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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde
CONCEPÇÕES E TRAJETÓRIAS DE FORMAÇÃO:
UM ESTUDO COM PROFESSORES DE MEDICINA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
Ângela Maria Moreira Canuto de Mendonça
São Paulo
2005
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO
CONCEPÇÕES E TRAJETÓRIAS DE FORMAÇÃO:
UM ESTUDO COM PROFESSORES DE MEDICINA DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
Tese
apresentada como parte dos requisitos
para obtenção do título de Mestre no Programa
de Mestrado Ensino em Ciências da Saúde
(CEDESS) sob orientação da Professora Doutora
Sylvia Helena Souza da Silva Batista.
São Paulo
2005
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Mendonça, Ângela Maria Moreira Canuto de.
Concepções e Trajetórias de Formação: um Estudo com
Professores de Medicina da Universidade Federal de Alagoas
/
Ângela Maria Moreira Canuto de Mendonça. - São Paulo: Universidade
Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina, 2005, X, 106 fls.
Tese (Mestrado) Universidade Federal de São Paulo. Escola Paulista
de Medicina. Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em
Saúde. Programa de Pós-Graduação em Ensino em Ciências da
Saúde.
Título em inglês: Conceptions and career steps: A study elaborated
with a group of professors of medicine at the Federal University of
Alagoas.
1. Educação médica. 2. Docente de medicina. 3. Formação de
professores.
1 INTRODUÇÃO
As origens da pesquisa e as questões norteadoras
O ensino médico em Alagoas vivencia um processo de transformação,
buscando caminhos que respondam às mudanças ocorridas nas cadas finais do
século XX, as quais trouxeram, dentre outras dimensões, a reflexão sobre a
necessidade formativa dos professores de Medicina. O ensino médico, em Alagoas,
vem acompanhando as mudanças postas no século XXI ou vem reproduzindo o
mesmo modelo de ensino médico vigente há quase um século? Essa questão não
está fora dos processos educacionais que marcaram a educação em Alagoas:
Nesse Estado as iniciativas para a criação dos cursos superiores
foram retardadas, por um lado, provavelmente pela proximidade de
Recife onde já havia a Faculdade de Direito. Por outro lado, talvez,
as oligarquias do açúcar que sempre determinaram a política no
Estado, não viam no estudo uma questão de valor. O fato é que para
serem donos de engenhos, o coronel e a sua descendência não
necessitavam de mais instruções do que aquelas que já detinham
para levar adiante os seus negócios, sendo o analfabetismo uma
condição freqüente. (VEOSA, 2001, p. 159).
A política tem refletido as condições concretas de existência. Portanto,
reconhece-se, na história alagoana, a supremacia dos valores e práticas políticas em
detrimento dos conhecimentos intelectuais. Segundo Verçosa (2001), a educação
escolar constituía em processo restrito, mantendo-se muito distante das
necessidades práticas do cotidiano. O valor da escolarização, assim, ficou reduzido
a um sico para gerir as políticas locais, o que pode, segundo o autor, ter
contribuído para o atraso em se instaurar uma educação de qualidade em Alagoas.
Nesse panorama, é possível inferir que, no início, o curso médico era uma
oportunidade a que somente alguns tinham acesso. Verçosa (2001) descreve que
era um curso longo, caro, e os alunos, na época, tinham que se deslocar para Bahia,
local mais próximo de Alagoas, onde funcionava uma Faculdade de Medicina.
Esse contorno político-educacional, percebido quando ainda aluna do
curso de Medicina, permitiu-me observar que, em geral, o perfil dos médicos
professores mais antigos evidenciava um professor de notório saber científico,
conservador, membro da classe social mais favorecida, que atuava com poder de
mando nos hospitais tradicionais da cidade.
Desde os tempos de estudante do curso médico despertou-me a atenção
o fato de que os professores médicos eram, em sua maioria, profissionais com
algum vínculo aos principais hospitais da cidade, mantinham consultórios e
ensinavam no curso de medicina. Parecia-me ser a atividade do magistério apenas
complemento das demais, pois, segundo se comentava, o médico-professor gozava
de um certo prestígio e até de um status que o diferenciava dos demais.
O que já não entendia era como um médico, após um longo curso de seis
anos, estudando as mais variadas matérias direcionadas em sua grande maioria
para o conhecimento do corpo humano, quer em sua estrutura microscópica quer na
macroscópica, automaticamentese tornasse um professor. Afinal, conhecer
profundamente um determinado assunto científico não me parecia condição
suficiente para compreender a complexidade das interações no campo do ensino e
da aprendizagem e saber produzir conhecimento novo.
A minha experiência como aluna do curso médico da UFAL, cerca de
trinta anos, foi marcada pelo autodidatismo. Quando entrei na Faculdade de
Medicina, vigorava no Brasil o regime militar. Fui surpreendida ao iniciar o curso
médico por uma reforma universitária, comandada pelo então Ministro da Educação
Jarbas Passarinho, que transformava o regime seriado em sistema de crédito,
reforçava a dissociação entre o curso básico e o profissionalizante, desde suas
localizações geográficas (prédios diferentes que distavam um do outro cerca de
20 Km), centralizava o nível decisório nos departamentos.
Sem nunca ter sido preparada para investir em educação continuada, a
partir da minha formatura em 1977, realizei um ano de prática em Clínica Médica no
Hospital de Base do Distrito Federal e posteriormente dois anos em
Gastroenterologia e Endoscopia no Hospital da Lagoa no Rio de Janeiro. Comecei a
freqüentar congressos e semirios anualmente no Brasil e eventualmente no
exterior.
As minhas experiências foram ampliadas em decorrência de ter morado
em Brasília e na Europa, o que gerou muitas oportunidades, entre elas, a de
relacionar-me com o ensino médico em nosso País e no exterior. Em Brasília, como
presidente da Sociedade de Gastroenterologia – DF (1995/1996), coordenei cursos
e ministrei aulas como professora convidada na UNB Universidade de Brasília.
Em Barcelona – Espanha, onde permaneci por seis meses (1997) no
Hospital Clinic i Provincial, como médica assistente desse hospital que é
universitário, tive a oportunidade de vivenciar um processo de ensino-aprendizagem
baseado na prática. Tínhamos, pois, na rotina semanal, práticas o dia inteiro e aulas
tricas duas vezes por semana. A teoria era baseada em casos clínicos.
Posteriormente ao meu retorno a Alagoas, no ano de 1998, submeti-me a
concurso público para professora substituta da UFAL. Iniciei a minha trajetória como
docente sem uma formação específica para o ensino, embora tenha tentado inserir-
me em um Mestrado de Educação da UFAL. Essa minha tentativa de fazer o
mestrado em educação coincidiu com o início da minha atividade na docência no
curso médico da UFAL. Nesse momento, comecei a perceber que ser uma
professora não implicava apenas dominar os conhecimentos específicos de minha
especialidade: a gastroenterologia. Era necessário bem mais: uma formação em
docência que permitisse ultrapassar a mera transmissão de conteúdos.
Eu aspirava a algo inovador. Desejava falar aos meus alunos uma nova
linguagem que os inspirasse a uma construção do conhecimento, não como a que
eu tivera e sim baseada na reflexão, na prática e na diversificação de cenários. Na
verdade, eu sentia a necessidade de formar profissionais adequados à realidade
atual do ponto de vista científico, social, ético e político.
Tornava-me professora na Faculdade de Medicina de Alagoas, fundada
em 03 de maio de 1950, com uma trajetória de mudanças muito peculiar na medida
em que poucos foram os momentos de superação ou ruptura com o modelo
centralizador e conservador que vai marcar a educação superior em Alagoas.
Em 1991, por ocasião da elaboração do projeto pedagógico global da
Universidade, a direção do Centro de Ciências da Saúde (CESAU), embasada nos
princípios do sistema vigente no país, nas recomendações da ABEM e nas
condições físico- espaciais existentes na época, definiu o perfil do médico que se
desejaria formar, propondo que este deveria conhecer a realidade sanitária, tendo
como referência o Sistema Único de Saúde (SUS), ter autonomia para atuar no
mercado de trabalho como médico geral e condições de complementar sua
especialidade através de cursos de pós-graduação.
Esse projeto foi considerado um avanço, porém não contou com a adesão
dos docentes. A partir de 1999, um grupo de professores e alunos reiniciou a
discussão. No final do ano 2000, alguns professores e alunos do curso médico da
UFAL fundaram o Núcleo de Ensino Médico (NEMED).
Durante o ano de 2001 esse núcleo estruturou-se e iniciou suas
atividades, elaborando um diagstico situacional do ensino médico, a que associou
as diretrizes pedagógicas do curso médico da UFAL. Em 2002, o Núcleo intensificou
a mobilização de professores e recursos materiais com o objetivo de realizar a
modificação do currículo atual.
As evidências verificadas em estudos de diagstico do ensino médico
realizados pelo NEMED indicam que o ensino médico em Alagoas segue o modelo
de há quase um século: o professor transmite conhecimentos a um aluno passivo,
portanto não pressupõe troca de conhecimentos e subestima a capacidade desse
aluno pelo simples fato de não conhecê-lo; utiliza o conceito de transmissão de
conhecimentos sem um processo de ensino-aprendizagem baseado na construção
do saber, priorizando o ato de decorar em relação ao de entender, não
transformando o aluno em agente ativo do processo.
Com esse diagstico e a realização do primeiro curso de
Especialização em Educação Médica, o qual envolveu, aproximadamente, 35
docentes, o Curso de Medicina da UFAL caminha para uma efetiva mudança desde
a sua origem (PROJETO DE REESTRUTURAÇÃO DO CURSO MÉDICO DA UFAL,
2002).
Os contextos institucionais e da pesquisadora como docente de Medicina
imbricam-se e conferem um contorno bastante significativo à presente pesquisa, pois
reconhece-se a importância de os docentes do Curso de Medicina acompanharem
os avanços e os compromissos assumidos nos campos da saúde e da educação,
atuando a favor de um ensino médico rigoroso cientificamente, eticamente e
relevante socialmente.
Nessa direção, algumas questões emergiram: o que pensam
professores médicos que atuam ou atuaram na UFAL, desde os anos 50 até a
década de 90, sobre os processos de ensinar e aprender em Medicina? Como
estes compreendem as suas trajetórias de formação?
Essas questões situam o presente estudo como uma investigação que
tem seu núcleo nos significados apreendidos a partir dos sujeitos participantes,
acreditando que é possível trilhar os percursos de compreender e contribuir para a
proposição de caminhos para uma Educação Médica mais democrática e
comprometida com as demandas sociais.
Na busca por responder aos questionamentos já referidos, o relato da
Pesquisa foi organizado da seguinte forma: a introdução explicita as origens da
pesquisa no contexto das características que marcam o Ensino Médico em Alagoas
e da trajetória da pesquisadora, bem como suas questões norteadoras.
Em Professor de medicina: um docente em construção,
empreende-se uma revisão da literatura, buscando articular professor do ensino
superior, professor de Medicina e tendências na formação docente.
Os objetivos são apresentados e a metodologia encontra-se descrita em
Procedimentos metodológicos.
Os resultados são discutidos em Por entre concepções e processos de
formação dos professores, traduzindo-se os diálogos entre os achados da
pesquisa e a literatura.
As considerões finais expressam os principais aspectos apreendidos
na pesquisa, procurando contribuir para o debate e a proposição de caminhos para o
ensino médico brasileiro.
Por fim, indicam-se as referências e os anexos.
2 OBJETIVOS
2.1 - Objetivo geral
Analisar as concepções do professor-médico, ingressantes
nas últimas cinco décadas na Universidade Federal de Alagoas,
sobre o ensino, a aprendizagem e os processos de formação
docente em Medicina.
2.2 - Objetivos específicos
Apreender as concepções docentes acerca do processo ensino-
aprendizagem, metodologia de ensino e atributos de um bom professor de Medicina.
Discutir como o professor-médico compreende sua trajetória na
docência (experiências de sucesso e dificuldades) e como percebe seu processo de
formação para exercer a docência.
3 REFERENCIAL TEÓRICO
3.1 - Professor de medicina: um docente em construção
3.1.1 - Professor do ensino superior: conhecendo interlocutores
Novos tempos, mudanças de paradigmas, inovações tecnológicas, novas
formas de conceber a formação docente para o início de um novo século. Nesse
panorama, compreender os enfoques que vêm sendo construídos para e sobre o
professor do ensino superior, particularmente no cenário nacional, implica
movimentos de resgate do que foi produzido, buscando apreender as ênfases
privilegiadas pelos pesquisadores.
Ao focalizarem-se os estudos publicados na década de 1990, identifica-se
que nesse período emergem debates nucleares sobre o professor universitário no
Brasil. Como todo processo de produção científica resulta de acúmulo de achados,
revisão crítica do que já foi divulgado e problematização da realidade, importante
registrar que, nos anos 80, três obras vão se constituir em referências para o campo
da docência universitária: O Professor Universitário em Sala de Aula, de Maria Célia
Abreu e Marcos Masetto; O Bom Professor e sua Prática, de Maria Isabel Cunha e a
Tese de Doutorado sobre a Sala de Aula Universitária na Visão dos Alunos, de
Josefa Grigoli.
Abreu e Masetto (1982) trazem uma sistematização do trabalho do
professor no ensino superior, focalizando as dimensões do planejamento, do manejo
de classe, da escolha das técnicas de ensino, do processo de avaliação. São
apontamentos importantes, pois realçam a dimensão da docência universitária como
prática intencional, já procurando superar a improvisação no cotidiano acadêmico.
Cunha (1988), fazendo uma pesquisa com professores do ensino médio,
provoca singular impacto com seus resultados sobre o chamado bom professor: as
vozes dos alunos revelam aspectos fundamentais e realçam a necessidade de que o
professor tenha uma formação que extrapole os aspectos técnicos da profissão
docente.
Nesse panorama, com relativa sensibilização para o professor do ensino
superior, a década de 1990 vai marcar, no âmbito da produção brasileira, anos de
efetivo compromisso com a produção de conhecimento sobre o professor
universitário, suas inserções institucionais, seus projetos, histórias e relações com os
alunos, seus pares e com as ciências.
Grigoli (1990) vai trazer para o interior da universidade a questão
professor a partir da visão dos alunos. A autora destaca os atributos de um professor
universitário que, na ótica dos universitários, seja comprometido com a
aprendizagem dos estudantes: domínio do conteúdo da disciplina em que atua e dos
aspectos ditico-pedagógicos; relacionamento interpessoal e afetivo com o aluno;
compromisso profissional com a docência, investimento no processo de
independência e autonomia intelectual e assunção de uma postura ético-política
frente às ações acadêmicas.
Essas pesquisas fomentaram importantes discussões sobre a docência
universitária que forma, sendo ampliadas e reconstruídas. Nesse sentido, Wanderley
(1992) contribuiu para o debate argumentado que ao entender o professor como
mediador entre saberes, lhe cabe despertar o aluno para o mundo, em uma
perspectiva criativa, prospectiva e de produção e difusão de saberes. Esse
movimento pode encontrar o estudante ainda valorizando o que já está pronto,
resistindo à reflexão, porém é necessário, afirma o autor, resgatar a necessidade do
estudo, do esforço pessoal, do trabalho e da cooperação entre sujeitos que
aprendem.
A articulação do conhecimento científico (indispensável para a prática
docente) e o compromisso e preparo para educar representa, na ótica de Cappelletti
(1992), um desafio, pois efetivar essa articulação implica explicitar valores,
pressupostos, princípios da educação, assumindo uma docência comprometida com
uma ação formativa que objetiva favorecer à construção da consciência crítica dos
alunos.
A autora afirma, tamm, ser necessário que o professor escolha as
situações de aprendizagem, as tarefas educativas a serem utilizadas como
mediadoras da reflexão na relação professor-aluno: um professor que no seu agir
autêntico demonstre sua própria cidadania, quando cumpre seus deveres,
reivindicando seus direitos, quando interpreta a realidade para organizar-se e atuar
com discernimento ideológico.” (CAPPELLETTI, 1992, p. 13).
Todo esse movimento esperado dos professores universitários encontra
desafios. Um primeiro foi analisado por Mizukami (1992) ao afirmar que parte
significativa dos profissionais que atuam na docência universitária é constituída por
bacharéis, centrados na pesquisa e que secundarizam o ensino. Refletir sobre o
ensino ou realizar alguma investigação a respeito da educação é uma prática quase
inexistente entre esses profissionais. E a autora faz a seguinte indagação: Não seria
de se esperar que, pelo simples fato de ensinar, ao menos tivessem eles
contemplado, em sua formação, a dimensão pedagógica de sua atuação?
(MIZUKAMI, 1992, p. 41 ). E prossegue constatando que:
Um dos grandes desafios, portanto, reside na criação de condições
que garantam ao futuro profissional, quando em fase de formação, a
instalação do processo de investigação e reflexão sobre a prática
docente, que se desenvolverá durante toda a sua atuação. Para que
isso ocorra é necessário que o profissional que atua no nível do
ensino superior, por sua vez, investigue, reflita e redimensione,
sempre que necessário, sua própria ação educativa. (
MIZUKAMI
,
1992, p. 41).
A ênfase nas lacunas de formação do professor universitário é tamm
assumida por Godoy (1992) que, a partir de suas experiências em cursos e
treinamento direcionados ao professor universitário, reconhece limitações, seja em
decorrência das condições institucionais, muitas vezes desestimulantes para uma
docência crítica e reflexiva, seja como um desdobramento de aspectos relativos a
uma desvalorização dos aspectos ditico-pedagógicos presentes na relação de
aprendizagem e ensino.
