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MEC
Ministério da Educação
INEP
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
A Avaliação da Educação e a Inserção
dos Egressos do Ensino Médio no
Mercado de Trabalho*
Nassim Gabriel Mehedff**
* Palestra apresentada no Seminário Internacional sobre Avaliação do Ensino Médio e
Acesso ao Ensino Superior, realizado em Brasília-DF, no período de 30 de junho a 2
de julho de 1997.
** Secretário de Formação e Desenvolvimento Profissional do Ministério do Trabalho.
Brasília
1999
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REVISÃO
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Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais – INEP
MEC – Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Anexos I e II, 4º andar
70047-900 – Brasília-DF
Fones: (061) 224-1573 – 224-7092
Fax: (061) 224-4167
As opiniões emitidas são da inteira responsabilidade do autor.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Mehedff, Nassim Gabriel.
A avaliação da educação e a inserção dos egressos do ensino médio no mercado de
trabalho / Nassim Gabriel Mehedff. Brasília : Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais, 1999.
17 p. (Série documental. Eventos, ISSN 0104-6535, 9A).
1. Ensino médio - avaliação. 2. Mercado de trabalho. I. Seminário Internacional sobre
Avaliação do Ensino Médio e Acesso ao Ensino Superior (Brasília : 1997). II. Título. III.
Série.
CDU 373.5
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SUMÁRIO
A Avaliação da Educação e a Inserção dos Egressos do Ensino Médio no Mercado de Trabalho
APRESENTAÇÃO – REPENSANDO O ENSINO PROFISSIONAL..................................... 5
A ESCOLA E A RELAÇÃO CAPITAL-TRABALHO............................................................... 7
EXPANSÃO DO ENSINO E EXCLUSÃO SOCIAL .............................................................. 8
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E ENSINO ............................................................................. 9
REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E CIDADANIA..................................................... 10
CERTIFICAÇÃO PROFISSIONAL ....................................................................................... 11
DEBATE ............................................................................................................................... 12
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APRESENTAÇÃO
REPENSANDO O ENSINO PROFISSIONAL
A inserção produtiva dos indivíduos é um dos aspectos mais importantes da cidadania. O
reconhecimento da importância dessa premissa tem aumentado nos últimos anos, paralelamente à
evolução tecnológica e ao duplo processo de elevação da integração e da concorrência internacionais.
Diante disso um novo desafio se apresenta aos responsáveis pela educação, como foi reconhecido
internacionalmente. “Já não é possível pedir aos sistemas educativos que formem mão-de-obra para
empregos industriais estáveis. Trata-se, antes, de formar para a inovação pessoas capazes de evoluir,
de se adaptar a um mundo em rápida mudança e capazes de dominar essas transformações”,
observaram os membros da Comissão Internacional sobre Educação para o Século XXI, presidida pelo
ex-ministro da Economia da França e ex-presidente da Comissão Européia.
Formar cidadãos aptos a exercerem atividades produtivas ainda é um desafio em muitos países
como o Brasil. Mas é preciso mais que isso. É preciso formar cidadãos capazes para desempenhar
atividades que sequer existem atualmente. Isso significa ensinar conteúdos e habilidades úteis no
presente, mas também ensinar a aprender no futuro, fora da escola convencional. A primeira condição
para esse novo aprendizado é melhorar o ensino fundamental e elevar o nível de escolaridade da
população. Mas é preciso, também, repensar e reformular o ensino profissional. Um passo importante
nesse sentido foi a proposta de Regulamentação das Bases Curriculares para as Habilitações
Profissionais, enviada recentemente pelo Ministério da Educação ao Conselho Nacional de Educação.
Paralelamente, é preciso seguir discutindo a questão e buscando novas abordagens num processo
que envolva governos, o setor privado e a sociedade civil.
O texto a seguir, baseia-se na participação do secretário de Formação e Desenvolvimento
Profissional do Ministério do Trabalho, professor Nassim Gabriel Mehedff, no Seminário “Exame Nacional
do Ensino Médio”, promovido pelo Inep, em 1997, e que faz parte da discussão em andamento no País
sobre os rumos do ensino profissional.
Consoante Mehedff, historicamente as questões educacionais, no que se refere à formação
profissional, foram condicionadas pelo padrão de inserção do país na economia internacional,
caracterizado pela exploração dos recursos naturais e de uma mão-de-obra barata e desqualificada.
Estabeleceu-se, assim, segundo ele, um sistema de ensino “regular”, voltado à formação da elite –
ainda assim de acordo com uma estrutura fordista/taylorista – enquanto a maioria dos brasileiros era
condenada a trabalhar e a obedecer, recebendo o mínimo de instrução necessário ao desempenho de
suas funções. A partir de um determinado momento, que Mehedff situa em 1982, esse paradigma
deixou de atender até mesmo às pouco exigentes necessidades do processo econômico excludente
nacional.
Mehedff sustenta que o “ensino e a educação profissional devem sempre estar em harmonia com
o sistema educacional, devendo ser a educação profissional cada vez mais pós-secundária, realizada
por meio de uma rede de educação profissional, em que tanto o Estado quanto o setor privado, o
movimento sindical e as ONGs possam colaborar com a sociedade, de forma permanente”.
Para Mehedff, a situação está evoluindo positivamente, no sentido de uma “nova relação do setor
educacional com o produtivo” – que nada tem a ver com integrar mercado de trabalho e sistema
educacional, com uma reprodução do mercado de trabalho em sala de aula. A revalorização do supletivo
e outras ações nas quais se encontram engajados os Ministérios do Trabalho e da Educação, devem
resultar na redefinição do perfil da escola técnica e num novo modelo de educação profissional.
Maria Helena Guimarães de Castro
Presidente do INEP
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A Avaliação da Educação e a Inserção
dos Egressos do Ensino Médio no
Mercado de Trabalho*
Nassim Gabriel Mehedff
Antes de mais nada, gostaria de agrade-
cer à professora Maria Helena Guimarães de
Castro pelo convite e, por seu intermédio, ao Mi-
nistério da Educação, destacando aqui o signifi-
cado deste, se não por outras coisas, pela nova
postura, razoavelmente bem, que este governo
está adotando em relação à discussão da ques-
tão da política social, da relação Estado/socie-
dade, e de sua própria integração.
O fato de aqui estar presente alguém do
Ministério do Trabalho, num seminário, para a dis-
cussão e algumas reflexões sobre a avaliação da
educação do segundo grau e sua inserção no
mercado de trabalho, significa um avanço.
Mesmo que nada dissesse hoje, apenas me
levantasse e fosse embora, o que não é o caso,
considero o fato de alguém do Ministério do Tra-
balho estar presente neste auditório, discutindo
a questão da educação, um avanço fundamental
na própria evolução da política social e da políti-
ca pública de educação neste País.
