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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
MESTRADO EM SAÚDE E GESTÃO DO TRABALHO
CARACTERIZAÇÃO DO PROGRAMA DE REDUÇÃO DE DANOS
DO MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ
MESTRANDA: JAMILLE Z. SECCHI
ORIENTADOR: DR. ALAN ÍNDIO SERRANO
Itajaí, SC, março de 2005
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1
JAMILLE ZAPELINI SECCHI
CARACTERIZAÇÃO DO PROGRAMA DE REDUÇÃO DE DANOS
DO MUNICÍPIO DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ
Dissertação apresentada o no Curso de Mestrado
Profissionalizante em Saúde e Gestão do Trabalho, da
Universidade do Vale do Itajaí, para obtenção do título
de Mestre - Área de concentração em Saúde da Família.
Orientador: Professor Dr. Alan Indio Serrano.
ITAJAÍ (SC), 2005.
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2
DEDICATÓRIA
Aos meus pais que me apoiaram, mesmo longe, com carinho, compreensão e incentivo.
A minha irmã que esteve ao meu lado sempre que precisei de apoio.
A minha avó, que desejou meu sucesso e cuja ausência é uma presença constante em minha
vida.
À equipe de Redução de Balneário Camboriú, motivo deste trabalho.
3
AGRADECIMENTOS
Desejo expressar meus agradecimentos a todos os que, de alguma forma, contribuíram para a
realização deste trabalho e, especialmente:
Ao meu orientador, Professor Doutor Alan Índio Serrano, pela confiança, apoio e
compreensão para a realização deste trabalho.
Aos meus pais, por todo apoio, carinho e incentivo dedicados a mim durante esta fase.
A minha avó, que sempre acreditou em mim, e que embora não esteja mais entre nós, estará
para sempre em minhas lembranças.
A minha irmã Betina, que esteve ao meu lado, me ouvindo e me apoiando quando precisei.
A minha amiga Alessandra que me incentivou e apoiou em todos os momentos desta
pesquisa.
Aos colegas de trabalho que apoiaram e torceram por mim nesta nova conquista.
Ao Ricardo, Coordenador do Programa de Redução de Danos e colega de trabalho, que deu
total abertura para a realização deste estudo.
Ao Édio, Supervisor de Campo da equipe de Redução de Danos, que me ajudou na coleta de
dados, fornecendo os materiais que precisei, mostrando-se sempre atencioso, interessado e
prestativo.
A toda equipe de Redução de Danos de Balneário Camboriú, que em todos os momentos
mostraram-se dispostos a contribuir no que fosse preciso.
4
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 13
2 OBJETIVOS....................................................................................................................... 16
2.1 Objetivo geral .................................................................................................................. 16
2.2 Objetivos específicos........................................................................................................ 16
3 DROGAS E SUAS IMPLICAÇÕES ................................................................................ 17
3.1Conceitos sobre Drogas.................................................................................................... 17
3.2 Ópio e os narcóticos derivados....................................................................................... 19
3.3 Cocaína............................................................................................................................. 21
3.4 Crack ................................................................................................................................ 24
3.5 Maconha........................................................................................................................... 25
3.6 Dependência e tratamento.............................................................................................. 26
3.7 Dependência química e AIDS......................................................................................... 29
3.8 Situação das drogas no Brasil: epidemiologia e custo social ....................................... 32
3.9 Políticas públicas ............................................................................................................. 35
4 REDUÇÃO DE DANOS .................................................................................................... 37
4.1 História e conceito ........................................................................................................... 37
4.2. Princípios básicos, pressupostos e valores.................................................................... 38
4.3 Áreas e estratégias de atuação........................................................................................ 40
4.4 Equipe, material e trabalho de campo........................................................................... 44
4.5 Críticas à redução de danos e provas de efetividade.................................................... 46
5 MARCO REFERÊNCIAL METODOLÓGICO............................................................. 48
5.1 Avaliação em Saúde......................................................................................................... 48
5.1.1 Redução de Danos......................................................................................................... 50
5.2 Procedimentos éticos.........................................................................................................52
5.3 Materiais e Métodos..........................................................................................................53
5.3.1 Tipificação da Pesquisa ................................................................................................54
5
5.3.2 Campo de pesquisa........................................................................................................56
5.3.3 Equipe pesquisada.........................................................................................................57
5.3.4 Procedimentos para coleta de dados............................................................................58
5.3.5 Procedimento para análise dos dados..........................................................................58
6 ANÁLISE DOS DADOS.................................................................................................... 59
6.1 Estrutura............................................................................................................................59
6.1.1 Recursos Físicos..............................................................................................................59
6.1.2 Recursos Humanos.........................................................................................................59
6.2 Processo de Trabalho........................................................................................................62
6.2.1 Histórico do programa..................................................................................................63
6.2.2 Rotina de trabalho e organização da equipe...............................................................64
6.2.3 Relações de trabalho e postura da equipe diante de críticas......................................66
6.2.4 População-alvo e parcerias............................................................................................67
6.2.5 Materiais informativos..................................................................................................68
6.2.6 Medidas de biossegurança.............................................................................................68
6.2.7 Formas de registro.........................................................................................................69
6.2.8 Demanda.........................................................................................................................69
6.2.9 Dificuldades....................................................................................................................69
6.3 Resultados..........................................................................................................................70
6.3.1 Os Registros do Programa............................................................................................70
6.3.2 Registros dos Acessos a usuários..................................................................................71
6.3.3 A Diminuição da Cocaína e o Aumento do Crack......................................................72
6.3.4 O Registro dos Usuários Vinculados............................................................................72
6.3.5 Usuários de outras drogas............................................................................................ 81
6.3.6 O Atendimento a Pessoas que não Usam Substâncias Psicoativas........................... 82
6.3.7 Atuação com presidiários............................................................................................. 83
6.3.8 A Distribuição de Informação e Insumos................................................................... 85
6.3.9 O Cuidado para não Montar Falácias com os Números........................................... 91
6.4 Discussão............................................................................................................................98
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................110
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................113
6
9 APÊNDICES......................................................................................................................116
10 ANEXOS..........................................................................................................................122
7
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Relação dos Recursos Humanos do Programa de Redução de Danos,
Balneário Camboriú, 2006................................................................................................. 60
Tabela 2: Tempo de trabalho dos integrantes da equipe e tempo de espera até serem
contratados, em meses pelo Programa de Redução de Dano de Balneário Camboriú,
2006.................................................................................................................................... 61
Tabela 3: Número de usuários de cocaína endovenosa ou outras drogas injetáveis
acessados pelo Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú,
2001-2005.......................................................................................................................... 71
Tabela 4: Número de usuários de cocaína endovenosa ou outras drogas injetáveis
vinculados ao Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú,
2001-2005.......................................................................................................................... 73
Tabela 5: Quadro Geral de Discriminação dos Acessos e Vínculos, por sexo, usuários
de cocaína endovenosa ou outras drogas injetáveis, Programa de Redução de Danos,
Balneário Camboriú, 2001-2005....................................................................................... 75
Tabela 6: Número de acessos a usuários de crack pelo Programa de Redução de Danos,
segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005............................................................. 76
Tabela 7: Número de usuários de crack vinculados ao Programa de Redução de Danos,
segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005............................................................. 77
Tabela 8: Comparação do número de acessos a usuários de crack com o de usuários
vinculados, Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005............... 79
Tabela 9: Total de acessos e de vínculos feitos pelo Programa de Redução de Danos,
para usuários de cocaína endovenosa e de crack, Balneário Camboriú, qüinqüênio 2001-
2005.......................................................................................................................... 80
Tabela 10: Número de acessos de Usuários de Drogas Gerais, feitos pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, nos anos 2001-2005......................................... 81
Tabela 11: Número de acessos realizados à população não usuária de substâncias
psicoativas, Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005............... 83
Tabela 12: População confinada atendida pelo Programa de Redução de Danos,
segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005............................................................. 84
Tabela 13: Total de atendimentos por população atendida pelo programa de redução de
danos, Balneário Camboriú, 2001-2005............................................................................ 85
8
Tabela 14: Número de seringas distribuída, achadas e recebidas pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005........................................................ 86
Tabela 15: Número de cachimbos distribuídos pelo Programa de Redução de Danos,
Balneário Camboriú, 2001-2005........................................................................................ 88
Tabela 16: Número total de seringas e cachimbos distribuídos pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005........................................................ 89
Tabela 17 – Preservativo distribuídos por população atendida pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005........................................................ 90
Tabela 18: Número de prontuários de pacientes com HIV positivo abertos para usuários
de drogas injetáveis, Centro Integrado de Saúde e Solidariedade, Balneário Camboriú,
1993-2003........................................................................................................................... 93
Tabela 19: Freqüência de AIDS por ano de notificação, segundo categoria de exposição
não hierarquizada, SINAN, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005................... 94
9
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Tendência temporal do acesso a usuários de drogas injetáveis pelo Programa
de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005................. 72
Figura 2. Tendência temporal da vinculação de usuários de drogas injetáveis ao
Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005........ 73
Figura 3: Comparação das tendências temporais de acessos e vínculos de usuários de
drogas injetáveis, Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005...... 75
Figura 4: Tendência temporal do acesso a usuários de crack pelo Programa de Redução
de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005..................................... 77
Figura 5: Tendência temporal da vinculação de usuários de crack ao Programa de
Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005............................. 78
Figura 6: Comparação das tendências temporais de acessos e vínculos de usuários de
crack, Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005........................ 79
Figura 7: Números absolutos de acessos e vínculos de usuários do Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, período 2001-2005........................................... 80
Figura 8: Comparação das tendências temporais de acessos de usuários de drogas
gerais, pelo Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005............... 82
Figura 9: Tendência temporal do acesso de pessoas não usuárias de substâncias
psicoativas pelo Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú,
SC, 2001- 2005.................................................................................................................. 83
Figura 10: População confinada atendida pelo Programa de Redução de Danos, segundo
o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005............................................................. 84
Figura 11: Tendência temporal do acesso da população atendida pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005................................................. 86
Figura 12: Tendência temporal da relação entre as seringas distribuídas, as achadas e as
recebidas pelo Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005.... 87
Figura 13: Tendência temporal do número de seringas e cachimbos distribuídos pelo
Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005............................ 89
Figura 14: Tendência temporal da distribuição de preservativos pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005................................................. 91
Figura 15: Relação entre o uso de drogas por via endovenosa e a preferência sexual
declarada pelo paciente, SINAN, Balneário Camboriú, 2001-2005.................................. 95
10
Figura 16: Freqüência de AIDS por ano de notificação, segundo categoria de exposição
hierarquizada, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005......................................................... 96
11
CARACTERIZAÇÃO DO PROGRAMA DE REDUÇÃO DE DANOS DO MUNICÍPIO
DE BALNEÁRIO CAMBORIÚ
SECCHI, Z. Jamille
SERRANO, I. Alan
Redução de Danos é um movimento que surgiu em resposta à crescente crise da AIDS na década de 80,
desenvolvida a partir do Programa de Troca de seringas e da prescrição médica substitutiva a substâncias
causadoras de dependência, iniciado na Europa. A Redução de Danos visa prevenir conseqüências danosas à
saúde decorrentes do uso de drogas, sem necessariamente interferir na oferta e no consumo. Embora os
programas de redução de danos sigam princípios comuns, cada um apresenta especificidades referentes ao
contexto em que está inserido. Este estudo tem como objetivo caracterizar o Programa de Redução de Danos da
cidade de Balneário Camboriú, mapeando aspectos do seu funcionamento técnico e administrativo e levantando
subsídios para sua prática. Trata-se de uma pesquisa do tipo avaliativo, cujo procedimento metodológico
utilizado para coleta de dados foi o da observação participante e análise documental. A pesquisadora
acompanhou os redutores em campo e participou das reuniões da equipe, observando como se organiza o
trabalho e como este funciona. Os registros e documentos da equipe de redução de danos foram analisados. As
vivências e conteúdos foram registrados em diário de campo. O material coletado foi organizado e interpretado,
através das etapas de avaliação em saúde proposta por Donabedian, estrutura, processos e resultados. Utilizou-se
de indicadores que facilitaram a análise. Foi possível perceber que em termos de estrutura física e adequação do
ambiente, não há problemas significativos. É um programa de bastante abrangência em termos populacionais,
pois sua atuação não está restrita a usuários de drogas injetáveis e crack, mas também engloba pessoas que não
se caracterizam como usuárias: profissionais do sexo, estudantes e população carcerária, com quem realizam
distribuição de preservativos e materiais informativos sobre doenças sexualmente transmissíveis e HIV/ AIDS.
De acordo com os dados, a falha do programa está na forma de registros, que não possibilita avaliar se o
programa vem alcançando, de fato, seu objetivo e na falta de monitoramento e avaliação. As parcerias com
outras instituições são pouco estruturadas para um trabalho em rede. O programa serve de referência à população
usuária de drogas, atuando como um serviço de acolhimento, apoio social e solidariedade. O estudo aqui
realizado poderá contribuir para uma reestruturação das formas de registro e controle do serviço prestado, o que
fornecerá dados mais fidedignos quanto a sua atuação.
Descritores: redução de danos, dependência (psicologia), serviços de saúde.
Palabras clave: reducción de daños, dependencia (psicología), servicios de salud.
Key words: harm reduction, dependency (psychology), health services.
12
CHARACTERIZATION OF DAMAGE CONTROL PROGRAM OF BALNEÁRIO
CAMBORIÚ CITY
SECCHI, Z. Jamille
SERRANO, I. Alan
ABSTRACT: Damage control is a movement that first appeared as a reply to the growing AIDS crisis that
occurs in the 80’s decade, it emerged from the Syringes Exchange Program and medical prescription in order to
replace the causative substances, it initiated in Europe. The damage control seeks to prevent harmful
consequences to the current use of drugs, it does not necessarily interferes in the offer and in the consumption.
Although the damage control programs follow general principles, each one presents its own particularities
referring to the context that is inserted. The objective of the present study is to characterize the Damage Control
Program of Balneário Camboriú City, mapping aspects of its technical and administrative operation and
subsidizing its practice. It is an evaluation type of research, which used the participant observation and
documentary analysis as methodological procedures for data collection. The researcher followed closely the
damage control agents in the field and she also attended to team meetings, observing how the work is organized
and operated. The damage control team registrations and documents were analyzed. The experiences gained in
the field and its contents were registered in a journal. The data collection was organized and interpreted, making
use of the evaluation stages in health proposed by Donabedian: structure, processes and results. The research
made used of indexes that facilitated the analysis. When it comes to physical structure and environment
adequateness, it was possible to notice that there are not significant problems. It is a plenty inclusive program in
population terms, because its performance is not restricted to drug injectors and crack users, but it also includes
people who are not characterized as drug users: professionals of the sex,
students and prison population, for
whom condoms and informative materials about sexually transmitted diseases, including HIV / AIDS, are
distributed. According to the data, the program flaw is in the registrations constitution, it doesn't make possible
to evaluate if the program reaches, in fact, its objective, it is also consist in the lack of supervision and
evaluation. The partnerships with other institutions are poorly structured for teamwork. The program concerns
the drug user population, acting as a reception, social support and solidarity service.
Descritores: redução de danos, dependência (psicologia), serviços de saúde.
Palabras clave: reducción de daños, dependencia (psicología), servicios de salud.
Key words: damage control, dependency (psychology), health services.
13
1 INTRODUÇÃO
Frente à realidade da existência e do uso de drogas ilegais, inúmeras medidas são
adotadas na tentativa de combatê-las. Cada medida baseia-se em ideologias
1
, paradigmas
2
e
pressupostos. Há medidas que visam reduzir a oferta das drogas ilegais, combatendo os
fornecedores, há outras que procuram reduzir a demanda, por meio de cerceamento legal,
educação ou medidas preventivas sanitárias e escolares, e há ainda as medidas de tratamento
para os dependentes.
A redução de danos é uma dessas medidas, que, como as demais, segue um caminho
baseado em ideologias e valores, mas que se diferencia não só por estes pressupostos, mas
pelo alvo de combate, uma vez que sua luta não é centrada no não consumo das drogas, mas
aos danos causados por estas.
A idéia central da Redução de Danos, segundo Friedman e Dês Jarlais (apud
MESQUITA; BASTOS, 1994, p.16) é de que se o uso de drogas, e mais especificamente o
seu uso injetável, provoca danos para os usuários e seu entorno, e se as tentativas de impedir o
uso de drogas vêm mostrando-se falhas, nada mais lógico do que desenvolver programas que
tenham como objetivo reduzir os danos causados por essas substâncias.
Frente a isso, o Programa de Redução de Danos (PRD) trabalha visando uma melhor
qualidade de vida e saúde às pessoas que vivem em situações de risco. Está incorporada à
política nacional de saúde e sustenta-se em princípios de cidadania e de inclusão social,
objetivando o rompimento da marginalização dos usuários, a quebra dos preconceitos contra
eles e a diminuição dos danos causados pelo uso de drogas.
É um projeto recente, que no Brasil teve inicio em 1995, em Salvador, Bahia,
apresentando uma nova perspectiva diante do uso
3
e abuso
4
de drogas, com práticas de
abordagem diferenciadas, aceitando o fato de que algumas pessoas usam e continuarão a usar
drogas e que a necessidade, nestes casos, é a de buscar medidas que reduzam os danos
1
De acordo com Gramsci “ideologia” pode ser caracterizada como uma concepção de mundo, que se manifesta
implicitamente na arte, no direito, na atividade econômica, em todas as manifestações de vida individuais e
coletivas. (GRAMSCI, 1995)
2
Kuhn define “paradigma” como uma série de suposições, métodos e problemas típicos, que determinam para
uma comunidade científica quais são as questões importantes, e qual a melhor maneira de respondê-las. (KUHN,
1977, p.70)
3
Uso é entendido como um vínculo frágil com a substância que permite a manutenção de outras relações. É
possível usar moderadamente certas substâncias sem abusar delas
4
Abuso é um Vínculo forte com a substância que interfere nas outras relações. Inclui a idéia de uso em excesso,
a noção de descomedimento. (FONTE)
14
causados por esta prática.
Embora popularmente tenha se dado ênfase à troca de seringas entre os usuários de
drogas injetáveis, a prática de atuação não se limita a isto, mas a uma série de atividades
focalizando os usuários de drogas injetáveis assim como a população que se encontra em
situação de risco, como moradores de rua, profissionais do sexo, transexuais, usuários de
drogas não injetáveis e etc.
Devido as suas práticas de atuação, levantam-se frente à redução de danos, algumas
resistências e críticas que questionam suas práticas e pressupostos, geralmente por
desconhecimento dos princípios que regem o programa ou por preconceito.
Os estudos de avaliação realizados em nível nacional e internacional demonstram que
os serviços de redução de danos resultam em redução do risco de infecção entre as populações
de usuários de drogas injetáveis e suas redes de socialização, sem que haja aumento do
número de usuários ou do consumo de drogas em razão da disponibilização de equipamentos
de injeção.
As avaliações realizadas mostraram que não aconteceu nenhum dos supostos
efeitos negativos que os oponentes à estratégia previam como muito
prováveis: não conseguiram documentar aumento do consumo, da
prevalência de injeção, do número de parceiros sexuais, nem de barreiras
para a aproximação de pacientes a programas de tratamento. Ao contrário, as
evidências são de que tais programas obtiveram redução do consumo, da
prática de compartilhamento de seringas e de práticas sexuais de risco
(BRASIL, 2001, p.19).
Suas atividades incluem programas educativos, aconselhamentos, encaminhamentos,
imunização dos usuários de drogas injetáveis contra hepatite B e vigilância epidemiológica.
A equipe, como consta no Manual de Redução de Danos (BRASIL, 2001, p.67) deve
ser diversificada e bastante capacitada, composta por profissionais da saúde, ex-usuários de
drogas, usuários, e voluntários, chamados de “colaboradores ou amigos do projeto”. O
treinamento varia de acordo com as características locais de cada serviço de redução de danos.
Segundo o Ministério da Saúde (ibid, p.67) o redutor de danos, pessoa que trabalha no
projeto, independente da sua categoria profissional, é o responsável por abrir o campo, fazer
contato com as pessoas da rede de interação social dos usuários de drogas injetáveis,
apresentar a proposta de trabalho para a população-alvo e, a partir desses acessos, fazer a
identificação dos usuários, buscar sua aceitação e executar as atividades programadas.
Cada equipe tem sua especificidade de acordo com o contexto em que está inserida e a
população atendida, no entanto deve seguir um referencial comum e buscar objetivos
15
coerentes com a filosofia do projeto.
Diante do fato de que as equipes de redução de danos trabalham com questões
delicadas, como a saúde de uma população, prejudicada pelos seus hábitos de vida,
marginalizadas e excluídas da sociedade, exige-se da equipe um preparo e uma capacitação
que torne os membros aptos a lidarem com situações delicadas e inesperadas. Além do
conhecimento necessário, o programa preconiza uma dose de consciência e de habilidade para
lidar com pessoas, respeitando-as e acolhendo-as como cidadãos, independentemente das suas
práticas de vida.
De acordo com o Ministério da Saúde (id 2001, p.70), para que o serviço de redução
de danos atinja seu objetivo de promover saúde, tornando a população, com a qual trabalha,
consciente e responsável pela própria saúde, instigando-a a buscar uma melhor qualidade de
vida, deve oferecer treinamento teórico-prático para as equipes, onde devem ser trabalhados
temas relevantes às suas práticas de atuação. Preconiza que a equipe deve ser trabalhada
integralmente, para um melhor relacionamento com a população, entre os próprios membros e
com a sociedade em geral, o que determinará todo o funcionamento do projeto na sua área de
atuação.
Traçamos um perfil de um Programa de Redução de Danos analisando o
funcionamento da equipe de trabalho, seu treinamento, suas relações entre si e com a
população, suas expectativas, suas frustrações e aspirações. Propiciando um panorama teórico
da sua atuação, com o intuito de facilitar a busca por melhoras e meios de atingir os objetivos
visados pela Saúde Pública, quanto à promoção e à prevenção.
Para tanto, nos capítulos que se seguem, para contextualização, abordar-se-á a questão
das drogas, os tipos existentes no mercado do município pesquisado, suas implicações e
conseqüências, bem como a situação das mesmas em nosso país e as políticas públicas
envolvidas, a fim de retratar um pouco de nossa realidade. Posteriormente será focalizada,
então, a estratégia de redução de danos, objeto da pesquisa.
16
2 OBJETIVOS
2.1 Objetivo geral
Caracterizar o Programa de Redução de Danos do Município de Balneário Camboriú,
mapeando aspectos de seu funcionamento técnico e administrativo
2.2 Objetivos específicos
2.2.1 Descrever a estrutura física e os recursos de um Programa de Redução de Danos, a
forma de trabalho da equipe, sua organização e o posicionamento dos profissionais frente aos
resultados alcançados;
2.2.2 Conhecer e descrever o processo de formação e capacitação de uma equipe de Redução
de Danos, o relacionamento entre os membros da equipe, e destes com a população atendida;
2.2.3 Identificar os tipos de serviços que o Programa de Redução de Danos do município de
Balneário Camboriú oferece à comunidade e a relação do programa com os recursos
existentes na área, em termos de organizações populares, instituições e equipamentos que
reflitam sobre a saúde;
2.2.4 Levantar subsídios para a revisão e o aprimoramento de suas práticas.
17
3 DROGAS E SUAS IMPLICAÇÕES
3.1 Conceitos sobre drogas
Neste capítulo trataremos especificamente sobre as drogas, seus conceitos, tipos
existentes, dependência e tratamento, sua relação com a AIDS e a situação das drogas no
Brasil, bem como as políticas públicas envolvidas nesta questão.
Explicar o que são drogas não parece uma tarefa difícil se perguntar a uma pessoa
leiga na rua. Ela provavelmente irá relatar as características e efeitos das drogas ilícitas e
talvez até reproduzir algum discurso que vem sendo veiculado na mídia, como algo
prejudicial à saúde. Muitos deixarão de citar as drogas lícitas, ou por esquecimento, ou
por não considera-las como drogas. Outros, entretanto, um engenheiro de alimentos, por
exemplo, poderá citar como drogas alimentos geneticamente modificados (os
transgênicos).
Revendo a história da humanidade, temos a impressão de que o interesse do ser
humano pelas drogas é tão antigo quanto o seu interesse por si mesmo e que busca, para
diferentes finalidades, substâncias que o ajudem a transcender a realidade em busca de um
contato com algo divino, mágico, de uma sabedoria através dos sentidos, de fuga, de diversão
ou de alívio do sofrimento.
De acordo com Longenecker (2002, p.5) As primeiras experiências ocorreram
acidentalmente através do consumo de plantas, que provocavam alterações no organismo. A
ingestão de tais plantas demonstrava que era possível aliviar a dor, dissipar o medo, e quem
sabe, até “ver” a face de Deus.
A capacidade do ser humano de aprender e prover-se levou ao conhecimento
e ao uso de um número cada vez maior de drogas. Os primeiros
consumidores tornaram-se peritos na arte de colher, preservar, cultivar e
registrar as fontes de drogas, assim como seus diversos efeitos. Foram
desenvolvidos diferentes métodos para consumir as drogas e os resultados
destas experiências foram devidamente registrados (LONGENECKER,
2002, p.5).
Descrições e listas de drogas, segundo este mesmo autor, assim como instruções para
sua administração estão entre os mais antigos documentos escritos que ainda existem;
documentos, estes, que propiciaram a criação da farmacologia moderna, assim como
18
possibilitaram grandes incursões na história humana.
De acordo com Ferreira, Ferreira (2003, p.331), existem evidências do uso cerimonial
de drogas que remontam a períodos pré-históricos. O xamanismo
5
tem suas origens nesta fase
da evolução humana e supõe, atualmente, que o recurso às plantas com propriedades
psicoativas tenha sido o método original de produzir êxtases xamânicos. Existem evidências
de que o homem de Neanderthal usou plantas com poder de alterar o psiquismo, uma vez que
essas foram identificadas entre as oferendas encontradas em túmulos datados sessenta mil
anos atrás.
Culturalmente o termo droga é definido como “qualquer substância ou ingrediente
usado em farmácia, tinturaria, etc. Medicamento, substância entorpecente, alucinógena,
excitante, etc. coisa de pouco valor ou desagradável” (BUARQUE DE HOLANDA, 1997,
p.260). Tudo quanto pomos para dentro do corpo se torna droga se o fizermos de modo
excessivo, inadequado ou impróprio. Silveira (2001, p.7) por sua vez, conceitua drogas como:
Substâncias utilizadas para produzir alterações, mudanças nas sensações, no
grau de consciência e no estado emocional. As alterações causadas por essas
substâncias variam de acordo com as características da pessoa que as usa,
qual a droga é utilizada e em que quantidade e efeito que se espera da droga
e as circunstâncias que é consumida.
Outra conceituação, deliberadamente ampla, aceita pela Organização Mundial de
Saúde (OMS), é utilizada e compreendida internacionalmente: Droga é toda “substância que
quando administrada ou consumida por um ser vivo, modifica uma ou mais de suas funções,
com exceção daquelas substâncias necessárias para a manutenção da saúde normal”
(GHODSE apud LEITE, 2003, p.26).
Como é possível perceber, conceituar drogas pode-se tornar difícil, uma vez que este
termo varia de um povo para outro, de um período histórico para outro. Concordando com
Velho (1998, p.48) “a própria noção de tóxico e o conceito de drogas é altamente
problemático e dependendo do critério e da posição do investigador, podem abordar desde a
cocaína até o papo de anjo”.
Em psiquiatria usa-se a expressão “substâncias psicoativass”, para se referir as
substâncias com poder de gerar dependência.
5
O xamanismo faz parte da religião de povos asiáticos e árticos. Embora a palavra xamã tenha origem na tribo
siberiana dos Tugus, sua origem histórica ou geográfica é difusa. É uma prática religiosa, de cura e visão de
mundo encontrada em todo o planeta. O xamanismo trabalha com respeito às forças da natureza, com rituais,
envolvendo cristais, fogo, água, metal, madeira.
19
As drogas estão presentes no dia a dia da sociedade. Desde criança assimilamos atos
adictos como no inocente desenho animado do Marinheiro Popeye, criado por Elzie Segar, na
década de 1920, onde o personagem, feio e franzino, faz uso de espinafre e torna-se forte,
invencível, vence o Brutus (suas barreiras e dificuldades) e conseqüentemente ganha o
coração de Olívia Palito (suas aspirações e desejos). Outro exemplo interessante são os
personagens da literatura infantil de Monteiro Lobato, que tomam pó de “pirlimpimpim” e
embarcam em viagens mirabolantes.
