível em si mesmo. (MARTINS; BICUDO, 1989).
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reflexiva de
conhecimento
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159
trabalhou com as pessoas abordando e valorizando a sua participação nos contextos, nas
circunstâncias e nas comunicações, de forma a “[...] esclarecer as condições sob as quais
surge compreensão [...].” (GADAMER, 1997, p. 442). Ao adotar tais princípios na
especificidade do campo educacional, foi viabilizada esta ação no intento de que esta
modalidade de pesquisa criasse possibilidades de alavancar elementos significativos para “[...]
uma formação mais humanizadora, crítica e transformadora” (MÜHL; ESQUISANI, 2004, p.
47) que não se limitasse a apenas observar e interpretar a realidade, mas na medida do
possível, transformá-la. Nessa vertente, as licenciandas inseridas nos seus locais de trabalho,
foram instigadas a realizar a apreensão da realidade e decifrar os sentidos aparentes, ou não,
das situações pedagógicas cotidianas, dos fenômenos e princípios, da escuta, do entendimento
e da descrição e argumentação destes, através da articulação de discursos. Afinal, a realidade
sendo sempre única, o a priori fenomenológico é o vivido, o experienciado, o concretizado.
Ao ousar adotar uma postura hermenêutica enunciei que, mesmo estabelecendo
algumas orientações a priori, admitia que renovadas trilhas nessa pesquisa pudessem oferecer
possibilidades abertas e expostas a outras redes de significações. Todas a nos convocarem “ao
anseio do rigor fecundo construído na tolerância com as epistemologias.” (MACEDO, 2000,
p. 95). Defendi, assim, a idéia de que essa forma de investigação seria desenvolvida muito
próxima da criação literária e artística (CORAZZA, 2002, p. 130) e como um processo
narrativo-discursivo. Deste ponto de vista, a subjetividade foi sendo considerada como
polifônica, plural, em perspectivas bakhtinianas. Havia a expectativa de que, a polissemia da
linguagem, (BAKHTIN, 1988), ao ser acionada a partir de dimensões cognitiva e estético-
hermenêutica, começasse a se expressar na exploração da palavra lida, ouvida, argumentada e
analisada, em fluxos de informação e aquisição de conhecimentos; e ainda, no entrelaçamento
do movimento de investigação-ação com o redimensionamento do caráter crítico-
160
emancipatório da prática educativa e de posições a favor de justiça social, econômica e
política. (GIDDENS; BECK; LASH, 1997; HABERMAS, 1987c; RAMALHO et al., 2000).
Libâneo (2002, p. 69) ao comentar a reflexividade hermenêutica, compartilhada,
solidária, comunitária refere-se à questão de “[...] retomar a preocupação com as coisas e com
as pessoas, nas práticas sociais cotidianas, em um mundo compartilhado, constituindo-se uma
comunidade reflexiva de compartilhamento de significados." Suas palavras encontram-se em
completa sintonia com esta ação.
Nessas condições, ao continuar acionando, através de textos programados como
subsidiadores da ação acadêmica, um horizonte comum de linguagem de modo a facilitar a
comunicação e a apreensão da tarefa híbrida - formadora e investigativa - levei em conta as
conseqüências que uma cultura de trabalho colegiado seria capaz de gerar nas pessoas e na
realidade circunscrita. Acatado o movimento proposto, sua operacionalização deu-se,
portanto, com a organização das ações de linguagem e, em tal contexto, apresentou sinais de
propiciar às parceiras da tarefa uma aproximação explícita de pressupostos teóricos mais
recentes da literatura sobre as questões abordadas e deram mostras, gradativamente, de
ajudar-nos a desenvolver uma tipologia de formas de trabalho coletivo que se aproximaram de
uma concepção cooperativa. Tais constructos teóricos, epistemológicos e metodológicos serão
descritos no próximo item deste documento.
3.8 Operacionalização dos ciclos espiralados e de ações de linguagem na (re)construção
do trabalho docente e na investigação
[...] tem a ver com as palavras o modo como nos
colocamos diante de nós mesmos, diante dos
outros e diante do mundo em que vivemos.
Jorge Larrosa, 2002.
161
O mundo não quer que eu me distraia; distraído,
estou salvo.
Paulo Leminski, 1982.
Assim, nos alinhamos com a intenção de ir além da lógica dos fatos, ou seja, apurar o
olhar e a sensibilidade diante da investigação focalizada “[...] tendo presente que somos
irremediavelmente parte daquilo que analisamos e que tantas vezes, queremos modificar.”
(VEIGA-NETO, 2002, p. 36).
Desse modo, a organização de eventos reflexivos no ambiente acadêmico ganhou
novas dimensões com os ciclos espiralados, conectados às ações de linguagem no trabalho
pedagógico posteriormente trazidas para o coletivo acadêmico. Nesse contexto, foram
relevantes as atitudes de fortalecimento das parcerias no reconhecimento do pleno emprego
das forças subjetivas conforme cita Morin (1993 apud BARBIER, 2002, p. 86) a propósito de
seu próprio método de pesquisa: “[...] a simpatia, a convivibilidade, ‘o viver-com’, estando o
mais possível dentro dos efeitos de emergência na complexidade do mundo.”
Dessa forma, um lastro de confiança na minha ação foi se constituindo juntamente
com o caráter reconstrutivo-construtivo e o discursivo ou prático da ação investigativa o qual
foi acionando visões retrospectivas e intenções prospectivas, operando-se, conjuntamente, um
constante movimento de reflexão sobre as ações passadas (explicação retrospectiva) para
informe das ações futuras (ação prospectiva). Desse modo, este processo, apoiado numa
abordagem interpretativa e numa noção de entendimento das pessoas, teve como base a
compreensão do passado em conjunturas individuais e coletivas. Isto se deu com a elaboração
das histórias de vida (FERRAROTTI, 1982), as socializações das denominadas cenas ou
fragmentos de vida pedagógica e a operacionalização dos diários reflexivos.
Tais dinâmicas iam dando indícios de constituirem-se como ampliadoras das
condições de empatia, observação, reflexividade, narração, descrição e confrontação das
próprias experiências e aprendizagens através de interações dialógicas como dispositivos de
162
observação, expansão da compreensão e (re)organização de tais ações. (ELLIOTT, 1993;
HABERMAS, 1989, 1990, 2006).
3.9 Ações de linguagem e sessões reflexivas
[...] ver tudo com os olhos recém-abertos, de
maneira que o que é velho e familiar se funde com
as novidades que se vêem em uma unidade de
várias estratificações.
Gadamer, 1997.
A despeito das condições do trabalho pedagógico que, muitas vezes, dificultavam o
exercício da escrita reflexiva em ação, o movimento descrito passou a ser realizado de tal
modo que a dúvida e a incerteza iam sendo não apenas aceitos, como também fomentados,
levando-se em consideração os efeitos gerados nos outros e na realidade circunscrita
(LAUXEN, 2004). Acerca disso, Grabauska e De Bastos (2001, p. 10), estudiosos brasileiros,
reafirmam que,
[...] a dimensão política e a intencionalidade emancipatória - colocam a
possibilidade de tornar os professores em geral e, ainda, mediados pela análise das
suas práticas pedagógicas, profissionais com mais poder - "empowerment" - para
agir no sentido da transformação, tanto destas mesmas práticas, como da sociedade
mais ampla.
Assim, ao optar pela utilização de uma estratégia de pesquisa dessa natureza e em tais
bases epistemológicas e metodológicas, coloquei-me na condição de pesquisadora acadêmica
no desempenho de um papel de problematizadora: daquela que buscava parceria e uma
interação democrática - no reconhecimento de que seu potencial transformador encontra-se na
capacidade de que as pessoas adquiram possibilidades de interpretar a realidade a partir de
suas próprias práticas, concepções e valores, como elementos que possuem potencial de
163
conduzi-las a atitudes críticas do status quo. Nesse sentido, ao instigar as professoras-alunas a
averiguar, escrever acerca de suas experiências pedagógicas desde que adentraram à Escola,
analisar e refletir sistematicamente em suas ações - num processo de compartilhamento de
pontos de vista e comprometimento com a práxis - houve a intencionalidade de que
juntamente com o processo investigativo ocorressem possibilidades de empowerment
132
, de
sensibilização com a profissão docente, de solidariedade e atitudes de liderança.
Reafirmo que este processo, ao ser pensado e realizado na vinculação a um contexto e
suas determinações históricas, constituiu-se como uma forma de investigação ancorada na
racionalidade emancipatória e no bojo de uma dimensão praxiológica (GRABAUSKA; DE
BASTOS, 2001) da Pedagogia de Paulo Freire afinada com o pensamento de um dos seus
seguidores mais fiéis, Moacir Gadotti (2007) o qual desvela nesta, dois pesos: um pela luta e
outro pela esperança; não apenas uma esperança de quem espera e sim, a espera de quem é
esperançoso e que faz a esperança acontecer.
132
Empowerment não tem tradução literal para o português e, desse modo, mantenho a grafia original. A
compreensão deste termo passa pelo fortalecimento político-organizacional de uma coletividade; nesse sentido,
Investigação-ação, Pedagogia problematizadora e empowerment se integram numa perspectiva emancipatória.
(FRIEDMAN, 1992; SAITO, 2001).
164
4 EIXOS DE ANÁLISE
Pode-se lá, porém, permitir que a palavra nasça
do amor da gente, assim, de broto e jorro: aí a
fonte, o miriqüilho, o olho d’água; ou como uma
borboleta sai do bolso da paisagem?
João Guimarães Rosa, 1967.
Os dados coletados nesta investigação-ação educacional foram abordados a partir de
diferentes movimentos. Aqueles advindos do questionário socioantropológico, através de
tabelas e gráficos de modo a permitir tanto análises quantitativas, quanto qualitativas de suas
categorias pré-estabelecidas. Tais categorias levantaram enunciados “[...] povoados por
pedaços de enunciados de outros, mais ou menos explícitos ou completos” (FAIRCLOUGH,
2001, p. 134) no sentido de pontuar mais profundamente a totalidade do fenômeno averiguado
e dar-lhe mais visibilidade. Estes dados ajudaram a traçar o perfil das professoras-alunas
parceiras desta investigação-ação educacional e tornaram-se deveras importantes para
subsidiar o processo de triangulação metodológica de dados, trazendo à baila uma visão
caleidoscópica da presente fenomenologia; houve desse modo, a interpenetração entre
objetividade, subjetividade e o social sem privilegiar unicamente a atitude objetivante na
busca do desvelamento dos discursos e das atitudes que pudessem trazer à luz o fenômeno sob
investigação.
Os discursos contextuados
133
em ações comunicativas sistemáticas, porque baseados
na linguagem advinda dos diários, das narrativas de vida pedagógica e expressos em
comunicações verbais, foram abordados a partir da hermenêutica gadameriana
134
, “[...] onde a
vida humana é concebida como um horizonte de possibilidades não decididas [...] antes,
133
Contextuado, aqui, na ligação com o vocábulo contexto (do latim, contextus), do verbo contexture
entrelaçar, reunir, tecer. No sentido de apreender mais significativamente como o objeto se situa em suas
manifestações relacionais. (LÜDKE, ANDRÉ, 1986).
134
Bem específica, cujas linhas centrais encontram-se na obra Verdade e Método. (GADAMER, 1997).
165
condicionada e contextualizada pelo fenômeno da linguagem, da cultura e da política.”
(GRÜN; COSTA, 2002, p. 96, 97).
Do mesmo modo, o enfoque fenomenológico conferiu a este estudo, como um
elemento de produção de sentidos, a atitude de abertura a orientações originárias de literatura
disponível acerca de análise do discurso
135
e da “[...] análise de conteúdos como um recurso
metodológico interpretacionista que visa descobrir o sentido das mensagens de uma dada
situação comunicativa.” (MACEDO, 2006, p. 145). A concepção analítica deste estudo tem,
portanto, como fio básico a linguagem e encontra-se marcada pelo dialogismo interacional,
“como um tecido de muitas vozes que se entrecruzam, se completam, respondem umas às
outras, ou polemizam entre si e no interior do texto.” (BRAIT, 1997, p. 34).
Desse modo, as manifestações de linguagem e o intercurso social fazem-se aqui
presentes no entrecruzamento de aspectos sociais, históricos, políticos e culturais, através de
elementos contraditórios que convivem nos movimentos de sínteses, permanentemente e
acionados a partir da compreensão dialógica bakhtiniana, a integrarem enunciado e vida,
falante e ouvinte, arte e escola, linguagem e consciência; na abordagem psicológica de
Vygotsky, pensamento e linguagem, aprendizagem e desenvolvimento, plano interpessoal,
plano intrapessoal. (FREITAS, 1997). Também a concepção de racionalidade comunicativa
de Habermas (2002, p.76) especialmente voltada para o relacionamento entre conceitos
espontâneos e conceitos formais trazendo, para este contexto interpretativo, a ilustração
estética no sentido de abrir os olhos da razão na intersubjetividade subjacente ao agir
135
BARROS, D. P. Teoria do discurso: fundamentos semióticos: São Paulo: Atual, 1998.
______. Contribuições de Bakhtin s teorias do discurso. In: BRAIT, B. (Org). Bakhtin, dialogismo e construção
do sentido. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1997, p. 27-38.
BRAIT, B. Bakhtin e a natureza constitutivamente dialógica da linguagem. In: ______. (Org). Bakhtin,
dialogismo e construção do sentido. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1997, p. 91 -104.
CHIZZOTTI, A. Pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006.
FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Tradução de Izabel Magalhães. Brasília: Editora Universidade
de Brasília, 2001.
ORLANDI, E. A linguagem e seu funcionamento: as formas do discurso. Campinas, SP: Ed. Pontes, 1987.
166
comunicativo, (HABERMAS, 1990b, p. 92) oferecendo-lhe um aporte teórico altamente
relevante.
Aciono, do mesmo modo, a Teoria social do discurso de Norman Fairclough (2001)
para quem (p. 91) “[...] o discurso é socialmente constitutivo e contribui para construir
relações sociais entre as pessoas e [...] a construção de sistemas de conhecimento e crença.”
Tais escolhas se deram pelo reconhecimento do caráter dialógico, bakhitiniano, do discurso e
à intertextualidade
136
e por concordar que “é impossível pensar no homem fora das relações
que o ligam ao outro.” (BAKHTIN, 1992, p. 35, 36).
4.1 A visibilidade da realidade: percursos híbridos
[...] os territórios ‘originais’, relativos tanto a um
espaço vivido, quanto a um sistema percebido, no
seio do qual um sujeito se ‘sente em casa’,
desfazem-se ininterruptamente.
Felix Guattari e Suely Rolnik, 1986.
Traçar o perfil das 37 professoras-alunas parceiras desta investigação-ação passa pelo
reconhecimento da inseparabilidade da formação profissional e da produção da subjetividade;
por instâncias de considerar a condição humana intrincada na processualidade da vida. Nessa
dimensão, significa morinianamente quebrar esferas fechadas concernentes aos contextos
relacionais e, assim, realizar um movimento de (r)estabelecer as articulações entre o que foi
separado na tentativa de compreender a multidimensionalidade (MORIN, 2002a) dos dados
qualitativos e quantitativos como um desafio importante para subsidiar as análises das
informações colhidas. Assim, tabelas e gráficos conviverão com informações discursivas
136
Termo cunhado por Kristeva no final dos anos 1960 e amplamente utilizado por Bakhtin (1992, p. 89) no
sentido de que “[...] a nossa fala é preenchida com palavras de outros .”
167
recolhidas dos diários reflexivos e das narrativas autobiográficas; suas especificidades vão
passar a confluir, a partir daqui, com “[...] sentidos e constelações vindos tal qual rios das
nascentes das nossas práticas locais e arrastando consigo as areias de nossos percursos
moleculares, individuais, sociais e planetários.” (SANTOS, B. S., 1987, p. 53). Para
enveredar por tais labirintos, incentivam-me as palavras de Corazza (2002, p. 110):
“Coragem, companheira/o. Não dá pra desejar que o mundo te seja leve, pois inventaste de
ser intelectual.”
O questionário aplicado (em anexo a este estudo) trouxe questões já consagradas pela
prática de pesquisa em geral; estas, ao se entrelaçarem com as dobraduras dos fatos relatados,
criaram expectativas de novas redes de significação. Tais coordenadas dizem respeito a
pessoas a quem a vida social imprimiu “[...] a aparência de insignificantes e que como
insignificantes são tratados” (MARTINS, 2000, p. 135) pelas grandes narrativas de uma
ciência que não incorpora em suas análises “[...] o drama e a trama da sociabilidade dos
simples.” (p. 135). Suas especificidades, é premente reconhecer, demandam “[...] distender o
elástico dos significantes e dos significados e ver onde outros sentidos podem fazer sua
morada, mesmo que provisória.” (CORAZZA, 2002, p. 112).
4.1.1 De onde vêm os enunciados?
O todo é mais e menos que a soma das partes e
que o todo. As partes são mais e menos que as
partes e eventualmente mais que o todo.
Edgar Morin, 1999.
Alcançar o contexto relacional tecido pelos fios do cotidiano traz à pauta espaços
marcados pela interação individual-coletivo, sem rígidas demarcações, portanto. A seguir,
analiso o intercâmbio que se estabelece entre tais dimensões.
168
A maioria das professoras-alunas (59%) são oriundas do Município de Vitória da
Conquista, as demais se declararam naturais de Itambé, Cordeiros, Paulo Afonso, Tremedal,
Barra do Choça, Itapetinga, Livramento de Nossa Senhora e Maetinga. São todas baianas,
portanto.
O município de Vitória da Conquista está localizado no Sudoeste da Bahia - região
que polariza uma área com um raio de 200 km e abriga uma população de aproximadamente 2
milhões de habitantes. Nesta, é o município que está dotado da melhor infra-estrutura urbana.
Sua sede está situada nas encostas da Serra do Periperi, na microrregião do Planalto de
Conquista. Possui as seguintes coordenadas geográficas: 14º 50’ 53’’ de latitude Sul e 40º 50’
19’’ de longitude Oeste e encontra-se a 510 km da capital do estado, Salvador. Sua
abrangência espacial é muito ampla: possui uma área de 3.743 km² distribuída em 12 distritos:
Sede, Iguá, Inhobim, José Gonçalves, Pradoso, Bate-pé, Veredinha, Cercadinho, Cabeceira da
Jibóia, Dantelândia, São Sebastião, São João da Vitória. Vitória da Conquista limita-se com
os Municípios de Anagé, Belo Campo, Encruzilhada, Planalto, Barra do Choça, Cândido
Sales, Itambé e Ribeirão do Largo.
Sua população, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em
1 de abril de 2007, era de 308.204 habitantes, fato que lhe proporcionou ser considerada a 5ª
maior cidade do interior do Nordeste e 3ª de toda Bahia
137
. Com uma renda média de R$
2.700,00, o Sudoeste contribui com 17% da população do Estado e possui um dos PIB
138
que
mais crescem no interior desta região. Capital regional de uma área que abrange
aproximadamente 70 municipios na Bahia, além de 16 cidades do norte de Minas Gerais. Tem
137
Mais informações nos sites: http://pt.wikipedia.org/wiki/Vit%C3%B3ria_da_Conquista
<http://www.achetudoeregiao.com/BA/vitoria_da_conquista/dados_gerais.htm> E na obra: SOUSA, M. A. S. A
Conquista do Sertão da Ressaca. Ed. UESB, 2001.