A autora, considerando os resultados de suas pesquisas, ressalta o
quanto o aluno universitário valoriza professores que mantêm uma postura de
diálogo com os alunos, inclusive com abertura para conversas informais e de caráter
pessoal. (GODOY,
1992, p. 86).
Esse olhar que aborda e privilegia as questões presentes no campo das
relações interpessoais tamm foi realçado por Abramowicz (1992). A autora
destaca que pensar nas condições existenciais do aluno parece, em alguns espaços
acadêmicos, enfatizar uma subjetividade quase situa como pouco científica. Afirma:
esquece-se que há uma dialética entre o afetivo e o cognitivo e que
emoção e pensamento se entrelaçam. Ressalta-se aqui que o aluno
é um todo indivisível onde as atitudes afetivas positivas são
essenciais na aquisição do conhecimento. O processo de
conhecimento é um momento de apreensão amorosa, afetiva.
(ABRAMOWICZ, 1992, p. 92/93).
A consideração das dimensões ao afeto, e às relações entre professor-
aluno, aluno-aluno, o foco nas histórias de cada um, emerge, nas afirmações da
autora, como eixo central na construção de uma formação profissional que seja
rigorosa do ponto de vista científico, ético, político e relacional.
Parece que os traços do professor universitário como formador que, muito
além da transmissão de conhecimentos, compromete-se com a aprendizagem dos
alunos, ganham força nas pesquisas. Os estudos de Rodrigues e Esteves (1993)
corroboram essa tendência quando destacam que se espera do professor uma
postura científica que alie uma preocupação com os valores, as crenças, os saberes
experienciais, as atitudes de cidadania, que se projeta para os alunos.
Os autores enfatizam tamm:
Que se caminha hoje no sentido de definir a profissão do professor à
altura dos desafios econômicos, sociais e educativos do mundo
moderno. Fazê-la sair dos quadros das atividades intuitivas e
artesanais em que tradicionalmente tem estado inserida, e dotá-la de
um quadro trico de conjunto em que se fundamenta
cientificamente a intervenção profissional é uma ambição, mas é
tamm um imperativo social. A implementação de uma
verdadeira formação profissional é uma medida fundamental
no sentido do reconhecimento da profissão do professor.
(RODRIGUES & ESTEVES, 1993, p. 42).
Pimentel (1993), com sua emblemática pesquisa O Professor em
Construção, traz para o universo da investigação sobre o professor universitário
brasileiro achados fundamentais. A autora sinaliza que as relações estabelecidas
pelos docentes com o conhecimento são múltiplas e heterogêneas, evidenciando
maneiras diferentes de lidar com as ciências. Os dados e as análises empreendidas
possibilitaram à autora organizar três grandes agrupamentos: os docentes que
atuavam na certeza do paradigma dominante (a verdade científica figurava como a
meta maior dos trabalhos de pesquisa), os professores que ensinavam a partir da
coexistência de paradigmas (oscilavam entre o conforto das verdades científicas
acabadas e a tensão do conhecimento como um permanente vir a ser) e os
docentes que investiam na certeza do paradigma emergente (a assunção da
provisoriedade das descobertas da ciência).
Acompanhar os debates travados na primeira metade da década de 90
permite delinear algumas recorrências: a falta de formação intencional no campo da
docência, a valorização da pesquisa em detrimento do ensino, as demandas por um
professor que se comprometa com a formação do aluno e não com a informação,
além da necessidade de se ter do trabalho docente no ensino superior uma
perspectiva de totalidade, não fragmentando cognitivo-afetivo.
Esses pontos vão ganhar bastante ênfase nos estudos publicados a partir
de 1995, tendo em Nóvoa (1995), um interlocutor privilegiado. A influência desse
autor não se deu apenas no âmbito da docência universitária, mas nesta tem marcas
significativas, principalmente no que se refere à formação docente. O autor introduz,
de maneira bastante enfática, a dimensão da pessoa do professor como algo
nuclear juntamente com as condições institucionais e com as questões relativas ao
conhecimento científico.
Vasconcelos (1997), corrobora as afirmações de Nóvoa, acrescentando
que destaque dado à formação do professor de ensino superior pretende
redimensionar a figura desse profissional através de uma visão mais ampla e mais
completa:
Formação técnico-científica (no sentido de domínio técnico do
conteúdo a ser ministrado; formação prática (o conhecimento da
prática profissional para a qual seus alunos estão sendo
formados); formação potica (no sentido de encarar a educação
como um ato potico, intencional, para o qual se exige ética e
competência);
formação pedagógica (voltada e construída no
seu fazer pedagógico cotidiano, em sala de aula, de modo não
ocasional e sim metodologicamente desenhado).
(VASCONCELOS, 1997, p. 92).
Na visão de Fernandes e Oliveira,
o professor togado, decifrante, catalogante cede lugar ao mestre ,
cuja função é a de definir não um saber definitivo, completo e
acabado, mas um desejo de saber. O desejo só se transforma em
ato, se e quando o aluno se transformar no sujeito do ato de saber
(FERNANDES & OLIVEIRA, 1998, p. 458).
Nessa direção, o final dos anos 90 é marcado por uma ênfase importante
na questão da formação do professor universitário. Estabelece-se a necessidade de
explicitar como se compreende o processo de formação:
traz em si uma intencionalidade que opera tanto nas dimensões
subjetivas (caráter, mentalidade) como nas dimensões
intersubjetivas, aí incluídos os desdobramentos quanto ao trajeto de
constituição no mundo de trabalho (conhecimento profissional).
Portanto, não se trata de algo relativo a apenas uma etapa ou fase
do desenvolvimento humano, mas sim como algo que percorre,
atravessa e constitui a história dos homens como seres sociais,
políticos e culturais. (BATISTA, 2001, p. 134).
Na linha que é expressa pela autora, identifica-se que a ênfase
na formação de professores abrange tanto as dimensões pessoais (as
histórias de vida profissional dos docentes) quanto os aspectos
institucionais (a rede de suporte – interlocutores, cenários de troca,
momentos de formação - que os professores têm em seus cotidianos
pedagógicos).
A subjetividade e a intersubjetividade são consideradas no contexto de
um processo em que se explicita que formar um professor implica saberes de
diferentes matizes: escolares, sociais, culturais, experienciais. Assim, parece que
não há como pensar a formação de professores universitários fora de uma reflexão
sobre as próprias trajetórias docentes, bem como o estudo sistemático das teorias já
produzidas e da apropriação crítica destas.
A formação docente inclui a dimensão político-pedagógica, a qual
possibilita olhar e interpretar o
lócus
coletivo (contexto institucional) e o individual
(atributos/qualificações no âmbito do conhecimento científico, cidadania, ética,
inclusão, responsabilidade, transformação social) afirma Sonzogno (2004).
Imbernón (2004) enfatiza que se abandona o conceito de que a formação
reduz-se a uma atualização científica, ditica e psicopedagógica do professor.
Compreende-se que formar e se formar implica descobrir, problematizar, organizar,
fundamentar, discutir, estudar, apropriar as teorias e reconstruí-la.
Na medida em que para o professor projetam-se horizontes ampliados de
aprendizagem e ensino, o autor destaca que se exige uma nova formação:
A formação assume um papel que transcende o ensino que
pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática
e se transforma na possibilidade de criar espos de
participação, reflexão e formação para que as pessoas
aprendam e se adaptem para poder conviver com a mudança e a
incerteza. (IMBERNÓN, 2004, p. 15).
Aposta-se em propostas formativas que ofereçam aos docentes espaços
para troca de dúvidas, experiências saberes e buscas partilhadas por novos
conteúdos. Inscreve-se a necessidade de se pensar como os professores, como
sujeitos adultos, aprendem a ser professores (PLACCO & SILVA, 2005). Nessa
perspectiva, a formação constrói-se como cenário em que se privilegiam as
situações complexas, que possam ser (re)significadas em meio às lutas e
contradições do momento contemporâneo.
Esboça-se que a possibilidade de superar modelos cristalizados de ser
professor do ensino superior passa pela instauração de espaços formativos que
rompam com a tradição da transmissão de informações. Cunha (2002), ao desvelar
as raízes históricas de uma sala de aula definida pelas relações verticais e por um
professor como repassador de informação, sinaliza que os docentes não têm feito
uma reflexão sobre suas práticas, favorecendo com que repitam “rituais
pedagógicosvividos.
Perdigão (2002), corroborando a leitura da autora referida, diz que é
possível afirmar que os professores atuais foram submetidos ao modelo
centralizador de aprendizagem, secundarizando os processo relacionais, críticos,
reflexivos e priorizando a retenção dos conteúdos escolares e/ou acadêmicos. O ato
de estudar, nessa perspectiva, tem foco na memorização, perdendo a dimensão da
autoria, da produção de um conhecimento novo.
Impõe-se recolocar a própria concepção de aprendizagem. Segundo
Batista,
aprender é, tamm, poder mudar, agregar, consolidar, romper,
manter conceitos e comportamentos, que vão sendo (re) construídos
nas interações sociais. É nesses movimentos de transformação que
as pessoas vão elaborando suas possibilidades de intervir no mundo,
questionando o estabelecido, concordando ou não com as opções
coletivas e contribuindo com alternativas de superação. (BATISTA,
2004, p. 61).
A autora destaca, tamm, que – múltiplas e diferentes são as
concepções de aprendizagem e ensino, currículo, planejamento, docência,
revelando os pressupostos que são valorizados. E essas concepções embasam o
trabalho do professor. Para Vasconcelos (2003), o professor do ensino superior tem,
dentre suas atividades como profissional acadêmico,
o de organizador do espaço da sala de aula; o de conhecedor dos
objetivos e dos conteúdos da disciplina com a qual trabalha; o de
responsável pelas técnicas mais adequadas para o correto
desenvolvimento dos trabalhos diticos; o de planejador das
atividades discentes em sala de aula; o de avaliador continuado de
todo esse processo. (VASCONCELOS, 2003, p. 69).
Na ótica do autor, corroborando os achados de Grigoli (1990) e Pimentel
(1993), os estudantes têm uma expectativa de que o professor desempenhe sua
docência com ética, atitudes comprometidas com o diálogo, competência técnica,
respeito aos alunos, estimulando-os à crítica das informações científicas e estando
atento às necessidades e demandas dos alunos.
A assunção da aprendizagem como um cleo central da prática docente
no ensino superior, superando a tradição de conceber o professor como o sujeito do
ensino e situando-o como sujeito de aprendizagem, emerge como um aspecto
fundamental na perspectiva de Masetto
A ênfase na aprendizagem como paradigma para o ensino superior
alterará o papel dos participantes do processo: ao aprendiz cabe o
papel central de sujeito que exerce as ações necessárias para que
aconteça sua aprendizagem - buscar as informações, trabal-las,
produzir um conhecimento, adquirir habilidades, mudar atitudes e
adquirir valores. Sem vida, essas ações serão realizadas com os
outros participantes do processo: os professores e os colegas, pois a
aprendizagem não se faz isoladamente, mas em parceria, em
contato com os outros e com o mundo. O professor terá substituído
seu papel exclusivo de transmissor de informações para o de
mediador pedagógico ou de orientador do processo de aprendizagem
de seu aluno. (MASETTO, 2003, p. 83).
Esse entendimento não deve, todavia, representar que se tenha o ensino
como uma mera atividade de transmissão de informação. Necessário se faz resgatá-
lo como atividade intencional, mobilizadora de saberes e que se coloque como uma
prática construída nas interações com os alunos, pares e com o conhecimento.
Nessa perspectiva, ensinar não abrange a repetição desvinculada do contexto e
nem uma cristalização dos produtos científicos, antes pode significar a construção
de olhares críticos forjados a partir de apropriações dos conhecimentos já
produzidos, instaurando espaços de incorporação, criação e socialização de novos
conteúdos, formas de trabalho e relações sociais. (SANTOS, 2002 & BATISTA,
2004).
Articular o ensino e a aprendizagem parece ser um desafio
contemporâneo, entendendo-os como processos dialeticamente imbricados, nos
quais o professor é redefinido, de acordo com Demo,
Em vez de algm treinado para ensinar passa a considerar-se o
eterno aprendiz, porquanto somente um professor que sabe aprender
consegue fazer seu aluno aprender. Para que o aluno pesquise e
elabore, torne-se autônomo e criativo, precisa de professor que
tenha, de maneira eminente, tais qualidades. (DEMO, 2005, p. 24).
Assim, importantes são as posições de Hurst (2004) que colocam o
professor como um sujeito que se compromete com o aluno, buscando mediar não
somente o acesso aos conteúdos e informações, mas apreender como utilizam as
ferramentas elaboradas na universidade, o que tem significado para o exercício de
sua condição de cidadão, como pensa e age em situações complexas da vida
profissional. Ao propor problemas, criar situações de aprendizagem centrada na
realidade e na vinculação com os conhecimentos científicos, o professor do ensino
superior pode configurar espaços e cenários que sejam significativos e
potencialmente transformadores.
Um aspecto que merece uma incursão refere-se aos processos de
inserção dos professores no ensino superior brasileiro:
Até a década de 70, embora já estivesse em funcionamento
imeras universidades brasileiras e a pesquisa já fosse um
investimento em ação, praticamente exigia-se do candidato a
professor do ensino superior o bacharelado e o exercício competente
de sua profissão. Essa situação se fundamenta em uma crença
inquestionável, até bem pouco tempo, vivida tanto pela instituição
que convidava a ser professor quanto pela pessoa convidada ao
aceitar o convite: quem sabe, automaticamente, sabe ensinar.
Mesmo porque ensinar significava ministrar grandes aulas
expositivas ou palestras sobre um determinado assunto dominado
pelo conferencista, mostrar na prática como se fazia, e isso um
profissional saberia fazer. (MASETTO, 2005, p. 11).
O que se verifica é a restrita noção que o professor apresenta sobre o
processo de ensino e aprendizagem pelo qual é co-responsável desde o primeiro dia
de aula e permanece distante do assunto mesmo após anos de exercício da
docência. (PIMENTA & ANASTASIOU, 2002).
As autoras referidas descrevem com singular clareza um traço que tem
marcado a docência universitária: a secundarização do estatuto de profissão acaba
carreando uma visão baseada na improvisação e na desqualificação da formação
ditico-pedagógica para atuar no ensino superior.
No momento contemporâneo, em meio a lutas sociais,
redimensionamento dos sistemas de referência científicos, na ampliação de acesso
ao ensino superior, o debate sobre o professor do ensino superior emerge como
aspecto nuclear.
E nos anos 2000, as ênfases temáticas sobre o docente universitário
abrangem, na perspectiva de Zabalza (2004), três dimensões: a dimensão
profissional (espaço de explicitação da identidade docente, das demandas de
formação e dos dilemas postos e vividos no cotidiano pedagógico); a dimensão
pessoal (expressão das singularidades e aprendizagem com as diferentes histórias
de vida pessoal e docente) e a dimensão administrativa (lócus de trabalho e seus
contornos e entornos institucionais).
Essas dimensões configuram uma rede complexa de relações, com uma
interpenetrando na outra, evidenciando que não como fragmentar a pessoa de
suas condições concretas de vida e de suas opções e situações profissionais.
3.2 - Professor de Medicina: aproximões
3.2.1 - A educação médica brasileira: alguns aspectos históricos
A compreensão da discussão mais ampla do professor universitário
favorece contextualizar o professor de medicina em suas singularidades, sem perder
as relações com as determinações histórica e político-educacionais. Nesse sentido,
procurando esboçar as circunstâncias que foram e são vividas por docentes
médicos, instigante é resgatar o processo de implantação e consolidação do ensino
médico no país.
Batista e Silva (2001) relatam que o marco inicial do ensino médico é de
1808, logo após a chegada da Família Real Portuguesa e do Príncipe Regente, com
a criação do primeiro curso médico-cirúrgico na Bahia. Segue-se, alguns meses
depois,a Escola de Anatomia e Cirurgia no Rio de Janeiro. Em 1813, essas duas
primeiras instituições tornam-se Academias Médico-cirúrgicas e, em 1832, são
transformadas em Faculdades de Medicina, adotando as regras e programas da
Escola Médica de Paris.
Continuam Batista e Silva:
A terceira faculdade foi implantada em 1899, 91 anos depois, em
Porto Alegre. Entramos no século XX com apenas três escolas
médicas. Nessa mesma época, o Canadá possuía sete escolas, o
México nove e os Estados Unidos cinqüenta e sete. Até 1922,
época da fundação da primeira universalidade brasileira, as escolas
médicas praticamente não se articulavam, funcionando
isoladamente. (BATISTA & SILVA, 2001, p. 22/23).
Os autores lembram a transformação surgida no Brasil após a revolução
de 1930. Neste período tinham-se 12 escolas públicas de medicina. No período de
30 anos, até 1960, foram criadas mais 19 escolas e entre 1960 e 1970 houve um
crescimento desordenado das escolas de medicina com uma concentração no Sul e
Sudeste e uma inversão na relação pública/privada.
Em 1980 existiam 75 escolas e em 1990, 80 escolas médicas. Situação
inusitada ocorre na década de 90: apesar da recomendação para não se abrirem
escolas médicas, as mesmas têm o número duplicado e são instaladas em cidades
de pequeno e médio portes. Esse quadro encontra-se em andamento, com fortes
embates entre os que pleiteam a abertura de novos cursos médicos e os órgãos de
classe e associações que sinalizam os riscos de implantações sem demanda social
relevante e efetivamente real.
O modelo pedagógico do ensino médico brasileiro tem suas origens no
academicismo francês e no enfoque alemão de pesquisa, segundo afirmam Batista e
Silva (2001). Os autores referem que, ao longo do tempo, ocorreram sucessivas
reformas apontando para o progressivo distanciamento da influência francesa,
substituída pela hegemonia da escola americana.
