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DILÉIA APARECIDA MARTINS
TRAJETÓRIAS DE FORMAÇÃO E CONDIÇÕES DE
TRABALHO DO INTÉRPRETE DE LIBRAS EM
INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO SUPERIOR
PUC-CAMPINAS
2009
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DILÉIA APARECIDA MARTINS
TRAJETÓRIAS DE FORMAÇÃO E CONDIÇÕES DE
TRABALHO DO INTÉRPRETE DE LIBRAS EM
INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO SUPERIOR
Dissertação apresentada como exigência para
obtenção do tulo de mestre em Educação, ao
Programa de Pós-graduação em Educação,
Pontifícia Universidade Católica de Campinas.
Orientadora: Profa. Dra. Vera Lúcia de C. Machado
PUC-CAMPINAS
2009
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Ficha Catalográfica
Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas e
Informação - SBI - PUC-Campinas
t419 Martins, Diléia Aparecida.
M386t Trajetórias de formação e condições de trabalho do intérprete de libras
em instituições de educação superior / Diléia Aparecida Martins. -
Campinas: PUC- Campinas, 2009.
121p.
Orientadora: Vera Lúcia de Carvalho Machado.
Dissertação (mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Centro de Ciências Sociais Aplicadas, Pós-Graduação em
Educação.
Inclui anexos e bibliografia.
1. Linguagem por sinais. 2. Surdos - Educação. 3. Surdos - Meios de
comunicação. 4. Educação especial. 5. Tradução e interpretação.
I. Machado, Vera Lúcia de Carvalho. II. Pontifícia Universidade Católica
de Campinas. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Pós-Graduação em
Educação. III. Título.
22.ed.CDD - t419
DEDICATÓRIA
Aos meus pais Anésio José Martins e Maria Angela Martins,
por terem me ensinado a valorizar, na simplicidade, nossas condições de
vida e por acreditarem no meu potencial de superação de barreiras
históricas socialmente impostas a nós negros.
À Pastoral dos Surdos e a Comunidade Surda,
por possibilitarem a vivência de experiências formativas na interpretação
da Língua Brasileira de Sinais.
Ao prof. Ricardo Sander, fundador da primeira Associação dos
Profissionais Intérpretes e Guias-Intérpretes da Língua de Sinais
Brasileira do Estado de São Paulo e aos Intérpretes de Libras membros
da Federação Brasileira dos Profissionais Tradutores e Intérpretes e
Guias-intérpretes de Língua de Sinais,
por dividirem momentos importantes na luta e conquista de direitos,
melhoria das condições de trabalho impostas a nossa categoria
profissional e, de modo especial, por terem aceito participar desta
pesquisa.
AGRADECIMENTOS
A Deus
por conceder-me força, vitalidade, inteligência, equilíbrio emocional e esperança sem os quais não
teria conseguido iniciar e concluir este trabalho.
À profa. Dra. Kátia Regina Moreno Caiado
Pela confiança no meu potencial, pela dedicação e pela perseverança diante das minhas
limitações, pela orientação e presença participativa no desenvolvimento desse trabalho.
Aos docentes do Programa de Pós-graduação em Educação
pelo conhecimento socializado no discorrer das disciplinas.
À Profa. Dra. Cristina Broglia Feitosa Lacerda e Profa. Dra. Elizabeth Oliveira Crepaldi de
Almeida
pela leitura e sugestões para o texto de qualificação e defesa.
Ao corpo docente da Faculdade de Letras da PUC Campinas, em especial, ao professor
Carlos de Aquino Pereira
pela disponibilidade e pela colaboração nos estudos relacionados à tradução e às propostas de
formação para tradutores e intérpretes de Língua Brasileira de Sinais.
A cada um dos colegas de curso
por se fazerem amigos no decorrer dessa jornada de estudo.
A Larissa de Souza Martins, Rute Telles e a todos os membros estudantes e visitantes do
grupo de pesquisa Laboratório de Estudos em Direito a educação,
pelo companheirismo e pelas discussões sobre a temática e metodologia utilizadas no
desenvolvimento da pesquisa.
À Pontifícia Universidade Católica de Campinas
pelo investimento em sua intérprete de Língua Brasileira de Sinais.
Aos membros da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação, Grupo
de Trabalho - Educação Especial,
pelo acolhimento e imensa colaboração na reflexão sobre questões relativas a educação da
pessoa surda no Brasil.
A Maria Cristina da Cunha Pereira e aos demais membros grupo Linguagem e Surdez da
Associação Nacional de Pós-graduação em Letras e Lingüística,
pelas sugestões e reflexões em torno do trabalho desempenhado pelo intérprete de Libras em sala
de aula bilíngüe.
Sou o que quero ser,
porque possuo apenas uma vida
e nela só tenho uma chance de fazer o que quero.
Tenho felicidade o bastante para fazê-la doce
dificuldades para fazê-la forte,
Tristeza para fazê-la humana e
esperança suficiente para fazê-la feliz.
As pessoas mais felizes não têm as melhores coisas,
elas sabem fazer o melhor das oportunidades
que aparecem em seus caminhos.
Clarice Lispector
RESUMO
MARTINS, Diléia Aparecida.
Título: Trajetórias de formação e condições de trabalho do intérprete de Libras em Instituições de
Educação Superior. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, Programa de Pós-graduação em
Educação, Campinas, 2009.
A presente dissertação tem como objetivo estudar as trajetórias de formação e as condições de
trabalho do intérprete de Libras certificado pelo exame nacional de proficiência para interpretação
de Libras, que atua em Instituições de Educação Superior. De acordo com a Lei de Diretrizes e
Bases para a Educação Nacional, Lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996, a educação especial
caracteriza-se como uma modalidade de ensino disponível desde a Educação Infantil até a
Educação Superior. Constitui-se de recursos materiais e humanos utilizados para a garantia de
condições de acesso de pessoas com deficiência à escolarização. No que tange à educação do
aluno surdo usuário de Língua Brasileira de Sinais (Libras), a presença de profissionais
proficientes em Língua Brasileira de Sinais torna-se fundamental em sala de aula e demais
espaços educacionais como parte do apoio especializado. Em decorrência dessa realidade,
visualiza-se a ascensão do Intérprete de Libras enquanto profissional cuja trajetória de formação é
recente, fator fortemente influente em suas condições de trabalho. O referencial teórico que
fundamenta este estudo é o histórico crítico, no qual se compreende que a educação e a
educação da pessoa surda é um processo histórico e cultural, datado no tempo e lugar social
(VIGOTSKI, 1997). De modo particular, a análise referente à trajetória de formação do Intérprete
de Libras ocorre mediante a observação do posicionamento ocupado por esse sujeito na
sociedade e às suas condições culturais e materiais de formação (BOURDIEU 1975). Como
abordagem teórico-metodológica, utiliza a pesquisa qualitativa para investigação de um campo
que envolve as ciências humanas e sociais (LOWY, 1985; GIL, 1999). A metodologia utilizada
para construção dos dados é um questionário composto por quarenta e uma questões e um
espaço para comentário disponível em um site durante cinco meses, acessado por cento e trinta e
um visitantes, dentre eles, os vinte e nove intérpretes participantes desta pesquisa. A análise dos
dados considera três eixos temáticos: trajetórias de formação, condições de trabalho e realidade
socioeconômica. Os resultados revelam que a formação desses intérpretes ocorreu a partir de
elementos apreendidos da interação com os valores da comunidade surda, apropriação do saber
científico e relações de trabalho.
Palavras-chave: intérprete de Libras; ngua brasileira de sinais; educação de surdos.
ABSTRACT
MARTINS, Diléia Aparecida.
Título: Trajetórias de formação e condições de trabalho do intérprete de Libras em Instituições de
Educação Superior. Dissertação (Mestrado em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de
Campinas, Centro de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, Programa de Pós-graduação em
Educação, Campinas, 2009.
The current dissertation has as its goal studying the education paths and working conditions of the
Libras interpreter certified by the national proficiency exam for Libras interpreting, that acts in
Higher Education Institutions. According to the Law Lei de Diretrizes e Bases para a Educação
Nacional, Lei nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996 special education is described as a teaching
form available since Child Education to Higher Education. It is constituted by material and human
resources used for the guarantee of the access condition of people with studying disability. As what
concerns the education of the deaf student user of Brazilian Sign Language (Libras), the presence
of proficient professionals in Brazilian Sign Language is fundamental in the classroom and other
educational spaces as part of the specialized support. As a result of this reality, it is seen the rise of
the Libras interpreter as a professional whose education path is recent, strongly influent factor in
their work conditions. The theoretical reference which gives this study its fundamentals is the
critical history, where it is understood that the education and the education of the deaf person is a
historical and cultural process, dated in time and social place (VIGOTSKI, 1997). In a particular
way, the referent analysis to the Libras Interpreter education path occurs through the observation
of the position occupied by this individual in society and their cultural and material conditions of
education (BOURDIEU, 1975). As a theoretical-methodological approach, uses the qualitative
research for the investigation of a field that involves human and social sciences (LOWY, 1985; GIL,
1999). The methodology used to build the data is a questionnaire composed by forty one questions
and a space for comment available in a website during five months, accessed by a hundred and
thirty one visitors, among them the twenty nine interpreters participant of this research. The
analysis of the data considers three theme axes: education paths, working conditions and social
economical reality. The results show that the education of these interpreters occurred from
elements taken from the interaction with values of the deaf community, appropriation of the
scientific knowledge and working relations.
Key words: Libras interpreter; Brazilian sign language; education for deafs
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1.
Religião dos intérpretes ........................................................................ 93
Gráfico 2.
Localização geográfica dos sujeitos da pesquisa .................................. 95
Gráfico 3.
Matrículas de alunos com deficiência em Instituições de Educação
Superior por região do país – Censo da Educação Superior (2005) .....
96
Gráfico 4.
Aprovados no Exame Nacional de Proficiência para tradução e
interpretação em nível superior por região do país ................................
97
Gráfico 5.
Escolaridade do pai ................................................................................ 99
Gráfico 6.
Escolaridade da mãe ..............................................................................
99
Gráfico 7.
Espaço de interação com pessoas surdas .............................................
106
Gráfico 8.
Escolarização ......................................................................................... 107
LISTA DE TABELAS
Tabela 1.
Atividades desenvolvidas por intérpretes de Libras vinculados a
FENEIS de 1988 a 2002..................................................................
52
Tabela 2.
Intérpretes aprovados no Prolibras de nível superior por lócus de
atuação ...........................................................................................
91
Tabela 3.
Aprovados por região do país – Proficiência para tradução e
interpretação em nível superior ......................................................
97
Tabela 4.
Conhecimento de línguas ............................................................... 108
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...............................................................................................................................
13
1 PROPOSTAS EDUCACIONAIS PARA A EDUCAÇÃO DE PESSOAS SURDAS NO BRASIL
16
1.1 Percurso histórico no Brasil: da instituição especializada à escola regular .......................
16
1.2 Primeiras iniciativas educacionais no Brasil ........................................................................ 17
1.3 Período de 1930 a 1970 – crescimento da educação e engajamento da sociedade civil ... 27
1.4 Período de 1970 a 2000 – Política internacional: equidade, integração e inclusão ............ 36
1.5 Nota sobre as propostas educacionais após os anos 1980-2005: inclusão & bilingüismo
na educação de pessoas surdas ...................................................................................................
44
2 O TRABALHO DO INTÉRPRETE DE LIBRAS NA EDUCAÇÃO DA PESSOA SURDA .........
51
2.1 Resgate da história da tradução da língua de sinais e da trajetória dos tradutores e
intérpretes línguas de sinais ......................................................................................................
51
2.2 Resgate da história da tradução e da trajetória dos tradutores e intérpretes de línguas
orais ............................................................................................................................................
55
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................................................
71
3.1 Contribuições de Lev Semionovitch Vygotski ...................................................................... 71
3.2 Contribuições de Pierre Bourdieu ........................................................................................ 76
4 PERCURSO METODOLÓGICO .................................................................................................
81
4.1 A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais ........................................................ 81
4.2 Participantes da pesquisa .................................................................................................... 82
4.3 A construção dos dados da pesquisa ...................................................................................
84
5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS .....................................................................................
90
5.1 Descrição e caracterização dos participantes da pesquisa .................................................. 90
5.2 Perfil dos sujeitos da pesquisa ............................................................................................. 92
5.3 Eixo temático A: Realidade socioeconômica ........................................................................ 94
5.4 Eixo temático B: Trajetória de formação .............................................................................. 105
5.5 Eixo temático C: Condições de trabalho ............................................................................... 110
CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................................
112
REFERÊNCIAS .............................................................................................................................
115
ANEXOS ........................................................................................................................................
121
13
INTRODUÇÃO
Este trabalho foi constituído devido a minha formação como
professora de especial e atuação com alunos surdos, como intérprete de Libras
em uma instituição de educação superior. Nesse trabalho diário e na convivência
com outros intérpretes encontrei as indagações que motivaram esse estudo.
A Educação Especial caracteriza-se como uma modalidade de
ensino que deve ser oferecida em todos os níveis da educação, conforme a Lei de
Diretrizes e Bases e Bases para a Educação Nacional Lei 9.394 de 20 de
dezembro de 1996, que garante o oferecimento da educação especial
preferencialmente na rede regular, desde a educação infantil em idade de zero a
seis anos até a educação superior.
A educação do aluno surdo deve ser contemplada com os
recursos educacionais especializados de que necessitar para seu desempenho
escolar.
Aos alunos que utilizam a língua de sinais é garantido o intérprete
na sala de aula, conforme o Decreto 5.626 de dezembro de 2005. Esse Decreto
regulamenta a Lei 10.436 de 24 de abril de 2002 e dispõe sobre a Língua
Brasileira de Sinais Libras e o art. 15 da Lei 10.098 de 19 de dezembro de
2000 e estabelece os recursos humanos e materiais necessários para
implementação de uma proposta educacional bilíngüe Libras – Português.
São poucas as publicações sobre a atuação do intérprete de
Libras. estudos sobre a atuação do intérprete em sala de aula do ensino
fundamental (ROSSI, 2005; LEITE, 2004; QUADROS, 2004; LACERDA, 2002,
2006). Algumas dissertações refletem o espaço ocupado pelo intérprete
fundamentando-se na psicanálise e nos estudos culturais (RAMOS, 2005; PIRES,
1999; SANTOS, 2004; ROSA, 2005) buscando compreender o posicionamento
ocupado por esse profissional na educação superior (LIMA, 2006) e na educação
de forma geral.
14
Dados oficiais do MEC revelam um aumento significativo de
matrículas na Educação Especial e dentre eles, de alunos surdos na escola
regular e na educação superior.
O ingresso do aluno surdo, usuário da Libras, na educação
superior provocou a contratação do intérprete de Libras. Esse profissional
enfrenta desafios ainda pouco conhecidos, assim o objetivo deste trabalho é
estudar as trajetórias de formação e as condições de trabalho de intérpretes
certificados pelo Exame Nacional de Proficiência (ProLibras) em nível superior,
que atuam em Instituições de Educação Superior. Para alcançá-lo, este texto está
organizado da seguinte forma:
O primeiro capítulo apresenta um estudo das propostas
educacionais para pessoas surdas, trata aspectos relacionados à educação
bilíngüe e ao modo no qual a língua de sinais foi inserida no trabalho pedagógico
em instituições de ensino, especialmente, na educação superior, pela análise das
condições que levaram a busca de um método e didática correspondentes à
condição lingüística do educando surdo.
O segundo capítulo resgata a história da tradução e a trajetória de
tradutores e intérpretes de línguas sinais e de línguas orais-auditivas. Apresenta
uma reflexão em torno da história do profissional tradutor e intérprete, no intuito
de aprofundar o olhar acerca de questões específicas constituídas nesse campo
de atuação.
O terceiro capítulo apresenta a fundamentação teórica para o
desenvolvimento da pesquisa pelas contribuições dos estudos de Lev
Semionovitch Vygotski acerca da aquisição da linguagem, estudos de
defectologia e pedagogia especial. Expõe as contribuições de Pierre Bourdieu
para a interpretação da realidade educacional e das desigualdades escolares, a
partir dos conceitos de espaço social, campo e capital econômico, cultural, social
e simbólico.
O quarto capítulo explicita a metodologia utilizada na pesquisa
qualitativa em ciências humanas e sociais. Expõe os instrumentos e metodologia
utilizados no intuito de alcançar os objetivos da pesquisa e, desse modo,
favorecer a leitura e a compreensão da realidade social. Revela a forma pela qual
15
as fontes primárias compostas por referências bibliográficas, legislação e
documentos norteadores contribuíram para a análise. Reflete sobre a utilização
do questionário, sua disponibilização na Internet via Web e sobre esse modo de
coleta de dados.
O quinto capítulo contém a análise e discussão dos dados a partir
dos eixos temáticos, trajetória de formação, condições de trabalho e realidade
social dos sujeitos da pesquisa. Podem-se reconhecer os elementos que
compõem a formação dos profissionais certificados para exercer a interpretação
da Libras em nível superior.
As Considerações Finais expõe reflexões sobre o caminho de luta
e mudanças sofridas numa sociedade, mediante a conquista de direitos sociais
por pessoas surdas. Esses direitos se manifestam também na inserção do
intérprete de língua de sinais na educação, um profissional que vivencia uma
trajetória de formação através de seu engajamento em atividades da comunidade
surda e pela apropriação de capital econômico, cultural, social e simbólico.
16
1 PROPOSTAS EDUCACIONAIS PARA PESSOAS SURDAS NO BRASIL
1.1 Percurso histórico no Brasil: da instituição especializada à escola regular
O objetivo deste capítulo é apresentar o percurso histórico da
educação da pessoa surda no Brasil, sobre as iniciativas educacionais ocorridas
em instituições especializadas e, posteriormente, em escolas regulares.
Foram três as referências que contribuíram para a elaboração do
presente texto: “A educação do deficiente no Brasil” de Gilberta Januzzi, “A
educação da pessoa surda no Brasil” de Maria Aparecida Soares e a edição
comemorativa dos cem anos do Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES), a Revista do INES publicada em 2006 por Solange Rocha.
Aqui se entende que, educação da pessoa surda como parte da
educação especial destinada a pessoas com deficiência, não pode ser estudada
dissociada da organização social e de seus condicionantes materiais, da
influência do progresso científico e das relações políticas, conforme aponta
Januzzi (2004).
A formação de um sujeito é influenciada pelos tempo e lugar
socialmente ocupados. No período em que o Brasil se constituía numa sociedade
rural distante da escolarização, a pessoa com deficiência encontrava-se
silenciada e anônima. No entanto, à medida que a educação primária começa a
ganhar espaço, as iniciativas educacionais passam a estender-se também às
camadas menos favorecidas, e a pessoa com deficiência começa, timidamente, a
conquistar espaço.
Do ponto de vista econômico, a educação de pessoas com
deficiência assume uma função elementar, na garantia da ordem e do
desempenho de um trabalho produtivo, visto o investimento na educação
profissional. A própria escola desenvolve mecanismos para diferenciação entre
anormais e normais, evidenciando a impossibilidade de que determinados grupos
possam alcançar conveniências estabelecidas pela classe economicamente
privilegiada. Diante dessa realidade, a educação da pessoa surda reflete em seu
17
percurso histórico as práticas e concepções socialmente estabelecidas na
educação de modo geral. É o que podemos observar pelo estudo das iniciativas
educacionais no Brasil.
1.2 Primeiras iniciativas educacionais no Brasil
Segundo Januzzi (2004 p. 6), a educação de crianças com
deficiência surgiu, timidamente, em instituições no conjunto das concretizações
possíveis, das idéias liberais divulgadas no Brasil no final do século XVIII e início
do século XIX.
O liberalismo, nesse período, almejava a abolição de algumas
instituições coloniais. Criticando o dogmatismo e o poder autocrático, lutou pelo
afastamento do Estado da economia, de modo a garantir a continuidade dos
benefícios da elite. Nesse contexto, a educação primária discutida na Assembléia
Constituinte foi esquecida. Apenas 2% da população era escolarizada. Sendo
assim, a primeira Constituição datada em 1824, propunha a “instrução primária
gratuita a todos”.
Nesse processo de estabelecimento da educação primária, a
educação de crianças com deficiência contou com poucas instituições. Em 1835 o
deputado Cornélio França apresentou um projeto propondo a criação do cargo de
professor de primeiras letras para o ensino de surdos-mudos. Entretanto, somente
após alguns anos iniciaram-se os atendimentos à crianças surdas num período de
ascensão do poder imperial e de idéias herdadas da França pela elite que ia
estudar nesse país.
É criado no município da Corte o Imperial Instituto dos Meninos
Cegos, pelo Decreto n. 1428 de 12 de setembro de 1854, embora as prescrições
da reforma Couto Ferraz (Regulamento de 17 de fevereiro de 1854), não fossem
cumpridas. Após alguns anos, em 1857, foi criado, também, o Instituto dos
Surdos-Mudos (ISM) pela lei n. 839 de 26 de setembro de 1857. A denominação
mudou posteriormente para Instituto Nacional dos Surdos-Mudos (INSM) e pela
18
Lei n. 3.198 de 6 de julho de 1957 para Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES).
Notam-se as influências gerais políticas e econômicas do período,
pois os dois institutos eram mantidos e administrados pelo poder central. Dentre
as ações de pessoas ligadas ao poder político, houve a recomendação de um
educador francês pelo Ministro da Instrução Pública da França, com o apoio do
embaixador da França no Brasil. Com surdez congênita, esse professor do ensino
emendativo do Instituto Bourges. Edouard Hüet chegou ao Rio de Janeiro em
1857 e, por designação dos envolvidos naquela realidade política assumiu a
responsabilidade de organizar o trabalho desenvolvido no instituto.
O trabalho de Huet iniciou-se, em uma sala, com um menino de
10 anos e uma menina de 12 anos, sendo supervisionado pelo Marquês de
Abrantes, que deveria, também, organizar uma comissão constituída por juristas,
ministros e sacerdotes para fundar a instituição.
A verba utilizada para manutenção do INES foi aprovada pela Lei
n. 939 de 26 de setembro de 1857, que liberava, conjuntamente, a pensão para
dez alunos que deveriam ser indicados pelo imperador. O prédio no qual
funcionava o instituto era pago pelos conventos do Carmo e de São Bento.
O Instituto encerrou o ano 1857 com sete alunos e, em 1858, a
supervisão dos trabalhos de Huet passou do marquês Abrantes para o marquês
de Olinda. Após essa mudança, foi sugerida a contratação de um brasileiro para
especializar-se no ensino de surdos. Huet retornou à França em 1861, devido ao
término do contrato, vendendo seus direitos sobre o instituto, que passou a ser
dirigido em 1862 pelo doutor Manuel de Magalhães Couto, habilitado pelo Instituto
de Paris.
A intervenção de figuras importantes tornou possível a criação e
organização do instituto, porém, segundo Januzzi (2004 p. 15), o atendimento era
considerado precário, pois, em 1874, atendia apenas 17 alunos numa população
em nível nacional de 11.595 pessoas surdas. Mesmo com essa realidade, no I
Congresso de Instrução Pública realizado em 1883 os participantes sugeriram um
currículo de formação de professor para cegos e surdos sendo os médicos
responsáveis pelo tratamento dos temas.
19
Assim como a instrução pública e primária de toda a população, a
educação de alunos com deficiência passou por um longo período de
esquecimento. Existiam escolas regulares desvinculadas do governo federal em
funcionamento, inclusive com alunos deficientes que as freqüentavam sem
nenhum tipo de atendimento diferenciado (JANUZZI, 2004 p. 18). A educação de
pessoas com deficiência ocorreu por meio de tentativas distintas em diferentes
tempos e espaços. Nesse contexto, podem-se reconhecer duas vertentes
pedagógicas
1
predominantes na educação de pessoas surdas: a vertente médico-
pedagógica e a vertente psicopedagógica.
1.2.1 Vertente Médico-pedagógica
A vertente médico-pedagógica chegou ao Brasil por intermédio de
profissionais cuja concepção de surdez relacionava-se à necessidade de alcance
da normalidade. Segundo Soares (1999 p.13), esse fato decorria de duas razões
específicas: a primeira, porque a surdo–mudez se constituía num desafio para a
medicina, uma vez que orgânica; a segunda, porque ajudar os desvalidos, entre
eles, aqueles que não podiam ouvir nem falar, fazia parte dos percursos
religiosos.
No período correspondente à revolução científica, o progresso da
ciência buscava a superação de concepções criadas em torno da surdez
fundamentadas na religiosidade e na crença da deficiência enquanto
manifestação sobrenatural.
Em relação aos estudos para o desenvolvimento da audição,
localizamos a contribuição de médicos, a exemplo Gerolano Cardano (1501-1576)
que, a partir de seus estudos, concluiu que a surdez não prejudica a
aprendizagem. Esse médico italiano desenvolveu investigações para verificar o
aproveitamento da condutibilidade óssea e, juntamente com o anatomista
1
Vertentes pedagógicas são compreendidas, em concordância a Januzzi (2004), como enfoques
que surgiram no processo de oferecimento de educação destinada a pessoas surdas.
20
Giovanni Filippo Ingrassias (1510-1580), pôde reconhecer a existência da
condução óssea do som.
Partindo da análise da forma com que a pessoa surda se
apropriaria do som, Cardano teria afirmado que havia a possibilidade de a escrita
representar os sons da fala ou representar idéias e por isso, a mudez não
constituía impedimento para que o surdo adquirisse conhecimento. Propôs a
avaliação do grau de capacidade de aprendizagem, entre diferentes tipos de
surdos segundo a seguinte classificação: os surdos de nascença, os que
adquiriram a surdez antes de aprender a falar, os que adquiriram a surdez depois
de aprender a falar, os que a adquiriram depois de aprender a falar e a escrever.
Cardano pôde, assim, estabelecer uma relação direta entre os “tipos de surdo” e
suas potencialidades para aprendizado da fala e da escrita.
