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Universidade Severino Sombra
Coordenadoria de Pós Graduação
Programa de Mestrado em História
DA CASA E DA ROÇA: A MULHER
ESCRAVA EM VASSOURAS NO SÉCULO XIX
Ana Maria Leal Almeida
Vassouras
2001
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Ana Maria Leal Almeida
DA CASA E DA ROÇA: A MULHER
ESCRAVA EM VASSOURAS NO SÉCULO XIX
Vassouras
2001
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DA CASA E DA ROÇA: A MULHER
ESCRAVA EM VASSOURAS NO SÉCULO XIX
Orientador: Prof. Doutor Carlos Eugênio Líbano Soares
Dissertação Apresentada ao Programa de
Mestrado em História Social do Trabalho
da Universidade Severino Sombra - USS,
pela Mestranda Ana Maria Leal Almeida,
como Requisito Parcial para obtenção do
Título de Mestre em História.
Vassouras
2001
ALMEIDA, Ana Maria Leal
Da Casa e da Roça: a Mulher Escrava em Vassouras no Século XIX.
Vassouras: USS, 2001.
Inclui bibliografia.
1. Escravidão. 2. Século XIX. 3. Mulher. 4. Vassouras. I. Título. II. Soares,
Carlos Eugênio Líbano (ori.) III. Universidade Severino Sombra CPG
PMH
Universidade Severino Sombra
Coordenadoria de Pós Graduação
Programa de Mestrado em História
Dissertação: DA CASA E DA ROÇA: A MULHER ESCRAVA EM
VASSOURAS NO SÉCULO XIX.
Elaborada por Ana Maria Leal Almeida
e aprovada por todos os membros da Banca Examinadora, foi aceita pelo Programa
de Mestrado em História da USS, como requisito para obtenção do Título de
MESTRE EM HISTÓRIA
Banca Examinadora:
______________________________________________
Presidente
______________________________________________
1º Examinador
______________________________________________
2ºExaminador
Vassouras
2001
AGRADECIMENTOS
Aos colegas Adelci Silva dos Santos, Flávio Guerra, Fátima Rocha Luiz
Vianna, Magno Fonseca Borges, Maria Lúcia Mexias Simon, Maria Luiza Trouche
Jordão Sertório e Paulo Domingos D’Antonio Silva dentre outros cujos
ensinamentos e troca de experiências enriqueceram esta dissertação.
À minha amiga Neide Benevides que sempre me incentivou.
Ao Professor Doutor Carlos Eugênio Líbano Soares e à Professora
Doutora Miridan Britto Knox Falci, que sem dúvida muito contribuíram para o
aprimoramento desta dissertação, minha gratidão toda especial.
À minha sogra, pela sua maturidade, pela amizade e sugestões que muito
auxiliaram no meu trabalho, meu carinho e meu emocionado muito obrigada.
Ao meu esposo e filhos com desculpas pelo tempo roubado e os
agradecimentos pelo suporte psicológico e estímulo que possibilitaram a realização
desta dissertação.
Aos meus pais que deixaram em mim marcas
profundas coragem, humildade, determinação e
dignidade para conquistarmos objetivos e ideais.
"Uma história é capaz de iluminar nossa relação com os
outros, de fortalecer nossa compaixão, de transformar o
olhar com que contemplamos os nossos semelhantes,
confirmando a crença de que estamos todos juntos na
tarefa de viver."
Ruth Stotter
IX
RESUMO
Esta dissertação apresenta pontos fundamentais para o estudo da
mulher escrava, em Vassouras no período de 1850 a 1888, a partir de fontes
documentais, da literatura de época e da bibliografia moderna.
Destaca, em especial, a presença da mulher escrava em inúmeras
ocupações, tanto no interior dos casarões urbanos ou campestres, como no
meio rural, nos mais diversos trabalhos de roça.
X
ABSTRACT
This work introduces fundamental aspects for the study of the
slave woman in Vassouras during the period from 1850 to 1888, according to
documental sources, literature of that time and modern bibliographical
reference.
It emphasizes the presence of the slave woman in countless
occupations, either inside the urban or country houses, or in the rural
environment, in the most varied agricultural tasks.
XI
ÍNDICE
INTRODUÇÃO.................................................................................................. 1
CAPÍTULO I MULHER ESCRAVA: NO ENFOQUE DE LITERA-
TOS E HISTORIADORES....................................................................... 19
CAPÍTULO II MULHER ESCRAVA: HISTÓRIAS DE VIOLÊNCIA
E DE LIBERDADE................................................................................... 41
CAPÍTULO III MULHER ESCRAVA: DA CASA E DA ROÇA............. 76
CONCLUSÃO..................................................................................................... 115
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................... 125
1
INTRODUÇÃO
Para esta dissertação levantamos dados que propiciaram
fundamentar aspectos da vida cotidiana das mulheres escravas, na
Vassouras do século XIX, no período de 1850 a 1888, a partir de fontes
documentais e literárias.
Ao encetarmos as pesquisas sobre o tema escolhido para nosso
projeto "Da casa e da roça: a mulher escrava em Vassouras no século
XIX" não desconhecíamos as dificuldades que iríamos enfrentar quanto
às fontes de informação então existentes, e não apenas quanto às
primárias. Mas quando voltamos nossa atenção para o que existe como
fontes sobre a mulher em geral, verificamos o que iríamos encontrar em
relação à mulher negra e escrava.
Del Priore acentua certa dificuldade em relação à mulher em
geral escrevendo:
“a tarefa não é fácil por uma simples razão: apesar de estar
presentes desde o início do processo de colonização, de
participar da luta contra as árduas condições de vida entre
os séculos XVI e XVIII, da grande variedade de lugares
que ocuparam em diferentes grupos sociais, raciais e
religiosos, elas não eram muito visíveis. Sua quase
invisibilidade as identificava “aos debaixo”. Isso porque a
maioria das mulheres era analfabeta, subordinada
juridicamente aos homens e politicamente inexistente.”
1
Se a própria AHA (Associação Histórica Americana) reconhece
que "as mulheres, os negros, os judeus, os católicos e os não cavalheiros
foram sistematicamente sub-representados durante anos", o que dizer
então da mulher negra e escrava?
1
DEL PRIORE, Mary. Mulheres no Brasil Colonial. São Paulo: Ed. Contexto, 2000. p. 9.
2
Embora indiscutível, a questão da precariedade das fontes, para
reforçar esta dificuldade, citamos as palavras de J.J. Reis & E. Silva:
"A abordagem da escravidão a partir dos escravos esbarra
em sérios problemas sendo o mais conhecido a carência de
fontes".
"A documentação diretamente produzida por escravos
parece ter sido muito pequena".
"Menos de um em cada mil escravos sabia ler e escrever".
2
Sem contestar as afirmações acima, vamos citar o enfoque de
Matos:
“Obviamente não é tanto a falta de documentação sobre as
mulheres, mas a noção de que tais informações não teriam
a ver com “os interesses da história”, que gerou a
“invisibilidade” das mulheres nos relatos do passado”.
3
Entretanto, como afirma Sonia Giacomini
4
- “a nossa história é
branca, masculina e das classes dominantes".
É reconhecida "a escassez de vestígios acerca do passado das
mulheres, produzidos por elas próprias", o que constitui um dos grandes
problemas enfrentados pelos historiadores; se isto é verdade em relação
ao que tange a mulheres em geral, com muito mais razão em relação à
mulher escrava e seu trabalho. Só a renovação dos estudos históricos, "a
refinação dos métodos e técnicas" e o desenvolvimento da
"inventividade com relação às fontes" têm possibilitado a ampliação dos
horizontes da história.
2
REIS, João José e SILVA, Eduardo. Negociação e Conflito - A resistência negra no Brasil escravista. p. 14/15.
3
MATOS, Maria Izilda de. Por uma História da Mulher. Bauru, São Paulo: EDUSC. 2000, pp. 9/14.
4
GIACOMINI, Sonia. Mulher escrava Uma introdução histórica no estudo da mulher negra no Brasil. Rio de
Janeiro: Vozes, 1988. p. 8.
3
No dizer de Lucien Febvre:
"o conhecimento histórico deve ter como referência "os
homens, nunca o Homem" torna-se, portanto, inadequado
falar-se, hoje, em uma "história da mulher"...cabe, sim,
abordar-se a "história das mulheres".
5
O desenvolvimento de novos campos como a "história das
mentalidades" e a "história cultural" vem reforçar o avanço na
abordagem do feminino. Assim, também, a interdisciplinaridade, uma
prática enfatizada nos últimos tempos pelos profissionais da história,
assume importância crescente nos estudos sobre as mulheres.
A onda do movimento feminista, ocorrida a partir dos anos 60,
contribuiu ainda mais para o surgimento da história das mulheres.
Para onde vai a história da mulher? História da mulher e história
social - juntas ou separadas?
“A história da mulher tem-se desenvolvido e mudado nos últimos
trinta anos, da mesma forma o feminismo”.
Realmente, a emergência da história das mulheres como um
campo de estudo acompanhou as campanhas feministas para a melhoria
das condições profissionais e envolveu a expansão dos limites da
história.
Reforçando a tese da maior visibilidade das mulheres em
função de sua presença no trabalho temos as palavras de Matos:
“a presença das mulheres nos escritos acadêmicos vem
crescendo, em função de um conjunto de fatores que tem
dado visibilidade às mulheres, mediante sua conquista de
5
SOIHET, Rachel. História das mulheres - Mulheres como objeto da história. In: CARDOSO, Ciro Flamarion & Vainfas,
Ronaldo. Domínios da História. Ensaios de Teoria e Metodologia. Rio de Janeiro: Ed. Campus, 1997. p. 275.
4
novos espaços. Um primeiro fator seria a maior presença
feminina no mercado de trabalho”.
6
Os anos de 1960 são os de formação da chamada história de
gênero.
Os estudos de gênero têm se mostrado como um campo
multidisciplinar. Nesse sentido, aproximaram-se particularmente da
psicologia e da antropologia, influências que, sem dúvida, favoreceram a
ampliação de áreas de investigação histórica.
Continua Matos:
“... na década de 70, as mulheres “entraram em cena”, e se
tornaram visíveis na sociedade e na academia, na qual os
estudos sobre a mulher se encontravam marginalizados na
maior parte da produção e na documentação oficial”.
“...O processo de emergência do tema, também na
produção historiográfica como em outras áreas, privilegiou
nos anos 70, entre outras questões, a do “trabalho
feminino”.
7
Mas a explosão dos trabalhos sobre a mulher ocorreu nos anos 80.
Primeiro nos Estados Unidos, depois no Brasil, foi se quebrando o mito
de que a mulher somente escapava da condição de escrava através da
sedução, que era o recurso típico da historiografia freyriana.
8
A produção historiográfica sobre as mulheres vem crescendo e
tomando vigor pluralista.
A existência do campo, relativamente novo, da história social
proporcionou, também, um importante veículo para a história das
6
MATOS, Maria Izilda S. de. Por uma História da mulher. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2000. p.9/14, 17/25.
7
Idem.
8
FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal. 26ª
ed. Rio de Janeiro: Record, 1989.
5
mulheres. A maior parte dessa história tem buscado, de alguma forma,
incluir as mulheres como objetos de estudo, sujeitos da história.
Num leque de várias interpretações, procurou-se recuperar a
atuação das mulheres no processo histórico como sujeitos ativos, de
modo que as imagens de pacificidade, ociosidade e confinação ao espaço
do lar vêm sendo questionadas, descortinando-se esferas de influências e
recuperando os testemunhos femininos.
Contudo, torna-se cada vez mais necessário, sem esquecer a
opressão histórica sobre as mulheres, superar a dicotomia ainda
fortemente presente entre a “vitimização” da mulher e a visão de uma
“onipotência” e “rebeldia” feminina, que algumas vezes estabelece uma
“heroicização” das mulheres.
Talvez a história tenha sido uma das áreas, no campo
interdisciplinar dos estudos de gênero, que mais intensamente tenha feito
essa incorporação.
Outrora rejeitada e até marginalizada a história da mulher passou
a ser encarada como uma possibilidade de recuperação de outras
experiências. Reconhecimento de que a realidade histórica é social e
culturalmente constituída.
No Brasil, as primeiras abordagens sobre o trabalho feminino
deram-se nos terrenos da sociologia e antropologia, sendo de Gilberto
Freyre as primeiras abordagens sobre a família brasileira.
Os primeiros trabalhos sobre escravidão pouca atenção davam
à mulher cativa. Somente com Gilberto Freyre é que a mulher escrava,
crioula ou africana, passa a ter alguma relevância na historiografia. Para
Freyre a mulher foi o veículo da cultura escrava dentro da família
senhorial.
6
Para evidenciar que o problema do papel da mulher na
sociedade é bastante anterior ao que agora enfocamos a mulher escrava
no Brasil, citamos “Horácio, o amor e a mulher marginal”, um trabalho
de Marilda Ciribelli.
9
Segundo Ciribelli, na ótica do poeta “as mulheres que merecem
sua exaltação não são as matronas ...e sim as escravas, as libertas, as
criadas, enfim, as mulheres marginais...”.
E continua:
“...entre as mulheres de “Segunda Classe” estão não
somente as escravas consideradas como coisas que
estavam à margem da sociedade, como as libertas que
levavam uma vida independente......estas mulheres
constituíam, em nosso entender, a vanguarda do
feminismo em Roma”.
10
Nessa obra encontramos diferenças dígnas de nota entre o
escravismo existente na Grécia e na Roma antiga e o escravismo
moderno: este reforça o estatuto legal do cativeiro com a discriminação
racial. O escravo só podia ser preto ou mulato, nunca branco.
Entretanto, seguindo a norma do direito romano, o direito imperial
brasileiro prescrevia que o estatuto do filho seguia o estatuto da mãe: o
filho de escravo nascia escravo. Disso surgia uma contradição,
principalmente no Rio, pois alguns escravos brancos filhos, netos e
bisnetos de escravas mulatas e de brancos isolados em fazendas
sertanejas, começaram a ser vendidos para a corte.
9
CIRIBELLI, Marilda Corrêa. Horácio, o Amor e a Mulher Marginal. In Revista do Mestrado de História. USS.
Rio de Janeiro: Sette Letras. 1998.
10
Ibidem, p. 55/57.
7
A historiografia tradicional fez acreditar que a mulher cativa era
vista na escravidão apenas em trabalhos específicos, como criada,
lavadeira, costureira e, até mesmo, como prostituta. Queremos mostrar
que, na realidade, centenas de mulheres, de todas as idades, foram
levadas para o trabalho mais duro do eito, junto com os homens, e
realizaram as mesmas tarefas pesadas, quer nos engenhos, quer nas
extensas lavouras de café, que predominavam em Vassouras no período
por nós enfocado, ocupando um arco bastante amplo, ainda mais aberto
do que o dos homens.
Nos tempos atuais é notória a influência da "Nova História" com
a preocupação de resgatar o cotidiano e a cultura, presente nas novas
pesquisas, contribuindo para a compreensão da realidade histórica
escravista. A busca de novos temas - como a mulher, os marginais, a
sexualidade e da leitura e re-leitura de novas fontes como -
testamentos, inventários, processos inquisitoriais, jornais - têm permitido
aos estudiosos resgatar o particular, o regional, sem desconsiderar o
todo.
Segundo Peter Burke:
“a nova história é a história escrita como reação deliberada
contra o “paradígma” tradicional que oferece uma visão de
cima no sentido de que tem sempre se concentrado nos
grandes feitos dos grandes homens, estadistas, generais ou
ocasionalmente eclesiásticos, baseada em documentos”.
11
Segundo esse mesmo autor, os documentos (registros oficiais
que expressam o ponto de vista oficial) necessitam ser suplementados
11
BURKE, Peter (org.) A escrita da história. Novas Perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992.
8
por outros tipos de fontes, dentro do movimento da “história vista de
baixo”, onde se poderá encontrar a negra escrava, pois no dizer de
Giacomoni, a mulher em geral era identificada “aos debaixo”.
Fox Genovese
12
tentou palmilhar o caminho de uma
historiografia específica de escravas, isto é, no campo das estratégias
ativas.
Esta historiografia, americana e caribenha de língua inglesa,
enfatizou o papel das mulheres como líderes de rebeliões, chefes
religiosas, ou mesmo lideranças de grupos fugitivos.
No novo livro de Slenes
13
sobre família escrava, percebemos
como a mulher cativa tecia estratégias contra a escravidão, partindo da
reformulação de padrões africanos e da experiência concreta da
escravidão. O mecanismo da “experiência”, um dispositivo criado pela
historiografia de Thompson, mostra que a realidade concreta vivida pelo
grupo é o referencial fundamental para a construção da identidade, não
uma longínqua tradição emersa de um passado distante.
No Brasil, segundo Fragoso
14
, a mulher escrava somente
ocupou um espaço específico a partir dos trabalhos sobre família
escrava. Estes trabalhos ressaltaram a estabilidade familiar dentro das
senzalas como conquista, em parte, das mulheres, já que os senhores não
estimularam, nem mesmo facilitaram a constituição de famílias escravas
que, segundo eles, dificultavam a venda das “peças”.
12
FOX GENOVESE, Elizabeth. Strategies and forms of resistance: focus on slave women in the Unites States. In: OKIHIRO,
Gary Y. In resistance: studies in african, caribbean and afro - american history. Boston: The University of Massachussets
Press, 1986. p. 143/165.
13
SLENES, Robert. Na senzala, uma flor: esperanças e recordações na formação da família escrava, Brasil Sudeste, século
XIX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
14
FRAGOSO, João Luis Ribeiro, FLORENTINO, Manolo Garcia. Marcelino, filho de Inocência crioula, neto de
Joana Cabinda:um estudo sobre famílias escravas em Paraíba do Sul, 1835/1872. Estudos Econômicos, São Paulo:
IPE-USP,v. 17, n. 2, 1987. p. 151/173.
9
Já Slenes
15
mostra o papel ativo das mulheres dentro da
organização familiar não apenas como estabilizadora, mas também como
fator de desequilíbrio da ordem senhorial.
Nessa nova perspectiva, a historiografia tem buscado resgatar o
escravo, enquanto sujeito histórico, numa clara tendência da produção
historiográfica em direção à História Social, embora mantido o espaço
das Histórias Econômica e Política.
Vemos, assim, que a interdisciplinaridade torna-se de
fundamental importância para a busca de uma História Total e, ainda,
que as pesquisas mais recentes vêm permitindo uma maior compreensão
da dinâmica social escravista e o resgate histórico de experiências
vivenciadas por homens e mulheres que durante muitos anos
permaneceram esquecidas e silenciadas pela historiografia "tradicional".
Esta baseou-se em um sistema de valores que não contempla a vida das
mulheres, a não ser as de algumas rainhas e princesas. E isto porque os
temas focalizados são os considerados “historicamente significativos”
pelos homens: história militar, história constitucional, história
diplomática, história política e todas têm a ver com poder e influências .
Dentro do espaço aberto pelo novo contexto, pela nova
perspectiva da história, é que pretendemos dar nossa pequena
colaboração ao estudo da possivelmente a mais esquecida de todas: a
mulher escrava e a sua colaboração na força de trabalho, como elemento
presente na formação do Brasil.
Concordamos com os que argumentam que, embora a história do
feminismo seja uma parte importante da história da mulher, não é
absolutamente toda ela.
15
SLENES, Op. cit. p. 30.
10
Como diz Mary Beard, “o que importa quanto às mulheres não é
que tenham sido um grupo oprimido, mas que tenham dado uma
contribuição contínua e marcante à sociedade através de toda a história”.
Dentro desse contexto é que ressaltamos a contribuição da Mulher
Negra e Escrava na nossa incipiente economia do século XIX.
Em meados do século XIX, a instituição escravista atingiu
verdadeiro apogeu na região sul-fluminense, salientando-se Vassouras
como núcleo da aristocracia rural da província, tendo-se tornado
famosa pelo volume da produção cafeeira. Corroborando com essa
afirmativa, encontramos em Stanley algo ainda mais taxativo:
“Entre 1850 e 1900, o Vale do Paraíba era o cenário da
maior produção de café do mundo” (...) “durante os trinta
anos precedentes, uma floresta primitiva havia sido
transformada numa série de extensos povoados
espalhados nos dois sentidos do Vale, convertendo-o
numa vasta região de fazendas de café com base no
trabalho escravo”.
16
E mais adiante, reafirma:
“A auto-suficiência da fazenda somada à terra barata e
farta e a uma crescente força de trabalho estabeleceram
uma base para a prática, e logo o café assumiu seu lugar ao
lado do açúcar e da agricultura de subsistência como um
pilar na crescente economia do município”.
17
Vassouras apresenta um contexto interessante para análise aqui
proposta, pois as suas fazendas receberam um grande contingente de
16
STEIN, Stanley. Vassouras um município brasileiro do café, 1850/1900. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990. p. 13.
17
Ibidem, p. 51.
11
escravos, principalmente da África Centro-Ocidental. Em meados do
século, foi um dos maiores produtores de café do Brasil, sendo mesmo
considerado, por Raposo, o maior centro agrícola da Província, tendo
portanto um grande número de escravos.
Azevedo esclarece:
“...com o processo de esgotamento das minas na 2ª
metade do século XVIII (1750-1800), vários pequenos
proprietários se deslocam com seus escravos para o Vale
do Paraíba, com o intuito de se lançar na agricultura”.
18
sendo, portanto, a maioria dos primeiros habitantes do Vale do Paraíba,
indivíduos oriundos das Minas Gerais.
Diz, ainda:
“...outro fator de desenvolvimento do Vale foi o incentivo
de D. João VI a diversas formas do cultivo do café, tendo
este se espalhado por todo o Vale do Paraíba onde,
“antigos tropeiros” que haviam acumulado fortuna,
tornaram-se proprietários de fazenda de café”.
19
E, segundo, Viotti:
“As fazendas do Vale, que já se haviam organizado com
base no braço escravo, não se sentiam ainda impelidas a
providenciar sua substituição. O emprego de máquinas
demandava o emprego de alta soma de capitais e era pouco
compatível com o trabalho escravo. Exigia trabalhadores
com certa qualificação, capazes de operá-las e conservá-
las”.
20
18
AZEVEDO, André Nunes de Araújo & ARAÚJO, Valdei Lopes. A história de Piraí. Rio de Janeiro: UERJ,
2000. p. 14.
19
Ibidem, pp. 29/31.
20
COSTA, Emília Viotti da. Da Senzala à Colônia. São Paulo: Brasiliense, 1989. p. 68.
12
A transição da mão-de-obra escrava para a mão-de-obra livre
apresentou certas dificuldades extras no Vale do Paraíba. O preconceito
dos fazendeiros locais com relação ao trabalho livre encontra raízes
numa tradição senhorial autoritária. Dificilmente um dono de escravos se
sujeitaria a negociar com um homem livre de igual para igual. O
trabalhador livre nacional era visto como vadio, preguiçoso e indolente
por natureza, sendo, portanto, inapto para o duro trabalho da fazenda
cafeicultora. Além deste fator, cabe ressaltar o fato de que estes
fazendeiros possuíam um grande número de escravos, não necessitando
do emprego de mão-de-obra livre.
Eis aí a razão da escolha da região de Vassouras, onde o grande
volume de escravos foi, sem dúvida, incontestável, pois constituíam eles
a mão-de-obra, quase exclusiva, das lavouras que eram a base da
economia vassourense.
Dentro deste contexto insere-se a importância do papel
fundamental da mulher escrava, crioula ou africana, naquela sociedade,
onde ela era colocada a trabalhar em todas as atividades, sujeita a todo
tipo de exploração, às vezes como criada doméstica, outras como animal
de carga, podendo ser alugada, comprada, trocada e até mesmo
hipotecada, como pudemos verificar em inúmeras obras e documentos
por nós analisados.
Segundo Mattos:
“A designação “crioulo” era exclusiva de escravos e forros
nascidos no Brasil e o significante preto, até a primeira
metade do século, era referido preferencialmente aos
africanos”.
21
21
MATTOS, Hebe Maria. Das cores do Silêncio: o significado da liberdade no sudeste escravista - Brasil século XIX. Rio
de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. p. 30.
13
Quanto ao período escolhido-1850/1888 - encontra
fundamento no fato de que, a partir de 1850, com o término do tráfico
transatlântico de africanos, um grande contingente de escravos crioulos
foi trazido de outras províncias do Brasil, para servir à demanda dos
cafezais da região. Assim o aumento da escravaria das fazendas de café
em Vassouras se deu do início do século XIX até o terceiro quartel desse
mesmo século, quando é proibido o tráfico interprovincial. Se outras
razões já explicitadas não existissem, apoiados nos relatos de Inácio
Raposo, podemos dizer que Vassouras acoplou, ao desenvolvimento
econômico, obras sociais e outras como o novo chafariz, para o qual D.