138
O Produto Interno Bruto (PIB) representa a soma (em valores monetários) de todos os bens e serviços finais
produzidos em uma determinada região (qual seja, países, estados, cidades), durante um período determinado
(mês, trimestre, ano etc). O PIB é um dos indicadores mais utilizados na macroeconomia
com o objetivo de
mensurar a atividade econômica de uma região.Na contagem do PIB, considera-se apenas bens e serviços finais,
excluindo da conta todos os bens de consumo de intermediário (insumos). Isso é feito com o intuito de evitar o
problema da dupla contagem, quando valores gerados na cadeia de produção aparecem contados duas vezes na
soma do PIB.
169
a altitude, nas escadarias da Igreja Matriz, de 923 metros podendo atingir mais de 1.000
metros nos bairros mais altos. Tem um clima tropical, amenizado pela relativa altitude do
lugar, possui umas das temperaturas mais amenas do estado Bahia tendo chegado a registrar
6,2°C em 2006.
As micro-indústrias, instaladas por todo o Município, geram trabalho e renda. Elas
produzem de alimentos a cofres de segurança, passando por velas, embalagens e movelaria,
além de um pequeno setor de confecções.
A rede urbana regional articula-se em torno de dois grandes eixos rodoviários: o
primeiro, no sentido Norte-Sul, é centralizado pela BR 116 (Rio - Bahia), permitindo acesso
tanto ao Centro-Sul como ao Norte e Nordeste do Brasil. O segundo eixo (BA 415) articula-se
na direção Leste com o município de Itapetinga e os pólos da zona cacaueira, Itabuna e Ilhéus
e ao oeste do Estado, BA 262 (Conquista - Brumado). Esta última é considerada o acesso sul
da Chapada Diamantina e constitui-se como a principal rota de entrada para a região Centro-
Oeste do país.
A educação é um dos principais eixos de desenvolvimento do município. A abertura
da Faculdade de Formação de Professores, em 1969, respondeu à demanda regional por
profissionais com formação acadêmica e para o exercício do magistério. A partir da década de
90, a UESB multiplicou o número de cursos oferecidos, possuindo atualmente 38 cursos
distribuídos pelos três campi (Vitória da Conquista, Jequié e Itapetinga). Também nessa
década, surgiram três instituições privadas de ensino superior no município. Na especificidade
da educação municipal, as 219 escolas e 20 creches de Vitória da Conquista são criadas e
mantidas pelo poder público em convênio, ou não, com outras instituições e administradas
pela SMED. O regimento comum das Escolas Municipais de Educação Básica – educação
infantil e ensino fundamental – foi devidamente formulado, incorporando às exigências da Lei
9.394 de 20 de dezembro de 1996 e demais legislações pertinentes ao ensino.
170
No sentido de buscar alternativas para a qualificação dos professores da rede pública,
professores da UESB elaboraram o Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em
Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental e criaram o Programa de
Graduação para os professores da Rede Pública Estadual e Municipal do Estado da Bahia –
UESB EM AÇÃO. A partir daí implantaram-se cursos nos campi de Vitória da Conquista e de
Jequié. Em Vitória da Conquista, o referido Programa atende a um universo de 400
professores habilitados através de processos seletivos e convocados paulatinamente desde
2004.
O Curso de Licenciatura Plena em Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino
Fundamental da UESB foi criado para acontecer em três anos e tem os seguintes objetivos:
Trabalhar, articuladamente, os conhecimentos básicos da educação infantil e
das séries iniciais do ensino fundamental, com domínio de conhecimentos
construídos historicamente, mediante a investigação, a interpretação e a
intervenção na dinâmica interna da sala de aula e da escola;
Perceber a escola, sua organização de trabalho e sua função enquanto
instituição inserida no contexto histórico-social, identificando e analisando
problemas que emergem da prática pedagógica, no sentido de subsidiar a
elaboração de projetos e ações a serem desenvolvidos na realidade analisada;
Refletir sobre a experiência docente, na perspectiva de aprofundar os saberes
da docência necessários ao exercício da profissão, aliando competência técnica
à competência política, contribuindo para a formação de um pedagogo
crítico/reflexivo, preocupado com a indissociabilidade teoria/prática.
171
O perfil do profissional a ser formado é o de um docente possuidor de competências e
habilidades básicas, cuja formação possa contribuir para a intervenção social na construção da
cidadania. Um profissional crítico, reflexivo que utilize os elementos da sua prática como
fonte de reflexão e busca de soluções, alimentando, assim, continuamente a produção de
novos conhecimentos.
139
Foram criadas 40 vagas semestrais para Vitória da Conquista, no turno noturno. Com
duas entradas anuais as 80 vagas vêm sendo distribuídas de acordo com o quadro abaixo:
Turma Início Total de Ingressos
01 II/2004 40
02 I/2005 40
03 II/2005 40
04 I/2006 40
05 II/2006 40
06 I/2007 40
07 II/2007 40
08 I/2008 40
09 II/2008 40
10 I/2009 40
QUADRO 2 – Cronograma de distribuição de vagas do Curso do Curso de Licenciatura de Educação Infantil e
Séries Iniciais do Ensino Fundamental – Vitória da Conquista
As 37 professoras-alunas, co-partícipes deste estudo, encontram-se devidamente
inseridas no contexto acima.
Carga horária do Curso de acordo com a Resolução CNE/CP 02/2002:
Prática como componente curricular (PCC) 400h
Estágio Curricular Supervisionado (ECS) 400h
Conteúdos Curriculares de Natureza Científico-Cultural (CC) 1.800h
Atividades Acadêmico-Científico-Culturais (ACC) 200h
CARGA HORÁRIA TOTAL 2.800h
Distribuídas em 3 anos letivos
QUADRO 3: Distribuição de carga horária do Curso de Licenciatura de Educação Infantil e Séries Iniciais do
Ensino Fundamental – Vitória da Conquista - BA.
139
Dados retirados do Projeto pedagógico do referido Curso. Julho de 2005.
172
Podem-se explorar, no Projeto explicitado, visões renovadas nos seus objetivos, no
perfil dos profissionais a serem formados;
140
porém a organização curricular (denominada de
estrutura) apresenta uma carga horária substancial reservada aos “Conteúdos Curriculares de
Natureza Científico-Cultural”, de caráter gradeado e disciplinar, voltado para a sala de aula.
Isso nos remete a Arroyo (2000, p. 131) que diz: “O modelo de escola e de mestre que os
centros reproduzem na ocupação dos tempos e espaços são para o aulismo, para serem meros
aulistas.” Muitas horas são reservadas, nas licenciaturas, para este conteudismo, muitas horas
são reservadas para assistir aulas e há fortes indícios de que este fato leva o processo
formativo a perder em densidade cultural: há pouco tempo para a dedicação a leituras que não
sejam apenas aquelas exigidas nas demandas das disciplinas (95% trabalham em regime de 40
horas semanais, como se verá adiante). Há um tempo escasso, portanto, para a participação
em outras atividades criativas, culturais, de convivência e trocas de experiências, de saídas
pela cidade, de oficinas, de aprendizado de outras linguagens. Novamente Arroyo (p. 132)
pontua de modo contundente: “É nesse reducionismo cultural, de horizontes, que se formam
[...] os agentes culturais.”
4.1.2 Quem está falando?
Como pensar um detalhamento metodológico, que
possibilite a reprodução do experimento como
critério de validação, quando a vida em
movimento não permite a exata repetição dos
acontecimentos sociais?
Edwiges Zaccur, 2003.
140
Nos objetivos citados acima se prevêem a formação de “[...] um profissional crítico, reflexivo que utilize os
elementos da sua prática como fonte de reflexão e busca de soluções [...].”
173
Sacristán (2002, p. 27) assevera: “A forma de ser dos professores é uma forma de
comportamento cultural [...] é importante acolher as raízes culturais das quais eles se nutrem
para entender como e por que atuam.” Nesta rota, enuncio uma ação interpretativa que
considero relevante para este estudo: a entremear as análises dos dados quantitativos, os
depoimentos oriundos das memórias autobiográficas se farão presentes. Como já foi dito,
estas tangenciaram este estudo e, agora, lhe apresentam subsídios acerca do perfil das
referidas professoras-alunas.
Da totalidade das parceiras desta investigação-ação 100% são do sexo feminino, 59%
declararam-se pardas, 30% brancas e 11% pretas. A faixa etária varia e há uma predominância
de 33% das que possuem de 30 a 34 anos.
Mais informações, acerca deste item, podem ser visualizadas abaixo:
Faixa etária Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) 25 a 29 anos 09 24%
(b) 30 a 34 anos 12 33%
(c) 35 e 39 anos 09 24%
d) 40 a 44 anos 05 14%
(e) 45 a 49 anos 02 5%
GRÁFICO 1 - Faixa etária
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
(a) 25 a 29 anos
(b) 30 a 34 anos
(c) 35 e 39 anos
d) 40 a 44 anos
(e) 45 a 49 anos
174
Cor da pele Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) Pardas 22 59%
(b) Pretas 04 11%
(c) Brancas 11 30%
(d) Amarelas 0 -
GRÁFICO 2 – Cor da pele.
Há um destaque para a questão da feminização
da profissão docente (LOPES, E. M.
T., 1991, p. 22-40) especialmente relacionada à educação infantil e às classes iniciais do
ensino fundamental. Isto aparece fortemente neste estudo, a sinalizar essa relação histórica
que diz respeito à combinação entre maternidade e catequese - a uma visão artesanal da
profissão docente. O depoimento transcrito abaixo, recolhido intencionalmente de uma
narrativa de vida pedagógica, revela de algum modo, o que se afirma:
Quando minha filha caçula estava com um aninho, voltei a estudar, fazendo
o magistério no intuito de conseguir uma formação que me desse o diploma;
não para exercer a função, mas para obter um ‘canudo.’ Não tinha a
pretensão de trabalhar fora de casa, gostava muito do lar, de cuidar de
minhas filhas, do marido, de manter a casa arrumada, fazer doces [...] no
decorrer dos anos tomei consciência de que trabalhar fora de casa era
importante para o meu crescimento pessoal , intelectual [...] nunca deixei de
cumprir minhas tarefas de esposa e mãe e educadora. [...] mas sentia desejo
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
(a) Pardas
(b) Pretas
(c) Brancas
(d) Amarelas
175
de compartilhar minhas experiências com alunos desfavorecidos
economicamente. (Professora-aluna IS).
141
“O fato de a professora ser mulher introduz um viés na profissão docente,” afirma
Sacristán (2002, p. 27). Aqui, percebe-se, de modo delicado e intimista, que a condição
feminina, aliada ao modus vivendi, encontra-se presente na escolha realizada, aquela
compatível com a função de mãe, dona de casa, esposa. O discurso do senso comum é
intertextual, feito de sedimentações de discursos anteriores colados a determinados traços
seculares do ofício de mestre e modos sociais de enxergar e viver a condição de mulher.
(ARROYO, 2000).
Ressalte-se que 40% delas têm de 11 a 15 anos de experiência docente sendo que 92%
estão a atuar em classes iniciais do ensino fundamental; apenas 8% na educação infantil,
conforme se vê abaixo:
Tempo de serviço como professoras Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) 06 a 10 anos 09 24%
(b) 11 a 15 anos 15 40%
(c) 16 a 20 anos 12 33%
d) 20 a 24 anos 01 3%
141
Reafirmo que esta codificação foi feita tomando como base a lista de freqüência às sessões presenciais de
trabalho acadêmico com o grupo citado. Tal lista ganhou símbolos (letras) como forma de preservar as
identidades das pessoas.
176
GRÁFICO 3 - Tempo de serviço como professoras.
Neste estudo, a maioria (40%) possui de 11 a 15 anos de exercício e 33% têm de 16 a 20
anos. Isso revela que elas são pessoas experientes, não se apresentando um perfil de iniciante
no magistério. As que possuem menos tempo de serviço (24%) têm de seis a dez anos. O
tempo de atividade na profissão é um dado relevante: ele surge como um fator importante na
compreensão dos saberes constituídos, já que o tempo de aprendizagem do trabalho
confunde-se muitas vezes com o tempo de vida, com a transformação de si, com a
autoformação profissional em sua processualidade. São as marcas subjetivas que, de algum
modo, guiam “[...] um sujeito-em-prática [...] sendo e, ao mesmo tempo, como potência de
vir a ser outro de si, algo diferente do que vem sendo, algo nunca sido.” (PEREIRA, M. V.,
2001, p. 36). Muito diferente de uma concepção identitária, algo estável, de
institucionalização de uma forma estereotipada de ser professor. As fontes de aquisição dos
saberes da experiência e seus modos de integração ao trabalho docente atravessam formações
existenciais singulares parecendo desequilibrar um sistema, até então, aparentemente estável,
e ativar novas possibilidades de a pessoa tornar-se diversa de si mesma. Como se vê em
registros de algumas professoras-alunas abaixo:
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
(a) 06 a 10 anos
(b) 11 a 15 anos
(c) 16 a 20 anos
d) 20 a 24 anos
177
Na minha profissão, são quase 19 anos trabalhando de um jeito empirista
sempre muito presa ao conteúdo e transmitindo para os alunos. [...] agora
percebo que o importante não é apenas isto e sim realizar atividades que
levem o aluno a pensar, a construir seu conhecimento, a agir por ele. Na
minha sala estou procurando criar situações problematizadoras, não dou
mais respostas prontas, estou fazendo trabalhos em duplas, em grupos. Tudo
isso dá muito trabalho, porém os resultados estão mais satisfatórios. Tenho
que melhorar muito ainda, hoje eu sei disso. (RG).
Com as leituras e discussões, muitas dúvidas de como agir com os alunos
surgiram. São muitos anos que atuo como professora e eu precisava deixar
(sic) pra trás muitos conceitos já formados, além de lutar com vários
obstáculos dentro de mim. [...] sei que tenho um longo caminho a seguir,
mas estou mais aberta a mudanças, sei que preciso mudar minha prática,
pois tenho resquícios do tradicional. Isto vai depender de tempo, mas sinto
que é possível [...] (MP).
Antes de entrar para a Universidade eu vivia no senso comum, não tinha o
hábito de ler, não conhecia teorias e nem os estudiosos: era como se eles não
existissem. Após ter entrado nesse Curso comecei a me ver melhor como
profissional e a rever a minha prática e minha postura diante da vida [...]
minha mente está se abrindo [...] hoje vejo o aluno como um sujeito crítico e
como alguém capaz de intervir na realidade [...] (GH).
Vivia angustiada, pois sentia necessidade de melhorar a minha prática e
ajudar mais os alunos com dificuldades de aprendizagem e não sabia como:
apelava para a coordenadora e para a minha surpresa ela não podia me
ajudar, sabia tanto quanto eu... Surgiu a oportunidade de entrar para a
Universidade [...] com as aulas e as discussões minha mente está se abrindo
[...] agora comecei a me olhar mais e refletir no que aprendo e na minha
prática e percebo mudanças: vejo meus alunos hoje de modo diferente
daquele aluno inquieto que eu pensava não querer nada [...] Penso na teoria
de Piaget que explica o conhecimento como uma construção contínua, feito
de trocas entre o sujeito e o mundo. Sei hoje que preciso é desafiar o aluno
pra ele ficar mais inteligente e criar na sala de aula um ambiente que
favoreça a capacidade criadora do aluno. Estou aprendendo a ser diferente.
(MN).
Percebe-se, por detrás dos fenômenos descritos, um conhecimento individual do ato
de ensinar, de tramas constitutivas de um aprender a ser professor entrelaçado a um tempo
de aprendizado proveniente da história de vida pessoal, dos lugares de formação e na
experiência de trabalho. (TARDIF, 2002). Nos registros, o saber profissional ao encontrar-se
na confluência entre várias fontes de saberes e de elementos socioculturais, vai se
processando em novas conexões e possibilidades; nesse sentido, a tomada de consciência
178
aparece como um dado provocador de conflitos e gerador de um importante processo de
reconstrução metacognitiva. Vê-se que há nos registros acima, manifestações de sentidos
implícitos e percepções individuais a revelarem um a priori acerca do fenômeno pedagógico.
Transparecem, ainda que as experiências vivenciadas no Curso tendem a colocar em ação um
processo em que conceitos e idéias são repensados e isso, de algum modo, provoca a
reconstrução dos conhecimentos prévios em direção a maiores compreensões: as novas
sínteses nos dizeres das professoras-alunas dão indicativos de ter havido transformações no
pensamento e no conhecimento pedagógico.
No item abaixo, o da renda familiar, mais indicadores:
Renda familiar Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) De um a dois salários mínimos 2 5%
(b) De três a quatro salários mínimos 24 65%
(c) De cinco a seis salários mínimos 10 27%
(d) De sete salários mínimos ou mais 1 3%
GRÁFICO 4 – Renda familiar.
Aqui, observa-se que o percentual mais alto (65%) de renda familiar corresponde a
uma faixa de 2 a 4 salários mínimos; 27 % ficaram na faixa de 5 a 6. Dessas, somente 3%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
(a) De um a dois salários mínimos
(b) De três a quatro sal ários
ni mos
(c) De cinco a seis salários mínimos
(d) De sete salários mínimos ou
mai s
179
estão entre aquelas que conseguem de 8 a 10 salários em família. Estas percentagens, num
grupo em que a maioria exerce a função de professora em 40 horas semanais (95%) e onde
35% se dizem provedoras, chefes da família e 65% contribuem parcialmente avalia-se que o
salário da professora tem uma importância fundamental na constituição familiar. Pode-se
visualizar esta realidade em mais dados e registros explicitados abaixo:
Posição econômico/financeira na família Total
%
Professoras-alunas pesquisadas 37 100,00%
(a) parceiras (contribuem parcialmente) 24 65%
(b) Provedoras (responsáveis pelo sustento da
família) 13
35%
GRÁFICO 5 - Posição econômico/financeira na família
A realidade do capitalismo selvagem está na minha sala de aula e está
me mostrando como estou sendo desvalorizada e explorada na minha
profissão. Hoje fui chamada por um aluno do Ciclo II, 9 anos, de
rapada. Isso me causou uma angústia muito grande. Primeiro pelos
valores que estão são sendo passados a esta criança, outra porque sei
que a minha condição financeira é realmente ruim, apesar de eu
trabalhar tanto. Me pergunto: (sic) a que ponto chegou o profissional
de educação? Será que vale a pena continuar? (EG).
Percebe-se, nesta declaração, que a visão dos profissionais se alargou, uma
consciência social e política mais dilatada está a se constituir e com isso transparecem mais
os traços de autocomiseração e autoculpabilidade a afetar a auto-estima da professora, já tão
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
(a) parcei ras (contribuem parcialmente)
(b) provedoras (responsáveis pelo sustent o da
família)
180
comprometida pela desvalorização profissional e salarial. Diante do comentário do aluno, tais
sentimentos parecem ganhar uma dimensão de verdadeira síndrome – a síndrome da
desistência, conhecida internacionalmente como burnout. São realizados estudos, no Brasil e
em outros países, relacionados à saúde docente e sabe-se que a questão do estresse e do
desânimo tem sido uma constante nessa literatura a denunciar condições precárias de vida
marcadas pelas adversidades de baixos salários, falta de apoio e a dura realidade da
convivência com a miséria, a violência e a exclusão. (COSTA, S. G., 2005).