Até 1922, época da fundação da primeira universidade brasileira, as
escolas médicas praticamente não se articulavam, funcionando isoladamente.
As escolas de medicina, durante os primeiros decênios do século XX, têm
a convião de haver chegado ao modelo definitivo de formação do médico apesar
de certas diferenças entre as escolas nacionais. Na Alemanha, a ênfase maior era
nas escolas sicas, enquanto na França e na Inglaterra a preocupação principal
era os aspectos clínicos e familiares (PROJETO CINAEM III FASE, 2000).
O modelo hospitalocêntrico das escolas médicas formando profissionais
distanciados da realidade social, da comunidade em que se situam, imbuídos de
excesso de teoria nos primeiros anos do curso, onde vivenciam o modelo
dicotômico, de curso básico e profissional, caracteriza um modelo de formação no
contexto brasileiro, com forte influência do chamado modelo flexneriano.
Kemp e Edler (2004), no artigo A Reforma Médica no Brasil e nos Estados
Unidos: uma comparação entre duas retóricas, discutem a gênese do modelo de
educação médica proposto por Abraham Flexner nos Estados Unidos, comparando-
o com a aplicação do modelo universitário germânico à educação médica brasileira,
na década de 1930, por Antonio da Silva Mello.
Ressaltam os autores que a passagem da medicina para a biomedicina
moderna foi feita pelas reformas de Flexner e que o mesmo foi um líder de um
movimento de reforma do ensino médico. Dizem que no Brasil a situação não era
menos complexa do que a que Flexner enfrentava nos Estados Unidos, pois o
ensino médico brasileiro mudava, no começo do século XX, para um padrão mais
próximo daquele da universidade e do laboratório.
No Brasil, Antonio da Silva Mello, médico e professor, foi um reformador
com iias similares as de Flexner. Junto a outras lideranças médicas que o
antecederam, era crítico da liberalidade e ausência de regulamentação da educação
médica norte-americana. Silva Mello representa uma corrente da medicina brasileira
preocupada em atualizar e adequar as iias contemporâneas sobre a formação
médica.
Os autores argumentam que o núcleo das reformas médicas não depende
somente da mudança das concepções dos médicos sobre o que seria a boa
medicina, mas sim de uma transformação no sistema educacional consolidado;
portanto, na sua estrutura de poder e nas expectativas de carreira consagradas pela
tradição.
A priori, quando não há um conhecimento profundo a respeito dos
caminhos pelos quais a Educação Médica tem evoluído no Brasil, pode-se até julgar
que este foi um movimento brusco e recente. Na verdade, as transformações não se
operam assim tão fácil e rapidamente. Elas seguem um processo que acompanha a
história mundial e conforma uma história própria, nacional, brasileira.
Os itinerários percorridos pela educação médica brasileira evidenciam que
os processos de mudança traduzem importantes e vigorosas forças e embates nos
campos da assistência à saúde e das políticas públicas de educação e pesquisa,
tanto em cenário nacional como nos movimentos internacionais. Nessa direção, uma
fase importante da Escola Médica no Brasil começa na década de 50, coincidindo
com a fundação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino
superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPQ). Novas demandas
são criadas, e novos papéis para a universidade e para as escolas médicas se
colocam.
Na mesma década, em 1952, na Conferência em Colorado Springs, são
apresentadas as propostas de Medicina Integral. Em 1960, essa influência acentua a
dicotomia entre a Medicina preventiva e a curativa. No início da década de 70, surge
nova proposta derivada dos Estados Unidos desde 1960, que foi a chamada
Medicina Comunitária.
No final de 1970, há uma tentativa de reorganizar o ensino médico
brasileiro. Dos Estados Unidos e do Canadá origina-se a iia do médico generalista
ou de família. Influenciada pela Conferência Internacional de Alma-Ata, ainda nos
anos 80 priorizou-se a Atenção Primária à Saúde, impulsionando a implantação dos
Programas de Integração Docente-Assistencial (IDA). Nessa proposta, o hospital
universitário seria integrado ao sistema de saúde, segundo os critérios de
regionalização e hierarquização. (BATISTA & SILVA, 2001).
Um fato importante refere-se ao projeto EMA (Educação Médica nas
Américas), em 1986, coordenado pela Federação Pan-Americana de Associações
de Faculdades, e que teve como objetivo refletir o futuro da Educação Médica frente
as mudanças sociais e tecnológicas, definindo o possível médico para o século XXI.
Nessa direção, a Declaração de Edimburgo apontou para os anos 90 um novo
desafio: uma Educação Médica comprometida com a ação, liderança e decisão
política. (BATISTA & SILVA, 2001).
No Brasil, o trabalho da CINAEM inscreve-se como um marco na história
da educação médica brasileira por configurar, dentre outros aspectos, uma ação
coletiva, organizada e intencional de avaliar e propor novos caminhos para o ensino
de Medicina no país. Dividindo suas atividades em três fases, construiu um
diagstico que apontava, já em 1997, uma formação médica centrada na dimensão
técnica, secundarizando as dimensões ética e humanística, com claros sinais de
especialização precoce e com egressos não preparados para o trabalho com a
comunidade e o atendimento às demandas sociais. (Fernandes e Oliveira, 1998)
Nos anos 90, viveu-se, tamm, uma intensa ação da fundação W.K.
Kellogg na América Latina, incluindo o Brasil. Desde 1992, a referida fundação
efetivou convite a 23 universidades, 103 cursos de graduação, 23 secretarias
municipais e/ou órgãos regionais de saúde, 197 unidades de prestação de serviços
de saúde nos três níveis de atenção e 644 organizações comunitárias distribuídas
em 11 países da América Latina para participarem de um Programa conhecido pela
sigla UNI: Uma Nova Iniciativa na Educação dos Profissionais de Saúde-União com
a Comunidade. (TANCREDI, 1999).
O objetivo do ideal UNI era construir modelos viáveis de educação em
saúde e de sistemas de saúde embasados na parceria universidade/sistemas locais
de saúde/comunidade. Para Tancredi (1999), um dos desafios do Projeto UNI foi
diferenciar-se de movimentos que o precederam como o modelo IDA: Integração
Docência Assistencial, cuja relação era bilateral entre a universidade e a
comunidade, programas de extensão universitária, ou entre serviços de saúde e
comunidade- programas de atenção primária.
De acordo Venturelli (1999), os projetos UNI contribuíram para mudanças
na formação e educação continuada dos profissionais de saúde, destacando a
aprendizagem realizada em novos cenários, a comunidade como sujeito
inserida no trabalho de saúde, a necessidade de trabalhar com a comunidade e
necessidade de novas estratégias educacionais.
No Brasil, seis faculdades brasileiras integraram o programa UNI em
nosso meio: Faculdade de Medicina de Botucatu, Faculdade de Medicina de Marília,
Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília, Faculdade de Medicina da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Faculdade de Medicina da
Universidade Federal da Bahia, Universidade Estadual de Londrina.
Com diferentes processos de apropriação e histórias institucionais, os
cursos mencionados vivenciam mudanças significativas e trazem para a experiência
nacional importantes indicadores e aprendizagens no sentido de como transformar a
educação médica. Especificamente, as experiências da Faculdade de Medicina de
Marília e o Curso de Medicina da Universidade Estadual de Londrina são expressões
concretas de uma completa mudança curricular (ambas optaram pela Aprendizagem
Baseada em Problemas como estrutura de currículo médico) e se tornaram
referências para outras escolas que empreenderam processos de mudanças.
(ALMEIDA, 1999 & FEURWERKER, 2002)
Uma construção importante no contexto das mudanças foi a constituição
da REDE UNIDA, a qual, ao congregar as profissões da saúde e seus processos de
formação, tem trazido para a educação médica pontos de debate e aprofundamento
que acabam fomentando novos estudos e iniciativas.
Todo esse processo vivido, construído e reconstruído em meio a lutas da
reforma sanitária, criação do Sistema Único de Saúde e avanços na democratização
da assistência à saúde, teve, na discussão e implementação das Diretrizes
Curriculares Nacionais para os Cursos de Graduação, um momento decisivo quanto
às possibilidades de alteração do processo formativo.
As Diretrizes para o Curso de Medicina são homologadas em 2001.
Envolvendo diferentes sujeitos, diversas instâncias políticas, múltiplos interlocutores
e segmentos, trouxeram um debate qualificado sobre as ênfases a serem
privilegiadas e, pelo seu traço mais articulador, a indispensável relação e diálogo
com os demais Cursos da Saúde. (BRASIL, 2001).
Nesse panorama, implanta-se, em 2002, o Programa de Incentivo às
Mudanças nas Escolas Médicas (PROMED), configurando-se como uma experiência
importante no contexto do ensino médico brasileiro, ao envolver 19 cursos em seus
processos de inovação curricular, com fóruns permanentes de discussão e
socialização das vivências acadêmicas. Como um processo em andamento, o
PROMED tem sido um eixo articulador de esforços e lutas por um ensino médico
que atenda às demandas sociais.
Em 2005, no bojo de uma política de formação em saúde que responda
às necessidades da população e esteja sintonizada com os princípios e práticas do
Sistema Único de Saúde (SUS), implanta-se o Curso de Especialização em Ativação
de Processos de Mudança, procurando contribuir na consolidação de processos
inovadores em andamento, bem como fomentar iniciativas no campo da formação
superior em saúde.
3.2.2 - Conhecendo interlocutores no campo da formação de
professores de Medicina
No contexto de transformações na formação médica, buscando coaduná-
la com as demandas da sociedade e com as políticas públicas de saúde,
particularmente na consolidação do Sistema Público de Saúde (SUS), o professor de
medicina tem sido desafiado a assumir novos papéis e lugares como um sujeito
fundamental no reordenamento do ensino médico.
Batista e Silva (2001) afirmam que teorizar e praticar a ação educativa
em uma perspectiva integradora, superando a despolitização característica do
ensino médico ao longo de sua história, é um dos desafios que se colocam para os
professores que acreditam em um projeto de universidade comprometido com o
processo de transformação democrática.
As mudanças na produção dos conhecimentos e a diversificação dos
meios de acesso à informação são indicados por Brenelli (2004) como motivos que
favorecem o desenvolvimento de parceria professor-aluno, na qual experiências e
saberes prévios sejam mobilizados por situações que demandem movimento de
busca, problematização, identificação dos s trico-metodológicos e compromisso
com as necessidades da comunidade.
Essa parceria pressupõe um professor que, sem desvalorizar sua
especialidade e campo de prática e pesquisa, assuma a docência como profissão e
integre-se em projetos de ensino que têm, na formação crítica, consistente,
problematizadora e produtora de saber, seus pilares fundamentais.
Chacón e Vergara (2002), em trabalho realizado na Universidade de
Cartagena, Colômbia, ressaltam que as instituições de educação superior devem
formar os estudantes para que se convertam em cidadãos bem informados e
profundamente motivados, com sentido crítico e capazes de analisar os problemas,
buscar soluções, aplicá-las e assumir responsabilidades sociais.
Os referidos autores assinalam que ensinar não é apenas proporcionar
informação e sim, ajudar a aprender e por isso os docentes devem ter um bom
conhecimento de seus estudantes: quais são seus conhecimentos prévios, o que
são capazes de aprender em um determinado momento, seu estilo de
aprendizagem, os motivos intrínsecos e extrínsecos que os animam ou desanimam,
seus hábitos de trabalho, as atitudes e valores que manifestam frente ao estudo
concreto de cada tema etc. A atividade na aula não pode ser uma situação
unidirecional, sim interativa, em que a relação com o estudante e dos estudantes
entre si integre a qualidade da docência.
Oliva e Cao (2002), em trabalho realizado na Escola Nacional de Saúde
Pública, em Cuba, o domínio pedagógico, sua relação com o modelo
comunicativo e o ensino contemporâneo, enfatizam a visão atual do processo
docente-educativo, do papel de protagonista do estudante em tal processo, as
principais qualidades e capacidades que um professor tem de possuir como
elemento essencial para planejar e desenvolver o processo de ensino-apendizagem.
Os autores questionam: o que é domínio pedagógico? É um dom natural, um
potencial vocacional? São qualidades da personalidade, espontâneas ou formadas?
Depende ou não da preparação pedagógica e psicológica e da experiência docente?
Assinalam os autores que não é suficiente para o professor possuir uma
alta preparação científico-técnica, que se traduza no domínio dos conteúdos do
ensino, mas, tamm, necessita conhecer e lidar com elementos fundamentais da
teoria da comunicação e desenvolver capacidades pedagógicas e psicológicas que
lhe permitam estimular, no trabalho educativo, o diálogo, a troca e o respeito na
relação com o aluno.
No contexto até aqui delineado, enfatiza-se a construção de uma nova
docência médica e nessa, os processos de formação de professores. Um docente
em formação para educar não é aquele que já aprendeu a pesquisar, nem o que já
reúne competência em sua área de atuação médica, pois o professor necessita
construir uma visão cultural ampliada, interagindo conceitos éticos, morais,
aprendizagem, com as dimensões relacional e política.
As tensões no que se refere à profissão professor tamm se
expressam na escola médica, agregando, ainda, o fato de que,
geralmente, primeiro se é médico e somente depois se configura o ser
professor de Medicina. Essa precedência acaba fortalecendo um certo
mito em torno da história natural da docência médica, sendo
fundamentais os projetos voltados para uma formação que seja
connua, sistemática e assumida como processo que exige desejo e
vontade, mas igualmente intencionalidade institucional de propiciar
espaços formativos.
Pesquisas sobre e na Docência em Medicina situam a importância do
professor nos processos de transformações político-acadêmicas vivenciados nas
escolas médicas brasileiras. Nesse sentido, o campo do desenvolvimento docente
tem se mostrado com um vigoroso movimento de produção, inspirando o estudo da
literatura como uma possibilidade de ampliar e intercruzar achados de pesquisas e
lições de experiências formativas.
Para Gordan (2004), o preparo educacional não pode limitar-se somente
a aprender pela experiência, pois, dada a complexidades do processo ensino-
aprendizagem, importante se faz sistematizar o estudo sobre os processos de
aprender e ensinar, refletindo sobre a própria prática docente, mas a ela não se
reduzindo.
Pololi e Frankel (2005), no trabalho Humanising medicall education
through faculty development: linking self-awareness and teaching skills, concluíram
que, ao reunir docentes de diferentes especialidades médicas no mesmo programa
de desenvolvimento, foi possível a vivência de uma experiência integradora, coletiva,
fortalecendo e favorecendo as relações interpessoais entre os professores médicos
Vaughn e Baker (2004), em um original artigo, Psychological size and
distance: emphasizing the interpersonal relationship as a pathway to optimal
teaching and learning conditions, corroboram com a importância das relações
interpessoais na formação de professores de Medicina com o estudo que realizaram
com preceptores e residentes de pediatria, obtendo resultados indicadores de que
as relações interpessoais positivas entre professores e alunos contribuem para uma
maior qualidade do aprendizado, existindo uma forte associação entre professores
que priorizam uma relação interpessoal e sua efetividade como docentes.
Gelula e Foley (1999) em pesquisa realizada na Universidade de Illinois
Chicago College of Medicine, criaram um programa para desenvolver o
aperfeiçoamento do ensino entre jovens professores médicos denominado Scholars
for Teaching Excellence, cuja conclusão deixou em evidência o fato de que a
formação pode fazer diferença no modo de ensinar, sendo necessário atentar para
situações formativas que favoreçam aos participantes identificarem suas próprias
necessidades e as necessidades do grupo; a reflexão da prática em contextos
interdisciplinares; o estudo sistemático sobre processos educativos e integração
entre os diferentes níveis de formação. Os autores afirmam, ainda, que a
preocupação com a formação do professor médico tem se refletido como uma
preocupação episódica, pontual e que demanda trabalhos mais sistemáticos e
continuados.
Eynard e Moreno (2004) enriquecem a discussão apresentando o Projeto
de Formação Docente em Ciências da Saúde na Faculdade de Ciências Médicas da
Universidade Nacional de Córdoba, na Argentina, que desenvolve um curso de s-
graduação chamado Plano Básico de Formação Docente. Instituído desde o ano de
1984, constitui uma estratégia que articula professores de educação em uma
interlocução constante com a área da saúde. Esse curso, com duração de três anos,
foi inicialmente dirigido apenas aos docentes médicos, passando a partir de 1992, a
englobar docentes de todos os cursos da faculdade. Os processos de avaliação do
Curso evidenciam sua importância e seu papel na construção de uma docência cuja
formação inscreve-se como um processo permanente.
As pesquisas de Ratnapalan e Hilliard (2002), abordando necessidades
de avaliação da aprendizagem na educação médica, e Aron et all. (2000),
investigando as relações entre os aspectos financeiros do grupo de médicos
dedicados à educação por referência e os que se dirigem para a clínica privada,
trazem novos ângulos para a formação do professor de Medicina, evitando que ela
se restrinja aos aspectos técnicos do ensinar, mas problematizando-a como um
processo conformado por perspectivas pessoais, institucionais, políticas e
econômicas.
Corroborando essa direção, Martinez (2004), em seu trabalho Reflexiones
acerca del término competências em la actividad docente, afirma que a formação do
docente, em todas as épocas, tem sido influenciada pelas transformações que
sofrem as funções das instituições docentes na dependência do contexto sócio-
histórico, dos modos culturais, do desenvolvimento tecnológico e na atualidade, do
fenômeno da globalização social e econômica.
