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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
PROPE – PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO MULTIDISCIPLINAR EM ECOLOGIA E PRODUÇÃO
SUSTENTÁVEL
SÔNIA SALETE ZAVAREZE
COMUNIDADE VOADEIRA E A GESTÃO DO TERRITÓRIO
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
ECOLOGIA E PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL
GOIÂNIA, 2007
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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
PROPE – PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO MULTIDISCIPLINAR EM ECOLOGIA E PRODUÇÃO
SUSTENTÁVEL
SÔNIA SALETE ZAVAREZE
COMUNIDADE VOADEIRA E A GESTÃO DO TERRITÓRIO
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ecologia e Produção
Sustentável da Universidade Católica de Goiás
como requisito parcial para obtenção do grau
de Mestre em Ecologia e Produção
Sustentável.
Professor orientador: Prof. Dr. Aristides Moysés
GOIÂNIA, 2007
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
PROPE – PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
MESTRADO MULTIDISCIPLINAR EM ECOLOGIA E PRODUÇÃO
SUSTENTÁVEL
COMUNIDADE VOADEIRA E A GESTÃO DO TERRITÓRIO
Aprovada em: 29/08/2007
Prof. Dr. Aristides Moysés (Presidente)
(Presidente)
Prof. Dr. Ycarim Melgaço Barbosa/UCG
(Avaliador Interno)
Prof. Pós Dr. Hidelberto de Sousa Ribeiro/UFMT
(Avaliador Externo)
Sei, cada vez melhor, que o único conhecimento que vale é o
que se nutre da incerteza e que o único pensamento que vive é o que se
mantém à temperatura da sua própria destruição.
(Edgar Morin, sociólogo francês, 1977)
AGRADECIMENTOS
Esta dissertação faz uma discussão teórica sobre desenvolvimento
regional e local, agroecologia, desenvolvimento sustentável e sobre o processo de
ocupação do Centro-Oeste nos anos 1960. Apresenta ainda uma descrição
etnográfica e o perfil sócio-econômico da Comunidade Voadeira, vila de Barra do
Garças – Mato Grosso, objeto deste estudo. Sua realização contou com a
contribuição de várias pessoas, cuja gratidão registro aqui.
Ao Prof. Dr. Aristides Moysés que, como meu orientador, desde o
momento da entrevista na seleção, demonstrou interesse pelo projeto,
profissionalismo e competência. Com sua simpatia, sempre se preocupou em
incentivar à leitura e à participação em congressos. Suas indicações bibliográficas,
questionamentos, contribuições e correções neste trabalho foram importantes para
me fazer crescer e, inclusive, ousar.
À Profª. Doutoranda Marilene Marzari e ao Prof. Pós-Doutor Hidelberto de
Sousa Ribeiro, pelas contribuições inicialmente na elaboração do projeto e,
posteriormente, na indicação bibliográfica, na leitura e contribuições para este
trabalho. Profissionais amigos, com os quais se aprende a disciplina, o gosto pela
leitura e o zelo pelos materiais.
Ao Prof. Dr. Ycarim Melgaço Barbosa, pelas importantes contribuições e
fundamentais sugestões de bibliografia, quando da qualificação do projeto.
Ao Prof. Mestre Francisco Silvério Adams e à Prof
a
. Mestranda Luciene
de Moraes Rosa, colegas de moradia, pelo apoio durante o período de estudos em
Goiânia. A eles, meu carinho e a certeza que esses laços de amizade contribuíram
para fortalecer-me nos momentos de dificuldades. Juntos, pudemos fazer da
Matemática uma ferramenta para as economias domésticas; da Geografia, um
instrumento para nossa localização nessa capital antes desconhecida para nós e, da
História, momentos para construirmos a nossa própria história.
Aos profissionais do IBGE/Barra do Garças – MT, EMPAER/MT,
SEBRAE, Cartório do 1º Ofício, Prefeitura Municipal, Rede CEMAT, EMASA e
INCRA, pelo fornecimento de dados, informações e materiais que muito me foram
úteis na construção desta dissertação.
Aos moradores da Comunidade Voadeira, pela contribuição e paciência
durante as entrevistas e aplicação dos questionários, os quais, por vezes, alteravam
a sua rotina para me atender.
À Secretaria de Estado de Educação, especialmente ao Prof. Esp. Sérgio
da Rocha Barrientos, Diretor da Escola Estadual “Antonio Cristino Côrtes”, pelo
empenho na viabilização da minha licença para qualificação, e aos demais
Profissionais e alunos daquela Instituição, pelo carinho mantido durante minha
ausência.
À diretoria do SENAC, pela licença concedida durante o mestrado, e aos
colegas da instituição, pelo apoio em realizar mais esta etapa de minha vida
acadêmica.
À Comissão de Pós-Graduação e Pesquisa da UCG, aos professores e
funcionários da secretaria do programa do Mestrado Multidisciplinar em Ecologia e
Produção Sustentável, extensivo aos profissionais da secretaria do Mestrado em
Desenvolvimento e Planejamento Territorial.
Aos colegas, especialmente à Cleonice e à Marisa, pela atenção e
sinceridade que sempre me dispensaram.
Aos amigos, que me compreenderam pelos momentos de ausência, em
virtude dos trabalhos do mestrado e, principalmente, pelo apoio e incentivo. Espero
poder retribuir essa “fraternidade”.
À minha família, fonte de inspiração, de força e de energia para alcançar
sempre novos objetivos.
RESUMO
Barra do Garças é um município do Leste do Estado de Mato Grosso, às
margens do Rio Araguaia. De origem garimpeira, é composto de índios e migrantes
oriundos de várias partes do país. Alguns desses migrantes, por volta de 1950,
ocuparam a Fazenda Voadeira. O proprietário, anos depois, negociou com os
ocupantes, que regularizaram suas chácaras ou venderam o “direito” a fazendeiros
da região. Da área remanescente da Fazenda, o proprietário doou 10 alqueires ao
Estado, em cujo espaço está localizada a Vila Voadeira. Parte dessa área foi grilada
por fazendeiros e agregada às suas propriedades. Uma alternativa econômica
encontrada pela Comunidade, agora sem área para plantio, foi criar a Associação de
Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira e produzir derivados de
caju, planta abundante na região. Apesar da importância histórica para a região, por
ter sido caminho para Cuiabá e sede de um posto de telégrafo, que, à época da
Fundação Brasil Central, impediu a Revolta do Veloso contra o governo JK, a
Comunidade sofre um processo de decadência. Atualmente com 71 moradores,
forma uma “ilha” entre as fazendas e chácaras e os moradores sofrem carência dos
serviços básicos. Nossa pesquisa baseou-se no estudo teórico do processo de
ocupação do Centro-Oeste, na sustentabilidade e na questão agrária e, com
aplicação de questionários e entrevistas, foi possível fazer uma descrição
etnográfica da Comunidade, estudar as relações sócio-econômicas e avaliar a sua
sustentabilidade. A conclusão que se teve foi de que não há sustentabilidade nas
atividades da Comunidade e, por isso, indicamos algumas ações, com objetivo de
geração de renda dentro da perspectiva sustentável e que podem servir de exemplo
para outras comunidades da região.
PALAVRAS-CHAVE: comunidade, produção, caju, sustentabilidade.
ABSTRACT
Barra do Garças is a municipal district of the East of the State of Mato
Grosso, located at the banks of the Araguaia River. Of the epoch the gravel washers,
it is composed of Indians and migrants originating from of several parts of the
country. Some of those migrants, about 1950, occupied Voadeira Farm. The
proprietor, years later, it negotiated with the occupants, that regularized their small
farms or they sold the “right” to farmers of the area. Of the remaining area of Finance,
the proprietor donated 10 bushels to the State, in whose space is located the
Voadeira small town. Part of that area was taken illegally for farmers and joined to
their properties. An economical alternative found by the Community, now without
area for planting, it went to create the Association of Residents and Small Producing
of the District of Voadeira and to produce derived of cashew, it plants abundant in the
area. In spite of the historical importance for the area, for it being road for Cuiabá and
headquarters of a telegraph position, that, to the time of the Brasil Central
Foundation, it impeded Veloso's Revolt against the government JK, the Community
suffers a decadence process. Now with 71 residents, it forms a "island" between the
farms and small farms and the residents suffer lack of the basic services. Our
research based on the theoretical study of the process of occupation of the Center-
west, in the sustainability and in the agrarian subject and, with application of
questionnaires and interviews, it was possible to do a description ethnographic of the
Community, to study the socioeconomic relationships and to evaluate its
sustainability. The conclusion that one had was that there is no sustainability in the
Community's activities and, for that, we indicated some actions, with objective of
generation of income inside of the maintainable perspective and that can serve as
example for other communities of the area.
WORD-KEY: community, production, cashew, sustainability.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................................13
1 DESENVOLVIMENTO REGIONAL E LOCAL: ASPECTOS TEÓRICOS DO
DESENVOLVIMENTO ................................................................................................................ 23
1.1 O DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO CENTRO-OESTE .................................................... 23
1.2 NOVAS FORMAS DE GERENCIAMENTO DOS TERRITÓRIOS ........................................ 29
1.3 O PAPEL DO ESTADO NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS À
PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL ..................................................................................................... 33
1.4 O PAPEL ESTRATÉGICO DAS COMUNIDADES NO GERENCIAMENTO DOS
TERRITÓRIOS – NOVAS FORMAS DE PLANEJAMENTO ....................................................... 41
2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E AGROECOLOGIA: CONCEITOS QUE SE
COMPLEMENTAM ..................................................................................................................... 43
2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: ORIGENS E CONCEITOS ................................... 44
2.2 PEQUENAS COMUNIDADES E A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL ........................................ 53
2.3 AGROECOLOGIA: UMA ALTERNATIVA DE SUSTENTABILIDADE PARA AS
PEQUENAS COMUNIDADES DE LAVRADORES ......................................................................59
3 REGIÃO CENTRO-OESTE, REGIÃO DE FRONTEIRA AGRÍCOLA A PARTIR DE 1960...... 64
3.1 O PROCESSO DE OCUPAÇÃO DO CENTRO-OESTE NOS ANOS 1960 .......................... 64
3.2 O RECENTE PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DO CENTRO-OESTE: COMO
INCORPORAR AS COMUNIDADES QUE VIVEM DA AGRICULTURA TRADICIONAL ............ 69
3.3 O MUNICÍPIO DE BARRA DO GARÇAS NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS
TERRITORIAIS ..................................................................... ...................................................... 73
4 COMUNIDADE VOADEIRA: UMA RADIOGRAFIA SÓCIO-ECONÔMICA E CULTURAL .... 80
4.1 PERFIL SÓCIO-ECONÔMICO DOS MORADORES DA COMUNIDADE VOADEIRA ......... 87
4.2 A ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E PEQUENOS PRODUTORES E A COZINHA
COMUNITÁRIA ...........................................................................................................................104
4.3 ENTRAVES ENDÓGENOS E EXÓGENOS PARA O DESENVOLVIMENTO
DA COMUNIDADE VOADEIRA ..................................................................................................108
5 COMUNIDADE VOADEIRA, DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA O SEU
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL ................................................................................... 116
5.1 ANÁLISE DA SUSTENTABILIDADE NA COMUNIDADE VOADEIRA ................................ 116
5.2 CARACTERÍSTICAS SÓCIO-CULTURAIS E PRODUTIVAS DA COMUNIDADE
VOADEIRA ............................................................................................................................... 121
CONSIDERAÇÕES FINAIS E PROPOSITIVAS ........................................................................131
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................................................134
ANEXOS......................................................................................................................................142
LISTA DE SIGLAS
ANA – Agência Nacional das Águas
APLs – Arranjos Produtivos Locais
AS–PTA/RJ – Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa/Rio de Janeiro
BASA – Banco da Amazônia
CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento
CURTUSA – Curtume Santo Antônio
DSG – Departamento de Serviços Geográficos
EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
EMPAER/MT – Empresa Mato-Grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural
EZ/EC – Empowerment Zones and Enterprise Communities (Zonas de Empoderamento e
Comunidades Empreendedoras)
FASE – Federação de Órgãos para a Assistência Social
FBC – Fundação Brasil Central
FNDR – Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional
FUNAI – Fundação Nacional do Índio
GTA – Grupo de Trabalho da Amazônia
GTP – Grupo de Trabalho Permanente
IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
LEADER – Ligações entre Ações de Economia Rural
LOADDT - Loi pour I’Amenagement et lê Développement du Territoire - Lei para Gestão e
Desenvolvimento do Território
LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social
MMA – Ministério do Meio Ambiente
MST – Movimento dos Sem-Terra
ONG – Organização Não-Governamental
PIB – Produto Interno Bruto
PIN – Programa de Integração Nacional
PND – Plano Nacional de Desenvolvimento
PPP – Parcerias Público-Privadas
POLOAMAZÔNIA – Programa de Pólos Agroindustriais e Agrominerais da Amazônia
POLOCENTRO – Programa de Desenvolvimento dos Cerrados
PPA – Plano Pluri-Anual
PRODECER –
Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados
PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
PROTERRA – Programa de Distribuição de Terra e Desenvolvimento Agroindustrial
SEBRAE – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas
SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SLP – Sistemas Locais de Produção
SUDAM – Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia
SUDECO – Superintendência de Desenvolvimento do Centro-Oeste
LISTA DE FIGURAS
Fig. 1 - Plantas de caju em chácara vizinha à Comunidade .................................... 62
Fig. 2 – Mapa de localização de Voadeira e limites do município............................. 74
Fig. 3 – Mapa da Gleba Taquaralzinho .................................................................... 82
Fig. 4 – Comunidade Voadeira ................................................................................. 84
Fig. 5 – Parrreiral ...................................................................................................... 87
Fig. 6 – Projeto Arquitetônico da Comunidade Voadeira ......................................... 89
Fig. 7 - Casa de adobe ainda utilizada pelos moradores de Voadeira ......................90
Fig. 8 - Esgoto despejado na via pública de Voadeira ..............................................90
Fig. 9 - Campo de futebol de Voadeira ......................................................................91
Fig. 10 – Mapa das migrações para Mato Grosso ................................................... 92
Fig. 11 - Casa de pau-a-pique e o cultivo de horta em Voadeira ............................. 93
Fig. 12 - Presença constante do fogão a lenha .......................................................101
Fig. 13 - Cozinha Comunitária com uso de fogões a lenha.....................................101
Fig.14 - Degradação da área do entorno do Córrego Voadeira ............................. 102
Fig.15 - Produção artesanal de doces .................................................................... 105
Fig.16 - Latrina ainda presente em algumas residências de Voadeira .................. 109
Fig.17 - Cozinha Comunitária de Voadeira .............................................................111
Fig.18 - XVI Festa do Caju ......................................................................................128
Fig.19 - Comercialização dos produtos Voadeira na II Feira das Águas ................128
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Atividade de origem e atividade atual dos chefes de família da
Comunidade Voadeira e do entorno ........................................................................ 94
Tabela 2 - Renda familiar da Comunidade Voadeira e do entorno ......................... 95
Tabela 3 - Faixa etária dos moradores da Comunidade Voadeira e entorno .......... 99
Tabela 4 - Número de filhos das famílias da Comunidade Voadeira e entorno ..... 100
INTRODUÇÃO
O processo de expansão da fronteira agropecuária na Amazônia se deu,
de forma muito rápida, com a colonização da região, iniciada na década de 1960 e
incentivada pelo Estado. Esse feito permitiu a entrada do capital no campo,
processo este denominado “modernização conservadora” que provocou grandes
impactos ambientais na região, além de expulsar os pequenos agricultores do
campo.
De grande extensão territorial, com imensas riquezas naturais e com
baixa densidade demográfica, a Amazônia, nos anos 1960, era vista pelo Estado
como um perigo para a Segurança Nacional. O Estado referia-se a uma “cobiça
internacional” pela região, por parte dos países carentes de matérias-primas e dos
países com alto contingente populacional.
A necessidade de integrar física, econômica e socialmente a Amazônia ao
restante do Brasil requereu do Estado um planejamento que atendesse às
necessidades da política territorial embutida de princípios geopolíticos para a
ocupação e expansão da região. Para esse propósito utilizou-se o Programa de
Integração Nacional (PIN), que, além de contribuir para a integração da Amazônia
ao restante do Brasil, contribuiria para a exploração de seus recursos naturais,
utilizando a força de trabalho dos agricultores das regiões Centro-Sul e Nordeste
que migraram para a Amazônia.
Essa utilização da força de trabalho nordestina e centro-sulina não
aconteceu de forma aleatória. Deu-se pela seca que tornava a vida do nordestino
vulnerável às questões climáticas e pelo processo de concentração fundiária
crescente, tanto na região Nordeste como na região Centro-Sul, em que se
desencadeou a modernização da agricultura, com o cultivo de monoculturas,
intensificada na década de 1960. Além disso, essa utilização foi marcada por
conflitos, uma vez que os migrantes encontraram problemas para se instalarem nos
locais de destino, como a falta de infra-estrutura, a falta de moradia e a falta de
emprego.
A especialização da produção, denominada “modernização
conservadora”, trouxe conseqüências negativas às pequenas comunidades. Este
não é um fato isolado; ocorreu em diversas partes do país e é conseqüência da
chegada do capital ao campo. Em Mato Grosso, por exemplo, levou ao acirramento
das atividades agropecuárias, movidas pelos altos investimentos, momento em que
se inicia a pressão sobre os pequenos produtores.
A cidade de Barra do Garças é um exemplo histórico desse fato, pois
localiza-se na divisa do estado de Mato Grosso com Goiás, numa região
denominada Vale do Médio Araguaia e, nos anos de 1950 a 1970, recebeu grande
contingente de migrantes, atraídos pela chegada da Expedição Roncador-Xingu,
posteriormente transformada em Fundação Brasil Central, que objetivou desbravar a
região, construir pontes, estradas e cidades, para apoio logístico e permitir a entrada
do capital no campo.
A partir de 1970, Barra do Garças tornou-se pólo que atendia os grandes
projetos agropecuários, fato que levou a um processo de acuamento dos antigos
moradores. Estes aí se encontravam em busca de melhoria do nível de vida, cuja
trajetória foi marcada por sofrimento, sonho e desencanto. Alguns deles vindos para
trabalhar em garimpos e, quando da sua decadência, passaram a desenvolver
agricultura de subsistência.
Os altos investimentos em projetos agropecuários facilitaram a
“modernização conservadora” que levou à especialização da produção,
principalmente de commodities. Esse processo ocorreu em diferentes regiões do
país e o estado de Mato Grosso não fugiu à regra. As características geográficas e
climáticas da região, as pesquisas da EMBRAPA para adaptação das sementes ao
tipo de solo e os altos investimentos destinados à agropecuária foram os principais
fatores que desencadearam fortes pressões às pequenas comunidades, como
aconteceu com os moradores da Comunidade Voadeira, no final da década de 1960.
Para melhor compreender a história dessa Comunidade, necessário se
faz descrever a trajetória de seus moradores, pois, assim como muitas comunidades
do interior do país, foram pressionados pelo capital e obrigados a migrarem para
diferentes regiões, em busca de melhores condições de vida.
Esses moradores da Comunidade Voadeira, na condição de migrantes,
chegaram a Barra do Garças na década de 1950 e ocuparam a Fazenda Voadeira,
incentivados por um político da região que afirmava aquela não ter dono aquela
área. Vindos principalmente da Bahia e do interior do estado de Mato Grosso,
instalaram-se às margens do Córrego Voadeira, formando ali uma vila – a
Comunidade Voadeira.
Situada a 18 km da cidade de Barra do Garças, a Comunidade, no seu
início, tinha a agricultura de subsistência como sua principal atividade. No entanto,
anos depois, esses moradores foram surpreendidos pelo aparecimento do
proprietário da fazenda que propôs a venda e escrituração dos lotes ocupados.
Alguns deles negociaram o pagamento e obtiveram escritura de sua área. Outros
acabaram sendo convencidos pelos fazendeiros do entorno a venderem o “direito” e
tiveram que migrar para outras áreas, ou, até mesmo, para a cidade.
Em conseqüência, a Comunidade Voadeira passou a sofrer um processo
de decadência, motivo este que nos despertou para este estudo, que é uma
tentativa de mostrar o processo de ocupação do espaço, fazer uma análise do seu
perfil sócio-econômico e a sua descrição etnográfica. Visa, ainda, avaliar se há
sustentabilidade nas atividades e identificar algumas de suas necessidades, para
propor alternativas de geração de renda, com base no desenvolvimento sustentável.
O interesse por estudar a Comunidade Voadeira iniciou-se em 1998,
quando da participação de uma Ação Cívico-Social e efetivou-se a partir de 2005,
quando do início da pesquisa de campo, que se deu por visitas locais e conversas
informais, entrevistas com moradores e lideranças, aplicação de questionários e
análise de documentos.
Como todo estudo teórico, é composto por categorias comuns ao meio
acadêmico. Dessa forma, faz-se aqui a justificativa pela opção de uso. Uma das
categorias utilizadas com freqüência é “ambiente”, para representar a expressão
habitualmente encontrada na literatura como “meio ambiente”, uma vez que
“ambiente” é definido como “aquilo que cerca ou envolve os seres vivos ou as
coisas, por todos os lados; lugar, sítio, espaço, recinto” e “meio” é o “lugar onde se
vive, com suas características e condicionamentos geofísicos; ambiente”
(HOLANDA, 2004). Ainda, “por ambiente, pode-se entender o resultado das relações
complexas que se estabelecem entre a Natureza e as Sociedades” (ROHDE, 2005,
p. 91). Entende-se como suficiente a utilização do termo “ambiente”, uma vez que,
em dado momento, “meio” e “ambiente” tornam-se sinônimos.
Resgatam-se aqui alguns conceitos para esclarecer as denominações
adotadas neste trabalho. Em pesquisa documental, referente à Vila Voadeira,
encontram-se divergências nas denominações, que variam entre Vila e Distrito. No
entanto, a fonte oficial, o IBGE, tem em seus registros a denominação de Vila.
Nesse sentido, cabe esclarecer algumas definições, a saber: comunidade
é “qualquer conjunto populacional considerado como um todo, em virtude de
aspectos geográficos, econômicos e/ou culturais comuns”; vila é um “conjunto de
pequenas habitações independentes, em geral idênticas, e dispostas de modo que
formem rua ou praça interior, por via de regra, sem caráter de logradouro público”;
distrito é a “divisão administrativa de município ou cidade, compreendendo
geralmente mais de um bairro” (HOLANDA, 2004).
Porém, pela natureza do trabalho que se está desenvolvendo e pela
dinâmica do local da pesquisa, adota-se a denominação de Comunidade Voadeira
para definir a Vila Voadeira, uma vez que a população abrangente comunga de
características peculiares locais, tanto no aspecto geográfico como no cultural e no
econômico.
Outro esclarecimento que se faz necessário refere-se ao termo Voadeira
que nomeia a vila, pois, em pesquisa documental, encontra-se a denominação
“Voadeira” e “Avoadeira”. Com essas variações, opta-se por adotar o termo
Voadeira, uma vez que já está sedimentada essa expressão na Comunidade.
Ainda em relação à Comunidade Voadeira, há documentos que a definem
como Distrito, inclusive a própria Associação de Moradores e Pequenos Produtores
do Distrito de Voadeira leva essa denominação. No entanto, o IBGE afirma que
Voadeira é apenas uma vila. Em pesquisa documental junto à Prefeitura Municipal
de Barra do Garças não se encontra nenhuma lei que faça menção à elevação de
Voadeira à categoria de distrito.
Quando se faz referência ao “entorno” de Voadeira, refere-se às onze
fazendas e chácaras vizinhas que compõem esta pesquisa, todas dentro do
município de Barra do Garças e parte é formada por propriedades que fazem limite
com a Comunidade Voadeira.
Feitos esses esclarecimentos, pretende-se, a partir daqui, não mais tecer
comentário a respeito da adoção das categorias indicadas, nem mesmo a respeito
da nomenclatura em relação à Comunidade, objeto da pesquisa.
Em 1998, a Comunidade Voadeira
1
, foi contemplada com uma Ação
Cívico-Social, numa parceria entre o SENAC, uma rádio local e o Ministério do
Exército, além de outros órgãos públicos e iniciativa privada. Nesse evento, como
funcionária do SENAC, me foi possível presenciar a participação maciça da
Comunidade local e do entorno, em busca de serviços como: registro de
nascimento, carteira de identidade, registro no CPF, corte de cabelo, consulta
médica e odontológica, motivo que despertou meu interesse em desenvolver algum
trabalho para melhoria da qualidade de vida desses moradores. Desde então, a idéia
amadureceu e, sete anos depois, tive a oportunidade de desenvolver a pesquisa de
mestrado na Comunidade.
O despertar para esse estudo se deu pelas características peculiares da
Comunidade, por ser formada basicamente por nordestinos migrantes, pobres, que
vieram em busca de melhores condições de vida e, embora encontrando um espaço
em que puderam se instalar, com o passar do tempo, sofreram as pressões do
capital e acabaram por ter seus sonhos transformados em sofrimentos e frustrações.
Hoje, com apenas 71 moradores no núcleo central, a Comunidade
procura desenvolver alternativas de sobrevivência com a produção de doces de caju
e seus derivados, além de criação de galinhas e cultivo de horta para o consumo.
Uma população rural tradicional, que mantém ainda os costumes de suas origens
culturais, com uma vida simples e precária em relação aos serviços básicos
garantidos pela Constituição Federal, tais como saúde, educação, transporte,
saneamento, lazer e emprego.
A Comunidade Voadeira é composta por uma pequena estrutura
urbanística e possui um monumento histórico onde funcionou, por mais de 50 anos,
o Posto Telegráfico, fazendo conexão entre Cuiabá e Goiás e foi desativado em
1963. Em 1981, a Comunidade, numa forma de organizar-se e aliar forças, criou a
Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira, cujo
1
Nome originário da Fazenda Voadeira, que foi desmembrada e parte dela foi vendida na forma de
chácaras, aos migrantes oriundos de Cícero Dantas – BA, Goiás, Minas Gerais e outras regiões do
Mato Grosso e do Brasil, que haviam ocupado a Fazenda na década de 1950. A Comunidade
Voadeira está constituída numa parte da referida fazenda que foi doada ao Estado na década de
1960.
objetivo é congregar os moradores e desenvolver um trabalho sócio-educativo e
demais atividades econômicas, profissionais ou culturais, bem como defender os
interesses da Comunidade e contribuir para a solução dos problemas que afetem as
atividades da Associação (ESTATUTO REFORMADO, 2004).
Quanto ao cultivo do caju, na região, uma característica bem peculiar o
difere das produções em larga escala: as plantas de caju são antigas, cultivadas
sem tecnologia e seus derivados são produzidos de forma bem artesanal. A
Associação desenvolve atividades de produção de doces da fruta, desde 1991, e
possui, entre seus associados, um grupo de cotistas que são os mentores da
Cozinha Comunitária, construída em 2001, com o objetivo de produzir doces e
comercializá-los para gerar renda.
A comercialização da produção da Cozinha Comunitária acontece na
Festa do Caju, evento que acontece há 16 anos na Comunidade e já faz parte do
calendário das festas populares do município. Outras formas de comercialização dos
produtos é no dia-a-dia dos moradores, em feiras livres e mercearias do município,
além da Casa do Artesão, em Cuiabá.
Todas essas iniciativas são insuficientes para a geração satisfatória de
renda, uma vez que a Cozinha Comunitária, segundo o líder do Serviço Brasileiro de
Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) de Barra do Garças, opera apenas
com 20% de sua capacidade produtiva, por falta de matéria-prima.
Nesse sentido, justifica-se o objetivo da pesquisa de estudar as relações
sócio-econômicas da Comunidade, fazer uma descrição etnográfica do local, avaliar
se as atividades desenvolvidas na Comunidade são sustentáveis e verificar se os
fatores culturais da população interferem na escolha das atividades ali praticadas.
O trabalho se iniciou com um estudo teórico sobre a ocupação do Centro-
Oeste nos anos 1960, desenvolvimento regional e sustentabilidade. Para a pesquisa
de campo utilizou-se uma metodologia qualitativa e quantitativa, pois a coleta de
dados se deu pela aplicação de questionários com todos os 24 chefes de família da
Comunidade Voadeira e com 11 chefes de família dos moradores do entorno. Foram
feitas, ainda, entrevistas com os moradores mais antigos, com lideranças do
SEBRAE e da Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de
Voadeira. Utilizou-se, ainda, de dados coletados junto aos órgãos públicos, tais
como: Cartório do 1º. Ofício, Prefeitura Municipal, Instituto Nacional de Colonização
e Reforma Agrária (INCRA), Empresa Mato-Grossense de Pesquisa e Extensão
Rural (EMPAER) e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A hipótese inicialmente considerada foi a de que a Comunidade Voadeira
sofreu um processo de saída de seus moradores, devido à falta de infra-estrutura
básica para buscar outras atividades alternativas de renda. E que as atividades
desenvolvidas pelos remanescentes na Comunidade, como a produção de doces de
caju, de seus derivados, de outros doces, bem como atividades no parreiral e como
diaristas, em fazenda, seriam sustentáveis. No entanto, no decorrer da pesquisa,
pôde-se constatar que o principal fator que desencadeou a saída dos moradores da
Comunidade foi a falta de terras para desenvolver a agricultura de subsistência e
que as atividades desenvolvidas pelos remanescentes da Comunidade não têm
sustentabilidade.
O problema que se coloca, neste estudo, é tentar compreender por que,
a partir do final da década de 1960, a Comunidade passou a sofrer um processo de
saída de seus moradores, ficando seus remanescentes a buscar novas fontes de
renda, antes encontradas nas atividades de agricultura. Buscou-se, ainda, investigar
se a produção de doces de caju e de seus derivados, hoje desenvolvidas na
Comunidade, têm sustentabilidade e saber por que esses moradores não
desenvolvem outras alternativas de geração de renda, utilizando-se dos recursos
que o Cerrado oferece.
O interesse pelo estudo da Comunidade Voadeira aumentou, ao se
constatar que é o núcleo populacional mais antigo de Barra do Garças, cujos
moradores desenvolviam atividades agrícolas em terras consideradas as mais férteis
da região e, no entanto, com a chegada dos investimentos estatais, sofreram um
processo de estrangulamento, encontrando-se hoje numa pequena “ilha” entre as
fazendas do entorno, sem possibilidades de expansão de seus lotes, ou mesmo de
criarem alternativas sustentáveis de geração de renda. Estão, sim, relegados ao
abandono, ao descaso do poder público, e as perspectivas apontam para a sua
extinção, caso medidas urgentes não sejam tomadas.
Dessa forma, é importante estudar alternativas sustentáveis para geração
de renda, livres da degradação do ambiente. Há que se pensar num projeto para a
Comunidade que incentive a diversificação da produção e o aumento da
produtividade, ao mesmo tempo em que estimule o contato com a natureza, a ética
de reverência pela vida e o debate sobre os problemas ambientais.
É mister que cada comunidade preserve suas características próprias,
sua cultura, sua forma de vida, seus costumes. Nesse contexto, acredita-se que,
para poder nela intervir, é necessário levar em conta as condições naturais do lugar,
a cultura do povo e a forma como esses grupos percebem o ambiente.
Nessa linha de raciocínio, entende-se que a Comunidade Voadeira tem
características próprias, pois é formada por antigos pequenos produtores agrícolas,
tradicionais, de cultura nordestina, ligados à terra e que, hoje, sem área para
trabalhar, necessitam de apoio para retomar atividades agrícolas e manter a tradição
e a cultura ainda muito arraigadas.
O que se pôde constatar foi que os fatores culturais dos moradores
impedem o desenvolvimento sustentável na Comunidade, pois eles são apegados
às práticas do passado, como o despejo de esgotos nas vias públicas, o uso
constante do fogão à lenha, o uso da queimada e o desmatamento da região.
Acrescente-se a isso outros fatores, como a idade avançada de parte desses
moradores, a baixa escolaridade ou inexistência dela e a falta de espírito
empreendedor, que dificultam o desenvolvimento de novas atividades.
Entende-se, então, que a pesquisa é de fundamental importância para o
desenvolvimento de perspectivas que possam beneficiar a Comunidade em estudo,
através de projetos de ação local que visem à sustentabilidade econômica, sem
deixar à margem as preocupações ecológicas, a ética, a cultura e as relações
sociais da população.
Nesse sentido é que pudemos constatar que na Comunidade a
possibilidade de desenvolvimento sustentável pode estar nas atividades ligadas ao
turismo, uma vez que as características da região favorecem esse tipo de atividade,
principalmente pelas questões geográficas, pela riqueza dos mananciais, bem como
pela produção artesanal de doces e pelas características culturais dos moradores.
Os dados coletados para traçar o perfil sócio-econômico da Comunidade,
as atividades desenvolvidas pela Associação, as atividades junto ao parreiral e
outras atividades temporárias foram tomados como referência com o objetivo de
analisar a atual situação da Comunidade, avaliar se há sustentabilidade nas
atividades e indicar algumas ações prioritárias possíveis de serem desenvolvidas,
dentro de uma perspectiva de desenvolvimento sustentável.
Como conseqüência disso, procurou-se demonstrar no decorrer dos
capítulos que se seguem:
a) que a modalidade de ocupação, na região de Barra do Garças, na
década de 1970, contribuiu para que os grandes empreendimentos da agricultura e
da pecuária se desenvolvessem nos moldes capitalistas;
b) que a Comunidade Voadeira, habitada por migrantes desde a década
de 1950, sofre as conseqüências do processo de expansão do capital na agricultura;
c) que a Cozinha Comunitária não consegue manter atividade constante,
por falta de matéria-prima e que isso se dá pela falta de área para plantio de
frutíferas, sendo, por isso, insustentável;
d) que as atividades alternativas para geração de renda, como as de
diaristas em fazenda, empreita de roçado etc. não são regulares, fato que deixa os
moradores em estado de insegurança;
e) que a Comunidade Voadeira está longe de ter as condições mínimas
de saneamento básico, saúde, transporte, emprego e educação garantidos pela
Constituição Federal;
f) que a região de Voadeira sofre um processo de degradação ambiental,
sendo necessário de imediato um projeto para sua recuperação, tendo em vista
tanto a preservação do manancial hídrico bem como a oferta de lenha muito utilizada
pela Comunidade;
g) que as atividades desenvolvidas na Comunidade não têm
sustentabilidade.
Como resultado da pesquisa, o primeiro capítulo trata do
Desenvolvimento Regional e Local, em seus aspectos teóricos, estuda as novas
formas de gerenciamento dos territórios, com exemplos de experiências bem
sucedidas, baseadas em Arranjos Produtivos Locais. Discute, ainda, o papel do
Estado na formulação das políticas públicas voltadas à produção sustentável e qual
o papel estratégico das comunidades no gerenciamento dos territórios.
O segundo capítulo põe em discussão o desenvolvimento sustentável e a
agroecologia. Esses dois conceitos, complementares entre si, contribuem para uma
alternativa sustentável nas pequenas comunidades de lavradores.
O terceiro capítulo apresenta o processo de ocupação da Região Centro-
Oeste, nos anos 1960, marcada pela chegada do capital ao campo, motivo da
exclusão das pequenas comunidades que vivem da agricultura tradicional.
Apresenta, ainda, o desenvolvimento do município de Barra do Garças, na década
de 1960 e 1970, momento em que recebeu um volume elevado de investimentos
estatais e instalaram-se grandes empresas agropecuárias. Nesse sentido, o
município é avaliado no contexto das políticas públicas de Desenvolvimento
Sustentável.
O quarto capítulo desencadeia um estudo histórico e etnográfico da
Comunidade Voadeira e apresenta o seu perfil sócio-econômico. Para finalizar o
capítulo, é feita uma análise das atividades desenvolvidas na Comunidade,
mostrando que não há sustentabilidade.
O quinto e último capítulo traz um estudo dos fatores endógenos e
exógenos que interferem nas atividades econômicas desenvolvidas na Comunidade,
mostrando que são entraves e contribuem para a insustentabilidade.
O trabalho se encerra com algumas ações propositivas para melhoria das
condições de saúde, saneamento básico, lazer, educação, infra-estrutura e geração
de renda, na Comunidade, com vistas à sustentabilidade.
