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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CONCEPÇÕES DE PROFESSORES EM AVALIAÇÃO, EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA E EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: BUSCANDO
INTERFACES
Emerson da Silva Ribeiro
Cuiabá – MT
2007
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
CONCEPÇÕES DE PROFESSORES EM AVALIAÇÃO, EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA E EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: BUSCANDO
INTERFACES
Emerson da Silva Ribeiro
Dissertação de Mestrado apresentada ao
Programa de s-Graduação em
Educação, do Instituto de Educação da
Universidade Federal de Mato Grosso,
como parte dos requisitos para obtenção
do título de Mestre em Educação, na área
de concentração Teorias e Práticas
Pedagógicas da Educação Escolar
Matemática, e da Linha de Pesquisa
Educação em Ciências, sob a orientação
da professora Dra. Marta Maria Pontin
Darsie.
Cuiabá – MT
2007
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FICHA CATALOGRÁFICA
Índice para Catálogo Sistemático
1. Educação Matemática
2. EJA
3. Avaliação
4. Concepções docentes
R484c Ribeiro, Emerson da Silva
Concepções de professores em avaliação, educação
matemática e educação de jovens e adultos: buscando
interfaces / Emerson da Silva Ribeiro. _ _ Cuiabá:
UFMT/IE, 2007.
251p.: il.
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
s-Graduação em Educação, do Instituto de Educação da
Universidade Federal de Mato Grosso, como parte dos
requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação,
na área de concentração Teorias e Práticas Pedagógicas da
Educação Escolar Matemática, e da linha de pesquisa
Educação em Ciências, sob a orientação da professora Dra.
Marta Maria Pontin Darsie.
Bibliografia: p. 237-245
Apêndices: p. 246-251
CDU _ 372.47:374.3/.7
DEDICATÓRIA
A DEUS,
fonte de toda inspiração e sabedoria.
AOS MEUS PAIS,
Cícero José Ribeiro e Maria de Fátima da
Silva, pelo exemplo de vida e fidelidade que
me legaram como herança, dando-me a
oportunidade e contribuindo para ser quem
eu sou.
À MINHA ESPOSA,
Renata Gonçalves Aguiar, pelo amor, pelo
incentivo e compreensão, e por ser mais que
uma amiga durante todo o caminho que
Deus nos permitiu estar juntos.
AGRADECIMENTOS
A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realizão deste
trabalho.
E meu especial agradecimento:
Em primeiro lugar a Deus, fonte de inspiração e de vida, por seus inesgotáveis
ensinamentos.
Aos meus pais, Cícero e Fátima, pela suavidade com que olharam sempre para
mim e pela formação que me proporcionaram para poder chegar ao final deste e de outros
desafios.
À minha esposa, Renata, pelo amor e amizade, pela compreensão, pela partilha
da vida, pelo apoio constante em meu caminhar e pela alegria de podermos compartilhar
este momento.
À Profa. Dra. Marta Maria Pontin Darsie, minha orientadora, pela orientação
no desenvolvimento deste trabalho, pela rica contribuão para a minha formação
profissional, pela oportunidade e por ter acreditado em mim, aceitando-me como seu
orientando. Muito Obrigado!
Aos professores participantes desta pesquisa e à Direção da Escola Estadual
Emília de Figueiredo, cuja disponibilidade e vontade de colaborar foram indispensáveis na
concretização desta investigação.
À Profa. Dra. Anna Regina Lanner de Moura e à Profa. Dra. Irene Cristina de
Mello, pela leitura respeitosa e criteriosa, e pelas sugestões que muito contribuíram para a
realização deste estudo.
Aos meus irmãos Everton e Viviane da Silva Ribeiro, pela alegria de sermos
uma família.
À minha sogra Maria Bernadete Veras Aguiar, pelo carinho e incentivo, e por
ter ficado ainda mais próxima da minha esposa durante minha ausência.
À família Franco Borges, representada pelos eternos amigos João Batista,
Delciene e Amanda, pela constante dedicação e solidariedade.
Aos mestres que tive na Universidade Federal de Ronnia (UNIR), que me
iluminaram pelos seus conhecimentos e experiências, contribuindo para o meu crescimento
acadêmico. Em especial os professores: Aparecida Augusta da Silva, Marlos Gomes de
Albuquerque e Eliane Maria Feitosa de Sales Reis. E também ao Prof. Carlos Reis pela
leitura deste trabalho.
Às minhas afilhadas amadas Camila e Fernanda Fernandes Cruz, e ao meu
sobrinho e afilhado Pedro Henrique Pimentel Ribeiro, pelos momentos de alegrias, nos
mostrando o quanto vale a pena viver quando vemos um sorriso doce nos lábios de uma
criança.
Aos meus cunhados Leonardo José Gonçalves Aguiar e Crislaine Pimentel; ao
meu tio José Lourenço da Silva Filho; e aos meus compadres tia Fernandes Mota Cruz e
Antonio da Cruz, pelo carinho.
À minha parceira para todas as horas durante nossa jornada no mestrado: Edina
Coleta Santiago. Também às amigas Ana Karina, Ruth Cristina da Palma, Vera Tanus e
Fernanda Candido.
Aos amigos que tive o prazer de conhecer em Cuiabá: André, Fernanda e
Juliana; Pedro e Cleuseli.
Aos funcionários da secretaria do Mestrado e também amigos: Luísa, Mariana,
Geison e Simone, sempre dispostos a despender atenção e simpatia.
Aos colegas do Departamento de Matemática da Universidade do Estado de
Mato Grosso (UNEMAT), campus de Sinop, pela compreensão dado os momentos em que
tive que me ausentar.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
pelo suporte financeiro.
Enfim, a todos os outros amigos, conhecidos ou desconhecidos, virtuais ou
presenciais, pela interação positiva e cota de participação intelectual e/ou afetiva na
realização desse trabalho. E como são tantos, deixo os nomes no anonimato para que cada
um se sinta importante, nem mais, nem menos, simplesmente importante, nesse processo.
RESUMO
RIBEIRO, Emerson da Silva. Concepções de professores em avaliação, Educação
Matemática e Educação de Jovens e Adultos: buscando interfaces. 2007. 251f. Dissertação
(Mestrado em Educação em Ciências) Instituto de Educação, Universidade Federal de
Mato Grosso, Cuiabá.
Este trabalho se insere no âmbito das pesquisas que buscam aprofundar a compreensão e
desvelar a realidade da avaliação e da Educação Matemática no contexto da Educação de
Jovens e Adultos (EJA). Incidi sobre a problemática investigativa: quais as interfaces
possíveis de serem estabelecidas entre as concepções de avaliação, de Educação
Matemática e de Educação de Jovens e Adultos de professores que atuam em uma escola
pública de Cuiabá voltada exclusivamente ao atendimento dessa modalidade. Esta pesquisa
alicerçou-se nos pressupostos teóricos de autores que se dedicam aos estudos sobre a EJA,
a Educação Matemática e a Avaliação Escolar, contribuindo para a construção de teorias
sobre essas áreas. A metodologia fundamentou-se na abordagem de investigação
qualitativa, tendo em vista as suas potencialidades em possibilitar ao investigador a busca
da explicação aprofundada e da compreensão de fenômenos complexos, como os que
fazem parte do contexto educacional. Tendo como sujeitos da pesquisa três professores de
Matemática da EJA, este trabalho se utilizou de quatro questionários e uma entrevista
semi-estruturada como instrumentos de coleta de dados, que foram aplicados junto a cada
um dos professores participantes da pesquisa. O primeiro questionário teve por objetivo
caracterizar alguns dados pessoais, a formação acadêmica e a experiência profissional
destes sujeitos. Os outros três questionários e a entrevista permitiram obter informações
sobre as concepções dos sujeitos pesquisados a respeito da avaliação e do processo de
ensino-aprendizagem da Matemática na EJA, e também acerca dessa modalidade. Para a
análise das informações obtidas a pesquisa baseou-se na perspectiva da abordagem
interpretativa. Os resultados desse estudo revelam que os significados atribuídos pelos
sujeitos pesquisados para cada uma das áreas constituintes da tríade EJA, Educação
Matemática e Avaliação se relacionam entre si, demonstrando haver interfaces entre as
concepções dos professores participantes da pesquisa para cada um dos temas em
discussão nessa investigação. Esses resultados evidenciam ainda a presença dos
pressupostos teóricos do velho e do novo modelo de educação nas concepções dos sujeitos
da pesquisa, mesmo que em alguns casos um modelo predomine sobre o outro.
Palavras-chave: Concepções docentes; Avaliação; Educação Matemática; EJA.
ABSTRACT
RIBEIRO, Emerson da Silva. Conceptions of professors in evaluation, Mathematical
Education and Adult Young Education: searching interfaces. 2007. 251f. Dissertação
(Mestrado em Educação em Ciências) Instituto de Educação, Universidade Federal de
Mato Grosso, Cuiabá.
This work if inserts in the scope of the research that they search to deepen the
understanding and to show to the reality of the evaluation and the Mathematical Education
in the context of the Adult Young Education (EJA). It happens on the inquiry of the
problematic one: which the possible interfaces to be established between the conceptions
of evaluation, Mathematical Education and Adult Young Education of professors who act
in a public school of Cuiabá come back exclusively to the attendance of this modality. This
research was based in the estimated theoreticians of authors who if dedicate to the studies
on the EJA, the Mathematical Education and School Evaluation, contributing for the
construction of theories on these areas. The methodology was based on the boarding of
qualitative inquiry, in view of its potentialities in making possible to the investigator the
search of the deepened explanation and the understanding of complex phenomena, as the
ones that are part of the educational context. Having as citizens of the research three
professors of Mathematics of the EJA, this work if used of four questionnaires and a half-
structuralized interview as instruments of collection of data, that had been applied next to
each one of the participant professors of the research. The first questionnaire had for
objective to characterize some personal datas, the academic formation and the professional
experience of these citizens. The others three questionnaires and the interview had allowed
to get information on the conceptions of the citizens searched regarding the evaluation and
of the process of teach-learning of the Mathematics in the EJA, and also concerning this
modality. For the analysis of the gotten information the research was based on the
perspective of the boarding of the interpretation. The results of this study disclose that the
meanings attributed for the citizens searched for each one of the constituent areas of triad
EJA, Mathematical Education and Evaluation if they relate between itself, demonstrating
to have interfaces between the conceptions of the participant professors of the research for
each one of the subjects in quarrel in this inquiry. These results still evidence the presence
of the estimated theoreticians of the old one and the new model of education in the
conceptions of the citizens of the research, exactly that in some cases a model
predominates on the other.
Key-words: Teaching conceptions; Evaluation; Mathematical Education; EJA.
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1. Características da EJA nas Perspectivas do Velho e Novo Modelo
Educacional .........................................................................................
051
QUADRO 2. Características da Educação Matemática nas Perspectivas
Excludente e Inclusiva ......................................................................
074
QUADRO 3. Características da Avaliação nas Perspectivas Excludente e Inclusiva
124
QUADRO 4. Caracterização Pessoal e Formação Acadêmica dos Sujeitos da
Pesquisa ...............................................................................................
135
QUADRO 5. Caracterização Funcional e Experiência Profissional dos Sujeitos da
Pesquisa ...............................................................................................
135
LISTA DE SIGLAS
ABC – ão Básica Cristã
ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas
ANPED – Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação
CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEAA – Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos
CEB – Câmara de Educação Básica
CEE/MT – Conselho Estadual de Educação de Mato Grosso
CEMPEM – Centro de Estudos, Memória e Pesquisa em Educação Matemática
CES – Centro de Ensino Supletivo
CNBBConferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNE – Conselho Nacional de Educação
COEJA – Coordenação de Educação de Jovens e Adultos
CONFINTEA – Conferência Internacional sobre Educação de Adultos
DEEB – Diretoria de Estatísticas da Educação Básica
EJAEducação de Jovens e Adultos
ENEJA – Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos
ENEM – Encontro Nacional de Educação Matemática
FPDEJA – Fórum Permanente de Debates sobre a Educação de Jovens e Adultos
Fundação Educar – Fundação Nacional para Educação de Jovens e Adultos
GRUEPEM – Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Matemática da UFMT
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
IPAE – Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação
LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEB – Movimento de Educação de Base
MEC – Ministério da Educação e Cultura
MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização
PEI – Programa de Educação Integrada
PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PNE Plano Nacional de Educação
PPP – Plano Potico Pedagógico
SBEM – Sociedade Brasileira de Educação Matemática
SBEM-RO – Sociedade Brasileira de Educação Matemática em Rondônia
SEA – Serviço de Educação de Adultos
SEDUC/MT – Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso
SEF – Secretaria de Educação Fundamental
SIPEM – Seminário Internacional de Pesquisa em Educação Matemática
UFMTUniversidade Federal de Mato Grosso
UNDIME – União dos Dirigentes Municipais de Ensino de Mato Grosso
UNE – União Nacional de Estudantes
UNEMATUniversidade do Estado de Mato Grosso
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura
UNIC – Universidade de Cuia
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
UNIR – Universidade Federal de Rondônia
UNIVAG – Universidade de Várzea Grande
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .........................................................................................................
013
CATULO I – O CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS .... 021
1.1 – Breve Histórico da Educação de Jovens e Adultos no Brasil ...................
021
1.2 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos ........................................ 029
1.3 – Especificidades da Educação de Jovens e Adultos ...................................
035
1.4 – Os Números da Educação de Jovens e Adultos ....................................... 041
1.5 – A Educação de Jovens e Adultos em Mato Grosso .................................. 044
CATULO II – EDUCAÇÃO MATEMÁTICA EM QUESTÃO ...........................
052
2.1 – Perspectiva Tradicional do Ensino de Matemática .................................. 052
2.2 – Educação Matemática de Jovens e Adultos: Um Novo Significado ........ 062
CATULO III – CONTEXTUALIZANDO A AVALIAÇÃO EDUCACIONAL . 076
3.1 – Perfazendo os Caminhos da Avaliação Através dos Tempos .................. 076
3.2 – Avaliação na Perspectiva Tradicional: Velho Modelo ............................. 085
3.2.1 – A avaliação como instrumento de socialização e desigualdade
social .............................................................................................
094
3.2.2 – Avaliação: mecanismo autoritário e disciplinador ....................... 097
3.2.3 – Instrumentos de avaliação: uma visão reducionista ..................... 102
3.3 – Refletindo sobre o Novo Modelo de Avaliação ....................................... 109
3.3.1 – Diversificando os instrumentos do processo avaliativo ............... 118
3.3.1.1 – Auto-avaliação ...............................................................
119
3.3.1.2 – Caderno de campo ......................................................... 120
3.3.1.3 – Conselho de classe .........................................................
120
3.3.1.4 – Diário reflexivo ............................................................. 121
3.3.1.5 – Entrevista ....................................................................... 121
3.3.1.6 – Filipetas reflexivas ........................................................ 121
3.3.1.7 – Mapa conceitual ............................................................ 121
3.3.1.8 – Portlio / Pasta avaliativa / Dossiê ............................... 122
3.3.1.9 – Projeto ........................................................................... 122
3.3.1.10 – Relatório avaliativo ..................................................... 122
3.3.1.11 – Teste e prova ............................................................... 123
3.4 – A Avaliação na Educação Matemática de Jovens e Adultos ....................
125
CATULO IV – METODOLOGIA DA PESQUISA ..............................................
132
4.1 – A Opção Metodológica ............................................................................ 132
4.2 – Universo da Pesquisa ................................................................................
133
4.3 – Sujeitos da Pesquisa ................................................................................. 134
4.4 – Coleta de Dados ........................................................................................
136
4.5 – Categoria para Análise ............................................................................. 139
CATULO V – ANÁLISE DOS DADOS .............................................................. 141
5.1 – Professor IRE ........................................................................................... 141
5.1.1 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos de IRE ................ 141
5.1.2 – Concepções de Educação Matemática de IRE ............................. 148
5.1.3 – Concepções de Avaliação de IRE .................................................
158
5.1.4 – Possíveis interfaces entre as concepções de EJA, Educação
Matemática e Avaliação reveladas por IRE .................................
168
5.2 – Professor DAM .........................................................................................
170
5.2.1 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos de DAM ............. 170
5.2.2 – Concepções de Educação Matemática de DAM .......................... 177
5.2.3 – Concepções de Avaliação de DAM ..............................................
184
5.2.4 – Possíveis interfaces entre as concepções de EJA, Educação
Matemática e Avaliação reveladas por DAM ..............................
190
5.3 – Professor GUT .......................................................................................... 192
5.3.1 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos de GUT .............. 192
5.3.2 – Concepções de Educação Matemática de GUT ............................
204
5.3.3 – Concepções de Avaliação de GUT ............................................... 211
5.3.4 – Possíveis interfaces entre as concepções de EJA, Educação
Matemática e Avaliação reveladas por GUT ................................
223
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 225
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 237
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ...........................................................................
244
APÊNDICES ............................................................................................................. 246
Questionário de Caracterização (QC) ................................................................
247
Síntese das Respostas dos Sujeitos da Pesquisa Referente às Perguntas do
Questionário 1 (Q1 – Educação de Jovens e Adultos) ......................................
248
Síntese das Respostas dos Sujeitos da Pesquisa Referente às Perguntas do
Questionário 2 (Q2 – Matemática na EJA) .......................................................
249
Síntese das Respostas dos Sujeitos da Pesquisa Referente às Perguntas do
Questionário 3 (Q3 – Avaliação em Matemática na EJA) ................................
250
Roteiro Básico para Entrevista Semi-estruturada .............................................. 251
INTRODUÇÃO
A proposição de discussões e estudos sobre a temática da avaliação no
processo de ensino-aprendizagem da Matemática na Educação de Jovens e Adultos tem
sido cada vez mais freqüente. De maneira inegável, as três áreas que comem essa
temática (Avaliação, Educação Matemática e EJA), foram e continuam sendo focos de
atenção de muitos educadores e pesquisadores, que projetam nessas áreas a significativa
possibilidade de se reverter o quadro da excluo sócio-cultural. Muitos buscam superar
esta exclusão decorrente da falta de um processo de escolarização capaz de atender aos
anseios de um direito imprescindível de uma Educação Básica de qualidade para todos.
Vale ressaltar que, o pouco tempo de conclusão do curso de Licenciatura em
Matemática (2002), e a falta de experiência docente, não nos impossibilitou de tratar o
problema proposto nesta pesquisa, como algo fundamental para o desenvolvimento de
questões investigativas no âmbito educacional. Não sendo, portanto, nosso envolvimento
menos intenso e instigante do que daqueles que têm uma experiência profissional
considerável na docência.
A dificuldade em se formular uma pergunta como foco de investigação,
exatamente por não se ter uma experiência docente, acentuou-se pela reflexão sobre o que
o me foi oferecido pela graduação em Matemática e pelo que foi possível compreender
durante a formação acadêmica.
Desta forma, o interesse inicial em desenvolver uma pesquisa contemplando a
temática dessa nossa investigação começou quando estava cursando o último ano da
Licenciatura em Matemática. Prestes a concluir o curso e, portanto, próximo de iniciar
minha trajetória profissional como professor de Matemática, comecei a tomar consciência
de que tive uma boa base de conhecimentos matemáticos, mas que não estava preparado
para a docência. Acometido por essa insegurança, foi nesse momento que passei a refletir
efetivamente sobre os questionamentos pertinentes ao campo da Educação Matemática.
A literatura disponível com ênfase nos processos educacionais e
principalmente a respeito do ensino-aprendizagem da Matemática passou a ser objeto de
estudo paralelo às minhas atividades acadêmicas durante e mesmo depois da conclusão da
Licenciatura em Matemática.
No envolvimento com os estudos na área, buscando entender por que a
14
Matemática se postava como uma disciplina aparentemente desprovida de vida e
desvinculada das atividades cotidianas dos educandos, comecei a projetar o desejo de
ingressar em um programa de mestrado em Educação Matemática como uma forma de
complementar a minha formação acadêmica. Sentia a necessidade de compreender
algumas questões educacionais ligadas à Matemática que pudessem contribuir para a
minha atuação docente quando eu estivesse diante de uma sala de aula lecionando
Matemática. Afinal, não queria repetir como professor exatamente aquilo que eu estava
questionando a respeito de um ensino da Matemática, onde esta é apresentada como uma
ciência fria e de pouca utilidade. Queria e quero apresentá-la aos alunos como ciência
construída por pessoas comuns ao longo da história da humanidade, e que todos somos
capazes de aprender e fazermos uso do conhecimento matemático.
Em fevereiro de 2003, concluí o curso de Licenciatura em Matemática e a
partir daí poderia começar a lecionar. Contudo, o me senti preparado para a tamanha
responsabilidade de assumir uma sala de aula repleta de alunos e preferi aceitar um convite
de trabalho na área administrativa na Câmara Municipal de Vereadores de Ji-Paraná,
Rondônia. Entretanto, não deixei de pensar em ingressar em um mestrado e mantive meus
estudos na área de Educação Matemática, principalmente depois que passei a fazer parte da
Diretoria Regional da Sociedade Brasileira de Educação Matemática em Rondônia
(SBEM-RO) a convite do seu diretor e meu ex-professor na Universidade Federal de
Rondônia (UNIR).
Durante os dois anos que permaneci trabalhando na Câmara e atuei como
tesoureiro na SBEM-RO, pesquisei alguns mestrados que contemplavam a área de
Educação Matemática, e em 2004, ingressei no Programa de s-Graduação em Educação,
do Instituto de Educação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT).
No mestrado tive a oportunidade de fazer parte do Grupo de Estudos e
Pesquisas em Educação Matemática da UFMT (GRUEPEM), coordenado pela minha
professora-orientadora Dra. Marta M. Pontin Darsie. O contato com os membros desse
grupo foi fundamental para que a área da Avaliação passasse a ser enfocada como um dos
objetos de investigação dessa pesquisa. Diante da experiência e do acervo bibliográfico da
minha orientadora na área da avaliação escolar, e da reflexão a partir das reuniões no
GRUEPEM acerca da importância da avaliação no processo educacional, decidi pesquisar
a Avaliação em Educação Matemática.
Então a Avaliação passou a ser objeto de minhas leituras na tentativa de se
compreender os aspectos da sua significância no e/ou para o processo de ensino-
15
aprendizagem.
Neste movimento, foi possível entender um pouco do quanto a avaliação é
extremamente importante para o contexto escolar. Passo a rever minhas concepções sobre
a avaliação. Até então, esta era para mim, apenas uma palavra a mais para designar os
inúmeros testes, exames e provas escritas que eu havia feito durante minha trajetória
escolar, e que servia aos professores, aos alunos e aos pais, para comunicar quem havia, ou
o passado de ano; quem havia, ou não, ficado para recuperação ou exame; quem tinha ou
o tirado “nota vermelha”. Passei a compreender que a avaliação é imprescindível para o
desenvolvimento e melhoria do processo educacional, servindo de diagnóstico permanente
das dificuldades de aprendizagens dos alunos, e, ao mesmo tempo daquilo que precisa ser
aperfeiçoado pelo professor nas tarefas de ensino.
Passei também, a vislumbrar a influência do papel da avaliação como um dos
mecanismos mais eficientes de que dispõe a escola consciente ou inconscientemente por
uma determinada ideologia reprodutivista da sociedade em vigor na determinação da
distribuição social dos indivíduos.
Neste sentido, se ainda não tinha idéia do quanto a avaliação escolar pode ditar
os rumos da vida social das pessoas a partir da análise exclusiva do desempenho dos
educandos como um de seus focos de julgamento do sucesso ou fracasso do processo
pedagógico, hoje, compreendo a necessidade de superação de uma ideologia da qual a
avaliação da aprendizagem tem servido para a discriminação e seleção social, legitimando
uma verdadeira sociedade de classes, para não dizer “de castas”.
Ao mesmo tempo em que fui me interessando cada vez mais e sendo orientado
pelos questionamentos envolvendo a área da avaliação, procurei aprofundar também meus
estudos acerca do processo de ensino-aprendizagem da Matemática. Nesse reencontro com
a temática da Educação Matemática, constatei mais uma vez a dicotomia entre as
perspectivas de uma Matemática tida como fria, pronta e acabada, ensinada de forma
mecânica e desvinculada da vivência dos alunos, e centrada na figura do professor como o
dono da verdade; e de uma Matemática em constante desenvolvimento, fruto de um
processo histórico de construção do conhecimento humano, ensinada para servir a todos e
o apenas aos “iluminados”, onde o professor é o mediador contribuindo para que o aluno
se torne construtor da sua própria aprendizagem.
Na tentativa de levantar com minúcia as referências bibliográficas que
envolviam o contexto da avaliação no processo de ensino-aprendizagem da Matemática na
literatura disponível, me deparei com uma das primeiras dificuldades na execução desse
16
estudo: o baixo número de trabalhos no Brasil enfocando o tema da Avaliação em
Educação Matemática. Contudo, diante da considerável quantidade de publicações
envolvendo as duas áreas separadamente, continuei me apropriando de seus aspectos e
persisti na realização dessa pesquisa.
A outra problemática que envolveu a mim e a minha orientadora, foi quanto à
definição do segmento da educação onde iamos desenvolver nossa investigação. Em
discussão no GRUEPEM, os colegas sugeriram o Ensino Médio ou Ensino Superior como
locus da nossa pesquisa. Definido a princípio o tema na área da Avaliação em Educação
Matemática, chegamos à conclusão de que as concepções dos professores de Matemática
do Ensino Médio Regular, seria o foco da nossa investigação.
Por volta dos meses de agosto e setembro de 2005, recebi um convite para
participar de um encontro promovido pela Secretaria de Estado de Educação de Mato
Grosso voltado aos professores da EJA, que discutia a questão da avaliação nessa
modalidade educacional. Na oportunidade, tive a satisfação de estar em contato com alguns
professores da área de Matemática que revelaram o quanto sentiam-se angustiados diante
das dificuldades de lidarem com a questão da avaliação escolar. O problema o estava no
fato de se oporem ao modelo avaliativo que a EJA em específico propõe em razão do perfil
de seu público, mas sim, estava ligada à questão de que não haviam sido preparados
durante sua formão acadêmica e profissional para atuarem nessa modalidade. E por mais
que tentassem conscientemente atender aos anseios de um ensino da Matemática e à
prática de uma avaliação da aprendizagem nessa disciplina condizentes com as
especificidades exigidas para a EJA, se sentiam limitados por não saberem como
desempenhar o trabalho pedagógico segundo os pressupostos dessa modalidade.
Nesse momento, passei a me questionar: Quem são os professores de
Matemática da EJA e que formação eles tiveram para atuar nessa modalidade? Os docentes
da EJA concebem essa modalidade da Educação Básica de forma distinta e específica em
relação às outras modalidades do ensino regular? Quais o as dificuldades encontradas
pelos professores de Matemática da EJA em suas atividades docentes? Como o processo de
ensino-aprendizagem da Matemática é desempenhado pelos professores no contexto da
EJA? Como os professores de Matemática da EJA avaliam seus alunos diante da
especificidade do público dessa modalidade?
Diante desses questionamentos e do interesse em compreender o papel dessa
modalidade no âmbito educacional, a EJA passou a se constituir como área de investigação
juntamente com as áreas da Avaliação e Educação Matemática. Porém, sem nos
17
preocuparmos agora em investigar a etapa específica do Ensino dio como antes
havíamos definido.
No processo contínuo de analisar e aprofundar os aspectos envolvendo a tade
Avaliação/Educação Matemática/EJA, procuramos entender os contextos do velho modelo
(excludente) e do novo modelo (inclusivo) educacionais e suas influências para cada das
áreas de investigação dessa pesquisa.
Na definição da EJA constatamos duas concepções antagônicas entre si. Uma
educação segundo a perspectiva de um modelo de educação inclusiva, emancipatória e
democrática, compreendida como um movimento mais amplo de renovação pedagógica no
direcionamento de esforços para a aprendizagem dos educandos que tiveram sua
escolarização interrompida ou jamais iniciada. Nesta perspectiva os educandos o
assumidos como sujeitos ativos no processo de construção de conhecimentos e no
desenvolvimento de competências e habilidades necessárias à formação humana e social. E
por outro lado, uma educação amparada por um modelo educacional excludente, baseado
nos pressupostos de uma educação meramente supletiva e nas experiências de preconceito
e infantilização do ensino, ao conceber os jovens e adultos de escolarização incompleta
como incapazes e marginais, e identificados psicologicamente e socialmente como
crianças.
No contexto da avaliação escolar os aspectos da exclusão e inclusão são ainda
mais conflitantes, mas coexistentes. Se de um lado a perspectiva inclusiva traz consigo a
prática de uma avaliação diagnóstica, contínua e processual, suporte para a tomada de
decisão no direcionamento para a aprendizagem e o desenvolvimento do educando. Por
outro, o que predomina é uma concepção tradicional de avaliação, que classifica o
educando na atitude expressa de sua aprovação ou reprovação, sem possibilitar
conseqüências para a melhoria da sua aprendizagem, impondo muitas vezes a conduta
negativa de sua exclusão do processo educacional e consequentemente social também.
Em relação à Matetica, a dualidade entre velho e novo modelo também se
confrontam, embora assim como nas áreas acima mencionadas coexistam no cotidiano da
sala de aula.
Diante as características do velho modelo de educação, temos um ensino da
Matemática configurado como treinativo, de memorização e de modelos, cuja tônica não
tem contribuído para tornar os alunos mais criativos, autônomos e construtores do próprio
conhecimento, o que deveria ser objetivo primordial da educação matemática, propagando-
se apenas como um instrumento a mais de discriminação social, contribuindo para o
18
fracasso escolar, através dos elevados índices de repetência e evasão em nossas escolas.
Já na nova perspectiva que postula uma educação através da Matemática,
encontramos uma Matemática acessível a todos e auxílio na percepção e intervenção da
realidade, sendo uma ferramenta básica para a formação intelectual e social do sujeito e,
portanto, para a realização plena da sua cidadania e para a compreensão das outras áreas do
conhecimento vitais às nossas atividades cotidianas.
Na tade Avaliação, Educação Matemática e Educação de Jovens e Adultos no
âmbito educacional, e no nosso interesse manifesto em desvendar as concepções de
avaliação dos professores de Matemática da EJA acerca dessas três áreas significativas no
processo de escolarização, ancoramos nossa probletica de investigação na seguinte
questão:
Quais as interfaces possíveis de serem estabelecidas entre as concepções de
avaliação, de Educação Matemática e de Educação de Jovens e Adultos de
professores que atuam em uma escola pública de Cuiabá voltada exclusivamente ao
atendimento dessa modalidade?
Para o desenvolvimento da pesquisa nos amparamos na abordagem qualitativa
da pesquisa em educação. Nossa coleta de dados se deu em uma escola da rede pública
estadual com atendimento exclusivo à modalidade EJA, onde investigamos a princípio
cinco professores licenciados em Matemática e lecionando essa disciplina, selecionando
posteriormente três destes professores, de acordo com o critério de tempo de atuação
docente na EJA, para serem os sujeitos da nossa pesquisa. Buscamos saber, quais suas
concepções de avaliação, Educação Matemática e Educação de Jovens e Adultos para
tentarmos estabelecer a relação entre essas concepções, proposta dessa investigação.
Neste sentindo, buscando melhorar a compreensão da questão investigativa
aqui proposta, nos apoiamos em diversos estudiosos que têm se dedicado à discussão das
áreas envolvendo as temáticas de investigação dessa pesquisa. Assim, encontramos em
PAIVA (1987), HADDAD (1994, 2001), RIBEIRO (1997), GADOTTI e ROMÃO (2001),
SOARES (2001, 2002), ARROYO (2005) e DI PIERRO (2005), e nos documentos oficiais
do MEC (2000, 2002a), da SEDUC/MT (2000, 2002) e da UNESCO (2005), os elementos
norteadores para o entendimento do contexto da EJA. Na área da Educação Matemática
tivemos o aporte teórico de CARRAHER (1986), MACHADO (1987), MEDEIROS
(1987), DUARTE (1995), FIORENTINI (1995), D’AMBRÓSIO (1996, 2001), BARALDI
(1999), CARAÇA (2002) e FONSECA (2005a, 2005b), além dos PCNs em Matemática
(1997) e da Proposta Curricular para a EJA (2002). Em relação à avaliação educacional,
19
nos fundamentamos principalmente em DEPRESBITERIS (1989, 2003), PERRENOUD
(1993, 1999), HADJI (1994, 2001), DARSIE (1996), HOFFMANN (1997, 2002, 2003),
LUCKESI (1998), ANDRÉ e DARSIE (1998), VASCONCELLOS (1998, 2002), DEMO
(2002) e SOUSA, C. P. (2003). E finalmente, quantos aos aspectos da metodologia da
pesquisa nos apoiamos nas obras de LUDKE e ANDRÉ (1986), TRIVIÑOS (1987),
BOGDAN e BIKLEN (1994), e FIORENTINI e LORENZATO (2006).
O desenvolvimento desse trabalho se deu conforme as normalizações: NBR-
14724 (apresentação de trabalhos acadêmicos), NBR-10520 (apresentação de citações em
documentos) e NBR-6023 (elaboração de referências), publicadas pela Associão
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) em 2002 e explicitadas por Fiorentini e Lorenzato
(2006).
Neste sentido, o resultado do nosso trabalho, após o caminho percorrido rumo à
melhor compreensão da natureza dessa pesquisa e à construção de uma resposta à sua
questão norteadora, ficou estruturado da seguinte forma:
No primeiro capítulo O contexto da educação de jovens e adultos
abordaremos alguns aspectos da literatura especializada sobre a Educação Básica de jovens
e adultos, trazendo um breve histórico dessa modalidade em nosso país, bem como, uma
compilação dos principais significados e características específicas difundidas ao longo da
história do processo escolar que dão suporte à EJA. Trataremos ainda dos dados
estatísticos globais e dos aspectos regulamentadores que mostram a dimensão de
atendimento da EJA no Brasil e em Mato Grosso.
No segundo capítulo Educação Matemática em questão discutiremos
as perspectivas de uma Educação Matemática influenciada pelo modelo tradicional de
ensino, e de um processo de ensino-aprendizagem da Matemática, compreendido no
contexto da EJA, como um novo modelo educacional contrário às práticas excludente e
discriminatória.
No terceiro capítulo Contextualizando a avaliação educacional
destacaremos a trajetória da avaliação escolar no decorrer da história da educação,
mostrando a evolução de suas teorias desde a interpretação como uma medida educacional
até sua compreensão como uma prática formativa e um instrumento de investigação
didática. Apresentaremos também uma reflexão do papel da avaliação no processo de
ensino-aprendizagem segundo os pressupostos das concepções tradicionais e de um novo
modelo educacional, além de evidenciar o contexto das práticas avaliativas em Matemática
na EJA.
20
No quarto capítulo Metodologia da pesquisa descreveremos o percurso
deste estudo e apresentaremos nossa opção metodológica pela pesquisa qualitativa
interpretativa por compreendermos que esta nos possibilita uma interpretação mais
coerente com o objeto de investigação do nosso trabalho. Além disso, elucidaremos o
universo e os sujeitos da pesquisa, os instrumentos e procedimentos da coleta de dados, e
suas categorias de análise.
No quinto capítulo Análise dos dados apresentaremos as concepções
docentes dos sujeitos da pesquisa a respeito de cada uma das áreas de investigação que
comem o objeto dessa pesquisa e a nossa análise interpretativa dessas concepções de
modo a desvendar as possíveis relações existentes entre elas.
E, finalmente, nas Considerações Finais, buscaremos não somente responder o
problema suscitado nessa investigação, como tamm, tentaremos contribuir de alguma
forma para o âmbito das pesquisas, que como essa, pretendem aprofundar a compreensão
sobre a realidade da avaliação e da Educação Matemática no contexto da Educação de
Jovens e Adultos.
CAPÍTULO I - O CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
Falar sobre Educação de Jovens e Adultos no Brasil é falar sobre algo pouco
conhecido. Além do mais, quando conhecido, sabe-se mais sobre suas mazelas
do que sobre suas virtudes (HADDAD, 1994, p. 86).
Neste capítulo, dada a necessidade de melhor compreensão da nossa pesquisa,
apresentamos algumas considerações teóricas sobre o contexto da Educação de Jovens e
Adultos, enfocando a trajetória dessa modalidade educacional no Brasil desde as primeiras
iniciativas de alfabetização e catequização dos adultos pelos jesuítas até a sua constituição
legal nos anos 2000 como uma modalidade específica da Educação Básica.
Em seguida, abordamos algumas concepções sobre a Educaçãosica de
jovens e adultos difundidas ao longo do seu processo histórico, bem como, elucidamos as
características específicas da EJA que a tornam uma modalidade diferenciada e com uma
identidade própria diante dos outros segmentos do ensino regular.
Com o intuito de evidenciar o cenário atual da EJA, tratamos ainda das
questões ligadas às estatísticas oficiais dessa modalidade no Brasil e em Mato Grosso, e
abordamos por último os aspectos regulamentadores da EJA nesse Estado.
1.1 Breve Histórico da Educação de Jovens e Adultos no Brasil
Reconstruir a trajetória da Educação de Jovens e Adultos no Brasil é tarefa
complexa, pois não existem registros suficientes em relação às diversas ações
implementadas, em especial no âmbito não-governamental. Contudo sabe-se que a sua
história reflete-se como muito mais tensa do que a própria história da Educação Básica,
remontando aos tempos coloniais, quando os religiosos exerciam uma ação educativa
missionária com adultos.
A educação de adultos nasceu, no Brasil, juntamente com a educação elementar
comum. Como sabemos, atras do ensino das crianças os jesuítas buscavam
também atingir seus pais; além disso, era tentada a catequese direta dos
22
indígenas adultos e nesses casos a alfabetização e transmissão do idioma
português servia como instrumento de cristianização e aculturação dos nativos
(PAIVA, 1987, p. 165).
Durante o período imperial, quase o houve ações educativas no campo da
educação de adultos no Brasil, uma vez que a concepção de cidadania ainda era
considerada apenas como direito das elites econômicas da época. Um dos marcos
educacionais desse período foi a Constituição de 1824, que sob forte inflncia européia
formalizou a garantia de uma instrução primária e gratuita para todos os cidadãos
brasileiros.
Impulsionada pelas grandes reformas educacionais decorrente da pressão
trazida pelos surtos de urbanização, nos primórdios da indústria nacional, que impôs a
necessidade de formação de mão-de-obra local, aliada à importância da manutenção da
ordem social nas cidades (MEC/SEF, 2002a) a educação de adultos passou a ser vista
com maior interesse somente a partir da década de 1920, quando foram criadas escolas
noturnas para adultos numa tentativa de diminuição dos índices de analfabetismo,
considerado “mal nacional” e “uma chaga social”, uma doença como a malária, falando-se
em “zonas negras de analfabetismo”.
Com o advento da Constituição de 1934, que instituiu nacionalmente a
obrigatoriedade e a gratuidade do ensino primário para todos, a educação de jovens e
adultos passa a se firmar como questão de política nacional, começando, segundo Ribeiro,
a delimitar seu lugar na história da educação no Brasil a partir dessa década de 30, quando
finalmente começa a se consolidar um sistema público de educação elementar no país”
(1997, p. 19).
A década de 1940, que segundo Gadotti (2001), até então, concebia a educação
de adultos como uma extensão da escola formal, principalmente para a zona rural, ficou
marcada pelo movimento impulsionado pelo governo federal, através do Ministério da
Educação, de articulação e extensão do ensino elementar aos adultos como umas das metas
a serem alcançadas pelas diretrizes educacionais. Foram criados durante esses anos 40: o
Fundo Nacional de Ensino Primário (1942), com o objetivo de incluir o ensino supletivo
para adolescentes e adultos analfabetos; o Serviço de Educação de Adultos (SEA, de
1947), com a finalidade de orientar e coordenar os planos anuais do ensino supletivo para
adolescentes e adultos analfabetos; e a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos
(CEAA, de 1947), que ao definir a identidade da educação de adultos como uma forma de
campanha nacional de massa, influenciou a produção pela primeira vez de material
23
didático específico para o ensino da leitura e da escrita para os adultos e alimentou ainda
mais a reflexão e o debate em torno do analfabetismo no Brasil.
Nesse momento, o analfabetismo era concebido como causa e o efeito da
situação econômica, social e cultural do país. Essa concepção legitimava a visão
do adulto analfabeto como incapaz e marginal, identificado psicológica e
socialmente com a criança (RIBEIRO, 1997, p. 20).
Essa concepção preconceituosa sobre adultos analfabetos é percebida
claramente pelas palavras usadas por uma professora encarregada de formar os educadores
da CEAA:
Dependente do contacto face a face para enriquecimento de sua experiência
social, ele tem que, por força, sentir-se uma criança grande, irresponsável e
ridícula... E, se tem as responsabilidades do adulto, manter uma família e uma
profissão, ele o fará em plano deficiente. O analfabeto, onde se encontre, será um
problema de definição social quanto aos valores: aquilo que vale para ele é sem
mais valia para os outros e se torna pueril para os que dominam o mundo das
letras. [...] inadequadamente preparado para as atividades convenientes à vida
adulta, [...] ele tem que ser posto à margem como elemento sem significação nos
empreendimentos comuns. Adulto-criança, como as crianças ele tem que ver o
mundo de egocentrismo que não lhe permite ocupar os planos em que as
decisões comuns têm que ser tomadas (apud PAIVA, 1987, p. 185-186)
1
.
O clima de entusiasmo da CEAA começou a diminuir na década de 50 devido
às críticas recebidas que se dirigiam tanto às suas deficiências administrativas e financeiras
quanto à sua orientação pedagógica e, portanto, antes do final dessa década a campanha se
extinguiu, sobrevivendo apenas a rede de ensino supletivo por meio dela implantada.
Ainda nos anos 50, destacaram-se como poticas educacionais para a educação de jovens e
adultos a Campanha Nacional de Educação Rural (1952) e a Campanha Nacional de
Erradicação do Analfabetismo (1958), que tiveram curta duração e poucas realizações.
A década de 50, que difundiu a educação de adultos como educação de base e
como desenvolvimento comunitário, chegaria ao seu final com duas tendências mais
significativas:
A educação de adultos entendida como educação libertadora, como
“conscientização (Paulo Freire) e a educação de adultos entendida como
educação funcional (profissional), isto é, o treinamento de mão-de-obra mais
produtiva, útil ao projeto de desenvolvimento nacional dependente (GADOTTI,
2001, p. 35, grifo do autor).
Os anos 60 podem ser instituídos como um dos períodos mais importantes para
a história da educação de jovens e adultos no Brasil, pois foram rias as ações promovidas
envolvendo tanto os movimentos civis quanto oficiais que se empenharam no combate ao
analfabetismo entre jovens e adultos e na promoção de uma educação continuada para
1
RUDOLFER, Noemy Silveira. Psico-pedagogia do adolescente e do adulto analfabeto. In: Fundamentos e
metodologia do ensino supletivo. p. 31. (citação conforme consta no livro de PAIVA)
24
estes.
Durante esse período destacam-se: a extensão da educação de jovens e adultos
ao curso ginasial, já que antes era oferecido apenas em nível equivalente ao ensino
primário; a difusão das iias de educação popular por estudantes e intelectuais que
pretendiam desenvolver novas perspectivas de cultura e educação junto a grupos populares,
através de diferentes instituições e com graus variáveis de ligação com o Estado; a criação
do Plano Nacional de Alfabetização e a disseminação por meio deste dos programas de
alfabetizão orientados pela proposta de Paulo Freire; e a organização da Cruzada de
Ação sica Cristã (ABC) e do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL)
promovida pelo governo federal depois do golpe militar, que também extinguiu o Plano
Nacional de Alfabetização.
Marco fundamental no contexto da educação popular e na educação de jovens e
adultos, o Plano Nacional de Alfabetização surgiu em decorrência das discussões que
tomaram o sistema educacional brasileiro após a extinção da CEAA. Tendo em vista os
direcionamentos voltados para uma nova visão sobre o problema do analfabetismo e para a
consolidação de um novo paradigma pedagógico para a educação de adultos, várias
iniciativas implementadas por diferentes grupos populares e instituições
2
no início dos
anos 60, que destacavam a importância da participação do povo na vida blica nacional e
o papel da educação para sua conscientização, acabaram pressionando o governo a apoiar e
estabelecer uma coordenação nacional dessas iniciativas, surgindo assim, em janeiro de
1964, o Plano Nacional de Alfabetização.
Esse Plano se instituiu com o propósito de disseminar por todo Brasil os
programas de alfabetização de adultos encaminhados por Paulo Freire, uma referência no
âmbito educacional, que com seu pensamento tornou-se fundamental no desenvolvimento
da educação de jovens e adultos, inspirando os principais programas de alfabetização e
educação popular que se realizaram no país no início dos anos 60, cujo paradigma
pedagógico
... baseava-se num novo entendimento da relação entre a problemática
educacional e a problemática social. Antes apontado como causa da pobreza e da
marginalização, o analfabetismo passou a ser interpretado como efeito da
situação de pobreza gerada por uma estrutura social não igualitária. Era preciso,
portanto, que o processo educativo interferisse na estrutura social que produzia o
analfabetismo. A alfabetização e a educação de base de adultos deveriam partir
sempre de um exame crítico da realidade existencial dos educandos, da
2
Destaque para o Movimento de Educação de Base (MEB), da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB); Movimento de Cultura Popular do Recife; Centros Populares de Cultura, da União Nacional de
Estudantes (UNE); Campanha de no Chão Também se Aprende a Ler, da Secretaria Municipal de
Educação de Natal.
25
identificação das origens de seus problemas e das possibilidades de superá-los
(RIBEIRO, 1997, p. 23).
O método Paulo Freire
3
, cujo princípio básico era: “A leitura do mundo
precede a leitura da palavra”, prescindindo da utilização de cartilhas, segundo Ribeiro
(1997), previa uma etapa preparatória, quando o alfabetizador deveria fazer uma pesquisa
sobre a realidade existencial do grupo junto ao qual iria atuar, levantando ainda o universo
vocabular utilizado pelo grupo para expressar essa realidade. Desse universo vocabular, o
alfabetizador deveria selecionar as palavras que melhor expressassem as situações
existenciais mais importantes, devendo agrupá-las conforme os diversos padrões silábicos
da ngua e organizá-las segundo o grau de complexidade desses padrões. De posse dessas
palavras, tidas como geradoras, o educador deveria iniciar uma discussão evidenciado o
papel ativo dos homens como produtores de cultura e as diferentes formas de cultura
(letrada e não letrada), objetivando assim, antes mesmo de iniciar o aprendizado da escrita,
levar o educando a assumir-se como sujeito de sua aprendizagem, como ser capaz e
responsável. Cumprida essa etapa, iniciava-se o estudo das palavras geradoras, que com o
auxílio de ilustrações e imagens referentes às situações existenciais a elas relacionadas,
desencadeava um debate em torno do tema e então a palavra escrita era analisada em
suas partes componentes, com suas famílias silábicas que serviriam para montar outras
palavras. Na etapa seguinte, as palavras geradoras seriam substituídas por temas geradores,
a partir dos quais os alfabetizandos aprofundariam a análise de seus problemas,
preferencialmente já se engajando em atividades comunitárias ou associativas.
Os programas de alfabetização e educação popular promovidos pelo Plano
Nacional de Alfabetização foram interrompidos pelo golpe militar de 1964, que os via
como uma grave ameaça à ordem, e com isso o governo permitiu a realização de
programas de alfabetização de adultos de caráter assistencialista e conservador, assumindo
e lançando, em 1967, o MOBRAL, cuja orientação metodológica apesar de reproduzir
parte dos procedimentos consagrados pelas experiências do início da década de 60, não
tinha como propósito promover todo o sentido crítico e problematizador que essas
experiências possuíam, visando basicamente ao controle da população (sobretudo a rural).
Propunha-se a alfabetização a partir de palavras-chave, retiradas “da vida
simples do povo”, mas as mensagens a elas associadas apelavam sempre ao
esforço individual dos adultos analfabetos para sua integração nos benefícios de
3
Uma descrição de como o método Paulo Freire era operacionalizado, acompanhada de uma síntese de seus
fundamentos filosóficos, pode ser encontrada nos livros: Educação como prática da liberdade, do próprio
Paulo Freire (24. ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000); e O que é o método Paulo Freire, de Carlos
Rodrigues Brandão (2. ed., São Paulo: Brasiliense, 1981. Coleção Primeiros Passos).
26
uma sociedade moderna, pintada de cor-de-rosa (RIBEIRO, 1997, p. 26).
Mesmo com a dura repressão imposta pelo governo aos movimentos de
educação popular, que eram tidos como uma grave ameaça à ordem, persistiram algumas
iniciativas, desenvolvidas freqüentemente em igrejas, associações de moradores,
organizações de base local e outros espaços comunitários.
Em 1971, o ensino supletivo foi instituído pelo Ministério da Educação e
Cultura (MEC), ganhando capítulo próprio na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN 5.962/71), estabelecendo que ele se destinava a “suprir a
escolarização regular para adolescentes e adultos que não a tinham seguido ou concluído
na idade própria”. Esse ensino poderia ser ministrado a distância, por correspondência ou
por outros meios adequados. Os cursos e os exames seriam organizados dentro dos
sistemas estaduais de acordo com seus respectivos Conselhos de Educação. nesse
período se afirmava a necessidade de adequar o ensino ao tipo especial de aluno a que se
destina”, resultando daí uma grande flexibilidade curricular (MEC/SEF, 2002a).
O MEC promoveu ainda, a implantação dos Centros de Ensino Supletivo
(CES), a fim de atender todos os alunos que desejassem completar os estudos fora da idade
regulamentada para as séries iniciais do ensino de primeiro grau; e também redefiniu as
funções do ensino supletivo, em 1972, destacando quatro aspectos:
A suplência, ou seja, a substituição compensatória do ensino regular pelo
supletivo via cursos e exames com direito a certificação de ensino de grau
para maiores de 18 anos, e de ensino de grau para maiores de 21 anos; o
suprimento, ou complementação da escolaridade inacabada por meio de cursos
de aperfeiçoamento e de atualização; a aprendizagem; e a qualificação
(MEC/SEF, 2002a, p. 16, grifo do autor).
Durante os anos 70, tivemos também o surgimento do Programa de Educação
Integrada (PEI), derivado das iniciativas do MOBRAL, que se expandiu por todo o
terririo nacional até ser extinto em 1985, após o fim do período militar.
Entre 1980 e 1985, o ensino supletivo contou socialmente com a mobilização
pedagogicamente inovadora da comunidade, tendendo à não-formalização, o que acabou
promovendo o surgimento de alguns programas de caráter compensatório, instituídos pelo
governo federal, que se caracterizaram por recuperar o atraso dos que não haviam
usufruído a escolarização na idade própria.
Com a emergência dos movimentos sociais e o início da abertura política na
década de 80, as pequenas e isoladas experiências de alfabetização de adultos com
propostas mais críticas promovidas pelos grupos dedicados à educação popular puderam
27
ser difundidas, possibilitando a construção de canais de experiência, reflexão e articulação
em torno da reorientação dos programas de educação de adultos, o que acabou culminando
para a extinção do MOBRAL, e sua substituição, ainda em 1985, pela Fundação Nacional
para Educação de Jovens e Adultos, chamada de Fundação Educar, que abriu mão de
executar diretamente os programas, passando a apoiar financeira e tecnicamente as
iniciativas de governos, entidades civis e empresas a ela conveniada, mas agora sem os
recursos de que o MOBRAL dispunha.
A Constituição Brasileira de 1988 ao expressar como dever do Estado com a
educação a garantia efetiva de ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os
que a ele o tiveram acesso na idade própria, se estabeleceu como fundamental no direito
à educação de jovens e adultos, já que a legislação anterior (Parecer 699/72) resguardava
esse direito apenas aos pertencentes à faixa etária dos 7 aos 14 anos, correspondendo ao
antigo Ensino de Grau”, representando de certa forma, uma situação de dificuldades de
acesso e permanência do público jovem e adulto no processo de escolarização, conforme
esclarece Soares:
Estando excluídos dessa faixa etária, restavam aos jovens e adultos, com
escolaridade incompleta, pagar, mais uma vez, pelos seus estudos através dos
inúmeros cursos supletivos espalhados pelo País, ou, se inscreverem nos poucos
programas públicos existentes (2002, p. 12).
A história da educação de jovens e adultos chega à cada de 90, conforme
Ribeiro (1997, p. 33), reclamando a consolidação de reformulações pedagógicas, também
necessárias a todo o ensino fundamental. E com a extinção da Fundação Educar, em 1990,
esse problema se agrava, criando um enorme vazio no âmbito das poticas educacionais
para o ensino básico de jovens e adultos, que passa a ser atendido por ações pulverizadas,
começando a arcar sozinhos com a responsabilidade educativa para esse setor os órgãos
públicos, as entidades civis e instituições, com o governo federal se constituindo apenas
como instância de apoio e articulação.
Ainda em 1990, o Brasil participou da Conferência Mundial de Educação para
Todos, em Jomtien, na Tailândia, que acabou influenciando na elaboração do Plano
Decenal brasileiro, em 1994, fixando metas para o atendimento de jovens e adultos pouco
escolarizados.
No que diz respeito às poticas blicas para a educação de jovens e adultos,
outra ação importante foi a publicação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB 9394/96), que estabeleceu em uma seção dedicada à Educação Básica de jovens e
adultos:
28
A reafirmação do direito dos jovens e adultos a um ensino básico adequado às
suas condições, e o dever do poder público de oferecê-lo gratuitamente, na
forma de cursos e exames supletivos. E a alteração da idade mínima para
realização de exames supletivos para 15 anos, no Ensino Fundamental, e 18, no
Ensino Médio, além de incluir a educação de jovens e adultos no sistema de
ensino regular (MEC/SEF, 2002a, p. 17).
Assumindo dignidade própria com a implantação da Lei 9394/96, a educação
de jovens e adultos além de passar a fazer parte constitutiva da lei, tornou-se uma
modalidade da Educação Básica nas etapas dos ensinos Fundamental e Médio
4
.
Com a incorporação da mudança conceitual de EJA que se dava desde o final
dos anos de 1980, a mudança de “ensino supletivopara “educação de jovens e
adultos não foi uma mera atualização vocabular. Houve um alargamento do
conceito ao mudar a expressão de ensino para educação. Enquanto o termo
“ensino” se restringe à mera instrução, o termo “educação” é muito mais amplo,
compreendendo os diversos processos de formação (SOARES, 2002, p. 12).
Em janeiro de 1997, o Brasil mereceu destaque no cenário internacional ao
sediar a Conferência Regional Preparatória da América Latina e Caribe para a V
Conferência Internacional sobre Educação de Adultos (V CONFINTEA), que se realizaria
em julho de 1997, na cidade de Hamburgo, na Alemanha.
A V CONFINTEA, que foi promovida pela Organização das Nações Unidas
para a Educação Ciência e Cultura (UNESCO), em 1997, representou um marco
importante, na medida em que estabeleceu a vinculação da educação de adultos ao
desenvolvimento sustentável e eqüitativo da humanidade, além de instituir algumas
orientações e princípios para a Educação Básica de jovens e adultos.
Apesar das ações implementadas em favor da Educação Básica de jovens e
adultos no Brasil durante os anos 90, marcada inclusive com a ampliação de estudos e
pesquisas voltados para esse segmento, Borges elucida:
... que permanecem até hoje as idéias dos anos 70 e 80 em diversos estilos de re-
edição, persistindo a idéia de que “qualquer pessoa que saiba ler e escrever pode
se converter em alfabetizador e que qualquer educador possa ser educador de
adultos (2001, p. 97-98).
Período em que se consolida o principal documento que regulamenta e
normatiza a EJA, e outros documentos considerados importantes para se compreender a
configuração da área, na atualidade, no Brasil, o ano de 2000 consagra-se no contexto da
Educação Básica de jovens e adultos com a aprovação e publicação do Parecer 11/2000 e
da Resolução 01/2000, que sob a responsabilidade do Conselho Nacional de Educação
4
A partir da LDB 9394/96, com a instituição da educação de jovens e adultos como modalidade da Educação
Básica, alguns autores irão se referir a essa modalidade com a denominação de Educação de Jovens e Adultos
(EJA), ou seja, com as iniciais maiúsculas. Fato esse que adotaremos a partir dessa parte neste trabalho.
29
(CNE), apresentam o novo paradigma para essa modalidade, sugerindo: a extinção do uso
da expressão supletivo”; restabelecimento do limite etário para o ingresso na EJA (14
anos para o Ensino Fundamental e 17 anos para o Ensino Médio); atribuão das funções
reparadora, equalizadora e qualificadora para a EJA; promoção de formação docente
voltada para o público específico da EJA; contextualização curricular e metodológica de
acordo com os princípios de equidade e diferença defendidos pela EJA.
Estabelecendo-se como um período significativo na história da EJA, os anos
2000 vão ainda consolidar a efetivação dos Encontros Nacionais de Educação de Jovens e
Adultos (ENEJA’s), realizado pela primeira vez em 1999, no Rio de Janeiro, e
posteriormente, na Paraíba (2000), São Paulo (2001), Minas Gerais (2002), Mato Grosso
(2003), Rio Grande do Sul (2004), Goiás (2005) e Pernambuco (2006), todos em
articulação com os Fóruns Estaduais de Educação de Jovens e Adultos.
Chegando ao fim desses tempos com um processo histórico marcado por toda
uma riqueza de experiências promovidas pelas ações formais e informais de educação de
jovens e adultos, difundidas por diversos segmentos governamentais e não-
governamentais, a EJA, diante da implementação de suas Diretrizes Curriculares Nacionais
(Parecer 11/2000), retoma os questionamentos em torno de sua prática, como não ocorria
desde os anos 50 e 60, colocando em questão os conceitos, os fundamentos e as funções de
uma Educação Básica de jovens e adultos que se inscreve com uma nova ressignificação
no cenário educacional brasileiro, onde a educação, segundo Haddad (2001), passa a
ocupar cada vez mais espaço na vida dos indivíduos, não na das crianças, mas também
na dos adultos, acontecendo de forma contínua ao longo da vida em razão das necessidades
educativas das pessoas, impostas pelo paradigma da sociedade contemporânea que se
refere à mudança constante dos processos de produção e das formas de relação social,
exigindo assim, entre outros motivos, atualização permanente dos conhecimentos.
1.2 Concepções de Educação de Jovens e Adultos
Falar da EJA é reconhecer, primeiramente, a própria redundância da sua
necessidade para aqueles que foram excluídos do sistema escolar quando crianças ou
adolescentes. É, sem vidas, compreender o tom de constrangimento que surge devido a
inevitável existência de uma educação de jovens e adultos, principalmente quando essa
30
Se constituiu muito mais como produto da miséria social do que do
desenvolvimento. É conseqüência dos males do sistema público regular de
ensino e das precárias condições de vida da maioria da população, que acabam
por condicionar o aproveitamento da escolaridade na época apropriada
(HADDAD, 1994, p. 86).
Definida sob o marco condicionante da miséria social, e compreendida com um
leque amplo e heterogêneo de experiências educativas de formatos e modalidades diversas,
que não correspondem necessariamente a ações de escolarização, a EJA passou por
grandes mudanças e foi influenciada por variadas tendências.
Observando a evolução do conceito de educação de jovens e adultos ao longo
da história no contexto internacional, através das Conferências Internacionais sobre
Educação de Adultos
5
até a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em
1990, Gadotti (2001) elucida que até a Segunda Guerra Mundial essa educação era
concebida como extensão da educação formal para todos, integrada à educação chamada
popular, isto é, uma educação para o povo, que procurava atuar nos espaços não atendidos
pela educação estatal (oficial ou do sistema), sobretudo, nas periferias urbanas e zonas
rurais.
A partir da I Conferência Internacional sobre Educação de Adultos, Gadotti
(2001) afirma que essa educação passou a ser concebida como uma espécie de educação
moral, “paralela”, fora da escola, uma educação continuada para jovens e adultos, cujo
objetivo deveria contribuir para o respeito aos direitos humanos e para a construção de uma
paz duradoura. Depois da Conferência Internacional sobre Educação de Adultos, de 1960,
essa educação de jovens e adultos foi enfocada sob a luz de duas concepções distintas:
como uma continuação da educação formal, como educação permanente, e, de outro lado,
como uma educação de base ou comunitária. A III Conferência Internacional sobre
Educação de Adultos difundiu a idéia de uma educação de jovens e adultos como suplência
da educação fundamental (escola formal), cujo propósito era reintroduzir jovens e adultos,
principalmente os analfabetos, no sistema formal de educação. a Conferência
Internacional sobre Educação de Adultos realizada em Paris se caracterizou pela
“implosão” do conceito de educação de jovens e adultos ao tratar de uma pluralidade de
conceitos, entre eles: alfabetização de adultos, s-alfabetização, educação rural, educação
familiar, educação da mulher, educação vocacional, e educação técnica.
5
As Conferências Internacionais sobre Educação de Adultos (CONFINTEA) são convocadas pela UNESCO
periodicamente: a primeira ocorreu em Elsinore, na Dinamarca, em 1949; a segunda transcorreu em
Montreal, Canadá, em 1960; a terceira realizou-se em Tóquio, no Japão, em 1972; a quarta foi sediada em
Paris, França, em 1985.
31
A Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada em Jomtien
(Tailândia), conforme observou Gadotti (2001), entendeu que a alfabetização de jovens e
adultos seria uma primeira etapa da Educação Básica, consagrando, assim, a iia de que a
alfabetizão não pode ser separada da pós-alfabetização, isto é, separada das
“necessidades básicas de aprendizagem”.
Voltado para o contexto latino-americano, Gadotti (2001) esclarece que foram
diversas as concepções que surgiram ao longo da história da EJA, destacando que essa
educação até os anos 40 foi concebida como extensão da escola formal, passando a ser
entendida principalmente como educação de base na década de 50, se assumindo no final
dos anos 50 como uma educação libertadora (Paulo Freire), e por outro lado, como uma
educação funcional (profissional), permanecendo ambas até a década de 70, que com
outras denominações: a primeira compreendida como educação não-formal, e a segunda
como suplência da educação formal.
Instituída como a primeira conferência que teve uma participação substantiva
das organizações não-governamentais envolvidas nos projetos de educação de adultos, a V
Conferência Internacional sobre Educação de Adultos além de ter demonstrado a
existência de concepções muito diferenciadas de educação de adultos, graças à efetiva
participação de mais de 1500 representantes de 170 países, também formulou um conceito
de educação de adultos com diversas orientações e princípios que se tornaram referência
máxima para o campo da EJA.
Na perspectiva de manifestar a importância da aprendizagem de jovens e
adultos e compreender a formação de pessoas adultas como uma multiplicidade de
processos formais e informais de aprendizagem e educação continuada ao longo da vida, a
V CONFINTEA aprovou a Declaração de Hamburgo que definiu em seu art. 3º:
Por educação de adultos entende-se o conjunto de processos de aprendizagem,
formal ou não, graças ao qual as pessoas consideradas adultas pela sociedade a
que pertencem desenvolvem as suas capacidades, enriquecem os seus
conhecimentos e melhoram as suas qualificações técnicas ou profissionais, ou as
reorientam de modo a satisfazerem as suas próprias necessidades e as da
sociedade. A educação de adultos compreende a educação formal e permanente,
a educação não-formal e toda a gama de oportunidades de educação informal e
ocasional existentes em uma sociedade educativa multicultural, em que são
reconhecidas as abordagens teóricas e baseadas na prática (apud DI PIERRO,
2005, p. 17)
6
.
Compartilhando dos ideais elucidados pela Declaração de Hamburgo sobre a
6
UNESCO. Declaração de Hamburgo e agenda para o futuro: V Conferência Internacional sobre Educação
de Adultos, Hamburgo, Alemanha, 1997. Lisboa: UNESCO, Ministério da Educação, Ministério do Trabalho
e Solidariedade, 1998.
32
compreensão de educação existente em uma sociedade educativa e caracterizada pelo
pluralismo cultural, onde ocorre a necessidade de respeitar o conhecimento e as formas de
aprendizagem dos diferentes grupos sociais, Gadotti (2001) justifica que a educação de
adultos deverá ser sempre uma educação multicultural, uma educação capaz de
desenvolver o conhecimento e a integração na diversidade cultural.
Ainda sobre a Declaração de Hamburgo, que segundo Gadotti (2001)
estabeleceu a educação de adultos como um direito de todos, Di Pierro esclarece que esta
declaração atribuiu à EJA
... o objetivo de desenvolver a autonomia e o sentido de responsabilidade das
pessoas e comunidades para enfrentar as rápidas transformações
socioeconômicas e culturais por que passa o mundo atual, mediante a difusão de
uma cultura de paz e democracia promotora da coexistência tolerante e da
participação criativa e consciente dos cidadãos (2005, p. 17-18).
Contudo, conforme trata a Agenda para o Futuro da Educação de Adultos
aprovada na V CONFINTEA, responsável pela definição das metas e compromissos
assumidos pelos países signatários da Declaração de Hamburgo, a educação de adultos
... adquiriu uma amplitude e uma dimensão acrescidas; ela tornou-se um
imperativo para o lugar de trabalho, o lar e a comunidade, no momento em que
homens e mulheres lutam para influir sobre o curso de sua existência em cada
uma de suas etapas. A educação de adultos desempenha um papel essencial e
específico, à medida que possibilita às mulheres e aos homens adaptarem-se
eficazmente a um mundo em constante mutação, e lhes ministra um ensino que
leva em conta os direitos e as responsabilidades do adulto e da comunidade
(UNESCO, 2004, p. 53).
Ao tratar da possibilidade da EJA ser assumida no âmbito de uma concepção
mais ampla, que contemple, principalmente, os múltiplos processos de formação para e
durante a vida, provenientes dos diversos contextos educativos, Soares (2001) assinala a
educação continuada como a modalidade que mais se aproxima desse ideário da EJA, uma
vez que implica apropriação, criação e aquisição de novas competências ao longo da vida,
potencializando o sujeito nas suas diversas dimensões.
Seguindo essa mesma tendência, Jane Paiva (2004, p. 21) sugeriu em sua
palestra no II ENEJA, que “há que se aprofundar a compreensão e os sentidos de EJA
como educação continuada, porque ela revela a perspectiva de aprender por toda a vida,
exigência das sociedades complexas em que se vive”.
Neste sentido, teremos como conceito de educação continuada, não aquela
que se realiza ao longo da vida, continuamente, mas também, aquela que
... é inerente ao desenvolvimento da pessoa humana e relaciona-se com a idéia
de construção do ser. Abarca, por um lado, a aquisição de conhecimentos e
aptidões e, de outro, atitudes e valores, implicando no aumento da capacidade de
discernir e agir. [...] envolve todos os universos da experiência humana, além dos
33
sistemas escolares ou programas de educação não-formal. [...] implica repetição
e imitação, mas também apropriação, ressignificação e criação. Enfim, [...]
associa-se à própria caractestica distintiva dos seres humanos, a capacidade de
conhecer e querer saber mais, ultrapassando o plano puramente instintivo de sua
relação com o mundo e com a natureza (HADDAD, 2001, p. 191-192).
O alargamento que o conceito de educação de jovens adultos adquiriu a partir
da V CONFINTEA, apesar de não ter sido plenamente assimilado segundo Di Pierro
(2005), influenciou o Parecer 11/2000, principal documento regulamentador das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a EJA no Brasil.
Colocando a EJA como uma conquista devido a sua nova formulação legal no
interior da Educação Básica como um direito público subjetivo, ao definirem-na como uma
modalidade nas etapas do Ensino Fundamental e Médio e como direito do cidadão, a
Resolução CNE/CEB 1/2000 e o Parecer CEB nº 11/2000 proporcionaram ainda uma
redefinição no papel da EJA ao instituírem-na não mais com a finalidade de suprir e de
compensar a escolaridade para aqueles que foram excluídos do processo de escolarização e
do acesso aos bens culturais que essa escolarização poderia ter proporcionado, mas sim
com as funções:
- Reparadora: refere-se não à restauração de um direito negado (direito a
uma escola de qualidade), mas também ao reconhecimento da igualdade
ontológica de todo e qualquer ser humano de ter acesso a um bem real,
social e simbolicamente importante;
- Equalizadora: relaciona-se à igualdade de oportunidades que possibilite
maiores condições de acesso e permanência na escola, permitindo aos
indivíduos nova inserção no mundo do trabalho, na vida social, nos espaços
da estética e na abertura dos canais de participação;
- Qualificadora: reconhecida como mais que uma função, e sim o próprio
sentido da EJA, correspondendo às necessidades de atualização e de
aprendizagem contínuas decorrentes dos ideais de uma educação
permanente, que tem como base o caráter incompleto do ser humano cujo
potencial de desenvolvimento e de adequação pode se atualizar em quadros
escolares ou não-escolares.
A instituição das Diretrizes Curriculares Nacionais para a EJA proporcionou
ainda uma outra definição para essa modalidade ao se referir à Educação de Jovens e
Adultos como a representação de uma dívida social não reparada para com os que não
tiveram acesso a e nem donio da escrita e leitura como bens sociais, na escola ou fora
34
dela.
Sobre esta condição, admitindo as diversas maneiras de se pensar e realizar a
educação de jovens e adultos em razão da miséria social, Haddad (1994, p. 86) definirá a
EJA como “uma educação para pobres, para jovens e adultos das camadas populares, para
aqueles que são maioria nas sociedades do Terceiro Mundo, para os excluídos do
desenvolvimento e dos sistemas educacionais de ensino”; e Rivero
7
citado por Soares
(2001, p. 202), mesmo reconhecendo o envolvimento de um público diverso, assinalará
que a EJA “é uma modalidade educativa que deve expressar de forma clara sua opção por
setores vulneráveis em condição de marginalidade socioeconômica e de desigualdade de
oportunidades educativas”.
Aqui, onde o imperativo e a finalidade da EJA será a reparação de uma
realidade historicamente marcada pela desigualdade e exclusão social de cidadãos
vitimados como marginais, oprimidos, excluídos, empregáveis, miseráveis, pobres, sem
terra, sem teto, sem horizonte, ou mesmo, sob nomes mais escolares, como: repetentes,
defasados, aceleráveis, analfabetos, candidatos à suplência, discriminados (ARROYO,
2005), o Parecer CEB 11/2000 nomeará a EJA como uma promessa de qualificação de
vida para todos, como uma promessa de efetivar um caminho de desenvolvimento de todas
as pessoas, de todas as idades, onde adolescentes, jovens, adultos e idosos poderão
atualizar conhecimentos, mostrar habilidades, trocar experiências e ter acesso a novas
regiões do trabalho e da cultura.
Não obstante à ampliação dos conceitos e das propostas atuais em EJA, torna-
se imperioso não deixar que esta volte a ser encarada como educação compensatória, ou
mesmo, que esta supere a idéia de educação complementar e compensatória, que segundo
Di Pierro (2005), ainda é uma concepção predominante entre educadores e gestores da
educação brasileira, atribuindo à EJA a mera função de reposição de escolaridade o
realizada na infância ou adolescência, se concebendo por trás da constituição do ensino
supletivo, que continua a ser a referência comum para pensar a EJA no Brasil.
De todo modo, cabe destacar as conquistas obtidas de forma merecedora pela
Educação de Jovens e Adultos ao ser concebida como modalidade específica e integrante
da Educação Básica, bem como, tanto conseqüência do exercício da cidadania, como
condição para uma plena participação na sociedade (Declaração de Hamburgo), e que de
7
RIVERO, José. Educación y pobreza: políticas, estrategias y desafios. In: SEMINÁRIO REGIONAL
PROGRAMAS DE EDUCACIÓN COMPENSATORIA EN AMERICA LATINA Y EL CARIBE, 1998,
Buenos Aires. (mimeo). (citação conforme consta no livro de SOARES)
35
acordo com Haddad:
Hoje, seja no domínio das práticas, seja no âmbito da sua sistematização trico-
metodológica, tem priorizado algumas temáticas em suas discussões, que podem
ser concebidas como desdobramentos daquelas que se colocavam nas décadas
anteriores: necessidade de se estabelecer um perfil mais aprofundado do aluno, a
tomada da realidade em que está inserido como ponto de partida das ações
pedagógicas, o repensar de currículos com metodologias e materiais didáticos
adequados às suas necessidades e à formação de professores condizente com a
especificidade da EJA... (2001, p. 202).
