Download PDF
ads:
Brasília, agosto de 2003
Coordinators
notebook
A infância em debate: perspectivas contemporâneas
Série Coordinators’ Notebook – v. 1
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
Título original do periódico: Coordinators’ Notebook: an international resource for early childhood
development.
Publicado originalmente pelo Consultative Group on Early Childhood Care and Development
© 2000 - Inclusive ECCD: A Fair Start for All Children
© 2001 - Early Childhood Indicators
© UNESCO 2003 Edição brasileira
A edição brasileira foi publicada pelo Escritório da UNESCO no Brasil
EDUCATION SECTOR
Division of Basic Education
Section for Early Childhood and Family Education/UNESCO – Paris
Os autores são responsáveis pela escolha e apresentação dos fatos contidos neste livro, bem como pelas opiniões
nele expressas, que não são necessariamente as da UNESCO nem as da Fundação ORSA, nem comprometem as
Organizações. As indicações de nomes e a apresentação do material ao longo deste livro não implicam a manifes-
tação de qualquer opinião por parte da UNESCO a respeito da condição jurídica de qualquer país, território,
cidade, região ou de suas autoridades, nem tampouco a delimitação de suas fronteiras ou limites.
ads:
Brasília, agosto de 2003
Coordinators
notebook
A infância em debate: perspectivas contemporâneas
GRUPO CONSULTIVO
SOBRE CUIDADO E
DESENVOLVIMENTO
INFANTIL
Série Coordinators’ Notebook – v. 1
Edições UNESCO BRASIL
Conselho Editorial da UNESCO no Brasil
Jorge Werthein
Cecilia Braslavsky
Juan Carlos Tedesco
Adama Ouane
Célio da Cunha
Comitê para a Área de Educação
Angela Rabelo Barreto
Célio da Cunha
Candido Gomes
Marilza Machado Regattieri
Tradução: Guilherme João de Freitas Teixeira; Lúcia Tunes e Alexandre Toledo.
Revisão: Mirna Saad Vieira
Revisão técnica: Romeu Sassaki, Vital Didonet (consultores); Aidê Cançado Almeida e Alessandra Schneider
(UNESCO) e Vera Lúcia Anselmi Melis Paulillo (Fundação ORSA)
Assistente Editorial: Larissa Vieira Leite
Diagramação: Paulo Selveira
Projeto Gráfico: Edson Fogaça
© UNESCO, 2003
Coordinators’ Notebook A infância em debate:
perspectivas contemporâneas. - Brasília : UNESCO,
Fundação ORSA, 2003.
84p. – (Série Coordinators’ Notebook; 1)
ISBN: 85-87853-78-3
Publicação baseada no periódico Coordinators’ Notebook:
an international resource for early childhood
development publicado por Consultative Group on Early
Childhood Care and Development. 2000/2001.
1. Educação Infantil 2. Criança
3. Primeira Infância 4. Educação e Saúde I. UNESCO
CDD 370
Fundação ORSA
Av. Deputado Emílio Carlos, 821
06310-160 – Carapicuíba – SP – Brasil
Tel./Fax.: (55 11) 4181-2232
Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura
Representação no Brasil
SAS, Quadra 5, Bloco H, Lote 6, Ed. CNPq/IBICT/UNESCO, 9º andar.
70070-914 – Brasília – DF - Brasil
Tel.: (55 61) 321-3525 – Fax: (55 61) 322-4261
CG Secretariat
Education Section, UNICEF TA 26-A
Three United Nations Plaza
New York, New York 10017, USA
Tel: (212) 824-6626, Fax: (212) 824-6481
GRUPO CONSULTIVO
SOBRE CUIDADO E
DESENVOLVIMENTO
INFANTIL
Agradecemos ao UNICEF que, gentilmente, nos cedeu as
fotos constantes dos artigos desta publicação.
Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .07
Educação Inclusiva: um início justo para todas as crianças . . . . . . . . . . . .09
1. Origens do conceito de inclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11
2. Educação e cuidado na primeira infância e inclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15
3. Princípios de um programa de educação inclusiva para a primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .17
4. Obstáculos aos programas inclusivos de educação e cuidado na primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .20
5. Nossos objetivos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .22
6. Conclusão e recomendações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .28
Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .31
A Educação Inclusiva no Estado de Goiás: relato de uma experiência . . .33
1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .33
2. Descrição da Experiência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .34
3. Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .37
Em busca de indicadores para a primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .39
1. Questões sobre os indicadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .41
2. Experiências de definição e de aplicação de indicadores para a primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .45
3. Etapas para se chegar a um conjunto de indicadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .55
4. Um conjunto de possíveis indicadores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .57
5. Em conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .67
Anexo 1 – Em que consiste um programa para a primeira infância? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .68
Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .69
Análise da situação dos países da América Latina em relação aos
indicadores para a educação da primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .71
1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .71
2. Projeto Regional da UNESCO/OREALC sobre os indicadores para a primeira infância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .72
3. Situação dos países no que se refere aos indicadores de educação e cuidado na primeira infância . . . . . . . . .73
4. Conclusões e Recomendações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .79
Sumário
7
A UNESCO, a Fundação ORSA e o Consultative
Group on Early Childhood Care and Development*
[Grupo Consultivo sobre Cuidado e Desenvolvimento
Infantil] têm a satisfação de apresentar, ao público
brasileiro e dos demais países de língua portuguesa, o
primeiro volume da Série “Coordinators’ Notebook – A
infância em debate, perspectivas contemporâneas”.
A Série veiculada em língua portuguesa pretende
contribuir para a disseminação de conhecimentos no
campo da educação infantil (que concorram para a
qualificação do debate teórico e o aprimoramento da
prática); para sensibilizar os quadros de decisão, pais e
comunidades sobre a importância da implementação
de programas de qualidade que garantam a efetivação
dos direitos das crianças e de suas famílias; e para
fomentar o debate sobre a formulação de políticas
articuladas para a primeira infância – com base em um
projeto nacional para a faixa etária – considerando a
legislação e a realidade de cada país, bem como as
condições concretas para sua implementação.
“Coordinators’ Notebook” é uma revista originalmente
publicada em língua inglesa pelo Secretariado do
Grupo Consultivo, em colaboração com várias organi-
zações não-governamentais e organismos interna-
cionais. A primeira foi publicada em 1985. Sendo dois
por ano, cada número traz um artigo principal e estu-
dos de caso relacionados ao tema, relatando experiên-
cias de vários países em todo o mundo, disponibilizan-
do notícias sobre a rede internacional em favor da
primeira infância – liderada pelo Grupo Consultivo – e
divulgando eventos relacionados à primeira infância no
mundo.
Desde 1999, a Sede da UNESCO em Paris traduz,
para a língua francesa, alguns artigos selecionados e
estudos de caso. Seu objetivo é promover a divulgação
da importância das políticas e programas destinados à
criança de zero a oito anos junto aos países francofôni-
cos, em especial o Oeste da África.
A representação da UNESCO no Brasil e a
Fundação ORSA, entendendo ser fundamental ampliar
o debate sobre questões contemporâneas relacionadas
à área da educação infantil, firmaram parceria com o
Grupo Consultivo para mais esta realização, que preten-
de ter um alcance cada vez maior junto aos profissionais
da primeira infância, pesquisadores, professores, quadros
de decisão, poder executivo, pais e comunidades.
A periodicidade da Série Coordinators’ Notebook será
anual, e sua continuidade poderá contar com novas
parcerias. Em cada volume serão apresentados dois
artigos principais – cada um sobre um tema – já publi-
cados em volumes anteriores da revista original.
Visando ampliar a abrangência da publicação, serão
relatadas experiências brasileiras ou latino-americanas.
Em 1990, sob a liderança da UNESCO, realizou-
se a Conferência Mundial sobre Educação para Todos
(Jomtien, 1990) – importante marco na luta pela “edu-
cação para todos ao longo de toda a vida” – que afirma
que a aprendizagem se inicia a partir do nascimento e
que a educação e o cuidado na primeira infância são
um componente essencial da Educação Básica. Fruto
de uma avaliação dos progressos da educação durante a
década 1990/2000, o Marco de Ação de Dacar (2000)
define que a principal meta da UNESCO, em âmbito
internacional, na área da educação infantil, é garantir o
aprimoramento e a expansão da educação e cuidado na
primeira infância.
Muito embora o Brasil conte com uma legislação
avançada no campo dos direitos das crianças e esteja
progredindo na sua concretização, é um dos países
que apresenta maiores índices de desigualdade social
no mundo, atingindo de forma contundente as crianças
de zero a seis anos e suas famílias. Acreditando que
“o bem-estar das crianças ao longo dos seus primeiros anos
de vida é bastante revelador do bem-estar geral de uma nação
ou de uma população”, a UNESCO e a Fundação
ORSA se aliam ao Grupo Consultivo com o intuito
de fazer avançar as práticas e políticas destinadas às
crianças de zero a seis anos e de influir na defini-
ção de uma agenda política que situe a criança
pequena e suas famílias no foco das prioridades
nacionais.
APRESENTAÇÃO
* O Grupo Consultivo, constituído em 1984, é composto por um consórcio de agências internacionais, com fortes vínculos regionais. Visa o fortalecimento de programas e
políticas destinados às crianças de zero a oito anos e suas famílias. Atualmente, a Secretaria do Grupo Consultivo está sediada no Canadá.
José Aparecido Montagnana
Diretor-Presidente da
Fundação Orsa
Kathy Bartlett e Louise Zimanyi
Co-diretoras do Secretariado do
Consultative Group on Early Childhood Care
and Developmen
Jorge Werthein
Representante da
UNESCO no Brasil
9
Luz Maria nasceu cega. Ela é a
caçula de cinco filhos e, com a família,
ocupa um prédio abandonado na periferia
do Rio de Janeiro. Está entregue aos
cuidados dos irmãos mais velhos e
vizinhos. Ela consegue se movimentar
pela casa, mas raramente sai do território
familiar. Apesar de muito esperta,
Luz Maria provavelmente não irá à
escola porque os professores não sabem
como lidar com sua cegueira.
Lijembe vive no Sudão. Com baixo
peso ao nascer, continua apresentando
um déficit ponderal, segundo as tabelas de
crescimento. É apático, raramente sorri
e não está muito interessado no mundo
à sua volta. As pessoas têm tendência
a ignorá-lo.
Farouk mora em Sarajevo, capital da
Bósnia-Herzegóvina. Aos três anos,
quando brincava em um terreno baldio,
sua atenção foi atraída por um brinquedo
de plástico na grama. Quando se
aproximou para pegá-lo, houve uma
explosão; assim, perdeu o antebraço
direito. Antes do acidente, costumava
brincar com um grupo de crianças do
bairro. Depois do ocorrido, quase não
sai de casa; sua família se sente
envergonhada por ele não poder fazer
as mesmas coisas que as outras crianças.
INCLUSÃO
UNICEF/5603/Mark Thomas
Educação Inclusiva:
Um início justo para todas as crianças
1
JUDITH L. EVANS
2
1
Originalmente publicado em inglês, sob o título “Inclusive
ECCD: A Fair Start for all Children”, na revista “The Coordinator’s
Notebook”, No. 22, 1998. A sede da UNESCO em Paris repro-
duziu o artigo na publicação “Le carnet du coordinateur”, nº
2/2000, sob o título “Inclusion: partir tous sur un pied d’égalité”.
2
Dra. Judith L. Evans é Professora Adjunta da Universidade de
Victoria, no Canadá. Dentre suas funções anteriores, podemos
citar: Diretora de Departamento do Programa de Comunicação
e Documentação na Fundação Bernard van Leer; Diretora do
Grupo Consultivo sobre Cuidado e Desenvolvimento Infantil;
Oficial de Programa da Fundação Aga Khan; Vice-Presidente da
Fundação de Pesquisa Educacional Superior. Dra. Evans escreveu
inúmeros artigos sobre a pesquisa e a prática em várias questões
relacionadas à primeira infância, e elaborou um manual
programático de primeira infância intitulado “Early Childhood
Counts”, fruto de um projeto conjunto entre o Grupo Consultivo,
UNICEF, a Fundação Aga Khan, o “Christian Children's Fund” e
o Banco Mundial.
E
m todo o mundo, existem milhões de crianças
como Luz Maria, Lijembe e Farouk, classificadas
como crianças com necessidades especiais; isto é,
diferentes das “normais”. Isso significa que elas são
e serão tratadas diferentemente das outras.
No passado e, ainda hoje, em muitas culturas e
subculturas, as crianças com necessidades especiais
têm sido ignoradas e até mesmo abandonadas. Tal
situação se explica por razões complexas, tanto de
ordem prática quanto psicológica. As crianças e as
próprias famílias podem sentir vergonha e medo de
suas diferenças. Tornam-se alvo de compaixão e são,
freqüentemente, ridicularizadas, em geral por ignorân-
cia sobre as causas da deficiência. Muitas vezes, a
vergonha surge da crença de que a deficiência possa
ser uma punição para um pecado cometido no passado.
É habitual sentir medo por desconhecimento e incapa-
cidade de prever o comportamento das crianças devido
à sua deficiência. A compaixão é sentida quando se
presume que a criança é incapaz e tem necessidade de
cuidados e proteção. As crianças são ridicularizadas
porque são diferentes; além disso, seu comportamento
causa mal-estar aos pais. As crianças com necessidades
especiais são, freqüentemente, consideradas um fardo,
sem valor, inúteis e dependentes, pela família e pela
comunidade e, rapidamente, por elas próprias.
As crianças que são diferentes e requerem uma
atenção especial, assim como suas famílias, precisam
de apoio. Porém, as práticas sociais, que regem as
reações de uma comunidade diante destas diferenças,
marginalizam a criança e a família, justamente quando
estas sentem maior necessidade de serem incluídas.
Quais crianças são suscetíveis de apresentar neces-
sidades especiais? É possível distinguir três categorias
de risco:
1. Risco congênito. Refere-se às crianças que vêm
ao mundo com capacidades diferenciadas. Ao
nascerem, possuem uma deficiência identificável:
10
UNICEF/5527/John Isaac
Risco Social. Muitas crianças são vítimas de guerras civis
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
11
cegueira, surdez, problemas neurológicos e defi-
ciência mental. (Luz Maria é uma criança com risco
congênito).
2. Risco biológico. Refere-se às crianças que, ao
nascerem, apresentam um problema físico que pode
ser corrigido. Por exemplo, bebês com baixo peso ao
nascer precisam de maiores cuidados para sobreviver
e se desenvolver. Com apoio apropriado, eles podem
se recuperar. (Lijembe é uma criança com risco
biológico).
3. Risco social. Refere-se às crianças suscetíveis de
desenvolver necessidades especiais porque o seu
ambiente lhes causa lesões e/ou não contribui para
que tenham um bom crescimento e desenvolvimento.
Essas crianças vivem em situação de pobreza, são
oriundas de minorias étnicas que não têm acesso aos
serviços disponíveis para os demais cidadãos ou,
ainda, estão sendo criadas em meio à guerra e à
violência (como Farouk, por exemplo).
Em todas essas categorias, uma intervenção pre-
coce pode mudar radicalmente a qualidade de vida
da criança. Certamente, as crianças do primeiro
grupo jamais se tornarão normais; mas isto pode
ajudá-las a valorizar ao máximo seu potencial. Em
compensação, no caso das crianças das duas outras
categorias, a intervenção precoce pode ter um
impacto considerável sobre seu desenvolvimento.
Trata-se de saber como responder às necessidades
destas crianças. Nos países desenvolvidos, as crianças
com risco congênito são imediatamente identificadas
e geralmente encaminhadas para programas espe-
cializados, separados dos programas comuns. Nos
países em desenvolvimento, em geral, poucos serviços
lhes são acessíveis. Uma grande parte destes países
busca reproduzir os sistemas e serviços espe-
cializados dos países desenvolvidos. Mas, na área da
educação especial, as idéias sobre esta questão têm
evoluído. Nos dois tipos de países, é questionada a
pertinência dos serviços especializados – separados –
destinados às crianças com necessidades especiais.
Na área da educação especial, atualmente, é muito
mais bem compreendida e aceita a idéia de que toda
criança tem direito a uma vida plena, independente e
‘normal’ ao máximo possível. Na opinião de muitos
defensores da causa da infância, apesar de certas
crianças serem física e/ou mentalmente diferentes,
todas têm alguma contribuição a dar à sociedade;
todas têm o direito de serem incluídas nas atividades
que constituem a vida cotidiana. A política de inclusão
incentiva a participação de TODAS as crianças em
TODOS os programas. Ao aplicá-la às políticas
destinadas à primeira infância, visa-se criar programas
eficazes, abertos a todas as crianças, e não programas
especiais destinados às crianças pequenas com neces-
sidades especiais. Este é o desafio! Todavia, uma vez
que a inclusão é uma abordagem relativamente nova,
ainda não são muitos os exemplos de sua aplicação
nos programas destinados à primeira infância.
As três categorias de risco produzem necessidades
especiais; entretanto, nos últimos anos, as categorias
2 e 3 (risco biológico e risco social) chamaram par-
ticularmente a atenção dos programas destinados à
primeira infância, nos países em desenvolvimento, em
detrimento da categoria dos riscos congênitos. Assim,
neste artigo, preocupar-nos-emos de forma mais
específica com a criação de programas inclusivos para
as crianças com riscos congênitos.
Aprofundaremos a tese básica de que os programas
de qualidade destinados à primeira infância constituem
um modelo que pode ser utilizado para as crianças de
todas as faixas etárias. É particularmente importante
desenvolver estes programas para as crianças a partir
de seu nascimento, porque um grande número de
condições biológicas e sociais, que gera as necessidades
especiais, pode, se identificado em tempo oportuno,
ser melhorado.
Em nossa análise, vamos descrever sucintamente a
evolução da atenção prestada às pessoas que apresen-
tam capacidades diferenciadas a fim de explicarmos
como chegamos ao conceito de inclusão; em seguida,
definiremos os princípios que regem a elaboração de
programas de educação inclusiva para a primeira infân-
cia e identificaremos algumas questões relaciona-
das com a criação de tais programas. E, finalmente,
determinaremos a ação que deve ser empreendida.
No artigo intitulado “A Educação Inclusiva no Estado
de Goiás”, será apresentada uma experiência brasileira
de educação inclusiva.
1. Origens do conceito
de inclusão
1.1. Histórico do apoio
às crianças com
necessidades especiais
Uma recapitulação da história da atenção dispensada
às crianças com necessidades especiais na Europa
reflete as tendências da “educação especial” nos países
desenvolvidos no decorrer dos últimos 200 anos.
Tuunainen (1997) distingue cinco fases.
O primeiro período (1775-1875) foi o da conscien-
tização da existência de crianças que tinham necessidade
de serviços e de apoio especiais. Durante essa época,
foram criados – em geral, por instituições religiosas
e/ou de caridade – estabelecimentos escolares e outros,
destinados às crianças com capacidades diferenciadas.
No decorrer do segundo período (1875-1945),
houve um reconhecimento de que a sociedade tem
responsabilidade para com estas crianças, cujos di-
reitos formais foram consagrados em legislação. Esta
tomada de consciência levou à criação de serviços
especializados.
No terceiro período (1945-1970), houve uma rápida
expansão destes serviços, oferecidos, na maioria das
vezes, em espaços segregados. Como observou
O’Toole (1991), “o indivíduo e o problema eram retirados
do seu contexto social e eram feitos esforços para se impor uma
solução em um novo contexto criado pelo terapeuta” (p. 15).
Esta tendência ao isolamento das crianças com ne-
cessidades especiais foi reforçada em certos países,
pelo fato de os estabeleci-mentos de educação espe-
cial se localizarem fora e distantes da comunidade
(Ainscow, 1994, 4). Na rea-lidade, o isolamento dos
estabelecimentos era uma versão moderna da prática
tradicional de esconder as crianças com deficiência.
O maior avanço em favor das pessoas com defi-
ciência ocorreu durante o quarto período (1970-
1990). As palavras de ordem da nova escola de
pensamento eram as seguintes: individualização,
normalização, integração e mainstreaming (processo de
levar os alunos com deficiência para serviços educa-
cionais disponíveis na sociedade). As crianças com
necessidades especiais começaram, então, a freqüentar
as mesmas escolas das outras crianças: no início, ape-
sar de inscritas no mesmo estabelecimento, freqüen-
tavam classes distintas. Com o tempo, estas crianças
foram mainstreamed (isto é, integradas aos serviços e
classes existentes) durante uma parte do dia e, até
mesmo, durante todo o dia. Foram assim sendo inte-
gradas às outras classes, compartilhando as mesmas
salas e serviços das demais crianças. Se essa situação
constituía um progresso em relação ao isolamento
que ocorria em muitas instituições, na prática, apre-
sentava problemas: nas classes destinadas às crianças
que enxergavam, ouviam e se desenvolviam normal-
mente, muitas vezes as necessidades específicas
destas crianças não eram levadas em conta; além disso,
os serviços complementares destinados a elas eram
dispendiosos e as mantinham separadas de seus
colegas. Em outras palavras, nem sempre a prática do
mainstreaming resultou na verdadeira integração das
crianças com necessidades especiais.
O quinto período começou na década de 90. Uma
nova tendência se manifestou, colocando o foco sobre
a inclusão, ou seja, a criação de um espaço aberto à
diferença de capacidades, necessidades e potencial
de desenvolvimento das crianças. Para as crianças
com necessidades especiais, a inclusão significa uma
mudança nos serviços, substituindo o simples interesse
em inseri-las na “estrutura normal” e oferecer-lhes um
apoio suplementar específico pelo incentivo ao seu
desenvolvimento integral em um contexto favorável.
Para tanto, é indispensável reestruturar o ambiente e
seus sistemas, de forma a responder às necessidades
de todas as crianças e não apenas às necessidades
especiais de algumas delas, independentemente do
currículo e da estrutura geral.
1.2. Razões da transição para
uma ideologia mais inclusiva
A transição para uma ideologia mais inclusiva deve-
se a diversas razões, tais como o reconhecimento
dos direitos da criança e os ensinamentos obtidos
através dos serviços prestados às crianças com neces-
sidades especiais. A seguir, algumas destas razões são
analisadas.
O reconhecimento dos direitos da criança
Uma série de declarações internacionais contribuiu
para tornar mais precisas as idéias atuais sobre a
inclusão, considerada como uma abordagem para o
tratamento de crianças com necessidades especiais. O
ano de 1981 foi declarado o Ano Internacional das Pessoas
Deficientes. Este evento foi um importante divisor de
águas em favor da conscientização sobre os problemas
enfrentados pelas pessoas com deficiência, dando
origem à Década das Nações Unidas para Pessoas
Deficientes (1983-1992). Declarações internacionais
mais amplas contribuíram para promover os direitos
de todas as crianças. Entre estes instrumentos, figura a
Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), adotada em
1989, na qual se destaca:
O ARTIGO 2declara que todos os direitos devem ser garantidos
a todas as crianças sem discriminação de qualquer natureza,
independentemente... de sua deficiência.
O ARTIGO 23 proclama que as crianças mental ou fisicamente
deficientes devem usufruir uma vida plena e decente, em
condições que favoreçam sua autonomia e facilitem sua
participação ativa na vida da comunidade. Ele também
declara que as crianças deficientes têm direito de se beneficiar
de cuidados especiais, ter acesso à educação, à formação,
aos cuidados de saúde, à reabilitação, à preparação para o
trabalho e às atividades recreativas. Todos esses serviços
devem ser concebidos de modo a assegurar às crianças:
“uma integração social tão completa quanto possível e seu
desenvolvimento pessoal, inclusive nos campos cultural e
espiritual.”
A Conferência Mundial sobre Educação para Todos, reali-
zada em 1990, adotou o Plano de Ação para Satisfazer às
Necessidades Básicas de Aprendizagem. Ela reafirmou que
todas as crianças devem ter acesso à educação básica,
como preconiza a Convenção sobre os Direitos da Criança.
O parágrafo 8 do Marco de Ação conclama à “expan-
são das atividades de cuidado e educação da criança pequena,
compreendidas as atividades em colaboração com a família
ou a comunidade, especialmente em favor das crianças pobres,
desfavorecidas e deficientes”.
Em 1993, a Assembléia Geral das Nações Unidas
adotou as Normas sobre a Equiparação de Oportunidades
para Pessoas com Deficiência. Outra importante iniciativa
foi tomada, em 1994, sob os auspícios da UNESCO,
12
3
A publicação em espanhol encontra-se disponível no site da
UNESCO: www.unesco.org.br, em ‘publicações internacionais’.
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
13
com a realização da Conferência Mundial sobre Educação
para Necessidades Especiais: Acesso e Qualidade, tendo
culminado na Declaração de Salamanca e no “Marco de
Acción sobre Necessidades Educativas Especiales”
3
.
O sucesso da escola inclusiva depende, consideravelmente, da
identificação, exame e estimulação precoces das crianças
pequenas com necessidades educacionais especiais. Os
programas de saúde e de educação destinados às crianças
com idade inferior a seis anos deveriam ser desenvolvidos e/ou
reorientados de forma a favorecer o desenvolvimento físico,
intelectual e social, assim como a preparação para o ingresso
na escola. Estes programas têm um importante interesse
econômico para o indivíduo, para a família e para a sociedade,
ao impedir o agravamento das condições incapacitantes.
Os programas para a primeira infância deveriam adaptar-se
ao princípio da inclusão e, numa perspectiva global, combinar
atividades pré-escolares com cuidados de saúde (Declaração de
Salamanca, artigo 53).
Portanto, existem textos através dos quais a comu-
nidade internacional recomenda a criação de programas
destinados à inclusão das crianças com necessidades
especiais, desde o seu nascimento.
O reconhecimento dos limites de um modelo
médico como resposta às necessidades de
todas as crianças pequenas
Com o aumento de recursos destinados às crianças
com necessidades especiais e com os progressos que
marcaram o conhecimento do funcionamento do
corpo humano, ocorrido na década de 50, os países
desenvolvidos investiram numa especialização mais
abrangente e mais aprofundada. A partir de uma
definição médica das deficiências da criança, foram
criadas diferentes categorias. Assim, os problemas
foram percebidos essencialmente sob um ângulo
psicomédico e sua identificação fez-se em função
dessas categorias. Esta visão estreita leva, muitas
vezes, a separar e a excluir a criança de seu ambiente
de aprendizagem. Como observou Ainscow (1994),
há “uma crescente conscientização de que as condições
incapacitantes são muito mais difundidas, variadas e
complexas do que nos levam a supor os sistemas de
classificação, largamente baseados em conceitos médi-
cos (p. 4). O comportamento e as características das
crianças são mais fielmente representados por uma
seqüência contínua do que por categorias descontínuas.
Além disso, é natural que haja uma grande diversidade
entre as crianças”.
Que paradoxo! Com o objetivo de ajudar, aceitamos os
rótulos, a discriminação e a exclusão que, muitas
vezes, podem ser a origem de graves problemas, tanto
para as crianças, quanto para suas famílias.
(Tuunainen, 1997, 22)
A proeminência dos cuidados primários de
saúde sobre os cuidados curativos, na
Declaração de Alma-Ata de 1978
A lógica dos cuidados primários de saúde inspirou,
de diversas maneiras, os serviços destinados às
crianças com necessidades especiais. Por um lado, ela
julga que é mais importante fazer com que toda
a população se beneficie de melhorias, por mais
modestas que sejam, do que fornecer cuidados, de
acordo com as mais estritas normas, para poucos
privilegiados; por outro, defende que pessoas não-
especialistas com uma formação restrita, embora
apropriada, podem prestar serviços cruciais (O’Toole,
1991, 15)
Ao analisar a questão das crianças com necessi-
dades especiais, na perspectiva da saúde pública,
concluímos que, ao invés de destinar parcos recursos
para poucos, é preferível colocar uma variedade
maior de serviços à disposição de um maior número
de pessoas. Os serviços individualizados, prestados
por especialistas, se revelaram muito dispendiosos.
Através da abordagem inclusiva, o papel dos especia-
listas consiste em preparar os parentes, profissionais
e outros membros da comunidade, com a finalidade
de criar um ambiente de apoio que pode, ou não,
exigir algum procedimento técnico por parte de
especialistas. Em geral, as competências e estratégias
básicas podem ser transferidas para aqueles que
mantêm maior contato com a criança.
A transição de um modelo centrado exclu-
sivamente na criança para um modelo que a
insere em um contexto social, econômico e
político mais amplo
O modelo médico, que isola a criança, é abando-
nado em favor de uma concepção social, ética e
econômica das necessidades especiais. Chegou-se à
conclusão de que só se pode avaliar os progressos de
uma criança relacionando-os a uma circunstância,
uma tarefa ou um conjunto de relações. Como resumiu
Ainscow (1994), existe uma crescente adesão à idéia
de que, “muitas vezes, as dificuldades encontradas
pelos jovens em seus estudos e em seu desenvolvi-
mento geral resultam tanto de circunstâncias desfa-
voráveis, como de características individuais” (p. 4).
Para as crianças que atingiram a idade de ingresso
no ensino fundamental, uma dessas “circunstâncias
desfavoráveis” poderia muito bem ser o próprio sistema
escolar. Aproximadamente, 90% das crianças em
idade escolar com necessidades especiais apresentam
necessidades especiais de aprendizagem (UNESCO,
1997). É bem provável que o sistema educacional
formal favoreça o aumento do número de crianças
com necessidades especiais, em vez de atendê-las
e oferecer apoio para seu pleno desenvolvimento.
A conscientização sobre os limites da
segregação
A especialização deu origem às terapias individuais,
onde o especialista trabalha com a criança por um
período de tempo limitado, a cada semana (talvez não
mais de uma hora). Por ser prestado, muitas vezes, fora
do contexto da vida cotidiana da criança, esse aten-
dimento nem sempre permite a transferência de com-
petências para aqueles que fazem parte do ambiente
da criança e não leva em consideração as suas neces-
sidades de “pertencimento” a um grupo social. O
aprendizado social é um elemento essencial da ex-
periência da criança. O isolamento social resultante
desse tipo de programa pode ter efeitos desfavoráveis
sobre seu desenvolvimento. Como escreveu Holdsworth
(1997), “a exclusão no decorrer da primeira infância pode
reforçar a exclusão por toda a vida” (p. 9).
A crescente defasagem entre oferta e de-
manda por serviços especializados
Estima-se que, aproximadamente, 10% da população
total de crianças possam ter necessidades especiais.
Nos países com elevados índices de pobreza e onde
proliferam a guerra e a violência, essa taxa pode atingir
e até mesmo passar de 60%. Para determinar em que
medida um país está satisfazendo essas necessidades,
é possível, por exemplo, considerar a porcentagem
de crianças com necessidades especiais que está
sendo atendida pelo sistema escolar. Em 1986/1987, a
UNESCO empreendeu, em 58 países, uma pesquisasobre
o atendimento das pessoas com necessidades especiais.
Verificou-se que em 34 países menos de 1% dos
alunos estava inscrito em programas de educação
especial; e que, em 10 países, menos de um aluno em
1.000 se beneficiava de tais programas (Ainscow,
1994, 2-3). Conclui-se que “considerando a expressi-
va demanda e a escassez de recursos disponíveis,
as necessidades de educação e de formação da maior
parte das pessoas deficientes não podem ser satisfeitas
pelas escolas e centros especiais” (UNESCO, 1988b,
15). Dez anos atrás, as necessidades de serviços
especializados já superavam amplamente a oferta.
Hoje, a situação é ainda mais grave. Com triagens
que permitem identificar um maior número de pes-
soas com necessidades especiais; com o aumento do
número de crianças com deficiência física e necessi-
tadas de apoio psicológico – em decorrência das
guerras; com o crescente número de crianças com
necessidades especiais – resultante da poluição; e
com o maior número de crianças criadas em
condições da pobreza – provocada pela economia
global, aumenta exponencialmente o percentual da
população que poderia ser classificada como tendo
necessidades especiais (UNESCO, 1997).
Constatação de que os recursos
necessários para a prestação de serviços
especializados não são suficientes para
satisfazer a grande demanda
Em países em desenvolvimento, são elevados os
custos da implantação de serviços especializados que
sejam equivalentes (isto é, que satisfaçam às normas)
aos dos países desenvolvidos. Quando os países
ainda estão se esforçando para atender às necessi-
dades mínimas da população em relação à saúde e
à educação, é difícil justificar a alocação de grande
volume de recursos para a criação de serviços espe-
cializados. Como observa O’Toole:
“Em nosso desejo oculto de imitar os serviços oferecidos no
Ocidente, perdemos de vista a real magnitude do problema.
Justificamo-nos, invocando a necessidade de ‘respeitar as
normas’. Entretanto, para 98% das famílias que atualmente
não recebem nenhuma assistência, o argumento relativo a ‘normas’
não tem relevância. Para essas famílias, trata-se simplesmente
de saber se terão de esperar toda a sua vida para que algum
serviço de interesse lhes seja prestado” (O’Toole, 1991, 13).
O reconhecimento de que a natureza
holística do desenvolvimento da criança
exige uma abordagem holística
A especialização leva a uma compartimentalização
da criança e à crença de que ações distintas podem
ser conduzidas para responder às necessidades de
categorias distintas de crianças. Os países em desen-
volvimento deveriam evitar os erros cometidos nos
países desenvolvidos, onde a experiência mostrou
que o modelo de intervenções realizadas por múltiplos
especialistas não é o melhor. Para ilustrar a complexi-
dade desse modelo e suas propostas, Bruder (1997b)
relaciona todos os especialistas que podem estar
envolvidos com a criança pequena. Entre eles, é pos-
sível encontrar o fonoaudiólogo, o educador especial
da primeira infância, o professor, o nutricionista, a
enfermeira, o terapeuta ocupacional, o médico, o
psicólogo, o fisioterapeuta, o fonoterapeuta e o oftal-
mologista especializado. Como observa Bruder,
“cada disciplina tem o seu programa de formação... e suas
exigências para licenciatura, bacharelado e/ou diplomação;
no entanto, a maior parte dessas disciplinas não exige espe-
cialização para trabalhar com crianças (e com suas
famílias)... Cada disciplina tende a utilizar sua forma
própria de operar (por exemplo, os terapeutas ocupacionais
enfatizam as técnicas sensoriais de integração, enquanto os
fisioterapeutas insistem nos movimentos funcionais, adotando
uma abordagem neurodesenvolvimentista).” (Bruder, 1997b, 1)
Esta especialização levou à compartimentalização
da criança e ao tratamento que enfatiza a tentativa de
atenuar o problema, em vez de se ocupar das múlti-
plas necessidades e habilidades da criança. Basta pro-
ceder à análise dos pressupostos subjacentes ao modelo
multidisciplinar para constatar seus limites, que são
apontados, de forma sucinta, por Bruder (1997b, 2) e
incluem:
– O modelo considera que um especialista de uma
disciplina específica é a pessoa mais apropriada
para intervir em determinada área do desen-
volvimento.
Entretanto, dada a natureza do desenvolvimento
infantil, haveria uma superposição, por exemplo, das
intervenções orais e motoras, com as intervenções
sociocognitivas.
14
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
15
– O modelo se baseia no pressuposto de que o
desenvolvimento da criança fará progressos
somente na área em que ocorreu a intervenção.
A maior parte das crianças que se beneficiam de
serviços de intervenção precoce demonstra atraso em
numerosas áreas. É muito difícil definir as intervenções,
devido à necessidade de intervir por disciplina e devi-
do à intensidade de tal ação. A escolha das mesmas
se torna arbitrária, não sendo possível avaliar a eficácia
de tal ou tal intervenção, isolando-a das demais. Em
ambientes com mais recursos, a prestação de serviços
pode ser implementada por um corpo de diferentes
especialistas, intervindo segundo graus variados de
freqüência e de intensidade.
– O modelo se baseia no pressuposto de que tanto
a criança quanto a família serão capazes de
assimilar as informações e as intervenções de
vários especialistas em diversas áreas.
A “falta de integração gera um número excessivo de inter-
venções especializadas, que devem ser articuladas pela família
na rotina diária da criança. Essa falta de coordenação
levanta sérias questões sobre a eficácia do modelo” (Bruder,
1997b, 2).
Em suma, um certo número de fatores interna-
cionais recentes, de caráter sócioeconômico, político
e profissional, relativo às intervenções junto às crianças
com necessidades especiais, fez com que deixássemos
de focalizar cada criança individualmente, para nos
concentrar na estrutura de vida de todas as crianças.
Considerando os múltiplos fatores do desenvolvimen-
to de modelos “inclusivos”, somos levados a nos
questionar sobre as conseqüências da inclusão na ela-
boração de programas destinados à primeira infância.
2. Educação e cuidado
na primeira infância e
inclusão
Muitos fatores nos levam a examinar a relação entre
os conceitos associados à inclusão e os conceitos as-
sociados à educação e cuidado na primeira infância
(ECPI). O primeiro conceito se refere à importância
da intervenção precoce a fim de prevenir certas defi-
ciências e atenuar o impacto de outras; o segundo diz
respeito ao fato de que os princípios fundamentais
relativos à qualidade da educação e cuidado na
primeira infância coincidem com os princípios exigi-
dos para a garantia dos direitos da criança à inclusão.
No Destaque 1, Holdsworth (1997) apresenta um
resumo das relações entre a Convenção sobre os Direitos
da Criança, a Declaração de Salamanca e os princípios
relativos à ECPI.
UNICEF/93-1715/Roger Lemoyne
Os recursos necessários à oferta de serviços especializados são empecilhos ao atendimento de um
grande número de crianças
16
Convenção sobre os
Direitos da Criança (CDC)
...a criança tem direito a um apoio e assistência
especiais. (Preâmbulo)... asseguram, da melhor
forma possível, a sobrevivência e o
desenvolvimento da criança. (Art. 6)
... a educação... deve ter como objetivo...
favorecer o desenvolvimento da personalidade
da criança, o desenvolvimento de seus talentos e
habilidades mentais e físicas, na medida de suas
potencialidades. (Art. 29)
Em relação às necessidades especiais das
crianças com deficiência, o apoio dado... é
concebido de tal modo que essas crianças
tenham, efetivamente, acesso à educação...
apropriada para garantir uma integração social
tão completa quanto possível, e seu
desenvolvimento pessoal... (Art. 23)
... o direito... de brincar... (Art. 31)
... direito à liberdade de expressão... de
procurar, receber e difundir informações e
idéias de qualquer espécie... (Art. 13)...
... para o desenvolvimento harmonioso
de sua personalidade, a criança deve
crescer em um ambiente familiar,
em uma atmosfera de felicidade,
de amor e de compreensão.
(Preâmbulo)... que a criança não
seja separada de seus pais,
contra sua vontade. (Art. 9)
Declaração de Salamanca
e Marco de Ação
A educação é um direito fundamental de cada
criança, que deve ter a possibilidade de
adquirir e de conservar um nível de
conhecimentos aceitável. (Decl., 2)
As escolas inclusivas devem reconhecer
e responder à diversidade de necessidades
de seus alunos, adaptando-se aos
diferentes estilos e ritmos de
aprendizagem. (Marco de Ação, § 7)
Cada criança possui características,
interesses, habilidades e necessidades
de aprendizagem que lhe
são próprios. (Decl., 2)
O desafio enfrentado pela escola
inclusiva é o de desenvolver uma pedagogia
centrada na criança, capaz de educar todas
as crianças, inclusive as gravemente
desfavorecidas. (Marco de Ação, § 3)
Os pais são parceiros privilegiados...
(Marco Ação, § 60) Os governos locais
devem encorajar a participação da
comunidade... (Marco de Ação, § 63)
Princípios fundamentais
relativos à ECPI
A primeira infância é a base sobre a qual
se edifica a vida da criança. Mas, longe de
ser uma simples preparação para a adolescência
e para a vida adulta, ela existe em si mesma.
Cada criança desenvolve-se segundo seu ritmo
e à sua maneira, nos planos afetivo, intelectual,
moral, social, físico ou mental; todos eles são
importantes e interdependentes.
Todas as crianças possuem habilidades que
podem (e devem) ser identificadas e
estimuladas. Em vez de ter como ponto
de partida o que elas não sabem fazer,
a aprendizagem deve basear-se no
que já sabem fazer.
As crianças pequenas aprendem a partir de
tudo o que acontece com elas e à sua volta;
elas não separam sua aprendizagem em
diferentes assuntos ou disciplinas.
A brincadeira e a conversa são os
principais meios através dos quais as
crianças aprendem a conhecer-se a si mesmas,
os outros e o mundo à sua volta.
O incentivo à reflexão independente
favorece a autonomia da ação.
As relações estabelecidas pelas crianças
entre si e com os adultos são de suma
importância para seu desenvolvimento.
Destaque 1—Relações entre a Convenção sobre os Direitos da Criança,
a Declaração de Salamanca e os princípios relativos à ECPI
Fonte: Holdsworth, 1997, 12-13
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
17
Uma vez que os três documentos adotam uma
posição semelhante em relação à oferta de oportu-
nidades de acesso para todas as crianças, temos
motivos para nos questionarmos sobre as diferenças
que eventualmente poderiam existir entre um bom
programa de Educação Inclusiva e um programa de
inclusão.
A resposta é que, no fundo, não existe nenhuma
diferença; ambos dão importância aos seguintes
elementos:
– intervenção precoce determinante para o
desenvolvimento posterior;
– relações estreitas de cooperação com a família;
– desenvolvimento social da criança intimamente
associado à sua aprendizagem;
– aprendizagem ativa;
– especificidades de cada criança e planejamento
quanto às necessidades de cada uma deles,
no contexto de seu grupo.
Dadas as semelhanças de objetivos e abordagens, a
inclusão das crianças com necessidades especiais no
sistema educacional deveria começar pela criação de
programas inclusivos de qualidade, destinados à
primeira infância. Para tanto, seria possível inspirar-se
em alguns princípios indicados a seguir.
3. Princípios de um
programa de educação
inclusiva para a
primeira infância
A elaboração de programas inclusivos é uma noção
relativamente nova; por conseguinte, ainda são raros
os modelos de implementação efetiva. Assim, à medida
que os programas são implantados, os participantes
devem ser flexíveis e estar dispostos a experimentar e
aprender. O programa inclusivo poderia se apoiar
nas seguintes recomendações.
