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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Darlene de Moraes Silveira
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a
Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL
SÃO PAULO
2008
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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Darlene de Moraes Silveira
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a
Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
DOUTORADO EM SERVIÇO SOCIAL
Tese apresentada à Banca Examinadora
como exigência parcial para a obtenção do
título de Doutora em Serviço Social, pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
sob orientação da Profª. Doutora Myrian
Veras Baptista.
SÃO PAULO
2008
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Banca Examinadora
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
________________________________________
Suplentes
________________________________________
________________________________________
Para
C
arolina.
Agradecimentos
À Carolina de Moraes Silveira Peixe, filha amada, pela presença
iluminada e aprendizagem da VIDA social.
Aos meus pais, Milton e Maria, cuja afetividade e apoio incondicional,
tornam possível minha busca de conhecimentos e a formação sistemática.
À minha irmã Carla, sensibilidade e afeto, presença e apoio
indispensáveis.
À Profª Dra. Maria Manoela Valença, influência amiga e companheira
de jornada política e profissional, cujo incentivo e apoio logístico viabilizaram
meu trânsito em São Paulo. Ao Dr. Rafael Valença, pela acolhida e apoio
logístico em São Paulo.
Às amigas Vera Nícia Forkamp de Araújo e Andréia de Oliveira,
presença afetiva e de aprendizagens constantes. Apoio e incentivo nesta
jornada acadêmica.
Ao Marildo Peixe, companheiro de tempos passados. Parceiro do
tempo presente na desafiante tarefa de educar/educando nossa filha, Carolina.
Ao tornar sua presença junto a nossa filha, forte o bastante, transformou minha
ausência em saudade, nestes tempos de PUC/SP.
Ao Valmir dos Passos, duo recente. Entre idiossincrasias e a gastronomia,
presença libertadora e possibilitadora de novas descobertas afetivas.
Testemunhos à memória.
À Profª Dra. Myrian Vera Baptista, orientadora desta tese, apoio,
atenção e respeito, cuja competência reflexiva e paixão acadêmica me
impulsionam a seguir o caminho escolhido.
Aos professores Doutores Maria Carmelita Yazbek, Maria Lúcia
Martinelli, Evaldo Vieira, José Paulo Netto, Maria Lúcia Barroco, Aldaíza
Sposati do programa de Estudos Pós Graduados da PUC/SP, e Ivete
Simionato do Programa de Mestrado da UFSC. As aprendizagens e a forma
respeitosa no trato educativo, instigam novas buscas e a continuidade da
formação acadêmica.
À Kátia, secretária do Programa de Estudos Pós Graduados em
Serviço Social PUC/SP. Atenção, apoio e paciência no acompanhamento e
orientações dos procedimentos institucionais.
Aos pais, mães e crianças da 3ª série “Ativa” da Escola Associação de
Pais da Praia do Riso, cujo apoio, e retaguarda carinhosa com a Carolina,
tornaram este caminho acadêmico mais tranqüilo e prazeroso. Em especial, ao
João e à Rita, pais da Maria Eduarda, ao Flávio e a Márcia, pais do Victor,
ao Gilmar e à Nilma, pais da Mariana e do João Pedro, ao Fábio e à
Luciana, pais do Paulinho.
Resumo
Constitui-se objeto deste estudo a interface entre o projeto ético-político do
Serviço Social e a defesa dos direitos de crianças e de adolescentes,
focalizando as deliberações e a agenda política dos Encontros Nacionais
CFESS/CRESS e os direitos preconizados pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente. O estudo aborda os elementos constitutivos do projeto ético
político profissional, que guarda estreita relação com os princípios que
fundamentam o atual Código de Ética Profissional do Assistente Social
considerando o cenário de transformações pelo qual passa a sociedade
brasileira (imersa no panorama de ‘globalização’). São determinações
macroeconômicas e sóciopolíticas que colocam o Serviço Social à prova, no
que tange as demandas sociais e perspectivas políticas, visto que as políticas
sociais representam amplo espaço ocupacional da profissão. A abordagem
sobre os direitos da população infanto-juvenil, corresponde ao movimento que
originou o Estatuto da Criança e do Adolescente ECA, contemplando-o em
suas bases doutrinárias.Dentre os direitos e a necessidade de ‘resistência’
profissional diante da cruzada ‘globalizante’, destaca-se neste estudo que o
Serviço Social, através das entidades representativas da categoria em sua
instância deliberativa os Encontros Nacionais CFESS/CRESS, se faz
presente e atuante na defesa dos direitos da criança e do adolescente.
Aspectos que marcam a interface entre a materialização do projeto ético-
político do Serviço Social e a defesa dos direitos da criança e do adolescente.
Coerentemente com o esperado processo de democratização das políticas
para a infância e para a adolescência, o projeto ético-político inaugura uma
nova identidade profissional fortemente vinculada a transformação do homem
massa em homem coletivo, visto que a categoria profissional, através de suas
entidades representativas, manifesta seu empenho na ‘reforma intelectual e
moral’, materializando o propósito de contribuir para a construção de uma nova
ordem societária, que privilegia a vontade coletiva.
Palavras chaves: Projeto ético-político, Serviço Social, direitos da criança e do
adolescente.
Abstract
Object of this study is constituted the interface between the ethical-political
project of the Social Service and the defense of the children's rights and of
adolescents, focalizing the deliberations and the political calendar of the
National Encounters CFESS/CRESS and the rights extolled by the Child's
Statute and of the Adolescent. The study focalizes the constituent elements of
the political ethical project professional, that keeps it narrows relationship with
the beginnings that base the current Code of the social worker Professional
Ethics considering the scenery of transformations by which goes the Brazilian
society (immersed in the background of 'globalization') Determinations are
macroeconomic and socio-political posing the Service to the test, as far as
social demands and political outlook, since social policies represent broad
occupational area of the profession. The approach on the rights of children and
youth population, is the movement that led to the Statute of the Child and
Adolescent - SCA, incorporating it into its doctrinal foundations. Among the
rights and the need for 'resistance' training before the cross' global ', stands out
in this study that the Service, through the representative bodies of the category
in its deliberative body - the National Meetings CFESS / CRESS, is present and
active in defending the rights of children and adolescents. Aspects that mark the
interface between the materialization of the ethical-political project of Social
Service and protecting the rights of children and adolescents. In line with the
expected process of democratization of policies related to childhood and
adolescence, the ethical-political project inaugurates a new professional identity
strongly linked the transformation of man into mass man collective, as the
professional category, through their representative bodies, expresses its
commitment to 'reform intellectual and moral', materializing the aim of
contributing to the construction of a new social order, which focuses on
collective will.
Key words: Ethical-political project, Social Service, the child's rights and of the
adolescent.
LISTA DE SIGLAS
ABEPSS – Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social
ALCA – Área de Livre Comércio das Américas
ANAS – Associação Nacional de Assistentes Sociais
CBAS – Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais
CEDEPSS – Centro de Documentação e Pesquisa em Política Social e Serviço
Social
CES – Conselho Estadual de Educação
CFAS – Conselho Federal de Assistentes Sociais
CFESS – Conselho Federal de Serviço Social
CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
CNBB – Confederação Nacional dos Bispos do Brasil
CPIHTS – Centro Português de Investigação em História e Trabalho Social
CRESS – Conselho Regional de Serviço Social
CF - Constituição da República Federativa do Brasil
CNE – Conselho Nacional de Educação
CUT – Central Única dos Trabalhadores
DHNet –Direitos Humanos na Internet (site)
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
ENESSO – Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social
FBO - Fórum Brasil do Orçamento
FEF – Fundo de Estabilização Fiscal
FMI – Fundo Monetário Internacional
Forum DCA – Forum Nacional Permanente de Entidades Não Governamentais
de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
INESC – Instituto de Estudos Sócio-Econômicos
INSS – Instituto Nacional de Seguridade Social
IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social
MMNMMR – Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua
MST – Movimento Sem Terra
OIT – Organização Internacional do Trabalho
OMC – Organização Mundial do Comércio
ONG – Organização Não Governamental
PNI – Programa Nacional de Imanizações
PROER – Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do
Sistema Financeiro Nacional
PUC/SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
SUS – Sistema Único de Saúde
UDESC- Universidade do Estado de Santa Catarina
UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina
ULBRA – Universidade Luterana do Brasil
UNISINOS – Universidade do Vale do Rio dos Sinos
UNISUL – Universidade do Sul de Santa Catarina
SUMÁRIO
I. INTRODUÇÃO ...............................................................................................11
1.1 - Extratos da trajetória profissional......................................................................11
1.2 - Contextualização do objeto de estudo ..............................................................14
1.3 - Procedimentos metodológicos ..........................................................................17
1.4 - A estrutura da tese............................................................................................24
II. A EMERGENTE DEMOCRATIZAÇÃO DO ESTADO E OS DIREITOS
DE CRIANÇAS E DE ADOLESCENTES...................................................................27
2.1 - O reordenamento do Estado e as incidências sobre as políticas sociais..........27
2.1.1 - A Constituição Federal de 1988 e a democratização do Estado....................34
2.1.2 - As políticas sociais no contexto democrático.................................................47
2.2 - O Estatuto da Criança e do Adolescente - políticas de direitos e uma nova
cultura. ......................................................................................................................54
III. O SERVIÇO SOCIAL – AS REVISÕES, AS RUPTURAS E OS NOVOS
RUMOS ÉTICO-POLÍTICOS.....................................................................................80
3.1 - O Serviço Social: a constituição de novas perspectivas ético-políticas. ...........80
3.2 - O Projeto Ético Político do Serviço Social e os indicativos de uma nova
identidade profissional...............................................................................................92
IV. A INTERFACE ENTRE O PROJETO ÉTICO-POLÍTICO DO SERVIÇO
SOCIAL E A DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE......112
4.1 - As deliberações dos Encontros Nacionais CFESS/CRESS: aproximações
e contribuições para a defesa e consolidação dos direitos. ....................................112
4.1.1 - XXII Encontro Nacional CFESS/CRESS - 1993...........................................115
4.1.2 - XXIV Encontro Nacional CFESS//CRESS – 1995........................................121
4.1.3 - XXV Encontro Nacional CFESS/CRESS – 1996..........................................125
4.1.4 - XXVI Encontro Nacional CFESS/CRESS – 1997.........................................130
4.1.5 - XXVIII Encontro Nacional CFESS/CRESS – 1999.......................................134
4.1.6 - XXIX Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2000.........................................137
4.1.7 - XXX Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2001..........................................147
4.1.8 - XXXI Encontro Nacional do conjunto CFESS/CRESS – 2002.....................151
4.1.9 - XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2003........................................165
4.1.10 - XXXIII Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2004.....................................171
4.1.11 - XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2005. ...................................179
4.2 - O Projeto Ético-Político profissional do Serviço Social e a defesa de
direitos da criança e do adolescente – reflexões prospectivas................................185
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................192
VI. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................201
I. INTRODUÇÃO
O presente estudo busca identificar e analisar a interface entre o
projeto ético-político do Serviço Social e a defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes. Os marcos para a referida identificação e posteriores análises são: o
projeto ético-político profissional do Serviço Social cujo ponto de partida neste
estudo é o Código de Ética profissional do(a) Assistente Social de 1993; os
relatórios dos Encontros Nacionais CEFESS/CRESS e o Estatuto da Criança e do
Adolescente novo arcabouço jurídico-formal que garante direitos às crianças e aos
adolescnetes.
A tese que ora apresenta-se, contém a descrição com as respectivas
reflexões teóricas, sobre as aproximações e contribuições do Serviço Social
mediante as deliberações da categoria profissional durante os Encontros
CFESS/CRESS para a defesa dos direitos de crianças e de adolescentes.
A perspectiva histórico crítica que fundamentou o estudo em tela, pode
ser apreendida através dos elementos que compõem a trajetória política e de
formação profissional. Desta, emergem as inspirações e o interesse investigativo
que delineiam a construção do objeto desta tese, bem como a constituição dos
procedimentos metodológicos que impulsionam o desenvolvimento deste estudo.
Diante destes elementos, que encontram-se articulados e em permanente
movimento histórico, é que buscou-se desenvolver a tese que ora apresento.
1.1 - Extratos da trajetória profissional
As práticas políticas e profissionais que convergem com o tema
proposto, fundam-se nas seguintes experiências:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
2
As vivências junto ao Movimento Nacional de Meninos/as de Rua
MNMMR entre 1987 e 1996, como educadora e pesquisadora no Projeto
Educação Social de Rua (1987/1990 - RS). Como militante - na coordenação da
Comissão Local de Porto Alegre e posteriormente de Florianópolis, na Comissão
Estadual do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina). Coordenação da delegação
de meninos/as em situação de rua do Rio Grande do Sul durante o IIº Encontro
Nacional de Meninos e Meninas de Rua realizado em Brasília com o propósito de
pressionar o Congresso Nacional para a aprovação do Estatuto da Criança e do
Adolescente, em 1989. Coordenação pedagógica do Centro de Formação do
MNMMR – Polo I/São Paulo, representando os três estados do sul do país.
Militância que oportunizou a participação ativa no movimento de defesa dos
direitos da criança e do adolescente e do processo de elaboração e aprovação
da lei 8.069/90, o ECA desencadeado ainda na década de 80.
A experiência profissional no processo de implantação e funcionamento
do Conselho Municipal da Criança e do Adolescente de Florianópolis CMDCA
(1992/1998). Participação da diretoria como vice-presidente e, posteriormente,
como presidente, cuja inserção corresponde a elaboração e negociação do ante-
projeto de lei que cria o Conselho de Direitos junto aos poderes executivo e
legislativo, percorrendo a criação do Forum de Organizações Não
Governamentais de atendimento e defesa dos direitos da criança e do
adolescente e a implantação e funcionamento do CMDCA. Através do CMDCA,
a elaboração da lei que cria os Conselhos Tutelares de Florianópolis,
coordenando o processo de implantação e de formação dos mesmos.
Elaboração do anteprojeto de decreto que criou o Fundo Municipal para a
Infância e a Adolescência. Em 1996, a coordenação da Iª Conferência dos
Direitos da Criança e do Adolescente de Florianópolis. Tal experiência, foi fonte
de reflexão e de sistematização durante a realização do mestrado em Educação
e Cultura Universidade do Estado de Santa Catarina - UDESC, que culminou
com a elaboração da dissertação O Conselho Municipal de Direitos da Criança
e do Adolescente de Florianópolis, os (des)caminhos entre as expectativas
políticas e as práticas vigentes. A ampliação e o aprofundamento deste estudo
ocorreu com a inserção no Programa de Estudos Pós Graduados em Serviço
Social – PUC/SP e a elaboração de trabalhos envolvendo políticas sociais,
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
3
direitos da criança e do adolescente e o projeto ético político do Serviço Social. O
curso de mestrado culminou com a dissertação de mestrado sob o título de: O
Conselho Municipal de Diretos da Criança e do Adolescente de Florianópolis:
cultura política e democracia.
A experiência como docente do curso de Serviço Social. Inicialmente
na ULBRA (1988-1991); na UNISINOS (1989-1991) e, desde 1994, como
docente da UNISUL. Em 1997 tornei-me responsável pela implantação do curso
de Serviço Social da UNISUL em Florianópolis, com atuação na coordenação do
curso entre 1997 e 2004. Atividades que correspondiam à formação profissional
do assistente social, as demandas administrativas e sociais dirigidas à
coordenação, assim como a sedimentação dos componentes do projeto ético
político do Serviço Social. Através da docência têm sido efetivados projetos de
Pesquisa e de Extensão abordando temáticas vinculadas à criança e ao
adolescente, às famílias e às formas organizativas da sociedade civil. As
aproximações juntos aos Conselhos de Direitos e Tutelares vem ocorrendo
mediante as solicitações de assessoria e capacitação por parte dos municípios
da Grande Florianópolis. A participação no Programa Tecendo a Cidadania
prestando assessoria (entre 1999 a 2001), na capacitação para articuladores e
gestores de políticas sociais, na Grande Florianópolis e Região de Tubarão,
através do convênio entre o Governo do Estado de Santa Catarina e a UNISUL.
Participaram dos cursos os articuladores das políticas públicas representantes de
órgão governamentais e não governamentais (conselheiros, técnicos da área
social, representantes de Fóruns de ONGs, gestores municipais). Também vem
contribuindo significativamente com meu amadurecimento político e profissional,
a participação nas elaborações e reformulações do projeto pedagógico do Curso
de Serviço Social da UNISUL, experiência que trás as reflexões sobre a
formação profissional em consonância com o respectivo projeto ético-político.
A experiência como vice-presidente do CRESS12 ª Região entre 1999
e 2002, que oportunizou a participação, em diferentes instâncias, em discussões
temáticas e de deliberação das questões atinentes à profissão, instituindo maior
vínculo com a categoria profissional, com suas demandas, ao tempo que
contribuía fortalecendo o compromisso com os princípios e fundamentos ético-
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
4
político profissionais. Esta representação viabilizou a participação do XXX
Encontro Nacional CFESS/CRESS, assim como os processos preparatórios para
o XXIX e XXXI Encontros Nacionais CFESS/CRESS.
Estas práticas, embora apresentadas de forma pontuais, articulam-se
entre os diferentes campos de atuação, o que potencia a riqueza das vivências, das
reflexões, das indagações e as contribuições possíveis nos atuais espaços
ocupacionais.
1. 2 - Contextualização do objeto de estudo
Com a Constituição Federal de 1988
1
, a formulação e o
gerenciamento das políticas sociais se alteram, pois, “a participação da sociedade
na coisa pública ganha novos contornos e dimensões” (RAICHELIS, 1998, p.75),
contrapondo-se à tradição centralizadora e autoritária presentes na história das
políticas sociais na sociedade brasileira.
Neste contexto, o Serviço Social tem seu campo de atuação ampliado.
Concomitantemente ao alargamento do espaço ocupacional, a categoria dos
assistentes sociais assume posições incorporando em seu projeto ético político a
atuação firme diante da centralidade da liberdade como valor ético fundamental,
assim como a defesa intransigente dos direitos humanos, reafirmando o
compromisso com a universalidade do acesso às políticas sociais, a ampliação da
cidadania, o aprofundamento da democracia, a eqüidade e a justiça social, de forma
articulada com os outros movimentos organizados da sociedade, rompendo com s
preconceitos e discriminações, convergindo para uma nova ordem societária.
(Resolução CFESS 273, que institui o Código de Ética Profissional do Assistente
Social; 1993).
1
Constituição cujo preâmbulo anuncia ...representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte
para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a
segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos...” Constituição da República Federativa do Brasil, 1988.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
5
Esses compromissos e posicionamentos passam a compor a agenda
política das entidades representativas do Serviço Social brasileiro, conforme
expressa o tema do XXXIV Encontro CFESS/CRESS, realizado em Manaus em
2005, que versou sobre: “Defender direitos e fortalecer os movimentos sociais:
atribuições ética, política e profissional do assistente social para radicalizar a
democracia”.
Para desenvolver o estudo em tela, partiu-se do mergulho em temas
relacionados ao desenvolvimento do Serviço Social no Brasil nas últimas décadas
a aprovação do Código de Ética profissional do Assistente Social em 1993, a
constituição do projeto ético-político do Serviço Social, as deliberações do conjunto
CFESS/CRESS durantes os Encontros Nacionais quando apontam na agenda a
defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes, a Constituição Federal de 1988
e a Lei 8.69/1990 - o Estatuto da Criança e do Adolescente com as considerações
sobre os preceitos legais e as expectativas políticas referente ao vínculo entre os
mesmos.
A contextualização do objeto de estudo ancora-se na inserção pessoal
em espaços ocupacionais e políticos vinculados à defesa dos direitos de crianças e
de adolescentes, cujas vivências, as tensões e as conquistas, frutificaram produções
sobre a política de direitos da criança e do adolescente e a relação desta com o
projeto ético-politico do Serviço Social. Estas experiências suscitaram o interesse
investigativo e a busca de aprofundamento das questões afetas à temática.
O movimento de “construção do objeto“ diante da proposta
investigativa, decorre das “aproximações sucessivas”
2
inerentes à formação
acadêmica e profissional, e, decorrentes das vivências e práticas direcionadas à
defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes.
2
Forma de abordar o objeto de pesquisa por Maria Manoela C. Carvalho Valença na tese de doutorado “A utopia do encontro
de dois mundos: um país de “mil-e-tantas misérias” e a doutrina de proteção integral”Programa de Estudos Pós-Graduados em
Serviço Social – PUC, 2001.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
6
Desta forma, a organização da presente tese parte da compreensão de
que “o objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de significados e
relações que sujeitos concretos criam em suas ações” (CHIZZOTTI, 2001, p.79)
Diante do exposto, constitui-se objeto deste estudo, as aproximações
e contribuições do Serviço Social na defesa dos direitos da criança e do
adolescente, considerando a agenda política e as deliberações dos Encontros
CFESS/CRESS. Para tanto propõe-se a abordagem sobre as interfaces existentes
entre o projeto ético-político do Serviço Social e as políticas de direitos da criança e
do adolescente, enfatizando o período pós Código de Ética profissional do
Assistente Social (1993) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990).
Objeto que passou a suscitar indagações frente ao interesse em
aprofundar o estudos desenvolvidos durante os cursos de mestrado e doutorado, as
vivências como militante do MNMMR e junto ao CRESS/SC. As experiências como
docente, incorporando a interlocução entre o Serviço Social, seu projeto ético-
político e a efetivação dos direitos assegurados às crianças e aos adolescentes.
Concomitantemente a este interesse, despontaram necessidades
advindas da atuação profissional, que originaram as seguintes questões:
Após a aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente
1990, e do Código de Ética profissional do Assistente Social de 1993, quais os
desdobramentos teórico-práticos da categoria dos assistentes sociais
relacionados à defesa dos direitos da criança e do adolescente?
Qual a interface entre o projeto ético-político do Serviço Social e
a defesa dos direitos da criança e do adolescente?
Quais as aproximações e distanciamentos existentes quanto ao
entendimento, percepções e deliberações da categoria dos assistentes sociais
relacionadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente, como prescreve
Estatuto da Criança do Adolescente?
Considerando as inquietações e questões aqui presentes,
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
7
perpassado do espírito científico, é possível apontar os objetivos que emergiram
diante da temática abordada, quais sejam:
Descrever as aproximações existentes entre projeto ético-
político do Serviço Social e a defesa dos direitos da criança e do adolescente que
emergem ao se considerar o Código de Ética profissional do/a Assistente Social
– 1993 e o Estatuto da Criança e do Adolescente - 1990;
Identificar a interface entre o Serviço Social através das
deliberações de suas entidades de representação o conjunto CFESS/CRESS,
e a defesa dos direitos da criança e do adolescente;
Compreender a relação histórica entre a defesa e as
manifestações públicas sobre esses direitos de crianças e de adolescentes e o
processo de debate e de deliberações por parte do conjunto CFESS/CRESS;
Explicitar as determinações decorrentes da trajetória dos direitos
para a infância e a adolescência e o contexto que envolve o Serviço Social com
sua agenda política e suas deliberações;
Analisar a relação existente entre o projeto ético-político
profissional do assistente social, os diretos da criança e do adolescente e as
contribuições da categoria profissional no processo de defesa destes direitos.
1. 3 - Procedimentos metodológicos
Os procedimentos metodológicos suscitaram buscas teóricas,
aprofundando estudos, incorporando a prática política e o exercício profissional,
selecionando instrumentais capazes de levar a apreensão de respostas às
indagações e impasses do caminho percorrido durante a trajetória acadêmica.
A opção metodológica corresponde aos procedimentos qualitativos
com a compreensão de pesquisa conforme propõe Antônio Chizzoti como um
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
8
“processo de formação e ação que deve provocar uma tomada de consciência”
3
(2001; p. 83)
Na constituição desta trajetória de estudos e de análises, a condição
de pesquisadora transcorre na forma descrita por este mesmo autor, ao colocar que
“é um ativo descobridor do significado das ações e das relações que se ocultam nas
estruturas sociais” (CHIZZOTTI, 2001, p. 80).
O universo estudado percorreu os componentes históricos e teóricos
de que tratam o projeto ético-político do Serviço Social e os direitos assegurados às
crianças e aos adolescentes através da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 e da lei 8.069/1990 - o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA.
Estudos e análises que envolvem em sua essência os relatórios
4
e publicações dos
Encontros do conjunto CFESS/CRESS contemplando as deliberações e agenda
política deste sobre a defesa dos direitos da criança e do adolescente.
A definição do eixo central do processo investigativo, parte da
perspectiva histórico-crítica, a partir da totalidade como categoria que apreende a
multiplicidade das relações e contexto social que envolve o objeto estudado, pois
segundo BAPTISTA (1996, p. 20):
Não é possível apreender a estrutura e a dinâmica essencial da
questão em foco sem compreender a articulação entre as suas
partes e sem perceber o seu lugar em estruturas mais amplas, ou
seja, sem levar em conta os acontecimentos históricos externos,
porque esse é o tecido que constitui a base sobre a qual se tecem
essas trajetórias.
É uma totalidade concreta e histórica que envolve o movimento real do
objeto em tela, apreendendo a realidade pesquisada e a dinâmica social com sua
complexidade, os elementos e as determinações que a compõem.
3
Recorre-se a perspectiva marxiana ao conceber A produção de idéias, representações, da consciência a princípio
directamente entrelaçada com a actividade material e o intercânbio material dos homens, linguagem da vida real (...) a
consciência não poder ser outra coisa se não o ser consciente, e o ser dos homens é o processo real de vida”. (MARX, K, &
ENGELS, F.; 1981, p. 29).
4
Os documentos a serem estudados e analisados devem corresponder agenda política dos Encontros Nacionais
CFESS/CRESS, envolvendo também documentos referentes às manifestações públicas da categoria.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
9
São procedimentos que correspondem o movimento dialético entre as
aproximações e os distanciamentos que envolvem percepções teóricas e a
contribuição do Serviço Social, enquanto categoria profissional, na defesa dos
direitos de crianças e de adolescentes.
Para Chizzotti, esta é uma apreensão da pesquisa qualitativa de
perspectiva dialética, pois, (...) valoriza a contradição dinâmica do fato observado e a
atividade criadora do sujeito que observa, as oposições contraditórias entre o todo e
a parte e os vínculos do saber e do agir com a vida social dos homens (2001, p. 80).
A dinâmica a ser instituída, amplia e aprofunda as atuais percepções e
apreensões referentes à temática proposta, na medida em que a pesquisa, os
estudos e respectivas análises passarão a ser ordenados e sistematizados de forma
a responder às indagações aqui presentes.
Para imergir na temática proposta o tratamento dos dados e as
respectivas análises são marcadas pela forte inspiração no pensamento de Antônio
Gramsci e seus intérpretes. Estudos que se fundamentam nos processos históricos
e sociais, que implicam numa relação dialética entre a estrutura e a superestrutura,
assim como na íntima relação entre economia, política, história, cultura e filosofia.
A perspectiva analítica ancora-se no pensamento de Simionatto, ao
escrever que:
Enquanto crítica da política, a reflexão teórica do pensador italiano
trabalha o real a partir de categorias que se elevam do abstrato ao
concreto, da aparência à essência, do singular ao universal, e vice-
versa. Sua reflexão categorial vai apreendendo a processualidade e
a historicidade do social, o jogo das relações que permite desvendar
a realidade e suas contradições constitutivas.
http://www.acessa.com/gramsci/?page 04/05/2008 18:52
Também é marcante o suporte teórico ancorado nas publicações que
circundam a formação profissional do assistente social e material de aula; nas
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
10
atividades programadas e nas disciplinas cursadas durante os cursos de mestrado e
de doutorado do Programa de Estudos Pós Graduados em Serviço Social da
PUC/SP, com os seguintes professores: Myrian Veras Baptista, José Paulo Netto,
Aldaíza Sposati, Maria Lúcia Barroco, Maria Carmelita Yazbek, Evaldo Vieira e Maria
Lúcia Martinelli. Tal como pela participação como aluna especial em disciplina
ministrada pela professora Ivete Simionatto, no curso de Mestrado em Serviço Social
da UFSC.
Cabe explicitar a opção metodológica pela realização do estudo a partir
das entidades da categoria o conjunto CFESS/CRESS - Conselho Federal de
Serviço Social e Conselhos Regionais de Serviço Social. Esta escolha deve-se à
compreensão política e ao reconhecimento formal determinado pela Lei 8.662, de
7 de junho de 1993 e pelo atual Código de Ética do Assistente Social de 13 de
março de 1993.
Destaca-se o Código de Ética profissional do Assistente Social de
1993, ao expor que compete ao Conselho Federal de Serviço Social, art.1º, alínea
‘a’:
zelar pela observância dos princípios e diretrizes deste Código [de
Ética Profissional do Assistente Social], fiscalizando as ações dos
Conselhos Regionais e a prática exercida pelos profissionais,
instituições e organizações na área do Serviço Social.
Assim como determina em seu parágrafo único que:
compete aos Conselhos Regionais, nas áreas de suas respectivas
jurisdições, zelar pela observância dos princípios e diretrizes deste
Código, e funcionar como órgão julgador de primeira instância.
Para além das prerrogativas formais, a atenção investigativa centrou-
se nos processos e movimentação política do Conjunto CFESS/CRESS, ou pela via
da entidade de representação nacional – CFESS – sempre relacionada à defesa e à
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
11
consolidação dos direitos de crianças e de adolescentes.
O caráter deliberativo e normativo destes Encontros Nacionais
encontram-se previstos no Estatuto do Conjunto CFESS/CRESS, que passou a
vigorar a partir de 24 de novembro de 1998, nos seguintes artigos:
Art. : O Conselho Federal de Serviço Social é o órgão normativo
de grau superior central do Conjunto CFESS/CRESS, tendo como
competência, na forma da lei criadora e do interesse público,
fiscalizar, orientar, supervisionar, normatizar e disciplinas o exercício
e as atividades da profissão do assistente social, em todo o território
nacional.
Art. 3º: O fórum máximo de deliberação da profissão e o Encontro
Nacional CFESS/ CRESS, que será convocado anualmente na
forma estabelecida pelo presente estatuto.
No Parágrafo único:
Parágrafo único: O Conselho Federal será subordinado ás decisões
de competência do Encontro Nacional CFESS/CRESS, devendo
executá-las, em conformidade com suas atribuições.
Quanto ao aspecto legal e relação hierárquica da profissão, diz o
referido estatuto em seu artigo 6º, parágrafo único:
A Lei 8.662 de 7 de junho de 1993 e o presente Estatuto constituem
respectivamente, os instrumentos legais hierarquicamente
superiores do Conjunto CFESS/CRESS.
O relatório do 34º Encontro Nacional CFESS/CRESS, realizado em
Manaus 2005 ratifica em sua página 02 a compreensão do Encontro Nacional
CFESS/CRESS como uma instância de participação e de deliberação,
acrescentando que este:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
12
Se caracteriza como importante momento de planejamento coletivo
para a agenda anual do Conjunto CFESS/CRESS. É, também, um
espaço de capacitação técnica e política que envolve discussões e
tomadas de decisão sobre as diversas temáticas relacionadas às
atribuições legais e políticas das entidades referentes às questões
que estruturam, hoje, as ações do Conjunto. A sistematização
dessas deliberações, traduzidas em proposições e recomendações
aprovadas em plenária é que deverão nortear a gestão do Conjunto
no desempenho de sua função precípua de fiscalização do exercício
profissional dos assistentes sociais.
Compreende-se como processo, a realização de Encontros anuais do
conjunto CFESS/CRESS
5
que reúnem entre sete e oito assistentes sociais por
Estado/seccional CRESS e percorrem uma agenda de debates sobre temáticas
emergentes e contemporâneas afetas à profissão e à conjuntura nacional e
internacional.
A partir das discussões, desencadeiam-se deliberações que passam a
compor a agenda administrativa e política do conjunto CFESS/CRESS, assim como
as orientações para o exercício profissional dos assistentes sociais no território
nacional.
Sobre os sujeitos que compõe este órgão deliberativo – Encontro
Nacional CFESS/CRESS - o artigo 11º do Estatuto do Conjunto CFESS/CRESS
determina:
O Encontro Nacional CFESS/CRESS é a instância máxima de
deliberação deste conjunto, composto de delegados do CFESS e
dos CRESS, com direitos a voz e voto, aberto à participação de
Assistentes Sociais, estudantes de Serviço Social, representantes
das entidades da categoria, da sociedade civil e convidados com
direito a voz.
5
Estes Encontros ocorrem com a alternância de Estado e duração de três a quatro dias. A participação costuma oscilar entre
200 e 230 assistentes sociais. A participação nestes Encontros Nacionais prescinde presença nos encontros descentralizados
que ocorrem por região geográfica no país, possibilitando a preparação destes, que em seus estados também participam de
assembléias preparatórias. Enquanto vice presente do CRESS 12ª Região gestão 1999-2002 - participei do XXXº Encontro
CFESS/CRESS realizado em Belo Horizonte. Atualmente existem 25 CRESS no país.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
13
Com esta apreensão, os estudos centraram-se nas decisões coletivas
da categoria profissional, conforme expressam os relatórios dos Encontros
Nacionais CFESS/CRESS e as Cartas
6
deliberadas pelo coletivo de assistentes
sociais durante estes Encontros. Estas apresentam os posicionamentos políticos
frente às questões conjunturais e/ou emergentes.
Os estudos e análises correspondem ao período entre 1993
7
(ano de
aprovação do atual Código de Ética do Assistente Social) e 2005. Período que
corresponde a delimitação pertinente ao projeto de qualificação, pautando a redação
do mesmo à época de elaboração do referido projeto, período acordado com a
professora orientadora desta tese. Este período corresponde a doze anos com
abrangência dos Encontro Nacional CFESS/CRESS – entre o XXII até o XXXIV.
As reflexões e abordagens teóricas contam com as flexibilizações
necessárias; anteriores e a posteriori aos Encontros Nacionais para a utilização dos
documentos com fins ilustrativos e informativos.
Diante disso, as análises que serão apresentadas na seção IV desta
tese, referem-se aos extratos destes documentos e às deliberações que compõem a
agenda política das entidades de representação da categoria dos assistentes
sociais – Encontros Nacionais CFESS/CRESS – quando aborda a defesa de direitos
de crianças e de adolescentes e a relação com o projeto ético-político do Serviço
Social.
1.4 - A estrutura da tese
6
Estas Cartas que expressam o posicionamento do coletivo dos assistentes sociais presentes aos Encontros Nacionais
CFESS/CRESS – pois, é neste espaço que são aprovadas - apresentam o nome da cidade onde ocorreu o referido Encontro.
São Cartas abertas à população em geral.
7
Em 1993 o ECA completava 3 anos de aprovação.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
14
A consecução dos objetivos e os questionamentos inerentes a esta
tese, conduzem à direção deste estudo, sinalizando a interface entre o projeto ético-
político profissional do Serviço Social e a defesa dos direitos da criança e do
adolescente.
A primeira seção trata das motivações políticas, profissionais e
acadêmicas que desencadearam o estudo em tela. Na seqüência, são apresentados
o objeto e os procedimentos metodológicos que balizam as reflexões e análises
constantes nesta tese.
A segunda seção aborda três pontos introdutórios do estudo,
necessários ao exercício analítico que aqui se propõe. Inicia-se com a abordagem
da democratização do Estado brasileiro, destacando como marco legal a
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e as conquistas no campo
do reordenamento político-administrativo do Estado. Conquistas que encontram
resistências de ordem estrutural e cultural na sociedade brasileira. Na seqüência,
serão apresentadas as conexões entre o preterido processo de democratização do
Estado e as políticas sociais, com suas contradições e antagonismos considerando-
se as mutações do sistema capitalista e o atrelamento do Estado brasileiro à agenda
neoliberal.
Apresenta-se, ainda, o Estatuto da Criança e do Adolescente ECA,
uma legislação que emerge com propostas de rupturas com os estigmas e
diferenciações dominantes no trato da população infanto-juvenil, ao tempo em que
acompanha as projeções para uma nova organização cio-política, incorporando
demandas e expectativas políticas de caráter democrático, prevendo os mecanismos
para viabilizá-lo. Dentre os mecanismos previstos pelo Estatuto da Criança e do
Adolescente, destacam-se os Conselhos de Direitos, os Conselhos Tutelares e os
Fundos Municipais para a Infância e a Adolescência. Nesse ponto, destaca-se o
caráter discriminatório e estigmatizante presente nas diferenças existentes entre
"menor" e criança e adolescente, atribuídas à população infanto-juvenil também no
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
15
trato das políticas sociais, e cujas raízes podem ser encontradas na herança cultural
e nas diferentes formas de hierarquia que predominam na sociedade brasileira.
A terceira seção focaliza o processo de criação do Serviço Social em
meio ao contexto da sociedade capitalista e a "dialetização" presente entre a sua
gênese, suas revisões e as rupturas com o “Serviço Social tradicional”.
Acompanhando o movimento histórico que é desencadeado na
sociedade brasileira, destaca-se a constituição das novas perspectivas ético-
políticas e os indicativos de uma nova identidade profissional. Nesta seção a
explicitação e análises das categorias que compõem o projeto ético político do
Serviço Social firmado a partir dos princípios que fundamentam o atual Código de
Ética profissional do Assistente Social.
Na quarta seção desta tese descreve-se as aproximações existentes
entre o projeto ético político do Serviço Social e a defesa dos direitos da criança e do
adolescente em meio ao contexto da sociedade brasileira. As análises repercutem o
período de doze anos após a aprovação do Código de Ética profissional do
Assistente Social em 1993, marcando a interface entre o projeto inerente ao
conteúdo deste Código – pautado em seus princípios fundamentais – e a defesa dos
direitos da criança e do adolescente.
O estudo toma por base nos relatórios dos Encontros Nacionais
CFESS/CRESS, apresenta as contribuições da categoria profissional diante da
defesa dos direitos da criança e do adolescente, indicando ao final, algumas
reflexões prospectivas.