As crises na área da educação, principalmente pela baixa remuneração, no Brasil, não
são problemas atuais. Atravessaram décadas e as conseqüências estão aí, são absolutamente
visíveis e nefastas: conforme levantamentos do IBGE, a média salarial de um professor do
nível médio no país é de R$ 866,00 mensais - um policial civil percebe R$ 1.510,00 e um
médico, R$ 3 mil. (AS CARÊNCIAS... 2004).
Quanto ao estado civil, a maioria (72%) é casada.
Estado civil Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) Casadas 27 72%
(b) Solteiras 04 11%
(c) Divorciadas 05 14%
(d) Viúvas 1 3%
GRÁFICO 6 – Estado civil
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
(a) Casadas
(b) Solteiras
(c) Divorciadas
(d) Viúvas
181
Parece haver nos dados citados até aqui uma clara relação entre intensificação do
tempo dedicado à tarefa docente e a proletarização deste trabalho; há indícios de que quanto
mais há controle do tempo, aliado à pressão pela realização de tarefas, mais se fragiliza a
noção de profissionalização do magistério, levando-o à pauperização. Se o professor perdeu o
controle do processo de seu tempo (pela necessidade de sobrevivência) e de seu trabalho, se é
levado a realizar tarefas predeterminadas por estruturas superiores, a concepção de autonomia,
tão necessária à profissionalização, desaparece e se produz uma espécie de colonização por
meio da intensificação de atividades. Sem tempo para pensar, estudar, se organizar em grupos,
o professor perde a força nas decisões e elaborações de sua tarefa pedagógica e se aliena,
parece murchar na profissão. Os professores, nessa perspectiva são considerados burocratas e
submissos, ou seja, preparados para uma atividade de execução tipicamente instrumental e
suas práticas voltam-se para a solução de problemas mediante a aplicação de teorias e técnicas
científicas tradicionais. A situação agrava-se com o acúmulo de tarefas inerentes à condição
de mãe, esposa e docente, agora acrescentadas com o recente papel de estudante. O
depoimento abaixo, retirado de um fragmento de vida pedagógica, descreve esta realidade:
[...] Estou muito preocupada: sonhei tanto fazer um curso universitário e
tenho medo de não dar conta das outras coisas da sala de aula [...] sempre
procurei dar o melhor para os meus alunos, mas trabalho o dia inteiro, agora
estudo à noite e tenho três filhos pequenos [...] meu marido me ajuda [...]
mas é um sufoco pensar num modo diferente de ensinar, com tanta coisa [...]
penso em desistir do Curso, ao mesmo tempo acho uma covardia. (IB).
No seu testemunho ela se refere ao fato de deixar de realizar seus próprios processos
produtivos como profissional e como aluna por falta de tempo. Ela exterioriza uma ansiedade
real ao se ver eternamente pressionada pelo tempo, pelas contingências cotidianas. Sabe-se
que nesse caso fica mais fácil lançar mão de manuais, textos prontos, livros didáticos
organizados, tornando-se uma presa mais maleável do sistema. Esta análise, é óbvio, não
isenta o professor de sua responsabilidade com a qualificação de seu trabalho e a luta por
182
melhores condições de seu exercício até porque, se não exercidos, estes são fatores que
contribuem para a sua desprofissionalização e pauperização crescentes. Mas, de todo modo, a
compreensão destes dados revela indícios de uma situação pouco alentadora no que diz
respeito às condições do exercício da profissão docente e da qualificação dessas professoras
nas circunstâncias de 40 horas diurnas de trabalho, semanais, e o exercício de serem discentes
de segunda a sexta-feira das 18 às 22 horas. Tal apreensão pode ser aventada tendo como
pano de fundo as políticas educacionais ligadas à formação docente praticadas, em especial,
nas últimas décadas. As reformas educacionais trouxeram uma pressão sobre professores e
administradores por resultados positivos nos índices escolares, sem a devida contrapartida por
melhores condições de trabalho, formação contínua e salário: este estado de coisas carece de
questionamento: as ações dos responsáveis pelos (des)caminhos da educação precisam ser
avaliadas, assim como estas políticas que propõem avaliar professores e alunos.
O próximo item diz respeito à realização dos estudos vinculados ao ensino médio: das
37 professoras-alunas, 99% optaram pelo curso de Magistério; apenas uma fez, também, o
curso de Técnico em Contabilidade, mas prossegue como docente. A grande maioria (84%)
fez seu curso em escola pública como se pode visualizar abaixo. Os comentários, anexados,
novamente enriquecem os dados estatísticos:
Realização do ensino médio Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) todo em escola pública 31 84%
(b) todo em escola particular 01 3%
(c) maior parte em escola pública 03 8%
(d) maior parte em escola particular 02 5%
183
GRÁFICO 7 – Realização do ensino médio.
Os registros abaixo dizem das escolhas e das circunstâncias em que estas foram
realizadas:
Era chegada a hora de decidir o que cursar. Com certeza não seria o
magistério, mas como a minha mãe teve em sua vida o sonho de ser
professora e por conta de vários fatores, não pôde realizá-lo, pediu-nos (a
mim e à minha irmã) que fizéssemos a sua vontade, logo depois poderíamos
seguir o que quiséssemos. Estudamos com afinco e nos tornamos professoras
[...] Foi no magistério que me encontrei. (US).
Eu não sabia se era realmente essa profissão que eu queria, mas como minha
mãe era professora, ela me influenciou e segui o seu caminho. Até hoje não
me arrependo. (UL).
Pensei em cursar auxiliar de escritório (sic), porém os argumentos de meu
pai me convenceram a cursar o magistério. Dizia ele que era a melhor
profissão para mulher, pois podia optar por trabalhar só um turno. (WS).
[...] Eu estava vivendo um conflito, pois meu pai queria que eu fizesse o
magistério e eu achava que essa decisão teria que ser só minha, afinal a
escolha de minha futura profissão era só do meu interesse, não entendia a
preocupação de meu pai [...] resolvi que estudaria à noite no curso de
contabilidade, cheguei à conclusão que não levava jeito para dar aulas por
ser muito tímida. Meu pai ficou mais decepcionado comigo do que minha
mãe, eles queriam que eu fosse professora: naquele tempo era o que a
maioria dos pais queria para suas filhas [...] Depois de treze anos fiz o
magistério [...] e comecei a dar aulas na zona rural [...] pegando carona na
estrada, fugindo de gado, chegando em casa toda empoeirada e
extremamente cansada [...] (SF).
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
(a) t odo em escola pública
(b) t odo em escola particular
(c) maior parte em escola pública
(d) maior parte em escola particular
184
A imagem feminina do magistério aparece aqui como algo incentivado, como
adequada a mulheres, especialmente de jovens oriundas das camadas mais populares da
sociedade. O magistério, ao ser aconselhado pela família parece trazer em si soluções, em
curto prazo, de sobrevivência rápida. “Para as filhas de trabalhadores, subempregados, o
magistério é um dos poucos horizontes possíveis,” diz Arroyo, (2000, p. 128). O aprendizado
da profissão acaba se situando nos limites da própria existência, nos âmbitos familiar e social
e envolve questões de gênero e raça. A relação com a construída professoralidade (PEREIRA,
M. V., 2001) e seu papel social, transparece em mistos de amor e ódio, quando elas se dão
conta da desvalorização sociopolítica da profissão. São importantes os depoimentos
transcritos abaixo:
Diante do descaso e da desvalorização profissional que o poder municipal
tem por nossa profissão e, ainda pensando no sentido mais amplo da
educação, me sinto muito importante e impotente, mas com capacidade para
grandes conquistas. (SK).
Como professora me questiono e reflito acerca desses meus dezesseis anos
dedicados à educação: será que o nosso sistema não tem, mesmo, jeito?!
Como esperar que a educação seja um dos ícones de transformação, se quem
está à frente das Instituições manipula, dita e determina regras? Me sinto
(sic) explorada profissionalmente e pouco reconhecida financeiramente.
(KB).
A dubiedade de sentimentos apresenta-se, aqui, de modo claro: no primeiro
depoimento a profissional-estudante reconhece a degradação qualitativa da educação escolar
pelo sistema público, demonstra que sofre concretamente os efeitos perversos de suas
condições de vida e trabalho dizendo-se impotente diante da crise da escola; ao mesmo tempo
reage, dizendo-se importante, “com capacidade para grandes conquistas.”
A segunda reage ao questionar situações problemáticas de manipulação ligadas à área
educacional e indaga-se sobre estas; ao mesmo tempo demonstra sentimentos de
desorientação, sofrimento e desamparo buscam interpretações para aquilo que está
185
vivenciando. Ao confrontar, revela um mal-estar na profissão, emite opiniões, exercita o
pensamento crítico, demonstra estar consciente de que “[...] vive a condição de massa de
manobra, de objeto de dominação na senzala da vida, coibido de autodeterminação.” (DEMO,
1996, p. 42). Nesse sentido, vale ressaltar que se traduzem, em estatísticas, os insignificantes
desempenhos do sistema educacional e a questão do desânimo dos docentes diante dos graves
problemas enfrentados em seus contextos pessoais como alunas e professoras. Para reafirmar
o que está sendo dito, vale trazer à pauta os depoimentos das professoras-alunas MN e FL:
São 3:55 da manhã, estou cansada mas não consegui dormir pensando em
muita coisa: na quantidade de trabalho da Universidade que tenho a fazer e
algumas atividades que eu gostaria de realizar com meus alunos. Me falta
(sic) tempo e isso me angustia. [...] Escrever foi uma forma que encontrei pra
desabafar e relaxar. [...] Ontem resolvi preparar o mesmo assunto para
trabalhar com as duas turmas e procurei adequar à realidade de cada grupo.
Com a turma do matutino (alunos de 11 a 14 anos) a aula foi interativa,
quase todos os alunos contribuíram com questionamentos e com a turma da
tarde (9 a 11 anos) não aconteceu o mesmo, por mais que eu tentasse não
conseguia atrair a atenção do grupo. Não havendo mais recurso incentivador
resolvi assumir uma postura tradicionalista. Pedi que abrissem os cadernos e
copiassem um texto enorme sobre o assunto, o qual eu coloquei no quadro-
de-giz. Em seguida passei um catatau de exercícios. [...] Fico a me
perguntar: “Será que é a professora que determina o perfil da turma com a
falta de habilidade e afetividade ou (são) os alunos que determinam a postura
pedagógica do professor com a sua falta de interesse, indisciplina e
violência?” [...] Penso que essa situação foi criada pelo meu cansaço. (MN).
[...] É muito difícil entender como a criança aprende [...] Tenho medo de
falhar e tenho muita vontade de aprofundar meus estudos, o que é muito
difícil porque eu tenho marido e quatro filhos pra dar conta e é muito difícil
ser mãe, professora, mulher, estudante em apenas 24 horas. Tenho fé em
Deus que vou vencer tantas barreiras [...]. (FL).
Para Habermas (1989) é, através da linguagem, como eixo de organização do mundo,
que as pessoas se constroem. Na teoria da ação comunicativa ele trata a discutibilidade, desde
que seja pública e socializável, como essencialmente política; para ele os processos de
aprendizagem baseados na linguagem supõem a interpenetração de três eixos: objetivo,
subjetivo e social. (HABERMAS, 1990b). No depoimento da professora MN vê-se que a
possibilidade de escrever acerca de circunstâncias de vida e trabalho é exercida por ela como
186
ato monológico inter-relacionado aos eixos citados. Esta ação abriu-lhe perspectivas de
exercer tal discutibilidade, consigo própria, de um modo emancipatório: a reflexão crítica
incitou-a a posicionar-se como cidadã e professora angustiada /inquieta, levou-a a pensar,
desabafar e a repensar, em contexto, a si e ao seu trabalho; trazido para o coletivo, pela
mediação da ação comunicativa, veio ao encontro de realidades similares e, de algum modo,
extrapolou a desesperança e a impotência em espaço de conscientização e de luta por
melhores condições de trabalho e exercício de cidadania.
Nos dois depoimentos, expressivamente ingênuos, transparecem realidades conjugadas
com as múltiplas tarefas a que estão submetidas as professoras que cumprem 40 horas
semanais em efetivo exercício docente, freqüentam aulas na Academia de segunda a sexta-
feira à noite e aos sábados pela manhã e, comumente, exercem os papéis de esposa, mãe e
dona de casa. E é preciso reconhecer que este contexto apenas reforça um reconhecimento de
uma situação extremamente difícil em que os professores da educação básica, que querem
produzir mais conhecimentos e avançar na carreira docente, estão colocados.
A partir dessas circunstâncias como pensar num professor reflexivo, crítico e
inventivo, “[...] como vislumbrar o rompimento do nada em direção à realização de todos os
sonhos do mundo, como diz Fernando Pessoa?” (BENASSULY, 2002, p. 191). Responder a
esta questão nos remete para a esfera das políticas públicas educacionais: por exemplo, no que
diz respeito às condições legais para que um professor se qualifique, as disposições delineadas
no Título VI da LDB 9394/96 compostas pelos seis incisos que compõem o artigo 67
142
, se
cumpridas integralmente, significariam mais efetivamente a “valorização dos profissionais da
educação”. No entanto, comumente os estatutos de magistério estaduais e municipais não
regulamentam e, conseqüentemente, não cumprem o que se encontra disposto no seu inciso II
142
LDBEN 6364/96 - Art. 67. Os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da educação,
assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público.
(Regulamentado pelo Decreto n. 3276/99).
187
- aperfeiçoamento profissional continuado, inclusive com licenciamento remunerado para
esse fim – e no seu inciso V – período reservado a estudos, planejamento e avaliação,
incluído na carga de trabalho.
É preciso reconhecer que o "contexto" atual apenas reforça a marginalidade em que
essas professoras foram alocadas: num Curso com as características desse as professoras
precisariam de um afastamento remunerado da docência em, pelo menos, 20 horas semanais a
fim de que pudessem se dedicar, mais efetivamente, às suas atividades acadêmicas
relacionadas ao exercício docente, participar de todas as instâncias possíveis em que seu
trabalho estivesse sendo discutido e analisado, além de exercer o direito de viver, em
melhores condições, a sua vida pessoal. O efeito perverso desta situação é que elas não
conseguem realizar bem nenhuma das suas atribuições e vivem angustiadas permanentemente,
sob múltiplas pressões.
Num próximo item, observa-se que, mesmo diante das dificuldades vivenciadas e
explicitadas, as professoras continuam vislumbrando o exercício profissional em sala de aula,
especialmente com o segmento da educação infantil (48%).
A seguir, a expectativa de atuação profissional após o término da licenciatura em
pauta:
Pretensão de atuação profissional após a
conclusão da licenciatura
Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) Em sala de aula – Ensino fundamental 12 33%
(b) Em sala de aula - Educação infantil 18 48%
(c) Em trabalhos de coordenação pedagógica 06 16%
(d) Em direção e vice-direção de instituições
educativas 0
0%
(e) Em espaços educativos não-formais 1 3%
(f) Outro. Qual? 0 0%
188
GRÁFICO 8 - Pretensão de atuação profissional após a conclusão da licenciatura.
Ao adentrar na questão das expectativas profissionais após a conclusão desta etapa
como licenciandas, apenas uma professora-aluna, dentre as 37, vislumbra realizar investidas
mais altas dentro da profissão docente e diz:
Pretendo chegar no mínimo ao mestrado, quem sabe à possibilidade de fazer
um doutorado... (FS).
Deduzo que tal posição, advinda da grande maioria, se deva à perda do prestígio social
da profissão à crescente desvalorização do trabalho docente e, ainda à falta de condições para
a solução dos problemas educacionais e sociais vivenciados no chão da escola.
Quanto às expectativas com o Curso 62% relataram que esperam ampliar seus
conhecimentos e melhorar a prática pedagógica. Apenas 14% admitem repensar a prática
pedagógica. E aqui, acredito que, talvez pela dificuldade que sentem em superar a distância
entre o que pensam sobre o ensino e o que vêem como possível de ser realizado em sala de
aula; “[...] entre o que estão a estudar e a realidade das escolas públicas; entre o que gostariam
de ser capazes de fazer e o que conseguem realizar.” (SANTOS, L. L., 2002, p. 165).
Vale visualizar a totalidade de suas expectativas:
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
(a) Em sal a de aula – Ensino fundament al
(b) Em sala de aula - Educação infantil
(c) Em trabalhos de coordenação pedagógica
(d) Em dirão e vice-dirão de inst it uições
educat ivas
(e) Em espaços educativos não-formais
(f) Out ro. Qual ?
189
Expectativas com a realização do Curso: Total
%
Professoras-alunas 37 100%
(a) Aprimorar os conhecimentos 23 62%
(b) Tirar o diploma 1 3%
(c) Repensar a prática pedagógica 5 14%
(d) Melhorar a qualidade de vida pessoal e
profissional 2
5%
(e) Valorização 3 8%
(f) Não opinou 3 8%
GRÁFICO 9 - Expectativas com a realização do Curso.
Outro aspecto considerado relevante transparece relacionado aos meios utilizados para
que as professoras-alunas se mantenham atualizadas. Um percentual muito alto obtém as
informações através de canais de TV (72%) sendo que, apenas 3% utilizam a internet visando
tal finalidade. Cruzando os dados referentes aos meios de obter informação com os
explicitados a respeito do tipo de literatura mais utilizada vê-se que o item referente aos
livros didáticos apresenta-se como o mais alto (46%), revistas, 29% e jornais, apenas 3% os
lêem. Considero que estes dados expõem as professoras-alunas a uma situação frágil no que
diz respeito à aquisição de informações e de uma cultura letrada mais densa.
Observam-se, abaixo, de modo detalhado, estas informações:
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
(a) Aprimorar os conhecimentos
(b) Ti rar o diploma
(c) Repensar a prát ica pedagógica
(d) Melhorar a qualidade de vida pessoal e
profissional
(e) Valorização
(f) Não opinou
190
Meios para se manter informada Total
%
Professoras-alunas 37 100,00%
(a) Televisão 27 72%
(b) Rádio 04 11%
c) Jornal 02 5%
(d) Livros diversos 03
8%
(e) Internet 01 3%
GRÁFICO 10 – Meios para se manter informada.
Tipo de literatura mais utilizada Total
%
Professoras-alunas 37 100%
(a) Livros didáticos 17 46%
(b) Literatura em geral 04 11%
(c) jornais 01 3%
(d) revistas 11 29%
(e) Livros de auto-ajuda 03 8%
(f) livros religiosos 01 3%
(g) outros - quais? 0 0%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
(a) Televisão
(b) Rádio
c) Jornal
(d) Livros diversos
(e) Internet
191
GRÁFICO 11 – Tipos de literatura mais utilizada.
