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JORGE ARTURO VILLENA MEDRANO
COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL INTEGRADA
ALICERCE INTRÍNSECO DA
ECONOMIA DE COMUNHÃO
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
E
SCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES
Departamento de
Relações Públicas, Propaganda e Turismo
São Paulo – 2007
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(Aqui entra a guarda-branca)
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JORGE ARTURO VILLENA MEDRANO
COMUNICAÇÃO
ORGANIZACIONAL INTEGRADA
ALICERCE INTRÍNSECO DA
ECONOMIA DE COMUNHÃO
Tese apresentada à Escola de Comunica-
ções e Artes da Universidade de São Paulo,
na Área de Concentração de Interfaces Soci-
ais da Comunicação, dentro da Linha de
Pesquisa de Políticas e Estratégias de Co-
municação, como exigência parcial para ob-
tenção do título de Doutor em Ciências da
Comunicação, sob a orientação da Profa.
Dra. Margarida Maria Krohling Kunsch.
São Paulo – 2007
4
A tese de doutorado
Comunicação organizacional integrada:
Alicerce intrínseco da Economia de Comunhão,
realizada pelo aluno
Jorge Arturo Villena Medrano,
no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação,
da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo,
foi
______________________________________________________________
no dia ____ de ______________ de 2007,
tendo sido avaliada pela banca examinadora composta por:
______________________________________________________________
Prof(a) Dr(a)
______________________________________________________________
Prof(a) Dr(a)
_____________________________________________________________
Prof(a) Dr(a)
______________________________________________________________
Prof(a) Dr(a)
______________________________________________________________
Prof(a) Dr(a)
5
“(...) o capital concentrado
nas mãos de alguns,
e a exploração de muitos outros.
Por que – nos questionamos –
tamanha potência não é direcionada
para a solução dos imensos
problemas do Brasil?
Porque falta o amor ao irmão
e dominam o cálculo e o egoísmo.
Mas a esperança existe,
ou melhor, a certeza”.
Chiara Lubich,
22 maio de 1991
6
A Chiara ...
A minha amada Daniele & Cia...
Aos meus pais...
Aos meus irmãos...
A meus sobrinhos e família...
Aos meus mestres na Obra...
A minha querida Bolívia...
Aos focolarinos (as) e mariapolitas...
... por hoje e por sempre.
7
AGRADECIMENTO
Meus pais me ensinaram que devo ser sempre agradecidos, assim que...
Agradeço...
A Deus!
A minha professora Margarida orientadora pelo zelo, carinho, amizade.
De coração muitíssimo obrigado!
Aos professores da minha banca de Qualificação profª Maria Schuler e
prof Mitsuru Yanaze, por expandir as fronteiras deste trabalho.
A ECA em geral...
A Chiara, Ginetta e mariapolitas celestes...
A minha esposinha Daniele, por tantas e tantas coisas...
Aos meus pais, pelo eterno amor e apoio. Aos meus irmãos por estar
sempre por no coração. Aos bebés...
A minha família Eusébio e Raquel, Wilma e Quela.
Ao Euclidinho, longe mas “perto”.`
Ao Centro Filadélfia em especial à colega Márcia Barauna
Aos da Mariápolis: Corrado, Ekke, Faro, Klaus, Bertin, Alexandre, Olavo,
Lorenzo, a Sebokada, Manoel e família, à casetinha, Germano, Filippo,
Fabrício, Munir, etc, etc.
As da Mariápolis: Gehilda, Márcia, Richelta, Libbie, Sandra, Maria do
Carmo, Carolina, etc, etc.
Ao CM e a escola Aurora.
Ao Centro de Pesquisa e Documentação da EdC e ao Centro Ginneta.
Aos e as de Sampa: João Manoel e Margarida, Fábio e Jakie, Aloísio,
André, Marconi etc, etc.
As de Vitória: Eli (pelo sorriso), Evanilda (sabedoria), Márcia, Sheila e
Cida.
Aos bravos voluntários, aqui e acolá...
A Cíntia e Magno...
A Fernanda, Fátima, Zé, Neinho, Marilda, René, Mazinho, Gilberto, Ar-
naldo, Vidal, os e as Gen...
A minha sogrinha, cunhados e sobrinhos. A Jannottada... Tia Jeny e Jo-
ão.
A “radia” e todos os irmãos e irmãs... a FNSPES, Dom Luiz Mancilha,
Dom Mário.
A Novo Milênio e todos os colegas e alunos...
Aos empresários da EdC, os trabalhadores e aos pobres.
A galera da FEMAQ, Rodolfo, Henrique, Marcelo..... e demais
A minha querida pátria Bolívia!
OBRIGADO BRASIL!!
8
Ficha catalográfica
VILLENA MEDRANO, Jorge Arturo. Comunicação organizacional integrada: Alicerce intrínseco
da Economia de Comunhão. 2007. 270 fl. Tese (Doutorado em Ciências da Comunicação) –
Universidade de São Paulo, Escola de Comunicações e Artes, São Paulo, 2007.
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo analisar as formas e relações de comunicação
organizacional integrada dentro da perspectiva da Economia de Comunhão
numa empresa brasileira.
A Economia de Comunhão (EdC), é um projeto de caráter sócio-econômico
que nasce a partir da experiência do Movimento dos Focolares, um movimento
civil e eclesial. Hoje a EdC encontra-se dispersa por cerca de 40 países envol-
vendo quase 800 empresas.
A comunicação organizacional integrada no contexto da Economia de Comu-
nhão apresenta características peculiares. Analisar as formas e relações de
comunicação em que se desenvolvem na prática nos permite enxergar a impor-
tância dessa nova maneira de agir no campo econômico e social.
A partir do método fenomenológico e do estudo de caso penetramos na reali-
dade da empresa com essa filosofia para constatar na prática aquilo que na
concepção ideológica da proposta é apresentada.
O estudo envolve conceitos ainda pouco abordados pela academia como “Cul-
tura do Dar”, “homem novo” e outros, que aprofundados nos revelam uma pra-
xe comunicacional baseada na partilha.
Palavras-chave: Comunicação organizacional integrada, Economia de Comu-
nhão, Cultura do Dar, Movimento dos Focolares, FEMAQ
9
ABSTRACT
The purpose of this study is to analyze forms and relations of integrated organ-
izational communication into the Economy of Communion perspective, in a Bra-
zilian organization.
The Economy of Communion (EoC) consists into a socio-economic project that
had birth from the experience of Focolare Movement, a civil and ecclesiastic
movement. Nowadays, EoC is dispersing around 40 countries, involving almost
800 companies.
The organizational communication integrated in the Economy of Communion
context presents peculiar characteristics. Analyzing the communication’s forms
and relations developed in practice allow us to realize the importance of this
new way of acting in the social and economic field.
Adopting the phenomenological method and case study we entered the organi-
zation reality using this philosophy to find, in practice, what is presented in the
ideological conception of this proposal.
This study involves concepts not much adopted in the academy, such as “Cul-
ture of Giving”, “new man” and others, that when deeply searched reveal us a
communicational praxis based on sharing.
Keywords
Organizational communication integrated, Economy of Communion de Comu-
nhão, Culture of Giving, Focolare Movement, FEMAQ
10
SUMÁRIO
Introdução
16
Capítulo 1.
Comunicação Organizacional Integrada
29
1. A comunicação nas organizações 29
1.1 O papel da comunicação no âmbito das organizações 31
1.2.Funções da comunicação das organizações 34
2. A comunicação organizacional 35
2.1 Evolução histórica da comunicação organizacional 35
2.2 Múltiplas perspectivas e definições da comunicação organizacional 39
2.3 Características da comunicação organizacional 46
3. Comunicação organizacional integrada 48
3.1 Comunicação administrativa 50
3.1.1 Comunicação interna 51
3.2 Comunicação mercadológica 55
3.3 Comunicação institucional 60
3.4.A comunicação interpessoal nas organizações 61
3.4.1 Definição de comunicação interpessoal 62
3.4.2 Comunicação grupal nas organizações 67
3.4.3 O grupo 67
3.4.4 A comunicação no grupo 68
4. Barreiras na comunicação organizacional 69
5. Apreciações 73
CAPÍTULO 2.
MOVIMENTO DOS FOCOLARES
74
1. Chiara Lubich e o Movimento dos Focolares 74
2. Composição e difusão do Movimento dos Focolares 80
3. Os diálogos, caminhos da Unidade 98
11
4. Conscientização para o “mundo unido” 99
5. Comunhão dos bens 100
CAPÍTULO 3.
A ECONOMIA DE COMUNHÃO
104
1. Doutrina Social da Igreja 109
2. Origem e desenvolviment 113
3. Objetivos da Economia de Comunhão 118
4. Do homo economicus ao homem novo 123
4.1. O homo oeconomicus 129
4.2 O homem novo 130
5 O homem: autor, centro e fim 134
5.1 O autor 134
5.2. O centro 136
5.3. O objetivo 138
6. A “Cultura do Dar” 140
6.1. Características da “Cultura do Dar” 143
7. Características gerais da Economia de Comunhão 146
7.1 O aporte econômico 146
7.2 Divisão na liberdade 147
7.3 Implicação no processo produtivo 148
7.4 Conceito de empresa e sua função social 148
7.5 Uma família ampliada 149
8. Diretrizes para conduzir uma empresa de Economia de Comunhão 150
9..Pólos empresariais 154
10. As empresas da EdC 157
11. Destino dos lucros 162
12. Conquistas e Apreciações 163
12
CAPÍTULO 4.
A PRÁXIS DA UTOPIA: FEMAQ, UMA EMPRESA DE ECONOMIA DE
COMUNHÃO
165
1. Contexto geográfico 166
2. História da FEMAQ 167
3. Áreas de atuação 170
4. Certificações e prêmios 171
5. Desempenho Produtivo 174
6. A empresa ao serviço do homem 179
7. Por uma “economia de comunhão” 184
8 Missão, Visão e Objetivos 187
9. Filosofia e solidariedade da FEMAQ 189
10. Respeito ao meio ambiente 194
11. Etapas da mudança da FEMAQ 199
12 A FEMAQ: comunicação e organização 205
13. Relacionamento com a sociedade 206
14. Principais conclusões 208
CAPÍTULO 5.
ABORDAGEM METODOLÓGICA
210
1. Método Fenomenológico 210
2. Estudo de Caso 211
2.1. Delineamento do estudo de caso 213
2.2. Análise Bibliográfica 214
2.3. Pesquisa de campo 214
2.4. Entrevistas 215
2.5. Observação Participante 216
13
CAPÍTULO 6.
COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL INTEGRADA NA FEMAQ
217
1. Redes de Comunicação 218
2. Categorias de Análise 223
2.1. Comunicação interna e administrativa 224
2.1.1. Problemas de comunicação 230
2.1.2. Comunicação e participação 231
2.1.2.1. Formas de participação 232
2.1.2.2. A liderança na FEMAQ. 232
2.2. Comunicação institucional 234
2.3. Comunicação mercadológica 237
3. Estratégias de comunicação organizacional 241
4. Impressões conclusivas 249
Considerações finais
250
Bibliografia
Anexos
14
Lista de quadros
Quadro Nº 1 Variáveis conceitual e operacional 26
Quadro Nº 2 Modelo EMI-REC 27
Quadro Nº 3 A comunicação organizacional na história 37
Quadro Nº 4 Comparação da natureza da comunicação nas organizações 38
Quadro N° 5 Etapas: Competência, tolerância, solidariedade e participa-
ção
126
Quadro N °6 Comparação entre Homo Oeconómicus e Homem Novo 132
Quadro N° 7 Composição dos empreendimentos EdC 145
Quadro N° 8 Número de empresas que aderiram à EdC 147
Quadro N° 9 Áreas de atuação 170
Quadro N° 10 Produtos e setores onde trabalha a FEMAQ 171
Quadro N° 11 FEMAQ S/A: Faturamento 178
Quadro N° 12 Relação de Benefícios na FEMAQ 180
Quadro N° 13 Entrevistas Realizadas 216
Quadro N° 14 Estilos de liderança 233
15
Lista de Gráficos
Gráfico Nº 1 Comunicação Organizacional Integrada 35
Gráfico Nº 2 Inputs, Throughputs e Outputs 43
Gráfico Nº 3 Mariápolis: Cidades-testemunho espalhadas no mundo 75
Gráfico Nº 4 Do estado possessivo ao estado egoente 111
Gráfico N° 5 Forma jurídica das empresas EdC 159
Gráfico N °6 Produção acumulada em toneladas 166
Gráfico N° 7 Certificados de qualidade para peças fundidas 172
Gráfico N° 8 Certificados ao Mérito 1995 e 1996 General Motors Brasil 173
Gráfico N° 9 Certificado Norma ISSO 9002 173
Gráfico N° 10 Destaque Ambiental do Ano 174
Gráfico N° 11 FEMAQ Faturamento em U$ 176
Gráfico N° 12 Investimento Social – Homem/Ano 176
Gráfico N° 13 Comparativo Faturamento Homem/Ano 176
Gráfico N° 14 Produtividade Comparativa FEMAQ X BRASIL 177
Gráfico N° 15 Produção comparada ano 2000 178
Gráfico N °16 Grau de Instrução dos Funcionários 181
Gráfico N° 17 Valores da FEMAQ 192
Gráfico N° 18 Refugo 195
Gráfico N° 19 Organograma FEMAQ 205
Gráfico N° 20 Rede de comunicação central 219
Gráfico N° 21 Mapa de redes e relações comunicacionais da FEMAQ 221
Gráfico N° 22 Logomarca da FEMAQ 238
Gráfico N° 23 Logomarca comemorativa 40 anos da FEMAQ 238
Gráfico N° 24 Site da FEMAQ 239
16
INTRODUÇÃO
Todas as organizações se encontram permeadas pela comunicação
organizacional integrada, mas algumas fazem dela seu principal alicerce. Esse é o
caso das empresas que participam do projeto econômico denominado Economia de
Comunhão.
A comunicação organizacional definida pela profª Margarida Krohling
Kunsch
1
como aquela que estuda como se processa o fenômeno comunicacional
dentro das organizações, analisa o sistema, o funcionamento e o processo de
comunicação entre a organização e seus diversos públicos, pode ser aplicada no
contexto da gestão da Economia de Comunhão (EdC).
Mas antes de continuar observemos de maneira holística a atual conjuntura
que se nos apresenta no nosso planeta, notemos que constantemente, somos
bombardeados com informações sobre o grande dilema da má distribuição de
riquezas que no nosso mundo ocasiona profundas desigualdades sociais e exibe um
quadro repetitivo onde poucos acumulam muitos bens, enquanto muitos outros não
têm sequer as necessidades básicas atendidas.
Assim, seis anos depois de termos ultrapassado o limiar do século XXI, o
mundo ainda enfrenta mudanças numa velocidade tal que às vezes é muito difícil
acompanhar e que, em conseqüência disso, provoca em toda a comunidade global
uma sensação de grande incerteza. O mundo está mudando mais rápido do que
antes e numa escala muito maior, porém das muitas transformações que estão
acontecendo, muito poucas podem ser motivo de celebração. Grande parte das
notícias que recebemos se refere à aceleração dos problemas globais e à desordem
sócio-econômica com terrorismo, violência, degradação do meio ambiente, guerras
etc., que parecem imperar no planeta,
1
KUNSCH, Margarida, Planejamento de Relações Publicas na Comunicação Integrada, São Paulo:
Summus, 2003, p. 149.
17
Ainda que o desenvolvimento econômico apresente cifras de grande
crescimento, pode-se facilmente constatar que nos últimos tempos ele não se
traduziu em desenvolvimento social, assim como o grande desenvolvimento
tecnológico, que não está sendo acompanhado de uma melhoria na caótica situação
em que vive a maioria da população mundial.
No meio de uma crise social e de uma crise ambiental que se enraízam
rapidamente, a humanidade enfrenta enormes desafios e adverte que se faz urgente
e vital uma mudança na história da convivência humana, a fim de realizar o sonho de
um mundo livre da fome, da doença, da guerra e da injustiça.
Essa triste realidade também se reflete no Brasil - segundo o Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, do Ministério do Planejamento, Orçamento e
Gestão, o país, com uma população de 185 milhões de habitantes, inicia o século
XXI como a 14ª economia do planeta, em 2005, porém com a mesma agenda social
do século XIX, que inclui problemas básicos envolvendo alimentação, segurança,
saúde, educação e saneamento.
Assim, o Relatório de Desenvolvimento Humano
2
(RDH) de 2005 atribui ao
Brasil um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de valor 0,792, o que coloca o
país em 63º lugar no “ranking” do IDH entre 177 territórios. O IDH é calculado pelo
PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Se o IDH fosse
baseado não no PIB per capita, mas na renda dos 20% mais pobres, o Brasil cairia
52 posições no “ranking” - de 63 para 115.
No Índice de Pobreza Humana (IPH), elaborado desde 1997 e calculado
apenas para países em desenvolvimento, o Brasil aparece na 20ª posição, num total
de 103 países e territórios.
2
PNUD, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Relatório do Desenvolvimento
Humano Brasil 2005: Cooperação Internacional Numa Encruzilhada, 2005.
18
A situação fica mais crítica quando o assunto é distribuição de renda, no
Brasil - os 10% mais ricos da população se apropriam de 46,9% da renda nacional,
enquanto os 10% mais pobres ficam com 0,7% da renda, segundo o último relatório
da Organização das Nações Unidas
3
.
E se repararmos com o resto dos países latino-americanos percebemos que
essa situação não é uma exclusividade do Brasil. Em todos os países vizinhos se
convivem com situações muito similares. Pobreza, abandono, miséria, analfabetismo
e fome, são o comum denominador dessa parte do planeta.
Em resumo, percebemos que tudo o que sucede no mundo é o resultado de
termos definido prioridades equivocadas e de termos confundido, numa visão
maquiavélica, os meios com os fins.
Mas nem tudo está perdido!
No meio dessas graves aflições, surgem alternativas e vozes que acreditam
num mundo diferente. No início deste século, com as catástrofes naturais e sociais,
como o Tsunami na Ásia, o terremoto no Paquistão, as guerras no Afeganistão e no
Iraque, inundações, dentre outros, manifestou-se mais uma vez o caráter solidário da
população mundial, consubstanciado nas mobilizações para arrecadar alimentos,
roupas e remédios para essas vítimas.
Nessa corrente, até os governos dos países mais desenvolvidos
participaram. Assim, o perdão da dívida externa dos 50 países mais pobres dobrou
entre 1999 e 2004.
Por outro lado, em resposta aos problemas que levam inúmeras famílias a
fazerem da rua seu lar, já é representativo o número de organizações não
governamentais (ONG’s), grupos religiosos e empresariais que realizam trabalhos
voluntários, na tentativa de minimizar os graves problemas sociais decorrentes de
3
ONU, Organização das Nações Unidas, Relatório sobre a Situação Social Mundial 2005: O
Problema da Desigualdade Nova York: ONU, 25 de agosto de 2005.
19
toda essa situação. Dia após dia, surgem instituições com fins altruístas, que saem
ao encontro dos mais necessitados, tanto no Brasil como no mundo todo.
Fatos como esses dão evidências de que o mundo está em processo de
mudança constante e que a solidariedade parece estar sendo resgatada do nível
pessoal e familiar para o humanístico permeando ambientes públicos, civis e
empresariais, a exemplo dos programas Bolsa Família do governo brasileiro, Criança
Esperança da UNICEF com a Rede Globo e muitos outros pequenos programas que
ajudam comunidades e pessoas carentes.
Ao analisar a situação social delineada pela política neoliberal adotada por
quase todos os governos capitalistas, temos percebido que esta política, em curto ou
médio prazo, deixará a uma parte considerável da sociedade, privada de seus
direitos de liberdade, por “classificá-las” como incapazes de ser competitivas no
mercado. Surge então uma pergunta: É possível que surja algum tipo de reação que
apresente novos paradigmas para a economia mundial? Frente esta interrogativa
Pierre Bourdieu
4
, propõe:
“historicamente, o Estado foi uma força de racionalização, porém
que foi posto a serviço das forças dominantes. Para evitar que assim seja,
não basta sublevar-se contra os tecnocratas de Bruxelas. Seria necessário
inventar um novo internacionalismo, pelo menos na escala regional da
Europa, capaz de oferecer uma alternativa à regressão nacionalista que,
graças à crise, ameaça mais ou menos a todos os países europeus. Tratar-
se-ia de criar instituições capazes de controlar essas forças do mercado
financeiro (...) É preciso, portanto, tentar criar bases organizacionais de um
verdadeiro internacionalismo crítico, capaz de opor-se verdadeiramente ao
neoliberalismo”.
Com esta observação, Bourdieu, refere-se à necessidade de uma resistência
à política neoliberal. Mas, essas oposições, não podem se reduzir a simples reação
de protestos e violência, para conseguir manchetes na mídia, que geralmente são
boicotados por essa. Movimentos dessa natureza, não chegaram a nada, cabe
4
BOURDIEU Pierre, Contrafogos.Táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1998, pp. 57.
20
lembrar dos motins na Inglaterra da Revolução Industrial, as máquinas foram
sabotadas e quebradas, mas não desapareceram.
As ciências sociais buscam a qualquer custo o paradigma que as permita
neste princípio de século suplantar a cultura de incremento das ambições individuais,
de excesso da autonomia do indivíduo e dos grupos de elite que não levam em
consideração o bem estar social das outras pessoas; da rivalidade crônica que
freqüentemente é motivo de comportamentos agressivos; da desproporção crescente
entre um pequeno grupo de pessoas que se enriquece de maneira injusta e outras
que são lançadas às margens da miséria, desocupação e falta de recursos
econômicos.
Comportamentos desse tipo conduzem inevitavelmente a uma patologia
social ou a conflitos latentes nas sociedades locais, que tanto em escala regional e
internacional, conduzem a guerras que trazem consigo mortes e novos exemplos de
genocídios
5
.
Quando não se tem uma “estratégia” ou “proposta” econômica e social,
claramente definida, a violência é inevitável. As autênticas mudanças e revoluções
que conquistaram e envolveram as massas, iniciaram-se com novas idéias que
propunham saídas para os problemas sociais, mesmo que pareciam utópicos.
É nesta discussão que se suscita o desenvolvimento da Economia de
Comunhão na Liberdade (EdC) que é uma destas tentativas de resposta a esse
desafio. Trata-se de um projeto de dimensões mundiais (atualmente envolve mais de
30 países), surgido em 1991, a partir da experiência do Movimento dos Focolares
6
.
5
BIELA, Adam, Economia de Comunhão, projeto, reflexões e propostas para uma cultura da
partilha. “Uma Revolução ´Copernicana´ para as ciências sociais”. Vargem Grande Paulista: Ed
Cidade Nova, 1998. p. 21.
6
O Movimento dos Focolares ou Obra de Maria foi fundado por Chiara Lubich em 1943, em Trento,
Itália. Está presente em mais de 180 nações e conta com cerca de 7 milhões de membros de
diferentes raças, culturas e religiões. A este Movimento aderem pessoas de todas as idades e
vocações e está composto essencialmente por leigos. Atualmente se destacam 18 ramificações que
têm como objetivo, contribuir, mediante as mais diversas iniciativas, para a construção de um
mundo mais justo e solidário.
21
Sinteticamente a EdC é formada por empresas que procuram desenvolver-
se com competência para enfrentar o mercado, mas que têm como objetivo
primordial o “bem-estar social”, mediante a divisão dos seus lucros em três partes:
uma parte deve ser utilizada para investimentos na própria empresa; outra parte para
investimentos em estruturas destinadas à formação de uma nova mentalidade na
qual o “dar” reproduzida na cultura do dar, e a preocupação com o “outro” que
também adquirem valor e se tornam os objetivos de toda a sociedade; e uma terceira
parte é destinada diretamente para atender as necessidades de pessoas e famílias
que se encontram em situação de pobreza.
Este projeto de impacto econômico-social, propõe fundamentalmente uma
economia que antes de tudo é uma opção de vida, na qual se prevê a partilha do
fruto do trabalho, da criatividade econômica, não só entre aqueles que trabalham
juntos, mas também com os que estão ao redor e precisam de ajuda.
Tal conceito, tenta integrar o direito a propriedade privada, a iniciativa
pessoal, a defesa dos direitos humanos e a solidariedade, de maneira que através da
atividade econômica propõe que se gere a realização individual e a harmonia social
em uma sociedade interdependente.
Até 2003, 797 empresas em todo o mundo participavam da EdC, das mais
variadas atividades
7
, o que nos dá uma idéia de que é um projeto viável, e que sua
expansão está em progressão, apesar de que o mundo em geral está vivendo uma
forte recessão econômica.
Um aspecto que é priorizado na EdC porque tem a ver com sua razão de ser
é o conceito de responsabilidade social. Percebemos que o espetacular avanço
tecnológico pareceria causar um efeito inverso na consciência das empresas em
relação ao seu papel na sociedade. Agora a moda é dar preferência ao enfoque
humanitário e social e ser uma empresa cidadã.
7
Dados proporcionados pelo Escritório Central de Economia de Comunhão em Roma em junho de
2005.
22
Uma empresa cidadã ou socialmente responsável, não se caracteriza
apenas por ações filantrópicas, mas por levar em conta os problemas sociais
existentes no país em que opera; preocupar-se com o bem-estar dos seus
funcionários; criar práticas que reflitam as preocupações e os valores da empresa
com todos os seusstakeholders”
8
; respeitar o consumidor, fabricando produtos com
qualidade, seguros e preservar os recursos naturais.
As organizações em geral, muito sutilmente, estão se conscientizando de
que, integrando-se às causas sociais, sejam elas de proteção ao meio ambiente,
marketing esportivo, marketing cultural, educação ou saúde, elas melhoram suas
relações com os empregados, clientes e fornecedores.
É neste contexto que a comunicação organizacional é fundamental para o
desenvolvimento deste projeto, já que consideramos eqüidistante a relação existente
entre comunicação e economia, tanto para a difusão do projeto no interior das
empresas que aderiram ao mesmo, como para sua projeção social.
E voltando ao segundo parágrafo deste trabalho, poderíamos partir da
definição de Lee Osborne Thayer
9
que afirma que comunicação organizacional se
refere: "a todos os fluxos de dados que são coadjuvantes, de algum modo, dos
processos de comunicação e intercomunicação da organização". Mas a comunicação
organizacional é sem dúvida mais abrangente, estuda como se processa o fenômeno
comunicacional dentro das organizações, analisa o sistema, o funcionamento e o
processo de comunicação entre a organização e seus diversos públicos, e é esta
definição da profª Margarida Krohling Kunsch
10
que norteara nossa pesquisa.
8
Palavra em inglês que define os públicos estratégicos de uma organização.
9
THAYER Lee, Comunicação: fundamentos e sistemas na organização, na administração, nas relações
interpessoais. Trad. Esdras do Nascimento e Sônia Coutinho. Ed. Atlas, São Paulo, 1976, p. 120. In:
KUNSCH, Margarida, Planejamento de Relações Publicas na Comunicação Integrada, São Paulo:
Summus, 2003, p. 149.
10
Ibid.
23
Também consideramos importante abordar os aportes de Katheleen Krone,
Fredric Jablin e Linda Putman
11
,
quem enfatizam a importância do conhecimento do
que e de como as perspectivas em comunicação humana afetam o fenômeno da
comunicação organizacional. Estes autores trabalham as perspectivas: mecânica,
fisiológica, interpretativa-simbólica e de interação de sistemas, que serão importantes
na nossa abordagem do processo comunicacional dentro das organizações.
Gostaríamos de sublinhar que o interesse nesta pesquisa começou quando
conhecemos o Movimento dos Focolares na Bolívia, e ficamos fortemente
impressionados fundamentalmente com o trabalho desenvolvido na área social no
Brasil, que teve como corolário a EdC. Todo esse processo e contexto nos
seduziram para encarar o desafio de estudar esse novo fenômeno social à luz da
comunicação.
A pesquisa começou no ano de 2000 quando apresentamos nosso projeto
de investigação no Mestrado em Comunicação e Desenvolvimento da Universidad
Andina “Simon Bolívar” (La Paz–Bolívia), com o intuito de encontrar novos processos
e paradigmas que norteiem o desenvolvimento social e econômico de paises que
como os nossos sucumbem perante os dogmas e receitas que se produzem em
lugares alheios à nossa realidade latino-americana.
Este projeto é a continuação coerente e lógica dessa primeira pesquisa, e
pretende aprofundar-se numa perspectiva muito mais ampla, colocando o estudo de
caso em profundidade de uma empresa brasileira.
É importante ressaltar que a EdC nasceu como uma inspiração empírica de
sua fundadora, Chiara Lubich, e que por isso representa um desafio duplo, porque
partimos de um fenômeno já existente e encaminhado, e não do resultado de um
processo de reflexão cientifica, e assim a teorização deste fenômeno pode-nos
11
KRONE, Katheleen; JABLIN, Fredric e PUTNAM, Linda, Communication theory and organizational
communication: multiple perspectives. In: JABLIN, F.M et. alli (orgs). Handbook of organizational
communication. in interdisciplinary perspective. Newbury Parky: Sage Publications, 1987, pp.
18-38 (Tradução nossa)
24
resultar pouco amplo perante o grau de importância que tem alcançado a EdC em
diferentes contextos.
Na nossa perspectiva, uma das principais rupturas epistemológicas que esta
investigação oferece é aquela que põe a economia liberal, baseada no “ter”, em
contraposição a um novo paradigma econômico, baseado no “dar”, que neste
contexto se denomina cultura do dar, e como afirmamos numa primeira aproximação,
tem na comunicação organizacional seu principal recurso. É fundamentalmente por
esta apreciação que consideramos importante realizar esta pesquisa.
Caminhos metodológicos percorridos
Devido à peculiaridade da nossa pesquisa utilizamos o método
fenomenológico a partir do estudo de Daniel Augusto Moreira, porém na medida que
nosso trabalho se sustenta no Estudo de Caso, recorreremos à pesquisa que Robert
Yin faz sobre o assunto, como explicitaremos num capítulo posterior.
Para eleger esses dos caminhos nos baseamos na necessidade de
conhecer e estudar o fenômeno e para essa aproximação o Estudo de Caso nos
ofereceu as melhores ferramentas metodológicas.
Nosso ponto de partida foi a formulação do problema de pesquisa,
posteriormente definimos dos objetivos a partir dos quais propusemos a hipótese da
pesquisa e finalmente estabelecemos as formas e relações de comunicação
organizacional como variáveis determinantes do estudo.
1. Formulação do Problema de Pesquisa
Como se desenvolve a comunicação organizacional integrada a partir da
análise das formas e relações de dentro da perspectiva da Economia de Comunhão
tendo como estudo de caso a empresa FEMAQ S.A., de Piracicaba (São Paulo), no
período de 2002-2005?
25
2. Definição dos objetivos:
¾ Objetivos principais
Apresentar as formas e relações de comunicação organizacional integrada
dentro da perspectiva da Economia de Comunhão numa empresa brasileira.
Pesquisar as relações entre a comunicação organizacional integrada e a
Economia de Comunhão tendo como estudo de caso a empresa FUNDIÇÃO E
MAQUINAS S.A. (FEMAQ), de Piracicaba (São Paulo), no período de 2002-2005.
¾ Objetivos específicos
Identificar as formas e as relações de comunicação
organizacional que se desenvolvem dentro de uma empresa de EdC.
Apresentar os princípios constitutivos da EdC e identificar as
características de uma empresa de EdC para entender suas implicações
sociais.
Apresentar os fundamentos do Movimento dos Focolares, para
entender sua importância no contexto da EdC.
3. Hipótese da Pesquisa
As formas e relações da comunicação organizacional integrada nas
empresas de Economia de Comunhão são os alicerces intrínsecos do seu
desenvolvimento integral. Sem a comunicação não existiria a Economia de
Comunhão.
4. Formas e relações de comunicação organizacional como variáveis
determinantes do estudo
26
Para abordar o Objeto de Estudo explicitamos as variáveis propostas nesta
pesquisa em função formas e relações da comunicação organizacional:
Quadro Nº 1
Variáveis conceitual e operacional
VARIÁVEL
DEFINIÇÃO CONCEITUAL DEFINIÇÃO OPERACIONAL
Formas de
Comunicação
Organizacional
Por formas entenderemos às maneiras
ou tipos de comunicação que se dão
dentro da empresa, desde a perspectiva
da Comunicação Organizacional, que
abarca a comunicação interpessoal,
grupal e massiva.
As formas (interpessoal, grupal e
massiva) se baseiam no modelo
comunicacional, proposto por Mario
Kaplún, conhecido como EMI-REC.
Estas três formas de comunicação se
circunscrevem dentro do enfoque da
comunicação organizacional, e assim:
Por comunicação interpessoal,
entenderemos aquela que se dá entre
duas ou mais pessoas fisicamente
próximas com retroalimentação
imediata.
A comunicação grupal tem uma
definição similar à anterior, porém varia
no grau de pertença a determinado
grupo, neste caso seção ou
departamento.
A comunicação massiva, é aquela
relacionada com a utilização dos médios
massivos de comunicação.
Relações de
Comunicação
Organizacional
Por relações entenderemos à maneira
que se dirige a comunicação entre
pessoas de espaços e estratos laborais
similares ou diferentes.
Analisaremos as relações:
Horizontais e
Verticais
Neste sentido, partimos do que Antonio
Pasquali
12
, propõe no que a relação
comunicacional se refere, uma interação
biunívoca, do tipo do com-saber.
As relações que operativamente
analisamos foram:
*Horizontais: aquelas que se
estabelecem entre pares, quer dizer,
entre seções, entre responsáveis de
seção, entre departamentos, entre
funcionários, entre diretores, entre
empresas.
*Verticais (chefes - subordinados):
aquelas que se dão entre os
funcionários a partir do organograma da
empresa, quer dizer de cima até abaixo.
Levando em conta que seja na empresa
em geral como em cada departamento,
existem chefes e subordinados.
12
Pasquali no seu livro Comunicación y cultura de masas (Caracas: Monte Ávila, 1986, p. 49), fala de
uma relação que produz uma inter-ação biunívoca, do tipo do com-saber: “que somente é possível
quando entre os dois pólos da estrutura relacional rege uma lei de bi valência: todo transmissor pode
ser receptor, todo receptor pode ser transmissor”.
No Comprender la comunicación (Caracas: Monte Ávila, 1985, p. 47), manifesta também que: “A
relação de comunicação soberana e por excelência eis o diálogo (...) o verdadeiro diálogo interpares, na
plena liberdade, sem prevaricações ocultas ou evidentes nem argumentos proibidos: entre
interlocutores não programados para respostas padronizadas, dispostos a alcançar dialeticamente
uma verdade superior à de seus respectivos pontos de vista iniciais”.
Tudo isto tem estreita relação com o caráter filosófico - doutrinal da Economia de Comunhão, que se
supõe deve existir nas relações comunicacionais que se desenvolvem nas suas empresas.
27
Apresentamos a continuação o modelo de comunicação EMI-REC, que
consideramos estar presente na comunicação organizacional das empresas de EdC.
Segundo Maria Teresa Watson
13
o modelo de comunicação EMI-REC foi
formulado em primeira instância por Clutier, quem afirma que “todo homem é
‘emirec’, isto é um Emissor-Receptor (E-R) dotado de faculdades para ambas
funções”. Posteriormente Mario Kaplún sinaliza que todos os seres humanos, grupos,
comunidades e setores da sociedade tem direito a participar no processo de
comunicação atuando alternadamente como Emissor e Receptor. O modelo
comunicacional poderia ser expressado pelos ‘emi-rec’ intercambiando mensagens,
como evidenciamos no seguinte quadro.
Quadro Nº 2
Modelo EMI-REC
Fonte: Mario Kaplún em Watson – (Elaboração e tradução nossa)
A fluidez comunicacional, baseada na solidariedade, que podemos apreciar
a partir deste modelo, acreditamos que se encontra presente nas empresas de
Economia de Comunhão. Desde uma primeira aproximação a este tipo de empresas,
pode-se evidenciar que as formas e as relações comunicacionais que existem
pareceriam ser as mesmas que se dão em qualquer outro tipo de empresa porém
elas possuem um conteúdo baseado na solidariedade.
13
WATSON, Maria Teresa, Enfoques conceptuales de la Comunicación y de la Educación, 1986. In:
FUENZALIDA, Valerio, Educación para la comunicación televisiva. Santiago (Chile): Editorial
Universitaria, p. 150
EmiRe
EmiRe
Comunicação
Diálo
g
o
Ênfase no Processo Dialógica
Criatividade altamente estimulada
Criticidade altamente estimulada
Mensagem
28
Descrição dos capítulos da pesquisa
Num primeiro capítulo abordamos a questão teórica da comunicação
organizacional integrada, seus conceitos, suas perspectivas e sua evolução
científica, tendo como base os estudos realizados pela profª Margarida Krohling
Kunsch entre 1997 e 2006.
No segundo capítulo apresentamos o Movimento dos Focolares. A partir do
pensamento e intuição da sua fundadora, Chiara Lubich, surgiu esse Movimento que
alcançou dimensões mundiais em diversas áreas de atuação. Como é a Economia
de Comunhão, caso específico desta pesquisa. Apresentamos de forma descritiva o
que é a EdC como práxis econômica e cultural do carisma do Movimento dos
Focolares.
No terceiro capítulo descrevemos amplamente a Economia de Comunhão.
Surgimento, evolução, alcances. Tentamos expor como esta práxis vem se
desenvolvendo no mundo, sendo aos poucos difundida em diversos foros de
discussão tanto acadêmicos como empresariais.
O estudo de caso em profundidade é apresentado no quarto capítulo. A
empresa escolhida foi a FEMAQ S.A. localizada em Piracicaba (São Paulo), por ser
uma das principais expoentes desse novo tipo de gestão e que incorpora dentro das
suas inovações à comunicação organizacional.
No quinto capitulo apresentamos o quadro metodológico utilizado na nossa
pesquisa, mostrando quais foram as técnicas e instrumentos utilizados para a
obtenção dos dados e a concretização da pesquisa.
No sexto capítulo apresentamos os resultados da nossa pesquisa, onde são
identificadas as formas e relações de comunicação organizacional integrada
presentes na empresa foco do nosso objeto de estudo pesquisa. Neste capítulo
vinculamos diretamente os conceitos teóricos expostos no início com a realidade
presente na Economia de Comunhão.
Finalmente enunciamos nossas conclusões da pesquisa.
29
CAPÍTULO 1
COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL INTEGRADA
Neste capítulo abordaremos como se percebe na atualidade à Comunicação
Organizacional Integrada, procurando resgatar o pensamento dos mais conceituados
pesquisadores sobre o tema. Este capítulo representa o marco teórico da pesquisa
aqui apresentada, navegaremos nos conceitos de comunicação nas organizações,
sua importância no contexto atual, o significado da comunicação organizacional, sua
evolução histórica, assim como as modalidades comunicacionais que na
comunicação organizacional se desenvolvem.
1. A comunicação nas organizações
A comunicação representa um fator relevante em toda e qualquer organização
humana. É por ela que os homens relacionam-se entre si. Representa a interação
humana, realizada através do uso de sinais, de símbolos e do intercâmbio de
vivências.
Sem dúvida a comunicação está na base de todas as relações entre os seres
humanos: entre estados, organizações etc, e constitui o verdadeiro ponto de apoio
de toda atividade pensante. Ela só tem sentido e significado dentro das relações
sociais que a originam, nas quais ela se integra e sobre as quais influência.
A comunicação é um processo natural, ligado a uma arte, a uma tecnologia, a
um sistema e a uma ciência social. Ela pode ser um instrumento de legitimação de
estruturas sociais e governos, como uma força que os contesta e transtorna. A
comunicação ensina, vende, distrai, entusiasma, chega a dar status, constrói mitos,
destrói reputações, faz rir, faz chorar, reduz a solidão etc.
Comunicação é, antes de tudo, interação, diálogo, tornar comum. Não pode
ser confundida com a simples transmissão unilateral de informações. Mas, no
30
ambiente das organizações, a dimensão comunicacional quase sempre está
reduzida a um instrumento de divulgação e controle.
No prólogo do livro organizado por Fernández Collado
15
, Javier Arnau e Horacio
Andrade se perguntam quando é que nasceu a comunicação organizacional, e afirmam
que ela apareceu quando surgiu a primeira organização do mundo. Portanto, o processo
comunicativo é consubstancial a qualquer grupo, organização ou sociedade humana.
Estes autores afirmam que ainda que o termo se cunhou só há algumas
décadas, foi a partir do interesse de um grupo de pesquisadores pelo estudo de maneira
sistemática da forma em que se da a comunicação nas organizações modernas que os
avanços registrados desde então têm sido satisfatórios, ainda que falta muito por fazer.
A comunicação é um fenômeno complexo no qual intervêm uma grande quantidade de
variáveis que se relacionam entre sim, a maioria das vezes de maneira simultânea. Se a
isto se agregam as inumeráveis possibilidades de análises que oferecem a organização
é possível cair em conta do rico, vasto e complexo que é o campo da comunicação
organizacional.
Por outro lado, o conhecimento dos múltiplos fatores que envolvem a
comunicação dentro do contexto organizacional, seria inútil se não tivera como
objetivo melhorar a qualidade e a oportunidade das mensagens que se intercambiam
entre os membros da organização, assim como entre esta e seus públicos externos.
Para a pesquisadora Mariluz Restrepo
16
a comunicação em e das
organizações deve de se entender de uma maneira integral, reconhecendo como ela
atravessa todas as ações de uma empresa ou entidade, configurando de maneira
permanente a construção de sua cultura e identidade, marcando um estilo próprio e,
por isso, suas formas de se projetar ao exterior.
15
ARNAU Javier e ANDRADE Horacio, Prólogo In: FERNÁNDEZ Carlos (coord.) La comunicación en
las organizaciones, 4ta Ed. México: TRILLAS, S.A., 1998. p. 5 (Tradução nossa )
16
RESTREPO Mariluz, Comunicación para la dinámica organizacional In: Revista Signo y
pensamiento Nº 26 (XIV) Universidad Javieriana: Facultad de Comunicación y lenguaje, 1995, p.
92. (Tradução nossa)
31
É cada vez é mais claro como os processos de comunicação contribuem a
desenvolver formas de inter-relação mais participativas e, por tanto mais
comprometidas, para dar maior flexibilidade às organizações como base de sua
permanente transformação, e a facilitar sua interação social de maneira responsável
para conjugar seus interesses com as condições culturais, econômicas e políticas
nas quais se movem e desenvolvem para configurar com maior sentido nossa
sociedade.
Ao destacar a importância da comunicação nas organizações, Kunsch,
afirma
17
:
"Interdependentes, as organizações têm de ser comunicar entre si. O
sistema organizacional se viabiliza graças ao sistema de comunicação nele
existente, que permitirá sua contínua realimentação e sua sobrevivência.
Caso contrário, entrará em um processo de entropia e morte. Daí a
imprescindibilidade da comunicação para uma organização social".
Assim trabalhar esses aspectos se faz indispensável como parte das tarefas
de qualquer organização. Ao acercar-se às organizações desde uma perspectiva
comunicacional se reconhecem novas maneiras de ver o trabalho, as relações
internas e aos diversos processos de interação com seus diversos públicos externos.
1.1. O papel da comunicação no âmbito das organizações
Na tentativa de definir o papel da comunicação no âmbito das organizações,
Annie Bartoli
18
expressa que a organização e a comunicação se encontram
estritamente vinculadas para o funcionamento da empresa que busca resultados.
Afirma também que esse vínculo possui dois componentes: o político (são
médios de uma estratégia global no qual influenciam) e o sociocultural (os valores, as
representações e fenômenos de poder pesam para a organização e a comunicação).
17
KUNSCH, 2003, p. 69.
18
BARTOLI Annie, Comunicación y organización: la organización comunicante y la comunicación
organizada [tradução de Stella Maris Garcia], Barcelona: Ed. Paidós, 1992, p. 159. (Tradução nossa)
32
Agrega que a comunicação implica realizações concretas a definir em função do
objetivo que se tem.
O conceito de comunicação ligado ao de organização de acordo com essa
autora e tal como enfatiza que: "para o funcionamento da empresa que busca
resultados", pressupõe que na comunicação: determinados estímulos geram
determinadas condutas ou respostas. Isto se remarca quando destaca o componente
político do vínculo entre organização e comunicação, e formula a influência desses
na estratégia global da organização.
Tais características ficam plasmadas na anterior asseveração de Bartoli sobre
a idéia de comunicação inclusa na problemática da direção da empresa: uma
comunicação que facilite um controle que permita prevenir o regular comportamentos
disfuncionais.
Já para François Eldin
19
, na sua tentativa de dar conta de um conceito da
comunicação nas organizações, afirma que as intervenções na empresa requerem
de uma comunicação com um ou vários interlocutores internos ou externos. Para ele,
a comunicação está onipresente na empresa. Assim, toda insuficiência nos atos de
comunicação incide sobre a qualidade e o custo do processo de produção e vice-
versa.
É importante, identificar aos atores que estão imersos na organização, que
vão desde a empresa como pessoa jurídica, passando pelos clientes e as distintas
organizações, até chegar aos meios e a opinião pública.
O esquema de comunicação que se reconhece na formulação de Eldin é
unidirecional. Aponta a controlar a eficácia do processo por meio de relações
reguladas. As políticas são propostas pela fonte, os interlocutores cobram
importância com relação ao alcance dos objetivos da fonte.
19
ELDIN François, El Management de la comunicación, De la comunicación personal a la
comunicación empresaria, Buenos Aires: Edicial, 1998, p. 22. (Tradução nossa)
33
Para Eldin, a comunicação está relacionada entre outras coisas com os
mecanismos de controle que asseguram a eficácia da empresa. Um processo de
comunicação que facilita o controle no acionar institucional remite à resposta
esperada e desejada, ao feedback do enfoque funcionalista da comunicação.
Assim a comunicação organizacional serve para uma função crucial de coleta
de dados para os membros da organização ao proporcionar-lhes informação com
sentido. A comunicação humana é também para o autor o veículo primário através
do qual os membros da organização podem ajudar a dirigir as mudanças da mesma,
ao influenciar nas atividades de outros indivíduos dentro da organização.
Esta função incluída na estrutura orgânica é uma área ou departamento para
otimizar os fluxos de comunicação interna ou externa dentro da organização e entre
esta e seu entorno: as pessoas ou grupos com ela.
Esta perspectiva sistêmica, segundo Dionisio Egidos e Lilian Páez
20
, permitiu
ampliar as possibilidades conceptuais para as análises dos fenômenos sociais que
não os considera lineares, senão processais, fatos sem princípio nem fim. A lógica
desta teoria poderia se resumir em: "Todas as partes afetam ao todo; toda ação tem
repercussões na organização".
Quer dizer, a organização é um sistema que opera para lograr um objetivo
comum e necessita da comunicação como subsistema que estabeleça relações, as
organize, ordene, coordene e facilite ações eficientes e eficazes possibilitando à
instituição realizar seus propósitos.
Segundo José Piñuel Raigada
21
:
20
PÁEZ Lilian e EGIDOS Dionisio, Comunicación en instituciones y organizaciones: una aproximación
teórico-analítica a su diversidad conceptual en Revista Latina de Comunicação Social, nº 35,
noviembre de 2000, España (Tenerife): <http://www.infoamerica.org/articulos/p/paez_lilian.htm>
(acesso maio de 2005) (Tradução nossa)
21
PIÑUEL José, Teoría de la comunicación y gestión de las organizaciones, Madrid: Síntesis, 1997
p. 94 (Traducção nossa).
34
"(...) o conceito de comunicação social, aplicado às organizações (...)
denota um sistema peculiar de comunicação no qual o intercâmbio de
expressões entre atores coletivos (como emissores, as organizações e como
receptores seus públicos ou audiências) se submete aos processos de
produção e consumo de um serviço convertido em mercancia profissional.
Este serviço consiste em facilitar (por o intercâmbio de dados codificados e
decodificados pelos atores-agentes sociais) a reprodução de conhecimentos
a propósito do acontecer social e material que compromete à organização.
Tais conhecimentos constituem um universo de objetos de referência frente
ao qual os membros da organização e da coletividade social necessitam
ajustar suas condutas como agentes e como sujeitos com aspirações sociais
e materiais".
Estas conceituações que temos analisado sobre a comunicação nas
organizações, depositam suas práticas comunicacionais no setor privado e mais
especificamente na empresa. Ocupam-se tanto das atividades de comunicação
interna como das de comunicação externa, ainda que com alguns matizes distintivos
quanto à importância de tais âmbitos.
1.2. Funções da comunicação das organizações
Segundo Carlos Fernández Collado
22
, a comunicação tem três funções nas
organizações:
1. Função de produção, indicativa e necessária para estabelecer os papeis
que cada um cumprirá na organização.
2. Função de inovação, a criação de novas idéias ou iniciativas dentro da
organização. Divide-se em:
Inovações da organização mudança de produtos ou serviços.
Inovações na organização mudança de comportamento.
3. Função de manutenção, afeta as funções de produção e inovação. Esta
função está dedicada à socialização da gente. Ocupa-se de recompensar e
motivar as pessoas para integrar as metas individuais e coletivas.
22
FERNÁNDEZ Carlos. Organización, información y comunicación In: Fernández, 1998. p 13.
35
Como manifestamos, a comunicação é consubstancial a qualquer forma de
relação humana e, portanto, também com a organização. Não é só agora é
impossível imaginar uma organização sem comunicação.
Hoje em dia existe uma corrente de estudiosos que defende que a organização é
comunicação e que ela se auto-organiza com a e graças à comunicação.
Conforme James Taylor
23
afirma: “As organizações se auto-organizam e o fazem
como resultado da dinâmica da interação local. A auto-organização é um fenômeno
comunicacional”.
Esta perspectiva vem ao encontro da conjuntura das organizações modernas
que entendem a importância da comunicação e que ao redor dela se auto-organizam
para descobrir-se como mais coesas perante o contexto econômico e social no qual
desenvolvem suas atividades.
2. A comunicação organizacional
A seguir começaremos a nos introduzir no contexto da Comunicação
Organizacional, iniciaremos nosso percurso apresentado à evolução histórica do
conceito desse conceito, suas principais definições a partir de diversas perspectivas.
Os autores aqui utilizados de alguma maneira representam o trabalho desenvolvido
em diferentes partes do planeta.
2.1. Evolução histórica da comunicação organizacional
Ao longo da história existiram, segundo Martínez de Velasco
24
, escolas de
comportamento organizacional, e que no estudo das organizações se podem resumir
23
TAYLOR, James Engaging organization through worldview. In: MAY, S. e MUMBY, D. K. (ED.)
Engaging organizational communication theory and perspectives: multiple perspectives. Thousand
Oaks: Sage, 2005, p. 215.
24
MARTÍNEZ DE VELASCO, Alberto Escuelas de comportamiento organizacional In: FERNÁNDEZ,
1998, pp. 35 - 60
36
em quatro teorias: a teoria clássica, a teoria humanista, a teoria de sistemas e a
teoria das contingências.
Podemos partir com a idéia de que é praticamente impossível compreender o
homem como ser social sem considerar sua inter-relação com as organizações.
Os seres humanos pertenceram a grupos e organizações formais e informais
desde suas origens, de tal forma que seria impossível tratar de separar uns dos
outros. Podemos pensar em uma organização tribal ou em uma família.
Desde o momento em que o homem se une com outros para desenvolver-se e
diferenciar roles, funções ou tarefas em benefício mútuo, falamos de uma
organização.
Desde há vários milênios estava presente o interesse por delimitar e
compreender que tipo de elementos ou características podem ser as mais úteis para
o bom funcionamento das organizações.
Para sua maior compreensão, realizou-se o seguinte quadro:
37
Quadro Nº 3
A comunicação organizacional na história
TEORIA CLÁSSICA
Max Weber, Frederick W.
Taylor, Henri Fayol
TEORIA HUMANISTA
Elton Mayo, Kurt Lewin,
Rensis Likert, Douglas
Mcgregor, Chis Argyris
TEORIA DE SISTEMAS
E. Trist, Daniel Katz E
Robert Kahn
TEORIA DA
CONTINGÊNCIA
Joan Woodward, Tom
Burns y G.M. Stalker,
Paul Lawrence y Jae
Lorsch
* Comunicação muito
formal.
* Preponderância escrita.
* Vertical Descendente.
* Muito regulada.
* Conteúdo básico de
normas e procedimentos.
* Centralização das
decisões.
* Supervisão próxima e
controle.
* Não leva em
consideração as
necessidades dos
empregados.
* Nível organizacional.
* Comunicação formal e
informal
* Oral e escrita
* Horizontal , vertical e
ascendente e vertical
descendente
*Flexível
*Conteúdo básico grupal
(padrões de
necessidades) e interno.
*Alta Descentralização na
tomada de decisões
* Flexibilidade interna
sem considerar
elementos externos
* Alta consideração das
necessidades dos
empregados
* Nível individual, díadas
e grupal
* Comunicação formal e
informal entre sistemas e
subsistemas
* Oral e escrita
* Horizontal e vertical
* Regulação variável
*Conteúdo básico
organizacional interno e
externo
*Descentralização
variável buscando
equilíbrio interno /
externo.
*Importância da
retroalimentação
*Consideração das
necessidades individuais.
*Nível individual,
subsistemas e sistemas
sem ênfases na
informação de entrada e
saída.