Essas colocações definidas por Haddad (2001), e outros questionamentos em
torno da Educação de Jovens e Adultos remete-se à necessidade de se pensar esse
segmento educacional como uma modalidade com características específicas e uma
identidade própria.
1.3 Especificidades da Educação de Jovens e Adultos
A questão da especificidade da EJA está na importância de se considerar o
perfil distinto de seus educandos e na satisfação das necessidades de aprendizagem de
jovens e adultos de escolarização básica incompleta ou jamais iniciada, que como tais,
(re)tomam sua vida escolar apresentando “perspectivas e expectativas, demandas e
contribuições, desafios e desejos próprios em relação à Educação Escolar”, conforme
esclarece Fonseca (2005a, p. 32).
Ainda que a especificidade da EJA seja interpretada pela consideração de que
seus educandos são diferentes dos estudantes presentes nos anos adequados à faixa etária,
caracterizando, portanto, a idade dos alunos que atende como determinante na definição da
EJA, Fonseca (2005a) enfatiza que o grande traço definidor dessa modalidade é a
caracterização sociocultural de seu público.
Oliveira sob essa perspectiva do contexto social e cultural do aluno da EJA
como aspecto determinante na definição do que se tem entendido por Educação de Jovens
e Adultos, afirma:
O tema “educação de pessoas jovens e adultas” não nos remete apenas a uma
questão de especificidade etária, mas, primordialmente, a uma questão de
especificidade cultural. Isto é, apesar do corte por idade (jovens e adultos são,
basicamente “não-crianças”), esse território da educação não diz respeito a
reflexões e ações educativas dirigidas a qualquer jovem ou adulto, mas delimita
um determinado grupo de pessoas relativamente homogêneo no interior da
diversidade de grupos culturais da sociedade contemporânea (2001, p. 15).
36
Diante desse quadro onde a heterogeneidade do público da EJA e suas
situações reais merecem consideração cuidadosa e os programas de educação de jovens e
adultos devem se impor como uma exigência de justiça social, para que a ampliação das
oportunidades educacionais não se reduza a uma ilusão e a escolarização tardia de milhares
de cidadãos não se configure como mais uma experiência de fracasso e exclusão
(RIBEIRO, 1997), a EJA deverá ser necessariamente instituída como um modelo
pedagógico próprio, concebido não para crianças e adolescentes que percorrem o caminho
da escolaridade de forma regular, mas para jovens e adultos com características
psicossociais, saberes e conhecimentos próprios.
O Parecer 11/2000, ao destacar os momentos de homogeneidade e
heterogeneidade que envolvem as duas faixas etárias consignadas na EJA, ou seja, jovens e
adultos, elucida que mais importante do que reconhecer que as expectativas e experiências
destes grupos freqüentemente não são coincidentes, é perceber o perfil distinto destes
estudantes e não tratar pedagogicamente os mesmos conteúdos como se tais alunos fossem
crianças ou adolescentes. O que significa, ainda segundo o Parecer, não contrariar mais do
que um imperativo legal, não contrariar um imperativo ético, e assim admitir o perfil dos
alunos da EJA como o princípio da organização do projeto pedagógico dos
estabelecimentos que atendem a esta modalidade da Educação Básica.
A especificidade da EJA em relação às demais etapas do ensino básico deverá
ser assumida como o preceito orientador na elaboração de um modelo educacional
inovador e de qualidade voltado às pessoas jovens e adultas inscritas nessa modalidade,
o se restringindo, conforme cita o Programa de Educação de Jovens e Adultos da
Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso:
... em grande medida, à aceleração do tempo curricular, expediente que muitas
vezes serviu mais ao aligeiramento do ensino que à contextualização dos
currículos e metodologias de ensino às características dos educandos e
especificidades da modalidade (2000, p. 17).
Ponto de partida do processo de aprendizagem, e reconhecido como uma das
bases da construção curricular da Educação de Jovens e Adultos, o conhecimento da
realidade dos alunos permite repensar as possibilidades de concretização das necessidades,
exigências, interesses, expectativas e desejos dos educandos da EJA, que devem ser
tomados como agentes culturais e sujeitos da aprendizagem.
Ainda, segundo essa perspectiva, referindo-se ao aluno da EJA como aluno
trabalhador, uma vez que em suas experiências concretas notaram que aqueles que
freqüentam os programas de educação de adultos, são majoritariamente os jovens
37
trabalhadores, a Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos esclarece que:
O contexto cultural do aluno trabalhador deve ser a ponte entre o seu saber e o
que a escola pode proporcionar, evitando, assim, o desinteresse, os conflitos e a
expectativa de fracasso que acabam proporcionando um alto índice de evao
(2001, p. 121).
Entre as contribuições de Paulo Freire para a Educação de Jovens e Adultos,
encontramos sua consideração de que é fundamental a compreensão crítica por parte dos
educadores sobre a realidade dos seus alunos, principalmente quanto ao aspecto social da
EJA. Para ele, seria impossível pensar em uma Educação Básica para jovens e adultos
considerando os conteúdos e procedimentos didáticos a serem ensinados desvinculados
totalmente da realidade desses sujeitos, pois isso seria confinar a EJA a um mero processo
escolarizante, deixando portanto, de atender a um dos principais objetivos da educação que
é desenvolver o processo de conscientização dos educandos.
Pensando sobre essa questão em que a realidade do educando deve ser
considerada pelo educador, Gadotti (2001) mesmo reconhecendo que nem sempre isso será
possível, suscita que o sucesso de um programa de educação de jovens e adultos é
facilitado quando o educador é do próprio meio. Devendo, portanto, o educador
proveniente de outros meios o apenas geográficos, mas também sociais, no mínimo,
fazer o diagnóstico histórico-econômico do grupo ou comunidade onde i trabalhar e
estabelecer um canal de comunicação entre o saber técnico (erudito) e o saber popular.
Sobre a importância de se conhecer melhor a vida dos alunos da EJA, Soares
(2001) explica que quando se insistia em conhecer quem era o aluno da Educação de
Adultos, as pesquisas a partir da realidade socioeconômica dos estudantes descobriram que
se tratava de um trabalhador adulto, que freqüentava o ensino noturno. Justificando a
necessidade de se intensificar os estudos para melhor compreender o perfil e os processos
de vivência dos sujeitos da EJA, Soares complementa:
Uma das contribuições desses estudos resultou na descoberta do jovem, como
parcela significativa, entre os participantes dos projetos e programas da educação
de adultos. Essa descoberta influenciou a ampliação do campo, que passou a
incorporar o segmento juvenil. Outra contribuição tem sido revelar o quanto esse
jovem e esse adulto, em situação de exclusão social, possuem características
distintas, quando se considera a sua diversidade cultural: gênero, raça e/ou etnia,
religiosidade, de origem rural ou urbana etc (2001, p. 214).
Outro elemento a ser considerado como princípio da EJA, está na valorização
dos conhecimentos prévios construídos pelos jovens e adultos que chegam à escola com
um saber próprio, elaborado a partir de suas relações sociais e dos seus mecanismos de
sobrevincia. Admitindo o jovem e o adulto como possuidores de um conjunto de
38
habilidades em razão dos conhecimentos adquiridos nas mais diversas práticas sociais ao
longo da vida, a função da educação, de acordo com Soares (2001), será a de potencializar
essas habilidades, tornando-os mais capazes para enfrentar seu cotidiano, significando
ainda, o fortalecimento desses sujeitos como seres autônomos.
Se como educação compreende-se o desenvolvimento das potencialidades do
indivíduo, é preciso levar em conta as condições nas quais essa educação se dá.
E se esse indivíduo é um jovem ou um adulto, esses apresentam peculiaridades
que os distinguem da criança. Distinções que afetam não o conceito, mas o modo
como se trabalha com esses sujeitos. Essas diferenças vinculam-se tanto à
metodologia, quanto à própria abordagem que se tome acerca de conhecimento
(PAIVA et al., 2004, p. 27)
Proveniente da discussão sobre a compreensão dos conhecimentos prévios dos
educandos da EJA, o respeito à diversidade cultural desses estudantes também será
incorporado como significante no processo curricular para essa área da educação.
Reconhecendo, na população que procura os cursos para jovens e adultos, a
grande diversidade de características sócio-culturais (perfil sócio-econômico, étnico,
gênero, localização espacial, engajamento no mundo do trabalho etc) e as motivações para
o retorno aos estudos, a Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos (2001)
defende que as experiências inovadoras que almejarem uma nova qualidade na Educação
Básica de jovens e adultos, além de tomarem esses sujeitos como construtores de
conhecimentos, terão necessariamente que assumirem o respeito à cultura dos mesmos
como ponto fundamental desse processo.
A Educação de Jovens e Adultos, devendo ser constituída e planejada de forma
a possibilitar o acesso e a permanência dos seus alunos, precisará não desenvolver
práticas pedagógicas que valorizem o perfil, a realidade e os conhecimentos prévios dos
educandos, como também, necessitará elaborar e implementar currículos flexíveis e
metodologias de ensino-aprendizagem adequados à maturidade e experiência dos
estudantes jovens e adultos. Com isso, torna-se imprescindível que os programas de EJA
pressuponham em sua estrutura pedagógica a flexibilização da organização escolar e dos
tempos e espaços de aprendizagem de acordo com as características, necessidades e
interesses dos educandos e especificidades da modalidade.
O Parecer 11/2000, diante do reconhecimento que os projetos pedagógicos e
planos de curso da EJA devem se adequar inevitavelmente ao tratamento diferenciado que
esse campo merece receber, vem tratar que:
Esta adequação tem como finalidade, dado o acesso à EJA, a permanência na
escola via ensino com conteúdos trabalhados de modo diferenciado com
métodos e tempos intencionados ao perfil deste estudante. Também o tratamento
didático dos conteúdos e das práticas não pode se ausentar nem da especificidade
39
da EJA e nem do caráter multidisciplinar e interdisciplinar dos componentes
curriculares (2000, p. 58).
Com base nessas orientações e diante dos desafios da Educação de Jovens e
Adultos, o papel do docente inserido nessa modalidade será extremamente fundamental,
uma vez que esta dependerá sobretudo da motivação, participação e aperfeiçoamento
profissional do educador de jovens e adultos.
Envolvido estreitamente com o processo educativo da EJA, o educador de
jovens e adultos deverá estar
... preparado, compromissado com o trabalho coletivo e com a inovação
pedagógica, dotado de sensibilidade para acolher educandos que carregam
diferentes motivações, capaz de lidar com a heterogeneidade, de reconhecer e
valorizar os saberes de que os jovens e adultos são portadores, disposto ao
diálogo democrático e à convivência plural (MATO GROSSO, 2000, p. 19).
Na compreensão do quanto é essencial o entendimento do processo de ensino-
aprendizagem do jovem e adulto como, muitas vezes, mais complexo do que o próprio
processo educativo realizado na infância e na adolescência, exatamente por se tratar de
pessoas dotadas de uma consciência formada e portadoras de uma bagagem cultural, o
educador da EJA precisará ter um olhar cuidadoso sobre as questões que norteiam a
relação entre professor, aluno e conhecimento.
Nesse sentido, algumas das qualidades indispensáveis, sugeridas por Ribeiro
(1997), ao educador de jovens e adultos serão: a capacidade de solidarizar-se com os
educandos; a disposição de encarar dificuldades como desafios estimulantes; a confiança
na capacidade de todos de aprender e ensinar; o interesse em procurar conhecer seus
alunos, com suas expectativas, cultura, características e problemas de seu entorno social e
suas necessidades de aprendizagem; a sensibilidade para trabalhar com a diversidade
cultural dos seus estudantes; o cuidado em buscar conhecer cada vez melhor os conteúdos
a serem ensinados, atualizando-os constantemente; a compreensão da necessidade de
refletir permanentemente sobre sua prática, buscando os meios de aperfeiçoá-la; e
finalmente, a compreensão do quanto é importante favorecer a autonomia dos educandos e
estimulá-los para que tomem consciência de como a aprendizagem se realiza,
incentivando-os a avaliarem constantemente seus progressos e suas carências, e a
entenderem seu próprio processo de aprendizagem.
Na discussão dos limites e das exigências que envolvem o universo da
Educação de Jovens e Adultos e a atuação e o papel dos professores diante da
complexidade diferencial que se situa esse contexto, uma formação docente específica para
40
a EJA precisará ser constituída como uma ação sistemática imprescindível.
Condizente com essa iniciativa, o Parecer 11/2000 versa um item específico
sobre a formação docente para a Educação de Jovens e Adultos. Nele (item VIII), o
Parecer ressalta que o “preparo de um docente voltado para a EJA, deve incluir, além das
exigências formativas para todo e qualquer professor, aquelas relativas à complexidade
diferencial desta modalidade de ensino (p. 56). Preocupado com a necessidade de se
ofertar habilitação docente voltada para a EJA, o Parecer recomenda que “as licenciaturas e
outras habilitações ligadas aos profissionais do ensino não podem deixar de considerar, em
seus cursos, a realidade da EJA” (p. 58). Para tanto, dada a inquietação não com a
formação inicial, mas também continuada para o campo da EJA, o Parecer sugere ainda
uma articulação entre os sistemas de ensino e as instituições formadoras, com vistas à
formação em serviço, sob a forma, por exemplo, de cursos de especialização.
Uma vez que, segundo a Comissão Nacional de Educação de Jovens e Adultos
(2001), os professores que trabalham na EJA, em sua quase totalidade, não estão
preparados para o campo específico de sua atuação, e em geral, são professores leigos ou
pertencentes ao próprio corpo docente do ensino regular, torna-se imperioso pensar nesse
educador de jovens e adultos como um profissional em formação, conforme as
considerações de Soares:
A valorização desse educador se considerando a relevância da sua função
perante uma sociedade que necessita pensar e propor alternativas de vida e
trabalho para uma parcela expressiva da população que se encontra, de um,
excluída e, de outro, ávida por se incluir em processos significativos de
formação. Para tal, se faz urgente investir na profissionalização do trabalhador
em serviço. É necessário investir na docência, o que requer dar tempo para a
formação desse profissional (2001, p. 221).
Cabe ressaltar, que não se obterá ensino de qualidade sem um corpo docente
qualitativamente preparado para o exercício de suas funções. O que reafirma o quanto são
elementos fundamentais tanto a profissionalização quanto a formação adequada dos
professores de jovens e adultos para atender a especificidade da EJA.
Contudo, quanto à especificidade da EJA, vale mencionar a necessidade de
construir uma Educação Básica de jovens e adultos com uma identidade própria, sem
concessões à qualidade de ensino e propiciando uma terminalidade e acesso a certificados
equivalentes ao ensino regular, sem que isso signifique tratar a EJA como uma reposição
da escolaridade perdida.
41
1.4 Os Números da Educação de Jovens e Adultos no Brasil
Mesmoo sendo uma pretensão deste trabalho apresentar um diagnóstico
completo sobre a situação da EJA, uma vez que não é nada fácil obter indicadores
estatísticos de uma área tão complexa e que envolve a participação de inúmeros agentes
sociais e instituições, ainda assim, vale destacar alguns dados sobre a conjuntura
educacional da EJA, afim de que se possa ter uma visibilidade desse universo.
Segundo as estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), através dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), em
2005, de um total de 135.482.389 pessoas com 15 anos de idade ou mais, cerca de quase
15 milhões eram analfabetas, ou seja, 11,05% da populão desta faixa etária eram
consideradas, de acordo com a definição de analfabeto da UNESCO, incapazes de ler e
escrever pelo menos um bilhete simples no idioma que conhece.
Comparando os dados do IBGE citados no Parecer 11/2000 (p. 55), que se
referem ao período compreendido entre 1920 a 1980, observa-se um decréscimo
sistemático do número de analfabetos na população brasileira com 15 anos de idade ou
mais. Em 1920, o Brasil tinha 11.401.715 analfabetos na faixa etária acima dos 14 anos de
idade, o equivalente a 64,9% dessa população assinalada. Em 1940 o percentual era de
56,0% de analfabetos com 13.269.381 pessoas. Em 1960, havia 15.964.852 analfabetos, ou
seja, 39,6% do universo de pessoas com 15 anos de idade ou mais. Em 1980, esse número
passou para 25,4% com 18.651.762 analfabetos. em 2004 (IBGE, 2006), o percentual
caiu para 11,38% com um contingente de 15.106.485 de analfabetos, o que significou
também um decréscimo no número absoluto de analfabetos na faixa etária acima dos 14
anos de idade.
Apesar dessa redução significativa da taxa de analfabetismo no Brasil, o
governo reconhece em seu relatório sobre o programa brasileiro de Educação de Jovens e
Adultos, apresentado pelo Ministério da Educação no encontro South-South Policy
Dialogue on Quality Education for Adults and Young People, realizado em junho de 2005,
na cidade do México, que
Embora o país tenha conseguido, nas últimas décadas, significativos avanços no
campo da educação, notadamente em relação à educação de jovens e adultos,
muito ainda por fazer, especialmente no enfrentamento dos diversos tipos de
analfabetismo: da educação, da cultura, da política e da cidadania. Nesse sentido,
os números da exclusão educacional são contundentes (HENRIQUES;
IRELAND, 2005, p. 349)
Outro problema que ilustra a necessidade de resgatar a educação como direito
42
de todos, de jovens e adultos excluídos do sistema de ensino, e que é concomitante ao
analfabetismo absoluto em nosso país, trata-se do analfabetismo funcional, que segundo
Haddad é uma
... situação que caracteriza pessoas que tiveram uma experiência escolar
insuficiente para garantir o domínio de habilidades como a leitura, a escrita e o
cálculo, num grau que corresponda às demandas do mundo do trabalho ou outras
dimensões do cotidiano (2001, p. 195).
Considerados pela UNESCO como as pessoas com menos de quatro anos de
estudos, e que mesmo que saibam ler e escrever frases simples não possuem as habilidades
necessárias para satisfazer as demandas do dia-a-dia e se desenvolver pessoal e
profissionalmente, os analfabetos funcionais, apesar de passarem de 36,9% em 1992 para
26,0% em 2002, dentre a população acima dos 14 anos de idade, em 2003, correspondiam
a 33 milhões de pessoas pertencentes a essa faixa etária.
Esses dados que refletem, de certo modo, o retorno das pessoas tidas como
analfabetas funcionais à vida escolar, principalmente os jovens de 15 a 17 anos, cuja taxa
de escolarização passou de 59,7% em 1992 para 81,1% em 2001, segundo o MEC graças
aos cursos de EJA, demonstram uma situação que vem ocorrendo de forma mais intensa
nos últimos anos no público que efetivamente freqüenta os programas de Educação de
Jovens e Adultos, ou seja, é cada vez mais reduzido o número daqueles que não tiveram
nenhuma passagem anterior pela escola.
Os dados estatísticos sobre a situação da EJA no Brasil, levantados pelo Censo
Escolar de 2005, publicado em junho de 2006 pelo Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), por intermédio de sua Diretoria de
Estatísticas da Educação Básica (DEEB), revelam que o número de alunos matriculados foi
de 5.615.409, sendo registradas 4.619.409 matrículas nos cursos presenciais e 996.000
matrículas nos cursos semipresenciais ou com presença flexível.
Tomando como base apenas os cursos presenciais da EJA, tivemos 3.395.550
alunos matriculados no ensino fundamental e 1.223.859 no ensino médio. Foram
registradas 875 matrículas pela dependência administrativa Federal; 2.329.966 pela
Estadual; 2.070.606 pela Municipal e 271.962 pela dependência administrativa Privada.
De acordo com o Censo Escolar, entre 2000 (ano que se constituiu as Diretrizes
Curriculares Nacionais da EJA e quando se registraram 3.410.830 alunos matriculados) e
2005 (ano em que as matrículas somaram 4.619.409), a oferta de vagas nos cursos
presenciais da EJA (incluindo o Ensino Fundamental e Médio) cresceu 35,43%, acolhendo
um contingente adicional de mais de um milhão de estudantes. Nesse mesmo período
43
notou-se a expansão das redes municipal (que registrou um aumento de 105,98% com
1.065.388 matrículas registradas) e estadual (com um acréscimo de 311.462 matrículas, ou
seja, um crescimento de 15,43%); e o decréscimo do número de matriculas efetivadas
pelos sistemas federal (que registrou uma redução de 92,44% com a perda de 10.698
matrículas) e privado (com a diminuição de 157.573 matrículas, ou seja, um decréscimo de
41,96%).
O número de instituições que ofereceram a EJA, segundo o Censo Escolar
2005, no Brasil, foi de 44.838 contra 11.879 registradas pelo Censo Escolar de 1995.
Nestes onze anos, de 1995 a 2005, o número de estabelecimentos que atenderam a
EJA/Supletivo ofertados pela União subiu de 7 para 10; passando de 1.422 para 1.671 na
rede privada; enquanto que no sistema estadual foram criados 4,5 mil estabelecimentos
(sendo 7.455 estabelecimentos em 1995 e 12.026 em 2005); e na rede municipal obteve-se
uma taxa de crescimento de 939,43%, com um aumento extraordinário no número de
estabelecimentos que em 1995 não ultrapassavam 2.995 e no ano de 2005 chegou a 31.131
estabelecimentos.
A elevada participação dos sistemas municipais na oferta da EJA está
associada segundo o MEC/SEF (2002a, p. 22) às “disposições transitórias da Constituição
de 1988 que incumbe os municípios e, supletivamente, os estados e a União, de prover
cursos presenciais para jovens e adultos”, ou mesmo, à descentralização da oferta escolar
para os jovens e adultos por parte do governo federal (DI PIERRO, 2005), ou ainda, ao
movimento ocorrido nos últimos anos em que o Estado se descomprometeu com a EJA
outorgando pouca importância a essa área voltada para os segmentos jovens e adultos
(SOARES, 2001).
Outro indicador importante no contexto da EJA refere-se ao número de
professores atuando nesta modalidade educacional. Em 2005, o INEP computou cerca de
247.983 funções docentes exercendo atividades em salas de aula da EJA, distribuídas por
dependência administrativa com 122 funções docentes para a União, 131.619 para os
Estados, 99.504 para os Municípios e 16.738 para os sistemas Privados. Com os dados do
Censo Escolar de 2005 verificou-se ainda um percentual de 72,6% dos professores da EJA
com nível superior completo e 26,5% com o Ensino Médio concluído, restando um valor
de menos de 1% de professores que têm apenas o Ensino Fundamental (sendo 0,8% os que
finalizaram esta etapa da educação e 0,1% os que ainda não concluíram).
Apesar dos dados sobre a formação docente dos educadores da EJA serem
satisfatórios, Di Pierro (2005) alerta que a formão inicial dos professores que atuam na
44
Educação Básica de jovens e adultos ainda é insuficiente para fazer frente aos desafios de
ampliação da oferta escolar e garantir os direitos de 66 milhões de brasileiro com baixa
escolaridade, principalmente quando quase não cursos superiores dedicados a habilitar
educadores para esse campo.
Uma prova disso é que, dos 1.306 cursos de Pedagogia existentes em 2003,
apenas dezesseis ofereciam habilitação em educação de jovens e adultos. Para
superar esse déficit seria desejável que os governos incentivassem as instituições
de ensino superior a ampliar a capacidade de habilitar professores/as para o
ensino de jovens e adultos, proporcionando também aos profissionais em
exercício novas oportunidades de elevação de escolaridade, certificação e
aperfeiçoamento profissional (DI PIERRO, 2005, p. 24-25).
O Parecer 11/2000 chama-nos a atenção para que não se ignore que alunos
atendidos pela iniciativa privada, pelos movimentos sociais, pelas entidades civis e por
múltiplas organizações não-governamentais, que apesar de desempenharem um papel
importante no desenvolvimento da EJA através de uma riqueza de iniciativas, de formatos,
de processos de sistematização, de publicações, em conseqüência do compromisso e do
caráter ousado de muitos desses grupos, ainda não constam nas estatísticas dos órgãos
governamentais responsáveis pelas pesquisas educacionais no Brasil.
1.5 - A Educação de Jovens e Adultos em Mato Grosso
Reconhecido, entre os governos estaduais, pelo empenho em tentar promover e
implantar programas e projetos específicos visando atender às reivindicações de uma
educação voltada para os jovens e adultos, o estado de Mato Grosso tem ocupado lugar de
destaque desde que o direito à educação fundamental blica, gratuita e adequada a jovens
e adultos ficou submetida à boa vontade dos governos municipais e estaduais, sem uma
participação mais efetiva do governo federal.
Neste sentido, destacando a participação dos governos estaduais na
implementação de ações voltadas à oferta de EJA, Soares esclarece:
Os governos estaduais têm criado projetos e programas com formatos bem
distintos. Em muitos deles a EJA não tem sido assumida como prioridade na
educação. Entre aqueles que elaboraram um programa para a área com forte
impacto no atendimento podemos citar o Paraná, o Mato Grosso e Rio Grande
do Sul (2002, p. 8).
Passando por diferentes propostas de atendimento, a Educação de Jovens e
Adultos em Mato Grosso foi normatizada no Sistema Estadual de Ensino, em setembro do
45
ano de 2000, através da Resolução 180 homologada pelo Conselho Estadual de Educação
de Mato Grosso (CEE/MT).
Estabelecida com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
de Jovens e Adultos expressas no Parecer 11/2000, a Resolução 180/2000-CEE/MT além
de confirmar e resguardar as proposições defendidas no Parecer 11/2000 atribuiu à
Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso (SEDUC/MT) a responsabilidade de
criação de um programa de orientação às escolas das redes blica e privada que
trabalhavam ou aspiravam trabalhar com a modalidade de EJA.
Após o desencadeamento de um processo de seminários regionais, que
culminaram em um seminário estadual e na constituição do Fórum Permanente de Debates
sobre a Educação de Jovens e Adultos (FPDEJA), favorecendo para a análise e
compreensão de uma nova concepção de EJA, o Programa de Educação de Jovens e
Adultos foi elaborado por um grupo de trabalho interinstitucional constituído por
representantes da SEDUC/MT, do CEE/MT, da União dos Dirigentes Municipais de
Ensino (UNDIME), da Secretaria Municipal de Educação de Cuia e dirigentes de escolas
da EJA, além da consultoria da Ação Educativa de São Paulo.
Regulamentado pela Resolução 177/2002-CEE/MT, o Programa de Educação
de Jovens e Adultos fixa os critérios e referências para que, respeitadas a legislação e as
normas vigentes, os estabelecimentos de ensino das redes blicas estadual e municipal e
privada que aspirem atuar na EJA estabeleçam suas propostas pedagógicas e planos de
curso com autonomia de forma a contemplar:
a) Diagnóstico da demanda por educação de jovens e adultos, considerados os
níveis de escolaridade da população, a localização geográfica da unidade
escolar e a cobertura escolar pré-existente;
b) Objetivos qualitativos e metas quantitativas da oferta escolar;
c) Etapas (Fundamental e/ou Média), segmentos (correspondentes às partes do
Ensino Fundamental, ou seja, 1
o
Segmento referente aos anos iniciais, e 2
o
Segmento referente aos anos finais) e formas de ensino oferecidas
(presencial, semi-presencial, a distância e/ou preparação para exames
supletivos);
d) Proposta didático-pedagógica, explicitando metodologias específicas à
modalidade;
e) Caracterização do corpo docente e descrição dos recursos sicos que a
escola dispõe para desenvolver a proposta pedagógica;
46
f) Regime Escolar e forma de estruturação da oferta, compreendendo
organização dos tempos (calendário anual, jornada escolar) e espaços
formativos dos educandos e dos educadores (formas de trabalho coletivo,
periodicidade de reuniões pedagógicas, estratégias de formação continuada,
etc.);
g) Proposta curricular (incluindo os conteúdos programáticos dos
componentes da base comum e da parte diversificada, os temas transversais
privilegiados, as formas de articulação das disciplinas em áreas de
conhecimento ou projetos interdisciplinares, etc.);
h) Sistemática de avaliação (incluindo descrição dos perfis de saída
8
de cada
fase e etapa, critérios e procedimentos de registro, modalidade de
recuperação oferecidas e de progressões admitidas, instrumentos para traçar
o perfil de entrada e proceder a classificação inicial do aluno, para
reclassificá-lo e proceder aos avanços durante o processo, para aferir
resultados finais e certificar competências, etc.);
i) Nos casos dos cursos de Ensino Médio de Jovens e Adultos nas formas
semi-presencial ou à distância, em que a certificação de conclusão de
estudos é realizada em exames especiais oferecidos pelo poder público,
será exigido também Projeto de Banco de Dados relativo ao perfil de saída
dos educandos, das habilidades e competências a serem desenvolvidas, e de
situações ou práticas sociais em que tais competências e habilidades
necessitem ser mobilizadas e transferidas para a resolução de problemas.
Parte integrante da Proposta de inserção das escolas interessadas em
integrarem-se no Programa de Educação de Jovens e Adultos, os Planos de Curso, que
após autorização inicial, deverão ser cadastrados pelo CEE/MT, para efeito de
conhecimento, acompanhamento e avaliação, contemplarão, segundo o Art. 11 da
Resolução 180/2000-CEE/MT, as seguintes exigências legais:
a) Conteúdos curriculares significativos que considerem habilidades e
competências, de acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais para o
Ensino Fundamental e Médio;
b) Metodologia adequada à modalidade;
8
De acordo com o inciso VI do Art. 2
o
da Resolução 180/2000-CEE/MT, o perfil de saída compreende os
objetivos a serem alcançados pelos alunos em relação às necessidades básicas de aprendizagem definidos
pela escola, à luz das Diretrizes Curriculares Nacionais e desta Resolução.
47
c) Formas de avaliação condizente;
d) Perfil de saída;
e) Formas de certificação;
f) Organização flexível, considerada a forma de oferta.
A autorização e a renovação de autorização de cursos de EJA, conforme o Art.
12 da Resolução 180/2000-CEE/MT, terão prazos limitados, inicialmente de três anos,
podendo ser renovado por igual período, após processo regular de avaliação pelo Sistema
de Ensino. Cabendo às autoridades competentes, a suspensão ou a cassação da autorização
dos estabelecimentos de ensino que não preencham as condições de qualidade e/ou
idoneidade.
Definido com o objetivo de ampliar progressivamente a oferta de
oportunidades de escolarização para o grupo etário compreendido pelos jovens e adultos,
de modo a atender à demanda e cumprir o dever do poder público na garantia dos direitos
dos cidadãos à Educação Básica de qualidade, o Programa de Educação de Jovens e
Adultos de Mato Grosso instituiu como suas diretrizes pedagógicas: valorização dos
conhecimentos e respeito à diversidade sociocultural dos educandos; abordagem
interdisciplinar do currículo e desenvolvimento de projetos temáticos; flexibilização da
organização escolar, dos tempos e espaços de aprendizagem; avaliação reflexiva e
formativa; trabalho coletivo, valorização profissional e formação continuada do educador.
Com a definição da duração e carga horária a que os estabelecimentos de
ensino da EJA devem oferecer aos alunos jovens e adultos organizado em seis fases anuais
de 800 horas cada no Ensino Fundamental (três fases no 1
o
Segmento e três fases no 2
o
Segmento) e três fases anuais de 800 horas cada no Ensino dio, e a obrigatoriedade
desses educandos freqüentarem no mínimo 75% das atividades presenciais de ensino e
aprendizagem evitando-se que tal exigência se converta em fator de exclusão, a Resolução
180/2000-CEE/MT e o Programa de Educação de Jovens e Adultos tentaram o somente
assegurar o combate ao aligeiramento do ensino, como ocorria no antigo Supletivo, mas se
propuseram a assegurar à educação dos jovens e adultos um padrão nimo de qualidade.
Facultando às unidades escolares da EJA criarem condições para que o aluno
possa aprender em níveis crescentes e se apropriar do mundo do fazer, do conhecer, do agir
e do conviver, além de reconhecerem a pluralidade cio-cultural dos seus educandos
jovens e adultos e seus direitos a traçarem com autonomia suas biografias formativas, de
modo a satisfazerem a diversidade de suas necessidades básicas de aprendizagem, o
Programa de EJA e a Resolução 180, tomando como princípio os dispositivos da LDB
48
9394/96 e da Resolão 150/99-CEE/MT, estabelecem que as experiências e saberes
sociais do jovem e do adulto podem ser sistematizados e referendados pela escola
receptora para efeito de aproveitamento de estudos, decorrendo progressão parcial ou total
de etapa ou segmento para o aluno.
Isto quer dizer que a unidade escolar ao detectar que o educando reúne
condições para avançar em seus estudos poderá avaliá-lo e proceder ao aproveitamento de
estudos parcial ou total das áreas da fase a qual está matriculado garantindo-se a inserção
na etapa subseqüente. Para o bom desenvolvimento desse processo, o Programa de EJA
sugere às escolas que procedam à avaliação diagnóstica e processual contínua das
habilidades e competências desenvolvidas pelos estudantes de forma a garanti-los uma
progressão escolar de qualidade, respeitando suas necessidades sicas de aprendizagem.
O Programa de Educação de Jovens e Adultos, proposto como um movimento
mais amplo de renovação pedagógica instrdo com bases numa educação emancipatória,
democrática, inclusiva e de qualidade, ao diagnosticar a real situação da EJA em Mato
Grosso, determinou como metas em seu planejamento estratégico de atendimento à
demanda dessa modalidade: a redução da taxa de analfabetismo no Estado na faixa etária
de 35 a 49 anos de 17% para 8%; e a sua integração no Plano Nacional de Educação
(PNE), estabelecido pela Lei 10.172/2001 com as seguintes metas prioritárias para a EJA:
- Alfabetizar, em cinco anos, dois terços do contingente total de analfabetos,
de modo a erradicar o analfabetismo em uma década;
- Assegurar, em cinco anos, a oferta da EJA nas três fases do primeiro
segmento (equivalente às quatro primeiras séries iniciais) do Ensino
Fundamental para 50% da população de 15 anos e mais, que não tenham
atingido este nível de escolaridade;
- Assegurar, até o final da década de 2000, a oferta de cursos equivalentes às
três fases do segundo segmento (equivalente às quatro ries finais) do
Ensino Fundamental para toda a populão de 15 anos e mais, que concluiu
as quatro séries iniciais;
- Dobrar em cinco anos e quadruplicar em dez anos, a capacidade de
atendimento nos cursos de EJA de nível médio.
Com base nos dados apurados pela PNAD realizada em 1999, onde 193.601
pessoas no Estado de Mato Grosso eram analfabetas, ou seja, 11,78% da população mato-
grossense com idade igual ou superior a 15 anos; o Programa de EJA constatou imperiosa,
diante a tentativa de atingir as metas do PNE, a alfabetização de 25 mil jovens e adultos
49
por ano em Mato Grosso, de modo a reduzir à terça parte do contingente total de
analfabetos em cinco anos, viabilizando a erradicação do analfabetismo em uma década.
Decorridos três anos, após a homologação do Programa de EJA da
SEDUC/MT, a taxa de analfabetismo das pessoas com idade igual ou superior a 15 anos no
Estado de Mato Grosso, segundo os indicadores sociais de 2005 publicados pelo IBGE em
2006, foi de 9,7% contra 11,0% registrada pela média nacional e 8,9% aferida pela rego
Centro-oeste. Esses dados revelam, apesar da diminuição da taxa de analfabetismo entre
1999 e 2005, que o Mato Grosso, em particular, assim como o Brasil, ainda apresenta um
elevado índice de analfabetismo, tendo em vista as metas propostas pelo PNE.
Outra situação preocupante e que também reflete a necessidade do aumento da
oferta da modalidade EJA em Mato Grosso, refere-se à ampliação do conceito de
analfabetismo para “analfabetismo funcional” (pessoas com menos de quatro anos de
estudo), conceito, segundo a UNESCO, mais adequado para se avaliar a realidade social do
mundo moderno. Apesar dos resultados mostrarem redução nos últimos anos,
acompanhando a perspectiva nacional, o Estado do Mato Grosso registrou em 2005 uma
taxa de analfabetismo funcional das pessoas de 15 anos ou mais de idade de 23,9%,
conforme dados obtidos na PNAD.
Sobre o contexto da EJA no Estado de Mato Grosso, segundo o Censo Escolar
de 2005 realizado pelo INEP, o número de alunos matriculados atingiu a marca de 59.834,
sendo registradas 57.260 matrículas nos cursos presenciais e 2.574 matrículas nos cursos
semipresenciais ou com presença flexível. Do número total de alunos matriculados na EJA
neste ano, 33.013 matrículas se referiam ao Ensino Fundamental e 26.821 ao Ensino
Médio.
Os valores registrados em 2005 significaram um aumento em torno de 15.540
matrículas efetuadas nos cursos presenciais da EJA na etapa de Ensino Fundamental e uma
diminuição de cerca de 2.730 matrículas na etapa de Ensino Médio em relação ao número
de matrículas na educação presencial de jovens e adultos em Mato Grosso apuradas pelo
INEP em 1999, quando se registrou quase 45 mil matrículas, 27 mil das quais no Ensino
Médio e 17 mil no Ensino Fundamental.
As matrículas nos cursos presenciais da EJA, registradas no Estado de Mato
Grosso em 2005, atingiram seu maior número na faixa etária de 18 a 24 anos de idade com
20.096 alunos matriculados, sendo 11.562 matrículas só na etapa de Ensino Médio. No que
se refere à etapa de Ensino Fundamental da EJA também para os cursos presenciais, vale
destacar o número de matrículas compreendidas na faixa etária de mais de 39 anos de
50
idade com 4.905 registros.
Ainda segundo o Censo Escolar de 2005, tomando como base apenas os cursos
presenciais da EJA em Mato Grosso, tivemos 43.096 matrículas registradas pela rede de
ensino Estadual; 12.352 pela Municipal; 1.812 pela rede privada; e nenhuma matrícula
registrada pela União. Esses dados refletem a mesma posição ocorrida em 1999, quando a
maior parte da oferta escolar para jovens e adultos também foi realizada pela rede estadual
de ensino de Mato Grosso.
Quanto ao número de estabelecimentos de ensino que ofereceram a modalidade
EJA no Estado de Mato Grosso, o INEP em 2005 apurou 292 instituições contra 271
registradas pelo Censo Escolar de 2000. Neste período, o número de estabelecimentos que
atenderam a EJA sob a responsabilidade dos Municípios subiu de 80 para 126; enquanto
que as instituições do sistema estadual passaram de 171 para 156; o mesmo ocorrendo na
rede privada onde houve uma diminuição de 10 instituições.
Ainda que as estatísticas apresentadas não representem com precisão o cenário
da Educação de Jovens e Adultos, seus números apesar de demonstrarem certa ampliação
da cobertura escolar dessa modalidade, ainda são tímidos diante dos desafios impostos para
assegurar a todos os cidadãos o direito subjetivo à educação, a garantia de inserção no
contexto sócio-cultural para a efetivação da cidadania e a constituição das habilidades e
competências capazes de propiciar a atualização de conhecimentos por toda a vida.
Analisando outro indicador importante no contexto da EJA, verificou-se a
existência de 2.746 professores exercendo suas atividades nesta modalidade em Mato
Grosso no ano de 2005, sendo 2.614 docentes atuando na rede urbana de ensino e 132 na
zona rural. Com esses dados do INEP de 2005, foi possível identificar ainda um percentual
de 92,6% dos professores da EJA com formação superior e 7,3% com o ensino médio
concluído, restando um valor inferior a 1% (0,01%) de professores com o ensino
fundamental concluído. Essas informações reafirmaram o exposto pelo Programa de EJA
da SEDUC/MT de que a ampla maioria dos professores atuantes na Educação de Jovens e
Adultos de Mato Grosso possui formação superior.
A esse respeito, a SEDUC/MT analisando a necessidade de favorecer o
desenvolvimento do Programa implementado no Estado, proporá ações sistemáticas de
formação de educadores da EJA em servo, uma vez que os limites da formação docente
o estão apenas no campo da habilitação profissional, mas principalmente na falta das
competências específicas para a docência junto ao público jovem e adulto, que implicam
articular características sócio-culturais e necessidades de aprendizagens diversas, organizar
51
propostas de trabalho altamente flexíveis, promover a contextualização curricular e
metodológica, a avaliação formativa e reflexiva.
Contudo, procurando sintetizar as diversas conceitualizações referentes ao
contexto da Educação Básica de jovens e adultos ao longo de sua história, que reflete em
linhas gerais, de um lado, a perspectiva de uma EJA compreendida exclusivamente como
reposição da escolaridade formal, e por outro, a perspectiva de uma EJA reconhecida como
uma educação libertadora, multicultural, inclusiva e continuada; apresentamos a seguir,
com base na construção teórica deste capítulo, um quadro síntese distinguindo as
características dessas duas perspectivas, interpretando-as segundo as concepções de um
velho e novo modelo de educação.
QUADRO 1
Características da EJA nas Perspectivas do Velho e Novo Modelo Educacional
Velho Modelo de EJA Novo Modelo de EJA
- Ênfase na educação funcional ou
profissional
- Voltada basicamente para o treinamento
de mão-de-obra mais produtiva
- Educação assistencialista e
conservadora
- Educação voltada para o controle da
população
- Ênfase no ensino supletivo
- Educação compensatória
- Defendida exclusivamente com o
intuito de suprir e compensar a
escolaridade
- Admite apenas a educação formal
(escolar)
- Aligeiramento do ensino
- Visão preconceituosa do jovem e adulto
de escolarização incompleta como
incapaz e marginal, e como uma
criança-grande
- Modelo pedagógico como se fosse para
crianças e adolescentes (infantilização
do ensino)
- Currículo seqüencial e rígido, sem
flexibilidade
- Trata todos como se fossem iguais
- Não propõe formação específica de
professores
- Exame crítico da realidade existencial
dos educandos
- Visão do educando como agente cultural
e sujeito da sua aprendizagem
- Reconhecimento da educação formal e
informal
- Reconhecimento do pluralismo e da
diversidade cultural
- Defendida com as finalidades reparadora,
equalizadora e qualificadora
- Reconhecimento do perfil distinto, da
caracterização sociocultural e da
heterogeneidade dos educandos
- Valorização dos conhecimentos prévios
dos educandos
- Fortalecimento dos sujeitos como seres
autônomos
- Potencializar as habilidades dos
educandos
- Currículos com metodologias e materiais
didáticos adequados ao público escolar
- Abordagem interdisciplinar do currículo
- Flexibilização da organização escolar,
dos tempos e espaços de aprendizagem
- Formação de professores condizente com
a especificidade da EJA
CAPÍTULO II - EDUCAÇÃO MATEMÁTICA EM QUESTÃO
De modo geral, poderíamos dizer que a Educação Matemática caracteriza-se
como uma práxis que envolve o domínio do conteúdo específico (a Matemática)
e o domínio de idéias e processos pedagógicos relativos à
transmissão/assimilação e/ou à apropriação/construção do saber matemático
escolar (FIORENTINI; LORENZATO, 2006, p. 5).
Discutimos, neste capítulo, algumas concepções mais freqüentes sobre a
significão do ensino-aprendizagem em Matemática. Desta forma, destacamos as
perspectivas de uma Educação Matemática influenciada de um lado pelo modelo
tradicional de ensino e, de outro, respaldada por um novo significado, onde a Matemática é
colocada a serviço de uma educação preocupada com o desenvolvimento dos educandos de
modo a incluí-los no processo sócio-educacional, refletindo assim, a perspectiva de uma
Educação Matemática de Jovens e Adultos.
2.1 Perspectiva Tradicional do Ensino de Matemática
O reconhecimento do valor da Matemática é indiscutível, afinal seja pela sua
utilização na resolução de problemas da natureza, por estar entranhada na sociedade em
que vivemos ou por necessitarmos dela para compreender a nossa realidade social, a
questão é que ela é e sempre foi imprescindível.
Nesse sentido, cada vez mais se percebe melhor a íntima relação entre a
Matemática e a sociedade, e com isso torna-se crescente a importância atribuída à
Matemática nos sistemas de ensino.
No discurso constante da presença da Matemática na vida das pessoas e como
uma ferramenta indispensável ao exercício pleno da cidadania, percebe-se ainda que ela
também tem sido interpretada como algo estranho e incompreensível, e às vezes até como
algo de temor e ódio.
Essa visão da Matemática como um objeto difícil e algumas vezes impossível
53
de ser compreendido geralmente é conseqüência do processo de ensino-aprendizagem da
Matemática desempenhado nas escolas, onde os problemas que se levantam ao ensino
dessa disciplina a todos os níveis não são novos, assim como não é novo o mal estar que
eles provocam em professores e alunos.
A respeito dos velhos problemas relacionados ao ensino da Matemática,
Machado esclarece que “ensinar Matemática tem sido, frequentemente, uma tarefa difícil e
às dificuldades intrínsecas, somam-se as decorrentes de uma visão distorcida da matéria,
estabelecida, muitas vezes, desde os primeiros contatos” (1987, p. 9).
Nesta perspectiva, sabe-se, portanto, que parte desses problemas estariam
relacionados à visão tradicional da Matemática e do seu ensino, e à influência dessa visão
nas práticas pedagógicas dos professores que acabam condicionando os alunos, o apenas
durante o processo escolar, mas também para as outras etapas da vida, a perpetuarem a
concepção de que os conhecimentos matemáticos são inatingíveis e alheios à natureza
humana.
Em relação a esse contexto da Matemática concebida pelo modelo tradicional,
Caraça esclarece:
A Matemática é geralmente considerada uma ciência à parte, desligada da
realidade, vivendo na penumbra do gabinete, gabinete fechado, onde não entram
os ruídos do mundo exterior, nem o sol, nem os clamores dos homens. Isto só em
parte é verdadeiro. Sem dúvida, a Matemática possui problemas próprios, que
não têm ligação imediata com os outros problemas da vida social. Mas não
dúvidas também de que os seus fundamentos mergulham tanto como os de outro
qualquer ramo da Ciência, na vida real; uns e outros entroncam na mesma mader
(2002, p. 13).
Diante desse paradigma tradicional a Matemática, portanto, é assumida como
um corpo de conhecimento estático, imutável e verdadeiro, inlume ao erro, desligado do
real e sinônimo de cálculo, apresentando-se ainda, como objetiva, precisa, rigorosa e neutra
do ponto de vista ideológico.
Dessa forma, entre essas características a respeito da natureza da Matemática e
suas influências no processo de ensino-aprendizagem dessa disciplina, historicamente
diversas concepções e tenncias se constituirão de uma forma ou de outra dos aspectos do
conhecimento matemático relacionado à perspectiva tradicional.
Tão antiga, porém ainda presente nos dias atuais, a concepção pitagórica
contribuí de alguma maneira para a visão tradicional da Matemática no sentido de exaltá-la
como a responsável pela explicação da ordenação do Universo, sendo os números o
princípio de tudo.
Sobre a concepção pitagórica, Baraldi esclarece:
54
Essa concepção aparece ainda difundida. Quando nos deparamos com as
“máximas: “os números regem o Universo; “tudo é Matemática”; “certa
equação rege tal fenômeno”; estamos dentro de um reino pitagórico. Dessa
concepção decorre, então, que em Matemática é necessário somente saber contar
e fazer cálculos, para entender como funciona a realidade concreta. A
Matemática, então, como corpo de conhecimento, fica deficiente de aspectos
geométricos, humanos, históricos, sociais tornando-se impotente para
contribuir na formação do cidadão de qualquer país do mundo. Ainda, acentua a
concepção estabelecida de que o papel da ciência deve ser o de medir e o de
conceituar, precisamente e com detalhes, todos os fenômenos do universo e,
consequentemente, constituir muralhas de livros com características de coerência
e lógica interligando todas as ciências (1999, p. 84).
A presença comum, principalmente entre os estudantes dos cursos de
Matemática, de frases como “os números dominam o mundo e nós dominamos os
números”, seria uma demonstração não apenas da concepção pitagórica em nossos dias,
mas também da provável atitude do futuro professor de Matemática como o detentor do
saber e o dono da verdade diante dos seus alunos no âmbito da sala de aula. Postura essa
uma das principais componentes da visão tradicional de ensino, caracterizada pela figura
central do professor, responsável pela organização das informações do meio externo que
deverão ser internalizadas pelos alunos, sendo estes apenas receptores de informações e do
seu armazenamento na memória (DARSIE, 1999).
A ênfase no domínio do lculo como condição suficiente, segundo a
concepção pitagórica, na determinação do conhecimento matemático estaria fortemente
ligado ao ensino atual da Matemática nas famosas expressões: “veja o exercício modelo e
faça igual”; “resolva os problemas conforme o exemplo; “arme e efetue”.
Nesse sentido, o ensino da Matemática voltado ao desenvolvimento do
pensamento do educando estaria sendo substituído pela promoção da dependência e do
automatismo dos alunos e, portanto, segundo Lellis e Imenes (1994), o ensino da
Matemática num exercício de obediência cega a regras incompreensíveis, estaria
contribuindo para um tipo de ensino que gera dependência e não autonomia.
Outra concepção antiga e também presente na atualidade, a concepção
platônica em defesa das idéias matemáticas como a representação do mundo ideal e que
toda e qualquer ciência se reduz à Matemática, demarca a perspectiva tradicional do ensino
dessa disciplina principalmente pela visão estática e a-histórica dos conhecimentos
matemáticos.
Novamente segundo Baraldi, que resume muito bem a influência dessa
concepção no ensino tradicional da Matemática, temos:
Embora seja muito antiga, não podemos dizer que seja “ultrapassada”, essa visão
da natureza da Matemática. No ensino e aprendizagem, ela apresenta-se na
55
Matemática contextualizada nela mesma, abstrata, pronta e acabada, que somente
pode ser apreendida intelectualmente. O aluno não participa da construção do
conhecimento, tendo, muitas vezes, a sensação que ela “caiu pronta do céu”, em
forma de um resultado importante. Também podemos ter que a Matemática é a
solução de todos os problemas, de forma organizada e perfeita, mas que esses
problemas não passam de meras banalidades perto da supremacia da Matemática.
Ainda que, para a aprendizagem de Matemática ser efetivada, seja necessário o
constante treino para “manter-se em forma” (1999, p. 85).
A apresentação da Matemática é assumida na concepção platônica sem
nenhuma referência à história de sua construção e à reflexão sobre as origens do
pensamento matemático, sua existência é independente do homem, que no máximo
conseguirá aprendê-la, mas jamais inventá-la.
A iia subjacente ao edifício pronto ou a obra acabada, discutida por
Medeiros (1987), faz com que o conhecimento matetico não seja vivido e nem
construído pelos alunos, gerando um certo estigma de que não são capazes para a
Matemática e que por isso devem permanecer alheios e passivos frente à sistematização
dos conceitos matemáticos trabalhados pelos professores, estes sim, reconhecidos no
sistema tradicional de ensino como indivíduos ativos por supostamente deterem o
conhecimento em questão.
O “manter-se em forma” suposto pela concepção platônica (BARALDI, 1999),
apresenta-se como um outro princípio tradicional de ensino influenciado por essa
concepção, em que o aluno aprende Matemática através de memorização de fatos, regras
ou conceitos transmitidos pelo professor ou pela repetição exaustiva de exercícios.
Na discussão dos pressupostos didáticos compatíveis com a concepção
platônica, Fiorentini elucida:
... pois se os conhecimentos preexistem e não são construídos ou
inventados/produzidos pelo homem, então bastaria ao professor “passar” ou
“dar” aos alunos os conteúdos prontos e acabados, que já foram descobertos, e se
apresentam sistematizados nos livros didáticos. Sob essa concepção simplista de
didática, é suficiente que o professor apenas conha a matéria que irá ensinar. O
papel do aluno, nesse contexto, seria o de “copiar”, “repetir”, reter” e
“devolver” nas provas do mesmo modo que “recebeu” (1995, p. 7).
De modo geral, o ensino da Matemática em conformidade com a concepção
platônica, e identificado por Fiorentini (1995) sob os pressupostos da tendência formalista
clássica não seria mais do que livresco e centrado na figura do professor, considerado o
transmissor das informações associadas aos conteúdos geralmente passadas aos alunos por
meio de exposições orais e desenvolvidas na lousa. a aprendizagem desses alunos não
seria de outra forma a não ser passiva e consistindo na memorização e reprodução precisa e
rigorosa dos raciocínios e procedimentos ditados pelo professor ou pelos livros.
56
Esse modelo de ensino da Matemática não passaria, portanto, segundo Darsie,
de uma concepção empirista do processo de ensino-aprendizagem no qual:
O modelo de ensino é fechado, acabado, livresco, no qual a não de
conhecimento consiste no acúmulo de fatos e informações isoladas, imerso em
simbolismos, quadros cheios de cálculos e fórmulas ou definições a serem
memorizadas sem significado real, numa concepção de memória
associacionista/empirista, em que fatos são armazenados e, quando necessário,
recuperados (1999, p. 10).
Nesse caso, a preocupação com as respostas a serem obtidas e com os modos
de procedimentos estabelecidos tornam-se uma forma tal que o se permitirá por parte
do aluno um distanciamento das palavras usadas para captar as iias subjacentes aos
objetivos e aos significados da atividade que se chama Matetica.
Esse ensino reduzido então à exposição dos conteúdos e à resolução dos
problemas-modelo feitos pelos professores para os alunos, traz à tona a impressão de que
todo o conhecimento matemático está fora do sujeito, e somente o professor e os livros
podem determinar o que os alunos devem aprender, como se esses fossem um recipiente
vazio onde se despeja alguma coisa na expectativa que assimilem o conteúdo desejado.
Neste sentido, Medeiros (1987) esclarece que o professor seria aquele que viria
a encher as cabeças vazias dos alunos, restando-lhes acatar métodos e conteúdos. Para
Darsie (1999, p. 10) os alunos seriam nessa concepção “como uma cera virgem sobre a
qual se imprimem os conhecimentos, ou como uma lousa limpa onde, na medida que o
sujeito cresce, vai-se inscrevendo o conhecimento trazido de fora e aprendido pelos
sentidos”.
No entendimento de Santos, interpretando essa perspectiva como “concepção
baldista”, teríamos que:
Essa concepção parte da idéia que, no momento de entrar em contato com um
novo objeto de conhecimento matemático, a cabeça do aluno se apresenta como
um balde vazio, ou, seja, ele não sabe de nada sobre esse novo objeto de
conhecimento, e que esse conhecimento será despejado em sua cabeça, da mesma
forma como enchemos um balde. Nesse modelo, poderemos dizer que o aluno
“aprendeu tudo” quando esse balde se encontra completamente cheio. Ou então,
é como se esse balde tivesse uma espécie de graduação, onde poderíamos
verificar se ele está preenchido a 80%, ou 60%, ou 40% correspondentes às notas
8, 6 ou 4 (2002, p. 11).
O conhecimento matemático aqui é visto como algo a ser apreendido pela
comunicação daqueles que detêm o saber. A prática pedagógica passa a ser entendida
como a arte da comunicação. O aluno, por sua vez, deve possuir com segurança os pré-
requisitos necessários para receber o novo conhecimento, caso contrário será rotulado
como um indivíduo que o “leva jeito” para a compreensão do conteúdo matemático. O
57
professor, naturalmente entendido como o dono da verdade é o responsável para indicar o
caminho supostamente correto.
Dessa maneira, encobrindo uma aparente clareza da exposição lógica e
organizada dos conhecimentos matemáticos, cabe ao professor transmitir da melhor forma
possível esses conhecimentos, e ao aluno, cabe estar atento, escutar e anotar em seu
caderno, para que receba bem as informações transmitidas pelo professor. Portanto, o
sucesso do processo de ensino-aprendizagem nessa concepção está associado à
comunicação entre o professor e o aluno, à necessidade de se ter alunos atentos e
motivados e à necessidade das representações dos alunos estarem de uma certa maneira
mais próximas daquelas do professor.
Na concepção absolutista, a Matemática é assumida como uma verdade
inquestionável, onde o rigor, a precisão e a certeza do seu conhecimento o traduzidos
como suficientes e necessários na comprovação das absolutas verdades e como
representantes do único domínio de conhecimento genuíno.
A concepção absolutista vai reforçar ainda o caráter da Matemática abstrata e a
linguagem matemática será valorizada de tal forma que se confundi com a própria
Matemática, além disso, essa não será mais vista como uma ciência, mas como uma
linguagem para as outras ciências.
A inflncia dessa concepção no processo de ensino-aprendizagem da
Matemática vai implicar na redução do conhecimento matemático a uma mera linguagem
desprovida de contextos reais, predominantemente algébrica e com ênfase nas
demonstrações rigorosas de teoremas e fórmulas, na apresentação de axiomas e postulados,
e na valorização do formalismo matemático.
Segundo Baraldi (1999, p. 87), ainda, nessa perspectiva, “acredita-se que a
Matemática é a única responsável pelo desenvolvimento do raciocínio lógico, entendendo
que esse último é regido pela Matemática e deve sempre ser apresentado numa forma
única”.
Ainda, em conformidade com Baraldi, essa concepção vai transparecer no
processo de ensino-aprendizagem da Matemática na forma que:
Para os alunos, a Matemática consiste num manipular de rmulas que, após
certo treino, torna-se fácil em situações próprias da Matemática. Também, o
contexto histórico, sócio-político ou até cultural ficam “camuflados”, importando
apenas que, de algum jeito, a rmula – o resultado – venha a ser útil para “se dar
bem” nos exames escolares (1999, p. 88).
Nessa perspectiva, Fiorentini também se referindo a essa concepção, porém
58
tratando-a na tendência da Matemática formalista moderna, elucida:
A concepção formalista moderna manifesta-se na medida em passa a enfatizar a
Matemática pela Matemática, suas fórmulas, seus aspectos estruturais, suas
definições (iniciando geralmente por elas), em detrimento da essência e do
significado epistemológico dos conceitos. Isto, porque se preocupa
exageradamente com a linguagem, com o uso correto dos símbolos, com a
precisão, com o rigor, sem dar atenção aos processos que os produzem; porque
enfatiza o lógico sobre o psicológico, o formal sobre o social, o sistemático-
estruturado sobre o histórico; porque trata a Matemática como se ela fosse
“neutra” e não tivesse relação com interesses sociais e políticos (1995, p. 16).
O caráter formalista da Matemática induz os alunos a concebê-la como se esta
fosse desprovida de história e alheia aos aspectos sócio-culturais, e assim acabam por
condicioná-la a um monte de regras e fórmulas desconexas de sua utilidade prática nas
atividades cotidianas, como algo mecânico e padronizado voltado apenas à aprovação nos
testes e à obtenção da certificação escolar.
Além disso, a imposição e a apresentação exclusiva da Matemática formalista
contribuem na queima de etapas necessárias na estruturação do pensamento dos educandos,
e faz com que esses apenas consigam manipular os símbolos, sem decorrer na
compreensão do que estão fazendo, agindo geralmente como incapazes de resolver
problemas que se afastam das mesmas situações-modelo formuladas pelo professor, sendo
induzidos aos automatismos segundo as regras ditadas para a execução das tarefas.
Neste caso, o professor é quem estabelece as relações entre a experiência
vivida e o conhecimento já pronto, principalmente por meio do fornecimento de
receituários e conteúdos muitas vezes sem significado para o aluno. As metodologias de
ensino utilizadas na concepção formalista proporcionam aos alunos apenas uma visão
parcial do fenômeno pela formação de hábitos ou automatismos, geralmente isolados da
sua vivência.
A tendência do tecnicismo pedagógico vai reduzir a Matemática a um conjunto
de técnicas, regras e algoritmos, sem grande preocupação em fundamentá-los ou justificá-
los, e vai enfatizar o fazer em detrimento de outros aspectos importantes como o
compreender, o refletir, o analisar e o justificar ou provar.
Para Fiorentini:
Segundo essa tendência pedagógica, a aprendizagem da Matemática consiste,
basicamente, no desenvolvimento de habilidades e atitudes na fixação de
conceitos ou princípios. [...] A finalidade do ensino da Matemática na tendência
tecnicista, portanto, seria a de desenvolver habilidades e atitudes computacionais
e manipulativas, capacitando o aluno para a resolução de exercícios ou de
problemas-padrão. [...] Ou seja, o é preocupação desta tendência formar
indivíduos não-alienados, críticos e criativos, que saibam situar-se historicamente
no mundo (1995, p. 17).
59
Nessas circunstâncias, bem como, sob a influência da concepção absolutista, o
aluno torna-se um exímio manipulador de símbolos, em situações de ensino padronizadas,
adquirindo o formalismo da Matemática e a capacidade de resolução de exercícios, pom
sem a compreensão necessária para apreender os significados matemáticos presentes nos
problemas que se pretende resolver.
O ensino da Matemática nessa concepção faz com que os alunos, por sua parte,
queiram uma forma rápida para chegar às respostas de questões matemáticas padronizadas,
e assim ao invés de aprenderem e compreenderem os conceitos em questão, se apropriam
das informações transmitidas pelo professor apenas com o objetivo de utilizá-las na
resolão de exercios e nas demonstrações matemáticas supostamente solucionadas.
Dessa forma, o aprender Matemática mais se parece com um treinamento de
técnicas e procedimentos para a execução de tarefas matemáticas do que a constituição de
conhecimentos procios e indispensáveis à atividade humana. Nesse sentido, o que se
considera como raciocinar identifica-se com a capacidade de memorizar uma seqüência de
instruções e executá-la.
O ensino em que se adote o treinamento, sem que se possibilite o envolvimento
intelectual do aluno, onde a consciência, isto é, o estado de alerta para o que este
esteja fazendo, não tome parte, conseguirá, quando muito, um aluno adestrado,
mas sem criatividade iminente. Este aluno continua, por ser humano, com uma
criatividade potencial, porque é ser de possibilidades, podendo ainda tornar-se
criativo, transformador das idéias e das coisas, apesar da passividade enraizada,
apesar do embotamento de suas próprias idéias ocasionado pelo ensino
tradicional (MEDEIROS, 1987, p. 28).
Nesta perspectiva, o ensino da Matemática se esvai de todo um respeito pela
criatividade do aluno, e este acaba se vendo como impotente frente à “sabedoria” do
mestre, trazendo à tona a discussão de um processo de ensino-aprendizagem que não
promove o pensar com a própria cabeça, o pensar com autonomia, mas o adestramento dos
educandos e a sua depenncia frente ao professor.
Em linhas gerais, unificando todas as concepções acerca da natureza da
Matemática e do seu ensino discutidas aqui na perspectiva tradicional ou do velho modelo
de educação, podemos concluir que à medida que a Matemática tem sido concebida
basicamente de forma fria, sem espaço para a criatividade, fixa e seu estado pronto e
acabado, consequentemente tem sido enveredada por um tipo de ensino que:
- Privilegia o resultado, o que pressupõe que o aluno parta para a prática
equipado com uma teoria, e a pratique através de um conjunto de rotinas e
modos de fazer;
- Prima pela irrefutabilidade, onde os problemas têm uma solução, não
60
valorizando a criatividade;
- O aluno é sujeito e se espera que absorva “caladotoda a sabedoria do
professor;
- O professor é o técnico transmissor de uma verdade inabalável de que é
detentor.
Neste caso, todas essas iias do velho modelo de ensino poderiam ser
resumidas conforme as observações de Carraher, que nos diz:
Neste modelo todo processo ensino-aprendizagem está centrado no professor que
dirige a aprendizagem do aluno, sendo o aluno apenas um receptor de
informações e do seu armazenamento na memória. O modelo de ensino é
fechado, acabado, livresco, onde a não de conhecimento consiste do acúmulo
de fatos e informações isoladas e a ênfase é dada a respostas certas, que devem
ser uma repetição perfeita e integral dos livros, apenas uma resposta certa para
cada questão ou problema (1986, p. 12).
Ou ainda, serem resumidas de acordo com as considerações de Micotti acerca
do ensino tradicional de Matemática:
Este ensino acentua a transmissão do saber construído, estruturado pelo
professor; a aprendizagem é vista como impreso, na mente dos alunos, das
informações apresentadas nas aulas. O trabalho didático escolhe um trajeto
“simples” transferir para o aprendiz os elementos extraídos do saber criado e
sistematizado, ao longo da história das ciências, fruto do trabalho de
pesquisadores. As aulas consistem, sobretudo, em explanações sobre temas do
programa; entende-se que basta o professor dominar a matéria que leciona para
ensinar bem (1999, p. 156-157).
Diante dessas caracterizações da perspectiva tradicional da Matemática e do
seu ensino, não seria estranho compreender porque a Matemática na escola tem se
apresentado como a pior das disciplinas, considerada a mais difícil, a que reprova e que
provoca temor e pavor nos alunos, constituindo-se como um filtro social.
Também não é difícil de compreendermos, perante esses aspectos, porque o
ensino tradicional de Matemática tem ajudado pouco os indivíduos a decifrar as
informações disponíveis na sociedade, cerceando a autonomia e contribuindo em nada para
duas condições de cidadania, ou seja, o binômio informação-educação.
Essa situação estaria ainda associada ao fato de que não frequentemente por
parte da Escola um profundo interesse em relação às formas como os alunos pensam a
respeito da Matemática. Neste caso, a Escola estaria, portanto, promovendo o processo
escolar sem levar em consideração quem pretende aprender: a aluno. Além disso, estaria
considerando todos os alunos como iguais no momento da transmissão do conhecimento,
estimulando ainda a prática de uma educação matemática desprovida de senso crítico e
autonomia e, portanto, contribuindo para a manutenção e a estabilidade da ordem social
61
determinada pelos ideais de uma sociedade dominante.
Nesse sentido, a Escola estaria contribuindo ainda com a crença de que o
responsável pelo fracasso escolar é o próprio aluno, onde as dificuldades ou os fracassos,
seriam, em geral, vistos como decorrentes de empecilhos, de algum modo, vinculados aos
alunos: falta de base ou de condições para aprender, problemas familiares, deficiência
mental ou cultural etc.
Diante desses fatos, segundo Micotti (1999, p. 157), o fracasso não estaria
ligado ao professor, quem transmite o conhecimento e teria ensinado mal, mas de quem
recebe o conhecimento e aprendeu mal.
Contudo, dado o contexto em que a Matemática caracteriza-se como uma
forma de compreender e atuar no mundo e o conhecimento gerado nessa área do saber é
fruto da construção humana na sua interação constante com o contexto natural e cultural
(PCN, 1997, p. 11). Não poderíamos deixar de significar que:
Precisamos compreender a Matemática como ela é: uma estratégia abstrata,
desenvolvida pelo homem através do tempo para atender as suas necessidades
práticas e explicar a realidade, dentro de um contexto natural e cultural
(D’AMBRÓSIO, 1996, p. 7).
Nesta perspectiva, oposta à consideração de que a Matemática seria um corpo
de conhecimento acabado, que deve ser assimilado pelo aluno. Essa visão, portanto, seria
um dos princípios para a compreensão do verdadeiro significado da Matemática, como
uma ciência dinâmica; questionável e sujeita a revisões; que admite diferentes formas de
cálculo e de pensamento; que utiliza a pedagogia do erro, onde se aprende também com as
respostas erradas; e que é para todos, o somente para gênios, afinal o conhecimento se
constrói com a colaboração de todos os intervenientes, onde cada um o que tem, o que
pode e o que sabe).
De acordo com esses ideais em torno da Matemática, que deveria ser sempre
assim, logo não há outro modo de se pensar no ensino-aprendizagem dessa disciplina se
o com as seguintes características:
- Ativo, feito à base da confrontação de diferentes ideais, da comunicação
matemática, de conexões e conjunturas;
- Onde a prática conduz a teorização, o que pressupõe muito estímulo, muito
empenho, organização do saber;
- Que admite várias soluções para uma mesma situação;
- Que fomenta a cooperação, a criatividade, o espírito de empenho no
trabalho e a autonomia;
62
- Onde os papéis dos intervenientes se alteram significativamente, tornando-
se o aluno “o agente da sua própria aprendizagem e o professor o
dinamizador” do trabalho, o “negociador de intenções”, o “companheiro
da descoberta” (VASCONCELOS, 2000).
Neste sentido, de uma educação matemática voltada principalmente ao
desenvolvimento dos educandos, praticada de forma que contribua para o efetivo exercício
da cidadania por parte dos indivíduos e assim revele um conhecimento matemático
acessível a todos e eficaz na melhoria de vida das pessoas, destacamos esses ideais como
imprescindíveis a todos os segmentos educacionais e principalmente à modalidade EJA.
2.2 Educação Matemática de Jovens e Adultos: Um Novo Significado
O ensino da Matemática para jovens e adultos é uma área que tem poucas
pessoas trabalhando no interior da Educação de Jovens e Adultos e também no campo da
Educação Matemática; e parte das pesquisas que tratam da questão da EJA está
concentrada na alfabetização de jovens e adultos, a continuidade desta formão no
segundo segmento, equivalente ao terceiro e quartos ciclos do Ensino Fundamental, e no
Ensino Médio, ainda não tem sido muito explorada, principalmente na disciplina de
Matemática (CARDOSO, 2001).
Essa situação pode ser compreendida em parte, segundo Duarte, devido ao fato
de que
Aqueles que trabalham com a educação de adultos têm, em geral, um receio em
relação à Matemática e, em sua maioria, consideram o ensino para adultos um
problema secundário, ou, pelo menos, como sendo um problema não pertencente
à sua área de atuação (1995, p. 7).
Apesar do número de publicações sobre o tema da Educação Matemática de
Jovens e Adultos ser ainda relativamente pequeno no Brasil, nos últimos tempos esse tema
tem sido objeto de discussão e produção de conhecimento, tanto no campo da Educação
Matemática quanto no campo da Educação de Jovens e Adultos. Nos Encontros Nacionais
de Educação Matemática (ENEM), desde 1998, a discussão da Educação Matemática de
Jovens e Adultos vem ganhando relevância nas sessões especiais promovidas pelos
encontros. Esse tema também tem sido contemplado entre os trabalhos aprovados e
apresentados no Grupo de Trabalho sobre a Educação de Pessoas Jovens e Adultos nas
63
reuniões anuais da Associação Nacional de s-graduação e Pesquisa em Educação
(ANPED).
Esse interesse em se discutir mais os aspectos da educação Matemática na EJA
deve-se às preocupações recentes de professores e alunos, dos pesquisadores e dos
responsáveis pela elaboração e implementação de propostas para essa modalidade.
Segundo Fonseca, essas preocupações que eram:
... antes mais fortemente concentradas na luta pelo direito à escola, elas agora se
voltam mais intensamente para as questões de ensino-aprendizagem, buscando
aprimorar a qualidade das iniciativas implementadas, especialmente pela
consideração das especificidades do público a que atendem (2005b, p. 322).
A demanda que vem se reconfigurando nos últimos anos em torno do tema da
Educação Matemática de Jovens e Adultos se deve também à preocupação da comunidade
da Educação Matemática em adequar o trabalho pedagógico em Matemática às
características, demandas, expectativas e desejos dos aprendizes da EJA, devidamente
reconhecidos por suas especificidades socioculturais.
Nesse sentido, Fonseca complementa que tem se inserido
... a educação matemática de jovens e adultos em linhas de trabalho da Educação
Matemática que procuram resgatar tanto a intencionalidade dos sujeitos que
produzem, usam ou divulgam o conhecimento matemático quanto as influências
da cultura e das relações de poder impressas e manifestas nos modos de
produção, uso e divulgação desse conhecimento (Ibidem, p. 322).
O conhecimento matemático produzido pelos educandos e o resgate do
processo histórico-cultural desse conhecimento matemático devem se constituir como
fundamentais para promover uma aprendizagem significativa. Assim, num contexto com
especificidades tão particulares como é a Educação de Jovens e Adultos, o processo de
ensino-aprendizagem da Matemática deve buscar compreender os percursos escolares e
vivências diversificadas dos educandos dessa modalidade no tocante à construção de suas
idéias Matemáticas.
No entendimento das relações socioculturais dos educandos em Matemática da
EJA torna-se imprescindível tomar conhecimento de que esses educandos vivem, em geral,
uma história de exclusão, que tem limitado o acesso aos bens culturais e materiais
produzidos pela sociedade. É importante refletir ainda, que através da escolarização, esses
educandos buscam construir estratégias que lhes permitam reverter esse processo de
exclusão. Nessa perspectiva, conforme elucida a proposta curricular para a EJA:
Um currículo de Matemática para jovens e adultos deve, portanto, contribuir para
a valorização da pluralidade sociocultural e criar condições para que o aluno se
torne agente da transformação de seu ambiente, participando mais ativamente no
mundo do trabalho, das relações sociais, da política e da cultura (MEC/SEF,
64
2002b, p. 11-12).
