Anexos
Mulher, mídia e movimentos culturais
Jandira Feghali
Deputada federal pelo PCdoB do Rio de Janeiro e coordenadora da bancada feminina no Congresso
Nacional
O movimento funk tem raízes histórias e conteúdo social, mas transformou-se em atração comercial
de gravadoras e televisões, que exploram e vulgarizam a imagem da mulher e colaboram com a
erotização infantil.
A recente polémica em torno da música funk reacendeu as atenções da sociedade e do movimento
feminista para a imagem da mulher, a repercussão sobre a sua vida cotidiana e, para ser mais concreta, a
erotização precoce das crianças.
Várias opiniões e dúvidas se expressaram nas diversas formas de comunicação, até mesmo os
cientistas sociais se dividem e por vezes trocam acusações de preconceito contra as camadas mais
populares, nas quais o funk criou raízes.
O antropólogo Hermano Vianna foi o primeiro a estudar e publicar opinião sobre o assunto com o seu
livro "O mundo funk carioca", já sensibilizado com as grandes festas do subúrbio carioca e com o
conteúdo das suas manifestações. Em matéria do caderno "Ideias" do Jornal do Brasil, em março deste
ano, a antropóloga Alba Zaluar diz: "O funk provoca uma separação brutal entre os sexos e acentua a
hipertrofia da sexualidade como forma de afirmação masculina". Já Micael Herschmann, professor de
comunicação, historiador e pesquisador do tema opina: "O funk já teve outros momentos
de evidência,
assim como o axé e o sertanejo, faz parte de uma dinâmica cultural que tem articulação com o mercado.
Antes mostravam mais os raps das comunidades, hoje dão destaque ao humor com
dimensão erótica",
realçando aí o enfoque da mídia.
O funk já teve outros momentos de evidência, assim como o axé e o sertanejo, faz parte de uma
dinâmica cultural que tem articulação com o mercado. Antes mostravam mais os raps das comunidades,
hoje dão destaque ao humor com dimensão erótica", realçando aí o enfoque da mídia.
Com suas origens na década de 30, no sul dos Estados Unidos, a partir da música negra, o funk sofreu
influências do rhvthm and blues, do gospel e do soul de crescente conteúdo reivindicatório. Já na década
de 60, com ritmo marcante e forte, surge com jeito próprio e novas técnicas de mixagem, e seus
representantes vão conformando expressões como o rapper (repentista) e o MC (mestre de cerimónias),
que misturam canto e fala nos bailes realizados em locais públicos e denunciam os problemas dos negros
nos guetos de Nova Iorque.
Surgem as músicas rap, o estilo hip hop e a dança break. No Brasil, nos anos 70 e 80, iniciam-se os
bailes de breve passagem pela zona sul e com instalação rápida e mobilizadora nos bairros do subúrbio e
zona oeste, com participação de milhares de jovens e com produção musical expressiva da realidade de
exclusão, como a música "eu só quero é ser feliz" de Claudinho/Doca, da Cidade de Deus.
Como destaca o relatório da CPI do Funk, da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro,
instalada para averiguar denúncias de violência, esses bailes passaram a representar quase que a única
forma de lazer dessa juventude carente e ainda diz "As ações do poder público, em geral,
resumiram-se
à repressão e ao cerceamento de manifestação cultural deste segmento da juventude e da sociedade.
Como, por exemplo, nos anos 70, quando diversos promotores de baile adeptos do movimento black-rio
foram obrigados a prestar depoimentos aos órgãos oficiais de repressão, em virtude do carâterdas
mensagens difundidas nos bailes. Temas como liberdade, orgulho da raça negra, igualdade de
oportunidades para todas as raças ..."
Violência
A violência não pode ser analisada fora do contexto da vida desses jovens que, em favelas ou bairros
carentes, convivem com a violência do tráfico, da polícia e de casa. Dados recentes do índice de
Desenvolvimento Humano da Organização das Nações Unidas e de pesquisas da Secretaria de
Segurança do Rio mostram que hoje a maior causa de mortes entre pessoas de 1 5 a 24 anos é a arma
de fogo. Mas, apesar disso, dizem os estudiosos e frequentadores, a violência não é a marca
predominante das festas.
Modestamente, após a observação atenta de diversas opiniões e a participação em debates, quero
concordar com a legitimidade do funk como movimento cultural e que tem na sua história a expressão
maior da exclusão. Por isso, sim, vítima de preconceito e desprezo do poder público. No entanto, não
podemos retirar de uma análise mais abrangente o papel devastador da lógica de mercado, dos