3.1. Começar pelos pais e pelas
famílias
As famílias são chamadas a tomar decisões em nome
da criança; portanto, os pais devem desempenhar um
importante papel na concepção dos programas inclu-
sivos. Um dos princípios fundamentais da elaboração
dos programas de educação inclusiva é o de começar
pelos conhecimentos e pela experiência dos pais, em
particular:
– partir das questões e preocupações deles;
– basear-se nos conhecimentos deles sobre a situação
atual – a percepção deles sobre o que constitui um
problema;
– dar-lhes o tempo necessário para abordarem detalha-
damente os diversos aspectos; e
– ajudá-los a terem uma perspectiva de longo prazo.
Apesar de, no curto prazo, os serviços imediatos ofere-
cerem uma resposta satisfatória, as necessidades de lon-
go prazo também devem fazer parte do planejamento.
UNICEF/93-1193/Jeremy Horner
Começando com os pais
3.2. Construir parcerias entre
profissionais e pais
Em alguns países, existem profissionais especializados
em diagnosticar a criança e prestar-lhe um atendimento
adequado. O abandono das terapias individuais inten-
sivas em favor de uma abordagem inclusiva exige que
seja redefinida a função desses profissionais. Eles
poderiam, por exemplo, colaborar com os pais na ela-
boração dos programas inclusivos; neste caso, a questão
é de saber como profissionais e pais poderão cooperar
para determinar o que é melhor para a criança.
De acordo com um estudo das abordagens atuais
sobre a oferta de serviços para crianças com necessi-
dades especiais (UNESCO, 1997), não existe, na
prática, uma única visão com relação à participação
dos pais nos programas destinados a essas crianças. Na
série de monografias que fazem parte do estudo
empreendido pela UNESCO, os diversos graus de
relação entre profissionais e pais constituem uma
seqüência contínua. Em uma de suas extremidades,
encontra-se a postura de que os profissionais têm a
competência exclusiva de decidir a respeito das neces-
sidades da criança e de fornecer os serviços apropriados,
sem a participação dos pais. Em seguida, apresenta-se
a tese de que os pais são importantes para a prestação
dos serviços. Ensina-se a eles o que devem fazer; neste
caso, os profissionais detêm o controle da situação. Na
posição subseqüente, os pais têm direito à palavra na
discussão sobre as providências a serem tomadas; no
ponto seguinte, eles tomam as decisões e determinam
os serviços que devem ser disponibilizados para a criança.
Finalmente, na extremidade oposta da seqüência,
situa-se a tendência geral dos países em desenvolvi-
mento, onde estão sendo criados programas com base
na comunidade, em que compete, quase exclusivamente,
aos pais (e à comunidade) instalar e ofertar os serviços.
De qualquer forma, é necessário construir parcerias
entre profissionais e pais, independentemente do nível
de competências existentes na comunidade e/ou no
país. Entretanto, esta tarefa não é fácil, porque a natu-
reza dessas relações depende de um grande número
de variáveis, o que coloca problemas nas seguintes
áreas específicas:
As relações dos pais e dos profissionais
com a criança
Para os pais, a criança representa uma realidade
cotidiana e um compromisso para toda a vida. Ter
uma criança com necessidades especiais é, para a
família, uma realidade presente no seu dia-a-dia.
Assim, suas preocupações vão além da prestação
deste ou daquele serviço. Por sua vez, o profissional
trabalha com um conjunto de regras e procedimen-
tos, e cada criança é um elemento dentre muitos
outros, cujas necessidades são cobertas por um
determinado serviço. Ele se limita a desempenhar
sua função. Portanto, seu ritmo – assim como seu
grau de determinação para responder às necessi-
dades da criança – é bastante diferente do ritmo
dos pais.
A concepção do profissional sobre seu papel
Numerosos profissionais se vêem como detentores
da solução dos problemas: conhecem a situação e
apresentam o diagnóstico. Uma efetiva participação
dos pais vai exigir uma mudança no papel do profis-
sional, que deverá tornar-se um mediador, promotor
e agente de um diálogo construtivo entre todos os
interessados.
O equilíbrio de poder entre pais e profissionais
O poder dos profissionais advém de seu conhe-
cimento sobre as necessidades da criança, além de
sua capacidade para satisfazê-las. Em decorrência de
sua posição central no sistema, eles têm igualmente
o poder de autorizar (ou negar) os serviços. Apesar
de terem o poder de decidir em nome do filho, se
os pais não possuírem os conhecimentos e a auto-
confiança necessários para desempenhar seu papel,
este poder permanecerá, via de regra, nas mãos dos
profissionais.
A origem socioeconômica dos profissionais
e pais
É freqüente que os profissionais e os pais sejam
oriundos de diferentes níveis socioculturais (ou de
grupos étnicos), o que pode gerar divergências
fundamentais com relação à sua concepção da vida,
assim como às suas crenças e atitudes sobre a edu-
cação das crianças. Quanto mais os profissionais
que atuam junto às famílias forem de uma cultura
próxima à das famílias, maior será a concordância
de pontos de vista e, portanto, maiores serão as
chances de se chegar a consensos.
O tipo de informação e de capacitação
dispensado às famílias
Para que as famílias possam tomar decisões
apropriadas, elas precisam de informações claras e
precisas. Além disso, os pais podem ter necessidade
de aprender a formular boas perguntas e a negociar
seus pontos de vista com diversos profissionais. As
informações e a capacitação dispensadas aos pais criam
as condições para redirecionar o poder em seu favor.
3.3. Enfatizar as primeiras
interações da criança com
as pessoas à sua volta
Este princípio se origina na tomada de consciência
sobre o valor da interação e da comunicação. As expe-
riências interativas são importantes para ajudar as
crianças a se desenvolverem na medida das suas poten-
cialidades. O desafio consiste em converter tais ex-
periências em serviços de apoio às famílias.
Na seqüência da tomada de consciência sobre o
valor e a natureza das experiências precoces de inte-
ração, desenvolveu-se, na Dinamarca, um projeto
18
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
19
baseado nos estudos de uma antropóloga que traba-
lhou em Uganda, na década de 70. Ao concluir seu
livro, Infant Care and the Growth of Love (1967) [Cuidados
com o bebê e o crescimento do amor], Mary Ainsworth
afirma que, no que se refere aos cuidados prestados
aos bebês, a manifestação do amor provém das
seguintes situações:
– contato físico freqüente e contínuo entre a mãe
e a criança, principalmente, durante os
primeiros seis meses de vida do bebê;
– aptidão da mãe em apaziguar a criança, de for-
ma eficaz, através do contato físico;
– receptividade da mãe às mensagens enviadas
pelo bebê e sua solicitude em satisfazê-las;
– capacidade das mães de prover o cuidado em
harmonia com o ritmo do bebê, e
– aptidão da mãe em organizar o ambiente do bebê
de tal maneira que este possa perceber as conse-
qüências de seus atos.
Os resultados do estudo foram reproduzidos em
outras culturas; e estudos posteriores indicam que
outras pessoas que cuidam das crianças podem intro-
duzir essas dimensões em suas relações com a criança
(ou seja, não é somente com a mãe que a criança
pode estabelecer vínculos de afeição).
Muitas das idéias identificadas por Ainsworth
receberam rótulos de caráter acadêmico, levando ao
seu distanciamento em relação às atividades da vida
das pessoas nas comunidades. É importante que as
orientações dirigidas às crianças e aos seus pais este-
jam ancoradas na vida cotidiana. A mensagem básica
que precisa ser transmitida é a seguinte: é importante
que os pais considerem o filho como uma pessoa
com plenos direitos e estejam bem conscientes de suas
potencialidades.
Nos países escandinavos, há um movimento que
incentiva as mães a permanecer mais tempo em casa
com a criança e conclama toda a população a prestar
maior atenção às interações precoces entre a mãe e a
criança. Na Dinamarca, foi implementado um projeto
que aplica os princípios definidos por Ainsworth e
outros pesquisadores da área que contribuíram para a
compreensão das necessidades da criança em diferentes
ambientes culturais. Os princípios enunciados anterior-
mente foram utilizados para ajudar os pais a estabelecer
vínculos com bebês muito prematuros, com múltiplas
deficiências. Ora, antes do início do programa, tais
vínculos só começavam a ser estabelecidos depois de
6 a 8 meses de idade, quando a criança recebia alta
dos cuidados médicos, o que, de acordo com os pais,
representava uma espera demasiadamente longa. No
novo projeto, os pais podem vir à maternidade
desde o dia do nascimento, e participar dos cuidados
dispensados ao bebê. Esta prática revelou-se muito
benéfica, tanto para os pais como para as crianças.
(Dyssegaard, 1997)
3.4. Tomar consciência de que
não existe um sistema único de
serviços
Não existe o serviço único ideal. Os serviços presta-
dos à criança são resultado de uma escolha feita no
âmbito das relações entre pais e profissionais, em função
dos recursos locais. O processo de negociação torna-se
um mecanismo que permite discutir conceitos e idéias.
As atividades inclusivas destinadas à primeira infância
podem ser variadas e ocorrer em diversos espaços:
– defesa e sensibilização em favor do valor e dos
direitos de todas as crianças;
– extensão àqueles que possuem recursos
(humanos e financeiros);
– educação e empoderamento dos pais;
– serviços prestados em casa;
– implementação de programas executados por
pais;
implementação de programas/grupos
recreativos pré-escolares;
– elaboração de planejamentos para a transição
de casa para a creche e/ou para a escola;
–uso e promoção de escolas como centros de
educação permanente, de saúde e de bem-estar;
– capacitação de trabalhadores das áreas de
saúde, assistência social e educação em
questões relacionadas à primeira infância, à
saúde, ao desenvolvimento e à inclusão;
– capacitação de públicos específicos em assuntos
especializados (avaliação, estimulação precoce,
currículo, defesa de direitos, responsabilização,
estimativas);
– mapeamento da comunidade (identificação de
estruturas, recursos e serviços formais e não
formais).
3.5. Dotar o programa de
pessoal apropriado
Um programa inclusivo bem-sucedido depende, em
grande escala, de ser dotado de pessoal capacitado,
solidário e com competências complementares. Para
lançar um novo programa, é particularmente impor-
tante poder recrutar um quadro de pessoal com quali-
dades apropriadas, comprometido com a inclusão e
interessado em se engajar nesta empreitada. Os pais
de crianças com necessidades especiais podem ser
uma categoria de agentes particularmente eficazes.
Os pais ainda jovens podem se identificar rapidamente
com os pais mais experientes e, compartilhando suas
experiências, podem elaborar, em conjunto, estraté-
gias apropriadas.
3.6. Assegurar capacitação
adequada
A capacitação é um elemento essencial para a imple-
mentação de programas inclusivos de qualidade, des-
tinados à primeira infância. No passado, muitos países
implantaram sistemas de formação de especialistas
que deveriam trabalhar junto às crianças com necessi-
dades especiais. Conforme se observou anteriormente,
esses sistemas são mais ou menos desenvolvidos,
segundo os países; entretanto, a adoção de programas
inclusivos traz a exigência de um tipo diferente de
formação profissional, que reforce as competências e
a habilidade dos diversos profissionais e dos “cuida-
dores” já existentes, em vez de criar um novo grupo
de profissionais especializados.
Diferentes populações exigem diferentes capaci-
tações. Na área médica, por exemplo, os profissionais
precisam ser mais bem informados sobre o crescimento
e o desenvolvimento da criança normal, além de apren-
derem a trabalhar com a colaboração dos pais. Por sua
vez, os profissionais que prestam os serviços precisam
ter conhecimento tanto sobre o desenvolvimento
infantil em geral, quanto sobre as necessidades espe-
ciais. Os pais também têm necessidade de estar bem
informados e de aprender a atuar em colaboração
com os profissionais. Estes últimos precisam aprender
a trabalhar com pessoas de outras áreas e disciplinas.
Todos os profissionais que trabalham com famílias
poderiam se beneficiar da capacitação em comuni-
cação, negociação, colaboração e parceria, defesa
dos direitos, valores e atitudes, e respeito pela comu-
nidade local e pelas famílias.
Não se pode pressupor que os professores e os
“cuidadores” estejam preparados para atender as crian-
ças com necessidades especiais nas suas casas ou seus
estabelecimentos. Mesmo os melhores profissionais
que se ocupam da primeira infância precisam de
capacitação suplementar e de apoio para enfrentar a
diversidade de necessidades das crianças, que abrangem
uma ampla gama de dimensões do desenvolvimento.
Há necessidade de pessoas que capacitem médi-
cos, trabalhadores da área social e agentes que atuam
junto aos pais – estes agentes podem, aliás, ser capa-
citadores bastante eficazes. Uma capacitação prévia,
por si só, nunca é suficiente. Com certeza, a capacitação
inicial é necessária para a aquisição de conhecimentos
básicos (tanto para os membros da corporação médica,
do serviço social, do corpo de professores quanto para
os pais), mas deverá ser sempre acompanhada por um
apoio e uma capacitação complementares, devido ao
progresso no campo dos conhecimentos teóricos e
práticos. Isso se aplica, em particular, à criação de
serviços inclusivos para a primeira infância, que é um
processo relativamente novo.
No que diz respeito aos sistemas de formação, é
importante enfatizar que, em vez de criar sistemas
inteiramente novos, é mais vantajoso recorrer à
readaptação ou revisão de sistemas já existentes.
4. Obstáculos aos
programas inclusivos de
educação e cuidado
na primeira infância
Embora seja possível que as pessoas que elaboram
programas inclusivos para crianças pequenas adotem,
fundamentalmente, os princípios que formam a base
de qualquer bom programa destinado à primeira
infância, tal empreendimento é mais fácil de ser
enunciado do que posto em prática. A educação es-
pecial traz consigo uma história e se caracteriza por
um conjunto de atitudes e de procedimentos que tor-
nam difícil, tanto para os pais como para os profis-
sionais, aceitar a idéia de que, em relação às crianças
com necessidades especiais, é fundamental en-
frentar, de maneira apropriada, os problemas desde a
primeira infância. Existem certas crenças e costumes,
assim como questões de ordem logística ou prática,
que prejudicam a implantação de programas inclu-
sivos de educação e cuidado na primeira infância
(ECPI). O que se segue é uma descrição de alguns
obstáculos que devem ser superados.
4.1. Crenças e costumes
O costume de esperar que as crianças
“estejam prontas”, antes de passá-las para
o nível subseqüente
Eis o que acontece, especialmente em relação às
crianças que são mentalmente mais lentas: são mantidas
em casa ou retidas nas turmas de educação infantil
(quando disponíveis), até que sejam consideradas
“prontas” para ingressarem no ensino fundamental.
Assim, correm o risco de ficarem retidas durante
vários anos e/ou assistirem ao adiamento do seu in-
gresso na escola. Essa prática se torna um ônus para
o programa de ECPI porque a vaga fica ocupada por
muito mais tempo do que no caso de uma criança
que passa de ano em função da idade. Além disso,
isto se constitui em uma fonte de tensão para a criança,
que fica cada vez mais distante, física e socialmente,
dos colegas da mesma faixa etária.
A falsa noção de que algumas crianças
não podem aprender
Um grande número de pessoas parte do pressuposto
de que as crianças com habilidades físicas diferentes
não possuem a mesma capacidade mental das outras
crianças; ora, até mesmo aquelas com capacidade intelec-
tual limitada são capazes de aprender certas coisas.
Cada criança tem o seu estilo de aprender e absorve,
diferentemente, o conteúdo da aprendizagem. Em geral,
as pessoas que trabalham junto a crianças com neces-
sidades especiais estabelecem limites arbitrários para
a capacidade de aprendizagem dessas crianças, ou
insistem em determinado método pedagógico que não
20
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
21
é adequado, ou não é o mais indicado para a criança.
Muitas vezes, tal atitude reflete os limites de seu conhe-
cimento em relação ao processo de aprendizagem.
A tendência dos países em desenvolvimento
de copiar os países desenvolvidos
Os modelos adotados pelos países desenvolvidos
continuam a gozar de um prestígio considerável junto
aos países em desenvolvimento; são como “o ideal a
ser alcançado”. Os países desenvolvidos optaram pela
alta especialização, o que dá a impressão de satis-
fazer as necessidades especiais de cada criança. Muitas
pessoas, quando ficam sabendo desta opção dos países
desenvolvidos, têm dificuldade em acreditar que a
educação inclusiva seja tão (ou mais) benéfica para as
crianças com necessidades especiais. O’Toole (1991)
observa: “Fomos seduzidos pela miragem da moderni-
zação que nos conduziu à ilusão de que as competên-
cias, os conhecimentos e a mentalidade ocidentais
deveriam ser transmitidos aos países em desenvolvimento.
Essa miragem é tão impositiva que muitos funcionários
insistem no fato de que as instituições do tipo ocidental
são a solução e que qualquer outro modelo só poderia
ser um ‘paliativo’, cuja adoção seria ‘humilhante’” (p. 13).
A crença de que somente os profissionais
com uma formação especializada podem
proporcionar experiências adequadas às
crianças com necessidades especiais
As pessoas que possuem uma formação especializa-
da nem sempre são as melhores para atuarem em uma
situação de inclusão. Como observou Bruder (1997b):
“Algumas disciplinas prestadoras de serviços correlatos
desenvolveram-se a partir de uma orientação médica
(por exemplo, as terapias) e estes profissionais correm
o risco de não se sentirem à vontade nas classes de
crianças pequenas. Podem prestar serviços eficazes,
diretamente a uma criança, em um espaço individuali-
zado, mais do que na estrutura
educacional. Se nunca pres-
taram atendimento a uma
criança em situação de grupo,
podem não se sentir compe-
tentes ou autoconfiantes para
fazê-lo” (p. 1). Em geral, os
dados disponíveis parecem
confirmar que os profissionais
bem-sucedidos em seu tra-
balho junto a crianças com
necessidades educacionais
especiais recorrem, em grande
medida, a estratégias que aju-
dam todas as crianças a terem
sucesso. (Ainscow, 1994, 34)
Devo confessar que, durante
a minha carreira, consagrei
muito tempo e energia na tentativa de encontrar técni-
cas especiais de ensino, com a finalidade de ajudar as
crianças com necessidades especiais a serem bem-
sucedidas em sua aprendizagem. Minha conclusão,
agora, é que nenhuma dessas abordagens especializadas
merece ser levada em consideração. Embora certas
técnicas possam ajudar uma ou outra criança a ter acesso
ao processo de escolarização, elas não são, por si mesmas,
a chave do sucesso. Além disso, ao limitarmo-nos a esse
aspecto, podemos nos esquecer de questões muito mais
importantes, que dizem respeito aos meios que podemos
empregar para melhorar o ensino escolar, a fim de aju-
dar todas as crianças a assimilar os conhecimentos que
desejamos transmitir-lhes. (Ainscow, 1994, 29)
4.2. Questões de ordem logística
e prática
Estas questões se referem a realidades concretas às
quais são confrontadas as pessoas que tentam criar
programas inclusivos:
O aumento, em muitos países, da dupla
pressão por uma incorporação da pré-escola
ao ensino fundamental e por um rebaixamento
da idade de acesso à escola obrigatória
Ao serem formalizadas as pré-escolas, impõe-se
um limite ao desenvolvimento de várias atividades
centradas na criança, e são exatamente estas ativi-
dades que permitem que todas as crianças, sejam
quais forem suas habilidades, participem em um con-
texto de grupo. Conforme observado, pré-escolas de
qualidade se coadunam perfeitamente com as pers-
pectivas da educação inclusiva. A tendência de se
É falsa a crença de que somente os profissionais com uma formação
especializada possam proporcionar experiências adequadas às
crianças com necessidades especiais
UNICEF/HQ96-0280/Nicole Toutounji
atribuir às pré-escolas a função de “preparação para
o ensino fundamental” criará provavelmente um
ambiente mais exclusivo do que inclusivo.
Os recursos insuficientes destinados à
formulação de programas inclusivos
Como a atenção da maioria dos países desenvolvidos
está centrada na expansão e aprimoramento da edu-
cação básica, torna-se extremamente difícil defender a
causa das crianças com necessidades especiais e obter
recursos em seu favor. Entretanto elas fazem, assim
como qualquer outra criança, parte integrante da
sociedade e têm direito à educação. Infelizmente, em
geral, o orçamento da educação representa um per-
centual ínfimo do orçamento nacional. As verbas
eventualmente destinadas a essas crianças são, com
freqüência, provenientes do orçamento geral da edu-
cação, o que reduz ainda mais a verba destinada ao
ensino fundamental. Além disso, como já foi observado,
o próprio sistema escolar pode estar engendrando
crianças com necessidades especiais. Segundo Ainscow
(1994), “quando este é o caso, ajudamos as ‘vítimas’ de um
sistema transferindo fundos de maneira tal que se incorre no
risco de fazer crescer ainda mais o número de tais vítimas”
(p. 30).
5. Nossos objetivos
5.1. Ampliar a consciência
A tomada de consciência do problema constitui o
começo da resposta. Os estudos de caso indicam
que, para a elaboração de programas inclusivos
sustentáveis, é necessário suscitar essa tomada de
consciência. Será preciso defender a causa das crian-
ças com necessidades especiais. As pessoas devem
saber que todas as crianças têm o direito ao acesso a
serviços de apoio que promovam seu crescimento e
desenvolvimento harmoniosos, sejam quais forem
seus conhecimentos, suas competências e suas ca-
pacidades iniciais.
Os argumentos invocados em defesa das crianças
com necessidades especiais podem apoiar-se em dife-
rentes considerações. Apesar de sublinhar a pertinência
dos programas inclusivos para todas as crianças, a
pesquisa raramente é utilizada para valorizar o con-
ceito. Em alguns países, são as declarações interna-
cionais e a adesão do governo a essas declarações
que parecem servir de motivação para a elaboração
de programas inclusivos. Os organismos doadores
internacionais desempenham também um importante
papel ao colaborarem com os governos para aper-
feiçoar programas destinados às crianças com neces-
sidades especiais. Em outros países, é a posição
assumida pelos pais que força o governo a levar em
consideração as necessidades de todas as crianças.
A escolha da inclusão pode ser também o resultado
de restrições financeiras e da idéia de que os progra-
mas inclusivos são mais baratos do que os serviços
especializados. São muitas as considerações que,
tomadas isoladamente (ou em conjunto), podem
servir para justificar – e influenciar – a elaboração
de programas inclusivos.
É importante reconhecer que, se a conscientiza-
ção nasce do conhecimento e da informação, ela
pressupõe igualmente atitudes. As atitudes, por sua
vez, determinam a maneira pela qual a informação é
percebida. Na realidade, os argumentos em favor
da educação especial são, muitas vezes, de cunho
político e emocional, mais do que racional.
5.2. Melhorar as técnicas de
triagem e exame para
determinar as necessidades
das crianças
Há duas maneiras de determinar as necessidades
especiais das crianças: triagem e exame. Estas duas
operações não são intercambiáveis. A triagem é um
processo preliminar, que visa a identificação das
crianças suscetíveis de apresentarem dificuldades
de aprendizagem no futuro. Em seguida, procede-se
a um exame minucioso dessas crianças a fim de
determinar a natureza da dificuldade potencial.
A triagem
Em geral, quanto mais grave a deficiência, mais
cedo e mais facilmente pode ser identificada (as defi-
ciências severas são comumente detectadas no nasci-
mento ou logo após); ao contrário, quanto mais sutil o
problema, mais difícil e mais tempo será necessário
para detectá-lo. Como o desenvolvimento e o compor-
tamento durante a primeira infância são extrema-
22
UNICEF/5747/Lauren Goodsmith
O exame precoce é crucial
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
23
mente variáveis, fica difícil fazer a triagem de bebês e
de crianças com idade inferior a 18 meses. É também
relativamente pequeno o número de deficiências
suscetíveis de serem detectadas durante os dois
primeiros anos de vida. Além disso, faz-se necessário
um substancial investimento financeiro e humano
para que se obtenha testes de triagem confiáveis e
baseados em normas locais. Acrescente-se aqui o custo
do treinamento de profissionais de saúde ou outros,
responsáveis pela aplicação dos testes. Por essas
razões, a triagem sistemática de todas as crianças po-
de não representar uma boa relação custo/benefício.
Qualquer que seja a triagem, o procedimento deve ser
rápido e simples, confiado a alguém que esteja em
contato diário com a criança, ser de baixo custo e de
fácil interpretação. Além disso, a relação entre os
acertos e os erros deve ser satisfatória (isto é, a triagem
deve identificar corretamente as crianças com necessi-
dades especiais – convém que não seja elevado o
número das crianças incorretamente identificadas
com problemas ou o número daquelas com problemas
não-identificados). Um exemplo de instrumento
simples para a triagem é apresentado no Destaque 2.
O exame
Ocorrendo geralmente depois da triagem, o exame
é um processo contínuo que consiste em observar a
criança de maneira mais aprofundada. Se a triagem
indica um problema potencial, convém proceder
imediatamente a um exame a fim de definir o perfil
das habilidades motoras, cognitivas e psicossociais
da criança. Tal exame deve ser completo e incluir várias
mensurações (algumas vezes efetuadas através de
instrumentos padronizados, tal como o Teste de Desen-
volvimento de Denver). Enquanto a triagem pode ser
feita em grupo, o exame é um processo mais individua-
lizado, que exige competências específicas; assim, na
medida do possível, deve ser feito por profissionais.
Apesar de ser complexo, o exame é importante para
a elaboração de programas inclusivos; é necessário
para conhecer o desenvolvimento da criança, e para
ajudar os pais e outras pessoas que cuidam da criança
no planejamento de atividades adequadas. O exame
permite determinar as necessidades da criança e definir
estratégias que respondam a essas necessidades; o que
deveria contribuir para desmistificar a deficiência da
criança junto a todos aqueles que participam de sua
vida.
Ao optar pela inclusão, convém levar em consideração
a diversidade de um determinado contexto. É impor-
tante também partir do princípio de que é necessário
examinar o desenvolvimento de cada criança. A fim de
determinar suas necessidades individuais, seria ideal
que todas as crianças passassem por um exame – por
mais simples que fosse; o que, certamente, não é viável
em grande parte dos países em desenvolvimento.
À semelhança da triagem, o exame suscita algumas
questões:
Destaque 2— Um instrumento de
triagem para a criança pequena
Os pais e outras pessoas que participam do cuidado
diário da criança podem garantir este tipo de triagem.
Você sabe que a criança pode ter problema em um ou vários dos domínios indicados
abaixo quando ela apresenta qualquer um dos seguintes comportamentos:
Escutar
ela não gira a cabeça para o lado da fonte de novos sons ou vozes
apresenta freqüentes infecções nos ouvidos (supurações, dores)
não responde à sua chamada quando você está fora do seu ângulo de visão
observa seus lábios quando você fala
fala muito alto ou muito baixo
não fala ou fala de modo estranho
Ver
freqüentemente, ela não consegue ver os pequenos objetos que deixou cair
apresenta os olhos vermelhos, secreções oculares crônicas,
manchas ou olhos embaçados, esfrega-os freqüentemente ou queixa-se de
dores nos olhos
freqüentemente esbarra nos objetos quando se movimenta
posiciona de forma estranha a cabeça, quando tenta olhar para alguma coisa
apresenta, algumas vezes ou sempre, sinais de estrabismo de um ou dos
dois olhos (depois dos 6 meses)
Falar
não fala “mamãe” (ou algo equivalente), por volta dos 18 meses
não consegue nomear alguns objetos familiares ou pessoas próximas,
por volta dos 2 anos
não repete músicas ou ritmos simples, por volta dos 3 anos
não fala pequenas frases, por volta dos 4 anos
não é compreendida por pessoas externas ao círculo familiar,
por volta dos 5 anos
fala diferentemente das crianças da mesma idade
Compreender
não reage ao próprio nome, por volta de 1 ano
não identifica as partes do rosto, por volta dos 3 anos
não responde a questões simples, por volta dos 4 anos
não consegue acompanhar histórias simples, por volta dos 3 anos
parece ter mais dificuldade de compreender o que você está dizendo, do
que outras crianças da mesma idade
Brincar
não se diverte em fazer movimentos lúdicos simples, por volta de 1 ano
não brinca com objetos de uso corrente (por exemplo, colher, panela),
por volta dos 2 anos
não participa de jogos com outras crianças (por exemplo, bola,
pique/esconde), por volta dos 4 anos
não brinca como as outras crianças da mesma idade
Movimentar-se
não consegue se sentar sem ajuda, por volta dos 10 meses
não anda sem ajuda, por volta dos 2 anos
não se equilibra, por um instante, em um só pé, por volta dos 4 anos
movimenta-se diferentemente das outras crianças da mesma idade.
Fonte: Early Childhood Care and Education A Trainer’s Manual, University of the
South Pacific [Educação e Cuidado da Primeira Infância – Manual do
Instrutor, Universidade do Pacífico Sul], 1995 (pp. 13-15.)
É importante que o exame seja feito o
mais precocemente possível. Em relação às
crianças com riscos congênitos e biológicos (com
baixo peso ao nascer, por exemplo), um exame pre-
coce (iniciado por volta dos 18 meses) é importante
porque permite uma intervenção precoce, visando
prevenir qualquer atraso ou deficiência no seu
desenvolvimento.
O exame deve ser considerado como um
processo. Conviria centrar a atenção no processo,
assim como nos resultados do exame, o que exige
a capacidade de observar, anotar, interpretar e
planejar. O processo deve ser concebido de forma
tal que os examinadores possam compreender o
comportamento da criança no contexto de sua vida
diária.
Bruder (1997a) refere-se ao processo como um
“inventário ecológico”, ou seja, “um inventário do con-
junto das capacidades necessárias à criança para se
integrar em todo tipo de ambiente natural ... Ele visa
coletar informações relativas à melhoria da qualidade
de vida da criança e de sua família, examinando os
pontos fortes e as competências da criança, quando de
suas interações com as pessoas e os objetos, em am-
biente próprio para a sua idade. Essas informações são
de importância vital para garantir que qualquer inter-
venção em seu favor venha a enfatizar competências
importantes e funcionais, associadas a todas as dimen-
sões do desenvolvimento.” (p. 4)
Os modelos tradicionais de exame, específicos de cada
disciplina, são introduzidos nas novas estruturas onde se
propõem atividades, dirigidas por uma pessoa desconhe-
cida, gerando informações insuficientes quando se trata
de bebês ou de crianças pequenas com deficiência
(
Bruder, 1997ª, 2).
O que entendemos por “inventário ecológico”?
Esta abordagem inclui:
– Fazer o exame no local onde a criança se
sintainteiramente à vontade. Diante de situa-
ções que não lhes são familiares, as crianças peque-
nas modificam seu comportamento. Portanto, convém
que os exames sejam feitos em um espaço confortá-
vel, se possível conhecido pela criança, e utilizado
por crianças “normais”. Na medida do possível, esse
espaço deveria ser o ambiente natural da criança –
a casa ou a creche, por exemplo.
– Apoiar o exame em elementos funcionais.
Os exames deveriam se basear naquilo que, segundo
a cultura da criança, faz parte de sua vida cotidiana:
por exemplo, tarefas domésticas (desenvolvidas
junto com a mãe/pessoa que cuida dela); outras
atividades (cantar, brincar com os colegas) ou,
ainda, elementos de rotina (a refeição, lavar as mãos,
a hora do sono).
– Adotar técnicas lúdicas. Se as crianças sen-
tem dificuldade em seguir as instruções (por exemplo,
utilizar um lápis para escrever ou marcar com um “X”
os formulários; trabalhar com objetos não-familiares;
interpretar imagens quando ignoram completamente
como fazer sua leitura, etc.), correm o risco de não
conseguir demonstrar suas reais capacidades. Uma
situação lúdica permite a observação em uma situa-
ção em que a criança se sente à vontade para reve-
lar seu amplo repertório de comportamentos.
– Buscar a informação em múltiplas fontes.
Para se fazer um verdadeiro exame das habilidades e
dos conhecimentos da criança, é desaconselhável
limitar-se a apenas um instrumento e um espaço. O
exame deve compreender a coleta de dados junto a
diferentes fontes – pais, professores e outros – com a
ajuda de instrumentos informais que complementem
os testes e dossiês, e apresentem um cenário comple-
to do modo de agir habitual da criança.
– Incluir itens que permitam abranger todas
as dimensões do desenvolvimento da criança
e observá-la no contexto familiar. É desejável
examinar os seguintes pontos:
o vínculo que une a criança e a pessoa que cuida dela.
O que é natural na família?
a motivação da criança. O que leva a criança a
desejar fazer alguma coisa? Em que consistem
suas recompensas?
a resolução de problemas. Como a criança os
enfrenta? Como procura chamar a atenção?
as adaptações. Como a criança administra sua
deficiência?
as reações em função dos ambientes e das pessoas. Como
a criança reage nos diferentes ambientes e com
pessoas diferentes?
24
UNICEF/HQ96-0247/Nicole Toutounji
Assistência à criança através de técnicas lúdicas
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
25
a sociabilidade. Como a criança se comporta com
seus colegas?
O exame deve ter um objetivo bem definido
e orientar o planejamento. É importante ter
uma idéia bem clara da RAZÃO do exame. Em um
planejamento inclusivo, o exame tem por objeto
criar um programa e atividades adequadas para todas
as crianças.
Convém, no entanto, saber que a relevância do exame
está relacionada à capacidade dos examinadores de
interpretar os resultados e de planejar de maneira apro-
priada: o exame feito apenas como “teste” tem pouca
utilidade e leva ao desperdício de recursos. O resultado
deve servir para criar atividades para a criança, que
visem, em particular, tirar partido de seus pontos fortes,
assim como atividades destinadas a fortalecer suas
capacidades em áreas bem circunscritas. O exame deve
contribuir para dar resposta às questões: Como
modificar o espaço de forma a proporcionar a plena
participação da criança? Quais atividades específicas
ajudarão a criança a aprender?
Em relação aos instrumentos de exame, seria con-
veniente colocar as seguintes questões:
– O instrumento tem relação com o currículo
adotado?
– O instrumento está associado a um processo
de capacitação? O processo de capacitação
para a utilização de um instrumento de exame
pode ser instrutivo, por ampliar a consciência
em relação àquilo que convém saber sobre o
desenvolvimento infantil. O processo de exame
deveria ser utilizado como ferramenta de
capacitação.
–O instrumento de exame pode ser utilizado no âm-
bito de uma análise mais ampla da situação no país?
– Os resultados podem ser utilizados para um
planejamento nacional?
Como fazer a relação, da melhor forma possível,
entre o exame e as atividades adequadas?
– Como o processo de avaliação pode ser utilizado
para nos informar sobre as necessidades de
desenvolvimento das crianças?
Iniciar e concluir o processo com os pais
O exame precoce oferece uma oportunidade única
de facilitação da participação dos pais – tanto no
processo de exame, como no apoio ao desenvolvi-
mento da criança. Isso não significa que os pais devam
fazer, eles mesmos, o exame completo, mas devem
compreender o processo e participar das atividades
em que se sintam confortáveis. Começar pelo que os
pais conhecem a respeito do filho. O que observaram
no seu comportamento? Embora nem sempre sejam
os observadores mais objetivos dos filhos, os pais estão
a seu lado em diversas situações e passam um tempo
considerável com eles. Dessa forma, os pais encon-
tram-se na melhor posição para fornecer informações
sobre o que o filho é ou não capaz de fazer.
Com o objetivo de desfrutar do conhecimento dos
pais, os pesquisadores estão adaptando os instrumentos
habituais de triagem, para colocá-los à disposição dos
pais. Assim, uma versão ilustrada do Teste de Desen-
volvimento de Denver foi aperfeiçoada para ser apli-
cada pelas mães. Os resultados revelaram-se mais
confiáveis do que aqueles obtidos através da aplicação
do teste por profissionais (Thorburn, 1997).
Em resumo, os processos de triagem e exame são
importantes para a determinação das necessidades de
todas as crianças. Entretanto, os instrumentos e as
técnicas de aplicação e interpretação continuam
sendo complexos; além disso, tanto os processos
como os resultados podem ser utilizados para excluir
as crianças dos serviços, ao invés de lhes oferecer as
melhores condições possíveis de aprendizagem. Mesmo
que haja um consenso sobre a riqueza dos ensinamentos
obtidos através do exame e mesmo que os princípios
apresentados anteriormente forneçam uma orien-
tação básica, subsiste um certo número de questões:
De que tipo e quantidade de informações têm
necessidade os pais, os “cuidadores” e os profes-
sores, para facilitar o desenvolvimento da criança?
– Quem deveria fazer o exame? O recurso a
profissionais é oneroso e, em muitos lugares,
seu número é reduzido. O recurso a agentes
comunitários leva mais tempo e sua capacitação
é indispensável.
– Quais tipos de exame deveriam ser feitos e
quando? Se quisermos que os professores façam
o exame, quais procedimentos podemos utilizar?
É preciso ter instrumentos que possam ser apli-
cados, de maneira confiável, por pessoas com
baixo nível de instrução.
– Quais modalidades permitem transferir os
resultados de um contexto para outro?
– Qual deveria ser a abrangência dos exames?
Devemos utilizar exames simples, embora
rudimentares, ou exames mais detalhados que
exijam mais tempo e capacitação, como por
exemplo o modelo de Portage que necessita, no
mínimo, de duas semanas?
– Até que ponto os instrumentos de exame deter-
minam os aspectos “universais” do desenvolvi-
mento e o que isso implica para o
aperfeiçoamento de instrumentos que possam
ser utilizados por todas as culturas? Admite-se
que, após adaptação, alguns instrumentos possam
ser utilizados, de forma satisfatória, em todos os
países (por exemplo, em uma publicação intitu-
lada “Estojo pedagógico destinado aos pais de uma
criança deficiente – Atividades lúdicas”, a Organiza-
ção Mundial da Saúde estabeleceu uma lista das
capacidades das crianças e de propostas de ativi-
dades); além disso, devem ser alocados recursos
para a revisão e análise de instrumentos de
exame, de forma a servirem de orientação
àqueles que estão em busca de instrumentos
adequados aos diversos contextos dos países em
desenvolvimento (UNESCO, 1998).
5.3. Diferentes modelos
de prestação de serviços
Quando vários setores (médico, educacional, social)
estão envolvidos na prestação de serviços, os pais
são obrigados a lidar com diversas organizações. Tal
situação pode gerar desânimo (sem contar que as
mensagens oriundas de fontes diversas podem parecer-
lhes contraditórias). Cada programa deverá levar em
consideração a natureza holística do desenvolvimen-
to da criança e a multiplicidade de suas necessidades.
Alguns modelos de serviços integrados foram aper-
feiçoados e podem funcionar de várias maneiras:
O trabalho de equipe
Este modelo de organização integra os diversos
serviços efetivamente fornecidos à criança e à sua
família por meio de equipes de planejamento comum
ou de outros mecanismos de coordenação.
Ao contrário da fórmula de disciplinas e serviços
múltiplos, Bruder (1997b) defende a idéia de equipes
de profissionais (atuando nos serviços), constituídas
por um grupo de pessoas cujos “objetivos e funções
se inspiram em uma visão idêntica, e que perseguem
os mesmos objetivos” (p. 3). De cunho multidisciplinar,
estas equipes têm uma abordagem que “exige que seus
membros compartilhem os papéis e transcendam,
sistematicamente, as fronteiras de cada disciplina ...
Os diferentes especialistas ensinam, aprendem e tra-
balham juntos para alcançar um conjunto de objetivos
comuns de intervenção em favor de uma criança e de
sua família. A diferenciação de papéis por disciplina
é definida de acordo com as necessidades da situação
concreta, e não pelas características de tal ou tal dis-
ciplina” (Bruder, 1997, 3).
A integração dos serviços tem por objetivo reduzir
o atual e predominante fenômeno de fragmentação.
Comporta quatro dimensões intimamente relacionadas:
– Prestação de serviços: integração centrada no
cliente, com base na compreensão global e
aprofundada dos múltiplos problemas aos quais
crianças e famílias são confrontadas.
– Articulação dos programas: integração com foco no
reagrupamento de diferentes serviços, distintos
e fragmentados, em um sistema polivalente.
– Gestão política: integração garantida pelos poderes
públicos a fim de aprofundar a coerência e a respon-
sabilidade do conjunto dos serviços sociais.
– Estrutura organizacional: integração envolvendo a reor-
ganização e a criação de estruturas governamentais.
Os centros de referência para as famílias
Os serviços podem ser articulados por meio de
uma única organização, onde os pais podem se infor-
mar sobre os serviços disponíveis. Em cada centro,
existe um coordenador que indica os serviços mais
adequados para responder às necessidades da criança
e da família.
Em geral, um centro de referência para as famílias
oferece “tudo num só local”. Usualmente, localiza-se
em uma instituição da comunidade. Os pais aí encon-
tram, centralizados, todos os serviços – sociais, de
saúde e de educação – destinados à criança e a eles
próprios. Quando esta alternativa não é viável, uma
pessoa é destacada para trabalhar com a família. Esta
pessoa fica encarregada de coordenar os serviços
oferecidos pelas diversas instituições; de indicar os
serviços mais adequados para a família e de colocá-la
em contato com tais serviços a fim de garantir que as
famílias tenham de fato acesso a eles. Isto oferece às
famílias, no mínimo, um ponto de contato centralizado.
O coordenador deve ser capaz de apoiar a família nos
cuidados com a criança, respeitando os princípios do
cuidado centrado na família. Deve saber também es-
treitar as relações a fim de resolver os problemas em
parceria com a família.
Reabilitação baseada na comunidade
A reabilitação baseada na comunidade (RBC) im-
plica colaborar com a comunidade para determinar
suas necessidades e implementar os serviços que levem
à inclusão de todos os seus membros na vida cotidiana.
Ele abrange todos os setores e serviços existentes. A
ênfase é dada à parceria e à comunicação entre os
parceiros, com o objetivo de oferecer o melhor apoio
possível às pessoas com diferentes habilidades.
Seu objetivo final é desmistificar o processo de rea-
bilitação e resgatar junto aos indivíduos, às famílias
e à comunidade sua responsabilidade na prestação
de serviços adequados. Todos os esforços visam
essencialmente disponibilizar apoios para as crianças
em casa ou na comunidade; neste último caso, são
constituídos comitês para identificar as crianças e
famílias com necessidades especiais. Em seguida, os
membros do comitê são capacitados para prestar
serviços, sensibilizar a comunidade, levar seu apoio
aos pais, etc.
