Em 1991, ocorre a publicação de O Mosaico Fluido, extenso estudo de Fernando Pinto do
Amaral que contemplava a modernidade e a pós-modernidade marcadas pela poesia dos anos
70 e 80, com destaque para alguns dos poetas já aludidos por Joaquim M. Magalhães. Dedica
o crítico um capítulo exclusivo à poesia de Al Berto, agora já alentada pela publicação de O
Medo, em 1987, obra completa, e que colabora significativamente para uma hermenêutica
mais intensa a respeito daquilo que foi produzido entre 1974 e 1987 (que compreende desde À
procura de um vento num Jardim d’Agosto até Uma existência de papel
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).
Fernando Pinto do Amaral, municiado pela idéia de conjunto, agora proporcionado
pela obra completa, o que permite a percepção dos avanços, das recorrências, das
modificações e dos recursos estilísticos do poeta, traça um panorama que servirá como uma
significativa chave de leitura e intelecção da obra de Al Berto, em que se destaca
principalmente a afirmação de que a sua poesia ancorava-se a uma exposição confessional do
cotidiano do qual brota uma escrita consciente de si e um sujeito que deriva entre vários
sujeitos textuais focalizados na e pela perspectivação da sexualidade como forma de uni-los a
todos. Embora destaque que o caráter homoerótico é uma linha de força e de significado na
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As obras completas de Al Berto circulam, na verdade, em cinco edições: a 1ª pela Contexto e a 2ª pela
associação Contexto/Círculo de Leitores. Ambas traziam fotos do autor na capa, grande característica, inclusive,
dos livros de Al Berto: uma fotografia do autor, feita por Paulo Nozolino, inspirada em Caravaggio, uma espécie
de referência a vários quadros do artista italiano. A 2ª edição, de 1991 inclui O livro dos regressos e Finita
Melancolia, produzidos entre 1986 e 1989. Em 1997, já na Assírio & Alvin, são adicionados Luminoso Afogado
e Horto de Incêndio e “Últimos poemas” e o design da edição póstuma é considerado bastante fúnebre, embora
respeite o projeto gráfico da editora, fato este comentado por Prado Coelho em resenha ao novo volume: capa
preta e lombada das folhas em roxo, sem nenhuma foto do poeta, fato que se repete na edição de 2000. O gosto
“fúnebre” da capa pode ser um sentido atribuído, a mais, à obra do poeta, que embora não se manifestasse na
capa, manifestava sua ausência no uso de cores relacionadas ao luto. Ou, como se prefere, à captação da idéia de
“assinatura” do poeta em todas as suas obras: a ausência física é marcada pela alusão a sua morte, o que manteria
a eloqüência do autor na capa do livro e a sua intervenção, já que a capa preta é clara alusão ao verso “as
paisagens soltaram-se do caderno de capa preta”, de “Equinócios de Tangerina”. Recentemente, em maio de
2005, foi publicada a 3ª edição, na qual se funde o design da Assírio & Alvim com a fotografia de Paulo
Nozolino utilizada nas edições da Contexto e da Círculo de Leitores. A nova edição traz modificações,
notadamente na ordem de alguns textos, assim como a inclusão de sete novos poemas. A organização do novo
volume deve-se a Luís Miguel Gaspar e Manuel de Freitas e inclui um índice a partir dos incipt, notas de
referência, biografia do poeta e relação de artigos e obras a ele relacionados. Ressalte-se o fato de que o poeta,
em Segundo Equinócio (de Tangerina) reitera que não deixará inéditos, justo para protegê-los dos “pequenos
abutres”. Em comentário à amiga Manuela Júdice, o poeta declara não querer sofrer, depois de morto, aquilo que
hoje se processa com o “baú” de Fernando Pessoa. Daí que tenha deixado tudo sempre muito organizado em
função do iminente risco de morte por AIDS.