Se o Ministério do Trabalho esteve sempre
ocupado em apagar incêndios provocados por
salário-mínimo, greve e dissídio coletivo, hoje
pretende, cada vez mais, junto com outros mi-
nistérios, pensar a política de relação capital-tra-
balho a médio e a longo prazos, em que a edu-
cação desempenha um papel importante. Nesse
contexto, o governo Fernando Henrique Cardo-
so tem uma idéia muito clara.
Consultando alguns alfarrábios, descobri
casualmente um artigo publicado em 1959, na
Revista Civilização Brasileira,
versando sobre as
questões das exigências educacionais no proces-
so de industrialização no Brasil, de autoria de
Fernando Henrique Cardoso. Naquele artigo,
identifiquei várias coisas que hoje estão sendo
postas em prática no governo Fernando Henrique
Cardoso.
A ESCOLA E A RELAÇÃO
CAPITAL-TRABALHO
A escola, dentro do processo da relação
capital/trabalho, bem como em sua dinâmica so-
cial, é hoje – embora o setor produtivo já esteja
saindo dessa linha rapidamente – uma das insti-
tuições mais rigorosamente fordista/taylorista, frag-
mentada, onde as coisas não são globalizadas.
Tudo isso está relacionado com a própria filosofia
de uma sociedade que sempre se pautou por um
modelo de desenvolvimento econômico e social
agravado a partir dos anos 30. Tinha este como
marca principal a exclusão, ou seja, a não incor-
poração da sociedade como um todo, em relação
aos benefícios resultantes do processo produtivo.
Tanto isso é verdade que costumo rotular o
fordismo/taylorismo no Brasil de “caboclo e
tropicalista”. Se comparamos a eficiência do
fordismo/taylorismo no Brasil com a eficiência por
ele apresentada nos Estados Unidos, onde nas-
ceu e teve uma função social ilustrada na frase
“two cars in each garage and two chickens in each
pot”
, veremos que, aquele país, ao manipular a
produção, conseguiu esse objetivo.
No Brasil, com um processo econômico
excludente, isto não ocorreu. Aumentou a produ-
ção, melhorou a produtividade, mas não promo-
veu o crescimento social. Daí, aquela velha his-
tória de primeiro crescer o bolo para depois ser
distribuído. O modelo e a prática do desenvolvi-
mento são a maior demonstração de que isso
não é verdade.
* O presente texto baseia-se na palestra proferida pelo autor no Seminário. Não se trata, portanto, de um texto previamente elaborado nem
de mera transcrição do que se ouviu naquela oportunidade. O trabalho de edição buscou tanto a fidelidade ao que foi dito, no que se refere
ao conteúdo, quanto o vigor da exposição oral. Esta versão conta, evidentemente, com a aprovação prévia do seu autor (N. E.).
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Antes de abordar a questão profissional, fa-
rei uma introdução do ponto de vista histórico, na
sua relação com o sistema educacional, para des-
pertar a reflexão sobre o uso específico da avali-
ação do segundo grau. Dentro desta perspectiva,
quero fazer mais uma consideração do que uma
palestra organizada, como há de parecer.
O Brasil, sob o ponto de vista do desenvol-
vimento econômico, tem características peculia-
res. E, quando buscamos fazer análises compa-
rativas com outros países, há uma enorme difi-
culdade, porque o Brasil é um país estranho
quanto à sua forma de caminhar. É necessário,
então, procurar entender o conservadorismo da
sociedade brasileira, moldada numa história de
desenvolvimento econômico-social excludente.
Para se ter uma idéia disto, é conveniente
fazer uma análise a partir de 1930, para estabe-
lecer um marco da industrialização no Brasil, que,
evidentemente, tem início antes de 1930. Desde
essa data, o PIB brasileiro cresceu 12 vezes,
superando países industrializados, sendo ultra-
passado apenas pelo Japão, cujo crescimento
foi de 13,4%.
Daí ser comum o brasileiro indagar-se:
Como isso aconteceu – já que temos uma dívida
imensa? Por que somos um país tão injusto? É
uma questão muito séria sobre a qual todos os
educadores deveriam refletir. Essa incoerência
é atribuída a três fatores e o terceiro fator tem
uma estreita afinidade com a educação.
O modelo excludente do País está associ-
ado a sua marginalização das questões bélicas.
Sabemos o que a Segunda Guerra Mundial re-
presentou para a Europa e os EUA, e até mes-
mo para o emergente mundo socialista. Alguns
países que não participaram de uma guerra mun-
dial conheceram, por sua vez, revoluções real-
mente significativas do ponto de vista histórico
que o Brasil jamais enfrentou. A revolução cam-
ponesa na China e a revolução agrária no Méxi-
co condicionaram positivamente a economia des-
ses países. O tempo exíguo desta palestra não
me oferece, todavia, condições para explicar, do
ponto de vista econômico-sociológico, o exacer-
bado protecionismo do mercado no Brasil, outro
fator a ser considerado. Aqui, os investimentos
na produção chegavam para se aproveitar do
aconchego do mercado protegido. Sem compe-
tição, a relação de risco praticamente não exis-
tia, sendo o governo visto como o grande pai, o
construtor de um modelo de relação Estado/So-
ciedade cuja função, na verdade, era proteger
um modelo excludente e, portanto, fazer com que
a relação de risco de incorporação de capital não
existisse.
Fora de duas guerras “quentes” e de uma
guerra “fria”, com o mercado protegido, este
mesmo mercado se beneficiava de um outro fa-
tor – a vantagem omparativa dos recursos natu-
rais. Entretanto, o Brasil, portador de incontáveis
recursos naturais, não soube aproveitá-los sob
a ótica do desenvolvimento sustentado.
Além dos nossos recursos naturais, era-nos
ensinado que o Brasil dispunha de mão-de-obra
abundante e barata – outra vantagem. Mas, para
ser barata, tinha de ser desqualificada, sendo o
sistema educacional instrumento dessa
desqualificação.
O sistema educacional reflete, portanto,
essa desqualificação, porque estabelece uma
dicotomia que foi a marca da história da educa-
ção brasileira. De um lado, o famoso ensino re-
gular que, semântica e ideologicamente, implica
algo “irregular”. O regular é o que conhecemos
como sistema formal de ensino.
