Essas bandas históricas: Afro Mandela e as outras, o seu grupo mesmo com as bandas de
percussão de Salvador que existe na Bahia como Timbalada, Ilê?
Wilson: Esse fenômeno desses grupos aconteceu na década de 90, no comecinho da década de 90
quando teve aquele “bum” do Olodum, e por conta da nossa identidade ter sido tão surrada, né
meu irmão? Porque a gente tem uma identidade cultural fortíssima, sim, ta entendendo? Só que a
nossa identidade foi surrada ao ponto do alagoano ele ficar meio sem nexo mesmo, ele ta meio,
ainda ta um pouco perdido, a gente ta começando a rever e a fazer releituras de algumas coisas
hoje, ta entendendo? Com essa consciência. Essas bandas começaram a surgir, esses blocos afro,
como a rapaziada chamava, por conta do fenômeno Olodum e isso foi bom de certa forma, o
samba reggae do neguinho do samba, o samba do ile aie, aí veio pra cá e tal e a rapaziada se
juntou, em alguns bairros a galera se juntava e fazia uns instrumentos e tal e criava um bloco
afro. Então a cada semana você via um bloco afro surgir na cidade, entendeu. A gente tinha uns
60 blocos afro aqui na cidade. Era muita coisa na década de 90. Foi um fenômeno danado, uma
coisa muito doida. Isso foi uma certa invasão da cultura, permitida, da cultura baiana, afro-
baiana, no nosso território, uma invasão permitida, né? Até por falta, né? Qual era o tambor que a
gente ia tocar, a gente tocava o tambor do candomblé, entendeu, e o tambor do candomblé ele
tinha que ser tocado dentro do terreiro. Ele não ia pra praça, até pelo fato da gente não querer
profanar o tambor mesmo, profanar os toques, os ritmos dos orixás, não era permitido, né velho,
colocar isso na rua. Mas tem uma coisa aqui que a gente pode botar na rua que é o que o Olodum
ta fazendo lá, então vamos botar na rua, aí surgiram, quer dizer, era uma manifestação, uma
possibilidade de manifestação que tava reprimida na época e o Olodum deu a possibilidade do
cara falar: vamos por os tambor na rua e tal. Isso foi bom porque criou de certa forma uma rede e
um elo de discussão, entendeu? Aí você pode juntar percussionistas, né, que tavam parados e
formar outros percussionistas. Então, foi uma possibilidade fomentar uma coisa que tava um
pouco incubada de certa forma, ta entendendo? Essa coisa da percussão no estado de Alagoas,
entendeu. E aí tal, lá vai, só que aí com o tempo o Olodum foi descendo e com o Olodum
descendo, em tese, o sucesso do Olodum foi parando um pouco mais e tal, aquela coisa dos
shows, na televisão toda hora, na mídia pesada. Com isso, os nossos blocos afro também foram,
até porque era uma coisa de momento, não era uma coisa de tradição nossa. E aí esses blocos
afros foram se desfazendo, entendeu? E com esses blocos afros se desfazendo, tipo o afro
Mandela, Axé Zumbi, Afro Zumbi, são dezenas de blocos que a gente pode ta enumerando. Com
esses blocos afros se desfazendo, esses blocos formaram muitos percussionistas que ficaram sem
fazer nada, entendeu. Os caras não tinham mais o que fazer. Vai tocar com o que? Aonde? Pra
quem? Não tem, entendeu? Não tem mais bloco afro, então vende os tambores, se desfaz, tem
muito tambor que ta parado ainda na sede dos blocos e tudo, só que paramos os blocos e de 90,
eu acho que 2000, 2001, começou a acontecer um outro movimento percussivo. A gente ta
começando a criar, tamo buscando, através de alguns percussionistas, uma identidade mesmo,
uma identidade baseada nos ritmos afro tradicionais, os ritmos do candomblé, entendeu? Então,
não é pegar o ritmo de candomblé e profanar e tal. Não é bem isso. É tentar fazer uma releitura de
uma coisa que a gente já tem e tem muito que é uma diversidade incrível, né velho? Se você for
falar de ritmos de candomblé, por exemplo, é uma diversidade incrível que a gente tem dentro
dos terreiros. E se você for falar de ritmos dos folguedos alagoanos, pô, só de folguedos a gente
deve ter uns vinte e nove ritmos distintos, ta entendendo? Então, a possibilidade, a gente tem
possibilidade de criar muito grande, entendeu? Uma possibilidade de criar muito grande. E agora
a gente ta começando a fazer isso, por exemplo, no caso da orquestra de tambores que a gente
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