Download PDF
ads:
81,9(56,'$'(
(67$'8$/'(/21'5,1$
LUCIANA PEREIRA TABOSA
CONSTRUÇÕES CAUSATIVAS DA LÍNGUA KAINGANG
LONDRINA
2006
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
LUCIANA PEREIRA TABOSA
CONSTRUÇÕES CAUSATIVAS DA LÍNGUA KAINGANG
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Estudos da Linguagem, da
Universidade Estadual de Londrina, como
requisito parcial à obtenção de título de
Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Ludoviko dos Santos.
Londrina
2006
ads:
Catalogão na publicação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da
Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina.
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
LUCIANA PEREIRA TABOSA
T114c Tabosa, Luciana Pereira.
Construções causativas da língua kaingang / Luciana
Pereira Tabosa. Londrina, 2006.
103f.
Orientador: Ludoviko dos Santos.
Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem)
Universidade Estadual de Londrina, 2006.
Bibliografia: f. 100-103.
1. Língua kaingang Verbos Teses. 2. Construções causativas
Verbos Teses. I. Santos, Ludoviko dos. II. Universidade Estadual de
Londrina. III. Título.
CDU
LUCIANA PEREIRA TABOSA
CONSTRUÇÕES CAUSATIVAS DA LÍNGUA KAINGANG
Dissertação apresentada ao Curso de
Mestrado em Estudos da Linguagem, da
Universidade Estadual de Londrina, como
requisito parcial à obtenção de título de
Mestre.
COMISSÃO EXAMINADORA
Prof. Dr. Ludoviko dos Santos
Universidade Estadual de Londrina
Profª. Drª. Lucy Seki
Universidade Estadual de Campinas
Profª. Drª. Vanderci Aguilera
Universidade Estadual de Londrina
Londrina, 23 de março de 2006.
À minha família e ao Ricardo que muito me incentivaram na
realização deste trabalho.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ser minha fonte de força e ter me abençoado ao permitir mais uma
conquista.
Aos meus pais, José e Nair, por acreditarem em meus ideais.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Ludoviko dos Santos, pela dedicação, amizade, incentivo,
paciência e por toda a atenção prestada a mim ao orientar-me no estudo da língua
kaingang desde a Graduação ao Mestrado.
Aos meus irmãos, Edemilcio, Nice, Cida, Lúcia, Ivone e Fátima, pelo apoio e motivação.
Ao meu noivo Ricardo que sempre se mostrou disposto a me ajudar a concretizar meus
projetos.
Ao meu cunhado, Nelson, pelo apoio e sugestões oferecidas ao meu trabalho.
Aos informantes professores bilíngües da Escola Cacique Luís Pénky Pereira, pela
acolhida, paciência e disponibilidade a mim dispensadas durante meu trabalho de
campo.
Aos colegas do projeto de pesquisa Elaboração de uma gramática pedagógica para a
língua kaingang, pelas importantes discussões e reflexões sobre a língua.
À CAPES, pela bolsa que permitiu o desenvolvimento de minhas atividades de
pesquisa.
Aos professores e colegas do Curso de Mestrado em Estudos da Linguagem e a todos
que de alguma maneira contribuíram para a realização deste trabalho.
TABOSA, Luciana Pereira.
Construções causativas da língua kaingang
. 2006.
Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem) Universidade Estadual de
Londrina.
RESUMO
Este trabalho descreve as construções que participam da alternância causativa,
construções formadas por redução de valência envolvendo o sujeito e a formação das
construções causativas da língua kaingang. Tem como objetivos: abordar, de um ponto
de vista descritivo, as orações formadas com verbos de alternância causativa e a
formação das construções causativas; subsidiar a produção de material de fácil acesso
a professores bilínes das escolas indígenas do Norte do Paraná e contribuir com a
descrição da língua kaingang. Para coleta de dados utiliza questionários constituídos de
orações, em português, que apresentam as estruturas do objeto de análise. Tem como
informantes os professores bilíngües da Escola Cacique Luís Pénky Pereira localizada
na Terra Indígena Apucaraninha. Aponta como principais resultados: a) não ocorre
mudança na forma verbal nas construções formadas com verbos recíprocos e
reflexivos; b) ocorre causativo morfológico nas construções que participam da
alternância causativa; c) existem alguns exemplos de causativos lexicais; d) as
construções causativas formadas de verbos intransitivos, monotransitivos e ditransitivos
são exemplos de causativos analíticos.
Palavras – chave:
kaingang - verbo - causatividade
TABOSA, Luciana Pereira.
Causative constructions of kaingang language
. 2006.
Dissertação (Mestrado em Estudos da Linguagem) Universidade Estadual de
Londrina.
ABSTRACT
This work describes the constructions that participate of the causative alternation, that
constructions formed by valence reduction involving the subject and the formation of the
causative constructions of the language kaingang. It has as objective: to approach, from
a descriptive point of view, the conjuncts formed with verbs of causative alternation and
the formation of the causative constructions; to make possible material of easy access to
bilingual teachers of the aboriginal schools in northern Paraná state and to contribute
with the description of the language kaingang. For data collecting it uses questionnaires
consisting of sentences in Portuguese that present the structures of the analysis object.
It has as informing people the bilingual teachers of the Chieftain Luís Penky Pereira
School, located in the aboriginal land called Apucaraninha. It points as main results: a)
change in the verbal form in the constructions formed with reciprocal and reflective verbs
does not occur; b) occurs morphologic causative in the constructions that participate of
the causative alternation; c) some examples of lexical causative exist; d) the formed
causative constructions of intransitive, monotransitive and ditransitive verbs are
examples of analytical causative.
Key words:
kaingang - verb - causativity
LISTA DE ABREVIATURAS
AC
acusativo
AG
agente
caus.
causativo
fem.
feminino
ind. erg.
indicador de ergativo
ms
marcador de sujeito
NOM
nominativo
OD
objeto direto
OI
objeto indireto
Pas.
passado
p.p. 1ª p.
pronome possessivo de 1ª pessoa
reflex.
reflexivo
sing.
singular
SUJ.
sujeito
?
não se tem certeza quanto à tradução
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 11
2 KAINGANG: TERRAS INDÍGENAS E ORGANIZAÇÃO SOCIAL ........................ 17
2.1 Distribuição Geográfica .................................................................................... 17
2.2 Característica do Grupo Indígena da Terra Indígena Apucaraninha ................ 18
2.2.1 Informações sobre a Escola Cacique Luís Pénky Pereira ............................. 19
2.3 Organização Social dos Kaingang .................................................................... 21
3 TRANSITIVIDADE ............................................................................................... 23
3.1 Conceito de Transitividade ............................................................................... 23
3.2 Classificação dos Verbos ................................................................................. 27
3.3 Verbos Intransitivos .......................................................................................... 29
3.3.1 Verbos Inergativos......................................................................................... 29
3.3.2 Verbos Inacusativos ...................................................................................... 30
3.3.2.1Tipos de Verbos Inacusativos....................................................................... 33
3.3.2.1.1 Construções Inacusativas com Verbos de Mudança de Estado Devido à
Causa Externa ........................................................................................................ 34
3.3.2.1.1.1 Verbos de Alternância Causativa........................................................... 35
4 VERBOS FORMADOS DE VERBOS COM MUDANÇA DE VALÊNCIA E FORMAÇÃO
DO VERBO CAUSATIVO ....................................................................................... 40
4.1 Verbos Formados de Verbos com Mudança de Valência ................................. 40
4.1.1 Mudança de Valência Não Envolvendo o Sujeito ........................................... 40
4.1.2 Mudança de Valência Envolvendo o Sujeito .................................................. 41
4.1.2.1 Diminuição de Valência .............................................................................. 42
4.1.2.1.1 Anticausativo ............................................................................................ 42
4.1.2.1.2 Recíproco ................................................................................................ 45
4.1.2.1.3 Reflexivo .................................................................................................. 46
4.1.2.2 Aumento de Valência .................................................................................. 47
4.2 Verbos Causativos ............................................................................................ 47
4.2.1 Causativos Analíticos, Morfológicos e Lexicais ............................................. 50
4.2.2 Argumentos Causer” e Causee.................................................................. 54
4.2.3 Causativos Formados de Verbos Intransitivos .............................................. 56
4.2.4 Causativos Formados de Verbos Monotransitivos ......................................... 57
4.2.5 Causativos Formados de Verbos Ditransitivos .............................................. 59
4.2.6 Verbos Causativos e Hierarquia de Caso ...................................................... 60
4.2.7 Causativos Formados de Intransitivos, Monotransitivos e Ditransitivos em
Português ............................................................................................................... 61
5 ANÁLISE ............................................................................................................. 64
5.1 Estudos do Nível Morfossintático da Língua Kaingang ..................................... 64
5.2 Ordem Oracional da Língua Kaingang ............................................................. 66
5.3 Mudança de Valência Envolvendo o Sujeito ..................................................... 68
5.3.1 Diminuição de Valência ................................................................................. 68
5.3.1.1 Verbos de Alternância Causativa ................................................................ 68
5.3.1.1.1 Similaridade entre Construções Inacusativas e Passivas ........................ 78
5.3.1.2 Oração com Verbo Recíproco .................................................................... 80
5.3.1.3 Oração com Verbo Reflexivo ...................................................................... 82
5.4 Construções Causativas ................................................................................... 84
5.4.1 Causativos Morfológicos, Analíticos e Lexicais em Kaingang ....................... 84
5.4.1.1 Causativos Formados de Verbos Intransitivos em Kaingang ..................... 87
5.4.1.2 Causativos Formados de Verbos Monotransitivos em Kaingang ................ 90
5.4.1.3 Causativos Formados de Verbos Ditransitivos em Kaingang ..................... 92
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 96
7 BIBLIOGRAFIA .................................................................................................... 100
11
1 INTRODUÇÃO
A realização deste trabalho foi motivada pelo interesse despertado pela
língua kaingang desde quando ingressei no Curso de Letras, mais precisamente nas
aulas de lingüística teórica ministradas pelo professor Ludoviko dos Santos, nas quais,
além dos conteúdos programáticos, tive a oportunidade de conhecer a importância de
estudar as línguas indígenas tendo em vista que, no Brasil, existem cerca de 170
línguas e um reduzido número de pesquisadores que se dedicam
a elas. Muitas ainda
não foram objeto de pesquisa.
Falada por aproximadamente 25.000 pessoas distribuídas em mais de
trinta Terras Indígenas nos Estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio
Grande do Sul, a língua kaingang pertence à família linística Jê, do tronco Macro-Jê.
Durante a graduação, participei do projeto Abordagem do Nível
Morfossintático da Língua Kaingang sob o Ponto de Vista do Funcionalismo Givoniano
(SANTOS e PONTES, 1997) do qual fui bolsista de iniciação cienfica nos anos de 98 e
99.
O projeto contava, no início, com aproximadamente 20 alunos, depois
este número foi se reduzindo devido à falta de interesse, dificuldades na leitura dos
textos teóricos e falta de disponibilidade para viajar até a Terra Indígena para coleta de
dados. Porém,
meu interesse pela língua aumentava a cada reunião do projeto e a
cada visita à Terra Indígena Apucaraninha onde
tive a oportunidade de entrar em
contato com a realidade escolar e com os professores bilíngües. Lá pude
12
constatar a importância e a necessidade de pesquisar a língua kaingang de maneira
que favorecesse a elaboração de material para a consulta dos professores.
Minha pesquisa, realizada durante os anos em que participei do projeto,
resultou no trabalho Orações simples da língua kaingangapresentado no XIII CELLIP
Centro de Estudos Lingüísticos e Literários do Paraná.
Durante o projeto
senti dificuldade em lidar com a categoria dos
determinantes
que resultou em motivação para elaborar a minha monografia
denominada Descrição Preliminar dos Pronomes Possessivos da Língua Kaingang
(TABOSA, 2002) para o curso de Especialização em Língua Portuguesa. A princípio,
meu objetivo era descrever todos os pronomes da língua kaingang, mas, devido ao
curto período do curso, tive que me restringir apenas à descrição dos pronomes
possessivos. Ao analisar os dados coletados, constatei uma mudança
da forma verbal
em orações transitivas e intransitivas que chamou a minha atenção; na época, não me
aprofundei porque não era objeto da pesquisa. Interessada em investigá-la, resolvi
analisar a variação do verbo em minha dissertação de Mestrado.
Tendo como base a pesquisa desenvolvida durante a Especialização e
Mestrado, elaborei os seguintes artigos: Variação das formas do plural e do singular
nos verbos do kaingang” (TABOSA, 2004), apresentado no II Encontro Científico do
Curso de Letras O Desafio das Letras; Descrição preliminar dos pronomes
possessivos da língua kaingang” (TABOSA, 2004), apresentado no IV Selisigno –
Semirio de Estudos sobre Linguagem e Significação e IV Simpósio de Leitura da
UEL; Variação da forma verbal na língua kaingang: causatividade(TABOSA, 2005),
apresentado no XVII Seminário do CELLIP e Hitese de causatividade na mudança
13
da forma verbal na língua kaingang” (TABOSA, 2005), publicado na Revista
Entretextos.
Os dois verbos utilizados nos dados da monografia - quebrare
“rasgar” - são verbos de alternância causativa e apresentam uma variante causativa
transitiva e uma variante não causativa inacusativa. Para o presente trabalho, utilizei
estes e outros verbos de alternância causativa, além de outros verbos que possibilitam
a formação de orações causativas.
Os capítulos 3 e 4 referem-se à teoria pesquisada para fazer a
descrição e análise das construções causativas da língua kaingang: o capítulo 3 versa
sobre o conceito de transitividade e classificação dos verbos, com ênfase na definição
dos verbos inacusativos e verbos de alternância causativa. Para discorrer sobre estes
verbos, adotei, principalmente, os pressupostos teóricos de Duarte (2003); o capítulo 4
tem como principal fonte teórica Comrie (1976, 1985) e versa sobre a formação de
verbos por diminuição de valência envolvendo o sujeito – anticausativos, recíprocos e
reflexivos e por aumento de valência envolvendo o sujeito – os verbos causativos.
Com relação aos verbos anticausativos, pude estabelecer semelhanças entre o termo
inacusativo apresentado por Duarte (2003) e o termo anticausativo apresentado por
Comrie (1985) (cf. p 44-45). Apesar de estar consciente de que se trata de modelos
teóricos diferentes, optei por usar esses autores porque são os que apresentam de
forma mais clara os problemas envolvidos na causatividade.
Quanto à formação das orações causativas, pude perceber que a
causatividade é um fenômeno que pode ser expresso de maneiras diferentes de uma
língua para outra, umas utilizam procedimentos morfológicos, outras sintáticos,
14
enquanto outras utilizam procedimentos lexicais. Há também línguas que utilizam mais
de um processo.
Baseada na teoria da Comrie (1976, 1985) sobre as orações causativas
formadas de verbos intransitivos, monotransitivos e ditransitivos, minha hipótese é a de
que a língua kaingang apresente causativo morfológico.
Antes de apresentar o referencial teórico, no capítulo 2, fiz algumas
breves considerações sobre as Terras Indígenas kaingang, dando ênfase à Terra
Indígena Apucaraninha onde realizei a coleta de dados. Também apresentei, neste
capítulo, a organização social dos kaingang ressaltando sua inflncia na língua.
Os objetivos que pretendo alcançar com a realização deste trabalho
são: abordar, de um ponto de vista descritivo, as orações formadas com verbos de
alternância causativa e a formação das construções causativas da língua kaingang;
subsidiar a produção de material de fácil acesso a professores bilingües das escolas
indígenas do Norte do Paraná e contribuir com a descrição da língua kaingang. Estes
objetivos estão relacionados com o projeto de pesquisa/UEL do qual faço parte
atualmente: Elaboração de uma gramática pedagógica para a língua kaingang,
coordenado por Ludoviko dos Santos e financiado pela Fundação Araucária.
Realizei a coleta de dados na Escola Cacique Luís Pénky Pereira
situada à Terra Indígena Apucaraninha durante um período de aproximadamente cinco
meses. Os informantes foram os professores bilíngües Manoel Norég Mág Felisbino,
Pedro Kagre Kág Cândido de Almeida, Jorge Rir de Almeida e João Santos de Oliveira
(todos indígenas). Nas reuniões para coleta, contei também com a colaboração dos
15
professores Jandira Grisãnh Felisbino, Rosângela Maria Santana e Rosenês Aparecida
Tomarozi Carvalho.
Segundo Santos (1997), a coleta de dados deve ser realizada de
maneira que proporcione uma interação entre o trabalho do lingüista e o trabalho do
informante. Assim como o lingüista aprende coletando dados, o informante tamm
deve aprender a respeito de sua língua ponte (no caso, o português). Como na
realização deste trabalho tive o privilégio de trabalhar com informantes professores
bilíngües, tornou-se indispensável que, durante as sessões para coleta de dados, fosse
explicado qual fenômeno lingüístico se busca na língua em análise e qual seu
correspondente em português. Procedendo dessa forma, acredito que posso contribuir
com os professores bilingües instrumentalizando-os no que diz respeito à relação entre
o português e o kaingang favorecendo assim, o ensino na escola da Terra Indígena
Apucaraninha.
