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Conforme Bruno Bettelheim (1989, p.276), Cinderela guia à criança através de suas
maiores decepções, desilusão edipiana, ansiedade de castração, má opinião de si
própria devido às más opiniões que acredita que os outros têm de si, ao encontro de
sua autonomia, conseguindo uma personalidade própria.
O último elemento a se destacar na história de Cinderela é o sapato, que é
um dos símbolos vinculados ao complexo de poder, daí a expressão: “vou pisá-lo
com meus sapatos”; simboliza, portanto, um ponto de vista da afirmação do ego.
Pode simbolizar ainda, o órgão sexual feminino por revestir o pé, que é um
conhecido símbolo fálico. O calçado que usamos é a parte do nosso vestuário mais
próxima ao chão, o que pode nos levar a fazer uma associação entre sapato e a
nossa relação com a realidade.
Segundo Chevalier e Gheerbrant
, (
1996, p. 802),
o sapato de Cinderela, na sua primeira versão, que remonta a Elieno,
orador e narrador romano do século III, confirma a identificação do
sapato com a pessoa. Quando uma cortesã, Rodopis, tomava banho,
uma águia roubou-lhe a sandália e levou-a ao faraó. Este,
impressionado com a delicadeza do pé, fez com que procurassem a
jovem por todo lugar; ela foi encontrada e ele a desposou. Da mesma
forma, o sapato que Cinderela abandonou no palácio do príncipe
quando fugiu, à meia-noite, se identificava com a moça. Grande foi a
surpresa quando Cinderela tirou do bolso o sinal de reconhecimento, a
prova irrefutável, o outro sapatinho, que colocou no pé: a prova da
identidade da pessoa. O príncipe, apático desde o seu
desaparecimento, tendo-a enfim reencontrado, casa-se com ela por
sua beleza, apesar de sua pobreza e dos seus farrapos.
No conto, Cinderela espera que o príncipe a encontre. Ele tem seu sapatinho
e, em algum momento, ele a encontrará e se casará com ela. O símbolo do sapato
que calça os pés é um forte símbolo sexual, representa a passagem para a vida
adulta e para o encontro da felicidade com o homem amado.
Então, percebemos que os contos de fada têm um importante valor no que
concerne à investigação dos processos psíquicos do inconsciente coletivo. Sendo
superior a qualquer outro material, representam os arquétipos, ou seja, o campo
favorável para a criação de determinadas imagens, símbolos e idéias.