Crescemos assistindo, muitas vezes, cenas de comportamentos adictos em nossa
família, onde para cada manifestação de dor, dificuldade ou alegria, segue acompanhada de
alguma substância externa para aliviar, ganhar forças ou exaltar as conquistas. Essas
mensagens indicam claramente que as soluções e prazeres são encontrados no mundo externo,
em substâncias que ao serem ingeridas, transformam nossa realidade. A droga potencializa
essa sensação de poder, onipotência, autoconfiança, tão buscada por jovens na fase da
adolescência.
Quando consideramos certas características do comportamento humano, como afirma
Longenecker (2002), o uso
6
excessivo de drogas é um desdobramento absolutamente
previsível do início do consumo de drogas. Curiosidade, prazer, desejo de alívio são apenas
algumas dessas características. A eficácia de algumas drogas pode conduzir à idéia de “quanto
mais, melhor”, o que levará ao abuso
7
da substância.
Segundo Edwards (apud FERREIRA, 2003, p.331) é curioso como algumas
sociedades são capazes de, em determinadas épocas, conviver com o uso mais ou menos livre
de drogas consideradas, em outras épocas ou em sociedades diferentes, tão perigosas a ponto
de ser necessário um controle legal rígido.
Em nossa sociedade, como afirma Ferreira, Ferreira (In CATALDO NETO; GAUER,
2003) um dos principais problemas é, sem dúvida, este relacionado ao mundo das drogas,
devido suas implicações sanitárias, judiciais (violência urbana, transgressões e crimes),
ocupacionais e familiares.
3.2 O ópio e os narcóticos derivados
Gravações e escritos antigos revelam que o ópio era conhecido pelos médicos da
6
Uso é entendido como vínculo frágil com a substância que permite a manutenção de outras relações. É possível
usar moderadamente certas substâncias sem abusar delas.
20
Antiguidade e usado centenas de anos antes do advento do cristianismo, como afirma Rocha
(1987, p.5). Isto indica que os povos antigos já conheciam as propriedades curativas das
plantas, como as da papoula e do suco dela extraído, o ópio. Os egípcios também conheciam a
aplicação terapêutica do ópio e descreveram as suas propriedades analgésicas, como se
constatou em pergaminhos encontrados em Tebas.
De acordo com Rocha (1987, p.6), uma das referências ao ópio parece encontrar-se na
Odisséia, escrita no século IX a.C. Provavelmente ele era o princípio ativo da droga nepente,
descrita por Homero como o mais poderoso destruidor de mágoas. Homero conta que Helena
de Tróia fez Telêmaco beber nepente para esquecer a dor e a desgraça.
Durante o período greco-romano, o ópio foi um remédio valioso, utilizado como
analgésico. E, no início da era cristã, foi empregado para acalmar a tosse, cortar a diarréia,
aliviar a dor e provocar o sono.
Na Europa renascentista, o ópio era utilizado comumente como remédio para os mais
diversos males, e foi também empregado no tratamento da histeria, sendo considerado por
alguns autores como a primeira droga a ser ministrada no tratamento das doenças mentais.
Segundo Rocha (1987, p.12) a produção de ópio é legal em vários países e estão sob
controle governamental local e internacional, atendendo-se às disposições dos Protocolos da
Comissão de Drogas Narcóticas da Organização das Nações Unidas (ONU). Entre os países
que produzem ópio para fins medicinais sob controle governamental, estão: Alemanha,
Argentina, Austrália, França e Rússia. Os Estados Unidos não produzem ópio, mas importam
todos os opiáceos
8
para uso medicinal.
A morfina é o mais ativo alcalóide
9
do ópio, com o teor de 10% de seu peso, e se
apresenta sob a forma de cristais solúveis, servindo para a preparação de numerosos derivados
como a diamorfina, codeína e a heroína. Destas a mais famosa é a heroína.
A partir de 1805, a morfina, extraída do ópio bruto e tomada oralmente, tornou-se
medicamento anestésico importante. Em 1858, dois médicos norte-americanos
experimentaram aplicá-la com agulhas hipodérmicas. A pesquisa com a injeção melhorou a
qualidade do tratamento médico no século XIX. Todavia, o abuso produziu uma série de
problemas de farmacodependência, o que levou a proibição da mesma em diversos países na
7
Abuso é um vínculo forte com a substância que interfere nas outras relações. Inclui a idéia de uso em excesso, a
noção de descodimento.
8
Segundo Rocha (1987), são chamadas de opiáceos todas as substâncias que derivam do ópio e também todos
aqueles compostos de origem sintética ou semi-sintética cuja estrutura química e ações farmacológicas são
parecidas com a da morfina.
9
Substâncias derivadas de plantas que contêm, em sua fórmula, basicamente nitrogênio, oxigênio, hidrogênio e
carbono. Seus nomes comuns geralmente contém o sufixo ina: cafeína, cocaína, papaverina, pilocarpina etc.
21
década de 1920.
Depois da Segunda Guerra Mundial, a produção do ópio voltou a se expandir e as
refinarias de heroína se multiplicaram em Hong Kong e Marselha, França. A heroína passou,
então, a ser contrabandeada pelas quadrilhas internacionais e vendida no mercado negro do
mundo ocidental, sobretudo nos Estados Unidos.
A heroína (diacetilmorfina) é sintetizada a partir da morfina e se apresenta geralmente
sob a forma de pó branco cristalino ou grãos muito finos. A droga nunca é vendida pura. Sua
taxa de pureza é de 5 a 10%. E usada de diversos modos: por via oral ou inalação, injeções
hipodérmicas, supositórios, etc. A forma de uso mais utilizada pelos europeus e norte-
americanos é a injetável, já os orientais costumam derreter o pó e aspirar a fumaça. A heroína
adicionada à cocaína constitui uma mistura tóxica forte, sendo mais utilizada nos Estados
Unidos, onde tal mistura é conhecida como speedball.
A heroína pode produzir falta de apetite, náuseas, olhos lacrimejantes, corrimento
nasal, dores musculares, diarréia e se o indivíduo não for socorrido a tempo pode entrar em
coma e ir a óbito. De acordo com Rocha (1987, p.17), pesquisadores afirmam que filhos de
mães dependentes de heroína apresentam síndrome de abstinência poucas horas após o
nascimento.
O tratamento deve ser hospitalar e consiste em ir diminuindo as doses e medindo a
intensidade da síndrome; caso esta seja muito grave, utiliza-se o tratamento de substituição
com a metadona, que é também opiáceo, com a vantagem de poder ser administrada
oralmente.
3.3 Cocaína
O uso da cocaína tem suas raízes nas grandes civilizações pré-colombianas dos Andes,
que há mais de 4500 anos já conheciam e utilizavam a folha extraída da planta Erythroxylon
coca, como testemunham as escavações arqueológicas do Peru e da Bolívia.
Na região andina, envolto em lendas, floresce o arbusto Khoka, a planta divina dos
incas, utilizada nos exercícios físicos, como fator de resistência à rarefação do ar nas altitudes,
nas cerimônias religiosas e nos sacrifícios ao deus Sol. Para a civilização Inca a cocaína com
certeza não era vista como uma droga, mas sim como questões de necessidade de ritual.
De acordo com Rocha (1987, p.20), em 1857, Karl Von Scherzer levou do Peru para
Viena várias amostras de folhas de coca e as entregou ao laboratório do químico alemão
Friedrich Wolher, onde foram pesquisadas.
22
Três anos depois, Albert Niemann, desse laboratório, isolou o principal alcalóide da
folha da coca, observando que a droga tinha um sabor amargo e produzia um efeito peculiar
na língua, entorpecendo-a. Deu-lhe o nome de cocaína e esta droga foi o primeiro anestésico
tópico utilizado em medicina.
A partir de então a droga passou a ser difundida na Europa e nos Estados Unidos e a
ser empregada legalmente na preparação de remédios e na fabricação de cigarros, doces,
gomas de mascar e bebidas estimulantes como a coca-cola.
Em 1906 o governo norte-americano proibiu a utilização da coca na fabricação de
alimentos e bebidas e restringiu o seu uso médico, limitando-o apenas como anestésico tópico.
E em 1914 classificou a cocaína como droga pouco útil na medicina e extremamente perigosa,
proibindo-a. Na mesma época, na Europa e no Brasil foram tomadas medidas idênticas.
A droga passou a ser estudada por médicos como Karl Koller, Willian Halsted, e
Sigmund Freud e experimentada no processo de tratamento de depressão, alcoolismo,
dependência a morfina, doenças digestivas, cirurgias oculares (como anestésico), entre outras
doenças.
Sigmund Freud contribuiu de maneira decisiva ao conhecimento desta droga (BYCK,
1976 apud BUCHER, 1992, p.119). Inicialmente entusiasmado com a ampla aplicabilidade do
produto, ele descreveu os efeitos positivos observados. Nessa ocasião aplicou a cocaína no
tratamento do seu amigo Ernest Von Fleishl, fisiólogo e químico, que tinha se tornado
dependente em morfina, em virtude de uma dolorosa amputação no dedo. Freud esperava
curá-lo, mas não obteve êxito. Ernest morreu em 1891, vitimado e arruinado pelo uso da
cocaína. Com este fato e outros estudos observou-se que o tratamento dava lugar à
dependência da cocaína.
Posteriormente, com o desenvolvimento da indústria farmacêutica, a cocaína foi
substituída pelos derivados sintéticos como a procaína e a novocaína. Hoje a cocaína não tem
mais nenhuma indicação terapêutica.
Mas a coca, segundo Rocha (1987, p.23) continua sendo cultivada pelos camponeses
nos altipanos andinos (Peru, Bolívia, Argentina e Chile) e também por alguns índios
brasileiros na região amazônica. Os laboratórios clandestinos preparam a pasta de coca, o
sulfato e o cloridrato de cocaína, contrabandeados por quadrilhas internacionais.
Na Bolívia, os arbustos de coca são cultivados legalmente nas regiões de Yungas e a
coca é transportada por toda a Bolívia sem nenhuma restrição ou controle, a não ser o
pagamento de impostos nas alfândegas agrícolas. No Peru a plantação é controlada. Na
23
Argentina as folhas de coca são contrabandeadas. No Brasil, Rio Branco e Porto Velho são os
centros de recebimento, produção e exportação clandestina da cocaína.
O que era, no entanto, privilégio dos silvícolas, restrito às cerimônias religiosas ou a
outros aspectos da cultura popular, passou a ser explorado por traficantes, que investem na
cultura do vegetal para disseminação da dependência com propósito comercial mediante a
utilização da mão-de-obra indígena de toda Amazônia legal (SANTOS, 1997, p.33).
A cocaína, hoje, no Brasil, é motivo de inquietação por duas razões: primeiro porque o
consumo está disseminado em todas as camadas sociais e nas diferentes faixas estarias;
segundo, porque o país tornou-se um grande corredor de exportação, concentrando em
território pátrio a atenção internacional do crime organizado.
O uso da cocaína geralmente advém da curiosidade pelos efeitos por ela causados. O
abuso da cocaína evidencia-se, inicialmente, pelos efeitos agudos: a euforia, acompanhada pela
sensação do aumento de capacidades físicas (energia), aumento das percepções sensoriais, perda
do apetite e da necessidade de sono, aumento da autoconfiança, egocentrismo.
Efeitos estes prazerosos, que levam o indivíduo a buscar a droga. Porém
diante desses efeitos “positivos” vem o “negativo”, que são ansiedade;
delírios de cunho persecutório; depressão; irritabilidade; alucinações
(auditivas e visuais); aumento da pressão arterial; aumento da freqüência dos
batimentos cardíacos; constrição dos vasos sanguíneos (desaparecimento das
veias); aumento da temperatura, podendo até ultrapassar 42°, o que leva a
convulsões e podendo levar a morte por hipertermia; agitação ou retardo
psicomotor; dor toráxica; alteração na pressão sanguínea; entre outros (DSM
IV, 2000, p.171).
A partir do uso da droga, o usuário passa gradativamente ao uso continuado ou crônico
da cocaína, que, por si só, traz efeitos mais danosos ao indivíduo. Leite (2003) é enfático ao
escrever sobre os efeitos do uso crônico da cocaína, como causadora de depressão intensa
com risco de suicídio, desmotivação, irritabilidade crônica, ataques de pânico severos,
ansiedade, padrão estereotipado compulsivo, repetitivo de comportamentos. Além de
possíveis alucinações visuais, auditivas ou táteis vívidas. Estudos clínicos mostram que a
cocaína induz ataques de pânico, podendo inclusive desencadear a síndrome de pânico, que
persiste mesmo após a suspensão da droga (LEITE, 2003, p.29).
Cabe aqui salientar, que nem todos os usuários de cocaína tornam-se dependentes da
droga. A dependência ocorre de acordo com a quantidade e com o intervalo de tempo de uso
que o indivíduo faz. Robert Du Pont, antigo diretor Norte Americano do National Institute of
Drug Abuse, propôs que a trajetória entre a experimentação e a dependência apresenta quatro
24
estágios diferentes: “experiência e uso inicial; consumo ocasional; consumo regular;
dependência propriamente dita” (LEITE, 2003, p.37).
Não existe uma definição para se passar de um estágio para outro. Isso depende de
cada pessoa, pois existem usuários que se tornam dependentes em poucos meses de uso,
outros só após alguns anos e outros entre tanto, nem chegam à dependência. Leite (2003)
coloca que os efeitos negativos advindos do uso da cocaína não estão presentes nos primeiros
meses do consumo ocasional, o que faz com que o usuário desacredite nos malefícios por ela
causados. Quando mais cedo se detecta a dependência, maior o sucesso que intervenções
terapêuticas podem obter.
A questão da relação sexual é um dos fatores que causam maior preocupação em se
tratando de usuário de drogas, que pode negligenciar sua preocupação com a proteção às
doenças transmissíveis. Na literatura, constata-se que entre os efeitos atribuídos à cocaína, há
interferência sobre a atividade sexual.
Existe uma séria preocupação com os usuários de drogas injetáveis (UDI) e o sexo
inseguro, pela relação existente de transmissão do HIV. Esta forma de transmissão é
reconhecida como importante nos meios governamentais brasileiros considerando “estudos
que revelam que 80% a 90% dos UDI têm vida sexual ativa e que “o uso de preservativo nesta
população é pouco freqüente” (LEITE, 2003, p.166).
A cocaína pode ser administrada por inalação, injeção, aplicação e oralmente. A
inalação consiste em cheirar uma porção que é espalhada numa superfície lisa em forma de
“carreirinha”. A estimulação, por esta via, se prolonga até 40 minutos. Quando injetada, a
cocaína causa euforia instantânea, prolongando seus efeitos por um período de 45 minutos. Se
ingerida oralmente produz efeitos não tão intensos e com duração de 15 a 30 minutos. Outro
método usado é o da fricção do pó nas gengivas, sob a língua ou colocada em contato com
qualquer mucosa, inclusive no pênis e na vagina.
Enfoques tanto psicológicos quanto farmacológicos ao tratamento da dependência de
cocaína tem sido usados na redução do uso de cocaína e na prevenção da recaída pós-
desintoxicação.
3.4 Crack
De acordo com Santos (1997, p.48) muita confusão se faz diante das derivações da
coca (ou seja, das folhas do vegetal Erytroxylon cocae L.), principalmente com relação ao
crack. A presença mais ou menos intensa deste elemento, assim como o nível de impurezas e
25
ainda a variedade dos componentes químicos utilizados no processamento da mistura é que
vai qualificar cada derivado.
Os derivados menos puros e menos elaborados surgiram como uma necessidade de
popularizar a cocaína e buscar formas alternativas de saciação barata, já que a cocaína em
era tida como “droga de rico”.
Pode-se dizer que o crack é uma espécie de cocaína de base, mas não é a base livre,
porque tem impurezas procedentes do processo industrial usado para extrair o fármaco das
folhas vegetais, como o bicarbonato de sódio. Também não é cocaína pura, apesar do alto teor
de alcalóide ativo. Um processo de extração artesanal, para produzir crack, consiste em
embeber as folhas de coca em qualquer solvente, como a gasolina e o querosene. Tal
procedimento é simples e não oneroso, razão pela qual esta apresentação da droga tem larga
aceitação nas classes menos favorecidas e marginalizadas.
O nome “crack” vem do barulho que faz quando fumado. Sua primeira aparição foi
nos EUA em 1980 e em cerca de dez anos, esta droga se consolidou, extrapolou fronteiras e
marcou presença no Brasil e nos países andinos.
O crack pode ser colocado no cigarro de tabaco, na maconha ou fumado com outras
substâncias. Tão logo a fumaça é absorvida o estado de euforia se produz. Seu uso, no
entanto, leva a uma forte dependência, fazendo com que o usuário use novamente após os
quatro ou cinco minutos de euforia. Além do efeito imediato, o crack não deixa cheiro quando
fumado, o que reforça sua aceitação.
3.5 Maconha
A maconha é a droga alucinógena mais conhecida de todos os tempos. Seu nome
botânico é Cannabis sativa Lineu e pertence ao gênero Cannabis. Originária da Ásia foi
levada para África, e deste continente acabou chegando ao Brasil pelas mãos dos escravos.
O delta-9-tetrahidrocannabinol (THC), é o constituinte químico responsável pelos
efeitos psicoativos da planta. As folhas de maconha secas e prontas para o consumo têm
aproximadamente 5% de THC. O haxixe e seus derivados têm concentrações consideradas
elevadas de THC (50%).
As formas de utilização mais comuns são através de cachimbos ou cigarros. Estes últimos
são confeccionados pelo próprio usuário, que enrola uma porção da erva em papel ou palha.
Quando o cigarro está quase consumido, os usuários utilizam o cachimbo (de madeira, osso ou
qualquer outro material). Assim pode consumir toda a erva, sem queimar dedos e lábios.
26
Seus efeitos dependem do grau de THC, da química corporal, receptividade
psicológica, estabilidade emocional, personalidade e condições sócio-ambientais (SANTOS,
1997, p.41). A falta de atenção, a euforia, as alterações na percepção e nas sensações, o
deterioro do raciocínio e da memória e a alteração nas respostas emocionais, assim como a
irritabilidade e a confusão, são conseqüências do uso crônico manifesto em alguns indivíduos.
A maconha consumida no Brasil vem do Paraguai e do nordeste brasileiro, onde o
clima é propício à produção.
Além das substâncias psicoativas apresentadas aqui existem inúmeras outras, muitas
de origem sintética como alguns alucinógenos, anfetaminas como o ecstasy e anorexígenos,
barbitúricos, inalantes e tranqüilizantes.
As substâncias psicoativas capazes de causar dependência física e psíquica, atuantes no
sistema nervoso central, provocam alterações no comportamento. Podem ser divididas em dois
grupos: drogas de uso proscrito e medicamentos controlados. As primeiras são assim chamadas
por não terem qualquer aplicação terapêutica, como a maconha, a cocaína, o dietilamida do
ácido lisérgico (LSD). Os medicamentos controlados, por outro lado, são aplicados em estados
patológicos particulares.
Considera-se que, para o Estado, as drogas de uso proscrito constituem o maior
problema nacional em termos de dependência, em detrimento do abuso de medicamentos de
uso controlado.
Kalina (1999, p.20) define a drogadição como uma prática alienada que resulta de uma
sociedade que induz ao consumo e aparentemente opõe-se a ele: “o adicto não faz outra coisa
que transladar para o campo de sua vida individual, o tipo de relações alienadas que imperam
na sociedade a que pertence”.
Como é possível perceber, o consumo de drogas é uma constante em nossa sociedade,
fazendo parte da história da civilização, embora com dimensões, contextos e objetivos
diferentes.
3.6 Dependência e tratamento
A dependência se dá a partir do momento que o indivíduo não resiste à substância
psicoativa quando esta se apresenta disponível, por sofrer os fenômenos da tolerância (precisa
aumentar a quantidade da droga para ter os mesmos efeitos) ao longo do período de uso e da
síndrome de abstinência, na sua falta:
27
O modelo médico da dependência baseia-se na suposição de que a
dependência consiste numa entidade nosológica distinta e progressiva,
possuindo origens físicas e/ou manifestações desse tipo, necessitando de
tratamento médico para que seja propriamente conduzida (SIEGLER et. al.,
1984, p.40 apud BABOR, 1994)
As escolas psiquiátricas e psicológicas afirmam que a dependência constitui uma
doença mental, um transtorno do comportamento ou, em alguns casos, um sintoma de doença
subjacente. De acordo com Edwards e Lader (1994) essas definições têm sido formuladas
primariamente dentro de um contexto de três orientações profissionais: a da saúde pública, a
psiquiátrica e a psicológica. Em decorrência disso é possível classificar os indivíduos que
usam substâncias psicoativas conforme nomenclaturas padronizadas, como a Classificação
Internacional de Doenças (ICD) ou o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders
(DSM), da Associação Americana de Psiquiatria.
Essas classificações diagnósticas são usadas com propósitos estatísticos e
epidemiológicos além de terem um papel na facilitação da troca de informações entre clínicos
e pesquisadores, por padronizar a linguagem e uniformizar os critérios nosológicos.
Segundo a Associação Americana de Psiquiatria, a característica essencial da
dependência de substâncias consiste em grupos de sintomas cognitivos, de
conduta e fisiológicos, que indicam que o indivíduo continua consumindo a
substância, apesar da aparição de problemas significativos relacionados a ela
(FERREIRA, FERREIRA In CATALDO NETO, GAUER, FURTADO,
2003, p.332).
A divisão entre os tipos de dependência (psíquica, química e social) é didática, pois
estão simultaneamente relacionadas.
A dependência psíquica se caracteriza pelo desejo irresistível (“fissura”
10
, em inglês
craving) de repetir a administração da droga para obter seus efeitos agradáveis, quer sejam
prazerosos ou evasivos ou evitar o mal-estar psíquico que sente com a ausência da substância.
Quanto à dependência química, trata-se de uma neuroadaptação à ação farmacológica
de uma substância, desenvolvendo-se um vínculo entre a droga e o organismo. Seus dois
componentes principais são: a tolerância
11
e a síndrome de abstinência
12
aguda.
Já a dependência social é definida como sendo a necessidade de consumir a droga
10
Fissura, segundo Ministério da Saúde, (BRASIL, 2001, p. 103) é um desejo intenso de usar a droga.
11
Tolerância é definida como perda do efeito psicoativo de uma dose particular, e conseqüentemente, a necessidade de
aumentar a dose para manter esse efeito
12
Síndrome de abstinência é o conjunto de sintomas de configuração e gravidade variáveis que ocorrem após a cessação ou
redução do uso de uma substância psicoativa, que vinha sendo usada repetidamente.
28
como um símbolo de pertinência a um grupo social, que proporciona um sinal de identidade
pessoal.
O consumo de substâncias, sem indicação médica e em doses inadequadas, que leva a
um quadro de dependência, seja física, psicológica ou ambas, produz uma neuroadaptação não
desejável e prejudicial e pode gerar uma série de conseqüências, que segundo Ferreira e
Ferreira (In CATALDO NETO, GAUER, FURTADO, 2003, p.335) são:
a) Reações anti-sociais (agressividade, furtos, tráfico ilegal, homicídios, prostituição,
além de um estado de tensão social que gera acidentes, suicídios, conflitos
familiares, ocupacionais, etc.);
b) Síndrome de déficit de atividade, (diminuição ou perda da capacidade cognitiva,
motora, passividade, apatia, isolamento, etc.);
c) Infecções e diminuição das defesas, (devido a falta de assepsia, o uso de drogas
injetáveis pode gerar quadros infecciosos como: hepatite viral, tétano, infecções
oculares, abscessos subcutâneos, síndrome de imunodeficiência adquirida (Aids)).
d) Perigo de superdosagem (overdose): quando se injetam altas doses depois de um
período de abstinência, o que pode ocasionar morte por depressão respiratória.
A dependência se dá a partir da não resistência à droga, a busca do prazer passa ser
substituída por evitar o desprazer de não consumi-la. Quando a dependência se estabelece, a
droga já não faz parte de uma instância de sua vida, mas torna-se o núcleo central. O
indivíduo acaba por ficar negligente com sua aparência, higiene, a atenção familiar,
compromissos profissionais, etc. O dependente é capaz de gastar todo o seu dinheiro com as
drogas, e quando não o tem, chega a cometer furtos, prostituição e tráfico de drogas para
sustentar o vício.
Com relação ao tratamento, é possível distinguir entre procedimentos e técnicas
específicas (terapia familiar, terapia de grupo, prevenção da recaída e farmacoterapia) e
programas de tratamento. Dentre os procedimentos, é possível destacar:
a) Terapias farmacológicas, nas quais os medicamentos constituem importante
instrumento de ajuda, indicados para reverter os efeitos da intoxicação aguda, para
aliviar os sintomas da abstinência, para controlar a compulsão nos casos mais
graves, e tratar os transtornos psiquiátricos induzidos pela intoxicação aguda.
b) Terapias cognitivo-comportamentais, onde a ênfase está na mudança consciente de
crenças, idéias e comportamentos.
c) Terapias psicodinâmicas, que procuram entender as questões inconscientes
relacionadas ao abuso de drogas.
29
d) Terapias sistêmicas, onde o trabalho vai além do usuário, abrangendo sua família,
comunidade, a ênfase aqui está na dinâmica social.
Denomina-se reabilitação psicossocial o conjunto de intervenções focalizando tanto o
paciente em si, como a dinâmica social, na busca de diminuir as limitações e promover a
integração do usuário na comunidade. Há também grupos de ajuda mútua, como os
Alcoólicos Anônimos - AA - e os Narcóticos Anônimos - NA.
A maior parte dos programas de tratamento usa diversos procedimentos específicos e
envolve diversas disciplinas profissionais. Os melhores programas combinam procedimentos
e disciplinas específicas para satisfazerem as necessidades de pacientes individuais após uma
cuidadosa avaliação.
3.7 Dependência química e AIDS
A síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA; AIDS) surgiu no panorama
sanitarista internacional no início dos anos 80. O vírus HIV ataca o sistema imunológico da
pessoa, deixando-a vulnerável pela debilitação progressiva de suas defesas naturais contra os
diversos agentes patogênicos invasores (bactérias, protozoários, fungos e vírus).
Alguns portadores do vírus, como afirma Bucher (1992, p.258), não chegam a
apresentar os sintomas característicos da doença. Outros desenvolvem o quadro clínico
referente à doença. No entanto, todos podem transmitir o vírus, se não adotarem as precauções
necessárias.
Os portadores do HIV que desenvolvem a doença apresentam inicialmente uma série
de sintomas, comuns em moléstias de outras origens, como resfriados, bronquites, distúrbios
gastrintestinais. Como sintomas característicos específicos da fase inicial, manifestam-se
fadiga, febre, fraqueza, diarréias, perda significativa de peso, coriza, edema dos nódulos
linfáticos (no pescoço, nas axilas, na virilha). Tais sintomas podem intensificar-se com o
aumento de infecções oportunistas que, dependendo da fragilidade do organismo, podem ser
fatais.
No que diz respeito à implantação de políticas preventivas, terapêuticas e assistenciais,
há uma série de fatores que contribuem para dificultar tais ações, tais como os culturais,
religiosos e ideológicos.
A AIDS é uma das doenças sexualmente transmissíveis (DST), mas como a
30
transmissão ocorre também pelo sangue, representa um caso particular entre elas. Uma
mulher grávida portadora do HIV pode transmiti-lo ao feto (transmissão perinatal ou vertical).
A contaminação também pode se dar pelo contato com o sangue infectado, como nos casos de
transfusão sanguínea, ou por compartilhamento de seringas hipodérmicas (agulhas para
injeção). Estas quatro principais vias de contaminação refletiram-se na conceituação dos
quatro maiores grupos de risco para AIDS, nos anos 80: o dos homossexuais, o da prole de
mães contaminadas, o dos hemofílicos e o dos usuários de drogas ilícitas injetáveis
(compartilhadores de agulhas). No final dos anos 90 a noção de grupo de risco para o HIV foi
fortemente abalada, pois a disseminação do vírus passou a atingir, com incidência importante,
pessoas que não se encaixam em qualquer grupo de risco definido.
De qualquer forma, o conceito ainda é perfeitamente válido para os usuários de drogas
ilícitas pela via endovenosa, pois há, como em outras populações especiais, circunstâncias
sociais caracterizadas por comportamentos repetitivos e circunstâncias que favorecem a
contaminação:
Existem, ademais, grupos de risco, expostos em função não somente do tipo
de conduta, mas de sua intensidade e circunstâncias que podem favorecer a
proliferação do vírus. Cabe mencionar aqui os grupos de prostituição, os
presidiários, os garimpeiros, a população “de rua”, em particular os menores
de rua (BUCHER, 1992, p.261).