Desde seu lançamento, o movimento de RBC
revelou-se extremamente capaz de mobilizar as co-
munidades, e de disponibilizar, para as pessoas com
deficiência e a suas famílias, os recursos necessários
para mudar as atitudes locais e aumentar as oportu-
nidades para todos os membros da comunidade. Esta
abordagem é particularmente útil na zona rural, onde
é limitado o acesso aos serviços de reabilitação em
centros especializados. No Destaque 3, O’Toole
(1991) apresenta o resumo de um programa de RBC
no Zimbábue.
Assim, a reabilitação baseada na comunidade é
uma forma de inclusão no âmbito da comunidade e
não se limita às crianças pequenas e às suas famílias,
mas abrange o conjunto da população.
26
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
27
5.4. Políticas de apoio
Os países deveriam elaborar suas políticas para a
criança, para a família e de educação, em função da
cultura e das necessidades nacionais, levando em
consideração as iniciativas internacionais. As políti-
cas implementadas para responder às necessidades
das crianças pequenas e de suas famílias variam de
país para país. Para saber se existem políticas adequadas,
podemos começar por analisar os planos nacionais
apresentados pela maior parte dos países no âmbito
da Convenção sobre os Direitos da Criança. Além disso, é
importante examinar as políticas em vigor nos diferen-
tes setores. Atualmente, vários ministérios desenvol-
vem ações para as crianças com necessidades especiais.
Com bastante freqüência, os Ministérios da Saúde,
da Assistência Social ou do Bem-Estar Social assumem
a responsabilidade pelos primeiros anos de vida da
criança. Entretanto, uma vez que a criança tem direi-
to à educação, o Ministério da Educação deveria
desempenhar um papel decisivo, desde o nascimento.
A iniciativa de formulação de políticas pode se
originar, especialmente, de duas fontes. (1) O movi-
mento pode vir da base; neste caso, as associações de
pais exercem, muitas vezes, uma pressão ativa em
favor da adoção de políticas e de serviços adequados.
(2) No entanto, a iniciativa pode ser também do
governo. Citamos o exemplo de Uganda, país onde,
recentemente, o Presidente declarou que tornaria
gratuita a educação para quatro crianças por família
e que as crianças com deficiência teriam prioridade.
Assim, da noite para o dia, verificaram-se uma reorien-
tação dos serviços prestados e uma mudança no perfil
da oferta, passando das classes especiais para os pro-
gramas inclusivos. Só em 1997, mais de 30.000 crianças
com necessidades especiais se beneficiaram desses
programas.
Toda política nacional de caráter geral contém
declarações de intenção. Entretanto, a existência de
políticas não garante sua implementação, que é
uma etapa distinta. Muitos governos declararam
que as crianças com necessidades especiais deveriam
ser incluídas em todos os serviços, sem, no entanto,
criar dispositivos que pudessem assegurar a efetivação
destas intenções. Para além das declarações políticas,
faz-se necessário definir estratégias, responsabili-
dades e recursos. Quando se chega ao estágio da
implementação, quanto mais complexos os sistemas,
mais tempo será gasto na concretização das ações.
A rapidez e a abrangência dos serviços a serem ofer-
tados dependem também do volume de recursos
disponíveis.
A esfera em que se exerce o controle difere, segundo
os governos. No passado, as administrações eram
centralizadas, mas, atualmente, insiste-se muito na
descentralização. Neste último caso, o governo na-
cional estabelece diretrizes e um marco de ação; e cada
distrito, região ou município se responsabiliza pela
implementação de programas, em função dos recur-
sos e das necessidades locais. A descentralização
repercute sobre a concepção e a implementação da
regulamentação, do acompanhamento e da supervisão.
5.5. Parcerias
Historicamente, foi a área médica quem tomou a
iniciativa e quem mais contribuiu para a definir o que
deve ser feito e para agir em favor das crianças com
necessidades especiais. Esse papel foi particularmente
eficaz para garantir a sobrevivência da criança, o que
Destaque 3 — O programa de RBC do Zimcare Trust
O
ZIMCARE Trust
, organização responsável pela educação e capacitação de pessoas com deficiência mental no Zimbábue, utiliza a reabilitação
baseada na comunidade para atingir os excluídos da zona rural. A idéia de criar o programa ocorreu quando se chegou à conclusão de que os
serviços existentes não respondiam às necessidades. Os 15 centros administrados pelo
Zimcare Trust
mobilizavam 300 agentes, que conseguiam
atender apenas 900 pessoas com deficiência. Segundo os resultados da pesquisa nacional sobre deficiência, de 1985, o número de deficientes mentais
foi estimado em 27.000, distribuídos em todo o território nacional. A maior parte dessas pessoas encontrava-se isolada a tal ponto que, ao serem inter-
rogadas em relação ao número de filhos, as famílias freqüentemente excluíam a criança deficiente desse número. Os bebês eram, muitas vezes, negli-
genciados e não recebiam qualquer estímulo.
Com a implantação do ensino fundamental universal e a publicidade veiculada pelos vários programas de reabilitação, houve um aumento signi-
ficativo da demanda por serviços. Convencido de que a solução não residia na multiplicação dos centros, o
Zimcare Trust
criou um programa especial
destinado às pessoas localizadas em áreas remotas, com acesso muito limitado aos serviços, e cujos problemas eram tão sérios que os serviços exis-
tentes não teriam condições de prestar-lhes um atendimento adequado. Em vez de oferecer serviços diretos às crianças, este programa oferecia uma
formação aos membros das comunidades locais, ensinando-lhes a lidar com as famílias que, por sua vez, cuidavam de seus filhos.
Um ano após o lançamento do programa, os pais foram entrevistados. Os resultados revelaram que 135 das 136 mães entrevistadas consideraram
o programa útil. Os pais se declararam felizes por compreenderem melhor o problema do filho, cujo estado havia melhorado sensivelmente (O’Toole,
1991, 22). A avaliação mostrou também que
em grande parte, o sucesso do programa devia-se ao fato de que o coordenador pertencia à comunidade e conhecia bem as condições locais;
foi importante garantir o envolvimento de pessoas ou grupos influentes – associações de pais, políticos locais/regionais, funcionários de
ministérios – antes do lançamento do programa; e
foi importante que o programa estabelecesse relações com uma série de organismos, pois se o número de contatos ou de fontes de referên-
cia tivesse sido pequeno, alguns tipos de problemas teriam passado desapercebidos.
continua sendo um desafio decisivo em muitas partes
do mundo. Entretanto, uma vez garantida a sobre-
vivência, o papel dos profissionais de saúde consiste
em reduzir o número de crianças com necessidades
especiais (isto é, prevenir lesões às crianças). Esta
tarefa pode (e deveria) envolver pessoas que atuam em
diversos setores. Quanto mais precoce for a inter-
venção, maiores são as possibilidades de evitar que o
desenvolvimento da criança sofra atrasos ou seja com-
prometido. Assim, um leque maior de setores deveria
contribuir para a promoção do desenvolvimento
holístico da criança e para a prevenção dos obstáculos
ao seu desenvolvimento harmonioso.
À medida que os poderes públicos começaram a
entender melhor as necessidades holísticas da criança,
uma responsabilidade cada vez maior foi confiada aos
setores educacional e social para a prestação de ser-
viços em favor das crianças com necessidades espe-
ciais. O caráter multissetorial do atendimento exige
que os diversos setores cooperem e se associem para
responder a essas necessidades. Nenhum ministério
ou organismo (financiador, bilateral, Organização
das Nações Unidas ou organização internacional não-
governamental) seria capaz de prover, por si só, todo
o leque de serviços. É necessário criar parcerias. A
parceria pode ser definida como:
– a construção de uma relação;
– o desenvolvimento de uma aliança, em que
cada um dos parceiros tem liberdade para agir e
decidir (sem que um exerça controle sobre o outro);
– um apoio mútuo (um processo de compartilhar
conhecimento e experiências);
– do mais elevado interesse, quando está associada
a um plano ou projeto (isto é, com um objetivo
preciso, para atuar em favor da criança);
– uma visão comum sobre o “vir a ser” da criança;
– um processo de longo prazo, e não uma discussão
ou decisão pontual.
Não é fácil colaborar através da parceria. Dentre
os inúmeros fatores a serem superados, figuram:
– a atual definição do papel das organizações, que limita
os tipos de serviços que podem ser ofertados;
– a filosofia da organização: algumas adotam o mode-
lo médico para tratar deficiências e patologias;
outras optam pelo modelo de educação e
cuidado inclusivos na primeira infância, que
enfatiza a valorização dos pontos fortes da
criança, através da provisão de inputs e de
suportes holísticos;
– o financiamento: quando é assegurado, geralmente
está alocado nos serviços; mas não pelo período
de tempo necessário para garantir o engajamento
nos processos de colaboração exigidos no plane-
jamento e na prestação de serviços inclusivos;
– o reconhecimento: os esforços de colaboração entre
as diversas organizações não são levados em
consideração;
– a redução do financiamento: quando vários serviços
são agrupados, verifica-se um corte de verbas,
mesmo se a variedade de serviços for maior;
– a motivação: não há incentivos financeiros, nem
pessoais para a colaboração entre serviços e
para a integração dos mesmos.
6. Conclusão e
recomendações
Os programas inclusivos destinados à primeira infância
deveriam acolher as crianças pequenas com necessi-
dades especiais. Os princípios que norteiam a elabo-
ração de programas inclusivos de qualidade são, essen-
cialmente, os mesmos que orientam a concepção e a
implementação de um programa de qualidade para a
primeira infância. Nos dois casos, busca-se responder
às necessidades de desenvolvimento de cada criança,
em um ambiente de afeto e apoio. Há também empenho
na oferta de serviços holísticos, que integrem saúde,
nutrição, serviços sociais e educação. A colaboração
na elaboração de um programa inclusivo é fundamental,
o que significa muitos parceiros trabalhando juntos
em todos os níveis – dos pais e das famílias, até as
comunidades, as organizações de base, as autoridades
locais e nacionais, as agências das Nações Unidas, as
organizações não-governamentais nacionais e inter-
nacionais, as comunidades doadoras, o mundo dos
negócios e o setor privado.
Os resultados da pesquisa evidenciam que a in-
clusão de todas as crianças em programas destinados
à primeira infância contribuirá para a redução do nú-
mero de crianças cujas necessidades especiais sejam
decorrentes da falta de nutrientes, da falta de estímulo
e/ou de amor e de cuidados. Para as crianças que têm
deficiência física, mas cuja capacidade mental não
foi afetada, a inclusão é perfeitamente possível, desde
que se proceda a eventuais adaptações do espaço
28
UNICEF/95-0769/Saad Jassim Zubeidi
Esta criança tem direito ao atendimento em um
programa de educação inclusiva, de modo a
desenvolver todo o seu potencial
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
29
físico. É possível desenvolver um conjunto de objetos
e de materiais que auxilie a criança a se adaptar em
um ambiente concebido para a primeira infância. Estes
objetos podem ser fabricados no próprio local.
Tratando-se de crianças com outros problemas
congênitos, inclusive deficiência mental, deve-se fazer
um esforço maior para analisar a estrutura dos progra-
mas e as possibilidades existentes, e para promover a
inclusão destas crianças com as demais, dentro do
próprio tecido comunitário. A tarefa não é fácil, mas é
possível, se houver uma colaboração mais estreita
entre aqueles que ofertam serviços para a criança
pequena e aqueles que trabalham com as crianças
com necessidades especiais. Entretanto, convém não
perder de vista alguns pontos.
Em primeiro lugar, a educação da criança pequena
ainda é um campo novo em termos de cobertura e de
distribuição de serviços. No plano internacional, os
programas destinados à primeira infância não chegam
a atingir, em média, 30% das crianças de 3 a 5 anos
de idade, atingindo em torno de 100% de cobertura
em alguns países e perto de 5% em outros. Assim,
não se trata simplesmente de melhorar a qualidade
dos programas existentes, mas também de criar novos
serviços para as crianças pequenas e suas famílias.
Em segundo lugar, considerando a importância de
uma intervenção precoce, deve-se disponibilizar
serviços para crianças com necessidades especiais
desde bem novas. Atualmente, o percentual de crianças
de 0 a 3 anos que se beneficiam, de uma forma ou de
outra, de um serviço destinado à primeira infância
é muito inferior ao percentual das crianças em idade
pré-escolar; portanto, existe uma necessidade urgente
de criar serviços para o primeiro grupo de crianças.
Em terceiro lugar, o setor responsável pela pres-
tação de serviços destinados às crianças com necessi-
dades especiais varia consideravelmente segundo
o país. O setor educação desempenha um papel
fundamental em todos os casos, mas é raro que o
Ministério da Educação seja responsável pelas
crianças com idade inferior a 3 anos; além disso,
os vínculos entre a educação e os outros setores
(especialmente, saúde e assistência social) diferem
muito de um país para outro.
Em quarto lugar, para as crianças com deficiências
severas, seria extremamente difícil criar um ambiente
educacional verdadeiramente inclusivo, que pudesse
ser benéfico para elas e para as outras crianças. Entre-
tanto, isso não significa penalizá-las, excluindo-as de
toda e qualquer vida comunitária. Deveriam existir
alguns ambientes onde estas crianças se sentissem
incluídas e que lhes oferecesse possibilidades de
interação social – eventos religiosos, comunitários,
esportivos etc.
Em quinto lugar, embora um programa inclusivo
destinado à primeira infância e um programa de
qualidade tenham muitas características em comum,
isso não significa que todo bom profissional de
um programa de qualidade esteja, forçosamente,
apto para atuar em um programa inclusivo. O atendi-
mento a algumas necessidades especiais requer uma
capacitação especial (e apoio).
Em sexto lugar, em determinadas situações con-
cretas, é extremamente difícil criar um verdadeiro
ambiente inclusivo. Quando um professor/educador
tem responsabilidade por um grupo de mais de 30
crianças, dentre as quais uma ou várias têm necessi-
dades especiais, esta situação é sempre muito difícil
para ele. Seria desejável que ele fosse auxiliado por
crianças mais velhas ou outros adultos. Em Uganda,
onde a educação básica tornou-se obrigatória e gra-
tuita, na proporção de no máximo quatro crianças
por família, o número de crianças por classe saltou de
40 para 300 e até 400. Além disso, as crianças com neces-
sidades especiais foram reconhecidas como prioridade.
É possível imaginar o que as crianças conseguem
aprender em tais condições! Tal situação nada tem a
ver com uma política de inclusão ou com a criação
de um ambiente educativo rico, ou ainda com a satis-
fação das necessidades de TODAS as crianças!
O presente artigo finaliza da maneira como come-
çou, com pequenos relatos sobre crianças peque-
nas. Holdsworth (1997) relata-nos as histórias de
Sonthong, Pousey e Vilayvanh: todos eles partici-
param de um programa de educação inclusiva
destinado à primeira infância, na República Demo-
crática Popular do Laos, que se pautava pela apren-
dizagem ativa.
Sonthong tem a síndrome de Down. Ao ingressar no jardim de infância em outubro de
1995, com 5 anos de idade, passava a maior parte do dia no chão. Não participava de nenhuma
atividade e parecia pouco consciente do que se passava à sua volta. Ele não sabia comer
nem ir ao banheiro sozinho. Em junho, ele estava totalmente integrado na classe e, por
ocasião do Dia das Crianças, participou com os colegas das comemorações do turno da
manhã, diante dos pais. Essa atividade consistia em uma série longa de movimentos
complicados e na execução do hino nacional, que ele realizou com entusiasmo. Dentre
todas as pessoas presentes, talvez apenas sua mãe e seus professores tivessem,
realmente, idéia daquilo que haviam realizado.
Pousey tinha 3 anos quando ingressou na escola. Criada por sua avó, havia passado
todos os seus dias dentro de casa. Com problemas físicos que afetavam suas pernas e a
mão direita, ela se arrastava na sala de aula e tinha medo das outras crianças.
Aconselhadas pelos profissionais de um centro de reabilitação, as professoras se
dedicaram a este trabalho. Em algumas semanas, Pousey alimentava-se sozinha.
Após um ano, começou a andar e faz uso das duas mãos, embora de forma desigual.
Ela é muito vivaz e participa de todas as atividades. Seu futuro é promissor.
Vilayvanh (quase 4 anos de idade) tem problemas de aprendizagem. Amedrontado e
isolado, passou as primeiras semanas agarrado, inicialmente a um cobertor e, em seguida,
a uma sacola repleta de outras sacolas. Progressivamente, ele passou a participar, cada
vez mais, das diferentes atividades e parece agora perfeitamente integrado. Ainda conserva
suas sacolas, mas consegue colocá-las de lado por algum tempo e, até mesmo, utilizá-las
em brincadeiras com os professores. Este ano, passa para a pré-escola, e se prepara para
o ingresso no ensino fundamental (inclusivo), no próximo ano.
Como observa Holdsworth (1997), não é preciso muita imaginação para inferir o que teria acontecido a cada uma
destas crianças se elas tivessem sido excluídas da vivência de experiências adequadas durante a primeira infância.
30
Objetivo: trabalhar pela inclusão de crianças com necessidades especiais na vida cotidiana de suas
comunidades
INCLUSÃO
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
31
BIBLIOGRAFIA
AINSCOW, M. Needs in the Classroom: a teacher education
guide. Paris: UNESCO, 1994.
BRUDER, M. B. Assessment of Young Children with
Disabilities. In: INTERNATIONAL CONSULTATION
ON EARLY CHILDHOOD EDUCATION AND SPECIAL
EDUCATIONAL NEEDS, Paris, 1-4 September. Comments.
Paris: UNESCO, 1997a..
______. Inter-professional Collaboration and Service Delivery.
In: INTERNATIONAL CONSULTATION ON EARLY
CHILDHOOD EDUCATION AND SPECIAL EDUCA-
TIONAL NEEDS, Paris, 1-4 September. Comments. Paris:
UNESCO, 1997b..
DYSSEGAARD, B. Policy and Management of Services: special
educational needs within the broader educational develop-
ment efforts. In: INTERNATIONAL CONSULTATION
ON EARLY CHILDHOOD EDUCATION AND SPECIAL
EDUCATION NEEDS, Paris, 1-4 Sep. 1997. Paper. Paris:
UNESCO, 1997.
GOODWIN, W. L.: DRISCOL, L. A. Handbook for
Measurement and Evaluation in Early Childhood Education.
San Francisco: Jossey-Bass, 1980.
HELANDER, E. et al. Training Disabled Persons in the
Community. Geneva: World Health Organization, 1989.
HOLDSWORTH, J. International Consultation on Early
Childhood Education and Special Educational Needs.
In: INTERNATIONAL CONSULTATION ON EARLY
CHILDHOOD EDUCATION AND SPECIAL EDUCA-
TIONAL NEEDS, Paris, 1-4 Sep. 1997. Working Paper.
Paris: UNESCO, 1997.
KOKKALA, H. (Ed.) Providing Special Education for Those
who Need it in Developing Countries. Helsinki: Department
of International Development Co-Operation, Ministry of
Foreign Affairs of Finland, 1997.
O’TOOLE, B. J. Guide to Community-based Rehabilitation
Services. Paris: UNESCO, 1991. (Guides for Special
Education; 8).
SAVOLAINENE, H. Between Discrimination and Inclusion:
persons with disabilities and services for them in Ethiopia
today. In: KOKKALA, H. (Ed). Providing Special Education
for Those Who Need it in Developing Countries. Helsinki:
Department of International Development Co-Operation,
Ministry of Foreign Affairs of Finland, 1997..
THORBURN, M. 3D Projects. In: UNESCO CONSULTA-
TION ON SPECIAL EDUCATION, Paris: Sep. 1997.
TUUNAINEN, K. Interaction between different special educa-
tion structures: Integrated-segregated. In: KOKKALA, H.
(Ed). Providing Special Education for Those Who Need it
in Developing Countries. Helsinki: Department of
International Development Co-Operation, Ministry of
Foreign Affairs of Finland, 1997.
UNESCO. First Steps: stories on inclusion in special needs
education. Paris: UNESCO, 1997.
______. Inclusive Education on the Agenda. In: WORLD
BANK, HUMAN DEVELOPMENT WEEK: module on
avoiding the social safety net – effective options for inclu-
ding disabled populations in Bank Funded Programs. Paris:
UNESCO, 1988.
______. Legislation Pertaining to Special Needs Education.
Paris: UNESCO, 1996.
______. Making it Happen: Examples of Good Practice
in Special Needs Education and Community-based
Programmes. Paris: UNESCO, 1997.
______. Review of the Present Situation in Special Education.
Paris: UNESCO, 1998b.
______. Review of the Present Situation on Special Needs
Education. Paris: UNESCO, 1995.
______. Teacher Education Resource Pack: special needs in the
classroom. Paris: UNESCO, 1993.
______. UNESCO Consultation on Special Education: statement
of general principles, trends, gaps and priorities. Final report.
Paris: UNESCO, 1998a.
UNITED NATIONS. Standard Rules on the Equalization of
Opportunities for Persons with Disabilities, 1993. New York:
United Nations, Disabled Persons Unit, Department for
Policy Co-ordination, 1993.
______. ______, 1994. New York: United Nations, Disabled
Persons Unit, Department for Policy Coordination and
Sustainable Development, 1994.
UNITED NATIONS CONVENTION ON THE RIGHTS OF
THE CHILD, New York, 1989. New York: United Nations,
1989.
WERNER, D. Nothing About Us Without Us: developing
innovative technologies for, by and with disabled persons.
Palo Alto: HealthWrights, 1998.
WERNER, D. Disabled Village Children. Palo Alto: Hesperian
Foundation, 1987..
WORLD CONFERENCE ON SPECIAL NEEDS EDUCA-
TION: ACCESS AND QUALITY. Paris, 1994. Final Report.
Paris: UNESCO, 1994.
1. INTRODUÇÃO
Apresentação do tema
O tema “Educação Inclusiva no Brasil” começou
a ser debatido nos três primeiros anos da década
de 90, portanto antes do primeiro documento
internacional que tratou especificamente do tema
– a Declaração de Salamanca e Linhas de Ação
sobre Educação para Necessidades Especiais
(aprovada em junho de 1994).
Os debates ocorriam em reuniões com poucos
educadores que já vinham introduzindo, em suas
escolas comuns, a prática de pelo menos alguns
dos princípios da educação inclusiva. E uma
parte muito pequena dos debates começou a
aparecer na literatura, geralmente após sua apre-
sentação em palestras sobre inclusão escolar de
alunos com deficiência. A propósito, antes da
Declaração de Salamanca, havia pouca clareza
a respeito da diversidade do alunado como
parâmetro do processo inclusivo. Naquela
época, muitos acreditavam que a educação inclu-
siva se referia apenas aos alunos com deficiência
(física, mental, visual, auditiva e múltipla). E
também havia entre eles o entendimento de que
o termo “necessidades especiais” abrangia tão
somente os diversos tipos de deficiência.
O Brasil poderia ter iniciado em grande escala
o movimento pela educação inclusiva já em 1994,
mas isso não ocorreu devido, possivelmente, a
um fato inusitado. Os educadores que, desde o final
de 1994 (1ª edição) até depois de 1997 (2ª edição),
tiveram acesso à tradução oficial da Declaração
de Salamanca não tomaram conhecimento dos
conceitos pertinentes à Educação Inclusiva quanto
a definições, filosofia, princípios, metodologias,
políticas, procedimentos etc. Pois a referida publi-
cação continha expressões como: integração,
educação integradora (integrada), princípio da
integração, orientação integradora, sociedade
integradora, ensino integrador, escolarização inte-
gradora e políticas integradoras. Na versão original
em inglês, constam os seguintes termos, respecti-
vamente: inclusão, educação inclusiva, princípio
da inclusão, orientação inclusiva, sociedade inclu-
siva, ensino inclusivo, escolarização inclusiva e
políticas inclusivas.
Apesar desse fato e graças em parte aos edu-
cadores que estudaram o texto original da Decla-
ração de Salamanca, o movimento pela educação
inclusiva prosseguiu, de início vagarosa e relutan-
temente. Hoje, ele é um fato consumado em todo
o Brasil, embora não necessariamente envolvendo
todas as escolas comuns. Inúmeros eventos sobre
educação inclusiva foram realizados em todo o
Brasil. A bibliografia específica hoje é vastíssima.
Vários consultores foram contratados por escolas
públicas e particulares e por secretarias estaduais
EXPERIÊNCIAS
33
A EDUCAÇÃO INCLUSIVA
NO ESTADO DE GOIÁS:
RELATO DE UMA EXPERIÊNCIA
Romeu Kazumi Sassaki
Consultor de educação inclusiva
Autor do livro “Inclusão: Construindo uma Sociedade para Todos” (WVA, 1997)
e municipais e organizações sociais, para agilizar
o processo inclusivo. Um fato sintomático foi o
surgimento, nos últimos quatro anos, de uma
enorme quantidade de trabalhos de conclusão de
curso, seja na graduação seja na especialização e
no mestrado ou no doutorado, apresentados por
estudantes que escolheram a Educação Inclusiva
como tema central.
Antes da experiência inclusiva de Goiás
Em conseqüência da trajetória acima descrita,
teve início, em 1999, a experiência de educação
inclusiva no Estado de Goiás, sob a direção da
Superintendência de Ensino Especial da Secre-
taria de Estado da Educação. Na verdade, aque-
le início foi o ponto final de um longo processo
de organização da Educação Especial como um
sistema paralelo ao sistema regular de ensino, pro-
cesso esse que foi respaldado em leis e políticas
públicas, tanto federais quanto estaduais, bem
como em quase 50 anos de práticas integrativas
realizadas em Goiás por iniciativas governamen-
tais e particulares. Vejamos algumas dessas leis:
No nível estadual, a Lei nº 926/53 criou o
Instituto Pestalozzi de Goiânia, uma instituição
pública que, a partir de 1955, passou a dar atendi-
mento educacional a crianças e jovens com defi-
ciência. Nos 40 anos seguintes, outros disposi-
tivos legais (p.ex., Lei nº 8.780/80, Portaria
1.674/82, Lei nº 10.160/87, Resolução nº 121/91,
Resolução nº 727/93, Lei Complementar nº 26/98,
Constituição de Goiás/89) foram dando estru-
tura a um órgão que coordenasse as ações de
educação especial e que, a partir de 1987, passou
a chamar-se Superintendência de Ensino
Especial.
No nível federal, foram publicadas as três Leis
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional –
LDBEN (nº 4.024/61, nº 5.692/71 e nº 9.394/96),
bem como foi criado o Centro Nacional de
Educação Especial (Cenesp) através do De-
creto nº 72.425/73, com sede inicialmente no
Rio de Janeiro e muitos anos depois em Brasília,
onde foi transformado na atual Secretaria de
Educação Especial do Ministério da Educação
(MEC). Acrescente-se também a Constituição
Federal/88 e o Estatuto da Criança e do Adoles-
cente/90.
Quanto às práticas integrativas, anote-se aqui a
diferença entre integração e inclusão.
A integração escolar é o processo tradicional
de adequação do aluno às estruturas física, admi-
nistrativa, curricular, pedagógica e política da
escola. A integração trabalha com o pressuposto
de que o aluno precisa ser capaz de aprender no
nível pré-estabelecido pelo sistema de ensino.
No caso de alunos com deficiência (mental, audi-
tiva, visual, física ou múltipla), a escola comum
condicionava a sua aceitação a uma certa prontidão
que somente as escolas especiais (e, em alguns
casos, as classes especiais) poderiam conseguir.
E mesmo aceitos sob esta condição, estes alunos
ficavam sujeitos a ser devolvidos às classes ou
escolas especiais se mais tarde viessem a apresen-
tar dificuldades de aprendizagem e/ou de rela-
cionamento.
A inclusão escolar é o processo de adequação
da realidade das escolas à realidade do alunado
que, por sua vez, deve representar toda a diversi-
dade humana. Nenhum tipo de aluno poderá ser
rejeitado pelas escolas. As escolas passam a ser
chamadas inclusivas no momento em que decidem
aprender com os alunos o que deve ser eliminado,
modificado, substituído ou acrescentado nas seis
áreas de acessibilidade (arquitetônica, atitudinal,
comunicacional, metodológica, instrumental
e programática) a fim de que cada aluno possa
aprender pelo seu estilo de aprendizagem e com
o uso de todas as suas inteligências.
2. DESCRIÇÃO DA EXPERIÊNCIA
Histórico
A experiência inclusiva em Goiás foi oficial-
mente iniciada pelo Governo em 1999, quando
assumiu o cargo de Superintendente de Ensino
Especial, na Secretaria de Educação, o professor
Dalson Borges Gomes.
O prof. Dalson e eu, sem conhecermos um ao
outro e sem sabermos o que iria acontecer de 1999
em diante, tivemos a oportunidade de participar,
em 1998, de um dos mais importantes eventos
ocorridos até então no campo educacional volta-
do a alunos com deficiências. Com o nome de
Fórum Estadual de Educação de Goiás, o evento
aconteceu em Goiânia por iniciativa da hoje
extinta Fundação da Criança, do Adolescente e
da Integração do Deficiente (Funcad) em parceria
com a Universidade Católica de Goiás, a Secre-
taria de Educação de Goiânia e outros. No fórum,
foi exaustivamente discutido pelo público o
documento preliminar “Uma Nova Proposta
Educacional com Base nos Princípios da Inclusão”.
A sua experiência obtida naquele fórum de
educação, o seu estudo sobre o livro “Inclusão:
Construindo uma Sociedade para Todos” (1997),
a sua leitura da entrevista publicada na revista
Integração, do MEC (n° 20, ano 8, pp. 8-10, 1998)
e a sua participação na reunião realizada pela
Funcad em 26/4/99, onde expliquei o paradigma
da inclusão aplicado ao campo da educação,
levaram o prof. Dalson, já na condição de Supe-
rintendente de Ensino Especial, a propor-me o
EXPERIÊNCIAS
34
convite para que eu atuasse imediatamente como
consultor de educação inclusiva nos quatro anos
de sua gestão. E então começamos. A equipe
técnica deu o nome de Programa Estadual de
Educação para a Diversidade numa Perspectiva
Inclusiva ao imenso desafio de se proporcionar,
em Goiás, uma educação de qualidade sem
excluir ninguém.
Interfaces e parcerias
Devido à sua visão inclusivista, desde o início
o prof. Dalson entendeu que as escolas estaduais
não se tornariam inclusivas se a sua Superinten-
dência, sozinha, quisesse implantar o Programa
Estadual. Evidentemente, esse Programa preci-
saria ser entendido e aprovado, antes de qualquer
outra pessoa, por duas autoridades do Governo
de Goiás: o Governador Marconi Ferreira Perillo
Júnior e a Secretária da Educação e Cultura Raquel
Figueiredo Alessandri Teixeira. Eles não só enten-
deram e aprovaram o Programa, como também lhe
deram apoio concreto durante todo o mandato deles.
Ao mesmo tempo, teria que haver um trabalho
conjunto envolvendo as demais Superintendên-
cias centrais e as Subsecretarias Regionais de
Educação, além das outras Secretarias estaduais
(Saúde, Obras Públicas, Transportes, Assistência
Social etc.). Este trabalho foi o de interfaces.
Pelo mesmo motivo, a Superintendência de
Ensino Especial, juntamente com as Subsecre-
tarias Regionais, trabalhou com a comunidade,
envolvendo principalmente as organizações de
pessoas com deficiência, empresários, órgãos
municipais e outros, constituindo assim o trabalho
de parcerias. Por exemplo, em 2001, várias prefei-
turas municipais participaram do Encontro Estadual
de Secretários Municipais de Educação a fim de
conhecerem o programa estadual de educação
inclusiva e, em 2002, muitas delas assinaram o
Termo de Adesão a fim de, juntamente com o
Estado, transformarem suas escolas municipais
em inclusivas. Outros detalhes desta parceria
estão relatados no item “Consolidação”.
Dados da situação inicial
e planejamento das ações
Iniciamos o Programa Estadual recebendo a
seguinte situação real: dos 242 municípios
goianos da época (hoje são 246), apenas 77 ofe-
reciam algum tipo de atendimento educacional às
pessoas com deficiência. Havia em todo o estado
52 escolas especiais, sendo 40 no interior e 12 na
capital, que juntas atendiam 5.767 alunos. Havia
138 classes especiais, sendo 107 no interior e 31
na capital, que juntas atendiam 1.283 alunos.
Havia 159 salas de recursos pedagógicos, sendo
125 no interior e 34 na capital, que juntas atendiam
2.469 alunos. Portanto, estavam envolvidos no
conjunto desses atendimentos cerca de 9.000
educandos. Era um número extremamente pequeno
em relação à demanda estimada (100.000).
Como chegamos ao número 100.000? Tomando
os índices da Organização Mundial da Saúde,
segundo a qual 10% da população possuiriam algum
tipo de deficiência, o Estado de Goiás, com cerca
de 4 milhões de habitantes, teria aproximadamente
400 mil pessoas com deficiência. Na época, as
unidades escolares tinham pelo menos 1 milhão
de estudantes, dos quais, portanto, 100 mil deve-
riam ser alunos com deficiência.
Diante de tal realidade situacional, pro-
cedemos ao planejamento das ações entendendo
que a magnitude do desafio não comportaria
transformações abruptas, radicais e impositivas.
Portanto, para montar o Programa Estadual, leva-
mos em consideração as seguintes diretrizes:
Desenvolver escolas abertas à diversidade
humana e não para receber apenas as pes-
soas com deficiência nas salas de aula co-
muns.
Adotar o conceito mais amplo de “necessi-
dades educacionais especiais”, decorrente
do conceito de diversidade humana.
Capacitar os agentes multiplicadores (media-
dores) que, por sua vez, capacitariam as
demais pessoas.
Adotar o processo gradativo, começando
pelas escolas que espontaneamente desejassem
tornar-se inclusivas.
Implantar nas escolas os seis tipos de acessi-
bilidade (arquitetônica, atitudinal,
metodológica, instrumental, comunicacional
e programática).
Dotar os multiplicadores com instrumentos
e materiais de capacitação
Dotar os professores e pais com recursos
que facilitem sua atuação junto a alunos e
filhos.
Montar uma rede de apoio em todo o
estado para assessorar, acompanhar, ajudar,
ensinar e incentivar as escolas inclusivas.
Desenvolvimento do
Programa Estadual
O Programa Estadual de Educação para a
Diversidade numa Perspectiva Inclusiva (Peedi)
constou de 10 Projetos, a saber: Escola Inclusiva
(projeto-chave, transformando escolas comuns
em inclusivas), Prevenir (em parceria com a
Secretaria de Saúde na prevenção e detecção pre-
coce de deficiências), Hoje (atendimento educa-
cional em hospitais), Espaço Criativo (inclusão
pela arte em parceria com o Centro Livre de
EXPERIÊNCIAS
35
Artes, na capital e no interior), Depende de Nós
(participação da família na inclusão de seus
filhos), Comunicação (melhoria das habilidades
de comunicação de alunos surdos e cegos),
Despertar (desenvolvimento de alunos com indícios
de altas habilidades), Caminhar Juntos (interfaces
com as Superintendências de Educação Infantil e
Ensino Fundamental, e parcerias com as redes
municipais de ensino), Refazer (para alunos autis-
tas) e Unidades de Referência (ressignificação das
escolas especiais).
As ações do Peedi foram agendadas para
quatro anos, ficando cada ano para um tipo de
operacionalização, conforme segue:
1999 – Sensibilização. Esta operacionaliza-
ção constou de: [1] Elaboração do Programa
Estadual de Educação numa Perspectiva Inclusiva.
[2] Realização do curso de Educação Inclusiva
para 80 professores e diretores de escola, como
agentes multiplicadores. [3] Reestruturação das
escolas especiais em Unidades de Referência
(UR). [4] Realização de seminários regionais,
reuniões e ciclos de estudos sobre educação para
a diversidade, atingindo cerca de 20.000 pessoas.
[5] Opção por implantação gradativa. [6] Cri-
térios para a escolha das escolas que iniciariam
o processo inclusivo (por região, pela demanda,
por escolas que possuíam classes especais, por
escolas que tinham alunos com necessidades
especiais encaminhados para serem “integrados”).
2000 – Implantação. Consistiu de: [1]
Lançamento oficial do Peedi, em solenidade com
2.000 pessoas e presença do Governador,
Secretários Estaduais e representantes do MEC e
outros órgãos oficiais. [2] Implantação do Peedi
em 17 escolas da capital (atingindo 320 profes-
sores, dos quais 125 com alguma especialização,
e 6.800 alunos, dos quais 1.560 com deficiência)
e 38 do interior. [3] Implantação de 13 classes
hospitalares, sendo 10 na capital e 3 no interior
(atendendo ao todo 3.500 alunos e acompanhan-
tes analfabetos). [4] Reestruturação de 35 escolas
especiais em URs (sendo 1 em cada Subsecretaria
Regional de Educação e 2 na capital), ficando
com a Secretaria Estadual de Educação toda a
escolarização e com as URs os atendimentos em
parceria com as Secretarias de Saúde e de
Assistência Social. [5] Estruturação de Setores de
Apoio à Inclusão (sete na capital e 34 no interior),
cada um composto de pedagogo, psicólogo,
fonoaudiólogo, assistente social, intérprete da
língua de sinais e instrutor da língua de sinais. [6]
Capacitação continuada (sete cursos, atingindo
2.100 profissionais). [7] Laboratórios itinerantes
– Superintendente de Ensino Especial e sua
equipe técnica (e às vezes, o consultor de edu-
cação inclusiva) visitando todas as Sub-secre-
tarias Regionais de Educação, envolvendo
municípios circunscritos e suas comunidades
escolares e demais segmentos sociais, para uma
troca de experiências, informações e formação
para o fortalecimento da ação pela inclusão
(houve 36 laboratórios, atingindo 25.000 pessoas).
2001 – Expansão. Foram realizados: [1] Total
de 315 escolas inclusivas, sendo 30 na capital e
285 no interior, atingindo todos os municípios
goianos (630 professores e 12.600 alunos). [2]
Unidades de Referência. [3] Setores de Apoio à
Inclusão. [4] Capacitação profissional (17 cursos
atingindo 5.100 profissionais). [5] Laboratórios
itinerantes (nas 37 Subsecretarias Regionais,
atingindo 28.000 pessoas).
2002 – Consolidação. Realizaram-se: [1] Par-
cerias com municípios na implantação de esco-
las municipais inclusivas, com 150 prefeituras
(60,9%) participando do Encontro Estadual de
Secretários Municipais de Educação, dos quais
136 assinaram o Termo de Adesão (beneficiando
256 professores e 5.120 alunos municipais) e
45 pediram maior prazo para estudar a pro-
posta de parceria com o Estado. [2] Laboratórios
itinerantes, em 11 regiões envolvendo 1.200
pessoas. [3] Cursos de capacitação continuada,
sendo 29 de Libras (atingindo 1.160 professores
em todo o estado), 5 de braile e sorobã (atingin-
do 200 professores) e 38 de mediação de práticas
pedagógicas em educação para a diversidade
(em 37 Subsecretarias Regionais de Educação,
atingindo 1.900 professores ou cerca de 50 por
curso). [4] Seminários municipais para a implan-
tação do Peedi, realizados por 128 prefeituras,
envolvendo cerca de 200 pessoas por município.
[5] 2º Encontro Nacional sobre atendimento
educacional hospitalar (atingindo 1.200 partici-
pantes) e Encontros Estaduais e Regionais (com
público variando de 200 a 600 participantes). [6]
Quatro encontros regionais com a família,
atingindo 2.800 pessoas. [7] Encontros Pedagó-
gicos para fortalecimento da ação pedagógica
das escolas inclusivas, nas 37 Subsecretarias
Regionais atingindo 8.600 pessoas (abordando
os temas: educação inclusiva, dificuldades de
aprendizagem, dificuldades de comunicação
visual, dificudades de comunicação auditiva e
síndromes).
Processo de avaliação do Programa
A avaliação da eficácia e da eficiência do
Programa Estadual consistiu de um processo
contínuo, não-pontual, baseado no dia-a-dia
das escolas inclusivas e aberto a todos os que
desejassem manifestar-se positiva ou negativa-
mente a respeito de como ia transcorrendo a
EXPERIÊNCIAS
36
implantação dos 10 Projetos do Programa Esta-
dual. Todas as ações realizadas serviram de base
para produzir feedback por parte dos usuários,
colaboradores, professores, diretores, pais, con-
sultor, profissionais de apoio, sem descartar a
equipe técnica central cuja atitude autocrítica
a ajudou a abrir-se, por quatro anos, para recla-
mações, sugestões, elogios e outras expressões
espontâneas de todas as comunidades atingidas
pelo Programa Estadual.
3. CONCLUSÃO
Reflexões sobre os aspectos
positivos e as limitações
Os expressivos números acima referidos refletem
os aspectos quantitativos alcançados, muito signi-
ficativos diante do tamanho do Estado de Goiás e
da sua população escolar. É oportuno mencionar-
mos aqui a qualidade dos eventos em prol da
implementação da educação inclusiva (empenho
dos organizadores e colaboradores na montagem
dos eventos) e a qualidade da produção dos
professores, alunos, coordenadores, supervisores,
diretores e outras pessoas no dia-a-dia das es-
colas inclusivas.
O processo inclusivo foi sempre acompanhado
de recursos complementares tais como: vídeos
produzidos pelo Programa Estadual (ao todo 12,
focalizando os principais temas da educação
inclusiva) que os participantes multiplicadores
receberam após sua capacitação a fim de po-
derem utilizá-los no repasse dos cursos, apostilas
fornecidas pelos palestrantes e instrutores e pelo
consultor, um pacote de livros sobre educação
inclusiva entregue a todas as Subsecretarias
Regionais de Educação, cartazes de sensibilização
e conscientização da comunidade, entre outros.