Johan Conrad Ammam (1669-1724), dico Holandês, renunciou
aos recursos de médico, para pensar em possibilidades de procedimentos de
leitura labial por meio do uso de espelho, um recurso que tinha sido criado,
anteriormente, por Helmont, estudioso da língua. Ammam pôde aprimorar a
técnica, utilizando-a para desenvolvimento da fala pela recepção de vibração da
laringe e pela percepção pelo tato da vibração das cordas vocais de um falante.
Juan Bonet (1529-1633) não era formado em medicina, porém
sua visão acerca da educação da pessoa surda se fundamentava numa
concepção médica. Publicou o “Primeiro tratado de ensino de surdos-mudos” no
qual mostra que o ensino deveria começar pela escrita, não por palavras inteiras,
mas por uma sistematização do alfabeto dactilógico e do alfabeto escrito para,
somente mais tarde, se ensinar a linguagem falada.
De acordo com Januzzi (2004) os métodos ligados à medicina
sugiram em decorrência das descobertas científicas do século XVII, ocasionado
modificações no modo de vida em países como Itália, Inglaterra e Holanda.
Devido à descoberta de práticas para introdução ao uso da oralização e da
escrita, a educação de pessoas surdas não teve, como prioridade, o aprendizado
do conteúdo escolar, que esteve em segundo plano, devido à definição de que
aquisição da oralidade e da escrita era prioridade.
21
Naquele período, era socialmente imposta a aquisição da língua
escrita como uma instrução necessária, ao mesmo tempo, que a fala se fazia
fundamental para comunicação. Dessa forma, a aquisição da fala e da escrita
tornavam-se fundamentais para que a pessoa surda pudesse se inserir na
sociedade.
Com relação à escrita, observa-se que, naquele período, havia
uma separação total entre o ler e o escrever, como afirma Manacorda (1989 p.
232) apud Januzzi (2004 p. 30),
O ler concerne essencialmente ao ensino religioso, à doutrina, às
Sagradas Escrituras; o escrever, que tem seus mestres e lugares
próprios, concerne a uma técnica especificamente material, que
exige cuidados particulares e voltado a preparar para o ofício
.
Esse modo de compreender a função social da leitura e da escrita
justifica a ênfase dada a ela na instrução primária dos poucos alunos surdos que,
em posição econômica favorável, puderam ter acesso a educação disponível
naquele período.
O avanço dos trabalhos realizados na área da surdez sofreram a
influência da evolução do conhecimento na área da medicina, reflexo das
correntes intelectuais, políticas e sociais que tiveram papel decisivo sobre a
ciência. A revolução francesa contribuiu, ao assegurar a liberdade do
pensamento. Instalava-se a renovação na França, na Itália e também em outros
países. A burguesia valorizou e facilitou a evolução de estudos superiores, livres
do controle político e religioso, apropriando-se do privilegio da cultura e do ensino
anteriormente restrito a uma minoria.
É nesse contexto que ocorre, no século XIX o Congresso
Internacional de Educação de Surdos-Mudos realizado em Milão, em 1880. Os
profissionais ali presentes subordinaram a instrução escolar à aquisição da
linguagem oral, aglutinando, na visão de Soares (1999), tipos de trabalhos que
deveriam ter objetivos específicos. A educação deveria assumir a transmissão do
conhecimento como nas demais escolas regulares e não apenas o tratamento da
linguagem.
22
O trabalho desses profissionais, na maioria médicos, voltava-se
para atividades de preparação para aquisição da fala, compreendida por eles
como educação. Posteriormente, em 1892, no Congresso em Gênova os
educadores de surdos obtiveram apoio para continuar a praticar o método oral
puro. Desde o trabalho iniciado pelo abade Charles Miguel de L’Épee (1712-1784)
adepto do uso de gestos até os médicos adeptos do método oral, observa-se as
influências da medicina e de técnicas que avançaram devido ao seu progresso.
1.2.2 Vertente psicopedagógica
A vertente psicopedagógica instalou-se mediante a criação de
laboratórios de psicologia primeiramente na Alemanha, em 1879, por Wilhem
Wundt (1832-1920) e, em 1883, nos Estados Unidos, por G. Stanley Hall (1844-
1924).
O Brasil recebeu a influência da França pela difusão de idéias dos
criadores dos laboratórios de psicologia experimental, a psicologia genética e
diferencial, introduzidas no país pelas obras de Alfred Binet (1857-1911)
elaborador dos testes de inteligência (1950) com a colaboração de Théodore
Simon (1871 – 1961).
Os alunos, antes de ingressarem nas escolas regulares
submetiam-se a testes de inteligência. As crianças cujo diagnóstico
correspondesse a “anormais da inteligência” devido ao baixo rendimento nos
testes eram impedidas de ingressar nas escolas.
Nessa concepção, a não aprendizagem era uma conseqüência de
um problema do aluno, da incapacidade de corresponder ao que a educação lhe
exigiria. De acordo com essa prática, os considerados “anormais” logo eram
rejeitados, excluídos do processo. A escala métrica de inteligência (de Binet e
Simon) foi mais utilizada para diagnóstico de deficiência mental, utilizando os
critérios para o aproveitamento escolar estabelecidos pelos idealizadores da
escala.
23
A relação estabelecida entre essa vertente e a surdez pôde ser
observada em decorrência de que, em 1800, Jean Garpard Itard, o primeiro
médico-chefe do Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris foi encarregado de
educar uma criança, Victor, que fora abandonada nos bosques de Aveyron. O
médico utilizou como metodologia de trabalho o empirismo sensualista de
Condillac.
Januzzi (2004) observa que o Brasil incorporou muito da
metodologia e das colocações dos profissionais de outros países que trabalhavam
com a educação dos considerados anormais. Por essa razão podemos perceber a
influência desses métodos e concepções na educação especial brasileira.
1.2.3 Organização do trabalho pedagógico
O estudo das primeiras iniciativas de trabalho da educação
especial no Brasil mostra que as vertentes pedagógicas foram postas em prática
com utilização de métodos variados.
Desde os estudos de Gerolano Cardano (1501-1576), uma vez
percebida a possibilidade de aprendizado da língua oral e escrita pelos alunos, os
educadores iniciaram procedimentos com o objetivo de favorecer a aquisição da
fala.
De acordo com Soares (1999), em 1800, Itard dispunha apenas
de uma classe no Instituto Nacional de Surdos-Mudos de Paris, com ênfase no
método gestual. Após o Congresso de Milão em 1880 devido à declaração de
superioridade do método oral puro
2
para a instrução de surdos, o oralismo foi
gradativamente implementado no Instituto.
O relatório enviado pelo Instituto Francês ao Brasil, no período em
que A. J. de Moura e Silva esteve na direção do INES
3
, descreve o processo de
aplicação do método oral puro e socializa em um relatório intitulado Surdos-
2
Método oral puro corresponde à aquisição da língua oficial do país na modalidade oral, ou seja,
sem a utilização dos gestos.
3
Instituto Nacional de Educação de Surdos.
24
Mudos Capazes de Articular e Meios Práticos de lhes Dar a Palavra e, com Ella, o
ensino” práticas possíveis para o treinamento auditivo.
O relatório era constituído por um histórico do trabalho
educacional realizado no Instituto Nacional De Surdos-Mudos de Paris, citando
que, embora no Congresso de Milão tivesse sido dada a prioridade ao método
oral puro, não se poderia desprezar a visão do americano E. Gallaudet que
presumia que nem todos os surdos seriam capazes de aprender a falar,
propondo, então, a utilização de um método combinado.
O trabalho pedagógico proposto pelo Instituto Francês ao INES
obedecia a critérios para o agrupamento de alunos, de modo que fossem
classificados o por idade e, sim, pelo nível de inteligência e aptidão para a fala.
Os alunos de fraca inteligência eram considerados incapazes de aprender as
palavras. Considerava-se perda de tempo e investimento inútil. Os alunos que se
tornaram surdos após a aquisição da fala e os semi-surdos, principalmente os
mais inteligentes, apresentam desempenho satisfatório, podendo ser ouvidos com
prazer. Para os surdos de nascença, com pouquíssimas restrições, o aprendizado
da oralidade é difícil e trabalhoso.
A partir dessas afirmações, ilustra um rol de procedimentos e
práticas, de exercícios de sopro e exercícios para preparação dos órgãos da fala,
com movimentos de ngua e de lábios, correspondendo a um período
preparatório. Posteriormente inserem-se exercícios de vozes, possibilitando ao
surdo tomar conhecimento da existência de posições e vibrações, dois elementos
responsáveis pela produção da voz (SOARES, 1999).
Compõe esse período também o Ensino da Consonâncias,
realizado diante do espelho, para perceber as diferentes vibrações produzidas na
emissão das consoantes. Segue o ensino da syllabação que é a leitura dos lábios
do professor enquanto este pronuncia palavras isoladas. Somente após todo esse
processo é que se poderia inserir o conteúdo das disciplinas do curso primário.
No Parecer na 26ª Questão da Actas e nos Pareceres do
Congresso de Instrução do Rio de Janeiro de 1884, o Dr. Menezes Vieira,
educador que trabalhou no Instituto, revela que o INES fez uma adaptação dos
instrumentos e métodos utilizados no Instituto de Paris. Esse fato decorreu do
25
questionamento levantado pelo Dr. Tobias Leite, diretor do INES naquele período,
quanto às vantagens de se investir na alfabetização dos alunos surdos num país
cuja população, em sua grande maioria, era analfabeta. Seria um prejuízo
alfabetizá-los para viver, numa sociedade em que poucos sabiam ler e escrever.
Tobias Leite, quarto diretor do INES (1868-1896), em um relatório
emitido em 1884, questiona a extensão que deve ser dada à instrução de surdos-
mudos no Brasil, citando que a finalidade da educação de surdos não seria “letrá-
lo”, torná-lo alfabetizado. Indaga sobre o ensino profissional apropriado, o artístico
ou o agrícola, julgando ser mais útil ao país e apropriado ao surdo brasileiro o
ensino profissional agrícola.
Esse posicionamento diante da formação oferecida pelo instituto
contraria as ações anteriores voltadas para o ensino. Percebe-se, então, que a
proposta educacional do INES manteve dois aspectos importantes: a aquisição da
linguagem falada e escrita e o aprendizado de um ofício profissional.
O ensino da linguagem articulada era obrigatório somente para
alunos cuja surdez tivesse sido adquirida em acidentes até a idade de 9 anos
4
, e
com até 12 anos, de acordo com a avaliação médica quanto à conveniência de
ensino da linguagem articulada.
Tobias Leite esteve no cargo de direção do instituto por 28 anos,
no período de 1868 a 1896. Sua visão do trabalho do INES revelada na
introdução da obra Lições de Geographia do Brasil é que os alunos do Instituto
que não se destinarão para a carreira das letras, mas para as profissões de
artistas e de trabalhadores levarão conhecimentos sufficientes da geografia de
seu paiz (LEITE, 1873 p. 3 apud SOARES, 1999 p. 53).
Há uma diferenciação entre o conhecimento ensinado a de alunos
considerados capazes ou não de aprendê-lo, pois o grupo portador de habilidades
para a aquisição da fala e da escrita exerceria funções específicas numa
sociedade inacessível àqueles cuja aquisição da fala não fosse possível.
Após a gestão de Tobias Leite, Dr. Custódio Ferreira Martins
permaneceu na direção do INES de 1907 a 1930. Em seguida, assumiu a direção
4
Esse tipo de surdez foi denominado por Tobias Leite como surdez Accidental.
26
o Dr. Armando de Lacerda, em 1930, no primeiro ano de governo de Getúlio
Vargas, concluindo sua gestão em 1947 durante o governo Dutra.
Segundo Rocha (2006 p. 13), em 1908, pelo Decreto 6892 de
19 de março de 1908, período da gestão de Dr. Custodio Ferreira Martins, foi
criada mais uma cadeira de Linguagem Escrita, disciplina com um período de seis
anos no currículo escolar. Até então, o Instituto contava com dois professores de
Linguagem Escrita, um para os 1
os
e 2
os
anos e outro para os 3
os
e 4
os
anos. Os 5º
e 6º anos estavam sem professor, sendo solicitado em 1879, por Tobias Leite.
Em 1911, o Decreto 9198, artigo 09, apresenta mudanças na
condução do ensino no Instituto, constando que o método oral puro deveria ser
adotado no ensino de todas as disciplinas, ocorrendo a transferências dos três
professores de linguagem escrita para três novas cadeiras de Linguagem
Articulada e Leitura Sobre os Lábios, somando quatro com a cadeira que existia
desde 1897.
Rocha (2006) relata ainda, que, em 1911, foi criada a seção
feminina, uma vaga para dentista e mais uma vaga para professor repetidor.
Somente nesse período foi aberta a possibilidade de meninas surdas estudarem,
resultando na ampliação do prédio para que comportasse um número maior de
alunos. A reforma teve início em 1913 e o prédio novo foi inaugurado em 1915
ainda sem a conclusão da seção feminina, devido a falta de verba.
Em 1913, a Cadeira de Linguagem Articulada ocupada por
Manoel Dantas Sobrinho programava o ensino de Gramática imitativa e
progressiva, leitura Sintética nos Lábios, Educação da Vista, Educação do tato,
Preparo dos Órgãos Respiratórios, Preparo dos Órgãos da Articulação da Palavra
e Desmutização.
Em 1914, Dr. Custódio Martins solicita ao governo, por meio de
um relatório, mudanças no regulamento do Instituto, pois boa parte dos alunos
apresentavam resultados insatisfatórios.
A prática demonstra o que era, em outros estabelecimentos da
Europa e dos Estados Unidos conhecido. Os surdo-mudos são
aptos para aprender a Linguagem Articulada até a idade de 7
anos; esta capacidade de apreensão vai diminuindo,
27
gradulamente, à medida que o aluno vai adquirindo maioridade,
de modo que, aos 9 e 10 anos, a percentagem dos aptos é muito
diminuta. Neste ano, verificou-se uma percentagem muito
pequena de alunos do ensino oral, talvez menos de 40%.
É, pois, necessário que V. Exª., reforme o regulamento deste
Instituto, permitindo a entrada dos alunos de 6 a 10 anos, no
máximo, entrada essa que é permitida no regimento em vigor
aos alunos de 9 a 14 anos.
Parece de toda conveniência ao ensino que as quatro aulas de
ensino de Linguagem Portuguesa sejam divididas, de modo a
ficarem duas aulas para o ensino de Linguagem Articulada,
systema oral, e duas de Linguagem Escrita. (ROCHA, 2006 p. 14)
A tentativa de mudança do procedimento de trabalho no INES
pode ser percebida ainda no Decreto 15.044 de 20 de setembro de 1921, que
extingue uma das cadeiras de Linguagem Articulada e no Decreto 15054 de 19
de outubro do mesmo ano que fecha uma das vagas de professor repetidor.
Posteriormente, em janeiro de 1925, pelo Decreto 16.782 é criado
o Departamento Nacional de Ensino, sendo o INES e o Instituto Benjamim
Constant dedicado ao ensino de pessoas cegas, inseridos na categoria de ensino
profissionalizante.
1.3 Período de 1930 a 1970 crescimento da educação e engajamento da
sociedade civil
O período de 1930 a 1970 é um momento de crescimento da
educação e engajamento da sociedade civil. Esta começa a organizar-se em
movimentos, em defesa das pessoas com deficiência, surgem associações de
pais, amigos, religiosos e pessoas preocupadas com o rumo dado à educação
desse grupo.
Segundo Januzzi (2004 p. 69), ocorreu, nesse período, a criação
de escolas dentro de hospitais; a fundação de mais entidades filantrópicas
especializadas e o surgimento de formas diferenciadas de atendimento em
clinicas, institutos psicopedagógicos e centros de reabilitação. Em 1930, muitos
educadores envolvidos com a educação de pessoas com deficiência fizeram uso
do ensino emendativo.
28
Armando Lacerda, diretor do INES no período de 1930 a 1947,
publica em 1934, a obra “A pedagogia emendativa do surdo-mudo: considerações
gerais”
5
. O inicio da gestão desse diretor foi destinado a organizar o trabalho do
Instituto, no intuito de
suprir as falhas decorrentes da anormalidade, buscando adaptar o
educando ao nível social dos normais. No que concerne ao surdo-
mudo esse desideratum é alcançado por intermédio do ensino de
linguagem e do correspondente desenvolvimento. (LACERDA,
1934 p. 6 apud SOARES, 1999 p. 57)
A prática do ensino Emendativo no INES ocorreu como proposta
do governo Vargas, que intuía a necessidade de correção das faltas e limitações
dos alunos surdos. No entanto, de acordo com Januzzi (2004 p. 71), em 1937
Getúlio Vargas afirma que o ensino emendativo, de aplicação difícil e restrita,
também vai receber ampliações, abrangência e aos inadaptados morais.
Naquele período, percebem-se ainda ações relacionadas à
ampliação dos direitos sociais de pessoas com deficiência. Em 1954, é concedido
o direito de voto ao cego, reconhecendo-se esse ato como importante mecanismo
de recuperação social.
Em 1956, no governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira, é
proposta a ampliação do ensino, por meio de um Programa de Ensino
Emendativo com ampliação de ação no campo e estimulo às iniciativas não
somente na esfera federal como também nos estados, municípios e entidades
privadas. Propõe-se, também, o levantamento de profissões acessíveis aos
indivíduos de capacidade reduzida e oferecimento de oportunidades de trabalho.
Em 1963, João Goulart (1961-1964) sugere a reorganização da
rede nacional de estabelecimentos de ensino emendativo de nível primário e
médio com diferenciação entre o investimento em instituições e escolas normais.
Esse processo conjunto de ações ocorreu num contexto de reorganização da
burguesia. Com relação às ações da sociedade civil, Olavo Bilac cria a liga da
5
“A pedagogia emendativa do surdo-mudo: considerações gerais”, Rio de Janeiro, Pimenta Melo,
1934. p.69/70
29
Defesa Nacional, defesa moral para combater a desgraça de caráter e a morte
moral. O serviço militar era apresentado como a manifestação completa da
democracia, pela disciplina, coesão, higiene obrigatória, regeneração física e
psicológica.
Desde sua fundação, em 1916, a Liga de Defesa Nacional se
estendera por diversos estados, contribuindo para a realização das reformas
educacionais estaduais. Nesse período, chega ao Brasil o ideário da “Escola
Nova”, com ênfase em métodos e técnicas, e a alfabetização passou a ser vista
de modo político, pois ser alfabetizado representaria ter o direito de voto negado
ao analfabeto na Constituição de 1989.
A escola apresenta-se nesse período, como fiel colaboradora para
a execução dos ideais republicanos. A educação é considerada importante na
reformulação do homem e da sociedade, do sonho republicano de educar a todos.
Por esta razão, nesse período, ocorreram programas nacionalistas.
No mesmo sentido de reforma movimentos declaravam
mudanças: a Confederação Católica e os movimentos de arregimentação; a
Associação Brasileira de Educação que organiza a I Conferencia Nacional de
Educação ressaltando a cultura moral e cívica; o Bloco Operário e Camponês
(BOC) trabalhando junto com a Aliança Liberal (Partido Democrático).
O problema da educação pode ser relacionado à política. Havia a
necessidade de oferta de educação de qualidade a todos e para que isso
ocorresse utilizavam cnicas específicas. Com relação ao poder político é
importante recordar que estendeu-se, em 1930, à Política do Café, com destaque
para 1947, quando ocorreu a criação do Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (INEP) com o objetivo de centralizar informações e promover
estudos sobre educação.
Recorda-se ainda que em 1951, é criado o Conselho Nacional de
Pesquisa (CNPq); em 1954, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
(SENAI); em 1942, as Leis orgânicas do ensino (LOEs) do ministro da Educação
Gustavo Capanema. Segundo Januzzi (2004), as mudanças mais especificas
sobre o ensino manifestam-se em 1942 com a criação do Fundo Nacional do
30
Ensino Primário (FNEP) pelo decreto 4.558 de 14 de outubro de 1946,
regulamentando a distribuição de verba.
Devido ao conjunto de transformações da organização social
brasileira, a ensino emendativo vai-se modificando lentamente, juntamente com o
novo modo de vida em sociedade, que, exigia cada vez mais instrução
principalmente em decorrência da instalação de indústrias.
A educação de pessoas surdas manteve-se no Instituto Nacional,
diretamente ligado ao governo federal e, por essa razão, esperava desse governo
a aprovação de leis e decretos que pudessem favorecer a organização do
trabalho nessas instituições. No governo Vargas foi oficialmente proclamada a
necessidade de oferecimento de cursos de formação de professores e de técnicos
especializados para o trabalho com deficientes sensoriais, devido à grande
quantidade de cegos (100 mil) e surdos (50 mil) no país.
No governo de Café Filho, após o suicídio de Getulio Vargas, o
Instituto Benjamim Constant ofereceu cursos para formação de professores e
inspetores de cegos. Anteriormente, em 1955, Ana Rímoli de Faria Doria, diretora
do INSM (1951–1961) conseguira a liberação para oferecimento do primeiro curso
normal de professores surdos-mudos, equivalente ao grau médio, com três anos
de duração. Receberam alunos de diversos estados, sendo-lhes oferecido, além
do externato, o internato considerando-se que a maioria delas era provinda de
São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Santa
Catarina, Paraná, Bahia, Maranhão e Rio de Janeiro.
No novo regulamento do Instituto, aprovado em 1956 pelo decreto
38.738 de 30 de janeiro de 1956, o item III objetivava, no artigo 1º, habilitar
professores na didática especial de surdos-mudos e, no item 5º, promover, em
todo o país, a alfabetização de surdos-mudos e orientar tecnicamente este
trabalho. Em 1958, havia 348 professores especializados e, no final do ano, o
INES diplomaria mais 32 que freqüentavam o curso de especialização de dois
anos.
O país havia atravessado a Guerra Mundial (1939-1945) e,
devido ao atendimento aos lesionados na guerra, ocorreu, nesse período,
progresso acelerado no campo da saúde, com a criação de modalidades de
31
atendimento educacional ligadas a esse campo. Segundo Januzzi (2004) não se
pode afirmar com precisão o ano de instalação e do início das atividades das
escolas regulares e instituições especializadas Os serviços começaram a ser
oferecidos de modos diversos e em períodos diferentes nas diversas regiões do
país.
Considera-se, também, a influência das transformações que
ocorriam em áreas da educação, a exemplo, a educação de jovens e adultos.
Ocorre em 1945, a criação do Fundo Nacional de Ensino Primário (FNEP),
designando verba para a educação de adultos e, em 1947, surgem as
Campanhas Nacionais para a Educação de Adultos. É o momento da organização
de pessoas com deficiência, como o Conselho Brasileiro para o Bem-estar dos
cegos, no mesmo ano de fundação da APAE em 1954 (CORDE/CVI, 1994 p. 12
apud JANUZZI, 2004 p. 86)
Paralelamente, o cresce a atuação de caráter filantrópico do setor
privado, favorecendo a ampliação do atendimento à classes favorecidas. A
direção do INES sugere a Campanha “Educação do Surdo Brasileiro (CESB) em
1957, pelo decreto n. 42.728 de 3 de dezembro de 1957, que propõe “medidas
necessárias à educação e assistência, no mais amplo sentido, aos deficientes da
audição e da fala” (artigo 2º do decreto). Nota-se a influência de propostas feitas
por Ana Rímoli quer no Regulamento do INES, quer no Anteprojeto de criação da
Campanha (Soares, 1999 p. 95 e 124).
O Decreto de criação do CESB não traz proposta de reabilitação
entretanto o documento de 1975 elaborado pelo CENESP explicita que o Centro
de Reabilitação é uma “instituição que atende adolescentes e adultos
excepcionais com a finalidade de, sob a orientação de equipe multi e
interprofissional, avaliar, tratar, treinar profissionalmente, visando a reintegração à
força de trabalho e a sociedade, desenvolvendo ao máximo suas capacidades
residuais”. (MEC/SG/CENESP/SEE, 1975ª, sumário apud JANUZZI, 2004 p 88).
Em 1950, o INES oficializou o todo oral para todo o alunado
baseado no conhecimento terapêutico para desenvolver órgãos fonoarticulatórios:
ritmo de respiração, ginástica respiratória, uso das cordas vocais, exercícios de
sopro etc. (SOARES, 1999 p. 74-76) além da classificação de acuidade auditiva
32
estabelecida mundialmente pela medicina ainda hoje. Esses procedimentos foram
obtidos dos Compêndios Educacionais Americanos, traduzidos por Ana Rímoli. A
origem desses documentos é de caráter reabilitatório claramente expresso nas
Campanhas Populares.
As campanhas populares não conseguiram extinguir o
analfabetismo, mas os movimentos de pessoas com deficiência foram
aumentando, reunindo mais pessoas e abrindo espaço para que o governo
criasse em 1973 o Centro Nacional de Educação Especial (CENESP).
Nesse período, o país sofre o golpe militar e a ditadura, que durou
até 1985, impõe restrições à liberdade individual. O ato Institucional de 1964
extinguiu as eleições diretas para presidente e governador com os partidos
políticos, estabelecendo o bipartidarismo entre a Aliança Renovadora Nacional
(ARENA) de apoio ao governo e Movimento Democrático Brasileiro (MDB), de
oposição. Enfim, esse governo impossibilitou o avanço dos movimentos
populares, impedindo a ampliação das reivindicações.
Pela influência dos pioneiros da Educação Nova são instituídas a
gratuidade e obrigatoriedade do nível primário. A nova Constituição reafirmou
propostas de redemocratização do país e assegurou à união a competência de
legislar sobre as Leis de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) (Título I, Cap I,
artigo 5º, inciso XV, alínea d).
Surgiram os movimentos de educação popular, com os Centros
Populares de Educação Popular, com os Centros Populares de Cultura, os
Movimentos de Cultura Popular e o Movimento de Educação de Base que
também contribuem teoricamente. Com destaca à influência de Paulo Freire, no
trabalho realizado com o povo embora essas iniciativas sofram a interrupção do
golpe militar e a direção educacional passe a orientação de grupos brasileiros
associados aos americanos.