EXPANSÃO DO ENSINO E EXCLUSÃO
SOCIAL
Ontem, a professora Maria Helena discor-
ria sobre a expansão do ensino primário e do
ensino fundamental nos anos 70 e agora, do se-
gundo grau, mas toda essa expansão ainda ocor-
re num modelo excludente de educação. Melho-
ra-se a expansão, mas não se cuida da alternati-
va metodológica que necessariamente não é
mais a de minha classe de escola primária. Éra-
mos 17 alunos. Começamos e terminamos o cur-
so com esse mesmo número. Todos, professo-
res e alunos, pertenciam à mesma classe social
e econômica. O diálogo e a aprendizagem se
davam numa imensa harmonia. Naquela classe,
em vez de 17, deveriam estar sentados 170. Essa
é a marca do modelo excludente e eficiente.
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Como definiríamos, pois, dentro dessa pers-
pectiva, o ensino regular? Segundo aprendi nos
meus primeiros anos do curso de Pedagogia, se-
ria o ensino visando à formação do homem inte-
gral, implicando, portanto, que pudesse haver um
“não integral”. Descobri, posteriormente, que os
alunos que cursavam o sistema regular seriam a
elite, para ocupar os postos de mando no País; os
demais, para trabalhar e obedecer.
Paralelamente, foi-se criando algo no Bra-
sil, com várias designações, como: ensino
profissionalizante, educação e trabalho, forma-
ção profissional, escola orientada para o traba-
lho, e outros tantos apelidos que nós, educado-
res, para dourar a pílula, começávamos a dar à
educação profissional.
Na Constituição de 1937 está escrito que o
ensino profissionalizante tem como objetivo aten-
der às massas carentes e desprovidas da sorte,
o que confirma a concepção que o Brasil sempre
teve quanto à questão educacional e ao destino
das pessoas através do sistema educacional do
País.
Vale aqui lembrar que fomos um dos últi-
mos países a abolir a escravidão, estando ainda
a relação senhor-escravo muito presente na re-
lação capital-trabalho e até mesmo na definição
das metodologias educacionais.
O que acabou finalmente acontecendo na
história da educação brasileira? Duas histórias da
educação: a história da educação chamada
profissionalizante e a história da educação regu-
lar. Só a partir de 1982, que considero um ano
paradigmático, não porque marque a superação
no modelo de desenvolvimento econômico em vi-
gor desde 1930, mas porque em 1982 – até por
uma experiência pessoal, como espectador privi-
legiado dessa questão, porque estava no Banco
Internacional de Desenvolvimento (BID) – o Brasil
declarou-se falido, admitindo assim o esgotamento
do modelo adotado por cinqüenta anos.
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E ENSINO
O esgotamento do modelo agravou-se ao
mesmo tempo por outros acontecimentos, como
a inovação tecnológica e organizacional do setor
produtivo. Este já seria um assunto para um ou-
tro seminário sobre como a inovação tecnológica
chegou à América Latina, em especial, ao Brasil.
Em outros países, a inovação tecnológica, mui-
tas vezes, chegou com o objetivo de benefício
social, como na Itália e depois na Austrália. No
Brasil, contrariamente, ela chegou para consoli-
dar o aumento do lucro do modelo excludente,
provocando, assim, o questionamento da inova-
ção tecnológica que, por sua vez, coincide com
o desaparecimento do fordismo/taylorismo en-
quanto forma de organizar a produção.
Com o advento da inovação tecnológica e
o início da globalização, as pessoas se deram
conta de que a educação não chegara ao escri-
tório, ao supermercado e mesmo à agricultura,
num verdadeiro descompasso como os “novos
tempos” e a educação em vigor no País. Um in-
tegrante do MST que foi ao Ministério do Traba-
lho questionou a qualificação nos assentamen-
tos, alegando que “não se pode assentar para
retomar a tecnologia agrícola existente naquela
fazenda, antes da sua ocupação”. Isso porque
as pessoas que as invadem devem possuir a
competência para implementar uma nova
tecnologia agrícola.
Portanto, essa conscientização que se evi-
dencia com relação ao problema agrário, da in-
dústria e dos serviços, mostrando nosso
despreparo, acaba questionando a própria ordem
social.
Isto não existia ou não chegava a consti-
tuir problema no modelo fordista/taylorista, pois
neste não se precisava de nenhuma relação cul-
tural ou inteligente. Por esse motivo, considero o
filme
Tempos Modernos
como paradigmático: na
linha de produção as coisas se complicam por-
que o operário não sabe o que está acontecen-
do, ignora as causas e as conseqüências, e aca-
ba sendo engolido pela própria máquina.
Hoje, as complicações são de outra ordem.
No lugar do torno, começa a aparecer o controle
numérico. E, para trabalhar com o controle nu-
mérico, é preciso saber ler, escrever, pensar,
globalizar. Começa-se, pois, a entender que, den-
tro da discussão da superação do modelo de
desenvolvimento social excludente e exportador,
havia também o problema de qualificação da
População Economicamente Ativa (PEA).
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Descobrimos, recentemente, algumas coi-
sas que não significavam muito, nas estatísti-
cas, como o nível de escolaridade da PEA. Isso
não constava das estatísticas educacionais do
País. Existia o dado, mas ninguém se preocupa-
va em analisá-lo, até recentemente.
Desta forma, chegamos à conclusão de que
a dicotomia existente na educação brasileira, já
apontada, criou uma situação calamitosa no País,
do ponto de vista da escolaridade, pois o ensino
regular foi criado para as elites, e o outro conce-
bido para os pobres desvalidos da sorte. O que
estaria implícito nisso? Exatamente o que minha
mãe dizia quando eu era criança: “melhor que
menino na rua fumando maconha ou roubando,
é menino no emprego”.
Um dos piores inimigos da democracia é o
senso comum. Portanto, quando é dito que “me-
lhor menino no emprego do que na rua fumando
maconha”, significa que ele não precisa ir para a
escola. Basta-lhe, pois, uma rápida qualificação
para um emprego de pedreiro ou de assistente
de qualquer coisa, porque deixa livre o caminho
para a elite.
Assim, acabamos construindo no País uma
PEA de aproximadamente 74 milhões de brasi-
leiros em idade produtiva, empregados e desem-
pregados, nos setores formal e informal, com uma
média de cinco anos de estudo (não necessaria-
mente de escolaridade). Inferior, portanto, à dos
nossos vizinhos do Mercosul.
Tem-se como uma das causas dessa baixa
escolaridade no Brasil o alto grau de repetência,
especialmente da 1ª para a 2ª série, em torno de
40% a 45%, que perdura há cinqüenta anos, em-
bora tenha declinado recentemente para 33%, mas
ainda alta. Como defendo a promoção automáti-
ca, não vou participar dessa discussão. Acho que
menino tem que estar na escola por idade. Se ti-
ver 9 anos, que esteja na 3ª série.