Neste cenário ficam explicitados os desafios postos para os docentes que trabalham
com a educação básica num país, como o nosso marcado pelas diferenças sociais, pelas
desigualdades de renda, pela exclusão de grupos culturais e pela crescente crise de valores que
se fazem presente, de modo especial, no cotidiano escolar. Há tarefas muito complexas e um
número crescente de problemas para o professor solucionar os quais exigem respostas tão
imediatas que “[...] o docente é constantemente assaltado por dúvidas, incertezas e indecisões,
quando não a apatia ou o desespero. Como conciliar as atividades de assistente social, de
psicólogo [...] com o exercício do magistério?” (SANTOS, L. L., 2002, p. 160, 161).
Nessa direção, como dar conta de tarefas tão amplas com a formação que têm e as
condições de trabalho e de remuneração que lhes são oferecidas? Tais desafios se colocam,
extensivamente, para aqueles profissionais chamados de formadores, os que trabalham com as
políticas de formação de professores emanadas da legislação e das propostas decorridas dos
discursos postos em circulação na literatura acadêmica. Acerca disso, corroboro com o
pensamento de Santos, L. L. (p. 173): “Os intelectuais deverão se lembrar que o docente é um
trabalhador e um cidadão e que por isso seu trabalho deverá ser situado no quadro de seus
deveres e de suas necessidades sociais e pessoais.” E eu complemento: e, por ora, dentro de
suas reais possibilidades. Nesse processo ajo e milito num espaço de anseio e busca pela
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
35%
40%
45%
50%
(a) Livros didáticos
(b) Literatura em geral
(c) jornais
(d) revistas
(e) Livros de aut o-aj uda
(f) livros religiosos
(g) out ros - quais?
192
reconfiguração da função docente articulada a novos objetivos que possam atender às
demandas que se colocam no campo da atuação docente.
Transparecem em estatísticas, em publicações e nos eventos científicos relacionados à
formação e ao trabalho docente, os insignificantes desempenhos do sistema educacional e a
questão do desânimo dos docentes diante de suas precariedades intelectuais, dos graves
problemas enfrentados em seus cotidianos institucionais da formação inter-relacionada ao
trabalho de professores e há um reconhecimento amplo de que “[...] é necessário que sejam
realizadas reformas econômicas e sociais e sejam concedidas mais verbas para a educação e
mais apoio e incentivo à carreira docente.” (SANTOS, L. L., 2002, p. 173). Enfim, um
grandioso desafio deverá ser urgentemente enfrentado por aqueles que pensam e executam as
políticas educacionais na direção de “[...] romper com séculos de história centrados em
princípios autoritários que imobilizam o pensar reflexivo da realidade educacional brasileira.”
(BENASSULY, 2002, p. 192).
No próximo item as ações de linguagem e a reflexividade serão tratadas, de modo
mais direto e específico, como espaços de promoção de visualização dos atos docentes
investigados.
4.2 Ações de linguagem na reflexividade sistematizada e intencional
Que pensar dos mirantes que ampliam a
possibilidade de ver?
Edwiges Zaccur, 2003.
Esta investigação-ação ao estar vinculada à situação acadêmica por três semestres
letivos trouxe consigo a instauração de um diálogo fecundo entre a pesquisa acadêmica e a
193
prática pedagógica. Nesse contexto, o uso do diário reflexivo foi realizado na condição de
instrumento de investigação didática e reflexão de pensamentos e ações, através de registros
escritos e processos reflexivos das próprias práticas educacionais. Nessa acepção, os registros
funcionaram como dispositivos mediadores (ALTET, 2001) e ocorreram como procedimentos
científicos de construção de conhecimento e como processo formativo, no entrelaçamento
entre formação, pesquisa e o exercício da profissão. O trabalho com a escritura dos diários
vinculou-se às características lingüístico-discursivas de cada uma das ações que compõem o
processo reflexivo sistematizado, amplamente exposto neste documento: descrever, informar,
confrontar e reconstruir, cujas análises serão realizadas adiante.
A intencionalidade das ações investigativas acerca dos que fazeres da prática sócio-
educativa e as sistematizações destas, apoiadas em registros escritos individuais e nos
diálogos constituídos nas sessões reflexivas, compuseram procedimentos fundamentados na
teoria de produção do conhecimento como atividade social contextualmente situada em um
processo mediado pela linguagem. (VYGOTSKY, 1987). Desde o início do processo, tais
elementos, interligados ao papel social da Universidade, deram mostras de ampliar as
condições de discussões e escolha de meios propícios para o seu incremento ao aumentar o
envolvimento entre as pessoas e enriquecer o espaço do exercício hermenêutico. Nessa
trajetória, havia uma consciência, de minha parte, de que a caminhada investigativa não
deveria apenas desvelar ou interpretar a realidade, mas ao mesmo tempo, “[...] num jogo de
puro amor à vida” (SERPA, 2001)
143
abrir possibilidades de contribuir com a escola pública
que aí está posta, sem agradar a tantos.
Do mesmo modo, destaco que os textos indicados e trabalhados nas disciplinas nos
remeteram para espaços reveladores de formas de dominação a que se encontram submetidos
os profissionais dessa área. No encaminhamento das ações percebi e registrei que, embora as
143
SERPA, Felippe numa comunicação oral, em aula da disciplina Educação e Territorialidade - EDC 721 -
ministrada no Programa de Pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia, 2001.
194
resistências naturais diante do novo que se esboçava o recinto acadêmico foi se constituindo,
ainda que de modo incipiente, num território de abertura para a diversidade, num lugar de
partilha e de reflexão coletiva, num locus de diálogo entre os saberes e as experiências; e,
nesse sentido, apoiadas em pesquisas e produções realizadas por autores variados, citados ao
longo deste documento. Estes, apesar de produzidos sob diferentes enfoques, apresentaram
um consenso sobre a importância do espaço da prática servir também à pesquisa educacional,
no processo de formação dos professores.
Assim, em raízes comuns, as multirreferências citadas se processaram: o caráter
crítico-emancipatório da pesquisa ao alinhar-se com o impulso democrático atribuiu ao
professor um papel ativo, parecendo desenvolver-se como princípio científico e educativo, um
consenso provisório e mutável (HABERMAS, 1990b) necessário para instalar uma base
comum provisória para as ações de linguagem. Certo entendimento parecia ganhar espaço
com o decorrer do tempo. Nas palavras de Habermas (p. 297): “[...] o acordo comunicacional
proposto, que se mede pelo reconhecimento intersubjetivo de exigências de validade, permite
a formação de uma rede de interações sociais e contextos do mundo, da vida.”
Houve, assim, em todo o itinerário investigativo-formativo, a busca de uma parceria
discursiva, argumentativa e a pretensão de ir além de um artifício de apropriação acrítica dos
conhecimentos científicos educacionais veiculados pela Academia. Um ambiente de
cooperação, com tais características, instalou-se processualmente: o fato de as agentes terem
voz para colocar seus registros, suas experiências e compreensões dos fenômenos, das
discordâncias em relação aos discursos das outras pessoas, fortalecia gradativamente o
engajamento destas na ação em pauta.
Com o passar do tempo, as professoras-alunas, pareceram compreender a relevância
das circunstâncias sistemáticas, formativas e processuais atreladas à averiguação da tarefa
docente, não sem relutâncias, aquiesceram em realizá-la intensificando “[...] as relações entre
195
os tempos e espaços de formação e os tempos e espaços de trabalho.” (BARROSO, 1997, p.
64). A experiência de projetar e discutir seu próprio trabalho rompia com a lógica de
formação tradicionalmente vivenciada: não se tratava mais de estudar uma teoria a ser
aplicada a posteriori, mas de, a partir da consciência do que se estava a realizar
pedagogicamente, promover articulações teoria-prática e prováveis reformulações de
concepções e estratégias docentes. Conforme citado anteriormente, tais situações geraram
resistências iniciais e acionaram defesas, talvez por romperem com a tradição formativa.
De todo modo, firmamos um acordo que, em cada sessão reflexiva (MAGALHÃES,
2004), seriam sorteadas pessoas do grupo que leriam seus registros e descrições de aulas
trazendo para o fórum grupal os elementos contratados, já que havia um intuito de apresentar
a epistemologia da prática profissional
144
, as conseqüências sociais e políticas do trabalho
docente para a discussão coletiva, a confrontação e na instauração do diálogo, possíveis
reconstruções. Da minha parte, dispunha-me também a escrever, a ler, analisar e mediatizar,
individual e coletivamente, tais registros, a instigar comentários acerca das situações
didáticas, num processo de teorização da prática e sistematização da investigação-ação em
curso. Nesse sentido, a mediatização, como característica da espécie humana, supõe a
utilização de intervenção intencional no sentido de provocar uma transformação, uma
adaptação. (FONSECA, 1998, p. 59-63; MENTIS, 1997, p. 13-14).
Assim, no decorrer de todos os períodos letivos trabalhados, uma vez a cada quinze
dias, após as sessões coletivas os diários reflexivos eram recolhidos por mim também com a
finalidade de, num intervalo curto de tempo, eu pudesse realizar estratégias de impregnação.
(MICHELAT, 1980). Assim, leituras densas, sucessivas e eram sistematizadas na perspectiva
de divisão do material coletado em seus elementos componentes, no sentido do
aprofundamento e desvelamento de mensagens implícitas. Desse modo eu fazia anotações à
144
Como o conjunto de saberes utilizados realmente pelos professores em seus espaços de trabalho cotidiano
para desempenhar suas tarefas docentes. (TARDIF, M., LESSARD, C ., 2005, p. 255).
196
margem dos relatos, dialogando por escrito com elas, concitando-as, deliberadamente, a
desestabilizarem os conhecimentos prévios e a desenvolverem novos olhares sobre as
questões que as instigavam e as preocupavam levando-se em conta “[...] as descontinuidades
que nos atravessam.” (FOUCAULT, 1993, p. 35). Concretamente, as práticas das professoras
eram assumidas como pontos de partida e de chegada das reflexões teóricas realizadas.
Reafirmo aqui que a prática que não deve ser confundida com ativismo, antes com “[...] uma
experiência total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética [...].”
(FREIRE, 2000, p. 26).
Enquanto isso, a categorização descritiva das informações colhidas e que serão
analisadas adiante, me permitia detectar necessidades e investir em possibilidades de subsidiar
a ação com um referencial teórico mais próximo das necessidades sentidas. Vale ressaltar,
aqui, que a aproximação do empírico com a teoria, ao se constituir como objeto de análise,
não significava o ponto final do processo de teorização. Alinhada com a opção metodológica
assumida por Marx (1980) agi no sentido de reconhecer que tais sínteses, ao serem
confrontadas com novas práticas registradas, acessavam o questionamento do real, na
indagação dos conhecimentos produzidos; assim, as tentativas de apreensão dos registros
encaminhou-se respaldada em Bakhtin (1992, 1999) na direção de fecundar a dialética com o
princípio dialógico, o que resultou num movimento de contraposição de palavras e
contrapalavras vinculado à arte de dizer/compreender. À medida que esse processo
epistemológico e metodológico ia se desenvolvendo, novos conhecimentos acerca da prática
pedagógica constituiam-se “[...] trazendo a marca do provisório, do inacabado, passível de ser
transformado ou até mesmo refutado no decorrer dos trabalhos.” (DICKEL et al., 2007, p.
39).
197
4.2.1 A escritura dos diários
A idéia de simplicidade se está desmoronando.
Onde quer que se vá, há complexidade.
Ilya Prigogine, 1996.
As conjunturas empíricas da prática docente pareceram propiciar um aprender a fazer
ciência educacional com o conhecimento técnico acoplado à problematização: a produção
individual das professoras-alunas nos diários, embora vivida de modo solitário, foi trazida,
processualmente, para as citadas sessões reflexivas ajudando a formar interações dialógicas,
problematização das experiências e produção de conhecimento crítico, não apenas através de
suas práticas descritas, também as das colegas-parceiras.
Houve, assim, desde o início, um exame atento e detalhado das informações coletadas
nos diários e nas sessões reflexivas e no ato de “[...] análise de conjunto de idéias, um modo
de pensar ou um corpo de conhecimentos expressos em uma comunicação textual ou verbal.”
(CHIZZOTTI, 2006, p. 120, 121). As análises que se seguem, abaixo, constituem-se como a
próxima etapa do processo de interpretação de dados colhidos, aleatoriamente, nos 37 diários
reflexivos.
Os primeiros registros das professoras-alunas, nos citados instrumentos, foram de
insegurança e rejeição o que me fez lembrar os versos do compositor Caetano Veloso em
Sampa (1978)
145
– ao compor e cantar, poeticamente, seu medo diante do novo – “[...] à
mente apavora o que, ainda não é mesmo velho [...]”. De algum modo, os registros abaixo
traduzem esse sentimento:
145
Composição datada de 1978. Aqui, citada como a faixa 9 do CD 836.528-2 - O Melhor de Caetano Veloso.
Sem lenço e sem documento – Selo Philips, Poly Gram do Brasil, 1994.
198
[...] em princípio, senti muita dificuldade em escrever no diário, pois este
não era mais meu diário de adolescência que ninguém tinha acesso e, sim,
um instrumento em que eu iria relatar meu dia-a-dia como professora-
pesquisadora. (AL).
Meu primeiro contato com o diário é instigante e, ao mesmo tempo,
estranho. Sempre detestei expor num papel o que sentia [...] e agora sei que
ele será lido por outras pessoas. Tentarei, no entanto, expor minhas angústias
e minhas experiências [...] (JC).
Estes escritos demonstram que o ato de escrever constituiu-se numa dificuldade a ser
transposta, especialmente porque deixa marcas, registra pensamentos, sonhos, itinerâncias,
desejos e frustrações. Nesse processo, pôde-se vivenciar esta realidade por inteiro: no decorrer
das primeiras sessões, em meio a naturais resistências, as pessoas demonstravam seus receios
e suas incertezas. Aquelas que se arriscavam a escrever resistiam à socialização de suas idéias
e dos escritos, nesse início.
Josso, (2004, p. 183) escreve sobre os sentimentos que envolvem esta ação:
A carga emocional, qualquer que seja a sua natureza (prazer, tristeza, vergonha,
orgulho, sofrimento, cólera, alegria, medo, deslumbramento, surpresa etc) surge
como primeira componente de qualquer início de experiência. Todos os episódios
relatados nas narrativas entram nessa classificação, porque contém uma carga
emocional muito forte que deixou um traço (ou mesmo um traumatismo) com que a
pessoa foi estimulada a fazer alguma coisa.
Ao relatar e posicionarem-se diante das experiências elas pareciam buscar ultrapassar
o nível de narrar, apenas. O distanciamento da ação parecia gerar a compreensão/leitura dos
posicionamentos, desnudando atitudes e isto parecia trazer insegurança, medo e provocava
mais resistências.
Convivendo com tais circunstâncias, o processo de formação aliado à investigação e
vivido de modo sistemático, ao instigar as pessoas a escreverem sobre suas experiências
parecia cumprir o desafio de promover aprendizagens vinculadas à realidade contextual. Nos
encontros acadêmicos, denominados aqui de sessões reflexivas, continuei a insistir na
necessidade da sistematização através de registros, das experiências vividas. O processo de
199
persuasão acontecia respaldado pela teoria e pelas primeiras participações daquelas que
tinham maior facilidade em se expressar por escrito e traziam seus registros para o plano
coletivo. Com o passar do tempo, as resistências foram sendo vencidas e, aos poucos, mesmo
aquelas que resistiam foram criando o hábito de anotar intenções e ações pedagógicas, lê-las
para o grupo avaliando os graus de percepção e realização possíveis nas diferentes situações.
Nas semanas que se sucederam já se podiam ver outros registros, como estes:
Ao reconhecer a importância do diário como instrumento de classificação,
reflexão e concretização de meu pensamento [...] me disponho a registrar, da
melhor forma, o exercício de ações e do que interessar na minha construção
de conhecimento. (GV).
Escrever no diário reflexivo é bom, preciso reconhecer, pois nos leva à auto-
avaliação e daí surge questionamento (sic): será que estou no caminho certo?
Em que posso melhorar? A minha prática condiz com a teoria e vice-versa?
[...] após o diário vejo que estou me tornando mais crítica e exigente [...].
(BV).
Após uma semana de escrita de minhas ações no diário reflexivo vejo que
estou me tornando mais crítica, isto vem contribuindo para a minha
transformação e passei a gostar mais de escrever. (SG).
Como se observa, transparece nestes depoimentos a reflexão como componente
essencial da análise que une pensamento e ação como investigação e esta, quando colocada no
mesmo nível da responsabilidade intelectual, começa a gerar uma categoria essencial
apontada por Dewey (1979a) na experiência da reflexividade e da produção de saberes
interligada à práxis: “Ser intelectualmente responsável quer dizer considerar as conseqüências
de um passo projetado; significa ter vontade de adotar essas conseqüências quando decorram
de qualquer posição previamente assumida.” (p. 44).
Vê-se, pela manifestação escrita, que ser intelectual responsável significa, além disso,
procurar conhecer, desvelando os propósitos educativos e éticos da própria conduta docente e
não apenas de seus propósitos utilitários, processando informações contextuais e encarando
200
“cada experiência presente como uma força em movimento, destinada a influir sobre o que
serão as experiências futuras.” (DEWEY, 1979, p. 93). Essa “força em movimento” a que
Dewey se refere constitui-se, nos fragmentos acima, como a correspondência entre plano-
ação-reflexão compondo a análise que une o pensamento à ação em contextos sistêmicos
complexos, não-lineares. Há um movimento no sentido de “reconhecer a importância da
reflexão na ação e sobre a ação é reconhecer que os contextos humanos são instáveis e que os
problemas que surgem neles podem ser originais e únicos e são, definitivamente, passíveis de
mudança.” (PEREIRA, J. E. D., 2000, p. 165).
Assim, o segundo comentário dá mostras de potencializar a compreensão mais acurada
da importância da reflexão acerca de situações reais em processos metacognitivo e
metapráxico. O ato de interlocução consigo mesma demonstra o que Bakhtin (1992, 1999)
chama de compreensão responsiva ativa: ao se questionar e às situações, a professora-aluna
BV referenda o uso do instrumento mediador, posicionando-se ao dizer-se “mais crítica e
exigente.” Fica patente, portanto, a manifestação de uma criticidade, ainda que tímida, rumo a
um processo de abandono de um empirismo ingênuo acerca dos fatos da realidade.
No último registro a professora-aluna SG admite que passou “a gostar mais de
escrever” demonstrando que a atividade proposta gerou interesse e motivação e pôs em
marcha possibilidades de incremento da crítica reflexiva e da transformação pessoal.
201
4.2.2 O processo reflexivo vivido na interação
Vygotsky (1991, p. 59-65) coloca em destaque o lugar das interações sociais no
desenvolvimento cultural humano ao afirmar que “[...] todas as funções aparecem duas vezes
em seu psiquismo: primeiro no nível social e depois no individual.” Inicialmente entre as
pessoas (interpsicológica ou social) e depois no seu interior (intrapsicológica ou pessoal). A
interação e a intermediação (dialogismo) do outro transparecem nos constructos teóricos deste
estudioso como espaço privilegiado de construção de sentidos. O citado autor (p. 64, 101)
assevera acerca disso:
Todas as funções superiores originam-se das relações reais entre os indivíduos
humanos. [...] O aprendizado desperta vários processos internos de
desenvolvimento, que são capazes de operar somente quando o indivíduo interage
com pessoas em seu ambiente e quando em cooperação com seus companheiros.