1 DESENVOLVIMENTO REGIONAL E LOCAL - ASPECTOS
TEÓRICOS DO DESENVOLVIMENTO
Neste capítulo, a discussão sobre o desenvolvimento regional e local leva
em conta a contribuição teórica de vários pesquisadores sobre o assunto, como
também as discussões recentes desencadeadas pelo Ministério da Integração
Nacional, sobretudo com o lançamento dos documentos oficiais “Política Nacional de
Desenvolvimento Regional” e do “Plano Estratégico de Desenvolvimento do Centro-
Oeste 2007-2020”. Esses documentos, mesmo sendo de caráter indicativo, podendo
resultar em políticas públicas, são de grande importância, face ao tema em
discussão, pois trazem contribuições para a reflexão em âmbito local.
As discussões macro-regionais, com certeza, proporcionam elementos
para analisar o desenvolvimento local e, a partir dele, lançar um olhar crítico sobre o
objeto deste estudo - a Comunidade Voadeira. Do ponto de vista metodológico, será
feita uma releitura teórica sobre o assunto, com base no levantamento histórico
sobre o desenvolvimento da região Centro-Oeste, desde o século XIX.
1.1 O DESENVOLVIMENTO DA REGIÃO CENTRO-OESTE
Levando em consideração o histórico do Centro-Oeste brasileiro, o estudo
de Leme (2003) mostra que a atividade principal dessa região, no século XVIII - a
mineração - entrou em decadência no final do mesmo século, deixando a região em
situação de pauperização, o que levou sua população a viver da agricultura de
subsistência e da criação de gado. No entanto, ainda segundo Leme (2003):
Esse pauperismo só começará a ser revertido no início do
século XX, inicialmente pelos efeitos dinamizadores da expansão cafeeira
paulista e pela presença das ferrovias que trouxeram estímulos
significativos às áreas meridionais da região. Estas últimas viriam a tornar
possível o escoamento regular e seguro da produção primária e, no sentido
inverso, o abastecimento de bens manufaturados provindos dos núcleos
mais avançados do Sudeste (p. 621).
Após 1930, de acordo com o mesmo autor (2003), a região foi favorecida
com investimentos do governo federal para a integração nacional e ocupação das
fronteiras agrícolas, via política pública, denominada “Marcha para o Oeste”, quando
foram implantadas obras de infra-estrutura em comunicação e transporte, permitindo
a integração com a economia dinâmica do Sudeste.
Para Leme (2003), essa incipiente integração nacional favoreceu o
crescimento populacional da região, ao mesmo tempo em que se abriram as portas
para a modernização agropecuária impulsionada nas décadas de 1970 e 1980. O
que contribuiu para isso foi a gama de incentivos fiscais, o crédito subsidiado, os
programas governamentais, como o Programa de Desenvolvimento do Centro-Oeste
(POLOCENTRO), o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o
Desenvolvimento dos Cerrados (PRODECER) e outros, a concessão de terras
públicas, a política de preços mínimos, o apoio da Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária (EMBRAPA) em pesquisas e os investimentos em armazenagem,
tornando a região uma das mais importantes produtoras de grãos e gado.
Segundo Cavalcante & Costa (1999),
Os projetos governamentais desse período como a SUDAM
(Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), SUDECO
(Superintendência do Desenvolvimento do Centro Oeste), PIN (Plano de
Integração Nacional), a TRANSAMAZÔNICA e muitos outros, tinham por
objetivo criar condições à expansão do capital nessas regiões. A maioria
dos órgãos vieram a beneficiar somente os grandes capitalistas e mais uma
vez ficaram excluídos aqueles que não tinham acesso ao capital (p. 132).
Verifica-se, com isso, que, cada vez mais, se acentua a concentração de
terras, com a abertura de estradas na região amazônica, como a Transamazônica, a
Cuiabá-Santarém, a Cuiabá-Rio Branco, etc., denominadas de “vias de integração
nacional”. Esses eixos rodoviários levam também conflitos com grupos indígenas do
Mato Grosso, ainda isolados, na medida em que seus territórios são invadidos e
retalhados pelos projetos de colonização e de exploração agropecuária e mineral.
Nesse sentido, Becker (2005), adverte que, para entender melhor o
processo em que se encontra a região amazônica, é preciso dissipar os mitos e as
representações que a envolvem.
A Amazônia é parte do Brasil, e seus problemas decorrem de
contradições intrínsecas ao modo de inserção do país no sistema capitalista
mundial e à acelerada reorganização da sociedade brasileira, embora com
feições particulares devido às especificidades regionais. Em coerência com
o que ocorreu no país, a Amazônia não é mais a mesma dos anos sessenta
– ela se constituiu numa selva urbanizada e industrializada, e a sociedade
civil se organizou como nunca antes verificado (p. 223-4).
A autora esclarece que hoje a grande fronteira expressa um conflituoso
processo de transição para um novo padrão de inserção do Brasil no sistema
mundial capitalista. Segundo ela, esse processo é conseqüência, tanto das rápidas
transformações do sistema capitalista no final do milênio, como do esgotamento do
modelo desenvolvimentista comandado pelo Estado. Por isso, concorda-se que,
para qualquer tomada de decisão política, é fundamental conhecer a dinâmica
desses vetores, pois as transformações são intensas e a sociedade brasileira
precisa determinar o seu sentido.
Como resultado dessa dinâmica de ocupação da fronteira, em termos
espaciais, Leme (2003) faz um balanço para mostrar que os incentivos estatais
consolidaram as áreas mais dinâmicas e capitalizadas da região, beneficiando
principalmente a atividade produtiva privada, considerando-se a fertilidade natural
dos solos e as políticas de aproveitamento dos cerrados. Isso facilitou o diferencial
da produtividade, o que levou a região a se tornar forte produtora de commodities,
como o caso da soja, inserindo-se no mercado internacional.
Atividades tipicamente urbanas concentraram-se em algumas sub-regiões
e em municípios de maior influência regional, levando à precarização das condições
de vida nos grandes centros urbanos e poucas oportunidades empregatícias. Essa
concentração é conseqüência da forma de desenvolvimento implantada na região,
impulsionada por uma agricultura altamente mecanizada que demanda um conjunto
de profissionais e de vários tipos de instituições, forçando um fluxo migratório em
direção aos centros maiores. Processo decorrente de uma ação combinada entre o
Estado e o capital privado que, segundo Leme (2003):
[...] transformou a realidade econômica e social do Centro-Oeste, pois
estimulou fortes movimentos migratórios, modificou o perfil do trabalho e do
emprego, submeteu a pesquisa e a extensão rural aos interesses dos
grandes capitais e estabeleceu as condições para a implantação das
grandes empresas do agrobusiness (p. 628).
Na década de 1990, segundo o autor, pelo fato de as terras do Centro-
Oeste já estarem praticamente ocupadas, ocorreu redução nos fluxos migratórios.
Entretanto, nas maiores aglomerações, o crescimento populacional continuou,
agora, com fluxo intra-regional, favorecendo uma concentração que tende à
metropolização.
Esse processo é decorrente da concentração da propriedade fundiária, da
especulação imobiliária, que provoca a expulsão de pequenos produtores e são as
responsáveis pelos sérios danos ao ambiente, como a contaminação das águas e a
erosão do solo, levando-o ao empobrecimento.
A expansão da monocultura de soja e de criação de gado, desenvolvidas
amplamente na região Centro-Oeste, levam à exclusão dos pequenos produtores,
como explica Almeida (1998)
2
:
É fato preocupante para nós brasileiros o quadro da fome e da
desnutrição no país. O Brasil conta com cerca de 150 milhões de
habitantes. Na região Centro-Oeste, principal núcleo do bioma Cerrado,
vivem aproximadamente 10 milhões de habitantes, sendo que quase três
milhões estão na zona rural. No Brasil estima-se que há 31milhões de
indigentes e na região Centro-Oeste, essa parcela representa mais de um
milhão e meio, sendo que 45% desses indigentes encontram-se na zona
rural (p. 15).
É possível fazer uma relação da análise de Almeida com o objeto deste
estudo, a Comunidade Voadeira. A Comunidade sofre as conseqüências
excludentes provocadas pela chegada do capital na região, fazendo com que passe
a sofrer uma pressão econômica pelo assédio dos fazendeiros do entorno. Para não
se desfazerem de suas propriedades, os moradores submetem-se a trabalhos, como
de diaristas e no sistema de empreita, sem garantia dos direitos trabalhistas. A
chegada de novos fazendeiros, com novas tecnologias, provoca a degradação
ambiental na Comunidade e impede o desenvolvimento sustentável.
Por isso, falar em desenvolvimento regional exige, como contrapartida, a
adoção de políticas públicas que, ao mesmo tempo, incorporem e mantenham as
famílias de pequenos produtores em suas terras, no seu espaço. A esse respeito
Leme (2003) lembra que:
1
Dados de junho/2002 apontam que 815 milhões de pessoas em todo o mundo sofrem por
subnutrição, a maior parte das quais são mulheres e crianças dos países em desenvolvimento.
Segundo o diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação
(FAO), 54 milhões de pessoas passam fome na América Latina e Caribe. Na América do Sul foi
registrada uma redução do número de pessoas subnutridas, que passou de 42 milhões para 33
milhões, mas na América Central houve um aumento de 17 a 19% e no Caribe de 26 a 28%. Nesse
sentido, ele afirma que apesar da importância estratégica da agricultura para combater esta
situação, nos últimos 10 anos o crescimento do setor agrícola no continente foi fraco, alcançando
apenas 2,7% no ano 2000. Um dos fatores que impede o crescimento da mesma deve-se à
concorrência dos países mais desenvolvidos, cuja agricultura é fortemente subsidiada pelos
respectivos estados. Para o filósofo Peter Singer, “basta que nestes países [mais ricos], se
deixassem de alimentar os animais domésticos à base de cereais de soja e estes alimentos fossem
distribuídos pelos necessitados para pôr fim à fome no mundo“.
<http://confrontos.no.sapo.pt/page4.html>, acesso em 22/06/2007.
Segundo o IBGE, no Mato Grosso, 500 mil pessoas (20% da população) vivem com até 1 salário
mínimo e 54 mil pessoas vivem com ½ salário mínimo. Para maiores detalhes consultar <http://jt-
gonzaga.zip.net/>, acesso 24 junho 2007. Mato Gross\
[...] seria crucial a adoção de uma política de desenvolvimento que
resgatasse o planejamento regional com dimensão nacional e contemplasse
potencialidades e heterogeneidades regionais, não apenas incorporando
áreas já dinamizadas, mas atuando decisivamente na promoção do
soerguimento das áreas deprimidas, através de políticas ativas e integradas
de redistribuição de renda, reforma agrária, crédito ao pequeno produtor e
pesados investimentos em serviços públicos. Em outras palavras, buscar
um desenvolvimento não excludente, contraposto à visão de “apropriação”
da Região, que se pauta na exportação de grãos e inclui apenas alguns
setores do Centro Oeste. Evidentemente, isso é impensável sem o
fortalecimento do setor público e de sua capacidade de coordenação e
intervenção (p. 631).
Considerando essa perspectiva, Becker (2002) afirma que
desenvolvimento regional deve ser definido como um mecanismo de mudanças
econômicas, sociais e políticas, cuja dinâmica ocorre a partir da comunidade e da
iniciativa dos próprios agentes locais, gerando mudanças internas estruturais e/ou
qualitativas.
As pesquisas de Dunford (1994) apontam que, “a qualidade do
desenvolvimento numa região e seu êxito na concorrência econômica serão maiores
nas áreas em que o desenvolvimento se encontrar melhor planejado e organizado, e
menos regulado pelo mercado” (p. 60).
Entre os desafios a serem enfrentados no processo de desenvolvimento
regional estão os relacionados ao mundo do trabalho e os decorrentes da
degradação ambiental que, para Becker (2003b):
Simultaneamente, trabalho, enquanto base social do processo
de desenvolvimento humano, e natureza, enquanto base natural do
processo de desenvolvimento regional transformaram-se em desafios
socioambientais da localização do desenvolvimento capitalista. Regionaliza-
se, porque é necessário, por um lado, defender-se da globalização
econômica e, por outro lado, superar os desafios de um processo de
desenvolvimento relocalizado pelo sistema. Por isso, parte-se do
pressuposto de que o processo de regionalização socioambiental do
desenvolvimento capitalista é, por um lado, necessidade do processo de
globalização econômica e, por outro lado, possibilidade de um
desenvolvimento local diferenciado e diferenciador. Essa é a outra
dimensão, a dimensão socioambiental – sustentável, qualitativa, concreta,
subjetiva, essencial – do processo de desenvolvimento capitalista (p. 97).
Becker (2003b), apoiado em Fausto (1987), define como movimentos
contraditórios o global e o regional, uma vez que o desenvolvimento regional
comporta a universalidade de ser global e, ao mesmo tempo, a singularidade de ser
desenvolvimento local. Nesse sentido, pode-se dizer que o desenvolvimento local
está ligado ao processo das diferentes dinâmicas de desenvolvimento regional.
Esses movimentos marcados pelo regional e pelo local, também são considerados
como “antagônicos” no sentido de que, no capitalismo, o que é desenvolvimento
para uns, não é desenvolvimento para outros; assim, produz riquezas para alguns e
provoca a pobreza para outros. É um processo que no capital se movimenta em
meio a constantes contradições e superações com contínuas respostas.
A proposta de uma política nacional de desenvolvimento regional é tema
de discussão no Ministério da Integração Nacional, resultando num amplo conjunto
de idéias, fruto de discussões de especialistas da área. Nessa proposta de
desenvolvimento regional, segundo a Nova Política Nacional de Desenvolvimento
Regional:
A política está voltada para a redução das desigualdades
regionais e também para a ativação das potencialidades de
desenvolvimento das regiões brasileiras. O ponto central da estratégia é
valorizar a magnífica diversidade regional do país. Diversidade esta que se
desdobra em múltiplas dimensões, ambiental, socioeconômica e cultural e é
capaz de servir de base a um desenvolvimento includente e sustentável,
levando, dessa forma, a estruturação de uma sociedade mais justa (s/d).
A política a ser adotada para o desenvolvimento do Centro-Oeste, na
visão de Leme (2003), é a de aprofundamento da especialização da produção de
grãos e carnes, em áreas mais dinâmicas, não levando em conta os efeitos nocivos
que esse processo provoca nas vidas dos pequenos produtores familiares, o que
pode redundar no
agravamento das desigualdades intra-regionais e permanência do padrão
de espacialidade [...], concentração populacional em pequenos números de
cidades maiores, possível consolidação de algumas cidades médias nas
áreas dinâmicas e, nas áreas estagnadas, grande número de pequenos
núcleos que continuarão débeis e com perdas populacionais, enquanto
prossegue a expansão das periferias metropolitanas (p. 633).
Nessa linha de pensamento, Fiamengue (2002), afirma que:
A política desenvolvimentista, intensificada pelos governos
militares, havia acentuado o inchamento das cidades, provocado pelo êxodo
dos trabalhadores rurais que atuavam como parceiros e meeiros, como
também de pequenos proprietários, expulsos do campo pela modernização
da agricultura (p. 173).
Isso implica dizer, na visão de Beduschi Filho & Abramovay (2003), que
há uma necessidade premente de “organizações intermediárias”, principalmente da
sociedade civil, que possam estabelecer os limites e atuações do município e
aqueles sob a custódia do Estado, para que possam dar forma aos projetos
estratégicos, cujo alcance permita a participação real de grupos sociais.
1.2 NOVAS FORMAS DE GERENCIAMENTO DOS TERRITÓRIOS
É conveniente considerar que os países em desenvolvimento, como é o
caso do Brasil, ao perderem em muito a capacidade de legislar sobre as políticas
públicas, passam a deslocar essas responsabilidades ao terceiro setor. Nessa
dinâmica surgem as “organizações intermediárias”, entidades da sociedade civil e de
representantes dos trabalhadores que devem gerenciar certos territórios. Esses
territórios, segundo Abramovay (2003), constituem-se de um conjunto de fatores
naturais e de capacidades humanas que dão conta de construir alianças informais e
organizativas, ao longo do tempo, as quais imprimem certa personalidade aos
grupos sociais, traduzindo, assim, a sua identidade.
Um dos maiores exemplos dessas organizações, de acordo com Becker
(2005), é o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), formado por iniciativas,
especialmente de Brasília e São Paulo, e que congrega hoje 316 entidades, em sua
maioria sindicatos, além da Coordenação das Nações Indígenas e de organizações
de pequenos produtores rurais.
A leitura da distribuição espacial dessas organizações revela outra face
da Amazônia, a face da sociedade. Os padrões detectados estão associados à
intensidade de conflitos resultantes da combinação de vários elementos: estruturas
produtivas, sociais e políticas; acessibilidade; origem geográfica e étnica; densidade
da população; características dos quadros natural e cultural.
Whitaker & Bezzon (2006), apontam que, para o gerenciamento de
determinado território por parte dessas organizações, deve-se considerar a
biodiversidade, isto é, as frutíferas, as matas ciliares, os animais, os
microorganismos, as madeiras nobres e outras que dão o equilíbrio à natureza. Por
isso, a implantação desenfreada da industrialização provoca a devastação dessa
biodiversidade e a substitui pela monocultura, criando os complexos agroindustriais
que excluem os camponeses e, concomitantemente, destroem também a
sociodiversidade
3
. Sem a devida orientação aos principais interessados, o fato pode
gerar preconceitos, nomeando o camponês como atrasado, incapaz e incompetente.
Políticas públicas de intervenção territorial precisam criar mecanismos de
geração de riquezas, mas, para isso, as organizações devem estar conscientes da
preservação do ambiente. Para os atores locais, a participação deve ser de forma
ampla, que passe por múltiplas instâncias de decisão, sempre considerando que
preservar com geração de bem-estar implica uma relação dialética em que o homem
e o ambiente devem viver uma relação de reciprocidade. Segundo Beduschi Filho &
Abramovay (2003), os atores locais devem participar da elaboração de projetos de
natureza estratégica, bem como de preocupação com o seu desenvolvimento. No
entanto, segundo Dantas (2002), há que se tomar cuidado para que não ocorra a
imposição de técnicos.
Na grande maioria dos casos o que ocorre é que os
interessados diretos [...] não são consultados. Os técnicos [...] revestem-se
de um autoritarismo tal, que os faz se julgarem dotados de mais saber [...], o
que pode ser entendido como uma clara questão de preconceito... (p. 198).
Beduschi Filho & Abramovay (2003), ao discutirem as experiências
internacionais, mostram que a União Européia, nos anos 1990, levou a implantação
do Programa Ligações Entre Ações de Desenvolvimento da Economia Rural
(LEADER), um conjunto de políticas em âmbito territorial, proposta inovadora,
fundada em quatro pilares da sustentabilidade, quais sejam os aspectos
econômicos, os ambientais, os sociais e os culturais.
Outro exemplo, de acordo com os autores, é o Programa Empowerment
Zones and Enterprise Communities (EZ/EC)
4
, adotado nos Estados Unidos a partir
de 1993, que engaja os cidadãos nas ações de planejamento estratégico, trabalho
que vai desde a elaboração até a implantação e acompanhamento dos projetos, os
quais devem contemplar quatro princípios básicos: “[...] oportunidade econômica,
desenvolvimento sustentável, cooperação e parcerias nas comunidades e visão
estratégica de mudança” (p. 9).
3
No caso específico do Centro-Oeste, a agroindustrialização cumpre este papel.
4
Zonas de Empoderamento e Comunidades Empreendedoras.
Diferentemente da estratégia de planejamento setorial, Beduschi Filho &
Abramovay (2003), apontam que as experiências acima apresentadas não devem
apenas ser vistas como a geração de recursos para regiões carentes e, sim, como
formas de dar apoio a projetos com características inovadoras, como a participação
ativa da comunidade na determinação dos rumos dos seus territórios, além de
permitir a troca de informações e estabelecer parcerias entre os setores do mesmo
espaço.
Os projetos construídos em âmbito territorial devem ter a sua implantação
monitorada, avaliada e, ainda, contribuir para que os recursos não se destinem
somente àqueles setores mais influentes da sociedade e, sim, a projetos que
tenham como objetivo o desenvolvimento dos territórios em que residem as
pequenas comunidades. Nesse sentido, Brandão, Costa & Alves (2005), afirmam
que os projetos devem promover o desenvolvimento local e que este se amplie para
seu entorno, para que as inter-relações aconteçam também em âmbito de todas as
regiões, ativando a economia da qual participam como integrantes da cadeia de
produção.
Esses projetos, para Brandão, Costa & Alves (2005), devem ser
estruturados para que atinjam o desenvolvimento em termos de Arranjos Produtivos
Locais (APLs), isto é, que sejam capazes de propiciar às empresas ali situadas um
diferencial que represente inovação, diferenciação, lucratividade e competitividade,
eliminando a cultura tradicionalista dos negócios da região.
Os APLs têm origem nas aglomerações
5
que podem ter diversas origens
e fins. Para Paiva (apud MORAES, 2003), o desenvolvimento das aglomerações
produtivas pode passar por três momentos: o primeiro momento é o da
aglomeração, o segundo é o do desenvolvimento da aglomeração, que é
denominado de arranjo produtivo e, por último, quando esse arranjo produtivo
começa a coordenar racionalmente o seu desenvolvimento tem-se um Sistema Local
5
Aglomerações aqui identificadas através do desenvolvimento endógeno, cujo desenvolvimento
econômico se dá pela união da aplicação do conhecimento aos processos produtivos e da utilização
das economias externas geradas nos sistemas produtivos e nas cidades, o que resulta em
rendimentos crescentes e, ao crescimento econômico. Essas aglomerações são também
denominadas clusters, ou seja, as empresas são estimuladas a organizarem-se em cooperativas,
desenvolvendo sistemas complexos de integração. A esse respeito, veja WITTMANN, Milton Luiz;
DOTTO, Dalva Maria Righi; BOFF, Vilmar Antônio. Estruturas Organizacionais em Rede e
Desenvolvimento Regional: contextualização e complexidades. In: WITTMANN, Milton Luiz;
RAMOS, Marília Patta. (0rgs). Desenvolvimento Regional: capital social, redes e planejamento,
Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2004, p. 21.
de Produção (SLP). Moraes (2003) afirma que um SLP só existe de verdade quando
“são constituídas as instituições regionais responsáveis pela governança e pela
administração da solidariedade sistêmica, ou seja, quando há capital social” (p. 277).
O conceito de APLs discutido por Brandão, Costa & Alves (2005) e o
conceito de SLP analisado por Moraes (2003), muito próximos nas suas intenções,
somente existirão a partir do momento em que a comunidade esteja num grau de
maturação, em termos de consciência, para que a dinâmica do trabalho esteja
baseada na participação conjunta dos seus pares e cujos resultados tragam a essa
comunidade inovação, diferenciação, lucratividade e competitividade. A importância
dos SLP está em possuírem uma cultura empreendedora
6
, capital humano
7
, capital
social
8
e capital produtivo
9
. É necessária a busca das potencialidades e vantagens
comparativas loco-regionais que contribuam para que os empreendimentos ganhem
força, compartilhem recursos, estabeleçam parcerias, numa relação de compromisso
e confiança, adquirindo, assim, identidade própria e competitividade, um diferencial
para o desenvolvimento.
Para que os SLPs tenham efetividade, o desafio que Brandão, Costa &
Alves (2005) apontam está em transformar a mera aglomeração de atividades
produtivas em arranjos dotados de eficiência coletiva. Para tanto, é necessário que a
política pública atue em três frentes estratégicas. A primeira, promovendo o
desenvolvimento local; a segunda, fazendo com que o desenvolvimento local
transborde para além do aglomerado e, finalmente, a partir de inter-relações entre
vários aglomerados, ativando toda a economia meso-regional da qual participa.
Esses autores afirmam ser necessário que as políticas públicas de apoio
ao desenvolvimento de APLs realizem um levantamento minucioso dos dados
estratégicos dessas regiões, que vão desde a sua localização, história, principais
6
Cultura empreendedora: na origem, o termo refere-se a qualquer ação feita por alguém. Uma
pessoa empreendedora é ativa, capaz de transformar o sonho em realidade, de fazer acontecer.
Para aprofundar o tema, ver SINGER, Paul; PAULA, Juarez de. CAMPOS, Helliana Kátia Tavares.
Cenário e Desafios. In: MELO, Claiton; STREIT, Jorge; ROVAI, Renato. (orgs.). Geração de
Trabalho e Renda, economia solidária e desenvolvimento local: a contribuição da Fundação Banco
do Brasil. São Paulo: Publisher Brasil, 2006, p. 28.
7
Capital humano aqui é entendido como o investimento nas pessoas, como educação, por exemplo
(Idem, ibidem, p. 29).
8
Capital social é “um misto de confiança, cooperação e organização” (Idem, ibidem, p. 29).
9
Capital produtivo não é apenas a soma das empresas existentes. Refere-se ao fato de que os
empreendimentos precisam de logística, marketing, acesso aos mercados, acesso a crédito, enfim,
sem esses serviços eles não prosperam (Idem, ibidem, p. 29-30).
produtos, instituições públicas e privadas ali presentes, até o estudo das
potencialidades, ameaças e desafios que se apresentam.
1.3 O PAPEL DO ESTADO NA FORMULAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS
VOLTADAS À PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL
Para Brandão, Costa e Alves (2005), o Estado é um agente pró-ativo na
solução de problemas, sobretudo quando não há possibilidade de sua realização
pelos agentes locais, seja por falta de instrumentos, seja por não possuírem
autonomia. O objetivo deverá ser sempre o de projetar o local, apontando para um
caminho mais promissor, no âmbito social. O Estado deve agir por intermédio de
práticas que despertem interesse, mostrando à comunidade a real importância da
competitividade, por meio de palestras, reuniões, fóruns, seminários e outros, de
forma a favorecer a sustentabilidade dos projetos, pelo envolvimento dos agentes
locais.
Além da ação do Estado, esses autores afirmam ser necessário propor
ações que visem implantar ou ativar entidades de classe patronais e de
trabalhadores; coordenar e participar da montagem de fóruns, agências, centros
comerciais e cooperativas; solicitar do poder público a presença de instituições
técnicas, acadêmicas, de pesquisa, de fomento, incubadoras e outras; estabelecer
relações formais e operacionais com outras instituições; aumentar o grau de
conectividade entre empresas, academia e governo; e, por último, desenvolver o
espírito empreendedor dos agentes locais e regionais.
Contudo, afirma Moraes (2003), que, para promover o desenvolvimento
do território, não basta às empresas se unirem para formar parcerias. É necessário
“estudar o grau de aproveitamento dos seus recursos e potencialidades endógenas”
(p. 280). Nesse sentido, é importante a participação dos agentes de
desenvolvimento, como o poder público e as instituições de educação, no sentido de
unir forças e instituir um modelo de cooperação empresarial. Para isso, é necessária
a formação de capital social, tal como o existente no norte da Itália
10
, que estimula
ações estratégicas coletivas.
10
O que aconteceu no Norte da Itália foi que um grande número de pequenas unidades de produção,
aparentemente desfavorecidas em estrutura de comercialização, de acesso ao crédito, de escala
produtiva e de intervenção nos mercados estrangeiros, conseguiu se destacar, conquistando um
mercado interno e externo, obtendo lucros e gerando empregos. Em contrapartida, outras
Putnam (apud MORAES, 2003) afirma que as evidências históricas
mostram que os fatores socioculturais, como capital social, tradições cívicas e
práticas colaborativas têm papel fundamental na explicação das diferenças
regionais. “Onde há tradição comunitária, a recorrência de compras e vendas e de
trocas de informações faz nascer relações de fidelidade entre clientes e
fornecedores” (p. 272).
Nessa mesma direção, Moraes (2003) afirma que o desenvolvimento loco-
regional deve caracterizar-se por ter como eixo central as comunidades locais, as
quais devem desenvolver estratégias e criar caminhos, com o objetivo de
implementar processos de mobilização, organização e cooperação, isto é, que
proporcionem o uso das capacidades, habilidades e competências da comunidade,
com a identidade social e histórica do seu território. Segundo o autor:
Isso pode ser feito através do empreendimento e gestão dos
seus fatores atuais e potenciais, assim como pela incorporação de
conhecimentos e pela transformação de possibilidades externas em
oportunidades internas, de modo a solucionar problemas ou atender a
necessidades locais (p. 280).
A implementação de políticas regionalizadas, na visão de Brandão, Costa
& Alves (2005), busca fortalecer internamente os processos de desenvolvimento,
para garantir a sustentabilidade. Tais políticas, de acordo com Beduschi Filho &
Abramovay (2003), contribuem ainda para reforçar a identidade local, situação que
permite aos moradores modificarem a maneira de ver a sua própria região, quando o
trabalho objetiva projetar os produtos produzidos regionalmente, tornando-os mais
desejáveis no mercado, prospectando-os até mesmo no âmbito internacional, com
traços peculiares que os tornem únicos. Sobre esse aspecto, Wittmann, Dotto & Boff
(2003), afirmam ser mais provável que, quanto maior for o nível de confiança numa
comunidade, maior será sua probabilidade de sucesso.
O exemplo dessa política, segundo Beduschi Filho & Abramovay (2003),
vem dos Estados Unidos que implantou o programa EZ/EC para o desenvolvimento
de comunidades carentes, na busca da sustentabilidade, fundamentado na idéia de
empresas maiores e mais bem equipadas passaram a perder mercado, fato que vinha a contradizer
as convicções dos economistas de que pequenas empresas haveriam de entrar em declínio com o
tempo. Para aprofundamento do tema, ver BECATTINI, Giacomo. Os Distritos Industriais na Itália.
In: URANI, André; COCCO, Giuseppe; GALVÃO, Alexander Patez (orgs.). Empresários e empregos
nos novos territórios produtivos: o caso da Terceira Itália. Tradução: Frédérie Monié, Eliana Aguiar,
Sieni Maria Campos. Rio de Janeiro: DP&A, 1999.
que o sucesso de uma comunidade não depende exclusivamente dos recursos
públicos. Nesse aspecto, é necessário um comprometimento dos envolvidos, na
captação e aplicação de outros tipos de recursos que podem contribuir para o êxito
dos projetos de desenvolvimento local.
Segundo esses autores, o importante é entender que a participação da
comunidade na construção e gerenciamento dos projetos favorece a valorização das
características e da cultura local, levando competitividade aos produtos nela
produzidos. Esses projetos, de acordo com Brandão, Costa & Alves (2005), devem
ter como princípio a redução das desigualdades, aliando a melhoria das condições
de vida dos cidadãos à situação geográfica e demográfica.
Para que o desenvolvimento endógeno aconteça na própria comunidade,
é necessário o autoconhecimento das potencialidades, ou seja, os atores locais
organizados deverão fazer uma análise das suas potencialidades, das aptidões e
das fragilidades, para traçar estratégias de ação, de forma a tirar o máximo de
proveito em benefício dessa comunidade. Essa atitude organizativa representará o
grau de maturidade e de comprometimento do grupo para com a sua comunidade.
No Brasil, durante os anos 90, a criação dos Conselhos Gestores,
segundo Beduschi Filho & Abramovay (2003), é considerada importante, por abrir
perspectivas de participação efetiva dos cidadãos, através de instâncias colegiadas,
que definem o uso dos recursos públicos. Exemplo disso é a criação dos Conselhos
Municipais de Desenvolvimento Rural que coordenam o Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), em âmbito regional.
Uma característica interessante do PRONAF, segundo esses autores, é
que ele visa atingir uma grande maioria de produtores que nunca havia sido
contemplada com financiamentos. Por exemplo, em 1999, 56% dos que foram
beneficiados pelo programa nunca haviam contraído qualquer tipo de empréstimo
bancário anteriormente. Isso revela que o programa possui um alcance social
relevante. No entanto, alguns problemas relacionados principalmente ao tráfico de
influência e ao poder local são apontados como entraves à democratização e acesso
de todos os interessados aos recursos.
Para Beduschi Filho & Abramovay (2003), apesar da constituição de
Conselhos Gestores com responsabilidades no planejamento local, os problemas
elencados dizem respeito, nos municípios, a padrões vigentes de relação de
dependência entre os indivíduos, entre os grupos sociais e entre as autoridades
públicas. Essa dependência impede que os representantes eleitos, os empresários e
as organizações associativas, tanto de trabalhadores como de empresários,
trabalhem com o objetivo de investir os recursos com vistas a uma estratégia de
crescimento, voltada à vocação econômica local, que tenha a participação efetiva
dos seus pares, com base em propostas inovadoras de desenvolvimento, que
poderiam modificar o ambiente de forma sustentável.
Os autores acima citados apontam certa preocupação em relação à forma
como se comporta a “malha produtiva” no interior do País, pois, na maioria dos
casos, exprime baixos custos, ou seja, pouco investimento na produção em relação
aos projetos e aos recursos recebidos, ligados à depreciação do trabalho e à
devastação da biodiversidade. Para tanto, necessário se faz estimular a elaboração
de projetos conjuntos, com a participação das associações locais, das empresas
privadas e do poder público, de forma a efetivar contratos de desenvolvimento com o
apoio do Governo Federal. Esses contratos requerem pessoas capacitadas para
desenvolvê-los, possivelmente encontradas nas cidades interioranas de grande e
médio porte, e que podem dar esse aparato às suas respectivas regiões.
Transplantando essa proposta para as pequenas comunidades, acredita-
se que somente projetos de participação conjunta dos atores locais é que trazem
resultados satisfatórios, com base na proposta de desenvolvimento sustentável. No
entanto, para Beduschi Filho & Abramovay (2003), em decorrência das relações
entre o poder central e as cidades do interior, tem ocorrido uma redução gradual dos
repasses de valores automáticos para o desenvolvimento regional e/ou setorial,
levando em conta suas vinculações com os projetos de desenvolvimento.
Esse programa também afirma que as universidades e faculdades do
interior teriam apoio para capacitar profissionais, com o intuito de elaborar projetos
direcionados a fomentar o empreendedorismo individual e coletivo. A formação de
cooperativas de crédito e agências locais dessa natureza seria estimulada, com o
objetivo de atenuar as assimetrias de informações entre o empreendedorismo local e
o sistema financeiro convencional. Por último, dotaria organizações locais de
personalidade jurídica, tanto de associações quanto do poder público e do setor
privado, para o recebimento de recursos do Governo Federal.
Essa nova política nacional de desenvolvimento regional precisa ser uma
política que venha de encontro às teses neo-liberalizantes e que exija a participação
ativa e articuladora do Estado e do Governo Federal. Tal política, conforme Araújo
(1999) é apontada como alternativa para esse tipo de desenvolvimento, exemplo já
adotado por outros países e a União Européia.
Do ponto de vista de mercado, Araújo (1999), lembra que as regiões que
mais atraíram investimentos foram a região Sul e a região Sudeste. Porém, o
Governo Federal patrocinou, via Programa “Brasil em Ação”, projetos prioritários na
área de infra-estrutura e na área social. Desses projetos, os de infra-estrutura são os
que têm capacidade de definir articulações econômicas inter-regionais e
internacionais e, dessa forma, fluem na organização territorial do Brasil. Esses
projetos diferenciam-se pela prioridade em integrar os espaços dinâmicos do Brasil
com o mercado externo e dar acesso aos pólos dinâmicos na área agrícola,
industrial, agroindustrial e agropecuária, ou seja, o governo dá prioridade à
ampliação de áreas já competitivas. Além disso, as regiões Sul e Sudeste são as
que mais concentram investimentos.
Para Araújo (1999), esses fatores apontados acima revelam que houve
uma ausência de políticas regionais claras do Governo Federal, fato que deu
abertura à “guerra fiscal” entre Estados e Municípios que objetivavam reforçar
alguns pontos de dinamismo em suas regiões. Deu-se margem, então, à formação
de “espaços não-competitivos”. Fazendo uma leitura mais profunda desses fatores,
percebe-se que há a tendência de o país repetir a trajetória de concentração
espacial e acirramento de desigualdades regionais, como o já sofrido desde a
industrialização. A diferença é que o quadro atual é mais melindroso porque o país
está se inserindo num mercado mundial de disputas acirradas e o Estado ainda é
deficiente para definir e implementar diretrizes que possam se opor aos custos
sociais de uma maior desigualdade regional.