Nesse movimento, o aprender Matemática deve ser compreendido como um
direito sico de todos e uma necessidade individual e social de homens e mulheres; e o
ensino da Matemática baseado na memorização de regras e estratégias, ou centrado em
conteúdos pouco significativos precisa ser superado para que os educandos da EJA tenham
uma boa formação Matemática que lhes possibilite o efetivo exercício da cidadania.
Com efeito, isso implica que o ensino da Matetica não pode basear-se em
uma concepção que desconsidera o conhecimento matemático vinculado às necessidades
sociais. A Matemática não é estática, mas sim, é um dos instrumentos de transformação da
sociedade, e por isso mesmo, uma compreensão contrária a essa visão,
É incoerente com a proposta de contribuir para a transformação social, pois, se
vemos a Matemática estaticamente, estaremos contribuindo para que esse modo
de ver as coisas seja adotado em relação ao restante da prática social do indivíduo
(DUARTE, 1995, p. 10).
O ensino de Matemática que se realiza no contexto da EJA deve se enquadrar
na tendência de um ensino preocupado com as transformações sociais, vendo na
Matemática um instrumento que nos ajuda a explicar, a compreender, a analisar nossa
prática social, e nos ajuda a propor alterações para essa prática.
Em um contexto vivenciado pelos alunos da EJA de exclusão do mundo letrado
e da tentativa de retomar o processo escolar, a concepção de uma Matemática capaz de
transformar a realidade da qual se deparam torna-se fundamental para motivá-los a
permanecerem na escola e não evadirem da mesma diante das práticas pedagógicas
pautadas por um ensino da Matemática didaticamente tradicional, que tem se condicionado
como um filtro social selecionando os educandos que terão ou não oportunidades de
avançar na Educação Básica.
Os que abandonam a escola o fazem por diversos fatores de ordem social e
econômica, mas também por se sentirem excluídos da dinâmica de ensino e
aprendizagem. Nesse processo de exclusão, o insucesso na aprendizagem
Matemática tem tido papel destacado e determina a freqüente atitude de
distanciamento, temor e rejeição em relação a essa disciplina, que parece
inacessível e sem sentido (MEC/SEF, 2002b, p. 13).
Diante desse cenário desolador provocado pelos efeitos do ensino tradicional
de Matemática na formação do cidadão, o ensino da Matemática não no contexto da
EJA, mas também nas demais etapas do processo educacional deverá se fundamentar na
ampliação da autonomia do aluno e na aproximação de sua realidade com a Matemática.
Isto implica que o ensino deverá apontar “para uma Matemática que propicie a leitura do
mundo e o pensamento autônomo, o que significa contribuir para o exercício pleno da
65
cidadania” (LELLIS; IMENES, 1994, p. 12).
Para isso, a proposta educacional em Matemática para os alunos jovens e
adultos da EJA deve contemplar como ponto de partida o reconhecimento do perfil distinto
desses educandos, que os tornam um blico especial em razão da situação de excluídos
que foram do sistema educacional quando crianças e adolescente; e da riqueza de
conhecimentos provenientes da experiência pessoal e coletiva que trazem para a escola.
Esses dois aspectos marcantes e definidores da identidade dos educandos da
EJA, e principalmente a questão da exclusão precoce da escola regular vivenciada por
esses educandos, que inclusive remete-se à própria necessidade de se estabelecerem
programas de Educação Básica de jovens e adultos, trazem à tona a designação de uma
educação matemática diferenciada em relação às outras etapas da educação.
Assim, quando falamos em Educação Matemática de Jovens e Adultos, não nos
estamos referindo ao ensino da Matemática para o estudante universitário ou da
pós-graduação, nem de cursos de Matemática que integram os currículos de
programas de formação especializada para profissionais qualificados, ou de
sessões de resolução de problemas matemáticos com finalidade terapêutica ou
diagnóstica. Estamos falando de uma ão educativa dirigida a um sujeito de
escolarização básica incompleta ou jamais iniciada e que acorre aos bancos
escolares na idade adulta ou na juventude. [Cuja] a interrupção ou o impedimento
de sua trajetória escolar não lhe ocorre, porém, apenas como um episódio isolado
de não-acesso a um serviço, mas num contexto mais amplo de exclusão social e
cultural, e que em grande medida, condicionará também as possibilidades de re-
inclusão que se forjarão nessa nova (ou primeira) oportunidade de escolarização
(FONSECA, 2005a, p. 14).
Nesse processo de re-inclusão, dadas a especificidade e a identidade cultural do
alunado da EJA, o processo de ensino-aprendizagem da Matemática ganha contorno não
somente distinto, como também recai em comprometer-se com uma potica de inclusão e
de garantia do espaço de jovens e adultos na Escola. Além disso, torna-se importante
adequar a escola para atender ao público específico da EJA, que a princípio não é o alvo
original da instituição escolar, originalmente concebida para crianças e adolescentes que
percorrem o caminho da escolaridade de forma regular (OLIVEIRA, 1999).
Essa adequação da escola e das práticas pedagógicas em Matemática requer,
por um lado, o reconhecimento da condição dos alunos da EJA como não-crianças, e por
isso a necessidade de um ensino da Matemática totalmente diferente do processo de
infantilização das atividades e abordagens pedagógicas geralmente praticadas no ensino
regular. E por outro lado, a compreensão dos alunos jovens e adultos como sujeitos de
conhecimento e construtores da própria aprendizagem, além da necessidade de se
considerarem as experiências que trazem de sua vida cotidiana.
No que diz respeito à inadequação de atendimento de jovens e adultos no
66
ensino regular e à comum oferta de vagas para alunos não-crianças nas turmas ditas
regulares do Ensino Fundamental, Fonseca (2005a) esclarece que isso acaba implicando no
desenvolvimento de um trabalho pedagógico não direcionado para as demandas e as
possibilidades próprias dos jovens e adultos, que acabam tendo um nível de ensino do qual
o foi originalmente idealizado para eles.
Um exemplo muito comum da presença inadequada da infantilização no
processo de ensino-aprendizagem da Matetica pode ocorrer na alfabetização
Matemática de jovens e adultos.
Com efeito, na Educação Matemática que se realiza no âmbito dos projetos de
alfabetização de adultos, o risco de uma inadequação identificada com a
infantilização das estratégias de ensino e, entre elas, das atividades propostas aos
alunos advém de uma transposição pouco cuidadosa de procedimentos
concebidos no trabalho com crianças com idades inferiores a sete anos para o
ensino de Matemática no contexto da EJA (grifo da autora) (FONSECA, 2005a,
p. 35).
A interpretação desse diagnóstico é constituída pela iia errônea de que o
processo de alfabetização Matemática se realiza da mesma forma tanto para as crianças nas
fases iniciais de escolarização quanto para os jovens e adultos inseridos em projetos de
alfabetizão. Não é levado em consideração, de que mesmo que os jovens e adultos não
tenham tido uma vivência escolar, já dominam noções Matemáticas que foram aprendidas
de maneira informal ou intuitiva.
Em relação ao ensino de Matemática para jovens e adultos, a questão
pedagógica mais instigante é o fato de que eles quase sempre,
independentemente do ensino sistemático, desenvolvem procedimentos próprios
de resolução de problemas envolvendo quantificações e cálculos. jovens e
adultos analfabetos capazes de fazer cálculos bastante complexos, ainda que não
saibam como representá-los por escrito na forma convencional, ou ainda que
não saibam sequer explicar como chegaram ao resultado... (RIBEIRO, 1997, p.
32).
Toda essa situação envolvendo os educandos da EJA geralmente inseridos num
processo escolar infantilizado, deriva não apenas de uma concepção didática tradicionalista
do ensino da Matemática e de uma possível visão de que esses educandos são incapazes de
vir a compreender conceitos e relações mais sofisticadas por estarem fora da cultura
letrada, mas também da falta de reconhecimento de que os alunos da EJA são portadores
de uma bagagem cultural considerável.
Não diferente do modo como deve ocorrer em outras etapas do processo
educacional, mas que deve ser enfatizado ainda mais na EJA, os conhecimentos prévios
dos alunos precisam ser considerados fundamentalmente na aquisição de novos
conhecimentos matemáticos por parte dos educandos. Na Educação Básica de jovens e
67
adultos, mais do que em outras modalidades de ensino, esses conhecimentos costumam ser
bastante diversificados e ricos em informação, e assim pode servir de suporte na mediação
entre o conhecimento informal dos alunos e o conhecimento sistematizado ou escolar.
Nesta perspectiva, tendo em vista a importância da consideração dos
conhecimentos prévios dos alunos, a Proposta Curricular para a EJA define:
Em relação aos jovens adultos, no entanto, é primordial partir dos conceitos
decorrentes de suas vivências, suas interações sociais e sua experiência pessoal:
como detêm conhecimentos amplos e diversificados, podem enriquecer a
abordagem escolar, formulando questionamentos, confrontando possibilidades,
propondo alternativas a serem consideradas (MEC/SEF, 2002b, p. 15).
A compreensão do sentido da experiência social e pessoal vivenciada pelos
educandos da EJA deve ser inserida no contexto do ensino e aprendizagem da Matemática
de modo que sirva de estímulo para romper com a própria visão que esses educandos
muitas vezes apresentam de que são incapazes de aprender e que pouco sabem em relação
ao conhecimento matemático.
Ao planejar a intervenção didática procurando reconhecer quais são os
conhecimentos prévios dos educandos, o professor de Matemática da EJA possivelmente
estará contribuindo para que seu aluno possa compreender que é um sujeito portador de
conhecimentos matemáticos, e mesmo queo tenha aprendido tais conhecimentos na
escola, ainda assim, reconhecerá que esses são válidos enquanto saberes sistematizados.
Desta forma, diante do domínio apresentado por muitos jovens e adultos de
noções Matemáticas aprendidas de maneira informal ou intuitiva, antes mesmo de entrarem
em contato com as representações simlicas convencionais, e que se constituem de forma
direta ou indireta como conhecimentos prévios num contexto da Matemática escolar, cabe
ao educador de jovens e adultos
... postar-se pois investido de uma honestidade intelectual que lhe permita
relativizar os valores das contribuições da(s) Matemática(s) oficial(is) da Escola
e da(s) Matemática(s) produzida(s) em outros contextos e com outros níveis e
aspectos de formalidade e generalidade; investido também da responsabilidade
profissional que lhe imputa disposição e argumentos na negociação com as
demandas dos alunos e com os compromissos da Escola em relação à construção
do conhecimento matemático (FONSECA, 2005a, p. 39).
O tratamento respeitoso que o conhecimento matemático informal precisa ter
irá não apenas se constituir como um dos pilares para o processo de ensino-aprendizagem
da Matemática na EJA, como também, influenciará a comunicação assumida no interior da
sala de aula, já que deverá desempenhar o papel fundamental de auxiliar os alunos a
construírem os vínculos entre as noções informais e intuitivas e a linguagem abstrata e
simlica da Matemática.
68
Nesse movimento, a contextualização do conhecimento matemático
transmitido ou construído e a valorização das reminiscências da Matemática escolar dos
alunos da EJA se constituem não somente para evidenciar a Matemática produzida por
esses educandos jovens e adultos, mas também como uma forma de inserção, permanência
e crescimento dos mesmos no processo de escolarização.
A necessidade evidente de contextualizar o conhecimento matemático vem
sendo amplamente discutida no âmbito da Educação Matemática de Jovens e Adultos.
Segundo a Proposta Curricular para a EJA em relação à contextualização dos temas
matemáticos:
Trata-se de apresentá-los em uma ou mais situações que façam sentido para os
alunos, por meio de conexões com questões do cotidiano dos alunos, com
problemas ligados a outras áreas do conhecimento, ou ainda por conexões entre
os próprios temas matemáticos (algébricos, geométricos, métricos etc.).
Recomenda-se apenas o cuidado de que os conhecimentos construídos não
fiquem indissoluvelmente vinculados a um contexto concreto e único, mas que
possam ser generalizados e transferidos a outros contextos (MEC/SEF, 2002b, p.
16).
Através da contextualização dos conhecimentos matemáticos pretende-se não
apenas possibilitar uma relação mais rica entre os jovens e adultos e a Matemática, onde
esses educandos descubram que a Matemática se aplica às mais variadas atividades
humanas, desde as mais simples utilizações na vida cotidiana às mais complexas
elaborações de outras ciências. Como pretende-se ainda, tornar mais claro para esses
jovens e adultos a finalidade e o papel da Matemática com uma das possibilidades de
transformação da realidade com a qual se deparam e/ou de suas formas de vê-la e
participar dela.
Assim, as reflexões sobre o conhecimento matemático, sua natureza, seu papel
na sociedade atual, sua construção individual e coletiva trazem para a Educação de Jovens
e Adultos o desafio de refletir a respeito da colaboração que a Matemática tem a oferecer
com vistas à formação da cidadania.
Com a contextualização do conhecimento matemático também é possível
superar a concepção de que a Matemática é um corpo de conhecimento imutável e
verdadeiro, que deve ser assimilado pelo sujeito; e difundir a conceão clara de que a
Matemática é uma ciência viva, tanto no cotidiano dos cidadãos, como nos centros de
pesquisa ou de produção de novos conhecimentos, os quais m-se constituído
instrumentos úteis na solução de problemas científicos e tecnológicos, em diferentes áreas
do conhecimento.
Na consolidação de que os alunos e alunas da EJA são sujeitos
69
socioculturamente constituídos e, portanto, sujeitos da própria aprendizagem, a valorização
das reminiscências da Matemática escolar dos alunos da EJA torna-se mais um elemento
importante não para evidenciar quais são as experiências que esses alunos trazem da sua
vida cotidiana e principalmente da sua trajetória escolar, dada as possíveis passagens pelos
bancos escolares. Mas também uma forma de (re)integração desses educandos no processo
de escolarização, uma vez que ao serem ouvidos e permitido que falem da sua história se
sentirão parte constituinte desse processo.
Nesse processo de incentivar os educandos da EJA a relembrarem das
experiências que vivenciaram numa passagem anterior pela escola, a idéia primordial
segundo Fonseca, estaria no fato de que
... respeitar o passado cultural do aluno não só lhe daria confiança em seu próprio
conhecimento e na sua habilidade de conhecer, como também lhe conferiria
“uma certa dignidade cultural ao ver suas origens culturais sendo aceitas por seu
mestre e desse modo saber que esse respeito se estende também à sua família e à
sua cultura (D’AMBRÓSIO, 1985, p. 5). Ao perceber que a escola o apenas
aceita, mas valoriza os conhecimentos que ele maneja com certa destreza, o aluno
adulto sente-se mais seguro, mais integrado ao fazer escolar e, principalmente,
“reconhece que tem valor por si mesmo e por suas decisões. É o processo de
liberação do indivíduo que está em jogo”, reforça D’Ambrósio (2005a, p. 70).
Nesse sentido, a compreensão dos conhecimentos escolares de Matemática
trazidos pelos jovens e adultos serviria ainda para se reorganizar, re-significar e relacionar
essas memórias com outros conhecimentos matemáticos dominados ou completamente
novos.
De modo geral, portanto, caberia aos educadores da EJA, dispensar um cuidado
especial não somente às situações reveladoras dos conhecimentos prévios dos alunos, mas
também às situações em que as reminiscências emergem nas aulas de Matemática ou de
qualquer outro assunto, tomando-as como instâncias de negociação de significados do
saber escolar, como uma demanda do presente a partir das lembranças Matemáticas do
passado (FONSECA, 2005b).
Nessa perspectiva, Fonseca esclarece:
Coloca-se, portanto, mais um desafio para o desenvolvimento de experiências
significativas na área da EJA: formar professores, Educadores Matemáticos de
Jovens e Adultos, com uma certa intimidade com a própria Matemática, com uma
generosa e sensível disponibilidade para compartilhar com seus alunos as
demandas, as preocupações, os anseios e os sonhos da vida adulta, e com uma
consciência atenta e crítica da dimensão política do seu fazer pedagico, que os
habilite a participar da Educação Matemática de seus alunos e de suas alunas,
pessoas jovens e adultas, com a honestidade, o compromisso e o entusiasmo que
essa tarefa exige (2005a, p. 54-55).
A formação do professor de Matemática como educador de jovens e adultos
70
torna-se imprescindível num contexto com especificidades tão particulares como é a EJA,
que exige um educador preparado, compromissado com o trabalho coletivo e com a
inovação pedagógica, dotado de sensibilidade para acolher educandos que carregam
diferentes motivações, capaz de lidar com a heterogeneidade, de reconhecer e valorizar os
saberes de que os jovens e adultos são portadores, disposto ao diálogo democrático e à
convivência plural.
Diante da necessidade de se desenvolver uma metodologia de ensino da
Matemática que possibilite aos educandos jovens e adultos desenvolver aquilo que já
sabem, e compreender aquilo que ainda não sabem e precisam saber (DUARTE, 1995), o
professor da EJA deverá conhecer diversas possibilidades de trabalho em sala de aula.
Entre algumas possibilidades que têm sido sugeridas e discutidas para o ensino de
Matemática na EJA, destacam-se: organização de conteúdos em rede; resolução de
problemas; história da Matemática; tecnologias da comunicação e da informação; e os
jogos matemáticos.
A organização dos conteúdos matemáticos em rede é uma proposta de trabalho
que busca superar com a forma hierarquizada com que os conteúdos de Matemática têm
sido transmitidos não apenas na EJA, mas também nos outros segmentos da Educação. A
idéia segundo a qual cada conteúdo é um elo de uma corrente, um pré-requisito para o que
vai sucedê-lo é substituída pela concepção de que uma forma interessante de organizar os
conteúdos é buscar contextos significativos para sua abordagem e, ao mesmo tempo,
indicar as conexões que podem ser estabelecidas entre os assuntos abordados.
Segundo a Proposta Curricular para a EJA quanto à organização dos conteúdos
matemáticos em rede:
A idéia subjacente é de que a aprendizagem de Matemática está ligada à
compreensão, isto é, à atribuição e à apreensão de significado. E apreender o
significado de um objeto ou acontecimento pressupõe identificar suas relações
com outros objetos e acontecimentos. Isto significa que o tratamento dos
conteúdos em compartimentos estanques, numa rígida sucessão linear, deve dar
lugar a uma abordagem em que as conexões sejam favorecidas e destacadas
(MEC/SEF, 2002b, p. 25).
Nesse movimento, a seleção dos conteúdos para o ensino de Matemática na
EJA estaria orientada pela identificação dos conteúdos que seriam essenciais à
aprendizagem dos educandos e não à idéia dos chamados pré-requisitos para o
desenvolvimento de outros. Portanto, mesmo reconhecendo que alguns conhecimentos
precedem outros, sabe-se que eles não se subordinam uns aos outros como amarras tão
fortes como as que comumente se supõe.
71
A resolução de problemas tem recorrentemente aparecido nos textos prescritos
para o ensino da Matemática em todos os níveis, e particularmente como um dos caminhos
possíveis para fazer Matemática em sala de aula de jovens e adultos.
Concebida como situações que demandam a realização de uma seqüência de
ações ou operações para obter um resultado, ou seja, situações em que a solução não está
disponível de início, mas é necessário e possível construí-la, a resolução de problemas tem
se estabelecido como um dos principais pontos de partida da atividade Matemática, como
eixo da aprendizagem Matemática na EJA.
Corroborando com essa concepção, de acordo com Ribeiro:
Para que a aprendizagem da Matemática seja significativa, ou seja, para que os
educandos possam estabelecer conexões entre os diversos conteúdos e entre os
procedimentos informais e os escolares, para que possam utilizar esses
conhecimentos na interpretação da realidade em que vivem, sugere-se que os
conteúdos matemáticos sejam abordados por meio da resolução de problemas.
Nessa proposta, a resolução de problemas o constitui um tópico de conteúdo
isolado, a ser trabalhado paralelamente à exercitação mecânica das técnicas
operatórias, nem se reduz à aplicação de conceitos previamente demonstrados
pelo professor: ela é concebida como uma forma de conduzir integralmente o
processo de ensino e aprendizagem (1997, p. 103).
A importância da resolão de problemas é discutida por possibilitar aos
alunos da EJA oportunidades para interpretar problemas; compreender enunciados; utilizar
informações dadas; estabelecer relações; interpretar resultados à luz do problema colocado
e enfrentar, com isso, situações novas e variadas; e mobilizar conhecimentos e organizar as
informações de que dispõem para alcançar novos resultados. Além do que, o conhecimento
matemático ganha significado quando os alunos se defrontam com situações desafiadoras e
trabalham para desenvolver estratégias de resolão.
A questão que se discute em torno do trabalho com resolução de problemas é
que muitas vezes esses, quando são apresentados, têm sido confundidos com os problemas
que são tradicionalmente trabalhados nas salas de aula ou que aparecem nos livros
didáticos, nos quais a situação é apresentada por um texto padronizado que evoca uma
resposta também padronizada. Ou seja, são passíveis de ser resolvidos de forma mecânica
e geralmente se destinam a aplicar os conceitos ensinados.
De acordo com os dados levantados pela Coordenação de Educação de Jovens
e Adultos (COEJA) da Secretaria de Educação Fundamental (SEF) do MEC junto a
secretarias de educação, professores e alunos, que permitem uma caracterização mais
detalhada do Segundo Segmento da EJA no Brasil:
Embora grande parte dos professores considere muito relevante a resolução de
problemas em diferentes campos numéricos, muitos trabalham apenas com as
72
operações, e poucos com resolução de problemas. Nota-se que os problemas não
têm desempenhado seu verdadeiro papel no ensino de Matemática, pois, no geral,
são utilizados apenas como forma de aplicação de conhecimentos adquiridos
anteriormente. A prática mais freqüente é ensinar um conceito, procedimento ou
técnica e depois apresentar um problema para analisar se os alunos são capazes
de empregar o que lhes foi ensinado. Nesse caso, a concepção subjacente de
ensino e aprendizagem é de que o aluno aprende por reprodução e imitação
(MEC/SEF, 2002a, p. 72).
Esta constatação reflete-se também em outras etapas da Educação Básica, onde
geralmente, nas aulas de Matemática, os problemas são resolvidos ao final de seqüências
de atividades, como aplicação da aprendizagem, e na maioria das vezes, apresentam
formulações artificiais que os distanciam dos problemas reais com os quais os alunos se
confrontam em suas atividades cotidianas.
No recurso à história da Matemática na Educação de Jovens e Adultos a
pretensão é fazer com que os educandos compreendam que a Matemática é uma construção
humana, e que o seu desenvolvimento está relacionado com a transformação da sociedade.
Assim, segundo Duarte:
Se pretendemos contribuir para que os educandos sejam sujeitos das
transformações sociais e do uso da Matemática nelas, é necessário que
contribuamos para que eles desenvolvam um modo de pensar e agir que
possibilite captar a realidade enquanto um processo, conhecer as suas leis
internas do desenvolvimento, para poder captar as possibilidades de
transformação social (1995, p. 10).
A importância da constituição da história da Matemática como competência na
Educação Básica de jovens e adultos tem como justificativa a necessidade de que o
conhecimento matemático seja percebido pelos estudantes como historicamente
construído.
Quanto ao uso da história da Matemática como recurso didático-metodológico,
a Proposta Curricular para a EJA esclarece que:
O professor pode criar melhores condições para que o aluno desenvolva atitudes
e valores mais favoráveis diante do conhecimento matemático ao revelar que a
Matemática é uma criação humana, elaborada em diferentes culturas e momentos
históricos, e ao estabelecer comparações entre os conceitos e processos
matemáticos do passado e do presente. Com isto, o aluno poderá perceber-se
como parte da história da produção do conhecimento matemático (MEC/SEF,
2002b, p. 28).
No entanto, é importante observar que não basta o educando compreender os
fatos históricos. É também necessário que ele faça ligações e tome como referência os
conceitos decorrentes das vivências pessoais e interações sociais. Desse modo,
Cabe aqui uma explicação: reproduzir condensadamente a evolução da
Matemática não implica necessariamente ficar contando a história da Matemática
para os educandos, mas sim fazer com que sejam percorridos os passos essenciais
73
dessa evolução... (DUARTE, 1995, p. 18).
Nessa compreensão de se tentar esclarecer e dar significado às idéias
Matemáticas que estão sendo constrdas nas aulas pelos jovens e adultos, a abordagem
histórica da Matemática, portanto, não deverá se restringir a informações relativas a
nomes, locais e datas de descobertas Matemáticas, mas deverá principalmente servir como
suporte no esclarecimento de alguns porquês do conhecimento matemático.
No tocante à utilização das tecnologias da comunicação e da informação nas
salas de aula da EJA, o desafio é contribuir para que os alunos jovens e adultos tenham um
acesso mais amplo aos recursos tecnológicos, em suas diferentes funções e formas.
Segundo a Proposta Curricular para a EJA (1997, p. 29) a idéia que se proe é que o
ensino de Matemática para EJA possa aproveitar ao máximo os recursos tecnológicos
disponíveis, tanto por sua receptividade social como para melhorar a linguagem expressiva
e comunicativa dos alunos jovens e adultos”.
O uso dos jogos matemáticos na EJA se justifica, pois podem contribuir para o
trabalho de formação de atitudes necessárias para a aprendizagem da Matemática, tais
como favorecer a criatividade na elaboração de estratégias de resolução de problemas e a
busca de soluções; possibilitar a construção de uma atitude positiva perante os erros, uma
vez que as situações sucedem-se rapidamente e podem ser corrigidas de forma natural;
contribuir para a participação dos jovens e adultos em trabalhos coletivos; e proporcionar
um espaço para o resgate da respeitabilidade e da auto-estima dos educandos. Porém, é
importante que a escolha dos jogos deva ser adequada à faixa etária dos educandos,
evitando-se infantilizações.
Na EJA, independente dos recursos didáticos e metodológicos, o importante é
que o processo de ensino-aprendizagem da Matemática contribua para a constituição de
condições humanas de sobrevivência, inserção das pessoas no mundo do trabalho, das
relações sociais e da cultura, com o desenvolvimento de posicionamento crítico e
propositivo diante das questões sociais.
Nessa perspectiva, Fonseca esclarece que
Para os alunos em geral, mas muito especialmente para os alunos da EJA, a
Educação Matemática deve, pois, ser pensada como contribuição para as
práticas de leitura, buscando contemplar (e até privilegiar) conteúdos e formas
que ajudem a entender, participar e mesmo apreciar melhor o mundo em que
vivemos... (grifo da autora) (2005a, p. 52).
As reflexões sobre o conhecimento matemático, sua natureza, seu papel na
sociedade hoje, sua construção individual e coletiva devem trazer para a EJA o desafio de
74
refletir a respeito da colaboração que a Matemática tem a oferecer com vistas à formação
da cidadania. Além disso, as atividades Matemáticas nessa modalidade devem contribuir
para que os educandos jovens e adultos percebam que os conhecimentos matemáticos são
meios para compreender e transformar o mundo à sua volta; que a Matemática tem um
caráter prático, pois permite às pessoas resolver problemas do cotidiano, ajudando-as a não
serem enganadas, a exercerem sua cidadania; e também contribuir para o desenvolvimento
do raciocínio, da lógica, da coerência, o que transcende os aspectos práticos.
Em síntese às diversas conceitualizações sobre o processo de ensino-
aprendizagem da Matemática, que revelam significados dicotomizados, apresentando, de
um lado, a perspectiva de um ensino da Matemática didaticamente tradicional e
excludente, e por outro, os ideais de uma Educação Matemática de Jovens e Adultos
comprometida com a inclusão social; destacamos a seguir, com base no referencial teórico
deste capítulo, um quadro síntese distinguindo as características dessas duas concepções
distintas em torno do processo educacional da Matemática, interpretando-as segundo as
perspectivas excludente e inclusiva.
QUADRO 2
Características da Educação Matemática nas Perspectivas Excludente e Inclusiva
Perspectiva Excludente (Velho Modelo) Perspectiva Inclusiva (Novo Modelo)
- Visão da Matemática como estática,
ciência à parte e desligada da realidade
- Conhecimento matemático como
imutável e verdadeiro, pronto e
acabado, a-histórico e neutro
- Matemática como algo de temor e ódio,
pior das disciplinas, a mais difícil, a que
reprova
- Formação matemática preocupada
apenas com a preparação dos alunos
para as etapas seguintes do processo
escolar
- Formação matemática não se preocupa
em formar indivíduos não-alienados,
críticos e criativos
- Educação matemática desprovida de
senso crítico e autonomia
- Ensino livresco e baseado na
memorização de regras e estratégias,
com ênfase no domínio do cálculo
- Ensino centrado em conteúdos pouco
significativos, imerso em simbolismos e
apresentados de forma linear
- Matemática como uma ciência viva e
como uma construção humana e histórica
- Matemática como uma ciência dinâmica;
questiovel e sujeita a revisões
- Matemática vista como para todos e não
somente para gênios
- Visão da Matemática com um caráter
prático e aplicado às mais variadas
atividades humanas
- Visão da Matemática como instrumento
de transformão da sociedade
- Aprender Matemática compreendido
como um direito básico de todos e uma
necessidade individual e social
- Formação matemática preocupada com o
exercício pleno da cidadania e com as
transformações sociais
- Educação Matemática diferenciada na
EJA em relação às demais modalidades
da Educação Básica
- Aluno é reconhecido como agente da sua
própria aprendizagem
75
- Ensino privilegia o resultado e prima
pela irrefutabilidade se esvaindo de
todo respeito pela criatividade do aluno
- Aprendizagem da Matemática somente
por meio de memorização de fatos,
regras ou conceitos transmitidos pelo
professor ou pela repetição exaustiva de
exercícios
- Aprendizagem é vista como impressão,
na mente dos alunos, das informações
apresentadas nas aulas
- Aprender Matemática mais se parece
com um treinamento de técnicas e
procedimentos para a execução de
tarefas matemáticas
- Trabalho pedagógico não direcionado
para as demandas e as possibilidades
próprias dos educandos da EJA
- Falta de reconhecimento de que os
alunos da EJA são portadores de uma
bagagem cultural considerável e
sujeitos da própria aprendizagem
- Somente o professor e os livros podem
determinar o que os alunos devem
aprender
- Professor é o detentor do saber e o dono
da verdade diante dos seus alunos
- Basta o professor dominar a matéria
que leciona para ensinar bem
- Aluno é o receptor passivo das
informações transmitidas pelo professor
e não participa da construção do
conhecimento matemático
- Professor é o dinamizador” do trabalho,
o negociador de intenções”, o
companheiro da descoberta”
- Consideração dos conhecimentos prévios
dos alunos
- Valorização do conhecimento
matemático produzido pelos educandos e
o resgate do processo histórico-cultural
desse conhecimento matemático
- Valorização do conhecimento
matemático informal e intuitivo
- Valorização das reminiscências da
Matemática escolar dos alunos
- Contextualização do conhecimento
matemático a ser transmitido ou
construído
- Adequação do trabalho pedagógico em
Matemática devido às características,
demandas, expectativas e desejos dos
aprendizes da EJA
- Organização de conteúdos em rede
- Utilização da resolução de problemas,
história da Matemática, tecnologias da
comunicação e da informação, e jogos
como recursos metodológicos
- Formação do professor de Matemática
como educador de jovens e adultos
- Utiliza a pedagogia do erro e admite
diferentes formas de lculo e de
pensamento
- Fomenta a cooperação, a criatividade, o
espírito de empenho no trabalho e a
autonomia
CAPÍTULO III - CONTEXTUALIZANDO A AVALIAÇÃO EDUCACIONAL
A procura do estabelecimento de uma teoria da avaliação é uma velha e nova
questão, pois o homem sempre avaliou o homem, sempre houve um julgamento
sobre as ações humanas, no entanto, agora se começa a refletir de modo mais
sistemático sobre ela (WERNECK, 1996, p. 371).
O contexto da avalião escolar é que abordamos neste capítulo, destacando a
sua trajetória ao longo do desenvolvimento da história da educação, que evoluiu das
técnicas de medidas educacionais às novas concepções que se comprometem com a
aprendizagem e não com a classificação dos educandos.
A avaliação escolar compreendida segundo as perspectivas do velho e novo
modelo, que se caracterizam respectivamente pelos ideais de uma visão excludente e
inclusiva do educando no processo educacional e social, também é apresentada neste
capítulo, que apresenta ainda uma reflexão sobre o papel da avaliação no processo de
ensino-aprendizagem da Matemática na Educação de Jovens e Adultos, haja vista o tema
de investigação de nossa pesquisa.
3.1 Perfazendo os Caminhos da Avaliação Através dos Tempos
A prática da avaliação é algo inerente à atividade humana, praticamente a todo
instante o ser humano se encontra formulando algum juízo de valor, avaliando os
elementos da sua realidade.
Conduzida como uma prática associada à experiência cotidiana do Homem
desde sua origem, não seria por demais concluir que a avaliação evoluiu se confundindo
com a própria história social da humanidade.
A avaliação estaria presente, por exemplo, nas cerimônias de iniciação nas
tribos primitivas, onde os jovens para se iniciarem na vida adulta necessitariam conseguir a
aprovação em testes de resistência ou de conhecimentos sobre os costumes locais.
77
Outro exemplo, estaria nos testes e exames realizados pelos chineses, durante
séculos antes de Cristo, na seleção de homens para o serviço militar ou mesmo para
examinar os oficiais do Estado com o objetivo de demiti-los ou promovê-los
(DEPRESBITERIS, 2003).
No campo educacional, pode-se dizer que a avaliação também passou por
rias transformações, sendo definida de diferentes maneiras, tal a complexidade a seu
respeito.
Sobre a trajetória percorrida pela avaliação educacional ao longo dos tempos
em função da evolução da sociedade, Stufflebeam e Shinkfield (1993)
9
apud Arantes
(2004), esclarecem que a avaliação, cronologicamente, passou por cinco períodos: pré-
tyleriano, que vai até 1930; tyleriano, desde 1930 até 1945; fase da “inocência”, desde
1946 até 1957; realismo, que vai de 1958 a 1972; e período do profissionalismo, a partir de
1973 até os dias atuais.
A avaliação escolar propriamente dita passou a ser melhor estruturada somente
depois do século XVIII, quando as universidades começaram a discutir a necessidade de
outros métodos de exames adequados às novas exigências de averiguação do rendimento
escolar dos acadêmicos, e também quando as primeiras escolas modernas começaram a se
formar e a escolaridade tornou-se obrigatória.
Durante o século XIX, a massificação de testes escritos foi tão intensa, que a
avaliação escolar ficou associada praticamente à idéia de exames, notação e controle,
constituindo-se o período de 1900 a 1930 como a Idade da Eficiência e dos Testes”, em
decorrência, principalmente, da extrema confiança dos métodos avaliativos utilizados, com
os propósitos de selão nos exames e concursos.
Ainda nesse século, cabe destacar a importância de Horace Mann e Joseph M.
Rice para o desenvolvimento dos testes padronizados para verificar o desempenho escolar.
Mann, responsável por um estudo baseado em testes de rendimento com o objetivo de
avaliar se as escolas de Boston estavam a educar bem os seus alunos, criou um sistema
único de exames com uma quantidade maior de questões específicas em substituição aos
testes orais pelos escritos. Já Rice, a partir de uma pesquisa sobre a ortografia numa
população de 33 mil estudantes, desenvolveu os primeiros testes objetivos para uso em
pesquisas de alcance escolar.
A propagação dos exames e a preocupação de se estudar o comportamento das
9
STUFFLEBEAM, D. L.; SHINKFIELD, A. J. (1993). Evaluación sistemática: guía teórica y prática.
Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica. (citação conforme consta na dissertação de ARANTES)
78
variáveis intervenientes envolvidas no processo de classificação característico desses
exames, contribuíram, nesta época, para o surgimento da docimologia. Ciência do estudo
sistemático dos exames, em particular do sistema de atribuão de notas e dos
comportamentos dos examinadores e examinados, a docimologia, proveniente do grego
dokimé (nota), surgiu na França e em Portugal, sendo aplicada por Piéron e Laugier (DE
LANDSHERE
10
apud DEPRESBITERIS, 2003).
Uma outra área que ganhou projeção, ainda nesse período, mais
especificamente no final do século XIX até parte do século XX, devido ao aparecimento e
a tentativa de se aperfeiçoar os instrumentos avaliativos utilizados até aquele momento, foi
a psicometria, que teve como precursores Robert Thorndike e Robert L. Ebel. Apoiada na
psicologia, a psicometria tinha como princípio mensurar as habilidades e aptidões dos
alunos constatadas através de testes padronizados, verificando se esses estudantes tinham
reproduzido nos exames o que o professor havia lhes ensinado.
Até as primeiras décadas do século XX, portanto, o que se evidencia é que o
termo avaliação praticamente esteve associado ao ato de medir ou à aplicação de testes.
Contudo a avaliação educacional esteve associada à mensuração do rendimento escolar.
Com a ampliação dos procedimentos voltados para a avaliação do desempenho
dos alunos na década de 1930 (SOUSA, S. Z. L., 2003b), o termo “avaliação educacional”
se tornou mais abrangente, principalmente, graças aos trabalhos de Ralph Tyler, que
proporcionaram uma redefinição no conceito de avaliação, passando a se preocupar
também em determinar até que ponto os objetivos educacionais estavam sendo realmente
alcançados pelo programa de currículo e do ensino, porém o se limitando apenas à idéia,
vista até então, de medida dos conhecimentos adquiridos pelos alunos.
Com o trabalho “Estudo de oito anos”, realizado por Tyler e Smith, que
preconizava uma diversidade de procedimentos de medidas tendo em vista a precisão das
informações da avaliação e os objetivos curriculares, a avaliação começou a se consolidar
como uma atividade científica atingindo sua constituição plena com as publicações do
artigo “General Statement on Evaluation” (1942) e do livro “Basic principles of curriculum
an instruction” (1949), ambos de Tyler.
A abordagem avaliativa de Tyler, gradualmente sistematizada através de suas
obras, baseava-se em confrontar os resultados da aprendizagem dos alunos com os
objetivos traçados anteriormente para o ensino, com o intuito de obter informações que
10
DE LANDSHERE, G. Avalião e exames: noções de docimologia. Coimbra: Almedina, 1976.
79
fossem suficientes para verificar se o desempenho dos estudantes havia se alterado frente a
esses objetivos que poderiam ter sido definidos pelos programas instrucionais ou pelos
professores.
Essas idéias de Tyler, que significavam ainda verificar o quanto os objetivos
educacionais estavam sendo alcançados pelo programa de ensino, deram origem à
concepção conhecida como “avaliação por objetivos”.
Bastante difundida entre os educadores até os dias de hoje, tendo influenciado
sobremaneira a prática escolar, a avaliação por objetivos caracteriza-se:
Por conceber a avaliação como procedimento que permite verificar se os
objetivos educacionais estão sendo atingidos pelo programa de ensino. Tem por
finalidade fornecer informações quanto ao desempenho dos alunos em face dos
objetivos esperados, possibilitando que se verifique o quanto as experiências de
aprendizagem, tal como previstas e executadas, favorecem o alcance dos
resultados desejados (SOUSA, S. Z. L., 2003b, p. 28).
Os aspectos ligados à quantificação e à utilização de diversos instrumentos
avaliativos na aferição se os objetivos educacionais estavam sendo atingidos, foram
discutidos com ênfase por Tyler. Colocando-se contra os testes padronizados pelo modelo
psicometrista, Tyler defendia a necessidade da participação de todos envolvidos no
processo educacional e a prática de mais de um julgamento para verificar a ocorrência das
mudanças provenientes dos objetivos educacionais traçados pelos programas instrucionais.
Na direção da perspectiva de Tyler, onde caberia ao processo avaliativo
identificar as necessidades e capacidades dos alunos, bem como, identificar os pontos
fortes e fracos dos programas curriculares a partir da mensuração das mudanças de
comportamento ocorridas com os alunos, para esse autor teríamos, então, que a avaliação é
o processo mediante o qual determina-se o grau em que as mudaas de comportamento,
sugeridas e visadas pelos objetivos educacionais, estão realmente ocorrendo (TYLER
11
apud SOUSA, S. Z. L., 2003b).
As idéias difundidas por Tyler perduraram durante as décadas de 60 e 70,
influenciando vários estudiosos que se voltaram aos estudos da avaliação do currículo e da
aprendizagem ampliando alguns pressupostos da sua teoria. No Brasil, inclusive, a
abordagem tyleriana tornou-se referencial teórico de muitos programas de formão de
professores e manuais de currículo.
Entre 1946 a 1957, devido a avaliação educacional na sociedade americana,
apesar dos seus avanços, não ter contribuído para o desenvolvimento do sistema de ensino,
11
TYLER, Ralph W. Princípios básicos de currículo e ensino. Tradução de Leonel Vallandro. Porto Alegre:
Globo, 1974.
80
ficando sob a dependência dos seus distritos escolares a responsabilidade de solucionar os
problemas dos menos favorecidos e em identificar e resolver os problemas do sistema
educativo, Stufflebeam e Shinkfield (1993) apud Arantes (2004), elucidam que esse
período passou a ser reconhecido nos Estados Unidos como a fase da inocência para a
avaliação.
Ainda segundo esses autores, no período compreendido entre 1958 a 1972, a
avaliação foi tomada como alvo de vários questionamentos no debate sobre os currículos
desenvolvidos nos Estados Unidos devido ao lançamento do Sputnik I por parte da União
Soviética. Neste momento, tratado como o período do realismo para a avaliação, entre as
diversas alterações significativas sugeridas para a educação, as teorias avaliativas sofreram
inúmeras críticas em razão do seu caráter demasiadamente técnico, destacando o produto
sem tomar como objetivo a formação integral do aluno.
Neste sentido, novas teorias, métodos e concepções de avaliação surgiram
tecendo duras críticas às concepções vigentes. Entre outros estudiosos que contribuíram
para que a avaliação educacional se posicionasse de modo diferente ao qual vinha sendo
praticada, Meger destacou-se procurando diferenciar avaliar de medir. Para esse autor:
Medir é um processo de determinar a extensão de uma característica pertencente
a um objeto ou a uma pessoa. Avaliar é o ato de comparar uma medida com um
padrão e de emitir um julgamento sobre essa comparação (DEPRESBITERIS,
1989, p. 9).
Cronbach foi outro estudioso que propiciou para que a avaliação se instituísse
como campo de investigação. Para ele, à avaliação interessa, essencialmente, a busca de
informações que possibilitem a tomada de decisões claras, exatas, válidas e amplas.
Considerado, segundo Depresbiteris (1989), o primeiro a incluir o elemento da tomada de
decisão como objetivo da avaliação, Cronbach ampliou a definição de avaliação ao
elucidar que essa
Pode ser definida como um processo que visa à coleta e ao uso de informações
que permitam tomar decisões sobre um programa educacional. [...] deve ser
entendida como uma atividade diversificada, que exige a tomada de diversos
tipos de decisões e o uso de uma grande variedade de informações (VIANNA,
1989, p. 29).
Cronbach defendia uma associão entre a avaliação e o processo de tomada de
decisões, onde o processo avaliativo deveria se propor ao aperfeiçoamento do currículo
escolar, não se limitando apenas a tecer julgamentos finais sobre o desempenho dos
estudantes. Sobre os critérios de avaliação de curso, Cronbach esclareceu ainda que o
desempenho dos alunos em provas ou testes o deveria ser elemento único de avaliação,
81
pelo contrário, que a avaliação deveria se prestar ao objetivo de verificar quais as
mudanças produzidas pelos estudantes por influência do curso, pois assim ela prestaria
um grande serviço identificando os aspectos do curso que necessitariam de revisão.
Entre algumas das sugestões de Cronbach sobre o processo de avaliação, vale
ressaltar:
1) determinar se os métodos de ensino e o material instrucional utilizados no
desenvolvimento de um programa são realmente eficientes;
2) identificar as necessidades dos alunos para possibilitar o planejamento da
instrução; julgar o mérito dos estudantes para fins de seleção e agrupamento;
fazer com que os estudantes conheçam seu progresso e suas deficiências; e
3) julgar a eficiência do sistema de ensino e dos professores, etc. (VIANNA,
1989, p. 34).
Dando seqüência às iias básicas lançadas por Cronbach, que se voltavam
praticamente para a avaliação da aprendizagem, diferentemente do que aconteceu com as
teorias de Tyler, conduzidas para a análise do curculo ou de um programa educativo,
Michel Scriven esclareceu que a avaliação deveria estar a serviço da aprendizagem do
aluno e desvinculada do processo seletivo da sociedade.
Sua obra “The Methodology of Evaluation”, publicada em 1967, marcou a
teoria da avaliação ao introduzir os conceitos de avaliação somativa e formativa,
distinguindo-as, em que à primeira interessa estudar os resultados, enquanto que à segunda
compete recolher informações contínuas para se proceder às reformulações necessárias no
sentido de regular as aprendizagens.
Scriven [...] estabelece uma distinção marcante entre o objetivo e as funções da
avaliação. Para esse autor, o objetivo da avaliação é julgar o mérito de alguma
coisa. Ele classifica as funções formativa e somativa. A avaliação formativa
consiste no fornecimento de informações que serão utilizadas na melhoria do
desempenho do aluno durante seu processo de aprendizagem. A avaliação
somativa refere-se às informações no final desse processo (DEPRESBITERIS,
2003, p. 54).
O aspecto formativo dado por Scriven à avaliação se caracterizou em
considerar como se dava o processo avaliativo para possibilitar intervenções enquanto este
ainda estava em curso. Segundo Arantes (2004, p. 13), é Scriven quem introduz pela
primeira vez o conceito de meta-avaliação, sugerindo que as avaliações finais também
deveriam ser sujeitas a uma avaliação.
O trabalho de Scriven serviu ainda de referência às teorias avaliativas
desenvolvidas por Benjamin Bloom, que tinham como princípio a pedagogia por objetivos,
uma vez que a função da avaliação seria julgar ou determinar a ocorrência ou o das
mudanças nos alunos frente às metas e objetivos educacionais.
Bloom também contribuiu para uma nova visão da avaliação educacional ao
82
desenvolver uma taxonomia que permitia reconhecer as diferenças individuais de cada
aluno no processo de ensino-aprendizagem, e ao idealizar uma aprendizagem para o
domínio em que todos os estudantes eram considerados aptos para aprender
independentemente do tempo que levavam para isso, cabendo ao sistema escolar encontrar
as ferramentas e metodologias capazes de promover o desenvolvimento dos alunos.
Neste sentido, contrário à iia de empregar a escola com a finalidade de
seleção, Bloom elucida:
A principal tarefa da escola é a de desenvolver no aluno as características que lhe
permitirão viver de forma eficiente numa sociedade complexa. Neste contexto a
suposição básica é de que o talento pode ser desenvolvido através de recursos
educacionais, e que o principal empenho da escola deveria ser o de aumentar a
eficiência dos indivíduos, ao invés de predizer e selecionar talentos (BLOOM;
HASTINGS; MADAUS, 1983, p. 6).
Diante da perspectiva de que o ensino seria um processo de modificação nos
aprendizes e de que cada programa, curso e unidade educacional resultaria em alguma
mudança ou mudanças significativas nos alunos, caberia, portanto à avaliação, segundo
Bloom, coletar sistematicamente os dados a fim de verificar se de fato certas mudanças
estariam ocorrendo no aprendiz, bem como verificar a quantidade ou o grau de mudança
ocorrido em cada aluno.
Com o advento de se rediscutir e aprofundar as teorias avaliativas difundidas
pelos sistemas educacionais até o início dos anos de 1970, e buscar desenvolver novas
concepções capazes de responder às indagações envolvendo o ato de avaliar, a avaliação
educacional passou a se constituir como foco de investigação por vários especialistas
resultando na chamada profissionalização da avaliação.
A partir desse período, a avaliação foi assumida sob a perspectiva de diversos
enfoques, decorrendo no surgimento de vários autores e teorias, que de certa forma
contribuíram para o desenvolvimento da avaliação educacional.
Stufflebeam foi um dos nomes que se destacou durante a fase definida como
profissionalismo da avaliação, ao defender que o objetivo primordial da avaliação é
possibilitar a melhoria do ensino. Focado nessa concepção, Stufflebeam defendeu que a
avaliação deveria se constituir num processo contínuo, levantando todas as informações
indispensáveis que fossem capazes de favorecer a tomada de decisões sobre o processo
educacional.
Compreendendo a avaliação como resultado de vários fatores, Parlett e
Hamilton também deram sua contribuão com a proposição da chamada avaliação
iluminativa, onde todas as informações recolhidas durante o processo avaliativo pelos
83
diversos participantes desse procedimento serviriam para uma tomada de decisões diante
do conhecimento e da compreensão dos elementos envolvidos no processo educacional. A
avaliação iluminativa, proposta por eles, visava descrever e interpretar os fatos, ao invés de
mensurar e predizer.
Na proposição de novas dimensões metodológicas da avaliação, Stake difundiu
o conceito de avaliação responsiva, cuja orientação deveria servir aos envolvidos no
processo avaliativo fornecendo as respostas para as variadas preocupações desse processo,
detectando os pontos críticos e apresentando os indicadores para o levantamento de dados
que poderiam ser revistos de forma contínua e interativa. O ponto chave desse modelo de
avaliação estaria no ato de ouvir e dialogar possibilitando ao avaliador identificar com
mais clareza os problemas do processo educativo.
Guba e Lincoln também estiveram entre aqueles que surgiram como
inovadores no processo de avaliação. Com eles difundiu-se uma nova concepção de
avaliação denominada de naturalista. Essa teoria avaliativa, voltada para a consideração da
subjetividade do ser humano, teria como finalidade responder às informações requeridas
levando em consideração o que os requerentes traziam consigo na conceitualização de
valor, favorecendo para a compreensão dos julgamentos decorrentes da avaliação.
O campo de atuação da avaliação educacional também foi ampliado devido às
críticas feitas pelos sociólogos da educação a respeito do caráter reprodutivo das
desigualdades sociais associadas ao sistema escolar. Discussões em torno do processo
avaliativo, como os debates envolvendo os conceitos de avaliação quantitativa versus
avaliação quantitativa, e avaliação de produto versus avaliação de processo, foram
possíveis em razão da propagação das idéias dos sociólogos educacionais, entre eles:
Althusser, Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet (MACIEL, 2003, p. 32).
Entre rios outros estudiosos da avaliação, cabe destacar ainda, Taba, Ragan e
Fleming, que com a tradução de suas obras nos anos 60 e 70, favoreceram para a
divulgação das teorias de Tyler no Brasil e influenciaram o currículo escolar brasileiro,
trazendo entre as etapas do planejamento curricular a avaliação com o caráter de controle
de seu desenvolvimento (SOUSA, S. Z. L., 2003b, p. 28).
De autores brasileiros envolvidos com a questão da avaliação educacional,
merecem ser lembrados os trabalhos realizados por Medeiros e Vianna, que se
caracterizaram por fornecer orientações para o desenvolvimento de testes e medidas
educacionais (Ibidem, p. 28-29).
84
No Brasil, segundo análise de Sousa
12
apud Brasil (2001) sobre a trajetória da
avaliação educacional no país a partir do final da década de 1930 até a década de 1980,
constataremos uma avaliação compreendida, até os anos 50, como mensuração de
capacidades e características individuais por meio de testes, permanecendo durante a
década de 1960 com o sentido de verificação do rendimento escolar. Na década de 70, a
concepção da avaliação como mensuração deu lugar à dimensão tecnológica da avaliação
preconizada pelas iias de Tyler sobre a avaliação por objetivos. nos anos 80, ganha
sentido a compreensão da realidade escolar com o fito de subsidiar as decisões, e é
colocado como desafio a construção de uma sistemática da avaliação da escola como um
todo.
Em resumo, ao perfazer os caminhos percorridos pela a avaliação, a história
desse importante elemento do processo educacional, nos esclarece que sua evolução passou
por três períodos importantes: o surgimento da psicometria, a propagação da pedagogia por
objetivos, e o desenvolvimento de novos conceitos, como exemplo, a avaliação formativa e
somativa.
Esta breve reconstituição histórica da avaliação, nos remete ainda ao
reconhecimento de que não um consenso comum entre os diversos educadores sobre o
verdadeiro valor da avaliação educacional, existindo sim, diferentes “olhares” sobre seus
aspectos e finalidades, onde as concepções avaliativas atuais ainda que tradicionalmente
se prestem ao julgamento e à classificação dos alunos, tornando-se esse o foco de
determinação do sucesso ou fracasso do processo pedagógico não são mais que o
reflexo resultante da mistura das diversas teorias da avaliação elucidadas ao longo da
história.
Reconhecendo desta forma, e sem ingenuidade, de que há atualmente uma
fortíssima disputa entre a visão estabelecida da avaliação como ato de classificar e excluir
e a perspectiva emergente de avaliar para intervir e mudar, onde as aceleradas inovações
teórico-metodológicas na avaliação estão em descompasso com a prática educacional
vigente, nos voltemos para a discussão da primeira forma de avaliação compreendida como
tradicional e proveniente do velho modelo, e da segunda refletida na perspectiva de um
novo modelo avaliativo.
12
SOUSA, Sandra M. Zákia L. Avaliação da aprendizagem nas pesquisas no Brasil de 1930 a 1980.
Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 24, p. 43-49, ago. 1995.
85
3.2 Avaliação na Perspectiva Tradicional: Velho Modelo
Compreendendo aqui, a avaliação escolar na perspectiva do velho modelo, por
se tratar de uma concepção antiga que remonta ao surgimento das primeiras práticas
avaliativas inscritas nas pedagogias de séculos passados; e também na perspectiva
tradicional, por se caracterizar de forma presente e dominante no processo de ensino nas
escolas de hoje; pretendemos elucidar as características mais marcantes desse modelo
avaliativo dentro do contexto educacional.
Fruto da prática educativa e, portanto, tendo em si ao menos uma teoria do
conhecimento, a avaliação tradicional, refletindo-se nas escolas como sinônimo de medida
e aferição do conhecimento revelado pelos alunos, tem sido praticada segundo a influência
dos pressupostos epistemológicos empiristas.
Nessa concepção, onde todo o conhecimento está fora do sujeito e o aluno é
um recipiente vazio à espera para internalizar as informações do meio externo organizadas
pelo professor para posteriormente ser capaz de reproduzi-las quando solicitado (Darsie,
1999); a avaliação se define como ato de medir, ao final de determinado período, os
resultados alcançados pelo aluno para saber quanto ele se aproximou dos níveis previstos
quanto ao domínio de informações e conteúdos veiculados pelo professor, devendo
devolver ao mesmo o que dele recebeu e, de preferência, exatamente como recebeu.
Essa perspectiva traduz uma visão clara da didática que conceituamos como
tradicional: o professor (detentor do conhecimento) passa as informações (leia-se
informações e não conhecimentos) aos alunos (receptores-repetidores) e estes copiam em
seus cadernos e na hora da avaliação (representada por provas e testes objetivos) devem
repetir o que receberam. Desta forma, percebe-se no contexto educacional a utilização de
uma avaliação centrada no ensino e no aluno, cuja tônica é o aspecto quantitativo em
detrimento do qualitativo.
Uma avaliação que visa à eliminação da subjetividade, com conteúdos
predeterminados e independentes das necessidades, do contexto e dos interesses dos
alunos; baseando-se na formulação de questões “objetivas” com atenção ao que foi
veiculado em sala de aula (de preferência com as mesmas palavras) e que podem, por sua
vez, também ser objetivamente corrigidas e quantificadas.
Preocupada com o que o aluno é capaz de repetir, através da memorização ou
de uma verdadeira “musculação” cerebral (D’AMBRÓSIO, 2001, p. 99), a avaliação
concebida no velho modelo, centra-se em procedimentos lineares do conhecimento e
86
aposta na transmissão de conteúdos e reprodução de práticas, perdendo de vista a
complexidade dos fenômenos avaliativos que merecem mais análise.
Essa modalidade de avaliação representa uma síntese dos resultados obtidos em
uma dada situação educativa. São momentos muito específicos, como os finais de uma
unidade, de um período, de um ano letivo ou de um curso e a informação que traduz esta
avaliação, geralmente, é de caráter numérico.
A análise do desempenho do aluno é vista como um ato isolado no processo de
ensino, não valorizando a avaliação feita nos momentos informais, quando o educando tem
oportunidade de demonstrar os avanços em termos de aprendizagem.
Centrada essencialmente no resultado ou no produto da aprendizagem, essa
prática avaliativa destina-se aos professores, na medida em que tem como finalidade
certificar as aprendizagens e verificar se os objetivos finais ou terminais da formação
foram atingidos ou o. Assim, essa avaliação “fomenta a distância entre processo e
produto” (ESTEBAN, 2003, p. 86).
Nesse enfoque, a avaliação ligada aos aspectos do ensino linear e reprodutivista
do conhecimento, ignora que:
Aprendizagem é a aquisição de capacidade de explicar, de apreender e
compreender, de enfrentar, criticamente, situações novas. Não é o mero domínio
de técnicas, habilidade e muito menos a memorização de algumas explicações e
teorias (D’AMBRÓSIO, 2001, p. 89).
Por trás desta postura pedagógica de transmissão mecânica de conceitos e de
uma atitude meramente informativa, a avaliação tradicionalmente concebida nos espaços
escolares estaria gerando uma série de dificuldades impedindo um maior aprofundamento
do trabalho educativo e, portanto:
... levando a uma profunda distorção da prática de estudo, pois o aluno ao invés
de se envolver com a efetiva aprendizagem, passa a ficar preocupado em
memorizar para poder “devolver” na prova; leva à mera repetição e não à criação.
(VASCONCELLOS, 1998, p. 48).
Ainda, de acordo com Vasconcellos, a avaliação aqui, estaria sendo conduzida
pelos professores com o critério de julgamento da capacidade do aluno de reproduzir ou
o o que foi ensinado (1998, p. 48).
Ao se proceder a utilização do processo avaliativo como aferição e como
julgamento, a avaliação assume-se com a finalidade de classificação, rotulando o aluno, de
maneira arbitrária, de bom ou mau, de inteligente ou não, dentre outros aspectos, segundo
os valores, supostamente, medidos sobre o que ele aprendeu ou deixou de aprender.
Sobre o ato de avaliar fundado na classificação, Luckesi esclarece que,
87
... o julgamento de valor, que teria a função de possibilitar uma nova tomada de
decisão sobre o objeto avaliado, passa a ter a função estática de classificar um
objeto ou um ser humano histórico num padrão definitivamente determinado
(1998, p. 34).
Situando o aspecto classificatório da avaliação da aprendizagem escolar, o
autor complementa que a classificação poderia ser dada como inferior, médio ou superior
(p. 34), constituindo-se num instrumento estático e aniquilador do processo de
crescimento, uma vez que,
A avaliação educacional escolar assumida como classificatória torna-se, desse
modo, um instrumento autoritário e frenador do desenvolvimento de todos os que
passarem pelo ritual escolar, possibilitando a uns o acesso e aprofundamento no
saber, a outros a estagnação ou a evasão dos meios do saber (LUCKESI, 1998, p.
37).
Esta situação classificatória determinada pelas práticas avaliativas tradicionais,
se evidencia ainda, quando por meio dos resultados da avaliação os educandos são
rotulados como diferentes, incapazes, inferiores, fracos e menos-dotados ou adiantados,
inteligentes, fortes e bons para o domínio das habilidades exigidas pelo processo ensino-
aprendizagem. Da mesma forma, os sinônimos atribuídos às turmas ou séries como
regulares, especiais, repetentes e atrasadas realçam os aspectos classificatórios decorrentes
das avaliações tradicionais.
A avaliação classificatória sobrepõe-se à finalidade de examinar, reorientar,
reformular e aprimorar o processo escolar desempenhado, constituindo-se, usualmente,
diante dos resultados da aprendizagem apenas com a função de estabelecer uma
classificação do educando, expressa em sua aprovação ou reprovação. O uso dos resultados
encerra-se na obtenção e registro da configuração da aprendizagem do educando, nada
decorrendo daí.
Nessa direção, conforme elucida Sousa, S. Z. L.:
Portanto a avaliação não tem constituído meio de identificarem-se causas de
sucesso ou fracasso do processo pedagógico para subsidiar a definição de
diretrizes e procedimentos de trabalho, mas tem servido, essencialmente, para
julgar e classificar os alunos. E, ao se proceder ao julgamento do aluno,
abstraem-se as condições contextuais presentes, entre as quais destaca-se o
desempenho dos outros agentes do processo pedagógico (2003a, p. 97).
Em síntese, dadas as observações até aqui desenvolvidas que demonstram a
avaliação da aprendizagem escolar aplicada, na quase totalidade das vezes, para classificar
os alunos em aprovados ou reprovados, o que fica mais claro em toda essa análise é a
função que assume o ato de avaliar: ele é realizado somente para detectar o desempenho do
aluno, ignorando-se, quase sempre, o desempenho do professor, a organização da escola e
88
do currículo, a relevância dos conteúdos e a metodologia de ensino.
Sob esse aspecto, concordamos com as palavras de Vasconcellos de que:
É evidente que o aluno deve ser avaliado, mas é fundamental avaliar também a
prática do professor, a organização da escola, o currículo, a participação da
comunidade, as condições de trabalho, ou seja, tudo aquilo que está envolvido no
processo de ensino-aprendizagem (1998, p. 41).
Ao chegarmos a esse tipo de constatação, fica evidente que dificilmente a
instituição escolar e os professores se avaliam, como se suas atuações não fossem passíveis
de reestruturação e de inovação em busca de caminhos mais produtivos do ponto de vista
da efetivação da aprendizagem.
Da mesma forma que se propõe uma avaliação orientadora para o aluno, esta
deveria ocorrer em relação ao professor, ao diretor e assim por diante. Assim, é
imprescindível que se estabeleça um clima de confiança entre os órgãos centrais
e as escolas (DEPRESBITERIS, 1995, p. 75).
Afinal, no sentido em que a avaliação é um elemento fundamental para se
compreender o processo educacional em toda sua complexidade, permitindo recuperar a
discussão dos objetivos, das metodologias, das técnicas, dos procedimentos didático-
pedagógicos, dos recursos, e do desempenho dos alunos, professores e instituição escolar,
Não há como desatrelar a avaliação do rendimento escolar do aluno da avaliação
do desempenho do professor e da instituição escolar, dado que o fracasso ou o
sucesso do primeiro é o reflexo do êxito ou da derrota dos segundos (ROMÃO,
2001b, p. 71).
O objetivo da avaliação classificatória é, simplesmente, a aferição e teste sobre
o conhecimento adquirido pelo aluno, e por isso a avaliação sob esse aspecto se constitui
exclusivamente em um instrumento para a aprovação ou reprovação dos alunos, e
consequentemente, na inclusão ou exclusão dos educandos.
Nesse sentido, Demo denuncia que “avaliações que exacerbam o efeito
classificatório facilmente deturpam a relação pedagógica, chegando às raias da humilhação
sistêmica; em vez de inclusão, aperfeiçoam a exclusão” (2002, p. 48).
O que implica então, é que esse modelo avaliativo ao impor conseqüências
negativas como a ameaça da reprovação, consegue o somente determinar o destino do
aluno e sua trajetória de vida, como também não consegue contribuir para as mais
significativas conseqüências para a melhoria do ensino e a da aprendizagem.
A inadequação das formas de avaliação escolar tradicionais face às exigências
da tomada de decisões sobre o processo educacional, e à necessidade da sua
compatibilização com o intuito de promover ao invés de classificar o educando, deixando,
portanto, de rotulá-lo como incompetente ou fracassado, que gera conseqüências sociais e
89
pessoais danosas, é aliás, salientada por Luckesi quando afirma:
Na prática pedagógica, a transformação da função da avaliação de diagnóstica em
classificatória foi péssima. O educando como sujeito humano é histórico,
contudo, julgado e classificado, ele ficará, para o resto da vida, do ponto de vista
do modelo escolar vigente, estigmatizado, pois as anotações e registros
permanecerão, em definitivo, nos arquivos e nos históricos escolares, que se
transformam em documentos legalmente definidos (1998, p. 35).
Segundo Romão, a prática avaliativa classificatória estaria relacionada à
concepção pedagógica autoritária, uma vez que:
A concepção autoriria do ensino busca na avaliação classificar periodicamente
os alunos, através de quantidades de conhecimentos adquiridos nos interstícios da
aplicação de instrumentos de medida, estendendo-lhes o princípio hierarquizador
(2001b, p. 73).
Ainda que, questões como: “Avaliação que não classifica, também não avalia!”
(DEMO, 2002, p. 19) ou “É fato que o classificação sem avaliação” (RIBEIRO, 1994,
p. 77) defendam a idéia de que garantir a aprendizagem do aluno contém também
pretensão classificatória, e que, portanto, saber se o aluno está ou não aprendendo, implica
classificar; é necessária a compreensão de que é possível avaliar sem que qualquer
classificação venha a seguir (RIBEIRO, 1994, p. 77), ou mesmo, que é bem melhor e mais
realista argumentar sobre as razões pedagógicas da avaliação classificatória e seus óbvios
riscos do que negá-la (DEMO, 2002, p. 18), uma vez que sua prática é tão evidente,
infelizmente, no contexto sócio-educacional.
A avaliação do rendimento escolar, traduzida de forma classificatória, legitima
ainda, um processo de seletividade e discriminação de alunos, se postando de modo
contrário ao aperfeiçoamento do ensino e aprendizagem.
Dessa forma, as práticas avaliativas tradicionais separam os “eleitos” dos “não-
eleitos”, excluindo uma parte dos educandos e admitindo, como “aceitos”, uma outra.
Neste instante, o processo ensino-aprendizagem começa a se fragmentar, pois
através da avaliação assume-se com o poder de definir quem sabe e quem não sabe e,
indiretamente, o de selecionar os melhores da sociedade.
A avaliação seletiva presume que as diferenças individuais tendem a distribuir-
se de acordo com a curva normal de Gauss, e assim, toma como referência, ou compara, as
realizações dos sujeitos que pertencem ao mesmo grupo, conferindo-lhes uma natureza
intrinsecamente seletiva e competitiva.
É sempre possível decantar na pedagogia que os alunos não deveriam ser
comparados entre si, porque cada um tem seu ritmo próprio, mas, na prática, o
fato de os alunos estarem juntos numa sala é o bastante para os escalonar, o que
transforma simples diferenças em autênticas desigualdades (DEMO, 2002, p. 10).
90
O que é avaliado é o desempenho de cada aluno e este é comparado com o dos
outros alunos e trocado por classificações e certificações, exatamente por se constituírem
em um grupo determinado no âmbito da sala de aula, podendo se estender para o universo
da escola.
A avaliação tradicional parece ser, portanto, a modalidade de avaliação mais
adequada quando a competição e a comparação se tornam valores fundamentais em
educação.
Dessa forma, a avaliação,
Pressupondo uma homogeneidade da clientela escolar, ela propõe igualdade de
condições a classes heterogêneas, com contextos de vida diferentes.
Desconsidera, dessa forma, a especificidade de cada um, o ritmo de
aprendizagem próprio de cada aluno (SOUSA, C. P., 2003, p. 129).
Em consoncia com Afonso (2002, p. 21), que se refere às formas de
avaliação como “julgamentos de excelênciana perspectiva de Perrenoud. A avaliação de
caráter seletivo se constituirá a partir dos julgamentos de excelência, que ocorrem no
quotidiano da escola e da sala de aula, contribuindo para fabricar imagens e representações
sociais positivas ou negativas que, consoante os casos, levam à promoção ou
estigmatização dos alunos, justificando a sua distribuição diferencial na hierarquia
escolar.
Através desse processo de seleção estimulado pela avaliação tradicional, que
reflete e é um reflexo da dinâmica educacional, reconhece-se, por meio de mecanismos
mais ou menos explícitos, a existência de uma prática discriminatória e de manutenção da
hierarquia social também no âmbito escolar (SOUSA, S. Z. L., 2003a, p. 103).
Reforçando essa visão e a função real que a avaliação tem desempenhado no
sistema educacional, Soares (p. 47)
13
manifesta:
É um dos mais eficazes instrumentos de controle da oferta e do aproveitamento
de oportunidades educacionais e sociais e de dissimulação de um processo de
seleção em que, sob uma aparente neutralidade e eqüidade, a alguns são
oferecidas sucessivas oportunidades educacionais e, em conseqüência,
oportunidades sociais, enquanto a outros essas oportunidades são negadas,
processo que se desenvolve segundo critérios que transcendem os fins declarados
da avaliação. [...] Implícita e mascaradamente, a avaliação exerce o controle do
conhecimento e, dissimuladamente, o controle das hierarquias sociais. (apud
SOUSA, S. Z. L., 2003a, p. 104).
Os aspectos classificatório e seletivo impostos pelo modelo tradicional de
avaliação se caracterizam de forma mais séria e preocupante quando não reconhecendo
13
SOARES, Magda B. Avaliação educacional e clientela escolar. In: PATTO, Maria Helena S. (org.).
Introdução à psicologia escolar. São Paulo: T. A. Queiroz, 1981.
91
suas limitações e capacidades, se impõem de forma arbitrária classificando muitos alunos
em excluídos ou especiais.
Nesse sentido, a avaliação servirá muito mais à prática do julgamento,
postando-se como instrumento para classificar os educandos em aprovados e reprovados, e
por conseqüência revelando seu lado mais cruel a partir da exclusão, do que interessada em
identificar os rumos para o progresso escolar do aluno e sua transformação social.
No caso, a avaliação está muito mais articulada com a reprovação do que com a
aprovação e daí vem a sua contribuição para a seletividade social, que existe
independente dela. A seletividade social posta: a avaliação colabora com a
correnteza, acrescentando mais um “fio d’água” (LUCKESI, 1998, p. 26).
Em crítica a esse modelo, D’Ambsio manifesta que:
A avaliação deve ser uma orientação para o professor na condução de sua prática
docente e jamais um instrumento para reprovar ou reter alunos na construção de
seus esquemas de conhecimento teórico e prático. Reprovar, selecionar,
classificar, filtrar indivíduos não é a missão do educador. Outros setores da
sociedade devem se encarregar dessa missão (2001, p. 98).
Analisando os modelos de sociedades pautadas pela competição, pela exclusão,
pelo temor ao diferente, não é de todo estranho constatar que na escola essas mesmas
idéias sejam reproduzidas.
Mesmo diante dos avanços em torno da avaliação voltada para favorecer a
aprendizagem, as práticas avaliativas executadas de forma tradicional conseguem agir
selecionando e excluindo os alunos e promovendo com isso desigualdades que ultrapassam
as fronteiras da escola e se fortalecem na sociedade.
Orientados segundo os sucessos ou insucessos obtidos em suas passagens pelos
bancos escolares, os alunos seguirão suas vidas e se constituirão socialmente de acordo
com os rótulos de fracassado ou vitorioso que a escola lhes impôs.
A continuidade de procedimentos seletivos e excludentes no interior da escola,
através, principalmente, das práticas avaliativas tradicionais é reflexo da lida concepção
de avaliação como sinônimo de medida do desempenho escolar. Concepção, inclusive,
com presença marcante em toda sociedade.
“Revestindo a avaliação de um caráter exclusivamente comercial,
contabilístico, que desconsidera o aspecto educacional” (DEPRESBITERIS, 1995, p. 53), a
medida, segundo os fins declarados pela avaliação tradicional, se volta com a pretensão
única de apenas verificar se o estudante alcançou, e em que grau, os objetivos que se
propõe o processo de ensino.
Nessa perspectiva, tomando como análise o trabalho de Luckesi (1998) sobre
92
o que pratica a escola? Verificação ou avaliação”, conclui-se que a medida implica na
verificação e não na avaliação da aprendizagem. Pois, a verificação encerra-se no momento
em que o objeto ou ato de investigação chega a ser configurado, sinteticamente, no
pensamento abstrato, isto é, no momento em que se chega à conclusão que tal objeto ou ato
possui determinada configuração. A dinâmica do ato de verificar encerra-se com a
obtenção do dado ou informação que se busca, isto é, “vê-se” ou “não se vê” alguma coisa,
o implicando que o sujeito retire conseqüências novas e significativas. Enquanto que na
avaliação procura-se atribuir um valor ou qualidade a alguma coisa, implicando um
posicionamento positivo ou negativo em relação ao objeto, ato ou curso de ação avaliado.