* Comunicação básica
formal dentro de e entre
sistemas e subsistemas
*Oral e escrita
* Horizontal e vertical,
interna e externa
*Regulação variável
segundo demandas do
entorno (situacional)
*Conteúdo básico
organizacional e externo
*Descentralização
variável segundo as
demandas do contexto
*Comunicação como
elemento integrador
*Necessidades totais ou
parciais segundo
demanda do contexto
* Nível organizacional ou
parcial, segundo
demanda do contexto.
Resgate
A estruturação e a
definição precisa. E a
comunicação dentro dela
é preponderante mente
formal, oficial e vertical;
com pouca liberdade no
que se refere a questões
fora do estipulado.
Resgate
Os fatores sociológicos e
psicológicos. Considera-
se a resposta ao
descuido da teoria
clássica respeito ao
elemento humano e as
organizações. Existe uma
maior comunicação e
participação do recurso
humano na organização a
todo nível. A
Comunicação
Organizacional é o
elemento central e
definitivo.
Resgate
A abertura ao meio e
interação das partes. A
escola de sistemas
considera relevante para
a compreensão
organizacional. Aspectos
como a apertura ao
médio e a influência do
contexto, não só tendo
uma orientação interna
senão externa. A
comunicação é mais
complexa e complementa
às duas anteriores. Leva
à comunicação aos
planos interiores e
exteriores e toma o papel
fundamental da
retroalimentação para a
homeostase e a
evolução.
Resgate
É o impacto do contexto.
Na comunicação está
dado o impacto que tem o
contexto na organização
e atua como
determinante para as
mudanças
organizacionais.
Fonte: Elaboração própria
38
No intuito de aprofundar a análise do pensamento organizacional nas três
escolas de conduta organizativa apresentamos a comparação da natureza da
comunicação nas organizações nas três escolas de conduta organizativa de Antonio
Lucas Marín
25
.
Quadro Nº 4
Comparação da natureza da comunicação nas organizações
Escola Clássica Escola de Relaciones
Humanas
Escola Sistêmica
Importância
da
comunicação
Relativamente pouco
importante, e bastante
restringida à comunicação
descendente dos diretivos
Relativamente importante.
mas principalmente limitada
à comunicação entre. iguais;
alguma atenção à
comunicação de
necessidades dos
trabalhadores à direção.
Muito importante; a
comunicação está
considerada como o
cimento que mantêm unidas
as unidades numa
organização.
Propósito da
comunicação
Para retransmitir ordens e
informação sobre tarefas
laborais e para lograr
obediência e coordenação
para efetuar esse trabalho.
Para satisfazer as
necessidades dos
trabalhadores, para
conseguir interação lateral
entre iguais em grupos de
trabalho, e para facilitar a
participação dos membros
na toma de decisões
organizacional. Um alto grau
de orientação receptora na
comunicação de parte da
direção.
Para controlar e coordenar,
e para dar informação aos
que tomam as decisões; e
para ajustar a organização
aos câmbios no seu
entorno.
Direção dos
fluxos de
comunicação
Para abaixo (vertical), da
direção aos trabalhadores,
para persuadi-los ou
convencê-los para seguir as
instruções.
Horizontal entre iguais que
pertencem a grupos de
trabalho informais; vertical
entre os trabalhadores e a
direção para ponderar as
necessidades dos
trabalhadores, e para fazer
possível a participação na
tomada de decisões.
Em todas as direções do
sistema, incluindo de abaixo
para cima através dos níveis
hierárquicos, e através dos
limites da organização com
seu entorno.
Principais
problemas de
comunicação
Rupturas, em comunicação
devidas a saltos de nível
hierárquico, e uma extensão
de controle demasiado
ampla.
Rumores, que são
comunicados de maneira
informal; uma estrutura de
comunicação formal
parcialmente ineficaz que é
dessa maneira suprida pela
comunicação informal.
Sobrecarga, distorção e
omissão; irresponsabilidade
para o feedback negativo.
Fonte: Antonio Marín
25
MARÍN Antonio, La comunicación en la empresa y en las organizaciones Barcelona: Bosch
Comunicación, 1997. p. 66
39
Este quadro nos permite esclarecer a análise da evolução histórica da
comunicação organizacional. Vemos que cada escola tem diferentes perspectivas
em relação à comunicação nas organizações.
2.2. Múltiplas perspectivas e definições da comunicação
organizacional
A comunicação organizacional possui diversas definições, mas como afirma
Fredric M. Jablin citado por Maria Del Pozo Lite, é considerada pela maioria dos
pesquisadores, de forma abrangente e de maneira simples, como “um processo que
ocorre, que tem lugar, entre os membros de uma coletividade social”.
26
Já Krone, Jablin e Linda Putman
27
, afirmam que talvez mais do que qualquer
outra área da pesquisa em comunicação, a comunicação organizacional encontra-se
indefesa contra alegações que pesquisadores falham ao articular estruturas teóricas
em relação ao uso de modelos para integrar resultados de pesquisa envolvendo
numerosas variáveis e geralmente desiguais. Além disso, entendidos da área
freqüentemente percebem a essência da comunicação diferentemente de certa
forma.
Esses autores adotam as seguintes perspectivas:
A perspectiva mecânica, que percebe a comunicação organizacional como um
processo no qual as mensagens passam por um canal de um ponto a outro.
Assim, a partir desta perspectiva, a comunicação é mas bem entendida como
um “conduto”, que enfoca (1) o canal do veículo transmissor de mensagens;
(2) um relacionamento linear e casual entre as partes do processo; (3) os
efeitos da fonte no receptor; (4) a natureza concreta e física das mensagens; e
(5) o papel do ruído do “porteiro” ao prevenirem quebras e ao alcançarem
fidelidade de mensagem.
26
LITE Maria Del Pozo, Cultura empresarial y comunicación externa Madrid: Fragua, 1997. p 19
27
KRONE, JABLIN, e PUTNAM, 1987, pp. 22-36
40
A perspectiva psicológica da comunicação organizacional enfoca
específicamente a forma como as características dos indivíduos afetam em
sua comunicação. Sob um ponto de vista psicológico, comunicadores
individuais estão num ambiente informacional que inclui vários estímulos para
o processo. Conseqüentemente, os “filtros conceituais” dos indivíduos tornam-
se o lugar do processo de comunicação a partir do modo que eles atuam num
campo de estímulo potencialmente caótico da estrutura. Concentra-se na
explicação dos ambientes onde se geram as informações, nos quais os
indivíduos estão localizados e a quantidade de estímulos aos quais eles
respondem usando uma variedade de filtros conceituais. Além disso, a
perspectiva psicológica na comunicação difere de alguma forma dos modelos
psicológicos de outros comportamentos nos quais a situação comunicativa
implica num certo grau de propositalidade ou instrumentalidade por parte dos
estímulos comportamentais produzidos pelos comunicadores, e esta
propositalidade é orientada por um outro comunicador.
A perspectiva interpretativa-simbólica é provavelmente a mais humanística
das quatro perspectivas. Esta adota uma visão da comunicação humana que
se assemelha ao interacionismo simbólico nas hipóteses que faz sobre si,
significados compartilhados e comportamento social. O local da comunicação
na perspectiva interpretativa-simbólica é onde se torna o papel e compartilha-
se significados. Esta perspectiva procura explicar a comunicação do ponto de
vista dos membros da organização. Enfoca a tomada de papéis e significados
compartilhados. Além disso, dissolvem as organizações. Os indivíduos
respondem aos outros baseados na tomada de papéis e nos significados
compartilhados para palavras e ações. Estes significados são derivados
simbolicamente da mutualidade de experiência de interpretação e de
negociação das interpretações consensuais de fatos e atividades
organizacionais. A cultura organizacional desenvolve-se e forma atividades
consensuais; esta cultura é o que a organização é mais do que ela tem.
41
Os estudos da perspectiva de interação de sistemas concentram-se nos
comportamentos externos como as unidades fundamentais de análise. Em
contraste com a visão psicológica, o sistema total de comunicação mais do
que os filtros conceituais determina o comportamento organizacional. O local
da comunicação na perspectiva de interação de sistemas é denominado
comportamento seqüencial. Nesta perspectiva, a comunicação é examinada
através de um método qualitativo conhecido como análise de interação que
ocorre em seqüências de atos contíguos ou interage no tempo. O local da
comunicação nesta perspectiva são os modelos de comportamentos
seqüenciais ou da ocorrência de atos e interatos contíguos. Esta perspectiva
enfatiza: (1) tempo; (2) atos comunicativos, interatos e interatos duplos; (3) as
probabilidades com as quais as seqüências de interatos e duplos interatos
ocorrem na interação social e (4) fases ou modelos de interação e ciclos
ocorridos. Em essência, enquanto as perspectivas mecânicas e psicológicas
conceituam a comunicação como algo que uma pessoa faz, a visão de
interação de sistemas a trata como um lado de participação.
Sendo assim, a partir do trabalho de Kunsch
28
vemos que o pensamento
comunicacional dos Estados Unidos, numa perspectiva tradicional, tinha como foco
ver a comunicação organizacional mais no âmbito interno e nos processos
informativos de gestão. Assim, Linda Putnam (uma das autoras supracitadas) e
George Cheney em 1990 identificaram cinco tradições de pesquisa no período de
1960 a 1980: (1) O estudo da comunicação como meio-mensagem; (2) Estudos de
canais de comunicação; (3) Estudos de clima; (4) Análise das redes formal e informal
de comunicação; (5) Comunicação superior-subordinado.
Kunsch afirma então que a partir dos anos 1980 há uma reviravolta nas
pesquisas e começam a ser incorporados os estudos interpretativos que procuram
priorizar outros aspectos, como a ênfase nas práticas cotidianas, nas interações
28
KUNSCH, M. M.. Krohling. Comunicação organizacional: conceitos e dimensões dos estudos e das
práticas In: MARCHIORI,Marlene. Faces da cultura e da comunicação organizacional.o Caetano
do Sul: Difusão Editora, 2006, pp.167-190.
42
sociais, nos processos simbólicos etc. Hoje, segundo essa autora, pode-se dizer que
os estudos são mais abrangentes e contemplam muitos assuntos, como análise de
discurso, tomada de decisão e poder, aprendizagem organizacional, tecnologia.
liderança, identidade organizacional, globalização e organização, entre outros.
Kunsch no seu trabalho, aponta também uma singularidade em todo esse
contexto que pode ser encontrado no Canadá, onde a Escola de Montreal apresenta uma
visão mais ousada da comunicação organizacional. Para essa autora, o pensamento
dessa Escola pode ser considerado uma mescla do pragmatismo norte-americano com o
pensamento francês, tendo como um de seus principais expoentes James Taylor da
Universidade de Montreal, que tem trabalhado a comunicação organizacional numa
perspectiva interpretativa/crítica, vendo a comunicação como organização, em vez da
comunicação nas organizações.
Taylor adota uma perspectiva mais dialética e assume a complexidade da
comunicação nas organizações. As relações ocorrem entre pessoas com diferentes
visões de mundo e estas pessoas, para que haja sucesso da organização, devem ser
capazes de agregar seus accounts (experiências e perspectivas) ao account maior da
organização (uma espécie de razão de ser). A questão da diversidade nas organizações é
bastante abordada por Taylor em sua teoria da co-orientação, na qual ele admite que
cada membro da organização é influenciado por todos os outros, partindo sempre de um
plano simbólico realizado na linguagem e nas narrativas. Esta visão, portanto, deixa de
conceber a comunicação como instrumental ou como um contêiner ou depósito para
viabilizar os fluxos informativos e a vê numa dimensão muito mais humana e de interação
entre os indivíduos dentro das organizações.
O argumento de Taylor é que os processos organizacionais, empiricamente
estabelecidos e auto-organizantes, são explicados comunicacionalmente por uma
propriedade única da linguagem que opera tanto como meio de conversação, quanto
como local de produção de significado individual.
43
A lavor de Taylor e da Escola de Montreal vêm sendo disseminada no Brasil,
pelos trabalhos da Adriana Machado Casali, da Universidade Federal do Paraná
(UFPR).
Ainda destacando o trabalho de Kunsch, o espanhol Joan Costa
29
, um dos
especialistas mais conceituados no assunto da Europa, apresenta uma visão
abrangente da comunicação como estratégia nas organizações, dando importância
às questões de imagem e da identidade corporativa:
“A comunicação se transformou em ‘corporativa’. Não por um capricho da
linguagem ou por querer introduzir mais complexidade no mundo das empresas,
mas pela força das coisas. Daí que as organizações estejam despreparadas diante
de uma nova realidade emergente, que é, ela mesma, produto da complexidade
generalizada e da atuação tecnológica que caracterizam nossa sociedade e nossa
civilização” (Costa, 1995, p. 95).
Para Costa, a comunicação corporativa nasce de uma nova estratégia das
organizações e leva em conta o total da comunicação de marketing, as várias
formas de comunicação organizacional e da comunicação administrativa. Trata-
se de uma abordagem, segundo ele, que especialistas desta área trabalham
para dinamizar suas próprias atividades de comunicação.
Já o holandês Cees B. M van Riel
30
, diretor do Centro de comunicação
Corporativa da Erasmus University, apresenta uma visão da comunicação
corporativa e estratégica com forte ênfase aos estudos de reputação e imagem
corporativa. Ele conceitua a comunicação organizacional como:
“um termo generalizado que engloba as relações públicas, assuntos
públicos, relações com investidores, comunicação com o mercado de
trabalho, propaganda institucional, comunicação com o ambiente e
comunicação interna. Denota um grande grupo de atividades heterogêneas
de comunicação, que só possuem algumas características em comum. A
característica mais importante que todas essas atividades têm em comum
é, sem dúvidas, que todas elas são primordialmente dirigidas aos
chamados públicos-alvo”.
29
COSTA, Joan. Comunicación corporativa y revolución de los servicios. Madrid: Ed. de las
Ciencias Sociales, 1995.
30
RIEL, Cees van B. M. Principles of corporate communication. Hemel Hempstead: Pretince Hall,
1995. p. 12
44
Kunsch também nos apresenta a perspectiva colombiana que contempla uma
visão ampla e social da comunicação nas organizações, entendendo-a como
processos, mensagens e redes e analisando sua gestão por meio da cultura e
identidade organizacional. Enfatiza, também, a comunicação estratégica e
corporativa. Mariluz Restrepo
31
, por exemplo, valoriza muito os aspectos da cultura e
da identidade na dinâmica organizacional. Escreve ela:
“A comunicação em e das organizações deve ser entendida de uma
maneira integral, reconhecida como presente em todas as ações de uma
empresa ou entidade, configurando de maneira permanente a construção
de sua cultura e identidade, marcando um estilo próprio e, por fim, suas
formas de projetar-se ao exterior. Cada vez está mais nítido como os
processos comunicacionais contribuem para desenvolver formas de inter-
relação mais participativas e, portanto, mais comprometidas a dar maior
flexibilidade às organizações como base de sua permanente transformação
e a facilitar sua interação social de maneira responsável para conjugar seus
interesses com as condições culturais, econômicas e políticas em que se
inserem e se desenvolvem, para configurar com maior sentido nossa
sociedade. Trabalhar estes aspectos se faz indispensável como parte das
tarefas de qualquer organização. Ao se abordarem as organizações a partir
de uma perspectiva comunicacional, reconhecem-se novas maneiras de ver
o trabalho, as relações internas e os diversos processos de interação com
seus diversos públicos externo”.
È importante sublinhar como Restrepo aborda o desenvolvimento cultural dentro
das organizações e a importância da comunicação organizacional para facilitar a interação
social dos envolvidos nesses processos.
Para a mexicana Maria Antonieta Rebeil Corella
32
, numa maneira mais
abrangente, a comunicação organizacional é aquela que dentro de um sistema
econômico, político, social ou cultural se da à tarefa de resgatar a contribuição ativa
de todas as pessoas que o integram operativa e tangencialmente e busca abrir
espaços para a discussão dos problemas da empresa ou instituição se esforçando
por lograr soluções coletivas que beneficiam ao sistema e que o fazem mais
produtivo. A comunicação organizacional integrada possui três modalidades
31
RESTREPO, Mariluz. Comunicación para la dinámica organizacional. Revista Signo y
pensamiento. Bogotá: Universidad Javeriana, n. 26 (XIV), 1995, p. 92
32
REBEIL CORELLA, Maria Antonieta. Perfiles de la comunicación en las organizaciones. In: REBEIL
CORELLA, Maria Antonieta, ANDOVAL RESENDIZ, Célia Ruiz (orgs). El poder de la comunicación
en las organizaciones. xico: Valdés Editores / Universidad Iberoamericana, 1998. p. 177.
45
essenciais: a comunicação institucional ou corporativa, a comunicação interna e a
comunicação mercadológica (marketing e publicidade).
E chegamos ao Brasil, onde os estudiosos da comunicação organizacional a
abordam dentro de uma visão ampla e estratégica, considerando-a numa perspectiva
integrada.
Nesse sentido Gaudêncio Torquato é um dos pioneiros dessa concepção.
Kunsch afirma que Torquato arrola sob esse conceito as subáreas da comunicação
social (jornalismo, relações públicas, publicidade, editoração etc.), a assessoria de
imprensa, o jornalismo empresarial, a comunicação interna, a comunicação
institucional, o marketing cultural e social, entre outras, todas elas amplamente
trabalhadas em suas obras.
Já Wilson da Costa Bueno
33
procura conciliar o institucional e o
mercadológico, destacando a função social das empresas. O autor continua
adotando até hoje a terminologia “comunicação empresarial”. Escreve ele:
“A comunicação empresarial afina-se com o processo de gestão
organizacional e tem sido pouco a pouco afetada pelas pressões do
mercado, sobretudo quando ele se orienta por objetivos estritamente
comerciais, relegando a segundo plano o seu caráter institucional.
Felizmente, por uma reação de grupos sociais, as organizações têm sido
pressionadas a exercer, em sua plenitude, sua função social. A indústria da
comunicação também experimenta mudanças drásticas, com o
aprofundamento de sua concentração e a sua dependência de fatores
políticos e econômicos. A comunicação empresarial precisa conciliar estas
duas vertentes, a institucional e a mercadológica, de modo a garantir, ao
mesmo tempo, o reforço da imagem de uma empresa comprometida com a
cidadania e a obtenção de resultados favoráveis”.
Ponto alto na visão de Bueno é colocar em discussão a questão da
responsabilidade social das organizações frente aos embates do mercado,
apresentado assim à cidadania como um exercício fundamental das organizações.
33
BUENO, Wilson da Costa. Comunicação empresarial: teoria e pesquisa. Barueri: Manole, 2003,
pp 31 - 32
46
Finalmente arribamos a conceitualização que Kunsch
34
faz da “comunicação
organizacional integrada”:
“Comunicação organizacional, como objeto de pesquisa, é a disciplina que
estuda como se processa o fenômeno comunicacional dentro das organizações
no âmbito da sociedade global. Ela analisa o sistema, o funcionamento e o
processo de comunicação entre a organização e seus diversos públicos.
“Comunicação organizacional’, “comunicação empresarial” e “comunicação
corporativa” são terminologias usadas indistintamente no Brasil para designar
todo o trabalho de comunicação levado a efeito pelas organizações em geral.
Fenômeno inerente aos agrupamentos de pessoas que integram uma
organização ou a ela se ligam, a comunicação organizacional configura as
diferentes modalidades comunicacionais que permeiam sua atividade.
Compreende, dessa forma, a comunicação institucional, a comunicação
mercadológica, a comunicação interna e a comunicação administrativa”.
Segundo a mesma autora esta concepção procura contemplar uma vio
abrangente da comunicação nas e das organizações, levando em conta todos aqueles
aspectos relacionados com a complexidade do fenômeno comunicacional inerente à
natureza das organizações, bem como os relacionamentos interpessoais, além da
função estratégica e instrumental. Na verdade, o que se defende é a adoção, por parte
das organizações, de uma filosofia da comunicação integrada e a não-fragmentação
dessa comunicação.
Acreditamos termos percorrido as mais importantes conceitualizações sobre a
comunicação organizacional. Como manifestamos logo no início desta pesquisa,
nosso fio condutor será o estudo de Kunsch que vem sendo realizado desde 1980 e
que continua em curso, porque essa autora busca sempre fundamentar e aperfeiçoar os
pontos mais relevantes para construção de uma teoria numa perspectiva do pensamento
comunicacional brasileiro dessa área do conhecimento.
2.3. Características da comunicação organizacional
A comunicação organizacional se propõe a combater o desconhecimento a
respeito da empresa, a falta de informação sobre seus produtos e serviços. Cuida da
integração entre os públicos ligados a ela, a fim de que, internamente, assegure uma
34
Kunsch, 2003, p. 149.
47
boa produtividade e, externamente, consiga aumentar as vendas e,
conseqüentemente, os lucros.
Para a empresa já não é suficiente “saber fazer”, faz falta sobretudo “fazer
saber”, ou seja fazer conhecer a própria capacidade, ressaltá-la frente à
competência, fazendo visível sua qualidade e seu valor. Nesta ótica, a empresa se
comunica para conseguir credibilidade, confiança, fidelidade e transmitir seriedade e
confiabilidade.
Como vimos, tradicionalmente, a comunicação organizacional foi definida
como: aquela que serve para criar, fazer funcionar e manter atuando as
organizações sociais. Por isso, pertencem ao âmbito da comunicação organizacional
todas as atividades comunicativas que utilizam os responsáveis de uma organização
para que ela exista e cumpra seu papel, como afirma Meneleu Almeida
35
.
Os termos comunicação corporativa, comunicação empresarial e comunicação
organizacional que são usados indistintamente para designar o tipo de comunicação
que se desenvolve ao interior das organizações, têm merecido por parte dos
estudiosos várias concepções e uso de diversas terminologias.
Pablo Múnera e Uriel Sánchez
36
, vêem a comunicação corporativa como é a
integração de todas as formas de comunicação de una organização, com o propósito
de fortalecer e fomentar sua identidade assim como melhorar sua imagem
corporativa.
Quer dizer, que envolve todas as formas de apresentação e representação
(simbolismo) de uma empresa: suas ações e seus atos voluntários; os tipos de
comunicação com suas polaridades e matizes, entre os quais se podem enumerar o
estratégico e o tático, o formal e o informal, a comunicação personalizada e a de
35
ALMEIDA Meleneu, Diagnóstico Preliminar do Sistema de Comunicação de uma Grande
Instituição Brasileira de Crédito, UNB, Brasília, 1981, p. 82.
36
MÚNERA Pablo e SÁNCHEZ Uriel, Comunicación empresarial: una mirada corporativa. Medellín:
AICE, 2003, p. 107.(Tradução nossa)
48
difusão, a massiva e a seletiva, a instantânea e a diferida, a direta e a indireta, a
unidirecional e a bidirecional, em fim todas as manifestações comunicacionais que
possam existir dentro da empresa.
Já Costa Bueno
37
refere-se a Comunicação Empresarial com as seguintes
conceituações:
“A Comunicação Empresarial encerra, agora, um conjunto de novos
atributos que a tipificam como insumo estratégico. Fundamentalmente,
caminha para assumir, por inteiro, a perspectiva da chamada comunicação
integrada, com uma articulação estreita entre os vários departamentos/áreas
e profissionais que exercem atividades de comunicação nas empresas ou
entidades. Com isso, as vertentes institucional e mercadológica deixam de
ser percebidas como distintas porque estão umbilicalmente associadas ao
negócio, à visão e à missão da organização”.
A abordagem defendida por Margarida Krohling Kunsch
38
é a comunicação
organizacional integrada. Esta compreende a comunicação institucional, a
comunicação mercadológica, a comunicação interna e a comunicação administrativa,
conforme diagrama demonstrativo seguinte.
3. Comunicação organizacional integrada
Segundo essa autora, a comunicação organizacional integrada é uma filosofia
que direciona a convergência das diversas áreas, permitindo uma atuação sinérgica.
37
BUENO, Wilson da Costa, Comunicación empresarial. Teoria e pesquisa, Barueri: Manole, 2003,
p.8.
38
KUNSCH, 2003, pp. 149-165.
49
Comunicação Organizacional Integrada
Gráfico N° 1
Fonte: Margarida Kunsch
Este desenho é defendido pela autora que nós apresenta as três grandes
áreas da comunicação organizacional integrada que são: as Relações Públicas
(comunicação institucional), a Comunicação Interna (comunicação administrativa) e o
Marketing (comunicação mercadológica). Essas são as formas de comunicação que
permitem a uma organização se relacionar com seu universo de públicos e com a
sociedade em geral. Sendo assim, não se devem mais isolar essas modalidades
comunicacionais. Resulta necessário que exista uma ação conjugada das atividades
de comunicação que formam o composto da comunicação organizacional.
50
Essas modalidades comunicacionais podem ser entendidas como uma forma
de descrever o desenvolvimento da comunicação organizacional na prática cotidiana
de uma organização se relacionar com os seus públicos estratégicos.
A continuação vamos a definir cada uma das partes desta perspectiva de
comunicação organizacional.
3.1. Comunicação administrativa
A comunicação administrativa é aquela que se preocupa pelo processo de
comunicação que envolve a administração da organização, é aquela que se ocupa
da questão empreendedora e burocrática da organização.
Segundo Kunsch
39
, a comunicação administrativa é aquela que se processa
dentro da organização, no âmbito das funções administrativas; é a que permite
viabilizar todo o sistema organizacional, por meio de uma confluência de fluxos e
redes.
“Administrar uma organização consiste em planejar, coordenar, dirigir e
controlar seus recursos, de maneira que se obtenham alta produtividade,
baixo custo e o maior lucro ou resultado, por meio da aplicação de um
conjunto de métodos e técnicas. Isso pressupõe um contínuo processo de
comunicação para alcançar tais objetivos. E o que organiza o fluxo de
informações, que permitirão à organização sobreviver, progredir e manter-se
dentro da concepção de sistema aberto”.
Este tipo de comunicação geralmente é executada pelo setor administrativo,
mas que atinge todos os relacionamentos dentro e fora da organização.
39
Ibidem.
51
3.1.1. Comunicação interna
Para começar a desenhar o mapa de conhecimentos teóricos que dão origem
à comunicação interna, começamos com o pensamento Ricardo Sotillo
40
quem
afirma que para conhecer os primórdios da comunicação interna podemos nos
remontar brevemente até Atenas, século V a.C., onde as decisões de caráter político
eram tomadas em Assembléia, que compunha a cidadania livre, na qual se intervêm
e se debate de maneira similar à que tinha sido adotado nos Parlamentos da
democracia atual.
Também nos litígios e causas judiciais a decisão era tomada por um amplo
número de cidadãos que formavam o júri. Em ambos cenários, além de caracterizar-
se por uma prática ausência de políticos e juízes profissionais, a influência exercida
nas pessoas dependiam em grande parte da capacidade de convicção dos
proponentes, o que se fazia especialmente importante conhecer e empregar
determinadas técnicas comunicacionais para poder influenciar em importantes
decisões da vida pública do dia-a-dia da Grécia Clássica.
Situados agora no mundo empresarial moderno, podemos afirmar que a
comunicação interna é inseparável da própria atividade produtiva de qualquer
organização.
Não havia passado ainda a segunda metade do século XX quando as
organizações começam a entender que essa transmissão de instruções
(comunicação descendente) não era suficiente e se começa a analisar um novo
campo de trabalho, entre os que se acrescenta a comunicação ao repertório de
habilidades diretivas.
Neste ponto percebemos que alguns autores começaram a definir à
comunicação interna simplesmente como um conjunto de atividades efetuadas por
40
SOTILLO, Ricardo Comunicación interna, ¿para qué?. Ser Humano y trabajo. Disponível em:
<http://www.sht.com.ar/archivo/temas/interna.htm#Autor>. Acesso em: 17 de jul. 2005. (Tradução
nossa)
52
qualquer organização para a criação e manutenção das boas relações com e entre
seus membros, para isso as organizações utilizavam diferentes meios de
comunicação que tinham o objetivo de informar, integrar e motivar aos membros da
organização, e assim esse contribuíam com seu trabalho para o alcance dos
objetivos organizacionais.
Este aproximação foi amplamente superada pelos estudos de comunicação
interna, dentre esses podemos mencionar o trabalho de Marlene Marchiori
41
, quem
entende que:
“a comunicação interna planejada e avaliada é uma ferramenta estratégica
que estimula o diálogo entre lideranças e funcionários. Oportuniza a troca
de informações via comunicação, contribuindo para a construção do
conhecimento, o qual é expresso nas atualidades das pessoas. É
fundamentalmente um processo que engloba a comunicação administrativa,
fluxos, barreiras, veículos, redes formais e informais. Promove, portanto, a
interação social e fomenta a credibilidade, agindo no sentido de manter viva
a identidade de uma organização”.
Assim sendo, este conceito passa a visualizar a comunicação interna de uma
forma global, que envolve a própria comunicação administrativa. Dessa maneira, a
comunicação interna é, sem sombra de dúvida, a vertente que constrói a identidade
organizacional e engloba, portanto, todas as demais posturas internas da empresa:
processo comunicativo entre as pessoas e grupos com suas barreiras e ruídos, a
comunicação administrativa, fluxos informativos, redes formais e informais, canais de
comunicação.
Este conceito de Marchiori é fruto de um pensamento mais abrangente da
comunicação interna, que ultrapassa a toda a organização.
Nessa mesma lógica para Kunsch
42
a comunicação interna:
“(...) seria um setor planejado, com objetivos bem definidos, para viabilizar
toda a interação possível entre a organização e seus empregados, usando
41
MARCHIORI, Marlene Comunicação interna: a organização como um sistema de significados
compartilhados In: Faces da cultura e da comunicação organizacional , Marchiori Marlene (org), São
Caetano do Sul (SP): Difusão, 2006 pp. 207 – 220.
42
KUNSCH, 2003, p. 154
53
ferramentas da comunicação institucional e até da comunicação
mercadológica (para o caso do endomarketing ou marketing interno).
Portanto, a comunicação interna corre paralelamente com a circulação
normal da comunicação que perpassa todos os setores de organização,
permitindo seu pleno funcionamento (...) Evidentemente, na medida em que
ela se desenvolve no conjunto de uma comunicação integrada, com políticas
globais estabelecidas, estratégias delineadas e programas de ação voltados
prioritariamente para todo o pessoal interno, tenderá a ser muito mais
eficiente e eficaz. Será pensada, planejada e avaliada de forma constante,
não ocorrendo simplesmente de forma fortuita”.
Desde a nossa perspectiva apresentamos esta nova comunicação interna
como uma estratégia fundamental na organização. Ampliar o horizonte da
comunicação interna à dimensão do conhecimento compartilhado e das relações
humanas, constitui uma abertura e, sobretudo, uma resposta à demanda e às
necessidades que têm as novas organizações e pessoas que as constroem.
A integração de elementos de comunicação interna na atividade de trabalho
cotidiana, unida a uma aposta firme desde os mais altos níveis da Direção, são
premissas básicas que se complementam com um suporte tecnológico adequado e
proporcional a nossos objetivos, junto a uma preparação do entorno social onde se
irá desenvolver.
É importante enfrentar de modo adequado às transformações ambientais, as
novas necessidades dos indivíduos, a globalização dos mercados, as diferentes
dinâmicas dos negócios. Mas para a plena eficiência de uma empresa, faz falta na
realidade, um contínuo esforço pela flexibilidade, a prontidão em responder às
variações do mercado, a atenção em personalizar objetos, produtos e serviços para
satisfazer o mais possível ao consumidor.
Nesse sentido Giovanni Quaglino
43
, afirma que a:
“Implicação e participação se fizeram sinônimos de qualidade e êxito da
empresa e nesta ótica, a comunicação se converte em expressão da
possibilidade de criar relações, compartilhar empenhos e riscos, trabalhar
juntos para alcançar objetivos e soluções”.
43
QUAGLINO Gian Pietro Azienda e comunicazione interna, Rapporto di ricerca, Roma: ASCAI, 1992
In: RIZZOLO Elena, Informazione e comunicazione d’impresa nel progetto di Economia di
Comunione. Università degli Studi di Torino. Facoltà di Economia, 2000. p. 64. (Tradução nossa)
54
As empresas buscam, portanto, pôr-se em dia e utilizar em tempo completo os
vários meios que a tecnologia oferece e que procura melhorar sua performance
44
no
panorama organizacional.
Agora, se está desenvolvendo um novo interesse entre os trabalhadores das
organizações que se refere a tomar consciência de que só a partir de uma
harmoniosa relação dentro do ambiente organizacional se torna possível transmitir
ao exterior uma imagem que seja capaz de reforçar e incrementar ações exitosas.
A vantagem competitiva atual depende, cada vez mais das capacidades do
fator humano; as decisões da direção que alcançam maior êxito são as que
consideram o homem como protagonista da organização e, por outro lado, as
mudanças organizacionais o demonstram, tornando-se cada vez menos passiva e
mais comunicativa a presença do indivíduo no contexto empresarial. Cada
trabalhador, de fato, enquanto ser humano, necessita sentir-se apreciado, estimado
e, em certo sentido indispensável para a empresa.
Somente desta maneira, o indivíduo dá realmente o melhor de si e seu
rendimento é ótimo. Isto tudo porque ele já não trabalha exclusivamente por seu
salário, mas porque crê na empresa e na importante contribuição que ele pode dar
para seu melhor funcionamento.
O clima empresarial se transforma e se enriquece de valores humanos como
os de integração, reciprocidade, respeito, confiança, colaboração, entre todos os
seus membros, muito além da posição que cada um ocupa.
Tudo isto se evidencia, portanto, positivamente no trabalho desenvolvido: o
sentido de responsabilidade de cada um aumenta, em toda a empresa, e o que é
produzido, e portanto transmitido ao exterior, adquire maior qualidade e
competitividade.
44
DI RACO A. e SANTORO G. M., Il manuale di comunicazione interna, Milan: Guerini, 1996 apud
RIZZOLO, 2000, p. 64 (Tradução nossa)
55
Tais considerações confirmam a vital importância, para uma empresa, de
contar com um eficiente sistema de comunicação interna: este pode ser, de fato, o
ponto de partida para consolidar-se externamente como uma empresa estável,
completa, funcional, forte, enquanto se vê constituída não só por sujeitos individuais,
mas por um corpo que atua pelo bem de todos.
3.2. Comunicação mercadológica
Entramos a seguir num outro composto do mix da Comunicação nas
Organizações, que sem sombra de dúvida, nas relações organizacionais
contemporâneas é um dos mais relevantes devido à importância que na atualidade o
marketing e as relações mercadológicas possuem.
Para Kunsch
45
, esta comunicação é responsável por toda a produção
comunicativa em torno dos objetivos mercadológicos, visando a divulgação
publicitária dos produtos ou serviços de uma empresa. Encontra-se vinculada
diretamente ao marketing de negócios.
A área de marketing deve estabelecer os parâmetros e fornecer os
subsídios necessários para toda a criação e organização da comunicação
mercadológica. A propaganda, a promoção de vendas e todas as outras
ferramentas que compõem o mix da comunicação de marketing têm de ser
abastecidas com informações colhidas com pesquisas de mercado e do
produto, que normalmente estão a cargo do departamento ou setor de
marketing das organizações.
Logo a autora afirma que assim como as relações públicas devem gerenciar a
comunicação institucional, fazendo todas as articulações necessárias com as outras
subáreas afins, o marketing tem a seu cargo a coordenação e a direção da
comunicação mercadológica. E, no desenvolvimento do seu processo, deve definir a
utilização de todo o mix de comunicação que o compõe e convém em cada caso.
Devido à relevância que o marketing alcançou nos últimos tempos, é quase
impossível não pensar nas organizações sem pensar no composto mercadológico.
45
KUNSCH, 2003, p. 154
56
Dia após dia a consolidação da percepção nas organizações em função do mercado
e como atingi-lo se faz mais evidente, e tudo é perpassado pela comunicação.
Nesse sentido Gaudêncio Torquato
46
aponta que:
A comunicação mercadológica objetiva promover a troca de produtos e/ou
serviços entre produtor e consumidor, [procurando] atender aos objetivos
traçados pelo plano de marketing das organizações, cujo escopo
fundamentalmente se orienta para a venda de mercadorias destinadas aos
consumidores, num determinado espaço de tempo: apóia-se a publicidade
comercial, na promoção de vendas e pode, também, utilizar-se,
indiretamente, das clássicas atividades da comunicação institucional.
Vemos então que este tipo de comunicação se centra parte mercadológica do
processo comunicacional ao interno das organizações.
Neste contexto Mitsuru Higuchi Yanaze aborda o conceito do Marketing, a
partir da Teoria dos Sistemas, por meio dos conceitos de: Inputs, Throughputs e
Outputs.
Yanaze trabalha o conceito do “mix” de Marketing a partir de uma definição
mas atualizada e abrangente dos “4 P’s” que foram apresentados por Jerome
McCarthy no início da década de 1960: Product (Produto), Price (Preço), Place
(Lugar ou Ponto de Venda) e Promotion (Promoção), para caracterizar o "mix" de
Marketing. Ou seja, os 4 Ps foram introduzidos como quatro variáveis básicas que
comporiam a estratégia de mercado de uma empresa.
Assim, todas as organizações, sejam elas constituídas com ou sem fins
lucrativos, têm nos 4 P’s sua base de interação com o mercado. As adequações de
Produto/Serviço, de Preço/Remuneração, dos Pontos de Venda/Distribuição e da
Promoção/Propaganda às demandas e expectativas do mercado e seus segmentos
são preocupações fundamentais de qualquer organização.
46
TORQUATO, Gaudêncio Estratégias de comunicação nas empresas modernas. In: III
CONGRESSO BRASILEIRO DE COMUNICAÇÃO EMPRESARIAL. São Paulo: Aberje, 1985. Mimeo.
apud KUNSCH, 2003, p. 163.
57
Yanaze passa a definir os 4 P’s como: Produto, Preço, Distribuição e
Comunicação.
(...) Essa adaptação decorreu dos processos de transformação do campo
sociocultural em mercado, particularmente a partir dos anos 80, com a
proposição neoliberal de Reagan e Thatcher, que levou à um recuo das
polêmicas culturais e políticas a favor dos determinantes econômicos, com
a conseqüente deriva e esvaziamento das questões ideológicas e divisões
partidárias direita/esquerda.(...)
47
A competitividade econômica e a aplicação do modelo neoliberal de mercado
cresceram, cuja atuação diluiu limites e fronteiras nacionais o qual chamamos de
globalização, absorveram os conflitos dos anos de 1960 e 1970. Se estes fatores
geraram o desenvolvimento da gestão empresarial, em contrapartida, abriu espaços
para o uso inadequado da expressão Marketing.
No diagrama a seguir vemos claramente como se articulam estes conceitos.
De maneira bem geral, podemos dizer que tudo aquilo que “entra” dentro da
organização são os inputs, logo temos aquilo que se “processa” que são
“throughputs” para finalmente termos os “outputs” que são os componentes do
composto de marketing.
Gráfico N° 2
Inputs, Throughputs e Outputs
Fonte: Mitsuru Yanaze
47
YANAZE,Mitsuru Higuchi. Esqueça o Marketing, Revista Acadêmica de Pós-Graduação da
Faculdade de comunicação social Cásper Libero. Ano III – nº 5 Comunicação & Pós-Modernidade.
Fundação Casper Libero págs. 88 a 93
58
Para este autor, os inputs compreendem todos os elementos que são
incorporados à organização para viabilizar suas operações. Já os Throughputs,
indicam a maneira como esses elementos são trabalhados internamente pela
organização. Finalmente os Outputs são os resultados obtidos dos processos
anteriores.
Não é difícil perceber no fluxograma acima, que quaisquer problemas que
ocorram nos inputs ou nos throughputs acabam influenciando um ou mais elementos
dos outputs, o que, segundo Yanaze, nos leva a uma conclusão importante: torna-se
claro que a atribuição de produzir outputs adequados é de toda a organização. Assim
entende-se que Marketing, longe de ser uma atividade do departamento de
marketing da empresa, é uma responsabilidade que envolve a todos os que
compõem a organização.
Percebemos que com todos setores dos Inputs e Throughputs integrados na
comunicação interna, é possível obter uma maior participação de todos na busca da
melhoria de seus produtos ou serviços que venham a fazer, ou até solucionar
problemas antes mesmo de se necessitar utilizar uma estratégia de Marketing,
otimizando tempo e dinheiro.
Os Inputs englobam, os recursos humanos da organização, assim como os
recursos financeiros, recursos materiais, informações e tecnologia, são
indispensáveis para o bom desempenho e até existência de uma empresa.
Para integrar a todos os membros da organização é que se utiliza a
comunicação interna, através dela é possível solucionar qualquer problema
detectado no planejamento.
Os Throughputs por sua vez, englobam o processo de produção, os sistemas
administrativos, política da empresa, cultura e logística, fazem parte da comunicação
integrada, para que juntamente com os Inputs, se otimizem ações e estratégias de
Marketing, em busca da solução dos problemas.
59
Esta “Teoria dos 3 Puts”: Inputs, Throughputs e Outputs, de acordo com
Yanaze
48
, tem por objetivo administrar o equilíbrio das potenciais, necessidades e
expectativas de uma organização.
Podemos resumir os três Puts da seguinte forma:
Inputs: Todos os recursos críticos da organização antes da produção, como
recursos humanos, equipamento, materiais, instalações, stakeholders chave.
Throughputs: Os métodos e mecanismos utilizados pela organização para
cumprir sua missão.
Outputs: Os efeitos diretos imediatos para a população, a partir do mix de
marketing, que é o resultado de aplicar suas atividades no mercado.
Esta teoria está baseada na abordagem sistêmica de uma organização, isto é,
com ênfase nos seus processos, apoiada por um conjunto de ferramentas e
metodologias de gestão organizacional. É uma via sustentada para o sucesso de
qualquer organização.
Dessa forma, para José Vara
49
a organização deve ser vista como um
conjunto de ou processos que trabalham coordenadamente como um único sistema
global, para atingir os objetivos do negócio.
Assim para a organização repousa sobre vários pressupostos:
As organizações criam e fornecem um produto, bem ou serviço (output), ao
sistema destinatário (mercado);
48
YANAZE, Mitsuru, Gestão de Marketing e Comunicação - Avanços e Aplicações, São Paulo:
Saraiva, 2006.
49
VARA, José. A abordagem sistémica na gestão da qualidade Revista "Qualidade", Nº 3 - Outono
2001, Associação Portuguesa para a Qualidade (APQ), In: Revista “Qualidade em Saúde”, Lisboa:
Instituto de Qualidade em Saúde, 2001. pp.36- 37.
60
As organizações funcionam como sistema processador, convertendo
inputs (encomendas, tecnologia, matérias-primas, capital, recursos
humanos) em outputs desejados pelo mercado;
As funções, departamentos ou serviços são subsistemas, cuja única razão
de ser é de contribuir para o processo base da organização, ou seja:
transformar inputs em outputs para o mercado;
As organizações são sistemas abertos e adaptativos, isto é: ou se adaptam
ao feedback do mercado, ou cessam de existir;
As organizações fazem parte de um sistema mais amplo que compreende,
entre outros, os fornecedores, concorrentes, sistema público e social,
valores culturais e a economia.
A Teoria dos 3 Puts de Yanaze vem de encontro à proposta de comunicação
organizacional apresentada nesta pesquisa. Esta teoria é sem dúvida alguma
revolucionaria enquanto à abrangência que propõe, porque nos permite apreciar que
todos os processos que se desenvolvem ao interno da organização são perpassados
pela perspectiva desta teoria.
3.3 Comunicação institucional
A seguir abordaremos a relação existente entre a comunicação organizacional
e as relações públicas, que têm na comunicação institucional seu principal fio
condutor. Uma das características mais importantes desta relação é aquela de
apresentar à organização perante a sociedade em geral. A construção desta imagem
pública se faz a partir de outras ferramentas que dão visibilidade à organização.
Para Margarida K. Kunsch
50
a comunicação institucional é a responsável, por
meio da gestão estratégica das relações públicas, pela construção de uma imagem e
identidade corporativas fortes e positivas de uma organização.
50
KUNSCH, 2003, p. 164.
61
Está intrinsecamente ligada aos aspectos corporativos institucionais que
explicitam o lado público das organizações, constrói uma personalidade creditiva
organizacional e tem como proposta básica a influência político-social na sociedade
onde está inserta.
Segundo Abílio da Fonseca
51
, a designa "como conjunto que é de
procedimentos destinados a difundir informações de interesse público sobre as
filosofias, as políticas, as práticas e os objetivos das organizações, de modo a tornar
compreensíveis essas propostas"
3.4. A comunicação interpessoal nas organizações
A comunicação interpessoal é fundamental nas organizações enquanto a
maior parte dos fluxos interativos se realizam baixo estes termos, assim, conhecer
seus elementos, dimensões e objetivos se convertem também em peça chave para a
eficácia e logro dos objetivos da organização.
Segundo Salvador Sánchez
52
, as organizações dependem da comunicação
para coordenar as atividades dos seus membros, sobre tudo quando o entorno
cambia imprevisivelmente. Os comentários que se escutam com freqüência nas
empresas sobre os “problemas de comunicação” são prova da sua preponderância
na vida trabalhista. Senão fosse importante coordenar as atividades, a comunicação
seria relegada a uma posição muito mais periférica na operacionalização das
organizações.
A comunicação interpessoal: “é também um ingrediente principal nas poucas
relações chave que determinam, em grande medida, nossas percepções sobre a
qualidade de nossas vidas
53
”.
51
FONSECA, Abílio da Comunicação institucional: contributo das relações públicas Maia/Portugal:
Instituto Superior de Maia, 1999. p. 140. apud KUNSCH, 2003, p. 163.
52
SÁNCHEZ, Salvador, La comunicación interpersonal en las organizaciones In: FERNÁNDEZ
(org), 1998. p. 61 (Tradução nossa)
53
Ibid p. 62.
62
Devemos destacar que quando falamos de comunicação organizacional,
sempre temos que primeiramente pensar em comunicação humana e como
explicitamos antes, é na comunicação interpessoal que se apresentam às múltiplas
perspectivas que permeiam o ato comunicativo no interior das organizações.
Assim, desde a visão de Kunsch, quando analisamos para analisarmos a
comunicação organizacional em primeiro lugar temos que pensar na comunicação
entre as pessoas e que os seres humanos não vivem sem se comunicar.
Gary Kreps
54
, ao defender a comunicação como um processo de organização,
enfatiza a importância da comunicação humana nas relações das pessoas no
ambiente organizacional, afirma:
“A comunicação é um processo dinâmico e contínuo. É o processo que
permite aos membros da organização trabalhar juntos, cooperar e
interpretar as necessidades e as atividades sempre mutantes da
organização. A comunicação humana não começa e nem termina As
pessoas estão envolvidas constantemente com a comunicação consigo
mesmas e com outras, especialmente na vida da organização. A vida da
organização proporciona um sistema de mensagens especialmente rico e
variado. Os membros da organização devem ser capazes de reconhecer e
interpretar a grande variedade de mensagens disponíveis, para que lhes
permitam responder de maneira apropriada a distintas pessoas e situações.
Não pode existir sem comunicar-se. A comunicação é uma realidade
inevitável de pertinência a uma organização e da vida da em geral”.
Sendo assim quando tratamos de comunicação e organizações e/ou de
comunicação organizacional, não podemos dissociar este agrupamento de pessoas
com o verdadeiro sentido da comunicação humana, que pressupõe compreensão e
colocação de idéias em comum.
3.4.1. Definição de comunicação interpessoal
Sánchez Gutierrez evidencia que se referir à comunicação interpessoal nos
formula um problema de delimitação. Se interpretarmos o conceito no sentido literal,
54
KREEPS, Gary L. La comunicación en las organizaciones. 2a. ed. Buenos Aires: Addison-Wesley
Iberoamericana, 1995. p. 28
63
trata-se da comunicação entre pessoas; porém, isto resulta ambíguo. Blake e
Haroldsen a definem como a interação “que tem lugar em forma direta entre duas ou
mais pessoas fisicamente próximas, e na que podem se utilizar os cinco sentidos,
com retroalimentação imediata
55
”.
Em outras palavras, quando falamos de comunicação interpessoal, falamos da
comunicação face a face. Fazer uma ligação telefônica ou manter uma relação por
correspondência também são formas de comunicação interpessoal, mas quase
sempre tem como prelúdio, conseqüência ou objetivo final a relação face a face.
O autor menciona as principais características deste tipo de atividade
comunicativa
56
:
1. O contato prévio permite “entrar em sintonia”, ou seja, iniciar o
intercâmbio de mensagens em volta a um ponto focal de atenção
compartilhado (uma temática em comum).
2. Todas as pessoas que intervirem na comunicação interpessoal são, de
Como condição inicial se precisa de um contato prévio entre duas ou
mais pessoas fisicamente próximas. O resultado desse contato é a
entrada de cada um dos envolvidos no marco perceptual dos outros.
3. Não há um número preestabelecido de participantes, além do qual a
interação deixe de ser interpessoal, mas se precisa pelo menos de duas
pessoas.
4. Uma ou outra maneira, participantes ativos. Trata-se, assim, de uma
relação de reciprocidade na qual os interlocutores assumem diferentes
funções.
5. A interação se leva a efeito mediante um intercâmbio de mensagens, no
qual cada participante oferece aos demais um conjunto de sinais para
55
Ibid p. 63.
56
Segundo o esquema proposto por Dean C. Barnlund em Interpersonal Communication, Survee and
Studies, citado por Blake e Haroldsen. op. cit., pp. 30 e 31; e Huseman, Lahíff e Hatfíeld,
Interpersonal Communication in Organizations, p. 5.In: FERNÁNDEZ (org), 1998, p. 63.
(Tradução nossa)
64
serem interpretadas.
6. Ao se tratar de uma interação face a face os participantes podem recorrer
a todos seus sentidos, por tanto, é necessário que estejam o
suficientemente próximos para conversar; a modalidade, o estilo e os
matizes pessoais de cada um serão percebidos pelos demais.
7. Aparentemente, o contexto interpessoal está pouco estruturado, pelo
qual pode-se pensar que a freqüência, a forma ou o conteúdo das
mensagens se regem por poucas regras, mas não é sempre assim.
De acordo com o anterior, segundo Sánchez
57
, pode-se dizer que a
comunicação interpessoal é “uma interação de natureza conversacional que implica
o intercâmbio de informação verbal e não verbal entre duas ou mais participantes,
em um contexto face a face”.
Até aqui se tratou de definir a comunicação interpessoal desde a perspectiva
situacional, quer dizer, ponderando unicamente critérios de situação.
Em relação à perspectiva do desenvolvimento, as relações entre as pessoas
se concebem em um contínuo que vai do impessoal ao interpessoal. Neste contexto
a comunicação interpessoal também pode ser compreendida como uma atividade
que elabora predições, ou seja, que os participantes inferem os resultados prováveis
de suas estratégias de interação, com base nos dados disponíveis sobre os demais.
As predições se fundamentam em três tipos de informação, cultural
(características atribuídos às pessoas com base em estereótipos de raça,
nacionalidade, classe social etc.), sociológica (baseada nos grupos de membros e de
referência) e psicológica (as características que distinguem a uns indivíduos de
outros).
57
Ibid. p. 64
65
Seguindo com a posição de Sánchez
58
, a informação disponível permite a
orientação em um de três níveis de conhecimento dos interlocutores:
1. Conhecimento descritivo: características físicas exteriores.
2. Conhecimento preditivo: sobre os valores, crenças, e modos de
comportar-se.
3. Conhecimento explicativo: razões de comportamento dos demais.
Vemos que os níveis de conhecimento são fases sucessivas e acumulativas
no processo de uma relação interpessoal. Partindo da perspectiva de
desenvolvimento, pode afirmar-se que as relações de trabalho, sobretudo nas
grandes organizações, parecem orientar-se entre os planos descritivos e preditivos.
O que significaria que normalmente não se estabelece uma verdadeira comunicação
interpessoal com quem nos rodeiam.
Para Sánchez
59
, existem algumas metas ou busca de objetivos para a
comunicação interpessoal :
1. Prazer, buscar a companhia de outras pessoas para satisfazer-nos.
2. Catarses, processo libertador de tensões mediante a expressão verbal
e a manifestação de sentimentos.
3. Resposta manifesta, com a provocação de resposta observável por
parte do receptor.
4. Resposta encoberta, é mais sutil.
Dentro da comunicação interpessoal a partir do Maria Schuler
60
percebemos
a importância do canal de comunicação que for escolhido porque pode determinar
as condições ambientais nas quais ocorrerá o contato entre emissor e receptor. Ela
cita um exemplo para explicar essa questão:
58
Ibid. p. 65
59
Ibid. FERNÁNDEZ, 1998, p. 66
60
SCHULER Maria (coord) Comunicação Estratégica São Paulo: Atlas, 2004 pp. 80 – 81.
66
“Quando escolhemos um outdoor para levar uma mensagem a nossos
receptores, sabemos de antemão que o receptor fará contato com a
mensagem num ambiente cheio de movimento e informação (o movimento
da rua), com um fundo confuso e poluído (paisagem de prédios, fios,
copas de árvores) e muito rapidamente, pois estará frente à placa por
apenas alguns segundos, de passagem para outro lugar. É importante
saber isso, para poder-se projetar uma comunicação atrativa, capaz de
competir pela atenção do receptor com tudo o que a circunda, além de
capaz de deixar no receptor uma informação mínima, básica, mesmo que
este olhe para a placa somente de passagem, sem nela se ater mais de
um segundo”.