De acordo com a análise de Araújo (1999), a inserção do Brasil na
economia globalizada tende a ser bastante diferenciada pela amplitude e
heterogeneidade econômica que se apresentam, fato que pode reforçar as históricas
e profundas desigualdades já existentes. O Brasil é visto pelos interesses
internacionais como mera “plataforma de operação”, pois visam apenas atender
seus objetivos privados. Isso pode levar o Brasil a apresentar divergências regionais,
como focos de pobreza em antigas áreas dinâmicas e vice-versa, para regiões
pobres. Para tanto, necessário se faz desencadear uma ação pública que congregue
educação e infra-estrutura de acessibilidade, evitando, assim, a fragmentação do
país ou o convívio de “ilhas de dinamismo” opondo-se a regiões de pobreza,
retrocesso e isolamento.
No entanto, novos elementos se apresentam como atores nesse processo
de regionalização dos investimentos, entre eles os Governos Estaduais, Municipais
e Entidades Empresariais locais. Esses atores delineiam novas esperanças para a
economia brasileira, porém não dispensam a ação firme do Governo Federal no
desenvolvimento regional, como acontece na União Européia. Uma prática freqüente
já acontece em muitas regiões do país, onde os atores locais se articulam para
traçar e desenvolver estratégias de desenvolvimento local e regional. Os consórcios,
segundo Araújo (1999), são exemplos em diversos Estados e dispõem de leis que
os estabelecem e os estimulam e cuja atuação se dá em nível local, ampliado ao
regional, facilitando a resolução de problemas e o melhor aproveitamento das
potencialidades da região.
Sendo assim, Araújo lembra que uma política nacional de
desenvolvimento regional requer mudanças profundas, pois as tendências de
mercado mostram um aprofundamento das diferenças regionais herdadas do
passado brasileiro, que provoca o abandono das áreas que já sofrem processo de
exclusão. Esse fato desintegra as regiões e as mantém em processo de
marginalização econômica, podendo resultar em custos sociais intoleráveis, com
desemprego e aumento da pobreza e da miséria.
Para essa autora, a política nacional de desenvolvimento regional deverá
ter como um de seus objetivos a redução sistemática das desigualdades regionais,
procurando garantir melhor nível de vida às populações, nas diferentes regiões do
País, com garantia de emprego produtivo, para que tenham mantida a sua
subsistência, ou seja, o objetivo de eqüidade entre as populações e da eficiência
produtiva, para garantir a competitividade no mercado nacional e internacional.
Além desses objetivos, Araújo (1999) ainda afirma que há a necessidade
de buscar a integração dos espaços regionais, por uma “divisão espacial do trabalho
que articule no interior da economia nacional das diferentes regiões, difundindo em
todas elas os efeitos positivos do crescimento da economia e da inserção cada vez
maior do país no mercado mundial” (p. 16).
Segundo Cardoso & Santos Júnior (2006), a governança democrática na
municipalidade, bem como o êxito de experiências locais de governo na realização
de políticas públicas, capazes de promover a cidadania, dependerão da forma como
se dispõem os arranjos institucionais no sentido de: impedir ou atenuar as práticas
clientelistas vigentes e a detenção das esferas públicas por interesses corporativos e
não públicos; produzir práticas e estruturas horizontais; experiências de participação
e capital social; reforçar grupos sociais em condições vulneráveis e de exclusão,
para reduzir o impacto das relações assimétricas de poder; e fortalecer laços
associativos dos grupos locais, suas movimentações e suas organizações
representativas, de forma a corroborar e fortalecer as relações de interação entre os
diferentes atores com a presença do setor público. Dependendo desses elementos,
mesmo em situações sociais semelhantes, os arranjos institucionais elaborados
podem resultar em efeitos muito diferentes quanto ao capital social mobilizado e ao
estabelecimento de práticas democráticas.
Na forma tradicional de abordar as políticas regionais brasileiras, Araújo
(1999) afirma que a questão do desenvolvimento regional foi sempre tratada
subsidiariamente e vista como um problema, cujas ações se centralizavam em
regiões periféricas, de maior pobreza e caracterizavam-se por reivindicações, e,
quando aplicadas, o foram em benefícios das elites conservadoras dessas regiões.
Como forma de se universalizar o desenvolvimento brasileiro, atualmente se impõe a
desconcentração das bases produtivas, bem como a descentralização de políticas
públicas; que se trate cada região conforme suas especificidades, de modo a
atender às heterogeneidades, no que tange às potencialidades, ameaças,
problemas ou entraves, com vistas à inserção da economia brasileira na economia
mundial.
Para esse propósito, segundo a mesma autora, é indicada a criação de
um Conselho Nacional de Políticas Regionais, presidido pelo Presidente da
República e com a participação de representantes do Governo, do Parlamento
Nacional e de representantes não-governamentais, e que esse fórum decida os
assuntos mais importantes da questão regional brasileira contemporânea, com
vistas à distribuição mais eqüitativa das oportunidades de empregos produtivos e à
busca de uma redução dos níveis de vida (classes sociais) entre os habitantes das
diversas regiões do país.
Um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) é proposto
como um instrumento de apoio, com objetivos e metas que visem minimizar as
desigualdades regionais e contribuir, de forma adequada e com base nos interesses
nacionais, para a inserção do País no processo de globalização em curso. O aporte
de recursos abrange os níveis federal, estadual e municipal, além de recursos
privados ou de empréstimos, com gestão descentralizada em Comitês Regionais.
Ao observar as propostas, entende-se que são viáveis e necessárias, pois
o país é de grande dimensão territorial e com características que variam de local
para local, necessitando de propostas diferenciadas e que atendam aos interesses
das comunidades das respectivas regiões, aglutinadas por características
semelhantes, de forma que possam desenvolver ações conjuntas sempre com vistas
à inserção dessas regiões no mercado nacional e internacional.
Além dos EUA, com o programa EZ/EC, a França possui legislação com
tendência à descentralização das competências e maior articulação entre as
instâncias e níveis administrativos, desde a década de 1980. Já em 1995, a Loi pour
I’Amenagement et lê Développement du Territoire (LOADDT)
11
, introduziu o conceito
de desenvolvimento sustentável e melhorou o papel das sub-regiões na
operacionalização de programas estratégicos de desenvolvimento.
O Brasil, na opinião de Gohn (2006), pode espelhar-se nos exemplos dos
países desenvolvidos que possuem projetos de desenvolvimento regional, cujos
objetivos são a melhoria das condições de vida dos cidadãos através de uma
distribuição econômica mais eqüitativa, renda suficiente, acesso à educação e
serviços básicos de assistência à saúde, recreação, lazer e transportes, respeito às
diferenças e às múltiplas identidades culturais, enfim, a busca de uma vida digna,
em condições de exercício pleno da cidadania.
No entanto, diante de um mundo globalizado, no qual a natureza é tida
como meio de produção importante e o padrão de necessidades materiais é cada
vez mais exigente, aumenta o ritmo da degradação ambiental e faz-se necessário
pensar em novos paradigmas de sustentabilidade. Nessa perspectiva, concorda-se
com Wilson (2002), quando afirma que:
[...] cada ecossistema tem seu valor intrínseco. Assim como cada nação
preza seus episódios históricos finitos, seus livros clássicos, suas obras de
arte e outras medidas da grandeza nacional, também deveria aprender a
prezar seus ecossistemas peculiares e finitos, ressoantes de um senso de
tempo e lugar (p. 172).
Daí a necessidade de se estudar alternativas sustentáveis de como
melhor trabalhar a terra, com vistas à não degradação do ambiente. Para isso, há
11
Lei para Gestão e Desenvolvimento do Território.
que se pensar num projeto de incentivo aos camponeses à diversificação da cultura
e ao cultivo de produtos orgânicos, estimulando o contato com a natureza, a ética de
reverência pela vida e debate sobre os problemas ambientais.
1.4 O PAPEL ESTRATÉGICO DAS COMUNIDADES NO GERENCIAMENTO DOS
TERRITÓRIOS – NOVAS FORMAS DE PLANEJAMENTO
É importante e necessário que as comunidades de camponeses estejam
organizadas na forma de territórios, cuja denominação, segundo Mitidiero Jr. (2001),
se dá quando uma área que é delimitada por características econômicas,
administrativas, culturais, jurídicas e outras, é dominada pelo homem, quando este
exerce seu poder.
Com esse modo de organização, abre-se a possibilidade de se fazer um
trabalho voltado para que as pessoas permaneçam no seu espaço, ou seja, na sua
propriedade ou no seu local de trabalho. Nesse aspecto, o planejamento regional
deve partir de características de um conjunto de regiões predefinidas, para as quais
são equacionados os problemas que bloqueiam o seu desenvolvimento. O mesmo
se dá para a territorialização, que é considerada um caminho para o
desenvolvimento sustentável.
A territorialização, para Mitidiero Jr. (2001), comportaria áreas em que o
homem administraria, tendo características semelhantes em toda sua extensão, a
exemplo da economia, da cultura, do bioma, enfim, proximidades de afinidades que
facilitariam o desenvolvimento integrado de toda essa comunidade.
Conseqüentemente, segundo Guimarães (2001):
[...] as novas bases de convivência que conferem governabilidade ao
sistema político requerem, portanto, um novo paradigma de
desenvolvimento, apto a inserir o ser humano no centro do processo de
desenvolvimento, considerar o crescimento um meio, e não um fim, proteger
as oportunidades de vida das gerações atuais e futuras e, por conseguinte,
respeitar a integridade dos sistemas naturais que permitem a existência da
vida no planeta (p. 48).
Em se tratando de desenvolvimento regional, não há como esquivar-se de
políticas, tais como as apontadas para o Rio Grande do Sul e que podem ser
estendidas a outras regiões, uma vez que lá, segundo Paiva (2004), adota-se uma
educação democrática, eficiente e promotora da autonomia, do empreendedorismo e
da autogestão dos trabalhadores; trabalha-se pela distribuição eqüitativa de outros
recursos produtivos para além da qualificação para o trabalho (reforma agrária,
acesso à propriedade urbana); enfrentam-se as dificuldades de acesso a crédito dos
não-proprietários.
Nesse sentido, o setor público precisa se comprometer com o
enfrentamento das crônicas dificuldades por parte dos micro e pequenos
empreendedores, no que se refere a encontrar preço justo e mercado para sua
produção; encontrar alternativas de transporte, como o fluvial e o ferroviário,
articulando-os com o rodoviário, de forma a melhorar a logística.
Há que se ressaltar, ainda, a importância do capital social que, para Soto
(2003), é a capacidade de uma comunidade em criar mecanismos de cooperação
social fundamentados na confiança mútua, com vistas a gerar benefícios coletivos
que incorporem sucesso econômico e desenvolvimento sustentado.
Por outro lado, a falta do capital social, segundo Ramos & Marino (2004),
indica que não há uma forte consciência comunitária e os indivíduos não conseguem
agir coletivamente. Isso se dá porque “as oportunidades estão concentradas na mão
de poucos e com isso a mobilidade social não é algo que vale para todos” (p. 96-7).
Na Comunidade em estudo, o que se percebe é a falta de capital social
para o desenvolvimento das atividades, pois é formada por nordestinos com tradição
agrícola e que hoje não dispõem de área para trabalhar a terra. Além do que, fatores
como a cultura, a idade avançada, o pouco grau de escolaridade e a falta de
conhecimento sobre os meios de viabilizar financiamentos, os impedem de assumir
papel de empreendedores, ou mesmo liderar projetos alternativos para a
sustentabilidade da Comunidade.
No capítulo 2 entra em discussão o desenvolvimento sustentável e a
agroecologia, formas alternativas encontradas por pequenas comunidades de
lavradores, para trabalhar a terra e conservar os recursos naturais.
2 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL E AGROECOLOGIA:
CONCEITOS QUE SE COMPLEMENTAM
Este capítulo discute a questão do meio ambiente, tendo como referência
o Fórum Mundial Rio-92, oportunidade em que se discutiram os efeitos provocados
pela forma de desenvolvimento praticado no mundo todo, principalmente nos países
em desenvolvimento, onde a agroindústria é a que mais agride o meio ambiente
devido a uma legislação branda e à omissão das autoridades; por isso,
desrespeitam-se as áreas de preservação ambiental, os mananciais, as margens de
rios. Discute também as concepções de desenvolvimento sustentável e agroecologia
e as contribuições que essas formas alternativas de desenvolvimento trazem para a
preservação do ambiente, além de serem práticas alternativas da sustentabilidade
econômica, principalmente para o pequeno produtor.
A agroecologia, entendida teoricamente como uma relação harmônica
entre o homem e o seu ambiente, passa, nos últimos anos, a ser objeto de
preocupação de equipes governamentais encarregadas da extensão rural, bem
como de organizações não-governamentais, preocupadas com a sobrevivência de
determinadas comunidades que têm no ambiente seu aliado. Por esse motivo, essas
equipes passaram a estar sistematicamente junto aos moradores dessas
comunidades, não só com a intenção de ensiná-los, mas também para fazer com
que eles se tornem educadores-multiplicadores dessa concepção.
Entender o processo histórico que levou à formalização do conceito de
agroecologia e de desenvolvimento sustentável, de acordo com Gonçalves (2005),
exige uma volta aos anos 1960, em especial ao movimento hippie, momento em que
os jovens iniciavam uma discussão a respeito dos efeitos que o processo de
desenvolvimento industrial causa à natureza.
A partir de então, essa discussão tomou tamanha força que, no final do
século XX, diversos fóruns mundiais foram organizados para discutir as causas e os
efeitos provocados pela forma de desenvolvimento em vigor que via a natureza
como algo que deveria simplesmente ser aproveitado ao máximo. A partir dessas
discussões, surgiu a idéia de um novo modelo de desenvolvimento para o século
XXI, o qual deveria compatibilizar as dimensões econômica, social, ambiental e
tecnológica. Pelo menos em sua concepção, o modelo resolveria, de um lado, o
velho dilema, crescimento econômico com a redução da miséria e, de outro,
resolveria a questão da preservação ambiental.
Um conflito teórico que vem de fato arrastando-se por mais de vinte anos,
em abertas hostilidades contra o movimento ambientalista, já que este encara a
forma de desenvolvimento econômico praticado como lesivo à natureza e os
empresários como seus agentes mais representativos.
2.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: ORIGEM E CONCEITOS
Segundo Brüseke (1996), o Relatório do Clube de Roma: “Limites do
Crescimento”, e a “Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano”,
realizados em 1972, contribuíram para o avanço do debate acerca da
sustentabilidade. A publicação de Ignacy Sachs, em 1976, do Environment and
styles of development
12
, teve sua parcela de contribuição nesse debate já que é um
documento que formula o conceito de ecodesenvolvimento, atualmente entendido
como desenvolvimento sustentável.
Nessa direção, em 1987, a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento, da Organização das Nações Unidas, reuniu-se na Noruega,
ocasião em que elaborou um documento denominado “Nosso Futuro Comum”,
também conhecido como “Relatório de Brundtland”, momento em que os governos
signatários desse documento se comprometeram com a promoção do
desenvolvimento econômico e social, em conformidade com a preservação
ambiental (CMMAD, 1988).
Esse Relatório traz uma versão mais elaborada de uma das definições
mais difundidas do conceito de desenvolvimento sustentável, concebido como
“aquele que atende as necessidades do presente sem comprometer as
possibilidades de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades”.
Desde então, os estudos sobre desenvolvimento sustentável giram em
torno do Relatório de Brundtland (1987), por meio do qual se definem as metas
fundamentais para o desenvolvimento sustentável, os quais, segundo o autor (apud
FERREIRA, 1998), são:
12
Meio ambiente e estilos de desenvolvimento.
1) retomar o crescimento; 2) alterar a qualidade do desenvolvimento; 3)
atender às necessidades essenciais de emprego, alimentação, energia,
água e saneamento; 4) manter um nível populacional sustentável; 5)
conservar e melhorar a base de recursos; 6) reorientar a tecnologia e
administrar o risco; 7) incluir o meio ambiente e a economia no processo de
tomada de decisões (p. 124).
Como requisitos fundamentais ao cumprimento desses objetivos, o
relatório aponta:
1) um sistema político que assegure a efetiva participação dos cidadãos no
processo decisório; 2) um sistema econômico capaz de gerar excedentes e
know-how técnico em bases confiáveis e constantes; 3) um sistema de
produção que respeite a obrigação de preservar a base ecológica do
desenvolvimento; 4) um sistema tecnológico que busque constantemente
novas soluções; 5) um sistema internacional que estimule padrões
sustentáveis de comércio e financiamento; 6) um sistema administrativo
flexível e capaz de autocorrigir-se (p. 124).
De acordo com essas orientações, a Conferência de Estocolmo e o
Relatório de Brundtland iniciam um debate em que se coloca a interdependência
entre ambiente e desenvolvimento, uma relação que passa a compor a agenda
internacional sobre o ambiente, vindo a se fortalecer com a Rio 92, quando são
sancionadas as propostas contidas na Agenda 21
13
.
Vale ressaltar que a Agenda 21 brasileira é um documento construído
com a participação da sociedade e tem como objetivo auxiliar no planejamento para
o desenvolvimento sustentável, de forma a fortalecer a participação da sociedade
civil, por meio da cidadania ativa, para a construção da democracia participativa, em
que toda a sociedade possa ser artífice na busca do desenvolvimento sustentável.
Ela contempla princípios e estratégias que auxiliam na formação e
implementação de políticas públicas nacionais e locais, tais como a inclusão social
para uma sociedade solidária; estratégias para a sustentabilidade urbana e rural;
recursos naturais estratégicos; governança e ética para a promoção da
sustentabilidade. Essas responsabilidades necessariamente têm de ser
13
É um plano de ação a ser adotado global, nacional e localmente por organizações do sistema das
Nações Unidas, governos e pela sociedade civil, em todas as áreas em que a ação humana
impacta o ambiente. Constitui-se na mais abrangente tentativa já realizada de orientação para um
novo padrão de desenvolvimento para o século XXI, cujo alicerce é a sinergia da sustentabilidade
ambiental, social e econômica, perpassando em todas as suas ações propostas (MMA, Caderno de
Debate: Agenda 21 e Sustentabilidade, 2006, n. 09).
compartilhadas entre governo e sociedade, pois é um desafio que implica mudanças
nos padrões atuais e nos hábitos culturais arraigados nos diferentes setores da
sociedade.
Para entendimento desses hábitos culturais, baseados na depredação
indiscriminada da natureza, há que se remeter ao período pós-Revolução Industrial,
momento em que se questiona a interdependência entre ambiente e
desenvolvimento. No Brasil, esse impacto se traduziu naquilo que ficou conhecido
por “modernização conservadora”, uma modernização, ancorada no ideário da
chamada Revolução Verde
14
da década de 1970, que busca a melhoria da
tecnologia de sementes na pesquisa agropecuária e no uso intensivo de tecnologias
agrícolas, no aumento da área produtiva e que traz consigo, conseqüentemente, a
devastação.
Para Becker (1997), ambas as revoluções se utilizaram maciçamente dos
recursos naturais e viam a natureza como objeto a ser explorado. Apoiaram-se na
hipótese de que o próprio processo de exploração da natureza geraria as condições
de sua auto-regulação. Hipótese levantada devido à grande quantidade de recursos
naturais até então disponíveis na natureza; no entanto há que se considerar, nessa
época, os parcos estudos a respeito da capacidade de suporte do ambiente.
Vale ressaltar que a busca desenfreada pela produtividade agrícola e que
redundou na Revolução Verde se justificava pela busca de acabar com a fome no
mundo. No entanto, Capra (1995) desmistifica essa justificativa, com base nas
pesquisas de Moore Lappé Collins, mostrando que a quantidade de alimentos
produzidos no mundo é suficiente para alimentar cerca de 8 bilhões de pessoas,
número muito acima do dobro da população mundial daquela época. Nesse sentido,
não se pode considerar que a escassez de alimentos é a causa da fome e, sim, a
desigualdade econômica. O fato é que a mecanização da lavoura favorece apenas
uma pequena elite e expulsa da terra milhões de pessoas, as quais, sem opções de
trabalho, não têm condições de comprar os alimentos que estão disponíveis.
Segundo Giansanti (1998), a Revolução Verde deixa conseqüências
catastróficas, tais como a homogeneização de sementes e culturas; a criação de
14
Baseada na melhoria do padrão QMG – Químico, Mecânico e Genético -, cujo objetivo é aumentar
a produtividade das lavouras; momento em que se fortalece a monocultura, através da
mecanização intensa, uso de herbicidas e inseticidas e uso de “sementes inteligentes”, melhoradas
geneticamente para adaptarem-se aos diferentes tipos de solo bem como resistirem às pragas.
laços de dependência dos agricultores em relação à aquisição de insumos
industriais; a perda da terra e migração para a cidade e a adoção de um modelo de
consumo mundial padronizado, que acarretam a perda de identidade e pressões
sobre o uso dos recursos naturais. Afinal, 1/5 da população mundial pratica o
consumo suntuário (luxuoso); outro 1/5, consumo moderado. Eles representam a
alta e média renda dos países de primeiro e terceiro mundo ou do ex-bloco
socialista. O restante mal satisfaz as necessidades básicas.
Nesse aspecto, Graziano da Silva & Del Grossi (2000), afirmam que a
Revolução Verde contribui para a manutenção e reforço da classe dos latifúndios,
uma vez que somente grandes produtores possuem acesso a créditos, tendo
condições de investir em altas tecnologias. Esses fatores contribuem para que o
pequeno produtor fique em desigualdade competitiva e, muitas vezes, precise
desfazer-se de suas terras, migrando para as fronteiras agrícolas do Centro-Oeste
ou deslocando-se para os centros urbanos.
Nessa Região, segundo Theodoro, Leonardos & Duarte (2002), o ciclo
modernizador das décadas de 1970 e 1980, que contemplou a viabilização
tecnológica, veio a facilitar a pecuária e a agricultura em grande escala. O conjunto
desses fatores, como informa Barbosa (1996), favoreceu a incorporação de novas
áreas e a expansão da fronteira agrícola que, a exemplo do que ocorreu em outras
regiões do Centro-Oeste, representa, para alguns, a dinâmica “natural” do
capitalismo que, para se desenvolver de forma ampla, deve incorporar o modelo
tradicional de produção. Assim, os camponeses, na tentativa de opor-se às novas
tecnologias, acabam arcando com o custo que isso representa e, sem condições de
concorrer com os grandes capitalistas agrários, acabam sendo expulsos desse
processo.
As conseqüências de tal prática estão atualmente rendendo
preocupações relacionadas aos impactos ambientais e sociais, causando também
uma inquietação em relação a um possível colapso energético. Para Jean Marc Von
Der Weid, da Organização Não Governamental Assessoria e Serviços a Projetos em
Agricultura Alternativa/Rio de Janeiro (AS-PTA/RJ) e representante da Agência
Nacional das Águas (ANA), se for mantido o ritmo e o estilo de desenvolvimento na
agricultura, não se terá mais condições de praticá-la nos próximos 20 a 25 anos. Até
2025 o custo energético afetará profundamente a população. A agricultura hoje
praticada é grande consumidora de energia, estando extremamente vulnerável
(informação verbal
15
).
Além do risco de um colapso energético, os efeitos do avanço da fronteira
agrícola levam à exclusão de pequenos produtores e, uma vez, aliado à destruição
de ecossistemas frágeis, principalmente pelas mudanças tecnológicas adotadas na
prática progressiva da monocultura, provoca um descompasso no binômio
exploração/reposição, pois o grau de exploração dos recursos naturais é
incompatível com o tempo necessário à natureza para repô-los. As conseqüências
são os indícios de esgotamento do solo, da falta de água, da erosão, da poluição, da
extinção de espécies, do descontrole de insetos nas lavouras, dentre outros.
Nesse sentido, não é possível manter a hipótese de que a própria
natureza teria a capacidade de se auto-regenerar, pois nem a natureza suporta as
altas agressões antropogênicas e nem as ciências, como se percebe, são capazes
de corrigir os danos causados a ela.
Diante desses impactos ambientais e sociais provocados pela
monocultura em grande escala, resta discutir formas alternativas de minorá-los, e o
“desenvolvimento sustentável” é a alternativa encontrada.
Nesse contexto, o conceito de desenvolvimento passa a ser questionado
já que, de acordo com Pelizzolli (1999), é “um termo que remete às ciências sociais
e à economia, reportando-se a uma transformação artificial dos habitat da natureza,
ao funcionamento, urbano, do ambiente construído” (p. 102). Para Riggs (apud
CAMARGO, 2003), nas ciências sociais, a palavra “desenvolvimento” “sugere a
evolução dos sistemas sociais humanos de mais simples a mais complexos” (p. 70).
Souza (1993) afirma que desenvolvimento, nessa proposta, se define:
[...] pela existência de crescimento econômico contínuo, em ritmo superior
ao crescimento demográfico, envolvendo mudanças de estruturas e
melhoria de indicadores econômicos e sociais per capita. É um fenômeno
de longo prazo, implicando o fortalecimento da economia nacional, a
ampliação da economia de mercado e a elevação geral da produtividade (p.
17).
15
Conferência proferida em 22/11/2006, intitulada: Dimensão Sócio-cultural e Econômica da
Sustentabilidade: diversidade, solidariedade e mercados. IV Congresso Brasileiro de Agroecologia:
construindo horizontes sustentáveis, da qual participei, em Belo Horizonte - MG, 20 a 23 de
novembro de 2006.
Considerando a questão da preservação do ambiente, sem desconsiderar
o conceito de desenvolvimento, há a necessidade de associá-lo a uma nova filosofia,
da sustentabilidade; daí a concepção de sustentação que, para Pelizolli (1999):
[...] é um termo próprio da biologia, expressando o funcionamento dos ciclos
naturais, nos ecossistemas flexíveis e em equilíbrio. [....] reporta-se ao
ecossistema em equilíbrio dinâmico, em sua integridade assimilando a
entropia e elaborando a emergência do caótico, onde se mantém o
funcionamento de um sistema com pontos de equilíbrio e reestabilização
que possuem um limite de alteração e adaptação (p. 102).
Para Brügger (1994), o termo “sustentável”, quando aliado ao termo
“desenvolvimento”, adquire um sentido singular, único, uma vez que se refere à
natureza homeostática (auto-reguladora) dos ecossistemas naturais, à capacidade
de suporte, referente a recursos/população.
Com base nessa concepção teórico-filosófica, a intenção deste trabalho é
entender se os moradores da Comunidade Voadeira têm consciência desse conceito
e se, na prática, o desenvolvem. Nesse sentido, o que se busca perceber é se a
sustentabilidade está presente nas atividades desenvolvidas pela Comunidade
16
.
Discutir essas questões implica uma reflexão histórico-filosófica da teoria
que norteia a noção de desenvolvimento sustentável, mesmo sabendo que alguns
pensadores se opõem ao uso da expressão “desenvolvimento sustentável”, uma vez
que, para eles, “desenvolvimento” está diretamente associado a uma concepção
difundida pelos tecnocratas do Estado. Segundo Boff (2004), para esses
tecnocratas, o conceito de desenvolvimento está associado tão somente ao
“aumento do Produto Interno Bruto (PIB), crescimento econômico, modernização
industrial, progresso tecnológico, acumulação crescente de bens e serviços,
aumento da renda das empresas e das pessoas” (p. 74).
Como se pode observar, no capitalismo, o progresso e a acumulação de
riquezas são prioridades, não levando em consideração outros aspectos tão
importantes como a conservação ambiental e a distribuição mais eqüitativa dessas
16
Ao propor a pesquisa no referido local, a conjetura que se fez foi de que a sustentabilidade estaria
presente nas atividades ali desenvolvidas. No decorrer da pesquisa de campo, observam-se alguns
pontos críticos, discutidos mais adiante, que derrubam as hipóteses ora construídas. Situações
como a degradação do Córrego Voadeira, a exploração da mata ciliar para uso da madeira como
lenha, a pecuária desenvolvida às margens do Córrego, que provocam erosões, são algumas das
constatações
.
riquezas. Nesse sentido, Boff (2004) mostra que a categoria sustentabilidade,
originária da biologia e da ecologia, comporta uma lógica contrária à capitalista. Para
ele, “sustentabilidade representa a tendência dos ecossistemas ao equilíbrio
dinâmico, à cooperação, à co-evolução e responde pelas interdependências de
todos com todos, garantindo a inclusão de cada ser, até dos mais fracos “(p. 74).
Uma contradição é proveniente da própria palavra “sustentável”, pois,
para o capitalismo, desenvolvimento implica expansão, aumento e ocupação de
novas áreas ainda não agricultáveis; e um desenvolvimento com sustentabilidade é
algo incompatível com essa proposta. Por isso, para Leonardo Boff, no modo de
produção capitalista, o “desenvolvimento sustentável” vem apenas reafirmar como
causa aquilo que é seu efeito. Ou seja, os capitalistas tentam mostrar que a pobreza
é a causa da degradação ecológica, portanto, ao se reduzir a pobreza e se ter mais
desenvolvimento, ter-se-ia menos degradação. Sendo assim, o autor defende que a
categoria “sustentabilidade” deve estar livre de regulação capitalista; garantindo-a “à
Terra, à Humanidade como um todo, à sociedade e à vida humana” ( p. 77).
Pode-se então questionar se é possível pensar em sustentabilidade num
país capitalista, pois este tem como premissa a busca do lucro. Dessa forma, não há
como discutir a sustentabilidade sem contabilizar as perdas de espécies nativas nem
mesmo as conseqüências ambientais do processo, ao se desbravar, por exemplo,
uma área de Cerrado para substituí-la por uma monocultura de soja. O que se vê é a
impossibilidade de se pensar em desenvolvimento sustentável no atual sistema,
levando em conta a forma como alguns grupos se apropriam da natureza, ao mesmo
tempo em que a degradam.
Grupos que defendem a agricultura sustentável, como o Movimento dos
Sem Terra (MST), Agricultores Familiares, Sindicatos, Organizações Não-
Governamentais (ONG’s) e outros, surgiram na década de 1980 e vêm questionar
esse tipo de desenvolvimento. Esse questionamento ocorre tendo como parâmetro a
própria história do recente desenvolvimento agrícola, e, para Brandenburg (2005),
nunca se presenciou, na história da sociedade brasileira, um processo de exclusão
social de tamanha amplitude, envolvendo pequenos trabalhadores do campo, de
modo geral.
Ao conjunto de forças que resistiram à modernização conservadora, aliou-
se a Federação de Órgãos para a Assistência Social e Educação (FASE), cujo papel
é o de ser catalisadora desse movimento. Segundo Brandenburg (2005), por meio
da FASE, discutiram-se questões acerca das políticas agrícolas e das técnicas
implementadas por essas políticas, incluindo-se aí as questões ambientais.
Essas discussões envolveram parte da classe agronômica, de sindicatos
de trabalhadores e dos grupos organizados, culminando na proposta de uma
agricultura “alternativa”, de maneira a criar um modelo de desenvolvimento
alternativo, baseado no uso racional dos recursos naturais, para garantir as
condições de sobrevivência às futuras gerações, principalmente as mais pobres,
além de almejar a eqüidade social para a atual geração. No entanto, na ordem
capitalista, de acordo com Moreira (1999), qualquer avanço, nessa direção, é
entendido como uma menor concentração dos recursos produtivos, o que não põe
fim às distinções entre as classes sociais.
Chegar a um modelo de desenvolvimento alternativo não é uma meta
simples de ser alcançada, pois há uma demora por parte da sociedade em entender
que o desenvolvimento sustentável é uma necessidade para a manutenção da vida
no Planeta; isso requer contínuos debates, sejam eles na academia, nas
organizações da sociedade, nas populações ribeirinhas, ou nos povos indígenas,
cujo objetivo deve ser de desencadear projetos de desenvolvimento local
sustentável, contribuindo para uma distribuição mais eqüitativa de renda.
Desde a Rio-92, tanto as entidades governamentais como os movimentos
ambientalistas, passaram a discutir as questões ambientais como questões de
políticas públicas. Isso, para Brandenburg (2005), significa que “Estado, mercado e
sociedade civil passam a agir ‘ambientalmente’, embora com perspectivas distintas”
(p. 3).
Nesse processo não é só o ambiente que é tido como ponto chave na
discussão da sustentabilidade; temas relacionados ao crescimento populacional, ao
nível de consumo e à distribuição de renda também fazem parte dos debates.
Dentre os defensores da premissa de que toda a problemática de degradação
ambiental encontra-se no crescimento populacional desordenado, Sachs (2002) é
um contestador, ao considerar essa análise incoerente, visto que leva em
consideração apenas o aumento populacional, principalmente das populações
pobres, não-consumidoras e não das populações mais abastadas, nas quais o
consumo é excessivo. Sachs defende que as populações mais ricas é que são as
maiores responsáveis pela degradação ambiental, uma vez que estas são as
maiores consumidoras.
Também se deve considerar que um dos grandes problemas da
insustentabilidade diz respeito a países em que há um alto índice de concentração
de riquezas e de consumo, onde há o descaso com a natureza, e ocorre a
degradação ambiental; no entanto, esses países transferem a responsabilidade do
processo aos outros, principalmente aos países em desenvolvimento e aos pobres.
Assim, segundo Procópio (2001):
[...] os Estados Unidos da América, pelo consumismo de sua população é o
país que, ecologicamente falando, mais custa no mundo. Nações da
periferia mundial, amarradas pelas burocracias que deixam de incrementar
as conhecidas alternativas de sustentabilidade, correm igualmente perigo.
No caso brasileiro, os privilégios de suas elites, a generalizada corrupção e
a perversa distribuição de renda sob o patrocínio do próprio Estado,
proporcionalmente tinge de sangue, mais que noutros países, a natureza e
o tecido social da nação. Daí a degradação ambiental associada à
baixíssima qualidade de vida do povo. Daí também a violência (p. 117).
Para o citado autor, uma vez que a política dos países periféricos não
está preocupada com as questões sociais e ambientais, pela falta de uma “ética da
solidariedade”, pela falta de acesso à educação e pela má distribuição de renda, ela
coloca em risco também sua democracia.
Nesse sentido, uma proposta alternativa de desenvolvimento sustentável,
segundo Sachs (2002), deve incorporar “a preocupação com a conservação da
biodiversidade aos seus próprios interesses, como um componente de estratégia de
desenvolvimento” (p. 53). Conseqüentemente, não haverá a necessidade de
migração para outras áreas o que, na maioria das vezes, provoca inchamento das
periferias das cidades, levando ao processo de exclusão social.
Quando Sachs se refere à conservação da biodiversidade, torna-se
possível fazer-se uma analogia com a importância que Capra (1995) dá à
preservação de uma região selvagem, pois, para ele “o que se preserva numa região
selvagem não são árvores ou organismos individuais, mas a teia complexa de
relações entre eles” (p. 260).
Desse modo, Capra reforça a importância de manter áreas nativas, para
que se preserve toda a cadeia de espécies de uma determinada região, evitando-se
a infestação de espécies exóticas, as quais podem interferir no equilíbrio ecológico
do ambiente, provocando a proliferação de determinadas espécies em detrimento de
outras, causando uma desordem naquela área. Um exemplo é o capim Brachiaria,
espécie exótica muito comum na Região Centro-Oeste, utilizada em pastagens de
onde foi subtraída a vegetação nativa
17
.
2.2 PEQUENAS COMUNIDADES E A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL
O uso dos recursos naturais locais para a manutenção das atividades
rurais está presente em muitas comunidades ribeirinhas. No entanto, parte delas
desconhece os processos de conservação e acaba contribuindo com a degradação.
Para se ter uma idéia do impacto que se causa com a degradação, que
muitas vezes leva à extinção de espécies nativas, há que se mencionar a riqueza da
diversidade de espécies do Cerrado. Segundo Almeida (1998), esse bioma
compreende uma área nuclear de cerca de 204 milhões de hectares e abrange os
Estados da Bahia, do Ceará, de Goiás, do Maranhão, de Mato Grosso, do Mato
Grosso do Sul, de Minas Gerais, do Pará, do Piauí, de Rondônia, do Tocantins e o
Distrito Federal e estima-se que ocorrem cerca de 6.200 espécies de plantas
vasculares nativas nessa região.