Os usuários de drogas proscritas, pela via endovenosa, representam um grupo
particular, com elevado comportamento de risco. Através de práticas de compartilhamento de
seringas correm um imenso risco de contaminação e de transmissão do HIV aos seus pares.
Através de inquérito epidemiológico, ficou notório que aproximadamente um terço
dos toxicômanos residentes em Amsterdã, Holanda, ou seja, por volta de 4.000 indivíduos, já
foi infectado pelo vírus da AIDS.
A maioria das pessoas que abusam de drogas injetáveis de uso proscrito tem
antecedentes de outras drogas. Como afirma Bucher (1992, p.265) o usuário de drogas que se
entrega à absorção de drogas injetáveis, não é um usuário “benigno” ou iniciante, mas uma
pessoa já dependente.
O tempo de duração dos efeitos da droga injetada é muito curto, o que faz com que o
usuário volte a injetá-la logo em seguida, podendo chegar a uma overdose. Esse método de
administração é mais perigoso que o de inalação, que leva alguns minutos para surtir efeito,
31
cuja duração média é de aproximadamente trinta minutos. O efeito da administração
endovenosa dura aproximadamente dez minutos (LEITE, 2003, p.17).
No Brasil, a droga mais utilizada por via endovenosa, segundo o Ministério da Saúde
(BRASIL, 2001) é a cocaína. O dependente, na ausência do produto, sente sua falta e se
torna:
Extremamente violento (fissura), acompanhado de um intenso sofrimento
que ataca a pessoa física e psiquicamente. Neste estado, tomar as
precauções higiênicas elementares no manuseio do instrumentário de
injeção torna-se difícil: a injeção da droga é um ato impulsivo que foge ao
controle racional e lúcido. Ele se assemelha assim a uma compulsão
(BUCHER, 1992, p.265).
No ritual do uso compartilhado as companhias determinam-se pelas necessidades
inerentes ao consumo: redução dos custos na divisão do papelote, disponibilidade de seringas
e auxílio no ato de injetar. Porém o uso da droga injetável em grupo faz com que uma mesma
seringa e agulha sejam utilizadas pelo grupo e desta forma, microorganismos presentes no
organismo de um usuário são diretamente injetados no próximo usuário, ritual que possibilita
a chegada do HIV, e das hepatites B e C ao sangue do usuário, sem a mínima proteção.
Acredita-se que o ato de injetar drogas em grupo faça parte de um ritual, mesmo que
esse ato não seja de compartilhar: “o ritual é uma atividade social” (HATZFELD, 1993,
p.123). Estar em roda com os amigos para injetar acaba fazendo parte de um ritual. E neste
espaço eles acabam compartilhando situações corriqueiras de suas vidas, bem como as
sensações ou “viagens” que a droga proporciona. Isso quer dizer que para o grupo de usuários
de drogas em geral existem gestos, gírias, falas, senhas que só são compreendidas pelo grupo.
E que, de qualquer forma, fazem parte de um ritual.
De acordo com Bucher (1992, p.265) a personalidade do usuário denota uma tendência
permanente, às vezes consciente, de expor-se a condutas de risco cujo potencial
autodestrutivo atrai. O toxicômano não só desafia a lei, estimulando a si mesmo pela sua
transgressão, como também desafia a morte, em um jogo que, semelhante à roleta russa,
comporta sempre um prazeroso risco calculado.
Entre os adolescentes que se envolvem com drogas, segundo Ferreira e Ferreira (In
CATALDO NETO, GAUER, FURTADO, 2003, p.335) são comuns as seguintes
características de personalidade: impulsividade, baixa tolerância à frustração, sentimento de
vazio interno, voracidade, dificuldade em postergar as satisfações, dificuldade em estabelecer
empatia, tendência a atitudes autodestrutivas e características depressivas. No entanto outros
determinantes também podem estar presentes, como os psicossociais, onde o contexto e a
32
família, podem ser propícios ao desenvolvimento do uso e do abuso de drogas.
Diante disso, pensa-se que as medidas preventivas possíveis devem adotar uma
filosofia pedagógica adequada, levando em conta as particularidades das vivências do
dependente.
“Sem entender suas contradições e contrariedades, suas oscilações entre a vida e a
morte, entre terapias para por fim à dependência, e entrega à procura desenfreada de prazer, as
medidas de prevenção cabíveis não terão êxito” (BUCHER, 1992, p.267).
Atitudes segregacionistas não só aumentam o drama desta população, mas ainda
reforçam a clandestinidade, ampliando o risco de contaminação. De acordo com Bucher (id,
ibid) para atingir o objetivo limitado de diminuir a propagação do HIV nesta população, é
necessário abdicar de posturas moralistas ou maniqueístas. Para evitar um mal maior, ou seja,
sofrimentos humanos e danos sociais maiores, pode-se reduzir os danos derivados do abuso
incontrolável de drogas.
Essas questões foram discutidas desde o Primeiro Simpósio sobre uso indevido de
drogas e HIV/AIDS, organizado pela OPAS/OMS, em Buenos Aires, em março de 1990,
onde foi enfatizada a participação comunitária nas estratégias a serem implantadas, levando
em consideração as particularidades culturais e sócio-econômicas das diversas populações.
Outra questão evidenciada foi a da responsabilidade dos governos e dos serviços de saúde e
de educação, principalmente com relação à capacitação dos profissionais envolvidos e a
elaboração de técnicas, materiais e métodos educativos. Por outro lado, os profissionais e
centros sanitários de referência devem se abster de qualquer envolvimento com as forças de
repressão ao porte e ao tráfico de drogas proscritas, pois isso dificultaria e impediria qualquer
aproximação com a população alvo.
3.8 Situação das drogas no Brasil: epidemiologia e custo social
Fala-se muito sobre o constante aumento do abuso de drogas no país e os perigos que tal
fato representa para a sociedade, principalmente para a população considerada como a mais
vulnerável, os jovens. Para avaliar o grau de veracidade de tais colocações, nada mais indicado
do que verificar estudos relacionados a esta questão, que oferecem um panorama de como está a
situação do país frente às drogas e a relação destas com a transmissão do vírus da AIDS.
Para Miranda Uchoa (2005), da Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), é difícil
uma resposta precisa porque o Brasil é um País com dimensões continentais. Desde a criação
da SENAD, em junho de 1998, aquela secretaria vem abordando o quadro epidemiológico do
33
uso de drogas no País.
O I Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil,
realizado pelo Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas – CEBRID – em
2001, estima a quantidade relativa e projeta o número de usuários de drogas nas 107 cidades
do país com mais de 200 mil habitantes. Esta pesquisa mostra um grande problema da
sociedade brasileira no tocante ao álcool e ao tabaco, drogas legais.
Entre as drogas legalmente proscritas, o maior uso é o de maconha, já experimentada
por cerca de 6,9% dos entrevistados.
O levantamento mostra que o Brasil não apresenta, com relação a nenhuma droga,
lícita ou ilícita, índice em que se pense em estado de emergência, no entanto o Governo está
ciente do problema e não deixa de considerá-lo como grave. “Basta que um único usuário,
dentro dos 180 milhões de habitantes, entre no campo da dependência química para nós já
considerarmos isso grave” (MIRANDA UCHÔA, 2005, p.1).
Há uma relação entre a transmissão do HIV e o uso de drogas injetáveis; de acordo
com o Ministério da Saúde (2001), essa relação se deu inicialmente na Europa, e em algumas
regiões da América do Norte, e tornou-se rapidamente um fenômeno mundial. Até junho de
2000, a Organização Mundial da Saúde registrou a presença de drogas injetáveis em 134
países. Destes, 114 haviam notificado casos de AIDS cuja forma de transmissão foi
considerada o uso de drogas injetáveis. No Brasil, o Ministério da Saúde anuncia que:
Já no início da epidemia de HIV/AIDS, ficou evidenciado o papel dos
usuários de drogas injetáveis (UDI) em seu curso. Primeiro caso registrado
desta categoria de transmissão foi no Estado de São Paulo em 1982. Houve
desde então, um incremento de mais de 3000 casos novos por ano desde
1993, perfazendo, até 31 de maio de 1997, um total de 22.879 casos de
UDI. Esses casos representam 20,6% do total acumulado de casos de Aids
notificados no País até a data acima referida. Embora com variações
regionais, desde então esta proporção vem se mantendo na epidemia
brasileira. No boletim epidemiológico da Coordenação Nacional de
Doenças Sexualmente Transmissíveis e AIDS do Ministério da Saúde (CN-
DST/AIDS) de agosto de 2000, os UDI representam 19,3% dos casos de
Aids do país no acumulado histórico (BRASIL, 2001, p.14).
De acordo com Bastos (2000 apud BRASIL, 2001, p.55) o tráfico, o consumo e a
disseminação do HIV e outras infecções de transmissão sanguínea vem se mostrando
relevante no litoral Sul, com epidemias extensas e de propagação acelerada do HIV entre
usuários de drogas injetáveis. Em alguns municípios, mais de 50% de todos os casos de AIDS
tem sido registrados entre usuários de drogas injetáveis. Entre tais municípios, Itajaí e
34
Balneário Camboriú, Santa Catarina, se posicionam entre as cidades do Brasil com maiores
taxas de incidência proporcional de Aids, com uma expressiva maioria dos casos notificados
entre os UDI e seus parceiros sexuais.
No entanto, de acordo com as pesquisas realizadas pelo Ministério da Saúde (2001), é
possível observar que “em algumas regiões brasileiras (Rio de Janeiro, Baixada Santista e
Salvador) existem hoje epidemias de HIV maduras em suas populações de usuários de drogas
injetáveis. Embora não seja possível, por ora, estabelecer relação de causalidade e
procedência, fato é que nestas mesmas localidades foram implantados, com relativo sucesso,
programas preventivos” (TELLES, 1999; MESQUITA, 2000; ANDRADE et al., 2001; apud
BRASIL, 2001, p.64).
Diante do panorama brasileiro frente às drogas surge a questão do custo social. Num
documento da Associação Brasileira de Estudo do Álcool e Outras Drogas (ABEAD, 1990)
estima-se que as conseqüências do abuso de drogas psicoativas custam ao Brasil o equivalente
de, pelo menos, 7,9% do PIB por ano, o que corresponde a aproximadamente 28 bilhões de
dólares.
Entre 1995 e 1997, mais de 310 milhões de reais foram gastos em internações
decorrentes do uso abusivo e da dependência de álcool e outras drogas. Ainda neste mesmo
período, o alcoolismo ocupava o 4º lugar no grupo das doenças que mais incapacitam,
considerando a prevalência global;
Finalmente, é preciso considerar os transtornos mentais associados ao uso e abuso de
substâncias psicoativas. As síndromes de dependência do álcool e de outras drogas são o
primeiro motivo de internações psiquiátricas. Os gastos totais relativos ao diagnóstico de
dependência de droga (CID 304) passaram de US$ 902.886,29 em 1993 para US$
2.919.933,94 em 1997. No total, os gastos diretos em internações que podem decorrer do uso
de substâncias psicoativas, em hospitais gerais da rede do SUS, chega a R$ 601.540.115,33.
Somam-se a isso os custos sociais não quantificáveis sob a forma de sofrimento
pessoal, familiar, comunitário e institucional. Sem falar nos danos causados pela AIDS, que
cresce entre os usuários de drogas injetáveis.
Os dados apresentados justificam o apelo aos diversos setores – governamental e não
governamental – para que estes possam responder à demanda gerada pelo uso indevido de
substâncias psicoativas. A assistência aos transtornos relativos decorrentes do consumo de
drogas deve espelhar a realidade nacional e caminhar no sentido de propiciar a atenção
integral à saúde do indivíduo.
Por isso a importância de estar implantando e executando uma política nacional com
35
programas efetivos de redução da oferta e da demanda, prevenção primária
13
do uso e abuso
e prevenção secundária
14
e terciária
15
do abuso e da dependência.
3.9 Políticas públicas
Até o momento, as políticas sobre drogas tendem a tratar o fenômeno na esfera
criminal. A Lei 6.368/76 rege os aspectos penais do uso e do tráfico. De acordo com Marlatt,
(1999, p.247) embora a estratégia nacional de controle às drogas tenha evoluído, sua ênfase
predominante é a de reduzir a oferta das drogas disponíveis. A guerra contra as drogas tem
três frentes: a primeira é a de tentar acabar com a oferta, combatendo os fornecedores; a
segunda é a da redução da demanda, por meio de ameaças; e a terceira diz respeito ao
tratamento para quem já é dependente.
Em 2002, a prevenção e o tratamento passaram a ser regulados pela Lei 10.409, e
passaram a serem vistos como solução, já que tem a melhor relação entre custo e benefício.
Conscientes de que esta luta contra as drogas, que estabelece como meta a erradicação
total das drogas, está sendo perdida, os agentes públicos buscam novas metas com diferentes
alternativas de intervenção. Entre estas está a redução de danos.
Cabe aqui ressaltar a diferença entre “redução do uso” e “redução de danos”. A
primeira está baseada em uma série de suposições “nos quais o comportamento é proibido e as
infrações são sujeitas a punição, ou seja, o objetivo aqui é a supressão total” (MARLATT,
1999, p.257). Já a segunda, redução de danos, envolve um conjunto de metas e de suposições
bastante distintas. No entanto é importante enfatizar que redução de danos não se confunde
com o conceito de legalização.
A maioria dos proponentes da Redução de Danos não é a favor da
legalização. Eles reconhecem que a proibição não conseguiu diminuir o
abuso de drogas, que ela é responsável por grande parte da criminalidade, da
corrupção, das doenças e das mortes associadas as drogas, e que seus custos
aumentam a cada ano. Mas eles também vêem como politicamente insensata
e que com ela corre-se o risco de aumentar o uso de drogas (MARLATT,
1999, p.258).
13
Segundo o Ministério da Saúde (2001), Prevenção primária se caracteriza por um conjunto de medidas, que
visam, basicamente, a educação para a saúde, com o objetivo de intervir antes que aconteça o uso de drogas.
14
Prevenção Secundária insere-se como prolongamento das estratégias primárias, através de abordagens mais
focadas na questão “uso de drogas”, com o objetivo de promover abstinência, impedir o abuso, a dependência e
os danos físicos, psicológicos e sociais.
36
Ou seja, a abordagem de redução de danos é compatível com uma grande variedade de
opções políticas que se situam em um espectro entre a legalização e a proibição total. Ela vai
além das iniciativas para diminuir a prevalência do uso de substâncias, reconhecendo que
alguns indivíduos não conseguem ou não estão dispostos a reduzir seu consumo de drogas,
mas que podem, ao menos, modificar suas práticas de uso para evitar possíveis danos.
Segundo o Ministério da Saúde, (2001), depois de dez anos das primeiras intervenções
feitas pelo projeto e de terem adotado a Redução de Danos (RD) como política de saúde
pública, e a presidência da República ter incluído a RD na Política Nacional Antidrogas, além
de vários estados terem aprovado legislação específica para a RD, não houve dificuldades
legais para a realização do trabalho.
Mesmo assim, os setores de justiça e segurança pública passam por constantes
sensibilizações e capacitações para compreenderem a atuação da redução de danos, e não
julga-la como uma prática estimulante do consumo de drogas, mas sim como uma intervenção
de promoção à saúde. É preciso reconhecer a estratégia de Redução de Danos sociais e à
saúde, amparada pelo artigo 196 da constituição Federal, como intervenção preventiva que
deve ser incluída entre as medidas a serem desenvolvidas, sem representar prejuízo a outras
modalidades e estratégias de redução da demanda.
15
A prevenção Terciária confunde-se com o tratamento propriamente dito, constitui-se numa série de
intervenções destinadas a evitar que o indivíduo, estando abstinente, retorne ao consumo de drogas.
37
4 REDUÇÃO DE DANOS
4.1 História e conceito
Neste capítulo será apresenta a história e o conceito da Redução de Danos, seus
princípios, áreas e estratégias de atuação, equipe, material e trabalho de campo, bem como as
críticas enfrentadas pelos programas de Redução de Danos.
A redução de danos é um movimento internacional que surgiu devido à crescente
propagação da AIDS na década de 80. Sua ação consiste em prevenir conseqüências danosas à
saúde que decorrem do uso de drogas, sem necessariamente interferir na oferta e no consumo
das mesmas:
As ações de redução de danos constituem um conjunto de medidas de saúde
pública voltadas a minimizar as conseqüências adversas do uso de drogas. O
princípio fundamental que as orienta é o respeito à liberdade de escolha, à
medida que os estudos e a experiência dos serviços demonstram que muitos
usuários, por vezes, não conseguem ou não querem deixar de usar drogas, e
mesmo esses, precisam ter o risco de infecção pelo HIV e hepatite
minimizados (BRASIL, 2001, p.11).
As primeiras intervenções no plano da saúde coletiva datam de 1926, na Inglaterra,
através do Relatório Rolleston
16
, que estabelecia que médicos poderiam prescrever legalmente
opiáceos
17
para dependentes dessas drogas, como um ato médico de tratamento. Ou seja, essa
16
O Rolleston Report é o relatório das recomendações de uma comissão interministerial, presidida pelo ministro
da Inglaterra, Sir Humphrey Rolleston. Ele teve uma grande influência neste e em outros países e estabeleceu o
direito dos médicos ingleses de prescrever suprimentos regulares de opiáceos nas seguintes condições: como
manejo da síndrome de abstinência em tratamentos com objetivo de cura; quando ficasse demonstrado que, após
prolongadas tentativas de cura, o uso da droga não pudesse ser seguramente descontinuado; e quando ficasse
demonstrado que o paciente só é capaz de levar uma vida normal e produtiva se uma dose mínima de droga for
administrada regularmente, mas ficasse incapaz disso quando a droga fosse inteiramente retirada.
17
Opiáceos ou drogas opiáceas são substâncias derivadas ou sinteticamente semelhantes ao ópio, suco leitoso
retirado do látex das cápsulas florais da papoula, planta botanicamente denominada Papaver somniferum. O
opiáceo mais conhecido é a morfina, cujo histórico é de larga aplicação medicinal. Todos os opiáceos produzem
uma analgesia (diminuem a dor) e uma hipnose (aumentam o sono). Em função disso, recebem o nome de
narcóticos sendo também chamadas de drogas hipnoanalgésicas ou analgésicos narcóticos. São classificadas
como substâncias entorpecentes podendo ser: 1. Opiáceos Naturais: derivados do ópio que não sofreram
nenhuma modificação (Ópio, Pó de Ópio, Morfina, Codeína); 2. Opiáceos Semi-Sintéticos: resultantes de
modificações parciais das substâncias naturais (Heroína); 3. Opiáceos Sintéticos ou Opióides: totalmente
sintéticos, são fabricados em laboratório e tem ação semelhante à dos opiáceos (Zipeprol, Metadona).
38
prática poderia minimizar os efeitos mais danosos da saúde dos indivíduos com ela
envolvidos.
No entanto, antes de se tornar um conceito e uma estratégia científica, a redução de
danos deu-se enquanto movimento político. Por volta dos anos 70, na Holanda, vinha sendo
estruturada uma política nacional tolerante às drogas. Antes mesmo da emergência da
epidemia da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS), houve a publicação do
documento pelo Comitê de Narcóticos, defendendo a premissa de que a política de drogas
deveria ser congruente com os riscos provocados pelas mesmas. Isso abriu caminho para
intervenções visando à redução de danos.
Segundo o Ministério da Saúde,
[...] o primeiro programa de redução de danos a trocar seringas no Brasil
surgiu em março de 1995, em Salvador (BA), e a primeira lei estadual a
legalizar a troca de seringas, de autoria do deputado estadual Paulo Teixeira,
foi sancionada no estado de São Paulo em março de 1998. Desde então,
outros estados e municípios aprovaram leis semelhantes (BRASIL, 2001,
p.13).
A forma de implantação da estratégia de redução de danos, no Brasil é a de programas
e projetos com um elenco de ações desenvolvidas em campo, por agentes comunitários de
saúde especialmente treinados, denominado de redutores de danos, que inclui troca e
distribuição de seringas, atividades de informação, educação, comunicação, aconselhamento,
encaminhamento e vacinação, entre outros.
O que importa não é determinar se um comportamento é bom ou ruim, certo ou errado,
mas sim se ele é seguro ou inseguro, e para tanto é preciso abandonar certos ideais tal como
uma sociedade sem drogas e encontrar formas alternativas para diminuir prejuízos que podem
ser gerados por determinadas práticas.
4.2 Princípios básicos, pressupostos e valores
A proposta de redução de danos centra sua atenção não no uso de drogas em si, mas
nas conseqüências ou nos efeitos do comportamento adicto. Como afirma Marlatt (1999,
p.46).
A redução de danos aceita o fato concreto de que muitas pessoas usam drogas
e apresentam outros comportamentos de alto risco, e que visões idealistas de
uma sociedade livre de drogas não têm quase nenhuma chance de tornarem-se
39
realidade. Ou seja, a redução de danos reconhece a abstinência como resultado
do ideal, mas aceita alternativas que reduzam os danos
.
Na redução de danos a abstinência é incluída como um ponto final ao longo de um
continuum, que varia de conseqüências excessivamente prejudiciais a conseqüências menos
prejudiciais. Em vez de estabelecer a abstinência como um pré-requisito para receber o
tratamento para dependência, os redutores de danos diminuem esses obstáculos e o fazem de
diversas maneiras, entre estas:
Estender a mão e formar parcerias e cooperação com a população-alvo no
desenvolvimento de novos programas e serviços, ou seja, os indivíduos são
aceitos como capazes de realizar mudanças pessoais em seus
comportamentos e de ajudar os outros a fazer o mesmo. Reduzir o estigma
que está associado à dependência de drogas e práticas sexuais de alto risco
(MARLATT, 1999, p.50).
Frente a isso, a redução de danos visa promover uma postura ativa frente a própria
saúde, por parte dos usuários, bem como oferecer mecanismo de apoio social.
Um outro princípio que norteia essa prática é a de que o comportamento prejudicial
acontece, e que é preciso então avaliar o que é possível fazer para reduzir o dano e o
sofrimento tanto para o indivíduo, quanto para a sociedade, ou seja, a redução de danos não
denigre nem rotula as pessoas que apresentam esses comportamentos de alto risco, até porque
sua atenção é desviada da pessoa em si para as conseqüências que seus comportamentos
podem causar.
Em nossa sociedade, o usuário de drogas não é reconhecido como cidadão e muitos
dos seus direitos acabam não sendo respeitados.
De acordo com o Ministério da Saúde,
[...] a violação dos direitos humanos e dos direitos da cidadania (direitos
básicos a partir da realidade de um dado país), tem sido uma prática
constante em nossa realidade, e os fatores que contribuem para essa situação
são muitos e de várias ordens. Ela expressa, em grande medida, o grau de
violência de nossas relações sociais e o nível de intolerância da sociedade
em conviver democraticamente com as diferenças (BRASIL, 2001, p.15).
No caso dos usuários de drogas, quando a sociedade não reconhece seus direitos como
cidadãos, acaba afirmando implicitamente que umas pessoas são mais cidadãs que as outras;
ou seja, acaba deixando a condição de cidadão em segundo plano em relação à de usuário de
40
drogas, pois primeiro a pessoa é julgada por fazer uso de drogas e em decorrência disso, perde
o reconhecimento como cidadão.
Afirma Marlatt (1999, p.48), “a dependência de drogas e AIDS são problemas tão
estigmatizados e contaminados pela reprovação moral que os indivíduos que sofrem desses dois
problemas, de modo associado acabam ainda mais marginalizados pela sociedade”.
A proibição não conseguiu diminuir o abuso de drogas, ela é responsável por grande
parte da criminalidade, da corrupção, das doenças e das mortes associadas as drogas, e que
seus custos aumentam cada ano. Mas como afirma Marlatt (1999, p.258) “a legalização pode
ser vista como politicamente insensata e que com ela corre-se risco de aumentar o uso de
drogas”.
Segundo Bucher (apud MARLATT, 1999, p. 1) os defensores da redução de danos
invocam, em suas argumentações, razões éticas e humanitárias. Entre esses argumentos, estão
os seguintes:
a) É inaceitável abandonar e discriminar os usuários que não desejam ou não
conseguem largar as drogas;
b) As medidas visam manter os dependentes dentro da rede sanitarista para poupá-los
da marginalização e de danos físicos e psíquicos maiores;
c) A medida de troca de seringas contém toda uma vertente preventiva em relação à
AIDS e outras doenças infecciosas, a ser levada em conta quando se avalia o custo
social da saúde pública;
d) As decisões políticas devem se basear na responsabilidade coletiva, não podendo
referir-se apenas à perspectiva individual do ideal de abstinência de um
determinado usuário ou tratamento terapêutico; estas devem considerar todos os
fatores intervenientes de uma política coerente de saúde.
Enfim, todas as ações do Programa de Redução de Danos devem estar voltadas ao
resgate da inclusão social e do rompimento da marginalização dos usuários de drogas, além de
evitar possíveis danos causados pelo uso de drogas. E isso depende de uma relação franca e
respeitosa para com os usuários.
4.3 Áreas e estratégias de atuação
A partir dos métodos e procedimentos da redução de danos emergem três estratégias
básicas de trabalhar com indivíduos ou grupos, que de acordo com Marlatt (1999, p.52) são:
educar, modificar o ambiente e implementar mudanças nas políticas públicas.
41
No trabalho com indivíduos ou grupos, a educação é a chave para prevenção e para
tentar minimizar os danos relacionados ao uso de drogas e ao comportamento sexual de alto
risco. Esse processo de educação visa aumentar a consciência sobre os comportamentos de
alto risco e de suas conseqüências, incentivando comportamentos que promovam a saúde e
reduzam os riscos.
Quanto à segunda estratégia, diz respeito aos recursos ambientais, pois sem estes não é
possível atingir as metas de redução de danos, ou seja, se um usuário de droga injetável não
tem acesso a seringas limpas ou não consegue encontrar um lugar seguro para injetar-se, a
motivação e as habilidades necessárias para as práticas de redução de danos tornam-se
irrelevantes.
Já a terceira estratégia, refere-se às políticas públicas, uma vez que estas afetam a
disponibilidade ambiental de instrumentos de redução de danos, como a provisão de seringas
limpas para usuário de droga injetável ou a distribuição de preservativos entre jovens
sexualmente ativos.
As estratégias de ação com usuário de droga injetável variam de país para país
conforme a demanda, porém no geral essa estratégia envolve troca ou distribuição de seringas,
ambas com o mesmo objetivo de evitar o compartilhamento destas. Essa troca pode ser feita
em postos de trocas fixos ou móveis, em serviços de saúde ou com visitas dos redutores em
locais freqüentados por usuários.
Diante do fato de que o uso de drogas injetáveis oferece um sério risco de saúde
pública na transmissão do HIV e outros vírus, são necessárias abordagens de prevenção
simples e acessíveis. Entre estas abordagens, a distribuição de alvejantes foi a primeira
estratégia de redução de danos aplicada na prevenção de infecções pelo HIV entre usuário de
droga injetável nos Estados Unidos da América. Os usuários foram ensinados a lavar seus
equipamentos de injeção de drogas para inativar o HIV. No entanto, segundo Marlatt (1999,
p. 182), apesar do valor prático documentado sobre essa abordagem, a distribuição de
alvejantes foi subestimada pela saúde pública e pelas campanhas nacionais.
Esta prática foi acusada de ser uma “política social de recuo” ou uma resposta
insuficiente para os reais problemas da dependência de drogas. Também foram levantadas
questões referentes aos outros riscos à saúde que poderiam ocorrer se o alvejante não for
suficientemente retirado da seringa, o que pode ocorrer se o usuário estiver sob efeito da
droga, sem condições de realizar a limpeza. Frente a isso, o programa que prevaleceu em
relação aos usuários de drogas injetáveis, foi a da troca ou distribuição de seringas.
Segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2001, p.28), os programas de Redução de
42
Danos (PRD) nacionais têm adotado, de acordo com as respectivas realidades locais, as
seguintes modalidades de troca:
a) Diretamente com o redutor, em campo, em postos de trocas fixos ou móveis e em
serviços de saúde; sem a presença do redutor, em residências ou estabelecimentos
comerciais com os amigos ou colaboradores do projeto (moradores da comunidade
que atuam como voluntários);
b) Todos os programas de redução de danos existentes no Brasil dão preferência pela
realização da troca, pois esta prática garante a retirada de circulação das seringas
usadas de imediato, impedindo possíveis contaminações.
No entanto algumas vezes a prática de troca não se torna possível, uma vez que os
usuários de drogas injetáveis saem rapidamente do local de uso, não recolhendo suas seringas,
impedindo que ocorra a troca destas seringas por novas. Diante dessas limitações, como
afirma Marlatt (1999, p.184), a equipe de redução de danos deve pensar estratégias para
superá-las já que a troca é mais eficaz do que a distribuição das seringas. Dentro dessas
estratégias há uma proposta de envolver as farmácias no projeto como postos de troca, porém
isso ainda é muito recente no Brasil.