Nesse período efetivam-se acordos do Ministério da Educação e
Cultura com a agência americana United States Agency International for
Development conhecidos como acordos MEC/USAID.
Na educação popular, o governo criou o Mobral (lei n. 5370 de 15
de dezembro de 1967) iniciado em 1970; no ensino superior, a lei n. 5.540/68 de
33
28 de novembro de 1968 e posteriormente a n. 5.692/71 quanto ao e graus.
Em relação à educação especial, posteriormente haverá a criação de um órgão
especifico para determinação política: CENESP (decreto n. 72.425 de 3 de julho
de 1973).
A educação especial possuía uma característica a parte da
educação geral que antes da década de 1970 caminhava ligada ao
desenvolvimento econômico, na medida em que possibilitava o ingresso no
mercado de trabalho e o progresso do país.
Com a difusão da teoria educacional da Escola Nova, educadores
que trabalharam com crianças especiais, como Montessori e Decroly,
desenvolveram propostas para a educação de crianças com deficiência mental. A
educação de pessoas com deficiência foi fortemente impulsionada pela filantropia
cujo significado relaciona caridade, amor a humanidade. Foi mencionada por
educadores como Tobias Leite, quarto diretor do INSM (1868-1896). Afirmava que
a educação dos surdos-mudos, na França e na Itália, “é um meio a que recorre o
partido Clerical para engrossar suas fileiras e melhor resistir às invasões dos
adversários”. Sugere então o imposto de 500 réis cobrados no batismo pelo
vigário, contribuição de fácil recolhimento, voluntário e muito de coração.
(SOARES, 1999 p. 50).
O presidente Epitácio Pessoa reclamava, em 1919, das despesas
excessivas do INSM, pois cada aluno surdo custava ao tesouro nacional
5:353$467 contos de réis ou 8:383$770 conto de réis se fossem incluídos os
gastos com terreno e o prédio e outras despesas. Reclamava que o prédio
suntuoso construído para o serviço de assistência pública deveria ficar melhor sob
direção superior. O INSM estaria sob a direção do Conselho Administrativo dos
Patrimônios, recebendo doações de duas mil apólices (MEC/INEP, 1987, vol. 1, p.
72 apud JANUZZI, 2004).
No governo de Jucelino Kubichek (1956-1961) reconheceu-se que
o governo deveria cuidar do ensino desses indivíduos entregues a campanhas
filantrópicas. Estudava-se a possibilidade de firmar convênios com as
administrações estaduais para criar atendimento aos surdos (idem vol. 2, p. 284).
As promessas de investimento nesse setor continuaram com João Goulart (1951-
34
1964). Quanto à reorganização do nível primário e médio, nesse período, fora
investido dois milhões de cruzeiros e solicitado que as escolas especializadas se
unissem a programas das escolas comuns para atender maior número de jovens
carentes (idem, vol. 2, p. 362).
1.3.1 Vertente médico-pedagógica
Segundo Soares (1999), no INSM, o diretor do período 1930-
1947, doutor Armando Paiva Lacerda, no livro Pedagogia emendativa do surdo,
explicita que o objetivo da educação é “suprir as falhas decorrentes da
anormalidade, buscando adaptar o educando ao nível social dos normais” (Idem,
p. 58). Por intermédio do ensino da linguagem, “o objetivo da linguagem oral é
dotar a criança surda de uma linguagem análoga à fisiologia” (Idem, p. 58). Era
seguido tal método de ensino, desde o escrito sinais gráficos e digitais para os
surdos-mudos “completos” até o acústico oral-associação de exercícios acústicos
aos orais para os “incompletos”.
1.3.2 Vertente psicopedagógica
Influência da psicologia: aspectos intelectuais têm testes de
inteligência como meio de organizar as classes homogêneas, facilitadoras,
segundo se pregava, do ensino e da aprendizagem.
O argumento da inteligência como base da educação do surdo
estava presente nos fins do século XIX como elemento de seleção (MOURA E
SILVA apud SOARES, 1999 p. 41). Na década de 1930, o doutor Armando
Lacerda fazia seleção dos alunos com base na capacidade mental auditiva e
lingüística, que facilitaria a formação de classes homogêneas.
As Reformas estaduais de educação e as conferências nacionais
de educação compõem o trabalho na vertente psicopedagógica, por terem-se
preocupado em estabelecer as bases das escolas de aperfeiçoamento e
35
laboratórios de psicologia experimental. Atuaram como os principais organismos
em alguns estados em relação ao deficiente, embora outras reformas, como a de
Anísio Teixeira, no Distrito Federal, ligassem a educação à vertente médica.
As reformas não estavam voltadas para crianças com
incapacidade física e mental comprovada por profissionais ou pessoa idônea, mas
alguns previram escolas ou classes especiais para tais estudantes. Esse
mecanismo incluiu também crianças residentes à distância de dois a três
quilômetros das escolas, portadoras de doenças contagiosas e repugnantes e os
desprovidos de todos os recursos. Esses mecanismos facilitariam a vida de
freqüentadores da escola comum, servindo como apoio aos que encontravam
dificuldades de aprendizagem.
Caracterizavam-se como freqüentadores das classes especiais as
crianças cujo qüoficiente de inteligência não alcançasse a média necessária para
serem reconhecidas capazes de ingressar no ensino comum.
Escolas de aperfeiçoamento e laboratórios de psicologia
experimental, principais organismos que atuavam em alguns estados de modo
geral, representavam a preocupação do governo do Estado com a formação
técnica, especializada de professores para garantia do êxito das modernizações
propostas no ensino de grau. Havia duas modalidades de cursos, sendo um de
16 meses de duração, após o curso normal, e o outro com menos horas, para
atualização profissional. A fundamentação desses cursos era a Psicologia e a
Biologia, História (somente dos métodos pedagógicos), pregando a necessidade
de desenvolver a sociabilidade do aluno como busca de harmonia entre todos.
A reforma, no estado de Minas, gerou a inclusão do especialista
médico, da enfermeira e do dentista dentro da escola. Por essa razão a educação
destinada à pessoa com deficiência sofreu a influência do enfoque psicológico
especialmente a educação de deficientes mentais.
36
1.4 Período de 1970 a 2000 política internacional: equidade, integração e
inclusão
Desde sua criação, em 1973, o CENESP
6
prossegue seu trabalho
com modificações ajustadas pela criação, em 1985, da Coordenadoria Nacional
para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE) e do Conselho
Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (CONADE), em 1999
procurando também colocar em prática os apelos da sociedade civil.
Segundo Januzzi (2004), a criação de um órgão específico para a
educação especial condiz com um modo de organização capitalista periférica. O
aparelho administrativo público foi dividido em ministérios, em nível federal, e
secretarias, nos estados e municípios que se encarregam dos setores: político,
econômico, militar, social. Cada órgão e setor dispõe de previsão orçamentária
própria, no entanto alguns projetos adquiriam maior previsão orçamentária que
outros.
O CENESP foi criado no período do Governo Médici (1969-1974)
pelo decreto n. 72.425 de 3 de julho de 1973 e esteve vinculado ao MEC com
autonomia administrativa e financeira. As atividades do CENESP estavam
subordinadas à Secretaria geral do MEC, assumindo o CENESP a coordenação,
em nível federal, das iniciativas no campo do atendimento de alunos da educação
especial. Integrava as esferas administrativas federal, estadual, municipal e
particular (inclusive o INES subordinava-se ao CENESP) de modo a favorecer a
integração no sistema regular.
Em 1986, no Governo Sarney (1985-1990) o CENESP foi
transformado em Secretaria de Educação Especial (SESPE), por meio do decreto
n. 93.613 de 21 de novembro de 1986. O INES estava na condição de autônomo
vinculado às SESPE para supervisão ministerial. Dentre os gastos com a
formação de profissionais e manutenção de recursos, destaca-se aquele com a
administração do CENESP, com os institutos nacionais correspondendo a 59,8%
no período de 1975 e 1979.
6
Centro Nacional de Educação Especial
37
A cooperação técnico-financeira com as instituições privadas
predomina sobre a dos sistemas estaduais de ensino, o que confirma que o
governo não assumiu de fato, naquele período, a educação especial como um
serviço da educação regular.
1.4.1 Vertente Economia da educação
A teoria economia da educação pode ser entendida como um
enfoque em que o compromisso educativo, prioritariamente atrela-se ao
desenvolvimento econômico do país, tal como ele vem efetivando-se. (JANUZZI,
2004 p. 172).
Nas propostas educacionais, vimos ser refletida, através de
diretrizes quase sempre relacionadas a algumas ciências principalmente a
medicina e a psicologia e mais recentemente a lingüística quanto a educação do
surdo, a existência de teorias orientadoras ou justificadoras de práticas
educacionais.
No período correspondente ao governo Vargas, posteriormente,
no governo de Juscelino Kubitschek e após o golpe de 1964, a escola é
enfatizada como elemento importante para a produção de mão-de-obra, de
recursos humanos ajustados às necessidade de produção. O trabalho era
valorizado como capital indispensável para o desenvolvimento do país. Por essa
razão a educação assumiu a promoção individual, de formação de capital
humano.
Com relação à educação de pessoas com deficiência, segundo
Januzzi (2004 p. 175) até 1973 constata-se a existência de relação direta entre a
defesa de sua educação e as propostas educacionais vinculadas ao plano de
desenvolvimento econômico do país.
As oficinas existentes no INSM, desde 1887, encadernação,
douração, sapataria etc e mesmo o fato citado de que, no IBC, os melhores
alunos poderiam continuar no Instituto como repetidores professores, visava,
sobretudo, a assegurar-lhes habilitação para subsistência, ocupar algum lugar na
38
sociedade, mas tal procedimento não era defendido como importante para
impulsionar o desenvolvimento do país. O doutor Armando Lacerda, diretor do
INSM (1930-1947), entendeu a educação de surdos como meio, “para que
deixassem de representar valores negativos no seio da sociedade” (SOARES,
1999 p. 65).
a preocupação pedagógica com o aluno, como sugere o artigo
1º, item g, do regulamento de 1956 (decreto n. 38.738) “manter uma fazenda-
escola para incentivar no espírito do aluno amor à terra e às suas dádivas,
despertando-lhe a consciência do seu valor como fatores positivos da sociedade”
(idem p. 85). Mesmo na Campanha da Educação do Surdo (CESB), o decreto que
instituiu a defesa dessa educação pelo ministro Clóvis Salgado é para que o
surdo se torne “elemento útil e produtivo, capaz de ganhar a própria vida e manter
a dignidade inerente à pessoa humana, que deve ser independente e livre” (idem
p.88).
A preparação para o trabalho é o objetivo das oficinas protegidas.
Assim, o regulamento aprovado em 1890, elaborado por Benjamin Constant
(IBC), declarava, no artigo 21, que o trabalho deveria ser de utilidade para o cego,
de modo a garantir recursos para que fosse útil a si, à família e à sociedade. Em
1929, Washington Luís (1926-1930) na mensagem ao Congresso Nacional sobre
duas instituições federais, afirmara que o INSM contava com duas oficinas
operantes: encadernação e sapataria, e que, no ano de 1929, fora freqüentada
por 69 alunos. Em 1930 foram desligados 14 alunos e, portanto, 55 passaram a
constituir o corpo discente, havendo 40 vagas ociosas que poderiam ser
preenchidas.
Essas considerações foram retomadas para evidenciar que, na
década de 1970, há certa transformação na visão de trabalho do deficiente,
embora continue sua operacionalização pelas oficinas. Em 1974 havia em torno
de 118 oficinas e três escolas-empresas em aproximadamente 2.362 modalidades
de atendimento educacional (classe comum, classe comum com consultor, sala
de recursos, classe especial anexa a hospital, atendimento itinerante, escola
especial, outros) (MEC/SG/Cenesp/Seec, 1975a, vol. 1, p. 26 apud JANUZZI
2004 p. 172).
39
Estava-se na época do trabalho parcelado, do taylorismo (F. W.
Taylor 1856-1915), e, portanto nesses locais treinava-se o deficiente para tarefas
especificas, repetitivas. Desenvolvia-se nelas o que não era rentável às
empresas: separar pequenas peças, montar caixas, preencher envelopes com
cartas, avisos etc. Não havia, geralmente, possibilidade de habilitação mais
completa e especifica. Assim, a disciplina era preocupação básica, indispensável
para o empregado. O rodízio das tarefas era feito no sentido de manter um certo
interesse, diversificar o treino, organizando também equipes, círculos de controle
de qualidade e até alguma participação do trabalhador nas decisões. A
readaptação política à continuidade socioeconômica do capitalismo internacional
implantada pelo golpe militar influiu na modernização da educação, no intuito de
fazer crescer os apelos de organização tecnocrática.
Foi aprovada a Reforma da Universidade em 1968 e, pela Lei n.
5.692/71, a reforma do ensino de e 2º graus. a preocupação com a
racionalização dos meios para atingir os mesmos fins, não os duplicando,
portanto; a busca da integração vertical e horizontal, a interdisciplinaridade, a
flexibilidade, o aproveitamento de estudos, a acentuação da profissionalização no
segundo grau, predominando a parte de formação especial do currículo (artigo 5º,
parágrafo 2º).
Seria esta teoria do capital humano a expressão mais acabada,
mais explícita da vinculação da educação ao desenvolvimento econômico do país,
um compromisso de colocar a educação em função desse desenvolvimento, tal
como ele se manifestava; a procura de, pela educação. Predominava a formação
do aluno para os postos de trabalho existentes. Uma subordinação da educação
ao projeto de desenvolvimento implantado; a escola como necessária à produção,
produtora de “recursos humanos”, entendidos como mão-de-obra. A educação
passou a ser vinculada diretamente ao setor produtivo. Essa posição, iniciada
com Adam Smith (1723 -1790), ganhou relevo nas décadas de 1960 e 1970, entre
nós, através da teoria da economia da educação. A escola desenvolve o capital
humano, a mercado passa a estimular o trabalho da educação.
40
1.4.1.1 Normalização/integração e “mainstreaming”
Centrada no trabalho pedagógico ainda em meio ao atrelamento
da educação ao desenvolvimento, um dos princípios presentes na educação
especial brasileira em finas de 1970 e início de 1980 foi a Normalização.
Olívia Pereira, técnica em assuntos educacionais do CENESP
esclarece que tal teoria, nascida na Dinamarca, onde foi incorporada na
legislação em 1959, tinha como objetivo criar condições de vida para a pessoa
retardada mental semelhantes, tanto quanto possível, às condições normais da
sociedade em que vive (Mikkelsen, diretor do Danish National Board Of Social
Welfare, 1978 apud JANUZZI 2004, p. 180)
Normalizar não significa tornar o excepcional normal, mas que a
ele sejam oferecidas condições de vida idênticas às que outras
pessoas recebem. Devem ser aceitos com suas deficiências, pois
é normal que toda e qualquer sociedade tenha pessoas com
deficiências diversas. Ao mesmo tempo é preciso ensinar ao
deficiente a conviver com sua deficiência. Ensiná-lo a levar uma
vida tão normal quanto possível, beneficiando-se das ofertas e
das oportunidades existentes onde vive. (idem)
A Normalização pode ser conhecida como um processo no qual
se busca minimizar as diferenças e maximizar as semelhanças individuais,
acreditando no principio de que as crianças normais e as “anormais” teriam mais
semelhanças do que diferenças.
O discurso enfatiza o principio de integração, de mainstreaming,
ou seja, da integração progressiva na corrente da vida com os considerados
normais, de modo que o deficiente seja aceito na escola e na sociedade,
requerendo para isto entrosamento da responsabilidade administrativa entre o
sistema regular de ensino e o de educação especial. Paulatinamente, vai-se
mostrando a responsabilidade de o meio também se transformar, mas a ênfase é
na modificação, na “normalização” do deficiente. O método apregoado é o
individual e aconselhava-se a adaptação curricular.
A partir de 1980, com a organização do Ano Internacional das
Pessoas Deficientes, o lema principal do movimento era “Participação plena e
41
igualdade”. Em relação aos surdos, a criação de associações foi um passo
decisivo para a autonomia desses sujeitos. Como resultado das discussões de
entidades que trabalhavam com temáticas relacionadas à educação da pessoa
surda, tais como familiares, pais, amigos, religiosos, em 1987, foi fundada a
Federação Nacional de Educação e Integração dos Deficientes Auditivos. Junto a
esta atuavam associações de surdos de diferentes estados, associações de
reabilitação, escolas especializadas, associações de pais de amigos de surdos,
Escola Estadual Francisco Selles, centro Educacional da Audição e Linguagem e,
também a Comissão de Luta pelos Direitos dos Surdos um grupo com trabalho
significativo junto a Federação Nacional.
Na reunião realizada no dia 16 de maio de 1987, em votação, foi
escolhido o nome FENEIS Federação Nacional de Educação e Integração dos
Surdos. Essa mudança refletia, também, as mudanças ocorridas no estatuto da
federação, de modo a garantir seu melhor funcionamento devido à legislação
vigente no país. Em parceria com a CORDE, a Federação firmou convênios com
empresas para a inserção de pessoas surdas no mercado de trabalho.
Ressalta-se que as associações nacionais de pessoas com
deficiência movimentavam-se nacionalmente em defesa de seus direitos, de
modo a incorporar seus trabalhos às entidades internacionais como a World
Federation of Deaf, ampliando sua perspectiva de atuação junto a CORDE, ao
governo e aos movimentos. É notada a importância dada à Federação e a
influência direta no trabalho realizado na educação de pessoas surdas.
Em 1999, o CONADE cita, entre os 13 representantes da
Sociedade Civil, pela Portaria n. 537 de de outubro de 1999, junto com as
federações das APAES, da Sociedade Pestalozzi e demais movimentos, a
Federação Nacional de Integração e Educação de Surdos. De modo significativo,
cresce o número das entidades, de modo a favorecer para esses deficientes a
conquista de espaço político, como uma forma representativa da visão que a
própria pessoa com deficiência e do que a própria pessoa surda conscientemente
almeja para sua educação e participação na sociedade.
De modo expressivo, os grupos percebiam a necessidade de
integração, participação desses alunos no ensino regular. Não a extinção dos
42
serviços existentes, mas a criação de condições efetivas de sua inserção nos
espaços da sociedade. Essa proposta foi apresentada na elaboração do
CENESP. A experiência pioneira em integração escolar havia ocorrido em Santa
Catarina em 1988, pela Fundação Catarinense de Educação Especial (FCEE),
instituição da secretaria Estadual de Educação e do Desporto de Santa Catarina
(SED). Passou-se a integrar crianças na faixa etária de 7 a 14 anos no sistema
regular. Planejou-se a implantação de serviços necessários complementares na
educação regular, salas de recursos, salas de apoio pedagógico. Outro
investimento estaria relacionado aos recursos humanos para facilitar a integração.
1.4.1.2 A Inclusão
A inclusão assumiu um espaço significativo em 1990, sendo
considerada como um avanço em relação à anterior proposta de Integração de
pessoas com deficiência à rede regular.
A declaração de Salamanca (UNESCO, 1994), propõe que se
assegure que a educação de pessoas com deficiência seja parte integrante do
sistema educacional. A Declaração recupera os apontamentos da Declaração de
Direitos Humanos, fazendo com que a educação especial possa ser vista como
parte integrante da política educacional brasileira.
A agência educativa passa a ser responsabilizada pelas
adaptações necessária para esse aluno. Essa posição é reafirmada pelas
Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica pela
resolução n. 2 de 11 de setembro de 2001. Enfatiza-se a ação da escola, da
educação como transformação da realidade, destacando-se métodos e cnicas
especificas a serem utilizadas no ensino. Nesse sentido, a escola assumiria uma
função essencial, ao buscar mecanismos capazes de favorecer a participação de
pessoas com deficiência na rede regular.
Na Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional, Lei
9.394 de 20 de dezembro de 1996, é garantido o oferecimento da educação
especial como uma modalidade de ensino preferencialmente na rede regular,
43
disponível desde a educação infantil (de zero a seis anos) até a educação
superior.
1.4.1.3 Educação como mediação
A partir dos fins de 1980, uma vertente forte e influente na
educação da pessoa com deficiência, fundamentada nos teóricos marxistas, no
materialismo histórico-dialético, empenhando-se em análises de modo a
considerar a educação como parte integrante da organização social, condicionada
pelos elementos materiais e de produção.
De acordo com Januzzi (2004, p. 191) esse movimento iniciou-se
em 1980 na educação regular, por influência de professores e alunos da pós-
graduação da PUC SP, de modo particular o professor Dermeval Saviani.
Compreende-se que a educação é colocada como mediação, momento
intermediário para a mudança da sociedade.
Compreende-se, nessa concepção, que, embora haja recursos,
técnicas e meios específicos para o ensino dos alunos da educação especial, esta
poderá somente efetivar-se mediante a solução de problemas sociais,
estabelecendo-se uma relação direta entre a apreensão e apropriação dos
conteúdos e possibilidades de uso e estabelecimento de relações entre eles e o
tempo e lugar ocupados socialmente na prática da cidadania.
Há, também, teorias da aprendizagem que reconhecem a
importância da intersubjetividade, da aprendizagem conjunta. Desse modo,
alguns trabalhos buscam sustentação nas teorias de Vigotski, na pedagogia
histórico-cultural. A utilização de métodos e técnicas específicas ocorre de modo
a garantir oportunidades diferenciadas necessárias à manutenção da igualdade.
Reconhece-se o princípio da eqüidade, do respeito à diferença e a necessidade
de existência de condições diferenciadas para o processo educacional.
Analisando a organização da educação especial ao presente,
presume-se que ela vem-se destacando pela aceitação da condição especifica de
ensino a pessoas com deficiência, principalmente após 1973, com o crescimento
44
dos movimentos sociais nacionais e internacionais; posteriormente, com a
Declaração de Salamanca (1994) e, oficialmente, no Brasil, pela Lei de Diretrizes
e Bases para a Educação Nacional (LDB n. 9394/1996, capítulo V, artigo 58,
parágrafos 1-2), e demais leis e decretos que a esta deram complemento.
Pode-se observar ainda as ações que vieram a compor parte da
história da educação de pessoas com deficiência no Brasil, a luta dos movimentos
organizados de pessoas surdas pelo reconhecimento da língua de sinais.
1.5 Nota sobre as propostas educacionais após os anos 1980-2005: inclusão
& bilingüismo na educação de pessoas surdas
Quanto à educação da pessoa surda as propostas educacionais,
são quase sempre relacionadas a algumas ciências, como a medicina e a
psicologia e, mais recentemente, a lingüística.
Com a Declaração de Salamanca (UNESCO, 1994) e a LDB n.
9394/1996, o trabalho realizado pela Secretaria de Educação Especial continuou
a desenvolver propostas educacionais em escolas especiais, e prioritariamente,
em escolas regulares. Paralelamente, conforme recorda Januzzi (2004), na
educação de pessoa surda a influência dos estudos da lingüística sobre a
linguagem, possibilitou o surgimento de uma nova proposta pedagógica capaz de
reconhecê-lo como usuário de duas línguas: a Língua de Sinais e a Línguas Orais
oficial do país.
Especificamente no final do século XX e início do século XXI,
destacam-se, no Brasil, estudos em lingüística sobre a Língua Brasileira de Sinais
(BRITO, 1979; 1985; 1989; 1990; 1991; 1994; 1996) contribuíram para o
reconhecimento dos gestos utilizados por grupos de pessoas surdas como uma
língua.
A influência de associações e de pessoas surdas organizadas no
sentido de favorecer o reconhecimento da língua de sinais pode ser observada
por meio de ações. Em 1999 foi encaminhado ao Ministério da Educação o
45
documento “Que educação nós surdos queremos” elaborado no pré-congresso
Latino Americano de Educação Bilíngüe para surdos, realizado em Porto Alegre
na UFRGS.
Em abril de 2002, foi homologada a Lei federal 10.436 que
reconhece a Língua Brasileira de Sinais como língua oficial das comunidades
surdas, representou um passo no processo de participação social e a abertura de
várias oportunidades respaldadas pela lei. Posteriormente, em dezembro 2005 a
Lei de Libras foi regulamentada pelo decreto 5.626, apresentando orientações
acerca da viabilização de propostas educacionais bilíngües e para formação de
recursos humanos.
Entre esses elementos, o descontentamento com o oralismo e as
pesquisas sobre línguas de sinais, segundo Lacerda (1998 p. 4) podem ser
reconhecidas como as principais razões para a busca de novas propostas
educacionais. Dentre as presentes na educação especial brasileira, na década de
1990, a Comunicação Total utiliza os gestos (sinais rudimentares), leitura
orofacial, alfabeto manual de modo a contribuir para que a criança desenvolva a
habilidade comunicativa, como, no Oralismo, preserva a aquisição da língua na
modalidade oral.
Pode-se destacar a influência de outros países nas pesquisas
sobre as línguas de sinais. Stokoe (1978), ao estudar a língua de sinais
americana, descreve que a estrutura dessa língua se assemelha à das línguas
orais, encontrando, nela, unidades - fonemas que são considerados parâmetros
básicos para a existência de uma língua. A influência dos estudos iniciais de
Stokoe e os que vieram posteriormente nos Estados Unidos (KICKOK, BELLUGI,
2004) e no Brasil (BRITO, 1997; QUADROS; KARNOPP, 2004) contribuíram para
a compreensão de que as línguas de sinais seriam nguas que emergiram da
convivência e interação de um determinado grupo de pessoas surdas.
Concomitantemente, a existência de propostas educacionais na
comunicação total, os estudos sobre as línguas de sinais tornaram-se cada vez
mais estruturados e, com eles, surgiram alternativas educacionais orientadas para
a educação bilíngüe.