REDE DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E
CIDADANIA
A relação do setor produtivo com a educa-
ção é hoje muito diferente. Até poucos anos, ha-
via mais ofertas de trabalho nos jornais, sobretu-
do para quem era portador de um curso
profissionalizante do Senai ou do Senac. Hoje,
essa oferta está restrita à posse do 2º grau com-
pleto. Há uma conscientização, inclusive por parte
dos sindicatos, no sentido da melhoria e qualifi-
cação da mão-de-obra, o que posso atestar em
razão da minha relação, como representante do
Ministério do Trabalho, com representantes da
CUT, Força Sindical, CGT, etc., todos preocupa-
dos com a qualificação profissional, pois têm a
consciência de que cidadão produtivo é cidadão
com 1º e 2º graus completos, de caráter acadê-
mico, sem qualquer vestígio de profissionaliza-
ção. Portanto, ensino e educação profissional
devem sempre estar em harmonia com o siste-
ma educacional, devendo ser a educação profis-
sional cada vez mais pós-secundária, realizada
por meio de uma rede de educação profissional,
em que tanto o Estado quanto o setor privado, o
movimento sindical e as ONGs possam colabo-
rar com a sociedade, de forma permanente.
Lembro-me que, ao dizer essas coisas,
num seminário da CUT, alguém me interpelou
dizendo: “professor, quando você vai nas fave-
las, nas fábricas, e discute com as famílias dos
operários e da população, o clamor é por ensino
profissionalizante”. Eu disse: eu sei. Só que como
reformadores da política social, não podemos
assumir a alienação do povo. Quem criou esse
discurso de o ensino profissionalizante ser a gran-
de e melhor saída para o povo? Quem pôs isso
na cabeça do povo? Fomos nós, a elite, que cri-
amos esse modelo de sociedade, convencendo
o povo de que isso era a melhor opção. A com-
provação disso é que minha empregada domés-
tica, o meu motorista e os copeiros no Ministério
só me pedem que lhes arranje uma vaga para os
filhos no Senai.
Percebem o constructo sociológico que se
fez com a profissionalização? Algumas ONGs e
movimentos organizados têm buscado proteger
a criança e o adolescente, oferecendo-lhes a
profissionalização. Embora sejam inegáveis os
bons propósitos dessas organizações, elas aca-
bam retirando dessas crianças a possibilidade da
cidadania através da escola, ao optarem pelo
ensino profissionalizante. Não é este o caminho.
Temos que resistir a esse tipo de alienação.
Embora a relação da educação com o setor pro-
11
dutivo seja positiva, o que se busca, hoje, é a
construção do indivíduo como cidadão, na esco-
la de 1º e 2º graus, sem apelar para qualquer
motivação romântica. Portanto, com uma visão
concreta do sistema produtivo, da relação, às
vezes selvagem, entre capital/trabalho, preparan-
do o indivíduo do ponto de vista da autogestão e
de sua profissão.
Ontem, nos indagávamos se a avaliação
do 2º grau sinalizava para o mercado de traba-
lho. Essa pergunta pode ser entendida como um
paradigma equivocado, porque se deseja saber
se a sinalização da eficiência do 2º grau aponta
para o mercado de trabalho na profissionalização.
Não aponta. Indica apenas que a escola está pro-
duzindo cidadãos competentes para o trabalho,
embora sem habilidade específica desenvolvida.
Isso se faz depois, durante a vida, mediante a
educação permanente.
O que vale é organizar um currículo aca-
dêmico impregnado das questões tecnológicas,
sociológicas e econômicas, da relação do ho-
mem com a natureza e o trabalho, pois ensinar
é globalizar. Oficinas de artes industriais e ar-
tes agrícolas não ensinam a pensar. Pelo con-
trário, oferecem ao aluno uma visão fordista
catatônica sobre a produção, tanto agrícola
quanto comercial.
Por falar em comercial, é conveniente con-
siderar a eficiência de nossas escolas técnicas
comerciais, estaduais ou municipais, que, como
todos sabem, não primam pela eficiência e le-
vam quatro anos para formar um contador que
o setor produtivo recusa. Embora eu teça críti-
cas ao Senac e ao Senai, quanto à sua resis-
tência em adaptar-se à nova visão produtiva do
mundo, inclusive quanto à sua forma de admi-
nistrar, reconheço que o Senac forma, em três
meses, um contador mais competente do que a
maioria de nossas escolas técnicas em quatro
anos.
Começo a acreditar que está certo aquilo
que pensava há quinze anos e que julguei, de-
pois, ser errado. Julgo ser fundamental reinte-
grar o latim nos cursos de 1º e 2º graus. Se eu
não tivesse estudado latim nos meus sete anos
de ginásio e colégio, não estaria pensando como
estou. Urge fazer uma comparação dos que se
formaram tendo currículo acadêmico com a ge-
ração regida pela famigerada Lei nº 5.692, que
destruiu o 2º grau neste País, porque consolidou
essa dicotomia, usando um discurso ideológico,
ao profissionalizar o 2º grau, que deixou de ser
acadêmico. Não formou o cidadão nem o
profissionalizou.
CERTIFICAÇÃO PROFISSIONAL
Uma questão diferenciada e fundamental
na avaliação do 2º grau é a certificação de com-
petência, que não deve ser confundida com
certificação de mercado de trabalho e que é uma
outra coisa: a certificação ocupacional.
Trata-se de algo novo, inexistente ainda no
Brasil, que estamos negociando em termos de
Mercosul, visando a uma certificação
ocupacional, não-estatal, feita pelo setor produ-
tivo – trabalhadores e empresários, como em
qualquer país desenvolvido. Na França, é feita
pelos sindicatos. Nos Estados Unidos, pelas
empresas. Fica, pois, claro que nenhum sistema
educacional faz certificação ocupacional e é im-
portante que as coisas não sejam confundidas.
O mercado de trabalho, o setor produtivo e
a construção do novo modelo querem uma sina-
lização de que o 1º e o 2º graus sejam capazes
de construir cidadãos que saibam aprender a
aprender, globalizar, escrever, contar e interpre-
tar texto. Ontem, Maria Helena relatou que pas-
sava um semestre para trabalhar interpretação
de texto com os alunos da Unicamp. Se isso for
verdade com alunos que passam nos vestibula-
res da Unicamp, imaginem o que significa o tra-
balho de construção de uma nova modernidade
de setor produtivo, com base numa população
economicamente ativa, com média de escolari-
dade de cinco anos.
O Ministério do Trabalho está engajado com
o Ministério da Educação, assumindo a linha de
frente de revalorização do supletivo. Grande parte
da população não vai mais voltar para a escola,
sendo necessário revalorizar o supletivo, tornan-
do-o contextualizado, ágil, com ritmo próprio, uti-
lizando novas metodologias, materiais didáticos
modernos, e que pode ser concluído no espaço
de oito meses a um ano, no máximo.