A autora ainda afirma que a disposição dos protagonistas, um em relação
ao outro, é seguidamente sujeita a diferentes interpretações e pode apresentar
efeitos muito variados sobre pessoas de culturas distintas. Schuler cita os estudos
sobre a proxêmica, principalmente os trabalhos de Eduard Hall (1959 e 1966),
que podem fornecer informações úteis para a compreensão da complexidade de
uma situação de comunicação interpessoal.
É interessante percebermos o aponte que Schuler faz em função do
posicionamento dos participantes do processo comunicacional, assim o fato de ter
que olhar para cima, para falar com o interlocutor, pode dar ao que está em baixo
uma impressão de inferioridade, e ao que está em cima uma impressão de
domínio sobre a situação. Essa impressão não corresponde exatamente à
realidade e pode perturbar o contato. A melhor maneira de evitar os efeitos dessa
impressão é estar consciente dela e poder encará-la racionalmente.
Schuler também aborda a influência do clima interpessoal na
comunicação e afirma que esse compõe-se da confiança mútua e da
percepção que um protagonista tem do outro (exemplo: se consideram-se como
adversários ou como parceiros). Ele é influenciado pelas relações de poder e de
dependência e pela consideração que um protagonista tem pelo outro.
Assim a credibilidade dependerá, em geral, da impressão de competência
que o e emissor produz, das informações de que o receptor dispõe sobre ele e da
inter, retação que o receptor fará desse conjunto.
67
3.4.2. Comunicação grupal nas organizações
Para compreender os fenômenos comunicacionais em uma organização como
grupo social é necessário referir-se à comunicação grupal cujas normas dirigem as
relações interpessoais.
As comunicações podem ser classificadas, segundo o número de pessoas
que intervêm nas mesmas, como comunicação interpessoal , grupal e massiva. Sem
dúvida, não é tão pouco o número de pessoas o que as caracteriza e as distingue;
desta maneira, a comunicação interpessoal e a comunicação grupal, que são as
mais freqüentes na vida cotidiana e sobretudo nas organizações sociais, não
requerem geralmente de uma mediação artificial e se orientam de acordo a normas
vigentes que definem expectativas recíprocas de comportamento e que tem que ser
entendidas e reconhecidas, pelo menos por dois sujeitos.
3.4.3. O grupo
Em uma definição de George Caspar Homans
61
, grupo é:
“uma certa quantidade de pessoas que se comunicam constantemente
entre si, durante certo tempo, e que são suficientemente poucas para que
cada uma delas possa comunicar-se com todas as demais, não em forma
indireta, através de outras pessoas, se não cara a cara”.
Temos visto que o indivíduo na empresa não é um ser isolado, é alguém que
por sua natureza social compõe grupos. Neste sentido, Jean-Claude Filloux afirma
que
62
:
“O grupo não é uma soma de membros; é uma estrutura que emerge da
interação dos indivíduos e que induz ela mesma mudança nos indivíduos (...)
a interação psico-social (comunicacional) está na base da evolução dos
61
HOMANS, G.C., El grupo humano, Buenos Aires: Eudeba, 1963, p. 29 In: MARTINEZ
Raynell
Comportamiento Organizacional. Disponível em: RRPPnet Portal de Relaciones Públicas
<http://www.rrppnet.com.ar/comportamientoorganizacional.htm> Acessado: 5 de agosto de 2005.
(Tradução nossa)
62
FILLOUX J-C., Los pequeños grupos, Buenos Aires: Libros de Tierra Firme, 1980, p. 1-
17.(Tradução nossa)
68
grupos e de seus movimentos; dito de outro modo, entre os indivíduos que
formam o grupo se produzem múltiplos fenômenos (atração, repulsão,
tensão, compulsão, etc.): as correntes que se estabelecem entre os
elementos do grupo e entre os elementos e o grupo, determinam um
movimento, uma dinâmica, que projeta de certo modo ao grupo para frente,
como se possuíra a faculdade de criar seu próprio movimento (...) A
evolução dinâmica do grupo conta como substrato uma sorte de espaço, que
resulta ser o lugar das interações, um verdadeiro campo de força social”.
Podemos afirmar que o fenômeno de grupo é possível somente através da
interação, ou seja, da comunicação.
Por outra parte, em relação à conformidade entre o pensamento e os
sentimentos ao interior de um grupo se reflete em normas de comportamento,
Freeman Stoner
63
, assegura que estas normas são o reflexo das expectativas de
como se comportaram seus membros, como se relacionaram entre eles e com outras
pessoas; algumas são equivalentes às normas sociais, outras, ao contrário, são
particulares do grupo e de seus fins especiais: “A conformidade com as normas pode
ser extremamente útil; resolve muitas perguntas sobre como devemos nos comportar
diante dos demais cotidianamente, nos da liberdade para concentramos em outras
atividades”.
3.4.4. A comunicação no grupo
Stoner define quatro funções dos grupos
64
:
“1ª A conservação e o fortalecimento das normas e valores que seus
membros têm em comum. (...) 2ª Brindam a seus membros o sentimento de
satisfação social, estabilidade e segurança. os grupos informais satisfazem a
necessidade humana de fazer amizades e obter apoio e segurança (...) 3ª
Os grupos informais, mantêm a seus membros em comunicação. Os
membros dos grupos informais aprendem sobre assuntos que os afetam
mediante o desenvolvimento de seus próprios canais informais de
comunicação que complementam os canais mais formais (...) 4ª Os grupos
informais ajudam a resolver problemas. Freqüentemente, as soluções aos
problemas de grupo ajudam à organização”.
63
STONER, James, FREEMAN, Edward y GILBERT, Daniel, Administración, 6° ed México: Prentice
Hall, 1996, Cap. 18 p. 546 (Tradução nossa)
64
Ibid., p. 544.
69
A conjunção existente entre comunicação e grupo é uma relação dinâmica e a
que para a existência de um grupo é imprescindível à interação e consciência deste
relacionamento que unicamente se pode dar através da comunicação.
Isto é mais evidente quando se entende que todo grupo se desenvolve em
duas áreas: no trabalho de grupo e na estrutura social do mesmo.
A primeira, é mais evidente, e a segunda se desenvolve paralelamente é na
qual os participantes vão moldando suas relações interpessoais, é no como das
comunicações onde se negociam os interesses pessoais sobre o grupo e o rol que
se ocupa.
A comunicação, que é a interação de suas dimensiones de conteúdo e de
relações, não só é essencial para a conformação do grupo, senão que também,
permite evolucionar, manter-se vigente ou modificar as normas de conduta de seus
membros, sua dinâmica e suas percepções.
4. Barreiras na comunicação organizacional
Possuidora de um clássico papel integrador e harmonizador, outra
característica da comunicação organizacional foi o fato de colaborar para criar o que
Amitai Etizioni
65
denominou como "quadro irreal de felicidade". A organização era
descrita como uma família ideal, onde não havia luta de poder entre grupos com
valores e interesses conflitantes. E mais: os comunicados organizacionais, vendiam
a idéia de que a organização era o único espaço no qual o indivíduo poderia crescer,
era a única referência, o único ponto de apoio.
Segundo Kunsch
66
, existem muitas maneiras de classificar as barreiras na
comunicação nas organizações, e faz o análise de quatro classes de barreiras:
65
ETIZIONI Amitai, Organizações Modernas. São Paulo: Pioneira, 6 Ed., 1980, p. 70
66
KUNSCH, 2003, p. 74 – 76.
70
Pessoais
Administrativas/burocráticas
O excesso de informações.
Comunicações incompletas e parciais.
Percebe-se que apesar da crescente importância atribuída à comunicação,
são muitas as barreiras organizacionais para um livre fluxo de idéias e opiniões, as
primeiras podem ser encontradas nas próprias contradições inerentes ao trabalho.
Essas contradições internas, segundo Omar Aktouf
67
, se produziriam na
separação produtor-produto do trabalho, na perda do sentido do trabalho (separação
trabalhador-ação), no corte com a natureza (o tempo de trabalho ser somente o
tempo biológico) e na separação trabalhador / proprietário.
Sánchez
68
, por exemplo, faz menção dos conflitos e as barreiras na
comunicação interpessoal:
Distorção semântica, que é a atribuição de significados diferentes.
Distorção serial, na qual cada um tem uma idéia diferente.
Sobrecarga de informação, excesso de informação.
Escassez de informação, o contrário do anterior.
Neste sentido parece-nos importante acrescentar uma outra causa de conflito
e/ou barreira, que consideramos muito importante, na comunicação organizacional: o
rumor.
Stoner
69
caracteriza da seguinte maneira o processo de rumor:
“Outro tipo de comunicação informal, que não conta com sanção oficial, é o
rumor. Os rumores em uma organização se compõem de várias redes de
comunicação informal, as quais se combinam e interceptam em vários
67
AKTOUF Omar, A administração entre a tradição e a renovação, São Paulo: Atlas, 1996 pp. 122-
127
68
FERNÁNDEZ, 1998, p. 84
69
STONER, 1994, p. 582
71
pontos (ou seja, algumas pessoas bem informadas tendem a pertencer a
mais de uma rede informal). (...) Além do mais das funções social e informal
de comunicação, os rumores têm várias funções relacionadas com o
trabalho. Por exemplo,mesmo que os rumores são difíceis de controlar com
precisão, com freqüência funcionam muito mais rapidamente que os canais
formais de comunicação. Os administradores podem utilizá-los para distribuir
informação através de filtrações planejadas ou comentários confidenciais
estrategicamente colocados”.
Por sua parte Stephen Robbins
70
, acena alguns propósitos das pessoas para
expandir um rumor:
“Estruturar e reduzir a ansiedade; interpretar a informação escassa ou
fragmentária; servir de veículo para organizar aos membros de um grupo... ;
e dar a conhecer o status do emissor (‘Eu pertenço ao grupo e, no tocante a
este rumor, você é pessoa alheia ‘) ou seu poder (‘tenho a autoridade para
fazer de ti um intruso’). A investigação revela que os rumores nascem diante
de situações que são importantes para nós, nas quais há ambigüidade, e
diante de circunstâncias que provocam ansiedade”.
Outra variável importante é a que se refere a como as empresas lidam com a
questão da comunicação como ideologia gerencial, ou o modo de pensar dominante
no ambiente da administração, na qual toda decisão é valorizada a partir da
perspectiva da racionalidade econômica, através da otimização dos meios, em busca
da eficácia.
Segundo Alain Chanlat e Rennese Bedard
71
: “Essa racionalidade, aliada ás
estruturas burocráticas, acaba por impor barreiras ao livre trânsito de informações.
Somente circulam livremente aquelas informações e idéias dirigidas á produtividade.
Todo o resto é visto como desperdício".
A própria língua administrativa, caracterizada pela predominância do modo
imperativo, pela normativa, e pela linguagem altamente especializada constituem
outra barreira. As estruturas burocráticas, que ainda domina o cenário
organizacional, é talvez a maior das barreiras, por impor canais e interlocutores,
definindo-os previamente a partir da hierarquia funcional.
70
ROBBINS Stephen, Comportamiento organizacional conceptos. Controversias y Aplicaciones, 3ª
Ed., México: Prentice - Hall Hispanoamérica S.A., 1987, p. 222 (Traduçaõ nossa)
71
CHANLAT Alain e BEDARD Rennese, Palavras: a ferramenta do executivo In: CHANLAT, Jean F.
(coord), O Individuo na Organização - dimensões esquecidas. São Paulo: Atlas, 1992, pp. 137-143.
72
Outros obstáculos são as culturas organizacionais baseadas na autoridade e
na normativa e o excesso ou a falta de objetividade.
Também podem ser vistas como barreiras á comunicação a existência de
algumas idéias preconcebidas sobre a figura do executivo ou administrador, que
segundo Aktouf
72
são as verdades definitivas.
A primeira destas verdades seria a noção de propriedade privada, baseada na
legitimação da detenção do poder e do exercício da dominação, tratada como um
instinto ou algo natural, na realidade, é fruto das relações sociais e das culturas. A
outra verdade fala a respeito dos direitos do chefe, como: "o poder, os privilégios
reservados, o direito de usar em primeiro lugar, de dar ordens, de fazer-se obedecer,
de decidir..."
73
Outra estaria associada à idéia de que a busca de produtividade, do prazer
máximo e da ganância sistemática seriam também qualidades naturais da espécie
humana. Estas visões justificam a postura autoritária de administradores, que
acreditam cegamente haver sido naturalmente escolhidos para os altos postos da
hierarquia.
Alem dos obstáculos enunciados é interessante citar Aktouf
74
quem afirma: "a
comunicação organizacional, tal como é conduzida, teorizada e tradicionalmente
ensinada, se aproxima muito mais ao controle e à dominação das situações e dos
empregados mais que colocar em comum".
Essa percepção dominadora da comunicação organizacional não se encontra
na perspectiva da comunicação organizacional integrada.
72
AKTOUF, 1996, p.123.
73
Ibid. p. 124.
74
Ibid., p. 136.
73
5. Apreciações
Para finalizar o presente capítulo, podemos afirmar que no percurso realizado
entendemos a organização desde uma perspectiva muito abrangente, perpassamos
a conceitualização para nos deparar com o principal composto da própria instituição:
o homem.
Por isso, a partir da abordagem da comunicação organizacional integrada
reencontramos nela a valorização do ser humano e suas relações dialéticas. É
reconfortante pensar que neste tipo de visão da comunicação se saliente o resgate
da natureza do homem como sujeito atuante na organização.
A organização não existe sem antes existir o homem, e está composta por
seres pensantes e atuantes, que dependendo do grau de motivação e
compenetração alavancaram à organização ou não. Sendo assim, resulta
fundamental a interação e conhecimento desses seres.
A seguir apresentaremos uma dessas organizações que como veremos logo
no estudo de caso numa empresa de EdC, parte dessa filosofia incluinte do ser
humano, que será evidenciada no Movimento dos Focolares, que aborda à
comunicação desde uma perspectiva cristã.
74
CAPÍTULO 2
MOVIMENTO DOS FOCOLARES
Nada acontece por acaso. E na história da Economia de Comunhão não é
diferente. É possível perceber nos primórdios do Movimento dos Focolares o gérmen
da EdC.
Assim para entender a natureza e como é que surge e se desenvolve a
Economia de Comunhão, é fundamental conhecer o Movimento do Focolares. Essa
história marcada por testemunhos de amor e força de vontade, de entrega e
sacrifício é apresentada a seguir.
1. Chiara Lubich e o Movimento dos Focolares
A fundadora do Movimento dos Focolares, Chiara Lubich, nasceu no dia 22 de
janeiro em 1920 em Trento (Itália). Esta histórica cidade surgiu na época dos
romanos, se encontra entre as montanhas Dolomitas e três vales de onde se origina
o seu nome Tridentum. Localiza-se quase na fronteira entre a Áustria e Alemanha.
De família simples, Lubich era a segunda de quatro filhos. Sua mãe era uma
cristã fervorosa e seu pai um socialista convicto. Eles se conheceram, quando
trabalhavam na tipografia do jornal Il Popolo. Luigi Lubich, o pai, era chefe da seção
de tipografia. A mãe era tipógrafa.
Luigi Lubich, logo após a Primeira Guerra Mundial, na qual esteve em primeira
linha, se dedicava ao comércio de vinhos, mas na crise dos anos 1930, foi a falência.
Ficou desempregado por ter se mantido fiel à suas convicções antifascistas
recusando-se a receber a carteira do partido do ditador Mussolini.
75
Para Kelen Leite
75
, no período que antecedeu a Segunda Guerra Mundial a
família Lubich chegou a passar fome, assim Chiara, já aos treze anos de idade
(1933), começou a dar aulas para crianças a fim de auxiliar no sustento familiar.
Ensinava, sobretudo, a língua italiana, matemática e geografia, mais tarde acabou
tornando-se professora primária, alimentando o sonho de ir para a Universidade
estudar Filosofia.
Entre as duas guerras mundiais, a Igreja Católica em Trento viveu uma grande
vivacidade associativa, que se concentrava, em particular, na Ação Católica e na
Terceira Ordem Franciscana. Não é, portanto, um caso fortuito que Lubich tenha
crescido justamente nesses dois ambientes associativos, ela era membro ativo e
líder das duas associações leigas.
Assim, segundo narra Jim Galhager
76
, em 1939 em meio à Segunda Guerra
Mundial, enquanto a cidade de Trento era destruída pelos bombardeios aéreos,
Lubich e um grupo de amigas entendiam que tudo é, como está escrito no evangelho
dos cristãos católicos: “Tudo é vaidade das vaidades
tudo passa” (Cf. Ecl.1, 2)
77
.
Uma delas se preparava para o casamento, mas o noivo não voltou da guerra; uma
outra queria terminar de construir sua casa, mas esta foi destruída, e a própria
Lubich foi impedida de continuar seus estudos.
Trento, localiza-se quase na fronteira entre a Áustria e Alemanha para onde
as forças aliadas empurravam de volta as tropas alemãs que, apoiadas por
Mussolini, haviam ocupado, até então, toda a Itália. De fato, na noite de 13 de maio
de 1944, os bombardeios americanos das forças aliadas despejam, pela primeira
vez, suas bombas, destruindo a cidade, obrigando a população a procurar refúgio
nas cidades, montanhas e aldeias vizinhas.
75
LEITE Kelen, Economia de Comunhão, Uma mudança cultural e política na construção do
princípio da reciprocidade nas relações econômicas, tese de doutorado Centro de Educação e
Ciências Humanas, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos (SP), julho de 2005.
76
GALLAGHER Jim, Chiara Lubich. Uma mulher e sua obra, São Paulo: Cidade Nova, 1998, p. 20
77
BÍBLIA, Português. Bíblia sagrada Edição Pastoral [Tradução de Ivo Storniolo e Euclides Martins
Balacin] São Paulo: Paulus, 1990, p. 860.
76
Entre bombas, destroços e mortos, estas jovens se questionavam se poderia
existir um ideal de vida pelo qual valeria a pena dedicar a própria vida, um ideal
menos vulnerável e que nenhuma bomba pudesse destruir.
Lubich
78
descreve a seguir como surgiu o Movimento que ela fundou:
Eram tempos de guerra e víamos desmoronarem todos os nossos ideais.
Diante disso, eu e algumas companheiras decidimos viver por um ideal que
não passa: Deus. Passaram-se alguns meses e, no dia 13 de maio de
1944, houve um grande bombardeio em Trento. A minha família resolveu ir
para um bosque, em busca de abrigo, e durante a noite vimos os aviões
sobrevoarem a cidade e bombardearem também o bairro onde ficava a
nossa casa. Para mim aquela noite foi decisiva (...) sentia que não poderia
sair da cidade de Trento, porque tinha construído um forte vínculo com as
minhas companheiras, já havia os primeiros sinais do que viria a ser o
Movimento e, portanto, eu me sentia no dever de ficar em Trento, mas
como eu poderia deixar a minha família sem ao menos um teto? (...) Tomar
essa decisão foi um drama para mim, um drama porque eu amava meus
pais e meus irmãos (...) e, naquela época, eu era a única pessoa que os
ajudava economicamente. Ao amanhecer, voltamos para a casa a fim de
recolher o que restava. Em seguida, despedi-me deles e encaminhei-me
para o centro da cidade totalmente destruído, as ruas estavam vazias, as
árvores arrancadas, tudo revirado (...) Pelo caminho veio ao meu encontro
uma mulher que parecia enlouquecida pelo sofrimento, e segurando-me
disse: ‘quatro da minha família morreram’. Naquela ocasião compreendi que
deveria me abrir aos sofrimentos dos outros.
Segundo Leite
79
, a descoberta desse Deus Amor, feita por Lubich e suas
primeiras companheiras, que se pode definir como uma experiência pessoal e
espiritual não se limitou, para as jovens de Trento, a um sentimentalismo, a um
idealismo ou a uma contemplação, mas as conduziu imediatamente a ação social, a
práxis social uma vez que imediatamente saíram à cidade com intuito de ajudar a
resolver o problema social de Trento.
A decisão de Lubich, em permanecer na cidade bombardeada, foi uma
decisão advinda da sua escolha de Deus como Ideal de sua vida, porém foi também,
uma decisão com fortes elementos políticos e sociais.
78
LUBICH, Chiara “Discurso por ocasião do Prêmio Europeu pela Promoção dos Direitos do Homem”.
v. III, n. 1, 2000.
79
Ibid.
77
Lubich em 1944 afirma
80
:
"Em um refúgio anti-aéreo abrimos ao acaso o Evangelho na página do
Testamento de Jesus:“Pai, que todos sejam um, como eu e tu”. Aquelas
palavras pareciam iluminar-se uma a uma. Aquele "todos" foi o nosso
horizonte. Aquele Projeto de Unidade a razão da nossa vida".
A fraternidade vivida pelas primeiras focolarinas
81
reconstruía o tecido social,
tornando as pessoas cidadãs. Essa decisão de Lubich em permanecer na cidade
bombardeada se soma à responsabilidade em relação ao pequeno grupo que se
formava ao seu redor.
Estas jovens iam aos refúgios anti-aéreos levando somente o Evangelho,
descobrem “como” responder ao Amor. É a própria Lubich que escreve naquele
tempo: "Cada dia novas descobertas: o Evangelho tornava-se o nosso único livro,
única luz de vida". No mandamento do amor recíproco, elas descobrem a lei para
recompor, através da fraternidade, a sociedade desagregada. "Colocávamos tudo em
comum: utensílios, casas, ajuda, dinheiro. Era uma outra vida".
Com admiração, aquele primeiro grupo experimenta a luz, a força, a coragem,
o amor, frutos da presença de Jesus, prometidos por Ele quando dois ou três estão
reunidos no Seu nome. Uma luz que ilumina a última oração de Jesus ao Pai: que
todos sejam um. Este projeto divino sobre a família humana, torna-se o programa da
vida delas: "Façamos da unidade entre nós um trampolim para correr onde não há
unidade e realizá-la".
Como resultado desta experiência Lubich descreve que "Cada dia aumentam
ao nosso redor pessoas de todas as idades e condições sociais. Ódio e rancor são
apagados. Muitas famílias se recompõe em paz”. Nasce a certeza que no Evangelho
está a solução de todos os problemas individuais e sociais.
80
MOVIMENTO DOS FOCOLARES Disponível em: <http://www.focolare.org> Aceso em: 07 de
outubro de 2006.
81
Focolarinas (os) são aqueles que vivem em focolare, este por sua vez designa pequenas
comunidades (femininas ou masculinas) compostos por leigos consagrados. Fazem parte dos
focolares também pessoas casadas que mesmo morando com suas famílias sentem a exigência de
consagrarem-se pessoalmente a Deus segundo o próprio estado.
78
O que se sucedeu podemos compreender pela repercussão deste estilo de
vida e pelos reconhecimentos dados a Chiara Lubich, a protagonista, convidada a
dar seu testemunho nos contextos os mais variados, desde os santuários mais
concorridos até as mesquitas muçulmanas, desde as sinagogas mais famosas, às
universidades e aos monastérios budistas, desde Aulas Magnas, à sala Schuman do
Palácio de Europa, à prestigiosa sala do Edifício de Vidro da Organização das
Nações Unidas (ONU) etc.
Nasce assim uma nova espiritualidade, a espiritualidade da unidade. Hoje
pode-se dizer que este estilo de vida teve e tem uma incidência notável no campo
eclesial, civil, político, econômico, social, etc.
Baseado em Lubich
82
, nasce e se difunde a convicção de que no evangelho
se encontra a resposta a cada problema individual e social. E foi através do amor
evangélico personificado em ações concretas em favor do outro, simplificado nas
premissas: amar a todos, amar por primeiro, amar como a si mesmo, ver Jesus no
outro, amar aos inimigos... que o espírito do Movimento dos Focolares penetrou
entre os cristãos de outras Igrejas. Ainda, foi desta forma que se promoveu o diálogo
com judeus, muçulmanos, budistas, xintoísta, ateus, fiéis de outras religiões
tradicionais, e é por esta via que muitas pessoas de outras culturas compartilham o
ideal da unidade, trabalhando como parte do mesmo corpo, salvaguardando os
valores universais como a unidade, o amor, a paz, a legalidade, os direitos humanos,
a solidariedade, etc.
È uma espiritualidade moderna que faz nascer relações interpessoais não só
pacíficas, mas contagiosas e criativas que originam por sua vez estruturas sociais e
econômicas a serviço da humanidade.
Há mais de 50 anos, suscitou uma renovação espiritual e social entre mais de
dois milhões de pessoas de todas as idades, raça, cultura: entre os jovens, nas
famílias, no mundo da economia, política, cultura e arte, no mundo eclesial entre
82
LUBICH Chiara, Resurrezione di Roma, en Nuova Umanità, XVII 1995, pp. 5-8. (Tradução nossa)
79
sacerdotes, religiosos e bispos. Em 182 países aglutina não somente a católicos,
mas também a cristãos de 300 Igrejas, fiéis de outras religiões e pessoas de
convicções diferentes.
O termo focolar é um termo italiano que quer dizer lareira, fogo ao redor do
qual a família se reúne. Esse estilo de vida, numa perspectiva da fraternidade
universal, gera uma grande família. O Movimento dos Focolares hoje conta com
cerca de 7 milhões de membros dentre esses, crianças, adolescentes, jovens e
adultos, de centenas de países, segundo Michael Vadeleene
83
.
O Movimento dos Focolares tem quatro dimensões específicas, que merecem
destaque, como explica Adam Biela
84
, Decano da Faculdade de Ciências Sociais da
Universidade Católica de Lublino, no seu Laudatio proferido por ocasião da atribuição
do Título de Doutor Honoris Causa a Chiara Lubich, a dimensão social, econômica,
moral e religiosa.
A dimensão social, reconhecida pelo seu caráter comunitário. A dimensão
econômica que é caracterizada pela promoção e organização de um sistema
econômico baseado em princípios de solidariedade de ajuda concreta aos
necessitados, baseia-se na proposta de novas soluções sistemáticas e recebeu o
nome de Economia de Comunhão.
Na dimensão moral, outra das características significativas do fenômeno
Focolare é o reconhecimento do valor da pessoa concreta ou das pessoas concretas,
visíveis durante os encontros dos membros do Movimento e em suas atividades. Isso
determina a atitude moral de busca das melhores soluções para o homem singular,
em relações bem determinadas (familiares, de vizinhança, profissionais e de
amizade). Trata-se portanto de envolver o homem com benevolência, amizade e
amor.
83
LUBICH Chiara, Ideal e luz: pensamento, espiritualidade. Apresentação de André Franco Montoro
(tradução de Irami B. Silva com colaboração José Maria de Almeida e Iracema do Amaral). São Paulo,
Brasiliense e Vargem Grande Paulista-SP, Cidade Nova, 2003. p. 12.
84
BIELA,.1998, p. 4
80
Depois, a dimensão mais profunda do fenômeno Focolare é constituída pelos
seus conteúdos e formas religiosas. É um Movimento de renovação religiosa, que
anuncia a mensagem da unidade.
Desde o nascimento deste Movimento uma prática comum é a cultura do dar,
seguindo o modelo dos primeiros cristãos que, como cita a Bíblia, “tinham tudo em
comum, não havia indigente entre eles” (cf. At 4,32-34)
85
. Esta sempre foi uma
prática entre os membros deste Movimento: colocar em comum o supérfluo para que
ninguém passe necessidade enquanto outros têm demais. Como reforça Lubich
86
:
“Tínhamos o objetivo de pôr em prática uma certa comunhão de bens, com o máximo
alcance que se pudesse pensar; não se tratava, porém de amar os pobres pelos
pobres, queríamos resolver o problema social”.
Pouco a pouco se desenvolvem, dentro do movimento, 22 ramificações e
múltiplas realizações entre as quais se encontra o projeto Economia de Comunhão
com mais de 700 empresas empenhadas, cidadezinhas – testemunho (sobre as
quais nos referiremos mais adiante), editoras, jornais de diversas edições em vários
idiomas, mais que 750 obras sociais.
Entre estas últimas são particularmente significativos os programas de
desenvolvimento no mundo, como o projeto das adoções à distância, que alcança
mais de 9.000 crianças, as obras como Bukas Palad nas Filipinas, o hospital e a
escola de Fontem nos Camarões e a cooperativa agrícola “Magnificat” no norte do
Brasil.
2. Composição e difusão do Movimento dos Focolares
Pela variedade das pessoas que compõem: jovens, adultos, crianças e
adolescentes, famílias e sacerdotes, religiosos e religiosas de distintas
congregações, bispos, empresários e políticos de vários partidos, mesmo que sendo
85
BÍBLIA, 1982, pp. 1395-1396.
86
LUBICH, Chiara. A Aventura da Unidade o Paulo: Cidade Nova, 1990, p. 11.
81
uma única realidade se encontram articulados em 22 ramos entre os quais se
encontram alguns Movimentos de amplo alcance que são:
Humanidade Nova - É a expressão de todo o Movimento no aspecto social.
Os principais responsáveis são leigos das mais diversas categorias sociais e
profissionais, denominados “Voluntários”, responsáveis pela renovação dos vários
campos da sociedade, como a política, a economia, a arte, a educação, o direito e a
comunicação.
Os Voluntários surgiram em 1956, logo depois da invasão soviética na
Hungria. Responderam ao apelo de Chiara que, atendendo ao pedido do Papa Pio
XII, expressa nas páginas da revista Cidade Nova a urgência do surgimento de
“autênticos discípulos de Jesus, que voluntariamente o sigam. Um exército de
voluntários – porque o amor é livre – capaz de construir uma sociedade nova".
Famílias Novas – É animado pelos focolarinos casados. Abre um novo
caminho para as crises familiares e transforma a família na célula-base que contribui
para a recomposição da unidade na sociedade.
O amor é revitalizado. Casais em crise recobram forças para voltar ao diálogo.
A família se abre à dimensão social. Promove uma cultura inovadora, baseada na
educação, formação, socialização e solidariedade. São realizadas adoções, tutela de
menores e sustento à distância em países do hemisfério Sul e no Leste Europeu.
Jovens por um Mundo Unido - Propõe aos jovens serem protagonistas de um
mundo novo, com numerosas atividades de solidariedade e paz em nível nacional e
internacional.
É animado pelos jovens mais comprometidos, os "Gen 2", "geração nova", a
segunda geração do Movimento. Em resposta às exigências de profundas
transformações por que passavam as novas gerações, em 1967 Chiara propôs aos
jovens o caminho do radicalismo evangélico.
82
Movimento Juvenil pela Unidade – Tem por objetivo realizar a fraternidade
universal, começando nas próprias cidades e nos ambientes nos quais vivem.
Percorrem todos os caminhos possíveis a fim de superar barreiras e divisões.
Sustentado pelos "Gen 3", terceira geração, os adolescentes tornam-se
promotores de manifestações internacionais, de micro-projetos de solidariedade e se
enriquecem reciprocamente através do intercâmbio dos valores culturais que
encontram.
Muitos destes adolescentes provém dos "gen 4", as crianças do Movimento,
que têm entre quatro e oito anos de idade.
Movimento sacerdotal – Em conformidade como o Concílio Vaticano II,
pretende contribuir, através da Espiritualidade da Unidade, para a renovação das
estruturas eclesiásticas. É animado pelos sacerdotes diocesanos membros do
Movimento.
Movimento Paroquial – Propõe fazer da Paróquia uma “casa e escola de
comunhão”, suscitando vitalidade e força evangelizadoras novas. Seus animadores
são sacerdotes, religiosos e leigos do Movimento. É uma ação que se está
desenvolvendo também em nível diocesano em algumas igrejas locais italianas.
No coração do Movimento estão os focolares (masculinos e femininos), que
de acordo com o Estatuto do Movimento dos Focolares
87
, são pequenas
comunidades com um estilo novo, compostas por leigos, também casados,
totalmente doados a uma experiência concreta de Deus, através do serviço ao irmão.
É uma pequena comunidade com um novo estilo de vida, que tem como
modelo a Família de Nazaré. É composta por leigos, virgens (distintamente homens
e mulheres) e pessoas casadas que, vivendo na própria família, doam-se totalmente
a Deus. O principal compromisso dos membros é viver com radicalismo o
87
Como un Arco Iris, Buenos Aires: Ed. Ciudad Nueva, p. 40
83
mandamento do amor recíproco, para que se mantenha sempre viva aquela
presença de Jesus que Ele mesmo prometeu a quem estiver unido em Seu nome.
(Mt 18.20).
O primeiro focolare surgiu em Trento, com Chiara Lubich e as suas primeiras
companheiras, em 1944.
Os focolares são também centros de irradiação e de convergência da família
do Movimento, coração do Movimento nas cidades onde se encontram. São
centenas os focolares espalhados pelo mundo, são cerca de 780 em 87 países e
reúnem mais de 6.300 pessoas.
As formas de inserção se dão a partir do grau de compromisso de cada
pessoa. Consideram-se membros aos que optam por uma participação efetiva
assumindo, inclusive, responsabilidades no Movimento.
Desde o ponto de vista diretivo, o Movimento conta com uma Assembléia
Geral e um Centro Mundial e se articula nas regiões presentes nos diferentes países,
com órgãos diretivos próprios.
Como Gallagher
88
constata, o Movimento dos Focolares é reconhecido e
aprovado pela Igreja católica como uma associação privada e universal de fiéis,
ligado ao Pontifício Concílio para os Leigos.
A primeira aprovação foi outorgada pelo Bispo de Trento, Mons. Carlo De
Ferrari, em 1947: “Aqui existe o dedo de Deus”. Seguem-se as aprovações
pontifícias: a primeira em 1962; a mais recente, para os desenvolvimentos ulteriores,
em 1990.
O Movimento dos Focolares foi aprovado oficialmente pela Igreja Católica com
a denominação "Obra de Maria".
Traz este nome porque:
88
GALLAGHER, 1998, p. 98.
84
"A sua típica espiritualidade, a sua fisionomia eclesial, a variedade de sua
composição, a sua difusão universal, as suas relações de colaboração e
amizade com cristãos de diferentes Igrejas e comunidades eclesiais,
pessoas de diferentes credos e de boa vontade, e a sua presidência leiga e
feminina, demonstram o particular vínculo existente entre a Obra e Maria
Santíssima, Mãe de Cristo e de cada homem". (Estatutos Gerais, art. 2)
Por causa da diversidade da sua composição, com os anos o Movimento
assume as dimensões de um pequeno povo, como o definiu o Papa João Paulo II:
abraça não só católicos, mas também cristãos de diferentes Igrejas e Comunidades
Eclesiais, além dos hebreus. Aos poucos vão fazendo parte do Movimento,
seguidores das grandes religiões e até pessoas sem uma referência religiosa. A
adesão ao Movimento acontece sem sincretismos, na plena fidelidade à própria
identidade.
A partir de 1943, em Trento, esta experiência se difundiu em primeiro lugar na
Itália e depois: desde 1952 na Europa, desde 1959 na América Latina e América do
Norte, desde 1966 na África e na Ásia e desde 1967 na Austrália.
Os Centros do Movimento estão presentes nos seguintes continentes e
países:
África: (Angola, Burkina Faso, Burundi, Camarões, Congo, Costa de Marfim,
Egito, Quênia, Madagascar, Nigéria, Sul da África, Uganda); América:
(Argentina, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El
Salvador, EUA, Guatemala, México, Panamá, Paraguai, Peru, República
Dominicana, Uruguai, Venezuela); Ásia: (China, Hong Kong, Coréia, Filipinas,
Índia, Israel, Japão, Líbano, Macau, Paquistão, Tailândia, Taiwan, Turquia)
Austrália e Oceania: (Austrália, Nova Zelândia) e Europa: (Albânia, Alemanha,
Áustria, Bélgica, Bulgária, Croácia, Dinamarca, Escócia, Eslováquia,
Eslovênia, Espanha, França, Grã Bretanha, Holanda, Hungria, Irlanda, Itália,
Malta, Grécia, Lituânia, Luxemburgo, Noruega, Polônia, Portugal, República
Checa, República Iugoslava, Romênia, Rússia, Suécia e Suíça).
85
A seguir, procurar-se-á explicar algumas das expressões concretas que o
Movimento dos Focolares tem no mundo, entre as numerosas concretizações se
destacam
89
:
Na cultura:
A Escola Abbá: A partir da espiritualidade da unidade estão se esboçando
linhas novas de pensamento teológico, filosófico e social, que colocam as bases para
uma cultura renovada como resposta à grande crise cultural que não só o Ocidente,
mas também todas as culturas orientais estão atravessando nesta mudança de
época.
As linhas desta cultura renovada estão emergindo da Escola Abbá, que,
nasceu em 1990, está composta por Chiara Lubich e mais de 20 expertos de várias
disciplinas, desde a Teologia em suas várias especializações, à Filosofia, ao
Ecumenismo, à Política; das Ciências Naturais à Economia; da Psicologia à
Sociologia.
Desde 1998 participam também trezentos docentes e expertos em distintas
matérias, de vários países. Esta colaboração se apóia sobre sua experiência
espiritual do carisma da unidade e sobre sua experiência profissional.
Os primeiros ensaios destas novas linhas culturais são publicados na revista
de cultura do Movimento, Nova Humanidade.
Conjuntos Musicais Gen Rosso e Gen Verde: Dois conjuntos musicais, que
têm sua sede em Itália e realizam espetáculos no mundo inteiro levando, antes de
tudo divulgar esta mensagem da unidade, carisma deste Movimento. Compostos por
integrantes do mundo todo e para cada país que vão em turnê procuram realizar o
espetáculo na língua oficial daquele povo.
89
MOVIMENTO DOS FOCOLARES Disponível em: <http://www.focolare.org> Aceso em: 15 de
dezembro de 2006.
86
O Gen Verde, conjunto feminino, esteve no Brasil em 2001 realizou shows em
Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo.
De março a maio de 2006, após vinte e um anos de ausência, o Gen Rosso
voltou ao Brasil, se apresentou em 17 capitais e realizou 28 shows com o espetáculo
Streetlight, que é um musical que conta a história e o sonho de dois jovens, Charles
e Jordan, com destaque para a luta que o primeiro realiza para vencer a violência do
'The Hole', bairro de Chicago (EUA) onde nasceu. Nessa luta, Charles não está
sozinho. Ele conta com companheiros músicos da 'Streetlight Band', cujo testemunho
chama a tenção do amigo Jordan, membro de uma das gangues que lutam para se
impor no controle daquela região da cidade. 'Streetlight' é inspirado na história real
do jovem afro-americano, Charles Moats, que nos anos 60 pagou com a vida, por
sua fé num mundo sem barreiras, sem opressão e sem divisões. O espetáculo foi
apresentado mais de 300 vezes antes de chegar ao Brasil.
Editoras e revistas
As editoras:
Città Nuova foi a primeira editora. Surgiu na Itália, durante os anos ‘50, para
difundir a espiritualidade da unidade. Esta expressão editorial do Movimento dos
Focolares foi, pouco a pouco, afirmando-se no mundo inteiro.
Abriram-se outras editoras com o mesmo nome no mundo inteiro, todos
comprometidos a difundir os valores propostos pelo Movimento: buscar a
fraternidade universal, dar atenção ao que leva a humanidade a progredir rumo a um
mundo mais unido, divulgação da espiritualidade da unidade e de suas propostas
culturais.
As editoras estão presentes em 26 países e, em seu conjunto, publicam 300
títulos por ano.
87
No Brasil a Editora Cidade Nova, segundo seu Diretor-Presidente Ekkehard
Shneider
90
, tem um compromisso: mediante suas publicações, contribuir para que
todas as pessoas componham uma única família humana e para que o mundo seja
mais unido. Esse compromisso implica a defesa e valores como a paz, a
solidariedade, a justiça, a dignidade, o respeito à diversidade, o diálogo, a tolerância,
a partilha, a vida e os direitos humanos. Fundamenta-se na convicção de que a
pessoa é chamada a amar, isto é, a descobrir o outro, a viver com o outro, para o
outro, enfim, viver o outro. E de que a história, em meio a seus conflitos e a suas
contradições, trilha um caminho rumo à unidade.
A linha editorial de Cidade Nova tem sua origem na Espiritualidade da
Unidade. As publicações de Cidade Nova oferecem instrumentos de vida e de
reflexão, difundem uma cultura de fraternidade, propiciando o encontro de homens e
mulheres de todas as idades, condições sociais, confissões religiosas, entre elas e
com o que elas têm de verdadeiro, de bom e de belo.
Constatar isso, ou melhor, vivenciar isso, inclusive por meio da leitura, é o
convite que a Editora Cidade Nova faz a seus leitores.
As publicações:
Città Nuova (Ciudad Nueva, Cidade Nova, New City etc.): Revista de opinião
com 38 edições em 27 idiomas. A primeira das revistas foi a Cittá Nuova, italiana,
que tem uma periodicidade quinzenal.
A Revista Cidade Nova no Brasil é um veículo de comunicação inteiramente a
serviço da cultura da fraternidade que já tem 43 anos de publicação. Cidade Nova se
interessa por todos os âmbitos - economia, política, cultura, educação, religião, arte,
saúde, psicologia, esporte etc. - porque todos eles podem e devem ser renovados
pelo amor para se fazer do mundo uma grande família.
90
EDITORA CIDADE NOVA, uma editora pelo mundo unido. Disponível em:
<http://www.cidadenova.org.br> Acesso em: 10 de dezembro de 2006.
88
Abba - Revista de Cultura: Com uma periodicidade de três números por ano
permite manter seus artigos na perspectiva da “Espiritualidade da Unidade”. O
objetivo da Revista é justamente oferecer ao público estudos e reflexões, que estão
sendo elaborados no âmago do Carisma da Unidade, e a difusão dos aspectos
culturais que, paulatinamente, estão nascendo a partir da luz que emana desta
espiritualidade.
Nova Humanidade: Revista bimestral de cultura, enraizada na mensagem
cristã. Contribui para o debate cultural contemporâneo nos campos da teologia,
filosofia, espiritualidade, etc.
Mondo unito: Revista trimestral destinada aos jovens.
Gen's: Revista bimestral de base pastoral dirigida especialmente aos
sacerdotes e seminaristas, com edições em várias línguas. No Brasil, se conhece
como a revista Perspectivas de Comunhão.
Unità e carismi: Revista bimestral dirigida especialmente aos religiosos,
publicada em várias línguas. No Brasil é editada como Unidade e Carismas.
As cidades - testemunho
São pequenas cidades-modelo de uma sociedade nova, conhecidas como
Mariápolis, que significa cidade de Maria, com casas, escolas, empresas, cuja lei é o
amor recíproco, a lei do evangelho, com uma conseqüente comunhão plena de todas
suas riquezas: culturais, espirituais e materiais. Cada ano são dezenas de milhares
os visitantes.
Estas cidades são 35 nos 5 continentes, cada uma com suas características
singulares:
89
Gráfico 3
Mariápolis: Cidades-testemunho espalhadas no mundo
Fonte: Site oficial do Movimento dos Focolares
91
A primeira ‘cidadezinha’, surgida em 1965 foi Loppiano (Florença-Itália), tem
características internacionais, conta com 800 habitantes de 70 nações. É um modelo
de "mundo unido", onde se expressa a criatividade da nova cultura planetária que
nasce da fusão das riquezas de distintas raças e povos.
No Camarões, Quênia e Costa de Marfim existem cidades-modelo nas quais
se vive a inculturação do evangelho nas sociedades africanas. No Brasil e Argentina
com seus nascentes pólos industriais, são modelos-piloto da nova "Economia de
comunhão na liberdade". Nas Filipinas se caracteriza pelo diálogo com as grandes
religiões orientais. Na Alemanha é ecumênica: onde convivem luteranos e católicos.
Na Polônia, no leste da Europa, é um modelo de sociedade nova. Nos arredores da
91
MOVIMENTO DOS FOCOLARES, Disponível em: <http://www.focolare.org/br/> Acesso em: 9 de
agosto de 2005.
90
cidade de Nova York, é uma cidade-modelo de diálogo entre raças e culturas
diferentes.
Na política
O Movimento dos Focolares promoveu a criação do Movimento político pela
unidade (MPPU), que consiste em uma rede mundial composta por cidadãos ativos,
políticos eleitos nos vários níveis institucionais ou militantes de vários partidos e
movimentos políticos, funcionários públicos, jovens interessados nas grandes
questões mundiais e na vida da própria cidade e estudiosos da ciência política,
coordenada por uma secretaria internacional.
Nasceu em Nápoles (Itália), em 2 de maio de 1996, por ocasião de um
encontro entre Lubich e um grupo de expoentes de diferentes funções e várias
matrizes políticas. Logo tornou-se conhecido no mundo inteiro.
Seu objetivo é contribuir politicamente para uma história de paz e de unidade
entre os povos da terra, comprometendo-se, com um estilo coerente e competente,
em fazer da fraternidade universal uma categoria política fundamental, traduzindo-a
em fatos, em direitos e deveres, substanciando a participação democrática, revendo
nesta luz as disposições institucionais locais, nacionais e internacionais.
O MPPU propõe escolas de formação cívica e política, encontros nas sedes
parlamentares, em nível federal, estadual e municipal, convênios e seminários de
estudo, grandes manifestações. São lugares nos quais, a vida prática e pensamento
se encontram: a experiência de quem trabalha pela fraternidade universal e a cultura
da unidade; espaços de diálogo profundo e aberto, onde encontram acolhida todos
os passos positivos realizados pela humanidade, já feitos ou em realização.
No direito
Comunhão e Direito é constituída por grupos de estudiosos e profissionais do
direito, presentes em diversas partes do mundo, que se inspiram nas finalidades
91
citadas. Eles procuram trabalhar para uma atuação da justiça e uma renovação
profunda no campo jurídico, legal e judicial, instaurando novos modos de
comportamento e de relações jurídicas, inspirados na fraternidade. Procurando viver
a fraternidade nos comportamentos e nas relações jurídicas, percorrem um caminho
que consente sanar as múltiplas rupturas que agridem os relacionamentos e, ao
mesmo tempo, garantir a comunhão, salvaguardando a identidade dos indivíduos.
Os grupos de Comunhão e Direito se encontram periodicamente para uma
troca de idéias, experiências e novas compreensões, num clima de amizade, respeito
recíproco e partilha.
Os crescentes conflitos que marcam a convivência humana em vários níveis
exigem a busca de novas formas de relações entre as pessoas, que favoreçam a
comunhão. A iniciativa de Comunhão e Direito se desenvolve em dois níveis. O
primeiro se refere ao empenho no plano concreto das atividades dos profissionais do
direito, nos diversos âmbitos jurídicos, legais e judiciais, para instaurar nelas uma
práxis das relações inspirada pela fraternidade. O outro nível é o do estudo e da
pesquisa no plano doutrinal, voltados aos fins previstos e conduzidos em espírito de
diálogo com as diversas instâncias da atual cultura jurídica.
Das experiências e das idéias amadurecidas nos grupos de Comunhão e
Direito desabrochou o Congresso internacional “Relacionamento no direito: qual é o
espaço da fraternidade?”, realizado em Castelgandolfo (Itália), em novembro de
2005. O Congresso, do qual participaram mais de 700 estudiosos e profissionais do
direito, de 35 países dos vários continentes, percorreu os vários campos do direito e
fomentou inúmeras intuições sobre o caminho da redescoberta do relacionamento e
da fraternidade enquanto dimensões imanentes ao direito.
A partir do Congresso se estabeleceu uma rede de relacionamentos, ainda
ativa em nível mundial, com um intercâmbio de experiências, reflexões e
elaborações.
92
Na medicina e saúde
Dando prosseguimento às inúmeras iniciativas desenvolvidas no decorrer dos
anos, nos mais variados âmbitos, nos sistemas de saúde mais e menos evoluídos,
em 2003 sentiu-se a exigência de constituir uma associação: Medicina Diálogo
Comunhão (M.D.C), interdisciplinar e intercultural, sem fins lucrativos, coordenada
por uma secretaria internacional.
Esta Associação quer contribuir para a elaboração de uma antropologia
médica inspirada nos princípios contidos na espiritualidade da unidade, do
Movimento dos Focolares, redefinindo nesta perspectiva o sentido da vida do
homem, a sua dignidade, o valor da pessoa, a relação saúde-doença, tanto na
dimensão pessoal como na dimensão social. A MDC quer contribuir – junto a muitas
outras iniciativas já existentes – para um humanismo cientifico que saiba promover
uma concepção da ciência e da medicina baseada num constante respeito ao
homem, à sua dignidade e integridade, à sua corporeidade, ao seu espírito, à sua
cultura.
A MDC se propõe a favorecer o intercambio de experiências realizadas em
nível internacional, atinente ao âmbito profissional, e promover iniciativas de caráter
cultural, como encontros, convênios, exposições, atividade editorial e outros, em
nível regional, nacional e internacional, só ou com a colaboração de outros órgãos e
entidades, que se inspiram nessa visão antropológica.
No esporte
Sportmeet é uma rede mundial de esportistas, agentes e profissionais do
esporte, cujo principal empenho é a promoção de uma cultura do esporte capaz de
contribuir para a paz e para a fraternidade universal em todos os níveis: entre
pessoas, povos, culturas, etnias e religiões. Spormeeet é a expressão, no mundo do
esporte, daquela renovação espiritual e social que constitui a base da experiência do
Movimento dos Focolares. Um projeto que se fundamenta na difusão de uma “cultura
93
da partilha” sustentada pela “regra de ouro”, presente em todas as culturas: “Faça
aos outros, o que desejaria que fosse feito a você”.
Promove a própria cultura esportiva através de cursos de formação e
congressos nacionais e internacionais como:
Sport&Joy (Esporte e alegria) - “Com o esporte autêntico a alegria corre”. Foi
o tema do Congresso 2005, realizado em Trento, sob o patrocínio da Unesco, como
parte dos eventos do Ano Internacional do Esporte e da Educação Física, promovido
pela ONU em 2005. Dialogaram sobre este tema esportistas que representavam 21
países, relatores e testemunhas renomadas.
Mesa-redonda das Nações Unidas em Genebra, sempre no contexto dos
eventos da ONU (27 maio 2005), para apresentar a cultura e projetos de esporte
para o desenvolvimento e a paz.
“Educar-se e educar através do esporte” foi o tema central do Congresso
2004, em consonância com o Ano Europeu da Educação através do Esporte,
promovido pela união Européia, realizado em Viena.
“Uma cultura da derrota, por uma nova cultura de vitória” foi o provocante
tema do congresso 2003, realizado na Mariápolis permanente de Loppiano (Florença
– Itália).
Entre seus projetos se destacam:
Sports4Peace (Esportes para a paz) – um projeto de educação para a paz
através do esporte, realizado na Áustria e hoje difundido em diversos países,
também graças a Sportmeet. As seis regras ilustradas no dado inflável colorido de
Sport4Peace: Play Hard (Jogue bem) – Do you best (faça o melhor que puder) – Play
Fair (Jogue limpo) – Hang in (Persevere) – Take care of (seja responsável pelos
outros) – Make a Difference (faça a diferença), oferecem a oportunidade de vivenciar
gestos de paz entre adolescentes e jovens de diversas culturas, raças e religiões,
94
tanto na escola quanto no esporte. Apóiam o projeto: os esquiadores Hermann Maier
e Michael Walchhofer, o piloto Ralf Shumacher, o campeão mundial de vôo livre em
asa delta Chistian Ciech, os jogadores Gianni Rivera e Johann Cruijff, o maratonista
olímpico Stefano Baldine.
Esporte, paz e desenvolvimento - Reconhecendo que a atividade esportiva
tem um papel significativo no crescimento integral da pessoa humana e no progresso
do tecido social, Sportmeet mantêm projetos esportivos em diversos países em
desenvolvimento: República dos Camarões, República Democrática do Congo,
República Dominicana, Argentina, Brasil, Colômbia, Romênia e Polônia.
No social
Foi fundado o Social One que reúne sociólogos, agentes e estudiosos de
ações sociais, há alguns anos envolvidos na pesquisa, reflexão e interação através
de uma dinâmica dialógica, na qual a escuta e a reciprocidade facilitam e constroem
a integração intelectual e espiritual. Social One é constituído por uma secretaria
internacional e, nos vários continentes, está se compondo uma rede internacional,
formada por pequenos círculos de estudo e reflexão, a fim de buscar juntos
perspectivas para o futuro no âmbito das doutrinas sociológicas (novas categorias
conceituais) e de experiências concretas no seio da sociedade.
Tem como objetivo recolher idéias, orientações e percursos para a pesquisa,
para a chave de leitura e interpretação da realidade e da ação no social, haurindo do
patrimônio espiritual e cultural do carisma da unidade que anima o Movimento dos
Focolares. Este trabalho está evidenciando perspectivas inéditas e uma contribuição
peculiar e original no conteúdo e no modo de pensar, analisar, compreender e agir.
Estas propostas foram objeto de três Congressos Internacionais realizados
respectivamente em 2002, 2003 e 2005. O primeiro sobre “As relações sociais”, o
segundo sobre “O conflito nas relações sociais”. O de 2005, que contou com uma
participação mais ampla e internacional em relação aos precedentes, teve como
95
tema: “Relações sociais e fraternidade: paradoxo ou modelo sustentável? Uma
perspectiva a partir das ciências sociais”.