Pedro concorreu com uma quantia em dinheiro, além do interesse e
amor demonstrado pelo progresso do município, na sua visita em 1848.
Desde a década de 70, do século XIX, a cafeicultura se
encontrava em franca decadência, por força das técnicas primitivas de
plantio utilizadas pelos fazendeiros do Vale do Paraíba mas,
“desprevenido do futuro, o vassourense, abandonando todas as outras
culturas, entregava-se unicamente ao plantio da famosa rubiácea”,
embora já naquele tempo se soubesse das graves conseqüências dessa
“indústria rural” e apesar da advertência do francês Charles Ribeyrolles
que, no seu “Brésil Pittoresque”, clamava:
“Brasileiros, não desprezeis o porco, o anil, o bicho-da-
seda, a abelha, nem tão pouco a banana. Plantas, frutos,
animais, tudo isto é mesquinho, mas tudo isto alimenta: o
café só se toma à sobremesa”.
22
22
RIBEYROLLES, Charles. Brasil pitoresco. Gastão Penalva, tr. 2v. São Paulo: 1941.
14
Ao longo dos primeiros anos do século XVIII, na região onde
será Vassouras, vão surgindo as roças de mantimentos que produziam
basicamente o milho que abastecia as tropas de mulas dos carregadores
de ouro. Além disso, produziam mandioca, o arroz, o feijão e o café.
O cultivo do café chega ao Vale do Paraíba, quando a extração
do ouro em Minas Gerais, já estava em declínio. As riquezas forjadas nas
lavras auríferas começam a desaparecer, os colonos estão à procura de
novos investimentos e a Coroa Portuguesa, de outras fontes econômicas
na Colônia. Por meio de doações de sesmarias, os mineiros vão investir
na região do vale, plantando café, expulsando o posseiro, o rancheiro e o
índio, além de desmatar uma densa floresta tropical.
Como já dissemos, parte da ocupação de Vassouras nesse
período foi feita por colonos vindos das Minas Gerais, que encontraram
novos caminhos para o Rio de Janeiro pela estrada do Comércio. Outra
parte da ocupação de Vassouras, que veio do Rio de Janeiro, trouxe para
a região cafeeira, algum capital mercantil proveniente de outras fontes,
como o açúcar e o tráfico.
Nos anos 1837/1838 o café supera a exportação do açúcar,
representando em torno de 40% do comércio exterior. É na segunda
metade do século XIX, no entanto, que passa a ser cultivado em larga
escala no Vale do Paraíba Fluminense, devido ao bom preço que alcança
no mercado internacional. As condições naturais para o plantio de café
são esplêndidas: topografia formada por ondulações suaves, numa
altitude que oscila entre 300 e 900 metros, com temperatura e
precipitação dentro dos limites ideais para o cultivo. As vilas da região,
sem expressão até esse período, são impulsionadas e tornam-se centros
15
cafeeiros, como Vassouras, Piraí, São João Marcos, Resende, Barra
Mansa, Paraíba do Sul e Valença.
As fazendas se multiplicam, havendo notícias de fazendeiros
como expoentes no Parlamento Imperial. A família Breves, na região de
Piraí e São Marcos, por exemplo, era proprietária de vinte fazendas,
aproximadamente, com cerca de seis mil escravos.
Stanley afirma que:
“...em Vassouras, assim como nos municípios vizinhos, o
número de cafeeiros havia se tornado a medida da riqueza
e era uma indicação clara do número de escravos na sua
força de trabalho. Pela quinta década do século, como o
gosto pelo café se espalhou entre as populações urbanas
em expansão da Europa e da América, a demanda por
escravos e a ânsia por florestas virgens cresceram entre os
fazendeiros de café do Vale do Paraíba”.
23
o que, mais uma vez, vem justificar a nossa escolha do Município de
Vassouras e do período enfocado. Quanto a este, temos ainda o seguinte
trecho:
“A decadência já francamente se manifestava, podendo-se
designar o ano de 1880 como o marco divisório da idade
de ouro do Município para a de prata que desde logo
sucedeu”.
24
Nesta dissertação, buscamos reconstruir a trajetória das
mulheres cativas, em todos os planos do mundo do trabalho da
Vassouras de outrora, desde as domésticas da vila, que viviam nos
opulentos casarões, até aquelas que viviam nas senzalas, compartilhando
23
STANLEY, J. Stein. Vassouras o Município brasileiro do Café 1850/1900. Rio de Janeiro: Ed. Nova Fronteira,
1990, p. 51.
24
Raposo, Ignácio. História de Vassouras. Niterói: SEEC, 1978, p. 168.
16
com os homens da vigilância e da brutalidade senhorial, enfrentando a
desvantagem de, além de escrava, ser mulher.
Para tornar mais amplo o campo de nossa pesquisa, além da
utilização dos documentos, de fonte primária, abordamos a literatura,
(capítulo I) que retrata a escravidão.
Corroborando com nossa decisão de inserir o capítulo “Mulher
escrava: no enfoque de literários e historiadores”, temos o enfoque de
Cardoso que procura estabelecer os laços entre “narrativa” e “história.”
Cardoso, dentro de uma perspectiva que ele chama de
transdisciplinar, procura por ao alcance de historiadores, e outros
profissionais de História, “alguns dos instrumentos analíticos” gerados
nos campos dos estudos literários, citando Langlois e Seignobos:
“A regra a seguir é, pois, começar a entender o texto em si
mesmo, “antes” de indagar o que dele pode ser
aproveitado para a história. Desse modo chegamos a esta
regra geral do método: o estudo de qualquer documento
deve começar por uma análise de seu conteúdo (...)”.
25
podendo, assim, o historiador interessar-se por textos especificamente
narrativos: contos, romances, crônicas, livros de história, filme etc... que
podem ser eficientes objeto de estudo.
No capítulo II, “Mulher escrava: histórias de violência e
liberdade” retratamos a presença da escrava em campos opostos: como
vítima e como algoz, a sempre carinhosa “mãe-preta” e a escrava cruel,
capaz de todas as maldades, chegando até a matar, como, aliás,
comprovam os documentos por nós manuseados e transcritos nesse
capítulo. Neste inserimos, também, o noticiário da época onde
25
CARDOSO, Ciro Flamarion. Narrativa, Sentido, História. São Paulo: Papirus, 1997. pp. 19/20.
17
encontramos relatos da violência quer do escravo contra o seu senhor,
quer deste contra o escravo.
Como não poderia deixar de acontecer, em decorrência dessa
violência contra o escravo, este reagiu surgindo a conseqüente luta pela
liberdade e esta por sua vez, envolvia a violência contra o senhor, o
proprietário da “coisa” a que se reduzia o escravo no seu dia-a-dia.
Essa luta para alcançar a liberdade, quer individualmente, quer
coletivamente, não apenas através dos atos de violência, chegando ao
homicídio de seu senhor, senhora ou feitor, mas também com as fugas
que se tornaram rotina nesse período, as rebeliões, as insurreições, a
formação dos inúmeros quilombos consta do mesmo capítulo.
Enfim, no capítulo III “Mulher Escrava: da casa e da roça”,
tratamos mais especificamente do tema de nossa dissertação, procurando
desmitificar a imagem da negra escrava apenas como doméstica, como
criada nos casarões urbanos e campestres. Transcrevemos, nesse
capítulo, inúmeros documentos onde está comprovada, taxativamente, a
presença da mulher na roça, no eito, na “plantation”, além das muitas
outras atividades por ela exercidas, de nenhuma excluída pela sua
condição de mulher.
Para encerrar nossa dissertação, procuramos demonstrar o
acerto ou não de nossas hipóteses:
- a presença marcante de mulheres em trabalho de
roça;
- a mulher escrava tanto podia ser encarregada dos
serviços pesados da roça, como podia ser deixada no
18
serviço mais leve, mas, nem por isso, menos opressor
do lar senhorial;
- a mulher era valorizada na sociedade escravista
vassourense por sua capacidade múltipla de trabalho.
Finalmente, ficou justificado, a nosso ver, o tema escolhido,
como uma mui pequena contribuição para esse campo da historiografia
a mulher negra escrava e seu papel na sociedade do século XIX.
19
CAPÍTULO I
A MULHER ESCRAVA: NO ENFOQUE DE LITERATOS
E HISTORIADORES
"A criação literária não deve ser
analisada apenas por sua expressão
estética, mas por seu valor social".
26
A afirmação acima é tanto mais válida quanto, tendo o conceito de
documentação se alargado, os textos literários tornaram-se “fontes
históricas” desde que se enquadrem nos “conceitos de realidade e
objetividade” adotados pelo historiador moderno.
A literatura, no seu processo de desrealização do real, na criação de
uma supra-realidade, ou mundo de ficção e fantasia, cria um universo
autônomo, sem vínculo de compromisso com a realidade aparente.
Sem compromisso com a realidade, seu espaço é infinito e os
desafios dessa desrealização para a construção abrem um leque de
possibilidades dentro da realidade recriada.
No entanto, mesmo ao mergulhar no imaginário, ela registra fatos
que retratam um mundo empírico do qual faz parte, pois não tem
condições de se desvencilhar dos acontecimentos que a ligam ao seu
tempo.
No dizer de Otto Lara Rezende, "o ficcionista é criador e
prisioneiro de seu universo; assim, toda obra é marcada por suas relações
subterrâneas com o mundo que a cerca".
26
ROCHA, Maria Cristina de Caldas Freire, Discurso crítico e construção histórica. Revista do Mestrado de História da
USS, Rio de Janeiro: Sette Letras, a. 1, n. 1, p. 41-51, 1998. p. 46.
20
Pesquisadores, dentro do novo enfoque da interdisciplinaridade,
estudaram a ligação História-Literatura, considerando esta uma
transmissora dos valores da sociedade sendo, portanto, fonte primordial
para recuperação das “vozes silenciadas”, dos “sussuros”, dos “gemidos”
que surgem no imaginário social dos romances.
27
Sendo a escravidão do negro um fato marcante da história do
Brasil, a literatura brasileira não poderia deixar de dedicar sua atenção a
este tema. E é na literatura que vemos retratados aspectos que
dificilmente seriam achados em tratados de história, principalmente da
tradicional.
Assim é que, nos momentos iniciais de nossa cultura, no séc.
XVII, os dois mais destacados nomes da literatura da época - Gregório
de Matos e Padre Antônio Vieira - enfocaram o escravo negro em seus
escritos; só que o mostravam em condições totalmente opostas. Na sátira
gregoriana, o negro é dissimulado e ladrão; para o Padre Antonio Vieira,
tido como um dos protetores do escravo, este é visto sob outro ângulo,
sendo ressaltado e reconhecido o seu enorme sofrimento.
No século XVIII, a época mais crucial para a questão da
escravatura, surge o movimento árcade, cuja poesia omite a figura do
escravo que aparece, quando muito, anonimamente, sacudindo a bateia
na busca do ouro, pois essa época corresponde à fase da extração do
ouro nas Minas Gerais.
No séc. XIX, com o movimento romântico, a literatura não
prioriza o negro. No entanto este surge permeando as atitudes
românticas, na figura do escravo vivendo nos casarões urbanos.
27
DUARTE, Lélia Parreira (Org.) Teses. Belo Horizonte: UFMG, 1994. pp. 65/67.
21
Nessa época, aparecem os primeiros intelectuais de origem
africana, como Machado de Assis, considerado o príncipe da
intelectualidade brasileira, que trata a escravidão como um fato natural da
época e Gonçalves Dias, cuja obra poética influenciou Olavo Bilac, mas
que, em sua poesia, não tematizou o negro, preferindo dedicar-se ao
indianismo.
Parece-nos que, para esse poeta do romantismo, era forte o
sentimento do absurdo suscitado pelo panorama social e político do
Império, pois foi levado a escrever no poema em prosa "Meditação"
(1846), depois de seu retorno da Universidade de Coimbra e três anos
antes de sua mudança do Maranhão para o Rio de Janeiro:
"E nessas cidades, vilas e aldeias, nos seus cais, praças e
chafarizes - vi somente escravos [...]. Por isto o estrangeiro
que chega a algum porto do vasto império - consulta de
novo a sua derrota e observa atentamente os astros -
porque julga que um vento inimigo o levou às Costas d'
África. E conhece por fim que está no Brasil".
28
O romantismo, na sua decantada mistura de raças, ignora a
contribuição negra, dando ao índio a primazia, como se vê em "O
Guarani", de José de Alencar, onde os principais personagens são o índio
Peri e a branca Ceci, ou em "Iracema", onde o primeiro brasileiro é filho
da índia Iracema e do português Martim. O próprio Castro Alves,
considerado o "poeta dos escravos", teve sua obra mais voltada para
evidenciar a iniqüidade do regime monárquico, em favor da República,
que para dignificar a luta contra a escravidão, embora o negro fosse por
ele mostrado romanticamente trágico, como na decantada poesia "Navio
negreiro". Entretanto, é preciso lembrar que o tráfico negreiro não mais
28
DIAS, Gonçalves. Meditação, em poesia completa prosa escolhida. p. 741 - 74.
22
ocorria no Brasil desde 1850, em decorrência, dentre outras coisas, da
atuação da Lei Bill Aberdeen (1845).
29
Voltando a José de Alencar, também em “Senhora” encontramos
algumas passagens que fazem referência a escravos e à sua atuação no
seio da família. Referindo-se ao patrimônio deixado pelo Senhor Seixas,
um dos protagonistas desse romance, é feito o comentário que depois
de difícil e morosa liquidação... pode-se apurar a soma de doze contos,
afora quatro escravos” que deveriam depois, a critério do herdeiro, ser
vendidos (dois) e alugados (dois) para ajudar a viúva nos gastos da casa.
30
Mais adiante, Aurélia a Senhora, figura central da trama,
ordenava à mucama que distribuísse, pelas outras escravas, uns enfeites e
vestidos já usados. A escrava, denotando a intimidade que muitas vezes
se estabelecia entre ama e mucama e com a liberdade que as escravas
prediletas tomavam, critica o “desperdício” da sinhá.
Continuando com José de Alencar, em seu romance "Til", a
participação de personagens escravos é apenas de "coadjuvantes" no
desenrolar da trama romântica. São eles: Monjolo - escravo vingativo; Pai
Quicê - escravo que envelheceu na propriedade e por lá perambula sem
que a ele se dê qualquer atenção; Zana - escrava que enlouqueceu vendo,
sua sinhá ser assassinada, sem poder defendê-la, conseguindo apenas
salvar a criança, Til, filha de sua sinhá. E encontramos algumas
referências à vida dos escravos nas fazendas:
"Aí à sombra dos renques de cafezeiros, descansavam os
pretos recebendo a ração do almoço, que as rancheiras de
29
CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravidão no Brasil-1850/1888. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
30
ALENCAR, José. Senhora. São Paulo: Ática, 1999.
23
cada turma dividiam pelas gamelas e palanganas que lhes
apresentavam".
De tal maneira estava arraigada a imagem de inferioridade do
escravo da roça, em especial, que outro personagem do romance Til,
"João Fera", branco criado com o filho do fazendeiro, mas transformado
em "matador de aluguel", considerava a enxada um vil instrumento,
preferindo a morte a ter de usá-lo:
"...o machado e a foice, ainda concebia que os pudesse
empunhar a mão do homem livre, mas em seu próprio
serviço, para abater o esteio da choça ou abrir caminho
através da floresta".
31
Em outro trecho, José de Alencar se refere ao negro escravo
relatando uma festa típica e destacando a diferença entre a condição da
"escrava da roça" e a "mucama", a serviço da casa. Vejamos o trecho:
"Adiante vinham o rei e a rainha do Congo... soberanos
do imaginário reino africano (...) Fazia de rainha a negra
Florência, que nesse dia triunfava sobre a rival, a mucama
Rosa...
Nesse instante lamentou a mucama condição que a
sujeitava a certo recato, e a privava, portanto, de tornar
parte no folguedo. Como preta da roça teria outra
liberdade; e ninguém lhe disputaria, por seguro, o título de
rainha".
32
Para os ideólogos escravistas, como José de Alencar, a escravidão
era um mal necessário, que deveria acabar de morte natural, em futuro
distante.
31
ALENCAR, José. TIL. São Paulo: Ática, 1999. p. 113.
32
Idem, p. 221.
24
Escravos Domésticos na escada posavam, dóceis, à porta da casa grande.
Fonte: FERNANDES Jr., Rubens; LAGO, P. C. O século XIX na fotografia brasileira.
Rio de Janeiro: Ed. Francisco Alves, 2000. p. 58.
Fonte:
FERNANDES Jr., Rubens; LAGO, P. C.
O século XIX na fotografia brasileira.
Rio de
Janeiro: Ed. Francisco Alves, 2000. p. 49.
25
Em contraposição a esse enfoque, Flores acentua:
...a escravidão foi uma das maiores tragédias da história
mundial, no entanto, nenhum dramaturgo brasileiro do
século XIX, inclusive os abolicionistas, colocou em cena as
agruras da captura do negro na África, a separação da
família, a infernal viagem nos navios tumbeiros, as
incertezas da chegada na terra desconhecida, o atroz
mercado humano onde amigos e parentes eram vendidos
ou separados, a adaptação ao cativeiro, a vida no eito, as
resistências, as fugas e a morte dos escravos. Também não
há texto que explore como temática a situação do liberto”.
33
“Ainda no século XIX, os dramaturgos negros como
Machado de Assis escreveram peças com os signos dos
brancos, pois a sociedade passava por um processo de
branqueamento, entendido como ascensão dos valores da
classe dominante, que incluía abandonar sua religião e se
tornar católico...
O branqueamento passa a ser importante na escalada
social no fim do século XIX, não havendo lugar para o
negro que continua na base da pirâmide social”.
34
Depois da abolição do tráfico em 1850, a campanha abolicionista
toma novos rumos, a solução para a escravidão é a mestiçagem, um meio
para civilizar o negro “bronco e imoral”. Esta mestiçagem realiza-se com
o branco e a mulher negra. O médico mestiço, filho de um branco com
uma mulata, consegue lugar na sociedade racista, desde que sua mãe saia
de cena, conforme o drama “A Mãe”
35
, de José de Alencar. É
interessante observar que intelectuais, como o mulato Machado de Assis,
não abordaram o drama social do escravo e do liberto, talvez com medo
de que lhes apontassem a origem por serem simpáticos à raça negra.
A representação do negro no teatro restringiu-se aos terreiros,
onde ele dança e canta revivendo os mitos tribais, e a mulher escrava
33
FLORES, Moacyr. O negro na dramaturgia brasileira, 1838/1888. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1995. p. 10.
34
Idem, p. 89.
35
ALENCAR, José. A mãe. Rio de Janeiro: B.L. Garnier editor, 2ª ed. 1864.
26
simbolizava dentro da casa a sexualidade desenfreada que abala a família
estruturada no casamento.
36
Em sua obra "Memórias Póstumas de Brás Cubas", Machado de
Assis, apesar de ter enfocado personagens brancos em seus romances,
não deixou de introduzir escravos negros, como vemos a seguir, onde ele
apresenta seu personagem principal tratando com escravos de maneira
bastante "malígna" no seu próprio dizer. Por exemplo:
"...um dia quebrei a cabeça de uma escrava porque ela me
negara uma colher de doce de coco que estava fazendo e,
não satisfeito da travessura fui dizer à minha mãe que a
escrava é que estragara o doce “por pirraça” e, mais
adiante, “Prudêncio, um moleque da casa, era o meu
cavalo de todos os dias; punha as mãos no chão, recebia
um cordel nos queixos, à guisa de freio, eu trepava-lhe no
dorso, com uma varinha na mão, fustigava-o, dava mil
voltas a um e outro lado, e ele obedecia algumas vezes
gemendo mas obedecia sem dizer palavra ou, quando
muito, um “ai, nhonhô!”.
37
Mais adiante, sobre este mesmo Prudêncio, que já havia sido
libertado por seu dono, pai do nosso personagem acima, temos o
seguinte trecho:
"Tais reflexões que eu vinha fazendo por aquele valongo
afora ... Interrompeu mais um ajuntamento, era um preto
que vergalhava outro na praça. O outro não se atrevia a
fugir; gemeu “senhor perdão!" Mas o primeiro não fazia
caso e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada
nova.
- Toma, diabo! Dizia ele; toma mais perdão, seu bêbado!
- Meu senhor, gemia o outro.
- Cala boca, besta! replicava o vergalho.
36
Idem, pp. 43/44, 89/91.
37
ASSIS, Machado de. Memórias Postumas de Brás Cubas. São Paulo: Ática, 2000.
27
Parei, olhei ... justos céus! Quem havia de ser o do
vergalho? Nada a menos que o meu moleque Prudêncio
o que o meu pai libertara alguns anos antes. Cheguei-me,
ele se deteve logo e pediu-me a bênção, perguntei-lhe se
aquele preto era escravo dele.
- É sim, nhonhô.
- Fez-te alguma coisa?
- É um vadio, um bêbado muito grande. Ainda hoje
deixei ele na quitanda, enquanto eu ia lá embaixo na
cidade, e ele deixou a quitanda para ir na venda beber.
- Está bom, perdoa-lhe, disse eu.
- Pois não, nhonhô. Nhonhô manda, não pede. Entra
para casa, bêbado!
"Exteriormente era torvo o episódio do Valongo (...) Logo
que meti mais dentro a faca do raciocínio achei-lhe um
miolo gaiato, fino e até profundo. Era um modo que o
Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas
transmitindo-as a outro".
38
Um outro personagem, o tio João, também aparece:
"... Não poucas vezes me aconteceu achá-lo no fundo da
chácara, no lavadouro, a palestrar com as escravas que
batiam roupa... As pretas, com uma tanga no ventre a
arregaçar-lhe um palmo dos vestidos, umas dentro dos
tanques de roupas, a batê-las, a ensaboá-las, a torcê-las,
iam ouvindo e redarguindo às pilherias do tio João, e a
comentá-las de quando em quando com esta palavra: "-
Cruz, diabo!... Este sinhô João é o diabo!”.
39
E, para finalizar, temos aqui a síntese da filosofia de Quincas
Borba, quando ele faz uma loa ao "frango" e ao "africano".
"Mas eu não quero outro documento da sublimidade do
meu sistema, senão este frango. Nutriu-se de milho, que
foi plantado por um africano, suponhamos importado de
Angola. Nasceu esse africano, cresceu foi vendido, um
navio trouxe, um navio construído de madeira cortada no
mato por dez ou doze homens, levado por velas, que oito
38
Idem.
39
Idem.
28
ou dez homens teceram, sem contar a cordoalha e outras
partes do aparelho náutico. Assim, este frango, que eu
almocei agora mesmo, é o resultado de uma multidão de
esforços e lutas, executados com o único fim de dar mate
ao meu apetite".
40
Em “O Mulato”
41
, de Aloísio de Azevedo, romance que se
enquadra no estilo naturalista, ainda com muita influência do
romantismo, encontramos os seguintes trechos com alguma referência
aos negros escravos.
Na sua labuta:
“Em certos pontos não se encontra viva alma na rua; tudo
está concentrado, adormecido, só os pretos faziam as
compras para o jantar ou andavam no ganho...doutro lado
na praça, uma preta velha, vergada por um imenso
tabuleiro de madeira, sujo, seboso, cheio de sangue e
coberto por uma nuvem de moscas, apregoava em tom
muito arrastado e melancólico: “Fígado, rins e coração!”
Era uma vendedeira de fatos de boi...”.
Tratados como animais:
“Os corretores de escravos examinavam, à plena luz do
sol, os negros e muleques que alí estavam para ser
vendidos; revistavam-lhes os dentes os pés e virilhas;
faziam-lhes perguntas sobre perguntas, batiam-lhes com a
biqueira do chapéu nos ombros e nas coxas,
experimentando-lhes o rigor da musculatura, como se
estivessem a comprar cavalos...”.
Desprezados e maltratados por “senhoras ditas piedosas”:
“Dona Maria Bárbara apesar de tudo isso, saíra-lhe “Má
dona de casa...Era uma fúria! uma víbora! Dava nos
40
Idem.
41
AZEVEDO, Aluísio. O Mulato. 15ª Ed. São Paulo: Ática, 2000. pp. 15/18.
29
escravos por hábito e por gosto; só falava a gritar e,
quando se punha a ralhar - Deus nos cuida! Incomodava
toda vizinhança! Insuportável!...Quando falava nos pretos,
dizia “Os sujos” e quando se referia a um mulato dizia “O
cabra”...Sempre fora assim e, como devota, não havia
outra. Em Alcântara tivera uma capela de Santa Bárbara e
obrigava a sua escravatura a rezar aí todas as noites, em
coro, de braços abertos, às vezes algemados...”.
