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unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
“JÚLIO DE MESQUITA FILHO”
Faculdade de Ciências e Letras
Campus de Araraquara - SP
VANESSA BATISTA DE ANDRADE
ESTÉTICA DA MERCADORIA E OBSOLESCÊNCIA: um
estudo da indução ao consumo no capitalismo atual
ARARAQUARA - SP
2007
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VANESSA BATISTA DE ANDRADE
ESTÉTICA DA MERCADORIA E
OBSOLESCÊNCIA:
:
:
um estudo da indução ao
consumo no capitalismo atual
Dissertação de Mestrado, Programa de
s-Graduação em Sociologia da
Faculdade de Ciências e Letras –
Unesp/Araraquara, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Sociologia.
Linha de pesquisa: Classes e
Movimentos Sociais
Orientadora: Maria Orlanda Pinassi
Bolsa: CNPq
ARARAQUARA – SP
2007
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VANESSA BATISTA DE ANDRADE
ESTÉTICA DA MERCADORIA E
OBSOLESCÊNCIA:
:
:
um estudo da indução ao
consumo no capitalismo atual
Dissertação de Mestrado, Programa de
s-Graduação em Sociologia da
Faculdade de Ciências e Letras –
Unesp/Araraquara, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Sociologia.
Linha de pesquisa: Classes e
Movimentos Sociais
Orientadora: Maria Orlanda Pinassi
Bolsa: CNPq
Data de aprovação: 30 /08 /2007
M
EMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA:
Presidente e Orientador: Profª Dra. Maria Orlanda Pinassi
UNESP .
Membro Titular: Prof º Dr. Jesus Ranieri
UNICAMP.
Membro Titular: Profº Dr. Adilson Marques Gennari
UNESP.
Local: Universidade Estadual Paulista
Faculdade de Ciências e Letras
UNESP – Campus de Araraquara
Dedicatória:
Dedico este trabalho a minha querida mãe, cuja vida dedicou a
nos ensinar o que era importante. E foi quem contribuiu para tirar
as vendas de meus olhos e me mostrou desde pequena as
desventuras do mundo, para que quando fosse grande pudesse
trabalhar arduamente para melhorá-lo. Mas que a casualidade não
permitiu que ela estivesse aqui hoje.
AGRADECIMENTOS:
Utilizarei estas palavras para agradecer a todos aqueles, que
foram imprescindíveis para a realização desta pesquisa. Gostaria
de agradecer a CNPq que por meio de uma bolsa anual, propiciou-
me a possibilidade – tamm anual – de dedicação exclusiva de
estudos dos temas por mim abordados.
Agradecer a instituição UNESP-FCLAR, na qual pude fazer
minha graduação em Ciências Sociais e na qual agora concluo
meu Mestrado em Sociologia, quero agradecer ainda a todos os
funcionários, que sempre foram solícitos e amigáveis em todos os
anos em que convivi com eles. Agradecer aos professores que de
uma forma ou de outra, me impulsionaram a uma sede cada vez
maior por conhecimento.
Quero agradecer a minha querida orientadora Maira Orlanda
Pinassi, que desde a graduação – por dois anos já vinha
acompanhado minha trajetória neste tema tão instigante, e na pós-
graduação me recebeu de braços abertos após tortuosos contra-
tempos. Agradecê-la por me orientar a respeito dos limites de
cada passo e me ajudar a encontrar o caminho possível.
A alguns professores gostaria de agradecer em destaque, pois
foram mais do que isso. Foram pessoas especiais com quem pude
dialogar e debater questões cruciais para meu próprio
aprendizado. Entre eles estão: Felipe Luiz Gomes, Adilson
Marques Gennari, Ivo Tonet, Sergio Lessa, Ricardo Antunes,
Maria Ribeiro do Valle, entre outros que por ventura me escapa
agora a memória.
Quero agradecer ao meu amado companheiro Marcelo
Gomes, que por nenhuma vez deu me respostas as minhas
questões, mas fez questão que eu percorresse o caminho mais
difícil e tortuoso para encontrá-las, para que eu realmente
aprendesse. Quero agradecê-lo pela paciência com meu
desespero e pela dureza com minha insanidade – insanidade, cujo
caminho científico suscita em nós. Agradecê-lo, por infinitas horas
de debates sobre Marxismo e horas conjuntas de estudo, como
tamm aos momentos inefáveis de prazer.
Gostaria de agradecer aos meus queridos e amados amigos,
que sempre estiveram presentes em todos os momentos dessa
pesquisa. Primeiramente gostaria de agradecer ao nosso grupo
“hospiciano” de estudo marxista, composto por Thiago de Oliveira
Ferreira, Romildo dos Santos Silva, Marcelo Gomes e eu, por
horas infinitas de dúvidas e reflexões marxianas, que geraram
debates acalorados sempre noite adentro.
Queria agradecer as minhas queridas e eternas amigas, na
figura de Itaiana Battoni, Meiriellen, Lessandra Carvalho, Tatiana
Cunha e Katiuscy Ivy da Silva, que me ampararam quando as
forças me faltavam, me acolheram e me colocaram em pé quando
a força da gravidade me forçava para baixo, a elas serei sempre
grata pela amizade e carinho neste momento tão importante de
minha vida.
Agradecer ao grupo de estudos marxista que compomos em
São José do Rio Preto, pelos domingos matinais cheios de
estudos e pesquisas sobre o pensamento de Karl Marx e Friedrich
Engels, agradecer pelo companheirismo, pela paciência e
dedicação dos camaradas Katiuscy Ivy, Celso Ricardo, Marcos
Eduardo, Jéssica, Marcelo Boreato, Tricya e Hélio, como também
aos camaradas do segundo módulo. Agradecer pelos debates
propiciados através do Brado informativo, e que por meio do qual
pude estabelecer contatos com camaradas com Jean Menezes,
Jorge Luis Jorge, entre outros tão importantes para crescimento
do debate na esquerda.
Quero agradecer a minha segunda família, que me socorreu
quando mais me faltou força, me adotou, me animou, e não me
deixou desistir – quando tudo contribuía para isso. Esta família a
qual me refiro é a do meu querido companheiro, que na figura de
Carlos Alberto Gomes e Darci Antunes Gomes não pouparam
esforços para me sentir melhor a cada dia, e me receberam como
a uma filha em seus corações. Muito obrigada por tudo.
Ainda nesta família quero agradecer a todos os tios e primos
que me ajudaram de alguma forma, ao meu cunhado Carlinhos e
minha cunhada Carol, pelas várias vezes de uso do computador
quando eu estava sem. Agradecer ao primo Rodrigo (Trosquilas),
que me ajudou com uma das partes burocráticas.
Quero agradecer a casualidade, por ter me possibilitado surgir
em meio a minha amada família, e ter podido ser irmã de meu
querido e amado irmão Richard Batista de Andrade, que
compartilhou comigo toda alegria e dor dessa vida. Dor
principalmente pela perda de nossa amada mãe. Agradecer ao
meu pai que sempre esteve presente em diversos momentos
desta pesquisa.
Mas principalmente agradecer a minha amada Mãe (Maria
Esmeralda Campanholo Batista de Andrade), que me ensinou a
nunca desistir mesmo que a batalha parecesse impossível,
agradecer a ela que criou em mim a esperança de chegar ao final
de pé e lutando, e com a certeza de estar do lado certo sempre.
Agradecer por ter me ensinado que o mundo é criado pelo homem
e que o homem deve transformá-lo em um lugar melhor. Em sua
memória agradeço por me dar o norte para minhas realizações, e
por todo seu amor. Muito obrigada por tudo, mamãe!
RESUMO
Este trabalho tem como objeto de pesquisa a análise das induções objetivas e
subjetivas provocadas pelo capital através da manipulação das mercadorias. Ou
seja, o objetivo dessa pesquisa foi tentar entender como foram e são utilizadas as
medidas estratégicas de aceleração da circulação econômica da mercadoria, em
específico: 1. a questão dos caminhos tomados pela publicidade para realçar a
estética da mercadoria e impulsionar o consumidor ao mercado, e 2. a questão da
taxa de utilização decrescente do valor de uso da mercadoria, que corresponde ao
processo de obsolescência dos produtos, gerando a descartabilidade e
impulsionando o consumidor a novas aquisições por meio da relação de troca.É
nesse processo que se dará então a subsunção das necessidades humanas pelas
necessidades de reprodução do capital. É de conhecimento de todos que estudam
criticamente o capitalismo que seu processo de produção já inverte esta relão
de necessidades. Neste caso, o objetivo da produção capitalista não é o valor de
uso, mas o valor de troca. Para atingir seu objetivo de valorização e reprodução, o
capital utiliza-se de diversas formas de obsolescência para induzir os homens ao
consumo, encurtando assim o ciclo produtivo do capital. Desse modo, norteado
pela lógica da lucratividade, seja um vaso de flores ou uma granada de mão, seja
na satisfação de necessidades básicas ou na guerra, o capital indistintamente só
vislumbra possibilidades de sua reprodução. Fazendo com que sua vida útil seja
reduzida, os bens duráveis se desgastam mais rapidamente e o capital tem um
aumento artificial na demanda. O que nos chama a atenção para a análise é o fato
de que a destruição — do ponto de vista humano — é considerada como fonte de
crescimento e reprodução do ponto de vista do capital. Aparecendo
constantemente aliado a este fator, temos tamm a manipulação das
necessidades promovidas por esta estrutura. Neste sentido, o estudo da regulação
das vontades pessoais é um imperativo para o capital otimizar sua taxa de
reprodução. Dito por outras palavras, este trabalho analisa as manipulações
provocadas nas mercadorias pelo capital, induzindo assim artificialmente o
consumidor ao mercado. Destarte, tanto a taxa de utilização decrescente (indução
objetiva) quanto a manipulação das necessidades do indivíduo pela estética da
mercadoria (indução subjetiva), concretizam a inversão de que falamos. Neste
caso, não é mais a produção que está a serviço do consumo, mas o consumo que
está a serviço da produção e reprodução do capital.
Palavras – chave: mercadoria, estética da mercadoria, obsolescência, consumo,
estratégias publicitárias, aceleração econômica.
Abstract
This work has as research object the analyse of the objective inductions and
subjective provide by capital through the manipulation of the merchandise. So, the
objective these research was to tempt understand as had been and are utilizeds
the strategical measures of acceleration of the economic circulation of the
merchandise, in specific: 1. the question of paths required by publicity to raise the
aesthetic of the merchandise and excite the distressing to the market, and 2. the
question of the rate of decreasing use of the value of use of the merchandise, that
correspond to the process of the obsolecense of the products, creating the
discarding and exciting the distressing the new acquisitions through exchange
relation`s. I`ts in this process so that will succeed the submission of the necessities
human beings for the necessities of reproduction of the capital. I`ts of the
knowledge of all that study the capitalism criticalment that your process of
production already invert this ralation of necessities. Thus, the objective of
production capitalist it is not use value`s, but the exchange value`s. For to reach
your objective of valuation and reproduction, the capital utilize itself of the forms
several of obsolecense for induce the men to the consumption, restraing so the
cycle productive of capital. Thus, guided by logic of the profitability, whether a vase
flowers or a hand grenade, whether in the satisfation of the necessities basic or in
the war, the capital only indistinctment faintly possibilities of the your reproduction.
Making with that his useful life whether reduced, the properties durable itself
consume more quickly and the capital have a artificial addition of the demand.
What that call us the atention for the analyse is the fact of that the destruction – of
the human point view – is considered like source of increasing and reproduction of
the capital point view. Appearing allied loyalment to this factor, we have also the
manipulation of needs provided for this structure. Thus, the study of the regulation
of the personal desires is a imperative for the capital to better his rate of the
reproduction. Said in other words, this work analyse the manipulations provided in
the goods by capital, inducing artificialment so the disstressing to the market. So,
as much the rate of utilization decreasing (objective inductions) how the
manipulation of necessities of individual by aesthetic of the merchandise
(subjective induction), they materialize the inversion of that we speak. Thus, it is
not more the production that it is the service of consumption, but the consumption
that it is the service of production and reproduction of the capital.
Key-words: commodity, aesthetic of commodity, obsolecense, consumption,
publicity strategies, economic acceleration.
SUMÁRIO
Introdução...................................................................................................12
Parte 1
Reflexões a respeito da produção material e simbólica da
mercadoria..................................................................................................15
1. A Questão da necessidade.......................................................................16
2. Produção e Circulação.............................................................................22
Parte 2
Estratégias Mercadológicas, Para Acelerar A Circulação
Econômica...................................................................................................26
1. Estética da mercadoria.............................................................................29
2. A emoção a servo da economia – o papel da publicidade e da psicologia
na relação de troca.......................................................................................35
2.01 As promessas infinitas da publicidade através dos meios de
comunicação................................................................................................39
2.02 Motivar para
comprar.......................................................................................................45
2.03 Crianças e entretenimento....................................................................49
2.04 A questão do belo, na exploração estética da indução ao consumo....56
3. A análise sobre a exploração da estética da mercadoria na Alemanha, a
partir dos anos 30.........................................................................................59
Parte 3
Desenvolvimento tecnológico como força motriz do movimento
econômico..................................................................................................63
1. Complexo militar.......................................................................................65
Parte 4
Obsolescência..........................................................................................70
1. Estética da mercadoria e obsolescência da desejabilidade...................77
2. Obsolescência de função.......................................................................81
3. Obsolescência da qualidade.
............................................................86
Parte 5
Publicidade no pós-guerra (45-65) – educando o trabalhador para o
consumo....................................................................................................92
1. Após os anos 70....................................................................................104
Conclusão................................................................................................109
Referência Bibliográfica.........................................................................113
12
Introdução
Este trabalho tem a expectativa de trazer luz ao entendimento do trajeto
percorrido pela economia, para que se efetue a realização do valor de uma
mercadoria, e o punctum saliens, dessa pesquisa foi entender como foram e são
utilizadas as medidas estratégicas de aceleração da circulação econômica da
mercadoria, em específico: 1. a questão dos caminhos tomados pela publicidade
para realçar a estética da mercadoria e impulsionar o consumidor ao mercado, e
2. a questão da taxa de utilização decrescente do valor de uso da mercadoria, que
corresponde ao processo de obsolescência dos produtos, gerando a
descartabilidade e impulsionando o consumidor a novas aquisições por meio da
relação de troca.
Para entender como funciona a essência desse movimento econômico
procuramos primeiro observar onde e quando estavam ocorrendo tais estratégias.
Pois a administração científica dos movimentos e do tempo do trabalhador passou
a ser utilizada tamm em seus momentos de ociosidade. Ou seja, o uso efetivo
da educação do trabalhador no chão de fábrica, que havia permitido ao capital
uma grande ampliação de seu processo produtivo e de sua própria realização,
passou a ser utilizado tamm nos tempos e movimentos fora do trabalho.
Construindo assim a perfeita realização do processo de produção e distribuição de
mercadorias.
Destarte, torna-se cada vez mais evidente a ampliação da administração do
capital em nossas vidas como observamos no comentário abaixo:
[...] hoje, é a totalidade de nossas vidas que é assim minuciosamente
ordenada a partir do exterior. Pela primeira vez, o homem parece
totalmente espoliado de si mesmo. Isso coincide, aliás, com a
espoliação do tempo (característica do proletário, segundo Marx) – o
homem moderno está tomando uma ocupação permanente, inclusive
a do lazer, nunca pode distanciar-se, refletir sobre sua condição; mas
também a relação com as administrações, que lhe toma um tempo
considerável, e o tempo jamais teve tão pouca importância, na sua
qualidade de vida, mas também na sua realidade natural. O homem
ganha cada vez mais tempo e, no entanto, seu tempo é cada vez
mais absorvido pelas atividades sociais. (ELLUL, 1985, p.202).
13
Ou seja, como havíamos percebido desde nossos primeiros contatos com
estes fenômenos econômicos, o homem serve como mola mestra na relação
produção e reprodução do capitalismo, e seu papel é exercido dentro e fora do
mundo do trabalho. O mundo do consumo imprime sobre ele o peso da
reprodução do capital num movimento tão alucinante que não lhe sobra tempo
para observar sua própria condição de “explorado” e “escravizado” do sistema.
Dessa forma, acreditamos que as observações por nós constadas por meio
dos autores que consultamos, sirvam de grande ajuda para apreender como foi se
concretizando, principalmente no pós II guerra, a aplicação das estratégias
econômicas que visavam impulsionar as relações de troca. Por intermédio dos
autores, conseguimos informações preciosas no que diz respeito a invasão do
nosso cotidiano pela persuasão das campanhas de vendas, e como nosso
momento de lazer deixou de nos pertencer e passou a ser mais um momento de
realização do capital por meio de nossas ações por ele programadas.
Sobre este tema Jacques Ellul, em seu livro Mudar de Revolução diz:
[...] que o lazer não é mais a possibilidade de um olhar distanciado,
mas outra absorção de tempo vivo que se torna atividade
insignificante. O divertimento é a outra face disso: toda atividade de
nossa sociedade parece ter por objetivo primordial impedir a tomada
de consciência da realidade, da situação de nossa vida. Divertimento
no sentido pascaliano: é preciso impedir que o olhar possa fixar neste
ponto. De ser desviado por muitos espetáculos, atrações, maravilhas.
É preciso a todo custo evitar uma tomada de consciência. Seremos,
então, enredados num bombardeamento múltiplo e complexo:
recebemos um conjunto de satisfações imaginárias, extremamente
gratificantes e valorizantes (espetáculo e viagem), que a publicidade
nos faz registrar como nossa verdadeira vida, consumimos símbolos
também valorizantes e significantes (cf. Baudrillard), temos acesso a
uma cultura (falsa, radicalmente falsa) que nos é distribuída e que,
pelo luxo dos meios, apaga nossas próprias possibilidades de criar
uma verdadeira cultura (tão mais mesquinha, medíocre em
comparação àquela que nos é oferecida a partir de todas as
direções...), temos acesso aos poucos a uma espécie de utopia
sonhada, e o menor choque (o aumento do preço da gasolina!)
aparece como um escândalo inimaginável, um intolerável atentado
neste universo de sonho acolchoado que só pode ser o nosso se
atingimos os meios deslumbrantes das técnicas modernas. (ELLUL,
1985, p.203)
Procuramos ainda entender como nossas necessidades passaram a ser
alvo para ampliação do sistema – alvo que constantemente é metralhado por
14
estímulos, que fazem surgir novas necessidades, novas carências etc que só
poderão ser saciadas pelas mercadorias – mercadorias estas que nos são
apresentadas como soluções de problemas que a nós foram colocados.
Nossas preocupações se balizaram em duas questões que podem ser
analisadas separadamente, mas que na maioria das vezes são aplicadas
conjuntamente: a efemeridade das mercadorias e a super elaboração da estética
destas. O que elas possuem em comum é o fato de serem estratégias econômicas
que têm o poder de lançar o consumidor ao mercado de maneira acelerada.
Desejos são estimulados para que a “produção” passe a ser
“imediatamente consumo” (MARX, 1974), criando uma verdadeira bola de neve
que age de forma reversa. Quanto mais necessidades, mais consumo e quanto
mais consumo, mais necessidades. Percebemos que essas duas formas de
estratégias guiadas para realização do capital, iniciaram sua utilização
conjuntamente de maneira intensificada no período de expansão do capitalismo e
no momento de ampliação do imperialismo americano. Por isso, nossos estudos
foram centrados no entendimento do processo que se efetivou no interior dos
Estados Unidos.
Em um de nossos tópicos trabalharemos sobre as transformações sofridas
pela força-de-trabalho, que por ser uma espécie de mercadoria tamm sofreu a
mesma pressão da obsolescência e da exploração estética. Esta seção será
trabalhada apenas para demonstração de que uma lei econômica age sobre toda
e qualquer mercadoria dentro do sistema.
Nosso trabalho, portanto, consistirá em demonstrar que a necessidade que
foi o motivo fundamental que permitiu ao homem o aprimoramento cientifico e
tecnológico, ao ser usada como alvo de reprodução do capital, aprisionou o
homem ao reino das mercadorias, e a partir de então o homem só se reconhece e
se autovaloriza ao possuí-las.
15
Parte 1
Reflexões a respeito da produção material e simbólica da
mercadoria
Pudemos perceber através de nossa pesquisa que a constituição da
mercadoria faz parte de um processo de construção que une o material ao
simbólico. Assim sendo, o resultado desta união é a mercadoria pronta para ser
consumida no mercado, já agraciada pela produção material e pela produção
simbólica trabalhada pela publicidade, que de uma forma peculiar “educa” o
consumidor a consumir o novo produto.
Através dos diversos autores que estudamos pudemos verificar que nosso
objeto de pesquisa era abordado pela economia, pela psicologia, pela sociologia,
bem como pelo setor administrativo – que através do departamento de marketing,
entre outras ações, promove as estratégias de publicidade e propaganda.
A pergunta crucial de nossos estudos era se a estética da mercadoria e a
obsolescência planejada desta, promovia uma maior velocidade à circulação
econômica da mercadoria pelo interior do mercado. Para responder está questão
resolvemos entender exatamente como esses dois fenômenos aconteceram e em
que momento foram efetuados em grande intensidade e tamm em qual local
eles foram aplicados conjuntamente.
Destarte, aprofundamos nossos estudos sobre como isso ocorreu no
período pós-segunda Guerra Mundial, já que nele se constituiu o momento
singular do afloramento do consumo de bens duráveis e não duráveis de maneira
global e massificada, graças uma sistemática das técnicas de consumo e da
construção de uma “ideologia consumista”.
Nosso recorte geográfico se localizou na região dos Estados Unidos da
América, pois lá a intensidade do emprego desses dois fenômenos ocorrera de
maneira conjunta e anteriormente a outros lugares que tamm os empregaram
separadamente. Como é o caso da Alemanha que tamm será apresentado por
nós de forma figurativa, para exemplificar que lá – como em outros países –
16
tamm estavam sendo empregadas essas estratégias de forma similar –
respeitando as especificidades locais e sua própria história.
Verificamos como as estratégias de vendas patrocinadas pelo setor de
publicidade e propaganda produziram no produto uma “áurea mágica”, muito além
de seu próprio valor de uso imanente. E tentamos mostrar que essa “áurea” deriva
da construção simbólica que abriu espaço às necessidades psicológicas
produzidas pelo capital, e acabaram se transformando nas necessidades do
“espírito” como dizia Marx e Engels na Ideologia Alemã.
Por fim, na última parte do trabalho iremos demonstrar o processo de
obsolescência que recai sobre a mercadoria e como isso foi e ainda é empregado
– no interior dos EUA, quando então explicaremos quando ocorreu a união da
aplicação das duas estratégias de indução ao consumo. Ou seja, quando e como
de maneira conjunta ocorreu a exploração da estética da mercadoria realizada
pela promoção publicitária de vendas e a aplicação da obsolescência da
mercadoria com intuito de acelerar circulação econômica da mercadoria.
Passaremos agora a explanar sobre a questão da necessidade e de sua
produção, bem como a produção da mercadoria e sua circulação.
1. A Questão da Necessidade
Para Karl Marx, a realização da necessidade se apresenta como o
potencial que permitiu ao homem se desenvolver e alcançar o mais elevado grau
de humanização. Pois, por vir ao mundo desprovido de acessórios que lhe
ajudassem na constante luta com a natureza, o homem por necessidade, criou
ferramentas – através de sua capacidade física e mental – e foi esta necessidade
imperiosa de criações que impeliu o surgimento de ser específico distinto de todos
os outros. E isso possibilitou, um desenvolvimento ao extremo de sua capacidade
teleológica, ou seja, o ato de pensar antes de executar uma ação. E isso não só
lhe conferia um caráter genérico e distinto dos outros animais, mas também
permitiu a ele recriar o mundo inteiro a sua volta. Nós humanos, portanto, não
17
fomos adaptados à natureza como qualquer outro animal, adaptamo-la, as nossas
necessidades, humanizamos tudo ao nosso toque e,destarte, a nós mesmos.
Desprovidos de garras retráteis, dentes afiados, visão aguçada, asas,
venenos de defesa etc, o ser humano foi obrigado a recriar a seu favor tudo isso
com sua racionalidade. Como evidência de tudo isso, basta-nos lembrar que
aviões, balões nos possibilitam alçarmos vôo; facas, lanças, flechas e armas de
fogo possibilitam abater qualquer animal ou defendermo-nos deles; óculos,
binóculos, lentes de todos os tipos nos permitem alcançar visões além do alcance
natural; e o veneno – cuja origem vem da palavra grega pharmacon, que significa
tanto veneno como remédio – conseguimos usá-lo a nosso favor transformando-o
em anti-veneno e em remédios para diversos tipos de doenças que nos
ameaçavam e ameaçam.
Em seu livro O Capital no capitulo V, Marx disse que “o homem é um ser
natural”, mas, por sua capacidade teleológica, difere a limine dos outros animais.
Como podemos ver a seguir,
Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a
abelha envergonha mais de um arquiteto humano com a construção
dos favos de suas colméias. Mas, o que distingue, de antemão, o pior
arquiteto da melhor abelha é que ele construiu o favo em sua cabeça,
antes de construí-lo em cera. No fim do trabalho obtém-se um
resultado que já no início deste existiu na imaginação do trabalhado,
e portanto idealmente. Ele não apenas efetua uma transformão da
forma da matéria natural; realiza, ao mesmo tempo, na matéria
natural seu objetivo, que ele sabe que determina, como lei, a espécie
e o modo de sua atividade e ao subordinar a sua vontade essa
subordinação não é um ato isolado. Além do esforço dos órgãos que
trabalham, é exigida a vontade orientada a um fim, que se manifesta
como atenção durante todo o tempo de trabalho[...] (MARX, 1985,
p.150)
Em sua atividade prática o homem impulsionado por suas necessidades
modifica a natureza, criando mediações para satisfazê-las. Uma vez que estas
carências são saciadas outras surgirão e, desse modo, amplia-se o reino de
conhecimento sobre seu meio e sobre os objetos que o circundam, como
podemos ver abaixo:
Graças à universalidade que caracteriza a atividade laborativa
humana do homem, 1) todo objeto torna-se objeto do agir humano; 2)
o homem introduz cada vez mais os objetos singulares em uma
18
conexão ativa com outros objetos; 3) ao adquirir novas necessidades
e ao desenvolver novos modos de produção, o homem explicita essa
atividade num terreno inteiramente novo e no interior de novas
conexões (por exemplo, através dos experimentos científicos). Tudo
isso tem como resultado que o homem chega a um conhecimento
cada vez maior do mundo dos objetos. (MARKUS, 1974, p. 63)
Mas é na Ideologia Alemã que Marx e Engels – ao trabalharem o capítulo
sobre Feuerbach – irão explicitar a questão do primeiro ato histórico surgir com a
produção dos meios que permitem satisfazer as necessidades humanas. Contudo,
para que o homem possa fazer história há como pré-condição ter satisfeito suas
necessidades primárias. Pois, segundo os autores, “o primeiro facto histórico é
pois a produção dos meios que permitem satisfazer suas necessidades, a
produção da própria vida material” (MARX & ENGELS, 1974, p. 33), e o segundo
ponto que eles consideram “é que satisfeita a primeira necessidade, a ação de a
satisfazer e o instrumento utilizado para tal conduzem a novas necessidades”
(MARX & ENGELS, 1974, p. 34).
E na terceira consideração,
[...] o aspecto que intervém directamente no desenvolvimento histórico
é o facto de os homens, a cada dia renovam a sua própria vida, ao
criarem outros homens, reproduzirem-se; é a relação entre o homem
e a mulher, os pais e os filhos, a família. Esta família, que é
inicialmente a única relação social, transforma-se numa relação
subalterna [...] quando o acréscimo das necessidades engendra
novas relações sociais e o acréscimo da população dá origem a
novas necessidades [...] (MARX & ENGELS, 196-?, p. 34)
Estes três momentos ocorreram simultaneamente desde o início e a
produção da vida surge com uma relação dupla, uma através do trabalho e outra
através da procriação, ou seja, ”por um lado como relação natural e, por outro,
como uma relação social – social no sentido de acção conjugada de vários
indivíduos [...]”.(MARX & ENGELS, 1974, p. 34)
Desde o início mostra-se, portanto, uma conexão materialista dos
homens entre si, condicionada pelas necessidades e pelo modo de
produção, conexão esta que é tão antiga quanto os próprios homens
– que toma incessantemente, novas formas e apresenta, portanto
uma história [...] (MARX & ENGELS, 1996, p. 42)
Então é por meio da ação humana, mediada pelo pôr teleológico, que o
homem em sua práxis transforma a natureza e é transformado por ela. Desta
19
relação surgem novas necessidades, e esta transformação do homem e da
natureza se dá por meio do trabalho.
Através do trabalho o homem media, regula e controla seu
metabolismo com a natureza [...] Ele põe em movimento as forças
naturais pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e
mão, a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para
sua vida (MARX, 1997, p.149).
Mészáros ipso litteris, em sua obra: Filosofia, Ideologia e Ciência Social
trabalha com a questão sobre a necessidade, no capitulo IV. Nele o autor percorre
as idéias dos filósofos Kant, Hegel e Marx sobre o tema apontado, e fala sobre o
imprescindível enfrentamento de dada questão “no sentido de se delimitar a
fronteira entre a necessidade natural e social” (MÉSZÁROS, 1993, p. 192 – grifo
nosso).
As necessidades, como vimos, tendem a se multiplicar e o homem é
impulsionando por elas a encontrar respostas que possam saciá-las. Ao fazer isso
por meio de seu trabalho ele cria possibilidade para seu próprio desenvolvimento.
Como disse Lukács, em sua obra As Bases Ontológicas do Pensamento e da
Atividade do Homem, “[...] o animal é formado homem através do trabalho, como
um ser que dá respostas [...] é inegável que toda atividade laborativa surge como
solução de respostas ao carecimento que a provoca” (LUKÁCS, 1978, p.39).
Segundo Marx, as carências sociais resultam da produção e das relações
sociais, e a riqueza da sociedade se assenta na proliferação dessas carências
produzidas socialmente. Por isso, o caráter da necessidade histórica é mutável, já
que é resultado do processo histórico, diferente da carência natural, que se refere
ao individuo reduzido a sujeito natural apenas com necessidades primárias.