46
Segundo Pereira (2004 p. 43), considerando que boa parte das
crianças surdas nascem em famílias ouvintes, espera-se que estas estejam
expostas à Língua Portuguesa e que fragmentos dessa língua sejam incorporados
por elas. Essa língua constituiria, juntamente com os gestos, as expressões
faciais e os movimentos corporais, uma linguagem partilhada com os familiares e
com a sociedade da qual fazem parte.
Esses aspectos relacionados à aquisição da língua de sinais
permitem identificar o bilingüismo, como uma proposta para a educação de
pessoas surdas. Pressupõe o ensino de duas línguas para as crianças. A primeira
é a língua de sinais, que dará arcabouço para a aprendizagem de uma segunda
língua, que pode ser escrita ou oral, dependendo do modelo seguido (Idem p. 45).
O princípio fundamental do bilingüismo é oferecer à criança um
ambiente lingüístico em que seus interlocutores se comuniquem com ela de forma
natural, como acontece com a criança ouvinte. Na convivência com um adulto
usuário da língua, a criança surda encontra a possibilidade de adquirir a língua de
sinais como primeira língua, não como uma língua ensinada, mas apreendida
dentro de contextos significativos para ela.
Por ser uma língua viso-espacial, a Língua de Sinais não
apresenta qualquer impedimento para o surdo e pode ser adquirida na interação
com usuários fluentes. A aquisição da língua de sinais por crianças surdas, filhas
de pais ouvintes tem sido objeto de estudo de pesquisadores (QUADROS, 1997;
1999; PEREIRA, 1983; 1987) que observam que, geralmente, as crianças surdas
nascidas em famílias ouvintes chegam à escola por volta de dois anos de idade
sem uma língua adquirida e iniciam, então, o seu primeiro contato com a Língua
Brasileira de Sinais, na interação com adultos surdos, usuários da mesma.
No Brasil, segundo Pereira (2006), a Língua de Sinais tem sido
apresentada a pessoas surdas em atividades discursivas, como conversas,
relatos, histórias, entre outras. Posteriormente, os alunos começam a apresentar
seus primeiros relatos, inicialmente com a incorporação de fragmentos do relato
do adulto ou de outro usuário fluente.
O domínio dessa língua será de suma importância para a inserção
social da pessoa surda, possibilitando a aquisição de uma segunda língua, a
47
Língua Portuguesa, que será adquirida preferencialmente pela leitura e pela
escrita, favorecendo o conhecimento de mundo e de língua, tornando possível
aos alunos surdos entenderem o significado do que lêem, deixando de ser meros
decodificadores da escrita (PEREIRA, 2000). Por sua vez, a língua escrita, por ser
totalmente acessível à visão, é considerada fonte necessária a partir da qual a
pessoa surda pode construir suas habilidades lingüísticas.
As línguas visuais-espaciais dispõem de uma série de formas
classificadoras, os classificadores, que fornecem a informação sobre um objeto ou
pessoa, o movimento por ele realizado e sua localização. A pessoa surda ao
aprender a língua de sinais, constitui um mapa do lugar, com pontos de referência
no qual as personagens se movem de um para outro ponto. No mapeamento da
disposição dos objetos, representam as relações espaciais entre os sinais e
correspondem às relações reais entre os objetos descritos.
Essas informações relativas à gramática da língua de sinais
contribuem para a compreensão do modo como a pessoa surda se apropria da
linguagem fazendo uso de recursos lingüísticos.
1.5.1 Organização do trabalho pedagógico bilíngüe e escolarização de
pessoas surdas
O trabalho pedagógico bilíngüe Libras – Língua Portuguesa é
considerado recente no Brasil. Os elementos anteriormente apresentados
sugerem possibilidades práticas para o desenvolvimento de um trabalho
pedagógico bilíngüe, para o letramento, aquisição da Língua de Sinais e da
Língua Portuguesa.
Segundo Quadros (2006 p. 55), como a língua de sinais é uma
experiência lingüística visual, sentimos um choque entre uma proposta
educacional oralista (praticada por tanto tempo) e o bilingüismo enquanto uma
proposta em processo de iniciação. No Brasil, é comum associar a educação de
pessoas surdas ao ensino do português (oral e escrito), pois ainda encontramos
resquícios do oralismo e da comunicação total, de modo que não podemos
48
considerar as práticas educacionais vigentes completamente enquadradas no
bilingüismo.
No entanto, atualmente, algumas experiências de educação
bilíngüe continuam condicionando a educação de pessoas surdas à aquisição da
língua oral, pela sua inserção no ensino comum sem que este esteja organizado
em duas línguas ou sem que assuma a língua de sinais como a primeira língua do
aluno surdo.
Os estudos sobre a aquisição da língua de sinais em crianças
surdas filhas de pais surdos, (LILO-MARTIN, 1986; PETITO, 1987) contribuíram
para visualizar o modo pelo qual uma criança surda filha de pais ouvintes poderia
desenvolver o uso da Língua de Sinais. Ao observar essas considerações sobre o
processo de aquisição da linguagem, compreendemos que nessa fase o processo
educacional deveria organizar-se de modo a favorecer, por meio do currículo
escolar e da organização do trabalho pedagógico, a apropriação dos conteúdos
escolares.
A base de todo o processo estaria fundamentada na língua
utilizada pelo surdo nas relações socialmente estabelecidas. De acordo com
Pereira (2006), se esta língua fosse a língua de sinais enquanto uma língua de
natureza visual adquirida na convivência com surdos adultos e nos fragmentos da
Língua Portuguesa adquirida pela interação com a família e com a sociedade
ouvinte, o ensino precisaria adequar-se a tal condição.
Passando pelas questões relativas ao aprendizado da escrita,
processo vivenciado na educação básica, de acordo com Lacerda (2006 p. 176),
a realidade escolar inclusiva torna necessária a presença de um profissional que
domine a ngua de sinais. No decorrer desse processo de instauração do
bilingüismo, dificuldade de encontrar professores preparados e capacitados
para o desempenho de um trabalho pedagógico bilíngüe.
O intérprete de Língua de Sinais passou, então, a ser considerado
como um meio de tornar real uma proposta educacional bilíngüe, na qual a
presença de um profissional fluente em Língua de Sinais é essencial. Entretanto,
inúmeras são as dificuldades encontradas no trabalho conjunto de professores e
intérpretes, com os alunos surdos e ouvintes.
49
A realidade escolar da inclusão esbarra na fragilidade da
formação docente, que desconhece a condição lingüística do aluno surdo e a
função a ser exercida pelo intérprete. Paralelamente, esbarra na formação do
intérprete para atuar no ensino, em sala de aula, cujo trabalho tem uma finalidade
educacional, que pretende mediar o processo de ensino/aprendizagem e não a
tradução/interpretação Língua de Sinais Língua Portuguesa desvinculada dos
processos educacionais.
Segundo Lacerda (2006) existem, ainda, implicações da falta de
planejamento, de trabalho em equipe e de clareza na compreensão do que vem a
ser, na prática, o ensino bilíngüe, de modo que este não se resuma à presença e
atuação do intérprete em sala de aula. De qualquer modo, a pesquisa realizada
pela autora deste trabalho revela que a presença do intérprete de Libras em
escolas brasileiras é pouco comum e, ao mesmo tempo que a fragilidade na
formação docente para trabalho com esse alunado é freqüente.
Em seu processo de escolarização, a criança não encontra um
ambiente educacional minimamente preparado para que possa aprender os
conteúdos do currículo do ensino fundamental. A presença do intérprete de língua
de sinais em sala de aula pode minimizar alguns aspectos deste problema, em
geral, favorecendo uma melhor aprendizagem de conteúdos acadêmicos,
entretanto, de qualquer modo, esse aluno continua inserido em um ambiente
monolingue.
No estudo das possibilidades para escolarização de educandos
surdos, observamos que as dificuldades encontradas na Educação Básica têm
sido freqüentes também no ensino superior. A problemática criada em torno da
fragilidade da formação docente para ensino de pessoas numa condição
lingüística bilíngüe e as limitações existentes no trabalho desempenhado pelo
intérprete de Libras, a ausência de uma organização bilíngüe, dentre outros
elementos, são observados nos demais espaços educacionais.
O trabalho pedagógico bilíngüe na educação superior, segundo
Ceretta e Fernandes (2008), tem ocorrido limitadamente desde o ingresso do
estudante na Instituição de Educação Superior por meio do vestibular. Devido à
existência de orientações do MEC, as universidades dispõem de bancas
50
especiais e intérpretes de Libras, mas não, de recursos especificamente
bilíngües.
No Brasil adultos surdos que freqüentam cursos bilíngües em
Instituições de Educação Superior. Segundo Franco (2008) o INES oferece,
desde 2004, um curso superior de licenciatura bilíngüe. O curso citado, do inicio
ao término das atividades didático-pedagógicas conta com capacitados
intérpretes de LIBRAS/Língua Portuguesa e docentes com informão suficiente
sobre características lingüísticas próprias da surdez. De modo geral, o INES
garante a flexibilidade na correção de provas e/ou trabalhos realizados pelo
universitário surdo. Para o possui resíduos auditivos disponibilizam equipamentos
de amplificação sonora de uso coletivo.
Uma segunda proposta de curso superior bilíngüe, segundo
Quadros (2006) e Rossi (2008) é um curso superior de licenciatura e bacharelado
em Letras Língua Brasileira de Sinais oferecido pela Universidade Federal de
Santa Catarina (UFSC), em parceria com o Ministério da Educação, com a
Secretaria de Educação a Distância e a Secretaria de Educação Especial. O
curso visa formar mão de obra especializada para o trabalho educacional bilíngüe.
O curso é oferecido na modalidade de educação a distância e
conta com materiais didáticos: vídeos, DVD´s, apostilas em Língua Portuguesa e
em Língua Brasileira de Sinais. Utiliza um ambiente virtual de aprendizagem no
qual os alunos participam de fóruns de discussão em horários pré-agendados. As
aulas presenciais ocorrem em pólos localizados em universidades parceiras,
contando com tutores e intérpretes de Libras. Ambas as propostas de cursos
bilíngües em Instituição de Educação Superior são iniciativas do governo federal,
sendo a primeira proposta em parceria com o INES e a segunda, da Secretaria de
Educação Especial e da Universidade Federal de Santa Catarina.
Apesar das duas únicas propostas educacionais bilíngües na
educação superior, reconhece-se que a maior parte da população constituída por
pessoas surdas tem freqüentado o ensino superior em Instituições de Ensino
Superior comum. Partindo dessa realidade, os próximos tópicos estudam
questões que norteiam as propostas educacionais destinadas à pessoas surdas,
com o trabalho do intérprete de Língua de Sinais.
51
2 O TRABALHO DO INTÉRPRETE DE LIBRAS NA EDUCAÇÃO DA PESSOA
SURDA
2.1 RESGATE DA HISTÓRIA DA TRADUÇÃO DA LÍNGUA DE SINAIS E DA
TRAJETÓRIA DOS TRADUTORES E INTÉRPRETES LÍNGUAS DE SINAIS
Segundo Quadros (2004 p. 13), a história de tradutores e
intérpretes de língua de sinais iniciou-se com a atuação destes em atividade
voluntária, valorizada enquanto atividade profissional na medida em que pessoas
surdas conquistavam seus direitos e espaço na sociedade a partir do
engajamento da sociedade civil.
Na Suécia a atuação de intérpretes de língua de sinais ocorreu
em trabalhos religiosos por volta do final do século XIX. A criação de cinco cargos
de conselheiros para surdos ocorreu em 1938, sendo ampliado para mais de 20
devido à demanda de trabalho, pela procura de surdos.
No ano de 1968, por uma decisão do Parlamento, todos os surdos
teriam direito a um intérprete sem arcar com encargos. Com a expansão do
campo de trabalho do intérprete, surgiu, também, o primeiro curso de treinamento
organizado pela Associação Nacional de Surdos, junto à Comissão Nacional de
Educação e à Comissão Nacional para Mercado de Trabalho.
Nos Estados Unidos, conta-se que o primeiro intérprete teria sido
Thomas Gallaudet, intérprete de Laurent Clerc, surdo francês que estava nos
EUA para promover a educação de surdos. Nesse país, em 1964, foi fundada
uma organização nacional de intérpretes para surdos (atual RID), estabelecendo
requisitos para a sua atuação. O trabalho realizado pela RID progrediu de modo a
avaliar e a registrar intérpretes de língua de sinais.
No Brasil, os registros encontrados revelam a atuação de
intérpretes de língua de sinais por volta dos anos 1980, conforme afirma Quadros
(2004). Entretanto ao analisar os documentos da FENEIS, enquanto uma
federação que representa pessoas surdas desde 1973 observa-se que o trabalho
desses profissionais pode ter-se iniciado anteriormente.
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No intuito de levantar dados referentes ao histórico do intérprete
de Língua Brasileira de Sinais, analisaram-se os relatórios da Federação Nacional
desde a Ata de fundação da Feneida, em 1973; posteriormente, na sua
transformação em FENEIS, em 1986, e nos anos seguintes até o ano de 2002,
data do último relatório disponível no site, na integra.
Na ata de fundação, se menciona a presença de intérpretes, sem
maiores informações. Somente no relatório de 1988 inicia-se a descrição dos
trabalhos realizados por esses intérpretes junto à Federação, conforme se
observa na tabela abaixo.
Tabela 1. Atividades desenvolvidas por intérpretes de Libras vinculados a FENEIS de 1988 a 2002
Atividades Ano
1988 1990 1993 1994 1996 1997 1998 2000 2002
Atuação em Redes Televisivas
(Rio de Janeiro)
Pagamento recebido por
trabalho realizado
Atuação em empresas de
aviação
Definição do trabalho
desempenhado
I Encontro local (Rio de Janeiro)
Encaminhamento às escolas
estaduais
II Encontro local (Rio Grande do
Sul)
Atuação em assessoria jurídica
Criação do departamento
nacional de intérpretes
Contato com escolas especiais
Realização de testes para
ingresso de novos membros
Atuação em atividades de RH
(admissão, treinamento,
entrevista, contratação e
demissão de pessoas surdas em
empresas)
Atuação em palestras
Atuação em Bancos
Atuação em Órgãos Públicos
(Defensoria Pública, Delegacia,
Hospital, Cartório, INSS,
Secretaria de Saúde, médico e
DETRAN)
Atuação na Igreja Católica
Atuação em faculdades
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Seriam essas a principais atividades desempenhadas pelos
intérpretes vinculados à FENEIS. É importante destacar que a atuação de
intérpretes de língua de sinais se expandia cada vez mais no Brasil, em diferentes
religiões, instituições educacionais e associações.
Na tabela, observa-se que a presença de intérpretes em órgãos
públicos, empresas, bancos, eventos etc tornava-se cada mais freqüente, assim
como sua remuneração deixando seu trabalho de ser voluntário. Entretanto não
encontramos registros de condições seguras e estáveis disponíveis à esses
profissionais.
Segundo Rosa (2003) e Rossi (2005) diversos profissionais
estiveram engajados em atividades de interpretação da língua de sinais, no
entanto, a ausência de formação específica representava um impasse. De acordo
com o decreto 5.626 de dezembro de 2005, a formação do profissional deve
ocorrer através de curso de formação para a tradução/interpretação da Libras-
Língua Portuguesa ou mediante aprovação em Exame Nacional de Proficiência.
Algumas faculdades e universidades vêm oferecendo cursos de
formação como a Faculdade Estácio de Sá - Rio de Janeiro; Universidade Federal
de Santa Catarina; Instituto Moura Lacerda Ribeirão Preto SP; Universidade
Metodista de Piracicaba; dentre outras. A tensão existente em torno de questões
relativas à formação de intérpretes de língua de sinais é algo que vem persistindo
ao longo dos anos. Nesse sentido, o intérprete vem retirando do aprendizado da
língua de sinais, pela convivência com pessoas surdas, elementos fundamentais
e necessários à sua atuação.
Na França, Dinamarca e Alemanha existem cursos de dois anos
de duração que não exigem como requisito para o ingresso o conhecimento de
língua de sinais. As habilidades envolvidas relacionam-se ao conhecimento de
língua de sinais, participação em associações de surdos, história, gramática,
psicologia entre outros. Paralelamente, ocorre o registro de intérpretes de surdos
em organizações e associações nacionais (QUADROS, 2004).
No Brasil, em resposta a exigência do decreto 5.626 de dezembro
de 2005 entrou em vigência o Exame Nacional de Proficiência (ProLibras),
desenvolvido pelo MEC em parceria com a UFSC, considera habilidades e
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competências exigidas para a docência ou tradução e interpretação. Os docentes
devem dominar habilidades que contemplam a comunicação em situações do
contexto escolar e ensino da Libras, como componente curricular. O tradutor e
intérprete apresenta o domínio de habilidades que contemplam tradução e
interpretação da língua de sinais para a Língua Portuguesa.
O Prolibras avalia questões relativas à gramática, história,
educação, competência linguistica e ética, a avaliação ocorre em duas partes: a
primeira prova objetiva em Libras envolve compreensão dos sinais,
conhecimentos específicos, legislação e ética profissional; a segunda consiste
uma prova prática de tradução e interpretação, com temáticas relacionadas à
educação, com dez minutos de duração, para cada participante.
Esse curto período de avaliação justifica a existência de críticas,
quanto à metodologia e recursos empregados. Diante da escassez de cursos de
formação, muitos profissionais submetem-se a uma avaliação, que desconsidera
elementos importantes para a sua atuação no campo educacional, o que não
garante que os aprovados possuam de fato habilidades necessárias para o
desempenho da função.
Esses, entre outros fatores, compõe a tensão atual e os desafios
encontrados por intérpretes de Língua Brasileira de Sinais, em busca de
formação. Ressalta-se ainda a dificuldade para se encontrar referencias
históricas relacionadas ao intérprete de Língua de Sinais.
Por ser esse profissional o foco do estudo passaremos a reunir os
dados encontrados relacionados ao intérprete de Língua de Sinais aos dados
referentes a trajetória de intérpretes de línguas orais que serão analisados no
capítulo seguinte.
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2.2 RESGATE DA HISTÓRIA DA TRADUÇÃO E DA TRAJETÓRIA DOS
TRADUTORES E INTÉRPRETES DE LÍNGUAS ORAIS
Segundo Delisle; Woodsworth (1995), os primeiros trabalhos
realizados por tradutores ocorreram desde as primeiras formas de escrita
ocorridas na Suméria e na Mesopotânia, no intuito de facilitar os registros das
atividades agrícola e comercial, posteriormente no Egito e na China. Com a
escrita, nasceu a história e, concomitantemente a tradução.
Os arqueólogos descobriram vocabulários das línguas suméria e
eblaíta gravados em tijolos de argila com 4500 anos. Com o passar do tempo, a
escrita passou a ser utilizada para os contratos comerciais, os ensinamentos
religiosos, o direito e a literatura. Nas antigas civilizações, os escribas eram os
mestres da escrita, do ensino e da tradução, exercendo a maioria das funções
administrativas e controlando tanto as ciências sagradas como as seculares fatos
que demonstram a existência de tradução desde as épocas mais remotas.
Alguns tradutores ajudaram a dar memória a certas nações: Ulfila,
o inventor dos alfabetos armênio, albanês e georgiano (século V, Armênia); Cirilo,
o inventor do alfabeto glagolítico (século IX, Moravia) e James Evams, o inventor
da escrita silábica dos cree (século XIX, Canadá). A função exercida por esses
tradutores pode ser historicamente vista pela sua colaboração para a extensão de
fronteiras e para disseminação do conhecimento.
O trabalho desses tradutores teria ajudado a despertar a
consciência coletiva de grupos étnicos e lingüísticos, importaram
novas idéias e valores espirituais. Por esta razão contribuíram
concomitantemente para o nascimento de uma literatura e a
preservação de uma herança cultural, estimulando a
alfabetização. (
DELISLE; WOODSWORTH, 1995 p. 28 ).
Para os missionários-tradutores daquele período, a invenção da
escrita era um requisito para a propagação da , embora possa observar-se que,
em todos os casos, o uso e a transmissão dessa escrita excediam os objetivos
religiosos. A tradução não poderia ser estudada isolada de fatores lingüísticos das
56
línguas nacionais, por estar diretamente relacionada a projetos de natureza
nacionalista, ideológica e religiosa. No passado, esses projetos tinham o apoio de
monarcas, aristocratas e instituições. O poder dos patrocinadores ou o contexto
crítico em que as traduções foram realizadas impulsionou e serviu como base
para a legitimação do trabalho realizado pelos tradutores.
Um exemplo seria a Inglaterra. As influências estrangeiras
enriqueceram a língua e estimularam o uso de um idioma verdadeiramente
nacional. Na França, o nacionalismo ocorreu de modo marcante pela existência
de monarquias poderosas que encorajaram a tradução e a incorporação de
grandes obras estrangeiras. No fim da Idade Média, o mosteiro de Vadstena,
conhecido como “o berço da tradução sueca” funcionou como um espaço
importante e sede da tradução, ajudando a desenvolver o moderno sueco escrito
(DELISLE; WOODSWORTH, 1995).
Na Alemanha, também foi a tradução de textos cristãos que levou
à formação de uma ngua padrão. Martinho Lutero que exercia um papel
eclesiástico contribuiu para a criação de uma língua literária. Do mesmo modo, na
África, a língua e a religião estiveram associadas. No período colonial, os
missionários que vinham difundir o Evangelho cristão contribuíram para promover
as línguas locais. Uma instituição como o Centro de Traduções para Gbaia, de
Meiganga, na República dos Camarões, reforçava a necessidade ideológica de
promover uma língua nativa.
Por fim, é preciso lembrar o hebraico, um idioma antigo que,
durante séculos, foi a língua sagrada do povo judeu. Os tradutores contribuíram
para inventar novos recursos lingüísticos e para transformar o hebraico em uma
língua moderna. No entanto é necessário considerar, que historicamente, a
tradução literária difere da religiosa e científica. Os primeiros tradutores cristãos
defendiam a tradução literal, especialmente São Jerônimo e Boécio, assim como
os tradutores medievais que vieram depois se preocupavam, fundamentalmente,
em transmitir a informação intelectual.
a tradução literária desenvolveu-se dentro de diferentes
contextos. Na época dos romanos, era considerada sujeita ao debate em torno de
sua fidelidade, considerada “um projeto retórico cujo objetivo era diferenciar-se do
57
texto original“. Da mesma forma, a tradução medieval dos autores clássicos para
o vernáculo implicava a interpretação, o comentário e a apropriação do texto. Ao
longo da história, a admiração pelo original sempre esteve associada ao propósito
de criar alguma coisa nova, de deslocar significados. Essas são idéias que
sempre estiveram associadas ao ato de traduzir.
A tradução, de algum modo, contribui para o desenvolvimento de
literaturas nacionais e para a formação dos Estados Nacionais na Europa
renascentista. Alguns fatores levaram ao crescimento da atividade da tradução,
durante o Renascimento, e ao surgimento paralelo das nguas e literaturas
nacionais, do próprio sentido de nação: a descoberta da imprensa e a
subseqüente difusão da palavra impressa, a paixão pela erudição grega e latina, a
conquista de novos mundos, a importância atribuída à divulgação da Bíblia nas
línguas nacionais.
No início do século XVIII e no fim do século XIX, muitas das
literaturas européias haviam atingido o estágio de literaturas “nacionais”. No
entanto, elas sofreram mudanças importantes devido à convergência de eventos
políticos e literários. Um destes é a tradução de Shakespare, situação que tem a
ver mais diretamente com o redirecionamento das literaturas nacionais. As
línguas nacionais existiam, do mesmo modo as literaturas, entretanto a
tradução favoreceu maior interação entre literaturas de culturas distintas.
Um exemplo seria a literatura africana, cujas raízes residem na
tradição oral, ao contrário do que acontece em outras partes do mundo, na
Europa, Oriente Médio e algumas regiões da Ásia. A África negra não tem uma
antiga tradição de literatura escrita, portanto não possui uma longa história de
tradução. Na época pré-colonial, a escrita pictórica foi uma forma comum de
expressão artística em certos grupos étnicos dos Camarões, como os bamum,
bamileke e beti, e o mesmo acontecia em outras culturas africanas. Trata-se de
uma crição de narrativas africanas em caracteres árabes. A atividade de tradução,
como entendemos hoje, só teve início com a chegada de missionários cristãos, no
século XIX, de posse do alfabeto latino.
Por essa razão, na África, questões relativas à língua e literatura
nacional são problemáticas, principalmente porque, após o encontro das Áfricas
58
com o Ocidente, as línguas européias assumiram uma posição ao lado das
línguas nativas, e algumas delas (o inglês, o francês e o português) receberam o
status quase oficial. Devido a essa realidade, a própria definição de “literatura
africana” é um tema controverso entre os escritores e acadêmicos. O
questionamento ocorre justamente devido a esta problemática em torno da língua
nacional, que reflete diretamente questões relativas a uma literatura nacional.
Até o momento, observa-se, que a tradução pode ser vista a partir
dos trabalhos realizados desde épocas remotas. Desde a invenção da escrita, os
povos procuravam adquirir o conhecimento cnico e científico dos seus vizinhos
e, nessa antiga busca por informação útil, as traduções ocuparam um espaço
amplo. Boa parte dos tradutores atuaram como educadores, utilizando o
conhecimento adquirido com seu trabalho para contribuir para o progresso
cientifico (DELISLE; WOODSWORTH, 1995). Talvez mais do que qualquer outra
modalidade, a tradução técnica e científica é um instrumento moderno de
“transferência de tecnologia” de uma nação para a outra.
Na Idade Média, três núcleos importantes da tradução
desenvolveram-se sob o patrocínio do Estado, representado pelos monarcas,
califas ou príncipes e da Igreja Católica Romana representada pelos cardeais,
bispos ou pelo próprio Papa. O primeiro foi a Escola de Bagdá, que reuniu a
segunda geração de tradutores do período abássida. Esse núcleo girava em torno
de Hunayn ibn Ishâq, um filósofo e médico que traduzia do grego para o árabe ou
o siríaco e que ocupava uma posição privilegiada na corte do califa al-Ma`mûn.