Outra ação de redução de danos frente aos usuários de drogas injetáveis, diz respeito a
informações, educação e comunicação.
As epidemias, especialmente a Aids, têm nos ensinado que a prevenção não
deve ser reduzida a campanhas de massa, distribuição de materiais
educativos e veiculação de informação. Prevenção é o resultado de cada uma
dessas ações na sua relação com os sujeitos concretos que se tornam capazes
de modificar comportamentos e atividades diante de situações ou práticas
socioculturais que oferecem riscos ou danos à saúde (BRASIL, 2001, p.36).
As informações veiculadas pela equipe de redução de danos esclarecem questões
referentes às drogas, aos direitos dos usuários, bem como serviços existentes para atender suas
demandas.
Entre suas práticas, também realizam aconselhamento e encaminhamentos, fazendo
atendimentos individuais quando necessário. Realizam também imunização dos usuários de
drogas injetáveis contra hepatite B e vigilância epidemiológica, a fim de fazer um
levantamento de dados acerca do perfil sócio econômico desses usuários e de suas práticas,
além de outros dados relevantes.
De acordo com o Ministério da Saúde (2001, p.35), a maioria dos programas de
redução de danos nacionais atua nos espaços de interação social dos usuários de drogas
43
(injetáveis e não injetáveis), em locais de compra e consumo de drogas. Essas intervenções
exigem atitudes éticas como respeito ao sigilo e privacidade, requisito básico em qualquer
atividade. É um espaço onde os usuários tiram suas dúvidas, contam experiências e trocam
informações, podendo com isso conscientizar-se dos perigos que envolvem o uso de drogas e
sua relação com doenças sexualmente transmissíveis e com o vírus da síndrome de
imunodeficiência adquirida.
O fenômeno da epidemia, aliado a disseminação do consumo de drogas, trouxe à
redução de danos o desafio de trabalhar com usuários de outras drogas, como o crack, (devido
sua alta toxidade aliada ao compartilhamento de “canudos” e “cachimbos” para consumo),
usuários de bebidas alcoólicas, maconha e ecstasy, pois tais drogas deixam os usuários
vulneráveis às DST, ao HIV, à hepatite, à tuberculose e a outras doenças.
Entre suas diversas áreas de atuação estão os projetos dirigidos a crianças e
adolescentes em situação de risco, com os quais tentam estabelecer relação de
confiança a partir do atendimento na rua com o objetivo de reforçar as
capacidades de socialização da criança mediante o incremento de autodefesas
não violentas e de uma reestruturação psíquica condizente com a consciência
da própria dignidade e da identidade individual (BRASIL, 2001, p.88).
A atuação frente a esta população vai além da disponibilização de informações e
orientações sobre o uso de drogas e sobre DST/AIDS, e de insumos de prevenção. A redução
de danos propõe-se a atuar em parceria com instituições, visando à criação de espaços de
acolhimento, onde o foco de intervenção não é o consumo de drogas em si, mas a promoção
alternativa de lazer, saúde e cidadania.
Outra área de atuação da redução de danos é com a população carcerária, onde, como
mostram os dados estatísticos há usuário de droga injetável. Segundo Koller (1996 apud
BRASIL, 2001, p.90), na cadeia pública de Itajaí, Santa Catarina, um estudo de 1996 mostrou
uma prevalência de 19,9% de infecção pelo HIV entre os internos, predominantemente
vinculados ao uso compartilhado de seringas.
No entanto há muitas dificuldades em implantar o programa nas prisões, devido a
objeções práticas, legais e políticas, pois o programa de troca de seringas implica no
reconhecimento e aceitação da disponibilidade de drogas na prisão e a distribuição de
preservativos demanda a aceitação da existência de práticas homossexuais.
Apesar disso, segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2001, p.91), vários países
europeus (Espanha, Suíça, Itália) vem obtendo resultados positivos com a implantação da
redução de danos em presídios.
44
Nesse contexto a redução de danos deve, segundo o Ministério da Saúde, trabalhar a
sensibilização dos gerentes de sistema prisional e capacitação dos funcionários para a
necessidade da implantação e implementação de programas de prevenção e promoção da saúde.
A ação da redução de danos também está voltada aos Travestis usuários de silicone
injetável, com quem realizam orientação quanto aos perigos das substâncias de má qualidade
e falta de higiene, que podem provocar infecções (AIDS, hepatite, além de outros vírus), bem
como orientações sobre aplicações mais seguras, não compartilhamento de seringas, além de
favorecer a utilização de hormônios de forma orientada e controlada.
Outra população alvo das ações do programa de redução de danos são os Usuários de
anabolizantes, para os quais disponibilizam equipamentos para injeção segura, informação e
orientação sobre a substituição das drogas por anabolizantes não esteróides, como os
aminoácidos, implementação de oficinas de sensibilização e capacitação de grupos com
jovens fisiculturistas e profissionais de saúde, além de ações de mobilização em academias de
musculação e artes marciais.
O campo de atuação dos programas de redução de danos, como se pode perceber, é
bastante amplo e diversificado, e independente da população trabalhada, há um conceito
adotado pela redução de danos, que serve de base em qualquer intervenção, trata-se do
conceito de “população-sujeito”. Este conceito traz para o campo da redução de danos, da
prevenção e da promoção à saúde, a noção de “protagonismo”, onde os agentes de saúde
deixam de lado, em sua prática, a relação de poder com o usuário, passando a compreender
que seu conhecimento é valioso, mas apenas complementar ao saber que o outro tem de sua
própria vida. Para haver mudança o usuário deve se perceber enquanto agente e assumir
responsabilidades sobre seus comportamentos.
4.4 Equipe, material e trabalho de campo
A denominação do termo “redutor de danos” foi adotada para nomear todas as pessoas
que fazem parte da equipe de redução de danos. Essas equipes atuam nos programas
nacionais e são bastante diversificadas. Incluem profissionais de saúde, trabalhadores sociais,
voluntários e os multiplicadores (usuários capacitados para realizar o recolhimento, a troca de
seringas e os encaminhamentos de outros usuários aos serviços de saúde). A importância do
usuário e ex-usuário de drogas na equipe está relacionada com o conhecimento que estes
possuem quanto aos locais de uso, aos rituais de injeção e à linguagem, além de não
precisarem de autorização para freqüentar os locais de uso. No entanto há certos riscos, com
45
os quais a equipe deve estar preparada, como os casos de dependências judiciais,
envolvimento com o tráfico e recaídas por parte dos ex-usuários. (BRASIL, 2001, p.67).
A inserção de técnicos na equipe tem como vantagens o conhecimento desses com
relação à farmacologia das drogas, os prejuízos causados à saúde em função do uso e sobre os
recursos disponíveis.
De acordo com o Ministério da Saúde (BRASIL, 2001, p.68), o convívio dos vários e
diferentes membros da equipe é um processo de aprendizagem permanente. De forma geral é
a existência de diferentes categorias de redutores de danos que constitui a riqueza do trabalho
de campo.
O treinamento das equipes varia de acordo com o contexto regional, geográfico e
cultural, bem como a inserção institucional desses projetos e a história de implantação e
implementação da proposta, que para cada projeto tem suas peculiaridades.
Os equipamentos utilizados pelas equipes são:
a) Insumos para os kits de redução de danos (estojo contendo seringas, agulhas,
frascos de água destilada, recipientes para diluição, compressas com álcool para
anti-sepsia, e preservativos), alguns projetos ainda distribuem garrotes para
facilitar a visualização e punção de veias;
b) Equipamentos de proteção individual (botas, luvas);
c) Pinça, lanterna, caixa coletora, mochila e capa de chuva;
d) Materiais educativos e de informação (folder, cartazes, álbuns seriados, fitas de
vídeo).
Esses materiais são distribuídos aos usuários, visando conscientizá-los da necessidade
de certos cuidados frente ao uso de drogas para a saúde individual e coletiva, uma vez que
esses cuidados podem evitar a disseminação de certos vírus:
A disponibilização permanente de materiais de prevenção, tais como
preservativos e equipamentos para injeção segura, além de sua função
relacionada aos objetivos da redução de danos, é uma questão fundamental
para a credibilidade e aceitação do projeto pela comunidade, para que a
população reconheça os redutores de danos como agentes de saúde (BRASIL,
2001, p.51).
As primeiras estratégias dos redutores de danos, indicadas pelo Ministério da saúde,
são buscar informações quanto às áreas conhecidas como locais de tráfico e uso de drogas, e
descobrir o número de portadores de HIV, hepatite e de usuários de drogas injetáveis. Após
esse levantamento de informações, o redutor de danos deve ir a campo para realizar o
46
mapeamento das áreas indicadas pelo levantamento, através de contatos com pessoas
estratégicas como donos de bares, policiais, associação de moradores e os próprios usuários
de drogas.
A partir daí faz-se à abertura de campo onde os redutores passam a conhecer e a criar
vínculo com a população alvo, conhecer os códigos culturais, as linguagens dos mesmos,
além de estabelecer os objetivos e os limites do trabalho.
É claro que não há receita pronta para a atuação do redutor de danos, tudo depende do
contexto e da demanda. O importante é que o mesmo tenha objetivos e limites bem definidos,
clareza e consciência do seu papel para se adequar à sua realidade e conquistar espaço.
4.5 Críticas à redução de danos e provas de efetividade
Os argumentos contrários aos projetos foram se modificando à medida que foram
sendo esclarecidos. O primeiro argumento, segundo Mesquita (1998, p.103), contrário era o
de que nos países onde a droga ilícita de eleição era a heroína seria possível estabelecer
intervenções de redução de danos, como a troca de seringas, mas aqui no Brasil, onde a droga
eleita pelos usuários de drogas injetáveis é a cocaína, isso jamais daria certo.
Esse argumento foi refutado, quando constatou-se que os usuários de drogas injetáveis
das cidades do Canadá, onde a droga eleita também é a cocaína, demonstraram ser suscetíveis
às estratégias de redução de danos.
Outro argumento que não prevaleceu, foi o de que a população de usuários de drogas
injetáveis é demasiadamente refratária e que dificilmente empreenderia qualquer modificação
de comportamento. Porém, estudos demonstraram que tais usuários são capazes de modificar
comportamentos em relação à não compartilhar seringas usadas.
O argumento de que a distribuição de seringas incentiva o uso de drogas, foi
derrubado, por um estudo norte americano, citado por Mesquita (1998, p.104), que analisou
inúmeros projetos de redução de danos nos Estados Unidos, Canadá e Europa e demonstrou
que a redução de danos não aumentou o uso de drogas, mas em alguns lugares contribuiu para
sua diminuição.
No entanto, por ser um tema recente, principalmente no Brasil, muitos obstáculos
ainda persistem.
Entre os estudos que destacam a efetividade do projeto, está o estudo de
comparação entre as taxas de conversão do HIV entre UDI em cidades com
47
PRD e outras sem o projeto. Esta avaliação das taxas de HIV com base na
disponibilidade de PRD no mundo todo, revelou que as cidades que possuem
o projeto apresentam diminuição nas taxas de conversão de 6% ao ano, ao
passo que as cidades sem o projeto sofrem aumentos de 6% ao ano
(HURLEY; FOLLEY e KALADOR, apud MARLATT, 1999, p.186).
De acordo com Marlatt (1999, p.187) alguns autores sugeriram que as mudanças de
comportamento de uso de drogas injetáveis podem servir para promover comportamentos
sexuais mais seguros e maior preocupação com a saúde em geral.
Frente a esses dados, muitas resistências à prática da troca de seringas estão baixando,
o que facilita a atuação dos programas de redução de danos. Propõe-se uma interação entre
todas as estratégias de combate às drogas e seus danos, além disso, o contato e a comunicação
entre a redução de danos e a rede de saúde devem ser permanentes, para controlar e minimizar
o problema.
48
5 MARCO REFERÊNCIAL METODOLÓGICO
5.1 Avaliação em saúde
Este capítulo descreve o marco teórico da Avaliação em Saúde, base de todo
procedimento metodológico do presente estudo, bem como o marco teórico da redução de
danos. Descreve, também, o procedimento metodológico aplicado para caracterizar a equipe
estudada, o método de análise e as questões éticas envolvidas.
Com base na definição de Tanaka (2001), avaliar significa expor um valor assumido a
partir do julgamento realizado com base em critérios previamente definidos. Ao avaliar,
identificamos uma situação específica reconhecida como problema e utilizamos instrumentos
e referências para emitir um juízo de valor, inerente a este processo. Desse modo, a avaliação
deverá ser também compreendida como uma estratégia para decidir como enfrentar e resolver
problemas.
De acordo com o conceito de Contandriopoulos (2001), “Avaliar consiste
fundamentalmente em fazer um julgamento de valor a respeito de uma intervenção ou sobre
qualquer um de seus componentes, com o objetivo de ajudar na tomada de decisões”. Este
julgamento pode ser resultado da aplicação de critérios e normas (avaliação normativa) ou se
elaborar a partir de um procedimento científico (pesquisa avaliativa).
O referencial teórico utilizado para serviço, sistema ou programa objeto de avaliação é
a concepção sistêmica de Donabedian (1980, apud TANAKA, 2001), que desenvolveu um
quadro conceitual fundamental para o entendimento da avaliação de qualidade em saúde, a
partir dos conceitos de estrutura, processo e resultado, classicamente considerados uma tríade,
que corresponde às noções da Teoria Geral de Sistemas.
Estrutura corresponde às características mais estáveis, refere-se aos objetivos, recursos
físicos, humanos e financeiros. Envolve desde estrutura física e disponibilidade de
equipamentos até a capacitação dos indivíduos que prestam a assistência, passando pela
organização dos serviços. Dentro dessa conceituação, cabem tanto dados numéricos em
termos de recursos disponíveis quanto à qualificação profissional, qualidade do equipamento,
existência de manutenção predial e de equipamentos, entre outros.
O Processo abrange todas as atividades desenvolvidas entre os profissionais de saúde e
os pacientes. É no processo que aparecem os aspectos éticos e da relação
médico/profissional/equipe de saúde-paciente. Tudo o que diz respeito ao tratamento
49
diretamente e no momento em que ele está ocorrendo pode ser considerado como processo. É
de acordo com o processo de trabalho de tal equipe que se obtêm os resultados da assistência
prestada, é de onde se retiram as bases para a valoração da qualidade.
É com base na estrutura e no processo que se chega ao resultado, que é o processo
final da assistência prestada, considerando saúde, satisfação de padrões e de expectativas.
De acordo com Donabedian (1980, apud TANAKA, 2001), para que as mudanças no
estado de saúde correspondessem à mensuração precisa da qualidade da assistência prestada,
seria preciso que as demais causas de mudança, também envolvidas na obtenção do mesmo
resultado, fossem eliminadas ou controladas. A atribuição de pesos específicos medindo a
influência de cada um desses aspectos nos resultados finais da assistência médica permanece
tarefa não resolvida, mas não se pode negar a inter-relação entre esses fatores, ainda que de
difícil mensuração.
Donabedian desenvolveu suas reflexões a partir do cuidado médico ou de saúde
prestado individualmente e dentro das perspectivas da garantia de qualidade, isto é, a partir do
monitoramento do desempenho clínico visando melhorar a qualidade. Para esse autor, o
desempenho da atividade médica é o tema central e tudo se passa a partir da ótica desse
profissional. Em parte, essa visão se deve ao receio da perda da “utilidade analítica” que a
ampliação do conceito de qualidade traria. Inicialmente, atribuiu três dimensões à qualidade:
conhecimento técnico-científico, relações interpessoais entre os profissionais e o paciente e
amenidades, isto é, condições de conforto e estética das instalações e equipamentos no local
onde a prestação ocorre.
Em outro modelo, Donabedian (1990, apud MALIK; SCHIESARI, 2005) ampliou o
conceito de qualidade, utilizando o que chamou de “sete pilares da qualidade”: eficácia,
efetividade, eficiência, otimização, aceitabilidade, legitimidade e eqüidade. A eficácia
consiste na habilidade do cuidado para melhorar a saúde. Significa o melhor que se pode fazer
nas condições mais favoráveis, dado o estado do paciente e mantidas constantes as demais
circunstâncias. São os resultados obtidos em curto prazo. A efetividade é o grau em que a
melhora da saúde é atingida. Está relacionada aos resultados produzidos num contexto social
específico, que devem ser os mais amplos possíveis. Eficiência é a habilidade de atingir
melhora na saúde a custo mais baixo. Se duas estratégias de cuidado são igualmente eficazes e
efetivas, a mais eficiente é a de menor custo. A otimização torna-se relevante à medida que os
efeitos do cuidado da saúde não são avaliados em forma absoluta, mas relativamente aos
custos. É o equilíbrio mais vantajoso entre custo e benefício. A aceitabilidade é sinônimo de
adaptação do cuidado aos desejos, expectativas e valores dos pacientes e de suas famílias.
50
Depende da efetividade, eficiência e otimização, além da acessibilidade do cuidado, das
características da relação médico-paciente e das amenidades do cuidado. A legitimidade é
aceitabilidade do cuidado da forma em que é visto pela comunidade ou sociedade em geral. A
equidade diz respeito à honestidade, justiça em relação à distribuição do cuidado e de seus
efeitos na saúde. (DONABEDIAN, 1994)
A presente categorização tem por objetivo a sistematização da complexidade da saúde,
permitindo que, a partir dela, se estabeleçam indicadores, específicos para cada uma das
dimensões consideradas.
Tais indicadores referem-se às variáveis, características ou atributos da Estrutura, dos
Processos ou dos Resultados que são capazes de sintetizar, representar ou dar maior
significado ao que se quer avaliar. Pode ser representado como uma variável numérica,
podendo ser um número absoluto ou uma relação entre dois eventos, ou ainda como uma
qualidade do evento.
O indicador serve justamente para direcionar a avaliação. Dentre as diversas variáveis
existentes em cada situação específica, será escolhida aquela que estiver relacionada com o
que se deseja avaliar.
Dessa maneira, de acordo com o método de Donabedian, a escolha de um indicador de
Estrutura pode auxiliar uma tomada de decisão de investimento ou de provimento de recursos
necessários para o sistema, serviço ou programa. A escolha de um indicador de Processo está
direcionada à tomada de decisão referente à otimização ou utilização racional da dinâmica
implementada, enquanto a escolha de um indicador de resultados está direcionado à tomada
de decisão de prosseguimento ou não da intervenção realizada.
5.1.1 Redução de danos
O enfoque adotado sobre a redução de danos é sob a perspectiva de três autores que,
entre outros, se destacam na literatura sobre esse assunto. Fábio Mesquita (1994), Francisco
Inácio Bastos (1994) e Alan Marlatt (1999).
A história pessoal de Mesquita revela esforços que começaram no final dos anos 80
para diminuir os danos causados pelo uso de drogas sob políticas repressivas. O maior porto
do país, Santos já foi chamado de “Moscou brasileira”, por receber marinheiros e contrabando
de todo o mundo. Havia também uma preocupação por parte da indústria do turismo porque
Santos é uma cidade turística e havia muita pressão para não se falar sobre o problema.
Mesquita tornou-se o primeiro diretor do programa de Doenças Sexualmente Transmissíveis
51
da cidade. A primeira coisa feita foi reconhecer que a AIDS era um problema agudo.
Trabalhou no sentido de que Santos fosse conhecida pelo sucesso da prevenção e não pela
epidemia (Id, ibid, 2003).
No primeiro ano foram distribuídas camisinhas e conduzida uma campanha de
educação pública sobre o sexo seguro. Também passou-se a encaminhar portadores de AIDS
para moradias e treinado trabalhadores de campo para conversar com as profissionais da
indústria do sexo. Segundo Al Giordano (2003), foi quando se depararam com o fato de que
muitos dos pacientes soro positivo eram usuários de drogas injetáveis. Passaram então a
estudar sobre os programas implementados em locais como a Holanda, Austrália, Califórnia e
em algumas partes dos Estados Unidos, e decidiram implantá-lo em Santos. No entanto foram
barrados por questões judiciais e a implementação acabou não ocorrendo, como descrito a
seguir:
A medida gerou imensa polêmica nacional em todos os meios de
comunicação e fóruns de debate específicos, após o Ministério público de
Santos enquadra-la como crime, previsto na lei vigente sobre drogas no
Brasil. De acordo com a interpretação daquele momento, a proposta se
chocava com um dos artigos da referida lei, que considera crime qualquer
forma de auxílio/incentivo àqueles que se utilizam de substâncias
entorpecentes (MESQUITA, 1994, p.169).
Em 1995, a cidade de Salvador, capital do estado da Bahia tornou-se a primeira cidade
brasileira a realmente distribuir seringas limpas e, ao contrário do que aconteceu em Santos,
as autoridades toleraram o programa.
Em março de 1998, Mesquita e outros brasileiros organizaram a Conferência
Internacional de Redução de Danos em São Paulo com a presença de mais de mil delegados
de todo o mundo. E com isso conseguiram fazer com que a lei fosse assinada pelo governador
do estado, legalizando a prática de troca de seringas.
O estado de Santa Cataria rapidamente aprovou a lei, portanto outro estado brasileiro
havia abraçado a proteção dos redutores de danos. O estado do Rio Grande do Sul, desde sua
capital Porto Alegre, logo se tornou o terceiro estado brasileiro a aprovar uma lei que protegia
as ações de redução de danos.
De acordo com Al Giordano (2003, p.1), em quatorze anos, a paisagem melhorou
radicalmente para o trabalho de Fábio Mesquita e muitos outros pioneiros da redução de
danos no Brasil.
As publicações organizadas por Mesquita juntamente com Francisco Inácio Bastos
retratam justamente a atuação da redução de danos nos estados brasileiros e sua importância
52
frente ao problema do HIV/AIDS, retratando a situação epidemiológica no Brasil, que
segundo esses autores justifica toda essa preocupação, como colocado na seqüência.
Fica evidente que a questão da difusão do HIV entre usuários de drogas
injetáveis constitui quadro muito complexo e relativamente novo, o que
reforça a necessidade de uma política inovadora que vise controlar a
epidemia de HIV/AIDS entre usuários de drogas injetáveis no nosso país, e
que, em conseqüência, tenha também impacto sobre o consumo de drogas
em nosso meio (MESQUITA, 1994, p.179).
Segundo Mesquita e Bastos (1994, p.172), sem dúvida o marco teórico-político mais
importante foi a conferência sobre AIDS dos ministérios da saúde dos países Ibero-Americanos.
Realizada em maio de 1993, em Brasília, ela definiu a questão da AIDS como problema sócio-
econômico da maior relevância para os países em questão. Entre outras medidas, foi aprovado o
texto que dizia: “as estratégias de sucesso em outros países como a distribuição de hipoclorito
de sódio para a desinfecção das seringas, bem como a própria distribuição das seringas devem
ser testadas nos países presentes, sendo avaliada sua eficácia”.
Foi a partir dessa iniciativa que a redução de danos ganhou seu primeiro documento
oficial de apoio em muitos países. Sendo que dentre os demais países da América do Sul,
segundo Bastos (1999) o Brasil se destaca na medida em que movimentos sociais de base e
agentes da área de saúde pública souberam sensibilizar a opinião pública e pressionar as
autoridades políticas a adotarem medidas não convencionais de prevenção à AIDS, como o
programa de troca de seringas e a distribuição de preservativos aos jovens.
De acordo com G. Alan Marlatt (1999), da Universidade de Washington, a redução de
danos é um desafio político em nossa sociedade de espírito democrático ainda cambaleante,
pois é preciso adotar políticas sociais que reconheçam a legitimidade da pluralidade de modos
vida e atuar a partir da aceitação dessa realidade. Uma vez que a redução de danos, dentro de
seus princípios de atuação, evita ações punitivas para comportamentos não aceitos
socialmente, estabelecendo metas pragmáticas e isentas de julgamento de valor para minorar
os riscos que tais comportamentos podem causar àqueles que o praticam e à sociedade como
um todo.
5.2 Procedimentos Éticos
Inicialmente foi solicitada a autorização para realização da pesquisa na instituição de
interesse, onde se obteve a aprovação pelo Coordenador do Programa de Redução de Danos
53
do município de Balneário Camboriú, bem como da Coordenadora do Programa de
DST/HIV/AIDS deste município. O estudo e seus objetivos foram apresentados a todos os
integrantes da equipe e entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (apêndice A)
deixando claro o grau de anonimato da pesquisa, preservando os parâmetros da lei 196/90,
que resguarda os direitos dos envolvidos, protegendo sua identidade. Tal documento foi
assinado e devolvido a pesquisadora. Houve ainda a garantia de entrega de uma cópia do
estudo realizado, bem como uma exposição dos resultados obtidos à equipe estudada.
Na continuação o projeto foi encaminhado à Comissão de Ética em Pesquisa da
UNIVALI, obtendo o parecer n. 537/2005, que subscreve a aprovação para dar início à
pesquisa.
5.3 Materiais e métodos
Os materiais utilizados foram artigos, livros, manuais, textos, diário de campo,
documentos de registros e os dados colhidos pela observação da pesquisadora realizada no
ambiente de trabalho.
Com relação aos métodos, foram realizadas pesquisas bibliográficas, analise
documental e observação participante e organizadas de acordo com os três pilares: Estrutura,
processo e resultados.
Esta pesquisa debruçou-se sobre dois aspectos básicos do ponto de vista da avaliação
em saúde:
a) Coleta de informações sobre as atividades, as características e as realizações
práticas do programa de redução de danos do município de Balneário Camboriú.
b) Emissão de julgamentos sobre o programa enquanto caso particular, específico do
município estudado, porém levando em conta o contexto social contemporâneo que ele se
encaixa. Este contexto compreende duas escaladas epidêmicas:
b.1) A escalada das dependências psicoativas, ou seja, há um incremento mundial e
local do consumo de drogas ilícitas.
b.2) A escalada da síndrome de imunodeficiência adquirida;
O mesmo contexto compreende também:
b.3) Uma época da história da saúde pública que gestou e está iniciando a divulgação
do conceito de promoção em saúde;
b.4) O acirramento das discussões sobre as formas de fazer prevenção e promoção, no
nível municipal, sob gestão local.
54
5.3.1 Tipificação da pesquisa
Esta pesquisa é do tipo avaliativo, através de analise documental e observação
participante. Os dados serviram para conhecer a organização e o funcionamento de um
Programa de Redução de Danos do município de Balneário Camboriú, Santa Catarina.
De acordo com Contandriopoulos (2006), Nosso raciocínio se baseia na idéia de que
avaliar pode ser definido como uma atividade que consiste fundamentalmente em aplicar um
julgamento de valor a uma intervenção, através de um dispositivo capaz de fornecer
informações cientificamente válidas e socialmente legítimas sobre ela ou qualquer um dos
seus componentes, permitindo aos diferentes atores envolvidos, que podem ter campos de
julgamento diferentes, se posicionarem e construírem (individual ou coletivamente) um
julgamento capaz de ser traduzido em ação. Este julgamento pode ser o resultado da aplicação
de critérios e normas (avaliação normativa) ou, ser elaborado a partir de um procedimento
científico (pesquisa avaliativa).
Para a coleta de dados, foram realizadas análise documental e observação participante,
a fim de entender as representações, os conceitos e a estruturação do projeto. Bardin (1979, in
Kakehashi, 1998, p.44) considera que:
A análise documental é um conjunto de operações que através do tratamento das
informações contidas nos documentos acumulados, objetiva a representação
condensada e de forma conveniente da informação. Com o uso de procedimentos de
transformação busca o armazenamento de informações de modo variável e facilita o
acesso as mesmas, para que obtenha o máximo de dados (aspecto quantitativo) e
com o máximo de pertinência (aspecto qualitativo).
Os documentos analisados foram os registros, relatórios de campo e relatórios de
progresso da equipe estudada (em anexo).
Foi adotada a observação participante como procedimento metodológico, juntamente
com a análise documental, por permitir uma visão mais ampla da instituição estudada. Como
afirma Backer (1999), A observação participante é muito mais do que mergulhar em dados, o
pesquisador de campo, devido sua presença constante, coleta muitos dados, pode perceber as
relações sociais envolvidas, as opiniões, ações e discursos, que enriquecem a pesquisa e
facilitam o entendimento do fenômeno estudado.
Este procedimento foi utilizado no decorrer de toda pesquisa, procurando observar e
participar de muitas atividades da equipe, o que possibilitou verificar a conduta adotada pelos
funcionários da equipe entre si, com a população atendida e com outros serviços direta ou
55
indiretamente ligados ao programa de redução de danos.
As vivências e conteúdos observados foram registrados em notas de campo. Depois de
concluída esta etapa iniciou-se a fase de análise, através do método de avaliação em saúde do
Donabedian.
