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As formas de tratamento podem ser usadas para “marcar território”,
estabelecer distanciamento formal, aproximar os falantes, seduzir o ouvinte,
evocar tradições, derrubar barreiras e até mesmo para demonstrar os papéis
dos falantes dentro do processo de comunicação. Na língua portuguesa, Cintra
estabelece três grandes grupos de formas de tratamento: as nominais (como o
senhor), as pronominais (tu, você) e as verbais (ouvistes?, ouviu?). Mais do
que uma simples conseqüência gramatical, cada uma delas tem sua própria
semântica. Cintra enfatiza:
1º Tratamentos pronominais do tipo tu, você, vocês, V. Exª, V. Exªs: (Tu
queres? Vocês querem? V. Exª quer?)
2º Tratamentos nominais do tipo de: a) o senhor, a senhora; b) o senhor Dr.,
o senhor Ministro; c) o pai, a mãe, o avô; d) o Antonio, a Maria; e) o meu
amigo, o patrão, etc. Exemplos: (o senhor quer?; os senhores querem?; o
senhor Dr. quer?; o pai quer?; a mãe quer?; o Antonio quer?; a Maria quer?; o
meu amigo quer?; o patrão quer?)
3º Tratamentos verbais ou seja, a simples utilização da desinência do verbo
como referência ao interlocutor-sujeito: (queres?; Quer?; querem?) (Cintra,
196?: 11-12)
Devemos nos lembrar de que esse modelo estudado por Cintra foi
observado com certas diferenças fundamentais de valores entre três tipos de
tratamento. A começar pelos tratamentos nominais:
Ao passo que um tratamento pronominal e, do mesmo modo, uma desinência
verbal nada evocam do que caracteriza o interlocutor e têm a sua função
limitada a chamar a atenção deste para o enunciado que lhe diz respeito (por
exemplo: “Tu já leste este livro?”, “Você já leu este livro?” ou “Leste?”; “Já
leu...?”), o tratamento nominal – ainda mesmo quando se trata de “o senhor”,
“a senhora”, o mais pronominalizado de todos eles – lembra alguma coisa
própria da pessoa com quem falamos. No caso de “o senhor”, “a senhora”,
trata-se unicamente do sexo; mas, no caso de “o senhor Dr.”, “o senhor
Ministro”, também se recorda a categoria social ou a profissão; no caso de “o
pai”, “a mãe”, o parentesco; no caso de “o Antônio”, “a Manuela”, alguma
coisa de intimamente ligado à personalidade de cada um: o nome próprio, o
nome de baptismo – e assim por diante. Creio que não será exagero afirmar
que o tratamento nominal se distingue dos outros por ser, em certa medida,