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FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E FILOSOFIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
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GUSTAVO CAPANEMA, CONCILIAÇÃO E REFORMA NOS ANOS DE 1930
LUIZ CARLOS BENTO
GOIÂNIA
2006
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LUIZ CARLOS BENTO
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GUSTAVO CAPANEMA, CONCILIAÇÃO E REFORMA NOS ANOS DE 1930
Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências
Humanas e Filosofia, da Universidade Federal de
Goiás, como exigência parcial para a obtenção do
título de Mestre em História.
Área de Concentração: Culturas, Fronteiras e
Identidades
Linha de Pesquisa: História, Memória e Identidades
Sociais
Orientador: Noé Freire Sandes
GOIÂNIA
2006
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LUIZ CARLOS BENTO
A EDUCAÇÃO EM LITÍGIO:
GUSTAVO CAPANEMA, CONCILIAÇÃO E REFORMA NOS ANOS 30
Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Humanas e Filosofia, da Universidade
Federal de Goiás, e aprovada no dia _______de _______ 2006, pela Banca constituída pelos
seguintes professores:
______________________________________________________________________
Professor Doutor Noé Freire Sandes (UFG)
_________________________________________________________________
Professor Doutor Antônio Almeida Oliveira (UFU)
_________________________________________________________________
Professor Doutor Élio Cantalicio Serpa (UFG)
_________________________________________________________________
Professor Doutor José Antunes Marques (UFG/FE)
GOIÂNIA
2006
Dedico este trabalho a todas as pessoas que
trabalham e estudam com seriedade, pessoas que
encontram pela frente todos os tipos de obstáculos e
empecilhos sociais, mas que mesmo assim não
desistem e continuam lutando para conquistarem
um direito que muitos desprezam. estes “fortes”,
que passam por situações semelhantes as minhas,
eu dedico o meu esforço.
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Ao longo de minha vida muitas pessoas mereceram e merecem a minha gratidão. Tenho
certeza que nada que eu possa fazer será suficiente para retribuir o apoio e a confiança que
estas pessoas tiveram por mim, mas tenho convicção que honrar e jamais esquecer essa
contribuição é a primeira forma de retribuir.
Primeiramente gostaria de agradecer, minha mãe e meus irmãos pelo apoio, pelo carinho e
pela confiança que sempre tiveram por mim, pois, na medida do possível, meus irmãos e
principalmente minha mãe sempre estiveram dispostos a me ajudar. Agradeço imensamente o
apoio, o respeito e a confiança que meu irmão Divino Bento da Silva sempre me ofereceu ao
longo de minha vida tanto pessoal quanto profissional.
Também gostaria de registrar o meu carinho e o meu agradecimento pelos meus amigos
Sidnei Lopes de Carvalho, Ricardo Iaras, Jean Isídio, Luciana de Fátima Oliveira e Rodolfo
Belchior Fernandes de Paula, pelo apoio e pelas conversas sempre proveitosa que tivemos ao
longo de nossas vidas.
Também gostaria de agradecer o meu grande amigo Divino Costa, que em um momento
difícil me prestou um grande apoio, auxiliando-me financeiramente para que eu pudesse ir
participar da ANPUH de Londrina, uma viagem que me possibilitou adquirir muitos livros
utilizados neste trabalho, sem os quais provavelmente ele ficaria prejudicado. Gostaria de
agradecer também meu padrinho Pedro Gonçalves, pela admiração, dedicação e carinho e de
uma forma muito especial a meu primo Lucimar Antônio dos Santos pela confiança e pelo
apoio em horas de dificuldades.
E também aos professores da UFG, com os quais eu pude aprender muito ao longo destes
anos que estive vinculado a universidade. Agradeço de forma muito especial ao meu
orientador professor Dr. Noé Freire Sandes pelas observações pertinentes, pelo incentivo, pela
autonomia e pelo respeito para com minhas idéias.
Tenho certeza de que muitas pessoas importantes não foram citadas, mas guardo a lembrança
de todas estas pessoas comigo e as levarei para onde quer que eu vá. Jamais poderei esquecer
os sacrifícios que as pessoas fizeram por mim, e é por isso que nunca esquecerei de um
grande homem chamado Afonso Celso, que além de incentivador, foi uma das pessoas que
lutou junto comigo para que eu pudesse ocupar o lugar que era meu por direito entre os
aprovados no vestibular de 1999. Em um dia de desespero, onde as coisas que eu havia lutado
anos para conquistar estavam sendo tiradas de mim pela incompetência de algumas pessoas, o
professor Afonso foi a minha defesa.
A ele e a todas estas pessoas, e muitas outras que não foi possível citar, fica para sempre o
meu respeito, o meu carinho e a minha mais profunda admiração. (Obrigado).
“Estamos sós e sem desculpas. O homem está
condenado a ser livre. Condenado porque o se
criou a si próprio; e, no entanto, livre, por que uma
vez lançado no mundo, é responsável por tudo
quanto fizer. Só podemos contar com o que depende
de nossa vontade ou com o conjunto das
possibilidades que tornam a nossa ação possível.
Fora disso não nenhum deus, nenhuma
humanidade, nenhum partido, nenhum
companheiro que nos possa auxiliar. Ou melhor,
para se atuar dispensa-se à esperança e afirma-se a
nossa responsabilidade para com nós mesmos”.
Jean Paul Sartre
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Esta dissertação, Educação em Litígio: Gustavo Capanema, Conciliação e Reforma nos anos
30, analisa as disputas ideológicas entorno das questões educacionais na era Vargas. O
trabalho visa situar num primeiro momento o processo de institucionalização do poder,
ocorrido no país a partir da crise do liberalismo no final do século XIX, com o intuito de
compreender a ação dos intelectuais neste processo.
A educação é utilizada como uma categoria de analise para se pensar este período, pois
através dela analisamos a atuação destacada de Gustavo Capanema na gestão dos conflitos
ideológicos, travados entre os educadores e intelectuais liberais, vinculados ao movimento da
Escola Nova e os representantes do movimento católico, relacionados ao Centro Dom Vital e
a revista A Ordem. A atuação modernizadora de Capanema nos projetos culturais é
confrontada com a sua atuação conservadora na educação. Em linhas gerais, esta dissertação
pretende analisar o período a partir das categorias “conciliação” e “reforma” que acreditamos
serem representativas deste contexto.
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This dissertation, Education in Litigation: Gustavo Capanema, Conciliation and it Reforms in
the thirties, it analyzes the ideological disputes I spill of the educational subjects in the age
Vargas. The work seeks to place in a first moment the process of institutionalization of the
power, happened at the country starting from the crisis of the liberalism in the end of the
century XIX, with the intention of understanding the intellectuals' action in this process.
The education is used as a category of analyzes to think this period, because through its we
analyzed Gustavo Capanema outstanding performance in the administration of the ideological
conflicts, joined between the educators and liberal intellectuals, linked the movement of the
New School and the representatives of the Catholic movement, related to the Center Dom
Vital and the magazine The Order. The performance innovative of Capanema in the cultural
projects is confronted with your conservative performance in the education. In general lines,
this dissertation intends to analyze the period starting from the categories “conciliation” and
“it reformsthat believed they be representative of this context.
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INTRODUÇÃO................................................................................................................... 09
CAPÍTULO I. ANOS 30: EDUCAÇÃO E POLÍTICA............................................................ 12
1.1. Autoritarismo e Estado............................................................................................. 16
1.2. Os intelectuais como protagonistas poticos........................................................... 22
CAPÍTULO II. A IGREJA EM GUARDA: MODERNIZAÇÃO, REFORMISMO E TRADIÇÃO
CATÓLICA........................................................................................................................ 28
2.1. A Escola Nova e a renovação da educação brasileira............................................... 41
2.2. Conciliação e reforma: reaproximação entre Estado e Igreja no governo Vargas.... 46
2.3. O ensino laico em debate.......................................................................................... 51
CAPÍTULO III. GUSTAVO CAPANEMA E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA.............................. 61
3.1. De deputado a ministro: a trajetória potica de Capanema...................................... 66
3.2. De ministro a missiorio: educação e projeto potico........................................... 78
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................................ 82
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................... 88
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Este trabalho pretende compreender a importância política da educação no
contexto de modernização do Estado brasileiro, no período de 1930 a 1945. Analisar
este período da história brasileira significa mergulhar em um universo marcado por
inúmeras correntes sociais que buscavam formas de se legitimar politicamente. Os
anos 30 foram marcados pelo colapso do liberalismo em várias regiões do mundo. No
Brasil, não foi diferente. A crise do modelo liberal propiciou a reordenação do Estado
por meio da burocratização e verticalização das relações entre Estado e sociedade,
criando um novo sentido para a unidade nacional.
As transformações ocorridas na sociedade foram acompanhadas por
modificações no terreno da política e da educação. Por esta via, a educação se tornou
um espaço privilegiado para a construção de uma linguagem, entendida como cultura,
formadora dos indivíduos para “o novo Estado e a nova sociedade” que se pretendia
construir. A necessidade de formar um “novo homem”, adaptado ao espaço urbano e
portador de um saber técnico-científico, visava suprir as novas necessidades advindas
do processo de modernização.
A partir do contexto acima esboçado, procurou-se, inicialmente,
sistematizar a análise de modo a situar o processo de institucionalização do Estado,
nos anos 30, com base no acompanhamento do debate historiográfico. Nessa direção,
no primeiro capítulo, tratou-se de avaliar a atuação do movimento conservador no
processo de institucionalização do poder, situando a importância do movimento
católico que teve destacada participação na defesa do conservadorismo.
O segundo capítulo tem por objetivo a análise das disputas ideológicas
travadas entre o pensamento conservador católico e as propostas renovadoras
vinculadas ao movimento da Escola Nova. Por fim, no terceiro capítulo, buscou-se
trazer à discussão a formação intelectual e política de Gustavo Capanema, bem como
seus vínculos políticos com parte da elite intelectual, principalmente as figuras de
Francisco Campos e Alceu Amoroso Lima homens de fundamental importância na
trajetória do futuro ministro da educação.
Em relação ao debate em torno da atuação de Capanema, merece destaque a
sua gestão à frente do Ministério de Educação e Saúde Pública. Durante o exercício de
suas funções ministeriais, ele articulou uma aliança política que domesticou a
radicalidade das propostas dos educadores liberais. Esta aliança reforçou o que se pode
chamar de uma síntese conservadora da política brasileira, característica o do
Ministério da Educação, mas do próprio governo Vargas. A atuação conservadora de
Capanema é mediada pela figura do pensador católico Alceu Amoroso Lima, consultor
primordial do referido ministro nos assuntos relativos à educação.
O debate sobre a educação, nesse período, nos permite compreender, com
maior clareza, um fenômeno político que Alcir Lenharo (1996) nomeou como
“sacralização da política”. Para ele, esse fenômeno se expressou pela vitória do
pensamento conservador católico que, impondo as suas convicções políticas no terreno
da educação, garantiu a proeminência do movimento católico leigo na política
brasileira.
Procurou-se analisar o objeto desse trabalho a partir de alguns conceitos centrais
como: memória, história, nação, sociedade, estado, indivíduo e poder. Estes conceitos
aparecem no texto como representações sociais produzidas historicamente no contexto de
redefinição da nacionalidade. Coube ao Estado, nesse processo, atuar no campo das produções
simlicas no que diz respeito à educação, difundindo valores como “amor”, pertencimento e
co-participação na afirmação de um projeto nacional. Com isto, o Estado visava a construção
de uma memória nacional que fosse capaz de afirmar-se hegemônica em todo o país. Essas
representações simlicas tornaram-se indispensáveis ao exercício de hegemonia desse
Estado com força suficiente para permanecer, entre crises, golpes e insatisfações, quinze anos
no poder.
A preocupação principal deste trabalho é refletir sobre a importância conferida a
educação no contexto das disputas poticas dos anos 30, buscando compreender e situar a
importância de Gustavo Capanema como articulador de uma síntese conservadora da
educação brasileira. Síntese que repercutiu fortemente nas poticas de consolidação de um
modelo de Estado centralizado e burocratizado no Brasil.
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ANOS 30: EDUCAÇÃO E POLÍTICA
Neste capítulo, buscar-se-á refletir sobre questões avaliadas como fundamentais
para a compreensão do debate que se instaura em torno do processo de institucionalização do
poder na década de 30. Compartilha-se da idéia de que o Estado que emerge a partir da crise
do liberalismo procurou, por meio da organização e do gerenciamento de projetos poticos de
formação da nacionalidade, uma via para legitimar as suas práticas poticas.
Entre 1930 e 1945, de acordo com Sérgio Miceli, ocorreu no Brasil um processo
de centralização autoritária que redefiniu os canais de acesso e de influência dos interesses
regionais junto ao poder central. A construção desta burocracia estatal alterou
significativamente os mecanismos administrativos e ampliou de forma visível o número de
instituições políticas (MICELI, 1979).
A partir de 1930, sobretudo, depois de 1934, com a nomeação de Gustavo
Capanema para o Ministério da Educação e Saúde Pública, a educação passou a ser o lócus
por excelência dos debates que envolviam os projetos políticos de formação da
nacionalidade, de consolidação do território e da cultura nacional. Nesse contexto, contando
com a atuação de alguns dos maiores intelectuais do período, o Ministério da Educação
promoveu mudanças na forma de conduzir as questões relativas à educação. O significativo
crescimento do mercado editorial, que se fez sentir nos campos de produção de livros
didáticos e de obras literárias, revela uma nova dinâmica política. Dinâmica que englobou os
interesses da indústria cultural associados à ideologia nacionalista.
A fim de abandonar, ainda que parcialmente, as práticas tradicionais do
clientelismo da República Velha, Vargas empreendeu a criação de novos canais de acesso ao
poder e de novas formas de relação com as massas. Ao fazer isto, ele redefiniu as regras do
jogo potico. Entretanto, a eleição marcada para 1938 sinalizava riscos indicando a
possibilidade de retorno dos grupos político que foram depostos durante o período
revolucionário.
O golpe, que resultou na proclamação do Estado Novo, colocou em primeiro
plano o poder dos militares, mas é inegável que, ao lado do forte aparato repressivo, o regime
conquistou enorme capacidade de produção de consensos. O êxito da dominação varguista se
fazia muito mais no nível simbólico do que no nível militar. Esta dominação, baseada em uma
coerção simlica, dependia da criação e da afirmação de uma visão positiva e legitimadora
do Estado, exigindo dos analistas um olhar mais cuidadoso em relação à educação, pólo
estratégico para a consolidação do regime.
Uma característica quase sempre presente em um Estado centralizado é a tentativa
de criar laços sociais de pertencimento, necessários para que os indivíduos se sintam
representados pelo Estado. Neste sentido, a ideologia varguista afirmou-se a partir da
naturalização da potica, característica própria das doutrinas corporativistas. Não se trata de
identificar o regime varguista com o fascismo, embora seja visível a circulação de uma cultura
fascista a partir dos anos 1930. O Estado Novo foi mais do que mera imitação do fascismo,
pois a sua composição heterogênea e as especificidades da sociedade brasileira demarcavam
diferenças essenciais em relação aos modelos europeus.
No contexto político dos anos 30, era fundamental para qualquer grupo potico,
que pretendesse se fixar no poder, conseguir produzir uma legitimidade para sua condição
política. Esta legitimidade consiste no fato de poder impor aos demais indivíduos a
identificação com uma vontade externa, construída a partir de um discurso potico, e não por
relações sociais no interior dos grupos. Essa legitimidade, fundada no discurso potico,
representou uma novidade e ambicionava impor-se em todos os cantos do país.
O objetivo primordial de qualquer arranjo potico, independente de suas
vinculações sociais, é, inegavelmente, obter a hegemonia. As reflexões clássicas de Weber
foram fundamentais para se conceber no plano conceitual a prática que sentido a
dominação. Pensando com base nesse autor, entende-se que a dominação é uma situação de
fato em que uma vontade manifesta, um “mandado” do “dominador(ou dominadores), quer
influenciar as ações de outras pessoas e as influencia de tal modo que suas ações, num grau
socialmente relevante, se realizam como se os dominados tivessem feito do próprio conteúdo
do “mandado a máxima de suas ações no mundo. Para Weber, isto resultaria na
obediência”, algo que é indispensável para a manutenção de qualquer poder de mando e, nos
estados modernos, realiza-se na forma de obediência às leis e ao Estado (WEBER, 1999).
Essa prática, que Weber denomina de organização, entrou definitivamente na
história potica brasileira ao longo dos anos de 1930. Nesse período, o Estado assumiu como
prática a organização sistemática do poder, respaldando essas ações em uma moderna
burocracia estatal, fundamento de sua legitimidade. A efetividade do poder burocrático exigiu
a redefinição de regras, normas e condutas sociais capazes de favorecer a legitimidade de suas
ações.
O Estado varguista buscou construir uma legitimidade para sua situação política
por intermédio da construção de um novo aparato burocrático e de novas formas de relação
com o povo fonte da qual emana a legitimidade de um governo. Seguindo as definições de
Weber, é possível afirmar que este comportamento potico, ocorrido no Brasil nos anos 30, se
deve a uma necessidade geral de todo poder e, até mesmo, de toda oportunidade de vida
que é se auto-justificar de modo a criar um discurso capaz de legitimar-se.
Uma simples observação histórica mostra que, quando existem contrastes de
situações ecomicas entre pessoas, aquele que se encontra em uma situação mais favorável
sente a necessidade incessante de legitimar o poder que o privilegia. Em outras palavras,
estrutura-se a “lenda de que cada indivíduo tem o destino que merece. De acordo com
Weber, se a referida “lenda” não se presta à explicação da realidade histórica desigual,
cumpre, no entanto, o papel de legitimar as diferenças historicamente constitdas.
Em um período marcado pela tentativa de institucionalização burocrática do
poder, um número considerável de intelectuais encontrou condições materiais e institucionais
para conciliar seus encargos no serviço público com seus projetos intelectuais. A
convergência de interesses fez com que, posteriormente, o próprio Estado se tornasse uma
instância decisiva de difusão e consagração de obras produzidas por este grupo de intelectuais
“funcionários” (MICELI, 1979).
A Era Vargas nunca produziu uma doutrina oficial única. No decorrer do Estado
Novo, distintos enfoques poticos partilhavam da mesma matriz ideológica fundada na
proemincia do poder central diante de uma frágil sociedade civil, diagnóstico marcado
pelos movimentos de conciliação e reforma tão presentes na vida potica brasileira
(OLIVEIRA, 1982). Os intelectuais que atuaram na linha de frente da ideologia do regime
transformaram a educação num espaço de poder, disputado tanto por liberais como pelos
distintos setores do pensamento conservador, este representado pela direita católica e pelos
integralistas.
Neste contexto, formula-se a concepção de “cultura brasileira” (MOTA, 1978),
que se constitui em uma rede de produção, distribuição e consagração de bens simbólicos.
Esta rede estava nas mãos de intelectuais que atuavam, direta ou indiretamente, como
ideólogos do regime, instituindo uma relação associativa marcada pelo mutualismo potico.
1.1. Autoritarismo e Estado
Elisa Pereira Reis analisa a constituição da nação como ideologia potica, atenta,
sobretudo, ao processo político republicano. Nessa direção, enfatiza o experimento autoritário
da Era Vargas, cuja característica central residiu na montagem de uma estrutura nacional que
se impôs ao fracionamento característico da Primeira República. Segundo a autora, a
construção da nação, enquanto ideologia potica do moderno Estado nacional, envolve uma
representação ideal da sociedade a ser organizada. Por essa razão, abarca a dimensão
simlica das práticas poticas ordenadoras de um Estado que se fez presente nacionalmente
ao impor ao país uma densa rede burocrática, além de um projeto ideológico fundado na
integração do terririo (REIS, 1988).
Durante o período da Primeira República, o poder do centro burocrático
representava, principalmente, uma afirmação simbólica da ordem blica, uma vez que na
prática a maioria da população continuava a prestar lealdade aos coronéis, detentores privados
do poder. Ou seja, os proprietários rurais mantinham a hegemonia potica sustentada no
mandonismo regional. Isto gerou empecilhos para o desenvolvimento de uma identidade
nacional e de um Estado centralizado no Brasil. A maioria da população não tinha qualquer
identificação com uma unidade territorial mais ampla do que os domínios de um latifúndio.