Na arte
Foi criado o CLARTÉ a partir de artistas em diálogo do mundo inteiro, que se
interrogam sobre o significado de seu trabalho e exprimem a própria exigência de
exprimir de forma teórica o diálogo vital que nasce da espiritualidade da unidade, são
representados numa Comissão internacional de arte que tem sede em Grottaferrata
(Roma/ Itália).
Em 2005, músicos de vários gêneros iniciaram o One–beat, um trabalho de
pesquisa sobre estética e prática musical.
CLARTÉ interpela e impulsiona a sonhar com uma arte que descubra a sua
vocação social, que seja verdadeiramente “popular”, um momento de elevação para
muitos, uma arte que seja verdadeira recreação para quem dela se aproxima, que
dilate a alma ao mistério da beleza, que lhe estimule o pensamento, a profecia, que
contribua ao grande desafio do futuro: a unidade de povos e culturas.
CLARTÉ nasceu após o Congresso internacional sobre “Deus Beleza e o
Movimento dos Focolares” que aconteceu no Centro Mariápolis de Castelgandolfo,
em 1999. Em 2002, em Trento e em Palermo (Itália), realizaram-se os primeiros
“encontros-escola” promovidos pelo CLARTÉ sobre a relação entre o trabalho
artístico e a espiritualidade da unidade. Seguiram-se congressos anuais para jovens
de diversos países sobre o tema da vocação artística.
Na pedagogia
EdU - Educação Unidade se propõe a promover e coordenar em nível
mundial, através de uma secretaria internacional, o estudo e a pesquisa pedagógica,
a fim de nuclear uma teoria sobre a educação que emerge da experiência espiritual –
pensamento-Vida – de Lubich e do Movimento dos Focolares.
96
Seu objetivo é implantar a pesquisa sobre as razões fundamentais da
educação, para alcançar progressivamente uma síntese teórica, em função das
ações. Trata-se, portanto, de dar impulso a um modelo unitário de pesquisa da qual
emerge a necessidade da relação estreita entre teoria e práxis, entre palavra e vida.
Em particular a pesquisa quer valorizar a importância fundamental da dimensão dos
relacionamentos para a educação, baseada no mandamento novo de Jesus “Amai-
vos uns aos outros como eu vos amei”, na perspectiva do “que todos sejam um”.
EdU tem, portanto, o objetivo de exprimir as linhas estruturais de uma Pedagogia da
Unidade através das formas e categorias específicas, próprias da pesquisa e da
reflexão no campo educacional.
Pedagogos, especialistas na ciência da educação e educadores, na busca
comum de uma cultura fundamentada no amor recíproco e na unidade entre as
pessoas, grupos e povos, estão empenhados a confrontar-se na pesquisa sobre a
finalidade, os métodos e os resultados pedagógicos, através de congressos, grupos
de trabalho científico, fóruns, seminários e publicações de artigos e ensaios.
Na comunicação
NetOne, é uma rede de especialistas, estudantes e profissionais da mídia, de
cinco continentes, que trabalham ou estudam nesse campo, na perspectiva de um
mundo unido. É coordenada por uma secretaria internacional e conta grupos
regionais ou nacionais. Deseja ser um espaço aberto para quem trabalha ou estuda
no campo da comunicação, criando oportunidade de contato e de intercâmbio de
experiências profissionais, idéias, projetos, cursos de formação, aprofundamentos
culturais.
NetOne nasceu na Itália, em junho de 2000, depois de um congresso
internacional de New Humanity cujo título era “Comunicação e unidade – a mídia na
perspectiva de um mundo unido” O fato de constituir-se como uma rede, típica de
NetOne, relembra uma idéia já presente há mais de 60 anos no Movimento dos
Focolares, do qual NetOne é uma expressão. Naquela época já se falava de uma
97
“rede de unidade” que envolveria o mundo, não tanto uma organização, portanto,
mas uma arquitetura de relacionamentos autênticos.
NetOne fomenta uma comunicação que possa suscitar fraternidade, a fim de
que a globalização não sufoque os povos, mas se transforme numa enriquecedora e
estimulante oportunidade de comunhão mundial entre as civilizações e as culturas,
com propostas inovadoras.
As trajetórias de estudo e aplicação:
“Unidade e pessoa” - O primeiro e mais válido meio de comunicação é a
pessoa que se comunica, doando algo de si mesma;
“Unidade e verdade” - evidenciar e difundir idéias que levem a humanidade a
progredir rumo à sua realização: a fraternidade;
“Unidade e diversidade” - Valorizar as diversidades culturais, favorecer um
diálogo atento e respeitoso;
“Unidade e reciprocidade” - Promover uma comunicação que ajude a
compreensão entre as partes, enriqueça o pensamento, crie idéias e aplicações
novas e partilhadas por todos, promova solidariedade e paz;
“Unidade e universalidade” - Trabalhar para que o uso da mídia seja
accessível a todos, sem descriminações.
O primeiro congresso internacional promovido por NetOne aconteceu em
novembro de 2004, com o tema: “O silêncio e a palavra. A luz. Comunicação e
diálogo nas artes e nos ofícios da mídia: idéias e experiências. O comunicador pode
ser construtor positivo da sociedade?”
Em nível regional realizam-se encontros periódicos de diálogo e
aprofundamento profissional e ético com o título: “Comunicar para um mundo unido”.
98
Alternam-se com os “encontros de NetOne”, ou seja, reuniões com profissionais de
destaque, para uma troca de experiências e diálogo sobre temais atuais relacionados
ao mundo da mídia.
No Brasil o NetOne vem desenvolvendo reuniões de profissionais da
comunicação especialmente na cidade de São Paulo, e já se começa a trabalhar a
idéia de realizar um encontro nacional de comunicadores para 2008.
3. Os diálogos, caminhos da Unidade
Com a difusão do Movimento para além dos confins da Itália e da Europa, em
cinco continentes e, por meio de circunstâncias bem definidas, abrem-se os diálogos,
em nível individual, com personalidades, Movimentos e instituições, na fidelidade à
própria identidade, com o testemunho da própria crença religiosa, na abertura e
respeito para com a fé ou convicções alheias, evitando qualquer forma de
sincretismo:
No seio da própria Igreja: entre Movimentos eclesiais, novas comunidades e
associações leigas, com carismas antigos e novos das congregações religiosas, a
fim de aprofundar a comunhão;
Entre as diversas Igrejas cristãs: para tecer relações de comunhão fraterna e
de testemunho comum, que fazem desmoronar preconceitos e abrem o diálogo da
vida, do povo, como um fermento que pode acelerar o caminho da unidade visível
entre os cristãos;
Com os judeus: para sanar feridas seculares e redescobrir patrimônios e
raízes comuns;
Entre seguidores de diferentes religiões: para construir um mundo fraterno,
fundamentado nos valores do espírito;
99
Com pessoas de convicções não religiosas: para trabalhar juntos - tendo por
fundamento os valores universais compartilhados - no âmbito da solidariedade, da
paz e da justiça, pela fraternidade universal.
4. Conscientização para o “mundo unido”
Esta conscientização é realizada através de Congressos mundiais, que,
normalmente acontecem em Roma, e são transmitidos ao vivo, via satélite, por
centenas de canais de televisão nacionais e regionais:
"Genfest": é um Festival Mundial da Juventude realizado a cada cinco anos,
desde 1975, reunindo jovens de todos os continentes com o objetivo de "Ser
protagonistas do mundo unido", através do intercâmbio de experiências de vida e o
lançamento de projetos concretos. Em 1993, os Genfest’s nacionais em diversos
países reuniram um total de 100.000 jovens. Patrocinado pela UNESCO, o Genfest
1995 (14.000 jovens de 80 países), foi difundido por 350 canais de televisão e deu
uma contribuição importante à campanha anti-racista lançada pelo Conselho de
Europa e ao ano internacional da Tolerância.
O Genfest 2000, contou com a presença de 25.000 jovens de mais 200
países, presentes no estádio Flaminio em Roma, este evento realizou-se como parte
do Jubileu da Juventude do qual participaram 2 milhões de jovens. Neste Genfest foi
lançado o Projeto África II, que propõe fazer uma nova comunhão de bens a nível
mundial para ajudar concretamente a esse continente.
"Familyfest": para as famílias, houve em 1993 (14 mil participantes, de 87
países) com o patrocínio da ONU. Através desta manifestação, Chiara Lubich
impulsionou as famílias a serem educadoras da paz e a se tornarem modelos para a
inteira família humana. O último foi realizado no 16 de abril de 2005 , com o lema “O
Amor constrói a Paz”, o palco foi o mundo, aconteceram simultaneamente, ao redor
do mundo 193 Familyfest’s, com a participação direta de cerca de 200 mil pessoas e
outras milhões conectadas pela Internet ou via satélite pelas emissoras de televisão.
100
"Supercongresso Gen 3": para os adolescentes, o último, em maio de 2002,
reuniu cerca de 16 mil adolescentes, de mais de 180 países, com manifestações
públicas em favor da paz, na cidade de Roma e transmitidas para o mundo através
do canal RAI internacional.
“Voluntarifest”. Em setembro de 2006 se realizou o encontro intitulado “50
anos de serviço à humanidade”, que reuniu a 9.000 voluntários de todo o mundo no
moderníssimo ginásio “SportArena”, em Budapest (Hungria), para um retorno às
raízes da sua história e um novo incentivo ao compromisso deles na renovação da
sociedade. Os “voluntários de Deus” (ramificação do Movimento dos Focolares)
estão empenhados na renovação da sociedade.
5. Comunhão dos bens
Para terminar a abordagem ao Movimento dos Focolares, gostaríamos de
apresentar uma das características inatas deste Movimento que dará lugar ao objeto
da nossa pesquisa: a Comunhão de Bens.
Lubich e suas companheiras viram que a descoberta evangélica do
mandamento novo de Jesus – “amai-vos uns aos outros como eu vos amei”
92
desencadeou uma ampla comunhão material e espiritual dos bens, desde o início do
Movimento, em Trento, em 1943.
Segundo Pino Quartana
93
, a comunhão de bens que se vivia procurava se
espelhar da melhor maneira possível na comunhão vivida pelos primeiros cristãos,
de quem está escrito, "eram um só coração e uma só alma" e "tinham tudo em
comum..." e por isso "não existia necessitado algum entre eles" (cf. At 2,42-45; 4,32-
35).
92
BÍBLIA, 1982 Jo 13, 34
93
QUARTANA, Pino, A Economia de Comunhão no pensamento de Chiara Lubich, site do
Movimento Humanidade Nova em Brasília-DF Disponível em:
http://www.geocities.com/huma_bsb/eco.html Acesso em: 16 de novembro de 2006.
101
Esse é um fato de enorme importância e denso de conseqüências: aquela
comunhão de corações e de bens – corolário das primeiras comunidades cristãs, eco
dos ensinamentos de Jesus ao longo da vida da Igreja -, que parecia ter perdido a
força, ou sido conservada apenas nos mosteiros, conventos ou em algumas
comunidades de leigos.
Lubich e suas primeiras companheiras, sem dúvidas, tinham plena
consciência disso
94
:
"Nós tínhamos a intenção de atuar a comunhão dos bens na maior
extensão possível, para resolver o problema social de Trento. [...] Pensava
assim: existem duas, ou três localidades onde os pobres se encontram;
vamos lá, e dividamos com eles o que possuímos. É um raciocínio muito
simples: nós temos mais, eles têm menos; elevemos o nível de vida deles,
de modo tal, a chegarmos todos a uma certa igualdade".
Segundo Leite
95
são muitas as recorrências a essa realidade de abertura a
comunhão e a realização da igualdade que para Lubich significava como ela mesma
diz, atuar uma realidade já preconizada por personagens como:
São Jerônimo que diz: "Deves aos outros tudo aquilo que, em roupas ou
alimentos (também em alimentos), tens a mais do necessário". E Paulo
acrescenta: "Não desejamos que o alívio dos outros seja para vós causa de
aflição, mas que haja igualdade” (2 Cor 8, 13). Percebam que palavras
sábias e equilibradas.
Lubich ressaltando que a comunhão dos bens atuou-se desde os primeiros
anos do Movimento diz:
“Recordo que, embora já a vivêssemos, esta se alastrou depois de eu ter
escrito uma carta sobre este argumento, lida a toda a comunidade (por
Ginetta Calliari, me lembro), e que citava o exemplo dos primeiros cristãos.
E... teve um grande resultado. A resposta foi imediata e concreta.
Colocávamos em comum tudo o que podíamos todos os meses: meios
(dinheiro, coisas) e necessidades (era a mesma coisa: dizer a necessidade
ou o que se possuía era a mesma coisa), registrando tudo. Escrevíamos
tudo, pois tínhamos os nossos cadernos”.
94
ECONOMIA DE COMUNÃO, Disponível em: http://www.edc-online.org/br/ispirazione.htm, Acesso
em: 8 de dezembro de 2006.
95
Citando um discurso de Lubich na cidadezinha de Montet (Suíça) em16/08/97. Pág 205 e 206
102
Nesses cadernos, afirma Leite, existia o registro de tudo aquilo que
sistematicamente era recolhido: vestuário, remédios, alimentos. O arrecadado não
era distribuído apenas aos que aderiam ao Movimento, que em poucos meses já
eram cerca de quinhentas pessoas, mas também para todos os doentes, sem-teto,
mutilados, presidiários, os quais elas encontravam andando entre os destroços da
guerra, sobretudo nos bairros mais atingidos como o Androne, S. Martino, Laste e
outros, período em que a cidade se encontrava completamente devastada e as
pessoas na miséria.
Lubich mesmo viveu esta comunhão de bens, em primeiro lugar, juntamente
com as suas primeiras jovens companheiras e com essas quinhentas pessoas. É a
própria Lubich quem explica: "era uma comunhão completa, no sentido de que
também quem se encontrava na indigência colocava em comum as próprias
necessidades".
Num pequeno apartamento recolhiam-se víveres e medicamentos, de onde
depois tudo era distribuído. Desse modo vivia-se uma dimensão do Evangelho que
readquiria uma vitalidade inesperada em pleno século XX. Era um ato pequeno, mas
ao mesmo tempo de grande valor humano e cristão, pois levavam alívio aos
famintos, aos sem-teto, aos que não tinham com que se vestir, aos doentes,
mutilado, encarcerados. E, ao realizar este trabalho, a primeira comunidade do
Movimento dos Focolares tinha como objetivo resolver o problema social da cidade
de Trento, pois Trento era todo o "seu mundo" naquela época.
É deste fato, que tem início a surpreendente experiência do "dai e vos será
dado" evangélico. Em plena guerra, alimentos, roupas e medicamentos, são
colocados em comum com extraordinária abundância. Nasce a convicção de que o
Evangelho vivido contém a solução "em germe" para os problemas individuais e
sociais.
103
Portanto, percebe-se que já desde aquela época, não se tratava de uma
comunhão de bens direcionada apenas a obras caritativas, assistenciais, para aliviar
alguma pessoa, existia uma viva atenção à situação social e o esforço em contribuir
para resolvê-la.
Esta prática da autêntica comunhão de bens entre os membros mais internos
do Movimento e, depois, da ajuda concreta a quem quer que dele se aproximasse,
primeiro iniciada em Trento e depois difundida, aos poucos, em todo o Movimento no
mundo inteiro.
O Movimento dos Focolares, segundo Luigino Bruni
96
, desde o início exprimiu
também toda uma dimensão social e civil: desde 1943 a comunhão de vida tornou-se
também (de um modo natural, mas decido) comunhão de bens, com o objetivo de
“não ter nenhum necessitado entre seus membros”.
Após quase meio século dessa prática cotidiana da comunhão dos bens,
numa viagem de Chiara ao Brasil, nasceu em maio de 1991, a experiência
econômica da Economia de Comunhão, que será estudado no seguinte capítulo.
96
BRUNI Luigino A Economia de Comunhão, palestra apresentada no Voluntarifest Budapest
(Hungria), 16 de setembro de 2006. pág 1.
104
CAPÍTULO 3
A ECONOMIA DE COMUNHÃO
Como já foi destacada na introdução desta tese nosso objetivo central com
esta pesquisa é apresentar novas alternativas possíveis que vem sendo
vivenciadas no campo da Economia e da Comunicação em relação à
redescoberta do conceito de Economia de Comunhão. Para que possamos
explicitar como a Comunicação Organizacional pode contribuir para que mais
organizações possam se valer dessa nova forma de gestão, julgamos necessário
clarear os reais conceitos do que significa e quais os alicerces que sustentam a
EdC. É o que pretendemos com este capítulo.
Esta abordagem terá como suporte teórico fundamental o pensamento do
economista italiano Luigino Bruni
97
, um dos principais expositores e
pesquisadores da Economia de Comunhão no mundo.
Para este autor, a comunhão é o profundo pendor da economia. Segundo
ele “Quando surgiu, na Grécia antiga, oikos nomos indicava a ‘administração da
casa’, e o termo casa remete-se à família, à comunidade. Toda a história humana
é também uma história econômica, e dizer humano é dizer comunhão”.
Assim, essa familiaridade que se evidenciava naquela época, hoje parece
não existir mais. Quando percebemos a realidade que nos circunda como algo
que nos domina, como algo estranho a nós mesmos, temos a sensação de que
como indivíduos não temos a capacidade de intervir para modificar seu curso.
Nesse contexto vale lembrar a história do ser humano. Ele foi superando seu
sentimento inicial de medo da natureza, de temor pelo desconhecido e logo
quando dominou as técnicas e tecnologia, passou a enfrentar à natureza de forma
até audaciosa. Assim, ele permitiu-se construir novas oportunidades para
modificar as condições ao seu redor, impondo supremacia sobre as coisas.
97
BRUNI, Luigino, Comunhão e as novas palavras em economia, São Paulo: Cidade Nova, 2001,
p. 9
105
Na teoria econômica contemporânea o objetivo do mercado e das
empresas é transformar os interesses individuais, que às vezes se encontram
contrapostos, no bem-estar de cada indivíduo e, portanto do grupo entendido
como a soma de indivíduos em bens de consumo. O mercado pode garantir esse
processo de desenvolvimento e crescimento do bem-estar da sociedade, mas
para fazê-lo não pode prescindir da ética. O consumo, por sua vez, deveria ser
considerado como o comportamento pelo qual o homem logra satisfazer suas
necessidades materiais e espirituais.
Bruni
98
nesse ponto afirma:
“A relação econômica é concebida como a nova relação interpessoal,
típica da sociedade comercial, das grandes sociedades, distinta e, em
certos aspectos, oposta à relação típica da comunidade, personalizada e
baseada em vínculos sólidos. Nessa teorização, a esfera social
(recordemo-nos da Filosofia do direito, de Hegel) coincide com a
econômica, distinta somente da esfera privada (família) e da política
(Estado). Nessa primeira perspectiva, o desenvolvimento dos mercados
traz consigo o desenvolvimento da sociedade civil, que não se apóia na
dádiva ou na benevolência, mas unicamente em contratos e convenções.
Segundo essa visão, que é também ideológica, os mercados operam
sempre e de qualquer modo para o bem comum; representam a forma
mais elevada da sociedade civil, e qualquer intervenção, ainda que tenha
objetivos solidários (como a Taxa Tobin), é vista como obstáculo e, por
conseguinte, danosa e imoral”
99
.
Sendo assim encontramos no lado oposto a essa primeira tradição aos
autores que consideram os campos econômico e social como realidades
conflitantes entre si.
Para Bruni essa tradição conta entre seus expoentes autores como Marx e
Polanyi, Weber e Simmel, que consideram a esfera econômica regida por
princípios substancialmente em conflito com os princípios que regem a esfera
social.
O mercado é concebido como um âmbito regido pelo princípio da troca,
radicalmente diferente tanto do princípio que rege a esfera política (autoridade)
98
BRUNI, 2001, p. 14
99
São as posições, por exemplo, de M. Novack , M., 2000. L’impresa come vocazione. Soneria
Mannelli: Rubbettino. 2000.
106
quanto dos princípios da esfera privada e familiar (dádiva, gratuidade etc.). Todas
as vezes que a esfera do mercado exorbita e tende a expandir-se para esferas
adjacentes, ele o faz em detrimento das outras duas: a privada, que se
mercantiliza, ou a política, que se torna troca instrumental.
O ser humano está chamado a assumir responsabilidades neste sentido, e
a atuar com uma atitude de abertura total respeito a seu próximo, respeito em
particular dirigido a quem ainda hoje vive em condições de absoluta miséria.
Portanto, ciente destas responsabilidades, surgiram iniciativas de cunho
econômico na sociedade a partir do século passado, iniciativas que têm no
princípio da solidariedade e da comunhão, a força motriz para sua realização.
A partir das respostas do ser humano nasceram diversas iniciativas de
cunho econômico e social, como a EdC e a Economia Solidária.
Para fins desta tese, que tem como objeto de estudo a EdC, abordaremos
a Economia Solidária apenas com intuito de diferenciá-las.
Um dos estudiosos expoentes sobre a Economia Solidária é o professor da
USP e economista Paul Singer
100
que assim descreve o surgimento e sua
abrangência.
“(...) surgiu como modo de produção e distribuição alternativo ao
capitalismo, criado e recriado periodicamente pelos que se encontram
(ou temem ficar) marginalizados do mercado de trabalho. A unidade
típica da economia solidária é a cooperativa de produção, cujos
princípios organizativos são: posse coletiva dos meios de produção
pelas pessoas que as utilizam para produzir; gestão democrática da
empresa ou por participação direta (quando o número de cooperados
não é demasiado) ou por representação, repartição da receita líquida
entre os cooperados por critérios aprovados após discussões e
negociações entre todos; destinação do excedente anual (denominado
‘sobras’) também por critérios acertados entre todos os cooperadores”.
Na perspectiva apresentada por Singer
101
, para falar de Economia Solidária
faz-se importante ter clareza sobre o conceito de autogestão, pois a empresa
100
SINGER, Paul e SOUZA, André Ricardo (organizadores), A economia solidária no Brasil: a
autogestão como resposta ao desemprego, São Paulo: Contexto, 2000. p. 7.
107
solidária é administrada democraticamente, ou seja, pratica a autogestão. Assim,
nas empresas de menor porte todas as decisões são tomadas em assembléias
gerais e quando são grandes, são eleitos alguns delegados que deliberam em
nome de todos.
Dessa maneira, para que o princípio de autogestão se realize, é preciso
que todos os sócios se informem do que ocorre na empresa, bem como das
alternativas disponíveis para a resolução de cada problema. Portanto, um grande
inimigo da autogestão é o desinteresse dos próprios sócios.
Uma outra consideração é que as empresas da Economia Solidária são
organizações sem fins lucrativos, e seu foco principal, seu lucro, é a resolução de
um grave problema social, o desemprego.
Porém, segundo Carbonari
102
, a Economia Solidária também é entendida
como uma economia centrada na busca de condições de satisfação das
necessidades dos seres humanos, na perspectiva do bem-viver de todos e para
todos, a serviço do homem, e não apenas como a chamada economia de
sobrevivência, marginal à economia de mercado.
Já Razeto
103
, no mesmo ponto de vista, entende que a Economia Solidária
é vista como o caminho ascendente para uma nova forma de organização do
trabalho na sociedade capitalista, advinda das populações pobres e
marginalizada, a partir da força da solidariedade, a qual liberta e cria vínculos de
organização e de comunidade.
É dentro do mesmo contexto que se desenvolve a Economia de Comunhão
(EdC), que também oferece a possibilidade de enfrentar os desafios que nos
propõe a época atual de profunda transição. Percebemos que a alta produtividade
101
SINGER, Paul, Introdução à Economia Solidária, São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2002.
p. 16.
102
CARBONARI, P. C. Economia Popular Solidária: possibilidades e limites. Seminário Regional
Passo Fundo de Trabalho e Economia Popular e Solidária, 1999.
103
RAZETO, L. O Papel Central do Trabalho e a Economia de Solidariedade. In: Revista
Proposta, nº 75, dez/fev de 97-98.
108
do trabalho e a competitividade obscena que caracterizam o caminho da
globalização dos mercados, assim como a progressiva inserção dos países em
desenvolvimento, são portadoras de grandes tensões mundiais, nacionais e
locais. Deste processo de mudança é vital que surjam algumas formas de
conceber a economia de modo diferente.
Podemos entender, portanto que a Economia Solidária e a Economia de
Comunhão nasceram da identificação e necessidade de resolver o problema
social, mas com estrutura e perspectivas bem diferentes.
Sendo assim, a EdC propõe uma maneira de reagir de forma positiva à
situação atual de mal-estar e aridez da economia capitalista.
Já que ainda não se encontram soluções para programar a economia de
uma melhor maneira no que se refere ao comportamento do sistema de mercado,
é importante considerar os novos desafios que modelos como o da EdC
oferecem. Consideramos que a EdC é de vital importância para evitar as grandes
confrontações sociais, que vão agravando-se na sociedade globalizada devido às
desigualdades econômicas exacerbantes provocadas pelo poder dos grupos
econômicos e supranacionais que ditam as regras mundiais,.
A resposta à desigualdade entre ricos e pobres, explorados e exploradores,
pode ser uma resposta pacífica, mas muito laboriosa, porque precisa de uma
mudança de mentalidade, como propõe a EdC..
A aplicação da EdC se fundamenta em um tipo de conduta, atitudes,
interesses, aspirações e motivações capazes de fazer surgir um novo tipo de
realidade social. Estes foram abstraídos e permitiram conceitualizar e
caracterizar, por um lado, o que se denominou “Homem Novo”
em contraposição
ao “Homo economicus”, e por outro lado, à relação destes “Homens Novos” que
originam a chamada cultura do dar
104
como uma nova realidade social.
104
Todos estes novos conceitos serão apresentados posteriormente.
109
Na EdC a direção da empresa fica nas mãos do empresário e o trabalhador
fica empregado em cargos de tipo mais executores, mas se propõe uma
revalorização da importância das pessoas. Isto se realiza reconhecendo-lhes o
direito a perceber uma adequada remuneração por sua participação, seu esforço
e sua gestão na empresa. Isto ocorre essencialmente pelo sistema de prêmios de
produtividade.
O êxito da economia em satisfazer a necessidade de justiça depende antes
de mais nada do papel que os empresários desenvolveram, por isso é que
devemos reconhecer a importância dos mesmos em todos os processos
econômicos. A EdC parte também da idéia de que são os empresários os
baluartes da revolução que se quer realizar a partir desta mudança de
mentalidade.
1. Doutrina Social da Igreja
Para entender à EdC é necessário entender numa primeira instância à
Doutrina Social da Igreja (DSI), e a partir dela, percebemos que a Igreja Católica
desde seu início propunha, pelo menos no seu discurso, que a brecha social
(ricos e pobres), seja cada vez mais reduzida. Sempre se manifestou contra a
desigualdade social, pelo que sua importância não é simplesmente histórica,
senão que tentou introduzir seu pensamento em diferentes concepções
econômicas.
É importante sublinhar que a EdC quer ser uma resposta concreta ao apelo
do Papa João Paulo II, quando acenou para a urgência e necessidade de uma
“economia de comunhão”, expressão utilizada, pela primeira vez, em outubro de
1992, na Quarta Conferência Episcopal Latino-americana, na cidade de Santo
Domingo
105
, que aponta a superar o desnível entre o Norte rico e o Sul pobre do
105
CARRIER H, Dottrina Sociale.Nuovo approccio all’insegnamento sociale della Chiesa,
Roma: San Paolo, 1993, p.21.
110
planeta. Essa expressão, tomada textualmente, é a que deu nome a este projeto
econômico promovido pelo Movimento dos Focolares.
Segundo Maria Teresa Branch Savino
106
, a Doutrina Social da Igreja é tão
antiga quanto a Igreja mesma pois dá forma ao comportamento e moral cristãos.
O Evangelho, de fato, impõe na ótica da missão profética da Igreja, atenção aos
contextos sociais, políticos e econômicos, para promover a justiça, a defesa do
mais necessitado e a caridade.
Na Encíclica Centesimus Annus
107
encontra-se delineados os principais
aspectos da DSI, que podem ser apresentados da seguinte maneira:
A interpretação das novas situações é indispensável, mas não constitui o
aspecto específico do Magistério da Igreja;
Através da Doutrina Social, a Igreja assume sua missão histórica de
evangelização;
A Igreja trata de manifestar constantemente sua preferência para com os
pobres;
O homem, sua dignidade, seus direitos, seu destino religioso e seu valor
único, são o centro da doutrina da Igreja;
A Igreja defende a realidade e a verdade de cada cultura e o dinamismo
vital dos países;
A Igreja desenvolve uma ação não violenta contra a opressão e a guerra,
utilizando como armas só a justiça e a verdade;
A desastrosa experiência do marxismo confirma a posição da Igreja sobre
as condições de uma autêntica liberação social;
A Igreja não propõe nenhum modelo senão uma orientação moral válida
para qualquer sociedade;
A evangelização é para todos os países um fermento de cultura que se
renova a cada geração;
106
BRANCH Maria, L'Economia di Comunione: uma proposta per uma società più giusta e
solidale. Instituto Superiore di Scienze Religiose di Malta, 1995, p. 4.
107
Centesimus Annus 35
111
Os católicos se empenham em favor da justiça e a paz em um espírito de
colaboração ecumênica e inter-religiosa.
De maneira geral, podemos afirmar, que a EdC é uma proposta concreta
inspirada nos princípios da Doutrina Social da Igreja, estes princípios, entre
outros, são os seguintes:
o direito à propriedade e privada e sua finalidade social e universal,
a liberdade de associação,
a solidariedade,
a valorização máxima do homem, e
a defesa dos direitos humanos.
Como vimos no capítulo anterior, a EdC se desenvolve através do carisma
do Movimento dos Focolares e se enriquece com a experiência de comunhão de
bens materiais e não materiais, realizada por seus membros ao longo dos
sessenta anos de história, prática que se denominou como Cultura do dar,
originada a partir da vivência dos primeiros cristãos e centrada na concretização
radical do Evangelho.
Sobre o particular, Vera Araújo
108
escreve:
“Destas duas premissas (a inspiração na Doutrina Social da Igreja e a
experiência do Movimento dos Focolares) se recolhe a vontade de
concretização de uma espiritualidade própria de seu tempo e o influxo -
nada marginal - da Doutrina Social Cristã percebida não por
especialistas, senão com a agudeza e a profundidade de um carisma”
Um sistema econômico moderno e de mercado que se inspira nos
princípios da Doutrina Social da Igreja deveria, portanto, ter a característica de
garantir todos os seguintes aspectos, alicerces da sua proposta:
a liberdade de iniciativa privada e individual, baseada no respeito da
liberdade de todos,
108
Socióloga brasileira publicou numerosos estudos sobre Doutrina Social da Igreja Católica e
sobre Economia de Comunhão, colabora com diversas revistas no mundo.
112
a importância da empresa, onde o empresário se empenha a fazer produzir
suas capacidades a serviço dos recursos materiais e humanos a ele
confiados,
a centralidade do homem e o trabalho, entendido como o fator de seu
desenvolvimento e como meio de expressão de sua criatividade,
o significado social do trabalho, para a melhoria da qualidade de vida do
indivíduo e da comunidade,
uma remuneração adequada ao nível de empenho e ao alcance dos
objetivos de eficiência,
uma forte coesão entre liberdade, criatividade, responsabilidade,
solidariedade e justiça social,
o destino universal dos bens, ao qual se encontram subordinados não só a
propriedade individual das pessoas, senão também a propriedade e as
riquezas dos povos.
A encíclica Centesimus Annus promulgada em 1º de maio de 1991 pelo
saudoso papa João Paulo II, ressalta os valores positivos da economia de
mercado, da empresa e dos empresários, e ao mesmo tempo coloca no
empresário uma responsabilidade para com toda a sociedade.
Ao se referir à importância dos empresários, João Paulo II afirmou:
“O grau de bem-estar que goza a sociedade atual seria impensável sem
a figura dinâmica do empresário, cuja função consiste na organização
do trabalho humano e dos meios de produção, de maneira que se
consigam os bens e os serviços necessários para a prosperidade e o
progresso da comunidade”
109
.
A EdC se inspirou no pleno respeito destes princípios e ainda que quando
possa parecer utópico, se faz importante tê-lo hoje em consideração como uma
das possibilidades que dispomos para enfrentar o desenvolvimento econômico
das empresas e talvez nos próximos anos, também a nível mundial.
109
João Paulo II, Discurso aos empresários e executivos da EdC (Milão, 2 de maio de 1983).
113
2. Origem e desenvolvimento
Numa primeira aproximação à definição da EdC, recorreremos a Vera
Araújo
110
, quem afirma:
“A Economia de Comunhão nasce do ‘húmus’ de um ato de amor.
Chiara Lubich, visitando o Brasil em 1991, se depara com a pobreza
das ‘favelas’ que compõem o cinturão periférico da cidade de São
Paulo, convivendo muitas vezes lado a lado com uma floresta de
arranha-céus. Nesta ocasião ela se intera de que muitos de seus ‘filhos’
vivem ali’. Como remediar esta situação? Onde está a solução para um
problema de tais dimensões? Para Chiara, a resposta era simples:
como uma verdadeira família que é. O Movimento dos Focolares não
pode aceitar que parte de seus filhos (se contava então com 200 mil, o
número dos membros participantes no Brasil) tenham condições de vida
digna e outra parte não. (...) foi então, que naqueles dias, surge a
inspiração de Chiara: fazer com que surjam empresas, dirigidas por
pessoas capazes de fazê-las produzir lucro, e depois repartir estes
lucros em três partes: uma para os necessitados, outra para a formação
de homens novos (já que sem eles não se constrói uma sociedade
nova) e uma outra parte, para investir na própria empresa, para
sustentá-la e fazê-la progredir”.
Assim, a idéia da EdC é formalizada em 1991 no âmbito do Movimento dos
Focolares por sua fundadora e presidente Chiara Lubich durante sua visita às
comunidades do Movimento no Brasil.
Dois elementos foram fundamentais para a formalização da EdC:
1. O “encontro” com a realidade social do Brasil
A história foi assim, no ano de 1991 tinha sido reservado na agenda de
Chiara Lubich para uma visita à comunidade do Movimento no Brasil. Ela havia
dito uma vez que recebia cartas dos brasileiros que lhe falavam, ‘em todos os
tons’, a respeito do problema social existente no País resultante da desigual
distribuição da riqueza e da renda entre a população.
Como explicitamos na introdução deste trabalho o contraste entre ricos e
milhões de pobres no País é dramático. Os 10% mais pobres da população vivem
com 0,8% da renda nacional enquanto que os 10% mais ricos possuem os 49,7%.
110
1
a
Escola Internacional de Empresários, na celebração dos 10 anos da Economia de Comunhão,
Castelgandolfo, Roma, 5 a 8 de abril de 2001.
114
Chegando ao Brasil ela se depara com a situação de muitos dos membros
do Movimento que, afetados por essa crise econômica, encontravam-se em
condições precárias de subsistência sendo que muitos estavam desempregados.
A praxe de “comunhão de bens” (vista no capítulo anterior) que sempre
marcou as relações sociais dentro do Movimento já não era suficiente para
garantir a todos esses membros condições mínimas materiais de vida
satisfatórias.
Passando pela cidade de São Paulo e vendo as numerosas favelas,
Lubich
111
anotará posteriormente em um Diário: “(...) a ‘coroa de espinhos’, como
o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns de São Paulo chama o cinturão de pobreza e
miséria que circunda a cidade (…), fez-me recordar Roma após a guerra (...). Aqui
os problemas são de outra dimensão. (...)”.
Num outro momento Lubich visitando o focolare masculino de São Paulo
ficou sabendo da história da cidade e escreve no seu Diário o seguinte:
“(...) em 1900 era apenas um vilarejo e agora é uma floresta de arranha-
céus. É o que faz o capital concentrado nas mãos de alguns, e a
exploração de muitos outros. Por que – nos questionamos - tamanha
potência não é direcionada para a solução dos imensos problemas do
Brasil? Porque falta o amor ao irmão e dominam o cálculo e o egoísmo.
Mas a esperança existe, ou melhor, a certeza. Era visível no semblante
dos focolarinos durante o encontro que tive na casa deles”
112
.
A percepção, que Lubich descreveu ao se colocar em contato com a
realidade brasileira, está de acordo com uma das raras unanimidades que hoje
existe no mundo acadêmico: a má distribuição de renda e o elevado desemprego
estrutural como um dos problemas mais graves do capitalismo globalizado. Que
se apresenta ainda mais cruel nos países em via de desenvolvimento como é o
caso do Brasil.
111
Em 15 maio 1991.
112
Em 22 maio 1991.
115
2. O carisma da unidade e a fraternidade universal
O Movimento dos Focolares leva este carisma como impulso, inspiração e
vida desde a II Guerra Mundial, e não foi casualidade que Lubich tenha sentido a
vontade de pensar em alguma alternativa perante a situação econômica e social
que se apresentava.
Em um encontro de Lubich com os dirigentes do Movimento no Brasil,
reunidos na Mariápolis Araceli (hoje Ginetta), em 25 de maio de 1991, procuram
refletir sobre a dimensão sócio-econômica intrínseca à espiritualidade do
Movimento, procurando soluções para responder ao impacto provocado pela crise
econômica que se estava desenvolvendo e assolando o país.
Ainda em seu Diário, Chiara anota:
“Hoje de manhã tive um encontro muito importante com os/as dirigentes
do Movimento. Falei de algumas idéias que tive sobre o futuro
desenvolvimento desta Mariápolis (...). Os focolarinos casados,
voluntários e membros do Movimento Famílias Novas (capacitados)
poderiam implantar e desenvolver empresas (…). O lucro desses
empreendimentos – sob o impulso do Ideal – seriam colocados em
comum livremente a fim de garantir uma vida digna aos moradores e
contribuir para o desenvolvimento da Mariápolis e das próprias empresas
(...). Uma Mariápolis no Brasil com estas características, onde o
contraste entre ricos e pobres constitui a chaga social por excelência,
poderia representar um farol, uma esperança”
113
.
Foram nesses pensamentos que se encontra em germe da Economia de
Comunhão. Naquele momento fugia à consciência da própria Lubich as
dimensões que em seguida o projeto iria tomar.
Este mesmo carisma explica porque o projeto foi acolhido com tanto
interesse e com uma adesão tão imediata em outras partes do mundo, enquanto
expressão econômica da comunhão de bens espirituais e materiais dentro do
Movimento.
113
Em 25 maio 1991.
116
Por isso, desde seu início a prática da ‘comunhão de bens’ foi conjugada
com um alto conceito do trabalho, considerando-o constitutivo do homem e,
portanto deve realizar-se da melhor maneira possível, ainda que com a percepção
de não colocar a atividade trabalhista em primeiro lugar na escala de valores.
Pode-se dizer que desde que nasceu o Movimento até agora, a experiência
de mais de 60 anos de autêntica comunhão dos bens entre seus membros e de
ajuda concreta a quem a necessitava a nível mundial, é importante e essa é a raiz
da EdC lançada no Brasil.
Outros motivos de inspiração da EdC foram:
a intuição de fundar cidadezinhas “com casas, escolas, mas também
indústrias, empresas onde testemunhar como seria o mundo se todos
vivessem o amor evangélico”
114
;
a reflexão sobre a encíclica Centesimus Annus, expressão da situação
econômica, social e política do mundo, reafirmada através da Doutrina
Social da Igreja, que afirma a legalidade da liberdade de iniciativa, de
associação, mas também convida à solidariedade para convertê-la em uma
hipótese para uma economia mundial... Um sonho talvez, mas também
uma esperança.
Lê-se no discurso de Lubich de 29 de maio de 1991 aos habitantes da
cidadezinha Araceli
115
, no Brasil:
“(...) Aqui em Araceli nasceu uma idéia: que nosso Movimento no
Brasil, que conta com umas 200.000 pessoas (...) seja chamado a
realizar uma comunhão de bens mais ampla, que envolva a todo o
Movimento em seu conjunto (...) sob o impulso da comunhão dos bens
devem surgir empresas. Estas devem ser de vários tipos e sustentadas
por pessoas de todo o Brasil, deve nascer uma sociedade onde cada
pessoa tenha a possibilidade de uma participação igualitária, ainda que
modesta. A gestão de tais empresas deve ser confiada a pessoas
114
Em 1961 mirando o complexo da abadia beneditina de Einsiedeln, na Suíça, Chiara sente a
necessidade de poder fazer nascer uma cidadela moderna com casas, escolas, industrias,
empresas onde dar testemunho do ideal da unidade entre todos homens.
115
A Mariápolis Araceli (hoje Ginetta) se encontra no Município de Vargem Grande Paulista, a 50
km do centro de São Paulo – Rodovia Raposo Tavares Km 42.
117
capazes e competentes, que possam fazê-las funcionar com a máxima
eficiência e gerar lucro.. E aqui está a novidade: estes lucros devem ser
colocados em comum. Deve nascer assim uma ‘Economia de
Comunhão’” na qual a cidadezinha constitua um modelo, uma cidade
piloto. Também nós certamente pensamos em um capital, mas lucro é o
queremos colocar em comum livremente. E para que fins? Os mesmos
fins da primeira comunidade cristã: para ajudar aos que estão em
necessidade, para dar-lhes com o que viver, para ter como oferecer-
lhes um posto de trabalho... Naturalmente para incrementar as
empresas, enfim para desenvolver as estruturas em função da formação
de ‘homens novos’, motivados pela solidariedade recíproca, porque sem
homens novos não se faz uma sociedade nova”
116
.
A EdC vai além da comunhão de bens, porque se trata da utilização
concreta desta comunhão: não se limita mais a doá-los simplesmente, senão que
são colocados em circulação na sociedade para que outros produzam e visa a
emancipação do homem, não a dependência de práticas assistencialistas.
Segundo João Manoel Motta
117
, comunhão de bens e pobres, ou, mais
concisamente, “pobreza-comunhão”, aparecem como um fio-condutor que, ao
lado do timbre da “unidade”, acompanha o Movimento em sua história social até
os albores do projeto EdC, como uma matriz condutora de um processo
integrador-comunional, que a nossa perspectiva traz como hipótese.
A EdC é a expressão econômica da vida da unidade proposta pelo
Movimento dos Focolares, concretizada nas relações econômicas renovadas,
entre homens que doam livremente em função do bem comum seus talentos, as
capacidades empresariais, a profissionalidade ou seus capitais monetários.
Para realizar este projeto, a EdC investe na atividade trabalhista e a
empresa se estrutura baseada da economia moderna, e se orienta a colocar em
comum os recursos, revitalizados por homens capazes de usar o princípio de
solidariedade, abertos ao exterior em direção de uma economia ao serviço da
comunidade local e mundial.
116
Discurso de Chiara Lubich em 29 de maio de 1991 na Mariápolis Arceli.
117 MOTTA, João Mantel, Da cooperação à comunhão: Ciência, movimentos sociais e processo
civilizatório: estudo sistêmico do projeto Economia de Comunhão (EdC) como um modelo sócio-
econômico inclusivo. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo: Mestrado em ciências da
religião, 2004, p. 191
118
3. Objetivos da Economia de Comunhão
No início a EdC nasceu com a intenção de solucionar sobretudo o
problema da pobreza dos membros do Movimento, pois a partir de um censo em
todas as regiões do mundo, evidenciou-se que só entre seus membros existiam
10.000 pobres, em virtude de que o número de participantes no Movimento havia
triplicado.
Porém entendamos que a pobreza, desde a perspectiva da EdC tem vários
matizes, segundo Bruni:
“No cristianismo, encontramos a pobreza nos Evangelhos e em todas as
Escrituras: ‘Aos pobres foi anunciada a boa nova’ (Mateus 11,5), ‘os
pobres são chamados bem-aventurados’ (Lucas 6,20) e o próprio Jesus,
de ‘rico, se fez pobre’, como afirma Paulo. Bastariam essas menções
para suspeitarmos que, sob essa palavra, pode estar escondido até
mesmo um tesouro”.
Para este autor, existe uma pobreza de que se é vítima, quase sempre
provocada e alimentada pelas injustiças dos homens e pelas “estruturas de
pecado”: é a indigência, a miséria, a falta de bens necessários à vida. É a pobreza
que deve ser combatida e erradicada com todo o esforço e em todos os níveis
(pessoais e institucionais), por ser um atentado à dignidade humana. É a essa
pobreza que se dirigem os programas sérios de erradicação da pobreza, cujo
insucesso também animou e sempre animará a EdC.
Mas Bruni chama a atenção para não nos esquecermos de que existe
também uma outra pobreza, a pobreza escolhida livremente, que é realmente
fonte de felicidade e constitui o pré-requisito para derrotar a pobreza injusta e
desumana; pobreza que representa um ideal também para toda pessoa que vive
e acredita na EdC.
Esta é a pobreza que nasce da consciência de que tudo o que sou, bem
como tudo o que tenho, me foi doado e como tal deve ser re-doado. É uma
pobreza ontológica, raiz da dinâmica da reciprocidade genuína e gratuita. Essa
pobreza nos impulsiona a libertar-nos interiormente dos bens e das coisas
119
enquanto propriedades absolutas, para fazermos delas dádivas e assim sermos
livres para amar e para fazer desses bens pontes, caminhos de reciprocidade,
oportunidades de comunhão.
Por isso, enquanto a primeira pobreza-indigência é imposta; a segunda
pobreza pode ser somente escolhida, necessitando de motivações intrínsecas,
necessitando da cultura.
A EdC, segundo Bruni, combate a miséria e a indigência, mas combate-as
propondo a todos a “pobreza escolhida”, pré-requisito para se compreender a
lógica da comunhão e para se experimentar o “cem vezes mais” que a comunhão
acarreta e constitui a sua característica.
Por essa razão a EdC, segundo Valeria Ferrero
118
, propõe a constituição
de empresas e atividades econômicas no possível compostas por sociedades de
acionários anônimos.
Estas sociedades não só têm que ser administradas por pessoas
competentes que livremente estão dispostas a colocar em comum suas utilidades
monetárias, senão também o conhecimento necessário para a criação de novos
postos de trabalho para:
1. Ajudar aos que vivem em condições de miséria, a satisfazer suas
necessidades mais urgentes e imediatas para logo inseri-los no ciclo
produtivo e torná-los auto-suficientes;
2. Incrementar a produtividade das empresas que aderem ao projeto com o
reinvestimento de parte do lucro;
3. Desenvolver estruturas para a formação de “homens novos”, educados
segundo a cultura do dar capazes de viver, aliados ao plano econômico, os
valores da solidariedade.
Estes são os três pontos fundamentais da EdC que explicamos a seguir:
118
FERRERO Valeria, Economia di Comunione e gestione delle imprese: dall'utopia alla
proposta. Faculdade de Economia e Comercio Universidade de Torino, 1987 pp. 10 – 11.
120
A primeira parte dos lucros a serem partilhados tem como objetivo a
solidariedade com as pessoas economicamente carentes que não conseguem
ganhar sua subsistência de uma maneira digna. A EdC surge como um método
de produção e distribuição de bens, direcionado pontualmente para socorrer
necessitados e pobres, inicialmente do próprio Movimento em escala global.
A segunda parte dos lucros deve incrementar a produtividade das
empresas. Isto é de vital importância porque são necessárias empresas rentáveis
para que os lucros sejam reinvestidos na própria empresa. Podemos afirmar que
é até estratégica a partilha dessa parte dos lucros com a finalidade de sustentar e
promover espaços culturais de sociabilidade na empresa.
A terceira parte da distribuição dos lucros pode ser entendida como o
desejo de transmitir os valores que suscitam a EdC. A difusão desses podem
forjar um novo modo de se fazer e de se conceber a própria teoria econômica, no
qual a esfera ética e a econômica sejam entendidas como distintas mas não
separadas. As Escolas e Congressos de EdC se estão multiplicando em todos os
países. A formação de “homens novos”, faz possível afirmar e reafirmar os
valores éticos. Cultivando nas pessoas ações sociais segundo os princípios da
fraternidade e da solidariedade. Essa é uma condição imprescindível para a
sustentabilidade da EdC, pois serão essas pessoas que estarão capacitadas a
tecerem relações sociais em vários níveis e portanto a constituírem uma
“sociedade nova”, marcada pela “cultura da partilha” e não do “acúmulo egoísta”.
Em suma, segundo estes pontos, o lucro que se consiga será distribuído
da seguinte maneira:
para fins sociais,
para estruturas de formação humana.
para o desenvolvimento das empresas,
121
Bruni
119
lembra que as três partes — “um terço, um terço, um terço”
representaram o slogan com o qual tudo teve início, e que ainda hoje inspira o
projeto.
Em primeiro lugar os pobres. Os pobres da comunidade e também aqueles
que têm uma relação vital com ela. Para os pobres procura-se emprego e para
eles criam-se projetos de desenvolvimento, sem se limitar a assisti-los
financeiramente (embora isso aconteça como medida de emergência e, portanto,
provisoriamente).
A parte destinada à formação cultural (na forma de imprensa, congressos,
estruturas, bolsas de estudo, etc.) corresponde à exigência de visar ao
desenvolvimento integral de toda a pessoa. Além do mais, se a comunhão não se
tornar cultura, não haverá qualquer esperança de que a EdC dure no tempo e o
problema social possa algum dia ser resolvido. De fato, este não existe pela falta
de recursos econômicos, mas, em primeiro lugar, por determinadas visões e
escolhas culturais. A espiritualidade do Movimento dos Focolares visa ao mundo
mais unido, à fraternidade universal; por isso, não surpreende o fato de ter
nascido dela um projeto econômico que não se satisfaz com a redistribuição de
renda, mas mira transformar a cultura por um humanismo autenticamente
“humano” e fraterno.
Finalmente, a terceira parte, que permanece na empresa. A empresa deve
desenvolver-se e crescer, e para isso tem necessidade, especialmente em certas
fases, de autofinanciamento e de investimentos. Isso também mostra que o
projeto não é uma intervenção de emergência; é muito mais uma proposta para o
funcionamento normal da vida econômica e empresarial. Note-se que a empresa
deve desenvolver-se preservando o meio ambiente, relacionando-se a longo
prazo com este, sóbria e responsavelmente. Portanto, ela não pode crescer
depredando o ambiente circunstante, mas sua finalidade é valorizá-lo, integrando-
o aos próprios objetivos e às próprias escolhas.
119
Ibid Bruni p. 22
122
Sendo assim, a vida de comunhão manifesta-se também na comunhão do
lucro, segundo estes três objetivos, que é o aspecto mais visível da vida de
comunhão dessas empresas. Mas, desde os primeiríssimos tempos do projeto,
compreendeu-se claramente que a comunhão é muito mais exigente do que a
mera repartição do lucro.
Por isso Bruni questiona:
“Afirmar que a comunhão do lucro é a ponta do icebergo significa,
contudo, subestimar seu papel essencial. O lucro dividido em três partes
é, desde 1991, efetivamente, o primeiro elemento da identidade do
projeto e até hoje uma medida, indicador concreto da qualidade e
seriedade da comunhão que procede e sucede a repartição do lucro. De
qualquer modo, é necessário lembrar que a empresa é um corpo vivo, e
pode acontecer — como de fato acontece — que, em determinado ano,
o lucro produzido tenha de ser todo reinvestido para se enfrentar uma
crise; mas seria um sinal muito preocupante uma empresa, durante
alguns (ou muitos) anos, não colocar em comunhão o lucro: ou
desapareceu a “cultura da comunhão” ou faltou a capacidade da
organização empresarial de gerar valor agregado”.
Portanto, o lucro sim está destinado aos “pobres” que na liberdade
compartilham também suas necessidades e são os protagonistas da Economia de
Comunhão.
Em 1999, Chiara Lubich, na cidade de Piacenza (Itália), por ocasião do
recebimento do título de doutor honoris causa em economia disse:
“Aqueles que se encontram em dificuldade econômica, destinatários de
uma parte do lucro, não são considerados ‘assistidos’ nem
‘beneficiários’ da empresa. São membros essenciais, ativos do projeto,
no qual eles dão aos outros as próprias necessidades […]. Na
Economia de Comunhão a ênfase, na verdade, não é dada à filantropia
por parte de alguns, mas antes à partilha, na qual cada um dá e recebe
com igual dignidade”
Aqueles que recebem a ajuda da EdC são pobres que estão no mesmo
plano de dignidade. Assim, não impressiona o fato de conhecer empresários que,
alguns anos antes, eram contados entre os destinatários da ajuda. Porém, cuidar
dos pobres que estão em contato com o Movimento dos Focolares não significa
esquecer outros milhões de pobres, como afirma Mulatero
120
:
120
MULATERO, C., 2000. Os pobres “atores” do projeto EdC. In: Economia de Comunhão - Uma
nova cultura, n. 13, p. 12.
123
“Este projeto deseja alcançar primeiramente os pobres que, tocados
pelo carisma da unidade, vivem a espiritualidade da qual ele se
originou. Os demais não estão excluídos; pelo contrário, o problema é
considerado na sua complexidade e amplitude, mas na fase inicial faz-
se o que é possível. Atua-se desse modo, para gerar uma comunidade
[…] de forma que não exista nenhum indigente”.
Para a gestão e a coordenação das utilidades que voltam à empresa,
foram instituídas em todas as zonas do mundo comissões independentes das
empresas e sem nenhum poder sobre as mesmas formado por membros do
Movimento dos Focolares que centralizam as informações das necessidades.
