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Comunitário do Bom Jardim (MSM)
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. O trabalho dela na Marrocos iniciou a partir de uma
experiência de assalto contra ela e outras pessoas.
Nós trabalhamos [MSM] em várias comunidades aqui no Bom Jardim. No
Pantanal, em 1994, que foi uma Ocupação, onde inclusive foi a primeira que
nos entramos assim com esse trabalho de assistência as pessoas nas
comunidades. Depois trabalhamos em outras, como a Nova Canudos, Oito
de dezembro, Mutirão, dentre outras que eu não lembro. Por ultimo foi na
Marrocos. Que a gente encontrou assim por acaso (risos)! Nós andávamos a
passeio pela Comunidade que a gente tava conhecendo naquele momento
[Eunice, uma italiana que visitava o MSM e outro integrante da ONG],
divulgando uma novena, e de repente nos fomos assaltadas. Aí, eu e outra
menina que trabalhava comigo pensamos: “olha quando acontece uma
coisa dessas é por que alguém tá precisando de algo”! Então nos
imaginamos que ali precisava de alguém que olhasse pra eles, que visse a
necessidade deles, a vida de pobreza e miséria que eles levavam. E a partir
daí nos começamos um trabalho lá, com novenas e atendimento pessoal
aos
moradores (Eunice, voluntária no MSM).
Importante destacar que este primeiro contato ocorreu quando na Marrocos ainda não
existiam ruas, iluminação e nem água. Isso, em si, já foi um cenário que mobilizou uma série
de expectativas em relação ao lugar de moradia de pessoas que viviam em condições de
intensa precariedade material. Sobre o assalto sofrido por Eunice e as outras pessoas de seu
grupo, ela relatou:
A história do assalto foi interessante! Nós íamos visitar o Pantanal
[Ocupação Santo Amaro], que a ente já conhecia por trabalhar lá há muito
tempo. Aí gente foi levar uns italianos [duas irmãs Combonianos] para
conhecer o Pantanal. Aí nesse dia resolvemos ir mais além, aí chegamos no
Marrocos, mas ninguém sabia que era Marrocos, não sabia né! Entramos lá
e elas [as irmãs Combonianas] começaram a tirar fotos dos buracos, dos
meninos que encontravam, aí de repente um cara anunciou o assalto. Eu
nem tinha percebido que era um assaltou! Quando eu percebi foi quando eu
já vi as meninas no chão. E ainda achei que era brincadeira, porque era um
rapaz novim, acho que adolescente, nem sei... “Deita no chão”, aí eu vi né e
deitei! Aí ele colocou o revolver no meu ouvido. Eu disse pronto meu Deus é
hoje (risos)! Eu digo é hoje, porque ele disse passa tudo, nós não tínhamos
nada, só tínhamos mesmo a máquina que a irmã tinha levado, mas nada! Eu
disse agora pronto, chegou minha hora, porque eu não tinha nada e como
era à última e ele tava com revolver no meu ouvido, eu digo agora pronto.
Mas aí a menina passou a máquina e ele foi embora
(idem).
O evento do assalto produziu uma espécie de “estalo” para situação da Comunidade
que, na perspectiva das vítimas do crime, sofria de uma situação de precariedade material e
simbólica. De acordo com os desdobramentos narrados por Eunice, percebi que o medo foi
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O Movimento de Saúde Mental Comunitária do Bom Jardim (MSM) é um organização cuja missão é oferecer
a população um atendimento psicossocial aos moradores da região do GBJ. Ademais, o MSM atende crianças,
jovens, adultos e idosos, oferecendo cursos de teclado, violão, teatro, bordado e cursos profissionalizantes como
informática, vendas e manutenção de computador. Além disso, conta com um cursinho pré-vestibular para
jovens e adultos das comunidades do Bom Jardim.