Os estudos internacionais têm evidenciado significativas ênfases com as
investigações brasileiras, o que parece configurar um cenário de produção
acadêmica bastante favorável ao desenvolvimento de experiências de formação que
valorizem as experiências docentes, os saberes construídos na prática, os
conhecimentos já produzidos sobre o processo ensino-aprendizagem em Medicina,
possibilitando aos docentes entrarem em contato com as teorias pedagógicas que
sustentam os projetos político-acadêmicos de formação dos futuros médicos.
No contexto brasileiro, significativas, têm sido as propostas formativas que
assumem o desafio de pensar e fazer no campo da docência médica. Uma iniciativa
importante tem sido desenvolvida na Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP
(FCMUNICAMP), onde, partindo do pressuposto de que há lacunas na formação
docente do professor de Medicina, os mestrandos e doutorandos da Pediatria
experienciam, por um semestre letivo, a disciplina Pedagogia Médica e Ditica
Especial:
Não existe a pretensão de formar o professor de Medicina, mas de
favorecer a reflexão do pós-graduando sobre a docência e assim
prepará-lo para enfrentar os desafios das transformações que
marcam as escolas médicas brasileiras. (ZEFERINO & BARROS,
2004, p. 228)
Na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP),
Basile (2004) relata sua experiência com a disciplina Preparação Pedagógica, no
contexto do Programa de Fisiopatologia Experimental, dirigida à formação dos s-
graduandos, a fim de prepará-los para a docência, estimulando-os ao
desenvolvimento da consciência crítica em suas atividades de docência,
contextualizando-as histórica e culturalmente. Essa formação integra um ciclo de
diálogos, análises e estudos, desenvolvidos em doze encontros presenciais, em que
se busca contribuir com uma profissionalização docente coadunada com uma
postura cidadã e ética.
Batista e colaboradores (2004) descrevem criticamente a experiência de
quase 10 anos com a disciplina Formação Ditico-Pedagógica em Saúde, oferecida
para mestrandos e doutorandos da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Com uma carga horária de 60 horas, sendo 30 presenciais, a referida disciplina é
desenvolvida em 10 encontros, nos quais se procura articular situações de prática
docente, o processo de planejamento coletivo e os estudos tricos sobre os temas
que estão presentes na docência superior em saúde. Privilegia os saberes que os
s-graduandos já trazem sobre o ser professor, buscando conectá-los com os
conhecimentos já produzidos sobre currículo, planejamento, aprendizagem, ensino,
avaliação, inovação educacional, interdisciplinaridade na formação superior em
saúde, além de contribuir para a construção da consciência reflexiva sobre os limites
e perspectivas que se apresentam para todos os que atuam na universidade
brasileira, com ela se comprometendo.
A revisão de literatura empreendida para o desenvolvimento da presente
pesquisa permite reconhecer que há convergência entre os autores, mas existem
ênfases diferenciadas e desafios para envolver e manter a motivação dos
professores para processos formativos. Importante destacar, ainda, que é
necessário entender o desenvolvimento docente no contexto de um amplo projeto de
profissionalização da docência em Medicina.
Conhecer, analisar e discutir pesquisas sobre o professor de Medicina e
docência médica pode significar investir em movimentos de comparação, explicação,
interpretação e teorização, desvelando dilemas e perspectivas num momento em
que o ensino médico busca caminhos éticos, humanistas, competentes e
socialmente comprometidos. É nesse panorama que se inscreve a presente
pesquisa.
4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
4.1 - O cenário da pesquisa: O curso de medicina da Universidade Federal
de Alagoas
Fundada em 25 de janeiro de 1961, vários anos depois da Faculdade de
Medicina, esta, criada em 3 de maio de 1950, a Universidade Federal de Alagoas
nesses 43 anos de existência tem desempenhado importante papel para a
sociedade alagoana. Abriga cerca de 790 docentes distribuídos em Centros
(Ciências Agrárias, Ciências Biológicas, Ciências Exatas e Naturais, Ciências
Humanas, Letras e Artes, Ciências Jurídicas, Ciências Sociais Aplicadas, Ciências
da Saúde, Educação e Tecnologia) compostos de departamentos e cursos
congregando as atividades de ensino, pesquisa e extensão.
Esta universidade tem, segundo o censo de 2003, 11.729 alunos e um
total de docentes, entre permanentes e contratados, de 1001. Entre estes, 294
doutores, 289 mestres e 140 especialistas.
Neste contexto, o Curso de Medicina foi criado em 1950, a partir da iia
do Dr Abelardo Duarte, conceituado pediatra e professor de Cosmografia do Liceu,
homem devotado a pesquisa no Instituto Histórico, que ao regressar das férias
anuais em Recife, onde morava o seu sogro, conhecido político alagoano Euclides
Malta, procurou o Dr Ib Gatto Falcão, respeitado médico, professor, escritor,
executivo e atual presidente da Academia Alagoana de Letras.
Esses médicos se encontraram na Santa Casa de Misericórdia, onde
trabalhavam e iniciaram uma conversa na qual o Dr Abelardo Duarte relatou ao
colega, os contatos médicos que tivera na cidade do Recife. E que, médicos do
Recife estavam convencidos de que Alagoas tinha condições de ter um curso de
medicina. O Dr Abelardo estava realmente empenhado e querendo aproveitar a
oportunidade que naquele momento se apresentava. Convidou o Dr Ib para, junto a
ele, abraçar essa iniciativa.
Segundo o relato do médico Ib Gatto Falcão, diante do desafio refletiu e
respondeu: lance a iia, inicie os procedimentos e eu o acompanharei. A notícia
da iminente fundação de uma faculdade de medicina na Paraíba, apressou um novo
encontro entre dois amigos médicos, que resolveram convidar um novo colega,
Dr José Lages Filho, conhecido pelo bom senso e, que, de imediato encampou a
iniciativa.
Os três médicos, Abelardo, Ib e Lages Filho uniram disposição,
inteligência e ponderação e em conseqüência, 48 horas depois de um encontro a
1º de maio de 1950, nascia a Faculdade de Medicina de Alagoas. Ainda, segundo o
Dr Ib Gatto, o pequeno grupo decidiu se multiplicar convidando outros colegas. O
critério para a escolha destes constituía-se em que fossem competentes, que
tivessem conduta ilibada e elevados critérios médicos e sociais.
No dia três de maio, na Sociedade de Medicina, reuniram-se 14 médicos
que após ouvirem a exclamação do Dr Sebastião da Hora: uma iia desta natureza
não se discute, aplaude-se!, apoiaram unanimemente o projeto. Em eleição regular
atribuiu-se a presidência e a vice-presidência, assim como a diretoria e a vice-
diretoria, subseqüentemente, aos doutores Ib Gatto e Abelardo Duarte.
Para Dr Ib Gatto, o projeto de estruturação da então Faculdade de
Medicina, obedeceu em linhas gerais as normas da Faculdade de Medicina da
Bahia. Graças a perticia, o esforço e o interesse desse grupo de médicos por essa
causa comum, Alagoas passou a abrigar uma Faculdade de Medicina.
O Curso de Medicina, atualmente, funciona em regime seriado, dividido
em dois ciclos (sico e profissional), tendo uma oferta de 80 vagas anuais. Os
departamentos do ciclo profissional compõe-se: de Clínica Cirúrgica (CLC), de
Clínica Médica (CLM), de Toco-Ginecologia (TGP), de Medicina Social (MSO) e de
Propedêutica Médica. Conta com um corpo docente constituído por 103 professores,
destes, 27 com doutorado, 29 com mestrado e 51 especialistas, divididos em regime
de trabalho de 20 e 40 horas semanais e dedicação exclusiva.
No âmbito dos recursos de infra-estrutura, dispõe de um Hospital
Universitário adequado para o desenvolvimento de suas atividades permitindo a
atuação dos discentes em todas as especialidades médicas e serviços. Conta,
tamm, com laboratórios para a realização das disciplinas que compõem o Ciclo
Básico e com o Núcleo de Cirurgia Experimental.
Aos discentes são oferecidas oportunidades de utilizar as estruturas de
saúde de vários municípios do Estado, particularmente no internato por ocasião do
Estágio Rural.
4.2 - Os sujeitos da pesquisa
Constituíram a amostra da presente pesquisa 21 professores em
atividade e aposentados, sendo quatro docentes por cada investigada (1960,
1970, 1980, 1990), com exceção da década de 1950.
Os critérios utilizados envolveram nível de titulação (graduação,
especialização, mestrado e doutorado) e departamento em que o professor
estivesse inserido (Clínica Cirúrgica, Clínica Médica, Toco-ginecologia). Foi
solicitada uma lista de docentes ao Setor de Recursos Humanos da Universidade
Federal de Alagoas (UFAL), considerando os referidos critérios.
Assim, a seleção dos entrevistados das cadas de 1960, 1970, 1980 e
1990, ocorreu, considerando os critérios mencionados por meio de um sorteio
baseado em uma relação de professores fornecida pelo mencionado Setor da
Universidade Federal de Alagoas.
Como na década de 1950 não são muitos os professores em condições
físicas e mentais de conceder entrevista, o sorteio não foi realizado, sendo a escolha
aleatória na dependência da situação em que estivesse o professor contatado para a
entrevista. Por este motivo, ao contrário, das demais cadas, nessa década foram
entrevistados cinco professores, que quando procurados manifestaram interesse em
conceder a entrevista.
Na década de 1960 foi realizado sorteio sem distinção sobre a formação
de pós-graduação, visto que à época, esses cursos praticamente inexistiam no
Nordeste e a comunicação e os deslocamentos para cursos fora do Estado eram
difíceis e incipientes.
Com as cadas restantes optou-se pelo sorteio obedecendo a seguinte
regra: um professor com doutorado, um com mestrado, um com especialização e
um, apenas graduado. Neste caso, somente na década de 1970 encontramos um
professor apenas graduado porque os demais docentes tinham, no mínimo, a
residência médica.
4.3 - Os procedimentos de coleta de dados
As pesquisas qualitativas envolvem uma grande variedade de
procedimentos e instrumentos de coleta de dados. Podemos dizer que observação
(participante ou não), a entrevista em profundidade e a análise de documentos são
os mais utilizados, embora possam ser complementados por outras técnicas
(MAZZOTTI & GEWANDSZNAJDER, 1998).
De acordo com Minayo (2004) o que torna a entrevista um instrumento
privilegiado de coleta de dados é a possibilidade da fala revelar pressupostos, valores e
condições estruturais, não somente do próprio sujeito, mas tamm de todo um grupo
social e/ou profissional cujos participantes compartilhem condicionantes sócio-culturais.
No presente estudo, considerando os objetivos da pesquisa, optou-se por
entrevistas semi-estruturadas. Estas, segundo Mazzotti e Gewandsznaider (1998),
seguem um roteiro, mas o fluxo assemelha-se a uma conversa, onde as ênfases,
experiências e demandas do entrevistado interferem no desenvolvimento da entrevista.
O investigador está interessado em compreender o sentido atribuído pelos sujeitos a
situações e/ou processos que estão em estudo.
Nesta pesquisa, foi estruturado um roteiro inicial, o qual foi submetido a
um estudo piloto para avaliar as necessidades de ajuste e/ou redimensionamento
nas perguntas previamente elaboradas. A análise deste estudo permitiu identificar
algumas distorções em algumas perguntas, o que levou a alterações no instrumento
proposto, configurando-se a versão final que se encontra no anexo III.
Assumiu-se como núcleos orientadores da entrevista: trajetória como
professor de medicina: inserção, experiências docentes, processo de
formação; e concepções docentes: o ensinar e o aprender em Medicina.
As entrevistas foram gravadas e transcritas pela pesquisadora, no prazo
máximo de 12 a 24 horas, utilizando-se um diário de campo, onde foram registrados
aspectos relativos ao clima da entrevista, comportamento dos professores durante
as entrevistas e percepções da entrevistadora.
A inserção da pesquisadora no Hospital Universitário dr Alberto Antunes
permitiu que a pesquisa fosse viabilizada dentro deste ambiente de trabalho, onde
após contato telefônico ou pessoal foram localizados os professores em exercício.
Quanto aos aposentados, parte deles estava dirigindo ou participando de instituições
intelectuais em Alagoas, de acesso fácil como a Academia Alagoana de Letras, o
Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas e a Sociedade Brasileira de médicos
escritores. Os outros foram contatados nas respectivas residências.
De acordo com as normas previstas pela Comissão Nacional de Ética na
Pesquisa, o presente projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética da Universidade
Federal de São Paulo, sendo aprovado (anexo I). Todos os sujeitos assinaram o
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (anexo II) garantindo-se o sigilo dos
dados coletados, bem como o direito às informações necessárias.
4.4 - Processo de análise de dados
A análise dos dados envolve o trabalho com os dados, a sua organização,
divisão em unidades manipuláveis, síntese, procura de padrões, descoberta dos
aspectos importantes e do que deve ser apreendido e a decisão sobre o que vai ser
transmitido ao outro.
Segundo Minayo,
O produto final de uma pesquisa é sempre provisório, resultado de
todas as etapas da pesquisa... A sua compreensão jamais é
contemplativa. Ela inclui num mesmo projeto o objeto, o sujeito do
conhecimento e as próprias interrogações em movimento totalizador.
A interpretação além de superar a dicotomia objetividade versus
subjetividade, exterioridade versus interioridade, análise e síntese,
revelará que o produto da pesquisa é um momento da práxis do
pesquisador, e sua obra desvenda os segredos de seus próprios
condicionamentos. (MINAYO, 1999, p. 237).
Por “análise temática” Minayo entende a descoberta dos cleos de
sentido que compõem uma comunicação, cuja presença ou freqüência signifiquem
alguma coisa para o objetivo analítico visado. Segundo a autora, a análise temática
desdobra-se em quatro etapas:
[...] pré-análise, exploração do material, tratamento dos resultado
obtidos e interpretação. A pré-análise implica na escolha do material
a ser analisado, na retomada das hiteses e dos objetivos iniciais
da pesquisa, reformulando-as frente ao material coletado, bem como
na elaboração de indicadores que orientem a interpretação final [...].
(MINAYO, 1999, p. 209).
Os momentos da exploração do material, tratamento dos resultados
obtidos e interpretação envolvem a leitura e releitura dos dados coletados,
buscando-se identificar as temáticas recorrentes, bem como os aspectos que se
mostraram singulares e importantes ao objeto investigado.
Nesta investigação, foram percorridas as seguintes fases de análise:
1 transcrição das entrevistas, buscando fidelidade às expressões dos
professores;
2 leitura e releitura das transcrições, procurando a familiarização com as
concepções docentes;
3 organização de uma análise por cada de ingresso dos professores
entrevistados, destacando as principais falas relativas às questões propostas no
roteiro;
4 elaboração de um quadro de resultados por cada questão do roteiro
proposto, aproximando os professores das diferentes cadas;
5 elaboração de um segundo quadro contendo as temáticas e as falas
dos professores;
6 aproximação das falas, buscando as convergências e divergências
entre elas e configurando os cleos temáticos apreendidos a partir da análise dos
dados.
Os resultados analisados foram agrupados em três cleos e são
apresentados, juntamente com a discussão a partir do referencial trico adotado,
no capítulo V: Por entre concepções e trajetórias de formação dos professores.
5 POR ENTRE CONCEPÇÕES E PROCESSOS DE
FORMAÇÃO DOS PROFESSORES
Esta pesquisa, dentre seus objetivos específicos, visou caracterizar a
formação do professor-médico, nas diferentes cadas, a partir da ótica dos
docentes, discutindo como esses professores-médicos compreendem o processo de
formação docente e refletir sobre suas concepções em relação ao cotidiano do
ensino-aprendizagem no Curso de Medicina.
O presente capítulo traz, dessa forma, as concepções e processos de
formação, empreendendo uma discussão à luz do referencial trico adotado na
investigação. Nessa etapa de análise interpretativa, entende-se que é necessário ir além
da mensagem do texto, saber ler nas entrelinhas e estabelecer diálogos com a literatura
e com as iias postas pelos sujeitos envolvidos na pesquisa (SEVERINO, 2002).
Para uma melhor compreensão, optou-se por sistematizar um tópico
dedicado a apresentar algumas características dos professores entrevistados. A
seguir, são expostos os cleos temáticos apreendidos: a inserção na profissão
docente; concepções docentes e trajetórias de formação como professores de
Medicina
.
5.1 - Os professores em foco: delineando um perfil
Em uma pesquisa que trabalha com professores de diferentes cadas,
destacam-se as possibilidades de agrupamento em torno do período em que
ingressaram na carreira docente. Assim, os professores da década de 1950 (P1,
P2, P3, P4 e P5) apresentam uma faixa-etária média de 80 anos, com uma atuação
docente de, aproximadamente, 40 anos de atividade ininterrupta. Esses professores
são graduados no curso de Medicina, a maioria com estágios em suas respectivas
especialidades: cirurgia geral, psiquiatria/neurologia, pneumologia e dermatologia.
A Medicina era exercida por esses professores em seus consultórios
particulares e hospitais públicos, o que, talvez, possa implicar que suas atividades
primordiais não eram as relacionadas ao exercício docente. Um dado interessante é
que um dos professores afirmou ter feito, nos anos 40, um curso relativo à ditica
de ensino.
Vale salientar, ainda, que, nessa década, todos os professores eram do
sexo masculino, fato que vai ser observado tamm nas cadas posteriores,
acompanhado de uma ingresso gradual de professoras no curso de Medicina da
UFAL.
Os professores da década de 1960 (P6, P7, P8, P9) têm, hoje, em
média, 70 anos de idade, apresentando um período de cerca de 30 anos como
docentes do curso médico. Três deles, P7, P8 e P9, revelaram ter realizado estágios
em suas especialidades ( patologia clínica, dermatologia e patologia geral) em outros
Estados do Brasil e um, inclusive, chegou a fazer estágio nos Estados Unidos
Duas características são marcantes dentre os professores dessa década:
a inserção de uma professora do sexo feminino e o fato de serem todos os docentes
egressos da primeira turma de graduados na Faculdade de Medicina de Alagoas.