Isto quer dizer que o ato de avaliar o se encerra na configuração do valor ou qualidade
atribuído ao objeto em questão, exigindo uma tomada de posição favorável ou
desfavorável ao objeto de avaliação, com uma conseqüente decisão de ação.
Ainda sobre os significados da medida em relação à avaliação, Popham
14
citado por Depresbiteris esclarece:
A medida, diz esse autor, revela o quanto o aluno possui de determinada
habilidade; a avaliação informa sobre o valor dessa habilidade. A medida
descreve o fenômeno com dados quantitativos; a avaliação descreve os
fenômenos e interpreta-os, utilizando-se, também, de dados qualitativos (1995, p.
54).
Sobre a prática do professor de medir ao invés de avaliar e, portanto, resgatar o
seu papel essencial que é ensinar, Vasconcellos esclarece que embora isto pareça
elementar, evidencia-se no concreto que a preocupação maior do professor não está sendo
ensinar, mas medir, quantificar, inclusive até de um jeito renovado (1998, p. 79).
A partir de uma mensuração do que o aluno produziu, como rendimento
escolar, a escola o rotula com uma medida, uma nota, expressa no histórico escolar, que se
torna o documento que credenciará ou não o educando na sociedade.
Diante das limitações da avaliação como medida como foi descrito no
pico anterior referente à breve contextualização histórica sobre a evolução da avaliação,
que inicialmente foi entendida como medida evidencia-se sua incapacidade em
compreender todos os aspectos educacionais passíveis de serem avaliados.
Se nos primórdios das discussões em torno da avaliação encontrávamos
concepções enfáticas em defesa da avaliação como medida. Como a de Ebel, ao afirmar
que a avaliação dependia da medida e que uma característica que não podia ser medida,
o podia, também, ser avaliada.
14
POPHAM, W. J. Avaliação educacional. Porto Alegre: Globo, 1983.
93
Hoje, apesar da avaliação continuar sendo interpretada, em algumas ocasiões,
como sinônimo de medida ou mensuração, como aponta Hadji (2001), referindo-se à
suposta “confiabilidade” das medidas em educação e dos parâmetros “objetivos” utilizados
pelos professores ao atribuir notas às tarefas dos alunos; compreende-se que não é mais
tão enfática sua visão baseada no ato de mensurar.
Nesse sentido, o papel da avaliação escolar não deve se reduzir à mera função
mensuradora, mas sim superá-la, afinal o processo avaliativo não se esgota na medida, mas
também a inclui.
Sousa, C. P. reforça essa concepção quando afirma que:
A avaliação do rendimento escolar é um processo amplo que envolve a medida e
ultrapassa-a. Compete à avaliação a análise dos dados obtidos pela mensuração
de acordo com critérios advindos do processo de ensino, tendo em vista o
encaminhamento de decisões educativas (2003, p. 115).
Outro aspecto da avaliação, nessa perspectiva de mensuração, é a sua
contribuição para criar uma relação de antagonismo entre professor e alunos. “A avaliação
tradicional, não satisfeita em criar fracasso, empobrece as aprendizagens e induz nos
professores, didáticas conservadoras e, nos alunos, estratégias utilitaristas”
(PERRENOUD, 1999, p. 18).
Dessa maneira, evidencia-se uma relação professor-aluno, identificada como
uma espécie de dominação, de autoritarismo, de submissão. Para Afonso, que parece
partilhar desta mesma convicção, e para nós próprios também,
A relação professor-aluno, enquanto relação avaliador-avaliado, é vivida como
uma relação de poder na medida em que a avaliação é compulsória, tem
conseqüências importantes para a vida escolar e pós-escolar dos alunos e impõe
unilateralmente uma determinada grelha de interpretação da realidade que faz
com a relação entre avaliador e avaliado seja vivida como uma relação de
dominação (2002, p. 20).
O professor ao receber do sistema escolar o poder de certificar e selecionar,
acaba, involuntariamente ou mesmo que o queira deliberadamente, decidindo sobre a
vida de seus alunos pela medida que lhes atribui.
Sobre esta questão, Maciel observa:
E aqui é que está o cerne da questão inerente à exclusão escolar, por refletir a
alienação do professor em relação às conseqüências das práticas avaliativas
induzidas pelo sistema de ensino. Mesmo estando bem intencionado, os efeitos
de suas ações são contrários ao que ele defende sem se dar conta disso (2003, p.
22).
Ao se prender ao ciclo da aprovação e reprovação, o professor deixa, portanto,
de avaliar de fato, por atender a uma exigência da atividade burocrática da escola, que
94
influenciada pela sociedade, tem na marca tradicional da avaliação o reconhecimento do
contexto social classificatório (DEMO, 2002).
Diante de uma cultura, a qual na sociedade é normal classificar as pessoas, a
avaliação tradicional assume proporções desastrosas, com conseqüências sociais e pessoais
danosas aos educandos, agindo de maneira: estanque, mensuradora, classificatória,
selecionadora, rotuladora, discriminatória, autoritária e, por fim, excludente.
3.2.1 – A avaliação como instrumento de socialização e desigualdade social
Todo processo educativo tem como pano de fundo as implicações sociais. A
própria sala de aula reflete uma parte da sociedade que ela é. Deste modo, sendo a
avaliação uma parte importante de todo processo educacional, não seria erneo afirmar
que as práticas avaliativas também são influenciadas pelas formas de organização da
sociedade.
Sendo assim, a avaliação escolar será sempre dimensionada por um modelo
teórico de sociedade, que por sua vez traduzirá uma concepção de educação, interpretada
na prática pedagógica. Portanto, ainda que ingênua e inconscientemente esteja a serviço de
uma concepção social, a prática avaliativa jamais se constituirá como uma atividade neutra
(LUCKESI, 1998, p. 28).
Desta percepção da avaliação como um processo que não é neutro, dadas as
razões da influência exercida pelo modelo de sociedade, Dias Sobrinho (p. 72)
15
, vem
esclarecer que:
Avaliar é uma ação que não admite neutralidade. Ultrapassa as descrições
objetivas e as análises de coerência interna da realidade tomada por objeto. É um
processo de forte conteúdo ético, pois indaga valores e significados sociais (apud
ALMEIDA, 2006, p. 40).
Na perspectiva de entendimento, onde a avaliação torna-se socialmente
determinada pelo modelo de sociedade que se impõe à escola, e esta se ime ao processo
avaliativo, dizemos, pois, que ao avaliar é impossível apagar o pano de fundo da clivagem
social em qualquer sociedade. Para Sousa, C. P. (2003, p. 113-114), nessa concepção,
A avaliação do rendimento escolar é uma atividade socialmente determinada. A
definição do porquê, o quê e como avaliar pressupõe uma concepção do homem
que se quer formar e das funções que atribuem-se à escola em uma determinada
sociedade. Melhor dizendo, são os determinantes sociais que definem a função
que a escola vai ter e o porquê, o quê e como a avaliação deve realizar-se para
controlar esse processo.
15
DIAS SOBRINHO, José. Avaliação institucional: marcos teóricos e campos políticos. Avaliação. Revista
da rede de avaliação institucional da educação superior. Ano 1, n. 1, jul. 1996.
95
Assim, segundo o modelo social, que pode ter, entre outros objetivos, por
exemplo, a “domesticação” ou “humanização” dos educandos. A avaliação escolar pode
ser praticada, por um lado, preocupada com a reprodução e conservação da sociedade,
propondo-se à adaptação e o enquadramento dos educandos no modelo social; e por outro,
voltada para as perspectivas e possibilidades de transformação social, oferecendo aos
educandos meios pelos quais possam atingir tal transformação (LUCKESI, 1998, p. 31-
32).
Assim, nossa avaliação pode estar tanto a serviço da manutenção do sistema
social de dominação (quando classificamos, quantificamos, excluímos e incitamos à
evasão) quanto ser a crítica desse sistema, visando à formação de indivíduos críticos, e
capazes de decidir e transformar.
As práticas avaliativas constituem um dos mais claros indicadores da relação
entre a escola e a sociedade. Enquanto, elemento constitutivo na vida da escola, e um dos
processos pedagógicos mais importantes, a avaliação acaba por contribuir para a
socialização dos educandos em escolarização conforme as determinações da sociedade.
Segundo esse consenso, a avaliação diante de um constante jogo de
poder/saber, se evidenciará: desde a sujeição dos alunos e alunas às regras estabelecidas na
e pela escola, até a circunscrição do que é permitido ou não é permitido pela sociedade
para tornar-se saber escolarizável.
Analisando as funções da avaliação escolar que têm sido praticadas no atual
contexto educacional, de um lado, como clima favorável para a aprendizagem, e por outro,
como um ritual a serviço da manutenção da ordem social, chega-se à conclusão a partir da
análise de Sousa, S. Z. L. (2003a, p. 97) que, se o ritual é improdutivo quando se considera
o papel da avaliação como meio de promover o aprimoramento do processo pedagógico, é
produtivo e eficiente como meio de controlar e adaptar as condutas sociais dos alunos.
Desse modo, a sociedade que tem se mantido, predominantemente,
conservadora, vem, por intermédio do sistema de ensino e dos professores, desenvolver
formas de ser da personalidade dos educandos, que inclusive se conformam aos seus
ditames.
Assim, os alunos, conforme corrobora Santos
16
(p. 7-8):
Encaram a avaliação como algo definitivo e o trabalho do professor legítimo. As
suas eventuais contestações o dirigidas, quando muito, ao modo como tais e
quais professores executam seus trabalhos. Nunca contestam a existência da
16
SANTOS, Wlademir dos. Mensuração e avaliação: significados, funções, diretrizes. Dissertação de
Mestrado. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica, 1978.
96
própria avaliação. Os resultados, quando negativos, mas considerados legítimos
são racionalizados: ‘fui reprovado porque não estudei como devia’. ‘Nunca
gostei de Matemática’, ‘Não houve tempo para estudaretc. Jamais perceberam a
relação de dominação na qual o professor é o representante do sistema (apud
SOUSA, S. Z. L., 2003a, p. 102).
Não só os alunos se conformam com os ditames sociais impostos pelo processo
avaliativo praticado pela escola através da figura do professor, como seus pais também
legitimam essa prática, aceitando o diagnóstico de incapacidade dos filhos na escola.
Novamente, Santos (1978, p. 8) citado por Sousa, S. Z. L. (2003a, p. 102), nos esclarece:
Para os pais a dominação exercida pelo professor é legítima e, na maioria das
vezes, eles nem concordam com as eventuais críticas que os filhos possam tecer
ao professor. Tomam tais atitudes dos filhos como ‘desculpas’ para justificar a
falta de estudos ou de esforços na vida escolar.
Levando os avaliados, no caso os alunos, no sentido amplo e grave a se
adaptarem ao que é desejado pelos avaliadores e executores dos interesses da sociedade, a
avaliação escolar torna-se corrompedora e deformadora do verdadeiro papel da escola, que
é o de promover a transformação social.
Diante do individualismo, competitividade, autoritarismo, dominação e
utilitarismo, como algumas das características marcantes da sociedade moderna, o avaliar
tradicionalmente concebido nos espaços escolares como ato solitário e dicotomizado entre
professores e alunos, representa um ilustrativo recorte dessa forma social de organização.
Nessa sociedade, predominantemente voltada para um modelo teórico de
compreensão que pressupõe a educação como um mecanismo de conservação e reprodução
social, a avaliação presume-se impreterivelmente sob o aspecto classificatório, integrando
e preparando os educandos para manterem a classe dominante em desejáveis níveis de
controle e manipulação.
Mais ainda, a avaliação do rendimento escolar, voltada para a garantia do
mecanismo de conservação e de reprodução da sociedade, assume-se também como
instrumento de controle disciplinar, de discriminação do aluno e de controle de sistema de
classe social.
A utilidade da avaliação classificatória, segundo essa lógica social, se justifica,
pois no processo de socialização as pessoas não apenas convivem, como são classificadas,
principalmente frente às expectativas das vantagens sociais. E isso é o que revela Demo:
Assim, toda sociedade, ao realizar seu processo de socializão, através do qual
padroniza os comportamentos, papéis, normas e valores, classifica as pessoas e
grupos, revelando tendência funcional de preferir o cidadão medíocre ao criativo
(2002, p. 11).
97
O contexto classificatório dentro da sociedade que a tudo e a todos classifica
torna-se, portanto, o motivo real para que a avaliação escolar se coloque a serviço do
entendimento teórico conservador da sociedade e da educação, se opondo à preocupação
com a educação como mecanismo de transformação social.
Nesse sentido, Demo (2002, p. 10), alerta que “é impraticável escamotear a
visível ligação entre avaliação e desigualdade social”. O autor esclarece ainda, que na
perspectiva social, devemos atentar para o pano de fundo da desigualdade, definida esta
como questão histórico-estrutural, e que aparece em qualquer sociedade (2002, p. 47).
No campo minado da desigualdade social, a avaliação emerge como
mecanismo de manutenção da sociedade de classes, possibilitando controlar a ascensão dos
indivíduos de uma classe menos favorecida para outra mais favorecida, determinando
assim, quem pode alcaar os melhores lugares na sociedade.
A desigualdade social, reproduzida pelas condições escolares idealizada pelo
modelo de sociedade conservadora, se estabelece assim, como uma ferramenta de exclusão
dos mais pobres e sem condições da escola, levando tudo a crer que,
Além das dificuldades resultantes da formação, os problemas da avaliação da
aprendizagem resultam também do tráfico ideológico das elites, que têm
conseguido certos consensos mitológicos, favoráveis, evidentemente, à
manutenção do status quo individualista, meritocrático, discriminatório e injusto
(ROMÃO, 2001a, p. 43).
A manutenção da sociedade na sua configuração conservadora, submete a
avaliação da aprendizagem escolar a se prestar a um modelo social dominante, o que a
torna obrigatoriamente autoritária, para servir com êxito a uma sociedade que para se
manter no poder exige controle e enquadramento dos indivíduos segundo suas normas.
Dentre, portanto, os aspectos específicos da vida da escola, as relações de
autoritarismo, arbitrariedade e hierarquia se expressarão através da prática da avaliação
manifestada na sala de aula e na estrutura educacional. Com isso, as manifestações de
poder e subordinão presentes na sociedade se reproduzirão na forma pela qual a escola se
organiza e funciona.
3.2.2 – Avaliação: mecanismo autoritário e disciplinador
A obrigatoriedade de se produzir sujeitos adequados às necessidades do
modelo de sociedade conservador tem feito com que a avaliação escolar seja conduzida de
maneira autoritária.
Diante do autoritarismo e da arbitrariedade do processo avaliativo, o modelo
98
social conservador e suas práticas pedagógicas têm se estabelecido na tentativa de garantir
que a equalização social não aconteça.
Desse modo, na compreensão da escola como um dos espaços sociais mais
importantes, a avaliação, como parte essencial dessa conjuntura educacional, tem se
manifestado como um mecanismo de poder e disciplinamento dos educandos, favorecendo
para a padronização de indivíduos dentro da normatividade socialmente estabelecida.
Na concepção autoritária, que não se esgota apenas na avaliação, o professor se
coloca como único detentor do conhecimento. Sua missão é repassar todas as informações,
todo conteúdo para os alunos. A aula é como se fosse o único momento e instrumento
adequado para a aquisição dessas informações, e por isso os alunos a assistem ao invés de
participarem efetivamente.
No que diz respeito ao relacionamento professor-aluno nessa concepção
autoritária, o que se estabelece é uma relação em que o respeito mútuo não se constrói no
reconhecimento das diferenças igualitárias, mas nas distinções hierarquizadas, valendo-se
de uma definição institucional de autoridade. A imposição e o controle tornam-se questões
de utilidade a que os professores recorrem para forçar aos estudantes os valores e os
comportamentos que eles idealizam como adequados.
Ainda que haja, generalizadamente, uma denúncia da burocratização do ensino,
os professores autoritários continuam atendendo, passivamente, muito mais às
exigências fiscalizadoras dos óros intermediários, do que às necessidades dos
alunos (ROMÃO, 2001b, p. 72).
Nessa perspectiva é que podemos entender na escola o surgimento, através da
avaliação do rendimento escolar, das práticas de sujeição e de controle das atitudes dos
educandos; da manifestação de autoridade docente; das repetitivas exigências dos
professores em cobrar dos alunos e alunas a matéria “dada”, de preferência sob a forma de
exercícios de memória, ou atividades sem maiores significados para os estudantes; e da
atribuição de prêmios ou gratificações àqueles que são estudiosos e “tiram” boas notas.
As formas disciplinantes e normatizadoras, assumidas pela escola através dos
professores, em suas práticas avaliativas restritivas do sujeito, colocam-na como instituição
social repressora e de sujeição. Assumindo através de exames e provas uma concepção de
avaliação que se ime como de controle e disciplinamento, a escola assume-se
evidenciando um modelo que observa com atenção e depois castiga.
Na descaracterização da prática avaliativa, que deveria preocupar-se com a
transformação social e não servir de mecanismo para a conservação e a reprodução da
sociedade, a avaliação escolar passa então a ser realizada de maneira invertida. Assim,
99
segundo Luckesi:
De um instrumento de diagnóstico para o crescimento, a avaliação passa a ser um
instrumento que ameaça e disciplina os alunos pelo medo. De instrumento de
libertação, passa a assumir o papel de espada ameaçadora que pode descer a
qualquer hora sobre a cabeça daqueles que ferirem possíveis ditames da ordem
escolar (1998, p. 40).
A partir dessa mudança de função, a avaliação no uso do seu poder, manifesta-
se de maneira autoritária e disciplinadora agindo como estratégia-chave de manutenção da
ordem social” na escola e nas salas de aula.
Nas mãos do professor, como representante do sistema social, a avaliação
concebida como autoritária, servirá como manifestação de poder do professor no
julgamento daquilo que achar conveniente julgar. Como “senhor do direito” e “autoridade”
diante dos alunos, ao professor é concedido o poder de exigir a conduta que quiser,
quaisquer que sejam os interesses dos educandos.
Assim, o professor poderá alterar seus padrões de julgamento quando da
decisão de aprovar ou reprovar os alunos, premiar ou castigar os educandos dentro do
ritual pedagógico, disciplinar os alunos com o poder e o veredicto da avaliação, e por fim,
promover a inclusão ou exclusão dos indivíduos escolarizáveis.
Na atitude do professor com seu juízo de valor emitido sobre os educandos, é
imprescindível destacar que, apesar de não ser o culpado, ele é o responsável pela
determinação do sucesso ou fracasso do aluno. Seu arbítrio, quando da atribuição de
conceitos e notas, sem que ele esteja consciente disso, poderá estar definindo o rumo da
vida do aluno. É necessário, portanto, que ao avaliar, e diante da angústia desse processo, o
professor compreenda o que está de fato avaliando e quais são seus sentimentos e teorias
sobre o objeto avaliado.
Caso contrário, estará decidindo quem são os aprovados e reprovados de
maneira injusta, sem critério prévio e sem relevância dos dados, baseando-se unicamente
em sua decisão nos critérios de julgamento determinados de acordo com seus interesses.
Isso demonstra a falta de uma posição objetiva e imparcial perante o processo
avaliativo, sendo assim,
Os dados relevantes, que sustentariam a objetivação do juízo de valor, na
avaliação, são substituídos pelo autoritarismo do professor e do sistema social
vigente por dados que permitem o exercício do poder disciplinador. [...] Por
exemplo, pode-se reduzir o padrão de exigência, se se deseja facilitar a aprovação
de alguém; ao contrário, pode-se elevar o padrão de exigência se se deseja
reprovar alguém (LUCKESI, 1998, p. 37-38).
O efeito da premiação é visto como decorrente do próprio empenho individual
100
dos alunos em aproveitarem as oportunidades de ensino. Através do ato de premiar, a
escola tenta legitimar o consenso sobre as diferenças individuais. Como se essas diferenças
fossem naturais, a avaliação com propósitos de classificação dos alunos, é justificada
independentemente do seu resultado. Assim, diante do privilégio da recompensa, cria-se a
ilusão de que todos têm as mesmas condições sócio-educacionais de serem premiados,
quando na verdade o objetivo aqui é a reprodução das hierarquias sociais a partir do
individualismo e competitividade entre os alunos.
Para Ott
17
(p. 148) apud Sousa, S. Z. L. (2003a, p. 100), o ato de premiar torna-
se eficiente para a manutenção da sociedade de classes, pois, “o efeito da premiação se faz
tanto sobre os que são premiados, que se julgam ‘justificados’, como os que não o são.
Sobre estes o efeito é de conformismo e de ‘reconhecimento’ do seu lugar”.
O castigo como instrumento gerador do medo, também é uma prática
autoritária que se impõe tanto como controle social quanto atividade de poder no
disciplinamento dos alunos. Não se explicitando mais de forma sica como ocorria em
tempos remotos afinal, quem nunca ouviu falar ou mesmo sentiu na própria pele as
famosas práticas coercitivas: palmatória, apanhar de régua, ajoelhar no milho ou feijão,
ficar em com o rosto voltado para a parede, puxão de orelha, beliscão, etc. o castigo,
atualmente tem se voltado através da ameaça.
Através da avaliação da aprendizagem, a escola e o professor têm exercido o
papel de punição e coerção explícita, por meio da ameaça, tanto para motivar o aluno para
a aprendizagem escolar quanto para manter a disciplina no interior da sala de aula e
também na escola.
Confirmando essa perspectiva, Vasconcellos afirma:
Na avaliação tradicional encontramos um dos mais comuns pontos de fuga da
mobilização, qual seja, o professor, não conseguindo motivar o aluno para o
trabalho, apela, e começa a usar a nota como um instrumento de pressão para
obter a disciplina e a participação (1998, p. 74-75).
Protestando ser um elemento motivador da aprendizagem, os professores
acabam usando a avaliação, representada pela figura máxima da prova, como instrumento
de ameaça e tortura prévia dos alunos. Sendo assim, quando o professor sente que o seu
trabalho na está surtindo o efeito esperado, anuncia aos seus alunos: “Estudem! Caso
contrário, vocês poderão se dar mal no dia da prova” (LUCKESI, 1998, p. 18-19).
Na prática, essa é uma das estratégias mais corriqueiras que os professores
encontram de tornar “significativo o trabalho; tudo passa a funcionar
17
OTT, Margot B. Tendências ideológicas no ensino de 1
o
grau. Tese de doutorado. Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, 1983.
101
“maravilhosamente”... Resultado: mais uma vez mantém-se a alienação da
necessidade em relação ao conhecimento, pois o aluno não se relaciona com o
conhecimento enquanto tal, mas enquanto meio de garantir a sua nota
(VASCONCELLOS, 1998, p. 75).
A prática de se utilizar a avaliação como instrumento de pressão para promover
a participação dos alunos na sala de aula é tão evidente, que os próprios professores m
defendido esse processo. O problema é que eles, muitas vezes, não se dão conta que, o fato
dos alunos estarem estudando não significa necessariamente que estão fazendo isso em
razão da aprendizagem, mas sim em função da prova, para obter a nota. “Pode até mesmo
acontecer que por medo o aluno estude, mas por este mesmo medo, não assimila o que
estuda” (PENNA FIRME
18
, p. 61 apud Ibidem, p. 75).
Para Luckesi, segundo esse entendimento, o estudante deverá se dedicar aos
estudos não porque os conteúdos sejam importantes, significativos e prazerosos de serem
aprendidos, mas sim porque estão ameados por uma prova. O medo os levará a estudar”
(1998, p. 19).
Um dos principais desvios na utilização da avaliação escolar tem sido seu
emprego como mecanismo de punição contra os alunos no sentido de discipliná-los. Nesse
sentido, é comum, diante da observação de alunos indisciplinados e desobedientes, a
freqüência de expressões do tipo: “Fiquem quietos! Prestem atenção! O dia da prova vem
e vocês verão o que vai acontecer” (LUCKESI, 1998, p. 18-19).
Entre outras arbitrariedades, em função do expediente de se ameaçar os alunos
com o poder e o veredicto da avaliação para manter a disciplina, encontraremos as mais
diversas situações de controle e disciplinamento das condutas dos alunos.
Desse modo, alguns professores, incapazes de manter a disciplina, podem
aplicar provas-surpresa a seus alunos, com a finalidade exclusiva de puni-los por seus
comportamentos (DEPRESBITERIS, 1995, p. 53); por desobediência do aluno, este pode
ser punido por meio de baixos conceitos, o que pode levá-lo à reprovação e até ao
convencimento de que é incapaz de adaptar-se à escola (SOUSA, S. Z. L., 2003a, p. 98);
ou ainda, por circunstâncias dos alunos “virem a ferir a ordem social da escola”, são
advertidos previamente que poderão sofrer conseqüências nos resultados da avaliação, a
partir de testes mais difíceis e outras coisas mais (LUCKESI, 1998, p. 40).
A nota pode até ser defendida por muitos professores como forma de
solucionar os questionamentos da indisciplina na sala de aula e na escola, contudo,
18
PENNA FIRME, Thereza. Mitos na Avaliação: Diz-se que... Ensaio, n. 1, v. 2. Rio de Janeiro: Fundação
CESGRANRIO, out./dez. 1994.
102
Vasconcellos (1998, p. 45) alerta que querer resolver o problema de disciplina através da
nota é um equívoco, uma vez que apenas o sufoca, pois a nota funciona como poder
ameaçador sobre o aluno”.
Segundo o mesmo autor (1998, p. 45-46), talvez os problemas de disciplina
fossem melhor resolvidos não tentando usar a nota como fator de pressão ou coação sobre
os alunos, mas sim parando para analisar os seguintes aspectos:
1) Rever a forma de trabalho;
2) Deixar as regras, os limites bem claros; fazer com que os alunos entendam
seu sentido. Favorecer a participação dos alunos na elaboração das normas
da classe;
3) Dialogar com os alunos mais “indisciplinados”. Trata-se de acolhê-los, para
que se sintam gente e com vontade de melhorar;
4) Conversar com a classe; expor o problema; analisar o que está
acontecendo;
5) Busca ajuda com colegas, orientação, direção.
Torna-se necessário, diante do exposto, a compreensão de que a avaliação
escolar é uma das dimensões do processo de ensino-aprendizagem, e não uma ferramenta,
ou instrumento desenvolvido de forma negativa para atrapalhar e prejudicar o andamento
desse processo. Ela deve ser empregada para ajudar a localizar os problemas educacionais
e com isto fazer com que a aprendizagem seja melhor, e não o contrário.
Seja como for, o ato de avaliar de modo autoritário e disciplinador, apenas tem
servido como arma extremamente eficiente para a conservação e reprodução da sociedade.
E nesse sentido, são as provas, exames e notas que têm determinado os rumos de uma
avaliação escolar contrária à posição da transformação social. Afinal, as funções e
finalidades das provas e exames são as que mais se compatibilizam com o senso comum
exigido pelo modelo social conservador.
3.2.3 – Instrumentos de avaliação: uma visão reducionista
A primeira imagem que nos vem à cabeça quando nos indagamos sobre os
instrumentos avaliativos da aprendizagem escolar é sem vidas a figura das provas e
exames. Ou mesmo, como preferia tratar uma ex-professora nossa nos tempos do ensino de
1
o
Grau: exercícios de verificação da aprendizagem”.
A prática das provas e exames se configura como a mais comum no processo
103
educacional quando nos referimos ao contexto da avaliação da aprendizagem. Reportando-
se a essa prática, Esteban (2003, p. 86) esclarece que o exame que o professor ou
professora realiza sobre o aluno ou aluna, ainda é predominante. Confirmando essa
situação, Afonso (2002, p. 29) observa que estamos tão habituados a estabelecer a relação
entre exames e sistema de ensino que nos é difícil imaginar que este possa existir sem
aqueles.
Nessa perspectiva, Luckesi (1998) esclarece que a avaliação da aprendizagem
tem se pautado por uma pedagogia do exame”. E assim, corrobora que “o nosso exercício
pedagógico escolar é atravessado mais por uma pedagogia do exame que por uma
pedagogia do ensino-aprendizagem” (1998, p. 18).
Fundamentadas como uma espécie de técnicas de certificação para medir com
pretensa objetividade um nível determinado de qualificação, as provas e exames têm se
resumido à finalidade de verificar o nível de desempenho dos educandos e julgá-los em
razão do grau desempenhado por eles.
As provas e exames, em detrimento das reais funções da avaliação, e por
atenderem à finalidade de julgamento, acabam sendo mais usadas no contexto sócio-
educacional em conseqüência dos interesses do modelo de sociedade conservadora. Assim,
em geral, vai se pensar mais na elaboração de provas e testes bem-feitos do que se atentar
para os efeitos do uso desses instrumentos sobre o destino dos alunos.
Herdeiras de práticas passadas, as provas e exames se multiplicaram ao longo
da história como instrumentos de controle, certificação e classificação, fornecendo à
sociedade burocrática indivíduos hierarquizados que eram solicitados por esta ao sistema
escolar.
Assim, a prática das provas e exames sistematizada da forma como
conhecemos atualmente teria sua origem,
... na escola moderna, que se sistematizou a partir dos séculos XVI e XVII, com a
cristalização da sociedade burguesa. As pedagogias jesuítica (séc. XVI)
comeniana (séc. XVII), lassalista (fins do século XVII e inícios do XVIII) são
expressões das experncias pedagógicas desse período e sistematizadoras do
modo de agir com provas/exames (LUCKESI, 1998, p. 169).
Deste modo, sobreviventes de uma época histórica que coincidiu com o
período de ascensão e consolidação da burguesia, as provas e exames estariam ainda hoje
servindo a uma pedagogia tradicional voltada aos interesses da sociedade moderna de
submissão e disciplinamento da conduta social dos indivíduos.
Na escola, as provas e exames também não estariam sendo executadas de
104
maneira muito diferente ao elucidado acima. Tratadas como instrumentos de classificação
dos alunos e como mecanismos de ameaça, sugerindo serem motivadoras da aprendizagem
e disciplinadoras na manutenção da ordem escolar, as provas e exames estariam sendo
utilizadas como um fator negativo por parte dos professores.
Confundidas como a própria avaliação, as provas e testes o significam
exatamente avaliar. Daí, em concordância com Hoffmann,
... que não devemos denominar um “teste de Matemática” por “avaliação de
Matemática, [...], pois isso significaria reduzir o processo, que é complexo e
multidimensional, aos seus instrumentos. Seria como reduzir um exame médico à
realização de uma radiografia (2002, p. 180).
É imprescindível distinguir o ato de avaliar do ato de aplicar prova ou teste,
que pressupõe apenas julgar algo para demonstrar a alguém. Fazer prova não é fazer
avaliação, pois a avaliação não tem como função o julgamento, que pressupõe uma
distinção entre o certo e errado, incluindo o primeiro e excluindo o segundo. A avaliação
tem por base acolher uma situação, para, então, ajuizar a sua qualidade, tendo em vista dar-
lhe suporte de mudança, se necessário (LUCKESI, 1998, p. 172).
Como reflexo do ato de julgar, as provas no processo de aferição do
aproveitamento escolar fornecem uma medida quantitativa representada pela nota.
Decorrendo daí, toma-se essa nota como pólo do processo avaliativo como se esta pudesse
traduzir em números todos os aspectos do universo educacional. É a nota que domina
tudo; é em função dela que se vive na prática escolar” (Ibidem, p. 24).
Essa situação faz com que o professor deva estabelecer alguma forma de
conversão das análises das atividades dos alunos para uma nota (VASCONCELLOS, 1998,
p. 59). A nota, portanto, é adotada como o centro das atenções tanto dos professores e dos
alunos, quanto do sistema de ensino e até dos pais dos alunos.
Os professores, considerando a necessidade de atribuir nota, reduzem a
avaliação da aprendizagem escolar à quantificação, e deixam de se preocupar com o
desenvolvimento geral do aluno e em possibilitar a aprendizagem. E dessa forma, segundo
Hoffmann (1997, p. 19), “estabelecem uma rotina de tarefas e provas periódicas
desvinculadas de sua razão de ser no processo de construção do conhecimento, deixando
de ser esta a sua função precípua”.
De maneira crítica a esse posicionamento do professor, Vasconcellos elucida:
A preocupação (e ocupação) do professor deve estar com o desenvolvimento em
geral do aluno. É correto que o aluno esteja sendo avaliado “desde o momento
em que entra na fila”, no entanto, considerando a necessidade de atribuir nota,
esta deveria vir das atividades objetivas dos alunos... (1998, p. 46).
105
Os alunos, agindo em fuão da nota, procuram saber as normas e modos pelos
quais estas serão obtidas e manipuladas em função de seguirem adiante no processo
escolar. Este condicionamento do aluno, o remete a estudar para atingir a nota e não para
aprender. “Para dizer a verdade, num sistema escolar tradicional, o aluno tem boas razões
para querer primeiro que tudo receber notas suficientes” (PERRENOUD, 1993, p. 180).
O sistema de ensino deseja com as notas, verificar como estão os alunos no que
se refere ao seu processo de promoção ou não nas etapas seguintes da escolaridade.
Querem saber o percentual de aprovados e reprovados do total dos educandos.
E por último, os pais dos alunos, na expectativa das notas dos seus filhos,
anseiam que eles alcancem a próxima fase do processo educacional. Essa atitude ingênua e
desatenta com o verdadeiro sentido da aprendizagem escolar, “faz com que os pais se
limitem a agir em função de algumas indicações numeradas que não conduzem a nenhuma
representação precisa do que o aluno domina realmente” (Ibidem, p. 176, grifo do autor).
Nesse mundo da nota, a lógica classificatória, faz com que a escola e o
professor, a partir de meia dúzia de provas anuais, decidam sobre a aprovação ou
reprovação do aluno, sobre seu destino de vida, sobre sua evasão.
De modo arbitrário e equivocado, e no tratamento do ato de avaliar com o
significado de dar nota,
... confunde-se “avaliar o aluno como um todo com querer que a nota exprima o
todo, ou seja, acaba se desejando que a nota expresse a avaliação como um todo e
se esquece de que a nota é a concretização da distorção da avaliação no sistema
escolar (VASCONCELLOS, 1998, p. 43).
A avaliação tipo prova é um ponto final, uma classificação, para depois excluir.
A nota, gerada por esse tipo de avaliação, somente, não expressa nada em relação ao aluno.
Ela gera um valor, e sem decorrer uma alise desse resultado impossibilita uma tomada
de decisão sobre o processo escolar.
Trabalha-se uma unidade de estudo, faz-se uma verificação do aprendido,
atribuem-se conceitos ou notas aos resultados (manifestação supostamente
relevante do aprendido) que, em si, devem simbolizar o valor do aprendizado do
educando e encerra-se aí o ato de avaliar. O símbolo que expressa o valor
atribdo pelo professor ao aprendido é registrado e, definitivamente, o educando
permanecerá nesta situação (LUCKESI, 1998, p. 34).
A avaliação mediante provas e exames diz muito pouco sobre a aprendizagem.
Seus resultados, geralmente, o falsos e nada dizem sobre o rendimento do aluno.
A esse respeito, Vasconcellos esclarece que,
Além da própria questão da qualidade do instrumento, não se tem certeza de
aquilo que o aluno expressou na prova realmente corresponde ao seu
conhecimento; pode haver influência seja da tensão emocional a que estava
106
submetido, seja da “cola” (mental ou material) a que eventualmente recorreu
(1998, p. 66).
No questionamento sobre a inutilidade da avaliação praticada através de testes,
tipicamente imposta para se obter uma medida da quantidade de conhecimentos e
habilidades dos educandos, e da sua incapacidade para relatar e tornar claro os aspectos
educativos, de modo a possibilitar seu desenvolvimento, D’Ambrósio destaca:
Onde está, com essa medida de caráter excludente, o passo em direção à
redenção desses jovens? Num paralelo com a saúde, esses testes são equivalentes
a propor melhorar a saúde do povo brasileiro mediante uma compra maciça de
termômetros e dando a cada família um termômetro! Ora, sabemos que o
problema está na febre, não na sua medição (2001, p. 93).
Não basta apenas a obtenção da nota, qualquer que seja o instrumento utilizado
para coletá-la. O desafio está na interpretação, a nota não fala por si, é preciso
compreender seu significado, e isso inclui refletir sobre os métodos pelos quais foi obtida e
se questionar sobre o que fazer a seguir diante da sua constatação. Talvez o problema
maior não seja a nota, mas quem a faz e a interpreta. Para Demo (2002, p. 53), “a nota em
si o tem ‘culpa’. É a cabeça do professor ou do pedagogo que a faz abjeta”.
De todo modo, não os professores, mas sim, todos os envolvidos no
processo educacional precisam saber analisar e refletir sobre os resultados
principalmente quando esses são expressos de forma quantitativa e as informações a que se
referem são características humanas seja para não fazê-los dizer o que não podem ou
para não deixar de extrair deles o que podem dizer.
Mesmo que seja a princípio quantitativa, a nota pode ser proposta de forma
qualitativa. Para isso, basta que se interprete a nota como algo complexo e, portanto,
merecedor de um tratamento descritivo e analítico. Antes mais, cabe destacar que a
realidade é ao mesmo tempo quantitativa e qualitativa e, portanto, não há qualidade sem
quantidade e vice-versa.
Em alguns casos, pensando em atribuir à nota um caráter qualitativo, evitando-
se assim o escalonamento apenas quantitativo, os conceitos serão propostos ao invés das
notas. E assim, surgem termos como: A, B, C, D, E ou Ótimo, Bom, Regular, Insuficiente,
no lugar dos valores numéricos compreendidos numa escala de 0 a 10.
O problema que se remete a este caso, é que geralmente, os conceitos estarão
associados quase que imediatamente à faixa de notas. E assim, o será difícil observar que
entre nota e conceito não existe, a rigor, qualquer diferença, porque ambos se referem a
uma escala.
Assim, atribuir “Excelente” a um trabalho ou a nota 10, exatamente na
107
mesma, ou seja, a preferência por conceito, em vez da nota, é irrelevante, porque no fundo
o qualquer diferença, pelo menos em termos de manter, no fundo, escala
comparativa (DEMO, 2002, p. 42). Esse recurso continua não correspondendo a uma
genuína estratégia de avaliação.
A compreensão necessária que se faz, é de que a nota serve apenas para
auxiliar na interpretação da aprendizagem, e assim, não pode ser tratada como algo preciso
e definitivo. Frente às suas limitações e reducionismos, a nota precisa ser discutida e refeita
para tornar-se mais clara e permitir informações que sirvam para a melhoria do processo de
ensino-aprendizagem. Por fim, a nota não pode ser utilizada como uma arma de repressão
do comportamento do aluno, mas deve ser encarada pelo professor como declaração do seu
compromisso com a aprendizagem dos educandos.
De todo modo, àqueles que reduzem o processo escolar à nota, principalmente
como resultado de provas e exames, do modo como geralmente vem ocorrendo, é
necessário destacar, segundo Demo (2002), que esta:
1) é dada de modo isolado; não verifica a aprendizagem propriamente, mas no
máximo donio mecânico de conteúdos; indica no máximo pontos
dispersos na evolução do aluno;
2) restringi-se a reduções drasticamente quantitativas; insiste em médias
abstratas e muitas vezes farsantes; não valoriza erros que podem sinalizar
aprendizagem por vezes mais que acertos;
3) fora de ambiente reconstrutivo, facilmente prejudica a auto-estima do
aluno, porquanto seu impacto reduz a mostrar sua incapacidade; torna-se
instrumento a mais de exclusão;
4) não expressa a capacidade do professor diagnosticar cuidadosamente o
aluno; tende a ser vista como algo inventado de fora, pois a escola pára, por
causa da prova, como se devesse significar parada, e não a normalidade de
processos bem acompanhados e garantidos de aprendizagem dos alunos.
Sobre a valorização do erro, tratado no item dois. Nota-se que a avaliação na
perspectiva tradicional tem enfatizado o erro no processo de ensino-aprendizagem, através
do reforço da falha, do julgamento do que é verdadeiro ou falso e correto ou errado. O
professor está preocupado em reconhecer o erro e não o acerto; está centrado em
considerar apenas a resposta e não o raciocínio desenvolvido pelo aluno. Através de um
padrão preestabelecido, que julga ser a expressão do que é certo, o professor pune o aluno
por não ter dado a resposta “certa”, justificando que assim está direcionando-o para a
108
aprendizagem.
Na análise dos aspectos retratados no item três, em específico a questão da
auto-estima. Recordo o quanto foi difícil cursar o primeiro semestre da faculdade de
Matemática. Apesar da alegria por estar no ensino superior; como eu o havia conseguido
ser aprovado no vestibular para as quarenta vagas oferecidas pelo curso, conseguindo
minha aprovação somente na segunda chamada na 41
a
colocação, passei o semestre inteiro
com a sensão de que todos os colegas da turma eram melhores do que eu. Sem auto-
estima e me sentindo inferior frente aos colegas de classe, me vi próximo de tirar a
primeira “nota vermelha” da minha vida escolar. Felizmente, isso não aconteceu, nem
naquele momento e nem em outro posterior. Lembro-me bem, que consegui resgatar a
auto-estima quando percebi que não era melhor ou pior do que o restante da turma, e que
tinha sim, capacidade para estar ali. Acredito que esta foi a primeira vez que me questionei
sobre o significado das avaliações do tipo prova, que achava até pouco tempo atrás,
confesso: ser o único instrumento avaliativo do processo escolar; afinal, dadas às raras
vezes que fiz algum trabalho valendo nota, foi praticamente através de provas e testes que
fui avaliado durante a minha trajetória escolar. Contudo, compreendi que as notas e a
classificação dos alunos segundo os resultados de vestibulares e de outras inúmeras
avaliações desse tipo, o representam de fato o verdadeiro valor da minha aprendizagem e
de outros educandos que já passaram ou que ainda passam pelos bancos escolares.
Tem sido muito difícil superar a concepção de avaliação arraigada no velho
modelo, que classifica, rotula, seleciona, pune e excluí. uma grande resistência por
parte dos educadores e da sociedade em geral em romper com os paradigmas da avaliação
tradicional. Talvez acreditem que essa prática avaliativa seja mais “confiável”, mais
conveniente” medida que se possa avaliar a todos de uma vez), de que “sempre foi
assim”, ou até mesmo, por não se saber como fazer diferente, pela sensação de impotência
frente ao desejo de mudança, ou pela própria legitimação social de que é assim que tem
que ser.
Porém, ainda que se queira justificar a forte presença da concepção tradicional
de avaliação no contexto educacional, faz-se necessário conferir e reforçar uma nova
utilização à avaliação. É imprescindível ressignificar a prática avaliativa na escola. Para
isso, a avaliação deve se comprometer com a promoção da aprendizagem e o
desenvolvimento de todos os educandos, deve se constituir a partir dos pressupostos da
transformação social dos alunos, e deve se propor como subsídio indispensável aos
processos de tomada de decisões para melhorar as respostas educativas das escolas.
109
3.3 Refletindo sobre o Novo Modelo de Avaliação
A avaliação compreendida na perspectiva de um novo modelo se constitui a
partir da imprescindível necessidade de se superar e romper com a cultura avaliativa
tradicional, concebida como classificatória, seletiva, autoritária e punitiva.
Essa nova postura avaliativa se fundamenta nos princípios de uma teoria da
avaliação cuja preocupação é promover e incluir os alunos dentro do processo sócio-
educacional; favorecendo para a aprendizagem de todos os educandos e servindo de aliada
aos professores e à escola na busca de uma cultura avaliativa mediadora, emancipatória,
integradora, democrática e cidadã, e assim, contrária a toda e qualquer postura do velho de
modelo de avaliação, que visa à aprovação e à reprovação, à atribuição de notas, e que se
vale quase que exclusivamente da prova.
Apesar dos avanços em torno das teorias avaliativas contrárias ao modelo
tradicional de avaliação; devido às práticas avaliativas no cotidiano escolar ainda trazerem
resquícios de uma avaliação mensuradora e a serviço do modelo de reprodução social,
alguns pesquisadores da avaliação educacional têm se manifestado de maneira preocupante
frente aos problemas que as práticas avaliativas têm causado no âmbito escolar.
Segundo esses aspectos, estudiosos contemporâneos e que fundamentam essa
pesquisa (André e Darsie, Demo, Hadji, Hoffmann, Luckesi, Perrenoud, Vasconcellos,
Villas Boas e outros) vêm contribuir com suas concepções avaliativas amparadas sob o
paradigma de superação das idéias classificatória e excludente da avaliação escolar,
retomando-a em seu sentido ético, de juízo consciente de valor, de respeito às diferenças,
de compromisso com a aprendizagem para todos e a formação da cidadania”
(HOFFMANN, 2002, p. 18).
Neste sentido, a avaliação passa a ser vista como uma grande aliada do aluno e
do professor, e também do processo educacional, pois, segundo Villas Boas:
Não se avalia para atribuir nota, conceito ou menção. Avalia-se para promover a
aprendizagem do aluno. Enquanto o trabalho se desenvolve, a avaliação também
é feita. Aprendizagem e avaliação andam de mãos dadas a avaliação sempre
ajudando a aprendizagem. Avalia-se, também, para saber como foi desenvolvido
o trabalho pedagógico de toda a escola e o da sala de aula (2004, p. 29).
Na reflexão de um novo conjunto de teorias avaliativas avesso ao modelo
avaliativo tradicional e capazes de atender ao exposto por Vilas Boas (2004), proposições
como formativa, diagnóstica, prognóstica, processual, mediadora, reguladora, contínua,
etc. serão incorporadas à avaliação na tentativa de se favorecer o processo de ensino-
110
aprendizagem escolar e de transformação social.
Entre essas proposições, a abordagem formativa será a mais defendida, por
diversos autores da avaliação educacional, em prol da substituição da avaliação tradicional
e do desenvolvimento dos alunos e professores.
Introduzida por Scriven em 1967, e desenvolvida por Bloom em 1971, a
avaliação formativa assume papel de relevo no processo avaliativo, pois determina, de uma
forma qualitativa, a evolução dos alunos no processo de ensino-aprendizagem e tem como
objetivo fornecer feedback aos alunos acerca das suas aprendizagens.
Essencialmente voltada, desta forma, para ajudar o aluno a identificar as
questões que precisam ser melhoradas, favorecendo deste modo a sua aprendizagem, a
avaliação formativa, conforme Abrecht (p. 19)
19
o será concebida apenas como uma
verificação de conhecimentos, mas,
É antes o interrogar-se sobre um processo; é o refazer do caminho percorrido,
para refletir sobre o processo de aprendizagem em si mesmo, sendo útil,
principalmente, para levar o aluno a considerar uma trajetória e o um estado
(de conhecimentos), dando sentido à sua aprendizagem e alertando-o, ao mesmo
tempo, para eventuais lacunas ou falhas de percurso, levando-o, deste modo, a
buscar ou, nos casos de menor autonomia, a solicitar os meios para vencer as
dificuldades (apud ARANTES, 2004, p. 18).
Como reorientadora do processo de ensino-aprendizagem, e tendo em suas
decisões a consideração de sempre possibilitar o aperfeiçoamento desse processo, a
perspectiva formativa da avaliação ajudará o aluno a aprender e o professor a ensinar
(PERRENOUD, 1993, p. 173). Isso porque, com o objetivo de contribuir para melhorar a
aprendizagem, a avaliação formativa informará o professor sobre as condições em que está
a decorrer essa aprendizagem, e instruio aprendente sobre o seu próprio percurso, os
seus êxitos e as suas dificuldades (HADJI, 1994, p. 63).
Nesse contexto, a avalião permite, então, conforme André e Darsie, uma
dupla retroalimentação, pois,
Por um lado, indica ao aluno seus ganhos, sucessos, dificuldades a respeito das
distintas etapas pelas quais passa durante a aprendizagem e ao mesmo tempo
permite a construção/reconstrução do conhecimento. Por outro lado, indica ao
professor como se desenvolve o processo de aprendizagem e, portanto, o
processo de ensino, assim como os aspectos mais bem sucedidos ou os mais
conflitantes, que exigem mudança. A avaliação assume característica dinâmica
no processo educativo: por um lado é impulsionadora da aprendizagem do aluno
e por outro é promotora da melhoria do ensino (1998, p. 449).
A avaliação, compreendida no sentido formativo e de retroalimentação da
atividade escolar, é concebida e usada a favor da aprendizagem do aluno e como
19
ABRECHT, R. A avaliação formativa. Rio Tinto: Edições Asa, 1994.
111
instrumento auxiliar do trabalho do professor. Pois, vem contribuir para que os alunos e
professores obtenham o maior número de informações possíveis que os ajudem a
reorganizar o processo de ensino-aprendizagem no sentido de encontrar as falhas e,
consequentemente, os aspectos a melhorar.
Para proporcionar, portanto, a obtenção dessas informações, a avaliação
formativa compreende três fases seguintes:
- coleta de informações relativas aos progressos e dificuldades de aprendizagem
sentidos pelos alunos;
- interpretação dessas informações numa perspectiva de referência criterial e, na
medida do possível, diagnóstico dos fatores que estão na origem das
dificuldades de aprendizagem observadas no aluno;
- adaptação das atividades de ensino e de aprendizagem de acordo com a
interpretação das informações coletadas (ALLAL
20
, p. 178 apud MACIEL,
2003, p. 57).
Nessa concepção de avaliação, o professor assume o papel de um pesquisador
que investiga quais problemas os alunos enfrentam e por quê. Assim, percebe o que não
entenderam bem, por que fizeram esta ou aquela interpretação, por que cometeram este ou
aquele engano. Ao tentar compreender o que cada aluno produziu e as soluções que
apresenta, o professor pode orientar melhor os alunos e transformar os eventuais erros de
percurso em situações de aprendizagem.
o aluno, é visto como o autor da sua própria aprendizagem e agente
ativamente envolvido e interessado com o processo avaliativo do qual faz parte. Assim, a
avaliação é um momento para ele pensar sobre sua atuação durante a atividade escolar,
compreender como é que ele está vivendo, o que precisa modificar, o que o está achando
interessante nessa atividade, enfim, acompanhar seu desempenho de modo a conseguir
construir sua autonomia.
A avaliação, aqui, se destina a fazer o educando refletir sobre suas dificuldades
e buscar o conhecimento necessário através da mediação sistemática e consciente do
professor.
No sentido de uma avaliação mais formativa, que de acordo com Perrenoud
(1993, p. 174) significa mudar a escola, não os professores e alunos serão avaliados de
acordo com os conceitos dessa avaliação, mas também, todos os envolvidos e as dimensões
do trabalho escolar. Uma vez que toda a escola participa do ambiente de aprendizagem, é
necessário que saibam reconhecer as informações que permitam uma adaptação das
20
ALLAL, L. Estratégias de avaliação formativa: concepções psicopedagógicas e modalidades de aplicação:
In: Avaliação num ensino diferenciado Atas do colóquio realizado na Univ. de Genebra, março 1978.
Coimbra: Livraria Almedina, 1986, p. 175-209.
112
atividades de ensino e de aprendizagem voltadas para o desenvolvimento do aluno e,
portanto, do professor, e consequentemente, da própria escola.
Avalia-se para conhecer não apenas os progressos dos alunos, mas também
para refletir sobre as estratégias de trabalho na sala de aula e na escola como um todo.
Dessa forma, em conformidade com Villas Boas, deve-se criar uma cultura
avaliativa da escola, onde
Avaliam-se as atividades organizadas pela escola, como conselhos de classe,
reuniões com pais, reuniões com professores, atividades esportivas, feiras,
exposições, jornal escolar, festas e outras. Avaliam-se a atuação dos professores e
a dos demais profissionais da educação que trabalham na escola (2004, p. 29-30).
Nesse raciocínio, a avaliação estará presente como um olhar crítico que
acompanha o desenvolvimento de todas as etapas do processo escolar, como uma constante
reflexão sobre o trabalho pedagógico, com o propósito de ampliar sempre a sua qualidade e
aprimorá-lo cada vez mais.
Com a avaliação de todos os aspectos do processo educacional e a identificação
daquilo que necessita ser melhorado no âmbito escolar, resgata-se o sentido de
compromisso com a aprendizagem dos educandos; e de diálogo entre aluno e professor,
aluno e aluno, e destes com a escola, favorecendo também, para a emancipação dos alunos.
Portanto, segundo essa perspectiva,
Abandona-se a avaliação unilateral (pela qual somente o aluno é avaliado e
apenas pelo professor), classificaria, punitiva e excludente, porque a avaliação
pretendida compromete-se com a aprendizagem e o sucesso de todos os alunos
(Ibidem, p. 35).
Se antes o professor detinha o saber, o poder e os processos do fazer e,
portanto, era o avaliador principal do processo de ensino-aprendizagem. Ora, os detém,
porém não mais como centralizador e transmissor, e sim como mediador. Essa detenção ou
posse do conhecimento coloca-o interativamente em parcerias e descobertas das
dificuldades do aluno e dele mesmo, interagindo com seus pares, com o aluno, com os
processos.
O professor/avaliador, portanto, antes preocupado simplesmente em observar
se o aluno/avaliado acompanhou o processo e atingiu os resultados esperados, agora
investiga e reorienta, a partir da sua avaliação, as tarefas escolares para promover ações em
benefício aos alunos, tendo por finalidade a evolão da aprendizagem dos mesmos.
Nesse sentido, ao conduzir o processo avaliativo dessa forma, o professor se
volta para uma avaliação numa visão mediadora, que, se destina, assim, segundo
Hoffmann:
113
... a acompanhar, entender, favorecer a contínua progressão do aluno em termos
destas etapas: mobilização, experiência educativa e expreso do conhecimento,
alargando o ciclo que se configura a seguir, no sentido de favorecer a abertura do
aluno a novas possibilidades (2002, p. 118).
Ainda, diante do reconhecimento do professor em encaminhar ações
subsidiadas para favorecer o desenvolvimento dos alunos, Hoffmann vai nos esclarecer,
que a avaliação, não será concebida como mediadora, mas também, como elemento de
promoção, pois estará ligada ao ato de “avaliar para promover uma educação digna e de
direito de todos os seres humanos” (2003, p. 9). Onde avaliar para promover significa,
assim, “compreender a finalidade dessa prática a serviço da aprendizagem, da melhoria da
ação pedagógica, visando à promoção moral e intelectual dos alunos” (Ibidem, p. 22).
Ao avaliar para promover, as práticas avaliativas se estabelecem não mais para
ajudar o professor a anunciar um veredicto de culpa ou absolvição do aluno, como é feito
pela avaliação tradicional, mas para analisar a situação real do aluno em função das
condições de ensino que estão sendo oferecidas, e a partir disso rever os procedimentos
que vem utilizando e replanejar o seu trabalho com o objetivo de incluir os alunos no
processo educacional.
A articulação entre a análise da situação real do aluno no processo escolar e a
perspectiva de replanejar esse processo de modo que se possa contribuir para a
aprendizagem do aluno, remete-se à concepção de Luckesi de que a “avaliação é um
julgamento de valor sobre manifestações relevantes da realidade, tendo em vista uma
tomada de decisão” (1998, p. 33).
Nessa perspectiva, a avaliação se compromete em ajuizar um valor de como o
processo de ensino-aprendizagem está sendo realizado, para posteriormente, objetivar uma
tomada de decisão, que dependendo do valor encontrado, significará retomar o processo
para ajustá-lo ou encaminhá-lo sem alterações. De todo modo, esse processo será mais ou
menos satisfatório quanto mais ou menos se aproximar dos seus objetivos
preestabelecidos; que para as finalidades educacionais, deverão estar voltados para o
compromisso com a aprendizagem e a formação social dos alunos.
Nesses questionamentos sobre a avaliação escolar, mais duas concepções serão
defendidas por Luckesi (1998) para a avalião da aprendizagem: uma como ato amoroso e
outra como ato diagnóstico. Dessa forma, o autor corrobora:
Defino a avaliação da aprendizagem como um ato amoroso, no sentido de que a
avaliação, por si, é um ato acolhedor, integrativo, inclusivo. [...] A avaliação tem
por base acolher uma situação, para, então (e então), ajuizar a sua qualidade,
tendo em vista dar-lhe suporte de mudança, se necessário. A avaliação, como ato
diagnóstico, tem por objetivo a inclusão e não a exclusão; a inclusão e não a
114
seleção (que obrigatoriamente conduz à exclusão). O diagnóstico tem por
objetivo aquilatar coisas, atos, situações, pessoas, tendo em vista tomar decisões
no sentido de criar condições para a obtenção de uma maior satisfatoriedade
daquilo que se esteja buscando ou construindo (LUCKESI, 1998, p. 172-173).
De maneira geral, as definições elucidadas por Luckesi acabam por se
integrarem em uma só, pois a avaliação da aprendizagem escolar será um ato amoroso
somente se a avaliação tiver por objetivo diagnosticar e incluir o educando no curso da
aprendizagem satisfatória (1998, p. 173).
A avaliação diagnóstica permite ao professor e ao aluno detectar os prontos
fracos deste e extrair as conseqüências pertinentes sobre onde colocar posteriormente a
ênfase no ensino e na aprendizagem. Ao detectar quais são as dificuldades do aluno através
de uma avaliação diagnóstica, o professor redireciona seu trabalho de modo que consiga
auxiliar o aluno para que continue aprendendo e não fique de fora do processo escolar,
incluindo-o e contribuindo assim para o seu desenvolvimento pessoal.
Desta forma, a avaliação não buscará classificar e hierarquizar os alunos, mas
diagnosticar quais são as situações de desempenhos carentes de reforço, de novas
provocações indutoras de correção e da retomada de rumos e de estratégias para que o
aluno possa aprender cada vez mais e se sentir como parte integrante do trabalho realizado
em sala de aula e, portando, se sentir ainda mais incluído dentro do rculo da
aprendizagem.
A avaliação diagnóstica, em muitas ocasiões, será compreendida como uma
avaliação inicial, no que concerne à localização temporal das práticas avaliativas. Como
tal, a avaliação diagnóstica é assumida com a função de determinar o grau de
conhecimento do aluno antes de se iniciar o processo de formação escolar. Deste modo, o
professor pode antever as dificuldades dos alunos e adaptar o seu método de ensino aos
níveis de conhecimentos destes; como pode, ainda, fazer com que o professor consiga
compreender as causas que estão provocando as dificuldades que decorreram durante o
processo de formação.
Se posicionando contra o desenvolvimento do processo avaliativo delimitado
em etapas (início, meio e fim), por acreditar que este se constitui por momentos contínuos,
provisórios e complementares que podem ser analisados em seu conjunto, Hoffmann
(2002, p. 123) esclarece que o termo diagnóstico é “limitador e contraditória, uma vez que
tende a ser interpretado como uma ação que deve ocorrer em momentos iniciais e definidos
do período escolar”.
O problema levantado por essa autora em torno da avaliação diagnóstica, se
115
expressa porque, muitas vezes as escolas ao estabelecerem o critério de uma avaliação
inicial ou prognóstica para analisar as concepções prévias dos alunos, acabam
determinando, na verdade, condições prévias” dos alunos em detrimento dos
conhecimentos prévios”. Assim, para Hoffmann:
Práticas tradicionais de sondagem-diagnóstica e a própria expressão avaliação
diagnóstica revelam, muitas vezes, ações que se destinam a agrupar os alunos por
graus de dificuldade em relação às expectativas iniciais dos professores de uma
série. Escolas, ainda hoje, se utilizam de práticas avaliativas, ao final de anos
letivos ou ao início destes, para enturmação” de alunos de acordo com o seu
desempenho na série anterior, organizando turma de alunos fracos, regulares e
com bom desempenho. Muitos alunos são retidos por não corresponderem às
“condições prévias” predeterminadas pelos professores da série seguinte, ao
invés de serem analisados quanto aos seus avanços e potencialidades de
superação (2002, p. 122-123).
Sendo assim, deve-se ter muito cuidado com o modo como se tratam as
informações fornecidas pela avaliação diagnóstica. Se por um lado estas podem ser
importantíssimas, dado que possibilitam ao professor e aos alunos adequarem os seus
todos de trabalho em função dos dados que recebem. Por outro lado, podem ser muito
prejudiciais para os alunos se os professores não entenderem que estas informações são
circunstanciais.
Em relação aos conhecimentos prévios dos educandos, é interessante que o
professor desenvolva uma avaliação capaz de lhe fornecer o maior número possível de
informações sobre o aluno para assegurar sua aprendizagem.
Uma vez que a avaliação deve existir para que se conheça o que o aluno já
aprendeu e o que ele ainda não aprendeu, para que se providenciem os meios para que ele
aprenda o necessário para a continuidade dos estudos, faz-se necessário compreender o
apenas em que ponto o aluno se encontra no início do seu processo de aprendizagem, mas
também, quais são suas experiências, suas possibilidades e limites.
Desta forma, Zabala (1998, p. 199) destaca que são importantes os seguintes
questionamentos: Quem são os meus aprendentes? Que sabem os alunos em relação ao que
quero ensinar? Que experiências tiveram? O que são capazes de aprender? Quais são seus
interesses? Quais são seus estilos de aprendizagem?
O reconhecimento desses aspectos, não só possibilita ao professor orientar suas
ações pedagógicas desde o início da formão escolar, como também, permite que ele
possa a qualquer instante durante essa formação rever seus procedimentos e tomar uma
decisão sobre qual postura assumirá diante dos seus objetivos, que devem estar atrelados
com o compromisso com a aprendizagem dos alunos.
116
De acordo com essa visão, a avaliação deve ser assumida, segundo
Vasconcellos, como:
Um processo de captação das necessidades, a partir do confronto entre a situação
desejada, visando uma intervenção na realidade para favorecer a aproximação
entre ambas. Avaliar é ser capaz de acompanhar o processo de construção do
conhecimento do educando, para ajudar a superar os obstáculos (2002, p. 85).
Para facilitar a alise de como está sendo encaminhado as práticas
pedagógicas, os métodos de trabalho e as estratégias de ação/transmissão de conteúdos, de
modo a fazer as adequações ou as mudanças, caso seja necessário; bem como acompanhar
o progresso da aprendizagem do educando, o professor terá que lançar mão de uma
avaliação contínua e processual, que não se limite a acontecer apenas em um determinado
momento (em geral, o final) de um processo e não fique centrada exclusivamente no
produto, que geralmente apenas estabelece uma comparação entre os alunos.
A pretensão da avaliação contínua e processual, é a de que o professor esteja
atento e ocupado com a apropriação efetiva do conhecimento por parte do aluno, com a
interação aluno-objeto do conhecimento-realidade, e não preocupado com o multiplicar
provinhas” (VASCONCELLOS, 1998, p. 51). Ainda, segundo o autor:
... essa avaliação pode ser feita com base na produção cotidiana do aluno e não
em momentos “especiais” que a artificializam. A expressão da síntese do
conhecimento o pode acontecer apenas em alguns momentos, de forma
ocasional, intempestiva, pois daí o professoro tem como ajudar o aluno
quando ele precisa; as dúvidas se acumulam, compromete-se a aprendizagem
(VASCONCELLOS, 1998, p. 51, grifo do autor).
Complementando esse posicionamento, Hoffmann corrobora que, dessa
forma, analisa-se a aprendizagem do estudante levando-se em conta a agregação ou o
acúmulo de conhecimentos, o seu envolvimento em um rol de atividades, enfim, o
cumprimento de uma rotina escolar” (2003, p. 28).
Na compreensão de que a avaliação é um ato pedagógico, reconhece-se que ela
está ligada a todo um processo que se desenvolve continuamente e, portanto, não pode ser
realizada de maneira terminal, concentrada em momentos determinados, pois isso distorce
o verdadeiro significado da avaliação, que é acompanhar efetivamente o processo de
conhecimento do aluno e fazer as retomadas necessárias.
Na discussão produto/processo da aprendizagem, a avaliação pode ainda ser
assumida como um instrumento de investigação didática, uma vez que permite analisar o
o produto da aprendizagem, mas, sobretudo, o seu processo. Nessa perspectiva,
Sacristán apud Darsie (1996, p. 51), defende que o grande valor da avaliação está, por um
lado, em ser instrumento de investigação didática”.
117
Para André e Darsie:
A investigação didática, pela avaliação da aprendizagem, pode indicar mudanças
na condução do processo, corroborar – ou não – a eficácia de situações de ensino
utilizadas, e revelar os erros e acertos a quem organiza e sobre como organiza o
ensino (1998, p. 449).
A avaliação, assim concebida, serve de reflexão ao professor não apenas para
analisar o desempenho dos alunos, mas também para examinar seu próprio desempenho
em função de toda a situação de ensino que se realiza no contexto escolar.
Ao que se remete à análise do erro no processo de ensino-aprendizagem, a
avaliação escolar compreendida segundo os paradigmas de um novo modelo contraditório
ao modelo classificatório e autoritário, em vez de se basear em medidas de acertos e erros,
buscará compreendê-los para melhor ensinar o aluno. Assim, ao invés de se valorizar os
resultados, propõe-se a sua interpretação.
Assim, em conformidade com Cardinet (p. 21)
21
citado por Villas Boas (2004,
p. 30), o “erro não é mais considerado como uma falta passível de repreensão, mas como
uma fonte de informação essencial, cuja manifestação é importante favorecer”.
Segundo essa concepção, reconhecer o tipo de erro cometido será uma das
funções do professor ao avaliar seus alunos, observando-o em sua aprendizagem e
contribuindo para que o erro seja superado sem punições; e que seja assim, tratado como
parte do processo de construção do conhecimento do educando.
O mais importante, nesse sentido, será investigar como o aluno chegou a uma
resposta ao invés de verificar se encontrou a resposta certa. Pensando assim, chega-se à
conclusão de que o erro,
Trata-se de uma hipótese na construção do conhecimento, portanto, um excelente
material de trabalho para o professor, que não é simplesmente dizer “certo” ou
“errado”, mas tentar acompanhar e compreender o que o educando entendeu que
o fez chegar àquele resultado, ajudando-o a tomar consciência e a se colocar
como um problema a ser enfrentado (VASCONCELLOS, 1998, p. 25).
Desta forma, o erro deixa de ser uma fonte de castigo para ser uma fonte de
virtude. Passa a não dar mais margem, na prática escolar, às variadas formas de castigo,
assumindo-se como ponto de partida para o avanço na investigação ou na busca da
satisfação de uma necessidade do educando, contribuindo assim, para o desenvolvimento
de sua aprendizagem (LUCKESI, 1998).
Para que a avaliação escolar possa fornecer informações reveladoras sobre o
processo de ensino-aprendizagem, na tentativa de melhor compreendê-lo e assim
21
CARDINET, Jean. A avaliação formativa: um problema atual. In: ALLAL, L.; CARDINET, J.;
PERRENOUD, P. (org). A avaliação formativa num ensino diferenciado. Coimbra: Almedina, 1986.
118
possibilitar uma possível tomada de decisão necessária à trajetória do trabalho educativo, é
imprescindível que as práticas avaliativas se materializem numa variedade de instrumentos
e superem com qualquer possibilidade de fragmentação e terminalidade na sua utilização,
assumindo uma perspectiva de integralidade, coesão e coerência com os procedimentos de
ensino e aprendizagem na relão professor e aluno.
A utilização de um único instrumento para se avaliar uma realidade tão
complexa como o contexto educacional faz com que a avaliação seja incapaz de
compreender todos os aspectos e envolvidos no processo escolar. Desta forma, é preciso
uma diversificação dos instrumentos para que se conha melhor o fenômeno educativo de
modo a adequá-lo sempre que necessário.
3.3.1 – Diversificando os instrumentos do processo avaliativo
A perspectiva da avaliação concebida segundo os ideais de um novo modelo,
ultrapassa as dimensões de uma avaliação centrada nas provas, testes ou exames e nos
educandos.
Diante da exigência de se obter o maior número possível de informações sobre
o trabalho docente e os percursos da aprendizagem dos alunos, uma vez que assim se
pode ter uma compreensão mais aprofundada da realidade educacional, é imperativo lançar
o de uma quantidade considerável e diversificada de instrumentos avaliativos. Esta
atitude, segundo Silva, J. F. (2003, p. 14), “possibilita coletar o máximo de informações
possíveis em torno das aprendizagens e das histórias de vida dos aprendentes e das
intervenções e das posturas docentes”.
No processo de ensino-aprendizagem, a diversificação dos instrumentos de
avaliação, por um lado, permite que se conheça o melhor possível com respeito ao que se
quer enxergar no aluno, caracterizando a intencionalidade do professor em ajudá-lo. Por
outro lado, revela para o professor e para o aluno o o que ele está aprendendo, mas
também como está aprendendo.
Vale ressaltar, que diversificar os instrumentos de avaliação não significa
utilizá-los de maneira aleatória. Deve-se ter clareza da intenção daquilo que se quer
avaliar, buscando sempre uma coerência pedagógica e didática destes instrumentos com os
procedimentos de ensino que os professores planejaram e fizeram uso (SILVA, J. F.,
2003).
Diversificar os instrumentos avaliativos também não significa fazer uso de um
119
único instrumento diversas vezes durante a formação escolar achando que assim está
coletando um número maior e variável de informações. Afinal, de acordo com Valadares e
Graça
22
(p. 67) citados por Silva, J. F. (2003, p. 14), a utilização repetida e exclusiva de
um mesmo tipo de instrumento de avaliação não permite ver o aluno sob todos os ângulos
e pode induzir no professor juízos incorretos acerca do aluno”.
Em relação à construção dos instrumentos avaliativos então, é preciso refletir
sobre o que Hadji (1994, p. 174) corrobora, ou seja, que os instrumentos da avaliação
devem ser susceptíveis de comunicarem da forma mais clara possível aos interessados as
respostas dadas às questões que orientam a avalião. Ainda segundo o autor, esses
instrumentos são diversos, em razão dos tipos de dados possíveis e, portanto, devem
necessariamente na recolha de informação obedecer às fuões: desencadear, observar e
comunicar, tendo sempre por base uma situação-problema.
Desta maneira, os professores devem ter um amplo conhecimento dos vários
modos e instrumentos avaliativos, das potencialidades e limitações de cada um, pois
assim podem optar por aqueles que melhor se adaptem aos propósitos da avaliação que
pretendem implementar e ao mesmo tempo atenderem às características dos seus alunos.
Dentro dessa perspectiva, os estudos de Darsie (2005) apontam alguns
instrumentos avaliativos que podem ser utilizados com o intuito de melhorar e desenvolver
o processo de ensino-aprendizagem.
3.3.1.1 – Auto-avaliação
A auto-avaliação possibilita ao professor e ao aluno um momento reflexivo
sobre o trabalho realizado. Ambos acabam desenvolvendo processos reflexivos no sentido
de buscar a melhor forma de prosseguir.
Através da auto-avaliação, o aluno pode promover seu desenvolvimento como
um sujeito autônomo e crítico frente ao processo de ensino-aprendizagem. E o professor
pode refletir sobre as estratégias de pensamento utilizadas pelos alunos e sobre a própria
atividade pedagógica.
A prática da auto-avaliação é importante, porém para que esta não se torne sem
sentido e desprovida de utilidade, faz-se necessário que professores e alunos estabeleçam
juntos os critérios a serem avaliados e os instrumentos de registros próprios para esse fim.
Além do que, o aluno deve ser estimulado a dizer o que sabe e o que não sabe sem medo
22
VALADARES, J.; GRAÇA, M. Avaliando para melhorar a aprendizagem. Lisboa: Plátano Edições
Técnica, 1998.
120
de ser punido, pois, somente assim, a auto-avaliação pode ser usada como uma forma de
inclusão e melhoria do processo de aprendizagem e não para punir e/ou excluir o aluno.
3.3.1.2 – Caderno de campo
O caderno de campo, também conhecido como caderno de registro, é utilizado
pelo professor para registrar o processo de construção do conhecimento do aluno. O
professor registra o que observou dos seus alunos, fazendo anotões e outros
apontamentos que o permite acompanhar a evolão dos mesmos.
No caderno de registro são transcritas todas as observações do professor
durante o processo de ensino-aprendizagem: os conhecimentos prévios dos alunos antes do
início de uma unidade; as vidas e dificuldades, e os avanços e conquistas apresentadas
pelo aluno durante sua aprendizagem.