Nesse sentido, o Cerrado, ao invés de continuar sendo objeto de
destruição para o desenvolvimento da agropecuária, pode ser utilizado, de forma
17
A referência ao caso do capim Brachiaria nos remete à pesquisa de campo realizada. Ao visitar a
nascente do Córrego Voadeira, presenciou-se a infestação do referido capim até às margens do
Córrego, em algumas partes do entorno do leito, local que deveria, por lei, ser destinado à mata
ciliar. Como a região que apresenta essa configuração já foi local de moradia há 20 anos e hoje é
destinada apenas à criação de gado, não há nenhuma preocupação do proprietário da área, quanto
a reverter, ou, pelo menos, amenizar a degradação das margens do Córrego e de algumas fontes
que o abastecem. Embora alguns entrevistados, proprietários de chácaras e fazendas que se
utilizam de pequenas fontes que deságuam nesse Córrego, apontem sofrer problemas de falta de
água para o consumo e para o gado, em certas épocas do ano, não demonstraram interesse em
preservar as matas do entorno dessas fontes que acabam secando, levando-os a se utilizar das
águas do Córrego Voadeira como alternativa. Esse Córrego é de fundamental importância para a
manutenção de muitas atividades com o gado nas chácaras e fazendas do entorno e para uso
doméstico (lavar roupas e louças) para algumas famílias do núcleo. A dificuldade em preservar é
justamente pela falta de conhecimento por parte dos moradores, de como se dá o processo de
preservação desses mananciais, pois se acredita que, a partir do momento em que essa população
passa a entender da interdependência de todos os elementos da natureza e dos impactos
causados pela ação antropogênica, haverá uma preocupação em garantir a preservação desses
mananciais. Segundo depoimento de um morador, por volta de 1982 é que foi derrubada a mata até
às margens do Córrego e substituída inicialmente por lavoura e depois por capim e pasto para o
gado. Naquele tempo, segundo esse morador, era praticada a caça de animais como antas,
catetos, queixadas e até onças, que eram encontrados no local. Hoje, notícias dos moradores dão
conta de que, somente na Serra do Taquaral, onde se localiza a nascente do Córrego Voadeira, é
que ainda aparecem a onça pintada e a anta, pois lá a mata continua virgem, por se tratar de uma
área de difícil acesso.
extrativista, pois, devido a sua alta riqueza de espécies frutíferas, pode se constituir
como alternativa para a geração de renda às pequenas comunidades, inclusive com
a possibilidade de plantio das mesmas espécies para ampliar a coleta.
Frente às questões analisadas, compreende-se que o estudo da
sustentabilidade requer o avanço do conhecimento científico, para entender a
dinâmica das comunidades, dos ecossistemas ali presentes e de sua complexidade,
pois está em questionamento nosso modelo conceitual de mundo, ou seja, está em
jogo o que se convencionou chamar de paradigma tradicional.
Numa visão cartesiana, segundo Almeida (2002), na sua prática
metodológica de ver o universo dividido em compartimentos estanques para
compreendê-lo, pôde o homem, no final do século XX, constatar que a natureza não
se deixa entender pelos instrumentos tradicionais de análise. Ela é “sistêmica,
complexa, não-linear. Não funciona como a soma das partes que a compõe, mas
como o produto da inter-relação das partes. Para ser compreendida, pede um novo
paradigma: orgânico, holístico, integrador” (p. 54).
Um novo paradigma, contrário ao cartesiano, é encontrado na
agroecologia, que, ao estudar as comunidades, leva em consideração os princípios
agronômicos, ecológicos e sócio-econômicos, com o intuito de entender e avaliar os
efeitos da tecnologia, tanto sobre as práticas agrícolas como sobre a sociedade
como um todo.
Há que se considerar ainda que as necessidades humanas são criadas
pela cultura de cada sociedade. Nesse sentido, segundo o documento Nosso Futuro
Comum (1991), necessário se faz promover valores que observem os padrões de
consumo e que se restrinjam aos limites da capacidade ambiental. Isso significa que
as sociedades atendam às necessidades humanas com o aumento de
produtividade, assegurando a todos as mesmas oportunidades, ou seja, a
distribuição eqüitativa dos recursos. A idéia se resume na compatibilidade do
crescimento econômico com o desenvolvimento humano e a qualidade ambiental.
Na Voadeira, o processo em andamento, pelo que se pôde perceber, está
baseado no velho paradigma cartesiano, pois o que se vê é a destruição da mata
original para plantar capim a fim de alimentar o gado, conseqüentemente,
contradizendo o paradigma da sustentabilidade, de modo que, parafraseando
Thomas Khun (1990), o processo em que se encontra o desenvolvimento
sustentável na Voadeira está longe de ser a fase “pré-paradigmática”, momento em
que um novo paradigma entra em conflito com o velho paradigma praticado.
Para entender melhor essa constatação, é necessário esclarecer que a
Comunidade Voadeira é composta por 71 moradores, em lotes residenciais,
variando de 200 m
2
a 1.000 m
2
, sem área para plantio. Esses moradores são
remanescentes do processo de expansão do capital, na região, uma vez que, antes,
praticavam agricultura de subsistência e, com o passar do tempo, foram forçados a
se desfazer de suas propriedades em favor dos grandes fazendeiros que compraram
as pequenas áreas para incorporá-las às suas fazendas, com objetivo de criação de
gado. Para os pequenos agricultores, resta apenas o lote das casas, cujas
alternativas de sobrevivência passam a ser o trabalho como diaristas em fazenda e
a produção de doces de caju e de outros frutos da região.
Espera-se que, em um período não muito distante, os moradores da
Comunidade Voadeira e do seu entorno tomem consciência da necessidade de
reflorestar as margens do Córrego Voadeira e adjacências, para garantir tanto os
mananciais como a lenha e as frutíferas, muito utilizados pela Comunidade.
Essas ações podem abrir caminho para o desenvolvimento sustentável da
Comunidade, uma vez que o conceito de desenvolvimento sustentável expressa
mais uma insatisfação com o padrão atual de desenvolvimento e não uma versão
acabada; é uma versão “transitória” de categorias teóricas e práticas de um novo
patamar na relação sociedade-natureza. Inicialmente, como afirma Pires (1998),
vistos como “anomalias”, porém, vão adquirindo status “à medida que oferecem
melhores respostas aos problemas considerados relevantes” (p. 65)
18
.
18
Sob essa ótica é que iniciativas de pequenas comunidades que buscam desenvolver um projeto
ambientalista ganham força. É o caso das reservas de extração de borracha em Xapuri - AC e a
Reserva de Desenvolvimento Sustentável de Mamirauá - AM. Nesta última, o plano de manejo
prevê programas de Extensão e Participação, Pesquisa e Monitoramento e Administração.
“Mamirauá prova que, para implementar projetos práticos, os profissionais de conservação devem
se envolver com aspectos financeiros, administrativos e políticos” (PRIMACK, 2001, p. 211).
Mamirauá é um exemplo de Reserva de Desenvolvimento Sustentável que está dando certo.
Compõe-se de uma várzea que apresenta um alto grau de endemismo (espécies que só ocorrem
naquele lugar). Os períodos de cheias e de secas determinados pelo Rio Solimões é que dão um
formato característico à Reserva, provocando uma mobilidade dos seus moradores, cuja criação de
gado é feita em balsas. A participação das comunidades em todo o processo de administração da
Reserva, muito visitada por turistas do país e do exterior, é que lhes proporciona uma vida melhor.
Para mais detalhes, consultar: PRIMACK, Richard B.; RODRIGUES, Efraim. Biologia da
Conservação. Londrina: E. Rodrigues, 2001.
De maneira geral, o conceito de desenvolvimento sustentável requer
pensar globalmente e atuar localmente, isto é, estimular projetos de
desenvolvimento regional que levem em conta os quatro pilares básicos da
sustentabilidade: o econômico, o ambiental, o social e o tecnológico. Dessa forma,
as populações terão incentivos para permanecerem em suas comunidades, podendo
preservar também suas raízes, sua cultura.
Para Camargo (2003), é preciso ter como premissa básica para o
desenvolvimento sustentável, a crença de que o homem deve harmonizar-se com a
natureza, fluir com ela, compreendendo suas transformações, adaptando-se e
vivendo nos seus limites. A proposta de Jonas Hans, segundo Bursztyn & Bartholo
(2001) reforça a importância de se ter uma “modernidade ética, não apenas uma
modernidade técnica. Pois o princípio ‘sustentabilidade’ implica incorporar ao
horizonte da intervenção transformadora do ‘mundo da necessidade’ o compromisso
com a perenização da vida” (p. 167) [Grifos dos autores].
Em que pese a variedade de interpretações existentes na literatura e no
discurso político acerca da sustentabilidade, a definição que se adota é a de que o
desenvolvimento sustentável é aquele que garante o suprimento das necessidades
de cada ser, com ética e eqüidade e, ao mesmo tempo, respeitando a
natureza/ambiente.
Trazendo a preocupação da sustentabilidade para as regiões do Cerrado
brasileiro, especificamente para a Região Centro-Oeste, observa-se que o modo de
exploração e o modelo econômico adotado, propiciam a exclusão social. Para Leme
(2003):
A forma de ocupação empreendida e a natureza da intervenção
estatal que a caracterizou, com favorecimento irrefreado do capital privado,
ignorando a questão social – em particular a democratização da
propriedade -, redundaram no quadro descrito: áreas estagnadas e à
margem do processo de “modernização” e aglomerações urbanas marcadas
pela exclusão e pobreza, compondo cinturões de periferia nas maiores
cidades. Os interesses que presidiram a ocupação produtiva – interesses de
capital mercantil exportador – definiam o teor das políticas do Estado, a
partir de suas articulações com setores do governo e da alta burocracia, e
garantiam a intocabilidade da propriedade. Mesmo que a expansão da
fronteira, no seu início, tenha funcionado como uma alternativa de acesso à
terra e de reprodução da pequena propriedade, aliviando as tensões
fundiárias, a valorização e a especulação que se seguiram, associadas aos
programas de estímulos aos capitais, foram expulsando os pequenos
produtores. Essa foi a tônica da ocupação (p. 631).
Fazendo uma análise das conseqüências desse processo, avalia-se que o
modelo de desenvolvimento vigente, no qual se pratica a agricultura voltada para a
produção de soja e a criação de gado, nas regiões do Cerrado, não atende a
sustentabilidade. A hegemonia da monocultura provoca o empobrecimento da
biodiversidade, aspecto mais preocupante da crise ambiental mundial que, para
Teixeira (2004), é uma das que mais merece consideração, pois representa reduzir a
possibilidade de uma dieta rica e variada, do fomento da produção alimentar, da
melhoria da renda, da ultrapassagem de obstáculos ambientais e da recuperação
dos ecossistemas.
Nesse modelo de desenvolvimento, as pequenas comunidades,
estranguladas pelos grandes empreendimentos do agronegócio, ficam
desassistidas, sofrendo grande parte de migrações para os centros maiores, que
contribuem para o aumento da pobreza e da exclusão social, uma vez que, ao
deslocarem-se para os centros urbanos, as pessoas, em sua maioria, não possuem
qualificação para ingressar no mercado de trabalho, nem mesmo condições de
habitação que lhes proporcionem qualidade de vida.
A vulnerabilidade da agricultura espelha a crise em que se encontra a
natureza humana, a qual decreta de imediato um processo de transição ecológica.
Para Guimarães (2001):
A transição ecológica caracteriza-se por uma verdadeira
revolução dos padrões de produção e de consumo. Esta revolução
desconectou-nos, um pouco de nossas necessidades biológicas, tornou-nos
mais alienados de nós mesmos e do respeito aos nossos sócios da
natureza, deixou-nos mais premidos pelo uso de quantidades crescentes de
recursos de poder para garantir a incorporação (e destruição) de ambientes
extranacionais capazes de garantir a satisfação dos padrões atuais
(insustentáveis) de consumo (p. 54).
Essa transição a que se refere Guimarães está relacionada a diversos
aspectos, entre os quais o tecnológico, já que este remete ao emprego de
quantidades crescentes de energia, muitas vezes provocando o aumento da entropia
(entendida como a medida da quantidade de desordem de um sistema). No aspecto
ecológico, a transição refere-se à incorporação da natureza à cultura, à quebra do
vínculo com a subsistência local, proporcionando a acumulação de bens de
finalidades que não sejam a sobrevivência. No aspecto filosófico, a transição dá-se
pela mudança da atitude de contemplação da natureza pela sua instrumentalização.
Tal instrumentalização é entendida como o uso da natureza pelo homem,
em benefício próprio, considerando-a como objeto de uso e não como parte
integrante do processo de desenvolvimento. Dessa forma, a maioria das práticas
agrícolas e pecuárias em vigor infringe as leis básicas de funcionamento dos
ecossistemas; por outro lado, não seria possível conceber uma comunidade
civilizada sem esse processo de ocupação no Planeta.
Sobre esse aspecto, Mead (1970) afirma que é preciso assumir as
conseqüências, considerando que jamais seremos capazes de retornar ao modo de
vida de nossos ancestrais, mesmo resgatando sua sabedoria original, a qual nos
auxiliaria a entender melhor o que vem ocorrendo, hoje, quando uma geração quase
inocente de senso histórico precisa aprender a conviver com um futuro duvidoso
para o qual não foi preparada.
Na visão de Brandenburg (2005), a implementação de políticas
governamentais, no primeiro período da modernização agrícola, baseada no
subsídio à agricultura, à extensão rural e à pesquisa agropecuária para modernizar o
campo, aponta ainda para o progresso social e econômico. No entanto, esse
discurso não se sustenta, uma vez que provocou todo um processo de exclusão do
pequeno agricultor, que, para sobreviver, passou a se organizar em sindicatos e em
instituições ligadas à igreja, como pastorais religiosas e associações, passando a
questionar as políticas agrícolas e as técnicas implementadas por elas.
Esses grupos organizados passaram a propor soluções alternativas
saudáveis, como a adoção de adubação verde, o plantio direto, o uso de
biofertilizantes líquidos, a vermicompostagem, cujos projetos experimentais vêm
sendo desenvolvidos em várias partes do país, principalmente na Região Sul,
direcionados mais à agricultura familiar, pois esta é bem representativa em escala
nacional. Nesse sentido é que a agroecologia passa a discutir não só os problemas
em relação à adoção de técnicas alternativas de uso do solo, como também as
questões sociais relacionadas à distribuição da terra, da renda e dos alimentos, os
conhecimentos tradicionais dos povos e sua cultura.
2.3 AGROECOLOGIA: UMA ALTERNATIVA DE SUSTENTABILIDADE PARA AS
PEQUENAS COMUNIDADES DE LAVRADORES
Na perspectiva de buscar alternativas sustentáveis para as pequenas
comunidades de lavradores, Pires (1998) afirma que poderá ser uma evolução do
atual modelo de produção agrícola para um modelo que combinará a agricultura
tradicional com a alternativa. Para muitos autores, a solução para essa agricultura
poderá ser específica para cada agroecossistema, substituindo-se a especialização
pela diversificação de culturas, atentando-se para a saúde dos agricultores e dos
consumidores, para a estabilidade do ambiente, assegurando os lucros dos
agricultores a longo prazo e para uma produção que atenda às necessidades atuais
da sociedade, considerando também as gerações futuras.
O autor menciona ainda outras técnicas, como as de reduzir a criação de
animais, de estabelecer o manejo integrado de pragas, adotar formas de fertilização
orgânica e verde, utilizar técnicas adequadas de plantio e trabalho da terra, fazer o
controle manual de ervas daninhas, praticar a agroflorestação, a rotação de culturas,
a integração da produção animal e vegetal, a economia de insumos, dentre outros,
convergindo em três regras básicas: estabilidade, resiliência e eqüidade.
Todas essas alternativas de desenvolvimento sustentável tornaram-se
referência a partir de experimentos realizados ao longo da história, uma vez que,
para Gomes (1991):
É pela prática que o ser humano cria as condições materiais de
sua existência na sociedade. É pela prática que estabelecemos a nossa
união concreta com o mundo exterior, revelando-nos as sensações, as
percepções, as representações, as quais funcionam como nexos entre os
conhecimentos (sensorial e conceitual). É pelo mecanismo da prática –
produção, experimentação, luta de classes – que testemunhamos a
veracidade de nosso saber (p. 19).
Com base nesse cenário, segundo Schmidt (2001), é necessário
fortalecer a agricultura familiar
19
, bem como reconstruir a cidadania no campo,
apontando, como caminho viável, a agricultura orgânica, transportando-a da
19
Entendida como “uma unidade de produção onde trabalho, terra e família estão intimamente
relacionadas” (CARNEIRO, 1999, p. 329). Nesse sentido, a agricultura familiar exige que pelo
menos um membro da família associe as atividades de administrador da produção e trabalhador.
Inclusive, em algumas regiões do país, a agricultura é apenas um componente da economia
familiar, pois cada vez mais outras atividades vêm sendo vinculadas, que não a agricultura
propriamente dita.
marginalidade para elemento estratégico, por meio de análise das mudanças nas
formas de comercialização e no perfil do consumidor dos produtos.
A participação da agricultura familiar na economia nacional, segundo
Mota & Schmitz (2005), possui uma característica importante pela sua
participação na produção de alimentos e na geração de ocupações,
equilibrando-se entre a maior ou menor destinação dos produtos ao
mercado e ao aprovisionamento. [...] funciona como uma proteção quanto
às oscilações do mercado, visando, em última instância, evitar que a família
sofra as conseqüências da falta de alimentos (p. 200).
Cabe mencionar também as atividades rurais não-agrícolas nas pequenas
propriedades cujos benefícios, segundo Carneiro (1999), vão desde o incremento na
renda, até uma segurança para períodos de crise na agricultura ou de desemprego.
O Censo Agropecuário do IBGE 1995/96, para Oliveira (2004), expressa
serem a pequena e a média unidade de produção, as responsáveis pela maior parte
da produção agropecuária. Os dados apontam que, dos 17,9 milhões de
trabalhadores rurais, 87,3% estão empregados nas pequenas unidades; 10,2%
estão empregados nas médias unidades e apenas 2,5% estão empregados nos
latifúndios.
Dessa forma, concorda-se com Mota & Schmitz (2005), ao afirmarem que
os dados mostram que a agricultura familiar é a principal fonte de ocupação no meio
rural e também na economia nacional, de forma que necessita de maior investimento
para o setor e que este seja continuado e melhor distribuído entre as regiões. Para
os autores, muitas são as vantagens da agricultura familiar, pois, além de manter o
homem no campo, garante a sua subsistência; contribui para a conservação do
ambiente na medida em que utiliza pouco ou nenhum insumo químico; produz
alimentos mais saudáveis e valoriza a cultura local, uma vez que os conhecimentos
e técnicas de trabalho com a terra, na pequena propriedade do meio rural,
geralmente são transmitidos de geração para geração.
Frente às evidências, para Caporal & Costabeber (2002) e Romeiro
(2003), uma forma vantajosa seria estabelecer uma associação entre a agricultura
familiar e a agricultura orgânica, fazendo prevalecer questões éticas, ou seja, a
manutenção do homem no campo e a inserção dos produtos por ele produzidos no
mercado, atendendo aos requisitos de agricultura agroecológica e a questão do
desenvolvimento rural sustentável, que abrange as dimensões ecológica, econômica
e social, em primeira instância; as dimensões cultural e política, em segunda
instância e a dimensão ética, em última instância.
Caporal & Costabeber (2002) afirmam que a dimensão ecológica abrange
a permanência e reabilitação da base dos recursos naturais, cabendo aí a
preservação e/ou melhoria das qualidades químicas, físicas e biológicas do solo e,
também, a manutenção e/ou melhoria dos mananciais hídricos, da biodiversidade e
dos recursos naturais em geral.
A dimensão social, para esses autores, compreende a eqüidade na
absorção do usufruto dos recursos gerados e dos custos da produção desses
recursos, por todos os segmentos da sociedade envolvida. A dimensão econômica
visa aumentar a produção e a produtividade através de balanços agroenergéticos
positivos. A dimensão cultural está pautada num modelo de intervenção que respeite
a cultura local das populações rurais. A dimensão política envolve os processos
democráticos de participação, cabendo o envolvimento dos atores em todas as
instâncias decisórias, e a dimensão ética está relacionada ao comprometimento da
vida no Planeta, com a qual temos responsabilidade direta pelas nossas ações
sobre os recursos naturais.
Sendo assim, entende-se que a agricultura familiar encontra um caminho
possível na agricultura agroecológica, cabendo aos participantes desenvolver
associações e cooperativas que facilitem a viabilização da certificação de seus
produtos, para competirem nos mercados mais próximos. Como exemplo, pode-se
citar o caso apresentado no programa Globo Rural, de 30 de abril de 2006, em que
uma cooperativa localizada próximo a Montes Claros - MG, por meio de seus
cooperados, negocia a venda de derivados dos frutos do Cerrado, com a Companhia
Nacional de Abastecimento (CONAB), sendo esta a intermediária entre as creches e
os asilos locais (GLOBO RURAL, 2006).
Esse exemplo mostra uma forma garantida de comercialização dos
produtos, pois se trata de um mercado local, que possui familiaridade com o tipo de
cultura, podendo, inclusive, garantir maior credibilidade do consumidor sobre os
produtos, cuja qualidade os interessados poderão comprovar in loco.
A sustentabilidade na produção incorpora técnicas alternativas saudáveis,
atendendo aos princípios da agroecologia. Sendo assim, é mister que essas
alternativas tecnológicas menos agressivas ao ambiente, passem a fazer parte das
políticas públicas e sejam disseminadas, de forma a atender as especificidades
regionais, buscando a potencialização do ambiente, com o mínimo de impactos,
incorporando a prática do desenvolvimento sustentável.
Nessa linha de pensamento, o estudo da Comunidade Voadeira requer
uma análise da estrutura sócio-econômica ali estabelecida, para verificar as
condições de vida dos moradores e averiguar se há sustentabilidade nas atividades
praticadas por eles. Ao conviverem moradores, frutíferas, araras, periquitos e
tucanos, sendo o controle de pragas totalmente natural, a impressão que se tem, ao
chegar à Comunidade Voadeira, é de que a modernidade ainda não chegou.
Nosso estudo mostra que a falta de terra para o cultivo de frutíferas ou
para o desenvolvimento de outras atividades agrícolas, a falta de conhecimento a
respeito da importância da preservação e conservação da natureza, são os
principais indicadores da insustentabilidade da Comunidade. Exemplo disso é a
matéria-prima (caju, jaca, manga e mamão) que, uma vez colhida nos próprios
quintais das famílias de Voadeira, é insuficiente, levando a Associação a recorrer às
chácaras e fazendas vizinhas para comprar (vide Figura 1), fato que gera aumento
dos custos para a atividade.
Figura 1
Plantas de caju em chácara vizinha à Comunidade, 20/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Outro gargalo é a necessidade de comprar lenha, muito utilizada na
produção de doces, o que contribui para a degradação ambiental, pois não há uma
política de reflorestamento para a Comunidade.
Observa-se que a Comunidade Voadeira sofre com a falta de uma política
que dê condições de manter as atividades ali desenvolvidas, cujos caminhos devem
transitar, obrigatoriamente, pelas áreas social, ambiental, tecnológica e econômica,
com vistas ao desenvolvimento sustentável.
No capítulo 3 faz-se um levantamento da ocupação da Região Centro-
Oeste, nos anos 1960, fomentada pelos altos incentivos estatais, suas contribuições
e conseqüências para as pequenas comunidades de lavradores.
3 REGIÃO CENTRO-OESTE, REGIÃO DE FRONTEIRA AGRÍCOLA A
PARTIR DOS ANOS 1960
Este capítulo faz um estudo do processo de ocupação da região Centro-
Oeste que se acentua nos anos 1960 e 1970, pela grande quantidade de incentivos
fiscais para o setor do agronegócio. Toda essa dinâmica, ao mesmo tempo em que
gera divisas para a região, acaba por excluir as comunidades tradicionais que viviam
da agricultura de subsistência, como é o caso Comunidade Voadeira, objeto deste
estudo.
3.1 O PROCESSO DE OCUPAÇÃO DO CENTRO-OESTE A PARTIR DOS ANOS
1960
Para entender melhor o processo de ocupação da região de Barra do
Garças, é importante analisar o papel do Estado como indutor do desenvolvimento
da região Centro-Oeste. Nesse sentido, a “Marcha para o Oeste”, um projeto
geopolítico dirigido pelo governo para ocupar e desenvolver o interior do Brasil,
lançado nos anos 1930, foi decisiva para o desbravamento da região.
Em 31/12/1937, de acordo com Cavalcante & Costa (1999), o governo de
Getúlio Vargas anunciou a criação de uma política que visava à ocupação do interior
brasileiro - a “Marcha para o Oeste”. De acordo com as diretrizes oficiais, a intenção
da “Marcha para o Oeste” seria a expansão das fronteiras do Brasil dentro de suas
próprias fronteiras, ou seja, dever-se-ia promover a migração e ocupação do Centro-
Oeste que teria como base trabalhadores da região nordeste.
Na década de 40, o Governo Getulista organizou a Expedição Roncador-
Xingu, ainda como parte da “Marcha para o Oeste”, com o propósito de desbravar e
mapear a estrutura fundiária e para saber quem eram os moradores da região.
Segundo Cavalcante & Costa (1999) e Lima Filho (2001), a intenção de desbravá-la
era para, em seguida, entregá-la à expansão capitalista. A expedição foi organizada
pelo Ministro João Alberto, que fez o loteamento do povoado de Barra do Garças em
um importante ponto de logística para um processo de desenvolvimento. O principal
objetivo foi abrir uma estrada para a ligação do Sul com o Norte, fixar núcleos
populacionais, ao longo das estradas, e uni-los por meio de linhas telefônicas.
Cavalcante & Costa (1999) revelam ainda que, em 1950, a expedição
atingiu a Serra do Cachimbo, divisa do Estado de Mato Grosso com o Pará. Ela,
ainda, estabeleceu a navegação regular nos rios interiores, provocou também o
surgimento de cidades, como Aragarças e Nova Xavantina, a construção de treze
campos aéreos e cinco rodovias, infra-estrutura que promoveu o desenvolvimento
da pecuária e da agricultura nos chapadões. As regiões, antes ocupadas somente
pelos nativos, viram-se integradas ao capitalismo; em contrapartida, os nativos
sofreram massacres e perdas de suas terras.
A presença da “Expedição Roncador-Xingu”, da Fundação Brasil Central
(FBC) e da Superintendência para o Desenvolvimento do Centro-Oeste (SUDECO)
na Amazônia proporcionaram vultosos empreendimentos os quais são responsáveis
por todo um processo de desenvolvimento e integração da região ao restante do
Brasil.
Nesses termos, Cardozo (1991), afirma que “O advento da Fundação
Brasil Central no município de Barra do Garças, não obstante os limitados efeitos,
em termos de proposta social, foi importante para o processo de desenvolvimento
da região” (p. 86).
A FBC teve como tarefa essencial montar uma infra-estrutura com o
objetivo de incorporar parte da região do Brasil Central ao mercado nacional, fato
que originou uma onda desenvolvimentista, a partir da segunda metade de 1970.
Nessa década, de acordo com Ribeiro (2001), o município de Barra do Garças foi
um dos que recebeu maior investimento financeiro, atingindo uma influência política
e econômica a um raio de 300 km, na região do Vale do Médio e do Baixo Araguaia.
Segundo Pietrafesa (2002), o processo de ocupação da região Centro-
Oeste ocorreu, de forma mais intensa, nas décadas de 1950 e 1960, estimulando o
crescimento populacional em Mato Grosso e Goiás, com migrantes vindos do
Nordeste e de Minas Gerais. Contribuíram para o desenvolvimento da agricultura na
Região, a partir da década de 60, tanto os investimentos governamentais na rede de
transportes e armazenagem, como o desenvolvimento de pesquisas agropecuárias e
a liberação de crédito agrícola subsidiado. A abertura dessa região para o capital,
segundo Pietrafesa (2002), levou o governo a estimular a ocupação de áreas
inabitadas existentes no País. Para isso, os projetos de colonização e migração
espontânea pretenderam dinamizar a produção agrícola, aliada ao aproveitamento
da mão-de-obra excedente, vinda principalmente do Nordeste.
No pós anos 1960, o Governo da União resolveu, frente aos graves
problemas sociais, estimular a colonização de toda a região Norte e Centro-Oeste,
através do projeto de integração nacional, o qual visou esvaziar as tensões
existentes principalmente nas regiões Nordeste e Centro-Sul. Para povoar a
Amazônia, segundo Siqueira (1990), era fundamental investir em obras infra-
estruturais: ferrovias, rodovias, colonização, reforma agrária, etc. Assim, o Governo
Médici, em 1970, criou o Plano de Integração Nacional (PIN). Nesse momento a
região de Barra do Garças foi integrada ao Projeto do Governo Federal como um
pólo de desenvolvimento econômico, de modo que a construção da BR 158, de
Barra do Garças a São Félix do Araguaia, tornou-se tão importante ao fazer a
ligação da região com a Amazônia.
Com a construção dessa rodovia e com os múltiplos incentivos oferecidos
pelo governo federal, deslocaram-se para a região grandes capitalistas que
realizaram investimentos lucrativos na pecuária, na agricultura, nas madeireiras, na
extração de metais e em outras atividades. Esses capitalistas, vindos principalmente
de São Paulo e da Região Sul, ao chegarem à região, receberam grandes extensões
de terras e, através de financiamentos bancários, passaram a utilizar tecnologias
modernas, as quais praticamente dispensam o trabalhador braçal. Assim, os
trabalhadores que desenvolviam agricultura tradicional, baseada nos recursos
naturais e no trabalho familiar e com alto grau de consumo, sofreram um processo
de estrangulamento, ou seja, foram deslocados para áreas de difícil acesso ou para
novas áreas de fronteira.
As próprias condições econômicas dos agricultores tradicionais não
permitiram acesso a crédito, impedindo a modernização de suas atividades. Dessa
forma, as alternativas encontradas foram de tornarem-se mão-de-obra do grande
capitalista e, na medida de suas possibilidades, desenvolverem pequenos plantios
para subsistência.
Essas comunidades tradicionais, formadas em sua maioria por
nordestinos e nortistas que moravam na região, continuaram as atividades de
subsistência, sem qualquer incentivo por parte do governo e vão formar a agricultura
familiar na região Centro-Oeste, alguns guiados por “concepções milenaristas”,
como afirma Martins (1996):
Pude observar que as migrações espontâneas do nordeste
para a Amazônia, para um número muito grande de pessoas, estão
motivadas por concepções milenaristas. Em diferentes pontos de uma
extensão de cerca de oitocentos quilômetros ao longo do rio Araguaia
encontrei diversos grupos de camponeses que chegaram à região
inspirados pela profecia do Padre Cícero sobre a existência de um lugar
mítico depois da travessia do grande rio. E tive notícia de um grupo
desgarrado, empenhado na mesma busca, que se estabelecera à beira do
rio Tocantins. Esse lugar mítico é reconhecido como o lugar das Bandeiras
Verdes, que ninguém sabe dizer exatamente o que é nem onde é. Mas,
seria reconhecido quando fosse encontrado, por ser um lugar de refrigério,
de águas abundantes, de terras livres, em contraste com o nordeste árido e
latifundista (p.54).
Isso pôde ser percebido no sonho dos moradores da Comunidade
Voadeira, como afirma uma das primeiras moradoras do núcleo “[...] nós saímos de
lá [de Cícero Dantas – BA], como quem ia para o céu (M. M. S., 80 anos,
aposentada, natural de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 20 de setembro de
2006).
O processo de ocupação das regiões de fronteira, no Centro-Oeste,
desde 1970 tem provocado grandes danos às populações locais que, nas palavras
de Ribeiro (2001), ocorrem “primeiramente sobre as populações indígenas, depois
sobre os camponeses pobres das frentes de expansão.” Uma análise mais
detalhada “nos informa que o colono capitalizado do sul do país e o tipo de
desenvolvimento implantado na Amazônia Legal foram cruciais para limpar do sertão
aquilo que ‘não presta’, isto é, índios e posseiros.” (p. 52).
As palavras de Ribeiro (1993) revelam ainda que:
A partir da década de 1970 o Governo Federal monta um
processo de colonização dirigida à Amazônia. Através do Programa de
Integração Nacional – PIN, criou obras de infra-estrutura e montou uma
dinâmica de assentamentos de trabalhadores rurais sem terra, através do
Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA. Esses dois
requisitos tornaram-se a linha de frente da valorização da região amazônica
e sua posse efetiva pelo capital. (p. 06)
Nesse sentido, a política de colonização e assentamento, segundo
técnicos do governo, tinha como finalidade permitir o acesso à terra de forma “mais
humana e racional”. No entanto, o projeto intencionava, inicialmente, transferir
colonos provenientes do Nordeste e do Centro-Sul do Brasil, áreas de fortes tensões
sociais, decorrência da gritante concentração de terras por parte de grandes
proprietários, que excluía grande número de trabalhadores do acesso à terra.
Segundo Ribeiro (1993), essa concentração é decorrente da história de
apropriação de terras e do processo de modernização do campo iniciada na década
de 1950, e que levou à substituição de culturas tradicionais, como feijão, arroz,
mandioca e etc., pelas culturas de exportação, no caso, a soja, o trigo, o milho, o
café e a cana-de-açúcar, fato que provocou a expulsão de grande número de
camponeses que, expulsos das terras, segundo esse autor, acabam por se tornar
força de trabalho para as obras de infra-estrutura implantadas pelo Governo Federal,
tais como rodovias, ferrovias, aeroportos, hidrelétricas e portos, cujos objetivos são a
reprodução, a acumulação e a ampliação do capital.
Num segundo momento, especificamente no final de 1973, o Governo
Federal pôs fim ao projeto de colonização baseado na migração espontânea; para
isso, a justificativa era a implantação de uma agricultura mais racional e em moldes
capitalistas, como só o agricultor do sul do país poderia fazê-lo, uma vez que já
estava acostumado a isso. Esse argumento, em vez de servir para reformular a
proposta de colonização, contribuiu apenas para a substituição da agricultura de
subsistência pela agricultura em moldes empresariais, com a produção em grandes
áreas e uma exploração predatória.
A partir desse momento, Ribeiro (1993) afirma que o Governo Federal
passou a adotar uma política de incentivo à colonização de pequenos produtores
capitalizados, sob a iniciativa de empresas colonizadoras e cooperativas. Outra
medida adotada foi a concessão de enormes parcelas de terras e incentivos fiscais a
grandes grupos econômicos que quisessem se instalar na Amazônia.
Cavalcante & Costa (1999) retratam bem o processo de expansão do
capital e suas conseqüências, no trecho a seguir:
A proteção do Estado aos grandes fazendeiros, latifundiários e
empresários, bem como a expropriação e exploração exacerbada do
trabalhador, levanta o problema da reprodução da posse e do posseiro.
A feição selvagem do capitalismo nas fronteiras agrícolas
Mato-grossenses não se restringe apenas a exploração do peonato. A
redução do contingente de trabalhador assalariado permanente, de
pequeno parceiro a arrendatário, é o reflexo da expropriação progressiva,
da ampliação dos latifúndios.
Isto ajuda a compreender o aumento assustador da posse e do
posseiro, [...] (p. 136).
Todo esse processo de expansão do capital na Amazônia Legal dificultou
o acesso do pequeno agricultor às terras da região, uma vez que a maioria não
possuía poder aquisitivo para adquirir uma parcela de terras ofertadas pelas
cooperativas e empresas imobiliárias, fato que muitas vezes o levou à abertura de
empréstimos bancários que, posteriormente, os obrigou a entregar suas terras como
forma de pagamento.
Resta-lhe, então, de acordo com Ribeiro (1993), a opção de se tornar
força de trabalho para o capital. As opções de trabalho aos destituídos de capital era
trabalhar nos grandes empreendimentos em processo de implantação; ou a luta, ou
a resistência, para permanecer na terra; uma luta que era acompanhada de
reivindicações por melhores condições estruturais.
A região Centro-Oeste, especificamente o município de Barra do Garças,
sofreu os impactos desse processo de desenvolvimento regional proposto pelo
Governo Federal, uma vez que recebeu incentivos para implantação de toda uma
infra-estrutura, destinada a dinamizar a região, tornando-a pólo de desenvolvimento.
A concessão de incentivos fiscais para fomentar projetos aprovados pela
SUDAM e pela SUDECO
20
foi a forma de atingir uma produção agropecuária nos
moldes capitalistas, ou seja, promover os grandes empreendimentos na região.