Os professores da década de 1970 (P10, P11, P12, P13) apresentam
uma faixa-etária entre 50 e 60 anos, com um trabalho docente de, em média, 25
anos. Um deles é apenas graduado (P12) e os demais (P10, P11 e P13) fizeram
suas especialidades como médicos nas seguintes áreas: pediatria,saúde pública,
ginecologia.
Nessa década o número de professoras passa a ser equivalente ao de
professores, além das características relativas à titulação: uma professora com
Mestrado e um professor com Doutorado.
Os professores entrevistados da década de 1980 (P14, P15, P16,
P17), com faixa etária entre 40 e 50 anos, estão na docência médica há cerca de 17
anos. Suas áreas de especialidades são: cirurgia, endocrinologia, gastroenterologia
e nefrologia.
No âmbito da titulação, todos os docentes dessa década têm Residência
Médica, além de um docente com Doutorado, uma professora com Mestrado e uma
com especialização em Educação Médica (título obtido em 2004).
Nessa década, ocorre o inverso dos anos de 1960, com uma significativa
inserção de professoras (para cada docente do sexo masculino há três docentes do
sexo feminino).
Os professores da década de 1990 (P18, P19, P20, P21) têm uma
média de 40 anos de idade e estão no exercício docente há, aproximadamente, 12
anos. Todos os professores entrevistados foram do sexo masculino. Um dos
professores tem título de mestre, doutor e realizou o pós-doutorado, exercendo
como especialidade médica a colo-proctologia e cirurgia (P19). Os demais são
especialistas em urologia (P18), ginecologia (P20) e oftalmologia (P21).
Dentre as singularidades e especificidades que marcam os professores
das diferentes cadas, considerando os contextos institucionais, políticos e
educacionais locais, regionais e nacionais, verifica-se um ponto comum: em todas as
cadas os professores têm como atividade principal a atuação em seus
consultórios particulares, o que pode contribuir para situar a docência como uma
atividade colocada em segundo plano.
5.2 - A inserção na profissão docente: desvelando motivações
No tocante à inserção docente, percebe-se que da década de 50 até a
cada de 1990, excetuando-se a década de 1970, vários professores vão explicitar
que seu ingresso na universidade aconteceu como desdobramento de uma atividade
docente no âmbito do ensino médio, destacando as experiências anteriores como
fator de significativa influência para iniciar na docência médica:
A minha inserção deu-se por formação na Escola Normal, no
Sacramento e no Instituto de Educação. (P1).
Eu já ensinava quando estudante. Eu comecei a ensinar higiene e
puericultura.isso me motivou para a carreira docente, pois eu já tinha
uma experiência razvel nesse campo pedagógico. (P3)
Iniciei com 28 anos, eu dava aula em colégios. (P8).
Eu comecei a trabalhar com 19 anos de idade sendo professor... fui
professor do colégio Marista e ensinava Ciências. E exerci essa
atividade durante uma parte do curso de Medicina. (P14).
Ingressei com 17 anos. Fui professor de Biologia na escola Técnica
Federal. (P19).
Desvela-se nos depoimentos dos docentes uma compreensão que parece
atribuir à experiência em si uma força bastante significativa no processo de
aprendizagem da docência. Gordan (2004) alerta para a necessidade de que sobre
as vivências sejam produzidas reflexões e críticas, pois entende as complexidades
do ensino-aprendizagem em Medicina, o que exige um aprofundamento permanente
e articulado.
Os professores revelaram, também, que
as necessidades de
atender às demandas
do curso de Medicina foram determinantes
para o ingresso na Universidade Federal de Alagoas, ora por
concurso, ora por convite:
Os professores fundadores entravam como titulares .Com a
federalização da Faculdade pelo governo Federal, s passamos de
titulares ä catedráticos, mesmo sem termos feito concurso. (P2).
Ingressei com 25 anos de idade, assim que terminei o curso... Eu fui
convidada pela professora Arlene para auxiliar, que ela estava com
carência na disciplina. (P12).
Ingressei com 24/25 anos de idade.Ingressei como convidado e
gostei de ser professor. Deixei para ser político. (P5).
As falas dos professores remetem, dentre outras, a uma indagação: até
que ponto um professor que é inserido nos quadros de uma universidade e até
chega a ser promovido, sem submeter-se a concurso, irá se preocupar com sua
qualificação para a docência?
Essa questão ganha realce quando se identifica, a partir das falas dos
docentes, uma preocupação em atender a demandas e resolver questões de ordem
administrativa que se sobrepuseram a uma política de formação de professor. Os
problemas imediatos, tais como preenchimento de vagas, colocaram-se na ordem do
dia, deixando para um segundo plano as questões voltadas para o ensino e a
pesquisa:
Ingressei na carreira docente aos 25 anos de idade, por necessidade
absoluta da disciplina, não tinha ningm. (P6).
Recém-formada aos 27 anos de idade me contrataram para ensinar
patologia geral. (P9).
Eu nunca pensei em ser professora. Eu sou uma pessoa meio
retraída... houve um conflito entre dois professores, algm me pediu
para dar uma aula e eu fui, terminei ficando e gostando. (P10).
Acho que eu estava com 31 e um anos de idade...bom, a princípio eu
tinha lhe dito que entrei por uma crise na parasitologia. Um professor
foi para a Europa, um outro vindo do Rio de Janeiro e não quis ficar e
o outro adoeceu de câncer. (P11).
É necessário reconhecer que a priorização dos aspectos administrativos
tamm pode ser compreendida a partir da consideração de que, nos primórdios da
história da Faculdade de Medicina de Alagoas, havia uma carência de profissionais
para compor o quadro acadêmico necessário ao funcionamento do curso. Isso talvez
se explique pelo fato de as Faculdades de Medicina mais próximas estarem
localizadas em Pernambuco e na Bahia, tornando o curso possível apenas para uma
minoria economicamente privilegiada (VEOSA,1997)
Para além dos determinantes locais da política de seleção de professores,
tamm toda uma tradição no meio universitário, no qual o processo por meio de
concurso, no âmbito das instituições públicas, representa uma importante conquista
dos professores.
Assim, se, por um lado, o concurso passou a ser exigência para o
ingresso dos docentes nas universidades públicas, por outro lado ainda permanece
como hegemônica, na maioria das instituições, a concepção do ser professor,
segundo a qual é suficiente ter domínio do conteúdo, sem considerar todas as
implicações de ordem trico metodológicas que o processo de ensino e
aprendizagem encerra. Nesse sentido, Masetto afirma que:
Essa situação se fundamenta em uma crença inquestionável até bem
pouco tempo, vivida tanto pela instituição que convidava o
profissional a ser professor quanto pela pessoa convidada ao aceitar
o convite: quem sabe, automaticamente sabe ensinar. Mesmo
porque ensinar significava ministrar grandes aulas expositivas ou
palestras sobre um determinado assunto dominado pela
conferencista, mostrar, na prática, como se fazia; e isso um
profissional saberia fazer. (MASETTO, 2005, p. 11).
Alguns professores atribuem as suas inserções docentes aos estímulos
gerados por atividades que exerciam como alunos, quer seja participando de
diretórios acadêmicos, quer seja na monitoria ou, ainda, residência médica como
recém-formados.
Durante o meu período de estudante fui presidente do diretório de
medicina, tinha uma certa atividade e o pessoal começou a gostar
mesmo das minhas aulas. (P11).
Isso aconteceu eu não esperava mas já tinha sido monitora, tinha de
qualquer forma uma experiência com o aluno. (P12).
O que me motivou foi o ambiente acadêmico. (P17).
Eu sou egresso do serviço público e fiz uma residência, tamm, em
um ambiente em que havia um compromisso embora não fosse um
serviço público, era um serviço privado mas havia sempre um
compromisso honesto das pessoas que nos transmitiram essa
honestidade, esse compromisso com o ensino da oftalmologia. (P21)
Essas falas expressam uma dimensão que tem sido explorada por
estudiosos da docência universitária (PIMENTA & ANASTASIOU, 2002; ZABALZA,
2004), indicando que as vivências como alunos e os modelos de professores que
vão sendo incorporados motivam para a carreira docente, e experienciando-a a partir
de determinados
modelos
de ser professor no ensino superior.
No âmbito da educação médica, os debates sobre a
formação/desenvolvimento docente têm evidenciado a relevância de resgatar a
história de vida profissional, pondo em discussão as motivações para a inserção na
docência em Medicina, possibilitando movimentos de crítica e transformação das
práticas acadêmicas (ZEFFERINO & BARROS, 2004; BATISTA e cols, 2004).
Emergiu, tamm, na expressão de um dos entrevistados, o ingresso
como uma
questão natural
na medida em que fazia parte de uma família cuja
profissão preponderante era o magistério:
Ingressei com 32 anos de idade, eu venho de uma família de
docentes. Não tinha interesse em ensinar, eu não tive nem tempo de
pensar. (P15).
Os modos de inserir-se como docente, no âmbito dos
professores investigados, realçam a multiplicidade de motivões.
Contudo, parece que o tro do improviso e da surpresa ao
reconhecerem-se como professores médicos é algo comum em
vários depoimentos. Esse dado e ainda a tendência à admissão de
docentes segundo parâmetros tradicionais, ou seja, sem considerar
uma formação didático-pedagógica, o aspectos discutidos na
literatura (BATISTA & BATISTA, 2001; GORDAN, 2004), chamando
atenção para a importância de se discutir sobre a inserção docente
como um campo que favorece a problematização dos processos e
mecanismos que caracterizam o tornar-se professor em Medicina.
A questão da inserção docente remete, também, aos
processos identitários, expondo os motivos e as condições em que
o tornar-se docente foi sendo conformado, e, em certa medida,
explicando as referências que estão inscritas na maneira de
ensinar. Zabalza argumenta que:
a carreira profissional faz parte da construção da identidade
profissional dos docentes desde o momento em que eles
iniciam tal processo como monitores ou assistentes até
alcançarem a maturidade profissional. Trata-se de um longo
itinerário em que vão mesclando-se muitos componentes dos
mais diversos tipos: das
circunstâncias pessoais e familiares até as oportunidades
acadêmicas; das normas institucionais aos critérios poticos e
econômicos de cada momento; das condições sociais
características do momento à forma como nos afeta o próprio
jogo de influências e divio de poder que ocorra em nosso
meio. (
ZABALZA, 2004,
p. 138).
A doncia como um fazer menor ou como uma atividade
que dá prazer ou, ainda, como uma profissão o significados
possíveis para os professores médicos. Batista e Ribeiro (2000,
p.132) afirmam que sob a ótica do exercício docente como prática
social, a profissionalização do professor deve ser encarada como
uma estratégia para repensar a dinâmica da educação médica nas
suas dimensões institucional e social.
Observa-se que colocar em debate a inserção docente
pode ser uma produtiva fonte de subsídios para entender os estilos
docentes e as opções que os professores fazem no decorrer de
suas vidas acadêmicas, construindo uma carreira como professor
universitário. E esse entendimento, na perspectiva de configurar
novos patamares de compreeno do professor de Medicina, exige
que se apreendam, dentre outros focos, as concepções sobre o
processo ensino-aprendizagem. Eis o próximo eixo deste capítulo.
5.3 - Ensino e aprendizagem: a vio de professores de Medicina
A análise das falas dos professores da década de 1950
evidencia que as concepções do processo ensino-aprendizagem estão
marcadas pela ênfase na interação professor-aluno, com uma
valorização da empatia, do respeito da horizontalidade de relações
pedagógicas, possibilitando uma relação procua entre o professor e o
aluno.
Eu era, paradoxalmente, um professor exigente e socialmente um
professor amorável. (P1).
Eu me coloco no mesmo plano, uma pedagogia horizontal e aberta,
dialética, através desta dialética nós vamos chegar ao conhecimento
do conceito que nós estamos dispondo ao aluno. (P2).
O professor tem que ter um diálogo com os alunos e um melhor
entendimento para fazer com que esse conteúdo seja
transmitido de uma forma correta. (P3).
Aproximação do estudante. O professor não pode se trancar, o aluno
diz: este é um chato. (P5).
Na década de 1960, a análise das falas dos
docentes evidencia a compreeno de que, com o advento
da semestralização dos cursos, há escassez de tempo para
trabalhar a disciplina, aulas teóricas pouco eficazes, bem
como uma reflexão crítica sobre a pedagogia da
transmissão e sobre o professor onipotente, dono do
saber.
A semestralização, para a minha visão da disciplina de Doenças
Infecciosas e Parasitárias não foi uma coisa muito boa porque tornou
necessário apressar a exposição do conteúdo e, inclusive, foi
absolutamente necessário eliminar quase a metade do conteúdo
programático. (P6).
Não há mais nenhum motivo para o aluno depender da cultura do
professor. Ele é apenas um orientador, nas suas inquietações, dos
seus interesses; o professor não é mais aquele trico que
determinava e impunha a sua cultura. (P7).
Enquanto que nós pensávamos que estávamos sendo os distantes
da verdade, disso e daquilo outro, s não estávamos dando ao
aluno o que ele precisava. (P8).
Na década de 1960, apenas um professor enfatizou
a relação professor/aluno.
É um processo belíssimo e eu acho que esse processo só funciona
bem quando os dois aprendem. (P9).
Os depoimentos dos professores da década de 1970 traduzem uma
preocupação com o relacionamento docente/discente, com a importância da
associação trico/prática e com a pedagogia da transmissão
[...] O professor, o aluno, a estrutura universitária entram nesse
esquema,mas esse bom relacionamento do professor com o aluno, o
professor que se interessa, que tenta se aproximar mais, que tenta
facilitar o aprendizado [...]. (P10).
Eu sempre tive um relacionamento extraordirio com os alunos. As
minhas aulas práticas eram riquíssimas, todos os alunos saíam
sabendo o que era o toxoplasma... Eu sempre associei a teoria à
prática. (P11)
[...] Eu acho que primeiro tem que o aluno querer e o professor
tamm querer dar. Porque se isso não acontecer, realmente fica
difícil [...]. (P12).
Aula eu não acho que seja maravilhosa, aluno fica disperso. Este
processo às vezes acontece com mais eficiência na. práticas de
ambulatório. Agora aquele ensino de ambulatório, quando você
pega o aluno no 6º ano, eles realmente já estão
interessados,associando os casos com a literatura.Eu acho bem
mais interessante... Aquela aula que eles anotam tudo o que você
fala Quando chegam no 6º ano, a gente pergunta e eles nem
lembram. (P13).
A importância da interação professor/aluno emergiu com força para os
professores da década de 1980.
O aluno é um aprendizado constante, a gente busca entender o
aluno... Você procura entender o aluno e fazer com que o aluno lhe
entenda. (P14).
Eu acho que você tem que chegar e não pode falar sozinho.
Estimular o aluno para ele falar, tirar as vidas, oportunizar com a
prática para ver se ele reteve as informações. (P15).
Hoje eu vejo como uma troca, um processo contínuo. (P16).
Eu acho que tem que ser interativo... Porque você aprende muito
com o aluno. (P17).
Na década de 1990, a análise das falas docentes evidencia a
preocupação com a interação do professor com o aluno,com a associação da teoria
à prática e com dois conceitos bastante atuais: a construção do conhecimento e a
interdisciplinaridade.
Eu acho o seguinte: na aula prática você viu um caso de próstata,
você tem que ler. Aproveitar aquele caso e estudar. (P18).
Nossa Universidade é uma universidade muito nova, com 43 anos e
precisa, ainda, desenvolver mais o relacionamento entre o professor
e o aluno.O processo das universidades históricas, como a de Viena,
o professor já tem um sistema de relação tutorial ou não, mas uma
relação mais próxima do aluno. (P19).
[...] Aprendizado, hoje, é essa relação, construção da participação do
aluno e do professor em todos os níveis, desde a parte do ensino
propriamente dito, da pesquisa e da extensão [...]. (P19).
Eu acho que dentro do ensino a primeira coisa que o professor deve
ter é o respeito pelo aluno. (P20).
Nesses momentos de transmissão de conhecimento com os alunos,
você tenta de alguma forma empolgar, mostrar ao aluno uma
correlação entre a pequena área oftalmológica no sistema como um
todo, seja uma interação com a neurologia, seja com a
endocrinologia. (P21).
Dentre as várias questões pertinentes ao processo de ensino e
aprendizagem, a
relação professor-aluno
se impõe como elemento fundamental à
medida que se trata do encontro de dois sujeitos.
Dentre as cinco décadas analisadas, na busca por compreender como,
ao longo desse período, foi se formando o professor de Medicina no Estado de
Alagoas, percebe-se que a ênfase dada pelos professores entrevistados incide na
forma como eles se relacionavam com seus alunos. Talvez essa percepção traduza
que os professores atribuíam suas experiências de sucesso ou de insucesso à forma
como interagiam com os discentes.
Em uma perspectiva de integralidade, o sujeito pensa, sente,
experimenta, expressando que a emoção e a afetividade fazem parte da
aprendizagem. Como sujeitos diferentes, professor e alunos, podem estabelecer um
contato emtico, confiante? Sonzogno (2004) colabora na resposta a essa questão
na medida em que alerta que os docentes ampliam suas possibilidades no processo
ensino-aprendizagem quando assumem uma atitude de escuta e de observação a
fim de que seja possível uma interação com o outro. Sugere a autora que não se
olhe o outro a partir de referências do próprio docente, mas sim que incorpore as
histórias, crenças, saberes e experiências dos alunos.
