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muitas perguntas, incluindo o ano em que estão, o século, se antes ou depois de Cristo, ao que
Hilário responde “que Cristo?”, se o mar é vermelho ou amarelo, para depois lhe dizer para
que diga tudo que lhe vier à cabeça, “e nada de escrúpulo”
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:
– Escrúpulo. Cabeça. O oceano é azul. Que calor está fazendo. A morte de Danton.
As metamorfoses de Ovídio. O senhor é uma besta. Com quantos paus se faz uma
canoa? Vinte e um, vinte e dois, vinte e três, vinte e quatro. As laranjas da Califórnia
são deliciosas. Umbigo. Rapadura. Otorrinolaringologista. É a tua, mulher nua, vou
pra Lua, jumento, pára- vento, dez por cento, Catão, catatau, catapulta que o pariu,
catástrofe, caralho, os medos, os vegas, as vegaminas, as sulfas e as para- sulfas,
diametilaminatetrasulfonatosótico, porra de merda, argentino, argentário,
argentículo, testículo, laparotomia, Boris Karloff, Irmãos Karamazov, Irmãos Marx,
Marx, Engels, Lenin, Lenita, onomatopéia, onomatopaico, onanista, ovos de Páscoa,
jerimum, malacacheta, salsaparrilha, Rzhwpstkj, Celeste Império, semicúpio,
Salazar, sai azar, seis e vinte da manhã, Dadá, Dodô, Dudu, holofote, oliveira, olá
Olavo, Alá, ali, alô sua besta já não basta?...
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Depois dessa seqüência de palavras que, na cabeça de Hilário, fazem um grande sentido
quando associadas, o médico lhe pergunta calmamente: “O senhor já foi à Bulgária?”
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Aparentemente, na cabeça do médico, tudo isso faz sentido também, e tudo isso indica que o
narrador sofre de “bulgarite aguda”. O próprio médico já sofrera dessa doença, mas agora,
(...) com a invenção do radar e do avião-foguete o mal parece ter decrescido um
pouco no mundo (no píncaro e nas faldas do Aconcágua é onde a incidência ainda é
maior) e calcula-se que dentro de cinco mil anos não se falará mais em bulgarite
sobre a face da terra, a menos que nesse meio-tempo se venha a provar a existência
da Bulgária, da Atlântida e do Canadá (...).
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Depois de concluir que, forçosamente e fatalmente, deveria um dia ir à Bulgária, e
sabendo-se tal feito difícil, para não dizer impossível, resolve reunir um grupo de
expedicionários dispostos a tal façanha. Coloca, então, um anúncio na página necrológica do
jornal (a mais lida) anunciando sua “EXPEDIÇÃO À BULGÁRIA” e sua busca por
voluntários.
Entra em cena, então, o personagem mais extremo desta narrativa: o professor de
bulgarologia Radamés Stepanovicinsky. Nele, estão contidas todas as características que
125
Idem, p. 320-321.
126
Idem, p. 328.
127
Idem, p. 328.
128
Idem, p. 329.