Por fim, na quinta seção são abordadas as considerações finais, um
extrato das reflexões e sistematizações oportunizadas com a elaboração desta tese.
Diante dos temas que constituíram o suporte teórico, os estudos, reflexões e
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
16
sistematizações é demarcada a interface entre o projeto ético-político do Serviço
Social e a defesa de direitos da criança e do adolescente.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
17
II. A EMERGENTE DEMOCRATIZAÇÃO DO ESTADO E OS DIREITOS
DE CRIANÇAS E DE ADOLESCENTES
2.1 – O reordenamento do Estado e as incidências sobre as políticas sociais.
A história do Brasil republicano vem colocando o país num crescente
envolvimento com o modo de produção capitalista e, consequentemente, produzindo
as seqüelas inerentes a este sistema.
Acompanhando o desenvolvimento capitalista, também o Brasil
mergulha na ‘globalização da economia’, com seus rebatimentos nas relações
sociais. Transformações sociais, econômicas, políticas e culturais centradas no
aspecto econômico, conduzindo à obliteração do tecido social em sua dimensão
ética e de necessidades sociais.
A história, no caso brasileiro, é marcada pelo domínio das oligarquias
e elites de acesso ao poder, prevalecendo seus interesses e projetos de
organização social.
Para pensar a estrutura social, recorre-se ao pensamento de Gramsci
ao apontar a íntima relação entre a economia, a política, a ideologia, a cultura e a
filosofia. São múltiplas as determinações que envolvem o conjunto das relações
sociais e seus respectivos processos históricos. É o desvelamento da realidade
ultrapassando suas questões aparentes, indicativos de um método de abordagem da
realidade parametrado em conhecimento teórico.
Considerando os processos históricos e sociais, Gramsci (CC. 1;
p.20/21) parte da relação dialética entre estrutura e superestrutura, sendo que
aponta:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
18
dois grandes ‘planos’ superestruturais: o que pode ser chamado de
‘sociedade civil’ isto e´, o conjunto de organismos designados
vulgarmente como ‘privados’) e o da ‘sociedade política ou Estado’,
planos que correspondem, respectivamente, à função de
‘hegemonia’ que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e
àquela de domínio direto’ ou de comando, que se expressa no
Estado e no governo ‘jurídico’.
Pensar a hegemonia, também pautada no pensamento gramsciano,
implica concebê-la, como Ivete Simionatto ( 2004, p.42/43), nas:
relações entre infra-estrutura e superestrutura, à forma como as
classes sociais se relacionam e exercem suas funções no interior do
‘bloco histórico’. Neste, as forças dominantes sofrem a oposição das
forças emergentes, dominadas, num processo de luta pelo
encaminhamento de uma nova ordem social.
Categorias do pensamento de Gramsci que fundamentam e orientam o
presente estudo, com vistas às reflexões dos respectivos processos históricos e
sociais e da relação entre o processo democrático brasileiro e o quadro de
transformações pelo qual passa o país, imerso no panorama de ‘globalização’.
Na sociedade brasileira, ainda no final dos anos 70, eclodem novas
perspectivas no campo político e social no cenário nacional, caracterizadas por
novas práticas e representações configuradas nas reivindicações por democracia,
direitos e cidadania. Reflexos das contradições geradas pela ditadura militar, em
face da repressão política e ideológica e a conseqüente rearticulação dos setores
populares, revalorizando práticas políticas e sociais presentes no cotidiano popular,
até então ofuscadas pela classe dominante.
Entre 1.974 e 1.980, o Brasil apresenta crescimento econômico (dados
do IBASE), porém, esse crescimento o se estende à área social. Seguindo o
curso da história das políticas sociais no país, um descompasso entre o plano
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
19
econômico e os investimentos nas políticas sociais. A explicação deste agravante
fica por conta do aumento da dívida externa e da recessão orquestrada pelo Fundo
Monetário Internacional -FMI.
Para Evaldo Vieira (2004, p.136):
a política econômica e a política social vinculam-se à acumulação do
capital. Concede-se ao termo ‘acumulação’ o sentido de
concentração e de transferência da propriedade dos títulos
representativos de riqueza.
Neste mesmo período, o conflito social passa a ganhar visibilidade, em
muito atribuída aos movimentos sociais, através das denúncias de violência, de
opressão e de exclusão existentes. As práticas sociais e políticas que compunham
esses movimentos, incorporam a percepção de uma sociedade vista como espaço
aberto às contraposições ao Estado autoritário e a construção de relações
democráticas.
No campo social, multiplicam-se atos de contestação e de protesto
contra a repressão, a censura e o permanente clima de vigilância aos grupos de
oposição à ideologia dominante. Foram para as ruas os movimentos de estudantes,
o movimento popular e o sindical contando com o apoio institucional de importantes
setores da sociedade com o propósito de manifestarem-se publicamente contrários
ao regime vigente, sob o comando autoritário dos militares.
Dentre os segmentos dos trabalhadores que passam a compor o
movimento de oposição à ditadura militar e de luta pela democratização do país,
estão os assistentes sociais, que marcam esta posição política através da realização
do III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais
8
(1979; III CBAS). A realização
8
Segundo Netto, neste evento, as correntes profissionais que faziam a crítica a ditadura não
só conseguiram se expressar, como, sobretudo, afirmaram-se como vanguardas do corpo
profissional” (2005; p.17). Em meio a tímidos ares de abertura democrática, a mesa de
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
20
deste Congresso explicita a inserção da categoria profissional na luta de classes,
posicionando-se ao lado da classe trabalhadora e mediante a articulação com os
demais movimentos sociais.
Chega-se ao final da década de 70 com o importante aceno de
rompimento com a mediocridade e com os estereótipos existentes, por conta de
iniciativas dos movimentos sociais e de suas diferenciadas formas de experiências e
de representação social.
Em meados da década de 80, o fortalecimento das lutas e dos
movimentos sociais que marcaram forte presença no movimento pelas eleições
diretas para a Presidência da República, denominado “Diretas Já”. As
manifestações por eleições diretas para a Presidência da República percorreram o
país aabril de 1984 quando a emenda constitucional das eleições diretas recebeu
298 votos, não atingindo os dois terços (320 votos) necessários à sua aprovação.
O que se verifica é uma diversidade de movimentos e grupos
contestatórios, diversidade inerentes às condições e especificidades que envolvem
cada um deles e o marcante empenho, por parte destes, em manter sua autonomia.
Entre 1978 e 1982 destacam-se o Movimento contra a Carestia, as Pastorais Sociais
da Igreja Católica e demais Igrejas progressistas, as greves de operários da Grande
São Paulo ABC, a movimentação pelas Diretas Já, a reorganização partidária no
país - a explicitação do partido como espaço de militância política, assim como a
criação de movimentos sociais populares que se sobressaem pelo caráter militante
(político) da ação voluntária de seus integrantes.
Éder Sader (1995, p. 29) escreve que:
abertura do III CBAS, originalmente composta por representantes oficiais da ditadura
militar, foi substituída por representantes do movimento sindical e popular.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
21
nessa representação, a luta social aparece sob a forma de
pequenos movimentos que, num dado momento, convergem,
fazendo emergir um sujeito coletivo com visibilidade pública (...) um
ato de afirmação de setores sociais até então excluídos do cenário
oficial (...) que chamaram a atenção para novos personagens que
alteravam os roteiros preestabelecidos..
Nos movimentos, embora com características e práticas diferenciadas,
predominam valores a justiça social e a solidariedade, como forma de oposição ao
sistema de opressão e de exclusão social. Emergem novas configurações das
classes populares, apontando formas diferenciadas de expressão e códigos de
comportamento, intrinsecamente vinculadas às suas histórias e práticas.
Vera Telles (1994, p. 60) diz que:
A novidade parece estar nos significados que esses movimentos
assumiram no momento de seu aparecimento, em meados de 70.
Significados que, por sua vez, trazem os sinais dos tempos. É
possível dizer que trazem as marcas de uma época que vivia sob o
signo de uma ruptura com sua história passada.
Seguindo o fluxo da história, a partir dos anos 80 alastram-se por todo
o país, expectativas políticas de democratização das relações sociais que envolvem
também a decisão, a execução e o controle social das políticas.
As conquistas que marcam a história, é protagonizada pelos
movimentos sociais, que se constituem "novos personagens" com expectativas
políticas e com práticas sociais que promovem novos referenciais. Segundo Éder
Sader, esses movimentos apoiam-se nos "valores da justiça contra as
desigualdades imperantes na sociedade (...)", além da "(...) reivindicação da
democracia referida às esferas da vida social". (1995, p. 312, 313).
Emerge a noção de ‘sujeito social’ coletivo imbuído das singularidades,
mas apontando a dimensão coletiva a que ela
se propõe. Conforme assinala Sader
(1995, p. 55):
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
22
a noção de sujeito coletivo é no sentido de uma coletividade onde
se elabora uma identidade e se organizam práticas através das
quais seus membros pretendem defender seus interesses e
expressar suas vontades, constituindo-se nessas lutas.
Contrapondo-se ao autoritarismo, emergem experiências de
organizações autônomas (em relação ao poder público), estando presente a
desconfiança na institucionalização que se distancia do controle das pessoas
diretamente implicadas nas ações. Conforme assinala Sader (1995, p. 311):
o repúdio à forma instituída da prática política, encarada como
manipulação, teve por contrapartida a vontade de serem ‘sujeitos da
sua própria história’, tomando nas mãos as decisões que afetam
suas condições de existência.
Tratam-se de alternativas construídas no cotidiano pelos trabalhadores,
estudantes, donas de casa, instituindo novas práticas e representações no campo
social e político. Neste caminho o principal elemento é o rompimento com as
concepções autoritárias e o espaço tutelado delimitado pelo Estado até então.
Esta tradição autoritária imposta pelo Estado apresenta várias
roupagens, determinadas pelas suas características de heterogeneidade e de
desigualdade nas formas de distribuição de bens e recursos
9
. Neste contexto,
destacam-se os padrões privatistas gestados pelos interesses de grupos de poder
econômico e/ou político os quais determinam os parâmetros que fundamentam as
relações sociais.
A sociedade brasileira, em meio às alterações políticas, agora sob o
processo denominado abertura democrática
10
, conta com eleições para
9
Compreendidas, aqui, também as políticas sociais.
10
Sob forte pressão dos movimentos sociais, assim ficou conhecido o processo formal que sancionou a anistia, libertou presos
políticos, a volta dos exilados políticos e do pluripartidarismo. Refere-se ainda, ao pleito de democratização das relações de
Estado.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
23
governadores e prefeitos das capitais (aentão nomeados). Sociedade que conta
com novas práticas de sociabilidade e de solidariedade, nas quais as experiências
produzem novos significados e o amadurecimento dos sujeitos sociais.
Para Éder Sader (1995, p.313), os novos sujeitos apontavam, em sua
essência, “(...) para uma nova concepção de política, a partir da intervenção direta
dos interessados. Colocaram a reivindicação da democracia referida às esferas da
vida social, em que a população está diretamente implicada(...)”.
O cenário político e social possibilita espaços de ações coletivas mais
estruturadas e qualificadas, ao que Vera Telles (1994, p. 65) chama a atenção para:
a descoberta do significado da ação coletiva no curso da História,
enquanto reabertura de um espaço coletivo reiteradamente negado
pelo Estado, e por onde foi possível pensar a sociedade e a política
não mais como objetivação das estruturas ou da ação do Estado,
mas como cenário criado e recriado pelas práticas de sujeitos em
conflito. O que não é pouco, quando se pensa a tradição de um país
em que as lutas políticas sempre estiveram voltadas para o Estado,
visto como espaço exclusivo e único do acontecer da História.
Em razão da realidade econômico-político-social, uma mudança de
ordem interna nos movimentos sociais, associando os objetivos de luta para usufruto
de bens e serviços à reivindicação e oposição à organização estatal (ditatorial e
autoritária).
Pode-se considerar, também, o período de efervescência dos
movimentos sociais, quando surgem vários movimentos atendendo a diversas
especificidades e lutas.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
24
Entre 1987 e 1988 os deputados federais e senadores se reuniram na
Assembléia Nacional Constituinte (ANC)
11
sob forte e intensa mobilização dos
movimentos sociais e de grupos sociais de interesse econômico.
Como conseqüência desse amadurecimento, o processo rumo à
Assembléia Nacional Constituinte é marcado por contradições e pela participação
política norteada por proposições apresentadas pelos diferentes grupos sociais, com
interesses e posições antagônicas. Parte destas proposições, posteriormente foram
incorporadas à Constituição da República Federativa do Brasil
12
.
2.1.1 - A Constituição Federal de 1988 e a democratização do Estado
A Constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 05
de outubro de 1988 amplia os direitos sociais, prescreve a descentralização político-
administrativa representando uma nova organização social e política. Projeções que
convergem com o pensamento de Simionatto (2003; p. 66) ao apontar que “entram
em cena novas relações sociais que deixam entrever uma crescente socialização da
política e, conseqüentemente, permitem visualizar a ampliação do fenômeno
estatal”.
Esta nova configuração de Estado está contida no texto constitucional,
donde destaca-se o artigo 3º que trata dos:
“{...} objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil”:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
11
“Com a expressão Assembléia Constituinte se designa um órgão colegial, representativo, extraordinário e temporário, que é
investido da função de elaborar a Constituição do Estado, de pôr – em outros termos – as regras fundamentais do
ordenamento jurídico estatal”. Bobbio, N, MATTEUCCI, Nicola e PASQUINO, Gianfranco - Dicionário de Política. Brasília: 9ª
ed.,Editora da UnB, 1997.
1212
Para a identificação destas proposições que passaram a ser incorporadas na Constituição Federal de 1988, recomenda-se
o estudo da Dra. Berenice Rojas Couto “O Direito Social e a Assistência Social na Sociedade Brasileira: uma equação
possível?”, tese de doutorado apresentada na PUC/Porto Alegre em 2003. Esta tese apresenta no quadro 15 “A Constituição
Brasileira de 1988 e as identificações dos direitos civis, políticos e sociais” com as respectivas especificações das conquistas
relacionadas à forma como se apresenta no texto constitucional.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
25
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais. (Brasil; 1988)
A Constituição de 1988 é fruto de um movimento propulsor que guarda
estreita vinculação com as perspectivas políticas dos movimentos sociais ancoradas
no clamor por justiça social e na democratização das relações em sociedade. É o
marco legal com conteúdo contraditório e de ambigüidades inerentes às relações na
sociedade. Preconiza liberdades e direitos aos cidadãos brasileiros, apontando para
uma nova ordem social que deverá ser consolidada através do reordenamento
político e institucional de competência das esferas de governo federal, estadual,
municipal, e da participação da sociedade civil, assegurando a democratização do
Estado.
Evaldo Vieira (2004, p. 30) assinala que:
a constituição de um país, fixa as bases da organização social e, ao
mesmo tempo, indica os princípios para a aplicação do direito.
Quando legítima, a Constituição representa um imperativo contra a
arbitrariedade, a tirania e o opróbrio, além de orientar a
interpretação das leis. Na verdade, as liberdades públicas dão
existência à Constituição: elas a mantém e fortalecem-na.
A conquista deste novo marco legal é aqui entendida como
componente da ‘invenção democrática’, a que Vera Telles (1994, p. 233) se refere
como a mediação que as leis e o direito realizam, pois, se apresentam como
referências de uma cultura pública igualitária desprovida de privilégios e sob o signo
dos direitos sociais. A autora refere-se ao modo 'como se operam direitos, como
prática, linguagem e representação. Pois não se trata apenas de garantias e
prerrogativas individuais e coletivas, contém uma potência simbólica pela qual a
própria realidade é reinventada.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
26
A Carta Constitucional é resultante de intenso debate de idéias e da
correlação de forças sociais, cujos interesses e demandas são divergentes.
Expressa os avanços quanto aos direitos coletivos e individuais, ao mesmo tempo
em que define e consagra o sistema capitalista.
Em meio ao antagonismo presente em seu conteúdo, destaca-se o
avanço, ao ter incorporado em seu texto, a seguridade social como base das
políticas de direitos. Em seu artigo 194 contempla que: “a seguridade social
compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da
sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à
assistência social” (Brasil; 1988). Em seu único parágrafo, este artigo estabelece:
{...} compete ao poder público, nos termos da lei, organizar a
seguridade social, com base nos seguintes objetivos:
I – universalidade da cobertura e do atendimento;
II uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às
populações urbanas e rurais;
III seletividade e distribuitividade na prestação dos benefícios e
serviços;
IV – irredutibilidade do valos dos benefícios;
V – eqüidade na forma de participação no custei;
VI – diversidade da base de financiamento;
VII caráter democrático e descentralizado da administração,
mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores,
dos empregadores dos aposentados e do Governo nos órgãos
colegiados. (Brasil; 1988)
A ampliação desta concepção não se contrapõe a centralidade das
políticas de seguridade social tal qual são destacadas por Behring & Boschetti
(2006, p.156) em recente estudo ao registrarem que:
Prevalece o consenso de que a introdução da seguridade social na
Carta Magna de 1988 significou um dos mais importantes avanços
na política social brasileira, com possibilidade de estruturação tardia
de um sistema amplo de proteção social.
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27
O novo marco legal institui a relação entre direitos e a
responsabilização do Estado frente à consecução dos mesmos, cuja concretude
ocorre pela via da política social. Considerando-se a concepção de seguridade
social, como está colocada, prescreve a articulação e a ampliação desses direitos.
O texto constitucional, no que tange aos seus avanços, aponta para a
necessidade de ruptura com os estigmas e as diferenciações dominantes no trato
dos direitos sociais, ao tempo em que acompanha as projeções de uma nova
organização sócio-política, incorporando demandas e expectativas de caráter
democrático.
A Constituição que ora vigora, garante juridicamente liberdades e
direitos aos cidadãos brasileiros, apontando uma nova ordem social que deverá ser
consolidada através do reordenamento político e institucional das competências das
esferas de governo federal, estadual, municipal, e da participação da sociedade civil,
assegurando a democratização do Estado.
Participação que se refere à tomada de decisões e controle social
sobre as ações como se pode observar no artigo 204, da Constituição Federal de
1988, ao dispor sobre:
I - Descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação
e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução
dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem
como a entidade beneficente e de assistência social;
II - Participação da população, por meio de organizações
representativas, na formulação de políticas e no controle das ações
em todos os níveis".
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28
Dentre as conquistas que se referem à partilha do poder e à
democracia política, estão os conselhos de políticas blicas, considerando sua
formação paritária entre representantes do poder público e da sociedade civil.
A democracia enquanto valor central corresponde ao rompimento com
valores e práticas que reduzem o homem ao individualismo egoísta, abrindo-se para
a articulação com os demais indivíduos em busca de direitos. Assume-se a
eficiência e eficácia social numa perspectiva de impacto coletivo das ações políticas.
Para Carlos Nelson Coutinho (1997, p. 146) “a democracia pode ser
sumariamente definida como a mais exitosa tentativa até hoje inventada de superar
a alienação da esfera política”.
Isso significa ir além do respeito à vontade da maioria, institui a
condição própria do regime político, que ocorre quando se institui direitos. Direitos
compreendidos sob o ponto de vista universal, isto é, válidos para todos. Assim
Coutinho (1997, p. 148) assinala que:
Os direitos são fenômenos sociais, são resultado da história (...) As
demandas sociais, que prefiguram os direitos, só são satisfeitas
quando assumidas nas e pelas instituições que asseguram uma
legalidade positivo.
A democracia aproxima-se inevitavelmente do entendimento de justiça
social, permitindo a eqüidade de acesso, participação, usufruto e produção dos bens
e serviços gerados na sociedade. Nesse sentido, CHAUÍ considera que "a questão
democrática implica, pois, criar condições para que o cidadão seja soberano e
interfira realmente nas decisões sociais e econômicas através dos órgãos de
decisão política" (1993 :194)
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29
Numa sociedade que está construindo relações sócio-políticas
democráticas, a existência de leis e a democracia se constituem em recíproca
dialética, cujo primado corresponde ao projeto hegemônico de garantia da dignidade
humana.
Neste sentido, focaliza-se o que Simionatto escreve sobre hegemonia:
A noção de hegemonia enquanto totalidade significa a unificação da
estrutura em superestrutura, da atividade de produção e de cultura, do
particular econômico e do universal político. Não se trata de uma
universalidade ideológica, mas antes concreta, pois os interesses
particulares passam a articular-se com os interesses universais. O
grupo social universaliza-se porque absorve, num projeto totalizador, a
vontade dos grupos subalternos,
http://www.acessa.com/gramsci/?page 4/5/2008, 18:52
Coerentemente com o pensamento de Gramsci, torna-se perceptível a
existência das duas esferas no interior das superestruturas a sociedade civil e a
sociedade política - permeada por suas distinções e tensões.
Pretensões democráticas permeadas de contradições, que Semeraro
(2003, p. 271) aborda como:
Uma relação dialética que se estabelece entre sociedade civil e
sociedade política, que acaba se tornando uma ‘relação
pedagógica’, um reconhecimento de recíproca valorização, porque
não mais alguém ou algo que tenha prerrogativas definitivas: o
que se tem em vista é, precisamente, a hegemonia da democracia,
ou seja, a socialização do saber e do poder.
A democracia supõe a idéia de conflito, de movimento, de diversidade,
exigindo permanente reflexão e a indicação de novos arranjos, ao mesmo tempo em
que atualiza códigos e práticas sociais.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
30
Ratificando seu pensamento, Semeraro (2003, p. 263) cita Gramsci
(CC, 3, 287) ao escrever que:
no sistema hegemônico, existe a democracia entre o grupo dirigente
e os grupos dirigidos na medida em que o desenvolvimento da
economia e, por conseguinte, a legislação que expressa este
desenvolvimento favorecem a passagem molecular dos grupos
dirigidos para o grupo dirigente.
A conquista do direito à participação política torna perceptível ao
cidadão que a esfera política compõe uma esfera mais abrangente, a sociedade em
seu conjunto.
Transições que convergem com a acepção de que “a sociedade
política vai sendo reabsorvida pela sociedade civil” (Gramsci, apud, Simionatto,
2003, p.73). Nesta direção teórica, Simionatto escreve que “deve servir de
parâmetro para a construção de relações sociais democráticas, envolvendo
“reformas” (na perspectiva gramsciana) e os mecanismos de “construção de uma
sociedade regulada” (2003, p.73).
A compreensão de democracia que permite a reforma gradual da
sociedade através do debate de idéias, das mudanças de mentalidade de das
relações sociais. Assim, o processo democrático permite a formação e a expansão
das revoluções silenciosas.
Semeraro (CC, 5, 42) citando Gramsci escreve que:
A democracia para ser verdadeira e hegemônica, deve promover a
gestão realmente popular do poder, educando os cidadãos para se
tornarem dirigentes de uma ‘sociedade regulada (ou Estado ético ou
sociedade civil)’ CC, 3, 244) para criar um novo ‘Estado social de
trabalho e de solidariedade’, para ‘reconstruir o mundo
economicamente de modo unitário [...], não para dominá-lo
hegemonicamente e apropriar-se do fruto do trabalho alheio’
Portanto, Semeraro (2003: p. 271) aponta que “o Estado, em Gramsci,
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31
não é um Leviatã que centraliza o poder e paira sobre a sociedade, mas é
organizado em função do surgimento da ‘sociedade regulada’.
As análises do texto constitucional sinalizam que o mesmo traz
indicações ao conjunto da política, da economia e da organização social a operar um
reordenamento, a revisar prioridades políticas e de investimentos, colocando em
questão o modelo de desenvolvimento e o respectivo projeto de sociedade – dividida
em classes sociais, que historicamente, reproduz a cultura da subalternidade,
desconhecendo, na prática, homens e mulheres como sujeitos de direitos.
Destarte, a inserção de direitos na Carta Magna, não se constitui
automaticamente na garantia do direito, especialmente ao se considerar o quadro de
complexidade política no caso brasileiro. O direito aqui tratado como possibilidade e
não como garantia real.
As questões que se referem ao exercício da cidadania e às relações
sociais democráticas vão além de sua regulamentação jurídica formal, pois navegam
também no campo ideológico e cultural de construção de novas práticas, novos
valores, novos costumes, novos ideais e novos significados.
Esta perspectiva aproxima-se do pensamento de Gramsci (1990)
quando o autor escreve sobre direito concebendo-o como capaz de fazer
desaparecer certos costumes e atitudes, difundindo outros atuando como
instrumento para este fim. Esta percepção trata do que o autor considera um certo
grau de civilização de cidadania.
Para Marilena Chauí (1997: 431), isto significa que “os cidadãos são
sujeitos de direitos e que, onde tais direitos não existam nem estejam garantidos,
tem-se o direito de lutar por eles e exigi-los. É este o cerne da democracia”.
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32
No final dos anos 80, o cenário político nacional ganha forças e ares
democráticos, passando pela oxigenação da primeira eleição direta para presidente
da república em 1989.
As organizações não-governamentais experimentam novas práticas e
ganhos políticos e tratam de difundi-las, construindo novos parâmetros,
alicerçados em bases culturais e democráticas bem sedimentadas.
No balanço realizado sobre a década de oitenta nos remete ao
fortalecimento dos movimentos sociais, dos sindicatos, bem como da visibilidade
pública das demandas populares.
As aspirações e ações na direção de uma sociedade justa e igualitária
ganham forma e marcam importantes conquistas formalizadas na Constituição
Federal de 1988. São novas configurações e interlocutores no jogo político nacional,
sendo que, dentre seus ganhos, está o processo de resistência ao avanço do
neoliberalismo, já em processo acelerado no panorama mundial.
No entanto, no que se referem às políticas sociais, poucos foram os
investimentos, tanto nas formulações quanto no financiamento, tornando-as frágeis e
distantes de uma relação de consolidação de direitos diante das demandas sociais.
Vera Telles (1994, p. 44) caracteriza os acontecimentos que encerram
o século XX:
sob o signo da esperança democrática, e terminou, no entanto,
encenando o espetáculo de uma pobreza jamais vista em nossa
história republicana. Mais do que confirmar os limites da democracia
em uma sociedade de pesada tradição autoritária, oligárquica e
excludente, essa pobreza traz à tona todas as contradições e
ambivalências inscritas na dinâmica da vida social brasileira..
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33
Instala-se no país um paradoxo entre a conjuntura política que
favorece o debate democrático e a conjuntura econômica que acelera a deterioração
das condições de vida da população, agravando o quadro de vulnerabilidade social
ampliando as contradições já demarcadas pela miséria, pelo desemprego, pelo
subemprego, pela concentração de renda e pela incapacidade de investimento do
Estado em políticas sociais.
O Estado brasileiro, gerenciado por governantes
13
com discursos
modernizantes de combate à corrupção e de promoção do desenvolvimento do país,
alinha-se às práticas neoliberais de abertura do mercado externo e preconiza a
defesa do Estado mínimo, imputando à estrutura estatal a responsabilidade pelo
agravamento da crise econômica e social.
O neoliberalismo à brasileira, guarda estreita relação com a abordagem
de Emir Sader (1995, p. 147) ao expor que:
os vilões do atraso econômico passam a ser os sindicatos, e junto
com eles, as conquistas sociais e tudo o que tenha a ver com
igualdade, com eqüidade e com justiça social. Ao mesmo tempo, a
direita, os conservadores, se reconvertem à modernidade na sua
versão neoliberal, via privatizações e um modelo de Estado Mínimo”.
Por esta perspectiva a Constituição de 1988 passa a ser o entrave à
governabilidade, o que justifica a crítica permanente ao seu conteúdo e as
sucessivas propostas de emendas constitucionais encaminhadas ao Congresso
Nacional. A direção do governo caminha para o fortalecimento da autocracia
burguesa, numa tentativa (por vezes exitosa) de despolitização da economia, das
relações entre Estado e sociedade civil; e de drásticos cortes nos gastos com a
política social.
Segundo Atílio Borón (1995, p.158):
13
Retórica presente nos discursos do Presidente Fernando Collor de Mello (1990-1992) e, posteriormente do Presidente Fernando
Henrique Cardoso (1995-2002).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
34
a categoria neoliberalismo é útil porque resume o senso comum da
época, o senso comum imposto pelas classes dominantes. O senso
comum da época neoliberal. Gostemos ou não, ele se implantou
profundamente nas massas. O mercado é idolatrado; o Estado é
demonizado; a empresa privada é exaltada e o ‘darwinismo social
de mercado’ aparece como algo desejável e eficaz do ponto de vista
econômico.
Para o entendimento do 'senso comum' retoma-se o pensamento de
Gramsci (1989, p. 14/34), por expressar que "no fato mais limitado de que, em uma
série de juízos, o senso comum identifique a causa exata simples e imediata (...) não
existe um único senso comum, pois também ele é produto de um devenir histórico".
A estratégia governamental com características marcadamente
neoliberais passa pelo desmonte gradativo das políticas sociais, através de uma
ação orquestrada que conduz à pauperização da população e desqualifica os
movimentos sociais, levando à desorganização dos sujeitos coletivos.
Destarte as contradições e tensões que marcam o início da década de
90, registram-se na área social duas importantes conquistas no campo jurídico-
formal, que incidem diretamente sobre as políticas sociais voltadas à população
infanto-juvenil, através da Lei Federal nº 8.069/90, o Estatuto da Criança e do
Adolescente; e através da Lei Federal 8.742/93, a Lei Orgânica da Assistência
Social, direcionada à população vulnerável economicamente.
Estas legislações, que incorporam expectativas de alteração das
diferentes manifestações no trato das políticas para a infância e a adolescência e de
assistência social, combinando a necessidade de novos valores, práticas e
posicionamentos políticos, fundamentada na aspiração de relações democráticas.
Convivendo dialeticamente, o movimento histórico que se expande por
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
35
todo o país, registra a materialização das expectativas políticas de democratização
das relações que envolvem a decisão, a execução e o controle social sobre políticas,
consubstanciada com a criação dos conselhos paritários de políticas públicas. Os
esforços passam a ser direcionados à existência de um Estado democrático, numa
sociedade em que as instituições/organizações (família, escola, empresa, etc.),
também se constituam democraticamente.
Quanto à organização do Estado, passava a exigir ações contundentes
demonstrando, no entender de Francisco de Oliveira (1990, p.11):
“(...) o reconhecimento de que o avanço de novas formas de
sociabilidade punham em xeque a dominação inconteste do Estado
pela burguesia. Tratava-se de liquidar um Estado cuja formação
contraditória estava acolhendo o peso cada vez maior das classes
dominadas através da institucionalização de espaços públicos, que
jogavam para o lixo as práticas populistas de privatização do
público, tendo liquidado a pretensão autoritária de completa
despolitização da economia e privatização da política”.
O país vivia a era da "Reforma do Estado Brasileiro"
14
, atendendo as
prerrogativas do projeto neoliberal e às demandas internacionais, vinculadas a
dívida externa e ao FMI – Fundo Monetário Internacional.
Seguindo o projeto neoliberal, a administração do Estado brasileiro
ancora-se na estabilização monetária
15
. Como ‘Reforma do Estado’, leia-se um
amplo processo de privatização do patrimônio público, para o qual o financiamento
ocorre em grande parte pelo próprio poder blico; e a destituição paulatina de
‘direitos’ assegurados na Constituição Federal que, na ótica governamental,
passaram a ser ‘privilégios’ do cidadão, causando (do ponto de vista dos
governantes) o 'engessamento' de um projeto de desenvolvimento nacional.
14
Denominação atribuída pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso ao se referir a inclusão do país na agenda de
reformas econômicas e políticas impostas pelo neoliberalimo.
15
Trata-se da equiparação da moeda nacional ao dólar. Para tanto necessitando de compor uma reserva de valor, cujos
recursos são extraídos de setores antes de investimentos em políticas de assistência, saúde, educação.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
36
Nas palavras de Oliveira (Folha de São Paulo, 13/10/1996).
“o longo trabalho realizado para a construção de uma esfera não-
burguesa está ameaçado. Os direitos ‘relutantemente reconhecidos’
transformaram-se da noite para o dia em privilégios: o cidadão virou
vilão. A Constituição de 1988, que o presidente votou, transformou-
se no mais grave obstáculo ao desenvolvimento”
Nesta matéria da Folha da São Paulo, Francisco de Oliveira refere-se
criticamente aos posicionamentos do então Presidente Fernando Henrique Cardoso.
A economia brasileira cumpre a inexorável necessidade da
acumulação capitalista, representando a vontade política dos grupos que a
manipulam em sintonia com as mudanças na divisão internacional do trabalho.
Como aponta Simionatto:
As relações Estado/sociedade, nesse cenário, elidem a formação de
uma cultura que substitui a relação estatal pela livre regulação do
mercado. Nessa ótica, a classe burguesa busca eliminar os
antagonismos entre projetos de classe distintos, no intuito de
construir um "consenso ativo" em nome de uma falsa visão universal
da realidade social. http://www.acessa.com/gramsci/?page 4/5/2008
18:52
Um período de consolidação do ajuste macroeconômico e de
implantação das reformas estruturais com vistas à estabilização da moeda e à
retomada sustentada do esperado crescimento que não veio, como também não
viria no segundo mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso.
O que se assiste é o forte investimento em programas econômicos
subjugados aos interesses do capital.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
37
Sobre os aspectos que delimitam o século XX e direcionam o início do
século XXI, Hobsbawm escreve que “em suma, o século acabou numa desordem
global cuja natureza não estava clara, e sem um mecanismo óbvio para acabar com
ela ou mantê-la sob controle. (1995, p.541).
Adentrando o século XXI, o Brasil experimenta a gestão de um
governo democrático popular, através da eleição do Presidente Luis Inácio Lula da
Silva.
As expectativas de mudanças contundentes no modelo de
desenvolvimento sócio-econômico e político foi frustrada mediante a as posições
governamentais quanto às políticas macroeconômicas. Considerando que as
políticas sociais relacionam-se intrinsecamente, o impacto destas posições e
alinhamentos macroeconômicos incidiram diretamente sobre a falta de eficácia
destas em relação às necessidades e demandas sociais.
Mesmo com a aparente continuidade por conta das primeiras
medidas macroeconômicas, as posições e iniciavas governamentais que se
seguiram passam a expressar mudanças no formato e trato das políticas sociais de
acesso aos direitos.
2.1.2 – As políticas sociais no contexto democrático
As transformações que vem sendo operadas no "mundo do trabalho"
em decorrência das inovações tecnológicas, comerciais e organizacionais, nos
marcos da globalização da produção e dos mercados, alteram tanto as formas de
produção, quanto às formas de gestão da força de trabalho. O panorama mundial
aponta para alterações no sistema capitalista que impõem novas relações sociais
especialmente fomentadas pela globalização da economia.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
38
Para Simionatto (2003, p. 275):
O momento presente continua proclamando a aparente vitória do
capitalismo, assentado na supremacia do sistema financeiro, no
espectro do fim da história e das ideologias, no desaparecimento
dos grandes sujeitos sociais, da ênfase exacerbada em
comportamentos individualistas, fundamentaislistas e nacionalistas –
enfim, a ausência de sonhos e o ‘desencantamento utópico’ são
marcas indeléveis dos esfumaçados diais atuais.
Mundialização da economia também se impõe nas formas de gestão
do Estado e da força de trabalho, conforme escreve Simionatto (2003, p. 276),
citando Negri:
A transição para essa nova ordem mundial não se restringe,
contudo, à produção de riquezas. Imbrica-se, também, na produção
da vida social, num movimento em que as esferas econômica,
política e cultural se sobrepõem e se complementam de forma
recíproca.
Quanto aos desdobramentos da globalização
16
, constata-se o aumento
da concentração de renda a um grupo cada vez mais reduzido, repercutindo nas
distâncias entre ricos e pobres e nas desigualdades sociais. A agenda do
capitalismo em sua versão ‘modernizada’ passou a pautar-se pela circulação de
mercadorias pela via das exportações. Assim, oblitera-se os interesses e demandas
internas sob a argumentação teórica
17
das exigências do mercado diante da
emergência da ‘qualidade total’.
Esta agenda afeta transversalmente as políticas sociais, no que tange
a interlocução destas com a economia, conforme aponta Evaldo Vieira (2004,
p.104) ao refletir que:
16
Ver Evaldo Veira (2004) ao apontar o “aumento da distância entre ricos e pobres (...) em 1960, os ricos ganhavam 30 vezes
mais do que os pobres. Em 1994, os 20 % mais ricos conseguiam renda 78 vezes superior à dos mais pobres”.
17
Trata-se de uma compreensão que pretende a separação das questões da vida cotidiana das relações econômicas, políticas
e ideológicas que se encontram neste contexto.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
39
São sociedades que passam por sérias transformações
econômicas, que as levaram, nos últimos dez ou quinze anos, a
uma política econômica com política social direcionada a cuidar
momentaneamente de indigentes, de maneira focalizada, dispersa e
seletiva. Aparecem programas e diretrizes, relacionados com a
política social; tais programas e diretrizes entre si revelam somente
pretensões de uma política social.
No aprisionamento brasileiro ao sistema capitalista tem-se que a
política econômica subordina a direção dada às políticas sociais, as quais se
apresentam como estratégias paliativas para atenuar a questão social. Para a
compreensão sobre a questão social, recorre-se a Marilda Iamamoto (2001, p. 27)
ao concebê-la como:
o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade
capitalista madura, que tem uma raiz comum: a produção social é
cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social,
enquanto a apropriação dos seus frutos mantém-se privada,
monopolizada por uma parte da sociedade.
Como conseqüência da subordinação e deste aprisionamento
brasileiro, no campo das políticas sociais, a predominância do favoritismo e do
clientelismo nas suas diferentes formas de representação e de práticas sociais.
Mesmo diante das mudanças acumuladas historicamente, constata-se que essas
características culturais e de operação das políticas sociais, persistem convivendo
com a agudização da questão social pela qual passa o país, compondo um
movimento dialético entre a conservação, a revisão e o repensar de sua história.