Abramowicz (1992), Godoy (1992) e Rodrigues e Esteves (1993)
enfatizaram em suas pesquisas a importância das relações interpessoais no
processo ensino-aprendizagem. Almeida e Placco (2003) e Silva (2005) aprofundam
a dimensão relacional, destacando que ser afetado pelo outro significa mobilização
dos desejos e necessidades de aprender, ensinar, formar.
A centralidade da relação professor-aluno na maneira de
conceber o processo de ensino-aprendizagem mostra-se como um dado
bastante instigante, na medida em que parece conviver, de forma
ambígua, uma compreensão do ensinar e do aprender como processo
de troca, ao mesmo tempo em que não fica clara a questão da
construção do conhecimento.
Aprendizado, hoje, é essa relação de participação do aluno e do
professor em todos os níveis, desde a parte do ensino propriamente
dito, da pesquisa e da extensão. (P19).
Eu acho que dentro do ensino a primeira coisa que o professor deve
ter é o respeito pelo aluno. (P20).
Nesses momentos de transmissão de conhecimento com os alunos,
você tenta de alguma forma empolgar, mostrar ao aluno uma
correlação entre a pequena área oftalmológica no sistema como um
todo, seja uma interação com a neurologia, seja com a
endocrinologia. (P21).
O processo ensino-aprendizagem emerge como decorrência de
um bom relacionamento, como significado de transmissão, de
capacidade de empolgar, de estar atualizado, de associar a teoria à
prática, de ter conteúdo. Essa concepção parece traduzir uma
determinada cultura de aprendizagem e ensino que se assenta no
acúmulo de informações e assimilação de conteúdos, sem uma
necessária vinculação com as exigências da vida prática, do cotidiano.
A construção de uma nova cultura, fundada no conhecimento
como processo de interpretação da realidade, de atribuição de
significado e apropriação crítica das teorias já consolidadas, demanda,
segundo Pozo (2002), uma (des)construção de valores e pressupostos
de professores e estudantes, estruturando ênfases na mediação, no
diálogo, no estudo com significado, na produção de conhecimento.
Nesse sentido, os estudos de Chacón e Vergara (2002) e Oliva
e Cao (2002) corroboram, no campo da educação superior, que há
intensos movimentos de resignificação dos lugares do professor e do
aluno no processo de formação e aprendizagem, em que a identidade
de sujeito é atribuída não somente ao docente, mas tamm ao
estudante.
Nesse contexto, em que as concepções de ensinar e aprender
mostram-se em transição para modelos educativos mais dialógicos,
críticos, sem perder o rigor científico, como se inserem as
metodologias
de ensino?
A análise dos professores entrevistados, nesta pesquisa, vem revelar que,
da década de 1950 até os anos de 1990, a tônica foi a centralidade nas aulas
expositivas, muito embora reconheçam que teria sido importante e até necessário
um conhecimento de métodos e técnicas pedagógicas para exercerem melhor a
atuação docente.
Durante toda a trajetória dos professores entrevistados, apenas dois
revelaram ter ido além das aulas expositivas, utilizando em suas salas de aula as
técnicas de dimica de grupo e trabalhos em grupo.
A maior experiência que eu passei como professor foi adaptar as
técnicas de dimica de grupo para o ensino médico de Histologia e
Embriologia. Aí se exigia não mais que o professor desse aula
magistral, aquela aula conceitual sobre o assunto. (P7).
Eu estimulava os alunos a acharem as próprias soluções, eu dava
um texto para eles lerem e discutirem em grupo e aí não era apenas
a memória, aí já estava a compreensão, a análise e no fim a síntese.
(P9).
Importante destacar que alguns professores revelaram ter estabelecido a
relação teoria-prática:
As minhas aulas práticas eram riquíssimas, todos saíam sabendo o
que era toxoplasma. (P11).
Eu acho o seguinte, na aula prática você viu um caso de próstata,
você tem que ler. (P18).
A análise das entrevistas fomenta uma questão
:
até que ponto essas
aulas práticas se constituíam como espaço de diálogo e de problematização ou
apenas se repetia a tradicional forma de repassar os conteúdos como acontecia nas
aulas tricas?
Tradicionalmente o espaço da sala de aula tem se constituído num
momento em que o professor detém os conhecimentos e os transmite aos seus
alunos. As aulas práticas muito raramente se dão na forma de prática sob
supervisão, mas sim restringem-se às aulas demonstrativas, quando o professor
assume o papel de mostrar como é o fenômeno” (MASETTO, 2003, p. 88). Reforça-
se a crença de que se aprende através da transmissão de saberes e não através da
solução de problemas e da reconstrução do conhecimento.
Compreender o processo de ensino-aprendizagem por meio de outras
referências, superando o modelo da transmissão, significa assumir o encontro
dialógico onde professor e aluno interagem para estudar, acessar conteúdos já
sistematizados, realizar descobertas, dirimir vidas, realizar trabalhos, apropriar-se
de conceitos, problematizar realidades. Segundo Masetto (2003, p. 89) “onde quer
que possa haver uma aprendizagem significativa buscando atingir intencionalmente
objetivos definidos, aí encontramos uma aula universitária.
Não obstante o reconhecimento da necessidade de uma transformação
no processo de formação de futuros médicos, os professores entrevistados
explicitam que saber ensinar significa saber proferir bons discursos:
Ser um bom professor é uma coisa eminentemente pessoal, uma das
coisas mais importantes é a elocução fácil, isso eu sempre tive. (P1).
Nesses momentos de transmissão de conhecimento com os alunos
você tenta de alguma forma empolgar. (P21).
Observa-se que, mesmo nos professores da década de 1990, como é o
caso do professor P21, persiste a concepção de que para ser professor é necessária
uma retórica capaz de empolgar os alunos.
Como diria Pedro Demo (2004), a aula permanece ainda como feito de
um professor que fala sozinho para uma multidão, o que pode parecer interessante,
no entanto a aprendizagem, para o autor, somente se efetiva quando o próprio
sujeito constrói o conhecimento e assim constrói sua autonomia.
Subjacente à concepção de que ensinar é fazer exercício de oratória em
que um fala enquanto outros escutam calados, reside uma postura bastante
autoritária, ou como afirma Demo:
A aula reprodutiva tem sido uma arma de autodefesa e de ataque. É
autodefesa porque, porque há através dela a manutenção da relação
prepotente, consumada no direito de reprovar. É ataque, porque
reforça sua posição de comando na sociedade,revidando a relação
clássica de conhecimento e poder. (DEMO, 2004, p. 68).
A aula reprodutiva, ao que parece, esteve presente em vários
depoimentos dos professores: uma aula que não privilegiava o exercício do
pensamento e que, portanto, muito mais informou do que formou. É bem verdade
que alguns participantes desta pesquisa tentaram (e tentam) superar o ensino
tradicional, porém faz falta uma postura epistemológica capaz de faze-los pensar
numa ação pedagógica consciente.
O processo de ensino é um processo complexo, não
podendo ser reduzido a proporcionar ao estudante informões,
mas sim, assumir a mediação de aprendizagens no percurso de
formar-se médico. Dentre os desafios dos docentes inscreve-se a
necessidade de ter um conhecimento sobre quem o seus alunos,
de identificar quais são os conhecimentos prévios, motivões,
atitudes, valores. Desse modo, a aula pode deixar de ser um
monólogo centrado na figura do professor, para ser construída uma
nova centralidade: a interação professor-aluno.
Batista (2004) destaca que o ato de ensinar não está
dissociado do ato de aprender, pelo contrário, se encontram em estreita
ligação.O professor ao pensar estratégias de ensino, ao elaborar
planejamentos, indaga-se sobre as possibilidade cognitivas do seu
aluno, vai além do elenco de conteúdos a serem trabalhados e se faz a
pergunta: como meu aluno aprende? Com essa preocupação explicitada
e na busca por configurar respostas, amplia-se a possibilidade de se
estabelecer um trabalho que seja significativo tanto para o professor
como para o aluno.
O processo de ensino e aprendizagem, no tocante à ação do professor,
precisa se caracterizar pelo empenho deste no sentido de que ocorram
aprendizagem significativa e construção de conhecimento novo. Para tal, espera-se
que sejam vários os procedimentos metodológicos e as estratégias escolhidas pelos
docentes. Batista e Silva (2001) salientam a necessidade de criar situações
problemas capazes de estimular e incentivar os alunos a fim de que sejam capazes
de se tornarem autônomos, críticos e participativos.
Batista e colaboradores (2004) situam o quão produtivas e construtivas
configuram metodologias que assumem os enfoques problematizadores, pois a
vivência de experiências fundadas na pergunta, na busca e na troca entre pares e
com parceiros mais experientes, pode ser referencial importante para o
redimensionamento de práticas profissionais em saúde, investindo na aprendizagem
de posturas éticas, cidadãs e cientificamente consistentes.
Zabalza (2004) e Pozo (2002) ressaltam que a produção das concepções
docentes dão-se em meio às circunstâncias sociais que vão sendo configuradas no
decorrer da trajetória docente. É sobre esse núcleo temático que se estruturou o
próximo item desta análise dos dados coletados.
5.4 - Trajetória docente: formação e experiências
A análise das entrevistas permitiu configurar, no campo da trajetória
docente, uma tríade marcada pela formação para ser professor, pelas experiências
de sucesso e dificuldades que marcaram e/ou marcam o exercício da docência.
5.4.1 - A formação para ser professor de Medicina: um projeto em
andamento
A procura por configurar uma compreensão dos condicionantes e das
características da formação docente na trajetória dos professores investigados
revelou como bastante significativa uma incursão sobre os atributos que
caracterizam o professor de medicina para os sujeitos da pesquisa. Para os
professores da década de 1950:
Cumprimento de uma atividade eminentemente profissional,
vocação, condições pessoais que determinem o pleno exercício das
atividades, não podemos numa atividade dessas fugir da
observação, da associação, da experiência real. O professor que se
baseia apenas na sua ciência e no seu talento torna-se insuportável.
A cultura geral do professor torna a aula mais agradável. (P1).
Ser um bom médico não é suficiente para ser um bom professor. É
uma coisa eminentemente pessoal. Uma das coisas mais
importantes é a elocução fácil. Como estudei pedagogia eu me
familiarizei. (P1).
Primeiro ser cidadão ou cidadã. Segundo ter conhecimento da
ciência médica. Terceiro ter uma boa vivência clínica significa ter
uma prática consciente da atividade clínica. (P2).
Conhecimento dos conteúdos necessários para esse desempenho.
Necessidade do conhecimento técnico e de métodos e técnicas
pedagógicas para que se passe melhor esse conteúdo. Ter
conteúdo humanístico para que ele possa compreender o aluno, o
paciente, para que ele possa compreender o ensino como global.
(P3).
Gostar da profissão e fazer todo um esforço para estar sempre
melhorando. Não esquecer nunca o bom relacionamento que deve
ter com os estudantes. (P5).
Na década de 1960, emergem noções de compromisso, responsabilidade,
amor. Enfoca-se, ainda, o conceito de que para exercer a atividade de professor faz-
se necessário ser “vocacionado.
Ter um compromisso rigoroso com o aluno e superar as dificuldades.
(P6).
O bom professor é aquele que gosta de ensinar. Gosta de passar
conhecimento. É aquele que tem facilidade de expressão. Vive e
compreende o olhar do aluno. Ser professor de medicina implica em
amar profundamente ao próximo. A formação ditico-pedagógica
para o Nordeste é muito importante. (P7).
O professor é uma pessoa que tem que ser nato. Tem que saber
transmitir, saber ensinar. Implica em melhorar a capacidade pessoal
porque esta é a premissa. Ele tem que ter uma bagagem acadêmica
suficiente para isso. (P8).
Eu acho que ser professor de medicina implica em zelarmos pelo
bem maior que as pessoas têm que é a vida. Trabalhar sensu latu,
raciocinando, mas, tamm, sendo humanístico, respeitando a vida.
A formação ditico-pedagógica é indispensável. O professor deve
saber quais os estímulos maiores que ele deve dar ao aluno. (P9).
Ser um bom médico, obrigatoriamente, não faz o bom professor.
Acredito para que haja a formação de um bom professor ele precisa
passar por um processo e eu não estou pensando em mestrado e
doutorado. Teria que haver uma preparação do professor para dar
aula, para preparar o aluno para uma prática, poder se conduzir
melhor diante do aluno. Ser professor de medicina implica em muita
dedicação ao trabalho, em um preparo especial da ditica do
professor. (P10).
São necessárias a dedicação e a formação ditico-pedagógica.
(P11).
Na análise das falas docentes da década de 1970, evidencia-se a
importância da formação pedagógica e do domínio das habilidades e competências
médicas:
O bom professor é aquele que passa tudo. Os médicos mais
simples conseguem passar melhor e eu digo isso até com a
minha experiência como aluna. Eu acho que ele precisa ser um
profissional dobrado. Ter dupla capacitação, ele tem que saber
ensinar mas antes ele tem que ser um bom médico. Ele tem que
ser médico e ser professor, é uma dupla jornada que tem que
ser muito estruturada, ter muito amor e muita dedicação. (P12).
O médico tem que estar atualizado, mas o professor tem redobrada
esta obrigação. A formação ditico-pedagógica é importante. Eu
acho que ser um bom médico é importante para ser um bom
professor mas não é suficiente. Porque às vezes você pode ser um
bom médico e não conseguir ter um bom relacionamento com o
aluno. (P13).
Na análise das falas docentes da década de 1980, surge a necessidade de
uma formação específica para o professor de medicina. Evidencia-se, tamm, uma
preocupação com as boas relações interpessoais docente/discente, pela pesquisa e pelo
conteúdo:
Sem a formação ditico-pedagógica o professor de medicina por
mais capaz que ele seja, pode se frustrar e não cumprir a sua função
adequadamente. É um instrumento, é uma ferramenta que o
professor tem que dominar para poder exercer corretamente a sua
atividade. A pessoa pode ser um médico excepcional, excelente,
famoso,muito bom, muito capaz e ser ssimo professor. (P14).
Primeiro ele tem que ter conteúdo e saber transmitir aquilo que
ele sabe. Ter paciência. Ter boas relões com os alunos. (P15).
Lembrar que o aluno que a gente vai formar é uma pessoa que
vai estar aí como médico, o produto final pode formar outras
pessoas e pode também cometer muitos absurdos. (P16).
E de ter interação com o aluno e interesse pela pesquisa. Eu acho
que pode ser um excelente médico e não conseguir passar as
informações de uma maneira correta. Você é treinado para ser
pesquisador, treinado para ser um bom médico, mas você não é
treinado para ser um professor. (P17).
Nas falas dos docentes da década de 1990, emerge, assim como nos anos
80, a importância da formação ditica, surgindo, ainda, a doação como capacidade
essencial para ser professor e o status que é conferido ao docente de medicina.
Professor, de qualquer maneira dá status na sociedade. O professor
tem que ter uma ditica para passar aquilo que ele sabe. (P18).
Ser professor de medicina implica em uma doação muito grande.
Você se doa aos dois elementos principais deste processo: ao aluno
e ao paciente, quer dizer, ser professor de medicina implica em doar-
se. (P19).
Para mim ser professor é uma medicina contínua. Nunca vou deixar
de estudar, nunca vou deixar de ensinar, nunca vou deixar de
exercer a minha medicina. (P20).
A tônica observada na fala dos professores sobre o que significa ser um
professor de medicina reside na compreensão de que, para ser um bom professor
não basta ser um bom médico. Há um reconhecimento explícito da carência de
preparação no campo específico da docência.
Esse aspecto tamm foi investigado nos estudos internacionais
(GELULA & FOLEY, 1999; VAUGHN & BAKER, 2004; POLOLI & FRANKEL, 2005) e
nacionais (BATISTA & BATISTA, 2004; FORESTI & TORALLES, 2004; ZEFERINO
& BARROS, 2004), apresentando uma recorrência bastante significativa. O desafio
coloca-se, atualmente, no desenvolvimento de propostas que possam, efetivamente,
contribuir na instauração de uma nova cultura na docência médica.
A partir da discussão dos olhares sobre o professor de medicina,
empreende-se um movimento analítico sobre os processos vivenciados no campo da
formação docente. Na década de 1950, no âmbito da
trajetória /formação
, constata-
se a importância do exemplo dos professores, assim como da oportunidade dada ao
aluno, além da prática e do autodidatismo:
Estudei pedagogia e a minha formação na Bahia com as várias
escolas cirúrgicas existentes. A grande vaidade dos professores,
naquele tempo, era dar teses e as docências livres para os alunos...
Fernando Luz, um dos maiores cirurgiões da época, acreditou em
mim, eu era interno dele. Ele me proporcionou leituras científicas
internacionais, da França, Itália, Espanha e Argentina. Comecei a
ensinar pedagogia, ditica e metodologia geral. Depois medicina –
clínica cirúrgica e ginecológica. (P1).
[...] Muitas falhas minhas decorriam do fato de eu não ter uma visão
técnica da pedagogia para aplicar à medicina. Uma grande falha
nisso: não ter a formação pedagógica que eu acho imprescindível
para o professor de qualquer curso, sobretudo e particularmente,
medicina, que é uma pedagogia especial. Logo após a minha
formatura fui ao Rio de Janeiro onde fiz s-graduação no Serviço
Nacional de Doenças Mentais... Achava bonito ser professor.
Comprava livros direto da França, dos Estados Unidos, da Argentina,
do Rio de Janeiro. Nós éramos autodidatas. (P2).
Construí a minha formação na prática das enfermarias do sanatório
General Severiano da Fonseca,, no Hospital Constança de Gois
Monteiro, no estudo que compensasse essa não formação em
mestrado e doutorado. (P3).