Ao adaptar a natureza às suas necessidades o homem possibilitou um
grande salto racional à sua existência. Em resumo, por meio do trabalho o homem
encontrou condições para realizar suas necessidades – ao concretizar produtos
utilizando mediações, fruto de sua capacidade teleológica. Dessa forma ampliou
seus conhecimentos “[...] obtidos sobre as finalidades e os meios de efetivação do
trabalho” (LUKÁCS, 1978, p.9), por meio de um longo processo histórico e
dialético.
20
O produto de seu trabalho – que visava saciar suas necessidades –
continha uma utilidade específica que foi denominada por Marx como valor de uso
do produto. Todos os produtos, portanto, possuem valores-de-uso que servem
“[...] para satisfazer as necessidades humanas de qualquer natureza” (MARX, p.
36, 1997). Com o desenvolvimento histórico houve a ampliação das relações
sociais e dessa maneira houve a proliferação das necessidades, e isso ocorreu
devido às trocas de experiências e de produtos entre os homens. Esta “[...]
conexão material dos homens entre si [...], foi [...] condicionada pelas
necessidades e pelo modo de produção [...]” (MARX, 1996. P. 47). Para que os
produtos pudessem ser trocados entre si, precisavam possuir um valor – um valor
de troca, que igualasse os diferentes produtos do trabalho humano. E é por meio
do tempo de trabalho socialmente necessário gasto para produzir cada produto
que Marx diz ocorrer o processo de valorização das mercadorias. Vejamos em
suas próprias palavras o que ele diz a respeito de valor de uso e do valor de troca.
Os valores-de-uso só se realizam pelo uso ou pelo consumo.
Constituem o conteúdo material da riqueza, qualquer que seja a
forma social dessa riqueza. Na sociedade que nos propomos
examinar, são, ao mesmo tempo, os suportes materiais do valor-de-
troca. O valor-de-troca surge, antes de tudo, como a relação
quantitativa, a proporção em que valores-de-uso de espécie diferente
se trocam entre si, relação que varia constantemente com o tempo e
o lugar. O valor-de-troca parece, portanto, qualquer coisa de arbitrário
e de puramente relativo; um valor-de-troca intrínseco, imanente à
mercadoria, parece ser, como diz a escola, uma contradictio in
adjecto”. (MARX, 1997, p. 46)
Os objetos deixaram de ser produzidos apenas para o uso do produtor, e
foram produzidos para fins de troca, e assim se concretizou a produção de
mercadorias. Ao encalço do processo de desenvolvimento econômico vieram as
contradições sociais dadas a partir das desigualdades dos homens em relação à
propriedade privada. Da mesma forma, o acesso às mercadorias tamm se deu
de forma diferenciada.
A realização da necessidade – que surgiu primeiramente como
“potencialidade” do desenvolvimento humano – no modo de produção capitalista,
apresenta-se subsumida à lógica expansionista de produção e reprodução do
capital. E as necessidades humanas, cumprem o papel de motor da realização do
21
capital, uma vez que toda produção de mercadorias está direcionada para produzir
estímulos que façam surgir novas necessidades, que só encontrarão a satisfação
nas mercadorias produzidas pelo próprio capital.
Segundo Mészáros, ao recordar o que Marx disse nos Grundrisse, as
carências sociais “[...] são elas próprias resultados da produção e das relações
sociais.” (MARX apud MÉSZÁROS, 1993, p. 183). E ainda diz que Marx chamava
essas novas carências produzidas, de necessidades geradas historicamente,
dizendo que “o que era ‘supérfluo’ se converteu em algo necessário” (MARX apud
SZÁROS, 1993, p. 193) no sistema capitalista. E que no processo de
desenvolvimento histórico o que era “necessário se torna historicamente obsoleto,
através da produção de novas carências” (MÉSZÁROS, 1993, p. 194).
As carências primárias vão se misturando com as necessidades sociais e
fundindo-se uma na outra, desse modo foi possível para a economia,
[...] defender a necessidade auto-impulsora do modo de produção
dominante como sendo ‘naturais’ e ‘absolutas’, decretando, assim a
‘naturalidade’ inquestionável dos apetites mais artificiais que surgem
das carências alienadas do valor de troca em auto-expansão.
(MÉSZÁROS, 1993, p.194).
A necessidade se tornou necessidade evanescente
1
(eine wascheindende
notwendigkeit), “a necessidade natural cede progressivamente seu lugar à
necessidade criada historicamente” (MÉSZÁROS, 1993, p.196) e, com a grande
expansão da capacidade produtiva, a necessidade histórica vai se tornando uma
necessidade potencialmente “descartável”, ou seja, ela “deve ser concebida como
inerentemente transitória” (MÉSZÁROS, 1993, p.198).
No capitalismo
A completa subordinação das necessidades humanas à reprodução
de valor de troca – no interesse da auto-realização ampliada do
capital – tem sido o traço marcante do sistema desde seu início
(MÉSZÁROS, 2002, p. 206).
Até aqui vimos de maneira sintetizada o que a teoria marxista diz sobre o
tema da necessidade humana e da potencialidade do papel que ela ocupa no
processo de humanização. Esse passo foi necessário para tratarmos da produção
1
Termo utilizado por István Mészáros, para identificar a necessidade histórica, no livro Filosofia,
Ideologia e Ciência Social - Ensaios de negação e afirmação. S. Paulo: Editora Ensaio,1993.
22
de necessidades que é realizada pelo capitalismo em escala cada vez mais
crescente, impulsionada ainda mais pelo desenvolvimento das forças produtivas.
Veremos agora, o que os nossos autores falam sobre a produção e a
circulação da mercadoria.
2. Produção e Circulação
A mercadoria cumpre um papel valioso em respeito ao funcionamento do
capitalismo, já que ela é o resultado concreto das necessidades humanas e é
sobre ela que o sistema capitalista pousa suas bases. E como Marx disse em sua
Crítica da Economia Política, “Sem necessidade não há produção. Ora o consumo
reproduz a necessidade” (MARX, 1974, p.115). E ainda,
Produção é consumo, consumo é produção [...]. Sem a produção não
há consumo; sem consumo não há produção. [...] Por outro lado a
produção motiva o consumo ao criar o modo determinado do
consumo, e originando em seguida do apetite do consumo a
faculdade de consumo sob a forma de necessidade. (MARX, 1974, p.
116)
Contudo, Mészáros – no capitulo XIV, denominado A Produção de
Riqueza e a Riqueza do Capital em sua obra Para Além do Capital alerta para a
submissão das necessidades aos imperativos do capital.
[...] a prática estabelecida da reprodução social, está subordinada aos
imperativos alienados da produção do capital sempre em expansão,
sem consideração das suas implicações para as necessidades
humanas.(MÉSZÁROS, 1993, p. 605, grifo nosso)
Ou seja, o sistema capitalista necessita fazer circular suas mercadorias, e
ele concretiza essa necessidade através da submissão das necessidades
humanas à sua lógica. Para realizar esse intento ele utiliza todos os tipos de
profissionais e diversas formas de estratégias.
Ao subsumir as necessidades ao círculo econômico, a circulação passa a
ser o alvo do sistema produtivo e reprodutivo do capital, pois “a velocidade de
circulação é de maior importância para o capital, já que depende dela a velocidade
23
do processo de produção e, como decorrência, senão os próprios valores [...], até
certo ponto, a massa dos valores”. (MARX apud ROSDOLSKY, 2001, p.281-282)
[...] é verdade que o desenvolvimento da produção capitalista “requer
que o círculo de consumo se expanda no interior da circulação como
o fez previamente o círculo produtivo”, um equivalente funcional
preferível está a disposição do capital na forma de aceleração da
velocidade da circulação dentro do próprio círculo de consumo
(aumentando o número de transações no círculo já existente) em vez
de embarcar na aventura mais complicada e arriscada de alargar o
próprio círculo. (MÉSZÁROS, 2002, p.62)
Mas com diria Rosdolsky, “o tempo de circulação não acrescenta nada ao
valor [...], não é o tempo de circulação que cria valor [...]”, mas “é o tempo de
trabalho”. (ROSDOLSKY, 2001, p.283). Os estudos econômicos foram
direcionados na tentativa de fazer expandir este círculo de consumo no interior da
circulação, aumentando o número de transações. E para isso surgiram diversos
tipos de estratégias, duas delas vamos apresentar mais à frente neste trabalho.
[...] a tendência se faz sentir através da crescente velocidade da
circulação, que se torna necessária com o desdobramento do
“capitalismo de consumo”, visando compensar tanto quanto possível
nessas circunstâncias algumas das mais danosas tendências
negativas do desenvolvimento econômico. (MÉSZÁROS, 2002, p.44)
Contudo devemos ainda lembrar que para a mercadoria chegar ao ato de
valorização ela passa por dois tipos de circulação – como nos lembra Rosdolsky, a
circulação “espacial” ou “real”, e a circulação “econômica”. A primeira circulação
“espacial” ou “real’ está relacionada com o processo de deslocação física do
produto, ou seja, como ele chega até o mercado – através dos meios de
transporte – e, segundo ele, este tipo de circulação “integra [...] do ponto de vista
econômico [...] o processo de produção” (ROSDOLSKY, 2001, P.280), já que o
produto só assume seu papel como mercadoria no encontro com o mercado. E
esse movimento físico é anexado ao custo de produção, como mais um gasto na
composição da mercadoria.
A princípio o desenvolvimento da produção capitalista requeria que o círculo
de consumo se expandisse. Porém, segundo Mészáros, “um equivalente funcional
preferível está à disposição do capital na forma de aceleração da velocidade de
circulação dentro do próprio círculo de consumo (aumentando o número de
transações no círculo já existente)” (MÉSZÁROZ, 1989, p.108).
24
É por meio da relação de troca que a mercadoria cumpre seu papel no
círculo reprodutivo do capital, ou seja, concretiza a mais-valia ou o “lucro” para seu
produtor. E para que isso ocorra, a mercadoria necessita concluir seu percurso,
que se inicia: na aplicação do dinheiro (D) para sua produção e que após esta
produção ela (M) seja direcionada ao mercado para ser trocada novamente por
dinheiro (D) e este, por fim, retorne a ser aplicado na amplião da produção de
novas mercadorias, concluindo definitivamente o círculo reprodutivo econômico.
E é dessa forma que se concretiza a realização da mais-valia relativa,
A produção de mais-valia relativa, isto é, a produção de mais-valia
baseada no crescimento e desenvolvimento das forças produtivas
exige que o círculo de consumo no interior da circulação se amplie,
como previamente ocorreu com o círculo de produção. Primeiro a
ampliação quantitativa do consumo existente; segundo criação de
novas necessidades pela propagação das já existentes por um amplo
círculo; terceiro a produção de novas necessidades, e descobertas e
criação de novos valores-de-uso. (MARX apud MÉSZÁROS, 1989,
p.56)
A velocidade, portanto, passou a ser a marca fundamental do capitalismo,
pois quanto mais rápido ocorresse a realização do valor, mais rápido haveria a
reconversão do dinheiro em produção de novas mercadorias. Essa renovação das
mercadorias a serem consumidas deveria se dar tamm de forma mais veloz.
Através do desenvolvimento das forças produtivas houve a intensificação da
velocidade da produção das mercadorias. Contudo, para que estas pudessem
completar seu ciclo no mercado, precisavam ser consumidas tamm mais
rapidamente.
Para ganhar a concorrência foi necessário que as empresas tomassem
algumas medidas econômicas que pudessem criar inovações para estimular a
velocidade de circulação da mercadoria. Algumas dessas inovações ficaram
conhecidas como indução sistemática ao consumo por meio da exploração das
potencialidades da estética da mercadoria, realizadas pelas campanhas de
vendas produzidas pelas agências de publicidade. Outra inovação ficou conhecida
como estratégias planejadas de obsolescência.
A mercadoria, como nos recorda Mészáros em Para Além do Capital, era
marcada pela durabilidade, e quanto mais durável maior era a probabilidade de
25
efetuar a troca das mercadorias. Com o passar do tempo a durabilidade passou a
ser um “entrave” para a realização de troca, já que os produtos demoravam para
se gastar ou estragar. Dessa maneira, o encalhe era uma ameaça constante e
deveria ser contornado a qualquer custo.
A preocupação dos administradores econômicos centrou-se na circulação
econômica das mercadorias e começaram a pensar a esse respeito estimulados
pela concorrência. A expansão do capitalismo no pós-segunda guerra mundial,
juntamente com a expansão do modo de produção fordista, possibilitou um grande
desenvolvimento econômico para além dos oceanos – como disse Hobsbawm – e
a concorrência se tornou mais acirrada.
Agora poderemos observar como foi o emprego das estratégias
econômicas planejadas que trabalharam com a estética da mercadoria,
empregadas intensamente a partir do período pós-segunda-guerra mundial, usado
primeiramente nos Estados Unidos da América e posteriormente em âmbito
mundial. Posteriormente analisaremos a estratégia de obsolescência da
mercadoria e a ativação da aceleração de sua circulação.
26
Parte 2
Estratégias Mercadológicas, para acelerar a Circulação
Econômica
O desenvolvimento cientifico e tecnológico percorre um caminho que
por si é social, mesmo quando os achados científicos são usados de forma
maniqueísta – para o “bem” ou para o “mal”. A produção científica humana,
portanto, é resultado de “imediata expressão de sociabilidade
(Gesellschaftlichkeit)” (MARX, 2004, p.107)
Posto que também sou cientificamente ativo etc., uma atividade que
raramente posso realizar em comunidade imediata com outros, então
sou ativo socialmente, porque [o sou] enquanto homem. Não apenas
o material de minha atividade – como também a própria língua na
qual o pensador é ativo – me é dado como produto social, a minha
própria existência é atividade social; por isso, o que eu faço a partir de
mim para a sociedade, é com a consciência de mim como ser social.
(MARX, 2004, p.107)
Os achados científicos possibilitaram a comodidade ao homem,
menos dispêndio de energia e, portanto, maior possibilidade ao
aproveitamento da vida, graças ao processo histórico de desenvolvimento
humano. Contudo, sob o modo de produção capitalista, não é possível a
todos tirarem proveito desta vantagem, pois a divisão social do trabalho não
permite que todos tenham acesso a tudo da mesma maneira. Isso se dá a
partir do local que você ocupa nesta relação de produção.
Este modo de produção também não possibilita o emprego de todos
no mercado de trabalho e, em seu processo de desenvolvimento, gera um
exército industrial de reserva – que às vezes é chamado para compor a
frente de trabalho, mas na maioria das vezes não. Atualmente o capitalismo
passa por um processo de crise estrutural, na qual sua composição
orgânica cresce e despreza o emprego de mão-de-obra, gerando um
crescente número de desempregados. Dessa forma, a grande maioria das
vantagens encontradas neste longo caminho humano, fica restrito a uma
27
pequena parcela, que está beneficiada pela posição social que ocupa
dentro deste sistema.
Mas o desenvolvimento tecnológico e científico trazido a reboque do
desenvolvimento econômico, possibilitou grande parte da sociedade usufruir
as conquistas encontradas para sanar as necessidades humanas, que
muitas vezes são imperceptíveis se não pararmos para refletir sobre o tema.
Em nossos dias atuais, pequenos detalhes formam uma grande quantidade
de conquistas científicas e, portanto, sociais. Elas estão imersas em nosso
cotidiano por meio de bens de consumo duráveis ou não – em sua maioria,
estas conquistas, foram elaboradas com a intenção explícita de facilitar a
vida humana. Contudo todas as mercadorias estão sob o jugo do capital,
que elas se constituem no objeto que sem o qual não existiria a relação de
troca.
Sobre os milhares de objetos – que se tornaram mercadorias, com a
efetivação da relação de troca – pesam anos de pesquisas voltadas para o
aprimoramento destes produtos. Nesse processo de estudos voltados para
o objeto há um fator que é indispensável para as empresas, o fator custo e
benefício, e a partir dele é traçada a logística de produção e distribuição.
Para que um tal produto seja inserido no mercado é necessário uma
série de considerações. O que nosso trabalho pretende mostrar é que duas
dessas considerações – econômicas – colocadas em prática pelas
empresas estão imbricadas neste processo
2
– que tem por objetivo final a
realização do valor. Tais considerações têm por objetivo, ao nosso ver,
causar uma aceleração no processo de circulação econômica da
mercadoria, por isso foram empregadas desde o pós II Guerra Mundial de
maneira tão intensificada.
2
Processo de produção e reprodução capitalista que tem por objetivo final a realização do valor, ou
seja, da realização do excedente que foi empregado com a intenção de acumular capital e ampliar
a capacidade produtiva.
28
As duas considerações que falamos acima são elas: 1) a exploração das
características inatas do valor de uso da mercadoria, por meio de sua estética e a
ampliação de características que possam se ligar a mercadoria e motivar o
consumidor a possuí-la como se fosse um novo “valor de uso” direcionado a uma
satisfação psicológica produzida pelas agências de publicidade sobre o produto e
explicitado pelas campanhas de venda; 2) o aprimoramento da pesquisa, que leva
o produto a um tempo de vida menor, seja por meio de uma indução psicológica
direcionada ao consumidor, fazendo ele desejar o novo produto e deixar o antigo
de lado, seja por desenvolver cada vez mais novas funções nos produtos,
deixando ultrapassado o último lançamento do mês passado; e, por fim, seja por
desenvolver, por meio de pesquisas, um limite de uso ao produto, fazendo-o ficar
obsoleto por não mais apresentar eficiência em suas funções, deteriorando-se
intencionalmente.
Portanto vamos trabalhar agora o tema sobre a estética da mercadoria, e
aprofundaremos nossas observações sobre como as elaborações determinadas
pela força criativa e comunicativa da publicidade puderam alcançar o público
desejado pelas empresas, a ponto de até produzir padrões de comportamentos
consumistas. Iremos ver como isso ocorreu nos Estados Unidos da América no
“período de ouro” do capitalismo.
Acreditamos que esta foi uma estratégia clara utilizada dentro do âmbito
econômico para não permitir o encalhe de produtos, e dessa forma, acautelar-se
contra uma possível depressão – depressão, que poderia ser ocasionada pela
super produção de mercadorias. Basta recordarmos o que aconteceu no período
que vai de 45-65 nos EUA, período no qual o modelo fordista de produção se
deparava com tal possibilidade, gerada pela própria característica deste modelo
de produção – que era o de produção massificada. Neste período sua produção
era maior que a demanda e empurrar as mercadorias encalhadas nas prateleiras
ou no pátio das empresas foi possivelmente o único meio de evitar tal depressão.
Posteriormente esta estratégia da exploração estética foi utilizada para imprimir
necessidades e criar demanda num período de crise que se instalou por volta de
73 e vem até nossos dias.
29
1. Estética
3
da Mercadoria
A aparência da mercadoria tem necessariamente a função de agradar o
consumidor e arrebatá-lo ao mundo do consumo. Por isso, passaremos agora a
examinar como se efetivou a ampliação do emprego da elaboração estética da
mercadoria pela publicidade, e como pôde “padronizar completamente a
sensualidade humana ao mundo das coisas” (HAUG, 1996, p.16).
Desde a Grécia Antiga, a beleza é percebida como a harmonia das
formas, e essa harmonia passou a ser prerrogativa para todas as mercadorias. Ela
deveria agradar os sentidos humanos e se apresentar como uma “promessa
aparente” embutida na mercadoria que facilitaria a troca dos produtos.
No período do pós-guerra, as empresas recorreram às agências de
publicidade para que seus produtos pudessem se destacar dos demais – que
possuíam a mesma função e que exerciam o papel de concorrente no mercado. O
papel da publicidade era explicitar as qualidades dos produtos através de sua
estética, ou ainda, criar qualificações que “ampliassem” seu valor de uso.
Acreditamos que esta prática de explicitar a mercadoria passou a imprimir
velocidade e aceleração à reprodução do capital, pois passou a gerar demanda
artificial através dos estímulos direcionados à subjetividade do consumidor,
criando novas necessidades. O consumidor passou a ser conduzido ao mercado
por meio de estímulos “psicológicos” advindos de necessidades preparadas e
planejadas pelas campanhas de vendas – o belo, o diferente, o novo etc, tomou
destaque na preferência dos consumidores ao efetuar suas compras.
A intenção por meio da estética da mercadoria era arrebatar as sensações
humanas, criar fascinação, desejo e necessidades ou ainda despertar aquelas que
estivessem adormecidas. E através de uma aparência tecnicamente produzida, o
objetivo era – como diz Haug em seu livro A Critica da Estética da Mercadoria:
“causar apetites patológicos” (HAUG, 1996, p.140) para que ocorresse a relação
de troca.
3
A palavra estética – deriva do grego “aisthetikos” – aqui empregada é no sentido que se refere à
qualidade perceptiva, ou a aparência das coisas.
30
[...] (o capitalista) busca meios para impulsionar (os trabalhadores) ao
consumo, procura dar aos seus produtos novos encantos, inspirar
novas necessidades pela propaganda constante etc. (MARX apud
MÉSZÁROS, 1989, p.53)
Diferentes aspectos de um mesmo produto podiam agradar diferentes
tipos de pessoas, e simples detalhes que modificavam os corpos das mercadorias
eram usados para esse intento; mudanças em suas características, tais como cor,
textura, desenho etc, que possibilitavam satisfazer necessidades subjetivas
diversas. A prática de transformar apenas a aparência da mercadoria passou
então a ser muito empregada, como vemos na citação abaixo.
Os desenhistas modernos começaram a esfoar-se para empolgar o
público através de comparáveis modificações de estilos pelos seus
respectivos produtos dentro de um período de poucos anos [...] o
produtor pôde modificar o perfil, como acontece quando levanta ou
abaixa o rabo de peixe ou a barra da saia, ou alterar sua ênfase
básica de linhas verticais para horizontais [...].(PACKARD, 1975, p.66)
Para melhor entendermos o emprego da exploração da estética da
mercadoria, realizada com a intenção de acelerar a relação de troca, devemos
lembrar que por si o valor de uso já funcionava como impulso à compra: “A
aparência estética, o valor de uso prometido pela mercadoria, surge tamm como
função de venda autônoma no sistema de compra e venda [...]” (HAUG, 1996, p.
27). Mas com o aprimoramento das técnicas de propaganda, utilizadas para
evidenciar esse valor de uso e juntar a ele novas características, possibilitou a
ampliação das relações de troca.
O valor de uso estético prometido pela mercadoria torna-se então
instrumento para se obter dinheiro. [...] Nesse contexto, o aspecto
sensível torna-se portador de uma função econômica: o sujeito e o
objeto da fascinação economicamente funcional. Quem domina a
manifestação, domina as pessoas fascinadas mediante aos sentidos.
Desse modo desde de os primórdios do capitalismo, na relação de
interesses de troca, a tendência para a tecnocracia da sensualidade
situa-se economicamente na subordinação do valor de uso ao valor
de troca. Uma vez que, como desdobramento da produção privada de
mercadorias, produz se essencialmente valores de troca e não “meios
de sobrevivência” essencialmente sociais – meios para a satisfão
das necessidades –; uma vez que as qualidades das mercadorias,
que correspondem às necessidades dos futuros consumidores, não
passam, portanto de um meio para se atingir um fim – a realização do
valor de troca – vale o que o jovem Marx acentuou com veemência
nos Manuscritos parisienses: “todo produto é uma isca, com a qual se
pretende atrair para junto de si a essência do outro, seu dinheiro”, a
31
única coisa importante para o ponto de vista do valor de troca.
(HAUG, 1996, p. 27).
Por meio de nossos estudos observamos que nos EUA e em outros
países a prática de impulsionar os consumidores por meio da estética da
mercadoria, trabalhada e re-trabalhada intensamente pelo setor de publicidade,
passou a ser usada primeiramente na seção de vestuário e, posteriormente, foi
aplicada a todos os tipos de bens duráveis.
As sutis mudanças estéticas efetuadas nos corpos das mercadorias foram
posteriormente empregadas tamm às suas embalagens, o que importava era
enaltecer, ornamentar e às vezes até rebuscar o aspecto visual da mercadoria,
para chamar a atenção e criar o desejo de possuí-la.
Plásticos transparentes, brilhantes e opacos eram usados para dar um
charme a mais ao produto; os papéis com formas geométricas diferentes
permitiam criar uma nova aparência para uma mesma mercadoria.
[...] a diferenciação funcional prepara a libertação verdadeira, e a
superfície da mercadoria lindamente preparada torna-se a sua
embalagem, que não é pensada, porém, apenas como proteção
contra os perigos do transporte, mas como o verdadeiro rosto a ser
visto pelo comprador potencial, antes do corpo da mercadoria, e que
a envolve, tal como a filha do rei em seu vestido de plumas,
transformando-a visualmente, a fim de correr ao encontro do mercado
e de sua mudança de forma. (HAUG, 1996, p. 75 - grifo nosso)
Através ainda dos autores que estudamos para este trabalho percebemos
que a produção estética cada vez mais elaborada da mercadoria pelo setor de
publicidade – que foi adotada pela equipe econômica das empresas, e
intensificado no período do pós-guerra – foi utilizada com a intenção de imprimir
velocidade à aceleração da circulação econômica das mercadorias, visto que no
pós II Guerra começou despontar uma superprodução de bens duráveis de
consumo, e era necessário fazer circular este capital. Isso podemos ver no
comentário de Packard sobre este problema, na década de 50.
O consumo precisa crescer e continuar crescendo. Alguns
especialistas em vendas estiveram anunciando que o cidadão médio
terá de aumentar suas compras em quase 50 por cento nos próximos
doze anos ou a economia adoecerá. Em apenas uma década,
afirmam os homens de publicidade, o cidadão dos Estados Unidos
terá de melhorar seu nível de consumo na mesma escala em que
32
seus antepassados conseguiram melhorá-lo em duzentos anos,
desde o período colonial até 1939.
As recentes exortões ao aumento do consumo foram inspiradas por
enormes estoques de mercadorias, que por sua vez são causadas
principalmente por dois fatores. Um deles é a crescente eficiência da
força produtiva dos Estados Unidos, graças em grande parte pela
introdução de equipamento automatizado nos escritórios e fábricas de
quase cem mil companhias americanas. No período de após-guerra, a
quantidade de mercadorias e servos que um homem pode produzir
em uma hora aumentou em cerca de 3 por cento cada ano. Essa
produção aumentada só pode ser absorvida se cada cidadão
consumir mais ou se houver, cada ano, maior número de cidadãos.
Em caso contrário, haverá menos trabalho.
Outro fator é a grande expansão das instalações produtoras dos
Estados Unidos, baseada na convicção existente nas salas de
diretoria de que o público pode ser induzido a consumir mais cada
ano que passa. (PACKARD,1965, p. 10)
Aparência do produto como tamm de sua embalagem, se tornaram
muito importantes para a concretizão desta marcha contínua do capital.
Segundo Silva, em sua tese O Gosto da Embalagem, “[...] a embalagem substituí
o argumento do vendedor, e interage com o consumidor dialogando como se fosse
o vendedor [...]” ela ainda “[...] é o último e o único vendedor da empresa no
momento crítico da decio”. (SILVA, 2001, p.9)
As campanhas de venda enalteciam as cores para que os consumidores
efetuassem suas compras de forma já direcionada; e tamm criavam padrões
que deviam ser empregados nas casas para realçá-las, de acordo com a última
tendência lançada pelo mercado. Como vemos abaixo;
O conceito de “combinações” de cor para aumentar vendas foi
também usado na promão de acessórios domésticos. Um porta-voz
da companhia de tecidos Kleenex anunciou através de uma cadeia de
televisão que “existe uma cor para cada aposento de sua casa”. E a
Bell System procurou ter maior número de extensões telefônicas em
cada casa pelo mesmo conceito de que “existe uma cor para cada
aposento”. A American Telegraph and Telephone concitou mesmo as
famílias a instalarem em suas casas, para uma maior comodidade,
uma segunda linha telefônica, inteiramente nova. Um funcionário de
uma companhia telefônica do Média Oeste falou-me sobre um estudo
feito em motéis que demonstrou ser possível aumentar em cerca de
20 por cento o números de telefonemas pelo uso de aparelhos
coloridos em lugar dos convencionais aparelhos pretos.
Aparentemente as cores brilhantes provocam o impulso de telefonar
para alguém pelo prazer de telefonar. (PACKARD, 1965, p. 29)
33
A atenção direcionada à estética da mercadoria, ou seja, de sua qualidade
perceptiva, foi cada vez mais trabalhada através da propaganda e da
publicidade, e por meio delas as mercadorias se transformaram em algo
necessário para o dia-a-dia do homem. Através de sua imagem – sua estética –
foram traçados parâmetros e modelos a serem seguidos por todos os
consumidores, obrigando-os veladamente a uma inclusão necessária ao
sistema a partir do ato de compra da mercadoria.
Houve então a intensificação do apelo deliberado à exploração do lado
sensível do homem, por meio da procriação de impulsos que visavam atingir as
necessidades humanas, mesmo as que estivessem adormecidas
4
. Isso foi
concretizado, graças aos meios de comunicação de massa que estabeleceram
essa ligação entre o mundo produtivo e o reprodutivo do capital, efetuado pela
movimentação da circulação econômica.
Sabemos que essa espoliação sobre a estética da mercadoria ou sobre os
benefícios de seu valor de uso
5
, não são novidades do capitalismo “atual”, apenas
aparece agora de maneira mais ativa, ou seja, inventaram “novas penúrias e
novas carências, novos luxos e novas pobrezas, deliberadamente,
sistematicamente, de acordo com a necessidade de rentabilidade e de
crescimento do Capital” (GORZ, 1987, p.142).
Os produtores deram cada vez mais atenção à vendabilidade de seu
produto, de forma que muito do que se apresenta nos livros como
custos de produção deveria ser lançado à conta de aparências
vendáveis. A distinção entre técnica de produção e técnica de venda
foi confundida, dessa forma, sendo hoje indubitável que o custo de
produção de muitos artigos fabricados para o mercado é atribuível,
principalmente à produção das aparências vendáveis, ordinariamente
meretrícias. (VEBLEN, T apud BARAN, P. & SWEEZY,1966, p.137
).