Lealdades pessoais, compromissos locais e autoridade privada continuaram a fazer parte da
vida cotidiana da população.
O dilema da centralização, vivido desde o século passado, foi atualizado no
contexto republicano a partir da emergência do pensamento autoritário, ainda nos anos 20.
Com a revolão de 1930, definiu-se um projeto centralizador em que a presença se fez sentir
no âmbito da educação e da saúde:
Os pioneiros da Saúde e da Educação, a despeito de toda a pertinência de
seus diagnósticos, da clareza de suas interpretações e de seu agudo senso
crítico, não conseguiram vislumbrar uma política que não passasse pela
unicidade de procedimentos, pela formalização universalizante, o que teve
como conseqüência o processo sico e incontrolável de centralização
burocrática (BOMENY, 1993, p. 5).
No que diz respeito as avaliações sobre a Primeira República, estabeleceu-se a
crença, por quase todos compartilhada, de que os direitos poticos liberais não se efetivaram
no contexto brasileiro dominado pelas oligarquias. Fundamentados nessa crença, os críticos
desse contexto republicano se propuseram a construir uma concepção diferente de sociedade
na qual a coleção de indivíduos defendida pelo liberalismo deveria ceder lugar a um
“indivíduo coletivo”, um todo orgânico nacional tutelado pelo Estado.
Como observou Lamounier (1977), a produção intelectual dos opositores da
“República Velha” apontava para a formação de um sistema ideológico orientado no sentido
de conceituar e legitimar a autoridade do Estado como princípio tutelar da sociedade. Este
elemento constitui a base do autoritarismo em suas mais variadas vertentes. O autor
caracteriza esse projeto autoritário como uma “ideologia de Estadode forma a contrastá-la
com a ideologia de mercado do liberalismo clássico.
Um aspecto importante a ser observado é que, em meio aos opositores da
Republica Velha, se desenvolveu, aos poucos, uma visão alternativa da nação, fundamentada
em premissas corporativistas, desafiando a concepção liberal-burguesa de sociedade. A
autoridade do Estado sobre o mercado, postulada pela ideologia autoritária, não encontrava
afinidade eletiva com os interesses econômicos dominantes. Contudo, revelou enorme
capacidade de agregação social no momento em que o liberalismo demonstrou, em escala
mundial, sua incapacidade de responder as crises inerentes ao sistema capitalista.
Na nova concepção política vigente a partir de 1937, a democracia dos partidos
constituiu uma ameaça permanente à unidade nacional
1
. Segundo Elisa Pereira Reis, foi com
base nesse discurso que Vargas passou a clamar por respaldo da nação para que fosse possível
consolidar o projeto de institucionalização de um governo forte, de paz, de justiça e de
trabalho, que, na perspectiva autoritária, faria a potica servir aos requerimentos econômicos
da nação. Nesse contexto, Vargas argumentava que apenas um Estado forte poderia impedir a
divisão que ameaçava a sociedade todas as vezes que os interesses de classe se manifestavam.
Pois, o Estado, o guardião do interesse nacional, deve supervisionar as ações sociais e
programar sua harmonia social (REIS, 1988). Em linhas gerais, o que se pretendia era
substituir as bases do liberalismo por uma potica de cunho paternalista e centralizadora.
O pensamento conservador passou a condenar, desde os anos 20, a separação,
defendida pelo liberalismo clássico, entre a economia e a potica como artificial e nociva para
a sociedade brasileira. Dando ênfase a essas críticas, os grupos sociais, que alcançaram a
hegemonia após 1930, transmitiram para o Estado a responsabilidade de promover a
solidariedade e a paz social. A ideologia autoritária criticava de forma veemente a igualdade
fictícia entre os indivíduos, sustentada pelo liberalismo. Na perspectiva do pensamento
conservador, a nação é representada como um “indivíduo coletivo que deve ser
simultaneamente uma entidade potica e econômica.
Para conciliar essa imagem da nação com a lógica individualista do capitalismo,
combatido pelo pensamento conservador brasileiro, foi necessário projetar mecanismos
complexos de integração social. A solução encontrada pelos partidários da proposta
conservadora apresentou uma certa semelhança com as conceitualizações elaboradas por
Durkheim para o problema da solidariedade na sociedade individualista moderna,
caracterizada pela solidariedade orgânica. O modelo de tipo corporativista, que nos anos 30 se
1
Discurso proferido por Getúlio Vargas, em 1937, no ato de consolidação do Estado Novo e de apresentação dos
novos moldes da política brasileira, transcrito em Skidmore (1973).
colocava como alternativa à concepção liberal burguesa da representação política, vinculava
os direitos poticos não aos indivíduos isoladamente, mas sim aos membros de profissões
específicas. Dentro da lógica do corporativismo o que qualifica um cidadão como tal é sua
vinculação particular ao processo produtivo, e o sua condição universal de membro da
espécie em um território particular. Ou seja, o indivíduo seria definido mecanicamente pela
sua função no meio social.
Em termos de construção do Estado, a expansão do aparato burocrático e militar,
durante o período aqui estudado, aponta claramente para um processo de expansão e
centralizão do poder público, que i culminar em uma maior racionalização da
administração pública no país. A compra de modernos equipamentos militares e a melhoria
dos programas de treinamento contribuíram significativamente para o fortalecimento das
Forças Armadas. Ressalte-se, ainda, que além dos avanços no sentido de um controle mais
rígido sobre os meios de defesa, coerção e violência, o Exército se envolveu efetivamente nas
atividades poticas.
A criação do Conselho de Segurança Nacional, que congregava o poder executivo
e as forças armadas, assumiu um papel crucial nos processos de tomada de decisão. Segundo
Sergio Miceli, esse Conselho foi a expressão mais óbvia de que o conceito de segurança
nacional tinha se ampliado de modo a absorver questões relativas à educação e a economia.
Absorção que se apresentou como necessária na medida em que estes dois campos poderiam
colocar em risco a tão sonhada estabilidade da política brasileira. Essa vasta reforma
administrativa propunha incrementar a racionalidade do serviço público e, simultaneamente,
neutralizar os traços patrimoniais herdados do passado.
O crescimento da burocracia blica contribuiu para reforçar a posição do Estado
como empregador na medida em que servia como uma via importante para a incorporação
política da classe média através do emprego. O Estado, na perspectiva de Sérgio Miceli,
atuava como avalista da coalizão de poder, acomodando as elites agrárias tradicionais e o
setor industrial emergente. O poder das oligarquias rurais derivava, em ampla medida, da
continuidade das relações sociais de produção no campo, as quais mantinham a força de
trabalho fora da arena política (MICELI, 1979).
Por sua vez, as elites industriais se beneficiavam das poticas econômicas
promovidas pelo Estado, que lhes propiciavam incentivos e barreiras protecionistas frente aos
competidores externos. Além disso, contavam ainda a seu favor com uma série de
investimentos públicos em áreas estratégicas, tais como serviços de infra-estrutura e produção
de aço. Finalmente, o Estado afirmava sua posição de avalista da aliança de poder graças a um
padrão particular de incorporação política dos setores populares urbanos.
A rota potica que se abriu para os trabalhadores urbanos foi, essencialmente, a
dos direitos sociais, tal como transparece de forma bem clara a extensa legislação trabalhista
que introduziu direitos básicos como: salário mínimo, licença de saúde, assistência médica e
aposentadoria. Simultaneamente, a lei subordinava as associações dos trabalhadores ao
estreito controle e supervisão do Estado. Essa forma tutelada de incorporação assegurou um
padrão de relacionamento estável entre o capital e o trabalho. Deste modo, garantiu, também,
um elevado grau de autonomia do Estado frente aos interesses econômicos dominantes.
A Construção da imagem de uma autoridade paternal que promovia a paz, a
prosperidade e a nacionalidade, assinalava a consolidação de uma ideologia autoritária,
inerente à dinâmica deste modelo de Estado nacional. Nesse contexto, o aspecto de
dominação de classe do capitalismo autoritário tornava-se de certa forma opaca, ao mesmo
tempo em que o Estado expandia de fato sua autonomia potica (ALVES, 2002).
A reflexão em torno do ano de 1930 ime a necessidade de trazer à discussão a
natureza e a abrangência do próprio conceito de revolução, que repetidas vezes é utilizado no
intuito de descrever os processos de transição social e potico ocorridos no Brasil a partir
dessa data. Acredita-se que este conceito não seja representativo deste período, pois se mostra
incapaz de objetivar e esclarecer esse complexo jogo político, marcado pela conservação e a
reforma.
Fundamentado na análise dos processos anteriormente descritos, observa-se que
houve um processo de rupturas. Contudo, entende-se que essas rupturas estão dentro da velha
lógica descrita por Luiz Werneck Vianna como “modificar conservando”, que faz parte da
história política brasileira. Na perspectiva de Vianna, nunca houve no Brasil, de fato, uma
revolução, e, no entanto, sempre se fala nela, como se tivesse existido. Pois, sobretudo aqui
Qualifica-se como revolução movimentos políticos que somente
encontraram a sua razão de ser na firme intenção de evitá-la, e assim se fala
em Revolução da Independência, Revolução de 30, Revolução de 64, todos
acostumados a uma linguagem de paradoxos em que a conservação, para
bem cumprir o seu papel, necessita reivindicar o que deveria ser o seu
contrário (a revolução). Nesta dialética brasileira em que a tese parece estar
sempre se autonomeando como antítese, evitar a revolução tem consistido,
de algum modo, na sua realização (VIANNA, 1997, p. 12).
Luiz Werneck Vianna define o Brasil como sendo o lugar por excelência da
revolução passiva”, onde todas as transformações sociais e poticas são resultados de um
(re)arranjo e um (re)ordenamento do passado em novos termos. Contudo, esses (re)arranjos e
(re)ordenamentos ocorrem sem romper com os elementos centrais das estruturas anteriores e
sem grandes alterações das condições poticas das elites. Essa percepção torna-se importante
para os objetivos desse trabalho, pois, será a partir de uma reflexão semelhante que se
pretende pensar a idéia da conciliação e da reforma no contexto educacional dos anos 30.
Sendo assim, o termo revolão torna-se inadequado aos propósitos deste estudo na medida
em que se refletirá sobre uma síntese conservadora da educação e da potica brasileira,
forjadas nos termos de uma legítima “revolução passiva”.
1.2. Os intelectuais como protagonistas políticos
O Estado Nacional, mesmo sendo um fenômeno hisrico recente, incorporou uma
série de elementos anteriores que criaram a impressão de um passado imemorial. Ao fazer
isto, naturalizou suas origens históricas e inventou para si próprio uma tradição capaz de
legitimá-lo, garantindo, desta forma, a sua viabilidade potico-institucional.
Por “tradição inventada”, entende-se, a partir da definição clássica de Hobsbawn,
o conjunto de práticas, normas reguladas por regras tácitas ou abertamente aceitas pela
comunidade. Essas práticas podem ser de natureza ritual ou simlica e visam a inculcar
certos valores e normas de comportamento através da repetão, o que implica,
automaticamente, uma relação de continuidade com o passado (HOBSBAWN, 1984).
Os debates sobre os possíveis destinos da Nação brasileira foram temas que
chamaram atenção dos intelectuais ao longo do século XIX. Durante o período Imperial, a
política era o território privilegiado para garantir a inserção do Brasil no quadro dos países
civilizados. A grande pretensão do Império era civilizar a população brasileira por intermédio
de padrões europeizados de cultura. No século XX, sobretudo no período que se estende entre
a Primeira Guerra e o Pós-Guerra, desenvolveu-se, entre os intelectuais, uma espécie de
nacionalismo militante que chamava para si a responsabilidade da “salvação nacional”.
Salvação que seria concretizada a partir da formação de um Estado nacional capaz de
promover a civilização das populações brasileiras (MICELI, 1979).
Os anos vinte foram marcados por uma profunda efervescência cultural. As
transformações iniciadas no continente europeu devastado pela Guerra repercutiram
profundamente no Brasil. A vanguarda intelectual brasileira iniciou a ruptura com as
concepções de uma Europa culturalmente coesa. A Guerra mostrou que existiam diversas
Europas, umas decadentes e outras modernas. Essa percepção surtiu grande impacto no Brasil
de modo a impulsionar a renovação intelectual, marcada pela semana de Arte Moderna de
1922.
O movimento modernista brasileiro teve duas fases distintas. Nos primeiros anos,
seguiu um caráter claramente universalista, inserindo o Brasil nos quadros da modernidade.
Na chamada segunda fase modernista, por volta de 1924, o movimento aprofundou os
elementos nacionalistas e regionalistas em oposição ao universalismo dos primeiros tempos.
Nesta fase do movimento modernista, intelectuais agrupados em torno de movimentos como o
Manifesto Pau-Brasil, o Verde-Amarelo, o Anta, entre outros, tinham a pretensão de romper
com os padrões culturais importados e propor a valorização da cultura nacional.
O Brasil deveria encontrar a sua inspiração interior. Pois, o Brasil litorâneo
padecia pela precariedade de uma civilização importada, que pouco tinha a ver com a
realidade brasileira. Em outras palavras, a síntese do Brasil perfeito seria a fusão harmônica
do litoral com o sertão. A semelhança entre esta pretensão modernista e o discurso
modernizador de Getúlio Vargas, por meio do ideal da Marcha para o Oeste, não é mera
aparência. Os ideólogos do Estado Novo apropriaram-se de alguns elementos do discurso
modernista. Com isto, tinham a pretensão de identificar no movimento modernista o
prenúncio do Estado Novo. A literatura regionalista, a Geografia e a História foram utilizadas
como elementos fundamentais do discurso de Vargas para romper com o esquema de
interpretação da realidade nacional sustentada na premissa dos dois Brasis, em que as
categorias litoral e sertão apresentavam-se de forma excludentes (PEDREIRA, 1993).
A construção da tria brasileira passou a ser vinculada à consolidação do
terririo nacional a partir da fusão harmônica do litoral com o sertão, anunciada pela
expansão das fronteiras. A elite intelectual, vinculada ao Estado Novo, criticava o modelo
liberal e os princípios federalistas. Essas críticas tinham o intuito de elaborar novas
concepções que fossem capazes de combinar a realidade histórica do país com um projeto de
“salvação nacional”.
Para Francisco Campos, um dos intelectuais que exerceram grande influência
política no período, somente um Estado portador de uma ideologia específica e precisa
desenvolveria a grande missão pedagógica e técnica em torno de um eixo ideológico definido.
Via-se na afirmação desse eixo ideológico a garantia de uma eficácia ímpar no esforço de
condução das massas nacionais. Para Campos, e a maioria dos representantes do
conservadorismo, o Estado tem que educar e conduzir as massas através da criação de uma
simbologia que identifica o regime com a figura do chefe.
O irracional é o instrumento da integração política total e o mito, que é sua
expressão mais adequada, a técnica intelectual de utilização do inconsciente
coletivo para o controle político da nação.O domínio da irracionalidade
pressupõe, conseqüentemente, o da ininteligibilidade, condição essencial da
unificação das massas entorno de um mito que se corporifica na figura de um
chefe (CAMPOS apud SCHWARTZMAN, 1984, p. 63).
Segundo os intelectuais conservadores, a realidade política contemporânea deveria
caminhar para regimes de autoridade, necessários para inverter a era de liberdade e
individualismo, decorrente das revoluções burguesas. A argumentação de Francisco Campos,
acerca da eclosão das massas e da necessidade potica de sua manipulação por um chefe, está
embasada, teoricamente, nas reflexões desenvolvidas por Mihail Manoilesco no campo da
ciência potica. Nota-se no pensamento de Francisco Campos, bem como no pensamento de
parte significativa dos intelectuais conservadores brasileiros, a inflncia da obra de
Manoilesco, intitulada O Século do Corporativismo: doutrina do corporativismo integral e
puro. O livro foi traduzido no Brasil em 1938, dois anos antes da publicação da mais
importante obra de Francisco Campos, O Estado Nacional.
O Estado Novo ofereceu a possibilidade de participação efetiva dos intelectuais na
história potica brasileira. Nas palavras de Alcir Lenharo,
O Estado muniu-se de uma política de burocratização intensiva da
intelectualidade [....] com o fim de efetivar o poder simbólico, um esforço
conjunto de homogeneização do discurso do poder, particularmente
ideológico. (LENHARO, 1986, p 26).
O ideal nacionalista estabeleceu o princípio do destino comum entre todos os
membros de uma nação. O discurso do poder pretendia criar um sentimento de co-
participação do povo brasileiro capaz de estabelecer uma unidade ético-cultural, potica e
econômica. Vargas pretendia construir uma nação brasileira desenvolvida, integrada e
irmanada pelo sentimento de nacionalidade. Este sentimento deveria ecoar de todos os cantos,
até mesmo das regiões mais distantes e remotas do Brasil.
No campo da memória coletiva, esboçara-se, anteriormente, uma perspectiva de
síntese da história nacional, agregando a experiência monárquica e republicana nas
comemorações do centenário da independência. A pacificação da memória foi obra dos
Institutos Históricos herdada pelo governo Vargas, que inaugurou o mausoléu, em Petpolis,
onde se encontram os corpos dos ex-imperadores. A construção de um “imaginário nacional”
aproximou Vargas de D. Pedro II como representação de matrizes distintas de um mesmo
projeto: a nacionalização do Brasil (SANDES, 2000).
Esta memória nacional, naturalizada e difundida em meio a diversos grupos que
formavam a nação, era o instrumento ideológico capaz de produzir o desejado sentimento de
pertencimento nacional, tão caro ao pensamento nacionalista brasileiro. Esta preocupação
evidencia a importância da atuação dos intelectuais no campo das produções simbólicas em
torno da educação.
No século XX, em especial durante a era Vargas, a educação assumiu o papel
desempenhado pela potica no século XIX. A centralidade do debate em torno da educação
decorreu das expectativas de que ela seria o lugar por excelência onde as possibilidades de
desenvolvimento para o país seriam traçadas e aplicadas à sociedade. A educação foi elevada
a um status de importância singular na história do país, visto que, para setores importantes da
intelectualidade, era neste âmbito que as mazelas da sociedade brasileira deveriam ser
solucionadas.
Em função desta virada de interesses, a educação, na década de 30, tornou-se uma
questão de segurança nacional, passando a desempenhar dois papéis importantes e de
naturezas distintas. Do ponto de vista potico, ela se tornou uma preocupação nacional e, do
ponto de vista privado, ela se tornou uma importante área econômica a ser explorada pela
indústria cultural. Isto explica, em certo sentido, a grande expansão do mercado editorial no
período.
Esse processo de institucionalizão da administração pode ser evidenciado
claramente quando atentamos para o grande número de instituições
2
que foram criadas e que
entraram em vigor ao longo desse período. Esse grande número de instituições, colocadas a
serviço da administração pública, demonstra um processo crescente de racionalização do
aparato político administrativo empreendido pelo poder central. O Estado transforma-se por
esta via, na instância superior de legitimação das competências ligadas ao trabalho cultural,
técnico e cientifico.
De acordo com Sérgio Miceli, embora não se possa afirmar a formação de um
monolio de certas carreiras, constata-se que os intelectuais se concentravam em cargos que
possuíam padrões salariais mais elevados e que contavam com mais regalias e vantagens na
hierarquia burocrática. Os intelectuais foram cooptados para o exercício de diferentes
funções: como funcionários em tempo parcial, como prestador de serviços de consultoria,
como ocupante de cargos de confiança junto ao Estado Maior.
2
De acordo com Sergio Miceli, foram construídos, nesse período, os Ministérios da Educação e Saúde Pública, Trabalho, Indústria e
Comércio, todos criados em 1930, e o da Aeronáutica, criado em 1941. Além destes, foram criados uma série de organismos diretamente
vinculados à Presidência da República: Departamento Administrativo do Serviço Público (1938), Departamento de Imprensa e Propaganda
(1939), Conselho Federal do Comércio Exterior (1934), Conselho de Imigração e Colonização (1938), Conselho Nacional de Petróleo
(1938), Conselho Nacional de Águas e Energia (1939) e o Conselho de Segurança Nacional (1939).