Concomitantemente ao panorama mundial, a sociedade brasileira
encontra-se imersa em sucessivas transformações nas suas dimensões econômica,
política, social e cultural, expressas por Vera Telles (1999, p.143) nas formas “(...) de
novas hierarquias sociais, atravessadas por enormes disparidades de renda, de
cultura, de valores e também de acesso aos mecanismos de representação e
participação política”.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
40
Este apanhado dos aspectos que compõem a estrutura social
brasileira, e partindo-se da compreensão abordada por Maria Lúcia Martinelli (2004,
p. 02) de que a “estrutura é a representação formal e aparente da organização
política, social e econômica de um povo”.
Talvez por serem tão heterogênea quanto desigual nas formas de
produção, distribuição de bens e de recursos (compreendidas aqui também as
políticas sociais), é que os critérios de redefinição das relações sociais sejam
influenciados - quando não conduzidos - pelas necessidades acumuladas.
Ao analisar os indicadores do senso de 2000, Maria Carmelita Yazbek
(2007, p.04) apresenta a seguinte reflexão:
o Brasil é hoje um país mais velho, mais urbano, mais feminino,
mais alfabetizado e mais industrializado. Porém, a desigualdade é a
marca nacional. A desigualdade não é de renda: é racial e de
gênero. O padrão de apropriação dos recursos naturais, econômicos
políticos e culturais vigentes na sociedade brasileira torna
insustentável a própria democracia.
São indicadores que apresentam a ampliação da desigualdade social e
distanciando-se da preterida “erradicação da pobreza’, tal qual prevê a Constituição
Federal em seu artigo 3º. É um cenário de acirramento da questão social, de
alastramento das desigualdades e aviltamento nas relações de trabalho. Observa-se
nestas últimas décadas a redução de direitos, e/ou a negação, na prática, da
existência dos mesmos. Este acirramento vem acompanhado da fragilização e do
desmantelamento da capacidade de resistência dos diferentes sujeitos sociais de
combate ante às ‘perdas’.
Associado ao ineficiente desempenho das políticas públicas,
diariamente uma enxurrada de dados estatísticos que apontam as formas
multifacetadas da pobreza existentes nos meios urbano e rural.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
41
Carmelita Yazbek (2006; p. 23) expõe que:
A concepção de pobreza configura-se em geral como uma noção
ambígua e estigmatizadora, cujos contornos poucos nítidos muitas
vezes ocultam seus aspectos resultantes da organização social e
econômica da sociedade. (...) O que se observa, apesar da
diversidade de parâmetros utilizados para a determinação empírica
da ‘pobreza’, é que a exclusão do usufruto da riqueza socialmente
produzida configura-se como um de seus principais elementos
definidores.
Quanto à organização do Estado, passa a exigir ações contundentes
demonstrando, no entender de Francisco de Oliveira (1990; p. 11):
“(...) o reconhecimento de que o avanço de novas formas de
sociabilidade punham em xeque a dominação inconteste do Estado
pela burguesia. Tratava-se de liquidar um Estado cuja formação
contraditória estava acolhendo o peso cada vez maior das classes
dominadas através da institucionalização de espaços públicos , que
jogavam para o lixo as práticas populistas de privatização do
público, tendo liquidado a pretensão autoritária de completa
despolitização da economia e privatização da política”.
No campo da ‘invenção democrática’
18
, as mediações que as leis e o
direito realizam se apresentam como referências de uma cultura pública igualitária
desprovida de privilégios. Essa questão, por si só, contém as ambigüidades e
tensões inerentes à constituição da sociedade capitalista.
Assim, destaca-se o que escreve Simionatto, ao abordar que para
Gramsci (2003, p. 73), é fundamental a superação do Estado enquanto órgão de
coerção e de manutenção dos privilégios e desigualdades. A democratização das
suas funções é ponto essencial e imprescindível.
18
Vera Telles trata sobre a “invenção democrática” no artigo “Sociedade Civil, Direitos e Espaços Públicos”, publicado na
Revista Polis, nº 14 de 1994
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
42
A história da constituição das políticas sociais, no caso brasileiro, é
pautada pelos interesses das elites dominantes, prevalecendo seus interesses e
projetos de organização social, resultando em ações residuais, desarticuladas e
descontínuas.
As políticas sociais, que vem se tornando um fértil e conturbado campo
de discussão acadêmica e política, são assim compreendidas por Evaldo Vieira
(2004, p. 113):
O que na atualidade tem sido chamado de políticas sociais (e
comumente de políticas públicas) resume-se quase sempre em
programas tópicos, dirigidos a determinados focos, descontínuos,
fragmentados, incompletos e seletivos, com atuação dispersa, sem
planejamento, esbanjando esforços e recursos oferecidos pelo
Estado, sem controle da sociedade.
A conquista de direitos, a serem materializados pela via da política
social, é marcada pela participação dos ‘novos personagens’, que protagonizam a
recente história política brasileira num movimento que envolve a contraposição e a
contestação das relações políticas e práticas impostas pelas elites dominantes,
assim como passam a produzir e divulgar novas práticas e posições políticas.
A temática política social sempre esteve presente no Serviço Social
brasileiro, alterando-se, porém, as concepções teóricas e políticas que a
fundamentam. Como o presente estudo focaliza o processo de ‘ruptura’ com a
perspectiva conservadora de prática e de política profissional, cabe destacar a
percepção do CFAS na já citada Revista Serviço Social e Sociedade 01, de 1979,
ao apontar que
“observa-se nos quadros institucionais da política social brasileira
uma total ausência de representantes da população nos organismos
de decisão e gestão dos serviços sociais. A política social é definida
e implementada verticalmente numa postura de tutela dos
interesses, necessidades e aspirações da população. (...) Além
disso obtaculiza a capacidade de participar do processo democrático
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
43
da disputa e negociações, visando a conquista dos seus direitos
sociais fundamentais”
Nesta mesma publicação ressalta-se o artigo de Joaquina Barata
Teixeira (1979, p.68) rejeitando o marco teórico tradicional (com vertente
funcionalista), optando, segundo a autora, por “referências teóricas que julgamos
mais explicativas, capazes de revelar e não ocultar as verdadeiras origens dos
problemas sociais”, com bases no materialismo histórico.
Dentro desse marco, Joaquina Barata (1979, p. 71) se refere às
possibilidades efetivas de política social quando o Estado é acionado para atuar:
a favor das classes oprimidas em duas condições: 1- quando os
interesses das classes oprimidas estão articulados ( o Serviço Social
teria uma responsabilidade nessa articulação em nível de base); 2
quando condições para a apropriação de razoável excedente por
parte do Estado, que será revertido em custos de política social
Concomitantemente, altera-se o espaço ocupacional do Assistente
Social no nível das demandas, das funções desempenhadas e da qualificação
exigida. Este redimensionamento do espaço ocupacional requer um novo perfil
profissional, exigindo uma sintonia com as mudanças nos padrões de acumulação
capitalista, com destaque para as relações no "mundo do trabalho".
No que se refere ao Serviço Social, o enfoque teórico-prático ancora-se
na compreensão da necessária mediação entre os direitos
19
e a concretização dos
mesmos via políticas sociais.
Em recente publicação, Behring & Boschetti (2006, p. 193) escrevem
que:
19
Direitos aqui compreendidos para além dos já conquistados no campo jurídico-formal, pois também
referem-se às possibilidades de constituição de novos direitos a serem instituídos mediante o
surgimento de novas necessidades.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
44
As políticas sociais, orientadas pela óptica da materialização dos
direitos legalmente reconhecidos e legitimamente assegurados,
instituíram o princípio da desmercadorização dos programas,
projetos e serviços, e possibilitaram aos cidadãos se manter sem
depender do mercado, contribuindo, assim, para mudar a relação
entre cidadania e classe social ainda que as relações econômicas e
sociais não tenham sido estruturalmente transformadas no sentido
de extinguir a sociedade de classes.
Não se trata, portanto, de superdimensionar as políticas socias, nem
de ignorar sua articulação com as metamorfoses do sistema capitalista. Trata-se,
pois, de reconhecê-las a partir do panorama econômico e político com suas
mutações e adequações às relações sociais (imbuídas de conflitos e divergências de
interesses de classe).
Pensar direitos e política social na sociedade capitalista implica
revisitar possibilidade e limites. Possibilidades no que se refere a reduzir
desigualdades e as diferenças sócio-econômico e culturais. Limites, pois, não se
vislumbra a extinção das classes sociais.
Com inspiração no pensamento de Gramsci, pode-se afirmar que se
trata de um movimento molecular, cujas ações se pautam em sair da passividade
numa direção consciente e desta forma -contribuir para o caminho da criação de um
Estado integral.
2.2 – O Estatuto da Criança e do Adolescente - políticas de direitos e uma nova
cultura.
Em meados dos anos 80, em processo de abertura política, o Brasil
sinalizava avanços no campo democrático com o fortalecimento de movimentos
sociais de caráter reivindicatório e de denúncias das violações aos direitos humanos.
Na área da infância e da adolescência, não é diferente, multiplicavam-se as
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
45
denúncias, as ações e as manifestações populares.
Ainda neste mesmo período, surge no cenário nacional o Movimento
Nacional de Meninos e Meninas de Rua - MNMMR, cujos princípios direcionavam-se
para a defesa de direitos de crianças e de adolescentes.
O MNMMR torna-se um importante articulador, em 1988, da formação
do Fórum Nacional Permanente de Entidades Não Governamentais de Defesa dos
Direitos da Criança e do Adolescente - Fórum DCA
20
. Este Fórum expressa a
necessidade de "uma articulação nacional de entidades atuantes na área de defesa
e promoção dos direitos da infância e da juventude", cujos propósitos voltavam-se
também para a "alteração no plano legal" (Revista Forum DCA, 1993: 06).
Desta forma, o Forum DCA passou a reunir Organizações Não-
Governamentais representativas das demandas sociais emergentes e da indignação
frente às variadas formas de violência cometidas contra crianças e adolescentes,
configurando-se num movimento nacional de defesa dos seus direitos.
A abordagem de Silveira (2006, p. 46) aponta que:
O Forum - DCA extrapola as fronteiras nacionais, chamando a
atenção dos organismos internacionais de defesa dos direitos
humanos e de crianças e adolescentes, que passam a apoiar o
movimento instalado no plano processual interventivo (de
conteúdo e método) e no plano legal (propondo a alteração da
legislação).
O surgimento dos variados segmentos na sociedade, apontando
injustiças e atrocidades cometidas contra crianças e adolescentes, possibilitou a
mobilização de organizações em torno da questão, numa demonstração de
20
Passam a compor Forum DCA, alem, do MNMMR - Pastoral do Menor da CNBB, OMEP - Organização Mundial de
Educação Pré-Escolar, Sociedade Brasileira de Pediatria, OAB, Centros e Núcleos de estudos de universidades, Centros de
Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, dentre outras, cujos princípios institucionais estão vinculados a defesa de
direitos.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
46
indignação frente aos fatos, denunciando seus significados e simbologias.
As denúncias desnudavam as distâncias de concepção e de atenção
dispensadas pelo Estado e pela sociedade às crianças e aos adolescentes e as
suas respectivas distinções ao se referir aos “menores” no Brasil.
Instala-se, no país, o debate sobre a controvertida questão do “menor”,
que oscila entre posições comprometidas com os direitos humanos de crianças e de
adolescentes e posições que optam por dissimular a origem da problemática,
encarando-a sob a ótica repressiva e a partir do apelo de manutenção da ‘ordem
pública’.
Este é um aspecto da vida social que coaduna com o pensamento de
Gramsci (1989, p. 24) ao expor que:
no fundo, se o subalterno era ontem uma coisa, hoje não mais o é:
tornou-se uma pessoa histórica, um protagonista; se, ontem, era
irresponsável, que era 'paciente' de uma vontade estranha, hoje,
sente-se responsável, que não é mais paciente, mas, sim, agente
e necessariamente ativo e empreendedor.
Porém, tanto na condição de 'paciente' ou de 'protagonista' das
atenções e ações do Estado e da sociedade, este é um processo permeado por
contradições, avanços e recuos, conformismos e mudanças.
Ao utilizar a terminologia ‘menor’, esta apontava para uma conotação
ideológica, presente na cultura política brasileira, que designava de forma
preconceituosa e estigmatizante crianças e adolescentes das classes subalternas.
O aumento da delinqüência, bem como os atos infracionais cometidos
por crianças e adolescente, impeliam a preocupação prioritária da opinião pública.
Aumenta a sensação de insegurança, reforçada cotidianamente pelos meios de
comunicação social. Torna-se perceptível que no imaginário coletivo, em amplos
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
47
setores da sociedade, a construção social da criança e do adolescente.
Esta situação concretamente traduz-se num ambiente
21
marcado pela
rejeição, pela indiferença e pelo temor. Essa ambientação social servia também,
para justificar uma aceitação latente de práticas inconcebíveis como o extermínio de
crianças e jovens
22
em algumas cidades.
Recorre-se ao pensamento de Gramsci (1989, p.41/42), ao referir-se à
ruptura com os estigmas, partindo da concepção de que essas crianças e
adolescentes/homens não deveriam ser vistos:
isoladamente, mas repletos de possibilidades oferecidas pelos
outros homens e pela sociedade das coisas (...) onde residem
elementos da vida social, nos quais, de maneira mais evidente e
ampla (isto é, com extensão de massa), manifesta-se o conjunto das
relações sociais.
Portanto, o momento histórico exigia dos ‘novos personagens’
23
que
passaram a compor o cenário brasileiro, novas práticas políticas, que viabilizassem
as atualizações no campo da cultura política, instituindo novas regras no
gerenciamento das políticas sociais e das representações sociais, rompendo com os
estigmas em relação a crianças e adolescentes.
Percebe-se claramente que as diferenças de terminologia utilizada na
época estão associadas a ritos autoritários de separação de posições sociais e a
componentes culturais e ideológicos, que apontam para as condições de classe e
sócio-econômicas da população em questão.
21
O entendimento sobre o ambiente refere-se ao que Gramsci atribui como "o conjunto das relações
de que o indivíduo faz parte".
22
Sobre a violência dos centros urbanos e o extermínio de crianças e de adolescentes, ver a obra de José
Fernando Siqueira da Silva “Justiceiros e violência urbana”.
23
Expressão utilizada por Éder Sader para designar a constituição dos movimentos sociais como sujeitos de
transformações sociais entre as décadas de setenta e oitenta
.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
48
Aqui, destaca-se a abordagem de Da Matta e as distinções que o autor
aponta entre ‘indivíduo’ e ‘pessoa’, demonstrando que o sistema brasileiro opera em
dois níveis distintos, um que atua por leis globais, e outro, que particulariza. Essas
distinções conduzem a concepções e ações concretas no universo social.
Das distinções detectadas por Da Matta (1979, p.169) supracitado
entre 'indivíduo e pessoa’, destaca-se que:
A pessoa merece solidariedade e um tratamento diferencial. O
indivíduo, ao contrário, é sujeito da lei, foco abstrato para quem as
regras e a repressão foram feitos. Dessa separação, muitas
conseqüências importantes se derivam.
Guardando as diferenças, recorre-se às concepções de ‘infância’ –
‘futuro da nação’, merecedor de afeto e estímulos ao seu desenvolvimento; e o
‘menor’ - não menos infante, porém uma ameaça à suposta harmonia social, aos
costumes e à moral vigente.
Às primeiras a atenção, e o acesso a políticas; ao segundo, a
legislação e programas (governamentais ou não-governamentais) que assegurem o
seu controle social.
Sobre este aspecto, destaca-se o que escreve Adorno (apud, Martins,
1991, p.184):
Trata-se da criança, cuja existência social e pessoal é reduzida à
condição de menoridade, passível, por conseguinte, da intervenção
'saneadora' das instituições policiais de repressão e das instituições
de assistência e de reparação social.
No Brasil, é evidente a distinção entre o ‘indivíduo’ e a ‘pessoa’ como
formas de conceber o universo social e as ações nele presente.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
49
Assim, Silveira (2006, p. 45) chama a atenção para:
Menorização era a terminologia utilizada para apontar a conotação
ideológica presente na cultura política brasileira, designando de
forma preconceituosa e estigmatizante crianças e adolescentes das
classes populares.
A terminologia criança e/ou adolescente era o "filho" da família com
condições econômicas estáveis e socialmente reconhecida, e, “menor” era o filho da
classe subalterna, da população com condições econômicas vulneráveis - do ‘povo’.
Adorno (apud, Martins, 1991, p.183) refere-se ao termo 'menor',
utilizado comumente no senso comum:
para divisar a população entre responsáveis e irresponsáveis.
Segundo o critério do discernimento moral e do desenvolvimento
psicológico, seu emprego generalizou-se para designar um tipo
específico de criança, aquela procedente das classes populares,
em situação de miséria absoluta, expulsa da escola desde a tenra
idade, que faz da rua seu habitat e lugar privilegiado de reprodução
cotidiana e imediata de sua existência.
Para o entendimento do 'senso comum' volta-se ao pensamento de
Gramsci (1989, p. 14/34), por expressar que:
no fato mais limitado de que, em uma série de juízos, o senso
comum identifique a causa exata simples e imediata (...) não existe
um único senso comum, pois também ele é produto de um devenir
histórico.
Detectadas essas diferenças, percebe-se que as mesmas são ora
latentes, ora explícitas na cotidianidade. O movimento de defesa dos direitos da
criança e do adolescente surge para cumprir o importante papel de contrapor e
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
50
contestar as representações vigentes, produzindo e divulgando práticas e novos
códigos de expressão, ações concretas que questionam a manipulação simbólica
utilizada comumente no senso comum.
Nesse sentido passa a mobilizar ações, tendo em vista duas frentes de
luta: uma que diz respeito às práticas pedagógicas, propondo novas relações entre
educadores e crianças e adolescentes. Partia-se de parâmetros educacionais de
caráter libertador; outra que propõe a substituição da legislação vigente, o Código de
Menores de 1979
24
, por uma legislação que atenda à população infanto-juvenil,
concebendo-a como sujeito de direitos e contemplando a exigência de prática
educativas de caráter libertador
25
.
Inicia-se a árdua tarefa de atuar no nível do imaginário coletivo, nas
construções simbólicas e da cultura, cujo conteúdo ideopolítico, como abordado,
se relaciona a passagem do senso comum ao bom senso.
Dentre os mecanismos práticos para efetivar este pleito, passaram-se
a difundir os diferentes projetos ‘alternativos’
26
de ações com as crianças e os
adolescentes, em que se experimentavam relações educativas libertadoras, abrindo-
se o direito à voz e manifestações
27
desses sujeitos sociais.
Sobre o aspecto pedagógico aqui referido, destaca-se o pensamento
de Gramsci (1989, p. 37) ao abordar a 'prática pedagógica' como uma 'relação ativa
e de vinculações recíprocas' e caráter educativo mútuo entre educadores e
24
Código de Menores, cujo conteúdo era marcado pela penalidade à condição de subalternidade, pela estigmatização de
crianças e de adolescentes e de controle social
.
25
Para a compreensão das práticas educativas libertadoras recomenda-se a leitura da obra de Paulo Freire, cujos métodos de
abordagem e princípios educativos inspiravam os projetos sociais com características transformadoras da realidade social.
26
Projetos alternativos passou a ser a terminologia utilizada para os Projetos Sociais com princípios educativos libertadores.
Paulatinamente estes passaram a ter espaços de divulgação da mídia, como uma alternativa ás práticas educativas de
conservação das relações em sociedade em que as crianças e os adolescentes eram tratados como o ‘objeto’ dos interesses e
percepções de educadores e dirigentes institucionais.
27
Dentre estas manifestações, pode citar os encontros nacionais de meninos/as de rua, organizados com o propósito de abrir
espaço social de ‘escuta’ e ‘diálogo’ com estes sujeitos sociais diante de suas necessidades e demandas na sociedade. O
Encontro (1986) foi inspirador para o texto base que deu origem ao Estatuto da Criança e do Adolescente. O IIº Encontro
(1989) focalizou a aprovação do ante-projeto que se transformaria no Estatuto da Criança e do Adolescente, em que os
sujeitos sociais estiveram no Congresso Nacional para reivindicar a urgência sua aprovação. Posterior a aprovação outros
encontros aconteceram chamando a atenção da sociedade para a implementação da referida lei.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
51
educandos. Processo no qual:
as novas gerações entram em contato com as antigas e absorvem
suas experiências e os seus valores historicamente necessários,
'amadurecendo' e desenvolvendo uma personalidade própria,
histórica e culturalmente superior.
As questões atinentes à legislação que vigorava neste período o
Código de Menores Lei 6.697/1979, pautavam-se no paradigma da ‘situação
irregular’ em que se encontravam os “menores”.
Amaral e Silva (1996, p. 08) escrevia à época: "o Direito do Menor com
sua aplicação centrada em medidas paternalistas tem-se mostrado antijurídico,
repleto de mitos e eufemismos".
28
Fazia-se necessária a substituição da legislação vigente por outra, que
deveria incorporar os princípios da Doutrina da Proteção Integral, reunindo,
sistematizando e normatizando a proteção preconizada pelas Nações Unidas, alvo
das reivindicações dos movimentos sociais de defesa dos direitos da criança e do
adolescente no Brasil.
Ao abordar as concepções presentes no Código de Menores,
Silveira (2004, p. 62) sinaliza que:
Por essa concepção, em situação ‘irregular’ encontra-se o Estado, a
sociedade e a família que descumprem suas
responsabilidade/deveres, negligenciando políticas sociais básicas,
omitindo-se frente às violações aos direitos de crianças e de
adolescentes.
Os apontamentos sobre as questões jurídicas estão em estreita
relação com os componentes culturais que os originaram e os legitimam. As
28
Antônio Fernando do Amaral e Silva - desembargador do tribunal de Justiça de Santa Catarina, Professor de Direito da
Criança e do Adolescente da Universidade Regional de Blumenau, membro do grupo de redação de Estatuto da Criança e do
Adolescente
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
52
questões legais são vistas aqui como fruto das necessárias mudanças nos códigos
de expressão e nas práticas de poder, presentes no âmbito da cultura.
Diante desta realidade, concomitantemente aos avanços no campo do
imaginário coletivo
29
quanto às percepções sobre a infância e a adolescência e as
práticas pedagógicas, a mobilização de organizações não-governamentais produzia
discussões e projeções de um novo corpo jurídico voltado à infância e à juventude.
Foi ficando cada vez mais claro para a sociedade que a abordagem
sobre os direitos de crianças e de adolescentes referem-se a um conjunto de ações
por parte do Estado, da sociedade civil organizada e das pessoas em geral. Ações
destinadas a garantir proteção integral e à sua condição de pessoa humana,
compreendendo todas as oportunidades e possibilidades que lhes facultassem o
pleno desenvolvimento integral.
Ao tratar sobre os direitos Carlos Nelson Coutinho (1997, p. 148)
escreve que:
Os direitos são fenômenos sociais, resultados da história. As
demandas sociais, que prefiguramos direitos, só são satisfeitas
quando assumidas nas e pelas instituições que asseguram uma
legalidade positiva.
Como abordado anteriormente, passada a segunda metade da
década de 80, houve o fortalecimento dos movimentos sociais que se destacam pela
intensa mobilização popular por ocasião da Assembléia Nacional Constituinte.
Em meio a este cenário, iniciava-se uma ampla mobilização nacional
em prol de um projeto que envolve a elaboração e a aprovação de uma nova
legislação para todas as crianças e adolescentes do país, passando por uma
29
O movimento existente produzia outros referenciais e significados sobre a infância pobre, destituindo a roupagem de
‘ameaça social’ e o caráter de ‘periculosidade’ que até então lhe era facultada, substituindo-a pela idéia de ‘proteção’ como co-
responsabilidade entre Estado e sociedade.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
53
participação significativa na Assembléia Nacional Constituinte, através da Comissão
Nacional Criança Constituinte
30
. Esta Comissão pauta-se na atribuição de inserir os
direitos inerentes a pessoa humana no texto constitucional, considerados
fundamentais ao desenvolvimento de toda criança e adolescente.
Na área da infância e da juventude, uma frente de organizações não
governamentais, mobilizadas pelo Forum DCA, criou a emenda popular “Criança -
Prioridade Nacional”., que resultou no artigo 227 da Constituição Federal de 1988.
Cabe especial destaque para o artigo número 227, C.F./1988, cujo
caput enuncia:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e
ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
O novo direito que se pretende consolidado, traz normas e institutos
exclusivos, não para algumas, mas para todas as crianças e adolescentes.
Consagra na ordem jurídica a Doutrina de Proteção Integral. Assegura às crianças e
adolescentes medidas de proteção e ações de responsabilidade por ofensa aos
seus direitos.
Pode-se afirmar, como expressa Bobbio(1986, p. 20), que ‘as normas
constitucionais que atribuem esses direitos não são exatamente regras do jogo: são
regras preliminares que permitem o desenrolar do jogo’.
30
participaram dessa comissão o Movimento Nacional de Meninos/as de Rua, Pastoral do Menor - CNBB; Organização
Mundial para a Educação Pré-Escolar -OMEP; Ordem dos Advogados do Brasil - OAB; Sociedade Brasileira de Pediatria;
Federação Nacional dos Jornalistas; UNICEF; Ministérios da Educação, Saúde, da Justiça e da Previdência e da Assistência
Social; Secretaria de Planejamento da Presidência da República, Frente Parlamentar de Defesa dos Direitos da Criança e do
Adolescente - congregando parlamentares de diferentes partidos políticos.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
54
Neste sentido, retoma-se o estudo de Silveira (2004) ao escrever que:
Numa sociedade que está construindo relações sócio-políticas
democráticas, a existência de leis e a democracia se constituem em
recíproca dialética, cujo primado corresponde à garantia da
dignidade humana.
Paralela a pressão pela aprovação do texto constitucional, estrutura-se
a proposta de texto para a legislação complementar que viria substituir o Código de
Menores. Regulamentando os Artigos 204 e 227 da Constituição Federal de l988,
em l990, cria-se uma legislação de defesa, de proteção e desenvolvimento integral
para a criança e o adolescente, Lei Federal 8069/90, O Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA).
No campo da normatização, Silveira (2004) contempla assim a
estrutura do ECA:
A partir de dois Livros, da seguinte forma: o Livro I, com a
disposições preliminares, os direitos fundamentais e a prevenção; o
Livro II, que dispõe sobre as políticas de atendimento, as medidas
de proteção e a prática do ato infracional; Título IV, apresentando
as medidas pertinentes aos pais ou responsáveis; Título V, sobre o
Conselho Tutelar; Título VI, sobre o acesso à justiça; Título VII,
abordando os crimes e infrações administrativas.
O ECA é resultante das lutas populares e da pauta de reivindicações
presente nos movimentos sociais em prol dos direitos humanos e, em especial, dos
direitos da população infanto-juvenil. Inspiração que se fundamenta na Doutrina de
Proteção Integral, presente nas normativas internacionais dos direitos da
criança
31
, tal qual escreve Amaral e Silva:
31
Para a especificação referente as normativas internacionais, recomenda-se consultar O Estatuto da Criança e do
Adolescente Comentado - comentários jurídicos e sociais, organizado por Cury, Munir; Amaral, Antônio Fernando; Mendez,
Emílio Garcia; aponta as normativas internacionais, destacando-se a Declaração de Genebra de 1924, que determinava “a
necessidade de proporcionar à criança uma proteção especial”.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
55
A Declaração de Genebra de 1924, Declaração Universal dos
Direitos Humanos das Nações Unidas - 1948 ; as Regras nimas
da Nações Unidas para a Administração da Justiça da Infância e da
Juventude - Regras de Beijing - 1985; Convenção sobre os Direitos
da Criança, aprovada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas em
1989. (1992, p. 17)
Materializando as referidas normativas, destacam-se os artigos Artigos
terceiro e quarto:
Art. 3º : A criança e o adolescente gozam de todos os direitos
fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção
integral de que trata esta lei, assegurando-lhes, por lei ou por outros
meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em
condições de liberdade e de dignidade.
Art. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à
criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar
e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e
opressão.
Os apontamentos sobre as questões jurídicas presentes neste estudo,
estão em estreita relação com os componentes culturais que os originaram e os
legitimam. Pois, para além das questões econômicas e políticas que envolvem os
direitos da criança e do adolescente está presente a questão cultural e as
concepções de homem e de mundo, assim como as possibilidades de transformação
social.
Ainda sobre a amplitude política e cultural contida no ECA, Amaral e
Silva (1996, p. 53) aponta que:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
56
a Lei 8.069 de 13 de outubro de 1990, criou muito mais que uma
nova Justiça da Infância e da Juventude. Ela estabeleceu o Estado
democrático de direito em esfera onde esteve ausente desde a
nossa formação histórica. Ela aboliu o arbítrio e o subjetivismo,
consagrando o Direito e dignificando a Justiça..
Simultaneamente à adoção da doutrina dos direitos humanos,
aprofunda-se o significado de cidadania, que não admite divisões em categorias de
gênero, etnia, idade, etc.. Possui sua ênfase centrada no conjunto de direitos e
responsabilidades necessárias para garantir a participação plena e cidadã na
sociedade.
Ao abordar o direito de crianças e de adolescentes, entende-se como
um desdobramento dos direitos humanos, porém, voltados especificamente à
população que necessita ser tratada com ‘absoluta prioridade’, tendo respeitadas
suas condições de ‘sujeitos de um processo histórico’ e pessoas em ‘condição
peculiar de desenvolvimento’.
O Estatuto da Criança e do Adolescente vincula-se aos princípios e
técnicas do direito, aos conceitos da ciência jurídica, voltado para o que é justo e
para a eqüidade social.
O estudo realizado por Silveira (2004, p. 64) demonstra que:
A aprovação do ECA supera simbolicamente a regulamentação
formal da Constituição Federal, pois aponta novas concepções e
conteúdos a serem adotados frente à população infanto-juvenil.
Concebe crianças e adolescentes como ‘sujeitos de direitos’,
respeitando sua “condição peculiar de desenvolvimento” e
garantindo-lhes ‘absoluta prioridade’.
O ECA traz indicações ao conjunto da política, da economia e da
organização social para operar um reordenamento, revisar prioridades políticas e de
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
57
investimentos. Coloca em questão o modelo de desenvolvimento e respectivo
projeto de sociedade, que historicamente, reproduz a cultura da exclusão social,
desconhecendo, na prática, crianças e adolescentes como sujeitos de direitos.
Os mesmos sujeitos sociais, que protagonizam a recente história de
conquistas legais, são desafiados a desempenhar um outro papel na história da
defesa dos direitos da criança e do adolescente, ou seja, de desencadeare a
implantação do ECA, assegurando sua materialização.
No plano estrutural, extrapolando os aspectos jurídico-formais, os
esforços voltavam-se para a implantação dos organismos previstos no ECA, quais
sejam: Conselho de Direitos - vinculado a este os Fundos dos Direitos da Criança e
do Adolescente; e o Conselho Tutelar. Nesta implantação havia uma explícita
intencionalidade política de por em pauta e materializar os direitos, as relações
democráticas e as questões referentes às concepções de infância e de juventude,
considerando-os em sua integralidade.
O direito, aqui é visto - para além da norma jurídica - como a
concretização de valores democráticos através da criação dos novos instrumentos
de participação popular. Este direito gera uma nova cultura para o tratamento das
políticas sociais voltadas à infância e à adolescência
O ECA propõe a integração das deliberações sobre as políticas para a
infância e para a adolescência à nova organização sócio-política do país. Nesse
contexto, as leis são concebidas como instrumentos necessários à democracia.
Busca-se suporte jurídico para as concepções e práticas que guardam
aproximações com as 'lutas' desencadeadas na década de setenta e consolidadas
na cada de 80, em prol da democratização das relações sociais. Esta
preocupação está também presente no ECA, artigo 88, em seu caput ao estabelecer
a:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
58
criação dos conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos
da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores
das ações em todos os níveis, assegurada a participação popular
paritária, por meio de organizações representativas, segundo leis
federal, estaduais e municipais.
Portanto, ao prever a criação dos Conselhos de Direitos, o ECA dispõe
sobre a construção de relações democráticas quanto às decisões e ao
gerenciamento das políticas destinadas á criança e ao adolescente. Esta disposição
prevê a necessária parceria, politicamente instituída, entre o Estado e a sociedade.
Trata-se de uma relação de negociação, também permeada por tensões, fundada
em compromissos e numa agenda pública acordada entre ambos.
Ivete Simionatto escreve que esta relação compõe um contexto
contraditório, em que:
a parcela da sociedade civil representada pelos novos institutos
democráticos, também surgidos com o intenso processo de
socialização da política, que se expressa através dos partidos, dos
sindicatos, das associações profissionais, de movimentos sociais de
ordem diversa, de comissões de fábrica, de ONGs, de organizações
culturais, etc., passa a desempenhar um papel fundamental nas
relações Estado/sociedade, principalmente na defesa de interesses
universais, diminuindo os poderes coercitivos do Estado e definindo
a prioridade do público sobre o privado. Constituindo-se enquanto
mecanismos de representação de interesses, tais organismos têm
aberto canais, originando uma nova trama nas relações entre
governantes e governados, e ampliado as formas de acesso e
participação nos processos decisórios.
http://www.acessa.com/gramsci/page, acessada em 04.05.2008
Os Conselhos de Direitos - nova institucionalidade mediadora das
relações entre Estado e sociedade civil, conforme previsto pelo ECA - devem
contemplar as demandas e os interesses da população infanto-juvenil. Devem
também assumir autoridade para desencadear um amplo processo de participação e
politização. Tendo em vista sua constituição, conforme estabelece esse mesmo
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
59
artigo, assegura "... a participação popular paritária”, nas deliberações e no controle
social.
O ECA inaugura, portanto, novas relações e níveis de participação
social. Para Vieira
(1998, p. 17)
:
“o processo de democratização possui um importante componente,
que é o controle social da administração pública. Isto significa dar
grande interesse ao que vem da sociedade, sobretudo da maioria
dela.”
Ao incorporar algumas das mais recentes concepções sobre gestão
democrática da “coisa pública” e sobre a democracia representativa, o ECA,
aproxima-se do pensamento de Bobbio (1986, p. 44), tendo em vista que o mesmo
define:
a expressão 'democracia representativa' significa genericamente
que as deliberações coletivas, isto é, as deliberações que dizem
respeito à coletividade interna, são tomadas, não diretamente por
aqueles que dela fazem parte, mas por pessoas eleitas para essa
finalidade.
A democracia representativa é considerada então como uma forma de
envolver diferentes partes, que, através de livres manifestações e do debate, leva à
formação de uma maioria.
Um segundo organismo previsto pelo ECA é o Conselho Tutelar,
cujas atribuições remetem à ação direta na defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes.
Os Conselhos Tutelares estão previstos no Título V, capítulo I do ECA,
o artigo 131 prevê a criação de um organismo “permanente e autônomo, não
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60
jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da
criança e do adolescente”.
Tem caráter permanente, pois, suas atividades devem ser
ininterruptas, de ação continuada; é autônomo, à medida em que decide (de forma
colegiada entre seus membros) e atua diretamente, mantendo independência
institucional, ou seja, sem interferências externas no âmbito de suas deliberações
(sem submeter-se a hierarquias no âmbito das administrações públicas); não
jurisdicional porque não lhe é atribuída competência quanto à apreciação e
julgamento relacionado a conflito de interesses, cujo papel cabe ao poder judiciário.
O Conselho Tutelar configura-se em organismo de prestação de
serviços, cuja ação é direta e de permanente defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes. Com caráter eminente, é educativo de crianças, adolescentes, pais e
da sociedade como um todo.
O Conselho Tutelar compõe um conjunto das estruturas preconizadas
pelo ECA (junto ao Conselho de Direitos e o Fundo). A natureza de suas funções é
de caráter executivo, com vistas à democratização das questões que envolvem
crianças e adolescentes no âmbito dos municípios (sua esfera de atuação).
O ECA, em seu artigo 132, aponta que "em cada município, haverá,
no mínimo, um Conselho Tutelar composto de cinco membros, escolhido pela
comunidade local para mandato de três anos, permitida uma recondução". Dessa
forma, está aberta à 'comunidade local' a participação na composição (através de
escolha de seus membros) do Conselho Tutelar.
O ECA, nos artigos que o do número 131 ao 140, dispõem sobre o
caráter, a obrigatoriedade do organismo em cada município brasileiro, o número de
membros, os requisitos para ser um/a conselheiro/a tutelar, a disposição
orçamentária para o funcionamento dos mesmos, as atribuições, sobre o processo
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61
de escolha e sobre os impedimentos para o exercício da função.
A temática conselhos tutelares també é abordada nna dissertação de
mestrado apresentada em 2004 por Silveira (p.123 ) que escreve:
Constitui-se mais uma forma de participação da comunidade local,
para atender a população infanto-juvenil e suas famílias na defesa e
execução de seus direitos. Trata-se de uma ação educativa, que se
opera através da abordagem de crianças e de adolescentes, de
pais, de responsáveis de representantes das instituições e da
comunidade em geral (dirigentes de entidades de atendimento,
professores e dirigentes escolares, profissionais da saúde,
servidores do setor de segurança pública, trabalhadores em bares,
no comércio, dentre outros).
Este caráter educativo dos Conselhos Tutelares corresponde às ações
de identificação, diálogo com a sociedade e encaminhamento das demandas
pertinentes às necessidades sociais, bem como a mediação entre estas e o
conteúdo filosófico e jurídico formal previsto no ECA
O ECA prevê, ainda, a criação dos Fundos. Esses são vinculados aos
Conselhos de Direitos e constituem-se como um aporte de recursos às questões
consideradas prioritárias no atendimento aos direitos desses.
Contemplando as diretrizes da política de atendimento, o ECA no
artigo 88, inciso IV, prevê a "manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais
vinculados aos respectivos conselhos de direitos da criança e do adolescente".