Dá-se verdadeiramente, também, que como objetivo para as empresas que
aderem à EdC, se encontra a adoção de um comportamento econômico
respeitoso:
da legislação fiscal vigente,
das normas sobre a segurança do trabalho,
da qualidade do produto (e o preço ao consumidor),
do cuidado no entorno de trabalho, e
da competência leal.
Este comportamento econômico é uma característica que nasce da
mudança do ser humano em função de uma sociedade mais justa. A EdC propõe
em primeiro lugar a mudança pessoal, sair do universo de homo economicus para
chegar ao homem novo.
4. Do homo economicus ao homem novo.
Devido ao fato que a aplicação prática da EdC tenha surgido antes de sua
descrição e a análise da sua influência na ciência econômica, este projeto não
pode ser explicado a partir da teoria econômica convencional
121
, já que pareceria
irracional e até certo ponto “não econômico”. Para entender a EdC é preciso
tentar estabelecer a relação entre o comportamento do homem e os problemas
121
Faz-se alusão à teoria econômica da qual seu enfoque parte basicamente da mesma hipótese do
comportamento do ser humano: do homo oeconomicus
124
que a humanidade enfrenta na atualidade, e que sem dúvida derivam de
processos comunicacionais.
Devido ao clima de aguda incerteza gerado por um profundo processo de
transformação cuja origem se encontraria nas amplas tendências que afetam hoje
à humanidade, na realidade derivariam de mudanças muito mais profundas, de
caráter integral e que se manifestam em todos os aspectos da vida do homem.
A respeito disso, segundo Ramón Muñoz
122
:
“Vivemos num mundo novo. Até ontem nos movíamos no campo da
estabilidade da matéria, das concepções mecânicas do universo e da
vida, das mudanças lentas e progressivas, da dualidade dos pares de
opostos e da divisão e desenvolvimento de partes separadas. A partir
da grande revolução da era moderna nos movemos em um campo de
consciência unitária e expansiva, de visão de totalidade e integralidade,
de liberação de limitações e separações e de ânsias de transformação e
transcendência. Hoje em dia explodiram os marcos convencionais do
espaço-tempo e o homem tem necessidade de uma nova vida, com
acesso a uma nova dimensão do ser”.
Apesar das mudanças, nossa inércia nos leva ainda a pensar com
referência a esquemas anteriores. O ser humano ao esforçar-se por dividir a vida
com suas idéias e emoções terminou perdendo o sentido da totalidade e unidade
da mesma. Ao final se colocou uma separação entre a vida do homem e a vida do
universo.
Estas considerações permitem além de sustentar que o ser humano, como
a humanidade, deve dar um salto em seu estado de consciência, que lhe permita
participar, expandir-se e harmonizar sua individualidade com a coletividade.
A humanidade se encontraria em processo de transição de um estado de
consciência possessivo para um estado de consciência egoente. A egoência do
ser, segundo Ramón Muñoz
123
, se explica da seguinte maneira:
“A egoência é uma necessidade individual do ser, é uma necessidade
de liberdade interior, é uma necessidade de lograr uma harmonia de
valores humanos e divinos, é uma necessidade de conhecer e
122
MUÑOZ Ramón, Gérmenes de futuro en el hombre, Buenos Aires: ADCEA, 1991, p. 22
123
MUÑOZ Ramón, La egoencia del ser, Buenos Aires: ADCEA, , 1991, p. 26
125
experimentar as leis fundamentais da vida individual e do universo, mas
experimentar tudo isso por si mesmo. E, ao mesmo tempo, é um negar-
se ao que ditas leis e necessidades lhe sejam impostas por autoridade,
como sistema já fabricado de idéias e conceitos ou como teorias prévias
sobre o homem e a vida”.
Gráfico 4
Do estado possessivo ao estado egoente
Fonte: Elaboração própria
Tornam-se interessantes hipóteses deste estilo que mostram certo espírito
do tempo que neste caso compreenderia quatro etapas consecutivas:
competência, tolerância, solidariedade e participação
124
.
Como as relações são a trama da vida, a humanidade conseguiria avançar
de uma etapa a outra na medida em que se vão tecendo relações entre as
pessoas e isto as conecta com todos os aspectos da vida, a medida que as linhas
de relação se expandem, se fundem umas com outras observando-se um
processo de união que na realidade é a simplificação gradual das relações até
que todas elas se integram numa relação única (transparente e simples).
124
WAXEMBERG Jorge, El arte de vivir la relación, Buenos Aires: ADCEA, 1993, p. 75
126
Quadro 5
Etapas: Competência, tolerância, solidariedade e participação.
Competência
A necessidade de sobreviver leva ao ser humano a
competir a qualquer custo sem esperar as
conseqüências.
Ao manter uma atitude competitiva, o ser humano se crê
separado do conjunto o que lhe induz a manipulá-lo
todo, a crer que pode destruir o que se opõe a suas
conquistas.
Tolerância
O sofrimento por seu isolamento vai ensinando ao ser
humano a medir o custo da competência e o valor da
tolerância, a aceitar aos demais.
Solidariedade
A tolerância leva pouco a pouco à solidariedade. Se
bem que a divisão que se faz entre um e os demais se
segue mantendo, a compaixão eleva o nível da relação.
Além de tolerar aos demais se colabora com eles, os
assiste em suas necessidades e se compartilha o que
se tem.
A solidariedade se mostra também através do respeito
pela Terra e seus recursos, a preocupação por seu uso
e o esforço para reparar os danos já produzidos nela.
Participação
Nesta etapa o ser humano sabe que é parte de um todo
e o sente assim. Isto o expressa espontaneamente
através de suas relações. Seu bem particular e o bem
da humanidade são o mesmo bem.
Fonte: Elaboração própria, sobre a base do estudo de Ramón Muñoz (2000)
Ao analisar este processo Enrique Hurtado
125
afirma:
“Seja como fosse, que a humanidade está atravessando por este
período de transição com as etapas descritas, como afirmam aqueles
que sustentam a hipótese anterior, o certo é que com freqüência se
esquece a relação entre o comportamento do ser humano e seus
efeitos. A aparente incapacidade do homem para eliminar os efeitos
negativos que a economia sistematicamente produz (além de certa
riqueza material) se deveria ao fato que dentre as ciências econômicas
e política, esta relação - entre comportamento e seus efeitos - foi
amplamente esquecida”.
125
HURTADO Enrique, A empresa de Economía de Comunión: iniciativa privada para un
desarrollo humano sostenible, Facultad de Ciencias Económicas, Cochabamba: UMSS, 1997, p.
45.
127
Alguns economistas chamam a atenção a respeito e sustentam que a
teoria econômica convencional está em crise, entre eles Amartya Sen
126
, afirma
que nos últimos anos a teoria econômica foi levada a perigosas contradições
porque a linha original que existia entre ética e economia foi interrompida. A
respeito Erich Fromm
127
afirma:
“(...) Na sociedade medieval, como em muitas outras sociedades muito
desenvolvidas e também nas primitivas, a conduta econômica esteve
determinada pelos princípios éticos (...) Em várias etapas, o capitalismo
do século XVIII efetuou uma mudança radical: a conduta econômica se
separou da ética e dos valores humanos. Na realidade, se supôs que a
máquina econômica era uma entidade autônoma, independente das
necessidades e da vontade humana. Era um sistema que funcionava
sozinho, e obedecia a suas próprias leis”.
Ao separar o comportamento econômico da ética e dos valores humanos, a
evolução do sistema econômico não se determinou mais pelas perguntas
socrática e aristotélica: Como se deve viver? (motivação) e O que é bom para o
homem? (logro social), senão por: O que é bom para o desenvolvimento do
sistema?
Ao enfoque ético da economia se sobrepôs um enfoque técnico. Este
último se interessou por temas logísticos (encontrar os meios adequados para
alcançar os fins) mais que pelos fins últimos (já que se dariam de forma bastante
direta). Criou-se uma oposição entre bem individual e bem social afirmando que o
comportamento humano tende a realizar acima de tudo o bem individual obtendo
o segundo (bem social) como um produto eventualmente agregado. Desde então,
se considera racional somente a quem procura seu próprio interesse,
comportamento claramente absurdo segundo Amartya Sen
128
:
“Considerar a mudança da maximização do próprio interesse como
evidencia da irracionalidade deve implicar a rejeição do papel da ética
na toma real de decisões. (...) O egoísmo universal como realidade
pode ser falso, porém o egoísmo universal como requisito da
racionalidade deve e é evidentemente absurdo”.
126
Importante economista contemporâneo da Universidade de Harvard.
127
FROMM Erich, ¿Tener o ser? Fondo de Cultura Económica, México DF, 1978, pp. 25-26
128
SEN Amartya, Sobre ética y economía, Madrid: Alianza Editorial, 1989, pp. 33 - 45
128
A hipótese sobre o comportamento do ser humano que os seguidores de
Adam Smith lhe atribuem, segundo a qual a pessoa humana esta motivada
unicamente pela busca de interesses pessoais, permanece firme e se identifica
com aquele que se definiu como “homo oeconomicus”. Um homem
fundamentalmente individualista, hedonista e egoísta.
Segundo Guido Signorino
129
, um modelo de homem (ser humano) incapaz
de interpretar e compreender todo o acionar da pessoa humana, que na
realidade, além das crenças religiosas ou políticas, está sempre impulsionado por
motivações como a solidariedade, o desejo de justiça o ou altruísmo que
completam e equilibram os comportamentos ditados pelo egoísmo e o interesse.
O ser humano atua numa dimensão material, embora, é o único ser que
tem conhecimento não só deste aspecto material senão também tudo o que
compõe seu ser. Para que uma pessoa viva plenamente sua condição humana
não precisa só de satisfazer suas necessidades materiais senão também
desenvolver valores afetivos, normativos, comunitários e espirituais.
A EdC toma em conta isto e como a ciência econômica atual parte da
hipótese implícita que o bem-estar do homem está no mundo material, ela parte
da hipótese explícita que o bem-estar do homem esta além do mundo material,
uma dimensão não material denominada ser dinâmico (conceito trabalhado por
Markus Ressl que abordaremos a seguir).
Conseqüentemente, a EdC, parte de um conceito de ser humano que
contem o aspecto não material: homem novo. Este conceito conduz a um novo
sentido de existência e à solução de muitos problemas individuais, sociais e
econômicos, dado que o ser humano sempre é o fator determinante da
organização e transformação do aspecto material.
129
SIGNORINO Guido, Ética e Economia In: Economia de Comunhão, Ano 1 nº 2, março 1995
129
4.1. O homo oeconomicus
Sobre o homo oeconomicus muitos autores já estudam e hoje existem
pesquisas que identificam este estilo de comportamento.
Markus Ressl
130
estabelece cinco características básicas do homo
oeconomicus com as quais a teoria econômica convencional define ao agente
econômico, que numa primeira instância o percebe como racional, ainda que sua
racionalidade consista em elevar ao máximo seu lucro pessoal, egoísta e
maximizador, e que se baseia na seguinte hipótese do comportamento: o ser
humano maximiza sua utilidade.
Esta hipótese se explica da seguinte maneira:
A utilidade se gera por meio dos bens materiais quando o homem os
usa para satisfazer suas próprias necessidades. Esta atividade se
conhece como “ato de consumo”,
A ação de produzir utilidade para si mesmo através do consumo,
determina o fato de que a finalidade do homem descanse no aspecto
material,
A atividade econômica resultante também tem uma finalidade material,
produzir bens de consumo,
Ao tratar de maximizar sua utilidade, o homem está limitado a sua
própria realidade, não lhe interessa descobrir e adaptar-se à realidade
dos outros. Assim, atua sem considerar a realidade daqueles quem são
afetados pelos resultados das suas ações, os outros não tem valor a
menos que contribuam a maximizar sua utilidade,
Portanto, a utilidade é resultado da compreensão subjetiva (produto
psicológico individual) e limitada da realidade do homem. Esta
determinada por inclinações e sentimentos do homem materialista, não
tem ponto de referencia fora dele.
130
RESSL Markus, Economy of Comunion. Universidade de Viena, Áustria, 1995, p. 18
130
Contrapondo a este conceito a EdC propõe um homem novo, definido por
São Paulo na Carta aos Efésios (cf. Ef 4, 21-24):
“Em Cristo aprendestes a remover o vosso modo de vida anterior, o
homem velho que se corrompe ao sabor das más inclinações, e a
renovar-vos pela transformação segundo o Espírito Santo, revestindo-
vos do Homem Novo criado segundo Deus, na justiça e santidade
verdadeiras”
4.2 O homem novo
Ao contrário da teoria econômica convencional que parte de uma
determinação biológica do homem, justificável a partir da doutrina Darwinista da
evolução, para explicar o comportamento competitivo do homo oeconomicus, a
EdC parte de que o ser humano não é um produto terminado senão que está em
processo de ser para explicar o comportamento do homem novo.
Os descobrimentos nos campos da psicologia, biologia e a filosofia
posteriores a Charles Darwin, quem projeta a características dos animais no
homem sustentando que o ser humano atua sempre pela sua própria
subsistência, confirmam que a principal característica que distingue ao homem
dos animais no é um nível superior de inteligência senão suas qualidades únicas
que o fazem capaz de realizar-se com uma lei que conduz a uma harmoniosa
interdependência social.
Estas qualidades são: o desejo de liberdade e a consciência moral (voz
interior), e estão baseadas num alto grau de consciência no sentido que o homem
é capaz de dar-se conta de sua existência e sua verdadeira identidade. O ser
humano se torna cada vez mais um homem novo à medida que desenvolve estas
qualidades através de sua experiência no relacionamento com as outras pessoas.
O homem novo aspira auto-realizar-se. Não se realiza no aspecto material
senão no ‘ser dinâmico’, esta acepção deve ser entendida por Ressl
131
como:
131
Ibid.
131
“O termo ‘ser’ descreve a dimensão onde o homem novo se realiza, de
fato, em cada momento de sua vida o homem novo tem sua finalidade
em o ‘ser’ (se refere à dimensão no material). Ao pensar no ser o
primeiro que se nos pode ocorrer é que este termo se refere a um
estado estático que não tem conexão alguma com o aspecto material o
inclusive que se contrapõe a este, porém, o conceito do ser, contem um
elemento dinâmico que inclui o aspecto material da seguinte maneira:
administrando e transformando o aspecto material e especialmente os
bens e recursos, de acordo à nova hipótese de comportamento, um
pode alcançar o ser dinâmico, isso é realizar-se em cada momento de
sua vida. O homem novo alcança o ser dinâmico através de sua
vivencia num constante esforço por descobrir a realidade dos outros
para que assim possa adaptar sua existência a esta nova realidade que
inclui às outras pessoas. Nos termos econômicos isto significa que o
homem novo trata de descobrir as ‘verdadeiras necessidades’ dos
outros para satisfazê-las usando toda sua vontade, energia, bens,
habilidades, educação e sua inteligência”.
O homem novo alcança o ser dinâmico através de sua vivencia num
constante esforço por descobrir a realidade dos outros para que assim possa
adaptar sua existência a esta nova realidade que inclua às outras pessoas.
A partir do conceito de homem novo, a EdC se baseia na seguinte hipótese
de comportamento: o homem novo maximiza a utilidade dinâmica. Este
pressuposto se explica da seguinte maneira:
Para o homem novo, os bens e recursos materiais não geram utilidade
dinâmica devido a que por si mesmos não tem valor. Num certo
momento se gera utilidade dinâmica quando os bens são livre e
conscientemente usados para satisfazer as verdadeiras necessidades
de outra pessoa.
A utilidade dinâmica é realizável em certo momento que no inclui a
noção de tempo. Ao maximizar a utilidade dinâmica o homem novo
alcança continuamente (a cada momento) satisfação no ser dinâmico. O
homem novo não é um consumista, ele administra os bens para
alcançar o ser dinâmico.
A atividade econômica no que se refere à produção impessoal de bens
se faz efetiva de forma pessoal e criativa para outras pessoas. O
comportamento do homem novo gera um tipo de atividade econômica
que pode imaginar-se como uma linha que passa através de outras
132
pessoas dentro da realização de cada um em o ser dinâmico. Isto
ocorre em certo momento independente do tempo, conseqüentemente o
conceito de eficiência do homem novo não contem o elemento “tempo”,
mas sim à pessoa humana.
O homem novo alcança o ser dinâmico através da satisfação das
necessidades verdadeiras das outras pessoas, conseqüentemente sua
realidade contem a realidade dos outros.
A utilidade dinâmica não é um produto psicológico individual, portanto
não é subjetiva. Ao contrario, é objetiva por que se refere a uma
realidade que compreende a todas as pessoas e está livre de juízos,
sentimentos e atitudes individuais.
A partir destes conceitos, apresentamos a seguir um quadro comparativo
entre homo oeconomicus e o Homem novo:
Quadro 6
Comparação entre Homo Oeconómicus e Homem Novo
Homo Oeconómicus Homem Novo
Satisfação das próprias
necessidades
Satisfação das necessidades dos
outros
Finalidade material do homem Finalidade no ser dinâmico
Finalidade material da
atividade econômica
Finalidade humana da atividade
econômica
Limitação à realidade individual Ampliação da realidade individual
à realidade de todos
A utilidade é subjetiva A utilidade dinâmica é objetiva
Fonte: Elaboração própria
Uma empresária da EdC, Ercília Teixeira Fiorelli
132
, explica a respeito do
homem novo:
132
TEIXEIRA Ercilia, Rumo a uma Economia de Comunhão, Palestra apresentada no 1º
Congresso sobre Gerenciamento Sustentável, Medellín (Colômbia) , 23 - 25 de maio de 1996.
133
“Na Economia de Comunhão o homem reencontra sua dimensão social.
Redescobre que os bens materiais não são somente meios para viver
sua dimensão material e concreta senão também que ele, na sua
essência mais profunda é um ser - pessoa, expressão que como
sabemos indica um ser - para, portanto, que se doa, que se abre e que
realiza sua autonomia pessoal sem deixar de considerar o aspecto
social porque precisamente passa através deste. O parâmetro deixa de
ser ele, de um modo egoísta, e passa a ser o outro ser humano, seus
semelhantes”.
Segundo a citação anterior, o comportamento do homem novo conduz a
uma situação social onde as forças individuais são utilizadas reciprocamente em
favor do outro. O efeito resultante de este tipo de interação é muito maior que a
somatória de forças individuais.
Porém, a interação de um grupo de pessoas, que pode chamar-se de
sociedade, caracterizada pelo comportamento do homem novo gera uma nova
realidade, com efeitos infinitamente maiores e totalmente diferentes das partes
individuais. Estes efeitos são sempre positivos para toda a sociedade.
Somente uma ou muitas pessoas atuando com o comportamento do homo
oeconomicus não podem experimentar este efeito que pode ser comparado com o
descobrimento de uma terceira dimensão num mundo de duas dimensões. Este
efeito é o continuo objetivo do homem novo assim como o sistema do ser
dinâmico como um todo. Para o individuo este efeito é a realização (satisfação) no
ser dinâmico e para a sociedade este efeito é a harmonia.
A verdadeira novidade da EdC é que não trata de transformar a estrutura
produtiva enquanto tal, senão de transformar a mentalidade que cria e administra
a estrutura produtiva, partindo de uma comunicação solidária dos princípios deste
homem novo.
134
5. O homem: autor, centro e fim
5.1. O autor
A EdC se propõe repensar as atividades e as relações econômicas, à luz
do que, para tal propósito, tem sido dito pelo magistério cristão: “o homem (…) é o
autor, o centro e o fim de toda a vida econômico-social”
133
.
Contempla-se, portanto, devolver-lhe ao homem a dignidade enquanto ser
humano e, para fazer isso, é necessário não negar as dimensões que lhe são
inerentes.
Concebê-lo na sua integridade significa compreendê-lo na sua identidade
pessoal. Mas não se pode negar que o homem atua pelo próprio interesse,
também é verdade que isto faz parte da natureza humana e entre suas
capacidades naturais também se encontra o atuar por benevolência, por
altruísmo, por sociabilidade; essa “polis” é, por conseguinte, a dimensão
constitutiva do ser humano no seu ser e no seu atuar, no qual a questão
econômica se encontra inclusa.
O autor da atividade econômica é o empresário e este, em conseqüência
do seu ser, é em primeiro lugar ser humano e logo empresário; realiza-se na
administração da sua empresa, mas não como uma pura ferramenta de produção,
burocratizado e impessoal, com a finalidade de fazer dinheiro, senão como uma
comunidade de pessoas.
A EdC sugere a utilização da sociedade (por ações concretas ou não)
enquanto instrumentos de agregação econômica que, se distinguem pelas
seguintes características, segundo Ferrucci
134
:
133
Gaudium et spes, 69.
134
FERRUCCI Antonio, Suggerimenti per l’attuazione dell’Economia di Comunione, In: Nuova
Umanità, Nº 80/81, março-junho 1992, pp. 190-192.
135
1. Nelas, incluso sem excluir a presença de acionistas com cotas importantes,
deveria estar presente um grupo acionário difuso, feito portanto, de
pequenas cotas.
2. Sua gestão deveria ser confiada a pessoas profissionalmente competentes
e particularmente comprometidas ao novo tipo de economia, capazes de
ter no somente a confiança dos possuidores da maioria das ações, senão
possivelmente, da totalidade dos acionistas.
3. O comportamento empresarial, sob o perfil da correção administrativa e
fiscal, da política de retribuição dos dependentes, da segurança e da
salubridade do posto de trabalho e o impacto sobre o entorno externo do
mesmo, deveria ser particularmente respeitoso das legislações vigentes.
4. As relações entre trabalhadores, direção e trabalhadores, entre empresa e
clientes, entre empresa e competidores, entre empresa e administração
pública, sempre deverão ser congruentes com os princípios da EdC, no
respeito das competências e a sensibilidade.
5. A gestão econômica deverá respeitar os cânones da eficiência e a
produtividade; a empresa deveria se encontrar rapidamente em condição
de poder caminhar com as próprias pernas, quedando sempre aberta à
intervenção da Providencia, como natural conseqüência do novo modo de
atuar econômico nela programada.
6. Um aspecto importante da empresa, para poder afirmar sua adesão à EdC,
deveria ser a decisão de todos ou pelo menos da maioria dos acionistas,
de devolver as utilidades empresariais não indispensáveis à consolidação
da empresa para a ajuda dos pobres e para a formação desta cultura do
dar nas novas gerações, formação que se faz de diversas maneiras, mas
certamente através das estruturas das “cidadelas
135
”, estas deveram ser
consideradas cada vez mais o coração desta proposta econômica.
7. Uma forma preciosa e prioritária do atuar dessas empresas em ajuda dos
pobres deveria consistir no criar para esses uma atividade produtiva; um
135
Cidadelas-testemunho que foram apresentadas no capítulo anterior.
136
modo eficiente para devolver-lhes as utilidades poderia ser fazer nascer
atividades produtivas de alto conteúdo de trabalho.
8. Tendo presente que num tempo pode apresentar-se a necessidade ou o
desejo de que algum sócio reclame receber todas as utilidades que lhe
correspondem, ou bem o desejo de que se lhe devolva o capital investido,
ou talvez a necessidade de enfrentar-se com herdeiros que puderam ter
idéias diferentes, é importante respeitar a característica empresarial da
EdC, que é a liberdade, de quem “investe” nela seus recursos.
Estas pessoas teriam que poder contar com seus bens quando assim o
requeiram; assim que as cotas dessas sociedades terão que manter um
valor de mercado, o que não seria possível si é que se decide devolver aos
acionistas as utilidades num período indefinido; por conseguinte estas
cotas terão que ser renovadas a cada ano por cada um dos sócios, aos
quais a sociedade terá que assegurar certa “liberdade efetiva” de receber
as mesmas utilidades: criar-se-ia, de outro modo, um pequeno sistema
econômico em si, arrancado da economia de mercado, que obstaculizaria a
difusão da EdC.
A partir destes oito pontos se perfila o projeto de uma empresa que se
coloca no sistema econômico já existente tanto na sua forma jurídica como à
legislação fiscal e civil existente. Também nesta característica podemos notar que
se reflete o enunciado na encíclica Gaudium et spes que: “reconhece a
positividade do mercado e a empresa, mas indica ao mesmo tempo a
necessidade que estes sejam orientados para o bem comum”
136
.
5.2. O centro
O “capital humano” está no centro da empresa. Não só em referência à
dimensão qualitativa e quantitativa, mas também na medida em que vive
136
Ibid.
137
integrado a uma rede de relações, a uma cultura e a uma ordem institucional que
permite o desenvolvimento e o fomento
137
.
O trabalho assume uma dimensão diferente, se converte numa relação
trabalhista com os outros que leva à compreensão recíproca, à divisão de fatigas
e problemas e à busca comum de novas soluções.
A relação interpessoal é um valor em si, enquanto responde à necessidade
de integração social da pessoa. A qualidade das relações entre quem trabalha na
empresa é portanto o verdadeiro fator competitivo, o “plus-valor humano” que as
empresas de EdC tratam de melhorar como uma “estratégia da atenção” para o
outro, indo além das “papeis”, sendo homens entre os homens.
A “estratégia da atenção”, pela qual o dependente se encontra para
desenvolver seu próprio trabalho num lugar no qual não existe nenhum obstáculo,
cria as condições favoráveis para que este possa redescobrir o prazer de
desenvolver um trabalho gratificante, valorizando-lhe como homem. Esta
gratificação cria uma conseqüência imediata que é a atenuação das tensões que
se acumulam no trabalho. Fecha-se assim um ciclo virtuoso no qual não pode
fazer-se outra coisa senão criar ambientes positivos na empresa e também fora
desta.
Em conseqüência, se trata de proteger o entorno trabalhista, de promover
tanto o trabalho de grupo como aquele individual. São criadas oportunidades de
aprendizagem contínua. Busca-se favorecer a comunicação interior e adotar
modernas técnicas de gerenciamento orientadas à pessoa. A empresa contempla,
também, a criação de novos postos de trabalho e trata de ajudar aos
trabalhadores a enfrentar situações complicadas.
137
Esta maneira de entender as relações interpessoais encontrou uma posição na teoria
econômica, hoje de fato, já se fala de bens relacionais. Luigino Bruni, Primeiras linha para uma
leitura relacional da Economia civil, In: Nuova humanita nº 109, 1997, pp. 101-127.
138
5.3. O objetivo
A atividade empresarial, além de ser concebida como um trabalhar com os
homens, também é uma atividade para os homens e é justo que nesta dimensão
do trabalho se possa ver ao homem como o objetivo da própria atividade.
Às vezes o operário consegue ver no destinatário do seu esforço, como no
caso de uma consulta médica ou num táxi. No entanto na maioria dos casos a
relação entre quem produz um bem e quem o desfruta é impessoal. Por exemplo,
quem fabrica um automóvel não conhece quem o adquire.
A EdC busca nos seus princípios encher de sentido esta relação impessoal
que já não é tal, se no trabalho se aplica a “estratégia da atenção” que faz que os
dois sujeitos (quem produz e quem desfruta do bem produzido), se aproximem. A
atenção dirigida ao destinatário de um objeto implica, num nível prático, um maior
empenho no oferecer bens e serviços úteis e de qualidade.
Trabalhar por ou para adquire uma conotação maior ao se pensar que o
“próximo” não é só o usuário ou o consumidor, mas também o indigente, o pobre.
A motivação ao trabalho (seja do empresário ou do operário), se carrega de um
sentido ainda mais profundo que não é a simples acumulação de capital, senão é
o pôr o homem no centro da atividade econômica, bem como sua felicidade. Uma
felicidade que só é real se for a compartilhada com quem se encontra ao redor.
Este desejo de “crescer juntos” se traduz na tentativa de produzir riqueza sem
tirá-la de outros e também colocando a esse próximo nas condições de produzí-
la.
A riqueza não deriva somente do trabalho físico ou intelectual do ser
humano, mas também da criatividade e da capacidade que este tem de
identificar-se com as necessidades do outro. Esta compreensão profunda das
necessidades alheias, é o “super-valor” da unidade, é fruto de uma harmoniosa
colaboração entre as partes (entendendo que o necessitado doa a própria
necessidade) que leva à unidade.
139
Tal atitude é a que nos leva a compreender os objetivos empresariais
direcionados ao marginalizado, e também cria para este último uma ocasião de
resgate que desaforadamente a mentalidade atual tende a excluir.
O pobre de fato é abandonado nessa condição, e às vezes até culpado
pelo seu estado. Esta mentalidade, por conseguinte, não cria nele uma razão para
encontrar a força de se recuperar desse estado, porque já sabe que foi
catalogado e que não tem nenhuma possibilidade em relação a quem o mira com
certa separação e desprezo.
O objetivo, portanto das empresas de EdC, é criar oportunidades para
fazer que essas pessoas possam expressar sua criatividade e desenvolver sua
potencialidade. É este o passo inicial que se deve cumprir para que em realidades
degradadas possa iniciar-se sua recuperação, que além de ser econômico
também é de caráter moral.
Para levar adiante tal projeto faz-se importante acreditar nele até o fim. E é
necessário submergir-se nessa cultura diferente, “a cultura do dar”, que leva ao
abandono de cada luta porque existe a consciência de fazer parte de uma única
realidade que deve ser anteposta a qualquer outra.
Esta capacidade de “fazer-se um com o outro”, tratando de manter
relações de confiança recíproca, se distingue claramente na atenção ao cliente
por questões de conveniência ou por estratégias mercadológicas particulares. A
motivação cultural é mais forte e para o cristão se traduz na frase do evangelho
que diz: “o que fazeis ao menor dos meus irmãos o fazeis a mim”
138
.
Portanto, deste modo de agir surge uma nova cultura batizada no âmbito
do Movimento dos Focolares como cultura do dar ou cultura da partilha, que
caracteriza o agir humano impelido pelo carisma da unidade.
138
Cfr. Lucas 9,48
140
6. A “Cultura do Dar”
O homem por mais submergido que se encontre na cultura do ter, do
possuir não é indiferente ao sofrimento humano, nem às necessidades dos
outros. A capacidade de compartilhar e de doar é também parte da natureza do
ser humano e, como Fromm
139
, afirma: “Só no momento que abandonemos o
modo de ter, que é o de não ser (...) pode surgir o modo do ser. Para ‘ser’ se
requer renunciar ao egocentrismo e ao egoísmo”.
Desta maneira como vivemos numa sociedade onde está presente a
cultura do ter, existe uma mentalidade essencialmente oposta, que tem suas
raízes em princípios e valores contrários aos que movem à Sociedade
Consumista. Esta é a cultura da partilha ou cultura do dar.
Na cultura do dar, se concebe ao ser humano a partir do conceito de
pessoa, assumindo a este em atitude de doação. Segundo Chiara Sguilla
140
, esta
ótica cultural: "põe o homem de frente ao outro numa atitude de recíproca
doação”.
Resulta importante sublinhar que a EdC não é um apelo ao
assistencialismo, se fala de doação, porém também de consagração, porque
implica uma comunhão de bens e de pessoas com propostas novas, com novos
“modelos socioculturais” e ao mesmo tempo como difusores e estimuladores de
uma nova mentalidade e cultura, é por isso que Lubich
141
a definiu como a cultura
do dar.
A cultura do dar interpreta a profunda necessidade de transformação
mundial que existe nesta época de grandes avanços tecnológicos, de enorme
139
Op. Cit. FROMM, p. 92
140
SGUILLA Chiara, Problemi e prospettive di sviluppo dei paesi arretrati.Un progetto
particolare: l'economia di comunione, Faculdade de Economia e Comercio, Università degli Studi
di Perugia, Itália, 1995, p. 80
141
QUARTANA, Pino, L’Economia di comunione nel pensiero di Chiara Lubich, In: Nuova
Umanità, nº 80/81, 1992, p. 8.
141
riqueza produzida, mas desperdiçada e mal distribuída, para que se desenvolva
sobre tudo uma consciência mundial sobre a economia.
O dar gratuito é possível e existe. De muitas formas desde a solidariedade
civil até as obras religiosas. Também se faz presente em algumas ocasiões entre
os povos: ao socorrer nos desastres naturais, a ajuda desinteressada, ao menos
nas intenções dos responsáveis pelos povos que morrem de fome e de doenças.
Na revolução que a EdC propõe, se tenta recolocar o ser humano no
centro da economia, e este ser é o irmão. Assim o dilema formulado por Fromm:
“Ter ou ser?”, a resposta contundente da EdC é: “dar!”, “partilhar!”. É neste “dar”
que se encontra a essência da EdC e a base da esperança da sua difusão
universal: o dar de fato, satisfaz a mais profunda exigência da natureza humana,
que no dar encontra a própria realização. É um profundo princípio de psicologia
humanística: “o homem partilhando se realiza”
142
.
A proposta da EdC se fundamenta na idéia de “empresa como família”,
para poder realizar a cultura do dar, Lubich
143
explica:
“A diferença da economia consumista, baseada na cultura do ter, a
Economia de Comunhão apresenta a cultura da partilha. Isto pode
parecer difícil, árduo, heróico. Porém não é assim, porque o homem
feito à imagem de Deus, que é amor, encontra sua própria realização
precisamente no amar, no dar. Esta exigência está no mais profundo do
ser, seja crente ou incrédulo. É portanto, nesta constatação, fruto da
nossa experiência, na que ciframos nossa esperança de uma difusão
universal da Economia de Comunhão”.
O chamado que Lubich faz através da EdC, almeja se converter em: “A
alma de um novo modelo de comportamento econômico que realiza uma
autentica revolução copernicana: o homem ao centro da economia, sim, mas, que
classe de homem?: o irmão”
144
.
Este é o alicerce da EdC. Não se trata de um ‘dar’ contaminado pelo
desejo de poder e de domínio sobre os outros, que constitui somente uma
142
Op. Cit. SGUILLA, p. 81
143
Op. Cit. QUARTANA, p. 9.
144
Ibid.
142
aparência; não se trata de ‘dar’ movido pelo egoísmo que busca a própria
satisfação e que leva ao outro a se sentir oprimido e humilhado; não é nem se
quer um ‘dar’ interessado que busca obter uma resposta, ou seja, o próprio
aproveitamento.
Essas diversas perspectivas de ‘dar’ alimentam sempre mais a
mentalidade consumista; ao contrário da cultura do dar que é gerada pelo dar
“evangélico” e é parte integrante das atitudes de quem as acolhem e se
comprometem na construção do Reino de Deus que Jesus inaugurou.
A cultura do dar se fundamenta principalmente no Ser; põe suas raízes na
natureza do ser humano resgatando seus valores e qualidades. Baseia-se na
confiança e na capacidade da pessoa em ser doação. Segundo Pietro Pizi
145
:
“De fato, o ‘doar’ não constitui só uma modalidade do comportamento,
senão que é uma realidade que identifica ao mesmo ser e deve ser do
homem. Tal concepção qualifica o homem como ‘pessoa’ ou seja como
um ser cuja identidade se forma e se realiza só e unicamente na
perspectiva de uma realização de reciprocidade com os demais".
O dar não significa a negação, nem a privação do material. Também não
proíbe ao ser humano daquilo de possuir o que necessita, senão essencialmente
é a liberdade do ser frente aos bens que se possui para poder ser capaz de
descobrir a própria realização na doação de si mesmo, mas que na acumulação
para sim. Nesse pensamento, Pino Quartana
146
aponta:
"O ideal que se persegue não é precisamente o da renúncia e da
pobreza voluntária, senão o da caridade que não pode admitir que
existam pessoas em necessidade. Deixam-se os próprios bens não pelo
desejo de ser pobre, senão para que não existam pobres entre os
irmãos. O desapego vivido é somente a conseqüência de um sentido
forte de solidariedade”.
No ser humano se gera uma mentalidade nova, uma mudança profunda e
verdadeira do seu comportamento pessoal e pessoal. Esta nova cultura não está
baseada no egoísmo, que caracteriza o homem consumista, senão inspirada no
145
PIZI Pietro, Verso una nuova cultura economica - Un progetto di Economia di Comunione ..
Faculdade de economia e comercio, Università degli Studi di Ancona , Italia, 1993, p. 126
146
QUARTANA Pino, A economia segundo a Biblia. Entrevista a Gerard Rosse. In: Ciudad Nueva,
nº 318, Buenos Aires, 1992, p.16
143
amor. Não como sentimentalismo, mas como força motriz, que exige toda a
vontade da pessoa. A conseqüência imediata desta mudança de mentalidade é
evidenciada nos fatos concretos, na vida mesma de quem descobriu sua
capacidade de ‘dar’.
O ‘dar’ tem distintas maneiras de se expressar, o ‘dar’ também se encontra
na cultura do ter. Araujo
147
estabelece uma diferenciação das formas de ‘dar’.
Descreve os tipos de ‘dar’ que ainda estão impregnados da mentalidade do ter e
finalmente explica o modo de ‘dar’ que conduz à cultura do dar.
Esta ou dar impregnado do desejo de poder sobre o outro, que busca o
domínio e diretamente a opressão. É um dar só em aparência.
Existe um dar que é expressão egoísta de si e que busca satisfações e
prazer no ato mesmo de dar. Em geral, quem recebe se sente
humilhado e ofendido.
Existe o dar utilitarista, interessado, que no fundo, busca o próprio
proveito, o próprio benefício.
E, finalmente, está o dar que conduz à cultura do dar. Este dar se abre
ao outro e o procura respeitando sua dignidade, que inclui usos,
costumes, cultura, tradições etc. É a expressão, portanto, de nosso ser
mais profundo. É o dar que é sinônimo de amar e é expressão do ser
que, porque é amor, é dom.
Este dar supera a prática assistencial, porque se trata de um compromisso
que responde às exigências profundas do ser. Devolve a dignidade da pessoa,
porque se realiza em doação e reciprocidade com os demais.
6.1 Características da “Cultura do Dar”
O ser humano é um ser social que, necessita se relacionar e se comunicar
com seus semelhantes. Enquanto estabelece contato com os demais toma
147
ARAUJO Vera, L’economia di comunione. Palestra apresentada na Conferência de Economia,
Dublíno, Irlanda, 1995, p. 4
144
consciência de que, o "outro" é um ser com necessidades similares às suas.
Então pode descobrir que na sua natureza se encontra a capacidade de dar e de
doação.
Este dar não se limita ao material, senão que transcende este plano e
envolve à pessoa integralmente com suas qualidades, valores, aptidões,
experiência, história, projetos, temores, sucessos etc. Em outras palavras, dar e
se doar constituem uma única realidade.
O ser humano da cultura do dar está aberto à comunhão, quer dizer, à
doação recíproca de si mesmo aos demais, como afirma Araújo
148
:
"A cultura do dar qualifica ao homem como um ser aberto à comunhão,
à relação com o Absoluto-Deus, com os outros, com o criado.
Individualidade e sociabilidade se encontram no dom de si, do próprio
ser e na circulação dos bens materiais necessários para o
desenvolvimento e o crescimento de todos".
Nesta cultura os bens materiais e a propriedade não são considerados o
fim da existência do homem, são unicamente os instrumentos que permitem
satisfazer as necessidades e desenvolver a capacidade de dar desde a
perspectiva de doação, e segundo Pizi
149
:
“A propriedade privada, então, perde seu caráter de exclusividade
absoluta, quer dizer de inacessibilidade aos demais. Isto não quer dizer
que da minha propriedade os outros podem fazer o que desejem, senão
que eu a possuo e a administrou não só mirando minhas exigências,
senão também as dos demais”.
Assim, a propriedade se justifica quando os bens que se obtém servem
para satisfazer as próprias necessidades, mas ao mesmo tempo as necessidades
dos outros são na medida das próprias necessidades. Como explica Quartana
150
:
“Numa palavra: o ter adquire seu sentido mais profundo na ‘possibilidade’ de
compartilhar, de dar”,
148
Ibid.
149
Op. Cit. PIZI, p. 165
150
QUARTANA P., Más allá del consumismo del desafío del dar. Entrevista a Vera Araujo. In:
Ciudad Nueva, Nº 315, Buenos Aires, 1992 p.13
145
Na cultura do dar, a realização do ser humano se alcança na doação de si
mesmo aos demais. Doar-se não sendo, ou seja, renunciando a si mesmo,
perdendo as próprias idéias, os próprios desejos, perdendo tudo por amor não
sendo, o Ser É. Ser não significa ter todo seguro, significa fazer vivo o Ser, o
caminho é buscar o não Ser que se chama amor.
Na cultura do dar o ser humano é assumido como pessoa. Supera-se desta
forma o conceito de indivíduo descrito na cultura de ter. A pessoa é o ser social
que, vive em relação com os demais, realizando sua própria individualidade
transcendendo-a. Ou seja, em doação aos demais. Pizi
151
explica a realidade da
pessoa nestes termos:
"... a essência da pessoa consiste na sua universalidade, ou seja no seu
ser relação ‘(unum- versus- alia)’: nesta lógica, uma pessoa se realizará,
quer dizer será muito mais si mesma, quanto mais logre sair de si para
se relacionar, para se doar aos demais. É justamente nesta perspectiva
que o ‘eu individual’ encontra sua realização e legitimação, porque a
essência mesma, a constituição ontológica do ‘eu’ é aquela de ser dom
para os demais. Portanto, a pessoa tem o próprio centro no outro e se
realiza só transcendendo o próprio si individual num si comunitário”.
Na racionalidade da cultura do dar a pessoa é considerada no seu caráter
individual. Mas realiza sua individualidade, somente quando se abre aos demais.
Dito de outra maneira, a pessoa é e existe não por si mesma, mas pelos demais.
Os desníveis e diferenças que existem na humanidade, se devem
principalmente ao fato de que as nações apontam o Ter antes que a Ser e em
conseqüência se encontram submergidas no consumismo. Desta maneira a
fronteira é cada vez maior, entre quem tem e quem sofre necessidades
angustiantes.
Não obstante se a humanidade aponta ao Dar, se suscita a comunhão
entre seres humanos gerando-se assim sociedades novas, nas quais
desaparecem os desníveis sociais e se dignifica a pessoa. Assim o explica
Quartana
152
:
151
Op. Cit. PIZI, p. 164.
152
Op. Cit. QUARTANA, p.13.
146
“Assim é. Porque o ter da pessoa individual serve ao seu ser. E seu ser,
é importante sublinhá-lo, é também social. Orientando o ter ao ser,
realizamos ao mesmo tempo duas ações importantes: liberamos-nos da
‘mercantilização’ que invade continuamente todas as expressões e
todos os espaços de nossa vida e de nossas relações; e o fazemos com
uma ação positiva, quer dizer usamos os bens, portanto o ter, para dar
conteúdos às nossas relações humanas. A Centesimus annus expressa
assim este conceito: assim como a pessoa se realiza plenamente na
livre doação de si mesma, assim também a propriedade se justifica
moralmente quando cria, nos devidos modos e circunstâncias,
oportunidades de trabalho e crescimento humano para todos".
Então, a Sociedade Nova é aquela na qual homens e mulheres se
comportam segundo os princípios da cultura do dar. O Homem Novo estabelece
relações verdadeiras baseadas na mútua doação de si. Este comportamento
renova as estruturas sociais porque se alcança o desenvolvimento integral para
todos.
Sendo assim, a EdC esta baseada nestes princípios da cultura do dar, é
sustentada por este estilo de vida. Seguem outras características da Economia de
Comunhão.
7. Características gerais da Economia de Comunhão
7.1 O aporte econômico
Fundamentalmente na EdC não se modificam os caracteres e os princípios
do capitalismo, porém se renova sua dimensão cultural para recobrar a verdade
integral sobre o ser humano e permitir assim se relacionar com o mesmo
dinamismo econômico a uma ética autenticamente humana, ou seja, respeitosa
da sua dignidade e liberdade.
Existem pessoas que sustentam que a EdC representa um modelo
diferente ao capitalismo o ao comunismo, um modelo diferente que se baseia na
147
Doutrina Social da Igreja, mas sublinha particularmente os aspectos da
participação e a solidariedade
153
.
7.2. Divisão na liberdade
Liberdade e globalidade caracterizam à EdC. Livremente as pessoas
aderem ao projeto, as utilidades são colocadas em comum. Assim, segundo
Ferrucci
154
:
“(...) a proposta deixa a possibilidade de uma plena expressão e
realização do homem, porque não obriga a abandonar fisicamente os
próprios bens ou a renunciar a produzir as próprias capacidades
humanas”.
A pessoa sempre pode potenciar aquelas capacidades empresariais, seja
onde elas se encontram ou talvez criando novos postos de trabalho ou se
esforçando por manter a ocupação existente.
Segundo Benedetto Gui
155
, o ideal, seria deixar que o sócio tomasse
livremente possessão da sua parte de utilidades e que logo as ponha em comum,
salvaguardando assim a satisfação moral fruto do resultado econômico. Esta
exigência de liberdade na doação deve procurar mostrar-se a outras pessoas,
fundamentalmente o que significa a motivação ideal que existe nestas empresas.
Esta motivação é muito importante para poder envolver moralmente ao projeto a
outras pessoas de boa vontade (trabalhadores, clientes ou fornecedores).
Sugere-se que o destino de uma parte das utilidades para fins sociais
possa ser explicitada nos estatutos da empresa ou nos acordos privados entre os
sócios, enquanto que para a parte restante, os sócios poderiam ser deixados na
liberdade de escolher em seu momento a melhor forma de sua contribuição.
153
ZAPPALA Roberto, Comunismo - capitalismo - comunione. Riflessioni in chiave antropologica,
In: Nuova Umanità nº 80/81, março-junho 1992.
154
Op. Cit. FERRUCCI, p. 33.
155
GUI Benedetto, Impresa ed economia di comunione In: Nuova Umanità, nº 80/81, 1992.
148
7.3 Implicação no processo produtivo
A EdC pretende surgir de todas as maneiras possíveis, colocando não só à
disposição os próprios bens materiais, senão também as mesmas capacidades de
trabalho, tempo, sonhos, experiência, cultura e educação na família a uma
mentalidade de comunhão ativa.
De acordo com Sorgi
156
, a implicação no processo produtivo a partir das
pessoas se dá da seguinte maneira:
“Quem muito tem, escolhe uma maneira para aderir e reordena sua
própria vida, esta doação vai desde a própria profissão ou própria
empresa orientando-se de maneira mais ativa e social. Quem tem
pouco encontra novas margens e modos para se fazer ‘doador’ (...)
Quem não tem nada, ao contrário, sai do estado de passividade e
resignação, e talvez se faça vendedor de tapioca, como ocorre nas
“favelas” ou nos “mocambos” do Brasil, com tal de ser parte ativa do
projeto”.
Os destinatários das utilidades são chamados especialmente para cooperar
“oferecendo a própria necessidade”, como vimos anteriormente, com tanto que, o
fato de receber, é já um ato de abertura ao outro e, portanto, um “dar”. A
necessidade se converte em uma contribuição que se oferece com dignidade e
fraternidade ao funcionamento de um programa de solidariedade do qual todas as
pessoas podem fazer parte.
7.4. Conceito de empresa e sua função social
As empresas são consideradas instrumento de promoção humana e como
o coração da EdC. A comunhão começa nas empresas, que atuam como reais
comunidades de trabalho, onde se recobra, segundo João Paulo II
157
“a primazia
do homem sobre o capital, sobre a propriedade, sobre as estruturas, criando uma
ética do trabalho”. Isto é constitutivo do ser humano e nele, o ser humano se
realiza e em certo sentido se torna mais ser humano.
156
Op. Cit. SORGI, p. 59.
157
João Paulo II, Laborem Exercens, nº 9, 1981.
149
Segundo Sorgi
158
:
“No atelier, laboratório, escritório, mina, empresa agrícola... os
empresários, os técnicos, os obreiros, podem desencontrar-se ou
encontrar-se: cada um pode fazer-se solidário com os outros, e de
concorrer com todos, nos mesmos papeis, à realização pessoal e à dos
outros, e à solução dos problemas empresariais”.
Desta maneira o trabalhador dependente poderá colaborar de maneira
ativa ao desenvolvimento da empresa. Este é um aspecto importante porque
desta maneira a EdC chega a mudar o estilo das relações de produção.
7.5. Uma família ampliada
Partimos da consideração que o hábitat natural do ser humano é, em
qualquer parte do mundo, a família. Em família não se olha quem ganha o quem
gasta, senão se consideram entre os gastos mais importantes o cuidado dos
idosos e a educação dos filhos, que são justos aqueles membros do núcleo
familiar que não ganham
159
. Portanto, surge a pergunta porque enquanto o ser
humano pode viver esta realidade na família e não se possa fazê-lo, igualmente,
num âmbito econômico maior?
A EdC é uma tentativa para fazer que o conceito de família se estenda em
nível mundial. Ao menos que todos os que querem aderir à cultura do dar nesta
família ampliada esta nova cultura se apresenta como a profecia de uma futura e
autentica família humana. O primeiro e principal objetivo dessa constituição
familiar é que nenhum membro desta família sofra mais necessidades.
158
SORGI Tommaso, Azienda: uma comunità, In: Economia di Comunione nº 3, setembro-
dezembro, 1995, pp. 32-33.
159
Ibid
150
8. Diretrizes para conduzir uma empresa de Economia de
Comunhão.
Segundo Eva Gullo
160
na finalização de um Congresso do Escritório
Internacional de Economia e Trabalho e do Movimento dos Focolares, realizado
em Roma em 2001, na ocasião da celebração dos 10 anos da existência da EdC,
foram estabelecidas algumas diretrizes formuladas pelos empresários presentes,
oriundos de todos os continentes.
Essas linhas de condução de uma empresa da EdC explicitam as
conseqüências da vida de comunhão em vários âmbitos da atividade de uma
empresa, tais como: a relação com o fisco (voltada à plena legalidade); a relação
com os concorrentes, clientes e fornecedores; a atenção com o meio ambiente; e
a harmonia da sede e dos espaços físicos da empresa.
Essas diretrizes resgatam, em linhas gerais, o dever ser de uma empresa
que aderiu à Economia de Comunhão.
A EdC quer favorecer a concepção do atuar econômico na busca de um
modelo ideal e operativo não só em função das utilidades, senão também que
persegue a promoção integral e solidária do ser humano e da sociedade.
Assim sendo, incluindo a atuação dentro das margens da economia de
mercado, a justa satisfação das exigências materiais particulares e alheias, o
atuar econômico se introduz num campo antropológico completo, dirigindo as
mesmas capacidades a um constante respeitar e valorizar a dignidade da pessoa,
seja dos operários, das empresas, das redes de produção e distribuição dos bens,
como de seus destinatários.
1ª Empresários, trabalhadores e empresa
160
GULLO Eva, Il progetto “economia di comunione”: aspetti culturali ed organizzativi,
Universita' Degli Studi di Bologna, Italia, 1997, pp. 87 - 91
151
Os empresários que aderem à EdC, como os demais, formulam
estratégias, objetivos e planos empresariais, valorizando os critérios típicos de
uma correta gestão e envolvem nesta atividade também os demais membros da
empresa. Eles tomam as decisões de investimento com prudência mas com
particular atenção para a criação de novas atividades e postos de trabalho
produtivos.
A pessoa humana e não o capital, está no centro da empresa. Os
responsáveis da empresa tratam de utilizar-se da melhor maneira os talentos de
cada trabalhador favorecendo para isso a criatividade. A forma de assumir as
responsabilidades e a participação na definição e realização dos objetivos
empresariais, tem que ver com a adoção de medidas particulares de ajuda pelos
que atravessam momentos de necessidade.
A empresa é administrada de maneira que possa promover o aumento dos
lucros, destinados para o crescimento da empresa, para a assistência às pessoas
em dificuldade econômica, partindo de quem é capaz de compartilhar da “cultura
do dar” e para a difusão desta cultura.
2ª Relação com clientes, fornecedores, sociedade civil e sujeitos externos
A empresa atua com os meios oportunos para oferecer bens e serviços
úteis e de qualidade, a preços de mercado.
Os membros da empresa trabalham com profissionalismo para construir e
reforçar boas e sinceras relações com os clientes, os fornecedores e a
comunidade, a quem estão orgulhosos de servir. Relacionam-se de modo leal
com a concorrência, mostrando o valor efetivo de seus produtos ou serviços e
negando-se a destacar o negativo dos produtos ou serviços alheios.
Tudo isto permite enriquecer a empresa de um capital imaterial constituído
por relações de consideração e de confiança com responsáveis de empresas
fornecedoras ou clientes, ou da administração pública, que cria um
152
desenvolvimento econômico menos sujeito à variabilidade da situação do
mercado.
3ª Ética
O trabalho da empresa é uma maneira de crescimento, amadurecimento e
desenvolvimento para todos seus membros. A empresa respeita as leis e mantêm
um comportamento eticamente correto em relação às autoridades fiscais, aos
órgãos de controle, aos sindicados e órgãos institucionais. Também atua com
total respeito aos próprios funcionários, dos quais espera igual comportamento.
No que concerne à qualidade dos produtos e serviços, a empresa procura cumprir
as normas estabelecidas, mas também valoriza a qualidade dos mesmos em
função do bem-estar das pessoas que se utilizarão desse produto ou serviço.
4ª Qualidade de vida e produção
Um dos objetivos dos empresários de empresas da EdC, é transformar a
empresa numa verdadeira comunidade. Para isso se encontram regularmente
com os responsáveis da gestão para averiguar a qualidade das relações
interpessoais e junto com eles se ocupam para solucionar as situações difíceis,
conscientes de que o esforço para resolver essas dificuldades pode engendrar
efeitos positivos sobre os membros da empresa, estimulando as inovações, a
maturidade e a produtividade.