O relacionamento com os informantes foi agradável e procurei coletar
os dados de maneira contextualizada, pois acredito que:
O papel do informante o se limita, necessariamente, a ser um
fornecedor de dados habilmente elicitados pelo pesquisador, o que
caracteriza uma interação como algo mais abrangente, isto é, o
informante deve ser um interlocutor ativo no sentido de haver uma troca
de informações úteis não só para o pesquisador, mas também para o
informante, levando-o a o apenas falar sua língua mas tamm a
falar sobre ela. (SANTOS, 1997, p. 21)
A coleta dos dados seguiu os passos abaixo.
1) Elaboração de orações formadas por diminuição de valência
envolvendo o sujeito, orações com verbos de alternância causativa e orações
16
causativas formadas de verbos intransitivos, monotransitivos e ditransitivos em
português.
1
2) Elicitação dos dados.
Para coletar os dados, eu escrevia as orações em português no quadro
e em seguida os informantes escreviam as orações correspondentes em kaingang. Ao
analisar os dados, constatei que era necessário confirmar e testar algumas orações,
para isso eu escrevia diretamente as orações em kaingang no quadro e perguntava
para o informante se as mesmas estavam corretas ou não.
No capítulo da análise, os dados estão organizados em três linhas: na
primeira, consta a descrição ortográfica da oração em kaingang, segundo Wiesemann;
na segunda, apresentam-se as glosas das palavras e partículas e, na terceira, a
tradução livre do exemplo.
1
Estas orações correspondem à tradução livre das sentenças do kaingang no capítulo da análise.
17
2 KAINGANG: TERRAS INDÍGENAS E ORGANIZAÇÃO SOCIAL
Este capítulo tem como objetivos: a) situar as Terras Indígenas
kaingang quanto à localização geográfica, com ênfase nas características da Terra
Indígena Apucaraninha e b) fazer uma breve abordagem sobre a organização social do
povo kaingang tendo em vista que esta possui influência na língua.
A divisão do capítulo está feita da seguinte forma: a seção 2.1 situa as
Terras Indígenas kaingang geograficamente; a seção 2.2 apresenta informações sobre
a Terra Indígena Apucaraninha, e a seção 2.3 discorre sobre a organização social dos
kaingang.
2.1 Distribuição Geográfica
Os índios kaingang pertencem ao grupo Jê e estão distribuídos em
mais de trinta Terras Indígenas nos Estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e
Rio Grande do Sul.
No Paraná há 15 Terras Indígenas sendo que no Norte encontram-se
as Terras Indígenas Apucaraninha, Barão de Antonina e São Jerônimo da Serra. Fiz a
coleta de dados com professores bilíngües do Apucaraninha, por isso achei oportuno
apresentar as principais características do grupo indígena desta T.I.
2
2
T.I. corresponde à abreviatura de Terra Indígena.
18
2.2 Características do Grupo Indígena da Terra Indígena Apucaraninha
Segundo relatório do Grupo M
3
(1996), esta T.I. compreende
aproximadamente 6.505 hectares e situa-se no distrito de Lerroville –
Município de
Tamarana entre os rios Apucaraninha ao Norte, rio Apucarana ao Sul, rio Tibagi a Leste
e, a Oeste, por trechos de pequenos rios, estradas, represas e propriedades
particulares. Conforme o censo de 1996, a população era de 794 kaingang, atualmente
conta com aproximadamente 1500 indivíduos.
Nesta T. I. há uma escola, uma enfermaria, galpão para maquirios e
implementos agrícolas, salão de festa, cadeia e duas igrejas: uma católica e outra do
Cristianismo Decidido. Existem casas pré-fabricadas, de madeira e ranchos tradicionais.
O relatório informa que 80% da área de preservação do Município
encontra-se nesta T. I. e que há uma usina hidrelétrica da COPEL que paga à
comunidade uma renda anual sobre o uso da área abrangida pela usina.
A economia dos kaingang se baseia no artesanato, agricultura de
subsistência, trabalho assalariado e criação de animais. A prática agrícola se faz por
meio de roças comunitárias onde cada família planta para se sustentar. Cultivam arroz,
feijão, milho, abóbora, batata doce, mandioca, etc.
Há índios assalariados que são
funcionários da FUNAI e das prefeituras que exercem funções de enfermeiros, técnicos
e professores. Outra forma de assalariamento acontece nas
épocas de roçado quando
prestam serviços às fazendas da região. A criação de gado beneficia a comunidade por
meio da distribuição de leite e de carne, inclusive para a realização da Festa do Dia do
3
Este grupo prestava assessoria pedagica às Terras Indígenas do Norte do Paraná.
19
Indígena. Algumas famílias ainda criam porcos, galinhas ou patos para o consumo de
carne e de ovos. Uma importante forma de obtenção de renda é o artesanato,
principalmente balaios e cestos que são vendidos nas margens das rodovias ou nos
centros urbanos.
Conforme aborda o relatório do Grupo M gem o cacique
que escolhe o vice-cacique e as
demais lideranças que o auxiliarão nas questões de
interesse da comunidade como a
organização de mutirões e a procura de soluções dos
problemas da comunidade.
2.2.1 Informações sobre a Escola Cacique Luís Pénky Pereira
A coleta de dados deste trabalho realizou-se na Escola Cacique Luís
Pénky Pereira. De acordo com o Grupo M
A escola antes denominada Xavier da Silva foi instalada por volta de
1970. Mas é somente em 30/11/82 através da resolução nº 3.221/82 da
SEED que a escola denominada Cacique Luís Pénky Pereirarecebeu
autorização de funcionamento. Esse nome foi escolhido em homenagem
ao cacique que comandou a área por 37 anos. Funcionava nos moldes
das escolas tradicionais fazendo com que a criança kaingang falante de
sua própria língua tivesse que aprender a ler e escrever em portugs
com uma professora não-indígena tão logo chegasse à escola. O
aprendizado de sua língua materna estava restrito ao ensino Pré-
Escolar. (p. 32)
Em 1988, o sistema de ensino alterou-se devido ao trabalho conjunto
UEL-FUNAI e Grupo M ão do ensino indígena
elucida a tentativa de formalização e reconhecimento pelo Estado de
uma educação escolar indígena específica, diferenciada, intercultural e
bilíne encaminhada pela programadora educacional da FUNAI Inelci
Deitos Aco, membro integrante do grupo M
20
De acordo com o relato do professor bilingüe Manoel Norég Mág
Felisbino, antes desta alteração, o primeiro ano era ensinado em kaingang, a partir do
segundo ano o ensino era feito em português com professor não indígena que
alfabetizava os alunos novamente. Segundo Silva (1996), atualmente o ensino está
organizado da seguinte maneira: na pré-escola e na primeira série, o ensino ocorre
somente em kaingang, depois há um período de transição no qual a língua falada é o
português e a escrita continua sendo o kaingang, na terceira e quarta séries o ensino
ocorre quase que exclusivamente na língua portuguesa com apenas uma hora
dedicada ao estudo da língua kaingang.
De acordo com esta autora, a alfabetização na língua materna é mais
produtiva porque as crianças já dominam seu sistema fonológico, só precisam associar
o som à forma gráfica correspondente. As crianças alfabetizadas na língua kaingang
apresentam dificuldades para aprender o português porque o sistema fonológico é
diferente e apresentam maior dificuldade na fase de transição porque algumas letras
usadas em kaingang não possuem correspondência em português e vice-versa.
Em 1993, o prédio da escola passou por uma reforma e a nova
estrutura conta com 1 refeitório e cozinha, uma sala de estudos, uma sala de ensino
pré-escolar, uma sala de alfabetização (fase I e II) e uma sala de transição (3ª e 4ª
séries). A escola funciona em dois turnos, somente a 3ª e 4ª séries são agrupadas. O
quadro docente é constituído por três professores não indígenas e sete indígenas.
21
2.3 Organização Social dos Kaingang
Em sua dissertação de Mestrado, Veiga (1994) elaborou uma revisão
bibliográfica crítica sobre a organização social dos kaingang. Segundo a autora, O
aspecto fundamental da organização social dos kaingang é a divisão nas metades
exogâmicas
KAMÉ
e
KA
, que se opõem e se complementam [...]” (VEIGA, 1994, p.
58, grifo da autora).
A metade KAMÉ está relacionada ao Oeste e utiliza pintura facial com
motivos compridos e a metade KA
caracteriza-se por motivos redondos. Conforme expõe Veiga, cada metade comporta
duas seções: a metade KAMÉ comporta as seções Kamé e Wonhétky e a metade
KA ões Ka ão a uma metade e seção é definida
patrilateralmente: os filhos, de ambos os sexos, pertencem à metade e seção de seu
pai, esse procedimento connuo através das gerações estabelece o caráter patrilinear
da sociedade kaingang. (VEIGA, 1994, p. 59).
Conforme relata Nimuendaju (1913), as metades são homônimas dos
heróis míticos:
A tradição dos kaingang conta que os primeiros desta nação saíram do
chão (...) Saíram em dois grupos, chefiados por dois irmãos por nome
Kañerú
e
Kamé
, sendo que aquele saiu primeiro. Cada um já trouxe um
número de gente de ambos os sexos. Dizem que
Kañerú
e sua gente
toda eram de corpo fino, peludo, s pequenos, ligeiros tanto nos seus
movimentos como nas suas resoluções, cheios de iniciativa, mas de
pouca persistência.
Kamé
e os seus companheiros, ao contrário, eram
de corpo grosso, pés grandes, e vagarosos nos seus movimentos e
resoluções. (apud VEIGA, 1994, p. 59-60, grifo do autor)
22
Veiga expõe que os seres e objetos do mundo natural, com exceção da
terra, do céu da água e do fogo, relacionam-se a estas metades de acordo com a
aparência que tenham para os kaingang: se são considerados “redondosclassificam-
se como Ka ão considerados compridos, como Kamé (tér). Nimuendajú
(1913) discorre sobre este fato:
Todos ainda manifestam sua descendência ou pelo seu temperamento
ou pelos traços sicos ou pela pinta [pintura]. O que pertence ao clã
Kañeru
é malhado, o que pertence ao clã
kamé
é riscado. O kaingang
reconhece essas pintas tanto no couro dos animais como nas penas dos
passarinhos, como também na casca, nas folhas, ou na madeira das
plantas. Das duas qualidades da onça pintada, o acanguçu é
kañeru
, o
fagnareté (sic) é
Kamé
. A piava é
Kañeru
, e por isso ela vai também
adiante na piracema. O dourado é
kamé
. O pinheiro é
Kañeru
, o cedro
é
Kamé
, etc. (apud VEIGA, 1994, p. 60-61, grifo do autor)
As duas metades possuem caráter clânico o que define as regras do
casamento. É possível verificar também influência destas metades na língua: os
substantivos têm uma subclassificação, ou seja, subst./subclasse redondo e
subst./subclasse comprido. A concordância de número se realiza apenas entre os
substantivos subclassificados como redondos. Para maiores detalhes deve ser
consultado o trabalho de Almeida e Santos(2005) “A concorncia de número em
kaingang.
23
3 TRANSITIVIDADE
Os objetivos deste capítulo são: a) fazer uma abordagem sobre a
definição de transitividade de acordo com uma concepção formal e nocional e b)
discorrer sobre a classificação dos verbos, com atenção especial dada aos verbos
inacusativos e verbos de alternância causativa.
O capítulo está assim dividido: na seção 3.1, apresento a definição de
transitividade; na seção 3.2, a abordagem de alguns autores sobre a classificação dos
verbos e na seção 3.3, os tipos de verbos intransitivos com destaque dado aos verbos
inacusativos e de alternância causativa.
Na elaboração do capítulo segui a abordagem teórica de Lyons (1979),
Vilela (1992), Campos (1999), Mendikoetxea (1999), e Duarte (2003).
3.1 Conceito de Transitividade
De acordo com Lyons, A concepção nocionaltradicional de
transitividade e o termo em si sugerem que o efeito da ação expressa pelo verbo
passado agente(ou ator), para o paciente(ou meta)”. (LYONS, 1979, p. 370)
O autor, porém,
ressalta a impropriedade dessa definição nocionalde
transitividade com relação a muitas frases. Se a definição diz que o efeito da ação
passa do agente para o paciente, nem todos os verbos transitivos correspondem a esse
conceito, como, por exemplo, o verbo ouvir” na frase Eu o ouçona qual a ação é em
sentido contrário.
24
Segundo o autor, essa crítica feita sobre a noção tradicional de
transitividade é, dentro dos seus limites, exata. Porém é preciso ter cautela, ele
ressalta, ao se ao se traçar a distinção entre definição formale nocional. O fato de a
definição semântica ou nocionalser aplicável à maioria dos verbos de dois lugares é
suficiente para que toda essa classe de verbos seja chamada transitiva, embora
[...]a classe dos verbos sintaticamente transitivos inclua, sem dúvida,
muitos outros, no inglês ou noutras línguas, que não se refiram a ações
cujos efeitos passamde um atorpara uma meta, não deixa de ser
verdade que o conceito nocional’ tradicional de transitividade seja
claramente aplicável à maioria dos verbos transitivos, do ponto de vista
sintático, ou formal.” (LYONS, 1979. p.370-371)
Campos (1999) também esclarece que a definição de que a ação passa
ao complemento é insuficiente para definir verbo transitivo. O autor apresenta um
histórico de todas as definições de transitividade. Segundo ele, nas gramáticas latinas,
orações transitivas eram aquelas que podiam passar de ativas a passivas. Esta
definição é adotada pelas gramáticas descritivas tradicionais. As gramáticas com base
escolástica definem verbo transitivo como aquele capaz de passar sua ação ao
complemento. O autor também ressalta que na lingüística estrutural há poucos estudos
sobre transitividade. Em seguida, Campos apresenta os postulados de Hjelmslev
(1972), Tesniére (1966: 103), Bello (1847) e RAE (1931). Estes autores afirmam que o
verbo determina o complemento que rege, portanto esta definição se refere à noção de
regência:
Esta propuesta se elabora en Tesniére 1966: 103, donde se proponen
dos planos lingüísticos: un plano de conexiones estructurales y outro de
conexiones semánticas. En el plano sintáctico, el verbo es el elemento
regente del cual dependen los complementos subordinados. En el plano
semántico, el verbo es el determinado y el sustantivo-objeto viene a
completar su significado, de allí el término de complemento. Verbo
25
transitivo, entonces, es aquel que tiene la capacidad de aparecer con un
complemento directo, el cual está regido por el verbo y el cual completa
el significado del verbo.” (CAMPOS, 1999, p. 1521)
Por último, o autor apresenta a definição da gramática gerativa que
trabalha com a noção de domínio. Segundo Campos, Chomsky (1965: 71) define o
complemento direto como a relação entre o sintagma nominal e o verbo dentro do
sintagma verbal no qual o complemento direto é o constituinte dominado pelo sintagma
verbal, já o sujeito é definido como o sintagma nominal dominado pelo nódulo O
(oração).
Ao discorrer sobre o conceito de transitividade, Vilela (1992) diz que,
nas múltiplas definições de transitivo e intransitivo, há traços recorrentes e o que mais
insistentemente surge
é o que aponta para a existência de um complemento, a que nas
gramáticas de língua portuguesa se chama complemento directo
(verbos transitivos diretos), complemento indireto(verbos transitivos
indirectos), ou os dois simultaneamente (transitivos directos e
indirectos).” (VILELA, 1992, p. 48).
Um outro traço ressaltado considera transitivos apenas os verbos cujos
complementos diretos são capazes de ser promovidos a sujeitos na passiva, o que leva
à exclusão de alguns grupos de verbos. Outros critérios, segundo Vilela, apontam ou
para traços semânticos como a presença de paciente, resultativoe objeto afetadoou
para traços sintáticos, como objeto/argumento interno, etc. No fundo, há a intenção de
definir por meio de traços semanto-sintácticos (sic) as funções que os termos assumem
na frase.” (VILELA, 1992, p.48).
26
Assim, o autor define como transitivo todo verbo que tenha um ou mais
complementos, obrigatórios ou facultativos, e a transitividade como algo que é
graduável, em que os traços fundamentais são a qualidade semântica do lexema
verbal, a existência de um complemento direto, a capacidade de passivização e a
chamada ergatividade. (VILELA, 1992, p.50).