Trata-se de mecanismos que o ECA lança na perspectiva de assegurar recursos
para viabilizar as ações afirmativas dos direitos de crianças e de adolescentes.
Os Fundos são considerados de natureza especial, e seu
funcionamento deve facilitar a aplicação dos recursos alocados, atendendo com
maior brevidade as emergências relacionadas aos atendimentos que lhe cabem,
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62
conforme deliberações dos Conselhos de Direitos.
Ao subordinar a aplicação dos recursos alocados nos fundos, às
deliberações e ao acompanhamento dos respectivos Conselhos de Direitos, espera-
se que a utilização dos mesmos supere uma tradição histórica de uso dos recursos
'públicos' com fins clientelistas e assistencialistas e passe a atender a efetivação dos
direitos de crianças e de adolescentes.
Os Fundos, conforme dispõe o ECA, referem-se à organismos de
natureza especial, pois são catalisadores de recursos do orçamento público e de
outras fontes, tais como doações, recolhimento de percentual do imposto de renda
devido, multas administrativas, dentre outros.
Porém, não cabe a esses fundos oferecem recursos para a
manutenção das políticas sociais
32
, e, sim, atender as demandas referentes às
situações consideradas de risco social ou pessoal envolvendo crianças e
adolescentes.
No plano nacional, em 12 de outubro de 1991, passa a vigorar a Lei
8.242, que cria o Conselho Nacional dos Direitos da Criança - CONANDA e institui o
Fundo Nacional para a Criança e do Adolescente.
Dentre as suas principais competências legais do CONANDA,
podemos destacar:
I - elaborar as normas da Política Nacional de Atendimento dos
Direitos da Criança e do Adolescente, fiscalizando as ações de
execução previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente;
32
Sobre a manutenção de políticas de atenção básica, a concepção presente no ECA corresponde à obrigação Estatal em
assegurá-la. Assim, os Fundos financiam ações com caráter emergencial e/ou prioritário com o fomento a formação,
diagnósticos de realidade, campanhas de explicitação dos direitos, eventos para subsidiar deliberações políticas, dentre outros.
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63
II - buscar a integração e articulação com os Conselhos Estaduais,
Distrital, Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente,
Conselhos Tutelares, os diversos Conselhos Setoriais, Órgãos
estaduais, distritais e municipais e entidades não-governamentais;
III - avaliar as políticas nacional, estaduais, distrital e municipais de
atendimento dos direitos da criança e do adolescente, bem como, a
atuação dos Conselhos Estaduais, Distrital e Municipais dos Direitos
da Criança e do Adolescente, na execução dessas políticas;
IV - promover e apoiar campanhas educativas sobre os direitos da
criança e do adolescente, com indicação de medidas a serem
adotadas nos casos de atentados, ou violação desses direitos;
V estimular, apoiar e promover a manutenção de bancos de
dados, com o intuito de propiciar o fluxo permanente de informações
sobre a situação da criança e do adolescente;
VI - acompanhar a elaboração da Proposta Orçamentária e a
execução do Orçamento da União, indicando as modificações
necessárias à consecução dos objetivos da política formulada para a
promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente;
VII - gerir o Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente –
FNCA.
Quanto a sua estruturação, o CONANDA, é um colegiado de
composição paritária, integrado por quatorze representantes do
Poder Executivo que são indicados pelos Ministros de Estado,
assegurada a participação dos órgãos executores das políticas
sociais básicas e, em igual número, por representantes de entidades
não-governamentais de âmbito nacional de atendimento, promoção,
defesa e garantia dos direitos da criança e do adolescente. E o seu
funcionamento é exercido pela Plenária que se reúne em
assembléias ordinárias mensais, com o auxilio das Comissões
Temáticas e Grupo de Trabalho.
Como no decorrer das décadas anteriores, os planos econômicos se
sobrepõem em importância e prioridade às demais necessidades, orquestrando o
acirramento de conflitos sociais e de crises permanentes no país.
No âmbito nacional, a responsabilidade pela organização e
coordenação da Conferência dos Direitos e Crianças e de Adolescentes é do
CONANDA. Estas Conferências tem seu primeiro evento em 1995 e se realizam a
cada dois anos em Brasília, reunindo delegados municipais e estaduais além de
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64
convidados e observadores. Estes são os representantes da sociedade civil e dos
poder público em sua área de abrangência, assim como técnicos e educadores que
atuam como operadores dos direitos de crianças e de adolescentes.
A seguir, apresentam-se em ordem cronológica o período de realização
das Conferências Nacionais dos Direitos de Crianças e de Adolescentes e suas
respectivas temáticas:
- I Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Crianças e Adolescentes: prioridade absoluta”, Brasília, 1995;
- II Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Crianças e Adolescentes: prioridade absoluta”, Brasília, 1997;
- III Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Uma década de história rumo ao terceiro milênio”, Brasília, 1999;
- IV Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Crianças, Adolescentes e violência”. Lema – “Violência é covardia as marcas
ficam na sociedade”, Brasília, 2001;
- V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Pacto pela Paz: uma construção possível”, Brasília, 2003;
- VI Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Controle social, participação e garantia de Direitos por uma política para
crianças e adolescentes”, Brasília, 2005.
- VII Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
Tema: “Concretizar Direitos Humanos de crianças e adolescentes: investimento
obrigatório”, Brasília, 2007.
Como parte integrante do processo participativo e de democratização
das políticas sociais, cabem aos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente
a promoção do debate e da definição das áreas prioritárias de ações pertinente a
esta população. A realização de Conferências no âmbito nacional, estadual e
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
65
municipal vem propiciando este ‘alargamento’ do espaço de participação social.
O relatório produzido pelo CONANDA sobre as deliberações da VII
Conferência Nacional aponta:
Da VII Conferência Nacional participaram cerca de 1500 pessoas,
das quais 1.200 eram delegados. Sem dúvida, a VII Conferência
tornou-se um marco na história das conferências dos direitos da
criança e do adolescente pelo seu caráter deliberativo, uma vez que
as anteriores possuíam o status de recomendação; e pelo aumento
significativo no número de participantes, com um acréscimo de 300
delegados. É importante destacar ainda a ampliação do
protagonismo infanto-juvenil com o aumento na proporção do
número de delegados adolescentes em relação ao de adultos. O
número de delegados adolescentes não cresceu em números
absolutos como também em termos percentuais -- que foi de cerca
de 50% comparando-se com a VI Conferência. No quesito qualidade
também houve avanços: eles tiveram os mesmos direitos dos
adultos, quando em conferências anteriores eles participavam de
conferências paralelas.
www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sedh/arquivos
No campo das políticas de direitos da criança e do adolescente, após a
aprovação do ECA, observam-se alterações na estrutura e corpo funcional com
objetivos supostamente voltados para o rompimento com o autoritarismo e o
assistencialismo existentes, apoiando a implantação do Estatuto da Criança e do
Adolescente no campos legal, institucional e de atendimento.
Porém, as alterações nas estruturas de atendimento propostas, em seu
cerne, contrapunham-se ao ECA em sua origem e princípios, pois, o próprio ECA
prevê mecanismos de implantação e medidas de controle social, centrados nos
Conselhos de Direitos nos níveis Nacional, Estaduais e Municipais.
Ao contrário, o que ocorreu foi o retardamento da implantação dessas
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
66
estruturas previstas pelo ECA, sendo privilegiados novos ‘Programas’, de caráter
fisiológicos. Estes Programas, lançados pelos governantes especialmente na esfera
federal tinham forte caráter de ‘marketing’ político
33
.
Somente em 1995 o CONANDA delibera sobre as ‘Diretrizes Nacionais
para a Política de Atenção Integral à Infância e à Adolescência’ nas áreas da saúde,
de educação, de assistência social e de trabalho para a garantia de direitos. Estas
diretrizes ficaram assim delineadas:
Educação: 1. garantir a qualidade do ensino público; 2 . implantar a
universalização do ensino público desde a educação infantil até o
ensino médio, assegurando a educação básica para jovens e
adultos.
Saúde: 1. garantir uma política de saúde pública de acesso universal
e igualitário, nos aspectos da promoção, da proteção e recuperação
de crianças e de adolescentes.
Assistência Social 1. garantir uma política nacional de assistência
social que tenha a família como foco central de ação, que assegure
os mínimos sociais à famílias pobres, promovendo o acesso de
todos os seus membros às demais políticas sociais básicas; 2.
garantir uma política nacional de apoio à juventude que promova o
protagonismo infanto-juvenil no aspecto da cidadania.
Cultura, esporte e lazer 1. garantir uma política nacional de
cultura, esporte e lazer para crianças e adolescentes de caráter
universal que contemple a integração regional e a valorização da
cultura local; 2. assegurar apoio financeiro da União, dos Estados
aos Municípios para a promoção de atividades culturais, esportivas
e de lazer destinada à criança e ao adolescente.
Ações Especiais: Proteção Especial; Violência Sexual e Trabalho–
1. garantir uma política nacional de promoção de direitos para
crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social; 2.
garantir a implantação do plano nacional de enfrentamento da
violência sexual infanto-juvenil; 3. garantir uma política de
erradicação do trabalho infantil e de proteção ao trabalho do
adolescente.
33
Este marketing político era explicitado tanto na figura exibicionista do então Presidente Fernando Collor, quanto no governo
do Presidente Fernando Henrique Cardoso e seu atrelamento à agenda neoliberal de privatização das ações até então
vinculadas ao Estado.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
67
Medidas socioeducativas 1. garantir a implantação de uma política
de atendimento aos adolescentes autores de ato infracional em
todas as modalidades de medias socioeducativas e em todas as
esferas de governo.
Conselhos de Direitos, Conselhos Tutelares e Fundos – 1. garantir a
implantação e o devido funcionamento dos Conselhos de Direitos e
dos Conselhos Tutelares, conforme determina o ECA, em todo o
território nacional; 2. garantir a criação e consolidação do Fundo nas
esferas nacional, estadual e municipal.
Mecanismos de Exigibilidade de Direitos- garantir a criação e o
funcionamento adequado dos órgão que compõem o sistema de
Garantia de Direitos. (Resolução 42 do CONANDA, de 13 de
outubro de 1995).
A correlação de forças no âmbito cultural e político expõe os confrontos
e os comportamentos no que tange à ação junto a população infanto-juvenil, ainda
presa a rótulos através da visão da criança pobre como ameaça ou como alvo de
‘comiseração’.
As tensões são perceptíveis: o evidentes as dualidades expressas
nas estratégias. Ora são de clientelismo, ora de respeito à cidadania. Estas
estratégias apresentam perspectivas repressivas e assistencialistas convivendo com
estratégias educativas e de aberturas dos espaços públicos e democráticos
(Conselhos de Direitos) para as discussões e deliberações de políticas para a
infância e adolescência no Brasil contemporâneo.
Ao se pensar as forças culturais e políticas, busca-se a abordagem de
Simionatto ao focalizar:
Cultura e política aparecem aqui como questões inseparáveis, pois
cultura é, para Gramsci, um dos instrumentos da práxis política,
sendo esta, justamente, a via que pode propiciar às massas uma
consciência criadora de história, de instituições, fundadora de novos
Estados. http://www.acessa.com/gramsci/page
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
68
Convivendo dialeticamente com as tensões, alastra-se por todo o país
a materialização das expectativas, até então projetadas de democratização das
relações que envolvem decisão, execução e controle sobre políticas para a infância
e a adolescência. Essa democratização através da possível articulação entre as
organizações governamentais e não-governamentais evidenciaria e se materializaria
pela via dos Conselhos de Direitos.
Trata-se, pois, de repensar a organização estatal e Gramsci poderia
ser uma referência nesta proposta. Simionatto, em seus estudos sobre o
pensamento de Gramsci, indica que para ele “é fundamental a superação do Estado
enquanto órgão de coerção e manutenção dos privilégios e desigualdades. A
democratização das suas funções é ponto essencial e imprescindível” ( 2004, p.73).
Por esta época, contraditoriamente, a estratégia governamental com
características marcadamente neoliberais passa pelo desmonte gradativo das
políticas sociais, através de uma ação orquestrada que conduz à subalternização da
população e desqualifica os movimentos sociais e os mecanismos de participação,
levando à desorganização dos sujeitos coletivos.
Para Vera Telles (1994, p. 230):
o exercício do poder político e econômico não encontra limites e,
por isso mesmo, pode ser devastador; sendo que os direitos não
fazem parte das ‘regras do jogo’, mesmo quando sacramentados em
leis ou corporificados em instituições, por mais precário que seja seu
funcionamento - daí a permanente e tranqüila transgressão nessa
espécie de delinqüência que parece fazer parte da cultura política
brasileira, que nela está ausente o critério de responsabilidade
pública.
Ao apontar o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, como uma
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
69
conquista jurídico-formal, retoma-se o movimento propulsor dessa conquista,
protagonizado por 'sujeitos coletivos' que, se manifestam através da "presença no
campo social e político, de interesses e vontades, de direitos e práticas que vão
formando uma história, pois seu conjunto lhes a dignidade de um acontecimento
histórico" (SADER, 1995, p. 12).
As questões que se referem às políticas sociais e aos direitos de
crianças e de adolescentes superam a regulamentação jurídica formal, pois,
navegam também no campo da ética social e da formação cultural.
A convergência de um esforço conjunto entre organizações
governamentais e organizações o governamentais deve servir de parâmetro para
a construção de políticas sociais coerentemente com os direitos preconizados para a
infância e para a juventude, envolvendo mudanças na formação cultural propiciando
as necessárias superações das relações de dominação e opressão existentes entre
‘dirigentes e dirigidos, governantes e governados’. Envolve a ‘reforma intelectual e
moral’, assim demonimada por Gramsci, configurando um novo pacto de relações
sociais, que privilegia a vontade coletiva.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
70
III. O SERVIÇO SOCIALAS REVISÕES, AS RUPTURAS E OS
NOVOS RUMOS ÉTICO-POLÍTICOS.
3.1 – O Serviço Social: a constituição de novas perspectivas ético-políticas.
O Serviço Social em termos mundiais tem sua gênese na sociedade
capitalista em seu estágio monopolista. Suas perspectivas e natureza ética
objetivam-se diante das relações sociais nela instaladas. Em seus primórdios, as
demandas profissionais dos assistentes sociais articulam-se à dinâmica que
movimentava a sociedade capitalista.
Os conflitos circulam em torno da origem da profissão, que tem a
marca profunda do capitalismo e do conjunto de variáveis subjacentes alienação,
contradição e antagonismo -, pois, foi neste vasto caudal que ele foi engendrado e
desenvolvido” (MARTINELLI, 1995, p.156).
O surgimento e o desenvolvimento do Serviço Social na América
Latina, igualmente, relacionam-se à negação dos antagonismos oriundos do
capitalismo, presentes no acelerado processo de industrialização mundial.
As práticas sociais revestem-se de ações humanizantes e tinham o
sentido da redução desses antagonismos. Práticas contraditórias do Serviço Social,
assim, considerado ‘tradicional’, negando as contradições existentes e atuando sem
as percepções sócio-históricas de tais condições, realizando processos de
adaptação, orientação e administrando conflitos mediante ‘certas técnicas de ajuda’.
Para a compreensão do que se qualifica como “Serviço Social
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
71
tradicional”, recorre-se a José Paulo Netto (2005, p.6), pois, o autor em recente
artigo apresenta-o sumariamente como:
prática empirista, reiterativa, paliativa e burocratizada, orientada por
uma ética liberal burguesa, que, de um ponto de vista claramente
funcionalista, visava enfrentar as incidências psicossociais da
‘questão social’ sobre indivíduos e grupos, sempre pressuposta a
ordenação capitalista da vida social como um dado factual
ineliminável.
Em oposição a sua gênese, entre 1960 e 1970 passa-se a operar uma
revisão crítica do Serviço Social, impulsionada por condições históricas favoráveis.
Condições essas, vinculadas às alterações do capitalismo que propiciaram, segundo
José Paulo Netto (2005, p.7):
o tensionamento das estruturas sociais no mundo capitalista, tanto
nas suas áreas centrais quanto periféricas, ganhou uma nova
dinâmica e gestou-se um quadro favorável para a mobilização das
classes subalternas em defesa de seus interesses imediatos (...) nas
suas mais variadas expressões (...) recolocavam na agenda as
ambivalências da cidadania fundada na propriedade (privada) e
redimensionavam a atividade política, multiplicando os seus sujeitos
e as suas arenas.
Na América Latina esse é um período de sucessivos golpes de Estado,
que reprimiam lutas sociais e políticas sinalizando uma conjuntura de efervescência
e de acirramentos das contradições oriundas do sistema capitalista.
Período em que também na América Latina é marcado pelas iniciativas
dos assistentes sociais em adotar novos referenciais teóricos, políticos e práticos
frente à realidade social.
Décadas em que emergem fortes críticas ao “Serviço Social tradicional”
e que se solidificam as idéias do Movimento de Reconceituação na América Latina
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
72
como um processo de rupturas
34
e de revisão crítica do Serviço Social.
Vicente Faleiros (1997, p. 141) situa o Movimento de
Reconceituação em meio a esta conjuntura:
não como um projeto isolado e vanguardista, mas como um
processo vivo e contraditório de mudanças no interior do Serviço
social latino-americano. A ruptura com o Serviço Social tradicional
se inscreve na dinâmica de rompimento das amarras imperialistas,
de luta pela libertação nacional e de transformações da estrutura
capitalista excludente, concentradora, exploradora.
O Movimento de Reconceituação apresenta-se tão diversificado quanto
plural com uma inerente complexidade de expressões teóricas e políticas. Cabe
destacar a indelével contribuição para a ruptura com um projeto profissional
marcado pelo tradicionalismo, que, em contrapartida almeja um ‘novo’ projeto
profissional permeado pela explicitação política da ação profissional, comprometida
com os subalternos e com a transformação social.
Para Netto (2005, p.12), algumas conquistas do Movimento de
Reconceituação ‘integraram-se na dinâmica profissional’ nos países latino-
americanos, dos quais se salientam:
a articulação de uma nova concepção da unidade latino-americana;
(...) a explicitação da dimensão política da ação profissional; (...)
lançou bases para uma nova interlocução crítica com as ciências
sociais, abrindo-se a novos influxos ( inclusive da tradição marxista)
e sintonizando-se com tendências diversificadas do pensamento
social então contemporâneo; (...) a inauguração de um pluralismo
profissional ... a Reconceituação concedeu carta de cidadania a
diferentes concepções acerca da natureza, do objeto, das funções,
dos objetivos e das práticas do Serviço Social.
34
Para a compreensão da nomenclatura a que se refere a ‘ruptura’, recorre-se a Netto, ao qualifica-la
como “ sempre um ineliminável caráter de oposição em face a autocracia burguesa” (1991; p.248).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
73
Em recente artigo sobre os 40 anos de Reconceituação do Serviço
Social, um de seus protagonistas Vicente Faleiros (2005, p. 21), escreve:
que este é um movimento de crítica ao positivismo e ao
funcionalismo e de sua fundamentação na visão marxista da história
e da estrutura. A construção da relação teoria/prática no Serviço
Social está articulada aos contextos sociais e políticos e vem se
aprofundando no sentido crítico tanto pelas lutas sociais de
transformação como pela organização da categoria profissional, o
que resulta em um debate sobre o significado da profissão e em
mudanças no Código Profissional e na Formação Acadêmica”
O Serviço Social brasileiro participou ativamente deste processo
contribuindo no debate e acirramento das tensões que envolviam a posterior
construção de um projeto profissional comprometido com os interesses das classes
trabalhadoras.
No presente estudo, entende-se que se torna central na trajetória de
formação e de projeto profissional do Serviço Social, o que Netto (2005, p.12) vem
destacar como “a principal conquista da Reconceituação: ... a recusa do profissional
de Serviço Social de situar-se como um agente técnico puramente executivo (quase
sempre um executor terminal de políticas sociais)”.
Ainda em 1979, a organização e a realização do III Congresso
Brasileiro dos Assistentes Sociais - CBAS
35
, na cidade de São Paulo, passa para
história do Serviço Social como o “ano da virada”. A realização deste congresso
representa a publicização da efetiva inserção do Serviço Social na luta que envolve
as contradições sociais, fruto do sistema capitalista. Dentre os segmentos dos
trabalhadores que passam a compor o movimento de oposição à ditadura militar e
35
Segundo Netto, neste evento, as correntes profissionais que faziam a crítica a ditadura não conseguiram se expressar,
como, sobretudo, afirmaram-se como vanguardas do corpo profissional” (2005; p.17). Em meio a tímidos ares de abertura
democrática, a mesa de abertura do III CBAS, originariamente composta por representantes oficiais da ditadura militar, foram
substituídas por representantes do movimento sindical e popular.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
74
de luta pela democratização do país, estão os assistentes sociais, que se articulam
com os demais movimentos sociais.
Dentre os segmentos dos trabalhadores que passam a compor o
movimento de oposição à ditadura militar e de luta pela democratização do país,
estão os assistentes sociais, que marcam esta posição política através da realização
do III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais - III CBAS. A realização deste
Congresso explicita a inserção da categoria profissional na luta de classes,
posicionando-se ao lado da classe trabalhadora e mediante a articulação com os
demais movimentos sociais.
A sintonia do Serviço Social com seu tempo histórico também pode ser
observada no lançamento, em 1979, da Revista Serviço Social e Sociedade, onde
se destaca o artigo assinado pelo Conselho Federal de Assistentes Sociais sob o
título Pela prática dos direitos sociais (1979, p.5). Neste artigo, dentre outros pontos,
a abordagem da democracia se faz em oposição à ditadura vigente, ao compreendê-
la como:
Antes de tudo, a democracia implica disputa, co-participação e
conquista. Trata-se de encontrar formas de autoridade que não se
baseiem na obediência cega, nem no pressuposto da auto-
regulação espontânea (...) A proposta da democracia pluralista e
militante é a alternativa que se contrapõe à arregimentação
totalitária e à desintegração completa do sistema de valores gerado
pelo individualismo .
O acirramento das contradições repercutiu no formato impresso ao III
CBAS, explicitando os conflitos existentes no interior do Serviço Social,
anteriormente deflagrados com o Movimento de Reconceituação.
Portanto, como escreve Simionatto (2004, p. 176):
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
75
as ações repressivas que atingiam toda a sociedade e se
manifestavam igualmente no Serviço Social, se, por um lado,
dificultaram o encaminhamento de reflexões ideopolítica, por outro,
não impediram que se gestassem algumas formas de crítica ao
poder constituído e aos aportes teóricos que permeavam o Serviço
Social no período.
Esta perspectiva se encontra expressa no lançamento, em 1979, da
Revista Serviço Social e Sociedade, publicada em setembro de 1979, (nº 1, com o
tema Política Social), ao expor em seu editorial
36
(1979; p.4) que:
mais do que objetivos, Serviço Social & Sociedade tem uma
esperança que nasce de uma convicção: a esperança de poder
contribuir para que os Assistentes Sociais se unam cada vez mais
enquanto categoria profissional, assumindo em linha de frente, com
outras categorias, as lutas mais gerais do povo brasileiro; a
convicção de que ao Serviço Social cabe uma tarefa das mais
importantes na reconstrução da sociedade contemporânea.
Ainda na década de 60 registra-se a aproximação do Serviço Social ao
pensamento marxista, entrecortado no período da ditadura militar. Tal aproximação
segue de forma tímida e reservada a mediada em que recrudescia a repressão
sociopolílica.
Estas eram as perspectivas profissionais que influíram na
reorganização política da categoria, que exigia uma renovação ético-política e
teórico-metodológica, a qual passou a ser contemplada paulatinamente na nova
agenda política do Serviço Social.
Para José Paulo Netto ( 1991; p. 303):
O esclarecimento cuidadoso da inserção da profissão na divisão
sóciotécnica do trabalho e sua localização na estrutura
sócioocupacional e a compreensão histórica da sua funcionalidade
no espaço das mediações entre classes e Estado redimensionam
36
Editorial de apresentação da Revista Serviço Social & Sociedade Nº 1, de 1979, elaborado pelo Conselho editorial formado
por: Aldaíza Sposati, José Pinheiro Cortez, Luiza Erundina de Souza, Mariângela Belfiore, Maria Carmelita Yazbek, Maria Lúcia
Martinelli, Mário da Costa Basbosa, Myrian Veras Baptista, Raquel Raichelis e Sergio Fuhrmann.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
76
amplamente o alcance e os limites da sua intervenção, bem como o
estatuto das suas técnicas, objetos e objetivos. Ou seja: a
renovação crítico analítica viabilizada pelo desenvolvimento teórico
da perspectiva da intenção da ruptura propicia novos aportes no
nível prático-operativo da profissão”.
a influência do pensamento de Gramsci para o Serviço
Social, é identifica a partir do final da década de 70. Sobre esta aproximação
destaca-se a obra de Simionatto
37
ao abordar as principais categorias de análise do
pensamento gramasciano e seus rebatimentos na história do Serviço Social
brasileiro.
Segundo Simionato (1991, p. 303):
Gramsci passa a ser um marco teórico significativo nas elaborações
do Serviço Social, O referencial gramsciano é buscado, inicilamente,
como possibilidade para pensar a atuação do assistente social
enquanto intelectual orgânico, marcando o seu compromisso com as
classes subalternas (...) as idéias de Gramsci passaram a
progressivamente a ser incorporadas pelo Serviço Social, abrindo
novas possibilidades para pensar seus referenciais teóricos e suas
ações interventivas. ( 1991; p. 303)
A sintonia do Serviço Social com seu tempo histórico também pode ser
observada no artigo assinado pelo Conselho Federal de Assistentes Sociais sob o
título Pela prática dos direitos sociais (1979, p.5). Neste artigo, dentre outros pontos,
a abordagem da democracia se faz em oposição à ditadura vigente, ao compreendê-
la como:
Antes de tudo, a democracia implica disputa, co-participação e
conquista. Trata-se de encontrar formas de autoridade que não se
baseiem na obediência cega, nem no pressuposto da auto-
regulação espontânea (...) A proposta da democracia pluralista e
militante é a alternativa que se contrapõe à arregimentação
37
A obra mencionada é: Gramsci: sua teoria, incidência no Brasil, influência no Serviço Social, cuja 3ª
edição foi publicada em 2004 pela Cortez e editora da UFSC.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
77
totalitária e à desintegração completa do sistema de valores gerado
pelo individualismo.
Os anos 80 e 90 para o Serviço Social são marcados por rupturas,
ressurgindo como uma categoria profissional que acompanha e passa a compor o
movimento social que luta por novas relações societárias. Atentos aos princípios e
ideários deflagrados nos diferentes países latino-americanos, a centralidade política
volta-se para o processo de redemocratização das relações sociais.
As rupturas no caso do Serviço Social envolvem os estigmas e práticas
repressivas/assistencialistas e as construções - através de concepções e práticas
libertadoras (com suas especificidades). Os pontos norteadores dos novos sujeitos
sociais correspondem a projeções políticas imbuídas de expectativas de
democratização da relação entre Estado e sociedade rumo à construção de uma
‘nova ordem societária’.
Convivendo dialeticamente, registram-se tensões, alastra-se por todo o
país a materialização das expectativas políticas de democratização a então
projetadas na recente história brasileira. Neste panorama de tensões e superações
é que a categoria profissional aprova em 1986 um Código de Ética Profissional que
reflete os avanços políticos, conforme expressa a resolução 273/93 do CFESS ao
apontar:
Conquistas e ganhos através de dois procedimentos: negação da
base filosófica tradicional, nitidamente conservadora, que norteava a
‘ética da neutralidade’, e afirmação de um novo perfil do técnico, não
mais um agente subalterno e apenas executivo, mas um profissional
competente teórica, técnica e politicamente. De fato, construía-se
um projeto profissional que, vinculado a um projeto social
radicalmente democrático, redimensionava a inserção do Serviço
Social na vida brasileira, compromissando-o com os interesses
históricos da massa da população trabalhadora.
A dimensão política da ação profissional do Serviço Social passa
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
78
a ter destaque, e é em torno desta que a categoria dos Assistentes Sociais em 1993
passa a revisar novamente o seu Código de Ética. Porém, essas revisões
processaram-se mediante a afirmação dos valores de liberdade e de justiça social
que permavam o Código de Ética de 1986.
É um movimento de ruptura e de projeções que se ancoram numa
concepção de mundo articulada com as prerrogativas democráticas como capazes
de explicitar e assegurar a liberdade e a eqüidade.
Considerando a inspiração no pensamento de gramsciano, se trata de
uma categoria (dos Assistentes Sociais) que pertence a “um determinado grupo,
precisamente o de todos os elementos sociais que compartilham um mesmo modo
de pensar e de agir.” .... “quando a concepção de mundo não é crítica e coerente,
mas ocasional e desagregada, pertencemos simultaneamente a uma multiplicidade
de homens-massa, nossa própria personalidade é compósita” (GRAMSCI, CC vol.I:
2006, p. 94)
Não se trata de um posicionamento unívoco no interiror da categoria
profissional, mas capaz de influir na direção da profissão, assim como no
redimensionamento dos elementos que incidem sobre a identidade profissional.
Em sintonia com os ‘personagens’ que compunham o cenário de lutas
e conquistas registradas na década de 80, os assistentes sociais inserem-se na
história através das entidades representativas da categoria, com especial destaque
para o conselho federal e os respectivos conselhos regionais dos assistentes
sociais.
Dentre as entidades de representação nacional da categoria
profissional da recente história do Serviço Social brasileiro, destacam-se o CFAS
Conselho Federal de Assistes Sociais, hoje, com a denominação de CFESS –
Conselho Federal de Serviço Social; ABESS Associação Brasileira de Escolas de
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
79
Serviço Social, atualmente ABEPSS Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa
em Serviço Social; a ANAS Associação Nacional dos Assistentes Sociais; o
CEDEPSS Centro de Documentação e Pesquisa em Políticas Sociais e Serviço
Social e, a ENESSO (denominação atual) Executiva Nacional dos Estudantes de
Serviço Social.
Coerentemente com o propósito do estudo em tela, destacam-se as
competências e eixos que vem norteando o conjunto CFESS/CRESS
38
. As
competências que integram o marco regulamentar da profissão Código de Ética
Profissional do Assistente Social de 1993, que em seu artigo 1º, refere-se a:
zelar pela observância dos princípios e diretrizes dês Código,
fiscalizando as ações dos Conselhos Regionais e a prática
exercida pelos profissionais, instituições e organizações na
área do Serviço Social
.
Para além do cumprimento com sua função jurídico-formal, estas
organizações da categoria profissional desenvolvem ações e instrumentais
compatíveis com as novas demandas sociais. Ações que se operam no cotidiano
profissional que contribuem com as perspectivas políticas asseguradas na
Constituição Federal de 1988 e suas respectivas regulamentações (LOAS, ECA,
SUS, dentre outras), assim como os fóruns populares.
Na década de 90, avançam as aproximações e nexos entre a agenda
sócio-profissional e o pensamento histórico-crítico de tradição marxista na produção
de conhecimento na área do Serviço Social.
Isto posto, compreende-se o direcionamento do projeto ético-político
profissional ao ser relacionado com as articulações e compromissos da categoria
38
Assim denominada a organização da categoria profissional que envolve o Conselho Federal de
Serviço Social e os Conselhos Regionais de Serviço Social. Mais do que uma nomenclatura esta
denominação institui o caráter democrático de debate de deliberação coletiva das questões de ordem,
administrativa, financeira, de organização e política da categoria profissional mediante os Encontros
anuais.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
80
com os movimentos sociais. São compromissos e agenda política que se colocam
para além daqueles inerentes aos espaços sócio-ocupacionais do assistente social.
Expõe a dimensão política da profissão como reflexo das determinações históricas e
seus aportes estruturais.
A década de 90, é, pois, marcada pelos antagonismos entre as lutas
pela democratização das relações sociais (e as conquistas formais neste campo) e o
reordenamento da sociedade capitalista (sob a égide do projeto neoliberal). As
entidades da categoria profissional (aqui mais especificamente o conjunto
CFESS/CRESS) diante deste paradoxo se motivada a realizar o enfrentamento à
desigualdade e às diferentes formas de apartação social e de discriminação
presentes entre os subalternos.
Neste ínterim, convivendo com as tensões e antagonismos que
marcam esta década, a categoria profissional vem construindo uma agenda ético-
política com proposições e a organização de ações asseguradoras da democracia
os amplos esforços neste sentido vinculam-se à compreensão de que somente nos
processos democráticos é possível viabilizar a liberdade e a eqüidade social.
É importante ter a clareza da origem histórica do Serviço Social para
qualificar a importância das revisões e rupturas que ocorrem a partir do Movimento
de Reconceituação na América Latina. Trata-se do rompimento com questões de
ordem ideológica, política e de práticas sociais que passam a permear posições e o
debate no interior da categoria profissional que se relacionam a organização de
novos projetos profissionais.
Esse movimento impulsionado por um grupo de Assistentes Sociais é
multifacetado e heterogêneo, mas tornou-se imprescindível para as alterações que
permeariam as novas tendências ético-políticas, teórico-metodológicas e técnico-
operativas no Serviço Social brasileiro.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
81
Tão heterogênea quanto plural, o conjunto da categoria insere-se
numa luta pela hegemonia. Tal diversidade expressa as diferentes influências de
ordem teórica e ideopolítica presentes na formação e prática profissional do
Assistente Social.
A recente história do Serviço Social brasileiro se sobressai pela sua
organização política e pelo protagonismo das entidades de representação da
categoria profissional movimentando-se na direção de um Serviço Social histórico
crítico que adentra o século XXI.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
82
3.2 - O Projeto Ético Político do Serviço Social e os indicativos de uma nova
identidade profissional.
Os fundamentos que se inscrevem historicamente na ética da vida
social, se relacionam, com os aspectos culturais, econômicos e políticos e e dão
sentido aos seus projetos societários. A abrangência e os rebatimentos sobre as
relações sociais presentes nos projetos societários repercutem sobre os projetos
profissionais, o que ocorre também com o projeto ético-político profissional do
Serviço Social.
É importante registrar que os projetos societários podem voltar-se para
a conservação das relações sociais presentes, assim como também podem pleitear
a transformação das mesmas. Neste sentido o Serviço Social impulsionado por
rupturas com sua ‘endogenia’, apresenta, nas palavras de Netto (1979, p.5):
conotações inerentes a um exercício profissional (e suas
representações) compatível com a modernidade: o reconhecimento
dos projetos societários diferenciados das classes e dos parceiros
sociais, a compreensão da dinâmica entre classes/sociedade
civil/Estado, a laicização do desempenho profissional, a assunção
da condição mercantilizada dos serviços prestados pelo profissional,
etc /.
Dentre os reflexos inerentes ao Movimento de Reconceituação,
sobressai a perspectiva de organização de um projeto ético-político em meados dos
anos 70. Projeto este que se consolida entre os anos 80 e 90, diante do permanente
debate no interior da categoria profissional e dos desafios postos pelas conjunturas
do país e pelas mutações do sistema capitalista.
José Paulo Netto (1996, p.116) escreve que:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
83
nas condições contemporâneas, uma categoria profissional jamais é
um bloco identitário ou homogêneo é sempre, sob todos os
prismas, um conjunto diferenciado e em movimento. Uma direção
consolidada é aquela que, sintonizada com as tendências sócio-
históricas mais significativas, circunscreve o espaço de
enfrentamento das diferenças em função de objetivos que se fazem
reconhecidos como legítimos e pertinentes; nessa ótica, aliás, é
apenas em face de uma direção determinada que as diferenças
profissionais adquirem sentido.
Os avanços promovidos pelo debate no interior da categoria
profissional, nos anos 80, consolidam o que Netto denomina a vertente de ruptura
com o conservadorismo, sinalizando a importância deste processo para as
conseqüentes alterações no campo ideológico, político, teórico e cultural da
profissão.
A mencionada ‘renovação’ do Serviço Social brasileiro no que tange
às orientações ética, política, teórica e metodológica, tem seu caminho marcado por
forte influência da perspectiva marxista. Essa mesma orientação, mais tarde
direcionará o projeto profissional ético-político.
Também cabe ressaltar a influência do pensamento de Gramsci, que,
para Maria Lúcia Barroco (2001, p. 170/171), contribui para a recuperação da “ação
educativa em outras bases, agora não se trata de ação ‘basista’, mas de uma
dimensão da atividade profissional pensada nos moldes do intelectual gramsciano”
Para o entendimento do significado da ética, os estudos de Barroco
(CPIHTS, 2007, p.03/03)
sinalizam:
ética se objetiva como reflexão teórica e ação prática. Como
reflexão teórica, nos chama a indagar filosoficamente sobre o valor
das ações; reflete criticamente sobre o significado histórico do agir
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
84
humano e sobre os fundamentos objetivos dos valores e princípios
que orientam a prática social dos homens. Trata-se de um saber
interessado; portanto, de um conhecimento que nega a neutralidade
da ciência, exigindo um posicionamento ético do pesquisador, pois
conhecemos objetivando um produto que seja valoroso para
determinado projeto que desejamos que realize com nossa ação
Pensar a ética profissional implica ainda, de acordo com o pensamento
de Maria Lúcia Barroco (2001, p.67):
um modo particular de objetivação da vida ética. Suas
particularidades se inscrevem na relação entre o conjunto complexo
de necessidades que legitimam a profissão na divisão sóciotécnica
do trabalho, conferindo-lhe determinadas demandas, e suas
respostas específicas, entendidas em sua dimensão teleológica e
em face das implicações ético-políticas do produto concreto de sua
ação.
Em sintonia com as circunstâncias históricas e sociais no campo
minado de conflitos, da ampliação das desigualdades sociais, das tensões e do
permanete debate, que se vincula a ética profissional refuta a idéia de seu caráter
estático.
Os estudos apresentados na primeira seção desta tese demonstram
que nos anos 80 consolidava-se o processo de redemocratização na sociedade
brasileira, o que contribuia objetivamente para um ‘ambiente’ de maturação ideo-
política e téorico-metodológica no Serviço Social.