3.2 O RECENTE PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DO CENTRO-OESTE:
COMO INCORPORAR AS COMUNIDADES QUE VIVEM DA AGRICULTURA
TRADICIONAL
Com o objetivo de acelerar ainda mais o desenvolvimento do Centro-
Oeste, recentemente o Governo Federal criou o Plano Estratégico de
Desenvolvimento do Centro-Oeste 2007-2020 (2006), cujo eixo norteador é o
desenvolvimento regional sustentável.
A justificativa para o lançamento de tal Plano é que essa região possui
uma dinâmica econômica resultante da rápida penetração da agropecuária,
concentrada na produção de grãos e carne, com altos níveis de produtividade que
ocupam um espaço crescente no agronegócio e nas exportações brasileiras. O
excelente desempenho do comércio exterior dessa região, conforme o Plano
Estratégico, embora com deficiências em termos de infra-estrutura econômica e
20
Órgão criado pela Lei nº 5.365, de 1º de dezembro de 1967 e extinto em 1990. Está em discussão
no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº. 184 de 07/06/2004, de recriação da
SUDECO, com o objetivo de articular diferentes instituições e agentes para implementação das
prioridades que promovam o desenvolvimento sustentável da Região Centro-Oeste, e assumir o
papel de agente articulador e coordenador de atores públicos e privados. Para maiores informações
consultar o Plano Nacional de Desenvolvimento do Centro Oeste (2007-2020), Brasília, 2006.
logística regional, de certo isolamento e elevados preços de transporte, é
compensado pela alta produtividade (obtida pelas condições do relevo e qualidade
da tecnologia agropecuária) e o baixo custo da produção de soja (30% menor do
que o norte-americano).
Diante do elevado dinamismo da economia regional, lembram os
formuladores do documento governamental que as condições de vida da população
do Centro-Oeste foram bastante limitadas. Apesar dos indicadores sociais serem
melhores que a média nacional
21
, a realidade social da Região contrasta com a
acelerada expansão da economia que deixa um rastro preocupante de degradação
ambiental e pode comprometer a sua própria sustentabilidade.
Outro fator preocupante que o plano aborda é o nível de escolaridade e
alfabetização na década de 1990
22
, pois o Centro-Oeste registra pouco mais de 10%
de não-alfabetizados, ainda muito acima do Sul e do Sudeste, sendo o Mato Grosso
o Estado da região com o maior número, com registro de 11,6% na população de 15
anos e mais. Tem ainda o menor índice de escolaridade da Região, com 5,5 anos
médios de estudos. Em se tratando do esgotamento sanitário, conta apenas com
29,8% das residências com tratamento, contribuindo para impactos negativos ao
ambiente.
Pela sua relevância, a questão ambiental é contemplada no Plano e
mostra preocupação com a rápida e recente ocupação na faixa de floresta tropical
úmida, ao norte de Mato Grosso, o que gerou grandes áreas desmatadas, devido à
mecanização intensiva, às queimadas e à extração de madeira, provocando sérias
conseqüências ao meio ambiente. Os impactos vão desde a redução da diversidade
da fauna e da flora, da deterioração das bacias hidrográficas, da erosão do solo até
de doenças respiratórias, riscos de incêndios e aumento da emissão de gás
carbônico. Este último, um dos principais responsáveis pelo efeito estufa e
aquecimento do Planeta.
21
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano, indicador síntese de renda, educação e expectativa de
vida. O Centro-Oeste passou de 0,717 em 1991, para 0,788 no ano 2000 (Plano Estratégico de
Desenvolvimento do Centro-Oeste, 2006). Disponível em <http://www.integracao.gov.br/>. Acesso
em 03/02/2007.
22
A taxa de escolarização em Mato Grosso, atualmente ficam em: 72,3% para crianças de 5 ou 6
anos; 96,4% para crianças de 7 a14 anos; 81,4% para jovens de 15 a 17 anos; 31,9% para adultos
de 18 a 24 anos e 6,9% para adultos de 25 anos ou mais. Fonte: PNAD 2005 < www.ibge.gov.br>.
Acesso em 16 de maio de 2007.
Segundo o Ministério do Meio Ambiente (2001), a ocupação desordenada
levará a uma perda média de solos nas culturas de grãos nos Cerrados, girando em
torno de 10 quilos por quilo de grão produzido, por erosão eólico-hídrica, cujos
custos serão insuportáveis, quer pela perda de fertilidade, que requer reposição via
insumos químicos, quer pelo assoreamento e poluição das bacias hidrográficas.
Fazem parte do Plano também a discussão a respeito dos conflitos
fundiários, a regularização e titulação das terras que geram restrições econômicas, à
medida que criam insegurança nos investidores e dificuldade de financiamento à
produção. O tratamento do problema demanda iniciativas políticas por parte dos
governos, especialmente dos Estados, tanto para mediar os conflitos, como para
acelerar o processo de demarcação e regularização da posse da terra dos diversos
grupos sociais interessados.
O Plano Estratégico de Desenvolvimento do Centro-Oeste (2006) deve
ser pulverizado em planos e projetos territoriais de pequena escala (bacias, meso ou
microrregiões, aglomerados e municípios, ecossistemas etc.) de caráter operacional.
A SUDECO e seus parceiros na rede devem estimular a elaboração participativa dos
referidos planos e, ao mesmo tempo, incentivar a configuração de instâncias locais
de gestão participativa. Embora tendo flexibilidade para a formação de múltiplos
modelos institucionais, de acordo com as características e escolhas de cada
território, será estimulada a constituição de organizações institucionais, nos moldes
das agências de desenvolvimento locais, que comprometem o governo federal, os
governos estaduais e municipais, e envolve as instituições privadas.
Nesse contexto, espera-se que a política de desenvolvimento regional
proposta pelo governo tenha a participação maciça das comunidades envolvidas na
sua efetivação e a aplicação dos projetos contemplados no Plano Estratégico de
Desenvolvimento do Centro-Oeste seja eficaz, de forma a amenizar as
desigualdades regionais e locais, tão evidentes. Do contrário, estar-se-á contribuindo
ainda mais para a exclusão de grupos minoritários, em privilégio da ampliação da
propriedade fundiária em moldes capitalistas, como ocorre na Comunidade
Voadeira, objeto deste estudo. Hoje a Comunidade sofre as conseqüências do
processo de reprodução e expansão do capital no campo, iniciada nas décadas de
1960 e 1970.
A política de investimentos estatais para a região contribuiu para o
fortalecimento de grandes empreendimentos agropecuários e veio a reforçar a
exclusão ou a formação de núcleos de pequenos agricultores, como é o caso da
Comunidade Voadeira. Nesse aspecto, concorda-se com Santos (1998), quando
este afirma que:
O homem do campo brasileiro, em sua grande maioria, está
desarmado diante de uma economia cada vez mais modernizada,
concentrada e desalmada, incapaz de se premunir contra as vacilações da
natureza, de se armar contra as oscilações dos preços externos e internos e
a ganância dos intermediários. Esse homem do campo é menos titular de
direitos que a maioria dos homens da cidade, já que os serviços públicos
essenciais lhes são negados sob a desculpa da carência de recursos para
lhe fazer chegar saúde e educação, água e eletricidade, para não falar de
tantos outros serviços essenciais (p. 29).
Santos aborda um ponto importante da problemática vivida pela
população rural, na qual se insere a Comunidade Voadeira. Ela carece dos serviços
básicos de saúde, educação, saneamento básico, emprego, transporte, enfim, essa
realidade espelha a distância que há entre a vida vivida e uma verdadeira cidadania.
Diante dessa realidade, a análise que se faz é a de que as pequenas
comunidades, como é o caso de Voadeira, devem se organizar e, com o apoio do
poder público, da iniciativa privada e de outras instituições, discutir as
potencialidades locais, com vistas a desenvolver formas alternativas de geração de
renda e de permanência dos moradores na Comunidade.
Nesse aspecto, pode-se considerar a importância do PRONAF, como
política pública que, via prefeitura, pode beneficiar a Comunidade Voadeira, no
sentido de demarcar a área de terras pertencentes aos moradores locais.
Esse caminho necessariamente se dará com a aplicação de políticas
públicas que dêem conta do gerenciamento dos recursos naturais e financeiros, com
a participação de toda a Comunidade, em parceria com instituições, como a
Empresa Mato-Grossense de Pesquisa e Extensão Rural (EMPAER/MT), o Serviço
de Apoio a Pequena Empresa (SEBRAE), o Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial (SENAC), o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA), o Banco do Brasil, o Banco da Amazônia, as Universidades,
os empresários locais, na busca de apoio técnico, financiamentos, estudos de
impactos sócio-ambientais e de viabilidade econômica das atividades. Essas ações
devem estar aliadas ao contexto regional e global, uma vez que tanto as ações
locais interferem no regional como no global e vice-versa.
É nesse aspecto que se discute a co-responsabilidade de todos para com
a natureza, pois todos, uns mais que outros, têm sua parcela de contribuição nos
processos de impactos nela gerados.
3.3 O MUNICÍPIO DE BARRA DO GARÇAS NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS
TERRITORIAIS
Barra do Garças é município do Estado de Mato Grosso que, segundo o
IBGE (2000), possui uma área de 9.142 km
2
,
com uma população de 52.092
habitantes e densidade demográfica de 5,6 habitantes por km
2
. Do total de sua
população, 47.843 moram na zona urbana e 4.249 na zona rural, ou seja, 91,8%
residem no espaço urbano, uma relação extremamente alta para um município que
se insere num vasto território, em que a economia é predominantemente
agropastoril.
Situa-se às margens do Rio Araguaia, região Leste do Estado, na
Microrregião do Médio Araguaia, fazendo limites com o município de Aragarças no
Estado de Goiás e com os municípios de Torixoréu, General Carneiro, Nova
Xavantina, Araguaiana e Novo São Joaquim, no Estado de Mato Grosso (vide
Figura 2).
O primeiro registro de penetração em solo barra-garcense data de 1672 e,
segundo Ferreira (1958), foi realizada:
[...] pela “bandeira” chefiada por Bartolomeu Bueno – O Anhangüera – [...]
ali foi encontrado pela expedição de Manoel de Campos Bicudo, que,
subindo o Cuiabá (sic), até São Gonçalo Velho, ganhou a Chapada de São
Jerônimo; cruzou o rio Paranatinga e prosseguiu rumo ao norte em busca
de índios Coróas. Pires de Campos, um dos componentes da expedição,
regressa a Cuiabá quase meio século depois, com o resultado da
exploração, de onde surgiu a lenda dos tesouros dos “Martírios”
presumivelmente localizados na zona vivida pelo sertanista [...] (p. 82).
No interstício entre essa primeira “bandeira” e o início do povoado que
deu origem à cidade de Barra do Garças, ocorreu a formação de pequenos
povoados no entorno, como Araguaiana – MT e Registro do Araguaia – GO, às
margens do Rio Araguaia. Esses povoados eram formados por garimpeiros, que, em
busca de ouro, viveram um período marcado por conflitos, por falta de recursos e
por ataques indígenas.
Figura 2
Ocorreu um período de despovoamento da região, entre a decadência do
ouro e o a descoberta do diamante, pedra preciosa cuja exploração iniciou-se, como
informa Ferreira (1958), na foz do Rio Garças, por volta de 1895.
O povoado da atual cidade de Barra do Garças se iniciou com a vinda dos
garimpeiros do Norte e do Nordeste, em busca de jazidas de diamantes na região,
dando origem ao povoado Barra Cuiabana (margem esquerda do Rio Araguaia) e,
na outra margem, a um povoado denominado Barra Goiana.
Segundo Ribeiro (2001), em 13 de junho de 1924, Barra do Garças foi
fundada “pela iniciativa dos patrões do garimpo, Antonio Cristino Côrtes e Francisco
Dourado” (p. 33). Eles orientaram a construção do povoado demarcando lotes e
distribuindo-os para quem quisesse construir casas para morar. Rapidamente
surgiram igreja, pensão, casa de comércio e escola, elevando-se à categoria de vila,
depois, distrito de Araguaiana.
O crescimento rápido do povoado, segundo Ferreira (1958), rendeu-lhe,
em 1932, a categoria de vila, pela Lei nº. 32 de 21 de dezembro de 1935. Em 15 de
setembro de 1948, Barra Cuiabana emancipou-se, recebendo a denominação de
Barra do Garças; e Araguaiana (antes sede do município) passou a ser distrito.
Em 1943, com a chegada da Expedição Roncador Xingu
23
, foi fundada a
cidade de Aragarças, no povoado de Barra Goiana e, no período de 1950 a 1954 foi
construída a ponte sobre o Rio Araguaia, depois, sobre o Rio Garças, bem como a
estrada (BR 158) até o Rio das Mortes, fato que marcou a integração de Barra do
Garças com todo o Brasil.
A partir de então, se instalaram bancos, energia elétrica, serviços de água
e esgoto, asfaltamento, urbanização, comunicação, escolas e serviços públicos, que
impulsionaram o desenvolvimento de Barra do Garças.
Segundo Ribeiro (2001), “A intenção da Fundação Brasil Central era
desbravar e colonizar o interior do Brasil, [...], as zonas compreendidas nos altos dos
rios Araguaia, Xingu, no Brasil Central e Ocidental” (p. 35). No entanto, o processo
de desenvolvimento de Barra do Garças ocorreu principalmente no período de 1950
a 1970, facilitado pela concessão de incentivos fiscais, por meio de organismos
estatais, a partir do Governo Médici – Pós-64. Nesse sentido, pode-se dizer que, a
partir de 1965, o município já estava preparado para a nova fase de efetivação das
relações capitalistas no Centro-Oeste e na Amazônia
24
.
A propaganda da qual se utilizava o governo para atrair migrantes, era de
que, com a fartura de terras, era só chegar e tomar posse. Essa propaganda atraiu
um contingente de pequenos agricultores, principalmente da região Nordeste e
Centro-Sul, os quais sofreram a expulsão de suas terras de origem, pela entrada da
modernização da agricultura.
Como já foi dito, essa migração para a Amazônia ocorreu via empresas
de colonização, por meio das cooperativas que desencadearam um processo de
23
A Expedição “Roncador Xingu” foi substituída pela Fundação Brasil Central ainda em 06 de outubro
de 1943 e incorporada à Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste – SUDECO em
1967.
24
A partir do Governo Médici ocorreu toda a implementação de obras de infra-estrutura na Amazônia
Legal. Os organismos estatais tiveram papel fundamental para o desenvolvimento da região, uma
vez que os objetivos eram de desbravar e colonizar a região, através da implantação de uma infra-
estrutura de transporte e de comunicação; fato que deu condições para a incorporação do município
de Barra do Garças ao mercado produtivo nacional.
colonização dirigida que deu origem, na região do Araguaia, na década de 1970, às
cidades de Canarana, Água Boa e Querência
25
.
Dentro da estratégia de ocupação da Amazônia Mato-grossense, para
Moreno (1998), o INCRA desenvolveu também diversos projetos de colonização em
áreas de desbravamento. Esses projetos receberam diversas denominações, de
acordo com as características do assentamento. Mas convergiram para os mesmos
objetivos, quais sejam, eliminar conflitos sociais gerados pela expropriação
sistemática de trabalhadores rurais nas regiões de elevada concentração fundiária,
como o Nordeste e o Centro-Sul; criar, ao mesmo tempo, pela remoção dos
expropriados, um bolsão de mão-de-obra nessas regiões, para viabilizar projetos de
caráter empresarial agropecuários, agroindustriais ou de mineração.
A colonização da região, incentivada pelo Estado, com vistas a atrair
produtores capitalizados e a entrada de empresas que aumentaram a área produtora
pela ocupação de terras públicas é que ficou conhecida por “modernização
conservadora”. Essa modernização é que imprimiu grandes impactos ambientais na
região, tais como o desmatamento, a inserção de espécies exóticas, como o capim
brachiaria, a poluição de mananciais pelo uso de agrotóxicos e a destruição de
espécies nativas.
Barra do Garças é parte integrante da Amazônia Legal e dispõe de uma
malha viária formada pelas rodovias BR 158, que leva às cidades do Baixo Araguaia
até a divisa com o Pará, na região do Xingu; e a BR 070, que leva à região
sudoeste do Estado.
Ribeiro (2001) informa que, antes da década de 1970, a cidade era
composta por uma população urbana basicamente de aventureiros e remanescentes
de áreas do garimpo e da área rural, por trabalhadores, posseiros ou agregados nas
25
Segundo Varjão (2004), até 1973, Barra do Garças era o maior município do mundo, com quase
176 000 km
2
, sendo posteriormente desmembrada e “Hoje, na área que formava Barra do Garças,
estão instalados 19 municípios mato-grossenses” (p. 57). Nesse sentido, Ferreira (1958), aponta
que a área do município era ainda maior e que “com o desmembramento de sua área para formação
de outras comunas, Barra do Garças, do 1
o
. lugar que ocupava, passou a ser o 2
o
em relação às
áreas dos demais municípios mato-grossenses, com 194 826 km
2
, ou seja, 14,86% da área do
Estado, superado apenas por Chapada dos Guimarães” (p. 85). Sobre esse aspecto, Lima Filho
(2001) aponta que o município, antes do ano de 1966, possuía aproximadamente 195 000 km
2
e
abrangia as cidades de Santa Terezinha, Luciara, São Félix do Araguaia e “lugares importantes no
imaginário regional, como a Serra do Roncador e rios como o Xingu, Kuluene, Rio das Mortes,
Tanguru, Suiá-Missu entre outros” (p. 76).
fazendas, oriundos dos estados da Região Norte, Região Nordeste e do Estado de
Minas Gerais.
O processo de colonização foi intensificado na década de 1970. Nesse
período, segundo Ribeiro M. (2005), uma grande leva de migrantes de diversas
partes do país chegou à região, atraída pelos altos investimentos estatais. Barra do
Garças passou a ser um pólo de desenvolvimento, pois recebeu cooperativas, cujos
projetos de colonização originaram novas cidades no interior, como Canarana, Água
Boa e Querência, que serviram de apoio logístico para o desenvolvimento do campo.
Segundo Oliveira (apud LIMA FILHO, 2001), em 1970, a SUDAM
proporcionou incentivos fiscais para implantação das Sociedades Anônimas, que
passaram de 50% para 70%. Duarte (apud LIMA FILHO, 2001) aponta que, das 189
empresas que receberam incentivos da SUDAM entre os anos de 1967 e 1982, 64
delas se concentraram na região do Araguaia, sobretudo no município de Barra do
Garças, e 15 no município de Luciara.
O crescimento da zona urbana de Barra do Garças, levou à sua
estruturação em distritos e povoados no seu entorno, que hoje compõem-se de:
distrito de Vale dos Sonhos, distrito de Toricoeje, distrito de Indianópolis, povoado
Tabazul, povoado Voadeira e o Monchão do Arueira.
É nesse contexto que se situa a Comunidade Voadeira, objeto de nossa
pesquisa.
O município de Barra do Garças é composto por uma vegetação que se
constitui de matas, cerrados e campos cujas pastagens naturais facilitam o
desenvolvimento da pecuária, fonte básica da economia local. De clima tropical, o
município possui um período chuvoso (outubro a março) e outro seco (abril a
setembro).
Situada à margem esquerda do Rio Araguaia, a cidade possui um
potencial hídrico muito grande, sendo o Rio Araguaia o mais importante. Seus
afluentes, o Rio das Garças, o Rio das Mortes, além de ribeirões, córregos e lagos
compõem a bacia hidrográfica do município, que facilita a agricultura.
Vale ressaltar também as comunidades indígenas que compõem a região,
como as tribos Xavante e Bororo. As atividades que desenvolvem baseiam-se em
plantações, criação, caça, pesca e artesanato. A população indígena da região,
segundo a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), em 2004, era de 2.440 índios.
A FUNAI (2004) informa que a Missão Salesiana de São Marcos atua
junto ao povo Xavante, na Reserva Indígena São Marcos, no município de Barra do
Garças, desde 1958. A reserva hoje possui uma área de 188 478,26 ha, composta
de 26 aldeias, com 20 a 400 pessoas em cada aldeia e suas principais necessidades
são: a conservação de estradas, esgoto sanitário, energia elétrica e água potável.
A Missão Salesiana Sagrado Coração, segundo Camargo (2001), também
lutou em favor dos índios Bororo, na demarcação de terras, no município de General
Carneiro/MT. O Padre Rodolfo Lunkenbein (37 anos), por apoiar a demarcação do
Território Bororo do Meruri, e Simão Cristino Bororo, que foi defender o padre, foram
mortos no pátio da Missão, em 15 de julho de 1976. Foram também gravemente
feridos os Bororo Lourenço Rondon Cibae Ewororo, então cacique daquela
comunidade, Dona Tereza, mãe de Simão Cristino, José Rodrigues Boiadowu e
Gabriel dos Santos Bakorokudu. Uma bala perdida atingiu também um rapaz, filho
de um morador da região. À custa desses sacrifícios os Bororo do Meruri têm hoje a
sua terra demarcada e registrada.
Essas tribos indígenas, nas palavras de Ribeiro (2001), passaram a sofrer
pressões com a chegada de colonizadores, já na década de 30:
[...] as frentes de expansão avançaram e ainda avançam sobre as terras
tribais que, na região de Barra do Garças, pertenciam aos índios bororos e
xavantes. Com a chegada das frentes pioneiras, momento que se
caracteriza pelo uso privado das terras, em que estas assumem a
equivalência de mercadoria, essas populações serão sumariamente
expulsas para dar lugar às grandes empresas, fazendas e aos projetos de
colonização. Por esses motivos, migram para outros locais do estado ou
para as periferias das cidades (p. 52).
Nas primeiras décadas do século XX, os sertanejos que migraram para a
Região Central do Brasil, oriundos das Regiões Norte e Nordeste, segundo Ribeiro
M. (2005), vieram em busca de melhores condições de vida. Assim, formavam
caravanas e deslocavam-se em lombos de burros e a pé, com muita dificuldade para
vencer o percurso; muitas vezes paravam para trabalhar em fazendas e ganhar um
dinheiro para seguir viagem, que podia durar de meses a anos. Apesar das
dificuldades de comunicação da época, as notícias de que a região era promissora,
foram levadas por canoeiros, comerciantes, tropeiros e aventureiros, fazendo com
que muitas famílias se deslocassem de seu lugar de origem para explorar esse
imenso sertão.
Esse processo de pressão sobre as terras indígenas foi agravado com a
modernização agrícola implementada a partir dos governos militares.
No Capítulo 4, faz-se uma análise da Comunidade Voadeira, em seus
aspectos sócio-econômicos e culturais, para entender o processo migratório de seus
moradores, as conseqüências sofridas pela chegada do capital ao campo e as
estratégias de sobrevivência por eles adotadas.
4 COMUNIDADE VOADEIRA: UMA RADIOGRAFIA SÓCIO-
ECONÔMICA E CULTURAL
A Comunidade Voadeira é um bairro rural, e faz parte do município de
Barra do Garças – MT. Localizada a 18 km da cidade e a 500 km da capital, Cuiabá,
tem atualmente uma população de 71 habitantes. Em pesquisa de campo,
constatou-se que esses 71 habitantes remanescentes, residem em 24 casas do
núcleo central, além dos habitantes residentes em chácaras e fazendas vizinhas.
A Comunidade Voadeira teve sua formação iniciada por volta de 1952,
como relata um dos seus primeiros moradores, J.J.C., quando foi designado pela
Agência dos Correios e Telégrafos para operar o telégrafo naquele local. Em
entrevista, ele relatou que, lá chegando, encontrou apenas uma família moradora no
lugar onde a Comunidade está constituída atualmente. Aos poucos foram chegando
famílias da região, principalmente do município de Torixoréu – MT, como M. B. e seu
esposo L., naturais da Bahia e considerados as primeiras lideranças da
Comunidade. O Sr. A. M. F., também vindo da Bahia, havia trabalhado no garimpo
de Baliza – GO e depois se mudou para Voadeira, sendo apontado como um dos
responsáveis pela vinda de outros baianos à Comunidade, ainda no início da década
de 1960.
Segundo J.J.C., nessa década, Voadeira já tinha uma média de 100
famílias, possuía uma pensão, uma farmácia e uma casa de comércio. O local, até o
final da década de 1960, era rota da linha de ônibus que ia para a capital, Cuiabá.
Os migrantes, oriundos principalmente do Nordeste e de outras regiões
de Mato Grosso, chegaram à região pelas notícias dos parentes que aqui já
habitavam, de que a região era farta em terras e água, motivo que os levou a deixar
a terra natal, local de seca e de dificuldades com a agricultura. Esses migrantes
foram movidos pelo sonho de encontrar um lugar em que pudessem viver de forma
mais decente, desenvolvendo uma agricultura que lhes desse melhores condições
de vida.
Instalada às margens do Córrego Voadeira, a área da Comunidade
pertencia à Fazenda Voadeira. A referida Fazenda localizava-se no lote 143 da
Gleba Taquaralzinho (vide Figura 3), com uma área de 5.435 hectares e era de
propriedade particular, cuja escritura foi expedida em 02/08/1945 (INCRA, 1984).
Essa Fazenda, segundo informações do cartório do 1º. Ofício de Barra do Garças,
foi adquirida por outro proprietário e, em 18 de fevereiro de 1960, foi repassada à
sua herdeira, da sobrepartilha de bens deixados pelo seu falecimento. Um dos
marcos do limite da fazenda passava a 40m pelo lado direito da linha telegráfica
Cuiabá-Registro do Araguaia. A área foi fracionada e 44 dessas partes foram
vendidas, restando uma área remanescente de 577,659 ha (1
o
Serviço Notarial e
Registral de Barra do Garças, 2006).
O que se tem de informação é que a herdeira da área era filha única e,
quando do falecimento de seus pais, nem tinha conhecimento de todos os bens
deixados por eles. Moradora da cidade de Goiânia, não participara das transações
comerciais da família. Um político da região, cuja esposa é prima da herdeira,
sabedor desse fato, incentivou a ocupação da área, com fins eleitoreiros, ao colocar
candidatura à prefeitura de Barra do Garças, no início da década de 1950.
Os migrantes, em sua maioria nordestinos e mato-grossenses, passaram
então a ocupar áreas da Fazenda, e construíram suas casas às margens do Córrego
Voadeira, local onde hoje está sediado o povoado.
Com o passar do tempo, uma amiga do casal herdeiro da Fazenda
Voadeira descobriu, num cartório em Cuiabá, o registro dessas terras e os
comunicou. Desde então, o casal tenta reaver a propriedade. Foram feitas várias
tentativas, em ações que envolveram 10 advogados, mas os moradores de Voadeira
resistiram para garantir suas posses. Apenas um advogado J. B. S., que,
posteriormente, passou a ser prefeito da cidade de Aragarças – GO é que conseguiu
negociar com os moradores. Nessa negociação, foi feita a legalização de algumas
das áreas ocupadas, através da emissão da escritura, mediante pagamento aos
proprietários legais. Os outros moradores que não se prontificaram a negociar com
os donos da fazenda, acabaram vendendo o seu direito para fazendeiros do entorno,
que negociaram e as regularizaram.
Vale ressaltar que, no depoimento de J. J. C., um dos primeiros
moradores de Voadeira, este relembra que políticos da época, candidatos a governo
do Estado, a vereador e a prefeito, quando da ocupação da Fazenda, manifestavam-
se em defesa dos ocupantes da área, quando estes se sentiam ameaçados pela
chegada de advogados para negociar. Esses políticos asseguravam aos moradores
que ninguém os retiraria da área ocupada. No entanto, o que veio a ocorrer foi a
saída de muitos moradores, que venderam o direito aos fazendeiros da região e
estes negociaram direto com o proprietário da Fazenda e escrituraram suas terras.
Figura 3
O relato a seguir, de um morador da Comunidade, sobre a negociação
com o proprietário da área de ocupação da Fazenda Voadeira, é elucidativo desse
processo:
Era de um doutor, que [...] não me lembro o nome dele, morava
em Goiânia, n/é? [...] Era, que era o dono da fazenda. Hoje eu nem sei se
ele é vivo. [...] Aí depois, [...] aí levaram vim fazer uma combinação com os
morador e até ele achou por bem vender e dar a escritura. Aí depois teve
uma reunião e veio 2 advogados aí, aí eles veio pra combinar com os povo
que tinham as chácaras ali. Eu já tinha minha terrinha aí. Aí acharam por
bem comprar que o doutor tinha planejado dar escritura. O povo comprava
naquele tempo no valor que tava e ele dava escritura e assim foi. [...]. Não
era pra pagar duma vez e as terras naquele tempo era barato, n/é? Muito
barato, n/é? Só que o dinheiro também, [...] acho quase era pior do que
hoje. Dinheiro toda vida a gente pobre não tem, a gente sabe, n/é? Mas deu
um jeito que quem quis comprou. E quem não, veio outros assunto aí se
não queria vender os direitos pro povo que se debelaram a comprar, pra
fazer fazenda. (J. P. F., 80 anos, aposentado, natural de Cícero Dantas
BA, entrevistado em 05 de setembro de 2006).
Em levantamento realizado nos arquivos da Prefeitura Municipal de Barra
do Garças, a Lei Municipal Nº. 216, de 04 de março de 1965, determina a isenção de
Imposto de Transmissão, na doação que o Sr. J.C. V., proprietário da Fazenda
Voadeira, que este fizer ao Estado de Mato Grosso. Tal Lei foi sancionada pelo
prefeito da época (BARRA DO GARÇAS, 1964).
No entanto, não foram localizados dados sobre a área doada. A única
informação que se tem foi colhida em conversa informal com a Presidente da
Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira e outros
moradores da Comunidade. Estes informam que o povoado está loteado numa área
pública, que era de 10 alqueires (48,4ha) e os lotes onde os moradores estão
instalados não têm registro. Nesse local, existem chácaras que eram de domínio
público e foram ocupadas. Essa área, hoje denominada “patrimônio”, é o local onde
estão construídas as residências dos moradores, e onde foi construído no passado o
Posto Telegráfico (vide Figura 4).
Durante a pesquisa ficou constatado que os moradores do núcleo ali
formado não possuem escrituras de seus lotes. Já os proprietários de chácaras e
fazendas vizinhas, todos informam possuir documentação. Os que se instalaram na
área pertencente à Fazenda Voadeira optaram por negociar com o antigo
proprietário, ou aguardaram o direito adquirido por usucapião ou ainda venderam o
direito aos fazendeiros que regularizaram suas terras. Na Comunidade, apenas um
morador, um dos primeiros a chegar à região, ainda possui uma propriedade fora do
núcleo, com 28 ha.
Figura 4
Comunidade Voadeira, 25/06/2006.
Fonte: arquivo da autora
Em relação aos moradores que venderam suas propriedades, as
conseqüências são drásticas:
Muita gente vendeu o direito deles e ficaram se batendo.
Venderam e foram pra cidade não sei o quê [fazer]. Aí acabou com aquele
dinheirinho e ficaram se batendo pior do que o que tava, porque quando
tava aqui o combinado tinha onde plantar uma mandioca, uns pés de
banana, uma cana, o que quisesse plantar, n/é? O povo vivia era da roça.
Dinheiro não tinha, mas tinha barriga cheia, tinha muita fartura quando eu
cheguei aqui, ali nessas roças fazia gosto de a gente ir ali ver as canas que
tinha, mamão perdendo, e tinha fartura ali. Aqui quando eu cheguei aqui eu
achei bom (J. P. F., 80 anos, aposentado, natural de Cícero Dantas/BA,
entrevistado em 05 de setembro de 2006).
O fato da chegada dos donos da Fazenda Voadeira para negociar com os
ocupantes levou muitos moradores a venderem o direito das terras aos fazendeiros
do entorno e a procurarem outras áreas. A agregação dessas pequenas chácaras às
fazendas do entorno desencadeou um processo de falta de trabalho, uma vez que
as fazendas constituídas passaram a desenvolver apenas a pecuária. A extinção
tanto do Posto de Telégrafo como da linha de ônibus que por ali passava com
destino à capital, contribuíram para a decadência do povoado. Outros fatores, como
a pouca oferta de escolaridade e falta de serviço, também são apontadas pelos
moradores como motivos para essa decadência, que se iniciou no final da década
de 1960.
O diálogo da socióloga Whitaker com Tundisi que trabalham com a
questão agrária, embora expressivo do interior de São Paulo, nos é esclarecedor no
sentido de mostrar, no contexto do município de Barra do Garças a existência de
uma pressão sobre as terras dos pequenos produtores, para que nelas seja
produzido gado, conforme encontra-se em Whitaker & Bezzon (2006):
A minha interpretação, baseada naquilo que pude observar, é a
seguinte: sitiantes venderam suas propriedades para grandes
conglomerados da agroindústria e foram morar na cidade. Mas eles não
tinham vocação para morar na cidade. Então, eu me lembro, o sujeito
comprava uma casa, na periferia da cidade, a geladeira e a televisão. Como
o dinheiro recebido era pouco, dava no máximo para comprar mais uma
casa ou duas de aluguel. Mas acontece o seguinte, ele sempre esteve
ligado à terra. E eu acho (não sei, exatamente, porque é pura observação e
eu posso estar enganado) que os bóias-frias de hoje são uma geração dos
antigos proprietários da terra e que perderam a vocação. Então, agora,
quando não dá mais para sustentar uma situação, vão trabalhar na terra,
mas para um outro patrão (p. 29). (Grifos dos autores).
Fica evidente que o assédio às terras dos pequenos agricultores de
Voadeira força-os a migrar para as cidades ou para outras áreas no campo.
Assim como todo trabalhador cuja cultura está ligada à terra, esse
migrante na busca de realizar o sonho da terra para sobrevivência, acaba fugindo
das dificuldades enfrentadas no seu lugar de origem, e a maioria dos moradores de
Voadeira são vítimas desse processo. No relato a seguir, uma moradora esclarece o
porquê de sua saída da Bahia acreditando encontrar uma vida melhor em Barra do
Garças, pois lá na Bahia as dificuldades eram inúmeras, como relata:
Aí eu trabalhava o dia todo na roça, eu comia era fruta de
mandacaru e bebia água. A comidinha que eu arrumava, eu empreitava
assim, tinha aqueles matão pra arrancar de enxadão eu não, não dava
conta de fazer muito serviço, eu fazia pouco. Eu recebia aquele dinheirinho
que comprava uma mixaria de nada, passava o dia todo morrendo de fome
na feira, não podia tirar um tostão pra comprar nada pra eu comer. Trazia as
comprinhas na cabeça, nas costas pra casa. Chegava em casa, dava pros
meus meninos e não chegava pra mim, [...] e eu ficava com fome. Eu tinha
era 09 filhos. Eu sofri demais. Virgem Maria. [...]. Passei fome, [...]. O
menino meu, o caçula “morreu”, chorou com fome, [...] e eu fiquei doida, [...].
Não morreu porque mandaram me buscar. Eu fiquei com a minha cabeça
meio variada, cheguei aqui, eu não sabia. Eu saí de casa assim de lá, eu
pra mim eu ia era assim pra ali, assim, um lugar pra passear, alguma coisa.
Larguei tudo assim, tranquei a porta e eu saí. E o menino gritava com fome
e eu só sentia o cheiro da comida na casa dos outros. E eu não podia nem
dormir mais de fraqueza. Aí eles ligaram pra cá pra minha família e
mandaram me buscar (I. R. A., 70 anos, aposentada, natural de Cícero
Dantas – BA, entrevistada em 04 de setembro de 2006).
O fragmento retrata o sofrimento desses migrantes nordestinos e de
outras regiões do país e o mito mantido por eles de que o Centro-Oeste teria fartura;
seria uma região onde se poderia prosperar, tanto pela abundância de água como
de terras férteis e mantimentos. Os migrantes que se estabeleceram na região de
Voadeira, acabaram por convencer outros membros da família e parentes a se
juntarem a eles.
A população de Voadeira é composta por moradores provenientes da
zona rural nordestina, acostumados a uma cultura rural, os quais mantêm os
costumes de suas origens culturais e têm uma vida simples e precária em relação
aos serviços básicos garantidos pela Constituição Federal.
Das famílias migrantes, 50% trouxeram consigo apenas roupas; 25%,
roupas e móveis; 12,5%, roupas e um mínimo de dinheiro; 4,17%, roupas, móveis e
animais. Restam os demais, 8,33%, que não são migrantes, pois nasceram na
Voadeira.