Procurei estudar. A formação didático-pedagógica é
importantíssima. Auxilia na aproximação com o aluno. (P4).
Autodiata. Dr Rolan Simon me estimulou, era um gênio, sujeito
formivel, completamente isento de ambições... A formação
ditico-pedagógica é importante. Estudar. Tudo que puder abrir as
portas do conhecimento é bom. (P5).
A análise das falas dos professores da década de 1960 evidencia a
importância das especializações e do exemplo dos professores. Um docente relata
formação em faculdade de educação.
Minha formação para ser professor de medicina foi sendo constituída
observando outros professores notadamente aquele professor de
quem eu estava mais próximo que era o professor Hélvio Auto, ele foi
o grande exemplo da minha vida, não só um exemplo ditico, mas
sobretudo exemplo de vida. Fiz um curso rápido de ditica do
ensino superior. (P6).
Eu tinha vindo de Chicago e lá não havia aula trica. Eu tinha 16
alunos para tomar conta e estudar com eles. Eles me perguntavam
eu tinha que responder e então tinha que estudar o assunto. Cada
aluno tinha um microscópio e uma caixa de lâmina e assim foi feito
em Maceió. (P7).
Eu me dediquei muito ao material ditico, aos livros-texto que hoje
eu não tenho uma cultura, vamos dizer assim uma cultura literária...
Minha formação de professor é exclusivamente autodidata. (P8).
Fizemos um curso de três meses na Faculdade de Educação do
Rio Grande do Sul ,em 1973, para que entendêssemos melhor os
processos psicológicos que se passam no aprendizado. Fiz
estágio de dois anos em Belo Horizonte com o professor Luiz
Bogliolo, especialização em Anatomia Patológica...Estágios em
patologia geral. (P9).
Na década de 1970, a análise das falas dos docentes
evidencia o valor do exemplo dos seus professores em suas
trajetórias de formação, além das especializões, persistindo,
ainda, a marca do autodidatismo:
Isso talvez tenha começado nos próprios bancos da
universidade quando eu era aluno de medicina.Aqueles
professores que me localizaram na pediatria, um Afonso
Lucena, um Luiz Sampaio, um Abelardo Duarte, Adail Pereira.
Esse pessoal me encantou na pediatria. (P10).
Porque a minha formação de universitário foi baseada nos grandes
ídolos dessa terra. Melo Mota foi meu ídolo... Naquele tempo no
Centro de Ciências Biológicas não tinha um ano em que não tivesse
cinco ou seis cursos modulares diferentes.Nós tivemos aula de
portugs, microfotografia, ditica do ensino superior. (P11).
Como eu tinha dito antes, eu fui autodidata, aprendi vendo os outros
fazerem. Fui tentando... Cheguei a fazer um curso sobre ditica,
coisas sicas. (P12).
A construção mesmo, de observar como dar uma aula, como
preparar foi muito minha. Tudo bem. Eu fiz uma especialização em
educação sexual, isso me ajudou um pouco, dede o começo, na
parte da ditica e no mestrado depois. Fiz residência na Bahia.
(P13).
A análise das falas dos docentes da década de 1980 evidencia a importância
da residência médica, do mestrado, da formação ditica. Porém ainda é marcante a
referência à postura autodidata.
Eu sempre tive essa vocação desde menino. Eu comecei
ensinando em colégio a disciplina de ciências e eu sempre tive
essa vontade de ensinar... Eu procurei desenvolver isso durante
a residência fazendo grupo de estudo, clube de revista. Eu
notava que eu tinha facilidade em transmitir, em expor
determinado assunto... Capacidade de resumir, condensar,
transmitir. Então foi um processo muito lento, muito gradativo e
que não acaba nunca... Fiz residência médica no Hospital dos
Servidores do Rio de Janeiro...Há nove anos atrás eu fiz um
curso de pedagogia e didática que me ajudou muito... Uma outra
coisa que me ajudou muito foi um curso de neurolinguística.
(P14).
Foi construída por mim mesma, aos poucos, com erros e acertos que
a gente foi construindo. A gente não tem nenhuma formação. A gente
entra do jeito que saiu do curso. Você não tem preparo nenhum para
exercer a profissão de docente. (P15).
Essa formação, em termos de ser professor, foi meio carente, foi
autoditica, pois as oportunidades que eu tive de fazer a parte
ditica foram muito poucas, pouquíssimas. A instituição não tem
essa preocupação como política de investir no professor. (P16).
Dentro do ambiente universitário, eu fui me interessando e
aprendendo mais. Resolvi fazer s-graduação mesmo sem ser
professora. Quando prestei o concurso, eu já tinha mestrado. Na
realidade foi um processo de apaixonamento. (P17).
A análise das falas dos docentes da década de 1990 evidencia que há
professores cuja trajetória inclui residência médica, mestrado, formação ditico-
pedagógica, doutorado e pós-doutorado. Contudo, permanecem as referências ao
autodidatismo como marca da formação:
.
Na verdade a medicina é aquele sacrifício todo e você vai
procurando coisas para melhorar o seu ganho mensal. Foi realmente
um acaso. (P18).
Eu terminei o curso médico e fui para S.Paulo e fiz a residência,
passei e fiz os dois anos e fui convidado para ir para a Escola, já me
matriculei no mestrado. Nesse período eu achava que deveria
procurar mais alguma coisa para me formar para ser professor. Foi
quando eu fiz na Universidade do Ibirapuera um curso de ditica do
ensino superior de um ano e oito meses, isso em 88/89. E depois já
me inscrevi no doutorado que a gente amadurece muito mais, em
termos de pensamento, de pesquisa do processo da ciência, do
processo de construção de novos conhecimentos. Finalizou com um
s-doutorado, foi quando eu me senti mais livre mesmo para
desenvolver uma pesquisa fora, no exterior. (P19).
Eu acho que comecei gostando, ensinando aos alunos, dando aula
prática, depois aula trica. Eu tive professores que me ensinaram
muito, pela postura, pela própria educação deles, pelo sentido de ser
um professor. (P20).
Tenho a impressão que a formação se deveu ou se deve, todos
estamos construindo, a achar interessante a pessoa ensinar e ter
vontade de aprender mais. Sou autodidata. (P21).
As referências ao modelo de
formação, por um lado, surgem na fala dos
professores como construções baseadas no autodidatismo. Há, portanto, uma
crença no esforço do próprio professor, na elaboração de saberes, na experiência
que bastarão para sustentar a docência em Medicina.
Por outro lado, identifica-se que a inexistência ou falta de sistematização
de uma formação ditico-pedagógica são apontadas pelos professores
entrevistados como falta, lacuna.
Batista e Silva, ao analisarem a lacuna na formação do professor de
Medicina, afirmam:
A questão do preparo do professor de medicina no que se refere aos
aspectos propriamente pedagógicos da ação não tem, geralmente,
merecido atenção. Diferentemente de outras áreas, especialmente
Ciências Humanas, a graduação e especialização do médico não
têm como objetivo a formação de um professor (BATISTA & SILVA,
2001, p.46)
As concepções sobre ser professor de Medicina e sua
formação docente suscitam uma discussão acerca da doncia
como profissão, explicitando uma tradição na qual o ensino na
educação superior emerge como atividade que tem demandando
um menor investimento para seu exercício. (BATISTA & BATISTA,
2002; PIMENTA, ANASTASIOU & CAVALLET, 2002).
Muito embora tenham sido significativos os esforços no
âmbito da qualificação dos docentes universitários, destacando-se
a Nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação (9394/96) e o Projeto
de Reforma Universitária (2005), observa-se que a realidade atual
ainda demandará um tempo para ser superada.
Alguns professores desvelaram uma perspectiva de ensino baseada em
métodos e técnicas, fundando em parâmetros de reprodução endógena, não
valorizando a construção do aprender a ensinar. A presença da ênfase no exercício
da docência como fruto de
vocação ou obra do acaso
revela que a docência para
eles não se configura como uma profissão.
Para Gordan (2004), os professores mais capacitados não atuam na
graduação, que é considerada uma tarefa menor. Isso quer dizer que a erudição e o
ensino não são adequadamente valorizados na graduação, pela mesma não ser
considerada tão importante quando comparada às atividades profissionais, clínicas
ou cirúrgicas e à pesquisa.
Martinez (2004) aponta para a complexidade da formação
do docente, uma vez que esta não se restringe a aspectos didático-
pedagógicos; mostra-se marcada pelas transformões culturais,
poticas e educacionais, características dos modos e das relões
de produzir a existência humana. Explicita-se uma dimeno macro
dos processos de formação de professores, situando-os como
construções sociais e históricas.
Um tro que também emerge dos dados coletados é que,
simultaneamente ao contorno de inscrição potica em um
determinado tempo e espo, refere-se à dimeno pessoal. A
pesquisa de Pimentel (1993) já tematizava essa dimeno,
mostrando o quanto as doncias estão marcadas pelos processos
de internalização das experiências, constituindo identidades como
professores do ensino superior.
As trajetórias de formação indicam, mesmo que em
mero restrito, momentos intencionais (cursos, seminários,
disciplinas no pós-graduação
stricto sensu
) de aprendizagem da
doncia. Mas, talvez, o aspecto mais ressaltado seja a
compreeno da formação como um processo que abrange
múltiplas experiências, encontros, modelos, superando pensar que
tornar-se professor resulta de um itinerário disciplinar e tecnicista.
Tornar-se professor é complexo, plural e multifacetado.
É nesse cenário de intersubjetividades e subjetividades em
construção, que ganha singular importância conhecer e discutir as
experiências de sucesso e as dificuldades relatadas pelos
professores entrevistados.
5.4.2 - Experiências de sucesso: desvelando significados
Tardif (2002) enfatiza que a docência envolve uma complexa rede de
saberes docentes, nos quais as vivências têm um lugar diferenciado. E o que vem
sendo aprendido no cotidiano de ser professor de Medicina?
Um foco investigado refere-se às experiências de sucesso no exercício da
docência médica. A análise das falas dos docentes das cadas de 1950 aponta
para experiências de sucesso que envolvem ações centradas no próprio professor: o
compromisso com uma interação boa com os alunos, a disponibilidade para ajudar
os estudantes, a criação de disciplinas e de outras iniciativas pedagógicas como a
criação da Unidade Técnica de Ensino.
Eu tive muita sorte, primeiro eu era rigoroso e em segundo lugar eu
tinha uma relativa facilidade de expressão, responsabilidade – uma
boa relação com o aluno...Eu nunca dei uma aula sem antes ler por
três ou quatro horas. (P1).
Um período muito produtivo para mim, muito construtivo e, sobretudo
no aspecto afetivo. Os alunos foram todos meus amigos e continuam
sendo...A experiência que deu certo foi a criação da disciplina
medicina sócio-cultural. Foi um nome dado por mim. (P2).
O desafio de viver numa época em que s convivíamos com
determinadas doenças absolutamente crônicas. Como os
pacientes com esquistossomose. Mostrar ao aluno as condutas,
os casos raros, em que s dedivamos um estudo intenso
para repassar ao aluno. Quando diretor do Centro de Ciências
Biológicas praticamente obriguei, forcei para que todos
tivessem uma formação. Naquele tempo a gente fazia curso de
métodos e técnicas pedagógicas para os professores e
enviávamos para um centro que existia no Rio de Janeiro.
Criamos a Unidade Técnica de Ensino que era uma novidade na
Universidade. (P3).
Eles não podiam comprar os livros que nem existiam nas livrarias
daqui. Eu liberava os meus livros e os colocava a disposição dos
estudantes. (P5).
Nessa década, apenas um professor revelou não ter qualquer experiência
de sucesso.
Nos anos 60, os professores já anunciam referências ao sucesso com
situações de construção de conhecimento, na medida em que começam a introduzir
novas práticas metodológicas, a exemplo das dimicas de grupo. Foram tamm
realçados o ensino integrado e a importância das relações interpessoais,
representando um suporte e um apoio nos momentos iniciais da carreira:
A coisa mais marcante na minha carreira de professor, até porque
um professor sem qualificação, eu entrei recém-formado, foi o
estímulo das primeiras turmas que ensinei, eram pessoas que eram
meus contemporâneos de faculdade. (P6).
A maior experiência que eu passei como professor foi adaptar as
técnicas de dimica de grupo para o ensino médico. Aí se exigia
não mais que o professor desse aula magistral, aquela aula
conceitual sobre o assunto mas sim que ele determinasse aos alunos
que estudassem aqueles assuntos pelos mais diversos livros,
formassem grupos de estudo. (P7).
E aí quando eu voltei já tinha sete Estados, s fomos o oitavo a
entrar no Ensino Integrado. Qual a vantagem disso?Era um
projeto do Ministério, que ajudava, inclusive financeiramente,
montando novos laboratórios. A integração tem várias
vantagens principalmente para os alunos. (P9).
A análise das falas docentes da década de 1970
evidenciou, como núcleos relativos às experiências de sucesso, o
investimento na formação de s-graduação (doutorado), a
participação no Projeto Rondon e na execução da Cartilha
Nacional de Saúde e as possibilidades de associação teoria e
prática:
O ápice que eu consegui foi ser aceito em Ribeirão Preto, no
mestrado que terminou se transformando no doutorado porque
foi considerada a experiência como docente na Universidade
Federal de Alagoas. No como da década de 1980 fui para
Fortaleza fazer um curso de Métodos e Técnicas de Ensino.
(P10).
Fiz várias experiências, inclusive com os alunos, especialmente,
esses que vinham no Projeto Rondon, o pessoal que chegava
aqui do Brasil todo.Ele passava pela parasitologia para eu dar
uma idéia onde ia encontrar tracoma, esquistossomose, Chagas,
isso os alunos adoravam. A Cartilha de Saúde Brasileira foi
nascida aqui no quartel comigo e o Newton fazendo com que
todos os soldados que entrassem no quartel, todos eles, tinham
que fazer um perfil das principais doenças da região. (P11).
Eu fiz uma coisa que eu nunca vi ninguém fazer: em
determinadas patologias, eu juntava um grupo de pacientes e
em vez de dar aula teórica sobre o assunto, eu levava o paciente
e a gente fazia aula teórico-prática e os alunos realmente
adoravam, pacientes de gota, de lúpus, ficava como um livro ao
vivo. (P12).
Eu acho que a prática é realmente o melhor, é o que eu gosto
mais... Sempre lidei com os residentes. Tenho residentes que
até hoje me procuram para ouvir a minha opinião. (P13).
Na análise das falas dos docentes da década de 1980,
identifica-se o interesse pela implantação de novas práticas
metodológicas, de um serviço de Nefrologia, além da referência à
regulamentação da Residência Médica e do destaque à prática.
Durante o período em que eu fui coordenador da comissão de
residência médica da Universidade foi justamente de 89 a 91
onde eu pude regulamentar a residência médica... Outra coisa é
o mestrado, com a introdução na nossa área da anestesia local
para a operação das hérnias inguinais. (P14).
Quando eu entrei, o tipo de prova da endocrinologia era aquela
de perguntas e respostas. Médico tem que ser prático. Comecei
a fazer casos cnicos. (P15).
Depois dessa especialização que a gente fez em Ensino Médico
houve a oportunidade de implantar novas metodologias, se
aproximar mais do aluno, fazer uma avaliação mais completa.
(P16).
O fato de a gente ter o ambiente de nefrologia foi uma vitória
muito grande. (P17).
Na década de 1990 observa-se o sucesso vinculado à
valorização de aulas práticas e, tamm, emerge o reconhecimento da
necessidade da qualificação acadêmica:
Eu sempre procurei passar nas minhas aulas um pouco mais do dia
a dia. Tentei atrair o aluno colocando um pouco mais de praticidade
nas minhas aulas. (P18).
Eu acho que foi assim que eu cheguei em Alagoas ter ido a
Universidade Federal de Pernambuco e operacionalizar um convênio
com a Universidade Federal de Alagoas. (P19).
Observa-se nos professores entrevistados que seus relatos vão dar
destaque a alguns avanços no âmbito, na relação professor-aluno, na introdução
das aulas práticas. Raras foram as experiências associadas a questões mais amplas
da instituição acadêmica. Identifica-se que mesmo os avanços, as citadas
experiências de sucesso, quando eram no campo do ensino e da aprendizagem,
sempre se configuraram como iniciativas pessoais, não havendo um projeto e uma
gestão acadêmica que articule a totalidade, redundando em ações isoladas. E aí
parece se expressar o traço de centralidade na figura do professor, suas atitudes e
práticas, que marca as experiências de sucesso apreendidas.
Compreender onde os professores localizam as suas
práticas bem sucedidas, observando o lugar que situam o aluno e o
conhecimento, pode contribuir na discussão e proposição de
espos formativos que valorizem as vivências e conhecimentos
construídos no cotidiano docente em Medicina.
Ao utilizar a proposição de Zabalza (2004), identificação das dimensões
profissional, pessoal e administrativa, pode-se inferir uma significativa ênfase nos
aspectos pessoais na atribuição de sucesso, parecendo anunciar um campo
bastante fecundo para futuras investigações.
5.4.3 - Dificuldades na prática docente
Na análise das falas dos docentes da década de 1950, observa-se que
parte dos professores compreende que não teve dificuldades no exercício da
docência, havendo, contudo, relatos de que as dificuldades abrangiam o preconceito
em relação a determinadas disciplinas do currículo médico e a escassez de
materiais/equipamentos para viabilizar o ensino:
A grande dificuldade era que as disciplinas de psiquiatria e
neurologia eram vistas como muito afastadas do currículo geral do
curso de medicina, o que não era verdade, era um preconceito...