Vilela distingue entre uma transitividade fortee uma transitividade
fracacom o seguinte quadro:
Transitividade forte
Transitividade fraca
dois ou mais complementos
um complemento
presença de acção
ausência de acção
presença de direccionalidade
ausência de direccionalidade
Intencional
não intencional
agente capaz de ação
agente não activo
objecto totalmente afectado
objecto não afectado
objecto (bem) individuado
objecto não individuado
(VILELA, 1992, p.50)
Para o autor uma frase será mais transitiva quanto mais traços de
transitividade forte apresentar. O traço número de actantesnão tem qualquer valor
superordenado relativamente aos critérios restantes: uma frase com apenas um actante
pode ser (+ transitiva) do que outra com dois complementos. A oração Suzana come
(VILELA, 1992, p. 51) apresenta o traço (+ tr.) em relação à oração O Alberto ama as
crianças” (VILELA, 1992, p. 51) que apresenta o traço (- tr.) porque o sujeito de amaré
mais o centro psicológico da ação do que propriamente o centro da ação.
27
Diversos autores trabalham com a classificação dos verbos. Alguns,
como Lyons (1979), enfatizam mais o caráter formal da classificação, outros abordam
tanto a noção formal como nocional. Abaixo segue a abordagem de alguns autores
sobre a classificação de verbos.
3.2 Classificação dos Verbos
Lyons (1979) trabalha a classificação dos verbos de acordo com o
número de expressões nominais com que se combinam nos núcleos de frases. Assim,
verbos de apenas um lugar, ou seja, verbos que exigem apenas uma expressão
nominal, como morrer”, são chamados de intransitivos. Um verbo que apresenta dois
lugares, sendo um deles preenchido pelo sujeito e o outro pelo objeto, são chamados
de transitivos, como por exemplo, o verbo matar”. Também são verbos transitivos
aqueles de três lugares, ocupados por um sujeito, um objeto direto e um objeto indireto
ou locativo direcional.
Mendikoetxea (1999) argumenta que a classificação de um verbo como
transitivo ou intransitivo é algo intrínseco a seu significado e independente do uso
concreto desse verbo com ou sem complemento. Segundo a autora, é necessário
atender a critérios semânticos e sintáticos para definir um verbo transitivo e um
intransitivo. Assim, ela define como transitivos os verbos que denotam um estado ou
evento que requer a existência de dois participantes ou argumentos. Nas orações
ativas, um dos participantes se realiza como sujeito (argumento sujeito) e o outro como
complemento do verbo (argumento objeto). O argumento sujeito pode ser um
experimentante ou agente e o argumento objeto é paciente ou tema. O verbo
28
intransitivo é aquele que denota uma atividade ou evento que requer semanticamente
somente um argumento. Este argumento se realiza sintaticamente como sujeito da
predicação e pode ser agente ou paciente. Esta distinção é crucial para diferenciar as
duas classes de verbos intransitivos que será apresentada no decorrer deste capítulo.
Vilela (1992) argumenta que qualquer classificação dos verbos
pressupõe uma teoria, determinados critérios e um método. Conforme o autor, para
analisar as classificações existentes nos seus pontos de partida, método e resultados
, é
necessário considerar vários aspectos:
1) o grau de universalidade da classificação (se todos os verbos ou
apenas grupos de verbos); 2) a base de classificação (se a
morfologia, a sintaxe, a semântica ou a pragmática); 3) se as
classificações propostas são apenas ponto de partida (isto é, não
passam de propostas), ou se são tamm pontos de chegada (isto é,
se efectivamente se produziram listagens de verbos com a
respectiva classificação); 4) se a finalidade da classificação é o
levantamento de classes, ou a procura de subclasses no interior das
classes tradicionais. (VILELA, 1992, p. 3-4).
Dessa forma, o autor distingue quatro classificações: classificações
(fundamentalmente) sintáticas, classificações (fundamentalmente) semânticas,
classificações sintático-semânticas e classificações (fundamentalmente) pragmáticas.
De acordo com Duarte (2003), os verbos distinguem-se em três
grandes subclasses com base nas propriedades de seleção categorial e semântica de
cada item lexical verbal: a subclasse dos verbos
principais
, a subclasse dos verbos
copulativos
e a subclasse dos verbos
auxiliares
. (DUARTE, 2003, p. 296 297, grifo
da autora).
29
Pertencem à subclasse dos verbos principais os verbos ditransitivos,
verbos transitivos de três lugares, verbos transitivos-predicativos, verbos transitivos,
verbos de dois lugares com um argumento interno objeto indireto, verbos de dois
lugares com um argumento interno oblíquo, verbos inergativos, verbos inacusativos,
verbos de zero lugares e verbos de alternância.
É interessante destacar que as gramáticas tradicionais geralmente
classificam os verbos principais como transitivos, bitransitivos e intransitivos sem
especificar que os últimos são subdivididos em inergativos e inacusativos. Apresento
abaixo a definição destes verbos tendo em vista que um dos pontos abordados na
análise é a descrição dos verbos de alterncia causativa que se caracterizam por
exibirem duas variantes: uma causativa transitiva e uma não causativa inacusativa.
3.3 Verbos Intransitivos
3.3.1 Verbos inergativos
Duarte (2003) define-os como verbos de um lugar que selecionam um
argumento externo com a relação gramatical de sujeito. Segundo a autora, estes são os
verdadeiros verbos intransitivos. Exemplos:
(1) a. [O bebé]
SU
espirrou
.
b. [As crianças]
SU
dormem
. (p. 300)
4
4
Como os exemplos de (1) a (21) foram todos retirados de Duarte (2003), citei apenas a página ao final
de cada exemplo.
30
A autora apresenta a seguinte lista exemplificada de verbos inergativos:
andar, assobiar, chorar, correr, dançar, dormir, espirrar, rir, sorrir, suspirar, tossir,
trabalhar, voar.
3.3.2 Verbos inacusativos
Conforme pontua Duarte (2003), os verbos
inacusativos
ou ergativos,
considerados intransitivos na tradição gramatical luso-brasileira, são verbos de um lugar
[...] que selecionam um argumento interno que ocorre com a relação gramatical de
sujeito.(DUARTE, 2003, p. 300, grifo da autora). Exemplos:
(2) a. [As rosas]
SU
já
floriram
.
b. [O chefe local do cartel da droga]
SU
morreu
. (p. 300)
Outros verbos inacusativos citados pela autora são: acontecer, florir,
adormecer, aparecer, cair, crescer, desmaiar, desaparecer, murchar, nascer e ocorrer.
A diferença entre verbos inergativos e inacusativos tem por base o fato
de o argumento dos verbos inergativos ter propriedades típicas de sujeito, enquanto o
argumento dos inacusativos exibe tanto propriedades de sujeito como de objeto direto.
Os verbos inergativos exprimem atividades ou processos que dependem da vontade de
um agente, já os inacusativos, exprimem estados ou eventos não agentivos. A respeito
desta distinção pontua Mendikoetxea:
Los agentes se realizan sintácticamente y de un modo uniforme como
sujetos de la oración tanto con verbos transitivos (activos) como con
verbos inergativos. Los temas o pacientes se realizan como objetos de
los verbos transitivos (activos) y como sujetos de algunos verbos
intransitivos, los que hemos denominado inacusativos. Por lo tanto, los
verbos inacusativos comparten propriedades de los verbos transitivos y
31
los inergativos: como los inergativos están asociados a un solo
argumento, pero ese único argumento se interpreta como el objeto
lógico o semántico del verbo transitivo: es un objeto nocional, a pesar de
ser un sujeto sintáctico, en contraposición con el único argumento de un
verbo intransitivo inergativo que es la vez sujeto nocional y sujeto
sintáctico. (1999, p. 1579)
Conforme apresenta Duarte (2003), Perlmuter (1978) foi quem
primeiramente discorreu sobre a distinção entre verbo inergativo e inacusativo ao
formular a Hipótese Inacusativa, Burzio (1986) incorporou-a na Teoria de Regência e
Ligação. Em português, Raposo (1981) aplicou-a no quadro da Gramática Relacional e
Levin e Rappaport Hovav (1995) aplicaram-na ao inglês.
É necessário enfatizar a diferença entre ergatividade verbal e caso
ergativo. Ao definir verbo inacusativo, Duarte (2003) emprega tamm o termo ergativo,
como se pode notar no início desta seção e, em nota, enfatiza que Burzio (1986)
chamou os verbos inacusativos de ergativos, uma designação enganadora, que
segundo a autora, uma vez que, no sistema casual ergativo-absolutivo, o caso ergativo
é reservado ao argumento externo dos verbos transitivos e dos verbos inergativos,
enquanto o objeto direto dos verbos transitivos e o sujeito dos inacusativos é marcado
com caso absolutivo.(DUARTE, 2003, p. 510).
Ao abordar os verbos inacusativos, Vilela (1992) define-os como verbos
que apresentam um sujeito paciente ressaltando que surgiu na Gramática Gerativa a
iia de designar como verbos ergativos os verbos que não apresentam casoobjecto,
e como apresentam um lugar vazio para o sujeito, o filtrode caso envia para esse
lugar o objecto, que ocorre não marcado (quanto ao caso).(p. 52). Porém, assim como
Duarte, o autor também discorda do uso do termo ergativo e, em nota, pontua que
32
A designação verbo ergativoparece-me ser equívoca: pois ergativo,
nas chamadas línguas ergativas, designa, normalmente, um agente', e
nos verbos aqui designados como ergativosnão há qualquer agente. A
aceitar-se a designação ergativo, nestes casos, só poderá
compreender-se pelo facto de aqui se atribuir ao pacienteo papel
central da frase, codificando-se o pacientecomo sujeito, o que é típico
das línguas ergativas. O exemplo comumente apresentado na distinção
entre ergativo e não ergativo é:
Mihi
factum est: ergativo
Habeo
factum: acusativo.
O sujeito permanece, mas não como tal, e é o acusativo que passa a
dominar a concordância:
A criança rompeu as calças
Romperam-se as calças
à/da criança
O ergativonão é culpado: é apenas o afetadopelo processo (trata-se
de um afectado passivo). É o chamado dativus auctorisdos clássicos,
ou a (CAUSE) da moderna teorização. Não qualquer
intencionalidade. (VILELA, 1992, p. 52)
Após ressaltar que o argumento do verbo inergativo tem propriedades
picas de sujeito e o argumento do inacusativo exibe tanto propriedades de objeto
direto como de sujeito, Duarte (2003) apresenta mais três características que os
diferenciam: (a) Construção de particípio absoluto; (b) Posição predicativa e atributiva e
(c) Nominalização em
–or
.
a) Construção de particípio absoluto: à semelhança do argumento externo dos verbos
transitivos, o sujeito do verbo inergativo não admite esta construção:
(3) *
Trabalhado
[o Jo] vs. [o João]
trabalha
.(p. 301)
O sujeito final do verbo inacusativo, assim como o argumento interno
direto do verbo transitivo admite-a:
(4)
Chegado
[o João] vs. [o João]
chegou
.(p. 301)
33
b) Posição predicativa e atributiva: as formas participiais de verbos inergativos não
podem ocorrer nem em posição predicativa (cf. (5
a)) nem em posição atributiva (cf.
(5b)), enquanto que as formas participiais dos inacusativos podem (cf. (6 a) e (6b)):
(5) a. *O rapaz [está
rido
]
PRED
.
b. *[O rapaz
rido
] é nosso amigo. (p. 301)
(6) a. A janela [está
fechada
]
PRED
.
b. [A janela
fechada
] está empenhada. (p. 301)
c) Nominalização em
–or
: os verbos inergativos, à semelhança dos verbos transitivos,
admitem nominalizações em
or
(cf. (7 a, b)), enquanto que os verbos inacusativos não
admitem (cf. (8)):
(7) a. correr
corredor
trabalhar
trabalhador
b. construir
construtor
informar
informador
(8) cair
caidor
desmaiar
desmaiador
nascer
nascedor” (p. 301)
3.3.2.1 Tipos de Verbos Inacusativos
Os verbos inacusativos não formam uma classe semântica uniforme.
Duarte aponta a existência de duas subclasses: (a) verbos de mudança de estado,
como arder e nascer, e de movimento, como ir e vir, e (b) verbos de existência e
34
aparição, como existir, aparecer e acontecer. Segundo Mendikoetxea (1999), esta
divisão foi feita por Levin e Rappaport Hovav (1995). Apresento
neste capítulo apenas
as construções referentes à classe de mudança de estado devido ao fato destas
constituírem o meu corpus.
3.3.2.1.1 Construções Inacusativas com Verbos de Mudança de Estado devido à
Causa Externa
Duarte (2003) esclarece que dois tipos de verbos inacusativos de
mudança de estado: (a) os que exprimem mudança de estado com causa externa e (b)
os que exprimem mudança de estado com causa interna. Como os verbos que optei por
analisar em kaingang encaixam-se na classe de causatividade externa, não abordarei
as características dos verbos de causatividade interna.
Entre os verbos que exprimem mudança de estado com causa externa
estão:
(i) aqueles em que a mudança de estado afecta a solidez ou rigidez do
objecto (
e.g., fracturar, rasgar, romper
); (ii) aqueles que exprimem a
forma como a mudança de estado deteriora ou destrói o objecto (
e.g.,
apodrecer, atrofiar, queimar
); (iii) aqueles em que a mudança de estado
afecta a forma ou a consistência, em função do modo como são tratados
ou manipulados (
e.g., cozer, dobrar, fritar
); (iv) aqueles que exprimem o
modo como aparece, desaparece ou se restabelece a sua integridade
(
e.g., cicatrizar, derreter, dissipar
); (v) aqueles que exprimem o aspecto
do objecto no estado resultante da mudança (
e.g., cristalizar, estilhaçar,
fossilizar
); (vi) aqueles que exprimem transições de vários tipos (
e.g.,
abrir, adormecer, aumentar
). (DUARTE, 2003, p. 515)
Alguns destes verbos são de alternância causativa. Na seção abaixo,
apresento a definição e características dos verbos de alternância causativa.
35
3.3.2.1.1.1 Verbos de alternância causativa
Segundo Duarte (2003):
Os
verbos de alternância
caracterizam-se por exibirem duas variantes,
relacionadas de um dos seguintes modos: a grelha temática do verbo
mantém-se em cada uma das variantes, mas a relação gramatical de um
ou mais desses argumentos é diferente em cada uma delas; uma das
variantes selecciona menos um argumento do que a outra, sendo a
relação gramatical desse único argumento diferente da que tal
argumento tem na outra variante. (p. 305, grifo da autora)
Entre esses verbos estão os verbos de alterncia causativa que se
caracterizam por exibirem uma variante causativa transitiva e uma variante não
causativa inacusativa sem argumento externo. Nesta variante, é o argumento interno
direto que ocorre como sujeito, como apresentam os exemplos abaixo:
(9)a. O estudante terminou [a prova]
TEMA
(cf. O estudante terminou-a)
b. [A prova]
TEMA
terminou.
(cf. Ela terminou)” (p. 306)
Alguns dos verbos que aceitam este tipo de alternância apresentam
obrigatória ou opcionalmente o pronome
se
na variante inacusativa:
(10) a. A esquadra inimiga afundou [o navio]
TEMA
b. [O navio]
TEMA
afundou-
se
.
(11) a. O calor derreteu [o gelado]
TEMA
b. [O gelado]
TEMA
derreteu(-
se
).” (p. 306)
De acordo com a autora, os verbos de alternância causativa
determinam os seguintes esquemas relacionais:
36
(12) “variante transitiva: [X
AG/CAUS
]
SU
V [Y
TEMA
]
OD
variante inacusativa: [Y
TEMA
]
SU
V(-
se
)” (p.306)
De acordo com o esquema acima, as variantes causativas e inacusativas
dos verbos de alternância causativa estão relacionadas de forma sistemática por meio
de duas propriedades: (a) o argumento interno direto da variante causativa ocorre como
sujeito da forma inacusativa e (b) o argumento externo da variante causativa não está
disponível na variante inacusativa nem mesmo sob a forma de agente implícito.
O fato de o argumento interno direto da variante inacusativa ser
pronominalizável (cf. (13)) e determinar a concordância verbal (cf. (14)) demonstra a
primeira propriedade.
(13) a. Ela derreteu-se.
b. Ela abriu-se.(p. 515)
(14) a. Os cubos de gelo derreteram.
b. Os fechos de mala abriram-se.(p. 515)
A segunda propriedade tem fundamental importância para distinguir a
variante inacusativa de verbos de alternância causativa de frases passivas devido à
impossibilidade de ocorrência de um sintagma preposicional agentivo, de advérbios
orientados para o agente (como
deliberadamente, intencionalmente, propositadamente
)
e de orações finais(DUARTE, 2003, p. 515) na variante inacusativa como se pode
observar nos seguintes exemplos:
(15) a. *A manteiga derreteu
pela Maria
.
b. A manteiga foi derretida
pela Maria
.
37
(16) a. *A manteiga derreteu
intencionalmente
.
b. A manteiga foi derretida
intencionalmente
.
c. A Maria derreteu a manteiga
intencionalmente
.