Segundo informam os entrevistados, as mudanças da Bahia para
Voadeira eram realizadas em caminhão e ônibus, durando em torno de 03 dias. O
sonho de uma vida melhor está tão latente que uma moradora, quando perguntada
sobre o porquê da migração, diz:
Da dificuldade da água que não tinha, de tudo. Mas a água era
pior, porque o que é o necessário de uma casa é a água, n/é? [...] Quando
eu cheguei aqui sabe quem me deu os pratos e os garfos pra comer, que eu
não tinha? Eu trouxe roupa, [...], forro de cama, isso eu trouxe, mas o resto,
naquele tempo o povo era besta, saía de lá largava tudo, sabe! Eu tinha
uma casinha na cidade, vendi por um pouco, mais o nada. E aí viemos
embora [...]. [Trouxe] só o dinheiro da passagem na marra. [...]. Daqui lá era
chão. É três dias de viagem de ônibus. [...]. Aí nós veio, no dia que nós veio,
veio 18 pessoas. Eu vim de ônibus, nesse tempo era atrasado, [...], quando
nós veio nós dormimos na Piranhas, chegamos na Piranhas, solão alto, lá
nós ficamos. Não tinha água. [...]. Nós veio num caminhão até Governador
Valadares e de Governador Valadares nós veio de ônibus até aqui na Barra,
mas assim, viemos, quando chegou na estrada, em Jataí, era tão cansada!
[...]. Aí nós foi dormir lá, não tinha água. Foi puxar água na cisterna pra todo
mundo banhar e lá nós dormimos e viemos assim tocando de reboque.
Chegamos na Barra, olha, [...], saímos da Piranhas e chegamos na Barra no
outro dia 12 horas, espia o tanto que era acanhado? Hoje da Barra pra
Piranhas você vai em 10 minutos (M. M. S., 80 anos, aposentada, natural de
Cícero Dantas/BA, entrevistada em 04 e 20 de setembro 2006).
Esses migrantes saíram do local de suas origens pelo sonho de buscar
uma vida melhor. Para a maioria dos moradores esse processo parece ser de uma
sina, pois, na história da maioria das famílias, isso já lhes custou um percurso de até
5 migrações sucessivas. Os dados mostram que, dos moradores do núcleo de
Voadeira, 34% fizeram 3 migrações; 29%, 1 migração; 8% fizeram 2 migrações; 8%
fizeram 4 migrações e 21% nasceram na Voadeira. Já para os moradores do
entorno, 45% fizeram 3 migrações; 27% fizeram 1 migração; 18% fizeram 4
migrações e 9% fizeram 5 migrações.
4.1 PERFIL SÓCIO-ECONÔMICO DOS MORADORES DA COMUNIDADE
VOADEIRA
A Comunidade Voadeira é o núcleo populacional mais antigo do município
de Barra do Garças, cujos moradores sobrevivem por meio de trabalhos
desenvolvidos com os derivados do caju e outros doces e, em fazendas, como
diaristas ou no sistema de empreita. Outra atividade que gera 10 empregos fixos e
outros empregos temporários é o parreiral, com produção de uvas e uma plantação
de mamão, localizado a 4 km do núcleo central, na Fazenda Santa Filomena das
Águas (vide Figura 5).
Figura 5
Parreiral que emprega moradores de Voadeira, 20/09/2006.
Fonte: arquivo da autora
A estrutura arquitetônica da Comunidade é composta por 24 casas, por
uma escola, uma igreja católica, uma igreja evangélica, uma praça, um campo de
futebol, um cemitério, um galpão de festas, uma cozinha comunitária, um posto de
saúde e um monumento histórico. Os lotes das casas variam de 200 m
2
a 1.000 m
2
(vide Figura 6):
O vilarejo possui sete vias públicas internas e duas ruas de acesso à
cidade. Essa disposição dos lotes indica uma provável ocupação, sem critérios, em
que os moradores iam construindo suas residências naquele espaço denominado
por eles de “patrimônio”.
A pesquisa revelou que as residências da Comunidade são todas em
alvenaria ou adobe (vide Figura 7). Existem também 28 pontos de iluminação
elétrica (CEMAT, 2005) e 75 hidrômetros (NOVACON, s/d), e o abastecimento de
água provém de um poço semi-artesiano instalado no local.
Quanto ao esgoto sanitário, o que se observa na Comunidade é que, das
35 famílias entrevistadas, considerando-se o núcleo e o entorno, apenas 29
possuem fossa. Algumas delas têm o esgoto da lavanderia despejado direto nas
vias públicas (vide Figura 8). Essa situação se repete conforme as práticas
vivenciadas nas moradias de origem, onde a pesquisa revela que apenas 20,83%
das casas possuem fossa e 4,17%, rede de esgoto.
Ainda com relação à estrutura física da Comunidade Voadeira, as
moradias estão construídas próximas ao Córrego Voadeira e, como área de lazer,
há apenas um campo de futebol (vide Figura 9) e uma praça central, onde se
localiza também uma pequena construção que dizem ser o Museu de Voadeira. A
pesquisa demonstra que as atividades de lazer na Comunidade resumem-se em
assistir aos programas da Televisão, ir à igreja e visitar amigos e parentes.
O atual Museu de Voadeira é o local onde funcionou, por mais de 50
anos, o Posto Telegráfico, que fazia conexão entre Cuiabá e Goiás e, segundo seu
operador, J.J.C., foi desativado em 1963. O projeto foi construído à época do
Marechal Cândido Rondon, nos anos 1940, período em que Barra do Garças conta
com toda uma infra-estrutura viária e de comunicação, sendo o telégrafo um recurso
importante. Como mostra Ferreira (1958):
[...] uma estação postal-telegráfica do Departamento dos Correios e
Telégrafos, na sede municipal, uma na Vila Araguaiana e uma no povoado
Sangradouro; um pôsto telefônico do mesmo Departamento na povoação de
Voadeira; uma estação radiotelegráfica da Fundação Brasil Central e outra
da Fôrça Aérea Brasileira, no povoado Xavantina (p. 86).
Figura 6
Figura 7
Casa de adobe ainda utilizada pelos moradores de Voadeira, 25/06/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Figura 8
Esgoto despejado na via pública de Voadeira, 05/09/2006.
Fonte: arquivo da autora
Figura 9
Campo de futebol de Voadeira, 25/06/2006.
Fonte: arquivo da autora
O depoimento a seguir mostra que no passado havia movimentação de
pessoas e de pequenos negócios superior à realidade atual. Um dos indicadores
que mensura este fato é a linha de ônibus de Barra do Garças para Cuiabá:
Ia, o motorista era o Jurandir, passava aqui, parava bem aqui
em frente essa casa ali, ó [apontando para a casa de frente]. Gente, todo
dia cedo o ônibus [...] vinha de General [Carneiro], passava aqui e ia todo
dia, [...] tinha ônibus de manhã e de tarde. Agora é que virou esse
“cemitério”. E aqui era assim ó: aqui tinha loja, aqui tinha pensão, tinha
farmácia, tudo quando eu cheguei aqui, tinha tudo isso. Tinha, dia da festa
de julho, da festa do Divino Pai Eterno eram 09 noites de festa. Gente que
chamegava que nem [...] formiga (M. M. S., 80 anos, aposentada. Natural
de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 20 de setembro de 2006).
Com o passar dos anos, a Comunidade Voadeira entrou num processo de
decadência, ocasionado pelos seguintes fatores: a) venda das pequenas
propriedades aos fazendeiros; b) mudança de rota do transporte para a capital; c)
modernização do sistema de comunicação que implicou na retirada do telégrafo
local; d) substituição das propriedades agrícolas por atividades pecuárias.
Enfim, com o desmantelamento da infra-estrutura existente, a
Comunidade perdeu sua força e capacidade produtiva, o que se refletiu de imediato
na movimentação do comércio local, distanciando-a dos centros mais dinâmicos do
Estado e levando os moradores a migrarem para outros locais e/ou a buscarem
alternativas de trabalho. Aos moradores atuais só resta buscar outras opções de
renda, das quais o caju e a produção artesanal de seus derivados são as mais
importantes, conforme será visto ainda neste capítulo.
Em relação à migração da população de Voadeira, a família mais antiga
reside há 53 anos no núcleo, e das 35 famílias entrevistadas, 11 emigraram da
Bahia, sendo 10 de Cícero Dantas/BA, 11 de Mato Grosso, 9 de Goiás, 1 do Piauí, 1
de Pernambuco, 1 de Minas Gerais e 1 de São Paulo (vide Figura 10).
Figura 10
Migrações para a Região Centro-Oeste
Fonte: IBGE, 1996 apud Ribeiro, 2005, p. 111.
Na Comunidade, as atividades econômicas são meramente de
subsistência e se restringem ao cultivo de horta e à criação de galinhas, bem como à
produção de doces de caju que já é tradição (vide Figura 11).
Figura 11
Casa de pau-a-pique e o cultivo de horta em Voadeira, 05/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Em relação às atividades de origem, os chefes de família informam que
desenvolviam, em sua maioria, atividades ligadas à lavoura. Essas atividades com a
terra ainda permanecem, uma vez que alguns moradores prestam serviços em
fazendas (vide Tabela 1).
De acordo com a análise dos dados da Tabela 1, pode-se considerar
como hipótese que a prática de atividades basicamente ligadas à lavoura e à
pecuária se deve às características do local onde residem, bem como às
experiências trazidas das regiões de origem. Outro fator que pode ter influenciado é
o nível de escolaridade dos chefes de família, que dificulta o desenvolvimento de
outras atividades que exijam maior escolaridade. O trabalho de vaqueiro, capataz de
fazenda, serviços gerais, boiadeiro, motorista, leiteiro entre outros, desenvolvidos
por uma parte dos chefes de família, requer baixo nível de escolaridade.
Vale ressaltar que as famílias permanecem com atividades ligadas à
terra, como uma forma de manter os seus valores, pois estes não se modificam.
Essas atividades representam uma relação com a terra e não com o capital.
Tabela 1
Atividade de origem e atividade atual dos chefes de família da Comunidade
Voadeira e do entorno
No Núcleo No Entorno
Atividade
De Origem (%) Atual (%) De Origem Atual (%)
Nenhuma 8,34
Lavoura 66,68 36,37
Do la
r
4,17
Pastora da I
g
re
j
a 4,17
Professora 4,17
A
posentado
(
a
)
29,15 27,27
Serviços
g
erais 8,34 41,66 9,09 27,28
Peão de boiadeiro 4,16 9,09
Leiteiro 4,16 4,17
Vaqueiro 4,17
Vi
g
ia 4,17
Comerciário 4,16 4,17 9,09
Motorista 9,09
Capataz de 9,09
Comerciante 9,09
Construção civil 4,16
Produtor rural 9,09 9,09
Pisciculto
r
9,09 9,09
Laticínio 9,09
Não declarado 9,09
Total 100% 100% 100% 100%
Fonte: Dados coletados pela autora na pesquisa de campo
Em relação à condição econômica, os dados da pesquisa revelam
situação precária, principalmente dos moradores do núcleo da Comunidade (vide
Tabela 2).
Tabela 2
Renda familiar da Comunidade Voadeira e do entorno
Renda da família No Núcleo No Entorno
De ½ a 1 SM 09
Mais de 1 até 2 SM 12 05
Mais de 2 até 3 SM 03 05
Não Declarou 01
Fonte: Dados coletados pela autora na pesquisa de campo
Os dados expressam que as condições de vida das famílias do núcleo
são piores que as condições das famílias do entorno, uma vez que as primeiras são
compostas por, em média, três pessoas e percebem até dois salários mínimos e não
têm área para desenvolver agricultura. Já as famílias do entorno, além de possuírem
renda um pouco melhor, têm área para plantio, praticam agricultura de subsistência,
produção de frutos, cultivo de horta, criação de galinhas, vacas de leite, cujos
excedentes são comercializados na cidade.
De acordo com os depoimentos dos moradores da Comunidade, observa-
se que a dificuldade para obter trabalho é uma das maiores preocupações; é o que
relata uma moradora:
Ah, a dificuldade daqui é só isso mesmo, é só serviço que não
tem n/é? Todo mundo tem que, uns tem que largar a família e sumir no
mundo caçando serviço. Aqui na região você ainda acha serviço braçal de
vez em quando pra roçar um pasto, fazer uma cerca, ou só mexer com um
gado assim quando vão vacinar às vezes eles vem atrás de uma pessoa pra
ajudar n/é? Os fazendeiros da região que vem. Aí quando não, tem que sair
daqui da currutela porque aqui não tem nada pra fazer mesmo não (M.E. C.,
49 anos, natural de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 05 de setembro de
2006).
Percebe-se que os moradores da Comunidade não conseguem ainda ter
autonomia para reforçar as novas alternativas de geração de renda, pois, mesmo
dispondo de recursos alternativos para a sua sobrevivência, como é o caso da
produção dos doces, ainda assim a Cozinha Comunitária não tem atividade
constante; carece de maior quantidade de matéria-prima e de uma câmara fria para
armazenamento.
Nesse sentido, pode-se dizer que os integrantes da Cozinha Comunitária,
apesar de tentarem se enquadrar nas empresas capitalistas, não têm uma visão
própria dos capitalistas. Isso se pode observar pela capacidade e estrutura da
Cozinha, que não é totalmente aproveitada, funcionando com apenas 20% da
capacidade produtiva. Além do que alguns pontos de abastecimento dos produtos,
como é o caso da Casa do Artesão, em Cuiabá, fica, muitas vezes, em falta de
produtos porque na entressafra do caju esgota-se o estoque que só será reposto na
próxima safra.
Vale dizer que, se esses cotistas da Cozinha Comunitária buscassem
outras alternativas de financiamentos, teriam condições de ampliar a produção de
doces e atingir uma fatia maior de mercado, com vistas a reforçar a marca
“Voadeira” e dar um salto de qualidade com esse empreendimento.
Durante a pesquisa ficou constatado que 60% dos chefes de família
entrevistados prestam serviço fora de suas propriedades por não terem outra
oportunidade na própria Comunidade. Essas atividades variam de diarista de
fazenda; empreiteiro de roçado, de cerca ou para vacinação de gado; vaqueiro;
capataz de fazenda; comerciário; vigia; ou ainda trabalho no parreiral, que gera 10
empregos fixos. Nesse aspecto, avalia-se a insustentabilidade econômica da
Comunidade.
Alternativas como criar galinhas, cultivar horta e produzir doces de caju
faz parte da cultura da maioria das famílias
26
. No entanto, para que as atividades
não-agrícolas tenham impacto positivo, em termos econômicos, é necessário que
essas comunidades disponham de um aparato tecnológico e informacional que
subsidie as atividades, com base em estudos de viabilidade econômica, ambiental,
social e tecnológica, isto é, que a atividade seja sustentável.
Nesse sentido, concorda-se com Pietrafesa (2002), quando afirma que
nas comunidades de origem agrícola, a relação de produção da agricultura familiar
foi se modificando ao longo do tempo, e:
Questões como mercado, produtividade, agregação de valores
a produtos primários, passaram a fazer parte do cotidiano do setor. A
necessidade de sobrevivência e reprodução, diante do processo de
modernização e de exclusão, forçou muitos agricultores a buscarem
26
Na Comunidade do Vale do Orizona – GO, cuja realidade se aproxima da Comunidade Voadeira,
segundo Pietrafesa (2002), as atividades não-agrícolas desenvolvidas de forma intensiva e em
pequena escala, propiciam novas oportunidades de sobrevivência e até mesmo de permanência na
terra, para os agricultores familiares da localidade, que não exercem apenas atividades
agropecuárias.
alternativas econômicas, produtivas e organizacionais. Isso multifacetou o
setor de agricultura familiar e, entre outras conseqüências, provocou a
proliferação do associativismo ou cooperação na utilização dos meios de
produção e também nas conquistas de políticas públicas (escolas, por
exemplo). Muitos agricultores familiares tradicionais [...] passaram a exercer
atividades rurais não-agrícolas [...] (p. 56).
A Comunidade Voadeira sofreu e sofre as ações do modelo de ocupação
econômica adotado para o Centro-Oeste e não se enquadra nos parâmetros do
desenvolvimento sustentável, já que esse modelo está pautado em quatro pilares:
econômico, tecnológico, ambiental e social. O modelo em vigor apresenta
conseqüências excludentes, em que as pequenas comunidades ficam sem
assistência.
A falta de assistência a essas pequenas comunidades gera migrações
para os centros maiores. Sem qualificação e com baixa ou nenhuma escolaridade,
encontram dificuldades para ingressar no mercado de trabalho e não conseguem
nem mesmo moradias que lhes proporcionem qualidade de vida.
No caso de Voadeira, muitos de seus antigos moradores foram para a
cidade em busca de melhores condições de vida. Os remanescentes sofrem por não
terem um emprego fixo nem área para plantio, conforme já abordado, devido ao
tamanho dos lotes, que variam de 200 m² a 1.000 m².
Quanto ao grau de escolaridade dos voadeirenses, a pesquisa aponta
que 60,57% dos moradores do núcleo possuem de 0 a 4 anos de estudo e, destes,
11,26% não são alfabetizados; 28,15% têm de 5 a 8 anos de estudo; 9,87% têm de
9 a 11 anos de estudo e apenas 1,41% freqüenta o ensino superior. Já no entorno, o
grau de escolaridade melhora: 33,34% com 0 a 4 anos de estudo e, destes, 6,45%
não são alfabetizados; 40% têm de 5 a 8 anos de estudo; 13,33% com 9 a 11 anos
de estudo; 6,66% estão cursando o ensino superior ou especialização e 6,67% não
declararam.
A Comunidade Voadeira possui uma única escola de Ensino
Fundamental, atendendo até a 4ª série, com 25 alunos distribuídos nos três turnos.
Devido à pouca oferta de escolaridade, a Prefeitura mantém um ônibus diário que
transporta os alunos para as escolas da sede do município, para cursarem da 5ª
série em diante, cuja preocupação com o deslocamento das crianças é revelada por
esta moradora:
Os meninos pra estudar tem que ir para Vila Maria, outros tem
que ir para a Barra, olha, isso aí é errado, n/é? Levanta [de] madrugada,
para amanhecer, os coitadinhos, no tempo das águas, tempo do frio, tem
que levantar. Chegam uma hora da tarde, morrendo de fome. Olha, é um
tormento aqui, nos estudos [...] (I. R. A., 70 anos, aposentada, natural de
Cícero Dantas – BA, entrevistada em 04 de setembro de 2006).
Outra moradora expressa sua indignação em relação à
dificuldade com o transporte dos estudantes até a sede do município:
Eu tenho uma netinha que está estudando no terceiro ano. [...].
Só que todo dia eu falo para a mãe dela, ainda ontem eu falei. [...]. Se ela
fizer o quarto ano, [...] a escola da Cárita encerrou. No dia que ela fizer o
quarto ano, se não tiver escola aqui, para a quinta, ela vai, por mim, ficar
sem estudar. Eu não vou pegar ela para por em riba de ônibus para ir para
a Vila Maria, sozinha, sem a companhia da gente grande porque menino
pequeno junto é bicho, n/é? E eu não tenho essa coragem. Ou então se
você pegar ela e levar lá para a madrinha dela [...] na Barra, para ficar lá,
porque senão ela vai ficar sem estudar (M. M. S., 80 anos, aposentada,
natural de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 04 de setembro de 2006).
Os dados da pesquisa revelam que a Comunidade tem interesse em que
se amplie o nível escolar ofertado. Entende-se que essa ampliação da oferta
proporcionaria maior qualidade de vida àquelas crianças e maior tranqüilidade aos
seus pais, pois o percurso o ônibus, para ir até a Vila Maria, perpassa as fazendas
do entorno, com falta de segurança e, ao chegarem ao destino, as crianças têm que
aguardar sozinhas até o horário da abertura da escola.
Nesse sentido, uma das professoras da escola, que se mudou
recentemente para o entorno da Comunidade, afirma ter elaborado um projeto de
oferta da 5ª série na escola local, o qual será apresentado à Secretaria Municipal de
Educação.
Essa iniciativa de reivindicar condições que venham elevar o nível escolar
para a Comunidade pode ser um indicativo de surgimento de nova liderança e
desencadear uma retomada do desenvolvimento na Comunidade Voadeira.
É interessante ressaltar a existência de um número razoável de
aposentados que, mesmo ganhando pouco, estão em melhores condições sócio-
econômicas em relação a outros moradores. Dos 71 moradores do núcleo central, 8
são aposentados por idade (26%), 2 jovens aposentados por deficiência (2,81%), 2
adultos recebem auxílio-doença (2,81%) e 1 recebe benefício da Lei Orgânica de
Assistência Social (LOAS) (1,40%). Existem ainda 5 funcionárias públicas (7,04%),
sendo 2 do Programa de Saúde na Família e 3 da escola municipal. A importância
desses salários para a manutenção das famílias é fundamental, uma vez que a
renda obtida nas outras atividades desenvolvidas fora da propriedade e até mesmo
da produção de doces não é fixa.
Quanto à faixa etária dos moradores do núcleo Voadeira e do entorno, os
dados coletados dos entrevistados apontam, conforme Tabela 3:
Tabela 3
Faixa Etária dos Moradores da Comunidade Voadeira e Entorno
Faixa Etária Da Comunidade
(
%
)
Do Entorno
(
%
)
Mais de 60 anos 14,08 13,33
De 40 a 60 anos 26,75 36,67
De 30 a 39 anos 5,64 13,33
De 21 a 29 anos 23,95 3,33
De 10 a 20 anos 12,68 16,67
Menos de 10 anos 16,90 10,00
Não declararam 6,67
Total 100% 100%
Fonte: Dados coletados pela autora na pesquisa de campo
Esses dados, uma vez utilizados pela Presidente da Associação, servem
para reforçar o fato de que a Voadeira possui uma população de idade mais
avançada:
[...] hoje ela está um distrito já de, acima de meia idade. Vamos falar que ela
esteja entrando na melhor idade. [...] as pessoas mais jovens que casaram
eles têm que vir para a Barra procurar emprego, eles têm que vir morar na
Barra, os que casaram ficaram por aqui [na Barra]. Então lá na Voadeira
está ficando só as pessoas de melhor idade (E.R. A., 32 anos, Presidente
da Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito da
Voadeira, entrevistada em 25 de outubro 2006).
Das 24 famílias que vivem no núcleo Voadeira, tem-se que a maioria dos
chefes de família são homens; apenas 5 são mulheres, sendo que, dentre elas, 3
são viúvas, 1 solteira e 1 casada. Elas são responsáveis pelo sustento da família.
Fora do núcleo, foram entrevistadas 11 famílias, das quais todos os chefes são
homens.
Vale ressaltar que a senhora casada, responsável pelo sustento familiar é
pastora da igreja evangélica, e os proventos da família vêm do seu trabalho na igreja
e conta ainda com o auxílio que recebe da LOAS. Seu marido trabalha de diarista e,
na maior parte do tempo, fica sem serviço, não tendo condições de ser o provedor
da família.
No que se refere ao tamanho das famílias, nota-se pelo número de filhos,
que ela tende a diminuir (vide Tabela 4):
Tabela 4
Número de Filhos das Famílias da Comunidade Voadeira e Entorno
Número de filhos No Núcleo (%) No Entorno (%)
Sem filhos 12,50
01 a 03 filhos 45,83 54,55
04 a 06 filhos 29,17 18,18
07 a 10 filhos 12,50 18,18
Não declarado 9,09
Total 100% 100%
Fonte: Dados coletados pela autora na pesquisa de campo
A Tabela mostra que família numerosa já não é mais realidade presente
na Comunidade. Nos casais mais jovens a tendência é de redução do número de
filhos e ela pode ser explicada, considerando-se a dificuldade no sustento dos filhos,
e a falta de perspectiva futura é um fator preponderante nesse aspecto.
Nas residências ainda é comum o uso de fogão a lenha, mostrando a
tendência de uma tradição, costume que também se percebe em suas residências
nas regiões de origem. No núcleo central da Comunidade, a pesquisa revela que 18
famílias possuem fogão a lenha e a gás, somente 1 possui apenas fogão a lenha e 5
possuem apenas fogão a gás (vide Figura 12).
No entanto, 19 dessas famílias utilizam, na maior parte do tempo, o fogão
a gás. Já nas famílias do entorno da Comunidade, das 11 famílias entrevistadas, 10
delas possuem os dois tipos de fogão, ficando o uso do fogão a gás, na maior parte
do tempo, em 5 famílias e, em 5, o fogão a lenha é o mais usado. Apenas um
morador não declarou qual sua preferência.
Na Cozinha Comunitária também é utilizado o fogão à lenha na produção
da maioria dos doces (vide Figura 13), o que, nos períodos de pico, exige a compra
de lenha de fora, dado que preocupa, uma vez que no entorno não se observa
presença de reserva de mata, a não ser a mata ciliar, já muito danificada pela
pecuária.
Figura 12
Presença constante do fogão a lenha, 05/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Figura 13
Cozinha Comunitária, com uso constante de fogões a lenha, 25/06/2006.
Fonte: arquivo da autora.
A opção pelo uso do fogão à lenha na Comunidade e no entorno pode
estar relacionada com a falta de condições financeiras para adquirir o gás, uma vez
que os dados da pesquisa revelam um baixo poder aquisitivo na maioria das
famílias. Mesmo considerando essa hipótese, a manutenção dos hábitos praticados
nas residências é decorrente de uma cultura tradicional.
Quando perguntados sobre a capacidade do Cerrado em atender à
demanda de lenha da Comunidade, 16 chefes de família da vila e 6 do entorno
demonstram preocupação e acreditam que, num futuro não muito distante, ela irá
faltar. Apenas 1 chefe de família diz que “tanto faz”; 11 acreditam que o Cerrado vai
suportar e 1 não opinou. Já em relação ao reflorestamento, apenas 13 chefes de
família da vila e 10 do entorno acreditam ser necessário.
Em se tratando de reflorestamento, vale dizer que a região de Voadeira
sofre a degradação ambiental, conseqüência do processo de ocupação das margens
do Córrego Voadeira, bem como pela pecuária praticada pelos fazendeiros do
entorno (vide Figura 14).
Figura 14
Degradação da área do entorno do Córrego Voadeira, 17/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Durante a pesquisa, constatou-se que próximo às nascentes dos córregos
Voadeira e Voadeirinha
27
, ocorre o desmatamento da mata ciliar, em boa parte das
margens, além da presença do capim Brachiaria, planta exótica utilizada para
pastagem, também aí localizado.
As áreas de pastagens, principalmente no entorno da Comunidade, estão
danificadas pela erosão das margens do Córrego Voadeira, fato que compromete o
futuro da Comunidade. Depoimentos de moradores revelam que, em tempos não
muito distantes, a presença de peixes era abundante e hoje é raridade, além do que
o volume de água do Córrego tem diminuído muito. A instalação de um pesque-
pague junto à nascente do Córrego Voadeirinha, localizado a 04 km da Comunidade,
é apontada por alguns moradores como o principal motivo da diminuição do volume
de água no Córrego Voadeira.
Na nascente do Córrego Voadeirinha percebe-se a preservação da mata
ciliar, que é composta por 13 olhos d’água, e está localizada na encosta da Serra do
Taquaral. O proprietário revela que seu objetivo no local é investir no turismo, com
outras opções de lazer, além do pesque-pague, de forma a aproveitar a estrutura de
sua fazenda e efetuar algumas melhorias como construção de alojamentos.
Atualmente ele recebe uma parcela razoável de visitantes que preferem o sossego e
a pescaria ao movimento da cidade.
Uma das preocupações que se tem com aquele local, é a de que o
investimento em infra-estrutura próxima à nascente do Córrego Voadeirinha pode
desencadear processos erosivos e interferir na qualidade e quantidade da água
daquele manancial, tão importante para o abastecimento das fazendas e da própria
Comunidade Voadeira. A presença constante de turistas pode resultar em alto
impacto ambiental irreversível, caso não seja devidamente estudado e planejado o
propósito do investimento.
Para os moradores, o Córrego Voadeira tem um valor inestimável, uma
vez que serve para lazer, lavar roupas e louças, bem como para abastecimento de
água das casas, quando ocorre algum problema com a bomba do poço semi-
artesiano que atualmente fornece água às residências.
27
Córrego Voadeirinha é um afluente do Córrego Voadeira, que desemboca acima da localização da
Comunidade.
4.2 A ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E PEQUENOS PRODUTORES DO
DISTRITO DE VOADEIRA E A COZINHA COMUNITÁRIA
Em 1981 a Comunidade Voadeira criou a Associação de Moradores e
Pequenos Produtores do Distrito da Voadeira, cujo objetivo constante no Estatuto
Reformado (2004) é:
[...] congregar os moradores e os pequenos produtores do Distrito da
Voadeira, para um trabalho sócio-educativo e demais atividades
econômicas, profissional ou cultural que completam o trabalho comunitário
e, ainda, amparar e defender os interesses gerais da comunidade,
representando-a perante os poderes públicos Federal, Estadual e Municipal,
colaborando com estes no estudo e solução dos problemas que direta ou
indiretamente possam, de qualquer forma, interessar as atividades da
Associação (p.1).
Inicialmente a Associação teve um trabalho voltado aos feirantes que, aos
poucos, foram deixando essa atividade. A partir de 1991, os associados passaram a
produzir doces de caju e seus derivados, com o apoio da EMPAER, como alternativa
à geração de renda.
De início, sem observar normas e regras, a Cozinha Comunitária passou
a produzir doces, num processo totalmente artesanal. Esse fato levou a Associação
a buscar uma parceria com o Banco do Brasil, para adequar-se às normas da
Vigilância Sanitária, bem como para melhorar os equipamentos. Em 2004, o projeto
foi executado e, hoje, o público consumidor dos produtos dispõe de maior segurança
alimentar (vide Figura 15).
Uma característica bem peculiar no cultivo do caju, na região, o difere das
produções em larga escala: as plantas são antigas, muitas delas nativas, outras,
cultivadas sem tecnologia e seus derivados são produzidos de forma bem artesanal.
A comercialização dos doces é realizada na tradicional Festa do Caju,
criada há 16 anos pela Comunidade e que beneficia boa parte das famílias
moradoras. Compondo o calendário turístico do município, a Festa contribui para
valorizar a produção de doces do local, além de proporcionar uma característica
peculiar à Comunidade e, em termos econômicos, acarreta incentivos pela sua
representação histórica, como expressa o líder do SEBRAE:
A Festa do Caju, só para a gente poder ter uma idéia, todos os
anos ela acontece já com recursos daquela Lei de Incentivo à Cultura, [...], a
antiga Lei Hermes de Abreu, [...]. Porque ali na Voadeira era a antiga
estrada que ligava Barra do Garças a Cuiabá e então, ali teve um telégrafo
naquela época que, segundo contam, foi enviada uma mensagem e que
essa mensagem acabou evitando uma guerra, n/é? [...]. Eu não me recordo
bem a data, mas foi aquela, foi na oportunidade do Veloso, [Revolta do
Major Veloso contra o governo de Juscelino Kubitscheck
28
] n/é? Então,
Voadeira tem muito a ver com as questões históricas, n/é? (D. M. R. – Líder
da Agência do SEBRAE – Barra do Garças – MT, entrevistado em 03 de
outubro de 2006).
Figura 15
Produção artesanal de doces, 17/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Outras oportunidades de comercialização dos doces são as feiras e
eventos, fundamentais para ampliar o acesso aos mercados, como relata o líder do
SEBRAE:
28
A Revolta do Veloso, segundo Miguez e Benevides (apud LIMA FILHO, 2001), ocorreu em 02 de
dezembro de 1959, quando os coronéis da Aeronáutica João Paulo Moreira Burnier e Haroldo
Veloso escolheram Aragarças como ponto de estratégia para a operação que acabou mal-
sucedida. Os revoltosos foram presos pelo Exército no aeroporto da cidade. O fato ficou conhecido
como o “Levante do Araguaia” (p. 137 – nota de final de capítulo). Os dois motivos apontados para
a Revolta foram a renúncia de Jânio Quadros à presidência da República, fato que decepcionou
militares e civis de direita e a suspeita de que houvesse um golpe de esquerda em marcha, sob o
comando de Leonel Brizola, a ser deflagrado em 15 de dezembro de 1959. A operação extinguiu-se
em dois dias por falta de meios e porque Jânio voltou atrás em sua decisão. O fato marcou a
história de Aragarças e de Barra do Garças, sendo recordado pelos moradores mais antigos. Para
maiores informações consultar <http://www.projetomemoria.art.br/JK/biografia/3_levante.html>.
Acesso em 30 jun 2007.
[...] porque, através do SEBRAE, também tem uma ação que chama acesso
aos mercados, que eles viajam, nós levamos os produtos deles até outros
mercados, eles estiveram em Cuiabá, outros Estados, inclusive. Eles já
participaram da FENAVEM, [...] ela acontece em Minas Gerais, [...]. Eles já
participaram da Feira Floresta que é no Rio de Janeiro, A Elisângela foi, [...].
Eles já participaram da Feira de Empreendedores em Cuiabá, da Mão de
Minas que acontece em Belo Horizonte, n/é? (D. M. R., Líder da Agência do
SEBRAE – Barra do Garças – MT, entrevistado em 03 de outubro de 2006).
Apesar da renda da Festa do Caju, segundo a EMPAER (2004), o
montante arrecadado, dividido entre os associados e a Associação é insuficiente,
mostrando serem necessários outros meios para ampliação e comercialização dos
produtos, expandindo a cultura e o potencial culinário de Barra do Garças.
Como alternativa, em 2003, os cotistas da Cozinha Comunitária deram
início à produção de outros doces tais como: de mamão, de jaca, de abóbora, de
abacaxi, de coco, de manga, de banana, de uva e de figo, cujo objetivo é manter a
atividade da Cozinha Comunitária durante o ano todo. Mesmo assim, a capacidade
de produção da Cozinha ainda está aquém do mínimo para a sustentabilidade
econômica, pois, segundo o SEBRAE, hoje opera em torno de 20% apenas. No
entanto, para ser viável economicamente deveria operar com, no mínimo, 60% de
sua capacidade produtiva.
Os produtos oferecidos pela Comunidade aparecem com certa posição de
destaque em termos de mercado, de modo que a crescente demanda por doces e a
falta de matéria-prima levam a Cozinha Comunitária a não ter condições de atender
toda a clientela, como se pode perceber no depoimento:
Então assim, é uma comunidade que eles já estão
prospectando no mercado já, já faz bastante tempo. E hoje eles têm aí uma
demanda de produtos advindo da Casa do Artesão de Cuiabá que eles mal
conseguem atender. Por quê? Não porque a cozinha não tem como
atender, até porque a capacidade produtiva da cozinha está ociosa. Eles
poderiam estar trabalhando, eles estão operando com em torno de 20% da
capacidade produtiva, n/é? Então muita coisa pode ser feita, mas para que
isso aconteça é preciso ter matéria prima, então eles estão muito restritos
ainda ao caju, porque eles não têm uma câmara fria para poder armazenar
o produto, n/é? (D. M. R., Líder da Agência do SEBRAE – Barra do Garças
– MT, entrevistado em 03 de outubro de 2006).
No entanto, há divergências em relação à produção da Cozinha, como
revela a presidente da Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito:
O que acontece hoje: a cozinha hoje praticamente o trabalho é
para manter ela funcionando. [...]. Ela trabalha com 5% da capacidade de
produção. Então o custo dela é alto. [...]. Você vê, ela é muito grande. [...]
você acaba gastando praticamente o que você trabalha durante o ano, é
para manter ela. Então as pessoas não vêem o lucro. E no mundo hoje que
a gente está, que é capitalista, se você não vê esse dinheiro, se você não
vê retorno, você não se esforça para trabalhar. Como que para produção da
Festa do Caju, eu posso passar até semana fora que a cozinha não pára de
serviço. Na festa do Caju, eu venho na Barra quase todos os dias. Eu chego
lá e a cozinha está lá funcionando, está trabalhando. Ela está trabalhando
das 6 [da manhã] às 10 [da noite]. Esse ano teve dia da gente trabalhar das
3 da manhã a 01 da madrugada, praticamente ela virou 24 horas. E isso
independente de eu estar ou não. Então eu acredito assim, que a partir da
hora em que o ano inteiro ela estiver com a mesma capacidade de
produção, quando a festa vem, eu praticamente vou ser descartada (E. R.
A., 32 anos, Presidenta da Associação de Moradores e Pequenos
Produtores do Distrito da Voadeira, entrevistada em 25 de outubro de 2006).