Cenário social em que se registram tanto as atividades políticas,
expressas pelas entidades da categoria profissional, quanto no campo acadêmico,
com os significativos avanços em estudos (publicações) e revisões curriculares que
passam a incorporar as novas orientações teórica-metodológicas e ético-políticas.
Maria Carmelita Yazbek (2007, p.7/8) analisa os desafios da profissão
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
85
diante dos impactos e da estrutura social, conforme segue :
É inserido neste contexto, desafiado pelas mudanças em
andamento, convivendo cotidianamente com a violência da pobreza
e com as incontáveis faces da exclusão social, que o assistente
social brasileiro trava o embate a que se propõe: o de avançar em
seu projeto ético político na direção de uma sociabilidade mais justa,
mais igualitária e onde direitos sociais sejam observados..
Tal processo foi adensado pelo Serviço Social na década de 80,
repercutindo na aprovação do Código de Ética de 1986, que, a princípio, revelava
um avanço para o momento histórico, pois, inseria a categoria profissional nas
discussões éticas contemporâneas fortemente marcados por três dimensões
negação da neutralidade; negação dos pressupostos idealistas; negação do papel
profissional tradicional.
Para Barroco a existência de um “Código de Ética representa uma
exigência legal de regulamentação formal da profissão, e como tal, é um instrumento
específico de explicitação de deveres e direitos profissionais, ou seja, refere-se a
uma necessidade formal de legislar sobre comportamento dos profissionais” (199, p.
82) Serviço Social e Ética.
É nesse sentido que ao apresentar o novo Código de Ética Profissional
dos Assistentes Sociais, aprovado em março de 1993, o Conselho Federal de
Assistentes Sociais CFAS (1986) destaca que o antigo código
39
não mais refletia
os interesses da categoria e as exigências da sociedade” (1986, p.5). Esse novo
Código expressava a necessidade de colocar o Serviço Social em sintonia com as
alterações sociais, e considerar as profundas modificações porque passa a
sociedade brasileira no atual momento histórico” (1986, p.5).
Este mesmo texto, do CFAS (1986, p.7), enfatiza que:
39
Código de Ética profissional do Assistente Social que vigorou entre 1986 e 1993.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
86
a categoria dos Assistentes Sociais passa a exigir também uma
nova ética que refleta uma vontade coletiva, superando a
perspectiva ahistórica e acrítica, onde os valores são tidos como
universais e acima dos interesses de classe. A nova ética é
resultados da inserção da categoria nas lutas da classe trabalhadora
e, consequentemente, de uma visão da sociedade brasileira. Neste
sentido, a categoria através de suas organizações fazem uma opção
clara por uma prática profissional vinculada aos interesses desta
classe.
Estes posicionamentos inserem-se como princípios e diretrizes
norteadores da prática profissional, expressos no Código de Ética Profissional dos
Assistentes Sociais, aprovado pelo Conselho Federal de Assistentes Sociais
CFAS, como estabelece a resolução 195/86 em 09 de maio deste mesmo
Conselho.
Este Código de Ética apresenta, portanto, significativos avanços na
constrção de um projeto profissional já com o delineamento de princípios ético
definidos, pois, demarcava a existência de projetos societários diferenciados e
explicitava o vínculo da categoria profissional ao projeto de sociedade que
contemplava os interesses da classe trabalhadora.
Logo após sua aprovação, estudos e o debate no interior do Serviço
Social demonstraram que o conteúdo expresso no Código de Ética apresentava uma
visão unilateral das relações sociais, bem como lacunas quanto às disposições
normativas. Tal percepção apontava para a necessidade de novas revisões no
Código vigente com a finalidade de realinhar a ética profissional seus princípios e
normas, às demandas sociais.
Novas proposições que passam a compor o projeto ético-político
profissional, expresso a partir do Código de Ética, porém, sem se restringir a ele.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
87
Trata-se de um realinhamento histórico onde “cabe compreender o
ethos profissional como um modo de ser construído a partir das necessidades
sociais inscritas nas demandas postas historicamente à profissão e nas respostas
ético-morais dadas por ela nas várias dimensões que compõem a ética profissional”
(BARROCO, 2001, p. 69).
Em meio às transformações sociais pautadas pelo neoliberalismo e
pela mundialização da economia, que provocam a agudização da questão social, é
que o Serviço Social brasileiro desencadeou o processo de discussão e revisão do
código de ética profissional e seu respectivo projeto ético-político profissional.
A organização de um projeto profissional, com bases democráticas, é
fruto de debates e reflexões no interior da categoria profissional, veiculados através
de suas instâncias de representação. No caso do Serviço Social, estas instâncias de
representação são principalmente o conjunto CFESS/CRESS, ABEPSS, ENESSO e
os sindicatos e Associações dos Assistentes Sociais.
Estas instâncias refletem a heterogeneidade inerente à diversidade de
expectativas e experiências e de posições políticas, teóricas e ideológicas dos
sujeitos individuais que compõe a categoria profissional.
Esses posicionamentos políticos dos sujeitos se aproximam do que
Gramsci (CC. 2006, 23) considera como ‘intelectuais orgânicos’, pois possuem a
grande função político-social, que a mediação profissional dificilmente se separa
da mediação política.
Diante do cenário histórico que envolve o surgimento e o
desenvolvimento do Serviço Social, emergem características dos sujeitos que o
compõem ao ser construído um projeto profissional, pautado em bases
democráticas.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
88
Maria Lùcia Barroco, em recente estudo que trata da ética vinculada ao
projeto profissional em sua dimensão crítica, assinala “a complexidade da ética
profissional, que impede de tratá-la apenas em sua formalização no Código de Ética
( 2001, p. 18).
O estudo da temática ‘projeto ético-político profissional’ se relaciona
com o movimento dialético que se encontra no contexto societário, em suas
dimensões econômica, política e cultural, sinalizando alternativas de respostas às
necessidades sociais.
De acordo com a concepção exposta por José Paulo Netto (1999, p.
95):
os projetos profissionais apresentam a auto-imagem de uma
profissão, elegem os valores que a legitimam socialmente, delimitam
e priorizam os seus objetivos e funções, formulam os requisitos
(teóricos, institucionais e prático) para o seu exercício, prescrevem
normas para o comportamento dos profissionais e estabelecem as
balizas da sua relação com os usuários de seus serviços, com as
outras profissões e com as organizações e instituições sociais,
privadas e públicas).
É um projeto profissional que expressa uma nova identidade da
profissão, analisada por Maria Lúcia Martinelli ao referir-se ao caráter coletivo da
construção do mesmo
Ao se construir um projeto profissional, pautado em bases
democráticas (pois as vivências em sua elaboração assim se expressam), este não
se apresenta unívoco em seus fundamentos e princípios. Este passa a refletir a
história da vida em sociedade e a prática profissional dos sujeitos que o compõem.
Cabe destacar que JoPaulo Netto (1999, p. 96) explicava esta
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
89
realidade ao afirmar que “toda a categoria profissional é um campo de tensões e de
lutas. A afirmação no seu interior, de um projeto profissional não suprime as
divergências e as contradições”.
Paralelamente às tensões inerentes a toda categoria profissional, as
análises aqui presente convergem com a perspectiva que considera “o Código de
Ética nos indica um rumo ético-político, um horizonte para o exercício profissional”
(IAMAMOTO, 1998; 77).
O projeto ético-político profissional do Serviço Social é um importante
instrumento balizador da ação profissional comprometida com a defesa e efetivação
de direitos. Seus princípios abordam a dialeticidade do exercício profissional, como
forma de colocá-lo em sintonia com a realidade social. Esta dialeticidade torna-se
importante de acordo com a reflexões de Maria Líca Martinelli (2004) ao apontar que
toda prática social que realizamos é teoria em movimento. Estabelecer uma nova
relação com a profissão é um ato político que movimenta saberes e uma nova
relação entre profissionais
40
.
Passa-se abordar o enfoque de Maria Carmalita Yazbek (2007),
expresso em seu estudo O Serviço Social na contemporaneidade, visto que a
autora aponta elementos que impulsionaram a construção do atual projeto
profissional, dos quais destacam-se:
- A busca de ruptura com o histórico conservadorismo no
pensamento e na ação profissional, na perspectiva de comprometer
a profissão com os interesses e necessidades dos usuários.
- O avanço de sua produção de conhecimentos sobretudo com o
desenvolvimento da pós graduação em Serviço Social no país. (...) o
Serviço Social brasileiro desenvolveu-se na pesquisa acerca da
natureza de sua intervenção, de seus procedimentos, de sua
formação, de sua história e sobretudo acerca da realidade social,
40
Material de aula referente à disciplina Serviço Social: identidade e contemporaneidade, 2º semestre
de 2004, ministrada pela Profª Marila Lúcia Martinelli, no Programa de Estudos Pós Graduados em
Serviço Social – PUC/SP.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
90
política, econômica e cultural onde se insere como profissão na
divisão social e técnica do trabalho. Avançou na compreensão do
Estado capitalista, das políticas sociais, dos movimentos sociais, do
poder local, dos direitos sociais, da cidadania, da democracia, do
processo de trabalho, da realidade institucional e de outros temas. -
- O debate sobre a formação profissional e a reforma curricular
desencadeada e acompanhada pela Associação Brasileira de
Ensino de Serviço Social - ABESS que impulsionou a revisão
curricular de 1982 e as atuais Diretrizes Curriculares (1998) que
apontam como direção da formação profissional a capacitação do
aluno para:- a apreensão crítica do processo histórico como
totalidade; - a investigação sobre a formação histórica e os
processos sociais contemporâneos que conformam a sociedade
brasileira, no sentido de apreender as particularidades da
constituição e desenvolvimento do capitalismo e do Serviço Social
no país.
- A Lei de Regulamentação da Profissão (Lei 8662 de 07/06/93
que dispõe sobre o exercício profissional, suas competências, suas
atribuições privativas e os fóruns que objetivam disciplinar e
defender o exercício da profissão - o Conselho Federal de Serviço
Social e os Conselhos Regionais de Serviço Social que
acompanham e fiscalizam o exercício profissional.
- O Código de Ética aprovado em 13 de março de 1993 pela
resolução do CFESS formação do assistente social é realizada
em curso superior de graduação em 273/93 que define para o
assistente social seus princípios éticos fundamentais. Os
indiscutíveis a avanços deste Código, que além dos princípios éticos
fundamentais, apresenta os direitos, deveres e impedimentos ético-
legais do trabalho do assistente social, expressam o acúmulo do
debate profissional dos últimos 20 anos do Serviço Social
brasileiro”. (2007; p. 10-12)
Ao pautar o projeto ético-político profissional do Serviço Social, coloca-
se em evidência o Código de Ética profissional do Assistente Social, aprovado
mediante Resolução do CFESS número 273 de 13 de março de 1993, através dos
‘princípios fundamentais’ que balizam o referido Código.
São esses princípios:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
91
Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das
demandas políticas a ela inerentes - autonomia, emancipação e
plena expansão dos indivíduos sociais;
Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do
autoritarismo;
Ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa
primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos
civis, sociais e políticos das classes trabalhadoras;
Defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização
da participação política e da riqueza socialmente produzida;
Posicionamento em favor da eqüidade e justiça social, que assegure
universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos
programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática;
Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito,
incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos
socialmente discriminados e à discussão das diferenças;
Garantia do pluralismo, através do respeito às correntes
profissionais democráticas existentes e suas expressões teóricas, e
compromisso com o constante aprimoramento intelectual;
Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de
construção de uma nova ordem societária, sem dominação -
exploração de classe, etnia e gênero;
Articulação com os movimentos de outras categorias profissionais
que partilhem dos princípios deste código e com a luta geral dos
trabalhadores;
Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população
e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência
profissional;
Exercício do Serviço Social sem ser discriminado, nem discriminar,
religião, nacionalidade, opção sexual, idade e condição física.
O entendimento aqui exposto refere-se ao elenco dos princípios
filosóficos que fundamentam a ética profissional do Serviço Social, que para Paiva &
Sales (1998, p.181):
não podem ser analisados e tratados isoladamente, porque foram
elaborados dentro de uma lógica que os articula. (...) Isto porque os
princípios que compõem o Código de Ética de 1993 tem coerência e
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
92
encadeamento internos, complementando-se entre si, o que
acrescenta dialeticidade a cada um novos sentidos e proposições.
Na análise desses princípios destacam-se signos que sinalizam as
percepções filosóficas de mundo, que na acepção de Gramsci sobre filosofia
envolve “tomar as coisas com filosofia”, no sentido de “convite à reflexão”, à “tomada
de consciência de que aquilo que acontece é, no fundo, racional, e que assim deve
ser enfrentado” (CC 11, Vol 1: 2006, p.98)
Considerando-se estes signos, iniciam-se pela abordagem da
liberdade como núcleo central do projeto ético-político, pois contempla o
compromisso emancipatório dos indivíduos sociais, com a negativa de suas
diferentes formas de autoritarismo e arbítrio.
Sob este prisma, recorre-se a Gramsci ao escrever que a:
liberdade significa apenas ‘movimento’, desenvolvimento e dialética
(...) a história é liberdade enquanto é luta entre liberdade e a
autoridade, entre revolução e conservação, luta na qual a liberdade
e a revolução continuamente prevalecem sobre a autoridade e a
conservação (CC 10; Vol. I, p. 300).
Para a compreensão desta centralidade da liberdade no projeto ético
político do Serviço Social, cabe pensá-la a partir da compreensão de homem. Para
esta compreensão recorre-se a Gramsci (CC 10, Vol. I, p. 405/6), pois:
concebe o homem como um conjunto das relações sociais (...) o
homem é também o conjunto das suas condições de vida, pode-se
medir quantitativamente a diferença entre o passado e o presente, já
que é possível medir a medida em que o homem domina a natureza
e o acaso. A possibilidade não é a realidade, mas é, também ela,
uma realidade: que o homem possa ou não possa fazer determinada
coisa, isto tem importância na avaliação daquilo que realmente se
faz. Possibilidade quer dizer ‘liberdade’. A medida das liberdades
entra no conceito de homem.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
93
Os apontamentos de Marx
(1981, p. 29)
remetem ao pensamento do/a
homem/mulher como sujeito da história, capaz de auto-determinar-se, criar suas
próprias leis, ser universal, consciente, pertencente ao gênero humano. Em ‘A
ideologia alemã’, apresenta a percepção de que:
a produção das idéias, representações, da consciência está a princípio
directamente entrelaçada com a actividade material e o intercâmbio
material dos homens, linguagem da vida real [...] os homens são os
produtores das suas representações, idéias, etc. [...[ a consciência nunca
pode ser outra coisa senão o ser consciente, e o ser dos homens é o seu
processo real de vida”.
O pensamento com bases histórica e materialista, reporta a reprodução
do ser social, que se faz através do próprio homem/mulher. Assim, tudo o que diz
respeito ao homem deve ser analisado aqui, historicamente, a partir da percepção
do real. Tudo o que se quiser investigar está pautado na história sem recorrer ao
transcendente.
A liberdade se torna um valor mediante a possibilidade dos homens de
se conscientizarem da sua capacidade. Capacidade de realizar escolhas entre
alternativas viáveis com o propósito de responder às suas necessidades. Não
escolha sem as alternativas e somente se têm alternativas se o homem/mulher
constituí-las. A liberdade é condição ontológica da existência do/a homem/mulher
41
.
A abordagem do signo da defesa intransigente dos diretos humanos
remete à percepção gramsciana (1990, p. 159) ao dizer que:
41
Material de aula referente à disciplina Fundamentos filosóficos e questões de método nas ciências
sociais, 1º semestre de 2002, ministrada pelo Prof. José Paulo Netto, no Programa de Estudos Pós
Graduados em Serviço Social – PUC/SP.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
94
A intransigência é uma atributo necessário do caráter. É a única
prova de que uma determinada coletividade existe como organismo
social vivo, isto é, tem um objetivo, uma vontade única, uma
maturidade de pensamento. Pois a intransigência exige que cada
parte em separado seja coerente com o todo, que cada momento da
vida social seja harmonicamente preestabelecido, que tudo tenha
sido pensado. Isto é, exige princípios gerais, claros e distintos e que
tudo que seja feito dependa necessariamente deles.
Ao se consederar esta concepção de Gramsci, trata-se, pois, de um
disciplinamento por parte do organismo social que corresponde às certezas quanto
aos objetivos e vontades coletivas diante da realidade.
Em relação à intransigência o que se expõe são os níveis de não
aceitação aos procedimentos equivocados para a consecução dos propósitos da
vida em sociedade. Isto significa reforçar os objetivos construídos coletivamente
(enquanto classe) e ‘não permitir que sejam adotados para alcançar um objetivo
meios não adequados ao objetivo e de natureza do objetivo” (GRAMSCI, 1990, p.
159).
Dentre este mesmo princípio outros signos podem ser destacados:
diretos humanos, que reporta à articulação entre os direitos e a cidadania, São
signos assinalados como forma de assegurar ao homem a condição de sujeito social
e político.
Direitos na sociedade capitalista, implica avanços nos marcos da
sociabilidade. Nesses marcos considera-se imprescindível a existência de uma
íntima relação entre a conquista e a consolidação de direitos a qual se relaciona, por
sua vez aos direcionamentos econômicos, históricos, culturais e políticos,
compondo uma totalidade de relações que corresponde à estrutura e à conjuntura
social.
Um outro signo a ser discutido é a democracia a qual se aproxima
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
95
inevitavelmente do entendimento de justiça social, e eqüidade de acesso, de
participação, de usufruto e de produção dos bens e serviços gerados pela
sociedade. Nesse sentido, Chauí considera que "a questão democrática implica,
pois, criar condições para que o cidadão seja soberano e interfira realmente nas
decisões sociais e econômicas através dos órgãos de decisão política" (1993 :194)
Também Carlos Nelson Coutinho (1997, p. 146) relaciona a cidadania
à democracia e ao acesso aos bens construídos pela sociedade:
Um dos conceitos que melhor expressa essa reabsorção dos bens
sociais pelo conjunto dos cidadãos – que melhor expressa, portanto,
a democracia é precisamente o conceito de cidadania. Cidadania
é a capacidade conquistada por alguns indivíduos, ou (no caso de
uma democracia efetiva) por todos os indivíduos, de se apropriarem
dos bens socialmente criados, de atualizarem todas as
potencialidades de realização humana abertas a vida social em cada
contexto historicamente determinado”.
Marcante é o posicionamento em favor da eqüidade e da justiça social.
Não se pode conceber uma sociedade democrática sem a consolidação da
cidadania e do acesso aos direitos, sem que se estenda ao acesso aos bens e
serviços e a noção de interesse público.
Em meio a relação contraditória entre as imposições do capital e as
demandas sociais, Coutinho (1997, p. 148) aponta que:
Os direitos são fenômenos sociais, resultados da história. As
demandas sociais, que prefiguramos direitos, só são satisfeitas
quando assumidas nas e pelas instituições que asseguram uma
legalidade positiva.
Neste sentido, Coutinho (1997, p. 146) escreve que:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
96
Sublinho a expressão historicamente porque me parece fundamental
ressaltar o fato de que soberania popular, democracia e cidadania
devem sempre ser pensadas como processos eminentemente
históricos .
Inspirado no pensamento gramsciano, Coutinho analisa a ‘política’ em
sua acepção “ampla”, pois ambas identificam-se e somam-se à “universalidade”,
assim como “com toda forma de práxis que supera a mera recepção passiva ou
manipulação de dados imediatos e se orienta conscientemente para a totalidade das
relações subjetivas e objetivas”(1992, p. 53).
Ao incorporar a participação política no projeto ético-político
profissional, há uma profunda relação desta com a construção de processos
democráticos.
Os processos democráticos das relações sociais, envolvem
contradições, conflitos e tensões sistemáticas, posto que é palco de disputa nas
relações de poder . O avanço democrático concorre para a sua concretização
mediante a real participação política que alastra-se entre os processos de produção
cultural, política e econômica. Para Vieira, a “sociedade democrática é aquela na
qual ocorre real participação de todos os indivíduos nos mecanismos de controle de
decisões, havendo, portanto, real participação deles nos rendimentos de produção”
(2004, p. 134).
A participação política se traduz na defesa da democracia, assim
como na gestão democrática de programas e políticas sociais.
Coerentemente com os invólucros do referido projeto (marcado pela
relação com a história de seu tempo e as respectivas transformações societárias),
vislumbra-se a participação política como parte de um caminho que combina
consciência política e prática social, articulada com os diferentes grupos sociais.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
97
Ratifica-se esta abordagem, mediante o pensamento de Marco Aurélio
Nogueira (2004, p. 133), pois:
Por intermédio da participação política, indivíduos e grupos
interferem para fazer com que diferenças e interesses explicitem
num terreno comum organizado por leis e instituições, bem como
para fazer com que se democratize e seja compartilhado. É essa
participação, em suma, que consolida, protege e dinamiza a
cidadania e todos os variados direitos humanos.
O projeto ético-político demarca de forma contundente o compromisso
com a construção de uma nova ordem societária, ou seja, com um outro signo,
que é a ruptura com o domínio e hegemonia burguesa imposto ao conjunto da
sociedade.
É o caminho proposto por Gramsci quando se refere a uma nova
hegemonia, a uma guerra de posição, pela mudança cultural, pelos movimentos
moleculares no âmbito da sociedade civil.
Discorrendo sobre esses aspectos na produção do pensador italiano,
Simionatto (1997) escreve que:
Cultura e política aparecem aqui como questões inseparáveis, pois
cultura é, para Gramsci, um dos instrumentos da práxis política,
sendo esta, justamente, a via que pode propiciar às massas uma
consciência criadora de história, de instituições, fundadora de novos
Estados.
Trata-se, também, de uma ‘batalha cultural’, fruto da ‘luta pela
hegemonia’ por parte das classes subalternas, de forma a ‘participar da formação de
uma nova concepção de mundo, de elaborar uma proposta transformadora de
sociedade a partir de “baixo”’ ( SIMIONATTO, 2004, p.50).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
98
É esse compromisso que explicita um posicionamento ético-político
demarcado, comprometido com as necessárias rupturas, partindo da compreensão
de que os profissionais de Serviço Social assumem sua contribuição para a
conquista de uma consciência superior, com valor histórico e apreensão de direitos e
deveres, tal qual o pensamento gramsciano (1989, p.58/59):
Significa que toda revolução foi precedida por um intenso e
continuado trabalho de crítica, de penetração cultural, de
impregnação de idéias em agregados de homens que erma
refratários e que só pensavam em resolver por si mesmos, dia a dia,
hora a hora, seus próprios problemas econômicos e políticos, sem
vínculos de solidariedade com os que encontravam na mesma
situação.
É na construção dessa nova ordem societária que se situa o
entendimento de ‘grande política’, conforme aborda Coutinho ( 2003, p. 72), citando
Gramsci quando diz que: “pretende criar novas relações de força e por isso, não
pode deixar de se ocupar com o ‘dever ser’ não entendido evidentemente em
sentido moralista” (CC, 3, 35) é o momento da afirmação da teleologia, da
liberdade.
Em conformidade com o exposto nesta seção, relacionado aos ‘signos’
que compõem o projeto ético-político profissional do Serviço Social - liberdade;
democracia; direitos; cidadania; participação política e uma nova ordem societária -
compreende-se a posição explicitada no Código de Ética Profissional do Assistente
Social referente à eliminação das diferentes formas de preconceito e o respeito à
diversidade, assim como a necessária articulação com os movimentos sociais.
Maria Lúcia Barroco
(2001, p. 206)
assinala que o Código de Ética:
contribui para o processo contraditório de construção de uma
nova moralidade profissional direcionada socialmente para a
ruptura com o conservadorismo e para a construção de uma
nova cultura profissional democrática que colide com a
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
99
hegemonia política do capital.
A atividade profissional permeada pelo conteúdo ético-político exposto,
considera a confluência das vontades moleculares, interagindo para a construção de
uma vontade coletiva pautada em interesses universais.
O digo de Ética delineia, dessa forma, uma identidade profissional,
claramente vinculada às necessidades e aos interesses da classe trabalhadora.
Na definição de Martinelli (2001, p. 11), a identidade “é construída no
cenário público, na vida cotidiana, juntamente com os movimentos sociais, com as
pessoas com as quais trabalhamos”. A autora enfatiza que a temática identidade
relaciona-se intrinsecamente com a recuperação “da centralidade do humano, do
reconhecer os sujeitos sociais com os quais atuamos como legítimos construtores da
prática profissional”.
Em consonância com as reflexões teóricas aqui apresentadas, pensar
a identidade profissional na contemporaneidade implica visualizá-la articulada às
“práticas sociais que tenham na consolidação da democracia e no fortalecimento da
cidadania a sua busca fundante ( MARTINELLI, 1998, p.146).
O projeto que inaugura essa nova identidade profissional, fortemente
vinculada à ação política no âmbito das práticas sociais. Propõe a transformação do
‘homem massa em ‘homem coletivo’, e também que a categoria profissional
associa-se às lutas coletivas mais amplas combatendo a ordem capitalista.
Homem que está carregado da dinâmica da sociedade, do seu tempo,
apreendendo as determinações dos fenômenos que a circundam. Ser histórico não
constitui apenas saber sobre a existência do fenômeno e de suas determinações,
mas também recorrer à gênese destes fenômenos, ou seja, as determinações
fundantes. Não basta acompanhar sua constituição histórica, é preciso identificar
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
100
sua processualidade.
Voltando ao pensamento de Gramsci, refletir sobre a construção da
identidade profissional exige a importância da unidade entre teoria e prática, entre o
pensar e o agir em meio a um processo dialético que envolve a realidade
(SIMIONATTO, 2001, p.238).
Essa proposta que apresenta uma nova identidade profissional,
correlata ao que já colocara Gramsci (2006, CC. 2 p.53), quando refletira que:
O modo de ser do novo intelectual não pode mais consistir na
eloqüência, motor exterior e momentâneo dos afetos e das paixões,
mas numa inserção ativa na vida prática, como construtor,
organizador, ‘persuasor permanente’, já que não apenas orador puro
mas superior ao espírito matemático abstrato; da técnica-trabalho,
chega à técnica-ciência e à concepção humanista histórica, sem a
qual permanece ‘especialista’ e não se torna ‘dirigente’
(especialista+político)
O projeto ético-político profissional é fruto de um Serviço Social
‘consolidado e maduro’
42
, apresenta a auto imagem da profissão, indica seus rumos
ético-políticos, também vincula-se a posições ideopolíticas e de reconhecimento
social, que cotidianamente são expressos mediante as práticas sociais.
42
De acordo com Yazbek “é fundamental assinalar que as transformações societárias dos anos mais recentes vão encontrar
um Serviço Social consolidado e maduro na sociedade brasileira, uma profissão com avanços e acúmulos, que, ao longo da
última década construiu, com ativa participação da categoria profissional, através de suas entidades representativas um projeto
ético político profissional para o Serviço Social brasileiro” (2007; p.8
).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
101
IV. A INTERFACE ENTRE O PROJETO ÉTICO-POLÍTICO DO SERVIÇO
SOCIAL E A DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE
4.1 – As deliberações dos Encontros Nacionais CFESS/CRESS: aproximações
e contribuições para a defesa e consolidação dos direitos.
As análises que ora se apresentam, expressam o reflexo do interesse
investigativo em associar a prática e posicionamento profissional à militância política
referente à defesa dos direitos de crianças e de adolescentes.
Contudo, faz-se necessário, alguns apontamentos complementares
acerca da contextualização do objeto e do desenvolvimento do estudo em tela.
Diante do estudo desenvolvido na seção III desta tese, foi possível
constatar que a organização do projeto ético-político do Serviço Social está pautado
em novas concepções e posicionamentos, novos instrumentos e práticas frente às
atuais demandas sociais. Uma prática profissional que venha desencadear a
necessária transformação social.
Os estudos e análises dos relatórios dos Encontros Nacionais
CFESS/CRESS centram-se no caráter deliberativo por parte do conjunto dos
assistentes sociais que participavam destes Encontros. Deliberações que passam a
explicitar posicionamentos políticos frente a defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes.
A ênfase ao processo deliberativo que permeiam os Encontros
Nacionais CFESS/CRESS se deve à compreensão de que “as deliberações
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
102
estabelecidas coletivamente devem ser racionais”. Aqui também está presente o
conhecimento e a crítica da realidade e a convicção de que este processo exige que
“os componentes da coletividade devem colocar-se de acordo entre si, discutir entre
si”, considerando que “cada elemento de verdade, que cada um pode trazer deve
sintetizar-se na verdade complexa e deve ser a expressão integral da razão”. Este é
um exercício relacional que pressupõe “discussão plena e sincera” donde se faz
necessária “a máxima tolerância”. (GRAMSCI, 1990, p.160).
O desenvolvimento deste e as respectivas análises, são apresentados
concomitantemente à transcrição de extratos dos relatórios dos Encontros Nacionais
do conjunto CFESS/CRESS. as Cartas deliberadas durante os Encontros
Nacionais, são apresentadas na íntegra, considerando que nelas estão impressas
uma cadeia de exposição lógica e de conteúdo político de difícil recorte.
Para proceder às análises que se relacionam à interface entre o projeto
ético-político profissional do Serviço Social e as políticas de direitos da criança e do
adolescente, este estudo passa a focalizar os relatórios dos Encontros Nacionais do
conjunto CFESS/CRESS e suas deliberações – em ordem cronológica sempre que o
conteúdo contemple deliberação sobre a defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes. Dentre os 13 Encontros Nacionais CFESS/CRES e seus respectivos
relatórios, 11 apresentam deliberações relacionadas ao objeto de estudo desta tese.
Com caráter ilustrativo e de aproximação do conteúdo que corresponde
aos princípios fundamentais constantes no Código de Ética, precede a abordagem
dos relatórios recortes do cartaz “Código de Ética do(a) Assistente Social 15 anos
de avanços no campo da ética e da defesados direitos humanos” recentemente
publicado pelo CFESS (2008).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
103
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
104
4.1.1 – XXII Encontro Nacional CFESS/CRESS - 1993
O XXII Encontro Nacional do conjunto CFESS/CRESS foi realizado em
Belo Horizonte, em outubro de 1993, sob a égide do Código de Ética em vigência
desde março desde mesmo ano. Este é um período em que a movimentação no
interior da categoria, dirigia-se às discussões que refletiam a recente aprovação do
Código de Ética profissional do Assistente Social. Porém, estas demandas internas
não impediram a atenção à conjuntura do país, e a incorporação, na agenda de
discussões e de deliberações, dos temas relacionados à conjuntura nacional.
Esta conjuntura era marcada pela movimentação política da classe
dirigente que se centrava na alteração do texto constitucional para alinhar-se ao
projeto neoliberal
43
.
No texto deliberativo que segue, o Conjunto CFESS/CRESS determina
a:
Participação enquanto trabalhadores das mobilizações e atividades
chamadas pela CUT e que o CFESS continue afirmando sua
posição nos fóruns contra a revisão constitucional. (
Relatório de XXII
Encontro Nacional CFESS/CRESS: BH, 1993)
Este é um posicionamento político que ratifica o princípio que
fundamenta o atual Código de Ética profissional do Assistente Social ao contemplar
a articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que partilhem
dos princípios do referido Código e com a luta geral dos trabalhadores. Também é
possível relacionar com o pensamento gramsciano ao propor o a articulação de um
projeto coletivo de sociedade, onde consta a necessidade da superação de práticas
corporativas.
43
Para o estudo e compreensão do neoliberalismo recomenda-se a leitura da obra “Pós-neoliberalismo: as
políticas sociais e o Estado Democrático”, que tem dentre seus organizadores Emir Sader e Pablo Gentili, Paz e
Terra, 1995, RJ.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
105
O texto que segue expressa a abordagem de Simionatto, citando o
pensamento de Gramsci, ao se referir à questão que envolve a ruptura com o
corporativismo e construção de um projeto coletivo:
Gramsci insiste na necessidade de que as classes sociais
abandonem o seu modo de pensar corporativo, produto das
relações sociais e do modo de ser próprio da sociedade burguesa,
que obstaculiza a formação de um projeto coletivo. A construção da
hegemonia exige, assim, compromissos de classe, superação de
interesses particularistas e individuais, abertura de espaços para
congregar as várias frações de classe. A partir da superação desse
modo de ser e de pensar, a vontade coletiva avança e vai
delineando uma nova consciência, que se manifesta e se concretiza
na prática política.
in http://www.acessa.com/gramsci/?page 4/5/2008
18:52
Este é um período em que as práticas governamentais eram marcadas
pelo discurso modernizante de combate à corrupção e à promoção do
desenvolvimento do país. Para tanto, eram necessários os ajustes propostos pelo
neoliberalismo de abertura do mercado externo e do pretendido Estado mínimo.
Imputava-se à estrutura do Estado a responsabilidade pelo agravamento da crise
econômica e social. Na ótica governamental, a Constituição Federal de 1988, e os
direitos nela preconizados são tratados como um entrave à governabilidade.
Quanto à organização do Estado, passava a exigir ações contundentes
demonstrando, no entender de Oliveira:
(...) o reconhecimento de que o avanço de novas formas de
sociabilidade punham em xeque a dominação inconteste do Estado
pela burguesia. Tratava-se de liquidar um Estado cuja formação
contraditória estava acolhendo o peso cada vez maior das classes
dominadas através da institucionalização de espaços públicos , que
jogavam para o lixo as práticas populistas de privatização do
público, tendo liquidado a pretensão autoritária de completa
despolitização da economia e privatização da política”. (1990:11).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
106
De acordo com Hobsbawm, este período que circunda os anos 90 e
93, é marcado pela ‘depressão’ do mundo capitalista desenvolvido, pois, apresenta
incertezas diante dos desafios postos pela pobreza, pelo excedente de mão de obra,
pelas economias centradas nos mercados financeiros, e pelo avanço tecnológico,
distantes da dignidade humana .
Eric Hobsbawm (1995, p.398) escreve que:
Ninguém sabia ao certo o que fazer em relação aos caprichos da
economia mundial, nem possuía instrumentos para administrá-la. O
grande instrumento para fazer isso na Era de Ouro, a política de
governo, coordenada nacional e internacionalmente, não funcionava
mais. As Décadas de Crise foram a era em que os esatados
nacionais e internacionais perderam seus poderes econômicos”
Na área da infância e da adolescência, neste mesmo período, verifica-
se uma pulverização de programas que se apresentam dispersos e descontínuos,
sem a capacidade de articular parcerias e de dar cunho prático aos direitos previstos
no ECA. Sobre este aspecto, Freitas (2004, p.262)
44
, faz uma importante observação
ao realizar estudo sobre o orçamento criança no governo Fernando Henrique
Cardoso, abordando a ‘coordenação fraca, fragmentada no âmbito federal, com uma
estrutura dispersa e sobreposta”.
Diz o autor, que: “é verdade, também, que a capacidade do estado
neoliberal de produzir e manter a exclusão social de parcelas significativas da
população é, absurdamente, maior que a capacidade de incluí-las” (FREITAS,
2004,p.262).
44
Jorge Freitas é o autor responsável pelo artigo “Orçamento criança: é preciso mudar!”, que integra a publicação “A era FHC
e o Governo Lula: transição?”; Brasília, 2004. esta é uma publicação do INESC Instituto de Estudos Socioeconômicos, fruto
de debates e seminários cujas temáticas se dirigiram ás análises das políticas públicas no governo do Presidente Fernando
Henrique Cardoso e o primeiro anão do governo Lula.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
107
São programas lançados pelo governo federal com forte marketing
social. Como apontam os estudos sobre a trajetória das políticas sociais voltadas à
população infanto-juvenil
45
, ao lançar o Programa Comunidade Solidária, novamente
o governo federal troca a ‘roupagem’ de suas instituições com a manutenção de
ações pontuais ineficazes e sem efetividade.
Em sua origem e princípios o Programa Comunidade Solidária
contrapunha-se ao ECA, visto que este prevê os mecanismos de implantação,
cumprimento e medidas de fiscalização, centrados nos Conselhos de Direitos nos
níveis Nacional, Estadual e Municipal. Ao contrário, desenvolvia medidas de
implantação do Programa Comunidade Solidária, que retardam a efetivação do ECA.
O discurso recorrente do governo federal ocultava as discussões sobre
as políticas sociais substituindo-as pela forte propaganda (e aposta em sua
resolutividade) do Programa Comunidade Solidária como forma de responder às
demandas sociais.
o Conjunto CFESS/CRESS, posicionava-se explicitando as mazelas
institucionais e o contra-senso estatal diante dos direitos e da implementação de
políticas inerentes a estes. Aponta como alternativa ao enfrentamento a estas
mazelas e as iniciativas de supressão dos direitos, a necessária articulação com
movimentos sociais e organizações da sociedade civil. Este é o aspecto fundante
das deliberações: participação e mobilização dos setores organizados da sociedade,
com vistas a garantir o texto constitucional e os direitos nele assegurados.
45
A dissertação de mestrado em Serviço Social – O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente: cultura
política e democracia, de minha autoria apresenta o estudo da trajetória histórica das políticas sociais voltadas às crianças e
aos adolescentes 2002; PUC/SP
.
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108
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
109
4.1.2 - XXIV Encontro Nacional CFESS//CRESS – 1995.
O XXIV Encontro Nacional do conjunto CFESS//CRESS foi realizado
no Rio de Janeiro, em 1995, marcado pela intensificação da forte percepção crítica
sobre a omissão do governo federal diante das políticas sociais que deveriam
contemplar direitos.