(17) a. *A manteiga derreteu
para fazer a tarde
.
b. A manteiga foi derretida
para fazer a tarde
.
c. A Maria derreteu a manteiga
para fazer a tarde
.(p. 516)
De acordo com Duarte (2003), a variante inacusativa dos verbos de
alternância causativa admite apenas a expressão de uma causa externa não intencional
ou de uma causa interna que se realiza estruturalmente como um adjunto preposicional,
como se pode notar nos exemplos abaixo:
(18) a. A manteiga derreteu
com o calor
.
b. A porta abriu-se
com o temporal
.
(19) a. A manteiga derreteu
por si só
.
b. A porta abriu-se
por si só
.”(p. 516).
A autora segue ressaltando que
A ausência do argumento com o papel de Agente/Causador, quer
estruturalmente realizado quer sob a forma de agente implícito, levou
alguns autores a sugerirem que a componente causativa presente na
variante inacusativa é uma causatividade estática, i.e., relacionada
exclusivamente com o subevento resultativo, contrariamente ao que
acontece na variante causativa, em que está em causa uma
causatividade dimica, relacionada tanto com o subevento causativo
(não especificado) como com o sub-evento resultativo. (Duarte, 2003, p.
516)
A distinção entre estes dois tipos de causatividade reflete-se nos
diferentes adjuntos que podem ocorrer na variante inacusativa dos verbos de
38
alternância causativa e nas verdadeiras construções reflexivas, como se nota pelo
contraste entre as frases (a) e (b) dos exemplos abaixo:
(20) a. A porta abriu-se
por si só
.
b. *A porta abriu-se
a si própria
.
(21) a. *O João cortou-se
por si só
.
b. O João cortou-se
a si próprio
. (p. 516)
Segundo Duarte, a descrição das construções exige, com quaisquer
verbos de alternância, que se assumam hipóteses específicas sobre a estrutura do
léxico. No caso das construções apresentadas nesta seção, é preciso decidir se o
léxico do português contém uma entrada lexical causativa e outra inacusativa para um
verbo de alternância causativa ou se contém apenas uma entrada lexical a
causativa -, da qual se deriva a variante inacusativa, opção esta adotada pela autora.
De acordo com esta hipótese, o verbo de alternância abrir”, por
exemplo, sofre uma operação lexical de Redução afetando o papel temático externo
cujo efeito é derivar um predicado mono-argumental de um predicado de dois lugares.
Como o papel temático externo é suprimido, o verbo perde a capacidade de legitimar
casualmente o seu argumento interno direto, assim a forma resultante da operação de
Redução tem as propriedades de um verbo inacusativo.
Duarte argumenta que
Com certos verbos de alternância causativa, esta operação de redução
exige uma marcação morfológica na sintaxe, sob a forma de um clítico
pseudo-reflexo, como acontece com
afundar-se
,
rasgar-se
. Com outros
verbos, tal marcação é possível mas não obrigatória, como é o caso de
derreter-(se), queimar(-se)
. Outros verbos ainda não a exigem nem
admitem, como acontece com
acabar, aumentar
. (DUARTE, 2003, p.
518)
39
Segundo a autora, o fato de o clítico que ocorre com a variante
inacusativa de certos verbos de alternância causativa ter propriedades distintas do
pronome reflexivo (veja o contraste dos exemplos (20) e (21)) e o fato dele marcar a
variante não causativa destes verbos levou muitos autores a denominá-lo de “-se
anticausativo.
40
4 VERBOS FORMADOS DE VERBOS COM MUDANÇA DE VALÊNCIA E
FORMAÇÃO DO VERBO CAUSATIVO
O objetivo deste capítulo é apresentar uma descrição da formação de
verbos de acordo com o aumento ou diminuição da valência. Atenção especial será
dada à formação dos verbos causativos.
O capítulo está assim dividido: na seção 4.1, apresento os verbos
formados de verbos com mudança de valência e na seção 4.2, as construções
causativas.
Os conceitos apresentados seguem a abordagem teórica de Comrie
(1976 e 1985), Lyons (1979), Duarte (2003) e Haspelmath & Müller Bardey (2004).
4.1 Verbos Formados de Verbos com Mudança de Valência
Segundo Comrie (1985), muitas línguas apresentam processos
derivacionais de graus variados para indicar mudança na valência do verbo. O autor
analisou separadamente mudanças de valência onde o sujeito não é envolvido e
mudanças de valência onde o sujeito é envolvido.
4.1.1 Mudança de Valência Não Envolvendo o Sujeito
A mudança de valência que não envolve o sujeito implica em uma
mudança que envolve o objeto.
41
A análise do kaingang abordará somente a mudança de valência que
envolve o sujeito devido ao fato desta estar relacionada com a causatividade, portanto
não será abordada com detalhes, neste trabalho, a mudança de valência envolvendo o
objeto. Apresento
abaixo apenas uma definição deste processo.
Muitas orações podem ser bem construídas com uma variação no
número de objetos. O verbo ler” é um exemplo, pois pode aparecer somente com o
objeto direto (O menino leu o livro.), sem objeto (O menino está lendo.), ou com um
objeto indireto além do objeto direto (A professora leu o livro para o menino.). Línguas
como o português e o inglês não marcam esta mudança de valência nas formas do
verbo, porém muitas outras apresentam mudanças nas formas verbais. De acordo com
o autor, tais diferenças na valência podem indicar: (a) diminuição no mero de objetos,
(b) aumento no número de objetos ou (c) reestruturação dos objetos com relação à
valência do verbo básico. Comrie diz que (a) e (c) freqüentemente utilizam o mesmo
mecanismo formal e que (b) e (c) são semelhantes em algumas instâncias.
4.1.2 Mudança de Valência Envolvendo o Sujeito
Comrie (1985) ressalta que a mudança mais comum é a relação
derivacional entre um verbo intransitivo e um verbo transitivo em que o sujeito do verbo
intransitivo é o mesmo que o objeto do verbo transitivo. É também possível a derivação
de um verbo transitivo para intransitivo. Em ambos os casos, a forma derivada
apresenta afixos adicionais na maioria das línguas descritas pelo autor.
42
Conforme o autor argumenta, o verbo intransitivo derivado do verbo
transitivo denomina-se anticausativo, e o verbo transitivo derivado do intransitivo
denomina-se causativo.
4.1.2.1 Diminuição de Valência
Há três tipos de construções formadas pela diminuição de valência
envolvendo o sujeito: com verbo anticausativo, com verbo recíproco e com verbo
reflexivo.
4.1.2.1.1 Anticausativo
Comrie (1985) afirma que o tipo mais comum de diminuição de valência
envolvendo o sujeito é a derivação de um verbo intransitivo de um transitivo, na qual o
verbo derivado é chamado de anticausativo. As línguas descritas pelo autor apresentam
um afixo anticausativo no verbo derivado, como, por exemplo, o russo que emprega os
sufixos “-sja/ ”-s” (cf. (22)), e o húngaro que emprega os sufixos “-ód(ik)”/ “-õd(ik)” (cf.
(23)).
(22) a. Anton otkryl dver”
Anton abriu a porta.
b. Dverotkryla-s
A porta abriu.(COMRIE, 1985, p. 325)
43
(23) “a. Zoltán cukrot old a vízben
Zoltan dissolve açúcar na água.
b. A cukor a vízben old-ódik
O açúcar dissolve na água(Comrie, 1985, p. 325)
Haspelmath & Müller Bardey (2004) tamm discorrem sobre o
anticausativo e explicam que há uma tendência muito forte em muitas línguas de que
todas as orações tenham sujeito. Quando nessas línguas ocorre uma mudança de
valência que implica na remoção do argumento agente da posição de sujeito, o
argumento paciente ocupa esta posição e o verbo derivado apresenta um sufixo
anticausativo que indica a eliminação do argumento agente.
Segundo estes autores, o termo anticausativo surgiu com Nedjalkov &
Sil’nickij (1969) e a noção deste termo era desconhecida na gramática tradicional, entre
as noções que foram empregadas para esta categoria estão as seguintes: incoativo,
pseudopassiva, passiva neutra, espontâneoe outras.
Tanto Comrie (1985) quanto Haspelmath & Müller Bardey (2004)
discorrem sobre a similaridade entre construções anticausativas e passivas devido ao
fato de ambas terem como sujeito o objeto direto do verbo transitivo, ou seja, têm
sujeito paciente, como se pode notar nos exemplos abaixo:
(24) a. Antônio abriu a porta. construção transitiva
b. A porta abriu(-se). construção inacusativa
c. A porta foi aberta. construção passiva
44
Em seguida, os autores enfatizam a diferença existente entre estas
construções: na passiva, mesmo que não esteja expresso, há um sintagma agentivo, e
a construção anticausativa refere-se a um evento espontâneo. Haspelmath & Müller
Bardey (2004) pontuam que o anticausativo é sujeito a severas restrições lexicais,
diferente da passiva que pode geralmente ser formada da grande maioria dos verbos
transitivos. Os verbos anticausativos indicam que a ação acontece espontaneamente,
sem a intervenção de agente humano. Assim, verbos como quebrar”, “rasgar”, abrire
fechar” freqüentemente apresentam anticausativo, enquanto que cortar, serrar”,
escrever” e lavar” não apresentam.
É possível estabelecer uma relação entre o termo anticausativo
apresentado por Comrie (1985) e Haspelmath & Müller Bardey (2004) e o termo
inacusativo apresentado por Duarte (2003) ao tratar da variante inacusativa dos verbos
de alternância causativa.
Ao estudar estes quatro autores, pude estabelecer semelhanças em
suas colocações que me levam a crer que eles tratam do mesmo fenômeno: (a) na
seção 3.3.2.1.1.1 do capítulo anterior, Duarte discorre sobre os verbos de alternância
causativa que se caracterizam por exibirem uma variante transitiva causativa e uma
variante não causativa inacusativa, na qual o argumento interno ocorre como sujeito e o
argumento externo é eliminado. Comrie e Haspelmath & Müller Bardey pontuam que,
por um processo de redução de valência, o argumento agente é removido da posição
de sujeito, posição esta que passa a ser ocupada pelo argumento paciente; (b) Duarte
discorre sobre a importância de se distinguir a variante inacusativa dos verbos de
alternância causativa de frases passivas. Os argumentos que a autora emprega são
45
semelhantes aos empregados por Comrie e Haspelmath & Müller Bardey ao
distinguirem a construção anticausativa da passiva; (c) os verbos que Comrie e
Haspelmath & Müller Bardey citam como exemplos de anticausativos encaixam-se no
que Duarte define como variante não causativa inacusativa dos verbos de alternância
causativa; (d) Comrie e Haspelmath & Müller Bardey denominam o afixo que ocorre
no verbo derivado como anticausativo, assim como Duarte também adotou esta
denominação ao clítico “-seque ocorre na variante inacusativa.
No capítulo da análise, usei Duarte (2003) para tratar de tópicos que me
parecem mais claros nesta autora e Comrie (1976, 1985) em tópicos melhor abordados
por este autor do que Duarte. Como meu trabalho é de cunho descritivo, não considerei
nocivo para o desenvolvimento da pesquisa apoiar-me em modelos teóricos diferentes,
uma vez que, mesmo da Duarte, me baseei, principalmente, nos aspectos descritivos
deste modelo.
4.1.2.1.2 Recíproco
Comrie (1985) aborda os verbos recíprocos como um tipo mais
complexo de diminuição de valência envolvendo o sujeito. Para o autor, o sujeito e o
objeto direto do verbo transitivo são combinados formando um único sujeito na oração
recíproca. A valência do verbo é, portanto, reduzida da construção transitiva para
intransitiva. O exemplo seguinte mostra que o russo utiliza na construção com verbo
recíproco o mesmo sufixo utilizado na formação do verbo inacusativo (ver 4.1.2.1.1):
46
(25) “a. Anton vstretil Ninu
Antônio encontrou Nina
b. Anton i Nina vstretili-s
Antônio e Nina se encontraram.(Comrie, 1985, p. 326)
Em português, não há modificação morfológica na forma verbal, o que
marca a construção com verbo recíproco é o uso do pronome se:
(26) Antônio e Nina se encontraram.
4.1.2.1.3 Reflexivo
Tanto Lyons (1979) quanto Comrie (1985) definem que, na construção
reflexiva, o sujeito e o objeto se referem à mesma pessoa. Segundo Lyons, frase
explicitamente reflexiva é aquela em que a identidade do sujeito e a do objeto são
marcadas claramente, ou na forma do pronome ou de alguma outra maneira, como, por
exemplo, o uso de um prefixo, sufixo ou infixo ligado ao tema verbal.(p. 382). Comrie
considera que os verbos reflexivos são formados por um processo derivacional dos
verbos não reflexivos. No verbo não reflexivo, o sujeito e o objeto direto são diferentes.
No verbo reflexivo somente o sujeito é expresso, mas o afixo reflexivo indica que o
sintagma nominal sujeito funciona igualmente como o sintagma nominal objeto. As
orações a seguir mostram como é o processo derivacional do verbo reflexivo em russo:
(27) a. Matpomyla rebenka
A mãe lavou a criança
b. Rebenok pomyl-sja
A criança lavou-se.(Comrie, 1985, p. 327)
47
É interessante observar que o russo utiliza os mesmos sufixos para
verbos anticausativos, recíprocos e reflexivos (ver 4.1.2.1.1 e 4.1.2.1.2).
4.1.2.2 Aumento de Valência
O aumento de valência que envolve o sujeito resulta na formação de
uma oração causativa. Este tipo de construção será abordado detalhadamente nas
seções seguintes.
4.2 Verbos Causativos
Comrie (1976) define uma oração causativa como derivada de uma não
causativa por um aumento de valência da oração não causativa. Este aumento se faz
pelo acréscimo de um sintagma nominal com função de causer” à oração não
causativa. Há duas possibilidades de construção de uma oração causativa: com dois
predicados ou apenas um.
Com relação ao primeiro tipo, o autor considera que a estrutura
subjacente de uma oração causativa consiste de uma oração principal e uma oração
encaixada: a oração principal contém um sintagma nominal sujeito (SP) (sujeito da
oração principal) que correspondente ao causerda ação, e a oração encaixada
contém um sintagma nominal sujeito (SE) (sujeito da encaixada) - que corresponde à
pessoa que de fato executa a ação,
tamm poderá ter um ou mais sintagmas nominais
objetos, de acordo com a valência do verbo encaixado – um objeto direto encaixado
48
(ODE), um objeto indireto encaixado (OIE) ou um outro constituinte oblíquo (CO).
Comrie (1976) representa esta estrutura através do esquema a seguir:
O
SP CAUSA O
SE V ODE OIE
João causa Maria dar livro Fred
Um segundo tipo de construção acontece na maioria das línguas
descritas por Comrie, nas quais o elemento causativo e o verbo encaixado se fundem
na estrutura derivada, de forma que não haverá oração encaixada:
O
SP CAUSA-V SE ODE OIE
Jo causa-dar Maria livro Fred
Nas línguas que apresentam esta estrutura, a fusão do elemento
causativo com o verbo encaixado é clara, porque há um único verbo, embora
morfologicamente mais complexo, como por exemplo, o verbo turco imzala-t” (fazer
assinar) com relação ao verbo imzala” (assinar). Outros exemplos do turco são:
(28) “Ali
Hasan-i
öl -dür -dü
5
OD morrer Caus Pas.
Ali fez Hasan morrer, matou Hasan.
-u
mür -e
imzala-t -ti
dentista carta OD diretor OI assinar Caus Pas.
O dentista fez o diretor assinar a carta
5
Os exemplos de (28) a (33) foram retirados de Comrie (1976, p. 262-263, grifo do autor).
49
-a mektub-u
mür tarafindan
ster -t ti
dentista OI carta OD diretor por mostrar Caus Pas.
O dentista fez o diretor mostrar a carta para Hasan.
Há línguas, como o francês que, mesmo usando dois verbos, ambos
funcionam como uma unidade única. Exemplos:
(31) “Je ferai courir
Henriette
.
Eu farei Henriette correr.
(32) “Je ferai manger les gâteaux
à Jean
.
Eu farei Jean comer os bolos.
(33) “Je ferai ècrire une lettre au directeur
par Jean
.
Eu farei Jean escrever uma carta para o diretor.
Comrie (1976) explica que, nas sentenças do francês e do turco citadas
acima, as posições sintáticas de OD, OI, etc., referem-se à sintaxe de superfície das
orações e que, em cada oração, o sujeito está em negrito. Os equivalentes não
causativos destes verbos são, respectivamente, intransitivos, transitivos com objeto
direto e transitivos com objeto direto e indireto. O sujeito encaixado aparece de acordo
com os argumentos do verbo encaixado. Se o verbo encaixado não tem nenhum objeto,
o sujeito encaixado aparece como objeto direto; se o verbo tem objeto direto, o sujeito
encaixado aparece como objeto indireto, se o verbo tem objeto direto e indireto, o
sujeito aparece como algum outro constituinte oblíquo. Ou seja, o sujeito encaixado
aparece em uma destas seguintes posições de acordo com a ordem:
sujeito objeto
direto objeto indireto outro constituinte obquo.
