Aspectos de uma Teoria da Tradução
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Isso implica afirmar que o cinema possui uma ambientação própria, com
elementos ausentes na literatura, a exemplo dos movimentos de câmera,
enquadramentos, iluminação, cor etc. Furtado observa que “o cinema, ao contrário
da literatura, é um evento, um ritual para o qual nos vestimos, saímos de casa e
pagamos ingresso, um ritual compartilhado com outros espectadores”. (FURTADO,
2003). A narrativa cinematográfica, ao contrário da narrativa literária
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é “intuitiva,
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Entende-se que narrar é representar fatos reais ou fictícios utilizando signos verbais ou não verbais.
A narrativa é a forma de composição na qual há um desenrolar dos fatos reais ou imaginários, que
envolvem personagens e que ocorrem num tempo e num espaço. No caso da narração, é um relato
centrado num fato ou acontecimento; há personagens e habitualmente um narrador que relata a
ação. O tempo e o ambiente (ou cenário) são outros elementos importantes na estrutura da narração.
A narrativa literária é aquela que descreve os cenários, os figurinos, a atmosfera e, podendo invadir a
subjetividade das personagens, descreve suas intenções, por mais ocultas que sejam. Além disso,
pela sua própria natureza, tende a relatar acontecimentos que ocorreram e, no momento da leitura,
pertencem ao passado. Possui várias características: a dramatização é freqüente; desfruta de maior
liberdade no uso dos tempos verbais; pode ocorrer narração em tempo real; o narrador é criado com
mais liberdade, podendo ser puro ou engajado à cena; utiliza a metonímia com finalidades diversas:
para atenuar, agravar, tornar o discurso conciso etc; preferência pelo detalhamento para criação de
atmosferas, envolvimento etc; empatia, envolvimento e presentificação são categorias com objetivos
centrais na narrativa literária; pontos de vista comprometidos com um personagem ou com alguma
tendência do narrador; a ordem de apresentação tem mais liberdade, em geral evita a ordem por
importância decrescente. Outras vezes, cria suspense, usando em ordem crescente. A narrativa
literária busca ludicidade, manipulação psicológica, crítica. Disponível em:
www.lanavision.com/walcestari/images/ docs/curso_de_redacao/narracao_teoria.doc . Acesso em
15/10/05.
Ainda à respeito desse assunto , o conceito de “narração” em literatura e em cinema não apresenta
muitas diferenças: Para Gérard Genette, “a passagem de um nível narrativo para outro só pode ser
assegurado pela narração, ato que consiste precisamente em introduzir em uma situação, por meio
de um discurso, o conhecimento de uma outra situação. Toda e qualquer outra forma de transito é,
senão sempre impossível, pelo menos transgressiva. Após citar exemplos transgressivos em
Cortazar, Diderot e Sterne, Genette afirma: “ Nós estenderemos a todas as transgressões o termo de
metalepse narrativa” (SANTANA, 1973, p. 244).
Pode-se dizer, então, que a narração não se confunde com a narrativa. Narrativa é o nome geral e
genérico dado aos textos que apresentam uma estória ou uma seqüência de eventos. A narrativa é o
récit dos franceses. A narração é o modo como o discurso se monta, é o discurso em sua
articulação. A leitura da narração é mais paradigmática (ou verticalizante) do que sintagmática e
superficial. ( ibid., p, 11).
Narração em cinema: “A narração em cinema se aplicava por meio da sucessão de
planos (tomada à distância, tomada média, primeiro plano etc.) Essa era a
linguagem de Welles. [...] Era descritiva e psicológica e tinha como elemento de
expressão o corte, que nos levava alternadamente de um plano a outro. Não havia o
‘plano profundo’. Para passar de um plano próximo para um distante era necessário
o corte. Por meio da descoberta do ‘plano profundo’, Orson Welles modificou a
narração clássica. E como? Simplesmente constrangendo o espectador a fazer uso
de sua liberdade de atenção, a sentir a ambivalência da realidade. [...] Lembro-me
da première de ‘Cidadão Kane’ [...] e a impressão à primeira vista intolerável que o
público teve deste novo tipo de narração. {SALLES}. Uma aula sobre Orson Welles.
Mais! (FOLHA DE S. PAULO, 29/09/96, caderno Mais, p. 13).