Assim sendo, numa relação dialética com pessoas (intervenção deliberada), os seres
humanos se tornam mais capazes de desenvolver e potencializar sua percepção, organizar os
elementos percebidos, compreender o inter-relacionamento de suas ações e dos fenômenos
naturais, desenvolvendo funções psicológicas cada vez mais sofisticadas. Sob esse prisma, a
concepção sócio-histórica dá uma importância especial à interação entre as pessoas
constituindo-se o uso da linguagem na condição mais importante do desenvolvimento das
citadas funções.
Nas sessões reflexivas aconteciam as leituras dos registros feitos nos diários
reflexivos (sempre de modos voluntário e aleatório) e entrelaçadas às ações de linguagem
propostas por Smyth (1992), referendadas por Magalhães (2004). Em movimentos
espiralados, estas puderam ser vivenciadas na íntegra: nas seqüências descritivas acontecia a
explicitação do vivido, informado, construído, reconstruído. Assim, na condição de elemento
mais experiente do grupo, em tais sessões reflexivas, eu buscava problematizar as seqüências
202
argumentativas, no sentido de questionar atos pedagógicos, revelados, que demonstrassem
estar atrelados a concepções monossêmicas e mecanicistas e atitudes conservadoristas ligadas
à vida e à ação docente.
Nesse processo, as partícipes eram convidadas a descrever, detalhar, no
encadeamento de suas ações, algum conceito ou tema não plenamente esclarecido fato que as
induziam a desenvolver a ação do informar e a sustentar, de algum modo, seus pontos de
vista. Comumente as elucidações levavam-nas à explicitação de teorias de ensino-
aprendizagem veiculadas nos textos lidos e discutidos anteriormente, que, por sua vez,
encaminhavam-nas à ordem do confrontar. Acerca disso, Horikawa (2004, p. 133) se
pronuncia: “[...] as seqüências argumentativas expõem o professor à tarefa de definir seu
ponto de vista e sustentá-lo por meio de argumentos, numa postura eminentemente reflexiva.”
Nesse caso, compelidas a enfrentar os contra-argumentos, elas foram,
gradativamente se percebendo na contingência de desenvolver um processo de reconstrução
de sua ação, com perspectivas de atuação emveis mais abertos de imaginação criadora, de
produção crítica do conhecimento. Desse modo, a utilização dos diários reflexivos, ao
apresentar indícios de funcionar como alavanca de formação interativa, apresentava indícios
de produzir, por meio de desvelamento de experiências e de percepções individuais e
coletivas, uma interiorização progressiva de conhecimentos mais elaborados. Isso se traduzia
nas condutas de explicação, argumentação e reexame do trabalho pedagógico, nos indícios de
potencialização da qualidade do trabalho educacional.
Tais indicativos se apresentavam à medida que, muitas vezes, ao socializar seus
registros escritos e suas explicitações orais, as professoras-alunas assumiam suas dificuldades
e suas necessidades, suas crenças, seus anseios e dúvidas, suas teorias práticas (implícitas de
ação), a reconceitualização de seus saberes experienciados: elas produziam no processo uma
gama de conhecimentos ressignificados, com base na análise interpretativa do trabalho
203
educacional nos contextos onde a investigação-ação estava a ocorrer. E, assim, observar e
registrar acontecimentos e examinar, individual ou coletivamente, o que se passava na inter-
relação do processo formativo com a atividade prática, na interconexão entre a teoria e a
prática ampliava suas percepções e suas possibilidades de ação auxiliando-as a perceber, mais
claramente, a cultura docente e as limitações pessoais e as de ordem cultural, social e
ideológica do sistema educacional.
Os registros abaixo, dentre outros aspectos, dizem das abrangências epistemológicas
do já tacitamente sabido - num processo reflexivo inter-relacionado com o desempenho da
prática pedagógica: dizem da relação entre o saber e a prática ou entre a teoria e a prática ou
ainda entre a reflexão e a ação:
Quando ingressei na Universidade senti alegria de haver alcançado um
objetivo há muito tempo perseguido, entretanto senti medo de não dar conta
de tantas atividades. Hoje vejo que este Curso vem me proporcionando um
crescimento não só profissional, pessoal também. Mesmo com o sufoco de
trabalhar o dia inteiro e estudar à noite ele tem me feito uma pessoa mais
segura e estou tendo oportunidades de rever minha prática pedagógica. Se
antes eu ouvia falar dos teóricos, hoje posso confrontar suas idéias com
minha rotina na escola e discuti-las com minhas colegas. Estou tendo
chances de construir novos caminhos, novos modos de desenvolver trabalhos
com os alunos, pois esta experiência tem contribuído de modo positivo e me
instrumentaliza a buscar soluções para que as crianças aprendam mais e
melhor. (SK).
Venho percebendo uma mudança significativa no meu pensamento e na
minha ação como professora desde que iniciei esse Curso: vejo os
pensadores “passeando” pela minha prática e venho percebendo a
importância do estudo na vida do professor. Sei que ainda falta muito para
eu melhorar, mas estou no começo e já enxergo que antes eu era mais ligada
aos conteúdos e esquecia-me de trabalhar o afetivo. Por exemplo: li que
Vygotsky destaca a interação social para o desenvolvimento da inteligência
das pessoas e a linguagem na formação de conceitos. Depois disso passei a
criar momentos na classe onde os alunos problematizam e trocam idéias uns
com os outros. [...] Acredito que depois desse Curso jamais serei a mesma
pessoa: a convivência com minhas colegas, aqui na UESB, me coloca
diariamente em situações de troca e aprendo muito. (SG).
Esses dois registros encontram-se permeados pela racionalidade prática e esta, envolta
em situações de metacognição, fornece importantes pistas para a análise dos saberes docentes
mobilizados pela experiência concreta e por exercícios de reflexão crítica da investigação
204
docente como processo-produto. A apreensão de diferentes níveis fenomênicos do real revela,
em ambos os casos, a investigação como uma importante estratégia de formação: estão
explícitas, nos relatos acima, incipientes ações de aprofundamento do conhecimento de si
mesmas, o refinamento de seus conceitos e o desenvolvimento da capacidade de auto-
regulação em situação profissional. A investigação-ação acontece, assim, num sentido
emancipatório.
4.3 A busca da densidade singular
[...] Meu coração a margem, o limite, a súmula, o
índice.
Fernando Pessoa, 1986.
No intuito “[...] de seguir a tradição fenomenológica, em pesquisa, que nos recomenda a
redução no detalhamento analítico dos dados” (MACEDO, 2006, p. 137) inicialmente procedi
a uma escolha aleatória, através de um sorteio de dez diários reflexivos dentre os 37
trabalhados. Em seguida foram realizadas novas leituras e releituras de tais instrumentos
visando realizar uma nova redução fenomenológica, uma espécie de filtragem contextualizada
denominada de variação imaginativa a qual resulta de uma redução fenomenológica do
estudo e “[...] consiste em refletir sobre as partes que nos parecem possuir significados
cognitivos, afetivos e conotativos e, sistematicamente, imaginar cada parte como estando
presente ou não na experiência.” (MACEDO, 2006, p. 137). Assim, destes diários, cinco
foram analisados mais detidamente em busca do desvelamento daquilo que permeia os
discursos explicitados, mas que dá condições de revelar essências do fenômeno em pauta.
Nesse sentido, é importante enfatizar que a pesquisa fenomenológica está dirigida para
significados, ou seja, “[...] para expressões claras que o sujeito tem daquilo que está sendo
205
pesquisado, as quais são expressas pelo próprio sujeito que as percebe.” (MARTINS;
BICUDO, 1989, p. 93). Num estudo feito a partir desta abordagem há uma relevância em
interpretar as percepções, em atribuir significados aos fatos e vivências registrados, provindos
dos discursos dos professores como seres-aí-no mundo.
146
Desse modo, ao mesmo tempo em que eu realizava releituras no material sorteado, fui
revendo minha compreensão inicial da problemática e escolhendo, para análises mais detidas,
aquelas experiências consideradas essenciais a fim de chegar à síntese das unidades
significativas provindas das escrituras dos diários e das várias fontes de informação utilizadas,
além destes.
Tal esforço de organização e síntese deu-se através do reagrupamento das informações
em categorias analíticas, abertas,
147
as quais, como um conjunto de unidades significativas,
sustentou-se em elementos da problemática da investigação-ação. São elas:
explicitação de saberes e experiências docentes como prováveis acionadoras de
renovadas percepções e organizações discursivas;
indicativos de questionamento e superação de concepções e ações pedagógicas
monossêmicas e mecanicistas;
sinais de (re)construção de conhecimentos didáticos e pedagógicos em níveis
mais elevados de criticidade;
indícios de desenvolvimento de uma sensibilidade socioexistencial e histórica
das pessoas.
146
O modo de ser do Homem num sentido de ser-aí, estar aí se liga ao termo filosófico Dasein o qual é utilizado
por Husserl para descrever o ser humano - Sein significa Ser. Heidegger, por sua vez, o emprega para enfatizar o
aspecto da existência contextualizada, ampliando a significação de Da-Sein para o Homem envolvido em sua
progressão temporal, histórica, evolutiva.
147
Categorias abertas são construtos que apresentam grandes convergências de unidades de significado. Indicam
os aspectos estruturantes do fenômeno investigado e abrem-se à metacompreensão, considerando a interrogação,
o percebido, o analisado, o diálogo estabelecido na intersubjetividade autor/sujeitos/ região de inquérito
(contexto). (BICUDO, 2000).
206
Por sua vez, ao serem reagrupadas em subconjuntos de informações tais unidades
auxiliaram no desvelamento das marcas lingüísticas interacionistas,
148
presentes nas fontes
analisadas. Este procedimento promoveu um afunilamento, a ênfase numa “[...] construção
analítica a se transformar num produto final aberto [...] orientada pelas questões e pelos
objetivos da pesquisa.” (MACEDO, 2006, p. 135, 136). Como já expressado, as análises
foram realizadas em exame dos textos representativos “como um tecido de muitas vozes”
situadas em contextos sócio-histórico, cultural, socioeconômico e político, específicos.
(BAKHTIN, 1992, 1999).
Assim, a interpretação e a atribuição de significados aos conteúdos emergentes serão
descritas a partir daqui.
4.4 A reflexão na ação e sobre a ação no aprendizado de pensar criticamente
A escrita materializa, dá concretude ao
pensamento, dando condições de se voltar ao
passado, enquanto está-se construindo a marca do
presente [...] o registro escrito amplia a memória e
historifica o processo.
Madalena Welfort, 1996.
É assim que aproximam as ciências do espírito das
formas de experiência que se situam fora da
ciência: com a experiência da filosofia, com a
experiência da arte e com a experiência da própria
história.
Gadamer, 1997.
O uso privilegiado da Língua proporcionou, durante todo o percurso
didático/investigativo, além de um entrelaçamento dos pressupostos teóricos com a prática,
uma investigação didática das situações e experiências. Isto deu mostras de acontecer, tanto
148
Como proposta bakhtiniana, a lingüística interacionista interpreta o horizonte discursivo, ou seja, o dito (o
material lingüístico) e o não-dito (o contexto situacional e os comportamentos posturais e mimo-gestuais), todos
constitutivos de sentido. (BAKHTIN, 1992, p. 25 -110).
207
na condição de alunas, quanto na de profissionais, ensejando elementos de validação, ou não,
das novas aquisições no sentido de revigoramento dos saberes traduzindo-se num rico
processo metacognitivo que pareceu acionar as metacompetências – saber-analisar, saber-
refletir, saber-justificar, através de um trabalho sobre as próprias práticas e experiências. Visto
sob tal prisma, o pensar epistêmico sobre a própria vida e sobre o processo educacional
revelou a importância de se olhar o ato educativo, não apenas na perspectiva do sujeito
cognoscente, também na dimensão política do ato de viver, convivendo.
O processo de reflexão crítica, sistematizado e tensionado através da Espiral auto-
reflexiva de conhecimento e ação (CARR E KEMMIS, 1988; KEMMIS & MCTAGGART,
1988) salienta o valor das perguntas pedagógicas como meio de desenvolvimento (SMYTH,
1992). Na perspectiva de emancipação dilatou-se na direção de se buscar a compreensão das
formas pelas quais as professoras enfrentam a complexidade da sala de aula, usa os
pressupostos teóricos e reconstrói estratégias pedagógicas. Nessas condições, as formas de
ação do processo reflexivo – descrever, informar, confrontar e reconstruir - (SMYTH, 1992;
MAGALHÃES, 2004), no cerne da citada Espiral, entrelaçaram-se na produção de textos,
enunciados ou sentenças relacionadas às ações docentes. Processualmente, tamm
fundamentaram a categorização que vem apresentada no quadro abaixo.
Mais uma vez o hibridismo epistemológico e metodológico, deste estudo, traz à
pauta sua característica formativa e investigativa. Dessa vez, juntamente com a preocupação
de analisar mais detidamente as unidades significativas com o objetivo de captar o essencial
do fenômeno investigativo social, concreto e, integrado à sua problemática.
O quadro abaixo, utilizado como apoio na análise de dados retirados dos diários
reflexivos, demonstra a relação entre as características das quatro formas de ação de
linguagem propostas por Smyth (1992) e seus aspectos organizacionais. (MAGALHÃES,
2004; LIBERALI, 2004). Hierarquicamente organizadas elas se elevam desde a descrição até
208
a reconstrução e transformação: as questões de descrição centram-se num nível do que as
professoras-alunas fazem ou sentem. As de interpretação (ação de informar) focalizam-se no
significado das ações ou dos sentimentos. Aquelas ligadas ao confronto trazem a inovação e,
muitas vezes, o incômodo, o desvelamento de atos arraigados em posturas tradicionais “[...] e
podem vir a constituir-se como um rasgar de horizontes e início da mudança, da reconstrução
e da inovação.” (ALARCÃO, 2004, p. 58).
FORMA DE
AÇÃO
QUESTÕES CAPACIDADE DE AÇÃO MARCAS / SEQÜÊNCIAS/
FASES
DESCREVER
O que fiz?
O que faço?
(Foco do
processo
reflexivo)
Apresentação do contexto;
Visualização das ações;
Ações concretas, rotineiras,
conscientes;
Acontecimentos marcantes
em classe.
Verbos concretos no pretérito
perfeito ou imperfeito;
Pouca ou nenhuma expressão
que denote opinião;
Distanciamento das ações;
Questionamento acerca das
escolhas feitas.
INFORMAR
Qual o
significado de
minhas ações?
O que agir
desse modo
significa?
(Foco nos
conceitos que
perpassam as
ações).
Teorias presentes nas ações;
Desvelamento das premissas
que regem o ato de ensinar;
Consciente entendimento das
ações;
Visão de construção de
conhecimentos.
Uso de expressões explicativas
e verbos no presente do
indicativo;
Uso de vocabulário técnico
(referente a teorias);
Relato de ações, atitudes e
fundamentas com base teórica e
sociocultural;
Reflexão sobre os significados
das escolhas realizadas.
CONFRONTAR
A que
interesses
minha prática
está servindo?
Que visão de
homem/socie
dade minha
forma de
trabalhar
ajuda a
construir?
Opiniões sobre a aula
descrita e explicada;
Busca de inconsistências da
prática;
Percepção de como as forças
sociais e institucionais estão
a influenciar modos de ação;
Significações das atividades
didáticas.
Uso de expressões de opinião
(argumentativas) e verbos no
presente do indicativo, no
pretérito perfeito ou imperfeito;
Expressões avaliativas,
opinativas;
Retomada de ações;
Compreensão e reflexão crítica.
209
RECONSTRUIR
Como posso
agir de modo
diferente,
renovado?
Retorno às ações;
Indícios de reformulação das
aulas;
Busca de alternativas para as
ações.
Verbos de ação: futuro do
pretérito (implica prever as
ações futuras);
Autocompreensão dos fatos;
Visualização de outras formas
de ação possíveis e suas razões;
Sinais de intervenção produtiva
no contexto de sala de aula.
QUADRO 4 - Organização das ações de linguagem como prática individual e discursiva. (SMYTH, 1992;
MAGALHÃES, 2004).
Conforme foi explicitado, a escrita dos diários envolve muitos aspectos e estes se
organizam sob variados níveis de reflexão: isto se pode observar, agora mais concretamente,
nos registros selecionados abaixo. Assim, nas transcrições a seguir, as explicitações das Ações
de linguagem aparecem sistematizadas e relacionadas à Espiral auto-reflexiva de reflexão e
ação, cuja operacionalização deu-se durante todo o percurso investigativo/formativo
amplamente relatado nos elementos epistemológicos e metodológicos deste estudo.
Visualiza-se, abaixo, a primeira cena pedagógica e esta registrada pela professora-
aluna EG. Como forma de facilitar a compreensão deste processo esta cena e as demais serão
transcritas no interior de um quadro analítico, híbrido, criado por mim especialmente para esta
finalidade:
UNIDADES
SIGNIFICATIVAS
INVESTIGADAS
REGISTROS DA
PROFESSORA-ALUNA EG
AÇÕES DE
LINGUAGEM
ESPIRAL AUTO-
REFLEXIVA
Saberes e
experiências
docentes como
prováveis
acionadoras de
renovadas
percepções e
organizações
discursivas.
Na minha sala, vejo problemas
com a leitura e a escrita e levei
para a classe alguns poemas e li-
os para os alunos, procurando
chamar a atenção deles para esta
modalidade de texto. Fiquei
frustrada porque vi que eles não
se interessaram muito por estas,
parei a aula e fui pensar no que
DESCREVER
(O que fiz?)
(O que faço?)
(Foco do
processo
reflexivo).
Diagnóstico de uma
situação prática;
Planejamento;
Formulação de
estratégias de ação.
210
fazer para buscar o interesse deles
e tornar a aula interessante.
Lembrei das leituras que fiz sobre
as teorias de Piaget e Vygotsky.
Questionamento e
superação de
concepções e ações
pedagógicas
monossêmicas e
mecanicistas.
Vejo que devemos trabalhar de
uma forma que elimine a simples
transmissão de conhecimentos e
motivar a criança a construir e
reconstruir hipóteses sobre o
mundo.
INFORMAR
(O que isso
significa?)
(Foco nos
conceitos que
perpassam as
ações).
Avaliação da
eficiência das
estratégias
empregadas;
Teorização da
prática;
Formulação de
outras formas de
ação possíveis e
suas razões.
(Re)construção de
conhecimentos
didáticos e
pedagógicos em
níveis mais elevados
de criticidade.
Vi que precisava entrar no
conteúdo a partir da realidade
deles, a fim de ver se chamava a
atenção dos alunos.
Pensando nisso, tive uma idéia.
CONFRONTAR
(Como ajo?)
(Foco na
avaliação e
percepção da
situação).
Investigação;
Reflexão;
Desenvolvimento
de estratégias;
Compreensão da
situação.
Desenvolvimento de
uma sensibilidade
socioexistencial e
histórica das
pessoas.