Para Miceli, o traço mais característico da contribuição desta elite intelectual e
burocrática reside nas diversas frentes nas quais se desdobravam as suas atuações, políticas e
culturais. Os intelectuais assumiam a responsabilidade de conservar, difundir e manipular a
herança cultural da nação brasileira. Deste modo, atuaram como porta-vozes do poder e
desempenharam uma função que a “literatura”, de inspiração gramsciana, denomina de
“ideólogos do poder”, pois trata se da transmissão de um discurso que representa os interesses
hegemônicos da elite.
Para se ter uma idéia da atuação dos intelectuais no regime, dos 30 eleitos para a
Academia Brasileira de Letras, entre 1930 e 1945, seis deles ocupavam postos no alto escalão
do governo e outros doze chegaram a ocupar postos no primeiro escalão em suas respectivas
áreas de atuação (MICELI, 1979). Entre todos os campos sociais, a educação foi, sem sombra
de dúvidas, o lugar em que se deu a maciça presença dos intelectuais. Entre os anos de 1930 e
1934, a educação tornou-se uma verdadeira arena de disputa potica, marcada por intensos
debates ideológicos entre intelectuais militantes de uma ideologia conservadora vinculada a
cosmo-visão católica – e intelectuais renovadores defensores dos ideais da Escola Nova.
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A IGREJA EM GUARDA:
MODERNIZAÇÃO, REFORMISMO E TRADIÇÃO CATÓLICA
A Igreja católica no Brasil esteve, desde o período colonial, vinculada ao
poder político e à gerência do Estado por meio do padroado gio. Esta relação de
poder esteve presente no país até a proclamação da república, em 1889, quando se deu
a separação entre a Igreja e o Estado.
O liberalismo trouxe consigo a idéia da separação política entre o Estado e a
Igreja. Na concepção liberal burguesa, o Estado deve ser laico e seguir uma ética científica e
filofica, oferecendo aos indivíduos as condições necessárias para o seu bem estar dentro da
sociedade. Essa separação, inegavelmente, abalou as estruturas da Igreja Católica no Brasil ao
ponto de romper com uma tradição que entrelava o poder espiritual ao Estado brasileiro.
De acordo com a interpretação de José Oscar Beozzo, o divórcio entre a Igreja e o
Estado também significou um distanciamento entre a Igreja e o povo (BEOZZO, 2004). Ao
longo do período republicano, a Igreja não deixou, em nenhum momento, de condenar a
proemincia do Estado laico em uma nação formada, fundamentalmente, por católicos.
Deste modo, realçou os efeitos deletérios que a laicização do Estado traria para a
nacionalidade. Entretanto, deve-se salientar que a diminuta presença da Igreja Católica nas
regiões mais longínquas acarretou um distanciamento dessa instituição dos segmentos
populares.
Se, por um lado, pode-se afirmar que a ruptura entre o Estado e a Igreja provocou
mudanças significativas em sua base eclesiástica, por outro, não se pode deixar de reconhecer
que para o povo, basicamente, não houve mudanças. Sua religiosidade
3
permaneceu a mesma:
o povo seguiu cultuando os seus santos e batizando os seus filhos quando o padre passava
(BEOZZO, 2004).
Ao longo da Primeira República, o catolicismo brasileiro se distanciou de suas
bases populares e a cúpula eclesiástica foi incapaz de um movimento de aproximação que
reatasse os nculos com as classes dirigentes e, tampouco, com os setores populares. A
explosão de movimentos messiânicos no campo sinalizava o sentimento de abandono a que
foram lançadas as populações sertanejas. A Igreja veio a blico condenar o que ela mesma
chamou de fanatismo religioso dos seguidores de Antonio Conselheiro, em Canudos, e de
Padre Cícero, em Juazeiro. Nesse sentido, colocou-se ao lado da ação repressora do Estado
(BEOZZO, 2004). Nessa perspectiva, a Igreja se apresentava como parceira na reorganização
do mundo republicano. Com isto, recuperou, ao menos em parte, sua força potica perante as
elites.
A partir da década de 1920, esse quadro foi alterado pela intensa militância de um
pequeno grupo de intelectuais católicos que assumiu a tarefa de revisão das diretrizes do
catolicismo eclesiástico brasileiro. Esse movimento de renovação da Igreja Católica foi
profundamente marcado pela atuação de dois personagens: Dom Sebastião Leme, o então
3
Esta interpretação feita por JoOscar Beozzo é pertinente quando utilizada para analisar a relação da Igreja
Católica com as populações sertanejas do interior do Brasil. Pois, neste contexto, a Igreja, mesmo antes do fim
da monarquia, não era muito presente uma vez que sua preocupação era com a formação das elites e dos setores
mais urbanizados da sociedade brasileira. A religiosidade sertaneja ensejou a formação de um cristianismo
popular sincrético que deu origem a inúmeros movimentos messiânicos no interior do Brasil.
arcebispo do Rio de Janeiro, e Jackson de Figueiredo, um dos principais representantes do
Centro Dom Vital.
Jackson de Figueiredo Martins nasceu em Aracaju, em 1891. Bacharel em Direito,
dedicou-se à potica e ao jornalismo. Seu nome é um marco importantíssimo na história do
catolicismo brasileiro como organizador do movimento católico leigo. Entre 1921 e 1922,
fundou o Centro Dom Vital e a revista A Ordem, instrumentos vitais no combate “as forças”
de dispersão dos valores católicos (ABREU, 2002). Segundo Jackson de Figueiredo, o
liberalismo e o comunismo impregnavam o mundo com um reformismo irresponsável. Por
essa razão, tornava-se necessário uma reação de leigos e religiosos que se dedicassem aos
estudos da doutrina católica. Foi por meio de seus escritos que o pensamento conservador
também avaliado ora como tradicionalista, ora como reacionário – foi introduzido no Brasil.
Em 1921, Jackson de Figueiredo defendeu a candidatura de Artur Bernardes, por
sua identificação com os princípios da autoridade, religião e ordem, em detrimento de Nilo
Peçanha, tido como demagogo revolucionário e ligado à maçonaria. Foi colaborador em
rios jornais e revistas, como a Gazeta de Notícias e O Jornal. Produziu, entre outras obras,
Afirmações (1921), A reação do bom senso (1922) e A coluna de fogo (1925). Veio a falecer
em 1928, sua morte deixou uma lacuna dentro do movimento católico que seria preenchida
por Alceu Amoroso Lima (BEOZZO, 2004).
Jackson de Figueiredo, por intermédio do Centro Dom Vital, desempenhou um
importante papel de mobilização potica e de “conscientizaçãode parte da intelectualidade
brasileira ao fortalecer as bases leigas do catolicismo. Alceu Amoroso Lima deu seqüência ao
processo de reordenação da Igreja, cujo poder alcançou dimensão potica em plano nacional a
partir de 1930.
Alceu Amoroso Lima nasceu no Rio de Janeiro, no ano de 1893. Bacharelou-se
em Direito, em 1913, pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro. Após
sua formatura, ele viajou para a Europa, onde fez cursos na Sorbonne e no Collège de France.
De volta ao Brasil, trabalhou alguns anos como advogado e como adido ao Itamarati antes de
assumir a direção jurídica de uma fábrica de sua família. Em 1919, iniciou sua colaboração
em O Jornal como crítico literário. Nesse momento, utilizou o pseudônimo de Tristão de
Ataíde (ABREU, 2002).
Em 1924, insatisfeito com sua postura existencial, Alceu Amoroso Lima começou
a demonstrar interesse por assuntos religiosos. Interesse que o levou a iniciar intensa
correspondência com o pensador calico Jackson de Figueiredo. No ano de 1928, declarou
sua conversão ao catolicismo, fato que teve grande repercussão nos meios intelectuais. Nesse
mesmo ano, com a morte de Jackson de Figueiredo, foi designado para substituí-lo à frente do
Centro Dom Vital.
Alceu Amoroso Lima, em 1930, manifestou-se publicamente contra o movimento
revolucionário deflagrado pela Aliança Liberal, sob a liderança de Getúlio Vargas. Criticou
severamente a ação política do Partido Republicano Mineiro (PRM), bem como do Partido
Republicano Rio-Grandense (PRR). Para ele, a auto-imagem revolucionária forjada pelo
discurso desses partidos era incompatível com o apoio que, outrora, haviam dado ao
autoritarismo de Artur Bernardes.
Empossado o novo governo, Alceu Amoroso Lima evitou colocar-se na oposição.
Consolidou sua posição de liderança junto ao movimento católico leigo e, ao lado de Dom
Sebastião Leme (arcebispo do Rio de Janeiro), empreendeu intensa campanha pela afirmação
de uma postura ativa dos católicos diante das grandes questões nacionais
4
. Assim, em 1932,
4
Todos os dados biográficos citados neste trabalho foram retirados da obra Alzira Alves de Abreu (2002) e de
uma pesquisa realizada nos anais de biografias do CPDOC/FGV.
frente à convocação de eleições para a Assembléia Nacional Constituinte de 1933, participou
da fundação da Liga Eleitoral Católica (LEC) e tornou-se secretário-geral da organização em
nível nacional. O objetivo da LEC era oferecer apoio aos candidatos que, independentemente
de partidos, se dispusessem a defender na Constituinte os pontos de vista da Igreja. Dentre os
principais pontos de vista da Igreja, citam-se: a indissolubilidade do casamento, a assistência
religiosa às escolas blicas, a pluralidade sindical e assistência religiosa as Forças Armadas.
Apesar de simpático à Ação Integralista Brasileira (AIB), evitou uma associão maior com
essa organização, com a finalidade de manter a LEC como entidade suprapartidária.
Ao longo dos anos 1920, a crescente urbanização, a secularização da cultura e a
fundação do Partido Comunista do Brasil enfraqueceram, visivelmente, a influência
tradicional do catolicismo. Para fazer frente a tais mudanças, o arcebispo do Rio de Janeiro,
Dom Sebastião Leme, liderou um movimento destinado a defender os ideais cristãos na vida
política nacional.
Constitda, fundamentalmente, por intelectuais e por segmentos representativos
da classe média, a LEC teve uma participação expressiva nas eleições de 1933 para a
Assembléia Nacional Constituinte. Sua atuação consistiu em supervisionar, selecionar e
recomendar ao eleitorado católico os candidatos aprovados pela Igreja. Esta estratégia
mostrou-se frutífera. Pois, nas eleições para a constituinte de 33, numerosos deputados foram
eleitos com o apoio da LEC, entre eles: Luís Sucupira, Anes Dias, Plínio Correia de Oliveira e
Morais Andrade.
Ao analisar a organização e os interesses do movimento católico no país,
percebeu-se que não foi por acaso que, em 1930, Francisco Campos pros abertamente um
pacto com a Igreja. Dada a representatividade política do movimento e a capacidade de
mobilização do catolicismo na cultura do país, essa aproximação era necessária para que fosse
possível fortalecer as bases de sustentação ideológica do Estado. Contudo, de acordo com
Simon Schwartzman, o movimento calico militante, a princípio, reagiu à Revolução de 30
com hostilidade e oposição. Visto que se tratava de uma revolução, uma alteração da ordem
que era, em si mesma, vista como um mal (SCHWARTZMAN, 1984). Jackson de Figueiredo
afirmava que a pior ilegalidade era ainda melhor que a revolução. Essa visão de mundo estava
estampada no próprio título da revista do movimento católico: intitulada A Ordem.
Na percepção do periódico católico, a revolução era vista como a vitória do
movimento tenentista, entendido como portador de idéias modernas perigosas associadas ao
liberalismo e ao positivismo. Em função desta preocupação, logo no início das mobilizações
tenentistas, Alceu Amoroso Lima afirmou que esse movimento era uma obra da Constituição
sem Deus, da escola sem Deus e da família sem Deus (ATAÍDE apud VELLOSO, 1978).
Na inauguração do Cristo Redentor no Morro do Corcovado, no Rio de Janeiro, o
Cardeal Dom Sebastião Leme dirá à multidão que ou “o Estado reconhece o Deus do povo ou
o povo não reconhece o Estado”. Porém, nesta altura, a Igreja havia encontrado o espaço
para a aliança com o novo regime, tendo como principal mediador o então Ministro da
Educação e Saúde Publica, Francisco Campos. Em dezembro de 1930, Alceu Amoroso Lima
expressou seu apoio ao movimento revolucionário. Nesse momento, afirmou existir entre os
revolucionários uma corrente racional, tradicional e cristã que estava em oposição a uma outra
que era demagógica, libertária e que, fatalmente, levaria ao materialismo comunista e à
perseguição da tradição cristã.
5
A partir desta percepção, Alceu Amoroso Lima mobilizou os
católicos para lutar contra a corrente demagógica. Para tanto, propôs o exercício de uma ação
social no sentido de defender a incorporação de suas reivindicações no futuro estatuto político
do país. Três meses depois, a revista A Ordem convocou o movimento católico para a defesa
das posições da Igreja sob a alegação de que a revolução seria ineficiente enquanto não se
5
ATHAÍDE, Tristão de. Palavras aos companheiros. A Ordem, Rio de Janeiro, v. 10, n. 9, out. 1930 apud
VELLOSO, Mônica Pimenta. Análise da revista A Ordem. Rio de Janeiro: FGV, 1978.
conferisse à Igreja sua devida supremacia. De certa forma, esses foram os primeiros passos da
chamada Ação Católica Brasileira.
O governo respondeu de forma positiva a essa ão católica. Um mês depois da
convocatória do movimento católico realizada pela revista A Ordem, o governo provisório
promulgou o decreto nº. 19.941 que facultava o ensino religioso nas escolas blicas, abolido
desde a Constituição de 1891. Ao promulgar esse decreto, o Estado atendeu a grande
reivindicação da Igreja Católica que temia perder o seu espaço de representação na sociedade
brasileira. O decreto em questão estabeleceu no primeiro dos seus onze artigos que ficava
facultado o ensino da religião em todos os estabelecimentos de instrução primária, secundária
e normal.
6
O foco das críticas da Igreja era o ensino liberal leigo que, para o pensamento
católico, poderia abalar as estruturas tradicionais da sociedade brasileira, comprometendo,
assim, o papel de orientação que ela pretendia exercer junto à família e à nação. Por essa
razão, a promulgação das emendas religiosas foi considerada pelo movimento católico como
uma importante vitória atingida pela sua militância através do Centro Dom Vital e da revista
A Ordem. Convencionou-se chamar de emendas religiosas o conjunto de reivindicações feitas
pela Igreja e defendidas pelos integrantes da Liga Eleitoral Católica na Constituinte de 1934.
Dentre essas reivindicações, destacam-se: o ensino religioso nas escolas blicas, a aceitação
do Brasil como nação católica, a assistência religiosa às forças armadas e a indissolubilidade
do matrimônio. De modo geral, esse conjunto de reivindicações coms a linha de frente das
demandas da Igreja Católica nesse período.
6
Este é um dos 11 artigos componentes do decreto lei 19.941 que decretou a realização de aulas de ensino
religioso nas escolas públicas. Esse decreto foi muito comemorado pelos membros militantes do catolicismo
leigo como uma grande conquista alcançada pelo movimento.
Com base nas análises de Mônica Pimenta Velloso a respeito da revista A Ordem,
pode-se perceber que a mobilização da Igreja se fez acompanhar de uma intensificação das
discussões doutrinárias sobre o papel social da Igreja. Nesse contexto, situou-se a mensagem
de fé da doutrina católica em meio ao avanço da argumentação, defendida por intelectuais
liberais e conservadores, contrária ao pensamento católico. Esses intelectuais colocavam-se a
favor da razão e da ciência, ao mesmo tempo em que defendiam um modelo racional como
critério único para a ação social e potica. Com isto, visavam integrar o país no interior do
processo de modernização, que é contrário, de forma intrínseca, à idéia de tradição na qual a
Igreja se inseria (VELLOSO, 1978).
Em face dessa ameaça, a Igreja critica a própria natureza da fé católica então
vigente no Brasil, onde ocorria, segundo Alceu Amoroso Lima, uma hipertrofia da afetividade
em detrimento da razão
7
. Em seu artigo Apologética e Sociologia, Alceu Amoroso Lima
pretendia elaborar uma proposta de restauração da fé. Para tanto, propôs a construção de uma
sociologia cristã que deveria aproximar fé e razão. Nas palavras de Schwartzsman,
Essa sociologia era vista como capaz de contribuir para a ação e doutrina da
Igreja, deslocando o centro de gravidade do sentimento para a razão. Ela
seria antes de tudo um método científico aplicável à sociedade, à filosofia e à
religião, contribuindo para que a Igreja Católica pudesse desempenhar bem a
sua tarefa de "reespiritualizar a cultura”, acabando de uma vez por todas com
a incompatibilidade entre a religião e a ciência. Ela substituiria o cientismo
do século passado, que implantara na ordem social os princípios da ordem
natural por uma racionalidade superior que viria restaurar os valores
metafísicos e conduzir ao "renascimento espiritualista”. A sociedade a ser
construída com o auxilio dessa sociologia cristã superaria o individualismo e
o socialismo, pois suas bases não seriam nem o indivíduo, nem o Estado,
mas a família. Ela daria cientificidade à e à ação da Igreja Católica, cuja
doutrina era a única capaz de promover a revolução espiritual e restaurar
uma filosofia social sadia capaz de unir as classes. (1984, p. 54).
A partir do quadro exposto, percebe-se que a Igreja Católica, em busca de
consolidar o seu papel potico, foi obrigada a reconstruir e adaptar o seu discurso doutrinário
7
ATHAÍDE, Tristão de. Apologética e Sociologia. A Ordem, Rio de Janeiro, v. 10, 1930. Este texto está citado
em Mônica Pimenta Velloso. A Ordem, uma revista de doutrina política e cultura católica. Revista de Ciência
Política, Rio de Janeiro, 1978.
às novas realidades da potica brasileira na década de 1930. Foi nesse contexto de
reformulação de sua base doutrinária e catequética que a educação tornou-se, cada vez mais,
uma área estratégica para a Igreja. Assim, pode-se afirmar que a educação transformou-se em
terreno de litígio, pois, era o alvo perseguido por várias correntes ideológicas desejosas de
propagar os valores indispensáveis para a manutenção e consolidação de grupos no poder.
O decreto de abril de 1931, que permitiu o ensino religioso nas escolas blicas,
foi recebido pela Igreja como uma primeira comprovação de que o Governo Provisório, mais
precisamente Francisco Campos tido como interlocutor privilegiado da Igreja Católica –, se
manteria fiel aos compromissos assumidos perante a consciência católica. Apesar da euforia
demonstrada pelo movimento, percebe-se que os interesses do pensamento católico eram bem
mais ambiciosos do que a simples aprovação das emendas religiosas.
Para além de reivindicar o direito de ministrar legalmente o ensino religioso nas
escolas, o movimento calico ansiava para que o próprio Estado se voltasse contra o ensino
neutro e a favor do ensino confessional católico. Essa exigência não alcançou sucesso, pois,
sua própria lógica inviabilizava o projeto modernizador de Vargas. Projeto este que tinha por
prioridade o desenvolvimento do ensino técnico, entendido como parte essencial para a
formação de quadros qualificados para as novas funções requeridas pelo desenvolvimento da
indústria e do corcio.
O auge desse conflito deu-se, sobretudo, a partir da reforma do ensino secundário,
em abril de 1932. Essa reforma introduziu disciplinas de caráter técnico-científico e ampliou,
significativamente, a interferência do governo na educação. Pautada na análise da revista A
Ordem, Mônica Pimenta Velloso avaliou esse processo de oficialização do ensino como “um
dos flagelos da família brasileira”. Como era de se esperar, os intelectuais católicos
condenaram a ênfase dada ao ensino técnico. Enxergaram nesse processo um excesso de
racionalismo que poderia colocar em xeque as idéias defendidas pelo pensamento calico.
Nesse contexto, observou-se que o termo laicização foi usado com freqüência nas
críticas que a Igreja endereçou ao Estado. Deste modo, as denúncias sistemáticas,
pronunciadas pela revista A Ordem, assumiram os seguintes contornos: “laicização do
ensino”, “laicização da cultura”, “laicização do Estado”, “laicização dos sindicatos”. Para
Simon Schwartzsman, essas denúncias revelam um sentimento de exclusão que se instaurou
quando a Igreja começou a detectar a perda de sua inflncia em meio a juventude brasileira.