A saúde e o bem-estar de cada membro da empresa são objeto de
atenção, em especial, a quem tem necessidades particulares de saúde. As
condições de trabalho são adequadas ao tipo de atividade: os membros da
empresa são treinados com relação às normas de segurança, existe uma
necessária ventilação, níveis toleráveis de barulho, iluminação adequada etc.
Trata-se de evitar um excessivo horário de trabalho, de modo que ninguém
seja sobrecarregado, e são previstas férias adequadas. O ambiente de trabalho é
153
distendido e amigável, o que favorece o respeito, a confiança e a consideração
recíproca.
A empresa produz bens e serviços seguros, dando atenção aos efeitos que
esses podem causar ao meio ambiente, a economia de energia e aos recursos
naturais em relação ao ciclo de vida dos seus produtos.
5ª Harmonia no trabalho
A empresa adota sistemas de gestão e estruturas organizativas visando
promover o trabalho em grupo em função do crescimento individual.
Os membros fazem com que o ambiente empresarial seja o mais limpo
possível, de modo tal que dentro desta harmonia de ambientes, empresários,
trabalhadores, fornecedores e clientes sintam a comodidade e possam difundir
este estilo de empresa.
6ª Formação e instrução
A empresa favorece que seus membros se envolvam numa atmosfera de
apoio recíproco, de respeito e de confiança, que seja natural colocar livremente a
disposição, os próprios talentos, idéias e capacidades, brindando vantagens para
o crescimento profissional dos colegas e para o progresso da empresa. Adotam-
se critérios de seleção de pessoal e programação do desenvolvimento profissional
para os funcionários a fim de facilitar o estabelecimento de tal atmosfera.
Para permitir que cada pessoa alcance seus objetivos, seja de interesse da
empresa ou pessoal, a empresa fornecerá a oportunidade de atualização e de
aprendizagem contínua.
154
7ª Comunicação
A empresa que adere a EdC cria um clima de comunicação aberta e
sincera que favorece a troca de idéias entre executivos e trabalhadores. Está
aberta a quem, apreciando seu valor social, se oferece a contribuir para seu
desenvolvimento e quem, interessados na cultura do dar, estão desejosos de
aprofundar os vários aspectos da sua experiência concreta.
As empresas que aderem a EdC, na tentativa de desenvolver relações
econômicas reciprocamente úteis e produtivas, utilizam os mais modernos meios
de comunicação para interagir entre elas seja a nível local como internacional,
alegrando-se com os sucessos mútuos e levando em consideração as
dificuldades, provas ou fracassos das outras, num espírito de recíproca
solidariedade.
Um espaço importante de comunicação são os diferentes encontros que se
realizam tanto em nível regional, como mundial. Nesses compartilham-se
experiências, fazem-se negócios, mas acima de tudo tentam criar mecanismos de
ajuda entre as empresas mais desenvolvidas e as que estão surgindo.
Outro instrumento de comunicação que é bem utilizado na EdC, é a revista
trimestral Economia de Comunhão, editada pelo Escritório Central da EdC,
publicada em diversas versões e traduções, assim como portal deste Escritório.
Podemos afirmar que uma outra ferramenta de promoção e comunicação
são os Pólos empresariais que surgiram para dar “visibilidade” à Economia de
Comunhão. Pela importância desses os descreveremos a seguir.
9. Pólos empresariais
Assim como as cidades-testemunho (cidadezinhas) do Movimento dos
Focolares, explicadas no capítulo anterior, que surgiram como os “laboratórios”
onde a proposta do mundo unido é vivida em plenitude, os Pólos empresariais,
155
surgiram para ser a ‘carta de apresentação’ da proposta de EdC, mas não no
espírito de construir uma sociedade paralela, despreocupada do contexto social,
senão mais bem, com a finalidade de chegar a toda a humanidade, meta
alcançável a partir de um sistema de círculos concêntricos que se alimentam
partindo do menor.
Segundo Tommaso Sorgi
161
com a EdC se quer propor:
“Um modelo concreto de sociedade que já opera sobre o exemplo dos
experimentos pilotos, das cidadezinhas, capazes de testemunhar com
fatos que esta economia a serviço do homem é capaz de funcionar”.
Na primeira intuição do surgimento da EdC estavam também presentes
outros dois elementos: o convite à constituição, nas imediações das cidadezinhas
do Movimento, de “pólos produtivos” e a solicitação, dirigida à comunidade inteira
dos Focolares, de constituir uma sociedade anônima, popular, para levantar o
capital indispensável e dar início a novas experiências empresariais,
especialmente nos países em vias de desenvolvimento, nos quais o acesso ao
crédito é difícil e caro (“somos pobres, mas somos muitos” — outro slogan dos
primeiros tempos da EdC).
Os pólos são elementos constitutivos da EdC: o principal laboratório vivo,
não só de empresas de comunhão, mas também de um sistema de empresas, de
distritos, sui generis. São as colunas que sustentam à EdC.
Estes pólos se configuram em recinto próprio, em forma de condomínio,
numa espécie de distrito industrial. Se desenvolvem nas imediações das
“cidadezinhas”, denominadas normalmente de “Mariápolis”
Esses pólos produtivos, segundo Motta
162
, além de seu aspecto de
visibilidade, estão abertos para o mundo empresarial e se configuram numa forma
econômica de força inovadora. Os economistas conhecem e estudam, pelo
menos há cem anos, os assim denominados “distritos industriais”. Esses
161
SORGI Tommaso, A cultura del dare, en Nuova Umanità N° 80/81, marzo-junio 1992, p. 80.
162
Ibid Motta, p. 206
156
“distritos” têm sido desenvolvidos pelas prefeituras de pequenas cidades com o
intuito de atraírem empresas industriais para o município
163
.
Os pólos empresariais EdC, além de se beneficiar das mesmas
características dos “distritos industriais”, se diferenciam dos outros, uma vez que
eles estão contidos no âmbito de uma “cidade-piloto” do Movimento dos
Focolares, que lhes consente a garantia dos conteúdos e valores que alimentam a
“cultura social” específica, mas, sobretudo, lhes confere as razões que fizeram
nascer esses pólos
164
.
Atualmente, já funcionam alguns pólos (“Spartaco” e “Ginetta”, no Brasil,
“Solidariedad”, na Argentina, e “Lionello”, na Itália); em outros países, eles estão
em fase de implantação (Estados Unidos, Bélgica, Espanha e Portugal).
O mais conhecido, e o primeiro de todos, é o Pólo Empresarial Spartaco,
localizado nas proximidades da Mariápolis Ginetta, no município de Cotia, Estado
de São Paulo.
O Pólo Empresarial Spartaco, foi construído pela Espri S/A,
(Empreendimentos, Serviços e Projetos Industriais),que é uma sociedade
anônima por ações, nascida no contexto do surgimento do projeto, em 1992, com
o fim específico de incrementar, implantar e desenvolver o Pólo Spartaco. A Espri
teve a função histórica, dentro do projeto EdC, de ter sido o primeiro
empreendimento dessa natureza com a função de construir um espaço
econômico e produtivo destinado à implantação de pequenas e médias empresas
inspiradas no projeto EdC.
Seus recursos operacionais foram, e ainda, são provenientes da
subscrição de ações ordinárias e preferenciais, realizadas [e popularizadas] por
mais de três mil acionistas de todos os Estados do Brasil e alguns acionistas do
163
No Brasil, muitas vezes esses distritos industriais surgem com o patrocínio estratégico do
SEBRAE.
164
BRUNI, Luigino, Il pólo industriale: città sul monte e sale della terra, In: Economia di
Comunione, n. 15, periodico quadrimestrale, Roma, Ano VII, n. 2, Dezembro 2001, p.8-9.
157
exterior. Esses acionistas foram movidos pela “fé” no projeto e por isso investem
na possibilidade da criação de novos conteúdos para a economia, recriando
assim critérios diferenciados de organizar a produção e a vida social.
O Pólo Spartaco foi iniciado em 1993, e se situa numa área de 37.466m
2
,
onde estão instaladas sete empresas: La túnica, Indústria de Confecções Ltda.;
KNE Plásticos, Indústria e Comércio Ltda.; Eco-Ar, Indústria e Comércio Ltda.,
(indústria de produtos de limpeza biodegradáveis); Prodiet Farmacêutica Ltda.,
(que atua no comércio de medicamentos e produtos hospitalares); AVN
Embalagens Plásticas Ltda, (indústria de vasilhames plásticos); Uniben, Fomento
Mercantil Ltda., (uma organização financeira) e ainda, os próprios escritórios da
Espri.
O Pólo Spartaco oferece 150 postos de trabalho diretos e tem capacidade
para abrigar ainda mais seis empresas
165
.
É importante destacar, que além das empresas instaladas diretamente no
Pólo Empresarial Spartaco, outras empresas, (principalmente de serviços)
fundadas no período inicial da EdC, se encontram instaladas nas imediações da
“Mariápolis” (Escola Aurora, Policlínica Ágape, Livraria Arco-Íris etc).
10. As empresas da EdC
A seguir para oferecer uma radiografia das empresas de EdC no mundo,
apresentaremos: o número de empresas associadas; sua localização geográfica;
distribuição por atividades econômicas, e o que elas representam hoje,
globalmente, no tocante às inversões de seus resultados em favor do projeto,
mais precisamente, sobre sua distribuição aos “necessitados” e o entrelaçamento
das redes culturais e sociais que envolvem o projeto.
As primeiras empresas que surgiram logo no início em 1991, no calor
“carismático” do nascimento da EdC, foram brasileiras. Um ano depois, em 1992,
165
Centro de Estudos, Pesquisa e Documentação da Economia de Comunhão, em Anais do
Bureau Internacional da Economia e Trabalho 1999, São Paulo, 2000, p.125-128.
158
as empresas que se inseriam no projeto (entre novas criadas e outras já
existentes que também aderiram) somavam 242. Nos anos subseqüentes houve
um contínuo crescimento simultâneo em quarenta e cinco países, sendo que no
final do ano 2002, o número de empresas “consolidadas” chegava a 771
associadas. O número engloba empresas operando em diversos segmentos da
economia, em cerca de 45 países. Em 31 de maio de 1999, a própria Chiara
Lubich, ao relatar ao Parlamento Europeu, em Estrasburgo, a experiência da
EdC, como uma “proposta de agir econômico”, dá alguns exemplos de empresas
que compõem a EdC:
A Prodiet Farmacêutica, pequena empresa distribuidora de produtos
farmacêuticos, de Curitiba, Brasil, ao se tornar uma empresa EdC, no
decorrer destes anos, passou de quatro para 50 funcionários,
conseguindo multiplicar por cinqüenta o faturamento. Hoje é uma das
empresas presentes com uma filial no Pólo Empresarial Spartaco;
No Banco Kayaban, um banco rural das Filipinas, a maioria dos
acionistas aderem à EdC. O Banco, orientado por uma empresa
consultora da EdC, em cinco anos passou do 123º. lugar em volume de
depósitos para o 3º. lugar no ranking dos bancos rurais filipinos; abriu
oito novas filiais, com um aumento de 150 funcionários e conseguiu
sobreviver à crise asiática em 1998, graças ao clima de confiança
criado entre a empresa e os associados;
Em Solingen, Alemanha, 23 empresários, criaram uma financeira, a
Solidar Capital, a fim de promover a criação e o desenvolvimento de
novas atividades produtivas nos países do Leste Europeu, Oriente
Médio e América Latina;
O Consórcio de Cooperativas Sociais Roberto Tassano nasceu do
desejo de responder à proposta da Economia de Comunhão na região
da Ligúria, Itália. Administra várias casas de repouso para idosos,
estruturas de proteção para doentes mentais, estruturas de produção
para emigrantes e pessoas carentes, em colaboração com as indústrias
locais. No decorrer de alguns anos, este consórcio passou dos poucos
159
sócios fundadores a 420 associados. E hoje é considerado uma
incubadora de empresas, em virtude de sua capacidade de suscitar
novas iniciativas de produção e trabalho.
No ano de 2001 a composição dos empreendimentos EdC, segundo a
forma jurídica das empresas estava assim distribuída:
Quadro 7
Composição dos empreendimentos EdC
Sociedades de capital:
200
Sociedades de pessoas:
58
Organizações sem fins lucrativos: 332
Sociedades cooperativas:
82
Empresas individuais
288
Várias
170
Fonte: Nuova Umanità, 135, ano 2003.
No ano de 2004, já a forma jurídica das empresas EdC era assim:
Gráfico 5
Forma jurídica das empresas EdC
Fonte: Bruni, 2004.
São na maioria pequenas e médias empresas com grande diversificação
de suas atividades. As percentagens estatísticas são as seguintes:
160
29% das empresas atuam na produção industrial;
23% em atividades comerciais e de informática;
48% em atividades de Serviços do Terceiro Setor.
Em 2004, as 756 empresas da EdC tinham os seguintes setores de
atividade:
Comercio: Alimentação 28
Automóveis 4
Decoração 10
Livros 10
Material de informática 3
Material de saúde 16
Moda 25
Outros 55
Total 151
Produção: Agricultura 27
Alimentação 34
Artesanato 3
Construção civil 28
Decoração 16
Indústria gráfica 8
Indústria mecânica 16
Material diverso 27
Moda 14
Plásticos 7
Vídeo 4
Outros 7
Total 191
Serviços: Advocacia 6
Consultoria 93
Contabilidade 8
Educação 36
Eletricidade 7
Eletrônica 1
Fotografia 3
Imobiliária 3
Informática 21
Manutenção 17
Projetos 18
Restauração 2
Saúde 59
Telefonia 1
Transportes 3
Turismo 19
Outros 92
Total 389
Outros: 25
Total empresas 756
161
A evolução do número de empresas que aderiram à EdC desde seu início
é a seguinte:
Quadro 8
Número de empresas que aderiram à EdC
Fonte: Bruni, 2004.
As empresas de EdC se encontram localizadas da seguinte forma de
acordo com a distribuição territorial:
Europa: 469 empresas (presentes em quase todos os países, inclusive
no Leste Europeu);
Ásia: 38 empresas (Japão, Tailândia, Coréia, Filipinas, Taiwan, Índia,
Paquistão, Líbano);
África: 14 empresas (Camarões, Costa do Marfim, África do Sul,
República do Quênia, Egito);
Austrália: 15 empresas;
América do Norte: 47 empresas (Estados Unidos, Canadá, México);
América do Sul: 170 (Brasil, Argentina, Colômbia, Venezuela, Uruguai,
Paraguai, Equador, Chile).
O que fica muito claro nos dados acima é a incidência maior de empresas
na Europa e América do Sul. Na América do Sul é fácil localizar o resultado de
seu surgimento inicial no continente, especialmente no Brasil, que mais contribui
162
no número global, com 94 empresas
166
; na Europa é significativo o maior número
absoluto de empresas, seja pela grande difusão do Movimento dos Focolares
(especialmente na Itália), como também pela capacidade e tradição empresarial
(em outros países de maior presença, como Alemanha, Suíça, Áustria, Espanha,
Portugal).
11. Destino dos lucros
Os lucros anualmente que as empresas colocam em comum são
recolhidos por um Fundo Internacional, assim como a comunhão de bens
realizada pelos membros do Movimento dos Focolares no mundo todo, são
utilizados para ajudar, sobretudo, a famílias necessitadas em várias partes do
mundo, especialmente África, América Latina e Caribe, Leste Europeu e
Sudoeste Asiático.
Esse Fundo Internacional recolhe tanto as doações como as necessidades
das pessoas, por meio de comissões locais, existentes em cada região que se
ocupam tanto de recolher esses dados como também de distribuir a ajuda aos
que necessitam.
Não sendo suficientes os fundos disponíveis, colocados em comunhão
pelas empresas, para cobrir as necessidades apresentadas durante o ano, estes
fundos foram complementados por uma contribuição extraordinária
167
por parte
dos membros do Movimento dos Focolares, no mundo inteiro. Com os 80% do
montante, disponível pelas empresas EdC, foram ajudados em forma de partilha
no ano de 2001:
166
No Brasil a maioria se encontra nos Estados do Sudeste e Sul do país, especialmente no Estado
de São Paulo, onde está o Pólo Empresarial Spartaco.
167
Desde o ano de 1997, a expectativa de ajuda e o número de “necessitados” no âmbito do
Movimento, assistidos por uma rede de relações, se demonstraram com uma demanda superior
aos recursos carreados pela partilha das empresas do projeto EdC. Nesse sentido, foi solicitado aos
membros do Movimento que suprissem essa falta com uma contribuição espontânea. No ano de
referência, esse diferencial entre demanda e oferta, foi cerca 20%, e o número de famílias ajudadas,
cerca de 12.000 pessoas. Cf. “Ajuda extraordinária” in: C
OSTA, Rui, “Ação pelos 5.000”, in VV.AA,
Economia de Comunhão, projeto, reflexões e propostas para uma cultura da partilha, São Paulo,
Cidade Nova, 1998, 2
a
. ed. pp.135-141.
163
1.207 famílias da Europa (especialmente dos países do Leste
Europeu);
24 famílias da Austrália
168
;
897 famílias da Ásia (especialmente Sudoeste Asiático, Índia,
Paquistão e Bangladesh);
2.518 famílias da América Latina e Caribe;
6.184 famílias nos países da África;
Total: 10.830 famílias foram ajudadas em todo o mundo.
De acordo com as solicitações, estes montantes foram utilizados de acordo
com as seguintes finalidades, em sua maioria necessidades primárias:
48% para alimentação;
17% para auxílio na escolarização elementar;
17% para assistência médica;
13% para moradia;
5% para outros fins.
No ano de2004, a ajuda que foi destinada Brasil pelo Fundo Internacional
foi de: US$ 673.092 e foram beneficiadas 845 pessoas (Nesse número não estão
incluídos os familiares que, indiretamente, também recebem a ajuda).
Talvez seja interessante saber como foi distribuída segundo as finalidades:
Alimentação 46 %
Estudo 20 %
Saúde 21 %
Moradia (reforma/construção) 11 %
Outras necessidades 3 %
12. Conquistas e Apreciações
Para finalizar este capítulo afirmamos como Bruni, que se é verdade que
na EdC se fala em empresas e em empresários, na realidade, a visão da
168
Incluído Papúa-Nova Guiné e ilhas do Pacífico.
164
economia e de empresa contida na EdC questiona a própria idéia de atividade
econômica, de mercado, de empresa e de empresário.
A EdC conduz uma verdadeira revolução cultural, mas não o faz com luta
armada nem violência. É uma revolução silenciosa, sem gritos, mais feminina que
masculina, numa palavra, “mariana” (de Maria, a mãe de Jesus), que “a humildes
exaltou e despediu ricos de mãos vazias”
169
. Por isso, as palavras da EdC são
palavras eloqüentes, transformadoras, que minam as palavras velhas: sem fins
lucrativos e com fins lucrativos, capitalismo e comunismo, liberais e
comunitaristas.
A EdC perpassa todas essas palavras, mas é uma outra coisa, é uma
criação nova; por isso, é considerada com fins lucrativos por aqueles que são sem
fins lucrativos, e sem fins lucrativos por aqueles que são com fins lucrativos;
capitalista pelos comunistas, e comunista pelos capitalistas; liberal pelos
comunitaristas, e comunitarista pelos liberais. Isso se deve ao fato de a
compreensão de uma experiência como a EdC, bem como de toda experiência
que nasce de um humanismo, requerer uma reorganização das palavras antigas.
Sendo assim, a partir deste levantamento bibliográfico foram contemplados
pontos importantes para entender a EdC e a partir disso introduzir o Estudo de
Caso na FEMAQ S/A, de Piracicaba (SP), uma empresa de Economia de
Comunhão desde 1991.
169
Canto do Magnificat cf. Lucas 1,46-55
165
CAPÍTULO 4
A PRÁXIS DA UTOPIA:
FEMAQ, uma empresa de Economia de Comunhão
Após termos analisado os antecedentes, a questão histórica e filosófica, e
a comunicação na Economia de Comunhão (EdC), de acordo com o objetivo
desta pesquisa, apresentaremos a seguir a comprovação prática de como uma
empresa pode aplicar a filosofia da EdC. A escolha para este estudo recaiu sobre
a FEMAQ S.A.
Uma das nossas preocupações foi identificar qual seria a melhor empresa
a ser estudada e que pudesse testemunhar de fato a viabilidade da Economia de
Comunhão e que além disso representasse aspectos da realidade brasileira. Por
essas razões escolhemos a FEMAQ S.A. (Fundição, Engenharia e Máquinas),
pela importância, não só econômica, mas, sobretudo porque nela se reproduzem
as questões propostas pela EdC.
A FEMAQ é uma empresa que produz peças fundidas em aço e ligações
de alumínio, com produtos manufaturados de até 30 toneladas o peso unitário.
Possui uma capacidade produtiva de 800 toneladas por mês em ferro cinzento,
nodular e aço, e, atualmente, com 86 funcionários, tem uma produção de mais de
6,5 mil toneladas por ano, capacidade que está sendo ampliada para 2007.
A alta produtividade fica mais eloqüente conforme o gráfico a seguir:
166
Gráfico 6
Produção acumulada em toneladas
Fonte: FEMAQ S/A., 2005
1. Contexto geográfico
A FEMAQ está localiza na cidade de Piracicaba, que é o 19º município em
extensão territorial do Estado de São Paulo (Brasil) com um complexo industrial
formado por mais de cinco mil indústrias, destacando-se entre as variadas
atividades os setores: metalúrgico, mecânico, têxtil, alimentício e petroquímico,
incluindo combustíveis.
As principais atividades industriais segundo Câmara de Vereadores de
Piracicaba são:
167
Aço e ferro Máquinas em geral
Aguardente Máquinas industriais
Álcool Metais
Caldeiraria Metalúrgica
Destilaria Minerais
Equipamento
hidráulico
Olaria
Material elétrico Papel e Papelão
Estrutura metálica Siderúrgica
Fundição Têxtil
Laminação Turbinas
Laticínio Usina
Madeira (produção) Outras
Fonte: Câmara de Vereadores de Piracicaba 2005
2. História da FEMAQ
Em 1937, o jovem Kurt Leibholz chegava ao Brasil, escapando da fúria
nazista que dizimou a toda sua família em Alemanha. Casou-se, teve filhos e, no
ano de 1966, abriu a empresa: “Fundição, Engenharia e Máquinas” (FEMAQ),
que, após seu falecimento, cinco anos depois, ficou nas mãos de seus filhos
Henrique e Rodolfo
170
:
“Quando nosso pai faleceu, nós, ainda éramos estudantes, mas tivemos
que assumir o comando da empresa: foi um período muito difícil, devido
à nossa inexperiência e à falta de confiança por parte de nossos
funcionários e clientes”.
Construída na Rodovia Comélio Pires, km. 1, Av. Kurt Leibholz, 100, a
FEMAQ ocupa uma área total de 20.000 m
2
, sendo 6.000 de área construída.
Os irmãos Leibholz receberam a empresa numa época de crise, mas cerca
de 10 anos depois já estavam estabilizados. Segundo Rodolfo Leibholz
171
: “Em
1979, já podíamos vender tudo e viver de juros ou, então, fechar a empresa ou
170
Entrevista com Henrique Leibholz, em 14 de setembro de 2005.
171
Entrevista com Rodolfo Leibholz, em 15 de setembro de 2005.
168
declararmos em falência, o que tivesse sido um grave prejuízo para os
funcionários”.
Ao contrário disso, esse ano começou a experiência de promoção social e
participação dos empregados nas decisões da empresa.
Em outra ocasião Rodolfo
172
afirma:
“Fizemos um pacto entre nós, de dirigir a empresa conforme as
exigências cristãs que visam o homem e não somente o lucro, mesmo
que essa decisão pudesse colocar em risco a sobrevivência da
empresa.
A partir dessa decisão tomamos uma série de iniciativas, dentro das
quais podemos citar: criação de um departamento médico com ênfase
na prevenção; distribuição de parte dos lucros aos funcionários;
assembléias mensais; contato com o sindicato e foi criado um fundo
para construção de moradias para (funcionários).
Muitas dessas iniciativas persistem até hoje”.
Esta consciência social reflete de alguma maneira a opção cristã dos
irmãos Leibholz a exemplo da mãe. Rodolfo lembra:
“Grande parte da família de minha mãe, na Alemanha era católica, já
meu pai era alemão judeu assim como toda a família dele. Daí você
pode imaginar a perseguição que sofreram antes da segunda guerra.
Quando ficamos maiores [ele e os irmãos] tínhamos duas opções
religiosas e percebemos que em qualquer escolha que fizéssemos
teríamos que ser coerentes, pois me lembro que as duas ensinavam o
amor ao próximo.
Então escolhemos o Cristianismo e estamos até hoje provando a nós
mesmos que o que Cristo ensinou é verdadeiro. E estamos avançando
muito com a prática do dia-dia e sentindo que o que Ele disse é
verdadeiro. Na empresa, na Família e na vivência em sociedade. Por
isso, nossa experiência continua a nos revelar e nos aproximar da
Verdade”.
Assim, nesses anos, além da formação recebida pelo seu pai, os diretores
da empresa tinham uma nova motivação. Estavam em contato há três anos com o
172
Experiência apresentada no XIII Congresso Nacional da EdC, Vargem Grande Paulista, junho de
2004.
169
Movimento dos Focolares, e em 1991 aderem à proposta de Economia de
Comunhão.
Numa entrevista para Luiz Sugimoto
173
, Rodolfo conta:
"Mesmo na época, em 1991, teríamos condições de, vendendo a
empresa, parar de trabalhar. Creio que seja o sonho de qualquer
empresário, o ápice do capitalismo: poder parar de trabalhar", recorda
Rodolfo. Mas foi justamente naquele ano que os dois engenheiros
decidiram adotar na FEMAQ a Economia da Comunhão. "Não
sentíamos necessidade de ficar cada vez mais ricos. Decidimos
continuar gerando riqueza com os meios produtivos, mas distribuí-la,
colocando o homem e o amor acima de tudo".
Para Henrique, o outro irmão Leibholz
174
, engenheiro mecânico e
metalúrgico:
“O sucesso profissional não satisfazia nossas aspirações mais
profundas. Queríamos que, no trabalho, nossas ações
correspondessem aos princípios cristãos do Movimento e da Doutrina
Social da Igreja, que se preocupam pelo homem e não simplesmente
pelo lucro. Fizemos então um ‘pacto de unidade’ entre nossos,
declarando que estávamos prontos a viver o amor recíproco sobre todas
as coisas, e nele encontramos a luz para continuar dirigindo a empresa
com a coerência das exigências cristãs, que nos reclamavam a
privilegiar o homem mais que ao lucro”.
Pelo sucesso alcançado, a importância da empresa na região industrial é
notória, de 6.500 empresas de Piracicaba, a FEMAQ S.A. ocupa o 26º lugar em
valor acionário.
A FEMAQ produz peças de ferro fundido para algumas das fábricas de
automóveis mais importantes do Brasil e do mundo, como a Ford e a Volkswagen,
General Motors, Volvo, Fiat, Mercedes Benz, Karmanm Ghia e Brasinca, a
FEMAQ atende hoje o 75% do mercado neste segmento. Outros importantes
clientes são: Matriceria Austral (Argentina), Voith S/A Máquinas e Equipamentos,
CSP - Cast Steel Products, entre outros.
A empresa também fabrica peças para outros setores industriais, como
cilindros para máquinas de fabricação de papel, produtos pelos quais obtiveram o
173
SUGIMOTO Luiz O grande flagelo, Campinas: Jornal da Unicamp - Novembro 2000, p. 6 e 7
174
Entrevista a Henrique Leibholz, Revista Cidade Nova, Brasil, Julio de 1992, p. 8
170
certificado TUV para seus produtos. Também fabricam componentes para usinas
elétricas e nucleares, também peças para a indústria extrativa açucareira
materiais de desgaste para calcário, cerâmicas e de máquinas domésticas pelo
qual obtive o certificado de qualidade ISO 9002.
Além disso, a FEMAQ exporta produtos para países de Europa, EUA,
Argentina, México e África do Sul.
A FEMAQ é uma empresa de capital brasileiro, e não está associada a
outras empresas seja a nível nacional ou internacional Está qualificada como uma
empresa de porte médio, em virtude do lucro e do número de funcionários.
3. Áreas de atuação
As áreas de atuação, na FEMAQ são variadas, e principalmente trabalha
em Ferro e Aço, como o veremos a continuação:
Quadro 9
Áreas de atuação
Peças em Ferro Fundido Cinzento até 30 tons/unit
Peças em Ferro Fundido Nodular até 15 tons/unidad
Peças em Aço até 3 tons/unidad
Fonte: FEMAQ, 2005 - Elaboração própria
171
Quadro 10
Produtos e setores onde trabalha a FEMAQ
Setor Exemplos
Indústria
Automobilística
Estampos automobilísticos, desempenos, mesas, calços, guias,
moldes para injeção, peças de manutenção feitos com modelos de
isopor ou madeira, ferramentas em geral.
Indústrias de papel
Cilindros secadores, rolos de prensão, cabeças de cilindros e rolos,
caixas de sucção, eixos centrais, sapatas hidrostáticas e peças em
geral.
Mineração
Pastilhas, suportes, revestimentos para moinhos, esferas de aço - 3
a 8 ton (sistema drop ball), rotores, tijolos, gargantas e discos para
bombas de sucção de areia, mandíbulas para britadores.
Outras peças sob consulta.
Indústria Cerâmica
Cilindros coquilhados de têmpera definida, cilindros com têmpera
definida, impulsores, corpos de máquinas, tambores matrizes.
Mecânica e Hidráulica
Barramentos de torno e plaina, cabeçotes, coluna de fresa, corpos
de retífica, engrenagens, discos de acoplamento, carcaças de
redutor, carcaças de válvulas.
Industria Química e
Metalúrgica
Cadinhos para fusão de alumínio e metal patente, corpos de
bombas e rotores anticorrosivos, grelhas, impulsores, câmaras de
vulcanização de pneus.
Industria Naval
Cabeçote de motor, carcaça de acionamento de bomba injetora,
curva e tubulação de escape, câmara de ar, arraste, volante,
carcaças de redutores, anel espaçador.
Prensa
Corpo de prensa, cabeçote, martelo, cilindros de pressão,
excêntricos, êmbolo, biela, engrenagens.
Modelação
Nossa modelação esta equipada para fabricar modelos em madeira,
isopor e plásticos (poliéster e epoxi).
Fonte: FEMAQ, 2005 - Elaboração própria
4. Certificações e prêmios
Entre os certificados obtidos se encontram:
CERTIFICADO DE QUALIDADE PARA PEÇAS FUNDIDAS N
0
047015080:
conforme a norma alemã AD-Merkblätter WO TRD 100, outorgado pela
172
BRTÜV
175
em 1995 e 1997. Assim como a AD 2000 Merkblätter W 0 em
2003.
Gráfico 7
Certificados de qualidade para peças fundidas
Fonte. FEMAQ, 2005
CERTIFICADOS DE MÉRITO 1995, 1996, 2000 e 2001: obtido da General
Motors do Brasil, como um dos seus fornecedores que apresenta rígidos
controles de custos, prazos e qualidade;
175
A BRTÜV Avaliações da Qualidade S/C Ltda. foi constituída em 6 de Outubro de 1994 pelo
IBQN e pela RWTÜV, seus sócios, com larga experiência e tradição nos mercados Brasileiro e
Internacional. A BRTÜV é um Organismo de Certificação Credenciado pelo INMETRO para atuar
nas áreas de certificação de sistemas de gestão da qualidade, gestão ambiental e de produtos,
sendo assim parte integrante do Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade.
Por meio de seu sócio internacional, está ligado ao maior Organismo Certificador Alemão, o TÜV
CERT, que é uma das principais entidades certificadoras do mundo. Estes credenciamentos e
parcerias permitem à BRTÜV oferecer aos seus clientes todos os serviços de certificação de que
necessitam, sejam eles de sistemas de gestão, produtos ou pessoal, com os mais variados
reconhecimentos oficiais.
173
Gráfico 8
Certificados ao Mérito 1995 e 1996 General Motors Brasil
Fonte: FEMAQ, 2006
PROCESSO DE CERTIFICAÇÃO CONFORME NORMA IS0 9002: através
da agência BRTUÜV, segundo a proposta BRTÜV SP 053, aprovada no
10/05/95.
Gráfico 9
Certificado Norma ISSO 9002
174
PRÊMIO DE MELHOR FORNECEDOR NA AMÉRICA LATINA, outorgado
pela General Motors do Brasil, em 2000, pela terceira vez consecutiva; este
prêmio significa ter prioridade em novos investimentos. Os critérios
considerados pela multinacional foram: qualidade do produto, eficiência na
atenção e rapidez na entrega.
Destaque Ambiental do Ano 199 e 2001, pelo Conselho Municipal de
Defesa do Meio Ambiente - CODEMA - Piracicaba – SP.
Gráfico 10
Destaque Ambiental do Ano
Prêmio de Mérito Ambiental 2001, da Federação das Indústrias do Estado
de São Paulo (Fiesp).
5. Desempenho Produtivo
Em 1995, o faturamento da FEMAQ alcançou os 7 milhões de dólares
americanos, em 1996, e se realiza a publicação da sua experiência como caso de
estudo pela prestigiosa fundação Getulio Vargas de São Paulo. No ano 2003 se
chegou a um faturamento de mais de 8 milhões e quinhentos mil dólares
175
americanos e no ano de 2004, chega-se a um faturamento superior quase quinze
milhões dólares:
Gráfico 11
FEMAQ Faturamento em U$
Fonte: FEMAQ S/A, 2005.
Nos gráficos a seguir apresentam o desempenho da empresa em termos
de: produtividade comparativa, investimento social e o Comparativo Faturamento
Homem/Ano da FEMAQ comparando com a do setor no Brasil nos mesmos
períodos, respectivamente.
176
Gráfico 12
Investimento Social – Homem/Ano.
Fonte: FEMAQ S/A, 2005.
Gráfico 13
Comparativo Faturamento Homem/Ano
Fonte: Abifa - Associação Brasileira Fundições, 2005.
177
Gráfico 14
Produtividade Comparativa FEMAQ X BRASIL
78,00
30,70
74,00
35,30
75,57
37,50
70,00
37,20
79,89
41,20
87,85
44,60
90,10
41,00
93,99
42,06
90,63
44,61
91,30
50,71
-
10,00
20,00
30,00
40,00
50,00
60,00
70,00
80,00
90,00
100,00
TON.HOMEM/ANO
2004200320022001200019991998199719961995
ANOS
FEMAQ BRASIL
fonte Abifa:Associação Brasileira Fundições
Fonte: Abifa - Associação Brasileira Fundições, 2005.
A FEMAQ produz 91,30 toneladas por homem ao ano, muito na frente da
média brasileira, que é da ordem de 50,71 toneladas por homem ao ano.
Dentro do contexto internacional, no ano de 2000 se constatou que a
produção da FEMAQ estava por cima da média americana com 66 toneladas por
homem ao ano e da japonesa com 75, para entender melhor a importância deste
alcance é que recorremos ao gráfico a seguir:
178
Gráfico 15
Produção comparada ano 2000
Fonte: FEMAQ S/A 2000
Talvez o surpreendente crescimento do faturamento tenha sido a principal
constatação de que esta nova concepção de empresa funciona:
Quadro 11
FEMAQ S/A: Faturamento
Ano Faturamento em U$
1989 2.463.395,34
1990 2.563.477,29
1991 2.385.870,32
1992 1.705.446,20
1993 1.156.832,18
1994 3.685.811,03
1995 7.419.494,42
1996 6.836.561,15
1997 5.825.839,02
1998 6.429.116,69
1999 7.833.527,07
2000 8.149.075,91
2001 7.962.429,58
2002 6.876.523,44
2003 8.586.825,51
2004 14.697.506,26
Fonte: Informes anuais FEMAQ S/A, 2005
179
Os dados de faturamento da FEMAQ revelam um amplo crescimento da
empresa especialmente após ter aderido à proposta da Economia de Comunhão.
Nos anos de 1996 a 1998, vemos uma leve queda no crescimento que pode ser
explicada pela crítica situação econômica do Brasil neste período.
Diante de uma economia com características recessivas, manter o
faturamento praticamente num mesmo nível, ao contrário de diminuí-lo, pode ser
considerado como uma evidência da eficiência e da capacidade da empresa para
se manter no mercado superando dificuldades objetivas do sector.
As projeções positivas a partir de 1999 podem ser explicadas pela melhoria
do mercado automobilístico do Brasil devido à desvalorização do Real nesse
período, assim como também pela diversificação da produção da FEMAQ.
6. A empresa ao serviço do homem
Colocar ao homem no primeiro lugar, como sujeito e não como objeto ou
um simples instrumento, foi a perspectiva desde um princípio, fruto de uma
grande sensibilidade social, que levou aos irmãos Leibholz a desenvolver um
novo modelo de empresa, onde o trabalhador é valorizado de forma integral, tanto
no seu aspecto físico quanto no espiritual.
Este projeto, segundo Henrique e Rodolfo Leibholz, devia seguir a lógica
do cristianismo; e por isso não poderia permanecer como uma simples utopia,
pelo contrário, deveria traduzir-se em fatos:
Segundo Rodolfo Leibholz
176
: “Entendemos que era preciso arregaçar as
mangas, ainda sendo a custo de pôr em jogo nossa tranqüilidade, com a
disposição de enfrentar todos os riscos de uma experiência imprevisível”.
Os anos 1980 foram, para todo o Brasil, muito difíceis desde o ponto de
vista econômico, por causa da crise do petróleo e outros problemas internos,
176
Op. Cit.
180
chegando ao ponto que alguns economistas definiram aquele período como a
"década perdida".
A experiência positiva da FEMAQ continuou, ainda passando por várias
dificuldades, “mas cada vez mais nos parecia que, não obstante nossos esforços,
faltava sempre alguma coisa para a plena realização do modelo de empresa que
sonhávamos”
177
.
A FEMAQ conta hoje com 86 funcionários diretos e 11 funcionários que
trabalham na área da empresa, mas que são contratados de terceirizada, que
atuam na manutenção de máquinas, equipamentos, limpeza e serviços gerais.
Um fato interessante é que para a preparação das refeições, realizadas
numa chácara que pertence à FEMAQ e fica cerca de 2 Km do setor de produção,
foi contratada também uma empresa especializada neste serviço. A FEMAQ
oferece a estrutura e a terceirizada os equipamentos e pessoal, como cozinheiras
e nutricionista.
Os benefícios oferecidos pela empresa aos funcionários podem ser
apreciados no seguinte tabela:
Quadro 12
Relação de Benefícios na FEMAQ
Benefício FEMAQ Funcionário
Convenio Medico e Odontológico 50% 50%
Unimed Qualitas 100% -
Seguro de Vida e Auxilio Funeral 100% -
Alimentação 84% 16%
Ticket Alimentação R$100,00 -
Incentivo Construção Empresta o valor à vista Parcelado em folha de
pagamento
Incentivo Educação 50% -
Crédito Consignação Empresta o valor à vista Parcelado em folha de
pagamento
Caixa Beneficente 2% do lucro 2% salário nominal
Fonte: FEMAQ S/A, 2005.
177
Op. Cit.
181
Em relação ao grau de instrução escolar dos funcionários da FEMAQ,
encontram-se distribuídos, conforme gráfico abaixo, percebe-se que cerca de
50% tem até o ensino fundamental incompleto, o que causa surpresa diante das
exigências do mercado moderno:
Gráfico 16
Grau de Instrução dos Funcionários
Fonte: FEMAQ S/A, 2005
A faixa etária dos funcionários varia de 24 a 62 anos, sendo que 58% dos
funcionários têm idade acima de 35 anos.
Na FEMAQ a taxa de absenteísmo em 2005 ficou em 1,79%. Dos índices
de rotatividade, segundo informações do Departamento de Recursos Humanos
aconteceram quinze demissões, em 2005, dentre as quais oito voluntárias e sete
involuntárias. E aconteceram cinco admissões.
No que se refere às causas mais comuns de saída da empresas, estão:
Não adaptação ao trabalho: quanto a produtividade, quanto ao relacionamento e
comprometimento a atividade da empresa. Abertura de negócio próprio.
182
Em 1991 foi criado o Departamento de Desenvolvimento Social, com a
finalidade de coordenar todo o processo de mudanças administrativas junto aos
trabalhadores. Foram implantados dispositivos de promoção humana e
distribuição do capital.
Para implementar essas inovações, os irmãos Leibholz evidentemente
tiveram que enfrentar muitos problemas, como a barreira cultural dos próprios
trabalhadores, o desestímulo, até o descrédito e as suspeitas dos empresários
colegas. Sem fazer menção aos limites da legislação no que se refere ao
processo de participação dos trabalhadores.
Como vimos uma das etapas na implantação deste novo estilo de empresa
foi uma completa pesquisa sobre o completo do estado de saúde dos
trabalhadores e seus familiares, seguida da implantação de um sistema de
medicina preventiva.
Depois, se enfrentou o problema da higiene e da segurança no trabalho.
“No Brasil, todos os anos, por iniciativa da Conferência Episcopal, é
promovida uma ‘Campanha da Fraternidade’, em preparação para a
Páscoa, com temas de conteúdo social. Num certo ano, a ‘campanha’
tinha como título: ‘Saúde para todos’ Inspirando-nos neste tema,
criamos dentro da empresa um consultório com um clínico geral e um
pediatra, a disposição de todos os nossos funcionários e suas famílias”
178
.
Também se fez um levantamento completo da situação econômica e de
moradia dos trabalhadores. Para isso foi criada uma Comissão da Fábrica para
promover uma participação mais direta dos funcionários junto aos diretivos da
empresa, que procura solucionar estes problemas.
Instituiu-se uma Caixinha de Beneficência, administrada por representantes
eleitos pelos trabalhadores. Atualmente, as verbas provêem dos empregados, que
contribuem com um 2% da planilha de salários, e da empresa, que contribui com
178
Op. Cit.
183
um 1%. Esta “caixinha” restitui aos seus associados alguns gastos como
medicamentos, hospital, dentista e funerais.
Também foi criado, o Fundo Rotativo de Crédito, com a contribuição média
por semestre do 5% do total obtido pelos lucros da empresa.
Este fundo provê financiamentos sem juros para a compra e melhoramento
das casas e do material de construção. Atualmente 100% dos funcionários da
empresa já possuem casa própria. “Fizemos uma experiência original. Ninguém
nos garantiu que isto funcionaria; e somente tentando obteríamos resposta”,
afirma Henrique
179
.
Aos poucos o círculo foi alargando-se, fiéis aos princípios cristãos e
convencidos de que não pode existir uma verdadeira relação humana senão
através do intercâmbio e da igualdade, Rodolfo e Henrique Leibholz procuraram
sempre novos interlocutores para compartilhar esta proposta. Os primeiros foram
os outros dos sócios que, ainda sejam minoritários, têm o mesmo direito a voto
que eles em todas as decisões da empresa.
Principalmente depois de entrar em contato com o Movimento Humanidade
Nova, a FEMAQ passou a promover encontros com outros industriais, com a
finalidade de apresentar a novidade da empresa aos que tinham o expresso
desejo de conhecê-la, e também para realizar um intercâmbio de autênticas
experiências
180
:
“A estrutura do homem dirigente resiste aos câmbios, as inovações que
escapam da mentalidade tradicional. A novidade é que nossa
experiência é muito humana. Não tem nenhuma importância a
hierarquia; se vai ao encontro das pessoas. Muitas vezes as pessoas
ficam um tanto confusas, porque não estão habituadas a isto.
Procuramos valorizar muito à pessoa humana, e isso rompe com certos
esquemas. Pelo que pudemos constatar, esta tendência começa a
universalizar-se em muitas empresas; mas para nós isto já é um hábito”.
179
Op. Cit.
180
Entrevista a Henrique Leibholz, 19 de octubre de 2005.
184
Outro aspecto importante é que a FEMAQ está se abrindo à sociedade.
Não se ocupa somente dos seus funcionários ou da sua administração interna, da
produção, do aperfeiçoamento tecnológico, ainda que estes aspectos são
importantes.
Apesar de ser considerada apenas uma empresa de porte médio, sua nova
experiência vem despertando interesse na região. Freqüentemente são
procurados pelos jornais para opinar sobre economia e sobre relações humanas.
“Algumas vezes, é até constrangedor, quando nos vêem como se fôssemos um
modelo ideal”
181
.
Por exemplo, o Jornal de Piracicaba publicou, o 1º de agosto de 1991, um
longo artigo sobre a FEMAQ, com o título: “Empresa transforma trabalhador em
sócio”.
É interessante a motivação que levou este jornal a falar sobre a empresa
dos irmãos Leibholz, dizia o artigo:
“Escolhemos algumas empresas significativas e de vanguarda, capazes
de influenciar a outras e ajudá-las a transformar-se, a partir do seu
interior. Significativas e de vanguarda não porque sejam grandes e
potentes, senão porque têm no seu interior uma filosofia, uma idéia”.
Vale a pena destacar que Henrique e Rodolfo, como também os outros
sócios e os funcionários da empresa, não se envaidecem quando apresentam seu
trabalho, porque simplesmente tem a consciência de ter madurado uma
experiência que está em sintonia com os sinais dos tempos.
7. Por uma “economia de comunhão”
Para Rodolfo e Henrique Leibholz
182
, o capitalismo e o socialismo
fracassaram como forma de promoção do bem-estar integral do homem:
181
Ibid.
182
Op. Cit.
185
“A individualidade, o potencial e as diferenças de cada um devem ser
respeitadas. a empresa não pode ser simplesmente um médio de
concentração do capital ou de poder a qualquer custo (...) Agora, nós
estamos buscando um terceiro caminho”.
É precisamente neste ponto da caminhada que a FEMAQ se encontra em
sintonia com a Economia de Comunhão, segundo o qual uma parte do lucro da
empresa, agora “comunidade produtiva”, em pleno respeito à liberdade de
consciência do empresário, é aplicada para socorrer aos mais pobres em suas
necessidades básicas e na sua formação espiritual.
Rodolfo, Henrique e suas famílias, entusiasmados, aderem imediatamente
à idéia da EdC. Segundo Henrique
183
:
“A novidade da Economia de Comunhão, está justamente no fato de
colocar livremente em comum uma parte do lucro, para ajudar aos que
passam necessidade, não só internamente, senão também fora da
empresa (...) Isto converte à empresa numa comunidade, e ajuda aos
funcionários não somente a sobreviver senão a que elevem aquela
dignidade plenamente humana, a qual todos têm direito”.
Já para Rodolfo
184
:
“Esta é uma experiência já existente em várias partes do mundo, de
empresas integradas para o bem-estar do homem, principalmente dos
mais necessitados. Ainda que está numa fase inicial, esta experiência
deverá promover o surgimento de novos valores e reformular
completamente a relação homem–trabalho–empresa–sociedade”.
Devido a que se trata de uma novidade absoluta no que se refere à
administração empresarial, ela tropeça ainda, com muitas dificuldades de caráter
contável e fiscal:
“Também aqui, vimos que não valia a pena esperar que todos os
aspectos jurídicos estivessem contemplados pela lei. Se trata de
começar com muitíssimo coragem, abrindo caminho, para que a própria
legislação encontre modelos nos quais se baseie, no estabelecimento
de novas normas fiscais”
185
.
Estas dificuldades estão sendo analisadas, estudadas e até superadas
como demonstra a pesquisa de Luiz Antonio Brandalise titulada “A Finalidade do
183
Op. Cit.
184
Op. Cit.
185
Op. Cit.
186
Lucro para as Empresas de Economia de Comunhão”
186
, que não
aprofundaremos aqui por se tratar de um outro foco de pesquisa.
Com a adesão à EdC, não é que muitas coisas mudaram porque na
FEMAQ já se tinha uma consciência cristã dentro da empresa, como afirma
Henrique
187
:
“Baseados nos princípios cristãos, já dávamos aos funcionários
participação nos lucros e benefícios concretos, além de dar prioridade à
ética nas relações com os fornecedores e clientes e com o Estado.
Quando Chiara Lubich lançou a Economia de Comunhão, o modelo se
completou. A empresa entrou num projeto econômico solidário dirigido
para toda a sociedade”.
Por sua parte, Rodolfo
188
assegura:
“Com a Economia de Comunhão adquirimos uma profunda convicção
de que devemos prestar contas a Deus pelos talentos e bens que
recebemos. Porém como não podemos, apresentar um relatório a Ele.
Nós devemos realizar essa prestação a nossos funcionários, clientes e
fornecedores. A ajuda aos necessitados fecha o ciclo. É um caminho
muito difícil. Nos enfrentamos a todo o sistema capitalista convencional.
Mas é assim que nos realizamos plenamente, como empresários, como
pessoas, como filhos de Deus”.
Segundo os dois diretores da empresa, o destino dos recursos mensais
que giram atualmente em torno de 8 mil dólares americanos para os funcionários
e 4 mil para a Economia de Comunhão gera um importante componente de
entusiasmo na empresa, aumentando a produtividade e a competitividade em
função do bem-comum.
Todos os funcionários, conhecem o projeto da EdC, porém nem todos
participam do Movimento dos Focolares, mas:
“Compartilham seus ideais, ou seja, procuram viver a unidade e a
solidariedade acima das pessoas, as classes sociais, os povos, as
raças e culturas. Nossa intenção é envolver a todos nesta cultura do
dar, da mesma maneira como nós, pouco a pouco, fomos sendo
186
Tese apresentada ao Departamento de Contabilidade e Atuária da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, para a obtenção do título de Doutor
em Controladoria e Contabilidade. Orientada pelo Prof. Dr. Sérgio de Iudícibus
187
Op. Cit.
188
Op. Cit.
187
envolvidos na participação dos lucros e na administração da empresa”
189
.
8. Missão, Visão e Objetivos
Num encontro de empresários, trabalhadores e pesquisadores da EdC em
2004, Rodolfo
190
apresentou uma aproximação à Missão de sua empresa:
“Realizar a pessoa na empresa através do trabalho, de maneira equilibrada e
sustentável, objetivando a satisfação do cliente, fornecedor e comunidade”. Da
mesma maneira apresentou a Visão da FEMAQ como: “Assegurar as condições
necessárias para o desenvolvimento da empresa através do conhecimento
gerencial e tecnológico”.
De maneira mais ampla estes dois conceitos podem se definir como:
Missão: Conformar um ambiente de trabalho propício e condições de
vida adequadas para que o crescimento humano, espiritual e produtivo
das pessoas se reflita na oferta de produtos e serviços competitivos, ao
menor custo, no menor prazo, e que estejam de acordo ou ultrapassem
as expectativas dos clientes.
Visão: Promover uma economia nova e moderna sustentada por uma
cultura do compartilhar com uma visão holística, na qual o homem se
realize plenamente e se desenvolva integralmente de tal maneira que
isto se veja refletido na qualidade de produção, produtividade e
crescimento industrial, onde também, a empresa cumpra um rol social
contribuindo à diminuição da pobreza.
Os objetivos da FEMAQ, podem resumir-se nos seguintes pontos:
Objetivos Gerais:
189
Op. Cit.
190
Op. Cit.
188
a) Econômico: Satisfazer ao cliente, aos empresários e aos empregados;
satisfazer as expectativas do cliente em qualidade, custo e cumprimento
dos prazos de entrega através do aumento da produtividade e da qualidade
(prevenir, reduzir e eliminar as deficiências de qualidade), como resultado
do crescimento e da satisfação pessoal e profissional de cada indivíduo.
b) Humano: Colocar a organização a serviço do homem; garantir um
ambiente de trabalho propício para o desenvolvimento humano integral,
construindo grupos de trabalho e potenciando as capacidades pessoais. É
fundamental a capacidade e habilidade de ouvir, sintetizar e analisar as
idéias para resolver os problemas da empresa ou pessoais.
c) Social: Promover a Economia de Comunhão; a empresa cumpre com
uma função social maior que só a produção de bens e a geração de
emprego. Ao estar comprometida com a EdC se compromete a gerar
utilidades para doá-las aos necessitados como um caminho para aliviar a
pobreza do seu entorno, e se compromete a investir no desenvolvimento
integral do homem e a formação de Homens Novos; por último, aspira
construir uma organização comunitária baseada na cultura do dar.
Quando se refere à Missão da FEMAQ, Rodolfo
191
assevera que a missão
da empresa é produzir para a sociedade bens de produção para desenvolver a
sociedade de maneira equilibrada e sustentável. E a visão de seus valores
consiste em que sua ação seja sempre analisada sobre sete aspectos que são:
Garantir sempre a missão para a qual a empresa nasceu.
Produzir garantindo a harmonia interna do ambiente de trabalho,
promovendo confiança e respeito entre a equipe.
Comunicar-se com todos revelando uma administração transparente.
Promover a formação da equipe e incentivar a pesquisa.
Relacionamento com o meio ambiente saudável.
191
Entrevista publicada no site Ética Empresarial, realizada em 17/03/2004 Disponível em
http://www.eticaempresarial.com.br/entrevistas.asp Acesso em: 15/12/2006.
189
Relacionamento com a comunidade.
E finalmente, manter a empresa lucrativa e financeiramente com índices
positivos (Este último é o foco único do capitalismo).