12
O supletivo contextualizado torna-se uma
necessidade para certificar o trabalhador, como
exigência do setor produtivo, em nível de 1º e 2º
graus, como também para ajudá-lo a reconstruir
a cidadania.
Começa-se, hoje, no Brasil, a conceber
uma nova relação do setor educacional com o
setor produtivo. Há que se construir esta cidada-
nia, resgatando a dívida social, sob o ângulo da
educação. Isto mediante um sistema educacio-
nal com três componentes básicos: educação
superior; educação básica com caráter de 1º e
2º graus acadêmicos e um sistema de educação
profissional continuada. Para essa tarefa, urge
adotar cursos e formas de atualização, aperfei-
çoamento tecnológico, sem esquecer a catego-
ria da mudança, que é uma característica da
modernidade e que atinge toda a sociedade.
Era essa a visão da realidade que eu queria
transmitir: não separar as coisas, mas integrá-las,
embora informalmente, pois muitos entendem que
integrar mercado de trabalho com o sistema edu-
cacional é trazer uma reprodução do mercado de
trabalho para dentro de sala de aula. Não é isso,
nem tampouco é fazer oficina de artes agrícolas e
industriais, ou coisas até mais avançadas.
Lembro-me de uma visita a uma importan-
te fábrica, na Alemanha, onde anualmente um
certo número de trabalhadores passava oito
meses fazendo curso de aperfeiçoamento e qua-
lificação. No local, os trabalhadores passavam
diariamente três horas no curso. Para isso, a
empresa cedia uma hora e meia e os trabalha-
dores, uma hora e meia do seu lazer.
Como educador, queria que o diretor me
mostrasse a grade curricular – palavra “mágica”
quando se começa a discutir política educacio-
nal. O diretor disse-me que não havia “grade”.
Participavam do curso 80 trabalhadores, dividi-
dos em 10 grupos de trabalho, contendo cada
grupo oito pessoas, entre homens e mulheres.
Ao perguntar-lhe o que faziam, fui informado de
que, diariamente, tinham 45 minutos de aula de
alemão, sendo os outros 45 minutos dedicados
à matemática. O tempo restante era destinado
aos grupos de trabalho para elaboração de pro-
jetos. Mais uma vez indaguei se eram projetos
de aperfeiçoamento de máquinas e o que faziam
na linha de produção. O diretor respondeu-me
que estavam com tempo livre. Pintavam um qua-
dro, esculpiam estátuas, compunham músicas,
escreviam peças teatrais que seriam apresenta-
das no final do curso. Concluí, como educador,
que deveria modificar muito as minhas opiniões
quanto ao setor produtivo, com 1º e 2º graus com-
pletos e obrigatórios, com cidadãos produtivos,
com capacidade de aperfeiçoar-se ao longo da
vida, mas não prematuramente.
Por mais de uma vez, a avaliação do 2º
grau foi motivo de nossas discussões neste se-
minário, inclusive quanto à sua sinalização para
o mercado de trabalho.
O certificado do exame de avaliação de 2º
grau é um documento a mais a compor o
curriculum vitae
do aluno, quando este for em
busca de emprego. Pode, sem dúvida, atenuar
preconceitos ou até modificar a opinião do setor
produtivo, que prefere um candidato procedente
de instituições tradicionais como o Colégio San-
to Agostinho, no Rio de Janeiro, na disputa com
outro candidato, vindo de um estabelecimento da
rede pública, como a Escola Rivadávia Correa,
na Baixada Fluminense.
Essa sinalização da avaliação do 2º grau
pode ser modificada com a cooperação do
empresariado e do setor produtivo, ao descobri-
rem que tanto colégios tradicionais como o San-
to Agostinho ou sem nenhuma tradição como o
Rivadávia podem produzir cidadãos produtivos.
Muito obrigado.
DEBATE
Profª Maria Helena Guimarães de Castro
(Inep): – Muito obrigada, Nassim. Pela natureza
da palestra feita pelo Nassim, achamos que se-
ria mais interessante não abrir o debate agora,
mas fazer um intervalo e, depois do
coffee break
,
retomar as exposições de experiências de vesti-
bular, porque vamos abordar um outro assunto
que parece extremamente interessante e, ao
mesmo tempo, fora da pauta das experiências
que vão ser apresentadas posteriormente. Su-
gerimos aos senhores 15 minutos de perguntas,
de debate, está bom?
13
Prof. Nassim Gabriel Mehedff (MTb): – Eu
trouxe um livreto produzido no Ministério do Tra-
balho, que é um dos documentos que definem
um pouco o pensamento sobre a política de qua-
lificação profissional dentro de uma perspectiva
de educação como um todo, na sua relação com
o setor produtivo, hoje, de propostas que o Mi-
nistério do Trabalho está avançando, no plano
de qualificação profissional, e atualmente muito
divulgado no Brasil.
Prof. Walter Teodor (UFPE): – Gostaria de
obter maiores informações sobre o conceito da
certificação ocupacional, aqui mencionado e so-
bre as políticas de educação continuada para um
mercado de contínua mudança, desenvolvidas
pelo Ministério do Trabalho e, também, as do
Ministério da Educação, valendo-me da presen-
ça da professora Maria Helena.
Profª Maria Helena Guimarães de Castro:
– Nós vamos considerar todas as questões que,
ao final, serão respondidas pelo professor, está
bem?
Profª Sonia Maria (UFSC): – Em junho do
ano passado, estive aqui em Brasília, numa reu-
nião da SESu, sobre a questão do pós-médio, a
que o senhor se referiu durante sua palestra. Lem-
bro-me que estava sentada ao lado de uma re-
presentante da Secretaria de Educação do
Paraná. Ela dizia que o pós-médio em Curitiba está
vindo com bastante força e que estão investindo
nesse sentido. Mas, na ocasião, ela não teve a
oportunidade de colocar o assunto porque a pla-
téia minimizava a questão do pós-médio. Então,
eu gostaria de pedir duas coisas. Primeiro, que o
senhor esclarecesse mais o tema do pós-médio,
e quando entraria o ensino profissionalizante. Se-
gundo, se haveria aqui alguém da Secretaria de
Educação de Curitiba para nos relatar essa expe-
riência, se não me engano financiada pelo BID,
se está sendo efetivada e de que maneira está
sendo recebida pela sociedade.
Sr. Paulo Fábio (UERJ): – Há quinze dias,
numa reunião com empresários no Rio de Janei-
ro, obtive uma informação de um dado que, se
fosse possível, gostaria de uma confirmação: que
as empresas gastam hoje, no Brasil, mais ou
menos 2,5 bilhões de dólares ao ano com edu-
cação, ou seja, o equivalente a um pouco menos
do que o governo federal gasta com todo o ensi-
no superior brasileiro. Acho esse dado extrema-
mente importante, mas não sei se ele é oficial, e
se a equivalência é mais ou menos essa, que
nós teríamos dois sistemas de educação, em ter-
mos de valores em dólares.