4
No livro Propaganda: Teoria, Técnica e Prática de Sant’Anna, Armando, São Paulo, Livraria
Pioneira Editora, 1981, p.102. Há um capitulo que observamos ter por objetivo ensinar formas de
persuasão aos publicitários, no que tange criar estímulos para despertar necessidades que possam
estar dormindo no consumidor.
5
Para Marx o valor de uso não é concebido como uma categoria natural, como era admitida pelos
economistas clássicos (ex.Adam Smith), mas como categoria especifica da economia política. No
âmbito da produção capitalista o valor de uso assume determinações sociais especificas, que
configuram sua função no interior da produção e da circulação do próprio valor e troca.
(SANDRONI, P. Novíssimo Dicionário de Economia, São Paulo, Editora Best Seller, 2003). Em
resumo podemos dizer que o valor de uso é a “utilidade” que a mercadoria pode realizar quando
vier a ser consumida.
34
Segundo Packard, nos anos 50 a revista Fortune fez uma retrospectiva
6
a
respeito das mais recentes invenções dos últimos cinqüenta anos em comparação
com as invenções da última década, na qual era possível perceber que não havia
nada de grandemente inovador como novos lançamentos, já que se limitavam a
trazer pequenas diferenças no estilo das mercadoriasos grandes progressos
“estavam sendo feitos em setores como o de preparação para a viagem espacial”.
(PACKARD, 1965, p. 14)
Todavia, ao cuidarem da aparência da mercadoria e deixarem de lado
outros aspectos mais importantes e que deveriam ser feitos, gerou-se uma certa
insatisfação na sociedade americana a respeito por exemplos dos automóveis
produzidos na década de 60, que esteticamente eram muito elaborados, mas no
que diz respeito ao desenvolvimento tecnológico e a segurança deixavam a
desejar. Podemos ver isso, expresso abaixo no comentário de Baran e Sweezy,
que apontam a crítica feita pela Associação Automobilística Americana da época.
O fato de que os produtos planejados segundo os ditames da
maximização do lucro podem ser, no sentido mais literal, inimigos da
necessidade elementar de sobrevivência é ilustrado por uma notícia
do New York Times (3 de março de 1964) segundo a qual a
Associação Automobilística Americana considera os fabricantes de
automóveis culpados de negligenciarem, grosseiramente as
considerações de segurança, em favor da boa apresentação. As
recomendações de engenheiros competentes, disse Robert S.
Kretschnar, diretor nacional da Associação e chefe de sua filial em
Massachussetts, “foram superadas pelos estilistas das formas e pelo
pessoal de comercialização”. E continua: “Os fabricantes olham um
carro como uma ‘mercadoria glamurosa’, e não como um mecanismo
que deve ser mais seguro possível”. Entre as deficiências de
segurança foram relacionadas “a falta de freios infalíveis,
pneumáticos defeituosos, mau desenho interior, mau desenho da
direção, construção frágil”. E não obstante, a indústria automobilística
gasta milhões de dólares anualmente em pesquisa e
desenvolvimento!”. (BARAN & SWEEZY, 1966, p. 143).
6
Como podemos ver a apresentação dos lançamentos das últimas décadas antes de 50. [...] os
fabricantes de bens de consumo não apresentaram uma única inovação comparável ao
automóvel (que se tornou comercialmente importante lá por 1910), o rádio (no começo da
década de 1920), o refrigerador mecânico (1920), máquina de lavar roupa (fins da década de
1930), ar condicionado doméstico e a televisão (fins da década de 1940). (PACKARD, 1965, p.
14).
35
Nesse movimento até mesmo o homem, sofreu influência desta pressão
econômica, pois através de sua força-de-trabalho que também é uma
mercadoria, passou pelo mesmo processo de valorização do invólucro, de sua
“embalagem”. Este assunto, no entanto, vamos discutir na última secção da
segunda parte deste trabalho – e será uma análise reduzida do tema – para tal
utilizaremos a obra A Critica da Estética da mercadoria de Wolfgang Fritz Haug.
Por enquanto vamos analisar como a publicidade pôde ajudar na
explicitação da mercadoria por meio de uma estética cada vez mais elaborada, e
como isso pode ter facilitado a concretização de um retorno mais rápido do
consumidor ao mercado gerado por uma demanda induzida.
2. A EMOÇÃO A SERVIÇO DA ECONOMIA – O PAPEL DA PUBLICIDADE E DA
PSICOLOGIA NA RELAÇÃO DE TROCA
A publicidade galgou destaque na história do capitalismo moderno devido a
acontecimentos interligados que permitiram a expansão de seu uso. Segundo um
dos expoentes deste setor, o professor Armando Sant’Anna em seu livro Teoria,
Técnica e Prática da Propaganda, a industrialização, juntamente com o
desenvolvimento dos meios de comunicação, foram fatores que possibilitaram a
propaganda a ser o meio mais eficaz de escoamento da produção em massa
.
[...] a expansão da imprensa não era um fenômeno isolado. Decorria
por sua vez, no desenvolvimento das técnicas que, desde a revolução
industrial, vinham modificando completamente o panorama da
sociedade capitalista que nela se iniciara.
Máquinas e equipamentos cada vez mais aperfeiçoados teriam que
determinar o aumento crescente da produção, fosse de tiragem de um
jornal diário ou de um periódico, ou de bens de consumo e
mercadorias de todos os tipos.[...]
Antes do impetuoso avanço da tecnologia, as fábricas se limitavam a
produzir aquilo que o consumidor realmente necessitava em
condições de adquirir.
Com o advento da produção em massa para um mercado que
principiava a superar a fase do consumir apenas o essencial, viram-se
os industriais forçados a encontrar meios rápidos de escoar o excesso
de produção de máquinas cada vez mais aperfeiçoadas e velozes.
36
E o meio mais eficaz encontrado foi a propaganda. (SANT’ANNA,
Armando, 1981, p.8)
Contudo devemos lembrar que o ato de evidenciar um produto qualquer ou
mesmo a si próprio – que hoje é muito utilizado – já foi empregado pelo homem
em sua relação social há tempos remotos. Ao observar a natureza, o homem pôde
posteriormente recorrer a ela para se destacar dos demais, pois atribuiu a si
recursos que o apresentasse como diferente. Essa diferenciação estabelecida
pela estética lhe possibilitou adquirir o lugar principal, numa relação competitiva
com os outros de sua mesma espécie.
Da mesma forma hoje na relação competitiva capitalista as mercadorias,
por meio da manipulação de sua estética, – trabalhada através da campanha
publicitária — pode de maneira sistemática induzir subjetivamente o individuo ao
consumo de um determinado produto, ao invés de outro. Pois a construção
simbólica desta mercadoria é gerada para alcançar necessidades humanas que
vão além das necessidades básicas ou vitais, ou seja, além de comer, beber,
dormir, procriar etc.
O setor de publicidade passou a criar sua própria teoria e técnica e deixou
de ser apenas um instrumento de vendas, passando a corresponder a um forte
instrumento de controle social e econômico
7
. Como vemos ainda em Sant’Anna,
Só a propaganda, com suas técnicas aprimoradas de persuasão
poderia induzir as grandes massas consumidoras a aceitar os novos
produtos, saídos das fábricas, mesmo que não correspondesse à
satisfação de suas necessidades básicas [...].
Chega ao estágio que Galbraith em The New Industrial State define
como “o controle da demanda pelos industriais”.
Esse controle só poderia ser feito através dos meios de comunicação
que além da imprensa periódica e diária, já dispunham, a essa altura,
dos recursos do rádio, televisão e cinema. (SANT’ANNA, Armando,
1981, p.10)
Dessa forma, a economia representada pelos seus agentes capitalistas, na
figura de seus publicitários, empresários, industriais, vendedores etc, começou a
fazer uso das necessidades humanas sistematicamente. Pois, de acordo com
7
Controle social e econômico, exatamente assim é que a publicidade pode agir no interior da
Alemanha de Hitler. Goebbels o ícone da publicidade moderna, braço direito do Führer, marcou
seu lugar no palco da propaganda ao criar diversos mecanismos, técnicas e processos que
possibilitaram a persuasão do povo alemão a favor do governo autoritário nazista.
37
essas novas técnicas e teorias de venda, o motivo que leva um consumidor a
comprar está diretamente ligado à emoção, a desejos pessoais
8
etc.
E para compreender melhor quais são as necessidades humanas — com o
intento de satisfazê-las e ampliá-las — o pessoal da propaganda listou e
classificou as principais delas e denominou-as arquétipos emocionais do
inconsciente coletivo
9
, que podem agora auxiliar na objetivação de conectar o
produto à satisfação humana. Como por exemplo:
O que acontece quando entro numa loja de discos e seguro um CD
na mão? Aproximo-me não só de um objeto metálico brilhante numa
caixa de plástico cujo custo de fabricação é de alguns centavos, mas
de uma aura de prazer e uma trilha de ressonância derivada da fama
do grupo cuja música está ali contida ou de minha experiência de ter
ouvido uma canção numa festa, no rádio, ou ter baixado no meu
computador. O objeto da publicidade é intensificar esta ressonância e
ligá-la a meus próprios sentimentos bons, passados e futuros. Minha
poltrona, neste sentido, “produz” não só a sensação contra minhas
costas e pernas, mas também uma sensação de conforto que posso
associar a minha infância. Tênis Nike produzem não só uma certa
sensação esponjosa contra a sola dos meus pés, mas (pelo menos
até que eu chegue na quadra) meu sonho de enterrar a bola como
Michael Jordan. (GITLIN, 2003, p. 51)
A psicologia, que era destinada a compreender os indivíduos, sob todos os
tipos de reveses e pressões no interior da sociedade, passou a ser utilizada para
condicionar e induzir os indivíduos a novos comportamentos, agora voltados ao
consumo. E assim foi “criada” a “psicologia da compra e venda”, ou seja, a
psicologia foi utilizada para “condicionar os indivíduos, incutir-lhes uma idéia que
os leva à ação – à ação de compra”.(Sant’Anna, 1981, p.104)
A maior parte dos bens serve as necessidades que foram reveladas
ao individuo, não pelo desconforto palpável que acompanha as
8
Que podem ser induzidos como é o caso da teoria dos reflexos condicionados de Pavlov, que é
utilizada pelo campo da publicidade há muito tempo para fixar um produto na mente do
consumidor. Como exemplo de uso de tal técnica podemos dizer dos comerciais de cerveja que
utilizam a fusão da bebida à imagem de uma bela mulher, e se o intuito de fusão for concretizado
de maneira eficaz, o consumidor condicionado, salivará com o simples nome da cerveja. O desejo
nesse caso sexual pode servir como estimulante de venda.
9
O livro MARTINS, José A Natureza Emocional da Marca, traz o esclarecimento e a receita
administrativa de como criar e fortalecer uma marca de acordo com os arquétipos emocionais do
inconsciente coletivo. Segundo ele os “arquétipos emocionais são padrões comuns a toda cultura
humana. Podem ser percebidos com estados de espíritos ou formas de percepção do mundo. Os
arquétipos são elementos simbólicos que resgatam estados de espírito comuns a todos nós,
possibilitando um trabalho de criação com objetivos definidos” (p.37). E dessa forma ao setor de
publicidade fica “[...] a cargo de traçar características emocionais que influenciam a criação da
alma (do negócio) e, conseqüentemente, o processo de compra.(p.38).
38
privações, mas por alguma resposta psíquica à sua posse. Eles lhe
dão uma sensação de realização pessoal; proporcionam-lhe uma
impressão de igualdade com os vizinhos, afastam a sua mente da
reflexão; servem às aspirações sexuais; prometem a aceitação social;
acentuam sua impressão subjetiva de saúde, bem-estar ou peristalse
regulada; contribuem para a beleza pessoal segundo os cânones
convencionais ou são de qualquer outro modo psicologicamente
gratificantes. (GALBRAITH, ano, p.221)
Uma das formas que a indução psicológica que pode ser empregada de
forma não revelada é por meio de artigos de jornais ou revistas que são escritos
de forma a direcionar os leitores a consumir determinados artigos. Como podemos
ver abaixo, no comentário de Packard sobre um artigo intitulado “Qual a atração?
que foi publicado em uma revista direcionada ao público feminino nos anos de
1960, a propaganda foi utilizada no artigo para incitar a compra de determinados
produtos.
A ilustração do artigo mostrava uma atraente jovem cercada por seis
elegantes homens. O propósito do artigo era mostrar os segredos da
Garota Feminina que é irresistível a homens muito indiferentes. Antes
de ler oitocentas palavras desse artigo, o leitor já sabia que a jovem
recorria a “loções para as mãos”, “cremes umidecentes”, “liquido de
limpeza”, “estolas”, “novo estoque de luvas”, “sais de banho”, “óleo de
banho”, “loção especial para os pés”, “creme depilatório”, “loção
sedosa para o corpo”, “antitranspirante”, “água-de-colônia”,
“cosméticos”, “shampoos”, “bolas de algodão saturado de
adstringente”, “esmalte de unhas”, “sombreados para maquilagem e
“baton”. Mais adiante, mencionava-se também que ela era “grande
bebedora de leite” e dormia oito horas por noite. (PACKARD, 1965,
p.211)
As mensagens publicitárias começaram a aparecer em lugares antes
proibidos e traziam veladamente a indução psicológica, como é o caso acima, no
qual a sensualidade e feminilidade não são mais atributos humanos, mas
resultados das mercadorias adquiridas. Neste sentido, com o advento da
televisão o consumidor passou a ser mais condicionado, e como disse um
consultor de vendas do período do pós-guerra a respeito do poder que a televisão
exercia sobre todos os americanos,
“Ela cria um novo conjunto de condições, conduzindo a um monopólio
de atenção do consumidor. Pela primeira vez, quase todo o público
consumidor americano tornou-se platéia cativa... A televisão vende
realmente a idéia generalizada de consumo”. (LEBOW apud
PACKARD, 1965, p. 210)
39
Ou ainda neste comentário do mesmo autor sobre o poder da publicidade:
A medida que os publicitários se viram com cada vez mais bilhões à
sua disposição, passaram a desempenhar o papel de considerável
força no sentido de influenciar o comportamento de toda a população.
Tornaram-se escala muito grande os donos do destino econômico da
nação e talvez os mais influentes formadores de gosto. Tornaram-se
ditadores do conteúdo de muito, se não da maioria, dos programas de
rádio e televisão, juízes com poderes de vida e de morte em relação a
muitas publicações e pelo menos co-desenhistas de muitos produtos
oferecidos ao público. (PACKARD, 1965, p.215 grifo nosso)
E para que este campo de poder exercido pelo pessoal da propaganda se
tornasse mais efetivo, livros e mais livros foram escritos com esse intento, escolas
foram criadas para dar conta da necessidade capitalista de se expandir, e
principalmente de criar o escoamento da demanda da superprodução no momento
de ascensão do capitalismo. Posteriormente a este período, esta estratégia de
elaborar a estética da mercadoria foi utilizada para criar demanda num período de
crise, já que naquele momento os índices de desemprego mostravam-se em
elevação.
2.01 As promessas infinitas da publicidade através dos meios
de comunicação
As promessas estabelecidas pelos meios de comunicação são eficazes,
pois as repetições intencionais das propagandas acabam condicionando a
vontade humana. A mídia conseguiu destacar novas mercadorias e induziu assim
os homens ao mercado para saciar essas novas necessidades.
Na verdade, poucos duvidariam hoje da afirmão de Louis Cheskin,
veterano em técnica de comercialização, de que “como os
consumidores pouco sabem sobre a maioria dos produtos” procuram
rótulos, marcas e nomes, ou sua observação de que “um produto
superior significa superior necessariamente em termos de valor
objetivo ou segundo padrões de laboratório”. As preferências do
consumidor, em outras palavras não são criadas colocando-o frente a
uma escolha entre produtos realmente diferentes, mas pelo emprego
de técnicas de sugestão e “lavagem cerebral cada vez mais refinadas
e complexas: também isso se tornou um fato bem conhecido.
(BARAN, P. & SWEEZY, 1966, p.137).
40
Segundo estes autores, a preferência do consumidor por um tipo de
produto e não por outro da mesma espécie se dá pela “lavagem cerebral
publicitária. Com o aumento da concorrência entre as empresas, a “guerra” entre
as marcas passou a ser travada na cabeça do consumidor que estava exposto aos
estímulos psicológicos gerados pelas campanhas de vendas dessas empresas –
que utilizavam os diversos meios de comunicação como um modo eficaz de atingir
seu público.
Os meios de comunicação
10
tiveram grande destaque na história do “boom
do capitalismo, pois possibilitaram acelerar a circulação econômica da mercadoria
dentro do mercado ao promoverem propagandas de novos produtos com infinitas
promessas de valores de uso – que eram sobre valorizadas por meio das cores,
luzes e sons etc. Estas propagandas também propagavam idéias, como: “sempre
cabe mais um”, “você merece o novo, pois o antigo é ultrapassado” etc, e elas
acabavam incitando o consumidor a procurar o mercado, estimulado por seus
desejos mais profundos, sem perceber que estava sendo condicionado por meio
das campanhas de vendas.
[...] “estudos realizados nos últimos 12 anos mostram
conclusivamente que as pessoas são influenciadas pela publicidade
sem terem consciência dessa influência. Uma pessoa é motivada a
comprar alguma coisa por um anúncio, mas freqüente não sabe a
razão disso”. Igualmente convincente, são os números e estudos
mostrando que a publicidade leva o consumidor a pagar preços
acentuadamente maiores do que os cobrados por produtos
materialmente idênticos, que não são apoiados por técnicas
publicitárias adequadas. (CHESKIN apud BARAN, P. & SWEEZY,
1966, p., 125-6).
Verificamos que por meio das propagandas o consumidor é levado a crer
que a nova mercadoria é sempre imprescindível a sua vida e que somente através
dela ele pode saciar as necessidades que são criadas através da própria
10
Devemos lembrar que os meios de comunicação de massa, se mantém ativos graças às
campanhas de vendas ou publicidades que fazem dos mais diferentes produtos imprescindíveis
para mercado consumidor e, seu papel na realização do valor das mercadorias é muito intenso,
uma vez que é através deles que se dá o envolvimento psicológico da subjetividade do consumidor
e veladamente o induzem ao consumo de produtos específicos – que foram publicizados milhares
de vezes nas retinas e ouvidos dos possíveis futuros compradores.
41
propaganda. Foi dessa forma que a obsolescência da desejabilidade
11
- que
iremos trabalhar mais à frente – se afirmou intensamente na cabeça de todos.
Naomi Klein, em seu livro Sem Logo, diz que já na segunda metade do
século XIX as campanhas publicitárias eram realizadas com o intento de criar
necessidades das mercadorias – que estavam sendo inseridas no mercado pela
primeira vez. Tinham que criar demanda para o que estava sendo produzido.
A publicidade devia informar os consumidores da existência de
algumas novas invenções, depois convencê-los de que sua vida seria
melhor se usassem, por exemplo, carros em vez de bondes, telefones
em lugar de cartas e luz elétrica em vez de lampião a óleo. Muitos
desses novos produtos traziam marcas – e algumas ainda estão por
ai até hoje , mais isso era quase incidental. Esses produtos eram em
si mesmo uma novidade; e isso praticamente bastava como
publicidade. (KLEIN, 2003, p. 29)
Todavia já por volta da segunda metade do século XX, com a intensificação
da concorrência, a marca do produto foi apresentada como um dispositivo a mais
que impulsionaria a velocidade para a concretização da relação de troca, uma vez
que a marca representava a segurança procurada pelo consumidor e a qualidade
dos produtos desejados por ele, mesmo em uma época na qual a obsolescência
estava sendo aplicada de forma tão avassaladora.
Assim o papel da publicidade mudou, passando do fornecimento de
informes sobre o produto para a construção de uma imagem em torno
de uma variedade identificada de um produto. A primeira tarefa do
branding era adotar de nomes próprios bens genéricos como açúcar,
farinha de trigo, sabão, cereais e produtos que antes eram retirados
de barris por comerciantes locais [...] as logomarcas coorporativas
foram aplicadas a produtos fabricados em massa como a sopa
Campbell’s, os picles H. J. Heinz e a aveia Quaker. [...] as logomarcas
eram elaboradas de modo a evocar a familiaridade e um caráter
popular [...] como uma forma de tentar superar o novo perturbador
anonimato dos bens embalados (KLEIN, 2003, p. 30).
A marca do produto “carrega todo um conjunto de promessas e
responsabilidades transferidas por [uma] empresa” (SILVA, 2001, p. 67). Ela
passa a ser um signo com a propriedade de fazer cumprir as promessas
11
Obsolescência de desejabilidade. Segundo o autor Vance Packard, é a situação, na qual “um
produto que ainda está sólido, em termos de qualidade ou perfomance, torna-se “gasto” em nossa
mente porque um aprimoramento de estilo ou outra modificação faz com que fique menos
desejável” (PACKARD, 1965, p. 51).
42
publicizadas de satisfação. O poder da marca de um produto advém dos enormes
gastos com publicidade que criam a própria marca e a mantém entre as mais
consumidas.
As campanhas de vendas americanas no período do pós-guerra ainda
estavam distantes da utilização da marca como princípio norteador de vendas.
Elas expressavam antes uma necessidade de amenizar o encalhe da
superprodução de mercadorias. Por isso, o apelo psicológico estava muito mais
ligado em oferecer quantidades de mercadorias como um benefício ao
consumidor, pois o incitava a possuir vários produtos de uma mesma espécie ao
invés de um e, principalmente, mostrava que o antigo era ultrapassado e deveria
ser trocado – urgentemente – pelo último lançamento do produto no mercado.
Podemos perceber isso nas citações abaixo:
Os fabricantes de diversos produtos de uso doméstico concluíram que
nenhum lar era realmente um lar se não tivesse em dobro
os produtos
cuja propaganda estavam promovendo. O presidente da Servel Inc.,
anunciou que o padrão de vida americano exige hoje dois
refrigeradores em cada casa. (PACKARD, 1965, p. 29, grifo nosso).
[...] a Associão dos Fabricantes de Material de encanamento
comou a fazer a propaganda que “cada casa com privazone... cada
membro da família tem que ter uma instalação sanitária só para seu
uso. Os fabricantes de rádio revelaram com orgulho que haviam
conseguido vender uma média de três receptores
para cada família
do país” (PACKARD, 1965, p. 29, grifo nosso).
No período pós II Guerra, a prática intensa de modificação estética do
perfil ou da silhueta dos produtos visava produzir a sensação no consumidor de
que seus bens sempre estavam em defasagem, e isso era conseguido por meio
das campanhas de venda, que utilizavam o rádio, a tv ou os jornais etc, para
apresentar os novos produtos. A propaganda cumpria com sua função quando os
novos produtos apresentados faziam os antigos se tornarem obsoletos perante
aos novos desejos que foram estimulados pelos meios de comunicação.
Como a necessidade humana é condição sine qua non para a realização
do capital, foi por meio dela que as agências de publicidade e propaganda foram
capazes de explorar a mente humana, imprimindo nela a necessidade de
43
consumir mais, por meio dos estímulos ao consumo gerados pelas campanhas de
venda. Contudo, poucos sabiam a respeito da maioria dos produtos. Sabiam
apenas que se sentiam estimulados a comprar o produto – que era objeto de seu
desejo.
O papel da publicidade e dos meios de comunicação são tão fortes sobre
o consumidor que por vezes a mercadoria desejada pode trazer problemas à
saúde de seu usuário e mesmo assim ela é utilizada – devido aos estímulos áudio
visuais das propagandas que se tornaram mais fortes que a racionalidade. Como
podemos observar nos casos dos sapatos de bico fino e dos saltos pontiagudos
usado pelas mulheres que causam joanetes
12
e calos; como tamm é o caso do
piercing
13
oral, que pode causar diversos danos pelo traumatismo na língua e
principalmente o caso do cigarro
14
, que vende uma imagem de prazer e aventura,
quando em verdade destrói as hemácias
15
e causa câncer de pulmão, entre outros
problemas de saúde.
12
O joanete é a denominação popular de uma elevação (protuberância) que se forma no osso
metatarsiano do primeiro dedo do pé.
13
Na Revista do Instituto das Ciências da saúde – da Universidade Paulista, em março de 2005, foi
publicada uma revisão literária sobre o problema que atinge os usuários do piercing oral. Segundo
os especialistas, o uso contínuo do piercing oral pode causar desde: risco de infecções, edema,
linfonodopatias; dificuldade na fala, mastigação e deglutão; pode ainda causar trauma aos tecidos
de sustentação, quebra, trincas e fraturas coronárias. E, conseqüentemente, a constante agressão
da mucosa bucal que este ornamento causa, pode ocasionar uma leucoplasia – lesão de mancha
branca na região da mucosa bucal - que é cancerizável.
14
Atualmente o “câncer de pulmão é a mais temível complicação associada ao cigarro. Em 90%
dos casos, é uma doença que acomete os fumantes e, em apenas 10%, pessoas que nunca
fumaram. No início do século XX, quando a epidemia do cigarro ainda não tinha se disseminado,
era uma enfermidade raríssima. Hoje, é o câncer que mais mata homens e mulheres, já que elas
tamm são suscetíveis desde que se tornaram dependentes dessa droga nefasta” Dr. Riad
Younes é chefe do grupo de cirurgia torácica do Hospital do Câncer de São Paulo e do Hospital
Sírio-Libanês de São Paulo.
http://drauziovarella.ig.com.br/entrevistas/cpulmao.asp
15
Hemácias - são constituídas basicamente por globulina e hemoglobina (composta de 4
moléculas protéicas e 1 grupamento heme, que contém o ferro), e a sua função é transportar o
oxigênio
(principalmente) e o gás carbônico (em menor quantidade) aos tecidos./ “Em 1956, Eisen
e Hammond detectaram em tabagistas, com e sem doença vascular, uma redução dos valores do
hematócrito, da hemoglobina e do número de hemácias, após um período de vários dias de
abstinência ao tabaco, e uma elevação destes valores depois de o indivíduo voltar a fumar”
(Zarebe Bitencourt Medeiros ,Revista de Angiologia e Cirurgia Vascular, 1992 a 2001, volume 6 –
1997 n° 3, Monografia: Efeitos Agudos do Consumo de Cigarro nos Capilares da Prega Ungueal)
http://209.85.165.104/search?q=cache:pIxUHHBjIjIJ:www.sbacvrj.com.br/paginas/revistas/sbacvrj/1
997/3/Monografiap158.htm+hem%C3%A1cias+cigarro&hl=pt-BR&ct=clnk&cd=2&gl=br
44
As necessidades humanas estão subsumidas à lógica da expansão
capitalista e, dessa forma, pouco interessa as implicações para o homem nessa
relação social. O que verdadeiramente importa é que o homem siga a lógica da
lucratividade e troque a cada estação seus bens duráveis, imprimindo assim
velocidade à relação de troca capitalista.
O capital, por meio da propaganda, conseguiu promover todas as
possibilidades de satisfação do homem ao lhe oferecer a solução de seu problema
de realização por meio da mercadoria ao obtê-la por meio de uma simples relação
de troca, propiciando ao mesmo tempo sua auto-realização.
Grande parte da prosperidade de após-guerra nas vendas resultou do
fornecimento de produtos desejados, se não muito necessários.
Todavia depois de doze anos, o espectro da saciedade está lançando
um desafio aos vendedores de muitos produtos. Um verdadeiro
vendedor rejeita o conceito de que um mercado possa estar saciado;
todavia, mesmo os vendedores estão começando a admitir que
grande parte da urgência está desaparecendo da procura de seus
produtos. Sales Management reconheceu: “O consumidor americano
foi empanturrado com toda espécie de produtos maravilhosos desde o
término da guerra. Está provavelmente, cansado, um pouco esgotado
e ávido por algo diferente”.
Hoje, cerca de nove em cada dez residências americanas contêm
pelo menos um refrigerador, um televisor e um fogão elétrico ou a
gás. E sete em cada dez têm um aspirador de pó, uma torradeira e
uma batedeira elétricas. Existem no país mais carros de passageiros
do que família. (PACKARD,1965, p. 11)
45
2.02 MOTIVAR PARA COMPRAR
As necessidades do “espírito” apresentadas por meio da mercadoria, foram
produzidas a partir de estudos direcionados ao público alvo de cada produto,
trabalhadas e construídas por meio do setor de marketing. Setor este que tem por
finalidade primordial,
[...] detectar as oportunidades de mercado ou a existência de
demandas inadequadamente satisfeitas pelas ofertas existentes, seja
da própria empresa e/ou de seus concorrentes. Essas oportunidades
são denominadas “nichos” mercadológicos. A outra finalidade
consiste em preencher esses nichos com o mínimo de recursos e
custo operacionais. (RICHERS, 1985, p. 26)
O setor de marketing setor de logística – planeja toda ação, todo o
processo produtivo e distributivo das empresas e, é constituído por
administradores, publicitários, psicólogos, antropólogos, sociólogos etc; que visam
captar o comportamento do consumidor para depois aplicar “os resultados no
planejamento de anúncios e produtos” (SCHLOSSER, 2002, p. 65).
E através da construção de “novos valores” sobre o produto, efetuado pela
publicidade, a mercadoria deixa de ter apenas o valor de uso específico e passa a
sediar ou comportar “valores de uso” psicológicos. Segundo Soares em seu livro
Para uma Leitura Critica da Publicidade, ele diz que estas “necessidades
psicológicas” estão em conexão com seis impulsos fundamentais humanos, que
são explorados pelos publicitários na intenção de captar seu público consumidor.