Poucas vezes os diretores da FEMAQ fizeram referência à Missão da
empresa quanto na colocação anterior. Vemos que claramente a coerência entre
os propósitos da FEMAQ com os da EdC.
9. Filosofia e solidariedade da FEMAQ
Segundo a pesquisa de Daniele Jannotti Villena
192
, a filosofia da FEMAQ
nasceu antes de tudo da convicção e anseio dos diretores em construir um modo
de gerir, alicerçado em valores humanos e cristãos.
Sobre a filosofia respondeu João Batista R. Mendes
193
, funcionário da
produção, quando perguntado se queria expressar algo mais sobre a empresa,
que não tivesse sido perguntado:
“Queria falar um pouco da filosofia da empresa porque eles procuram
viver o que eles pregam o que procuram passar para o pessoal é o que
eles vivem então isso aí é que passa motivação pra gente. E não são
eles que sobem no palco pra falar, mas são pessoas como eu que com
uma vivência de alguns anos [aqui na empresa] é que falam. Não pra
dar glória a eles, mas pra mostrar que existe essa diferença, esta
qualidade”.
Podemos definir a filosofia que se propõe a FEMAQ a partir de:
a) Trabalho em equipe: o importante é o que se pode aportar para o bem
da empresa, tanto nas decisões como na ação, em grupos de pessoas que
se necessitam entre si para alcançar melhores resultados.
b) Qualidade: a qualidade é um valor que ultrapassa a produção e
transcende a vida cotidiana entendida como superação pessoal e
192
VILLENA Daniele As contribuições da Economia de Comunhão para o estudo da influência de
valores no ambiente organizacional, UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO
193
Entrevista com João Batista R. Mendes funcionário da moldagem que trabalha há 18 anos na
FEMAQ, realizada em 21 de junho de 2005.
190
profissional. A empresa se constrói com pessoas que incumbem seu
pensamento e ação com qualidade, a qualidade é o modo de ser coerente
com seus objetivos pero não é a finalidade em si mesma.
c) Comportamento Ético: a valorização máxima e integral do homem, da
família e da vida abre o caminho para um comportamento ético, de
confiança mútua e transparência, no qual se valora a integridade, a
moralidade, a honestidade, o companheirismo, a bondade, a solidariedade.
d) Solidariedade: Compromisso com a Cultura do Dar como um caminho
alternativo que incluía o positivo do capitalismo e socialismo, mas sobre
tudo do cristianismo; cultura que à vez que permite satisfazer
eqüitativamente as necessidades materiais, satisfaça as necessidades de
realização pessoais e espirituais, e, finalmente, satisfaça as necessidades
dos pobres.
e) Comunicação: As formas e as relações comunicacionais dentro da
FEMAQ são fundamentalmente horizontais, ou seja, se prioriza a
comunicação interpessoal, em todos os espaços da empresa, porque é um
tipo de comunicação, que ajuda às relações entre todos os trabalhadores e
seções.
Desta maneira, uma prática inovadora da FEMAQ, dentro desta
perspectiva de valorização dos funcionários, foi a realização do PLR (Participação
nos Lucros e Resultados), que acontece em muitas empresas, e em Piracicaba é
lei desde dezembro de 2004, porém na FEMAQ tem características peculiares.
A característica peculiar da prática do PLR nesta organização é que tanto o
lucro quanto o prejuízo são divididos mensalmente em partes iguais entre todos
os funcionários da empresa, independente de sua função.
Neste ano está sendo concebido o planejamento estratégico da empresa,
atividade que os diretores fazem questão de realizar juntamente com os
191
funcionários, mesmo que isso requeira mais tempo para sua concretização.
Para a FEMAQ o planejamento estratégico
194
tem como objetivo
responder: por que a organização existe, o que e como ela faz e até onde ela
quer chegar.
Como resultado deste planejamento a missão da FEMAQ passou a ser
“Realizar a pessoa na empresa através do trabalho, de maneira equilibrada e
sustentável, objetivando a satisfação do cliente, fornecedor e comunidade”. E
como visão “Assegurar as condições necessárias para o desenvolvimento da
empresa através do conhecimento gerencial e tecnológico”.
Dessa mesma forma, os princípios da FEMAQ têm como objetivo
assegurar a manutenção de valores humanos na organização e fazem referência
a cores, cada princípio está relacionado a uma das sete cores do arco-íris.
Relação esta já estabelecida pelo Movimento dos Focolares para correlacionar os
valores cristãos aos diversos aspectos práticos da vida do homem, conforme o
gráfico a seguir.
194
Informações fornecidas pela analista de departamento de pessoal, Fabiana Longato, em 21 de
junho 2005.
192
Gráfico 17
Valores da FEMAQ
1. VERMELHO: Resultado financeiro positivo (lucro) como fonte de
subsistência;
2. AZUL: Estudos, pesquisas e desenvolvimento gerenciais e tecnológicos,
incluindo a qualidade do produto;
3. VERDE: Respeito ao meio ambiente e à segurança e saúde no trabalho;
4. ALARANJADO: Relacionamento com fornecedores, clientes e comunidade,
o governo e a sociedade;
5. VIOLETA: Comunicação interna, com clientes e fornecedores;
6. ANIL: Harmonia entre as pessoas, o ambiente de trabalho e a infra-
estrutura;
7. AMARELO: Atitudes coerentes com a missão, visão, valores e metas
estabelecidas.
Em 1979 os diretores realizaram uma assembléia de um dia todo. Todos os
funcionários puderam apresentar reclamações e sugestões. O evento foi
193
considerado como uma loucura no meio empresarial da época. O sindicato dos
metalúrgicos também desconfiou da proposta
195
: “Os sindicalistas pensavam que
com a assembléia, queríamos descobrir um mecanismo para burlar as conquistas
salariais obtidas por eles nessa época”.
As reuniões continuam desenvolvendo-se até hoje, mensalmente, porém
com uma duração menor, é a “assembléia”, como dizem os membros da FEMAQ.
Nesta ocasião, a diretoria mostra todos os índices do mercado, comparando-os
com os da FEMAQ; atualiza os funcionários quanto à política econômica,
conversa sobre a meta da empresa para o próximo mês e todos os funcionários
são convidados a participar com suas idéias e opiniões. Há também um relato
sobre lucros ou prejuízos do mês anterior.
Segundo os diretores, esta “loucura” deu como resultado o aumento da
produtividade e da competitividade. E em relação às dúvidas da oposição sindical,
um dos resultados concretos das assembléias foi a participação nos lucros, como
vimos anteriormente, definida com os trabalhadores, que se realiza há 15 anos:
“Somos pioneiros em proporcionar uma autêntica participação nas
ganâncias porque destinamos uma porcentagem real dos lucros aos
empregados. O que se faz no mercado é a distribuição de uma
quantidade em dinheiro determinada por um acordo entre a direção das
empresas e o sindicato. Naturalmente, nessas outras empresas, esta
quantidade, em geral, não aumenta quando o lucro é maior. Mas
também não diminui quando o lucro cai. Então, que participação e
sentimento de responsabilidade o empregado pode ter com este
método?”
196
Nestes 41 anos de existência, a FEMAQ nunca deixou de lado sua filosofia
social, ainda suportando as diferentes crises econômicas que o Brasil atravessou.
Até nas épocas de recessão, quando se teve que recorrer à extrema medida do
corte de funcionários, a empresa sempre procurou fazer com que as
conseqüências pesassem o menos possível nas costas dos trabalhadores:
examinando caso por caso, procurando encontrar um novo emprego para os
despedidos ou um adiantamento de seis meses do seu salário.
195
Op. Cit.
196
Op. Cit.
194
Segundo Henrique Leibholz
197
, isto: “também é fruto de uma nova visão
empresarial que modifica os conceitos mais tradicionais da empresa, ao
transformar o trabalhador num sócio”.
A participação dos trabalhadores inclui que eles tomem conhecimento do
desempenho da empresa em todos seus âmbitos, com eles se realiza uma
profunda discussão da direção que devem ter os lucros, além de analisar as
dificuldades e as metas administrativas, isto se realiza através das assembléias
mensais.
“Nossa preocupação é colocar o homem no primeiro lugar, como sujeito
de todo o processo produtivo. E sentindo-se respeitado na sua
dignidade, o operário também trabalha melhor, e até produz mais”,
afirma Henrique Leibholz
198
, ao explicar o desempenho que a FEMAQ
alcançou nestes últimos anos.
Sublinha-se que o nível de participação e responsabilidade de todos na
condução da empresa teve um crescimento considerável: “Isto se constata na
disponibilidade dos empregados, na seriedade em cumprir os compromissos
assumidos, na contribuição espontânea com idéias novas procurando aperfeiçoar
as técnicas de produção e numa maior capacidade de desenvolver um trabalho
em equipe”
199
.
Mas não somente se trata da participação nos lucros, inicialmente, Rodolfo
e Henrique Leibholz procuraram enfrentar, além do aspecto administrativo e
financeiro, o problema da participação dos funcionários, na própria condução da
empresa.
10. Respeito ao meio ambiente
No que diz respeito ao meio ambiente, a FEMAQ, desde sua adesão ao
projeto EdC conseguiu reduzir a quase zero a porcentagem de contaminação ao
meio ambiente, o que lhe conferiu, no ano de 2001, o “Prêmio ao Mérito
197
Op. Cit.
198
Op. Cit.
199
Op. Cit.
195
Ambiental 2001”, outorgado pela Federação das Indústrias do Estado de São
Paulo – FIESP.
Das milhares de fábricas paulistas, a FEMAQ ficou entre as dez melhores –
sendo que as outras nove eram todas multinacionais – em virtude de seus
projetos eficazes de proteção à natureza. O respeito ao meio ambiente é visível
no grande reaproveitamento que é feito de toda a matéria-prima utilizada,
sobrando apenas uma pequena porcentagem de 1,24% de restos inutilizáveis
200
.
Gráfico 18
Refugo
Fonte: FEMAQ S/A, 2005
O reconhecimento da FIESP, foi pelo destino dado ao resíduo da areia
utilizada para os moldes na produção que, além do problema ambiental, gera
gastos porque sua conservação deve ser feita pela empresa, aumentando o preço
do produto.
200
Segundo dados constantes da dissertação de mestrado de Villena, dos resíduos da areia
utilizada para os moldes na produção, a FEMAQ reaproveita 90% e os 10% restante são utilizados
na produção de blocos de cimento para a construção civil.
196
Na FEMAQ o reaproveitamento do resíduo é da ordem do 90% e os 10%
restantes servem para a produção de blocos de cimento para a construção civil,
quer dizer que foi criada uma nova empresa a RECIBLOCO encarregada desta
inovação.
Como explica Henrique Leibholz
201
: “Cada quilo de material fundido gera
de três a cinco quilos de areia residual”. Por exemplo, a produção no ano 2003 foi
de 6.616 toneladas, se multiplicamos por 4 teremos 26.464 toneladas de areia,
isso nos dá a dimensão da degradação ambiental e do desperdício evitados pelo
projeto ambiental da empresa. A fábrica de blocos produz 10 mil unidades por
mês, dando trabalho a cinco pessoas.
Um aparelho que separa as substâncias químicas da areia a ser
reutilizada. O que sobra desse processo, aproximadamente o 10% do material, se
transforma nos blocos. O projeto permitiu-lhes receber o Certificado de Destaque
Ambiental, concedido pelo Conselho Municipal da Defesa do Médio Ambiente de
Piracicaba (CONDEMA), assim como de menções honrosas da Câmara dos
Vereadores.
Segundo Heloisa Gonçalves
202
, o processo de gestão ambiental foi iniciado
em 1998, a partir de um trabalho de pesquisa dentro da empresa que culminou
com a possibilidade de processar e reutilizar a areia descartada da fundição, tanto
para a produção de novos moldes de fundição quanto para a produção de
artefatos de concreto.
Partiram do pressuposto de que não se pode produzir qualidade, se o
ambiente em que a empresa está inserida é poluído e prejudicial à saúde
humana. E, que não se pode dirigir uma empresa de maneira responsável
ambientalmente e socialmente se a gestão não se preocupar além da
competência profissional com a valorização do ser humano e com a
sustentabilidade do meio ambiente. A premissa central dos irmãos Leibholz é que
201
Op. Cit.
202
GONÇALVES Heloisa, Os resíduos sólidos de uma empresa de economia de Comunhão, X
SIMPEP Simpósio de Engenharia de Produção, Bauru – SP pp. 7 e 8
197
um comportamento ético ambiental pode ser difícil no sistema e cultura na qual
estamos inseridos, mas não é impossível.
Com vistas à prática de tais pressupostos, inicialmente foi avaliado o
processo de fundição utilizado pela FEMAQ e identificados os elementos
integrantes da areia de moldagem.
Foram separadas e preparadas amostras da areia descartada que serviram
como base para os ensaios posteriores. Para a obtenção destas amostras, foi
acompanhado todo o processo, desde o preparo da areia de moldagem até a sua
desmoldagem da caixa, após o processo de fundição. As amostras passaram por
uma primeira etapa de limpeza e moagem afim de, retirar as partes metálicas e
fazer uma redução na dimensão dos torrões de areia. Em seguida, as amostras
brutas foram homogeneizadas, misturando as areias que estavam mais próximas
das peças fundidas, com as que estavam mais próximas da caixa de moldagem.
Posteriormente, foram coletadas amostras desta areia, que foram
peneiradas a fim de caracterizar e padronizar as granulometrias. Em seguida
foram acondicionadas em local protegido e serviram de matéria prima básica para
todos os ensaios desenvolvidos. É importante salientar que todos os
procedimentos e ensaios aplicados foram executados com base nas normas
técnica vigentes.
Os ótimos resultados destes ensaios demonstraram definitivamente a
possibilidade técnica e ambiental da utilização de areia descartada de fundição
FEMAQ, como parte da matéria prima básica para a produção de artefatos de
concreto. Após a avaliação dos trabalhos por parte da Companhia de Tecnologia
de Saneamento Ambiental (CETESB), deu-se início à instalação piloto para a
produção de artefatos de concreto e do aparelho recuperador de areia
descartada.
Logo em seguida foi instalada junta a fábrica piloto de artefatos de
concreto, uma estação de tratamento de águas servidas totalmente construída
198
com produtos fabricados pela ROTOGINE, também uma empresa de economia
de comunhão. Esta estação de água descartada dos sanitários, vestiários e
restaurante através de um sistema composto de fossa séptica, septo difusores e
filtros de areia e brita, trata e devolve a água em condições de ser utilizada para
molhar os artefatos de concreto e promover a sua cura úmida.
Além dos benefícios ambientais a RECIBLOCO está produzindo blocos de
concreto com qualidade e que chegam ao consumidor final custando em média
15% menos que os demais produtos convencionais encontrados no mercado.
Dando continuidade a sua vocação empreendedora, a RECIBLOCO vem
desenvolvendo novas pesquisas de aplicações para os resíduos de fundição,
mantendo parcerias técnicas com a Escola Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz (ESALQ-USP) e com algumas empresas de pavimentação de região de
Piracicaba.
Em curto espaço de tempo, pretende apresentar novas alternativas
ecologicamente corretas para o uso dos resíduos de areia de fundição com a
matéria prima em outras áreas.
A experiência da FEMAQ também é apresentada pela CETESB como um
caso de sucesso pelo Reúso de areia de fundição e reciclagem de resíduos da
recuperação.
O sistema de recuperação da areia exigiu um investimento de R$
800.000,00, na aquisição de equipamentos utilizados nesse processo, sistema de
transporte, silos e obras civis. A instalação da fábrica de blocos requereu um
investimento de R$ 150.000,00, com a compra de equipamentos e a realização de
obras civis.
O principal benefício ambiental da medida adotada foi a eliminação da
necessidade de disposição final de cerca de 1.500 t/mês de areia de fundição.
Além disso, esta medida permitiu a redução de 83% do consumo de areia, que
199
passou de 600 a 1.600 t/ mês para 100 a 300 t/ mês, dependendo da demanda
dos clientes. Do ponto de vista econômico foram obtidos:
Economia anual média de R$ 500.000,00 com a redução no consumo
de areia;
Economia anual média de R$ 240.000,00, relativa ao transporte e
disposição final do resíduo;
Lucro (receita) anual médio de R$ 50.000,00, com a venda dos blocos
produzidos com areia fina;
Estes resultados permitiram uma economia média anual de R$ 790.000,00,
com tempo de retorno do investimento em cerca de 15 meses.
11. Etapas da mudança da FEMAQ
Consideramos importante detalhar quais são e que passos se foram dando
para chegar à transformação e ao sucesso obtido, que como especificamos
considerou desde o início o ser humano, o trabalho humano e à empresa como
uma mesma realidade.
A seguir as etapas que foram se cumprindo
203
:
Gerar um ambiente de mudança
Tentou-se harmonizar o crescimento da empresa com o crescimento das
pessoas, se estabeleceu a imagem da empresa como um lugar de trabalho e
contato humano, onde o grupo se realizaria pessoal e profissionalmente, se
reorganizou o trabalho no sistema produtivo da empresa através dos seguintes
parâmetros:
A otimização do ambiente de trabalho, começando pela direção da
empresa se iniciou uma aproximação aos funcionários dos diferentes
203
Tomado da palestra apresentada pela FEMAQ na CONAF ‘95 - Congresso de Fundição - titulado
“Aumentado a Produtividade em Época de Turbulência”, Medellín, Colômbia, 1995.
200
setores, e assim, pouco a pouco foi quebrando-se a rígida estrutura que
distanciava às pessoas seja por falta de comunicação ou por falta de
empatia.
A especialização profissional, incentivando a criatividade, estimulando a
participação em cursos de profissionalização, especialização ou
melhoramento em cursos nas universidades.
Intercâmbio profissional: visitas, práticas e intercâmbio de experiências, se
programaram exposições e visitas grupais de outras empresas, neste caso
clientes, também se contataram profissionais especializados para oferecer
treinamento na empresa. Isto possibilitou uma visão mais ampla da
empresa desde fora, porque o grupo passa a se conhecer melhor, seja
naquilo que produz, como os problemas e/ou benefícios.
Uma visão global da empresa: reestruturando as funções e os papéis, se
trocou a teoria da “subdivisão do trabalho” para uma “teoria de conjunto”,
as pessoas têm a possibilidade de observar à empresa na sua totalidade e
não como as partes desse todo. A intenção é mostrar que cada parte da
fábrica é fundamental na elaboração do produto final. Assim aumentou o
interesse e o estímulo por aquilo que cada setor desenvolve no espaço
geográfico da fábrica. Isto também possibilitou o desenvolvimento de um
sentimento de companheirismo e valorização de aquilo que o companheiro
faz.
A recolocação de profissionais, para valorizar o trabalho fabril nos
diferentes segmentos da empresa muitas vezes se precisou mudar o
plantel profissional de uma a outra função buscando valorizar o trabalho
dos outros companheiros. A mudança facilitou a eliminação do tédio, criou
desafios, melhorou a flexibilidade do grupo, aumentou o respeito pelo
trabalho alheio e ajudou ao desenvolvimento global da empresa.
A organização
Para criar um ambiente propício a fim de que o grupo se realize humana e
profissionalmente, quem dirige a empresa deve se colocar a serviço dos seus
201
funcionários. É nesta nova concepção que o executivo deixa de ser o todo-
poderoso e se coloca como mediador do processo produtivo e da realidade
humana. Para tanto é fundamental a capacidade e a habilidade de escutar e
extrair idéias das pessoas tanto para a empresa e como para solucionar os
problemas das próprias pessoas.
Desta maneira os proprietários se colocaram na posição de construtores de
grupos de trabalho e ao mesmo tempo de potencializadores de talentos nas
pessoas.
Logrou-se assim, um salto qualitativo na inovação do gerenciamento na
empresa. Esta concepção implica um câmbio de mentalidade; não é só o operário
quem se coloca ao serviço do empregador, senão também o empregador se
coloca ao serviço do operário. Esta perspectiva de trabalho além de resultados
práticos permitiu sua realização como pessoas.
Sistemas de incentivos que aumentam a participação
Como já foi mencionado, para proporcionar uma maior participação dos
funcionários foram concedidos alguns incentivos que no transcurso do tempo
foram se alterando. É importante notar que o incentivo deve ser percebido desde
as necessidades do grupo e não desde aquilo que pode num primeiro momento
parecer interessante, mas que não reflete a realidade na qual atuam os
trabalhadores. Em princípio estes foram os principais:
Percebeu-se que um dos problemas que afligia o pessoal se referia à
questão da saúde. Para isso se criou um sistema de atenção médica
interna na empresa que mais tarde se estendeu à família do trabalhador.
Outro problema diagnosticado foi o relacionado com a formação escolar de
alguns trabalhadores. Sobre isto, se tentou incentivar a formação de
grupos para alfabetização, cursos universitários subsidiados pela empresa
e outros cursos necessários para a formação humana dos trabalhadores.
202
Na medida em que se incrementava a participação dos funcionários
surgiram outras necessidades como a comunicação interna. Criou-se uma
assembléia periódica com os funcionários, onde se informa sobre a
situação da empresa, produção, alimentação etc. Também se criou um
sistema de votação donde os funcionários qualificam o desempenho dos
vários setores da empresa.
Também se criou um sistema de incentivo que se desenvolve sob a forma
da participação financeira nos resultados da empresa ligados à
produtividade, freqüência e utilidade. Esta participação se distribui
igualmente a todos os funcionários por decisão da assembléia.
Um aspecto que merece ser ressaltado neste sistema de incentivos foi a
proposta de construir uma empresa “nova” no contexto em que atuava.
Este desafio foi lançado a todos: diretores, gerentes e funcionários da
empresa; isso implica criar um ambiente de “tensão” positiva, onde o
trabalhador se transforma num sócio.
Os trabalhadores assumem e realizam este objetivo de maneira
heterogênea, porque deve realizar-se respeitando a liberdade dos
indivíduos, que é a filosofia que alimenta esta proposta.
Intuição por lógica
Na cotidianidade, para o executivo no sempre é possível tomar decisões
com números porque se entende que o problema é muito complexo para uma
análise puramente racional.
Neste sentido, quando se apresenta uma situação desta natureza, dentro
da empresa se tenta envolver a duas ou mais pessoas para discutir o assunto e
intuir juntos sobre a melhor decisão a tomar-se; este tipo de trabalho implica
disposição, interação e transparência de quem participa para que a decisão não
seja unilateral.
203
Entre as várias decisões tomadas existe uma que melhor caracteriza este
tipo de decisão e que narra a adesão à EdC e que citamos como exemplo
204
:
“Num determinado momento, chegou até a empresa uma proposta
inédita do Movimento dos Focolares, que se denominou ‘Economia de
Comunhão’. Mas, que quer dizer isto? Esta proposta evidenciava um
modo ‘sui generis’ de entender à economia. Em resumo, se propunha
que uma parte dos lucros da empresa poderia ser investida na formação
de homens novos e em favor dos mais necessitados. Consideramos
interessante a proposta, principalmente no que referia à nova maneira
de pensar. Tendo em vista este assunto, se o colocou na agenda de
uma das reuniões da direção para analisar a proposta em questão. Ao
respeito se observa que a cultura ocidental (capitalista) do ‘ter’, nos
levou a fazer considerações diversas, desde técnicas, burocráticas,
sociológicas, antropológicas. Nesta dialética evolutiva, se chegou à
decisão unânime de participar deste projeto. Esta decisão foi tomada
com base à intuição do grupo, o que nos leva a considerar que, nesta
situação em particular, o raciocínio lógico-financeiro não foi o fator
decisivo. Investir na formação do homem é nossa utopia. (...) Após de
três anos de participação neste projeto, observou-se que a decisão
tomada foi acertada, pelo benefício social e, principalmente, porque a
cultura da empresa e até o próprio sistema produtivo e as relações
humanas quedaram mais ricas com este objetivo”.
Qualidade: fator essencial
O movimento rumo à qualidade total nas empresas aumenta cada ano. Na
FEMAQ o enfoque inicial estava centrado na inspeção do produto acabado, este
enfoque inicial, gerava problemas críticos devido principalmente à quantidade
produzida e aos atrasos na produção que ocasionavam atrasos na entrega.
Para adequar o enfoque às necessidades da empresa se deu maior
importância ao controle de processos, iniciando um trabalho que tentava melhorar
o diálogo entre os setores envolvidos e ressaltar o valor da qualidade. No
desenvolvimento deste trabalho se quis aproveitar a capacidade criativa do ser
humano, incluindo técnicas de compromisso do pessoal e treinamento em
qualidade.
204
Ibid.
204
Terceirização
O processo de terceirização de atividades nesta empresa constitui parte da
estratégia de atenção às expectativas do cliente, por meio do produto principal e
de serviços adicionais.
Ao terceirizar os serviços como: transporte, manutenção, parte de vendas,
assistência médica e outros, se buscou maior eficiência, redução de custos e
concentração na produção de peças fundidas, que em definitiva é o produto
principal.
Optou-se pela terceirização em sistema de sociedade, levando em conta
sempre como parâmetro uma filosofia de respeito ao ser humano. Alguns ex-
funcionários da FEMAQ na atualidade são micro e pequenos empresários.
Comportamento ético
Dentro do seu trabalho os que levaram para frente esse processo de
mudança perceberam nos indivíduos formados durante as últimas décadas, certo
vazio de valores altruístas que cimentam as relações humanas, assim como, o
processo de formação familiar, escolar e profissional; dentro desses valores,
existem certos requisitos imprescindíveis para o crescimento da empresa:
integridade, moralidade, honestidade, companheirismo, bondade e outros.
Esses valores que vêm do lar, da comunidade e dos diferentes grupos em
que se participa e que se contrapõem em grande parte ao predomínio da
racionalidade técnica, o que favorece a segmentação do processo produtivo e
pelo geral não favorece ao trabalho cooperativo.
Para corrigir essas deficiências de formação se ofereceu, sempre
respeitando a liberdade da pessoa, a oportunidade de participação em cursos ou
reuniões que possam transmitir valores que se julgaram essenciais para a
pessoa, sua família e a empresa.
205
“Este tipo de proposta pode até parecer como uma ‘invasão da
privacidade’, porém, cremos que o verdadeiro líder é aquele que
transforma o trabalho, de um simples médio de vida, num ato
pedagógico de valorização da vida, do trabalho e do homem. Nesta
dialética podemos contar com verdadeiros sócios e colaboradores para
o sucesso da empresa. O comportamento ético pode ser difícil no
sistema e a cultura em que nos encontramos, mas não impossível”
205
.
12. A FEMAQ: comunicação e organização
Ainda que ao longo deste capítulo evidenciamos como se realizam os
processos comunicacionais e o espírito dos mesmos, a continuação os
explicitaremos, para que fiquem mais claros:
Organograma
A estrutura organizacional encontra-se retratada no gráfico a seguir:
Gráfico 19
Organograma FEMAQ
Fonte: FEMAQ, 2004.
É importante afirmar que este é o Organograma tradicional, que
corresponde a um esquema organizativo empresarial comum, apresentado pela
FEMAQ como uma empresa qualquer. Com setores bem definidos, e corresponde
205
Ibid.
206
a um esquema piramidal hierárquico, no qual a Direção se encontra no cume e os
setores produtivos na base.
Com a presente pesquisa constatamos que este organograma não é tão
“verdadeiro”, e que na realidade o que se pratica é diferente, ainda que não se
tenha institucionalizado, é conhecido por todos os trabalhadores e diretores.
Basicamente nota-se que a Assembléia (e entendamos este termo como
todas as formas existentes de participação) se encontra ao mesmo nível da
Direção. Quer dizer que os funcionários são tão responsáveis pelas decisões da
empresa quanto os proprietários.
É fundamental nesta organização a cultura do dar, que como observamos
anteriormente é a que garante a presença do princípio de solidariedade social,
porque assim todos participam e constroem a empresa.
Constatamos também, a importância do Departamento de Controle de
Qualidade, poderíamos dizer que é o eixo central da empresa, todos os outros
departamentos, se encontram de certa maneira inter-relacionados a esta seção,
devido a que a priorização da qualidade é fundamental para o desenvolvimento
do trabalho de todos os sectores da empresa.
13. Relacionamento com a sociedade
A empresa procura manter um relacionamento muito estreito com a
sociedade em geral e são diversos os frentes nos quais se participa, um desses
projetos é “Piracicaba 2010”, no qual a FEMAQ é uma das empresas promotoras.
Este é um projeto integral: econômico, urbanístico e social, e segundo o diretor
financeiro, Pedro Luiz da Cruz
206
: “Piracicaba 2010, é um projeto que partiu da
iniciativa privada e envolve a toda a população. Nós vamos construir uma nova
cidade e temos que crer que isso é possível".
206
Parte do discurso na Criação da sede do Projeto Piracicaba 2010, 10 de maio de 2001.
207
Como mencionamos anteriormente a empresa recebeu vários prêmios que
sem dívida refletem o bom relacionamento estabelecido com a sociedade, entre
eles, em 2001 o “Destaque Ambiental do Ano” do CODEMA Conselho Municipal
de Defesa do Meio Ambiente – Piracicaba - SP, em função de buscar não apenas
o cumprimento da lei, mas também cumprir o seu papel social na comunidade em
que atua.
Ainda, em 2001, recebeu o Prêmio de Mérito Ambiental, da Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Em 2003 recebeu da O.P.B (Ordem
dos Parlamentares do Brasil), o Prêmio Ulysses Guimarães em destaque na
categoria FUNDIÇÃO e reconhecimento pelos relevantes serviços prestados em
prol da valorização da “Democracia”, através do “Parlamento Brasileiro”. Brasília
D.F., 8 de dezembro de 2003. Resolução unânime em reunião do Conselho
Federal de Honrarias e Méritos.
Por outra parte, a FEMAQ participa dos diretórios de algumas
organizações relacionadas com o rubro metalúrgico como a Associação Brasileira
de Fundição na qual Pedro Luiz da Cruz é o 2º Suplente Conselho Consultivo.
Também faz parte do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas, de
Material Elétrico, Eletrônico, Siderúrgicas e Fundições de Piracicaba, Saltinho e
Rio das Pedras (SIMESPI) no qual o mesmo Pedro Luiz da Cruz é Diretor de
Relações Públicas e Comunicação. Pedro Luiz também é o vice-presidente de
Piracicaba 2010, assim como diretor da CIESP (Centro de Industrias de São
Paulo).
A FEMAQ apóia diversas atividades sócias que vão desde a Campanha de
Desarmamento Infantil (2003) até a apresentação da Orquestra de Câmara de
Augsburg (2004), aproximando-se e influenciando cada vez mais a diversos
setores da sociedade.
Como vimos a sociedade reconheceu o trabalho desenvolvido pela FEMAQ
como instituição com alguns prêmios e destaques, porém também o fez com as
pessoas que fizeram possível as mudanças, assim os irmãos Leibholz receberam
208
o título de cidadania piracicabana da Câmara de Vereadores de Piracicaba em
2003, pelo trabalho desenvolvido em favor da cidade. Já o Diretor financeiro da
empresa Pedro Luiz da Cruz recebeu o título de Piracicabanus Praeclarus em
junho de 2004, pelo seu comprometimento e amor pela cidade natal.
14. Principais conclusões
Pode comprovar-se que o gerenciamento centrado no ser humano
possibilita além da sobrevivência econômica, o melhoramento da pessoa e do
grupo de trabalho. O grupo de trabalho se aproxima a sua meta com menos
dificuldades quando se reconhece na dignidade dos seus membros parte dos
princípios sociais.
Na FEMAQ pode-se observar o nascimento de uma nova dimensão da
cultura empresarial com características marcantes: antropologicamente teve uma
evolução da pessoa que agora passa a pensar coletivamente, com espírito de
equipe e com uma realização maior, realizando-se no trabalho e do trabalho;
economicamente com resultados surpreendentes teve aumento de produtividade
e faturamento; socialmente, se produzem ‘riquezas’ para a equipe de trabalho e
para a sociedade.
Segundo os irmãos Leibholz
207
:
“Esta cultura de compartilhar é de difícil medição. Não conseguiríamos
definí-la com precisão, porque estaríamos medindo conhecimentos e
valores ilimitados com valores limitados. Ao mesmo tempo, poderíamos
dizer que temos uma nova visão da economia. Esta visão nos permite
um salto em qualidade, já que passamos a lidar com valores conhecidos
em determinadas ramas da natureza humana. Na estrutura adotada,
tomamos como referência a família, onde compartilhar é uma atitude
comum. (...) Assim, cremos que na cultura do compartilhar se poderia
seguir por uma terceira via que incluiria os avances do liberalismo e do
socialismo em uma concepção mais amplia do ‘ser humano’,
‘sociedade’, ‘mundo’. Nesta caminhada, poderíamos seguir por
caminhos ainda não trabalhados nem enfatizados da capacidade
humana e aí concretizar novos rumos para uma ‘economia do futuro’.”
207
Ibid.
209
Podemos afirmar que a FEMAQ, é uma autêntica empresa de EdC, a esta
conclusão chegamos, baseando-nos em que a teoria estudada anteriormente, se
concretiza nesta empresa, se tem alcançado a utopia, e todos seus trabalhadores
são partícipes deste alcance, nos surge a esta altura perguntarmos quem ganha
com este tipo de experiência? A resposta é até óbvia: ganha a humanidade.
210
CAPÍTULO 5
ABORDAGEM METODOLÓGICA
Como já acenamos na Introdução desta tese, devido à peculiaridade da nossa
pesquisa porque se trata de um fenômeno novo dentro do contexto acadêmico, é que
utilizamos o método fenomenológico a partir do estudo de Daniel Augusto Moreira,
para nos guiar. Também recorremos à pesquisa que Robert Yin faz sob o Estudo de
Caso, que nos permitiu submergimos no trabalho de campo dentro da FEMAQ.
1. Método Fenomenológico
Segundo Moreira
208
, nesse método: “O foco está no fenômeno e não no fato.
Quando há fatos, há causalidade, previsibilidade, controle. O pesquisador
fenomenológico realiza o trabalho interrogando o fenômeno”.
O mesmo autor afirma que esse é:
“um método ‘pessoal’, em que o dado é apreendido direta e unicamente
pelo fenomenólogo, que deve se libertar de teorias, pressuposições ou
hipóteses explicativas. A apreensão do fenômeno deve dar-se em primeira
mão. No entanto, na pesquisa empírica quem vive a experiência não é o
pesquisador, mas sim o sujeito da pesquisa. Qualquer que seja o
procedimento de coleta de dados usado, este será sempre de segunda
mão”.
Para Moreira nesse método os principais instrumentos de coleta de dados
comuns em todas as variantes são: (1) entrevista – os participantes descrevem suas
experiências de um fenômeno; (2) descrição escrita de experiências pelo próprio
participante; (3) relatos autobiográficos
em forma escrita ou oral; (4) observação
participante – o pesquisador parte das observações do comportamento verbal e não-
verbal dos participantes, de seu ambiente, das anotações feitas em campo, de áudio,
208
MOREIRA, Daniel Augusto. O método fenomenológico na pesquisa. São Paulo: Pioneira
Thomson, 2002, p. 99 - 104
211
etc. A mais utilizada é a entrevista oral, geralmente, aberta, com poucos participantes
(no máximo 10).
2. Estudo de Caso
Na medida que nosso trabalho se sustenta no Estudo de Caso (ES),
recorreremos à pesquisa que Robert Yin
209
faz sobre o assunto quem afirma que o
ES é uma investigação empírica que: “Investiga um fenômeno contemporâneo dentro
de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o
contexto não estão claramente definidos”.
Analisando os objetivos desta pesquisa nota-se claramente que a abordagem
qualitativa mostra-se como a mais apropriada aos seus propósitos. Inicialmente será
realizado um levantamento bibliográfico e posteriormente, estudo de caso com
pesquisa de campo, de natureza descritivo-comparativa.
Segundo Yin, a análise de dados consiste em examinar, classificar em tabelas
ou, do contrário, recombinar as evidências tendo em vista proposições iniciais de um
estudo. Cada pesquisador deve começar seu trabalho com uma estratégia analítica
geral – estabelecendo prioridades do que ser analisado e porque.
É ponto comum no ambiente acadêmico a necessidade de se construir
categorias para saber o que se esta processando e assim analisar mais
precisamente os dados coletados numa pesquisa qualitativa, porém este método
pode trazer prejuízos para esta pesquisa no sentido de reduzir muito os resultados,
pois todos os dados devem se encaixar nestas categorias e neste caso podem
ocorrer distorções pelas características peculiares do nosso objeto de estudo.
Sendo assim, nesta pesquisa será adotado o seguinte método para
tratamento e análise dos dados:
209
YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2.ed. Porto Alegre: Bookman, 2001. p.
32.
212
Ouvir detalhada e pausadamente as entrevistas para seleção do material
mais importante.
Transcrever o material selecionado das entrevistas;
Selecionar as expressões-chave nas entrevistas, o que nos ajudará a
entender melhor os processos e relações comunicacionais pesquisados;
Identificar e as formas e relações de comunicação organizacional integrada
a partir da observação participante;
Listar exaustivamente as características da empresa estudada à luz da
Economia de Comunhão em função da observação participante realizada;
Os dados e informações para um Estudo de Caso podem vir de seis fontes
distintas: documentos, registros em arquivo, entrevistas, observação direta,
observação participante e artefatos físicos.
Sendo assim, nesta pesquisa para a coleta de dados, serão utilizados no
contexto do Método Fenomenológico e o Estudo de caso: a análise documental,
entrevistas semi-estruturadas e a observação direta. Estas ferramentas contribuirão
para entender as características do modelo de empresa estudado.
Portanto, antes de realizar as visitas na empresa buscamos publicações sobre
ela em jornais, revistas locais, websites institucionais, para levantar informações
sobre a empresa e como a sociedade civil percebe esta empresa.
Posteriormente foram realizadas três visitas sistemáticas na empresa, sendo a
primeira com o intuito de realizar as entrevistas com os diretores e com dois
funcionários. Estes foram selecionados levando em consideração sua posição
hierárquica na empresa: sendo um deles no nível de gerência ou supervisor e outro
da produção – do nível hierárquico mais baixo, diretamente ligado à atividade fim da
empresa. Isto para termos uma visão de como os vários níveis percebem a gestão
da empresa.
213
Nessa primeira visita conhecemos a história da empresa e como ela se
desenvolve. Também tentamos entender melhor o mercado no qual a FEMAQ tem
seu escopo de trabalho.
Na segunda visita tentamos conhecer a questão burocrática da empresa,
assim tivemos acesso aos registros internos da empresa, verificação de registros,
como número de funcionários, níveis salariais, formas comunicacionais “formais”,
espaços de comunicação, estrutura organizativa, abordagem administrativa etc.
Finalmente na terceira visita que foi a que demorou mais tempo (uma semana)
é que realizamos a observação participante. Tentamos nos envolver ao máximo com
o dia-a-dia da empresa e seus funcionários.
2.1. Delineamento do estudo de caso
O presente estudo parte do pressuposto de que a empresa que têm suas
diretrizes baseadas nos princípios da Economia de Comunhão apresenta uma
realidade de processos comunicacionais, trâmites burocráticos e relações
interpessoais diferente daquelas que atuam estritamente no contexto capitalista.
Acredita-se que essa realidade na empresa a ser promovida pelo
desempenho das formas e relações comunicacionais conduz a um bom desempenho
organizacional propiciando aos seres humanos melhores condições de trabalho e
relacionamento. Portanto, os princípios da Economia de Comunhão guiarão o
material a ser coletado por meio das entrevistas e da observação participante, que
acontecerão conforme descrito acima, tendo como orientação os guias de entrevistas
e observações.
O escopo da pesquisa nos leva a propor uma observação participante em
função das formas e relações da comunicação organizacional integrada, assim que
procuraremos identificar e descrever todas elas.
214
Pelo fato de que o tema ainda é pouco estudado, nossa pesquisa foi
classificada como exploratória. É também descritiva. Percebemos que a abordagem
qualitativa mostrou-se a mais apropriada aos propósitos desta pesquisa.
De acordo com Yin
210
, na pesquisa qualitativa dá-se ênfase aos seguintes
pontos: (1) foco na interpretação, em vez de na quantificação; (2) ênfase na
subjetividade, em vez de na objetividade; (3) flexibilidade no processo de conduzir a
pesquisa; (4) orientação para o processo e não para o resultado; (5) preocupação
com o contexto; (6) pesquisador exerce influência sobre a situação da pesquisa e é
por ela influenciado.
2.2. Análise Bibliográfica
Para realizar esta pesquisa, em primeiro lugar, procuramos informações sobre
a FEMAQ em diversos documentos, revistas e jornais, notícias on-line e livros.
Solicitamos também à empresa outros documentos, que foram gentil e prontamente
entregues.
2.3. Pesquisa de campo
Para a realização desta pesquisa solicitamos via e-mail a atualização de
alguns dados que tínhamos levantado em nossa pesquisa bibliográfica como:
faturamento no período que circunscrevemos esta pesquisa, o grau de instrução dos
trabalhadores, Participação nos Lucros e Resultados, organograma e todo o material
possível.
Fomos acolhidos com muita consideração por todos membros da empresa.
Tanto os membros da diretoria como todos os trabalhadores da empresa nos
colaboraram nas três visitas realizadas.
210
Ibid.
215
Foram realizadas três visitas: uma de aproximação em setembro de 2004,
outra em setembro de 2005 e finalmente outra em outubro de 2005, onde passamos
um tempo maior.
A empresa como já se fez costume para atender aos pesquisadores de EdC
que visitam a empresa disponibilizou a analista de departamento de recursos
humanos para auxiliar no que se fizesse necessário, informações, dados da empresa
e seleção do pessoal para entrevista e outros.
2.4. Entrevistas
Escolhemos os nossos entrevistados de forma aleatória. Mas tentamos focar
nossa atenção naqueles funcionários que estão na empresa há mais tempo, para
conhecer especificamente os processos de mudanças que viveram na FEMAQ e
como se desenvolveram os processos comunicacionais nestes processos.
Utilizamos dois roteiros diferentes uma para os diretores (Anexo A) e outro
para os funcionários (Anexo B). Como se trataram de entrevistas abertas, esses
roteiros serviram para nos guiar na formulação das perguntas, todas as conversas
foram gravadas.
Na primeira visita foram realizadas dez entrevistas e na segunda visita outras
quatro. Devemos sublinhar que Rodolfo Leibholz foi entrevistado em três
oportunidades porque consideramos importante sua contribuição para o presente
trabalho. A terceira visita procuramos não fazer nenhuma entrevista e realizar a
observação participante e entrevistamos novamente Rodolfo.
216
Quadro 13
Entrevistas Realizadas
ENTREVISTADO OCUPAÇÃO TEMPO DE CASA
Adriano Leocade Ribeiro Soldador 2 anos
Claudiane Freitas Recepcionista 5 anos
Fabiana Longato Analista de dep. Pessoal 7 anos
Henrique Leibholz Diretor-Sócio Mais de 30 anos
João Batista R. Mendes Moldador/soldador 18 anos
João dos Santos Souza Maçarico 3 anos
José Jesus Casadei Moldador 10 anos
Marcelo Pompermayer Gerente Industrial 18 anos
Maria Inês Coord. do Controle de qualidade 16 anos
Pedro Luiz Cruz Diretor-Sócio 20 anos
Rodrigo Munhos Modelador 4 anos
Rodolfo Leibholz Diretor-Sócio Mais de 30 anos
Fonte: Elaboração própria
Na observação participante realizamos algumas conversas informais com os
mais variados temas e pessoas.
2.5. Observação Participante
Realizamos um estudo em profundidade a partir da Observação Participante
no mês de outubro de 2005 baseados na Guia para observação previamente
elaborada que consta no Anexo 3
Foram ao todo mais de dez dias de observação. Todos os aspectos
observados foram anotados em um diário de campo, tendo o cuidado de anotar a
observação. O método fenomenológico foi de grande ajuda neste caso. Nos permitiu
adentrarmos por dentro do fenômeno para entendê-lo e analisá-lo.
217
CAPÍTULO 6
COMUNICAÇÃO ORGANIZACIONAL INTEGRADA NA FEMAQ
Neste capítulo abordamos a análise e o tratamento dos dados coletados na
empresa FEMAQ S/A, levando em consideração as propostas da Economia de
Comunhão (EdC) e os conceitos levantados no referencial teórico dos processos
comunicacionais evidenciados nas organizações.
Na pesquisa realizada percebemos que existe um interesse recíproco pela
realidade de cada pessoa, sobre seus problemas pessoais, sem invadir sua
privacidade e como esses influenciam no seu trabalho e como se sentem nele.
Como afirmamos na elaboração da metodologia de pesquisa desta tese
realizamos diversas entrevistas em profundidade e uma observação participante
divididas em três partes.
Para realizar especificamente a observação participante fizemos uma
imersão de vários dias na empresa que nos permitiu conhecer de perto o que
denominamos redes comunicacionais. Estas redes são geralmente de tipo
horizontal onde se prima pelo diálogo sobre todas as coisas.
A identificação destas redes que se tecem ao interior da empresa nos
surpreendeu pela sua organização. Até poderíamos afirmar que: “tudo funciona
como um relógio”, porem às vezes esse relógio atrasa ou adianta, como em
qualquer outra organização.
Como afirmamos logo no inicio desta pesquisa, utilizamos a proposta de
Margarida K. Kunsch sobre a comunicação organizacional integrada e desde essa
perspectiva construímos as categorias de analise neste capítulo, tais como:
Comunicação interna e administrativa.
Comunicação institucional e relações públicas
Comunicação mercadológica e marketing
218
Para iniciar nossa análise abordaremos as redes comunicacionais que
foram identificadas na FEMAQ, tendo por base o trabalho dos 86 empregados.
Nesta análise não foram considerados os funcionários terceirizados que cuidam
especificamente do setor do refeitório e da segurança.
1. Redes de Comunicação
O objetivo desta análise foi conhecer as redes de comunicação que foram
estabelecidas dentro da FEMAQ, o que nos permitirá identificar o tipo de relações
que se ocorrem na empresa e registrar o tipo de liderança.
De maneira geral, se observa uma rede comunicacional que centraliza a
comunicação de outras redes que correspondem aos setores dessa empresa.
Esta rede comunicacional que chamaremos de central está formada pela
diretoria e o chefe de pessoal da empresa. Internamente é desburocratizada e no
caso de atividades complexas tende a ser rápida e precisa.
Pelo observado as pessoas que participam desta rede recebem ou
receberam alguma formação sobre a filosofia, os princípios e o modo de atuar da
Economia de Comunhão e da cultura do dar. Expressam abertamente sua
intenção de comportar-se de acordo ao conceito de “homem novo”.
Para ilustrar melhor o tipo de relações, tentaremos reproduzir esta rede
central no gráfico a seguir:
219
Gráfico 20
Rede de comunicação central
Fonte: Pesquisa na FEMAQ, 2005.
Entre eles se gera uma dinâmica de comunicação e relação coerente com
a cultura do dar, e entre os diretores e donos, existe um compromisso manifesto
por construir uma realidade de comunhão.
Estas pessoas são as responsáveis de aplicar as políticas da empresa de
acordo aos princípios da Economia de Comunhão e a Doutrina Social da Igreja.
São as cabeças das estratégias de comunicação, reflexionam continuamente
sobre sua experiência e o tipo de relação que mantêm se irradia a toda a
empresa.
Aqueles que compõem esta rede são os técnicos da empresa, quer dizer,
aqueles que lhes dão as linhas diretrizes e administrativas.
Esta primeira rede é de tipo círculo, por esta razão nela a satisfação de
seus membros tende a ser alta. Isto se deve a que existe uma participação muito
ativa e eqüitativa na vida do grupo, mais além das relações funcionais que
puderam ter.
220
Em segundo lugar, estão outros grupos, que correspondem a cada setor da
empresa, em cada um deles existe uma tendência à centralidade. A sobreposição
das redes formais e informais demonstra que muitos chefes de setor atuam como
líderes e sua função é a de procurar fazer de ponte entre a própria rede e as
outras redes grupais.
As relações comunicacionais são obviamente horizontais. A franqueza e
liberdade fazem parte da realidade deste tipo de relações em geral. Como não
existe um nível hierárquico explicito todos se encontram nas mesmas condições e
todos os posicionamentos são respeitados.
Seguindo a lógica de Stoner percebemos que as redes centralizadas dos
diferentes setores da empresa funcionam com maior rapidez e precisão que as
descentralizadas, com a condição de que as atividades sejam relativamente
simples, como é este caso.
Nestas redes, os relacionamentos informais determinam as características
das redes, algumas mais abertas que outras. Entende-se que estas redes sejam
mais centralizadas devido a que a função do líder é mais específica e está dirigida
ao controle do trabalho e da produção.
A seguir apresentaremos o mapa de redes comunicacionais no interior da
FEMAQ, levando em consideração todos os setores da empresa:
221
Gráfico 21
Mapa de redes e relações comunicacionais da FEMAQ
Fonte: Pesquisa na FEMAQ 2005 (Elaborado por Jorge Villena Medrano)
Este diagrama foi construído em primeira instância a partir do organograma
proporcionado pela FEMAQ, e logo na observação participante realizada na
empresa.
Tentamos identificar nele todos os funcionários da FEMAQ, obviamente se
tratando de uma empresa de meio porte pudemos observar quase todos seus
222
membros. Conversamos com eles e criamos relacionamentos que nos permitiram
elaborar esse gráfico.
Partimos daquilo que denominamos Rede Central que é o cérebro desse
corpo, logo fomos chegando às seções da empresa. Durante a visita
dedicávamos um dia a cada seção para tentar entender da melhor maneira
possível cada um desses relacionamentos comunicacionais.
Ficamos muito impressionados pela disposição de todos os funcionários da
FEMAQ, aqui cabe salientar que esta empresa é sempre visitada por diversos
pesquisadores da EdC, sendo assim, esses funcionários já estão familiarizados
com esse tipo de abordagens científicas.
Podemos afirmar que a Rede Central se encontra totalmente aberta às
outras secções e pessoas, mas para evitar confusões, no gráfico, foram
agrupados em um só grupo.
Todos os funcionários da empresa se encontram representados no gráfico
anterior, em seus respectivos setores e grupos, e como se pode apreciar, as
relações em sua totalidade são recíprocas, biunívocas (como afirma Pasquali) e
solidárias.
Pode-se concluir também que na FEMAQ se aplica uma comunicação em
dois tempos. A rede central se comunica com as demais redes as quais os
responsáveis de setor (RS), são ao mesmo tempo líderes que retransmitem a
realidade da primeira rede.
Adverte-se, também, que a organização formal da FEMAQ se assenta nas
relações informais e sobre a organização informal de cada grupo, desta maneira,
os responsáveis de setor são às vezes líderes informais de seu grupo; por isso,
entre outras funções, os líderes se encarregaram de fazer cumprir tanto as
normas institucionais como de transmitir os valores e princípios da empresa que
223
recebem da rede central e, portanto serão os responsáveis por manter a cultura
institucional em todos os setores.
Ainda que exista uma hierarquia, a gerencia, a diretoria, as divisões, todo
se encontra mediatizado pela comunicação, quer dizer o tipo de comunicação que
é muito intensa. Então todos na empresa entendem perfeitamente a missão das
direções, como no caso dos gerentes. Aqui se evidencia a novidade e importância
do papel dos gerentes. O gerente que é o líder se coloca a serviço dos
funcionários e pelo tipo de relacionamento que foi construído isto não cria
nenhuma barreira. O relacionamento vertical fica quase que invertido. Assim o
organograma é mais operacional.
2. Categorias de Análise
Como conclusão geral, podemos afirmar que a comunicação
organizacional na FEMAQ tem três características: é direta, rápida e, por isso a
retroalimentação (feed-back) é imediata.
O canal privilegiado é a comunicação
interpessoal, quer dizer, face a face.
Rodolfo Leibholz afirma: “Para que as empresas de EdC se transformem
em comunidades que vivam a comunhão, podemos dizer que o diálogo seja a
ferramenta mais importante dessa transformação”.
O mesmo Rodolfo explica que quando se têm dentro de uma empresa 100
pessoas pode-se dizer que a comunicação é de suma importância e se valoriza
muito o diálogo entre as pessoas. Obviamente existem alguns problemas porque
o ser humano deve ter um preparo para o diálogo. Tudo depende muito de cada
pessoa, mas em geral internamente e com as outras empresas a comunicação é
ótima.
A partir deste ponto começamos a desenvolver as categorias de
comunicação organizacional integrada formuladas acima:
224
2.1. Comunicação interna e administrativa
Se voltarmos à definição de Kunsch de que este tipo de comunicação seria
um setor planejado, com objetivos bem definidos, para viabilizar toda a interação
possível entre a organização e seus empregados, usando ferramentas da
comunicação institucional e até da comunicação mercadológica, vemos que é
precisamente isso o que acontece na FEMAQ.
No caso das comunicações formais, muito poucas informações instrutivas
são enviadas ou circulam de forma escrita. As cartas não são comuns,
geralmente são utilizadas estas formas de comunicação para orientar os que
trabalham entre os setores de fusão e do laboratório (controle de qualidade) com
informações técnicas para operacionalização das tarefas muito peculiares dos
empregados desses mesmos setores; esse tipo de mensagens escritas são muito
curtas e específicas.
Observa-se que existe um limite de tempo entre estas mensagens, devido
a que se prioriza a qualidade sobre todas as coisas. É uma forma de
comunicação muito interessante já que ambos setores trabalham sob pressão.