50
Esta ordem é chamada por Comrie (1976) de hierarquia de caso, na
qual o sujeito encaixado é rebaixado da posição de sujeito para a próxima posição
disponível na hierarquia. Nem todas as línguas se ajustam nesta hierarquia. As
características da hierarquia de caso são: (a) não existe nenhuma restrição sintática na
formação de construções causativas, não importa quantos argumentos tem um verbo
não causativo, o seu equivalente causativo terá um argumento a mais (a exceção se
encontra na língua Songhai);
(b) uma oração simples não poderá ter mais de um
sujeito, nem objeto direto, nem objeto indireto, embora haja exceções. Comrie notou
que não há restrições na duplicação de outros constituintes oblíquos, a duplicação de
objeto direto é menos freqüente que a de objeto indireto e a de sujeito é muito rara, se
não inexistente; (c) sempre é o sujeito encaixado que é removido para a posição ainda
não ocupada e (d) o rebaixamento do sujeito se faz passo a passo, isto é, sempre para
a posição mais alta da hierarquia que ainda não foi ocupada.
4.2.1 Causativos Anaticos, Morfológicos e Lexicais
Segundo Comrie (1985), existem três tipos de construções causativas:
analítica (ou sintática), morfológica (ou sintética) e lexical.
Na construção analítica, não há a fusão do elemento causativo e o
verbo da oração não causativa, ou seja, a construção causativa não é feita por uma
oração simples; o predicado que expressa a iia de causa será separado do predicado
não causativo. Esta construção corresponde à primeira estrutura apresentada na seção
4.2. Conforme o autor, a seguinte oração não causativa Sam slid off the roof” (Sam
escorregou do telhado) (p. 331) terá como causativos analíticos correspondentes as
51
seguintes construções: Mary brought it about that Sam slid off the roof, Mary caused
Sam to slide off the roofou Mary made Sam slide off the roof” (Maria fez Sam
escorregar do telhado) (p. 331), nas quais a iia de causa é expressa pelos verbos
bring about, causee make.
A maioria das línguas descritas por Comrie apresenta uma oração
simples causativa derivada da oração não causativa, como é possível observar na
segunda estrutura apresentada em 4.2. Na oração causativa, o verbo sofre um
processo derivacional por meio de afixos para expressar a causa. Este tipo de
construção é o que o autor chama de causativo morfológico. O seguinte exemplo turco
ilustra o causativo morfológico:
(34) a. Hasan öl-dü
Hasan morreu
b. Ali Hasan i öl –dür –dü
Ali fez com que Hasan morresse, matou Hasan.(COMRIE, 1985, p. 331)
Lyons (1979) tamm utiliza este exemplo e explica que o sufixo “-dür
converte o radical transitivo öl-“ (morrer) no transitivo öl-dür-na oração derivada. O
sufixo “-dümarca o tempo passado e o “-ié marca do objeto.
O causativo lexical pode ser ilustrado com os seguintes exemplos de
Lyons:
(35) “a. Bill died
Guilherme morreu
b. John killed Bill
João matou Guilherme” (LYONS, 1979, p. 372)
52
De acordo com o autor, é possível dizer que a relação entre o transitivo
e o intransitivo está lexicalizada: É uma questão de estrutura lexical que faz com que
se diga
John killed Bill,
e não
*John died Bill/ *João morreu Guilherme
. A relação
sintática e semântica entre kill e die é daquelas que a criança, ao aprender a língua,
virá a conhecer, [...]” (LYONS, 1979, p. 372). O autor segue dizendo que, num primeiro
momento, kille diesão vistos como verbos diferentes; mais adiante considera as
implicações que em tratá-los como realizações fonológicas alternativas,
sintaticamente condicionadas ao mesmo verbo.
Arrais (1985) aborda que algumas línguas como o turco, o basco, o
guarani, o japonês, o klmer, o coreano e muitas outras apresentam morfemas
causativos próprios (sobretudo prefixais e sufixais). Nas línguas indo-européias, mais
comumente se verificam procedimentos sintáticos ou léxico-sintáticos na formação de
construções causativas, sendo esporádicas e nada sistemáticas as formações de
verbos causativos com morfemas sufixais.(p. 44). Em português, os sufixos
izar
e
ficar
são comumente apontados como formadores de verbos causativos (humanizar,
esterilizar, atemorizar, danificar, purificar, etc.).
Lyons aborda que
Contrariamente aos causativos ‘lexicaise aos causativos morfológicos,
os verbos transitivos
move, change, grow
, etc. podem ser descritos
como derivados dos verbos intransitivos correspondentes idênticos na
forma fonológica, e por isso referidos acima como os mesmos verbos
por meio de um processo morfológico de modificação zero. Convém
assinalar que muitas das formas que se diz tradicionalmente ocorrerem,
em inglês, como adjetivoe como verboscaem no âmbito dessa
classificação: p.ex.:
He warms the milk / Ele esquenta o leite
, relaciona-
se com
The milk is warm / O leite está quente
, que contém o verbo
adjetivointransitivo
warm
, e igualmente
He moves the stone / Ele move
a pedra
, está relacionado com
The stone moves
A pedra se move.
53
Morfologicamente, os verbos transitivos
move
e
warm
são derivados
dos intransitivos
move
e
warm
, por modificação zero. (1979, p. 380).
Comrie (1985) ressalta que, às vezes, pode ser difícil fazer distinção
entre o causativo sintático e morfológico ou entre morfológico e lexical. O francês, como
se pode observar nos exemplos (31), (32) e (33) utiliza o verbo fairemais o infinitivo
do verbo principal para expressar uma situação causativa. Esta parece ser uma
construção analítica, mas, na verdade, fairemais o infinitivo comporta-se como um
predicado único, isto é, como um causativo morfológico. Sobre esta construção, Comrie
(1976) explica que embora fazer” e o infinitivo sejam considerados verbos
independentes, quando se reúnem na construção causativa, formam uma unidade
particularmente aderente, nenhum sintagma nominal pode interpor entre os dois verbos.
Prova disto é a agramaticalidade da frase: * Paul fit Pierre manger les pommes
(COMRIE, 1985, p. 332). Este tipo de construção é agramatical em francês porque a
língua utiliza apenas um predicado, embora complexo, para expressar causatividade,
assim Pierrenesta oração deveria ocupar a posição de objeto indireto. Lyons (1979)
também aborda este tipo de construção dizendo que é uma característica da
construção causativa em francês o fato de que o sujeito do cleo subjacente com
verbos de dois lugares é transformado em objeto indireto com verbos causativos de três
lugares, mesmo sendo verbos complexos, enquanto o objeto do núcleo subjacente de
dois lugares permanece como objeto direto na construção causativa de três lugares,
como se pode observar no exemplo (33).
54
Como será apresentado na seção 4.2.7, o português comporta-se de
modo diferente de línguas latinas como o francês e espanhol na construção de orações
causativas formadas com o verbo fazer”.
Segundo Comrie (1985), a distinção entre causativos morfológicos e
lexicais pode ser até mais difícil de traçar, porque causativos lexicais poderiam ser
tratados como causativos morfológicos envolvendo supletivismo, isto é, killseria
causativo de dieda mesma maneira que wenté passado de ir. Esta análise pode
provavelmente ser justificada quando há poucos pares supletivos ao longo de uma lista
de causativos claramente morfológicos, porém este fato provavelmente está mais ligado
à posição do lingüista do que à língua propriamente dita.
Depois de apresentar os três tipos causativos, Comrie ressalta a
questão da produtividade e diz que, em geral, a formação de causativos analíticos é
completamente produtiva; a formação de causativos lexicais é, por definição,
considerada não produtiva, visto que há poucos casos e o grau de produtividade dos
causativos morfológicos varia imensamente de língua para língua.
4.2.2 Argumentos Causere Causee
A oração causativa apresenta um argumento a mais que a oração o
causativa correspondente. Este argumento é chamado de causer” e geralmente
aparece como sujeito da oração causativa. O sujeito da oração não causativa torna-se
o causee” (argumento que Comrie chama de sujeito encaixado em 4.2) da oração
55
causativa correspondente. Estes dois argumentos estão representados nas seguintes
orações:
(36) a. oração não causativa: O menino comeu o bolo.
b. oração causativa:
A mãe
fez
o menino
comer o bolo.
causer causee
Como apresentado em 4.2, o causee” refere-se ao sujeito encaixado e
representa quem de fato executa a ação. Nas línguas em que ocorre o causativo
morfológico, este argumento não pode aparecer como sujeito da oração derivada, visto
que esta posição já está ocupada pelo causer, portanto ele aparece nesta oração
como objeto direto, objeto indireto ou outro constituinte oblíquo dependendo da valência
do verbo.
Assim, há três possibilidades de formação de um verbo causativo
derivado de um não causativo: causativo formado de um verbo intransitivo, causativo
formado de um verbo monotransitivo e causativo formado de um verbo ditransitivo.
Todas estas construções envolvem mudança de valência, pois há o acréscimo de um
argumento, o causer, e a mudança da função sintática do argumento que funciona
como sujeito da oração não causativa. Convém ressaltar que a formação de causativos
de verbos intransitivos, monotransitivos com objeto direto e ditransitivos com objeto
direto e indireto que serão apresentados nas seções: 4.2.3, 4.2.4 e 4.2.5 resulta em
predicados simples, portanto as construções derivadas apresentam causativo
morfológico.
56
4.2.3 Causativos Formados de Verbos Intransitivos
De acordo com a hierarquia de caso apresentada na seção 4.2, na
formação de uma oração causativa derivada de uma oração com verbo intransitivo, o
causeraparece como sujeito e o causeecomo objeto direto, já que esta é a próxima
posição disponível na hierarquia. O seguinte exemplo do sânscrito mostra este tipo de
construção onde R
Sujeito abelha (OD) voar-CAUSE
Ramo fez a abelha voar.(COMRIE, 1976, p. 266)
Comrie (1985) pontua que esta posição do causeetamm se aplica
quando o verbo é intransitivo, mas tem um objeto locativo como acontece neste
exemplo turco:
(38) “a. Çocuk okul- -di
criança escola-OI partir-Pass
A criança partiu para a escola.
-u okul- -t-ti
professor criança-OD escola-OI partir-CAUSE- Pass
O professor fez a criança partir para a escola.(COMRIE, 1985, p. 337)
Segundo o autor, em algumas línguas, ao lado de construções onde o
causeeaparece como objeto direto, é possível encontrar construções onde ele
aparece como um objeto oblíquo, como em húngaro:
57
(39) “a. Én köhög-tet-te-m a gyerek-et
Eu tossir-CAUSE-PAST-ISG a criança-OD
b. Én köhög-tet-te-m a gyrek-kel(INSTR)
Eu fiz a criança tossir(COMRIE, 1985, p. 337)
A primeira oração tem o causeecomo objeto direto e a segunda como
um objeto oblíquo (instrumental). Estas duas orações não são absolutamente
sinônimas: a primeira implica maior coerção que a segunda. Assim, quando o causee
não aparece como objeto direto, ele retém pelo menos uma agentividade parcial.
4.2.4 Causativos Formados de Verbos Monotransitivos
Causativos formados de verbos transitivos normalmente têm a mesma
valência de um básico verbo ditransitivo. O causer” aparece como sujeito do verbo
causativo, o causeecomo seu objeto indireto e o objeto direto do verbo da oração não
causativa permanece como objeto direto da construção causativa. Este tipo de
construção é a mais freqüente e segue a hierarquia de caso. O exemplo turco
apresentado em 4.2 mostra este tipo de construção:
(29 -u müdür -e imzala-t -ti
dentista carta OD diretor OI assinar Caus Past
O dentista fez o diretor assinar a carta
As orações do hindi e do francês também exemplificam este tipo de
construção:
58
mãe Suj criança OI bola jogar-Caus-Perf
A mãe fez a criança jogar bola.(COMRIE, 1976, p. 268)
(41) “Jai fait manger la pomme à Claude.
Sujeito fazer comer OD OI
Eu fiz Cláudio comer maçã.(COMRIE, 1976, p. 268)
Exemplos paralelos, segundo Comrie (1976), são encontrados em
georgian, songhai, tagalog, punjab e italiano.
Algumas línguas permitem ou exigem que tanto o causeequanto o
objeto direto do verbo transitivo apareçam como objeto direto na construção causativa,
como, por exemplo, o sânscrito com objeto direto no acusativo:
(42) “a. Bhrtyah katam karoti
empregado(NOM) tapete (AC) preparar
O empregado prepara o tapete.
Rama (NOM) empregado (AC) tapete(AC) preparar(CAUSE)
Rama fez o empregado preparar o tapete.(COMRIE, 1985, p. 338)
A língua alemã também permite a duplicação do objeto direto, como se
pode verificar no exemplo a seguir:
(43) “Er liess seinen Sohn den Brief abtippen
ele fazer seu filho(OD) a carta(OD) datilografar
Ele fez seu filho datilografar a carta.(COMRIE, 1976, p. 285)
59
Um tipo de construção que pode acontecer é o causeeaparecer como
algum objeto (constituinte) oblíquo, geralmente o mesmo usado para expressar o
agente na construção passiva. Esta construção é, às vezes, encontrada junto ao
causeecomo objeto indireto como no seguinte exemplo francês:
(44) “a. Pierre mangea les pommes
Pierre comeu as maçãs
b. Paul fit manger les pommes à/ par Pierre
Paul fez Pierre comer as maçãs(COMRIE, 1985, p. 339)
4.2.5 Causativos Formados de Verbos Ditransitivos
Conforme a hierarquia de caso apresentada em 4.2, quando um verbo
não causativo apresenta objeto direto e objeto indireto, o causeena construção
causativa correspondente aparecerá, preferencialmente, como um outro constituinte
(objeto) oblíquo, como pode ser observado no seguinte exemplo turco apresentado em
4.2:
-a mektub-u müdür tarafindan göster -t ti
dentista OI carta OD diretor por mostrar Caus Pass.
O dentista fez o diretor mostrar a carta para Hasan.
A posposição tarafindantamm marca o agente da passiva:
(45) “Adam kadin tarafindan döv-ül-dü
homem mulher por atingir-PASS-PAST
O homem foi atingido pela mulher.(COMRIE, 1985, p. 340)
60
Algumas línguas permitem que haja a duplicação do objeto indireto na
formação do causativo de um verbo bitransitivo, como o turco:
-e mektub-u Hasan-a göster-t-ti
dentista diretor-OI carta-OD Hasan-OI mostrar-CAUSE-PAST
O dentista fez o diretor mostrar a carta para Hasan.(COMRIE, 1985, p. 341)
Segundo Comrie (1985), falantes nativos de turco freqüentemente
variam se tal
construção com duplo objeto indireto é permissível. Esta hesitação parece
ter a ver mais com a eufonia ou com outras considerações estilísticas.
4.2.6 Verbos Causativos e Hierarquia de Caso
De acordo com a hierarquia de caso apresentada em 4.2, o sujeito
encaixado (“causee) tende a ocupar a posição mais alta à esquerda ainda não
preenchida. O esquema a seguir feito por Comrie ilustra a posição que o causeedeve
ocupar na construção causativa segundo a ordem apresentada na hierarquia de caso:
sujeito objeto direto – objeto indireto outro constituinte oblíquo. Como pontuei na
introdução deste trabalho, minha hitese é a de que a língua kaingang se encaixe
nesta hierarquia.
61
Construção básica Construção causativa
Intransitivo SUJ SUJ
OD
Monotransitivo SUJ SUJ
OD OD
OI
Ditransitivo SUJ SUJ
OD OD
OI OI
OBL
Ao analisar as línguas que permitem a duplicação de algum
constituinte, como nos exemplos (42a), (43) e (46), Comrie observou que a ordem de
duplicação segue a ordem da hierarquia de caso, ou seja, a duplicação do sujeito é
extremamente rara e que a duplicação do objeto indireto é mais comum que a
do objeto
direto enquanto a duplicação do constituinte oblíquo ocorre livremente.
4.2.7 Causativos Formados de Intransitivos, Monotransitivos e Ditransitivos em
Português
A língua portuguesa apresenta estrutura diferente das orações
apresentadas nas seções 4.2.3, 4.2.4 e 4.2.5 e não se encaixa na hierarquia de caso
apresentada por Comrie. Nas orações derivadas de verbos intransitivos, transitivos e
ditransitivos, há o acréscimo de um predicado, portanto o tipo de causativo neste tipo
de derivação é analítico.
62
A estrutura do portugs corresponde ao primeiro esquema
apresentado por Comrie na seção 4.2. A derivação de uma oração causativa de uma
não causativa se faz pelo acréscimo de um predicado que tem um sintagma
funcionando como causer” e do verbo fazer. Na oração derivada, o predicado
acrescentado torna-se a oração principal e a oração primitiva é encaixada nela. A
posição de sujeito da principal será ocupada pelo causerenquanto a posição de
sujeito da encaixada será ocupada pelo causee, argumento que, de fato, executa a
ação como nos seguintes exemplos:
(47) a. O menino dormiu.
b. A mãe fez o menino dormir.