As limitações ficaram por conta de vários
fatores, tais como: a grande extensão territorial
de Goiás, o longo tempo de deslocamento dos
profissionais dos Setores de Apoio à Inclusão
pelos municípios e da equipe técnica central para
o interior, a escassez de tempo para se fazer tudo
o que estava previsto, a escassez de recursos
financeiros (apesar dos R$ 10.624.552,00 dis-
ponibilizados e utilizados em 4 anos, seria
necessário um pouco mais), a escassez e/ou falta
de certos recursos humanos em algumas regiões
do estado.
Apesar desses entraves, o Programa Estadual
de Educação para a Diversidade numa Perspectiva
Inclusiva cumpriu as metas planejadas, conse-
guindo realizar a sensibilização, a implantação, a
expansão e a consolidação sem traumas e propi-
ciando motivos de orgulho e satisfação para mi-
lhares de pessoas.
Paralelamente à implantação do Programa
Estadual, ocorreram dois fatos de abrangência
nacional. O primeiro foi a aprovação do Decreto
federal nº 3.298, de 20-12-99. Ele mantém a
visão integracionista ao determinar “a matrícula
compulsória em cursos regulares de estabelecimentos públicos
e particulares de pessoa portadora de deficiência capaz de
se integrar na rede regular de ensino” (grifo meu). Por que
apenas as pessoas com deficiências capazes de
se integrar? Como e quem decide se uma pessoa
é capaz de se integrar? E os que forem considera-
dos não-capazes de se integrar na escola comum?
E o segundo fato se deu com a aprovação da
Resolução CNE/CEB nº 2, de 11-9-01, que se
configura como um avanço na direção da inclu-
são ao estabelecer no art. 2º que “Os sistemas de
ensino devem matricular todos os alunos, cabendo às escolas
organizar-se para o atendimento aos educandos com neces-
sidades educacionais especiais, assegurando as condições
necessárias para uma educação de qualidade para todos”
(grifo meu). Quando examinamos o texto desta
Resolução, pudemos constatar que os seus prin-
cipais pontos já estavam contemplados no
Programa Estadual de Educação para a Diver-
sidade numa Perspectiva Inclusiva desde 1999.
Avanços obtidos e fatores determinantes
para o sucesso da experiência
Em termos gerais, houve muitos avanços em
relação ao ponto em que se encontrava a questão
da educação de pessoas com necessidades espe-
ciais antes de 1999 em Goiás. Avanços que estão
refletidos nas seguintes conquistas mais impor-
tantes: 1) efetiva mudança de mentalidade (da
integração para a inclusão) onde quer que a edu-
cação inclusiva tenha chegado, desde escolas,
famílias, alunos com e alunos sem necessidades
especiais e profissionais em geral, até autoridades,
estudantes universitários e outras pessoas; 2)
efetiva mudança arquitetônica nas escolas e nos
espaços urbanos; 3) efetiva mudança nas me-
todologias, nos instrumentais, nas formas de
comunicação (convencional, braile, Libras,
computador etc.) e nas políticas e leis; 4) efetiva
mudança no enfoque dado pela mídia goiana aos
assuntos pertinentes a necessidades especiais e
à inclusão escolar.
Contribuíram para o sucesso do Programa
alguns fatores subjetivos: a sólida crença no
paradigma da inclusão, a compreensão de que
era chegada a hora da reestruturação do sistema
de ensino, a confiança na capacidade de todos
os alunos independentemente de suas condições
pessoais, a autoconfiança dos professores e
demais profissionais de educação para enfren-
EXPERIÊNCIAS
37
tarem o desafio da inclusão escolar, a vontade
de fazer e de fazer acontecer, o desejo de cons-
truir um mundo melhor através das escolas inclu-
sivas, entre outros.
Futuros desdobramentos e desafios
Já na montagem do Programa em 1999, decidi-
mos que entregaríamos ao Governo sucessor,
cujos integrantes poderiam ser outras pessoas que
não nós, uma realidade consolidada, na qual
haveria a necessidade adicional de desenvolver as
escolas ainda não-inclusivas. Com a reeleição do
Governador e a manutenção do prof. Dalson
como Superintendente de Ensino Especial, esse
trabalho adicional já começou a acontecer. Nos
próximos quatro anos, trabalharemos para que
haja sucesso na realização das seguintes dimen-
sões da educação inclusiva – a implantação dos
seis tipos de acessibilidade em TODAS AS
ESCOLAS e o aperfeiçoamento das práticas
inclusivas de TODAS AS PESSOAS envolvidas
no processo de ensino e aprendizagem a fim
de que TODOS OS ALUNOS exerçam plena
e alegremente o seu direito de aprender.
EXPERIÊNCIAS
38
39
Em busca de
Indicadores
para a
Primeira
Infância
1
ROBERT G. MYERS
2
SECRETARIADO DO GRUPO CONSULTIVO
SOBRE
CUIDADO E DESENVOLVIMENTO INFANTIL
3
A
criação e o uso de indicadores para avaliar a
mudança social são atividades que continuam
na moda
4
. A maioria dos relatórios de organiza-
ções internacionais inclui, normalmente no
final, um conjunto de tabelas, mostrando números
bem organizados, com o objetivo de representar a
situação dos países sob vários ângulos: demográfico,
econômico, social e, às vezes, político. Esses números,
geralmente, são retomados no corpo do texto para
comparar os países, comentar as tendências, descrever
os avanços, as discrepâncias e as lacunas, além de
propor diretrizes para os programas e ações. Depar-
tamentos nacionais de planejamento, chefes de Estado
e de Governo, ministros da saúde, unidades de avalia-
ção, etc., exigem e utilizam, muitas vezes, diversos
indicadores sociais tanto para justificar ou impor pro-
gramas, quanto para monitorá-los. A maior parte dos
modelos de avaliação dos projetos prevê, explicita-
mente, a criação de indicadores que servirão de
parâmetro para medir seus resultados.
Os aspectos particulares do bem-estar econômicos
ou sociais, tratados em qualquer relatório, dependem
do mandato e dos interesses da organização respon-
sável pela elaboração do documento. O que mais
interessa ao Grupo Consultivo é o bem-estar das crian-
ças nos primeiros anos de vida; de fato, tal situação é
bastante reveladora do bem-estar geral de uma nação
ou de determinada população. Neste artigo, serão
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
1
Originalmente publicado em inglês, sob o título “Early
Childhood Indicators: In Search of Early Childhood Indicators” na
revista Coordinators’ Notebook, Nº 25, 2001. A sede da UNESCO
em Paris reproduziu o artigo na publicação Le Carnet du
Coordinateur, nº 4, 2002, sob o título “A la recherche d’indicateurs
relatifs à la petite enfance”.[Nota do Revisor]
2
Dr. Robert Myers é Ph.D em Educação Comparada pela
Universidade de Chicago, tem título de mestre em Pedagogia
pela Universidade de Stanford e graduou-se em Economia pela
Faculdade Oberlin. Dentre suas funções anteriores, destacam-se:
Coordenador do Grupo Consultivo sobre Cuidado e
Desenvolvimento Infantil; Diretor de Divisão da Fundação de
Pesquisa Educacional Superior; Professor Assistente da
Universidade de Chicago. Foi responsável pelos Projetos de
Avaliação em Educação Compulsória e/ou Pré-Escolar em vários
países. É Membro da Sociedade de Educação Comparada;
Membro do Conselho Mexicano de Pesquisa Educacional
(COMIE); Membro do Grupo Mexicano de Apoio à Criança
(COMEXANI). É autor de várias publicações na área de edu-
cação, economia da educação, sociologia do conhecimento,
educação para América Latina e, nos últimos anos, vem traba-
lhando especificamente na área de desenvolvimento infantil,
com ênfase em planejamento e programação. [Nota do Revisor]
3
O presente artigo inspira-se em numerosos estudos e, princi-
palmente, em diversos projetos realizados pelo Consultative Group
on Early Childhood Care and Development (Grupo Consultivo sobre
Cuidado e Desenvolvimento Infantil). Esses projetos foram
Pueblito/Diane Alexopoulos
O bem-estar das crianças nos seus primeiros anos de
vida é revelador do bem-estar geral de uma nação ou
população
40
enfatizados a criação e o uso de indicadores para a
primeira infância
5
no que se refere à: 1) situação geral
das crianças durante seus primeiros anos de vida (do
nascimento até os seis anos); 2) abrangência e qualidade
dos programas destinados a melhorar essa situação;
e, de forma mais geral, 3) qualidade dos contextos que
influenciam o desenvolvimento da criança.
Uma das principais motivações que nos leva a
abordar, na publicação “Coordinators’ Notebook”, a
questão dos indicadores para a primeira infância, é a
nossa insatisfação com os que foram definidos e
utilizados na Avaliação de Educação para Todos (EPT),
do ano 2000. Muitos leitores sabem que, em março de
1990, a Conferência Mundial de Educação para Todos,
realizada em Jomtien, Tailândia, aprovou uma
Declaração que especificava, entre outros itens, que:
“A aprendizagem começa a partir do nascimento. Tal cons-
tatação implica a necessidade de investir no cuidado e edu-
cação da criança pequena; essa atenção pode ser prestada
através de diversas ações, que incluem a família, a comunidade
ou as instituições, conforme cada caso” (Artigo 5). Entre as
metas a serem consideradas nos planos nacionais de
ação para a década de 90, o Marco de Ação também
estabeleceu a “expansão das atividades de educação e cuida-
do da primeira infância, inclusive no âmbito das famílias ou da
comunidade, especialmente em favor das crianças pobres,
desfavorecidas e com necessidades especiais” (parág. 8, nº 1)
6
.
A Conferência Mundial de 1990 não fixou nenhum
indicador específico para orientar a comunidade
internacional e ajudá-la a acompanhar os avanços
em direção ao alcance dessa meta; tampouco, foram
fixados indicadores específicos para a educação e
cuidado da primeira infância (ECPI) nas deliberações
e resultados da Cúpula Mundial pela Infância, em setem-
financiados pelo UNICEF, pela Fundação Bernard van Leer e
pelo International Development Research Centre (Centro de Pesquisa
em Desenvolvimento Internacional).
4
Além de existirem há muito tempo, os indicadores sociais são
cada vez mais numerosos e têm sido aplicados com uma freqüên-
cia cada vez maior, nos últimos vinte anos.
5
A faixa etária compreendida pela primeira infância varia de um
estudo para outro. Para o Grupo Consultivo, a primeira infância
é definida como o período que vai do nascimento até a idade de
8 anos. Segundo o GC, são duas as razões para se considerar
esta faixa etária (0 a 8 anos). A primeira é de que esse período é
consistente com a visão da psicologia do desenvolvimento infantil.
As crianças abaixo de oito anos de idade aprendem melhor quando
dispõem de objetos que possam manipular, quando têm
possibilidade de explorar o mundo à sua volta, oportunidades
para experimentar e aprender a partir da tentativa e do erro, em
um ambiente seguro e estimulante. Aos nove anos de idade elas
começam a ver o mundo de maneira diferente. Podem manipular
idéias e aprender conceitos mentalmente, e são menos dependentes
dos objetos. A segunda razão é de que a primeira infância inclui
um período importante para estas crianças, de transição de suas
casas ou pré-escolas para a escola obrigatória. Neste artigo, a exemplo
de vários estudos conduzidos internacionalmente, o autor se
refere à primeira infância como o período de vida que vai do
nascimento até o ingresso no ensino obrigatório. [Nota do Revisor]
bro de 1990, cujo principal objetivo consistia em
chegar a um acordo entre os líderes mundiais sobre o
desenvolvimento de atividades que permitissem colo-
car em prática as orientações emanadas da Convenção
sobre os Direitos da Criança. Entretanto, no final da déca-
da e por ocasião do debate ocorrido na reunião de
avaliação, organizada dez anos depois de Jomtien, ou
seja, no Fórum Mundial de Educação – realizado em
Dacar, em abril de 2000 – foi solicitado aos países que
fizessem uma avaliação de seus avanços em relação
a esse objetivo, assim como em relação a outras metas
aprovadas em Jomtien.
Como será claramente demonstrado na análise que
se segue, esta iniciativa, embora tenha representado
um avanço, na medida em que, daí em diante, a ques-
tão da primeira infância foi firmemente inserida na
agenda política, era limitada e continha imperfeições.
A leitura dos relatórios nacionais, elaborados no
âmbito da avaliação, nos levou a interrogar tanto sobre
os indicadores utilizados quanto sobre a maneira como
teriam sido aplicados em escala internacional. Este
exercício revelou o valor potencial dos indicadores
para a primeira infância e também a necessidade de
dedicar uma atenção mais aprofundada à elaboração
e à incorporação de tais indicadores em sistemas de
relatórios padronizados. Fomos assim levados a nos
indagar sobre como aperfeiçoar a criação e a uti-
lização de indicadores para garantir seu monitora-
mento, tanto no plano internacional, quanto (e so-
bretudo) no nacional.
Na nossa reflexão sobre a elaboração e a utilização
de indicadores para a primeira infância, nossos obje-
tivos concretos serão, neste artigo, os seguintes:
– contribuir para determinar quais indicadores
são (ou poderiam ser) utilizados e de que
maneira são (ou deveriam ser) aplicados a fim
de aperfeiçoar o processo de seleção e de
utilização pelos planejadores e profissionais
da primeira infância, especialmente, no plano
nacional;
– alertar os leitores em relação a algumas ar-
madilhas, assim como em relação ao valor po-
tencial dos indicadores comumente utilizados
para acompanhar a evolução do cuidado da
criança pequena e do desenvolvimento infantil;
– descrever, de forma sucinta, o processo de se-
leção, operacionalização e uso de indicadores
para monitorar a evolução dos programas, assim
como o estágio de desenvolvimento das crianças
no plano nacional ou regional/estadual;
– sugerir eventuais indicadores como ponto de
partida para o debate.
Este artigo está, portanto, dividido em quatro seções.
Responde-se inicialmente a algumas questões gerais a
6
Ver também o Anexo 1: Em que consiste um programa para a
primeira infância?
41
respeito dos indicadores, em particular, para a primeira
infância. Em seguida, apresenta-se um breve panorama
das tentativas anteriores e atuais de definição e de
aplicação dos indicadores para a primeira infância,
inclusive uma análise da utilização dos indicadores,
por ocasião da Avaliação de Educação para Todos (EPT)
do ano 2000. A terceira seção propõe um processo de
seleção e operacionalização de indicadores significa-
tivos em contextos nacionais específicos. A última
seção apresenta um conjunto de dezesseis possíveis
indicadores que poderiam ser tomados como ponto de
partida para um debate.
Nesta introdução, resta-nos esclarecer um último
ponto: apesar de partirmos de relatórios e de indi-
cadores internacionais (particularmente da Avaliação
de EPT), o que nos interessa, de fato, é a criação e o
uso dos indicadores nacionais. Com efeito, defendemos
que se os indicadores internacionais em geral podem
ser úteis, podem também ser mal utilizados e induzirem
a erros. Pensamos igualmente que, em certo sentido,
aqueles indicadores que atualmente gozam da pre-
ferência generalizada obstruem ou desviam os esforços
empreendidos para chegarmos aos indicadores mais
úteis e de maior interesse para as políticas e planeja-
mento nacionais
1. Questões sobre os
indicadores
1.1. O que é um indicador?
A definição que orienta o processo do estabelecimento
e uso dos indicadores pode variar muito. Vamos con-
siderar as seguintes definições:
– Segundo os dicionários, [Dicionário Webster,
um indicador é “Uma pessoa ou coisa que indica”.]
“indicar” tem várias acepções: [“apontar, dirigir
a atenção para, receber um sinal ou aviso, signi-
ficar, mostrar necessidade de.”] [Dicionário
Aurélio, um indicador é “que indica”]. “indicar”,
segundo o mesmo dicionário significa
[“demonstrar, relevar, denotar; determinar, es-
tabelecer; mostrar a conveniência de; designar”]”
– “Os indicadores são descrições qualitativas de
condições sociais, destinadas a informar a
opinião pública e os responsáveis pela elaboração
das políticas nacionais. Eles descrevem estados,
definem problemas e identificam evoluções da
sociedade que, por meio da engenharia social,
presume-se, podem ser orientadas para a con-
cretização de objetivos definidos pela sociedade
através do planejamento” (Duncan, 1974, citado
in Fondation M. S. Swaminathan, 2000, 1).
– “Em uma linguagem simples, um indicador seria
um elemento que revela que alguma coisa
aconteceu ou que um objetivo foi alcançado”
(Fondation M. S. Swaminathan, 2000, 6)
– “Um indicador reflete importantes característi-
cas de um sistema ou atividade que podem ser
úteis para identificar ou avaliar um “avanço” ou
“sucesso”. Assim, diferentemente dos dados
estatísticos que se destinam a descrever, um
indicador serve para avaliar. As estatísticas tor-
nam-se indicadores quando estão relacionadas
com objetivos ou com uma definição explícita
do progresso a obter ou do sucesso a alcançar.
Por definição, os indicadores são instrumentos
de avaliação; assim, para que eles venham a
adquirir sentido, convém chegar a um entendi-
mento sobre o que é bom e justo, bem como à
explicitação destas normas e julgamentos de
valor.” (Grupo Consultivo, 1999, 5)
– “Um indicador é um comportamento ou um
resultado específico que pode ser utilizado
como uma referência a fim de decidir em que
medida os objetivos foram alcançados.” (Evans
et al. 2000, p. 278)
A diversidade dessas definições mostra claramente
que, no centro do debate sobre os indicadores, con-
vém estabelecer o objetivo ou objetivos específicos
aos quais eles supostamente estão a serviço, além de
explicitar a definição das normas, valores ou obje-
tivos a serem adotados quando são criados e interpre-
tados. Daí, a seguinte questão: por que desejamos
fazer sobressair uma coisa, mostrar uma necessidade
ou dar um sentido?
1.2. Para que servem os
indicadores?
“O monitoramento continua sendo importante
para informar as políticas e para distribuir, com
eficácia, os recursos disponíveis. Do mesmo modo,
as comparações entre nações são sempre úteis para
mostrar o que pode ser alcançado através de
diferentes políticas e prioridades, assim como para
estimular o orgulho nacional e para incentivar a
ação.” (Adamson, 1996)
Dessa observação geral, podem ser identificados
pelo menos três objetivos que influenciam o(s) tipo(s)
de indicador(es) a ser(em) escolhido(s).
Sensibilização da opinião pública
(advocacy)
Um dos objetivos dos indicadores consiste em
obter o apoio social e político com vistas a “estimular
o orgulho nacional e incentivar a ação” (Adamson,
1996). Utilizar os indicadores, para descrever as dis-
paridades ou os atrasos em relação a outros países ou
a alguma norma absoluta, ajuda a justificar uma causa
e, espera-se, incitar o orgulho nacional, levando à ação.
Análise das políticas
Existem indicadores que são utilizados para uma
ação nos planos internacional, nacional ou regional/
estadual. Em todos os níveis, a definição de indicadores
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
ajuda a identificar os graus de sucesso ou as insufi-
ciências em relação a determinada característica de
um programa (p. ex. distribuição geográfica ou
administrativa, distribuição por gênero, condições
econômicas, grupos étnicos, etc.) que influem na
política em questão. Apesar de permitir uma análise
capaz de “disponibilizar informações para as políti-
cas”, assim como, talvez, também, de orientar a des-
tinação eficaz dos recursos disponíveis, esse uso de
indicadores não possibilita a busca de explicações.
Os indicadores para a primeira infância, utilizados
na análise das políticas, podem se referir ao desen-
volvimento das crianças ou servir para a descrição de
seu meio ambiente.
Ao procurarmos determinar os indicadores que
serão utilizados para acompanhar o desenvolvimento
das crianças pequenas, em geral não nos colocamos
na perspectiva de um pesquisador que tenta explicar
a razão pela qual as normas previamente definidas
em comum acordo foram ou não cumpridas. Dito
isso, não há motivo para que os indicadores escolhi-
dos para medir o “sucesso” de vários grupos ou subdi-
visões de uma população não possam ser aplicados
em uma avaliação ou pesquisa para tentar explicar a
razão pela qual o nível de desempenho varia entre os
grupos; esse duplo uso teria implicações óbvias na
política em questão.
Avaliação administrativa e monitoramento
Nesse caso, os indicadores servem para ajudar os
administradores a verificar se um sistema, programa
ou instituição estão funcionando como deveriam,
se são utilizados conforme o planejado e se alcançam
os objetivos estabelecidos. Esses indicadores, apre-
sentados muitas vezes como elementos de um “sis-
tema de administração informatizada”, são mais
especificamente concebidos para assegurar uma
alocação eficiente dos recursos destinados aos
programas ou projetos; eles oferecem um dispo-
sitivo de alerta, segundo critérios específicos do
sistema. Em geral, tais indicadores se centram não
nos resultados e impactos, mas, sobretudo, nos
recursos e processos. Mais uma vez, os indicadores
deste tipo normalmente não fornecem resposta à
questão de saber porque um sistema funciona bem
ou precariamente; limitam-se a assinalar o que está
acontecendo.
Embora possa haver superposições entre os indica-
dores utilizados para estas três finalidades, é evidente
também que diferentes objetivos e contextos exigem
diferentes indicadores. Por exemplo, apesar de, no
plano internacional e para os objetivos da política em
questão, ser útil proceder à comparação das taxas de
matrícula, o mesmo pode não ser suficiente para
a análise de uma política em um cenário nacional
específico. Se a taxa de matrícula nacional corres-
ponde a 100%, ou perto disso, o problema da política
nacional pode ser mais qualitativo do que quantitati-
vo, exigindo outros indicadores. Ou ainda, enquanto
um agente que atua na defesa dos direitos desejará,
provavelmente, saber se determinado recurso destina-
do aos programas em favor da primeira infância foi
efetivo, um administrador terá maior interesse em indi-
cadores que mostrem se os recursos foram aplicados
nos fins previstos, independentemente do valor
total dos recursos alocados.
O presente artigo dá maior destaque aos indicadores
relacionados às atividades de sensibilização da opinião
pública (advocacy) e às políticas, do que aos que se
referem ao monitoramento administrativo.
1.3. A qual quadro de referência
se reportam os indicadores?
Os programas destinados à criança pequena devem
ser considerados segundo quadros de referência sociais
e teóricos variados, cujos objetivos são diferentes e
consideram diferentes prioridades na busca dos indi-
cadores mais apropriados. Por exemplo, uma abordagem
dos programas para a primeira infância, em um quadro
de referência relacionado aos direitos das crianças e
à Convenção sobre os Direitos da Criança, fará apelo, com
toda certeza, a um conjunto de indicadores dife-
rentes daqueles resultantes de uma abordagem cujo
quadro de referência seja, por exemplo, a redução da
pobreza ou uma melhor preparação das crianças para
a escola. Um defensor dos direitos da criança pode
estar mais preocupado com a efetivação do direito da
criança a ter um nome, enquanto um quadro de referên-
cia que enfatiza a preparação para escola poderá
buscar um indicador de desenvolvimento cognitivo
no momento do ingresso na escola. Em compensação,
uma abordagem mais ampla sobre o desenvolvimento
do ser humano pode incluir indicadores relacionados
aos valores que a criança está desenvolvendo. Do ponto
de vista teórico, um quadro de referência ecológico
destinado à análise do desenvolvimento infantil,
que leve em conta os diferentes ambientes em que a
criança se desenvolve – considerados essenciais ao seu
42
Indicadores de “efeitos” sobre o estágio atual
do desenvolvimento das crianças, são omitidos
do monitoramento e avaliação dos programas
de ECPI
Gorno-Badakhshan, Tajikistan: Aga Khan
Foundation/0124-055/Pierre Claquin
43
crescimento – exigirá, evidentemente, indicadores
diferentes dos que são utilizados em um quadro
de referência focado exclusivamente na evolução
psicológica e social da criança. Em resumo, não existe
“um único” quadro de referência.
1.4. O que nos relevam os
indicadores para a primeira
infância?
Uma forma de classificar o que os indicadores devem
nos informar foi proposta por Windham (1992) em um
documento produzido para o UNICEF
7
. Segundo ele,
em geral, gostaríamos que os indicadores nos reve-
lassem algo sobre as mudanças ocorridas em relação
aos seguintes aspectos:
– o contexto (p. ex., produto interno bruto (PIB),
distribuição de renda, população, disponibilidade
de serviços de saúde, meios de comunicação, ex-
pectativa de vida, nível geral de instrução da
população);
– a capacidade financeira e o compromisso em
apoiar programas (gastos sociais, percentual
dos orçamentos destinados aos vários setores
e programas);
– o esforço envidado (taxas de matrícula em pro-
gramas e evolução destas taxas; indicadores de
qualidade, tais como proporção de crianças
por adulto – na sala de aula, níveis de escolari-
dade e titulação);
– a eficiência (custo por participante ou por
aluno formado, percentual de formados em
relação ao total dos matriculados inicialmente,
etc.);
– os efeitos (indicadores de desenvolvimento,
conclusão do curso, valores e atitudes);
– o bem-estar social (taxas de mortalidade, de
analfabetismo e de delinqüência).
Grande parte dos relatórios nacionais e interna-
cionais incluem indicadores de contexto. As mudanças
ocorridas nas variáveis contextuais deveriam implicar
modificações no desenvolvimento da criança pequena,
resultantes das interações entre esta e seu ambiente.
A maior parte dos indicadores contextuais utilizados
possuem um alcance bastante geral; raramente
consideram a qualidade dos diferentes ambientes
de aprendizagem, ou as diferenças entre contextos
de um mesmo país.
Menos freqüentemente utilizados são os indicadores
da capacidade financeira e do compromisso político
em apoiar os programas sociais. Quando estão mais
relacionados a orçamentos do que a despesas, eles
ressaltam principalmente a intenção política no
momento da definição do orçamento. Com freqüência,
os dados relativos aos programas destinados às
crianças pequenas encontram-se muito dispersos
(entre saúde, apoio à família, educação, etc.) ou embu-
tidos em categorias mais amplas (p. ex., as turmas de
pré-escola são freqüentemente incluídas no ensino
compulsório), tornando difícil determinar qual é o
apoio oferecido e quem são os beneficiários.
A maior parte dos indicadores referem-se essen-
cialmente ao que Windham designa por esforço despen-
dido, representado por indicadores de cobertura e de
qualidade dos programas. Nos relatórios nacionais ou
internacionais, é raro encontrar indicadores que se
refiram aos efeitos de programas destinados à primeira
infância.
Os indicadores de eficiência econômica, tais como
“o custo por criança”, raramente figuram entre os indi-
cadores relativos à primeira infância e, quando exis-
tem, são freqüentemente precários. Os indicadores do
bem-estar social são freqüentes; todavia suas conexões
com os programas que, supostamente, deveriam bene-
ficiar são frágeis. Pode-se pensar que um indicador, tal
como a taxa de mortalidade, é revelador tanto dos
efeitos dos programas, quanto do bem-estar social. Se
um indicador da evolução da situação da criança
tivesse de ser incorporado em um plano geral de
monitoramento, ele poderia ser enquadrado em ambas
as categorias.
Outra maneira de classificar o que os indicadores
podem nos informar consistiria em analisar: 1) o
estado geral do meio ambiente, que afeta tanto a
situação das crianças quanto a efetividade potencial
dos programas (conhecimento e práticas das famílias
e da comunidade, saneamento, disponibilidade de
alimentos, acesso a serviços, etc.); 2) a natureza dos
programas destinados a melhorar a situação das
crianças (taxa de cobertura e qualidade); e 3) as
condições de vida das crianças (saúde, situação nutri-
cional e desenvolvimento psicossocial, educação,
oportunidades de emprego ao longo da vida).
Estado geral do meio ambiente em que a
criança se desenvolve
Essa categoria de indicadores compreende os tipos
mencionados por Windham. Entretanto, pode também
incluir indicadores relativos às famílias; por exemplo,
seu conhecimento sobre a educação e cuidado da
criança e sobre o desenvolvimento infantil. Podem
também ser criados indicadores que se refiram a
fatores específicos do meio ambiente, tais como
saneamento, acesso a alimentos ou acesso a serviços.
Natureza dos programas e dos projetos
Para estabelecer os indicadores relativos ao acesso
aos programas e ao seu funcionamento, podemos
nos interessar: a) pelos aportes de recursos (são
fornecidos os aportes que nos parecem essenciais
para o funcionamento do programa?); b) pelas abor-
dagens utilizadas (estaremos fornecendo às crianças,
de maneira eficaz, os elementos considerados essen-
7
Este conjunto de categorias foi adaptado de Windham, 1992,
pág. 30.
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
ciais para seu desenvolvimento?); e c) pelos resulta-
dos esperados (o sistema expandiu conforme pre-
visto e estamos obtendo o efeito esperado em
relação, por exemplo, às atitudes, competências e
comportamentos daqueles que o administram, ou em
relação à situação do público-alvo do programa?).
Freqüentemente, os “resultados” são mensurados
apenas pela ampliação da cobertura de determi-
nado programa. Isso nada nos diz a respeito da
qualidade do programa ou, o que é mais grave, a
respeito da melhoria das condições de vida das
crianças.
Condições de vida das crianças
Os indicadores utilizados atualmente para descrever
a situação das crianças tendem a enfatizar a taxa de
mortalidade e/ou o estado físico das crianças. Os
mais difundidos são a taxa de mortalidade infantil
(para crianças menores de 1 ano) e a taxa de mortali-
dade para crianças menores de 5 anos (para crianças
de 1 a 5 anos). Outros indicadores amplamente
aceitos são o baixo peso ao nascer e vários indicadores
nutricionais (combinação de altura, peso e idade;
circunferência do braço; e diversas medidas de defi-
ciências de vitaminas e sais minerais). Estes indicadores
são aplicados principalmente em crianças com idade
inferior a 3 anos. São bons para descrever os proble-
mas físicos e de sobrevivência das crianças pequenas,
para selecionar os grupos que precisam de atendi-
mento e para avaliar os resultados de programas.
Quando passamos a considerar, além dos problemas
de sobrevivência e crescimento físico, o desenvolvi-
mento da criança em todos os seus aspectos, já não
encontramos indicadores tão amplamente aceitos e
utilizados. Raramente há concordância em relação
aos indicadores de desenvolvimento mental, social e
afetivo das crianças; praticamente já não são utilizados
para descrever uma população e, muitas vezes, não
são levados em consideração pelos gestores dos pro-
gramas no momento da tomada de decisão na área da
educação (ou outro). E isso ocorre não por falta de
testes ou medidas relativas às diferentes dimensões do
desenvolvimento no decorrer da primeira infância.
Entretanto, a avaliação desses instrumentos ainda não
é suficiente para saber quais são os mais confiáveis,
válidos e padronizados, e mais adaptados às circuns-
tâncias locais. Voltaremos a esse tema mais adiante.
1.5. Os indicadores devem ser
definidos no plano internacional,
nacional ou regional/estadual?
Essa questão está relacionada à discussão acima que
se refere aos objetivos. O principal objetivo de um
indicador é o de permitir fazer uma comparação inter-
nacional, ou de utilizá-lo para avaliar uma política
nacional? No primeiro caso, o problema é que os
indicadores internacionalmente comparáveis são
extremamente rudimentares. Como são de natureza
essencialmente cumulativa, em vez de revelarem, cor-
rem o risco de dissimularem o que pretendem estudar.
Uma vez que se aplicam a diferentes contextos e a
diferentes sistemas, são obrigatoriamente bastante
genéricos.
Segundo parece, existem indicadores genéricos que
têm um significado e podem ser comparados no plano
internacional; por exemplo, um indicador geral de
contexto, tal como a distribuição de renda, represen-
tada pelo percentual de riqueza de um país, controla-
da por 10% ou 20% das pessoas mais ricas, pode ser
significativo se sua evolução for acompanhada ao
longo do tempo.
A mortalidade infantil é outro indicador desse tipo:
a morte é sempre a mesma, onde quer que ela ocorra
8
.
Em compensação, um indicador, tal como a taxa de
matrícula na pré-escola, deve ser interpretado com
prudência e aprimorado (ver a seguir), porque é fre-
qüentemente construído a partir de dados oriundos de
sistemas educacionais bastante diferenciados.
1.6. Como devem ser interpretados
os indicadores?
Os indicadores devem ser interpretados em relação
a uma norma fixa e absoluta ou a interpretação deve
ser relativa e focalizar as melhorias ocorridas? Para
responder a essa questão, é interessante analisar alguns
ensinamentos da área de nutrição. A relação peso/
idade é um indicador internacional de nutrição ampla-
mente aceito. Quando as tabelas de crescimento basea-
das nessa proporção foram introduzidas como forma de
monitorar a situação nutricional das crianças, elas eram
divididas em três seções (vermelha, amarela e verde),
de acordo com uma norma internacional de nutrição.
Para se medir o “sucesso”, verificava-se o número de
crianças que constava da seção verde da tabela. A
“normalidade” era fixada em referência à norma
internacional. Posteriormente, em muitos países, foram
criadas normas nacionais para medir o percentual de
crianças desnutridas, o que dificultou a comparação
internacional porque as normas variavam.
Outro ajuste foi operado para interpretar as tabelas
quando se tratou de medir o estado nutricional de
cada criança. Em vez de classificar a criança de acordo
com o nível do indicador em um momento preciso e
de acordo com uma norma absoluta (zona verde ou
amarela, ou então relação peso/idade), utilizou-se uma
classificação com base no ganho ou perda registrado
por esse indicador, entre as datas de pesagem. Esse
tipo de indicador (de progresso) não foi adotado
pelos países e, embora o relatório “O Progresso das
Nações” [The Progress of Nations] – publicado pelo
44
8
Até mesmo neste caso, convém manter uma certa prudência
porque os dados subnotificados de nascimento variam,
sensivelmente, de um país para outro. Contudo, este é um
problema relativo à precisão de dados, e não um problema
inerente à definição do indicador.
45
UNICEF – represente um esforço nessa direção, a
análise longitudinal raramente é utilizada como norma
internacional. Finalmente, um outro tipo de ajuste foi
feito na área de nutrição, agregando ao índice (mix)
indicadores relacionados aos micronutrientes, superan-
do o modelo tradicionalmente adotado que se baseia
na desnutrição calórico-protéica.
No momento em que nos debruçamos sobre os
indicadores do desenvolvimento da primeira infância,
diversas razões nos levam a chamar a atenção para a
experiência com indicadores nutricionais. Em primeiro
lugar, estes indicam o estado das crianças, e não a taxa
de cobertura de determinado programa ou a taxa de
freqüência nesse programa. Em segundo lugar, apesar
da persistência de reais diferenças, chegou-se a um
acordo em relação à utilização de alguns indicadores.
Em terceiro lugar, os ajustes que foram sendo feitos
ao longo do tempo aproximaram os indicadores das
normas nacionais, mais que das normas internacionais.
Em quarto lugar, são utilizados indicadores múltiplos.
Por último, foi introduzida a idéia de enfatizar o “pro-
gresso”, ao invés de adotar uma norma fixa.
1.7. Como levar em consideração
múltiplos objetivos e finalidades?
Em geral, um indicador fornece informações sobre
um aspecto de um sistema ou de uma atividade rela-
cionada a um objetivo particular; ora, os sistemas e as
atividades possuem múltiplas finalidades. Conseqüen-
temente, necessitam de um conjunto de indicadores
para que se possa efetivamente monitorar a evolução
da maior parte das atividades. Se pretendermos moni-
torar programas destinados à primeira infância, diver-
sos objetivos entram em jogo. E se desejarmos abordar
essa questão, de forma integrada, não devemos nos
limitar a indicadores específicos para cada um de
seus diferentes componentes. Esta necessidade torna
a busca de indicadores consideravelmente mais com-
plicada. Um modo de resolver essa questão poderia
consistir em criar um perfil que descrevesse as crianças
na idade de ingresso no ensino compulsório e que
representasse o resultado de tudo o que influenciou o
desenvolvimento da criança, antes do seu ingresso na
escola. Poderíamos, também, tomar esse perfil como
linha de base para o monitoramento dos progressos
e dos resultados nos primeiros anos do ensino com-
pulsório.
2. Experiências de
definição e de aplicação
de indicadores para a
primeira infância
Desde a Conferência de Jomtien, muitos esforços
foram feitos para definir e/ou apresentar as estatísticas
e os indicadores que devem orientar o processo de
monitoramento e de avaliação dos programas desti-
nados à primeira infância. A análise de várias dessas
experiências, realizadas com a ajuda de diferentes
organizações internacionais, ajudar-nos-á a compreen-
der as dificuldades que envolvem a definição de tais
indicadores. Ao final desta publicação, será apresen-
tada uma experiência latino-americana Análise da situa-
ção dos países da América Latina em relação aos indicadores
para a educação da primeira infância, relatada pelas
autoras Rosa Blanco e Mami Umayahara (UNESCO/
OREALC), que contém elementos para uma discussão
mais próxima da realidade brasileira.
2.1. UNICEF
Modelo, manual e plano para os indicadores
de Educação para Todos (EPT) (Windham, 1992)
Esse modelo, produzido por Windham, foi analisa-
do anteriormente. Até hoje, ainda não foi aplicado para
monitoramento de programas destinados à primeira
infância. Alguns de seus elementos foram utilizados
para a elaboração da Avaliação de EPT do ano 2000.
Sistema de monitoramento
O UNICEF concebeu e aplicou um sistema a ser
usado para monitorar a situação da infância. Esse
sistema, entretanto, carece de indicadores para o
desenvolvimento psicossocial da criança pequena.
Multiple Indicator Cluster Survey
(MICS)
Em 1998, o UNICEF iniciou um processo de ajudar
os países a avaliarem os progressos obtidos no final
da década, em relação às metas da Cúpula Mundial
pela Infância (Nova York, 1990). A lista dos indicado-
res mundiais utilizados para tal fim foi aperfeiçoada
no decorrer de múltiplas consultas, ocorridas no
UNICEF, bem como junto à OMS, UNESCO e
OIT (para maiores informações, acessar o site
www.childinfo.org).
Há numerosas fontes de dados para mensurar os
progressos obtidos em nível nacional, mas muitos
não funcionam suficientemente bem a ponto de
disponibilizar dados atuais e de qualidade, ou ainda
não fornecem as informações necessárias para avaliar
os progressos. As pesquisas domiciliares podem
preencher grande parte dessas lacunas.
A avaliação, feita na metade da década, permitiu
a 100 países reunir seus dados, utilizando o Multiple
Indicator Cluster Survey (MICS), que são pesquisas
domiciliares desenvolvidas para obter dados especí-
ficos da metade da década, ou ainda, módulos do
questionário MICS incorporados em outras pesquisas.
Em 1996, 60 países em desenvolvimento haviam
efetuado as pesquisas MICS e outros 40 tinham
incorporado alguns dos módulos do MICS em outras
pesquisas. No website citado, estão disponíveis: o
questionário e o manual para a metade da década,
uma lista dos países onde uma pesquisa MICS foi
realizada e uma seleção de relatórios nacionais.
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
O questionário e o manual MICS para o final
da década foram especialmente concebidos para a
obtenção de dados sobre 63 dos 75 indicadores
destinados a medir os progressos do final da década,
em mais de 50 países onde as estatísticas são geral-
mente insuficientes. O questionário e o manual
levaram em consideração, de forma ampla, as expe-
riências com o MICS da metade da década e as
subseqüentes avaliações do MICS, e estão também
disponíveis no website.
Em relação à ECPI, foram formuladas três questões:
a primeira, sobre a matrícula de crianças de 5 anos
em estabelecimentos pré-escolares; a segunda, sobre
a freqüência de crianças de 3 e 4 anos de idade em
programas formais de educação e cuidado fora de
casa; e, a terceira, nos casos em que a família havia
matriculado crianças de 3 e 4 anos de idade em algum
programa, sobre a carga horária semanal de freqüência.
O Grupo Consultivo sobre Cuidado e Desenvolvimento Infantil
espera analisar esses dados, dar um tratamento para as
informações contidas nos relatórios e nos bancos de
dados, e efetuar outras análises mais aprofundadas.
Em seguida, pretende comparar os resultados com as
estatísticas fornecidas pela Avaliação de EPT/2000, a
fim de chegar a algumas conclusões sobre o que nos
informam os dados, assim como sobre o que poderia
ser útil para os futuros MICS e, finalmente, recomen-
dar indicadores adicionais.
Para maiores informações, inclusive manuais,
questionários e uma apresentação geral, ver
www.childinfo.org
2.2. UNESCO
A educação no mundo e Relatório Mundial
de Educação
A UNESCO publica estatísticas periódicas de
matrículas naquilo que a Pesquisa Mundial de Educação
(1971) designa de “educação pré-primária
9
. Tais estatís-
ticas tornam-se indicadores dos progressos de
determinados países quando se fixa uma taxa de cober-
tura ideal de 100% ou quando se compara um país a
um outro. (Esse indicador pode ser encontrado na
última parte do Relatório Mundial de Educação, publi-
cado a cada dois anos aproximadamente.) A
UNESCO está redefinindo seus métodos de coleta
das informações sobre a “educação pré-primária” que,
atualmente, estão limitadas a programas formais e à
faixa etária de três a cinco anos de idade (ver, mais
adiante, discussão sobre os indicadores de matrícula
na Avaliação de EPT de 2000.)
Educação e cuidado da primeira infância
(ECPI): indicadores básicos sobre as crianças
pequenas (1995)
Nesse documento da UNESCO, os indicadores
foram divididos em quatro categorias, como segue:
CATEGORIA INDICADORES BÁSICOS
Criança pequena Crianças menores de 5 anos de
idade (em valor absoluto)
Taxa de mortalidade de crianças
menores de 5 anos
Crianças menores de 5 anos
desnutridas (%)
Família Taxa de alfabetização de homens (%)
Taxa de alfabetização de mulheres (%)
Taxa total de fecundidade (por mulher)
Comunidade PNB per capita (US$)
Acesso a serviços de saúde (%)
Acesso a água tratada (%)
Educação Faixa etária da
“pré-primária” “educação pré-primária”
Taxa bruta de matrícula na
“educação pré-primária” (%)
Na primeira categoria, os indicadores que dizem
respeito à situação da criança fornecem informações
sobre a população, a sobrevivência e o crescimento;
não existem indicadores de desenvolvimento. A quarta
categoria – “educação pré-primária” – comporta dois
elementos, dos quais o primeiro não é propriamente
um indicador e, sim, a indicação da faixa etária a que
se referem as taxas brutas de escolarização.