O coletivo dos assistentes sociais presentes neste XXIV Encontro,
deliberam sobre o Programa Comunidade Solidária, da seguinte forma:
Que os CRESS acompanhem a regulamentação do Comunidade
Solidária para que ele não se sobreponha aos Conselhos de Defesa
dos Direitos como os da área da assistência, saúde, criança e
adolescente. (...) Que os CRESS não integrem os Conselhos de
Comunidade Solidária. (...) Denunciar o Programa Comunidade
Solidária mostrando nossa contraposição, questionando e
mostrando porque defendemos a LOAS e não o Comunidade
Solidária e seu caráter clientelista. (
Relatório do XXIV Encontro
Nacional CFESS//CRESS: RJ, 1995
)
Francisco de Oliveira (1996) explicita que o Programa Comunidade
Solidária passa a ser tratado pelo poder público como Conselho, por sua
composição heterogênea - entre ‘estrelas’ convidadas e representantes do poder
público - reportando-se aos preceitos constitucionais que prevê a criação de
conselhos paritários para a formulação de políticas públicas.
Esta questão reporta o papel do Estado ao nível da caridade pública “O
Programa Comunidade Solidária não é outra coisa senão uma retórica cnica a
serviço do fisiologismo e da política de clientela (...) A política como espetáculo e o
espetáculo como política”. (OLIVEIRA,Folha de São Paulo, 13/10/1996).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
110
O autor chama a atenção, em seu artigo, para a hipocrisia e para a
relação fantasiosa, referindo-se ao “espetáculo” criado em torno do Programa, que
não guardava qualquer referência e legitimidade pública.
Neste XXIV Encontro Nacional de 1995, ocorreram deliberações
vinculadas às políticas de direitos e à sua relação com o cotidiano profissional,
conforme apresenta o texto, ao instituir para a categoria:
Buscar aproximações com os profissionais que trabalham na área
da criança e da adolescência para levar a discussão do Estatuto,
articulando-o com o Código de Ética e com a LOAS. (...) Viabilizar o
debate conceitual e político do Estatuto com a categoria, no sentido
de contextualizar e perceber a demanda política da lei, da sociedade
e da profissão. (...) Fortalecimento da discussão e participação da
categoria na defesa dos direitos da criança e do adolescente
articulando-se com os Fóruns e Conselhos de Direitos da Criança e
do Adolescente”. (
Relatório do XXIV Encontro Nacional CFESS//CRESS:
RJ, 1995
)
O texto acima expõe o compromisso e o envolvimento da categoria
com a defesa dos direitos de crianças e de adolescentes, demarcando a
necessidade da participação nos espaços instituídos (Conselhos, Foruns).
Este é um aspecto, que se refere à prática profissional em seu
movimento e em sintonia com seu tempo histórico. Martinelli (2004) trás importantes
reflexões ao apontar que toda prática social é teoria em movimento. Estabelecer
uma nova relação com a profissão é um ato político que movimenta saberes e uma
nova relação entre profissionais.
Aspectos que guardam estreita relação com os princípios fundamentais
do Código de Ética, donde destaca-se o compromisso com a qualidade dos serviços
prestados à população e com o aprimoramento intelectual.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
111
Estes elementos denotam o exercício profissional com competência
teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa, com qualificação em sua
área de desempenho e a necessária formação intelectual e cultural.
A deliberação supracitada é consoante com a perspectiva de que o
projeto ético-político do Serviço Social se materializa na prática cotidiana, cujos
confrontos e conflitos que permeiam o tecido social, desafiam permanentemente à
tomada de posição.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
112
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
113
4.1.3 - XXV Encontro Nacional CFESS/CRESS – 1996.
O Relatório do XXV Encontro Nacional CFESS/CRESS realizado em
Fortaleza, em 1996, explicita a sintonia da profissão com os princípios e conteúdo
jurídico-formal constante no ECA.
Ao descrever em sua gina 15, sob o título: ‘em defesa dos direitos
de crianças e de adolescentes’, destacam-se as seguintes deliberações:
- Intercambiar informações com a representação do CFESS no
CONANDA – necessidade de maior feed back;
- Fortalecer a concepção da necessária articulação entre a prática
política e técnico-profissional do serviço social com o ECA;
- Encaminhar ao CONANDA, via representação CFESS,
informações e denúncias quanto as situações de violação dos
direitos ocorridos nos Estados, a fim de possibilitar que o CONANDA
intervenha, como instância deliberativa na defesa dos direitos de
crianças e de adolescentes.
No plano nacional, o CONANDA Conselho Nacional de Defesa dos
Direitos da Criança e do Adolescente é a instância legítima de deliberação sobre as
políticas de direitos para a criança e para o adolescente, portanto, sinalizando o
avanço na democracia política. Tanto compondo a gestão (como membro titular ou
suplente) do CONANDA, como entidade membro do Forum DCA, a representação
da categoria dos assistentes sociais estava presente com o propósito de
acompanhar e atuar na direção da defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes.
Como é possível observar no texto do relatório, durante o XXV
Encontro Nacional CFESS/CRESS, existe a forte preocupação com o
acompanhamento a esta representação, através de subísios e orientações para que
a mesma contemple as lutas (princípios e perspectivas políticas) da categoria
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114
profissional.
Como abordado na segunda seção deste estudo, os Conselhos de
Direitos - nova institucionalidade prevista pelo ECA (artigo n.º 88), - passam a
imbuir-se de autoridade para desencadear amplo processo de participação e
politização, tendo em vista sua constituição paritária, conforme estabelece esse
mesmo artigo, inciso II, que assegura "... a participação popular paritária por meio de
organizações representativas...". Também presentes em seu caráter deliberativo e
controlador das ações.
A formação desse novo cenário, ou seja, com a composição de
representações da sociedade civil e do poder público, passa a exigir a parceria entre
Estado e sociedade civil. Projeta-se a articulação e a interação através da
negociação política e deainterlocução com as demandas na área da infância e da
adolescência, cuja pluralidade é apreendida, segundo ressalta Bobbio (1987, p.61),
como "uma característica fundamental da democracia".
A construção dessa nova institucionalidade os Conselhos de Direitos
é capaz de inaugurar formas do trato político e cultural em relação à infância e à
adolescência, desencadeia a necessidade de esclarecer o significado da
representação no interior dos Conselhos por parte das OG´s e ONG´s.
A representação passa a ser um importante elemento dessa nova
institucionalidade, tal qual aborda Marilena Chauí (1993, p. 286), pois passa a:
significar estar no lugar de. Justamente essa passagem da coisa-
em-pessoa à sua presença em imagem ou em idéia tornou-se um
dos pontos intermináveis da discussão filosófica moderna (a partir
do século XVII) acerca do valor objetivo das representações, da
adequação da representação ao real representado, dos critérios
para garantir a verdade da representação.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
115
A delegação projetada à representação do CFESS, correspondia ao
conjunto das ONG´s no campo democrático popular
46
, portanto, a forma de
representação junto ao CONANDA desafiava também a categoria dos assistentes
sociais a afirmar os pressupostos da democracia, cujos apontamentos de Chauí
(1993, p. 295) indicam como uma concepção de representação ao qual denomina de
'democracia concreta':
Trata-se da idéia de representação como delegação e mandato
imperativo, rotativa e revogável, de tal modo que o representante
não representa um poder em geral nem uma vontade em geral nem
uma razão em geral, mas reivindica direitos concretos de classes e
grupos. Descendo ao particular, a representação agora significa
expressão política universalizada como direito de decidir e controlar
a coisa pública em nome dos direitos coletivos dos excluídos.
O rol de deliberações indica a articulação da categoria com seu projeto
ético-político ao contemplar o CONANDA como um espaço de participação política
legítimo para receber e transformar as denúncias de violações dos direitos de
crianças e de adolescentes. Registra-se a aproximação, a superação do senso
comum e os indicativos para a constituição de um novo sujeito social.
A representação do CFESS no CONANDA ocorre balizada na defesa
dos direitos de crianças e de adolescentes, no aprofundamento da democracia e na
participação política.
Sobre a participação política, Marco Aurélio Nogueira (2004, p.133) a
concebe como:
A participação propriamente política, porém, realiza-se tendo em
vista a comunidade como um todo, a organização da vida social em
seu conjunto, ou seja, o Estado. Ela é, assim, uma prática ético-
46
Pois se tratava de uma representação vinculada ao Fórum DCA, ou seja, o agrupamento
de ONG’s fortemente preocupadas com a violência e as formas de exposição de crianças e
de adolescentes, em contraposição às garantias de direitos.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
116
política, que tem a ver tanto com a questão de poder e da
dominação quanto com a questão do consenso e da hegemonia (...)
é mediante a participação política que a ‘vontade geral’ o pacto
social – se objetiva, se recria e se fortalece.
O compromisso democrático e de participação política que estão
presentes nas deliberações, referem-se a articulação teórico-prática à capacitação
profissional, materializando o compromisso ético-político para a implementação do
ECA. É possível analisar este aspecto sob a perspectiva gramsciana ao considerar
os assistentes sociais como intelectuais capazes de estabelecer mediações diante
dos direitos de crianças e de adolescentes, assim como se colocam como difusores
destes direitos e vigilantes diante das possíveis violações dos mesmos.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
117
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
118
4.1.4 - XXVI Encontro Nacional CFESS/CRESS – 1997.
O Relatório do XXVI Encontro Nacional CFESS/CRESS, realizado em
Belém, em 1997, expõe os seguintes aspectos sobre a defesa de Direitos da
Criança e do Adolescente:
Ratificação de todas as deliberações da II Conferência Nacional
“Criança Prioridade Absoluta”, quais sejam:
- Realização do encontro Nacional de Conselheiros Tutelares;
- Reordenamento institucional governamental de forma a assegurar
o funcionamento das retaguardas previstas no ECA;
- Combate à exploração do trabalho infantil;
- Realização de campanha de divulgação do ECA. (
Relatório do XXVI
CFESS/CRESS Relatório de deliberações).
As deliberações reafirmam o compromisso ético-político da categoria
em mediar a relação entre as conquistas jurídicas e a responsabilidade coletiva com
a população infanto-juvenil, em convergência com a complexidade que envolve o
contexto social.
A deliberação acima transcrita explicita o objeto de estudo desta tese
a interface entre o projeto ético-político e a defesa de direitos da criança e do
adolescente assim como a opção política dos assistentes sociais
47
. É notável o
direcionamento colocado para o conjunto da categoria sobre a necessidade de
empreender ações políticas e práticas que dispõem sobre a efetivação dos direitos
de crianças e de adolescentes.
Trata-se de um encaminhamento que impõe ao Serviço Social uma
nova prática profissional, pois, contém um caráter ‘político e pedagógico’ diante da
47
Aqui novamente se faz necessário lembrar que, ao mencionar a opção políticas dos profissionais, trata-se daqueles
profissionais que participam dos processos decisórios, que acompanham o movimento e as organizações de representação da
categoria profissional, cuja contribuição para a construção da identidade é inegável.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
119
realidade social e da luta pela hegemonia (SIMIONATTO, 2004, p.199).
É um Serviço Social cuja mediação, corresponde ainda a perspectiva
gramsciana de intelectuais orgânicos, que, conforme sinaliza Simionatto (2004, p.
219), corresponde a construção da vontade coletiva e que esta:
Requer a articulação entre intelectuais e povo, que passa pela
integração orgânica com a luta das classes subalternas para se
afirmarem como sujeitos efetivos do processo político e social.
São aspectos que indicam rupturas com a inércia e a reprodução de
práticas sociais de conservação do status quo, envolvem a assimilação, na prática,
da nova identidade profissional, tal qual descreve Maria Lúcia Martinelli (1998,
p.145), pois:
É com o movimento do real que temos que aprender a dialogar, é
em direção a ele que precisamos lançar o nosso olhar, aguçar a
nossa razão, estimular a nossa consciência crítica, de forma a poder
desvendá-lo, lançando as raízes da possibilidade da construção de
práticas sociais múltiplas, plurais, capazes de contribuírem
efetivamente para a produção do novo.
Estas deliberações corroboram os indicativos que envolve não
posições ético-políticas, como se sustentam em fundamentos teórico-metodológicos
e projeções técnico-operativas diante da necessária implementação do ECA.
A II Conferência Nacional dos Direitos da criança e do Adolescente
ocorreu entre os dias 17 e 20 de agosto de 1997 e contou com 800 participantes
48
,
tendo como objetivo geral:
48
Participei desta II Conferência como delegada/representante de ONG Ação Social
Arquidiocesana – pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Florianópolis.
À época eu presidia o CMDCA – Fpolis e fui escolhida delegada diante da Conferência Estadual/SC.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
120
Promover uma ampla mobilização social nas esferas municipal,
estadual e nacional para avaliar a situação de implementação dos
direitos da população infanto-juvenil, como prioridade absoluta, em
especial no que se refere aos eixos temáticos do CONANDA, a
saber: erradicação do trabalho infantil e proteção ao trabalho do
adolescente; violência e exploração sexual contra crianças e
adolescentes; ato infracional e medidas sócio-educativas; Conselhos
Tutelares, orçamento público e Fundos.
(www.dhnet.org.br/dados/dh/cc/3/crianca/conferencias/htm)
Ainda sobre a defesa de direitos, o conjunto CFESS/CRESS delibera:
Para o fortalecimento da área de defesa de direitos, reconhecemos
que é papel do Serviço Social e do Conjunto CFESS/CRESS apoiar
o Sistema de garantia de Direitos/Reordenamento institucional.
(Relatório do XXVI CFESS/CRESS Relatório de deliberações Pág.
9).
Como forma de materializar esta deliberação o CFESS confecciona
cartazes e adesivos que ressaltam os 7 anos de Estatuto da Criança e do
Adolescente e a necessidade de se efetivar os direitos ali assegurados. Estes são
distribuídos pelo país através dos CRESS e das organizações de articulação do
CFESS/CRESS.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
121
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
122
4.1.5 - XXVIII Encontro Nacional CFESS/CRESS – 1999.
Consta no Relatório de deliberações do XXVIII Encontro Nacional
CFESS/CRESS, realizado em Campo Grande, em 1999, a abordagem sobre o
controle social:
Acompanhamento do controle das políticas públicas. Participação
efetiva nos Conselhos de Assistência Social, Saúde, Criança e
Adolescente e nos respectivos Fóruns nas três esferas de governo,
Conferências, Plenárias, etc..(
XXVIII CFESS/CRESS Relatório de
deliberações).
Esta deliberação incorpora a compreensão de Estado presente no
projeto ético político do serviço social que, pretende-se, superando seu conceito de
aparelho burocrático-coercitivo
49
, comum à sociedade. Trata-se do reconhecimento
dos Conselhos (paritários) de políticas públicas como espaços legítimos de
participação política coerentemente com um novo Estado brasileiro em construção.
A abordagem de Semeraro (1999, p.75) dispõe que:
O novo conceito de Estado deve, portanto, resultar da composição
de elementos políticos e sociais; da força das instituições e da
liberdade dos organismos privados; da inter-relação entre estrutura
e superestrutura, da compenetração do aparelho estatal com a
sociedade civil organizada.
É um conceito que corresponde a inclusão na esfera estatal, das
demandas da sociedade civil, assegurando a eqüidade de acesso aos direitos.
Sobre a gestão social, o mesmo Relatório aponta:
Articular com os Fóruns de gestores, trabalhadores e usuários para
a formulação e implementação de projetos de capacitação nas áreas
49
Esta compreensão é abordada por Giovanni Semeraro como “vulgarmente a maioria da população
pensa. Suas dimensões, de fato, não se limitam aos instrumentos exteriores de governo,mas
compreendem, também a multiplicidade dos ‘organismos’ da sociedade civil.(1999; p.75)
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
123
das políticas sociais, imprimindo direção social do projeto ético
político do Conjunto
. (XXVIII CFESS/CRESS Relatório de deliberações).
Deliberações que sinalizam o posicionamento em favor da
universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas
sociais. Na deliberação acima transcrita, uma explicitação da categoria dos
assistentes sociais quanto aos posicionamentos políticos e de ordem prática em
estreita relação ao que escreve Barroco (2001, p.206) ao situar que:
A partir de 1993, o Código de Ética passa a ser uma das referências
dos encaminhamentos práticos e do posicionamento político dos
assistentes sociais em face da política neoliberal e de seus
desdobramentos para o conjunto dos trabalhadores. É nesse
contexto que o projeto profissional de ruptura começa a ser definido
como projeto ético-político.
Em relação às orientações gerais para o conjunto CFESS/CRESS, o
relatório descreve a determinação de “defender intransigentemente o ECA, LOAS,
LOS, PNI e outras legislações das demais políticas”.
(XXVIII CFESS/CRESS Relatório
de deliberações).
Esta deliberação associa-se ao que expõe o Código de Ética ao
determinar dentre os seus princípio a defesa intransigente dos direitos humanos.
Simultaneamente à vinculação à doutrina dos direitos humanos,
ampliam-se as possibilidades de cidadania. A concepção de cidadania presente no
projeto ético político refuta as percepções formais e estáticas constantes nas
relações sociais, “nesta sociedade, cidadania representa igualdade jurídica (...)
fundamenta-se no princípio de que as pessoas são iguais unicamente perante a lei ”.
(VIEIRA,1998, p. 10). A abordagem possui sua ênfase centrada no conjunto de
direitos e responsabilidades que estão colocados nas legislações vigentes (ECA,
LOAS, SUS, dentre outras).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
124
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
125
4.1.6 - XXIX Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2000.
Durante o XXIX Encontro Nacional CFESS/CRESS realizado em 2000
em Maceió as deliberações sobre a seguridade social no aspecto relativo ao controle
social apontam:
Controle social –
- Discutir a natureza diversificada dos Conselhos de Políticas
Públicas, identificando a interface de forma articulada;
- Fortalecer os Fóruns de Políticas Públicas, Conferências,
Conselhos. (XXIX CFESS/CRESS Relatório de deliberações Pág.
15).
Os Conselhos de Políticas Públicas (previstos no âmbito nacional,
estadual e municipal) incorporam as expectativas políticas que correspondem à
democratização das relações sociais alocadas de forma concreta na
operacionalização das novas regras de convivência política.
Na área da infância e da adolescência, os Conselhos de Direitos
passam a imbuir-se de autoridade para desencadear amplo processo de
participação e de politização, tendo em vista sua constituição paritária, caráter
deliberativo e de controle social.
O fortalecimento da participação política e de deliberação de políticas
públicas deve ser compreendido “como todo o processo de intensificação
democrática, no qual vêem à tona participantes até então excluídos do processo
decisório e da vida pública” (NOGUEIRA, 2004, p.154).
Este processo que compõe uma esfera mais abrangente, ou seja, a
sociedade em seu conjunto, está vinculado ao entendimento de que a educação
para a democracia ocorre diante do próprio exercício democrático. Somente através
da prática democrática, torna-se possível a compreensão, a revisão dos
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
126
procedimentos e a construção de novos parâmetros e experiências, em que os
interesses coletivos sejam incorporados na agenda de deliberação das políticas
públicas.
Ao pautar a consolidação dos Conselhos (paritários) de políticas
públicas, o conjunto CFESS/CRESS contribui com o debate no interior da categoria
profissional e nos segmentos dos quais participa, consubstanciando as prerrogativas
constitucionais e as expectativas de ampla participação política e de partilha do
poder decisório em relação à deliberação de políticas nos diferentes setores sociais.
Os Conselhos paritários tratam da articulação entre Estado e
sociedade civil com fins de atender as reais demandas da população.
Assinala Simionatto:
Mesmo considerando as características heterogêneas e
multifacetadas da sociedade civil, não sendo tomada aqui de forma
generalizada, nem mesmo como o centro de todas as virtudes, é
possível, a partir dela e de sua interface com o Estado, buscar o
alargamento da participação nos processos decisórios e o
bloqueamento das estratégias de destruição dos direitos sociais e
dos institutos de representação coletiva.
http://www.acessa.com/gramsci/?page 4/5/2008 18:52
No aspecto que se refere a gestão, o XXIX Encontro Nacional definiu
por:
Defender a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente
ECA contra a redução da idade penal. (XXIX CFESS/CRESS
Relatório de deliberações Pág. 13).
Aqui, constata-se a forma contundente na defesa de direitos das
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
127
crianças e dos adolescentes pela via da implementação do Estatuto da Criança e do
Adolescente, propondo-se a enfrentar a cultura da 'menorização'50, atribuída à
infância e à adolescência em condição de subalternidade, cuja superação torna-se
mais um desafio incorporado à agenda política do conjunto CFESS/CRESS.
Este tema recebe especcial atenção da categoria no final do ano de
2003, através da publicação de uma Carta aberta contra a proposta de redução da
idade penal
51
, donde se destaca o seguinte posicionamento:
A verdade é que a violência está diretamente ligada à desigualdade
e exclusão social. Não resta dúvida que a solução para o problema
está na melhoria do sistema de proteção social, no fortalecimento
das políticas sociais, no respeito aos jovens como cidadãos
portadores de direitos.(
Carta Aberta – gestão 2002-2005 do CFESS,
2003)
Esta manifestação ancorava-se no repúdio àsegregação e punição de
jovens, que sinalizava a forma equivocada de atender o desejo da sociedade em
solucionar a reprodução da violência.
A Carta aberta reafirma o compromisso com uma nova ordem
societária, remetendo para a efetivação dos direitos o caminho e a forma mais
adequada de combate à violência. Trata-se de uma reversão cultural quanto a
concepções e procedimentos, que, segundo o pensamento de Gramsci (1989, p.
109) corresponde a "uma nova cultura em gestação, que se desenvolverá com o
desenvolver-se das relações sociais".
Esta perpectiva remete à crise das relações sociais e do sistema de
produção o foco das atenções. A violência urbana é comumente tratada desta forma:
50
Menorização aqui se refere aos ritos autoritários e estigmatizantes, envolvendo a população
infanto-juvenil em condição de pobreza.O debate social que envolve a redução da idade penal de 18
anos – conforme previsto no ECA – para 16 anos. São distorções vinculadas a redução da violência
urbana.
51
Esta Carta encontra-se disponível no site www.cfess.org.br.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
128
um fragmento isolado do conjunto das relações sociais capitalistas, acompanhadas
de medidas imediatistas e de caráter opressivo. A discussão que envolve a redução
da idade penal no país, diz respeito a estas fragmentações
52
.
Neste mesmo Encontro CFESS/CRESS, a categoria delibera e publica
sua primeira Carta Aberta, que expressa posições sobre a estrutura e a conjuntura
nacional e de relações internacionais. Ressalta-se a riqueza deste conteúdo em se
tratando da explicitação pública do projeto ético-político do Serviço Social.
A Carta de Maceió que a seguir será transcrita, aponta elementos
desta crise do capitalismo contemporâneo ao mesmo tempo em que demarca as
ações para as rupturas com os processos de pobreza e de desigualdade social.
Carta de Maceió
Seguridade Social Pública: É Possível!
Os delegados reunidos no XXIX Encontro Nacional CFESS/CRESS,
na cidade de Maceió (AL), entre os dias 3 e 6 de setembro de 2000,
representando o conjunto dos assistentes sociais brasileiros, afiançam
publicamente a importância da luta em defesa da Seguridade Social
pública no país.
Reafirmam, ainda, sua concepção de seguridade, entendida como um
padrão de proteção social de qualidade, com cobertura universal para as
situações de risco, vulnerabilidade ou danos dos cidadãos brasileiros. A
Seguridade Social, assegurada num plano legal, tem sido atropelada pelas
reformas neoliberais que atentam contra o aprofundamento da democracia
e da cidadania na sociedade brasileira.
A defesa da Seguridade faz parte da agenda do Conjunto
CFESS/CRESS, balizada no projeto ético-político profissional do Serviço
Social. Hoje, diante da investida do grande capital especulativo, insistimos
entre os segmentos dos trabalhadores que mantém a sua defesa. É sabido
que muitos abandonaram a luta e pragmaticamente aderiram à proposta
focalista e privatista em curso. Outros priorizaram a inserção e mobilização
em torno das políticas setoriais. Poucos mantiveram a perspectiva da
seguridade social, a qual vimos reforçar neste momento como parte de
52
Sobre as discussões que envolvem o ato infracional e a redução da idade penal, recomenda-se a
obra de Mário Volpi “Sem liberdade, sem direitos: a privação de liberdade na percepção do
adolescente”. São Paulo, Cortez, 2001.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
129
uma agenda estratégica da luta democrática e popular no Brasil, visando a
construção de uma sociedade justa e igualitária. Por quê? Algumas razões
nos parecem decisivas na reafirmação dessa direção política. Vejamos:
O conceito de seguridade social expresso na Constituição de 1988 foi um
dos grandes avanços no processo de redemocratização da sociedade
brasileira desencadeado em fins dos anos 70, que culminou na constituinte,
ainda que tenha se mantido restrito à previdência, saúde e assistência
social.
Com ele, deu-se passos no sentido de uma maior socialização da política,
por meio dos mecanismos de gestão e controle social com participação
popular Conselhos e Conferências nos três veis de governo. Assim, a
implementação cotidiana das políticas de seguridade politizou-se mais,
tornando-se um ambiente relevante de disputa de projetos societários.
Apontou-se também para uma alocação mais democrática dos recursos
públicos, a partir do orçamento da seguridade social, na perspectiva de
uma ampliação da cobertura, tendo em vista a idéia da universalidade do
acesso a direitos sociais legalmente definidos. Portanto, a seguridade
social é um espaço de disputa de recursos uma disputa política que
expressa projetos societários, onde se movem os interesses das maiorias,
mas estão presentes as marcas históricas da cultura política autoritária no
Brasil, que se expressa pela pouca distinção entre público e privado, pelo
clientelismo e pelo patrimonialismo. O resultado desse embate tem forte
impacto sobre uma parcela enorme da população que conta com as
políticas de seguridade para sua sobrevivência. É de vida que se trata sob
os números, e cada "tesourada" ou manutenção de recursos interfere no
cotidiano de milhares, milhões de pessoas.
Portanto, a seguridade social é, sobretudo, um campo de luta e de
formação de consciências críticas em relação à desigualdade social no
Brasil, de organização dos trabalhadores. Um terreno de embate que
requer competência teórica, política e técnica. Que exige uma rigorosa
análise crítica da correlação de forças entre classes e segmentos de
classe, que interferem nas decisões em cada conjuntura. Que força a
construção de proposições que se contraponham às reações das elites
político-econômicas do país, difusoras de uma responsabilização dos
pobres pela sua condição, ideologia que expressa uma verdadeira
indisposição de abrir mão de suas taxas de lucro, de juros, de sua renda da
terra.
Os assistentes sociais, pela sua inserção profissional histórica nas políticas
sociais, realizaram a crítica do assistencialismo, do clientelismo e da
ausência de mecanismos democráticos de controle social. Participaram da
luta na constituinte, na definição da legislação complementar das políticas
de seguridade, com destaque para a assistência social. Enfim, constituímos
uma referência política para os demais segmentos dos trabalhadores e
outros movimentos sociais nesse campo. E vimos, neste duro contexto de
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
130
recrudescimento das tendências mais perversas da formação social e
política do Brasil, acirrado pelas políticas neoliberais, sendo um pólo crítico,
propositivo e combativo, na resistência à verdadeira inviabilização da
seguridade social pública preconizada pelo governo Fernando Henrique
Cardoso. O Conjunto CFESS/CRESS teve e tem um papel indiscutível
nesse processo.
Considerando essa perspectiva estratégica, é que, reunidos em
Maceió, levantamos algumas orientações gerais para tornar a Seguridade
Social pública possível no Brasil, superando essa condição ambígua de
possuir uma existência legal/formal, mas que pouco se realiza na prática,
apesar de alguns avanços pontuais, tendo em vista garantir melhores
condições de vida para a população, bem como avançar num processo de
profunda democratização do Estado e da sociedade brasileiras. São elas:
Manter uma posição firme contra a perspectiva da focalização,
denunciando publicamente propostas restritivas do acesso aos direitos
constituídos;
Denunciar o desvio de recursos da seguridade social para a sustentação
da política macroeconômica regressiva do governo federal, a exemplo do
PROER, do FEF e do pagamento das vidas interna e externa, que
cresceram exponencialmente para subsidiar os especuladores, os grandes
beneficiários deste Estado máximo para o capital e mínimo para os
trabalhadores, enunciado pelo neoliberalismo;
Interferir na definição dos orçamentos, junto aos demais atores da
sociedade civil com compromissos democráticos, no sentido de assegurar
recursos para a seguridade social e que tais recursos sejam de uso
exclusivo da mesma;
Superar a fragmentação setorial engendrada à revelia do princípio
constitucional da seguridade social, a partir de sua tematização por meio
dos eixos da gestão, controle social e financiamento e de propostas no
sentido da articulação das três políticas;
Apontar para um conceito mais amplo de seguridade social, que incorpore
outras políticas sociais, constituindo um verdadeiro padrão de proteção
social no Brasil;
Manter a inserção nos espaços de controle social, com vistas a assegurar
os princípios da universalidade, da cidadania, da democracia e da justiça
social, obter informações relevantes para a luta social e promover a
articulação política no âmbito da sociedade civil. A intervenção nos
Conselhos e Conferências requer a construção dos Fóruns, com o objetivo
de definir as propostas e estratégias do campo democrático e popular
nessas instâncias.
Desenvolver um trabalho profissional que fortaleça junto aos usuários a
noção de direito social, e a possibilidade da ão coletiva dos mesmos em
sua defesa.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
131
Esta Carta Aberta é fortemente marcada pela reivindicação da
consolidação da Seguridade Social, tal como prevista na Constituição Federal de
1998. Marca um novo ciclo de comunicação da categoria com a sociedade: ao
mesmo tempo que aproxima-se de seu movimento histórico, contribui para o
reconhecimento de uma identidade profissional vinculada a noção de direitos e de
democratização das relações sociais.
A Carta de Maceió, faz um traçado conjuntural da preocupante
desigualdade social, denunciando as diferenças sócio-econômicas, políticas e
culturais.
O site dos Direitos Humanos na Internet (DHnet) apresenta e analisa
os dados do senso 2000, cujas informações apontam que, dos 160 milhões de
habitantes no Brasil, 61 milhões são crianças e adolescentes de 0 a 17 anos. 23%,
ou 57 milhões de brasileiros vivem em estado de pobreza possuem renda per
capita por mês inferior a ½ salário mínimo; 15% são extremamente pobre.
Ainda segundo o site do DHnet, 23% de crianças e de adolescentes no
Brasil tem seus direitos negados, que representa cerca de 14 milhões de habitantes.
Estas crianças e adolescentes compõem as nove milhões de famílias que
sobrevivem com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínmo.
Estes dados vinham acompanhados do aumento das taxas de
desemprego, do subemprego e da precarização das relações de trabalho, numa
sociedade com níveis de desigualdade sem precedente. Associado ao ineficiente
desempenho dos serviços públicos, neste mesmo período, diariamente havia uma
enxurrada de dados estatísticos que apontavam os agravamentos da questão social
no país, que se apresentavam em suas diferentes expressões no meio urbano e
rural.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
132
Para Vera Telles (1994, p. 225), esse quadro de pobreza generalizada
produzia
um campo de debate onde o próprio país é problematizado, revisto e
repensado em sua história, tradições, possibilidades e também (ou,
sobretudo) limites. Pois a pobreza brasileira tem raízes seculares; se
traz as marcas de uma tradição oligárquica e autoritária, também é
certo que assume nova configuração no horizonte das
transformações em curso no mundo contemporâneo, projetando-se
numa encruzilhada de alternativas incertas nas quais os destinos do
país estão sendo decididos.
Ao analisar os demais indicadores do senso de 2000, Yazbek
apresenta a seguinte reflexão:
o Brasil é hoje um país mais velho, mais urbano, mais feminino, mais
alfabetizado e mais industrializado. Porém, a desigualdade é a marca
nacional. A desigualdade não é de renda: é racial e de gênero. O
padrão de apropriação dos recursos naturais, econômicos políticos e
culturais vigentes na sociedade brasileira torna insustentável a própria
democracia. (2007, p.04)
A abordagem de Yazbek é categórica ao apontar a ampliação da
desigualdade em suas diferentes formas de expressão na sociedade, assim como
ratifica as condições de subalternidade a qual está exposta a população brasileira.
Este documento marca os posicionamentos diante da metade do
segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, cujos programas de
governo vincularam-se à plataforma do projeto neoliberal e o recrudescimento em
relação às políticas sociais mediadoras de direitos.
Após o Encontro Nacional CFESS/CRESS, neste mesmo ano de 2000
acontece o II Encontro Nacional de Serviço Social e Seguridade, em Porto Alegre
53
.
Este II Encontro Nacional de Serviço Social e Seguridade apontou para a agenda
53
Participei deste Encontro, assim como do processo de organização do mesmo, compondo a
Comissão Técnica representando o CRESS 12ª Região. Neste período eu desempenhava a função
de vice-presidente do CRESS 12ª Região.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
133
dos assistentes sociais:
O aperfeiçoamento da qualificação e capacitação técnico política
dos conceitos de: direitos sociais, seguridade social, inclusão social,
gestão relação Estado/sociedade, parcerias, público/privado
(Relatório do II Encontro Nacional de Serviço Social e Seguridade:
2001; p. 25)
Cabe destacar que a realização deste Encontro marcou o
posicionamento político da categoria dos assistentes sociais sobre a necessária
ampliação da concepção da seguridade social, ou seja, para além dos aspectos
previstos no artigo 194 da Constituição Federal de 1988 (saúde, assistência social e
previdência). Esta concepção relaciona-se a ao sistema de proteção social
assegurado pelo Estado integral.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
134
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
135
4.1.7 - XXX Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2001.
Durante o XXX Encontro Nacional CFESS/CRESS foi realizado em
Belo Horizonte, em setembro de 2001, os encaminhamentos referentes às políticas
de direitos da criança e do adolescente no aspecto gestão foram:
- Investimento na efetiva implementação das medidas sócio-
educativas previstas no ECA;
- Mobilização da sociedade para a não redução da idade penal.
Ao colocar em pauta as medidas sócio educativas, que correspondem
ao conjunto de medidas dirigidas aos adolescentes em conflito com a lei autores
de atos infracionais - e o combate à redução da idade penal, o conjunto
CFESS/CRESS posiciona-se diante dos estigmas e preconceitos que envolvem as
classes subalternas.
É um debate que diz respeito subtração de possibilidades e de acesso
aos serviços e políticas previstos no ECA.
As medidas sócio-educativas encontram-se no ECA, no capítulo IV,
entre os artigos 112º e 125º e correspondem a: “advertência; obrigação de reparar o
dano; prestação de serviço à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime
de semiliberdade; internação em estabelecimento educacional”.
São denúncias que desnudam as distâncias de concepção e de
atenção dispensadas aos adolescentes em conflito com a lei no Brasil. "Porque, no
fundo, se o subalterno era ontem uma coisa, hoje não mais o é: tornou-se uma
pessoa histórica, um protagonista; se, ontem, era irresponsável, já que era 'paciente'
de uma vontade estranha, hoje, sente-se responsável, que não é mais paciente,
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
136
mas, sim, agente e necessariamente ativo e empreendedor". (Gramsci; 1989; 24).
Esta condição de 'protagonista', ou, na abordagem do ECA, sujeitos de
direitos das atenções e ações do Estado e sociedade, é um processo permeado por
contradições e a convivência de avanços e recuos, conformismos e mudanças.
O conteúdo expresso nas deliberações marca a coerência e
articulação entre o projeto ético-político profissional do Serviço Social e a defesa de
direitos de crianças e de adolescentes no que tange a não discriminação e à
eliminação dos preconceitos.
Quanto ao aspecto financiamento, as deliberações da categoria dos
assistentes sociais assim definiu:
Garantia da primazia do Estado no financiamento e
controle da qualidade dos serviços prestados”. (Relatório de deliberações do
XXX Encontro
Nacional CFESS/CRESS)
Tratar do enfrentamento à discriminação na direção do acesso aos
direitos e de imputar ao Estado a responsabilidade de garantir a efetivação destes, é
contemplar uma nova composição cultural e uma nova organização estatal.
Como focaliza Simionatto:
A elevação cultural das massas assume importância decisiva nesse
processo, a fim de que possam libertar-se da pressão ideológica das
velhas classes dirigentes e elevar-se à condição destas últimas. A
batalha cultural apresenta-se como fator imprescindível ao processo
de construção da hegemonia, à conquista do consenso e da direção
político-ideológica por parte das classes subalternas.
http://www.acessa.com/gramsci/?page 4/5/2008 18:52
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
137
Sobre o controle social neste XXX Encontro Nacional foi encaminhado
a seguinte deliberação: “Discussão do papel, função e caráter dos Conselhos
Tutelares, buscando seu fortalecimento para o cumprimento do ECA”. (Relatório de
deliberações do XXX Encontro Nacional CFESS/CRESS)
Os Conselhos Tutelares como abordado na segunda seção desta
tese, é um importante organismo previsto pelo ECA com a responsabilidade de zelar
pela efetivação dos direitos da criança e do adolescente. Sua atuação é direcionada
para as situações onde ocorram a ameaça e/ou violação de direitos.
Seu caráter é educativo, de execução direta diante das questões que
envolvem crianças, adolescentes e sociedade no âmbito dos municípios, visto que
esta é sua esfera de atuação.
O conselho tutelar configura-se em organismo de prestação de
serviços, cuja ação é direta e de permanente defesa dos direitos de crianças e de
adolescentes. Com caráter eminente, é educativo de crianças, adolescentes, pais e
da sociedade como um todo. Sua atuação, quando em acordo com o que propõe o
ECA é propulsora de mudanças no campo cultural.
Estas mudanças correspondem à percepção das ações articuladas
com os Conselhos de Direitos o que exige a capacitação dos sujeitos sociais e a
ampliação da percepção de política.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
138
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
139
4.1.8 - XXXI Encontro Nacional do conjunto CFESS/CRESS – 2002.
O XXXI Encontro Nacional CFESS/CRESS realizado em Brasília, em
setembro de 2002, delibera sobre a seguridade social da seguinte forma:
Defender enfaticamente o conceito de Seguridade Social indicado
pelo conjunto CFESS/CRESS englobando o conjunto das políticas
que assegurem a proteção social dos indivíduos. Essa deve ser com
cobertura universal, financiamento e controle social reconhecendo o
estatuto da cidadania. (Relatório do XXXI Encontro CFESS/CRESS,
2002; p. 19)
Esta definição atribuída à seguridade social confronta com a direção
imposta pelo Estado brasileiro à época, “cujo formato às políticas sociais no país são
casuísticas, inoperantes, fragmentadas, superpostas, sem regras estáveis ou
reconhecimento de direitos” (Yazbek: 2006; p.37).