Srª Ana Maria (UFRJ): – Já vivemos, du-
rante muito tempo, a história do segundo grau
profissionalizante. Sou uma, dentre tantas, que
tiveram registrado no diploma ser formada em
análise clínica, numa escola particular, sem nun-
ca ter visto um laboratório na minha vida. Várias
pessoas, como eu, obtiveram esse tipo de for-
mação. Acho que há um consenso social de que
não é esse o papel do Estado. Mas, em
contrapartida, construímos coisas muito impor-
tantes, como as escolas técnicas federais, cujo
modelo estão questionando. Não podemos dizer
que ele esteja falido. Pelo contrário. Pode não
ter abarcado ou atingido a idéia que alguns teri-
am do ensino técnico profissional – inclusive o
apresentado nas escolas técnicas – , o aspecto
terminal. Ele nunca foi apresentado como termi-
nal, mas como curso de formação. Temos ótimos
alunos que ingressaram na universidade, oriun-
dos desse projeto das escolas técnicas federais
e que hoje estão ameaçadas frente a uma políti-
ca não muito clara quanto ao papel que está sen-
do reservado a essas escolas. De outro lado,
você, na sua apresentação, coloca que movimen-
to sindical tem a consciência de que não há a
necessidade desse ensino profissional e sim da
educação básica. Eu diria que o ensino regular
apenas dá a informação geral.
Então, quem fornece a formação profissio-
nal? Tenho informações de que há muitos proje-
tos oriundos dos movimentos das entidades sin-
dicais, que passam pelo Sistema Nacional de
Emprego, que vai sendo financiado pelo FAT, e,
me desculpem por usar a expressão “rios de di-
nheiro” alocados nesses projetos para compra de
computadores para alguns sindicatos, centrais sin-
dicais ou coisas do gênero fazerem cursos profis-
sionais. Da mesma forma, imagino que as empre-
sas também estejam apresentando esses proje-
tos. Então, está-se visualizando um projeto em que
o sistema produtivo, no caso, trabalhadores e
empresários, sejam responsáveis pela educação
profissional e o Estado não. Portanto, pergunto:
há possibilidade de garantia de acesso às clas-
14
ses que não têm como pagar? Porque não está
garantido que esses cursos são gratuitos.
Prof. Nassim Gabriel Mehedff:Todos são,
por lei.
Srª Ana Maria (UFRJ): – Se por lei são gra-
tuitos, esse já é um ponto positivo. Então, por que
a idéia de tirar do Estado o acompanhamento des-
se tipo de oferta, passando apenas a normatizar
e a regulamentar? Seria essa a proposta que está
colocada? Tenho algumas dúvidas.
Participante não-identificado: – A minha
pergunta, professora Maria Helena, é se esta
palestra está sendo gravada e se seria possível
obter uma cópia desta, em decorrência da rique-
za das informações que foram passadas e da
impossibilidade de anotá-las.
Profª Maria Helena Guimarães de Castro:
– Professor, está sendo gravada. Podemos pro-
meter, não sabemos para quando, a transcrição
da gravação.
Participante não-identificado: – Muito obri-
gado. É só escrever para o Inep e pedir?
ProfªMaria Helena Guimarães de Castro:
– Só não é para amanhã.
Participante não-identificado: – Eu sei.
Mas todo interessado deve escrever para o Inep
pedindo?
Prof. Nassim Gabriel Mehedff:Trouxe
estes livros que, como disse, são parte de uma
vasta documentação que o Ministério do Traba-
lho tem produzido, num diálogo permanente com
a sociedade, sobre a questão da educação pro-
fissional. Este é um dos documentos básicos.
Mas aqueles que estiverem interessados em
obtê-los, por favor, registrem seus endereços, que
eu envio um
kit
completo de toda a documenta-
ção que, inclusive, esclarece as perguntas da
professora da UFRJ.
Profª Maria Helena Guimarães de Castro:
– Está bem. Pediremos que circule uma lista para
quem quiser receber o
kit
completo. Então va-
mos ao número 71. Esta é a última pergunta.
Depois virão as respostas.
Participante não-identificado: – Minha per-
gunta é a seguinte: o senhor falou sobre a ne-
cessidade de que as crianças permaneçam na
escola e de um currículo acadêmico. Se eu pego
os dados, pelo menos da região em que estou
situado em Minas Gerais, verifico, por exemplo,
que, em relação a gênero, as mulheres têm per-
manecido mais tempo na escola que os homens.
E se a gente for verificar a razão por que isso
ocorre, verificamos que a sociedade – a família
espera isso, tem uma série de coisas, e vai des-
de o campo até a cidade – tem cobrado dos ho-
mens aquilo que caracteriza o seu padrão tradi-
cional, isto é, desde cedo eles têm que contribuir
para o sustento da sua família, têm que assumir
o papel de provedor...
Prof. Nassim Gabriel Mehedff: – Deixar
dessa frescura de estudar.
Participante não-identificado: – Isso. Dei-
xar dessa frescura de estudar. A gente observa
essa tendência, inclusive com reflexos na pró-
pria universidade, onde cada vez mais aumenta
o número de mulheres superando o de homens.
Isto é um problema, visto que a mulher cresce
em participação, embora tenha o homem uma
função extremamente importante, ao constituir a
maioria produtiva da nossa população. Isto tem
reflexos enormes no nível de sua qualificação,
como provedor ou trabalhador na indústria e/ou
outros setores. Este é um problema difícil de abor-
dar porque é um problema cultural, enraizado pro-
fundamente na consciência de nossa socieda-
de. Como enfrentar essa situação?
Prof. Nassim Gabriel Mehedff: – Quanto à
certificação ocupacional, no
kit
que mencionei,
há maiores detalhes. Primeiro, porque não exis-
te no Brasil, ainda, um sistema de certificação
ocupacional; ninguém certifica ocupacionalmente
no Brasil, hoje, a não ser as profissões de nível
superior, na universidade. Então, você não tem,
no Brasil, como existem em outros países, siste-
mas de certificação de profissões. Nós, brasilei-
ros, não temos certeza se o eletricista que toca a
nossa campainha e vem consertar a nossa to-
mada vai causar um profundo curto-circuito e um
incêndio na casa, porque ele não tem uma forma
de comprovação do que ele é. Nos Estados Uni-
dos, para você ser sindicalizado, você tem que
15
ser certificado antes. O que regula, inclusive, uma
série de questões de salário.