Esse depoimento revela que a Cozinha não atinge os objetivos de
gerar renda, apesar dos esforços da Comunidade e do apoio do SEBRAE. A própria
Casa do Artesão, de Cuiabá, que é um ponto de venda dos derivados de caju, por
vezes fica sem produto, conforme relata a presidente:
A gente fornece para a Casa do Artesão, com produtos do caju,
mas como os produtos eles só são em uma época, ela também não é
permanente, não é direto, a gente abastece lá enquanto tem produto, e
depois só na nova safra (E. R. A., Presidenta da Associação de Moradores
e Pequenos Produtores do Distrito da Voadeira, entrevistada em 25 de
outubro de 2006).
Já os doces produzidos de outros frutos são comercializados, ao longo do
ano, tanto na própria Comunidade, como em mercearias da região e na feira livre do
município, que acontece todas as quartas-feiras, à noite, e aos domingos, pela
manhã. O depoimento da presidente da Associação revela:
O que a gente está abastecendo direto é no doce de leite a
gente está abastecendo o Super Ouro Fino, a Mercearia N.S. Aparecida, a
lanchonete do Posto Boa Viagem e o Açougue Catarinense, mas esse é o
doce de leite, de pedaço (E. R. A., Presidenta da Associação de Moradores
e Pequenos Produtores do Distrito da Voadeira, entrevistada em 25 de
outubro de 2006).
Nessa Comunidade, em se tratando da produção dos derivados de caju,
que representam a marca Voadeira, tem-se percebido que a dificuldade maior é a
falta de uma área para plantio, pois 34 dos 35 chefes de família entrevistados
alegam faltar terra para plantar, sendo que os moradores do núcleo não possuem
condições econômicas de adquirir uma área.
De acordo com as análises realizadas junto à Comunidade Voadeira,
entende-se que, como afirma Müller (1997), "a participação, a localidade ou região, a
pesquisa científica com os conhecimentos do pessoal da região, são ingredientes
fundamentais para uma estratégia ecologicamente sustentável." (p.133).
Nas palavras de Müller (1997) essa é a base para que o desenvolvimento
local possa acontecer de forma sólida, participativa e eficaz. Pois somente com o
envolvimento dos atores locais, ao contribuir com o seu conhecimento e reconhecer
as suas potencialidades e os seus desafios, é que se fortalecem as relações das
instituições com a Comunidade.
É preciso que cada comunidade preserve suas características peculiares,,
sua cultura, sua forma de vida, seus costumes. Nesse contexto, Becker (1997)
afirma que, para poder nela intervir, é necessário entender que:
[...] cada processo de desenvolvimento específico representa, ou melhor,
expressa a conexão entre a produção material, produção cultural e a
produção ético-ideológica do lugar, respondendo ao mesmo tempo às
necessidades sociais de mudança. Por isso, as intervenções no processo
de desenvolvimento devem considerar as condições naturais, culturais e
ético-ideológica de cada lugar como pressuposto e, ao mesmo, resultado do
próprio processo de desenvolvimento (p. 81).
As concepções teóricas desenvolvidas por Becker trazem à reflexão a
necessidade de se conhecer bem a realidade da Comunidade, antes de nela intervir;
por isso é que a descrição etnográfica da população da Comunidade Voadeira é
importante para elaborar um novo projeto de desenvolvimento, baseado na
sustentabilidade.
4.3 ENTRAVES ENDÓGENOS E EXÓGENOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA
COMUNIDADE VOADEIRA
Diante dos dados levantados e das análises feitas, a questão que se
coloca é a seguinte: até que ponto o desenvolvimento sustentável é possível numa
Comunidade em que o histórico de vida dos moradores é composto de sucessivas
migrações, fome, expropriação de suas terras, trabalho informal, dentre outros, e
que vivem sem as condições de saneamento básico? (vide Figura 16).
Como vimos em depoimento de moradores, os discursos de políticos da
região vêm recheados de falsas promessas, de falsas melhorias, as quais são
esquecidas, após o pleito eleitoral, ou, mesmo quando são construídas obras com
objetivos eleitoreiros, elas não cumprem com a sua função social, como é o caso do
Posto de Saúde da Comunidade, o qual não tem atendimento médico nem mesmo
medicamentos ou vacinas.
Figura 16
Latrina ainda presente em algumas residências da Comunidade Voadeira, 05/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Nesse sentido, vale ressaltar as palavras de Lago (1984), ao dizer que um
projeto de desenvolvimento sustentável contempla descentralizar a economia, a
política, o poder, o espaço social e a produção. Isso requer priorizar as exigências
de consumo local, incentivar as pequenas cidades a tornarem-se centros culturais e
econômicos autônomos, desconcentrar geograficamente os parques industriais,
incentivar os camponeses a diversificar as atividades econômicas e cultivar produtos
orgânicos – vinculados à reforma agrária, obter fontes de energia, matéria-prima e
mão-de-obra para a produção agrícola e industrial, a partir de recursos regionais.
Face às constatações obtidas através das pesquisas junto à Prefeitura
Municipal, ao IBGE, ao cartório, ao INCRA, das entrevistas, da coleta de dados e
das informações por meio de questionários aplicados aos moradores de Voadeira,
podem-se tecer algumas considerações.
Pelo levantamento do perfil sócio-econômico da Comunidade, constata-se
que as atividades ali desenvolvidas não atendem aos princípios da sustentabilidade,
uma vez que não existe um equilíbrio entre os quatro pilares básicos: econômico,
ambiental, social e tecnológico.
A economia local atualmente se baseia numa produção em que a renda
da maioria das famílias não possui regularidade, tanto pelas atividades rurais de
diaristas, como pelas atividades da produção de doces.
Os direitos sociais estão comprometidos pela carência dos serviços
básicos de saúde, saneamento, escola, transporte, emprego, lazer, telefonia e
outros na Comunidade. A própria Associação de Moradores e Pequenos Produtores
do Distrito de Voadeira não consegue atingir o objetivo que consta do seu Estatuto
Reformado (2004), que é de congregar os moradores “para um trabalho sócio-
educativo e demais atividades econômicas, profissional ou cultural que completam o
trabalho comunitário e, ainda, amparar e defender os interesses gerais da
comunidade...” (p.1).
Não há nem apoio, nem iniciativa no sentido de buscar inovação
tecnológica, pois as atividades ali desenvolvidas baseiam-se em trabalho artesanal,
tanto na produção dos doces como nos serviços gerais de fazenda os quais são
braçais.
O que se pode considerar de positivo, no âmbito tecnológico, é a reforma
da Cozinha, que procura adaptar-se aos moldes da vigilância sanitária e o apoio do
SEBRAE, com cursos e consultoria que vêm incrementando o trabalho (vide Figura
17) e dá maior qualidade aos doces e derivados. Nesse aspecto, contribui para a
prospecção de mercado e reforça a marca Voadeira. No entanto, para atingir o
mínimo de sustentabilidade, necessário se faz atingir um patamar mais elevado de
tecnologia que possa garantir aumento da produtividade e continuidade das
atividades ao longo de todo o ano.
Em relação às questões ambientais, talvez um dos problemas mais
preocupantes encontrados na Comunidade, que revelam insustentabilidade, é o
processo de degradação das margens do Córrego Voadeira, o que já compromete o
suprimento de água para as fazendas e chácaras vizinhas em períodos de estiagem.
Tanto o núcleo central como o entorno de Voadeira sofrem as ações
antropogênicas e isso se reflete inclusive na carência de lenha para cozinhar,
conforme a maioria dos entrevistados menciona. A respeito do Córrego Voadeira,
que passa próximo às casas, percebe-se a inexistência de mata ciliar em certas
partes do leito e a presença de erosões, provocadas pela pecuária.
Figura 17
Cozinha Comunitária de Voadeira, 25/06/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Outra constatação nesse aspecto é que, quando da visita à nascente do
referido Córrego, observa-se a plantação de capim Brachiaria até a beira do
Córrego, em ampla extensão, além de uma represa construída dentro da sede de
uma fazenda. A presença de lixo inorgânico nas redondezas da vila e o despejo de
esgoto de lavanderia nas vias públicas também são fatores preocupantes que
afetam a preservação.
Outra preocupação que se levanta é em relação à coleta de frutos, que é
de base extrativista e, se for intensiva, pode tornar-se predatória, uma vez que a
utilização alimentar é a parte reprodutiva da planta – o fruto. Nesse aspecto, Almeida
(1988) afirma ser necessário deixar uma quantidade adequada de frutos para
germinação das sementes no campo, para que não ocorra a extinção daquela
espécie e nem a falta de alimentos para animais silvestres que deles se utilizam. A
solução seria a produção de mudas e o cultivo de espécies de interesse.
Nesse aspecto, pôde-se observar durante a pesquisa de campo, no
período de coleta do caju, a presença de muitas araras e periquitos alimentando-se
no local. Esse fato nos remete ao depoimento de um morador da vila, o único que
possui ainda uma propriedade rural no entorno, o qual relatou que, antigamente, se
podia matar e espantar os passarinhos das roças e, hoje, com a legislação aplicada,
a dificuldade em cuidar das roças é muito grande.
Ah, eu planto lá, sempre colhendo da roça lá. Agora, [...] estou
plantando, mesmo porque eu cheguei aqui plantando mais arroz, milho,
feijão, aqui naquele tempo era mais fácil de lidar. E hoje ainda hoje dá, mas
hoje as terra parece já está mais cansada, só se for com adubo. Mas a
gente perdeu o jeito desse negócio de plantar arroz, milho, porque não faz
gosto. O derradeiro aí que eu plantei, eu já fiquei meio contrariado com o
arroz, porque plantar uma roça pequena, a gente fraca só planta é pouco,
n/é, porque a gente vai trabalhar braçal, que é mais o que a gente faz, não
tem maquinário, aí planta roça pequena, é só pra passar raiva. Os
passarinho renderam, a lei, veio uma lei para não açoitar passarinho, não
matar, não sei o quê. Aí na lei que está é só deixar só render. Olha, eu acho
que precisava de o povo, como diz, pôr emenda nesse negócio, modo de o
governo votar esse negócio porque de um jeito que está, o pobre não tem
jeito mais de viver mais não, de roça não. Plantar rocinha pequena o
papagaio, o passarinho come tudo, tudo! Porque encheu de trem aí, de
passarinho, tem passarinho demais. Aí não é para matar nenhum, porque
matar a gente não dava conta não. Mas naquele tempo que podia matar,
fazia mais medo, com tiro, uma coisa, matava algum eles lá sentiam falta, e
a gente só faltava um pouco. Mas agora está por conta. Vigiar uma roça
pequena, a gente planta pequeno, não dá tempo de ficar lá vigiando. Aí não
colhe não. Aí até no ano atrasado mesmo eu plantei um meio alqueire de
milho na beira da estrada, [...], ah, mas eu passei raiva! [...]. Mas o milho
quando foi engrossando o leite do caroço, os passarinho montou em cima,
os papagaios, periquito. Aí quando ele coalhou o leite, eu digo: eu vou
dobrar esse milho para ver se, porque de primeiro a gente dobrava, modo
dos periquito, dobava e sossegava, aí dobrei e ficou do mesmo jeito, eles
ficou comendo do mesmo jeito. Se foi o trabalho, que teve [...] de dobrar, e
ficou lá comendo do mesmo jeito. Tá doido! O ano atrasado. Aí, não sei
não, hoje em dia está sem jeito da gente poder trabalhar. Mandioca eu vivi
mas eu plantei, eu plantava mais essas coisa, mais mandioca, o que eu
mais plantava era mandioca. [...]. Alguma vez saiu o caminhão carregado
daqui com farinha para a cidade. (...) A farinha eu ainda eu estou fazendo,
porque todo ano eu faço para despesa. (J. P. F., 80 anos, aposentado,
natural de Cícero Dantas/BA, entrevistado em 05 de setembro de 2006).
Esse depoimento revela que não há uma visão ecológica, de preocupar-
se em manter áreas nativas para a preservação de aves e animais silvestres. Na
visão de alguns moradores, eles devem ser extintos para que se possa produzir.
Com base nas análises realizadas junto à Comunidade Voadeira, que
pratica atividades extrativistas, produção de horta e criação de galinhas para
subsistência, além de outras atividades temporárias, constata-se que ela se
classifica como carente. Assim, entende-se viável indicar algumas ações, conforme
proposta inicial deste estudo. A efetivação dessas ações necessita do envolvimento
da Comunidade, do poder público e da iniciativa privada.
Para alcançar os objetivos do novo projeto que apresentaremos, o
conhecimento deste estudo será necessário aos envolvidos, pois a pesquisa
realizada junto a esses pequenos agricultores teve como objetivo estudar as
relações sócio-econômicas da Comunidade, fazer uma descrição etnográfica do
local, avaliar se as atividades desenvolvidas na Comunidade são sustentáveis e
verificar se os fatores culturais da população interferem na escolha das atividades ali
praticadas.
Outro fator a ser considerado é o de que nem sempre o sucesso
econômico significa o bem-estar social e cultural. Na visão de Carneiro (1999) isso
quer dizer que o sucesso econômico medido pelo incremento da produtividade e
renda pode estar associado à “intensificação da exploração da força de trabalho ou
da destituição de laços de solidariedade e da desestruturação familiar” (p. 338).
Segundo esse autor, uma das razões que levam os agricultores familiares
à pluriatividade é a queda da renda agrícola. No entanto, não são todas as unidades
familiares que optam por essas alternativas e isso se deve a razões de tradição
cultural. Essas atividades dependerão do capital econômico disponível, das
condições de mercado, das capacidades individuais e coletivas existentes para
enfrentar os períodos de redução nos rendimentos da agricultura, que podem
desencadear novas atividades. Nem sempre é o fator econômico que determina a
abertura de novas atividades; muitas vezes valores culturais podem estar
representados no patrimônio territorial da atividade agrícola, convergindo esforços
para sua manutenção.
Nesse sentido, concorda-se com Whitaker & Bezzon (2006), para quem a
solução é encontrada na criação de “redes de produção local em territórios bem
definidos e a partir do caráter multifuncional da pequena propriedade” (p. 84).
Porém, nem sempre essas soluções encontradas por algumas
comunidades são sustentáveis. Brundtland (1987) cita que o desenvolvimento
sustentável requer atender às seguintes categorias: retomada do crescimento;
mudança na qualidade do desenvolvimento; geração de emprego, alimentação,
energia, água e saneamento; manutenção de uma escala populacional sustentável;
conservação e melhoria da base de recursos e a inclusão do ambiente e da
economia nas tomadas de decisões.
A crença com a qual se iniciou o trabalho de pesquisa era a de que as
atividades desenvolvidas pela Comunidade Voadeira seriam sustentáveis. Porém,
no decorrer da pesquisa, ao contrário do que se quis demonstrar, constatou-se que
as atividades ali desenvolvidas não têm sustentabilidade, conforme os inúmeros
pontos negativos abordados anteriormente.
A partir de autores como Ferreira (1998), Sachs (2002), Boff (2004),
Brandenburg (2005), Capra (1995), Procópio (2001), Martins (1996) e outros, e com
base nos dados coletados, constatou-se que a Comunidade Voadeira não apresenta
sustentabilidade em suas atividades. Para atingir a sustentabilidade é necessário
garantir a participação de todos os moradores nas decisões, desenvolver um
sistema de produção que respeite a vocação local, ter preocupação em preservar o
ambiente, investir em tecnologia inovadora para o desenvolvimento das atividades,
propor um mercado justo e regular, promover a inclusão social e contribuir para a
melhoria dos indicadores sociais.
É a mobilização social que vai dar força às ações, das quais devem
participar a prefeitura, instituições financeiras, universidades, instituições de
formação profissional e de apoio técnico e outros parceiros. De forma articulada, é
necessário focalizar nas atividades produtivas pretendidas; fortalecê-las através de
agentes financiadores, como bancos e cooperativas e capacitar a Comunidade nas
questões organizativas, gerenciais e mercadológicas, como forma de garantir a sua
emancipação e a governabilidade das ações.
No que diz respeito à Comunidade Voadeira, é necessário um projeto de
desenvolvimento local, que respeite a singularidade do povoado, com a formulação
de políticas públicas que atendam às necessidades básicas dos moradores e que os
incentive a uma cultura empreendedora, com apoio logístico às suas atividades, com
acesso aos mercados e ao crédito, aliada à conservação do ambiente. Esse
conjunto de fatores é que gera a competitividade dos negócios.
Um plano de desenvolvimento local para a Comunidade Voadeira
necessariamente deve contemplar a instalação de uma rede de esgotos; a
ampliação e melhoria da rede escolar; a melhoria do sistema de transporte; a
geração de empregos; o crescimento econômico; a conservação dos recursos
naturais; a melhoria do sistema de comunicação; a ampliação da oferta de matéria
prima e a ampliação dos mercados.
Especificamente falando dos recursos naturais, não se percebe na
Comunidade ações de conservação, que possam beneficiar as futuras gerações. A
hipótese que se considera é de que a forma como os moradores agem em relação
aos recursos naturais deve-se tanto ao baixo grau de escolaridade como pelo baixo
nível tecnológico adotado. Principalmente em relação aos moradores do entorno,,
cujas propriedades são maiores, não se percebe a inserção dos meios
preservacionistas. A presença de capim Brachiaria ou de pastagens nativas até a
beira dos córregos, substituindo a mata ciliar, é um indicativo de não preservação.
Inclusive alguns chacareiros reclamam da queda do volume de água nos córregos, o
que já está prejudicando suas atividades de pecuária em certas épocas do ano.
Essas informações revelam que é necessário definir ações imediatas,
pois ainda há possibilidade de reverter esse processo destrutivo. Para isso, é
preciso dialogar tanto com os moradores como com o poder público, de forma a
montar um projeto de florestamento (plantio de espécies nativas) das matas ciliares,
para conter a degradação das margens e evitar a perda das nascentes. Mesmo
considerando que a natureza, na maioria das vezes, se regenera sozinha, no caso
específico de Voadeira, no estágio em que se encontra, entende-se que requer
ações externas, inicialmente, para interromper o processo de destruição e, em
seguida, iniciar a reposição das espécies nativas do local.
Sempre com o olhar para o desenvolvimento sustentável, no Capítulo 5,
faz-se um estudo mais aprofundado dos aspectos sociais e econômicos da
Comunidade Voadeira e, com base nas análises, apresentam-se algumas ações
possíveis de serem desencadeadas, dentro de uma perspectiva de desenvolvimento
sustentável.
5 COMUNIDADE VOADEIRA, DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA O
SEU DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
O objetivo deste capítulo é discutir alternativas de desenvolvimento
econômico e de organização social que assegurem à Comunidade Voadeira,
perspectiva de vida com mais qualidade e independência. O ponto de partida será o
perfil sócio-econômico e as atividades desenvolvidas pela população. Isso implica
analisar a atual situação da Comunidade, em particular as atividades desenvolvidas
pela Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira,
especificamente pelo grupo de cotistas da Cozinha Comunitária, além dos que
desenvolvem atividades no parreiral e de outras atividades temporárias das quais a
Comunidade depende para sua sobrevivência.
O propósito que se tem é de indicar algumas ações prioritárias possíveis
de serem desenvolvidas na Comunidade, para que o seu desenvolvimento possa se
desencadear dentro de uma perspectiva sustentável.
5.1 ANÁLISE DA SUSTENTABILIDADE NA COMUNIDADE VOADEIRA
O processo de modernização da agricultura brasileira, em particular da
região Centro-Oeste, forçou o avanço da fronteira agrícola e, com esta, ocorre uma
enorme pressão sobre as terras indígenas e dos pequenos produtores,
principalmente dos posseiros, daqueles sem documentação de suas terras.
A Comunidade Voadeira sofre todo esse processo de pressão pelos
grandes proprietários de terra do entorno e hoje é uma “ilha” em meio a latifúndios,
sem possibilidade de expansão dos seus lotes. Sofre carências de infra-estrutura, de
atendimento à saúde, de saneamento básico e possui transporte precário e
insuficiente. Nessa situação, os moradores procuram desenvolver atividades
alternativas, como a produção de doces, a prestação de serviços de diaristas em
fazendas, nas atividades de roçado, de vaqueiro, de instalação de cercas, dentre
outras.
Sua importância histórica é muito grande, por se tratar do núcleo
habitacional mais antigo do município de Barra do Garças e por carregar a
historicidade de ter sido a sede do posto de telégrafo que fazia comunicação entre
Cuiabá e Goiás.
Naquele período, Voadeira era mais movimentada; os moradores
praticavam agricultura em suas próprias terras e quem não possuía propriedade,
arrendava terra dos fazendeiros do entorno, conforme relato dos moradores:
Eu tocava roça, [...], quem não tinha terra, tocava roça, nós
todo mundo tocava roça lá na terra de Gerson. Zé Dinilo, eu, José Balduino,
todo mundo tocava roça lá. Plantava arroz, plantava feijão, plantava milho.
[...] Era pouquinho que pagava n/é? Eu não sei se era 25, era uma besteira
que a gente pagava [...]. Aí Gerson vendeu, foi vendendo, vendendo, foi
plantando capim, foi acabando. Aí pronto! Ficou todo mundo parado. Só o
Zé Dinilo que tem uma terrinha ali, o Antão que tem outra pra acolá, os
moradores antigos ninguém tem, acabou tudo, foi todos embora, [...]. O
João Abacate foi embora, foi acabando, acabou a pensão. A mãe de
Carolino tocava uma pensão aqui nessa casa [apontando para uma casa
próxima]. [...], o Hermidio tocava uma loja ali, tinha farmácia, tinha loja. Foi
embora [...] pro Goiás, não ficou ninguém. Ficou aí, foi acabando. Foi o
povo foi saindo, saindo... (M. M. S., 80 anos, aposentada, natural de Cícero
Dantas/BA, entrevistada em 20 de setembro de 2006).
Esse depoimento, rico em detalhes sobre a vida dos moradores de
Voadeira demonstra que, como afirma Ribeiro (2001), os que migram em busca de
terra, se deparam com uma série de contradições entre o sonho e a realidade. É na
terra e por meio desta que procuram manter suas tradições, suas representações de
mundo e suas liberdades. No entanto, com o processo de modernização, são
pressionados e/ou convencidos a venderem suas terras. Essa venda lhes
proporciona a ilusão de buscar melhoria de vida, nas cidades, ou em outras regiões
rurais, pois o que lhes atrai não é a renda, mas o sonho de buscar um pedaço de
terra onde possam criar sua família e manter as tradições.
Esse processo de venda da propriedade ocorre por conta da chegada do
capital ao campo. O desenvolvimento das grandes propriedades agropecuárias na
região leva a um processo de expulsão dos pequenos agricultores, cedendo lugar à
expansão das pastagens.
No período de 1950 a 1954, com a construção das pontes sobre os rios
Araguaia e Garças, Barra do Garças ligou-se aos Estados de Goiás, de Minas
Gerais e de São Paulo. Esse fato alavancou a incorporação do município ao
mercado produtivo nacional, que se intensificou na década de 1970.
A reprodução e expansão do capital no campo, nesse período, fez com
que os pequenos agricultores remanescentes desenvolvessem inúmeras estratégias
para continuar sobrevivendo em suas terras.
Para se contrapor a esse processo que gera exclusão dos pequenos
agricultores, é necessário pensar uma tecnologia de acesso à maioria; por isso,
entende-se que a agroecologia e a valorização do pequeno produtor é uma iniciativa
louvável.
Outra medida, de cunho governamental, é a criação do PRONAF, que se
amplia e atende um número significativo de pequenos agricultores, proporcionando
condições de melhorar a dinâmica do trabalho, na propriedade rural, bem como
ampliar a produção, na busca de geração de renda.
O Movimento dos Sem-Terra (MST), iniciado na década de 1980, veio
combater o latifúndio improdutivo e tentar amenizar os problemas dos pequenos
agricultores e do desemprego urbano. Nesse sentido é que esse movimento de
cunho político, reivindicatório, em defesa da agroecologia, contribuiu para engrossar
e fortalecer a luta pela justiça, pela democracia, pela punição dos que atentaram
contra a vida de trabalhadores e por melhores condições de vida, a luta pela
dignidade, a luta pelos direitos de cidadãos.
Essa grande parcela da população que vive em condições precárias,
formada pelos sem-terra, pelos sem-teto, pelos sem-trabalho, busca sensibilizar o
poder público e fazer aplicar a legislação. Nesse sentido, concorda-se com Assad &
Almeida (2004) ao afirmar que a agricultura é essencial para a produção de
alimentos e de produtos de primeira necessidade, portanto, importantes para o bem-
estar humano. No entanto, gera inúmeros desafios, tanto para governos e sociedade
como para os agricultores.
O primeiro desafio é o ambiental, pois a agricultura causa impactos pela
substituição de uma vegetação natural, já adaptada ao solo, por outra que exige a
contenção do processo de sucessão natural, ou seja, acarreta o uso de insumos
externos para retribuir uma produção que proporcione ganhos econômicos. Nesse
sentido, o desafio está em buscar sistemas de produção agrícola adaptados ao
ambiente de tal forma que seja mínima a dependência desses insumos externos e
de recursos naturais não-renováveis.
Outro desafio é de natureza econômica. Isso porque a agricultura é
considerada uma atividade capaz de gerar produtos de valor comercial tanto maior
quanto maior for o valor agregado. Nessa ótica, o desafio consiste em adotar
sistemas de produção e de cultivo que atenuem perdas e desperdícios, cuja
produtividade seja compatível com os investimentos feitos, e em estabelecer
mecanismos que garantam competitividade no mercado bem como a qualidade do
produto.
O terceiro desafio é social. A agricultura é um dos setores da economia
que gera, ao mesmo tempo, empregos e contribui para a contenção de fluxos
migratórios, aliviando, em conseqüência, o processo de urbanização acelerada e
desorganizada. Entretanto, esse desafio exige a adoção de sistemas de produção
que assegurem geração de renda para o trabalhador rural, em condições dignas de
trabalho, com remuneração compatível com seu grau de importância no processo de
produção.
O quarto desafio considera a agricultura como uma atividade que se
realiza fundamentalmente no território e, por isso, é uma atividade que se integra a
outras atividades rurais. Em outros termos, a efetiva integração entre a produção
agrícola e o espaço rural ocorre por meio da diversificação de atividades e da
multifuncionalidade desses espaços. É a utilização do espaço rural para desenvolver
atividades não-agrícolas, tais como a produção de doces, queijos, frutas, ovos,
frangos, verduras, artesanato, turismo, piscicultura, enfim, uma série de atividades
que incrementam a renda.
E, por último, o desafio tecnológico que transformou a agricultura e esta
se tornou uma atividade fortemente dependente de tecnologias. A dinâmica da
agricultura do Centro-Oeste, a partir dos anos 1970, atestou essa integração com o
aumento da produção e da produtividade. Se, por um lado, o uso intensivo de
recursos tecnológicos revolucionou a agricultura, por outro causou grandes impactos
ao ambiente, de tal forma que é crescente a necessidade de se desenvolverem
novos processos produtivos com tecnologias que sejam menos agressivas,
ambientalmente, mantendo uma adequada relação produção/produtividade.
A Agenda 21 (2004), além das questões ambientais, discute também a
importância da dimensão social visando à redução das desigualdades e combate à
pobreza; à proteção e à promoção das condições de saúde humana e seguridade
social, assim como à promoção da educação e da cultura para a sustentabilidade e
à proteção e promoção dos grupos estratégicos da sociedade.
Entretanto, esclarece que o governo e a sociedade devem estar
integrados para promover o progresso social e o exercício da cidadania dos grupos
socialmente vulneráveis, por meio de ações que lhes garantam serviços de saúde,
educação, assistência social e lazer, bem como documentação básica. Essa união
deve estar pautada no respeito às diferenças culturais e peculiaridades regionais, via
participação popular, sempre com vistas à melhoria da qualidade de vida dessas
populações e à eqüidade social.
Ressalte-se, porém, que não se pode inserir a Comunidade Voadeira
nesse contexto, uma vez que esta é caracterizada por suas peculiaridades regionais,
limitada pelo uso da terra e acesso a ela pelos grandes proprietários, carentes de
serviços de assistência social. As atividades desenvolvidas pela Comunidade
atenderam inicialmente à agricultura capitalista, com prestação de serviços para
abertura de novas áreas, com práticas agrícolas diversas, com plantio de pasto e
com a oferta de serviços braçais. Hoje, são relegados à própria sorte, pois os
fazendeiros do entorno praticam apenas a pecuária, diminuindo drasticamente a
oferta de serviço aos moradores. Acaba para o pequeno agricultor o sonho da
fartura, que, na verdade, nunca existiu.
Na visão de organismos internacionais, da sociedade civil organizada, e
de pesquisadores como Becker (2005), para a solução dos problemas
socioambientais e econômicos da Amazônia, é necessária a aplicação maciça de
recursos em ciência, tecnologia e educação, na região. Isso porque, na perspectiva
do desenvolvimento sustentável, o fortalecimento da sociedade e a adoção de novos
modelos de produção são indispensáveis para que se possa promover o
crescimento econômico, a inclusão social e a conservação dos recursos naturais.
Em conseqüência, a exploração ordenada dos recursos naturais geraria
emprego e renda e proporcionaria para a região, por um lado, a proteção da
biodiversidade e, por outro, o desenvolvimento de condições adequadas de
produção, baseadas na exploração desses recursos, através de cadeias industriais.
Hoje, segundo Becker (2005), a situação que se apresenta nas iniciativas
comunitárias é a falta de investimento em pesquisa e tecnologia que sejam
apropriadas ao desenvolvimento de processos industriais mínimos. Nesse sentido, o
sucesso das cadeias produtivas de base alternativa só se dará a partir das
populações locais, as quais necessitam aprender e melhorar suas técnicas para
agregar valor aos produtos, buscar a certificação e estreitar laços com os centros de
biotecnologia avançada.
Na Comunidade Voadeira, o que se percebe é que ela sofre as
conseqüências excludentes pela não aplicação das políticas públicas que estão
garantidas na Constituição Federal, ou seja: educação, saúde, lazer, transporte,
saneamento básico, entre outras.
Dessa forma, a Comunidade não apresenta autonomia econômica, sofre
pressões dos fazendeiros do seu entorno, que não estão preocupados com a
questão ambiental, mas, sim, com a posse das terras dos moradores. Em função
disso, constata-se que a degradação ambiental está presente na Comunidade.
Diante da dificuldade da oferta de serviços, os moradores de Voadeira,
como forma de resistência para permanecer na terra, gestaram um projeto novo,
uma alternativa - a construção da Cozinha Comunitária - por meio da criação da
Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira, na busca
da emancipação econômica.
Na Voadeira, a população desempenha atividades voltadas ao
extrativismo, com a coleta do caju, principal matéria-prima para o funcionamento da
Cozinha Comunitária na produção de doces, além da coleta de outros frutos da
região: jaca, mamão, abacaxi, manga e outros. Essa matéria-prima é coletada nos
quintais das famílias do núcleo, como também nas chácaras e fazendas vizinhas.
5.2 CARACTERÍSTICAS SÓCIO-CULTURAIS E PRODUTIVAS DA COMUNIDADE
VOADEIRA
A Comunidade Voadeira, atualmente, possui características de um bairro
rural, e seus moradores são apegados às práticas tradicionais, como o uso da
queimada, culturas de ciclo longo (frutíferas) e não são muito ecológicos, pois o local
apresenta-se devastado, com lixo no entorno do Córrego e algumas residências com
esgoto despejado nas vias públicas. O uso intensivo do fogão a lenha e a ausência
de mata no entorno, revelam a não preocupação com a preservação do local. Todos
esses fatores contribuem para a insustentabilidade do lugar.
Do ponto de vista econômico, mantêm vivas características típicas do
nordeste, como a fabricação da farinha de mandioca, a criação de galinhas, galinhas
d’Angola e pequenas hortas. Já com relação aos costumes, o uso do chapéu de
couro, do facão na cintura e do cão como companheiro também revela o apego às
práticas do passado. E, arquitetonicamente, na Comunidade, muitas casas
continuam sendo de adobe, o que permite dizer que a modernidade ainda não
chegou ao local. No que se refere à questão sócio-ambiental, vários problemas
permitem classificá-la como sendo uma Comunidade carente, cujas características e
práticas culturais revelam a insustentabilidade pelos seguintes motivos:
a) a ausência de fossa em algumas residências contraria a Lei de Política
Nacional do Meio Ambiente (Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981) e o Decreto n°
8.468, de 08 de setembro de 1976, pois a Lei define como poluição o lançamento de
esgotos, em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos, isto é, que
degrade a qualidade ambiental, prejudicando a saúde, a segurança e o bem-estar da
população;
b) a presença de lixo em áreas públicas, às margens do Córrego Voadeira,
provoca a poluição das águas;
c) a degradação das margens do Córrego Voadeira, pela derrubada da mata
ciliar e pela prática da agropecuária, provoca o assoreamento do manancial;
d) o uso intensivo de fogão a lenha, tanto nas residências como na Cozinha
Comunitária, compromete a sustentabilidade ambiental, visto que na região a
presença de mata ciliar já é mínima;
e) a falta de uma política de atendimento à saúde na comunidade, caracteriza
um estado de completo abandono por parte do poder público, pois, apesar da
presença do Posto de Saúde, não há vacinação, atendimento médico ou
odontológico, nem mesmo fornecimento de medicamentos;
f) o sistema de transporte apenas uma vez por semana para a sede do
município é insuficiente, porque todas as famílias dependem da cidade para
compras, atendimento médico, serviços públicos em geral, além de opções de lazer
para o final de semana. Como alternativa, resta-lhes a carona de vizinhos que
possuem veículos, ou mesmo a Kombi da Associação que, quase diariamente, vai à
cidade e cobra uma taxa de R$2,50 para ida e R$2,50 para volta. Viagens extras
custam R$1,00 por quilômetro rodado;
g) o grau de escolaridade ofertado na comunidade é insuficiente para as
necessidades das famílias. A alternativa oferecida pela Prefeitura Municipal é de
transportar os alunos da 5ª série em diante para a cidade, a longas distâncias, com
falta de segurança, o que gera insatisfação por parte dos pais;
h) o sistema de telefonia é precário, pois há um único orelhão, além do que o
sistema de telefonia celular, na maioria dos casos, não funciona;
i) a falta de asfaltamento e de manutenção das estradas gera constantes
problemas mecânicos nos sistemas de transporte;
j) a presença de algumas casas fechadas na Comunidade revela a falta de
perspectiva dos moradores, que se deslocam em busca de trabalhos temporários
em fazendas, ou, até mesmo, migram para as cidades, em busca de melhores
condições de vida;
k) a distância do centro da cidade e a falta de transporte diário reduzem as
possibilidades de lazer na comunidade, uma vez que as opções no local resumem-
se em um campo de futebol, uma praça, o Córrego Voadeira ou, como mencionado
pelos moradores, na televisão;
l) a Cozinha Comunitária opera bem abaixo de sua capacidade de produção,
por falta de uma câmara fria para armazenamento da matéria-prima, ou, até mesmo,
por não possuir área para plantio de frutíferas, que favoreceria a ampliação das suas
atividades;
m) a pesquisa revelou que 18,28% dos moradores da Comunidade vivem de
aposentadorias ou de auxílio-doença, 14,08% têm mais de 60 anos de idade e
16,90% têm menos de 10 anos de idade, ou seja, não têm condições de assumir
novas atividades;
n) o grau de alfabetização é baixo, pois 60,57% dos moradores têm de 0 a 4
anos de estudo, sendo 11,26% não alfabetizados. Isso dificulta qualquer tentativa de
melhorar as condições sócio-econômicas da Comunidade através de medidas que
envolvam formação profissional;
o) a renda média das famílias é baixa, pois 87% das famílias do núcleo vivem
com até 2 salários-mínimos, não tendo condições de uma alimentação balanceada;
p) a cultura tradicional arraigada nos moradores, cujas práticas vão desde o uso
constante de fogão a lenha, derrubada da mata, uso de queimada, dejetos
despejados nas vias públicas e desperdício de matéria-prima para fabricação dos
doces, contribui para a insustentabilidade da Comunidade;
q) a inoperância e o descaso do poder público no atendimento às necessidades
de transporte, educação, saneamento, saúde e lazer são cruciais na contabilização
social que gera a insustentabilidade local;
r) a pouca oferta de trabalho no entorno aponta para a falta de perspectivas
futuras para os moradores da Comunidade, uma vez que até no parreiral que
emprega 10 pessoas, o responsável pela equipe aponta que a baixa escolaridade
pode ser um agravante na hora da contratação.