A revogação do decreto 19.941 foi interpretada pela revista, em janeiro de 1932, como
resultado da influência da maçonaria. Em um momento posterior, o movimento calico
atribuiu a culpa da revogação aos liberais, aos céticos e, finalmente, aos protestantes.
Nesse contexto de intensa e acirrada disputa potica pela Educação, Alceu
Amoroso Lima levantou-se contra o manifesto dos Pioneiros da Educação Nova. Segundo
esse pensador católico, a concentração do ensino nas mãos do Estado contribuiria para a
implantação do regime comunista. Advertiu, também, sobre o seu receio quanto à
institucionalização da nova potica educacional. Para ele, essa institucionalização significava
um atentado contra a nacionalidade na medida em que o ensino leigo colocava em perigo os
valores tradicionais da família. Em junho de 1932, a revista A Ordem denunciou a orientação
dada pelo Estado à educação desde 1930, cujo “naturalismo” levaria a descristianização do
ensino e ao advento da pedagogia comunista. Ainda nessa revista, houve a identificação de
Fernando de Azevedo e de Anísio Teixeira como precursores do comunismo no país.
De acordo com Schwartzman, durante a Revolão Constitucionalista de 32, os
ataques a nova potica educacional, promovidos pelo movimento católico, diminuíram.
Contudo, manteve-se certa intensidade nos aspectos relativos ao “ensino laico” e à atuação
laicista” de Anísio Teixeira diretor da Instrução Pública do Distrito Federal. Todavia, em
dezembro de 1932, a revista A Ordem voltou, com furor redobrado, a denunciar o "laicismo
pedagógico”.
Em artigo intitulado "Mobilizemo-nos”, responsabiliza a 5a. Conferência
Nacional de Educação pelo acirramento do antagonismo entre "os defensores
do laicismo integral de ensino", adeptos das teorias de Dewey, que vinham
se impondo sistematicamente, e a corrente adepta "da educação integral" da
qual faziam parte os católicos, cuja atuação dispersa e carente do apoio
oficial deveria ser organizada sob a dirão de Fernando de Magalhães, com
a finalidade de interferir na elaboração das leis do ensino e na sua aplicação
(LIMA apud SCHWARTZMAN, 1984, p. 58).
Os ataques ao movimento da Escola Nova assumiram um tom cada vez mais
pessoal e violento. No ano de 1933, Fernando de Azevedo foi duramente criticado pelo
pensador católico Sobral Pinto por se opor à instrução religiosa nas escolas blicas
primárias. A orientação pedagógica adotada pelo eminente professor foi percebida como uma
ameaça à nacionalidade por negar a religião e a moral.
http://www.schwartzman.org.br/simon/capanema/ - N_26_O governo provisório foi
severamente criticado por não ter cumprido o compromisso assumido pelos revolucionários
perante a “consciência católica.”http://www.schwartzman.org.br/simon/capanema/ - N_27_
As críticas aos pensadores vinculados ao movimento da Escola Nova tornaram-se
cada vez mais duras à medida que os seus principais representantes passaram a ocupar lugares
intermediários dentro do Governo, como eram os casos de Fernando de Azevedo e de Anísio
Teixeira. Dentre todos os integrantes e simpatizantes da Escola Nova, o mais atacado pelos
pensadores católicos, por intermédio da revista A Ordem, foi Anísio Teixeira.
Em 1933, o pensador católico Sebastião Pagano, em artigo sobre a ação católica,
se referiu a Anísio Teixeira como sendo um
Jovem desnorteado pelos ensinamentos em Columbia, a ponto de negar "o
primado de Deus na educação do homem [...] para contentar-se com o
primado ridículo da democracia e da ciência, à altura dos instintos mais
rasteiros ou mais triviais do egoísmo humano”. (SCHWARTZSMAN, 1984,
p. 59).
Denúncias como essas de Sebastião Pagano visavam denegrir o prestígio de
Anísio Teixeira, que se afirmava como o grande pensador da educação brasileira. Para tanto,
promoviam a desqualificação de todos os postulados defendidos pela Escola Nova. Os ataques
tinham como alvo a laicização do ensino, a escola única, a co-educação, o monopólio estatal
da educação e a gratuidade do ensino. Enfim, questionava-se as premissas sicas dos
educadores liberais que viam nessas propostas o que havia de mais moderno em termos de
educação no mundo. Ataques mútuos eram abertamente veiculados nos periódicos e revistas.
A efervescência desses ataques transformou a educação em uma arena de luta entre os
pioneiros da Escola Nova e os defensores da Igreja Católica.
Um exemplo bem visível deste quadro conflituoso de iias pode ser observado
nas votões para a Assembléia Constituinte, no ano de 1933. Quando os representantes dos
pensadores vinculados aos pioneiros da Escola Nova enviaram à Assembléia suas propostas
(elaboradas durante a V Conferência Nacional de Educação), o movimento católico, em
protesto contra essa onda renovadora, enviou à mesma Assembléia um outro documento.
Redigido pelo Padre Leonel Franca, esse outro documento reivindicava, entre outras coisas, a
liberdade do ensino particular, o ensino religioso facultativo nas escolas públicas e o direito
natural dos pais à educação dos filhos. Nesse período, o debate de iias tornou-se tão intenso
que os representantes do pensamento conservador católico apelaram para os membros da
constituinte. Nessa apelação, os católicos afirmaram que “neste momento de crise, as ações
políticas deviam ser abandonadas em detrimento de uma ação católica que visasse livrar as
famílias brasileiras dos ‘perigos’ destas novas práticas educacionais”.
8
Para os católicos, essas
8
Reflexões de Alceu Amoroso Lima. Para mais, consultar: ATHAÍDE, Tristão. Reflexões sobre um debate
atual. A Ordem, Rio de Janeiro, v.14, n.49, mar. 1934 apud SCHWARTZMAN, Simon. Tempos de Capanema.
Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
novas práticas educacionais poderiam prejudicar os papéis históricos da família na sociedade
brasileira.
O movimento católico alcançou conquistas significativas no texto final da
Constituição. Dentre essas conquistas, cabe citar três propostas da Liga Eleitoral Católica
(LEC): a indissolubilidade do matrimônio, o ensino religioso facultativo nas escolas blicas
e a assistência religiosa facultativa às Forças Armadas. A incorporação dessas propostas na
Constituição significou o apenas uma vitória política, mas, também, uma conquista
doutrinária, pois, a partir desta data, a Igreja Católica brasileira passaria efetivamente a
aproximar-se dos setores urbanos.
A significativa vitória da Igreja na Constituão aconteceu no mesmo período em
que o mineiro Gustavo Capanema foi nomeado para o Ministério de Educação e Saúde
Pública. Essa nomeação marcará, profundamente, a história da educação brasileira, sobretudo,
no que diz respeito a destacada atuação desse ministro como mediador de conflitos.
Capanema foi, ao longo de sua gestão à frente do Ministério da Educação, um conciliador de
coisas quase inconciliáveis.
É importante lembrar que a Igreja o era o único setor organizado da sociedade
que estava atento a importância do campo educacional. As forças armadas, também, viam na
educação um caminho indispensável para um projeto nacional de longo alcance. Projeto pelo
qual se sentiam responsáveis. Nessa direção, atualizavam-se as idéias fascistas que ganhavam
nova coloração no ambiente político brasileiro.
2.1. A Escola Nova e a renovação da educação brasileira
A Escola Nova pode ser entendida como um grande movimento educacional de
caráter renovador, que lançou suas bases no Brasil a partir dos anos de 1930. Esse movimento
contou com o apoio de educadores como Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Anísio
Teixeira e Cecília Meireles. De acordo com Otaíza Romanelli, um dos fatores que
diferenciava a Escola Nova de outros movimentos era seu programa trico. Baseado nos
novos estudos relacionados à psicologia do comportamento humano, esse programa forjava
novas maneiras de pensar e questionar o papel tradicional desempenhado pela família, pela
Igreja e pelo Estado na formação educacional dos indivíduos.
A Escola Nova, bem ou mal, introduziu no Brasil a questão de se pensar a
educação como problema filofico. Questão que era quase ausente no país antes de 1930.
Lourenço Filho, em sua obra Introdução ao Estudo da Escola Nova
9
, procurou apontar os
pontos básicos do novo método educacional que os educadores liberais queriam implantar no
Brasil. O primeiro ponto era fazer uma revisão crítica dos meios tradicionais de ensino. Nesse
sentido, destacou a individualidade questão pouco relevante para os educadores tradicionais
– como elemento primordial na concepção de educação dos renovadores.
De um ponto de vista estritamente educacional, a visão dos renovadores esteve
balizada em uma profunda crítica à escola vigente, caracterizada pela seletividade social de
grupos e por uma formão educacional de tipo propedêutica, trabalhando com conteúdos
pedagógicos de caráter formalista. Além das questões próprias ao método, a crítica se
debruçou na dissociação do ensino da realidade social, com fins a criar uma separação entre o
ensino e a vida.
9
A obra Introdução ao Estudo da Escola Nova: bases, sistemas e diretrizes da pedagogia contemporânea foi
publicada pela primeira vez em 1929 e seu objetivo geral era expor e analisar novos sistemas didáticos
experimentados em nações da Europa, Estados Unidos e outros paises.
Para superar o tradicionalismo, que os representantes da Escola Nova tanto
criticavam, foi proposto a superação de toda seletividade social por meio da criação de uma
escola única, dirigida a todos os segmentos da sociedade. Essa escola única deveria assumir
sua importância na construção da sociabilidade do aluno. Para tanto, sua pedagogia deveria
sustentar-se na individualidade do educando e na consciência da sociabilidade humana como
característica primordial à espécie. O nculo entre a educação e a emancipação humana
exigia uma educação pública gerenciada pelo Estado, capaz de romper com o domínio da
iniciativa privada.
Um dos pontos centrais do ideário da Escola Nova, frontalmente contrário aos
interesses da Igreja Católica brasileira, era o papel que deveria ser desempenhado pela escola
na formação dos indivíduos. Pretendia-se, com isto, deslocar a ação educadora da família e da
Igreja para a escola. Para os renovadores, essa era a melhor forma de amenizar as diferenças
sociais entre os diversos grupos que compunham a nação brasileira.
Nesse sentido, a escola deveria se tornar um lugar neutro e distante da
interferência moral da Igreja e da família, pois, tanto uma quanto a outra, eram portadoras de
valores da ordem tradicional vigente e, por isto, definiam o rumo do indivíduo, seja na vida
profissional, seja na vida espiritual. Importava, sobretudo, seguir a moral e as regras de
conduta determinadas institucionalmente e orientadas por valores laicos. A fim de impedir a
intervenção dos setores tradicionais da sociedade brasileira na educação, os simpatizantes e
militantes da Escola Nova defenderam uma educação pública e neutra em relação aos grupos
sociais, sem, com isto, afetar os interesses primordiais da nação, centrados na construção de
uma cultura nacional mais coesa e homogênea.
Com a Escola Nova, a responsabilidade de educar os indivíduos passa a ser
atribuição do Estado. A partir de então, rompe-se com o domínio exclusivo da família e da
Igreja na formação dos homens. Ao assumir uma identidade como movimento moderno, a
Escola Nova atraiu a reação de dois inimigos poderosos na época: a Igreja e o Estado
autoritário de Vargas. A presença do Estado como agente modernizador esbarrava nos limites
da ordem tradicional. Embora muitas das premissas dos pensadores da Escola Nova fossem
incorporadas ao discurso estatal, outras tantas foram cerceadas ao serem identificadas como
nocivas aos seus interesses poticos. Em linhas gerais, o projeto pedagógico dos liberais
confrontava-se com certas diretrizes do pensamento nacionalista brasileiro.
Nesse contexto, a Igreja proferiu, por meio do Centro Dom Vital e da revista A
Ordem, pesadas críticas aos militantes e simpatizantes da Escola Nova. Os renovadores
responderam aos ataques tradicionalistas através de jornais, em especial, na página de
educação do Diário de Noticias, dirigida por Cecília Meireles, entre 1930 e 1933. Ao lado da
Associão Brasileira de Educação, essa página se tornou a grande porta-voz da Escola Nova
no Brasil (LAMEGO, 1996).
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, elaborado por Fernando de
Azevedo e assinado por vinte e seis educadores brasileiros, inicia-se a partir do
estabelecimento de uma relação dialética que deve existir entre a educação e o
desenvolvimento humano. Ao colocar a educação em uma posição de primazia em relação aos
problemas nacionais, o Manifesto ressaltava a importância das atividades culturais para o
desenvolvimento econômico e social do país. Ao fazer isto, transferia para a educação, em
certo sentido, a responsabilidade de gerir esse desenvolvimento.
O Manifesto procurou ressaltar a importância da educação no processo de
desenvolvimento a partir do quadro de “inorganização” em que se encontrava o aparelho
escolar no Brasil. Essa questão apareceu, logo nas primeiras linhas do documento, como
elemento indispensável para se pensar os problemas educacionais no país.
Pois, se a evolução orgânica do sistema cultural de um país depende de suas
condições econômicas, é impossível desenvolver as forças econômicas ou de
produção, sem o preparo intensivo das forças culturais e o desenvolvimento
das aptidões, à invenção e à iniciativa que são os fatores fundamentais do
acréscimo de riqueza de uma sociedade. No entanto, depois de 43 anos de
regime republicano, se der um balanço ao estado atual da educação pública,
no Brasil, se verificará que, dissociadas, sempre as reformas econômicas e
educacionais, que era indispenvel entrelaçar e encadear, dirigindo-as no
mesmo sentido, todos os nossos esforços, sem unidade de plano e sem
espírito de continuidade, não lograram ainda criar um sistema de
organização escolar, à altura das necessidades modernas e das necessidades
do país.
10
(AZEVEDO, 1932, p. 02).
O referido manifesto priorizava demonstrar ao povo e ao governo a necessidade
de uma reforma educacional à altura das novas realidades impostas pela modernização de
alguns setores da economia brasileira. Em linhas gerais, esse manifesto tinha por objetivo
imprimir uma direção mais firme ao movimento renovador. Para tanto, buscou defini-lo de
forma objetiva. O manifesto defendeu, abertamente, a necessidade de um programa nacional
de reconstrução do sistema educacional.
Nesse manifesto, Fernando de Azevedo e seus signatários criticaram a falta de
iniciativa e de determinação dos fins sociais e filoficos da educação brasileira, condenando
a ausência de espírito científico na resolução dos problemas educacionais. Em suas palavras,
Esse empirismo grosseiro, que tem presidido ao estudo dos problemas
pedagógicos, postos e discutidos numa atmosfera de horizontes estreitos, tem
as suas origens na ausência total de uma cultura universitária e na formação
meramente literária de nossa cultura. (AZEVEDO, 1932, p. 02).
Para os signatários do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, o tratamento
científico dos problemas da administração escolar ajudaria a descobrir, a partir das finalidades
estabelecidas pela educação, os processos mais eficazes para a construção de um modelo
educacional no país. De modo a respeitar os fundamentos do movimento renovador, esse
manifesto afirmou que a finalidade da educação deve ser definida de acordo com a filosofia e
o contexto de cada época.
Desta forma, a nova educação brasileira deveria ser uma reação categórica,
intencional e sistemática, contra a velha estrutura educacional montada no Brasil durante a
10
Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova no Brasil produzido, em 1932, pelos educadores liberais, com
liderança de Fernando de Azevedo, e dirigido ao povo e ao governo com o interesse de apresentar as bases para
um projeto de reconstrução educacional no Brasil. Disponível em: <http://pedagogiaenfoco.pro.br/heb07a,htm>.
república velha. Para os renovadores, o conflito se assentava em duas concepções de
educação: de um lado, a concepção atrelada ao que resolveram chamar de “velhoe, de outro,
a concepção que pretendia acabar com as antigas visões tradicionalistas e implantar o “novo”,
este identificado com o desenvolvimento industrial. Nessa direção, o manifesto trouxe à
discussão não apenas um debate educacional, mas também um projeto de superação do
atraso”, provocado pelo domínio das oligarquias tradicionais no país, ao longo da Primeira
República.
A partir das condições históricas do período pós-1930, a educação deveria seguir
o movimento de centralização da potica brasileira. Nesse sentido, a educação era definida
como uma função própria do Estado, cabendo ao mesmo evitar que qualquer classe social
fosse excluída do direito ao ensino. Definida nesses termos, a educação não poderia se tornar
privilégio de ninguém. Para tanto, deveria ser ministrada a todos de forma igual, geral e
comum, sem nenhum tipo de distinção que pudesse vir a beneficiar interesses de classe.
O Manifesto sugere em que deva consistir a ação do Estado, reivindicando a
laicidade do ensino público, a gratuidade, a obrigatoriedade e a co-educação.
Reconhecendo pertencer ao cidadão o direito vital à educação, e ao Estado o
dever de segurá-la e assegurá-la de forma que ela seja igual e, portanto
única, para todos, quantos procurem à escola pública, é evidente que esse
direito possa ser assegurado a todas as camadas sociais, se a escola for
gratuita. (ROMANELLI, 2001, p. 147).
O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, no Brasil, assumiu um significado
histórico muito importante. Pois, ao proclamar a educação como um direito individual que
deveria ser assegurado a todos, sem distinções, ele elevou a educação a uma outra esfera
social. Ao afirmar ser dever do Estado assegurar a educação para todos, através da
implementação de escolas públicas, gratuitas, obrigatórias e leigas, o Manifesto dos Pioneiros
a tratou como um problema social, cuja responsabilidade deveria ser assumida pelo povo e
pelo governo. Isto representou, inegavelmente, um grande avanço para a época.
Por meio desse documento, o movimento renovador inaugurou uma série fecunda
de debates de idéias. Essa série agitou o ambiente potico da época e contribuiu para as
primeiras reformas que apontaram para uma nova direção dos modelos educacionais
brasileiros, que passariam a nortear o pensamento em torno da unidade da função educacional
a partir de novos conceitos.
Ao empreender uma análise histórica das idéias balizadoras do ideário da Escola
Nova, constatou-se que elas resultaram da nova situação criada com a ascensão de novas
classes sociais. Essa complexidade pode ser associada a uma conquista do Estado burguês
decorrente da nova etapa do desenvolvimento do capitalismo industrial e urbano.
2.2. Conciliação e Reforma: reaproximação entre Estado e Igreja no governo Vargas
Em linhas gerais, a conseqüência mais imediata do acordo de reaproximação
política, proposto por Francisco Campos, pôde ser sentida quando a Igreja passou a aceitar,
sem críticas, uma presea muito mais ativa do Estado na educação do que normalmente o
faria. Nos anos de 1930, o Brasil respirou em meio ao debate da educação pública versus
educação privada. Esse debate, que migrou da Europa, assumiu na realidade brasileira a forma
de uma oposição entre os defensores do ensino leigo, universal e blico, de um lado, e os
defensores do ensino privado e confessional, ligados a Igreja, de outro.
O papel crescente do governo federal na educação teve, também, como
conseqüência o enfraquecimento dos esforços educacionais dos estados. Ao longo da década
de 1920 e início dos anos 1930, em várias regiões do país, observou-se que esses esforços
educacionais delinearam-se com maior vigor. A exemplo disto, cita-se a reforma da educação
mineira que projetou, nacionalmente, o seu idealizador, Francisco Campos. Todavia, este o
foi um efeito exclusivo da potica do Ministério da Educação, mas sim parte de um processo
muito mais amplo de concentração do poder no Rio de Janeiro, que, por sua vez, acarretou o
conseqüente esvaziamento dos estados.
Um dos principais resultados da colaboração entre a Igreja e o Ministério da
Educação foi a grande ênfase dada ao ensino humanista na escola secundária em detrimento
da formação científica e técnica. Essa opção justificou-se pela percepção de que caberia à
escola secundária a formação das elites condutoras do país, enquanto as grandes massas
seriam atendidas pelo ensino primário ou por escolas profissionais menos prestigiadas.
