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Como exemplo da dupla incidência
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e 37
de esferas, Sarlet (2002) cita o direito à saúde:
Os direitos fundamentais em direitos de defesa (negativos) e direitos a
prestações (positivos), é o fato de que o direito à saúde pode, dependendo de sua
função no caso concreto, ser reconduzido a ambas as categorias, o que, como
ainda se terá oportunidade de verificar, acarreta reflexos importantes no âmbito
da eficácia e da efetividade.
Continuando, Sarlet (2002) esclarece que o direito à saúde, por exemplo, pode ser
simultaneamente tanto um direito de defesa – no sentido de impedir ingerências indevidas por
parte do Estado ou de terceiros na saúde do titular – como um direito à prestação. Esta última é a
dimensão mais problemática, pois impõe ao Estado a realização de políticas públicas que
busquem a efetivação deste direito para população, como atendimento médico e hospitalar,
as devidas ponderações; e (5) pretensão de defesa ou de proteção (Schutzanspruch), que impõe ao Estado, nos casos
extremos, o dever de agir contra terceiros. A Constituição outorga, não raras vezes, garantia a determinados
institutos, isto é, a um complexo coordenado de normas, tais como a propriedade, a herança, o casamento, etc. Outras
vezes, clássicos direitos de liberdade dependem, para sua realização, de intervenção do legislador. Assim, a liberdade
de associação (CF, art. 5º, XVII) depende, pelo menos parcialmente, da existência de normas disciplinadoras do
direito de sociedade (constituição e organização de pessoa jurídica, etc.). Também a liberdade de exercício
profissional exige a possibilidade de estabelecimento de vínculo contratual e pressupõe, pois, uma disciplina da
matéria no ordenamento jurídico. O direito de propriedade, como observado, não é sequer imaginável sem disciplina
normativa. Da mesma forma, o direito de proteção judiciária, previsto no art. 5º, XXXV, o direito de defesa (art. 5º,
LV), e o direito ao juiz natural (art. 5º, XXXVII), as garantias constitucionais do habeas corpus, do mandado de
segurança, do mandado de injunção e do habeas data são típicas garantias de caráter institucional, dotadas de âmbito
de proteção marcadamente normativo. Entre nós, Ingo Sarlet assinala como autênticas garantias institucionais no
catálogo da nossa Constituição a garantia da propriedade (art. 5º, XXII), o direito de herança (art. 5º, XXX), o
Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII), a língua nacional portuguesa (art. 13), os partidos políticos e sua autonomia (art
17, caput e §1º). Também fora do rol dos direitos e garantias fundamentais (Título II) podem ser localizadas
garantias institucionais, tais como a garantia de um sistema de seguridade social (art. 194), da família (art. 226), bem
como da autonomia das universidades (art. 207), apenas para mencionarmos alguns dos exemplos mais típicos”
(MENDES, 2002).
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“Como exemplo, referimos aqui o direito à moradia, que, na condição de direito a ações positivas (fáticas ou
normativas) voltadas à promoção e satisfação das necessidades materiais ligadas à moradia, pode ser definido como
direito a prestações. Por outro lado, a moradia (agora na condição de direito negativo) também é protegida contra
ingerências externas, sejam elas oriundas do Estado, sejam elas advindas de esfera jurídico-privada. Temos, portanto,
que um mesmo direito fundamental, abrange muitas vezes um complexo de posições jurídicas, isto é, de direitos e
deveres, negativos e positivos” (SARLET, 2005. p. 224).
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“Ademais, também o direito à moradia reveste-se da complexidade peculiar dos direitos fundamentais,
notadamente dos sociais, já que abrange um conjunto heterogêneo de posições jurídicas objetivas e subjetivas, assim
como assume uma dupla feição defensiva e prestacional. Na sua condição como direito de defesa (negativo) a
moradia encontra-se protegida contra a violação por parte do Estado e dos particulares, no sentido de um direito da
pessoa a não ser privada da moradia digna, inclusive para efeitos de uma proibição de retrocesso [...]” (SARLET,
2005. p. 331).