essa tarefa como um requisito para a compreensão do mundo e do homem. Estudar traria a
consciência do conhecimento, racionalizando as experiências, nomeando-as, classificando-
as, dissecando seus sistemas de funcionamento. Ler, nesse caso, residiria na condição
humana de perceber, memorizar, reconhecer, significar; estudar estaria subordinado a essa
condição; estaria circunscrito à atitude de, isentando-nos (ainda que momentaneamente)
dos sentimentos e das intuições, propor e comprovar teses, soluções para problemas;
decorar fórmulas, citar formalmente outros seres humanos igualmente estudiosos; mostrar,
cientificamente, como somos e o que fazemos no e para o mundo onde vivemos. Afinal, o
estudo tem feito o mundo evoluir; tem feito vacinas, tratamentos de saúde; pontes,
aeronaves, radares e sondas; computadores (ah, os computadores!), cinema, televisão;
carros, conforto, escadas rolantes e elevadores. Mas, omitindo o pressuposto da
sensibilização advinda da (pouca) leitura (de livros e do mundo), o homem ignorou a
dificílima dangerosíssima viagem de si a si mesmo; deixou de obrigá-lo a pôr o pé no chão
do seu coração e experimentar, colonizar, humanizar o homem, descobrindo, em suas
próprias inexploradas entranhas, a perene, a insuspeitada alegria de conviver — como
diria Drummond. Por isso, Iraque, Bush, Rocinha, fome, anorexia, violência, homens-
bomba, prisão, solidão, shoppings e mais shoppings, e pouquíssima arte. Hoje é preciso
muita ciência para que, racionalmente, seja provada a fragilidade humana perante o próprio
ser humano, pois sua capacidade intuitiva, sensível, parece embotada por tanta tecnocracia.
Ler, criar significados a partir da perspectiva única de cada homem (e não os reproduzir
simplesmente!), portanto, realmente deveria ser mais importante que estudar.
Se, como em Paulo Freire, a leitura da palavra for vista como fim e caminho para a
leitura do mundo, “movimento em que a palavra dita flui do mundo mesmo através da
leitura que dele fazemos” (Freire, 2003:20), outra vez ler torna-se mais importante que
estudar, pois a leitura coloca o homem em simbiose com o mundo, dando-lhe a
oportunidade da autoria da posição ocupada, por meio da palavra, da leitura que faz, de sua
atuação via palavra. Para Freire, o estudo só tem sentido se o educando aprender a se
posicionar, a criticar, a se ver inserido socialmente; se aprender a ler sua condição de vida e
transformá-la. Para isso, não basta memorizar mecanicamente conceitos, be-a-bá; é preciso
encontrar sentido, significar a existência do educando como “gente”, possibilitando uma
“compreensão diferente de sua indigência” (op.cit.: 21). A importância do ato de ler, para o