Dentro do espírito do Estado Novo, o ministro Capanema tratou de centralizar,
quando possível, a educação nacional. Todavia, deve-se assinalar que o centralismo não se
originou com Capanema. Antes dele, o centralismo fez-se presente na legislação promulgada
por Francisco Campos, em 1931. Essa centralização foi, sobretudo, normativa. O Estado
sentia a necessidade de fixar em lei todos os detalhes da atividade educacional. Isto
significava registrar desde os conteúdos curriculares aos horários de aula, passando pelas
taxas cobradas aos alunos. O ideal era repetir, no Brasil, o lendário modelo napolnico. Ou
seja, o ministro orgulhoso deveria saber o que cada professor estava ensinando em qualquer
parte do terririo nacional, sem que isto demandasse sua saída do gabinete
(SCHWAZTMAN, 1984).
Inicialmente, a autonomia era aceita nas universidades, conforme a legislação
promulgada, em 1931, por Francisco Campos. Mas, era corrente a opinião, até o presente em
voga, de que elas “ainda não estavam preparadas”. O conteúdo do ensino básico
11
deveria ser
11
Durante o Império e a República Velha, o ensino básico, ou primário, era deixado a cargo das iniciativas locais
das províncias e dos estados. O governo nacional não intervinha nem para estimular nem para cooperar. O
fixado por lei e sua manifestação concreta fixada em instituições. Dentro dessas perspectivas,
o Colégio Pedro II e a Universidade do Brasil, mais que referências, transformaram-se em
modelos de ensino para o país.
As instituições de ensino não poderiam projetar seu próprio crescimento e definir
seus objetivos ao longo do tempo. Também era inaceitável a idéia de que elas pudessem
evoluir segundo formatos, modelos e conteúdos distintos. Como afirma Schwartzman, não
havia lugar para incrementalismo e muito menos para pluralismo. A ênfase toda era dada na
uniformização dos valores nacionais.
A uniformidade dos procedimentos e planos atenderia aos interesses da Igreja e do
Estado na medida em que afinasse seus instrumentos na construção de uma ideologia
nacional. Na interpretação de José Oscar Beozzo, a Igreja Católica foi a mais beneficiada
nesse processo em função da alteração nas relações triangulares entre o Estado, a Igreja
brasileira e o Vaticano. Ao longo do período colonial, a Igreja fez parte da administração
pública e não passou de uma instituição atrelada ao governo e aos seus desígnios. Nesse
sentido, a Igreja brasileira esteve mais vinculada ao governo do que ao Vaticano.
As a Constituição republicana de 1891, o Estado e a Igreja foram separados.
Com isto, ocorreu uma reestruturação das bases eclesiásticas da Igreja brasileira. Nesse
contexto, ela esteve mais diretamente subordinada aos desígnios do Vaticano. Ao longo dos
anos de 1930, o bispado brasileiro conseguiu articular e mobilizar uma grande parcela da
população e de setores da intelectualidade brasileira, que passaram a assumir como suas as
idéias e os interesses da Igreja. Por meio dessa mobilização, a Igreja conseguiu articular-se de
modo a forçar sua entrada na cena potica brasileira, fato que se consolidou com a
resultado disso foi um desenvolvimento falho, desigual e retardado. É por isso que a fixação do conteúdo do
ensino básico por lei federal significou um grande avanço para a nacionalização do ensino. Sobre o assunto, ver:
CAPANEMA, Gustavo. Educação. In: SCHWARTZMAN, Simon. Estado Novo um auto-retrato. Brasília, DF:
Editora Universidade de Brasília, 1983.
promulgação da Constituição de 1934. Constituição que celebrou a reaproximação potica
entre o Estado e a Igreja no Brasil.
No período posterior a promulgação da Constituição de 1934, a Igreja Católica
brasileira ficou em situação de privilégio, pois, novamente, estava atrelada ao Estado e
possuía poder de barganha, inclusive com o Vaticano (BEOZZO, 2004). A partir de 1937,
com a institucionalização do Estado Novo, a situação da Igreja fora alterada. O governo
rompeu o pacto com a Igreja quando eliminou da Carta Constitucional de 1937 todas as
reivindicações católicas. Contudo, Vargas procurou tranqüilizar a Igreja. Assegurou-lhe que
na prática nada seria alterado na situação potica e social da Igreja, que deveria permanecer a
mesma, de acordo com as afirmações do líder da nação. A única diferença foi que a situação
da Igreja, que antes estava resguardada em lei inscrita na Constituição, passou a depender do
arbítrio do governo brasileiro.
Diante do exposto, pode-se dizer que a situação para a Igreja deixou de ser
cômoda, mas não de ser privilegiada. Mesmo depois de 1937, o Brasil continuou se
reconhecendo como nação católica e a Igreja permaneceu prestando apoio religioso as forças
armadas. O ensino religioso facultativo nas escolas também foi mantido, tal qual previsto na
Constituição de 1934. A continuidade das conquistas históricas da Igreja pode ser tomado
como indício de um pacto de confiança entre a Igreja Católica e o Estado Novo.
A partir dos anos de 1920, o Cardeal Leme ocupou papel primordial na trajetória
política da Igreja. Ele opôs-se diretamente a uma possível aliança entre o Estado brasileiro e a
Santa Sé. Caso isto ocorresse, avaliou que a Igreja Católica brasileira ficaria duplamente
dominada e isso não interessava de forma alguma as suas pretensões. Ao seguir a
interpretação proposta por Jo Oscar Beozzo, em seu texto clássico A Igreja entre a
Revolução de 30, o Estado Novo e a Redemocratização, afirma-se que ocorreu no Brasil, a
partir de 1937, a celebração de uma concordata moral entre o Estado e a Igreja. Esta
concordata moralpropiciou à Igreja a manutenção de certa liberdade, tanto em relação ao
Estado quanto em relação ao Vaticano (BEOZZO, 2004).
O processo de centralização e de nacionalização, visível no âmbito do Estado,
também atingiu a Igreja Católica quando da prática de uma potica de verticalização dos
interesses da Igreja brasileira em torno da figura do Cardeal Dom Sebastião Leme. Esse
cardeal compreendia a importância dos intelectuais dentro da sociedade, reconhecendo o
campo intelectual como caminho para o fortalecimento do pensamento cristão. Nessa direção,
atribuiu importância estratégica ao grupo de intelectuais católicos vinculados ao Centro Dom
Vital. Com isto, confiou a esse grupo a direção de instituições de distintas naturezas, tais
como a Liga Eleitoral Católica (LEC), a Confederação Calica Brasileira de Educação, o
Instituto Católico de Estudos Superiores e a Ação Católica. Essas instituições estiveram
diretamente envolvidas na defesa dos princípios católicos no âmbito da educação ou na
condução moral da nação, orientando, inclusive, a ação dos partidos poticos. A ousadia
intelectual do catolicismo não seguiu a diretriz indicada. Por essa razão, esboçou um novo
patamar reflexivo para a nacionalidade. Nessa caminhada da Igreja, duas figuras ocuparam
lugar de destaque: entre os leigos, o espaço foi preenchido por Alceu Amoroso Lima,
enquanto que, entre os representantes do clero, o padre Leonel Franca ganhou projeção.
A figura do Cardeal Leme esteve presente em todas as grandes manifestações do
catolicismo. Sua atuação carismática foi capaz de centralizar, sob sua direção, os principais
objetivos da Igreja. Isto fez dele o principal líder da Igreja Católica brasileira. A morte do
Cardeal Leme, em 1942, resultou em prejuízo para a organicidade e para a mobilização do
movimento calico. A capacidade de direção, tal qual desempenhada por Dom Leme durante
a era Vargas, foi alcançada novamente no interior da Igreja apenas em 1952, com a criação
de um centro de coordenação e decisão, conhecido como CNBB.
2.3. O ensino laico em debate
Com base no exposto até o momento, pode-se afirmar que o cenário educacional
dos anos de 1930 foi marcado por intensas disputas ideológicas. Frente a isto, faz-se
necessário refletir sobre o debate que envolveu inúmeros intelectuais brasileiros em torno da
definição dos destinos e dos caminhos da educação. Dentro desse debate, avalia-se que a
questão do ensino laico representou o principal ponto de discordância entre os educadores
liberais e católicos. Enquanto que, para os educadores liberais, o ensino laico seria a forma
mais correta para solucionar os problemas da educação brasileira, para os educadores
católicos, ele poderia colocar em risco o papel tradicional da família e da Igreja na sociedade,
criando, assim, uma “anarquia de valores”.
As análises empreendidas pelos pensadores católicos e pelos pensadores liberais
partiam da constatação de que o mundo passava por uma intensa crise de valores (CURY,
1986). Porém, as causas e as conseqüências desta crise eram interpretadas de forma
diferenciada por ambos os grupos, em função de suas vinculações sociais e ideológicas.
Para os educadores liberais
12
, essa crise era fruto da modernização das relações
sociais, econômicas e poticas. Para eles, essa modernização fora trazida pelas revoluções
burguesas do século XVII e XVIII, que introduziram, através da ciência, novos
conhecimentos e técnicas. Segundo suas convicções, a função da educação na superação da
crise era clara: através da educação os homens seriam preparados para se tornarem senhores
desta nova realidade histórica.
Para esses educadores, a crise era fruto do despreparo intelectual da cultura
brasileira. Pois, esta não havia se modernizado para acompanhar as transformações sociais
12
Este termo é utilizado para designar o grupo de educadores que se tornaram os pioneiros da Escola Nova no
Brasil Dentre eles, citam-se: Fernando de Azevedo, Lourenço Filho, Anísio Teixeira, Cecília Meireles e os
demais signatários do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova.
que estavam acontecendo em todo o mundo. A solução desse problema residia na criação de
um modelo educacional moderno e coerente com as realidades brasileiras, fundamentado em
valores filosóficos e científicos. Por causa desse diagnóstico, a educação tinha que ser pública
e não seletiva. Ou seja, deveria ir além dos interesses de classe, assim como assumir, acima de
tudo, a condição de laica (CURY, 1986).
Do outro lado do debate, colocavam-se os educadores de filiação católica, aqui
chamados de conservadores. Para esses, a crise também estava vinculada às mudanças sociais
e poticas introduzidas pelo liberalismo. Contudo, as causas e os motivos dessa crise eram
outros. Os pensadores católicos acusavam os pensadores liberais de materialistas. Para os
católicos, a iia de criar uma escola laica era uma forma de concretização do materialismo.
Em 1931, Alceu Amoroso Lima falou sobre a importância do decreto lei que
regulamentou o ensino religioso nas escolas publicas de todo o Brasil e ressaltou a
importância de “Deus na Escola”.
Seja como for, porém, o decreto que aí está, representa sem dúvida, um
primeiro passo no sentido de reparar, não o erro laicista de 1891, mas,
sobretudo a falsa interpretação, que se vinha dando ao postulado da
neutralidade pública em matéria religiosa (ATHAYDE, 1931, p. 68).
Para Alceu Amoroso Lima, a educação brasileira estava, desde 1891, sujeita
ao que ele chamou de absolutismo laicista, segundo o qual o Estado deveria dar apenas
instrução, deixando a educação a cargo de cada individuo. Ele responsabilizou o
instrutivismo da educação brasileira, manifesto nos primeiros anos da república, pela
precariedade do sistema e dos valores educacionais de sua época. Segundo sua análise,
as gerações que se formaram sob esse modelo sofreram com a instabilidade, pois, não
possuíam convicções seguras, ideais nítidos, como também não eram capazes de
formar uma personalidade coletiva coerente e forte.
Neste inicio de século em que estamos, havia nos programas de ensino, um
abandono absoluto da formação do corpo e da formação do caráter, nem
educação fhysica, nem educação moral e religiosa. Instrução, instrução e
nada mais (ATHAYDE, 1931, p. 71).
A concepção de educação que Alceu Amoroso Lima defendia para ser
implantada no Brasil, em clara oposição às idéias liberais, era uma educação de forte
base moral. Com isto, esperava que a educação fosse capaz de fornecer aos indivíduos
uma visão social harmônica da sociedade brasileira. Essa visão estaria assentada na
criação de um sentido teleológico e teodicéico da vida, na supressão das liberdades
individuais soltas e, por fim, no forjar de um sentido harmônico de consciência
coletiva que encontrasse sua sustentação na família, na Igreja e no Estado.
Para os pensadores católicos, a separação efetuada, em 1891, entre a Igreja
e o Estado não baniu apenas o ensino religioso das escolas, mas, tamm, todo e
qualquer senso de dever moral que nela existia.
Ao passo que se estudavam como ciências positivas à física e a matemática,
como conhecimentos sistemáticos à gramática ou a história, como estudos
fundamentais o desenho ou o latim, mas o ensino da moral consistia em
vagos discursos cívicos nas datas nacionais, o de religião era
completamente inexistente. Durante quarenta anos de república, gerações e
gerações se sucederam em nossas escolas públicas sem que ouvissem falar
jamais em deveres morais e religiosos, senão por acaso, ou eno fora da
escola (ATHAYDE, 1931, p. 96).
Baseado nessa análise, Alceu Amoroso Lima considerou que a situação da
educação brasileira representou um dos maiores empecilhos para a construção de uma
nacionalidade e de uma nação harmoniosa. Em linhas gerais, o modelo educacional
defendido pela militância católica possuiu uma certa visão estóica da vida social.
Nesse sentido, a educação tinha como principal objetivo formar indivíduos com fortes
valores morais e com uma consciência social, forjada em múltiplos sensos de deveres
para com as instituições. Diante dessa análise, torna-se difícil não concordar com Jamil
Cury quando diante de uma visão cosmogânica da vida, que se afirmou em clara
oposição a cosmovisão liberal naquilo que ela tem de mais essencial: a liberdade de
ação. Nesses termos, para os pensadores católicos, a educação deveria condicionar a
formação do indivíduo para cumprir seus deveres sociais para com Deus, a família e o
Estado.
Em dezembro de 1932, Alceu Amoroso Lima, através da revista A Ordem,
descreveu o grupo dos reformadores da seguinte forma:
Concretizadores do materialismo silenciam sobre Deus, (são “ateus
inconfessos”), negam ao homem a dimensão espiritual, e limitam-se ao
natural e ao terreno, aceitam a mutabilidade de tudo até mesmo na moral.
Baseiam-se na ciência e no seu todo experimental e recusam-se a
valorizar a metafísica
13
. Em educação querem o homem educado apenas para
o presente desta vida, menosprezam a ação da Igreja e diminuem o papel da
família e tendem ao monopólio pedagógico estatal. Fundamentalmente
leigos no ensino, excedem na valorização dos novos todos e caem em
toda sorte de exageros quanto ao papel e a função da escola na
sociedade.(LIMA, 1932).
Essa descrição, realizada por Alceu Amoroso Lima, assumiu importância na
medida em que expressou, de forma bem clara, a idéia que os católicos tinham em relação aos
reformadores liberais. Para os católicos, a falta de fé e a vulgarização das iias seriam as
causas últimas da crise nacional. Os pensadores católicos colocavam grande ênfase na
formação das elites intelectuais. Pois, a “revolução espiritual” pretendida por eles deveria
13
Descrição elaborada por Alceu Amoroso Lima, em dezembro de 1932, e publicada na revista A Ordem. Para
mais, consultar: CURY, Carlos R. Jamil. Ideologia e Educação Brasileira: católicos e liberais. São Paulo:
Cortez, 1986.
ocorrer de cima para baixo, visto que para os católicos o problema do caos” brasileiro não
era um problema político e sim religioso (RODRIGUES, 2005).
Para os católicos, o que estava em jogo era uma disputa de poder, uma vez que as
alterações propostas pelos liberais colocavam em crise a função da Igreja dentro da sociedade
brasileira. A mobilização do catolicismo em torno da educação ganhou forma de uma
mobilização potica (Ação Católica) que se fez sentir na manutenção dos valores tradicionais
que davam à Igreja a sustentação de sua própria existência.
A grande questão que esteve em jogo, e que apareceu visivelmente na disputa pela
educação, foi o confronto de duas visões de mundo, que, em linhas gerais, se mostraram em
posições opostas. A disputa entre o “antigoe o “modernofoi introduzida pela modernidade
na Europa, e chegou ao Brasil através do liberalismo. A década de 1930 foi o momento em
que essas duas cosmovisões entraram em choque direto pela disputa da hegemonia das
questões educacionais.
Nesse sentido, os anos de 1930 representou para os brasileiros um período de
passagem, no qual os desdobramentos da história, movidos pela ão e pelo interesse dos
indivíduos, colocaram diante da sociedade brasileira duas possibilidades de formação
14
. Nesse
contexto em que a possibilidade da revolução e da mudança eram possíveis, os indivíduos
inseridos no processo optaram pela conciliação em detrimento de uma reforma substancial
que poderia inserir novos valores, ao mesmo tempo em que contribuiria com o
desenvolvimento da educação e da cultura no país. Por essa razão, afirma-se que esse período
assumiu traços de um novo malogro na história potica brasileira em que a possibilidade da
14
Entende-se por “formação” a idéia que circunscreve a formação do indivíduo como sendo fruto do processo
de interação do homem com a sociedade, orientada a partir de determinados valores e visões de mundo, que
marcam e fornecem os elementos para a sua interpretação da realidade. Uma reflexão verossímil foi produzida
por Otília Beatriz Fiori Arantes. Para mais, consultar: ARANTES, Otília Beatriz Fiori. Sentido da Formação:
três estudos sobre Antônio Candido, Gilda de Melo e Souza e Lúcio Costa. Rio de Janeiro: Paz e terra, 1997.
revolução foi novamente abandonada em detrimento de uma reforma, marcada,
substancialmente, por traços fortíssimos de conservadorismo.
Durante as cadas iniciais do século XX, acompanhou-se o deslocamento dos
debates sobre a educação para o primeiro plano das diretrizes políticas do país. Pode-se
afirmar que o que conferiu à educação relevância potica foi a crença, por quase todos
compartilhada, em seu poder de moldar a sociedade a partir da formação das mentes e da
abertura de novos espaços de mobilidade social e participação (SCHWARTZMAN, 1984).
Essa importância simbólica que a educação passou a exercer no século XX,
sobretudo na era Vargas, foi o que mobilizou a inserção em uma análise mais cuidadosa
dessas questões, com o propósito de compreender historicamente o período aqui estudado.
Pois, antes de Vargas, desconhece-se indícios de uma abertura tão grande para a atuação de
intelectuais nos assuntos concernentes à nação brasileira.
As disputas ideológicas foram intensas e direcionadas à conquista do poder.
Contudo, também se fizeram notar quando no exercício do próprio poder. Existiam correntes
sociais das mais variadas orientações ideológicas que pretendiam buscar seu espaço e
legitimar-se dentro da máquina estatal. Provavelmente, não existiu um lugar onde essas
disputas ideológicas foram tão intensas quanto no campo da educação. No interior desse
campo, apesar de existirem outras orientações ideológicas, essa disputa polarizou-se entre a
educação leiga de fundo humanista e a educação cristã de cunho religioso. Polarização esta
que se estabeleceu por intermédio de representantes do chamado Movimento da Escola Nova
e da Igreja Católica (PAIM, 1982).
O movimento da Escola Nova o possuía um projeto especificamente definido e,
de forma geral, unia-se em torno de grandes temas. Para esse movimento, a escola blica
deveria ser universal e gratuita, a educação deveria ser ministrada para todos e todos deveriam
possuir o mesmo modelo de educação, dando aos indivíduos a igualdade básica orientada pela
educação. A diferenciação ocorreria com as capacidades individuais de cada pessoa. Esse
ensino seria, naturalmente, leigo. Sua grande função era, em última análise, formar o cidadão
livre e consciente que pudesse incorporar-se, sem a tutela de corporações de ofícios ou
organizações sectárias de qualquer tipo, ao Estado Nacional (ROMANELLI, 2001).
Além desses grandes temas, o movimento pela educação nova incorporava, de
forma nem sempre sistemática, uma série de princípios pedagógicos que se afastavam da
transmissão autoritária, direta e repetitiva de conhecimentos e ensinamentos. Também
procurava se aproximar dos processos mais criativos e menos rígidos de aprendizagem. Nesse
movimento, alguns nomes se destacaram por suas iias e suas atuações. Cabe aqui citar
nomes como o de Anísio Teixeira, de Fernando de Azevedo, de Manuel Lourenço Filho e de
Francisco Campos. Este último foi responsável pelas reformas educacionais em Minas, o que
lhe rendeu a participação como primeiro ministro da Educação e Saúde do governo de Vargas,
em 1931. Como afirma Simon Schwartzman:
Nem todos pensavam da mesma maneira, e nem tiveram o mesmo destino.