Vítimas do preconceito:
“Pois você queria ver sua filha confessada, casada, por um
negro?”...
Reagindo contra os maus tratos:
“José da Silva enriquecido no contrabando dos negros da
África e fora sempre mais ou menos perseguido e
malquisto pelo povo do Pará; até que um belo dia, se
levantou contra ele a própria escravatura, que o teria
exterminado, se uma das suas escravas mais moças, por
nome de Domingas, não o prevenisse a tempo...a fuga
fizeram eles o senhor e escrava a pé, por maus caminhos ,
atravessando os sertões...o contrabandista arranjou-se o
melhor que pôde com a escrava que lhe restava e, mais
tarde, no lugar denominado São Brás, veio a comprar uma
fazenda, onde cultivou café, algodão, tabaco e arroz...”
Tendo a escrava que o ajudou na fuga, recebido um “prêmio”:
Depois de vários abortos, Domingas deu à luz um filho de
José da Silva. Chamou-se o vigário da freguesia e, no ato
do batismo da criança, esta com sua mãe, receberam
solenemente a carta de alforria”.
42
42
Idem, p. 42.
30
Outra obra de Aluísio de Azevedo, representativa do naturalismo,
é “O Cortiço”
43
, em que a maior ênfase é dada na apresentação de uma
sociedade, onde o dinheiro e a posição social comandam a vida do
homem, cuja meta única é ascender nessa sociedade hipócrita, ainda que
para isso deva abandonar quaisquer resquícios de humanidade e de
caráter. Como “modelo” dessa sociedade coloca o personagem João
Romão que lança mão de todos os recursos, ainda que os mais excusos,
para se transformar de mero taberneiro em cidadão requintado. É através
da exploração de toda aquela gente pobre e ignorante que formava o
“Cortiço”, e em especial da escrava negra Bartoleza, a mais explorada e
vilipendiada de suas vítimas, que ele consegue sua ascensão. Em o
“Cortiço”, encontramos a figura da escrava pagando ao dono uma
quantia estipulada:
“Bartoleza, crioula trintona, escrava de um velho cego...
Bartoleza também trabalhava forte; a sua quitanda era a
mais bem afreguesada do bairro. De manhã vendia angu,
e à noite peixe frito e iscas de fígado, pagava de jornal a
seu dono vinte mil-réis por mês e, apesar disso, tinha de
parte quase que o necessário para a alforria”.
44
Com relação ao pagamento do “Jornal” a que se refere Aluísio de
Azevedo, encontramos em “Escravidão o século do ouro” de Liana
Maria Reis, que:
“o sistema de jornal predominante em algumas regiões
mineiradoras abria espaços para os escravos e escravas
conseguirem comprar sua alforria na medida em que uma
vez paga a quantia estipulada ao senhor e satisfeitas as
necessidades de sobrevivência, os cativos acabavam por
43
AZEVEDO, Aluísio. O Cortiço. São Paulo: Ática, 2000.
44
Idem, p. 13.
31
acumular recursos. Entretanto, a conquista da carta de
liberdade era facilitada, no caso das mulheres, pelo contato
pessoal (afetivo e sexual) com seus senhores”.
45
Voltando ainda ao “O Cortiço”, verificamos que, infelizmente,
como se vê do transcrito a seguir, a escrava Bartoleza não conseguiu sua
liberdade senão pela morte.
João Romão percebendo que Bartoleza não mais constituía sua
grande fonte de riqueza (além de amásia, tinha sido cozinheira, caixeira,
enfim, “pau para toda a obra”) e era agora um entrave para sua ascensão,
começou a arquitetar um meio de se livrar dela.
“É preciso despachá-la quanto antes, seja lá como for!
Entretanto, percebendo o perigo que corria se executasse
o plano, não o fez....Partindo para uma solução mais
prática, o miserável denunciou a localização da escrava a
seu dono primitivo...Quando a escrava percebe que fora
enganada por aquele a quem dedicara toda a sua vida, não
suportando o duro golpe, se mata utilizando a faca de
ponta que usava na cozinha”.
46
Por mais incrível que se possa achar, João Romão, nessa ocasião,
recebe o título de “Cidadão benemérito da sociedade”.
Assim, como acentua o próprio autor, essa era a conduta dos
homens que formavam uma sociedade que desprezava os negros,
marginalizando-os. As que mais sofriam eram as mulheres que eram
coisificadas, tratadas como animais, como verdadeiros “burros de carga”.
No livro “Escrava Isaura”, de Bernardo Guimarães,
47
Isaura era
filha de uma escrava negra com o capataz da fazenda, que a encontra e a
usa como instrumento sexual, como era comum neste mundo onde as
45
REIS, Liana Maria. Escravidão no Século do Ouro, in: ANAIS ANPUH- MG: Juiz de Fora, 1994, p. 248.
46
AZEVEDO, Aluísio, op. cit., p. 40.
47
GUIMARÃES, Bernardo de. Escrava Isaura. São Paulo: Ática, 1999.
32
mulheres escravas ficavam sujeitas aos caprichos sexuais, não só dos seus
senhores, como também dos capatazes, responsáveis pelo trabalho dos
negros nas fazendas.
Embora Isaura tenha pele branca, e tenha sido criada e educada
por sua dona e senhora, não deixava de ser uma escrava, e como tal,
sofre as mais terríveis perseguições por parte do filho do Senhor, o dono
da fazenda. Com a morte da sua protetora, Isaura se sente oprimida,
deprimida e perseguida pelo jovem senhor, que se sente atraído por sua
graça e beleza. Isaura não cede aos caprichos do malvado Leôncio, por
isso é castigada de forma cruel, sofrendo as mais terríveis humilhações.
Consegue fugir, mas é encontrada e trazida para a fazenda onde os
castigos, agora mais cruéis, continuam, até que a morte de Leôncio vem
libertá-la de uma vida impossível de ser vivida por uma criatura frágil e
meiga como Isaura. Assim, a mulher escrava não tinha vontade própria,
era sempre tratada como coisa de que os senhores dispunham ao seu
querer e prazer, como se depreende do trecho a seguir:
“Leôncio e Henrique não tardaram em aparecer, e parando
à porta do salão puseram-se a contemplar Isaura, que sem
se aperceber da presença deles continuava a bordar
distraídamente....
Então que te parece? - segredava Leôncio a seu cunhado.
Uma escrava dessa ordem é um tesouro inapreciável?
Quem não diria que é uma andaluza de Cádis ou uma
napolitana?
Não é nada disso; mas é coisa melhor respondeu
Henrique maravilhado - é uma perfeita brasileira...
Se minha mãe teve o capricho de criá-la com todo mimo e
de dar-lhe uma primorosa educação, não foi decerto para
abandoná-la ao mundo, não achas?... Também meu pai
parece que cedeu às instâncias do pai dela, que é um pobre
galego, que por aí anda, e que pretende libertá-la”.
48
48
Idem, p. 22.
33
Como colaboração da literatura temos, ainda, numa visão pouco
enfocada pelo historiador, o romancista Joaquim Manuel de Macedo, na
sua obra “As VítimasAlgozes” (1869). Em resposta à apresentação do
negro cativo como um coitadinho no romance “A Cabana do Pai
Tomás” da escritora norte-americana Harriet Beecher-Stowe, Macedo
transforma em algozes os escravos vistos quase sempre como vítimas,
relatando, em suas histórias, dramas cotidianamente estampados nos
jornais. Entre estes, estava o de uma escrava cozinheira que depois de
envenenar seis pessoas da mesma família, foi vendida, fazendo na nova
casa duas novas vítimas. Apesar disso, ainda foi alugada, tudo para não
perder dinheiro mandando prendê-la.
Corroborando com o escritor, o “Jornal do Commércio” adverte:
“...desgraçadamente abundam os fatos de escravos
perversos e assassinos vendidos pelos senhores que os
reconhecem criminosos, mas que para salvarem seu valor,
sem se importarem com os males que irão causar aos
novos senhores não os denunciam”.
49
Vimos, assim, que embora em forma romanceada, a literatura
cumpre sua tarefa de “historiadora social” enfocando muitas facetas da
vida dos escravos, principalmente, como já dissemos antes, na vida
doméstica das fazendas e dos casarões urbanos, apesar de, muitas vezes,
não refletir inteiramente a realidade encontrada em documentos por nós
manuseados.
Vimos, também, que o romantismo elegeu o índio em detrimento
do negro, fazendo poucas vezes referência a esse .
49
Jornal do Commércio. 01/04/1849.
34
Como diz Flores
50
, “o historiador pode buscar o mundo das idéias,
no relato literário que, com sua dimensão fictícia e imaginária dos fatos,
mantém um aparato conceitual relacionado à uma realidade. A análise
dos códigos e das convenções retóricas do discurso, como formas
submersas de pensamento não só do autor como de sua época, permite o
entendimento de uma realidade histórica”.
Não somente obras literárias podem ser analisadas para o estudo
da mulher escrava. Sociólogos e historiadores deram também sua
contribuição.
A década de 1930, no que diz respeito aos estudos sobre a
escravidão brasileira, foi marcada pela publicação de "Casa Grande &
Senzala", de Gilberto Freyre, que causou grande impacto nos meios
acadêmicos da época.
Del Priore assim se refere a essa obra:
Mesmo para o leitor que nunca folheou sua obra magna,
Casa Grande & Senzala, convém dizer que esse foi o texto
que mais discussões despertou sobre o papel e a função da
mulher na sociedade brasileira. Debates sobre a submissão
sexual das escravas, o caráter patriarcal da família
brasileira, a importância das mulheres indígenas na
formação dos primeiros núcleos de povoamento
incentivaram várias obras que aí estão”.
51
E mais :
Freyre não apenas serviu como ponto de partida para um
amplo debate sobre ao papel da mulher nos primórdios da
colonização, como as fontes documentais por ele
utilizadas, inesgotavelmente pilhadas, nortearam a maior
50
FLORES, Moacyr. op. cit, p. 8.
51
DEL PRIORE, Mary. Mulheres no Brasil Colonial. São Paulo: Contexto, 2000. p. 10.
35
parte dos trabalhos históricos sobre sexualidade, vida
privada, família e trabalho feminino”.
52
Em Mattos encontramos:
“Desde a “Casa Grande e Senzala”, de Gilberto Freyre
(1933) o modelo de família patriarcal marcou um lugar
definitivo no imaginário acadêmico sobre o Brasil
escravista(...) O conceito de “família patriarcal” de Freyre,
entretanto, como bem assinalou Vainfas em “Trópicos dos
pecados”, abarca uma significativa muito mais ampla do
que a de “família extensa”, à maneira do grupo de
Cambridge’’ estritamente associado à “coabitação” pois
implica na “presunção de que escravos e dependentes
livres construíram sua identidade familiar em relação à
“casa grande”, incapazes, eles próprios, de formar e
reproduzir culturalmente suas próprias famílias”.
53
Não podemos negar a influência de Freyre, criando “mitos”
que Karasch contesta em sua obra “A vida dos escravos no Rio de
Janeiro”.
Karasch, escreve:
“O mito número um como sustenta Robert E. Conrad em
“Children of Gold's fire” é geralmente descrito como a
tese de Gilberto Freire dos senhores benevolentes cujo
tratamento suave tornou o fardo dos escravos no Brasil
menos pesado que o dos cativos na América do Norte”.
54
E Conrad resume dizendo que:
"...as teorias de Freire baseavam-se, em parte, nas
invenções de antigos defensores e apologistas da
52
Idem.
53
MATTOS, Hebe Maria. Das cores do silêncio: O significado da liberdade no Sudeste Escravista. Brasil - séc. XIX. Rio
de Janeiro: Ed. Nova Fronteira, 1998. p. 55/56.
54
KARASCH, Mary C. A vida dos escravos no Rio de Janeiro 1808-1850. São Paulo: Companhia das Letras,
2000.
36
escravidão brasileira”.
55
A que Karasch acrescenta:
“...e, também, das opiniões de muitos viajantes, que
passaram rapidamente pelo Rio e falaram dos escravos
bem vestidos de cariocas abastados.”
“Um segundo mito derivado de Freyre é de que o Brasil
foi colonizado por escravos culturalmente superiores da
África Ocidental”.
56
Karasch esclarece, ainda, que as teorias de Gilberto Freire
influenciaram os mitos populares mantidos pelos brancos do Brasil e
que, estando as obras de Gilberto Freyre entre as poucas traduzidas para
o inglês, suas idéias sobre a escravidão no Brasil formaram toda uma
geração de estudiosos americanos.
Mas não se pode ignorar as palavras de Chiavenatto, em “Negro
no Brasil”, onde ele comenta que Freyre, apesar de sua tendência para
defender os brancos, aponta alguns procedimentos reprováveis desses
em relação aos negros:
“Gilberto Freyre, que costumeiramente perdoa os excessos
dos brancos, não deixa de caracterizar em “Casa Grande &
Senzala” algumas das formas brutais de exploração sexual
[...] O negro se sifilizou no Brasil [...] Foram os senhores
das casas grandes que contaminaram de lues as negras das
senzalas. Negras tantas vezes entregues virgens, ainda
molecas de doze e treze anos, a rapazes brancos já podres
de sífilis das cidades”.
57
E continua:
55
Idem.
56
Idem.
37
“Para Gilberto Freyre, é igualmente de se supor que muita
mãe negra, ama-de-leite, tenha sido contaminada pelo
menino de peito, alastrando-se, por esse meio, da casa
grande à senzala, a mancha da sífilis”.
58
Assim, além do prejuízo para seu próprio filho que precisava
dividir o leite com o “sinhozinho”, a escrava estava sujeita a mais esse
descalabro.
Apesar de reconhecermos que não só Karasch mas outros
estudiosos da escravidão no Brasil demonstraram a tendenciosidade das
obras de Freyre, achamos que não poderíamos deixar de fazer referência,
neste capítulo sobre a mulher escrava na literatura, a trechos de outra
obra de Gilberto Freyre "Sobrados e Mucambos" onde alguns
enfoques representam fatos reais:
"Ficava proibido a partir de 10/12/1831, fazer alguém
"vozerias, alaridos e gritos pelas ruas", restrição que
atingia em cheio os africanos e as suas expansões,
proibido, que os pretos carregadores andassem pelas ruas
cantando, "desde o recolher até o nascer do sol".
59
Restrição severa, dado o hábito dos africanos de adoçarem o
trabalho com o canto. E mais:
“...nenhum escravo poderia, na cidade, andar na rua de dia
ou de noite, com paos, ou outra qualquer arma, pública ou
oculta, sob pena de sofrer de 500 a 150 assoutes na
Cadeia, conforme a qualidade agravante da arma, isso
executado será entregue ao seo senhor”.
60
57
CHIAVENATTO, Júlio José. O negro no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1987. p. 137.
58
Idem.
59
FREYRE, Gilberto, Sobrados e Mucambos. 7ª ed. Rio de Janeiro: Ed. José Olimpo, 1985. p. 396.
60
Idem, p. 387.
38
Nesses trechos Freyre focaliza uma realidade, pois desde remotos
dias coloniais os homens do governo, no nosso País, preocuparam-se em
proibir aos escravos e aos pretos não só a ostentação de jóias como a de
armas, considerandose que umas e outras deveriam ser insígnias da raça
e da classe dominante.
As armas não foram consideradas só insígnias, como também
vantagens técnicas em caso de luta ou conflito de senhores com servos.
Daí, provavelmente, o fato de ter-se desenvolvido entre os negros e
mulatos livres das cidades do Rio de Janeiro e do Recife a arte da
capoeiragem, através da qual indivíduos desarmados poderiam lutar
vantajosamente com policiais e particulares armados.
Houve, também, perseguição aos indivíduos pobres e de cor que,
com seus banhos, “conspurcavam” as águas dos rios e representavam
figuras contrárias à moral pública, incorrendo, assim, nas penas
estabelecidas pelo código do processo criminal no seu §7º artigo 12, e
não apenas nos castigos das posturas das câmaras.
Quanto às condições de saúde, Freyre postula em “Sobrados e
Mucambos”:
“...pode-se atribuir as causas do desenvolvimento da
opilação à natureza do clima e da higiene pelos habitantes
dos lugares húmidos, pelos meninos pobres e pretos
escravos de ruins senhores. Nos lugares onde o calor é
forte, em que existe bastante humidade como a partir do
Rio de Janeiro até o Rio Amazonas, esta moléstia há muito
freqüente, mas independente das condições climáticas
cremos que a principal causa está na natureza do solo que
se habita, e, na espécie de alimentação... “Pois, da
população, “a parte que mais sofre é a que vive sujeita a
uma má nutrição”, como "os pobres e os escravos”, isto é
os escravos de “ruins senhores”. Foi no Brasil, doença ao
mesmo tempo de raça africana, de classe servil e da região
39
agrária latifundiária. Principalmente da sub região do
café”.
A opilação se apresentava maior onde o trabalho dos escravos era
excessivo e mais exposto à chuva ou ao sol, como na área de cafezais; e
onde eram piores as condições de habitação. Uma das causas
predisponentes da moléstia parecia-lhe ser o “dormir sobre a argila
húmida”.
Responsabilizavase também pela generalização do mal entre
nossa gente servil, o vestuário dos escravos, “quase nus”, e a
alimentação.
Em “Sobrados e Mucambos” encontramos ainda:
“É claro que o trabalho escravo, forçado, apenas se
atenuou entre nós com o crescente uso daqueles animais
nos engenhos, nas fazendas, no transporte de pessoas e de
carga, no aleitamento de crianças e na alimentação de
doentes, de convalescentes e mesmo de gente sã sob a
forma de leite fresco, coalhada e queijo, substituindo-se na
última função - a de fornecer leite às pessoas mulheres
pretas e pardas por vacas e cabras chamadas de leite,
embora do próprio leite consumido pela população do Rio
de Janeiro, no meado do século XIX conste que era
principalmente leite de escrava, isto é, de cabra-mulher e
não cabra-bicho ou de vaca. Pois semelhante gênero de
trabalho o escravo só se tornaria arcaico ou obsoleto
com o desenvolvimento da máquina espécie de
sublimação, realizada entre nós principalmente pelos
ingleses, da energia animal em energia mecânica, animada
pelo vapor. Principalmente pela energia do cavalo
consagrada pelas iniciais H.P. - isto é, “Horse Power”-
como o símbolo ou medida de força motora ou de
tração”.
61
61
Idem, p. 490.
40
Gostaríamos de registrar a ausência de literatura em relação à
mulher escrava em Vassouras. Não encontramos nenhuma obra literária
que tivesse Vassouras como cenário da vida escrava, nem mesmo um
estudo mais completo como os relativos ao Piauí
62
, a Campinas
63
, a
Campos
64
, onde a autora diz que “apenas para as áreas cafeeiras do Vale
do Paraíba não teve condição prática de realizar o mesmo tipo de
levantamento.” Assim, tornou-se de suma importância para a
historiografia sobre Vassouras que sejam trabalhados, em maior extensão
e profundidade, os documentos dos arquivos: CDH, da USS, Arquivo
Municipal e Eclesiástico, dos quais nos valemos para alicerçar nossa
dissertação.
62
FALCI, M. B. Knox. Escravos do sertão. Teresina: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1995.
63
XAVIER, Regina Célia Lima. A conquista da liberdade. Libertos em Campinas na Segunda metade do séc. XIX.
Centro de Memória, UNICAMP. 1996.
64
MATTOS, Hebe Maria. Das cores do silêncio. Os significados da liberdade no sudeste escravista. Brasil séc. XIX. Ed.
Nova Fronteira, 1998.
41
CAPÍTULO II
MULHER ESCRAVA: HISTÓRIAS DE VIOLÊNCIA
E DE LIBERDADE
Como veremos neste capítulo, as referências à violência eram uma
constante nas obras que retratavam a escravidão e nos periódicos da
época. Mas, a reação do escravo e sua luta pela liberdade, não se iniciou
no período por nós enfocado. Como se expressa Viotti:
“...o protesto do escravo não foi uma invenção do séc.
XIX. Desde os primeiros tempos da Colônia existiram
tensões entre senhores e escravos. Negros fugidos,
quilombos, levantes de escravos eram episódios constantes
nos anais da sociedade colonial desde o séc. XVI”
.
65
E, como esclarece Sandra Graham
66
, o escravo se encontrava à
mercê dos senhores, cujo poder exercido sobre a família e os agregados
era “privado e pessoal”. Nenhuma instituição pública poderia ser
avocada em sua defesa contra as decisões pessoais dos senhores,
apoiados pelas tradições da lei portuguesa, que encontrava reforço no
clero e nas práticas locais de escravidão.
Na segunda metade do séc. XIX, no entanto, a situação era outra.
Os escravos encontravam apoio na justiça e contavam com a simpatia de
amplos setores da população. A escravidão que no passado fora vista
como uma instituição natural, “produto dos desígnios da Divina
Providência”, passou a ser encarada como uma instituição condenável e
ilegítima a serviço dos interesses de uma minoria.
65
COSTA, Emília Viotti da. Da senzala à Colônia. São Paulo: Unesp, 1998, p. 49.
66
GRAHAM, Sandra Lauderdale. Proteção e Obediência - Criadas e seus Patrões no Rio de Janeiro-1860/1910. p. 15.
42
Mesmo tendo a escravidão passado a ser uma “instituição
execrável” para um setor da população, isto não conseguiu abolir a
violência praticada contra o escravo e pelo escravo. Esta tornou-se
apenas mais “visível”, como se pode verificar dos documentos existentes
(processos-crime, noticiários...).
Embora não se possa negar a violência na vida do escravo em
geral, destacando-se como maior vítima a mulher escrava que, além dos
maus tratos do senhor e do feitor, sofria toda a reação da “sinhá” em sua
labuta no interior dos casarões, como se pode ver em muitas obras
literárias e nas fontes primárias, essas “vítimas” não eram figuras
passivas, como poderia parecer.
Recorrendo às fontes primárias, encontramos dois processos que
tratam da violência entre os próprios escravos. Elaboramos um resumo
que transcrevemos a seguir:
- A escrava Vitória, usando a foice de seu trabalho na roça, vai até a
casa da Umbelina, profissão da roça, e lhe dá várias foiçadas. Ela alega
que Umbelina, era amante de seu marido. Umbelina acaba morrendo
de tétano, mais tarde.
67
- No dia dezessete de fevereiro de mil oitocentos e cinquenta e nove,
foi perpetrado o assassinato da escrava Sophia, de nação Mina, pelo
também escravo, de nação Congo, Fidellis, arriador de tropa de seu
senhor Camillo José Pereira de Faro, dono da Fazenda Pocinho.
Segundo uma testemunha, deve ter havido luta corporal, pois o lenço
que a vítima costumava trazer na cabeça, estava na sua boca,
possivelmente para sufocar os gritos.
67
CDH. USS. Caixa: 233. Título: Ofensas Físicas. Partes: Vitória, escrava (ré) e Umbelina Rosa da
Conceição (vítima).
43
O réu esclareceu, ainda, que depois do crime tomou a direção da
mata da Fazenda de Manoel Franco, onde foi aprisionado, depois de,
assustado com os tiros dos que estavam a sua procura, ter atirado e
acertado no escravo Cherubim. Dois dias depois de perpetrado o crime,
em dezenove de fevereiro, foi aberto o processo, que foi concluído no
dia vinte de fevereiro com a condenação do réu a doze anos de prisão
com trabalho.
68
Em outro processo, fica evidenciada a violência contra uma
escrava doméstica:
Margarida, escrava de D. Júlia Maria Damasceno, residente na
Freguesia de Paty do Alferes, num lugar denominado Morro de São
Paulo, alega que sua senhora a maltrata muito. Tem uma das mãos
aleijada e o braço dormente, quase paralítico... A escrava cansada da vida
que levava e meio adoentada, junta a quantia de quinhentos mil réis e
vem requerer um Curador a fim de que consiga sua liberdade. A escrava
acaba sendo vítima de um assalto, onde roubam-lhe um conto e
duzentos mil réis. Verificamos, no processo, que fora o próprio
procurador, responsável por negociar a sua liberdade , que roubara
Margarida. Sua alforria é passada no dia 22/08/1878.
69
Na eterna dicotomia oprimido X opressor onde, o oprimido,
normalmente o mais fraco, aquele que não tem como se defender ou
lutar, algumas vezes consegue, mesmo dentro de suas limitações, atingir
seu oponente.
68
CDH. USS. Processo Crime. Data: 19/02/1859. (Em recuperação).
69
CDH. USS. Título: Arbitramento. Ano: 1878.
44
Escravas “minas” com o turbante, peça indispensável na indumentária dessas
escravas. (detalhe citado em um processo crime transcrito nesse capítulo
Violência e Liberdade).
45
Senzala da Fazenda do Pocinho (local do evento de que trata o processo crime já referido).