Convivendo dialeticamente com estas tensões, alastra-se por todo o
país a materialização das expectativas políticas até então projetadas de
democratização das relações que envolvem a decisão, a execução e o controle
sobre políticas para a infância e a adolescência, através da mobilização das
organizações governamentais e não-governamentais e da implantação dos
organismos previstos pelo ECA - Conselhos de Direitos, Conselhos Tutelares e
Fundos par a infância e adolescência.
No âmbito da gestão social, as deliberações deste Encontro
prescrevem:
Promover em parceria CRESS / Escolas de Serviço Social /
Universidades Públicas, cursos de extensão e especialização para a
categoria nas áreas de estudo de criminalidade, família, criança e
adolescente, execução de pena de prisão, penas alternativas e
medidas sócio-educativas, saúde, metodologia participativa.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
140
(
Relatório de deliberações do XXX Encontro Nacional CFESS/CRESS,
2002
).
Quanto as recomendações foi encaminhado:
Que o conjunto CFESS/CRESS contribua na divulgação e na
articulação para implementação do Pacto pela Paz”. (
Relatório de
deliberações do XXX Encontro Nacional CFESS/CRESS, 2002
)
Evidencia-se o acúmulo de uma riqueza simbólica que se renova
através da criação e produção atualizada de novos saberes e práticas, contribuindo
para o processo de transformações - fruto da mobilização e de amplo esforço
coletivo pelo qual passa a sociedade brasileira. São movimentos que envolvem
indivíduos e gupos sociais percorrendo o caminho que busca a superação da
passividade através do direcionamento consciente de práticas sociais.
As tensões são perceptíveis através da dualidade expressa nas
estratégias dos grupos de poder, convivendo com a constituição de espaços
públicos e democráticos (Conselhos de Direitos), fruto das discussões de políticas
para a infância e adolescência no Brasil contemporâneo.
A estratégia governamental com características marcadamente
neoliberais passa pelo desmonte gradativo das políticas sociais, através de uma
ação orquestrada que conduz à pauperização da população e desqualifica os
movimentos sociais, contribuindo para a desorganização dos sujeitos coletivos.
Para Vera Telles (1994, p. 225), o quadro de pobreza generalizada
produzia:
um campo de debate onde o próprio país é problematizado, revisto e
repensado em sua história, tradições, possibilidades e também (ou,
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
141
sobretudo) limites. Pois a pobreza brasileira tem raízes seculares; se
traz as marcas de uma tradição oligárquica e autoritária, também é
certo que assume nova configuração no horizonte das
transformações em curso no mundo contemporâneo, projetando-se
numa encruzilhada de alternativas incertas nas quais os destinos do
país estão sendo decididos.
Numa demonstração de prática social em processo de
experimentação, os assistentes sociais, através das entidades de representação da
categoria apresentam uma nova Carta de manifestação pública. Esta Carta contém
posicionamentos, reivindicações e contribuições na direção de um novo
ordenamento social – coerentemente com os fundamentos seu projeto ético-político.
Considerando que este XXXI Encontro Nacional ocorreu às vésperas
da eleição para a presidência da república, o coletivo dos assistentes sociais
deliberou pela escrita de uma Carta aos presidenciáveis, demarcando posições,
apontando indicativos de ações e de expectativas diante da nova composição de
governo:
Carta aos Presidenciáveis - Eleições 2002
Exmos. Srs. Candidatos,
As(Os) Assistentes Sociais reunidas(os) no 31o Encontro Nacional
do Conselho Federal-CFESS e Conselhos Regionais-CRESS de
Serviço Social, em Brasília, entre os dias 01 e 04 de setembro de
2002, vêm, por meio desta, manifestar suas intenções e propostas
aos(às) candidatos(as) aos cargos de Presidência da República e
Governos de Estados.
Compomos uma profissão com quase 60 mil profissionais que lida,
no seu dia-a-dia, com as conseqüências sociais mais perversas das
relações capitalistas que dominam a sociedade. Enfrentamos em
nosso cotidiano os níveis mais complexos da realidade social,
manifestos em múltiplas expressões da “questão social” no Brasil.
Os números e estatísticas das brutais desigualdades sociais
brasileiras se materializam nos usuários do Serviço Social,
estampam-se em seus rostos.
Nos últimos anos, o governo brasileiro passou por um
reordenamento do Estado, fruto de uma política internacional, que
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
142
atinge milhões de trabalhadores e interfere diretamente na profissão
de Serviço Social.
Os acordos firmados com os organismos internacionais elegem as
prioridades do governo em atender os interesses do grande capital –
os oligopólios/multinacionais - em detrimento das necessidades da
população trabalhadora. Exemplos não nos faltam: o montante de
verbas destinadas ao pagamento da dívida externa; a avalanche de
privatização de estatais; o sucateamento dos serviços e políticas
públicas e a recente tentativa de maior ataque aos direitos
trabalhistas conquistados e consolidados constitucionalmente,
mostram o caminho da barbárie a que estão submetidos os milhares
de brasileiros.
Os índices sociais e econômicos dos anos 90 (década da ofensiva
neoliberal entre nós) são piores que os dos anos 80. Se a década de
80 foi considerada a “década perdida”, por apresentar índices
irrisórios de crescimento econômico, a década de 90 mereceria
denominação mais contundente, pois, apresentou um recuo
econômico ainda maior (uma quase estagnação). Este quadro foi
agravado pela introdução de outros elementos típicos do
neoliberalismo, como a abertura econômica, liberalização comercial
e privatização.
As conseqüências sociais do desalentador quadro econômico dos
últimos anos são avassaladoras. Senão, vejamos: agravamento da
histórica concentração de renda, o que fez com que o Brasil
passasse a liderar o ranking das piores distribuições de renda do
mundo; aumento contínuo do desemprego, que atinge cerca de 20%
dos trabalhadores (DIEESE, 2002); queda de 15% da renda real
daqueles que trabalham; incremento de novas formas de trabalho
infantil; reavivamento de novos tipos de trabalho escravo;
precarização generalizada do trabalho, com criação de formas de
contrato perversas, como a terceirização, o trabalho temporário, o
informal (hoje cerca de 50% dos brasileiros não possuem carteira
assinada); degradação salarial generalizada, com destaque para o
encolhimento real do salário mínimo; redução drástica dos gastos
sociais em todos os níveis (Saúde, Educação, Assistência,
Previdência Social etc); incremento do trinômio
degradação/mercantilização/privatização das políticas públicas de
caráter estatal; agravamento da feminilização e racialização da
pobreza, com a entrada desigual de negros e mulheres no mercado
de trabalho; aumento do desemprego entre a juventude brasileira;
focalização das políticas públicas, com escassez de recursos e
fragmentação das ações; acirramento das tensões sociais no
campo; inexpressiva política de reforma agrária, com reduzido
número de assentamentos de famílias e parcos recursos para a
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
143
manutenção de créditos agrícolas; e aumento brutal dos níveis de
violência urbana.
Vivemos um quadro social de extrema pobreza e miserabilidade. Os
últimos reordenamentos capitalistas produziram uma estagnação
econômica e, conseqüentemente, um esgarçamento do tecido
social. As chamadas políticas neoliberais conseguiram promover um
regresso histórico monumental, repondo e reatualizando níveis de
vida sub humanos. Não qualquer valoração ideológica na
consideração de que o capitalismo neoliberal é um desastre para as
massas trabalhadoras. Trata-se de pura constatação, de uma
questão factual. Todos os indicadores sociais e econômicos nos
mostram essa realidade no Brasil.
A desresponsabilização das funções básicas do Estado quanto às
políticas sociais públicas e a transferência de responsabilidade para
o conjunto da população, desencadeando o processo de
“refilantropização”, ferem direitos garantidos em lei, destroem o seu
caráter universalizante, e alteram significativamente o fazer
profissional, que nasce e se desenvolve a partir da necessidade de
respostas governamentais à questão social. Nós, Assistentes
Sociais, enfrentamos os resultados desse quadro em nosso
cotidiano profissional. Para isso, dispomos de poucos recursos e
contamos com o não privilegiamento de políticas sociais públicas
por parte do atual Governo. Por outro lado, dispomos de formação
voltada para a formulação e execução de políticas sociais, tendo
como parâmetro um conjunto de princípios e compromissos que
norteiam nosso exercício profissional. Nosso projeto éticopolítico-
profissional fundamenta-se em princípios que se opõem
frontalmente à situação real que descrevemos. Dentre eles,
destacamos: reconhecimento da liberdade como valor ético central;
defesa intransigente dos direitos humanos; ampliação e
consolidação da cidadania e da democracia; posicionamento a favor
da eqüidade, justiça e participação social. Estes princípios, contidos
em nosso Código de Ética Profissional, são materializados em
direitos e deveres que devem ser consubstanciados em nossas
ações profissionais. Além disso, tais princípios são traduzidos por
nós em compromissos que assumem um direcionamento político na
defesa concreta do trabalho, da democracia e dos direitos e na
afirmação das políticas públicas de caráter estatal, como eixos
estratégicos.
Dessa forma, as(os) Assistentes Sociais vêm, ao longo das últimas
três décadas, participando do movimento de construção efetiva de
uma sociedade justa e igualitária, ao reafirmarem os princípios,
compromissos e eixos políticos citados. Dando continuidade a essas
lutas, que passam pela garantia da construção de uma ordem
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
144
societária fundada nos interesses das classes trabalhadoras,
queremos reafirmar propostas que coloquem na mãos das classes
trabalhadoras o curso e a direção da nação:
1. Rejeição a qualquer tipo de acordo com organismos multilaterais,
como o FMI e o Banco Mundial, que tragam prejuízos sociais para
as classes trabalhadoras, em especial para os usuários do Serviço
Social;
2. Fim das renegociações em torno da ALCA, entendendo-a como
lesivas aos interesses da soberania nacional, e apoio aos resultados
do Plebiscito Nacional organizado por diversas entidades como a
CNBB, a CUT e o MST;
3. Auditoria da dívida externa, considerada ilegítima por plebiscito
nacional organizado por diversas entidades em 2000;
4. Garantia dos direitos historicamente conquistados e consolidados
em lei, com posicionamento veemente contra a flexibilização das leis
trabalhistas e pelo veto à Lei Dornelles;
5. Manutenção dos tratados da OIT, a exemplo da Convenção 103,
que trata da licença maternidade;
6. Apoio à reforma agrária, considerando-se, especialmente, as
propostas do MST;
7. Abertura imediata de concursos públicos em todos os níveis e nas
diferentes áreas profissionais;
8. Reposição das perdas salariais dos servidores públicos,
considerando os oito anos de congelamento salarial;
9. Aumento real do salário mínimo até os marcos estabelecidos para
a garantia de um padrão de vida digno;
10. Respeito às manifestações da sociedade civil organizada;
11. Criação de mecanismos e políticas que combatam efetivamente
a desigualdade social;
12. Combate à fome, que assola 20% da população brasileira;
13. Criação de políticas de geração de trabalho e renda amparadas
por direitos trabalhistas estabelecidos em lei;
14. Defesa da Seguridade Social Pública e Estatal, ampliando o
leque das políticas públicas e criando o Ministério da Seguridade
Social, com orçamento específico;
15. Universalização dos direitos sociais e gestão democrática das
políticas públicas, garantindo seu caráter participativo,
descentralizado e redistributivo, respeitando-se os parâmetros
constitucionais;
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
145
16. Defesa da Saúde, da Previdência Social e da Assistência Social
como políticas públicas de caráter universal, componentes da
Seguridade Social, assegurando as diretrizes de descentralização
políticoadministrativa, comando único em cada esfera de governo,
com participação popular, controle social e financiamento próprios;
17. Respeito às decisões das Conferências Nacionais, reconhecidas
como fóruns legítimos de Políticas Públicas;
18. Garantia do Serviço Social como serviço da Previdência Social,
com imediata recomposição do quadro e das atividades previstas
originalmente no regimento interno do INSS;
19. Garantia dos princípios do SUS com qualidade e resolutividade;
20. Inclusão do assistente social na equipe mínima do Programa de
Saúde da Família (PSF), considerando-se a efetividade do conceito
ampliado de saúde e os princípios do SUS;
21. Garantia de efetivação da política de recursos humanos na área
da saúde, conforme preconizado pelo SUS;
22. Criação e implementação de uma política pública de formação e
qualificação de recursos humanos na área da justiça e segurança
pública, com vistas ao desempenho profissional ancorado no
respeito aos direitos humanos;
23. Repúdio à terceirização dos serviços de custódia e assistência
(médica, educacional, social etc.) das prisões brasileiras, com o
efetivo respaldo do Ministério da Justiça e dos respectivos governos
estaduais;
24. Defesa intransigente do Estatuto da Criança e do Adolescente,
criando condições para sua plena execução;
25. Compromisso com a defesa dos direitos humanos,
compreendidos enquanto direitos econômicos, sociais, culturais e
políticos, observadas as propostas dos movimentos da área;
26. Repúdio veemente à pena de morte;
27. Defesa intransigente da inimputabilidade penal até os 18 anos;
28. Defesa de iniciativas sociais e do cumprimento de legislações
nacional e internacional que, no âmbito da justiça, prevêem sanções
para práticas discriminatórias e preconceituosas;
29. Estímulo à construção e ampliação de redes de serviços de
atendimento, com capacitação especializada na área de políticas
públicas de gênero, raça/etnia, orientação sexual e dependências
químicas;
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
146
30. Redirecionar a Política Nacional Anti-Drogas, a fim de garantir o
seu caráter intersetorial, deslocando-a da área específica da
Segurança Pública;
31. Apoio à Política Nacional do Idoso, com vistas à ampliação e
garantia dos direitos do envelhecimento no país;
32. Garantia plena dos direitos e ampliação das políticas voltadas às
pessoas portadoras de deficiências;
33. Apoio às decisões do Congresso Nacional de Educação, em
especial àquelas que visam o combate à exclusão sócio-educacional
em todos os níveis;
34. Defesa da autonomia das universidades públicas, segundo a
concepção da comunidade acadêmica, e recusa à concepção de
autonomia financeira como sinônimo de privatização;
35. Recusa às pressões da Organização Mundial do Comércio
(OMC) de incluir a educação, em todos os seus níveis, como
serviço, no rol das mercadorias sujeitas à especulação do mercado
globalizado;
36. Defesa intransigente da universidade pública, laica, gratuita,
crítica e de qualidade;
37. Veto ao parecer nº. 100/02 do CNE/CES, o qual fixa em 03 anos
o tempo mínimo dos cursos de graduação e estabelece um
percentual máximo de 15% para atividades práticas (estágios),
pesquisa e intervenções supervisionadas, e 15% para atividades
acadêmico culturais;
38. Recusa ao modelo de avaliação institucional instituído através
do Provão;
39. Garantir que as Diretrizes Curriculares dos cursos de graduação,
construídas democraticamente pelas Entidades das categorias,
sejam consideradas e aprovadas pelo CNE/CES, suspendendo
Pareceres e Resoluções que não respeitam esses processos;
40. Implementar ações efetivas no combate à corrupção no país,
legitimada pela impunidade que mutila e viola os direitos humanos
(civis, políticos, culturais e sociais);
41. Garantia de políticas públicas eficazes de convivência com a
seca do Nordeste;
42. Respeito do direito à posse da terra aos povos remanescentes
de quilombos;
43. Respeito à organização e autodeterminação dos povos da
floresta;
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
147
44. Respeito à organização e autodeterminação dos povos
indígenas,
garantido-lhes a posse definitiva da terra;
45. Garantir serviços públicos de transportes hidroviários de
qualidade, de modo a atender as peculiaridades das populações
amazônicas;
46. Implementar política de segurança na Amazônia de modo a
evitar o avanço do narcotráfico e do contrabando de recursos
(animais, minerais e vegetais), salvaguardando a soberania
nacional;
47. Pelo incremento de um processo de desenvolvimento
sustentável que respeite o meio ambiente e a biodiversidade;
48. Incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento científico nacionais,
instituindo mecanismos de controle no processo de coleta de
material e produção do conhecimento, evitando seu patenteamento
por nações estrangeiras;
49. Criar política de redistribuição tributária que garanta o retorno
proporcional da arrecadação sobre a exploração e exportação de
bens naturais, verticalizando a produção.
Esperamos que essas propostas façam parte não da plataforma
política das candidaturas, mas que possam efetivamente ser
incorporadas nos programas de governo. Nossos compromissos são
com a construção de um Brasil justo e igualitário, que só se realizará
com a afirmação das propostas acima arroladas.
Reafirmamos nossa veemente recusa da “velha indiferença” do
neoliberalismo e oferecemo-nos à construção coletiva de um “Brasil
diferente”, orientado pelos compromissos expostos nesta Carta.
Brasília-DF, 03 de Setembro de 2002.
Assistentes Sociais reunidos no XXXI Encontro Nacional
CFESS/CRESS
O documento aborda de forma breve, o apanhado de aspectos que
compõem a estrutura social brasileira, que na acepção de Martinelli (2004, p. 02) “é
a representação formal e aparente da organização política, social e econômica de
um povo”.
Retomando-se às percepções sobre a crise capitalista, que aqui é
concebida de forma ‘orgânica’, Hobsbawm (1993) expõe um cenário político e
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
148
econômico com evidências do distanciamento entre o avanço capitalista e as
demandas sociais, marcado pelo livre mercado e pela democracia política.
Neste campo contraditório e de metamorfoses do sistema capitalista,
as demandas afetas aos direitos de crianças e de adolescentes no país se
caracterizam também pela via da implementação das conquistas no âmbito jurídico-
formal.
Sobre este aspecto e chamando a atenção para a extensão da análise
para além do campo econômico, Simionatto escreve que:
A crise do capitalismo contemporâneo, "crise orgânica" no dizer de
Gramsci, resulta, portanto, de dificuldades não somente no terreno
econômico, mas também no ideológico, esfera onde se produzem e
se mantêm as resistências aos impulsos de unificação da
consciência humana. Romper essa unidade ideológica, criticar a
concepção de mundo "imposta" do exterior requer a elaboração de
uma nova forma de pensar, crítica e coerente, viabilizadora de
práticas sociais. http://www.acessa.com/gramsci/?page
Perpassando o texto da Carta aos Presidenciáveis, encontra-se a
concepção de Estado, que guarda estreita relação com o pensamento de Gramsci,
ratificado por Semeraro ao colocar que:
Nasce daqui a função ‘ética’ e educativa’, de ‘impulso histórico’ e de
‘elevação moral e intelectual’ das massas, que o Estado
democrático deve passar a desempenhar (...) ‘Estado ético =
sociedade civil = sociedade regulada’, onde o Estado se torna ético
porque promove o crescimento da sociedade civil sem anular as
suas liberdades; e esta ao amadurecer, dispensa as intervenções
exteriores do Estado, porque o grau de socialização e o de
responsabilidade alcançados inauguram os tempos novos duma
sociedade regulada pelas próprias iniciativas. (1999; p.77)
Ao colocar-se como sujeito partícipe para a construção coletiva de um
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
149
“Brasil diferente”, conforme expõe o texto da Carta aos presidenciáveis, os
assistentes sociais presentes ao XXXI Encontro Nacional, disponibilizam a categoria
profissional como um sujeito social comprometido com este movimento histórico que
exige transformações na sociedade.
Sujeitos profissionais que se colocam imbuídos de conhecimento para
identificar as diferentes expressões sociais e lidar com elas. Neste sentido,
consubstancia o que prescreve os princípios fundamentais do Código de Ética
Profissional dos Assistentes Sociais, especialmente ao vincular o projeto profissional
ao processo de construção de uma nova ordem societária.
O conjunto CFESS/CRESS se dispõe a uma relação educativa e ética
com a sociedade de forma a contribuir com as transformações no campo econômico,
cultural e social, necessárias para a superação da dominação-exploração de classe.
A Carta expõe que a economia brasileira cumpre a inexorável
necessidade da acumulação capitalista, representando a vontade política dos grupos
que a manipula em sintonia com as mudanças na divisão internacional do trabalho.
Dentre os aspectos mencionados, destaca-se a apreensão dos dados
estruturais projeto neoliberal - e conjunturais, devidamente refutados em sua
origem e reprodução social, ressaltando a necessária produção de relações sociais
condicionadas á criação de um ‘Estado Integral’.
Este documento merece destaque por tratar a realidade social em sua
totalidade, cujo conteúdo além de expressar o posicionamento político da categoria
dos assistentes sociais
54
, sinaliza a organização de uma agenda de ações políticas
compatíveis com as demandas sociais e com o desejado rumo à ‘uma nova ordem
54
Mesmo compreendendo que o posicionamento dos assistentes sociais não é unívoco, trata-se de uma parcela que
representa o conjunto da categoria profissional
.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
150
societária’
55
.
Esta Carta aos Presidenciáveis expressa aspectos éticos relevantes
como o compromisso da categoria em socializar e ‘difundir criticamente as verdades
descobertas’, transformando-as em ‘bases para as ações vitais ’. Por este
caminho a categoria profissional também adensa posicionamentos ético-políticos de
forma pública, que contribuem para construção paulatina de sua nova identidade
profissional.
Em consonância com esse posicionamento dos profissionais,
Simionatto acrescenta, em seu artigo, algumas das decorrências do projeto político-
social que vinha sendo adotado:
O projeto político-social voltado para o fortalecimento da ordem
econômica confere ao Estado, no entanto, um forte potencial de
cooptação e supremacia, provocando, no campo ideológico, a
conseqüente despolitização das classes subalternas. Essa prática,
marcadamente conservadora, antidemocrática e excludente, leva a
burguesia a fazer e refazer suas alianças, a romper os elos que
unem as classes e seus dirigentes, tornando-as cúmplices da
dominação burguesa e cerceando as possibilidades de formação de
organizações revolucionárias. http://www.acessa.com/gramsci/page
4/5/2008 18:52
A Carta explicita os princípios que fundamentam o projeto ético-político
da profissão ressaltando o compromisso com os indicativos intransigentes quanto a
defesa dos direitos humanos; com a radicalização da democracia no país; e com a
viabilização do acesso às políticas sociais de direitos.
Os debates e as manifestações públicas direcionadas para a
democratização das relações sociais sinalizam posições e deliberações por parte do
conjunto CFESS/CRESS, indicam a nova identidade profissional. Consubstanciam o
processo dialético entre as necessidades sociais e a implementação de políticas
55
Em conformidade com os princípios que fundamentam o Código de Ética profissional do Assistente Social
.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
151
públicas de forma simultânea e indissolúvel influenciando na criação de novos
parâmetros políticos e culturais.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
152
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
153
4.1.9 - XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2003.
O XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS realizado em 2003 na
cidade de Salvador, deliberou sobre a seguidade social da seguinte forma:
1. “Mapear”a :representação do conjunto e criar mecanismos de
articulação dos representantes dos CRESS nos conselhos e Fóruns
de políticas públicas.
2. Fortalecer /retomar os Fóruns de Políticas Públicas como espaços
de fortalecimento da sociedade civil, no âmbito estadual, inclusive
promovendo momentos de integração entre os diversos conselhos.
3 Avaliar a participação dos CRESS nos conselhos de Políticas
Públicas e de defesa de direitos, articulando-a com as comissões
temáticas do conjunto.(
relatório de deliberações do XXXII Encontro
Nacional CFESS/CRESS/ 2003
)
Estes posicionamentos e deliberações correspondem à concepção do
Serviço Social como uma profissão inserida no movimento orquestrado pelas
relações travadas na sociedade. Desta forma, tal qual a percepção de Yazbek
(2007), o trabalho do assistente social pode colaborar na construção de uma nova
hegemonia, e sobretudo, pode contribuir para politizar as relações despolitizadas.
Como parte desta potencialidade profissional, é factível a compreensão
de que “os Conselhos de defesa de direitos e de controle social das políticas
públicas também destacam-se como espaços onde o protagonismo dos assistentes
sociais na defesa da justiça, da democracia, da cidadania e de direitos se faz
notar”(YAZBEK, 2007)
Neste caminho, a participação de assistentes sociais representando a
categoria profissional nos espaços instituídos, torna-se imprescindível na luta pela
nova hegemonia. É uma aposta e interferência na formatação do Estado,
contribuindo para o que Gramsci já apontara: “na realidade, o Estado deve ser
concebido como um ‘educador’, pois, tende exatamente a criar um novo tipo ou nível
de civilização” (1990; p.109).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
154
Nas recomendações gerais do conjunto CFESS/CRESS para as áreas
de seguridade social, criança e adolescente registra-se:
Contribuir para o redimensionamento das ações da Política de
Assistência Social à Criança e ao Adolescente, a fim de estabelecer
ações políticas de capacitação continuada para os atores envolvidos
(Conselhos de Direitos e Conselhos Tutelares), evitando
superposiçãode ações;
Defender o desenvolvimento de políticas de capacitação continuada
aosConselhos da Criança e do Adolescente;
Contribuir para o redimensionamento da competência dos conselhos
dedireitos para propor e articular políticas de garantias dos direitos
básicosa crianças e adolescentes junto às políticas setoriais
públicas;
(relatório de deliberações do XXXII Encontro Nacional
CFESS/CRESS, 2003
)
As recomendações ratificam a preocupação com a flexibilidade das
relações políticas, a cooptação e o desmantelamento operado pelo Estado, dos
espaços de deliberação de políticas públicas, enfatizando o compromisso da
categoria dos assistentes sociais no fortalecimento destes espaços necessários a
consolidação da democracia.
Para Evaldo Vieira (2004, p.134) a “sociedade democrática é aquela na
qual ocorre real participação de todos os indivíduos nos mecanismos de controle de
decisões, havendo, portanto, real participação deles nos rendimentos de produção”.
Este fortalecimento deve ser pensado considerando a transformação
social e reinvenção da política. Este é o exato entendimento de Nogueira (2004,
p.164):
Apenas pode avançar se seus cidadão forem alcançados por
processos fortes de educação política, de conscientização cívica e
de politização. Esses cidadãos não são apenas seus protagonistas
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
155
principais: são sua garantia. São requisitos dela e produto dela.
Cidadão ativos, afinal, portadores de direitos e de deveres, mas,
concomitantemente, construtores de ‘bons governos’ e da ‘boa
sociedade’, dependem tanto de instituições políticas e de marcos
jurídicos adequados quanto de condições adequadas de
participação na esfera blica. Requerem, em suma, procedimentos
e atos participativos.
E continua o relatório:
Garantir a descentralização e municipalização das políticas sociais,
através do levantamento das demandas sociais locais;
Contribuir para a instituição e fortalecimento, em nível local, de rede
de serviços, com vistas à garantia dos direitos da criança e do
adolescente;
Fortalecer os Conselhos Estaduais de Direitos da Criança e do
adolescente, das frentes de defesa e do SIPIA; (
relatório de
deliberações do XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS/ 2003)
É posicionamento conjunto do CFESS/CRESS justamente de fortalecer
os processos participativos, regulares, contínuos capazes de enraizarem uma
cultura permanente e não políticas e programas que ruem não raras ineficientes.
Defesa de uma política de capacitação continuada, na perspectiva
do fortalecimento dos Conselhos de Políticas Públicas, de Direitos e
Tutelares,envolvendo todos os seus atores.
Proposição de mecanismos de monitoramento e avaliação das
ações de efetivação das políticas públicas, utilizando-se dos
instrumentos de informação, a exemplo do SIPIA. (
relatório de
deliberações do XXXII Encontro Nacional CFESS/CRESS, 2003)
Este balizamento do CFESS/CRESS coaduna com o que coloca
Nogueira (2004, p.156):
A ineficiência, a ineficácia e a falta de efetividade também devem
ser vistas como obstáculos. Os processos participativos são quase
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
156
sempre longos e vivem ameaçados pela inconstância e pela
irregularidade. Caso procedam por espasmos, não produzirão
efeitos virtuosos, ou seja, serão ineficientes e pouco efetivos. Para
ser constante e regular, a participação precisa de treino, de
educação política, consciência cívica. (2004; p. 156).
Sobre as potencialidades da efetiva contribuição do profissional de
Serviço Social com a construção de um novo projeto societário, Yazbek (2007, p.
7/8) escreve que:
Sem dúvida, o assistente social é um profissional habilitado para
propor, elaborar e executar políticas, programas e serviços no
campo da iniciativa governamental, empresarial e/ou da sociedade
civil organizada nessa direção. Do que estamos tratando? Estamos
tratando da questão da hegemonia, na condução do processo de
construção de direitos não apenas como questão técnica, mas como
questão essencialmente política, lugar de contradições e resistência.
Âmbito a partir do qual seja possível “modificar lugares de poder
demarcados tradicionalmente, e portanto de abertura para construir
outros.
O relatório indica a preocupação do conjunto CFESS/CRESS através
da abordagem articulada entre ética e direitos humanos, na tentativa de qualificar
a participação dos sujeitos políticos nos mais diversos espaços políticos:
Reconhecer a apropriação de cada regional sobre as legislações
relacionadas aos Direitos Humanos, assim como, algumas leis que
fundamentam Políticas Públicas brasileiras e que apontam direitos
relativos à população às quais se dirigem: ECA, Estatuto do Idoso,
Lei de Execução Penal e outras.
Promover a capacitação na área de Direitos Humanos, priorizando
os profissionais já capacitados no curso Ética em Movimento, para
estabelecer relação entre Ética e Direitos Humanos e qualificar a
participação/ intervenção da categoria e de conselheiro(a)s nos
espaços políticos. (
relatório de deliberações do XXXII Encontro Nacional
CFESS/CRESS, 2003
)
Alé de apontar os posicionamentos da categoria dos assistentes
sociais, o texto deliberativo reconhece as Conferências Nacionais como a instância
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
157
legítima para a formulação das políticas de direitos.
Sobre este aspecto, IAMAMOTO (2002, p. 33) escreve que “torna-se
fundamental estimular inserções sociais que contenham potencialidades de
democratizar a vida em sociedade, conclamando e viabilizando a ingerência de
segmentos organizados na sociedade civil na coisa pública”.
A participação do assistente social na relação entre Estado e
sociedade acontece num movimento contínuo, perpassado de tensões, resultando
na produção de novos valores, representações e práticas sociais. Cabe-lhe como
alternativa coerentemente com seu projeto ético político profissional “promover a
participação política das massas, desenvolver seu protagonismo ativo e consciente
na sociedade (SEMERARO,. 1999, p.93).
Aspectos que referem-se a uma reforma intelectual e moral, inscrita no
campo das idéias e da ação política no âmbito das práticas sociais.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
158
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
159
4.1.10 - XXXIII Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2004
O XXXIII Encontro CFESS/CRESS foi realizado em Curitiba, no ano de
2004, com o eixo temático Seguridade Social, nele destacamos a seguinte
recomendação:
13. Incorporar na agenda política do conjunto CFESS/CRESS,
através das comissões de seguridade social e de ética e direitos
humanos, a luta contra a violação de direitos da criança e
adolescente expressa na forma de trabalho infantil, exploração
sexual, violência doméstica e sexual, violência institucional e outras
(Relatório do XXXIII Encontro Nacional CFESS/CRESS, 2004)
Compreendendo que estas violações a que estão expostas crianças e
adolescentes em condições de subalternidade, os desqualifica para a vida em
sociedade, corroendo-lhes o grau de humanidade e de possibilidades. Neste sentido
torna-se importante a forma abordada por Gramsci (CC vol 1; p. 413) ao conceber o
homem como uma “a série de relações ativas (um processo) no qual, a
individualidade tem a máxima importância”.
A superação destes processos de desumanização e de subalternidade
a que estão submetidas crianças e adolescentes, é contemplada reiteradamente na
pauta de discussão e de proposições políticas do conjunto CFESS/CRESS.
Trata-se do “enfrentamento da subalternidade no campo social e
político que vem se articulando em torno da consciência acerca do caráter
cumulativo e comum do processo de pobreza e exclusão a que estão submetidos os
subalternos”(YAZBEK, 2006, p. 170).
Contribuir no processo de capacitação dos conselheiros da
sociedade civil para o exercício do controle social. 9. Contribuir para
o redimensionamento da competência dos Conselhos de Direitos
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
160
para propor e articular políticas de garantia de direitos básicos a
crianças e adolescentes junto às políticas setoriais públicas
Contribuir para a instituição e fortalecimento, em nível local, de rede
de serviços, com vistas à garantia dos direitos da criança e do
adolescente.
Incorporar na agenda política do conjunto CFESS/CRESS, através
das comissões de seguridade social e de ética e direitos humanos, a
luta contra a violação de direitos da criança e adolescente expressa
na forma de trabalho infantil, exploração sexual, violência doméstica
e sexual, violência institucional e outras. (
relatório do XXXIII Encontro
Nacional CFESS/CRESS – 2004).
As contribuições podem ser compreendidas como um trabalho coletivo,
uma ação política que atravessa as esferas da economia, da cultura e da ideologia.
As questões que se referem a capacitação dos conselheiros marcam a
necessidade de qualificação do sujeitos sociais para novos espaços instituídos.
Esta qualificação e aprimoramento amplia as possibilidades de democratização das
políticas públicas. É uma perspectiva que converge com o que fora abordado de
que a dimensão formativa corresponde à instrumentalização teórica permanente
para a participação nos espaços instituídos através de estudos, debates, posições
políticas definidas e subsidiadas. (SILVEIRA, 2004, p.141)
A formação cultural da sociedade brasileira aponta para o
aprisionamento ao favoretismo e ao clientelismo político. O desafio posto, a priori, é
o de concretizar a participação política e de materializar os direitos.
Conforme ressalta Gramsci (1989, p.41/42), referindo-se "à ruptura
com esses estigmas, partia da concepção de que essas crianças e
adolescentes/homens não deveriam ser vistos "(...) isoladamente, mas repletos de
possibilidades oferecidas pelos outros homens e pela sociedade das coisas (...)
onde residem elementos da vida social, nos quais, de maneira mais evidente e
ampla (isto é, com extensão de massa), manifesta-se o conjunto das relações
sociais". (1989:41/42)
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
161
Esta é uma questão intrínseca à educação política, sendo que a
educação aqui contempla a relação entre o político e o pedagógico, que, de forma
simultânea e indissolúvel, movimenta-se, acompanhando a dinamicidade da
realidade social, influindo na criação de novos parâmetros culturais.
Durante o XXXIII Encontro Nacional do CFESS/CRESS, ao abordar o
eixo temático eixo temático Ética e Direitos Humanos, a deliberação trata da:
Realização pelo conjunto CFESS/CRESS de um movimento de
publicização de seu posicionamento frente à violação dos direitos
dos adolescentes em situação de conflito com a lei através das
seguintes estratégias: Fortalecimento da articulação com órgãos de
fiscalização e controle (Ministério Público, Vara da Infância e
Juventude, Conselhos de Direitos, etc.) e movimentos de defesa dos
direitos humanos;
Promover articulação estratégica e sistemática com outros sujeitos
políticos que como o Serviço Social tem por compromisso a luta pela
cidadania, pela justiça social e pela democracia, enquanto
socialização da política e da economia, visando a ampliação e o
fortalecimento do projeto ético-político.(
relatório do XXXIII Encontro
Nacional CFESS/CRESS – 2004
)
As posições frente a violações de direitos de crianças e de
adolescentes, referem-se a abordagem gramsciana sobre a intransigência, ao
referir-se que “um organismo social possa ser disciplinado intransigentemente é
necessário que ele tenha uma vontade (um objetivo) e que o objetivo seja racional,
seja um objetivo verdadeiro e não um objetivo ilusório” (1990, p. 159).
As ações emanadas pelo conjunto CFESS/CRESS direcionam-se no
caminho de afirmação de um projeto ético-político profissional como resultante de
objetivos de uma coletividade.
O caminho a ser percorrido é em direção da luta pela efetivação dos
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
162
direitos e da consolidação da cidadania e do acesso aos direitos, negando-se as
diferentes formas de autoritarismo e arbítrio.
Como forma de publicizar posicionamentos e manifestar-se diante da
conjuntura nacional marcada pelo aviltamento aos direitos e os riscos de retrocessos
nas conquistas constitucionais, o coletivo de assitentes sociais aprova a carta de
Curitiba, durante o XXXIII Encontro Nacional CFESS/CRESS.
CARTA DE CURITIBA
As(os) assistentes sociais brasileiras(os) reunidos no XXXIII
Encontro Nacional CFESS/CRESS, na cidade de Curitiba (PR),
entre os dias 4 e 7 de setembro de 2004, balizados em seu projeto
ético-político profissional, afiançam publicamente:
1. A defesa da luta por terra, trabalho e seguridade social pública no
país;
2. A não banalização da violência e naturalização da pobreza, da
exclusão e da subalternidade;
3. A concepção de seguridade social entendida como um padrão de
proteção social de qualidade, com cobertura universal. Consolidada
num plano legal, a seguridade social tem sido atropelada, em todos
os governos, por reformas neoliberais que atentam contra o
aprofundamento da democracia e da cidadania na sociedade
brasileira;
4. O governo Lula tem convivido com uma grande contradição em
seu discurso: adotar uma perspectiva de "inclusão social" mantendo
a política econômica herdada do governo de Fernando Henrique
Cardoso claramente promotora da desigualdade social no país.