O segundo cleo foi a chamada Escola de Toledo. Essa
denominação deve-se a dois movimentos distintos, na Espanha. O primeiro no
século XII e o segundo, no culo XIII. Durante o primeiro, a herança filosófica e
científica do mundo greco-árabe foi traduzida do árabe para o latim. Em sua maior
parte, essas traduções foram feitas sob o patrocínio de membros da Igreja, como
o arcebispo Raymond. Durante o segundo período, as traduções eram
primordialmente de obras cientificas desta vez do árabe para o espanhol e, em
menor escala, para o latim e o francês, sob o patrocínio do rei Alfonso (Alonso) X,
que ficou conhecido como Alfonso, o Sábio.
59
O terceiro núcleo importante de tradução na Idade Média, na
segunda metade do século XIV, deu-se quando um grupo de eruditos traduziu as
auctoritates, textos da tradição greco-latina, vertidos do latim para o francês. Essa
“escola” funcionava sob o patrocínio do rei Carlos V, também conhecido como
Carlos (o Sábio).
Esses, porém, não foram os únicos centros de tradução. Durante
a Idade Média, outros centros floresceram na Europa, embora em menor escala.
Em meados do século IX, Carlos (o Calvo), rei da França encomendou a tradução
de textos gregos e latinos. Por volta da mesma época, o rei Alfredo (o Grande), da
Inglaterra, instituiu um programa de tradução do latim, de que ele próprio chegou
a participar. Na Itália, traduções de biografias de santos foram realizadas em
Nápoles, Amalfi e Pisa. Entre 1230 e 1343, os tradutores estiveram ativos na
Sicília. Um primeiro grupo traduziu do árabe para o hebraico, durante o reinado de
Frederico II (1194-1250) e do seu sucessor Manfredo (1222-66); um segundo
grupo mais numeroso e com maior produção, traduziu do árabe para o latim
durante os reinados de Carlos e Roberto de Anjou.
Tanto na França como na Espanha, as atividades compunham
uma política lingüística desenvolvida pela monarquia. Até então, na Europa
Ocidental o latim era a única língua considerada adequada à redação de obras
científicas ou filosóficas. Para que fosse substituído pelas línguas vernaculares,
que se tornavam cada vez mais importantes, era crucial que fossem feitas
traduções para o francês ou o espanhol. Os monarcas que patrocinavam as duas
escolas citadas, Carlos V e Alfonso X, contribuíram muito para atrair os tradutores
mais talentosos da época. Tudo isso ajudava o desenvolvimento do francês e do
espanhol.
Como a profissão do tradutor não era oficialmente reconhecida,
(como não é, até hoje, em boa parte dos países) grande parte dos que praticavam
a tradução trabalhavam sob a égide da Igreja Católica Romana. Alguns eram
chamados de diaconus, archidiaconus e canonicus. Outros tradutores
trabalhavam sob a proteção de um monarca, com títulos tais como aulae
imperialis protonotarius, notaire et escriven de monseignour Roy ou assinavam
suas obras como voltre humble serviteur et subjetc (vosso humilde súdito e
60
servidor). Nas escolas patrocinadas pelos monarcas, havia uma correlação entre
o status dos tradutores e as condições em que trabalhavam. Sabemos que
Hunayn ibn Ishâq recebia, em ouro, o valor das suas traduções.
Os tradutores que trabalhavam dentro da Igreja tinham um
envolvimento mais pessoal com o que faziam e podiam seguir seus próprios
interesses com mais liberdade. O mais conhecido e mais prolífico dos tradutores
para o latim do século XII, Gerard de Cremona, aparece relacionado como um
cônego de Toledo de 1157 a 1176. Ele traduziu o Almagesto, de Ptolomei, porque
queria uma cópia desse livro. De modo geral, suas traduções eram protegidas
pela autoridade eclesiástica, ainda que não tivessem sido necessariamente
encomendadas por algum bispo ou arcebispo, que estes não sabiam o que
havia disponível em árabe, a língua-fonte.
A relação de poder entre os monarcas e os tradutores foi
ressaltada nas publicações da época, assim como nos prefácios das obras
traduzidas. As fotos e imagens da época mostram os tradutores ajoelhados
humildemente aos pés de um monarca ou de alguma outra personagem real,
oferecendo-lhe seu trabalho. Os prefácios eram fundamentalmente dedicatórias,
seguindo variações, um esquema preciso que salienta a posição central de quem
encomendara a tradução; o tradutor fizera o que lhe havia sido encomendado,
embora não tivesse preparado para uma tarefa daquela magnitude (DELISLE;
WOODSWORTH, 1995 P. 170). A tarefa em questão consistia em servir os
interesses do patrocinador, seguindo sua orientação e recomendações e, como é
óbvio, tecendo-lhe louvores (idem).
Em alguns casos, os tradutores recebiam uma remuneração
especial pelo seu talento. Através de uma carta dirigida por Pedro a Bernard de
Clairvaux, sabe-se que Pedro precisou “abrir a bolsa” para convencer Robert de
Chester e Herman da Dalmácia a colaborar na tradução do Corão e de outros
textos islâmicos, do árabe para o latim. No século seguinte, Alfonso X da Espanha
contemplou com ricas recompensas os membros da chancelaria real a quem
confiara partes dos textos que queria traduzir. No século XIV, Carlos V da França
doou a Raoul de Presles e a Nicolas Oresme, dentre outros, riquezas substanciais
61
em troca da tradução para o francês de alguns dos textos mais importantes da
Antiguidade latina.
Durante a Idade Média, o poder dos patrocinadores de traduções
foi contrabalançado pelo poder muito pessoal, embora limitado, dos tradutores,
pelo fato de que eram conhecedores profundos do seu campo de atuação. Esse
patrocínio dava aos tradutores oportunidades singulares. O poder real e
eclesiástico permitia seguir seus interesses pessoais, reservando-lhes um espaço
que, de outra forma, não teriam nas sociedades em que viviam. No século XII, por
exemplo, os estudiosos interessados nos textos islâmicos seriam condenados à
fogueira se não tivessem a proteção de patronos poderosos, que queriam que
esses textos fossem traduzidos.
No contexto dos estudos acadêmicos medievais, os tradutores
tinham um poder próprio. Sabe-se que, na Idade Média, a atividade acadêmica
era pouco criativa, consistindo mais em comentários. Essa tradição, combinada
com a visão teológica do mundo como epifania, ou revelação da natureza das
coisas, ocasionava a dupla definição da tarefa dos tradutores: eles precisavam
respeitar a letra do texto, traduzindo literalmente, mas era-lhes permitido
“ornamentar” a tradução para torná-la mais acessível ao público. Assim, tinham a
possibilidade de omitir certas passagens e inserir comentários, com uma
liberdade que jamais seria igualada na história da tradução no mundo ocidental.
No contexto da conquista e da colonização, os tradutores estão
associados ao poder. Conscientemente ou não, os tradutores indígenas se
tornam instrumentos do domínio estrangeiro sobre o seu próprio povo, embora
possam, também, empenhar-se em atos de resistência.
No entanto as relações de poder tornam-se tão desiguais que,
muitas vezes, o povo colonizado possui poucas escolhas. Um exemplo dessa
situação é a conquista das Américas pela Espanha. O estudo de documentos do
período revela que os colonizadores compreendiam bem a importância dos
tradutores, vistos como instrumentos da justiça e do governo no Mundo Novo.
Ressaltam-se as 29 leis promulgadas entre 1529 e 1680, que enfatizavam
lealdade dos tradutores para com a Coroa espanhola e a moralidade da sua vida
pessoal, muito mais do que o conhecimento lingüístico. Naturalmente, esperava-
62
se que os tradutores ajudassem a difusão do cristianismo e a consolidação do
domínio espanhol. Nessa primeira fase da instituição e consolidação da nova
estrutura de poder, a interpretação era mais comum do que a tradução escrita.
O primeiro tradutor-intérprete espanhol de Colombo foi Don Luís
de Torres, um judeu convertido que conhecia o castelhano, o latim, o árabe, o
hebraico, o grego e o armênio e se considerava, assim, bem equipado para lidar
com as línguas do Novo Mundo. Colombo, porém, precisou de tradutores
indígenas.
A principal tarefa dos tradutores e intérpretes a serviço dos
conquistadores que seguiam Colombo era dissuadir os índios de qualquer
resistência. O mais famoso deles foi Doña Marina (la Malinche), filha de um chefe
influente, um cacique. Marina foi mais do que uma simples intérprete de Cortés.
Conforme relatos do povo da época, era, também, sua conselheira e concubina,
mantendo-o informado sobre espiões e conspirações. Teve muito êxito ao
persuadir os índios a não resistir aos espanhóis.
Marina foi condenada pelo seu povo por ter ajudado os
conquistadores espanhóis. Conta uma lenda popular mexicana que seu fantasma
perambula pela antiga capital asteca, Tenochtitlán (a cidade do México dos
nossos dias), lamentando seu destino, incapaz de encontrar repouso depois de
morta por haver traído o seu povo. Recentemente, o seu papel passou a ser visto
sob nova luz, especialmente por historiadores feministas, que acentuam as
pressões a que estava sujeita como mulher e escrava, e que a reconhecem como
um modelo, um símbolo da fertilidade do intercambio de culturas, e não como
uma traidora.
Na tradução, como em muitas outras atividades sociais e
intelectuais, na história do Ocidente, as mulheres foram tratadas de forma
diferente. Durante a Idade Média e a Renascença, a tradução era vista como um
dos poucos campos de produção literária abertos ao sexo feminino. Na Inglaterra,
as mulheres estavam limitadas à tradução de textos religiosos. Como se pode
observar, características da realidade social influenciaram diretamente na
trajetória de tradutores
63
Por meio da tradução houve a difusão de religiões. Os textos
sagrados conhecidos por “escrituras” são a base das religiões baseadas na
revelação divina. Os membros da comunidade religiosa conferem um status
mítico a esses textos, cuja antiguidade e características lingüísticas os distanciam
dos outros tipos de discurso. As principais traduções da Bíblia, por exemplo, são
formas cruciais para a transição cultural, a principio do mundo semita para o
helênico, depois para o mundo latino. Do mesmo modo, as traduções dos
principais textos budistas para o chinês e o tibetano contribuíram diretamente
para difundir o budismo em grandes áreas da Ásia.
Quando nasceu a religião cristã, sua escritura sagrada era a
Bíblia hebraica, contudo, não na língua original, mas na tradução grega: a
Setuaginta. Assim, um dos dois textos fundamentais da Igreja nascente, o Velho
Testamento, era uma tradução, enquanto o outro, o Novo Testamento, foi escrito
basicamente em grego. Uma das mensagens da Igreja era a de Jesus como o
Messias não dos judeus, mas de todos os povos. Assim, era preciso que, à
medida que a fé cristã se desenvolvia e se espalhava pelo mundo, começassem a
aparecer traduções dos textos sagrados. Antes mesmo que o cânon do Novo
testamento fosse finalmente estabelecido, no fim do século IV, os Evangelhos e
as Cartas de Paulo estavam sendo traduzidos do grego para outras línguas.
Possivelmente mais do que qualquer outra religião, o cristianismo aceitou com
entusiasmo a tradução como um meio de difundir seus textos fundamentais. Em
poucos momentos na história do catolicismo, em especial durante a Contra-
Reforma, a tradução foi desestimulada e até mesmo proibida oficialmente.
A importância cultural da tradução da Bíblia, na história do mundo
ocidental, nenhuma outra obra teve uma influência tão ampla na língua, na
literatura e nas crenças. Traduzida para mais de 2.000 línguas, parcial ou
integralmente, a Bíblia é o livro de maior circulação em todo o mundo. E as várias
traduções bíblicas foram decisivas para atualizar o seu estilo e sua interpretação
em momentos críticos da história ocidental. A intensa atividade dos tradutores
contribuiu de forma significativa para a emergência e a legitimação dos novos
vernáculos, o surgimento das línguas nacionais na Europa, durante a Renascença
e de muitas línguas coloniais nos séculos XIX e XX.
64
São Jerônimo, considerado o santo patrono dos tradutores, é,
sem vida, um dos mais conhecidos no Ocidente, pela tradução da Bíblia latina
padrão. Nascido em uma família cristã de Stridon, na fronteira da Dalmácia e da
Panônia, Jerônimo foi enviado para estudar em Roma, onde usufruiu dos muitos
atrativos da cidade, inclusive o circo e o teatro. Durante os anos em que viveu na
capital do império, adquiriu conhecimento da literatura clássica, do direito, que
pretendia praticar, e da filosofia pagã, sendo batizado aos 19 anos.
Durante uma viagem a Trier (na atual Alemanha), em busca de
fortuna, soube da vida dos monges egípicios, cujo exemplo decidiu seguir.
Quando retornou a Roma, sua vocação religiosa começou a tomar forma.
Abandonou sua carreira como funcionário do governo imperial, desfez-se dos
bens materiais e partiu para o Oriente. Descobriu a literatura cristã enquanto
estudava grego em Antioquia. Cada vez mais atraído pelo asceticismo da vida
monástica, recolheu-se ao deserto de Cálcis, no que hoje é território da Síria.
Passou dois anos fazendo penitência e, nesse período, teve o famoso sonho em
que era acusado de ser “um ciceroniano, não um cristão”. Comovido por essa
experiência espiritual, Jerônimo devotou-se integralmente ao estudo da Bíblia e
da literatura cristã, depois de “cruzar o deserto”, o que o ajudou a aprimorar seu
conhecimento da língua hebraica. Retornou a Antióquia e começou a preparar
seus textos de erudição. Passou algum tempo em Constantinopla, onde voltou
sua atenção para outro projeto literário, a tradução de homilias sobre o Cântico
dos Cânticos e o Evangelho segundo São Lucas.
Ao regressar a Roma, atuou como intérprete no sínodo das
Igrejas grega e latina. O sínodo não foi um sucesso, mas Jerônimo continuou a
serviço do papa Damaso I, como secretário, intérprete e consultor teológico.
então conhecia três línguas, o hebraico, o grego e o latim. Sabia filosofia,
gramática e dialética. O papa o comissionou para traduzir e revisar a Bíblia, e
Jerônimo deu inicio à sua tarefa traduzindo o Novo Testamento e os Salmos, a
partir dos textos gregos aceitos. Em Roma, levava uma vida confortável, em
companhia de mulheres jovens e damas aristocráticas. Depois da morte de seu
protetor, em 384, perdeu a posição que desfrutava: não foi escolhido como
sucessor de Damaso, como esperava.
65
Refugiando-se em Belém, Jerônimo continuou a traduzir. Depois
de completar a tradução do Antigo testamento, a partir do grego, voltou a traduzi-
lo do hebraico. É tido como o primeiro a traduzir o Antigo Testamento para o latim
diretamente do original hebraico (hebraica veritas), em lugar da Septuaginta.
Jerônimo deixou um conjunto substancial de comentários e outros escritos que
contribuíram para a tradição da pesquisa bíblica no Ocidente. Registrou, também,
suas idéias bem amadurecidas sobre o ofício do tradutor, consignadas em mais
de cem prefácios, numerosas cartas e prólogos das suas traduções das
Escrituras.
Quando completou a tradução e revisão da Bíblia, no fim do
século IV, a reação imediata não foi de todo favorável. Santo Agostinho, bispo de
Hippo Regius, na Numídia (a atual Argélia), opunha-se à tradução para o latim
dos textos canônicos, a não ser sob a forma de edições críticas, chamando a
atenção para as discrepâncias entre a Septuaginta e o texto original hebraico.
Escreveu a Jerônimo queixando-se de que seus paroquianos estavam
perturbados com o desaparecimento de certas palavras familiares que se haviam
acostumado a esperar através da liturgia.
Dentre as controvérsias existentes entre os religiosos, Jerônimo
teve um papel crítico na aproximação do cristianismo com a cultura clássica. o
Jerônimo foi canonizado no século VIII e proclamado doutor da Igreja (Doctor
doctorum) no culo XIII., juntamente com três outros pais da Igreja romana:
Santo Ambrósio, Santo Agostinho e o papa Gregório I. O fato de ter alcançado a
santidade pelo seu trabalho projeta uma luz especial sobre o relacionamento
entre o tradutor e a divindade: considera-se que Jerônimo trabalhou inspirado por
Deus, o que, por sua vez, garantiu proteção para a sua tradução da Bíblia.
Depois de um período de esquecimento, o culto de São Jerônimo reviveu durante
a Renascença.
O fim da Renascença coincidiu com o início da Reforma,
movimento destinado, como o nome sugere, a reformar a Igreja Católica. Latente
desde a Idade Média, o movimento ganhou força durante o século XVI,
estimulado pela curiosidade intelectual e a liberdade associadas com o
Humanismo, o desenvolvimento da imprensa, que permitiu aos líderes da
66
Reforma divulgar suas idéias e, em particular, o surgimento de novas versões das
Escrituras, que podiam ser traduzidas para os vernáculos.
A atitude de tolerância com respeito à tradução dos textos
religiosos, que tinha prevalecido durante a Idade Média, o se manteve
necessariamente nos períodos subseqüentes. A posição da Igreja Católica
Romana, por exemplo, refletiu-se na decisão tomada pelo Concílio de Trento em
1546, de considerar a Vulgata a única versão “autentica”, decisão que foi
reconsiderada em 1943.
Martinho Lutero (1483-1546) é considerado o fundador da
Reforma. Depois de graduar-se na universidade, começou a estudar Direito, mas
abandonou esse campo para ingressar em um mosteiro agostiniano em Erfurt.
Ordenou-se em 1507 e continuou seus estudos em Winttenberg, recebendo o
doutorado em teologia em 1511. Estava bastante familiarizado com a teologia
escolástica da sua época e devotou-se ao estudo da Bíblia, rebelando-se contra
muitas práticas da Igreja e criticando, em particular, a doutrina das indulgências.
Ao ser excomungado, refugiou-se no Castelo de Wartburg, onde começou a
traduzir o Novo Testamento.
Lutero trabalhou na sua tradução da Bíblia de 1521 a 1534, em
colaboração com um grupo de estudiosos. Sua tradução para o alemão do Novo
Testamento grego de Erasmo foi publicada em 21 de setembro de 1522, e a
Bíblia completa apareceu em Wittenberg em 1534. A Bíblia de Lutero foi a
primeira Bíblia completa em uma língua moderna traduzida diretamente das
línguas originais, grego e hebraico. O principal objetivo de Lutero era dar à sua
Bíblia a linguagem do alemão coloquial, a ngua “da mãe dentro de casa, das
crianças na rua, do homem comum no mercado”. A Bíblia de Lutero é também
muito respeitada como obra literária, um texto fundamental para uma língua
literária nascente. Os fatores históricos, culturais e religiosos especiais que
influenciaram essa tradução contribuíram para o surgimento e a aceitação do
alemão moderno e o trabalho de Lutero inspirou traduções similares: para o sueco
(1541), o dinamarquês (1550), o islandês (1584) e o esloveno (1584).
No culo XIX, houve o aumento impressionante do número de
idiomas para os quais a Bíblia foi traduzida. Durante o primeiro terço do século,
67
foram publicadas traduções para mais de 86 novas línguas, 66 das quais não-
européias: 43 asiáticas, 10 americanas, 7 africanas e 6 da Oceania.
Ao contrário do cristianismo, o Islam não aceitou facilmente a
tradução como meio de propagar sua doutrina. Assim como os textos judaicos
enfatizam o papel do hebraico como língua da revelação, diversos versículos do
Corão afirmam explicitamente que o árabe deve ser o veículo da palavra
divina. Através dos tempos, o texto do Corão esteve associado à qualidade
expressiva da língua árabe, refletida na riqueza da poesia pré-islâmica. A tradição
escolástica muçulmana dos primeiros tempos colocou o debate sobre o fato de o
Corão ser inimitável dentro da sua preocupação teológica mais ampla com a
Essência Divina. Qualquer tentativa de tradução é til, que o discurso eterno,
incorporado ao Corão, não pode ser imitado ou reproduzido por qualquer pessoa.
Entretanto, no século IX, menos de duzentos anos depois da
morte do Profeta, começaram a surgir traduções, normalmente acompanhadas,
linha por linha, do original árabe.
No passado, em muitos momentos, a tradução e a interpretação
eram vistas como tarefas sinônimas, entretanto em uma definição ampla,
interpretar significa explicar ou traduzir de uma língua para a outra, de forma
simultânea ou consecutiva (DELISLE e WOODSWORTH, 1995).
Atualmente esse trabalho é diferenciado em categorias de
intérpretes com qualificação especifica: intérpretes de conferência, de tribunal,
acompanhantes, comunitários classificados de acordo com o papel que
desempenham, a serviço do Estado ou de uma religião, em expedições de
descoberta ou conquista, a serviço de militares ou da diplomacia.
Cartas, diários, memórias e biografias dos próprios intérpretes
foram utilizadas como fontes de dados para o conhecimento do modo como
trabalhavam no passado. Entretanto, a dificuldade para se localizar registros
gerou atraso no conhecimento dessa história. É sabido que os antigos gregos
pouco respeitavam as línguas de outras nações, chamando-as de bárbaras. Da
mesma forma, no antigo Egito e entre os romanos, as outras línguas eram mal
consideradas e, em conseqüência, as pessoas da elite não se esforçavam por
aprendê-las. A única exceção era o grego, embora se observe que trinta séculos
68
antes da Era Cristã os egípcios tinham um hieróglifo que significava
“interpretando”.
Em vários períodos históricos, surgiu umangua franca como
meio de comunicação entre pessoas que falavam idiomas diferentes. De modo
particular este fato ocorreu com o latim, língua da Igreja, da ciência, das letras e
da diplomacia européia até o culo XVII. Em certa medida, o italiano e, depois, o
francês, português e espanhol nos impérios coloniais desses países. No entanto,
essas línguas de intercomunicação se limitavam a certas áreas ou grupos sociais.
Assim que os exércitos, os comerciantes, exploradores ou missionários
adentravam espaços de línguas por eles desconhecidas, precisavam da
colaboração de intérpretes. Os romanos, por exemplo, precisavam de intérpretes
nas campanhas em regiões fronteiriças do seu imenso império e para administrar
os territórios conquistados.
Em período anterior ao Renascimento, raramente se mencionava
o trabalho do intérprete. Quando se deixava documento escrito, como é o caso
dos tradutores, é mais fácil obter informação da história. A posição social dos
intérpretes pode também explicar sua omissão nos anais da história: híbridos
étnicos e culturais, muitas vezes do sexo feminino, escravos ou membros de uma
“subcasta”, cristãos, armênios e judeus que viviam na Índia britânica, por
exemplo, esses intermediários não recebiam de acordo com os registros
históricos o tratamento que mereciam.
Ingrid Kurz (1986, p. 218-9) conseguiu encontrar mais traços
dessa atividade, documentando cuidadosamente as várias referencias a
intérpretes nas obras clássicas: cinco em Lívio e numerosas outras em César,
Cícero, Aulo Gélio, Horácio, Plínio, Salústio e Valério Máximo. Outro autor Hans J.
Vermeer localiza, também, referências na literatura da antiga Grécia e de Roma e
na Idade Média. Por exemplo, no caso de Anabasis, de Xenofonte, ele concluiu
que tanto os gregos como os persas trouxeram seus próprios intérpretes para as
negociações.
Quanto à atuação dos intérpretes na Antiguidade, antes do
Renascimento, eles raramente eram mencionados devido à valorização da
tradução de livros e textos escritos. Na literatura latina e na literatura árabe
69
medieval, a interpretação é mencionada com freqüência crescente. Na Idade
Média, a necessidade de usar intérpretes cresceu e foi reconhecida, como se
podem observar, nas crônicas francesas, a referência aos intérpretes durante as
Cruzadas.
Os próprios intérpretes deixaram, nos últimos cem anos,
lembranças necessárias e úteis, testemunho do papel desempenhando, de sua
vida e prática da profissão. De certo modo reconhece-se que muitos profissionais
passaram a exercer a profissão por conhecerem diferentes línguas.
Considerando ser a interpretação uma tarefa complexa, ao longo
dos anos diferentes recursos e métodos foram utilizados em sua realização
(consecutiva, sussurrada ou simultânea, com ou sem equipamento).
Devido, fundamentalmente, ao espaço que a interpretação ocupa
em conferências, com a ajuda de fones de ouvido, ou na televisão, quando ocorre
a interpretação simultânea, passou a ser vista como um trabalho, como todos os
outros de natureza técnica.
Na conferência de Paz de Paris e das reuniões da Liga das
Nações, no fim da Primeira Guerra Mundial, no decorrer das negociações, a
interpretação consecutiva ocorreu com o trabalho de profissionais e recursos
altamente qualificados. Entre os intérpretes que atuaram nessa ocasião,
reconhecidos como pioneiros estavam Paul Mantoux, Antoine Velleman, Jean
Herbert, Robert Confino, os irmãos André e George Kaminker, e George Mathieu.
Salvador de Madariaga (1886-1978), escritor diplomata e chefe da delegação
espanhola à Liga das Nações, menciona, com admiração, uma certa Madame
Angeli, que podia “ouvir todo um discurso em inglês, francês ou italiano e repeti-lo
nas outras duas línguas sem jamais tomar uma só nota”.
Comenta-se que os intérpretes com essa habilidade se prestavam
mais ao trabalho da Assembléia, enquanto os outros interpretavam os
pronunciamentos curtos e comentários rápidos, adaptando-se melhor às
comissões (DELISLE e WOODSWORTH, 1995). Outros intérpretes consecutivos
trabalharam em épocas e situações diferentes, como doña Marina, que
interpretava para o conquistador Cortés, no México do século XVI e Vernon
70
Walters, no século XX, que prestou serviços a vários presidentes dos Estados
Unidos.