Senzala da Fazenda do Pocinho, onde podemos observar a existência somente de portas,
aspecto retratado por Frond e descrito por Ribeyrolles.
46
Isso está bem delineado no poema de Jorge de Lima “Essa nega
Fulô”
70
, cuja transcrição se encontra, em anexo, no final deste capítulo.
Podemos perceber, através desse poema e de narrativas escritas ou
mesmo passadas oralmente de geração em geração, como as escravas
negras das casas grandes podiam prejudicar suas sinhás, pois era grande
o ódio que elas nutriam. E não sem razão pois, por ciúmes (as negras
mais jovens eram cobiçadas por seus senhores e, muitas vezes, os
sinhozinhos faziam com elas suas primeiras experiências sexuais) as
sinhás mandavam castigá-las, furando-lhes os olhos, deformando-as
etc...
71
. Algumas vezes chegavam mesmo a lhes tirar a vida, como no
caso da escrava Peregrina, que foi condenada à forca por haver matado
sua senhora, conforme relato de João Dornas Filho, baseado em
documento, em “Enforcadas de Sabará”.
Entretanto, se alguns eram taxativos ao apontar o “perigo”
representado pela escrava, outros, como Expilly, tinham palavras para
minorar esse enfoque:
“A mulher de cor está longe de ser perigosa. O seu
comércio não atinge, absolutamente, a independência do
espírito e não compromete em nada a honra (já não digo a
felicidade) das famílias”.
72
Embora tenhamos procurado mostrar que não existiu inteira
passividade por parte do escravo, tão propalada em alguns escritos, isto
não anula a evidência de que, sendo elemento fundamental na
sustentação da economia cafeeira, o escravo, comprado, vendido,
70
LIMA, Jorge. Antologia poética.. Rio de Janeiro: Sabiá, 1960. p. 53-56.
71
FREYRE, Gilberto. Casa Grande & Senzala: Formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal:
Rio de Janeiro/Brasília: José Olympio Editora, 1980.
72
C. Expilly, Mulheres e Costumes no Brasil. São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1977. pp. 101/105.
47
trocado, alugado, hipotecado, tratado por alguns como animal de carga e
objeto, o escravo é colocado a trabalhar em todas as atividades, sujeito a
todo tipo de exploração, nessa Vassouras do séc. XIX, onde a instituição
escravista atingiu verdadeiro apogeu na Província.
Ao analisarmos os processos sobre os castigos aplicados aos
escravos, levamos em consideração a importância de seu estudo para
melhor conhecimento da historiografia brasileira, na medida em que a
escravidão desenvolveu-se intensa e violenta nos estados brasileiros,
refletindo-se de forma significativa em nossa sociedade até os dias atuais.
A expressão “eu não sou seu escravo”, até hoje ouvida quando se pede
alguma ajuda, bem demonstra o que afirmamos.
Outras expressões, usadas nos dias de hoje, mostram bem como a
cor negra é associada ao mal, ao sofrimento ou ao trabalho pesado,
como nos indica Mexias:
“asa negra (influência perniciosa); mancha negra (aspecto
vergonhoso); trabalhar como um negro (trabalhar demais);
dias negros (dias sem sorte); não ser o negro de alguém
(não trabalhar para essa pessoa); preto de alma branca
(branco = puro, donde, preto = impuro); mercado negro
(tráfico) e humor negro”.
73
O trabalho pesado é associado à escravidão e esta à raça negra,
dando dimensão racial a um fato econômico. Admitindo-se que os
escravos “eram considerados uma necessidade absoluta nas fazendas de
café”, chega-se à conclusão da “necessidade de uma constante supervisão
dos trabalhadores e o completo controle através da disciplina que,
freqüentemente, conduz à punição brutal, isto é, à violência e até mesmo
73
MEXIAS, Simon, Maria Lúcia. O falar da escravidão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996. p. 104/105.
48
à morte”.
74
Segundo Mexias, “o relacionamento entre brancos e negros
sempre se desenvolveu num clima de ódios e tensões, mantidos, mais ou
menos, sob controle pelo poder”.
75
E como afirma Pinaud:
“as relações de trabalho se estabeleceram e se mantiveram
numa situação de domínio do elemento de origem
européia sobre o de origem africana, o que equivale a dizer
que o trabalho foi utilizado como instrumento de
dominação e repressão”.
76
Ao pesquisarmos esses elementos, verificamos que a relação entre
o Poder Público e o Escravo, através da Justiça, não tinha como único
fator norteador a legislação vigente, sendo muitas vezes permeada por
critérios subjetivos. Assim é que, apesar da violência bastante manifesta
dos senhores e feitores, não encontramos processos instaurados pelos
escravos contra os senhores, ou contra os feitores.
A subjetividade do julgamento dos agentes do Poder Público está
intimamente relacionada com a esfera e a atuação do poder do senhor de
escravos.
Ainda sobre a violência, encontramos vários artigos tratando das
reações dos escravos contra seus senhores, publicados no jornal “O
Município”, que transcrevemos a seguir:
“Os assassinatos praticados por escravos, vão infelizmente
reproduzindo-se em larga escala, ameaçando tomar
incremento pelas crenças de que elles se achão imbuídos
ou tentativas de morte perpetrados com insistência
assustadora nos municípios agrícolas, por escravos
74
STEIN, S.J.Vassouras, um município brasileiro do café - 1850/1900. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990.
75
MEXIAS, op. cit., p. 13.
76
PINAUD, J. L. Insurreição negra e justiça. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1987. p. 8.
49
convencidos que o único meio de libertarem-se mais
depressa da escravidão, é o crime, embora tenhão de
sujeitar-se a pennas perpetuas...”.
77
“Os frequentes attentados ultimamente commetidos por
escravos nas pessoas de seus senhores e prepostos
reclamão dos altos poderes do Estado promptas e
energicas medidas. Nas causas, que determinão esses
deploráveis factos, não enxergamos ... a influência, da lei
de 28 de setembro de 1871... outros são, pois os motivos
que actuão no espírito naturalmente acanhado desses
infelizes e embrutecidos por sua condição, figurando
incontestavelmente no primeiro plano a crença errônea de
que a pena de galés perpétuas, quasi sempre imposta aos
escravos, é uma escravidão mais leve do que elles
suportarão sob o domínio particular”.
78
“Por mais de uma vez notificando crimes perpetrados por
escravos nas pessoas de seus feitores ou administradores...
temos feito sentir a necessidade de adaptarem-se medidas
que garantão os proprietários de escravos e seus prepostos
nas fazendas rurais”.
79
E, na mesma fonte “O Município”, temos algumas notícias sobre
fugas dos escravos, como reação aos maus tratos recebidos:
“...o escravo Graciano que há dias se achava fugido,
occultando-se entre um pé de café à beira do caminho
aggredio o feitor Agostinho, pardo, liberto... No dia
seguinte Graciano veio entregar-se à prisão confessando o
delicto”.
80
“No dia 9 do corrente João, africano fugido do poder de
seu senhor Augusto Brandão ... ao atravessar a linha férrea
na freguesia dos Mendes, a turma de trabalhadores
daquelle logar pretendeu obstar-lhe a passagem, orignou-se
dahi uma luta entre o escravo fugido ... e um dos ditos
trabalhadores ficando ambos gravemente feridos, aquelle
com um tiro de espingarda e este com facada”.
81
O noticiário sobre fugas é extenso, como se vê nos anúncios,
77
O Município, 14/06/1877, p. 1.
78
O Município, 15/07/1877, p. 1.
79
O Município, 13/12/1877, p. 1.
80
O Município, 17/05/1878, p. 1.
81
O Município, 21/04/1878, p. 1.
50
sendo de notar que somente um é referente a uma escrava:
Fugiram no dia 29 de junho... do Paty do Alferes, sitio do
Tatuhy... e a escrava Damiana, Benguela... com falta de três
dedos na mão direita...”.
82
“Fugiu no dia 8 de agosto... o escravo Laurentino,
creoulo... tem um aleijão na mão direita, a qual é virada
para dentro... falla bem, e ligeiro e toca viola... Procede-se
com todo o rigor da lei contra quem o acoitar.”
83
“Fugiu no dia 10 de setembro... o escravo Clemente... côr
cabra... falta de dente na frente... tem um talho atravessado
em um dos braços...”.
84
“Fugiu o escravo Mariano de nação... côr preta, um pouco
fula... anda meio tropego das pernas por ter estado preso
na cadeia de Vassouras por muito tempo”.
85
“Fugiu da villa de Vassouras, de uma padaria, um preto de
nome Bernardo, nação Congo... tem no beiço de baixo
uma cicatriz procedida de um talho que apanhou...muitas
cicatrizes nas costas por ter sido castigado gratifica-se a
quem o ...levar...no lugar denominado Morro da Vaca, em
casa de Manoel José da Silva Moreira”.
86
82
O Município, 05/06/1877, p. 4.
83
O Município, 18/09/1877, p. 4.
84
O Município, 30/09/1877.
85
Idem.
86
Jornal do Commércio, 1/4/1849, p. 3.
Escravos em fuga (mulheres e crianças).
Fonte: BELLUZZO, Ana Maria de. O Brasil dos Viajantes. In: BIARD, François Auguste. Fuga de Escravos,
1859. Rio de Janeiro: Saraiva, 1999.
51
As fugas nem sempre tinham a finalidade de alcançar a liberdade
como se poderia supor, mas, sim, a simples mudança de um senhor cruel
por outro mais benevolente. As penas iam de açoites, ferro ao pescoço,
prisão perpétua, galés, até pena de morte (forca).
Encontramos um processo,
87
cujo tipo de castigo chamou nossa
atenção: perpétuo silêncio (porque o escravo batera em um português).
87
CDH. USS. Caixa nº 484. Processo Crime: Ofensas Físicas. Ano: 1863.
“Colar de Ferro”. (Debret)
Usado para “marcar o escravo fugitivo e
dificultar novas tentativas de fuga.
Fonte: DEBRET, Jean Baptiste. Viagem Pitoresca e História ao Brasil. Rio de
Janeiro: Círculo do Livro, s/d. p. 311.
52
Apesar de fora do período por nós enfocado, achamos interessante
fazer referência a um processo de 1893
88
como um resquício dos
problemas trazidos pela violência existente no período da escravidão, que
ultrapassou até mesmo o ato da abolição. Trata-se de um processo de
remoção de tutela: uma ex- escrava do tutor, pede a remoção da tutela de
sua filha, em função de maus tratos sofridos por ela com o
consentimento do tutor ou, mesmo, por ele próprio. “Indeferido o
pedido”.
Chegava, às vezes, a tal ponto a crueldade de senhores e feitores
que os escravos cometiam um delito e se entregavam à justiça, pois
consideravam as “galés” castigo menor que os infligidos a eles nas
fazendas.
A luta do escravo pela liberdade se fez sentir desde os primeiros
tempos da colônia e tomou diversos aspectos, quer individuais, quer
coletivos. Mas a liberdade concedida pelos senhores, de que trataremos a
seguir, só se concretizou em 13 de maio de 1888, quando a Princesa
Isabel, apoiada pelo gabinete conservador de João Alfredo, assinou a Lei
Áurea que aboliu a escravidão no país, tendo desagradado aos
latifundiários que passam a exigir indenização pela perda dos “bens” e,
não sendo atendidos, apoiam a causa republicana. No dizer de Viotti:
“...a elite brasileira, composta predominantemente por
grandes proprietários e por comerciantes envolvidos na
economia de exportação, estava interessada em manter as
estruturas tradicionais”.
89
88
CDH. USS. Título: Remoção de Tutela, Ano: 1893.
89
COSTA, Emilia Viotti da. Da Monarquia à República: Momentos decisivos. Editorial GRIJALBO. São Paulo:
1977. p. 220-222.
53
Abertos os portos brasileiros aos imigrantes europeus, foi
permitido aos escravos alforriados, ou libertos, o retorno à África.
Poucos, entretanto, conseguiram voltar à sua terra de origem. A maioria
dos escravos, abandonados à própria sorte, sem preparo algum para
assumir sua liberdade, caiu na miséria, na mendicância vindo a compor a
camada mais miserável das classes populares.
Viotti acrescenta:
“A escravidão foi abolida por um ato do parlamento com
os aplausos das galerias. Promovida principalmente por
brancos, ou por negros cooptados pela elite branca, a
abolição libertou os brancos do fardo da abolição e
abandonou os negros à sua própria sorte”.
90
O Brasil foi o último país do continente a abolir formalmente a
escravidão, o que levou Schwarcz a afirmar, em um de seus ensaios, que
“o Brasil carrega até os dias de hoje uma triste marca: a de ter sido a
última nação do mundo a abolir a escravidão”.
91
Em 1899 partiu o “Aliança”, levando de volta à África um grupo
de ex-escravos, último navio a fazer esse transporte.
Esse foi o capítulo final da escravidão no Brasil mas, no espaço de
tempo entre este final e o começo da escravidão, os negros lutaram pela
sua liberdade nas mais diversas formas ao seu alcance.
Dentro das fazendas, podemos citar as seguintes maneiras de os
negros se libertarem dos grilhões do cativeiro: - as fugas, o banzo, uma
tristeza profunda que os levava à morte; - o suicídio individual e coletivo,
não muito raros.
90
Idem.
91
SCHWARCZ, Lilia Moritz e Letícia Vidor de Souza Reis-org. Negras Imagens. Ed. USP. São Paulo: Estação
Ciência, 1996, p. 11.
54
Os rituais religiosos eram uma forma de negar os valores dos
brancos, uma forma de rebeldia, uma forma de reafirmar sua condição
de ser negro. As fugas individuais, geralmente mal sucedidas, dada a
perseguição feroz que terminava sempre em tortura e, às vezes, em
morte, eram quase uma rotina no final do século XIX. Além das fugas
temos as inúmeras revoltas e a formação de quilombos.
Mott esclarece:
“Quilombos ou mocambos eram núcleos de escravos
fugidos. Segundo a legislação, bastavam três escravos
reunidos para se ter um quilombo, daí a freqüência com
que a palavra “quilombo” aparece para designar acidentes
geográficos por esse Brasil afora”.
92
Na realidade, liberdade e violência estão profundamente unidos na
vida do escravo. O desejo da primeira, a liberdade, é decorrência,
principalmente, da existência da segunda, a violência, que é a causa
principal das fugas e, portanto, da formação dos quilombos.
Foram muitos os quilombos como, por exemplo, o de Palmares, o
de maior duração e de maior contingente de escravos, liderados por
Zumbi, hoje considerado o símbolo da consciência negra, cultuado, no
dia vinte de novembro. Aqui, destacamos o “Quilombo de Manoel
Congo”, por ter sido formado em Vassouras. Foi ele objeto do primeiro
livro de Carlos Lacerda, dedicado ao Vale do Paraíba, região onde
nasceu o autor. Além de uma análise crítica da história do Brasil,
“história das classes dominantes”, se detém na vida dos negros escravos
nessa região, onde o “símbolo da autoridade era o pelourinho”.
Referindo-se ao quilombo “Santa Catarina”, relata que:
92
MOTT, Maria Lúcia de Barros. Op. Cit., p. 42.
55
“Para se livrar da vida miserável que lhes era imposta,
fugiam e iam se esconder no mato. Manuel Congo era o
chefe. Ninguém o impôs. Ninguém o propôs. Ele era o
chefe...”.
93
E aponta a atuação da mulher escrava no movimento,
continuando:
“E Maria Crioula, companheira firme, sabedora de rezas
para curar os ferimentos mais teimosos, para fechar o
corpo contra cobra e mau olhado, era a rainha”.
94
Mais adiante, o autor fala das “expedições” que negros do
quilombo, entre eles as mulheres, faziam contra as fazendas da região,
até que uma tropa, comandada por Caxias, foi dar combate aos negros
sendo preso Manuel Congo, que, mais tarde, foi enforcado. Quanto aos
“seus companheiros, não se sabe o destino” e diz adiante “Maria
Creoula, a negrinha que foi chefe de vocês no quilombo, só não morreu
porque um fazendeiro desejou conhecê-la na intimidade”.
95
Mexias escreve que no processo conhecido por Manoel Congo, as
rés são assim mencionadas:
“...e as fêmeas Marianna Crioula e outras no mínimo (no
grau mínimo de açoites a que devem ser condenadas,
segundo libelo- crime firmado pelo Promotor Público-
1838-folha 39)”.
96
93
LACERDA, Carlos - (Marcos) O quilombo de Manuel Congo. Rio de Janeiro: Lacerda Editores, 1998. p. 36-37.
94
Idem.
95
Idem.
96
MEXIAS, Maria Lúcia Simon.O falar da escravidão. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1996. p. 82.
56
O processo de enforcamento de Manuel Congo, por ter provocado
um levante de 500 escravos, está bem preservado e, atualmente, em
exibição no Museu da Justiça, no Rio de Janeiro.
97
Um outro processo
98
sobre os participantes do Quilombo de Santa
Catarina, chefiado por Manuel Congo, nos dá outras informações. São
relacionados 19 escravos presos, entre eles uma mulher Libania, e mais
38 escravos apadrinhados (fazendeiros se dispuseram a ficar responsáveis
por eles); entre estes, oito mulheres Tereza, Felisberta, Balbina,
Cezária, Leocádia, Madalena, Antonia e Joaquina.
Ainda sobre o Quilombo de Manuel Congo, encontramos no
Dicionário, “Mulheres do Brasil”, referência à rainha, fazendo par com
Manuel Congo, o “rei”. Referindo-se à atitude da “rainha” quando do
ataque chefiado por um coronel da Guarda Nacional, relata que:
“A negra Mariana, com seus 30 anos, pusera-se à frente
dos revoltosos, resistindo ao cerco da polícia, e
esbracejando: “Morrer, sim, entregar, não!”.
99
Do transcrito, detectamos uma divergência quanto ao nome da
“rainha”: Carlos de Lacerda registra “Maria Creoula”, no Dicionário
“Mulheres do Brasil”, Mariana. Tendo em vista o registrado por Mexias,
com base no processo conhecido por Manoel Congo, o qual foi por nós
analisado, e o que encontramos em “Mulheres Fluminenses”
100
, nos leva
a afirmar que o nome da rainha era mesmo Marianna Crioula.
Ainda no mesmo Dicionário “Mulheres do Brasil”, corroborando
com a nossa temática da mulher escrava em diversas atividades, inclusive
97
CDH. USS. Processo Crime. Ano: 1838. Provisoriamente no Museu da Justiça RJ.
98
CDH. USS. Homicídio. Ano: 1838 (Em recuperação).
99
SCHUMAHER & Melo, H. Dicionário Mulheres do Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000. p. 417.
100
ARAUJO, Clara Maria de Oliveira (coord.). Mulheres fluminenses, do vale do Paraíba. Rio de Janeiro: CEDM. 2001. p. 7.
57
na resistência à escravidão, encontramos uma outra escrava Mariana que,
“apesar da idade avançada, colaborava com os negros da região, que se
organizavam em quilombos”.
101
Ao lado das lutas pela liberdade, e das Leis do Ventre Livre e Lei
do Sexagenário que vieram, aparentemente, minorar as agruras da
escravidão, devemos citar também as Cartas de Liberdade, nas quais
centralizamos parte de nossas pesquisas. Cartas de Liberdade são
documentos assinados pelos proprietários que alforriam seus escravos,
documento este, particular, registrado em cartório, em livro específico.
Karasch faz referência a um documento raro sobre alforria:
“Um dos documentos mais raros da cidade do Rio de
Janeiro está preservado na Santa Casa da Misericórdia.
Simbólico das aspirações dos escravos ao longo de anos de
serviço obediente, é uma cópia da carta de alforria de uma
mulher. Infelizmente, Rosa Francisca teve pouco tempo
para gozar sua liberdade, pois morreu quatro meses depois
de receber a carta . O documento preservado com seu
atestado de óbito, resume facetas importantes da alforria.
A liberdade de Rosa Francisca foi paga por sua filha”.
102
Registra, ainda, Karasch:
“As cartas, bem como uma amostra de petições de
liberdade, mostram uns poucos escravos excepcionais,
mediante intervenção burocrática, religiosa ou real,
obtiveram a liberdade contra a vontade de seus donos... A
maioria dos ex- escravos devia sua alforria aos esforços
próprios ... entravam para a categoria dos livres não
porque senhores “benevolentes” concediam gentilmente a
liberdade, mas porque eles a compravam”.
103
101
SCHUMAHER, op. cit., p. 417.
102
KARASCH, Mary C. A vida dos escravos no Rio de Janeiro 1808/1850. São Paulo: Cia da Letras, 2000, p. 439.
103
Ibidem, p. 440.
58
Nos livros de Notas de Tabelião, foram examinados,
especificamente, documentos referentes a escrituras, procurações,
contratos, substabelecimentos, mas nos detivemos, principalmente, nas
Cartas de Liberdade. Foram consultados os Documentos Cartorários nº
01 da caixa nº 09 e nº 03, da caixa nº 03 referentes ao Primeiro Ofício de
Notas que se encontram sob a guarda do Centro de Documentação
Histórica da Universidade Severino Sombra (CDH), conforme rege o
Convênio feito entre a Universidade Severino Sombra e a OAB.
Para que fosse feita uma análise mais cuidadosa, selecionamos
as informações relacionadas ao período compreendido entre 03/05/1869
e 13/12/1888, em que consta um total de vinte e duas cartas de liberdade
devidamente registradas.
A escravidão em Vassouras revestiu-se de grande intensidade e
violência. Até mesmo as benesses e manumissões, na sua maioria,
visavam mais aos interesses senhoriais que aos dos cativos.
As manumissões espontâneas, em Vassouras, no séc. XIX,
ocorreram, com maior incidência, nas décadas de 70 e 80 , refletindo a
decadência da cafeicultura ,a ação das campanhas abolicionistas e a nova
ordem econômica capitalista, enfim, o próprio processo progressivo da
abolição O escravo era um bem com valor econômico. Sua liberdade
significava diminuição de patrimônio. Por isto, as manumissões, em geral,
beneficivam os escravos que já não mais se constituiam em força de
trabalho suficiente e eficaz para o desenvolvimento das propriedades
agrícolas, em especial as fazendas cafeeiras, ou os que tinham alguma
ligação mais estreita e familiar com seus senhores.
59
Sobre as manumissões, encontramos no noticiário do jornal “O
Município”, referências àquelas feitas por subscrição pública ou por
verbas governamentais:
“...tem que ser entregues aos escravos abaixo
mencionados, por intermédio de seus senhores, as suas
cartas de liberdade, concedidas por conta da quota do
fundo de emancipação distribuída a este município, e
segundo a ordem ...” (Anexa uma relação de 54 nomes
de escravos com os nomes dos respectivos
senhores).
104
“Realizou-se no dia 5 do corrente mez na casa da camara
municipal, a audiência para a entrega das cartas de
liberdade aos escravos libertos pelo fundo de emancipação
... a estes, fazendo sentir que para serem-lhes profícuos os
resultados beneficos da lei, que para serem elles uteis a
sociedade, em que vão entrar, e poderem ser por esta aceitos,
era mister que não abandonassem os hábitos de
trabalho”.
105
Ainda na obtenção da liberdade, “por fundo de emancipação”
temos o caso dos seguintes escravos:
Teresa (35 anos), da roça; Francisca (62 anos), costureira;
Lucinda (18 anos), da roça e Maria (12 anos), sem
profissão declarada, cuja proprietária, por ser solteira, não
deixa herdeiros diretos, liberta seus escravos.
106
Karasch
107
registra, entre as libertações legais, as libertações
“por intervenção governamental ou real”, os libertos graças a serviços
militares prestados. Cita, ainda, “documentos de apelação” (pedido de
liberdade contra a vontade do dono) dirigido a Sua Alteza Real.
104
O Município, 20/10/1878, p. 3-4.
105
O Município, 7/11/1878, p. 1.
106
CDH. USS.1ª ofício, caixa nª 190, Ano: 1883. Grupo Cível: liberdade. p. 30.
107
KARASCH, Op. Cit., p. 441.
60
Como veremos nos exemplos a seguir, a liberdade, algumas
vezes, é conseguida pela vontade dos senhores, que se manifesta através
de Testamento, ou mesmo na Pia Batismal (as chamadas Alforrias de Pia).
Entretanto, é importante frisar que muitas das determinações
dos testadores não são cumpridas por seus herdeiros, como, também,
estão condicionadas à prestação de serviços por alguns anos, ou durante a
vida de determinados herdeiros e, até mesmo, ao pagamento de dívidas
do testador.