Ele destaca esses impulsos e os classifica em três: psicobiológico que são
os impulsos de auto-preservação e sexual; psicossocial que são os impulsos de
sociabilidade e auto-afirmação; psicorracional com os impulsos de racionalidade e
moralidade. E é por meio da exploração desses estímulos humanos – segundo ele
– “que as campanhas de publicitárias procuram produzir peças tendentes a suprir
as necessidades suscitadas pelos impulsos”.(SOARES, 1988, p.64)
Segundo ele ainda:
A sociedade capitalista, contudo, somente consegue sobreviver caso
seja permanentemente capaz de canalizar os campos de escolha dos
indivíduos na aquisão dos bens materiais. Trata-se efetivamente, de
administrar as necessidades psicobiológicas dos homens de educá-
las e, se possível, condicioná-las. Neste gigantesco trabalho de
46
condicionamento, a sociedade urbano-industrial capitalista, ao
apresentar as soluções para as necessidades, reduz a importância de
determinados caminhos de atendimento ao homem (deixando por
exemplo de investir na produção de alimentos essenciais ou na
educação de todos os cidadãos) enquanto valoriza outros, de
importância real reduzida ou questionável (investindo, por exemplo,
na produção de bens supérfluos, destinados a uma porcentagem
reduzida da população). E para que a sociedade aceite, como
natural, as soluções apresentadas pelos que gerenciam as relações
de produção e distribuição dos recursos de uma região, ou nação ou
mesmo continente, faz-se uso das técnicas publicitárias. [...]
Chegamos, desta foram, a desconhecer o que realmente atenderia
nossas reais necessidades quanto à manutenção ou preservação da
qualidade de vida. Passamos, pela publicidade, a viver um grande
simulacro, um mundo de faz-de-conta. Um faz-de-conta tão real e
colorido que nos impressiona e nos faz tomar decisões. (SOARES,
1988, p. 65 – grifo nosso)
Dentro deste sistema operacional econômico, cabe ao consumidor tomar
decisões que irão de encontro a satisfazer as novas necessidades criadas pelo
mercado, e é no mercado que ele encontrará sua realização. E para sanar este
problema ele só conseguirá realizá-lo por meio das mercadorias que trazem
embutidas em seu corpo simbólico as formas de psicologias associativas
16
.
Essas psicologias associativas serviam como mais uma promessa do
valor de uso, pois a mercadorias trabalhadas intensamente pela publicidade,
passaram a prometer a concretização de sonhos e desejos, que não eram
imanentes ao seu corpo, mas faziam parte da construção publicitária criada para
apresentar a mercadoria à sociedade.
As estratégias de vendas patrocinadas pelo setor de publicidade e
propaganda produziram no produto uma “áurea mágica”, além de seu próprio valor
de uso imanente. As promessas consistiam em oferecer: sucesso, fama, alegria,
sensualidade, confiança, vitória, status etc. Ou ainda ofereciam por meio da
mercadoria a inserção a uma “tribo urbana”, a um grupo social ou a um estilo de
16
Termo utilizado por BARBER, Benjamin em seu livro JIHAD x MCMUNDO. Psicologias
associativas – são as necessidades produzidas no individuo intencionalmente com o objetivo de
direcionar o consumidor a adquirir um certo produto, ao ser estimulado psicologicamente com os
prováveis atributos “espirituais” que ela possui. Destarte, ao adquirir uma tal mercadoria, o
consumidor passará a acreditar que ao poss-la, terá poderes e atributos, como: a possibilidade
de voar em um NIKE Air como os jogadores de basquete da liga NBA; ou ao possuir um carro GOL
da Volkswagen, ele será mais bonito e conquistará todas as mulheres a sua volta – como nos
comerciais veiculados em rede televisiva nacional no ano de 2005.
47
vida desejado. E como tudo isso seria possível? Através da relação de troca
capitalista.
Hoje a produção simbólica da mercadoria, permite ao consumidor adquirir
a beleza e a sensualidade ao comprar um sabonete ou, o poder e a vitalidade ao
fumar um cigarro; o resultado da compra de uma mercadoria vem agora acrescido
de uma realização para além de seu valor-de-uso.
É só abrir uma revista ilustrada e colorida e observar: todas as
propagandas estarão vendendo imagens, idéias, objetos. Para isso,
estão procurando atingir e sensibilizar alguns dos impulsos
fundamentais dos consumidores em potencial.
Assim, se o produto é uma marca de sabonete, a motivação pode
querer atingir os impulsos de “sociabilidade” /ou de “auto-afirmação”,
ou ainda nossa “sexualidade”. Se o produto vendido é uma
“campanha” contra a paralisia infantil, a motivação pode ser a
“sociabilidade” (se você não ajudar, o seu filho poderá estar privado
de convivência de seus amiguinhos), ou “moral” (você deve ajudar,
senão será culpado de...).
Se o produto é uma nova marca de automóvel, a motivação poderá
ser o “impulso sexual” do provável comprador, que associará a marca
de beleza de uma morena ou uma loura atraente, ou ainda o impulso
de “auto-afirmão” (somente pessoas de personalidade forte usam
esta marca de carro...). Aliás tudo é possível, e o jogo está aberto a
criatividade do profissional. (SOARES, 1988, p.69)
A mercadoria “patrocina” dessa forma a oportunidade do consumidor
adquirir uma possível ascensão de status, ou um possível vínculo com alguma
“tribo urbana” e ainda a sensação de adquirir virtudes, poderes sobrenaturais etc.
E isso tudo só é possível mediante a compra da mercadoria que está à venda no
mercado.
E utilização hoje dos arquétipos emocionais universais pelas marcas de
consumo, se tornou mais eficaz, graças ao desenvolvimento da tecnologia. Seu
uso conseguiu atingir em cheio a sensibilidade humana através de características
humanizadas do produto, propagada pelos meios de comunicação. Como foi o
caso da marca Marlboro, recordado por José Martins em seu livro A Natureza
Emocional da Marca.
[...] já na década de 50, criava para cada marca uma personalidade,
um habitat e verdadeiros personagens que viviam em volta dela, que
chamava de o “drama do produto”. Foi dessa maneira que criou um
dos maiores sucessos da história da publicidade, o Marlboro Country.
(MARTINS, 1999, p.38)
48
Para que ocorresse mais rapidamente a realização do valor de troca, o
valor de uso tornou-se um “portador” de promessas cada vez mais ampliadas. A
mercadoria passou a conter respostas para todos os desejos e carências materiais
e psicológicas dos homens, mas, para realizá-las, o homem teve que se subsumir
a relação de troca capitalista.
Na verdade, à medida que a produção capitalista evoluiu até os dias
atuais, ou seja, à medida que o valor de troca passou a autonomizar-
se como verdadeiro desiderato da produção exatamente por ser o
produtor e realizador da mais-valia nele embutida, esta sim, a
verdadeira caça dos capitalistas , o capital aprendeu a criar, recriar
e programar os valores de uso e seu talante. Em outras palavras, o
capital aprendeu, por meio de seus tecnólogos, programadores e do
marketing, a interferir no gosto dos consumidores e, em grande
medida, também na quantidade de produtos que tais consumidores,
dentro de certos limites, que são os limites da repartição da renda e
da concorrência, devem demandar. Numa palavra, o valor de uso
passou a ser programável: o capital predetermina o que deve ser
valor de uso para a sociedade, ou seja, o que deve ser consumido
pela sociedade de acordo com suas conveniências, no que se refere
a parte e custo do capital, taxa de lucro almejada e outras tantas
combinações; assim, o melhor valor de uso é aquele que é mais
conveniente à maior lucratividade a partir do valor de troca
(CARVALHO, 2001, p. 1).
Há tamm outra estratégia de marketing muito utilizada atualmente, que
trabalha com esses “valores de usos” predeterminados pelo capital, que advém de
sonhos produzidos muitas vezes por eles mesmos – como é o caso da Disney que
possui sua própria indústria cinematográfica a Disney-MGM. Esta estratégia ficou
conhecida como sinergia, que é uma tática utilizada pelas grandes companhias,
que se juntam e efetuam a promoção de suas marcas através de produtos não
específicos de suas fábricas. Como exemplo, podemos ver no caso da Disney:
Entre outras inovações culturais, Walt Disney foi pioneiro de uma
estratégia de marketing chamada “sinergia”. Durante a década de 30,
assinou acordos com dezenas de empresas, concedendo-lhes o
direito de usar a imagem do camundongo Mikey em seus produtos e
propagandas. A Branca de Neve marcou um ponto de virada na
indústria do cinema: Walt Disney tinha assinado setenta contratos de
licenciamento antes mesmo de lançar o filme. Brinquedos, livros,
roupas, salgadinhos e discos relacionados com a história da Branca
de Neve já estavam a venda quando o filme entrou em cartaz.
(SCHLOSSER, 2002, p.58)
Estas ligações feitas de maneira simbólica por meio da mercadoria,
realizada graças ao trabalho do setor de marketing – que se efetuou através da
49
campanha publicitária, que por sua vez utilizou-se dos meios de comunicação,
funciona como um reforço para a aceleração da realização do valor, à medida que
possibilitam um giro muito rápido nos produtos que possuem tais características
dos filmes ou desenhos, apresentados pela indústria cinematográfica. Hoje por
exemplo, vemos isso quando um filme da Disney é lançado e no McDonald’s já
existe diversos bonequinhos que podem ser adquiridos, se o consumidor comprar
o Mclanche feliz – a concretização da “McDonaldlândias”, simboliza o pacto de
sinergia, efetuado por estas duas grandes empresas.
2.03 Crianças e Entretenimento
As crianças passaram a ocupar um papel importante para realização da
relação de troca capitalista – como recorda Schlosser em seu livro País Fast Food
, o objetivo principal é fazer com que elas ocupem os papeis de “suplentes de
vendedor” – recordando algo que o sociólogo Vance Packard
17
já havia dito anos
atrás. O que importa é atormentar os pais até o ponto que estes se rendam aos
apelos do mercado.
E para que isso ocorra, antes, há um trabalho elaborado e cada vez mais
crescente de pesquisadores, que investigam os lugares mais recônditos dos
pequenos – onde se encontram seus desejos infantis. Este trabalho permite aos
17
Como bem lembrou Baran e Sweezy a respeito deste autor: “Os livros de Packard, como muito
caçadores de escândalos mais recentes, encerram informação útil e ao mesmo tempo mostram,
nas palavras de Marx, “a força e a fraqueza do tipo de critica que sabe como julgar e condenar o
presente, mas não sabe como compreendê-lo.”(MARX apud BARAN & SWEEZY, 1966, p.133,
grifo nossos).
Contudo, por encerrar informações importantes que não podemos deixar de lado, principalmente
para exemplificar as mudanças essenciais ocorridas no interior dos Estados Unidos da América no
período do pós-guerra, como também os conceitos que ele utiliza referentes à obsolescência
planejada da mercadoria, e as quais classifica em três: obsolescência de desejabilidade, de função
e de qualidade. Iremos utilizar seu livro Estratégia do Desperdício, pois nos permite apreender de
maneira pormenorizada a atuação dessas três formas de deterioração da mercadoria, que será
muito utilizada pelo capital para acelerar a circulação desta no interior do mercado, tornando-a
mais rapidamente descartável. Essa apreensão feita por ele, vai de encontro o conceito pensado
por István Mészáros sobre a taxa de utilização decrescente da mercadoria, e que será por nós
utilizado para referendar nosso embasamento teórico marxista de apreensão da realidade atual.
50
empresários saber antecipadamente e exatamente, como deve ser o novo
produto, qual o público que ele irá atingir e qual são os recursos necessários para
uma campanha de vendas abrangente.
Antes de afetar o comportamento das crianças, os anunciantes têm
que aprender seus gostos. Os pesquisadores de mercado de hoje não
se limitam mais a realizar pesquisas com crianças dentro dos
shoppings; eles também organizam grupos específicos de crianças de
2 ou 3 anos apenas. Analisam os desenhos delas, contratam outras
crianças para dirigir os grupos específicos, fazem festinhas noturnas e
depois interrogam a meninada noite adentro. Enviam antropólogos
culturais para dentro das casas, lojas, lanchonetes e outros lugares
onde é provável uma concentração de crianças para observar em
silêncio e sub-repticiamente, o comportamento de seus possíveis
fregueses. Estudam a literatura acadêmica que trata o
desenvolvimento infantil, buscando novos insights nas obras de
teóricos com Erik Erikson e Jean Piaget. Estudam as fantasias vividas
pelas crianças, depois aplicam os resultados nos planejamentos de
anúncios e produtos. (SCHLOSSER, 2002, p. 65)
A disputa acirrada entre os EUA e a URSS no período da Guerra Fria, fez
com que o então presidente Eisenhower concedesse a publicidade uma
importante missão, a de conceber uma campanha publicitária de defesa da
energia nuclear – energia esta que, aliás, já havia sido utilizada pelos americanos
na Segunda Guerra Mundial sobre Hiroshima e Nagasaki e, agora possibilitava
aos EUA sair à frente na disputa do poderio atômico. Segundo Schlosser em seu
livro País Fast Food, nem as crianças escaparam.
Quando o governo de Eisenhower pediu a Walt Disney que
produzisse um programa defendendo o uso civil de energia nuclear,
Heinz Haber
18
recebeu a incumbência. Apresentou um programa da
Disney chamado “Nosso amigo, o átomo” e escreveu um livro infantil
muito popular com o mesmo titulo. Em ambos, a fissão nuclear foi
mostrada como uma coisa divertida e não assustadora. “Nosso amigo,
o átomo” foi patrocinado pela General Dynamics, fabricante de
reatores nucleares. A mesma empresa financiou o submarino atômico
da Terra do Amanhã, na Disneylândia. (SCHLOSSER, 2002, p.57-58)
18
Para explicitar quem estava por traz da Disney, Schlosser declara que: Heinz Haber passou boa
parte da II Guerra Mundial, realizando pesquisas sobre vôos em alta velocidade e a grande altitude
para o Instituto de Medicina da Aviação da Luftwaffe. Para avaliar riscos que os pilotos da força
aérea alemã teriam que enfrentar, o instituto realizou experiências em centenas de presos do
campo de concentração de Dachau, perto de Munique. A maior parte daqueles que sobreviveram
às experiências foram mortos e depois dissecados.(SCHOLSSER, 2002, p. 57)
51
Desde então até os dias hoje, as crianças assumiram um papel muito
importante dentro da sociedade capitalista, há uma gigantesca gama de anúncios
de diversos gêneros que apelam a elas. “Hoje em dia, a garotada é alvo de
campanhas publicitárias de empresas telefônicas, petrolíferas e automobilísticas,
bem como de lojas de roupas e redes de restaurantes” (SCHLOSSER, 2002, p.
62)
[...] a cultura da rapidez topa com a cultura da lentidão e conquista o
que pode.[...] No último meio século, época de vasta renda disponível
e comercialização volumosa, a indústria de bens de consumo recrutou
geração após geração de aliados em cada onda de crianças,
encurralando-as contra o estilo e o ritmo de adultos arrastados.
(GITLIN, 2003, p. 147)
Os clubes infantis foram um dos importantes meios para vender
mercadorias, ao mesmo tempo em que as crianças se entretinham. Por meio
deles, as crianças alcançavam o status de pertencer a um grupo, ou seja, por trás
da aparente capa da diversão, era possível coletar dados pessoais para
posteriormente serem utilizados em campanhas de vendas de bens de consumo
que estivessem relacionados ao universo que abrangia o “clubinho”. O Clube do
Mikey é um grande exemplo disso, e que foi copiado pelas grandes empresas
comerciais como a Burger King
19
e o McDonald’s.
Com a ampliação dos meios de comunicação, as pesquisas agora estavam
dentro de cada casa – como ainda deixa claro Schlosser, dando como exemplo o
site do McDonald’s, que pede para as crianças mandarem um e-mail para a
personagem Roland McDonald’s, dizendo qual é a preferência delas dentro de seu
cardápio, para suprir corretamente a demanda.
Mesmo com a ampliação do mundo virtual da Internet, os estudos revelam,
que a televisão é ainda mais eficaz quando se trata de estimular esses jovens
consumidores, pois o tempo que eles gastam a frente do aparelho televisivo é
muito maior, do que qualquer influência que se possa ocorrer por outro meio
comunicativo.
19
O clube infantil da Burger King foi responsável em 1991, pelo aumento de 300% da venda de refeições
para crianças . (SHLOSSER, 2002, p.68)
52
Em 1965, quando Packard escreve seu livro Estratégia do Desperdício, os
índices já marcavam a grande influência das propagandas na vida dos
americanos.
Um diretor da General Foods revelou que uma família americana
típica é exposta a 1.518 mensagens de venda no decurso de um dia
médio. E isso não inclui o material enfiado nas caixas de
correspondência da nação: um total de dezesseis bilhões de volumes
por ano, ou seja, quatro vezes mais que a quantidade encontrada nas
caixas de correspondência uma década antes.
[...] Os membros de uma família média, segundo disse o mesmo
diretor da General Foods, são expostos diariamente a 117 anúncios
na televisão e no rádio. Outros estudos mostraram que só na
televisão os programas ouvidos cada dia, numa residência média por
um ou mais membros da família contêm quase uma hora de anúncios.
(PACKARD, 1965, p. 205)
Segundo o autor, em 1978 a FTC (Federal Trade Comercial)
20
tentou proibir
todos os anúncios direcionados as crianças menores de sete anos, pois segundo
estudos, elas não sabem diferenciar um anúncio publicitário de um programa de
televisão. Contudo os “grupos de indústrias interessados na rejeição da proposta
fizeram lobby no congresso americano para impedir qualquer restrição aos
anúncios” (2002 ,p. 67) e em 1981 – três meses após a posse do presidente
Regan, houve o engavetamento de tal idéia que visava uma lei de contenção.
A este respeito – como foi observado por Schlosser – nos EUA, a
campanha publicitária dos cigarros Camel, utilizava uma personagem de desenho
animado, chamada Joe Camel, e que por se apresentar como um desenho infantil
acabou por influenciar as crianças menores de sete anos a consumirem cigarros –
já que não diferenciavam Joe de outro personagem infantil como o Mikey Mouse.
Um outro recurso utilizado pela empresa dos cigarros Camel foi o jingle com a
música italana “Voláre”, muito conhecida e transformada em “Fumáre”, que
acabou fixando na mente dos consumidores, mas principalmente das crianças que
inocentemente a cantarolavam.
Um estudo de 1991, publicado no Jornal of the American Medical
Association, [...] descobriu que um terço de todos os cigarros
vendidos ilegalmente a menores era Camel. (SCHLOSSER, 2002,
p.63)
20
Comissão Federal de Comércio
53
E ainda para piorar tal situação a respeito da exploração da inocência
infantil efetuada pela propaganda, temos
[...] uma decisão de 1984 do governo Reagan que acabou com os
limites de tempo para comerciais na televisão; a propaganda vazou
para programas de entretenimento e noticiários, tornando indistintas
as fronteiras entre ela e a programação. (BABER, 2003, p.96)
Outro modo encontrado pelo capital de se auto-realizar, veio através dos
parques temáticos
21
, que ao mesmo tempo são entretenimento e vendas de
mercadorias. Em seu livro Jihad X McMundo, Benjamim Barber diz que os
parques temáticos [...]:
São templos da modernidade, são nossas igrejas seculares nas quais
valores como diversão, saúde, viagens, lazer, além do “American
way” são glorificados numa liturgia sem sofrimento que se propõe a
oferecer entretenimento, informação e até um pouco de educação
sem esforço. Os temas dos parques do McMundo são próprios temas
do McMundo. (BARBER, 2003, p. 165)
Há um grande trabalho de marketing sendo feito na área de entretenimento
pelos grandes grupos comerciais, que já estão trabalhando para tornar as
mensagens de suas mercadorias – ou marcas – apreciáveis ao ponto em que os
consumidores possam vê-las apenas de forma positiva. Os parques temáticos são
uma mistura sedutora do comércio e da fantasia, que neste sentido, obnubila a
intrusão de uma empresa ou marca nos momentos de prazeres dos indivíduos.
Esta é uma forma eficaz de intrusão que não é percebida por seus usuários, que
vão até a estes lugares na tentativa de satisfazer seus desejos – desejos
manipulados previamente por estas mesma empresas e marcas.
“Disney World é um lugar irreal e não se deve temer que a realidade
entre para atrapalhar. Todo mundo se sente feliz e satisfeito. Tudo é
limpo. Todos são corteses. Nada há a temer. Espere até chegar em
casa para sentir-se culpado de todos os problemas do mundo.”
(BARBER apud Orgintz In: Relatório anual 1992, p.14, 2003, p. 172)
A fantasia permite ao capital que sua valorização ocorra de maneira
naturalizada, e a não percepção da relação de troca por trás dos benefícios dos
21
Parque temático – gigantescos empreendimentos localizados fora do perímetro urbano bem como os
shoppings das cidades, que abrangem estúdios de cinema, centros comerciais, hotéis e cadeias de fast food.
54
parques, possibilita a eles que seu faturamento seja sempre muito alto. Como
exemplo disso podemos ver nas cifras geradas ao ano pela Disney.
Os parques temáticos dos vários locais do mundo participam com 3,3
bilhões dos 7,5 bilhões faturados anualmente na Disney, sendo que
os filmes participam com 3,1 bilhões de dólares e os produtos de
venda ao consumidor (relacionados aos temas dos filmes e aos
parques), o restante 1,1 bilhão. Todas as três divisões da Disney
inspiram-se em um único conjunto de imagens de desenhos
exploradas em infindáveis variações pelo Departamento de
Imagineering, responsável por redefinir nossa realidade. (BARBER,
2003, p. 173)
Reforçando o que já disse acima, o obscurecimento da relação econômica,
que está por trás do momento fenomênico de diversão, faz com que o capital, se
realize sem ser percebido. O que importa para os usuários desses parques
temáticos são os “benefícios” encantados e hiper trabalhados pelo setor de
publicidade.
Dentre os diversos parques e locais de entretenimento podemos destacar: o
Walt Disney World – que foi o pioneiro neste intento; o McDonalds Land; os
cruzeiros marítimos da Disney Magic – que tem como destino a ilha particular da
Disney nas Bahamas, conhecida com Castaway Cay; a Nike Town; o Sony Center
em Berlim; o Mall of América de Mineapolis – que é Shopping Center, mas que se
assemelha a uma pequena cidade; o Aloquin Park em Ontário – um acampamento
de verão da Roots Lodge entre outros.
Ainda devemos recordar aqui o que Naomi Klein fala sobre a privatização
da praça pública no cotidiano da periferia das cidades,
A combinação de compras e entretenimento encontrada nas
superlojas e shoppings com parques temáticos criou uma vasta área
de espaço público pseudoprivado. Políticos, a polícia, assistentes
sociais e até lideres religiosos reconhecem que os shoppings se
tornaram a moderna praça pública. Mas ao contrário das antigas
praças públicas, que eram e ainda são locais para discussão
comunitária, protestos e comícios políticos, o único tipo de discurso
bem recebido aqui é o marketing ou outro jargão de consumo.
Manifestantes pacíficos são rotineiramente expulsos por seguranças
de shoppings por interferirem com as compras, e mesmo os piquetes
são ilegais dentro desses cercados. O conceito de praça pública foi
recentemente retomado pelas superlojas, muitas das quais agora
afirmam que também oferecem espaços públicos. “Essencialmente,
queremos que as pessoas usem a loja como um local de encontro.
Um lugar onde as pessoas podem ter seus encontros de cultura pop e
ficar durante algum tempo. Não é um lugar para as compras, é um
55
lugar para se estar”, disse Christos Garkinos, vice-presidente de
marketing do Virgin Entertainment Group, por ocasião da inauguração
da Virgin Megastore de 3700 metros em Vancouver. (KLEIN, 2003,
p.207)
E assim, à medida que as grandes lojas se expandiram em mares de
concreto na periferia da cidade, geraram uma ânsia renovada por
desenvolvimento na escala humana; pela antiquada praça da cidade,
por lugares público de reunião que ao mesmo tempo permitissem
grandes concentrações de pessoas e conversas íntimas; por um tipo
de varejo com mais interação e mais estimulo sensorial. Em outras
palavras, lançaram fundamentos para Starbucks, Virgin Megastore e
Nike Town. (KLEIN, 2003, P.158)
Como podemos perceber até aqui, é que não importa o meio, o importante
é fazer com que a estética da mercadoria seja cada vez mais trabalhada, dando a
ela uma “áurea mágica”, que leve o consumidor a consumir a partir dela diversos
outros produtos e serviços, fazendo por fim com que o capital se realize mais
rápido e de forma cada vez mais ampliada.
Nesta corrida não importa se você tem 3 ou 80 anos, certamente as
empresas apostam que suas estratégias poderão levá-lo à uma vida inteira de
compras, ou como disse Schlosser “as empresas planejam estratégias” de
indução ao consumo que vão “do berço ao túmulo”. (SCHLOSSER, 2002, p. 62)
56
2.04 A questão do belo na exploração estética da indução ao
consumo
Etcoff em seu livro A Lei do mais Belo, diz que há um fio comum dos
discursos sobre a beleza dentro de nossa sociedade desde os tempos pré-
socráticos, e pode ser percebido por meio de uma preferência estética “[...]
baseada em proporção e números”, ou em “[...] medidas e tamanhos apropriados
das partes que se ajustam harmoniosamente em um todo” (ETICOFF1999, p. 25).
Ou seja, há um fio condutor de percepção que define a beleza como sinônimo de
forma geométrica e equilíbrio.
E segundo ela, nós seres humanos, temos uma tendência de nos sentirmos
atraídos pelas imagens harmônicas, do ideal do que é belo, por isso os bebês nos
atraem, pois em sua maioria, apresentam-se com imagens simétricas e perfeitas.
O bebê com “a pele e os cabelos macios, olhos enormes, pupilas grandes,
bochechas roliças e nariz pequeno” (ETCOFF, 1999, p.45), compõe um quadro,
que identificamos como mimoso, e dessa forma sentimo-nos atraídos por qualquer
criatura que o imite. De olho nessa predileção, “as fábricas de brinquedos, os
cartunistas [...]” e por que não dizer os capitalistas em geral “[...] se aproveitam de
nossas preferências inatas por feições juvenis” (ETCOFF, 1999, p.45), e
produzem personagens e mercadorias que se assemelhem a elas.
E eles podem fazer isso por meio de um simples desenho animado cujo
personagem “parodia a geometria de uma criancinha humana” (p.45), e que nos
motiva a sair de casa e ir ao cinema, pois nos sentimos atraídos pelas feições
fofas de seus personagens; ou por tantos outros produtos que trabalham com
nossos apetites. As campanhas de moda podem ser um bom exemplo, já que
sabem trabalhar muito bem com nossas preferências; elas produzem padrões de
beleza inspirados nas formas juvenis, e ditam idéias – que serão perpassadas
pelos meios de comunicação a todos dentro da sociedade – idéias como: de que a
beleza está exclusivamente no período de vida conhecido como juventude, e por
isso todos devem se conservar jovens, ou então correr atrás de juventude perdida.
57
A busca incansável do homem pelo belo, possibilitou ao capitalismo grande
expansão de mercado, pois na procura da beleza “ideal”, mulheres e homens se
conduziram a ele rendendo-se a sua “ajuda ofertada”. Para rejuvenescer, re-
trabalharam suas aparências, por meio dos diversos produtos a venda. Tentaram
buscar no mercado a receita da beleza natural herdada por outros animais.
A maioria das mulheres aplica, irrefletidamente, blush e baton
diariamente, muitas acrescentam bases e pós um tom mais claro que
suas compleições naturais. A base clara, o blush nas mãs do rosto
são sinais sexuais que parodiam a juventude e a nuliparidade, o
corado da juventude e o vigor da saúde. (ETCOFF, 1999, p.128)
E, de acordo ainda com a autora, quando pinturas, pós e cremes não
trazem o resultado almejado, os seres humanos passam a efetuar alterações
cirúrgicas, para alcançar a embalagem perfeita. A bela embalagem diferenciada
permite a mercadoria ser mais quista do que outras no mercado, da mesma
maneira, a “bela embalagem” tamm permite aos homens se destacarem dentro
da sociedade.
Hoje, numa sociedade onde a aparência se transformou em pré suposto
para aceitação social, a propaganda conseguiu promover todas as possibilidades
de satisfação ao homem, ao oferecer a solução de seus problemas de realização,
por meio da realização do próprio capital. Pois ao tratá-lo como mercadoria, lhe
oferece a oportunidade de elaborar a aparência de sua embalagem por meio de
roupas, maquiagens, tinturas, perfumes etc — tudo para que sua imagem se torne
agradável e vendável. No capitalismo a produção da aparência não é nada mais
que uma função para objetivar a realização do valor da mercadoria.
Segue abaixo um exemplo de anúncio retirado da revista alemã Wollsiegel
de 1968, dirigida aos seus leitores, e que demonstra muito bem esse tratamento
do capital com os seres humanos.
Como é possível que as pessoas inteligentes muitas vezes não
progridam e não tenham sucesso na profissão? Não diga que é azar
— talvez a causa seja a ‘embalagem. Com um terno novo, você
vender-se-á melhor! E é quase isso que importa na vida (HAUG,
1996, P.105)
Podemos perceber a imposição do capital sobre nosso inconsciente
quando, por exemplo, assistindo a tv somos levados a pensar que a sensualidade
está no frasco de um determinado perfume ou de um sabonete; ou ainda, quando
58
um produto promete que se você usá-lo, possivelmente alguém ilhe oferecer
flores.
Muitas vezes, os produtos são apresentados por divinas “mulheres” – para
não dizer meninas que ainda se encontram em sua adolescência – que são
apresentadas pela propaganda extremamente sexualizadas e sensualizadas,
imprimindo no pensamento de todas as outras mulheres na sociedade, que o
corpo e a beleza ideal – como aquela apresentada pela imagem das modelos – só
poderão ser alcançados por meio daquela mercadoria X que foi publicizada pelos
meios de comunicação. Poderíamos aqui perder horas, demonstrando por meio de
exemplos publicitários, que efetivamente utilizam a questão da beleza juvenil
como chamariz, aos nossos desejos e afeições, para efetivamente vender
mercadorias.
Segundo o autor Wolfgang Fritz Haug – que iremos ver na próxima seção
–, a construção da beleza diferenciada das mercadorias que possuíam os mesmos
valores de uso, chamavam mais atenção do consumidor e assim a relação de
troca, ocorria mais rapidamente com elas, do que com aquelas não trabalhadas.