Anísio Teixeira e, em menor grau, Fernando de Azevedo, atrairiam a ira da
Igreja Católica, seriam chamados de comunistas, e passariam períodos de
ostracismo; Lourenço Filho assumiria uma postura predominantemente
cnica e se manteria como assessor próximo de Capanema até o fim de seu
ministério. Francisco Campos não mais voltaria à área educacional depois de
seu período de ministério, assumindo mais tarde posição no governo Vargas
como seu ministro da Justiça e mentor intelectual do golpe de estado de
1937.(SCHWARTZMAN, 1984, p. 37).
Para Schwartzman, a tradição brasileira, desde o Império, sempre foi a de que o
governo central se preocupava com a educação superior e a ciência, deixando para a Igreja,
para as províncias, e de certa forma para ninguém, a educação da população. Ao final do
século XIX, quando muitos países da Europa haviam conseguido universalizar a educação
básica, o Brasil criava novas faculdades de engenharia e medicina, mas a população
continuava analfabeta.
Quando Capanema assumiu o Ministério da Educação, em 1934, o Brasil
continuava um país de analfabetos. Contudo, o tema da educação pública começava a
preocupar os intelectuais brasileiros. O Ministério da Educação havia sido criado em 1930 e,
em março de 1932, foi divulgado o "Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, que fazia
referência ao movimento de reconstrução educacional.
O Manifesto argumentava que o Brasil avançava economicamente, mas que a
educação ainda ficava para trás. Com base nesse diagnóstico, esse manifesto defendia uma
educação nova e pragmática que deveria se propor a servir não apenas aos interesses de
classes, mas aos interesses do indivíduo. Somado a isto, caberia a essa educação nova fundar-
se sobre o princípio da vinculação da escola com o meio social, em que o modelo escolar
estivesse condicionado pela vida social atual. Esse modelo deveria ser profundamente
humano, marcado pela solidariedade e pela cooperação (ROMANELLI, 2001).
O manifesto afirmava que a laicidade”, gratuidade, obrigatoriedade e co-
educação eram princípios em que deveria se assentar o projeto de escola unificada. Esses
princípios decorrem tanto da subordinação à finalidade biológica da educação, quanto de
todos os fins particulares e parciais (de classes, grupos ou crença)
15
.
O Manifesto defendia a criação de um fundo público para a educação que
financiasse as escolas em todo o país de forma descentralizada. Esse fundo deveria, por um
lado, atender a um núcleo comum de conhecimentos para a educação até os 15 anos, com
forte diferenciação profissional a partir daí, e, por outro, prestar auxílio a universidade de
modo a fazer com que o ensino e a pesquisa fossem viabilizados de forma inseparável.
Tanto o Manifesto dos Pioneiros quanto a atuação de seus signatários marcaram a
evolução da educação brasileira nas décadas seguintes. Do mesmo modo, foi o Manifesto que
15
Manifesto da Educação Nova produzido, em 1932, por Fernando de Azevedo e por Anísio Teixeira, com o
propósito de ser dirigido ao povo e ao governo. Dispovel em: <http: //pedagogiaenfoco.pro.Br/heb07a, htm>.
definiu o conjunto de iias que acabaram por ser utilizadas ou rechaçadas por Capanema, ao
longo de seus onze anos de atuação ministerial (GOMES, 2000).
A contribuição principal de Capanema na área da educação foi, provavelmente, a
manutenção da agenda ressaltada no Manifesto dos Pioneiros, ao longo dos anos
subseqüentes. No entanto, o é possível afirmar que Capanema tenha sido um adepto fiel das
idéias e propostas dos pioneiros. Na verdade, uma análise mais aprofundada desse período,
demonstrou que Capanema esteve mais próximo, sobretudo no início de sua carreira potica,
do conservadorismo autoritário de Francisco Campos. Até o rompimento de suas relações em
1934, Campos foi para Capanema, ao mesmo tempo, o seu mentor ideológico e o grande
incentivador de sua carreira potica, em Minas Gerais. O referido rompimento ocorreu
quando ambos disputaram os votos para deputado federal na cidade de Pitangui. Essa questão
do rompimento potico entre Campos e Capanema não será desenvolvida aqui, pois, em
função de sua relevância, ela será tratada em um capítulo à parte que tem por objetivo
analisar, paulatinamente, a trajetória política de Gustavo Capanema.
Apesar do Manifesto não revelar isto claramente, foi possível perceber que os
movimentos educacionais dos anos de 1920 e 1930 foram marcados por profundos conflitos
ideológicos, em que a Igreja Católica e seus representantes leigos exerceram um papel
fundamental. Tradicionalmente, em todas as partes, a aprendizagem das primeiras letras
sempre esteve associada ao ensino da religião, e não é por acaso que judeus e protestantes,
para os quais a leitura da Bíblia é obrigatória, não conheçam o analfabetismo. A Igreja
Católica também preocupou-se em demasia com a educação, sobretudo, para garantir o
conteúdo da formação ética, humanista e religiosa das elites dirigentes dos países em que ela
se faz presente.
A Constituição de 1934 incorporou as emendas religiosas e deu ao novo ministro
ampla margem de ação. De acordo com seu artigo 150, caberia à União fixar o Plano
Nacional de Educação para todos os graus e ramos de ensino, comuns e especializados,
coordenar e fiscalizar a execução do plano em todo o território do país, bem como organizar o
ensino secundário e superior nos territórios e no Distrito Federal.
A liberdade de ensino foi reconhecida como princípio geral, mas “observadas as
prescrições da legislação federal e estadual”. A definição desse plano e o estabelecimento de
um sistema nacional de coordenação e execução dominaram as atividades do ministério, nos
anos que se seguiram à sua aprovação. No entanto, a questão educacional não era uma tarefa
fácil, nem mesmo isolada. Naqueles anos, ela fora tema altamente politizado, que atraiu os
melhores talentos da potica e das letras, como também provocou os maiores conflitos de
natureza ideológica (ROMANELLI, 2001).
À frente do Ministério da Educação, Capanema foi o gestor das reformas
educacionais. Mas, em linhas gerais, as reformas não abrangeram a substituição dos valores
arcaicos presentes na educação brasileira. Apenas conseguiu reorganizar a questão a partir da
concilião de elementos modernos e conservadores,bem como da criação de uma nova
estrutura para a educação. Todavia, manteve os antigos valores que corroboraram para a
falência da educação no país.
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GUSTAVO CAPANEMA E A EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Neste capítulo, buscamos reconstruir e analisar os projetos que mobilizaram o
Ministério da Educação durante a gestão de Capanema. Procuramos, sobretudo, suas matrizes
políticas e ideológicas, acompanhando os movimentos e práticas sociais que coordenaram as
ações no campo da educação.
O Ministro Capanema foi o maestro das reformas, portanto se torna necessário
acompanhar sua formação potica, suas principais inflncias e contatos. O quadro traçado
anteriormente, apesar de limitado, revela as grandes correntes de pensamento que marcaram o
debate potico sobre a educação e a cultura.
O Ministério da Educação foi criado no Brasil em 14 de novembro de 1930 com o
nome de Ministério da Educação e Saúde blica. Sua criação foi um dos primeiros atos do
Governo Provirio de Getúlio Vargas, que havia tomado posse em três de novembro, logo
após a Revolão de 30. O primeiro Ministro da Educação, Francisco Campos, veio de Minas
Gerais. Sua nomeação foi uma compensação do governo federal a Minas pela participação na
Revolução de 1930, mas resultou também da pressão de setores conservadores da Igreja
Católica liderados por Alceu Amoroso Lima, que defendia a nomeação de uma pessoa de
confiança da Igreja. A aliança entre os católicos e o governo provisório se enfraquecerá em
função de divergências ideológicas no interior do grupo conservador, pois Alceu Amoroso
Lima não concordava com o papel que Campos reservara a Igreja no pacto com o Estado,
idealizado por ele ainda em 1930, mas que só entrou em vigor, com ressalvas, em 1934.
Francisco Campos já acumulava uma experiência de reformador da educação em
Minas Gerais na década de 1920. A reforma que fez no ensino primário e normal do Estado
foi pioneira no país. Neste momento, Campos seguia os postulados gerais da Escola Nova,
que haviam chegado ao Brasil pelas mãos de educadores como Anísio Teixeira e Fernando de
Azevedo, após a Primeira Guerra Mundial (SCHWARTZMAN, 1984).As principais medidas
tomadas por Francisco Campos, na pasta da Educação e Saúde Pública, datam de abril de
1931. Nessa ocasião, foi assinado um decreto que afirmava ser preferível o sistema
universitário ao das escolas superiores isoladas, estabelecendo como exigência para a
fundação de uma universidade a existência de três unidades de ensino superior: as Faculdades
de Direito, Medicina e Engenharia ou, no lugar de uma delas, a Faculdade de Educação,
Ciências e Letras. Outra medida importante foi à reforma do ensino secundário, iniciada por
Campos e concluída por Capanema.
Com a demissão de Francisco Campos, em 16 de setembro de 1932, outro mineiro
assumiu o ministério, Washington Pires. Em 25 de julho de 1934, foi substituído por Gustavo
Capanema, igualmente representante de Minas Gerais. O novo Ministro permaneceu no cargo
entre 1934 e 45. Nesse longo tempo aproximou o ministério dos intelectuais que assumiram a
função de consultores e defensores das propostas educativas do governo. Durante toda a sua
gestão, Capanema contou com a fidelidade do poeta Carlos Drummond de Andrade, seu chefe
de gabinete, e recebeu também a colaboração direta de Mario de Andrade, Rodrigo de Melo e
Franco de Andrade, Anísio Teixeira, Lourenço Filho, Fernando de Azevedo, Heitor Vila
Lobos, Manuel Bandeira, Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, entre outros representantes da
cultura, da literatura e da música nacionais.
Para o poeta e amigo Carlos Drummond de Andrade, Capanema: soube ser ao
contrário de muitos, um intelectual no poder, sem os excessos e as frustrações que o poder
quase sempre impõe aos intelectuais (SCHWARTZMAN, 1984, p. 26). O ministro Capanema
ficou conhecido pelas grandes reformas que promoveu. Os projetos que foram iniciados na
gestão de Francisco Campos foram amadurecidos, tais como a reforma do ensino secundário e
o grande projeto de reforma universitária, que resultou na criação da Universidade do Brasil,
hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Além destas questões diretamente relacionadas à educação, não devemos esquecer
foi também nessa época que se definiu uma potica de preservação do patrimônio cultural do
país, que culminou na criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
(SPHAN), concebido por Mário de Andrade e dirigido por Rodrigo Melo Franco de Andrade.
Merecem destaque, ainda, a criação do Instituto Nacional do Livro e a construção do edifício-
sede do Ministério da Educação no Rio de Janeiro, marco da moderna arquitetura brasileira,
projetado por Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e decorado com painéis de autoria de Cândido
Portinari.
Mas a gestão de Capanema foi também marcada, como obviamente não poderia
deixar de ser, pelos efeitos da potica autoritária e centralista do Estado Novo. Em 1939, foi
fechada a Universidade do Distrito Federal, se iniciando uma dura ação repressiva contra as
escolas mantidas pelas colônias alemãs no sul do país. Foram fechadas mais de duas mil
escolas, sobretudo depois de 1942, quando o Brasil rompeu relações com a Alemanha. Esse
ato do governo ficou conhecido como a “nacionalizão do ensino”, difundindo a xenofobia
para todo território nacional, sentimento de aversão ao estrangeiro tão comum em épocas de
guerra.
Do ponto de vista da saúde pública, a segunda atribuição do ministério, houve
uma preocupação de atender às populações do interior. Em 1937 foi criado o Serviço
Nacional de Febre Amarela, o primeiro serviço de saúde pública de dimensão nacional, e em
1939, o Serviço de Malária do Nordeste. Vários hospitais, colônias e asilos foram construídos
para o tratamento de outras endemias, como a tuberculose e a lepra. Em 1941, o
Departamento Nacional de Saúde assumiu o controle da formão de técnicos em saúde
pública para ampliar o atendimento.
Mas, a faceta talvez mais significativa da gestão de Capanema no Ministério da
Educação, que hoje é esquecida por muitos, foi sua íntima associação com os setores mais
militantes e conservadores da Igreja Católica; naqueles anos representados por Alceu
Amoroso Lima, Padre Leonel Franca e, como figura central, o Cardeal Dom Sebastião Leme,
do Rio de Janeiro. Não se tratava de mera afinidade filosófica ou ideológica. Em 1934,
quando Capanema chega ao Ministério da Educação, firmou-se o pacto político pretendido
por Francisco Campos entre Getúlio Vargas, e a Igreja. Segundo este acordo, a Igreja daria ao
governo apoio político e receberia em troca a aprovação das chamadas “emendas religiosas”
na Constituinte de 1934, que incluía, entre outras coisas, a obrigatoriedade do ensino religioso
nas escolas blicas. Mais do que isto, o pacto permitiu que o Ministério da Educação fosse
entregue a uma pessoa de confiança da Igreja, que trabalharia em consulta constante com
Alceu Amoroso Lima.
A maior parte do trabalho do Ministério Capanema na área da educação se dá nos
níveis do ensino secundário e superior. Para o ensino secundário, naqueles anos começando
com o antigo ginásio, que recebia crianças a partir de 10 anos, o Ministério busca na Itália o
modelo para um currículo enciclopedista, centralizado e convencional, baseado na
aprendizagem formal e abstrata das ciências e das letras, que consolidava a natureza elitista e
classista da educação, e uma pedagogia “de fora para dentro”, e não a partir da vincia do
mundo do trabalho e da vida em comunidade, que o Manifesto dos Pioneiros havia tão bem
criticado.
No ensino superior, a principal atividade do Ministério parece se concentrar nas
negociações e projetos para a construção dos prédios da cidade universitária do Rio de
Janeiro, e na elaboração detalhada e minuciosa dos currículos dos diferentes cursos e carreiras
proporcionados pela Universidade do Brasil. Esta deveria servir como modelo para as demais
instituições de ensino superior, incluindo a Universidade de São Paulo, que havia se
estabelecido de forma independente em 1934, com a participação ativa de Fernando de
Azevedo.
O fechamento da Universidade do Distrito Federal assumiu, além de um
significado potico, também um significado ideológico, pois com a construção da
Universidade do Brasil Capanema pretendia uniformizar o ensino superior em todo país.
Conforme já anunciamos, o que estava em jogo era a centralidade modelar da Universidade
do Brasil, inclusive a USP deveria acompanhar as novas diretrizes, pois segundo o próprio
Capanema a nova instituição deveria ser “total e unânime”.
Nessa conjuntura, Capanema preparou, sob a influência de Alceu Amoroso Lima,
o projeto de um Estatuto da Família, extremamente retrógrado, que pretendia proibir o
trabalho feminino e exercer forte censura sobre todos os meios de comunicação, impedindo a
difusão de iias e informações que pudessem ameaçar o papel tradicional da mulher na
família, e sua função reprodutiva.
O estatuto desenvolvido e orientado pelo pensador católico e proposto por
Capanema é um documento doutrinário que buscava combinar duas idéias fundamentais para
o pensamento católico e para o governo que eram aumentar a população do país e preservar as
estruturas tradicionais da família na sociedade.
A prosperidade, o prestígio e o poder de um país dependiam da sua
população e de suas forças morais: a família era a fonte geradora de
ambos. No dizer do preâmbulo do projeto a família é a maior base da
política demográfica e ao mesmo tempo a fonte das mais elevadas
inspirações de estímulos morais. (SCHWARTZMAN, 1980 p. 111).
Ainda que nem sempre lembradas, as divergências ideológicas entre o Ministério
Capanema e o Manifesto dos Pioneiros marcaram o debate sobre educação, enquanto outras
diverncias mais sutis, cujos impactos seriam mais duradouros, permaneceram pouco
visíveis. Enquadra-se nessa perspectiva as propostas descentralizadoras presente no Manifesto
dos Pioneiros que rompia com a excessiva influência dos governos, objetivando entregar a
gestão dos problemas educacionais a especialistas da área.
3.1. De deputado a ministro: a trajetória política de Capanema
Em julho de 1934, Gustavo Capanema foi empossado no Ministério da Educação
e Saúde Pública. Antes de chegar ao Ministério, Capanema fez sua carreira potica em Minas
Gerais, iniciando sua vida pública como Secretário do Interior do então governador Olegário
Maciel. Com a saída de Francisco Campos para assumir o Ministério da Educação e trilhar
novos caminhos na potica nacional, Capanema assume o seu lugar em Minas tornando-se
um importante elo entre o governo de Minas e as diretrizes nacionais.
Nestes anos Capanema fez parte de um jogo delicado de poder, que se realizava
em duas frentes bem distintas. Em vel nacional, o sico era manter os canais abertos e a
lealdade ao novo governo federal, e utilizá-lo como ponto de apoio para consolidar a posição
de poder dentro do estado. No nível estadual, tratava-se de fazer a operação inversa, ou seja,
manter e consolidar o máximo de apoio das lideranças poticas regionais e locais, e utilizá-lo
como capital potico para manter as boas graças do governo federal. Ao longo de sua vida
política, Capanema demonstrou uma fidelidade quase inquebrantável ao governo Vargas o
que de certa forma pode explicar o seu grande sucesso como homem público neste período de
alianças tão tênues.
Em 1934, em um momento de frustração com o regime logo após a sua
destituição da interventoria de Minas, cargo que ele ocupava desde a morte de Olegário
Maciel, e ainda sem saber do lugar de suma importância que o aguardava, Capanema
registrou suas impreses sobre o seu primeiro encontro com Getúlio Vargas:
A primeira vez que vi Getúlio: em companhia do Campos e do Lanari, no
Catete, à noite. Não me lembro o dia. Mas foi em dezembro de 1930. Lanari
falou de finanças. Eu não tinha assunto. Visita a Minas. Impressão penosa.
Homem frio, inexpressivo; não achei nenhuma flama, nenhuma simpatia;
sem ardor, sem luz; não inspirando confiança; homem impróprio para aquele
momento criador; cheio de reticências, de silêncios, de ausência; olhando
para cima, não olhando para a gente; um riso difícil, riso sem alegria, sem
malicia, mas com maldade; um físico redondo, com pequena estatura, com
um ventre dilatado, as pernas apertadas numas calças brancas curtas; sapatos
de fantasia; sem gravidade, sem emoção; uma pronunciação estranha de
gaúcho; enfim uma figura incapaz de seduzir, de incitar ao trabalho, de
convocar ao sacrifício, de organizar uma nação apenas saída da fornalha
revolucionária. ( CAPANEMA apud SCHWARTZMAN, 1984).
Esta é a visão de Capanema em um momento de crise de sua vida potica, pois o
que lhe parecia improvável ocorrera: uma figura de pouca expressão potica como Benedito
Valadares havia vencido a disputa pelo governo de Minas, um posto que a grande maioria
acreditava que seria conquistado por Capanema. A compensação por esta inesperada derrota
veio com sua nomeação para o Ministério de Educação e Saúde blica. A nomeação para o
Ministério da Educação e Saúde reataria a continuidade de sua carreira potica e sua lealdade
ao chefe de governo.
Capanema assume o Ministério da Educação em 1934, para muitos, conforme
análise anterior, como uma compensação pela nomeação de Benedito Valadares para o
governo de Minas, mas uma observação mais profunda poderia indicar que sua ascensão ao
Ministério da Educação e Saúde foi parte do acordo que se estabelecera entre a Igreja e o
regime de Vargas, proposto anos antes por Francisco Campos. A parte visível deste acordo foi
à aprovação, pela Assembléia Constituinte de 1934, das chamadas “emendas religiosas”. Por
este prisma, a aprovação destas leis significou uma grande viria para a Igreja Católica e do
movimento católico que, por meio da revista A Ordem e pela Ação Católica, pressionaram a
aprovação das reivindicações da Igreja.
A parte menos visível deste acordo, cujas conseqüências foram significativas, foi
à entrega do Ministério da Educação a Capanema, homem de confiança da Igreja que assumiu
a tarefa de conciliar o projeto educacional e pedagógico da Igreja com os propósitos do
Estado. Como garantia dos propósitos indicados nomeou Alceu Amoroso Lima como
consultor direto do Ministro durante os onze anos de sua gestão.