Este tipo de comunicação é assim: a equipe de Fusão realiza a mescla dos
materiais, segundo as especificações do cliente, imediatamente manda um
primeiro resultado do produto fraguado e o laboratório examina esta mescla em
no máximo uma hora e envia os resultados, dizendo qual componente se deve
aumentar ou diminuir nessa junção.
Realiza-se uma nova mescla e novamente se envia uma amostra ao
laboratório, que verifica que essa se encontra de acordo às especificações. Este
“ciclo comunicacional” se realiza até que a mescla seja aquela solicitada pelo
cliente, num tempo muito curto.
225
Muitos dos concorrentes demoram até uma semana para alcançar a
mescla específica, mas na FEMAQ por esta política comunicacional baseada na
qualidade se realiza em no máximo cinco horas.
Ao respeito dos “memorandos”, esses realmente não existem, como
manifestamos, a comunicação se realiza “face a face”, como explicaremos
posteriormente.
Rodolfo, um dos diretores da empresa, explica
211
que a uma das
comunicações que se faz por escrito é na parte de segurança no trabalho.
Quando acontece que alguém realizou um ato inseguro, as recomendações e até
chamadas de atenção são feitas por escrito, chamando a atenção daquele que
cometeu lembre que a segurança neste tipo de trabalho é muitíssimo importante.
Uma outra comunicação escrita tem a ver com o cuidado dos funcionários,
especialmente quando se trata da sua saúde, isto é quanto foi gasto com
remédios, entre outras coisas e também a participação na Caixa Beneficente,
porque os empréstimos precisam ser documentados.
Existe um clima organizacional muito descontraído, os funcionários na
empresa brincam, fazem piadas, porém sem excessos; não são diferentes às
pessoas do entorno, mas aparentam liberdade para falar, dizer e fazer coisas sem
sentir-se preocupados, ansiosos ou angustiados porque poderiam lhes chamar a
atenção.
Observa-se, uma comunicação aberta e sincera, onde as pessoas se
respeitam, é evidente que a relação que se estabelece é muito mais importante
que o comunicado.
Rodolfo
212
afirma sobre este tipo de relacionamento:
“Os funcionários têm esta liberdade e falam comigo constantemente, a
impressão que tenho e que eles me sentem como seu amigo. Por
211
Entrevista com Rodolfo Leibholz em 11 de outubro de 2005
212
Ibid.
226
exemplo, eu tinha que fazer em agosto de 2005 uma cirurgia cardíaca, e
tive que passar um tempo no hospital, muitos deles me visitaram ou me
enviaram desejos de melhoras. Quando aos poucos fui voltando na
ativa eles vinham me perguntar se passei bem, se estava melhor, e
acho que com todos, com os gerentes, supervisores, em fim, com todos,
os funcionários têm uma grande liberdade para conversar”.
Como vimos a partir dos valores da EdC, este tipo de relacionamento
comunicacional não somente é importante para os funcionários senão também
para a diretoria, como vemos a seguir na narração de Rodolfo:
“Este tipo de relacionamento, de amizade, não é importante só para
eles, mas para nós também, como recentemente um funcionário estava
com um problema. Se endividou há uns três ou quatro anos e usou
cheque especial com juros absurdos e chegou numa divida no banco de
25 mil e não falou para nós. Percebemos ai que ele que era um
funcionário de 20 anos na casa começou a ter problemas na área
profissional e finalmente nos disse que precisava de 20 mil, que já tinha
pego emprestado cinco mil com um familiar. O primeiro que fizemos foi
pagar os cinco mil para o familiar, pois isso causava outro tipo de
problemas para ele. Logo nosso pessoal foi negociar com o banco, pois
ele não sabia como fazer isto, mas nós sim. É diferente para uma
empresa negociar com o banco, pois tinha juros sobre juros. Logo após
a negociação a dívida caiu para cinco mil o total. Emprestamos os cinco
mil e a família ficou grata. Então não e só dar, mas ir a fundo,
acompanhar o que esta acontecendo. Também quando alguém fica
doente procuramos ajudar, temos este relacionamento extra
profissional”
Nos grupos tenta-se equilibrar o aspecto técnico com o humano, assim
procura-se manter uma pessoa para gerar um ambiente agradável para trabalhar,
que motive ao grupo, harmonize as relações e que possa neutralizar os conflitos.
Rodolfo explica que os grupos são feitos, pois um setor pode atrasar com o outro
setor, então semanalmente se encontram para ver os problemas, às vezes há um
excesso de carga de trabalho daí passam para a diretoria para ver o que fazer.
Um exemplo por demais eloqüente que evidencia o grau de inter-relação
criada entre os trabalhadores se dá durante o trabalho de fundição, no qual pelo
observado não é mais necessária a comunicação verbal.
O trabalho de fundição de uma peça de várias toneladas exige ser
realizado com muita precisão porque é um processo no qual se realiza com a
pressão do tempo, alem de ser um processo perigoso.
227
“Neste trabalho em grupo as pessoas não gritavam como poderia
acontecer numa situação similar de um trabalho pesado e de muita
precisão executado por operários; ao contrário aqui se percebia muita
compreensão num nível não verbal. Isto pode acontecer devido ao nível
de concentração no trabalho, na confiança nos colegas e ao grau de
integração e conhecimento pessoal com os outros, foi um trabalho de
equipe de toda a empresa, cada um sabia o que tinha que fazer. Foi
muito harmonioso, todos estavam concentrados e a comunicação era
gestual, porém existia muita coordenação. Cada um estava atento às
necessidades do outro, se ajudavam mutuamente e se colaboravam;
não se ouviam gritos, se falava tranqüilamente porque existia muita
confiança, pois um erro poderia representar o fracasso de todo o
processo”
213
.
Este fato permite entender que a filosofia da empresa penetrou na “cultura
organizacional” e como neste caso, as atitudes e formas de comunicação não têm
sido improvisadas, senão teve que existir um processo de formação de
habilidades comunicacionais e uma mudança na mentalidade dos funcionários, de
maneira que se tenha conseguido elevar o entendimento recíproco num nível
relacional ou de metacomunicação.
O tipo de linguagem utilizado na relação de trabalho é do tipo “feijão com
arroz”, ainda que com isso não se diminua o conteúdo do expressado na intenção
de difundir a mentalidade de trabalho e de relação na FEMAQ
214
:
“Procuramos dar um trato respeitando frustrações, desejos, sentimentos
de cada um. Por exemplo, perguntando como se sentem, como
observam as melhorias etc. A relação estabelecida é muito próxima,
então devem estar atentos às dificuldades e problemas familiares, se
lhes estimula, se valoram suas idéias”.
A linguagem adequada, a comunicação dos princípios da instituição e do
que se espera da gente, expressado em forma simples e compreensível, a
motivação e estimulação de atuar de acordo à filosofia da EdC, contribuem ao
compromisso com este projeto e à coesão da empresa em torno aos objetivos.
Portanto, o compromisso mútuo, com a empresa e com esses objetivos se
alcança através da comunicação. Este compromisso se dá não só de maneira
213
Entrevista com José Jesus Casadei, 19 de outubro de 2005.
214
Entrevista com João Batista R. Mendes, 3 de outubro de 2005.
228
explícita, senão também na conduta, que manifesta a intenção de satisfazer as
necessidades do outro.
No processo de comunicação intergrupal se verifica que a identificação das
pessoas com a FEMAQ tem relação com a participação e contribuição pessoal na
edificação da realidade comunitária, ou seja, se aplica a máxima que indica que
215
:
“A gente deseja dar, sobretudo quando se trata de algo que considera valioso e
necessário”.
Ao mesmo tempo a organização através da atitude dos diretores, mantém
um compromisso comunicacional de reciprocidade com as pessoas, que origina
uma dinâmica de confiança mútua. A visão da empresa aplicada pelos diretores
permite que esta empresa ofereça oportunidades para que todos contribuam ao
bem comum com seu talento, além da sua participação funcional: O que une à
gente na FEMAQ não é o que recebe senão o que pode somar em termos
globais.
Além da comunicação verbal na difusão da mentalidade da empresa se
realiza um “reforço” com cartazes, com mensagens como “A força humana,
prioridade da nossa qualidade”, “A qualidade é um direito de quem compra e uma
obrigação de quem faz”.
Esses tipos de cartazes fazem parte da comunicação interna da empresa
para melhorar cada vez mais a qualidade nos relacionamentos e nos processos
de produção. Existem também cartazes sobre segurança industrial como “cuide
de seus olhos”, “utilize capacete”. Outro meio de comunicação utilizado é um
painel de avisos contendo quadros com mensagens positivas e de reflexão sobre
a vida.
Rodolfo nos explica também com informações administrativas:
“Existe um quadro onde expomos o faturamento do mês, porque temos
aquela participação no lucro que é diretamente ligado à produtividade.
215
Ibid.
229
Então os funcionários precisam saber disto. Então colocamos todo este
material nos quadros dentro da fábrica como todas estas informações. É
uma coisa da organização (...) Depois, nos quadros existem aquelas
informações que são normais: balanço, análise de balanço etc,
comunicamos como foi feita esta análise. A parte oficial de salário, das
horas tudo isso é escrito. A parte administrativa legal nós cumprimos
integralmente”
216
.
Existem também espaços onde se facilita a comunicação interpessoal
informal. Um deles é uma pequena copa, que é um espaço de encontro muito
importante, a qualquer hora do dia podem se encontrar pessoas tomando um
cafezinho ou um chá. Também dentro do horário de trabalho existe um intervalo
de descanso, tanto na parte da manhã como à tarde, onde se descansa e
compartilha com os funcionários de outras seções. Com o novo refeitório no
horário de almoço este tipo de interação comunicacional também adquire novos
espaços.
Nesses espaços se dá muita comunicação informal entre pessoas dos
diferentes setores. Não existe formalidade na relação entre diretores e
funcionários porque se percebe que existe uma relação de amizade e também de
mútuo respeito.
Existem outros momentos propícios para a comunicação, como datas de
aniversários, festividades natalinas quando se comemora com uma
confraternização especial, entre muitas outras iniciativas.
Há também um torneio de jogo de cartas. Quando tem festa e depois do
almoço alguns jogam “truco”, quando se faz uma confusão muito prazerosa. Isso
também acontece nas festas de final de ano.
A FEMAQ dispõe de um local próximo, tipo chácara com churrasqueira
refeitório, quadra de futebol e áreas verdes que está à disposição dos
trabalhadores para realizar diferentes atividades de confraternização. Por
exemplo, às sextas-feiras a saída é mais cedo para ter um momento de
216
Ibid.
230
expansão, jogando futebol. Nesta chácara é onde está instalada a fábrica
Recibloco fruto do reciclado dos resíduos da produção.
É um local consideravelmente amplo, com um salão onde se realizam
alguns festejos, encontros, apresentações e especialmente a Assembléia, têm
todas as comodidades para os trabalhadores, é o seu “clube”. É nesse espaço
que as relações comunicacionais extra-trabalhistas são mais fortes e onde se vive
claramente um clima de família.
2.1.1. Problemas de comunicação
O principal problema de comunicação se origina na diversidade de
formação dos funcionários desta empresa, assim por um lado, estão os
profissionais e por outro, os operários que em sua maioria apenas receberam
formação formal e que além do mais procedem de diferentes regiões do Brasil.
A isso deve somar-se o espaço físico que compartilham ambos os grupos
na empresa, dado que o setor administrativo tem um ambiente e o setor produtivo
outro. Portanto, os vínculos são mais estreitos entre os membros de cada grupo e
se geram dinâmicas de grupo paralelas, mesmo que esta situação eles tentam
superar constantemente prováveis conflitos.
De acordo com Rodolfo, na FEMAQ sempre se busca eliminar as possíveis
barreiras comunicacionais, procurando aperfeiçoar os relacionamentos. Talvez a
maior barreira seja barreira de pessoal e do mau humor. Porque estão cientes de
que quando aparecem estas barreiras todos são atingidos de alguma forma.
Começa pelos grupos e depois chega a todos, na assembléia e em geral.
Isso significa também que a percepção de um mesmo tema ou problema é
diferente para cada grupo. Os problemas surgem especialmente no que se refere
aos operários novos, aqueles que ainda não compreenderam a filosofia da
empresa. Esse são agravados por certos prejuízos com respeito a
impossibilidade de alcançar uma comunicação horizontal entre superiores e
231
subalternos, tendo dificuldades em expressar-se e conseqüentemente dão lugar a
rumores que se expandem em grupos informais ao redor.
Este tipo de problemas se resolve através do diálogo aberto, em muitos
casos os mesmos operários comunicam seus pensamentos e sentimentos a
respeito a alguma ação adotada pelo setor administrativo, em outros casos,
quando surge um rumor, se tenta cortar a raiz o quanto antes possível, para que
não afete à empresa.
2.1.2. Comunicação e participação
Dentro da FEMAQ temos evidenciado que a comunicação é o hábito principal em
todas as relações pessoais. Existe uma comunicação recíproca muito marcante já
que se entende que esta é um meio recíproco entre os que dirigem a empresa e
os subordinados em torno de um objetivo comum. Este objetivo não é só dentro
da empresa, mas para transformar a realidade social de uma forma humana,
respeitando os direitos de cada um
217
:
“Uma comunicação aberta a todos e transparente é estar ao serviço,
assim como a direção se abre aos funcionários, está a serviço deles,
todos estão a serviço de todos... a grande estratégia é ouvir às pessoas
e atender suas necessidades”.
A comunicação entre diretores, chefes de setor e demais funcionários tende a ser
informal e por isso tende à horizontalidade, isto permite uma rápida
retroalimentação.
Neste sentido, a comunicação que geralmente é face a face, normalmente não
exige a existência dos denominados filtros entre diretores e funcionários, como
secretarias ou lobbys, existem duas salas de reuniões para tratar os assuntos
imediatamente.
217
Op. Cit.
232
2.1.2.1. Formas de participação
Assembléias: Informar sobre a situação da empresa, carga do trabalho, a
produção, a situação financeira, caixa de beneficência dos funcionários,
alimentação, etc. e adotar decisões. Não existe uma votação na qual a
maioria ganha senão se vão sondando os grupos e os funcionários têm a
possibilidade de falar e expor suas idéias durante a assembléia.
Sistema de Valoração: os funcionários valorizam o desempenho dos
diferentes setores da empresa. Na FEMAQ está se desenvolvendo uma
avaliação dos funcionários que entram baseada nos sete aspectos dos
valores da empresa. A avaliação envolve saúde, comunicação, resolução
de conflitos, harmonia. Em nenhum caso é critério de avaliação a religião
ou a política.
Decisões compartilhadas: Muitas decisões são tomadas em conjunto com
os responsáveis dos setores. Em outras ocasiões, se envolvem duas ou
mais pessoas para discutir um assunto e adotar uma decisão, muitas vezes
intuída. Para isso se requer muita disposição, interação e transparência, a
mudança vem de dentro, não é que se reage passivamente ao externo
precisamente por tomar decisões compartilhadas.
Ênfase no trabalho em Equipe: Faz parte da filosofia de trabalho da
Empresa, por isso, se estimula este tipo de trabalho, além do mais,
constantemente se emitem mensagens verbais sobre o trabalho em equipe
e seus efeitos no alcance de metas.
2.1.2.2. A liderança na FEMAQ.
Segundo este estudo, concluiu-se que os responsáveis pelos
departamentos e setores têm os seguintes estilos de liderança:
233
Quadro 14
Estilos de liderança
Departamento Estilo de liderança
Controle de Qualidade Moderadamente participativo
Compras Altamente participativo
Departamento Comercial Participativo
Gerência Industrial Estilo misto (Autoritário e
participativo)
Pessoal Misto com tendência participativa
Contabilidade Participativo
Modelação Estilo misto (Autoritário e
participativo)
Manutenção Moderadamente participativo
Fonte: pesquisa de campo na FEMAQ, 2005.
O estilo participativo que prevalece nos responsáveis de setor indica que
essas pessoas estimulam a comunicação grupal dentro de seus setores, dando
prioridade à modalidade de comunicação informal e se orienta às pessoas do
grupo, antes que para as tarefas.
O estilo de liderança, por suas características orientadas para os membros
do grupo é parte da cultura organizacional desta empresa, que evidentemente é
aquela da cultura do dar e ao mesmo tempo a reforça.
Neste sentido, os responsáveis são líderes que permitem a participação,
eles valorizam a comunicação como uma função de tomar decisões que afetam
ao grupo, aproveitando as comunicações informais para tal efeito.
O estilo participativo de liderança projetado para o grupo favorece o
comportamento orientado aos demais. Que pode traduzir-se num trabalho em
equipe, colaborativo e de compartilhamento.
234
Pode-se intuir que os princípios e valores culturais que prevalecem nos
líderes e que são transmitidos aos funcionários e membros do grupo são aqueles
analisados anteriormente e que fazem parte da filosofia e valores da empresa.
Neste sentido, entre outras das características que se tem do funcionário
ideal, na cultura organizacional da FEMAQ se reconhecem principalmente
habilidades e hábitos comunicacionais.
Por isso, podemos concluir que os princípios da EdC permitem que os
líderes considerem e tratem positivamente a cada membro do grupo e valorizem à
pessoa antes que a atividade.
Se fizermos uma comparação desses valores, pode-se comprovar que
existe relação entre o exposto e os postulados da EdC, e disso pode derivar-se
que a EdC e a cultura do dar penetram na mentalidade dos líderes e eles
encarregaram-se de transmití-los aos membros do seus grupos. Neste aspecto, a
liderança é importante para a comunicação de dois tempos na empresa para
manter a cultura organizacional inspirada nos princípios e na filosofia implantada
pelos seus dirigentes.
É também preciso dizer que no estilo de liderança participativo e orientado
para as pessoas do grupo, é importante a conduta, ou seja, a atitude dos líderes
com respeito aos demais membros do grupo.
2.2. Comunicação institucional
Nesta categoria de pesquisa selecionamos a informação recolhida nas
entrevistas e na observação participante que se referem à comunicação
institucional que como Kunsch sustenta é a responsável, por meio da gestão
estratégica das relações públicas, pela construção de uma imagem e identidade
corporativa forte e positiva de uma organização.
235
Uma das primeiras questões tem a ver com os clientes, com os quais a
maioria das comunicações é feita por escrito, por exemplo, preço, mudança,
estado do pedido etc. Assim como o relacionamento com os órgãos do ambiente,
tudo é por carta, e-mail, tudo sempre documentado, eles recebem um resumo dos
processos para seu acompanhamento.
Nessa perspectiva da comunicação institucional os trabalhadores da
FEMAQ participam do sindicato do seu setor, e quando convidados, apresentam a
experiência da empresa, como se fosse a própria. É nesse espaço que também
se pode constatar o grau de interação participativa que eles possuem, assim
pode-se afirmar que os trabalhadores se sentem verdadeiros “donos” da empresa.
Uma outra manifestação de comunicação institucional é o time de futebol
Real Sport/Femaq que participa de competições inter-empresas e no campeonato
do Sindicato dos Metalúrgicos. Seu uniforme é azul e branco. Ganharam muitos
campeonatos durante os últimos 10 anos. Este tipo de promoção faz parte do
marketing social da empresa.
A FEMAQ incentiva e apóia financeiramente as atividades artísticas. Um
pessoal se encarrega de fazer telas, esculturas e seus trabalhos são expostos no
refeitório. A empresa fornece o material necessário e dá apoio a essas iniciativas.
As relações e a comunicação com as empresas concorrentes,
fornecedoras e outras são fraternas. Procura-se interagir com a sociedade como
vimos no caso da promoção do projeto “Piracicaba 2010”, que é um bom exemplo
da inserção da FEMAQ na comunidade local onde está inserida.
Piracicaba 2010 é uma ONG conformada por 33 representantes de
empresas, universidades e entidades diversas que, voluntariamente, se reuniram
com o objetivo de contribuir para a construção de um futuro melhor para a cidade
de Piracicaba. Está preocupada em estender à comunidade benefícios que
podem ser alcançados com a aplicação da metodologia do planejamento
estratégico. A idéia de um plano elaborado exclusivamente pela sociedade civil e
236
que fosse posteriormente oferecido à Prefeitura foi substituída pela consciência
da importância da participação do poder público, cujos técnicos seriam envolvidos
nos estudos e debates, durante todo o processo. Assim sendo há uma integração
entre esta ONG com a iniciativa privada e a Prefeitura como um todo.
Para Rodolfo, este projeto tem a ver com a responsabilidade política das
empresas, porém, sem nenhuma ligação com os partidos políticos, mas sim com
a política. Trata-se de influenciar a política no sentido construtivo de possuir um
planejamento estratégico para a cidade. O Diretor financeiro da FEMAQ, Pedro
Luiz, é atualmente o vice-presidente de Piracicaba 2010, porque ele tem a função
de elaborar o planejamento estratégico da FEMAQ. Este “Piracicaba 2010”
influencia diretamente na política, pois quando entra um candidato se quer saber
se ele vai aderir a este planejamento. Dessa forma se faz o controle da política
sem ser partidários desse ou daquele partido político. Seria importante se todas
as cidades tivessem este tipo de projetos e as empresas com sua força pudessem
ajudar às cidades em trabalhos como este.
A partir do trabalho desenvolvido pela FEMAQ para fora da empresa, eles
se tornaram uma referência na cidade e no País. Os dirigentes acreditam que o
fato de ser referência é uma das missões da empresa porque crêem que vivem da
comunidade e para a comunidade.
Este relacionamento que a FEMAQ faz por médio da comunicação
institucional com a comunidade local simboliza alguns dos princípios da empresa,
conforme Rodolfo:
“Levamos a nossa vida para a comunidade, para as outras empresas.
Quando fazemos o PLR, fazemos pelo bem da empresa e dos
funcionários, então isso se reflete nas outras empresas. Comunicamos
o que dá certo. Nós não queremos impor nada, apenas transmitimos a
vida que vivemos e temos”..
Outro relacionamento institucional é o estreito vínculo que existe entre a
FEMAQ e as universidades da região. Fato que possibilita continuamente os
237
dirigentes da empresa a serem convidados a expor suas experiência em distintos
fóruns no meio acadêmico.
Como vimos, quando analisamos a história da FEMAQ, no princípio, tanto
concorrentes como o Sindicato de Metalúrgicos de São Paulo, viam com receio a
iniciativa que se estava desenvolvendo, paulatinamente esta visão tem mudado,
agora tanto empresários como sindicalistas, vêem na FEMAQ um exemplo a ser
imitado.
2.3. Comunicação mercadológica
No que faz referência à comunicação mercadológica, vemos na FEMAQ
que ainda se estão construindo as bases para sua expansão nesta área. Como
veremos posteriormente pelo setor no qual desenvolve suas atividades a empresa
não precisa de ações concretas de publicidade e promoção.
Um ponto importante que podemos entender como comunicação
mercadológica, é a participação da empresa em congressos nacionais e
internacionais. A experiência da FEMAQ foi apresentada em diversos fóruns no
Brasil e no exterior.
A FEMAQ somente participa das feiras EdC, porque seus produtos são
para um mercado especializado “bussiness to bussiness” que não requer
exposição para o consumidor comum.
A logomarca da FEMAQ, segundo os diretores foi feita bem no início da
empresa e se manteve até hoje.
238
Gráfico 22
Logomarca da FEMAQ
Fonte: FEMAQ S/A, 2005
No ano de 2006 a FEMAQ comemorou seus 40 anos de existência e
elaboraram uma logomarca comemorativa:
Gráfico 23
Logomarca comemorativa 40 anos da FEMAQ
Fonte: FEMAQ S/A, 2006
No que se refere à comunicação mercadológica, a FEMAQ não necessitou
explorar essa área da comunicação, em primeira instância devido a que no setor
no qual se desenvolve, não é necessário, e em segunda instância a melhor
239
publicidade é a qualidade de seus produtos, já que são os próprios clientes quem
a indica como uma das melhores empresas no setor automotor.
A maior expressão de esta forma de comunicação é o site:
www.femaq.com.br, no qual se mostra a qualidade dos produtos e as metas
alcançadas, é importante destacar que não se expressa a adesão à Economia de
Comunhão, pois não se pretende aproveitar dessa situação para conseguir novos
clientes ou mesmo fazer divulgação dos seus produtos.
Gráfico 24
Site da FEMAQ
Fonte: Site da FEMAQ S/A, 2006
O site na atualidade teve uma grande evolução, com ferramentas
interativas de alta qualidade. Está português e inglês pelo fato da FEMAQ querer
expandir seus mercados nos próximos anos.
Também com relação à comunicação mercadológica, a FEMAQ está
ingressando a uma nova etapa, há poucos anos foi contratado um profissional na
240
área de marketing, Odilon Junior, que está desenvolvendo um trabalho de
abertura de novos mercados e de promoção da empresa em diversos espaços.
A partir desse trabalho estão sendo elaborados alguns materiais para
revistas especializadas, especialmente na revista da Associação Brasileira de
Fundição (ABIFA). Anualmente outros materiais são produzidos, como folder
técnico da empresa, agenda executiva personalizada para dar de presente etc.
O foco do trabalho de Marketing na atualidade é a indústria automobilística
por meio de um serviço tecnológico de desenvolvimento, atendimento e de visitas
periódicas e técnicas quando necessárias às empresas clientes.
Outra iniciativa é a busca de novos mercados fora da indústria
automobilística. Existe um planejamento estratégico que tem como meta daqui a
algum tempo ter da produção geral somente o 50% atendendo ao setor
automobilístico e o restante para a exportação e outros mercados: hidráulico,
bomba, saneamento, etc.
3. Estratégias de comunicação organizacional
O reconhecimento da importância da comunicação organizacional em suas
formas: interpessoal e grupal, tanto entre o líder e os membros do grupo como
dos membros entre si, não somente faz parte dos modelos mentais dos
responsáveis e líderes da empresa, também fazem parte da política de gestão de
recursos humanos.
Essa comunicação é importante porque orienta o líder como interagir. Se a
empresa pega um trabalho grande, sem dúvida que se pagam horas extras,
porém a diferença é que a empresa não obriga os funcionários, são eles os que
assumem o trabalho porque são eles os que conhecem quanto pode ser
demorado o serviço. Isso se faz com muita participação e envolvimento voluntário.
241
Já ocorreu também o contrário, quando a empresa não teve muito serviço
e teve que dar férias coletivas aos funcionários eles não ficaram com medo de
serem mandados embora porque sabiam o que estava acontecendo. Essas
decisões maiores sempre são analisadas em assembléia.
A diretoria tem reunião cada semana, assim como com a diretoria mais
ampliada (Rede de comunicação central) para se comunicar com todos os
responsáveis de cada setor. Isto permite fazer um acompanhamento da produção
e se houver algumas dificuldades essas são também analisadas em tempo.
Os irmãos Leibholz afirmam que a comunicação organizacional é uma
estratégia importante porque faz parte de um processo de mudança de
mentalidade.
Identificamos os seguintes princípios que estão presentes naquilo que
poderia denominar-se “estratégias de comunicação organizacional da FEMAQ”,
eles são:
a simplicidade;
a abertura;
a transparência;
a ética; e
a valorização do homem.
Estes princípios que regem as comunicações nesta empresa estão
presentes tanto nas comunicações interpessoais, como nas grupais, formais e
informais, e se derivam dos valores da Economia de Comunhão.
Dentro destas estratégias originadas pela visão e os princípios que
postulam, se encontram:
242
Organização do trabalho
Os diretores “saem de suas oficinas”, quer dizer que são sempre
acessíveis, realizam diariamente reuniões com os diversos setores da empresa,
em sua mesma área de trabalho, onde além de trocarem opiniões a respeito das
tarefas cotidianas da empresa, realizam uma planificação e acompanhamento
diário.
As reuniões de planificação começam na oficina da direção e logo os
diretores recorrem os diferentes setores para discutir algumas decisões que se
devem tomar ou para dar algumas instruções práticas, ao mesmo tempo recebem
uma retroalimentação daquilo que acontece em cada setor.
Manter um “clima organizacional harmonioso”
Entre as atividades próprias do Departamento de Pessoal está aquela de
manter, o que se denominou, um clima organizacional harmonioso dentro da
empresa. Quer dizer, este departamento é responsável para manter um alto
astral, a confiança e a motivação. Isto deve ser feito, por meio de uma
comunicação informal e interpessoal, sobretudo tratando cada um de maneira
diferente, de acordo com suas necessidades e exigências.
A principal dificuldade é a origem dos conflitos, que se sucedem na
empresa, é a diversidade de culturas, religiões e costumes; isto devido a que as
pessoas provêem de todo o Brasil, por isso se procura manter um equilíbrio
dando um trato personalizado, segundo as capacidades e limites de cada um.
O chefe de pessoal estimula muito a auto-estima e o desejo de
crescimento dentro da empresa para melhorar o nível de vida dos funcionários,
neste sentido se valoriza a família, inclusive chegam a assessorar na planificação
econômica.
Para a FEMAQ é muito importante o homem, e especialmente a família,
porque se não existe qualidade na família não existe qualidade no trabalho.
243
Devido a isto se presta ajuda para que cada família possa viver melhor. Esta
ajuda não sempre é material, muitas vezes passa pelo aconselhamento pessoal,
que é realizada por este setor.
Integração de funcionários novos
Os encarregados de integrar aos funcionários novos, tanto ao estilo de
trabalho como a forma de pensar e de atuar na FEMAQ normalmente são os
funcionários mesmo e em especial, os responsáveis de setor.
O processo acontece da seguinte maneira, como nos narra Adriano
Leocade Ribeiro, um dos funcionários mais novos na empresa
218
:
“O responsável de pessoal conversa com o funcionário novo, mostra-lhe
a empresa, mostra como é o ambiente de trabalho. E o diz que aqui
ninguém quer que se mate trabalhando, só tem que fazer um bom
trabalho tem que ter um bom comportamento. Diz também que aqui
tudo mundo faz de todo, inclusive os donos. Aos funcionários novos se
dá muito apóio, anima-os até por um mês; nunca se o coloca para
trabalhar sozinho, sempre está uma pessoa junto para que aprenda o
trabalho e veja como adquira a prática. Pensamos que a empresa
necessita de pessoas novas para que não pare. Nós gostamos de vê-la
crescer porque a vida aqui dentro nos interessa mais que em outros
lugares. Como o mundo evolui, as pessoas novas têm outra
mentalidade que ajuda com que a empresa cresça, por isso é bom ter
cabeças novas”.
A partir desta experiência vemos a importância da comunicação
organizacional para transmitir os valores e principalmente o princípio de
solidariedade aos funcionários novos.
Nota-se que desde o princípio esses funcionários parecem se sentir em
família e rapidamente envolvidos, e se integram como parte da empresa.
Tomada de decisões
O processo de tomada de decisões se desprende da filosofia e visão da
empresa. Cada decisão comporta não somente aspectos técnicos, senão também
218
Entrevista com Adriano Leocade Ribeiro, em 8 de outubro de 2005
244
os aspectos morais e sociais por isso se discutem bastante antes de tomar uma
decisão.
Antes de tomar uma decisão se discute ampla e informalmente com o
pessoal de diferentes setores. Os responsáveis de cada um desses, se sentem
livres para expressar suas idéias, recomendações, temores, expectativas e
opções. Logo os diretores estudam as alternativas e tomam a decisão final que
imediatamente é comunicada aos responsáveis pelos respectivos departamentos
ou setores.
Este processo permite que, tanto os diretores como cada responsável de
setor tenham toda a informação do que ocorre e ocorrerá na empresa. Isto lhe
faculta a tomar algumas decisões específicas de seu setor. As mesmas são
imediatamente comunicadas à direção e em outros casos antes de tomar a
decisão final se consulta primeiro à direção. Sem dúvida os processos são
rápidos e eficientes. Em outros casos, como de movimento de pessoal, a direção,
o chefe de pessoal e o responsável do departamento tomam as decisões de
maneira conjunta.
As decisões da Assembléia são canalizadas por meio dos representantes
dos setores e pelos próprios diretores. Trata-se de fazer próprios os desejos dos
funcionários, por isso as solicitações demandadas em Assembléia são quase
sempre atendidas no menor tempo possível. É bom deixar claro que não existe
uma “ditadura do proletariado”, isso quer dizer, que os trabalhadores têm uma
grande maturidade ao fazer suas solicitações, porque entendem que a empresa é
como sua família e procuram manter esse clima que os beneficia a eles próprios
em primeiro lugar.
Ordens, reconhecimentos e chamadas de atenção
Assim como se tomam decisões, as ordens e solicitações geralmente
surgem do consenso sobre a melhor maneira de realizar uma tarefa específica e,
portanto, carecem da verticalidade como geralmente ocorre em outras empresas.
245
Sem dúvida, também se dão ordens precisas que geralmente são
explicadas, contextualizadas e solicitadas da maneira mais cordial possível.
Poucas vezes acontece que se suscitem conflitos por isso, quer dizer rebeldia,
rumores ou ressentimentos, pela relação de confiança adquirida entre as partes
envolvidas.
As chamadas de atenção produzidas quando um comete um erro no
sistema da FEMAQ são feitas nela própria equipe, que, por sua dinâmica tende a
realizar um laboratório de autocontrole e por isso essas são restritas e internas
entre os próprios membros do grupo. Tem-se a consciência de que “os erros por
negligência nas equipes afeta o trabalho de todos”, especialmente por causa da
segurança.
Sem dúvida, não se trata de achar culpados, tenta-se solucionar o
problema, vendo que o problema é de todos e nisso todos colaboram para
solucioná-lo, e, sobretudo, tenta-se não maltratar determinada pessoa
isoladamente.
O Gerente Industrial, Marcelo Pompermayer, descreve assim o
procedimento realizado na FEMAQ
219
:
“Se chama a quem cometeu o erro de lado. Nunca diante dos outros,
ninguém mais sabe porque é ’muito chato’. Conversa-se “numa boa”
(amistosamente), pergunta-lhe o que aconteceu se estava nervoso, se
foi um defeito o que era, pergunta-lhe se tem problemas familiares. Se
for o caso de um problema familiar, se pode ajudá-lo a resolver, nisto
existe muita solidariedade e sentido de equipe. Se é outro o caso,
conversamos entre todos, nos reunimos e se vê como solucionar o
problema. Conversamos bem sobre o trabalho e o executamos”.
Ao contrário, quando se executam bem o trabalho, as felicitações são
gerais, porque todos se beneficiam disso, mas também há a realização pessoal
de cada um e isto é quase cotidiano.
219
Entrevista com Marcelo Pompermayer, 3 de outubro de 2005.
246
Administração de conflitos e problemas
É importante sublinhar também que a filosofia da empresa não elimina os
conflitos, tanto pessoais como interpessoais ou grupais neste sentido, o chefe de
pessoal observa
220
:
“Cada pessoa é uma realidade diferente e assim as considera
individualmente, portanto, quando surge um problema ou situações
difíceis se negocia, se faz um pouco de ‘jogo de cintura’ no que muitas
vezes se deve ceder,o importante é tomar a iniciativa e ser os primeiros
em dar o primeiro passo. Os pontos difíceis se vêem com um dos
diretores, mas normalmente se tenta dar uma solução e tomar decisões.
Geralmente ocorre que ao diretor se levam as soluções, não os
problemas, e cabe a ele dar sua aprovação. Nesses casos, devido ao
fato de existir gente de todo o Brasil, é importante entender a cultura de
cada um”.
Quer dizer, os valores e princípios da empresa são úteis também nos
momentos difíceis, por isso, para a administração e solução de conflitos o
primeiro que se faz é conversar pessoalmente com os causadores do conflito e
logo se for o caso se lhe aconselha, se realiza uma conversação entre todo o
grupo.
É também neste momento que se procura “entrar na pele do outro” e
“anular-se”, posto que a mentalidade da direção é colocar-se a serviço dos
demais.
Rodolfo Leibholz fala o que ocorre nesses casos
221
:
“Normalmente existe uma realidade que deve ser mudada. Se esta
realidade é fruto de confrontações, egoísmos, murmúrios dentro da
empresa se para na hora. Os conflitos mais freqüentes são de
comunicação, se os funcionários não entendem algo ou o percebem
diferente começa o mal-estar. Por isso se procura ter muito cuidado e
atenção ao dizer alguma coisa. Se um se equivoca é bom dizê-lo antes
que o mal-estar se estenda. Às vezes é preciso perder uma idéia, mas
não deixar de ser transparentes”.
220
Op. Cit.
221
Op. Cit.
247
Neste sentido, se procura uma boa comunicação: clara, completa e rápida
para prevenir conflitos, pois a informação está armazenada por percepção
distorcida pela influência cultural.
Controle do rumor
Como vimos na FEMAQ se entende que os rumores são frutos de vácuos,
de falta de informação, por isso se existe, imediatamente se os corta pela raiz
conversando com cada um e depois com todos.
Sobre essa questão Rodolfo afirma:
“Os rumores até acontecem. Mas quando alguém começa a falar algo
que não é verdade, como existe um diálogo permanente isto diminui
muito. Quanto maior e melhor é a comunicação, menos rumores terão,
como ‘radio peão’. Existe fofoca em nível pessoal, mas muito pouco.
Como se sentem participativos e se tem dúvidas perguntam”.
Normalmente não existem rumores porque alguém que deseja saber algo
pergunta, tem toda a liberdade para fazê-lo, para apresentar seu problema e
inclusive para dar sugestões, e imediatamente se tenta dar atenção à demanda.
A informação é muito rápida em ambos os lados, como se comprovou
através da observação participativa.
É importante destacar que são os próprios funcionários que ao identificar
os responsáveis do rumor, o reprimem rapidamente; a cultura organizacional
presente na empresa, faz que o rumor seja “diluído” de diferentes maneiras.
Assembléias
Nas Assembléias existem dois momentos importantes, primeiro se executa
uma política de comunicação aberta na informação de dados financeiros,
produtivos e as perspectivas de trabalhos futuros.
Logo se aplica uma política de recepção das demandas e necessidades
concretas dos funcionários. Nesse sentido se tenta conhecer qual é a posição e
248
percepção da realidade apresentada, como se sentem, como se pode contribuir
para melhorar suas condições familiares e sociais.
Aqui se percebem dois momentos de diálogo grupal aberto. Existem dois
interlocutores coletivos: a administração e os trabalhadores.
Assim sendo, os diretores consideram que
222
:
“Os funcionários falam abertamente de seus problemas, mesmo se não
se pode saber o grau de honestidade, o que fica no ar é algo positivo,
algo que tanto a direção como os funcionários sabem que é correto,
logo o funcionário reagirá da mesma maneira”.
Como disse Claudiane Freitas
223
, recepcionista da empresa:
“Os diretores compartilham o que é deles com os empregados, e isso
anima aos funcionários. Não se esconde nada, falam tudo, existe
liberdade para falar, mas muitos não se sentem bem de falar em
público, tem medo de ‘falar besteira” (falar estupidez), mas quando
necessitam algo, primeiro eles comentam comigo para que eu
comunique aos responsáveis”.
A Assembléia às vezes não ocorre todo mês. As reuniões de grupos sim,
mas a assembléia acontece conforme a necessidade até em dois meses para
orientação geral.
Reflexão sobre sua experiência
Além de manter uma memória da experiência, que é abertamente
comunicada, também se mantém uma biblioteca pequena, mas atualizada sobre
assuntos administrativos relacionados com a motivação, comunicação, métodos
de segurança e outros temas. Este espaço permite àqueles que fazem parte da
FEMAQ melhorar sua capacidade intelectual e poder estudar tranqüilamente.
Outras iniciativas como a criação de salas de computação e Internet àqueles que
quiserem acessar, aprender e manusear estão em curso.
222
Op. Cit.
223
Entrevista com Claudiane Freitas, realizada em 7 de outubro de 2005.
249
4. Impressões conclusivas
A orientação estratégica da FEMAQ que está fundamentada nos princípios
da EdC, considera a comunicação organizacional integrada como um elemento
importante para alcançar seus objetivos gerais, devido à valorização do homem e
a sua sociabilidade num ambiente organizacional e social.
Em seu objetivo humano, se expressa a necessidade da empresa de gerar
capacidades e habilidades comunicacionais para a participação de todos os
funcionários na vida da empresa e conseqüentemente se estabelecem políticas,
estratégias e mecanismos de comunicação coerentes com os princípios de
Economia de Comunhão.
Neste sentido se pode concluir que: para a execução das estratégias de
administração dos recursos humanos em função de gerar um ambiente de
mudança, trabalho em equipe e para a participação na tomada de decisões,
formularam-se mecanismos de comunicação e estratégia para a participação.
As comunicações interpessoais existentes demonstraram que coincidem
com as propostas de comunicação e das modalidades de comunicação da EdC.
São fundamentais para medir a implementação do projeto num ambiente
organizacional.
Tanto as pessoas como a própria empresa possuem determinadas
atitudes, conhecimento e características pessoais que originam uma realidade
comunitária.
Entre essas se encontram de maneira geral capacidades comunicacionais
coerentes com a EdC, apresentadas como estratégicas e, se encontram no
diretório as dinâmicas de anular-se e “entrar na pele do outro”.
Essas novas atitudes, conhecimento e características comunicacionais se
originam mediante a aprendizagem, reforço e melhorias contínuas dessas
pessoas, sob as características do “homem novo”.
250
Esta atividade está subvencionada pela própria empresa como parte da
capacitação humana.
A empresa reflete sobre si mesma e estimula a participação nesse âmbito
para gerar idéias inovadoras dos seus funcionários em benefício do conjunto todo.
A FEMAQ pode se considerada como uma empresa solidária, devido a que
existe uma relação de interdependência que se traduz na colaboração concreta,
mútua e constante que depende da rede de informação que circula livremente.
Também se fortalece mediante uma rede de relações interpessoais que permite
com que as pessoas desenvolvam uma rede de confiança mútua entre todos seus
membros. Isto permite com que a comunidade de trabalhadores saiba que pode
contar com os demais e com seus dirigentes.
Os princípios e filosofia da EdC, não só facilitam esse comportamento
institucional, mas o alimentam, por meio da comunicação, que não são simples
técnicas aplicadas, mas são o reflexo da mudança de modelos mentais que se
acercam à visão de “homem novo” e dão sentido a ação dos funcionários da
FEMAQ.
251
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo geral que este trabalho se propôs foi apresentar as formas e
relações de comunicação organizacional integrada dentro da perspectiva da
Economia de Comunhão numa empresa brasileira. Acreditamos ter alcançado esse
propósito.
A comunicação organizacional integrada está na base de todas as relações
entre as pessoas que participam da EdC. Constitui o verdadeiro ponto de apoio de
toda sua atividade. Ela só tem sentido e significado dentro das relações sociais que a
originam, nas quais ela se integra e sobre as quais influência.
As formas e relações da comunicação organizacional integrada nas
empresas de Economia de Comunhão estão dirigidas ao reencontro do ser humano
no seio das organizações. É a partir da comunicação que esse ser se redescobre
como parte integrante do processo produtivo.
Todas as organizações se encontram permeadas pela comunicação
organizacional integrada, mas algumas fazem dela seu principal alicerce. Esse é o
caso das empresas que participam do projeto econômico denominado Economia de
Comunhão.
No caso da EdC, a comunicação organizacional integrada, é seu alicerce
intrínseco porque faz parte da sua razão de ser, do seu desenvolvimento integral.
Sem a comunicação não existiria a Economia de Comunhão.
Na EdC a comunicação representa um fator relevante em toda sua
conceituação e estruturação. É por ela que os agentes do processo econômico se
relacionam entre si e estabelecem a comunhão.
Assim a comunicação organizacional é um processo que se apresenta como
natural ligado a um sistema e a uma ciência social. Ela pode ser um instrumento das
252
mudanças e aspirações que promove a EdC. A comunicação na EdC ensina,
compartilha e entusiasma, a quem participa do projeto.
Comunicação é antes de tudo, interação, diálogo, tornar comum. E no caso da
EdC não pode ser confundida com a simples transmissão unilateral de informações.
E alicerçada na comunicação organizacional a EdC combate a miséria e a
indigência, porém combate-as propondo a lógica da comunhão. O “humanismo” da
EdC visa a derrotar a indigência convidando todos a se colocarem na posição de
escolher livremente uma vida sóbria e, por essa razão, feliz.
Sem dúvida não podemos generalizar porque nesta pesquisa somente
abordamos um Estudo de Caso, porém o que foi analisado nos oferecer algumas
luzes ao respeito de que a EdC é muito mais que ações de filantropia, e no Caso da
FEMAQ isso se faz muito presente.
A EdC não é uma atitude pessoal que transforma a cultura das empresas. A
EdC é um novo modo de viver e conceber a vida empresarial; e dizer empresa
significa dizer organização, portanto, estruturas; ela não se pode limitar ao aspecto
da distribuição do lucro nas três partes.
O carisma descoberto no Movimento dos Focolares nitidamente perpassa
através da comunicação organizacional à Economia de Comunhão. Formas e
relações se encontram reconciliadas dentro da empresa pesquisada. Não parece
existir o “meu”, senão o “nosso”.
A Unidade proposta pelo Movimento dos Focolares claramente vá ao
encontro da proposta de Kunsch quando se entende às organizações como um
espaço abrangente, que envolve a todos.
O mix da comunicação nas organizações desde a perspectiva da Economia
de Comunhão nos apresenta uma interação humanista das relações dentro das
organizações. Todos os tipos de comunicação deste mix nessa perspectiva servem
253
tanto para o desenvolvimento socio-económico das organizações como para o
crescimento das relações sociais baseadas na “Cultura do Dar”.
Nessa lógica, de alguma maneira analisamos quais os motivos que fizeram
com que vários empresários aderissem a um projeto onde o lucro não é destinado
única e exclusivamente a eles e/ou aos seus funcionários, mas é destinado também
aos excluídos.
Constatamos que a EdC, propõe aos atores do processo econômico uma
alternativa ao diálogo, essencialmente à comunhão não só material, senão espiritual,
melhor ainda, plena.
O fato de colocar em comum seus lucros faz dos empresários desse tipo de
corrente, sujeitos sui generis numa filosofia de mercado onde é o lucro o centro da
economia e não o homem.
A comunicação organizacional integrada cumpre seu propósito quando integra
aos sujeitos do processo comunicativo dentro das organizações e até podemos nos
perguntar se o espaço aberto pela EdC não é o mais natural para esse propósito?
Ainda teremos que acostumarmos aos conceitos do dar, que é opostamente
contrário ao ter, ao possuir, que pareceria são o único norte das organizações: o
lucro, mas isso não é verdadeiro.
Este percurso pela comunicação organizacional e pela EdC nos ajudaram a
entender que a pesar de tudo o que possamos estarmos fazendo contra nós mesmos
sempre encontraremos alternativas contrárias de aquelas já pré-estabelecidas, e que
dia-a-dia o sol renasce e uma nova vida se gera.
254
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nossa)
259
ANEXO 1
INSTRUMENTOS PARA PESQUISA DE CAMPO – FEMAQ
Guia para entrevistas aos diretores
1) Com relação à história da empresa FEMAQ
Como nasceu? Quantos anos de mercado? Sócios?
O que é a empresa? Segmento de mercado?
Importância da empresa no próprio mercado (nacional e internacional)
Formas de comunicação.
o Comunicação administrativa
o Comunicação interna
o Comunicação mercadológica
o Comunicação institucional
o Comunicação interpessoal
o Comunicação grupal
o Comunicação massiva
Relações de comunicação organizacional
o Vertical
o Horizontal
As relações humanas (internas e externas)
O ambiente empresarial
Visão, missão, objetivos e valores da empresa.
Relação com o Movimento dos Focolares
A adesão à EdC. Como aconteceu?
2) Manutenção e Desenvolvimento da Empresa - Pós EdC:
O processo de crescimento e desenvolvimento da empresa
Novos empreendimentos
Repercussões deste tipo de gestão na sociedade civil.
260
Fatos recorrentes do relacionamento com os trabalhadores, fornecedores,
clientes.
Como se trabalha em uma empresa de EdC?
Qualidade de vida de funcionários e clientes, como a empresa vê e concretiza
esta realidade? (horário de trabalho, qualidade dos produtos)
Que diferenças existem entre a empresa e uma de seu segmento que adota
outro sistema de valores?
As empresas EdC podem ser competitivas, ou isto não faz parte desta
cultura? Se sim, como se dá isso, tem alguma diferença do processo de
competição natural?
Zelo com o ambiente (fatos)?
O homem o autor da EdC ?
O homem o centro da EdC?
O homem o fim da EdC?
O pensamento maquiavélico “Os fins justificam os meios” são aceitáveis e
vividos nesta empresa? (com respeito ao meio ambiente, ao relacionamento
com funcionários e concorrentes)
Como se dá o processo de seleção e desenvolvimento de pessoal nas
empresas EdC? O processo de treinamento? Doutrinação?
Como se dá a comunicação interna? Meios? Resultados? Fatos?
Como é o processo de comunicação com meio? Ferramentas usadas?
Resultados, Fatos?
3) Perspectivas- manutenção EdC:
- Impacto da adesão a EdC na vida da comunidade interna e externa?
- A empresa e EdC visão de futuro? Como pode ser visto?
- Números:
• Investimentos
• Trabalhadores.
Faturamento (si for possível)
261
Previsões para o futuro
Crescimento em números.
- O que mudou na vida das pessoas após EdC?
- Forças?
- Oportunidades: Quais são as oportunidades para a empresa no mercado?
- Fraquezas: Quais são as fraquezas da empresa no mesmo mercado, quais
são as mais perigosas?
- Ameaças: O que poderia destruir/ enfraquecer a atuação da empresa
- Marketing da empresa
262
ANEXO 2
Guia para entrevistas para funcionários
Como se trabalha em uma empresa de EdC? Relacionamento interpessoal?
O que mudou na vida das pessoas após EdC?
Qualidade de vida de funcionários e clientes, como a empresa vê e concretiza
esta realidade? (horário de trabalho, qualidade dos produtos)
Que diferenças existem entre a empresa e uma de seu segmento que adota
outro sistema de valores?
Como se dá seleção e desenvolvimento de pessoal nas empresas EdC? O
processo de treinamento? Doutrinação?
Como se dá a comunicação interna? Meios? Resultados? Fatos?
Como é o processo de comunicação com meio? Ferramentas usadas?
Resultados, Fatos?
Quais as vantagens e desvantagens para os funcionários de trabalhar na
empresa?
263
Guia para observação
O QUE ONDE
A empresa adota sistemas de gestão e estruturas organizativas
visando promover o trabalho em grupo em função do
crescimento individual.
Toda a empresa
Formas de comunicação.
Comunicação administrativa
Comunicação interna
Comunicação mercadológica
Comunicação institucional
Comunicação interpessoal
Comunicação grupal
Comunicação massiva
Toda a empresa
Relações de comunicação organizacional:
Vertical
Horizontal
Toda a empresa
Os empresários que aderem à EdC, como os demais, formulam
estratégias, objetivos e planos empresariais, valorizando os
critérios típicos de uma correta gestão e envolvem nesta
atividade também os demais membros da empresa. Eles tomam
as decisões de investimento com prudência mas com particular
atenção para a criação de novas atividades e postos de
trabalho produtivos.
Setor gerencial
A pessoa humana e não o capital, está no centro da empresa.
Os responsáveis da empresa tratam de utilizar-se da melhor
maneira os talentos de cada trabalhador favorecendo para isso
a criatividade.
Diversos setores
da empresa
Os membros da empresa trabalham com profissionalismo para
Toda empresa
264
construir e reforçar boas e sinceras relações com os clientes, os
fornecedores e a comunidade, a quem estão orgulhosos de
servir.
Relacionam-se de modo leal com a concorrência, mostrando o
valor efetivo de seus produtos ou serviços e negando-se a
destacar o negativo dos produtos ou serviços alheios.
Setor comercial
A empresa respeita as leis e mantêm um comportamento
eticamente correto em relação às autoridades fiscais, aos
órgãos de controle, aos sindicados e órgãos institucionais.
Setor
administrativo
Um dos objetivos dos empresários de empresas da EdC, é
transformar a empresa numa verdadeira comunidade. Para isso
se encontram regularmente com os responsáveis da gestão
para averiguar a qualidade das relações interpessoais e junto
com eles se ocupam de solucionar as situações difíceis.
Setor gerencial
Trata-se de evitar um excessivo horário de trabalho, de modo
que ninguém seja sobrecarregado, e são previstas férias
adequadas.
Toda empresa
A empresa produz bens e serviços seguros, dando atenção aos
efeitos que estes podem causar ao meio ambiente, a economia
de energia e aos recursos naturais em relação ao ciclo de vida
dos seus produtos.
Controle de
qualidade
Para permitir a cada um alcançar seus objetivos, seja de
interesse da empresa ou pessoal, a empresa fornecerá a
oportunidade de atualização e de aprendizagem contínua
Recursos
humanos
A empresa que adere a EdC cria um clima de comunicação
aberta e sincera que favorece a troca de idéias entre executivos
e trabalhadores
Toda empresa
As empresas que aderem a EdC, na tentativa de desenvolver
relações econômicas reciprocamente úteis e produtivas, utilizam
os mais modernos meios de comunicação para interagir entre
Setor
administrativo
265
elas seja a nível local como internacional, alegrando-se com os
sucessos mútuos e levando em consideração as dificuldades,
provas ou fracassos das outras, num espírito de recíproca
solidariedade.
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