Diante dessa realidade, faz-se um questionamento quanto ao
compromisso do poder público, pois o posto de saúde da Comunidade não cumpre
com sua função social. Segundo a Lei Municipal Nº. 1295 de 04 de abril de 1990,
que dá providências para a construção de um posto de saúde na Comunidade
Voadeira, foi projetado um, com 1 sala para consultas, 1 copa, 1 sala para
imunização e curativos, 1 sala para dentista e sanitários. Hoje, esse posto está
inerte.
A população de Voadeira, quando das campanhas de vacinação, tem de
se deslocar até a sede do município de Barra do Garças, uma vez que o posto de
saúde não possui médico, dentista, vacinas e muito menos medicamentos. O único
serviço lá prestado é o de verificação da pressão arterial, segundo informações dos
moradores.
Esse descaso por parte do poder público é colocado com muita ênfase
pelos moradores. Veja os depoimentos:
Tem um posto de saúde, nós fez calo na mão de carregar
cascalho, nunca me serviu para nada. Eu sou indignado com esse posto de
saúde, viu. Eu não sei por que que ele existe. Não tem médico, não tem
remédio, não tem nada. Se vai lá pegar uma cibalena, não tem licença de
entregar, e não tem também, não tem nada, n/é..., por quê? (L. P. P., 72
anos, aposentado, natural de Pontalina – GO, entrevistado em 04 de
setembro de 2006).
Médico aqui de ano em ano vinha um, mas agora nem isso não
vem. Nem vacina, se eu explicar para a senhora. As crianças pequenas
aqui vem vacina pra Barra, de primeiro vinha. Tinha uma mulher que era,
não sei que era que trabalhava, a Dona Antônia [referindo-se à secretária
municipal de saúde da gestão anterior] acho que era. Vinha as vacinas para
as crianças. Agora, se quiser vai vacinar no Palmares [Bairro distante 14 km
do núcleo] ou na Barra. Nem isso já está com não sei quantos meses que
vem para vacinar, vacina para a Barra e aqui não vem não (M. M. S., 80
anos, aposentada, natural de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 04 de
setembro de 2006).
O que se pôde constatar é que a falta de um programa que atenda a
Comunidade tanto na saúde, como na educação, esgoto sanitário, transporte e
geração de emprego, leva a comunidade a ter baixa qualidade de vida. Como revela
uma moradora, ao falar da rua onde mora. Segundo ela, sua rua era sempre
esquecida, descaso que se estendia até mesmo à falta de energia. Veja:
É que o lugarzinho é pequeno, como aqui é a Voadeira, uma
currutelinha pequena. E passa [...] energia lá na frente e aqui no fundo não
passa, por quê? A gente [...] também aqui é filho de Deus. Aí eu me revolto
umas horas. Eu digo: na política todo mundo acerta que mora gente aqui
em cima. Eu já passei cada uma aqui em político. Eu digo: aqui não mora
ninguém, não. – Uai, dona! Mora! A senhora não mora aqui? - Não, eu não
moro aqui, não! Porque aqui ninguém manda nada para aqui, não. Chegam
as coisas aí para baixo, e lá para baixo mesmo recebe tudo, se acaba tudo,
e aqui em cima ninguém se lembra. É, ninguém se lembra! É, que fulano
teve aqui dando isso dando aquilo e aqui nada! Aí quando eles vêm com
santo eu digo: nem de santo eu gosto, [...], eu falo bem assim. Não se
lembra da gente quando a gente não vota, também? [...] com razão, porque
quando a gente precisa também, pelo menos uma energia. Ninguém vai
pedir dinheiro, ninguém vai pedir isso ou aquilo. Mas que se lembrasse
daqui também, que aqui também mora gente aqui em cima, n/é? Que jeito
que gasta para puxar uma energia dali de onde está esse poste para aqui
n/é? Porque eles não querem! É. Agora quando querem voto todo mundo
chega aqui com santinho, n/é? Não estou precisando de santo! (I. R. A., 70
anos, aposentada, natural de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 04 de
setembro de 2006).
Vale mencionar que, em função do período eleitoral, na semana seguinte
à entrevista, a energia já estava colocada. Fatos como esse, de os políticos só
aparecerem em período eleitoral, deixam a comunidade arredia em relação a
promessas, como revelado por alguns moradores, durante o período das entrevistas,
uma vez que estas aconteceram em período eleitoral.
De acordo com os depoimentos, a leitura que se faz é de que os
moradores têm percebido que as promessas de campanhas políticas já se tornaram
corriqueiras e que não mais fazem diferença. Fato é que, desde 1998, quando se
participou de uma Ação Cívico Social, em parceria com o Ministério do Exército e
uma rádio local, um candidato a vereador e sua esposa empenharam-se na reforma
da praça e do museu e, mesmo com seu esforço eleitoreiro, não conseguiu se
eleger. Inclusive houve indignação por parte de sua esposa, quando da visita
posterior à Comunidade, ocasião em que percebeu o descaso em que se encontra a
praça e o museu que ela se empenhara em reformar. Veja o que conta a moradora:
Essa pracinha aí quem fez foi a M. [esposa do candidato]. Mas
o exagero dela [da praça] a senhora vê. [...] está com muitos anos que foi a
M. que fez. Aquela casinha daquele museu só tava o chão. Ela mandou
fazer os tijolos, os adobes, que não pode fazer de tijolo, que é coisa antiga
do Projeto Rondon n/é? Ela pagou para fazer os adobes, fez a casa. E aí,
arrancou as portas velhas, levou na Barra, deu uma reformada. Está ali. A
praça quando ela está uma capoeira, fica um mundo velho, cresce essas
árvores aí fica encobrindo, você não vê nada. Serve, serve de motel, aí eles
pegam, o pessoal da prefeitura vem roçar de ano em ano. Toda festa de
outubro, quando é na festa do caju eles vem roçar essa praça. Quando não,
agora vieram na festa da igreja, no mês de julho [festa do Divino Pai
Eterno]. Estava um mundo velho, eles cortam no toco, ali agora ela está
crescendo. Quando for daqui uns dias, que ela estiver nas nuvens de novo,
daqui de um ano eles vem aqui e cortam. É uma praça? Nunca! Não é.
Esses dias a M. teve aqui e falou pra mim: essa daí se acabar, num tem M.
pra fazer outra mais não! (M. M. S., 80 anos, aposentada, natural de Cícero
Dantas/BA, entrevistada em 04 de setembro de 2006).
A presença dos profissionais da prefeitura para serviços de jardinagem
somente em períodos de festa não resolve os problemas que a Comunidade
enfrenta. O mesmo ocorre com a manutenção da estrada que, segundo depoimento
dos moradores, é realizada muito esporadicamente, geralmente em período de
festas.
Em se tratando de festas, o Inventário Turístico do Município (2005)
registra que, na Comunidade Voadeira, existem duas festas anuais tradicionais.
Uma delas é a Festa do Divino Pai Eterno, de cunho religioso, realizada há
aproximadamente 40 anos. Antes era comemorada por 09 dias seguidos. Hoje se
estende por dois finais de semana e termina sempre no primeiro domingo de julho,
que é o dia do Divino Pai Eterno. A outra é a Festa do Caju. De cunho popular e
folclórico, ela acontece no mês de outubro, com duração de dois dias. Realizada há
16 anos, tem a finalidade de valorizar a cultura local e gerar renda para a
Comunidade (vide Figura 18).
Como atrativo turístico local, tem-se também o Museu Histórico Voadeira,
em adobe e madeira, tendo aproximadamente 12m
2
que, nos dias de festa, é
utilizado para exposição e comercialização de artigos de artesanato da cidade
vizinha, General Carneiro.
Assim como as festas tradicionais, segundo o Inventário Turístico do
Município (2005), a Feira Livre consta também do calendário de eventos. Todo
domingo a feira acontece na sede do município, onde três moradores da
Comunidade Voadeira comercializam a produção de hortifrutigranjeiros. Essa feira é
considerada um atrativo por comercializar frutas, verduras, legumes, queijos, ovos,
ervas medicinais, roupas, produtos artesanais, comidas típicas, frutas silvestres, mel
e outros.
Em outubro/2006, a Feira Livre passou a ter uma edição também às
quartas-feiras, à noite, atendendo somente os produtores de Barra do Garças,
havendo a exposição e comercialização de doces por parte da Associação de
Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira.
Com potencial turístico, a Comunidade Voadeira tem ainda, nas suas
imediações, um pesque-pague e todo visitante, para chegar lá, passa pela
Comunidade. Isso pode ser visto como uma oportunidade de oferecer outros
atrativos que venham a fomentar o turismo local; como exemplo pode-se citar a
confecção de artesanato, cuja possibilidade já está sendo estudada, conforme
depoimento a seguir:
Na verdade está sendo estudado dentro da Associação um
novo grupo para trabalhar só com artesanato. Porque aí seria a marca
Voadeira também impressa no próprio artesanato. A gente está pensando
em trabalhar com as meninas mais novas, a gente está tendo dificuldade
porque as instituições que dão curso só pegam acima dos 16, e esses
jovens estão na faixa de 12,13, até os 15 anos. Então a gente está
esperando, mas acredito que daqui uns 02 anos vai ter um novo grupo, ele
também vai funcionar na forma de cotização, eles também vão ter uma sede
própria, tudo dentro da Associação, mas já vai ser um grupo diferente, vai
funcionar como a própria Cozinha (E. R. A., 32 anos, Presidenta da
Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira,
entrevistada em 25 de outubro de 2006).
Iniciativas como essa contribuem para agregar valor aos produtos, assim
como a proposta de incluir os doces no controle de qualidade, estando esse
processo já em andamento, conforme informações da Presidente da Associação
(vide Figura 19).
Não resta dúvida de que os doces, em geral, com selo de qualidade,
adquirem maior credibilidade junto aos consumidores. Outra ação louvável nos
trabalhos da Cozinha é que a Associação recepta vidros que são reutilizados no
armazenamento dos doces e licores. Há duas empresas da cidade que fornecem
garrafas de água mineral, em vidro, as quais são submetidas ao processo de
esterilização e reaproveitadas para embalar o licor e o mel de caju, além de vidros
de conservas que são reaproveitados para os doces.
Está prevista a aquisição do programa de código de barras para a
Cozinha Comunitária, o que vai facilitar a disseminação da marca dos produtos. Até
então, os produtos da Cozinha Comunitária, caso sejam comercializados em
supermercados, levam o código de barras do próprio supermercado e,
conseqüentemente, a marca do supermercado. Nesse sentido, a Associação deixa
de reforçar a marca Voadeira, ou seja, omite-se a “identidade” do produto, conforme
revela o líder do SEBRAE:
Figura 18
XVI Festa do Caju, 14/10/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Figura 19
Comercialização dos produtos Voadeira na II Feira das Águas, Porto do Baé – Barra do Garças – MT
13/09/2006.
Fonte: arquivo da autora.
Mas para poder utilizar o código de barras do supermercado,
não pode colocar a marca Voadeira, e sim do supermercado. E fica
caracterizado como um produto do supermercado, n/é? Então isso é um
ponto de gargalo que atrapalha o marketing deles. E tem outras coisas que
acabam interferindo também, o código de barra eu acredito que no próximo
ano eles possam estar conseguindo, já (D. M. R., Líder da Agência do
SEBRAE – Barra do Garças – MT, entrevistado em 03 de outubro de 2006).
Durante a pesquisa de campo, foi constatado que, para fortalecer o
trabalho da Associação, na Comunidade estavam sendo ministrados vários cursos,
em parceria com o SEBRAE e EMPAER. A Cozinha Comunitária “Antonio Roque
Minete Flores”, segundo a EMPAER (2004), já está funcionando em conformidade
com as normas da vigilância sanitária e foi construída com o apoio da Fundação
Banco do Brasil e da EMPAER. A contrapartida da Comunidade é a construção do
muro e do portão, já em fase de conclusão.
A Cozinha Comunitária é a principal fonte de produção de doces na
Comunidade. No entanto, segundo informação da presidente da Associação,
Voadeira oferece esporadicamente almoço, com cardápio regional, tendo, já em
2006, atendido 3 grupos fechados. É mais uma alternativa de a Comunidade gerar
renda, além de preservar sua cultura e costumes.
As atividades agrícolas, antes desenvolvidas na região, hoje fazem parte
apenas da memória de moradores, conforme depoimento a seguir:
Antes os fazendeiros davam as terras n/é?... para o povo
plantar, n/é?. Plantava arroz, milho. Aí mudava pra porcentagem, dava,
colhia os mantimentos aí depois quando o ano que vem, repartia a
porcentagem n/é?..., pagava porcentagem [...]. Aí depois eles foram só
formando, formando [o pasto], aí os outros venderam para outros aí não
davam mais. [...], agora é só trabalhar por dia e pronto. Porque quando eles
davam n/é?... as terras, às vezes eles davam [...], pra tirar os mantimentos
da gente e davam o pasto pra jogar a semente de capim. E aí quando foram
trocando de fazendeiros aí os outros já não davam mais, [...] nem
arrendado, nem pagado, nem alugado, aí jogava era capim (M. E. C., 49
anos, natural de Cícero Dantas/BA, entrevistada em 05 de setembro de
2006).
No mesmo depoimento, a moradora revela as opções de trabalho que
restam para a Comunidade:
Agora ali na frente [...] tem um homem que comprou uma
fazenda lá e ainda dá serviço. Tem um bocado de gente que trabalha lá no
parreiral que tem aí [...]. Aí eles largam a família aqui e eles vão todo dia e
voltam. Trabalham todo dia lá. Uns vivem de salário, outros vivem por dia. É
o único lugar que ainda tem serviço ainda que o povo daqui trabalha é
nesse parreiral aí. Aí na região é quando tem ainda vem caçar [procurar]
assim é para trabalhar de vaqueiro, pra tirar leite; é o único serviço que tem
aqui. Aí, tirando isso do parreiral e esses leiteiros, aí quem quiser trabalhar
pra não morrer tem que sumir para o mundo, largar a família e sumir,
senão... A única coisa que é difícil; porque aqui é um lugar bom, sossegado,
não tem bagunça, não tem briga, mas no demais, está faltando serviço para
os homens e só (M. E. C., 49 anos, natural de Cícero Dantas/BA,
entrevistada em 05 de setembro de 2006).
O parreiral atualmente gera 10 empregos fixos e todos os empregados, à
exceção do agrônomo, são filhos da Comunidade Voadeira. A maioria mora na
Comunidade e desloca-se diariamente para o local de trabalho. A produção de uvas
atende o comércio local e região, inclusive a capital, Cuiabá.
Não há exigência em relação ao grau de escolaridade para o trabalho no
parreiral, segundo informações do agrônomo responsável, visto que as instruções
são passadas todas com demonstração prática.
Nesse sentido, pode-se dizer que os trabalhadores sem escolaridade, ou
com baixo grau de estudo, ainda têm campo de trabalho na área rural. Porém, a
tendência é que poderá haver dificuldades no futuro, pois, segundo o agrônomo
responsável pelo parreiral, “se o empregado tiver estudo, sempre é melhor. Nós
sempre estamos incentivando para os estudos”. Esse depoimento pode revelar que,
se aparecerem outros profissionais com grau de escolaridade maior, podem vir a
ocupar esses lugares.
Em se tratando de grau de escolaridade, durante a pesquisa constatou-se
que, na Comunidade Voadeira, está bem abaixo daquele apresentado pelos
moradores do entorno.
Aqui, faz-se uma ressalva para o fato de que as condições sócio-
econômicas dos moradores do entorno são melhores, pois eles têm veículo próprio,
dispõem de uma condição salarial favorável para ter mais acesso aos estudos
29
.
Dessa forma, entende-se que a Comunidade carece de melhores
condições de transporte, de atendimento à saúde, apoio técnico, para desenvolver
atividades próprias da região, aliadas a financiamentos que possam estruturar esse
trabalho, vincular-se ao mercado de consumo, de forma estratégica e permitir a
geração suficiente de renda.
29
Durante a pesquisa, a única moradora do núcleo que faz faculdade foi perguntada do por que
escolher um curso parcelado e fora do município. Ela respondeu que, como na comunidade não há
transporte diário para a sede do município, não teria como freqüentar um curso regular.. E fazendo
a faculdade parcelada, quando vai, as aulas são compactadas em 15 dias, facilitando o acesso.
CONSIDERAÇÕES FINAIS E PROPOSITIVAS
Em função dos indicadores coletados, tanto nas entrevistas como nos
questionários, pode-se declarar que as atividades da Comunidade Voadeira são
insustentáveis economicamente.
A Cozinha Comunitária, da forma como vem sendo conduzida, opera com
apenas 20% de sua capacidade de produção quando deveria operar, pelo menos,
com 60%.
Os dados da pesquisa indicam, também, elevados custos com a
manutenção da Cozinha, uma vez que ela não mantém suas atividades constantes,
durante o ano, pela falta de matéria-prima para a produção dos doces. Dessa forma,
entende-se que é necessário e urgente tomar medidas que propiciem a ela
atividades regulares, além de providências para redução dos custos.
Acrescente-se, ainda, que a falta de área para desenvolver agricultura
leva os moradores a trabalharem como diaristas em fazendas. Atividade esporádica,
sem vínculo empregatício, sem direitos trabalhistas, não garante o sustento da
família; ao contrário, gera insegurança e falta de perspectivas para uma vida melhor.
O número de moradores da Comunidade é pequeno, com baixa
escolaridade, com idade avançada e apegados a uma cultura tradicional. Os dados
da pesquisa apontam que eles não conhecem os caminhos para buscar
financiamentos que poderiam facilitar o desenvolvimento de um projeto alternativo
para geração de renda.
A preocupação de instituições como o SEBRAE, EMPAER e outras, na
oferta de diversos cursos, tanto na área de artesanato, de doces, de
empreendedorismo e de liderança, não atingiu os objetivos de geração de renda,
pois a falta de criatividade dos moradores, para fazer uso dessa apropriação do
conhecimento em benefício próprio, para melhorar o padrão de vida, não aconteceu.
As características culturais, físicas e econômicas da população impedem qualquer
tentativa de intervenção mais ousada em que se idealizem mudanças profundas.
Contudo, mesmo com a problemática apontada, entende-se que a
atividade da Cozinha deve ser incentivada através de medidas que possam
amenizar parte dos problemas detectados. Essas medidas, algumas delas contidas
no Plano Estratégico de Desenvolvimento do Centro-Oeste (2006), podem ser: a
criação de certificados de produtos ecologicamente corretos (selo verde);
qualificação dos recursos humanos; aumento dos espaços de participação e
fortalecimento de novas lideranças.
Com o objetivo de melhorar as condições de vida na Comunidade em
estudo, é que são sugeridas, a seguir, algumas ações possíveis de serem
executadas, com base na sustentabilidade. Essas ações podem, no decorrer do
processo, garantir a permanência dos moradores no local, uma vez que favorecem a
geração e incremento da renda dentro da propriedade. Podem, ainda, iniciar um
processo de desenvolvimento de um novo produto: o turismo, pois a população do
núcleo apresenta relevância histórica e características peculiares próprias: pela
localização fora da zona urbana, com estilo tipicamente rural, pelas atividades
desenvolvidas na Cozinha Comunitária e pela presença de um pesque-pague a 04
km da Vila que vem se fortalecendo, e cujos visitantes passam, obrigatoriamente,
pela Voadeira. Por isso, recomenda-se:
a) políticas de incentivos financeiros e técnicos para a expansão das atividades
da Associação de Moradores e Pequenos Produtores do Distrito de Voadeira;
b) oferta de atendimento no Posto de Saúde local, com médico e dentista, pelo
menos uma vez por semana;
c) ampliação da oferta de escolaridade na Comunidade;
d) instalação de rede de esgotamento sanitário em toda a Comunidade;
e) oferta de serviço de limpeza urbana e jardinagem na Praça Central, uma vez
por semana;
f) aquisição de uma área para a Associação de Moradores e Pequenos
Produtores, para plantio de frutíferas e de cana-de-açúcar para produção dos doces;
g) ampliação e melhoria da oferta do serviço de transporte à sede do município;
h) potencialização do uso da Cozinha Comunitária de forma a gerar mais renda;
i) integração dos artesãos de doces da Comunidade aos artesãos de cerâmica do
município de General Carneiro;
j) capacitação dos moradores de Voadeira para o desempenho de atividades que
estejam ligadas à sua cultura, por exemplo, criação de um grupo de teatro de
repentes, contadores de histórias;
k) desenvolvimento de um projeto de florestamento (plantio de mudas nativas) às
margens do Córrego Voadeira, consorciado com o Curtume Santo Antônio
(CURTUSA), que já desenvolve um projeto de reflorestamento (plantio de espécies
exóticas);
l) aquisição de uma câmara fria para armazenar a matéria-prima para os doces;
m) aquisição de embalagens, por atacado, para diminuir os custos da Cozinha
Comunitária;
n) ampliação da reutilização de embalagens de vidro;
o) instalação de telas suspensas, como aparadores, sob os pés das frutíferas,
para evitar a perda de matéria-prima para os doces;
p) criação de um site para divulgar os produtos e serviços da Comunidade
Voadeira, consorciado com os artesãos de General Carneiro;
q) escrituração dos lotes dos moradores;
r) construção de asfalto nas vias públicas da Comunidade;
s) construção de um ginásio de esportes anexo à escola;
t) incentivo aos jogos de dominó, de cartas, de dama e de xadrez, no Salão
Paroquial, para oportunizar a integração e o lazer dos moradores;
u) um estudo local com inventário das potencialidades turísticas, com vistas a
desenvolver atividades ligadas ao turismo, para geração de emprego e renda.
Entende-se que essas ações podem vir a atenuar os problemas
enfrentados pelos moradores da Comunidade Voadeira e amenizar o sofrimento
dessa população que vive as conseqüências da chegada do capital ao campo e do
descaso do poder público quanto ao atendimento aos direitos do cidadão.
“É preciso criar pessoas que se atrevam a sair das trilhas aprendidas,
com coragem de explorar novos caminhos.
Pois a ciência construiu-se pela ousadia dos que sonham,
e o conhecimento é a aventura pelo desconhecido em busca da terra prometida”
Rubem Alves
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A N E X O S
Universidade Católica de Goiás
Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Mestrado Multidisciplinar em Ecologia e Produção Sustentável
Identificação
Aluna: Sônia Salete Zavareze
Orientador: Prof. Dr. Aristides Moysés
Objetivo da pesquisa de campo
Estudar como se formou a concepção de economia sustentável junto a Comunidade
Voadeira, além de verificar se há potencial para desencadear outras atividades
produtivas que venham a beneficiar a comunidade, sem impactar o ambiente e
analisar se existem, no território do município, outras plantas que venham a ser
utilizadas como alternativa econômica.
Questionário
I - Dados Pessoais e Familiares: (entrevistar o chefe da família)
1)
Data: Nome: Religião:
Local de
Moradia
Núcleo central ( ) Fora do núcleo ( )
Estado civil: Sexo: Idade: Escolaridade:
Cônjuge: Escolaridade:
Atividade: Sexo: Idade:
FILHOS
Nome Relig
ião
Sexo Idade/
de onde veio
Escolaridade/
onde estuda?
Ativida-
de
Ado-
tivo
OUTROS
Nome Relig
ião
Sexo Idade/de onde
veio
Escolaridade?/
onde estuda
Ativida-
de
Paren
tesco
2) De onde veio?
a) Cícero Dantas – BA ( ) b) Outro____________________________________
2.1) Sua trajetória migratória foi:
2.1.1) direto para a Comunidade Voadeira? Sim ( ) Não ( ) Se não, ir para 2.1.2
2.1.2)______________________________________________________________
2) Que tipo de atividade desenvolvia lá na cidade de origem?
a) Lavoura ( ) Em terras próprias? Sim ( ) Não ( ) b) Serviços domésticos ( )
c) Outros: _____________
4) Motivo da migração?
a) Acompanhamento de família ( ) b) Busca de melhoria de vida ( )
c) Expulsos da terra ( ) d) Venda da propriedade ( )
e) Outros_____________________________
5) Em que ano chegou à Comunidade Voadeira?____________________________
6) O que sua família trouxe quando chegou na área?
( ) móveis ( ) dinheiro ( ) animais domésticos ( ) animais para produção
( ) outros ___________________________
7) Como era lá o uso da terra?
( ) bem aproveitado, com adubação orgânica ( ) bem aproveitado, com
adubação química
( ) mal aproveitado, sem adubação ( ) não havia espaço para produção
( ) outros __________________________________________________________
II – Dados da Propriedade na cidade de origem e da propriedade na Voadeira
1)
Infra estrutura da
residência
Na cidade de origem Na Comunidade
Voadeira
Quartos
Salas
Cozinha
Banheiro
Despensa
Área
Galpão
Sala comercial
Água encanada
Energia
Fossa
Patrimônio Imobiliário
Casa
Lote
Possui(a) escritura?
Se não possui(a), por
quê?
2) Quando foi construída a casa em que você mora? _________________________
3) Qual é o tamanho da área construída? ____________m
2
3) Você fez melhorias na casa nos últimos anos? _____
4) Quais? _______________________________________________________
III) Dados complementares:
1) Utiliza na maior parte do tempo fogão: à lenha ( ) à gás ( )
2) Tem habitação na cidade ( ) sim ( ) não
3)Quais eletrodomésticos você tinha e tem na sua casa?
Relação
Eletrodomésticos
Onde residia Hoje, na
Voadeira
Hoje, na cidade
Fogão a gás
Fogão a lenha
Máquina de costura
Rádio
Aparelho de som
Televisão
Geladeira
Tanque de lavar roupa
Ferro de passar roupa
Freezer
Liquidificador
Outros (enumere)
4) Tem propriedade rural? ( ) sim ( ) não Área: ______ ha
4.1) Infra-estrutura da propriedade rural:
Especificação Terra própria, uso
quando chegou
(hectares)
Terra própria, uso atual
(hectares)
Pastagem natural
Pastagem formada
Capineira
Culturas anuais
Culturas permanentes
Matas ciliares
Matas
Áreas inaproveitáveis
Área inaproveitadas
4.2) A sua área tem problemas com erosão? ( ) não ( ) moderada ( ) acentuada
Se tem, como resolve? _________________________________________________
4.3) Você enfrenta problemas com água na propriedade rural? ( ) Sim ( ) Não
Como resolve o problema? _____________________________________________
IV – Renda Familiar e profissão
1) Ocupação profissional atual:
1.1) Trabalha com caju e outros doces? Sim ( ) não ( ) Desde que ano: _______
1.2) Outras atividades que desenvolve:
Rural ( ) Qual? ______________________________________________________
Urbana ( ) Qual? Doméstica ( ) Pública ( ) _________________ Outra ( ) _______
2) Renda Familiar
a) até R$175 ( ) b) mais de R$175 a R$350 ( ) c)
mais de R$350 a R$700 ( )
d) mais de R$ 700 a R$1.050 ( ) e)mais de R$1.050 ( )
3) Meios de subsistência:
a) Trabalho rural de diarista ( ) b) Produção de doces e derivados ( )
c) Criação de galinhas ( ) d) Horta ( )
e) Produção de leite ( ) f) Produção de gado ( )
g) Comércio ( ) h) Emprego público ( ) i) Outros_______
4) Recebe algum benefício governamental
a) bolsa-escola, sim ( ) Não ( ) b) bolsa-família, sim ( ) Não ( )
c) aposentadoria, sim ( ) Não ( )
d) auxílio-doença, sim ( ) Não ( ) e) pensão, sim ( ) não ( )
f) LOAS, sim ( ) não ( )
5) Posse de automóvel? Não ( ) Sim ( ) Tipo _________________ Ano_______
Marca ________________
V – Perspectivas para o futuro da comunidade
1) Onde moram e o que fazem seus filhos (múltipla escolha)?
( ) na propriedade ( ) na cidade para estudar ( ) na cidade para trabalhar
( ) ajudam nos trabalhos da propriedade ( ) trabalham fora e ajudam nas
despesas da família.
2) Se os filhos moram fora da propriedade, qual atividade desenvolvem?
_________________________________________
3) Você acredita que o Cerrado vai suportar a demanda de lenha para a
comunidade?______________________
4) Pensou em outras frutas, além do caju, para comercializar os derivados? Sim ( )
Não ( ) Quais? _____________________________ Por quê?_______________
5) Qual a sua relação com o Córrego Voadeira?
( ) conhece a nascente ( ) desconhece o córrego ( ) faz uso constante do
córrego ( ) preserva-o
( ) não acredita que necessite de conservação ( ) outros_______________
VI – Necessidades da Comunidade
Infra-estrutura Saúde Meio Ambiente Educação
Transporte ( ) Médico ( ) Reflorestamento-
margens do córrego( )
Reforma da escola
( )
Emprego ( ) Farmácia
( )
Preservar nascente ( ) Biblioteca ( )
Quadra de esportes ( ) Dentista
( )
Cursos ( ) Projetos
alternativos ( )
Estradas ( )
Cuidar da Praça ( ) Eventos culturais
( )
Asfalto ( )
Palestras/cursos
( )
Terra para plantar ( ) Ampliar o nível
escolar ( )
Lotes p/ residências ( )
VII – Participação social
1)
Organização Cargo Sempre
participa
Às vezes Nunca
Associação de Moradores
Sindicato Trab. Rurais
Partido Político
Igreja Católica
Igreja Evangélica
Conselho Municipal de
Desenvolvimento Rural
Outros
2) Que tipo de benefícios recebeu participando das organizações?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
3) Quais as formas de lazer preferidas por você e sua família?
( ) Ir a celebrações religiosas
( ) ir a local de dança
( ) Passear na casa de vizinhos e parentes
( ) Jogar bola
( ) Mesa de truco
( ) Assistir televisão
( ) Outras_________________,___________________,____________________
VIII – Desenvolvimento Sustentável
1) Na sua opinião, o que você pensa ser necessário para que a Comunidade
Voadeira possa se desenvolver e manter seus moradores?____________________
2) Nas roças e horta utiliza que tipo de adubação?
( ) orgânica. ( ) palhada ( ) esterco bovino ( ) esterco de galinhas ( ) esterco
de suínos
( ) outros ___________________________________________________________
( ) química. Que tipo___________________________________________________
2.1) Qual o destino dos vasilhames dos produtos químicos utilizados?____________
3)Como faz a conservação do solo?
( ) Por rodízio de culturas Quais?______________________________________
( ) adubação
( ) curvas de nível
( ) plantio de sorgo e outros na entressafra para produzir palhada
( ) mantém corredores de mata nativa
( ) preserva as margens dos córregos
( ) Outros___________________________________________________________
IX - Quanto à assistência técnica
1) Você já recebeu algum tipo de assistência técnica? ( ) sim ( ) não.
2) De quem? ______________________________________________________
3) Quantas vezes por ano? ___________________________________________
4) Você ou membros de sua família já participaram de cursos para melhorar o seu
sistema de produção?
( ) sim ( ) não
4.1) Nome do curso _________________________________________________
4.2) Instituição que ofereceu___________________________________________
4.3) Local_____________________________________ Data _____/_____/_____
4.1) Nome do curso _________________________________________________
4.2) Instituição que ofereceu___________________________________________
4.3) Local_____________________________________ Data _____/_____/_____
4.1) Nome do curso ________________________________________________
4.2) Instituição que ofereceu__________________________________________
4.3) Local____________________________________ Data _____/_____/_____
5) Esses cursos ajudaram a melhorar a produtividade de suas atividades?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
X - Políticas públicas
1) Você recebeu algum tipo de crédito nos últimos anos? ( ) Sim ( ) Não
1.1) Qual? ( ) FCO ( ) PRONAF ( ) Outros_______
Quanto (R$)_______________________
2) Se sim, qual o valor e este crédito foi para quê?___________________________
3) Consegui pagá-lo dentro do prazo? ( ) sim ( ) não ( ) está pagando
4) Qual resultado obtido (benefícios ou problemas)?
___________________________________________________________________
5) Como você avalia a atuação da prefeitura na sua cidade, para o atendimento às
demandas dos agricultores familiares?
___________________________________________________________________
6) Você participou, de alguma forma, na elaboração do Plano Municipal de
Desenvolvimento Rural – PMDR?
___________________________________________________________________
7) Tem conhecimento sobre ele?
___________________________________________________________________
8) O que deveria ser feito pela Prefeitura para melhorar a vida dos agricultores?
___________________________________________________________________
XI - Relações da família fora da propriedade
1) Presta algum tipo de serviço fora da propriedade
( ) Sim ( ) Não Que tipo?________________________________________
2) Por quanto tempo no decorrer do ano?__________________________________
3) Por que faz esta atividade? ___________________________________________
4) Você recebe ajuda de parentes? ( ) sim ( ) não De quem?_______________
Qual a freqüência?____________________________________________________
5. Gastos mensais (o que compra fora da propriedade)
Produto Quantidade Onde compra? Quais as razões da compra
Arroz
Feijão
Açúcar
Sal
Óleo
Macarrão
Legumes/Verduras
Carne de gado
Carne de aves
Carne suína
Farinha
Polvilho
Frutas
Outros
XII - Qual futuro vê para sua família e sua propriedade?
1) Quais as possibilidades de permanência de sua família na propriedade (múltipla
escolha)?
( ) São boas, pois tenho ajuda dos filhos, noras, genros, outros parentes para
desenvolver as atividades produtivas;
( ) Meus filhos moram na cidade, mas ainda tenho forças para continuar nas
atividades da propriedade;
( ) Tenho recebido crédito e assistência técnica que ajudam minha permanência na
terra;
( ) Não vai dar para continuar por muito tempo, pois os filhos saíram e não tenho
condições de manter as atividades;
( ) São ruins as possibilidades de permanecer na propriedade, mas ainda assim é
melhor que viver na cidade como assalariado;
( ) Outras? Quais_____________________________________________________
2) Há possibilidade de seus filhos, genros e noras continuarem o trabalho na
propriedade?
( ) Sim ( ) não ( ) Não sabe, os filhos são pequenos
3) Se sim (múltipla escolha):
( ) Porque vêem futuro nas atividades;
( ) Estão inseridos no sistema de produção e dele tiram a manutenção de suas
despesas;
( ) A infra-estrutura é boa, com moradia para todos;
( ) Temos perto da propriedade boa Escola e atendimento à saúde.
4) Se não (múltipla escolha):
( ) A terra é pequena, não dá para todos;
( ) Não tenho máquinas e equipamentos suficientes para ampliar a produção;
( ) O que se produz não dá para suprir as necessidades básicas da família;
( ) Os filhos querem estudar e mudar de atividade;
( ) Quero que meus filhos estudem e mudem de atividade;
( ) Outros: ________________________,_________________________________
5) O que você acha que deveria ser feito EM PRIMEIRO lugar para melhorar a sua
vida e a dos agricultores familiares (múltipla escolha)?
( ) Ampliar a linha de crédito;
( ) Aumentar a assistência técnica pública e gratuita ;
( ) Melhorar as estradas até o comércio mais próximo;
( ) Melhorar ou construir escolas no meio rural;
( ) Ter assistência médica no meio rural;
( ) Outros__________________________________________________________
6) Quais os principais PROBLEMAS você vê para o bom desenvolvimento da
agricultura familiar (múltipla escolha)?
( ) Individualismo para desenvolver as atividades produtivas, isso baixa a
produtividade;
( ) Falta estrutura de comercialização;
( ) Falta equipamentos e máquinas adequadas à pequenas áreas;
( ) O governo municipal e estadual está sempre ausente;
( ) Terra insuficiente para desenvolver minhas atividades;
( ) Má qualidade de minha terra;
( ) As cidades oferecem melhores condições de vida e por isso minha família
migrou;
( ) Outros___________________________________________________________
XII – Como comercializa o excedente de produção?
1) Na comunidade: ( ) na festa do caju ( ) no dia-a-dia
2) Supermercados/lojas: ( ) no município ( ) fora do município
3) Feira livre: ( ) no município ( ) fora do município
4) Eventos: ( )do município ( ) fora do município
5) Outros ___________________________________________________________
XIII – Desenvolvimento Sustentável
1) O que você entende por “Desenvolvimento Sustentável”?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
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