A aproximação de Gustavo Capanema com a Igreja pode ser explicada,
principalmente, por fatores de ordem potica ou, mais precisamente, pelo fato de Capanema
ter surgido na vida blica seguindo os passos de Francisco Campos. Mas se Campos tinha
em mente um projeto político ambicioso do qual a Igreja seria apenas uma peça, Capanema
indica projeto contrário, orientando sua ação potica para dar cumprimento ao mandato que
havia recebido dos católicos na condução do Ministério da Educação. Capanema, e
principalmente, Alceu Amoroso Lima, não concordavam com o papel subalterno e
instrumental que a Igreja deveria assumir no pacto proposto por Campos. Eles defendiam a
ampliação do papel da Igreja na trajetória potica do país, principalmente no que diz respeito
às questões pedagógicas vinculadas à educação.
Para os pensadores católicos, a educação deveria inculcar os valores morais
indispensáveis para manutenção da ordem pública. Portanto, segundo Alceu Amoroso Lima, a
educação deveria ter uma função de ascese, ou seja, elevar o espírito humano ao melhor que
este possa ser desenvolvido: a sabedoria. A educação pensada como formão profissional
transforma a pessoa em um expert” em conhecimentos científicos, formação insuficiente e
até mesmo anti-humanista. A educação deveria ser “integral”, ou seja, deveria promover a
alma humana ao grau mais elevado de cultura, de civilização e sabedoria conquistada pela
humanidade através da religião cristã.
16
Uma importante questão a ser colocada, e que geralmente é deixada em segundo
plano, são as influências sofridas por Capanema durante o seu Ministério e ao longo de toda
sua vida como homem blico. Na adolescência de sua vida potica ao longo da década de
20, Gustavo Capanema fazia parte das rodas de debates formada pela juventude intelectual
mineira, que contava com a participação de jovens que futuramente assumiriam papéis
importantes nos assuntos relacionados à política e à cultura brasileira. Entre estes jovens
podemos destacar: Abgar Renault, Pedro Aleixo, Gustavo Capanema, Elio Moura, Carlos
Drummond de Andrade, Milton Campos, João Pinheiro Filho, João Alfonsus, Mário
Casassanta, Afonso Arinos de Melo Franco e Pedro Nava. Todos estes jovens que, sem
sombra de duvidas, representavam as famílias de maior expressão financeira de Minas, visto
que geralmente são as elites que conseguem formar os filhos e introduzi-los no mundo das
letras, deixaram suas marcas na vida de seu estado e seu país (SCHWARTZMAN, 1984).
Dentre esses, dois teriam papéis profundamente distintos, mas igualmente
importantes: Carlos Drummond de Andrade desenvolveria uma obra poética e literária da
melhor qualidade, até chegar à posição de destaque que hoje ocupa como figura central de
nossa literatura e Gustavo Capanema entraria ativamente na vida potica, assumindo vários
cargos dentro da política mineira o que viria a credenciá-lo ao cargo de Ministro da Educação
e Saúde Pública.
Muitos destes nomes estariam diretamente vinculados à vida potica de
Capanema e exerceriam grande importância dentro do Ministério, mas nenhuma influência foi
maior na formação potica de Capanema do que a exercida por Francisco Campos e,
16
Esta interpretação é similar à desenvolvida por Raymundo de Lima. Para mais, consultar. LIMA, Raymundo
de. Alceu Amoroso Lima o “Tristão de Athayde” e a missão da universidade. Revista Espaço Acadêmico, n. 31,
dez. 2003.
posteriormente, por Alceu Amoroso Lima. O grande mentor político de Capanema, no início
de sua vida blica, foi Francisco Campos, que atuou diretamente na linha de frente da
revolução de 30 em Minas e tornou-se um dos homens de grande importância para a
consolidação da revolão. A experiência de Campos como reformador da educação mineira
foi indispensável para sua nomeação como primeiro Ministro da Educação de Vargas.
Nesse período, Campos elaborou planos ousados para a política mineira que
culminaram na crião da Legião de Outubro, que atuava como uma organização encarregada
de defender os ideais da Revolução de 30 e lutava para garantir a sua estabilidade. Nesse
projeto, Capanema era o intermediário constante entre o Governo de Minas e as diretrizes
nacionais. As primeiras viagens de Capanema ao Rio de Janeiro estão diretamente vinculadas
a esse projeto.
A grande ambição potica de Campos era constituir uma organização potica
capaz de fortalecer os ideais da Revolão de 30, que, supostamente, estavam sendo
abandonados. Para tanto propôs um pacto com a Igreja, no intuito de fortalecer
ideologicamente o Estado Nacional. O projeto potico de Campos, em linhas gerais,
fracassou a partir da segunda metade do ano de 1931 em razão do desgaste de seu nome junto
ao novo Partido Progressista em Minas e do rompimento com o Governador Olegário
Maciel
17
, provocando sua saída do Ministério e o conseqüente desgaste público em torno de
seu nome (ABREU, 2001, p. 997).
Apesar de seu desgaste político, a iia de fazer um pacto com a Igreja não perdeu
força, pois este projeto foi levado à frente em 1934 por Getúlio Vargas e Capanema. Porém, o
projeto inicial proposto por Campos apareceu pela primeira vez na carta enviou a Getúlio
17
O desgaste político de Campos se deve ao fato de que o governador Olegario Maciel em uma carta a Getúlio
Vargas acusou Francisco Campos de tramar junto com Artur Bernardes a criação de uma milícia armada para
apoiar a Revolução Constitucionalista de 1932. Sobre este assunto, ver: ABREU, Alzira Alves de. Dicionário
Histórico Bibliográfico Brasileiro. Rio de Janeiro: FGV, 2002. (Vol. I).
Vargas em 18 de abril de 1931, acompanhando a proposta de introdução do Ensino Religioso
nas escolas publicas em todo país.
Permito-me acentuar a grande importância que terá para o governo um ato
da natureza do que proponho a V. Excia. Neste instante de tamanhas
dificuldades, em que é absolutamente indispensável recorrer ao concurso de
todas as forças materiais e morais, o decreto, se aprovado por V. Excia
determina a mobilização de toda a Igreja Católica ao lado do governo,
empenhando as forças católicas, de modo manifesto e declarado, toda a sua
valiosa e incomparável influência no sentido de apoiar o governo, pondo a
serviço deste um movimento de opinião de caráter absolutamente nacional.
(CAMPOS apud SCHWARTZMAN, 1984)
Assinando este decreto lei, reitera Campos, “terá V. Excia. praticado talvez o ato
de maior alcance potico do seu governo, sem contar com os benefícios que de sua aplicação
decorrerão para a educação da juventude brasileira”. Antes de concluir a carta Francisco
Campos expõe o que seria fundamental para o governo Vargas, afirmando de forma enfática
que “a Igreja Católica saberá agradecer a V. Excia. Esse ato, que não representa para ninguém
limitação à liberdade, antes uma importante garantia à liberdade de consciências e de crenças
religiosas”
18
.
Francisco Campos pensava um pacto no qual a Igreja Católica seria utilizada
como um instrumento do Estado para criar coesão e fornecer legitimidade para os projetos
políticos. Era um pacto tão centralista e utilitário que nem em países, como Itália e Alemanha,
chegou a se concretizar. Para Campos seria função do Estado tutelar a juventude,
coordenando e ajustando seu pensamento aos novos interesses do Estado. Para que isso fosse
possível era necessário a existência de mbolos a serem difundidos e cultuados. Na visão de
Campos a Igreja Católica era uma instituição capaz de exercer essa função, portanto o Estado
poderia usar este poder de mobilização e legitimação, estabelecendo uma aliança onde as
vontades do Estado se sobrepusessem aos interesses meramente religiosos do catolicismo.
18
Carta de Francisco Campos a Getulio Vargas, de 18 de abril de 1931. Arquivo Getúlio Vargas, GV
31.04.18/1/CPDOC. Citado em Simon Schwartzman. Tempos de Capanema. 2.ed. Rio de Janeiro: FGV; o
Paulo: Paz e Terra, 2000.
No Brasil muitos foram os que se opuseram a tal projeto e entre eles é importante
ressaltar a posição de Alceu Amoroso Lima que, desde o início, se colocou contra esta
proposta, apesar de defender a aliança entre a Igreja e o Estado. Esta questão fica clara na
carta que Alceu Amoroso Lima envia a Mário Casassanta em 1932:
Inquietou-me um pouco o panteísmo goethiano do prefácio, esse primado da
ação sobre o ato, que é um dos pecados mais graves do mobilismo
contemporâneo. Creio que uma orientação fascista, como teve o movimento
legionário em boa hora iniciado pelo Capanema, pelo Campos, por você,
pelos novos mineiros, pode ser útil a Minas e ao Brasil, se mantiver o
primado da inteligência como Meio de defesa da supremacia da Fé. De outro
modo, através do hegelianismo, do primado da ação, continuaremos apenas
no evolucionismo, no relativismo que provocam o ceticismo e que uma
nacionalidade como a nossa, sem estrutura certa, sem ideais definidos, sem
unidade geográfica e sem critério político, poderá ser o nosso desastre
definitivo. (LIMA apud SCHWARTZMAN, 1984, p. 21).
Esta carta dirigida a Mário Cassassanta
19
apresenta de forma clara os termos nos
quais a Igreja enxergava a sua colaboração e o seu apoio ao novo regime, deixando visível a
sua discordância em relação ao projeto político de Francisco Campos
20
. Havia,
inegavelmente, identidade de pontos de vista entre eles, principalmente no que diz respeito à
falência do regime liberal ao longo dos primeiros anos da república e também no fato de
concordarem quanto à importância dos valores religiosos, como fundamento ideológico para a
consolidação moral do país. Para Schwartzman:
Havia, também, uma divergência profunda. Apesar de considerar "útil" a
orientação fascista do movimento iniciado por Campos, Alceu deixa clara
sua divergência profunda com um dos princípios básicos do fascismo e do
pensamento político de Francisco Campos, que é a crença na supremacia da
ação e da vontade sobre o uso da razão. (SCHWARTZMAN, 1984, p. 46).
O pensador calico, Alceu Amoroso Lima não abandona a idéia clássica do
tomismo, de que é possível estabelecer uma ordem social de base moral, erigida de acordo
com os princípios de uma filosofia racional. O tomismo como forma de expressão filosófica,
19
Mário Cassassanta era escritor e um dos críticos de Francisco Campos em Minas. Na juventude ele foi um dos
componentes dos intelectuais da rua da Bahia, termo criado por Schwartzman para designar o grupo de jovens
intelectuais mineiros formados entre outros por: Abgar Renault, Pedro Nava, Carlos Drummond de Andrade,
Afonso Arinos, Miltom Campos e Gustavo Capanema.
20
Carta de Alceu Amoroso Lima a Mario Cassassanta, de 09 de setembro de 1932. Arquivo Getúlio Vargas, G/C
Cassassanta/CPDOC. Citado em Simon Schwartzman. Tempos de Capanema. 2. ed. Rio de Janeiro: FGV; São
Paulo: Paz e Terra, 2000.
busca aproximar a razão e a fé criando uma justificação racional para ela, onde as verdades
são buscadas pelo homem, mas sem ferir os dogmas das “verdades reveladas da Igreja”. É
esta racionalidade que, para Alceu Amoroso Lima permitiria sair do relativismo, do ceticismo
e da falta de critério. É ela que permitiria substituir a debilidade de princípios que ele via no
liberalismo democrático, por uma ordem social fundada em princípios cristãos.
Estas iias conservadoras e contra-revolucionárias cristãs, defendidas por Alceu
Amoroso Lima são na verdade as bases tricas e filosóficas da revista A Ordem e de todo
pensamento católico brasileiro. Estas idéias foram introduzidas no Brasil por Jackson de
Figueiredo através da leitura de teóricos como: Edmund Burke, Joseph de Maistre, Juan
Danoso Cortez, Carl Schmitt e Jacques Maritain
21
. Este modelo de pensamento esta
sustentado em uma posição “tomista renovada que critica os princípios fundamentais do
liberalismo e do racionalismo moderno, fazendo a defesa dos valores cristãos e pregando a
importância social da Igreja como instituição política.
Em linhas gerais, o pensamento católico brasileiro é uma corrente que tem nos
valores difundidos pela Igreja Católica o fundamento último para a explicação e a construção
da realidade. Esta concepção, amplamente difundida na década de 30, é profundamente
arcaica e conservadora, demonstrando a persistência da tradição e a resistência dos setores
tradicionais ao processo modernizador.
É justamente neste ponto de valorização da que Francisco Campos se distancia
do movimento calico. Para Campos, os princípios cristãos deveriam ser instrumentalizados
para a mobilização política, e não conservavam um valor em si. Campos diferentemente de
Alceu Amoroso Lima e do movimento católico leigo, têm uma perspectiva utilitarista e
instrumental da religião, o que ele pretende é utilizá-la como forma de “domesticar”
21
Os intelectuais reunidos entorno do Centro Dom Vital e da revista A Ordem tinham como matrizes teórico-
filosóficas e político-ideológicas os pensadores clássicos do conservadorismo moderno. Sobre este tema, ver:
RODRIGUES, Cândido Moreira. A Ordem: uma revista de intelectuais católicos (1934 – 1945). Belo Horizonte:
Autêntica; São Paulo: Fapesp, 2005.
moralmente as massas, facilitando o controle ideológico sobre elas. O afastamento da Igreja
das iias de Francisco Campos fragiliza a proposta de pacto político proposto em 1931.
A aliança entre Campos e Capanema não foi tão duradoura, apesar da
proximidade alimentada ao longo de anos de convívio. O fim desta parceria ocorreu na
disputa dos votos de Pitangui, cidade natal de Capanema e base potica de ambos, para a
Constituinte de 1934. Em fevereiro de 1933 após a formação do Partido Progressista, Campos
enviou uma carta a Capanema na qual expôs sua indignação com os caminhos da potica
mineira, com o comportamento e as novas posições de Capanema, que por anos havia sido o
seu maior aliado e amigo. Esta carta marca o inicio do rompimento político dos dois, nela
Campos afirma:
Você não tem o privilégio do serviço de investigação e vigilância. Estou
inteiramente a par das providências tomadas por você em relação a Pitangui.
Não estranho que você peça votos para o Partido Progressista e peça votos
contra mim. Está no seu direito. Nem lhe peco nenhum tratamento de favor.
O que, porém, me surpreende é que você pretenda capitular de crime
qualquer ato de nobreza da população de Pitangui para comigo. Você intima
Pitangui a me negar o e água, como a um aventureiro de estrada. Você
exige que eu não tenha entrada na casa paterna; que, nela e entre os meus, eu
seja tratado como inimigo e como réprobo [...]. O que mais me comove,
porém, Capanema, é que você, valendo-se de sua situação ocasional, queira
impor a Pitangui um ato de tamanha indignidade, como o de, em troca dos
vinténs que você lhe pode dar, entregar ao Antônio Carlos a sua alma e o seu
coração, considerando indigno de reprovação e de castigo. Aquilo,
exatamente, que distingue uma sociedade de homens de um aglomeramento
de animais [...]. Você intima Pitangui a ser ingrata, insensível e brutal. Você
não lhe reconhece o direito de ter alma. Privando-a de alma, você terá dado à
vingança de Antônio Carlos a mais completa satisfação. Que inveja teria de
você, se não fosse a pena que sinto de Pitangui e, particularmente, de sua
mocidade e inteligência.
22
A resposta de Capanema, a essas acusações é feita através de outra carta datada de
29 de abril de 1933, bem ao seu estilo de Ministro, esta carta é bastante ponderada e até
22
Carta de Francisco Campos a Capanema, de 1933. Arquivo Getúlio Vargas, GC/Campos, F-A, doc. 07, série
b/CPDOC. Texto citado em Simon Schwartzman. O intelectual e o poder: a careira política de Gustavo
Capanema. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE A REVOLUÇÃO DE 30. Brasília, DF: Editora UnB,
1980. (Coleção Temas Brasileiros). p. 385.
mesmo em certos pontos conciliadora, pois não possui o mesmo tom acusador. Nesta carta
Capanema inicia dizendo: Doutor Campos
A sua carta me acusa de uma vilania. Não a cometi. [...] Não trabalhei direta
ou indiretamente para que as portas do lar pitanguiense lhe fossem fechadas
ou para que os votos do reconhecimento, da amizade ou da admiração lhe
fossem negados na sua, na nossa terra. Muito menos pronunciei uma palavra
que significasse desapreço pela sua admirável figura, ou desrespeito pelos
seus preclaros antepassados. O que fiz e estou fazendo, com firmeza e
claridade, é dizer aos seus conterrâneos, correligionários: do Partido
Progressista, de que sou um dos chefes, que a orientação que lhes dou é a de
votarem integralmente na chapa desse mesmo partido. [...] Estou cumprindo
o meu dever, o qual é ainda mais belo porque é mais duro de cumprir e
porque contraria os impulsos do coração. O senhor está envenenado pela
intriga e exacerbado pela paixão. É pena que um homem de seu gênio,
talhado para conduzir uma geração inteira de moços de ação e de cultura”,
não seja capaz da apolínea serenidade de um verdadeiro homem de Estado.
23
As o confronto em Pitangui, Capanema e Campos romperam relações e
seguiram caminhos distintos. Capanema foi nomeado Ministro da Educação e Francisco
Campos foi, momentaneamente, marginalizado na potica mineira e nacional, mas não
abandonou a vida potica. Em 1937 voltou a cena nacional como um dos principais
responsáveis pela construção ideológica do golpe de Outubro, cujo caráter centralizador, bem
próximo do modelo fascista, revela a permanência dos valores defendidos desde 1931.
Segundo Schwartzman uma amostra das grandes diferenças entre Capanema e seu
mentor reside no fato de que Francisco Campos foi sempre um ideólogo, no sentido
gramsciano. A sua atuação política se fazia a partir de determinadas idéias e concepções que
lhe pareciam mais apropriadas para a época e para o jogo político no qual se envolvia, era um
homem de princípios poticos quase imutáveis. Capanema, sem deixar de ser também um
homem de idéias, parecia mover-se muito mais pelas contingências do dia-a-dia, em uma
23
Carta de Capanema a Francisco Campos, 29 de abril de 1933. Arquivo Getúlio Vargas, GC/Campos, F-A, doc.
07, série b/CPDOC. Texto citado em Simon Schwartzman. O intelectual e o poder: a careira política de Gustavo
Capanema. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE A REVOLUÇÃO DE 30. Brasília, DF: Editora da
UnB, 1980. (Colão Temas Brasileiros). p. 385.
estratégia de conciliação, de conservação e acúmulo de poder que, no final, se mostraria
bastante realista e efetiva, ainda que acarretasse uma perda de autonomia e independência
(SCHWARTZMAN, 1984). Essa posição estratégica foi importante para o sucesso de
Capanema, em um território tão perigoso e tão cheio de armadilhas como o da política.
Em 1934, quando perdeu a chance da interventoria em Minas, é a Alceu Amoroso
Lima que Capanema se dirige, buscando um caminho de volta à vida potica. Era um
momento de frustração, pois Capanema havia perdido em uma disputa que todos davam como
decidida a seu favor. Esta derrota inesperada abalou a confiança do futuro Ministro em
relação ao regime, disseminando a insegurança em relação a seu futuro político.
Em fevereiro de 1934 Alceu Amoroso Lima envia uma carta a Capanema na qual
afirma:
Infelizmente, nada de novo posso comunicar-lhe sobre o assunto de que aqui
falamos antes de sua partida. O Meio oferece grandes dificuldades por
estarem ocupadas todas as posições. Creio que em Belo Horizonte será mais
fácil o prosseguimento de sua tarefa de advogado, à espera de dias melhores.
Continuo, entretanto, atento, e à mínima oportunidade lhe comunicarei o que
houver. Conversei, aliás, com o Negrão de Lima, que me comunicou já ter
você recomeçado a advogar. [...] A situação política continua delicada e
envolta em uma atmosfera de grandes apreensões. Tudo é possível em um
momento como este, uma qualquer alteração da ordem seria agora um
desastre para todo o Brasil. Continuo em grande atividade para encaminhar
as emendas religiosas que, espero em Deus, ver vitoriosas, para bem de todo
o povo brasileiro.
24
Em abril de 1934 Capanema recebe por meio de outra carta, uma nova
manifestação de apoio de Alceu Amoroso Lima, que entendia a necessidade de amparar o
político que se sentia abandonado, e naquele momento de exclusão política sentia como se
24
Carta de Alceu Amoroso Lima a Gustavo Capanema, 05 de março de 1934. Arquivo Getúlio Vargas,
GC/lima/CPDOC. Citado em Simon Schwartzman. O intelectual e o poder: a careira potica de Gustavo
Capanema. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE A REVOLUÇÃO DE 30. Brasília, DF: Editora da
UnB, 1980. (Colão Temas Brasileiros). p. 389.
todas as portas se fechassem para o exercício de suas atividades. Nesta carta Alceu Amoroso
Lima afirma em tom de acalento:
Não é sem sacrifícios que se consegue a autoridade para conduzir os povos e
são na adversidade que se forjam os caracteres chamados a essas difíceis
posições de mando. O momento que você está atravessando corresponde ao
da adolescência, isto é, aquele em que mais facilmente somos timas das
paixões e em que tudo o que fazemos marca para toda a vida. Você teve a
infância de sua vida política coberta de rosas. Chegaram agora os espinhos, e
você provará se pode passar além, vencendo as circunstâncias como
anteriormente fora por elas conduzido. Por isso digo que o momento é o
mais delicado de sua vida de homem público. Deus o ilumine e ampare.
25
Empossado no ministério, Capanema teria em Alceu Amoroso Lima seu principal
conselheiro, que indicaria nomes, vetaria outros, proporia leis e trataria de dar conteúdo às
principais iniciativas do ministro. A lealdade de Capanema a seu novo mentor se manteria
tanto quanto possível inalterada nos próximos onze anos de ministério. Esta relação de
aproximação, rompimentos e conciliações foram constantes ao longo da vida potica de
Capanema.
Ao acompanhar o entrecruzamento entre relações poticas e pessoais por meio
das trajetórias poticas de Gustavo Capanema, Francisco Campos e Alceu Amoroso Lima,
procurei demonstrar que a política não é um terreno dominado apenas pela razão e isento das
paixões. As ações dos indivíduos sejam quais forem as suas orientações, estão sempre
marcadas pelo desejo, pois a potica não esta livre do afeto, do ódio, do medo e do amor. A
atuação potica caminha de braços dados com as emoções, por mais racional que possa
parecer o mundo da política, o que mantém as alianças é quase sempre uma relação de
confiança que é estabelecida afetivamente.
Deixando de lado a questão da trajetória potica de Capanema e das influências
sofridas por ele na relação com os seus dois grandes mentores na vida blica, retorno à
reflexão acerca da relação entre o Estado e Igreja. Não evidências de que o compromisso
25
Carta de Alceu Amoroso Lima a Gustavo Capanema, de 23 de abril de 1934. Citada em Simon Schwartzman.
Tempos de Capanema. 2. ed. Rio de Janeiro: FGV; São Paulo: Paz e Terra, 2000.
de Vargas com a Igreja incorpore o compromisso ideológico do seu Ministro da educação. É
certo que o presidente buscou o apoio do clero católico, mas o preço não poderia exceder a
aprovação das emendas religiosas. No campo da política, toda negociação é possível desde
que o pro a se pagar pelos benefícios não seja alto demais.
3.2. De ministro a missionário: educação e projeto político
A perspectiva de Capanema em relação à educação, não é diferente da assumida
por um governante, pois ele toma a educação como problema, o do ponto de vista
filofico, mas do ponto de vista prático. Na sua gestão o Ministério da Educação inaugurou
uma potica de maior aplicação de recursos financeiros nos assuntos relativos à educação,
tanto pela União quanto por parte dos Estados e Municípios. Esta maior atuação do Estado
nos assuntos relativos à educação foi responsável pela ampliação do número de escolas e pela
duplicação do efetivo de alunos nas escolas brasileiras após 1932.
Nos primeiros anos da década de quarenta, Capanema tomou a iniciativa de
produzir um documento, que fosse capaz de produzir uma visão aprofundada das realizações
do governo Vargas, a partir de 1930. Neste documento cada setor da administração deveria
ficar responsável pela elaboração do texto sobre atuação nas áreas específicas de cada
instituição, cabendo então ao próprio Capanema escrever sobre a atuação do Ministério da
Educação e Saúde Pública (SCHWARTZMAN, 1983).
Neste documento, intitulado de Algumas notas sobre os problemas da Educação e
Saúde no governo Getúlio Vargas
26
, ele expõe, numa perspectiva ufanista, as realizações do
governo no campo da educação. O marco inicial das mudanças na visão de Capanema foi a
fundação do Ministério da Educação e Saúde Pública:
Criou-se o Ministério da Educação e Saúde, para o fim de coordenar e
impulsionar, em todo o país, o desenvolvimento dos trabalhos relativos a
esses dois importantes problemas: a educação e a saúde, e deram-se ao novo
Ministério todos os elementos de ação para a realização de uma obra de
alcance nacional. ( CAPANEMA apud SCHWARTZMAN, 1986, p. 355).
26
O documento original está disponível no Arquivo Gustavo Capanema, mas os temas referentes à Educação
estão disponíveis na Colão Temas Brasileiros da Universidade de Brasília sob a organização de Simon
Schwartzman. Estado Novo um auto retrato. Brasília, DF: Editora UnB, 1986. p. 355-378.
A perspectiva de Capanema nesta exposição é, até certo ponto, clara; para ele a
educação e a saúde foram sempre temas abandonados pela potica brasileira desde o império
e assim permaneceram durante os primeiros anos da república. Somente com a criação do
Ministério após a viria da “revolão” é que:
O antigo caos e a anterior dispero dos serviços educacionais cedem lugar a
um sistema nacional harmônico, coeso e funcional, que comunica a todas as
instituições e aparelhos do nosso ensino, uma mesma dinâmica e um só
sentido. (CAPANEMA apud SCHWARTZMAN, 1986, p. 359).
Em linhas gerais, o esforço de Capanema em ressaltar a importância do Ministério
é uma chave para compreensão do papel da educação no seu projeto potico. Em 1937,
Capanema escreve a Vargas, definindo sua gestão como um exercício de preparação e
aperfeiçoamento do homem brasileiro, portanto o Ministério da Educação seria “o Ministério
do Homem”
27
, voltado para o desenvolvimento cultural, portanto deveria se tornar um
“Ministério da Cultura Nacional”, uma instituição capaz elevar os valores humanos e
promover os ideais da nacionalidade (LISSOVSKY, 2000).
Neste sentido, a educação era para Capanema o caminho para elevar a cultura
nacional a modernos padrões de civilização. A educação tinha um sentido preparatório e
integrador, pois tinha a função de inserir o homem brasileiro dentro de novos padrões sociais
e produtivos com os quais ele ainda não estava familiarizado, mas que cabia ao Estado
através da educação familiariza-lo, pois desta forma ele poderia contribuir para o
desenvolvimento do país.
Na perspectiva de vincular a educação ao desenvolvimento cultural, Capanema
desenvolveu e apoiou diversos projetos no campo da cultura e das artes, que inegavelmente
foram de grande importância para a cultura brasileira. Esta atuação destacada no campo da
cultura e das artes leva, de acordo com Schwartzman, quase sempre a uma visão distorcida da
27
Carta de Gustavo Capanema a Getúlio Vargas, de 14 de junho de 1937. Arquivo Gustavo Capanema, série F,
34.10.19, III-9. Texto citado em Maurício Lissovsky. O novo em construção: o edifício-sede do Ministério da
Educação e Saúde e a disputa do espaço arquitetural nos anos 30. In. GOMES, Ângela de Castro (Org).
Capanema: o ministro e seu ministério. Rio de Janeiro: FGV, 2000.
atuação de Capanema no terreno específico da educação, onde as suas realizações o bem
mais modestas. A visão de Schwartzman é coerente e embasada, mas é limitada em
abrangência, pois não é capaz de refletir sobre as condições históricas desta frágil atuação no
campo educacional. Acreditamos que estes resultados bem menos expressivos no terreno da
educação foram decorrências das vinculações ideológicas de Capanema com os setores
conservadores da cultura política brasileira, representada pelo pensamento católico leigo,
através de Alceu Amoroso Lima.
A expressão “modernização conservadora”, muitas vezes utilizada para
caracterizar o regime Vargas, aplica-se com toda a propriedade a seu Ministro da Educação. A
modernização se manifestava em seu desejo de criar um sistema educacional forte e
abrangente e na preocupação constante com a atividade cultural e artística. O lado
conservador se manifestava de formas distintas: pela concentração do poder, que não permitia
a organização de instituições educacionais e culturais livres e autônomas fora da tutela
ministerial e pela concepção estetizante, e em certo sentido utilitária da cultura e das artes,
que o Ministério produzia a partir do seu quadro de artistas e intelectuais.
A música, a poesia, a pintura e o patrimônio cultural do país, tudo isto era, na
medida do possível, apoiado e estimulado, mas basicamente como cultura ornamental ou,
alternativamente, como arte monumental capaz de mobilizar os grandes sentimentos cívicos.
Este monumentalismo está presente nos grandes projetos arquitetônicos, no muralismo de
Portinari, assim como nos grandes corais cívicos de Villa-Lobos.
O que dava a educação nestes tempos uma importância simbólica muito grande
era a crença, quase geral, de que a educação poderia mudar, por meio da imputação de valores
morais corretos, os destinos do país. Isto fez da educação neste período um espaço altamente
disputado do ponto de vista do poder. As questões relativas a este campo passaram a ser a
chave para a construção de uma nação forte e coesa, capaz de integrar todos os indivíduos
dentro deste território, fazendo a junção harmônica pretendida pelo movimento modernista
entre o litoral e o sertão.
Esta síntese resultaria no que Vargas chamou de um imperialismo interno, um
processo capaz de colocar fim aos antagonismos existentes no país, representados pela
interpretação dualista fundada na percepção da existência de dois brasis. A consolidação da
nacionalidade exigia a ruptura desse dualismo e o sujeito capaz de levar a frente este projeto
deveria ser o Estado.
A partir de um diálogo cuidadoso com Schwartzman e Alcir Lenharo é possível
perceber que as expectativas de mudanças eram enormes. Tanto os intelectuais quanto o
próprio Estado esperavam que o Ministério da Educação desempenhasse um papel central na
formação profissional, moral e potica da populão brasileira, contribuindo diretamente para
o desenvolvimento do país.
Era natural, assim, que as atividades do ministério se desdobrassem em dois
grandes planos, que na realidade eram percebidos como profundamente interligados: em um
nível mais concreto, era necessário dar forma e conteúdo a todo o sistema educativo, desde a
universidade até ao ensino industrial e agrícola, voltado para os trabalhadores urbanos e
rurais, passando por sua espinha dorsal, que era o ensino secundário. Em um sentido mais
amplo, era necessária uma obra educativa que ultrapassasse as escolas e as universidades. Era
preciso atuar diretamente sobre a cultura e a sociedade, criando as normas e instituições que
mobilizassem os jovens, definissem o papel e o lugar das mulheres e atraíssem os imigrantes
estrangeiros para o grande projeto de construção nacional, intento maior do Estado.
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Neste espaço pretendemos prioritariamente analisar de forma mais
específica alguns fatores que nos levaram a compreender a educação como espaço
social de lutas simbólicas e ideológicas na década de 30. O primeiro deles diz respeito
à inversão do estatuto simbólico da educação, ocorrido no período, e que revestiu a
educação de um novo valor, sobretudo ao longo dos anos 30.
A grande questão que se coloca quando se discute a construção de um
estado autoritário é perceber sua concepção como prática pensada politicamente. No
caso do estado brasileiro, consolidado no pós 30 por meio de um processo de
institucionalização e burocratização do poder, é importante destacar a atuação dos
intelectuais, representando uma novidade no processo político brasileiro. O Estado
autoritário necessitou de partilhar o seu projeto com os intelectuais, definindo uma
estratégia de conquista da hegemonia.
Deste ponto de vista, a força de um regime vem da capacidade de produzir uma
representação positiva de si mesmo, transpondo para a comunidade imaginada, a nação, o
discurso legitimador de uma prática potica fundada em um pacto entre modernização, daí a
ênfase no processo de burocratização, e tradição, retomando as demandas do catolicismo,
principalmente no campo da educação.
Esta idéia de representação que esboçamos anteriormente segue, em linhas
gerais, o conceito produzido por Roger Charter e Pierre Bourdieu, no qual a
representação não é uma realidade fictícia ou uma falsificação da realidade, mas um
discurso constituinte da realidade (CHARTIER, 1989). Neste sentido, queremos dizer
com esta exposição, que o real não é algo dado, ou seja, ele não existe enquanto tal, ele
é constituído a partir de uma representação ou de várias representações que se
produzem sobre ele.
Neste contexto, a educação como não poderia deixar de ser, torna-se uma
arena de disputa ideológica, pois os vários grupos sociais emergentes no período
buscaram na educação um caminho para legitimar suas situações sociais, abrindo
espaço para as ações políticas. A antiga ordem aristocrática e outros setores
tradicionais da sociedade brasileira teriam muito a perder com essas mudanças, pois
elas colocariam em xeque os valores sob os quais, foram levantadas as práticas do
clientelismo, do paternalismo e do personalismo brasileiro. Valores estes que eram as
bases da política brasileira na República Velha e que marcaram profundamente a
cultura do país. Esta situação de perda de espaços levou vários representantes da elite
brasileira a buscarem formas de empreender um processo de modernização lenta e
controlada orientada em sua base de valores por fortes traços de conservadorismo.
Dentro deste contexto as atuações de Francisco Campos na reforma da
educação em Minas e a gestão de Gustavo Capanema no Ministério da Educação o
exemplos deste processo de modernização conservadora. A crise do liberalismo da
primeira república e a gradativa substituição de uma economia agrária exportadora por
um modelo econômico mais voltado para o espaço urbano gerou mudanças que a
longo prazo significariam a perda de espaços políticos das elites oligárquicas. Em
função desta perda, os setores conservadores se mobilizaram para reconquista da
presença da Igreja na direção da vida social brasileira.
O segundo fator que gostaríamos de chamar atenção diz respeito à atuação dos
intelectuais neste processo de reformulação das idéias poticas e educacionais no Brasil. É
difícil afirmar algo desta natureza, mas certamente o houve outro período na história
política brasileira em que a atuação dos intelectuais fosse tão marcante. Neste sentido
podemos considerar seguindo uma expressão já consagrada de Lucia Lippi Oliveira que os
intelectuais foram os protagonistas poticos do período, pois foram eles os grandes
idealizadores das reformas ocorridas na sociedade brasileira (OLIVEIRA, 1982).
No contexto em que se insere este trabalho, muitos intelectuais foram importantes,
mas nos restringimos a analisar a importância de três: Francisco Campos, Alceu Amoroso
Lima e Gustavo Capanema. A escolha deles foi imposta pela própria natureza do objeto, visto
que foram eles os principais idealizadores e protagonistas das reformas e disputas ocorridas na
educação nos anos 30.
O terceiro fator que gostaríamos de observar diz respeito à atuação e a visão
política do ministro Gustavo Capanema. A partir das fontes pesquisadas e do diálogo com a
historiografia, percebemos em Capanema uma personalidade que representa o sentido potico
da Era Vargas. Como Ministro atuou sempre no contraponto do conflito, buscando a
concilião, mesmo em momentos em que as coisas pareciam inconciliáveis. Conseguiu
colocar ao seu lado, de forma direta ou indireta, intelectuais das mais variadas formações
ideológicas e sempre conseguiu retirar deles o melhor, em termos de produção. Ao longo de
sua gestão, nunca deixou totalmente de lado os valores básicos defendidos pela Escola Nova e
pelos educadores liberais, mas também não os colocou em prática de forma definitiva. Em
linhas gerais, esteve quase sempre ao lado dos interesses dos setores mais conservadores da
sociedade brasileira, representados no ministério por Alceu Amoroso Lima, seu consultor
principal.
O Ministério Capanema confunde-se com a personalidade de seu ministro e as
suas ações poticas representam de forma bem clara e pragmática o que foi a potica
brasileira nos anos 30. O Estado Varguista cooptou o maior número possível de intelectuais,
forjando uma idéia de nacionalidade que se sustentava na diferença, mas que se definia e se
fortalecia na unidade das ações conjuntas e na sistematicidade orgânica do todo social. Neste
sentido, Capanema soube direcionar o interesse dos diversos grupos para construir uma
memória nacional balizada na idéia de uma cultura brasileira, que pretendia transcender os
interesses de grupos específicos, apontando para os interesses gerais da nação.
De forma consciente ou não, os educadores vinculados ao movimento da Escola
Nova conseguiram impor no Brasil à prática de se pensar a educação, enquanto problema
social e filofico. Esta importância dada à educação, nos anos 30, provinha da crença
largamente difundida de que era a educação a única capaz de formar o homem “novo”, ou
seja, o homem brasileiro dotado da capacidade de sobreviver em um mundo em processo de
modernização.
O resultado direto deste embate potico e ideológico no campo da educação foi à
construção de um modelo potico e educacional que resolvemos chamar de “síntese
conservadora” e que foi construído por Gustavo Capanema entre 1934 e 1937. O corolário
direto desta síntese foi a forte influência da religião na potica brasileira do período e o
conseqüente fortalecimento da Igreja Católica brasileira, fato este que inegavelmente está
diretamente vinculado a uma série de equívocos e descaminhos poticos que marcam a
realidade brasileira no pós 45.
Nossa preocupação é a de chamar a atenção para estas tramas ideológicas que se
projetaram na potica brasileira e tiveram fortes repercussões no campo social, cuja base de
sustentação se dava no plano da educação. Refletir sobre a potica brasileira na era Vargas
exige dedicar uma atenção redobrada para a ação dos intelectuais que, atuando no campo da
educação, partilharam da criação de diretrizes poticas e da própria dinâmica estabelecida
entre Estado e a Sociedade. Estudar os tempos de Capanema, como demonstrou Simon
Schwartzman, significa, acima de tudo, abrir uma janela para o ambiente intelectual, político e
ideológico daqueles anos para melhor entendermos o legado que deles recebemos.
Outro ponto que nos parece de suma importância, é que atuação destacada de
Capanema no terreno da cultura, acaba muitas vezes por confundir a sua real importância no
campo educacional, onde a sua atuação não foi tão expressiva. É inegável a importância de
Capanema no campo da cultura, com destaque para sua atuação modernista e modernizadora,
mas no terreno da educação sua postura foi na maioria das vezes conservadora. O que nos
permite considerar que se por um lado ele apoiou e contribuiu para o desenvolvimento
cultural do país em curto e médio prazo, através do apoio aos artistas e intelectuais
modernistas, por outro, ao se vincular ao pensamento católico brasileiro de matriz
conservadora, ceifou, em longo prazo, as possibilidades de desenvolvimento e modernização
da educação brasileira.
Esta atuação se deve em grande medida a concepção de educação que Capanema
possuía. Através da leitura de seus próprios relatos sobre a educação no período, é possível
perceber que para ele, educação e cultura eram entendidas como termos correlatos. Portanto,
segundo este princípio o desenvolvimento de uma cultura nacional, marcada por fortes traços
modernistas no campo da literatura, da música e das artes em geral, resultaria diretamente em
uma renovação de valores que se refletiriam na educação do país.
Acreditamos que seja inegável a importância de Capanema, não apenas para a
política, mas também para a cultura do país. Seu apoio ao movimento modernista e seu
esforço para ressignificar a cultura nacional, através dos incentivos do Ministério da Educação
a intelectuais e artistas, foi fundamental para o desenvolvimento da cultura brasileira, mas por
outro lado, a sua adesão aos valores conservadores impediu a possibilidade de modernização
da educação brasileira, orientada a partir de valores laicos e científicos, conforme as teses
defendidas pelos educadores liberais e principalmente por Fernando de Azevedo.
As propostas dos pioneiros não representariam uma solução imediata para os
problemas da educação brasileira, mas apontavam uma preocupação orientada por valores
pedagógicos, menos elitistas e mais adequada aos anseios de um país que pretendesse romper
com tradições arcaicas em nome de uma efetiva modernização de seus valores culturais.
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