Eugen Dollmann, que trabalhou na Alemanha nazista, relata um
tipo diferente de experiência. Em suas memórias, lembra o primeiro discurso que
precisou interpretar para Hitler, planejado para ser breve, mas que durou meia
hora e foi realizado ao ar livre, para um grupo visitante de cerca de mil membros
da organização da juventude de Mussolini. Dollmann, que ainda não aprendera a
tomar notas, fez “um discurso em italiano que nada tinha a ver com as palavras
de Hitler”, mas foi recebido com aplausos entusiásticos (DOLLMANN, p.13 apud
DELISLE; WOODSWORTH, 1995 p. 260).
Em certas circunstâncias, os intérpretes eram solicitados
especificamente para narrar uma frase após a outra, como ocorreu com Arthur
Ferguson (1859-1908) na Conferencia de Paz de Paris de 1898, ao fim da guerra
entre os Estado Unidos e a Espanha. À medida que o Tratado de Paz ia sendo
redigido, os textos escritos eram submetidos à aprovação dos negociadores para
que fossem lidos em voz alta, sendo de preferência dos delegados que os
intérpretes os narrassem.
Um tema freqüente nas discussões sobre a interpretação
consecutiva é o da “fidelidade”. O coronel Stephen Bonsal (1865-1951), intérprete
do presidente Woodrow Wilson, defendia uma certa “revisão” da linguagem
original. Conta-se que um dos Quatro Grandes lhe pediu para sugerir a Lawrence
da Arábia que “suavizasse o impacto de algumas das palavras ofensivas de Emir
Faiçal.
A análise de fatos referentes à história dos tradutores e
intérpretes de línguas orais, aproximam características e fatos que evidenciam a
importância do trabalho realizado por esses profissionais para o desenvolvimento
das línguas, difusão cultural-religiosa e preservação da memória.
Conforme o objetivo do presente estudo, passaremos a refletir
nos capítulos seguintes, a trajetória de formação e as condições de trabalho de
intérpretes de Libras em IES, a partir de uma fundamentação teórica, de um
percurso metodológico e de dados que serão analisados e discutidos.
71
3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
3.1 Contribuições dos estudos de Lev Semionovitch Vygotski
Dentre os escritos de Lev Semionovitch Vigotski, encontram-se
textos redigidos a partir de seus estudos sobre o desenvolvimento da linguagem e
sobre a aprendizagem de crianças surdas.
Embora os estudos de Vigotski estejam diretamente associados à
psicologia, suas obras expressam as possibilidades de superação dos limites
dessa ciência. Considera-se um exemplo disso a atenção destinada à
defectologia (ciência que estuda as deficiências) e à pedagogia especial. Os
escritos dos anos 1924 e 1931 reunidos no livro “Fundamentos de Defectologia”
(Obras Completas), publicado em 1983, contêm os trabalhos que constituem a
base teórica essencial para o desenvolvimento científico da pedagogia especial.
As contribuições de Vigotski estão diretamente relacionadas à
linha de pensamento histórico-cultural, que compreende que as funções
psicológicas superiores têm uma origem biológica e também social. Desse modo,
o desenvolvimento da criança poderia ser definido como sócio-gênese das formas
superiores do comportamento. Nessa concepção, o desenvolvimento e a
formação da criança ocorrem mediante uma situação social de desenvolvimento e
sua participação numa realidade social (VIGOTSKI, 1983).
Quando uma criança não corresponde a um modelo de
desenvolvimento para uma determinada faixa etária, como ocorre com algumas
crianças com deficiência, poder-se-ia pressupor que, as condições sociais é que,
na verdade, ditariam as possibilidades de desenvolvimento e não, a deficiência.
As crianças surdas impossibilitadas de fazer uso da fala poderiam utilizar técnicas
que favorecessem sua educação e não serem privados dos processos
educacionais.
No entanto, segundo Vigotski (1983), aspectos atípicos do
desenvolvimento dessas crianças permitem observar, com maior clareza, a
interação entre o desenvolvimento natural e o cultural que, também, está presente
72
nas crianças sem deficiência. A idéia central de Vigotiski (1983) é a de que a
educação de crianças com deficiência o se diferencia da educação de crianças
que não possuem deficiência.
As crianças com deficiência poderiam assimilar conhecimento e
desenvolver habilidades de maneira semelhante à das demais crianças, porém,
para isso, tornar-se-ia imprescindível a utilização de métodos, procedimentos e
técnicas específicas. Essa idéia atribui à concepção formulada por Vigotiski
(1983) a característica de uma ciência otimista acerca do desenvolvimento dessas
crianças. Devido, fundamentalmente, a esse ponto de vista, Vigotski (1983) crítica
a escola especial, caracterizando-a como uma instituição que excede o uso de
técnicas terapêuticas, não permitindo que a educação especial estabeleça o
vínculo necessário com o social.
A pedagogia especial não poderia trabalhar separadamente das
condições materiais produzidas pela sociedade, sendo seu objetivo favorecer a
participação de crianças com deficiência nos processos sociais coletivos. No
entanto, o que não ocorreu, por um longo período, foi a vinculação entre a prática
pedagógica especial e a vida. A escola especial deveria caracterizar-se por sua
estreita relação com a comunidade onde estão inseridos os alunos. Com o
conhecimento disseminado nesse coletivo é que estes alunos devem estar.
De acordo com o estudo apresentado por Vigotski (1983), na obra
Fundamentos de Defectologia (1983), a deficiência de um membro, órgão ou
sentido o produz, necessariamente, a incapacidade total do sujeito.
Relativamente à surdez e à deficiência auditiva, a impossibilidade de uso
completo da audição pode representar a necessidade de obtenção de formas
diferenciadas de aquisição e uso da linguagem.
A compensação é uma noção teórica desenvolvida por Vigotski
(1983), um conceito que se refere às possibilidades biológicas e sociais de
utilização de outros órgãos e superação de dificuldades impostas pela deficiência
para convivência e participação na sociedade. Dessa maneira, não ocorreria
somente a compensação dos sentidos. A criança surda faria um melhor
aproveitamento da visão, do tato, do olfato e de outros sentidos.
73
A dinâmica desse processo seria mais completa se relacionada às
condições materiais por meio das quais essas crianças encontram formas de
desenvolver-se. A utilização da visão pelo surdo não desempenha a mesma
função em pessoas que ouvem normalmente, porém a compensação de uma
deficiência é produzida por um canal indireto de caráter social e psicológico.
Esse fato não representa a eliminação da deficiência de ordem
sensorial, mas pode significar a superação de limites impostos pela surdez. A
interação com a sociedade concretizada em experiências de linguagem possibilita
o desenvolvimento de funções psíquicas superiores.
O ensino da linguagem oral às crianças surdas é visto como um
desafio. Observa-se, no trabalho realizado por Vigotski (1983 p. 94), a luta contra
a utilização de um método artificial que forçava a memorização de palavras e
frases. O método de I. Golosov, professor do Instituto para Sordomudos de
Moscou, é apresentado por Vigotski (idem) como uma intenção original de
organizar o ensino da linguagem oral.
Em 1910, iniciou-se a elaboração prévia do método; em 1913, em
Varsóvia, iniciou-se a prática, porém a elaboração teórica e prática do método
somente pode ser finalizada após a Revolução ocorrida em Moscou. A essência
desse método é que a criança receba, imediatamente, uma palavra inteira e não,
por partes. O experimento apresentou resultados favoráveis, de modo que um
primeiro grupo se surdos entre os anos 1923-1924, estudou por esse método e
conseguiu fazer uso da fala. Nesse processo, dedicou-se, conjuntamente, à
leitura “labiofacial” vinculando-se a leitura e a escrita das letras. Desse modo, o
som não se apresenta separadamente da palavra e de seu significado.
O método desenvolvido por Golosov representou avanço, por
compreender a linguagem como um elemento vivo, que não pode ser memorizado
ou estudado distante de seu significado ou contexto de uso. É necessário
imaginar, segundo Vigotski (1983), as inesgotáveis possibilidades de favorecer o
desenvolvimento da linguagem, da consciência e do pensamento.
A tarefa de ensinar as crianças surdas a falar sofreu, ao longo dos
anos, crises conhecidas em todo o mundo. Os diferentes países buscam métodos
74
adequados e eficazes de modo que não existe um único método que possa ser
considerado solidamente fundamentado teórica e cientificamente.
Vigotski (1983) considerava a situação da escola russa ruim,
apontando os déficits e as falhas do sistema escolar. Afirmava que os professores
tornavam-se, inevitavelmente, reformadores dos meios e formas de ensinar.
Denunciava a enfraquecimento da estrutura administrativa, econômica e
pedagógica da escola russa e a falta de especialistas preparados para a
pedagogia especial.
As limitações do sistema impuseram aos alunos a realização de
um trabalho forçado para que pudessem passar pelas etapas escolares.
naquele período, a criança surda criava, inevitavelmente, sua forma de linguagem
através da mímica. Essa prática, porém, nem sempre representava uma
contribuição ao seu desenvolvimento, por não favorecer o acúmulo de
experiências socialmente estabelecidas.
De modo particular, segundo Vigotski (1983), a educação escolar
limitava-se ao cumprimento das determinações de uma visão moralista-religiosa.
A linguagem servia somente como um meio de compreender o sermão religioso,
sempre no idioma oficial do país. Nenhum sistema especial pode ser
compreendido de outro modo que não seja em um plano geral de idéias sócio-
pedagógicas e de relações com sua época.
O autor afirma que o problema da linguagem de crianças surdas
não sesolucionado pela metodologia especial e, sim, pela reestruturação geral
da escola sobre os princípios da educação social. A linguagem na criança surda
deve surgir quando tem necessidade dela, quando possa representar uma
experiência que lhe sirva para todas as experiências e por toda a vida escolar e
para isso não basta a reforma de um método e, sim, das possibilidades criadas
em torno da vida dessas crianças. A educação social amplamente desenvolvida é
a base necessária para solucionar o problema existente em torno da linguagem.
O método utilizado na pedagogia especial não deve trabalhar
somente com técnicas para o ensino da linguagem. Devem-se considerar três
princípios fundamentais: o pedagógico, o social e o metodológico. Seria
impossível trabalhar sem algum desses três elementos. Sem que exista uma base
75
social para a educação, nenhuma técnica resultará no desenvolvimento da
linguagem para a criança surda. A técnica é apenas um instrumento de sua
educação social e deve ser valorizada desse ponto de vista.
A aproximação da surdopedagogia (termo usado por VIGOTSKI,
1983) da escola geral se faz necessária para a nova revisão do problema em um
aspecto prático e teórico. Isso exige de nós o reconhecimento do problema do
ensino da linguagem. Apesar de todos os êxitos da surdopedagogia teórica e
prática, não se pode considerar solucionada a parte principal que se refere à
relação da educação geral com a linguagem. Surge a necessidade de revisar a
relação teórica e prática tradicional com os seus diferentes tipos de linguagem e,
em primeiro lugar da mímica e da linguagem escrita.
As investigações psicológicas (experimentais e clínicas)
demonstram que a poliglotia (o domínio de diferentes formas de linguagem), no
estado da surdopedagogia, é uma via benéfica e inevitável para o
desenvolvimento da linguagem e da educação da criança surda (VIGOSTKI, 1983
p. 294).
A experiência de avanços dos pedagogos europeus e norte-
americanos (em particular a experiência escandinava e norte-americana)
evidencia a possibilidade de realizar tanto a complementação de diferentes
formas de linguagem, como o enfoque diferenciado do ensino da linguagem à
criança surda.
Esse conjunto de fatores representa problemas e demandas à
pedagogia surda teórica e prática que, os quais podem ser solucionados não com
um plano metodológico particular e sim, com um plano da metodologia para o
ensino da linguagem. Em concordância com Vigostski (1983), reconhece-se que a
linguagem deve ser estudada e reconhecida como um instrumento social com
implicações diretamente relacionadas à aprendizagem.
Essa condição revela, ainda, que o trabalho educativo precisa ser
orientado para a apropriação de elementos culturalmente importantes, para
favorecer o desenvolvimento mental e cognitivo, possibilitando, então, ao sujeito
significar o mundo. O estudioso tinha no início uma visão oralista, porém, o
desenvolvimento de suas pesquisas evidenciaram a necessidade de se valorizar
76
o uso da “mímica”. Seus estudos contribuíram de forma elementar para a
superação da visão oralista e para a abertura de trabalhos educacionais com o
uso dos sinais.
3.2 Contribuições de Pierre Bourdieu
As contribuições de Pierre Bourdieu podem ser apresentadas a
partir de seu novo modo de interpretação da realidade escolar e educacional.
Pierre Bourdieu é considerado uma referência na Sociologia do
século XX. Sua formação inicial foi realizada nos anos 1950, na Escola Normal
Superior de Paris e na Sorbonne, no campo da Filosofia, e a partir do período
vivido na Argélia (1955-1960), em Ciências Sociais, em particular, a Antropologia
e Sociologia.
As obras de Bordieu caracterizam-se por burlar fronteiras
disciplinares e empreender estudos em diferentes campos das Ciências Sociais
(Sociologia, Antropologia, Sociolingüística). Por essa razão, contribuiu com
produções sobre religião, artes, escola, linguagem, mídia, utilizando, em seus
estudos, os mais variados métodos e técnicas de pesquisa: observação
etnográfica, questionário, fotos e material publicitário.
Suas obras contribuíram para o campo da Educação, para a
formulação de respostas aos problemas ocasionados pelas desigualdades
escolares. Até o século XX, predominava, nas Ciências Sociais uma visão
funcionalista, que atribuía à escolarização papel principal no processo de
superação do atraso econômico, do autoritarismo e dos privilégios associados às
sociedades tradicionais, e de construção de uma sociedade justa, moderna
(centrada na razão e nos conhecimentos científicos) e democrática
(fundamentada na autonomia individual).
Através da escola pública e gratuita seria resolvido o problema do
acesso à educação e, assim, garantida, em princípio, a igualdade de
oportunidades para todos os cidadãos. Os indivíduos competiriam dentro do
sistema de ensino, em condições iguais, e aqueles que se destacassem por seus
77
dons individuais seriam levados, por uma questão de justiça, a avançar em suas
carreiras escolares e, posteriormente, a ocupar as posições superiores na
hierarquia social.
A escola seria, nessa perspectiva, uma instituição neutra, que
difundiria um conhecimento racional e objetivo e que selecionaria seus alunos
com base em critérios racionais. Ocorreu, nos anos 1960, com a colaboração de
Bourdieu uma crise dessa concepção de escola e uma reinterpretação radical do
papel dos sistemas de ensino na sociedade.
A partir do final dos anos 1950, houve a divulgação de uma série
de grandes pesquisas quantitativas patrocinadas pelos governos inglês,
americano e francês (a “Aritmética Política” na Inglaterra; o Relatório Coleman
nos EUA; os estudos do INED na França) que mostraram de forma clara, o peso
da origem social sobre os destinos escolares. Desse modo, pôde-se defender que
o sucesso dos alunos na educação escolar não dependia, tão simplesmente, dos
dons individuais, mas da sua origem social (classe, etnia, sexo, local de moradia
etc).
A mudança no modo de conceber a educação, nos anos 60, está
relacionada, também, a certos efeitos inesperados da massificação do ensino. Na
França, considera-se o progressivo sentimento de frustração dos estudantes, com
o caráter autoritário e elitista do sistema educacional e com o baixo retorno social
e econômico auferido pelos portadores de certificados escolares no mercado de
trabalho. Os anos 60 marcaram a chegada ao ensino secundário e à universidade
da primeira geração beneficiada pela forte expansão do sistema educacional no
pós-guerra.
A geração frustrada, submetida ao trabalho em setores diferentes
das tradicionais elites escolarizadas, provou a desvalorização dos títulos
escolares e a massificação do ensino, vendo extinguir-se suas expectativas de
mobilidade social através da escola. Como diz Bourdieu, a decepção dessa
“geração enganada”, alimentou uma crítica feroz ao sistema educacional e
contribuiu para a eclosão do amplo movimento de contestação social de 1968.
Diante desses elementos, Bourdieu propõe, nos anos 60, uma
verdadeira revolução científica, que se inicia, primeiramente, com a mudança do
78
modo de olhar a educação escolar. Os dados coletados por Bourdieu revelam a
forte relação entre desempenho escolar e origem social, negando o paradigma
funcionalista. A frustração dos jovens das camadas médias e populares diante
das falsas promessas do sistema de ensino representou para Bourdieu a
reprodução e legitimação das desigualdade sociais e não, a igualdade de
oportunidades e justiça social características de uma visão funcionalista.
Na teoria de Bourdieu, a escola deixa de ser vista como
transformadora e democratizadora da sociedade para ser vista como uma das
principais instituições por meio da qual se mantêm e se legitimam os privilégios
sociais. Dentro desse modo de compreender a vida em sociedade Bourdieu
favoreceu ainda a compreensão de uma teoria da prática centrada no conceito de
habitus. Os principais conceitos desenvolvidos por Bourdieu: espaço social,
campo e capital (econômico, cultural, social e simbólico) evidenciam o modo
como o estudioso faz a analise da vida em sociedade.
As ações e interações sociais dependem das condições objetivas
que poderiam explicar o curso dessas interações. O problema desse fato,
segundo Bourdieu, não seria apenas suas limitações, por não atingir as bases
sociais que, supostamente, condicionariam as experiências práticas, mas, o fato
dessas ações contribuírem para uma concepção ilusória do mundo social que
confere aos sujeitos excessiva autonomia e consciência na condução de suas
ações e interações.
As escolhas, as percepções, as apreciações, as falas, os gestos,
as ações e as interações não deveriam, sob o risco de se construir uma
concepção enganosa do mundo social, ser analisados em si mesmos, de forma
independente em relação às estruturas objetivas que os constituem.
Em contraposição ao subjetivismo, o conhecimento objetivista é caracterizado
pela ruptura que promove em relação à experiência subjetiva imediata.
As críticas de Bourdieu, na verdade, superam as correntes
estritamente fenomenológicas e atingem um conjunto mais amplo de teorias,
classificadas por ele como subjetivistas. A questão essencial para Bourdieu é
como entender o caráter estruturado ou ordenado das práticas sociais, como
essas práticas seriam organizadas pelos sujeitos sociais.
79
Para encontrar uma resposta a essa questão tornar-se-ia
necessário compreender um princípio de produção social incorporado pelos
próprios sujeitos. A esse conceito, Bourdieu denomina “habitus”, entendido como
sistema de disposições duráveis estruturadas de acordo com o meio social dos
sujeitos e que seriam “predispostas a funcionar como estruturas estruturantes,
isto é, como princípio gerador e estruturador das práticas e das representações”
(BORDIEU, 1996 p. 49).
O conceito de habitus seria a mediação, entre as dimensões objetiva e subjetiva
do mundo social, ou simplesmente, entre a estrutura e a prática.
Para Bourdieu (1996) a estruturação das práticas sociais não é
um processo mecânico, unicamente de acordo com as condições objetivas
presentes em determinado espaço ou situação social ou autônomo, condicionado
exclusivamente pela consciência dos sujeitos. As práticas sociais seriam
estruturadas pela posição social de quem as produz, porque a própria
subjetividade dos sujeitos constitui, também, sua forma de perceber o mundo.
Segundo Bourdieu (1996), cada sujeito assume posição nas
estruturas sociais, vivenciando uma série de experiências que estruturariam
internamente sua subjetividade. Nesse ponto de vista, o habitus não
corresponderia, a um conjunto inflexível de regras de comportamento a ser
observadas pelo sujeito, mas, diferentemente disso, constituiria um “princípio
gerador duravelmente armado de improvisações regradas” (Idem p. 87). O habitus
seria formado por um sistema de disposições gerais que precisariam ser
adaptadas pelo sujeito a cada conjuntura específica de ação.
O conceito de habitus é atribuído por Bourdieu, um papel de elo
articulador entre três dimensões fundamentais de análise:
a estrutura das posições objetivas, a subjetividade dos indivíduos e as situações
concretas de ação. É por meio do habitus que Bourdieu estuda e analisa a
posição de cada sujeito na estrutura das relações objetivas (campo) e os tipos de
capital apropriados pelos sujeitos.
Paralelamente a uma disposição social e à estrutura objetiva,
funcionariam, ainda, um poder simbólico, identificado por Bourdieu (1996) como
as produções simbólicas moral, arte, religião, ciência, língua, dentre outros.
80
Seriam dessas tradições que um sujeito se apropriaria por meio de suas relações
e posicionamento na sociedade.
Desse modo, em concordância com Bourdieu (1996), conclui-se
que a posição que o sujeito ocupa na estrutura social não o conduziria facilmente
a um determinado modo de ação, mas faria com que ele incorporasse um
conjunto específico de disposições para a ação que o orientariam, ao longo do
tempo, nas mais diversas situações sociais.
81
4. PERCURSO METODOLÓGICO
4.1 A pesquisa qualitativa em ciências humanas e sociais
Como uma abordagem teórico-metodológica, a pesquisa
qualitativa permite estudar um campo que envolve ciências humanas e sociais,
carregando em si elementos relacionados à interação entre pessoas e fatos
inseridos em um determinado contexto que, apresentando significados visíveis,
tornam-se necessários para uma investigação.
A escolha do procedimento metodológico deve ocorrer de acordo
com a realidade a ser estudada, considerando como característica da pesquisa
qualitativa em ciências humanas e sociais a contestação da neutralidade
científica, reconhecendo o compromisso ético-político do pesquisador com a
realidade a ser estudada (LÖWY, 1985; CHIZZOTTI, 2006; GIL, 1999).
De acordo com Gil (1999), o procedimento deve favorecer a
interação entre o pesquisador e os participantes da pesquisa, bem como a
observância dos objetivos.
Nessa perspectiva, estima-se o uso do questionário de acordo
com:
a) O perfil da população a ser investigada;
b) A dispersão geográfica dos participantes;
c) A possibilidade de tradução dos objetivos em questões
centrais relacionadas a fatos, atitudes, construção de
índices e indicadores socioeconômicos.
Em concordância com os elementos anteriormente apresentados
os procedimentos utilizados para o desenvolvimento da pesquisa são: aplicação
de questionário fechado via web; análise de fontes documentais: instrumentos
legais, fontes de indicadores sociais e dados estatísticos; levantamento
bibliográfico.
82
Ressalta-se que, diante da necessidade de interação direta com
os sujeitos da pesquisa, foram observadas as implicações éticas da participação
na pesquisa na vida dos sujeitos. Por essa razão, o projeto inicial submeteu-se à
avaliação de um Comitê de Ética em Pesquisas da Pontifícia Universidade
Católica de Campinas, que concedeu um parecer favorável ao desenvolvimento
da pesquisa.
4.2 Participantes da pesquisa
De forma geral, participaram da pesquisa visitando o site e
respondendo ao questionário diversos membros de Associação de Surdos e de
Intérpretes de Libras. Pessoas surdas e ouvintes, que tiveram conhecimento do
desenvolvimento dessa pesquisa através da UFSC que colaborou na divulgação
da pesquisa enviando um e-mail de divulgação do blog aos inscritos nos exames
realizados em 2006 e 2007. O segundo canal de comunicação com os sujeitos foi
a lista de discussão no yahoogroups, constituída por intérpretes de Libras de
diversas regiões do país.
7
De acordo com o objetivo da pesquisa, consideram-se sujeitos,
somente os intérpretes de Libras certificados pelo Exame Nacional de Proficiência
para Tradução e Interpretação em nível superior e que atuam predominantemente
nesse nível de ensino.
A opção metodológica pelo estudo de profissionais certificados
pelo exame nacional justifica-se pela abrangência e finalidade desse exame. O
Prolibras é um programa promovido pelo Ministério da Educação em IES tendo
por objetivo viabilizar a certificação de proficiência em Língua Brasileira de Sinais
para uso, ensino e tradução/interpretação.
O Exame Nacional foi criado pelo MEC para cumprir a Lei
10.436/2002 e o Decreto 5626/2005 e implementado em 2006, de acordo com o
7
O grupo Brasil Intérpretes foi criado em 26 de dezembro de 2002, atualmente possui
382 associados e tem por objetivo debater assuntos relativos à categoria, divulgar cursos,
livros, associações, legislação, congressos relacionados à tradução e interpretação de
língua de sinais e favorecer a união necessária para a organização profissional.
83
art. e parágrafo da Portaria Normativa MEC nº 11, de 09/08/06, que constitui
um exame nacional sob a responsabilidade do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais “Anísio Teixeira” - INEP a ser realizado por meio de
parceria entre o Ministério da Educação, o INEP e a Universidade Federal de
Santa Catarina. Prevê a certificação de pessoas fluentes em Libras interessadas
em ser professores ou instrutores da Libras, principalmente, nos cursos de
formação de professores e de fonoaudiologia; pessoas ouvintes, fluentes em
Libras interessadas em exercer a tradução e interpretação da Libras,
principalmente, nas instituições de ensino.
Desse modo o certificado é conferido ao participante que
demonstra domínio operacional da Libras apresentando-se capaz de
compreender e produzir textos nessa língua, fluentemente, sobre assuntos
variados em diferentes contextos educacionais demonstrando ter domínio de
estruturas da Libras e vocabulário.
O Prolibras considera habilidades e competências exigidas para
as funções de docência ou de tradução e interpretação, para a função de tradutor
e intérprete, essas habilidades correspondem a tradução e interpretação da Libras
para a Língua Portuguesa (modalidades oral e escrita) e tradução da Língua
Portuguesa para Libras.
A avaliação da competência dos participantes ocorre pela
observação de sua leitura e compreensão dos sinais e de seu desempenho no
processo de interpretação. Para certificação de tradução e interpretação é
realizada em duas etapas, a primeira correspondente a uma prova objetiva
envolvendo a compreensão da Libras e ética profissional. A segunda parte
corresponde á tradução e interpretação Libras-Língua Portuguesa com temáticas
relacionadas à educação, com duração de dez minutos.
Um estudo realizado por Fernandes e Ceretta (2007) revela dados
importantes sobre o Exame no Estado do Paraná. Boa parte dos intérpretes
submetidos ao exame manifestaram dificuldade em compreender os sinais
utilizados, devido as diferencias entre sinais utilizados em cada região do país.