Tal processo de avaliação divide-se em três pilares: avaliação da estrutura, que são os
recursos físicos, materiais e financeiros. Avaliação do processo, que são todas as atividades
realizadas pelo projeto e a avaliação dos resultados. Trata-se, portanto de uma avaliação
formativa, na qual a preocupação central reside em coletar dados para reorientação do processo
estudado.
Depois de organizado os dados, categorizando-os nestes três pilares propostos por
Donabedian (1994) - estrutura, processo e resultados - são encontrados os indicadores, que
são variáveis, características ou atributos de estrutura, processo ou resultado, capaz de
sintetizar ou representar o que se quer avaliar. Ele é, portanto, válido para o contexto
específico do que se está avaliando.
5.3.2. Campo de pesquisa
O estado de Santa Catarina está dividido em vinte micro-regiões, entre as quais a
micro-região da Foz do Rio Itajaí (AMFRI) que é composta pelos seguintes municípios: Itajaí,
Balneário Camboriú, Camboriú, Ilhota, Itapema, Luiz Alves, Navegantes, Penha, Piçarras,
Porto Belo e Bombinhas.
De acordo com o Plano Municipal de Saúde de Balneário Camboriú (2005), dados
publicados no Plano Integrado de Desenvolvimento Socioeconômico (PSIDSE) em 1990
caracterizam a micro-região da Foz do Rio Itajaí como a mais importante região litorânea de
veraneio e turismo do Estado e do Sul do país.
Destaca-se também por ser o terceiro maior pólo receptor de visitantes estrangeiros. O
município de Balneário Camboriú lidera a preferência entre aqueles que vêm dos países do
Cone Sul.
Segundo dados do IBGE (2005), Em 2005 a população estimada é de 96.000
habitantes, sendo predominantemente urbana, uma das causas prováveis é atribuída ao fato de
Balneário Camboriú ser uma cidade com sua economia voltada para o turismo e grande parte
da população trabalha nos bares, hotéis e restaurantes, ou cedem suas casas para aluguel nos
56
meses de verão. A população que poderia ser caracterizada como rural, exerce atividade
pesqueira.
No setor saúde, de acordo com o plano municipal (2005), no final dos anos 80, com a
implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), ocorreram mudanças em toda a infra-
estrutura administrativa, ou seja, houve a descentralização da equipe atuante, surgindo nova
equipe com a separação dos setores epidemiológicos e sanitários, encerrando assim o trabalho
conjunto.
Dentre os serviços de saúde oferecidos à população, está o Programa Municipal
DST/AIDS, criado no início da década de 90, devido à incidência de casos de Aids no
município, quando se constatou a necessidade de se criar no município, um programa que
assistisse a estas pessoas, que até então se dirigiam ao município de Itajaí, para receber
assistência.
Assim no mês de maio de 1993 tiveram início os atendimentos à população no
programa de doenças infecto-contagiosas no Posto de Saúde Central. Contavam, com um
espaço físico e materiais necessários que foram fornecidos pela Secretaria da Saúde de
Balneário Camboriú.
Em 1997, com a inauguração do CISS (Centro integrado de solidariedade e saúde), os
atendimentos às doenças infecto-contagiosas passaram a ser realizados na sede própria,
localizada na Rua 300. No CISS há em funcionamento os serviços do Hospital Dia (HD),
Centro de Testagem e Aconselhamento para o HIV (CTA), Serviço de Assistência
Especializada em doenças sexualmente transmissíveis (DST) e AIDS (SAE) e ambulatório de
tuberculose.
Em 2004, pela necessidade de uma área física maior, as ações do CISS e do Núcleo de
prevenção foram separadas em duas unidades. O Núcleo de Prevenção é onde estão
centralizadas as ações de prevenção das DST, AIDS e uso indevido de drogas. Composto por:
I). CTA – Centro de Testagem e Aconselhamento, que realiza os exames anti-HIV e sífilis.
II). Projetos de prevenção, onde é trabalhada a prevenção para populações específicas:
a) Educa Vida é uma parceria da Secretaria da Saúde com a Secretaria da Educação e
conta com duas pedagogas que realizam as atividades;
b) Bem-Viver: direcionado as mulheres da comunidade;
c) PRD: Projeto Redução de Danos, realizado entre os usuários de drogas;
d) Homem Saudável: direcionado aos homens em geral;
e) Produção e Saúde: realizado nas empresas;
f) Aprender: direcionado aos universitários
57
5.3.3. A Equipe Pesquisada
Dentre os programas de prevenção existentes no Núcleo de Prevenção para
DST/HIV/AIDS, está o programa de Redução de Danos, foco desta pesquisa.
O Programa de Redução de Danos é uma estratégia de saúde pública para minimizar
os danos causados por práticas de uso de drogas. O Ministério de Saúde criou um “Manual de
Redução de Danos”, que direciona as equipes quanto a princípios éticos, formação de equipe
e atuação em campo. No entanto, cada município tem suas particularidades que demandam
ações específicas por parte do programa.
O programa de Redução de Danos do município de Balneário Camboriú foi iniciado
no ano de 2001, a partir da iniciativa de profissionais que atuavam no programa DST/AIDS
do município de Balneário Camboriú. A equipe contava com uma coordenadora (Assistente
social), um psicólogo (atual coordenador) e quatro redutores.
Em 2002 a equipe passou por mudanças, o psicólogo do programa assumiu a
coordenação e houve mudança no quadro de redutores.
Em 2003 o programa foi reformulado, passando a atender, também, usuários de crack,
devido a demanda percebida pela equipe.
5.3.4. Procedimentos para Coleta de Dados
Após o percurso de elaboração do projeto, definição da metodologia utilizada, trâmites
burocráticos referentes às questões éticas da pesquisa, e apresentação dos objetivos do estudo
para equipe de redução de danos, deu-se início a coleta de dados. O procedimento utilizado no
início da coleta foi o da observação participante. A pesquisadora participou das reuniões de
equipe para entender a dinâmica do grupo e durante o período de dois meses foi a campo com
os redutores, onde foi possível coletar dados referentes a atuação dos redutores em campo, a
relação entre os membros da equipe e destes para com a população atendida, a forma de
registro, os campos visitados, a organização da equipe, ou seja, foi possível coletar dados
referentes a estrutura e o processo de trabalho da equipe. O segundo procedimento foi a
análise documental, quando foi estudado os registros feitos pela equipe e os relatórios de
campo e progresso.
A partir desse período os procedimentos de observação participante e análise
documental passaram a ser realizados paralelamente. Uma vez que os dados quantitativos
58
percebidos nos registros eram discutidos em reunião para maior entendimento da
pesquisadora, bem como para perceber a postura e o discurso da equipe diante dos registros e
dados apresentados por eles.
Todas as observações feitas foram registradas no diário de campo para serem
analisadas posteriormente.
A coleta foi organizada de acordo com o método de avaliação em saúde, proposto por
Donabedian (1994). Através dos procedimentos de observação participante e análise
documental foi possível coletar dados referentes a estrutura do programa, seu processo de
trabalho o os resultados alcançados, bem como a postura da equipe diante destes.
5.3.5 Procedimento para Análise dos Dados
Inicialmente os dados foram organizados em suas categorias de avaliação em saúde:
estrutura, processo e resultados. Em cada categoria foram encontrados referências que
facilitam o processo de análise e discussão.
As referências utilizadas para avaliar a estrutura foram: o espaço físico, sua
localização, facilidade de acesso, o número e a qualidade dos materiais informativos, número
e qualificação dos membros da equipe e financiamento do programa, organizados nas
seguintes categorias: recursos físicos, recursos humanos e recursos financeiros.
Para análise do processo foram utilizados os seguintes designativos: histórico do
programa, organização da equipe e rotina de trabalho, relação entre os membros da equipe e
destes para com a população atendida, postura diante das críticas e dificuldades, população-
alvo e redes de parceria, medidas de biosegurança, formas de registro, demanda, bem como
reclamações da equipe.
Finalmente, para se analisar os resultados, os indicadores utilizados foram os números
registrados pelo programa. São eles: Números de acessos a usuários de drogas injetáveis,
crack e outras drogas, não usuários e população carcerária; número de vinculações (população
e estabelecimentos comerciais), Número de insumos distribuídos (seringas, cachimbos e
preservativos); e o Número de pacientes com AIDS que fazem ou fizeram uso de drogas
injetáveis.
Assim, a discussão e análise destes indicadores foram realizadas a luz dos discursos da
própria equipe, de autores que estudam o tema e do referencial proposto pelo Ministério da
saúde, como também na ótica dos princípios do SUS, referentes à integralidade, acolhimento
e promoção à saúde.
59
6 ANÁLISE DOS DADOS
A análise está organizada em três pilares: Estrutura, Processo e Resultado, cada qual
com seus indicadores específicos.
6.1 Estrutura
6.1.1 Recursos físicos
A sede do Projeto de Redução de Danos fica no Núcleo de Prevenção, também
conhecido como Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA), na Rua 700, centro de
Balneário Camboriú, é onde são realizados os exames de HIV e onde se desenvolvem os
programas de DST/HIV/AIDS. Tais programas têm como objetivo conscientizar e sensibilizar
a população para que adote medidas preventivas com relação ao HIV e às DST, com o intuito
de diminuir o número de pessoas portadoras do vírus no município. Um destes projetos é o da
redução de danos, que tem como população-alvo os usuários de drogas injetáveis e não
injetáveis, atendendo também profissionais do sexo e a população em geral.
Há uma sala reservada ao Programa de Redução de Danos, com duas mesas, oito
cadeiras, um banheiro, armário e computador. Há materiais informativos na sala, cartazes
educativos nas paredes, álbum seriado, dois quadros com amostras dos diferentes tipos de
drogas e um quadro com o mapa da cidade, assinalando os campos de atuação do projeto. No
armário estão guardadas as caixas contendo cachimbos e os kits (conjuntos de material
contendo seringa, agulha, frasco de água destilada, recipiente para diluição e compressas com
álcool para anti-sepsia) camisetas, chaveiros, panfletos e cartazes. É nesta sala que acontecem
as reuniões de equipe e onde os redutores se encontram todos os dias para a confecção dos
cachimbos distribuídos aos usuários de crack.
Na recepção do CTA é deixada uma caixa da redução de danos contendo cachimbos e
seringas para serem entregues aos usuários que procuram o posto com esta finalidade.
6.1.2 Recursos humanos
O programa conta com oito funcionários: um coordenador, um supervisor de campo e
seis redutores. Cabem ao coordenador as funções de planejamento, programação, negociação
60
de recursos e provisão de insumos, treinamento, monitoramento, avaliação, articulação com
outras organizações.
A tabela abaixo apresenta todos os funcionários do Programa de Redução de Danos de
Balneário camboriú, com suas respectivas funções, formação, vínculo jurídico, jornada
semanal, turno e remuneração.
Tabela 1: Relação dos Recursos Humanos do Programa de Redução de Danos, Balneário
Camboriú, 2006.
Cargo Função Formação
Vínculo
Jurídico
Jornada
Semanal
Turno
Remuneração
Bruta
Coordenador Planejar, negociar,
treinar, avaliar
3º grau
completo
Contratação 30h Diurno R$ 1.300,00
Supervisor de
Campo
Organizar, avaliar o
trabalho de campo
3º grau
incompleto
Contratação
30h
Diurno e
Noturno
R$ 650,00
Redutor Trabalhar em campo
com os usuários
3º grau
incompleto
Contratação
30h
Noturno
R$ 452,33
Redutor Trabalhar em campo
com os usuários
2º grau
completo
Contratação
30h
Noturno
R$ 452,33
Redutor Trabalhar em campo
com os usuários
2º grau
completo
Contratação
30h
Noturno
R$ 452,33
Redutora Trabalhar em campo
com os usuários
3º grau
incompleto
Contratação
30h
Noturno
R$ 452,33
Redutor Trabalhar em campo
com os usuários
2º grau
completo
Contratação
30h
Noturno
R$ 452,33
Redutor Trabalhar em campo
com os usuários
2º grau
completo
Contratação
30h
Noturno
R$ 452,33
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
O coordenador do projeto é psicólogo e também aconselhador do CTA. Em função de
suas demais obrigações organiza-se de tal modo a reservar horários exclusivos ao programa e
sempre que pode acompanha os redutores nas idas ao campo. No entanto, como isso não
acontece com freqüência, fica sob responsabilidade do supervisor de campo fazer o
monitoramento, a avaliação e a resolução dos problemas relativos ao trabalho de campo,
revendo resultados, estratégias e identificando problemas de equipe.
Ao redutor cabe a função de realizar atividade in loco, corpo a corpo com os usuários
de drogas, através de orientações e esclarecimentos sobre DST/AIDS, troca de seringas e
distribuição de cachimbos. Cabe-lhe, também, encaminhar, quando necessários, os usuários
para a rede de saúde, distribuir materiais educativos, distribuir preservativos e realizar
orientações.
O programa atualmente conta com um coordenador, um supervisor de campo e seis
redutores. Destes, apenas o coordenador possui ensino superior completo, três são
61
universitários e os demais encerraram os estudos no segundo grau. Todos já tiveram
experiências com usuários de drogas, seja em outros serviços, como o caso do coordenador do
programa e de um redutor que já trabalharam em comunidades terapêuticas, ou como usuário,
pois três redutores se caracterizam como ex-usuários. Não há voluntários atuando na equipe.
Na tabela seguinte consta o tempo de trabalho de cada funcionário e o tempo de espera
entre o processo seletivo e a contratação.
Tabela 2: Tempo de trabalho dos integrantes da equipe e tempo de espera até serem
contratados, em meses pelo Programa de Redução de Dano de Balneário Camboriú, 2006.
Cargo Tempo de trabalho Tempo de Espera até a contratação
Coordenador 5 anos Imediata
Supervisor de Campo 5 anos Imediata
Redutor 3 anos Imediata
Redutor 2 anos 8 meses
Redutor 5 anos Imediata
Redutora 1 ano e 4 meses 2 anos
Redutor 5 meses Imediata
Redutor 4 meses 1 mês
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Dos oito integrantes, três estão na equipe desde o início do programa há cinco anos, os
demais entraram depois. Dois redutores são novatos na equipe.
A inserção dos profissionais no projeto acontece através de processo seletivo realizado
pela prefeitura municipal. Neste o candidato é avaliado por seus conhecimentos sobre drogas,
DST/HIV/AIDS, através de prova escrita e entrevista, onde também é avaliada sua
experiência pessoal com drogas, uma vez que se acredita ser este um requisito importante que
facilita a relação e a aproximação para com os usuários, por conhecer a linguagem, os locais e
as práticas de uso de drogas.
Geralmente a contratação ocorre de imediato após o resultado do processo seletivo. No
entanto, como podemos perceber na tabela 2, alguns redutores tiveram que aguardar que
alguma vaga fosse liberada para serem chamados. Isso acontece dependendo da classificação
do candidato à vaga.
Ao entrar para a equipe o novo redutor passa por uma capacitação onde são tratados
temas sobre drogas, DST/HIV/AIDS, e treinamentos para a atuação prática. Nesta fase o novo
62
redutor sai a campo como observador para aprender com os demais redutores como deve atuar
em campo. Materiais são repassados continuamente para que toda equipe se mantenha
atualizada.
O processo de decisão é democrático e embora haja uma hierarquia, os redutores
possuem autonomia para tomada de decisões, tudo é discutido em reuniões e cabe a toda
equipe procurar soluções. Quem fica responsável pelas questões burocráticas (envio de
relatórios, prestações de conta, ou seja, toda a documentação que precisa ser enviada à
secretaria de saúde e ministério público) é o coordenador e o supervisor de campo, que
contam com o auxílio dos demais integrantes.
O supervisor de campo faz todo controle de trabalho dos redutores, deixando claro,
porém, que estes possuem autonomia e que jamais usa do autoritarismo para organizar a
rotina de trabalho.
Quanto aos recursos financeiros, de acordo com a coordenadora do programa
DST/HIV/AIDS de balneário Camboriú, quando o projeto iniciou recebia verba do
programa das Nações Unidas para o controle internacional de drogas (UNDCP). Esse
financiamento se deu porque o Ministério da Saúde faz convênio com agências
internacionais e assim que o programa de redução de danos de Balneário Camboriú foi
aprovado conseguiu o financiamento desta agência, com contrato de um ano. No entanto o
programa pediu prorrogação do contrato e foi aprovado, recebendo financiamento até 2003.
Neste período era enviado semestralmente o relatório de progresso, prestando conta do
dinheiro investido. Em 2004 conseguiram um termo de cooperação, via Ministério da Saúde,
com a UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura), porém
só receberam o financiamento em 2005. Como tinha contrato de um ano, atualmente não
recebem mais esta ajuda financeira.
O programa hoje é financiado com os recursos destinados ao programa DST/AIDS do
município. Do total do valor recebido, uma parcela de 1500 a 2000 reais é destinada,
mensalmente, ao Programa de Redução de Danos. Essa verba vem do ministério através do
PAM (Plano de Ações e Metas), que é enviado anualmente. Nele deve constar a meta anual
do programa, que não poderá ser alterada e deve ser cumprida.
6.2 Processo de trabalho
Os indicadores que correspondem ao processo de trabalho são: histórico do programa,
organização da equipe e rotina de trabalho, relação entre os membros da equipe e destes para
63
com a população atendida, postura diante das críticas e dificuldades, população-alvo e redes
de parceria, informações, medidas de biosegurança, formas de registro, demanda, bem como
reclamações da equipe, apresentadas a seguir.
6.2.1 Histórico do Programa de Redução de Danos de Balneário Camboriú
As atividades do projeto redução de danos no município de Balneário Camboriú,
tiveram início em maio de 2001 quando foram enviados ofícios a diversos órgãos, como a
Promotoria Pública, a Polícia Militar, a Polícia Civil, meios de comunicação e a OAB de
Balneário Camboriú, sobre as atividades do projeto, bem como ofícios para pedido de compra
de material ao departamento de compras.
A equipe era composta pela coordenadora que era assistente social, o psicólogo do
programa, atual coordenador e quatro redutores. Três deles conheciam o funcionamento do
programa porque haviam trabalhado como voluntários no programa de Itajaí. Além disso, dois
deles eram ex-usuários de drogas e tinham conhecimento dos locais de uso no município.
Baseado nesse conhecimento e no da coordenadora, definiram os primeiros locais de
interveão. Neste período teve início a capacitação da equipe. Durante cerca de um mês
puderam esclarecer dúvidas sobre DST/HIV/DST, biosegurança e drogas. A partir do mês de
junho o programa de redução de danos passou a sair às ruas para efetivar as aberturas de
campo
18
, sendo trabalhados, a princípio, apenas dois bairros (Bairro das Nações e Bairro dos
Municípios), onde foi feita a apresentação do Projeto para a comunidade local via abordagem
nas ruas e palestras.
Em 2002 mudou a equipe, o psicólogo assumiu a coordenação e novos redutores
passaram a fazer parte da equipe. Segundo ele, 2001 foi um ano de estudos, capacitações e
pouca atuação prática; em 2002 a equipe já estava estruturada e os trabalhos em campo
tiveram início. No entanto, nesse mesmo ano, o coordenador sofreu um acidente e ficou
afastado do programa por um longo período, o que fez com que as atividades do programa
continuassem no mesmo ritmo sem alterações e inovações.
Em 2003 resolveram elaborar um novo projeto, incluindo os usuários de crack, devido
a grande demanda no município. Um novo processo seletivo foi realizado e a equipe de
redutores mudou novamente, passando a ter um coordenador (o mesmo de até então), um
18
Abertura de campo, de acordo com o Ministério da Saúde (2001), pressupõe a conquista da população de
usuários de drogas e da comunidade em que ela se insere, conhecimento dos códigos culturais e das linguagens
64
supervisor de campo e seis redutores. A partir desse ano foram organizados os documentos,
relatórios e dado início a uma nova forma de trabalho. Isso explica os poucos dados existentes
nos anos de 2001 e 2002, conforme veremos em seqüência.
A reforma ocorrida no ano de 2003 foi baseada na questão da epidemia silenciosa de
hepatite B e C que atingia os usuários de crack, pelo fato de compartilharem materiais
cortantes durante o uso da mesma (latas, cachimbos feitos de materiais cortantes, como
alumínio, ferro, etc. Estas práticas também podem causar contaminação por outras
enfermidades com herpes, tuberculose e leptospirose, o que levou o programa de redução de
danos a confeccionar cachimbos descartáveis, buscando a diminuição do contagio de hepatite
B e C e de outras enfermidades entre os usuários de crack.
Essa nova abordagem, iniciada em 2003 predomina sobre a prática de troca de
seringas nos dias atuais em Balneário Camboriú, uma vez que o número de usuários de
drogas injetáveis diminuiu consideravelmente, perdendo espaço para o número de usuários
de crack.
6.2.2 Rotina de trabalho e Organização da Equipe
O trabalho realizado pelos redutores acontece no período noturno, com exceção das
segundas-feiras, quando trabalham à tarde das 13 às 19h. Nesse dia, ficam responsáveis pela
produção de cachimbos até as 15 horas, horário em que o coordenador do projeto trabalha nos
aconselhamentos
19
realizados no CTA. Após as 15 horas o coordenador assume o projeto e
inicia a reunião de equipe. Nesta, cada redutor lê seu diário de campo da semana anterior, dia
após dia, discutindo sobre situações ocorridas, a população atendida e a postura dos redutores
frente a determinados acontecimentos. Após a leitura, feita por cada redutor, de todas as
anotações dos dias de atuação referentes à semana passada, os relatórios são entregues para o
supervisor de campo, que os assina e arquiva. Nesse relatório constam o número de pessoas
acessadas, sexo e idade, quantos preservativos distribuídos, número de usuários de crack e de
usuários de drogas injetáveis acessados e vinculados, quantos cachimbos, seringas e
preservativos foram entregues aos mesmos, se houve casos de encaminhamento ao CTA
utilizadas por eles, promover aproximação, busca constante e manutenção da confiança dos usuários de drogas
injetáveis e não injetáveis e de suas comunidades e identificar demandas.
19
Segundo Ministério da Saúde, (2001), aconselhamento é um diálogo baseado em confiança que visa
proporcionar à pessoa condições para que avalie seus próprios riscos, tome decisões e encontre maneiras
realistas de enfrentar seus problemas relacionados às DST/HIV/AIDS. O aconselhamento descrito aqui diz
respeito à atividade pré-teste realizada no CTA antes da coleta de sangue das pessoas que realizarão o exame de
HIV.
65
(Centro de Testagem e Aconselhamento), CISS (Centro Integrado de Solidariedade e Saúde) e
outras instituições. Tais relatórios são fundamentais para que haja um monitoramento do
trabalho, além de facilitar a organização e a reformulação de estratégias.
A organização do trabalho, a cada semana que se inicia, também é realizada nesta
reunião, decidindo como serão distribuídos os campos e os redutores responsáveis.
No restante da semana (de terça a sexta), o horário de trabalho inicia-se às 17 horas,
com a produção de cachimbos até as 18:30h quando o carro da prefeitura chega para levá-los
aos campos, onde trabalham até as 22 horas.
O total de campos onde o programa atua são oito, sendo eles: Bairro das Nações, Vila
Real, Bairro dos Municípios, Barra Sul, Avenida do Estado, Cento, São Judas, Iate Clube e
Pioneiros. Para cada campo os redutores levam um número específico de materiais
(preservativos, cachimbos, seringas), de acordo com a demanda que tal campo estabelece.
Tudo isso é anotado nos relatórios, para se ter controle da quantidade de material que vem
sendo distribuído em cada campo.
São cobertos dois campos por dia ficando cada dois ou três redutores responsáveis por
um. Nestes são visitados postos de gasolina, bares, lanchonetes, salão de beleza, quiosques,
saunas e mocós
20
, todos vinculados
21
ao projeto, para entrega de panfletos e preservativos.
São visitadas também casas onde residem usuários vinculados para entrega de materiais. As
demais abordagens acontecem durante a caminhada dos redutores por todo bairro, onde se
aproximam de grupos e pessoas para falar sobre o programa, distribuírem preservativos e
materiais para uso de drogas se necessário (cachimbos e seringas).
Em dias de chuva, ou quando o campo é pequeno, realizam o campo parado, quando
sentam em algum posto de gasolina vinculado, distribuem os materiais informativos e
preservativos em uma mesa, entregando-os para as pessoas que se aproximam.
Ao abordar as pessoas nas ruas, os redutores se apresentam como funcionários da
Secretaria Municipal de Saúde e do programa DST/AIDS, entregam os panfletos enfatizando
a importância de se realizar o exame de HIV, passam o endereço do CTA e entregam
preservativos, para então falar sobre a redução de danos e a entrega de materiais descartáveis
para uso de drogas. Explicam o porquê dessa distribuição, explicando sobre os danos à saúde
que podem ocorrer com práticas de uso de drogas inadequadas, como a contaminação pelo
HIV ao compartilhar seringas e as doenças como hepatite, tuberculose, leptospirose entre
20
Locais onde usuários de drogas se encontram para fazer uso de drogas. Nos anos setenta a expressão
significava “esconderijo” ou “local clandestino”, tendo seu significado se alargado.
66
outras ao se usar latas para o fumo do crack. No entanto só mostram ou entregam o material
se a pessoa pedir.
6.2.3 Relações de Trabalho e postura da Equipe diante de Críticas
Os redutores enfatizam a importância de respeitar as pessoas e criar vínculo com as
mesmas, o que as deixará mais a vontade para se aproximar, pedir ajuda e materiais. Sempre
que necessário orientam as pessoas em suas dúvidas procurando conscientizá-las da
responsabilidade que possuem frente à própria saúde.
Os redutores em reuniões e treinamentos, sempre enfatizam a importância de informar,
e mais ainda de conscientizar e sensibilizar as pessoas, para que mudanças possam ocorrer.
Uma estratégia que é utilizada em alguns casos, é a da identificação. Como os redutores já
tiveram experiências pessoais com drogas, em alguns casos os relatam aos usuários como uma
forma de aproximá-los, de fazê-los sentirem que são compreendidos e respeitados, e que não
serão julgados, mas orientados para que mudem certas práticas e busquem uma vida mais
saudável e consciente.
Quanto à relação entre os membros da equipe, há respeito e diálogo entre os mesmos.
Diante de algum conflito ou mal entendido procuram sentar-se junto ao coordenador e
conversar sobre o ocorrido. É possível perceber em contato com a equipe, uma relação que
parece ir além da profissional, gerando um clima de amizade e companheirismo entre os
membros.
Há também abertura por parte dos membros para pessoas que desejam conhecer o
programa, realizar alguma atividade (como o estudo em questão). Mostram-se bastante
receptivos a tudo que possa acrescentar ou divulgar o trabalho da equipe.
Quando acusados de estarem incentivando o uso de drogas, defendem-se argumentando
que o projeto de redução de danos não é um programa de luta contra as drogas, mas um projeto
de saúde pública com foco na disseminação do HIV. Sua atuação tem por objetivo diminuir o
número de pessoas contaminadas pelo HIV e por outras infecções de transmissão sanguínea
causada por meio do uso de drogas injetáveis e sexo desprotegido, também focando as outras
possíveis doenças provocadas por práticas inseguras de uso de drogas.
21
Pessoas e locais que conhecem o projeto e ajudam na distribuição de preservativos e materiais educativos para
população geral e usuários de drogas.
67
6.2.4 População-alvo e Parcerias
A população-alvo do programa são os usuários de drogas injetáveis, usuários de crack;
usuários de drogas em geral e moradores do município que não se caracterizam como usuários
de drogas.
No que diz respeito aos usuários, a atuação do projeto abrange os que fazem uso de
drogas e não desejam parar. Sendo assim, as orientações são feitas visando reduzir os danos à
saúde através de práticas de uso de drogas mais seguras, evitando a contaminação de algumas
doenças. No entanto ao se deparar com um usuário que deseja parar com o uso e receber
auxílio, os redutores o encaminham para instituições que oferecem tratamento.
Um outro trabalho realizado pelo projeto é com crianças e adolescentes. Para acessar
essa população os redutores, em dias específicos, ficam na frente de escolas distribuindo
materiais informativos e preservativos, orientando sobre HIV/DST/AIDS e drogas. No
entanto, embora tais atividades estejam no cronograma do projeto, não tem sido realizadas nos
últimos tempos. O que tem acontecido para se trabalhar com esta população, atualmente, é
uma parceria do programa de redução de danos com o Programa Educa Vida, também com
sede no CTA, que visa conscientizar, sensibilizar professores e alunos do ensino público e
privado, sobre a nossa realidade frente o HIV/DST/AIDS e o uso abusivo de drogas,
formando multiplicadores que atuarão dentro das escolas, trabalhando constantemente tais
temas. Esse projeto é uma parceria da Secretaria de Saúde e da Educação, para se trabalhar
educação em saúde nos ambientes escolares. Para isso são realizadas constantes capacitações,
palestras e treinamentos em escolas e a redução de danos participa levando informações
referentes ao seu trabalho com drogas para alunos e professores, discutindo medidas de
redução de danos frente às demandas trazidas pelas escolas.