A seguir, baseados em documentos (Cartas de Liberdade),
citaremos casos de alforria condicionada:
Digo eu Antonio Pires Rebelo por esta por mim feita e
assinada que sou senhor e possuidor de um escravo mulato
por nome Policarpo e pelos bons serviços que tenho dele e
amor com que me trata passo-lhe esta carta de liberdade
somente com a obrigação de me servir enquanto a minha
vida eu tiver e deixar declaradas, e assim a minha sepultura
e também por minha alma será obrigado a dizer 40 missas
que eu peço e satisfazendo isto tudo ficará o dito escravo
com toda sua liberdade, livre e sem impedimento algum
por ser esta alforria de minha livre e desempedida vontade,
sem constrangimento de pessoa alguma para o que lhe
passo esta Carta de Liberdade . São Paulo, 22 de Junho de
1790. Antonio Pires Rebelo”.
108
Pedro de Nação, 50 anos, de propriedade de Maria José da
Conceição e Antônio Joaquim Esteves, alforriado “com a
condição de me servir durante a minha vida e do meu
marido”.
109
João, de mais ou menos 60 anos, propriedade de
Laurentina de Carvalho Motta Sayão “dou de minha livre
vontade plena liberdade com a condição de me servir 3
anos, contada desta data, findo os quais será entregue sua
carta e não poderá servir a mais ninguém”.
110
108
NEVES, Maria de Fátima Rodrigues. Documentos sobre a escravidão no Brasil. São Paulo: Contexto, 1996. p. 82-83.
109
CDH. USS. 1
o
Ofício, Ano 1882. Grupo Civel: Cartas de Liberdade.
110
Idem.
61
Ursula, crioula, de 20 anos, de propriedade de Maria José
da Conceição e Antônio Joaquim Esteves, nos seguintes
termos: “servir durante a minha vida e do meu marido”.
111
Brígida, crioula, do mesmo proprietário, de 26 anos, nas
seguintes condições: “dou liberdade porém de me servirem
durante a minha vida e do meu marido e não poderem
servir a mais ninguém”.
112
Nos casos de escravos com mais de 50 anos, depreende-se que
o benefício não é totalmente para o alforriado, como se poderia supor. O
senhor está também se liberando da manutenção do escravo não
produtivo, já que o escravo, dadas suas condições de vida, muito cedo
perdia sua capacidade de trabalho.
Dentro desta linha de pensamento, encontramos em Maria
Graham o seguinte:
“Aqui não é raro conceder a um escravo a alforria, quando
ele está muito velho ou muito doente para trabalhar, isto é,
-lo pela porta a fora para mendigar ou morrer de
fome...”.
113
Segundo Slenes
114
e outros historiadores, as alforrias podiam ser
também uma forma de controle social, pois o aceno da liberdade,
exigindo obediência, teria propiciado acomodações do escravo ao
trabalho, na esperança de liberdade num futuro próximo, como
recompensa pelos bons serviços prestados. Mas, algumas vezes
encontramos casos de “liberalidade”como os que se seguem:
111
Idem.
112
Idem.
113
GRAHAM, Maria. Diário de uma viagem ao Brasil e de uma estada nesse país durante parte dos anos de 1821, 1822 e
1923. São Paulo: Cia. Ed. Nacional, 1956. pp. 158, 219.
114
SLENES, Robert. Na senzala uma flor: esperanças e recordações na família escrava. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1999.
62
Ana Bernadina Moreira alforria a preta Francisca a quem
deixa a quantia de cinqüenta mil réis, deixa livre sem
condição alguma a escrava Florisbela e declara que desiste
dos serviços da ingênua Julieta.
115
A escrava Leocádia, crioula, de cor preta, 23 anos, do
serviço da casa que conseguiu a aquiescência de seu
proprietário, quanto à quantia oferecida para comprar sua
liberdade e de seus quatro filhos menores. Apesar de
avaliados em um conto e setecentos mil réis, o dono
concorda em dar a carta de liberdade por um conto de réis
que a escrava recebera de Manoel Pereira da Silva que se
agradara dela.
116
Falci
117
procura mostrar que a questão do valor e os motivos
pelos quais se alforriava, sempre constavam nas cartas. A alforria, às
vezes, ficava anulada quando havia, uma condição para se dar a liberdade:
situação compreensível já que, na verdade, o escravo não está livre, possui
apenas um aceno de liberdade. Afirma ainda que há duas formas de
alforria sob o ponto de vista jurídico: as concedidas “a título gratuito”,
assim consideradas as pagas com dinheiro ou não, e a título precário ou
oneroso, que estabelece um limite, uma diminuição daquela concessão, e
que pode por sua vez depender do pagamento, através de trabalho, de
prestação de serviço etc.
Como exemplo do valor influindo nos casos de alforria temos:
A escrava Verônica, lavadeira consegue sua liberdade por
“não ser prendada”, o proprietário concorda com a quantia
oferecida (seiscentos mil réis) porque ela “apenas sabia
lavar”.
118
Suzana obteve sua liberdade apesar de sua proprietária não
concordar com a quantia oferecida (quinhentos mil réis)
“visto :que a escrava era jovem, bonita e prendada”.
119
115
CDH. USS. 1º ofício, Caixa: 243. Ano: 1879, Título: Testamento (Ato Adm.).
116
CDH. USS. 1 ofício, Caixa: 02, Ano:1882.Título: Arbitramento-Liberdade.
117
FALCI, M. B. Knox. Escravos do Sertão. Piauí: Fundação Cultural Monsenhor Chaves, 1995.
118
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 190, Ano: 1883. Grupo: Cível, Título: Liberdade.
119
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 190, Ano: 1883. Grupo: Cível, Título: Liberdade.
63
Em outros dois casos, o pouco valor das escravas é fator
decisivo:
Teodora, 40 anos, tem seu pedido negado sob a alegação
de que o dinheiro oferecido por ela não fora ganho por seu
trabalho (fora doação de um carpinteiro que se agrada
dela).
120
Thereza, 25 anos a quem a justiça deu ganho de causa,
apesar de seu dono não concordar,por considerar justo o
valor por ela oferecido (seiscentos mil réis) já que “não era
prendada, só sabia fazer o serviço da roça, mais
precisamente da lavoura”.
121
Karasch
122
aponta, também como “forma de alforria”, a
concedida no leito de morte. Isso não exprime uma forma, pois a morte
do proprietário não concedia a liberdade por si só. A propriedade e,
portanto, os escravos, passava aos seus herdeiros. E é, por isso, que as
cartas de alforria decorrentes de disposições de leito de morte recebem o
título de “Carta Judicial de Alforria”.
Na carta de liberdade, que Maria Francisca do Nascimento
passou, encontramos:
“Declaro o qual por minha morte ficará liberto José de
Nação Cabinda e poderá gozar de sua liberdade como se
de ventre livre tivesse nascido”.
123
Já no acordo de liberdade da escrava Theodora com os
herdeiros de Manuel Antônio de Melo, temos:
“...vem requerer sua liberdade, mas os herdeiros do seu
dono não aceitam e querem, sim, vendê-la para outro
lugar. Com a orientação de um oficial de justiça consegue
120
CDH.USS. 1º Ofício, caixa nº 190, Ano: 1875. Grupo Cível. Título: Liberdade.
121
CDH.USS. 1º Ofício, caixa nº 190, Ano: 1883. Grupo Cível. Título: Liberdade.
122
KARASCH, op. cit. p. 438.
123
CDH. USS. Caixa n º 03, Livro nº 03, Ano: 1870-1872. Título: Cartas de liberdade.
64
sua liberdade pagando uma indenização aos seus antigos
donos. Foi avaliada em 1:400$000 mas foi libertada por:
1:100$000”.
124
Nos textos, em geral, percebe-se que as alforrias eram um ato
importante, representando perda material, e só se justificavam por algum
motivo relevante.
No caso que se segue, há uma clara indicação de alguma ligação
mais estreita e familiar entre o alforriado e seu senhor, como vemos:
“...minha escravinha Basília poderá fazer de hoje em
diante, uso de sua inteira liberdade e de todos prevelegios
que as leis do Brazil concedem aos libertos e para
contribuir para a extinção da escravidão em nosso país”.
125
Num outro processo, o testador reconhece as duas filhas tidas
com a escrava Belisária, que possui uma carta de liberdade. Deixa a
quantia de quatrocentos mil réis para a escrava e institui as filhas como
suas legítimas herdeiras.
126
Semelhante a este, encontramos o caso da escrava Maria
Henriqueta que recebe de herança a quantia de dois contos de réis e tem
suas duas filhas reconhecidas pelo testador que as faz suas herdeiras.
Nesse mesmo processo o testador deixa para uma outra filha (já casada),
tida com a escrava, possivelmente já morta, duas escravas (Joana e Altina)
que ficam forras mas com a condição de ajudar a nova proprietária no
serviço da casa, por oito anos.
127
Mais um exemplo do envolvimento do proprietário com sua
escrava:
124
Idem.
125
Idem.
126
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 241, Ano: 1859. Grupo: Atos Adm., Título: Testamento. p. 04.
127
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 242, Ano: 1862. Grupo: Atos Adm., Título: Testamento. p. 08.
65
Perpétua, do serviço da casa, é libertada e passa a viver
maritalmente com seu dono que a inclui em seu
testamento deixando terras em “uso e frutos” enquanto
viva for. Como não tiveram filhos, por morte da ex-
escrava serão seus herdeiros os afilhados do testador.
No processo seguinte, vemos que não era incomum o legado de
“escravos para escravos”:
O barão de Capivary deixa para sua escrava forra América
Luiza a quantia de dez contos de réis e mais nove
escravos, com a condição de servi-la enquanto viva ela for,
não podendo vendê-los mas sim alforriá-los. Deixa ainda
para ela terras com plantações de café que reverteria para o
filho do barão por morte da escrava. Determina, ainda, que
o testamenteiro construa uma casa para a ex-escrava.
128
No decorrer de nossas pesquisas percebemos, ainda, que muitos
dos senhores concediam a liberdade mediante pessoas designadas “a
rogo” por eles, já que muitos não sabiam ler, nem escrever, como no
exemplo seguinte:
A escrava Eva, crioula, matrícula nº 7023, de propriedade
de Ambrósio de Souza Andrade sendo o documento
assinado “a rogo” por José Joaquim Rodrigues Pereira, nos
seguintes termos: “sem ônus algum pelos bons serviços
que me tem prestado”.
129
Quanto às alforrias concedidas em Cartas de Liberdade a
menores, encontramos:
A escrava Lucinda, crioula, de 05 anos, propriedade de
Eduardo Ribeirão da Costa e Souza: “muito livre e
espontaneamente dou liberdade a menor Lucinda para
128
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 242, Ano: 1863. Grupo: Atos Adm. Título: Testamento, p. 16.
129
Idem.
66
gozar de todas as prerrogativas sem constrangimento de
pessoa alguma é a minha última vontade para que a justiça
desse Império faça cumprir”.
130
Maria, parda, de 03 anos; Amâncio, de 01 ano, crioulo;
Paulino, pardo, de 06 anos, todos de propriedade de Maria
José da Conceição e seu esposo José Inácio Salinas:
“Filhos de minha escrava Geralda e vão me servir durante
a minha vida”.
131
Julieta, parda, de 02 anos, de propriedade de Laurentina
de Carvalho Motta Sayão, “Filha de Venância de meu
irmão Joaquim que recebeu da loja Massônica Estrela do
Oriente a quantia de cem mil réis”.
132
Será que podemos considerar a alforria uma “benesse” para a
criança alforriada se, mesmo com a Lei do Ventre Livre, de 28 de
setembro de 1871, havia ressalvas quanto à liberdade concedida a
menores ingênuos?
Embora a Lei nº 2040, de 28/09/1871, ao colocar em poder e
sob a autoridade dos senhores os filhos de escravos nascidos ingênuos, os
obrigasse a “crial-os e tratal-os até a idade de 8 anos completos”, a seguir
faz a seguinte ressalva:
“Chegando o filho de escravos a esta idade, o senhor da
mãe terá a opção, ou de receber do estado a indenização
de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a
idade de 21 annos completos”.
Como diz Mattoso,
“pelo que se infere nos documentos que são os
inventários, e pelas normas e leis da sociedade civil e
religiosa, há, ao lado da maior idade religiosa e civil, uma
terceira maior idade, esta afeta ao início de uma atividade
econômica produtiva”
.133
130
Idem.
131
CDH. USS. 1
o
Ofício, Caixa 190, Ano: 1870-1872. Título: Cartas de liberdade.
132
Idem.
133
MATTOSO, Kátia M. De Queiroz. O filho da escrava: em torno da Lei do Ventre Livre. in Revista Brasileira de
História. São Paulo: ANPUH Marco Zero, v. 8, n.16, mar/ago.1988, p. 37-55.
67
Assim, quanto ao destino dessas crianças, nada se pode afirmar:
a alforria foi realmente uma “benesse”ou colocou-as em uma situação
mais precária de “coisa sem dono”?
Entre as formas de alforrias encontramos a designada “alforria
de pia”. No caso transcrito a seguir temos um exemplo de alforria de pia
em que a vontade do proprietário da escrava não é respeitada por seus
herdeiros:
A escrava Augusta, de 14 anos, alega ter ganho a liberdade
na pia bastimal, mas como não consegue comprovar o
alegado, no processo de inventário a ré (nova dona) fica de
posse da escrava.
134
Em “O Mulato”, de Aloísio de Azevedo, encontramos uma
referência à alforria concedida no batismo, a dita “Alforria de Pia” que,
no caso, foi estendida à mãe da criança batizada.
“Depois de vários abortos, Domingas deu à luz um filho
de José da Silva. Chamou-se o vigário da freguesia e, no
ato do batismo da criança, esta com sua mãe, receberam
solenemente a carta de alforria”.
135
Ainda sobre “manumissões” transcrevemos a seguir as palavras
de Viotti que, por sua vez, cita Slenes:
“Segundo Slenes, o índice de manumissões é mais alto nas
cidades do que no campo e as alforrias são concedidas
principalmente a escravos ou escravas de mais de
cinqüenta anos e menos de dez. Encontra-se entre os
alforriados maior número de mulheres do que de
homens”.
136
134
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 190, Ano: 1875. TítuloLiberdade.
135
AZEVEDO, Aluísio. O mulato. Ática, 15
a.
Ed. São Paulo: Ática, 2000.
136
Costa, Emília Viotti da. Da senzala à colônia. São Paulo: UNESP. 1998, p. 57.
68
Confirmando observação já feita por nós quanto à idade dos
escravos na concessão das manumissões, Viotti faz ainda outra
observação a respeito dos motivos que levavam os proprietários de
escravos a conceder sua alforria:
“Parece, no entanto, inegável, como assinalamos “Da
senzala à Colônia” que o número de alforrias aumenta
consideravelmente nos anos do final da abolição, quando
os fazendeiros de café tentaram reter a mão-de-obra
escrava que fugia concedendo manumissão aos escravos
com a condição de que permanecessem na fazenda por um
determinado número de anos”.
137
Também em um artigo de Richard Graham encontramos uma
refutação à imagem, defendida por alguns, do brasileiro, como um
proprietário de escravos “bondoso”.
“A fim de que não nos arrebatemos admirando o
proprietário de escravos brasileiro, é importante notar,
mesmo de passagem, que mais da metade dos escravos
adultos que foram alforriados pagaram por sua liberdade
em dinheiro ou sob a promessa de dinheiro. Assim muitos
senhores, enquanto concediam a alguns escravos a
oportunidade de acumular economias próprias, também
demandavam como pagamento pela alforria o equivalente
aproximado do preço de um escravo novo. Mesmo assim,
nem todo escravo poderia comprar sua liberdade, mesmo
quando paga em dinheiro, a manumissão era ainda
considerada uma concessão por parte do senhor, dada ao
escravo obediente e leal, de quem se esperava gratidão. A
relativa freqüência da libertação de crianças, além do mais,
pode ser em parte explicada pelo alto custo do crédito que
fazia com que o investimento em criá-las fosse muito alto
em relação ao baixo custo de comprar escravos direto do
navio vindo da vizinha África”.
138
137
Idem.
138
GRAHAM, Richard.Cor: cidadania no Brasil escravocrata Revista Maracanam, Rio de Janeiro: UERJ, a. 1, n. 1, 1999/2000. p. 35.
69
Seria a liberdade, no caso dos nossos escravos, realmente uma
coisa positiva?
Karasch situa, com bastante clareza, as vantagens e
desvantagens da liberdade. Escreve ela:
“A carta de alforria era a prova da liberdade de um
escravo, introduzindo-o na vida precária de uma pessoa
liberta numa sociedade escravista.
No século XIX, a carta transferia o título de propriedade
(o cativo) de senhor para escravo. Em certo sentido, os
escravos literalmente compravam-se ou eram doados para
si mesmos”.
139
Com relação à última frase da citação anterior, analisamos
alguns documentos que justificam essa afirmativa. Em cartas de liberdade
encontramos casos em que o escravo comprara sua liberdade com
quantias que juntava com seu trabalho ou doações e, em testamentos, a
transferência de propriedade de um escravo do senhor para outro
escravo.
Continua Karasch citando um caso em que o escravo
demonstra pouco interesse em alcançar a liberdade: :
“A Inglaterra , nos dizem, é muito fria, e não vamos
gostar; e o que faremos com nossa liberdade aqui? Temos
tudo o que desejamos, o senhor nos dá comida e roupas, e,
se ficamos doentes, dá-nos remédios e cura-nos; mas se
tivermos nossa liberdade, não teremos ninguém para
cuidar de nós”.
140
E diz que os registros da polícia revelam que: “as pessoas
libertas eram vítimas freqüentes de outros grupos sociais, inclusive
139
KARASCH, op. cit. p. 439.
140
Ibidem, p. 473.
70
escravos, mas especialmente de soldados e marinheiros”, citando o
viajante Freireyss:
“Em geral, sem qualificações , quase sem dinheiro e na
turbulência de suas paixões, que despertam mais forte na
liberdade por terem sido reprimidas durante tanto tempo,
o liberto entra no mundo e, em poucos dias, está
completamente mudado. Agora trabalha somente quando
a extrema necessidade o obriga a isso e seus ganhos
servem-lhe apenas para a satisfação de seu desejo de beber;
um vício segue o outro e, por fim, doente e sem amigos
para ajudá-lo, fica reduzido à miséria”.
141
E conclui:
“Tendo em vista as muitas dificuldades de sobreviver por
conta própria, alguns libertos preferiam não se retirar da
proteção do dono, mas continuar como clientes
dependentes. Uns poucos escravos chegavam a optar por
não pedir a liberdade. Como observou Marjoribanks,
alguns escravos preferiam continuar no cativeiro e investir
seu dinheiro em outra coisa. Se faziam tais escolhas, então
temos de questionar a alforria como forma de mobilidade
social, pois outras fontes esclarecem que a separação de
um senhor causava muitas vezes mobilidade social
descendente e piorava suas condições de vida.
142
Em contraposição a esses percalços do liberto, temos o ponto
de vista de alguns escravos que achavam valer a pena enfrentar as
incertezas e desvantagens que acompanhavam a liberdade.
Entre as vantagens usufruídas pelo liberto, Karasch cita:
- liberto podia votar em uma eleição para selecionar eleitores,
embora não pudesse ocupar cargos político ou ser eleitos;
141
Ibidem, p. 474.
142
Idem.
71
- liberto que entrava para o exercito podia ter esperanças de se
tornar oficial de um regimento negro ou pardo, mas estava
impedido de ser oficial da Guarda Nacional;
- a Igreja Católica que barrava escravos e ex-escravos do
sacerdócio, admitia filhos legítimos de libertos nas ordens
religiosas;
- liberto tinha o direito de casar-se e constituir família sem
medo de ser separado;
- liberto tinha direito à propriedade.
143
E conclui com uma observação de Rugendas, “o escravo liberto
estava destinado à classe mais baixa. Sua única esperança era que seus
descendentes poderiam levar uma vida melhor”.
144
É de se registrar que as alforrias gratuitas garantiam aos
escravos a posse da liberdade imediatamente após a morte do senhor.
Mas, em muitos casos ficava expresso o desejo de que o ex- escravo
continuasse prestando serviço e que as cartas de liberdade seguiam mais
ou menos um padrão pré - estabelecido e praticamente em todas elas
aparecem expressões como: “por minha livre e espontânea vontade,
como se de ventre livre fosse, que me sirva até minha morte, sem
qualquer contestação dos herdeiros e até intenções mais nobres como
“contribuir para a extinção da escravidão no Brasil”.
Verificamos, também, que a lei nº 2040, de 1871, embora não
com a intenção de beneficiar o escravo, dava a ele a liberdade, se não
fosse cumprido o dispositivo sobre o seu registro conforme transcrito a
seguir:
“A fim de controlar a população escrava, a lei de 1871
postulava ainda que todos os senhores deveriam registrar
143
Idem.
144
RUGENDAS, Johann Moritz. Viagem Pitoresca através do Brasil. São Paulo: 1967. pp. 151/152.
72
seus escravos. Tratava-se da matrícula dos escravos, a ser
feita em um livro especial, contendo informações com o
nome, filiação, idade, profissão, estado civil, cor etc... Este
registro serviria para controlar o número de escravos
nascidos após a lei, facilitando assim a garantia de seus
direitos e a efetividade desta lei. O registro ainda facilitava
o controle sobre venda, compra ou libertação dos
escravos. Para garantir que esta determinação não fosse
burlada, a lei de 1871 determinava que o escravo que não
tivesse sido dado à matrícula seria considerado livre”.
145
Apesar do “cuidado”, visível no último parágrafo, a lei nem
sempre foi cumprida, conforme se vê no testamento
146
em que o senhor,
para “desencargo de consciência” declara que a escrava Hortência já era
livre, pois nunca fora matriculada, conforme a lei de 1871.
Enfim, não resta dúvida de que para melhor entender todo o
processo da escravidão no Brasil é preciso fazer uma revisão bibliográfica,
analisar documentos e aprofundar os conhecimentos sobre o tema.
ESSA NEGA FULÔ
Ora, se deu que chegou
(isso já faz muito tempo)
no bangüê dum meu avô
uma negra bonitinha
chamada negra Fulô.
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Ó Fulô! Ó Fulô!
(Era a fala da Sinhá.)
145
XAVIER, Regina Célia Lima. A conquista da liberdade. Centro de memória. UNICAMP: Campinas, 1996, p. 49.
146
CDH. USS. 1º Ofício, Caixa nº 243, Ano: 1878. Grupo: Atos Adm., Título: Testamento.
73
Vai forrar a minha cama,
Pentear os meus cabelos,
Vem ajudar a tirar
A minha roupa, Fulô!
Essa negra Fulô!
Essa negrinha Fulô
Ficou logo pra mucama,
Para vigiar a Sinhá
Pra engomar pro Sinhô!
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Ó Fulô? Ó Fulô?
(Era a fala da sinhá)
Vem me ajudar, Ó Fulô,
Vem abanar o meu corpo
Que eu estou suada, Fulô!
Vem coçar minha coceira,
Vem me catar cafuné
Vem balançar minha rêde,
Vem me contar uma história,
Que eu estou com sono, Fulô!
Essa negra Fulô!
“Era um dia de princesa
que vivia num castelo
que possuía um vestido
com os peixinhos do mar.
Entrou na perna dum pato
Saiu na perna dum pinto
74
O Rei-Sinhô me mandou
Que vos contasse mais cinco”.
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Ó Fulô? Ó Fulô?
Vai botar para dormir
Êsses meninos, Fulô!
“Minha mãe me penteou
minha madrasta me enterrou
pelos figos da figueira
que o Sabiá beliscou.”
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Ó Fulô? Ó Fulô?
(Era a fala da Sinhá
chamando a Negra Fulô.)
Cadê meu frasco de cheiro
Que teu Sinhô me mandou?
-Ah! Foi você que roubou!
Ah! Foi você que roubou!
O Sinhô foi ver a negra
Levar couro do feitor.
A negra tirou a roupa.
O Sinhô disse: Fulô!
(A vista se escureceu
que nem negra Fulô.)
Essa negra Fulô!
75
Essa negra Fulô!
Ó Fulô? Ó Fulô?
Cadê meu lenço de rendas
Cadê meu cinto, meu broche,
Cadê meu terço de couro
Que teu Sinhô me mandou?
Ah! Foi você que roubou!
Ah! Foi você que roubou!
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
O Sinhô foi açoitar
Sozinho a negra Fulô.
A negra tirou a saia
E tirou o cabeção,
De dentro dêle pulou
Nuinha a negra Fulô.
Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!
Ó Fulô? Ó Fulô?
Cadê, cadê teu Sinhô
Que nosso Senhor me mandou?
Ah! Foi você que roubou,
Foi você, negra Fulô?