Constata-se que a seguridade social pública está
vivendo um processo de desmonte: os direitos conquistados pelos
trabalhadores no âmbito da previdência social, por exemplo, foram
subtraídos, destacando-se: queda no limite do teto da
aposentadoria, cobrança da contribuição previdenciária dos
pensionistas e aposentados e a criação de um amplo mercado para
a previdência complementar, colocando os trabalhadores num
horizonte de riscos e incertezas;
5. A assistência social está voltada para os pobres em extrema
vulnerabilidade, mostrando-se restrita e limitada. Suas proposições
inovadoras, como a criação do SUAS e a unificação dos programas
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
163
de transferência de renda poderão ser efetivadas se garantidos
recursos no orçamento da união;
6. A saúde está se tornando um sistema cada vez mais
fragmentado. Os três grandes subsistemas: o público (SUS),
destinado a 130 milhões de brasileiros, o privado de atenção médica
suplementar destinado a 40 milhões e o privado de oferta direta
paga pelo usuário, evidenciam o descumprimento do princípio
constitucional da universalidade nesse atendimento e a tendência a
privatização desse direito. A precarização da saúde é agravada pelo
aumento insuficiente da verba para esse setor: No ano de 2003,
foram destinados 25 bilhões de reais para a saúde enquanto que em
2004 esse número passou para apenas 28,4 bilhões de reais;
7. No tocante ao ensino superior assiste-se ao avanço da educação
como mercadoria. Entre 1988 e 2003, o número de cursos de
graduação no país apresentou um crescimento de 107% , sendo
que hoje 88% do total das instituições de ensino são privadas. O
aumento da rede privada no período de 1998 a 2002 foi de 200%
com a criação de 264 instituições. Essa tendência promove a
criação de cursos voltados apenas para o mercado, em detrimento a
uma formação crítica e humanista dos estudantes.
Diante desse panorama as(os) assistentes sociais apresentam
algumas propostas para agenda política em defesa da seguridade
social:
- Luta pela primazia do Estado nas políticas sociais públicas;
- Luta pela expansão do investimento público estatal na área social
e combate às políticas focalistas, segmentadas e descontínuas;
- Luta pela alteração das políticas de contra-reforma, isto é, da
tendência de privilegiamento do capital especulativo financeiro em
detrimento das políticas sociais que garantam os direitos dos
brasileiros, numa perspectiva de distribuição de renda, riqueza e
construção de uma cultura política democrática;
- Articulação de um fórum unificado de seguridade social com a
participação dos Conselhos de Políticas e de Segmentos;
- Luta pela instalação do Conselho Nacional de Seguridade Social;
- Luta por uma nova ordem societária por meio da articulação dos
segmentos sociais que pactuam com os princípios da liberdade,
justiça social, democracia e cidadania.
Conselhos Federal e Regionais de Serviço Social - Gestão 2002-
2005 Curitiba - PR - 7 de setembro de 2004
Cabe destacar aqui, o entendimento de ‘grande política’, conforme
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
164
aborda Coutinho (2003, p. 72), citando Gramsci em que: “pretende criar novas
relações de força e por isso, não pode deixar de se ocupar com o ‘dever ser’ não
entendido evidentemente em sentido moralista”, é o momento da afirmação da
teleologia, da liberdade.
A democracia aproxima-se inevitavelmente do entendimento de justiça
social, e eqüidade de acesso, participação, usufruto e produção dos bens e serviços
gerados na sociedade. Nesse sentido, Chauí (1993, p.194) considera que "a questão
democrática implica, pois, criar condições para que o cidadão seja soberano e
interfira realmente nas decisões sociais e econômicas através dos órgãos de
decisão política".
A existência de uma sociedade civil fortalecida constitui-se em uma
‘aposta’ de rompimento com as deformações das relações entre Estado e sociedade
(bloqueando as possibilidades dos interesses particulares se sobreporem aos
interesses públicos). Além de ampliar a produção e propagação de novos códigos de
expressão e de representações, que, para Bobbio (1982, p.48), “tenham um nexo
qualquer com a elaboração e difusão da cultura”.
Bobbio (1987) destaca a insuficiente educação dos cidadãos pelos
ideais democráticos, aos quais está ligado o entendimento de que a educação para
a democracia ocorre diante do próprio exercício democrático. Somente através da
prática democrática, torna-se possível a compreensão, a revisão dos procedimentos
democráticos e a construção de novos referenciais, em que os interesses coletivos
superem os interesses individuais.
Este é um processo que envolve uma nova hegemonia e a formação
de um movimento histórico coletivo capaz de operar a preterida transformação social
rumo a novas relações societárias.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
165
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
166
4.1.11 - XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS – 2005.
A realização do XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS ocorreu em
Manaus, em 2005, cujo tema destaca: Defender direitos e fortalecer movimentos
sociais: atribuição ética, política e profissional do assistente social para radicalizar a
democracia”.
Nela é nítida a prioridade com a qualificaficação profissional :
(...) enfim, o esforço do conjunto em dar respostas ‘as questões que
se apresentam nessa conjuntura, que retrata a preocupação em
qualificar cada vez mais a intervenção dos profissionais de Serviço
Social nas políticas públicas, enfocando a sua dimensão política e
reafirmando a relação de compromisso que deve se estabelecer
entre todos em uma mesma direção.
O balanço pode ser considerado positivo, embora desafiador, que se
desdobra em outras agendas para as entidades e a categoria na
defesa intransigente dos direitos humanos, justiça social e uma
sociedade democrática, pois como afirmam os assistentes sociais
na Carta de Manaus, a consolidação de direitos requer o
fortalecimento de práticas de resistência que estão em sintonia com
os princípios de defesa da liberdade, da radicalidade democrática,
comprometida com a socialização da riqueza e da participação
política, da justiça social e da construção de uma nova ordem
societária.(
Relatório do XXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS, 2005)
Segundo Yazbek (2006, p.170), “o estatuto político conferido às
práticas de resistência das classes subalternas à sua dominação nos revela mais
uma vez a diversidade e a riqueza dos espaços onde se constrói a classe”. Implica
em ‘costurar’ as lutas de classe contemplando suas lutas mais amplas.
Novos horizontes políticos aportam à vida social, reconstituindo a
percepção ampliada de política e de participação:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
167
Eixo Seguridade Social
Potencializar a participação do Conjunto CFESS/CRESS nos vários
espaços de controle social (Conselhos de direitos e fóruns de
políticas públicas);
Divulgar para os Assistentes Sociais, parlamentares e sociedade,
documento que expresse a posição do Conjunto CFESS/CRESS em
defesa do ECA, em especial no que diz respeito:
a) não alteração da idade de responsabilidade penal.
b) não ampliação do tempo de duração da medida sócio-educativa
de privação de liberdade. (
XXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS,
2005)
No que tange aos direitos da criança e do adolescente, além de
vincular-se aos princípios filosóficos, assim como filia-se à aplicabilidade do ECA ao
mencionar a participação do conjunto CFESS/CRESS nos espaços de controle
social.
Ao se considerar os direitos de crianças e de adolescentes prescrito no
ECA e a implantação de novas estruturas para a efetivação destes direitos, é
possível identificar a organização de relações societárias que implicam a
compreensão da dinamicidade dialética entre a formação cultural e política, diante
das práticas sociais.
Ao pautar a participação do conjunto CEFESS/CRESS nos Conselhos
de políticas públicas está presente a democratização das relações sociais. Nesta
direção Iamamoto (2001, p. 33) assinala que “torna-se fundamental estimular
inserções sociais que contenham potencialidades de democratizar a vida em
sociedade, conclamando e viabilizando a ingerência de segmentos organizados na
sociedade civil na coisa pública”.
Ainda no campo da defesa do ideário que orienta o conteúdo jurídico
do ECA, as deliberações apontam para a publicização dos posicionamentos do
conjunto CFESS/CRESS mediante a determinação da divulgação dos mesmos:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
168
EIXO TEMÁTICO V – Divulgação e Imprensa
Confeccionar materiais para distribuir nas Conferências de Saúde,
Assistência e da Criança e Adolescente, ressaltando os 15 anos do
ECA, 15 anos do SUS e implantação do SUAS (selos, adesivos,
cartazes). (Relatório do XXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS,
2005, p. 16)
O conjunto CFESS/CRESS contribui com a publicização dos direitos
produzindo e distribuindo material de divulgação. Estes materiais explicitam os
compromissos da categoria profissional com a defesa de direitos, aqui se
destacando os assegurados no ECA. Encontram-se disponíveis no site do CFESS
para consulta e reprodução.
O XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS deu origem a Carta de
Manaus, que a seguir será trancrita:
CARTA DE MANAUS
O Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Serviço Social,
reunidos no XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS, realizado em
Manaus/AM, no período de 04 a 07 de setembro de 2005, se
manifestam veementemente contrários à política econômica
realizada pelo Governo Federal, de forte orientação neoliberal, que
se subordina ao capitalismo financeirizado. A opção por uma política
que favorece o capital em detrimento das demandas do trabalho
vem provocando a elevação progressiva dos juros, o que permitiu
aos bancos obter lucro de R$ 20,8 bilhões em 2004 (Andes, 2005) e
enfraquece o setor produtivo, gerando baixos índices de
crescimento, aumento do desemprego e precarização
do trabalho.
A ampliação do superávit primário (diferença entre arrecadação e
gastos, utilizada para pagamento dos juros da dívida pública), que
saltou de 3,19% do PIB em 1999 para 4,61% em 2004, vem
superando a meta estabelecida pelo próprio Fundo Monetário
Internacional (FMI), que em 2004 foi de 4,5% do PIB. Esta
regressiva política econômica que prioriza o pagamento de juros e a
redução do chamado “risco Brasil” reduz investimentos em políticas
públicas e agrava o “risco social”, provocando:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
169
1) redução dos gastos sociais, que em 1995 correspondiam a 85%
da arrecadação federal e passaram a corresponder a apenas 75%
em 2004. Neste ano, o total de gastos com saúde, educação,
assistência social, organização agrária, segurança pública,
urbanismo, gestão ambiental, habitação, cultura e saneamento foi
de R$ 70 bilhões, enquanto a despesa com o superávit primário foi
de R$ 81 bilhões (FBO, 2005);
2) carga tributária regressiva, que o aumento de impostos para a
classe trabalhadora (impostos sobre o consumo) foi superior aos
impostos sobre o patrimônio;
3) desmonte da administração pública, pois o cumprimento das
metas provoca privatização e desestruturação de equipamentos e
serviços públicos e impõe redução de gastos com pessoal, o que
inviabiliza realização de concursos públicos;
4) devastação dos recursos naturais e do ecossistema,
transformando os bens naturais em mercadoria.
Esta política econômica se fortalece na grave crise política que
assola a sociedade brasileira e revigora forças conservadoras,
provocando o estreitamento da agenda social, a manutenção de
elites burguesas no poder, o clientelismo, o fisiologismo e a
fragilização das instituições democráticas. Dessa forma, a ênfase na
rentabilidade econômica se confronta com os anseios e propostas
forjados nas lutas da classe trabalhadora, corroendo a histórica
construção dos projetos de esquerda no Brasil.
O enfrentamento a essa direção econômica e social é possível
com a organização coletiva dos trabalhadores e o fortalecimento dos
movimentos sociais comprometidos com a defesa dos direitos como
processo estratégico de luta democrática e popular visando a
emancipação e a construção de uma sociedade não submetida aos
ditames do capital. É nesse sentido que a conquista de direitos na
ordem do capital não pode ser vista como um fim, como um projeto
em si, mas como via de transição a um padrão de civilidade que
começa pelo reconhecimento e garantia de direitos no capitalismo,
mas não se esgota nele. Contudo, constitui requisito fundamental na
instituição de bases objetivas para radicalização da democracia,
pautada na defesa de:
• amplo conjunto de direitos que conformem um sistema de proteção
social estatal, universal e equânime;
fortalecimento dos espaços de participação e controle social,
entendidos como espaços de socialização da política;
política econômica que valorize o investimento produtivo, a
geração e ampliação de empregos estáveis e garantidores de
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
170
direitos, o aumento da renda dos trabalhadores e garanta a
socialização da riqueza socialmente produzida;
aumento crescente de orçamento público para as políticas sociais,
com investimentos proporcionais à arrecadação, de caráter
progressivo e redistributivo e que não sejam utilizados para gerar o
superávit primário.
O Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Serviço Social
denunciam e reagem contra esta avassaladora política econômica
excludente e regressiva. A consolidação de direitos requer a recusa
intransigente dessa direção política, o fortalecimento de práticas de
resistência que estão em sintonia com os princípios de defesa da
liberdade, da radicalidade democrática, comprometida com a
socialização da riqueza e da participação política, da justiça social e
da construção de uma nova ordem societária.
Manaus, 07 de setembro de 2005.
A construção e materialização das políticas sociais que consolidam
direitos é complexa e confronta-se com os aspectos econômicos, sociais, culturais e
políticos que cercam a estrutura e a conjuntura do país. Trata-se da construção da
eqüidade social e de regras de civilidade nas relações sociais, concretizando a
possibilidade de democratização destas.
Cabe, aqui, a indagação de Gramsci, citada por Semeraro (1999, p.
87/88):
Pode existir reforma cultural, quer dizer: elevação civil das camadas
inferiores da sociedade, sem uma prévia reforma econômica e uma
mudança na organização social e no mundo econômico? Uma
reforma intelectual e moral, portanto, não pode estar ligada a um
programa de reforma econômica. Pelo contrário, o programa de
reforma econômica é exatamente a maneira concreta com a qual
toda reforma intelectual e moral se apresenta.
Sobre as expectativas geradas pela Constituição Federal de 1988, a
publicação CFESS Manifesta elaborada e distribuída durante a IV Conferência
Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, realizada em 2005, explicita que,
mediante a carta constitucional:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
171
Estava posta a possibilidade de instituição de um amplo sistema de
proteção social com direitos amplos, universais e equânimes; de
aprofundamento da socialização da política, por meio de
participação efetiva nos conselhos de gestão e conferências,
entendidos como espaços de disputa política de projetos societários;
e de alocação democrática e redistributiva dos recursos públicos, a
partir da criação do orçamento da seguridade social. Tal
perspectiva, contudo, vem sofrendo duros e sucessivos golpes, que
estão derruindo as potencialidades da seguridade social consolidar-
se como amplo e sólido sistema de proteção social capaz de reduzir
as persistentes desigualdades sociais no Brasil. No âmbito dos
direitos, estes não foram uniformizados e universalizados.
(CFESS/2005).
Dentre as atuais frentes de atuação do CFESS, destaca-se a
Comissão de Seguridade Social à qual se vinculam as lutas de defesa dos direitos
de crianças e de adolescente. Esta Comissão orienta-se pela concepção de
Seguridade Social do Conjunto CFESS/CRESS, conforme segue:
Defende a democracia e as políticas públicas, com ênfase na
concepção de uma seguridade social universal, gratuita e de
responsabilidade estatal. Através da participação nos fóruns, nos
Conselhos de Direitos e de Políticas defende concepções e explicita
os posicionamentos dos assistentes sociais. A concepção de
Seguridade Social defendida pelo Conjunto CFESS/CRESS amplia
para além do conceito inscrito na Constituição Federal de 1988.
(www.cfess.org.br/institucional/frentesdeatuação
)
Os extrados do relatório ora apresentados, expressam de forma
contundente e articulada o conjunto de princípios fundamentais tal qual consta no
Código de Ética Profissional do Assistente Social. Marca o compromisso da
categoria profissional com a luta pela hegemonia como seu propósito primordial.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
172
4.2 – O Projeto Ético-Político profissional do Serviço Social e a defesa de
direitos da criança e do adolescente – reflexões prospectivas.
Em meio aos ‘novos personagens’ que protagonizam a história da
defesa dos direitos de crianças e de adolescentes, encontra-se a categoria dos
assistentes sociais, ancorando-se em seu projeto ético-político, reunidos através das
entidades representativas da categoria, assim como inseridos nas diferentes
organizações sociais.
Esta tese marca o entendimento de que, “no âmbito político-
profissional, as entidades da categoria vêm envidando esforços memoráveis na
disseminação de uma concepção de direitos sintonizada e orientada pelo projeto
ético-político profissional.” (BEHRING & BOSQUETTI, 2006, p. 194).
Passam a assimilar o alargamento no âmbito da política.
Posicionamentos que se encontram expressos no Código de Ética Profissional do
Assistente Social de 1993, decorrendo daí marcos para um projeto ético-político
coerente com as necessárias “reformas” na sociedade brasileira.
Sobre este aspecto, Iamamoto (2001, p. 141) assevera que :
A consolidação do projeto ético-político profissional que vem sendo
construído requer remar na contracorrente, andar no contravento,
alinhando forças que impulsionem mudanças na rota dos ventos e
das marés na vida em sociedade.
A participação dos profissionais de serviço social nos novos espaços
instituídos - dentre eles os Foruns de Defesa de Direitos e os Conselhos de Direitos
da Criança e do Adolescente - impõe um direcionamento compatível com o projeto
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
173
ético-político em um campo de ação que supera o corporativismo, as vaidades
institucionais e as ações fragmentadas.
O caminho percorrido nos Encontros CFESS/CRESS demarcam ações
propositivas de defesa dos direitos de crianças e de adolescentes e de políticas
sociais em sintonia com as necessidades sociais.
Perspectivas políticas e de prática social projetadas aos profissionais
de Serviço Social que convergem com o pensamento de Marilda Iamamoto (2001,
p.78), ao escrever que:
O assistente social é tido como o profissional da participação,
entendida como partilhamento de decisões, de poder. Pode
impulsonar formas democráticas na gestão de políticas e
programas, socializar informações, alargar os canais que dão voz e
poder decisório à sociedade civil, permitindo ampliar sua
possibilidade de ingerência na coisa pública.
Este caminho expressa a construção de uma nova ordem política e
cultural, conforme se observa na produção dos relatórios de deliberação dos
Encontros Nacionais do conjunto CFESS/CRESS. As análises correspondem ao
alinhamento do coletivo dos assistentes sociais, à defesa de direitos e as
contribuições dessas deliberações para mudanças no âmbito da cultura que
determina o acesso aos direitos e às políticas de direitos de crianças e de
adolescentes.
As aproximações entre o projeto ético-politico do Serviço Social e a
defesa de direitos de crianças e de adolescentes prescrevem, para além dos
aspectos da economia e da política, a sedimentação de um novo projeto sócio-
cultural. Perspectiva que corresponde a abordagem de Simionatto, ao escrever que:
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
174
“A compreensão da historicidade do social, no pensamento
gramsciano, não está desvinculada da economia, do
desvendamento das relações de produção, mas o pensador italiano
também compreende que a luta pela emancipação política do
proletariado não se esgota no terreno econômico, pois, dadas as
condições de subalternidade intelectual às quais sempre estiveram
submetidas as classes trabalhadoras, torna-se necessário o
encaminhamento de um novo projeto cultural que propicie o
desenvolvimento de uma vivência democrática independente do
domínio ideológico da classe burguesa”.
http://www.acessa.com/gramsci/?page 04/05/2008
Os relatórios dos Encontros Nacionais CFESS/CRESS, ao abordar o
ECA e os direitos de crianças e de adolescentes, sinalizam o que já abordara
Silveira (2004, p. 157):
As expectativas políticas que o ECA contempla, ora de forma
explícita, ora de forma latente, supõe um movimento cultural que
envolve alterações de valores, representações, comportamentos e
práticas sociais, não somente na relação direta com a população
infanto-juvenil, mas apontando novas formas de organização social,
de acordo com os princípios democráticos.
Coerentemente com o projeto ético-político do Serviço Social,
vislumbra-se uma ‘nova ordem societária’ a ser construída no tecido próprio das
relações sociais. Nessa construção contemplam-se as crianças e os adolescentes
como partícipes e como sujeitos de direitos. A consolidação deste paradigma vem
ocorrendo paulatinamente, mediante o esforço e a luta de ‘personagens’
56
e, ainda,
com muitos desafios diante do caminho pretendido.
É uma trilha que envolve a superação da atual estrutura social e que
corresponde também a criação de uma nova cultura. Como aborda Gramsci (CC Vol
I: 2006, p.95):
56
Dentre estes ‘personagens’ estão as entidades da categoria dos assistentes sociais, visto os assistentes sociais se
colocaram diante das demandas e lutas populares como sujeitos políticos deste processo.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
175
Criar uma nova cultura não significa apenas fazer individualmente
descobertas ‘originais’; significa também, e sobretudo, difundir
criticamente verdades já descobertas, ‘socializá-las’ por assim dizer;
e, portanto, transformá-las em base de ações vitais, em elemento de
coordenação e de ordem intelectual e moral.
O estudo dos relatórios aponta que os Encontros Nacionais
CFESS/CRESS incorporam as contribuições com uma nova formação cultural. A
partir de suas prerrogativas, debates sobre temas contemporâneos e deliberações –
extrapolam a agenda de emergências impostas socialmente.
Os relatórios dos Encontros CFESS/CRESS, expõem temáticas que
ora estão ocultas e ora compõem a arena política e social do país
57
. As análises
demonstram o vigor das entidades de representação da categoria dos assitentes
sociais ao pensar a realidade social em sua totalidade.
a relação dialética entre os direitos e o aporte legal nos remete ao
pensamento de Vera Telles (1999, p.139) ao colocar que “para além das garantias
formais, os direitos estruturam uma linguagem pública que baliza os critérios pelos
quais os dramas da existência são problematizados e julgados nas suas exigências
de eqüidade e justiça”.
Porém, essas projeções de ordem teórica, jurídica e política,
encontram resistências e entraves em sua implementação por conta da estrutura de
classes que envolve a sociedade brasileira.
Cabe o destaque para a formulação e aprovação das Cartas, que
expressam de forma abrangente e contundente as percepções sobre o tecido social
e seus entrelaçamentos. Retoma-se Gramsci e a crítica ao capitalismo e seu
57
Temas como a erradicação do trabalho infantil, a implantação dos organismos previstos no ECA, a aplicação das medidas
sócio-educativas tal qual prevê o ECA, dentre outros, que são relevantes à consecução dos direitos de crianças e de
adolescentes e que são omitidos e/ou protelados do debate público e da sua aplicação em consonância com o ECA.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
176
pretenso processo “civilizatório” é que permite formar a “consciência unitária do
proletariado: e crítica quer dizer cultura, e não evolução espontânea e natural” (CC
vol.I, 2006; p.60).
Estas Cartas extrapolam o interior da categoria dos assistentes
sociais, pois, ao serem publicadas, contribuem fortemente com a sedimentação de
uma nova identidade profissional vinculada ao compromisso com a universalização
dos direitos e com a transformação social.
Tal perspectiva converge com os princípios fundamentais do Código de
Ética no sentido que reflete Marilda Iamamoto
(2001, p.78):
Os princípios constantes nodigo de Ética são focos que vão
iluminando os caminhos a serem trilhados, a partir de alguns
compromissos fundamentais acordados e assumidos coletivamente
pela categoria. Então ele não pode ser um documento que se
‘guarda na gaveta’: é necessário dar-lhe vida por meio dos sujeitos
que, internalizando seu conteúdo, expressam-no por ações que vão
tecendo o novo projeto profissional no espaço ocupacional cotidiano.
O aporte teórico-metológico, ético-político e técnico-operativo que
orientam o Serviço Social, contribuem para a construção de novos comportamentos
políticos na direção da efetivação dos direitos de crianças e de adolescentes, donde
destacam-se alguns indicativos prospectivos:
Participação no processo de mobilização da sociedade civil,
construindo alternativas reais de participação nos canais instituídos, contribuindo
com suas reflexões e práticas, conferindo-lhes poder de deliberação, de controle
social e de avaliação das políticas de direitos;
Contribuição com o processo de formação/capacitação permanente
dos sujeitos políticos que compõem a rede de defesa dos direitos da criança e do
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
177
adolescente (Conselhos de Direitos, Conselhos Tutelares, programas sociais
governamentais e não governamentais), garantindo uma participação com
capacidade crítica e propositiva, constituindo-se vigilante quanto à defesa dos
direitos de crianças e de adolescentes.
Desenvolvimento de instrumentais e alternativas de ação, tornando-
os consistentes, mediante os discursos e práticas que permeiam as relações entre
Estado e sociedade na atualidade, contemplando a estrutura e conjuntura nacional e
local.
O projeto ético-político do Serviço Social é um importante instrumento
balizador da ação profissional comprometida com a defesa e efetivação de direitos
de crianças e de adolescentes. Seus princípios abordam a dialeticidade do referido
exercício profissional, de forma a torná-lo em sintonia com a realidade social.
Como abordado, o atual projeto ético-político do Serviço Social não
é unívoco, mas representa o conjunto da categoria dos assitentes sociais.
Apresenta-se permeado de tensões e da pluralidade inerente à toda a categoria
profissional, sem suprimir, na prática, suas divergências e contradições (NETTO,
1999, p.96).
Marcantes são os signos elencados do projeto ético-político do Serviço
Social ao qual focaliza-se a relação destes, com as conquistas dos direitos de
crianças e de adolescentes no campo jurídico, político e das práticas sociais.
O estudo em tela, demonstra que os desafios colocados à profissão
direcionam-se “a construção de uma nova prática social, ou consolidá-la, fortalecê-la
quando existente, exige que aprendamos a visualizá-la a partir de uma perspectiva
histórica” (MARTINELLI ,1998, p.147).
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
178
Para Martinelli (1998, p. 147/148), esta perspectiva histórica exige seu
reconhecimento como:
1.expressão do saber” , focalizando-a como toda prática social é
teoria em movimento, é articulação de saberes, é construção
coletiva em busca de objetivos socialmente determinados e
historicamente estabelecida. 2. prática educativa, compreendendo-a
como a expressão concreta da possibilidade de trabalharmos com
os sujeitos sociais na construção de seu real... é, portanto, prática
do encontro, da possibilidade, do diálogo, da construção partilhada.
3. prática política,” cujo entendimento refere-se “a prática social,
dialeticamente concebida, na perspectiva que a estamos
trabalhando, é, por excelência, a possibilidade de operar com
projetos políticos que tenham por horizonte a consolidação da
democracia e o fortalecimento da cidadania. Em outras palavras,
trata-se de uma prática que assume plenamente a sua vocação
social e o seu compromisso político”
Estes elementos apontam para um Serviço Social em sintonia com seu
tempo histórico, parametrado na totalidade das relações sociais, voltado para a
questão da hegemonia e dos direitos. Por fim, empenhado na construção de um
Estado integral.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
179
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Brasil apresenta-se culturalmente vinculado a uma herança colonial,
predominando o favoritismo e o clientelismo nas suas diferentes formas de
representação e de relações de poder. Essas características culturais persistem
convivendo com a agudização da questão social, provocando um movimento
dialético entre a conservação, a revisão e o repensar de sua história e de sua
formação cultural.
Os padrões privatistas balizam as relações sociais comprometendo a
dimensão ética da vida social, subtraindo o sentido verdadeiramente público das
responsabilidades e obrigações sociais.
Nestas últimas décadas, o país convive com um movimento que vem
restringindo o papel do Estado, suprimindo direitos, através do não reconhecimento
ou da não consolidação dos mesmos. O sistema capitalista com seus novos
contornos e contradições está imbuído de uma diversidade de clivagens e de
antagonismos que só fazem ampliar as condições de subalternidade.
Neste sentido Hobsbawm (1995, p. 562) reflete que:
Sabemos que, por trás da opaca nuvem de nossa ignorância e da
incerteza de resultados detalhados, as forças históricas que
moldaram o século continuam a operar. Vivemos um mundo
conquistado, desenraizado e transformado pelo titânico processo
econômico e técnico científico do desenvolvimento do capitalismo,
que dominou os dois ou três últimos séculos. Sabemos, ou pelo
menos é razoável supor, que ele não pode ser ad infinitum. O futuro
não pode ser uma continuação do passado, e sinais, tanto
externamente quanto internamente, de que chegamos a um ponto
de crise histórica
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
180
Tudo isto repercute no Serviço Social, destacando-se, de um lado, a
entrada dos movimentos sociais na cena política, de outro, a incapacidade de o
Estado absorver as demandas sociais, verificando-se uma crise das políticas sociais
e dos serviços assistenciais.
No caso brasileiro pode-se afirmar que os sinais históricos o
balizados pelas conquistas no campo da democratização das relações sociais e dos
novos marcos legais que instituem direitos. Como este é um processo fruto das lutas
sociais, a materialização destas reformas ainda tem um longo caminho a ser
percorrido.
A coexistência de diferentes hierarquias intrínsecas à questão social,
nas formas como se entrelaçam as relações em sociedade, torna difícil a
viabilização da justiça social.
Se considerarmos os direitos conquistados no campo legal, é
possível identificar a organização de novas relações no conjunto da sociedade, que
implicam numa dinamicidade dialética destas relações. A sociedade civil, na
denominação de Sader, ‘os novos personagens em cena’ passam a ser
protagonistas desse movimento dinâmico de criação e de expansão da participação
nos espaços públicos que, permeada por uma cultura política democratizadora e
com a imposição de novas formas de relações societárias.
Em meio a estes ‘novos personagens’ encontram-se assistentes
sociais, reunidos mediante as entidades representativas da categoria profissional,
assim como inseridos nos diferentes movimentos sociais. Passam a assimilar
também na perspectiva profissional um alargamento no âmbito da política.
Posicionamentos políticos expressos no Código de Ética Profissional do Assistente
Social de 1993, decorrendo dos marcos para um projeto ético político profissional
coerente com as necessárias “reformas” na sociedade brasileira.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
181
As expectativas políticas que o ECA contempla, ora de forma explícita,
ora de forma latente, supõe um movimento cultural que envolve alterações de
valores, representações, comportamentos e práticas sociais. Para além da relação
direta com a população infanto-juvenil, apontam novas formas de organização
social, de acordo com os princípios democráticos.
Portanto, o ECA incorpora as 'indicações e contornos' das expectativas
políticas dos 'sujeitos coletivos' que o geraram. Se considerarmos os direitos de
crianças e de adolescentes conquistados, e a implantação de novas estruturas
para a efetivação destes direitos, é possível identificar a organização de relações
societárias que implicam a compreensão da dinamicidade dialética entre a cultura e
as práticas sociais.
Dentre as contradições presentes na realidade brasileira, evidencia-se
o acúmulo de uma riqueza simbólica que se renova através da criação e produção
atualizada de novos saberes e práticas, influenciando a ampliação de direitos
sociais, a mudança cultural e a ‘compreensão da realidade para superá-la
revolucionáriamente’.
Com coloca IAMAMOTO( 2002: 32) é uma:
aposta no avanço da democracia, fundada em princípios da
participação e do controle popular, da universalização dos direitos,
garantindo a gratuidade no acesso aos serviços, a integralidade das
ações voltadas à defesa da cidadania de todos, na perspectiva de
eqüidade
As relações entre estado e sociedade passam a ser dinamizadas pela
criação e expansão de novas expressões e pela participação nos espaços públicos,
assimilando uma ‘linguagem’ de direitos.
No período que decorre de sua aprovação é possível identificar
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
182
avanços paulatinos, no campo social e cultural, tal qual escreve Jorge Freitas
(2004, p. 265):
do ponto de vista conceitual, o avanço foi muito significativo. No
aspecto legislativo, importantes leis foram elaboradas buscando
regulamentar o inciso constitucional que determina à criança
atendimento prioritário... cresceu na sociedade o sentimento de
repulsa a certos tabus até pouco tempo considerados normais,
como, por exemplo, acreditar que o trabalho infantil é elemento
constitutivo na boa formação do homem”
A recente história das políticas para a infância e a adolescência
evidenciam ações e manifestações políticas que produzem alterações na cultura.
Surgem através de denúncias de violações de direitos ou de experiências e
propostas de ões - denominadas de alternativas, que se caracterizam pelo
rompimento com práticas assistencialistas, centralizadoras e seletivas.
São relações marcadas por um movimento contínuo e perpassado de
tensões, resultando na produção de novos valores, representações e práticas
sociais.
Realidade social que exige o exercício profissional com criatividade,
com iniciativa, com capacidade de negociação, de resolução e de argumentação,
cujo “desafio posto às vanguardas do Serviço Social consiste em prosseguir na luta
por direitos sociais universais, garantindo a autonomia do seu projeto profissional”
58
.
(NETTO, 2004, p. 79).
Esse projeto profissional que inaugura uma nova identidade
profissional, fortemente vinculada a ação política no âmbito das práticas sociais, a
transformação do ‘homem massa’ em ‘homem coletivo’, visto que também a
58
O artigo de José Paulo Netto refere-se ao Serviço Social e a conjuntura do governo Luiz Inácio Lula da Silva, porém, como o
próprio autor afirma o desafio posto ao Serviço Social nestas duas últimas décadas, apenas renovou-se diante da manutenção
da orientação macroeconômica e conjuntura sóciopolítica
.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
183
categoria dos assistentes sociais se associa às lutas coletivas mais amplas
combatendo a ordem capitalista.
É o que preleciona
Gramsci (CC 10; Vol. I, p. 405/6):
O homem deve ser concebido como um bloco histórico de
elementos puramente subjetivos e individuais e de elementos de
massa e objetivos e materiais, com os quais o indivíduo está em
relação ativa. Transformar o mundo exterior, as relações gerais,
significa fortalecer a si mesmo, desenvolver a si mesmo”.
É na dinâmica dos conflitos historicamente constituídos que a
esperança de cidadania e de direitos conquistados se ancoram, pois, a todo
momento, vivem a rede de definição das relações sociais. Evidenciam-se canais de
participação e mecanismos que propiciam revoluções silenciosas, no dizer de
Gramsci.
Trata-se da 'aposta' no futuro das relações sociais, que passa por
alternativas capazes superar todas as formas de dominação e de exploração, pela
reestruturação de regras de convívio social e político, reconhecendo direitos e
tornando factível a construção de novas institucionalidades fundamentadas em
relações democráticas.
A democratização das relações sociais torna-se um árduo caminho,
conforme expressa Simionatto(2003: p. 287):
Temos, por outro lado, uma democracia ainda débil na garantia de
igualdade de condições para o pleno exercício da cidadania. O
acesso aos bens públicos, aos serviços essenciais e à justiça ainda
se apresentam de forma desigual e discriminatória.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
184
São práticas de poder e hierarquias enraizadas e presentes no âmbito
das relações sociais, permeadas de conflitos e excludências.
Estas percepções estão presentes na profissão, são retomadas e
refletidas no processo de revisão do Código de Ética Profissional de 1986 e
delineadas no Código de Ética aprovado em 1993, em sintonia com o contexto de
democratização da sociedade brasileira.
O texto que introduz o Código de Ética de 1993 esclarece este aspecto
ao sinalizar que :
De fato, construía-se um projeto profissional que, vinculado a um
projeto social radicalmente democrático, redimensionava a inserção
do Serviço Social na vida brasileira, compromissando-o com os
interesses históricos e da massa da população trabalhadora. O
amadurecimento deste projeto profissional, mais as alterações
ocorrentes na sociedade brasileira (com destaque para a ordenação
jurídica consagrada na Constituição de 1988), passou a exigir uma
melhor explicitação do sentido imanente do Código de 1986.
Tratava-se de objetivar com mais rigor as implicações dos princípios
conquistados e plasmados naquele documento, tanto para fundar
mais adequadamente os seus parâmetros éticos quanto para
permitir uma melhor instrumentalização deles na prática cotidiana do
exercício profissional”.(Resolução CFESS n. 273/93)
Evidencia-se o acúmulo de uma riqueza simbólica que se renova
através da criação e produção atualizada de novos saberes e práticas, contribuindo
para o processo de transformação social. A correlação de forças no âmbito cultural
expõe confrontos e comportamentos no que tange à população infanto-juvenil, ainda
presa a rótulos através da visão da criança pobre como ameaça ou como alvo de
‘comiseração’.
As contradições e adversidades sociais são perceptíveis e travam a
operação do projeto ético-político do Serviço Social. Porém, estas questões de
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
185
ordem estrutural não é exclusiva da profissão, visto que compõe as relações sociais.
Demonstrando resistência e alinhamento ao seu projeto ético-político, a categoria
dos assistentes sociais, mantém em sua agenda política a consolidação dos direitos
de crianças e de adolescentes como uma das lutas prioritárias.
A participação da categoria profissional na constituição desta arena
política, corresponde ao empenho ético-político dos assistentes sociais na
articulação com outras categorias e segmentos sociais que partilhem de propostas
similares (NETTO, 1999, p.105).
É preciso relembrar que o Estatuto da Criança e do Adolescente é a
primeira legislação (voltada à população infanto-juvenil), cujas concepções partem
de rupturas com práticas e componentes culturais depreciativos ao desenvolvimento
infanto-juvenil, apresentando concepções e métodos condizentes com o
desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.
O Estatuto da Criança e do Adolescente se destaca, ainda, por suas
pretensões políticas diante dos direitos de crianças e do adolescentes e
democráticas diante da formulação, gestão e controle social de políticas dos direitos.
Daí decorre a interface entre o projeto ético-político do Serviço Social e a defesa dos
direitos da criança e do adolescente.
Aos estudar os Encontros Nacionais CFESS/CRESS constata-se que a
categoria dos assistentes sociais vem empreendendo esforços para manter-se
atuante e atenta aos tempos atuais. Pautada no projeto ético-político do Serviço
Social, busca-se ler e decifrar os diferentes meandros do tecido social, de forma a
identificar as expressões que compõem a questão social.
Os estudos e análises dos documentos citados apontam importantes
sinalizações quanto ao conteúdo teórico e ao formato das exposições políticas frente
à defesa de direitos da criança e do adolescente.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
186
Enquanto categoria profissional, o conjunto CFESS/CRESS, através
dos Encontros Nacionais, posiciona-se em prol da convergência de um esforço
coletivo de forma a servir de parâmetro para a construção de políticas sociais
coerentes com os direitos preconizados para a infância e para a juventude.
Está presente o envolvimento com as mudanças na formação cultural
propiciando as necessárias superações das relações de dominação e opressão
existentes entre ‘dirigentes e dirigidos, governantes e governados’. Envolve a
‘reforma intelectual e moral’, assim demonimada por Gramsci, configurando um novo
pacto de relações sociais, que privilegia a vontade coletiva.
A Interface entre o Projeto Ético-Político do Serviço Social e a Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente
187
VI. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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www.presidencia.gov.br/estrutura_presidencia/sedh/arquivos
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