A partir daí chamei-os pra brincar
de “chuva de palavras ”(cada um
dizia uma palavra e eu ia
anotando no quadro). Em seguida
estas palavras serviram de base
para a criação de um poema
coletivo e o envolvimento de
todos se deu de modo positivo.
Cada um deu a sua contribuição e
tivemos momentos de muita
aprendizagem.
Pude trabalhar com eles os
conceitos de verso, estrofe e
rimas e explorei ao máximo o
significado do poema que teve
como tema A PAZ. No fim todos
fizeram questão de copiá-lo nos
cadernos. Vou realizar mais
atividades desse tipo.
RECONSTRUIR
(Como posso
agir de modo
diferente,
renovado?)
(Foco no
desenvolvimento
de novas
estratégias e na
retomada do
processo).
Novas reflexões
sobre a prática;
Replanejamento
de cenas
pedagógicas;
(Re)ajuste de
ações;
Desenvolvimento
de novas
estratégias;
Processamento de
etapas semelhantes
para a nova
situação prática.
QUADRO 5 - Transcrição da cena pedagógica I - inter-relacionada às Ações de linguagem e à Espiral auto-
reflexiva de conhecimento e ação.
211
Vê-se aqui que a práxis educacional, aliada a um agir epistêmico metacognitivo e
comunicacional, acaba sendo exercida como diálogo, se contrapondo a modelos tradicionais
de educação. Estes juízos pessoais são, por seu próprio caráter, sempre discutíveis e devem
estar abertos a reinterpretações através da prática reflexiva e não em relação a pontos fixos e
imutáveis. (PEREIRA, M. V., 2001). E isto ocorreu com a referida professora, ao explicitar,
no seu diário, a sua gestão da situação pedagógica: ali, ela exerce a pesquisa como uma
prática acessível e cotidiana, processando informações colhidas na realidade e selecionando
indicadores representativos que a auxiliam a interpretar os sinais e utilizá-los para a tomada
de decisões. Ao afirmar que “vou procurar realizar mais atividades desse tipo [...]”, ela
exterioriza uma ação metacognitiva e metapráxica, demonstrando a força que possuem os
dados empíricos como fundamento de uma melhoria do trabalho docente. É um fato que, na
reconstrução das ações expressas, com a ajuda de dispositivos mediadores (ALTET, 2001, p.
33), as condutas auto-observáveis passam por um processo de pensar sobre o próprio pensar
dirigido por operações mentais complexas que as afastam do automatismo. Nesse contexto
informativo sistematizado e intencional, a atuação das pessoas parece se ligar aos seus
julgamentos de modo dinâmico e dialético, através de seus registros; assim de modo especial,
através da articulação entre o mundo vivido e o sistema social, o homem se constrói.
(BENASSULY, 2002).
Na vivência de um processo que se modifica continuamente em espirais de reflexão e
ação já citados, permeado por tais mediações, se pode observar que nem sempre é fácil para o
professor, em geral, deslocar-se de um modelo que lhe é familiar para outro. Ao levar-se em
conta o procedimento descrito, a professora em pauta diagnosticou, no ato, a ineficácia de sua
ação; lembrou, embora de modo muito aligeirado e superficial, de leituras realizadas acerca
de novos constructos teóricos e definiu-se por formular outras estratégias didáticas a partir da
realidade deles, a fim de ver se chamava a atenção dos alunos. Ao desenvolvê-las, ela
212
utilizou-se de instrumentos conceituais ainda em processo de acomodação dentro de si
transformando-os em um saber
149
adaptado à situação e agiu de modo diferente. “Esta
articulação entre saberes e adaptação na ação ocorre implicitamente e requer uma reflexão do
profissional sobre seus atos.” (ALTET, 2001, p. 31). Assim ocorreu: o ato reflexivo ao se
centrar na tematização e na análise do que foi realizado apresentou-se marcado por
probabilidades de ampliar o olhar para a práxis educacional como um objeto sobre o qual ela
podia pensar e o fez: “Vejo que devemos trabalhar de uma forma que elimine a simples
transmissão de conhecimentos e motivar a criança a construir e reconstruir hipóteses sobre o
mundo.”
Assim, a professora-aluna EG, ao confrontar-se com a situação avaliou-a, ampliou a
sua compreensão e visualizou outras formas de ação. Finalmente a linguagem da reflexão
crítica instrumentalizou-a para a transformação da ação ajudando-a a definir novas estratégias,
a visualizar novas possibilidades de exercer o trabalho docente.
Novos registros, desta vez, realizados pela professora-aluna PJ, ampliam as
percepções do fenômeno em pauta:
UNIDADES
SIGNIFICATIVAS
INVESTIGADAS
REGISTROS DA
PROFESSORA-ALUNA PJ
AÇÕES DE
LINGUAGEM
ESPIRAL AUTO-
REFLEXIVA
Saberes e
experiências
docentes como
prováveis
acionadoras de
renovadas
percepções e
organizações
discursivas.
Comecei a sentir necessidade de
criar, na sala de aula, um
ambiente que favoreça a
capacidade criadora de meus
alunos. Estou aprendendo a ser
diferente, eu acho. Planejei uma
aula e comecei com a história de
ChapeuzinhoVermelho,
apresentando várias versões, de
propósito. Em seguida arrumei a
sala com 4 grupos com o cuidado
de deixar em cada grupo um
DESCREVER
(O que fiz?)
(O que faço?)
(Foco do processo
reflexivo).
(Ação-reflexão-
ação)
Diagnóstico de uma
situação prática;
Planejamento;
Formulação de
estratégias de ação.
149
Saber, aqui, dentro de uma noção polissêmica, construído “[...] na interação entre conhecimento (algo de
ordem pessoal) e informação, entre sujeito e ambiente, na mediação e através dela.” (ALTET, 2001, p. 28).
213
aluno que redigisse melhor.
Questionamento e
superação de
concepções e ações
pedagógicas
monossêmicas e
mecanicistas.
O estudo de Vygotsky me ajudou
a pensar que o trabalho com pares
é mais interessante. Com ele
venho aprendendo que o
professor e os alunos são sujeitos
de aprendizagem e aprendem
melhor no social.
INFORMAR
(O que isso
significa?)
(Foco nos
conceitos que
perpassam as
ações).
Avaliação da
eficiência das
estratégias;
empregadas;
Teorização da
prática;
Formulação de
outras formas de
ação possíveis e
suas razões.
(Re)construção de
conhecimentos
didáticos e
pedagógicos em
níveis mais elevados
de criticidade.
Os alunos se envolveram muito
com a atividade e eu até me
espantei com os mais inquietos.
No momento da socialização
pude constatar a participação
coletiva, pois ficou clara a
emoção dos alunos ao ouvirem
suas histórias lidas.
Essa aula ter dado certo me deu
um fôlego novo.
CONFRONTAR
(Como ajo?)
(Foco na
avaliação e
percepção da
situação).
Investigação;
Reflexão;
Desenvolvimento
de estratégias ;
Compreensão da
situação.
Desenvolvimento de
uma sensibilidade
socioexistencial e
histórica das
pessoas.
Vou planejar uma aula com
fantoches e sucatas para amanhã.
Vou propor a eles a escrita e
depois a apresentação de seus
textos. Com os fantoches.
Não posso negar o quanto é
gratificante fazer esse curso, mas
o ideal seria ter 20 h semanais pra
ler, fazer os trabalhos, estudar
como preciso e transformar
direito a minha sala de aula num
laboratório.
Planejei a atividade com os
fantoches e pude perceber que a
apresentação oral incentiva os
alunos a ouvir e respeitar o que os
outros colegas criam e que isso
precisa ser trabalhado em minha
classe mais vezes. Vou procurar
realizar mais atividades desse
tipo: percebi que os meus alunos
estão tímidos nas apresentações e,
também precisam parar para ouvir
mais os colegas.
RECONSTRUIR
(Como posso agir
de modo
diferente,
renovado?)
(Foco no
desenvolvimento
de novas
estratégias e na
retomada do
processo).
Novas reflexões
sobre a prática;
Replanejamento
de cenas
pedagógicas;
(Re)ajuste de
ações;
Desenvolvimento
de novas
estratégias;
Processamento de
etapas semelhantes
para a nova
situação prática.
QUADRO 6 - Transcrição da cena pedagógica II - inter-relacionada às Ações de linguagem e à Espiral auto-
reflexiva de conhecimento e ação.
214
Num planejamento realizado a priori, a ação docente, descrita acima, se derivou da
necessidade de realizar um ambiente que favorecesse a capacidade criadora dos alunos. A
professora fez escolhas e optou por trabalhar a partir de uma tipologia textual que supôs
agradar a estes; com isso explicita que teve o intuito de motivá-los a uma participação mais
efetiva nas atividades pedagógicas.
Aliás, de um modo geral, pude perceber nas leituras densas realizadas nos diários, que
a utilização de histórias infantis aparece em inúmeras tentativas de integração de conteúdos e
até como pretexto para explorações da oralidade, da leitura e da escrita em situações
contextualizadas. Há uma tendência marcante em explorar os aspectos macro e
microestruturais da Língua utilizando-se desta peculiar tipologia textual como meio de se
obter um nível de participação intensa dos alunos.
Nesse sentido, as professoras já perceberam que, ao desafiá-los a oralizar, fazer
leituras, interpretações, extrapolações escritas, análises e reflexões sobre a Língua a partir de
histórias infantis - ou mesmo poemas - os níveis de participação e interesse se elevam. Resulta
daí, muitas vezes, uma prática “mesclada” com atuações ora com base no modelo empirista,
ora com uma tendência sociointeracionista, gerando, muitas vezes, distorções no ato
pedagógico. Há uma questão posta por Nóvoa (1996, p. 29) que vale lembrar: “Por que é que
fazemos o que fazemos na sala de aula?” E ele fala de quase uma segunda pele profissional
feita de modos e formas de agir no interior da sala de aula, como conseqüência de uma série
de experiências que se vão acumulando, sem análise e reflexão – o que deu certo um dia, pode
dar novamente. E essas formas e esses modos estão quase sempre mais relacionados com os
saberes vinculados às disciplinas do currículo do que com as necessidades dos alunos.
Segundo esse autor, vai nascendo daí uma rigidez no uso dos mesmos instrumentos, das
mesmas ações, a qual dificulta novas aprendizagens. Esse fato fortalece e reafirma a
necessidade de um trabalho cada vez mais efetivo, de uma maneira organizada e
215
compreensiva, com as concepções de ensino e aprendizagem a fim de que os professores
possam ter claro que pressupostos teóricos estão a orientar as suas práticas.
Ao retomar a especificidade desta análise observa-se que a professora-aluna PJ, ao
anunciar que dividiu a classe em grupos, avisa que se apóia na teoria vygotskiniana (portanto,
de cunho sociointeracionista, sócio-histórica) e diz estar aprendendo “a ser diferente.” Assim,
ao associar a teoria à prática ela realiza e informa a sua ação e, desse modo, faz um
movimento de superação de visões dicotômicas, racionaliza os conhecimentos pedagógicos e
apresenta fortes indícios de alcançar uma prática conscientizada. A articulação realizada
sugere que houve um entrelaçamento entre o processo formativo e as ações pedagógicas
demonstrando que “[...] a teoria não se distancia da prática e dela não se distingue quando se
percebe que uma é fundamento da outra em total e recíproca relação.” (PEREIRA, R. B.,
1998, p. 333). Sob tais bases, o registro das experiências e idéias gerou e estabeleceu um
processo de reflexividade e, com ele, uma perspectiva mais emancipatória do pensar e do
realizar na área educacional.
Nesse contexto, a professora-aluna em pauta se refere a um fôlego novo ao confrontar
a ação com suas conseqüências e constatar o atendimento aos objetivos de aprendizagem e
envolvimento dos alunos com a aula. Dewey (1979 b) se refere à atitude do entusiasmo em
ação como a predisposição para enfrentar a atividade com curiosidade, energia, capacidade de
renovação e de luta contra a rotina. Assim, ao pensar em reconstruir o efetivo da ação ela
considera “a emoção dos alunos em ouvirem as próprias histórias lidas. [...].” Isto indica a
provocação de seu entusiasmo e ela ensaia a elaboração de um novo planejamento,
percebendo, no ato, que o desenvolvimento de novas estratégias necessita de fundamentação e
justificação. Realiza-o referindo-se que “[...] a apresentação oral incentiva os alunos a ouvir e
respeitar o que os outros colegas criam [...]” demonstrando haver ampliado a consciência na
ação. Ela assimilou, na prática, pressupostos da teoria vygotskiniana: vê que o aluno precisa
216
de mediadores mais experientes e dos colegas para exercer sua ação sobre o meio social e
cultural; nessa direção, reconstrói ações de modo pensado, consciente e internaliza conceitos.
Ao mesmo tempo, ao cumprir o ciclo espiralado no processamento de etapas
semelhantes para a nova situação prática ela explicita a importância do Curso nesse processo -
como a lembrar que as ações formativas têm influência no que está a vivenciar. Aqui,
novamente vem à tona um ponto crucial para as professoras-alunas que estudam à noite (e
95% delas atuam em 40 horas semanais): a importância da redução desta carga horária
docente para 20 horas “[...] pra ler, fazer os trabalhos, estudar como preciso e transformar
direito a minha sala de aula num laboratório” Ela traz à pauta a crucial e já citada questão da
legislação educacional no que diz respeito ao inciso V da Lei de Diretrizes e Bases (LDBEN
9.394/96) do seu artigo 67 com referência ao período reservado a estudos, planejamento e
avaliação, que não é regulamentado no estatuto do magistério dos professores da rede
municipal. Fica claro que este tempo não deveria ficar restrito às poucas horas voltadas para
as Atividades de Coordenação (AC) e sim transformar-se num licenciamento parcial,
remunerado, da docência, criando possibilidades da realização de um processo
formativo/investigativo da docência em outras bases produtivas. Nesse sentido, 100% das
professoras-alunas exteriorizam um sentimento de revolta e indignação ao sentirem, na
própria pele, os efeitos de uma política pública excludente que não valoriza o trabalho nem a
formação docente. No entanto, as professoras lutam pouco no que se refere à efetivação de
seus direitos - não há, entre elas, nem mesmo a consciência suficiente destes direitos, não há
uma cidadania organizada – é a perspectiva da pobreza política ainda instalada, acerca da qual
se refere Demo (1996, p. 42): “Uma face aguda desta pobreza é a falta de consciência dela
mesma, o que impede, de partida, todo projeto de sua superação.” Nesse sentido, como
acredito que “[...] ter consciência de um problema ainda não é resolvê-lo, embora seja passo
indispensável” (p. 43) eu nunca abri mão, na minha tarefa, de uma postura política do ato de
217
desvelar a importância da luta pela valorização da nossa categoria profissional, por melhores
condições de exercício da profissão, pelo direito à qualificação com tempo reservado para
estudar e viver com crescente dignidade.
Abaixo, mais manifestação de uma terceira cena pedagógica. Desta vez registrada
pela professora-aluna RG:
UNIDADES
SIGNIFICATIVAS
INVESTIGADAS
REGISTROS DA
PROFESSORA-ALUNA RG
AÇÕES DE
LINGUAGEM
ESPIRAL AUTO-
REFLEXIVA
Saberes e
experiências
docentes como
prováveis
acionadoras de
renovadas
percepções e
organizações
discursivas.
Minha atividade deste dia já havia
sido preparada: uma avaliação de
Matemática.
Primeiro fizemos uma oração
agradecendo e pedindo a benção
de Deus para mais uma semana
juntos. Em seguida falamos um
pouco do fim de semana e como a
turma comemorou o domingo de
Páscoa.
Como já tinha sido previsto pedi
aos alunos que se organizassem
em fila indiana e entreguei-lhes a
avaliação a qual continha seis
problemas envolvendo as
operações de adição, subtração e
multiplicação.
Devido estar trabalhando com a 4ª
série tenho a preocupação ainda
maior de selecionar as atividades
que levem ao alunos a pensar, já
que é de fundamental importância
a interpretação.
Como era de se esperar, alguns
alunos tiveram facilidade na
interpretação dos problemas, mas
a maioria demonstrou
dificuldades.
DESCREVER
(O que fiz?)
(O que faço?)
(Foco do
processo
reflexivo).
Diagnóstico de uma
situação prática;
Planejamento;
Formulação de
estratégias de ação.
Questionamento e
superação de
concepções e ações
pedagógicas
monossêmicas e
mecanicistas.
Comecei então a observar a turma
e fui percebendo os graus de
dificuldades diferenciados.
Assim, mudei a organização da
atividade: pedi que eles se
INFORMAR
(O que isso
significa?)
Avaliação da
eficiência das
estratégias
empregadas;
218
juntassem em grupos de quatro.
Pedi que cada grupo elegesse
alguém para fazer a leitura dos
problemas em voz alta para o
grupo e que antes de tentarem
resolver os problemas eles
analisassem e discutissem a
melhor forma de resolvê-los. No
início houve um pouco de tumulto
e ao passo que eu ia visitando os
grupos e orientando-os na
discussão pude perceber como
ficou mais fácil a compreensão e
a resolução dos problemas.
Lembrei-me então da dialética
interacionista quando diz que “a
construção do conhecimento
caracteriza-se por um processo
ativo e interativo.” Quando diz
que o sujeito necessita interagir
com o mundo e seus semelhantes
para que possa evoluir.
(Foco nos
conceitos que
perpassam as
ações).
Teorização da prática;
Formulação de outras
formas de ação
possíveis e suas
razões.
(Re)construção de
conhecimentos
didáticos e
pedagógicos em
níveis mais elevados
de criticidade.
Foi importante naquele momento
mudar a forma como havia sido
programada a realização da
avaliação: de maneira totalmente
tradicional e perceber como um
ajudando o outro, a turma toda
envolvida numa mesma situação,
facilita a compreensão, fazendo
com que todos tenham um melhor
aproveitamento.
CONFRONTAR
(Como ajo?)
(Foco na
avaliação e
percepção da
situação).
Investigação;
Reflexão;
Desenvolvimento de
estratégias;
Compreensão da
situação.
Desenvolvimento de
uma sensibilidade
socioexistencial e
histórica das
pessoas.
E por desejar um enriquecimento
da minha prática pedagógica e o
crescimento da turma procurarei
investir mais nos trabalhos de
grupo.
RECONSTRUIR
(Como posso
agir de modo
diferente?)
(Foco no
desenvolvimento
de novas
estratégias e na
retomada do
processo).
Novas reflexões sobre
a prática;
Replanejamento
de cenas pedagógicas;
(Re)ajuste de ações;
Desenvolvimento de
novas estratégias;
Processamento de
etapas semelhantes
para a nova situação
prática.
QUADRO 7 - Transcrição da cena pedagógica III- inter-relacionada a ações de linguagem e à Espiral auto-
reflexiva de conhecimento e ação.
219
O discurso retrospectivo da professora-aluna, em foco, revela inicialmente uma visão
tradicional de educação ao referir-se à organização da classe em fila indiana na realização de
uma avaliação na área de Matemática, corroborando que tendemos a fazer com o outro aquilo
que fizeram conosco, em especial, no ambiente escolar.