Meu filho mora nos Estados Unidos e é ci-
neasta. Para obter a certificação de cineasta e
entrar no Sindicato de Cineastas da Califórnia, com
especialização em montagem e direção, que lhe
daria o direito de ganhar oito vezes mais, por se-
mana, teve de submeter-se ao exame de
certificação ocupacional apesar da posse de um
diploma universitário. A certificação é um sistema
de testes criado pelo setor produtivo, empresas e
o próprio sindicato, e não pelos educadores.
Certificação profissional é, pois, um conjun-
to independente de escolaridade. A pessoa diz ser
um bombeiro. Se for analfabeta, pode ir fazer todo
o sistema de certificação e tornar-se bombeiro,
sem ser obrigado a possuir, necessariamente, um
diploma de escolaridade formal. A questão da exi-
gência de escolaridade se apresenta de outra for-
ma – mediante a competência que o indivíduo tem
de adaptar-se continuamente a novas tecnologias,
saber aprender a aprender.
Aproveito para fazer um rápido comentário.
Hoje estou convencido de que a expressão “ensi-
no terminal” está superada. Nada hoje, do ponto
de vista da organização da sociedade, é terminal.
Alguém que faz um curso de quatro anos na uni-
versidade e acha que está formado, não está. Aque-
le que faz um curso de 200 horas para ser bombei-
ro, não é. Pois no setor produtivo, a única coisa
que é permanente é a mudança. E o sistema de
certificação ocupacional é quase que um sistema
de atualização. A pessoa tem que, periodicamente,
voltar. É igual a carro nos Estados Unidos e na
Europa. Todo ano tem que ser levado para ser fis-
calizado, dizer se está com a revisão em dia, se a
chapa ou o freio estão corretos e se está adaptado
às novas condições de meio ambiente, etc. É a
mesma coisa com a certificação ocupacional, que
é um conjunto de testes, de baterias, de entrevis-
tas, de várias formas de avaliação, cuja responsa-
bilidade é fundamentalmente do setor produtivo.
Evidentemente, possibilitado e fundamentado pelo
Estado, que incentiva, participa e garante a sua
existência, mas cuja iniciativa é do setor produtivo.
Essa é a diferença entre certificação profissional e
certificação de competência.
Pós-secundário
Quando digo que a educação profissional
tem que, cada vez mais, pós-secundária, estou
também afirmando que não substitui a educação
básica, acadêmica, de boa qualidade, na constru-
ção da cidadania. Quando falo em pós-secundá-
rio, não se trata de curso superior apenas ou de
formação de tecnólogos. A idéia de ensino termi-
nal estava, como sabemos, associada à idéia de
controle social, de evitar, por meio do 2º grau
profissionalizante, a pressão sobre a universida-
de. Foi essa, nos anos 70, uma das causas, ou
seja, a explicação ideológica da Lei nº 5.692.
A educação, hoje, tem que apresentar uma
base acadêmica, de 1º e 2º graus, e um outro
sistema após essa base, que inclui tanto o ensi-
no superior, público e privado, como a educação
profissional, da qual se encarregam o Estado, a
sociedade, o setor produtivo, as ONGs, as uni-
versidades – que hoje têm experiência disso, por
meio das pró-reitorias de extensão.
A primeira coisa importante no pós-secun-
dário é que vocês não confundam o que estou
chamando de paradigma velho, pois estou cha-
mando de pós-médio só o nível superior de curta
duração, de dois anos, como a formação de
tecnólogo, etc.
Quando falo em pós-médio, sem me limi-
tar ao pós-médio superior, estou dizendo que se
tem de construir uma rede de educação profissi-
onal no Brasil, diversificada, flexível e com com-
petência para atender às necessidades da po-
pulação economicamente ativa, nas suas mais
diferente demandas.
A questão das escolas técnicas
Estamos discutindo que, com a garantia da
presença do Estado como formulador, mas tam-
bém com a participação dos empresários, dos
trabalhadores, das ONGs, das universidades, dos
SS (Senai, Senac, etc.) – enfim, dos empresári-
os – as escolas técnicas possam, gradativamen-
te, mudar o seu perfil, tornando-se pólos de ex-
celência nessa rede de educação profissional,
produzindo metodologia, conhecimento, forman-
do formadores. Esse é o novo perfil que se espe-
ra construir. Temos que discutir o papel, o perfil
da escola técnica num novo modelo de rede de
educação profissional, porque a escola técnica
vai continuar pública, financiada com dinheiro da
sociedade, portanto tem que responder a um
perfil de educação profissional que a sociedade
e o setor produtivo – trabalhadores e empresári-
os – estão exigindo.
16
A escola técnica tem que deixar de ofere-
cer só ensino de segundo grau; deve ofertá-lo,
mas que seja um 2º grau contextualizado, para
uma determinada função dentro de uma rede de
educação profissional, por exemplo, a formação
de formadores para a rede de educação profissi-
onal. O que se está querendo dizer é o seguinte:
a escola técnica não pode continuar só atenden-
do a um pedacinho da PEA, tem que ampliar e
diversificar sua atuação.
São duas as questões fundamentais na dis-
cussão da reformulação do sistema da rede de
escolas técnicas federais. Primeiro, a escola téc-
nica tem de ser entendida como um integrante e
base de uma rede de educação profissional, por-
que aí o Estado passa a ser formulador na práti-
ca, não no gabinete do Ministério do Trabalho ou
da Educação. A reformulação se faz na relação
direta com o setor produtivo; na relação com a
sociedade e na relação com a população econo-
micamente ativa. Essa relação da escola técni-
ca, hoje, está reduzida, só atende a uma deter-
minada faixa do 2º grau. Não estou discutindo a
eficiência da escola técnica; aliás, é por isso que
a gente acha que a escola técnica tem condições
de mudar o seu perfil e de ter um amplo horizon-
te de trabalho. Duas coisas são fundamentais
para a construção de um novo perfil da escola
técnica, na perspectiva de ser a semente de uma
rede e o apoio de nucleação metodológica e de
formação de formadores da educação profissio-
nal: primeiro, uma reformulação no conceito de
sua clientela, que deve ser a população econo-
micamente ativa, empregada ou desempregada,
de 15, 20, 30 ou 60 anos de idade. A clientela da
rede de educação profissional são 74 milhões de
brasileiros que hoje compõem a população eco-
nomicamente ativa. Segundo, as escolas técni-
cas têm que se enquadrar nesse novo perfil e
produzir a competência dessa rede de atendi-
mento à população economicamente ativa.
Para ser semente de uma rede de educa-
ção profissional, não pode ser a escola técnica
concebida e dirigida somente por educadores;
tem que dispor de uma participação do setor pro-
dutivo (empresários e trabalhadores) e de outras
forças da sociedade, como as universidades,
ONGs, etc., que têm que participar da direção da
escola técnica, que não pode ser dirigida exclu-
sivamente por educadores, administradores de
1º e 2º graus.