76
CAPÍTULO III
MULHER ESCRAVA DA CASA E DA ROÇA
Embora tenhamos elegido o tema da mulher escrava na roça,
em contraposição a uma acentuada tendência para apresentar a negra
escrava apenas como doméstica dos casarões urbanos ou campestres,
não poderíamos, entretanto, deixar de fazer referência à diversidade de
funções que ela exerceu nas atividades econômicas de nosso país.
Como acentua Mott:
“...poucos foram os trabalhos que a mulher escravizada
não realizou no Brasil. Ao contrário, além daquelas
atividades que tinham obrigação de cumprir, o mais
comum era acumularem várias outras ao mesmo
tempo”.
147
E continua, adiante, esclarecendo que, habituadas ao trabalho
agrícola na África, nas grandes propriedades elas foram utilizadas no
trabalho considerado “mais leve” como semear, tirar ervas daninhas e
catar larvas e, embora usassem foice e enxada, os homens eram chamados
a atuar onde era necessário o machado. No entanto, os pequenos
proprietários e os mais pobres utilizavam as negras escravas em todas as
tarefas, mesmo as mais pesadas como o desmatamento e o corte de lenha.
Já a dita “habilidade feminina” levava a que as escravas fossem preferidas
na colheita do café.
147
MOTT, Maria Lúcia de Barros. Submissão e Resistência A mulher na Luta Contra a Escravidão. São Paulo: Ed.
Contexto, 1988, p. 20,21,25.
77
Em decorrência dessa diversidade de atividades, a jornada de
trabalho da negra escrava acabava, muitas vezes, mais longa do que as 12
ou 15 horas habitualmente estipuladas pelo proprietário.
Mott afirma, ainda, que as escravas estiveram presentes
também na área da mineração, trabalhando nos garimpos, carregando
gamelas com cascalho, batendo ouro. Cita até o fato de que foi uma
africana, Jacinta da Siqueira, quem descobriu a zona aurífera de “Quatro
Vintém”, no Serro Frio.
Mas não só Mott enfoca essa faceta da diversidade das
atividades da mulher escrava, que não foi apenas uma mucamba dos
casarões. Outros textos, que citaremos a seguir, demonstram o engano
dos que assim pensavam.
Em Reis
148
encontramos a afirmativa de que as mulheres
africanas aqui exerciam tarefas no comércio, na lavoura e nos engenhos
de açúcar do nordeste, onde muitas vezes as escravas eram responsáveis
pelas atividades mais perigosas como a moagem de cana.
Ainda em Reis encontramos:
“...que as escravas também exerciam tarefas específicas na
manufatura do açúcar, participavam do descaroçamento
do algodão, do beneficiamento da mandioca, da limpeza da
roça, da ordenha etc...
...a escravidão desenvolveu-se rapidamente levando ao
aparecimento de oficiais mecânicos, sapateiros, barbeiros,
carregadores, prostitutas, negras de tabuleiro, dentre
outros... Para as Minas vieram diferentes grupos africanos
que desempenharam papel relevante na extração mineral e
também na agricultura e na prestação de serviços,
incluindo as mulheres”.
149
148
REIS, Liana Maria. Ideologia e Dominação Escravista. In ANAIS ANPUH MG IX Encontro Estadual de
História. Juiz de Fora 1994, p. 246.
149
Idem, p. 247.
78
“Antes da partida para a roça”. Litografia de Victor Frond.
Fonte: Fazendas. Solares da Região Cafeeira do Brasil Imperial. Editora Nova Fronteira, p. 20.
Partida para a colheita do café 1885.
Fonte: FERNANDES Jr., Rubens; LAGO, P. C.
O século XIX na fotografia
brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Francisco Alves, 2000. p. 131.
79
Já Expilly nos fala de outras funções ao anotar que:
“...uma cinquentena de escravos de ambos os sexos e de
todas as idades guarneciam essa oficina rústica ... Era aí
que se fabricavam cabos sólidos e o grosseiro
encordoamento que se faz com a fibra do coco de piaçaba,
produtos preciosos para o comércio dessas
paragens....Negras, de braços nus, preparavam os fios da
palmeira, trazendo algumas delas um filho na cacunda”.
150
Stanley
151
nos relata o encontro do suiço Pradez com uma
idosa “Tia” escrava, que era da confiança do fazendeiro e dirigia a sua
fazenda.
Voltando ao enfoque principal de nossa tese o trabalho da
mulher escrava na roça vamos citar diversos autores que em seus
escritos fazem claras referências a esse trabalho.
150
EXPILLY, Charles Mulheres e Costumes no Brasil. São Paulo: Ed. Nacional, 2ª ed. 1977, p. 259.
151
STANLEY, J. Stein. Vassouras um município brasileiro do café-1850/1900. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,
1990, p. 207.
Negras depois do trabalho 1861 Victor Frond.
80
Slenes faz menção de uma “Christiana, esposa de Samuel”
empregada no “serviço da roça” que foi alforriada em 1870, aos 46 anos
de idade. E enfatiza que: “no campo, onde as mulheres trabalham se
acende o fogo com um tição que elas trazem consigo do fogo
doméstico”.
152
Levantando a hipótese de que esse ritual fosse uma
herança de uma época em que não era tão fácil fazer um fogo novo,
pergunta ele:
“...será que o próprio fogo doméstico havia-se tornado
uma espécie de “niksi”
153
e as mulheres, ao levar essa
“medicina” ao eito, visavam garantir que a proteção dos
espíritos se estendesse a seus trabalhos agrícolas?”.
154
Stanley, ao enfocar a abolição e suas conseqüências, deixou
bem clara a participação da mulher escrava nos serviços da roça quando
se refere à escassez de trabalho como um agravamento posterior à
liberdade, dizendo que:
“...a maior redução de mão-de-obra disponível se originou
da relutância de muitas mulheres recentemente
emancipadas retornarem às turmas no campo. Elas não
queriam pegar novamente nas enxadas”.
155
E, confirmando nossa anotação anterior sobre a preferência pela
mão-de-obra feminina na colheita do café, ele faz uma referência explícita
quanto a isso:
152
SLENES, Robert. Na Senzala uma Flor: esperanças e recordações na família escrava. Rio de Janeiro: Nova
Fronteira, 1999. p. 205.
153
NIKSI - é uma prática originária dos povos do Congo em que um objeto (como por ex. uma estátua) era
carregado de poderes mágicos através de rituais.
154
SLENES. Op. cit., p. 243.
155
STANLEY. Op. cit., p. 307.
81
“...nas épocas de colheita (do café), no entanto, quando os
fazendeiros pagavam uma taxa fixa pelo café colhido, as
mulheres freqüentemente voltavam ao trabalho”.
156
Mais adiante, fazendo uma observação sobre a maior independência
da mulher entre os escravos, em termos econômicos, ele volta ao ponto
que nos interessa, primordialmente, o trabalho da mulher na roça, ao
escrever:
“Elas desempenhavam os trabalhos masculinos capina,
trabalho com a enxada e colheita - nas plantações de café.
Cultivavam gêneros alimentícios em seus pedaços de terra
para vender; dessa maneira, ajudadas por estranhos,
compravam a liberdade”.
157
156
Ibidem, p. 308.
157
Idem.
Ao romper do dia, cabia
-
lhe a revista da escravaria a fim de dar início à jornada, verif
icando a presença de
cada um, examinando possíveis faltas e apurando o motivo da ausência, bem como observando
ferramentas de trabalho (amoladas e afiadas). Após esses cuidados, seguia a partida dos pretos até o eito.
A caminho do trabalho no eito (predominância de mulheres com seus instrumentos de trabalho
enxada e cestas).
Fonte: Fazendas. Solares da Região Cafeeira do Brasil Imperial. Editora Nova Fronteira, p. 21.
82
Também em Giacomini
158
encontramos trechos que mostram
como a mulher negra escrava teve uma atuação bastante intensa nos
trabalhos da roça (eito ou “plantation”) e, temos de reconhecer que,
infelizmente, sua condição de mulher, além de escrava, trazia-lhe um
acréscimo de sofrimento, pois além de uma exploração exaustiva no seu
trabalho de escrava na “plantation”, estava sujeita à violência que não
discriminava sexo para se fazer presente. São palavras de Giacomini:
“...a situação da escrava empregada no trabalho produtivo
da “plantation” esteve necessariamente determinada pela
sua condição de “coisa”, compartilhada com o homem
escravo, soma-se a particularidade advinda do fato de ser
mulher”...as negras pejadas e as que amamentavam, não
eram dispensadas da enxada”.
159
Quanto a estas últimas, as que amamentavam, cabe-nos fazer
um reparo. Elas muitas vezes eram retiradas do trabalho na roça não para
ajudá-las mas para submetê-las a um sacrifício maior: deixar de
amamentar os próprios filhos para servirem de amas-de-leite dos filhos de
seus senhores, já que as mulheres de elite, como nos informa Mott
160
, não
tinham o hábito de amamentar. Numa época em que não havia o recurso
das mamadeiras e da geladeira, essas escravas eram “peças” importantes
dos casarões, conseguindo minorar suas agruras ao receberem melhor
alimentação e vestimenta.
Mas, em contraposição a essa pequena “vantagem”, Sandra
Graham acentua que:
“...precisamente porque o trabalho dentro de casa trazia
proximidade com os poderosos, dos quais não tinha o
158
GIACOMINI, Sonia Maria. Mulher escrava Uma introdução histórica ao Estudo da mulher negra no Brasil.
Petrópolis: Vozes, 1988. p. 24.
159
Idem.
160
MOTT, Op. cit, p. 22.
83
direito de discordar, a criada podia ser vítima da raiva da
patroa ou sofrer abuso sexual de seu filho. Podia ser
sempre acusada de roubar guardanapos, facas,
colhersinhas, roupas ou jóias. Ao invés de proteção a
reclusão na casa podia ocultar o isolamento ou aviltamento
das criadas”.
161
Mais adiante ela aponta uma vantagem usufruída pelo escravo,
esta em decorrência de sua própria condição de cativo:
“Em matéria de resistência passiva os escravos, por ironia,
contavam com uma vantagem sobre os criados livres, que
podiam ser despedidos. Já os escravos tinham pouco
incentivo para trabalhar bem mas iriam sempre ser
alimentados, abrigados e vestidos pois representavam um
investimento”.
162
Além dos textos citados, outra fonte em que apoiamos a nossa
tese da escrava negra nos trabalhos da roça são os documentos do CDH
da USS.
Faremos agora um ligeiro resumo dos processos-crime
envolvendo escravas. Entre eles encontramos o da escrava Rita, da roça,
que é acusada de ter, junto com seu dono, furtado um garoto de 12 anos,
também escravo, e de tê-lo ajudado a fugir. Neste processo há um recorte
do “Jornal do Commércio” 11/07/1875, com anúncios procurando o
menino. Nele ainda constam anúncios de aluguel de raparigas para
cozinhar, andar com crianças na rua, lavar, engomar, ser ama de leite ...
163
Outros casos interessantes, já citados no capítulo II, por
tratarem de violência ou de liberdade, são o da escrava Tereza, de
161
GRAHAM, Sandra Lauderdale. Proteção e obediência- criadas e seus patrões no Rio de Janeiro-1860/1910. Rio de
Janeiro: Companhia das Letras, s/d. p. 64.
162
Idem.
163
CDH. USS, Réus: José Maria Carneiro e sua escrava Rita Título: Furto, Caixa 227, Ano 1875.
84
profissão da roça, que consegue sua liberdade justamente porque ela não
era prendada, só sabia fazer os serviços da roça, mais precisamente da
lavoura
164
e o da outra Thereza, de profissão da roça, é libertada, por sua
proprietária com outros escravos entre eles Lucinda, também da roça. A
senhora, por ser solteira, não deixa herdeiros diretos.
165
Temos ainda o caso de Vitória, escrava de Miguel Correa Lima,
que, usando a foice de seu trabalho na roça, agride Umbelinda Rosa da
Conceição, também escrava da roça.
166
Entre os processos cíveis, encontramos o de Leocádia, crioula,
que desempenhava serviços na casa e na roça, que pleteia a sua liberdade
e a de seus 4 filhos
167
e o caso de Luzia crioula, Firmina, Florisbela e
Julieta, todas escravas da roça, que constam do testamento de sua
proprietária Ana Bernadina Moreira
168
, típicos da grande quantidade de
cativas que trabalhavam no eito.
Um caso interessante é o da escrava Severina que herdou uma
roça e a queria vender e o senhor Antonio Corrêa e Castro vem
interceder por ela para tentarem vender a dita roça. O processo não dá
detalhes, nem diz se ela conseguiu vender ou não a tal roça. Este processo
mostra que roceiras se tornaram, às vezes, proprietárias
169
.
Em outro processo, o testador, Elias José Alves Guimarães,
deixa para seu filho a quantia de seiscentos e cinqüenta mil réis. Valor
pelo qual ele havia vendido a escrava Ricarda que coubera a seu filho na
partilha dos bens de sua mãe, pós-morte. Deixa para seu genro a escrava
164
CDH. USS, Título: Liberdade, Ano:1883, Caixa 190.
165
CDH. USS, Título: Liberdade, Ano:1883, Caixa 190.
166
CDH. USS, Título: Ofensas Físicas, Caixa: 233.
167
CDH. USS, Título: Arbitramento - Liberdade, Caixa 02, Ano: 1882.
168
CDH. USS, Título: Testamento, Caixa 243, Ano: 1879.
169
CDH. USS, Título: Atos Adm. do Judiciário, Caixa 239.
85
Severina que havia herdado com a morte de sua 1ª mulher. O testador
declara, ainda, para desencargo de consciência, que a escrava Hortência,
filha da escrava Quintina, nunca foi matriculada e portanto, deve ser
considerada liberta.
170
Nesse caso, em que a profissão citada para as escravas é da casa
e da roça, vê-se no último parágrafo uma referência a lei nº 2040,de 1871,
já parcialmente transcrita no capítulo que trata de “liberdade” , que
obrigava à matrícula dos escravos, em livro especial, sob pena de serem
considerados livres os que não tivessem sido matriculados.
Ainda outro processo interessante é o que trata de uma rescisão
de contrato em que o réu vendeu à vítima a fazenda hipotecada
juntamente com todos os seus pertences, inclusive as seguintes escravas,
todas do serviço da roça: Isabel, 26 anos, solteira, crioula; Rita, 20 anos,
crioula, solteira; Maria da Gloria, 45 anos, de nação, solteira; Francisca, 26
anos, crioula, solteira; Benvinda, 40 anos de nação, solteira; Carlota, 55
anos, casada, africana; Josepha, crioula, 34 anos, casada; Magdalena, 57
anos, crioula, solteira; Ursula, 49 anos, africana, solteira; Maria da Glória,
41 anos, solteira
171
. No caso da escrava Francisca, o réu a vende para a
vítima, sem possuir a escritura da mesma. É feita uma investigação e
descobre-se que Francisca nunca fora matriculada, portanto é considerada
livre. Francisca tinha 26 anos e sempre trabalhou, como escrava, na
lavoura. Nunca soube que deveria ser livre. No entanto, seu proprietário,
além de omitir esse fato, a vende para o Comendador Filizardo que
também compra a fazenda com seus móveis, roças, gado, e demais
escravos por noventa contos de réis e, só mais tarde, descobre que a
fazenda estava hipotecada com todos os seus pertences, inclusive a
escrava Francisca.
170
CDH. USS, Título: Testamento, Caixa: 243, Ano: 1878.
171
CDH. USS, Título: Libelo Cível de rescisão de venda de terra, Ano: 1880, Caixa: 186, p. 174.
86
No início do processo, cita-se que Francisca é do serviço da
roça. Ao final do mesmo, consta que ela é cozinheira e não mais crioula e
sim preta. Como se vê, nem sempre os dados obtidos nos documentos
são precisos e, também, podia haver uma fluidez ocupacional das cativas,
realizando vários serviços com o correr dos anos.
Conrad
172
apresenta dados estatísticos sobre a ocupação e a
composição sexual da população escrava que, mais uma vez, vem
corroborar com a nossa tese de que em número expressivo, as escravas
eram utilizadas nos trabalhos da roça. Segundo este autor, os dados,
fornecidos pelo Censo do Império de 1872 para todo o Brasil eram:
- 1.510.776 total de escravos, sendo:
- 805.170 homens, dos quais 503.774 estavam empregados
na agricultura;
- 705.606 mulheres, das quais- 304.657 encontravam-se nas
atividades da roça.
dados esses utilizados nos gráficos 1 a 3.
172
CONRAD, Robert. Os últimos anos da escravidão no Brasil-1850/1888. Rio de Janeiro: Civilização brasileira. 1978.
87
Homens Escravos no Brasil
(1872)
Atividades de
Roça 62%
Outras
Atividades 38%
Gráfico 1
Fonte: Conrad, Robert- Os últimos anos da escravidão do Brasil 1850-1888.
Gráfico 2
Fonte: ver gráfico 1.
Total de Escravos no Brasil (1872)
Homens 53 %
Mulheres 47 %
88
Gráfico 3
Fonte: ver gráfico 1.
Como mostram os gráficos 2 e 3, as mulheres participavam em
proporção cerca de 20% menos do que os homens, nas atividades da
roça.
A seguir, com base em dados colhidos nos livros da coletoria,
publicados no jornal “Vassourense”
173
, elaboramos os gráficos e os
comentários que se seguem:
173
VASSOURENSE, periódico imparcial e literário, ano III, nº 30, 27/07/1884.
Mulheres Escravas no Brasil (1872)
Atividades da
Roça 43%
Outras
Atividades 57%
89
Gráfico 4
Total : 21.093 escravos.
Sabemos que a proporção de mulheres entre os africanos que
aqui chegavam era de 20%. Assim podemos supor que esse número, em
1873, que confirma os dados do Censo de 1872, quanto a proporção de
mulheres (44%) em relação aos homens, se deve às escravas nascidas no
Brasil, ou seja, às crioulas.
Escravos Matriculados em Vassouras
(1872-1873)
Homens 56%
Mulheres 44 %
90
Gráfico 5
Total: 3.199 escravos.
Fonte: (gráficos 4-5) O Vassourense - ano III, nº 30 - 27/07/1884.
Nota-se que houve um grande decréscimo no número de escravos
matriculados em Vassouras, mantendo-se, no entanto, quase a mesma
proporção de mulheres.
Ainda examinando os outros dados publicados observamos que do
total apontado 24.292 escravos em 1874 somente restam em 1884,
17.891 escravos, em decorrência da saída de 1.704 escravos, falecimentos
de 4.052 escravos e liberdade concedida quer por fundo de emancipação
(129), quer por alforria gratuita (494) ou por ato oneroso (22) num total
de 6.401 escravos.
Escravos Importados para
Vassouras (1873-1884)
Homens 59%
Mulheres 41%
91
Gráfico 6
Fonte: Ver gráfico 4.
Fonte: O Vassourense ano III, n 30, 27-07-1884.
Nos gráficos seguintes, vemos a proporção entre homens e
mulheres nos diferentes fatores que levaram à diminuição de braços
escravos:
0
5000
10000
15000
20000
25000
Escravos Matriculados em
Vassouras (1874)
Total
Homens
Mulheres
92
Gráfico 7
Total : 1.704 escravos.
Fonte : ver gráfico 6.
Gráfico 8
Total: 4.052 escravos.
Fonte: Ver gráfico 6.
Gráfico 9
Total: 129 escravos.
Fonte: Ver gráfico 6.
0
200
400
600
800
1000
Migração de Escravos de Vassouras (1874-1884)
Homens
Mulheres
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
Falecimentos de Escravos (Vassouras 1874-1884)
Homens
Mulheres
61
62
63
64
65
66
Libertos pelo Fundo de Emancipação (1874-1884)
Homens
Mulheres
93
Gráfico 10
Total: 494 escravos.
Fonte: Ver gráfico 6.
Os números relativos à liberdade por alforria gratuita vieram
confirmar o que já havíamos anteriormente observado ao examinar os
documentos do CDH da USS: - as mulheres tinham mais facilidade para
alcançar esse tipo de liberdade, dada a sua convivência com os
proprietários nos casarões. Nos dados estatísticos, temos 327 mulheres
para 167 homens.
0
50
100
150
200
250
300
350
Alforria Gratuita (1874-1884)
Homens
Mulheres
94
Gráfico 11
Total: 22 escravos.
Fonte: Ver gráfico 6.
Em relação a esses dados, encontramos o seguinte comentário,
no mesmo periódico citado:
“Se o escravo é de facto o productor exclusivo, larga
diminuição deve ter soffrido a industria do municipio.
Com effeito de 24.292 escravos matriculados e entrados
neste decennio (1874 a 1884) existem 17.891 tem pois
a lavoura perdido 6.401 productores, ao passo que os
ingenuos por hora simples consumidores elevão-se à cifra
de 5.182.
Assim, a parte a soffreguidão do abolicionismo, é demais
precário o estado da agricultura do município relativo à
carência de braços”.
174
Desejando confirmar nossas observações ainda com mais
cuidado, destacamos em nosso trabalho o trato das fontes cujo corpo
documental consta de 441 inventários. Documentação manuscrita cuja
conservação troxe grandes problemas de leitura e utilização. Foram assim
distribuídos pelas décadas:
174
VASSOURENSE. Periódico imparcial e literário, ano III, nº 30, 27/07/1884.
0
2
4
6
8
10
12
Alforria por Ato Oneroso em Vassouras (1874-1884)
Homens
Mulheres
95
Década N º de Inventários
1850 136
1860 151
1870 116
1880 38
Fonte: CDH da USS.
É certo que também nesses documentos encontramos a mesma
dificuldade já referida: imprecisão e ausência de dados a serem
trabalhados. Levantamos uma relação de 5.968 escravos, sendo 4.409
homens e 1.559 mulheres. Selecionamos, de inventários menos
incompletos, os elementos que serviram de base para elaborarmos os
gráficos sobre a origem, a profissão e a idade dos escravos nos anos 50 a
80.
Origem
As escravas arroladas nos inventários das décadas de 50 a 80, da
região de Vassouras, tinham uma enorme variedade étnica.
Esclarecemos que as denominações “ Nação” e “Africana”,
encontradas nos gráficos a seguir, indicam escravas oriundas da África,
sem especificação da nação de origem. Outra observação diz respeito à
nação Benguela que, por ser o porto da África de onde partiam a maioria
dos navios negreiros, engloba, muitas vezes, as escravas de outras origens.
Esses são dois exemplos da imprecisão a que já nos referimos.
96
Gráfico 12
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 136 inventários.
Verifica-se que na década de 50, quando determinada sua
origem, as escravas aparecem agrupadas em 12 diferentes nações. Dessas
12 nações, as mais expressivas, quantitativamente, são: Benguela, Cabinda
e Mina.
Origem / Nação - Anos 50
18%
2%
25%
5%
2%
1%
13%
1%
1%
14%
5%
1%
7%
5%
Cabinda
Manjolo
Rebolo
Benguela
Moçambique
Canonge
Nação (indeterminada)
Africana (indeterminada)
Mina
Inhambane
Angola
Cassange
Conga
Quiçamã
97
Gráfico 13
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 151 inventários.
Na década de 60 predominam as etnias Mina, Benguela e
Cabinda.
Não podemos deixar de mencionar que a historiografia sobre a
província do Rio de Janeiro pouco ou nenhuma atenção deu aos minas,
em grande parte oriundos do tráfico interprovincial com a Bahia. Esta
forte presença de mulheres minas na Vassouras rural representa uma
mudança significativa nos padrões étnicos conhecidos dos africanos na
região.
Origem / Nação - Anos 60
9%
5%
9%
5%
36%
11%
25%
Cabinda
Conga
Benguela
Canonge
Nação
(indeterminada)
Mina
Africana
(indeterminada)
98
Gráfico 14
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 116 inventários.
Gráfico 15
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 38 inventários.
Nas décadas de 70 e 80, início da decadência cafeeira, predominam
as etnias Conga, Mina e Benguela.
Origem / Nação - Anos 70
17%
8%
5%
35%
10%
3%
5%
6%
6%
5%
Conga
Benguela
Moçambique
Nação (indeterminada)
Mina
Africana (indeterminada)
Inhambane
Angola
Mussena
Crioula
Origem / Nação - Anos 80
17%
8%
5%
35%
10%
3%
5%
6%
6%
5%
Conga
Benguela
Moçambique
Nação (indeterminada)
Mina
Africana (indeterminada)
Inhambane
Angola
Mussena
Crioula
99
Comparando-se a década de 50 com a de 80 quanto à origem
africana, percebe-se que predominava na primeira a etnia Benguela, na
segunda predominava a etnia Conga. Isto nos leva a admitir que houve
profunda reordenação dos fluxos de distribuição e de comércio atlântico
ou mesmo de tráfico interprovincial.