Observa-se que se a avaliação abrange todo o país deveria, também, acolher a
84
regionalidade oriunda das transformações ocorridas em uma língua em pleno
funcionamento.
De acordo com as pesquisadoras, os Exames de proficiência,
costumam avaliar habilidades comunicativas e gramaticais gerais e o grau de
familiaridade e relação do candidato com diferentes aspectos da língua. Essas
entre outras a proposta de avaliação da proficiência em tradução e interpretação
da Libras são freqüentes, entretanto, servirão nesse trabalho para a delimitação
dos sujeitos, considerando a finalidade do ProLibras de certificar profissionais que
deverão atuar na educação de pessoas surdas.
4.3 Construção dos dados da pesquisa
A construção dos dados da pesquisa ocorreu pela aplicação de
questionário com questões referentes à realidade social, à trajetória de formação
e às condições de trabalho dos sujeitos.
Nessa dimensão, não se utilizou questionário como recurso para
a realização de enquete ou para se ter noção de opinião pública. Na elaboração
do questionário, observou-se o conceito de Indicador Social, que, de acordo com
Januzzi (2001 p. 2), é uma medida utilizada para
operacionalizar um conceito social abstrato, de interesse teórico
(para pesquisas acadêmicas) ou programático (para formulação
de políticas). É um recurso metodológico, empiricamente referido,
que informa algo sobre um aspecto da realidade social ou sobre
mudanças que estão processando na mesma.
Nessa dimensão, as questões direcionavam os participantes a
fornecer informações referentes às suas condições de vida. Essa forma de
análise pode ser compreendida, em concordância às teorias sociais, como a
utilização de recursos necessários à análise dos fatos sociais e caracterização
das condições socioeconômicas.
Pelo questionário, também, coletaram-se dados referentes ao
processo de formação educacional e acadêmica vivenciado pelos sujeitos da
85
pesquisa. Em concordância com Bourdieu (1997), a trajetória é vista como uma
maneira singular de percorrer o espaço social e resultado construído de traços
próprios da história individual ou de um grupo. Mediante esse conceito, os dados
foram sistematizados de modo a favorecer a visualização de características
relativas à trajetória de formação dos intérpretes de Libras.
Juntamente aos dados anteriormente apresentados, observaram-
se as condições de trabalho e o desempenho da função exercida pelo intérprete
de Libras em Instituições de Educação Superior. Problematizou-se a fragilidade
na formação do intérprete de Libras e a precariedade à qual os profissionais da
educação superior têm sido submetidos. Discutiu-se o envolvimento do intérprete
na organização do trabalho pedagógico considerando os tipos de contrato de
trabalho à luz da legislação trabalhista, a carga horária de trabalho e remuneração
disponibilizadas aos profissionais.
4.3.1 Questionário
De acordo com Thiollent (1987), o questionário pode ser utilizado
no intuito de fornecer ao pesquisador o acesso a informações precisas acerca da
vida dos participantes da pesquisa. Na elaboração das questões que viriam a
compor o questionário, foi observado uso das palavras e formas de escrita para
garantir a eficácia na comunicação, evitando influenciar a escolha das respostas.
Entretanto, houve a preocupação com a possível inflexibilidade
mediante a existência de questões fechadas uma vez que o participante podia ser
sentir forçado a fazer a opção por uma única alternativa. Nessa perspectiva,
disponibilizou-se um espaço aberto para comentários no qual o participante
poderia livremente expressar-se, sem necessidade de seguir os temas abordados
nas questões.
A escolha da utilização de um questionário fechado deu-se devido
à extensão da amostra. Também por essa razão, utilizou-se um blog, um site de
fácil utilização, onde você se pode postar rapidamente informações garantindo a
interação com as pessoas de forma rápida. Devido a presença dos intérpretes em
86
diversas regiões do país foi considerada a dificuldade para envio e recebimento
de questionários pelo correio.
As questões estavam relacionadas aos eixos temáticos a partir da
seguinte distribuição:
A. Realidade socioeconômica: vinte e quatro questões referentes à idade,
sexo, escolarização, escolarização dos pais, tipo de serviço médico
freqüentado, participação em atividades culturais, estado civil, religião e
bens/propriedades.
B. Trajetórias de Formação: nove questões que solicitavam aos
participantes informações referentes à sua trajetória de formação:
escolarização, tipo de curso do ensino médio, nível de formação
acadêmica e envolvimento em atividades de pesquisa. Compõem esse
núcleo de análise, os dados referentes ao engajamento dos intérpretes em
movimentos sociais da comunidades surdas.
C. Condições de trabalho: oito questões referentes ao tipo de contrato de
trabalho firmado entre a instituição de ensino e o intérprete, função ou
cargo registrado, carga horária aproximada de desenvolvimento de
atividades remuneradas, nível de ensino em que tem predominantemente
atuado, tempo de atuação, relações com os colegas de trabalho e doenças
adquiridas devido ao trabalho exercido
4.3.2 Utilização de dados estatísticos
A análise dos dados da pesquisa foi realizada pela observação de
dados estatísticos relacionados às propostas e serviços educacionais disponíveis
a pessoas surdas; indicador-processo, que corresponde ao investimento e
aplicação dos recursos públicos. A esses fatores associam-se características
87
demográficas e socioeconômicas, dados do Censo Superior e da Secretaria de
Educação Especial referentes a projetos voltados ao tradutor e intérprete de
Libras. Abaixo, o quadro 3 apresenta as principais fontes de indicadores:
Juntamente às informações anteriormente apresentadas
utilizaram-se indicadores apresentados no quadro abaixo:
4.3.3 Dinâmica do processo de coleta de dados via web
As tecnologias da informação têm sido freqüentemente utilizadas
na área de educação, de forma a facilitar a comunicação e a interação à distância
entre os envolvidos no ato educativo.
No desenvolvimento do blog, contou-se com o trabalho de uma
empresa especialista no ramo. Através de reuniões, a homepage foi elaborada de
forma que se pudessem unir os possíveis sistemas de criação de páginas na
Quadro 1
: Principais fontes de Indicadores uti
lizadas para a construção e análise dos
dados
Instituição Fonte de dados Temas investigados Periodicidade
Ministério da Educação
Secretaria de Educação
Especial
Censo Escolar Matrículas na
educação especial
IBGE Censo Superior Matrículas de
pessoas surdas na
educação superior
Anual – Dados
correspondentes aos
anos 2000, 2001, 2002,
2003, 2004, 2005 e
2006.
IBGE Censo
populacional
População com
deficiência,
população com
surdez.
Anual
FNDE Resoluções e
deliberações
Recursos e
investimentos
Anual
Ministério do trabalho Documentos Empregos, salários,
regulamentação de
profissão.
Anual
* Esse quadro foi elaborado pela autora, desse trabalho, no intuito de favorecer uma melhor
visualização das fontes de indicadores utilizados para a construção dos dados.
88
internet à necessidade de reunir num banco de dados as respostas do
questionário.
A empresa apresentou duas possibilidades de criação da página:
1. Utilizando Subdomínio. Ex. www.empresa.com.br/pesquisa
Nesse modelo, seria utilizada a homepage da empresa, alugando
um espaço no qual esta pesquisa poderia ser desenvolvida. Haveria o
investimento financeiro na criação, desenvolvimento da página e manutenção.
2. Utilizando Domínio próprio. Ex: www.pesquisa.blog.br (ver anexo III)
O segundo modelo apresentado possibilitava o uso de um
domínio próprio na Internet, sendo o investimento na criação e desenvolvimento,
hospedagem e manutenção da página (como o modelo anterior), porém, como
uma página particular. Para isso seria necessário fazer o registro do domínio e
efetuar o pagamento da anuidade.
A opção pela segunda alternativa ocorreu devido à possibilidade
de contar com um domínio próprio, considerando a possibilidade de disponibilizar,
no mesmo endereço, informações referentes à pesquisa.
Após a definição do design da página e com o sistema em
funcionamento, antes da divulgação, houve a colaboração de três intérpretes para
entrar no sistema e responder ao questionário. Esse teste possibilitou o
reconhecimento de falhas e erros no sistema.
O desenvolvimento da homepage foi concluído, sendo esta
composta por três páginas: uma página inicial era acessada pelo participante no
endereço http://www.dileiamartins.blog.br para a realização do cadastro. Na
segunda página, o participante respondia o “Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido” e mediante a aceitação em participar da pesquisa, visualizava o
questionário disponível na terceira página.
89
No questionário, o participante fazia a opção por apenas uma
alternativa e, devido ao cadastro do e-mail e fornecimento dos documentos
pessoais (para o preenchimento do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido),
sua senha era bloqueada caso tentasse fazer um novo cadastro para participar da
pesquisa mais de uma vez.
O blog contém, ainda, uma área com informações pessoais do
pesquisador e uma área de gerenciamento dos dados, que disponibiliza
informações referentes aos usuários cadastrados que responderam ao
questionário e usuários cadastrados que não responderam; Resultado Final;
Resultado por nome.
As contribuições do uso da Internet na pesquisa qualitativa podem
ser reconhecidas pela dinamização do processo de construção dos dados, pela
superação de barreiras de localização geográfica, pela redução de gastos com
papel, impressão e correio entre outros.
90
5. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
5.1 Descrição e caracterização dos participantes da pesquisa
Na descrição e caracterização dos participantes da pesquisa,
observa-se que diversos profissionais envolvidos na área da surdez visitaram o
site, acessando e respondendo ao questionário. Do total de 210 (duzentos e dez)
visitantes do blog, 131 (cento e trinta e um) responderam ao questionário. Após a
leitura das respostas, elas foram agrupadas por categorias, tendo em vista o
objetivo da pesquisa.
Nesse processo, constatou-se a existência de 5 (cinco)
categorias. Em concordância a Gil (2007 p. 169), considera-se categorias como
agrupamentos das respostas, para que possam ser adequadamente analisadas e
observadas quanto à correspondência com o objetivo da pesquisa.
Sendo assim, os participantes foram divididos em categorias A, B,
C, D e E sendo: categoria A correspondente a pessoas surdas e/ou com
deficiência auditiva representando 5% dos participantes (o equivalente à seis
participantes); categoria B composta por 15% (o equivalente à dezenove
participantes) dos participantes representando aqueles que não se submeteram
ao Exame de Proficiência; a categoria C correspondente a 30% (o equivalente à
quarenta participantes); dos participantes representando aqueles que obtiveram
a reprovação nos exames aplicados nos anos 2006 e 2007;
Considerando esses elementos, as três primeiras categorias (A, B
e C) foram isoladas, trabalhando-se com as categorias D e E correspondentes
aos profissionais que se identificaram intérpretes de Libras e aprovados no
Exame Nacional de Proficiência para a tradução e interpretação.
Na categorização inicial dos dados, foram realizados dois tipos de
estratificações, verificando-se:
A identificação direta por parte dos participantes como intérprete de Libras;
91
A identificação como profissionais aprovados no Exame Nacional de
Proficiência para tradução e interpretação da Libras.
Os participantes agrupados na categoria D correspondem a 28%
(o equivalente à trinta e sete participantes); dos participantes que se apresentam
enquanto certificados de nível médio; os agrupados na categoria E caracterizam-
se como profissionais com certificação de nível superior correspondente acerca
de 22% dos participantes (o equivalente à vinte e nove sujeitos). Como o objetivo
da pesquisa era estudar as trajetórias de formação e as condições de trabalho de
intérpretes de Libras, certificados pelo Exame Nacional de Proficiência para a
Tradução e Interpretação da Libras em nível superior e que atuam em IES, optou-
se pelo trabalho com a categoria E.
Embora a categoria D não se adeque ao objetivo da pesquisa, no
desenvolvimento da análise correspondente ao lócus de atuação do participante,
observaram-se semelhanças entre os dados do grupo D e E. Em decorrência
desse ocorrido, a categoria D comporá num outro momento a análise dos dados.
No desenvolvimento de uma análise na dimensão qualitativa,
considera-se para caracterização dos sujeitos juntamente a identificação
profissional e a certificação, o lócus de atuação. Quando observadas as respostas
referentes ao lócus de atuação, reconhece-se que os participantes da pesquisa
atuam predominantemente em IES, como se observa na tabela 1.
Tabela 2: Intérpretes aprovados no Prolibras de nível superior por lócus de atuação
Lócus de atuação Quantidade
Freqüência relativa (%)
Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série 1 3%
Ensino Fundamental de 5ª a 8ª série 1 3%
Ensino Fundamental – Escolas Especiais 1 3%
Educação Superior 22 77%
Congressos e eventos 1 3%
Jurídico 1 3%
Igrejas 1 3%
Associação de surdos, FENEIS, CBS etc. 1 3%
Total 29 100%
Fonte: Dados do questionário
92
A escolha pelo estudo da trajetória de profissionais que atuam em
IES partiu, a princípio, da necessidade de delimitar o contexto no qual a pesquisa
seria desenvolvida. Por outro lado, observamos que 77% do total de 131
participantes da pesquisa atuam predominantemente nesse nível de ensino.
Levantam-se questões referentes às razões pelas quais esse grupo de
profissionais atuam predominantemente no Ensino Superior e não, na Educação
Básica.
Em decorrência da problemática exposta, os dados referentes à
categoria D, composta por profissionais com proficiência de nível médio, podem
ser observados, revelando a atuação de 93% dos participantes em IES.
O fato de deparar-nos com a crescente atuação dos intérpretes
em IES instiga a observação das condições nesse nível de ensino. A partir desses
dados, se buscará aprofundar o olhar para as características do grupo, de modo a
conhecer os sujeitos da pesquisa sob aspectos socioeconômicos.
O reconhecimento da IES enquanto um espaço promissor de
atuação para profissionais intérpretes de Libras direciona a análise de
característica especificas desse nível de ensino.
5.2 Perfil dos sujeitos da pesquisa
Na análise dos dados referentes ao perfil dos sujeitos da
pesquisa, observou-se a existência de características gerais do grupo e de
variáveis demográficas. Dados referentes ao sexo revelam a freqüência de 78%
dos participantes do sexo feminino e 22% do sexo masculino. Destaca-se uma
quantidade maior de sujeitos com faixa etária adulta no grupo de idade de 30 a 39
anos representando 53% dos participantes. Os participantes de 20 a 29 anos
correspondem à 35%, e os de 40 a 49 anos representam 12%.
Com relação ao estado civil, reconhece 56% dos participantes
casados e 44% solteiros. Considera-se nula a freqüência de divorciados e/ou
viúvos. Aproximadamente 69% dos profissionais não possuem filhos e 26%
possuem apenas um filho. A análise dos dados referentes à religião revela que
93
boa parte dos intérpretes declaram o credo religioso cristão, conforme ilustra o
gráfico 1.
Gráfico 1: Religião dos intérpretes
Sem religião
5%
Outras
22%
Esrita
3%
Protestante
51%
Católico
19%
Católico
Protestante
Esrita
Outras
Sem religião
Fonte: Dados do questionário
De forma geral pela análise das respostas referentes à religião,
observa-se a opção pelo credo protestante em 44% dos sujeitos e pelo católico
em 26%. O Espiritismo e outras denominações correspondem à escolha de 13%.
Somente 4% revelam não possuir religião.
Com relação à cor/etnia, cerca de 56% dos profissionais se
declaram brancos (as), 22% pardos (as) ou mulatos (as), 17% negros (as) e 5%
de origem indígena
8
. Nenhum dos participantes se declarou amarelo (a) ou de
origem oriental.
Na realização de uma análise estatística estima-se a
predominância de profissionais do sexo feminino, sendo mulheres casadas, de
cor branca, que possuem idade entre 20 e 39 anos, não possuem filhos e cuja
religião é de origem protestante.
8
Os participantes da pesquisa que se reconhecem de origem indígena, quando
consultados, explicam que seu avós eram Índios, é uma característica comum aos que
residem na região centro-oeste.
94
5.3 Eixo temático A: Realidade socioeconômica
Compõem o eixo temático A referente à realidade socioeconômica
dos sujeitos da pesquisa dados referentes ao posicionamento geográfico dos
participantes, condições de domicílio e moradia, família, cultura e arte , acesso a
informação e interação com meios de comunicação de massa e qualidade de
vida.
Segundo Gil (1999 p. 90), pode-se, teoricamente, definir o status
socioeconômico como a posição de um indivíduo na sociedade, tomando como
referência a posição dos outros indivíduos em relação à sua. Para efeito dessa
análise, observam-se as dimensões econômica, educacional e ocupacional como
três importantes modos de estudar as relações socialmente estabelecidas pelos
sujeitos da pesquisa.
Nessa perspectiva, foram utilizados os dados coletados pela
aplicação do questionário, os índices demográficos obtidos pelos dados do Censo
Populacional e do IBGE e os índices educacionais do Censo da Educação
Superior – 2005 e da Secretaria de Educação Especial referente ao Exame
Nacional de Proficiência.
5.3.1 Posicionamento e localização geográfica dos intérpretes de Libras
Inicia-se a análise da realidade socioeconômica dos sujeitos da
pesquisa pela observação do posicionamento e da localização geográfica dos
intérpretes no território brasileiro.
Segundo Babbie (2005 p. 138-139) a localização geográfica numa
cidade, estado ou nação ou lugar geográfico, de modo geral, propicia a análise
referente à representatividade do grupo social. Dentro de um país, determinadas
regiões apresentam características e funções específicas.
Na análise dos dados referentes à localização geográfica, cerca
de 45% dos sujeitos residem na região Sudeste do país, 32% na região Sul, 9%
na região Nordeste, 9% na região Centro-oeste e 5% na região Norte do país.
95
Pode-se identificar a concentração de intérpretes nas regiões Sudeste e Sul do
país, como se observa no gráfico 2.
Gráfico 2: Localização geográfica dos sujeitos da pesquisa
Nordeste
9%
Centro-oeste
9%
Sudeste
45%
Sul
32%
Norte
5%
Norte Nordeste Centro-oeste Sudeste Sul
Como se pode observar, a concentração de profissionais nas
regiões sudeste e sul do país instiga a análise dos fatores que podem ter exercido
algum tipo de influência. A justificativa seria somente a maior participação ou
adesão à pesquisa por profissionais dessas regiões?
De qualquer modo, a atuação do intérprete estaria diretamente
relacionada à matrícula de pessoas surdas em IES. Nesse sentido seria
necessário olhar para o índice de matrículas desses estudantes em IES.
Em matéria publicada no ano de 2007, o INEP
9
afirma que 49%
das 6.328 (seis mil trezentos e vinte e oito) matrículas de alunos com deficiência
em IES estão localizadas na região Sudeste do país. Na região Sul, concentram-
se 24% das matrículas, e na região Centro-oeste concentram-se 14% das
matrículas, conforme ilustra o gráfico 3:
9
Edição ano 5 nº154 - 5 Abril 2007 o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP).
96
Gráfico 3: Matrículas de alunos com deficiência em Instituições de Educação
Superior por região do país – Censo da Educação Superior (2005)
Fonte: Censo da Educação Superior (2005)
Segundo os dados do Censo da Educação Superior (2005),
estima-se que, do total de matrículas de estudantes com deficiência, 38%
correspondam à matrícula de alunos com surdez e/ou deficiência auditiva
10
. A
partir dos dados, infere-se que a quantidade de matrículas de pessoas surdas em
IES em determinadas regiões do país, suscita o aumento de profissionais que
atuam nessa área, de modo a corresponder à demanda. Outro dado importante
divulgado pelo INEP corresponde ao índice de IES nas regiões sul e sudeste do
país, cuja característica econômica faz com que essas instituições estejam
concentradas nessas regiões.
Paralelamente, podem-se observar, ainda, os dados referentes
aos aprovados no Exame Nacional de Proficiência para Tradução e Interpretação
da Libras em nível Superior. Seria este, também, um indicador da quantidade de
profissionais certificados por região do país. O Relatório Técnico do ProLibras dos
anos 2006
11
e 2007
12
apresenta que, de um total de 1.054 inscritos e 371
aprovados, 34% dos profissionais certificados residem na região Sudeste e 29%
residem na região Sul, conforme ilustrado no gráfico abaixo.
10
Ressalta-se que, de acordo com o documento Números da Educação Especial, o número total
de matrículas de alunos com deficiência em IES era de 5.078 em 2003, 5.392 em 2004 e 11.999
em 2005. Com relação aos alunos com deficiência auditiva e surdez, os dados da Secretaria de
Educação Especial apresentam, em 2003, um total de 665; em 2004 um total de 974 e, em 2005,
um total de 2.428. Devido à divergência ocasionada pela apresentação de dados diferentes por
parte da Secretaria de Educação Especial e do INEP pelo Censo da Educação Superior (2005),
considera-se para efeito dessa análise, os dados diretamente retirados do órgão responsável pelo
desenvolvimento de pesquisas, o INEP.
11
http://www.prolibras.ufsc.br/2006/relatorio/relatorio_tecnico_completo.pdf
12
http://www.prolibras.ufsc.br/2007/relatorio/relatorio_tecnico_completo.pdf
97
Gráfico 4: Aprovados no Exame Nacional de Proficiência para tradução e
interpretação em nível superior por região do país.
Sul
29%
Centro-
oeste
19%
Nordeste
13%
Norte
5%
Sudeste
34%
Sudeste Sul Centro-oeste Nordeste Norte
De um total de 371 profissionais com certificação em nível
superior, 127 (cento e vinte e sete), ou seja, 34% concentram-se na região
Sudeste; na região Sul localizam-se 29%, o equivalente a 107 profissionais
certificados; na região Centro-oeste, concentram-se 19%, o equivalente a 69
certificados; na região Nordeste 13% o equivalente a 50 aprovados e, na região
Norte 5%, o equivalente a 18 aprovados. Observa-se na tabela 2.
Tabela 3: Aprovados por região do país Proficiência para tradução e interpretação em
nível superior
Sudeste Sul Centro-oeste Nordeste Norte Total por ano
2006 54 53 31 29 11 178
2007 73 54 38 21 7 193
Total por região 127 107 69 50 18
Total geral 371
A partir dos dados do Censo da Educação Superior (2005) e dos
dados do Exame Nacional de Proficiência para Tradução e Interpretação em nível
superior referentes aos anos 2006 e 2007, presume-se com relação ao
posicionamento geográfico dos sujeitos, que dois fatores podem influenciar
diretamente a predominância de intérpretes na região Sudeste e Sul do país:
1. O índice das matrículas de alunos surdos em IES nas
regiões sudeste e sul do país;
98
2. O índice de aprovados no Exame Nacional de Proficiência
para Tradução e Interpretação em nível superior por
regiões do país.
5.3.2 Condições de domicílio e moradia
A análise referente às condições de moradia dos sujeitos da
pesquisa revela que 60% dos participantes residem em imóvel próprio, 35% em
imóvel cedido e 5% em imóvel alugado.
Cerca de 35% dos sujeitos residem em imóveis com seis ou mais
cômodos; 22% com até quatro cômodos; 17% com até cinco cômodos; 13% com
até três cômodos e 13% com adois cômodos. Acrescenta-se a esse dado que
61% dos participantes afirmam possuir um banheiro em sua residência; 26%, dois
banheiros; 9%, três banheiros e 4%, quatro banheiros em sua residência.
De modo geral, nota-se que a maioria dos intérpretes possui
imóvel próprio, com até cinco cômodos e um banheiro. Apresentam, em média, a
posse de duas televisões, um computador, um rádio, um carro, um vídeo-cassete,
um aparelho DVD, uma geladeira, um aspirador de e uma máquina de lavar
roupas.
Os itens laptop, freezer e microondas aparecem nos dados de
apenas 3% dos sujeitos da pesquisa. A partir da análise de suas condições de
domicilio e de posse, em concordância com Januzzi (2002), observa-se que o
nível econômico dos sujeitos da pesquisa é considerado médio.
5.3.3 Família
Os dados referentes às questões relativas às famílias dos
sujeitos, apresentam que 43% dos intérpretes possuem dois irmãos; 26%
possuem quatro ou mais irmãos; 17% possuem apenas um irmão; 9% possuem
apenas três irmãos e 5% não possuem nenhum irmão.
99
No que tange à escolaridade dos pais, 39% dos pais e mães
possuem o ensino médio completo. Cerca de 40% das mães concluíram a 4ª série
do primeiro grau, 4% concluíram a série e 17% possuem formação em nível
superior.
Aproximadamente 22% dos pais concluíram a série do primeiro
grau, 17% concluíram a série e 22% concluíram o ensino superior. Pode-se
observar os gráficos.
Gráfico 5: Escolaridade do pai Gráfico 6: Escolaridade da mãe
Ensino
Fundamental
de 1ª à
série
22%
Ensino
Fundamental
de 5ª à
série
17%
Ensino Médio
39%
Ensino
Superior
22%
Ensino
Fundamental
de 1ª à
série
40%
Ensino
Fundamental
de 5ª à
série
4%
Ensino Médio
39%
Ensino
Superior
17%
Considerando que 39% dos pais e das mães possuem o ensino
médio e que 22% dos pais e 17% das mães completaram o ensino superior,
conclui-se que a posição da família na sociedade mostra a formação educacional
considerada elevada, uma vez que, segundo os dados do IBGE, cerca de 56% da
população nacional concluiu apenas as cinco primeiras séries da educação
básica.
5.3.4 A dimensão de cultura e arte
De acordo com Chauí (2006 p. 250), o núcleo da cultura em três
sentidos principais que se constituem na criação
da ordem simbólica da lei;
100
de sistemas de interdições e obrigações estabelecidos a partir da
atribuição de valores e da ordem simbólica para interpretação da realidade,
a exemplo o sagrado e o profano, o visível e o invisível;
e, num terceiro nível, de um conjunto de práticas, comportamentos, ações
e instituições pela quais os seres humanos se relacionam entre si.