A oração (b) é um exemplo de oração causativa formada de verbo
intransitivo. Como se pode constatar neste exemplo, o complemento de fazer” é uma
oração encaixada com função de objeto direto. Esta oração é composta por sujeito +
verbo no infinitivo. Em (b), o argumento acrescentado assume a função de causer” e o
sujeito da encaixada a função de causee.
O mesmo ocorre na formação de oração causativa formada de verbo
monotransitivo:
(48) a. O menino comeu bolo.
b. A mãe fez o menino comer bolo.
A oração derivada apresenta uma oração principal com sujeito ocupado
pelo causer”. Esta oração tem como complemento uma oração encaixada com o
causeena função de sujeito + verbo no infinitivo. É possível observar que tanto o
63
sujeito como o objeto da oração básica permanecem nestas posições na oração
derivada.
Com verbos ditransitivos ocorre o mesmo tipo de estrutura:
(49) a. O menino deu um presente para sua mãe.
b. O pai fez o menino dar um presente para sua mãe.
A oração (b) apresenta como sujeito da principal o causer” - argumento
acrescentado. Na oração encaixada, as posições de sujeito, objeto direto e objeto
indireto são ocupadas pelos mesmos argumentos da oração básica.
Portanto, conclui-se que em português os argumentos que ocupam a
posição de sujeito e objetos (direto e indireto) permanecem nesta posição na
encaixada. É interessante notar que esta língua comporta-se de maneira diferente do
francês e espanhol, que são da mesma família.
Os exemplos (31), (32) e (33) do francês demonstram que esta língua
segue a hierarquia de caso defendida por Comrie. Os exemplos abaixo do espanhol
também estão de acordo com a hierarquia:
(50) Hicimos bailar a Julia.
Fizemos Julia bailar.(HERNANZ, 1999, p. 2.247).
(51) “Hizo abrir las ventanas al conserje.
Fiz o porteiro abrir as janelas.”(HERNANZ, 1999, p. 2.249)”.
Em (50), o causeeocupa a posição de objeto direto e, em (51), a de
objeto indireto. Ambas as orações apresentam um único predicado, no qual o verbo
fazer” mais o infinitivo formam uma unidade.
64
5 ALISE
Este capítulo tem como objetivo principal descrever a formação de
orações causativas da língua kaingang. Apresento também as construções com verbos
de alternância causativa e orações formadas por diminuição de valência, envolvendo o
sujeito (recíprocas e reflexivas). Antes de abordar estas orações, faço uma breve
exposição sobre os estudos do nível morfossintático da língua kaingang e, em seguida,
a descrição da ordem oracional da língua kaingang, com o objetivo de esclarecer o
leitor na compreensão das construções apresentadas ao longo do capítulo.
Para descrever e analisar as orações do kaingang eu me apoiei nos
pressupostos tricos apresentados nos capítulos 3 e 4.
O capítulo está assim dividido: na seção 5.1, apresento os estudos do
nível morfossintático da língua kaingang; na seção 5.2, a descrição da ordem oracional
da língua; na seção 5.3, os verbos formados com diminuição de valência envolvendo o
sujeito e na seção 5.4, a formação de orações causativas.
5.1 Estudos do Nível Morfossintático da Língua Kaingang
Apesar de ser grande o número de falantes, as pesquisas lingüísticas
que envolvem a língua kaingang são poucas, o que leva a alguns problemas:
a) o número de pesquisadores da língua é pequeno
65
Há uma escassez de pesquisadores para estudar as cerca de 170
línguas faladas no território brasileiro, o que se configura como uma deficiência para o
quadro de lingüistas brasileiros, ou seja, não apenas o kaingang, mas a maioria das
línguas Jê necessita de estudos no nível morfossintático que possam contribuir o
apenas para o escopo da Lingüística, mas tamm para os estudos comparados desta
família lingüística.
b) a língua carece de estudos do nível morfossintático
Um dos primeiros estudiosos a dedicar-se à língua foi Frei Mansueto B.
de Val Floriana, que organizou uma gramática (FLORIANA, 1918) e um dicionário
(FLORIANA, 1920) do kaingang. Apesar de ser um material riquíssimo, o uso do
mesmo constitui apenas uma referência a estudos mais apurados da morfossintaxe da
língua, uma vez que as análises desenvolvidas por Floriana são pouco sistemáticas e
se baseiam nos conhecimentos gramaticais da época. (SANTOS e PONTES, 1997, p.
6).
Rosário F. Mansur Guérios (GUÉRIOS, 1942 e 1945) e Herbert Baldus
(BALDUS, 1947) abordaram aspectos morfossintáticos, porém de forma não
sistemática. Em 1966, Mullen publicou um trabalho sobre a pluralização em kaingang.
Destacam-se os trabalhos de duas pesquisadoras: Úrsula Wiesemann e
Marita P. Cavalcante.
Um dos trabalhos mais importantes de Wiesemann é Phonologische
und Grammatische der Kaingáng Sprache(WIESEMANN, 1972) no qual aborda as
estruturas fonológicas e morfossintáticas da língua. Outro trabalho importante de
66
Wiesemann é o Dicionário Kaingáng – Português e Português Kaingáng
(WIESEMANN, 1971) útil em algumas informações gramaticais.
O trabalho de Cavalcante (1987) refere-se à fonologia da língua. Sua
análise segue os princípios da gramática gerativo-transformacional.
Quanto à marcação de caso, são relevantes os trabalhos de
Nascimento (1995
a, 1996) e de DAngelis (1995 a).
c) são poucos os estudos sobre a língua kaingang que possam ser
usados por professores bilíngües
Os professores bilíngües da terra Indígena Apucaraninha não dispõem
de absolutamente nenhum material acessível sobre a estrutura da língua kaingang.
Acredito que o acesso a materiais técnicos sobre a gramática da língua contribuirá para
o bom desempenho das atividades de ensino, pois constatei grande interesse por parte
deles.
5.2 Ordem Oracional da Língua Kaingang
A ordem oracional canônica na língua kaingang é S O V como se pode
constatar a partir do exemplo:
(52) g
sujeito objeto verbo
menino ms bolo comer (pas.)
O menino comeu bolo.
67
Em kaingang, o passado é o tempo não marcado, ou seja, tem a
mesma forma do infinitivo. A oração acima e as demais que apresento
no decorrer
deste capítulo foram coletadas neste tempo, por isso, nas glosas, o verbo aparece no
infinitivo com a indicação de passado entre parênteses.
A partícula v
marcador do sujeito.
Na oração transitiva indireta, o objeto indireto ocorre depois do objeto
direto:
(53) Kófa v
sujeito
obj. ind. obj. dir. verbo
velho menino pl. para história contar (pas.)
O velho contou uma história para os meninos.
Na oração acima, a partícula agfunciona como marcador de plural.
Na oração intransitiva, a ordem é S V como se pode notar no exemplo
abaixo:
(54) toto v t
sujeito verbo
borboleta ms voar (pas.)
A borboleta voou.
Abreu (2005), no trabalho Os pronomes e a estrutura frasal em kaingang,
constatou que, em certas orações com o sintagma nominal sujeito preenchido por um
pronome pessoal, a ordem é O V S (cf. (55)) e VS (cf. (56)).
68
(55) gój ma inh
objeto verbo sujeito
água carregar(pas.) eu
Eu carreguei água.
(56) Mur ti
verbo sujeito
nascer (pas.) ele
Ele nasceu.
5.3 Mudança de Valência Envolvendo o Sujeito
5.3.1 Diminuição de Valência
De acordo com Comrie (1985), três tipos de construções derivadas
de um verbo transitivo com diminuição de valência: com verbo anticausativo, oração
com verbo recíproco e oração com verbo reflexivo. Tratarei o verbo anticausativo como
a variante inacusativa dos verbos de alternância causativa seguindo a definição de
Duarte (2003).
5.3.1.1 Verbos de Alternância Causativa
Conforme apresentado no capítulo 4, os verbos de alternância
causativa se caracterizam por exibirem uma variante causativa transitiva e uma variante
69
não causativa inacusativa. A variante inacusativa é derivada da transitiva por um
processo de redução de valência, no qual o argumento que funciona como objeto direto
da variante transitiva ocorre como sujeito da forma inacusativa e o argumento externo
da variante transitiva não fica disponível na inacusativa
,
portanto o verbo sofre um
processo de redução que afeta o papel temático externo resultando em um predicado
mono-argumental derivado de um predicado de dois lugares. Como o papel temático
externo é suprimido, o verbo perde a capacidade de legitimar casualmente o seu
argumento interno direto, assim a forma resultante tem as propriedades de um verbo
inacusativo.
Os verbos de alternância causativa da língua kaingang apresentados
abaixo se encaixam no que Duarte (2003) define como verbos de mudança de estado
devido à causa externa.
Verbo quebrar vidro
(57) g ãm
menino ms p.p.1ªp. prato quebrar vidro (pas.)
O menino quebrou meu prato.
(58) inh pratu vy v
p.p.1ªp. prato ms quebrar vidro (pas.)
Meu prato quebrou.
Nota-se que o verbo quebrar vidroapresenta uma variante causativa
transitiva (57) e uma não causativa inacusativa (58). O sujeito sintático da variante
inacusativa e o objeto da variante transitiva têm a mesma função semântica. A primeira
é uma construção causativa transitiva que se constrói com um argumento agente (o
menino) e que expressa um evento que denota uma mudança de estado em seu
70
argumento objeto (meu prato). A segunda é uma construção inacusativa que se constrói
com somente um argumento: o elemento que sofre a mudança de estado. A relação
semântica entre o verbo quebrar” e o sintagma nominal meu pratoé a mesma nas
duas construções, pois, em ambos os casos
,
trata-se do paciente ou tema afetado- é
um objeto nocional que apresenta variação na sua realização sintática: objeto na
construção transitiva e sujeito na oração inacusativa.
Na construção inacusativa, é possível entender que há uma causa
externa que desencadeia o processo que o verbo denota, mas esta causa não é
especificada.
Duarte (2003) argumenta que as variantes inacusativas de certos
verbos de alternância causativa em português são marcadas com o clítico -se
denominado anticausativo; Comrie (1985) e Haspelmath & Müller-Bardey (2004)
destacam
que o verbo anticausativo derivado do verbo transitivo por redução de
valência é marcado com um afixo também denominado anticausativo.
A língua kaingang marca a variante inacusativa dos verbos de
alternância causativa com uma modificação morfológica. Nos exemplos (57) e (58) é
possível notar que a variante transitiva causativa do verbo quebrar vidroé gãme que
a variante não causativa inacusativa é góv.
Abaixo segue a descrição de outros verbos de alternância causativa da
língua kaingnag.
71
Verbo fechar
(59) g ã n
menino ms porta fechar (pas.) (?)
O menino fechou a porta.
(60) jankã v
porta ms fechar (pas.) ?
A porta fechou.
Como se pode notar, nas orações acima, o verbo fechar” na
construção transitiva causativa tem a forma n ão
inacusativa.
Verbo esfriar
(61) kafe kusãg fi
café esfriar (pas.) ela
A mulher esfriou o café.
(62) kafe v
café ms esfriar (pas.) (?)
O café esfriou.
Na oração transitiva causativa, a forma do verbo esfriar é kusãge na
oração inacusativa a forma é kusa. Na oração (61), mulher é representada pelo
pronome fi. Quando o sujeito da oração é ocupado por pronome, ele aparece no final
da oração e não há marcação de sujeito.
72
Verbo quebrar
(63) g
menino ms janela quebrar (pas.)
O menino quebrou a janela.
(64) janela v
janela ms quebrar (pas.)
A janela quebrou.
A forma do verbo quebrar” na oração transitiva causativa é mranhe
na oração inacusativa é mráj.
Verbo rachar
(65) g
menino ms lenha rachar (pas.)
O menino rachou a lenha.
(66) p
lenha ms rachar (partir uma vez) (pas.)
A lenha rachou.
Como se pode notar a forma do verbo racharna oração transitiva
causativa é “ryge na oração inacusativa é “ryg ké.
Os verbos que serão apresentados abaixo (acordar, abrir, rolar,
queimar, rasgar e matar/morrer) apresentam um padrão na mudança morfológica da
forma transitiva causativa para a inacusativa. Na forma transitiva apresentam final “-ne
na forma inacusativa apresentam final “-r”.
73
Verbo acordar
(67)
criancinha mãe fem. ms ele acordar (pas.)
A mãe acordou o menino.
(68)
criancinha ms acordar (pas.)
O menino acordou.
O verbo acordarapresenta a forma “r ão transitiva causativa
e a forma “r ão inacusativa. Sobre a estrutura da oração (67), convém
ressaltar que ãe do menino. Na
posição de objeto, a palavra menino é representada pelo pronome ti.
Verbo queimar
(69)
homem ms casa queimar (pas.)
O homem queimou a casa.
(70)
casa ms queimar (pas.)
A casa queimou.
Na oração transitiva causativa, a forma do verbo queimar é p
oração inacusativa é p
Verbo rolar
(71) g
menino ms pedra rolar (pas.)
O menino rolou a pedra.
74
(72) pó v
pedra ms rolar (pas.)
A pedra rolou.
O verbo “rolar” apresenta a forma t ão transitiva causativa e
a forma t ão inacusativa.
Verbo abrir
(73) g ãnkã nón
menino ms porta abrir (pas.)
O menino abriu a porta.
(74) jãnkã v
porta ms abrir (pas.)
A porta abriu.
Na oração transitiva causativa a forma do verbo abrir” é nóne na
oração inacusativa é nor”.
Mesmo quando o sujeito é preenchido por um instrumento, a forma do
verbo é a mesma da oração que apresenta um argumento agente:
(75) chave v ãnkã nón
chave ms porta abrir (pas.)
A chave abriu a porta.
Verbo rasgar
(76) g ãn
menino ms p.p.1ªp. rede rasgar (pas.)
O menino rasgou minha rede.
75
(77) inh t
p.p.1ªp. rede ms rasgar (pas.)
Minha rede rasgou.
Como se pode observar, a forma do verbo “rasgar” na oração transitiva
causativa é jãne na oração inacusativa é jar”.
Um exemplo interessante de alterncia causativa acontece com o
verbo matar” e morrer”. O kaingang emprega dois verbos distintos com o significado
de matar: o verbo tãnhindica matar a pauladas e o verbo ténsignifica matar ou
embebedar. Ambas as formas têm como correspondente não causativo o verbo ter
(morrer). Pode-se dizer que os verbos téne ter” são, na verdade, um único verbo que
significa cessar a vidaporque têm a mesma raiz, o primeiro indica a presença de um
argumento agente, portanto ocorre em oração transitiva causativa; e o segundo tem
como sujeito sintático o objeto nocional do primeiro, portanto é um verbo inacusativo.
Exemplos:
(78) veneno v
veneno ms onça matar (pas.)
Um veneno matou a onça.
(79) m
onça ms morrer (pas.)
A onça morreu.
A relação entre tãnhe ter” será tratada na seção 5.3.1.
76
Outro exemplo interessante de alternância causativa ocorre com o
verbo cair. Há dois verbos cair” na língua kaingang: o verbo to héque significa estar
em pé no chão e cair e o verbo ku t
verbos têm como causativo o verbo kut
que ku t ão com o
primeiro indica cair” com a presença de um agente e a construção com o segundo
indica cair” sem a presença do mesmo. Exemplos:
(80) N
Manoel ms menino derrubar (pas.)
Manoel derrubou o menino.
(81) g
menino ms cair (pas.)
O menino caiu.
Como se pode observar nos exemplos acima, na oração transitiva
causativa a forma do verbo é kut ão inacusativa, a forma é ku t -
se, portanto,
de um mesmo verbo que sofre uma mudança morfológica representada
pela perda de “-mna oração inacusativa. A relação entre to hée kut
na seção 5.3.1.
As orações acima participam da alternância causativa e todos os verbos
apresentados apresentam uma mudança morfológica na variante inacusativa. O quadro
a seguir mostra a forma dos verbos nas orações transitivas causativas e nas orações
inacusativas derivadas:
77
Verbo
Oração Transitiva
Causativa
Oração Inacusativa
quebrar vidro
gãm
góv
fechar
n
n
esfriar
kusãg
kusa
quebrar
mranh
mráj
rachar
ryg
rug ké (partir uma vez)
acordar
r
r
queimar
p
p
rolar
t
t
abrir
nón
nór
rasgar
jãn
jar
matar/morrer (cessar a
vida)
ten
ter
derrubar/cair
kut
ku t
Alguns verbos que tamm participam da alternância causativa não
apresentaram mudança morfológica na oração inacusativa:
(82)
homem ms canoa ? virar (pas.)
O homem virou o barco.
78
(83) kakénh v
canoa ms virar (pas.)
O barco virou.