Em seguida, ao repassar o instrumento para os alunos ela demonstra que já havia feito,
a priori, uma análise do grupo: revela isso ao descrever seu julgamento, de modo claro, no
momento em que observa reflexiva e, detidamente, a situação: “como era de se esperar,
alguns tiveram facilidade, mas a maioria demonstrou dificuldades.” Ao reafirmar seu
diagnóstico e concluir que a maioria não estava conseguindo realizar a tarefa, ela age na
urgência,
150
e intervém no processo enquanto a ação se processa; nesse caso a professora-
aluna mobiliza recursos cognoscentes, certamente, produzidos no Curso e informa isso:
“Lembrei-me então da dialética interacionista quando diz que ‘a construção do conhecimento
caracteriza-se por um processo ativo e interativo.’ Nesse momento, intencionalmente, coloca
os alunos em grupos de quatro pessoas na crença de que “ o sujeito necessita interagir com o
mundo e seus semelhantes para que possa evoluir.” Ao tomar esta atitude, além de sair em
cada grupo mediando situações de trocas, de aprendizagem conjunta, ela valoriza o instante,
reafirma sua consciência acerca da forma como foi programada a realização da avaliação “[...]
de maneira totalmente tradicional” ela reflete e, incontinenti, age conforme as necessidades
sentidas na ação. Desse modo, de um jeito experiente e maduro, ela acaba transformando o
ato avaliativo num momento rico de mediações e aprendizagem. Alarcão (2004, p. 52) diz
bem desse processo reflexivo: ela “[...] desocultou situações complexas e tomou
conhecimento do que já sabia”.
150
No prefácio de sua obra “Ensinar: agir na urgência, decidir na incerteza” Perrenoud (2001b, p. vii) esclarece
que agir na urgência não é o mesmo que agir com urgência. Num sistema complexo como é a sala de aula,
simultaneamente “[...] temos de fazer recortes, definir prioridades, correr riscos, integrar conhecimentos,
sentimentos e compromissos.”
220
Na realidade, ao transformar o que aconteceu em ações de linguagem devidamente
contextualizadas, a professora-aluna, dá mostras de que a sua análise da vivência apresentou-
se como uma estratégia epistêmica de grande valor formativo: há explicitações de que houve a
(re)construção de conhecimentos didáticos e pedagógicos em níveis mais elevados de
criticidade. Na quarta cena pedagógica, descrita abaixo, a professora ZL demonstra que tais
evidências vêm à tona:
UNIDADES
SIGNIFICATIVAS
INVESTIGADAS
REGISTROS DA
PROFESSORA-ALUNA ZL
AÇÕES DE
LINGUAGEM
ESPIRAL AUTO-
REFLEXIVA
Saberes e
experiências
docentes como
prováveis
acionadoras de
renovadas
percepções e
organizações
discursivas.
Meus alunos, pela faixa etária que
se encontram, deveriam estar no
período das operações formais
segundo a Teoria piagetiana. No
entanto, posso constatar que
muitos ainda não atingiram este
estágio, necessitando de objetos
concretos para raciocinarem
matematicamente.
Diante disso, para trabalhar as
quatro operações resolvi utilizar
as cédulas e as moedas do Real,
pois com os números, apenas, eles
não conseguiam abstrair.
DESCREVER
(O que fiz?)
(O que faço?)
(Foco do
processo
reflexivo).
Diagnóstico de uma
situação prática;
Planejamento;
Formulação de
estratégias de ação.
Questionamento e
superação de
concepções e ações
pedagógicas
monossêmicas e
mecanicistas.
Assim, utilizando o Sistema
monetário do Brasil vi que eles
adquiriam possibilidades de
operar facilmente com as
operações: problematizei várias
situações e, além de os alunos se
interessarem mais, acertavam
realizar as contas.
Pude, com isso, compreender
melhor o que Piaget quis dizer
quando afirmou que “as
operações sempre se referem a
objetos concretos presentes ou
experienciados.”
INFORMAR
(O que isso
significa?)
(Foco nos
conceitos que
perpassam as
ações).
Avaliação da
eficiência das
estratégias
empregadas;
Teorização da prática;
Formulação de outras
formas de ação
possíveis e suas
razões.
(Re)construção de
conhecimentos
Foi uma aula muito produtiva e
registro como um fato curioso
CONFRONTAR
Investigação;
221
didáticos e
pedagógicos em
níveis mais elevados
de criticidade.
eles terem criticado o livro
didático que apontava uma bola
por R$ 61,00. Eles fizeram
comparações com os preços de
bolas encontrados em lojas e
supermercados de suas
localidades. Intermediei falando
da relação preço x qualidade do
produto, levando a discussão para
a importância de se fazer
pesquisas antes de se efetuar uma
compra.
Foi uma aula muito produtiva na
qual eu senti que meus alunos
realizaram muitos aprendizados e
eu também!
(Como ajo?)
(Foco na
avaliação e
percepção da
situação).
Reflexão;
Desenvolvimento de
estratégias;
Compreensão da
situação.
Desenvolvimento de
uma sensibilidade
socioexistencial e
histórica das
pessoas.
Hoje vejo mais claramente que
trabalhar matemática de modo
mais concreto e ligado às
situações da vida, ao dinheiro,
principalmente, facilita a tarefa de
ensinar e aprender. É uma pena
que sinto agora mais necessidade
de planejar aulas mais
interessantes e quando chego à
escola encontro dificuldades para
realizá-las.
RECONSTRUIR
(Como posso
agir de modo
diferente?)
(Foco no
desenvolvimento
de novas
estratégias e na
retomada do
processo).
Novas reflexões sobre
a prática;
Replanejamento
de cenas pedagógicas;
(Re)ajuste de ações;
Desenvolvimento de
novas estratégias;
Processamento de
etapas semelhantes
para a nova situação.
QUADRO 8 - Transcrição da cena pedagógica IV- inter-relacionada a ações de linguagem e à Espiral auto-
reflexiva de conhecimento e ação.
Apesar de haver um reconhecimento da singularidade das situações pedagógicas, há
uma tendência dos docentes em buscar regularidades no exercício de seu ofício. No relato
acima, a professora apresentava a expectativa de que todos os alunos estivessem “no período
das operações formais” sem compreender que ao classificá-los, mesmo com base em teorias
presentes no campo pedagógico, pode criar formas de exclusão dos alunos. Muitas vezes, a
rotina e a repetição fazem o conhecimento prático tornar-se tão espontâneo que os professores
sequer percebem o que estão fazendo. Por meio da atitude vigilante e indagativa, para a
professora-aluna ZL tornou-se possível criticar a compreensão tácita subjacente à avaliação da
ocorrência em foco. Nesse caso, ao diagnosticar o problema, embora tenha feito o julgamento,
222
ela decidiu, em ação, apelar para um saber experienciado aliado a um saber acadêmico recém-
construído; assim, pôde compreender com maior clareza o que Piaget afirma ao referir-se aos
objetos concretos; com isso, lançou mão do sistema monetário nacional para um trabalho com
as problematizações matemáticas e, ao refletir acerca do que fez, referendou a teoria ao
afirmar que “trabalhar matemática de modo mais concreto e ligado às situações da vida, ao
dinheiro, principalmente, facilita a tarefa de ensinar e aprender.”
Ao analisar este registro é possível verificar que as conjunturas enfrentadas pelos
profissionais no seu cotidiano são complexas e que as soluções dependem tanto de
conhecimentos teóricos quanto de conhecimentos práticos - sendo estes são aspectos que
devem ocorrer de modo inter-relacionado com a investigação do cotidiano escolar. Daí,
argumento que a organização curricular dos Cursos de formação docente precisa se organizar
na articulação entre o contexto escolar, o ensino e a pesquisa - em torno de problemas que
fazem parte do campo de trabalho pedagógico. Em tais direções deverão ser ampliadas as
possibilidades de cooperação entre os pesquisadores acadêmicos e investigadores de
contextos pedagógicos específicos e as discussões sobre o significado e a importância social e
política das pesquisas que os professores produzem, numa abordagem baseada em uma
concepção de práxis.
Finalmente, nesta amostragem de registros docentes, ressalto que as professoras-
alunas EG, PJ, RG e ZL, ao empreenderem pesquisas deliberadas acerca de suas ações
pedagógicas, refletiram e ampliaram suas percepções e compreensões para os valores e as
premissas teóricas que sustentam suas práticas. Nesse sentido, as situações vividas
constituíram-se como pontos de partida para a reflexão e deram-lhes condições para mudar a
qualidade de suas tarefas docentes.
É preciso reconhecer, entretanto, que ainda há uma distância entre estes fatos e o
empreendimento de mudanças substanciais em seus percursos profissionais, nas suas
223
professoralidades. (PEREIRA, M. V., 2001). Como já foi descrito no capítulo reservado à
revisão de literatura deste estudo, é preciso atentar para a infra-estrutura tácita do
conhecimento a qual, de modo especial, encontra-se presente no sistema cognitivo das pessoas
adultas trazendo, em si, um aporte de cristalização em torno do que é familiar à mente e
levando-a “[...] a defender-se de tudo o que lhe prometa perturbar seriamente os seus próprios
balanços e equilíbrios.” (BOHM, D.; PEAT, D., 1989, p. 36).
Apresento, abaixo, a transcrição de um registro colhido no diário reflexivo da
professora-aluna BS. Dá para ver que, de algum modo, suas palavras corroboram com o que
está sendo dito:
Depois que estou freqüentando este Curso, diariamente, já senti uma diferença na
minha prática. Agora me interesso mais por analisar e refletir sobre as minhas
ações tentando melhorá-las. Ainda assim, tenho dificuldades e não posso dizer que
a mudança é total, não é fácil mudar na idade em que estou: acho difícil trabalhar
com alguns conteúdos que não seja de modo tradicional. Mas sei o quanto este
Curso vem me ajudando: hoje escuto mais meus alunos valorizando a opinião de
cada um e fazendo com que eles possam interagir mais. Agora eu reconheço o
valor da teoria e procuro ler, é uma pena que o tempo não dê para me aprofundar
nos estudos como eu preciso, pois trabalho 40 horas como docente e freqüento as
aulas à noite. (BS).
Esta professora-aluna, ao reconhecer que o Curso está ajudando-a a pensar acerca
dos referenciais teóricos, escreve sobre a valorização da ação docente vinculada ao contexto
acadêmico. Observe-se que ao referir-se a este ela o faz interligando-o às suas tarefas
docentes de modo positivo, evidenciando seus interesses sobre a investigação e análise das
ações. Revela, além disso, uma disposição para a mudança dos rumos da prática, mas
reconhece-a como difícil e demonstra atentar para o fato de que tem problemas na
mobilização de seus conhecimentos para níveis mais elevados: “Tenho dificuldades e não
posso dizer que a mudança é total, não é fácil mudar na idade em que estou: acho difícil
trabalhar com alguns conteúdos que não sejam de modo tradicional.” Ainda assim, ao
explicitar a dificuldade de exercer seu ofício de um modo que não seja o tradicional, a
224
professora-aluna em questão anuncia passos na direção de que os estudos vêm ajudando-a a
escutar mais os alunos, a valorizar suas opiniões e a colocá-los em situação de interação.
Finalmente, não sem intenção, ela também explicita as condições sociais em que vive
ao exercer as funções de professora e estudante: a jornada dupla de trabalho, a falta de horário
para o preparo das aulas, para as leituras e sistematização de estudos. Mais uma vez torna-se
visível como a sobrecarga de trabalho e de estudo se constituíram nas principais barreiras para
o trabalho de organização das ações essenciais do trabalho docente e estas acopladas à
pesquisa e à formação: ler, planejar, investigar, registrar, refletir, replanejar.
Nas sessões reflexivas, sempre que os registros eram trazidos para serem discutidos
havia muitas queixas e, no processo preocupou-me as condições pouco favoráveis em que
estávamos a fazer pesquisa. Entretanto, no percurso, fortaleceram-me as leituras, os resultados
que foram aparecendo, as palavras de estudiosos, a exemplo de Giroux (1997, p. 220) que diz:
“A natureza de tal tarefa (pesquisadora) pode parecer utópica, mas o que está em jogo é
valioso demais para ignorar-se tal desafio.”
Ainda assim, posso perceber que, mesmo lidando com pessoas adultas e numa esfera
tão refratária à mudança como é a escola constato que as professoras-alunas, assumidamente
criticam e desenvolvem “[...] suas teorias práticas à medida que refletem a sós ou em
conjunto na ação e sobre ela, acerca de seu ensino e das condições sociais que modelam as
suas experiências de ensino.” (ZEICHNER, 1993, p. 22, grifo meu).
De qualquer modo, a ocorrência de uma formação orientada para a pesquisa e
permeada pelos questionamentos das ações comunicativas (SMYTH, 1992) encoraja as
pessoas a fazerem correlações entre o que estão estudando e o cotidiano das tarefas docentes;
a reflexão sistemática e intencionada torna visível o desenvolvimento de uma compreensão
dos princípios que regulam a prática. Daí observa-se que as professoras-alunas, ao agirem
reflexivamente acerca das situações educativas, acabam criando condições e mais disposição
225
para estudar seus modos de ensinar e demonstram vontade de se tornarem melhores ao longo
de suas carreiras.
A seguir, mais alguns registros de situações particulares ilustram e revelam o que
está sendo afirmado:
Hoje a aula foi interessante, pois tratamos de Concepções de ensino e
aprendizagem. Após várias leituras de textos e em seguida de Diários das
colegas e algumas discussões de como acontece a produção do
conhecimento, assistimos a uma mídia trazida pela professora que mostrava
as diversas correntes de pensamento filosóficas e psicológicas na Educação.
Durante a apresentação fui percebendo que costumo mesclar, na minha
prática, as concepções Inatista, Empirista e Interacionista e fiquei feliz ao ver
que minha prática se encaixa melhor no Interacionismo. Ainda assim minha
consciência me acusa quando, no meu pensamento, ainda rotulo certos
alunos achando que eles não vão conseguir progresso devido ao meio em
que vivem. Este Curso está sendo uma oportunidade boa de pensar. Por
exemplo: aprendi muito na aula de hoje, principalmente que, mesmo diante
do difícil, não devo desacreditar na capacidade de aprender de meus alunos,
nem mesmo posso deixar de insistir em promover situações
problematizadoras na tentativa de alcançar melhores resultados na
aprendizagem deles. (JL).
Estudei a teoria de Vygotsky e gostei do que li sobre a Zona de Desenvolvimento
Proximal: pude ver que o professor deve considerar não apenas o nível de
desenvolvimento real de seu aluno e sim investir em seu potencial para que ele
possa avançar na construção de seu conhecimento. A partir dessa leitura fiquei
pensando em experiências que tive e às vezes que subestimei meus alunos achando
que eles não tinham condições de aprender. Assim, não os desafiava a ir além do
que eles estavam conseguindo. Quantas vezes fui impaciente dando as respostas
prontas sem esperar eles raciocinarem... Preciso é aprimorar minha prática e
provocar situações de problemas e desafios que levem os alunos a questionar e
atribuir significados ao que eles ainda desconhecem. Com os estudos que já realizei
até agora reflito que devemos trabalhar de uma forma que elimine a simples
transmissão de conhecimentos. Hoje vejo que é preciso valorizar a capacidade
expressiva dos alunos e motivá-los a construir e reconstruir hipóteses sobre o
mundo. (HM).
Com mais estes registros, é preciso reconhecer que, nas condições dadas, a inquietação
epistemológica aconteceu e, que no bojo desta, a problematização da relação ensino-
aprendizagem contribuiu no sentido de ajudá-las a vivenciar um processo de desacomodação
e desfamiliarização com o que acreditavam ser válido para o desenvolvimento da ação
docente, até então. Este fato constitui-se como algo bastante positivo e o conhecimento
226
resultante do processo de compreensão e interpretação da realidade tornou mais abrangentes
os processos de auto-observação e auto-monitoração fundamentais para o desenvolvimento
pessoal e profissional. As citadas inquietações e desfamiliarizações acontecem vinculadas a
processos de (re)construção de conhecimentos.
227
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Eu falarei, por agora, do paradigma de um
conhecimento prudente para uma vida decente.
Com esta designação quero significar que a
natureza da revolução científica que atravessamos
é estruturalmente diferente da que ocorreu no
século XVI. Sendo uma revolução científica que
ocorre numa sociedade, ela própria revolucionada
pela ciência, o paradigma a emergir dela não pode
ser apenas um paradigma científico (o paradigma
de um conhecimento prudente), tem que ser
também um paradigma social (o paradigma de
uma vida decente).
Boaventura de Souza Santos, 1988.
A tarefa acadêmica, imbricada com a investigação-ação a partir dos pressupostos
expostos, abriu perspectivas de ampliação da compreensão epistemológica dos componentes
fundantes da ação docente e apresentou, desde o seu início, sentidos e sinais de tensão como
tessituras de criação e recriação de percepções, de fatos, reconstrução de experiências e de
teorização da prática. A partir dos princípios explicitados, as observações e os registros
reflexivos realizados, sistematicamente, trouxeram à pauta a polissemia da linguagem
utilizada na perspectiva das dimensões cognitiva e estético-hermenêutica da reflexividade,
expressando-se na exploração coletiva das palavras escritas e lidas nas sessões coletivas. A
interlocução com as professoras-alunas inseriu-se como produção social numa dimensão
política enriquecedora: os fluxos de informação ao produzir os primeiros movimentos de
inquietação impulsionaram a aquisição de novos conhecimentos na direção de um
redimensionamento do caráter crítico-emancipatório da práxis pedagógica.
Nessa direção, paulatinamente o grupo foi adquirindo uma compreensão mais refinada
da situação, não, apenas, através da literatura pertinente à temática da investigação da própria
prática; também por meio das discussões coletivas acerca do que ia sendo registrado e
discutido como fonte de investigação científica; desde o início do processo os registros, ao
228
serem amplamente empregados no cerne de uma estratégia metodológica de sistematização e
discussões, deram indicativos de constituírem-se como ricos desafios epistemológicos.
Reconheço, ainda, que estes colaboraram com o movimento dinâmico e compartilhado da
investigação-ação ao serem operacionalizados por meio de um processo que envolveu, na
interação, a (re)construção de interpretações detalhadas do fenômeno estudado.
Importa ressaltar que, nesta investigação-ação, a utilização das referências da teoria
habermasiana proporcionou a ocorrência de questionamentos sobre os próprios referenciais
teóricos e práticos do Curso em questão e dos cursos de formação de professores, o que
envolveu a compreensão do modo tradicional como o conhecimento é construído e veiculado,
os papéis atribuídos aos professores, aos alunos, na busca de verificar as possibilidades de
superação da razão monológica ainda presente na ação pedagógica de inúmeros docentes. No
entanto, é imperativo esclarecer que, embora Habermas não proponha diretamente a discussão
sobre a questão da escola e da formação de professores, sua proposta teórica, que tem por
base a intersubjetividade subjacente ao agir comunicativo, ofereceu um aporte teórico
altamente relevante para o estudo em questão. A reconstrução do processo educativo a partir
de uma nova racionalidade, a racionalidade comunicativa, aportou neste estudo e trouxe à sua
base metodológica a idéia de que “[...] nossas realizações cognitivas estão enraizadas na
prática das relações pré-científicas que existem entre pessoas e coisas.” (HABERMAS, 2002,
p.76). No presente contexto, estas se encontraram, em especial, no relacionamento entre
conceitos espontâneos e conceitos formais.