Eram vistas como disciplina para fantasiar o curso, para completar o
curso. Não eram vistas como base, como essenciais à formação do
estudante. (P2).
Iniciei, a faculdade estava de esmola. Acho que foi o Ib que levou
dias depois um microscópio. (P5).
Os professores da década de 1960 realçaram dificuldades no âmbito
material, interpessoal e da pesquisa:
Dificuldades não na docência em si. Nós tivemos dificuldades
materiais. (P6).
As dificuldades foram que você fazer carreira de pesquisa
profissional no Nordeste é muito ingrato. Ingrato economicamente e
pior ainda, ingrato intelectualmente. (P7).
Então você chegava na sala de aula não havia esse relacionamento
com o aluno, o professor passava a ser uma pessoa diferenciada,
distante dos alunos. (P8).
A dificuldade sempre foi financeira.Infelizmente temos que dizer isso.
Que dificuldade eu tive para ter um projetor de slide... Às vezes eu
queria projetar um slide. Você sabe, na patologia é muito bom ver a
foto. Até tamm, minha filha, claro, os nossos salários, lamento
dizer, são aviltantes. (P9).
Na década de 1970, emergem as dificuldades relativas à falta de
professores, à ausência de preparo ditico-pedagógico, às necessidades materiais,
às relações interpessoais e às restritas possibilidades de inovações curriculares.
Encontrar algumas pessoas que bloqueavam... Como primeiro
coordenador do curso de medicina da UFAL, então quando eu
cheguei eu lidei com os meus antigos professores, eu estava
tentando elaborar um novo plano de carreira para as diferentes
disciplinas inclusive com um material como devia trabalhar,
lidar com os alunos, inclusive os currículos. Eu fui com um
grupo que estava me apoiando, a gente preparou isso tudo.
Então, a gente teve dificuldade de implantar essa alteração nos
currículos da universidade, todas as cadeiras da área de
medicina. (P10).
Eu aprendi a ser uma pessoa independente. Eu reconheço que tive
alguns problemas com alguns professores, mas só que eu ganhei
todas porque quem tem ética e moral não perde não. Problemas de
relacionamento. (P11).
Foram dificuldades inerentes ao nosso meio. Para onde a gente vai,
para um ambulatório do SUS a gente tem dificuldade. Na minha
disciplina, além de dificuldade de material, s somos muito poucos.
(P13).
A carência de condições materiais adequadas e a falta de
um apoio didático-pedagógico para o professor de medicina foram
situadas como dificuldades pelos professores dos anos de 1980:
Sim. Eu tive dificuldade no exercício da doncia porque s
não fomos preparados para ser professores. Eu tinha a vocação
mas não tinha a técnica, com o mestrado voltei a estudar
didática e pedagogia. (P14).
Olha a maior dificuldade é em termos de recursos. Recursos que a
gente não tem. Infraestrutura de local, muito aluno e pouco local para
a gente fazer prática de ensino. (P15).
Principalmente a falta de recursos, pessoal, remuneração. (P16).
A falta de infra-estrutura sem vida nenhuma... Este é o aspecto
mais complicado para lidar: a falta de preparo para ser docente.
(P17).
A ênfase na questão dos recursos didáticos e da infra-
estrutura marca os depoimentos dos docentes da década de 1990:
Até para você dar uma aula expositiva não tem material. Muitas
vezes você tem que levar o seu material, eu levo o meu computador,
datashow para melhorar um pouco a ditica. (P18).
A gente não tem laboratório, o biotério da Universidade não funciona
de forma adequada. (P19).
Na realidade, a universidade, aqui em Alagoas,começou muito tarde.
Ela não incentiva ao professor. (P20).
São as dificuldades de ordem material, de apoio, técnicas, de modo
que falar da questão salarial porque é uma unanimidade.Então, você
não tem, hoje, um datashow, você não dispõe na sala de aula de
equipamentos para que você possa transmitir melhor aquilo que você
já assimilou nos congressos. (P21).
A leitura e a discussão das dificuldades apontadas pelos
professores entrevistados permitem reconhecer a recorrência da
queixa em relação às condições materiais e infra-estruturais (o que
é compartilhado por docentes de outras áreas da universidade
pública brasileira), anunciando, mesmo que em um nível diferente,
a questão da falta de formação docente no campo da doncia
médica. Em um grupo que valorizou a relação professor-aluno no
processo ensino-aprendizagem, a dimeno relacional abrange, no
âmbito das dificuldades, as interões com os pares e os limites de
ruptura com modelos já consolidados.
Por entre as vivências exitosas e os cotidianos difíceis, há de se construir
um caminho do meio:
A superação permanente dos limites, que, uma vez negados, são
substituídos por novos, geralmente mais complexos e difíceis, implica
em não se incidir em posturas extremadas. Nem na postura
onipotente, com expectativas exageradas na capacidade
transformadora da educação médica, nem na postura negativista,
ditada pelo determinismo estrutural, que subordina toda e qualquer
mudança às regras da infra-estrutura econômica, às características
dos serviços de saúde e dos modelos de atenção ou às condições da
prática médica. (ALMEIDA, 1999, p. 174).
Parece que os problemas que hoje afligem as universidades públicas têm
focos na carência de recursos humanos qualificados, na falta de recursos financeiros
suficientes para equipar laboratórios, bibliotecas, nos salários de professores e
técnico-administrativos. De 1950 até os nossos dias pode-se verificar que as
mudanças almejadas pelos que fazem a universidade pública ainda estão por vir, o
que pode justificar falas semelhantes entre os professores de diferentes cadas.
O caminho analítico que foi empreendido a partir dos depoimentos dos
professores entrevistados configura possibilidades de interpretação que estão
condicionadas pelas produções científicas que constituíram a revisão de literatura e,
tamm, pelas lentes singulares de uma professora médica que, do lugar de
pesquisadora, procurou construir uma reflexão sobre as concepções e trajetórias de
seus pares, em perspectiva crítica, integradora, e, principalmente, imbuída da crença
e do prazer de experienciar a docência médica.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Contribuir com um movimento de esforço coletivo entre os docentes do
Curso de Medicina da Universidade Federal de Alagoas foi a razão primeira para o
desenvolvimento desta pesquisa. Conhecer a história dos professores de medicina,
que durante cinco décadas vêm formando os médicos em Alagoas, foi o principal
estímulo, no momento em que profundas transformações ocorrem no processo de
formação de médicos.
Esta pesquisa foi orientada pelas questões: O que pensam professores
médicos que atuam ou atuaram na UFAL, desde os anos 50 até a década de
1990, sobre os processos de ensinar e aprender em Medicina? Como estes
compreendem as suas trajetórias de formação?
O enfoque adotado, do ponto de vista metodológico, valorizou a fala dos
professores, procurando desvelar significados que possam contribuir para uma
compreensão ampliada da docência no Curso de Medicina da Universidade Federal
de Alagoas. Portanto, não houve pretensão de respostas prontas e definitivas, mas
um nível de aproximação que possibilitasse conhecer a realidade de docentes que
construíram e/ou constroem seus cotidianos acadêmicos no ensino médico.
Na perspectiva de que o conhecimento é uma construção, importante é
socializar análises que, articuladas a outras investigações, configurem respostas
possíveis em tempo e espaços historicamente condicionados. Nesse sentido, como
um primeiro achado apreendido nesta investigação, detectou-se a compreensão
do ensinar e do aprender em Medicina: os professores entrevistados destacaram a
dimensão relacional entre o professor e o aluno.
Nas diferentes cadas, os docentes acreditam que manter um
relacionamento interpessoal, caracterizado pelo diálogo, pelo respeito e pelo
compromisso, torna-se condição fundamental na formação médica. Chamou
atenção, entretanto, que várias foram as referências ao ensino em sua face de
transmissão de informações, com os movimentos de aprendizagem como
construção ficando em um segundo plano.
O crescimento do debate contemporâneo sobre as relações professor-
aluno, médico-paciente, médico-comunidade, médico-equipe de saúde, no qual os
temas de humanismo e ética ganham singular realce, sem vida confere a esse
aspecto apreendido a partir uma relevância e pode ser um sinalizador de que novos
estudos poderão aprofundar e qualificar o que tem sido concebido como
relacionamento saudável no curso de Medicina.
Imbricado com a dimensão da relação professor-aluno, emergiu, como um
segundo achado, a centralidade da aula expositiva na prática docente dos
professores entrevistados. Tímidas foram as incursões em estratégias de ensino
problematizadoras e que situam o aluno como sujeito ativo. Percebe-se que as
concepções sobre o processo ensino-aprendizagem indicam uma situação de
transição de valores, pressupostos e saberes sobre o trabalho do professor de
Medicina como um mediador crítico.
E as falas dos professores revelam que essa transição traduz tanto
processos muito diferenciados de inserção na profissão docente (convite,
necessidade administrativa e pedagógica, experiência anterior no ensino médio,
tradição familiar), como trajetórias bastante diferenciadas no que tange à formação
docente. Eis um terceiro achado.
Os percursos formativos que foram explicitados pelos professores, foco
privilegiado na pesquisa, mostraram que se aprende a ser professor na prática
cotidiana, com o exemplo do outro, com cursos sistemáticos. Todavia, houve uma
significativa convergência na referência ao autodidatismo, o que pode representar
que os docentes de Medicina não têm tido interlocutores sistemáticos no âmbito da
educação médica, ficando os movimentos de formar-se professor como decorrência
de um esforço, desejo e decisão pessoal.
Inscreve-se uma dicotomia bastante séria para o encaminhamento do
ensino médico, uma vez que as dimensões institucional e política ficam silenciadas,
estabelecendo-se não uma condição assumida coletivamente, mas projetos
individuais de procurar cursos, semirios, disciplinas. Nesse contexto, recoloca-se
o importante papel que a pós-graduação stricto sensu pode exercer na formação de
quadros docentes para o ensino superior, contribuindo para superar o hiato entre
ensinar e pesquisar. Esse desafio permanece como caminho a ser construído na
história dos Programas de Mestrado e Doutorado brasileiros.
Houve uma referência a um Curso de Especialização em Educação
Médica, situando que essa experiência potencializou novas práticas metodológicas
em sala de aula, com ênfase na construção do conhecimento e diminuição relevante
do número de aulas tricas, além de uma reflexão constante sobre o ensinar e o
aprender. Talvez esse seja uma alternativa a ser estudada como possibilidade de
formação docente em Medicina.
Como os achados são sempre complexos e mutifacetados, há um aspecto
singular no autodidatismo que abrange uma ampliação do conceito de formação,
pois esta não se restringe a cenários intencionalmente estruturados, mas abarca as
diferentes e múltiplas interações que marcam a docência. Assim, investigar sobre
formação é, tamm, perguntar sobre a pessoa do professor, compreendendo que
este vai se formando cotidianamente.
Essa concepção de formação já vem sendo debatida nos fóruns de
produção científica, mas cada investigação que corrobore a questão da
subjetividade na profissão docente, contribui para que novas pesquisas possam
avançar no sentido de articular o sujeito, a instituição, o contexto das políticas
públicas de saúde e de educação.
E, no processo de conhecer os saberes que os professores entrevistados
foram construindo em suas práticas, instigantes foram os achados no plano das
experiências de sucesso, nas quais as atitudes dos docentes tiveram uma grande
centralidade, e das dificuldades, vinculadas fortemente às condições infra-estruturais
e de remuneração.
Parece que aqui volta a ser enunciado a transição, pois ter êxito como
professor ainda emerge como algo que parte de quem ensina, não havendo muito
espaço para que o sucesso possa ser reconhecido como uma conquista de parceria
com alunos, pares, comunidade, paciente.
Na mesma direção, as reais e efetivas dificuldades (denunciadas nos
movimentos docentes)relativas às verbas e condições de trabalho parecem nublar
referências a outros patamares que situem o docente, suas relações com o
conhecimento, com as políticas mais amplas, com os alunos.
Um achado bastante significativo foi apreendido: o conceito clássico de
que um bom médico é automaticamente um bom professor foi desmistificado pelos
professores entrevistados. Por caminhos diversos, instauram-se condições para que
se supere a linearidade entre a prática na especialidade médica e a prática docente,
favorecendo com que se discuta e se proponha mais firmemente no campo da
profissionalização do professor de Medicina.
Esses achados, na ótica de pesquisadora, configuram momentos de
aprendizagem da docência médica, resignificando o que é ser professor (presentes
foram as referências ao gostar do que faz, à necessidade de formação docente, aos
exemplos inesquecíveis) e sinalizando potencialidades para e na formação médica.
Assim, por entre concepções, práticas e trajetórias de formação, conclui-se esta
pesquisa acreditando que, afinal, mestre não é quem sempre ensina, mas quem
de repente, aprende (Guimarães Rosa).
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9 ANEXOS
ANEXO I:
Termo de Consentimento do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade
Federal de São Paulo / Hospital São Paulo
ANEXO II:
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Para a realização da pesquisa, Concepções, Trajetórias e Perspectivas na
Formação de Professores Médicos: Um Estudo na Universidade Federal de Alagoas,
essas informações estão sendo fornecidas objetivando sua participação voluntária
neste trabalho, que visa fazer um estudo qualitativo sobre a formação do professor
médico ao longo dos últimos cinqüenta anos, na Universidade Federal de Alagoas.
As entrevistas serão orientadas por um roteiro, sendo com sua permissão
gravadas e transcritas para posterior análise dos dados. Nesse sentido, não há
riscos nem desconfortos previstos para os participantes.
Ao final do estudo, poderemos concluir que, conhecendo a realidade passada e
presente da formação do professor médico, pode-se ter subsídios para mudanças
curriculares e de formação continuada dos professores que constroem seus
trabalhos pedagógicos no cotidiano das escolas médicas brasileiras.
Em qualquer etapa do estudo, você terá acesso aos profissionais
responsáveis pela pesquisa para esclarecimento de eventuais vidas. O principal
investigador é a Dra Ângela Maria Moreira Canuto de Mendonça que pode ser
encontrada no endereço Rua Coronel Lisboa. 837 – CEDESS/UNIFESP, telefone
(11) 5549-0130.
Se você tiver alguma consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa,
entre em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) Rua
Botucatu,572 – 1 andar- cj. 14, 5571-1062, FAX: 5539 – 7162 – e-
mail: cepunifesp@epm.br.
É garantida a liberdade da retirada de consentimento a qualquer momento
e deixar de participar do estudo, sem qualquer prejuízo a continuidade de sua
permanência na Instituição.
As informações obtidas serão analisadas em conjunto com outros sujeitos
da pesquisa, não sendo divulgada a identificação de nenhum participante. Fica
assegurado, tamm, o direito de ser mantido atualizado sobre os resultados
parciais das pesquisas, quando em estudos abertos, ou de resultados que sejam do
conhecimento dos pesquisadores.
Não há despesas pessoais para o participante em qualquer fase do estudo.
Tamm não há compensação financeira relacionada à sua participação. Se existir
qualquer despesa adicional, ela será absorvida pelo orçamento da pesquisa.
Comprometo-me como pesquisadora principal, a utilizar os dados e o material
coletados apenas para esta pesquisa.
Acredito ter sido suficientemente informado a respeito das informações que li,
descrevendo o estudo Concepções, Trajetórias e Perspectivas na Formação de
professores médicos: um estudo na Universidade Federal de Alagoas.
Eu discuti com a Dra Ângela Maria Moreira Canuto de Mendonça sobre a
minha decisão em participar nesse estudo. Ficaram claros para mim quais são os
propósitos do estudo, os procedimentos a serem realizados, as garantias de
confidencialidade e de esclarecimentos permanentes. Ficou claro tamm que a
minha participação é isenta de despesas e que tenho garantia ao acesso aos dados
quando necessário. Concordo voluntariamente em participar deste estudo e poderei
retirar o meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o mesmo, sem
penalidades ou prejuízo ou perda de qualquer benefício que eu possa ter adquirido,
ou no meu atendimento nesta Universidade.
Assinatura do participante Data
Assinatura da testemunha Data
ANEXO III:
Roteiro da Entrevista
Caro professor (a)
Gostaria de contar com a sua participação na presente investigação
concedendo-me esta entrevista.
Agradeço desde já a sua disponibilidade.
Atenciosamente,
Ângela Canuto
PARTE I: Situando o professor:
Nome:
Ano de formatura:
Onde se formou:
Especialização:
Professor: ativo ( ) aposentado ( )
Tempo de docência:
Disciplina em que atua ou atuou:
Atividades Acadêmicas que desenvolve:
Ensino ( ) Pesquisa ( ) Extensão ( ) Gestão Universitária ( ) Outras ( )
PARTE II Conhecendo aspectos da trajetória docente:
1) Com quantos anos ingressou na carreira docente?
2) Relate como aconteceu a sua inserção na carreira docente, destacando o
que o motivou a ser professor.
3) Conte uma experiência que considera de sucesso em sua carreira como
professor de medicina.
4) Relate uma situação que configure dificuldades no exercício da docência.
PARTE III Conhecendo sentimentos e concepções:
5) Como se sente ou se sentiu como professor médico?
6) Como compreende o aluno, o professor e o processo ensino-
aprendizagem?
7) Ser um bom médico é suficiente para ser um bom professor de medicina.
Qual a sua opinião sobre esta afirmativa?
PARTE IV Discutindo a formação docente:
8) Como foi sendo construída a sua formação para ser professor de
medicina?
9) Qual a importância, na sua opinião, da formação ditico-pedagógica para o
professor de medicina?
10) Que conteúdos e estratégias poderia sugerir para encontros que tivessem a
intenção de contribuir para a formação do professor.
11) Ser professor de medicina implica em... Como continuaria esta afirmativa?
12) Comentários.
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