Ao observar essa lógica as empresas passaram a trabalhar arduamente na
produção do diferencial estético entre as mercadorias que possuíam a mesma
função. Neste mesmo processo, segundo este autor, as normas direcionadas
voltadas à mercadoria passaram tamm a coordenar a aparência dos homens
dentro da sociedade, e isso é o que veremos a seguir.
59
3. A análise sobre a exploração da estética da mercadoria na
Alemanha, a partir dos anos 30.
Wolfgang Fritz Haug, autor da obra Critica da Estética da Mercadoria, traz
em seu livro considerações de como já nos anos 30, na Alemanha, a questão da
estética elaborada da mercadoria se torna imprescindível para a realização das
relações de troca, e de como essa norma estabelecida para as mercadorias,
passou a integrar na mesma lógica, também os homens que as manipulavam, ou
seja, os vendedores.
Ele diz que a aparência pessoal – tamm elaborada – passou a ser uma
exigência das empresas. Respeitando a apresentação da mercadoria, cujo design
e a embalagem são o rosto do produto, os homens deveriam tamm estar
visualmente de acordo com a beleza própria da mercadoria.
Em seu livro há diversas passagens que trazem citações de estudos
realizados por um pesquisador chamado Siegfried Kracauer, que analisou – na
época – alguns estabelecimentos comerciais. Como podemos ver abaixo.
O que antigamente se impôs, sobretudo à classe de empregados —
em primeiro lugar, porém, aos vendedores e vendedoras, sob a
mobilização de medos sociais violentos — foi um novo padrão de
aparências, gestos de auto-apresentação. Kracauer observa nesse
processo “uma seleção efetuada sob a pressão das relações sociais
apoiada obrigatoriamente na economia, despertando-se as
respectivas necessidades dos consumidores [...]. (HAUG, 1996, p.96)
Kracauer deixou claro em seus estudos – segundo Haug; que em Berlim
estava se formando um tipo específico de empregado, a partir do comando
efetuado pelas empresas comerciais, coordenando a contratação de funcionários
que já fossem agraciados com formas simétricas, ou que se esforçassem para
apresentar tal simetria por meio de seu vestuário, e de cosméticos e maquiagens.
Assim, nessa procura pela beleza dos vendedores que valorizasse a própria
mercadoria, “[...] a linguagem, o vestuário, os gestos e as fisionomias se
assemelham, e o resultado do processo [...] foi [...] justamente aquela aparência
agradável”.(HAUG, 1996, p. 96).
Idas aos salões de beleza, como também o desenfreado uso de
cosméticos, tiveram papel decisivo na construção dessa nova aparência, que os
60
homens deveriam ter para serem aceitos integralmente no mercado de trabalho, a
partir de então começou a se formar no inconsciente coletivo da sociedade alemã,
a idéia que“[...] rugas e cabelos brancos levam a uma “menor capacidade de
faturamento”.(KRACAUER apud HAUG, 1996, p.96, grifo nosso)
A pressão gerada pelos estabelecimentos comerciais, aos seus
funcionários, culminou em um crescente aumento de gastos sociais com produtos
farmacêuticos e cosméticos que propunham por meio de seu valor de uso,
resgatar ou atribuir um equilíbrio nas formas humanas. A mercadoria cosmética
passou a ter um “poder” de gerar a agradabilidade exigida pelas lojas a qual
funcionava como um estimulo a mais para efetivação de troca.
A representação da mercadoria por meio da imagem de seus vendedores
– de acordo com Haug – transformou-se em exigência padronizada a todos
aqueles que estavam relacionados ao movimento de troca dos produtos. Essa
exigência fez com que os vendedores passassem a gastar cada vez mais com
cosméticos
22
e vestuários, com a intenção de que suas aparências pudessem
demonstrar a beleza e jovialidade imanentes aos produtos e exigida pelo capital.
Contudo esse movimento foi se ampliando e espalhando pela sociedade –
no caso estudado por Haug, foi o da sociedade alemã – contudo este era um
movimento que respeitava uma exigência universal do próprio capital, e isto
estava ocorrendo ou já havia ocorrido, também em outras sociedades capitalista.
A roupa nesse processo tornou-se a embalagem do homem dentro das
relações econômicas e sociais, que agora obedecia à norma estabelecida pelo
capital, para efetivar mais rápida e eficientemente sua realização. Por isso, muitas
propagandas apontavam para os indivíduos dentro do mercado oferecendo lhes
oportunidades jamais imaginadas, como podemos ver nesta recomendação da
revista alemã Twen de 1969, as suas leitoras: “torne-se arrebatadora, linda...
experiente o que você jamais experimentou. Se quiser sondar o mercado, você
precisa se oferecer na mais sedutora embalagem” (HAUG, 1996, p. 105)
22
As pessoas comentem atos extremos em nome da beleza. Investem tanto de seus recursos e
arriscam tanto por ela, que parece que a vida depende disso. No Brasil,mais mulheres
vendendo Avon do que membros no exército. Nos Estados Unidos gasta-se mais dinheiro com
beleza do que com educação ou serviços sociais. Toneladas de maquiagem — 1484 tubos de
batom e 2055 potes de produto para a pele — são vendidas por minuto (ETCOFF, 1999, p. 14-5).
61
As mulheres foram o primeiro alvo. E o setor de moda feminina foi pioneiro
nesse intento. Em 1960 o setor de moda feminina na Alemanha, como em toda
Europa e nos EUA, já obedecia ao ritmo firme da obsolescência de estilo, que foi
um dos “truques” encontrados pela economia como nos lembra Packard para
acelerar a velocidade da rotação econômica deste produto. Consistia em criar
ciclos temporais para o uso de um determinado tipo roupa, estabelecendo, por fim,
períodos regulados pelas estações do ano, nos quais eram apresentadas novas
criações estéticas da mercadoria, com a intenção de induzir as mulheres ao
consumo.
Mas a intensificação dessa indução de procura pela beleza e
principalmente a beleza juvenil, por meio do capital sobre os indivíduos, se deu no
momento de “boom” do capitalismo, ou seja, no momento do pós Segunda Guerra
Mundial – momento no qual, houve o a ampliação da possibilidade de compra pela
sociedade, graças à ampliação do desenvolvimento produtivo mundial. E as
grandes campanhas de venda que eram veiculadas nos meios de comunicação e
propagadas para toda sociedade, ditaram veladamente um novo padrão
comportamental.
As indústrias químicas – de cosméticos e farmacêuticas – acabaram
lucrando muito com isso e suas vendas
23
cresceram intensamente, nos últimos
anos, pois elas apresentaram inovações no mercado num processo contínuo. As
promessas dos novos lançamentos cada vez mais aprimorados tentavam
satisfazer as novas necessidades humanas – que foram enfim geradas
historicamente, para atender as expectativas reprodução do capital.
Tintas de cabelos, maquiagens e até cirurgias plásticas são os meios
encontrados pelos homens e mulheres para não serem “retirados de uso como
mercadorias velhas [...]”. (HAUG, 1996, p.95 grifo nosso) Atrás da característica
de juventude ou jovialidade, estavam imersas as intenções por parte do capital, de
retirar o máximo de energia do trabalhador. Os jovens por suposto, estariam no
23
O aumento das vendas de cosméticos entre 1966 e 1967, na Alemanha, em torno de 10,
ultrapassando os três milhões de marcos, “fez a industria de beleza praticamente o único setor a
crescer na Alemanha Ocidental” durante a recessão ... o valor de produção de cosméticos
aumentou em 16% no primeiro semestre de 1968 comparando ao mesmo período de 1967.
(HAUG, 1996, 109 e 141)
62
ápice dessa potência pretendida pelo movimento metabólico de produção e
reprodução do capital e dessa forma, os homens passaram a retirar do corpo da
mercadoria, tudo o que necessitavam para não se tornarem obsoletos ao capital,
ou seja, terem sempre uma aparência renovada.
Quem busca o amor faz se bonito e amável. Todas as jóias e tecidos,
perfumes e maquiagens oferecem-se como meio para representar a
beleza e a amabilidade. Do mesmo modo, as mercadorias retiram a
sua linguagem estética do galanteio amoroso entre os seres
humanos. A relação então se inverte, e as pessoas retiram sua
expressão estética das mercadorias. Ou seja, ocorre aqui uma
primeira reação conjunta da forma de uso das mercadorias motivadas
pela valorização sobre a sensualidade humana. (HAUG, 1996, p.30,
grifo nosso)
As promessas das mercadorias se intensificam, e os padrões a serem
usados são lançados a todo o momento no mercado, eles estabelecem como os
homens devem se apresentar a cada estação para estar em acordo com as
preferências do capital.
63
Parte 3
Desenvolvimento tecnológico como força motriz do
movimento econômico.
O desenvolvimento cientifico e tecnológico percorre um caminho que por si
é social, mesmo quando os achados científicos são usados de forma maniqueísta
– para o “bem” ou para o “mal”. A produção científica humana, portanto é
resultado de “imediata expressão de sociabilidade (Gesellschaftlichkeit)” (MARX,
2004, p.107)
Posto que também sou cientificamente ativo etc., uma atividade que
raramente posso realizar em comunidade imediata com outros, então
sou ativo socialmente, porque [o sou] enquanto homem. Não apenas
o material de minha atividade – como também a própria língua na
qual o pensador é ativo – me é dado como produto social, a minha
própria existência é atividade social; por isso, o que eu faço a partir de
mim para a sociedade, é com a consciência de mim como ser social.
(MARX, 2004, p.107)
Os achados científicos possibilitaram a comodidade ao homem, menos
dispêndio de energia e, portanto maior possibilidade ao aproveitamento da vida –
graças ao processo histórico de desenvolvimento humano. Contudo, sob o modo
de produção capitalista, não é possível a todos aproveitar desta vantagem, pois a
divisão social do trabalho não permite que todos tenham acesso a tudo da mesma
maneira.
Este modo de produção também não possibilita o emprego de todos no
mercado de trabalho, e em seu processo de desenvolvimento gera um exército
industrial de reserva – que às vezes é chamado para compor a frente de trabalho,
mas na maioria das vezes não. Atualmente o capitalismo passa por um processo
de crise estrutural, na qual sua composição orgânica cresce, e despreza o
emprego de mão-de-obra, gerando um crescente número de desempregados,
dessa forma a grande maioria das vantagens encontradas neste longo caminho
humano, fica restrito a uma pequena parcela, que está beneficiada pela posição
social que ocupa dentro deste sistema.
Mas o desenvolvimento tecnológico e científico, trazido a reboque do
desenvolvimento econômico, e vice e versa, possibilitou a grande parte das
64
pessoas usufruir grandes conquistas encontradas para sanar as necessidades
humanas, que muitas vezes são imperceptíveis se não pararmos para refletir
sobre o tema. Em nossos dias atuais, pequenos detalhes formam uma grande
quantidade de conquistas científicas, que estão imersas em nosso cotidiano por
meio de bens de consumo duráveis ou não, e elas foram elaboradas com a
intenção explícita de facilitar a vida humana – mesmo que sob o jugo do capital.
E sobre os milhares de objetos que se tornaram produtos com a efetivação
da relação de troca, estão anos de pesquisas voltadas para o aprimoramento
destes produtos, nesse processo de estudos voltados para o objeto, há um fator
que é indispensável para as empresa, o fator custo e benefício, e a partir dele é
traçada a logística de produção e distribuição.
Para que um tal produto seja inserido no mercado é necessário uma série
de considerações, e o que nosso trabalho pretende mostrar, é que duas dessas
considerações – econômicas – colocadas em prática pelas empresas, estão
imbricadas neste processo – que tem por objetivo final a realização do valor, ou
seja, da realização do excedente que foi empregado com a intenção de acumular
capital e ampliar a capacidade produtiva –, e elas tem por objetivo, ao nosso ver,
causar uma aceleração no processo de circulação econômica da mercadoria, por
isso foram empregadas desde de o pós II Guerra Mundial de maneira tão
intensificada.
As duas considerações que falamos acima são elas: 1º. a exploração das
características inatas do valor de uso da mercadoria, por meio da de sua estética
e a ampliação e exploração de características que possam se ligar a mercadoria e
motivar o consumidor a possuí-la, como se fosse um novo “valor de uso
direcionado a uma satisfação psicológica, produzido pelas agências de
publicidade sobre o produto e explicitado pelas campanhas de venda; 2° é o
aprimoramento da pesquisa que leva o produto a um tempo de vida menor, seja:
por meio de uma indução psicológica direcionada ao consumidor, fazendo ele
desejar o novo produto e deixar o antigo de lado; seja por desenvolver cada vez
mais as funções dos produtos, deixando ultrapassado o último lançamento do mês
passado; ou ainda desenvolver por meio de pesquisas, um limite de uso ao
65
produto, fazendo-o ficar obsoleto por não mais apresentar eficiência em suas
funções, deteriorando-se intencionalmente.
Mas antes, devemos fazer uma pausa sobre o tema complexo industrial militar,
pois todo o desenvolvimento relevante ao setor civil se deu exatamente como
herança das pesquisas direcionadas primeiramente ao setor militar, já que ele
representa a “máxima expansão possível com taxa de uso decrescente”
(MÉSZÁROS, 2002, p.73),
como bem colocou Mészáros.
1. Complexo Militar-Industrial
Como nos esclarece Jorge Cádima em seu artigo O negócio do armamento
e o complexo industrial-militar, a origem do conceito “complexo industrial-militar”,
muito utilizado por Mészáros em sua obra Para Além do Capital – que o utiliza
para designar o poderio militar e político utilizado pelo capitalismo atual, para
seguramente fazer circular toda economia mundial. Ele diz que este conceito ficou
popular através do ex-presidente dos Estados Unidos e general Eisenhower, que o
utilizou com ênfase, em 1961, em seu discurso de despedida de seus oito anos de
mandato presidenciável, para demonstrar sua eficiência nesta área.
Achamos relevante levantar aqui algumas perguntas a respeito do tema
“complexo militar industrial”, como por exemplo: por que o complexo industrial
militar se desenvolveu estrondosamente no pós-guerra? E por que essa produção
direcionada a destruição é tão importante para o capitalismo? Acreditamos que
tentar responder estas perguntas seja imprescindível, para demonstrar que o
desenvolvimento deste setor está diretamente ligado ao objeto de nossa pesquisa.
Pois a reboque do setor industrial militar o setor industrial civil, captou a
experiência deste, e ampliou as funções de seus produtos, como tamm pode
aplicar os anos de pesquisa despendida sobre a taxa de utilização decrescente
dos materiais bélicos para desenvolver os bens de consumo que poderiam ser
duráveis ou obsolescentes, dependendo dos materiais que comporiam o corpo do
produto.
66
O instrumento disposto e capaz de romper o nó gordio de como
combinar axima expansão possível com a taxa de utilização
mínima apresentou-se ao capital na figura do complexo militar-
industrial, após uma série de tentativas fracassadas em lidar com os
problemas de superprodução de modo menos perdulário a partir da
crise econômica mundial de 1929/33. Ainda que os primeiros passos
para a encontrar uma solução para a super produção, por meio da
produção militarista, tivessem sido dados antes da Primeira Guerra
Mundial, como vimos nas proféticas observações de Rosa
Luxemburgo, sua adoção geral ocorreu somente após a Segunda
Guerra Mundial. (MÉSZÁROS, 2002, p. 685)
As estratégias de indução ao consumo – nos casos específicos das
obsolescências de função e de qualidade – utilizadas, intensamente pela
economia, no período do pós-guerra, orientada para fazer circular mais
rapidamente o capital no setor dos bens duráveis, são tributárias ao
desenvolvimento do setor militar. Que uma vez desenvolvido, trouxe consigo
novas descobertas científicas que puderam ser aplicadas em outras áreas
industriais.
A princípio, sabemos que o desenrolar de uma guerra gera destruição de
cidades e uma grande quantidade de material humano, todavia a partir da
destruição há possibilidade do crescimento econômico, uma vez que com a
reconstrução, amplia-se o espaço do mercado e minimizam as possíveis pressões
internas geradas pelos conflitos sociais – resultados da desigualdade social e do
crescente desemprego – já que, grande parte da mão de obra ociosa foi
eliminada. A guerra é, portanto, vista positivamente pelo setor econômico.
O período da Guerra Fria foi marcado por um grande processo de
desenvolvimento tecnológico e científico, de ambos os lados envolvidos. A URSS,
passou de um estágio praticamente campesino, para um estágio de
desenvolvimento regrado pela competição científica dos armamentos nucleares e
pela corrida espacial; os Estados Unidos, na questão nuclear já havia provado sua
potência no final da segunda guerra Mundial ao desintegrar Hiroshima e Nagasaky
com potentes bombas atômicas.
Esse processo de corrida científica sob o manto do terror nuclear,
possibilitou aos EUA, um desenvolvimento sem igual nas áreas: da informática,
eletrônica, química, comunicação etc; o setor do automobilismo auxiliado pelas
67
novidades tecnológicas ampliou seu mercado, como diria José Arbex em seu livro
A outra América,
Se a técnica criara o grande boom, tornara-se, também, afiançadora
da felicidade. Conquistas da ciência e da indústria foram elevadas à
categoria de símbolos e ícones da identidade americana. O
consumismo desenfreado colocava nas mãos da classe média a
ilusão de possuir a chave para o mundo mágico das máquinas,
mediante a compra de objetos e quinquilharias eletrônicas. Hollywood
exportava para o mundo a idéia de que a felicidade está num carrinho
de supermercado. (ARBEX, 1998, p.36)
A ameaça nuclear propiciou o desenvolvimento tecnológico inimaginável a
vários setores da sociedade, e a ele produziu uma mútua intimidação, já que o
poderio militar servia como meio de manobras diplomáticas.
O poderio militar existe como uma sanção da política externa de uma
nação; é usada como meio de intimidar as intenções agressivas de
outros estados; acentua as manobras diplomáticas; é em suma um
elemento essencial da psicologia política. A manifestação da
capacidade de recorrer à força serve para influenciar o
comportamento de outras nações. (TARR, 1966, p. 16)
Segundo Lima Filho, em sua tese A Economia Política do Complexo
Industrial-Militar – o Caso do Brasil; diz:
[...] a busca pela auto-suficiência, [...] imporia a sociedade,
conseqüentemente, a necessidade de manutenção de uma
mobilização permanente para a guerra. Isso geraria o conúbio
irrefreável entre militares e a indústria – que expressaria, assim, a
segurança do estado e sua preponderância sobre ele. E que
seria o núcleo vital da atividade econômica (que direta ou
indiretamente estaria coordenando o desempenho da maioria dos
setores industriais) ele submeteria a si a ciência a técnica – ambas
caminhando juntas, voltadas para o mesmo fim. Ou seja, a
garantia do poder do império e da segurança nacional. (LIMA
FILHO, 1993, p. 140)
E ainda de acordo com Paulo Lima, o capital monopolista americano, uma
vez conquistado o status de “senhor quase absoluto” do Estado devido à guerra,
passou a querer estar sempre na cena principal e se recusava a uma política de
paz, apostava numa economia em permanente estado de guerra, que permitisse a
expansão do capitalismo. A guerra segundo ele “definitivamente consolidara a
expansão universal dos apetites do capital monopolista” (LIMA FILHO, 1993, p.
148) E o período da Guerra Fria só veio naturalizar essa relação.
68
Por isso que o agente capaz e disposto – segundo Meszáros – de combinar
máxima expansão possível com uma taxa de utilização decrescente mínima foi o
complexo militar-industrial. Segundo ele CMI (Complexo Militar Industrial):
[...] remove as restrições tradicionais do círculo de consumo definido
pelas limitações do apetite dos consumidores. Neste aspecto, ele
corta o nó gordio altamente intrincado do capitalismo “avançado” ao
reestruturar o conjunto da produção e do consumo de maneira a
remover, para todos os efeitos e propósitos, a necessidade do
consumo real. Em outras palavras, aloca uma parte maciça e sempre
crescente dos recursos materiais e humanos da sociedade a uma
forma de produção parasitária e que se autoconsome, tão
radicalmente divorciada e, na verdade, oposta à real necessidade
humana e seu consumo correspondente que pode divisar como sua
própria racionalidade e finalidade última até mesmo a total destruição
da humanidade. (MÉSZÁROS, 2002, p.688).
Devemos considerar que a Guerra, sempre foi utilizada para expansão
econômica dos povos, pois a medida em que destrói materialmente localidades –
paises ou regiões – possibilita a abertura de brechas para consolidar um novo
mercado. No caso específico da Guerra Fria, ela funcionou como propulsora de
desenvolvimento tecnológico na área militar, que repercutiu para todas outras
áreas, podemos dizer que o avanço científico ocorrido em vinte anos pode superar
o avanço científico de duzentos anos anteriores.
Nesse processo, segundo István Mészáros, o Capitalismo “avançado” com
seu objetivo auto-expansivo, destaca-se através o complexo militar-industrial, que
“tem todo o sistema orientado no sentido de produção para a destruição [...] em
conformidade com a lei tendencial da taxa de utilização decrescente, capaz de se
aproximar teoricamente, do índice zero. (MÉSZÁROS, 2002, p.693).
Podemos perceber como exemplo do que Mészáros está falando, quando
André Gorz vai discorrer sobre como é feito o calculo sobre o PNB (produto
nacional bruto) de um país, em seu livro Adeus ao Proletáriado de 1965, ele diz:
Todo crescimento da produção e das compras, compreendendo aí as
quantidades crescentes de embalagens descartáveis, de aparelhos e
de metais jogados fora, de papéis queimados com o lixo, de utensílios
quebrados sem conserto, de próteses e de tratamentos médicos para
mutilados pelo trabalho e pelos automóveis — e guerras. As
destruições surgem, dessa forma, como fontes de riqueza, porque
tudo o que é quebrado, jogado fora e perdido deverá ser substituído e
dará lugar a produções, e vendas de mercadorias, a fluxos de
dinheiro, a lucros. Quanto mais rapidamente as coisas quebrarem,
forem usadas passarem de moda, forem jogadas fora, maior será o
69
PNB e mais as contabilidades nacionais irão declarar que somos
ricos. Mesmo os ferimentos e as doenças são computados como
fontes de riqueza na medida em que fazem crescer o consumo de
medicamentos e de tratamentos médicos. (GORZ, 1965, p.145 – grifo
nosso).
Acreditamos que através desta pequena reflexão sobre o complexo militar-
industrial, conseguimos responder porque o complexo industrial militar se
desenvolveu estrondosamente no pós-guerra e porque essa produção direcionada
a destruição é tão importante para o capitalismo. Lembrando que o Estado
americano assumiu um papel forte no que diz respeito à defesa militar, e
principalmente na luta contra o comunismo. Dessa forma os grandes gastos
militares serviram de apoio a política keynesiana, que assim alcançava o principal
objetivo liberal – e que durante os primeiros anos do pós-guerra esses gastos
pareceram essenciais devido à política de Stalin na Europa. Mais tarde, estes
gastos direcionados ao complexo militar-industrial foram se justificando por meio
de todas as outras guerras que se apresentavam como necessárias ao
capitalismo.
70
PARTE 4
O
BSOLESCÊNCIA
A obsolescência da mercadoria ou taxa decrescente do valor de uso
24
da
mercadoria, são categorias criadas para designar a deterioração consciente ou
intencional da mercadoria realizada pelas empresas com a intenção de uma
velocidade maior da circulação desta pelo mercado.
Essa lógica, que se acentuou no capitalismo contemporâneo, deu
origem a uma das tendências mais importantes do modo de produção
capitalista, que Mészáros denomina taxa de utilização decrescente do
valor de uso das coisas. “O capital não considera valor de uso (o qual
corresponde diretamente à necessidade) e valor de troca como coisas
separadas, mas como um modo que subordina radicalmente o
primeiro ao ultimo” (idem:566). O que significa que uma mercadoria
pode variar de um extremo ao outro, isto é, desde ter seu valor de uso
realizado, num extremo da escala, até, no outro extremo, jamais ser
usada, sem por isso deixar de ter, para o capital, a sua utilidade
expansionista e reprodutiva. Essa tendência decrescente do valor de
uso das mercadorias, ao reduzir a sua vida útil e desse modo agilizar
o ciclo reprodutivo, tem se constituído num dos principais mecanismos
graças ao qual o capital vem atingindo seu incomensurável
crescimento ao longo da história (ANTUNES, 2002, p.567)
Nesta parte do trabalho iremos tratar da obsolescência, ou seja, o ato ou
efeito de tornar descartável e frágil um produto, por meio dos materiais utilizados
em sua composição; ou ainda o ato de tornar descartável uma mercadoria através
da exploração psicológica da desejabilidade humana, pois o lançamento de um
novo produto, com mais brilho e beleza, serviria para instigar os consumidores a
substituir o produto antigo determinando assim seu tempo de uso.
E para tratar do tema da obsolescência devemos começar pelo setor de
pesquisa e desenvolvimento das empresas, que dedica longas horas de estudo
sobre um novo objeto, antes de ele ser consagrado em mercadoria e ser
24
Taxa de utilização decrescente do valor de uso da mercadoria é o termo utilizado por Mészáros,
para designar o processo de degradação ou deterioração empregado à mercadoria, muito utilizado
pelas empresas principalmente nos últimos quarenta anos. Contudo preferimos utilizar o termo
obsolescência da mercadoria no lugar de taxa de utilização decrescente do valor de uso, primeiro
porque ao nosso ver contempla a proposição da categoria criada por Mészáros e segundo, porque
entendemos que ela permite uma maior precisão ao objeto estudado, já que ele se desdobra em
três classificação: obsolescência da desejabilidade, obsolescência da função e obsolescência da
qualidade, essa singularidade feita pelo conceito, nos permite objetivar fenômenos distintos de uma
mesma categoria que é a obsolescência.
71
direcionado enfim ao mercado. É no setor de pesquisa e desenvolvimento, que se
efetuam inúmeros testes nos novos produtos, para que estes sigam as normas de
qualidade e de custo razoavelmente apresentáveis ao mercado, e para que
possam competir com os concorrentes.
Mas para a economia como um todo, o efeito é sem dúvida positivo.
Numa sociedade com um grande estoque de bens de consumo
duráveis, como os Estados Unidos, um componente importante da
procura total de bens e serviços repousa na necessidade de substituir
parte desse estoque quando se desgasta ou é posta de lado. A
obsolescência pré-fabricada aumenta a taxa de desgaste e freqüentes
modificações no modelo aumentam a taxa de substituição[....] O
resultado líquido é uma intensificação na taxa de procura de
reposição, e um surto geral na renda e no emprego. Sob esse
aspecto, como em outros, as campanhas de vendas constituem um
poderoso antídoto para a tendência do capitalismo monopolista de
afundar-se num estado de depressão crônica. (BARAN, P. &
SWEEZY, 1966, p.135-136).
Neste sentido, a obsolescência apresentada pelo produto pode ser muitas
vezes resultados de anos de pesquisa direcionados a uma menor vida útil da
mercadoria, decorrência principalmente do emprego de materiais de baixo custo,
utilizados intencionalmente para garantir lugar junto à concorrência.
Para o mercadólogo, a qualidade intrínseca de um produto não
necessariamente coincide com sua capacidade de satisfazer os
padrões ótimos de desempenho tecnológico viáveis dentro da
capacidade produtiva e dos recursos da empresa. Para melhor
atender a demanda o mercadólogo, por vezes, pleiteia uma
redução desses padrões técnicos de qualidade, se isto para ele
implica em vantagens como, por exemplo, a possibilidade de uma
redução do preço que torna o produto mais competitivo.
(RICHERS, 1985, P.47)
A obsolescência induzida da mercadoria pode ser observada com maior
intensidade, nesses últimos quarenta anos, agindo sobre o nosso cotidiano social,
através do decréscimo da vida útil de cada objeto de consumo, graças ao grande
desenvolvimento da tecnologia – tributária ao desenvolvimento tecnológico do
setor militar. Para melhor entender o que estamos falando basta recordarmos
como as mercadorias eram feitas e os materiais que eram utilizados em sua
constituição, que lhes davam um maior tempo de duração. Como é o caso do
ferro e do aço, que com o desenvolvimento tecnológico foram sistematicamente
substituídos pelo plástico ou materiais próximos, como outros polímeros.
72
[...] o capital depara agora com a grande durabilidade de seus
produtos. Uma técnica que responde a essa questão – sobretudo
na área de artigos de consumo duráveis, como automóveis
eletrodoméstico, lâmpadas e produtos têxteis —, consiste em
piorar a qualidade dos produtos. Essa técnica modificou
radicalmente o padrão do valor de uso em várias áreas de
consumo privado, levando à resistência e durabilidade menores.
Essa técnica de diminuão do tempo de uso foi discutida sob o
conceito de “obsoletismo artificial”, traduzido pela expressão
“deterioração do produto”. As mercadorias são fabricadas com
uma espécie de detonador, que dá início a sua autodestruição
interna depois de um tempo devidamente calculado (HAUG, 1996,
p. 53).
Recorremos aqui a um pedaço do texto literário de Arthur Miller, que
expressa muito bem está situação de obsolescência da mercadoria, que foi
sentida pelo autor e expressada pela personagem Willy Loman em sua obra Morte
do Caixeiro Viajante
25
.
”Pelo menos uma vez na vida, eu gostaria de possuir inteiramente
alguma coisa antes que se quebrasse! Estou sempre apostando
corrida com o ferro-velho! Mal acabo de pagar o automóvel, e ele está
no fim. O refrigerador consome correias como um maldito maníaco.
Eles marcam tempo para esses produtos. Eles marcam tempo para
que estejam gastos quando a gente finalmente acabar de pagá-los”.
(MILLER, Arthur apud PACKARD, 1965, p.49)
A economia adotou a celeridade como medida para a vida útil dos
produtos, a custo da precarização da qualidade da mercadoria, com intenção de
maior lucro. Esta tendência, segundo (Mészáros, 2002, p. 670), pode ser
notada através “da crescente velocidade de circulação e do turnover de capital”
e que, segundo ele, foram necessários como desdobramentos do “capitalismo
de consumo”. Dessa forma se intensificou o estudo econômico sobre a taxa de
utilização da mercadoria para que esta fosse cada vez mais decrescente,
permitindo a circulação mais rápida de novos produtos. Como disse Mészáros,
como a produção em massa não conseguia deixar distantes os lobos da crise
de expansão da produção.
Torna-se, desse modo, necessário divisar meios que possam reduzir
a taxa pela qual qualquer tipo particular de mercadoria é usada,
encurtando deliberadamente sua vida útil a fim de tornar possível o
25
Vance Packard usa este mesmo texto como epigrafe para tratar do capitulo que tem o titulo:
Progresso Através da Obsolescência em seu livro Estratégia do Desperdiço de 1965, que faremos
uso neste trabalho.
73
lançamento de um continuo suprimento de mercadorias
superproduzidas no vórtice da circulação que se acelerar. A notória
“obsolescência planejada” em relação aos “bens de consumo
duráveis” produzidos em massa; a substituição, o abandono ou o
aniquilamento deliberado de bens e serviços que oferecem um
potencial de utilização intrinsecamente maior (por exemplo, o
transporte coletivo) em favor daqueles cuja taxa de utilização tende a
ser muito menor e, até mínima (como o automóvel particular) e que
absorvem uma parte considerável do poder de compra da sociedade;
a imposição artificial da capacidade produtiva quase que
completamente inutilizável […].(MÉSZÁROS, 2002, p. 670)
A utilização de materiais de baixo custo e técnicas de obsolescência se
constituem ainda, em táticas para abrir novos mercados de consumo ou “nichos
mercadológicos, que são direcionados as diferentes classes sociais que se
distinguem pela classificação alfabética A,B,C,D e E
26
.
Segundo o professor de Psicologia da Comunicação da Escola de
Comunicações e Artes da USP, Ismar O. Soares em seu livro Para uma Leitura
Critica da Publicidade, após estudos realizados pelo instituto Marplan de
pesquisas em 1983, foi possível detectar que as classes A,B,C,D e E, não
estavam tão distantes em relação ao consumo, e por isso, segundo ele, as classes
C, D e E deviam merecer mais atenção.
Ele disse ainda que, a partir dessa pesquisa tão abrangente, realizada em
oito mercados pesquisados – na Grande São Paulo, Grande Rio de Janeiro,
Salvador, Grande Recife, Curitiba, Grande Porto Alegre, Grande Belo Horizonte e
Brasília –, mostrou que “nem todos os planos de mídia devem ser direcionados
apenas às classes A e B” uma vez que 73% da população urbana pertence as
classes mais baixas.
Por volta dos anos de 1920 e 1930 [...] foi a General Motors (GM)
quem primeiro elaborou uma estratégia de marcas no plural — a
corporação empreendeu diferentes estratégias de produtos,
ligadas a campos imaginários diversos. Antecipando a idéia de
segmentação de mercado, e desejando estar presente em
diferentes segmentos, a GM desenvolveu, então, um leque não
apenas de produtos, mas também de marcas inspiradas em
conceitos diversos: Cadillac, em prestígio; Buick, em luxo;
Oldsmobil, em inovação técnica; Pontiac, Chevrolet (cf. Broustail,
1992). Sloan, o homem que transformou a General Motors na
maior empresa mundial, compreendeu que a função das marcas
26
SOARES, Ismar de Oliveira - Para uma Leitura Critica da Publicidade, São Paulo, Edições
Paulinas, 1988.
74
não seria apenas a de distinguir objetos, mas a de servir também
como instrumento de identificação, distinção e demarcação de
indiduos e de grupos sociais. (NORBERTO, v. 16, n. 2, 2004)
As diferentes marcas de produtos visam atender características específicas
dos nichos mercadológicos, com as fusões e incorporações
27
de algumas
empresas, ocorreu tamm a duplicação de marcas de um mesmo produto para
atender segmentos diferentes dentro da sociedade. Os consumidores passaram a
encontrar uma grande a variedade de produtos, graças ao alargamento de ofertas
oferecidas pelas diversas linhas das empresas, como tamm a possibilidade de
um menor preço na aquisição da mercadoria, graças a utilização de matéria prima
de menor qualidade, como tamm devido a concorrência e aos “entrechoques”
das marcas.
O problema da obsolescência do produto pode ser sentido pelo consumidor
com um problema de garantia ou qualidade, nesta categoria podem ser incluídos
defeitos de fabricação, mau funcionamento, prazos de validade estipulados dos
produtos, lançamento de novos produtos etc.
Os homens de negócio desenvolveram através dos anos uma
variedade de expressões para descrever aquele ponto crítico em que
seu produto se estragará ou terá probabilidade de estragar-se. Falam
em “ponto de utilidade exigida”, emépoca de falha” ou em “data de
morte do produto”. Estabelecer o tempo de vida provável de um
produto não é muito difícil. Muitas vezes é possível fazer
determinando a duração da vida de seu elo mais fraco. A vida de um
produto tende a sero longa quanto à daquele elo, especialmente se
ele for difícil de substituir (PACKARD, 1965, p. 53).
27
Podemos lembrar o caso da Batavo e da Parmalat, que se fundiram e passaram a atuar em
diversos segmentos do mercado, até que a Parmalatrepresentada por seus acionistas
começou a apresentar dificuldades financeiras, e hoje a Batavo assume a liderança e amplia seu
mercado com a fabricação de diversos produtos que visam atender os mais diferenciados públicos.
Como podemos ver neste pedaço do artigo apresentado no 09/03/2005, na revista eletrônica Isto é
Dinheiro: “Com a casa arrumada, a Batavo deu início a uma avalanche de produtos, sobretudo
derivados refrigerados de leite, como iogurtes, leites fermentados e sobremesas. Só em 2004, 44
novidades chegaram ao varejo. Em pouco mais de um ano, o portfólio de produtos saltou de 110
para 202. A Batavo aproveitou o encolhimento da Parmalat para se lançar no mercado onde os
italianos eram mais fortes, o de leites especiais, aqueles reforçados por vitaminas, cálcio, ferro,
entre outros. A Batavo, aliás, garantiu que a marca Parmalat não desaparecesse inteiramente das
gôndolas. Em outubro de 2003, a companhia paranaense havia assinado um contrato de uso da
marca italiana no mercado de refrigerados. Quando a crise veio, os italianos tentaram recuperar os
direitos. O caso foi parar mais uma vez nos tribunais e a Batavo levou a melhor nos julgamentos
das duas primeiras instâncias.Mas o embate jurídico entre elas continua, tanto pelo controle
acionário, como pelo uso da marca”.
http://www.terra.com.br/istoedinheiro/391/negocios/socio_sumiu.htm
75
As empresas desenvolveram setores que permitiam promover a criação
de novos produtos que apresentavamnovidades”, a cada ano ou mês – para
incentivar um consumo mais veloz – as novidades podiam ser representadas por
um design diferente ou uma função nova acoplada a um modelo antigo. Coube ao
o setor de desenvolvimento e pesquisa estipular ou prever um prazo de validade
aos produtos, encurtando sua vida útil deliberadamente, forçando assim uma nova
troca no mercado, já que não compensava o conserto da mercadoria. Essas
práticas começaram a se intensificar no pós-guerra, mas se estenderam até aos
dias atuais.
A idéia de criar obsolescência de qualidade através de falhas
materiais não é um conceito novo. Em fins da década de 1920,
Advertising & Selling publicou uma declaração de J. George Frederick
sobre o problema do aumento do consumo. Condenou com um
“simples paliativo sem importância” as propostas dos políticos liberais
no sentido de se colocar mais dinheiro nas mãos dos consumidores.
Alavanca muito mais poderosa, disse ele, era o “princípio” para o qual
havia imaginado o nome de “obsolescência progressiva”. Significa
isso simplesmente incutir nas pessoas que tinham dinheiro para
gastar o hábito de “comprar mais mercadorias na base de
obsolescência em eficiência, economia, estilo ou gosto” (PACKARD,
1965, p. 54).
Os anos de guerra interromperam temporariamente o “crescente
impulso” contra a durabilidade [...]. Entretanto, na década de 1950, o
problema da crescente produtividade de artigos de consumo estavam
novamente afligindo os produtores. Muitos de seus vendedores
comaram a falar desajeitadamente sobre a necessidade de maior
obsolescência. Em seu número de fevereiro de 1959, Dun’s Review
and Modern industry publicou um artigo de Martin Mayer, autor de
Madson Avenu, U.S.A., intitulado: “Obsolescência Planejada: Solução
para Mercados Cansados?” (PACKARD, 1965, p. 57)
.
Segundo o sociólogo americano Vance Packard em seu livro Estratégia do
Desperdício de 1965, deixa claro que a obsolescência planejada da mercadoria,
alcançou altos índices no fim da década de 1950, no período do pós-guerra,
principalmente nos Estados Unidos da América, e foi empregada tanto para
estimular o consumo como também influenciar a atitude mental do consumidor.
76
Ao analisar o processo de seu emprego no interior dos Estados Unidos
28
,
ele pôde observar que a prática da obsolescência da mercadoria seguia três
momentos diferentes, e assim ele classificou em três conceitos a obsolescência,
como podemos ver abaixo:
Obsolescência de função. Nesta situação, um produto existente torna-
se antiquado quando é introduzido um produto que executa melhor a
função.
Obsolescência de qualidade. Neste caso, quando planejado, um
produto quebra-se ou gasta-se em determinado tempo, geralmente
não muito longo.
Obsolescência de desejabilidade. Nesta situação, um produto que
ainda está sólido, em termos de qualidade ou perfomance, torna-se
“gasto” em nossa mente porque um aprimoramento de estilo ou outra
modificação faz com que fique menos desejável. (PACKARD, 1965, p.
51- grifo do autor)
Essas formas de obsolescências acima apresentadas foram as
modernas estratégias planejadas e usadas pelas empresas, que visavam um com
a aceleração da circulação da mercadoria, obter maior lucro. Todavia é de nosso
conhecimento, não ser novidade do capitalismo atual, planejar a circulação da
mercadoria por meio de sua durabilidade, isso já era feito no século XIX, como
podemos ver no texto de Paul Lafargue em sua obra O Direito à Preguiça escrito
em 1880.
Em nossas províncias laníferas, desfiam-se trapos sujos e meios
podres para fazer panos ditos da renascença, que duram o que
duram as promessas eleitorais. Em Lyon, em vez de deixar a fibra da
seda com sua simplicidade e flexibilidade naturais, sobrecarregam-na
com mais sais minerais que, aumentando-lhe o peso, tornam-na
quebradiça e pouca utilidade. Todos os nossos produtos são
adulterados a fim de facilitar seu escoamento e encurtar sua
existência. Nossa época será chamada de idade da falsificação, do
mesmo modo como outras épocas da humanidade receberam os
nomes de Idade da Pedra, Idade do Bronze, derivados de seu modo
de produção. (LAFARGUE, 1999, p.98 – grifo nosso)
A proposição de Lafargue de uma “idade da falsificação” já no século XIX
soaria extremamente atual à nossa época. Não obstante, soaria tamm como
uma afirmação muito incontida, tendo em vista a sistemática aplicação do
28
Nos EUA foi sem dúvida o local — segundo nossas pesquisas — onde inicialmente foi
empregado com grande intensidade a prática de estratégias planejadas de obsolescência da
mercadoria, no período do pós-guerra para estimular a circulação do capital.
77
processo de obsolescência vista no século XX. Para isto, basta compararmos o
aumento ainda mais acentuado da fragilidade dos produtos de outrora.
Mészáros considera que esta prática de estratégias planejadas de descarte
perdulário de bens perfeitamente utilizáveis conseguiu atingir altos índices nas
décadas do pós-guerra, e puderam “ser consideradas como poderosas alavancas
de expansão capitalista” (MÉSZÁROS, 2002, p.671). Principalmente com o
emprego dessa estratégia no complexo industrial militar.
1. Estética da mercadoria e a obsolescência da
desejabilidade.
Para aprofundar na questão das diferentes obsolescência, primeiramente
daremos início à obsolescência da desejabilidade, pois é por meio da estética ou
da aparência do produto, que o homem trava o primeiro contato com a
mercadoria. É por meio dos cinco sentidos que os homens são estimulados, mas é
principalmente pela audição e visão, que ele percebe o universo mercadológico, já
que os meios de comunicação utilizados para publicizar determinados produtos
são em geral: a televisão, o rádio, cartazes, jornais, outdoors etc.
Por isso a estética da mercadoria acaba exercendo uma função muito
importante na apresentação do valor de uso do produto, pois quanto mais
elaborada, colorida, brilhante e envolvente, maiores são as chances de efetuar a
troca.
A mercadoria per se deve criar desejos no homem a respeito de si,
primeiramente devido ao seu valor de uso - segundo os autores que trabalhamos
nesta pesquisa, as mercadorias precisam se tornar desejadas para que possam
ser trocadas. E é por meio do valor de uso que a atração se concretiza, dessa
forma a empresas empregaram e empregam grandes esforços para criar mais
encantos ao valor de uso das mercadorias. Com a intenção de transformá-las em
coisas imprescindíveis a vida humana ao criar novas necessidades das novas
mercadorias.
78
Com o desenvolvimento no interior das empresas de um corpo técnico que
cuida da sensualidade estética de cada produto, ocorreu uma ampliação de
pesquisas que objetivavam especular a sensibilidade humana, na tentativa de
aumentar o número de vendas dos produtos. E foi assim nas décadas do pós-
guerra, que os produtos começaram a se apresentar com uma aparência
constantemente diferenciada, para agradar os mais diversos consumidores.
A técnica mais radical não atua somente no valor de uso objetivo de
um produto, a fim de diminuir o seu tempo de uso na esfera do
consumo e antecipar a demanda. Essa técnica inicia-se com a
estética da mercadoria mediante a mudança periódica da aparência
de uma mercadoria, ela diminui a duração dos exemplares do
respectivo tipo de mercadoria ainda atuante na esfera do consumo
(HAUG, 1996, p. 53-4).
Como já colocamos anteriormente, o valor de uso passou a representar
muito mais que sua utilidade e através das promessas coloridas televisionadas,
cada produto ancorava consigo “valores sociais mais amplos de uma época”
(FONTENELLE, 2002, p.193) ou apenas “valores e modo de vida de um
determinado público que [se] desejava atingir” (FONTENELLE, 2002, p.193).
Nesse movimento de utilização intensificada da estética da mercadoria
cada vez mais elaborada, a indução subjetiva do consumidor foi explorada por
métodos que utilizavam as psicologias associativas – já por nós conhecidas.
O produto deixou de ser comprado apenas pelo seu objetivo funcional,
mas passou a ser comprado por possibilitar prazeres psicológicos ao ser adquirido
pelo consumidor. Por exemplo, um tênis passou a ser comprado, não apenas para
proteger os pés, mas porque com ele você “satisfazia o sonho de voar nas alturas”
(BABER, 2003, p. 99) como os grandes jogadores de basquetes.
A promoção de novos produtos engendrada pela publicidade gerou a
obsolescência da desejabilidade, o consumidor acabava trocando um produto
seminovo pelo último lançamento, já que seu produto antigo não fazia mais parte
da moda atual.
O tremendo crescimento das campanhas de vendas e a intensificação
espetacular de sua influência nascem do fato de terem elas sofrido
uma transformação qualitativa de profundas conseqüências. As
competições dos preços desapareceram, em grande parte, como
meio de atrair a preferência do público, dando lugar a novos modos
de promoção de vendas: publicidade, variação do aspecto dos
79
produtos, de sua embalagem, a “obsolescência planejada”, as
modificações de modelos, vendas a crédito, etc. (BARAN, P. &
SWEEZY, 1966, p.129).
A estética da mercadoria, neste sentido, foi usada como diferencial nas
relações de troca, fosse para simplesmente evidenciar as potencialidades do valor
de uso da mercadoria, fosse para incitar necessidades adormecidas ou até então
inexistentes, e serviu para influenciar o consumidor a um tipo de comportamento
compulsivo que colocou em prática essa forma de obsolescência, realizada por
meio do desejo. Desejo adquirido graças às fantásticas campanhas de vendas,
que davam a mercadoria poderes antes impensáveis, que a colocaram em um
patamar simbólico “divinizado”, sob a promessa de que ao possuí-la — por meio
da relação de troca — se obteria o desfrute das mais sublimes sensações e
sentimentos.
Como diria Barber, “O poder da marca e da psicologia associativa aliava
glamour chique dos movimentos feministas e da participação jovem a produtos de
venda”. (BABER, 2003, p. 98) Já é possível comprar um condicionador para os
cabelos e de bônus extra, ganhar a possibilidade de “descobrir a história da
reserva do Xingu e dos índios Caiapós que colheram a castanha-do-pará para
nós” (BABER, 2003, p. 95). Esta é a tentativa de fazer o ato de compra em algo
socialmente responsável, contudo subordina a responsabilidade ao ato de compra.
Como vimos acima, para que a circulação fosse potencializada, as
mercadorias agora começavam a se tornar gastas na mente dos consumidores,
sem sequer estarem gastas de fato em sua composição física.
Podemos dizer que a obsolescência da desejabilidade começou a se
fortalecer aos poucos com o desenvolvimento do capitalismo atual, e as
mercadorias foram se tornando antiquadas, ultrapassadas na mente do homem. E
como vimos até o próprio ser humano nesse processo sofreu o mesmo efeito. A
obsolescência planejada pelo capital para as mercadorias, atinge a tudo dentro do
sistema. Como podemos ver nas palavras de István Mészáros.
A taxa de utilização decrescente afeta negativamente todas as três
dimensões fundamentais da produção e do consumo capitalista, a
saber: 1) bens e serviços; 2) instalações e maquinarias; e 3) a própria
força de trabalho. (MÉSZÁROS, 2002, p.670)
80
O uso da obsolescência planejada da desejabilidade do produto em
síntese consistia em gastar a mercadoria na mente de seu proprietário, e a moda
foi sem dúvida um dos primeiros instrumentos utilizados para alcançar esse intuito,
e ela ajudou a imprimir velocidade na circulação da mercadoria dentro do
mercado.
Nos produtos foram desenvolvidas pesquisas e mudanças, mas na
maioria das vezes essas mudanças não eram feitas para melhorá-los, mas antes
para torná-los obsoletos.
Essas profundas transformações ocorridas no interior da sociedade foram
alicerçadas no momento de expansão do capitalismo no período dos anos
dourados. Contudo, já na década 60, começam aparecer novas necessidades
para fazer circular a mercadoria, a promoção de novos produtos engendrada pela
publicidade e a obsolescência da desejabilidade não conseguiram dar conta da
superprodução, então novas formas de obsolescência foram inseridas para
objetivação de tal intento.
Elas passaram a atuar em conjunto sobre o homem e sobre a mercadoria
para que a velocidade da circulação econômica fosse realmente ativada e a
realização do valor ocorresse mais rapidamente.
Entretanto, apesar da cínica prática de “obsolescência embutida”,
assim como todos os esforços manipulatórios de propaganda, que
visam produzir a mesma “obsolescência prematura” por outras vias,
não é muito fácil garantir na escala necessária e com a consistência
exigida para torná-la confiável do ponto de vista do capital orientado-
para-a-expansão a motivação para o descartar perdulário dos bens
perfeitamente utilizáveis, dadas as restrições econômicas dos
consumidores individuais, mesmo nos paises mais ricos, assim como
as demandas conflitantes impostas sobre seus recursos . Desse
modo, garantias muito mais seguras precisam ser encontradas em
escala suficientemente ampla, e numa forma diretamente
institucionalizável, de modo que possa prosseguir sem obstáculos o
incansável impulso do capital para a frente, combinada com sua
tendência de reduzir sua taxa de utilização.
[...] essa garantia é proporcionada ao capital pela emergência e
consolidação patrocinada pelo Estado do “complexo militar-industrial”,
que temporariamente desloca várias das contradições mais
importantes. (MÉSZÁROS, 2002, p.671)
81
Passaremos agora a trabalhar com a obsolescência de função e
respectivamente com a de qualidade, mas lembrando que as estratégias
empregadas pelo capital para acelerar a circulação econômica, vai encontrar seu
ápice, com o advento do complexo industrial militar.
2. Obsolescência de Função
No período por nós estudado, a publicidade, através da estética da
mercadoria, teve uma eficácia razoável para o capital – no que tange ao seu
objetivo de encurtar o ciclo de realização do valor – ao efetivar pelo estímulo o
aumento da velocidade de circulação “econômica” das mercadorias – aumento
realizado graças a intensa indução subjetiva dos consumidores por intermédio dos
meios de comunicação. Contudo, como disse (MÉSZÁROS, 1989), o capital
procura meios mais eficazes para agilizar a circulação da mercadoria, pois através
apenas do estimulo subjetivo, deixa a possibilidades de acontecer ou não a troca
ou substituição de uma mercadoria por outra mais nova, sendo assim as
empresas elaboraram a aplicação ampliada da obsolescência de função e
qualidade, pois contavam com um retorno garantido.
[...] a sociedade dos descartáveis encontra seu equilíbrio entre
produção e consumo, necessário para sua contínua reprodução,
somente se ela puder artificialmente “consumir” em grande velocidade
(isto é, descartar prematuramente) grandes quantidades de
mercadorias que anteriormente pertenciam a categoria de bens
relativamente duráveis. Desse modo a sociedade se mantém como
um sistema produtivo manipulando até mesmo a aquisão dos
chamados “bens de consumo duráveis” que necessariamente são
lançados ao lixo (ou enviados a gigantescos ferros-velhos, como os
“cemitérios de automóveis” etc) muito antes de esgotada a sua vida
útil (MÉSZÁROS, 2002, p. 640).
Para falar sobre obsolescência de função e qualidade precisamos recordar
o que Marx disse na Crítica da Economia Política, sobre a produção: “ser
imediatamente consumo” (MARX, 1974, p. 114). Pois o emprego destas duas
estratégias vinculadas à obsolescência da desejabilidade, fazia parte do plano
econômico das empresas que visavam criar um novo modo de comportamento
82
consumista regrado pela descartabilidade dos produtos, mediante a apresentação
de novos produtos pelo mercado.
Deste modo, como vimos anteriormente, a sociedade é moldada à
necessidade da produção e reprodução capitalista. Vance Packard disse que “o
próprio povo americano foi condicionado através dos anos a reagir favoravelmente
a algumas espécies de obsolescência. Muitos talvez ficassem apavorados pela
idéia de possuir um automóvel que atendesse esplendidamente às suas
necessidades de transporte durante vinte ou trinta anos”
29
(PACKARD, 1965, p.
50-1).
Por isso, aparentemente, a produção de um novo celular, TV, computador,
automóvel etc, ou seja, um lançamento de um novo produto representa para a
sociedade atual como fator positivo, pois é assim que se apresenta no nível da
aparência, e é para isso que as empresas trabalham e gastam muito com
publicidade, contudo em essência podemos verificar que são estratégias
planejadas de obsolescência, aplicadas intencionalmente e intensamente de
maneira sistemática desde meados do século XX, que visam maior reprodução de
capital.
Produtos realmente novos ou diferentes, porém, não são fáceis de
criar, mesmo em nossa era de rápido progresso científico e
tecnológico. Assim grande parte da novidade com que o consumidor é
sistematicamente bombardeado é fraudulenta ou relacionada – de
forma trivial – e em muitos casos mesmo negativa – com a função e a
utilidade do produto (BARAN & SWEEZY, 1966, p. 133)
.
Um novo produto lançado no mercado atualmente, em geral pode
apresentar melhoramentos de suas funções, como é o caso dos automóveis,
computadores, celulares etc – que trazem novas tecnologias e atualizações dos
produtos. Estes novos produtos serão intensamente explicitados pelas campanhas
de venda, como o “mais novo” produto de tal “marca”, concorrendo também com o
produto da mesma empresa, mas que foi lançado alguns meses atrás.
29
A este respeito a empresa Volkswagen apresentou um comercial de televisão na primeira
metade do ano de 2005, no qual um brasileiro pensava sobre a durabilidade dos produtos de
maneira saudosista, recordava de geladeira da mãe, do fogão e uma série de bens duráveis que
realmente duravam, mas rapidamente descartava tal idéia, ao pensar que isso poderia prejudicar a
possibilidade dele poder possuir um Gol última geração.
83
Assim, é por meio da função que os novos produtos competem com os
antigos, e esta obsolescência da função é apresentada rapidamente no mercado
criando no consumidor a sensação de estar sempre atrasado. Suas mercadorias
aparecem sempre defasadas com o novo produto que geralmente é apresentado
no mercado de acordo com a velocidade das “datas especialmente produzidas
para vender”, como o dia das mães, dos pais, das crianças, dos namorados, natal,
etc
30
. Ou seja, neste caso não é por meio da criação de um novo produto outrora
inexistente que se gera uma nova necessidade, mas simplesmente por uma nova
função, que será muito bem trabalha no inconsciente coletivo pelas campanhas
publicitárias, e passará ser necessária a partir de então.
A função, que se apresenta como novidade em um lançamento de um
novo produto, às vezes já poderia ter sido apresentada anteriormente graças à
eficiência do desenvolvimento tecnológico, contudo o produto poderia custar mais
caro e causar encalhe da mercadoria, então aos poucos as funções são
acrescidas de acordo com a lógica do capital e a rapidez com que são
conquistadas as novas tecnologias.
Mas a rapidez nem sempre é racional. A rapidez pode, na verdade,
sair pela culatra. Se a empresa A for rápida demais para levar ao
mercado uma nova tecnologia, pode perde para empresa B, que
passou mais tempo desenvolvendo um método rival – ou apropriando-
se da melhor parte do método do rival, como o Windows da Microsoft
fez em relação à Apple. A Sony foi a primeira a desenvolver e vender
um gravador doméstico de videocassete, e muitos fãs acreditam que
sua tecnologia Betamax produzia imagens mais nítidas que o sistema
VHS rival. Mas o VHS, com sua capacidade mais longa de gravação,
predominou, e o Betamax continua a ser tecnologia para
especialistas. Os primeiros fabricantes americanos de computadores
domésticos – Altair, Osborne, Morrow e outros – foram superados
pelos que custaram a vender sistemas mais avançados. Para o ramo
de negócios, assim como para um país, existe a desvantagem de ser
o primeiro. A cultura da rapidez é, antes de tudo, uma cultura de
mercado – uma cultura na qual a principal razão para o fabricante de
coisas é que elas vão vender (ou assim crêem seus produtores).
(GITLIN, 2003, p.141)
30
De fato, qualquer data apresenta-se como um pretexto para estimular uma relação de troca,
como podemos ver neste anúncio de 1960 de uma loja de departamentos de Nova York que dizia:
“Páscoa é um novo par de sapatos” (PACKARD, 1965).
84
Segundo Packard, uma revista dos anos 50, chamada Fortune, na época
fez uma retrospectiva dos últimos 50 anos em comparação com as últimas
invenções da última década, na reportagem dizia que “não havia nada de
grandemente inovador como novos lançamentos”, já que se limitavam a trazer
uma pequena inovação ou diferença de estilo na mercadoria. Como podemos ver
abaixo, o comentário extraído do artigo, no qual apresentava os lançamentos das
últimas décadas.
“[...] os fabricantes de bens de consumo não apresentaram uma única
inovão comparável ao automóvel (que ser tornou comercialmente
importante lá por 1910), o rádio (no começo da década de 1920), o
refrigerador mecânico (meados da década de 1920), máquina de
lavar roupa (fins da década de 1930), ar condicionado doméstico e a
televisão (fins da década de 1940)”. (PACKARD, 1965, p. 14).
Mas com o advento da Guerra Fria estas mudanças inovadoras ocorreram
de forma avassaladora, todo o desenvolvimento cientifico que se processou no
âmbito militar, pode ser empregado no desenvolvimento dos bens duráreis. O
plástico, a microeletrônica, informática, telefonia, a tecnologia de ponta etc,
representam conquistas militares que foram incorporadas no setor civil.
[...] nos Estados Unidos, a tecnologia militar era imediatamente
aplicada à industria civil, ao passo que na União Soviética, isso
acontecia de forma infinitamente mais lenta, já que o Estado,
dominado por uma burocracia, era proprietário de tudo. Não
existindo competição, não havia interesse econômico imediato em
melhorar os bens de consumo.
O fato de a economia americana ter crescido impulsionada pela
indústria bélica teve várias conseqüências importantes para a vida
política da nação. As empresas que produziam a tecnologia
necessária ao Estado foram transformadas em imensas
corporações, com grande poder de influenciar as decisões do
Poder Executivo e do Congresso. Essas grandes corporações
empregavam uma sólida classe média, que cresceu habituada aos
confortos do americam dream. (ARBEX,1998, p. 37)
Esses desenvolvimentos tecnológicos propiciado pelo setor militar
puderam ser convertidos para a produção de bens de consumo duráveis. Com
inovações constantes na produção de novas mercadorias, que apresentavam
pequenas mudanças de funções, criou-se um ritmo acelerado de descarte dos
produtos que se tornavam antiquados aos novos lançamentos, e criou-se dessa
forma uma demanda constante pelo novo produto disponível no mercado.
85
Mas para a economia como um todo, o efeito é sem dúvida positivo.
Numa sociedade com um grande estoque de bens de consumo
duráveis, como os Estados Unidos, um componente importante da
procura total de bens e serviços repousa na necessidade de substituir
parte desse estoque quando se desgasta ou é posta de lado. A
obsolescência pré-fabricada aumenta a taxa de desgaste e freqüentes
modificações no modelo aumentam a taxa de substituição [...]. O
resultado líquido é uma intensificação na taxa de procura de
reposição, e um surto geral na renda e no emprego. Sob esse
aspecto, como em outros, as campanhas de vendas constituem um
poderoso antídoto para a tendência do capitalismo monopolista de
afundar-se num estado de depressão crônica. (BARAN, P. &
SWEEZY, 1966, p.135-136).
A obsolescência de função foi muito utilizada na linha dos produtos
automobilísticos, como também no setor de eletros-portáteis. Um carro americano
apresentava mudanças funcionais apresentadas geralmente de três em três anos,
quando se tratava de carroçaria; nos faróis, pára-lamas e coisas semelhantes, a
mudança ocorria a cada dois anos; mas no ano de 1958 a General Motors decidiu
que ia remodelar a carroçaria de seus automóveis, anualmente, colocando para
concorrência uma nova pressão que geraria uma obsolescência de estilo.
Segundo uma entrevista com o presidente da General Motors, Frederic G.
Donner, ao se referir a “obsolescência artificial” provocada por mudanças
funcionais dizia: “Se não fosse a mudança anual do modelo [...] nossos fregueses
não teriam incentivo para comprar um carro novo enquanto seu carro velho não se
gastasse” (PACKARD, 1965, p. 80).
Essa técnica para incentivar as vendas foi produzida intencionalmente
para criar velocidade a todos os tipos de mercadoria, ao renovar as funções dos
produtos existentes. Como vemos na explicação de um desenhista industrial da
época:
Toda a nossa economia é baseada em obsolescência planejada [...].
Fazemos bons produtos, convencemos as pessoas a comprá-los e no
ano seguinte introduzimos deliberadamente algo que torne aqueles
produtos velhos, antiquados, obsoletos... Não é desperdício
organizado. É uma sólida contribuição para a economia americana
(STWENS apud PACKARD, 1965, p. 50).
Atualmente podemos perceber explicitamente o emprego da estratégia de
obsolescência planejada de função nos celulares – que a menos de duas décadas
de comercialização ultrapassa as inovações de diversos eletros-portáteis
86
existentes anteriores a sua aparição no mercado; nas câmeras fotográficas – que
se tornaram digitais e foram acrescidas de novos recursos, ampliando sua área de
atuação, e nos produtos ligados à área da informática, que em ritmo frenético, se
apresentam acrescidos com novas funções a cada dia.
A rapidez no giro da apresentação dos novos produtos, acrescidos com
novas funções, propiciaram uma crescente obsolescência a uma infinidade de
produtos recentemente lançados, mas que já estão em defasagem com o último
lançamento.
A instauração de modismos relaciona-se intimamente ao avanço da
descartabilidade dos bens, pois o homem moderno tornou-se um
adicto de bens fugazes, não-duráveis. Beatriz Sarlo define o
consumidor moderno como um colecionador Às avessas, que
desvaloriza os objetos imediatamente após sua aquisição (vide a
enorme depreciação do preço de um automóvel novo a partir de sua
compra). Pessoas da classe média e baixa de grandes cidades da
Europa e Estados Unidos mobíliam suas casas com bens duráveis
descartados no lixo, que ainda apresentam longa vida útil, mas
saíram de moda. Pequenas alterações na forma, tecnologia e estilo
são lançadas e invalidam os produtos precedentes como obsoletos.
Torna-se impossível adquirir os últimos lançamentos, pois a cada
momento novas funções e acessórios são criados, instalando um
estado permanente de obsolescência para aqueles que desejam ficar
sempre na vanguarda da modernidade. (SOARES, 2000, p.14)
3. Obsolescência da Qualidade
A diminuição qualitativa e quantitativa do valor de uso é compensada
geralmente pelo embelezamento (HAUG, 1996, p. 53).
Adentremos por fim ao tema da obsolescência de qualidade. Como o
próprio nome sugere esta técnica afetará exatamente o corpo físico do produto,
estipulando e encurtando sua vida útil. Com a aplicação desta forma de
obsolescência os bens duráveis acabaram se tornando frágeis e se tornando
“descartáveis” na medida em que lhes foram impostos uma data limite de utilização.
Assim torna-se necessário divisar meios que possam reduzir a taxa
pela qual qualquer tipo de mercadoria é usada, encurtando
deliberadamente sua vida útil, a fim de tornar possível o lançamento
87
de um continuo suprimento de mercadorias superproduzidas no
redemoinho da circulação acelerada. A “obsolescência planejada” em
relação a “bens de consumo duráveis” produzidos em massa, a
substituição, o abandono ou o aniquilamento deliberado de bens e
serviços que oferecem um potencial, de utilização intrinsecamente
maior [...] em favor daqueles nos quais a taxa de uso tende a ser
muito menor, até mínima [...] (MÉSZÁROS, 2002, p.44)
Com a vigência desta forma de obsolescência programada, o conserto de
tal objeto é improvável e uma nova troca se faz necessária para atender aquela
necessidade cujo encurtamento da vida útil do produto somente permitiu realizar
em parte.
Fixar uma data de morte para a mercadoria como vimos em Lafargue era
uma técnica já utilizada no século XIX e, talvez, até anteriormente, mas que será
empregada despudoradamente – e com uma violência jamais vista – no período,
pós-segunda guerra mundial. De fato, não podemos desconsiderar que isso se
deu envolto a um momento expansionista do sistema capitalista.
A durabilidade, que era um fator que atuava como um grandioso
incentivador das vendas das mercadorias, foi substituída pela obsolescência de
qualidade. Os produtos serão apresentados ao mercado possuindo uma
fragilidade cada vez mais acentuada, visando com isso impulsionar os
consumidores a direcionarem novamente ao mercado para adquirir um novo
produto.
[...] “O dinheiro faz dinheiro, diz o ditado”.
Se, portanto, a esse grande capital agora fazem frente pequenos
capitais com pequenos ganhos, como acontece na situação
pressuposta de forte concorrência, ele esmaga completamente.
Nesta concorrência, a conseqüência necessária é, então, a
deterioração geral das mercadorias, a adulteração, a produção
enganosa (de má qualidade
31
) e a contaminação universal, tal como
ela se manifesta nas grandes cidades. (MARX, 2002, p.88)
O emprego de novos materiais barateava o custo dos novos produtos,
como é o caso do plástico, e como diria Packard:
31
Colocamos entre parêntese esta frase “má qualidade” que está em outra edição, apenas para
reforçar o sentido de obsolescência que iremos trabalhar a partir de agora, pois achamos que fica
mais explicita no lugar de “produção enganosa”. Edição: MARX, Karl. Manuscritos Econômico-
Filosóficos. São Paulo: Martin Claret, 2002.
88
Os plásticos atraíram os produtores não só por serem em geral mais
baratos que o metal, mas também porque suas cores ajudam a
promover a venda com base no estilo e no impulso.
Deve-se notar naturalmente, que os plásticos podem variar
consideravelmente quanto a resistência. Podem ser grossos ou finos.
[...] Os plásticos também podem ser rijos ou frágeis. Appliance
Manufacture acentuou a “singularidade” de os fabricantes não usarem
freqüentemente os plásticos mais duráveis existentes. Falou a
respeitou das peças de refrigeradores que pareciam ótimos no salão
de exposição, mas que se descoloriam e rachavam com o uso
doméstico normal...(embora) existam à venda de plásticos que
reduziriam os custos – talvez não de maneira tão drástica – e se
conservariam convenientemente em funcionamento. (PACKARD,
1965, p. 100)
Sob a pressão da concorrência, há uma procura acirrada por custos
mínimos de produção – que geralmente são determinados pela utilização de
tecnologia mais desenvolvida – associados a custos também mínimos como
matéria-prima, embalagens, transportes, distribuição, etc. Estes custos mínimos
permitirão um maior volume de produção e, com a aplicação das obsolescências
planejadas, principalmente a de qualidade permitirão as empresas impulsionar
a velocidade de circulação de suas mercadorias.
Quando a concepção do produto está ligada às vendas, e não à sua
função, como ocorre cada vez mais, e quando a estratégia da
comercialização se baseia em freqüentes modificações de estilo, há
certo resultado quase inevitáveis: a tendência ao uso de materiais
inferiores; abreviação no tempo necessário ao bom desenvolvimento
do produto; o desprezo pela qualidade e pela inspeção adequada. Os
efeitos dessa obsolescência pré-fabricada é um aumento de preço
disfarçado para o consumidor, na forma de menor vida para
produção, e, com freqüência, de maiores gastos e consertos
(PACKARD apud BARAN, 1966, p. 135).
Já no final da década de 30 o planejamento da obsolescência podia ser
sentido por meio dos artigos de jornais e revistas publicados pelos representantes
das empresas. Como podemos ver nesta publicação da Printer’s Ink do dia 09 de
janeiro de 1936: “Se a mercadoria não se gastar mais depressa, fábricas ficarão
paradas e pessoas desempregadas” (PACKARD, 1965, p. 54). A partir da década
de 50 isso foi aplicado de maneira sistemática no interior dos Estados Unidos.
Basta observarmos os comentários de uma colunista financeira da época.
“Por trás das portas recheadas de salas de diretoria de gigantescas
companhias de um litoral a outro” estava sendo discutida a
conveniência de executar uma política de obsolescência planejada.
89
“Nunca um debate dessa natureza – que afeta o alicerce do padrão
de vida americano – se manifestou tão abertamente” (PACKARD,
1965, p. 50).
Artigos e mais artigos foram publicados incentivando e criticando as
obsolescências planejadas no final da década de 50. Os que corroboravam com a
prática investiam em adjetivos que colocavam o uso de tal técnica como a saída
ou a solução para os problemas de “mercados cansados”, apregoando a aplicação
intensa desta estratégia. Outros, no entanto, faziam observações críticas a
respeito da fragilidade elevada das mercadorias. Como podemos ver, “a doutrina
da obsolescência planejada é levada tão longe que o produto mal se conserva
unido para o embarque. E a conservação é tão difícil e insegura que se torna mais
fácil a substituição” (PACKARD, 1965, p. 52).
Em abril de 1956, Electrical Manufacturing publicou uma interessante
matéria intitulada: “Desenho para Obsolescência Planejada”. Nela se
dizia que a garantia de “tempo de vida”, outrora um poderoso
incentivador de vendas estava perdendo seu encanto à medida que
os americanos impacientes, diante da necessidade de uma economia
em expansão adquiriam disposição para aceitar a obsolescência
planejada. “A dura lógica de nossa economia nacional”, dizia o artigo,
“sustenta a necessidade de ampla política de obsolescência
planejada a fim de tirar a máxima vantagem de nosso potencial de
produtividade e progresso tecnológico”.
“Que significa isso”, pergunta o articulista, “para os homens
responsáveis pela engenharia de desenho desses produtos? Em
primeiro lugar, significa que o desenho da obsolescência planejada se
torna um objeto legítimo”. Acrescentava que o consumidor de hoje
“adquirirá prontamente um aparelho anunciado para servi-lo por não
mais de dois, três ou cinco anos e ser substituído depois desse tempo
por um modelo mais novo e presumivelmente melhor. Todavia não
aceitará essa vida limitada do aparelho se for sobrecarregado com
problemas de conservação e manutenção, e com despesas durante o
mesmo período”.
O artigo sugeria que os produtos “civis” deviam ser planejados de
maneira como são planejados como são planejados os produtos
militares: para “um período de vida razoavelmente curto”, mas para
segurança durante essa curta vida. (PACKARD, 1965, p. 58 – grifo
nosso).
Para exemplificarmos como as empresas agem mediante a necessidade
de estabelecer maior lucro, podemos citar aqui um dos exemplos encontrados no
livro Estratégia Operária e Neocapitalismo de André Gorz de 1964
32
. Neste livro
ele esclarece um pouco como age a obsolescência sobre a mercadoria, e dá como
32
Nesta fase este autor ainda apresentava uma notada vinculação com o marxismo.
90
exemplo um recurso utilizado pelo truste Philips, que já em 1938 fabricava os
tubos fluorescentes que duravam até 10.000 horas, mas como a rotação do capital
seria lenta – devido à longa vida útil dessa mercadoria –, eles investiram horas em
pesquisa para que sua taxa de utilização decrescesse de 10.000 para 1.000
horas, e dessa forma, acelerasse a rotação do capital e da própria produção,
produzindo assim um lucro mais elevado.
As técnicas utilizadas para piorar o produto intencionalmente variam, mas
sempre estão sendo aplicadas. Às vezes diminuem a quantidade e mantém o
tamanho da embalagem. A exemplo podemos citar o caso recente no Brasil dos
rolos de papel higiênico que até gerou um mal estar na sociedade, pois ficou
explicitado o uso de tais técnicas perante o consumidor cuja quantidade passou
de 40 para 30 metros. Tais práticas também se fizeram visíveis nos pacotes de
bolacha que diminuíram o peso de seus produtos deixando sua aparência
inalterada.
Uma forma intermediária de deterioração qualitativa do produto e a
diminuição quantitativa séria, por exemplo, o adelgamento dos
tecidos. Mercadorias que se prestam especialmente à diminuição
quantitativa são os víveres e as substâncias semelhantes do
consumo privado, que podem ser empacotados e vendidos em
embalagens de marca. Se o preço e a apresentação de um pacote de
massas alimentícias mantêm-se inalterados, diminuindo-se, porém, o
conteúdo, surge então uma nova expressão da mercadologia prática,
o conceito de “altura de enchimento”. Ele designa até que altura o
pacote ainda está cheio. Essa expressão surge então quando os
pacotes são regularmente vendidos em parte vazios. Como o espaço
vazio que torna perceptível a altura de enchimento é acessível à
percepção consciente, determinadas firmas passaram a colocar
espertamente na embalagem um fundo falso. Desse modo, o truste
Henkel de Khasana, por exemplo, com a marca Creme 21, comou a
concorrer com a marca Nívea, de Beiersdorf. Foi assim: por um preço
de 2,90 marcos ofereceram-se latas com 150 cm³, que pareciam
consideravelmente maiores que as latas de 150 cm³ da Nívea, ao
preço de 2,60 marcos. O efeito foi alcançado por meio de espaço
vazio de aproximadamente 6 mm a 13 mm de altura na parte interna
da lata, invisível por fora. Mais do que física é válido no mercado
capitalista de mercadorias: a ação produz a reação. Beiersdorf lançou
uma lata de creme Nívea no mercado, cujo fundo falso acabou
superando o da Henkel; a lata, com a aparência bastante semelhante
a da 150 c da Henkel de Khasana continha apenas 100 cm³, ao
preço de 2,50 marcos (HAUG, 1996, p. 53).
91
Automóveis, eletrodomésticos, lâmpadas, produtos têxteis, cremes,
bolachas, etc., nada escapa à taxa de utilização decrescente. “Não existem mais
artigos de consumo durável. Todos eles são semiduráveis, com ênfase no semi
(PACKARD, 1965, p. 95). É a verdadeira produção para a destruição que
Mészáros fala tanto em seu livro Para além do Capital, e assim ocorre à indução
ao consumo, para que sua rotação econômica possa acontecer mais rapidamente,
pois é isso que importa.
E como a venda das mercadorias depende de hábitos e comportamento
do consumidor, a manipulação destes constituirá a razão principal das indústrias.
Por meio de pesquisas direcionadas a ele, o setor de marketing poderá planejar
como será a produção e distribuição de tais produtos, como será o uso das
propagandas, e principalmente como se realizará o emprego das estratégias
planejadas de obsolescências, que afetará o cotidiano deste consumidor o
aprisionando num círculo vicioso de consumo.
92
PARTE 5
P
UBLICIDADE
33
NO PÓS-GUERRA (45-65) – EDUCANDO O TRABALHADOR
PARA O CONSUMO
Figura 1.1
34
Gastos totais em publicidade nos Estados Unidos, 1915,1963.1979-98
Os produtores deram atenção cada vez mais à vendabilidade de seu
produto, de forma que muito do que se apresenta nos livros como
custos de produção deveria ser lançado à conta de aparências
vendáveis. A distinção entre técnica de produção e técnica de venda
foi confundida, dessa forma, sendo hoje indubitável que o custo de
produção de muitos artigos fabricados para o mercado é atribuível,
33
Publicidade não constitui um fenômeno simples. É tamm importante estratégia da competição
e a criação de desejos, é, normalmente, um resultado complementar dos esforços para deslocar a
curva da procura de uma firma às custas de outras ou (o que é menos importante, creio eu)
modificar sua forma aumentando o grau de diferenciação do produto.(GALBRAITH, 1974, p.157
nota de rodapé)
34
Tabela de gastos em publicidade nos Estados Unidos, 1915, 1963, 1979-98, apresentada no livro
de Naomi Klein denominado SEM LOGO- a tirania das marcas, página 35, 2003.
Gastos Totais em publicidade nos Estados Unidos, 1915, 1963, 1979-98
$10
$20
$30
$40
$50
$60
$70
$80
$90
$100
$110
$120
$130
$140
$150
$160
$170
$180
$190
$200
1915
1963
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
Bilhões de dólares americanos
93
principalmente à produção das aparências vendáveis, ordinariamente
meretrícias. (VEBLEN, T apud BARAN, P. & SWEEZY, 1966, p.137).
Em sua obra a Crítica a Economia Política, Marx já dizia do duplo caráter da
produção, que ao mesmo tempo era: satisfação de necessidade e tamm
produção da própria necessidade. Como podemos ver abaixo:
Sem produção não há consumo; mas sem consumo também não
haveria produção, porque neste caso a produção não teria qualquer
objetivo. O consumo produz duplamente a produção. 1º. Somente
pelo consumo o produto se torna realmente produto. Por exemplo, um
fato só se torna verdadeiramente um fato quando vestido; uma casa
que não seja habitada não é, de fato, uma verdadeira casa; logo, o
produto ao contrário do simples objeto natural, não se afirma como
produto, não se torna produto, senão pelo consumo. Apenas o
consumo, ao absorver o produto, lhe dá o retoque final (finish stroke);
porque a produção não se desencadeou enquanto actividade
objetivada, mas como mero objecto para o sujeito activo [o consumo
produz a produção]. 2º. O consumo cria a necessidade de uma nova
produção, por conseguinte a razão ideal, o móbil interno da produção,
que é a sua condição prévia. O consumo cria o móbil da produção;
cria também o objeto que, actuando sobre a produção, lhe determina
a finalidade. Se é evidente que a produção oferece, uma forma
material, o objeto de consumo, não é menos evidente que o consumo
supõe idealmente o objeto da produção, na forma de imagem interior,
de necessidade, de móbil e fim. Cria objetos da produção sob uma
forma ainda subjetiva. Sem necessidade não há produção. Ora o
consumo reproduz a necessidade. (MARX, 1974, p.219-220)
Esse efeito será denominado por Galbraith de “efeito dependência, e
segundo ele, nos Estados Unidos terá seu papel assegurado “pelos modernos
institutos de publicidade e de propaganda” (GALBRAITH, 1982, p.241) [...] “já que
a função fundamental deles era precisamente a de criar tais desejos, ou seja, de
estimular necessidades que antes não existiam”. (GALBRAITH, 1982, p.241-242)
A época do pós II Guerra Mundial se apresentou radiante, graças ao
período anterior, ao alto desempenho do setor industrial, e principalmente da
grande intensidade de fabricação de materiais bélicos. Contudo isso só foi
possível devido à implementação do New Deal (Nova Política) aplicado a partir de
1933, pelo então presidente Roosevelt, que pretendia combater os efeitos da
grande depressão. Este programa econômico estava apoiado sobre as idéias
keynesianas, e cuja intervenção do Estado no processo produtivo por meio de um
plano de obras públicas visava atingir o pleno emprego. O uso de tais idéias – no
94
plano do governo – possibilitaram o fortalecimento e desenvolvimento do processo
capitalista nos EUA.
[...] foi o programa de Roosevelt que fortaleceu e consolidou o
sistema capitalista no país. Nos anos de sua aplicação, o grande
capital passou por um intenso processo de desenvolvimento e
concentração, enquanto as pequenas empresas eram eliminadas ou
absorvidas. No final da década de 30, três companhias produziram
80% dos automóveis do país, enquanto outras três eram
responsáveis por 60% da produção de aço. (SANDRONI, 2003,
p.423).
Para atingir sua meta o governo criou leis e órgãos que permitiram
reorganizar e fiscalizar a indústria nacional e, diversas medidas foram tomadas
inclusive para conseguir obter controle do sistema financeiro. Entre algumas delas
podemos destacar: o embargo do ouro e a desvalorização do dólar, que tinha por
objetivo fortalecer a exportação; a criação da NIRA
35
(Lei de Recuperação da
Indústria Nacional), que pretendia incrementar a indústria nacional; criou o sistema
de previdência; criou também a NARA (Lei de Recuperação Administrativa), que
era encarregada pela aplicação e controle do programa industrial do governo; foi
criado o salário mínimo nacional e a partir de então se permitiu liberdade de
organização sindical; com a aplicação da NIRA, foi também estabelecida a
redução de horas de trabalhado, que pretendia maior absorção da mão-de-obra
desempregada; e o Estado estabelecia acordos sobre preços, salários e
programas de produção com os empresários, no intuito de estabelecer à
racionalização econômica.
Portanto graças ao New Deal aplicado por Delano Roosevelt, e perpassado
para os outros governos – claro que às vezes com muita oposição e um pouco
modificado – foi que os Estados Unidos se recuperou da grande depressão e saiu
da Segunda Guerra Mundial como a superpotência econômica e militar.
Após a II Guerra Mundial, durante alguns anos, a política keynesiana
tornou-se o summum bonum da política econômica liberal. Partia-se
do princípio de que um nível de procura adequado de produção e de
emprego resolveria quase todos os problemas econômicos e grande
parte dos sociais. Produção e emprego inadequados tornavam todos
os demais problemas insolúveis. Assim, com um certo senso de
estratégia, os economistas liberais concentraram-se em políticas cujo
35
NIRA – National Industrial Recovering Act ou Lei de Recuperação da Indústria Nacional, criada no
governo de Roosevelt.
95
objetivo era assegurar um nível de procura adequado que teria como
conseqüência níveis adequados de produção e emprego. Esta
situação permaneceu no governo Eisenhower”. (GALBRAITH, 1974,
P.17)
Em 1931, foi observado pela Comissão Provisória Nacional de Economia,
que a economia americana estava ameaçada por uma crônica deficiência de
procura. Contudo após a aplicação do New Deal e a realização da II Guerra
Mundial, a deficiência fora substituída pela grande capacidade de procura, isso se
deu, devido ao ”um grande incremento da despesa pública, apoiado por um
grande aumento na taxação” (GALBRAITH, 1974, p.18) aliado a um super
“aumento de produtividade, que assegurou a abundância e o crescimento de
oportunidade”.(SLICHTER, 1964, p.134).
Com o progresso tecnológico houve o aumento da renda per capita
36
, que
por sua vez possibilitou o aumento da poupança e do crédito individual, que por
fim resultou no aumento do consumo.
O crédito ao consumidor
37
foi uma das vias utilizadas para que os bens de
consumo pudessem de fato chegar às mãos dos consumidores de maneira mais
facilitada, via empréstimos ou de pagamentos programados em vezes. Portanto o
consumidor passou a ser duplamente incitado pelo mercado; primeiramente pela
própria mercadoria através da promoção de vendas realizada pela publicidade e
posteriormente pelas empresas de créditos que “possibilitavam” a ponte entre o
desejo e sua realização.
Simplificando ao extremo a questão, o que faz o sistema de crédito é
tomar dinheiro emprestado, a determinada taxa de lucro, de pessoas
que têm mais dinheiro do que precisam para, àqueles que precisam
(ou julgam precisar) mais dinheiro do que têm. O dinheiro mantém-se
desse modo circulando – e a dívida crescendo.
[...] (e) o crédito direto ao consumidor, (é um) fator sempre importante
de demanda de bens de consumo duráveis [...] (MAGDOFF &
SWEEZY, 1978, p.35).
36
Renda per capita. Literalmente, “renda por cabeça. Em economia, indicador utilizado para medir
o grau de desenvolvimento de um país, obtido a partir da divisão da renda total pela população.
Este índice, embora útil oferece algumas desvantagens, pois, tratando-se de uma média, esconde
as disparidades na distribuição da renda. Assim um país pode ter uma renda per capita elevada,
mas a distribuição muito desigual dessa renda. Ou, ao contrário, pode ter uma renda bem
distribuída, não registrando grandes disparidades entre ricos e pobres. (SANDRONI, 2003, p.524)
37
O emprego do crédito ao consumidor assumirá papel intensificado principalmente no período que
vai de 1970-1975, período em que é registrado um aumento dos gastos com consumo e circulação
de crédito ao consumidor.
96
Uma nova “filosofia” comportamental começa a se delinear no interior dos
Estados americanos, o antigo hábito de guardar ou poupar é trocado pelo gastar,
consumir e antecipar através do crédito as rendas futuras em troca de
mercadorias.
A função da publicidade, talvez a sua função dominante hoje, torna-se
assim a de travar, em nome dos produtores e vendedores dos bens
de consumo, uma guerra incessante contra a poupança e em favor do
consumo. E o principal meio de realizar tal tarefa é provocar
modificações na moda, criar novas necessidades, fixar novos padrões
de status, impor novas normas de propriedade. O êxito indiscutível da
publicidade, na realização desses objetivos, fortaleceu de muito seu
papel como força cotrabalançadora da tendência que tem o
capitalismo monopolista a estagnar e ao mesmo tempo marcou-o
como o principal arquiteto do famoso “Modo de Vida Americano”.
(BARAN & SWEZZY, 1966, p.132)
Segundo Magdoff e Sweezy em A Crise do Capitalismo Americano, dizem
que graças aos vários anos de pleno emprego e as horas extras realizadas para
produção de guerra, a classe operária pode acumular “poupança considerável”
criando “um intenso fluxo de renda para o consumidor”, criou-se assim um grande
reservatório de demanda efetiva – já que na época da guerra, os bens de
consumo eram escassos, pois os materiais eram destinados à produção de guerra
– aos produtos bélicos.
Esse enorme e sem precedentes reservatório de demanda efetiva foi
o grão que serviu ao moinho capitalista. Novas instalações de
produção foram construídas, sugiram novos bairros, abriram-se
estradas – todo esse processo ganhou impulso à medida que o
aumento do emprego e das rendas favorecia um crescimento ainda
maior. O ímpeto inicial, pom, logo se desgastou: não foram
necessários muitos anos para que consumisse a poupança da classe
trabalhadora e se satisfizesse a sede de bens de consumo.
(MAGDOFF & SWEEZY, 1982, p.16)
Novos suportes tornaram-se necessários, e foram proporcionados ao
consumidor, inclusive dos empréstimos hipotecários para a
construção de novas casas. (MAGDOFF & SWEEZY, 1982, p.16)
E segundo BARAN & SWEZZY em sua obra Capitalismo Monopolista, as
campanhas de vendas surgiram muito antes de sua fase monopolista “a
campanha de vendas é muito mais velha do que o capitalismo como ordem
econômica e social. Surge sob várias formas na antiguidade, torna-se bastante
acentuada na Idade Média, e cresce em âmbito e intensidade na era capitalista”.
(1966, p.119). Contudo foi só na fase monopolista, e principalmente nos Estados
97
Unidos da América que pôde ser utilizada de forma majestosa, e de um simples
recurso da economia passou a ser “um dos seus centros nervosos decisivos”
(1966, p.120) e ainda segundo estes autores, “seu impacto sobre a economia só
são superadas pelo militarismo
”. (BARAN & SWEZZY, 1966, p.120 – grifo nosso)
E Vance Packard em seu livro A Estratégia do Desperdício, nos leva ao
conhecimento que nos EUA a produção em massa do momento fordista sistema
rígido levou a uma superprodução de bens duráveis. E para afastar uma
possível crise de superprodução, duas medidas econômicas foram adotadas, que
visavam: 1º estimular as vendas e compras de novas mercadorias, usando a
“pressão psicológica” sobre a população, outorgando a ela responsabilidade pela
estabilidade econômica do país; 2º aplicar a obsolescência planejada das
mercadorias, para tentar acelerar sua circulação econômica.
E para exemplificar a pressão psicológica exercida sobre a população,
o autor recorda que em 1959, o presidente Eisenhouer foi a público pedir aos
cidadãos americanos que comprassem qualquer coisa que necessitassem, pois
assim a depressão econômica não se instalaria. E em sua mensagem econômica
anual disse: “[...] a prosperidade só poderia ser mantida se os consumidores –
assim como o patronato e o operariado – executassem suas funções econômicas”
(PACKARD, 1965, p.18).
E como a hipnopedia
38
do livro Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley,
se instalou nos EUA um movimento publicitário que utilizava
[...] slogans que martelavam as razões patrióticas ou egoísticas pelas
quais todos deviam atacar de rijo e consumir mais. Em Detroit, um
coro com 45 vozes, gritava quinhentas vezes por semana através do
rádio e da televisão: “Dias de compra significam dias de pagamento...
dias de pagamento significam dias melhores... Por isso, comprem,
comprem!... alguma coisa de que precise hoje” (PACKARD, 1965,
p.16, grifo nosso).
38
Hipnopedia – era um recurso utilizado pelo governo do novo mundo – do livro Admirável Mundo
Novo de Aldous Huxley – que visava por meio da de repetição influenciar os habitantes do mundo
novo para que se conformassem com a forma de governo e posição social que ocupavam dentro
desse sistema, ou para que gostassem de algo levando a consumir, usar e usufruir determinado
bem. Este discurso era efetuado enquanto eles dormiam, para captar o inconsciente de cada um.
98
A primeira maneira encontrada pelos empresários americanos para afastar
a possível crise de superprodução foi empurrar as mercadorias
39
existentes no
mercado, para conseguir um equilíbrio econômico. E dessa forma a estratégia dos
publicitários era, [...] martelar na cabeça das pessoas a conveniência indubitável,
e, na verdade, a necessidade imperativa, de possuir o mais recente produto que
surg(ia) no mercado. (BARAN & SWEZZY, 1966, p.120)
As medidas empresariais pretendiam estimular e criar um “apetite voraz”
nos consumidores, “expandir suas necessidades” e “criar desejos de
mercadorias”. Este era o comando de ação direcionado às agências de
publicidades, pois a capacidade de produção havia superado a de consumo e,
algo devia ser feito muito rápido. E como alertou Marx sobre a questão da
realização do valor “[...] a existência de encalhe significa a morte econômica do
capital fixado em forma de mercadoria” (MARX apud HAUG, 1996, p.35). “Pois o
tempo de circulação do capital é tempo de sua desvalorização” (ROSDOLSKY,
2001, p.282).
Os apelos efetuados pelos meios de comunicação ao público foram
inúmeros, como é possível perceber por meio dos jornais da época. Segue abaixo
um pequeno pedaço de um texto, retirado de dois longos artigos feitos por um
consultor de vendas no The Journal of Retauling
40
na década de 1950.