Uma outra parceria que existiu entre os programas era o da redução de danos com o
Programa Beija-Flor, no qual a redução de danos atuava junto às profissionais do sexo, quanto
ao uso abusivo e indevido de drogas nas casas de prostituição do município, assim como nas
ruas. No entanto o programa Beija-Flor, por motivos de financiamento, deixou de atuar,
acabando assim com essa parceria. Mas a redução de danos continua a atender esta população,
distribuindo preservativos às profissionais.
No presídio municipal o projeto de redução de danos também efetivou práticas de
prevenção e conscientização em DST/HIV/AIDS junto aos detentos. Entre os detentos foram
realizados testagem para o HIV e distribuição de materiais educativos. No entanto, devido a
alguns obstáculos, como a questão da distribuição de materiais para uso de drogas esbarrar em
68
questões legais, o projeto de redução de danos optou por treinar um profissional da área de
enfermagem que atua no presídio, para que este realize um trabalho de prevenção e redução
de danos junto aos detentos, realizando exames de HIV em parceria com o CTA. Atualmente
o coordenador do programa visita o presídio toda sexta-feira, para realização de exames anti-
HIV, entrega de resultados e repasse de informações sobre redução de danos.
O programa procura trabalhar em rede com outras instituições, como as comunidades
terapêuticas com quem realiza um trabalho de referência e contra-referência, postos de saúde
ligados ao Programa Saúde da Família (PSF), presídio, CISS, postos de gasolina, bares,
saunas, lanchonetes e associações de moradores, vinculando tais instituições ao projeto, para
que fiquem responsáveis pela entrega de preservativos e materiais educativos, podendo
indicar usuários e pessoas interessadas à sede do projeto.
6.2.5 Materiais Informativos
Os materiais informativos distribuídos pelo programa estão organizados de forma a
levar informações específicas dependendo da população atendida. Com a população não
caracterizada como usuária de droga, profissionais do sexo que não fazem uso de alguma
substância psicoativa e estudantes, o material distribuído trata sobre HIV/DST/AIDS,
informações sobre tipos de drogas e os prejuízos á saúde causadas por estas. Já com a
população que faz uso de drogas injetáveis junto com o kit contendo seringa e agulhas, há
informativos indicando os cuidados básicos que o usuários de ter ao se injetar. Há um cuidado
em não fazer circular tal material para não servir de incentivo a quem não faz uso desse tipo
de droga.
6.2.6 Medidas de Biosegurança
Quanto às medidas de biosegurança, todos os redutores passaram por treinamento e
receberam todo o equipamento de proteção individual como: luvas, pinça e caixa coletora (para
coleta de seringas) e lanternas. No entanto só os utilizam quando fazem visitas em locais
específicos onde há encontro de usuários para o uso de drogas injetáveis (mocós). Como essa
realidade vem diminuindo no município de Balneário Camboriú, dificilmente precisam fazer
uso de tais materiais de segurança. Contudo estão esclarecidos quanto às medidas básicas de
segurança para ida a campo, como sapatos fechados e calças, além de fazerem uso de gel
desinfetante sempre que necessário.
69
6.2.7 Formas de Registros
Todos os procedimentos da equipe são registrados em notas de campo e relatórios,
pois servem como parâmetro para a realização do relatório de progresso, que é enviado a cada
seis meses para a Secretaria Municipal de Saúde, para comprovar a atuação do projeto e sua
eficácia. Os registros são realizados diariamente pelos redutores em campo, anotando o
número de acessos por sexo, vínculos, insumos distribuídos (seringas, cachimbos e
preservativos) e encaminhamentos.
Esses registros diários são entregues ao supervisor de campo que os organiza e
condensa em um relatório semanal, mensal e anual.
O número de palestras e eventos também são registrados.
6.2.8 Demanda
Pode-se afirmar que as ações desenvolvidas no programa são, predominantemente,
preventivas e de promoção, tem caráter contínuo e de rotina. Atendem demanda espontânea,
mas também procuram criar demanda, divulgando o programa em vários locais com os quais
fizeram parceria, como as comunidades terapêuticas, PSF, presídio, estabelecimentos
comerciais, escolas, atividades realizadas nas comunidades, e nas ruas apresentando o
programa para os moradores do município.
6.2.9 Dificuldades
Ao citar as limitações atuais do programa, o coordenador cita o transporte, pois nem
sempre a prefeitura disponibiliza o carro para levar os redutores a campo e busca-los,
resistência dos diretores do presídio, das comunidades terapêuticas, recursos financeiros,
humanos, não existência de um CAPS-UD (Centro de Atenção Psico-Social a Usuários de
Drogas), pouca vinculação com o Programa da Saúde da Família (PSF), preconceito para com
a filosofia do programa.
O programa não tem parceria com todas as comunidades terapêuticas existentes no
município, pois algumas se mostram resistentes, com o PSF já realizaram sensibilização com
os profissionais, mas acreditam que a interação poderia ocorrer de forma mais efetiva.
Neste ano a equipe recebeu acusações com relação à distribuição de cachimbos, pois
70
na legislação consta que o programa pode realizar a distribuição de seringas e não de
cachimbos. Nos meios de comunicação do município foram feitas acusações com relação ao
“incentivo” ao uso de drogas. Diante disso, foi realizada uma audiência onde o programa de
redução de danos apresentou seu trabalho defendendo-se das acusações. Nesta estavam
presentes a equipe de redução do município de Itajaí e Florianópolis, o Secretário de Saúde e
profissionais de saúde de outras localidades que trabalham com a redução de danos.
6.3 Resultados
De acordo com o projeto (em anexo 1), enviado ao Ministério da Saúde, o objetivo do
programa de redução de danos é reduzir a disseminação do HIV e de outras infecções de
transmissão via sanguínea. É voltado aos usuários de drogas injetáveis e seus parceiros, sejam
de uso ou sexuais. O projeto também objetiva atuar junto aos usuários de crack para reduzir
danos que práticas inseguras possam acarretar.
O programa municipal estabeleceu como meta, aumentar o número de acessos e o
número de pessoas e locais vinculadas ao projeto. Todo ano é estabelecido um número de
usuários de drogas e de pessoas ligadas a estes que devem ser acessadas pelos redutores em
campo e também nas palestras e orientações feitas pela equipe do programa.
6.3.1 Os registros do programa
Para verificar se os resultados são alcançados o programa utiliza o “relatório de
progresso”, elaborado semestralmente, no qual constam seus objetivos, os resultados
esperados, os meios utilizados e os resultados obtidos. Constam ainda as atividades não
previstas e realizadas e sua justificativa, as atividades previstas e não realizadas e seus
motivos, as dificuldades encontradas e sugestões para solucioná-las.
Os técnicos ligados ao programa registram as atividades realizadas, como as palestras,
os treinamentos e os atendimentos realizados pelo coordenador e psicólogo do programa.
Também registram número de acessos e vinculações de usuários de drogas injetáveis, de
usuários de crack, de não usuários, de profissionais do sexo e de usuários que procuram a sede
do projeto para obter seringas para drogas injetáveis e cachimbo para crack.
Todas as atividades realizadas são registradas, pois a efetividade do programa está
baseada no número de acessos, na abrangência das ações de prevenção, na conscientização,
nas mudanças de comportamento frente às drogas e às doenças sexualmente transmissíveis,
71
especialmente a AIDS.
O programa de redução de danos do município de Balneário Camboriú foi iniciado no
ano de 2001, quando a equipe buscou subsídios (leituras, capacitações, reuniões com outras
equipes de redução de danos) para estruturar-se, deu início à abertura de campo, fez os
primeiros contatos com os usuários de drogas injetáveis e os primeiros registros.
Os registros utilizados pelo programa estão em anexo (2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10)
6.3.2 Registro dos acessos a usuários
Entende-se por usuário acessado aquele aos quais os redutores se aproximam,
apresentam o programa e fornecem insumos (seringas e agulhas) para diminuir os riscos da
prática de uso de droga injetável, no que se refere à transmissão do HIV, sem maiores
vínculos. Este usuário é relatado como sendo encontrado ocasionalmente durante o trabalho
de campo da equipe de redutores. O registro é feito por acesso e não por usuários, ou seja, o
mesmo pode ser acessado várias vezes na semana e cada acesso é registrado.
A tabela 3 mostra os números de acessos a usuários de drogas injetáveis acessados
pelo programa de redução de danos de Balneário Camboriú, no período de 2001 a 2005.
Tabela 3: Número de acessos a usuários de cocaína endovenosa ou outras drogas injetáveis
pelo Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Ano
Acessos
2001* 2002* 2003 2004 2005 TOTAL
Masculinos 40 40 43 17 12 152
Femininos 6 6 5 0 0 17
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
A figura 1 a seguir corresponde aos dados da tabela 3. que mostra o número de usuários
de drogas injetáveis do sexo masculino e feminino acessado pela equipe de redutores.
72
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Número de Usuários Acessados
Masculinos
Femininos
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
Figura 1: Tendência temporal do acesso a usuários de drogas injetáveis pelo Programa de
Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005.
6.3.3 A Diminuição da cocaína e o aumento do crack
Percebe-se na tabela 3 e na figura do gráfico 1, que nos anos de 2001, 2002 e 2003 o
programa conseguiu um número maior de acessos a usuários de drogas injetáveis tanto
masculinos quanto femininos, vindo a decair nos anos seguintes. Esse fato ocorreu, segundo a
equipe de redução de danos, devido à diminuição do uso de droga por via endovenosa na
região e pelo aumento do uso de crack. O uso de crack, muito presente, na percepção dos
redutores, vem substituindo o de cocaína injetável. Isso levou a uma queda do comportamento
de risco associada às práticas de uso por via endovenosa. Cabe aqui destacar que o número de
usuários de drogas injetáveis do sexo masculino é maior que o do sexo feminino.
6.3.4 O Registro dos usuários vinculados
A partir da aproximação dos usuários, o objetivo dos redutores passa a ser a
vinculação dos mesmos ao programa. O usuário considerado vinculado é aquele que os
redutores já acessaram várias vezes, com quem conseguiram criar um vínculo de amizade e de
parceria. Alguns dos usuários vinculados passam frequentemente na sede do programa para
73
pegar insumos para uso próprio, ajudando a divulgar o programa a outros usuários que ainda
não o conheçam. Há usuários que não passam na sede, mas recebem a visita dos redutores,
toda semana, em suas casas ou em locais que costumam freqüentar.
Aqui encontramos um dos maiores problemas de registro realizado pelo programa
municipal de redução de danos de Balneário Camboriú. Não há uma anotação confiável do
número de pessoas acessadas. O que há é um registro voltado a mostrar a produtividade dos
redutores de danos, relacionando os contatos feitos (acessos), mas não o número de pessoas
contatadas (acessados). Isto dificulta a comparação entre o número de usuários acessados e o
número de usuários que, após o acesso, vincularam-se ao programa.
A tabela 4 e a figura 2 refletem os dados que colhemos nos registros de vinculações,
ao longo de cinco anos.
Tabela 4: Número de usuários de cocaína endovenosa ou outras drogas injetáveis vinculados
ao Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Ano
Usuários
Vinculados
2001* 2002* 2003 2004 2005 TOTAL
Masculinos 16 16 37 30 5 104
Femininos 8 8 3 0 2 21
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
0
5
10
15
20
25
30
35
40
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Número de Usuários Vinculados
Masculinos
Femininos
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
74
Figura 2. Tendência temporal da vinculação de usuários de drogas injetáveis ao Programa de
Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005.
No gráfico apresentado na figura 2, é possível perceber, com relação à diferença de
gênero, o maior número de usuários de drogas injetáveis masculinos vinculados ao programa.
Isto era de se esperar, uma vez que o número de acessados masculinos é maior que o
feminino. De uma média de 40 acessos realizados a usuários de drogas injetáveis do sexo
masculino no ano de 2001 e 2002, 15 tornaram-se vinculados (37,5%). Na população de
usuárias do sexo feminino aparentemente 100% dos acessos, geraram vínculos ao programa.
No ano de 2003, houve apenas cinco acessos e três vinculações para o sexo feminino.
Enquanto o número de vinculados do sexo masculino aumentou a do sexo feminino diminuiu.
Em 2001 e 2002 o número de usuárias do sexo feminino vinculadas ao programa foi
maior que o número de acessos. Segundo o coordenador do programa isso ocorreu devido ao
fato de que dois redutores que iniciaram na equipe eram ex- usuários de drogas injetáveis. Já
conheciam muitos dos usuários, para os quais apresentaram o programa e passaram a entregar
insumos logo no início das atividades, vinculando-os ao programa desde o primeiro ano de
atuação.
No ano de 2004 houve mais usuários masculinos vinculados ao projeto do que acessos.
Aquele ano a população de usuárias de drogas injetáveis do sexo feminino, tanto acessada,
como vinculada, desapareceu. Voltou a surgir, em 2005, com duas mulheres vinculadas. Essa
diminuição, tanto acessos como vinculações, em 2005, também ocorreu com a população
masculina, na qual somente 12 pessoas foram acessadas pelo programa e dessas 41,66%
foram vinculadas. O número de usuários de drogas injetáveis atendidos, de ambos os sexos,
diminuiu entre os anos de 2001 e 2005.
A tabela 5 e o gráfico da figura 3 apresentam o total de usuários de drogas injetáveis
(feminino e masculino), acessados e vinculados ao programa. Nelas se observa o declínio do
número de usuários de drogas injetáveis atendidos pelo programa no município de Balneário
Camboriú.
75
Tabela 5: Quadro Geral de Discriminação dos Acessos e Vínculos, por sexo, usuários de
cocaína endovenosa ou outras drogas injetáveis, Programa de Redução de Danos, Balneário
Camboriú, 2001-2005.
Ano
Usuários
2001* 2002* 2003 2004 2005 Total do Qüinqüênio
Acessos Masculinos 40 40 43 17 12 152
Acessos Femininos 6 6 5 0 0 17
Total de acessos 46 46 48 17 12 169
Vinculações Masculinas 16 16 37 30 5 104
Vinculações Femininas 8 8 3 0 2 21
Total de Vinculações 24 24 40 30 7 125
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
N. Usuários de Drogas Injetáveis
Acessados Masculinos
Vinculados Masculinos
Vinculados Femininos
Acessados Femininos
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 3: Comparação das tendências temporais de acessos e vínculos de usuários de drogas
injetáveis, Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Desde as primeiras saídas a campo, segundo o coordenador do programa, já os
redutores perceberam que no município de Balneário Camboriú havia mais usuários de
crack do que de drogas injetáveis. No entanto como a proposta da redução de danos era
trabalhar mais especificamente com os usuários de drogas injetáveis, procuraram cumprir
esse objetivo, distribuindo as seringas. Aos usuários de crack procuravam passar
76
informações a respeito dos perigos envolvendo as práticas de uso e o risco de manter
relações sexuais sem preservativos.
Em 2003 perceberam que a população de usuários de drogas injetáveis havia
diminuído consideravelmente e que a maior demanda era com relação ao uso de crack. Diante
disso procuraram informações a respeito das atividades voltadas a esta população e chegaram
a receber do Ministério da Saúde o cachimbo-modelo, oferecido aos usuários, para evitar
contaminações por hepatite, tuberculose e leptospirose (comuns através de latas de alumínio).
Foi neste ano que reformularam o programa, acrescentando como atividade a distribuição de
cachimbos para usuários de crack. Como já conheciam alguns dos usuários de crack, estes
foram vinculados ao programa logo no início da atividade de distribuição de cachimbos.
Ao sair a campo, os redutores devem registrar o número de cachimbos entregues, o
número de acessos e o número de usuários vinculados ao programa atendidos naquele dia. Os
dados são fechados semanal, mensal e anualmente.
As tabelas 6 e 7 e as figuras 4 e 5 mostram, respectivamente, os acessos e vínculos
realizados:
Tabela 6: Número de acessos a usuários de crack pelo Programa de Redução de Danos,
segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Ano
Usuários
2001 2002 2003 2004 2005 TOTAL
Masculinos
506 428 181 1.115
Femininos 47 42 19 108
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
77
0
100
200
300
400
500
600
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Acessos a Usuários de Crack
Masculinos
Femininos
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
Figura 4: Tendência temporal do acesso a usuários de crack pelo Programa de Redução de
Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005
Tabela 7: Número de usuários de crack vinculados ao Programa de Redução de Danos,
segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Ano
Usuários
2001 2002 2003 2004 2005 TOTAL
Masculinos
504 869 574 1.947
Femininos 57 38 48 143
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
78
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Vinculações de Usuários de crack
Masculinos
Femininos
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
Figura 5: Tendência temporal da vinculação de usuários de crack ao Programa de Redução
de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Chama atenção comparando as figuras 4 e 5, o fato de que o número de acessos em
2004 e 2005 é menor do que o número de usuários vínculados. A explicação dada pela equipe,
é que nos anos anteriores entre 2001 a 2003, o programa não atendia especificamente essa
população de usuários de crack. Estes eram incluídos na população chamada de “usuários de
outras drogas” que não injetáveis.
Dessa forma, quando modificaram o programa para atender os usuários de crack,
distribuindo cachimbos aos mesmos, já conheciam muitos deles que foram considerados logo de
início, como vinculados ao programa. Isso explica o maior número de vinculações do que acessos.
A tabela 8 consolida o conjunto dos dados registrados no programa, sobre acessos e
usuários vinculados, em cinco anos, que colhemos.
79
Tabela 8: Quadro geral de discriminação de acessos a usuários de crack e de vínculos,
Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Ano
Usuários
2001 2002 2003 2004 2005 Total de Qüinqüênio
Acessos Masculinos 506 428 181 1.115
Acessos Femininos 47 42 19 108
Total de Acessos 553 470 200 1.223
Vinculações Masculinas 504 869 574 1.947
Vinculações Femininas 57 38 48 143
Total de Vinculações 561 907 622 2.090
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
0
100
200
300
400
500
600
700
800
900
1000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
N. Usuários de Crack
Acessos Masculinos
Acessos Femininos
Vinculões
Masculinas
Vinculões
Femininas
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 6: Comparação das tendências temporais de acessos e vínculos de usuários de
crack, Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005.
O número de usuários vinculados chama a atenção e é de se perguntar se não há
pessoas repetidas nessa estatística. Sendo a população de Balneário Camboriú, em 2005,
composta por 90.461 pessoas, 2,3 % da população estariam recebendo cachimbos todos os
anos, na média destes três anos. Pode-se deduzir, portanto, que o número de dependentes de
crack seja de 2.090 pessoas.
Como é possível perceber na figura 6, há um número maior de usuários de crack do
sexo masculino do que feminino tanto acessados como vinculados, como já ocorria com o uso
de droga injetável. A comparação e o estabelecimento da proporção de acessados e vinculados
com esta população se torna difícil, uma vez que, diferente dos usuários de drogas injetáveis,
80
o número de usuários de crack é elevado e os registros de usuários acessados são feitos por
acesso e não por usuário. Dessa forma não há como saber qual a proporção de usuários de
crack acessados que se vincularam ao programa.
Isto caracteriza uma deficiência do programa, pois a validade dos registros fica
diminuída, uma vez que os dados de acesso e de vinculação não são comparáveis, a rigor.
Para corrigir esta deficiência o programa precisaria rever a forma de conceituar o acesso e a
forma de registrá-lo.
A tabela 9 mostra um número de usuários de cocaína endovenosa vinculados ao
programa, quase dezessete vezes menor do que o número de usuários de crack vinculados.
Tabela 9: Total de acessos e de vínculos feitos pelo Programa de Redução de Danos, para
usuários de cocaína endovenosa e de crack, Balneário Camboriú, qüinqüênio 2001-2005.
Droga
Usuário
Cocaína E.V. Crack
Acessos Masculinos 153 1.115
Acessos Femininos 18 108
Total de Acessos 171 1.223
Vinculações Masculinas 103 1.947
Vinculações Femininas 21 143
Total de Vinculações 124 2.090
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
0 500 1.000 1.500 2.000 2.500
Número de Usuários
Injetáveis Crack
Vinculado
s
Acessado
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
81
Figura 7: Números absolutos de acessos e vínculos de usuários do Programa de Redução de
Danos, Balneário Camboriú, período 2001-2005.
6.3.5 Usuários de Outras Drogas
Uma outra população atendida é a de usuários de outras drogas que não crack e nem
drogas ilegais de uso injetável. São usuários de maconha, álcool, tabaco, êxtase, cocaína
inalada e anfetaminas.
O programa chama esta população de “Usuário de droga geral”, termo este que utilizaremos
aqui para apresentar os dados referentes a esta população.
A atuação frente a estes usuários é a de repasse de informações sobre a droga de uso,
os perigos à saúde envolvidos, a importância do preservativo nas relações sexuais, e a
disponibilização do exame de HIV. A tabela 10 mostra o número de acessos a usuários de
drogas atendidos nos anos de 2001 a 2005.
Tabela 10: Número de acessos de Usuários de Drogas Gerais, feitos pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, nos anos 2001-2005
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002.
A figura 8 ilustra a distribuição dos acessos ao longo de cinco anos
Ano
Usuário de Droga Geral
2001* 2002* 2003 2004 2005 TOTAL
Masculino 2.247 2.247 4.149 7.024 2.925 18.592
Feminino 469 469 814 2.854 1.181 5787
82
0
1.000
2.000
3.000
4.000
5.000
6.000
7.000
8.000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Usuário de droga geral
Masculino
Feminino
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 8: Comparação das tendências temporais de acessos de usuários de drogas gerais, pelo
Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Essa forma de registro não nos possibilita saber quantos usuários são atendidos pelo
programa anualmente, nem traçar um paralelo do número de dependentes químicos por número
de habitantes, uma vez que o mesmo usuário pode ter sido acessado diversas vezes. O que
podemos observar na figura 8 é que o número de usuários masculinos acessados é maior que o
número de usuários do sexo feminino. Em 2004 o número de acessos superou consideravelmente
os demais anos. A explicação dada pela equipe do programa é a de que em 2004 a equipe contava
com um maior número de redutores, o que facilitou o maior número de acessos.
6.3.6 Atendimento as pessoas que não usam substâncias psicoativas
O programa não se restringe somente aos usuários de substâncias ilícitas, embora este
seja seu objetivo primordial. Ele atende a uma população que não faz uso de substâncias
psicoativas. Chama essa população de “população geral”, sendo esta composta por pessoas
acessadas pelos redutores em campo, para apresentar o projeto, entregar preservativo e
entregar material informativo. Para estas pessoas não são entregues insumos para uso de
droga. Geralmente o programa apenas repassa informações a respeito dos riscos envolvendo
relações sexuais sem preservativo.
A tabela 11 mostra o número de acessos realizados à população não usuária de
substâncias psicoativas, entre os anos de 2001 a 2005.
83
Tabela 11: Número de acessos realizados à população não usuária de substâncias psicoativas,
Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, 2001-2005.
Ano
População
2.001* 2.002* 2.003 2.004 2.005
TOTAL
Masculino 5498 5498 3531 6039 2199 22.765
Feminino 2075 2075 1932 3756 1285 11123
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
.
0
1.000
2.000
3.000
4.000
5.000
6.000
7.000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Populão
Masculino
Feminino
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 9: Tendência temporal do acesso de pessoas não usuárias de substâncias
psicoativas pelo Programa de Redução de Danos, segundo o sexo, Balneário Camboriú,
SC, 2001- 2005.
Como consta na figura 9, em 2004 houve um número maior de acessos, devido ao
número de redutores do programa ser maior do que nos outros anos, o que possibilitou um
maior número de acessos em campo para entrega de preservativos.
6.3.7 Atuação com presidiários
O programa atua também junto à população confinada, no presídio do município. O
trabalho com esta população consiste em educação, entrega de preservativos e também de
insumos. No entanto, a entrega de insumos para uso de drogas (seringas e cachimbos), esbarra
em questões judiciais, pois para realizar este tipo de atividade dentro de presídios seria preciso
admitir que os detentos cometem a contravenção de usar drogas dentro da instituição.
84
Por isso os redutores encontraram obstáculos, o que os levou a focalizar suas
atividades nas questões informativas e no uso de preservativo, bem como na realização de
exames de HIV.
Junto aos redutores trabalhou um enfermeiro que realizava a coleta de sangue dos
detentos que decidiam realizar o exame.
A tabela 12 mostra o número de detentos atendidos pelo programa entre os anos de
2001 e 2005.
Tabela 12: População confinada atendida pelo Programa de Redução de Danos, segundo o
sexo, Balneário Camboriú, 2001 - 2005.
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
A figura 10 ilustra a distribuição anual destes acessos, notando-se a predominância
masculina entre as pessoas encarceradas atendidas.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
110
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Número de Atendimentos
Masculina
Feminina
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
Ano
População
2001* 2002* 2003 2004 2005 TOTAL
Masculina 40 40 79 101 24 284
Feminina 10 10 23 31 4 78
85
Figura 10: População confinada atendida pelo Programa de Redução de Danos, segundo o
sexo, Balneário Camboriú, 2001 – 2005.
Em 2003 e 2004, como consta nos gráficos, tal atividade alcançou o maior número de
detentos, decaindo consideravelmente em 2005. Tal fato ocorreu, de acordo com os redutores,
devido às dificuldades de acesso que começaram a surgir frente às questões legais. Diante
disso resolveram mudar a estratégia e o enfermeiro que trabalha no presídio, ficou
responsável pelas informações referentes às drogas, sexo seguro e doenças sexualmente
transmissíveis e AIDS. Este enfermeiro entra em contato com o programa regularmente para
repassar informações e encaminhar o sangue de quem deseja realizar o exame para detecção
do HIV.
No ano atual, 2006, as atividades dentro do presídio voltaram a acontecer. Toda sexta-
feira, pela manhã, o coordenador do projeto trabalha junto com o enfermeiro da instituição.
6.3.8 A distribuição de informações e de insumos
A tabela 13 mostra o total de atendimentos, entendido aqui como acessos nos quais os
redutores repassam informações, tiram dúvidas, entregam preservativos e insumos para uso de
drogas (caso haja a demanda) com toda a população atendida pelo programa. Esta população
compreende usuários de substâncias psicoativas, detentos e população moradora do município
não caracterizada como usuária. Nestes atendimentos, nem sempre são realizadas todas as
atividades citadas acima. Em alguns casos, principalmente com a população não usuária,
ocorre somente a entrega de preservativos e folhetos. Por isso o número de registros com esta
população é tão elevado.
Tabela 13: Total de atendimentos por população atendida pelo programa de redução de danos,
Balneário Camboriú, 2001 - 2005.
Ano
População
2001* 2002* 2.003 2.004 2.005 TOTAL
Usuário de Drogas Injetáveis 70 70 88 47 19 294
Usuário de Crack 0 0 1114 1377 822 3313
Não usuário 7.572 7.572 5.463 9.795 3.484 33.886
População confinada 50 50 102 132 28 362
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
86
0
200
400
600
800
1.000
1.200
1.400
1.600
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
População
Usuário de droga
injetável
Usuário de crack
Populão confinada
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 11: Tendência temporal do acesso da população atendida pelo Programa de Redução
de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001- 2005.
No início, o programa estava focado nos usuários de drogas injetáveis. As atividades
eram basicamente repassar informações a respeito de drogas, distribuir ou trocar seringas e
realizar encaminhamentos quando necessário. Hoje sua principal atuação continua sendo a
distribuição de insumos para uso de drogas. No entanto o foco não está especificamente nos
usuários de drogas injetáveis, mas também nos usuários de crack e na população que não faz
uso de drogas.
Os insumos distribuídos hoje são os kits com seringas e materiais informativos e
também os cachimbos para fumar crack.
Na tabela 14 consta o número de seringas distribuídas pelo programa desde sua
implantação. A idéia inicial do programa era de troca de seringas usadas por seringas novas.
Tabela 14: Número de seringas distribuídas, achadas e recebidas pelo Programa de Redução
de Danos, Balneário Camboriú, 2001 - 2005.
Ano
Seringas
2001* 2002* 2003 2004 2005 TOTAL
Distribuídas 175 175 232 0 40 622
Achadas 20 20 13 3 1 57
Recebidas 75 75 1 1 17 169
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
87
0
50
100
150
200
250
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Seringas
Distribuídas
Achadas
Recebidas
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú
Figura 12: Tendência temporal da relação entre as seringas distribuídas, as achadas e as
recebidas pelo Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001- 2005.