Se, até 50, os fazendeiros podiam contar com a vinda contínua
de navios negreiros, a partir daí eles tiveram que comprar, dentro dos
mercados do Brasil, principalmente nos mercados que estavam em
decadência no Nordeste. Então percebe-se que as etnias passaram a
variar.
175
A classificação dos escravos africanos, como se depreende dos
gráficos anteriores se fazia por local de origem, enquanto a dos brasileiros
pela cor. “As nações brasileiras” eram crioula, parda e cabra.
Nos gráficos de 16 a 19 estão discriminadas sob diferentes
denominações (crioula, parda, mulata e cabra) escravas nascidas no Brasil
em contraposição às de “Nação”, isto é, provenientes da África.
Encontramos diferentes definições para os termos crioulo,
pardo ou cabra. Mas, em geral, crioulo era usado para o negro nascido no
Brasil; pardo correspondia ao mulato e era mencionado com os adjetivos
claro e escuro (eram os mestiços de negros africanos e brancos europeus
175
Sobre as etnias encontradas no Nordeste ver FALCI, Miridan Knox, Escravos do sertão. Terezina: Fundação
Cultural Monsenhor Chaves, 1995. Sobre as etnias vindas no tráfico internacional ver : CONRAD, R. E.
Tumbeiros: o tráfico de escravos para o Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
100
e, finalmente, cabra era às vezes, um termo pejorativo utilizado para
escravo de raça mista e incluía possivelmente os cafuzos ou caribocos
(descendentes de africanos e indígenas).
Gráfico 16
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 136 inventários.
Gráfico 17
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 151 inventários.
Origem / Crioula - Anos 50
10%
85%
3%
2%
Parda
Mulata
Crioula
Cabra
Origem / Crioula - Anos 60
18%
77%
2%
3%
Parda
Cabra
Crioula
Mulata
101
Gráfico 18
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 116 inventários.
Gráfico 19
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 38 inventários.
Origem / Crioula - Anos 70
15%
80%
3%
2%
Parda
Cabra
Crioula
Fluminense
Origem / Crioula - Anos 80
32%
6%
57%
5%
Parda
Cabra
Crioula
Mulata
102
Profissões
Embora seja apenas uma amostragem com dados restritos de
inventários por nós analisados, onde nem sempre vinha determinada a
profissão da escrava, estes dados nos dão uma visão da diversidade de
funções, exercidas pelas escravas, a que nos referimos no início do
capítulo.
Além disso, evidencia-se a forte presença da escrava na roça, ou
na lavoura, como às vezes, vem indicado. Apesar da lavoura cafeeira estar
entrando em decadência, na região de Vassouras, nas décadas de 70 e 80,
vemos que nas de 50 e 60 apenas cerca de 30 % das escravas estavam na
lavoura, enquanto nas décadas seguintes 65% das escravas estavam lado a
lado com seus companheiros nas labutas da roça.
Gráfico 20
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 136 inventários.
Profissão - Anos 50
9%
13%
34%
2%
20%
2%
11%
2%
7%
Roça
Cozinheira
Enfermeira
Costureira
Engomadeira
Pagem
Mucama
Rendeira
Lavadeira
103
Gráfico 21
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 151 inventários.
Gráfico 22
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 116 inventários.
Profissão - Anos 60
35%
8%
11%
6%
25%
5%
9%
1%
Roça
Cozinheira
Serv. Domésticos
Lavadeira
Costureira
Mucama
Engomadeira
Enfermeira
Profissão - Anos 70
66%
8%
18%
1%
2%
3%
1%
1%
Roça
Costureira
Pagem
Mucama
Lavadeira
Cozinheira
Serv. Domésticos
Lavoura
104
Gráfico 23
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 38 inventários.
Para reforçar a nossa tese da presença marcante de escravas na
roça, analisamos os elementos do quadro abaixo:
IDADE SEXO
Homens
Mulheres
Total
PROFISSÃO
1.954 1.164 3.118 Serviço de Lavoura
631 1.564 2.195 Serviço Doméstico
Menores de 21
anos
1.274 1.257 2.531 Sem Profissão Declarada
4.671 2.665 7.336 Serviço de Lavoura
1.118 1.393 2.511 Serviço Doméstico
De 21 a 60
anos
05 04 09 Sem Profissão Declarada
38 51 89 Serviço de Lavoura
Maiores de 60
anos
37 07 44 Serviço Doméstico
TOTAL
9728 8105 17833
Fonte: “O Vassourense”, ano III, nº. 30, 27-07-1884.
Profissão - Anos 80
65%
4%
13%
3%
9%
6%
Roça
Cozinheira
Serv. Domésticos
Lavadeira
Costureira
Mucama
105
Encontramos, em relação ao total de escravos:
Serviço doméstico 4.750 dos quais 63% são mulheres
Serviço da roça 10.543 dos quais 37% são mulheres.
Mas se considerarmos os números absolutos em relação às
mulheres, encontramos no serviço da roça 3.880 contra somente 2.964 no
serviço doméstico, o que mais uma vez confirma a nossa tese de que
grande número de escravas labutava na roça.
Quanto aos dados referentes à profissão, não podemos ignorar
as palavras de Bridget, que nos alertam quanto a precariedade desses
dados, para serem trabalhados estatisticamente, no caso das mulheres em
geral e das escravas em particular:
“...a coleta de dados mais completos e informativos sobre
o papel do trabalho das mulheres encontra sua maior
dificuldade na definição usada para o trabalho... os Censos
não espelham a realidade quanto às atividades da mulher
pois estas são consideradas desocupadas desde que não
remuneradas, dentro de negócios da família, as que
trabalham nas áreas rurais, além de outros casos.
Assim, as conclusões não podem ser baseadas apenas em
números, mas, precisam ser alicerçadas na evidência
histórica e na literária, além dos documentos
consultados”.
176
Faixa Etária
Com os elementos apurados nos 441 inventários já referidos,
elaboramos os gráficos de nº 24 a 27 sobre faixas de idade. A estrutura
da população denota, de saída, uma população muito jovem,
observando-se que 30% têm de 0 9 anos. Por outro lado, percebe-se
176
BRIDGET, HILL. Para onde vai a história da mulher? História da mulher e história social juntas ou separadas? In
Varia História Belo Horizonte, nº 14, Set/95, P.61 66.
106
que a população morria cedo, pois nos patamares superiores a 50 anos só
existiam 8% de escravos. Esta estrutura de população não confirma
outras encontradas nos estudos relativos ao Piauí, São Paulo e Rio de
Janeiro.
177
Gráfico 24
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 136 inventários.
Gráfico 25
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 151 inventários.
177
Sobre população do Piauí ver FALCI, M. B. Knox. Escravos do sertão. Terezina: Fundação Cultural
Monsenhor Chaves, 1995. São Paulo, MARCÍLIO, Maria Luiza. População e sociedade - Evolução das sociedades
pré-industriais. Petrópolis: Vozes, 1984. e Rio de Janeiro, KARASCH, Mary C. A vida dos escravos no Rio de
Janeiro 1800/1850. São Paulo, Companhia das letras, 2000.
Idade - Anos 50
29%
17%
21%
16%
9%
4%
3%
1%
De 00 a 09
De 10 a 19
De 20 a 29
De 30 a 39
De 40 a 49
De 50 a 59
De 60 a 69
De 70 a 79
Idade - Anos 60
25%
20%
19%
21%
10%
4%1%
De 00 a 09
De 10 a 19
De 20 a 29
De 30 a 39
De 40 a 49
De 50 a 59
De 60 a 69
107
Gráfico 26
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 116 inventários.
Gráfico 27
Fonte: CDH da USS. Levantamento feito através da análise de 38 inventários.
Idade - Anos 70
16%
14%
16%
11%
21%
19%
1%
2%
De 00 a 09
De 10 a 19
De 20 a 29
De 30 a 39
De 40 a 49
De 50 a 59
De 60 a 69
De 70 a 79
Idade - Anos 80
15%
12%
26%
13%
14%
13%
6%
1%
De 00 a 09
De 10 a 19
De 20 a 29
De 30 a 39
De 40 a 49
De 50 a 59
De 60 a 69
De 70 a 79
108
Esta estrutura etária, com a presença maciça de crianças com
menos de 9 anos, numa época em que o tráfico de escravos adultos ainda
era comum, é um dado novo na demografia histórica escrava; difere de
várias outras abordagens como a de Maria Luiza Marcilio e de Stanley
quando afirmam que havia pouca reprodução interna entre os escravos:
as mulheres não tinham filhos, mesmo porque (sexo ratio) havia uma
desproporção entre os sexos, havendo muito mais homens.
Ainda com base no quadro citado podemos, quanto à idade,
observar que na faixa acima de 60 anos as mulheres aparecem em maior
número que os homens no serviço rural (38 Homens para 51 Mulheres)
mas no serviço doméstico essa posição se inverte (37 Homens para 07
Mulheres). Esta faixa é pouco representativa do trabalho escravo, talvez
porque a vida ativa dos cativos, como já dissemos antes, era relativamente
curta, dadas as suas precárias condições de vida, e as escravas domésticas
já teriam alcançado a sua alforria.
Procurando levantar alguns dados sobre o valor das escravas
utilizamos a ficha de levantamento de dados nº 02, fizemos a relação de
44 fazendas existentes em Vassouras, com sua situação nos inventários,
encontrados no CDHUSS, onde observamos uma predominância do
número de homens sobre o de mulheres escravas em todas as fazendas
relacionadas, exceto na Santa Mônica em que estão registradas 25
mulheres para 21 homens.
109
Fazendas
Local
Ano do
Inventário
Mulheres
Escravas
Homens
Escravos
Valor das
Mulheres
Valor dos
Homens
Bela Vista Vassouras 1860 20 39 23900$000 54100$000
Boa
Esperança
Vassouras 1860 73 89 78500$000 113350$000
Boa Sorte Vassouras 1855 42 72 36500$000 68270$000
Boa Vista Vassouras 1852 29 41 14370$000 24200$000
Boa Vista Vassouras 1857 12 27 10550$000 36650$000
Boa Vista do
Mato Dentro
Vassouras 1848 38 97 20050$000 48320$000
Cabarú Vassouras 1857 30 50 49000$000 78700$000
Cachoeira Vassouras 1866 45 130 24650$000 102900$000
Cachoeira Vassouras 1877 30 43 36400$000 55950$000
Cachoeira Vassouras 1851 31 111 17000$000 52050$000
Cachoeira Vassouras 1864 123 190 105000$000 183700$000
Cachoeira Vassouras 1869 118 183 95000$000 194500$000
Cachoeira Vassouras 1844 61 94 30720$000 48806$000
Cachoeira Vassouras 1871 41 55 27600$000 49500$000
Cachoeira Vassouras 1886 26 36 12675$000 21800$000
Cachoeira Vassouras 1855 24 50 22800$000 51250$000
Cachoeira Vassouras 1869 64 121 56600$000 115050$000
Cachoeira Vassouras 1841 66 83 27440$000 42064$000
Cachoeira
Bonita
Vassouras 1861 43 56 51900$000 81500$000
Cachoeira
Bonita
Vassouras 1850 71 197 35550$000 98230$000
Cachoeira
das Pedras
Brancas
Vassouras 1844 38 90 20720$000 52550$000
Conceição Vassouras 1844 21 42 9330$000 18000$000
Cruzes Vassouras 1875 43 63 46500$000 100600$000
Encantos Vassouras 1847 53 116 26230$000 66390$000
Freguesia de
N. S. da
Conceição do
Alferes
Vassouras 1841 70 382 19260$000 121150$000
Guache Vassouras 1854 22 38 13075$000 24825$000
Japão Vassouras 1843 38 54 16300$000 23120$000
Mato Dentro
Vassouras 1857 44 61 44600$000 78110$000
Monte
Alegre
Vassouras 1862 224 285 234500$000 418350$000
Palmas Vassouras 1855 87 93 29750$000 44880$000
Pau Grande Vassouras 1848 85 146 29370$000 53370$000
Pau Grande Vassouras 1863 110 120 69050$000 84850$000
Pindabas Vassouras 1846 136 304 69650$000 166930$000
Retiro Vassouras 1850 41 76 22610$000 40170$000
Ribeirão Vassouras 1841 12 48 5650$000 23500$000
Sant’Ana Vassouras 1870 74 73 53600$000 60550$000
110
Santa Mônica
Vassouras 1844 25 21 13960$000 12140$000
Santo
Antonio
Paraíba 1864 35 47 40250$000 47850$000
Santo
Antônio
Vassouras 1846 4 11 2060$000 6160$000
São Bras Vassouras 1874 20 58 27450$000 52510$000
São
Fernando
Vassouras 1879 46 91 47320$000 112400$000
São
Francisco
N. S. da
Conceição
1872 28 69
25100 $000
85700$000
São
Francisco
N. S. da
Conceição
1886 12 46 5355$000 26330$000
São Jose dos
Nogueiros
Massamba-
1878 63 67 52200$000 90600$000
Total 2318 4165 1.700.395$000
3.331.925$000
Fonte: Levantamento cedido por Flávio Guerra, Aluno do Programa de Mestrado em História da USS.
Tomando-se o valor total dos 4.165 escravos 3.331.925$000 e
o das 2.318 escravas 1.700.395$000 encontramos o valor médio de
799$000 para os homens e 776$000 para as mulheres.
178
Entre as hipóteses que levantamos figura a de maior valia da
mulher escrava por sua múltipla capacidade de trabalho. Entretanto, não
encontramos elementos suficientes para confirmar essa hipótese. Ao
contrário, em nossas leituras encontramos elementos para apoiar o menor
valor da mulher em sua condição de escrava, principalmente quando do
trabalho da roça.
Embora não seja referente a Vassouras (região cafeeira), não
podemos ignorar, houve quem aventasse a hipótese de que a preferência
por empregar mulheres nos engenhos, em tarefas de risco, se devia ao
fato de poderem ser adquiridas por menor preço.
178
Utilizamos este índice - valor médio, como referencial explicativo, embora saibamos que no preço do
escravo estão embutidas outras variáveis: idade, condição de saúde, profissão, etc.
111
Encontramos em Antonil:
“...assim os escravos como as escravas se ocupavam do
corte da cana; porém, comumente os escravos cortam e as
escravas amarram os feixes”.
179
Mas, ao falar do trabalho na moenda, é relatado adiante:
“...o lugar de maior perigo que há no engenho é o da
moenda, porque , se por desgraça a escrava que mete a
cana entre os eixos, ou por força do sono, ou por cansaço,
ou por qualquer outro descuido, meteu desatentadamente
a mão mais adiante do que devia, arrisca-se a passar moída
entre os eixos, se não lhe cortarem logo a mão ou o braço
apanhado, tendo para isso junto da moenda um fação, ou
não forem tão ligeiros em fazer parar a moenda”.
180
Confirmando esse fato, Mott diz taxativamente:
Nos engenhos eram as mulheres que colocavam a cana-de-
açúcar para moer e que tiravam os bagaços. Essa atividade
era bastante perigosa pois, devido ao longo tempo de
serviço, as escravas podiam cair no sono e ter as mãos
decepadas. Será que a escolha de mulheres para este
serviço não estaria relacionada a seu menor valor?
181
Mott escreve, ainda, que:
“O menor valor na hora da compra, a possibilidade de
executar múltiplas atividades e a necessidade de certa
proximidade física foram algumas das razões que as
mulheres sós e chefes de família escolherem escravas para
seu serviço”.
182
179
ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil. São Paulo: EDUSP, 1982, p. 112.
180
Idem.
181
MOTT, op, cit. p. 23.
182
Idem.
112
Também Viotti afirma:
“...o preço das mulheres embora inferior ao dos homens,
cresce imediatamente após a cessação do tráfico , o que
sugere maior interesse pela reprodução da força de
trabalho escravo a partir da interrupção do tráfico. Na
década de 1870, no entanto, a diferença entre o preço do
trabalhador feminino e masculino cresce novamente a
favor do escravo masculino. Essa inversão pode ser
atribuída aos efeitos da Lei do Ventre Livre”.
183
Com relação à afirmação de Viotti, o desinteresse pelo
“potencial reprodutivo” da escrava tinha seu alicerce no fato de que o
“potencial produtivo” da escrava na roça era bem mais valorizado. Isto
porque, do ponto de vista econômico, sustentar “crias das escravas” até
serem produtivas ficava mais caro que a compra de um escravo. Assim,
além de não terem as condições mínimas necessárias durante a gestação,
como já dissemos antes, eram levadas à prática de aborto e infanticídio
como uma forma de resistência ou, ainda, como publicado no jornal:
“...a escrava mata o filho antes de nascer, ao nascer ou no
berço, para poupar à sorte miseranda que o aguarda; mata
o escravo querido para lhe dar a única alforria a que pode
aspirar”.
184
Assim, o que encontramos como elemento para maior valia não
foi a sua capacidade múltipla de trabalho, mas a sua condição de
“reprodutora” para aumentar o contingente de escravos quando se tornou
difícil obtê-los pela compra, já que havia sido proibido o tráfico.
Agassiz nos dá a sua visão do trabalho nas fazendas de café,
assegurando mais uma vez, a presença da mulher nos trabalhos da roça:
183
COSTA, Emília Viotti da. Da senzala à colônia .São Paulo. Ed. UNESP. 1998, p. 50.
184
Diário do Rio de Janeiro, de 19-07-1871.
113
“Era a época da colheita e o espetáculo que tínhamos
diante dos olhos era verdadeiramente pitoresco. Os pretos,
homens e mulheres estavam espalhados pela plantação,
trazendo às costas amarradas às suas roupas uma espécie
de cesto feito de caniços e bambus. Dentro dele é que
amontoavam os grãos de café, uns vermelhos e brilhantes
como cerejas frescas, outros já ressequidos, e, de quando
em vez, alguns ainda verdes, não de todo maduros mas
não devendo tardar em amadurecer sobre o solo abrasado
do terreiro. (...) Cada qual deve uma quantidade certa de
trabalho: tanto por homem, tanto por mulher.
185
Esta afirmação mostra que nos últimos anos da escravidão as
mulheres escravas lidavam com o eito de igual para igual com os
homens.
185
AGASSIZ, Luís e Elizabeth. Viagem ao Brasil (1865/1866) São Paulo: Cia Ed Nacional, 1938. P. 157.
Pequeno descanso da dura labuta, com seus cestos de col
heita de café
Fonte: FERNANDES Jr., Rubens; LAGO, P. C. O século XIX na fotografia brasileira. Rio de
Janeiro: Ed. Francisco Alves, 2000. p. 134.
114
“A Cozinha na roça”. Victor Frond.
Fonte: FERNANDES Jr., Rubens; LAGO, P. C.
O século XIX na
fotografia brasileira. Rio de Janeiro: Ed. Francisco Alves, 2000. p. 134.
115
CONCLUSÃO
Apesar do título dessa dissertação “Da Casa e da Roça: a mulher
escrava em Vassouras no século XIX” não nos ativemos, apenas, a
elementos específicos dessa região, pois ficou evidente a semelhança de
procedimentos e acontecimentos nas outras regiões em que reinou o
sistema escravista; mas estamos conscientes de que não se deve
generalizar os fatos no tema escravidão, pois há peculiaridades que não
podem ser ignoradas. A escravidão no Brasil tomou formas e proporções
diferentes, se considerarmos as épocas e as diversas regiões brasileiras.
As hipóteses levantadas nesta dissertação são, sem dúvida, tema
polêmico. O novo enfoque historiográfico e a visão multidisciplinar
favoreceram a ampliação das áreas de investigação histórica, havendo,
ainda, muito a pesquisar antes que se possa chegar a conclusões
definitivas sobre os pontos aqui enfocados. Entretanto, algumas
considerações sobre a escravidão podem ser feitas com base nas obras
existentes, quer de historiadores, quer de literatos, e nos documentos do
Centro de Documentação Histórico (CDH) da Universidade Severino
Sombra, por nós analisados, como: testamentos, inventários, processos-
crime e cartas de liberdade. Muitas vezes, a partir deles, foi possível
rastrear outros registros que compuseram o material empírico, a partir do
qual construímos esta dissertação.
O cruzamento dos dados foi capaz de revelar, no decorrer de
nossa pesquisa, inúmeras contradições entre os enfoques de diferentes
autores. Vejamos:
116
Houve quem defendesse o “mito” do escravocrata brasileiro
mais benigno do que o de outras nações e quem discorresse sobre as
atrocidades cometidas por senhores e “sinhás”, estas muitas vezes mais
“sádicas” que os próprios feitores, quando sob o impacto do ciúme.
“Quanto mais feias, melhor” era o critério das esposas de fazendeiros na
escolha das escravas para serviço doméstico. Ou, ainda, nas palavras de
Chiavenatto, “a exploração dos senhores ia tão longe que sequer se
davam ao trabalho de alimentar seus escravos”.
186
A imagem feminina da “Mãe Preta”, que muitos
“sinhozinhos” carregavam pelo resto da vida, pois haviam sido
amamentados e acarinhados pela preta escrava, que lhes havia ensinado a
andar, e a contraparte masculina do “Pai João”, ambas figuras doces e
pacatas, em contraposição com Marianna Crioula, Zumbi, Manuel
Congo, paradigmas da rebeldia.
187
Um dos aspectos, também enfocados pelos estudiosos do
regime escravocrata, é o da ausência da Justiça, só tenuamente presente
nos últimos decênios do século XIX, talvez em decorrência da pressão
exercida pelos movimentos abolicionistas, que levaram a uma mudança
de opinião pública sobre a escravidão: antes aceita como “natural”,
passou a ser execrada, alvo de ataques nos periódicos da época. A
violência existiu, os castigos eram muitas vezes extremamente
desumanos, apesar de alguns contestarem esse enfoque. Mais um aspecto
que não pode ser generalizado pois nem todos os senhores eram assim
tão cruéis.
188
186
Ver FREYRE, Gilberto. Casa Grande e senzala.
187
Sobre este debate ver REIS, João Negociação e conflito.
188
PENNA, Eduardo Epiller. Pajens da casa imperial. Ed. Unicamp, Campinas, 2001.
117
Outro aspecto que desperta estranheza é a aquiescência do
clero, o apoio deste à escravidão no Brasil, até mesmo em seu aspecto
violento, levando Viotti a dizer que a igreja católica no Brasil Colonial
tinha uma visão de organização de classe estática, além de sacramentar as
desigualdades sociais, e segundo essa visão “Providencial”, “os senhores
nasciam senhores e os escravos para serem escravos”.
Durante o século XIX, até 1888, o escravo era um “bem” e,
portanto, “coisa” que podia ser manipulada segundo a vontade de seu
proprietário como evidenciam, claramente, os termos encontrados em
alguns testamentos: “terras e escravos são os bens que possuo”.
Embora não possamos generalizar esse procedimento, isto é, o
tratamento do escravo como “coisa”, não podemos ignorar que ele foi
assim encarado por muitos proprietários, sendo a situação do negro
escravo bastante precária e, ainda mais, a da escrava, pois nem mesmo a
Igreja levantava a voz para defender a cativa.
Outro ponto polêmico é o que diz respeito à passividade do
escravo. Esta, aceita por alguns, foi contestada por muitos que
retrataram, além das reações sub-reptícias, no desempenho das atividades
domésticas, e no trato com as “sinhás”, a resistência passiva, também as
formas extremas de resistência, quer individuais(as fugas que eram uma
constante no noticiário dos jornais da época, os suicídios e os
assassinatos), quer coletivas (na forma de levantes, rebeliões e formação
de quilombos).
Carlos Lacerda, sob o pseudônimo de Marcos, em seu livro “O
quilombo de Manuel Congo”, estabelece, poeticamente, uma conexão
entre as “vozes da escravidão” e as “ vozes dos oprimidos de todos os
tempos”.
118
Assim se expressa ele:
“Teus gritos serão ouvidos porque tua voz não morreu,
não morrerá. Dentro dos tempos ela estará como um eco.
Ela é a voz dos oprimidos, dos explorados de todo o
mundo. É a voz das senzalas, é a voz das fábricas, a voz
dos torturados e dos humildes, dos tristes e dos famintos.
A voz que vai crescendo e há de emudecer os opressores”.
Cabe ressaltar que encontramos, também, as mulheres
desempenhando papel relevante no aspecto “rebeldia contra o cativeiro”.
E isto não só através da “resistência passiva”, numa reação individual,
mas nas reações coletivas, na organização de fugas e quilombos, como se
constata nos processos-crime de insurreição.
Aliás, foi sob esse aspecto de “criminosas” que encontramos
uma das poucas vezes em que a escrava era beneficiada precisamente por
sua condição de mulher. O capítulo das penas do “Código Criminal do
Império” revelava distinção na aplicação de sanções dirigidas ao homem
e à mulher, pois determinava que as mulheres escravas não podiam
sofrer pena de morte e, se estivessem grávidas, nem mesmo a de galés.