O caderno de campo poderá servir ainda para que o professor anote questões
ligadas à auto-estima, disposição para aprender, interesse pelo estudo, relacionamento com
os colegas e o professor, e outros apontamentos para a tomada de decisão quanto à
superação dessas atitudes.
Esse registro feito pelo professor no caderno de campo de toda atividade do
aluno é uma das formas de se assegurar a qualidade e o desenvolvimento da aprendizagem.
3.3.1.3 – Conselho de classe
O conselho de classe consiste de reuniões planejadas tendo por objetivo a
oportunidade de reunir professores, para refletirem sobre a aprendizagem dos alunos,
avaliarem o andamento do trabalho da escola e das turmas, e reflexionarem sobre suas
atuações docentes.
O conselho de classe permite ainda, que os professores troquem informações
entre si com o intuito de promoverem o desenvolvimento dos alunos, respeitando seus
limites e potencialidades e a individualidade de cada um.
Para que os conselhos de classe não fiquem tão centrados na discussão das
notas dos alunos, como vem ocorrendo em grande parte das escolas, e se preocupem mais
com a reflexão sobre o processo escolar, Vasconcellos (1998, p. 19) sugere que os
conselhos aconteçam no meio do bimestre e não no final.
121
3.3.1.4 – Diário reflexivo
O diário reflexivo como instrumento de avaliação do aluno consiste de um
documento onde este registra suas reflexões sobre sua aprendizagem após cada aula ou
unidade. Dessa forma, passa a pensar e refletir sobre o que aprendeu e como aprendeu e
sobre suas dificuldades, possibilitando assim, a tomada de consciência da própria
aprendizagem.
O aluno, portanto, se coloca, assim, no movimento mesmo de construção e
reconstrução histórica do conhecimento, e, fundamentalmente, atua como sujeito do
próprio processo de construção e reconstrução (DARSIE, 1996, p. 51).
Nessa perspectiva, esses registros produzem informações que permitem ao
professor tomar consciência do processo de aprendizagem dos alunos, e assim, refletir
sobre o ensino e, em função disso, reorganizá-lo à medida que for necessário (ANDRÉ;
DARSIE, 1998).
O diário reflexivo do professor consiste de um documento onde o mesmo
registra suas reflexões sobre sua prática avaliativa, bem como, suas observações, tomada
de decisão e replanejamento da ação docente frente às dificuldades e avanços dos alunos
revelados pelos instrumentos avaliativos de acompanhamento da aprendizagem.
3.3.1.5 – Entrevista
A entrevista é um instrumento que permite coletar os dados de natureza
quantitativa e qualitativa, fornecendo uma capacitação imediata e contínua, e também
aprofundada da informão desejada; seja junto a um grupo específico ou individualmente.
3.3.1.6 – Filipetas reflexivas
As filipetas reflexivas são tiras de papel com questões reflexivas sobre o
conteúdo e a aprendizagem registradas pelos alunos durante ou ao término de uma aula ou
unidade de estudo. Geralmente arquivadas em pastas, elas servem para mostrar ao longo do
processo escolar quais são os avanços dos alunos.
3.3.1.7 – Mapa conceitual
O mapa conceitual como instrumento avaliativo é utilizado para verificar como
o aluno estrutura seu conhecimento e relaciona os conceitos de um determinado conteúdo
122
ou disciplina. Serve ainda, para avaliar o poder de ntese do aluno, assim como a sua
compreensão global sobre um determinado assunto, que é apresentado na forma de um
diagrama relacionando palavras, desenhos e outros símbolos concebidos segundo o
entendimento do aluno.
3.3.1.8 – Portfólio / Pasta avaliativa / Dossiê
O portfólio, também denominado de pasta avaliativa ou dossiê, é um
procedimento de avaliação que permite aos alunos participar da formulação dos objetivos
de sua aprendizagem e avaliar seu progresso através das suas produções e coleções e
trabalhos, que são organizadas e arquivadas nestas pastas durante um bimestre, semestre ou
ano letivo.
Ao analisar o conteúdo do portfólio, que pode se compor de resumos de textos,
dissertações, relatórios, provas escritas, auto-avaliações, etc., o aluno tem a oportunidade
de desenvolver sua capacidade avaliativa acerca do seu percurso de aprendizagem.
O portfólio permite ao professor avaliar a evolução de seus alunos e saber onde
estes necessitam de ajuda podendo assim melhorar suas práticas de ensino com o intuito de
sanar essas necessidades dos educandos.
3.3.1.9 – Projeto
O projeto é um procedimento que possibilita verificar o andamento do processo
de ensino-aprendizagem, pois através dele pode-se: representar os objetivos a serem
alcançados, antever os resultados e as estratégias daquilo que será trabalhado, e escolher as
estratégias mais adequadas para se atingir os objetivos propostos.
O projeto pode ser proposto individualmente ou em grupo, abrangendo
diversas áreas do conhecimento.
3.3.1.10 – Relatório avaliativo
O relatório avaliativo é um recurso onde se registra o desenvolvimento do
aluno em seus aspectos cognitivos, atitudinais, comportamentais, afetivos, sociais e de
construção da identidade e da autonomia.
O relatório avaliativo permite ao professor descrever o processo de construção
da aprendizagem do aluno e suas dificuldades, bem como, o estágio de construção de
conhecimento em que se encontra.
123
O relatório se torna ainda mais interessante quando é elaborado conjuntamente
pelo professor e aluno; e atende na sua descrão os aspectos de: dinamicidade;
relativização; caráter interacionista, reflexivo e de intervenção; relevância e qualidade nas
informações; e consideração dos destinatários.
3.3.1.11 – Teste e prova
Utilizados pelos professores praticamente como um dos únicos instrumentos
avaliativos do desempenho escolar dos educandos, os testes e provas devem ser praticados
com o intuito de diagnosticar a aprendizagem dos alunos. Não adianta aplicá-los, corrigi-
los, quantificá-los e entregá-los sem uma análise mais precisa de seus resultados, que
também precisam ser analisados pelos alunos como co-responsáveis e co-avaliadores do
seu processo de aprendizagem.
As provas e testes podem ser utilizados como qualquer outro instrumento de
avaliação, desde que se tenha claro quais são seus limites e possibilidades. Assim é preciso
observar alguns aspectos importantes:
1) Seus resultados não podem ser utilizados como único indicador de
desempenho escolar;
2) Seus resultados não podem ter valor absoluto, que sua elaboração e
correção têm um certo grau de subjetividade;
3) Não se pode esquecer que o retorno ao aluno sobre os resultados corretos
ou esperados, é parte insepavel da prova, afinal cada aluno precisa saber
em que e por que acertou ou errou.
4) A correção pode ser feita a partir da problematização e discussão das
respostas: as incompletas, as incompreensíveis, as que mostram que o
aluno não entendeu o que foi pedido, as que reproduzem “fielmente” os
assuntos tratados, as que mostram que não haviam uma única resposta, etc.
As provas e testes podem, portanto, com esses cuidados, comporem com outros
instrumentos, um conjunto coerente de práticas avaliativas.
Os professores devem utilizar diferentes instrumentos avaliativos para verificar
se os alunos compreenderam ou o os conteúdos. Só assim a avaliação pode fornecer
informão consistente e útil, dado que esta envolve sempre juízos de valor por parte de
quem avalia e, como tal, é-lhe inerente algum nível de subjetividade.
A diversificação dos instrumentos de avaliação proporciona uma melhor
124
compreensão sobre o objeto avaliado para melhorar sua qualidade e não classificá-lo,
possibilitando o diagnóstico e a intervenção e não a seleção e exclusão.
Contudo, dadas as conceitualizações em torno das concepções de avaliação
praticadas no contexto educacional, que refletem duas perspectivas contraditórias entre si,
de um lado, um velho modelo avaliativo que é classificatório e seletivo, e de outro, um
novo modelo de avaliação que se compromete com a melhoria do processo de ensino-
aprendizagem; apresentamos a seguir, com base na construção teórica deste capítulo, um
quadro ntese distinguindo as características desses dois modelos de avaliação,
interpretando-os segundo as perspectivas excludente e inclusiva.
QUADRO 3
Características da Avaliação nas Perspectivas Excludente e Inclusiva
Perspectiva Excludente (Velho Modelo) Perspectiva Inclusiva (Novo Modelo)
- Medida do conhecimento do educando
- Aferição do conteúdo aprendido pelo
aluno
- Mensuradora
- Pontual
- Terminal
- Estanque
- Centrada no resultado ou produto final
da aprendizagem
- Centrada no ensino e no aluno
- Professor é o agente da avaliação
- Unilateral (somente o aluno é avaliado
e pelo professor)
- Centrada em procedimentos lineares do
conhecimento
- Julgamento da capacidade do aluno
reproduzir ou não o que foi ensinado
- Verifica se o estudante alcançou e em
que grau, os objetivos que se propõe o
processo escolar
- Desempenhada exclusivamente por
provas e exames
- Quantitativa
- Traduz-se geralmente por uma
informão de caráter numérico
- Enfatiza a nota ou conceito, que são
tidos como precisos e definitivos
- Encerra-se na obtenção e registro da
configuração da aprendizagem do
educando
- Enfatiza o erro, através do reforço da
falha e do que é certo ou errado
- Impulsionadora da melhoria do processo
de ensino-aprendizagem
- Examina, reorienta, reformula e aprimora
o processo escolar
- Tomada de decisão com o intuito de
promover a aprendizagem e o
desenvolvimento do educando
- Momento a mais para se aprender
- Formativa
- Mediadora
- Contínua
- Processual
- Permite acompanhar o processo de
construção do conhecimento do educando
- Diagnóstica
- O aluno também é avaliador do seu
trabalho
- Todos os envolvidos e as dimensões do
trabalho escolar são avaliados
- Conhecimento de como foi desenvolvido
o trabalho pedagógico de toda a escola e
o da sala de aula
- Materializa-se na variedade e
diversificação dos instrumentos
- Qualitativa
- Nota serve apenas como um auxílio na
interpretação da aprendizagem
- Reguladora
- Serve de orientação para o professor na
condução de sua prática pedagógica
- Determina a evolução dos alunos no
processo escolar
125
- Compara as realizações dos sujeitos que
pertencem ao mesmo grupo
- Desconsidera a especificidade e o ritmo
de aprendizagem de cada aluno
- Promove a competitividade
- Classificatória
- Seletiva
- Autoritária
- Discriminatória
- Rotuladora
- Estigmatizadora
- Promove o antagonismo entre professor
e aluno
- Instrumento de pressão para promover a
participação dos alunos nas aulas
- Punitiva
- Disciplinadora
- Controla e adapta as condutas sociais
dos alunos
- Padroniza os indivíduos segundo a
normativa socialmente estabelecida
- Mecanismo de manutenção da
hierarquia social
- Informa o professor sobre as condições
em que está a decorrer a aprendizagem
dos seus alunos
- Fornece feedback aos alunos sobre suas
aprendizagens
- Propõe a interpretação dos resultados
- O erro é considerado como uma etapa da
aprendizagem e uma fonte de informação
essencial
- Busca-se compreender o erro dos alunos
para melhorar o ensino e a aprendizagem
- Instrumento de investigação didática
- Prognóstica
- Identifica os conhecimentos prévios do
educando
- Respeita as diferenças individuais dos
alunos
- Emancipatória
- Integradora
- Democrática
- Identifica os rumos para o progresso
escolar do aluno e sua transformação
social
- Compromete-se com a aprendizagem de
todos e a formação da cidadania
As discussões acerca da avaliação enquanto mecanismo de exclusão e inclusão
dos educandos na escola e consequentemente na sociedade devem ser ainda mais
freqüentes quando o assunto em questão é a Educação de Jovens e Adultos.
Nessa modalidade que se propõe a oportunizar os princípios bases de uma
educação àqueles que não tiveram condições de freqüentarem ou mesmo permanecerem
nos bancos escolares. A avaliação deve ser cuidadosamente pensada e praticada para não
se prestar como mais um elemento de exclusão em meio a tantos outros vivenciados por
esse blico de jovens e adultos que retornam à escola com objetivos claros de se verem
inseridos no processo sócio-educacional e exercendo ativamente seus direitos como
cidadãos através de uma escolarização básica.
3.4 A Avaliação em Educação Matemática de Jovens e Adultos
A avaliação é uma área da Educação Matemática bastante complexa e ainda
126
pouco estudada. E apesar dos esforços, a partir da década de 1970, em se considerar essa
área como foco de investigação dentro do contexto da Educação Matemática, ainda assim,
segundo Fiorentini e Lorenzato, numa visão mais abrangente do problema, a avaliação
no/do processo ensino-aprendizagem da Matemática tem sido muito pouco investigada
pelos educadores matemáticos” (2006, p. 51).
Essa situação torna-se evidente, quando em análise ao Banco de Dissertações e
Teses do Centro de Estudos, Memória e Pesquisa em Educação Matemática (CEMPEM)
da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),
encontramos entre as produções brasileiras em Educação Matemática no período de 1970 a
2001, cerca de 14 (quatorze) trabalhos de pesquisa enfocando o tema avaliação da
aprendizagem em Matemática.
Felizmente, nos últimos anos, têm-se feito esforços de forma a contrariar esta
situação. Atualmente, se encontra instituído um grupo de trabalho (GT8) para discussões
acerca da avaliação no processo de ensino-aprendizagem da Matemática no Seminário
Internacional de Pesquisa em Educação Matemática (SIPEM) promovido pela Sociedade
Brasileira de Educação Matemática (SBEM). Também, conforme levantamento das
publicações sobre avaliação em Educação Matemática no Brasil entre 2000 e 2005,
realizado por Santos e Celeste (2006), verifica-se a existência de 33 (trinta e três) trabalhos
produzidos nessa área, sendo 25 (vinte e cinco) dissertações e 1 (uma) tese, e 7 (sete)
artigos de revistas e periódicos compreendidos nas áreas de educação, avaliação
educacional e educação Matemática.
No que concerne às pesquisas enfocando a temática da avaliação no processo
de ensino-aprendizagem da Matemática no contexto da Educação de Jovens e Adultos,
nota-se que esse campo específico não tem sido explorado de forma investigativa,
refletindo as observações de alguns estudiosos (DUARTE, 1995; CARDOSO, 2001;
FONSECA, 2005a) de que são relativamente restritos os trabalhos na área do ensino da
Matemática para jovens e adultos.
Apesar da falta de trabalhos publicados especificamente na “região de
fronteira” como é a Educação Matemática de Jovens e Adultos, conforme define Fonseca
(2005a), é justo tratar que existe um grande número de publicações no campo da Educação
que de maneira indireta ou não podem contribuir para que os educadores de jovens e
adultos e particularmente os educadores matemáticos de jovens e adultos se voltem para o
paradigma da inclusão desse blico, excluído que foi do processo de escolarização e do
acesso aos bens culturais que essa poderia proporcionar-lhe.
127
Nessa perspectiva, Fonseca elucida que:
O educador de jovens e adultos deve buscar referências que o integrem na
discussão da mudança essencial de paradigma nas iniciativas educacionais, que,
mesmo que ainda não tenha encontrado ou viabilizado as condições de
realização, abrace a idéia da inclusão (grifo da autora) (2005a, p. 88).
Numa visão em que se propõe, portanto, uma participação mais autônoma e
inclusiva dos educandos da EJA a uma cultura letrada, torna-se evidente e imprescindível
se desvincular a avaliação dos aspectos classificatório e seletivo e priorizar suas ações no
sentido de ajudar as aprendizagens Matemáticas dos alunos jovens e adultos.
Desta forma, a avaliação integrada de maneira a contribuir para o
desenvolvimento matemático dos educandos deve ir além do que apenas se preocupar em
medir os resultados e saber a quantidade de informação que estes dominam. Deve se
interessar em fornecer informações, segundo Fernandes
23
(p. 280), sobre:
A aquisição e utilização de conhecimentos; as convicções; as atitudes dos alunos
em relação à Matemática; a perseverança; o controle; o trabalho que os alunos
desenvolvem em projectos de natureza diversa e a sua capacidade para
trabalharem cooperativamente em pequenos grupos; a capacidade dos alunos
para formularem e reformularem hipóteses, para recolher e organizar dados, para
explicar conceitos oralmente, por escrito ou com o auxílio de materiais, para
utilizar diferentes abordagens para o mesmo problema; a capacidade dos alunos
para relacionar e aplicar conceitos e processos em diferentes contextos; a forma
como o trabalho dos alunos vai evoluindo como tempo; a capacidade dos alunos
para resolver problemas correctamente (apud ARANTES, 2004, p. 45).
Além dessa complexidade de informações a que deve se prestar uma avaliação
comprometida com as aprendizagens Matemáticas dos estudantes de qualquer segmento
escolar. A avaliação na educação matemática de jovens e adultos precisa tomar como
ponto de partida o desenvolvimento de capacidades e competências fundamentais para o
exercício da cidadania e o reconhecimento de um perfil distinto e singular que é o da
clientela dessa modalidade,
... caracterizado pela heterogeneidade de experiências, demandas, necessidades e
motivações, pelo domínio de um amplo e diversificado rol de conhecimentos,
construídos a partir de experiência do cotidiano e por disponibilidades peculiares
para novas aprendizagens (BRASIL, 2002a, p. 107).
Assim, no interior dessas iias exige-se uma avaliação que dialogue com o
que os alunos trazem, ou seja, com os conhecimentos matemáticos que eles constroem em
sua experiência de vida e de trabalho, acolhendo-os como sujeitos que criam cultura ao
organizar o mundo segundo suas necessidades.
23
FERNANDES, D. (1991). Resolução de problemas e avaliação. Em I. P. Martins, A. I. Andrade, A.
Moreira, M. H. A. , N. Costa e A. F. Paredes (Eds.), Didáctica: projecto de formação e investigação
Actas do Encontro Nacional de Didácticas e Metodologia de Ensino (pp. 275-296). Aveiro: Universidade
de Aveiro. (citação conforme consta na dissertação de ARANTES)
128
Exige-se ainda, a compreensão de uma avaliação que emancipa o sujeito da
aprendizagem e promova sua autonomia, garantindo o seu avanço a qualquer instante
dentro do seu processo de aprender, sendo o educando o parâmetro de si mesmo na relação
com o outro e com o mundo.
Nessa concepção, as práticas avaliativas em Matemática devem ser realizadas
com participação, diálogo e negociação entre educandos e educadores. Devem ser
concebidas com as funções reflexiva, emancipatória, formativa, democrática e reguladora
para fornecer tanto aos professores quanto aos alunos da EJA indicações relevantes para a
constante redefinição das escolhas, metas e procedimentos que permitam a adequação do
trabalho pedagógico aos progressos e necessidades de aprendizagem Matemática dos
educandos jovens e adultos e, portanto, para o desenvolvimento cultural e a progressão
escolar destes.
Na perspectiva de se compreender o processo de ensino-aprendizagem da
Matemática, identificar os obstáculos desse processo e decidir sobre a intervenção
adequada para superar determinadas dificuldades dos alunos, o professor avaliará os
conhecimentos matemáticos do educando da EJA de forma a obter informação sobre as
suas destrezas de lculo, o seu conhecimento de conceitos e procedimentos matemáticos,
as suas capacidades de resolução de problemas, de raciocínio e de comunicação.
Nesse sentido, ao avaliar os conceitos matemáticos, a avaliação desempenhada
pelo professor deve atender às capacidades dos alunos não na memorização de definições,
mas na sua aplicação em novas situações, pois assim demonstram que dominam e
compreendem os conceitos. Em relação à avaliação do raciocínio dos educandos jovens e
adultos, deve-se valorizar a utilização de diferentes tipos de raciocínio e dar a oportunidade
de utilizarem raciocínios intuitivos e informais, já que muitos são portadores de uma
experiência Matemática considerável e que extrapola os muros escolares. Na avaliação da
capacidade de comunicação Matemática desses alunos, o intuito do professor deverá ser o
de verificar até que ponto estes utilizam o vocabulário, os símbolos e estruturas para se
expressarem e compreenderem idéias e relações.
Ao se referir a essas e outras questões relevantes no ensino e aprendizagem da
Matemática num contexto de EJA, e principalmente aos ideais de inserção, permanência e
crescimento dos alunos da EJA no processo de escolarização como alternativas
fundamentais para a conquista desses educandos de melhores e mais inclusivas condições
de cidadania, Fonseca corrobora que,
A avaliação da Educação Matemática num projeto pedagógico de EJA deverá
129
indicar em que medida o trabalho desenvolvido foi capaz de contribuir para a
ampliação, a diversificação e a eficiência das habilidades de leitura (e escrita) dos
educandos, quer pelo enriquecimento e confiança no uso do vocabulário; quer
pela compreensão de novas formas de representação; quer pela capacidade de
relacionar informações, especialmente aquelas expressas por dados quantitativos
ou que requerem ser submetidas a operações aritméticas ou algébricas; quer seja
ainda porque todo o texto está permeado por tipos de raciocínios próprios dos
procedimentos ou da organização da Matemática, forjando sua linha de
argumentação, ou inserindo-o num contexto cultural em que o conhecimento
matemático tem uma valoração tal que faz do acesso às formas de produção e
expressão desse conhecimento um requisito fundamental para o processo de
inclusão social (2005a, p. 71-72).
Portanto, para que avaliação da aprendizagem Matemática possa então cumprir
com os anseios de uma educação inclusiva, finalidade imprescindível da Educação de
Jovens e Adultos, é significativo que o educador dessa modalidade desempenhe uma
postura avaliativa constante e processual como parte integrante de uma proposta curricular
e a tomada de decisão direcionadas para o aprimoramento das aprendizagens dos alunos
como questões-chave para quem está ensinando na EJA.
Tendo em vista outro caráter peculiar da EJA, como a concepção de seus
educandos como sujeitos ativos no processo de construção de conhecimentos e no
desenvolvimento de competências e habilidades necessárias à formação humana e social,
cabem aos educadores matemáticos promoverem a participação dos educandos jovens e
adultos na avaliação contínua de suas aprendizagens, de modo a ganhar mais consciência e
controle sobre seus conhecimentos, sobre suas próprias atividades.
Na educação de jovens e adultos em Matemática, é preciso que estejam
claramente definidas as expectativas de aprendizagem, tanto no que se refere à avaliação
do professor quanto na avaliação do aluno. Isso permitique o estudante compreenda a
avaliação não como forma de punição e frustração, mas como ferramenta de
acompanhamento do seu próprio processo de ensino e aprendizagem. Assim
compreendida, a avaliação deve ser necessariamente processual, lançar mão de
instrumentos variados e ter critérios compartilhados entre alunos e professor.
A necessidade de envolver os educandos da EJA no processo avaliativo de seus
conhecimentos e assim tentar garantir que assumam responsabilidades perante a própria
aprendizagem e sintam-se estimulados a progredir, é inclusive reforçada pela Proposta
Curricular para a EJA quando esta observa que:
É preciso implementar práticas em que os alunos participem efetivamente dos
processos avaliativos, por meio de negociações e acordos estabelecidos com o
professor nos quais se definam objetivamente as finalidades, as ações, as
condições de realização, as responsabilidades e a colaboração na tomada de
decisões (BRASIL, 2002a, p. 107).
130
A justificativa para que o educando da EJA tome parte em compreender o
papel da avaliação de suas aprendizagens, e assuma assim, a dinâmica de seu processo
educativo do qual ele próprio é o agente, se fundamenta inicialmente na consideração de
que o ato de avaliar não pode ser de responsabilidade única do professor, uma vez que ele
pressupõe uma quantidade de decisões a serem tomadas; e finalmente na consideração de
que:
A participação do aluno na avaliação é a crença no indivíduo como ser humano
autodeterminado, capaz de solidariamente construir seu destino. É a possibilidade
de formar sujeitos com autonomia uma forma de promoção do ser humano
o quesubstância a educação (SILVA, I. R., 2003, p. 44).
A ação compartilhada pelo professor e o aluno acerca do controle e
responsabilidade de ambos pelo processo de ensino-aprendizagem da Matemática rompe
com a idéia de que os alunos são incapazes de reconhecer seus êxitos e dificuldades e que
o professor é o único responsável pela a avaliação. Desta forma, educadores e educandos
se educam e se avaliam permanentemente, e de forma sistemática, contribuem juntos para
o sucesso do processo escolar em conseqüência do desenvolvimento matemático dos
educandos.
Não obstante dizer que a perspectiva inclusiva dos programas de Educação
Básica de jovens e adultos requer a substituição dos mecanismos de avaliação
classificatória, competitiva, recriminatória e excludente, por práticas formativas,
diagnósticas e reflexivas de avaliação escolar que favoreçam a aprendizagem Matemática e
a transformação social dos seus educandos. A avalião deve ainda favorecer para que o
educando da EJA aprenda a aprender, sendo este um dos objetivos principais dessa
modalidade educacional
Contudo, dada à iniciativa de não se acrescentar outros limites já impostos pela
vida que signifiquem uma nova discriminação dos educandos da EJA; e mais a efetivação
das funções reparadora, equalizadora e qualificadora dessa modalidade que se estabelece
como um movimento amplo de renovação pedagógica na constituição de uma educação
inclusiva e de qualidade; ressaltamos a importância dos educadores matemáticos de jovens
e adultos contemplarem duas dimensões primordiais da avaliação escolar:
A dimensão social, de fornecer aos alunos informações sobre o
desenvolvimento das capacidades e competências exigidas socialmente e auxiliar os
professores a identificarem os objetivos atingidos, com vista a reconhecer as capacidades e
competências dos alunos que favorecem sua inserção no mercado de trabalho e
possibilitem sua maior participação na vida sociocultural;
131
A dimensão pedagógica, de fornecer aos professores e alunos informações
sobre como está ocorrendo a aprendizagem, sobre os conhecimentos prévios e os
conhecimentos adquiridos, os raciocínios desenvolvidos e as representações constrdas, os
valores e hábitos dos alunos, com vista aos encaminhamentos necessários para a
aprendizagem efetiva dos educandos.
CAPÍTULO IV - METODOLOGIA DA PESQUISA
A pesquisa em Educação é uma ocasião privilegiada que reúne pensamento e
ação na elaboração dos conhecimentos sobre os aspectos da realidade
(BARALDI, 1999, p. 17).
Em busca de respostas às nossas indagações cujo objeto são as concepções
dos professores sobre avaliação, Educação Matemática e EJA descrevemos neste
capítulo os passos percorridos na construção de nossa investigação, traçando a opção
metodológica, o universo e os sujeitos da pesquisa, os instrumentos e procedimentos da
coleta de dados, e suas categorias de análise.
4.1 A Opção Metodológica
Considerando a natureza de nossa pesquisa norteada pela questão: quais as
interfaces possíveis de serem estabelecidas entre as concepções de avaliação, de Educação
Matemática e de EJA de professores que atuam em uma escola blica de Cuiabá voltada
exclusivamente ao atendimento dessa modalidade procedemos por meio dos
pressupostos da pesquisa qualitativa, que entre as suas potencialidades, possibilita ao
investigador a busca da explicação aprofundada e da compreensão de fenômenos
complexos, como os que fazem parte do contexto educacional.
Em face disso e segundo as considerações de Ludke e André (1986, p. 12) de
que na pesquisa qualitativa o interesse do pesquisador é verificar como o problema emerge
na realidade do dia-a-dia, e a forma com que os pesquisados percebem e falam sobre a
realidade vivida é ponto de interesse, ressaltamos a escolha metodológica pela a
abordagem qualitativa por constituir-se essa melhor opção para a pesquisa que realizamos.
Na perspectiva da investigação qualitativa em Educação, Bogdan e Biklen
(1994) discutem as características que fundamentam essa modalidade de pesquisa
assinalando que:
133
1) A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de
dados e o pesquisador como seu principal instrumento: o contexto em que ocorre o
fenômeno o sofre qualquer manipulação intencional do pesquisador, já que preservá-lo é
fundamental para compreender o objeto em estudo;
2) Os dados coletados são predominantemente descritivos: todos os dados da
realidade são considerados relevantes, sendo assim, expressa-se uma tentativa de abordar o
fenômeno de maneira minuciosa, respeitando a forma como ele se apresenta;
3) A preocupação com o processo é muito maior do que com o produto: a
preocupação maior do pesquisador é constatar como o fenômeno se mostra nas diversas
atividades e procedimentos cotidianos e como se constitui para os sujeitos envolvidos;
4) O significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de
atenção especial pelo pesquisador: busca-se compreender as perspectivas dos participantes;
5) A análise dos dados tende a seguir um processo indutivo: o pesquisador
o possui hipóteses formuladas a priori, não procura buscar evidências para a
comprovação de suas questões.
Analisando as cinco características básicas discutidas por Bogdan e Biklen
(1994) sobre a investigação qualitativa em Educação; e o fato de que nossa pesquisa foi
realizada no contato direto com o contexto da escola dos professores participantes, os
dados coletados (provenientes dos questionários e entrevistas) foram descritivos, que nos
concentramos em retratar e compreender todos os femenos possíveis capazes de elucidar
as concepções avaliativas manifestadas pelos sujeitos envolvidos, e jamais buscamos
confirmar hipóteses ou comprovar algo previamente definido antes do estudo procurando
sempre entender e mostrar os fatos reais como foram e não como gostaríamos que fossem;
novamente chegamos à compreensão que a investigação que realizamos se ancorou na
perspectiva da metodologia qualitativa.
4.2 Universo da Pesquisa
A nossa pesquisa compreendeu o contexto da Escola Professora Emília
Fernandes de Figueiredo, pertencente à rede pública da Secretaria de Estado de Educação
de Mato Grosso, criada pelo Decreto 2.313 de 02 de dezembro de 1974 e autorizada para
oferecer o Ensino Fundamental e Médio nas modalidades Aceleração e EJA.
134
Implantada inicialmente como Centro de Estudos Supletivos (CES) o único
inclusive na capital mato-grossense, já que os outros três CES foram instalados nos
municípios de Rondonópolis, Cáceres e Barra do Garças a Escola Professora Emília
Figueiredo manteve sua identidade e até hoje permanece atendendo exclusivamente à
clientela de jovens e adultos, tendo como oferta de ensino alfabetizão e pós-alfabetização
para os alunos acima dos 14 (quatorze) anos de idade nas etapas equivalentes ao Primeiro e
Segundo Segmento do Ensino Fundamental, bem como o Ensino Médio da modalidade
EJA, funcionando em Regime de Externato tanto em sua sede como em seu anexo
localizado na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), também estabelecida na
cidade de Cuiabá.
Situada na região Leste do município de Cuiabá, a Escola Elia Fernandes de
Figueiredo localiza-se geograficamente numa posição privilegiada, tendo em vista a
facilidade de acesso da comunidade escolar que pode contar com várias linhas de
transporte coletivo com trajeto em frente à escola, favorecendo não somente o acesso de
estudantes provenientes de Cuiabá como também de outros municípios como Várzea
Grande e Santo Antonio do Leverger.
Desta forma, dada à importância da Escola Professora Emília Fernandes de
Figueiredo no contexto da EJA, além do número de alunos matriculados (cerca de 8000
mil) e do mero de professores atuando com a disciplina de Matemática (cerca de 10),
justificamos a escolha dessa escola como universo de nossa pesquisa.
4.3 Sujeitos da Pesquisa
Os sujeitos da pesquisa constituíram-se inicialmente de quatro professores e
uma professora, todos lecionando a disciplina de Matemática nas turmas do 2
o
Segmento
do Ensino Fundamental e/ou no Ensino Médio da EJA da Escola Professora Emília
Figueiredo.
Desta forma, com base no questionário de caracterização respondido pelos
cinco professores, que possibilitou elucidarmos algumas informações de ordem pessoal, a
formação acadêmica e a experiência na docência; e seguindo o critério de tempo de
atuação docente na Educação de Jovens e Adultos, selecionamos três professores para
comporem o quadro de sujeitos dessa pesquisa.
135
Assim, os sujeitos da pesquisa se constituíram de três professores, que de modo
a assegurar o anonimato foram identificados por:
- IRE – professor com maior tempo na docência em EJA (20 anos);
- DAM – docente com um período médio de atuação na EJA (07 anos);
- GUTprofessor com menor tempo de atuação docente na EJA (02 anos).
QUADRO 4
Caracterização Pessoal e Formação Acadêmica dos Sujeitos da Pesquisa
Identificação Sexo Idade Graduação Pós-graduação
IRE
M 45
Licenciatura em
Matemática
Especialização em
Metodologia do Ensino da
Matemática
DAM
M 57
Licenciatura em
Ciências e Matemática
Especialização em Gestão
Empresarial
GUT
M 42
Licenciatura em
Matemática
-
QUADRO 5
Caracterização Funcional e Experiência Profissional dos Sujeitos da Pesquisa
Identificação
Situação
Funcional
Jornada de
Trabalho
Exerce Outra
Profissão além
da Docência
Tempo de
Atuação
Docente
Tempo Atuação
Docência em
Matemática
Tempo Atuação
Docência na
EJA/Supletivo
Formação
Complementar
na área de EJA
IRE
Efetivo 40 h/sem. o 20 anos 20 anos 20 anos Sim
DAM
Efetivo 30 h/sem. Sim 34 anos 07 anos 07 anos Não
GUT
Efetivo 40 h/sem. Não 21 anos 21 anos 02 anos Não
IRE. Único entre os professores participantes a considerar ter feito um curso
de formação complementar voltado para a EJA, nasceu em Cuiabá e é casado. Licenciado
em Matemática (desde 1986) e Especialista em Metodologia do Ensino da Matemática pela
UFMT, há 20 anos é professor lecionando sempre com a disciplina de Matemática e
trabalhando todo esse tempo na Escola Professora Emília de Figueiredo. foi diretor
dessa escola e hoje exerce o cargo de professor apenas no período matutino.
DAM. Docente mais velho entre os professores participantes, casado e natural
de Cuiabá, graduou-se em Licenciatura em Ciências pela UFMT e obteve o tulo de
Licenciado em Matemática pela Universidade de Cuiabá (UNIC) no ano de 2001.
Especializou-se em Gestão Pública e Empresarial pela UFMT em 2002, e exerce além da
docência a profissão de técnico da área instrumental do Governo do Estado de Mato
136
Grosso. Com 34 anos de experiência docente, é professor de Matemática da Escola
Professora Emília Figueiredo há 7 anos, onde leciona no período noturno na própria Escola
e também em seu anexo junto à UFMT. Atualmente não está lecionando em outra
modalidade da Educação Básica a o ser a EJA.
GUT. O único entre os professores participantes que não possui um curso de
pós-graduação, é casado e nasceu no Rio de Janeiro. Licenciado em Matemática pela
UFMT desde 1992, atuou também durante algum tempo como professor de Física.
Trabalha na Escola Professora Emília Figueiredo 5 anos, porém é professor da EJA
somente há 2 anos, pois ficou um tempo afastado. Leciona nos períodos vespertino e
noturno, e atualmente também leciona no Ensino Médio Regular em outra instituição
escolar.
4.4 Coleta de Dados
Amparada pela abordagem qualitativa (LUDKE e ANDRÉ, 1986; TRIVIÑOS,
1987; BOGDAN e BIKLEN, 1994) e constituindo-se como uma investigação no campo da
Educação Matemática, esta pesquisa se lançou à coleta de dados tendo como premissa as
considerações elucidadas por Fiorentini e Lorenzato (2006) de que:
Há várias formas de interrogar a realidade e coletar informações. Algumas são
mais dirigidas [...] Outras são mais abertas [...] Todas essas técnicas têm suas
vantagens e desvantagens. O pesquisador, visando obter maior fidedignidade,
pode lançar mão de mais de uma técnica, procurando, assim, triangular
informações (p. 102).
Desta forma, e reconhecendo nas palavras de Baraldi (1999, p. 19) de que se
faz necessária “a triangulação, ou seja, a recorrência a uma variedade de dados, coletados
em diferentes momentos, em situações variadas, utilizando-se de recursos variados”,
durante a nossa pesquisa para a recolha das informações selecionamos os seguintes
instrumentos: quatro questionários e uma entrevista.
O questionário que é um dos instrumentos mais tradicionais de coleta de
informações, consistindo numa série de perguntas objetivas (fechadas) e subjetivas
(abertas) ou ainda mistas (combinando com questões fechadas e parte aberta), e cuja
finalidade é descrever os participantes da pesquisa coletando o maior número de dados que
possibilitem o confronto das informações recolhidas, sobretudo na fase inicial e
137
exploratória da pesquisa (FIORENTINI; LORENZATO, 2006), foi elaborado e aplicado
em nossa investigação da seguinte maneira:
- Questionário de Caracterização (QC) organizado com questões fechadas,
teve como objetivo elucidar algumas informações pessoais e também sobre
a formação acadêmica e a experiência profissional dos sujeitos da pesquisa
(Anexo I);
- Questionário 1 (Q1) (Educação de Jovens e Adultos) – elaborado com
perguntas subjetivas, esse questiorio foi guiado com o propósito junto
aos professores participantes de caracterizar suas concepções sobre a
definição, o papel social e a oferta da EJA no contexto sócio-educacional; a
influência da formação acadêmica e da própria experiência profissional na
sua prática docente na EJA; bem como, sobre suas visões a respeito de
quem são e com que interesse geralmente seus alunos procuram a EJA e
que tipo de formação essa modalidade deve propor a estes estudantes
(Anexo II);
- Questionário 2 (Q2) (Matemática na EJA) constituído de questões
abertas, procurou-se sintetizar alguns aspectos de como os sujeitos da
pesquisa concebem a Matemática e seu processo de ensino-aprendizagem
no âmbito da EJA, e como trabalham com essa disciplina junto aos seus
alunos da EJA (Anexo III);
- Questionário 3 (Q3) (Avaliação em Matemática na EJA) organizado com
questões subjetivas e com o intuito de aprofundar e compreender as
informações prestadas pelos professores participantes sobre o que pensam a
respeito da avaliação da aprendizagem em Matemática no contexto
educacional da EJA (Anexo IV).
A etapa seguinte da nossa coleta de dados compreendeu a utilização da
entrevista, reconhecida como um dos procedimentos mais usuais no trabalho de campo no
âmbito da pesquisa qualitativa (FIORENTINI; LORENZATO, 2006) e também como um
dos principais recursos que o investigador qualitativo possui para realizar sua coleta de
informações (TRIVIÑOS, 1987). Além de se constituir em um instrumento de coleta de
dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver
intuitivamente uma idéia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo
(BOGDAN; BIKLEN, 1994).
Interessados em entrar no mundo dos participantes da pesquisa, e assim
138
compreendermos suas concepções e aprofundarmos os aspectos pertinentes ao nosso objeto
de investigação recorremos à entrevista fundamentados nas seguintes considerações:
A entrevista é um recurso metodológico muito eficaz para obtenção das
informações desejadas, e permite o aprofundamento de pontos levantados por
outros recursos. Também permite correções, esclarecimentos e adaptações que
outros se limitam a permitir. Ela consiste num encontro social que possui
características de empatia, intuição e imaginação, criando assim uma interação,
uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde
(BARALDI, 1999, p. 20).
Depois de transcorridos cerca de um mês e meio as termos aplicado os
questionários (1, 2 e 3) junto aos sujeitos da pesquisa, retornarmos à Escola Professora
Emília Figueiredo para entrevistá-los individualmente durante um período que variou entre
40 a 65 minutos, sempre em horário previamente combinado e de acordo com a
disponibilidade dos mesmos. Na ocasião utilizamos a modalidade de entrevista semi-
estruturada, definida como:
... uma outra forma de entrevista que articula duas modalidades (entrevista
estruturada e não-estruturada). Essa modalidade é muito utilizada nas pesquisas
educacionais, pois o pesquisador, pretendendo aprofundar-se sobre um fenômeno
ou questão específica, organiza um roteiro de pontos a serem contemplados
durante a entrevista, podendo, de acordo com o desenvolvimento da entrevista,
alterar a ordem dos mesmos e, inclusive, formular questões não previstas
inicialmente (FIORENTINI; LORENZATO, 2006, p. 121).
Em face disso, elaboramos um roteiro básico com perguntas subjetivas para a
entrevista semi-estruturada, que teve uma duração mínima de aproximadamente 40
minutos, de forma a coletarmos e elucidarmos algumas questões que já tinham sido
respondidas nos questionários, bem como outras que ainda o haviam sido contempladas
anteriormente (Anexo VIII).
Pretendendo aprofundar ainda mais as concepções reveladas pelos professores
participantes a respeito da avaliação, do processo de ensino-aprendizagem da Matemática e
da Educação de Jovens e Adultos organizamos a entrevista em três Blocos:
- Bloco I, sendo duas questões, uma sobre o que seria a EJA e a outra sobre
quais seriam os aspectos positivos e negativos dessa modalidade da
Educação Básica;
- Bloco II, com três perguntas, uma referindo-se como deveria ser realizado
o processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA e as outras duas
evidenciando como o professor costuma desempenhar esse processo e quais
seriam as principais dificuldades em se trabalhar com a disciplina de
Matemática na EJA;
- Bloco III, compreendendo seis questões relacionadas a o que, para que,
139
quando e como avalia, além do como registra o que avalia e como deveria
ser realizada ou praticada a avaliação do ensino-aprendizagem da
Matemática na EJA.
Organizamos ainda, um quarto bloco, cujas questões se voltaram para o
conhecimento do Plano Potico Pedagógico (PPP) da escola e sobre o processo de
“Reclassificação” desempenhado pela mesma; além de um quinto bloco que, apesar de não
se constituir de questões específicas e comuns, foi desenvolvido com o propósito de
referendar algumas respostas dadas no questionário e até mesmo sobre a própria entrevista
que não haviam ficado bem esclarecidas.
Diante das informações reveladas pelos sujeitos da pesquisa a partir dos
instrumentos de coleta de dados utilizados em nosso estudo, nos voltamos para a análise do
conteúdo desses instrumentos tentando desvendá-los e assim compreendermos o
“significado simlico das mensagens” expressas através das percepções e concepções dos
professores participantes sobre o objeto de investigação do nosso estudo.
Na interpretação e organização do material obtido (questionários respondidos e
transcrição das entrevistas), e guiados pela questão investigativa da nossa pesquisa
buscamos categorizar as informações tentando encontrar as unidades de significados
contidas nos padrões convergentes dos dados, de modo que refletissem os propósitos do
estudo.
4.5 Categorias para Análise
As categorias para análise dos dados decorreram da própria construção teórica
sobre o tema de investigação e das informações encontradas a partir dos questionários
respondidos e das transcrições das entrevistas realizadas com os professores participantes.
Deste modo e em conformidade com o objeto de nossa investigação, que se
insere nas concepções apresentadas pelos professores participantes dessa pesquisa acerca
da avaliação, da Educação Matemática e da Educação de Jovens e Adultos, categorizamos
nossa análise por sujeito definindo duas categorias para evidenciar quais são as concepções
dos sujeitos para cada uma das áreas investigadas.
a) Perspectiva excludente
Essa perspectiva de conceber a avaliação, a Educação Matemática e a EJA se
140
ancora nas iias de um velho modelo de ensino, também tido como tradicional, que é
excludente e cujas características principais se apresentam nos quadros sínteses destacados
no final dos capítulos desse trabalho: Quadro 1, sobre as características da EJA (p. 51);
Quadro 2, referente à Educação Matemática (p. 74); e Quadro 3, sobre a Avaliação (p.
124).
b) Perspectiva inclusiva
As concepções acerca da avaliação, da Educação Matemática e da EJA
compreendidas segundo essa perspectiva se fundamentam nos ideais defendidos por um
novo modelo de ensino, que tem como principal qualidade distintiva a visão inclusiva dos
educandos no processo cio-educacional, além das características apresentadas nos
quadros elucidados no final dos capítulos desse estudo, às mesmas páginas mencionadas
acima.
Vale destacar que adotamos para a análise dos dados um caráter
essencialmente interpretativo, uma vez que na análise interpretativa os investigadores
analisam de perto os dados da pesquisa qualitativa, de modo a encontrarem construtos,
temas e padrões que podem ser utilizados para descrever e explorar o fenômeno em estudo.
Com o intuito de analisar e compreender as possíveis interfaces entre as
concepções de avaliação, de Educação Matemática e de EJA apresentadas pelos sujeitos de
nossa pesquisa, prosseguimos a análise dos dados procurando confrontar essas concepções
logo após um exame individualizado de cada umas das áreas investigadas, tentando assim
produzir resultados e considerações relacionados à questão de investigação.
Nesse movimento da análise dos dados, queremos deixar claro que não temos
intenção alguma de fazermos julgamentos dos sujeitos dessa pesquisa, tendo como intuito
exclusivo analisarmos suas concepções mediante as categorias definidas, que
reconhecidamente coexistem nas práticas de todos nós educadores, sendo possível assim,
que as concepções dos sujeitos transitem entre as duas perspectivas institdas como
categorias de análises dessa pesquisa.
Desta forma, ressaltamos que reconhecemos que as concepções de ensino-
aprendizagem firmadas nas práticas de todo professor, na maioria dos casos não aparecem
em forma pura, mas com características particulares, muitas vezes mesclando aspectos de
mais de uma linha pedagógica.
CAPÍTULO V - ANÁLISE DOS DADOS
Neste capítulo, apresentamos os dados coletados e a nossa análise
interpretativa dos mesmos, a partir dos fundamentos teóricos e metodológicos construídos
nos capítulos anteriores e das informações prestadas pelos sujeitos da pesquisa por meio
dos questionários e entrevistas aplicados no decorrer dessa investigação.
A análise se apresenta por sujeito, que são identificados pelos mesmos
pseudônimos atribuídos anteriormente, e se constitui de acordo com as categorias
estabelecidas nos capítulos anteriores, analisando-se as concepções de EJA, Educação
Matemática e avaliação dos professores participantes dessa pesquisa.
Ao final da análise de cada sujeito, apresentamos nossas considerações a
respeito das suas concepções de EJA, educação Matemática e avaliação, procurando
estabelecer as possíveis interfaces entre essas concepções evidenciadas.
5.1 Professor IRE
O professor IRE, entre os sujeitos dessa pesquisa, é o que tem mais tempo de
atuação docente na Educação de Jovens e Adultos. Desde que começou a lecionar,
quase 21 anos, sempre lecionou nessa modalidade, mesmo quando essa ainda tinha a
denominação de ensino supletivo. Durante sua trajetória como professor, sempre trabalhou
na Escola Emília Figueiredo, onde inclusive, atuou como diretor. Por trabalhar
exclusivamente no período matutino, grande parte de seus alunos acabam se constituindo
de jovens na faixa etária dos 14 aos 20 anos que poderiam estar freqüentando o ensino
regular.
5.1.1 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos de IRE
Ao definir a Educação de Jovens e Adultos (EJA) como um: Processo
educacional para aqueles com defasagem escolar que freqüentaram ou não uma
escola” (Q1-1), IRE reconhece a EJA como uma modalidade da educação com a
142
finalidade de suprir e compensar a escolaridade dos educandos que não tiveram como
prosseguir ou mesmo iniciar o processo escolar. No entanto, não explicita que a EJA
também é uma modalidade educacional constituída principalmente para restaurar um
direito negado a uma escola de qualidade, capaz de possibilitar uma educação permanente
e contínua, e permitindo assim, aos educandos jovens e adultos excluídos do processo
escolar uma nova inserção no mundo do trabalho e na vida social.
Ao esclarecer ainda, que a EJA “é uma modalidade de ensino, que vem
atender a necessidade daqueles alunos que em sua faixa etária deixaram de estudar
regularmente; que perderam, por algum motivo diferenciado, aquele momento de
fazer em seu tempo normal” (E-1). E novamente ao se referir à EJA como “uma
modalidade de ensino, que vem dar essa contribuição pra aqueles alunos que
deixaram em seu tempo normal de vida etária, deixaram de freqüentar aula por um
motivo ou por outro. Então ela vem atender essa necessidade, suprir essa necessidade
daqueles alunos que por caminhos não se sabe o que, deixaram de freqüentar
regularmente as aulas(E-41).
Percebemos que IRE evidencia recorrentemente a perspectiva de uma EJA
instituída exatamente para atender aos jovens e adultos que o tiveram como estudar na
idade apropriada, reconhecendo de certo modo, a faixa etária e as dificuldades que
forjaram a exclusão desses educandos do processo de escolarização como traços
definidores da EJA.
Sobre essa visão, Fonseca (2005) esclarece que, a própria necessidade de se
estabelecerem programas de Educação Básica de Jovens e Adultos resultou em função
daqueles que foram excluídos do sistema escolar quando crianças ou adolescentes.
Ao tratar que o papel da EJA no contexto cio-educacional é de um: “Ensino
de qualidade para aqueles que não oportunizaram nas etapas regulares da educação”
(Q1-2), IRE deixa claro mais uma vez que a definição da EJA está ligada à questão da
falta de oportunidades para que os educandos prosseguissem sua trajetória escolar na idade
própria. Porém, demonstra ainda, desconhecer, a princípio, que o papel cio-educacional
da EJA não se restringe ao oferecimento de um ensino de qualidade, mas principalmente à
reparação de uma realidade historicamente marcada pela desigualdade e exclusão social de
cidadãos.
No esclarecimento de que um dos pontos positivos da EJA “é esta questão de
inserir. De tentar inserir essas pessoas em uma sociedade assim mais, como podemos
dizer, inserir na sociedade. [...] eles a partir do momento que entram na escola
143
começam até a mudar essa visão, eles começam a participar mais, a entender mais o
mundo em que a gente está vivendo” (E-2).
Notamos que IRE não retoma a questão do papel sócio-educacional da EJA
limitado a uma educação de qualidade, como também, remete-se à compreensão da
inserção social dos educandos jovens e adultos a partir da EJA. Além disso, traz à tona
uma reflexão sobre o papel da escola como condição plena para promover a participação
dos educandos na sociedade e para possibilitar o exercício da cidadania. Demonstrando
ainda, conceber a EJA como uma modalidade educacional capaz de promover a inclusão
social dos educandos, ao se referir ao fato de que ao entrarem na escola os alunos
começam a mudar sua visão e a entender mais o mundo.
Essa concepção encontra respaldo nos ideais de uma Educação Básica de
jovens e adultos comprometida com a busca da construção de uma educação inclusiva, cuja
nica é tentar efetivar um caminho de desenvolvimento dos jovens e adultos, de forma que
tenham acesso a novas oportunidades sócio-culturais por meio da escolarização.
Ainda em relação à definição de Educação de Jovens e Adultos, ao indagarmos
IRE se ele diferenciaria a EJA atual do antigo ensino supletivo, e se as mudanças que
ocorreram em torno dessa modalidade foram para melhor ou pior, o mesmo respondeu:
“Olha, eu acho assim, que o supletivo, ele tinha uma cobrança, entendeu? Ele era
uma cobrança maior. Hoje a gente assim, que se perdeu essa cobrança, ficou uma
coisa assim, você não tem mais como falar que vai reprovar aluno, você não tem.
Antigamente, ainda você tinha um caminho que falava, quer dizer, o aluno tinha que
ser mais persistente antes. Hoje ele não é mais persistente, porque ele já, eu acho que
pelo conhecimento dele, ele já sabe que ele não vai ficar na série, ele já tem essa idéia”
(E-42).
Percebemos, nessa afirmação, que IRE parece preferir uma Educação sica
de jovens e adultos nos moldes do antigo ensino supletivo do que no modelo da EJA
defendida atualmente de acordo com suas Diretrizes Curriculares Nacionais e outros
documentos que a fundamentam. Sua argumentação se pauta na questão de que a
flexibilização da organização escolar que se propõe na EJA não consegue garantir que o
aluno seja mais presente e participativo em relação aos seus estudos; que o ensino
supletivo cobrava mais essa persistência dos educandos nas atividades escolares e,
portanto, era um modelo escolar mais rigoroso e controlador, onde o fato de se poder
reprovar o aluno característica comum da prática avaliativa tradicional que voltaremos a
analisar seria uma forma de pressão para motivá-lo para o trabalho e a participar mais
144
em sala de aula.
Outro fator de destaque nessa afirmação de IRE, estaria em atribuir ao
educando toda a responsabilidade pelo sucesso ou fracasso do processo educacional, como
se conhecendo o sistema de progressão da escola, o aluno tivesse o poder de decidir em
estudar ou o, já que saberia reconhecer se essa seria ou não uma condição para se
avançar ou ficar retido em uma determinada etapa do processo escolar.
A defesa de IRE, de certo modo, acerca do antigo ensino supletivo, reflete,
segundo Di Pierro (2005), uma concepção ainda predominante entre educadores e gestores
da educação brasileira, em que a constituição do ensino supletivo continua a ser a
referência comum para pensar a EJA no Brasil.
Em relação à visão de IRE a respeito de seus alunos da EJA, ao defini-los:
“Com expectativas de aprendizado, porém com muitas dificuldades e com interesse
no certificado” (Q1-4), e em seguida concluir que seus alunos procuram a EJA com
objetivo de irem “Em busca de certificação de forma mais facilitada” (Q1-5).
Verificamos que IRE traz à tona a compreensão de que apesar dos educandos
recorrerem à EJA com vontade de aprender, o que buscam na verdade é o aligeiramento do
processo escolar. Neste caso, revela ainda, a idéia de que, na opinião dos seus alunos, a
EJA é uma modalidade em que a certificação da Educação Básica é mais fácil do que nos
outros segmentos educacionais.
Essa visão reflete o que verificamos quando estávamos coletando os dados para
a pesquisa na Escola. Na oportunidade, em conversas com os professores, inclusive alguns
que o são sujeitos dessa investigação, estes nos disseram que muitas vezes os alunos se
matriculam na escola para conseguir a aprovação em uma determinada disciplina que não
conseguiram ser aprovados onde estudavam, para depois retornarem à sua escola de
origem, mencionando o seguinte: “Nós queremos passar em ‘tal disciplina’ para depois
voltarmos para a escola normal”.
Ao ser questionado sobre como compreende a oferta de educação regular, por
meio da EJA, para jovens e adultos de escolarização básica incompleta ou jamais iniciada,
que (re)tomam os bancos escolares, IRE declara: “Preocupante, pois os mesmos já
esqueceram ou não aprenderam coisas básicas e úteis para o bom rendimento das
aulas (Q1-3).
Percebemos aqui, que IRE parece não compreender que a EJA tem como traço
definidor exatamente umblico de jovens e adultos que não tiveram acesso e nem
domínio da escrita e leitura como bens sociais, na escola ou fora dela. E que, portanto, não
145
se constitui como absurdo, jovens e adultos de escolarização sica incompleta ou jamais
iniciada apresentarem problemas referente à falta de conhecimentos escolares. Sendo
assim, como professor da EJA, IRE parece não compreender que uma das situações
definidoras dessa modalidade refere-se ao perfil distinto de seus alunos, cuja própria
desigualdade de oportunidades educativas ao longo de suas vidas, torna-se um fator
decisivo para que acabem apresentando alguma dificuldade na aprendizagem escolar.
No entanto, ao recordarmos que os alunos de IRE são, em sua maioria, jovens
provenientes do ensino regular, talvez isso possa explicar que ele admita a oferta da EJA
como preocupante pelos motivos expostos. Afinal, pressupõe que seus alunos deveriam
trazer consigo um mínimo de conhecimentos básicos para o andamento de suas atividades
pedagógicas.
No mesmo sentido, ao se referir à falta de alguns conhecimentos escolares dos
alunos como sendo essenciais para o andamento de suas aulas, IRE corrobora com uma
situação que tem sido constatada junto aos professores da EJA, que afirmam entre as
dificuldades para se trabalhar nessa modalidade a falta de base dos conhecimentos formais
que os alunos apresentam no interior das salas de aula (MEC/SEF, 2002a).
Ao remeter-se à questão dos pontos negativos da EJA como sendo: “As
condições das escolas, por exemplo, que não são adequadas. Eu acho que é barra
negativamente porque você não tem espaço, não tem uma estrutura pra você dar
seqüência em qualquer tipo de atividade que venha a fazer. É então, muito
desgastante pra vo tentar buscar alguma coisa diferenciada. Por mais que você
procure voencontra barreiras, a escola não tem espaço, a escola não tem material,
não tem laboratório, não tem informática. [...] por falta também da questão de
recursos financeiros e ainda não estar assim totalmente ensinado” (E-3). “Nós temos
uma outra barreira grande que são as salas de aula, são lotadas, um número muito
grande de alunos por sala” (E-7).
IRE parece condicionar todos os problemas na realização das atividades
escolares à falta de estrutura da escola, com salas e espaços inadequados, ausência de
materiais e recursos financeiros para investir em laboratórios de matemática e infortica.
Nesse sentido, parece revelar que a qualidade do ensino na EJA está intimamente ligada à
questão logística e material das escolas, não compreendendo dessa forma, que a garantia de
uma educação qualitativa não está condicionada apenas à disponibilidade de recursos
físicos e materiais. Mas está ligada também à formação de professores preparados para o
campo específico de atuação na EJA; motivação dos professores para atuarem em uma
146
modalidade com uma identidade própria; consideração de que a instituição escolar o foi
concebida originariamente para atender ao público específico da EJA e sim para crianças e
adolescentes; valorização da educação informal am da educação formal; reconhecimento
do perfil distinto, da caracterização sociocultural e da heterogeneidade dos educandos da
EJA etc.
Ao mencionar: “pra você dar seqüência em qualquer tipo de atividade que
venha a fazer. É então, muito desgastante pra você tentar buscar alguma coisa
diferenciada. Por mais que você procure você encontra barreiras. Seque sempre
vamos continuar fazendo a mesma coisa? Não vamos buscar uma coisa
diferenciada? Você não consegue” (E-3).
Além de complementar sua iia quanto aos aspectos discutidos anteriormente
sobre as dificuldades para se desempenhar suas atividades docentes nas salas de aulas da
EJA. IRE demonstra a intenção de desenvolver um trabalho diferenciado em razão das
características peculiares da EJA, apesar de esbarrar nos problemas elencados por ele, que
acabam impedindo-o de assim proceder durante sua prática docente. Porém, revela limitar-
se aos obstáculos expostos por ele, não assumindo, como elemento integrante e essencial
do processo educativo, que talvez os problemas enfrentados por ele no contexto das salas
de aulas da EJA estejam também pautados em suas deficiências como educador que não foi
preparado em sua formação inicial e nem durante sua atividade docente na EJA para
preceder com algumas das questões peculiares que envolvem essa modalidade.
Em resposta à pergunta: Na sua opinião, a EJA deve se propor a que tipo de
formação para seus alunos? IRE esclarece: “Formar alunos competitivos e em
igualdades de condições com outros de outras modalidades” (Q1-6).
Neste caso, o conseguimos chegar a uma compreensão sobre que tipo de
formação IRE acredita que a EJA deve se propor aos seus educandos. Por um lado, parece
remeter-se aos ideais de uma EJA enquanto formadora de educandos para a competição
com os demais educandos dos outros segmentos educacionais, demonstrando concebê-la
como uma modalidade voltada para a educação funcional ou profissional, para a
preparação de mão-de-obra mais produtiva e competitiva em igualdade com a formão
escolar da Educação Básica regular. Por outro lado, aparenta também, conceber a EJA para
a formação dos educandos nas mesmas condições que a formão escolar oferecida pelas
outras modalidades da Educação sica, revelando assim, entendê-la com uma identidade,
sem concessões à qualidade de ensino e propiciando uma terminalidade e acesso a
certificados equivalentes ao ensino regular.
147
Ao definir seus alunos como “pessoas assim retraídas. Eles são essas pessoas
que são bem devagar para chegar nas coisas” (E-2), IRE revela novamente não
compreender o perfil distinto dos educandos da EJA, e que não nada de incomum em
seus alunos se sentirem assim, principalmente se considerarmos o tempo que se
encontraram fora da escola e a falta de condições que tiveram para aproveitar melhor as
restritas oportunidades escolares.
Além disso, segundo Fonseca (2005), é natural as questões de desconfiança,
rejeição e busca oscilarem nos discursos e nas atitudes assumidos pelos alunos da EJA,
principalmente, quando percebem o ficit que lhes é imposto por não compartilharem do
gênero discursivo da Matemática Escolar, mesmo possuindo eventuais destrezas nos
cálculos.
a) Algumas considerações sobre as concepções de IRE acerca da Educação de Jovens
e Adultos
Analisando os significados atribuídos por IRE acerca do universo
compreendido pela Educação Básica de jovens e adultos, é possível identificarmos
características de uma EJA fundamentada no novo modelo ao remeter-se à compreensão de
uma educação inclusiva, voltada para a efetivação do acesso e a inclusão dos educandos a
oportunidades socioculturais por meio da escolarização. Bem como, ao demonstrar a
iniciativa de desenvolver um trabalho diferenciado em razão das especificidades da EJA.
Neste sentido, percebemos ainda, que ao demonstrar preferência em alguns
instantes pelo ensino supletivo, acreditando ser este mais rigoroso e controlador junto aos
alunos do que a EJA; ao aparentar o compreender em outros momentos o perfil distinto
dos educandos da EJA; e ao atribuir a estes a responsabilidade pelo sucesso ou fracasso
escolar do processo educativo, IRE demonstra revelar uma concepção antiga de EJA,
baseada em uma educação supletiva e compensatória, sem reconhecimento das
particularidades que envolvem a Educação Básica de jovens e adultos.
Contudo, diante das considerações de IRE sobre o campo complexo da
Educação de Jovens e Adultos, percebemos que suas concepções m oscilado entre as
perspectivas do velho e do novo modelo de EJA, mesclando aspectos de uma educação
para a inclusão e também para a mera reposição da escolaridade formal não realizada na
infância e na adolescência.
148
5.1.2 – Concepções de Educação Matemática de IRE
Dando continuidade à nossa pesquisa, buscamos compreender as concepções
do professor IRE a respeito do processo de ensino-aprendizagem de Matemática no
contexto educativo da Educação de Jovens e Adultos.
Dessa forma, iniciamos nossa investigação indagando IRE sobre como ele
define a Matemática na EJA, ao que ele respondeu: “Aplicada para que os educandos
possam usá-la em sua vida” (Q2-1). Reafirmando essa compreensão na entrevista quando
diz: “A Matemática na EJA, eu acho assim, que ela tem que ser pra uso na prática.
Porque esses alunos têm experiência de vida, então, o que tem que ser colocado
para ele é a praticidade dela” (E-37).
A definição de IRE a respeito da Matemática no contexto da EJA é assumida
como um caráter prático e de utilidade no dia-a-dia, demonstrando a iia de que é preciso
contribuir para que os educandos da EJA percebam que o conhecimento matemático ajuda
a resolver problemas do cotidiano das pessoas e que se aplica às mais variadas atividades
humanas.
No entanto, ao se referir apenas ao papel funcional da atividade matemática
dirigida à aplicação na vida prática, IRE não expressa, a princípio, a função formativa da
Matemática voltada para o desenvolvimento de capacidades intelectuais para a estruturação
do pensamento, ou seja, da sua capacidade em contribuir para o desenvolvimento do
raciocínio, da lógica, da coerência, o que transcende os aspectos práticos.
Essa perspectiva, quanto aos papéis funcional e formativo da Matemática, é
corroborada por Fonseca (2005) quando esclarece que, para além da dimensão utilitária, os
sujeitos da EJA percebem, requerem e apreciam também sua dimensão formativa.
O fato de IRE tentar justificar o caráter utilitário e prático da Matemática na
EJA devido à experiência de vida dos seus alunos evidencia que ele reconhece que os
educandos jovens e adultos trazem para a escola uma riqueza de conhecimentos
provenientes de suas experiências pessoais e coletivas. No entanto, essa bagagem cultural
dos alunos o é tratada por ele como ponto de partida para a construção de novos
conhecimentos, uma vez que os exemplos práticos não são tomados a partir da realidade
dos alunos, não são eles que sugerem esses exemplos, mas sim o professor.
Ao esclarecer: Se o aluno tem pensamento matemático, se consegue
enxergar isso ai de forma que ele use lá, que ele exerça a cidadania dele. A partir do
momento que ele consegue exercer sua cidadania eu acho que você fez muito pela
149
Matemática. Se ele consegue enxergar que andando fora agora não vai ser
alienado, que ele não vai perder viagem, ele tá” (E-39).
Percebemos que IRE remete-se à perspectiva da importância do educando da
EJA aprender Matemática como um requisito necessário para efetivar o exercício de sua
cidadania. Desta forma, IRE revela compreender a Matemática no contexto da EJA como
um elemento capaz de contribuir para que o aluno se torne agente da transformão de seu
ambiente, participante mais ativo nas relações socioculturais constituídas na sociedade. De
modo geral, essa afirmação de IRE destaca ainda, a iia de que não basta aprender
Matemática, também é importante que o aluno saiba utilizá-la nas suas atividades
cotidianas.
Sobre a importância do ensino da Matemática na EJA, IRE afirma que a
Matemática deve ser ensinada “De forma significativa, pois a mesma se aplica a tudo
que se possa imaginar” (Q2-3).
Assim, notamos a visão de IRE de que a Matemática se aplica às mais variadas
e complexas atividades humanas. Esclarecendo que, exatamente, devido a Matemática ter
um amplo campo de aplicação, ela precisa ser ensinada no contexto da EJA de forma
significativa.
No entanto, ao se referir a essa questão da Matemática ser ensinada de forma
significativa, IRE não explicita a necessidade de se valorizar o conhecimento matemático
produzido pelos educandos da EJA e o resgate do processo histórico-cultural desse
conhecimento matemático como fundamentais para promover uma aprendizagem
significativa.
Questionado sobre que conhecimentos são essenciais para que os alunos da
EJA supram suas necessidades básicas de aprendizagem da Matemática, IRE refere-se ao
“Domínio das regras, dos conceitos, dos cálculos e utilização das fórmulas (Q2-5).
Complementando a necessidade de se atentar também, mediante a formação básica em
Matemática para os alunos da EJA, para “os cálculos sicos: adição, subtração,
multiplicação, divisão. Isso é o que ele teria que ser bem fluente” (E-40). Justificando
esses conhecimentos sicos “para o aluno conseguir na frente, principalmente, no
Ensino Médio, não ter essa dificuldade” (E-40).
Diante de tais considerações de IRE, percebemos uma valorização dos cálculos
e das quatro operações matemáticas como fundamentais para a aprendizagem da
Matemática por parte dos educandos da Educação de Jovens e Adultos.
Esse aspecto reflete o que foi constatado em pesquisa realizada pela
150
Coordenação de Educação de Jovens e Adultos (COEJA) junto aos professores da EJA, de
que parece evidente que esses professores julgam essencial para os alunos da EJA aprender
procedimentos de cálculos com as quatro operações básicas da Matemática: adição,
subtração, multiplicação e divisão (MEC/SEF, 2002a).
Ao se referir ao donio das regras e utilizão das fórmulas, IRE demonstra
ter uma concepção de Matemática pautada no Formalismo, onde a Matemática tem seu
valor nos axiomas, definições e teoremas, ou seja, em outras palavras, nas fórmulas
matemáticas.
Analisando ainda, as considerações de IRE sobre os conhecimentos que ele
defende como essenciais para uma boa formão dos educandos da EJA em Matemática, é
possível verificarmos certa ênfase em tais conhecimentos com o intuito único para que os
alunos jovens e adultos os apliquem apenas nas outras etapas do processo de escolarização,
que se refere ao fato dos alunos aprenderem tais conhecimentos matemáticos somente
para não terem dificuldades futuras, principalmente no Ensino Médio.
Ao se limitar ao entendimento de uma formação básica em Matemática para os
alunos da EJA como pré-requisito para as próximas etapas do sistema escolar, IRE parece
ter uma concepção mais próxima do velho modelo, principalmente, por não compreender
que o ensino da Matemática na EJA deve visar à construção da cidadania e à constituição
do aluno como sujeito da aprendizagem.
Perguntado se o processo de ensino-aprendizagem da Matemática deve ser
compreendido de forma diferenciado no universo da EJA em relação às outras modalidades
da Educação Básica, IRE responde que “Não” justificando “pois os alunos da EJA
devem ser inseridos no contexto sem distinções de qualidade” (Q2-2). Voltando a
reafirmar essa questão ao tratar: “Também não. Eu acho que a mesma coisa, da mesma
forma, porque se fala em qualidade. Então não deve ser mudado nada. Deve ser
buscado adequação para as coisas. Se o aluno perdeu o conteúdo, então, deveria se
buscar uma forma desse aluno também conseguir aquilo ali, ” (E-36).
Percebemos aqui, que ao responder não ser necessário que o processo escolar
da Matemática na EJA seja diferenciado em relação aos outros segmentos do ensino
regular, IRE se refere ao fato de que os conteúdos matemáticos na EJA não devem ser
contemplados diferentemente das demais modalidades educacionais. Ou seja, remete-se à
idéia de que a estrutura curricular da Matemática na EJA quanto nos outros segmentos da
Educação Básica é a mesma, e assim deve ser sem distinções, independente de que
segmento da educação seja o educando.
151
Ao se referir à questão de se buscar adequação para que o aluno da EJA possa
aprender um conteúdo que havia perdido, IRE parece reconhecer que o ensino da
Matemática na EJA deve receber um tratamento metodológico diferenciado em relação às
demais modalidades educativas. Pom, esse aspecto da diferenciação metodológica é
tomado por IRE não em razão das especificidades da EJA, que se justifica, exatamente,
pelo perfil distinto de seus educandos, jovens e adultos na situação de excluídos que foram
do sistema educacional e possuidores de uma riqueza de conhecimentos provenientes de
suas experiências pessoais e coletivas. Mas sim, é justificado somente em razão de que os
educandos não fiquem defasados em termos de conteúdos, demonstrando uma visão
característica do ensino tradicional, no qual cada conteúdo é um elo de uma corrente, um
pré-requisito para o que vai sucedê-lo.
Se referindo ao processo de reclassificação
24
executado em sua escola, que é
realizado segundo o próprio IRE da seguinte forma: “O processo se no primeiro
bimestre. É feita a reclassificação. É no conselho de classe. Os alunos têm que ter um
conceito ‘O’ ou excelente pra ser reclassificado. Se ele tiver O’ ou ‘E’ em duas áreas
de conhecimento, então ele é considerado reclassificado. Ele não precisa ter ‘O’ ou ‘E’
em todas as áreas, mas precisa ter ‘O’ ou ‘E’ em duas das áreas (E-18).
Constatamos junto à Resolução 180/2000-CEE/MT e ao Programa de
Educação de Jovens e Adultos da SEDUC/MT, que ao se referirem ao processo de
reclassificação o estabelecem um período exato em que este deve ocorrer no interior dos
estabelecimentos de ensino da EJA. Apenas destacam que “as experiências e saberes
sociais do jovem e do adulto podem ser sistematizados e referendados pela escola
receptora para efeito de aproveitamento de estudos, decorrendo progressão parcial ou total
de etapa ou segmento para o aluno” (Art. 17 da Resolução 180/2000-CEE/MT). Ou ainda,
uma vez que os alunos comprovem deter as competências e habilidades correspondentes à
fase que cursam, poderão progredir para a fase subseqüente, sem necessariamente ter que
cumprir a carga horária integral prevista para todas as seis fases do Ensino Fundamental e
as três fases do Ensino dio (Programa de Educação de Jovens e Adultos da
24
Processo no qual a escola ao detectar que o seu aluno detém as competências e habilidades
correspondentes à fase que cursa, e que reúne, portanto, condições para avançar em seus estudos, poderá
avaliá-lo e proceder à progressão do aluno na fase subseqüente (MATO GROSSO, 2000). De acordo com o
Regimento Escolar da Escola dos sujeitos dessa pesquisa: “Art. 39 A Reclassificação acontecerá para o
aluno que no decorrer do processo ensino-aprendizagem apresentar conhecimentos, habilidades e
competências além da proposta curricular na Fase em curso. I O aluno será submetido à análise do corpo
docente e pedagógico para fins de reposicionamento (reclassificação), com data marcada no calendário
escolar, sendo em consonância com o Artigo 29, da Resolução n. 150/99-CEE-MT, deverá ser efetuada no
final do primeiro bimestre de cada ano letivo e antes do início do bimestre seguinte”.
152
SEDUC/MT). Desta forma, verificamos que a escola de IRE tem sido pontual ao realizar o
processo de reclassificação apenas no primeiro bimestre, quando poderia realizar esse
procedimento a qualquer momento tomando como referência os princípios expostos acima
pela Resolução 180/2000-CEE/MT e o Programa de Educação de Jovens e Adultos da
SEDUC/MT.
Ao destacar como pontos negativos da reclassificação o fato de que: Ela é
ruim pelo outro lado que o aluno deixa de ver muitas coisas e a escola não tem, como
é que fala? A não ser que o aluno for muito interessado e buscar por fora os outros
conteúdos que ele deixa de ver, entendeu? Então, isso é que é uma coisa assim.
Ainda mais Matemática, se você deixa de aprender, por exemplo, o aluno inicia na
escola, aprende a lição, vamos supor, ai ele pula daquela, daquele processo que seria
subtração, multiplicação e divisão, ele já faz adição, subtração e depois já vai para
a rie seguinte que é aplicação, entendeu? Então, como que ele vai fazer pra
aprender a multiplicação, a divisão ou a potenciação? Se ele pulou, e ele não vai
voltar” (E-32).
Nesse momento, IRE remete-se novamente à preocupação com a questão dos
conteúdos que os alunos acabam o vendo, principalmente em razão da reclassificação,
trazendo à tona mais uma vez a idéia hierarquizada com que os conteúdos de Matemática
devem ser transmitidos no processo de escolarização. Não compreendendo, portanto, a
organização dos conteúdos matemáticos em rede, onde os chamados pré-requisitos para o
desenvolvimento de outros conteúdos seriam substitdos pelos conteúdos
reconhecidamente essenciais à aprendizagem dos educandos.
Nesse sentido, é possível evidenciarmos que IRE se remete, segundo Fonseca
(2005), ao princípio da linearidade com que se deve apresentar os conteúdos matemáticos
aos alunos, ou da necessidade de se vencer completamente uma etapa para passar à
subseqüente.
No entanto, torna-se compreensível por outro lado essa visão de IRE,
principalmente quando se sabe que alguns conteúdos matemáticos se relacionam
precedendo ou se subordinando uns aos outros. O que seria o caso das quatro operações
fundamentais da Matemática, consideradas pelos professores da EJA como essenciais para
a formação matemática dos educandos dessa modalidade.
Nesta perspectiva da relação existente entre as quatro operações básica da
Matemática, Duarte (2005) esclarece que, o conceito de multiplicação é o de uma adição
de parcelas iguais, enquanto que a divisão é uma subtração de parcelas iguais, bem como, a
153
adição e a subtração, e a multiplicação e a divisão, são operações inversas entre si.
Ao se referir ao procedimento da revisão como uma provável solução para
amenizar o problema da perda de conteúdos por parte dos alunos da EJA, e destacar: “São
aquelas revisões que eu falei, sempre você tem que estar voltando com o aluno
porque, olha isso aqui é revisão, que não seria revisão, quer dizer para aquele aluno
que foi reclassificado, para ele não é revisão, tudo que você faz para ele não é mais
revisão. Por mais que você fale revisão, mas não é” (E-32).
Percebemos que IRE demonstra ter uma atitude positiva ao remeter-se à
necessidade de se buscar sempre revisar o conteúdo matemático de modo a possibilitar ao
aluno aprender aquilo que não lhe foi dado, mas que será usado na fase seguinte para a
qual foi reclassificado. Evidenciando ainda, uma situação da qual a revisão que tem
proposto nas salas de aulas da EJA, na verdade não tem se referido apenas a revisar algo
que foi visto, mas muitas vezes tem se configurado de fato como uma oportunidade do
aluno aprender algo que ele havia deixado de estudar ou que jamais viu anteriormente.
Questionado sobre como o processo de ensino-aprendizagem da Matemática
deve ser realizado no contexto da EJA, IRE destaca: “As aulas de Matemática devem
colaborar para que os alunos a utilizem na sua vida prática. Então, eu acho que teria
que ser de forma bem aplicada mesmo” (E-4).
Desta forma, IRE apresenta recorrência em sua concepção quanto à definição
da Matemática com as dimensões utilitária e prática. Aspectos esses, inclusive sugeridos
como reflexão sobre o conhecimento matemático na EJA, por permitir às pessoas resolver
problemas do cotidiano, ajudando-as a o serem enganadas e assim exercerem
efetivamente sua cidadania.
Ao destacar: “Você tem que pegar Matemática, vamos trabalhar com tal
coisa, mas que tal coisa vai se complicando. Você vai trabalhar, por exemplo,
geometria espacial, você pode estar mostrando para o aluno se ele for um empresário
futuro e precisar fazer um tipo de embalagem onde ele precisa ter essa visão que ele
vai pegar isso aqui e usar na vida dele. Então seria um procedimento mais ou menos
assim, de prática” (E-4). E tratar ainda: “Mas ai se ele entendeu que ele precisa é fazer,
por exemplo, um projeto, por exemplo, vai confeccionar uma caixa, ele tem que fazer
um projeto pra depois recortar e fazer essa caixa, entendeu? Então, desta forma a
gente faz, e eu procuro fazer. Mostrar pra eles porque que tem que calcular a área
total, porque que tem que calcular a área lateral, porque é que tem que calcular o
volume” (E-11).
154
Percebemos, que ao desempenhar suas atividades pedagógicas, IRE revela
mostrar ao seu aluno o caráter prático e utilitário da Matemática demonstrando sua
aplicação em alguma atividade específica. No entanto, a forma como IRE procura ensinar
Matemática se referindo à idéia de aplicação do conhecimento matemático não se remete
às atividades próximas à realidade dos seus alunos. Na verdade, IRE remete-se ao ensino
da Matemática através de aulas práticas com recursos didáticos e materiais concretos,
demonstrando sua aplicação não em questões sugeridas pelos alunos, mas escolhidas por
ele próprio. Ou seja, os exemplos dados por ele parecem não resgatar o cotidiano dos seus
alunos, condicionando-se apenas às questões escolares e de conteúdo matemático.
Ao esclarecer ainda, referindo-se à questão sobre o modo como o processo de
ensino-aprendizagem da Matemática deve ser realizado no contexto da EJA, que: “Você
não pode detalhar muito até por questão de tempo, que já ele termina sendo reduzido
e até voltando essa parte, às vezes, o aluno, ele perde nessa questão de querer ser, de
querer fazer tudo rápido, ele termina perdendo e tem uma parte também que a EJA
abre muito espaço, e ai a gente não sabe como que esse aluno procura por trás disso,
preencher o que ele não conseguiu, porque ele adiantou muitas vezes, mas ele não foi
buscar a prática, eu não tenho nada claro como que ele vai estar procurando filtrar”
(E-4).
Além da falta de estrutura e adequação da escola, as salas de aulas com um
número excessivo de alunos, e a falta de pré-requisitos dos educandos para o andamento
das aulas destacados anteriormente como obstáculos para o desenvolvimento do seu
trabalho docente, IRE destaca ainda, outras dificuldades para desenvolver suas aulas como
as questões de tempo, do aluno querer acelerar as coisas, da própria característica de ser da
EJA, e a dificuldade de saber ao certo como o aluno tem procurado sanar a falta de
aprendizagem de alguns conteúdos matemáticos em razão do processo de reclassificação.
Sobre esse último aspecto ligado ao problema da relação aluno e conteúdo,
quando IRE esclarece: “O aluno entra no primeiro ano, e ele é reclassificado pro
segundo, mas ele mesmo no primeiro ano ficou um monte de coisas que não se sabe se
ele vai buscar ou não. Mas ele vai sair da escola daqui um tempo e a gente não sabe
como é que ele vai fazer pra adequar esse espaço que ele perdeu, esse conteúdo que
ele perdeu que não é pouco, é muito. Então ele fica assim, um aluno defasado,
defasado em termos de conteúdo” (E-4).
Percebemos que IRE deixa claro mais uma vez a necessidade se criar
alternativas adequadas para que os alunos não fiquem defasados em termos de conteúdos
155
que não tiveram como aprender, principalmente em razão do processo de reclassificação.
Porém, não explicita o que seria possível fazer, além da proposição de revisões do
conteúdo citadas por ele anteriormente, para se resolver esse problema.
Entre os problemas pautados por IRE para desenvolver o processo de ensino-
aprendizagem na EJA, a permanente tensão entre o tempo disponível e a tarefa de tratar os
conteúdos propostos, e a falta de pré-requisitos dos alunos têm sido apontados também por
outros professores dessa modalidade, conforme pesquisa realizada pela COEJA
(MEC/SEF, 2002a).
Na afirmação: “Nesse caso dos alunos de reclassificação a gente sempre tem
que voltar. Por exemplo, a partir do momento que ele vai pra rie seguinte você tem
que estar sempre voltando com revisões. Às vezes, você fala assim revisão, mas pra
eles não é uma revisão. É o que? É um conteúdo que ele tem que aprender, entendeu?
que essa revisão muitas vezes é muito rápida, então você faz muito rápido e ele ,
termina tendo uma coisa mecânica. Que ele tem que aprender daquela forma
mecânica, que foi bem rápida, não teve como, não teve espaço de mostra pra ele que
poderia não ser mecânico” (E-5).
Notamos que IRE, talvez pelas dificuldades destacadas e por buscar revisar
com freqüência a matéria que supostamente deveria ter sido assimilada pelo educando
como uma forma de amenizar a falta de conteúdo que este acabou perdendo, tem procedido
por meio de um ensino da Matemática de forma mecânica, mesmo não querendo isso.
Nesse sentido, é possível identificarmos ainda, que IRE sempre busca
desculpas para justificar os problemas encontrados por ele para desenvolver suas
atividades docentes, não assumindo que talvez pudesse realizar o seu trabalho de forma
diferente, apesar das dificuldades enumeradas.
Perguntado sobre como costuma regularmente desenvolver suas aulas
independente de ter ou não alunos reclassificados, IRE esclarece: “Aulas de campo,
laboratórios, jogos e aulas expositivas” (Q2-6). Corroborando essa afirmação quando
responde: “Na maior parte são extensivas. Propomos dar aulas de campo, jogos,
laboratório, confecção de materiais ligados a laboratórios (E-6).
Sobre essas questões, diante o fato das aulas de IRE serem extensivas e
expositivas, verificamos que não tem agido diferentemente dos demais professores da EJA
consultados na pesquisa realizada pela COEJA, que revela que os professores apontaram
aulas expositivas e exercícios como as estratégias didáticas utilizadas com maior
freqüência (MEC/SEF, 2002a).
156
O modo como manifesta ensinar Matemática aos seus alunos da EJA reflete
aquilo que acredita ser a melhor forma de se ensinar Matemática nessa modalidade, afinal,
em resposta a que forma voacha que a Matemática deve ser ensinada na EJA, IRE
elucida: “Através de uma metodologia com pratica para que os educandos
concretizem os conhecimentos a serem aplicados” (Q2-4).
Assim, IRE parece recorrer à iia de que a Matemática deve ser ensinada de
modo que o aluno compreenda sua utilidade prática, devendo saber aplicá-la como uma
forma de demonstrar que se apropriou do conhecimento matemático.
Na proposição de aulas de campo, jogos, confecção de materiais e aulas de
laboratório, percebemos serem essas atividades didático-metodológicas as que IRE
acredita favorecer para que os educandos da EJA consigam concretizar os conhecimentos
matemáticos a serem aplicados.
Desta forma, ao considerar importante a utilização de outras atividades
pedagógicas distintas além de aulas expositivas, IRE demonstra preocupar-se em oferecer
aos seus alunos, alternativas que possam contribuir para suas aprendizagens matemáticas.
No entanto, cabe ressaltar que a aprendizagem do aluno não está condicionada aos objetos
e recursos metodológicos, mas sim, na idéia de que a atribuição de significados por parte
dos alunos está ligada principalmente às experiências e aos conhecimentos prévios que
possuem enquanto sujeitos da própria aprendizagem.
Entre as orientações sugeridas frequentemente para se trabalhar com o
conhecimento matemático nas salas de aulas da EJA, IRE expressa utilizar os jogos, não
mencionando o uso de outras possibilidades importantes como o uso da história da
matemática, e das tecnologias da comunicação e da informação.
Ao destacar em diversos momentos grifados por nós, como: “Proporcionar
aos alunos um estado de conquista para o desenvolvimento das atividades e situações
problemas (Q3-3); “Essa avaliação deve ser feita diariamente em sala de aula,
através das atividades e das situações-problemas que você coloca pra que os alunos
desenvolvam” (E-8); “São passadas atividades em sala de aula, então aí você vai
observando na sala de aula mesmo” (E-11); Tem as atividades que a gente propõe,
situações-problemas, laboratórios. [...] Através deste caderno de campo que está
marcado, várias coisas, situações-problemas, atividades, tarefas, exercícios em sala de
aula, exercícios de campo (E-12).
Percebemos que IRE em diversos momentos demonstra trabalhar
frequentemente com resolução de problemas ou situações-problemas em Matemática, que
157
têm se constituído no contexto da Educação Matemática de Jovens e Adultos como um dos
recursos metodológicos mais propícios e eficazes para o desenvolvimento da aprendizagem
matemática.
Questionado sobre quais as causas e/ou motivos que levam o aluno da EJA a
“fracassar” em Matemática, IRE respondeu: “Visão que a Matemática é difícil desde as
séries iniciais” (Q2-7), reafirmando assim, a idéia apontada por professores e alunos da
EJA que o “fracasso” em Matemática é decorrente exatamente por ser essa a disciplina
escolar mais difícil de ser aprendida (MEC/SEF, 2002a).
Ao elucidar que: “É necessário fazer sempre cursos com enfoque próprio
para Educação Matemática” (Q1-7b). IRE revela ser importante que o professor de
Matemática da Educação de Jovens e Adultos procure complementar sua formação
acadêmica buscando se aperfeoar mais quanto às questões envolvendo o contexto da
Educação Matemática.
Sobre esse aspecto, Fonseca (2005) destaca que, é preciso que o professor ou o
pesquisador que atua na Educação de Jovens e Adultos o se descuide da formação
matemática.
b) Algumas considerações sobre as concepções de IRE acerca da Educação
Matemática
Em análise às concepções apresentadas por IRE acerca do processo de ensino-
aprendizagem da Matemática na Educação de Jovens e Adultos nos deparamos em
diversos instantes com pontos de vistas divergentes, em que esse processo, ora é concebido
segundo os pressupostos de um novo modelo educacional, ora é compreendido sob a
perspectiva de uma Matemática fundamentada no modelo tradicional de ensino.
Neste sentido, constatamos que IRE tem se remetido aos ideais de uma
Educação Matemática de Jovens e Adultos na perspectiva de um modelo educacional
inclusivo quando concebe a Matemática com as dimensões prática e utilitária, aplicada às
mais variadas e complexas atividades humanas, constituída como um requisito
imprescindível para que o educando se torne agente da transformação de sua realidade e
possa exercer plenamente sua cidadania.
Ou ainda, quando reconhece, em alguns instantes, que os educandos jovens e
adultos trazem para a escola uma riqueza de conhecimentos provenientes de suas
experiências de vida. Quando procura também, desenvolver suas aulas demonstrando o
158
caráter aplicado da Matemática, propondo ainda, atividades diferenciadas como jogos e
resolão de problemas na tentativa de favorecer a aprendizagem da Matemática de forma
significativa.
E finalmente, quando remete-se à necessidade de se criar alternativas
adequadas para que os alunos da EJA não fiquem defasados em termos de conteúdos em
razão do processo de reclassificação; e reconhece a importância dos professores de
Matemática da EJA buscarem uma formação continuada em Educação Matemática.
Por outro lado, também é perceptível a manifestação de IRE pautada nos
pressupostos de um modelo tradicional e excludente de Educação Matemática ao
desenvolver, no universo da EJA, um ensino da Matemática baseada na concepção
Formalista, realizado de forma mecânica e linear, como se os conteúdos devessem ser
expostos numa seqüência predeterminada e fixa, independente do contexto escolar da EJA.
A perspectiva tradicional de IRE acerca da Educação Matemática de Jovens e
Adultos é percebida ainda, quando não explicita a função formativa da Matemática, se
limita ao entendimento de uma formação básica em Matemática para os alunos da EJA
apenas enquanto pré-requisito para as próximas etapas do sistema escolar.
E finalmente, quando o considera a necessidade de se valorizar o
conhecimento matemático produzido pelos educandos da EJA e o resgate do processo
histórico-cultural desse conhecimento matemático; não toma a bagagem cultural dos
alunos como ponto de partida para o desenvolvimento da aprendizagem matemática; e
remete-se apenas a fatores externos para justificar os problemas encontrados por ele no
desenvolvimento de suas atividades docentes, não se assumindo como elemento essencial
no contexto da sala de aula, e assim, como responsável também pelo sucesso ou fracasso
do processo pedagógico.
Contudo, diante dos significados evidenciados por IRE, é possível
constatarmos que suas concepções de Educação Matemática de Jovens e Adultos transitam
entre as perspectivas da tendência pedagógica tradicional e do novo modelo de educação.
Oscilando muitas vezes entre os ideais de uma formação matemática voltada tanto para o
exercício da cidadania quanto para a preparação dos educandos apenas para as próximas
etapas da escolarização.
5.1.3 – Concepções de Avaliação de IRE
Na afirmativa: “O professor se organiza em função de atividades, e em
159
função dessas atividades ele avalia” (E-30), IRE reconhece o valor da avaliação como
parte inerente do processo de ensino-aprendizagem ao destacar que o professor avalia em
função das atividades que organiza no seu trabalho docente.
Quanto à definição da avaliação escolar, IRE afirma que para ele avaliar em
Matemática na EJA significa: “Verificar o desenvolvimento dos cálculos, regras e suas
aplicações nas situações problemas” (Q3-1). Ou ainda, que: “Seria você verificar se os
alunos conseguem fazer cálculos é claro. Mesmo se não fazer lculos, se eles
conseguem entender fórmulas, e também pensamento matemático” (E-39).
Nesse sentido, IRE revela recorrência no significado atribuído ao papel da
avaliação no processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA.
Percebemos ainda, que ao conceber o processo da avaliação escolar dessa
forma, IRE demonstra remeter-se as idéias de uma avaliação tradicional, voltada apenas
para a aferição do conteúdo aprendido pelo aluno, cujo objeto a ser medido é o resultado
ou o produto final da suposta aprendizagem desse educando sobre um determinado
conteúdo. Que no caso de IRE refere-se ao domínio dos cálculos e das fórmulas
matemáticas.
Segundo os significados atribuídos por IRE acerca do processo avaliativo, é
possível percebermos a concepção de uma avaliação unilateral, cujo foco é exclusivamente
o aluno, e o professor é o único responsável pela função avaliativa. Porém, ao destacar aqui
a avaliação dessa forma, IRE revela certa contradição com a idéia defendida por ele de que
a avaliação é importante para que o professor possa organizar suas atividades pedagógicas.
Ao mencionar o termo verificar, IRE conota um pressuposto da avaliação no
velho modelo, cujo princípio se volta para a pretensão única de apenas saber se o educando
alcançou, e em que grau, os objetivos que se propõe o processo de ensino. Não denotando,
portanto, a partir daí, nenhuma decisão capaz de favorecer para o verdadeiro significado da
avaliação que é possibilitar a aprendizagem e o desenvolvimento dos educandos.
Sobre essa perspectiva revelada por IRE, a avaliação consistiria, segundo
Hadji (2001), na aferição do grau de aproximação entre as aprendizagens do aluno e o
conhecimento tido como uma verdade que deve ser assimilada por esse aluno.
Reconhecendo o esclarecimento de IRE que os conhecimentos matemáticos
essenciais para a formação escolar dos alunos da EJA seriam: “Domínio das regras, dos
conceitos, dos cálculos e utilização das fórmulas (Q2-5). Não é difícil compreendermos
porque para IRE a avaliação em Matemática no contexto da EJA consiste exatamente em
verificar se os alunos conseguem fazer cálculos. Sendo assim, torna-se perceptível a
160
relação existente entre as concepções de Educação Matemática e de avaliação em
Matemática apresentadas por IRE.
Questionado sobre o que avalia em Matemática na EJA, IRE elucida: “O que
eu avalio? Olha, avaliar seria se ele consegue desenvolver as fórmulas, fazer os
cálculos, relacionar isso com aquela situação-problema, com algo que ele tem. Dessa
forma que a gente procura buscar. A maneira que ele consegue jogar isso para a vida
dele. Então, ai sim ele sendo avaliado. Porque se ele tá conseguindo entender que
ele pode usar, por exemplo, aquela caixa ali, que ali existe um volume, existe uma
quantidade de material a ser usado para fazer aquilo ali. Então, eu acho que você está
avaliando a partir do momento que você vê que ele consegue enxergar isso” (E-9).
Desta forma, IRE não reafirma o aspecto da avaliação como verificação
daquilo que o seu aluno consegue fazer em relação aos cálculos matemáticos. Como
acrescenta ainda, que avalia ao tentar verificar se o seu aluno consegue ou não aplicar um
determinado conhecimento matemático na vida dele, ou mesmo, se ele consegue
enxergar” a utilidade desse conhecimento no desenvolvimento de alguma atividade
específica.
Nesse sentido, remetendo-nos à definição de IRE acerca da Matemática, que é
assumida por ele com uma dimensão prática e utilitária, torna-se claro a compreensão de
IRE a respeito de uma avaliação que busca verificar se o aluno consegue aplicar a
Matemática em sua vida e servir-se dela em atividades cotidianas que sugerem seu uso.
Ao mencionar que avalia: “As atividades propostas que são desenvolvidas
em sala de aula ou fora” (Q3-2). E em seguida, ao tratar que: “Aí seria através de
experiências que a gente faz e pode proceder em sala de aula” (E-10), percebemos uma
falta de clareza quanto aos métodos utilizados por IRE, na tentativa de avaliar como os
seus alunos estão conseguindo aplicar os conhecimentos matemáticos em suas atividades
cotidianas.
Perguntado como costuma avaliar, ou seja, como é feita sua avaliação do
processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA, IRE explica: “São passadas
atividades em sala de aula, então aí você vai observando na sala de aula mesmo. Quer
dizer eu não preciso levar, às vezes, a gente até leva o caderno de aluno ou alguma
coisa assim, mas geralmente eu observo o que ele faz em sala de aula. Diariamente
você olha, eu olho o caderno, eu passo atividades e vou percebendo se ele consegue.
Até na confecção do material, eu percebo se o aluno consegue fazer ou não” (E-11).
Neste caso, percebemos que IRE ao realizar o processo da avaliação escolar
161
o esclarece como é que geralmente procede ao avaliar. Reafirmando apenas a questão da
avaliação das atividades desenvolvidas pelos alunos que são aplicadas por ele em sala de
aula. Além de definir a observação diária do que é efeito pelos seus alunos no âmbito da
sala de aula e em seus cadernos como uma forma de coletar as informações que julga
necessário para realizar a avaliação.
Ao tratar a observação como uma forma de avaliar o processo de ensino-
aprendizagem da Matemática, IRE não esclarece como e o que de fato é observado por ele
de modo a contribuir para a sua avaliação. Passando a impressão de que apenas observa,
sem decorrer a partir desta alguma decisão para melhorar suas atividades pedagógicas e
permitir que os educandos tenham uma aprendizagem da Matemática de forma
significativa.
Ao afirmar: “Eu, por exemplo, graças a Deus, tenho uma percepção muito
boa e nas atividades em sala de aula eu termino fazendo a avaliação” (E-7), IRE
parece demonstrar muita confiança ao promover a avaliação escolar através da observação
das atividades desenvolvidas na sala de aula.
Afirmando ainda, que avalia: “Em todos os momentos que a Matemática
possa contribuir para uma visão mais ampliada de mundo” (Q3-4). Reafirmando essa
perspectiva quando elucida: “Eu avalio todos os dias. Todos os dias que eu tenho aula
nas salas eu avalio” (E-14); e “Essa avaliação deve ser feita diariamente em sala de
aula” (E-8).
Percebemos que além de avaliar por meio da observação, IRE demonstra
ainda, proceder através de uma avaliação contínua. Concebendo assim, uma perspectiva do
novo modelo de avaliação, onde a pretensão da avaliação contínua é a de que o professor
esteja atento e ocupado com a apropriação efetiva do conhecimento por parte do aluno.
Porém, IRE não esclarece novamente, se ao proceder através de uma avaliação contínua e
por meio da observação das atividades escolares desempenhadas pelos educandos, remete-
se à tomada de decisão direcionada para a melhoria do processo de ensino-aprendizagem
da Matemática na EJA.
Como instrumentos avaliativos, além da observação, IRE destaca as “Aulas de
campo, jogos, enquetes, debates e etc.” (Q3-5), bem como “Situações-problemas,
atividades, tarefas, exercícios em sala de aula, exercício de campo” (E-8).
Observa-se aqui, que os instrumentos utilizados por IRE para realizar o
processo de avaliação confundem-se com os recursos didático-metodológicos empregados
por ele no ensino da Matemática na EJA. E, portanto, o tem se pautado de uma
162
quantidade considerável e diversificada de instrumentos de avaliação capazes de lhe
fornecer informações pertinentes sobre suas atividades pedagógicas e sobre os percursos da
aprendizagem de seus alunos.
Nesta perspectiva, considerando a ausência de instrumentos avaliativos por
parte de IRE, exceto pela utilização da observação das atividades desenvolvidas em sala de
aula, compreendemos porque IRE ao fazer o registro daquilo que ele avalia, procede
apenas por meio dos “registros que são feitos no caderno de campo (E-12). Ou seja,
uma vez que se avalia por meio da observação e não possui registros sobre os
acontecimentos escolares, é fácil entender porque IRE afirma: “A gente não sabe como
que esse aluno procura por trás disso, preencher o que ele não conseguiu, porque ele
adiantou muitas vezes. [...] Ele vai sair da escola daqui um tempo e a gente não sabe
como é que ele vai fazer pra adequar esse espaço que ele perdeu” (E-4).
Desta forma, percebemos que IRE parece não conseguir desempenhar a função
da avaliação escolar voltada para o diagnóstico do desenvolvimento da aprendizagem dos
seus educandos. Não conseguindo, portanto, detectar quais são as dificuldades do aluno
para redirecionar seu trabalho de modo que consiga auxiliar o aluno para que continue
aprendendo e o fique de fora do processo escolar, incluindo-o e contribuindo assim para
o seu desenvolvimento pessoal.
Ao destacar: “Você chega sempre naqueles que até se interessam mais e
ficam em cima. Então você, por esses você até faz uma análise” (E-7), IRE revela
também avaliar seus educandos quanto às suas atitudes ao se referir à questão do interesse
dos alunos. Percebemos ainda, neste caso, que IRE demonstra uma visão classificatória da
avaliação, esclarecendo que avalia justamente aqueles que se destacam, compreendidos
aqui, pelos que se interessam mais e ficam em cima.
Na avaliação assumida com a finalidade de classificação, o aluno geralmente é
rotulado segundo um padrão definitivamente determinado, podendo está relacionado aos
valores e atitudes, supostamente medidos e observados pelo professor.
No esclarecimento de IRE: É o que eu falei para você, se a sala for com
menos alunos, teria muito mais chances de ter uma visão melhor, fazer um perfil
melhor para o aluno. Como as salas são lotadas, não tem como fazer esse perfil,
mas mesmo assim, dá de ter uma coisa assim, mais ou menos, não cem por cento, mas
uns setenta por cento dessa visão” (E-8).
Percebemos que IRE não demonstra avaliar a turma no geral em detrimento
à prática avaliativa dos educandos individualmente, de modo a propor alternativas mais
163
específicas visando à aprendizagem dos seus alunos. Como dá uma prova de que somente a
observação das atividades desempenhadas pelos alunos no contexto da sala de aula o se
configura em um instrumento avaliativo capaz de revelar informações procias para o
desenvolvimento do processo escolar. E que, portanto, é imprescindível complementar a
avaliação com outros instrumentos de avaliação.
Neste sentido, por mais que IRE esclareça que o processo de reclassificação e
as salas lotadas de alunos dificultam as práticas avaliativas da aprendizagem matemática
dos educandos, percebe-se que ele o tem se apropriado de mais informações sobre outros
obstáculos que geralmente impossibilitam, mas também permitem a readequação do
trabalho pedagógico aos progressos e necessidades de aprendizagem Matemática dos
educandos jovens e adultos. O que seria possível mediante a utilização de vários
instrumentos de avalião e de registro dos percursos escolares desencadeados pelos
envolvidos no processo educacional.
Desta forma, diante da necessidade de se encontrar respostas para as questões
educacionais, é preciso pressupor que a avaliação requer uma grande quantidade de
decisões a serem tomadas, em distintas singularidades de cada situação didática que se
avalia, determinando assim, a imprescindível busca de informações sobre o processo de
ensino-aprendizagem através dos mais variados e diversos instrumentos avaliativos.
Considerando ainda, a questão dos instrumentos de avaliação do processo
escolar, é notável a discussão de IRE a respeito das usuais e tradicionais avaliações tipo
prova ou teste. Ao afirmar que “nas atividades em sala de aula eu termino fazendo a
avaliação e, às vezes, até esqueço de fazer essa questão de prova”(E-7), IRE deixa
transparecer que não costuma avaliar através de provas, reafirmando a questão da
observação das atividades em sala de aula como procedimento mais comum em sua prática
pedagógica e avaliativa.
Os limites e possibilidades da prova como único instrumento de avaliação
também é evidente nas palavras de IRE, principalmente quando destaca que o professor:
Ele pode avaliar até com prova, mas não seria uma única, ou seja, não seria um
único momento para ver. De repente aquele aluno está passando por um momento
difícil na vida dele, não vai conseguir. Nós temos alunos aqui, por exemplo, uma
senhora que entrou em depressão. Agora que faleceu o pai dela, ela deixou de
freqüentar a aula. Então, ela antes desse problema, ela era uma aluna ativa,
freqüente, participativa. Quer dizer então, se fosse fazer uma prova com ela agora,
ela seria o que? Entendeu?” (E-30).
164
Compreendemos aqui, que IRE tem clareza que a prova pode até ser utilizada
como instrumento avaliativo, porém, não deve se constituir como único instrumento de
avaliação do processo escolar. Além disso, ao exemplificar o caso de sua aluna, IRE
parece ter consciência que a prova diz muito pouco sobre a aprendizagem dos alunos, uma
vez que não se tem certeza de aquilo que o aluno expressou na prova corresponde ao se
conhecimento, principalmente porque o se sabe quais são os fatores que estão
influenciando o educando naquele instante da prova. Desta forma, IRE revela uma
concepção inovadora da avaliação ao reconhecer os aspectos negativos das práticas
avaliativas desempenhadas exclusivamente através das provas.
Na afirmação: “Você passa a definir seus alunos por tudo o que ele faz.
Quer dizer, você não vê só o momento dele, só aquele momento dele fazer uma prova,
tirar dez, tirar cinco. Você não sabe, às vezes, nem como que ele tirou aquela nota,
entendeu? E se você está acompanhando, se o professor consegue fazer, organizar as
coisas para que ele tire de cada coisa que ele faz, alguma coisa positiva do aluno, eu
acho que ele está ganhando” (E-31).
Percebemos que a visão de IRE sobre os aspectos limitantes das provas
reconhecendo que estas dizem muito pouco sobre a aprendizagem, e que seus resultados,
geralmente, são falsos e nada refletem sobre o rendimento do aluno é recorrente.
Preferindo assim, proceder à avaliação do processo de ensino-aprendizagem dos seus
alunos através da observão em detrimento à prova.
A crítica à prova como forma de avaliação é novamente enfatizada quando
IRE se remete ao processo de reclassificação que a sua escola havia realizado naquele ano.
Em que ocorreu uma espécie de provão para pré-selecionar os educandos que seriam
posteriormente avaliados pelo Conselho de Classe se tinham ou não condições de serem
reclassificados para a fase subseqüente a que se encontravam. Neste sentido, fazendo um
balanço do processo de reclassificação daquele ano, IRE afirma: Então, eu considerei
que muitos alunos que tinham grande rendimento, por exemplo, na área de exatas, na
prova, ele foi, às vezes, penalizado porque ele não conseguiu” (E-23). Concluindo que o
processo de reclassificação: “Pelo provão achei injusto. [...] O que pesou mais foi a
prova” (E-29).
O fato de IRE remeter-se ao provão como injusto, faz com que percebemos em
sua concepção algumas características da avaliação baseada na perspectiva educacional
inclusiva e, portanto, contrária à dimensão excludente da avaliação escolar.
Principalmente, quando se sabe que as provas e exames têm servido ao modelo tradicional
165
como instrumentos de controle, disciplinamento, ameaça, certificação e classificação dos
educandos, decidindo através da aprovação ou reprovação do aluno, sobre seu destino de
vida, sobre sua exclusão do processo escolar.
Ao se referir ainda, ao processo de reclassificação realizado pela escola
naquele ano como injusto, justificando que: “Achei injusto porque tira toda a
autonomia do professor. Porque o professor, você está ali em sala de aula, você
conhece o aluno, você, você está com ele ali vivenciando o que ele faz, o que não faz e
o que deixa de fazer, o que ele consegue, o que ele não consegue” (E-29).
IRE revela ter uma concepção avaliativa baseada nos ideais da avaliação
processual. Ou seja, uma avaliação que não se limita a acontecer apenas em um
determinado momento de um processo e centrada exclusivamente no produto, mas que
permite o professor acompanhar seu aluno e conhecê-lo, bem como, saber o que ele faz e o
que não fez, reconhecendo quais são suas dificuldades, para tomar decisões direcionadas
para o aprimoramento da sua aprendizagem.
No entanto, é possível ainda, a partir dessa última afirmação e do trecho:
Então ficou uma coisa assim, eu acho assim, que a autonomia do professor deve
prevalecer no processo de reclassificação” (E-30), constatarmos que IRE demonstra
valorizar a idéia de que o professor deveria ser o principal responsável pela a avaliação do
desempenho escolar dos alunos.
Neste caso, mesmo tentando justificar essa iia ao destacar que o professor
tem mais condições de avaliar seus alunos do que o provão realizado para julgar quais
alunos estão aptos a passar pelo crivo do Conselho de Classe na reclassificação, IRE
parece não reconhecer que os alunos, enquanto adultos sujeitos do processo de aprender,
também merecem ser consultados de modo a compartilharem e participarem efetivamente
tanto do processo reclassificatório quanto do processo avaliativo de suas aprendizagens, e
assim, se sentirem estimulados a assumirem a responsabilidade pela própria aprendizagem
e a progredirem em sua escolarização.
Ao esclarecer que: “O erro é o início para busca do acerto (Q3-6), IRE
demonstra uma concepção avaliativa positiva ao interpretar o erro como o caminho para o
acerto, revelando assim, a visão de que o erro também é importante no processo de ensino-
aprendizagem. Desta forma, os erros são tomados como partes dos percursos em situações
de aprendizagem, estimulando, portanto, os professores a compreenderem o que cada aluno
produziu nas soluções apresentadas pelos alunos.
Indagado se acredita que a avaliação em Matemática na EJA deve ser
166
compreendida e praticada de forma diferenciada em relação às outras modalidades da
Educação Básica, IRE respondeu que: Não, pois as situações Matemáticas tanto para o
aluno de EJA são as mesmas que para outros de outras modalidades de ensino” (Q3-
7). Reafirmando: “Eu acho que não. A avaliação, ela em qualquer dimensão é como eu
disse. Eles são pessoas. Então não pode, por exemplo, terem essa distinção de coisas.
Então, que a distinção ai seria por questão etária, mas são pessoas, se são pessoas não
devem ter distinção” (E-35).
Percebemos uma recorrência nas idéias defendidas por IRE quando se referiu à
questão da Matemática na EJA não precisar ser ensinada de forma diferenciada em relação
às demais modalidades educacionais. Desta forma, além dessa visão, é possível
percebermos que IRE acredita que a avaliação escolar independente do contexto escolar e
do público estudantil deve ser praticada do mesmo modo.
Essa compreensão de IRE parece ser válida, principalmente quando se sabe
que a avaliação escolar deve ser uma só, ou seja, uma avaliação comprometida com a
aprendizagem e o desenvolvimento dos educandos, integrada aos ideais de uma educação
inclusiva. Uma avaliação formativa, diagnóstica, contínua, processual, e instrumento de
investigação didática, contrária, portanto, aos aspectos classificatório, seletivo,
disciplinador, punitivo e excludente.
Ao destacar que: “O supletivo, ele tinha uma cobrança, entendeu? Ele era
uma cobrança maior. Hoje a gente assim, que se perdeu essa cobrança, ficou uma
coisa assim, você não tem mais como falar que vai reprovar aluno, você não tem.
Antigamente, ainda você tinha um caminho que falava, tipo ohh, quer dizer, o aluno
tinha que ser mais persistente antes. Hoje ele não é mais persistente, porque ele já, eu
acho que pelo conhecimento dele, ele já sabe que não vai ficar na série, ele já tem essa
idéia” (E-42).
Além da discussão sobre a prefencia de IRE pelo antigo ensino supletivo ao
invés da EJA, estabelecida na análise sobre suas concepções de Educação de Jovens e
Adultos, percebemos aqui, que essa preferência não estaria pautada apenas na questão da
flexibilização da organização escolar, dos tempos e espaços de aprendizagem propostas
para a EJA, mas principalmente, na utilização da avaliação como ferramenta disciplinadora
e autoritária por parte da escola e do professor nos tempos do ensino supletivo, como o
próprio IRE define.
A cobrança para que os alunos assumissem o suposto compromisso com a sua
aprendizagem e também com a sua escola era exercida, segundo IRE, através da
167
possibilidade da reprovação dos alunos.
Diante de tal revelação manifestada por IRE, é possível percebermos em sua
concepção traços de uma visão excludente da avaliação escolar, cujo propósito estaria
condicionado à ameaça e ao disciplinamento dos alunos pelo medo da reprovação. Neste
caso, portanto, a avaliação como instrumento de promoção do aprendizado e
desenvolvimento dos educandos não estaria nos planos de IRE.
Ao manifestar que “a escola deveria repensar o seu plano pedagógico, todo
ele. Mesmo havendo reclassificação, havendo os relatórios, tudinho. Ela deveria
repensar e de repente mudar essa questão de ser por área, porque por área termina,
você sabe bem que termina o aluno nunca vai ser reprovado. Se ele pode, tem que
ter duas áreas negativas para ele reprovar, então, dificilmente isso vai acontecer” (E-
43).
Percebemos que IRE evidencia novamente uma atitude negativa de se poder
reprovar o aluno, demonstrando assim, uma postura avaliativa classificatória, punitiva,
autoritária e disciplinadora como fontes de argumentação para se alterar a proposta
educacional da EJA no âmbito da sua escola, que atende exclusivamente essa modalidade.
Não compreendo, portanto, a avalião como diagnóstico do processo de ensino-
aprendizagem para corrigir e readequar o percurso escolar, melhorando o ensino e
impulsionando a aprendizagem dos educandos.
c) Algumas considerações sobre as concepções de IRE acerca da avaliação
Em análise às concepções reveladas por IRE sobre a avaliação escolar é
possível evidenciarmos as mais distintas e contraditórias visões de uma prática avaliativa,
por vezes excludente, mas também incorporadas sob a perspectiva inclusiva.
Deste modo, o velho modelo avaliativo é revelado por IRE quando demonstra
conceber a avaliação escolar apenas para a aferição do conteúdo aprendido pelo aluno e
para verificar aquilo que o aluno consegue fazer em relação aos cálculos matemáticos, não
denotando nenhuma decisão capaz de favorecer para o verdadeiro significado da avaliação
que é possibilitar a aprendizagem e o desenvolvimento dos educandos.
Ou ainda, quando não demonstra clareza quanto aos métodos utilizados para
avaliar seus alunos e nem como é que geralmente procede ao avaliar. Quando se refere
apenas à observação como instrumento de avaliação, não se pautando assim, de uma
quantidade considerável e diversificada de instrumentos avaliativos; demonstrando
168
também uma concepção avaliativa classificatória ao avaliar somente os alunos que se
interessam mais ou que o procuram com maior freqüência.
E finalmente, quando se submete a avaliar a turma no geral em detrimento à
avaliação individualizada dos educandos; quando não desempenha a função da avaliação
escolar voltada para o diagnóstico do desenvolvimento da aprendizagem dos seus
educandos; quando não reconhece que os alunos, enquanto adultos sujeitos do processo de
aprender, também devem participar do processo avaliativo; e quando, referindo-se ao
ensino supletivo, remete-se à avaliação como ferramenta disciplinadora, autoritária e
punitiva para forçar os alunos a estudarem em decorrência da possibilidade da reprovação
escolar.
A visão de IRE de uma avaliação fundamentada nos pressupostos do novo
modelo é percebida também quando ele reconhece o valor da avaliação como parte
inerente do processo de ensino-aprendizagem; quando procede através de uma avaliação
contínua e processual, e também por meio da observação; quando reconhece o erro como
um caminho para o acerto e como elemento importante no processo de ensino-
aprendizagem; e quando reconhece que a prova pode até ser utilizada como instrumento
avaliativo, porém, não deve se constituir como único instrumento de avaliação do processo
escolar, uma vez que o diz muito sobre a aprendizagem dos educandos e sabe que seus
resultados geralmente são falsos e nada dizem sobre o rendimento dos alunos.
Contudo, ainda que IRE desempenhe em alguns momentos a avaliação do
processo de ensino-aprendizagem de forma tradicional, também pratica a avaliação
baseado nos princípios do novo modelo avaliativo, mesclando nas suas práticas avaliativas
características tanto inclusivas quanto excludentes. Desta forma, é possível dizer que as
concepções avaliativas de IRE transitam entre o velho e o novo modelo de educação.
5.1.4 – Possíveis interfaces entre as concepções de EJA, Educação Matemática e
Avaliação reveladas por IRE
Ao analisarmos os significados atribuídos por IRE sobre o universo da
avaliação do processo de ensino-aprendizagem da Matemática na Educação de Jovens e
Adultos, é possível percebermos em diversos momentos que as concepções de IRE sobre
cada uma das temáticas constituintes desse universo, de um modo ou de outro, acabam se
relacionando entre si.
Desta forma, percebemos que quando IRE demonstra ter uma visão mais
169
inclusiva sobre a EJA e remete-se a iniciativa de desenvolver um trabalho diferenciado em
razão das especificidades dessa modalidade; demonstrando ainda, reconhecer a faixa etária
e a situação de excluídos do seu público que retornam à escola com os ideais da inserção
social, essa concepção acaba influenciando as perspectivas de IRE sobre a Educação
Matemática e a avaliação no processo escolar na Educação de Jovens e Adultos.
Neste sentido, encontramos nas palavras de IRE a iniciativa de uma
Matemática concebida como imprescindível para o exercício da cidadania, aplicada às
mais variadas e complexas práticas humanas. Uma ferramenta de utilidade inquestionável e
imprescindível para facilitar as atividades cotidianas das pessoas, de modo a
transformarem a sua realidade.
No mesmo caminho, IRE demonstra proceder através de uma avaliação da
aprendizagem matemática de forma contínua e processual, e por meio da observação do
que acontece nas salas de aula. Reconhecendo ainda, o valor da avaliação como elemento
importante no processo de ensino-aprendizagem, bem como, criticando as práticas
avaliativas tradicionais comumente traduzidas através das provas e testes escritos, uma vez
que esses nada dizem sobre a aprendizagem dos alunos.
Por outro lado, quando IRE demonstra manifestar-se em defesa de uma
Educação Básica de jovens e adultos nos moldes do antigo ensino supletivo, enfatizando
uma educação supletiva e compensatória, e com ênfase apenas na preparação dos alunos
para as etapas seguintes do processo de escolarização. Não reconhecendo ainda, em alguns
momentos, o perfil distinto dos educandos da EJA.
Verificamos que essa perspectiva baseada num velho modelo de EJA, acaba
restringindo o processo de ensino-aprendizagem da Matemática desempenhado por IRE ao
mito da linearidade dos conteúdos matemáticos, apresentados de forma mecânica e com
ênfase no domínio de regras e fórmulas. A formação básica em Matemática para os alunos
da EJA acaba sendo compreendida apenas enquanto pré-requisito para as próximas etapas
do sistema escolar. E a bagagem cultural trazida para a escola pelos alunos da EJA o é
tomada como ponto de partida para o desenvolvimento da aprendizagem matemática.
Do mesmo modo, seguindo as concepções de IRE de uma EJA enquanto
educação compensatória e baseada no ensino supletivo, a avaliação escolar acaba sendo
interpretada por IRE de forma unilateral, voltada apenas para a aferição do conteúdo
matemático aprendido pelo aluno. Não desempenhando a função de diagnosticar o
desenvolvimento da aprendizagem dos seus educandos, e não denotando nenhuma decisão
capaz de favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento dos educandos. Assumindo-se
170
ainda, como classificatória, disciplinadora, autoritária e punitiva no sentido de IRE preferir
o ensino supletivo em detrimento da EJA exatamente pela possibilidade de se reprovar o
aluno.
Em razão das considerações expostas, além de constatarmos que as concepções
reveladas por IRE acerca da Educação de Jovens e Adultos, da Educação Matemática e da
Avaliação estão ligadas entre si, uma influenciando a outra; é possível notarmos, que essas
concepções de IRE têm oscilado entre as perspectivas inclusiva e excludente, mesmo que
acabem pendendo um pouco para uma perspectiva ou outra. Sendo assim, as concepções
de IRE sobre a tríade EJA, Educação Matemática e avaliação, não só se relacionam entre
si, como também, transitam entre as tendências do velho e do novo modelo de educação.
5.2 Professor DAM
O professor DAM, em relação aos sujeitos dessa pesquisa, é o que tem um
período médio de atuação docente na Educação de Jovens e Adultos. Também é o que
possui maior experiência como professor e o que se licenciou a menos tempo em
Matemática. Além disso, é o único que exerce outra função fora a docência, atuando como
técnico em gestão pública. Começou a atuar na EJA na mesma época em que passou a
lecionar a disciplina de Matemática, e neste caso sempre trabalhou na Escola Professora
Emília Figueiredo. Além de lecionar nessa escola, também atua em um anexo da mesma
que funciona no campus da UFMT em Cuiabá.
5.2.1 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos de DAM
Na definição da Educação de Jovens e Adultos “como um processo de
aprendizagem da formação de jovens e adultos que objetiva a educação integral do
educando” (Q1-1).
Percebemos que DAM demonstra reconhecer que a EJA remete-se a uma
modalidade educacional voltada para a formação escolar de um público formado por
jovens e adultos. Porém, não esclarece que a EJA é uma modalidade específica
reconhecidamente constituída para atender uma clientela distinta, composta de jovens e
adultos sim, mas com o agravante de excluídos do processo educacional quando crianças
171
ou adolescentes, que (re)tomam sua vida escolar com expectativas e demandas bem
diferentes dos estudantes que freqüentam o ensino regular.
Ao destacar que “na realidade a EJA veio para reparar uma falha da
Legislação Básica do ensino e visa dar uma nova oportunidade aos alunos na faixa
etária de 17 anos” (Q1-3). E reafirmar que na verdade a EJA veio para reparar uma
falha desse processo da legislação” (E-2); “veio apenas com a oportunidade de estar
assim contemplando um aluno numa faixa etária que envolve acima dos dezessete
anos” (E-3); “além que eu sou da opinião de que a EJA de modo geral veio para
reparar uma falha na legislação, só isso” (E-19).
Notamos que DAM parece acreditar na perspectiva de que a EJA foi criada no
sentido de possibilitar uma nova oportunidade àqueles não puderem freqüentar a escola na
idade própria, e assim reparar um problema decorrente dos próprios males do sistema
público regular de ensino que condicionaram a exclusão desses educandos do processo de
escolarização quando crianças e adolescentes.
Nesse sentido, DAM demonstra conceber a idéia na qual a EJA é uma
representação de uma dívida social não reparada para com os que não tiveram acesso e
nem donio da escrita e leitura como bens sociais, na escola ou fora dela. Ou ainda, como
e reparação de uma realidade historicamente marcada pela desigualdade e exclusão social
provocadas muitas vezes pelas práticas de um sistema escolar excludente.
Em relação à faixa etária atendida pela EJA, DAM demonstra desconhecer que
essa modalidade não estaria apenas voltada aos educandos acima dos 17 anos de idade,
mas também compreende a faixa etária a partir dos 15 anos, organizando-se no
atendimento do Ensino Fundamental e Médio com idade superior a 14 e 17 anos
respectivamente.
Questionado sobre qual o papel da EJA no contexto sócio-educacional, DAM
elucida: “É a preparação do jovem e adulto para o mercado de trabalho e convívio na
sociedade para dela se servir” (Q1-2). Destacando ainda: “É se preocupar e preparar o
aluno para ingressar numa carreira de trabalho, servir a sociedade” (E-3); Então eu
acho que a EJA tem que estar direcionada para o mercado de trabalho, que é o
objetivo dela, obrigação maior dela é essa” (E-5).
Dessa forma, é possível percebermos que DAM parece conceber que a EJA
deve se voltar principalmente a uma formação escolar dos seus educandos para
ingressarem no mercado de trabalho, bem como, para uma formão direcionada para a
participação destes na sociedade.
172
Nesta perspectiva, DAM parece remeter-se à função equalizadora da EJA,
relacionada ao objetivo de se favorecer o acesso e a permanência dos educandos jovens e
adultos na escola para que possam se inserir no mundo do trabalho e na vida social.
Ao se referir à idéia da EJA preparar o aluno para o convívio social e servir à
sociedade, DAM revela compreender o caráter da inclusão social dos educandos dessa
modalidade em função do acesso ao mundo letrado proporcionado pela escola.
Na discussão que o objetivo maior da EJA deve ser a qualificação dos
educandos para o mercado de trabalho, DAM demonstra conceber essa modalidade com os
princípios da educação funcional, voltada principalmente para o treinamento e a
capacitação de mão-de-obra.
Na questão com que objetivo acredita que seus alunos procuram a EJA, DAM
esclarece: “Como uma oportunidade para conseguir uma colocação de emprego no
mercado” (Q1-5). Reafirmando esse aspecto em diversos instantes: “Os alunos m pra
escola só com o objetivo de conseguir uma colocação no mercado de trabalho. A gente
tem observado isso. Esse objetivo deles é porque não tiveram oportunidade e eles
vêm com esse objetivo de preparar eles pra conseguir um emprego” (E-1); “Que eles
têm que ter é a preparação e ter a possibilidade de conseguir um emprego, pois a
maioria, você pode ver, vem aqui com esse objetivo. Ninguém vem aqui porque: Ah,
eu quero apenas adquirir um conhecimento porque não tive oportunidade’. [...] A
maioria deles querem emprego. Porque hoje se sabe que o mercado está uma
competição. [...] Então isso caracteriza bem que o objetivo dele é este, e a competição
que está é essa, e o aluno tem que se qualificar mesmo, não tem jeito”(E-2); “Você
pode entrevistá-los, até fazer enquête com esses alunos perguntando: E você veio,
voltou e tal, teve um tempo, mas qual é o seu objetivo? Ele vai falar que tem que se
preparar para conseguir um emprego. É isso aí, a maioria fala isso” (E-19).
Dessa forma, percebemos que DAM é recorrente quanto à perspectiva de que
os educandos procuram a EJA com o intuito principal de conseguir um emprego e de se
qualificar para o mercado de trabalho em razão da competitividade existente; que o
interesse maior é com a preparação para o mundo trabalho e não para a possibilidade de se
apropriar dos conhecimentos básicos dos quais não tiveram oportunidade de ter em função
da exclusão do processo escolar.
Nesse sentido, é possível percebermos porque DAM acredita tanto que a
obrigação principal da EJA deve ser a formação dos educandos para o mercado de trabalho
e a qualificação profissional.
173
Destacando que a EJA deve se propor a uma: “Formação integral na 1
a
fase
para uma base sólida teórica de conhecimentos e uma 2
a
etapa profissionalizante”
(Q1-6). Elucidando ainda: “Seria assim, em duas etapas, na primeira etapa seria o
conteúdo, visando à formação teórica; e na segunda, a prática” (E-1); “Eu acho que a
EJA tem que ter sua estrutura voltada para um conhecimento mínimo teórico, um
embasamento teórico direcionado para esse mercado de trabalho. Em Cuiabá o
setor terciário é o que predomina, o comércio, então tem que ter conteúdo voltado
para preparar para inseri-lo nesse mercado. Porque não adianta, eles vão para o
vestibular, concorrer com pessoal do Ensino Fundamental que vem com uma
formação ao longo do tempo. Eu não vejo condições nessa finalidade, pois muitos
poucos tentam atingir esta meta” (E-2); “Tem que ter um conteúdo básico na
primeira etapa, e depois tem que direcionar. Por exemplo: se é escritório, se vai
trabalhar como assistente, auxiliar, se é informática, então a escola tem que se
adequar. Então vamos preparar, como tem umas aí, como o SESC, SENAC, que
preparam eles para o mercado de trabalho” (E-5).
Percebemos que DAM parece ser enfático em tratar a EJA como uma
modalidade educacional profissionalizante e funcional, voltada praticamente à qualificação
e ao treinamento de mão-de-obra para o mercado de trabalho.
Nesta perspectiva, apesar de querer justificar essa situação devido aos
interesses dos educandos em participarem do processo educacional da EJA, DAM
demonstra que a formão escolar deve ocorrer em dois momentos, o primeiro com ênfase
nos conhecimentos escolares básicos, e o segundo direcionado à profissionalização em
uma determinada área de trabalho.
Assim, DAM revela que a EJA deve se propor exatamente a uma formação
profissional e não voltada para aquilo que acha que tem acontecido, ou seja, direcionada à
preparação dos educandos para as outras etapas da escolarização, como seria o caso do
ingresso no ensino superior mediante aprovação no vestibular.
Nesse momento, DAM parece o compreender o verdadeiro significado da
EJA como uma modalidade educacional instituída com as funções reparadora,
equalizadora e qualificadora, como uma promessa de efetivar um caminho de
desenvolvimento onde os jovens e adultos poderão atualizar conhecimentos, mostrar
habilidades, trocar experiências e ter acesso e condições plenas para participar da
sociedade.
Dessa forma, DAM parece mesmo é acreditar na perspectiva de uma EJA
1
74
confundida como um curso técnico-profissionalizante, onde geralmente o importante é o
treino para o desenvolvimento de habilidades estritamente técnicas, e os conteúdos
transmitidos referem-se a um conjunto de informações, regras e técnicas voltadas à
instrução.
Desse modo, DAM parece compreender a EJA segundo alguns dos princípios
da tendência tecnicista pedagógica, em que a educação escolar, conforme Fiorentini
(1995), teria a finalidade de preparar e integrar o indivíduo à sociedade, tornando-o capaz e
útil ao sistema de produção capitalista, onde as relações trabalhistas são significativas.
Na afirmação de que: “A EJA não prepara o aluno para o mercado de
trabalho, prepara para ingressar na universidade e não para exercer uma profissão.
Então os alunos terminam que vão terminar e não vão avançar mais, vão parar o
estudo que foi apenas para adquirir aquele conhecimento, mais que não vão colocar
isso em prática, ainda mais em termos de ter uma profissão futura” (E-18).
Percebemos novamente que DAM parece ser recorrente quanto à iia de que a
EJA deve oferecer uma formação escolar direcionada à preparação dos educandos para o
mercado de trabalho.
Neste caso, DAM parece ainda, acreditar que a EJA somente tem preparado os
alunos para prestarem um vestibular e tentarem o ingresso no Ensino Superior, quando na
verdade deveria qualificá-los para conseguirem um emprego.
Assim, notamos que DAM é crítico à forma como acredita que a EJA tem sido
desempenhada, principalmente por achar que o educando dessa modalidade vai acabar não
ganhando em nada com a formação que ela tem oferecido, já que seu interesse maior não é
ingressar na universidade, mas conseguir uma colocação no mercado de trabalho.
Ao se referir ao seu aluno da EJA como: Na sua maioria um aluno sem a
base de formação necessária, com enormes dificuldades de aprendizagem, articulação
e compreensão dos problemas” (Q1-4); “Aluno muito tempo fora e não tem aquele
embasamento, vem despreparado, com uma enorme dificuldade” (E-2); “A maioria
não tem embasamento, vem o problema, é cansaço, tem que trabalhar e estudar”
(E-3); “Aluno que já vem desmotivado, vem cansado. É o aluno que não entendeu e
voa em algum assunto. Então eles vêm aqui com toda essa deficiência de assimilação”
(E-7).
Percebemos que DAM remete-se aos seus educandos jovens e adultos
principalmente como alunos com defasagem escolar e dificuldades de aprendizagem em
razão de estarem afastados do processo educacional há algum tempo e também pela
175
jornada dupla que levam como trabalhadores e estudantes.
Neste caso, pode até parecer que DAM reconha qual é a clientela da EJA.
Mas também, é possível perceber que ele pareça não compreender que numa modalidade
educacional como a EJA é natural a presea de alunos com dificuldade de aprendizagem e
sem alguns conhecimentos escolares básicos, principalmente quando estes são educandos
trabalhadores e de escolaridade incompleta que retornam para a escola.
Assim, ao destacar quem são seus alunos, pode-se perceber que DAM deixa de
explicitar ou mesmo de reconhecer que seus educandos, apesar das limitações e
dificuldades em aprender, também são agentes culturais e sujeitos da própria
aprendizagem, bem como, portadores de uma bagagem cultural e de conhecimentos
prévios.
Nesse sentido, DAM traz à tona ainda, um fato que tem sido bastante
questionado por grande parte dos professores da EJA, ou seja, a visão de que a falta de
base de conhecimentos dos alunos têm se constituído um dos problemas sérios no
desenvolvimento das práticas pedagógicas nessa modalidade.
Na afirmação: “Muitos deles não conseguem, são poucos que vão conseguir,
quando chegar ao Ensino Médio, após concluir o primeiro, daí para frente são poucos
que conseguem dar continuidade, pois os demais eles não conseguem porque tem que
ter uma preparação mais adequada, aí eles não têm a base” (E-4).
Percebemos que DAM não retoma a questão da falta de base de
conhecimentos por parte do educando da EJA, como também, parece conceber que em
decorrência dessa situação muitos desses educandos não conseguirão prosseguir no
processo de escolarização.
Dessa forma, é possível percebermos que DAM parece acreditar que parte dos
alunos jovens e adultos o conseguirá concluir a Educação Básica, e assim permanecerão
nas mesmas condições em que se encontram, ou seja, com a escolarização incompleta.
a) Algumas considerações sobre as concepções de DAM acerca da Educação de
Jovens e Adultos
Analisando os significados revelados por DAM acerca da Educação de Jovens
e Adultos, é possível percebermos que nas suas concepções aparecem alguns aspectos
típicos tanto da tendência do velho quanto do novo modelo de EJA.
Nesse sentido, DAM parece revelar algumas características do novo modelo de
176
EJA quando parece acreditar na perspectiva de que essa modalidade representa ao mesmo
tempo a reparação de uma dívida social e também a possibilidade de uma nova
oportunidade para àqueles que não tiveram como se apropriar dos bens proporcionados
pela escola e foram condicionados por isso à exclusão social.
Da mesma forma, DAM parece conceber a EJA de acordo com os princípios de
um novo modelo educacional quando remete-se à função equalizadora dessa modalidade,
destacando a iniciativa de se formar os educandos jovens e adultos tanto para a inserção no
mercado de trabalho quanto para participarem efetivamente da sociedade.
os aspectos característicos do velho modelo de EJA parecem se fazer
presente nas concepções de DAM quando parece enfatizar a iia dessa modalidade como
uma educação profissionalizante e funcional, voltada quase que exclusivamente à
formação escolar baseada na qualificação e no treinamento dos alunos para o mercado de
trabalho.
Nesta perspectiva, o velho modelo de EJA parece se evidenciar ainda, quando
DAM demonstra conceber essa modalidade de acordo com alguns princípios da tendência
tecnicista pedagógica; bem como, quando a trata como se fosse um curso técnico-
profissionalizante, defendendo a necessidade de uma formação escolar com a discussão de
alguns conhecimentos básicos no primeiro momento, e num segundo instante o
desenvolvimento de algumas habilidades específicas direcionadas à profissionalização do
educando em uma determinada área de trabalho.
Diante dos significados revelados por DAM, percebemos que suas concepções
de EJA m se pautado principalmente pelo paradigma do velho modelo de educação do
que pelos pressupostos do novo modelo educacional de EJA. Isso porque, é possível
percebermos que suas idéias acerca dessa modalidade parecem estar voltadas praticamente
para os princípios da educação funcional ou profissional, quase que exclusivamente
direcionadas à qualificação e ao treinamento dos educandos para ingressarem no mercado
de trabalho.
Dessa forma, por mais que, em alguns momentos pareça revelar algumas
características do novo modelo de EJA, percebemos que DAM parece não atribuir outro
significado a essa modalidade a não ser o caráter exclusivo da preparação dos educandos
para a conquista de um emprego.
Assim, numa atitude reducionista ao enfatizar o papel funcional da EJA, DAM
parece não compreender que a significância dessa modalidade é superior a essa
perspectiva, se instituindo não apenas com a possibilidade de favorecer inclusive a
177
inserção dos educandos no mundo do trabalho, mas principalmente, de proporcionar que
esses educandos também tenham acesso e condições plenas de participação na sociedade,
que possam se desenvolver e transformarem a sua realidade, marcada pela desigualdade e
exclusão social.
Contudo, em razão dessas considerações, entendemos que as concepções de
EJA reveladas por DAM parecem estar compreendidas principalmente segundo os
pressupostos do velho modelo de Educação Básica de jovens e adultos.
5.2.2 – Concepções de Educação Matemática de DAM
A Matemática na EJA é definida por DAM “como uma oportunidade de
realizar as operações e problemas do dia-a-dia, através do conhecimento e
capacitação” (Q2-1).
Assim, é possível percebermos que DAM parece conceber a Matemática no
contexto da EJA com o caráter funcional, dirigida às atividades matemáticas e à solão
dos problemas cotidianos.
Dessa forma, percebemos ainda, que DAM parece remeter-se à Matemática
com o valor prático e utilitário, como uma ferramenta eficaz que permite às pessoas
resolver problemas do cotidiano.
Nesse sentido, DAM deixa de destacar que a Matemática deve ainda
transcender os aspectos práticos, contribuindo também para o desenvolvimento do
raciocínio, da lógica e da coerência, ou seja, não se remete ao papel formativo das
atividades matemáticas.
Sobre a importância do ensino da Matemática na EJA, DAM esclarece que
essa: É de fundamental importância para a realização das operações e resolução dos
problemas diários de sua vida prática” (Q2-3).
Desse modo, DAM parece reafirmar os aspectos prático e utilitário da
Matemática, bem como, seu caráter funcional, destacando a importância do seu ensino aos
educandos jovens e adultos em função da sua aplicação na tentativa de solucionar os
problemas que as pessoas se defrontam no dia-a-dia.
Questionado sobre a forma como acha que a Matemática deve ser ensinada na
EJA, DAM elucida: “Idêntica ao Ensino Fundamental, porém com o conteúdo
condensado que permita ao aluno possuir o conhecimento específico necessário” (Q2-
4). Esclarecendo também: “Aí é o seguinte, tem que estar com um conteúdo, por
178
exemplo, é preparando o aluno, como vamos supor, para o cálculo de porcentagem,
que tem que ter a prática, porque se é técnico. [...] Então a Matemática ia colocar
um conteúdo e ia trabalhar juntamente com outra disciplina, preparando o aluno
para poder exercer aquela função. Se é, por exemplo, comércio, então ele ia ver
mais a questão relacionada ao comércio, fazer cálculo de porcentagem. Então a gente
ia trabalhar no sentido de preparar mesmo para poder desempenhar sua função” (E-
6).
Percebemos na primeira afirmação, que DAM demonstra de certa forma
acreditar que o ensino da Matemática na EJA deve ser desenvolvido diferentemente em
relação à organização e ao desenvolvimento dos conteúdos que são trabalhados no Ensino
Fundamental.
Neste caso, DAM parece esclarecer que o conteúdo matemático ensinado na
EJA deve ser resumido de modo que se torne mais específico na tentativa de atender às
necessidades dos educandos jovens e adultos. Porém, não explicita que conhecimentos
específicos são esses que os alunos devem possuir.
Esse aspecto recaí na discussão da tomada de decisões sobre a seleção e a
organização dos conteúdos matemáticos na EJA, em que os professores muitas vezes
escolhem os conteúdos muito mais em função daquilo que acreditam ser importante do que
aquilo que de fato é significativo para o desenvolvimento da aprendizagem matemática dos
educandos.
Na segunda afirmação, é possível percebermos que DAM parece remeter-se
aos conteúdos matemáticos que acredita ser importante aos educandos da EJA, justificando
a necessidade de se trabalhar alguns desses conteúdos em decorrência da função ou da
profissão que o aluno desempenharia após a formação escolar.
Percebemos que DAM parece conceber que o ensino da Matemática na EJA
deve se voltar à formação escolar dos educandos para entrarem no mercado de trabalho,
qualificando-os para desempenharem uma determinada profissão.
Assim, DAM demonstra que os conteúdos matemáticos na EJA deverão ser
organizados e desenvolvidos de acordo com o tipo de função que o educando está sendo
preparado para ingressar no mercado de trabalho.
Referindo-se aos conhecimentos matemáticos que considera essenciais para
que os alunos das EJA supram suas necessidades básicas de aprendizagem da Matemática,
DAM esclarece: “As operações fundamentais e os conteúdos ensinados voltados para a
preparação de mão-de-obra para o mercado” (Q2-5).
179
Nesse sentido, é possível percebermos que DAM parece não apenas conceber a
organização e o trabalho dos conteúdos destinados à preparação dos educandos para o
mercado de trabalho, mas também, que os próprios conteúdos em si deverão estar voltados
a essa finalidade.
Dessa forma, DAM demonstra que os conteúdos matemáticos significativos
aos educandos jovens e adultos referem-se exatamente àqueles que estão ligados
diretamente à possibilidade de contribuir para a qualificação de mão-de-obra trabalhista.
Nesta perspectiva, notamos que DAM deixa de elucidar que os conteúdos
matemáticos também precisam estar voltados à idéia de permitir que os educandos possam
desempenhar suas atividades cotidianas e desenvolver algumas capacidades intelectuais na
estruturação do pensamento.
Assim, ao enfatizar o ensino de alguns conteúdos que acredita contribuir para o
ingresso dos educandos no mercado de trabalho, DAM parece não compreender que os
conteúdos escolares da Matemática também devem favorecer outras habilidades
importantes para que os alunos da EJA tenham sua participação na sociedade efetivada.
Ainda em relação aos conhecimentos matemáticos básicos para uma boa
formação escolar dos educandos jovens e adultos em Matemática, DAM elucida: “Toda
operação fundamental. o aluno tem que saber tabuada direitinho, pelo menos
realizar as operações fundamentais, que é a adição, subtração, pronto. os
conteúdos seguintes, com um resumo de todos os conteúdos, que é o que eu considero
que é fundamental, que vai dar base teórica para poder resolver outro assunto, outro
conteúdo lá na frente, aí fica bom” (E-9).
Percebemos que DAM, além de valorizar os conteúdos matemáticos aplicados
ao desenvolvimento de determinadas habilidades específicas direcionadas à qualificação
profissional, parece valorizar também as operações fundamentais da Matemática.
Neste caso, percebemos que DAM corrobora com a idéia difundida pela
maioria dos professores de Matemática da EJA de que as quatro operações devem se
constituir como conteúdos básicos na formação escolar dos educandos jovens e adultos
(MEC/SEF, 2002a).
Ao destacar a importância de se desenvolver no ensino da Matemática um
resumo de todos os conteúdos, DAM parece reportar-se à questão da supressão dos
conteúdos e também à sua discussão anterior de que os assuntos devem ser tratados de
forma semelhante ao Ensino Fundamental, porém de maneira condensada.
Ainda, em relação a essa questão, e também com base na afirmação: “Porque
180
a Matemática é um processo acumulativo de aprendizagem onde determinado
assunto (teoria) serve de base para o conteúdo seguinte” (Q2-7). É possível
percebermos que DAM parece acreditar no aspecto da linearidade dos conteúdos
matemáticos, onde cada conteúdo é pré-requisito para o assunto subseqüente. Defendendo
em função disso a necessidade de se tratar todos os conteúdos, mesmo que resumidamente,
como uma forma de garantir que os educandos tenham uma base teórica para a
aprendizagem dos conteúdos subseqüentes.
No questionamento se o processo de ensino-aprendizagem da Matemática na
EJA deve ser ou não diferenciado em relação aos demais segmentos da Educação Básica,
DAM explica que: “Não, tem que ser de forma idêntica, porém o conteúdo tem ser
assim meio resumido, tem que ser condensado. Até porque no Ensino Fundamental é
uma série que você tem um tempo para você estar aprofundando e agora na EJA não.
Também, você tem que ir numa sala de alunos, onde tem aluno que viu aquele
assunto, é repetente; ou às vezes é aluno que vai para outra série, mas ele não tem o
conteúdo básico que é seqüência do outro, é base do outro, e ele fica meio perdido.
Eu acho que tem que ser idêntico, que tem que ser conteúdo assim diferenciado”
(E-8). “Acho que seria igual, idêntico, mas um pouco diferenciado na forma de você
estar passando os conteúdos para eles, que seria mais maneiro” (E-18).
Dessa forma, é possível percebermos que DAM parece acreditar que a
Matemática na EJA não precisa ser necessariamente ensinada de maneira diferenciada,
porém somente os conteúdos devem ser desenvolvidos diferentemente da forma como são
trabalhados no Ensino Fundamental regular.
Neste sentido, as razões explicitadas por DAM para justificar o tratamento dos
conteúdos matemáticos na EJA de forma condensada estaria relacionado à organização do
tempo escolar no Ensino Fundamental regular e ao contexto da heterogeneidade dos
conhecimentos matemáticos dos educandos jovens e adultos em função geralmente do
processo de reclassificação. Neste último caso, a diferenciação no desenvolvimento do
conteúdo matemático na EJA estaria condicionada ao fato de alguns alunos estarem ou não
em um estágio mais avançado do que os demais alunos na sala aula.
Diante desses aspectos e de certo modo, torna-se compreensível a visão de
DAM a respeito dos conteúdos na EJA merecerem um trabalho diferenciado em relação ao
jeito como geralmente são desenvolvidos em outras modalidades da Educação Básica. Isso
porque a forma de estruturação dessa modalidade tem suas particularidades; e também, o
processo reclassificatório o tem atendido à sua finalidade, fazendo muitas vezes, da
181
forma como vem sendo desempenhado, com que as turmas dessa modalidade se tornem
ainda mais heterogêneas, agora não em relação às diferenças entre jovens e adultos,
como também, entre alunos não-reclassificados e reclassificados. Neste caso, segundo os
professores da EJA, é comum ver os alunos reclassificados apresentarem maiores
dificuldades para compreender os conteúdos da etapa da qual foram reclassificados do que
os educandos que não foram, refletindo de certo modo um sistema de reclassificação que
o tem conseguido avaliar as habilidades e competências necessárias para que os
educandos sejam reclassificados de forma coerente e justa.
Nesta perspectiva, ao demonstrar acreditar que o processo de ensino-
aprendizagem da Matemática na EJA não deve ser diferenciado e sim somente a forma de
se trabalhar os conteúdos matemáticos nessa modalidade (devido ao tempo escolar e ao
processo de reclassificação), é possível percebermos que DAM deixa de se referir aos
aspectos distintos do perfil dos educandos da EJA que consequentemente têm definido essa
modalidade com a necessidade de um tratamento diferenciado.
Desse modo, notamos que DAM parece não reconhecer que a caracterização
sociocultural dos educandos da EJA é o marco definidor que torna essa modalidade
educacional diferenciada e com particularidades que obrigatoriamente a instituem com um
modelo pedagógico próprio, concebido para jovens e adultos de escolarização incompleta e
o para crianças e adolescentes que freqüentam o ensino regular.
Ao destacar ainda que: “O pior que eu vejo é o seguinte, porque tem uma
turma, vem aluno de outra turma e assim vai. Quando você entra no conteúdo, aí vem
o aluno que ainda não estudou esse conteúdo, e pronto, você não sabe se avança ou
se você dá o conteúdo. É difícil, você fica sem saber, você não pode avançar porque os
alunos que vieram de outra fase não têm conhecimento desse assunto, e você tem
que uma reciclada, voltar e tal, revisão, para poder ver se os outros conseguem ir
pegando” (E-9).
Percebemos que DAM não se reporta à questão das diferenças de
conhecimento matemático entre os alunos de uma turma, geralmente devido ao processo de
reclassificação, como expõe ainda, que esses aspectos seriam um dos principais fatores que
tem tornado o processo escolar na EJA difícil.
Neste caso, DAM revela ainda que tem tentado por meio de revisões dos
conteúdos matemáticos reverter a situação em que os alunos foram reclassificados e não
têm o conhecimento básico para o desenvolvimento dos assuntos propostos nessa nova
etapa que acabaram de ingressar.
182
Perguntado como costuma ensinar Matemática aos seus alunos da EJA, DAM
afirma: “Através de aula expositiva, aplicação de exercícios, trabalhos e fazendo
comparações com os problemas do cotidiano enfrentados por eles” (Q2-6); “Então
como é que eu trabalho, eu tento colocar o assunto sempre comparando com a vida, o
dia-a–dia. Mas é difícil, a gente encontra enorme dificuldade, você não consegue, você
às vezes usa rios métodos expositivos, comparando e tal, mas o aluno não absorve
isso. Porque ele às vezes está com fome, já vem do trabalho, passa o dia todo lá, não se
alimentou bem, cansaço. Então fica difícil, você tem que trabalhar como? O ideal
seria você colocar todo conteúdo, como é feito normalmente, e eles fazerem,
entenderem a explicação na aula expositiva e depois fazerem os exercícios, porque
Matemática se aprende fazendo. Eu sempre falo pra eles, tem que fazer uma vez,
duas vezes,três vezes, e até brinco com eles que é repetição entendeu, quanto mais
fazer mais você assimila” (E-7).
Dessa forma, apesar de se referir que costuma ensinar Matemática aos seus
alunos da EJA também por meio da resolução de problemas relacionados ao cotidiano
deles, é possível percebermos que DAM tem desempenhado sua função docente por meio
das metodologias de ensino mais tradicionais do contexto escolar.
Ao destacar, por exemplo, que costuma ensinar por meio de aulas expositivas e
aplicação de exercícios, DAM demonstra que tem se utilizado das estratégias didáticas
mais utilizadas pelos professores da EJA consultados pela pesquisa da COEJA (MEC/SEF,
2002a), que sugere ainda, que isso é um indicador de que esses docentes apresentam aos
alunos atividades passíveis de ser resolvidas de forma mecânica e que os problemas,
quando são apresentados, se destinam a aplicar os conceitos ensinados.
Nesse sentido, é possível que DAM também esteja desenvolvendo suas
atividades de ensino da Matemática de forma mecânica e com a apresentação de problemas
descontextualizados da realidade dos alunos, ou mesmo, sendo usados principalmente ao
final da discussão dos conteúdos.
Nesse momento, DAM parece ainda querer justificar o porque geralmente tem
trabalhado dessa forma, destacando que os fatores relacionados às dificuldades dos alunos
em compreender o conteúdo devido às suas condições sócio-econômicas têm condicionado
a sua maneira de lecionar, tornando o seu trabalho difícil.
Percebemos ainda, que DAM parece acreditar que a melhor maneira de ensinar
Matemática na EJA seria explicar os conteúdos de forma expositiva e aplicar
posteriormente exercícios para os alunos fazerem, e que o modo mais eficaz de se aprender
183
Matemática seria, portanto, por meio da repetição dos exercícios propostos.
Assim, é possível notarmos uma concepção de educação matemática por parte
de DAM caracterizada segundo alguns pressupostos do ensino didaticamente tradicional,
onde os conteúdos mateticos são apresentados pelo professor (centro do processo
escolar) através de preleções teóricas no quadro e a aprendizagem do aluno é passiva,
ocorrendo principalmente pela memorização e pela repetição exaustiva baseada na idéia de
que só se aprende fazendo.
b) Algumas considerações sobre as concepções de DAM acerca da Educação
Matemática
Em análise às concepções reveladas por DAM a respeito do processo de
ensino-aprendizagem da Matetica no contexto da EJA, constatamos a existência de
algumas características do velho e do novo modelo de educação matemática nessas
concepções.
Assim, percebemos a presença de alguns aspectos definidores do novo modelo
de educação matemática quando DAM em alguns momentos parece conceber a
Matemática com o caráter funcional e com os valores prático e utilitário, destacando a
importância do seu ensino na EJA em função da sua aplicação na tentativa de solucionar os
problemas que as pessoas se defrontam no dia-a-dia.
A visão tradicional do ensino-aprendizagem da Matemática parece se
evidenciar na concepção de DAM quando parece conceber que essa disciplina escolar deve
ser ensinada na EJA com o objetivo principal de preparar os educandos para o mercado de
trabalho, servindo-se como uma ferramenta aplicada ao desenvolvimento de determinadas
habilidades necessárias à qualificação profissional dos educandos. Deixando, portanto, de
destacar ainda, a importância do ensino da Matemática para que os educandos possam
efetivar sua participação na sociedade e transformar sua realidade marcada pela
desigualdade e exclusão social.
Essa concepção tradicional parece se cristalizar ainda, quando DAM demonstra
o reconhecer a caracterização sociocultural dos educandos da EJA como marco definidor
da necessidade dessa modalidade merecer um tratamento diferenciado; quando parece
destacar o aspecto da linearidade dos conteúdos matemáticos; e principalmente, quando
parece acreditar que se aprende Matemática por meio da repetição e da memorização, e
que uma das melhores maneira de se ensiná-la consiste na exposição oral e no
184
desenvolvimento dos conteúdos na lousa por parte do professor e na aplicação de
exercícios logo na seqüência para que os alunos pratiquem os assuntos abordados.
Sendo assim, diante das considerações expostas, acreditamos que as
concepções de educação matemática de DAM tem se constitdo basicamente pelos
pressupostos do velho modelo educacional, ou ainda, pelos paradigmas do ensino
tradicional.
5.2.3 – Concepções de Avaliação de DAM
Questionado sobre o que é avaliar em Matemática na EJA, DAM elucida que:
“É verificar se o aluno assimilou o conteúdo e o modo de resolver deste problema,
caracterizando assim a aprendizagem” (Q3-1).
Nesse momento, é possível percebermos que DAM parece conceber a
avaliação como uma aferão do conteúdo supostamente aprendido pelo educando, sendo o
foco dessa prática o resultado do conhecimento demonstrado pelo aluno sobre os assuntos
abordados pelo professor na sala de aula.
Nesse sentido, a concepção de DAM parece apresentar uma característica
determinante do paradigma da avaliação tradicional, onde o termo verificar utilizado por
ele denota apenas a idéia de mensuração do produto final da aprendizagem revelada pelo
aluno, não decorrendo a partir dessa medida nenhuma tomada de decisão na melhoria do
processo de ensino-aprendizagem.
Percebemos ainda, que a avaliação definida por DAM parece se centrar apenas
no aluno e no julgamento da sua capacidade em reproduzir o conteúdo que foi transmitido
pelo professor, revelando assim a visão de uma avaliação unilateral.
Ao destacar que avalia com o objetivo de ver: “Se o aluno foi capaz de
solucionar um problema formulado e se aprendeu” (Q3-2) e “Se houve aprendizagem
através da assimilação do conteúdo” (Q3-3). Ou ainda: “Ver que o aluno conseguiu
assimilar aquele conteúdo que foi passado, se ele compreendeu, se ele é capaz de
desenvolver aquele processo. Então, o objetivo é este, se ele conseguiu, então se ele
está apto para poder mudar (E-11).
Notamos que DAM demonstra recorrência no sentido de uma avaliação
centrada no aluno e na medida do conhecimento alcançado por ele em comparação aos
assuntos transmitidos no decorrer do processo escolar.
Neste caso, DAM parece compreender que a avaliação serve apenas para medir
185
o grau de aproximação entre a apropriação dos conteúdos por parte dos educandos e os
conhecimentos discutidos em função do ensino destes conteúdos escolares.
Assim, percebemos que a avaliação praticada por DAM tem sido pontual, ou
seja, tem avaliado apenas para saber se o aluno assimilou ou não o conteúdo.
Demonstrando, portanto, não conceber o ato de avaliar para a reorientação, reformulação e
aprimoramento do processo escolar com o objetivo principal de promover a aprendizagem
e o desenvolvimento dos educandos.
Nesta perspectiva, a avaliação praticada por DAM parece corresponder à
discussão de Lins (1999), que esclarece que a avalião escolar hoje em dia tem servido
predominantemente ao propósito, ainda que o discurso que a acompanha diga que não, que
o que se quer saber é se o aluno aprendeu ou o.
Nos questionamentos relacionados ao modo como costuma avaliar na EJA,
DAM esclarece: “Eu faço assim, eu avalio o aluno assim, não pela resolução correta
dos exercícios, mas pelo interesse, o aluno tem que ter interesse. Primeiro, por
exemplo, assiduidade, se ele tem alguma coisa, pois se ele não produzir fica difícil,
como você vai avaliar. Você não tem os instrumentos, é a prova, o teste, e isso
hoje não é o principal, fica sem utilidade. Então, primeiro é o interesse do aluno,
ele tem que estar fazendo os exercícios, porque ele aprende. É você estar observando
que ele está aprendendo isso. É o mais correto, fora isso, prova não tem jeito” (E-
7). Revelando ainda: Eu avalio o aluno assim, se ele conseguiu compreender, ver que
ele entendeu o modo de resolver aquilo lá. Eu vejo se ele reuniu as condições
necessárias, não preocupo apenas com as questões resolvidas, exatamente com
resultados não, eu avalio mesmo pela assiduidade, participação, se o aluno está
acompanhando, questionando, perguntando, principalmente isso, criticando. [...] O
senso crítico, é outro aspecto que tem que levar sempre em conta. Então eu considero
que o aluno preparado é aquele que desenvolveu aquele conteúdo, realizou as
atividades em sala. Às vezes a gente pega o caderno para dar uma olhada, dar um
visto, para motivar mais, porque o aluno precisa ver que o professor está
interessado, está valorizando o que ele está fazendo e eu vejo se ele conseguiu fazer
isso. Às vezes a gente um teste, uma prova, então apesar de não ter chegado ao
resultado, mas pelo menos desenvolveu ali, desencadeou o processo de como resolver.
Isso aí para mim é o suficiente” (E-10).
Dessa forma, é possível percebermos que DAM tem desempenhado o papel da
avaliação em Matemática na EJA se pautando principalmente na consideração das atitudes
186
dos alunos quanto à participação em sala e à assiduidade.
Nesse sentido, DAM revela que a participação e a assiduidade são aspectos
mais importantes de se avaliar do que os resultados apresentados pelos alunos na resolução
dos exercios aplicados na sala de aula ou mesmo dos resultados decorrentes de provas.
A defesa de DAM quanto à participação e à assiduidade como elementos
significativos no processo avaliativo parece se constituir da idéia básica de que só é
possível avaliar se o aluno produzir, e consequentemente se consegue diagnosticar essa
produção do educando observando sua freqüência e participação na sala de aula.
Percebemos que para DAM a participação do educando é efetivada somente
quando este demonstra fazer os exercícios, ou ainda, quando acompanha e se coloca de
forma questionadora no desenvolvimento das aulas.
Assim, é possível percebermos ainda, que DAM considera como fundamental
os educandos fazerem os exercícios propostos, destacando essa prática como uma condição
necessária na efetivação da aprendizagem matemática.
Diante desse aspecto, notamos que DAM parece acreditar que o educando
revela que aprendeu quando consegue resolver os exercícios e desempenhar outras
atividades relacionadas à aplicação do assunto ensinado, demonstrando assim ter
assimilado o conteúdo. Neste caso, DAM parece revelar que tem se utilizado da prática
freqüente de ensinar um conceito ou procedimento e depois apresentado alguns exercícios
para analisar se os alunos foram ou não capazes de empregar o que lhes foi ensinado,
evidenciando assim uma das características do paradigma do velho modelo de educação.
A questão das provas e testes também é discutida por DAM, que apesar de
utilizá-los, demonstra conceber que esses instrumentos avaliativos não suficientes para
interpretar o verdadeiro significado da aprendizagem dos educandos. Que além destes
também é fundamental observar como o aluno está sistematizando sua aprendizagem
durante o desenvolvimento do processo escolar. Nesta perspectiva, percebemos que DAM
remete-se, de certa forma, a alguns dos princípios da perspectiva do novo modelo de
avaliação.
Ao destacar ainda, em relação ao uso das provas e testes como instrumentos de
avaliação, que o importante não é o educando ter chegado ao resultado, mas tentado
resolver os exercícios propostos, DAM demonstra indícios de que sua avaliação tem se
pautado principalmente em função do processo desencadeado pelos alunos e não se
limitado ao resultado final. Assim, percebemos que DAM remete-se novamente aos
pressupostos do modelo avaliativo contrário à avaliação tradicional.
187
Percebemos que DAM destaca ainda, a importância de se verificar os cadernos
dos educandos, não como uma forma de avaliá-los, mas de motivá-los diante a impressão
que o professor está valorizando suas atividades e seu desempenho durante o processo
educacional.
Ao esclarecer que: “A avaliação não tem um período determinado, ela é
continuamente” (E-15), DAM parece compreender a perspectiva na qual a avaliação não
deve ser terminal ou estanque, ocorrendo somente em momentos específicos do contexto
escolar, mas sim, que deve se estabelecer durante todo processo pedagógico, possibilitando
o professor acompanhar a evolução da aprendizagem dos educandos.
Na discussão de quais instrumentos utiliza na hora de sua avaliação do
processo de ensino-aprendizagem da Matemática, DAM elucida: “Através da resolução
dos exemplos e exercícios e do conhecimento exposto” (Q3-4); “Problemas individuais
e em grupo, pois o aluno somente aprende fazendo, exercitando” (Q3-5); Através da
aplicação das atividades, dos exemplos, dos exercícios e os testes que a gente faz” (E-
12).
Percebemos que DAM não tem se pautado de muitos instrumentos avaliativos
e que basicamente tem se apropriado dos mesmos recursos didático-metodológicos
utilizados na sala de aula no ensino dos conteúdos matemáticos.
Dessa forma, é possível notarmos que DAM o tem diversificado seus
instrumentos de avaliação, e que estes são praticamente os mesmos, mudando apenas de
nome, que todos, de uma forma ou de outra, intensificam apenas a resolução por escrito
de questões direcionadas à aplicação dos assuntos transmitidos pelo professor.
Nesse sentido, percebemos ainda, que DAM é recorrente à iia de que os
educandos somente aprendem Matemática exercitando, fazendo mais e mais exercícios e
repetindo na resolão dos problemas o modelo apresentado pelo professor.
Para registrar o resultado de suas avaliações, DAM explica: “O que eu faço
logicamente são as atividades, recolho as atividades, atribuo às vezes um ponto, dois
pontos. Então eu complemento com a assiduidade e com a participação do aluno,
porque eu considero o fato do aluno que vem todo dia e participa, pois o fato de
estar vindo aqui e tal ele já está aprendendo, ele está vendo” (E-13).
Assim, é possível percebermos que DAM parece conferir pontos às atividades
realizadas pelos alunos, bem como, atribuir pontos também em função da participação e
freqüência dos educandos nas aulas.
Neste caso, notamos ainda, que DAM demonstra recorrência quanto à
188
importância de se considerar a participação e a assiduidade dos educandos como
determinantes no momento da avaliação. Justificando essa sua opinião mediante a
revelação de que esses aspectos por sijá seriam suficientes para garantir a aprendizagem
dos educandos.
Esse argumento, de que basta a presença de um indivíduo no ambiente em que
as informações são expostas para que haja aprendizagem, é destacado por Micotti (1999).
No caso, o autor esclarece que essa crença tem influenciado a rotina escolar, apesar da
prática mostrar que a simples presença na sala de aula não assegura a ocorrência de
aprendizagem.
No questionamento sobre a avaliação dos erros cometidos pelos alunos na
Matemática, DAM explica: “Como uma forma de aprendizagem, pois aprendemos
errando 1 vez, 2, 3, depois 3, 2 e 1 vez” (Q3-6). Revelando assim, conceber o erro como
uma etapa do processo de aprendizagem.
Desse modo, percebemos que DAM parece compreender a perspectiva do novo
modelo avaliativo em relação ao tratamento do erro, considerado uma fonte de informação
essencial capaz de possibilitar ao professor o diagnóstico do processo desenvolvido pelo
aluno na resolução de uma determinada questão.
Questionado se acredita que a avaliação no contexto da EJA deve ou não ser
diferenciada em relação aos outros segmentos da Educação Básica, DAM afirma: “Não.
Deve ser idêntica da Educação Fundamental e Ensino Médio, para proporcionar ao
aluno um conhecimento geral e mais amplo dos conteúdos” (Q3-7); “Eu acho que tem
que ser o mesmo, mas é o que eu falo para você, é muito difícil porque você não pode
pegar um aluno da EJA e pegar outro aluno do ensino regular. O outro detém mais
conhecimento, muito maior do que o outro da EJA. você vai fazer uma avaliação
como? O ideal seria que fosse igual, agora considerando todos esses fatores que eu
mencionei” (E-16).
Aqui, percebemos que DAM, apesar de afirmar que a avaliação na EJA o
necessita ser diferenciada, principalmente porque deve oferecer aos seus educandos os
mesmos conhecimentos transmitidos no Ensino Fundamental e Médio. Por outro lado,
parece acreditar que sim, principalmente em relação às diferenças entre os conhecimentos
dos alunos do ensino regular e dos educandos jovens e adultos.
Neste caso, DAM parece destacar que o ideal seria que o processo avaliativo
fosse o mesmo para todos os segmentos educacionais, inclusive na EJA, porém acreditando
que os educandos dessa modalidade têm menos conhecimentos que os alunos da Educação
189
Básica regular, esclarece que o haveria como avaliá-los da mesma forma.
Diante dessa perspectiva, percebemos que DAM não se remete a outros
motivos mais importantes na diferenciação dos educandos da EJA em relação aos alunos
das demais modalidades educacionais, se limitando apenas à questão dos conhecimentos
revelados por eles, como se isso não fosse algo possível e natural, principalmente quando é
reconhecido que os educandos da EJA possuem um perfil distinto.
Dessa forma, DAM demonstra não reconhecer que a situação de excluídos
socioculturalmente, e as expectativas e demandas em relação à Educação Básica dos
educandos da EJA seriam fatores muito mais significativos de se compreender na
diferenciação dessa modalidade do que as diferenças de conhecimentos desses educandos
em comparação aos alunos do ensino regular.
c) Algumas considerações sobre as concepções de DAM acerca da avaliação
Analisando os significados atribuídos por DAM a respeito do processo
avaliativo, é possível percebermos que os paradigmas do velho e do novo modelo de
avaliação aparecem nas concepções de DAM.
Nesse sentido, constatamos que os pressupostos da avaliação tradicional
demonstram estar presentes nas concepções avaliativas de DAM quando parece conceber o
significado da avaliação como aferição do conteúdo supostamente aprendido pelo
educando ou mesmo como mensuração do produto final da aprendizagem revelada por ele,
o decorrendo a partir desses resultados em nenhuma tomada de decisão na melhoria do
processo de ensino-aprendizagem e no desenvolvimento dos educandos.
Percebemos ainda a presença de alguns pressupostos da prática avaliativa
tradicional nos significados da avaliação revelados por DAM quando parece ser pontual
em suas avaliações, voltando-se apenas ao julgamento se o educando assimilou ou não o
conteúdo; quando parece conceber somente o caráter unilateral da avaliação escolar; e
finalmente, quando demonstra que não tem diversificado seus instrumentos avaliativos.
Também podemos perceber uma postura tradicional na forma de avaliar de
DAM quando parece revelar que tem se utilizado da prática freqüente de ensinar um
conceito ou procedimento e depois apresentado alguns exercícios como uma forma de
avaliação se os alunos conseguem ou não empregar o que lhes foi ensinado.
A perspectiva do velho modelo de educação parece se evidenciar ainda nas
concepções de DAM quando demonstra recorrência sobre a idéia de que os educandos
190
aprendem Matemática exercitando; e quando parece não reconhecer o perfil distinto dos
educandos da EJA e a própria característica particular dessa modalidade como fatores
significativos e determinantes para que seja compreendida e tratada de forma diferenciada
em relação aos outros segmentos da Educação Básica.
Por outro lado, a perspectiva do novo modelo avaliativo parece se fazer
presente nas concepções de DAM quando revela que a participação e a assiduidade dos
educandos nas aulas são aspectos mais importantes de se avaliar do que os meros
resultados decorrentes dos exercícios e provas realizados por eles; quando demonstra
reconhecer as limitações das provas e testes escritos na interpretação da aprendizagem dos
educandos; quando parece revelar que sua avaliação tem se pautado em investigar o
processo desenvolvido pelo aluno na resolução de alguma questão do que se limitado
apenas ao resultado final dessa questão em si; e finalmente, quando parece acreditar nos
princípios da avaliação contínua e na idéia básica de que os erros cometidos pelos alunos
se constituem em uma etapa do processo de aprendizagem.
Dessa forma, ainda que DAM apresente alguns indícios da tenncia do novo
modelo de avaliação, é possível percebermos que a tendência tradicional parece ser
predominante nas concepções avaliativas de DAM.
Contudo, diante dos significados revelados por DAM acerca da avaliação em
Matemática no contexto da EJA, acreditamos que ele tem se pautado mais pela perspectiva
da avaliação tradicional do que pelos pressupostos do novo modelo avaliativo.
5.2.4 – Possíveis interfaces entre as concepções de EJA, Educação Matemática e
Avaliação reveladas por DAM
Em alise às concepções de EJA, Educação Matemática e avaliação reveladas
por DAM, é possível verificarmos que essas parecem estar relacionadas umas as outras,
interagindo entre si, revelando, portanto, algumas interfaces entre elas.
Assim, além de identificarmos que essas concepções parecem estar constituídas
uma influenciando a outra em razão de suas características aparentemente fundamentar-se
de acordo com os mesmos pressupostos da tendência do velho modelo de educação, é
possível ainda percebermos outras situações que parecem revelar a existência de interfaces
entre elas.
Nesse sentido, ao conceber a EJA como uma modalidade da Educação Básica
com ênfase na educação funcional, e que, portanto, deve necessariamente se voltar à
191
formação dos educandos para ingressarem no mercado de trabalho ou mesmo se
qualificarem profissionalmente, DAM acaba tendo sua concepção de educação matetica
de jovens e adultos também influenciada por essa perspectiva.
Desse modo, o processo de ensino-aprendizagem de Matemática na EJA vai ser
concebido por DAM de forma que contribua para que os educandos se qualifiquem para o
desempenho de uma determinada profissão e assim permita que eles consigam um
emprego. Sob a mesma inflncia, DAM vai destacar ainda que os conteúdos matemáticos
na EJA devem ser organizados de acordo com o tipo de função que o educando está sendo
preparado para ingressar no mercado de trabalho.
Por outro lado, a concepção matemática de DAM também vai influenciar o
modo como pratica o ato de avaliar. Neste caso, ao destacar que o educando aprende
Matemática somente através da repetição exaustiva de exercícios e na reprodução e
memorização dos modelos, DAM vai enfatizar na sua avaliação a resolução dos exemplos
e exercícios realizados pelos alunos.
Dessa forma, DAM vai avaliar a aprendizagem dos educandos principalmente
quando após o ensino de um determinado conceito apresentar alguns exercícios de
aplicação dos conteúdos ensinados para analisar se os alunos foram ou o capazes de
empregar os conceitos transmitidos. Situação essa, concebida por DAM como condição
necessária na definição se o educando assimilou ou não os assuntos abordados.
a interface entre as concepções de EJA e avaliação será determinada pelo
fato de DAM demonstrar não reconhecer o perfil distinto dos educandos dessa modalidade.
Assim, ao deixar de conceber que os educandos jovens e adultos se diferenciam dos alunos
do ensino regular principalmente por suas características socioculturais e pelas
expectativas e demandas em relação à Educação Básica, DAM destaca que a EJA precisa
receber um tratamento diferenciado somente em relação à organização dos conteúdos
matemáticos. No caso, o motivo maior aqui, seria porque DAM acredita que os alunos do
ensino regular têm mais conhecimentos do que os educandos da EJA e assim não como
avaliá-los da mesma maneira.
Diante desses aspectos e do fato das concepções de DAM sobre a tríade EJA,
Educação Matemática e Avaliação compartilharem da mesma perspectiva do modelo
tradicional de ensino, acreditamos que essas concepções, de uma forma ou de outra,
parecem se relacionarem entre si.
192
5.3 Professor GUT
O professor GUT, apesar de ter uma experiência considerável na docência, é o
que tem menos tempo de atuação docente na Educação de Jovens e Adultos entre os
sujeitos dessa pesquisa. Além disso, é o único que leciona em outra modalidade da
Educação Básica que não seja a EJA, trabalhando principalmente no Ensino Médio regular.
Na EJA, tem lecionado não na disciplina de Matemática, onde trabalha com as turmas
do Segundo Segmento do Ensino Fundamental, como também na disciplina de Física,
lecionando nas turmas do Ensino Médio. A maior parte de sua experiência docente tem se
constituído lecionando em escolas particulares de ensino regular.
5.3.1 – Concepções de Educação de Jovens e Adultos de GUT
Ao se referir à Educação de Jovens e Adultos como “um sistema educacional
que atinge uma parcela da sociedade que se encontra fora da escola” (Q1-1). E
esclarecer ainda que a “Educação de Jovens e Adultos vem para dar um apoio a uma
determinada clientela de pessoas que estão fora do ambiente escolar” (E-1).
Percebemos que GUT parece conceber apenas a idéia da EJA como uma
modalidade educacional instituída com o propósito de reintroduzir uma parte da população
no sistema formal de educação. o esclarecendo quem são exatamente as pessoas que
pertencem à parcela da sociedade que está fora da escola e que tipo de apoio a EJA deve
propor a essas pessoas.
Nesse caso, a definição de Educação de Jovens e Adultos apresentada por
GUT parece o se completar, pois, se por um lado, remete-se à EJA como uma
modalidade educacional voltada a algumas pessoas que estão fora da escola, de modo a
apoiá-las; por outro lado, deixa de esclarecer que a EJA redunda da necessidade de se
restaurar um direito negado, o direito à educação, para os jovens e adultos que de uma
forma ou de outra foram excluídos do sistema escolar quando crianças e adolescentes, e
hoje retomam sua vida escolar com perspectivas e expectativas pprias em relação à
Educação Básica.
Dessa forma, não seria qualquer grupo de pessoas fora da escola o público a ser
atendido pela EJA, mas sim, um grupo específico formado por pessoas jovens e adultas de
escolarização básica incompleta ou jamais iniciada. E também não seria a EJA uma
modalidade da educação voltada apenas para apoiar as pessoas que estão fora da escola,
193
mas uma modalidade compreendida como restauradora do direito a uma escola de
qualidade capaz de permitir a inclusão cio-educacional daqueles que não usufruíram da
escolarização na idade apropriada.
Ainda sobre a definição da EJA, ao elucidar que: “O objetivo principal da
EJA é fazer com que aquela pessoa que estaria ociosa em casa, venha para um
ambiente escolar” (E-1), GUT demonstra novamente certa falta de compreensão a
respeito do público característico da EJA, que não é formado por qualquer pessoa, muito
menos exclusivamente por alguém que se encontra sem ocupação em sua casa. Mas pelo
contrário, é um blico constitdo por uma parcela expressiva da população na situação
de excluídos, devido à desigualdade de oportunidades educativas, e ávidos por se incluir
em processos significativos de formação escolar.
Questionado sobre o papel da EJA no contexto cio-educacional, GUT
elucida: “De inclusão de uma faixa da sociedade com idade avançada no ambiente
escolar” (Q1-2).
Apesar de destacar um dos aspectos mais significativos da EJA, que trata-se do
comprometimento com a inclusão e a garantia do espaço de jovens e adultos na escola,
GUT parece mais uma vez não entender a que público específico a EJA se destina,
referindo-se apenas àquelas pessoas com idade avançada.
Ao destacar ainda, que a EJA “é uma maneira de inserir as pessoas que
estão há muito tempo afastadas da escola, que têm dificuldade no acesso à educação, é
uma maneira de inserir” (E-1). E que “a idéia da EJA é a inserção do aluno na
sociedade através da educação” (E-18).
Percebemos que GUT demonstra o somente a perspectiva da EJA abraçada à
idéia da inclusão ou mesmo da re-inclusão dos educandos de escolaridade incompleta no
processo de escolarização, quanto a perspectiva da inclusão social dos educandos da EJA a
partir do acesso aos bens culturais que a educação pode proporcionar.
Nesse sentido, GUT revela compreender o caráter inclusivo da EJA, a visão de
que através dessa modalidade educacional é possível o apenas permitir o acesso como a
participação efetiva dos indivíduos, até então excluídos do contexto sócio-educacional, nas
relações sociais, econômicas e culturais desempenhadas pela sociedade, principalmente
pela inserção desses no mundo letrado.
No questionamento de que “o ponto principal da EJA e que o aluno ainda
não entendeu, é colocá-lo, inseri-lo num processo educacional. E o objetivo do
supletivo era simplesmente terminar em menos tempo o Ensino Médio e
194
Fundamental. A EJA não tem essa finalidade. A EJA atende um outro tipo de
clientela do que o supletivo. Eu acho que o supletivo é uma coisa e a EJA é outra. Na
minha visão o supletivo tem uma função e a EJA tem outra função” (E-4).
Notamos que GUT não retoma a questão da EJA com o objetivo de
promover a inserção dos alunos no processo de escolarização, mas demonstra ainda, ter
uma concepção definida de que a EJA e o antigo ensino supletivo se constituem de
maneiras distintas entre si.
Neste caso, GUT traz à tona a discussão em torno do alargamento do conceito
de Educação Básica de jovens e adultos, onde ao ocorrer a mudança de ensino supletivo
para EJA foram incorporadas outras finalidades em substituição aos aspectos da educação
compensatória e complementar antes destacados pelo ensino supletivo.
Nesta perspectiva, mesmo sem elucidar exatamente as finalidades reparadora,
equalizadora e qualificadora da EJA, GUT parece reconhecer que a EJAo deve se
propor ao expediente do aligeiramento do Ensino Fundamental e Médio promovido pelo
ensino supletivo, defendido exclusivamente com o intuito de suprir e compensar a
escolaridade dos que não usufruíram a escolarização na idade própria.
Ainda em relação a essa questão da EJA e do supletivo, GUT observa que: A
EJA hoje, simplesmente, para a maioria dos alunos mudou simplesmente um nome
supletivo para EJA. Não tem diferença entre a EJA e o supletivo” (E-4). E se referindo
aos professores, esclarece ainda: “A maioria vai te falar que a EJA veio para substituir
o supletivo, e no meu modo de pensar, a EJA é uma coisa e o supletivo é outra
totalmente diferente” (E-19). Concluindo: “A EJA, na realidade, tem muito pouca
diferença do antigo Supletivo, e eu penso que não deve ser assim” (E-1).
Dessa forma, não apenas percebemos recorrência da visão de GUT de que a
EJAo deve ser compreendida e realizada nos mesmos moldes do ensino supletivo,
quanto é possível ainda, diagnosticar que a EJA tem sido confundida com o próprio
Supletivo não pelos professores dessa modalidade, mas também pelos próprios
educandos desse segmento educacional.
Neste sentido, segundo as revelações de GUT, é possível constatar que para os
alunos da EJA, ainda que essa modalidade tenha sido atualizada, a única reformulação que
se deu foi apenas em relação à sua nomenclatura, continuando a exercer a função de
recuperar o atraso escolar dos educandos, principalmente através da possibilidade de
acelerar e reaver o tempo escolar perdido.
No mesmo caminho, tamm é possível perceber que a maioria dos professores
195
da EJA ainda não superaram a idéia dessa modalidade atribuída com a mera finalidade de
reposição da escolaridade não realizada na infância ou adolescência, se concebendo por
trás da constituição do ensino supletivo. Reafirmando assim, a constatação de Di Pierro
(2005), de que a educação complementar e compensatória continua a ser a referência
comum para pensar a EJA no Brasil.
Questionado se a EJA deve ser tratada como uma modalidade específica e
diferenciada em relação aos outros segmentos da Educação Básica, GUT elucida: “Eu
acho que o ensino regular tem o seu papel, o supletivo tem o seu papel e a EJA tem a
sua função, uma não pode querer tomar o lugar da outra” (E-11). “Não é igual à
outra escola regular, você não pode aqui exigir determinado tipo de postura do aluno,
porque é outro tipo de aluno e isso está até no Plano Político Pedagógico, que é a
inserção do aluno. Essa inserção do aluno é algo que transcende a determinadas
exigências, é aluno, é adolescente do presídio Pomeri que está conosco acompanhado
por juiz que vem ver se ele está freqüentando a escola, é gente de tráfico de drogas, é
policial que vem e entra com fuzil aqui dentro da escola e que cisma com um aluno
e dá geral nele , é momento em que voestá dando aula e que o policial entra na
sua sala e pede licença para algemar um e tirar porque ele está sendo procurado.
Então a vivência é diferente, o que a gente tem que trabalhar aqui é a inserção deles
(E-21).
Na primeira afirmação, é possível perceber que GUT demonstra conceber a
necessidade de diferenciação entre a EJA e as demais modalidades educacionais, e também
entre a EJA e o Supletivo, principalmente ao se referir às finalidades distintas que cada
uma possui, mesmo o esclarecendo qual seria o papel da EJA, do ensino regular e do
Supletivo.
Em relação à última colocação, percebemos que GUT não apenas retoma a
questão da EJA voltada à inclusão social, mas parece compreender com mais ênfase do que
na afirmação anterior, que a EJA deve ser tratada de forma diferenciada em relação ao
ensino regular, principalmente em função do traço definidor do seu público. Que não
apenas possui desafios e desejos próprios frente à educação escolar, diferente dos
educandos que freqüentam os bancos da escola regular, como ainda, e se não bastasse,
possui um perfil distinto com características sócio-culturais marcada pela exclusão dos
sistemas educacionais de ensino e pela condição de marginalizados socialmente.
Ao destacar quem são parte dos seus educandos nas salas de aula da EJA, GUT
evidencia alguns aspectos discutidos por Rivero (1998, apud Soares, 2001) e por Arroyo
196
(2005), ou seja, a existência da EJA como uma modalidade educativa para setores
vulneráveis em condição de marginalidade socioeconômica e cidadãos vitimados como
marginais, oprimidos, miseráveis, pobres, excluídos, discriminados, sem horizonte.
Ainda sobre o aspecto da diferenciação entre a EJA e outros segmentos da
Educação Básica, GUT complementa: “O que eu penso sobre a EJA é desvincular a
EJA de algo pré-estabelecido, como sendo correto para o Ensino Médio ou para o
Ensino Fundamental, fugir daquele programa de conteúdos que uma escola regular
trabalha. A gente não pode estar preso a esse compromisso de trabalhar conteúdos
com o objetivo do aluno da EJA fazer vestibular, e a gente está muito ligado a isso
ainda” (E-2). “Muita gente acredita nisso, mas eu acho que é besteira achar que nós
estamos só preparando um aluno para fazer um curso superior aqui” (E-10).
Percebemos que GUT parece se remeter à idéia de que é preciso adequar os
conteúdos escolares à especificidade da EJA, não os tratando do mesmo modo como são
trabalhados no Ensino Fundamental e Médio da escolar regular. Além disso, ao questionar
que os conteúdos desenvolvidos na EJA não devem estar presos à finalidade de preparar os
educandos para o vestibular, GUT parece demonstrar que a EJA é muito mais do que uma
modalidade voltada à preparação dos educandos para as próximas etapas da escolarização
básica e/ou superior.
Ao se referir principalmente à questão curricular, ou seja, ao programa de
conteúdos, esclarecendo que este precisa ser diferenciado no contexto da EJA, GUT parece
acreditar que é importante se criar uma proposta curricular específica para essa
modalidade, que não seja apenas uma pia fiel do mesmo currículo escolar desenvolvido
na Educação Básica Regular.
Ao destacar ainda, que os conteúdos têm sido trabalhados na EJA como se
fossem para preparar os educandos para ingressarem no Ensino Superior concepção
essa difundida categoricamente como o principal objetivo das instituições escolares da rede
de ensino particular, na qual o próprio GUT é professor é possível percebermos que
GUT não parece se colocar de forma contrária a essa visão no contexto da EJA, como
parece demonstrar também, a necessidade de um tratamento pedagógico dos conteúdos em
conformidade às especificidades dessa modalidade e às características, necessidades e
interesses dos seus educandos, que a princípio, não são as mesmas dos estudantes das
escolas particulares, que visam principalmente por meio dessas instituições uma formação
escolar preparatória para o vestibular e consequentemente o ingresso no Ensino Superior.
Dessa forma, é possível verificar que GUT aparenta conceber alguns dos ideais
197
que têm sido discutidos em torno da EJA, ou seja, da necessidade dessa ser institda como
um modelo pedagógico próprio; com tratamento didático dos conteúdos intencionados ao
perfil distinto de seus estudantes; e com currículos flexíveis, metodologias e abordagens de
ensino-aprendizagem adequadas aos jovens e adultos e não para crianças e adolescentes
que percorrem o caminho da escolaridade de forma regular.
Ao afirmar: “A gente trabalha na EJA do mesmo jeito que no ensino
regular, que de maneira condensada” (E-2), GUT traz à tona a discussão de que,
apesar da EJA ser proposta como uma modalidade específica, com um modelo pedagógico
e uma identidade própria, principalmente pela caracterização cio-cultural dos seus
educandos, na verdade, ela tem sido desempenhada pelos professores da mesma forma
como se estivessem atuando no ensino básico regular.
Nesta perspectiva, é possível diagnosticar através das palavras de GUT, que os
envolvidos no processo educacional ainda não conseguiram adequar a escola, os
procedimentos didáticos e as práticas pedagógicas às especificidades da EJA, que por ser
uma modalidade voltada aos jovens e adultos excluídos e portadores de peculiaridades
distintas das crianças e adolescentes, requer distinções que afetam não o conceito de
educação, mas o modo como se deve trabalhar com esses sujeitos.
Esse aspecto corrobora com a observação de Oliveira (1999), que chama a
atenção para as dificuldades na adequação da escola para atender ao público da EJA, que
o é o alvo original da instituão escolar. Além disso, a autora aponta ainda, que os
aspectos dos currículos e métodos de ensino originalmente concebidos para crianças e
adolescentes freqüentadores da escola regular têm sido reproduzidos nas salas de aula da
Educação Básica de jovens e adultos.
Considerando ainda a afirmação de GUT, principalmente quando ele destaca
que na EJA os docentes têm trabalhado de maneira condensada, é possível constatar que a
única postura diferenciada exercida pelos professores da EJA em relação ao ensino regular
tem se remetido exatamente à supressão de alguns conteúdos escolares.
Em relação a essa questão, a Proposta Curricular para a EJA (MEC/SEF,
2002b) esclarece que, infelizmente ainda existem poucas reflexões específicas sobre a
seleção de conteúdos para o ensino de Matemática na EJA; e que, em geral, determinados
conteúdos fundamentais para a construção e a aquisição de conhecimentos da Matemática
têm sido suprimidos ou excessivamente abreviados, sob a alegação dos professores, de que
o fazem parte da realidade dos alunos ou não têm uma aplicação prática imediata.
Indagado sobre que formação básica deve ser formalizada pela EJA para o
198
educando dessa modalidade, GUT elucida: “A formação que o aluno tem que ter é um
diploma de Ensino Médio ou da Educação Fundamental, e se descobrir uma pessoa
capaz de aprender, capaz de participar da sociedade. Eu acho que é mais fazer o
aluno pesquisar, um aluno que vai atrás, busca conhecimento. Eu acho que a
formação é essa, uma formação mais integral do que uma formação formal, de
conteúdo. Acho que o principal é isso” (E-3). Esclarecendo ainda: “Na minha
concepção o objetivo principal é pegar ele que está no zero e fazer desenvolver, e daí
ele ter uma visão mais macro do contexto, ir correr atrás, buscar, coisa que não faria
se tivesse fora da escola. Acho que o objetivo da EJA é esse aí, fazer ele acreditar
nele (E-10).
Percebemos que GUT parece reconhecer que a EJA deve propiciar uma
terminalidade e acesso a certificados equivalentes ao ensino regular, sem que isso
signifique tratá-la como uma reposição da escolaridade perdida pelos seus educandos na
idade própria.
GUT parece ainda não conceber os educandos da EJA como sujeitos da
própria aprendizagem e ter confiança na capacidade dos mesmos aprenderem, como
demonstra compreender também, o quanto é importante favorecer a autonomia desses
educandos e estimulá-los para que resgatem a auto-estima e a motivação para acreditarem
que são capazes de aprender e buscar conhecimentos, garantindo assim, cada vez mais sua
participação plena na sociedade.
Outro aspecto que parece ser concebido por GUT, refere-se à questão de que a
EJA não deve centrar-se em uma formação escolar de caráter conteudista, mas preocupar-
se com o desenvolvimento do educandos, potencializando-os para que abarquem as
possibilidades oportunizadas pela educação escolar.
Ao definir seu aluno da EJA como: “Carente, tanto do ponto de vista
intelectual, quanto social, mas que busca um espaço na sociedade” (Q1-4).
Complementando: “Ele vem para cá, ele sente que ele pode ser inserido. Aqui o aluno
tem o único pensamento dele ter condições de ser inserido na sociedade através da
educação. Isso ele tem consciência, que estudando ele vai melhorar de vida” (E-10).
Percebemos que GUT parece conceber que seus educandos jovens e adultos
buscam por meio da educação escolar construir estratégias que lhe permitam reverter o
quadro da exclusão das relações realizadas na sociedade, que é conseqüência da falta de
conhecimentos provenientes do mundo letrado.
Neste sentido, é possível verificar ainda, que GUT demonstra compreender que
199
os educandos da EJA, ao retomarem a escolarização, não estão apenas interessados em
recuperar o atraso escolar, mas também, preocupados em transformar a realidade da qual
se deparam e se inserirem plenamente na vida social.
Ainda nesta perspectiva, questionado sobre com que objetivo acredita que seu
aluno procura a EJA, e respondendo: “Uma grande parte tem o objetivo de adquirindo
o diploma obter alguma possibilidade no mercado de trabalho” (Q1-5). “Ele está
preocupado em certificado, ele entende que o certificado é importante para ele, só que
ele não caiu na real ainda que o certificado sozinho não vai resolver o problema dele”
(E-11).
GUT traz à tona outro aspecto que tem sido visado pelo educando da EJA
através do processo escolar, ou seja, a possibilidade de ao concluir os estudos conseguir se
inserir no mundo do trabalho, ou ainda, se qualificar profissionalmente ou progredir dentro
do seu próprio local de serviço.
Além disso, GUT parece questionar que, ainda que uma parte dos educandos
da EJA estejam interessados apenas no certificado de conclusão da Educação Básica, isso
o é suficiente para que consigam alcançar os ideais da inclusão social e da inserção no
mercado de trabalho. Destacando assim, a necessidade dos educandos da EJA refletirem
sobre as possibilidades e demandas decorrentes do processo educacional, e não apenas da
certificação escolar.
Ao destacar: “Eu sinto que o aluno que entra aqui, e eu já vi isso, o aluno
desenvolve muito, desenvolve muito mesmo. que a gente tem que entender que ele
entrou no zero, é completamente diferente de você pegar uma criança ou um
adolescente que entra no Ensino Médio de uma escola particular (que eu tenho mais
experiência) que vem de uma família que tem cultura, que tem acesso a cultura, que
tem pai com nível superior, que tem mãe com nível superior, que tem internet, tem
televisão. Aqui você pega um aluno de bairro periférico que às vezes não tem dinheiro
nem para pegar um ônibus, quanto mais acesso à informação. Qualquer coisa para
eles é de outro planeta, se vofalar de um país da Europa ou alguma outra coisa,
eles não sabem nada” (E-9).
E reafirmar isso: “Eu sinto o desenvolvimento, o aluno entra cru, entra
zero, como que a educação faz ele mudar de pensamento, ser mais crítico, muito
aquém de um aluno de uma escola particular, por causa de como eu falei, da falta de
conhecimento familiar, falta de cultura familiar e isso é muito difícil de vencer. A
gente que vem de uma família que tem uma cultura, até para a gente falar errado é
200
difícil falar errado, agora pergunta por que, na sua casa teve a hora que estava
falando errado teve seu pai, sua mãe te corrigindo. Aqui eles não m quem corrija
eles” (E-17).
Percebemos que GUT não revela o quanto a educação é fundamental para
que os educandos da EJA possam se desenvolver socioculturalmente, tornarem-se mais
conscientes e transformarem sua condição social, como parece entender também,
principalmente em decorrência da sua prática docente no ensino regular privado, o perfil
distinto dos educandos da EJA em relação aos seus outros alunos da rede particular de
ensino.
A condição sociocultural dos educandos da EJA aparentemente reconhecida
por GUT, parece fazer com que ele remeta-se ainda, à idéia que a EJA deve receber um
tratamento específico e diferenciado, e que apesar da situação social, cultural e econômica
desfavorável dos educandos dessa modalidade, isso não os caracteriza como menos
capazes de aprender, ou mesmo, os impedem que sejam assumidos como agentes culturais
e sujeitos ativos no processo de construção de conhecimentos.
Questionado se teria alguma crítica a fazer em relação à EJA, GUT elucida: “A
critica que eu faço é que os professores não têm formação para trabalhar com EJA.
Eu particularmente não me sinto preparado para trabalhar com EJA. Eu não fiz
nenhum curso. Eu acho que está muito largado na mão de gente que não tem
qualificação, que é o meu caso, eu me incluo nesse pessoal. Eu não pude ir a nenhum
curso, por questão de tempo, já que eu não trabalho em escola pública; e por
questões dos cursos limitados apenas às pessoas que poderiam participar do curso nos
horários integrais, não podia assistir aula num determinado tempo. Então eu me
sinto desqualificado. Então essa é a crítica, crítica na formação. A gente não sabe
muito bem como lidar com a EJA. Eu estou te falando isso sobre a EJA, da minha
experiência de aula, não que alguém me falou que a EJA é isso” (E-5).
Dessa forma, é possível perceber que as dificuldades destacadas por GUT para
se trabalhar na EJA remete-se ao fato de se sentir sem qualificação para lecionar nessa
modalidade; e também à falta de uma formação docente voltada ao educador de jovens e
adultos para que possa lhe dar com a complexidade diferencial que envolve a EJA.
Neste sentido, GUT demonstra ainda que a sua experiência como professor na
educação regular é que tem contribuído para que consiga, ainda que com limitações,
desenvolver seu trabalho nas salas de aula da EJA. Contexto educacional esse que se
coloca como um professor despreparado para atuar, uma vez que não recebeu na formação
201
inicial preparo suficiente para trabalhar com uma modalidade com especificidades tão
distintas dos outros segmentos da Educação Básica, que são o foco original dos cursos de
Licenciatura.
A formação continuada para os professores em exercício na EJA também é
questionada por GUT, demonstrando que os poucos cursos de capacitação e
aperfeiçoamento voltados à EJA não têm conseguido dar conta de atender aos docentes
dessa modalidade, principalmente devido à falta de disponibilidade dos professores, que
muitas vezes têm que complementar sua carga horária e até sua situação financeira em
outras escolas ou mesmo desempenhando outras atividades não ligadas propriamente à
docência.
Esses aspectos evidenciados por GUT corroboram com a constatação do
Parecer 11/2000 da CEB sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais, que ressalta que o
preparo de um docente voltado para a EJA, deve incluir, além das exincias formativas
para todo e qualquer professor, aquelas relativas à complexidade diferencial desta
modalidade de ensino. E que, uma vez que a formação inicial não consegue atender tais
exigências, é imprescindível uma formão continuada para o campo da EJA aos
professores em serviço.
Ao destacar ainda: “Nunca se fala especificamente de como é a atitude da
EJA. Acho que todo mundo tem medo de falar da EJA. Fica assim, ninguém sabe o
que é a EJA e todo mundo esconde essa dificuldade e transparece que todo mundo
sabe o que é a EJA ou qual o objetivo principal que a EJA tem (E-19).
GUT parece corroborar com a constatação da Comissão Nacional de Educação
de Jovens e Adultos (2001), na qual os professores que trabalham na EJA, em sua quase
totalidade, não estão preparados para o campo específico de sua atuação, e em geral, são
professores leigos ou pertencentes ao próprio corpo docente do ensino regular.
Nesta perspectiva, parece mais do que imprescindível a constituição de ações
sistemáticas que favoreçam o investimento tanto na profissionalização do professor em
serviço quanto na formação adequada dos docentes para atender às exigências que
envolvem o universo da Educação de Jovens e Adultos.
Na afirmação feita por GUT: “Eu como professor de Matemática tenho um
objetivo muito maior que só trabalhar a Matemática. É como se eu fosse um psicólogo
ali, alguém que pára para escutar. Então você se sente, poxa vida, eu uma pessoa sem
essa qualificação, estou parecendo um psicólogo aqui e na verdade sou professor de
Matemática” (E-18).
202
Percebemos que GUT não apenas se remete novamente à questão da falta de
qualificação para atuar na EJA, como parece compreender a necessidade de outras
competências além do conhecimento específico em sua área de atuação, na qual o
professor da EJA precisa ser investido de algumas habilidades para pensar e propor, muitas
vezes, alternativas de vida e trabalho para um blico excluído e ávido por conquistar seu
espaço na sociedade.
Na observação de GUT se referindo às salas de aula da EJA que: “Tem um
monte de aluno aqui que tem, você entende alguém que tem 14 e 15 anos que pode ser
matriculado no grau e fazer uma rie, um aluno de 14 anos fazer uma série,
com uma diferença de idade muito pequena para o regular, e tem um monte aqui.
Fazer série, rie com 14 anos e podia estar no regular, mas e a cabeça dele, a
cabeça dele é terminar mais cedo, mas infelizmente” (E-11).
É possível perceber que GUT aparentemente se mostra preocupado com a
presença cada vez mais significativa de jovens que poderiam estar cursando o ensino
regular e que estão, na verdade, freqüentando os bancos escolares da EJA. Principalmente
quando esses jovens parecem apenas intencionados em acelerar sua escolarização e
concluir a Educação Básica dentro de pouco tempo, ao invés de aproveitar as
oportunidades educativas decorrentes da própria existência da Educação de Jovens e
Adultos.
Sobre essa situação que remete-se, de certo modo, à idade mínima para cursar a
EJA, Soares (2002) levanta a discussão de que com um contingente expressivo de
adolescentes ingressando na EJA a heterogeneidade existente nessa modalidade pode se
tornar mais complexa; e os adultos, possivelmente, se afastarão das salas de aulas por
incompatibilidade com os ritmos e os perfis dos adolescentes.
A preocupação de GUT com o interesse dos educandos mais jovens da EJA em
concluir mais cedo a escolarização básica através dessa modalidade, traz à tona ainda, a
discussão da EJA não se tornar um facilitador para uma multidão descartar a vincia
escolar em detrimento da vontade de obter em menos tempo o certificado de conclusão da
Educação Básica.
a) Algumas considerações sobre as concepções de GUT acerca da Educação de Jovens
e Adultos
Analisando as concepções reveladas por GUT sobre o contexto da Educação
203
de Jovens e Adultos, ainda que em alguns momentos pareça não esclarecer a que público a
EJA se destina, definindo-a com o objetivo de reintroduzir as pessoas que estão fora do
ambiente escolar no sistema formal de educação. É possível diagnosticarmos que GUT
parece reconhecer a condição sociocultural dos educandos da EJA, bem como, suas
demandas e expectativas em reverter a situação de excluídos e transformarem sua
realidade, buscando ainda, novas oportunidades de inserção no mundo do trabalho e na
vida social por meio da educação escolar.
No mesmo caminho, é possível identificarmos a visão aparente de GUT em
relação à EJA instituída não somente para a preparação dos educandos para as outras
etapas do processo escolar, mas principalmente, para a inclusão social desses educandos a
partir do acesso aos bens socioculturais que a educação escolar pode proporcionar.
GUT parece acreditar também, que a EJA não deve ser tratada e desenvolvida
do mesmo modo que o antigo ensino supletivo, devendo se recusar impreterivelmente ao
expediente do aligeiramento do ensino básico. Além disso, parece conceber a necessidade
da EJA ser tratada como uma modalidade diferenciada e específica em relação aos
segmentos da Educação Básica Regular, principalmente em razão do perfil sociocultural do
seu público.
Nesta perspectiva, GUT demonstra remeter-se ainda, à iniciativa de uma
adequação do programa de conteúdos escolares à especificidade da EJA, com um
tratamento pedagógico em conformidade com as características, necessidades e interesses
dos educandos dessa modalidade, e uma formação escolar centrada indiscutivelmente no
desenvolvimento dos alunos e o em uma formão de caráter meramente conteudista.
Em relação à formação escolar que a EJA deve oferecer aos seus educandos,
GUT parece reconhecer que essa modalidade educacional deve proporcionar uma
terminalidade e acesso a certificados equivalentes à educação regular, sem concessões à
qualidade de ensino. Demonstrando ainda, a necessidade dos educandos da EJA não se
apegarem exclusivamente à certificação de conclusão da Educação Básica, mas
principalmente, às possibilidades e vantagens que a educação escolar pode propiciar.
No que diz respeito aos educandos da EJA, é possível perceber que GUT
parece concebê-los como agentes culturais e sujeitos ativos no processo de construção de
conhecimentos; parecendo revelar ainda, o quanto é importante favorecer a autonomia e a
auto-estima desses educandos para que possam conquistar cada vez mais sua participação
na sociedade.
A formação docente voltada ao professor da Educação Básica de jovens e
204
adultos também é elucidada por GUT, revelando ser importante uma preparação específica
para que os professores da EJA consigam desempenhar com qualidade suas atividades
pedagógicas nas salas de aulas dessa modalidade, atendendo assim, a complexidade
diferencial que a envolve.
Contudo, diante dos significados atribuídos por GUT a respeito da Educação
de Jovens e Adultos, é possível percebermos que suas concepções têm se revelado sob a
perspectiva de uma EJA compreendida com o caráter inclusivo e baseada nos ideais de um
novo modelo educacional.
5.3.2 – Concepções de Educação Matemática de GUT
Questionado sobre a definição da Matemática no contexto da Educação de
Jovens e Adultos, GUT elucida: De fundamental importância, pois é um instrumento
na resolução de problemas aplicados no cotidiano” (Q2-1).
Dessa forma, é possível percebermos que a Matemática na EJA parece ser
definida por GUT como importante devido à sua utilidade e aplicação na tentativa de
solucionar os problemas relacionados ao dia-a-dia dos educandos jovens e adultos.
Nesse sentido, se por um lado, GUT aparenta remeter-se à iia da importância
da Matemática na EJA em razão da possibilidade de sua aplicação na solão de problemas
da vida prática e, portanto, como um benefício para os educandos em suas atividades
cotidianas. Por outro, deixa de se referir à Matemática como uma ciência viva, produzida
histórico-culturalmente pelas práticas sociais, como um instrumento de transformação da
realidade social e uma necessidade individual e coletiva para o exercício pleno da
cidadania.
Ao destacar que o ensino da Matemática na EJA é importante na prática do
cotidiano, e desenvolve a inteligência lógico-matemática que o aluno da EJA irá
precisar em outras ciências” (Q2-3), GUT parece conceber não a importância de se
ensinar a Matemática no contexto da EJA, como demonstra justificar essa importância em
função da possibilidade da atividade matemática favorecer o desenvolvimento de
capacidades intelectuais para a estruturação do pensamento dos educandos, bem como,
dessas capacidades serem aplicadas na vida prática e nas diferentes áreas de conhecimento.
Sendo assim, é possível notarmos que GUT parece remeter-se tanto à questão
do papel funcional da Matemática, ligada à dimensão utilitária na resolução de problemas
cotidianos, quanto ao papel formativo, relacionado ao desenvolvimento da estruturação do
205
pensamento matemático.
Na discussão sobre que conhecimentos matemáticos são essenciais para que os
alunos da EJA supram suas necessidades básicas de aprendizagem da Matemática, GUT
refere-se às “operações matemáticas, Matemática Financeira, área, assuntos
relacionados ao seu cotidiano” (Q2-5).
Assim, percebemos que GUT não apenas destaca as quatro operações
matemáticas como importante para a formação matemática dos seus educandos da EJA,
opinião esta predominante entre os professores de Matemática dessa modalidade
(MEC/SEF, 2002a), como ressalta ainda a Matemática Financeira e o estudo de áreas como
fundamentais aos educandos jovens e adultos.
Essa importância atribuída por GUT quanto ao ensino da Matemática
Financeira na EJA talvez possa ser explicada em razão dos alunos jovens e adultos
vivenciarem frequentemente situações cotidianas que requerem um conhecimento nimo
de questões envolvendo juros e porcentagem. O que torna, portanto, essencial o ensino
desse conteúdo matemático na formação escolar dos educandos da EJA.
É importante elucidar ainda, que em relão aos conteúdos da Matemática
Financeira e de Área citados por GUT, a pesquisa da COEJA (MEC/SEF, 2002a) esclarece
que infelizmente entre os professores de Matemática da EJA esses conteúdos costumam ser
pouco desenvolvidos.
Perguntado se o processo de ensino-aprendizagem da Matemática deve ser
compreendido de forma diferenciado no universo da EJA em relação às outras modalidades
da Educação Básica, GUT elucida: “A experiência maior que eu tenho é com escola
particular, e o universo é completamente diferente. [...] Então a Matemática tem que
ser completamente diferente. Porque você está trabalhando com alguém que não tem,
ele tem a vivência, então precisa trabalhar a vivência, ele não tem abstração, ele não
consegue abstrair, você não pode dar nada fora do contexto, porque abstração vem
com o tempo” (E-9).
Nesta perspectiva, percebemos que GUT demonstra reconhecer que o contexto
da educação matemática na EJA deve sim ser diferenciado quanto aos outros segmentos do
ensino regular, justificando sua resposta em razão das distinções entre essas modalidades
educacionais e devido às dificuldades relacionadas à abstração matetica dos educandos
da EJA.
O aspecto das vivências diversificadas e da construção das iias matemáticas
dos educandos jovens e adultos parece ser resgatado por GUT em sua consideração de que
206
o ensino da Matemática na EJA tem suas diferenciações em relação às outras etapas da
Educação Básica.
Ao se referir à questão da abstração matemática como uma das particularidades
distintas dos estudantes da EJA, GUT traz à tona a discussão em torno das diferenças entre
a Matemática escolar e a Matemática que o aluno consti fora da escola. Neste sentido,
parece compreender que essa discussão é mais aguçada no contexto educacional da EJA,
devido principalmente à vivência dos educandos jovens e adultos, acostumados mais com
uma Matemática cotidiana, pouco valorizada pela escola, que tem transmitido uma
Matemática mais formalizada, abstrata e simbólica, dificultando assim, sua aprendizagem.
Se reportando à maneira como acredita que o processo de ensino-aprendizagem
da Matemática deve ser realizado na EJA, GUT esclarece: “Aplicando situações do
cotidiano do aluno” (Q2-4). “Eu acredito que a Matemática na EJA tem que partir de
situação-problema, de pegar problema do cotidiano do aluno, trazido pelo aluno.
Problemas, situações do cotidiano, que você sugerisse para ele, no sentido em relação
à sua idade, à série que ele está vivenciando. E a partir dessa situação-problema,
dessa vivência, você escrevesse o conteúdo, trabalhasse o conteúdo para que eles
resolvessem problemas específicos, não você dar um conteúdo pelo conteúdo, mas dar
o conteúdo para atender especificidades, situações. Eu acho que Matemática tinha
que ser assim” (E-6).
Dessa forma, percebemos que GUT parece conceber que a resolução de
problemas é um dos recursos metodológicos eficazes que devem ser empregados no
processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA. Corroborando assim, com a
perspectiva da Proposta Curricular para a EJA (MEC/SEF, 2002b) de que a resolução de
problemas é um dos caminhos possíveis para fazer Matemática em sala de aula de jovens e
adultos.
No mesmo sentido, ao se referir à importância de se considerar as situações
cotidianas dos alunos na formulação dos problemas a serem desenvolvidos em sala de aula,
GUT parece destacar que o método da resolução de problemas não deve estar ligado a
qualquer assunto, mas relacionado às situações cotidianas dos alunos. Defendendo,
inclusive, que essas situações devem ser destacadas não pelo professor em
conformidade com a idade/série como também pelos próprios educandos.
Diante da valorização do método de ensino da Matemática por meio da
resolão de problemas, notamos que GUT acaba não explicitando a utilização de outros
recursos como os jogos matemáticos, a história da Matemática e as tecnologias da
207
comunicação e da informação, que também se configuram como importantes no processo
da educação matemática de jovens e adultos.
Ao demonstrar ainda, que o ensino de Matemática na EJA deve partir de uma
situação-problema do cotidiano do educando para em seguida iniciar o desenvolvimento do
conteúdo, tomando sempre em consideração a resolução do problema inicial em específico,
GUT parece não se enquadrar no diagnóstico constatado pela COEJA (MEC/SEF, 2002a)
junto aos professores de Matemática da EJA, onde estes têm se baseado na prática
freqüente de ensinar um conceito ou procedimento e depois apresentado um problema para
analisar se os alunos são capazes de empregar o que lhes foi ensinado.
Nesta perspectiva, diante da valorização do método de ensino da Matemática
baseado na resolução de problemas cotidianos dos educandos, percebemos que GUT
demonstra conceber alguns pressupostos da Matemática segundo a tendência cio-
etnocultural, onde o ponto de partida do processo ensino-aprendizagem remete-se aos
problemas que dizem respeito à realidade dos alunos (FIORENTINI, 1995).
No questionamento sobre como costuma ensinar Matemáticas aos seus alunos
da EJA, GUT afirma: “Lançando situações problemas relacionadas às dificuldades no
cotidiano do aluno. A partir do conteúdo é trabalhado” (Q2-6). “É aquele negócio
que você mescla conteúdos que estão no programa e que nós decidimos, colocando
situação-problema sempre, em todo o início você coloca situação-problema sempre.
Escrevendo o conteúdo a partir daquela situação-problema” (E-7).
Assim, percebemos que GUT parece desenvolver suas atividades pedagógicas
quanto ao ensino da Matemática exatamente como acredita que deve ser realizado o
processo de ensino-aprendizagem dessa disciplina na EJA, afinal esclarece que sempre
procura inicialmente lançar situações-problema relacionados ao dia-a-dia dos alunos para
então dar prosseguimento ao conteúdo.
Além disso, ao tratar da questão dos conteúdos, GUT traz à tona a situação
delicada envolvendo os procedimentos da tomada de decisão sobre a seleção dos conteúdos
considerados como meios para o ensino da Matemática na EJA. Dessa forma, mesmo não
indicando como faz e que conteúdos geralmente tem selecionado, parece claro que estes
são definidos segundo a concepção pessoal de GUT sobre aquilo que considera ou não
relevante o aluno aprender.
Esse aspecto é ressaltado pela Proposta Curricular para a EJA (MEC/SEF,
2002b), que esclarece que a seleção de conteúdos para a EJA tem se constituído um
desafio, um processo envolvendo discussões sobre o que enfatizar e em que aprofundar
208
cada um dos grandes temas curriculares.
Referindo-se ao desenvolvimento de suas aulas por meio de situações-
problema do cotidiano dos seus alunos, GUT se queixa: “Mas eu sinto que depois o
objetivo que eu pressupus para aquela aula não foi totalmente alcançado porque os
alunos voltam a trabalhar aquilo ali como se fosse simplesmente um conteúdo e não
como aquilo ali sendo uma situação do cotidiano deles. Eles não conseguem fazer esse
vínculo de buscar esse negócio. Mas sempre é feito assim (E-7).
Dessa forma, é possível perceber que apesar de não estar conseguindo alcaar
seus objetivos educativos por meio do todo da resolução de problemas cotidianos dos
educandos, GUT, ainda assim, tem insistido em desenvolver seu trabalho docente dessa
forma.
Isso nos remete a questionar se os problemas propostos por GUT têm se
instituído de fato em situações típicas do dia-a-dia dos seus educandos ou em meras
questões da realidade humana sem contextualização em relação às atividades de vida dos
seus alunos.
Diante da afirmativa de GUT: “Você faz uma proposta de trabalhar com
área, de uma maneira de perguntar a quantidade de telhas que teria que comprar
para cobrir um telhado sabendo que o m
2
exige tantas telhas, ou lata de tinta para
pintar, ou piso para ser colocado, essas coisas que eles vivenciam, e todo mundo
vivencia. Eles não se sentem à vontade, o pessoal da EJA está acostumado
simplesmente a fazer trabalho, trabalho de cópia. Os alunos são muito bons para
fazer isso, para fazer cópia de assunto. Você faz uma proposta para eles pensarem,
eles não. [...] Então a Matemática fica sendo trabalhada com isso, e você acaba tendo
que trabalhar na Matemática da mesma maneira como você trabalha no ensino
regular” (E-6).
Percebemos então, que as situações-problema colocadas por GUT no ensino da
Matemática na EJA parecem se constituir às vezes mais como ilustrações e exemplos
ligados à realidade cotidiana em geral do que exatamente relacionadas ao contexto diário
dos seus educandos.
O que caracteriza que, talvez esse seja um dos motivos pelo qual a metodologia
da resolução de problemas utilizada por GUT não tem dado tão certo quanto desejaria.
Nesta perspectiva, notamos ainda, que GUT apesar de parecer acreditar no
princípio que a educação matemática na EJA deve receber um tratamento diferenciado em
relação às demais modalidades educacionais, não tem desempenhado suas atividades
209
docentes segundo essa idéia.
Percebemos aqui, que além de se queixar da forma como os alunos da EJA
preferem desenvolver as atividades escolares, GUT tenta justificar inclusive, em razão
desses aspectos, o fato de acabar lecionando Matemática na EJA da mesma maneira como
leciona no ensino regular. Portanto, não considera, a princípio, outros aspectos que
poderiam estar influenciando também no modo como tem trabalhado com o conteúdo
matemático na Educação Básica de jovens e adultos.
Assim, indagado sobre quais seriam as principais dificuldades para realizar o
processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA, GUT elucida: “Eu não sei, acho
que volta ao que eu tinha te falado antes, falta para gente, no meu caso, falta
formação, falta qualificação na Matemática para a EJA. Falta formação especifica,
pois às vezes a formação é muito pedagógica e pouco especifica. É muito raro você ter
alguém que trabalha com a EJA na área de Ciências da Natureza e que te fala: ‘Olha
eu fiz essa experiência, deu certo, vamos trabalhar desse jeito, quem sabe’. Falta tudo
isso. Porque tem muita gente com teoria pedagógica, mas pouca gente com ação
prática nas Ciências da Natureza, e Matemática especificamente” (E-8).
Nesse sentido, percebemos que GUT não só retoma a questão da falta de
formação docente para atuar na EJA, como intensifica essa idéia, esclarecendo que a falta
de uma qualificação específica no campo da Matemática para jovens e adultos tem se
constituído como um dos fatores determinantes entre as dificuldades de se desenvolver o
processo ensino-aprendizagem dessa disciplina na EJA.
Esse aspecto da formação do professor de Matemática da EJA é colocado por
Fonseca (2005a) como um dos grandes desafios para o desenvolvimento de experiências
significativas na área dessa modalidade, que requer um educador matemático de jovens e
adultos não somente com uma certa intimidade com a própria Matetica, mas também
com uma sensibilidade para as especificidades da vida dos jovens e adultos.
Além disso, ao retratar que existem poucas pessoas desenvolvendo atividades
significativas na EJA em relação à Matemática especificamente, GUT traz à tona, de certo
modo, o preceito diagnosticado por Duarte (1995) e Cardoso (2001), em que o ensino da
Matemática para jovens e adultos tem sido uma área pouco explorada no interior da EJA,
onde as pessoas têm se centrado mais na alfabetização de jovens e adultos.
b) Algumas considerações sobre as concepções de GUT acerca da Educação
Matemática
210
Em análise às concepções atribuídas por GUT sobre o contexto da educação
matemática de jovens e adultos, é possível percebermos em diversos momentos
características de uma Matemática compreendida segundo os pressupostos formativo e
funcional, dirigida tanto ao desenvolvimento de capacidades intelectuais mateticas
quanto à aplicação dessas capacidades na resolução de problemas cotidianos e nos
diferentes campos do conhecimento humano.
Da mesma forma, é possível evidenciarmos que GUT tem concebido alguns
princípios da Matemática baseada na tendência cio-etnocultural, principalmente quando
demonstra valorizar a utilização da resolução de problemas ligados à realidade cotidiana
como recurso significativo no ensino-aprendizagem da Matemática na EJA. Ou mesmo,
quando destaca que as situações-problema devem ser sugeridas não pelo professor de
acordo com a idade/série do aluno, mas principalmente pelos próprios educandos.
Concernente ao desenvolvimento do processo escolar da Matemática na EJA,
ainda que GUT pareça se utilizar, às vezes, de situações-problema um pouco distante dos
problemas reais com os quais os alunos se confrontam em suas atividades diárias; notamos
que ele parece não se apropriar do método da resolução de problemas apenas como uma
aplicação dos conhecimentos ensinados ao final de seqüências de atividades, mas pelo
contrário, demonstra que tem utilizado as situações-problema como desencadeadores dos
conhecimentos matemáticos e dos conteúdos a serem trabalhados posteriormente.
Percebemos ainda, apesar de GUT revelar que tem atuado na EJA do mesmo
modo que no ensino regular, que ele parece reconhecer a necessidade de um tratamento
diferenciado do processo ensino-aprendizagem da Matemática na EJA em relação aos
demais segmentos da Educação Básica, reconhecendo essa diferenciação em razão das
particularidades envolvendo tanto essa modalidade em específico quanto os aspectos da
dificuldade de aprendizagem e de abstração matemática dos educandos jovens e adultos
muitas vezes devido às suas condições sócio-culturais e econômicas.
No que diz respeito à formação escolar matemática para os educandos da EJA,
verificamos que GUT não tem se remitido somente ao ensino das operações fundamentais
da Matemática, como tem feito a maioria dos professores dessa disciplina na EJA
(MEC/SEF, 2002a), mas também revela acreditar na importância de se trabalhar a
Matemática Financeira e outros conteúdos ligados ao cotidiano dos educandos.
O aspecto da formão de professores voltada especificamente para a área da
Educação Matemática de Jovens e Adultos também parece ser questionado por GUT como
fundamental para a melhoria do ensino-aprendizagem da Matemática no contexto da EJA.
211
Dessa forma, diante dos significados apresentados por GUT acerca do
processo ensino-aprendizagem da Matemática na EJA, é possível constatarmos que suas
concepções parecem estar compreendidas segundo os pressupostos do novo modelo de
educação matemática para jovens e adultos, e, portanto, comprometida com a perspectiva
da inclusão educacional.
5.3.3 – Concepções de Avaliação de GUT
Ao afirmar que o objetivo da avaliação escolar é o de “cumprir uma etapa
importante do processo ensino-aprendizagem (Q3-3), GUT parece reconhecer o
significado da avaliação como fruto da prática educativa e como um elemento integrante
do processo escolar.
Em relação à definição da avaliação em Matemática na EJA, GUT esclarece
que ela significa: “Verificar se o aluno possui ou desenvolveu habilidades necessárias
no assunto proposto” (Q3-1).
Percebemos aqui, que GUT parece conceber a avaliação como uma medida do
conhecimento do aluno, ao destacar a iia de se verificar as habilidades que este possui; e
também como uma aferição do conteúdo assimilado pelo educando, ao destacar ainda o
fato de se verificar as habilidades que este desenvolveu.
Dessa forma, é possível perceber nesse momento, que GUT apresenta alguns
pressupostos da avaliação tradicional, principalmente por denotar que a avaliação se define
como ato de medir as habilidades dos educandos sobre um determinado conjunto de
informações ou conteúdos veiculados pelo professor.
A idéia básica nessa perspectiva, remonta a definição de Popham (1983, apud
DEPRESBITERIS, 1995) em que a medida tem apenas o objetivo de revelar o quanto o
aluno possui de determinada habilidade.
Nesse sentido, a avaliação assumida por GUT parece ser compreendida de
forma unilateral e como um julgamento de valor das habilidades dos alunos, não se
remetendo à avaliação dos outros envolvidos no processo escolar e nem à possibilidade de
se tomar os resultados verificados como uma decisão daquilo que precisa ser ou não
modificado em função da melhoria do ensino e da aprendizagem dos educandos.
Ao destacar que o que costuma avaliar é “o que foi conquistado, através de
práticas em sala de aula e fora dela, com habilidade no assunto trabalhado” (Q3-2),
GUT parece reafirmar a iia de uma avaliação ligada apenas à aferição das habilidades
212
adquiridas ou não pelos alunos referentes a um determinado conteúdo.
Esse aspecto recorrente denota para a visão de uma avaliação classificatória,
que não se remete à exigência da tomada de decisão a partir das habilidades avaliadas, mas
encerra-se na constatação daquilo que foi assimilado pelo educando.
Questionado sobre como deve ser tratada a avaliação na educação matemática
de jovens e adultos, GUT esclarece que: “Eu costumo fazer as avaliações em provas
mesmo, mas eu dou pouca importância para a correção e pouca importância para a
nota dessas provas que eles fazem. Porque eu dou a prova muito mais por exigência
do aluno do que minha, porque como o aluno tem um vício de estudar para fazer
prova, a preocupação do aluno é a prova, preocupação do aluno não é
necessariamente o conhecimento, ele está preocupado com a prova, então você acaba
dando prova para satisfazer e não deixar frustrado. Mas eu particularmente, a minha
avaliação é muito mais na observação diária do aluno, na sua vontade, no seu
trabalho em grupo, aquele olhar de vontade de aprender que ele tem, que é que eu
valorizo, do que um papel que ele errou um gráfico e que ele fez uma representação
errada, não é isso. Eles ficam assim: Ah e como é que fui na prova?’ Mais a nota
não está necessariamente ligada aquilo ali, às vezes até nem corrijo, ou corrijo e falo
que foi bem, retomo o exercício no quadro, mas sem entregar o papel efetivamente
para eles como na escola particular às vezes exige o papel que é aquela prova mesmo
como prova de que ele foi bem. Aqui não, acho que o fato dele vir, e estar
participando com tanta dificuldade, estar com vontade de aprender, para mim é isso.
Então a minha avaliação é feita muito mais no cotidiano, na vivência em sala de aula.
Agora ele faz trabalho em grupo, faz prova escrita, mas é como eu te falei, a nota que
ele tem, o conceito que ele tem no final do bimestre não. Às vezes o aluno fez tudo
certinho e eu dei um B para ele, um bom para ele, e outro fez tudo errado também
ganhou um bom porque eu vi que ele se interessou. Então é assim, eu penso que é por
aqui. Especialmente na Matemática que é uma das disciplinas que mais faz aluno
desistir da EJA. Então a gente não pode fazer o cara desistir, tem que fazer ele ficar e
o que segura ele é um pouco do seu conceito, aquela história de que vou passar, vai
passar e a gente o sabe para onde que vai passar, mas você tem que dar essa
esperança para ele de que ele vai passar (E-12).
Percebemos nesse momento vários aspectos em discussão por parte de GUT,
principalmente, em relação à prova escrita e as notas decorrentes desse tipo de instrumento
avaliativo, além dos questionamentos envolvendo o modo como avalia e a necessidade de
213
se criar alternativas para manter os educandos jovens e adultos na escola e não desistirem
em função da Matemática.
Sobre a prática da prova escrita como instrumento avaliativo, GUT, apesar de
se utilizar desse tipo de avaliação, demonstra não acreditar em sua utilidade como um
diagnóstico fiel do processo de ensino-aprendizagem, parecendo assim, compreender suas
limitações. O que de certa forma, caracteriza essa visão de GUT como um aspecto positivo
em relação ao contexto da avaliação escolar, principalmente quando se sabe que as provas
o atendem as reais funções do processo avaliativo, servindo-se mais como mecanismos
de controle e classificação dos educandos do que como instrumentos adicionais no intuito
de diagnosticar e possibilitar a aprendizagem dos alunos.
Essa perspectiva, revela que GUT parece conceber que o ato de avaliar não
pode ser confundido com o ato de aplicar prova, ou que a avaliação o se resume a uma
aplicação exclusiva de provas, mas requer outros instrumentos avaliativos no ajuizamento
da qualidade do processo educacional e no suporte à reformulação e o aprimoramento
desse processo.
A atitude de GUT, em relação à prova, parece remeter-se ainda ao fato de que
as notas e os conceitos provenientes desse instrumento avaliativo não são suficientes para
se traduzirem como o pólo do processo avaliativo e muito menos para interpretarem os
aspectos da aprendizagem dos alunos.
Nesse sentido, percebemos que GUT parece compreender que a nota gerada
pela avaliação tipo prova, não somente não expressa nada em relação ao aluno, como
ainda, é incapaz de possibilitar uma tomada de decisão sobre o processo escolar.
Dessa forma, é possível percebermos que GUT parece demonstrar que a nota,
constituída como uma forma de conversão quantitativa da aprendizagem dos educandos, é
muito mais do que um simples resultado numérico decorrente de uma prova escrita
realizada pelo aluno. Mas ao contrário disso, é um resultado subjetivo, que para servir
como auxílio na interpretação da aprendizagem escolar, deve se constituir da forma mais
fiel possível diante da análise das diversas atividades desenvolvidas pelos educandos
durante o processo educacional.
Ao explicitar que costuma fazer suas avaliações por meio de provas escritas
devido aos alunos se manifestarem em favor das mesmas e de estarem sempre interessados
nas notas decorrentes destas, GUT traz à tona a questão da nota como o centro das
atenções da prática escolar, vivendo em função dela não apenas os professores, mas
também os próprios alunos.
214
Em relação a essa questão posta por GUT da prova como uma exigência do
aluno e aproveitando ainda o trecho: “O aluno não está acostumado a ser avaliado a não
ser com uma prova e com uma nota. [...] Ele não consegue entender que avaliação é
muitas vezes subjetiva, e consegue entender a nota. Se você pegar uma prova e der
para ele, ele tirar um zero e você disser que ele está reprovado, ele aceita. Se você der
uma prova e ele tirar zero, e você falar que ele está aprovado, ele não aceita. [...] Que
ele também não entende que aquilo ali é um quantitativo, que não vai valer, que
não tem problema, que é só uma coisa temporal” (E-23).
Chegamos à compreensão que é provável que isso seja reflexo das
reminiscências escolares dos educandos jovens e adultos, que ao recordarem de suas
passagens pela escola lembram-se bem das práticas avaliativas exclusivamente baseadas
nas avaliações tipo prova, desconhecendo outras formas de se avaliar. O que estaria,
portanto, nos dias atuais, dificultando a idéia de admitirem, em seu retorno à escola, serem
avaliados de outro modo a não ser pelos “famosos” testes tradicionais com que se
habituaram durante o processo de escolarização quando crianças ou adolescentes.
Considerando ainda, essa discussão de GUT a respeito do interesse maior do
aluno pela nota, pode-se evidenciar uma situação característica que vem ocorrendo no
sistema escolar tradicional, no qual o educando está habituado a ser “estimulado” a
estudar, não para aprender, mas para atingir uma nota. O que tem, inclusive, condicionado
o aluno a ter boas razões para se preocupar com suas notas e querer acima de tudo que elas
sejam suficientes, já que são determinantes para o seu sucesso ou fracasso escolar.
Retomando a resposta de GUT sobre a forma como deve ser tratada a
avaliação em Matemática na EJA, é possível percebermos ainda, que ele prefere proceder à
avaliação escolar por meio da observação diária daquilo que o aluno desempenha em sala
de aula. Avaliando também a participação dos educandos nos trabalhos em grupo, e
principalmente as suas atitudes, pautadas efetivamente pela força de vontade em aprender e
pela participação em sala de aula.
Dessa forma, GUT demonstra que ao avaliar tem se pautado principalmente
em diagnosticar aquilo que os alunos desenvolvem em sala de aula e também a capacidade
desses alunos trabalharem cooperativamente em grupos, do que se baseado exclusivamente
nos resultados das provas escritas aplicadas junto aos alunos.
Percebemos também, que o interesse do educando em aprender e sua
participação nas aulas, principalmente diante das dificuldades sócio-econômicas com que
se defrontam, m se constitdo, na opinião de GUT, como aspectos muito mais
215
significativos de se avaliar do que propriamente os erros ou acertos expressos nas provas
escritas realizadas pelos alunos.
Quanto à discussão de GUT sobre a necessidade de se criar condições para que
o aluno não venha a evadir da escola, principalmente por causa da avaliação em
Matemática, é possível percebermos que GUT parece compreender a causa da inclusão e,
portanto, a condição de não se acrescentar outros limites impostos pela vida que
signifiquem uma nova exclusão dos educandos da EJA do processo de escolarização.
Nesse sentido, GUT demonstra preocupar-se não apenas com a idéia da
permanência, mas também com a garantia da progressão escolar dos educandos jovens e
adultos.
Ao destacar ainda, que a garantia da permanência dos alunos na escola deve ser
enfatizada principalmente em relação à Matemática, reconhecidamente uma das disciplinas
que mais fazem os alunos desistirem, GUT traz à tona a discussão em torno da Matemática
condicionada como um filtro de seleção social dos educandos.
Assim, GUT demonstra compartilhar não somente do diagnóstico da Proposta
Curricular para a EJA (MEC/SEF, 2002b), de que o insucesso na aprendizagem
Matemática tem provocado a exclusão dos educandos da dinâmica escolar; mas também da
observação de Sebastiani Ferreira (2001), de que a Matemática tem sido a grande
responsável pela exclusão da maioria da população de participar da cidadania e, portanto,
na vinculação entre cidadania e educação marcada pela excludência é a Matemática a
grande responsável.
Perguntado se acredita que o processo avaliativo em Matemática na EJA deve
ou não ser diferenciado em relação ao ensino regular, GUT esclarece: “Sim. O público
alvo é diferenciado, trabalha, estava afastado da escola” (Q3-7). “É assim, tem alguns
aspectos diferentes. O principal aspecto é que a avaliação tem que estar sempre
vinculada ao processo, assim como na escola particular. A avaliação tem que estar
vinculada ao processo. Se você deu determinado conteúdo e trabalhou de uma forma
o conteúdo, tem que cobrar o conteúdo daquele jeito que você trabalhou. Na EJA
também, claro, como o conteúdo é diferente acaba que a avaliação também tem que
ser diferente, mas o jeito de avaliar é igual, é prova escrita, trabalho em grupo, como
você faz lá. que a valorização da prova é que eu acho que tem que ser diferente da
do ensino regular, porque aqui às vezes não tem tempo de estudar, não tem tempo de
estudar fora do horário, então você tem que resolver o problema ali, ali você ensina,
ali você aprende, ali você estuda e ali você avalia, tudo no mesmo lugar. Sendo que o
216
aluno da escola particular tem tempo, tem o pai que vai orientá-lo. Eu acho que
avaliação tem que ser um pouco diferente na maneira de medir resultado, na
medida do resultado, se vai dar um B, se vai dar um O, se vai dar um conceito maior
ou menor. Não deve estar vinculada efetivamente a um resultado do papel, mas um
resultado do bimestre como ele se portou dentro da sala de aula” (E-13).
Percebemos que GUT parece acreditar que a avaliação na educação
matemática de jovens e adultos deve sim ter suas diferenciações em comparação às outras
modalidades da Educação Básica, porém em alguns aspectos desse processo avaliativo os
procedimentos serão os mesmos, sem que seja necessário um tratamento diferenciado.
Neste caso, GUT demonstra que a avaliação na EJA não será diferente
principalmente em relação aos instrumentos avaliativos, que praticamente acabam sendo os
mesmos independentes da modalidade educacional. Assim, revela avaliar por meio de
provas ou trabalhos em grupo tanto na EJA quanto no ensino regular, onde também
leciona.
Outro aspecto elucidado por GUT que o deve ser diferenciado no tratamento
da avaliação refere-se ao processo de desenvolvimento dos conteúdos, que devem ser
avaliados seguindo os mesmos princípios com que foram desenvolvidos no decorrer das
aulas. Isso quer dizer que uma vez trabalhado o conteúdo de uma determinada maneira,
este deve ser necessariamente cobrado na avaliação do mesmo jeito que foi desenvolvido.
Esse aspecto da cobrança na avaliação do conteúdo ensinado da mesma forma
como o professor o transmitiu em sala de aula remete-se de certo modo a um dos princípios
da avaliação tradicional, em que o aluno deve impreterivelmente devolver ou repetir nas
provas os mesmos conteúdos veiculados pelo professor e de preferência exatamente como
os recebeu.
As razões explicitadas por GUT para justificar as diferenciações de tratamento
da avaliação na EJA parecem remeter-se aos conteúdos, que segundo sua opinião, são
diferentes nessa modalidade; às particularidades da clientela da EJA; e também à forma de
se medir os resultados alcançados pelos alunos.
Quanto à questão dos conteúdos, GUT revela que como estes são diferentes na
EJA em relação ao ensino regular, logo a avaliação também será assumida de forma
diferenciada nessa modalidade, uma vez que quase sempre o processo avaliativo está
associado ao desenvolvimento dos conteúdos escolares. Porém, é válido ressaltar que os
conteúdos escolares independentes da modalidade educacional são os mesmos, pois a
Educação Básica é regida por uma única estrutura curricular. Entretanto, talvez o que GUT
217
quer dizer quando afirma que os conteúdos na EJA são diferentes do ensino regular, não é
que estes sejam de fato diferentes, mas geralmente são trabalhados de forma diferenciada,
sendo tratados de maneira condensada a critério do professor.
O perfil distinto dos educandos jovens e adultos parece também ser concebido
por GUT como um dos aspectos característicos na sua compreensão de que a avaliação na
EJA deve receber um tratamento diferenciado. Ao destacar, por exemplo, que o aluno
dessa modalidade estava afastado da escola, trabalha e não tem tempo para estudar,
diferentemente do seu aluno da escola particular que dispõe de tempo e ainda tem alguém
para ajudá-lo, GUT demonstra reconhecer que as condições sócio-econômicas dos
educandos da EJA e sua retomada do processo escolar são determinantes não na hora de
se diferenciar o processo avaliativo, mas também toda a prática pedagógica dessa
modalidade.
Outro aspecto significativo revelado por GUT como uma justificativa de se
diferenciar o ato da avalião na EJA em relação aos demais segmentos educacionais, e
que de certa forma refere-se ao perfil distinto da clientela dessa modalidade, remete-se à
medida dos resultados obtidos pelos educandos no decorrer do processo escolar. Neste
caso, GUT parece acreditar que as notas atribuídas aos alunos devem ser cuidadosamente
estudadas, levando em consideração não apenas os resultados expressos pelas provas
escritas, mas principalmente as atitudes evidenciadas pelos educandos na sala de aula.
Dessa forma, é possível percebermos que GUT revela recorrência quanto à
idéia de se valorizar muito mais as atitudes e a participação dos alunos como aspectos
passíveis de serem avaliados do que efetivamente as provas escritas.
Ao destacar que avalia a “participação, interesse e vontade em crescer” (Q3-
3). E esclarecer ainda: Eu avalio o interesse e a vontade de aprender principalmente.
São esses dois pontos que eu mais preso no aluno. A vontade de aprender porque se o
cidadão tem vontade ele busca, ele vai buscar quando ele sentir que isso é necessário.
Quer dizer, eu olhando o aluno na sala de aula, eu sei que ele tem vontade de buscar
conhecimento” (E-14); “Agora é aquilo que eu te falei antes, isso é uma maneira de
avaliar, uma maneira de avaliar até a vontade, você as condições de vida dele e ele
está ali, disposto a sair de casa. [...] Então, isso acho que é uma maneira de voestá
vendo, está avaliando” (E-18).
Percebemos que GUT novamente refere-se ao interesse e a vontade do aluno
em aprender como os aspectos mais importantes em sua avaliação do processo de ensino-
aprendizagem da Matemática, revelando ser recorrente ao princípio de avaliar seus alunos
218
quanto a essas atitudes.
Além disso, é possível notarmos aqui, que GUT parece justificar os motivos
pelos quais o interesse e a vontade de aprender do aluno têm se constituído nos pontos
mais significativos de sua avaliação. Assim, esclarece que tendo vontade em aprender o
educando estará sempre disposto a buscar o conhecimento e, portanto, ávido a se
desenvolver e conquistar cada vez mais seu espaço na sociedade.
Dessa forma, não é difícil compreender porque GUT tanto valoriza o aspecto
da força de vontade em aprender como uma atitude importante de ser avaliada,
principalmente na EJA, onde o traço definidor se caracteriza pela própria condição de
exclusão dos seus educandos, que a cada dia lutam para se manterem na escola e assim
tentarem transformarem sua realidade.
Ao esclarecer que sua avaliação se “durante todo o processo” (Q3-4), “de
várias maneiras: prova escrita, observação na sala de aula, auto-avaliação. Coloco
pontos no papel e eles auto-avaliam, eles acham o máximo esse negócio de auto-
avaliação. Eles acham o máximo, mas é aquele negócio, eu faço aquele discurso antes
da auto-avaliação, como que tem que ser a auto-avaliação, como que é isso, qual é o
objetivo da auto-avaliação, como eles se sentem dentro do processo, se estão bem se
estão mal. E diante disso tudo eu dou uma olhada geral e vejo, principalmente na
observação. Ai eu vejo como que esse aluno tem condições de ir adiante ou não tem”
(E-15). “E eu observo a mudança de comportamento, isso eu observo, a mudança de
comportamento, pequena, mas eu observo a mudança de comportamento do inicio do
ano para o final do ano” (E-17).
Notamos que GUT parece proceder não somente por meio da avaliação
contínua e processual, mas também demonstra que tem se utilizado de uma quantidade
razoável de instrumentos avaliativos.
Nesse sentido, GUT revela avaliar de forma contínua e processual
principalmente quando destaca que sua avaliação se durante todo o processo e também
quando procura observar durante todo o período letivo as atividades desenvolvidas pelos
educandos no contexto da sala de aula.
Ainda queo explique se toma alguma decisão em favor da melhoria do
processo de ensino-aprendizagem a partir de suas práticas avaliativas, GUT demonstra
alguns princípios do novo modelo de avaliação ao avaliar durante todo o processo e por
meio das observações diárias do desempenho dos alunos.
No mesmo caminho, GUT demonstra que não tem se centrado apenas em um
219
instrumento avaliativo, mas ao contrário disso, tem tentado diversificar tais instrumentos,
utilizando-se principalmente de provas escritas, observação em sala de aula, trabalhos em
grupo e auto-avaliação.
Dessa forma, GUT parece compreender que é necessário mais que um único
instrumento para se avaliar o complexo processo escolar, e que somente uma diversidade
de instrumentos é capaz de fornecer um resultado mais digno e próximo da verdadeira
realidade desse processo.
Percebemos ainda, que GUT parece conceber a necessidade de estimular os
educandos a tomarem consciência de sua participação no processo de ensino-aprendizagem
ao incentivá-los a se auto-avaliarem.
Assim, ao demonstrar se utilizar da auto-avaliação como instrumento
avaliativo, GUT demonstra acreditar o na possibilidade dos alunos avaliarem seus
progressos e carências, e entenderem seu próprio processo de aprendizagem, como
também, na possibilidade de refletir sobre as estratégias de pensamento utilizadas pelos
alunos.
Ao demonstrar preocupação em explicar aos educandos como deve ser e quais
são os objetivos da auto-avaliação, GUT demonstra ainda, que essa prática não deve ser
realizada sem critérios ou mesmo sem significado, e a idéia principal é que os educandos
digam tudo aquilo que sabem e também o que não sabem, sem medo de serem punidos por
isso.
Na questão como costuma fazer o registro dos aspectos que avalia, GUT
elucida: “Eu tenho ficha, eu faço uma fichinha, não é diário, diário serve para colocar
nota. Eu tenho ficha dos alunos e vou colocando semanalmente, ou às vezes de 15 em
15 dias, um pouco do que acontece em determinado dia, eu vou anotando esses
quesitos como a participação e os quesitos da observação. [...] Então, o registro é feito
no papel, a maioria das vezes em uma ficha que eu tenho, e nas as outras vezes eu
conheço mesmo o aluno pelo trabalho diário” (E-16).
Aqui, além de demonstrar mais uma vez que costuma avaliar por meio da
observação, GUT esclarece que registra periodicamente os fatos observados no contexto
da sala de aula por meio de uma ficha.
Assim, GUT revela que as suas observações são sistematizadas numa espécie
de ficha de campo, onde são anotadas informações, de tempos em tempos, sobre o que
observou dos seus alunos na sala de aula, geralmente se constituindo de questões ligadas à
participação e o interesse em aprender.
220
Dessa forma, GUT o demonstra que tem se apropriado da ficha como
mais um instrumento avaliativo, mas também, parece revelar que por meio desta tem
tentado acompanhar a evolução dos alunos no decorrer do ano letivo, mesmo não se
referindo a outras anotações além da participação e disposição dos educandos em aprender.
Ao destacar que o educando não pode ficar “preso a um sistema educacional
que vai punir ele se ele for mal na prova, que vai reprová-lo, coisa desse tipo” (E-11).
E afirmar ainda que: “O Projeto Político Pedagógico da escola tem inclusive que
transcender essa exigência que o professor tem, que é de às vezes ser muito radical em
determinada postura: ‘Ah! Ninguém sabe nada de Matemática, não vou passar
ninguém’. É uma muito visão muito micro” (E-21).
Percebemos que GUT parece trazer à tona a discussão de que a escola e os
professores não devem promover a prática de uma avaliação punitiva e excludente,
preocupada excessivamente com o julgamento dos alunos em aprovados ou reprovados,
como se as notas decorrente das tradicionais provas escritas fossem o fator determinante do
sucesso ou fracasso escolar do educando.
Nesta perspectiva, é possível notarmos ainda, que GUT não parece
compartilhar em nada da postura de professores, que se baseando apenas na avaliação dos
conteúdos geralmente reproduzidos pelos alunos na prova, têm condicionado seus
educandos à reprovação e conseqüentemente ao fracasso escolar por acreditarem que estes
o sabem “nada” de Matemática, por exemplo.
Neste sentido, é possível que GUT compartilhe de alguns dos ideais discutidos
pelo novo modelo avaliativo, totalmente contrário às práticas classificatória, punitiva e
excludente da avaliação, que ao contrário disso, deve servir à melhoria do processo escolar
e ao desenvolvimento da aprendizagem dos educandos.
Na discussão de como avalia os erros dos alunos da EJA no processo de
ensino-aprendizagem da Matemática, GUT afirma: “Retomando e provocando novas
discussões sobre o assunto” (Q3-6).
Notamos que o erro parece ser assumido por GUT de forma positiva, sendo
assumido como uma possibilidade de se transformar numa situação de aprendizagem ou
mesmo como um elemento de orientação ao aluno na construção de seu conhecimento.
Desse modo, percebemos que GUT parece remeter-se à perspectiva de que os
erros cometidos pelos alunos também são considerados uma etapa da aprendizagem e uma
fonte de informão essencial.
221
c) Algumas considerações sobre as concepções de GUT acerca da avaliação
Analisando as concepções apresentadas por GUT acerca do processo avaliativo
é possível diagnosticarmos a presença de elementos característicos tanto do paradigma
tradicional quanto do novo modelo de avalião.
Nesse sentido, GUT parece revelar alguns pressupostos da avaliação
tradicional quando, principalmente em resposta às perguntas do questionário (Q3), denota
que a avaliação se define como o ato de medir as habilidades dos educandos sobre um
determinado assunto ou conteúdo proposto pelo professor; ou mesmo, quando demonstra
avaliar somente os alunos, ou seja, avalia apenas as habilidades dos educandos, praticando
assim uma avaliação unilateral.
A perspectiva avaliativa tradicional parece evidenciar-se também, quando
GUT demonstra não se remeter a partir dos resultados de sua avaliação a uma tomada de
decisão do que precisa ser reformulado e aprimorado para a melhoria da aprendizagem e o
desenvolvimento dos educandos.
Do mesmo modo, GUT parece ainda, revelar alguns indícios da avaliação
tradicional quando destaca que trabalhado um determinado conteúdo o professor tem que
cobrar esse conteúdo na avaliação exatamente do mesmo jeito como foi desenvolvido na
sala de aula.
Por outro lado, os pressupostos da avaliação no novo modelo educacional
parecem evidentes na concepção avaliativa de GUT quando revela reconhecer a
importância da avaliação como fruto da prática educativa e elemento integrante do
processo escolar; quando parece proceder a uma avaliação contínua e processual e
demonstra acreditar que ato de avaliar não pode ser confundido com o ato de aplicar
provas.
A perspectiva de um novo modelo de avaliação parece ainda estar presente na
concepção avaliativa de GUT quando reconhecendo as limitações das provas escritas e as
notas e conceitos decorrentes desse instrumento como insuficientes para interpretarem os
aspectos do processo ensino-aprendizagem, demonstra se apropriar de uma quantidade
razoável de instrumentos avaliativos, entre eles a própria prova, para fazer um diagnóstico
mais preciso do contexto escolar.
Nesse sentido, ao revelar que tem se utilizado de provas escritas, observação
em sala de aula, trabalhos em grupo, auto-avaliação e fichas de campo como instrumentos
avaliativos, preferindo ainda proceder principalmente por meio da observação da
222
participação e vontade do educando em aprender do que se limitar aos resultados das
provas, GUT parece conceber mais uma vez alguns dos fundamentos do novo modelo
avaliativo.
Sobre a prática da auto-avalião, GUT também mostras de uma
perspectiva contrária à avaliação tradicional, principalmente por demonstrar uma visão na
qual os educandos devem ser estimulados a tomarem conhecimento de sua participação
escolar e do desenvolvimento da sua aprendizagem a partir da iniciativa de se auto-
avaliarem.
No diagnóstico de que a avaliação na EJA deve ser diferenciada em relação às
demais modalidades educacionais, principalmente em conseqüência das suas
particularidades e do perfil distinto dos seus educandos, marcados pela exclusão e pela
perspectiva de transformarem sua realidade, GUT demonstra novamente apresentar uma
visão do novo modelo de avaliação.
No mesmo caminho, ao demonstrar-se preocupado não apenas com a idéia da
permanência, mas também com a progressão escolar dos educandos da EJA, e com isso se
colocar de forma crítica contra o papel da Matetica como responsável pela evasão dos
alunos e como mecanismo de seleção sócio-educacional, GUT parece evidenciar a
perspectiva inclusiva da avaliação.
Percebemos ainda, a existência de alguns pressupostos contrários à avaliação
tradicional na concepção de GUT quando se remete ao erro como uma etapa da
aprendizagem do educando; e se mostra totalmente contrário à postura de alguns
professores que de forma arbitrária submetem seus alunos ao fracasso escolar por acharem
que estes não sabem nada em Matemática e por isso devem ser reprovados.
Concluindo, ainda que apresente alguns indícios referentes à avaliação
tradicional, é possível percebermos que as concepções avaliativas de GUT estão muito
mais voltadas para o paradigma da avaliação no novo modelo educacional do que ligadas à
prática avaliativa excludente.
Dessa forma, diante de tais considerações baseadas nos significados revelados
por GUT sobre a avaliação, entendemos que suas concepções parecem estar
compreendidas principalmente segundo os pressupostos da avaliação inclusiva, e assim
baseadas nos aspectos que fundamenta o novo modelo de educação oposto ao modelo
tradicional.
223
5.3.4 – Possíveis interfaces entre as concepções de EJA, Educação Matemática e
Avaliação reveladas por GUT
Em análise aos significados revelados por GUT sobre o contexto da EJA, da
Educação Matemática e da avaliação, é possível evidenciarmos que as concepções de GUT
acerca de cada uma dessas áreas têm se constituído de modo que uma tem influenciado a
outra, caracterizando assim, uma interação entre elas.
Nesse sentido, não bastasse o fato das concepções de GUT sobre cada temática
do contexto em questão parecer compartilharem do mesmo paradigma fundamentado no
novo modelo de educação como uma provável evincia de que essas concepções se
relacionam entre si, encontramos ainda diversas situações que caracterizam uma possível
intersecção entre essas concepções.
Assim, percebemos, por exemplo, que quando GUT demonstra conceber a EJA
como uma modalidade com especificidades próprias e distintas em relação ao antigo
ensino supletivo e o ensino regular, reconhecendo no perfil cio-cultural dos seus
educandos o traço definidor da diferenciação dessa modalidade, logo essa visão acaba por
influenciar os significados de GUT referentes à Educação Matemática e à avaliação.
Dessa forma, percebemos que GUT não reconhece que o processo de
ensino-aprendizagem da Matemática na EJA deve ser diferenciado, como também revela
que a avaliação nesse contexto também precisa ser assumida de forma diferenciada,
principalmente em razão das particularidades, das expectativas e demandas, e das
condições de vida dos educandos jovens e adultos.
Da mesma forma, ao parecer ainda, conceber os educandos da EJA como
sujeitos da própria aprendizagem e acreditar na capacidade de aprenderem, bem como,
revelar ser importante resgatar a auto-estima e motivar os alunos a buscarem o
conhecimento como uma forma de conquistar sua participação na sociedade, GUT terá
novamente suas concepções de Educação Matemática e avaliação influenciadas por essa
razão.
Nesse sentido, GUT vai conceber a Matemática como significativamente
importante para os educandos jovens e adultos, principalmente por favorecer o
desenvolvimento das capacidades intelectuais na estruturação do pensamento dos alunos e
também pelo seu potencial utilitário na tentativa de solucionar os problemas cotidianos
desses alunos e dos cidadãos em geral. Além do que, GUT, mediante sua concepção sobre
os educandos da EJA, vai parecer ainda, destacar as situações-problema relacionadas à
224
realidade dos alunos como ponto de partida do processo ensino-aprendizagem da
Matemática.
em relação à avaliação, GUT vai revelar ser mais significativo avaliar o
interesse e a força de vontade dos alunos em aprenderem do que seus resultados expressos
nas provas escritas. Além disso, GUT vai destacar a importância dos educandos se auto-
avaliarem como uma forma de estimulá-los a tomarem consciência do desenvolvimento da
sua aprendizagem e também da sua participação no processo escolar.
Na interface entre as concepções de Educação Matemática e avaliação escolar,
é possível percebermos que GUT esclarece a necessidade de um tratamento diferenciado
da avaliação na EJA não em função do perfil dos educandos dessa modalidade, mas
também por acreditar que os conteúdos mateticos na EJA são tratados de maneira
diferenciada. Assim ao entender que os conteúdos o diferentes, GUT concluí que a
avaliação nessa modalidade também é diferente em relação aos demais segmentos da
Educação Básica.
Concluindo, chegamos à consideração de que não só existem interfaces entre as
concepções de GUT sobre a tade EJA, Educação Matemática e Avaliação, mas que
também essas concepções parecem se constituir de maneira comum diante da perspectiva
de um novo modelo de educação oposto ao modelo tradicional de ensino.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Chegamos nesse instante ao que muitos poderiam definir como o desfecho de
um trabalho, ou mesmo, como a conclusão de uma etapa significativa do processo de
investigação. Porém, gostaríamos de pensar nisso de uma outra forma, na qual chegamos
sim, não ao que se entende como o final, mas ao que se compreende como o icio. O
começo de um novo ciclo que esperamos se abrir à possibilidade de outras etapas e de
outros momentos importantes, bem como, de novas oportunidades para se aprender e
construir outros significados acerca do objeto desse estudo.
Nesta perspectiva, ressalta mencionar ainda, que se não chegamos ao fim é por
reconhecermos também que nenhuma pesquisa é definitiva e que jamais foi pretensão
nossa dar conta da complexidade envolvendo as temáticas constituídas como foco de
investigação desse trabalho.
Dessa forma, sem querer, portanto, apresentar um resultado conclusivo e
generalizado, e muito menos tecer julgamentos sobre os aspectos revelados, observados e
analisados sobre as concepções dos sujeitos envolvidos nesse estudo, destacamos nesse
instante o objetivo de apresentarmos algumas respostas e questionamentos obtidos durante
o processo de investigação orientado pelo problema dessa pesquisa: Quais as interfaces
possíveis de serem estabelecidas entre as concepções de avaliação, de Educação
Matemática e de Educação de Jovens e Adultos de professores que atuam em uma
escola pública de Cuiabá voltada exclusivamente ao atendimento dessa modalidade?
Na busca por respostas que pudessem nos ajudar a alcançar os objetivos
relacionados à questão central dessa investigação nos defrontamos com algumas
dificuldades e limitações que por hora nos fez pensar, em alguns momentos, se seria
possível a realizão desse trabalho da forma como havíamos planejado.
Durante o desenvolvimento desse estudo tivemos dificuldades, por exemplo,
em constituir os sujeitos da pesquisa, bem como, garantir a participação deles,
principalmente devido ao número limitado de docentes atuando na modalidade EJA com a
disciplina de Matemática e que pertencessem ao quadro de professores efetivos da rede
pública estadual de ensino.
Na ocasião, o motivo pelo qual adotamos o critério dos professores serem
efetivos era porque tínhamos receio que não encontrássemos mais os professores em outros
226
momentos da pesquisa caso fossem interinos e com contrato provisório. Assim pensamos
até mesmo em levantar a hipótese de convidarmos para participar desse estudo alguns
professores efetivos que estavam lecionando Matemática em outras escolas estaduais com
oferta de vagas na modalidade EJA. Neste caso, chegamos inclusive a fazer um
levantamento junto à representação da EJA na SEDUC/MT dos professores de Matemática
pertencentes ao quadro efetivo da rede pública de ensino que estavam trabalhando em
escolas que atendiam a EJA.
Felizmente, conseguimos constituir os sujeitos dessa pesquisa com os próprios
professores da escola que havíamos considerado anteriormente. Entretanto, isso não foi tão
simples, pois dos cinco professores efetivos que estavam lecionando a disciplina de
Matemática nessa escola, um deles se recusou a participar desse estudo alegando que não
tinha condições e que estava muito ocupado com suas atividades docentes. Desse modo,
somente conseguimos fechar o quadro inicial com cinco sujeitos da pesquisa quando
tomamos conhecimento que havia uma professora interina que permaneceria no mínimo
dois anos na escola e que aceitou participar do nosso trabalho.
Outra limitação que nos deparamos no decorrer do desenvolvimento da nossa
investigação se deu em função da baixa quantidade de publicações encontradas por nós que
contemplassem estudos sobre as temáticas da avaliação escolar e da Educação Matemática
voltadas especificamente ao segmento da EJA. Isso sem contar também, a produção ainda
tímida em relação ao contexto da avaliação no processo ensino-aprendizagem da
Matemática.
Não diferente de tantas outras pesquisas semelhantes à nossa, vale ressaltar
ainda a dificuldade que foi analisar as concepções atribuídas pelos professores
participantes da pesquisa, principalmente quando isso remete-se à perspectiva de investigar
quais são os pressupostos teóricos que formam direta ou indiretamente seu ideário
pedagógico. Assim, mesmo que essa investigação não tenha significado classificar os
professores sujeitos da pesquisa numa tendência ou outra, e muito menos julgá-los
incisivamente por apresentar aparentemente algumas práticas e crenças baseadas em um ou
outro modelo educacional, foi possível percebermos o quanto a tarefa da análise dos dados
é angustiante dado a sensação de não sabermos se estamos sendo justos ou não em relação
à nossa interpretação das concepções atribuídas pelos sujeitos da pesquisa.
Nesse movimento, as limitações e dificuldades serviram também para que nos
tornássemos ainda mais cuidadosos e persistentes quanto ao desenvolvimento dessa
pesquisa em torno da questão investigativa e ao estabelecimento de um diálogo entre a
227
revisão bibliográfica e o objeto desse estudo; permitindo também que nos interrogássemos
sobre nossos limites e pré-conceitos formados acerca dos temas em discussão nessa
investigação, bem como, sobre nossa influência exercida junto aos sujeitos investigados,
mesmo que involuntariamente.
Desse modo, e conscientes do nosso papel como pesquisadores, obtivemos
algumas respostas se o conclusivas, mas reveladoras que nos permitiram resgatar
as concepções de um grupo de professores a respeito do problema central dessa pesquisa,
intimamente relacionada a três grandes áreas significativas do contexto educacional: EJA,
Educação Matemática e avaliação escolar.
Sendo assim, os resultados obtidos nesse estudo nos possibilitaram tecer
algumas considerações sobre cada um dos casos envolvendo as categorias de nossa análise
dos dados e também, como não poderia ser diferente, sobre cada um dos sujeitos
envolvidos nessa pesquisa. Além disso, nos possibilitou ainda evidenciarmos algumas
situações passíveis de reflexões e investigações mais aprofundadas sobre as áreas aqui em
discussão.
Nesse sentido, percebemos que os sujeitos pesquisados demonstraram, de uma
forma ou de outra, possuir interfaces nas suas concepções sobre a tríade EJA, Educação
Matemática e Avaliação. Evidenciando ainda, em suas ideologias e práticas pedagógicas
acerca dessa tríade a presença dos pressupostos teóricos do velho e do novo modelo de
educação, mesmo que em alguns casos um predominasse sobre o outro.
Entre os professores participantes da pesquisa, percebemos que IRE parece
revelar que seus significados sobre a EJA, o processo de ensino-aprendizagem da
Matemática e a avaliação desse processo relacionam-se entre si, um influenciando o outro,
principalmente devido compartilharem das mesmas características transitórias entre as
perspectivas do velho e do novo modelo de educação.
Dessa forma, não bastasse o fato incomum das concepções de IRE para cada
uma das áreas discutidas nesse estudo se enquadrarem transitando entre as tendências
excludente e inclusiva; percebemos ainda, que as concepções de IRE revelam possuir
interfaces quando concebendo a EJA com um público específico marcado pela situação de
excluídos e com a expectativa da inserção social; vem conceber a Matemática como
imprescindível ao exercício da cidadania e à transformação da realidade social dos
educandos, e praticar a avaliação contínua e processual com ênfase na observação dos
acontecimentos da sala de aula em detrimento à postura tradicional da avaliação tipo
provas e exames.
228
Do mesmo modo, é possível diagnosticarmos ainda a existência de interfaces
entre as concepções de IRE quando manifestando-se em defesa da EJA nos mesmos
moldes do antigo ensino supletivo e com ênfase na preparação dos seus educandos apenas
para a conclusão do processo de escolarização; vai discutir uma formação básica em
Matemática aos alunos com ênfase no donio de regras e fórmulas e somente para servir
às próximas etapas do sistema escolar, e vem desempenhar o papel da avaliação de forma
unilateral e dirigida exclusivamente à mensuração do conteúdo assimilado pelo educando,
bem como, desenvolvendo-a de maneira classificatória e punitiva frente ao disciplinamento
dos educandos pela possibilidade de reprová-los.
Por outro lado, também perceberemos uma intersecção entre as concepções de
EJA, Educação Matemática e avaliação de IRE quando demonstrando desconhecer em
alguns momentos o perfil distinto dos seus educandos; vai deixar de reconhecer a bagagem
cultural e os conhecimentos prévios dos alunos da EJA como ponto de partida para o
desenvolvimento da aprendizagem matemática, e não desempenhará a função de
diagnosticar o desenvolvimento da aprendizagem dos seus educandos a partir da avaliação
e nem estimulará esses educandos a tomarem consciência do próprio processo escolar no
qual fazem parte.
No caso de DAM, é possível identificarmos que suas concepções acerca das
temáticas investigadas nessa pesquisa demonstram se relacionarem entre si quando parece,
principalmente, que estão compreendidas segundo os mesmos pressupostos da tendência
tradicional de educação.
Neste caso, percebemos ainda que as concepções de DAM estão constitdas
uma influenciando a outra quando enfatizando que a EJA deve se voltar principalmente à
formação dos educandos para o mercado de trabalho; vai destacar que a Matemática deve
qualificar esses educandos para o desempenho de uma determinada profissão e
consequentemente os conteúdos matemáticos devem estar organizados de acordo com o
tipo de função no qual o educando está sendo preparado para ingressar no mercado de
trabalho.
Da mesma forma, os significados revelados por DAM o mostras de que
estão ligados uns aos outros quando não reconhecendo o perfil distinto dos educandos da
EJA como diferentes dos alunos do ensino regular principalmente em razão das suas
características socioculturais e pelas expectativas em relação à Educação Básica; além de
o defender uma diferenciação no tratamento da avaliação na EJA em relação às demais
modalidades educacionais, vai destacar que avaliação em si deverá se diferenciar apenas
229
por não haver como avaliar os educandos jovens e adultos da mesma maneira que os
alunos do ensino regular, afinal esses teriam mais conhecimentos do que os educandos da
EJA.
As interfaces entre as concepções de DAM parecem se evidenciar também
quando destacando que os alunos aprendem Matemática somente através da repetição
exaustiva de exercícios e na reprodução e memorização de regras e modelos transmitidos
pelo professor; vai enfatizar em sua avaliação a resolução dos exemplos e exercícios
realizados pelos educandos como uma forma de constatar se estes assimilaram e foram
capazes de aplicar o conteúdo trabalhado anteriormente à aplicação desses exercícios.
Em relação aos significados atribuídos por GUT a respeito da tríade em
destaque nessa pesquisa, percebemos que eles demonstram relacionarem-se entre si, o
pelo fato de compartilharem do mesmo paradigma fundamentado no novo modelo de
educação, como também, por evidenciar algumas outras particularidades.
Neste sentido, é possível percebermos haver interfaces entre as concepções de
GUT quando concebendo a EJA como uma modalidade com especificidades próprias e
distintas em relação ao antigo ensino supletivo e o ensino regular e reconhecendo no perfil
sócio-cultural dos seus educandos o traço definidor da diferenciação dessa modalidade; vai
reconhecer a necessidade de um tratamento diferenciado não apenas do processo de
ensino-aprendizagem da Matemática, mas também da avaliação desse processo na EJA.
A caracterização de uma possível intersecção entre as concepções de GUT se
evidencia ainda quando reconhecendo os educandos da EJA como sujeitos da própria
aprendizagem e acreditando na capacidade de aprenderem; vai esclarecer que a
Matemática deve favorecer o desenvolvimento das capacidades intelectuais na estruturação
do pensamento dos alunos e também servir à solução dos problemas cotidianos dos
cidadãos, e vai revelar ser mais significativo avaliar o interesse e a força de vontade dos
educandos em aprenderem do que seus resultados expressos nas provas escritas.
Do mesmo modo, percebemos que os significados revelados por GUT em
torno das áreas constituintes do objeto desse estudo estão ligados uns aos outros quando
reconhecendo ser importante resgatar a auto-estima e motivar os educandos da EJA a
buscarem o conhecimento como uma forma de conquistar sua participação na sociedade;
vai elucidar que as situações-problema relacionadas à realidade dos alunos deve ser o
ponto de partida do processo ensino-aprendizagem da Matemática e o elemento chave da
valorização dos conhecimentos matemáticos vivenciados pelos educandos fora do
ambiente escolar, e vai destacar a importância dos educandos se auto-avaliarem como uma
230
forma de estimulá-los a tomarem consciência do desenvolvimento da própria
aprendizagem e tamm da sua participação no processo escolar.
Percebemos também existir interfaces entre as concepções de GUT quando
esclarecendo que os conteúdos matemáticos na EJA devem ser organizados e tratados
diferentemente em relação às demais modalidades da Educação Básica; vai concluir que a
avaliação também deverá receber um tratamento diferenciado.
Na análise das concepções reveladas por IRE, DAM e GUT, ainda que entre
eles não haja um comparativo até porque nunca foi objetivo desse estudo compará-los,
mas analisar e compreender suas concepções individuais é possível evidenciarmos
algumas semelhanças e também diferenças em suas concepções.
Nesta perspectiva, é possível percebermos que os três revelam semelhanças em
suas concepções ainda que não configurem a visão predominante deles a respeito da
EJA quando em alguns momentos, se referem a esse segmento educacional como uma
modalidade estabelecida como uma nova oportunidade àqueles que não puderam
freqüentar a escola na idade própria e também voltada aos ideais da inclusão social dos
educandos.
A diferença nas concepções dos três em relação à EJA se caracteriza em fuão
dos aspectos marcantes nos quais cada um define o papel da formação escolar que essa
modalidade deve oferecer aos seus educandos. Dessa forma, percebemos que para IRE a
EJA deve se propor à preparação dos educandos para as outras etapas do processo de
escolarização. DAM enfatiza uma formação voltada basicamente para o ingresso dos
educandos jovens e adultos no mercado de trabalho. E GUT destaca a importância de uma
escolarização voltada à inserção dos alunos da EJA na sociedade a partir do acesso aos
bens culturais que a formação escolar pode proporcionar.
As concepções de IRE, DAM e GUT acerca do processo de ensino-
aprendizagem da Matemática na EJA revelam semelhanças principalmente quando
remetem-se às dimensões prática e utilitária da Matemática, demonstram se apropriar da
resolão de problemas como recurso didático-metodológico e destacam a importância das
quatro operações matemáticas (adição, subtração, multiplicação e divisão) como
conhecimentos essenciais para uma formação básica em Matemática para os educandos da
EJA.
Apesar de não haver diferenças significativas, percebemos que as concepções
de IRE, DAM e GUT se diferenciam em relação à educação matemática de jovens e
adultos, principalmente em razão da forma como concebem a formação escolar que a EJA
231
deve se propor. Assim, notamos que IRE remete-se à importância de uma formação
matemática como pré-requisito para as demais etapas do processo de escolarização; DAM
remete-se à necessidade de uma formação matetica voltada à preparação e qualificação
de o-de-obra para o mercado de trabalho; e GUT remete-se à formação matemática
como fundamental para desenvolver a intelincia lógico-matemática dos educandos e
prepará-los para utilizar os conhecimentos matemáticos em outras ciências e nas atividades
cotidianas.
No que diz respeito às concepções avaliativas de IRE, DAM e GUT,
percebemos que entre as outras áreas em discussão nessa pesquisa, a avaliação é que
possui mais pontos incomuns na visão dos três. Sendo assim, é possível evidenciarmos
algumas semelhanças em suas concepções quando remetem-se em alguns momentos à
avaliação apenas como aferição do conteúdo assimilado pelo aluno, ou ainda, quando
denotam não tomarem decisão a partir de suas avaliações, procedem através da avaliação
unilateral, revelam avaliar de forma contínua e processual e principalmente por meio da
observação em sala de aula, demonstram avaliar as atitudes dos alunos, reconhecem as
limitações das provas escritas no processo avaliativo, e concebem o erro como uma etapa
da aprendizagem.
A principal diferença nas concepções de IRE, DAM e GUT acerca da
avaliação escolar se refere aos aspectos gerais que determinam os pressupostos do velho e
do novo modelo avaliativo. Neste caso, as diferenças revelam-se no sentido de IRE
transitar entre as perspectivas excludente e inclusiva da avaliação, no fato de DAM
remeter-se principalmente às características da avaliação tradicional, e na questão de GUT
demonstrar uma visão da avaliação baseada principalmente segundo a tendência do novo
modelo educacional.
Na trajetória da análise dos significados revelados pelos sujeitos dessa pesquisa
é possível evidenciarmos ainda alguns destaques que caracterizam de forma marcante as
concepções de IRE, DAM e GUT acerca das áreas que constituem a problemática dessa
investigação.
Neste sentido, percebemos que um dos principais fatores que se destaca nas
concepções de IRE diz respeito à sua manifestação em defesa da EJA de acordo com os
princípios do antigo ensino supletivo, demonstrando preferência por este sistema não
somente por parecer não concordar com a perspectiva da flexibilização e organização
curricular da atual conjuntura escolar dessa modalidade, mas principalmente por acreditar
que antes essa modalidade era mais rigorosa quanto ao controle dos educandos, servindo a
232
possibilidade de reprovação dos alunos como uma forma inclusive de fazê-los estudar mais
em comparação aos dias de hoje.
Em relação à questão de destaque entre as concepções reveladas por DAM,
percebemos que o fator marcante refere-se à sua proposta de que a EJA deve se voltar
basicamente à qualificação profissional e à formação escolar dos educandos para
ingressarem no mercado de trabalho ou conseguirem melhores condições de emprego, já
que esse seria o principal objetivo dos alunos ao procurarem a EJA.
O destaque nos significados atribuídos por GUT acerca das temáticas
discutidas nesse estudo remete-se ao seu reconhecimento de que a EJA é uma modalidade
diferenciada o apenas em relação aos demais segmentos da Educação Básica, mas
também em relação ao ensino supletivo, e que essa diferenciação está pautada
principalmente no perfil sociocultural e nas expectativas e demandas dos educandos jovens
e adultos frente aos alunos do ensino regular.
Partindo para algumas considerações mais gerais diante das concepções
reveladas pelos sujeitos dessa pesquisa, sem querer com isso generalizar, é possível
percebermos que o tempo de atuação docente na EJA parece não ser um fator determinante
na constituição do ideário pedagógico dos professores em conformidade com os
pressupostos teóricos do novo modelo de educação, comprometido principalmente com a
causa da inclusão social dos educandos jovens e adultos.
Assim, constatamos que o fato do professor ter ou não uma certa experiência
docente na EJA parece não influenciar de maneira decisiva o seu entendimento ou mesmo
suas práticas pedagógicas quanto ao desenvolvimento do processo escolar nessa
modalidade educacional.
Além disso, alguns pressupostos que considerávamos encontrar e não
diagnosticamos no universo pesquisado refletem que os professores dessa modalidade
ainda têm dificuldades para compreender quem são os educandos da EJA, quais são suas
características sociais e o que querem retornando para os bancos escolares depois de algum
tempo fora da escola.
Nesta perspectiva, demonstrando não reconhecer exatamente a clientela da
EJA, percebemos que os professores acabam tendo dificuldades para desenvolver suas
atividades docentes, principalmente quando isso faz com que não saibam ao certo como
trabalhar de modo que consigam atender a um blico tão heterogêneo formado de jovens
e adultos, que formação escolar devem promover, que conteúdos matemáticos devem
enfatizar, quais recursos didático-metodológicos são interessantes utilizar, o que e como
233
avaliar, enfim, acabem não conseguindo lhe dar com uma série de fatores relacionados ao
processo educacional nessa modalidade tão complexa e distinta em relação às demais
modalidades da Educação Básica.
Esses aspectos nos conduzem à iia de que as escolas com oferta de vagas
voltadas para a EJA parecem não possuir uma identidade com essa modalidade; parecem
o reconhecer a necessidade de um modelo pedagógico próprio concebido para jovens e
adultos de escolarização básica incompleta que se diferem dos alunos que freqüentam o
ensino regular o apenas pela questão etária, mas principalmente pela situação
sociocultural e pelas expectativas e demandas em relão à Educação Básica.
Neste sentido, diante da falta de identidade com a EJA e com as
particularidades que as envolve, e consequentemente no desempenho das atividades
docentes nessa modalidade como se estivessem no ensino regular, os professores parecem
desconhecer a relão homem e trabalho, conhecimento cotidiano e conhecimento escolar,
cidadania e educação matemática, bem como, demonstram desconhecer o verdadeiro
significado da importância da educação na vida de pessoas marcadas pela exclusão e
desigualdade social e, portanto, ávidas em melhorarem suas condições e transformarem sua
realidade a partir da escolarização.
Nesse movimento, é imprescindível reafirmarmos a importância da EJA como
a reparação de uma dívida social, como uma nova oportunidade sócio-educacional àqueles
que foram excluídos do sistema escolar quando crianças ou adolescentes, como uma
possibilidade de uma nova inserção no mundo do trabalho e na vida social, uma promessa
de qualificação de vida para todos onde o princípio da atualização de conhecimentos e da
aprendizagem contínua signifique ao educando “aprender a aprender” ao longo de sua
trajetória dentro e fora do ambiente escolar.
Da mesma forma, vale ressaltar o papel fundamental da Matemática na EJA
como uma necessidade individual e social no efetivo exercício da cidadania e como um
instrumento de transformação da sociedade. Deve-se pensar na Matemática para os
educandos jovens e adultos como uma contribuição para as práticas de leitura e
compreensão do mundo em que vivemos, de modo que assim, possam participar mais e
mesmo apreciar melhor esse mundo cada vez mais dependente dos conhecimentos
matemáticos entranhados na realidade social.
Considerando também, a influência e a importância da avaliação no contexto
educacional da Educação Básica e da EJA em especial, não poderíamos deixar de destacar
ainda sua fundamental participação nessa modalidade. Dessa forma, a perspectiva da
234
avaliação como impulsionadora da aprendizagem e capaz de promover o desenvolvimento
dos educandos deve ser assumida em detrimento a uma avaliação influenciada pelo
paradigma da desigualdade social, que é contrário à perspectiva inclusiva da EJA, que
requer respeito às diferenças individuais dos alunos e também que esses tenham
consciência da própria aprendizagem.
Nesse momento, diante da importância da EJA, da Matemática e da avaliação
escolar aos educandos dessa modalidade e frente a real situação na qual o processo escolar
na EJA parece se configurar, um dos principais indicativos de ação para reverter esse
quadro vai se constituir na necessidade de uma formação inicial e continuada dos
professores voltada ao atendimento das especificidades dessa modalidade.
Sendo assim, a formação docente específica para a EJA torna-se uma ação
sistemática imprescindível na tentativa de se atender as exigências e a complexidade
diferencial que envolvem essa modalidade.
Neste caso, torna-se fundamental que as licenciaturas e outras habilitações
ligadas aos profissionais do ensino não deixem de considerar em seus cursos a realidade
complexa da EJA.
Considerando ainda, que grande parte dos professores que trabalham na EJA
são leigos ou pertencentes ao quadro docente do ensino regular, e consequentemente não
estão preparados para atuarem no campo específico dessa modalidade, torna-se
impreterível a formulação de ações voltadas à formação continuada ou em serviço desses
professores em conformidade com as especificidades da EJA.
Diante do desafio de mostrar aos educandos da EJA a finalidade e o papel da
Matemática como uma das possibilidades de transformação da realidade social e o efetivo
exercício da cidadania, torna-se indiscutível ainda a necessidade de formação de
professores como educadores matemáticos de jovens e adultos, dotados não apenas de
certa intimidade com a própria Matemática, mas também preparados e compromissados
com especificidades que envolvem além dos educandos a própria modalidade EJA em si.
No mesmo caminho, é imprescindível a oferta de cursos de formão docente
voltados à discussão da avaliação, principalmente no sentido de se buscar alternativas e
soluções para a superação do fracasso e da exclusão escolar decorrente das práticas
avaliativas classificatórias, punitivas e disciplinadoras. Haja vista a necessidade de
capacitações de professores que possibilitem o conhecimento e a reflexão de outras
práticas e instrumentos avaliativos contrários às avaliações tradicionais, mas que
desempenhem o verdadeiro papel de impulsionadoras da melhoria do processo escolar com
235
o intuito de promover a aprendizagem e o desenvolvimento dos educandos.
Na discussão relacionada ao desenvolvimento de outros estudos que refletem
de uma forma ou de outra a problemática investigada nessa pesquisa, acreditamos que é
preciso fomentar investigações no âmbito da EJA sobre a relação entre as concepções dos
professores e sua prática pedagógica, principalmente quando se reconhece que o
conhecimento e as crenças dos professores afetam de modo significativo a forma como
organizam e ministram suas aulas.
Outros assuntos que merecem ser explorados e investigados em trabalhos
futuros, e que percebemos a partir dos resultados dessa pesquisa, remetem-se à discussão
do processo de reclassificação dos educandos, à definição dos conteúdos matemáticos
selecionados pelos professores, e aos questionamentos acerca da influência do tempo de
atuação docente na constituição do ideário e das práticas pedagógicas dos professores.
Em relação ao processo de reclassificação previsto na EJA, percebemos que ele
tem sido bastante questionado como uma das principais dificuldades dos professores em
desempenharem suas atividades pedagógicas nessa modalidade. Além disso, é possível
evidenciarmos algumas contradições em torno desse processo, como no caso do
questionamento que em diversos momentos nos motivou a refletir sem que chegássemos a
uma conclusão: como é que os alunos chegam à etapa seguinte do processo escolar com
defasagem de conteúdos e provavelmente apresentando dificuldades de aprendizagem
depois de terem sido reclassificados, sendo que a reclassificação desse educando para a
fase subseqüente onde se encontrava tem como princípio ocorrer apenas quando se acredita
que ele já possui as habilidades e competências necessárias para sua progressão à próxima
fase?
Durante a análise dos dados revelados pelos sujeitos da pesquisa, em diversos
momentos percebemos que os professores se referiram à necessidade de se tratar de modo
diferenciado o processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA em relação às
demais modalidades educacionais apenas em fuão da organização e do desenvolvimento
dos conteúdos matemáticos que são trabalhados no ensino regular, destacando a
necessidade desses serem resumidos no contexto da EJA. Neste sentido, acreditamos ser
importante a fomentação de estudos sobre os princípios adotados pelos professores na
tomada de decisões sobre a seleção e a organização dos conteúdos matemáticos na EJA,
principalmente quando se sabe hipoteticamente que eles escolhem esses conteúdos muito
mais em função daquilo que acreditam ser importante do que pelo fato desses serem
significativos para o desenvolvimento da aprendizagem matemática dos educandos.
236
No momento em que esperávamos encontrar entre os professores pesquisados
uma concepção mais próxima aos ideais de um novo modelo de educação à medida que
possuíam maior experiência docente na EJA, e isso o foi confirmado em nosso estudo,
acreditamos ser interessante o desenvolvimento de pesquisas nesse sentido que
investiguem se o tempo de atuação docente na EJA estabelece de fato alguma influência no
ideário e nas práticas pedagógicas dos professores baseadas nos pressupostos teóricos
contrários ao modelo de ensino tradicional e amparadas no paradigma da educação
inclusiva e democrática que essa modalidade deve se propor.
Contudo, ressaltamos a necessidade de se aprofundar a discussão e a
compreensão a respeito da tade EJA, Educação Matemática e avaliação, fundamentais
o apenas no contexto educacional, mas significativas também do ponto de vista social e
cultural.
REFERÊNCIAS
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Janeiro, Fundação Cesgranrio, v. 6, n. 21, p. 447-462, out./dez. 1998.
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ALMEIDA, Laura I. M. Vasconcelos de. Concepções de professores em avaliação e
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ARANTES, Maria José G. M. de Andrade. Concepções e práticas de avaliação de
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Supervisão Pedagógica em Ensino da Matemática) Instituto de Educação e Psicologia,
Universidade do Minho, Braga, Portugal.
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APÊNDICES
247
QUESTIONÁRIO DE CARACTERIZAÇÃO (QC)
Professor(a),
Gostaríamos de solicitar sua colaboração para responder este questionário, que tem por objetivo obter
informações de caráter pessoal que serão importantes para o desenvolvimento de uma pesquisa de Mestrado
envolvendo as temáticas da avaliação e da educação Matemática no contexto da EJA. Esclarecendo ainda,
que preservaremos seu anonimato, agradecemos sua preciosa colaboração.
Emerson da Silva Ribeiro (Mestrando)
Dra. Marta Maria Pontin Darsie (Orientadora)
I. Dados Pessoais
Nome completo: ___________________________________________________________
Data de nascimento: _____/_____/_______. Naturalidade: ________________________
Sexo: ( ) Masc. ( ) Femin. Estado civil: _________________________
Situação Funcional: ( ) Professor Efetivo ( ) Professor Contratado
Telefone para Contato: ____________________
II. Formação Acadêmica
Graduação
Curso/Habilitação: _________________________________________________________
Instituição em que se formou: ________________________________________________
Ano de ingresso: ______ Ano de conclusão: ______ Cidade/Estado: __________________
Pós-Graduação
( ) Especialização ( ) Mestrado ( ) Doutorado
Área: _____________________________ Instituição: _____________________________
Ano de ingresso: ______ Ano de conclusão: ______ Cidade/Estado: __________________
tulo Monografia/Dissertação/Tese: ___________________________________________
Fez algum curso de formação complementar na área da EJA? ( ) Sim ( ) o
Nome do curso: ___________________________________________________________
III. Experiência Profissional
a) Há quanto anos atua como professor? _____. E como professor de Matemática? ______.
b) Há quanto tempo é professor da Educação de Jovens e Adultos (EJA)? _________ anos.
c) Atualmente está atuando em outra modalidade da Educação Básica que não seja a EJA?
( ) Sim ( ) o. Em qual modalidade? ( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio
d) Há quantos anos leciona no Ensino Médio? ______. E no Ensino Médio da EJA? _____.
e) Há quanto tempo trabalha nessa Escola? _________ anos.
f) Quantas horas leciona por semana? ( ) 20 horas ( ) 40 horas ( ) Mais de 40 horas
g) Exerce outra profissão além de professor? ( )Sim ( ) Não Qual? _______________
___________________________________
248
SÍNTESE DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS DA PESQUISA REFERENTE ÀS PERGUNTAS DO
QUESTIONÁRIO 1 (Q1 – Educação de Jovens e Adultos)
SUJEITOS DA PESQUISA
PERGUNTAS
IRE DAM GUT
1. Como vo define a Educação de Jovens
e Adultos (EJA)?
“Processo educacional para aqueles com
defasagem escolar que freqüentaram
ou não uma escola”.
“Defino como um processo de
aprendizagem da formação de jovens e
adultos que objetiva a educação integral
do educando”.
“A EJA é um sistema educacional que
atinge uma parcela da sociedade que se
encontra fora da escola”.
2. Em sua opinião, qual é o papel da EJA
no contexto sócio-educacional?
“Ensino de qualidade para aqueles que
não oportunizaram nas etapas regulares
da educação”.
“É a preparação do jovem e adulto para o
mercado de trabalho e convívio na
sociedade para dela se servir”.
“De inclusão, de uma faixa da sociedade
com idade avançada, no ambiente
escolar”.
3. Como você compreende a oferta de
educação regular, através da EJA, para
jovens e adultos de escolarização básica
incompleta ou jamais iniciada, que
(re)tomam os bancos escolares?
“Preocupante, pois os mesmos
esqueceram ou não aprenderam coisas
básicas e úteis para o bom rendimento
das aulas”.
“Na realidade a EJA veio para reparar
uma falha da Legislação Básica do
ensino e visa dar uma nova oportunidade
aos alunos na faixa etária de 17 anos.
“Necessária e importante, pois põe uma
grande parcela da sociedade dentro da
sala de aula”.
4. Como você define o seu aluno da EJA?
“Com expectativas de aprendizado,
porém com muitas dificuldades e com
interesse no certificado”.
“Na sua maioria um aluno sem a base de
formação necessária, com enormes
dificuldades de aprendizagem,
articulação e compreensão dos
problemas”.
“Carente, tanto do ponto de vista
intelectual, quanto social, mas que busca
um espaço na sociedade”.
5. Com que objetivo você acredita que seus
alunos procuram a EJA?
“Em busca de certificação de forma mais
facilitada”.
“Como uma oportunidade para conseguir
uma colocação de emprego no mercado”.
“Uma grande parte tem o objetivo de
adquirindo o ‘diploma’ obter alguma
possibilidade no mercado de trabalho”.
6. Em sua opinião, a EJA deve se propor a
que tipo de formação para seus alunos?
“Formar alunos competitivos e em
igualdades de condições com outros de
outras modalidades”.
“Formação integral na 1
a
fase para uma
base sólida teórica de conhecimentos e
uma 2
a
etapa profissionalizante.
“Apenas na formação básica (I a IV), o
mercado é muito competitivo para uma
formação fraca no ensino médio”.
Formação
Inicial
“1. As disciplinas trabalhadas na UFMT
não relacionavam com a prática”.
“3. Mais da metade considera a formação
do conhecimento do aluno adquirido e
vivenciado acima da média”.
“5. Para entender a função principal da
EJA”.
Formação
Continuada
“4. É necessário fazer sempre cursos com
enfoque próprio para Educação
Matemática”.
“3. Mais da metade considera a formação
continuada no processo de aprendizagem
acima da média”.
“4. Com o objetivo de aperfeiçoamento”.
7. Para cada uma das
questões, atribua um
valor de 0 a 5 que
corresponda, em sua
opinião, à influência
desses contextos
formativos na sua prática
docente na EJA. E
justifique os valores
atribuídos para cada uma
dessas questões:
Conhecimento
Experiencial
“4. Pois um comodismo tanto do
professor como aluno”.
“2. Devido ao aluno não possuir uma
formação teórica e de conhecimento
consistente, o conhecimento com base na
experiência fica prejudicado. Abaixo da
média”.
“5. Conhecer práticas metodológicas
aplicadas à EJA”.
249
SÍNTESE DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS DA PESQUISA REFERENTE ÀS PERGUNTAS DO
QUESTIONÁRIO 2 (Q2 – Matemática na EJA)
SUJEITOS DA PESQUISA
PERGUNTAS
IRE DAM GUT
1. Como você define a Matemática na EJA?
“Aplicada para que os educandos possam
usá-la em sua vida”.
“Como uma oportunidade de realizar as
operações e problemas do dia-a-dia,
através do conhecimento e capacitação.
“De fundamental importância, pois é
um instrumento na resolução de
problemas aplicados no cotidiano”.
2. O processo de ensino-aprendizagem da
Matemática deve ser compreendido de forma
diferenciado no universo da EJA em relação
às outras modalidades da Educação Básica?
( ) Sim ( ) Não. Justifique
“Não, pois os alunos da EJA devem ser
inseridos no contexto sem distinções de
qualidade.
“Não. Conforme o aluno objetiva uma
colocação no mercado de trabalho e se
não se preparar adequadamente jamais
conseguirá êxito. Portanto, a formação
deve ser integral”.
“Não. Assim como outra carência do
conhecimento deve ser trabalhada de
forma criteriosa respeitando o tempo
do aluno”.
3. Que importância você atribuí ao ensino da
Matemática na EJA?
“De forma significativa, pois a mesma se
aplica a tudo que se possa imaginar”.
“É de fundamental importância para a
realização das operações e resolução dos
problemas diários de sua vida prática.
“É importante na ptica do cotidiano,
e desenvolve a inteligência gico-
matemática que o aluno da EJA irá
precisar em outras ciências.
4. De que forma você acha que a Matemática
deve ser ensinada na EJA?
“Através de uma metodologia com
prática que os educandos concretizem os
conhecimentos a ser aplicados.
“Idêntica ao ensino fundamental, porém
com o conteúdo condensado que permita
ao aluno possuir o conhecimento
específico necessário.
“Aplicando situações do cotidiano do
aluno”.
5. Em sua opinião, que conhecimentos
matemáticos são essenciais para que os
alunos da EJA supram suas necessidades
básicas de aprendizagem da Matemática?
“Domínio das regras, dos conceitos, dos
cálculos e utilização das fórmulas”.
“As operações fundamentais. Os
conteúdos ensinados voltados para a
preparação de mão-de-obra para o
mercado”.
“Operações matemáticas, Matemática
Financeira, área, assuntos relacionados
ao seu cotidiano”.
6. Como você costuma ensinar Matemática
aos seus alunos da EJA?
“Aulas de campo, laboratórios, jogos e
aulas expositivas”.
“Através de aula expositiva, aplicação de
exercícios, trabalhos e fazendo
comparações com os problemas do
cotidiano enfrentados por eles.
“Lançando situações problemas
relacionadas às dificuldades no
cotidiano do aluno. A partir daí o
conteúdo é trabalhado.
7. Em sua opinião, quais são as causas e/ou
motivos que levam o aluno da EJA a
“fracassar” em Matemática?
“Visão que a Matemática é difícil desde
as séries iniciais”.
“A falta de um embasamento teórico
prático, porque a Matemática é um
processo acumulativo de aprendizagem
onde determinado assunto (teoria) serve
de base para o conteúdo seguinte. Falta
também de um trabalho de
conscientização da importância do estudo
da Matemática pela escola”.
“O aluno da EJA não prioriza a escola,
logo não tem tempo para se dedicar e
melhorar seu conhecimento”.
250
SÍNTESE DAS RESPOSTAS DOS SUJEITOS DA PESQUISA REFERENTE ÀS PERGUNTAS DO
QUESTIONÁRIO 3 (Q3 – Avaliação em Matemática na EJA)
SUJEITOS DA PESQUISA
PERGUNTAS
IRE DAM GUT
1. Para vo o que é avaliar em
Matemática na EJA?
“Verificar o desenvolvimento dos
cálculos, regras e suas aplicações nas
situações problemas”.
“É verificar se o aluno assimilou o
conteúdo e o modo de resolver deste
problema, caracterizando assim a
aprendizagem”.
“Verificar se o aluno possui ou
desenvolveu habilidades necessárias no
assunto proposto”.
2. O que você avalia em Matemática na
EJA?
“As atividades propostas que são
desenvolvidas em sala de aula ou fora”.
“Se o aluno foi capaz de solucionar um
problema formulado e se aprendeu”.
“O que foi conquistado, através de práticas
em sala de aula e fora dela, com habilidade
no assunto trabalhado.
3. Qual seu objetivo ao avaliar em
Matemática na EJA?
“Proporcionar aos alunos um estado de
conquista para o desenvolvimento das
atividades e situações-problemas”.
“Se houve aprendizagem através da
assimilação do conteúdo”.
“Cumprir uma etapa importante do
processo ensino-aprendizagem”.
4. Em que momento vo avalia em
Matemática na EJA?
“Em todos os momentos em que a
Matemática possa contribuir para uma
visão mais ampliada de mundo”.
“Através da resolução dos exemplos e
exercícios e do conhecimento exposto”.
“Durante todo o processo”.
5. Quais são os instrumentos utilizados
por você para avaliar em Matemática na
EJA?
“Aulas de campo, jogos, enquetes,
debates, etc.”.
“Problemas individuais e em grupo, pois
o aluno somente aprende fazendo,
exercitando.
“A participação, interesse, e vontade em
crescer”.
6. Como você avalia os erros dos alunos
em Matemática na EJA?
“O erro é o icio para busca do acerto”.
“Como uma forma de aprendizagem,
pois aprendemos errando 1 vez, 2, 3
depois 3, 2 e 1”.
“Retomando e provocando novas
discussões sobre o assunto”.
7. Você acha que a avaliação em
Matemática na EJA deve ser
compreendida e praticada de forma
diferenciada em relação às outras
modalidades da Educação Básica?
( ) Sim ( ) Não. Justifique?
“Não, pois as situações Matemáticas
tanto para o aluno de EJA são as mesmas
que para outros de outras modalidades de
ensino”.
“Não. Deve ser idêntica da educação
fundamental e ensino médio, para
proporcionar ao aluno um conhecimento
geral e mais amplo dos conteúdos.
“Sim. O público alvo é diferenciado;
trabalha, estava afastado da escola”.
251
ROTEIRO BÁSICO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
Bloco I – Educação de Jovens e Adultos
1. O que é a Educação de Jovens e Adultos (EJA)?
2. Quais os aspectos positivos da EJA? E os negativos?
Bloco II – Matemática na EJA
3. Como deve ser realizado o processo de ensino-aprendizagem da Matemática na EJA?
4. E como você costuma realizar esse processo?
5. Quais são as principais dificuldades encontradas por você na realização do seu
trabalho na EJA?
Bloco III – Avaliação da Matemática na EJA
6. Como você acha que deve ser realizada e/ou praticada a avaliação do ensino-
aprendizagem da Matemática na EJA?
7. O que você avalia?
8. Para que você avalia?
9. Como você avalia?
10. Como é feito o registro daquilo que você avalia?
11. Quando você avalia?
Bloco IV – Plano Político Pedagógico (PPP) e Reclassificação
12. Vo conhece o Plano Potico Pedagógico (PPP) desta escola? Participou do
processo de construção desse Plano? Como você compreende esse Plano?
13. Como é realizado o processo de “Reclassificaçãona escola? De que forma isso é
registrado?
14. O que você tem a dizer positivamente sobre o processo de “Reclassificação”
realizado nessa escola? E o que tem a dizer negativamente?
Bloco V Perguntas complementares referentes ao questionário e até mesmo sobre a
própria entrevista que não ficaram bem esclarecidas
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