É possível observar que o verbo virar” apresenta a mesma forma virn
kétanto na oração transitiva causativa quanto na inacusativa. (Não achei estas formas
no dicionário, mas encontrei estas: v v.i.sg. virare vir v.i. virar”)
O mesmo ocorre com o verbo pararcomo se pode notar abaixo:
(84) kam
caminhão motorista ms caminhão ? parar (pas.)
O motorista parou o caminhão.
(85) kam
caminhão ms parar (pas.)
O caminhão parou.
A forma do verbo parar” é kr ões.
5.3.1.1.1 Similaridade entre Construções Inacusativas e Passivas
A passiva, segundo Comrie (1985), tamm é um tipo de construção de
diminuição de valência que envolve o sujeito. O sujeito da construção passiva é o
objeto do verbo transitivo. Este tipo de construção ocorre na língua kaingang como se
pode observar a seguir:
79
(86) - oração ativa: g ãm
menino ms prato quebrar vidro
O menino quebrou o prato.
(87) - oração passiva: pratu v
prato ms menino para quebrar
O prato foi quebrado pelo menino.
Como se pode observar no exemplo (87), em kaingang não ocorre
locução verbal na passiva como em português. Na construção passiva, o paciente
ocupa a posição de sujeito e o verbo aparece na mesma forma usada na oração
inacusativa como no exemplo (58).
É provável que a língua kaingang utilize o mesmo processo de
mudança morfológica do verbo para a oração passiva e inacusativa. De acordo com
Comrie (1985) e Duarte (2003), as duas construções são similares porque têm como
sujeito o objeto do verbo transitivo. A diferença entre elas é que, na passiva,
há um
sintagma agentivo mesmo que não esteja expresso e a
construção inacusativa refere-
se a um evento espontâneo.
Com os verbos “rasgar” e fechar” é possível notar que, na oração
passiva, os verbos apresentam a mesma forma usada na construção inacusativa
(contraste (89) com (77) e (90) com (60)).
(88) - oração ativa: g ãn
menino ms rede rasgar (pas.)
O menino rasgou a rede.
80
(89) - oração passiva: t
rede ms menino para rasgar
A rede foi rasgada pelo menino.
(90) oração ativa: g ã n
menino ms porta fechar (pas.) (?)
O menino fechou a porta.
(91) oração passiva: jankã v
n
é
porta ms menino para fechar ?
A porta foi fechada pelo menino.
5.3.1.2 Oração com Verbo Recíproco
Segundo Comrie (1985), na construção de uma oração que usa um
verbo recíproco ocorre diminuição de valência envolvendo o sujeito. O sujeito e o objeto
direto do verbo transitivo são combinados formando um único sujeito na oração com
verbo recíproco. Ocorre, assim, a redução de valência da construção transitiva para a
intransitiva.
A língua kaingang não apresenta nenhuma modificação morfológica no
verbo para marcar este tipo de derivação, como se pode observar nos exemplos
abaixo:
(92) Manoel v
Manoel ms Jandira fem. encontrar (pas.)
Manoel encontrou Jandira.
81
(93) Manoel mré Jandira fag v
Manoel com Jandira fem. + pl. ms reflex. encontrar (pas.)
Manoel e Jandira se encontraram.
É possível notar que a forma do verbo encontrar - ka to t - é a
mesma na oração transitiva e na intransitiva. Para marcar a reciprocidade do verbo é
usada a partícula jagn e tipo de construção em kaingang é semelhante à
construção do português, ou seja, o há mudança morfológica na forma do verbo na
oração intransitiva com verbo recíproco e para indicar a reciprocidade há a ocorrência
de uma partícula reflexiva.
O mesmo tipo de construção ocorre nos exemplos abaixo:
(94) g
menino mãe fem. ms ele encontrar (pas.)
A mãe encontrou o menino.
(95) g
menino mãe fem. com ele reflex. encontrar (pas.)
O menino e a mãe se encontraram.
É interessante notar que a língua kaingang comporta-se diferentemente
das línguas descritas por Comrie que apresentam mudança morfológica no verbo da
construção intransitiva para indicar a reciprocidade, como o exemplo turco apresentado
em 4.1.2.1.2:
82
(25) “a. Anton vstretil Ninu
Antônio encontrou Nina
b. Anton i Nina vstretili-s
Antônio e Nina se encontraram.
5.3.1.3 Oração com Verbo Reflexivo
De acordo com o que foi exposto na seção 4.1.2.1.3, na oração
reflexiva o sujeito e o objeto se referem à
mesma pessoa. Lyons (1979) registra que a
identidade do sujeito e a do objeto são marcadas com o uso de um pronome ou por
prefixo, sufixo ou infixo ligado ao tema verbal. Segundo Comrie (1985), o verbo reflexivo
é formado do verbo não reflexivo que possui
sujeito e objeto distintos. Na construção
com verbo reflexivo, somente o sujeito é expresso e o afixo indica que o sujeito
funciona igualmente como o objeto.
Em kaingang, a construção reflexiva apresenta o pronome reflexivo
v
do verbo não reflexivo. Exemplo:
(96) Jandira fi v
Jandira fem. ms menino lavar (pas.) (no dicionário encontrei: kupe)
Jandira lavou o menino.
83
(97) g
menino ms reflex. lavar (pas.)
O menino se lavou.
Como se pode notar, a forma do verbo lavar” o sofre modificação
morfológica na oração reflexiva. Para indicar que o sujeito da reflexiva é o objeto da
transitiva, a língua emprega o pronome reflexivo v
pentear”:
(98) Margarida fi g
Margarida fem. menino pentear (pas.)
Margarida penteou o menino
(99) g
menino ms reflex. pentear (pas.)
O menino se penteou.
Nos exemplos acima, é possível verificar que a língua kaingang
comporta-se diferentemente das línguas descritas por Comrie (1985), pois não há
acréscimo de um afixo ao verbo derivado, como pode ser constatado no exemplo russo
que utiliza sufixo no verbo derivado. Exemplo:
(27) “a. Matpomyla rebenka
A mãe lavou a criança
b. Rebenok pomyl-sja
A criança lavou-se.
84
5.4 Construções Causativas
5.4.1 Causativos Morfológicos, Analíticos e Lexicais em Kaingang
No capítulo 3, apresentei os três tipos causativos segundo a
classificação de Comrie (1985): morfológicos, analíticos e lexicais. Estes três tipos
envolvem um aumento de valência na formação da construção causativa pelo
acréscimo do argumento causer”. O sujeito da oração não causativa correspondente é
o argumento causeeda construção causativa.
O causativo morfológico indica que o verbo sofre um processo
derivacional (geralmente o acréscimo de um afixo) para expressar a idéia de causa. O
causativo lexical apresenta um item lexical diferente para indicar a situação causativa e,
no causativo analítico, há o acréscimo de um predicado para expressar a causa.
O causativo analítico representa a primeira estrutura apresentada
em 4.2:
O
SP CAUSA O
SE V ODE OIE
João causa Maria dar livro Fred
O causativo morfológico representa a segunda estrutura na maioria das
línguas que Comrie descreveu:
85
O
SP CAUSA-V SE ODE OIE
Jo causa-dar Maria livro Fred
Os verbos que participam da alternância causativa encaixam-se no
causativo morfológico, pois há mudança morfológica na forma do verbo da oração
inacusativa em relação à forma do verbo da oração transitiva causativa.
De acordo com o que foi exposto na seção 5.3.1.1, a língua kaingang
tem dois verbos distintos com significado de matar” e cair”. As formas tén/ter” e
kut ão exemplos de causativos
morfológicos.
O verbo tãnh” (matar a pauladas) é um exemplo de causativo
lexical em kaingang porque é um item lexical completamente diferente de ter” (morrer)
que é um verbo não causativo. Exemplo:
(79) m
onça ms morrer (pas.)
A onça morreu.
(100) ãnh
caçador ms onça matar (pas.) (a pauladas)
O caçador matou a onça.
86
Como se pode observar nos exemplos acima, na oração transitiva
foi usado um item lexical tãnhdiferente de ter” para expressar a idéia de
causatividade.
O verbo kut ão com
o verbo to hé” (estar de pé no chão e cair) que é um verbo não causativo conforme se
verifica nos exemplos abaixo:
(101) g
menino ms cair (pas.)
O menino caiu.
(80) N
Manoel ms menino derrubar (pas.)
Manoel derrubou o menino.
O verbo empregado na oração (101) indica que o menino estava em pé
no chão e caiu. Na oração causativa correspondente foi utilizado um item lexical
diferente para expressar a idéia de causa.
Com base nos exemplos (78)/(79) e (80)/(81) é possível dizer que, na
relação tén/ter” e kut ão
tãnh/tere kut usativo lexical, conforme se pode verificar nos
exemplos (79)/(100) e (101)/(80).
Quanto à formação de orações causativas derivadas de verbos
intransitivos, monotransitivos e ditransitivos, minha hipótese era de que a língua
kaingang apresentasse causativo morfológico, mas ela o se confirmou, como será
apresentado nas seções seguintes, pois a língua apresenta causativo analítico.
87
5.4.1.1 Causativos Formados de Verbos Intransitivos em Kaingang
É possível construir uma oração causativa derivada de um verbo
intransitivo. De acordo com Comrie (1985), o sujeito da oração intransitiva passa a
objeto direto da oração causativa porque a posição de sujeito será ocupada pelo
causer. O objeto direto na oração causativa assume a função de causee. Esta
hierarquia acontece na maioria das línguas descritas pelo autor, porém algumas, como
foi apresentado no capítulo 4, fazem a duplicação de algum constituinte.
A língua kaingang, neste tipo de estrutura, não apresenta causativo
morfológico como nas línguas descritas por Comrie. Em kaingang, ocorre o causativo
analítico constituído de uma oração principal com o verbo causativo fazer” e uma
subordinada que preenche o lugar do objeto direto, portanto é uma oração subordinada
objetiva direta.
Abaixo apresento exemplos de orações causativas do kaingang
derivadas de verbos intransitivos. Nas orações derivadas, as subordinadas estão em
negrito.
Verbo voar
(102) s
passarinho ms voar (pas.)
O pássaro voou.
(103) N
s
han
Manoel ms passarinho voar fazer (pas.)
Manoel fez o pássaro voar.
88
É possível observar que, na oração derivada, há o acréscimo do
causer” representado pelo sintagma nominal N ão de sujeito
da oração principal. O causee” representado por “s ão de sujeito da
oração subordinada. Esta oração ocupa a posição de objeto direto, por isso ocorre
antes do verbo da oração principal han. Como se pode observar, a forma do verbo
na oração intransitiva é a mesma na oração derivada.
Verbo dormir
(104) g
menino ms dormir (pas.)
O menino dormiu.
(105) g
ti n
han
menino mãe fem. ms ele dormir fazer (pas.)
A mãe fez o menino dormir”.
Como ressaltado na seção 5.3.1.1, na posição de objeto o sintagma
g presentado pelo pronome tie o sintagma g
mãe do menino.
Na oração causativa derivada do verbo dormir, o causer” ocupa a
posição de sujeito da oração principal (g ão de
sujeito da oração subordinada (ti). Assim, como no exemplo com o verbo voar”, a
oração subordinada ocupa a posição de objeto direto do verbo fazer”. Todas as
orações subordinadas
apresentadas abaixo ocupam esta posição já que o verbo da
oração principal é transitivo direto.
89
Verbo ir
De acordo com Comrie, também é possível construir uma oração
causativa derivada de um verbo intransitivo com objeto locativo.
(106) g ãfã ra vyr
menino ms escola para foi (pas.)
O menino foi para a escola.
(107) g
ti t ãfã ra t
han
menino pai ms ele ind. erg. escola para fazer andar fazer (pas.)
O pai fez o menino ir para a escola.
A oração derivada do verbo ir” apresenta estrutura um pouco mais
complexa em relação às derivadas dos outros verbos intransitivos apresentados. Como
este verbo apresenta um objeto locativo, supõe-se que na língua kaingang ele seja
considerado um verbo transitivo, portanto na oração subordinada ocorre a parcula t
que funciona como marcador de sujeito ergativo. Na oração derivada, o causerocupa
a posição de sujeito da principal e o causeea posição de sujeito da oração
subordinada. O sintagma que funciona como causer” pode ser interpretado como o pai
do menino.
90
5.4.1.2 Causativos Formados de Verbos Monotransitivos em Kaingang
Na formação de uma oração causativa formada de um verbo transitivo,
Comrie (1985) diz que o objeto direto do verbo básico continua nesta posição na oração
causativa derivada e o causeeocupa a posição de objeto indireto já que a posição de
sujeito já é ocupada pelo causer”. Como na língua kaingang o causativo derivado de
verbo transitivo é analítico, a construção derivada é formada por uma oração principal e
uma subordinada. A estrutura é a mesma das orações formadas de verbos intransitivos,
com o acréscimo, porém, da parcula t
ergativo, já que a oração subordinada é transitiva.
Verbo beber
(108) g
menino ms água beber (pas.)
O menino bebeu água.
(109) g
ti t
han
menino mãe fem. ms ele ind. erg. água beber fazer (pas.)
A mãe fez o menino beber água.
Nota-se, no exemplo (109), que o causer” ocupa a posição de sujeito
da oração principal (este sintagma deve ser interpretado como a mãe do menino”) e o
causee” (ti)
a posição de sujeito da subordinada substantiva objetiva direta. O objeto
direto da oração básica permanece na mesma posição na oração subordinada. Os
91
verbos comer”, “rasgar” e fechar” apresentados abaixo também apresentam a mesma
estrutura.
Verbo comer
(110) g
menino ms banana comer (pas.)
O menino comeu banana.
(111) g
ti t
han
menino mãe fem. ms ele ind. erg. banana comer fazer (pas.)
A mãe fez o menino comer banana.
No exemplo (111), o causer” ocupa a posição de sujeito da oração
principal e o causeea posição de sujeito da oração subordinada.
Verbo fechar
(112) g ãnkã n
menino ms porta fechar (pas.)
O menino fechou a porta.
(113) g
ti t ãnkã n
han
menino mãe fem. ms ele ind. erg. porta fechar fazer (pas.)
A mãe fez o menino fechar a porta.
Na oração derivada, o causerocupa a posição de sujeito da oração
principal e o causeea posição de sujeito da oração subordinada.
Verbo rasgar
(114) g ãn
menino ms rede rasgar (pas.)
O menino rasgou a rede.
92
(115) g fi
ti t ãn
han
menino mãe fem. ele ind. erg. rede rasgar fazer (pas.)
A mãe fez o menino rasgar a rede.
Como se pode observar na oração (115), o causer” ocupa a posição de
sujeito da oração principal e o causeea posição de sujeito da oração subordinada.
5.4.1.3 Causativos Formados de Verbos Ditransitivos em Kaingang
Os verbos ditransitivos admitem um objeto indireto. Segundo Comrie
(1985), quando o causativo é formado de um verbo ditransitivo, o causeeaparece,
preferencialmente, como algum constituinte oblíquo já que a posição de sujeito será
ocupada pelo causer, a de objeto direto pelo objeto direto da oração não causativa e a
posição de objeto indireto será ocupada pelo objeto indireto da oração não causativa.
Em kaingang, a formação de uma oração causativa formada de um
verbo ditransitivo apresenta a mesma estrutura da oração formada de um verbo
monotransitivo. Há, no entanto, o acréscimo do objeto indireto, que aparece depois do
objeto direto na oração subordinada.
Verbo dar
(116) Jandira fi g
Jandira fem. menino para comida dar uma coisa não comprida (pas.)
Jandira deu comida para o menino.
(117) N
Jandira fi t n
han
Manoel ms Jandira fem. ind. erg menino para comida dar fazer (pas.)
Manoel fez Jandira dar comida para o menino.
93
Na oração derivada, o causer” ocupa a posição de sujeito da oração
principal e o causeeocupa a posição de sujeito da subordinada. O objeto direto e o
indireto da oração básica permanecem na mesma posição na oração subordinada. A
mesma estrutura ocorre com o verbo contar” como poderá ser verificado abaixo.
Verbo contar
(118) Professor v m
Professor ms menino para livro contar/ dizer (pas.)
O professor leu o livro para o menino.
(119) N
professor t
han
Manoel ms professor ind. erg. menino para livro contar fazer (pas.)
Manoel fez o professor ler o livro para o menino.
Com relação aos causativos formados de verbos intransitivos,
monotransitivos e ditransitivos em kaingang é possível concluir que: (a) ocorre
causativo analítico já que a construção derivada apresenta uma oração principal com o
verbo causativo fazer” e uma subordinada que funciona como objeto deste verbo; (b) a
forma do verbo da oração básica permanece a mesma na oração derivada como se
pode constatar nos exemplos de (102) a (119); (c) o causer” ocupa a posição de sujeito
da oração principal e o causeea posição de sujeito da oração subordinada e tanto o
objeto direto quanto o objeto indireto da oração básica permanecem na mesma posição
na oração subordinada; (d) quando a oração é derivada de verbo monotransitivo e
ditransitivo ocorre a parcula t
constatado por meio dos exemplos (109), (111), (113), (115), (117) e (119).