Esta série de indicadores apresentada por uma
instituição internacional não compreende indicadores
dos “efeitos” da educação e cuidado, nem indicadores
financeiros. Existem diversos indicadores de contexto
ou ambientais (categorias 3 e 4). Veremos, mais
adiante, o motivo pelo qual o indicador de “esforço”
utilizado – a taxa bruta de escolarização ou de
matrícula – não deveria ser utilizado para proceder a
comparações entre os países.
46
9
Segundo a Classificação Internacional Padrão de Educação
[International Standard Classification of Education – ISCED], a
educação das crianças na faixa etária de 3 a 5 anos (admitindo-
se estender a faixa de forma a incluir as crianças de 2 anos,
para países que incorporaram as crianças desta idade na etapa
de educação que antecede o ensino compulsório) é denomi-
nada educação pré-primária, uma expressão já ultrapassada na
legislação brasileira. No Brasil, desde 1996, com a aprovação
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, utiliza-se a
expressão ‘educação infantil’ para designar a primeira etapa da
educação básica, ofertada em creches (para crianças de zero a
três anos) e pré-escolas (para crianças de quatro a seis anos).
Ao longo do texto, manteve-se a terminologia adotada pela
ISCED. [Nota do Revisor]
47
Na 30ª Conferência Geral da UNESCO, em
1999, foi aprovada uma resolução relati-
va ao aperfeiçoamento dos indicadores
para a primeira infância. Com o objetivo
de dar continuidade a essa resolução, a
Seção Primeira Infância e Educação das
Famílias está lançando, em colaboração
com o Instituto de Estatística da
UNESCO, um programa piloto de médio
prazo, baseado nos indicadores para a
primeira infância. Tal programa visa
melhorar os indicadores existentes e
elaborar outros que ajudem na formu-
lação de políticas e sejam comparáveis
no plano internacional. Mais especifica-
mente, ele diz respeito ao aperfeiçoamento
dos dados sobre os programas destinados
à criança, excetuando-se os de educação
“pré-primária”
10
. Essa orientação tem
sua origem na seguinte observação:
Os dados relativos à primeira
infância, coletados pelos
ministérios da educação dos
diversos países, dizem respeito
sobretudo ao que foi definido pela
International Standard
Classification of Education –
ISCED
(Classificação Internacional
Padrão de Educação) como educação
"pré-primária" (ISCED nível 0).
Entretanto, a educação pré-primária
constitui apenas uma fração dos
programas destinados à primeira
infância; além disso, a definição
revela consideráveis lacunas con-
ceituais entre a idéia que os meios
acadêmicos e profissionais têm
dos programas relativos à primeira
infância e a forma como são imple-
mentados e colocados em prática.
Por exemplo, o nível 0 da ISCED colo-
ca ênfase nos programas de educação,
enquanto a maior parte dos programas
destinados à primeira infância dos países
em desenvolvimento contém, exclusiva
ou inclusivamente, componentes de
cuidado em relação ao crescimento
físico e ao bem-estar nutricional da
criança. Em segundo lugar, enquanto
a educação pré-primária se refere a
programas organizados e ministrados
em escolas ou centros educacionais,
grande número dos programas destina-
dos às crianças pequenas tem caráter
não-formal ou informal. Em terceiro
lugar, a educação pré-primária deve,
em princípio, ser ministrada por corpo
docente com qualificação pedagógica;
enquanto para o desenvolvimento da
criança os pais desempenham um papel
igualmente, senão mais importante, do
que aquele que é exercido pelos profes-
sores. Em quarto lugar, a educação
pré-
primária
é caracterizada por seus obje-
tivos educacionais, enquanto os efeitos
dos programas destinados à primeira
infância são mais diversificados,
incluindo não apenas o aumento da
eficácia pedagógica, mas também a
busca da justiça social e a melhoria da
produtividade econômica. Por último, a
idade mínima para o acesso à educação
pré-primária foi fixada nos três anos
(exceto quando as crianças de dois anos
são admitidas), mesmo que a Declaração
de Educação para Todos, de Jomtien,
proclame que a aprendizagem se inicia
a partir do nascimento.
A lacuna é, portanto, considerável,
mas a responsabilidade não deve ser
imputada à ISCED, que não tem como
objetivo incluir toda a gama de progra-
mas destinados à primeira infância.
Conseqüentemente, a falta de dados
sobre outros programas, que não sejam
a educação pré-primária, não deve ser
vista em termos de força ou fragilidade
da ISCED. As lacunas existem, simples-
mente, por falta de diretrizes operacionais
que orientem a coleta de dados confiáveis
e pertinentes sobre esses programas.
E é este componente excluído dos pro-
gramas destinados à primeira infância
que requer melhorias conceituais e
operacionais mais urgentes.
O programa-piloto da UNESCO sobre
os indicadores para a primeira infância
visa superar essa falha, reconhecendo
que os programas destinados à criança
pequena contribuem para um processo
holístico e integrado de desenvolvimen-
to e aprendizagem da criança, processo
este que se inicia a partir do nascimento
e engloba outros elementos, além da
educação pré-primária. Assim sendo, as
estatísticas nacionais deveriam incluir
dados sobre os programas formais e não
formais. O mais difícil é conceituar o
componente atualmente excluído dos
programas destinados à primeira
infância. Esse esforço deve, no entanto,
ser empreendido em nível nacional, levando
em consideração situações e necessidades
diversas, específicas de cada país.
O objetivo imediato do programa-
piloto não é definir novas categorias de
indicadores para a primeira infância ou
julgar a validade ou a viabilidade dos
vários indicadores existentes. Os indicadores
adotados por um certo número de países-
piloto constituirão o corpus da linha de
base e os esforços se concentrarão na
ampliação da cobertura dos indicadores
já existentes. Se a capacidade nacional
permitir e caso esteja de acordo com as
necessidades nacionais, um esforço adi-
cional será feito no sentido de desen-
volver novos indicadores.
Em relação a canais e metodologias
Programa Piloto da UNESCO sobre indicadores para a
primeira infância
Korog, Tajikistan: Aga Khan Foundation/0264-002
Jean-Luc Ray
Alunos coletam uma amostra da água como parte de um
projeto de saúde local
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
2.3. UNICEF-UNESCO
Resultados de uma oficina técnica
UNICEF-UNESCO sobre um efetivo monitora-
mento para Avaliação de Educação para
Todos/EPT (1997)
Em outubro de 1997, por ocasião de uma oficina
técnica sobre um efetivo monitoramento de Edu-
cação para Todos, foi apresentado um conjunto de
indicadores a serem usados no estudo do componente
de educação infantil da EPT. As seis dimensões da
ECPI e os indicadores propostos na reunião
UNICEF-UNESCO são:
Demografia Percentual de crianças com idade
inferior a 6 anos, em relação
à população total.
Participação Percentual de crianças matriculadas
em programas estruturados.
Política Existência de uma política e/ou de
um currículo nacional para a
primeira infância.
Capacitação Percentual de professores (inclusive
professores do 1º ano do ensino
compulsório), de outros profissionais
e de pais/famílias capacitados nos
temas relativos à primeira infância.
Financiamento Percentual do orçamento
(nacional) destinado à ECPI.
Preparação para a escola Estado de saúde/nutricional (relação
altura/idade) e percentual de alunos
do primeiro ano do ensino compul-
sório que participaram de algum
programa destinado à primeira
infância.
Basta dar uma olhada em cada uma dessas dimensões
para compreender como é difícil definir indicadores
adequados e, ao mesmo tempo, oferecer uma base
que possibilite vislumbrar outras alternativas.
Percentual de crianças com idade inferior
a seis anos, em relação à população total
(demografia)
Esse indicador de contexto demográfico toma como
ponto de partida as crianças “com idade inferior a seis
anos” e não aquelas “com idade inferior a cinco anos”,
conforme o indicador utilizado no exemplo precedente;
além disso, é expresso em porcentagem da população
total e não em valor absoluto. Se esta estatística
demográfica é transformada em um indicador, é, sem
dúvida, porque se presume que determinado país terá
melhores condições de atender as crianças com idade
inferior a seis anos, se ele tiver relativamente menos
48
de coleta de dados, o programa-piloto
respeitará as práticas existentes nos
países-piloto; além disso, um novo modelo
de pesquisa ou de coleta só será intro-
duzido se o mecanismo existente não
for capaz de reunir os tipos de dados
requeridos. O programa não procura,
assim, pelo menos nesse estágio-piloto,
alterar ou corrigir a estrutura técnica
ou a infra-estrutura administrativa de
coleta de dados sobre a primeira infância.
Esta orientação reflete a convicção de
que é necessário e urgente estabelecer
uma definição operacional dos progra-
mas destinados à primeira infância,
englobando ambos os componentes –
educação “pré-primária” e “não pré-
primária” – antes de adotar medidas
técnicas e administrativas para a melhoria
dos atuais indicadores.
O programa visa elaborar diretrizes
operacionais que incluam os seguintes
elementos:
– definição e clareza conceitual dos
programas destinados à primeira infância;
identificação dos indicadores-chave
para as políticas destinadas à
primeira infância;
especificação dos dados requeridos
para gerar os indicadores identificados;
difusão de instruções técnicas rela
tivas a coleta, análise, interpre-
tação, disseminação e utilização dos
dados sobre a primeira infância.
O principal resultado será um
anteprojeto de definição operacional
dos programas destinados à primeira
infância, englobando tanto a educação
pré-primária quanto os outros compo-
nentes. Essa definição terá como base
um denominador comum – tanto no
plano teórico quanto prático – estabele-
cido a partir de diversos programas e
definições inventariados nos países-
piloto. Espera-se que a definição possi-
bilite a comparação internacional dos
dados coletados de acordo com as
diretrizes, pelo menos entre os países-
piloto. Se o resultado inicial se revelar
encorajador, na fase seguinte as dire-
trizes serão aplicadas a outros países,
antes de serem testadas em escala
regional e, eventualmente, mundial.
O plano de trabalho do programa-
piloto está sendo finalizado
11
e será
aplicado em cinco países na região da
Ásia-Pacífico. Um grupo consultor de
especialistas supervisionará o processo
de conceituação no plano mundial.
Serão feitos esforços para instalar uma
cooperação interinstitucional, fazendo
apelo aos colegas do Grupo Consultivo
sobre Cuidados e Desenvolvimento
Infantil, da OCDE (Organização para
Cooperação e Desenvolvimento
Econômico), do UNICEF (Fundo das
Nações Unidas para a Infância) e do
Banco Mundial – que se reuniram, em
2001, para discutir sobre a questão,
em Washington-DC e em Paris – assim
como a representantes de outras
organizações.
10
Trata-se de programas excluídos da atual definição do nível zero da ISCED que, na sua maioria, são não-formais. Porém, como a
atual definição da ISCED não exclui explicitamente os programas não-formais para a primeira infância, os componentes excluídos não são
referidos como programas não-formais de atenção à criança. Como o nível zero da ISCED corres-ponde à educação ‘pré-primária’, o
restante é referido como programas ‘não pré-primários’, até que a terminologia seja melhor definida.
11
Após sua conclusão, esse documento poderá ser obtido no Setor da Primeira Infância e de Educação das Famílias da UNESCO.
49
colocar em prática os dispositivos da Convenção sobre os
Direitos da Criança (Artigo 28, 20 de novembro de
1989). Em geral, considera-se que a existência de tal
plano é sinal de que o país desenvolve uma política
nacional para a primeira infância. Normalmente, tais
planos priorizam a saúde e a nutrição durante os
primeiros anos de vida, porque os participantes da
Cúpula Mundial pela Infância definiram, em setembro de
1990, os objetivos da década, referindo-se, quase
exclusivamente, a indicadores dessas duas áreas.
Embora os planos sempre dediquem atenção à
educação, esta geralmente é abordada apenas a partir
do ensino compulsório, mesmo que por vezes se faça
uma breve menção à educação infantil formal. Não é
de surpreender, uma vez que a seção da Convenção, que
trata da educação, postula que a educação e a apren-
dizagem começam com o ingresso na escola obri-
gatória (“escola primária”) (Assembléia Geral das Nações
Unidas, 1989). As referências à primeira in-
fância encontram-se dispersas em outras seções da
Convenção e, muitas vezes, estão mais vinculadas ao
bem-estar social e ao trabalho dos pais do que à edu-
cação. Pode-se considerar que um plano nacional,
elaborado em conformidade com a Convenção, tal
como ela foi interpretada pela Cúpula Mundial pela
Infância, confirmaria a existência de uma política
nacional para a primeira infância? A resposta não é
óbvia. Em resumo, ao utilizar este indicador, convém
defini-lo cuidadosamente e, sem dúvida, evitar vin-
culá-lo a planos nacionais baseados nos indicadores
fixados, para a “década”, pela Cúpula de 1990.
Percentual de professores (inclusive profes-
sores do 1º ano do ensino compulsório), de
outros profissionais e de pais/famílias
capacitados em temas relativos à primeira
infância
Com a inclusão deste indicador, o grupo UNICEF-
UNESCO empreendeu uma tentativa interessante
para agregar uma dimensão qualitativa aos indi-
cadores de esforço. Aplicado, com bom resultado na
avaliação dos programas europeus, efetuada em 1995,
este indicador revelou que todos os profissionais (que
participam de programas estruturados) que atuam
diretamente com as crianças entre 0 e 3 anos de idade
(muitas vezes, na modalidade de creche domiciliar)
são os menos qualificados (Comissão Européia, 1996).
Portanto, esse indicador pode realmente ter valor;
mas convém examiná-lo mais detalhadamente antes
de chegar a conclusões definitivas.
Em primeiro lugar, parece lógico separar os profes-
sores e os outros profissionais de um lado, e de outro
pais e famílias; simplesmente porque os programas
de educação dirigidos aos pais e às famílias não são
os mesmos que se destinam aos professores e aos
demais profissionais. Freqüentemente, os programas
de educação dirigidos aos pais são difundidos através
da mídia. Deve-se considerá-los? Em outros casos, eles
crianças para atender. O número absoluto de crianças
com idade inferior a seis anos, a partir do qual o indi-
cador é criado, ajuda a definir a demanda potencial de
programas destinados à primeira infância, e estabelece
uma base de cálculo para outro indicador – a taxa de
matrícula (participação). Embora faça sentido a noção
geral de que um menor número relativo de crianças
com idade inferior a seis anos é melhor do que um
número relativamente maior, é difícil imaginar o obje-
tivo específico à luz do qual este indicador poderá
ser interpretado. Haveria um percentual “ótimo” de
crianças de menos de seis anos? Haveria um patamar
abaixo do qual o fato de ter um número menor de
crianças com idade inferior a seis anos tornar-se-ia
uma desvantagem em vez de uma vantagem?
Percentual de matrícula em programas
estruturados (participação)
Este é o indicador mais comumente utilizado para
monitorar os programas para a primeira infância. O
Comitê Técnico UNICEF-UNESCO recomenda que
este indicador inclua as crianças matriculadas em
todos os programas, formais e não formais, destinados
à primeira infância.
Ele pode ser interpretado pelo menos de duas
maneiras. Em primeiro lugar, ao relacioná-lo com o
percentual de matrículas (em geral, 100%) fixado
como objetivo, porque mostra que toda a demanda
foi satisfeita (ou seja, o acesso é garantido a todas as
crianças). Em segundo lugar, ao comparar as taxas de
matrícula em diferentes países: umas vezes utilizando
como padrão um grupo de países em desenvolvimento;
e outras vezes relacionando a taxa de matrícula com
a riqueza econômica relativa do país. As ciladas deste
indicador serão discutidas mais adiante.
Existência de uma política e/ou de um
currículo nacional para a primeira infância
Esse é um indicador do “compromisso político”.
Pressupõe-se que seja benéfica a criação de uma
política e/ou de um currículo nacional. Entretanto, não
se pode afirmar que a existência de tal política seja
necessariamente um indicador válido; sendo questio-
nável vinculá-lo a um currículo nacional. Na verdade,
a presença de uma política ou de um programa nacional
pode se configurar como uma desvantagem porque,
em vez de promover uma abordagem holística da
educação e cuidado da criança, sensível aos aspectos
culturais, ela freqüentemente favorece a adequação
a um único modelo e, nem sempre, permite o recurso a
variantes reconhecidas e que dão bons resultados. Assim,
no México, a pedagogia Montessori e outras peda-
gogias respeitadas não são oficialmente reconhecidas,
porque o Ministério da Educação desenvolveu seu
próprio currículo, que deve ser nacionalmente adotado.
Como definir a existência de uma política
nacional para a primeira infância? Quase todos os
países da América Latina elaboram planos que visam
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
são organizados em uma estrutura formal, tendo porém
alcance limitado. A China, por exemplo, costumava
conceder um “certificado” aos pais que, no período de
um ano, tivessem participado de oito palestras. O
México tem um programa anual de 40 semanas de
educação inicial, que envolve pais e outros responsáveis
pelas crianças no domicílio; no entanto, o programa
não chega perto do que é exigido dos professores de
pré-escola ou dos outros profissionais que atuam em
programas formais. Haverá alguma equivalência entre
todos estes sistemas de formação?
Ao definir este indicador, como a capacitação deve-
ria ser medida? Conviria avaliar ano a ano ou de forma
cumulativa? Deveria estar atrelada à participação
em algum curso formal?
12
Por exemplo, como tratar
a capacitação de professores fora do sistema? No
México, grande número de cursos informais, não
autorizados pelo sistema, são propostos aos profes-
sores e a outros profissionais da primeira infância.
Podem ser cursos oferecidos por grandes editoras que
utilizam seu próprio material, como cursos propostos
por organizações sociais ou não-governamentais que,
muitas vezes, possuem qualidade superior à de alguns
cursos oficiais ministrados em escolas tradicionais.
Percentual do orçamento nacional destinado
à educação e cuidado da primeira infância
(financiamento)
Este indicador revela tanto a capacidade e o com-
promisso em apoiar os programas destinados à criança,
quanto o esforço que está sendo feito nesse sentido. Entre-
tanto, a meta que deve servir de referência para julgar
este dado não está clara. Existe um percentual específico
que deverá ser atingido por todos os países? Um per-
centual mais elevado será sempre sinal de uma melhoria?
Antes de utilizar este indicador, será necessário
defini-lo de forma mais precisa. Por exemplo, refere-se
aos recursos destinados aos programas de nutrição e
de saúde das crianças, além daqueles destinados aos
programas de cuidado e aos programas para a primeira
infância no âmbito do sistema educacional? Ou apenas
de ECPI? Neste último caso, convirá comparar os
dados com os orçamentos combinados da educação e
da assistência social (ou bem-estar social), ou com o
orçamento nacional? O que ocorrerá se a maior parte
dos programas destinados à primeira infância estiver
incluída em um programa em favor das mulheres
(como na China; ou como acontecia – em certa época
– na Indonésia; ou como ainda ocorre no Peru, no caso
dos programas destinados às crianças menores de
3 anos de idade)? Como definir esse indicador para
que permita proceder a comparações entre países?
Conviria estabelecer a comparação com o “orça-
mento nacional”? No caso afirmativo, como levar em
consideração as diferenças nos compromissos entre
os países em relação à dívida externa, o que reduz
os montantes disponíveis para os programas em
execução?
Talvez fosse preferível concentrar-se no percentual
do orçamento da educação destinado aos programas
em favor da primeira infância e compará-lo com o
percentual de crianças matriculadas na educação
infantil, representada como uma proporção do número
total de crianças (ou de pessoas) matriculadas em
todos os programas financiados pelo setor Educação.
Constata-se, em geral, que o segundo percentual é
muito mais elevado do que o primeiro. É claro que
tudo isso depende da existência ou não de destinação
orçamentária da educação para outros programas
que favoreçam a primeira infância. O que sustenta
este indicador é a noção de que a educação infantil
deveria receber uma proporção do orçamento da edu-
cação, que deveria ser, no mínimo, correspondente à
porcentagem de crianças de zero a seis anos matricula-
das no sistema educacional. Entretanto, este indicador
apresenta a desvantagem de se limitar à educação, o
que nos afasta da visão integrada da política para a
primeira infância, deixando de fora os programas de
saúde, de assistência e de previdência social.
Estado de saúde/nutricional (relação altura/
idade) e percentual de alunos do primeiro
ano do ensino compulsório que participaram
de algum programa destinado à primeira
infância (“preparação para a escola”)
Ao designar este indicador como “preparação para
a escola”, sugere-se que se trata de uma tentativa de
criar um indicador que permita medir os efeitos dos
programas para a primeira infância. Porém, os indica-
dores específicos aqui propostos não nos levam além
da suposição de que uma criança que tenha participa-
do de um tipo qualquer de programa para a primeira
50
12
Supondo que 5% de todos os pais de crianças pequenas
tenham a oportunidade de participar, no primeiro ano, de um
tipo qualquer de curso formal de educação de pais. No ano
seguinte, outros 5% tenham a possibilidade de seguir um
curso semelhante; porém, alguns participantes, digamos 1%,
são os mesmos do ano precedente. Será que nosso indicador,
em relação ao segundo ano, se baseia na taxa de matrícula do
segundo ano (5%) ou na taxa de novos pais matriculados no
segundo ano (4%), ou na soma das matrículas registradas
no primeiro e segundo anos (10%) ou, ainda, no número total
de participantes durante os dois anos (9%)? Normalmente, os
sistemas de estatísticas referentes à educação de pais apontam
aqueles que seguiram um curso durante determinado ano.
Eles não apresentam a educação de pais, acumulada pela
população. Apesar de se dispor de estatísticas relativas ao
número ou percentual de professores, de um sistema que são
‘diplomados’ ou qualificados em função de alguns critérios,
não se dispõe de um dado numérico equivalente com caráter
cumulativo, em relação à ‘diplomação’ dos pais.
13
O estudo comparativo foi finalizado e publicado em 2001
sob o título “Starting Strong: Early Childhood, Education and Care”.
Uma versão para o idioma português foi divulgada no Brasil
pela UNESCO, sob o título “Educação e Cuidado na Primeira
Infância – Grandes Desafios”. Tradução de Guilherme João
de Freitas Teixeira. – Brasília: UNESCO Brasil, OECD,
Ministério da Saúde. 2002. [Nota do Revisor]
51
infância se encontrará em um estágio mais avançado
de desenvolvimento e estará mais bem preparada para
ingressar na escola; eles não nos fornecem um indicador
do desenvolvimento infantil.
Os dois indicadores combinados aqui são comple-
tamente diferentes um do outro. O de saúde e de nutri-
ção fornece algumas informações sobre a situação
atual da criança. Mas o percentual de crianças que
freqüentaram algum tipo de programa para a primeira
infância não nos revela nada sobre a situação das
crianças ou da preparação delas para a escola; ele
simplesmente indica que elas participaram de um
programa. Por essa razão, esse indicador poderia ser
agrupado com o indicador de cobertura/matrícula/
freqüência, e não ser incluído, aqui, como medida ou
indicador de “preparação”. Mais uma vez, fica claro
que há carência de critérios, estabelecidos através de
consenso, para avaliar o estágio de desenvolvimento
das crianças pequenas.
2.4. ORGANIZAÇÃO DE COOPERAÇÃO
E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICOS
(OCDE)
Um breve olhar sobre a educação: os indica-
dores da OCDE
Nessa publicação, a OCDE apresenta informações
relativas à participação na educação infantil em países-
membros da Organização. Além de indicar a taxa
bruta de escolarização, subdividida em “público e pri-
vado”, “tempo integral ou parcial”, a publicação indica
as idades de ingresso na escola e de término dos estu-
dos nos diversos países. Este indicador pode chegar
a resultados estranhos, tais como uma taxa bruta de
escolarização de 208,5% na Noruega (Organisation for
Economic Co-operation and Development, 1992, 71).
O Projeto de educação e cuidado na
primeira infância
Este projeto tem como objetivo desenvolver sis-
temas de coleta de dados e de monitoramento. Baseado
em estudos de caso de doze países, a OCDE recomen-
dará novos indicadores, metodologias de coleta de
dados e de elaboração de relatórios
13
.
Introdução
A educação e o cuidado das crianças
pequenas estão recebendo uma maior
atenção nos países-membro da OCDE.
Uma política de educação e cuidado para
a primeira infância (ECPI) é não apenas
necessária, se se pretende garantir o
acesso igualitário das mulheres ao
mercado do trabalho, mas cada vez mais
parece que é sobre o desenvolvimento
nos primeiros anos de vida que repousam
as possibilidades de aprendizagem ao
longo de toda a existência. Além disso,
quando tal política é acompanhada por
efetivas medidas fiscais, sociais e de
emprego, que apóiem os pais e as comu-
nidades, os programas destinados à
primeira infância podem contribuir para
proporcionar um início de vida melhor
para todas as crianças e para fortalecer
a integração social.
Iniciativas
Na primavera de 1998, um novo Estudo
temático da política de ECPI foi
empreendido, sob os auspícios do Comitê
de Educação da OCDE. Doze países
aceitaram, voluntariamente, participar
deste Estudo, entre o outono de 1998 e o
verão de 2000: Austrália, Bélgica,
Dinamarca, Estados Unidos da América,
Finlândia, Itália, Holanda, Noruega,
Portugal, Reino Unido, República Tcheca
e Suécia. Esses países chegaram a um
acordo sobre a estrutura, a extensão e o
processo do estudo e definiram as prin-
cipais questões a serem investigadas.
Além disso, foi planejada uma agenda
das visitas aos países pelas equipes de
examinadores da OCDE. Informações
sobre essas visitas podem ser encon-
tradas no
website
da OCDE:
www.oecd.org/edu
Objetivos do Estudo
O Estudo teve por objetivo fornecer
informações, numa perspectiva interna-
cional, para o aprimoramento do planeja-
mento e da formulação das políticas de
educação e cuidado da primeira infância
em todos os países-membro da OCDE.
Com a ajuda dos ministérios e dos
principais atores da ECPI em cada país,
ele visa:
distinguir e investigar os contextos
da ECPI, assim como os principais
temas de preocupação e as soluções
encontradas pelas políticas em
resposta a essas preocupações, nos
países participantes;
estudar os papéis respectivos do
governo federal, das autoridades
descentralizadas, das ONGs e dos
outros parceiros sociais, assim como
os recursos institucionais destinados
ao planejamento e à implementação
em cada esfera;
identificar as opções viáveis de política
em função dos diferentes contextos;
avaliar o impacto, a coerência e a
efetividade das diferentes abordagens;
destacar as políticas e práticas espe-
cialmente inovadoras e
contribuir para o projeto “Indicadores
de Sistemas de Educação”
[Indicators
of Education Systems]
, identificando
os tipos de dados e instrumentos a
serem aperfeiçoados a fim de melhorar
a coleta de informações, a formulação
de políticas, a pesquisa, o monitoramento
e a avaliação da ECPI.
Organização de Cooperação e Desenvolvimento
Econômicos (OCDE): Estudo Temático da Política de
Educação e Cuidado para a Primeira Infância (ECPI)
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
2.5. FÓRUM MUNDIAL
Avaliação de Educação para Todos (EPT)
da metade da década: documento de tra-
balho e documento estatístico (1996)
Em 1996, por ocasião da Avaliação de EPT da
metade da década, preparada para a reunião do Fórum
de Educação para Todos, em Amã, na Jordânia, foi elabo-
rado um documento de trabalho que incluía uma
seção dedicada à primeira infância. Para mostrar os
avanços em relação à expansão do atendimento, foram
utilizados como indicadores as mudanças ocorridas
desde 1990 nos países em desenvolvimento, em relação
a: 1) número de crianças de 3 a 6 anos de idade matri-
culadas em estabelecimentos de educação pré-primária
(número total e percentual de meninas); 2) número de
estabelecimentos de educação pré-primária e 3) núme-
ro de outros profissionais empregados [excetuando-se
os professores]. Esses indicadores são apresentados
em termos gerais no texto do documento de trabalho,
mas não foram incluídos no documento anexo, que
continha os dados estatísticos por país. A Avaliação
de EPT da metade da década sublinhava também
diversas tendências gerais de ordem qualitativa sobre
o desenvolvimento da criança pequena, sem qualquer
referência a indicadores específicos.
A fonte utilizada para extrair conclusões sobre as
matrículas e as tendências relativas ao desenvolvimento
da criança não foi mencionada, mas deve ser buscada,
muito provavelmente, nas pesquisas sobre Educação,
realizadas periodicamente pela UNESCO; aliás, daí
provêm os dados utilizados na Pesquisa Mundial de
Educação [World Survey of Education] e no Relatório
Mundial de Educação (“Educação no Mundo”).
Avaliação de Educação para Todos (EPT)
do ano 2000
Conforme mencionado anteriormente, uma moti-
vação para tratar desse tópico decorre da maneira
52
Alcance do Estudo e principais temas
de pesquisa
Para examinar de maneira abrangente as
experiências pelas quais passam as
crianças em seus primeiros anos de
vida, o Estudo adota uma abordagem
ampla e holística. Analisa as políticas, os
programas e a oferta de serviços para
crianças, desde o nascimento até a idade
de ingresso na escola obrigatória, inclu-
sive o período de transição entre a edu-
cação infantil e o ensino compulsório.
Dá relevância ao papel das famílias, das
comunidades e de outros fatores ambien-
tais que condicionam o desenvolvimento
e a aprendizagem da criança pequena.
Em particular, o Estudo aborda as
questões relativas à qualidade, ao aces-
so e à eqüidade, com ênfase na formu-
lação de políticas nas seguintes áreas:
regulamentação, equipe de profissionais,
conteúdo e implementação dos progra-
mas, envolvimento e apoio da família,
financiamento.
Organização do processo do Estudo
O Estudo compreende quatro principais
etapas:
Orientado por um modelo comum,
cada país participante elabora um
Relatório Preparatório
que apresenta
um panorama conciso do contexto do
país, das principais questões e
preocupações, das políticas específi-
cas de ECPI, assim como da oferta,
das abordagens inovadoras e dos
dados de avaliação disponíveis.
Uma equipe multinacional de especialis-
tas, titulares de diferentes for-
mações e experiências políticas,
estuda, em seguida, o
Relatório
Preparatório
e outros documentos rele-
vantes, antes de conduzir a visita
que possibilitará aprofundar o estudo
de caso no país em questão.
Depois da
Visita de Estudo
, o
Secretariado da OCDE prepara uma
breve
Nota
sobre o país a partir das
informações extraídas do
Relatório
Preparatório
, da avaliação da Equipe
de Examinadores e de outras fontes
pertinentes. A
Nota
(
Relatório por
País
) fornece informações sobre as
políticas atuais de ECPI, sobre as
principais dificuldades encontradas e
sobre os meios adotados para serem
atingidas as metas nacionais; além
disso, ela explora as opções viáveis
de política, de forma a garantir a
qualidade, o acesso e a eqüidade.
O Estudo conclui-se com a redação de
um
Relatório Comparativo
14
, prepara-
do pelo Secretariado da OCDE, que
contém uma comparação e uma
análise das políticas de ECPI nos
doze países participantes. Focalizando
os grandes problemas e as questões
essenciais na área da ECPI, as ver-
sões provisórias deste relatório se
beneficiaram das contribuições dos
representantes nacionais e dos espe-
cialistas, em reuniões posteriores
O Secretariado da OCDE promoveu,
em Paris, nos dias 28-29 de setembro de
2000, um encontro dos representantes
nacionais [dos doze países que fizeram
parte da primeira rodada da pesquisa]
com especialistas convidados, para
analisar um projeto de
Relatório
Comparativo
[publicado em 2001].
Os
Relatórios Preparatórios
e as
Notas
sobre cada um dos países encontram-se
à disposição dos formuladores de política,
pesquisadores, responsáveis pela elabo-
ração de programas e profissionais
interessados no tema.
Os membros da equipe do Secretariado
da OCDE que trabalharam neste
Estudo
temático da política de educação e cuida-
do da primeira infância
, lotados na
Divisão
de Educação e de Formação
, podem ser
contatados por meio do endereço que
segue, por correio eletrônico ou por tele-
fone: 2, rue André Pascal, 75775 Paris
Cedex 16, FRANÇA; site
www.oecd.org/edu Fax: (33 1) 45 24 90 98.
Mr. Abrar Hasan (Chefe de Divisão);
Mr. John Bennett (Consultor); e-mail :
Ms. Deborah Whedon-Fernandez
(Secretária); e-mail:
14
O Relatório Comparativo, que inclui doze países-membro da OCDE, foi publicado em língua portuguesa e encontra-se disponível
nos sites www.unesco.org.br e www.SourceOECD.org . Mais rodadas do Estudo estão previstas para os próximos anos, envolvendo
outros países. [Nota do Revisor].
53
como os indicadores para a primeira infância são
tratados na Avaliação de EPT do ano 2000. As diretrizes
técnicas adotadas pelo Fórum de EPT propõem dois
indicadores, citados a seguir, para os quais os países
são convidados a coletar e a apresentar informações
nos relatórios nacionais:
1. Taxa bruta de matrícula nos programas destina-
dos à primeira infância, e
2. Percentual de novos alunos no 1º ano do ensino
compulsório, que tenham freqüentado algum tipo
de programa estruturado destinado à primeira
infância, durante pelo menos um ano (ou um
período escolar).
Os dois indicadores selecionados são indicadores
de matrícula: um, das matrículas atuais; e o outro, das
passadas. Eles não permitem avaliar a qualidade dos
inputs nos programas destinados à primeira infância,
nem a eficiência dos programas, nem seus efeitos
sobre as crianças, nem a parcela de recursos finan-
ceiros destinada pelos países a esse segmento do sis-
tema educacional. Quando o número e a abrangência
de indicadores dos progressos relativos à primeira
infância, incluídos nas diretrizes técnicas de EPT, são
comparados aos treze indicadores propostos no
mesmo documento para avaliar os primeiros anos do
ensino compulsório), fica ainda mais evidente que o
tratamento dado aos programas destinados à primeira
infância é muito limitado e tem pouca prioridade.
Taxa bruta de matrícula
A definição deste indicador, estabelecida nas
Diretrizes Técnicas de EPT, é a seguinte:
“Número total de crianças matriculadas em
programas destinados à primeira infância,
independentemente de sua idade, expresso em
percentual da população da faixa etária de referência
ou da faixa etária de 3 a 5 anos. Este indicador mede
o grau de participação de crianças em programas
para a primeira infância. Ele indica também a
capacidade de um país em preparar as crianças
para o ensino compulsório” (Fórum de EPT, Diretrizes
Técnicas para a Avaliação do ano 2000, p. 8)
Deve-se ter cuidado quando se tenta interpretar,
com base em dados coletados no contexto da Avalia-
ção de EPT, quais informações este indicador nos
fornece sobre os programas para a primeira infância.
Em primeiro lugar, não devem ser feitas compara-
ções diretas de níveis e de percentuais de matrícula
entre os países, porque existem importantes diferenças
entre eles, no que se refere:
– à definição da faixa etária a que se destinam
os programas para a primeira infância, e que
constitui a base para a coleta dos dados
15
;
– ao ano da linha de base e ao ano em que os últi-
mos dados de matrícula foram apresentados
16
;
– à definição do que constitui um programa para
a primeira infância
17
;
– à duração, em dias e horas, dos programas, o
que difere significativamente de país para país
18
;
– à liberdade de que dispõem os centros de
atendimento da criança pequena para funcionar
fora do sistema oficial, de forma irregular e,
portanto, fora das estatísticas oficiais,
subestimando assim as matrículas;
– à confiabilidade dos dados.
Em segundo lugar, ao analisar o crescimento nas
matrículas, é importante levar em consideração a linha
de base em relação à qual os crescimentos ocorreram
19
.
Em terceiro lugar, aspecto freqüentemente negli-
genciado, os dados de matrícula são coletados geral-
mente no início de cada ano e se referem às matrículas
e não à freqüência (ou seja, à real participação) em um
programa. Essas informações não levam em conside-
ração as crianças que, mesmo matriculadas, nunca
freqüentaram o programa; nem as alterações ocorridas
na matrícula ao longo do ano, inclusive os casos de
desistência após alguns dias ou semanas de freqüência.
A estabilidade do número de crianças matriculadas em
programas varia de país para país. Além disso, algumas
crianças constam das listas de presença durante todo
o ano, embora raramente freqüentem os programas.
Uma alternativa consiste em coletar dados estatísticos
sobre os alunos freqüentes.
Em quarto lugar, algumas crianças estão matricula-
das em mais de um programa, o que implica dupla
contagem e superestimação.
Em quinto lugar, são utilizadas as taxas brutas de
matrícula. Para a maior parte dos países, isto não faz
15
A faixa etária adotada como referência é bastante variável:
alguns países consideram o período que vai do nascimento
até os 5 anos; outros limitam-se às crianças de 5-6 anos; e
ainda outros utilizam a faixa etária de 3 a 5 anos.
16
Por não disporem de dados relativos ao ano de 1990, muitos
países utilizaram outro ano de referência, inclusive o de 1996.
Em certos casos, alguns países apresentaram dados relativos ao
ano de 1999 e outros serviram-se dos dados de 1998 ou de 1997.
17
Em alguns países, as estatísticas referem-se unicamente
aos programas formais ou àqueles do setor educação (descon-
siderando, por exemplo, aqueles conduzidos pelos setores do
bem-estar da família ou da seguridade social). São raros os
países que incluem a educação de pais em suas estatísticas.
Cuba é uma exceção por levar em consideração essa educação,
que representa 70% das matrículas totais.
18
Na maior parte dos países, os programas estão baseados
em jornadas de meio-período, durante o ano escolar.
No entanto, em alguns, a educação da primeira infância
consiste em jornadas intensivas de dois meses que antecedem
imediata-mente o ingresso no ensino compulsório. Ainda, em
outros, as atividades ocupam o tempo integral ou um país em
particular pode ter vários programas que diferem amplamente
quanto ao período das jornadas, mas que entram em pé de
igualdade nas estatísticas oficiais.
19
Por exemplo, é possível registrar um aumento de matrículas de
500% em 10 anos, embora estas nem cheguem a 5% da faixa etária.
Inversamente, quanto mais se aproxima da taxa de matrícula “má-
xima” fica mais difícil, tanto do ponto de vista estatístico quanto em
termos de possibilidades de recrutamento, evidenciar tal aumento.
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
muita diferença, uma vez que é mínima a incidência
de crianças acima ou abaixo da faixa etária que serve
para o cálculo dos percentuais. Há, entretanto, casos
em que os programas para a primeira infância incluem
uma proporção significativa de crianças fora da faixa
etária selecionada.
Em sexto lugar, em alguns relatórios, a faixa etária
não é claramente indicada. Em outros, há incoerências
(em geral, pouco importantes, mas reais) entre dados
apresentados em diferentes pontos do relatório.
Em sétimo lugar, em um número significativo de
relatórios nacionais, os dados solicitados não foram
apresentados; em alguns casos porque inexistiam
estatísticas de matrícula ou porque não existia censo,
nem outros dados demográficos relativamente à faixa
etária selecionada.
Em oitavo lugar, há uma suposição questionável
por detrás deste indicador: tacitamente, supõe-se que
a matrícula bruta deva ser de 100% e que isso é bom.
No entanto, quanto mais nova a criança, menor a
viabilidade de tal hipótese. Não é evidente que a
freqüência, por 40% das crianças de dois anos de
idade, em algum programa estruturado, seja, neces-
sariamente, preferível a uma freqüência de 5%. O
juízo sobre este indicador refletirá o valor atribuído
por uma sociedade aos cuidados dispensados às
crianças em casa e à existência, nos países em que o
percentual de atendimento é mais baixo, de programas
de apoio aos pais que, por sua vez, não estão disponí-
veis nos países onde esse percentual é mais elevado.
Em suma, mesmo o indicador de matrículas, aparen-
temente tão simples, deve ser tratado com ceticismo
quando utilizado para efetuar comparações em escala
internacional.
Novos matriculados (no ensino compulsório),
que freqüentaram algum programa destinado
à primeira infância
A definição deste indicador contida nas Diretrizes
Técnicas de EPT é a seguinte:
“Número de novos alunos no 1º ano do ensino
compulsório que participaram de algum programa
estruturado destinado à primeira infância equiva-
lente a, no mínimo, 200 horas, expresso em por-
centagem do número total de novos alunos no 1º
ano do ensino compulsório. Este indicador ajuda a
visualizar a proporção de novos alunos no 1º ano
que se beneficiaram de uma preparação para o ensino
compulsório, através dos programas destinados às
crianças pequenas”. (Fórum Consultivo Internacional)
Na prática, numerosos países não apresentaram
esse número porque essa informação normalmente
não é coletada. Isso levou à utilização de métodos ino-
vadores para estimar esse percentual. Este indicador,
no entanto, não acrescentou nada de significativo às
informações já existentes sobre as taxas de matrícula.
2.6. Algumas conclusões
gerais
Embora nesta seção não se tenha abrangido todas as
atividades e publicações que tratam das medidas e dos
indicadores para a primeira infância, a análise destas
várias atividades nos permite tirar algumas conclusões
gerais:
1. Não existe acordo, em âmbito internacional,
sobre indicadores que permitam monitorar, de
forma satisfatória, os avanços relativos à educação
e cuidado da criança pequena.
2. O monitoramento dos programas destina-
54
Fontes não-formais de informação, tais como, pesquisas domiciliares para saber quantos na casa
estão empregados e/ou sobre o bem-estar familiar freqüentemente geram informações sobre quais
indicadores de ECPI podem ser criados, como, por exemplo, quem cuida das crianças durante o dia
55
dos à criança pequena tende a ser muito limita-
do e incide especialmente sobre os “esforços”,
definidos em termos de população atendida (núme-
ro ou percentual de matrícula). Ocasionalmente,
interessa-se pela qualidade, geralmente avaliando-
se os inputs (p. ex., gastos ou qualificação formal
dos profissionais). Indicadores de “efeitos”, inclu-
sive sobre o estágio de desenvolvimento das
crianças, estão praticamente ausentes do moni-
toramento e da avaliação – nacional ou inter-
nacional – desses programas.
3. Os indicadores raramente são desagregados,
de forma a possibilitar relacioná-los ao grau de
pobreza, aos grupos desfavorecidos ou aos porta-
dores de deficiência (conforme recomendado no
Marco de Ação de EPT).
4. Existem diversas novas iniciativas que podem aju-
dar a melhorar a definição e o uso de indicadores para
os programas destinados às crianças pequenas.
3. Etapas para se
chegar a um conjunto
de indicadores
3.1. Constituir um grupo
intersetorial e interdisciplinar
encarregado de examinar e de
determinar os indicadores que
podem ou deveriam ser utilizados
para monitorar permanentemente
a situação das crianças, os
ambientes que influenciam seu
desenvolvimento e os programas
concebidos para (impactar)
impulsionar o seu desenvolvimento
O ideal seria que este grupo reunisse os responsá-
veis pelo planejamento de programas e pelo monito-
ramento nas áreas de saúde, nutrição, educação,
assistência social e outras que, em determinado país,
reservam um espaço para a primeira infância, tanto
no plano teórico, quanto no administrativo. Ele incluiria
os potenciais usuários da informação, pessoas que co-
letam os dados e aquelas tecnicamente competentes
para efetuar avaliações em campos convergentes. Se o
grupo pudesse funcionar vinculado a uma comissão
nacional para a primeira infância, ou um comitê nacional
de defesa dos direitos da criança, ou algo equivalente
que localmente fizesse sentido, suas recomendações
teriam maior legitimidade e visibilidade. Seria acon-
selhável confiar a responsabilidade de coordenação a
uma instância exterior, talvez a um escritório nacional
de planejamento ou, até mesmo, a uma ONG reconhe-
cida por sua atividade em favor da primeira infância.
Por ocasião de sua primeira reunião, esse grupo
poderia promover uma discussão geral sobre a edu-
cação e cuidado na primeira infância, e o desenvolvi-
Chitral, Pakistan: Aga Khan Foundation/0321-063/Jean-Luc Ray
20
No Brasil, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (1996), as Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação Infantil (1998), bem como grande parte da literatu-
ra especializada na área, apontam para a construção de um
conceito complexo de “educação e cuidado” como um
processo único, indissociável e integrado. Pretende-se superar
as práticas dicotômicas de cuidado como assistência e de
educação como escolarização. Não há como educar senão
cuidando, nem há como cuidar senão educando. A síntese
em um único movimento destas duas dimensões da mesma
realidade tem conduzido à redefinição das propostas
pedagógicas e do perfil dos professores de educação infantil,
tendo importantes reflexos na prática das creches e pré-esco-
las. Está-se começando a forjar, no Brasil, uma nova prática
de educação e cuidado infantil a partir da noção de que elas
são apenas facetas de um mesmo processo de aprendizagem e
desenvolvimento.[Nota do Revisor]
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
mento infantil, segundo as diferentes perspectivas
representadas, à luz do cenário mais amplo do desen-
volvimento social e econômico nacional. Qualquer
discussão sobre os indicadores deverá partir de uma
compreensão comum sobre o que é “educação e
cuidado
20
na primeira infância”, e “desenvolvimento
infantil”, bem como as razões de sua importância.
3.2. Fazer um levantamento dos
atuais sistemas de monitoramento
e de coleta de dados que contenham
informações relevantes sobre os
programas destinados à
primeira infância
Este levantamento poderia ser encomendado antes
da primeira reunião do grupo intersetorial para a pri-
meira infância, como contribuição aos debates iniciais,
ou poderia ser o resultado de uma primeira reunião no
decorrer da qual todos os presentes irão contribuir,
identificando e sugerindo onde buscar tais informações.
No âmbito desse levantamento, recomenda-se que,
para cada fonte de informação, se possa responder a
algumas questões:
– Quais dimensões do bem-estar e do desenvolvi-
mento da criança estão contempladas nas
informações que estão sendo coletadas?
Quais são os indicadores específicos criados a
partir dessas informações?
– As informações nos dizem algo sobre a situação
das crianças, sobre as circunstâncias que
interferem no seu desenvolvimento, sobre o
alcance, a qualidade, a eficiência e o financia-
mento dos diferentes serviços?
– Porque as informações são coletadas? Para
que servem? Poderão ser utilizadas também
para outros fins?
– Que instrumentos são utilizados para a coleta
das informações? Esses instrumentos são
confiáveis e adequados?
– Quem é responsável pela coleta de informação,
tanto administrativamente quanto no lugar
onde será feita a coleta? As pessoas encarregadas
de fornecer/coletar as informações receberam
uma capacitação adequada?
– Em que momento (idade ou estágio de
desenvolvimento) da vida da criança, ou do
programa, as informações são coletadas?
– Junto a quem, ou sobre quem a informação é
coletada? Ela se baseia em uma amostra ou
é coletada para todas as crianças e todos os
programas? Estão incluídas ambas as
modalidades de educação e cuidado – não
formais e formais?
– Com que freqüência a informação é coletada?
– Como a informação é processada, analisada e
disseminada? Para quem?
– Qual é o custo da coleta e da disseminação da
informação?
Fontes O levantamento deveria servir-se de fontes de
informação que, às vezes, não são consideradas quan-
do se pensa nas crianças e nos programas destinados
à infância. Por exemplo, as pesquisas em domicílios
sobre emprego ou sobre o bem-estar das famílias
muitas vezes fornecem informações a partir das quais
é possível criar indicadores para a primeira infância.
Assim, em algumas pesquisas domiciliares pergunta-se
se a criança freqüenta, durante o dia e fora de casa,
algum programa. Esta informação pode fornecer um
dado mais preciso sobre os serviços utilizados,
porque ela permite incluir serviços não oficiais e não
autorizados. Semelhante fonte pode permitir ir além
dos simples indicadores e estudar as razões pelas
quais, em função de suas próprias características, as
famílias utilizam, ou não, os serviços. Estas pesquisas
podem também fornecer informações sobre os
“fatores de risco” relacionados à primeira infância.
Outras possíveis fontes para a criação de indi-
cadores podem ser os dados censitários; orçamentos
nacionais ou setoriais; planos nacionais; estatísticas
de matrícula educacional e da assistência social;
dossiês médicos ou uso de diferentes serviços, desde
a gravidez até o ingresso da criança na escola; cartões
de saúde e de nutrição; sistemas de monitoramento
de programas e projetos; avaliações realizadas no
momento do ingresso no ensino compulsório; avalia-
ções de projetos; pesquisas especiais e projetos de
pesquisa. Os leitores vão certamente se lembrar de
outras possíveis fontes.
Dependendo da situação, este levantamento pode
produzir uma abundância de dados ou muito poucos.
Entretanto, mesmo onde não há tradição de monitora-
mento de programas e onde os sistemas de coleta de
informações são rudimentares ou informais, pode-se
tentar identificar fontes que não foram bem utilizadas
e que, com relativamente pouco esforço, poderiam ser
aperfeiçoadas e modernizadas. Por exemplo, muitos
programas coletam informações para fins burocráticos
internos (sobre o número de crianças, quadro de pes-
soal, etc.), que são enviadas para o nível central; mas
que, depois dessa análise interna, são arquivadas ou
depositadas em “arquivo morto”, sem considerar outras
finalidades mais amplas para as quais seriam úteis.
3.3. Escolher os indicadores: com
informações ào e com
clareza de propósitos, o grupo
intersetorial deve selecionar os
indicadores desejáveis
Diante de interesses tão diferentes, não será fácil
saber com clareza o que se pretende e será necessário
definir compromissos. O que pode ocorrer é que se
chegue à recomendação de um amplo conjunto de
indicadores, concebidos para servir a muitos fins e/
ou conciliar diversos interesses. Ora, deve-se fazer
um esforço para limitar o número de indicadores, não
só porque o custo da coleta de informações ameaça
tornar inaplicável o sistema de monitoramento pro-
posto, mas também porque um número reduzido
de indicadores bem selecionados apresenta melhores
condições de ser aceito e aplicado do que um vasto
leque de indicadores.
Ao selecionar indicadores, várias questões deverão
ser consideradas:
– Os indicadores permitem monitorar os objetivos
e os programas específicos destinados à
primeira infância?
– Eles são claros e compreensíveis?
– Podem ser desagregados, por categorias
(p. ex., gênero, urbano-rural, público-privado,
estratos econômicos ou sociais, serviços
administrativos)?
– Podem ser aplicados ao longo do tempo?
– Abordam diferentes aspectos do cuidado e
educação da primeira infância e do desenvolvi-
mento infantil, e as diferentes faixas etárias?
– Os indicadores são operacionais?
3.4. Determinar o que é preciso
fazer para tornar operacional
o conjunto de indicadores
propostos
Esta etapa consiste em comparar o que já existe
com o que se deseja obter. Ela implica revisitar as
várias questões levantadas pelo estudo das fontes
existentes, a fim de determinar a forma de aperfeiçoar
os sistemas atuais, ou seja, os instrumentos utilizados,
assim como os sistemas de coleta, de processamento
e de disponibilização da informação (incluindo o
treinamento das pessoas que divulgam a informação),
e qual o seu custo.
Será necessário decidir a(s) idade(s) das crianças a
partir da(s) qual(is) as informações serão coletadas:
no nascimento? Aos 3 anos? Ao ingressarem na escola?
Essas decisões sobre a idade para a qual serão criados
os indicadores dependerão dos objetivos definidos
e da maneira como são organizados os serviços e os
56
57
programas em favor das crianças pequenas. Por exem-
plo, argumenta-se em favor da coleta de informações
no momento do ingresso no ensino compulsório.
Nesse importante momento de transição para muitas
crianças, um indicador pode refletir tudo o que tenha
exercido influência sobre o seu desenvolvimento ante-
rior e pode servir como linha de base para a avaliação
posterior da criança nos primeiros anos do ensino
compulsório.
Será necessário também, sem dúvida, indicar com
precisão o que constitui um programa para a primeira
infância. Uma breve análise dessa questão encontra-
se no Anexo 1 (“Em que consiste um programa para
a primeira infância?”).
No caso de alguns indicadores, pode ser aconselhá-
vel trabalhar com uma amostra de crianças, em vez
de toda a população. Uma amostra bem escolhida
permite tirar conclusões para a população como um
todo e, ao mesmo tempo, reduz os custos da coleta.
A amostragem pode ser simplificada pela utilização
de cadastros amostrais criados para outros fins, por
exemplo, para pesquisas sobre emprego ou renda
(caso da Jamaica, disponível na Coordinators’ Notebook
em língua inglesa). Pode-se utilizar também uma
amostra de crianças no momento de ingresso no ensino
compulsório, aproveitando os dados coletados para
toda a população em um determinado momento e, ao
mesmo tempo, coletando informações adicionais so-
bre um pequeno grupo de crianças, escolhidas aleato-
riamente.
Utilizando uma amostra, as avaliações sobre as
crianças poderão ser efetuadas por pessoal mais
bem capacitado, de maneira que os resultados serão
rigorosos e confiáveis, o que seria mais difícil se
a coleta abrangesse todas as crianças. Além disso,
a coleta de informações de uma amostra de crianças
permite evitar os “rótulos”, isto é, a caracterização
de determinadas crianças como atrasadas. Foi pen-
sando neste problema que o Grupo de Especialistas
sobre Metas Nacionais de Educação dos Estados
Unidos [National Educational Goals Panel in the United
States] sugere, até mesmo, a utilização da técnica
chamada matriz de amostragem, em que cada criança
responde unicamente a uma parte do teste ou do
protocolo; e, em seguida, todas as informações cole-
tadas são reunidas para análise.
Para algumas dimensões do cuidado e do desen-
volvimento infantil, a utilização de instrumentos de
coleta de dados pode não ser um problema. Assim,
na maior parte dos casos, há uma concordância não
só em relação aos indicadores de saúde e nutrição
que devem ser utilizados para monitorar a situação
geral das crianças pequenas, mas também em relação
aos instrumentos específicos a serem aplicados para
atingir aquele objetivo. Todavia, não é assim tão fácil
chegar a um acordo sobre as dimensões psicossociais
do desenvolvimento infantil, nem de torná-las opera-
cionais. Realmente, é necessário um grande esforço
para se chegar a um acordo sobre como coletar infor-
mações que venham a produzir indicações sobre os
progressos no desenvolvimento da criança, em re-
lação, por exemplo, ao desenvolvimento cognitivo,
ao desenvolvimento da linguagem e da socialização,
considerados na perspectiva geral do desenvolvimen-
to humano, ou, de forma mais restrita, na perspectiva
da preparação para o ensino compulsório
21
.
Tudo isso pode parecer um tanto difícil, mas é bom
lembrar que um estudo conduzido pela Childwatch,
que analisou a possibilidade de criar indicadores para
monitorar a aplicação da Convenção sobre os Direitos
da Criança, concluiu que na maior parte dos casos:
– é possível modificar a coleta de dados com
baixo custo;
– existem muitas informações e o principal proble-
ma consiste em reuni-las e harmonizá-las;
– é possível utilizar os centros de coleta de dados
já existentes, tais como escolas, hospitais e
“observatórios”.
Para maiores informações, ver o website do projeto:
www.childwatch.uio.no/cwi/projects/indicators/index.html
Além disso, pode-se citar o exemplo do Nepal, onde
um comitê da primeira infância, não encontrando
um número suficiente de informações, decidiu criar
seus próprios instrumentos e testá-los para utilizá-
los, mais tarde, em todo o país.
Uma outra etapa poderia consistir em redigir uma
proposta a ser apresentada a determinados grupos
interessados, assim como às fontes de recursos
nacionais e internacionais, de forma que o processo
de criação do sistema desejado de indicadores possa
ser posto em prática. Poderá ser necessário também
proceder a um certo controle dos instrumentos e
das medidas.
4. Um conjunto de
possíveis indicadores
Não sem reservas, apresenta-se, a seguir, um con-
junto de dezesseis indicadores a serem levados em
consideração no debate sobre os indicadores que
poderiam ser utilizados para o monitoramento dos
programas destinados à primeira infância em âmbito
nacional, com fins de sensibilização da opinião pública
[advocacy] e de planejamento. Não se trata de reco-
mendar sua aplicação imediata; são instrumentos que
21
Na publicação original de “Coordinators´ Notebook”,
assim como na versão em língua francesa, são analisadas
fontes úteis para se chegar a um acordo sobre os instrumentos
e as medidas a serem utilizados para monitorar o desenvolvi-
mento psicossocial (estudos de Grigorenko, de Sternberg e
de Shepard, Kagan e Wurtz).[Nota do Revisor]
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
58
servem para alimentar um debate que conduza à
definição de um conjunto de indicadores adequados
a cada situação específica. Nossas reservas provêm
de experiências anteriores quando se tomou esse con-
junto de indicadores como ponto de partida para o
debate sobre o projeto de indicadores do Grupo
Consultivo. A apresentação dos mesmos parece ter
sugerido uma posição pré-definida no debate, o que
limitou a busca de alternativas.
Os dezesseis indicadores possíveis são organizados
nas seguintes categorias:
4.1. Cobertura e acesso
4.2. Qualidade do programa
4.3. Compromisso político: políticas e financia-
mento
4.4. Custos e gastos
4.5. Efeitos dos programas sobre as crianças e os
pais
4.1. Cobertura e acesso
Indicador 1. Taxa bruta de matrícula: taxa
bruta de matrícula em programas destinados
à primeira infância, expressa em percentual
do grupo de idade considerado, em um dado
ano
Por que criar este indicador?
Em partes anteriores deste artigo, criticou-se a manei-
ra como este indicador está sendo internacionalmente
utilizado. Entretanto, o indicador tem valor por revelar
a medida em que uma sociedade oferece serviços para
a primeira infância. A suposição é de que, ao participar
desses programas, as crianças têm uma experiência
agradável, que também as prepara melhor para a
escola e para a vida. Teoricamente, então, quanto mais
próxima de 100% for a taxa de cobertura, tanto melhor.
É importante, no entanto, qualificar essa interpretação,
porque nem todas as crianças, em todas as idades,
vão necessariamente precisar ou tirar proveito por
participar de um programa. Além disso, alguns pro-
gramas são de tão baixa qualidade que podem ser
prejudiciais às crianças que os freqüentam. Portanto, é
imperativo que este indicador quantitativo seja com-
plementado por indicadores de qualidade.
Provavelmente, a distribuição dos serviços para a
primeira infância em uma sociedade será desigual,
favorecendo, em geral, áreas urbanas, grupos sociais
dominantes e famílias mais abastadas. A utilização
dos serviços pode também variar segundo o gênero.
Ao desagregar os dados e ao considerar os indicadores
por subgrupos de população, deveria ser possível reve-
lar essas variações e, assim, tanto apoiar os esforços de
sensibilização da opinião pública [advocacy], quanto
incentivar a busca de ações apropriadas, que ajudem
a equilibrar a distribuição dos serviços.
Se o indicador de cobertura for acompanhado lon-
gitudinalmente (particularmente para os subgrupos
de população desagregados por idade e, talvez, por
outras características), será possível determinar onde
a sociedade está concentrando seus maiores esforços,
em direção a quais tipos de programas ela se orienta e
quais são os beneficiários.
Se o dado puder ser desagregado por idade, será
possível comparar os indicadores dos diferentes países.
Quando tais indicadores de matrícula são relacionados
aos indicadores de contexto, como o PIB per capita,
é possível verificar se um país específico está se esfor-
çando para ofertar serviços à altura do que dele se
espera, considerando os recursos de que dispõe.
Quais informações são necessárias para calcular este indi-
cador?
1. A soma do número total de crianças de diferentes
idades (até a idade de ingresso no ensino compul-
sório), que freqüentam programas destinados à
primeira infância que respondam aos critérios
de idade e de organização que definem um pro-
grama.
2. Uma contagem atualizada da população que
indique o número de crianças em cada uma das
categorias de idade relevantes: 0, 1, 2, 3, etc.
Fontes O dado sobre a matrícula pode ser fornecido
pelos vários ministérios responsáveis pelos progra-
mas destinados à criança pequena. Os dados relativos
à população serão provenientes de censos ou de
pesquisas nacionais recentes. A partir das pesquisas
em domicílio, será também possível obter os dados
sobre freqüência; neste caso, a pesquisa deverá conter
perguntas tais como: “Seu filho está sendo cuidado ou
educado por alguém fora de casa? (Regularmente? Ou
por um período de no mínimo três horas por dia?)”;
e “Em caso afirmativo, por quem?” (com uma lista das
alternativas mais previsíveis).
Com essas duas questões, torna-se possível conhe-
cer as modalidades de atendimento não-formais (ou
que estejam fora do sistema formal), tanto quanto a
freqüência no sistema formal, segundo diferentes
opções. Seria possível, também, calcular um indicador
de utilização de serviços para cada grupo de idade e ou
ainda desagregar os dados segundo as características
econômicas e sociais das famílias.
Este indicador foi detalhadamente analisado porque
é o mais utilizado em programas destinados à primeira
infância. Ao mesmo tempo, ele raramente é calculado
de maneira precisa e, em geral, não é desagregado por
idade. Espera-se, assim, aperfeiçoar seu cálculo.
Indicador 2. Educação de pais. Número de
crianças, cujos pais participam de progra-
mas de educação sobre a primeira infância,
expresso em percentual do grupo de popu-
lação correspondente
Por que criar este indicador?
Os programas de educação de pais complementam
os serviços destinados diretamente às crianças e podem
59
ser muito efetivos, impactando o desenvolvimento e
a aprendizagem da criança. Para a definição das polí-
ticas, do planejamento e das ações de sensibilização
da opinião pública [advocacy], é instrutivo verificar se
determinada sociedade fixa suas prioridades na edu-
cação dos pais ou na oferta de serviços, e como essas
diferentes estratégias evoluem no tempo. Observa-se
uma tendência atual, em alguns países, de expandir ra-
pidamente a educação dos pais, a fim de se atribuírem
o mérito de agir em favor da primeira infância e, ao
mesmo tempo, de negligenciar a oferta concreta de
serviços. Por exemplo, no México, a cober-tura dos
programas de educação dos pais de crianças com
idade inferior a quatro anos aumentou em 95%
durante os últimos cinco anos, enquanto verificou-se
apenas uma expansão de 12% dos programas desen-
volvidos em espaços especialmente destinados à
primeira infância.
Quais informações são necessárias para calcular este indicador?
1. O número de crianças (do nascimento até o
ingresso no ensino compulsório), cujos pais ou
pessoas que delas cuidam estão matriculados
em programas de educação de pais.
Em cada país, será necessário decidir sobre os
critérios a serem aplicados para definir quais pro-
gramas de educação de pais incluir (p. ex., o número
de horas ou a freqüência das reuniões, ou a entrega
de certificado, de acordo com um sistema pré-deter-
minado). Pode fazer sentido, incluir, na categoria dos
programas de educação de pais, os programas que
permitem que o professor/educador(es) se reúna(m)
freqüentemente com os pais (uma vez por semana ou
de 15 em 15 dias), durante determinado período de
tempo, perfazendo, por exemplo, no mínimo vinte
sessões com duração de, no mínimo, uma hora cada.
Certamente vinte horas de educação de pais não são
suficientes e esse teto talvez devesse ser elevado.
Não está claro se os tipos de programa indicados a
seguir , por vezes qualificados como “educação de
pais”, devem ser incluídos; nossa inclinação seria
deixá-los de lado.
– Mensagens televisivas sobre cuidados com a
criança e sobre o desenvolvimento infantil, assis-
tidas pelos pais.
– Séries de TV sobre essas questões (a menos que
estejam relacionadas a um debate que reúna,
periodicamente, as pessoas para a análise de seu
conteúdo, e que essas séries se prolonguem por, no
mínimo, 20 sessões).
– Cursos matrimoniais para os pais.
Consultas informais dispensadas pelos profissionais
de saúde.
Palestras organizadas em centros de saúde cujo
tema sejam apenas a imunização, a diarréia e
outras questões relativas a doenças. Entretanto,
se fizerem parte de um conjunto sistemático e
integrado de debates e reuniões periódicos, que
tenham uma duração mínima de vinte horas, essas
palestra devem ser incluídas.
O leitor deve observar que este indicador é expres-
so pelo número de crianças, cujos pais ou pessoas que
delas se ocupam estão inscritos em programas, e não
pelo número desses pais ou pessoas. Isto situa o indica-
dor fora do campo da educação de adultos, e o coloca
no da primeira infância.
Para calcular o número de crianças potencialmente
beneficiadas pela educação de pais, será provavelmente
necessário estimar (ou determinar a partir dos dados
de censos) o número de crianças indiretamente bene-
ficiadas, multiplicando-se o número de adultos matri-
culados no programa pelo número médio de crianças
com menos de seis anos de idade por família. Se, por
exemplo, um programa tem 400.000 pais e pessoas
que se ocupam das crianças matriculados e a média de
crianças pequenas é de 1,3 por família, o número total
de crianças será 520.000.
2. A população de crianças no grupo relevante.
Uma outra razão pela qual este indicador deve
referir-se às crianças e não tanto aos adultos é a difi-
culdade de definir, para estes últimos, o “grupo de
população relevante”. Pode por exemplo ocorrer que a
educação de pais seja ministrada a adolescentes que
ainda não têm filhos (mas podem estar cuidando de
crianças pequenas ou terão essa responsabilidade no
futuro). Os programas podem, também, incluir os avós
ou outros membros da família que no momento não
têm crianças pequenas, mas que são responsáveis pelo
cuidado e educação das crianças na família ampliada.
Focando nas crianças e supondo que cada pessoa
inscrita em um programa de educação de pais tenha
crianças sob sua responsabilidade, pode-se tomar por
base o número total de crianças pequenas na popu-
lação, à semelhança do que foi feito para o primeiro
indicador.
Entretanto, os programas de educação de pais
freqüentemente têm um público-alvo; assim, trata-se
de dirigir tais programas não a todas as crianças em
determinada sociedade, mas, sobretudo, às crianças e
famílias pertencentes a certas categorias (rural, pobre,
ou outra). Neste caso, mantendo a coerência, a popu-
lação relevante deveria ser o grupo específico de crian-
ças nas famílias que apresentem aquelas características.
Fontes A principal fonte de informação para este
indicador serão as pesquisas periódicas de programas
destinados aos pais, realizadas pelos órgãos adminis-
trativos competentes.
4.2. Qualidade do Programa
“Qualidade” é um conceito vago. A lista abaixo apre-
senta diversos elementos que, segundo parece,
permitem definir a qualidade de um programa efetivo
de educação infantil. Cada um deles poderia servir
para elaborar um indicador.
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
Os participantes de qualquer processo de criação
de indicadores para a primeira infância são vivamente
incentivados a sugerir outros indicadores, eventual-
mente a partir dos dados existentes e/ou segundo o
que julgam ser mais adequado ao seu contexto especí-
fico, além daqueles que são indicados mais abaixo.
Por exemplo, uma publicação recente da UNESCO
sugeriu os seguintes critérios, que possibilitariam
determinar a qualidade de um programa de educação:
– Freqüência regular e pontual dos professores.
– Freqüência assídua das crianças.
– O professor mantém atualizados os registros
relativos a todas as crianças.
– O professor conhece o nome e o histórico de
todas as crianças.
Tempo despendido em atividades acadêmicas
de nível superior.
– Materiais/Atividades interessantes/adequadas
– Estratégias de aprendizagem participativa.
– Adequação do ensino aos interesses e às
habilidades da criança.
– Emprego do tempo de forma organizada
e planejada.
– Ambiente de trabalho confortável
(temperatura, iluminação).
– Ambiente de aprendizagem atraente.
– Acesso a veículos de comunicação (rádio).
– Regularidade na correção dos
trabalhos dos alunos e rápido retorno.
– Preparação de todas as aulas.
– Direção escolar efetiva.
– Supervisão/apoio profissional regulares.
– Respeito mútuo (professor-aluno, aluno-aluno,
aluno-professor).
– Materiais/Atividades de enriquecimento/
de aceleração ou recuperação.
– Monitoramento regular das aprendizagens
fundamentais.
– Teoria coerente sobre como as crianças aprendem.
Estes critérios foram definidos tendo em mente
mais o ensino compulsório do que a pré-escola, e
supõem a aplicação de um instrumento de observação,
embora possam servir para orientar pessoas-chave
sobre os tipos de indicadores de que necessitariam
para tomar decisões relativas às políticas e à progra-
mação pedagógica.
É comum ouvir dizer que os elementos determi-
nantes da qualidade de um programa são os profis-
sionais de educação e cuidado. Todavia, a habilidade
dos mesmos está condicionada, em certa medida, ao
número de crianças pelas quais são responsáveis. Isso
nos leva a um possível primeiro indicador de qualidade,
que é freqüentemente calculado.
Indicador 3. Número de crianças por
professor/ outro profissional
Por que criar este indicador?
A maior parte dos países estabelece normas relativas
60
ELEMENTOS DE QUALIDADE DOS
PROGRAMAS DE EDUCAÇÃO DES-
TINADOS À PRIMEIRA INFÂNCIA
Elementos que definem a qualidade e têm sido associados com a
efetividade dos programas de educação destinados à primeira
infância incluem o seguinte:
METAS E OBJETIVOS Metas e objetivos claros, bem fundamentados
e compartilhados por professores e pais, compreendidos pelas crian-
ças e suscetíveis de serem modificados através de um processo que
envolva todos os interessados. O caminho que conduz a um entendi-
mento em relação às metas e aos objetivos é, às vezes, mais impor-
tante do que os próprios resultados.
PROFESSORES/EDUCADORES/OUTROS PROFISSIONAIS A presença
contínua de adultos sensíveis, saudáveis, compromissados, afetivos
e responsáveis que, em decorrência de sua experiência e formação,
têm conhecimento sobre o processo de desenvolvimento da criança
e interagem com ela de maneira consistente e respeitosa, ajudando-
a sem lhe causar medo.
CURRÍCULO Um currículo testado que se apóie em uma visão global
do desenvolvimento da criança; que lhe proporcione uma variedade
de experiências significativas de aprendizagem, estimulantes e
prazerosas, para que ao mesmo tempo ‘crie raízes e aprenda a voar’;
que estimule as crianças a brincar, explorar e iniciar suas próprias
atividades de aprendizagem; e que respeite e responda às diferenças
individuais. Um currículo de qualidade integra educação e cuidado,
respondendo às necessidades físicas, sociais e emocionais das
crianças, bem como às suas necessidades de desenvolvimento cogni-
tivoe intelectual. Além disso, deve favorecer relações saudáveis
da criança consigo própria, com os outros e com o meio ambiente.
ESPAÇO FÍSICO Um ambiente limpo, arejado, estimulante, seguro
e saudável, que ofereça espaço suficiente para que as crianças
possam brincar.
AVALIAÇÃO Utilização de métodos de avaliação sistemáticos,
validados pelos professores/outros profissionais/educadores e pais,
que visem adequar o ensino às necessidades das crianças.
NÚMERO DE CRIANÇAS POR ADULTO Número suficientemente baixo
para permitir uma freqüente interação e uma atenção pessoal,
quando necessário.
CAPACITAÇÃO E SUPERVISÃO Capacitação em serviço adequada
e apoio da supervisão, fomentando um contínuo crescimento profis-
sional e pessoal.
DIREÇÃO DO PROGRAMA Uma direção clara, que empregue muito
tempo na coordenação e gerenciamento, mantendo-se, ao mesmo
tempo, próxima do processo cotidiano de educação e de socialização
das crianças.
PARTICIPAÇÃO DOS PAIS E DA COMUNIDADE Envolvimento e partici-
pação reais das famílias e das comunidades como parceiros do
Programa, ajudando a estabelecer normas apropriadas, a funcionar
bem e a adaptar o atendimento às condições e necessidades locais,
enquanto, ao mesmo tempo, famílias e comunidades aprendem a
melhorar a atenção prestada às crianças pequenas.
RECURSOS Uma quantidade de recursos materiais e financeiros
consistente e permanente, suficiente para permitir trabalhar, de
maneira adequada, com as crianças e de promover atividades
educacionais, de forma que os professores não se desviem de
sua tarefa primordial de educar crianças.
Fonte: Ball, 1994; Moss and Pence, 1995; Schweinhart, 1995; NAEYC,
1986; Basili, 1994.
61
à razão crianças/professor ou crianças/profissional
que se ocupa das crianças. Essas normas geralmente
diferem em função da faixa etária. Parte-se da hipótese
de que é preferível ter um número menor de crianças
por professor porque isso permite que o adulto preste
atenção mais individualizada às crianças, o que,
presume-se, asseguraria uma melhor aprendizagem
e desenvolvimento. Um número muito grande de
crianças por professor tende a restringir as atividades
individualizadas, exigindo do educador uma atenção
concentrada no controle e manejo do grupo, ao invés
de favorecer a aprendizagem das crianças através
da exploração e da atenção às suas necessidades indi-
viduais.
Advertência Este indicador pode fornecer um bom
resultado para a avaliação de programas específicos; no
entanto, para que ele tenha significado no âmbito de um
sistema, é necessário desagregá-lo pela idade da crian-
ça atendida e/ou por tipo de programa, porque as
normas diferem por idade, variando de um adulto para
cada quatro ou cinco crianças de 1 ano de idade, até um
adulto para cada vinte e cinco crianças de 5 anos de
idade. Se todas as crianças são consideradas, indepen-
dentemente de sua idade, e se esse total for relacionado
ao número de adultos, a média resultante será de difícil
interpretação. Isso será menos freqüente se o número
de alunos puder ser classificado segundo o tipo de
programa, procedendo, ao mesmo tempo, à distinção
entre as pré-escolas – destinadas às crianças entre 4
e 5 anos de idade – e os programas destinados especi-
ficamente às crianças com menos de 4 anos.
Quais informações são necessárias para criar este indicador?
1. O número de crianças freqüentes em programas
destinados à primeira infância.
O ideal seria indicar o número de crianças por faixa
etária. Será provavelmente difícil empreender a operação
de relacionar, diretamente e de forma a produzir signi-
ficado, o total obtido ao número de adultos respon-
sáveis por aquelas crianças. Entretanto, caso sejam
realizadas pesquisas periódicas em determinadas insti-
tuições, pode-se tentar obter essa informação recorren-
do aos dados no “momento zero”. Outra solução seria
classificar as crianças por tipo de programa, buscando
distinguir as pré-escolas, que atendem crianças nos anos
que precedem imediatamente seu ingresso na escola
(em geral, as crianças de 4 e 5 anos de idade), dos pro-
gramas que enfatizam a atenção às crianças pequenas.
2. Número de professores/outros profissionais que
atuam diretamente com as crianças, segundo a faixa
etária das crianças.
Segundo as Diretrizes Técnicas de EPT, os professores
são “pessoas que, no exercício de sua profissão, servem
de guia e orientam as experiências de aprendizagem
dos alunos de forma a possibilitar a aquisição de
conhecimentos, de atitudes e de competências esti-
puladas em uma proposta pedagógica específica”. Se
essa definição fosse aplicada, todos os professores
que não possuem a necessária qualificação profissional
seriam excluídos, assim como todas as instituições que
não seguem a proposta pedagógica definida. Não
está claro se os auxiliares dos professores deverão ser
incluídos. Essas decisões têm de ser tomadas, para
se chegar ao número total de professores/outros profis-
sionais que atuam diretamente com as crianças pequenas.
Supõe-se que o pessoal administrativo e de supervisão
não deva ser incluído (a menos que desempenhe um
duplo papel, e também exerça a função de professor).
Em nossa opinião, para calcular este indicador,
dever-se-ia contar todos os adultos que atuam direta-
mente com as crianças, porque muitos sistemas con-
tratam um grande número de adultos não titulados
que, entretanto, são capazes de dispensar muita
atenção e afeto às crianças, além de favorecerem a
aprendizagem que irá ajudá-las em seu desenvolvimen-
to. A titulação será objeto de outro indicador.
Fontes A principal fonte de informação para este
indicador virá das pesquisas periódicas efetuadas nas
várias instituições que atendem as crianças de 0 a 6
anos, promovidas pelos serviços administrativos
competentes.
Indicador 4. Qualificação de professores.
Percentual de professores/outros profissionais
qualificados que atuam diretamente com as
crianças
Por que criar este indicador?
Em geral, pressupõe-se que professores ou outros
profissionais que atuam diretamente com as crianças
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
New Delhi, India: Aga Khan Foundation/0248-067/Jean-Luc Ray
O processo de revisão, desenvolvimento e
testagem de indicadores de campo ajuda na
construção de uma base para as discussões
multissetoriais, envolvendo as áreas de saúde,
educação e bem-estar social
mais bem qualificados dispensarão uma melhor
atenção a elas. Os países freqüentemente orgulham-se
de terem um alto percentual de professores qualifi-
cados. Este indicador é sugerido como forma de avaliar
o grau de formação do pessoal que trabalha nos pro-
gramas, e de ocasionalmente indicar o tipo de prepa-
ração adicional que será necessária.
Advertência Freqüentemente, uma pessoa “melhor
qualificada” é definida tendo como parâmetro a sua
titulação; usualmente, faz-se referência a um nível de
escolaridade que indica a conclusão de um curso
específico de educação infantil, ou à obtenção de um
certificado comprovando que um certo número de
critérios foi satisfeito. Embora no geral isso seja ver-
dade, sabe-se que a qualificação formal não garante,
por si, bons professores; a falta de experiência, a fraca
motivação, o descontentamento com a baixa remunera-
ção e a falta de autoconfiança, entre outros motivos,
podem impedir que os diplomados se tornem bons
professores. Sabe-se também que, em todo o mundo,
muitos professores e profissionais sem qualificação
colocam seus conhecimentos, sua experiência e sua
dedicação a serviço da primeira infância, de tal modo
que acabam influindo mais na vida das crianças do que
muitos professores formados ou diplomados. Final-
mente, é possível prover cuidados de qualidade ao
associar um pessoal altamente qualificado e experiente
com auxiliares ou assistentes competentes que, embora
não formalmente qualificados, estejam sendo capaci-
tados em serviço.
Por essas razões, as qualificações dos professores
constituem, na melhor das hipóteses, um indicador de
qualidade bastante aproximativo que, em certos casos,
pode até mesmo não ser especialmente válido ou útil,
a menos que a definição de qualificação vá além do
diploma de certificação oficialmente reconhecido,
incluindo, além do processo de certificação padrão,
a experiência adquirida e os cursos de capacitação
freqüentados.
Quais informações são necessárias para criar este indicador?
1. Número de pessoas com qualificação.
Antes de tudo, deve ser definido o que significa
“ser qualificado”; em seguida, devem ser coletadas
informações a fim de determinar o número de profis-
sionais que atuam diretamente com as crianças (staff),
que satisfazem os critérios dessa qualificação.
2. Número total de professores/outros profissionais
que atuam diretamente com as crianças.
Por ocasião da análise do indicador nº 3, sugeriu-se
utilizar uma definição suficientemente ampla de
“profissionais que atuam diretamente com as crianças”,
de forma a incluir todos os adultos diretamente
responsáveis pelas crianças em determinado programa.
Fontes A principal fonte de informação para este indi-
cador virá das pesquisas efetuadas em instituições que
desenvolvem programas para a primeira infância, pro-
62
movidas pelos serviços administrativos competentes.
Indicador 5. Ambiente físico
Neste aspecto, não será sugerido nenhum indicador
específico; no entanto, aqueles que quiserem podem
entrar num acordo sobre um indicador de qualidade
do ambiente físico, que seja apropriado ao contexto.
Existe uma grande variedade de instrumentos que per-
mitem proceder a essa avaliação em função de fatores,
tais como o espaço disponível por criança, as pre-
cauções de segurança tomadas, a existência de insta-
lações sanitárias limpas e funcionais, a disponibilidade
de água potável, etc.
Para este indicador, a principal fonte de informação
será proveniente, provavelmente, de pesquisas perió-
dicas efetuadas em instituições que desenvolvem
programas para a primeira infância, promovidas pelos
serviços administrativos competentes. Entretanto,
pode ser necessário promover uma pesquisa especial
(p. ex., como foi feito na Namíbia)
22
.
Indicador 6. Currículo e interação
Provavelmente, o melhor indicador de qualidade
dos programas destinados à primeira infância seria um
indicador que captasse a qualidade da interação entre
adultos e crianças em instituições de educação e cuida-
do da criança pequena. Para tanto, seria necessário
proceder a observações sistemáticas em uma amostra
de diferentes tipos de programas. Um exemplo de
estudo que fornece esse tipo de dado é a pesquisa do
IEA sobre a educação pré-primária, que utilizou o
mesmo questionário em instituições de educação e
cuidado de 15 países. Além de medir a percentagem
de tempo em que as crianças estão interagindo com
adultos ou com outras crianças, o estudo produz infor-
mações sobre alguns aspectos da proposta pedagógi-
ca, tais como: 1) a variedade dos tipos de atividades
das quais as crianças participam e a estrutura de grupo
proposta pelo professor; 2) quem propõe a atividade
da qual a criança participa (a criança ou o professor);
e 3) percentual de casos observados em que os pro-
fessores escutam as respostas ou comentários das
crianças
23
. Embora tais observações sejam bastante dis-
pendiosas e demoradas, o esforço pode valer a pena.
Obviamente, o exposto acima não esgota todas as
possibilidades de elaboração de indicadores de quali-
dade. Por exemplo, pode-se também julgar a qualidade
dos programas em função dos efeitos que eles têm
sobre as crianças. Os efeitos serão tratados mais adiante,
em uma categoria distinta.
22
Para conhecer esta experiência, remeter-se à publicação
em inglês.[Nota do Revisor]
23
O estudo do IEA sobre a educação pré-primária foi
conduzido pela High/Scope Educational Research Foundation
(Fundação de Pesquisas Educacionais Avançadas).
63
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
O Projeto de Educação Pré-Primária do
IEA [
The IEA Preprimary Project
]
24
é um
estudo comparativo inovador, realizado
em três fases e em países de quatro conti-
nentes, sobre os serviços destinados à
primeira infância. Seu objetivo é identi-
ficar os espaços em que as crianças
pequenas de diferentes países passam o
tempo, avaliar a “qualidade de vida” das
crianças nestes espaços e verificar
como esses espaços afetam o desen-
volvimento intelectual, social e escolar
das crianças com 7 anos de idade. A idéia
desse estudo emergiu das mudanças
sociais, econômicas e demográficas que
ocorreram nas últimas três décadas, que
levaram ao aumento da demanda por
serviços destinados às crianças pequenas,
obrigando, por conseguinte, os países a
buscar informações mais completas, com
o intuito de responderem às necessidades
emergentes das famílias.
Com certeza, os países precisam de
informações sobre a qualidade das
experiências vivenciadas pelas crianças
pequenas nas diferentes modalidades de
atendimento e sobre os efeitos dessas
experiências em seu desenvolvimento
futuro. Tais informações podem ajudar
os quadros dirigentes a elaborar progra-
mas que atendam à crescente demanda
por serviços destinados às crianças
pequenas, além de colaborar com os
órgãos de governo em suas tentativas de
integrar o planejamento dos programas
em favor da primeira infância com outros
aspectos do planejamento social e
econômico de longo prazo.
Pontos fortes do Projeto
Um dos pontos fortes do Projeto é
que os 15 países participantes
25
disponi-
bilizam informações sobre várias
questões, dentre as quais: forma de
governo, população e estágio de desen-
volvimento. Como esses países em geral
não apresentam taxas de mortalidade
infantil muito elevadas, podem conse-
qüentemente deixar de lado as preocu-
pações com a sobrevivência das crianças
e se empenharem em lhes ofertar serviços
de educação e cuidado adequados.
Outro ponto forte do estudo é que ele
se beneficia da cooperação e das valo-
rosas contribuições de pesquisadores
especialistas da primeira infância, nos
países participantes, assim como de um
centro de coordenação, que normalmente
está vinculado a uma universidade ou a
um órgão de governo. Além disso, o proje-
to é dirigido por uma pessoa que conhece
bem os serviços locais em favor da
primeira infância, os aspectos organiza-
cionais das instituições locais voltadas
para a primeira infância e as principais
características culturais ou étnicas dos
países estudados. Um importante ponto
forte é a participação dos coordenadores
nacionais da pesquisa em todos os está-
gios de elaboração e de implementação
desse projeto de cunho internacional e,
sobretudo, da elaboração de todos os
instrumentos necessários – entrevistas,
questionários, protocolos e roteiros de
observação e avaliação do estágio de
desenvolvimento das crianças.
A FASE 1 (1986-1994) permitiu
conhecer as características das políticas
nacionais de educação e cuidado da
primeira infância (ECPI) (Olmsted e
Weikart, 1989) e partir de uma pesquisa
domiciliar para identificar e caracterizar,
nos diferen-tes países, as principais
modalidades de atendimento utilizadas
pelas famílias para a educação e cuidado
das crianças pequenas (Olmsted e
Weikart, 1994).
Situação atual
: fase con-
cluída.
NA FASE 2 (1989-2000), lançou-se
mão de um amplo leque de dados de
observação (para informações mais deta-
lhadas, ver mais adiante) e de entrevistas
para analisar, em cada país, o emprego
do tempo, as características interativas
e estruturais das principais modalidades
de serviços para as crianças e para
explorar os efeitos dos programas e dos
fatores familiares sobre o estágio de
desenvolvimento das crianças de quatro
anos de idade. Quatro monografias apre-
sentarão as conclusões das pesquisas
efetuadas no decorrer da fase 2:
Opinião dos professores e pais sobre
as dimensões mais importantes do
desenvolvimento das crianças peque-
nas (Weikart, 1999)
.
Características do espaço físico das
modalidades de atendimento desti-
nadas à primeira infância (no prelo em
2000).
Conclusões das observações realiza-
das nas instituições e estabelecimentos
destinados à primeira infância
Estágio de desenvolvimento das
crianças com 4 anos de idade e
relação entre esse fator e as caracte-
rísticas do ambiente familiar
Situação
A primeira monografia já foi
publicada e a segunda deverá estar con-
cluída em 2000; continuam os trabalhos
referentes às outras duas.
NA FASE 3 (1993-2000) o projeto será
finalizado, documentando a maneira
como essas experiências vivenciadas na
primeira infância afetam o desenvolvi-
mento das crianças de 7 anos de idade,
ou seja, uma idade em que todas as
crianças dos países participantes já
terão tido, no mínimo, um ano de escolari-
dade obrigatória. O objetivo dessa fase
final é analisar as relações entre as
experiências vivenciadas aos 4 anos de
idade em programas para a primeira
infância, e o desenvolvimento cognitivo,
da linguagem, social e escolar aos 7 anos
de idade – todos eles fatores relevantes
para o desempenho e sucesso no ensino
compulsório.
Situação
: A coleta dos dados da fase
3 foi concluída.
Elaboração dos instrumentos
necessários à fase 2
Por ocasião da elaboração dos instru-
mentos de observação, os grupos de
coordenadores da pesquisa trabalharam
para assegurar que seus resultados não
tivessem relação direta com o estágio de
desenvolvimento de um país, ou com o
nível socioeconômico das crianças que
freqüentavam os diversos serviços.
De comum acordo, eles decidiram tam-
bém que, para fazer comparações des-
O Projeto de Educação Pré-primária do IEA: Estudo
Comparativo dos Programas destinados à Primeira Infância
em 15 Países
os países possuem uma política de educação. Alguns
países têm políticas que relacionam os cuidados com
a criança ao trabalho feminino (ou ao trabalho de
membros da família); outros incorporam a educação
de pais nos planos de ação de educação e/ou de
saúde; outros ainda possuem uma política e um plano
de nutrição e de alimentação. No entanto, é raro que
todos esses elementos estejam reunidos em uma polí-
tica e em um plano únicos, especificamente dirigidos
às crianças pequenas. Por conseguinte, pode ser difícil
elaborar um indicador significativo que capte, de uma
forma geral, o compromisso com a primeira infância.
Os participantes podem querer debruçar-se sobre
as atuais políticas para verificar se existe alguma que
responda a um certo número de critérios considerados
essenciais para toda boa política, usando-os como um
indicador que permite medir se um país está em vias
de atingir o objetivo de uma boa política em favor da
primeira infância.
Indicador 8. Financiamento. Percentual do
orçamento da educação destinado ou gasto
com programas para a primeira infância
Por que criar este indicador?
Quando a maior parte dos programas para a primeira
infância é confiada ao setor Educação, este indicador
pode ser bastante útil; se tal implementação é distri-
buída entre numerosos órgãos, o indicador pode não
ser tão pertinente. A título de exemplo, na Jamaica foi
possível mostrar que apenas 2% do orçamento da
64
critivas entre os vários tipos de
serviços, os sistemas de observação
final deveriam ser igualmente adequados
a todas as modalidades de serviços des-
tinados às crianças (isto é, tanto a um
programa de educação pré-escolar na
zona urbana da Bélgica, quanto a um
grupo informal de crianças confiadas ao
cuidado de alguém em uma zona rural da
Tailândia). Conseqüentemente, os coor-
denadores concentraram sua atenção
mais nos processos ocorridos dentro das
instituições do que nas suas característi-
cas físicas. A observação concentrou-se
em três áreas: 1) organização do tempo
das crianças pelo adulto; 2) atividades das
crianças e intera-ções destas com outras
crianças e com os adultos; e 3) compor-
tamento e interações dos adultos com as
crianças. Ao elaborar estes sistemas de
observação, os grupos de coordenadores
tiveram dois objetivos principais:
descrever o que se passava, realmente,
em um serviço destinado à criança e
avaliar a qualidade do serviço, com base
nos processos nele ocorridos. Até então,
avaliava-se, sobretudo, a qualidade das
modalidades de atendimento com base
em indicadores de
‘input’
(estáticos)
(isto é, número de anos de experiência
dos professores, tamanho dos grupos,
etc.). Embora estes fatores fossem con-
siderados importantes para descrever a
boa qualidade de um programa, o grupo
de coordenadores quis avaliar a quali-
dade em função das atividades e das
interações que realmente ocorriam, no
interior destes serviços.
Para maiores informações, entrar em
contato com
High/Scope Educational
Research Foundation
. Endereço: 600
North River Street, Ypsilanti,
MI 48198-2898. Tel: (734) 485-2000;
Fax: (734) 485-0704;
Nazeem Abad, Pakistan: Aga Khan Foundation/0614-
010/Jean-Luc Ray
24
A High/Scope Educational Research Foundation (Fundação de Pesquisas Educacionais Avançadas) é o Centro Internacional de
Coordenação e o Centro Nacional de Pesquisa dos EUA para o Projeto de Educação Pré-primária do IEA.
25
Os 15 países participantes nas fases 2 e 3 do Projeto do IEA sobre a educação pré-primária são os seguintes: Bélgica, Espanha,
Finlândia, Grécia, Irlanda, Itália, na Europa Ocidental; Eslovênia, Polônia e Romênia, na Europa Oriental; China (República Popular
da), Hong Kong, Indonésia e Tailândia, na Ásia, além dos Estados Unidos da América.
4.3. Compromisso político:
políticas e financiamento
Indicador 7. Políticas. Existência de uma política
e/ou de um plano nacional para a primeira infância
Por que criar este indicador?
No âmbito do monitoramento da Convenção sobre os
Direitos da Criança, tornou-se uma prática perguntar aos
países se tinham uma política consistente de defesa
dos direitos da criança e se haviam elaborado um
plano nacional de ação baseado em tal política,
especificando as metas, as atividades e os resultados
esperados. Supõe-se que tornando a política de direi-
tos da criança explícita e implementando um plano,
dispõe-se de uma base não apenas para agir, mas
também para fazer o monitoramento das ações. O
compromisso político é avaliado a partir da simples
presença ou ausência de uma política e de um plano.
Advertência Embora este indicador possa ser útil
para proceder a uma rápida comparação entre os
países, ele provavelmente não terá a mesma utilidade
em âmbito nacional. Nesta escala, poderia ser mais útil
estudar as políticas e os planos para verificar até que
ponto tais planos são integrados e se eles visam atingir
os membros mais pobres da sociedade tanto quanto
a classe média ou os ricos. Além disso, apesar de todos
os países terem uma política em favor da primeira
infância, ocorre de ela não ser explícita e, na prática,
traduzir-se pela inação. Em alguns países, pode existir
uma política explícita, que pode ser ignorada. Todos
65
avaliado em função dessa renda), ele será também
bastante revelador acerca das desigualdades relativas
aos serviços.
Para criar este indicador, será necessário dispor
de pesquisas em domicílio que coletem informações
sobre gastos com educação e cuidado em favor das
crianças pequenas.
4.5. Efeitos dos programas
sobre as crianças e os pais
Esta dimensão do indicador é extremamente impor-
tante e não foi incorporada, adequadamente, nas ava-
liações dos programas em favor da primeira infância.
Para complementar as medidas de cobertura e de
qualidade, que já foram medidas pelos inputs ou pelos
processos do programa, é necessário ter uma idéia
sobre os efeitos do programa. “Mais” nem sempre
significa “melhor”. Uma mudança do currículo pode
ou não ser acompanhada por uma mudança no está-
gio de desenvolvimento das crianças que participam
dos programas.
Indicador 12. Desenvolvimento da criança
Por que criar este indicador?
Um importante objetivo dos programas para a
primeira infância é, ou deveria ser, o de produzir efei-
tos positivos no desenvolvimento da criança; por este
motivo, espera-se que o estágio de desenvolvimento
da criança seja mensurado. Considera-se “desenvolvi-
mento ideal” quando a criança é capaz de adquirir as
competências e os comportamentos culturais que lhe
permitam agir, efetivamente, em seu contexto atual,
assim como se adaptar, com sucesso, quando ocorrem
mudanças no contexto e/ou saber provocar mudanças.
O uso de um indicador de estágio de desenvolvi-
mento da criança em determinado país pode ou não
estar relacionado à expansão ou melhoria dos progra-
mas relativos à primeira infância. As melhorias podem
estar relacionadas, por exemplo, a uma mudança da
situação econômica ou a uma melhor educação dos pais.
Se o objetivo é verificar se os programas exerceram
algum impacto, é preciso criar este indicador para as
regiões nas quais o programa esteja em funcionamento
e para as regiões que ainda não tenham programa a
fim de poder estabelecer uma comparação.
Quais informações são necessárias para criar este indicador
e como podem ser coletadas?
Vários testes, escalas e dados de observação podem
ser usados para estabelecer um indicador de desen-
volvimento da criança. Cada país terá de determinar o
que julga ser o indicador mais adequado para o desen-
volvimento da criança, além de determinar em que
idade deve ser coletada a informação. Existem, literal-
mente, centenas de testes e escalas que, segundo se
presume, avaliam o desenvolvimento infantil. O pro-
blema, em qualquer cenário nacional, pode advir da
dificuldade em se chegar a um entendimento sobre
educação foram destinados à educação pré-primária,
enquanto o número de crianças nela matriculadas
representava quase 20% do total de matrículas na
rede de educação.
Se este indicador for considerado adequado e útil,
seria preferível trabalhar com dados relativos às des-
pesas, em vez de orçamentários. Os orçamentos tra-
duzem, às vezes, mais uma intenção política do que
uma realidade; e importantes transferências de uma
rubrica para outra são efetuadas ao longo do ano.
Entretanto, o inconveniente de utilizar as despesas é
que provavelmente os dados não serão tão recentes.
4.4. Custos e gastos
Indicador 9. Custos (ou gastos médios) por
governo e por criança, com programas
destinados à primeira infância
Por que criar este indicador?
Presume-se que quanto maior o gasto por aluno
(considerando a inflação e/ou o poder aquisitivo),
maior o compromisso do governo com a primeira
infância. Além disso, por vezes sugere-se que maiores
gastos indicarão que um sistema é de mais alta quali-
dade. É possível, entretanto, imaginar que maiores
gastos podem simplesmente refletir maior ineficiência
e não resultar em melhoria da qualidade. Por essa razão,
é importante dispor de dados, tanto sobre os efeitos dos
gastos, como sobre as despesas atuais.
Indicador 10. Custos (ou gastos médios) por
governo e por criança, com programas destinados
à primeira infância, em percentagem do PNB
per capita
Por que criar este indicador?
Se o objetivo é verificar o nível de desempenho de
um país em relação a outros países, os gastos deverão
ser inseridos em seu contexto para que as comparações
possam ter sentido. Uma forma de proceder consiste
em estabelecer uma relação entre os gastos por criança
e o PNB per capita. Dessa maneira, é possível verificar
se um país despende o mesmo esforço relativo em
programas destinados à primeira infância.
Indicador 11. Gasto médio por criança e por
família em programas para a primeira infância
(crianças abaixo de 6 anos), em percentagem
do salário mínimo (ou da renda familiar)
Por que criar este indicador?
Uma coisa é avaliar os gastos públicos em favor da
primeira infância, outra coisa é determinar até que
ponto as famílias comprometem seus próprios recursos
com esses programas. Se a filosofia de um governo é
ofertar serviços universais para as famílias a baixo
custo ou gratuitamente, este indicador terá menos
significado do que se a sua filosofia for a de incentivar
as famílias a investir em suas próprias crianças. Se
este indicador está associado à renda familiar (ou é
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
as medidas e instrumentos específicos que devem ser
utilizados para medir o desenvolvimento da criança,
tanto de forma geral, quanto relacionadas com as
dimensões das diferentes idades. O problema pode ser
mais político do que técnico. As seguintes razões difi-
cultam a obtenção desse acordo:
Os instrumentos de avaliação são o reflexo das
diferentes posições teóricas e ideológicas.
Questiona-se sobre o grau de adaptação dos
instrumentos à cultura local (tanto dos instrumen-
tos importados que foram ajustados de alguma
maneira, como dos instrumentos que foram cria-
dos localmente).
Interroga-se sobre a confiabilidade e a validade
desses instrumentos.
Não há acordo sobre o objetivo básico dessas
medidas e instrumentos (por exemplo, alguns
acham que é muito mais benéfico usar instrumen-
tos para a triagem do desenvolvimento do que
para medir o estágio geral do desenvolvimento
das crianças, ou para demonstrar se as crianças
estão preparadas para ingressarem na escola).
Disputas pessoais entre os autores de diferentes
escalas sobre se, sob o ponto de vista cultural, são
apropriadas, confiáveis e válidas.
Aqui, não cabe entrar em discussão sobre o que
constitui uma medida ou um instrumento válidos,
nem procurar detalhar as diferentes dimensões do
desenvolvimento a serem levadas em consideração;
trata-se de uma decisão que deve ser tomada local-
mente. Em compensação, é evidente que as medidas
e instrumentos devem ser confiáveis, válidos e sensí-
veis à cultura e à linguagem; além disso, devem en-
globar várias dimensões do desenvolvimento. Eles
devem ser, também, fáceis de aplicar e o mais barato
possível.
Alguns países chegaram a um certo consenso sobre
a seleção de um instrumento e, embora ainda possa
haver algum desacordo sobre tal escolha, o instru-
mento é utilizado para medir os progressos no desen-
volvimento das crianças. Ele pode servir para elaborar
um indicador. Alguns exemplos:
– No Chile, foram desenvolvidos, localmente,
dois testes para medir diversos aspectos do
desenvolvimento: um, focando o período que
vai de 0 a 2 anos; e o outro que compreende a
faixa etária de 2 a 6 anos. Ambos os testes
foram incorporados ao processo regular de
monitoramento do sistema de saúde que, no
Chile, contrariamente a muitos outros países
desenvolvidos, é acessível e utilizado por uma
alta porcentagem da população. Do teste
chileno vem, por exemplo, um indicador do
percentual de crianças de 5 anos que apresentam
um atraso de linguagem.
– Na Jamaica, foi estabelecido um sistema que
permitirá conhecer o perfil das crianças no
momento do ingresso na escola. Ele associa
informações obtidas por meio de pesquisas
nacionais em domicílios aos dados coletados
pelo Sistema Nacional de Saúde e pelo Ministério
da Educação, que aplica testes às crianças no
66
Os indicadores de desenvolvimento físico e emocional da criança deveriam ser acrescentados àqueles
relativos ao estágio cognitivo e ser incluídos na definição e medição da “preparação para a escola”
Nyeri, Kenya: Aga Khan Foundation/0739-064/Jean-Luc Ray
67
momento do ingresso no ensino compulsório
(nas primeiras semanas do ano escolar). Este
sistema permite obter indicadores para a
nutrição, assim como para diversos aspectos do
desenvolvimento psicossocial.
– Na Bolívia, está sendo aplicado um teste em
uma amostra de crianças nas áreas urbanas,
utilizando o sistema já existente de pesquisas
por amostragem. Foi criado um indicador do
percentual de crianças que estariam “em
situação crítica”.
– No Líbano, foi criado um teste para ser aplicado
em todas as pré-escolas.
Nos países em que não foi possível chegar a um
acordo sobre os instrumentos e as medidas, e em que
nenhum é utilizado habitualmente, o desafio será veri-
ficar se é possível alcançar um acordo e/ou selecionar
uma medida que possa ser aplicada por uma instituição
existente, capaz de efetuar, em âmbito nacional, uma
amostra aleatória com crianças.
Indicador 13: Preparação para a escola
Por que criar este indicador?
Uma das razões apontadas para criar programas
para a primeira infância é que as crianças participantes
estarão mais bem preparadas para ingressar na escola.
Em seguida, tal preparação irá permitir-lhes um melhor
progresso e obter melhores resultados na escola, o que
reduzirá as taxas de repetência e evasão, beneficiando
as crianças e o sistema educacional (esses elementos
poderiam constituir, a longo prazo, indicadores dos
resultados dos programas para a primeira infância,
mas o efeito ou o resultado mais imediato é a mudança
da situação da criança que se prepara para o ensino
compulsório).
Existe uma tendência para definir esta “preparação
para a escola”, com base unicamente no estágio de
desenvolvimento cognitivo e de linguagem, assim
como, às vezes, na capacidade da criança para apren-
der o alfabeto e, até mesmo, para ler antes de ingressar
no ensino compulsório. Conseqüentemente, muitos
peritos em desenvolvimento da criança, fazem objeção
a esta idéia de medir “a preparação para a escola”.
Pode-se argumentar que a medida do estágio cogniti-
vo da criança – no momento do ingresso na escola e,
até mesmo, ainda mais cedo – pode ser um indicador
extremamente útil para os países. Entretanto, também
pode-se defender que uma boa avaliação dessa con-
dição deveria incluir indicadores do desenvolvimento
emocional e físico da criança. Se esse for o caso, é pos-
sível supor que tal medida será bastante semelhante
à medida do desenvolvimento infantil. Isso nos leva a
vislumbrar um conjunto de indicadores que descrevem
os diferentes aspectos do desenvolvimento infantil ou
de sua preparação para a escola, sem perder de vista o
fato de que o desenvolvimento é um fenômeno holís-
tico e integral. Nesse sentido, os indicadores da situação
nutricional e do estado de saúde, citados mais adiante,
deveriam ser considerados também como possíveis
indicadores dos efeitos dos programas para a primeira
infância.
Indicador 14: Situação nutricional
Um leque de indicadores da situação nutricional da
criança está sendo utilizado no plano internacional, e
inclui: peso para a idade, altura para a idade, peso para
a altura, circunferência do braço e níveis de vários
micronutrientes. A tarefa, aqui, consiste em encontrar
os indicadores considerados úteis em determinado
contexto e verificar como eles evoluem ao longo do
tempo, se possível, em função dos grupos etários, áreas
e programas específicos.
Indicador 15: Estado de saúde
Em geral, os indicadores do estado de saúde já
estão bem definidos e,
como no caso da nutrição,
o desafio não será criar
novos indicadores, e sim
inserir os indicadores exis-
tentes em um sistema
mais amplo que leve em
consideração o desenvolvi-
mento global (incluindo o
desenvolvimento físico) da
criança.
Indicador 16.
Conhecimento e
expectativas dos pais
Por que criar este indicador?
Os pais são, e contin-
uarão a ser, os principais
respon-sáveis pelo cuidado
e educação das crianças pequenas. Se estiverem mais
bem informados sobre o desenvolvimento infantil e
sobre o que fazer para melhorá-lo, a situação dos filhos
também será melhor.
Para estabelecer este indicador, é necessário definir
o que os pais “deveriam” saber. Trata-se de uma iniciativa
difícil porque os métodos de educação dos filhos em
determinadas culturas não correspondem às práticas
que a ciência ou uma outra cultura dominante sugerem
como norma. Entretanto, deveria ser possível chegar
a um acordo em relação aos conhecimentos funda-
mentais que todos os pais deveriam ter a fim de
estarem em melhores condições de ajudar os filhos
em seu desenvolvimento.
5. Em conclusão
A maior dificuldade para aqueles que pretendem mo-
nitorar o desenvolvimento infantil, seu meio ambiente
e os programas que visam a melhoria da ECPI é, sem
dúvida, criar indicadores que, permanecendo sensíveis
às diferenças, evidenciem as etapas do desenvolvimento
Mombasa, Kenya: Aga Khan Foundation/1362-036/Jean-Luc Ray
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
psicossocial da criança. Isso não pode ser feito de uma
forma comparável para todos os países, mas espera-se
que essa limitação não venha a constituir uma barreira
para a busca de indicadores confiáveis e válidos do
desenvolvimento psicossocial, os quais sirvam para
orientar as políticas e o planejamento, adaptados ao
contexto particular no qual são utilizados.
Anexo 1: Em que consiste
um programa para a
primeira infância?
Uma das primeiras questões levantadas na tentativa
de estabelecer indicadores para a primeira infância,
visando informar e monitorar a política e seu planeja-
mento é: “Em que consiste um programa para a pri-
meira infância?”. A resposta não é evidente. Visando
a presente discussão, sugere-se que sejam aplicados
dois critérios para definir tal programa.
Idade: O programa deve atender crianças com
idadeinferior à do ingresso no ensino compulsório.
Um sistema organizado de atendimento que
inclua a “educação”: o programa deve seguir um
sistema organizado de atendimento às crianças
pequenas que inclua um componente educacio-
nal (que pode ser um estímulo que facilite a
aprendizagem, em vez de uma atenção voltada
diretamente para a aprendizagem de fatos,
conceitos ou habilidades específicas).
Cada um desses itens será discutido separadamente.
Idade
Aplicando-se o critério indicado anteriormente, o
limite superior de idade dependerá da idade fixada
para o ingresso no ensino compulsório que pode
variar de 5 a 7 anos. Em alguns países, o jardim de
infância, destinado às crianças com 5 anos, faz parte
do sistema de educação formal (p.ex., na Trinidad e
Tobago) e, portanto, não está incluído nas estatísticas
de educação infantil que se limitam às crianças de
idade igual ou inferior a 4 anos. Em outros países,
as crianças não ingressam no ensino compulsório
antes de completar 7 anos de idade, e, por conse-
guinte, as estatísticas incluem as crianças de 6 anos.
Na Avaliação de EPT do ano 2000, o limite supe-
rior de idade pode chegar aos 8 anos. Ela leva em
consideração numerosas definições utilizadas para a
“primeira infância”. Embora essa superposição seja
útil quando se analisa o conteúdo educacional e a
transição entre os diversos tipos de programas pré-
escolares e o ensino compulsório, ele pode levar, facil-
mente, a uma dupla contagem e a uma certa confusão
em relação aos indicadores aplicados para avaliar as
escolas e a escolarização no ensino obrigatório.
Neste estudo, a idade mínima adotada é, teorica-
mente, o nascimento, ou seja, ano zero. Isso acom-
panha a concepção de Educação para Todos (EPT)
segundo a qual “a aprendizagem começa a partir do
nascimento”. Não se espera que os recém-nascidos
sejam encontrados em programas coletivos fora da
família e que seguem um sistema estruturado de
atendimento, incluindo um componente de educação.
Entretanto, os programas de educação de pais podem
ser ministrados no período pré-natal ou imediatamente
após o parto. Além disso, em alguns países, é uma
prática comum que as crianças comecem a ser atendi-
das nos programas coletivos, em diferentes períodos
entre o nascimento e o primeiro ano de vida – programas
que, realmente, dão atenção sistemática ao desenvolvi-
mento mental e físico das crianças. No México, por
exemplo, os Centros de Desenvolvimento Integrado da
Criança, administrados pela Seguridade Social, aceitam
crianças a partir dos 43 dias de vida.
A redução do limite mínimo para uma idade tão
precoce vai contra a prática adotada pela UNESCO
para estabelecer suas estatísticas de educação pré-
primária. Para a UNESCO, a idade mínima é de 3 anos
porque “... os programas destinados às crianças peque-
nas não satisfazem, em geral, os critérios educa-
cionais da International Standard Classification of
Education ISCED” (Classificação Internacional
Padrão de Educação). Isso significa, de fato, que os
programas ditos de “cuidados em favor das crianças”
podem ser incluídos nos programas para a primeira
infância, tendo como objetivo a criação de indicadores.
Com relação ao limite da idade, a Avaliação de EPT
do ano 2000, refere-se à “faixa etária oficial, quando
esta existe, ou caso contrário, à faixa etária de 3 a 5
anos”. Isso deixa em aberto a possibilidade de incluir
crianças de todas as faixas etárias, desde o nascimento
até o ingresso no ensino compulsório e ainda as mais
velhas, embora a atenção enfoque o grupo das crianças
de 3 a 5 anos
26
.
No que foi abordado anteriormente fica claro que:
– Será difícil fazer comparações diretas entre os
países por meio dos indicadores para os progra-
mas em favor da primeira infância porque não
há normas que definam a faixa etária à qual
esses programas seriam destinados, a não ser
que os dados sejam distribuídos por idade, com
base anual.
– Conseqüentemente, o objetivo consistiria em
obter informações classificadas por idade para o
conjunto de programas ofertados na área da
primeira infância. Isto abre a possibilidade de
criar um conjunto de indicadores classificados
por idade. Os indicadores de cobertura poderiam,
por exemplo, comparar a matrícula por faixa
etária com o número de crianças na mesma
faixa etária na população correspondente. Isso
possibilitaria efetuar comparações no plano
68
26
Na International Standard Classification of Education - ISCED
(Classificação Internacional Padrão de Educação) adotada e
aperfeiçoada pela UNESCO, a idade mínima é de 3 anos.
“Essa idade foi escolhida uma vez que os programas destina-
dos às crianças de 0 a 3 anos não satisfazem, em geral, aos
critérios educacionais da ISCED”.
27
Em relação ao saudável desenvolvimento da criança, algu-
mas dessas modalidades podem, de fato, ser mais benéficas
do que os programas formais.
internacional, idade por idade, ou por faixas
etárias, tal como a categoria das crianças de 3 a
5 anos, sugerida pela Avaliação de EPT do ano
2000.
Sistema organizado de atenção que inclui
a “educação”
Para serem considerados como programas para a
primeira infância – objeto da coleta de dados – os
serviços ofertados devem incluir, pelo menos teori-
camente , uma atenção deliberada para melhorar a
aprendizagem da criança por meio de estímulos
precoces ou de uma instrução, ou de outras ativi-
dades que vão além do simples cuidado com a saúde,
alimentação e condições de segurança. Por meio
desta restrição, pretende-se estabelecer uma dis-
tinção entre a “guarda” organizada das crianças e os
sistemas organizados de cuidado e educação da
primeira infância; aliás, tal distinção é, freqüente-
mente, difícil de ser feita.
De acordo com esta definição, os programas inte-
grados de cuidado das crianças podem e devem ser
incluídos nos cálculos e análises se comportarem um
componente de educação, mesmo que sejam rotula-
dos, formalmente, como “centros de atendimento às
crianças” ou “creches” ou outras denominações.
Além disso, os programas apresentados como se
estivessem baseados em estímulos precoces, instrução,
atividades pedagógicas pré-escolares, etc., serão
incluídos mesmo que, na prática, não apliquem o que
apregoam e mesmo que os profissionais que atuam
diretamente com as crianças não tenham titulação
correspondente às qualificações pedagógicas exigidas.
Essa dimensão do programa será analisada com indi-
cadores específicos de qualidade, e não através da
tentativa de incorporar a qualidade diretamente na
definição do que constitui determinado programa para
a primeira infância. Assim, torna-se importante com-
plementar os indicadores do grau de cobertura com
indicadores de qualidade.
O leitor notará que a definição de um programa
para a primeira infância não está vinculada a outros
critérios que, conscientemente ou não, são aplicados
com freqüência:
Local
Neste estudo, a definição de um programa para a
primeira infância não se limita àquela que caracteriza
o programa desenvolvido em uma escola ou em um
“centro educacional”. Portanto, a definição proposta
pela International Standard Classification of Education
(ISCED), a qual tem como critério principal para a
educação pré-primária que um programa esteja situado
em “uma escola ou em um centro educacional”, não é
respeitada.
Por exemplo, os programas organizados de cuidado
domiciliar, à semelhança dos que são oferecidos por
mulheres em suas casas na Colômbia, deveriam ser
incluídos no processo de criação de indicadores se
satisfizerem aos dois critérios mencionados acima.
Provavelmente, eles não seriam incluídos nas estatísti-
cas nem nos estudos da UNESCO porque não estão
localizados em uma escola ou em um centro (embora,
ao reunir várias crianças, uma casa possa ser similar,
em certo sentido, a um centro).
Além disso, tais programas em domicílio poderiam
ser considerados, mesmo se a qualidade da atenção
voltada para a melhoria da aprendizagem nesses locais
fosse relativamente insuficiente, visto que fazem parte
de um programa organizado, cuja concepção inclui
um componente de estimulação e de educação.
Os serviços de babás em casas particulares (da
própria criança ou em outra casa) não serão incluídos
caso exista apenas um acordo informal da mãe com
uma pessoa, que não faça parte de um programa orga-
nizado
27
.
A questão do local torna-se ainda mais difícil se os
programas destinados à educação de pais estiverem
incluídos nos programas para a primeira infância.
Vínculo administrativo
Tanto os programas públicos quanto os privados,
deverão ser incluídos, desde que satisfaçam os critérios
básicos, independentemente da vinculação adminis-
trativa com o setor de saúde, seguridade social, bem-
estar social ou setor de educação.
BIBLIOGRAFIA
ADAMSON, P. Beyond Basics. In: UNICEF. The Progress of
Nations 1996. New York: UNICEF, 1996.
BALL, C. Start Right: the importance of early learning. London:
The Royal Society for the Encouragement of Arts,
Manufacturers and Commerce, 1994..
BASILI, F. Criterios de calidad de los servicios para niños y
niñas menores de 6 Años. In: II SIMPOSIO LATI-
NOAMERICANO, “PARTICIPACIÓN FAMILIAR Y
COMUNITARIA PARA LA ATENCIÓN INTEGRAL DEL
NIÑO MENOR DE SEIS AÑOS, Lima, 1994. Trabajo.
Lima: UNICEF. 1994.
CONSULTATIVE GROUP ON EARLY CHILDHOOD
CARE AND DEVELOPMENT. In Search of Early
Childhood Care and Development Indicators: a contribution
to the EFA Year 2000 assessment. Technical Guidelines for
Country Studies. Toronto: CGECCD, 1999. p.5. (Mimeo)
EVANS, J.; MYERS, R.; ILFELD, E.. Early Childhood Counts: a
programming guide on early childhood care for develop-
ment. Washington, D.C.: The World Bank, 2000. p.278.
INTERNATIONAL CONSULTATIVE FORUM ON EDU-
CATION FOR ALL the year 2000 assessment. Paris, 1999.
Technical Guidelines. Paris: UNESCO, 1999.
M.S. SWAMINATHAN FOUNDATION. Taking Stock:
Developing Indicators for Analysing Costs and Benefits
of Early Childhood Care and Development Programmes.
New York: The M.S. Swaminathan Foundation. 2000.
(Proceedings; 25).
MOSS, P.; PENCE, A. (Eds). Valuing Quality in Early
Childhood Services. London: Paul Chapman Publishing Ltd.,
1995.
INDICADORES PARA A PRIMEIRA INFÂNCIA
Série “Coordinators’ Notebook”, v.1
69
NATIONAL ASSOCIATION FOR THE EDUCATION OF
YOUNG CHILDREN. Position statement on develop-
mentally appropriate practice in early childhood programs
serving children from birth through age 8. In: ______. Young
Children. N.p: NAEYC, 1986. p. 4-29.
OLMSTED, P.; WEIKART, D.P. How Nations Serve Young
Children: profiles of child care and education in 14 countries.
Ypsilanti, Michigan: High/Scope Press, 1989.
______. (Eds). Families Speak: early childhood care and educa-
tion in 11 countries. Ypsilanti, Michigan: High/Scope Press,
1994.
ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION
AND DEVELOPMENT. CENTRE FOR EDUCATIONAL
RESEARCH AND INNOVATION. OECD Indicators. Paris:
UNESCO, OECD, 1992..
UNESCO. World Survey of Education, 1955. London: Evans Bros,
1971.
UNITED NATIONS CONVENTION ON THE RIGHTS
OF THE CHILD, New York, Nov. 20, 1989.
WEBSTER’S NEW WORLD DICTIONARY OF AMERICAN
ENGLISH, Third College Ed. New York: Simon and
Shuster, Inc., 1988.
WEIKART, D.P. (Ed). What Should Young Children Learn? Teacher
and parent views in 15 countries. Ypsilanti, Michigan:
High/Scope Press. 1999.
______. In press, 2001.
WINDHAM, D. Education for Indicators: a proposed framework,
manual, and implementation plan, a report prepared for
UNICEF. Albany, N.Y.: University of New York at Albany,
1992. (Mimeo).
WORLD DECLARATION ON EDUCATION FOR ALL
AND FRAMEWORK FOR ACTION TO MEET BASIC
LEARNING NEEDS. Jomtien, Thailand, Mar. 5- 9, 1990.
Article 5. Paris: UNESCO, 1990.
70
1. INTRODUÇÃO
A educação e o cuidado na primeira infância
têm sido reconhecidos como parte indispensável
da educação básica e os pesquisadores em educa-
ção têm dado maior atenção aos seus benefícios
educativos, sociais e econômicos. A Declaração
Mundial sobre Educação para Todos (EPT), adotada
em Jomtien em 1990, propôs uma visão mais
ampla da educação básica, considerando que esta
começa com o nascimento e não com o ingresso
no ensino fundamental como considerado tradi-
cionalmente. Um dos objetivos fundamentais do
Marco de Ação de Educação para Todos foi a expansão
das atividades e educação e cuidado da primeira
infância, inclusive no âmbito das famílias ou da
comunidade, especialmente em favor das crian-
ças pobres, desfavorecidas e portadoras de
deficiência.
No Fórum Mundial sobre Educação ocorrido em
Dacar (2000), os paises reafirmaram os seus
compromissos com a Declaração Mundial de
Jomtien, respaldada pela Declaração Universal dos
Direitos da Criança, de que cada criança, jovem
ou adulto tenha o direito à educação, e que esta
satisfaça as suas necessidades básicas de
aprendizagem no mais amplo sentido da palavra.
Uma educação que permita à criança aprender
a conhecer, a fazer, a viver junto e a ser. Na
oportunidade, estabeleceu-se que, até 2015, os
objetivos de ampliar e melhorar o cuidado e a
educação na primeira infância, especialmente
das crianças mais vulneráveis e desfavorecidas,
seriam alcançados.
Durante os anos 90, muitos países da América
Latina incorporaram mudanças políticas e estru-
turais na educação fundamental e/ou pré-escolar.
Tais mudanças ocorreram nas Reformas Educa-
tivas. Alguns países da América Latina incorpo-
raram, parcialmente, este nível de ensino no nível
EXPERIÊNCIAS
71
ANÁLISE DA SITUAÇÃO DOS PAÍSES
DA AMÉRICA LATINA EM RELAÇÃO AOS
INDICADORES PARA A EDUCAÇÃO DA
PRIMEIRA INFÂNCIA
Rosa Blanco
1
Mami Umayahara
2
UNESCO/OREALC
1
Rosa Blanco é graduada em Filosofia e Ciências da Educação,
com especialização em Educação Especial pela Universidade
de Madri. Tem cursos de doutorado no programa
“Desenvolvimento psicológico e aprendizagem escolar”, pela
Universidade Autônoma de Madri. Presentemente, atua como
especialista em educação especial e inicial no Escritório
Regional de Educação da UNESCO em Santiago, e coordena
a Rede de Inovações Educativas INNOVEMOS.
2
Mami Umayahara é graduada em antropologia lingüística e
estudos ibero-americanos pela Universidade de Toronto,
Canadá e, tem mestrado em educação internacional comparada
pela Universidade de Stanford, EUA. Atualmente é assessora
no Escritório Regional de Educação da UNESCO para a
América Latina e o Caribe (OREALC), nas áreas de Educação
da Primeira Infância e Famílias e de coordenação regional
do programa Educação para Todos.
de ensino compulsório
3
. Este contexto político-
educativo requer um novo marco no conceito dos
programas educativos destinados à primeira in-
fância e na coleta dos dados estatísticos para
gerar indicadores relevantes para a educação e
cuidado de tal infância.
No início do século XXI, a desigualdade na
distribuição dos ingressos escolares continuava
sendo uma forte característica da estrutura
econômica e social da América Latina, que, de
acordo com um estudo do Banco Interamericano
de Desenvolvimento – BID, era a região mais
desigual do mundo
4
. Por outro lado, muitas
pesquisas demonstram que a experiência na
educação pré-escolar tem efeito extremamente
positivo no desenvolvimento acadêmico posterior,
nas oportunidades de emprego e produtividade.
Também pode contribuir de maneira eficaz,
compensando as situações de desvantagem e de
redução das desigualdades socioeconômicas. Por
esta razão, Selowsky, por exemplo, recomenda o
investimento na educação infantil, já que a habili-
dade e a potencialidade da criança, no momento
de ingressar na escola, é o fator mais determinante
para o aproveitamento da educação posterior
5
.
Para se fazer uma análise crítica sobre a situ-
ação atual e para se promover políticas e progra-
mas que possam atender de forma prioritária as
populações mais vulneráveis, é necessário contar
com uma informação quantitativa e qualitativa no
que diz respeito ao contexto demográfico, social
e econômico da população da primeira infância,
assim como sobre as características da população
infantil e dos programas a ela destinados.
2. PROJETO REGIONAL DA
UNESCO/ OREALC SOBRE OS
INDICADORES PARA A
PRIMEIRA INFÂNCIA
Entre setembro de 1999 e fevereiro de 2000, a
UNESCO/OREALC coordenou uma avaliação
dos 10 anos de Educação para Todos na região
da América Latina e do Caribe. Esta avaliação
tinha como objetivo identificar os avanços
alcançados, por meio de um conjunto de 18
indicadores básicos para cada um dos objetivos
estabelecidos em Jomtien, entre eles o cuidado e a
educação na primeira infância. Para avaliar este
último, foram estabelecidos dois indicadores. O
primeiro deles foi a taxa de matrícula nos progra-
mas de educação da infância nos setores público,
privado e comunitário, e o segundo, o percentu-
al de novos alunos que ingressam no primeiro
ano do ensino fundamental, aos quais se dis-
pensou qualquer tipo de programa organizado
para a primeira infância
6
. A determinação de
somente dois indicadores para representar uma
área tão ampla como o cuidado e a educação na
primeira infância, assim como para saber se eles
eram adequados, foi insuficiente, segundo co-
mentários de diversas Agências, Organismos
Governamentais e Não-Governamentais envol-
vidos na Educação para Todos
7
.
Esta avaliação evidenciou que a maioria dos
países carece de sistemas de informação confiá-
veis que lhes permitam conhecer a verdadeira
situação da educação da primeira infância e o
número de crianças beneficiadas pelos programas
em suas diversas modalidades, dependências
administrativas e distribuição geográfica. A avalia-
ção mostrou que os dados estatísticos existentes
em muitos países são incompletos no que diz
respeito às diferentes características dos meninos
emeninas (gênero, idade, área geográfica, origem
étnica e lingüística e sua deficiência) e das suas
famílias (nível sócioeconômico e educacional
dos pais). Também, foi evidenciado que, além de
faltar estudos sobre a análise da demanda e da
adequação da oferta, faltam indicadores para o
monitoramento e a avaliação da qualidade dos
programas da primeira infância.
Em síntese, os países contam com uma escassa
informação tanto no que diz respeito aos indica-
dores de caráter macro, que servem para a tomada
de decisões políticas, quanto de indicadores de
caráter micro, que permitem avaliar a qualidade e
EXPERIÊNCIAS
72
3
Até a presente data, 10 dos 19 países latino-americanos
haviam acrescido um ou mais anos na educação pré-escolar
dentro da educação básica obrigatória: Argentina (5 anos),
Colômbia (5-6 anos), Costa Rica (5-6 anos), Equador (6 anos),
El Salvador (4 a 6 anos), Panamá (4-5 anos), Peru (5 anos),
República Dominicana (5-6 anos), Uruguai (5 anos),
Venezuela (5 anos). O México aderiu a esta lista em novem-
bro de 2002. Publicou a modificação constitucional que estabe-
lece a obrigatoriedade dos três anos de educação pré-escolar, a
ser cumprida de maneira progressiva a partir do ano de 2004
para o calendário escolar de 2008-2009. (Diário Oficial da
Secretaria de Governo do Poder Executivo, 12 de novembro
de 2002).
4
BID. Facing Up to Inequality in Latin America, 1998-99.
5
Selowsky, Marcelo. “A Note on Pre-school Age Investment in
Human Capital in Developing Countries”, Economic Development and
Cultural Change, 24, 1976, pp.707-719. Citado em Una Mirada a
la Situación de la Infancia en América Latina y el Caribe. Latorre,
Carmen Luz. 1999.
6
Fórum Consultivo Internacional sobre Educação para Todos.
Educação para Todos, Avaliação 2000: Diretrizes Técnicas,
UNESCO, 1999.
7
Entre os diversos documentos que abordam o tema, ver
Education for All Indicators Expert Group Meeting, Report on the meeting
and proposals for the future development of EFA indicators, UNESCO
Paris, 25-26 de Junho, 2001; Myers, R. Education for All 2000
Assessment Thematic Studies: Early Childhood Care and Development,
UNESCO, Paris, 2001.
adequação dos programas. A falta de informação
é dificultada porque muitos programas dependem
de diferentes organismos (Ministério da Educação,
Saúde, Trabalho, Bem-Estar Social, Famílias,
ONG, etc.). Além disso, existem ainda muitos
programas e serviços comunitários não oficializa-
dos. Por esta razão, um sistema de informação de
serviço, tanto da oferta quanto da demanda, seria
de grande ajuda para o planejamento e a focali-
zação da atenção, visando atingir uma maior
equidade e melhor qualidade dos serviços.