O papel da conjugação da sociedade na
construção de um atendimento da população
economicamente ativa, para a melhoria da com-
petência profissional, superando o paradigma da
mão-de-obra abundante, barata e desqualificada,
só pode ser desempenhado pelo Estado na cons-
trução da política e da prática da preparação de
formadores, hoje precariamente resolvida.
Orçamento da educação profissional
O sistema de educação profissional no Bra-
sil, hoje, se consideramos as escolas técnicas
federais, estaduais e municipais – o Sistema S
(Senai, Senac, Senat e Senar), empresas, ONGs,
movimentos sindicais, universidades, o próprio
setor privado – os chamados cursos livres (como
o Instituto Universal Brasileiro, escolas de
informática), tudo isso junto significou, em esti-
mativas globais, para 1994, segundo os dados
que tenho, razoavelmente levantados, que o País
gastou – eu não digo investiu – R$ 3,5 bilhões,
aproximadamente. E esses R$ 3,5 bilhões, gas-
tos pelo Estado e pela sociedade – setor priva-
do, movimento sindical, as ONGs e universida-
des, por meio das pró-reitorias de extensão, etc.,
– tiveram uma profunda ineficiência porque no
ano de 1994 todo esse dinheiro conseguiu quali-
ficar, ou requalificar, somente 4% da PEA. É muito
pouco para 3,5 bilhões de reais. Se você fizer a
relação, o sistema de qualificação e requalificação
do trabalhador, da população economicamente
ativa no Brasil, foi absolutamente – e ainda é –
ineficiente.
O Programa Nacional de Qualificação do
Trabalhador (Planfor), do Ministério do Trabalho,
não tem o objetivo de ficar distribuindo cursos
pelos estados, repetindo aquilo que já se fazia
tradicionalmente. O Planfor pretende ser o cerne,
uma semente na construção de uma rede inte-
grada, com ampla participação da sociedade. O
Planfor aplicou, entre 1995-1997, quase R$ 600
milhões no País inteiro, e conseguiu preparar 3,2
milhões de trabalhadores em termos de qualifi-
cação e requalificação, com uma carga horária
média de 100 horas (dados atualizados até de-
zembro de 1997). Teve uma outra grande vanta-
gem, que é o princípio da construção dessa rede
de educação profissional. Os programas foram
executados, em 1997, por uma rede de 800 ins-
tituições parceiras, tais como: escolas técnicas,
17
universidade, ONGs, Senai, Senac, sindicatos,
setor privado, empresas. Enfim, uma gama de
instituições que estão se mobilizando, melhoran-
do a sua competência e provocando, umas nas
outras, uma profunda discussão sobre a
metodologia de educação profissional e a
readaptação de todo o tema da formação profis-
sional do trabalhador brasileiro.
A questão do gênero
É fato que a inserção da mulher no merca-
do de trabalho cresce, mas o salário continua
mais baixo do que o dos homens, em qualquer
nível. Trata-se de relação cultural e social muito
complicada. A questão do gênero é um item im-
portante na definição, por exemplo, da clientela
das escolas técnicas como o cerne de uma rede
de educação profissional. Você observará nos
cursos de qualificação profissional, no atendimen-
to e no aperfeiçoamento da população economi-
camente ativa, uma participação muito maior de
mulheres do que antes. Isso é um fato novo, pois
a sociedade condicionou a mulher de que ela ti-
nha que estudar na “escolinha”, e de que qualifi-
cação profissional era um assunto mais do mun-
do masculino, metal-mecânico, urbano-industri-
al, que não tinha muito a ver com o papel da
mulher definido, na sociedade dos preconceitos.
No Planfor, temos compromisso de garantir par-
ticipação feminina, e que representou por exem-
plo, 51% dos treinandos em 1997.
Profª Maria Helena Guimarães de Castro: –
Teremos um intervalo de 15 minutos para, depois,
retornar com as experiências das universidades.
Participante não-identificado: – Acho que
é apenas uma questão de resgatar uma verda-
de. Em primeiro lugar, desde o ano passado, não
era permitido às universidades fazer cursos de
capacitação e de formação de professores, sem
que houvesse uma bênção das secretarias de
educação. É uma determinação do MEC, porque
esse entende que a clientela é das secretarias
de educação, já que são elas que administram a
rede pública de ensino de 1º e 2º graus.
Tudo bem. Não temos nada a contestar.
Trabalhamos em parceria com a Secretaria de
Educação. Mas o Esquema 1 não é bem visto
pelas universidades, nem é aceito facilmente.
Pelo contrário, ele é imposto pelo MEC, via Se-
cretaria de Educação. O professor Pedro de Sou-
za, da Secretaria de Educação do Estado de
Santa Catarina, está aqui, e sabe que a Secreta-
ria de Educação do nosso estado está implan-
tando, atualmente, o Esquema 1. Com verbas do
Ministério, e a duras penas, nós conseguimos que
profissionais da universidade federal se engajem
num processo como esse. Daí, dizer que isso é
de autoria das universidades faz uma diferença
muito grande.
Prof. Nassim Gabriel Mehedff: – O Esque-
ma 1 só será melhor quando o setor produtivo
fizer parceria com ele.
18
19
Série Documental
Uma das funções institucionais do INEP é prover e estimular a disseminação e
discussão de conhecimentos e informações sobre Educação, visando ao seu desenvolvimento
e domínio público, através de sua produção editorial.
A Série Documental forma um canal de comunicação, diversificado quanto ao público,
à temática e à referenciação, abrangendo vários campos e objetivando alcançar, com tiragens
monitoradas, segmentos de público, com maior presteza.
Cada subsérie trabalha diferentes fontes:
1 —
Antecipações
apresenta textos de pesquisas cuja circulação está em fase
inicial nos meios acadêmicos e técnicos.
2 —
Estudos de Políticas Governamentais
divulga textos e documentos de diretrizes
e subsídios à formulação de políticas da Educação, especificando a temática
anteriormente com o título Estudo de Políticas Públicas.
3 —
Eventos
publica textos e conferências apresentados em eventos, porém
não divulgados em anais.
4 —
Relatos de Pesquisa
traz os relatos das pesquisas coordenadas pelo INEP.
5 —
Textos para Discussão
divulga opiniões e pensamentos sobre temas atuais
que subsidiem o estudo da Educação ou de áreas correlatas.
6 —
Traduções
apresenta, em português, textos básicos sobre Educação produzidos
no exterior.
Distribuição: Diretoria de Disseminação de Informações Educacionais
MEC - Esplanada dos Ministérios, Bloco L, Anexos I e II, 4
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