O que se observa é que parece não ter havido uma real troca: o número de seringas
recebidas sempre foi bem menor do que o de seringas distribuídas.
De um total de 175 seringas distribuídas em 2001 e 2002, 75 foram devolvidas (42,85%),
após o uso e 20 foram achadas, (11,42%). Tais dados, de 2001 e 2002, parecem satisfatórios,
uma vez que parte das informações dadas aos usuários diz respeito à devolução das seringas
utilizadas, para que estas saiam de circulação, evitando riscos. Quanto às demais 80 seringas,
não se sabe que destino tiveram.
No ano de 2003, das 232 seringas distribuídas, número maior que o dos anos
anteriores, somente uma foi recebida e treze foram achadas em locais públicos. Dado curioso
uma vez que neste ano houve um maior investimento público no programa, com maior
distribuição de seringas. Contudo parece que algo falhou, pois o retorno esperado da
população atendida não ocorreu. Segundo o coordenador do programa essa diferença entre os
números de seringas recebidas e achadas no ano de 2003 em comparação com os anos
anteriores se deu porque em 2001 e 2002 havia um redutor na equipe que era ex-usuário de
droga injetável e conhecia muitos dos usuários, dos locais de uso e dos horários mais
freqüentados, o que facilitava a visita dele nesses locais para pegar as seringas.
Havia também uma usuária de droga injetável, vinculada ao projeto, que recebia dos
redutores uma quantidade de seringas, mensalmente para uso próprio e para outros usuários
88
que freqüentavam sua casa. Ela ficava responsável pela devolução das seringas usadas. No
fim de 2002 esta usuária não foi mais encontrada pelos redutores, pois havia se mudado para
outra cidade, segundo relataram vizinhos dela. Neste mesmo período o redutor ex-usuário saiu
da equipe. Estes dois acontecimentos, segundo o coordenador, foram os responsáveis pela
queda nos números de seringas achadas e recebidas nos anos de 2004 e 2005.
Em 2004, o programa focalizou suas atividades nos usuários de crack, ou seja, na
distribuição de cachimbos, não fazendo a entrega de seringas por não haver demanda,
segundo os redutores. No entanto foram achadas três seringas e somente uma foi recebida.
Pressupõe-se que estas seringas tenham sido reutilizadas ou conseguidas por outro meio que
não o Programa de Redução de Danos, uma vez que este não fez entrega de seringas em 2004.
No ano de 2005, das 40 seringas distribuídas, 17 foram recebidas (42,5%) e uma foi
achada (2,5%). Percebe-se que o programa voltou em 2005 a atuar com a população de
usuários de drogas injetáveis na entrega de insumos para uso da droga. Embora pequena,
ainda havia uma demanda por parte desta população.
O número de seringas distribuídas diminuiu nos últimos anos, acompanhando a
diminuição do número de usuários de drogas injetáveis no município.
O foco principal do programa, a partir de 2003, passou a ser o de distribuição de
cachimbos para usuários de crack, com o objetivo de diminuir a contaminação dos usuários
por hepatite, tuberculose e leptospirose. Diferentemente dos usuários de drogas injetáveis,
para os quais há registros do número de contaminações pelo HIV por compartilhamento de
seringas, entre os usuários de crack isto se torna mais complexo. As contaminações por
leptospirose, tuberculose e hepatite podem se dar por diversas vias. Não há registros
específicos de tais contaminações em usuários de drogas.
A tabela 15 mostra os números da distribuição de cachimbos ao longo da atuação do
programa.
Tabela 15: Número de cachimbos distribuídos pelo Programa de Redução de Danos,
Balneário Camboriú, 2001 - 2005.
Ano
Cachimbo
2001 2002 2003 2004 2005 TOTAL
Distribuídos 569 1203 910 2.682
Fonte: Folha de registros do Programa de Redução de Danos de Balneário Camboriú.
Os usuários receberam, segundo os dados apresenatdos, mais de um cachimbo por
89
ano, uma vez que o número de usuários de crack vinculados ao programa estava em 561
pessoas em 2003, 907 em 2004 e 622 pessoas em 2005.
Em 2004 o número de cachimbos distribuídos foi maior que nos demais anos, devido a
um número maior de funcionários trabalhando na equipe. O número que consta nesses
registros diz respeito ao número de cachimbos entregues e não do número de usuários.
A tabela a seguir mostra uma comparação entre os números de seringas e cachimbos
distribuídos pelo programa.
Tabela 16: Número total de seringas e cachimbos distribuídos pelo Programa de Redução de
Danos, Balneário Camboriú, 2001 - 2005.
Ano
Insumos
2001* 2002* 2003 2004 2005 TOTAL
Seringas 175 175 232 0 40 622
Cachimbos 569 1203 910 2.682
Fonte: Folha de registros fornecidos pelo programa de redução de danos de Balneário Camboriú
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
Ocorreu uma relação inversamente proporcional entre a disponibilidade, pelo
programa, de seringas e de cachimbos.
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
Insumo
s
Seringas
Cachimbos
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 13: Tendência temporal do número de seringas e cachimbos distribuídos pelo
Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001- 2005.
Comparando o número de seringas e cachimbos distribuídos, percebemos que a
90
distribuição de cachimbos é maior do que de seringas a partir do ano de 2003. Houve uma
diminuição de seringas distribuídas, segundo a equipe do programa, devido à diminuição de
usuários de drogas injetáveis e ao aumento da demanda de cachimbos para o uso de crack. No
ano de 2004 não foram entregues seringas e em 2005 elas voltaram a ser distribuídas, em
função da demanda ter diminuido.
Os preservativos são distribuídos em estabelecimentos comerciais que possuem
vínculos com o programa, como alguns postos de gasolina, bares e quiosques, por onde os
redutores passam semanalmente. Estes estabelecimentos conhecem o programa, recebem as
informações a respeito de suas atividades e aceitam contribuir com a distribuição de
preservativos.
A tabela 17 apresenta os números de preservativos entregues entre os anos de 2001 e
2005, pelo programa.
Tabela 17: Preservativos distribuídos por população atendida pelo Programa de Redução de
Danos, Balneário Camboriú, 2001 - 2005.
Fonte: Folha de registros fornecidos pelo programa de redução de danos de Balneário Camboriú
*Ano para o qual se calculou o valor médio do constante no consolidado do biênio 2001 e 2002
Balneário Camboriú, por ser um município turístico, tem uma população flutuante. Ela é
muito aumentada no verão e bastante aumentada em alguns feriados e períodos especiais, como
das festas catarinenses de outubro, dentre as quais se sobressai a Oktoberfest, de Blumenau,
município próximo.Contudo se levássemos em conta somente a população residente, de cerca
de 90.500 pessoas, em 2004, foi distribuído um preservativo por habitante.
Ano
População
2001 2002 2003 2004 2005 TOTAL
Usuário de droga injetável 393 393 259 98 51 1.194
Usuário de crack 0 0 3.379 3.498 2.140 9.017
Usuário de droga geral 5.917 5.917 14.291 24.037 8.029 58.191
Não usuário 15.934 15.934 12.044 20.431 6.780 71.123
Profissionais do sexo 0 0 0 0 2.690 2.690
Postos de gasolina 0 0 3.277 7.837 3.299 14.413
Bares e quiosques 0 0 19.166 30.726 22.523 72.415
Total 22.244 22.244 52.416 86.627 45.512 229.043
91
0
5000
10000
15000
20000
25000
30000
35000
0123456789
Ano
N. de preservativos distribuídos
Usrio de droga
injetável
usuário de crack
Usrio de droga
geral
Não usuário
Profissionais do sexo
Postos de gasolina
Bares e quiosques
Fonte: Registro interno do Programa de Redução de Danos, Balneário Camboriú.
Figura 14: Tendência temporal da distribuição de preservativos pelo Programa de
Redução de Danos, Balneário Camboriú, SC, 2001- 2005.
O número de preservativos distribuídos para a população de usuários de crack, é maior
que o distribuído aos usuários de drogas injetáveis desde 2003, ano em que a equipe passou a
focalizar os usuários de crack. Com relação à distribuição de preservativos para as demais
populações atendidas nota-se mais uma vez que o número entregue é maior no ano de 2004
em comparação com os demais anos registrados. A diminuição do número de integrantes na
equipe é apontada como explicação. A entrega em locais vinculados passou a ser registrada a
partir de 2003, quando foi firmado o vínculo com tais estabelecimentos. Por isso não há
registros nos anos anteriores. Somente em 2005 o programa passou a atender especificamente
as profissionais do sexo, distribuindo preservativos e fornecendo orientações sobre o exame
de HIV.
Além deste trabalho de orientação, informação e distribuição de insumos, os redutores
fazem encaminhamentos para realização de teste para detecção de HIV e para diagnóstico e
tratamento de doenças sexualmente transmissíveis. No entanto tais encaminhamentos não são
feitos formalmente. O programa apenas orienta e indica onde são realizados os exames,
enfatizando a importância da realização dos mesmos.
6.3.9 O cuidado para não montar falácias com os números
Dados coletados nos prontuários do Centro Integrado de Saúde e Solidariedade do
município de Balneário Camboriú, mostram o número de soropositivos com HIV relacionado
92
ao uso de drogas injetáveis entre os anos de 1993 (ano em que o programa de redução de
danos ainda não existia no município), até 2004 (quando o programa já estava realizando suas
atividades desde 2001), tratados por este centro.
De 1993 até primeiro semestre de 2001, quando o programa ainda não tinha iniciado,
havia 762 prontuários de pacientes com HIV positivo abertos. Destes, 208 (27,3%) eram
prontuários de pacientes com HIV positivo relacionados ao uso de droga injetável.
Do segundo semestre de 2001 até o primeiro semestre de 2004, quando o programa já
havia sido implantado e já estava realizando suas atividades, o número de prontuários de
pacientes com HIV positivo era de 345. Destes, 28 (8,12%) eram relacionados ao uso de
droga injetável.
A implantação do programa de redução de danos coincidiu com uma queda, em quatro
anos, de aproximadamente 18,0 % dos casos de HIV positivo relacionados ao uso de drogas
injetáveis.
Embora essa correlação seja feita pelo programa com o intuito de provar sua
efetividade e comprovar resultados, não há como afirmar que haja causalidade entre o número
de prontuários de pacientes com HIV positivo abertos por uso de droga injetável e a atuação
do programa de redução de danos. Há muitos fatores associados que podem estar envolvidos
na diminuição do número da transmissão do vírus do HIV por compartilhamento de seringas.
O mais importante deles, provavelmente, é a introdução do crack fumável, que cativou uma
clientela que, de outra forma, poderia optar pelo uso de cocaína injetável.
Os dados mostrados na tabela 14, oferecidos pelo programa, permitem hipotizar uma
correlação até o primeiro semestre de 2004, ano em que a equipe não distribuiu nenhuma
seringa.
Os dados a seguir foram coletados pela própria equipe de redução de danos nos
prontuários do Centro Integrado de Saúde e Solidariedade (CISS), de Balneário Camboriú,
responsável pela abertura de prontuários de pacientes HIV positivos e tratamento dos
mesmos. Nos prontuários consta se o paciente faz uso de droga injetável.
93
Tabela 18: Número de prontuários de pacientes com HIV positivo abertos para usuários de
drogas injetáveis, Centro Integrado de Saúde e Solidariedade, Balneário Camboriú, 1993-2003.
Ano Número HIV positivo
1993 17
1994 19
1995 27
1996 28
1997 36
1998 28
1999 30
2000 22
2001 9
2002 11
2003 9
Fonte: Registro do Centro Integrado de Solidariedade e Saúde, Balneário Camboriú.
No entanto, embora esses dados indiquem o número de portadores de HIV que são
usuários de drogas injetáveis, não há como saber se a contaminação ocorreu por esta via, ou
por transmissão sexual. Nem há como saber quanto tempo antes da abertura do prontuário se
deu a contaminação. Fazer a correlação e a afirmação de causalidade dos números de usuários
de drogas injetáveis portadores do HIV com a atuação do programa é um raciocínio
reducionista demais, uma vez que há outras variáveis presentes.
Estes dados são utilizados pelo Programa de Redução de Danos como indicadores de
que seus objetivos de reduzir a disseminação do HIV através de compartilhamento de seringas
está sendo alcançado. No entanto, apenas com esta análise simplificada não é possível fazer
tal afirmação. Seria preciso uma avaliação mais rigorosa com relação aos resultados do
programa em si, entrevistando uma a uma as pessoas, para colher os dados através de suas
histórias clínicas, onde ficasse claro o impacto do Programa de Redução de Danos em suas
vidas individuais. Para tanto suas narrativas seriam essenciais.
Com relação aos usuários de crack, população-alvo do programa desde 2003, a análise
de resultados se torna ainda mais complexa, uma vez que há doenças passíveis de transmissão
pelo uso de latas de alumínio para fumar o crack, como hepatite, tuberculose e leptospirose.
As formas de transmissão destas doenças são diversas, impossibilitando registros de
causalidade que poderiam dar maiores indicativos da efetividade do programa para com esta
94
população.
O programa avalia sua atuação de acordo com o número de acessos e não de
resultados, ou seja, focaliza os meios e não os fins.
Traçamos um paralelo entre os dados fornecidos pelo programa e os dados coletados
no Sistema de Informação de Agravos de Notificação – SINAN – Desenvolvido entre 1990 e
1993. O SINAN, que substituiu o Sistema de Notificação Compulsória de Doenças – SNCD -
concebido pelo então Centro Nacional de Epidemiologia, tem o apoio técnico do DATASUS
e recebe os dados dos municípios de todo o Brasil.
Mesmo que o município não disponha de microcomputadores em suas unidades, os
instrumentos deste sistema são preenchidos à mão e o processamento eletrônico é feito nos
níveis centrais das Secretarias Municipais de Saúde, mas Regionais ou nas Secretarias
Estaduais (SERGIPE, 2006). O sistema é alimentado pela notificação e investigação dos casos
de doenças e agravos existentes na “lista nacional de doenças de notificação compulsória”.
Porém é facultado a estados e municípios incluir outros problemas de saúde importantes para
a sua região, refletindo necessidades do perfil epidemiológico local. O SINAN facilita a
formulação e a avaliação das políticas, planos e programas de saúde, subsidia o processo de
tomada de decisões e contribui para a melhoria da situação de saúde da população. Registra
não apenas os casos detectados de AIDS (síndrome de imunodeficiência adquirida) em
adultos, como também os casos de infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) em
gestantes e crianças expostas ao risco de transmissão vertical.
A classificação por categoria de exposição não hierarquizada, apresentada pelo
SINAN, para o município de Balneário Camboriú, mostra o montante de notificações de
síndrome de imunodeficiência adquirida ligada simultaneamente a drogas e a comportamentos
sexuais de risco, para o período estudado, dados expostos na tabela abaixo:
95
Tabela 19: Freqüência de AIDS por ano de notificação, segundo categoria de exposição não
hierarquizada, SINAN, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005.
Categoria de Exposição não Hierarquizada 2001 2002 2003 2004 2005* Total
Ignorada pelo SINAN 0 0 0 0 0 0
Homossexual 3 3 8 6 2 22
Drogas/Homossexual 0 0 0 1 0 1
Bissexual 3 6 4 0 0 13
Drogas/Bissexual 1 0 1 0 0 2
Heterossexual 27 48 43 27 7 152
Drogas/Heterossexual 9 6 2 9 1 27
Heterossexual com parceiros de risco 0 0 0 18 6 24
Drogas 0 0 0 0 1 1
Transfusão 0 0 0 0 0 0
Transmissão Vertical 0 0 0 0 1 1
Total
43 63 58 61 18 243
Fonte: SINAN, 2006.
* É possível que os dados de 2005, coletados em setembro de 2006, estejam incompletos
.
Dos 31 casos de HIV relacionados com drogas injetáveis notificados, 27 apresentam-
se como heterossexuais. A relação entre o uso de drogas por via endovenosa e a preferência
sexual declarada pelo paciente e referida na tabela é especificada, a seguir, no gráfico.
0 5 10 15 20 25 30
Drogas/Heterossexual
Drogas/Bissexual
Drogas sem
especificação
Drogas/Homossexual
Fonte: SINAN, 2006.
96
Figura 15: Relação entre o uso de drogas por via endovenosa e a preferência sexual
declarada pelo paciente, SINAN, Balneário Camboriú, 2001 – 2005.
Ao hierarquizar a categoria de exposição, na tabela montada com os dados do SINAN,
o montante de notificações de síndrome de imunodeficiência adquirida em usuários de drogas
ilícitas injetáveis fica claro. O município de Balneário Camboriú registrou 31 casos na série
histórica estudada, distribuídos de forma cíclica.
Nota-se uma discrepância entre o número de notificações registradas no SINAN e o
número de registros de pacientes com prontuário aberto no Centro Integrado de Saúde e
Solidariedade. Isso acontece, segundo a coordenadora do Programa DST/AIDS de Balneário
Camboriú, devido aos critérios de notificação serem diferentes. No CISS os registros são
feitos de acordo com os prontuários abertos de pacientes encaminhados ao serviço,
independente de estarem ou não apresentando os sintomas da AIDS. No SINAN registra-se a
notificação de todas as pessoas contaminadas que já estejam com uma carga viral elevada a
ponto de caracterizá-lo como doente de AIDS. Ou então apresentando sintomas característicos
ou doenças oportunistas.
Usuário de droga injetável
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Ano
UDI
Usuário de droga
injetável
Fonte: SINAN, 2006.
Figura 16: Freqüência de AIDS por ano de notificação, segundo categoria de exposição
hierarquizada, Balneário Camboriú, SC, 2001-2005.
97
Fazendo uma comparação com os dados fornecidos pelo programa e os dados
coletados pelo SINAN, é possível perceber que em 2001 quando o projeto estava se
estruturando e sua atuação consistia na abertura de campo e nos primeiros contatos com os
usuários, houve uma notificação de sete ocorrências de AIDS na categoria de usuários de
drogas injetáveis. No ano seguinte, 2002, o programa estava atuando na distribuição de
seringas junto aos usuários. A forma de registro das atividades ainda estava precária e a
equipe atuava de acordo os treinamentos realizados no primeiro ano de abertura do programa.
O coordenador estava ausente devido a um acidente, o que segundo ele teria prejudicado as
atividades e registros. Ao mesmo tempo, este ano, segundo os dados do SINAN, houve uma
queda de notificações de AIDS na categoria em questão, baixando de sete para cinco.
Para que alguém que seja soropositivo venha a desenvolver AIDS requerem-se alguns
anos. As pessoas notificadas em 2002 contaminaram-se no mínimo três anos antes. Logo, não
se pode manter uma suposta relação de causalidade entre a queda do número de notificações e
a existência do programa de redução de danos em tão curto período de tempo.
O ano de 2003 foi aquele em que mais se distribuiu seringas entre os usuários.
Coincidentemente, nas notificações registradas pelo SINAM, os casos baixaram de cinco no
ano de 2002 para três em 2003. Foi quando, segundo a equipe de redução de danos, percebeu-
se que a demanda de usuários de drogas injetáveis havia diminuído consideravelmente e que a
maior demanda no município era de usuários de crack. Em 2004 o programa concentrou as
atividades nos usuários de crack, confeccionando e distribuindo cachimbos. As notificações
do SINAM apontam que nesse ano houve um aumento de 3 para 9 casos de AIDS entre
usuários de drogas injetáveis, ano em que o programa não distribuiu nenhuma seringa.
A comparação entre os números de pessoas infectadas pelo HIV que estão expostas ao
risco de transmissão pelo uso de drogas injetáveis é reducionista e tentadora aos redutores de
danos.
Não há, por esta via, possibilidade de manter uma relação direta de causalidade. Só
haverá por este caminho, possibilidade de montar correlação de causalidade, se tivermos, para
avaliação, uma série histórica muito longa, capaz de absorver o tempo que a história natural
da doença requer para se manifestar, desde a contaminação, passando pela queda da
imunidade, até o diagnóstico e a notificação. Isso não se dá num mês, num ano e nem de um
ano para outro.
98
6.4 Discussão
O estudo aqui apresentado traça um panorama do Programa de Redução de Danos de
Balneário Camboriú, apresentando sua estrutura física, recursos humanos e financeiros, seu
processo de trabalho e como avaliam seus resultados.
Avaliando a estrutura do programa é possível afirmar que com relação aos recursos
físicos, tiveram no início financiamento suficiente para organizar o serviço num espaço físico
adequado, com materiais informativos, computador, e insumos necessários (preservativos e
seringas) para realização das atividades propostas.
O local onde a sala do programa está montada é adequado por estar dentro da sede do
programa DST/AIDS, integrado com os demais projetos de prevenção. Parcerias entre eles
são constantemente propostas para acessar diversas camadas da população e atender as
diversas demandas, o que é positivo sob o ponto de vista da promoção e da prevenção à saúde.
Para a população é um centro de referência na busca de auxílio às questões relacionadas à
sexualidade e às drogas.
O programa de redução de danos contou com apoio financeiro de agências
internacionais como a UNDCP (Programa das Nações Unidas para controle internacional de
drogas) de 2001 a 2003, e com a UNESCO em 2004. A partir desta data quando encerrou-se o
contrato, o programa passou a ser financiado com uma parcela da verba destinada ao
programa DST/AIDS do município.
A equipe do programa passou por diversas mudanças no quadro de pessoal, desde a
coordenação até a equipe de redutores. Cada funcionário novo que entra deve ser capacitado e
treinado, interferindo no rendimento das atividades.
Isso pode ser notado na coleta de dados aqui realizada. Relativos a 2001 e 2002, o
programa possui apenas dados condensados e sumários em seus registros, o que dificulta uma
análise mais precisa das atividades realizadas neste período. No período a equipe contava com
um quadro de pessoal diferente da equipe atual. O único funcionário que ainda permanece é o
atual coordenador, que no início era o psicólogo do programa. Nestes anos já aconteciam as
parcerias com outros programas de prevenção e os redutores, em campo, atendiam usuários de
drogas injetáveis e usuários de outras drogas não especificadas, assim como a população
caracterizada como não usuária. Postos de gasolina, bares e quiosques não tinham ainda sido
vinculados ao programa. As profissionais do sexo, atendidas hoje pelo programa, não o eram
devido à existência de um programa específico para esta população (o projeto Beija-Flor), que
atualmente não existe mais.
99
Foi um período fundamental para o programa, pois foi quando iniciou a abertura de
campo, as parcerias, a aproximação dos usuários e os primeiros vínculos. Isso foi facilitado
pela presença de dois redutores ex-usuários, que conheciam os locais de uso, os usuários e sua
linguagem, o que facilitou a aproximação. Estes redutores haviam trabalhado em um
programa de redução de danos de outro município, onde adquiriram experiência com este tipo
de trabalho.
A coordenadora deste período era assistente social e seu conhecimento das
comunidades do município facilitou a abertura de campo. A principal falha parece estar na
forma de registro que foi passada para a nova equipe dificultando uma avaliação mais precisa
dos anos em questão.
Em 2003 a equipe se reestruturou, houve saída de funcionários e entrada de novos,
mudou a coordenação e melhoraram as formas de registros. A partir daquele ano o programa
tem registro anual das atividades, o que sugere melhor organização para as atividades
propostas.
Foi o ano em que, de acordo com os registros, o número de acessos de usuários de
drogas injetáveis foi maior, e consequentemente, o número de vínculos também. Mais
seringas foram entregues em comparação com os demais anos de atuação. No entanto houve
dificuldades para estabelecer relações de troca de seringas. Uma das causas foi a saída
dos redutores que eram ex-usuários. Eram eles que tinham facilidade em negociar a troca de
seringas. Sua demissão dificultou tal negociação. Paralelamente a isso, uma usuária vinculada
ao programa, que colaborava na troca de seringas, se mudou para outra cidade.
Essa dificuldade de realizar a troca é um ponto negativo do programa. Quando as
seringas usadas permanecem com os usuários ou ficam perdidas pela cidade, abre-se a
possibilidade de que tais seringas sejam reutilizadas, podendo levar a contaminações. Soma-se
a isso o fato de que sob efeito da “fissura”, o desejo intenso de usar a droga, o usuário pode
não se preocupar com as condições da seringa que está disponível, mesmo consciente dos
perigos envolvidos.
De acordo com o Manual de Redução de Danos, essa é uma dificuldade encontrada em
vários programas de redução. Uma vez que o uso de drogas envolve questões judiciais, o
usuário consciente de estar agindo ilegalmente preocupa-se em não deixar vestígios.
Abandona o local de uso rapidamente, deixando por lá a seringa utilizada.
Algumas dessas seringas poderão ser reutilizadas, ou levadas pelo serviço de limpeza
do município, ou mesmo ser encontrada pelos redutores ao visitarem os locais de uso. O
Ministério da Saúde preconiza que “diante da impossibilidade de troca, está indicado fazer
100
distribuição, que amplia a disponibilidade e o acesso a equipamentos estéreis e descartáveis
de injeção entre usuários de drogas injetáveis e, em decorrência, diminui a probabilidade de
compartilhamento de seringas e agulhas” (BRASIL, 2001 p.30).
Um outro problema operacional percebido no programa de redução de danos de
Balneário Camboriú, mas que não se restringe a ele, é o número adequado pré-estabelecido,
pelo ministério, de seringas a serem disponibilizadas para se obter e se manter o controle da
infecção. Desta forma fica a critério de cada programa, frente à sua realidade, estabelecer um
parâmetro.
O programa aqui estudado, procurava negociar com os usuários vinculados um
número de seringas deixadas semanal ou mensalmente.
Paralelamente a este atendimento aos usuários de drogas injetáveis, o programa
percebeu uma demanda de usuários de crack, que passou a aumentar no ano de 2004, levando
a uma reformulação do programa frente à nova demanda. Esse fato não ocorreu somente no
município estudado, mas de forma geral, como consta nos estudos multicêntricos realizados
durante 10 anos e divulgados em 2001 (BRASIL, 2001). O aumento do uso de crack já vinha
acontecendo em outras localidades, antes de ocorrer em Balneário Camboriú.
A troca da cocaína injetável pelo crack fumado em cachimbos não é resultado da
existência dos programas de redução de danos:
As limitações das políticas públicas de drogas e saúde se refletem nos
achados de outras alterações relativas ao padrão de consumo de drogas.
Parece que muito mais do que uma decisão tomada como fruto da ação da
saúde pública, o crescimento do uso de cocaína em forma de pedra de crack
na população estudada, deu-se entre outras causas por uma decisão
comercial do tráfico de drogas. É preciso ficar claro que seria indefensável
do ponto de vista das autoridades de saúde, o incentivo ao uso de crack,
como forma de desestimular o uso de cocaína injetável (BRASIL, 2001,
p.35).
O crack pode ter substituído a droga injetável por diversos fatores: o preço mais
acessível, a facilidade do porte de uso, a velocidade com que o efeito da droga se manifesta, a
consciência dos riscos envolvidos na prática do uso da droga endovenosa. Existem muitas
hipóteses referentes ao aumento do uso de crack.
Afirmar que a diminuição do uso de droga injetável tem como fator a atuação do
programa de redução de danos é tão improvável quanto afirmar que este seria o responsável
pelo aumento do consumo de crack.
101
De certa forma, o aumento do uso de crack se reflete na diminuição do número de
usuários de drogas injetáveis e, consequentemente nas futuras notificações de AIDS entre
usuários de drogas injetáveis.
As vinculações ao programa é que poderiam gerar condições para a obtenção dos bons
resultados teorizados. Quanto maior o número de usuários vinculados ao programa, para
pegar insumos e informações, colocando-o como referência, mais o programa estará
promovendo mudanças comportamentais no usuário de drogas que recusa a abstinência e o
tratamento.
Em 2003, dos 49 usuários de drogas injetáveis acessados, 81,6% tornaram-se
vinculados. É discutível a forma com que tais vinculações são consideradas, pois não há um
cadastro oficial: basta acessar a mesma pessoa mais de uma vez para considerá-la vinculada
ao programa.
A equipe argumenta ser complicado fazer um cadastro, por ser uma população
flutuante, difícil de vincular oficialmente. Haveria exceções, mais fáceis de cadastrar, como
os casos de usuários que recebiam a visita dos redutores regularmente para receber insumos,
ou que costumavam ir na sede do programa frequentemente.
Tal fato explica porque em 2004 e 2005 o número de vinculados é maior que o de
acessados. Como o número desta população de usuários de drogas injetáveis diminui
consideravelmente, a maioria dos usuários ainda atendidos pelo programa já era conhecida e
considerada, portanto, vinculada.
Um problema semelhante ocorre em relação aos usuários de crack, população-alvo do
programa a partir de 2003. Nesta população há uma maior dificuldade no registro de acessos e
vinculações, devido o número elevado de usuários.