189
Quanto às funções exercidas pelas escravas, ponto central
dessa dissertação, ficou evidenciada a amplitude e a diversidade que essas
funções abrangeram. Ficou comprovado que a negra escrava prestou
serviço, quer no interior dos casarões, urbanos ou campestres, como
mucamas, amas-de-leite, cozinheiras, lavadeiras, costureiras, prostitutas,
quer no campo, nos mais diversos trabalhos na roça, capinando,
roçando, plantando, colhendo, além de outras funções menos
189
SOUZA, Maria Cândida Gomes de. In: PINAUD, João Luis Duboc. Insurreição Negra de Justiça. Rio de
Janeiro: Expressão e Cultura, 1987. p. 113.
119
corriqueiras, ou, ainda, como vendedoras dos produtos resultantes de seu
trabalho no eito, as ditas “negras de tabuleiro”.
Nos gráficos, baseados em dados estatísticos, ficou bem
documentada a presença da mulher escrava nos trabalhos do campo, às
vezes até a sua predominância sobre os outros setores.
Com relação à hipótese de maior ou menor valia da negra
escrava, vimos que quase nada se pode afirmar, em geral, pois o seu valor
estava condicionado às condições físicas, à idade e , também, dependia
do período enfocado, quando era maior ou menor a escassez de
“braços” disponíveis para o trabalho.
Até mesmo a sua condição de “reprodutora” não deu a ela
melhor “status”, pois alguns proprietários achavam que a sua “cria”, até
chegar à idade de estar capacitada para o trabalho, era mais onerosa que a
compra de um escravo. Somente a interrupção do tráfico de escravos, e
o rápido crescimento das plantações de café, levaram o fazendeiro a
reformular esse enfoque, pois o preço dos escravos aumentou
vertiginosamente, o que levou Viotti a dizer: “O tráfico interno ofereceu
uma solução temporária, mas a auto reprodução dos escravos não podia
satisfazer a demanda imediata”.
190
Uma das peculiaridades a que já nos referimos é a inesperada
quantidade de escravas na faixa de idade de 0 a 09 anos, nos dados
levantados nos inventários do CDH USS referentes à região de
Vassouras nas décadas de 50 e 60.
Nessa região, parece-nos, não prevalecia a opinião de que a
criação do escravo era mais onerosa do que a compra de um escravo.
Embora não seja objetivo de nossa dissertação uma ampla análise
190
COSTA, Op. cit., p. 226.
120
demográfica da população escrava encontrada nos inventários, uma
observação geral levou-nos a especular algumas características dessa
população feminina.
Em primeiro lugar observa-se um grande predomínio da
população infantil nas décadas de 50 e 60. Nas décadas de 50 e 60, cerca
de 45% da população escrava feminina tinha idade até 20 anos.
Percentuais um pouco menores se encontravam nas faixas entre 20 e 40
anos (entre 30 e 40%) e depois dessa idade a população feminina
diminuia acentuadamente.
A grande percentagem de crianças e adolescentes nos leva a
deduzir que havia uma acentuada natalidade na escravaria de Vassouras,
fato que a maioria dos autores da década de 70 e 80 negava. O célebre
trabalho de Gorender (O Escravismo colonial), o trabalho de Maria
Luiza Marcílio sobre dinâmica populacional
191
, onde ela analisa e
classifica os sistemas demográficos encontrados no Brasil entre os livres
e os escravos, a tese de Slenes, defendida em Standford em 1975 e nunca
publicada no Brasil
192
, apontam no sentido de que os escravos no Brasil
não se reproduziram.
Todos esses estudos advogam a tese de que havia um pequeno
número de mulheres nos engenhos e nos cafezais e que por isso a
população escrava não se reproduzia. No entanto, na década de 90,
trabalhos feitos com grande material empírico, encontrado nos arquivos,
como os do Prof. Iraci del Nero da Costa, Francisco Vidal Luna,
Roberto Borges Martins, Renato Marcondes, Miridan Knox Falci e do
191
MARCILIO, Maria Luíza. População e Sociedade Evolução das Sociedades Pré-Industriais. Petrópolis: Vozes, 1984.
192
SLENES. The demography and economics of Brazilian Slavery: 1850-1888. Standford: Dep. of History, Standford
University, PHD, 1975.
121
próprio Slenes mostraram que as evidências apontadas nos trabalhos
anteriores não estavam totalmente corretas.
Segundo vários estudos desses autores, os escravos, no Brasil,
apresentaram alta natalidade. Reproduziram-se de maneira similar à
população branca. O que invalidava o crescimento daquela população era
o trabalho excessivo, os deslocamentos territoriais através das vendas
para outros senhores e as condições sub-humanas de vestuário,
habitação e alimentação. Assim, a mortalidade infantil era superior à
encontrada entre as crianças brancas. Por outro lado a mortalidade geral
era também superior à dos brancos.
Essas nossas percentagens vêm se somar ao quadro das
pesquisas feitas por aqueles autores. Nas décadas de 70 e 80 observa-se
uma diminuição da população infantil e adolescente, fato explicável pela
Lei do Ventre Livre. Nota-se também um envelhecimento da população
escrava feminina, principalmente na década de 70. Cerca de 40% da
população feminina escrava tinha entre 40 e 60 anos o que invalidava a
reprodução natural.
Na década de 80 os padrões de população infantil e
adolescente perduram iguais aos da década de 70, mas a população adulta
feminina é bem menor. Podemos lembrar uma mortalidade mais
acentuada, um sub-registro ou a atuação (a partir de 1886) da Lei dos
Sexagenários.
Uma conclusão que tiramos da análise dos gráficos 23, 24, 25 e
26, por faixas etárias, foi a de que, no auge do desenvolvimento do café,
na região de Vassouras, foi a população feminina apta, sob o ponto de
vista de capacidade de trabalho, que forneceu sua força e energia para o
levantamento daquela economia e da região. Foi uma população jovem e
122
operosa que forneceu aos senhores de Vassouras as condições do seu
florescimento e riqueza.
Entre as considerações gerais pode-se incluir a de que “a
escravidão do negro foi a fórmula encontrada pelos colonizadores
europeus para o aproveitamento das terras descobertas”
193
e que a
relação criada entre as condições sociais do regime escravista e o trabalho
trouxe para este uma conotação bastante negativa. Muito já foi escrito
sobre este sentido desqualificador da escravidão sobre o trabalho de
maneira geral. Entre os males perniciosos que perduram está o
preconceito, não apenas quanto à cor, mas quanto à depreciação do
trabalho. Isto porque ser livre numa sociedade escravista seria
basicamente não trabalhar ou, seja, viver de rendas. O trabalho era
considerado desonroso por ser demonstração de pobreza. Daí as
expressões pejorativas que, infelizmente, até hoje são ouvidas. Ao
mesmo tempo que degradou o trabalho, a escravidão corrompeu as
relações entre os homens. Até nossos dias, o “gênero”, a “raça” e a
“condição social” se encontram no ranço deixado pela escravidão,
principalmente em relação ao trabalho.
Em se tratando de escravidão e do papel exercido pela negra
escrava na sociedade escravista do século XIX, não se pode esquecer o
quanto ela concorreu para a formação do povo brasileiro através da
miscigenação. O português, segundo se pode observar dos escritos sobre
essa época, não possuía nenhum preconceito quanto ao ato sexual, quer
com nativas, quer com a negra africana. Misturava-se aos dois povos tão
diferentes, o nativo e o africano, dando origem aos mestiços mamelucos,
193
COSTA, Op. cit. p. 226.
123
cruzamento do branco com a mulher nativa, e dos mulatos, resultantes
do branco com a negra africana.
Na análise dos documentos existentes no Centro de
Documentação Histórica da USS, representado pelo acervo cartorário e
eclesiástico do Vale do Paraíba Vassouras, encontramos inúmeros
casos de reconhecimento de filhos do testador com suas escravas. Além
dos citados no capítulo referente à liberdade, temos o testamento de
Pedro Corrêa e Castro, Barão do Tinguá,
194
que entre outras cláusulas,
reconhece sua ex-escrava como “mãe de minha família” e seus seis
filhos, cinco “femias” e um “macho”.
Desse convívio nasceram heranças no vocabulário, na
alimentação, na música, nas cantigas de ninar, na religião ... que , embora
diluídas no decorrer do tempo, deixaram suas marcas na vida do
brasileiro.
Em nossas pesquisas, encontramos, também, como um dos
esteriótipos mais divulgados, a propalada inferioridade da raça negra. No
entanto, segundo se depreende dos fatos estudados, na realidade, os
negros, como os índios, foram submetidos a um processo de
“desculturação”, de aniquilação de suas culturas primitivas. E, até
mesmo, de um processo de “desumanização”, ao serem tratados como
“coisa”, considerados “boçais” e só depois “reumanizados”, ao se
converterem em “ladinos”, com o aprendizado da língua do “ senhor”,
seu proprietário.
Entre as peculiaridades, a que nos referimos no início, está a
dificuldade dos fazendeiros da região de Vassouras em aceitar a real
194
CDH. USS. Título: Testamento, ano 1865, caixa 242, documento, esse, objeto de um artigo do “Jornal do
Brasil”, de 30/09/2000, sob o título “Páginas que o Tempo Esqueceu”.
124
precariedade da situação da mão-de-obra escrava nos últimos decênios
do século XIX e agir como em outras regiões, substituindo ou pelo
menos complementando o trabalho escravo com os trabalhadores livres,
os colonos.
Antes de encerrar esta dissertação, queremos esclarecer que,
dentro do período enfocado, trabalhamos quatrocentos e quarenta e um
(441) inventários dos quais selecionamos aqueles que relacionavam um
número significativo de mulheres escravas e que forneciam dados sobre
a função por ela exercida.
Além desses inventários, analisamos outros, relacionando
quarenta e quatro fazendas dos quais consideramos os elementos que
interessavam as nossas pesquisas: ano do inventário, número de escravos
(homens e mulheres) e valores correspondentes, bem como vinte e uma
cartas de liberdade, e diversos processos-crime (furtos, roubos, ofensas
físicas, assassinatos, fugas e diferentes rebeliões envolvendo escravas),
todos documentos do Centro de Documentação Histórica da USS.
Concluindo, tornamos a observar que há muito ainda a ser
pesquisado para que possamos ter uma visão historiográfica mais
completa sobre escravidão da mulher no Brasil. Certamente, muitos
conceitos cairiam por terra e outros surgiriam propiciando uma nova
visão, o que certamente modificaria de forma significativa a história da
sociedade brasileira e, especialmente, a de Vassouras, durante o período
da escravidão.
Apesar de problemas materiais, foi possível reunir certas
informações e reflexões que parecem mostrar a riqueza do caminho
proposto e seguido. Valeu a pena.
125
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
I. FONTES PRIMÁRIAS:
Arbitramento:
1. 1º ofício, caixa 02, ano: 1878, partes: Margarida (escrava) e Júlia Maria
Damasceno.
2. 1º ofício, caixa 02, ano: 1878, partes: Philomena (escrava) e João
Batista de Almeida Werneck e esposa.
3. 1º ofício, caixa 02, ano: 1879, partes: Cecília (escrava) e José Maria R.
Moreira.
4. 1º ofício, caixa 02, ano: 1882, partes: Leocádia (escrava) e José de
Souza Werneck.
5. 1º ofício, caixa 02, ano: 1883, partes: Mônica (escrava) e Henrique
Gaspar Laemeyer.
Defloramento:
1. Caixa nº 454, ano: 1883, partes: Estevão Teixeira da Silva (réu) e
Francisca, menor (vítima).
Furto de Escravos:
1. 1º ofício, caixa nº 227, ano: 1875, partes: José Maria Carneiro e sua
escrava Rita (réus) e Ignácio Rodrigues de Souza (autor).
Homicídio:
1. Caixa nº 231, ano: 1884, partes: Manoel Alves Moreira (réu) e
Gerôncio, escravo (vítima).
126
Libelo Cível de Rescisão de Venda de Terra:
1. 1º ofício, caixa 186, ano: 1880, partes: Felizardo José Tavares e esposa
e Veríssimo José Machado (réu).
Liberdade:
1. 1º ofício, caixa 190, ano: 1875, partes: Theodora, escrava e Manoel
Antonio de Mello.
2. 1º ofício, caixa 190, ano: 1875, partes: Augusta, parda e Maria
Laureana de Jesus Torres.
3. 1º ofício, caixa 190, ano: 1880, partes: Thereza, Francisca, Lucinda, e
Maria e João Baptista Guimarães.
4. 1º ofício, caixa 190, ano: 1883, partes: Thereza, escrava e Antonio
Lazzarini.
5. 1º ofício, caixa 190, ano: 1883, partes: Suzana, escrava e Luiza
Streche.
6. 1º ofício, caixa 190, ano: 1883, partes: Verônica, escrava e Francisco
Gomes D’Assumpção.
Ofensas Físicas:
1º ofício, caixa 233, partes: Vitória, escrava (ré) e Umbelinda Rosa da
Conceição(vítima).
Periódicos:
1. “O Diário do Rio de Janeiro” 19/07/1871.
2. “O Jornal do Commércio” 01/04/1849
11/07/1875.
127
3. “O Município” 05/06/1877
15/07/1877
18/09/1877
30/09/1877
20/10/1878
07/11/1878
4. “O Vassourense 27/01/1884
23/03/1884
27/07/1884
03/08/1884
24/08/1884
31/08/1884
Sedução:
1. Caixa 237, ano: 1821, partes: Antonio Machado Botelho (réu) e Ana,
escrava (vítima).
Testamentos:
1. 2º ofício, ano: 1853, partes: José Cardoso da Silva (avaliação de bens).
2. Ano 1841, Inventariado Capitão-Mor Manoel Francisco.
3. Ano 1841, Inventariado Luíza Ignâcia da Conceição.
4. Ano 1844, Inventariado Ana Francisca do Nascimento.
5. Ano 1844, Inventariado João Barbosa dos Santos.
6. Ano 1847, Inventariado Joaquina Madildes de Assunção.
7. Ano 1848, Inventariado Manoel Avelar e Almeida.
8. Ano 1851, Inventariado Maria Esméria Teixeira Leite.
9. Ano 1850, Inventariado Francisca Maria dos Santos Werneck.
128
10. Ano 1852, Inventariado Agostinho Pinheiro de Souza.
11. Ano 1854, Inventariado Antônio Sares da Costa.
12. Ano 1855, Inventariado Sabino José da Silveira.
13. Ano 1855, Inventariado Emília Adelaide dos Santos Werneck.
14. Ano 1857, Inventariado Padre Antônio D’Annunciada.
15. Ano 1857, Inventariado Barbara Maria da Conceição.
16. Ano 1859, Inventariado Francisca Pereira Lima.
17. Ano 1860, Inventariado Manoel Vicente de Souza.
18. Ano 1860, Inventariado Ana Balbina Mascarenhas Salt.
19. Ano 1861, Inventariado Caetano de Souza Vieira.
20. Ano 1864, Inventariado Comendador Antônio Corrêa e Castro.
21. Ano 1866, Inventariado Maria Esméria Teixeira.
22. Ano 1869, Inventariado Baronesa do Ribeirão.
23. Ano 1869, Inventariado Comendador Antônio Corrêa e Castro.
24. Ano 1871, Inventariado Thereza Maria Vieira de Andrade.
25. Ano 1875, Inventariado Peregrino Augusto dos Santos.
26. Ano 1877, Inventariado Capitão Hilário Rodrigues de Almeida.
27. Ano 1880, Inventariado Francisca Carolina de Oliveira Tavares.
28. Ano 1883, Inventariado José Ribeiro Leite Zamith.
29. Ano 1885, Inventariado Francisca Gabriela Teixeira de Almeida.
30. Ano 1886, Inventariado Capitão Hilário Rodrigues de Avelar.
31. Caixa 85, ano: 1844, partes: João Barboza dos Santos e Luiza Ignácia
da Conceição.
32. Caixa 88, ano: 1847, partes: Joaquina Mathildes DAssumpção e
Claudio Gomes Ribeiro Dávellar.
129
33. Caixa 91, ano: 1850, partes: Escolástica Candido Ferreira e Luis
Caetano Alves.
34. Caixa 91, ano: 1850, partes: Fernando Luiz dos Santos Werneck e
Jesuina Policena de Oliveira.
35. Caixa 91, ano: 1850, partes: Fernando Luiz dos Santos Werneck e
Jesuina Policena de Oliveira.
36. Caixa 92, ano 1851, partes: José Francisco d’Avila e Francisco José
d’Avila
37. Caixa 92, ano: 1851, partes: Carolina Maria Jesus Corrêa e Laureanno
Corrêa e Castro Jr.
38. Caixa 92, ano: 1851, partes: Maria Luiza Souza e Manoel Vicente
Souza.
39. Caixa 92, ano: 1851, partes: Maria Caetana do Nascimento e Manoel
Caetano de Souza.
40. Caixa 92, ano: 1851, partes: José Maria Salter e Joaquim Mascarenhas
Salter.
41. Caixa 93, ano: 1851, partes: Maria Esméria Teixeira Leite e Francisco
José Teixeira Leite.
42. Caixa 93, ano: 1851, partes: Luiz Barbosa S. Werneck e Rita P. Passos.
43. Caixa 94, ano: 1852, partes: João Vieira Xavier de Castro e Maria
Joaquina Vieira Manso.
44. Caixa 94, ano: 1852, partes: Agostinho P. Souza e Gertrudes M.
Angélica.
45. Caixa 94, ano: 1852, partes: Delfina Laureana de Moura e Antônio
Ferreira Moura.
46. Caixa 94, ano: 1852, partes: Francisco Xavier Corrêa e Antônia Maria
da Conceição.
47. Caixa 94, ano: 1852, partes: Lucidoro Francisco Xavier e Maria
Joaquina do Espírito Santo.
130
48. Caixa94, ano: 1852, partes: José Rouriz Pereira e Francisca Carolina
Borges Pereira.
49. Caixa 94, ano 1852, partes: José Inácio Pereira de Carvalho e Maria
José Oliveira de Carvalho.
50. Caixa 95, ano: 1853, partes: Francisco José M. D’Assis e Domingos
M. Vasconcelos.
51. Caixa 95, ano: 1853, partes: Anna Bernadina Carvalho Leite e João
Evangelista Teixeira Leite.
52. Caixa 95, ano: 1853, partes: Anna Bernadina Carvalho Leite.
53. Caixa 102, ano: 1856, partes: Maria Felisbina D’Assis Furtado e
Joaquim José Furtado.
54. Caixa 103, ano: 1857, partes: Francisca Delfina Soares e Angelo
Marques Soares.
55. Caixa 103, ano 1857, partes: Antônio Soares da Silva e Anna Maria do
Espirito Santo.
56. Caixa 104, ano: 1857, partes: Thereza Jesus Maria e Hermogenes F.
Goulart.
57. Caixa 104, ano: 1857, partes: Ignacia M. Da Penha e Ignacio Gomes
D’Assumpção.
58. Caixa 105, Ano 1858, partes: Bernardo S. Dutra e Maria Luiza S.
Dutra.
59. Caixa 105, Ano 1858, partes: Francisca Maria D’Ávila e Francisco
José D’Ávila.
60. Caixa 106, Ano 1858, partes: Rosa Maria D’Almeida e Lucindo
D’Almeida.
61. Caixa 106, Ano 1585, partes: Joaquim José Teixeira e Jesuína Cândida
Teixeira.
62. Caixa 107, Ano 1859, partes: Francisco V. Pacheco e Lúcia M.
Conceição.
131
63. Caixa 111, Ano 1861, partes: Firmina Leolpoldina Werneck Silva e
Manoel Vicente Pereira da Silva.
64. Caixa 112, Ano 1861, partes: Joaquim de Faria Barros e Luiza
Cândida de Faria Barros.
65. Caixa 115, ano: 1862, partes: Francisco Peixoto de Lacerda
Werneck (1º barão de Paty do Alferes) e Baroneza de Paty do
Alferes.
66. Caixa 116, Ano 1863, partes: Anna Rosa Delfim e José Passos.
67. Caixa 116, ano: 1863, partes: Anna Rosa Delfim e José Fernandes
Passos.
68. Caixa 116, Ano 1863, partes: Francisco de Paula Brito e Maria
Francisca de Paula Brito.
69. Caixa 116, Ano 1868, partes: João Barbosa dos Santos e Felisberta
Balbina D’Avelar Santos.
70. Caixa 120, Ano 1865, partes; João Morreira Serra e Antônio Fernades
Moreira.
71. Caixa 121, Ano 1865, partes: Eleutherio Rodrigues Barboza e Maria
Barboza de Freitas.
72. Caixa 121, Ano 1865, partes: João Vicente de Souza e Francisca Maria
de Souza.
73. Caixa 126, Ano 1867, partes: Francisco da Chagas Werneck e Ana
Izabel de Lacerda Werneck.
74. Caixa 129, Ano 1868, partes: Luiz Gomes Pereira e Anacleta Rosa
Goulart Pereira.
75. Caixa 133, Ano 1869, partes: José da Rocha Goulart e Thereza Maria
Goulart.
76. Caixa 135, Ano 1870, partes: Joaquina Francisca de Jesus e Francisco
Dantas Moreira.
77. Caixa 137, Ano 1871, partes: Paulo Gomes de Avela e Baronesa de
São Luis.
132
78. Caixa 141, Ano 1873, partes: Campo Bello, Baronesa e Cristovão
Corrêa e Castro.
79. Caixa 141, ano: 1873, partes: Campo Bello, baroneza e Cristovão
Corrêa e Castro.
80. Caixa 142, ano: 1869, partes: Anna Izabel de Lacerda Werneck e
Felício Augusto de Lacerda.
81. Caixa 154, Ano 1878, partes: Joana Cândida Ferreira e Quintino
Ferreira da Silva e outros.
82. Caixa 154, Ano 1878, partes: José da Rosa Pereira e Pedro da Rosa
Pereira.
83. Caixa 155, Ano 1878, partes: Luiz Maria Bernnatier e Carlota
Joaquina Bernnatier.
84. Caixa 156, Ano 1879, partes: Ignâcio José de Souza Werneck e José
Ignâcio de Avelar Werneck.
85. Caixa 156, ano: 1879, partes: Ignácio José de Souza Werneck e José
Ignácio de Avelar Werneck.
86. Caixa 157, Ano 1879, partes: José Ferreira Neves e Cândida
Marcondes Neves.
87. Caixa 158, ano: 1880, partes: Ezequiel de Araújo Padilha e
Alexandrina de Araújo Padilha.
88. Caixa 158, Ano 1880, partes: Manoel José da Silveira e Maria Dutra
do Espirito Santo.
89. Caixa 158, Ano 1880, partes: Antônio de Oliveira e Angela Maria do
Nascimento.
90. Caixa 158, Ano 1880, partes: Francisca Carolina de Oliveira Tavares e
José Ignâcio Corrêa Tavares.
91. Caixa 158, Ano 1880, partes: Ezequiel de Araújo Padilha e
Alexandrina de Araújo Padilha.
92. Caixa 159, Ano 1881, partes: Antônia Delfina da Trintade Matos e
Francisco José Garcia.
133
93. Caixa 241, ano: 1859, partes: Thomaz Ferrere (testador)e Mariano
José Coelho (testamenteiro).
94. Caixa 242, ano: 1862, partes: Francisco Xavier dos Santos (testador) e
Cristina Xavier dos Santos Souza ( testamenteiro).
95. Caixa 242, ano: 1863, partes: Capivary, Joaquim Ribeiro de Avelar,
Barão de e Joaquim Ribeiro de Avelar.
96. Caixa 242, ano: 1865, partes: Tinguá, Pedro Corrêa e Castro, Barão do
(testador) e Antonio Agrícola de Fontes (testamenteiro).
97. Caixa 243, ano: 1878, partes: Antonio Francisco Apolinário e Antonio
Botelho Peralta.
98. Caixa 243, ano: 1878, 0-partes: Elias José Guimarães e Maria Roza de
Souza Guimarães.
99. Caixa 243, ano: 1879, partes: Anna Bernardina Moreira e Américo
Brasileiro da Costa Moreira.
100. Caixa 320, ano 1850, partes: Barnabé de Souza Barreto e
Antônio de Souza Barreto.
101. Caixa 320,ano: 1859, partes: José de Souza Vieira e Manoel
Caetano Vieira.
102. Caixa 320, ano: 1859, partes: José de Souza Freitas e Luiza
Maria do Espírito Santo.
103. Caixa 322, ano: 1863/1883, partes: Garibú, Claudio Gomes
Ribeiro de Avelar e Quintiliano Gomes Ribeiro de Avelar.
104. Caixa 326, ano: 1867, partes: Francisco Corrêa e Castro e
Laurinda Vieira Corrêa e Castro.
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