94
Os quadros abaixo representam as construções causativas formadas
de intransitivos, monotransitivos e ditransitivos:
a)
Oração básica com verbo intransitivo
SUJEITO + v
Principal
Subordinada
Principal
Oração causativa
derivada
SUJ + v
(causer)
SUJ + VERBO
(Causee)
VERBO FAZER
b)
Oração básica com verbo monotransitivo
SUJEITO + v
Principal
Subordinada
Principal
Oração causativa
derivada
SUJ + v
(causer)
SUJ + t
(Causee)
VERBO FAZER
c)
Oração básica com verbo
ditransitivo
SUJEITO + v
Principal
Subordinada
Principal
Oração
causativa
derivada
SUJ + v
(causer)
SUJ+ t
(Causee)
VERBO FAZER
É interessante notar que a língua kaingang é semelhante ao português
na formação de orações causativas derivadas de verbos intransitivos, monotransitivos e
ditransitivos, pois ambas as línguas apresentam causativo analítico e se diferenciam
das línguas descritas por Comrie.
Assim como o português, o kaingang não forma uma oração simples,
mas sim um período composto constituído de uma oração principal com o verbo fazer
95
mais a subordinada que ocupa o lugar do objeto direto, mas há a marcação de ergativo
para o sujeito da oração subordinada.
96
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo deste trabalho foi descrever a formação das construções
causativas da língua kaingang. Antes de elaborar o conjunto de dados para coleta, fiz
uma pesquisa bibliográfica para me aprofundar no assunto. Achei oportuno fazer uma
abordagem da noção de transitividade e da classificação dos verbos que muito
contribuiu com meu conhecimento, pois descobri que a noção de transitividade e a
noção de intransitividade abrangem muitos conceitos não tratados pelas gramáticas
tradicionais, como, por exemplo, o fato de haver dois tipos de verbos intransitivos.
Ao estudar os dois tipos de verbos intransitivos, descobri que estes são
divididos em duas classes: os verbos inergativos e inacusativos. Há dois tipos de
inacusativos: os que denotam mudança de estado ou localização, dentro os quais
encontram-se os verbos de alternância causativa, e os que expressam existência e
aparição. Aprofundei-me na pesquisa dos verbos de alternância causativa devido ao
fato deles apresentarem uma variante causativa transitiva e uma variante não causativa
inacusativa.
Os verbos que constam das orações que analisei na minha monografia
de Especialização são de alternância causativa. Constatei que ocorre uma mudança na
forma do verbo de uma oração para outra e este fato motivou a minha pesquisa no
Mestrado, portanto fiz a coleta de mais orações com verbos deste tipo.
Ao analisá-los, constatei que ocorre um padrão de mudança
morfológica na maioria deles: na variante causativa transitiva apresentam final “-ne na
97
variante não causativa inacusativa apresentam final “-r”. Devido ao fato de ocorrer esta
mudança, considerei-os como exemplos de causativos morfológicos.
Para descrever o processo de formação das construções causativas,
me apoiei principalmente na abordagem trica de Comrie (1976 e 1985). De acordo
com ele as construções causativas são formadas pelo aumento de valência do verbo
não causativo que se caracteriza pelo acréscimo do argumento que funciona como
causer. O autor apresenta antes as construções formadas pela diminuição de valência
envolvendo o sujeito que resultam em orações anticausativas, recíprocas e reflexivas.
A maioria das línguas descritas pelo autor apresenta
uma mudança
morfológica na forma do verbo da oração derivada manifestada pelo emprego de um
afixo. Geralmente, um mesmo afixo é usado nas três construções. Na descrição da
formação destas orações, Comrie abordou também a similaridade entre construções
inacusativas e passivas. Em kaingang, constatei que ocorre mudança morfológica nas
variantes não causativas inacusativas dos verbos de alternância causativa, como
demonstrado acima, verifiquei também que a construção passiva não apresenta
locução verbal e se caracteriza pelo emprego do verbo na forma inacusativa e o uso da
partícula m às construções com verbos recíprocos e reflexivos, constatei que
não ocorre mudança na forma do verbo da oração derivada. A partícula jagn
reciprocidade do verbo e na construção reflexiva, e o pronome reflexivo v a
que o sujeito funciona igualmente como o objeto direto do verbo não reflexivo.
Com relação às construções causativas, Comrie (1985) discorre sobre
os causativos morfológicos, analíticos e lexicais e sobre a formação de orações
causativas formadas de verbos intransitivos, monotransitivos e ditransitivos.
98
Conforme o exposto acima, os verbos que participam da alternância
causativa são exemplos de causativo morfológico. A língua apresenta dois verbos com
o sentido de matar” e dois com o sentido de cair”. Ao analisar as orações construídas
com estes verbos, constatei que tén” (matar) com relação ao verbo ter” (morrer) é um
exemplo de causativo morfológico, assim como o verbo kut
com o verbo ku t ãnh (matar a pauladas) relacionado ao verbo
ter” é exemplo de causativo lexical, da mesma forma que kut
verbo to hé” (cair estando no co).
As construções causativas formadas de verbos intransitivos,
monotransitivos e ditransitivos são exemplos de causativos analíticos. Na construção
derivada, a oração sica ocupa a posição de objeto direto, o causer” a posição de
sujeito da principal e o causeea posição de sujeito da subordinada, o objeto direto e o
indireto da oração básica permanecem na mesma posição na oração subordinada. O
sujeito da subordinada (“causee”) é marcado com a partícula t
ergativo) quando o verbo da oração é monotransitivo ou ditransitivo.
Neste trabalho procurei descrever as construções causativas da língua
kaingang com base no referencial trico sobre causatividade. Quando se trabalha com
a descrição de uma língua, acredito que nenhuma análise é definitiva. Por experiência,
sei que um pesquisador nunca considera um trabalho como acabado, pois, a cada nova
leitura, surge um ponto que precisa ser investigado melhor ou tratado de outra forma.
Acredito que um pesquisador não pode chegar a nenhuma conclusão
sozinho, por isso considero de grande valor as contribuições feitas pelo orientador que,
na verdade, é um co-autor.
99
Espero que esta dissertação contribua na descrição da língua kaingang
e sirva como fonte para trabalhos comparativos das línguas Jê. Fica aqui aberta a
possibilidade de outros pesquisadores da língua kaingang aprofundarem a descrição e
análise das construções causativas abordadas neste trabalho.
100
7 BIBLIOGRAFIA
ABREU, Emília R. R. Os Pronomes e a Estrutura Frasal em Kaingang. In: SEMINÁRIO
DO CENTRO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS E LITERÁRIOS DO PARANÁ CELLIP,
12, 2005, Guarapuava. No prelo.
ALMEIDA, Leriana de; SANTOS, Ludoviko. A concordância de Número em Kaingang.
In: IV ENCONTRO INTERNACIONAL SOBRE LÍNGUAS E CULTURAS MACRO-JÊ,
2005, Recife.
ARRAIS, Telmo Correia. As construções causativas em português.
Alfa
, São Paulo, 29:
41-58, 1985.
BALDUS, Herbert. Vocabulário Zoológico Kaingáng.
Arquivos do Museu Paranaense
.
Curitiba, 6: 149 161.
BITTENCOURT, Vanda de O. A Questão da Transitividade das Estruturas Causativas
Sintéticas do Portugs.
Letras & Letras
, Uberlândia 3 (2), p. 169 182, dez., 1987.
BORBA, Francisco S.
Uma gramática de valência para o português
. São Paulo:
Ática, 1996.
CAMPOS, Héctor. Transitividad e intransitividad. In: BOSQUE, Ignacio; DEMONTE,
Violeta (Dir.).
Gramática Descriptiva de la Lengua Española
: Las construcciones
sintácticas fundamentales. Relaciones temporales, aspectuales e modales. Madrid:
Espasa, 1999. v.2, p 1519-1574.
CAVALCANTE, Marita P.
Fonologia e Morfologia da ngua Kaingáng
: o Dialeto de
São Paulo Comparado ao do Paraná. 1987. Tese. Universidade Estadual de Campinas,
Campinas.
COMRIE, Bernard. The Syntax of Causative Constructions: Cross Language Similarities
and Divergences. In: SHIBATANI, M (Ed.).
Syntax and Semantics
: The Grammar of
Causative Constructions. New York: Academic Press, 1976. v. 6, p. 261-312.
__________. Causative verbs and valency change. In: SHOPEN, Thimoty.
Language
typology and syntactic description
: Grammatical categories and the lexicon. New
york. Cambbrige University Press, 1985. v. 3, p. 309 - 348.
DANGELIS, Wilmar da Rocha. Ergatividade no Kaingang? In: I ENCONTRO DO
CELSUL – GT ESTUDOS KAINGANG. Florianópolis, UFSC, 1995a.
DANGELIS, Wilmar da Rocha; CUNHA, Carla Maria; RODRIGUES, Aryon D. (Orgs.).
Bibliografia das Línguas Jê
.
Campinas: DL/IEL/Unicamp, 2002.
101
DOURADO, Luciana. Construções com Predicados Complexos em Panará (Jê). In:
SANTOS, Ludoviko; PONTES, Ismael (Orgs.)
Línguas Jê
: Estudos Vários. Londrina:
Ed. UEL, 2002. p. 41 55.
DUARTE, Inês. A família das construções inacusativas. In: MATEUS, Maria Helena M.
et al.
Gramática da Língua Portuguesa
. Lisboa: Caminho, 2003. 5. ed., p. 507 548.
HASPELMATH, Martin; MÜLLER-BARDEY, Thomas. Valency change. In: BOOIJ,
Geert; LEHMANN, Christian; MUGDAN, Joachim (Edts.).
Morfhology
: A Handbook on
Inflection and Word Formation. Berlin: de Gruyter, 2004. v.2, p. 1130-1145.
________. Relações gramaticais, esquemas relacionais e ordem de palavras. In:
MATEUS, Maria Helena M. et al.
Gramática da Língua Portuguesa
. Lisboa: Caminho,
2003. 5. ed., p. 275 321.
FLORIANA, Frei Mansueto B. de Val. Ensaio de grammatica kainjang.
Revista do
Museu Paulista
. São Paulo, 1918. 10: 531 563.
________.
Diccionários Kainjgang - Portuguez e Portuguez Kainjgang
. Curitiba:
Museu Paranaense, 1920.
GRUPO M
Relatório de Pesquisa Realizada Junto as Escolas das
Áreas Indígenas do Norte do Paraná
. Londrina, 1996.
GUÉRIOS, Rosário F. M. Estudos sobre a Língua Caingangue.
Arquivos do Museu
Paranaense
. Curitiba, 1942. 2: 97 – 178.
________. O Xokrén é idioma Caingangue.
Arquivos do Museu Paranaense
. Curitiba.
1945. v.4, p. 321-331.
HERNANZ, M. Lluïsa. El infinitivo. In: BOSQUE, Ignacio; DEMONTE, Violeta (Dir.).
Gramática Descriptiva de la Lengua Española
: Las construcciones sintácticas
fundamentales. Relaciones temporales, aspectuales e modales. Madrid: Espasa, 1999.
v.2, p 1575 -1630.
LYONS. Jonh.
Introdução à Línística Teórica
. Trad. De Rosa Virgínia Mattos e
Silva e Hélio Pimentel. São Paulo: Companhia Editora Nacional/EDUSP, 1979.
MAIER, Nicole. Causatives in Brazilian Portuguese.
Cadernos de Estudos
Linísticos.
Campinas, (33), p. 83 96, jul./dez. 1997.
MENDIKOETXEA, Amaya. Construcciones inacusativas y pasivas. In: BOSQUE,
Ignacio; DEMONTE, Violeta (Dir.).
Gramática Descriptiva de la Lengua Española
:
Las construcciones sintácticas fundamentales. Relaciones temporales, aspectuales e
modales. Madrid: Espasa, 1999. v.2, p. 1575 -1630.
MOTA, Lúcio T.
As Guerras dos Índios Kaingang
: A história épica dos índios
kaingang no Paraná (1769 1924). Maringá: EDUEM, 1994.
102
MULLEN, Paul. Verb pluralization in Kaingáng.
Arquivo Lingüístico
. Brasília: Summer
Institute of Linguistics (SIL). n.159, 1966. Cópia em microficha no CEDAE-IEL-Unicamp.
NASCIMENTO, Silvia Helena L. do.
Aspectos morfossintáticos e sintáticos e
marcação de caso da ngua Kaingáng
. 1995a. Dissertação (Mestrado)
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.
________. Marcação de caso em Kaingáng (Jê). In: XI ENCONTRO NACIONAL DA
ANPOLL, 1996, João Pessoa.
Anais...
João Pessoa. p. 540-550.
OLIVEIRA, Marlene.
Da Taquara ao Cesto
: A Arte Gráfica Kaingáng. 1996. 88 p.
Monografia (Especialização em Sociologia) Universidade Estadual de Londrina,
Londrina.
SANTOS, Ludoviko. Elementos de Pesquisa: A Descrição de Línguas Indígenas. In:
SEMINÁRIO DO CENTRO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS E LITERÁRIOS DO
PARANÁ CELLIP, 7, 1994, Paranavaí.
Anais...
Paranavaí, 1994. p 555 558.
________.
Descrição de Aspectos Morfossintáticos da Língua Suyá Família Jê
.
1997. Tese. Universidade Estadual de Santa Catarina, Florianópolis.
SANTOS, Ludoviko; PONTES, Ismael.
Abordagem do Nível Morfossintático da
Língua Kaingáng sob o Ponto de Vista do Funcionalismo Givoniano
. Projeto de
Pesquisa: Universidade Estadual de Londrina. CPG 37122/97.
SEKI, Lucy.
Gramática do Kamaiurá
: Língua Tupi-Guarani do Alto Xingu. Campinas:
Editora da Unicamp; São Paulo, Imprensa Oficial, 2000.
SILVA, Célia R.
História Crítica da Construção da Escrita do Kaingáng.
1996. 109 p.
Dissertação (Mestrado em Letras) Universidade Estadual de Londrina, Londrina.
TABOSA, Luciana P.
Descrição Preliminar dos Pronomes Possessivos da Língua
Kaingang
. 2002. 47 p. Monografia (Especialização em Língua Portuguesa)
Universidade Estadual de Londrina, Londrina.
________. Variação das formas do plural e do singular nos Verbos do Kaingang. In:
ENCONTRO CIENTÍFICO DO CURSO DE LETRAS O DESAFIO DAS LETRAS, 2.,
2004, Rolândia.
Anais...
Rolândia, 2005. 1 CD Rom.
________. Descrição preliminar dos Pronomes Possessivos da língua kaingang. In: IV
SELISIGNO SEMINÁRIO DE ESTUDOS SOBRE LINGUAGEM E SIGNIFICAÇÃO E
IV SIMPÓSIO DE LEITURA DA UEL, 2004, Londrina.
Anais...
Londrina, 2005. 1 CD
Rom.
________. Hipótese de causatividade na mudança da forma verbal na língua kaingang.
Entretextos
: Revista do Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem,
Londrina, v. 5, p. 287-295, jan./dez. 2005.
103
________. Variação da Forma Verbal na Língua Kaingang: Causatividade. In:
SEMINÁRIO DO CENTRO DE ESTUDOS LINGÜÍSTICOS E LITERÁRIOS DO
PARANÁ CELLIP, 12, 2005, Guarapuava. No prelo.
TALMY, Leonard. Lexicalization patterns: semantic structure in lexical forms. In:
SHOPEN, Thimoty.
Language typology and syntactic description
: Grammatical
categories and the lexicon. New york. Cambbrige University Press, 1985. v. 3, p. 57 -
149.
TOMMASINO, Kimiye.
A História dos Kaingáng da Bacia do Tibagi:
Uma Sociedade
Jê Meridional em Movimento. 1995. 348 p. Tese (Tese de Doutoramento apresentada
ao Departamento de Antropologia da faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo) - Universidade de São Paulo, São Paulo.
VEIGA, Juracilda.
Organização Social e Cosmovisão Kaingang:
uma introdução ao
parentesco e nominação em uma sociedade Jê Meridional. 1994. 221 p. Dissertação
(Mestrado – Departamento de Antropologia do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas da Universidade Estadual de Campinas) Universidade Estadual de
Campinas, Campinas.
VILELA, Mário.
Gramática de Valências
: Teoria e Aplicação. Coimbra: Livraria
Almeida, 1992.
________.
Dicionário Kaingáng-Português, Português-Kaingang
. Rio de Janeiro:
Summer Institute of Linguistics (SIL), 1971.
WIESEMANN, Úrsula.
Die phonologissche und Grammatische Struktur der
Kaingáng Sprache
. Mouton. SIL, 1972.
________.
Kaingang Potuguês Dicionário Bilingüe
. Curitiba: Ed. Evangélica
Esperança, 2002.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo