3 UM BREVE HISTÓRICO SOBRE A RELAÇÃO ENTRE FORÇA E MOVIMENTO 62
Ora, não posso imaginar de onde viriam todos esses movimentos irregulares,
a menos que seja de algum tipo de matéria sutil que fique condensada no
vidro e seja rarefeita pela fricção, tal como a água é rarefeita em vapor pelo
calor, e que, nessa rarefação, seja difundida pelo espaço em torno do vidro a
uma grande distância, e levada a se mover e a circular de várias maneiras e,
por conseguinte, a acionar os papéis, até retornar novamente para o vidro e
ser recondensada nele. E, assim como essa matéria condensada, rarefazendo-
se num vento etéreo (pois, por sua penetração e circulação fácil no vidro,
estimo que seja etéreo), pode provocar esses movimentos estranhos e, ao se
condensar novamente, pode fazer com que a atração elétrica, com seu
retorno para o vidro, ocorra em lugar do que é continuamente recondensado
ali, também a atração gravitacional da Terra pode ser causada pela
condensação contínua de algum outro espírito etéreo semelhante, não do
corpo principal do éter fleumático, mas de algo muito fino e sutilmente
difundido através dele, talvez de natureza untuosa ou viscosa, tenaz e
elástica, e que tenha com o éter a mesma relação que tem o ar o espírito
aéreo vital
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que é necessário à conservação da chama e dos movimentos
vitais. Pois, se um tal espírito etéreo pode ser condensado nos corpos em
fermentação ou em combustão, ou coagulado de alguma outra maneira nos
poros da terra e da água, numa espécie de matéria ativa úmida para os usos
contínuos da natureza, aderindo aos lados desses poros à maneira como os
vapores se condensam dos lados de um recipiente sutilmente montado, o
vasto corpo da Terra, que talvez esteja em perpétuo funcionamento por toda
parte, até seu próprio centro, pode condensar continuamente uma quantidade
tão grande desse espírito, que o faça descer do alto com grande celeridade
para abastecê-la. Nessa descida, é possível que ele traga consigo para baixo
os corpos que perpassa, com uma força proporcional às superfícies de todas
as partes deles sobre as quais atua; a natureza promove uma circulação, pela
ascensão lenta, de uma quantidade igual de matéria, saída das entranhas da
Terra, sob uma forma aérea, a qual, durante algum tempo, constitui a
atmosfera, mas, sendo mantida em contínua flutuação pelo novo ar,
exalações e vapores que se elevam de baixo pra cima, acaba (com exceção
de uma parte dos vapores, que retorna na chuva) tornando a desaparecer nos
espaços etéreos, onde, com o tempo, talvez se abrande e se atenue em seu
primeiro princípio. [...] E, assim como a Terra, talvez o Sol se impregne
abundantemente desse espírito para conservar seu brilho e para impedir que
os planetas se afastem mais dele. E que assim o desejar também poderá
supor que esse espírito proporciona ou carrega consigo para lá o combustível
solar e o princípio material da luz; e que os vastos espaços etéreos entre nós
e as estrelas são um repositório suficiente desse alimento do Sol e dos
planetas (NEWTON apud COHEN; WESTFALL, 2002, p. 33-34).
Ainda mais uma vez, em 1679, oito anos antes de publicar a primeira edição dos Principia,
em uma carta enviada a Robert Boyle, Newton refere-se a um novo modelo de éter para
explicar a gravidade:
Vou apresentar mais uma conjetura, que veio à minha mente enquanto estava
escrevendo esta carta; é sobre a causa da gravidade. Para isso, suporei que o
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Alguns experimentos, feitos aproximadamente nessa época, mostravam que havia algo no ar que mantinha a
vida e a combustão, e que era chamado de diversas maneiras, inclusive “espírito aéreo vital”.