Notamos que em 2003, quando o trabalho com usuários de crack começou a ser
realizado, os números de acessos e vinculações eram praticamente iguais. Segundo os
redutores, isso aconteceu porque eles já conheciam a maioria dos usuários acessados. Tal fato
sugere que os usuários foram registrados nos acessos e já considerados vinculados. É,
portanto, possível que um mesmo usuário possa ter sido registrado mais de uma vez, em
ambas as categorias.
Isso explica os números elevados de vinculações e dificulta a avaliação do programa
com relação ao número de usuários que aderiram ao programa.
Em termos quantitativos dá a impressão de que muitos usuários estão sendo acessados
e vinculados pelo programa, o que não condiz com a realidade, se avaliarmos como tais
registros são feitos.
102
Em questão de números, os anos de 2003 e 2004 se destacaram na maioria das
atividades realizadas pelo programa. Isso ocorreu, de acordo com a equipe, pelo número
maior de funcionários nestes anos. Em 2003, quando a equipe foi reestruturada passou a
contar com um coordenador, um supervisor de campo e seis redutores. É o mesmo número de
funcionários que compõe a equipe no ano de 2006.
Mais redutores em campo implicou em mais preservativos distribuídos, mais usuários
acessados, mais insumos entregues, mais bairros visitados durante a semana e mais cachimbos
produzidos. No entanto, isso não garante resultados.
Para melhor avaliar o objetivo geral do programa, de reduzir a disseminação do HIV e
de outras doenças de transmissão sanguínea entre usuários de drogas injetáveis e destes para
seus parceiros de uso da droga ou sexuais, é preciso relacioná-lo à ocorrência e à prevalência
de casos de HIV/AIDS no município. No SINAN registros são feitos por categorias
hierarquizadas ou não. Na tabela de categorias não hierarquizadas são colocadas as
possibilidades de vias de contaminação. Ali consta se o paciente fazia uso de drogas
injetáveis, se era hetero, homo ou bissexual. Ser usuário de droga injetável o coloca em um
grupo de alto risco para contaminação do HIV, mas não há como saber se a transmissão se
deu por esta via ou por relação sexual.
Nesta categorização há os heterossexuais com parceiro de risco indefinido. Aqui cabe
colocar a questão de gênero, também enfatizado no Estudo Multicêntrico:
Pesquisadores de diversos países como Goldestein, Scheper-Hughese e
Giffin com seus grupos de colaboradores, bem como pesquisadores
brasileiros coordenados por Ventura-Felipe, em trabalhos de bastante
profundidade, analisam as dificuldades do enfrentamento da epidemia do
HIV/AIDS no Brasil onde a relação de gênero é bastante desfavorável às
mulheres. Em uma sociedade machista, na qual prazeres e riscos são
controlados pelos parceiros sexuais do sexo masculino, as mulheres se
colocam de maneira inferiorizada no relacionamento a dois. Isto, portanto
acaba se traduzindo no risco maior também das mulheres usuárias de drogas
injetáveis para a transmissão do HIV (BRASIL, 2001, p.34).
Um dos objetivos do programa consiste em atuar com usuários de drogas injetáveis ou
crack e suas parceiras ou parceiros, implantando estratégias de prevenção. A metodologia
proposta é a da distribuição de insumos (seringas, preservativos, folhetos educativos), repasse
de informações, disponibilização de exame para o HIV e aconselhamentos.
A atuação ocorre de forma indireta, pois o acesso é realizado com os usuários e não
com suas parceiras ou parceiros sexuais. O que o programa faz, portanto, é distribuir os
preservativos e orientar sobre a importância do uso. Não há dados para confirmar se tal
103
procedimento gera mudanças de comportamento nos usuários para com suas parceiras ou
parceiros.
Os registros indicam quantos preservativos, seringas e cachimbos foram distribuídos
para cada população específica, o número de usuários, localidades acessadas e o número de
encaminhamentos (feitos de maneira informal). No entanto não há dados indicando se houve
mudança de comportamento por parte dos usuários atendidos com relação ao uso de drogas e
sexo seguro, nem quantos dos encaminhados foram até a unidade para realização de exame.
Isso dificulta a mensuração dos resultados alcançados com tais medidas. As metas são
cumpridas, mas não é possível afirmar com que efetividade.
Outro objetivo é o de implementar ações de redução de danos em unidades básicas e
outros serviços, criando referências de atendimento para usuários de drogas acessados pelo
programa. O programa registra o número de unidades de saúde contatadas. Segundo o
relatório de progresso da equipe, “houve uma boa aceitação e integração das equipes de PSF”.
Embora exista parceria do programa com as equipes do PSF do município, essa
parceria é precária e mal estruturada. Assim como existem grupos específicos trabalhados
nessas unidades, como grupos de gestantes e hipertensos, seria válido ter grupos de usuários
com os quais os redutores poderiam realizar oficinas e estimular a participação social. Mas
dificuldades para reunir tal população não parecem faltar, principalmente por ela se colocar na
ilegalidade, o que os marginaliza da sociedade. A solução que o Programa de Redução de
Danos vislumbra, embora ainda não tenha iniciado na prática, seria a de abrir oficinas para
usuários de drogas, para que estes ajudem na confecção dos cachimbos, feitos atualmente
pelos redutores. Isso aproximaria os usuários do programa e facilitaria a criação de vínculo.
Tal atividade ainda está em estudo pelo programa.
O que ocorre esporadicamente é a participação do programa nos eventos das
comunidades, realizados pelo programa de Saúde da Família (PSF), levando informações
sobre seu trabalho, bem como palestras para os profissionais.
Segundo a equipe do programa, quanto ao sistema de referência e contra-referência,
poucas pessoas buscam o serviço por encaminhamento das unidades. Não há novos planos
para efetivar essas parcerias. Seu argumento é o de que muitos profissionais se mostram
resistentes ao programa e à sua atuação. A não existência do Centro de Atenção Psicosocial
para usuários de drogas (CAPS AD) no município também dificulta o trabalho em rede, pois
não há um serviço de saúde que atue especificamente com a população de usuários de drogas.
104
Como consta no Manual de Redução de Danos, estabelecer parcerias não é tarefa fácil,
mas uma vez iniciado esse processo, mais que uma estratégia de trabalho, ele se torna um
exercício de promoção da cidadania.
O programa de redução de danos de Balneário Camboriú está integrado ao Programa
DST/AIDS do município, localizado no Núcleo de Prevenção, conhecido como Centro de
Testagem e Aconselhamento (CTA). Isto teoricamente facilitaria o sistema de referência e
contra-referência com este serviço, bem como com o serviço ambulatorial de especialidades,
localizados no Centro Integrado de Saúde e Solidariedade (CISS), onde são atendidas as
pessoas portadoras do HIV, os doentes de AIDS, outras doenças sexualmente transmissíveis e
a tuberculose.
Com o programa DST/AIDS, frequentemente são realizados eventos, principalmente
para estudantes em escolas. Nestes eventos o programa visa formar alunos multiplicadores,
que ficariam responsáveis por desenvolver trabalhos nas escolas onde estudam, levando as
informações que aprenderam referentes às doenças sexualmente transmissíveis, HIV/AIDS e
drogas.
As avaliações destes trabalhos não são de responsabilidade do programa de redução de
danos, mas do Programa Educa Vida também desenvolvido no núcleo de prevenção.
Com relação às comunidades terapêuticas voltadas à abstinência de drogas ilícitas, há
parceria com duas existentes no município de Balneário Camboriú. Nota-se a existência de
uma incompatibilidade de visões e discursos, entre o programa e as comunidades que se
mostram opostas, apesar de complementares.
As comunidades tidas como centros de reabilitação para dependentes químicos,
trabalham com a abstinência dos usuários e com recursos para que estes não tenham recaídas.
O foco está no uso e abuso das substâncias. Na redução de danos não se trabalha com a
possibilidade de abstinência do usuário. Pelo contrário, atua-se junto às pessoas que não
desejam parar de usar a droga, focando a diminuição de danos à saúde.
As incompatibilidades entre estas instituições mostram-se nos discursos e nas
posturas, mais moralistas ou mais liberais, adotadas pelos funcionários das equipes. No caso
do programa de redução de danos alguns funcionários, se não todos, devido a uma cultura
institucional que se estabeleceu, parecem assumir uma postura de permissividade frente às
drogas, interpretadas por outras instituições como uma postura incentivadora.
Vários programas de redução de danos existentes no país já enfrentaram problemas
com a polícia e o poder judiciário, como também com instituições conservadoras.
Recentemente o Programa de Redução de Danos de Balneário Camboriú enfrentou acusações
105
devido a uma denúncia de que o programa não tinha permissão legal para distribuir
cachimbos a usuários de drogas. Foi acusado de estar incentivando o uso de drogas pelos
meios de comunicação de massa. Diante disso os redutores precisaram cessar suas atividades
até o dia da audiência. Nela, o Programa contou com apoio de representantes que trabalham
com a redução de danos em outras localidades, bem como com o Secretário de Saúde e outras
autoridades.
Coloca-se a reflexão sobre a necessidade de atuações diferentes para populações
específicas, com foco na saúde do usuário de drogas e da população que pode ser
contaminada por ele. A permissividade e o respeito pela escolha do usuário de continuar
fazendo uso de alguma substância ilícita levanta a polêmica. A Redução de Danos não
condena, não dá conotação moral aos usuários, todavia seu objetivo não pode fugir da
educação e nem da abstinência, em alguns casos, como meta final.
A partir disso, surge uma outra questão trabalhada pelo programa, a questão da
exclusão social:
A ilegalidade de algumas drogas, em nossa realidade, tem contribuído para o
processo de exclusão social
22
dos sujeitos com esta prática sociocultural,
afastando-os, geralmente, dos sistemas de referência de valores e
institucional que são socialmente legitimados. Essa distância, acentuada pela
exclusão social, pode gerar uma falsa idéia da existência de dois mundos
opostos: o mundo da normalidade e o mundo das drogas. A convivência
entre esses dois mundos passa, então, a ser de negação mútua, gerando
mitos, preconceitos e intolerância (BRASIL, 2001, p.34).
Os redutores acabam sendo o elo entre os usuários de drogas ilícitas e os serviços de
saúde. Demonstram ter consciência desta responsabilidade e por isso preocupam-se em
vincular os usuários ao programa. Os resultados dessa atuação aparecem quando o usuário
procura o serviço. Alguns vêm até a sede do programa para buscar insumos apenas. Há outros
que não procuram somente os insumos: pedem para conversar, contam seus problemas,
procuram apoio. Isso caracteriza o programa de redução de danos como um serviço de
acolhimento, apoio social e solidariedade.
De acordo com Teixeira (2003, p.98), a temática do acolhimento nos serviços de saúde
vem ganhando importância crescente no campo médico-sanitário e, sobretudo, vem
22
Os processos de exclusão social são amplos e complexos. Podem ser de natureza econômica, étnica, de gênero,
de orientação sexual ou relativos a práticas culturais consideradas patológicas, anormais ou mesmo subversivas.
No entanto em linhas gerais, podemos afirmar que a exclusão social expressa a incapacidade de uma dada
organização social em atender as reais necessidades dos diferentes segmentos sociais, gerando intolerância,
negação de direitos e, principalmente, marginalização (BRASIL, 2001, p.34).
106
requalificando a discussão a respeito do problema do acesso e da recepção dos usuários nos
serviços de saúde.
O acolhimento tem a ver com o reconhecimento do outro como ser humano com
necessidades, especificidades, responsabilidades. Muitas vezes é entendido como ouvir sem
julgar, orientar sem impor, aceitando as diferenças e compreendendo as limitações.
Este conceito está ligado ao de integralidade. Segundo Pinheiro (2001, p.4), a
integralidade é assumida como sendo uma ação social resultante da permanente interação dos
atores na relação demanda e oferta, em planos distintos de atenção à saúde. Aquela autora
observa um plano individual, onde se constrói: a integralidade no ato da atenção individual e
um plano sistêmico, onde se garante a integralidade das ações na rede de serviços.
O programa de redução de danos pode ser interpretado dentro de tais conceitos, uma
vez que procura acolher os usuários, respeitando-os enquanto sujeitos, eliminando os
estereótipos gerados nesta população e atendendo cada usuário como único, dando a ele
possibilidades de se tornar protagonista frente à própria vida, adotando práticas mais seguras,
que protejam sua saúde. No entanto é preciso ter um método para avaliar e monitorar as
atividades e os resultados alcançados.
O monitoramento e avaliação são fundamentais para a manutenção e o aprimoramento
das atividades desenvolvidas pelo programa de redução de danos. Contudo:
O monitoramento e a avaliação dos programas de redução de danos
revestem-se de especial dificuldade, uma vez que lidamos com uma
população de difícil acesso, alvo de discriminação, quando não de sanções
penais, de dimensão desconhecida e de hábitos bastante mutáveis, em grande
parte ocultos ou desconhecidos dos pesquisadores e das instituições de
saúde, de modo geral (BRASIL, 2001, p.75).
Mesmo existindo dificuldades o Ministério da Saúde estabelece algumas medidas de
monitoramento e avaliação do programa. As atividades podem ser monitoradas por meio de
instrumentos de coleta de dados a serem preenchidos pelos executores, principalmente pelos
redutores de danos, referente à sua rotina, e destinados aos registros das atividades
desenvolvidas:
(a) Relativas à organização do trabalho, como o número e a especificação dos recursos
humanos em atividade, os treinamentos e supervisões de campo realizadas;
(b) Relativas ao trabalho de campo, reuniões realizadas, usuários de drogas e usuários
de drogas injetáveis acessados, dificuldades encontradas, encaminhamentos realizados para
centros de referência de doenças sexualmente transmissíveis, de AIDS e de tratamento para
107
abuso ou dependência de drogas, encaminhamentos para atendimentos específicos em outros
serviços de saúde e assistência social.
Tais atividades desenvolvidas constam no relatório de progresso elaborado anualmente
para ser enviado ao Ministério da Saúde. Em relação aos encaminhamentos, eles são feitos
informalmente, sem nenhum documento que possa servir de registro para comparar
posteriormente quantos dos encaminhados se dirigiram à instituição indicada. Há, portanto,
um déficit estrutural de monitoramento e de controle do programa.
O monitoramento deve acontecer, segundo o Ministério da Saúde (BRASIL, 2001, p.
75), com relação aos recursos materiais também, onde deve ser registrado o número de
insumos (seringas, cachimbos, preservativos) recebidos e distribuídos pelo programa, número
de seringas trocadas, número de vacinas aplicadas e mapa de campo.
Estes registros também são encontrados no relatório de progresso. A aplicação de
vacinas consta na página de atividades previstas, porém não realizadas. A justificativa é a
resistência dos usuários em permitir a vacinação.
Com relação à população atendida, o programa deve registrar o número de usuários de
drogas injetáveis e não injetáveis acessados e vinculados, a distribuição geográfica dos
mesmos, a distribuição por idade e sexo, o número estimado de parceiros sexuais, o tipo de
drogas consumidas, o número de estimado de portadores de DST, HIV e hepatites B e C.
O que encontramos nos registros pesquisados foi apenas o número de acessos e
vinculações a usuários de drogas injetáveis e crack. Isto nos impossibilita traçar um paralelo
realista de quantos usuários acessados se tornaram vinculados pelo programa e dificulta até
mesmo ter uma noção clara de quantos usuários são acessados no município, uma vez que se
registra o número de acessos e não o número de acessados. O mesmo usuário pode ser
acessado e registrado mais de uma vez, o que praticamente invalida diversas conclusões que
se poderia tirar dos dados estatísticos.
Com relação aos outros itens (distribuição geográfica, idade, sexo, número de
parceiros, tipos de drogas, portadores de DST/HIV e hepatite), o único registrado é o sexo,
com o qual foi possível traçar um paralelo da diferença de gênero relacionado ao uso de
drogas. O registro dos outros itens facilitaria a caracterização da população atendida pelo
programa e, consequentemente, sua atuação.
O registro é feito pelo redutor em campo diariamente e entregue todas as segundas-
feiras na reunião de equipe, onde se fecham os dados da semana. Tais dados são fechados
mensalmente, para no fim de cada ano elaborar o relatório anual, que será enviado ao
Ministério da Saúde.
108
Embora deixem de registrar dados importantes, os redutores procuram cumprir o que
vêem como tarefas burocráticas e consideram o registro como uma forma de saber se o
trabalho realizado está alcançando a meta proposta. Os dados registrados não têm servido,
efetivamente, para pensar o programa, de um ponto de vista do monitoramento, e do controle
de avaliação.
No que diz respeito à avaliação desses resultados encontramos falhas no programa. De
acordo com o próprio Ministério da Saúde:
A avaliação dos programas de redução de danos não é uma tarefa fácil, tanto
do ponto de vista metodológico como operacional. Ela exige um
conhecimento prévio de uma gama de informações sobre a área e sua
população que inclui as características e problemas de saúde, bem como dos
serviços destinados ao seu atendimento, além de dados locais de vigilância
epidemiológica relativos à epidemia da AIDS, à incidência e prevalência de
hepatites, ao uso de drogas e às ações de prevenção e tratamento em
execução (BRASIL, 2001, p.76).
O conhecimento de que dispõe o programa estudado, é com relação às drogas mais
utilizadas no município, aos riscos à saúde que provêm de práticas de uso de drogas
inadequadas, aos serviços especializados e a dados referentes à contaminação do HIV em
usuários de drogas injetáveis. No entanto tais dados não são suficientes para fazer uma
avaliação mais profunda, e nem para orientar o gerenciamento integrado a uma visão de
conjunto da saúde pública local, levando em conta a epidemia da AIDS e sua relação com os
comportamentos de risco. Em torno dos usuários de crack, esta avaliação é mais precária, pois
não se conhece a incidência de doenças como hepatites, leptospirose e tuberculose nesta
população.
Uma avaliação dos resultados do programa precisa se fundamentar em uma classes de
evidências como consta no Manual de Redução de Danos: mudanças nos padrões de
comportamento da população de usuários de drogas injetáveis e crack e suas redes de
socialiação em relação a:
a) Comportamento de risco no que diz respeito à utilização de seringas estéreis e não
compartilhamento de equipamentos de injeção, ou uso de latas para fumo de crack;
b) Comportamento de risco referentes à sexualidade, como o uso de preservativos;
c) Adesão ao tratamento da infecção pelo HIV;
d) Solicitação de encaminhamentos para tratamento de dependência;
e) Ressocialização dos usuários, avaliada, por exemplo, pelos níveis de envolvimento
com tráfico, roubos, furtos e violência familiar;
109
f) Taxa de retorno de seringas aos postos de troca.
Dados dessa relevância não foram desenvolvidas pelo Programa de Redução de Danos de
Balneário Camboriú, e é preciso reconhecer que esta dificuldade é, principalmente,
determinada por uma cultura institucional que não incorpora, em sua rotina de procedimentos,
o registro e a sistematização de dados.
No entanto isso é fundamental, não só pra garantir financiamento, mas para obter um
panorama de sua atuação, onde está sendo eficaz e o que necessita de reformulações.
Nesse sentido, como preconiza o Ministério da Saúde (BRASIL, 2001, p.40), é de
fundamental importância que os programas de redução de danos tenham em sua rotina de
trabalho instrumentos de registros e levantamento de dados acerca do perfil socioeconômico e
cultural da população atendida e de suas práticas e comportamentos sexuais, além de dados
sobre padrões e hábitos relativos ao consumo de drogas.
110
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa buscou caracterizar o Programa de Redução de Danos de Balneário
Camboriú através do método de observação participante e análise documental, pautada na
estratégia de avaliação em saúde, proposta por Donabedian (1994). A instituição estudada foi
analisada a partir de três pilares: estrutura, processo e resultados. Esta forma de organização
facilitou a coleta e organização dos dados e possibilitou traçar um panorama do programa
estudado, alcançando os objetivos propostos de caracterizar e descrever o programa, sua
equipe, sua organização, seu funcionamento e a forma como avaliam seus resultados.
Foi possível perceber que em termos de estrutura física e adequação do ambiente, não
há problemas significativos. Sua localização é adequada e facilita a interação com outros
programas de prevenção. Dentre estes, é o programa que tem mais abrangência em termos
populacionais, pois não atende somente usuários de drogas injetáveis, mas outros tipos de
usuários, inclusive de crack, bem como a população não caracterizada como usuária de drogas
e profissionais do sexo.
Sempre que há eventos nas comunidades realizados pelo Programa de Saúde da
Família, a equipe de redução de danos participa, levando informações sobre drogas e suas
conseqüências para a saúde. Realiza palestras em locais vinculados ao programa, como
saunas, escolas (juntamente com o Programa Educa Vida, que trabalha a prevenção nas
escolas), casas de prostituição e presídios.
Isto é um ponto positivo do programa, enquanto estratégia de prevenção, pois esta
abrangência de acesso a diversas camadas da população possibilita que conhecimentos a
respeito de drogas, doenças sexualmente transmissíveis, HIV e AIDS estejam sendo levados à
população na busca de promover conscientização e promoção à saúde.
Outro aspecto positivo é o relacionamento entre os membros da equipe, por haver
respeito, democracia, companheirismo e humildade. A equipe é acessível, se mostrou
receptiva à confecção desta pesquisa e disposta a participar no que fosse preciso.
A relação dos membros para com a população atendida também se mostra satisfatória,
procuram respeitar as pessoas em suas escolhas pessoais e estão conscientes do seu papel,
tomando os devidos cuidados para não incentivar o uso de drogas (acusação comum feita aos
Programas de Redução de Danos). Procuram servir de elo entre os usuários de drogas e os
serviços de saúde, procurando promover a inclusão dessa população que se encontra
marginalizada da sociedade. O Programa de Redução de Danos funciona como um serviço de
111
referência, acolhimento, apoio social e solidariedade para os usuários de drogas, que os
procuram para pegar insumos e também para conversar, procurar apoio e auxílio.
A equipe preocupa-se em registrar as atividades realizadas, os acessos e vínculos, os
insumos distribuídos e a população atendida, com intuito de ter um controle do serviço
realizado e prestar conta ao Ministério da Saúde para garantir financiamento.
No entanto aqui está uma das limitações do programa, a forma de registro. Ao nos
depararmos com os números registrados, temos a impressão de que muitos usuários de drogas
estão sendo acessados pelo programa e tornando-se vinculados ao mesmo. Porém, ao analisar
como tais registros são feitos percebemos que os números não condizem com a realidade
apresentada. O número registrado não é de usuários acessados, mas sim de acessos, o que
impossibilita saber, realmente, quantos usuários são atendidos pelo programa e quantos destes
se tornaram vinculados.
Não há também como afirmar que o número de pessoas contaminadas por
compartilhamento de seringas diminuiu em função da atuação do programa, uma vez que há
outras variáveis envolvidas, como a substituição da cocaína injetável pelo uso de crack.
Afirmar se o programa de redução de danos, aqui estudado, gera resultados
satisfatórios com relação aos objetivos de diminuir a disseminação de doenças como HIV,
hepatite e outras doenças provocadas por práticas de uso de drogas inadequadas, é impossível
diante dos dados apresentados. Porém um amplo levantamento e algumas discussões podem
auxiliar esse e outros programas a estabelecer medidas mais efetivas.
O argumento da equipe diante de tal constatação é a dificuldade de acesso dessa
população, por ser flutuante e resistente. Tal complexidade em se avaliar resultados é citada
pelo Ministério da Saúde no Manual de Redução de Danos, devido ao fato do programa
trabalhar com uma população difícil, devido às condições sociais em que se encontram. No
entanto há maneiras de se avaliar os resultados do programa, mas este deve ir além de
registrar números. É preciso em primeiro lugar traçar um perfil do usuário trabalhado e depois
investiga-lo, acompanhando-o constantemente para saber se houve ou não mudança de
comportamento gerado pelas intervenções do programa.
Um Estudo Multicêntrico realizado ao longo de 10 anos em Santos, no Rio de Janeiro
e em Salvador, (BRASIL, 2001) acompanhou a evolução das intervenções dos Programas de
Redução de Danos locais e chegou a resultados satisfatórios, mostrando que apesar de toda
dificuldade e complexidade referente à população de usuários de drogas injetáveis, as
intervenções da redução de danos provocaram mudanças de comportamento diminuindo a
contaminação pelo HIV entre esta população.
112
Um estudo que acompanhe esta população por um período longo, considerando o
contexto, outras variáveis presentes e as dificuldades encontradas pode, com dados e registros
fidedignos, chegar a uma conclusão se o programa vem alcançando resultados concretos ou
não.
Tal afirmação não pode ser feita pelo estudo aqui realizado, no entanto tal pesquisa
pode servir ao programa como um meio de repensar sua forma de registro e criar instrumentos
e estratégias para modificá-las na busca de dados mais claros e reais. Modificar os critérios
que classificam os usuários como acessados e vinculados seria a primeira estratégia. Poderia
se pensar em criar um documento para registrar os usuários que vinculam-se o programa,
traçando um perfil dos mesmos. Tais usuários poderiam participar de alguma oficina criada
pelo programa (como a da montagem de cachimbos, projeto já existente do programa ainda
não colocado em prática) onde seriam treinados a fim de levar informações a outros usuários e
servir de elo entre estes e o programa.
Outro aspecto a repensar no programa são as parcerias, que embora aconteçam com
algumas instituições, ainda encontra-se insatisfatória. Parcerias com comunidades
terapêuticas, PSF, CISS, CAPS devem ser reavaliadas e reafirmadas, para por em
funcionamento um serviço em rede que dê amparo e assistência integral a população de
usuários de drogas, independente de sua escolha de parar ou continuar com o uso da droga.
É preciso que a equipe do programa tenham a consciência, de que embora seu foco de
atuação explícita não seja a abstinência dos usuários, podem estar trabalhando neste sentido
também, conscientizando essa população quanto aos prejuízos das drogas para a saúde e
encaminhando para instituições responsáveis. Tais encaminhamentos poderiam ser feitos
oficialmente por meio de documentos que fortaleçam a parceria do programa com os demais
serviços de saúde.
O programa poderia repensar ainda, estratégias para vencer resistências dos usuários,
justificativa dada pelo programa, frente à vacinação contra hepatite, pois essa é uma estratégia
de prevenção importante. Essa resistência pode ser vencida por meio do vínculo dos
redutores com os usuários, o que necessita de tempo e confiança, além de um trabalho se
sensibilização para que percebam os perigos que envolvem tais enfermidades.
Com relação aos usuários de drogas portadores do vírus HIV, que já iniciaram o
tratamento para AIDS, poderiam pensar em estratégias para se trabalhar a adesão ao
tratamento, atuação de competência dos Programas de Redução de Danos, segundo o
Ministério da Saúde, e que não é trabalhada no programa em estudo. Tal atuação poderia ser
113
pensada a partir de uma parceria com o Centro Integrado de Solidariedade e Saúde (CISS) do
município.
Essas são algumas sugestões levantadas diante dos dados analisados e que pode
contribuir para melhoria do Programa de Redução de Danos estudado.
Com esta pesquisa foi possível proporcionar o início das investigações deste
programa. Ficam abertas novas possibilidades de estudo junto à equipe e à população
atendida, para levantar dados referentes aos resultados deste programa no município.
114
8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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117
9 APÊNDICES
Apêndice A – Consentimento Livre e Esclarecido
Apêndice B – Autorização para a Realização da Pesquisa
118
APÊNDICE A
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
119
APÊNDICE B
Autorização para a Realização da Pesquisa
120
10 ANEXOS
Anexo 1 – Projeto do Programa de Redução de Danos
Anexo 2 – Relatório de Progresso 2002
Anexo 3 – Relatório de Progresso 2003
Anexo 4 – Relatório de Progresso 2004
Anexo 5 – Relatório de Progresso 2005
Anexo 6 – Relatório Diário
Anexo 7 – Condensado Semanal
Anexo 8 – Condensado Mensal
Anexo 9 – Relatório Financeiro
Anexo 10 – Folha de Controle do Motorista
Anexo 11- Material informativo distribuído a usuários de drogas injetáveis
121
Anexo 1
Projeto do Programa de Redução de Danos
122
Anexo 2
Relatório de Progresso 2002
123
Anexo 3
Relatório de Progresso 2003
124
Anexo 4
Relatório de Progresso 2004
125
Anexo 5
Relatório de Progresso 2005
126
Anexo 6
Relatório Diário
127
Anexo 7
Condensado Semanal
128
Anexo 8
Condensado Mensal
129
Anexo 9
Relatório Financeiro
130
Anexo 10
Folha de Controle do Motorista
131
Anexo 11
Material Informativo Distribuído a Usuários de Drogas Injetáveis
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