Em tais sentidos, a investigação-ação educacional realizada a partir desses
pressupostos e, entremeada pela subjetividade de resgastes e interpretações de fragmentos
autobiográficos, gerou subsídios e sinais que nos levam a considerar a relevância de se
promover articulações entre as trajetórias humanas e as trajetórias profissionais. O
desenvolvimento de um processo reflexivo-crítico na formação de professores – a partir de
229
reflexões acerca de si e dos contextos particulares de ação - demonstrou que a agregação de
conhecimentos produzidos à escuta das práticas cotidianas incita as pessoas a aguçarem suas
percepções e a dilatarem seus entendimentos das situações nas quais elas estão inseridas.
Esse processo de apreensão da realidade converteu práticas não-reflexivas em práxis,
ou seja, em ação comprometida socialmente e informada teoricamente, o que tendeu a
transformar, por sua vez, a teoria que a informou. No cenário deste estudo formativo
transpareceu a relevância da investigação que integrou, num mesmo processo, a produção da
teoria e a prática docente e, assim, o desenvolvimento profissional se apresentou, nessa
perspectiva, radicalmente diverso da concepção que considera o docente como mero usuário
de conhecimentos produzidos por outras pessoas. (CONTRERAS, 1994).
Em tais dimensões, ficou patente que um dos grandes desafios para a educação nestes
tempos mutantes, é a formação de professores capazes de um ofício novo, desde quando, na
maior parte dos países ocidentais, o professor está em vias de passar do status de executante
para o de profissional através de estudos e experimentações na prática, com capacidades para
realizar com mais autonomia, responsabilidade e criticidade atos intelectuais não-rotineiros e
complexos. Nesse sentido, as tarefas do sentir/aprender/fazer/criar/ampliar possibilidades
devem ser superiores àquela de ensinar no sentido de apenas transmitir. (AZEVEDO, 2001;
PERRENOUD et al., 2001b).
Desse modo, nesta investigação-ação, a busca da informação “num constante
processo de interanimação dialógica” (SPINK, 2000b, p. 55) da pessoa consigo mesma e com
os outros, a aceitação da diversidade, da transcendência,
151
da mutação como condições
essenciais da vida, auxiliaram no processo de distinguir relevâncias, analisar e considerar
alternativas na anuência da incompletude como a marca de um mundo em crise, em ebulição;
realidade onde se reconhece: um novo estilo de humanidade deve ser gerado.
151
Transcendência, aqui, no sentido de ir mais além, ultrapassar-se, superar-se, entrar em comunhão com a
totalidade indivisível, compreender-se como parte integrante do universo. (MORAES, 1997, p. 25).
230
No cerne dessas tensões, se se concebe o ensino como atividade crítica, como prática
social, o professor deverá ser tratado como um profissional autônomo, reflexivo, que necessita
investigar a complexa ecologia do seu próprio fazer profissional. E neste aspecto, o papel da
pesquisa na formação docente - como meio de produção de conhecimentos e intervenção na
prática social e, mais detidamente na prática pedagógica – ainda é pouco enfatizado em cursos
de licenciatura que guardam semelhanças com este, que serviu de contexto a esta presente
investigação-ação. Permeia a organização de tais projetos pedagógicos, a fragmentação e a
departamentalização que ainda não foram superadas, apesar das possibilidades abertas pela
LBDEN 9394/96. Tal fato dá a estes cursos um caráter pragmatista, disciplinar e simplista
com ênfase no desenvolvimento de competências para um exercício técnico da profissão,
formando um profissional eminentemente prático. Isto, de algum modo, atende à perspectiva
de tecnólogo do ensino elaborada a partir das prescrições legais vinculadas à relação
custo/benefício explicitadas nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de
Professores da Educação Básica em nível superior, que ainda compreendem “[...] a
preparação voltada para o atendimento das demandas de um exercício profissional específico
que não seja uma formação genérica, nem apenas acadêmica.” (BRASIL, CNE/CP/09 2001,
p.35).
A partir da perspectiva citada, a formação de professores – baseada em competências
e habilidades fundamentadas na prevalência de métodos – é comumente realizada de modo
disciplinar e acrítico e, nessa direção, desenvolve uma concepção utilitarista que reduz o
docente a um mero tarefeiro executor de atividades rotineiras e vinculadas a conteúdos
prontos e cristalizados em livros didáticos. Freitas, H. L. (1999, p. 17-43) afirma, com base
em estudos realizados, as dificuldades e limitações demonstradas pelas Instituições de
formação docente relacionadas “[...] à revisão da atual estrutura dos cursos e programas de
formação dos profissionais da educação, em especial, com uma organização didática mais
231
avançada e integrada das disciplinas limitadas às psicologias, fundamentos, didática e práticas
de ensino.”
Desse modo, sem vivenciar a relevância do fato de ser um investigador de sua
realidade, de suas itinerâncias, resta ao professor a atividade de reproduzir e transmitir
conhecimentos desvinculados do contexto social mais amplo. Paulo Freire (2000, p. 32) dá o
tom de contraponto a esta realidade e rejeita esta perspectiva de formação pela ótica
utilitarista e acrítica, ao afirmar que “Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a
busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se
perceba e se assuma, porque professor, porque pesquisador.”
Assim, o novo panorama mundial requer uma educação diferenciada e,
conseqüentemente, do professor são exigidos determinados perfis, dispositivos didático-
pedagógicos e disposições que lhe confiram condições de lidar com os dilemas cotidianos que
a sua profissão possibilita, para atuar com os alunos: se envolver mais com o trabalho da
escola, mediar situações de produção de conhecimentos, acompanhar e estimular a progressão
da aprendizagem de seus alunos; administrar a heterogeneidade e a diversidade, ampliar o
espaço educativo para além da sala de aula; e com isso, utilizar metodologias, estratégias de
ensino e materiais de apoio à aprendizagem que possibilitem aos seus alunos o
desenvolvimento da própria capacidade de aprender com crescentes graus de autonomia
intelectual; e, enfim, lidar com seus anseios, necessidades socioexistenciais e sonhos de
qualificação.
No entanto, lamentavelmente, nas atuais condições da educação brasileira, muitos
fatores vêm prejudicando a formação dos professores no país, destacando-se o aviltamento
salarial e a precariedade do trabalho escolar. Sabe-se que o desestímulo dos jovens à escolha
do magistério como profissão futura e a desmotivação dos professores em exercício para
buscar aprimoramento profissional, são conseqüência, sobretudo, das más condições de
232
trabalho, dos salários pouco atraentes, da jornada de trabalho excessiva e da inexistência de
planos de carreira. Entretanto, não apenas o desvelamento dos problemas que limitam a ação
docente constitui-se numa necessidade premente: a reflexividade precisa se compor como
essência dos processos formativos abrindo “[...] possibilidades de subjetividade autônoma
[...]” (LASH, 1997, p. 139) geradora de “[...] autoconfrontação com os efeitos da sociedade de
risco [...]” (BECK, 1997, p. 16).
Nesta ação investigativa, o que os autores citados acima discutem, ficou patente: a
dimensão reflexiva da pesquisa demonstrou ser essencial à cultura e à prática docentes, pois
desenvolveu uma atitude científica de olhar a realidade educacional para além dos conceitos
espontâneos – importantes conceitos, mas não são suficientes para o crescimento profissional.
Neste veio, promoveu um sentido de que, um contexto formativo/investigativo, que abrigue
em si uma dimensão discursivo-reflexiva de cunho colaborativo, constitui-se num grande
recurso para a composição da professoralidade, numa força para a profissionalização docente,
num processo para a tomada de consciência crítica e de abertura para a produção de uma “[...]
subjetividade autônoma em relação a seus ambientes naturais, sociais e psíquicos.” (LASH,
1997, p. 139).
De todo modo ficou evidente que o desafio de ajudar a formar professores críticos e
reflexivos, de intelectuais engajados politicamente na (re)construção de suas concepções de
ensino e aprendizagem é tarefa emergente e imprescindível para a transformação da educação.
Nessa dimensão, favorecer e/ou provocar as condições para que uma modernidade reflexiva
ocorra, significa, também, estar atento para o que Lash (1997, p. 139) denomina de “[...]
novas inseguranças, novas formas de subjugação,” ao referir-se às advertências de Giddens
para que esta reflexividade não se transforme numa “devoção cega”. Lash (p. 139) afirma que
“[...] a modernidade reflexiva profere uma política de democracia radical, plural, enraizada no
localismo e nos interesses pós-materiais dos novos movimentos sociais; se a modernização
233
simples significa subjugação, a modernização reflexiva envolve a capacitação dos
indivíduos.” Nessa direção, este estudo aponta ainda para a necessidade da criação de
renovadas possibilidades formativas para que os professores busquem condições de se
organizarem individualmente e, também, politicamente. Enfrentar estes desafios é tarefa a que
a Universidade e seus formadores não poderão (mais) se furtar.
Tornou-se visível, assim, uma premência de que o processo formativo aconteça inter-
relacionado com a investigação-ação no sentido de aumentar as probabilidades de que o
professor construa conhecimentos sobre seus próprios movimentos de auto-reflexividade e de
seu trabalho; ainda acerca do sistema educacional numa direção de compreender e operar com
as complexas pautas sociais e políticas que envolvem a mediação cultural dos processos
educacionais. (MACEDO, 2006). E, para que isso possa ocorrer nesses níveis, avalio ser
imprescindível criar meios para que uma consciência do mundo da vida (LASH, 1997), dos
problemas e uma ação de luta se estabeleçam entre os docentes a fim de provocar uma
revisão/reestruturação das leis e regras que organizam o espaço/tempo de seu trabalho e de
sua formação, pois do contrário continuará havendo entraves para que um processo formativo,
desta natureza, aconteça de modo pleno, mais exigente e completo como seria pertinente e
desejável. Em tais sentidos, esta investigação-ação traz à pauta a necessidade de se encontrar
mecanismos mais adequados para articular não apenas prática e formação, mas formação
inicial e formação permanente de um lado e, de outro, formação e pesquisa em educação.
(CHARTIER, 1998).
Assim, muito embora num contexto ainda carente de condições, por meio desta ação,
aconteceram atos de desfamiliarização de concepções tradicionais com as quais as
professoras-alunas antes se expressavam acerca da vida e da ação profissional. Verificou-se,
especialmente através das ações de linguagem que, mesmo sob uma conjuntura perversa, o
exercício formativo/investigativo possibilitou construções mais conscientes e distantes do
234
puro praticismo e automatismo de práticas consolidadas, o que auxiliou, sobremaneira, a
constituição de atuações docentes mais críticas e emancipatórias.
Muito visíveis ficaram, neste estudo, que, em especial no interior da Bahia, os
professores ainda possuem condições conjugadas de trabalho, salário e formação que
dificultam um exercício crítico-reflexivo da profissão nas dimensões buscadas por este
estudo. E, assim, tão precárias condições tolhem de algum modo, a lida com as grandes
tensões que envolvem a reconceitualização de saberes e revisão de atitudes pessoais e
profissionais.
Diante disso, vejo que há urgências instaladas na esfera educacional, não apenas no
contexto deste estudo, mas de um modo geral: a transição de um paradigma científico em que
a compreensão da realidade se efetua dentro do clássico princípio de causa/efeito e da
dicotomia corpo/mente para um paradigma estético, ético e político em educação dirigido à
transformação da tradição. Afirmo isto na pressuposição de que a criação, em seu estado
nascente e transcendente é o que constitui a potência permanente e contingente de atualização,
de possibilidades e razões de vibração, de paixão e prazer com os atos de ensinar e aprender,
com a vida, de um modo crescentemente político, ético, étnico e poético
152
. Nessa linha,
conjecturo que, se o professor tiver mais condições de interagir com os alunos
horizontalmente e construir uma subjetividade coletiva, uma paixão de aprender em mão
dupla, como atividade criadora, isso poderá acarretar uma ampliação dos níveis conscienciais
nos seres humanos, uma educação mais voltada para valores renovados e visões de mundo
mais dignas e democráticas. Concordo plenamente que “[...] este é o grande desafio
poemático (praxiológico) que temos pela frente,” conforme afirma Dante Galeffi (2001, p.
293). E para que isso se concretize, há fortes indicativos de que será preciso passar por um
movimento de desdogmatização da ciência a fim de criar espaços ético-étnicos-estéticos e
152
Passeron, R. (1997, p. 23) apresenta a poiética como uma filosofia da criação em que o sujeito e a obra criam
relações de diálogo no interior de um fazer criativo.
235
olhares novos,
153
a fim de ampliar a consciência para a face aguda da pobreza política “[...]
como um passo indispensável para a sua superação.” (DEMO, 1996, p. 43). Enfim, sair,
segundo Laszlo (1997) de um processo de evolução extensivo para um processo intensivo,
voltado para o Homem e o bem-estar da sociedade, com base na comunicação e no
entendimento. E isto requer, evidentemente, uma nova cultura, novas crenças, renovados
valores morais, um saber engajado numa abordagem crítico-emancipatória e poética e, nesse
processo, não somente assumir responsabilidades, mas riscos.
Com base em tais evidências este estudo ratificou que a instância formativa
acadêmica, voltada para a especificidade da docência, precisa promover, dentre inúmeras
outras coisas, uma postura auto-reflexiva, intercultural e poética que dê condições para que o
professor potencialize uma abertura do ser à consciência crítica, aos processos criativos, às
experiências a partir de concepções de ensino e aprendizagem ativas e interativas; posturas
que ampliem a fluência da vida e possam ajudar a este profissional na criação de renovadas
formas de pronunciá-la e transformá-la.
Esta investigação-ação educacional promoveu, assim, um destaque para os momentos
pedagógicos dialógicos e problematizadores como organizadores metodológicos nas
denominadas sessões reflexivas nas quais ocorriam as leituras compartilhadas e socialização
de registros da prática: nestas, gradativamente iam se instalando momentos de reflexão,
debates, rediscussões e sistematizações teóricas que, desde o início, davam indícios de
contribuir para a compreensão e interpretação de si mesmas e da realidade mais próxima.
Nesse sentido, após vivenciar esta híbrida experiência analiso que, ao se estar num
momento de mudança, de movimento e de imprevisibilidade, ser profissional da Educação
implica, cada vez mais, em disponibilizar-se a aprender sempre, a assumir riscos, a olhar de
frente seus medos e defesas, a acrescentar ao mundo alguma coisa mais bonita, mais
153
“A idéia é construir uma ética estetizada e compreendê-la em termos de etnicidade,” diz Lash (1997, p. 171).
236
verdadeira, mais útil, ou simplesmente mais evolucionada do que o que já está aí. Ressalto
ainda a premência de acionamento de ações formativas/investigativas que instiguem os
professores a prosseguir aprendendo, também, mediante a intuição e o imaginário, as
sensações, os sentimentos, as emoções, a vivência da inter-relação, interdependência e
interatividade entre as pessoas e todos os fenômenos da natureza; além disso, mediante o
diálogo entre as religiões e os mitos, o respeito à diversidade entre os indivíduos, às
diferenças sociais e culturais possíveis geradoras de ampliação de níveis ingênuos de
consciência.
Realço desse modo, a importância de um processo formativo/investigativo-em-ação
que possa reunir elementos filosóficos interculturais críticos que facilitem o caráter relacional
da linguagem que faz emergir possibilidades de interanimação dialógica, a articulação de
áreas, conceitos e categorias como: complexidade, multirreferencialidade, multiculturalismo,
identidade, diferença, diversidade cultural, intercriticidade, ética, estética, subjetividade,
alteridade, dimensões estéticas e políticas da reflexividade e outros correlatos. A insistência
da inclusão de tais elementos conceituais, como imprescindíveis à formação docente, deve-se,
sobretudo, à compreensão, agora mais expandida, que este trajeto investigativo propiciou a
mim e, creio, a todas as pessoas que dele participaram mais diretamente: nele e, nas tramas do
cotidiano, nas atividades educacionais, o pensar se reintegrava constantemente à ação
(MAFFESOLI, 1998) passando a não se constituir, apenas como uma atitude técnico-
metodológica; antes, em atos de características políticas, pedagógicas, antropológicas,
culturais, complexas e dinâmicas, as quais iam proporcionando uma dimensão especial ao
processo metapráxico que se ia vivenciando.
Entretanto, posso discernir que essa ampliação de consciência amplamente vista nesta
investigação-ação não tenha se constituído ainda em condição suficiente para uma
mobilização adequada da capacidade crítica e da transformação das estruturas humanas
237
internas, sociais ou políticas que pudessem estar dificultando a ação docente das professoras-
alunas partícipes. Considero, contudo, que o acionamento de novas organizações discursivas,
no cerne de um processo formativo e, este, conectado à prática em ciclos espiralados de
planejamento, ação, observação, reflexão e replanejamento funcionou como um motor de
desenvolvimento e de aprendizagem dos esquemas complexos - individuais e sociais das
pessoas.
Avalio assim, que, de um modo integrado e coerente, houve uma importância
intrínseca nesta experiência vivida de um modo híbrido: seus resultados apontam para a
ocorrência de possibilidades de que a complexidade das ações de linguagem, imbricadas com
a citada espiral de ação e reflexão possa ter contribuído para o reexame de atitudes individuais
e coletivas, para uma ampliação de percepções políticas e concomitantes manifestações de
desenvolvimento de uma sensibilidade socioexistencial do professor-pessoa. Confiro, neste
contexto, uma nota especial para a produção dos registros em suas condições de dispositivos
de investigação didática e de vida pessoal, como provocativos de reflexão, de possibilidades
de tomada de consciência de si e da professoralidade, da concomitante interferência na práxis
pedagógica.
Por fim, considero que os subsídios e os sinais emitidos por esta investigação-ação
educacional - onde o exercício reflexivo foi utilizado como categoria epistemológica, tanto de
construção de conhecimentos, quanto de formação (DESAGNÉ, 1997) - poderão servir para
imprimir renovados rumos para a sua continuidade noutras bases, com possibilidades de
maiores aprofundamentos, de mobilizações de consciências públicas e sociais até mais
abrangentes. Ao fazer tais considerações aciono o pensamento de Larrosa (2004, p. 160) para
reiterar que me encontro atenta a olhar esses sinais na direção de “[...] algo como um território
de passagem, algo como uma superfície de sensibilidade na qual aquilo que passa afeta de
algum modo [...].” E, nesse processo, perceber que assumir o papel mediador de realizar e
238
refletir a investigação-ação com professoras-alunas, em efetivo exercício docente, significou
exercê-lo como um diálogo transdisciplinar, na interfecundação de saberes e, organizá-lo não,
apenas, na direção de fortalecer a autonomia e a responsabilidade profissional docentes, mas
especialmente apoiado numa preocupação explícita com os dilemas vividos pela categoria e,
de modo mais genérico, com a (re)construção social de um mundo decente.
239
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270
ANEXOS
273
ANEXO B: Memórias de Vida Pedagógica
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