“Nossa economia enormemente produtiva [...] exige que façamos do
consumo nosso modo de vida, que transformemos as nossas
compras e uso de mercadorias em rituais, que procuremos nossas
satisfações espirituais, as satisfações de nosso consumo [...]
Precisamos ter coisas consumidas, queimadas, gastas, substituídas e
jogadas fora, em um ritmo sempre crescente” (LEBOW apud
PACKARD, 1965, p.23).
O desenvolvimento produtivo trouxe consigo alterações no padrão de
consumo, que podem ser percebidos ao analisar como foi se consolidando nos
Estados Unidos o “espírito consumista”, produzido pela necessidade do próprio
sistema de “empurrar mercadorias”. O novo padrão criou novos hábitos numa
população a qual até então se mantinha avessa aos gastos e fiéis a poupança.
39
Empurrar mercadorias ou criar uma demanda artificial para utilizar um termo econômico.
40
Victor Lebow, The Journal of Retauling: primavera de 1955, pág. 7 : inverno de 1955-56, pág-
166.
99
Nesse processo o caráter ascético do americano protestante, foi violado e
transformado em um “padrão” que seria posteriormente exportado - “the american
way of life”.
Na composição desse novo modo de viver sob a lógica do capital, os
americanos foram moldados por meio de pressões psicológicas exercidas através
dos meios de comunicação
41
, que diariamente anestesiavam a consciência
puritana e construíram novos desejos, necessidades que impulsionaram o
desenvolvimento econômico. Isso se deu graças a grande pressão publicitária que
apontava o consumo sendo o melhor investimento ao americano colocando a
poupança em segundo plano, gastar era a palavra de ordem dirigida à população.
As estratégias de estimulo subjetivo do consumo americano foram
ampliadas e se diversificaram, elas agora visavam criar no consumidor novas
necessidades e não apenas responsabilizá-los pela estabilidade econômica do
país. Dessa forma a publicidade passou a ser a “arma” ou instrumento que
mediava a possibilidade de efetivar a relação de troca. O valor de uso se tornou
uma “isca”, que seduzia o consumidor e criava nele a carência pelo objeto
publicizado; contudo como a grande maioria da população já possuía diversos
bens duráveis, era necessário criar uma situação para que os bens já obtidos pelo
consumidor se tornassem de alguma forma obsoletos.
Com o aumento da produtividade, o problema da realização assume
uma nova forma para os oligopólios. As forças produtivas organizadas
do capital privado não mais se defrontam com os muitos vendedores
concorrentes como um limite, mas diretamente com a barreira das
41
Sobre meios de comunicação podemos recordar o que Huxley disse em seu livro Retorno ao
Admirável Mundo Novo, 1959: “Desde o tempo de Hitler, o arsenal de dispositivos técnicos à
disposição do aspirante a ditador foi consideravelmente aumentado. Além do rádio, do alto-falante,
do cinema e das grandes máquinas impressoras, o propagandista contemporâneo pode empregar
a televisão para transmitir a imagem, assim como a voz, de seu cliente, e pode registrar tanto a voz
como a imagem nas fitas magnéticas. Graças ao progresso técnico, o Grande Irmão pode ser
agora quase tão onipresente como Deus. E não é apenas no âmbito da técnica que a mão do
aspirante a ditador recebeu novas forças. Desde o tempo de Hitler, tem se realizado trabalhos
notáveis nos campos da psicologia e da neurologia aplicadas, que constituem o domínio próprio do
propagandista, do doutrinador e lavador de Cérebros.” (HUXLEY, 1959, p. 63) E foi através de
Joseph Gobbels que Hitler conseguiu, já naquele tempo trabalhar com as necessidades humanas
de forma eficaz. Conseguiu como diz o próprio Huxley, “privar oitenta milhões de pessoas da
liberdade de pensamento para sujeitá-las à vontade de um homem”. O que mudou hoje na
verdade, foi apenas à figura representativa de poder, de um homem — o Grande Irmão — para o
Grande Capital.
100
relações de produção que definem a necessidade social desde que a
demanda seja solvente. Numa sociedade como a americana, uma
grande parte da demanda total — como observam Baran e Sweezy —
“baseia-se na necessidade de substituir uma parte dos pertences por
bens de consumo duráveis, tão logo se deteriorem”. Uma vez que o
caminho para a diminuição do trabalho em toda a sociedade levaria a
abolão do capitalismo, o capital depara agora com a grande
durabilidade de seus produtos. (HAUG, 1996, p.52)
Novamente o setor de propaganda trabalhou arduamente, criando novos
campos de “ataque”: 1)º começou a trabalhar com a idéia de que: “sempre cabe
mais um” produto em sua casa; 2)° como tamm, trabalhou com a crião no
americano, do “espírito de jogar fora” os produtos antigos; 3)° colocou em prática
de forma intensificada a obsolescência da desejabilidade
42
. Esses três campos de
ataque da publicidade sobre a subjetividade do consumidor foram se entrelaçando
e por meio da estética da mercadoria, consolidou-se enfim a intenção capitalista
de realização do valor ao impulsionar a circulação dos produtos.
As pressões psicológicas exercidas sobre o inconsciente dos americanos
no período da Guerra Fria, permitiram por parte das campanhas de vendas, o
emprego em demasia e por vezes “falacioso”, da importância e imprescindibilidade
de determinados produtos para vida do homem comum. Falacioso, pois como
disse Galbraith em seu livro O Novo Estado Industrial .
A maior parte das mercadorias realizam funções comuns: suprimem a
fome, prestam-se aos vícios do álcool ou da nicotina, conduzem as
pessoas gradualmente através do tráfego intenso, movimentam mais
rapidamente os resíduos através do tubo intestinal ou ajudam a
remover a sujeira. Pouco ou nada de importância pode-se
verdadeiramente dizer a respeito do modo pelo qual um produto
desempenha essas funções de rotina. Mentiras descaradas sobre a
sua atuação geralmente não são permissíveis, mas é essencial que
haja um substituto para a verdade. Substituto, pelo qual, qualidades
menores ou mesmo imaginárias proporcionem grandes benefícios.
(GALBRAITH, 1968, p. 355)
Primeiramente a aceleração da circulação da mercadoria foi impressa
através do emprego intensificado da propaganda e do desgaste da mercadoria na
mente do consumidor – propiciado pela obsolescência da desejabilidade.
42
Obsolescência de desejabilidade. Segundo Packard é “a situação, na qual um produto que ainda
está sólido, em termos de qualidade ou performance, torna-se “gasto” em nossa mente porque um
aprimoramento de estilo ou outra modificação faz com que fique menos desejável (PACKARD,
1965, p. 51- grifo do autor).
101
Posteriormente outras espécies de obsolescência seriam aplicadas sobre a
mercadoria com esse intuito, que colocariam limites aos produtos e obrigariam
veladamente o consumidor a voltar ao mercado para adquirir um novo produto, já
que sua satisfação foi comprometida com a deterioração desta mercadoria.
Como percebemos através de nossos autores estudados até aqui, é que
as estratégias planejadas de obsolescência a partir desse período foram
construídas de maneira conjunta e aplicadas intensivamente sobre as mercadorias
e sobre a sociedade. Primeiramente esse emprego foi observado nos paises de
capitalismo mais desenvolvidos como é o caso dos Estados Unidos e,
posteriormente com a expansão do capitalismo esse emprego se generalizou na
mesma medida.
As empresas desenvolveram setores que permitiam promover a criação
de novos produtos que apresentavam “novidades”, a cada ano ou meses, para
incentivar um consumo mais veloz. Como tamm o setor de desenvolvimento
permitia estipular ou prever um prazo de validade aos produtos, encurtando sua
vida útil deliberadamente, forçando uma nova troca, já que não compensava seu
conserto. Essas práticas começaram a se intensificar no pós-guerra, mas se
estenderam até os dias atuais.
Para o historiador Eric Hobsbawm a década de 50 o momento do
predomínio do keynesianismo e do fordismo , se consagrou como “os anos
dourados”. Esse termo cunhado por ele, designa as décadas do pós-guerra que
ficaram marcadas pelo grande crescimento mundial da economia, pela
internacionalização da produção em massa, pela expansão do capitalismo que
trouxe consigo uma forte onda de consumo graças em parte pelo crescimento
do uso das técnicas de propaganda aliada ao grande desenvolvimento dos meios
de comunicação de massa
43
, momento no qual primeiramente o rádio e
posteriormente a televisão, tiveram papel fundamental, pois promoviam a indução
ao consumo. Esta época ficou conhecida como o período do pleno emprego, e o
43
Mass media: é termo normalmente usado para a multimídia rádio e televisão. A palavra mídia
etimologicamente tem sua origem em médium e significa meio; meio pelo qual é posvel veicular
mensagens, designa o elemento material que divulga a mensagem. Em síntese é “(...) todo meio,
forma ou recurso capaz de levar ao conhecimento do grupo consumidor a mensagem publicitária”.
(GIACOMONI FILHO, Gino. Consumidor versus Propaganda, São Paulo: Summus Editorial, 1991)
102
modelo fordista de produção em massa possibilitou o crescimento da “classe
média”. Este extrato social seria arrebatado pela ideologia consumista.
Bens e serviços antes restritos a minorias eram agora produzidos
para um mercado de massa [...] o que antes era um luxo tornou-se o
padrão de conforto desejado [...]. Em suma, era agora possível o
cidadão médio desses países viver como só os ricos tinham vivido no
tempo de seus pais. (HOBSBAWM, 1995, p. 259)
Ao mesmo tempo, o compromisso político de governos com o pleno
emprego e – em menor medida – com redução da desigualdade
econômica, isto é um compromisso com a seguridade social e
previdenciária, pela primeira vez proporcionou um mercado de
consumo de massa para bens de luxo que agora podiam passar a
serem aceitos como necessidades (HOBSBAWM, 2000, p. 264).
Em parte o grande ‘boommundial do capitalismo foi realizado graças à
política-econômica keynesiana atada ao modo de produção fordista, que juntos
promoviam o crescimento da economia. A reconstrução dos paises arrasados
44
,
aliado ao emprego da produção em massa de maneira generalizada, pôde
realmente propiciar o que Hobsbawm chamou por ‘anos dourados’ em âmbito
mundial.
[...] é essencial ter presente que o período capitalista monopolista
testemunhou um grande crescimento de renda nacional e um
crescimento ainda maior do excedente econômico. Tais fatos,
tomados em conjunto como o progresso tecnológico com que se
relacionaram tanto na qualidade de causa como de efeito, levaram a
modificações importantes na distribuição ocupacional da força de
trabalho. A estratificação dentro da classe trabalhadora,
rigorosamente definida, aumentou, e muitas categorias de
trabalhadores especializados e burocratas obtêm rendas e status
social que eram, até há bem pouco tempo, desfrutados apenas pelos
membros das classes médias. Ao mesmo tempo, a velha camada de
“comedores do excedente” aumentou, e novas camadas surgiam:
burocratas das companhias e governamentais, banqueiros e
advogados, publicitários e peritos em relações públicas, corretores de
títulos e de seguros, especuladores imobiliários e agentes funerários,
e assim por diante, numa sucessão aparente sem limites. Todos
esses grupos [...] [como também os] ricos e muito ricos das grandes
companhias têm rendas bastante grandes para viver não só
confortavelmente, mas com vários graus de luxo. Uma grande
proporção deles poupa, habitualmente, parte de suas rendas, e
quando estas se elevam, enfrentam eles uma escolha entre consumir
ou poupar o incremento [...]
44
Os paises atingidos pela II Guerra Mundial tiveram um crescimento econômico estrondoso no
pós-guerra, graças a grande quantidade de valores emprestados pelos Estados Unidos, que tinha
como intenção o desenvolvimento econômico mundial do próprio capitalismo industrial.
103
A função da publicidade, talvez a sua função dominante hoje, torna-se
assim a de travar, em nome dos produtores e vendedores dos bens
de consumo, uma guerra incessante contra a poupança e em favor do
consumo. (BARAN & SWEEZY, 1996, p. 131 -132)
Após termos apreendido amplamente o processo de como ocorreu às
diversas práticas de indução ao consumo sobre o trabalhador, principalmente nos
Estados Unidos da América, nos parece que realmente a publicidade acabou
“educando-o”, mas da pior forma possível, pois esta “educação comportamental”
se deu sob a forma de uma coação velada, estabelecendo aos homens e
mulheres um comportamento cada vez mais consumista. Coação velada, que
é impressa no subconsciente de cada homem ou mulher dentro da sociedade, a
necessidade de possuir uma nova mercadoria, pois a eficácia funcional de sua
mercadoria adquirida anteriormente, fica sempre a mercê da que acabou de ser
lançada no mercado, pois esta, traz em seu bojo a promessa uma eficácia
funcional maior, como tamm promete uma realização maior para quem a
possuí-la.
104
5.1 As anos 70 – desemprego e consumo.
Após os anos 70, o desenvolvimento do processo econômico sofreu
algumas avarias, já que se instalou uma crise econômica com tendências a sérios
problemas estruturais. A composição orgânica do capital continuava a crescer
enquanto jogava para fora do mercado a mão de obra operária.
Segundo Magdoff, o longo período de prosperidade que foi o da década
de 40 a 70, começa a sofrer panes de insustentabilidade, “agora a hegemonia
pertence ao passado [...] o sistema monetário está entregue à desordem e que
uma guerra comercial destruidora se avizinha, as corporações multinacionais terão
que renunciar ao seu sonho e se ajustar a uma realidade bem diferente”
(MAGDOFF, 1978, P.23)
E segundo ele ainda, o que mantinha e sustentava o sistema eram três
forças muito importantes, como podemos ver em suas palavras abaixo:
Três forças importantes sustentam o dinamismo da economia norte-
americana nos 25 anos que se seguiram a II Guerra Mundial: a
demanda interna contida pelos bens de consumo duráveis que se
acumulam durante a guerra, a hegemonia do Estados Unidos no
quadro do capitalismo mundial, e os gastos militares e as guerras
travadas em defesa dessa posição hegemônica. (MAGDOFF, 1982,
P.15)
Dessa forma o momento do pós-guerra, que ficou marcado com o
brilhante crescimento do emprego e das transações comerciais – propiciadas em
grande parte pela poupança acumulada –, começa a se esfacelar por volta do final
dos anos 60 e início dos anos 70, principalmente com a crise do petróleo. A
ocorrência de tal fato criou a necessidade de “novos suportes”, para evitar
qualquer problema grave ligado à crise. Algumas medidas foram tomadas, como
[...] uma rápida expansão de crédito ao consumidor, inclusive dos empréstimos
hipotecários para construção de novas casas. (MAGDOFF, 1982, P.16)
O crédito ao consumidor foi um dos estímulos que propiciou um grande
crescimento do consumo, e ajudou a patrocinar a recuperação dos EUA.
O principal fator da recuperação dos EUA não tem sido, como poderia
esperar normalmente, a acumulação de capital, mas o consumo.
Como indicação de predomínio do consumo, podemos notar que
105
entre 1973 e 1977, os gastos com consumo pessoal (em dólares
constantes de 1972), aumentou 10,8% enquanto o investimento fixo
não residencial (também em dólares de 1972) na realidade baixou
3%. E o crescimento do consumo foi alimentado por uma explosão
extraordinária do crédito ao consumidor (durante os anos 1970-75, o
acréscimo anualquido ao volume de circulação de crédito ao
consumidor era em média de 11,1 bilhões de dólares, enquanto em
1976 esse número aumentou para 20,2 bilhões e em 1977, para 30,9
bilhões) (MAGDOFF, 1982, p. 49)
O crédito ao consumidor juntamente com a hipoteca permitiu um
desempenho mais seguro ao EUA, e se não fosse esta economia pautada na
dívida, talvez ele não tivesse alcançado um nível superior em relação aos outros
paises. A hipótese de Magdoff, é que a diferença em relação dos EUA e aos
outros paises está “na mais longa história do crédito ao consumidor nos EUA –
ligada a uma “automobilização”
45
anterior da sociedade norte-americana – e aos
mecanismos institucionais mais bem desenvolvidos para sua promoção e
fornecimento”. (MAGDOFF, 1982, p. 49)
Esta fase de extrema prosperidade começou a encontrar entraves quando
outras nações “capitalista adiantadas” ganharam força e começaram a competir
com os EUA, e em algumas áreas começou a ultrapassar sua produção. Então,
muito esforço foi direcionado para continuar as promoções de venda e ampliar o
crédito ao consumidor.
[...] o comportamento preponderante das firmas é aproveitar toda
oportunidade de aumentar os preços, quer a produtividade esteja
subindo ou descendo. Novos modelos e novas embalagens são
planejadas, não só para oferecer oportunidades de aumentar os
preços. [...] A estratégia típica das grandes companhias monopolistas
que hoje dominam a economia dos EUA, é aproveitar os aumentos de
produtividade para elevar os lucros e/ou intensificara promoção de
vendas – não reduzir os preços. (MAGDOFF, 1982, p. 106)
Usando um pouco do raciocínio que Thompson utiliza em seu livro A
Globalização em Questão, podemos entender como o cenário pleno de
desenvolvimento econômico que foi construído no pós-segunda guerra mundial,
começa a apresentar as primeiras turbulências na década de 70. Segundo ele as
45
O período da automobilização que foi iniciado após a I Guerra Mundial, foi segundo Magdoff a
espinha dorsal da prosperidade americana, por volta dos anos vinte. Pois, no seu bojo trouxe
consigo o desenvolvimento de diversas indústrias que estavam ligadas a ela, como as de petróleo,
vidro e borracha etc.
106
turbulências se apresentam sob várias formas, entre elas estão: o colapso do
Sistema Bretton Woods; a crise do petróleo de 73 e 79 que gerou pressões
inflacionárias nos países avançados — estimuladas pelas altas de preço do
petróleo; a Guerra com o Vietnã levou a crise para o país dominante de então, os
EUA etc. Muitas outras transformações começaram a ocorrer no cenário político e
econômico mundial; e a busca por mercados adicionais para investimentos levou
os países avançados a realizar grandes empréstimos dos bancos aos países de
terceiro mundo.
Tivemos o crescimento do mercado de eurodólar, como também o
crescimento do comércio exterior em relação ao PIB nos países industriais
avançados. No decorrer desse processo ainda, tivemos a aceleração da política
pública de internacionalização dos mercados financeiros e o desenvolvimento do
sistema monetário europeu; apresentou-se então uma forte tendência a “dês-
industrialização”, na Inglaterra e nos EUA e um forte crescimento do desemprego
na Europa; nos países de terceiro mundo, ocorreu um rápido desenvolvimento
industrial, chegando a interferir no comércio do primeiro mundo e dessa forma,
gerou uma grande preocupação dos países avançados com a competição que se
tornava cada vez mais acirrada.
Neste cenário o Japão se destacou, pois já havia passado pelas
transformações da produção de massa padronizada, para a produção flexível,
tamm foi nesta fase que ocorreram mudanças das corporações oligopolistas
nacionais que passaram para uma nova configuração de empresas menores e
multinacionais.
[...] este novo padrão mundial de acumulação começa a emergir dos
escombros do velho ciclo pós-guerra, que está em crise desde o final
dos anos sessenta ou início dos anos setenta. Como se trata de uma
mudança global e estrutural da acumulação ampliada do capital, essa
crise detonou os alicerces mais sólidos de tudo que existia e parecia
sólido, redesenhado a história. (GENNARI, 1999, p.91)
Segundo David Harvey, em seu livro Condição Pós-Moderna, foi possível
presenciar profundas transformações no âmbito da economia no período que
compreende a segunda metade do século XX. Entre as marcas que representam
essas transformações, estão as mudanças dos processos de trabalho, as
107
configurações geográficas e geopolíticas, os poderes do Estado e principalmente
os hábitos de consumo – de acordo com ele, cada regime de acumulação traz
consigo o modo de regulamentação social e política que permite o esquema de
reprodução do próprio sistema de acumulação, e o comportamento de cada
indivíduo no interior da sociedade é moldado a partir das “normas, hábitos, leis,
redes de regulamentação etc. que garantem a unidade do processo”. (HARVEY,
1992, p. 117).
Contudo, Harvey salienta que o período que vai de 1965 a 1973
demonstrou a “incapacidade do fordismo e kenesianismo de conter as
contradições inerentes ao capitalismo” (HARVEY, 2001, p.133)
E diz ainda que:
A profunda recessão de 1973, exacerbada pelo choque do petróleo,
evidentemente retirou o mundo capitalista do sufocante torpor da
“estagflação” (estagnação de produção de bens e alta inflação de
preços) e pôs em movimento um conjunto de processos que
solaparam o compromisso fordista. Em conseqüência, as décadas de
70 e 80 foram um conturbado período de reestruturação econômica e
reajustamento social e político. (HARVEY, 2001, p.140)
Edmilson Carvalho, em um artigo a Revista Outubro
46
de 2003, deixa
claro que não foi o auto-esgotamento do modo fordista de produção, como os
regulacionista pensam que levou a crise, mas
[...] foi a eclosão da grande crise de superprodução de 1974/75 que
fez voar aos pedaços o fordismo, o kenesianismo e a social-
democracia. De modo semelhante, não foi, logo depois, o
neoliberalismo que criou a reestruturação produtiva, mas a
reestruturação produtiva que reclamou a política de Estado neoliberal.
O capital iria, a partir daí, dar início a uma fase nova, assentada num
novo padrão de organização de trabalho e da produção (a
reestruturação produtiva) e um novo corolário político (o
neoliberalismo) – uma fase, que já dura cerca de três décadas, toda
formada de profundas desigualdades, desemprego e instabilidade,
turbulências à vista de recuperação. (CARVALHO, 2003, P. 48)
Enfim o impulso oriundo de uma demanda crescente de bens de consumo
duráveis estava destinado a enfraquecer, mais cedo ou mais tarde, e por isso que
o Complexo Industrial Militar reaparece para imprimir velocidade à circulação das
mercadorias. E por meio das guerras – ou como diria Mészáros, através de uma
46
A crise da exaustão do Capital, Revista Outubro, nº 9, 2003.
108
produção voltada para destruição – temos sempre a origem de novos mercados e
com eles originam-se tamm novas formas de trocas de mercadorias.
109
Conclusão: uma constatação do real
Por meio de “truques astutos”, o homem vem submetendo a natureza a
sua vontade, e exatamente dessa forma que a ciência vem sendo empregada.
Hora por meio de longos períodos de estudos, direcionados a persuasão
psicológica, que visam captar o que é essencial ao homem, e a partir dessa
necessidade criar uma carência que possa ser sanada por meio do produto; hora
por meio de longos períodos de estudos científicos voltados a procura de um
ponto ótimo de obsolescência do produto. E como diria Mészáros, o complexo
militar-industrial nesse quadro, se apresenta como o agente eficaz de emprego
científico direcionado para destruição, e dessa forma para a reprodução do capital.
Além disso, uma vez que seu empreendimento é separado de uma
perspectiva humana abrangente, o ‘truque habilidoso” em questão na
verdade submete a natureza “à vontade do homem”, mas
fundamentalmente, direciona de modo catastrófico contra a
humanidade na mais insana de todas as equações concebíveis, que
vê na expansão ilimitada do poder desumanizador e necessariamente
destrutivo do complexo militar-industrial, apesar das perspectivas da
“aniquilação geral assomando cada vez mais claras”, as condições
elementares do progresso humano. (MÉSZÁROS, 198-, p. 295)
Na realidade o desenvolvimento histórico produziu o perverso agente
material do complexo militar-industrial e os “truques habilidosos” dos
“técnicos astutos”, através dos quais a “astúcia da Razão” parece
estar prestes a confundir e enganar irrevogavelmente a si mesma,
assumindo assim a forma de irracionalidade total e, em vez de
realizar a liberdade na história, colocando um ponto final na própria
história. (MÉSZÁROS, 198-, p. 295)
Concluímos que a aceleração da circulação econômica da mercadoria foi
a meta estabelecida pelo capital para enfrentar ameaças de qualquer porte
relacionadas aos possíveis entraves gerados pelo encalhe de mercadorias. Dessa
forma a extrapolação da exploração estética das mesmas, utilizada pelos meios
de comunicação, representam a ansiedade do capital de se auto-valorizar, a
medida que consegue imprimir movimento aos consumidores em direção ao
mercado.
110
Constatamos que o primeiro passo encontrado pelo capital no pós-
segunda guerra-mundial, foi a tentativa de ampliar do círculo de consumo. Este
passo consistiu em aplicar estratégias que induzissem os consumidores mais
rapidamente ao mercado, e dessa maneira a publicidade ganhou realce, pois era
por meio dela que as mercadorias eram re-elaboradas simbolicamente, na
tentativa de estabelecer novas propriedades ao se valor de uso imanente ou ainda
construir um valor de uso fictício, virtual e até mesmo imaginário para a
mercadoria.
Para que a ampliação do círculo do consumo realmente ocorresse, foi
necessário o emprego de grande massa de capital para execução da elaboração
das campanhas de venda dos produtos. A televisão, entre todos os meios de
comunicação utilizados para propagar informações, funcionou como o meio
condutor mais eficaz de comportamentos consumistas, pois a transmissão dos
anúncios dos produtos permitiu a ampliação das necessidades de novas
mercadorias.
E como recurso adjacente da produção de guerra, a obsolescência surgiu
no ambiente econômico dos bens de consumo duráveis, como um agente
acelerador do processo de valorização do capital, pois ao ser imensamente
aplicada sobre as mercadorias, impulsionou o consumidor a um retorno ao
mercado, para adquirir bens que pudessem por fim saciar as necessidades que
não foram completamente saciadas.
Vultosa é a dimensão das estratégias encontradas pelo capital, para
exercer de forma oculta – na vida cotidiana de todos os indivíduos dentro da
sociedade – uma maior eficácia de sua realização.
Às vezes tal disfarce estratégico é reconhecido, quando um produto não
se realiza integralmente, pois os materiais empregados em sua construção deixam
o consumidor a desejar um melhor produto do que já foi por ele adquirido.
Contudo, como a velocidade acelerada do capital, rege o dia-a-dia social, poucos
serão os problemas que realmente se converterão em luta de direitos por uma
taxa de utilização maior do produto. E para silenciar grandes discussões sobre a
qualidade respeito de um tal produto, as empresas já prevêem e estabelecem uma
111
garantia por tempo determinado, cujos problemas serão sanados dentro desse
prazo previsto.
Foi criado um tempo limite às mercadorias, tamm foi empregado um
tempo limite as necessidades historicamente construídas. Essas necessidades se
transformam cada vez mais em necessidades evanescentes como a própria
durabilidade das mercadorias. Duram basicamente o período do ciclo da moda,
que a cada dia se torna mais exíguo.
A aceleração destrutiva da mercadoria responde a ânsia do capital de se
auto-valorizar, por isso quando mais rápido a circulação econômica da mercadoria
ocorrer, mais rápido tamm será sua obsolescência – psicológica quando
envolve o homem nas artimanhas da exploração estética da mercadoria,
elaboradas logisticamente pelo setor de marketing, ou física quando recai sobre o
corpo da mercadoria deteriorando-a mais rapidamente.
Concluímos, portanto, que tais fenômenos estratégicos utilizados pela
economia, foram e são empregados com o objetivo explicito de reprodução e
expansão máxima do capital, que se auto-realiza por meio da decrescente taxa de
valor de uso do produto.
Para que isso se efetive, ou seja, para que o círculo de consumo amplie e
encurte a circulação da mercadoria, a economia trabalha arduamente para
encontrar meios pelos quais o consumo seja cada vez mais crescente. Podemos
observar este fato no caso dos cartões de crédito americano, que possibilitaram o
consumidor, mesmo sem dinheiro, se direcionar ao mercado e adquirir
mercadorias e só posteriormente pagar por elas – claro que acrescidas de juros e
correções monetárias.
Segundo Rubens Ricupero “a cada 15 segundos, um americano é
declarado falido”,
47
graças a dívida pessoal gerada por um consumo desenfreado.
E esta freqüência aumento cinco vezes desde os anos de 1980.
O controle exercido pelo capital primeiramente para conter a crise gerou
uma extrapolação do próprio capital sobre a vida cotidiana dos homens e cada
47
RICUPERO, Rubens . Artigo apresentado na Folha de São Paulo , assunto: Dinheiro, Titulo: A
dívida como benção e libertação, data: 19/12/2004.
112
espaço foi ocupado pelo capital para sua realização. A descartabilidade destrutiva
ou a produção para a destruição foi por fim direcionada tamm para o próprio
homem através de sua força de trabalho, que neste processo se tornou uma
mercadoria descartável tal qual as demais.
O capitalismo ávido para encontrar meios de se auto-expandir ou de fazer
circular mais rapidamente o capital, adotou medidas convencionais
48
para afastar
as crises – e foi estes meios que estudamos nesta pesquisa, com o intuito de
tentar entender o processo de valorização despudorada do capital em sua atual
fase. A fase da produção destrutiva do capital, como diria Mészáros, na qual a
“máxima expansão possível (que corresponde à lucratividade), está centrada na
base de uma taxa de utilização mínima [...]” (MÉSZÁROS, 2002, p.118), ou seja, a
produção é inteiramente direcionada ao descarte perdulário dos bens de consumo
como tamm do próprio trabalhador, devido ao movimento contraditório do
capital, que ao se compor organicamente exclui a mercadoria que o produz, ou
seja, a mão de obra assalariada.
Ao nosso ver, o equivalente funcional encontrado pelo capital para afastar
suas possíveis crises (de super-produção ou de baixa demanda), foi o emprego
dessas duas estratégias econômicas conjugadas, que serviram para acelerar a
velocidade de circulação econômica da mercadoria dentro do próprio círculo do
consumo “aumentando o número de transações no círculo já existente”
(MÉSZÁROS, 1989, p.108). E paralelamente o uso do complexo militar-industrial
removeu “os tradicionais constrangimentos do círculo de consumo definido pelas
limitações do apetite dos consumidores” (p.123). Abrindo com isso, novas
possibilidades ao metabolismo do capital para se auto-expandir.
48
Medidas convencionais, pois se tratavam de medidas muito utilizadas pelo capital durante toda
sua existência, como vimos anteriormente no comentário de Paul Lafargue a respeito da
obsolescência aplicada já no século XIX.
113
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