Para Constantino (2004), esse público seria, grosso modo, constituído pela
classe média
222
, afinal, segundo ele, “os valores e códigos manejados pelos dominantes
dispensam a publicidade massiva, já que esse código é uma linguagem esotérica apenas
compreendida dentro de seu circuito específico” (2004, p.138). Assim, a publicidade estaria
voltada para os blocos dominados da sociedade, sobretudo para classe média, uma vez que ela
possui um poder aquisitivo maior do que o das classes populares
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. Para ele, o profundo
conhecimento que os(as) publicitários(as) teriam dos códigos e valores da classe média
explicar-se-ia pela origem desses(as) profissionais, na própria classe média.
Conhecendo as trajetórias pessoais dos publicitários, verifica-se que
pouquíssimos são provenientes das classes altas, que tendem a direcionar
seus filhos a outras áreas, como direito, medicina etc. A maioria,
especialmente os mais antigos, vieram das classes médias, em geral urbanas,
muitos com pais sem formação superior. A sintonia mágica dos publicitários
com as classes médias, expressada pela capacidade de se fazer entender
através das mensagens publicitárias, encomendadas pelo pólo dominante,
vem, de fato, da homologia estrutural do campo publicitário.
Para nós, embora careça de comprovação empírica, essa sua hipótese, à
primeira vista, explica razoavelmente bem essa aparente afinidade do universo publicitário
222
Nas suas palavras, “entendida como todos aqueles grupos de consumo que consome bens já previamente
desvalorizados pelos dominantes, e que só foram outrora considerados “valorizados” porque justamente eram
desconhecidos do gosto das massas – eram, outrora, objetos de ‘distinção’” (2004, p. 39).
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A partir das análises feitas por Bourdieu dos mecanismos e jogos de distinção estabelecidos na
contemporaneidade, Constantino (2004) faz uma interessante análise do papel da publicidade para a classe
média. Para Bourdieu (1998), a hierarquia social é definida substancialmente em função do consumo de bens
simbólicos. Desta forma, a acumulação e a diferenciação simbólica constituem elementos importantes na relação
e (di)visão das classes sociais. Sendo assim, da sua perspectiva, as classes dominantes se distanciam das
dominadas, em grande medida, pelos gostos, posturas, opiniões, estilo de vida etc de seus(as) agentes. Ela marca
e hierarquiza sua diferença negando todos(as) aqueles(as) e tudo aquilo está abaixo dela. A classe média, por sua
vez, para marcar posição, não apenas nega o que está abaixo dela – as classes populares – como também busca
ascender socialmente procurando consumir e seguir o modelo de distinção imposto pela classe dominante. De
acordo com Constantino (1998), nesse contexto, a publicidade exerceria, então, uma função pedagógica para a
classe média, apresentado a ela os valores e produtos distintivos da classe dominante. Produtos estes que têm o
seu valor distintivo desvalorizado justamente quando passam a ser consumidos pela própria classe média. Afinal,
ao serem consumidos por ela, deixam de ser algo escasso, raro, exclusivo da classe dominante. É nesse
momento, então, que essa última classe tende a assumir novos valores, produtos e estilo de vida que a distinguirá
uma vez mais da classe média. Da mesma forma, a publicidade também exerceria um papel pedagógico para as
classes populares. Neste caso, apresentado para essa classe os valores e produtos distintivos da classe média. A
publicidade atuaria, assim, como uma espécie de mediadora cultural para todas as classes dominadas, fazendo os
bens de consumo escoarem, na sua inspirada metáfora, “numa escada, em que os degraus representam os estratos
sociais” (137, p.2004).