Tais dificuldades fizeram com que o Escritório
Regional de Educação da UNESCO desenvol-
vesse um projeto sobre os indicadores do cuidado
e educação na primeira infância. No marco de
seguimento de Educação para Todos, este projeto
visa melhorar os dados já existentes e conscientizar,
ainda mais, as autoridades que tomam decisões
políticas em nível nacional, com o propósito de
incluir plenamente a educação na primeira infân-
cia nas políticas educativas e nos gastos públicos
e privados.
A primeira fase deste projeto consistiu em sis-
tematizar as definições e conceitos da primeira
infância, assim como as características dos pro-
gramas, os dados estatísticos e os indicadores
existentes na região. Nesta sistematização, foram
incluídos os seguintes aspectos:
Definições conceituais da primeira infância.
Políticas e normas que regulamentam a
educação e o cuidado na primeira infância.
Características dos programas de atenção à
primeira infância.
Indicadores relativos ao contexto e às
famílias.
Indicadores sobre o cuidado na primeira
infância.
Indicadores de população atendida nos pro-
gramas da primeira infância.
Definições e indicadores de recursos humanos
nos serviços para a primeira infância.
Definições e indicadores de recursos finan-
ceiros para a primeira infância.
Para se realizar esta sistematização, diversas
fontes de informação foram utilizadas, tais como:
Os relatórios nacionais de avaliação de
Educação para Todos, de 19 países da
América Latina.
Estudos de caso em quatro países (Bolívia,
Chile, Colômbia e México).
Outros documentos:
– Situação Mundial da Infância 2001 (UNICEF)
– Cúpula das Américas. Projeto Regional de
Indicadores Educativos: O Relatório Regional (versão
preliminar) 2001. (Ministério da Educação
do Chile e UNESCO-OREALC)
– Anuário Estatístico da UNESCO (1999)
– Education at a Glance (OCDE)
Na segunda fase deste projeto, foi elaborado
um modelo de análise da situação da educação
da primeira infância por meio de uma série de
categorias e de um conjunto de indicadores, os
quais foram debatidos e analisados por estatísti-
cos e especialistas da área de educação para a
primeira infância. Na terceira fase, foi validado
um conjunto de indicadores de alguns países da
região, já que a finalidade do projeto era produzir
um conjunto de indicadores da primeira infância
comparáveis, tendo como base tanto os dados
estatísticos desagregados quanto as definições e
os métodos de cálculo comuns. Estes indicadores
servirão para o monitoramento dos sistemas edu-
cacionais, não sendo viáveis para a avaliação de
programas.
3. SITUAÇÃO DOS PAÍSES NO
QUE SE REFERE AOS
INDICADORES DE EDUCAÇÃO
E CUIDADO NA PRIMEIRA
INFÂNCIA
Como mencionado anteriormente, o sistema de
informação existente nos países é insuficiente
para orientar a definição de políticas e a provisão
de recursos e de serviços para a atenção integral
da primeira infância. Em muitos países, os dados
estatísticos disponíveis são incompletos no que se
refere às diferentes características dos meninos e
meninas (gênero, idade, área geográfica, origem
étnica/lingüística, deficiência), das suas famílias
(nível sócio-econômico e escolaridade dos pais)
e do contexto.
Muitos países da América Latina estabelecem
em suas leis a educação na primeira infância a
partir do nascimento dos meninos e meninas
(mesmo que não necessariamente obrigatória).
Contudo, somente apresentam os dados estatísti-
cos daqueles com idades próximas ao ingresso no
ensino fundamental (3 a 5 anos ou 4 a 6 anos). A
informação disponível sobre a atenção às crianças
de 0 a 3 anos é escassa na maioria dos países, e
quando existe não está disponível por idades.
Observa-se, ainda, que não existe informação
completa sobre os programas não-formais ou que
estão em áreas isoladas.
Um dos primeiros problemas para a coleta de
dados comparáveis é que os países têm diferentes
definições de educação e cuidado na primeira
infância, e consideram diferentes subdivisões e
grupos de idade. Não obstante, a educação da
primeira infância, geralmente, está subdividida
em dois grupos ou categorias, que têm denomi-
nações distintas nos países. O Primeiro grupo vai
EXPERIÊNCIAS
73
do nascimento até os 3 ou 4 anos de idade; e o
segundo vai dos 3 ou 4 anos até os 5 ou 6 anos de
idade, quando se dá o início da educação básica
obrigatória. Outra dificuldade para a coleta de
dados é a grande variedade de modalidades e
dependências administrativas dos programas
dirigidos à primeira infância.
Tradicionalmente, a educação para a primeira
infância é considerada como uma etapa prepa-
ratória para o ensino fundamental conforme
definida na Classificação Internacional Padrão de
Educação (“pré-primária” ou “nível zero”)
8
. Esta
definição limitada apresenta dois problemas. O
primeiro é que ela enfoca atividades organizadas
em estabelecimentos educacionais que excluem
iniciativas não-convencionais que envolvam a
participação da família e da comunidade. Na
América Latina, os programas denominados não-
formais são precisamente os que têm um papel
importante na atenção à primeira infância. Em
1998, por exemplo, 98.3% dos meninos e meni-
nas com idade entre 0 a 6 anos foram educados
em Cuba, sendo que 70,4% deles foram pela via
não-formal.
9
O segundo é que esta definição tradicional não
reflete plenamente a realidade da atenção inte-
gral à primeira infância na região, o que está
sendo paulatina, mas amplamente reconhecido
na região. A atenção às necessidades fisiológicas
básicas (cuidado na primeira infância) e o desen-
volvimento dos processos educativos (desen-
volvimento infantil) são inseparáveis e perpassam
diferentes idades desde o começo da vida.
Posteriormente, serão abordados os principais
resultados e conclusões do estudo realizado pela
UNESCO/OREALC sobre a sistematização das
definições dos indicadores em educação e cuida-
do na primeira infância.
Indicadores relacionados com o contex-
to geral e as famílias
Todos os países contam com indicadores
demográficos, sociais e econômicos das crianças
e do seu contexto familiar. É importante dispor
de dados desagregados por idade, gênero, área
geográfica e nível sócioeconômico, com a finali-
dade de avaliar as disparidades existentes no
país e determinar as áreas e os grupos de popu-
lação menos favorecidos, os quais são prioritários.
Todos os países contam com indicadores demo-
gráficos desagregados por gênero e área geográ-
fica. Contam, também, com informação sobre as
taxas de natalidade, fecundidade e reprodução,
mortalidade e expectativa de vida ao nascer. Os
países apresentam a informação demográfica
separada por grupo de idade e não por idade,
sobretudo para os menores de 3 anos.
Indicadores do contexto demográfico
Os países dispõem de indicadores demográficos,
a partir da projeção feita em função do censo
nacional que é realizado periodicamente. São
desagregados por gênero, idade e área geográfica
(estado, região, município, província). Da mesma
forma, os países estimam as taxas de natalidade,
fecundidade e reprodução, mortalidade, assim
como a expectativa de vida ao nascer. O Centro
Latinoamericano y Caribeño de Demografía (CELADE),
da CEPAL, coleta dados detalhados sobre a
população de todos os países da América Latina e
do Haiti, e apresenta os índices desagregados por
gênero, idade e ano calendário
10
, assim como por
zonas urbanas e rurais
11
, obtidos a partir das pro-
jeções nacionais.
Os estudos-piloto nacionais não apresentam de
maneira sistemática a informação demográfica
da população de meninos e meninas na primeira
infância (0 a 6 anos), que é um indicador da
demanda por serviços, teoricamente falando.
Mesmo tendo os dados desagregados por gênero
e área geográfica, sugere-se utilizar os grupos de
idade, (por exemplo, 0-2, 2-4, 4-6), em vez das
idades simples. Isto é, mesmo que existam núme-
ros demográficos por idade simples, a atenção
aos meninos e meninas é comumente analisada
por grupo etário, sobretudo em se tratando dos
menores de 3 anos.
Famílias e Pais
Não há dúvida de que as famílias – particular-
mente os pais – e os contextos social, cultural e
econômico têm grande influência no desenvol-
vimento dos meninos e meninas durante a
primeira infância. Segundo os resultados do
Primeiro Estudo Internacional Comparativo do
Laboratório Latino-Americano de Avaliação
EXPERIÊNCIAS
74
8
Os dados estatísticos do Instituto de Estatísticas da
UNESCO estão organizados de acordo com a Classificação
Internacional Padrão de Educação [International Standard
Classification of Education] (revisão de 1997), e sua aplicação nos
países da América Latina pretende separar as crianças de 3 a 5
anos de idade (“nível ISCED zero” ou “pré-escolar”) e as crianças
de 6 a 12 anos de idade (nível ISCED 1 ou primário).
9
Centro de Referência Latino-Americano para a Educação
Pré-Escolar. (1999). Programa Social de Atenção Educativa aos
Meninos e Meninas de 0 a 6 anos: Eduque o Seu Filho. Educação para
Todos. Ano 2000. Estudo de Caso sobre a Alfabetização e a
Educação Não-Formal. Havana – Cuba.
10
CEPAL-CELADE. Boletim demográfico Nº. 66. América
Latina: População por Ano-Calendário e Idade.
1995-2005. 2000.
11
CEPAL-CELADE. Boletim demográfico Nº. 63. América
Latina: População Urbana e Rural 1970-2025. 2000.
da Qualidade da Educação, coordenado pela
UNESCO/OREALC, o contexto sóciocultural
dos alunos tem grande influência no seu desem-
penho escolar
12
. Outros estudos comprovam que
o nível educacional das mulheres é um elemento
chave para o desenvolvimento infantil e tem
impacto direto no nascimento e no desenvolvi-
mento das crianças
13
. Portanto, a educação dos
pais, das famílias e das comunidades contribuem
para o desenvolvimento integral dos meninos e
meninas. O México, por exemplo, dispões de dados
sobre a matrícula nos programas de educação
de pais, o qual faz parte da educação inicial.
Existem vários indicadores que podem medir
estes aspectos, os quais podem ser coletados por
meio do censo demográfico e de pesquisas nacio-
nais. Os mais utilizados são as taxas de analfabe-
tismo adulto e os anos de escolaridade dos adultos,
que são dois indicadores aproximados do nível
educacional dos pais e dos outros membros
das famílias. Os indicadores do contexto sócio-
econômico incluem: a) a renda familiar; b) o
emprego (taxa de emprego/desemprego, distri-
buição por tipo de ocupação, etc.); c) a pobreza e
o bem-estar (índice de desenvolvimento humano,
número de famílias abaixo da linha da pobreza,
acesso aos serviços de saúde etc.). O Chile e a
Colômbia apresentam alguns indicadores como
a renda e o tipo de ocupação, segundo o chefe de
família. O Serviço Nacional da Mulher no Chile,
por exemplo, tem informações sobre a porcenta-
gem dos chefes de família por gênero, segundo
região e quantil de renda. Comprovada a impor-
tante influência das mães na aprendizagem dos
seus filhos, existe ainda um indicador ameaçador
de que 40% das famílias da zona rural, pertencen-
tes ao quantil mais pobre, têm a mulher como
chefe de família (a taxa nacional é de 22,8%).
Em geral, existem poucos estudos que explo-
rem as relações entre os indicadores dos pais e
das famílias e os indicadores da atenção à primei-
ra infância. A única que aparece nos estudos de
caso realizados é a dos resultados da Pesquisa
CASEN/Chile, que mostra a população de 0 a 6
anos assistida pela educação infantil (nos jardins
de infância) cruzada com as variáveis das famílias:
a) o tipo de atividade do chefe do domicílio; b) a
estrutura da família; c) a renda média da principal
ocupação do chefe de família d) a média de
escolaridade e alfabetização do chefe de família.
Seria importante desenvolver e aprofundar a
análise das relações entre as variáveis das famílias
e da atenção à primeira infância, visando identi-
ficar os fatores que dificultam a sua participação
nos programas de atenção.
Indicadores sobre o cuidado
da primeira infância
Tanto as leis dos países como os seus programas
não chegam a definir, explicitamente, o que se
entende por cuidado na primeira infância. Entre-
tanto, alguns desses países têm indicadores a esse
respeito. O Relatório do México, por exemplo,
apresenta um grande número de indicadores
nesta categoria, citando, principalmente, as
estatísticas e os indicadores de crescimento e
situação nutricional, coletados pelos países no
contexto de acompanhamento do Programa
Nacional de Ação em favor da Infância (Programa
Nacional de Acción a Favor de la Infancia PAFI). O
UNICEF informa, anualmente, a situação dos
países, em nível mundial, em relação aos indi-
cadores de mortalidade, nutrição e saúde
14
:
Populações atendidas nos programas
da primeira infância
Quando se analisa a situação da educação na
primeira infância na Região, há que se tomar
cuidado com as taxas de escolarização, por dife-
rentes razões: a) existem diferenças significativas
entre os países; b) os países consideram diferentes
grupos de idade; c) muitos países não consideram
a matrícula nos programas não-formais ou não-
convencionais.
Em geral, o indicador mais utilizado para avaliar
o nível geral da atenção à primeira infância é a
taxa bruta de matrícula nos programas educa-
tivos. A taxa bruta de matrícula indica a capaci-
dade do país em atender à demanda. Por outro lado,
a taxa líquida de matrícula indica a proporção
das crianças em idade escolar que freqüentam os
programas, mostrando as oportunidades educativas
efetivamente aproveitadas. Segundo as Diretrizes
Técnicas de Avaliação de Educação para Todos
15
,
a taxa bruta de matrícula é definida como o “total
de alunos matriculados em uma série, ciclo ou
nível de ensino – independentemente de sua
idade – expresso em porcentagem da população
correspondente ao grupo oficialmente definido
como escolarizável em um determinado ano
escolar”. A mesma fonte define a taxa líquida de
matrícula como o “número de alunos que fazem
EXPERIÊNCIAS
75
12
Aproximado com as variáveis relativas ao nível educa-
cional dos pais, a quantidade de livros disponíveis em casa, a
quantidade de horas que os pais ficam em casa e se ambos
(pai e mãe) vivem no mesmo domicílio.
13
Latorre S., Carmen Luz. Una Mirada a la Situación de la
Infancia en América Latina y el Caribe – Marco Legal, Políticas y
Limitaciones. Santiago, Chile, 1999.
14
UNICEF. ibid.
15
Fórum Consultivo Internacional de Educação para Todos.
Educação para Todos: Avaliação do Ano 2000, Diretrizes Técnicas. 1999.
parte do grupo oficialmente definido como esco-
larizável expresso em porcentagem da população
total desse grupo etário”.
O Programa Mundial de Educação para Todos
estabeleceu a educação na primeira infância
desde o nascimento como um dos seis objetivos,
porém, a Avaliação de Educação para Todos,
realizada em 2000, incluiu somente dois indi-
cadores de acesso aos programas da primeira
infância: a taxa bruta de matrícula nos programa
destinados à primeira infância e a porcentagem
dos novos alunos que ingressaram no ensino fun-
damental e que freqüentaram qualquer tipo de
programa organizado para a primeira infância.
Esta seleção de indicadores, limitada às taxas de
matrícula, ilustra a falta de dados estatísticos e de
indicadores que englobem como um todo a
atenção integral à primeira infância.
Em relação à taxa bruta de matrícula utilizada
na Avaliação de Educação para Todos, vale destacar a
especificação do “grupo oficialmente definido
como escolarizável” para calcular este indicador,
já que se trata de avaliar a capacidade do país em
atender a população da faixa etária oficialmente
designada. A tabela a seguir mostra as seguintes
categorias de idade: 1) oficialmente estabeleci-
das para a educação da primeira infância; 2) ofi-
cialmente definidas como o último ciclo pré-
escolar e/ou obrigatório; e 3) apresentadas na
Avaliação de Educação para Todos.
Dos 19 países, 7 selecionaram o item “grupos
etários” que não correspondem à categoria oficial
da educação para a primeira infância nem à últi-
ma categoria oficial de educação pré-escolar. Por
exemplo, o Relatório Nacional de Avaliação de
Educação para Todos do Peru assinala que a
Constituição de 1993 estabeleceu – pela primeira
vez – a educação das crianças menores de 5 anos
e a extensão da obrigatoriedade escolar para um
ano pré-escolar para os meninos e meninas de 5
anos de idade. Os mais altos escalões do governo
assumiram os objetivos e as metas da Declaração
de Jomtien e vêm promovendo ações vinculadas
à provisão de serviços para as crianças de 0 a 3
anos. Contudo, a Avaliação de Educação para Todos
informa somente a cobertura da atenção às crian-
ças entre 3 e 5 anos de idade.
Isto pode levar, por um lado, à falta de cons-
ciência ou de ação, em relação ao compromisso
político assumido em Jomtien, no que diz respeito
EXPERIÊNCIAS
76
Fonte: Relatórios Nacionais de Avaliação de Educação para Todos. 2000.
a que a aprendizagem começa com o nasci-
mento. Por outro lado, também pode levar a que
o sistema de informação existente não colete
dados relevantes em relação à população total
correspondente. Isto se evidencia pela ausência
geral de informação sobre a atenção aos meninos
e meninas entre 0 e 2 anos. Quando existem dados
sobre esta categoria etária, sugere-se apresentá-la
agrupada e não simplesmente por idade.
O que foi mencionado anteriormente eviden-
cia a discrepância entre o que se considera como
educação da primeira infância e o que medem os
indicadores deste nível, na Avaliação de Educação
para Todos. Por exemplo, mesmo que muitos paí-
ses da América Latina estabeleçam em suas leis
que a educação da primeira infância se dá a partir
do nascimento dos meninos e meninas (mesmo
não sendo obrigatória), eles apresentam dados
estatísticos da faixa etária mais próxima ao in-
gresso no ensino fundamental (3 a 5 anos ou 4
a 6 anos).
População atendida segundo origem étnica e
lingüística
Em alguns países, os censos demográficos de-
sagregam a população por gênero, origem étnica
e área geográfica (estado, município, etc.). Embora
os estudos da Bolívia, do Chile e da Colômbia
disponham de dados de população segundo gru-
pos étnicos, não fica claro se a desagregam por
idade simples (a Colômbia informa por faixa
etária). O México resgata a matrícula nos pro-
gramas de Educação Pré-Escolar Indígena, en-
quanto o Chile apresenta o número de jardins de
infância de comunidades indígenas e o número
de crianças atendidas. Em geral, esta informação
demográfica é importante, contudo, não é sistema-
ticamente coletada, mesmo que em alguns países
este dado possa servir de indicador aproximado.
População com necessidades especiais atendidas
em programas para a primeira infância
É importante que os países estudados disponham
de informações sobre o número de meninos e
meninas com alguma deficiência ou necessidade
especial, assim como sobre a cobertura da
atenção a este grupo, obtidas por meio do censo
demográfico ou por meio de informações prove-
nientes das unidades de atendimento. Estes dados
são desagregados por gênero, tipo de deficiência
e/ou unidade administrativa geográfica. As
estatísticas dos grupos étnicos e a informação em
geral carecem de classificação por idade. Em
relação a esse grupo, é importante destacar que
há, por parte dos países, uma tendência de inte-
grar estes meninos e meninas nos programas e
centros de atenção regular.
Outras situações de vulnerabilidade
É importante coletar as informações sobre as crian-
ças que vivem em situação de vulnerabilidade,
para dispensar-lhes uma atenção prioritária que
compense sua situação de desvantagem. Os estu-
dos piloto mostram a importância de priorizar
a atenção dos meninos e meninas provenientes
de famílias de baixa renda. No Chile, a pesqui-
sa CASEN, do Ministério do Planejamento e
Cooperação, cruza a taxa de matrícula com o
nível sócioeconômico. No México, a Diretoria-
Geral de Planejamento, Programação e Orçamento
cruza a cobertura pré-escolar com a classificação
da pobreza por município que foi produzida com
base no Censo Demográfico de 2000.
Não existem informações quantitativas e sis-
temáticas sobre os meninos e meninas em outras
situações de vulnerabilidade (abandono, maus
tratos e violência doméstica, abuso sexual, pros-
tituição infantil, viciados em drogas ilícitas).
Contudo, os pesquisadores e ONGs da Colôm-
bia, por exemplo, coletam os dados detalhados
sobre as crianças e adolescentes em situação
de risco que requerem atenção imediata: o recru-
tamento militar de menores, a mudança forçada
para um outro local por causa dos conflitos arma-
dos, o trabalho infantil, o abandono e a adoção,
o desaparecimento, seqüestros, maus tratos, a
violência doméstica, o abuso sexual, as crianças
e adolescentes infratores, os meninos e meninas
de rua e os viciados em drogas ilícitas. Para obter
uma informação completa e detalhada e atender
as crianças que se encontram em situação de
risco, existe a necessidade urgente de uma cola-
boração intersetorial, tanto entre as diferentes
esferas de Governo como entre estas e as orga-
nizações não-governamentais.
Indicadores de Recursos Humanos
Os profissionais que atendem as crianças peque-
nas, suas denominações e formação variam
consideravelmente, segundo os programas. Nos
jardins de infância, conta-se mais freqüentemente
com equipes constituídas de um diretor, educa-
dores diplomados, assessores especializados
(enfermeira, médico, nutricionista), auxiliares que
dão apoio aos educadores e que fazem os serviços
gerais e voluntários que ajudam os educadores
e outros técnicos (pais, famílias e pessoas da co-
munidade).
O Anuário Estatístico da UNESCO coletou o
número de “agentes educativos” e o número de
crianças atendidas por um “agente educativo”. Os
quatro países do estudo piloto relatam o número
médio de crianças por adulto nas pré-escolas
públicas. Não obstante, advertem que existem
EXPERIÊNCIAS
77
diferenças consideráveis em função dos tipos de
programa e “centros de atenção” no mesmo país.
De fato, esta variedade é a maior de todos os
níveis de ensino e a discussão sobre o número
adequado de crianças por adulto é um tema
polêmico
16
.
Mesmo assim, existe uma grande diferença
entre os quatro países, no que diz respeito ao
nível mínimo de qualificação e à formação espe-
cializada exigida dos profissionais da primeira
infância. Na Bolívia, no Chile e na Colômbia, os
diretores e educadores de pré-escola necessitam
de cinco anos de formação universitária especiali-
zada em educação, enquanto no México os edu-
cadores só precisam do certificado de nível médio
para, posteriormente, receberem cursos de forma-
ção. Contudo, um estudo no México relata que um
número significativo de educadores não tem ne-
nhuma (ou muito pouca) educação formal. Os au-
xiliares ou os profissionais que trabalham com as
crianças mais novas necessitam apenas de forma-
ção de nível médio ou fundamental.
No que diz respeito à formação dos profissio-
nais, somente o Chile e a Bolívia informaram o
número de docentes titulados. As melhores infor-
mações se encontram nos programas e projetos
de capacitação dos docentes, mesmo que não
estejam disponíveis os indicadores que possam
medir a extensão e a qualidade de tais interven-
ções. Observa-se, ainda, a falta de avaliação dos
efeitos das diferentes iniciativas de formação e
de capacitação.
A participação das famílias e das comunidades
no processo educacional dos meninos e meninas
é valorizada e incentivada em todos os países
da região. Contudo, não foi encontrado nenhum
indicador que avalie o grau de sua participação
ou do papel que desempenham. Dada a reconhe-
cida importância da participação das famílias e
das comunidades nos programas formais e não-
formais, é necessário sistematizar as informações
sobre a participação destes atores. Em geral, a
informação sobre os recursos humanos é fragmen-
tada e incompleta, sendo necessário incrementar
a investigação e a sistematização da informação.
Indicadores de recursos financeiros
Os países dispõem de informações sobre a fonte
e o montante de recursos financeiros públicos
gastos nos programas de atenção à primeira
infância. Por exemplo, existem indicadores como
a porcentagem do gasto público em educação e
a porcentagem do gasto público em educação
destinada ao nível de educação infantil (ou pré-
escolar). Esta informação financeira pública é
relativamente fácil de ser coletada, já que a peça
orçamentária pública é centralizada e os governos
dispõem destes indicadores. Contudo, existe pou-
ca informação disponível sobre a contribuição do
setor privado e os números não incluem gastos
com os programas não-convencionais ou que não
sejam de âmbito público (ex: educação indígena
e comunitária no México). O estudo piloto da
Bolívia apresenta o orçamento dos empréstimos
dos organismos bilaterais e multilaterais que
apóiam o Programa Nacional de Atenção ao
Menino e Menina menor de 6 anos de idade
(PAN), por organismo que financia e local.
Alguns países dispõem da informação sobre o
gasto público por aluno na atenção à primeira
infância, inclusive em diferentes programas (Chile
e Colômbia). O México tem este indicador so-
mente para o nível de “educação pré-escolar”
e não para a “educação inicial”
17
. É importante
dispor de dados financeiros desagregados por
modalidade, unidade administrativa geográfica
e programa – se possível – já que os custos entre
eles variam consideravelmente. Seria relativa-
mente fácil calcular este indicador por programa,
utilizando o dado orçamentário e o número de
meninos e meninas matriculados em um dado
programa.
No que diz respeito ao custo para as famílias,
o estudo da Colômbia mostra os valores mensais
que os pais têm que pagar pela assistência presta-
da aos filhos, segundo uma tabela de cálculo que
tem por base a renda familiar e o salário mensal.
A Bolívia relata que existe uma grande diferença
entre os programas no que diz respeito aos custos
assumidos pelos pais: desde o serviço público
gratuito do Ministério da Educação até um valor
mensal de US$200 (duzentos dólares) nas institui-
ções privadas. Novamente, verifica-se a importân-
cia de desagregar este dado financeiro por pro-
grama. Além disso, há que se considerar outros
gastos diretos da família, como materiais esco-
lares, livros, uniformes, transporte, etc. – para os
quais podemos contar com alguns estudos feitos
no México.
EXPERIÊNCIAS
78
16
Ministério da Educação do Chile e UNESCO/OREALC.
Cúpula das Américas. Projeto Regional de Indicadores
Educativos: O Relatório Regional (versão preliminar). 2001.
17
No México, a educação inicial é determinada pela faixa
etária de 0-3 anos e a educação pré-escolar pela faixa etária
de 4-5 anos.
4. Conclusões
e recomendações
A seguir, serão apresentadas as principais con-
clusões e recomendações que surgiram da sistema-
tização realizada, as quais têm servido de ponto
de partida para as fases posteriores do Projeto
Regional de Indicadores, desenvolvido pela
UNESCO/OREALC:
É preciso desenvolver um marco conceitual
compartilhado, quanto ao que se entende
por atenção integral à primeira infância, em
suas dimensões de cuidado, proteção e edu-
cação. A diferença dos conceitos e
definições e as diferentes divisões e subdi-
visões que existem nos países, em relação à
primeira infância, fazem com que seja difícil
realizar uma análise comparativa da situação
na região.
Para analisar criticamente a situação atual e
implementar políticas e programas que
atendam de forma integral às necessidades
dos menores de seis anos, é preciso contar
com um sistema de informação amplo que
contemple a informação quantitativa e
qualitativa sobre os contextos demográfico,
social e econômico da população da
primeira infância, assim como das caracte-
rísticas dos programas que vão atendê-la.
Mesmo assim, é importante conduzir
pesquisas e avaliações sobre as condições
que favorecem o desenvolvimento, a apren-
dizagem e o bem-estar das crianças, bem
como a qualidade e a adequação dos progra-
mas. É preciso sistematizar e difundir expe-
riências inovadoras que estão dando bons
resultados e aprender com tais experiências.
Estabelecer com urgência um marco opera-
cional coerente entre a concepção da
educação e cuidado na primeira infância e
a definição dos indicadores e dos dados
estatísticos para analisar a situação dos
meninos e meninas menores de 6 anos,
visando tomar decisões adequadas relativas
às políticas, programas e recursos. Ainda
que muitos países da América Latina esta-
beleçam em suas leis a educação da primeira
infância (mesmo que não necessariamente
obrigatória), a coleta de dados estatísticos
se centra na faixa etária mais próxima do
ingresso na “escola primária” (3 a 5 anos ou
4 a 6 anos).
O objetivo fundamental das ações de
educação e cuidado é contribuir para o
desenvolvimento integral das crianças e
favorecer a aprendizagem, por isso é
urgente que os países definam um conjunto
de indicadores relativos ao desenvolvimento
e à aprendizagem das crianças menores de
6 anos. Esta informação é crucial para a
definição de outros indicadores como, por
exemplo, a qualidade dos programas de
educação e cuidado – já que um elemento
essencial de valorização de tal qualidade é
identificar em que medida os programas
auxiliam ou dificultam o desenvolvimento e
a aprendizagem das crianças. Visto que o
desenvolvimento e a aprendizagem estão
intimamente relacionados com as culturas
em que as crianças estão inseridas, torna-se
difícil elaborar um conjunto de indicadores
comparáveis entre os países, mesmo que
existam alguns indicadores universais de
desenvolvimento que, com pequenas varia-
ções, sejam aplicáveis a todas as culturas.
Da mesma forma, cada país estabelece em
seus currículos a aprendizagem que considera
necessária, mas a análise dos currículos dos
países também mostra que existe uma série
de aprendizagens que são comuns às diferen-
tes culturas.
É fundamental que os países construam um
conjunto de indicadores acerca do desen-
volvimento e da aprendizagem das crianças,
visando não estabelecer comparações entre
eles, mas com a perspectiva de identificar,
o mais precocemente possível, aqueles
meninos e meninas que possam apresentar
problemas no desenvolvimento ou dificulda-
des de aprendizagem, proporcionando-lhes
a ajuda e o apoio necessários para
compensar suas dificuldades e otimizar o
seu desenvolvimento psicossocial.
Em relação ao que foi mencionado anterior-
mente, recomenda-se que, em um primeiro
momento, os países construam os indicadores
de desenvolvimento e aprendizagem para,
em um segundo momento, identificar quais
poderiam ser transversais e comparáveis. A
comparação pode ser útil para medir o pro-
gresso de cada país e identificar os apoios e
os recursos requeridos para se progredir de
forma adequada. Do nosso ponto de vista, a
comparação não deve ter por objetivo esta-
belecer um “ranking” entre os países, mas
contar com parâmetros que permitam aos
países identificar o seu progresso, conside-
rando as suas características e circunstâncias
específicas.
Tudo isso nos leva à necessidade de contar,
também, com um conjunto de indicadores
EXPERIÊNCIAS
79
para avaliar a qualidade dos programas des-
tinados à primeira infância, os quais não se
limitem somente aos aspectos operacionais
de tais programas, o que, freqüentemente, é
feito. Neste aspecto, é importante construir
indicadores relativos aos insumos, aos
processos, às estratégias de implementação
e aos resultados dos programas, especial-
mente no que se refere ao impacto dos
mesmos, tanto no desenvolvimento e apren-
dizagem da criança quanto nas famílias e na
comunidade. Este dado é muito útil para
promover as melhorias necessárias nos
programas, modificando aqueles aspectos
que dificultam o adequado desenvolvimento
e aprendizagem das crianças e de suas
famílias.
Vale destacar a importância de dispor de
dados desagregados por idade, gênero, área
geográfica e nível sócioeconômico, com o
objetivo de avaliar as disparidades existentes
nos próprios países e, assim, determinar as
áreas e grupos de população que serão
priorizados nos programas para a primeira
infância. A desagregação dos dados por
idade é crucial, especialmente em se tratando
das crianças com menos de 3 anos de idade.
Devido ao grande potencial que têm as
modalidades não-convencionais desenvolvi-
das, em sua maioria, por organizações da
sociedade civil em atingir a população sem
acesso aos serviços oficiais, torna-se
necessário incluí-las nas estatísticas, visando
ter um quadro completo da cobertura e
garantir a qualidade do serviço.
Dada a reconhecida importância da partici-
pação das famílias e das comunidades nos
programas formais e não-formais de
atenção, faz-se necessário sistematizar a
informação sobre a participação destes
atores e definir indicadores relacionados ao
impacto da ação das famílias e da comunidade
no desenvolvimento e na aprendizagem das
crianças. Mesmo assim, seria importante
desenvolver e aprofundar a análise das
relações entre as variáveis das famílias e da
atenção à primeira infância, visando identi-
ficar os fatores que estão dificultando a
participação nos programas.
É importante coletar dados estatísticos
sobre crianças que vivem em situação de
vulnerabilidade, para dispensar-lhes uma
atenção prioritária que possa compensar, o
mais precocemente possível, sua situação de
desvantagem. Para obter uma informação
completa e detalhada e atender às crianças
em situação de risco, faz-se necessário a
urgente colaboração intersetorial tanto
entre as diferentes esferas de Governo como
entre estas e as organizações não-governa-
mentais.
Em geral, a informação sobre os recursos
humanos é fragmentada e incompleta,
fazendo-se necessário uma investigação e
sistematização sobre a questão, uma vez
que os recursos humanos são um fator
determinante para a qualidade da atenção
dispensada aos meninos e meninas.
É importante desagregar o dado financeiro
por modalidade, unidade administrativa
geográfica e por programa – se possível – já
que os custos entre eles variam consideravel-
mente. Seria relativamente fácil calcular este
indicador por programa, utilizando o dado
orçamentário e o número de meninos e
meninas matriculados em um dado programa.
EXPERIÊNCIAS
80
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO foi criada em
1945. Sua mais importante missão é contribuir para a construção da paz, por meio da cooperação técnica entre as
nações nas áreas de educação, ciência, cultura e comunicação, visando favorecer o respeito universal à justiça, aos
direitos humanos e liberdades fundamentais. Para a UNESCO, a educação é um direito fundamental do ser humano,
sendo a chave para o desenvolvimento sustentável, a paz e a estabilidade das nações e entre os países.
Entre suas funções prospectivas, a UNESCO procura identificar tendências, antecipar o futuro e ajudar a mapear
novos caminhos por meio do fomento, da transferência e do intercâmbio de conhecimentos. No campo normati-
vo, contribui para a elaboração e a adoção de convenções, declarações e compromissos firmados internacionalmente.
O objetivo estratégico da UNESCO, no campo da educação infantil, é contribuir para que seja cumprida a meta
do Marco de Ação de Dacar: "expansão e aprimoramento da assistência e educação da primeira infância".
A UNESCO Brasil oferece cooperação técnica na área, contribuindo para a formulação e o aprimoramento da
política de educação infantil. Atua em parceria, disseminando conhecimentos sobre o tema, por meio de proje-
tos, publicações, seminários e discussão com órgãos do governo e com a sociedade civil, visando contribuir para o
aprimoramento das políticas públicas.
A Fundação ORSA, instituída em 1994, tem como missão a formação integral da criança e do adolescente em
situação de risco pessoal e social, atuando nas áreas programáticas de educação, saúde e promoção social.
Sediada em Carapicuíba, Estado de São Paulo, desenvolve programas e projetos com atendimento direto e indire-
to. Na área da educação, com o foco na Educação Infantil, tem implantado programas e projetos de formação e
valorização dos profissionais que atuam com crianças de 0 a 6 anos, de produção e publicação de materiais de
apoio e de gestão de centros de Educação Infantil em parceria com prefeituras.
Na área da Educação Infantil, merecem destaque estes projetos: Programa de Formação de Profissionais de
Educação Infantil, Prêmio Qualidade na Educação Infantil, Gestão Pedagógica nos Centros de Educação Infantil.
Conheça algumas publicações da Fundação ORSA:
– Fontes para a Educação Infantil
– Município Feliz
– Guia de Adoção
– Compreendendo a Violência Sexual Contra a Criança e o Adolescente
– Perda do Pátrio Poder – Aproximações a um estudo socioeconômico
– Atos Infracionais na Comarca de Barueri – Pontos & Contrapontos
– CEM Passo a Passo
– Manual Técnico de Atenção Humanizada ao Recém-Nascido de Baixo Peso – Método Mãe Canguru
Children and youngsters in Laranjal do Jari, Amazon, Brazil: Risk and Hopes
– Educar a Criança Deficiente
Para maiores informações sobre a publicação em língua portuguesa, contactar:
Fundação ORSA
www.fundacaoorsa.org.br
UNESCO
www.unesco.org.br
Grupo Consultivo sobre Cuidado e Desenvolvimento Infantil
[Consultative Group on Early Childhood
Care and Development]
é um consórcio interagencial de abrangência internacional, com fortes vínculos
regionais, formado por agências doadoras, organismos internacionais, organizações não governamentais, institu-
tos e fundações. Objetiva a melhoria das condições de vida das crianças em situação de risco, baseando-se em
uma visão multidisciplinar do cuidado e desenvolvimento da criança de 0 a 8 anos, em países em desenvolvimento.
O Grupo Consultivo se constituiu em 1984, a partir da necessidade de articular as iniciativas existentes, e fomen-
tar novas ações para o fortalecimento de programas e políticas destinados à criança de 0 a 8 anos e suas famílias.
O Grupo Consultivo conta com uma Secretaria Executiva e com Representantes Regionais. A Secretaria atua de
forma a levar as instituições e representantes regionais a identificarem as lacunas e as áreas prioritárias e de interesse
relacionadas com o cuidado e o desenvolvimento infantil, assim como a articularem novos parceiros para comporem
a rede. Atualmente, a Secretaria está sediada na Escola de Educação Infantil [School of Early Childhood Education] da
Universidade de Ryerson. O suporte administrativo é fornecido pelo Escritório de Assuntos Internacionais de
Ryerson [Ryerson Office of International Affairs]. Os Representantes Regionais coordenam a rede de parceiros em 8
regiões no mundo, abrangendo cerca de 2.800 instituições e especialistas distribuídos em 120 países.
GRUPO CONSULTIVO
SOBRE CUIDADO E
DESENVOLVIMENTO
INFANTIL
Para maiores informações, contatar:
Kathy Bartlett, Co-director
Aga Khan Foundation
1-3, Avenue de la Paix, 1202 Geneve
P.O. Box 2369, 1211 Geneve 2, SWITZERLAND
Tel: (41 22) 909-7200 / 7208 direct
Fax: (41 22) 909-7291
Dr. Robert G. Myers
Insurgents Sur 4411, Ed. 7, Dept. 302
Tlalcoligia, D.F. 14430, MEXICO
Tel: (52-5) 513-4813, Fax: (52-5) 573-4277
CG Secretariat
Education Section, UNICEF TA 26-A
Three United Nations Plaza
New York, New York 10017, USA
Tel: (212) 824-6626, Fax: (212) 824-6481
Louise Zimanyi, Co-director
Ryerson University
School of Early Childhood Education
350 Victoria Street, Toronto, Ontario
M5B 2K3, CANADA
Tel: (416) 979-5000 ext. 7034
Fax: (416) 979-5239
O Grupo Consultivo pode ainda ser contactado através de:
www.ecdgroup.com
O GRUPO CONSULTIVO SOBRE CUIDADO E DESENVOLVIMENTO INFANTIL [CONSULTATIVE GROUP ON
EARLY CHILDHOOD CARE AND DEVELOPMENT] (GC) é um consórcio de agências internacionais,
organizado em redes regionais, que articulam novas instituições e parcerias e fomentam ações
que visam o fortalecimento de programas e políticas para as crianças de 0 a 8 anos e suas
famílias. O trabalho do Grupo Consultivo baseia-se em uma visão multidisciplinar do cuidado
da criança e do desenvolvimento infantil.
METAS
AMPLIAR O CONHECIMENTO O GC coleta, sistematiza e dissemina informação sobre o desen-
volvimento infantil, obtida através de experiências de campo, do conhecimento tradicional e
da pesquisa científica.
S
ERVIR COMO UM CATALISADOR O GC trabalha para ampliar a consciência das pessoas sobre
temas relacionados às crianças, desenvolvendo materiais e estratégias que visam ajudar as
comunidades, organizações e governos a avançar da teoria para a prática, da política para o
planejamento e implementação de programas.
C
ONSTRUIR PONTES O CG articula em rede instituições que têm preocupações e interesses
comuns, promovendo o trabalho entre os setores; colocando as pessoas em contato com o tra-
balho de outras por meio da organização de reuniões, da disseminação de informação (publi-
cações) e servindo como elo de comunicação.
S
ERVIR COMO UM CONSELHO OUVIDOR O CG se engaja em atividades que promovam o
diálogo entre financiadores e quadros de decisão, relativas às melhorias para a área, fornecendo
referências básicas para a formulação de políticas, assim como para o planejamento, a progra-
mação de atividades e sua implementação.
Ocasionalmente, os Membros da Secretaria provêem assistência técnica às organizações no
que se refere ao desenho de um programa, sua implementação e avaliação ou, ainda, à elabo-
ração de relatórios ou artigos técnicos.
Como parte das atividades de informação, comunicação e disseminação de experiências, o
Grupo Consultivo publica semestralmente a revista “Coordinators’ Notebook”, caracterizada como
uma ‘ferramenta do trabalho em rede’.
Coordinators’ Notebook é produzido pelo Secretariado do Grupo Consultivo em colaboração com
parceiros e redes regionais e com o apoio da Academy for Educational Development, Fundação Aga
Khan, Fundação Bernard van Leer, Christian Children’s Fund, Ministério das Relações Exteriores da
Holanda, Pueblito, Save the Children Alliance, UNESCO e UNICEF.
Cada número do periódico em língua inglesa refere-se a um tema específico – identificado
através de consulta a parceiros sobre as lacunas e prioridades constatadas na área –, apresenta-
do por meio do seu artigo principal e ilustrado nos estudos de caso relacionados ao tema.
Uma segunda parte do periódico divulga notícias sobre a rede interagencial que compõe o
Grupo Consultivo [Network Notes], apresentando as atividades da Secretaria Executiva e do
Secretariado, bem como outras iniciativas regionais, descrevendo atividades das instituições
parceiras, disponibilizando endereços eletrônicos para contato sobre pesquisas, publicações e
áreas de atuação e divulgando eventos como Seminários e Conferências na área. Todos os
números do periódico encontram-se disponíveis no site do Grupo. www.ecdgroup.com
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo