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outros trabalhadores do local. No entanto, como fazer isso quando, por vezes, não
há tempo sequer para refletir sobre seu próprio trabalho? Isso leva a experimentar
pesar pela inabilidade de lidar com os pedidos de ajuda dos demais. A falta de
material para trabalhar, número inadequado de trabalhadores para atender a
demanda e o excesso de pacientes em relação à capacidade de atendimento são um
problema social. Contudo, os cuidadores acabam assumindo para si a
responsabilidade destes problemas, sobrecarregando-se. Esses problemas afetam o
trabalhador, gerando-lhe angústia e sobrecarga de tensão. A falta de condições de
trabalho adequadas é um dos aspectos que dificulta a realização do trabalho,
muitas vezes sendo possível realizá-lo somente se empregarem recursos materiais
ou financeiros próprios. A articulação entre o trabalho e o adoecimento tem sido
caracterizada por sua invisibilidade institucional-legal. A trajetória das
trabalhadoras adoecidas por LER evidencia formas particulares de enfrentamento
técnico-burocrático. Estas se expressam nas formas que as trabalhadoras têm que
enfrentar para “legitimar” sua lesão, perante as instituições - médico da empresa,
perito, INSS - que acabam por adotar as práticas e os discursos da Medicina do
Trabalho, centrados no saber médico (nas “provas” dos exames complementares,
no não reconhecimento do saber do trabalhador) e na ligação da doença a fatores
individuais e biológicos. Assim, o trabalhador, vítima de um processo de
adoecimento, se vê perdido numa rede de resistência técnica e burocrática, de
difícil compreensão. Para o lesionado por LER é difícil adoecer, pois, ao consultar
um médico, na busca de auxílio, ou mesmo compreensão para sua dor, defronta-se
com alguém que coloca em dúvida sua lesão, acentuando em decorrência disso, o
seu sofrimento. O caminho percorrido pelo lesionado, desde os primeiros
sintomas, é permeado de grande sofrimento. Sofrimento relacionado aos sintomas
de dor que acabam fazendo parte da sua vida, tanto durante a jornada de trabalho
quanto no período em que está com a família, nos afazeres cotidianos, nos período
de lazer e descanso. As práticas de invalidação, ou de não reconhecimento dado
pela gerência/chefia revelam os problemas e as dificuldades enfrentadas pelas
lesionadas e mostram como as relações de trabalho tornaram-se desumanizadas e
impessoais, convertendo-se em outra fonte de sofrimento. Os trabalhadores, no
decorrer do processo de adoecimento, percebem que as empresas discriminam o
funcionário que não pode mais cumprir suas metas produtivas. Eles relatam perder
o valor para as empresas e não gozarem mais do pouco reconhecimento de que
dispunham. O afastamento do trabalho torna público o adoecimento, mas, até
então, foi percorrida uma trajetória individual e introspectiva, carregada de
sofrimento. DEJOURS (1992) comenta a prática corrente de que não se trata de
evitar a doença, mas sim de domesticá-la e contê-la, aprendendo a conviver com a
dor e suas implicações. Neste processo de controlar a doença, as estratégias são no
sentido de impedir que o corpo pare de trabalhar, tanto que o reconhecimento da
doença ocorre somente quando esta atinge uma gravidade tal que impede a
continuidade da atividade profissional ou das atividades domésticas e familiares.
Para este autor, a hospitalização ou qualquer outro recurso ligado à assistência
médica representa, de alguma maneira, o fracasso do sistema de contenção da
doença. Nas palavras de RIBEIRO (1997), o que os portadores de LER/DORT
temem é a morte social, isto é, não poder trabalhar, cuidar de si e dos seus. A
invisibilidade da LER/DORT traz problemas adicionais para a realização do
diagnóstico, o que acarreta uma vivência de sofrimento entre os portadores. Diante
de orientações médicas conflitantes ou que depositam no indivíduo a
responsabilidade de administrar a dor, são comuns opções pelo abandono de
qualquer tentativa de tratamento. O julgamento dos colegas de trabalho é um dos