A autora adverte ainda que não existe cultura no singular e, sim,
culturas, pois esta engloba em si diferentes possíveis formas de se viver uma
ordem simbólica, também expressa de diferentes modos. Na elaboração do
questionário utilizado no desenvolvimento da pesquisa, buscou-se recolher
informações referentes ao acesso que os intérpretes possuam à cultura.
No entanto, observa-se que um dado anteriormente apresentado
referente à religião pode, perfeitamente, ser, nesse momento, retomado
considerando que a religião pode caracterizar-se socialmente como uma
manifestação cultural. Segundo Chauí (2006), a invenção cultural do sagrado se
apresenta como um processo de simbolização e busca de significação para
situações, fatos, ocorrências que não podem ser facilmente justificadas ou a
invenção de divindades.
Ao se observar que 44% dos sujeitos se dizem protestantes e
26% se denominam católicos, reconhece-se que os objetos simbólicos que
norteiam os valores desses profissionais se aproximam do
pensamento religioso sistematizado na religião como uma narrativa da
origem, a exemplo, o gênese na crença cristã de que o mundo foi criado
por Deus Pai;
a vivência de ritos que devem ligar os humanos à divindade, organizando o
espaço e o tempo ocupados por ambas as partes, os objetos simbólicos
presentes em seres objetos utilizados no dia-a-dia mas que no momento
do “sagrado” assumem um novo sentido;
a lei divina caracterizada por regras que devem ser fielmente obedecidas
pelos adeptos da religião, dentre outras características especificas
relacionadas a religiões cristãs.
101
Segundo Delisle; Woodsworth (1995 p. 30) também os tradutores
e intérpretes de línguas orais possuíam uma relação íntima com a religiosidade.
Esse fato decorria-se de que os primeiros tradutores foram àqueles missionários
engajados na difusão do evangelho e do cristianismo. Trabalharam sob a égide
da Igreja na tradução da Bíblia para diversos idiomas e acompanharam religiosos
em viagens missionário-catequéticas.
A análise dos objetos simbólicos que norteiam os elementos
culturais dos sujeitos da pesquisa, em concordância com Chauí (2006),
apresentam a arte ainda como parte da cultura. Tal como a religião, a arte é uma
manifestação do pensamento humano transformado e moldado pelas relações
socialmente estabelecidas. Na sociedade atual, reconhecer a arte torna-se uma
tarefa complexa, a cultura de massa disseminada pelos meios de comunicação
que, de modo geral, apresentam valores, costumes e práticas globalizadas.
Até a industrialização e o progresso científico e tecnológico a arte
podia ser reconhecida na dança, no artesanato, na pintura etc. Atualmente a arte
assumiu uma conotação diferente, ainda não tão bem esclarecida. Arte seria
poesia e música? Ou pode-se assumir como arte qualquer obra humana que
revele seus sentimentos, emoções ou ainda sua forma de conceber o mundo?
A dimensão de acesso à cultura onde se insere compõe a
investigação realizada nessa pesquisa diretamente relacionada ao acesso à
cultura erudita produzida e consumida no Brasil por uma classe considerada
favorecida. Cerca de 60% dos sujeitos da pesquisa freqüentam o cinema de uma
a duas vezes por semana; apenas 40% freqüentam teatro e shows musicais,
concertos e dança entre uma e duas vezes por semana. Em contrapartida, cerca
de 91% dos participantes lêem em média 8 (oito) ou mais livros por ano,
escolhendo a obra pelo assunto e não, pelo autor, capa ou indicação de amigos.
De modo específico, com relação à formação social e cultural
intérprete de Libras, observa-se que os profissionais que atuam em IES
apresentam características que nos levam a refletir sobre a formação cultural,
sendo estes, portadores de um considerado de médio para alto nível cultural.
102
5.3.5 Acesso à informação e interação com meios de comunicação de massa
O acesso à informação e a interação com os meios de
comunicação de massa podem ser estudados paralelamente a análise
anteriormente realizada referente ao acesso aos objetos de arte confundido com
lazer e entretenimento de fácil acesso.
Segundo Chauí (2006), o rádio e a televisão assumiram, no
período da guerra fria, um papel importante no estabelecimento de comunicação
entre os países envolvidos nas guerras. Decorre dessa experiência a sofisticação
sofrida por esses recursos que, com o passar do tempo, assumiram um novo
papel, sendo vistos como mais um mecanismo de massificação das informações
e da cultura.
Em contrapartida, a interação com os meios de comunicação tem-
se apresentado como um modo de se manter atualizado acerca de realidades que
norteiam a vida dos cidadãos e não, um modo que essa sociedade encontra para
expor aquilo que seria compreendido por bens culturais. Cerca de 60% dos
participantes assistem, com uma freqüência dia de uma a duas vezes por
semana, programas de televisão e 48% lêem jornais nessa mesma freqüência.
Cerca de 47% ouvem pouco ou raramente rádio e 40% ouvem rádio diariamente
ou até cinco vezes por semana.
Observa-se, ainda, que os participantes utilizam com maior
freqüência a informática 81% dos participantes têm uma exposição alta, ou seja,
utilizam diariamente ou até cinco vezes por semana seus computadores.
Pode-se, a partir dos dados apresentados, refletir sobre os
mecanismos utilizados pelos intérpretes na tradução de valores considerando que
parte da interpretação assume o modo de identificação estabelecido pela própria
sociedade e disseminado pelos meios que esta encontra para tal finalidade.
Os valores disseminados correspondem ainda as constituintes do
campo ético estabelecido pela consciência criada por si e por outros acerca de
uma moral estabelecida pelo grupo. A ética exprime a maneira como a cultura e
uma sociedade definem para si mesma o resultado de suas práticas.
103
Nessa perspectiva, pode-se concluir que os dados referentes ao
acesso dos sujeitos da pesquisa aos meios de comunicação e a shows, teatro,
cinema etc remetem diretamente aos modos de produção simbólica produzidos
por esta sociedade e a forma pela qual o profissional intérprete de Libras se
apropria desses valores justamente por fazer parte da sociedade.
A forma pela qual os intérpretes constituem seu próprio campo de
valores está relacionada ao campo simbólico socialmente constituído pela
religiosidade, pela moral e ética. Esses dados direcionam a análise de elementos
relacionados ao Código de Ética dos intérpretes de Língua Brasileira de Sinais
13
,
principalmente no que tange ao capítulo II, da Ética Profissional - Art. 3º O
Intérprete e o Guia-intérprete deve manter uma atitude neutra durante o
transcurso da sua interpretação, evitando quaisquer opiniões próprias, a menos
que seja solicitado.
O conceito de neutralidade tem sido ao longo dos anos
questionado por estudiosos e pesquisadores das ciências humanas e sociais. No
entanto, ao localizar dados precisos sobre os intérpretes em exercício, pode-se
evidenciar que a questão da neutralidade não pode ser vista de forma dissociada
ao processo de formação social do intérprete.
A língua em si pode ser caracterizada como uma manifestação
cultural sendo então submetida aos valores socialmente disseminados, dentro
dessa perspectiva a dimensão de neutralidade precisa ser seriamente
questionada.
5.3.6 Qualidade de vida: saúde e esporte
Compõem ainda este núcleo de análise as questões relativas à
qualidade de vida, à saúde e ao esporte. O cuidado com a saúde tem, como
objetivo o bem-estar físico representam, de acordo com a Organização Mundial
da Saúde um estado completo de bem estar físico, mental e social.
13
http://www.apilsbesp.org/etica.asp
104
O “Welfare state”, “Estado de bem-estar social”, termo que surgiu
após a devastação vivenciada pelos paises que sofreram a destruição das
guerras mundiais representa as condições de vida de que um grupo ou individuo
precisa para se manter em condições não somente de sobrevivência, mas de
qualidade de vida.
Na análise dos dados, observou-se que a maior parte dos sujeitos
da pesquisa faz uso do serviço de saúde, preferencialmente com convênios,
representando 56% dos participantes e na rede particular, cerca de 26% dos
participantes. Somente 5% possuem convênio coberto pela IES. O restante, 13%,
freqüenta o médico na rede pública.
Observou-se também que 56% dos intérpretes não possuem
nenhuma doença, porém 17% atestam Lesão por Esforço Repetitivo (LER) e 9%
atestam doenças musculares crônicas ocasionadas pelo trabalho como intérprete.
13% dos participantes não se sentiram contemplados em nenhuma das
alternativas e apenas 5% submetem-se a terapia psiquiátrica e/ou psicológica.
Ressalta-se, ainda, com relação ao desempenho de atividades
esportivas, que 60% dos sujeitos da pesquisa não praticam nenhum tipo de
atividade esportiva. Para efeito desse estudo, reconhece-se que os fatores
relacionados ao desgaste e ao estresse são influenciados pelo cuidado ou não
com a saúde.
Não praticar atividades esportivas influencia diretamente no
desempenho físico dos profissionais. Um estilo de vida sedentário pode provocar
distúrbios como má alimentação, obesidade, estresse, e outros diferentes tipos de
doenças.
Os dados referentes a esse eixo direcionam a análise das
condições sociais vivenciadas pelos intérpretes de Libras. Desde seu acesso á
cultura até aos cuidados com a saúde observa-se as implicações concretas na
formação social e humana. Como poderemos aprofundar a partir desse momento.
105
5.4 Eixo temático B: Trajetória de formação
A análise realizada no eixo temático B corresponde a Trajetória de
formação dos profissionais. O presente estudo fundamenta-se na visão de
trajetória, em concordância com Bourdieu (1997), como uma maneira singular de
percorrer o espaço social e resultado construído de traços próprios da história
individual ou de um grupo.
Compõem esse núcleo de análise, os dados referentes ao
engajamento dos intérpretes em movimentos sociais das comunidades surdas, a
escolarização e formação acadêmica, o conhecimento de línguas, como também,
o envolvimento em atividades de pesquisa.
5.4.1 Engajamento em movimentos sociais
Segundo Bourdieu (1997), o falante de uma língua está inserido
em um campo, sendo este reconhecido como uma forma de organização social
que apresenta dois aspectos centrais:
a) uma configuração de papéis sociais, de posições dos agentes e
de estruturas às quais estas posições se ajustam;
b) o processo histórico no interior do qual estas posições são
efetivamente assumidas, ocupadas pelos agentes (individuais ou
coletivos).
Nesse campo, tornam-se presentes estratégias de ação, de vida
que constituem a trajetória daqueles que de um determinado meio participam. Por
essa razão, entre as possíveis formas de se refletir a formação, neste estudo,
considera-se a formação social e humana ocorrida a partir do posicionamento
social.
Desse modo, ao observar o posicionamento social ocupado por
pessoas ouvintes que se apropriaram da ngua brasileira de sinais e se tornaram
intérpretes desta língua reconhece-se o engajamento desses profissionais em
106
movimentos sociais da comunidade surda, em associações de surdos e
intérpretes por parte de 49% dos participantes da pesquisa. Pode-se observar o
gráfico 7:
Gráfico 7: Espaço de interação com pessoas surdas
17%
49%
4%
17%
9%
4%
Parente próximo (pai, mãe
e irmão)
Parente próximo por
casamento
Colega de trabalho
Colega de classe
Feneis, Associações de
surdos e intérpretes
Vizinho
O engajamento em movimentos sociais da comunidade surda
tem-se apresentado como o campo, no qual o intérprete de Libras, ao se inserir,
encontra condições para se apropriar da língua de sinais. Esse modo de conceber
a língua como uma prática social instiga a reflexão acerca de dois fatores
envolvidos na formação social dos tradutores e intérpretes:
Registros de que os primeiros tradutores não obtiveram formação
especifica em cursos, mas que passaram a exercer a função devido à
necessidade de facilitar a comunicação entre grupos com línguas
diferentes entre si, conhecidas pelos tradutores;
De modo especifico, a formação de intérprete de Libras ocorreu por um
longo período nas próprias Associações e Federações de Surdos, através
de oficinas e estudos, como ressalta Quadros (2004);
Diante das possibilidades existentes, pode-se concluir que a
formação do tradutor e intérprete deve corresponder ao exercício de uma
atividade profissional e por esta razão não deve ser vista como uma tarefa não
cientifica.
107
Ao mesmo tempo, indaga-se quanto à possibilidade de que a
formação social do falante da língua possa compor um núcleo essencial na
formação de tradutores e intérpretes de Libras. Além do conhecimento técnico e
cientifico necessários à sua formação profissional, o envolvimento com o campo
no qual a comunidade surda está inserida tem-se apresentado como um fator de
forte influencia em sua formação.
5.4.2 Escolarização
Um outro dado pode ser observado nesse momento, referente à
escolarização dos sujeitos da pesquisa. Dentre os participantes, 44% submeteu-
se à escolarização toda e/ou a maior parte do tempo em escola pública conforme
apresenta o gráfico abaixo.
Gráfico 8: Escolarização
A maior parte do
tempo em
escola pública
22%
Toda em escola
blica
22%
A maior parte do
tempo em
escola privada
17%
Toda em escola
privada
17%
Metade em
escolapública e
metade em
escola privada
22%
Esse dado relaciona-se à formação básica ocorrida nas séries
iniciais e no ensino médio que, de acordo com os dados, não ocorreu em escolas
privadas e, sim, na rede pública. Identifica-se ainda que cerca de 52% dos
sujeitos da pesquisa concluíram o ensino dio na rede regular de ensino.
Destaca-se que 30% dos sujeitos concluiu o ensino médio profissionalizante do
magistério e que 17% concluiu uma outra formação em nível técnico.
108
Reconhecer que 30% dos participantes possui formação
especifica no magistério pode ser considerado um dado relevante, uma vez que
puderam se apropriar de elementos favoráveis à sua formação para atuação em
instituições de ensino.
Os dados referentes à formação acadêmica revelam que 52% dos
sujeitos possuem a titulação de especialista; 26%, mestrado; 21%, graduação
somente. Nenhum dos profissionais se apresentou com a titulação de doutorado.
Desse total de profissionais com formação superior, 82% desenvolvem ou
desenvolveram em algum período da vida acadêmica, atividades de pesquisa.
Observa-se que a formação em nível superior não é na área específica de
tradução e interpretação da Libras e sim em diversas outras áreas.
Na questão referente ao conhecimento de línguas, 39% dos
sujeitos afirma não possuir nenhum conhecimento de inglês e 21%, nenhum
conhecimento de espanhol. Cerca de 39% afirma “ler, mas não escrever e nem
falar” o espanhol; nenhum dos participantes “lê, escreve e fala bem” no entanto
9% afirmam serem proficientes. Pode-se observar a tabela 4.
Tabela 4:Conhecimento de línguas
Inglês Espanhol
Praticamente nenhum 39% 21%
Leio mas não escrevo nem falo 26% 39%
Leio e escrevo mas não falo 21% 13%
Leio, escrevo e falo razoavelmente 5% 17%
Leio, escrevo e falo bem 5% 0
Sou proficiente 5% 9%
Mediante o dado referente ao conhecimento de nguas, pode-se
inferir a possibilidade de que os profissionais com proficiência em inglês e/ou
espanhol possuam habilidades que favoreçam a possível atuação como intérprete
trilingue Libras Português Inglês ou Libras Português Espanhol.
Entretanto, poucos profissionais possuem a proficiência em uma ngua
estrangeira de modo a facilitar o trabalho realizado em eventos e congressos
internacionais que envolvam a participação de usuários de diversos idiomas.
Um dado que desperta curiosidade é o referente ao conhecimento
de Libras. Embora todos os profissionais tenham sido aprovados no Exame
Nacional de Proficiência para tradução e interpretação em nível superior, existem
109
aqueles que consideram seu conhecimento de Libras muito bom, mas não,
proficiente. Entretanto observa-se que nenhum dos sujeitos julga seu
conhecimento bom, regular, insuficiente ou nulo.
Após a análise dos dados referentes ao envolvimento com
movimentos sociais, escolarização, formação acadêmica, envolvimento com
atividades de pesquisa e conhecimento de línguas, identificam-se as seguintes
características relacionadas à trajetória de formação dos sujeitos da pesquisa:
Engajamento em movimentos sociais da comunidade surda, pela atuação
em Associações de Surdos e de Intérpretes de Libras;
Trajetória escolar na rede pública;
Boa parte dos sujeitos possuem formação em nível médio técnico sendo
que 30% possuem formação profissionalizante no magistério;
Predominância de especialistas, em seguida mestres e graduados com
envolvimento em atividades de pesquisa em áreas afins;
Alguns profissionais foram aprovados no Exame Nacional de Proficiência,
mas consideram seu conhecimento de Libras, excelente ou muito bom. O
conceito de proficiência é ainda, pouco compreendido inclusive por aqueles
que atuam como tradutores e intérpretes;
Poucos possuem conhecimento considerado proficiente em ngua inglesa
e espanhol observando-se a possibilidade de atuação como intérprete
trilingue.
Mediante a presença de dados referentes à trajetória de
formação, pode-se concluir que o campo de formação social de intérpretes de
Libras tem se apresentado a partir de relações estabelecidas pela língua de sinais
e pela formação acadêmico-científica.
110
5.5 Eixo temático C: Condições de trabalho
Os dados analisados no eixo temático C, correspondente às
condições de trabalho dos sujeitos da pesquisa, revelam que a jornada de
trabalho dos intérpretes tem se estendido a 40 horas semanais em 34% dos
sujeitos; até 20 horas semanais mais que 20 horas semanais e menos que 40
horas semanais em 30% dos participantes. Somente 5% trabalham,
eventualmente, como intérpretes de Libras e nenhum dos sujeitos desenvolve
apenas trabalho voluntário.
Observa-se que a contratação de intérprete em IES tem ocorrido
através de contrato CLC efetivo correspondente a 47% dos sujeitos da pesquisa e
CLT temporário correspondente a 26% dos participantes. A contratação como
autônomo ocorreu com 21% dos sujeitos da pesquisa e como estagiário com 5%
dos participantes.
As condições ideais de trabalho passam muito longe do que vem
ocorrendo na prática. O trabalho em instituições de ensino implica em condições
específicas como a didática e metodologia empregada, organização e tempo
escolar, dentre outras. Desse modo, ressalta-se que o intérprete deveria ter direito
a um contrato que se enquadre em sua carga horária de atuação as horas de
atuação interpretação em sala de aula, acrescido do tempo em que utilizaria
para estudo do conteúdo a ser interpretados e de possibilidades de tradução.
Do mesmo modo, a contratação como autônomo ou temporário
não caracteriza sua atuação como um profissional essencial para a mediação da
relação de ensino-aprendizagem em Libras. Esses dados revelam que em
diversos momentos a inserção do intérprete ocorre somente para o cumprimento
da legislação vigente, sem que sejam considerados aspectos que suscitaram sua
atuação naquele contexto, a presença de um aluno surdo usuário de duas
línguas.
Com relação ainda as possíveis formas de contratação, 60%
obtiveram o registro na função ou cargo Intérprete de Libras; 34% dos sujeitos
foram registrados na função ou cargo professor e 5% como um outro tipo de
111
contratação. A função ou cargo ainda influencia de forma considerável as
possibilidades de entrosamento e participação do profissional no meio acadêmico.
Reconhece-se que 39% dos sujeitos atuam na Educação Superior
acerca de 1 e 2 anos; 30% atuam a mais de 6 anos; 26% atuam acerca de 3 e 4
anos e 5% atuam cerca de 5 e 6 anos. Desse modo reconhecemos que a
experiência de atuação nesse nível de ensino, tem se tornado a maior aliada dos
profissionais em exercício.
112
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As considerações finais, acerca do estudo realizado,
correspondem ao objetivo deste trabalho, que é estudar as trajetórias de
formação e as condições de trabalho do intérprete de Libras, certificado pelo
exame nacional de proficiência, para interpretação de Libras em nível superior,
que atua em IES.
Observa-se que a atuação, no campo educacional, tem-se
apresentado ao longo dos anos, como um desafio, mediante as condições
históricas e materiais, nas quais, a educação brasileira foi instaurada. O estudo
em educação, mais precisamente, do trabalho em IES, numa modalidade de
ensino, a Educação Especial, carrega em si elementos relacionados às
transformações ocorridas numa sociedade de classes (SAVIANI, 2007 p. 17).
Desse modo, as condições que influenciam o modo de vida, e
organização dessa sociedade, podem ser consideradas, como o principal meio de
compreensão da realidade. Nessa perspectiva, a fundamentação teórica com as
contribuições de L. Vigotski e P. Bourdieu dão suporte a observação, do modo no
qual a pessoa surda é vista, como deve ocorrer sua educação, e com quais
recursos uma instituição de ensino poderia trabalhar, para favorecer o
desenvolvimento de uma pedagogia especial.
Os elementos obtidos pela análise e discussão, elencados a
seguir, dentro do que foi possível refletir nesse estudo, o importantes para que,
junto a outras reflexões e pesquisas, possam abrir possibilidades de avanço.
As reflexões que a pesquisa apontou foram:
A organização do trabalho pedagógico bilíngüe esbarra, na fragilidade da
formação dos profissionais envolvidos, dentre eles, o intérprete de Libras
que se caracteriza como um profissional inserido em uma IES sem
condições básicas e fundamentais para o desempenho de sua função;
Assim como os tradutores e intérpretes de línguas orais, o tradutor e
intérprete de língua de sinais, nem sempre recebe o reconhecimento
merecido por tipo de contrato, remuneração, condições de trabalho. Seriam
113
essas características comuns, entre tradutores e intérpretes de quaisquer
línguas;
Dentro dessa realidade, a partir da história dos tradutores e intérpretes de
língua orais-auditivas, observamos que esses profissionais favoreceram a
importação de idéias e valores culturais entre grupos usuários de línguas
diferentes e a difusão de projetos ideológicos e religiosos;
Um elemento comum entre tradutores e intérpretes corresponde a sua
atuação como educador missionário, envolvido com a evangelização. Esse
dado pode ser obtido pela análise de questões relativas à cultura, no qual
observamos nesse trabalho, que o campo simbólico de formação social e
cultural do intérprete é norteado por questões relativas a religiosidade
Com relação ao perfil do intérprete de Libras, e a predominante presença
do sexo feminino, a figura da mulher, anteriormente estigmatizada, adquire
um novo espaço desde a Idade Média e a Renascença, período no qual a
tradução passa a ser um dos poucos campos de atuação abertos ao sexo
feminino.
Observa-se que, dentre os elementos utilizados para a tradução de uma
língua de modalidade visual-gestual para oral-auditiva, o domínio
insuficiente da língua de sinais e da língua portuguesa; Pode-se considerar
insuficiente também, o conhecimento e domínio de habilidades básicas
relacionadas à psicologia, história, ética, direito e, inclusive educação com
ênfase no trabalho pedagógico;
Diante dessa realidade, os profissionais em exercício, se amparam em
conhecimentos apropriados, no decorrer de sua formação humana, a partir
de sua disposição social e de seu acesso às produções simbólicas. Esse
fato nos direcionada a compreensão de que o Intérprete de Libras que atua
na Educação Superior submete-se a uma trajetória de formação que o
mantém num bom nível cultural e social considerável.
Com relação à interpretação, em concordância à Eco (1990 p.
183), um intérprete, como protagonista ativo da interpretação, está certamente
pressuposto no curso de um processo de comunicação (eu digo rosa para alguém
114
e esse alguém compreende que quero dizer flor vermelha. Dentre as inúmeras
oportunidades, o intérprete de língua de sinais aprende a realizar uma
interpretação correspondente a um sistema semântico e a um contexto.
Nesse sentido, o estudo de sua trajetória de formação, revela que
um dos possíveis desafios às pesquisas futuras seria encontrar meios de
favorecer a este profissional, a oportunidade de aprimorar sua metodologia de
trabalho, diante da complexidade e variedade de áreas inseridas na educação
superior.
115
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VIGOTSKI, L. S. Obras Escogidas V – Fundamentos de Defectología. Madrid:
Visor, 1983.
121
ANEXOS
Anexo I: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Anexo: Questionário
Anexo III: Imagens do blog
122
ANEXO I
1. Identificação do Projeto de Pesquisa
Título do projeto: O intérprete de LIBRAS na educação superior: desafios e tendências
para formação e trabalho pedagógico.
Área do Conhecimento: Ciências humanas Educação
Curso: Programa de pós-graduação - Mestrado em Educação
Número de sujeitos no centro: 186 Número total de sujeitos: 186
Patrocinador da pesquisa: PUC Campinas
Instituição onde será realizado: Associação dos Profissionais Intérpretes e Guia-
Intérpretes de Língua Brasileira de Sinais do Estado de São Paulo
Nome dos pesquisadores e colaboradores: Diléia Aparecida Martins (Pesquisadora)
Telefone do Comitê de Ética em Pesquisa: 3756-6777
E-mail: comitedeetica@puc-campinas.edu.br
Você está sendo convidado (a) a participar do projeto de pesquisa acima identificado. O
documento abaixo contém todas as informações necessárias sobre a pesquisa que
estamos fazendo. Sua colaboração neste estudo será de muita importância para nós,
mas se desistir, a qualquer momento, isso não causará nenhum prejuízo a você.
2. Identificação do Sujeito da Pesquisa
Nome:
Data de Nascimento: Nacionalidade:
Estado Civil: Profissão:
Endereço:
Telefone: E-mail:
3. Identificação do Pesquisador Responsável
Nome: Diléia Aparecida Martins
Profissão: Intérprete de Libras N. do Registro no Conselho: 157902
Endereço: R. Riciere Motta, 180 Monte Alegre I Paulínia SP
Telefone: (19) 3884 1197 (19) 9162 7243 E-mail: [email protected].br
Eu, sujeito da pesquisa, abaixo assinado(a), concordo de livre e espontânea vontade
em participar como voluntário(a) do projeto de pesquisa acima identificado. Discuti com
o pesquisador responsável sobre a minha decisão em participar e estou ciente que:
123
1. Os objetivos desta pesquisa são:
Refletir a implementação da educação inclusiva e bilíngüe para surdos;
Estudar o processo de formação do Intérprete de Língua de Sinais – LIBRAS;
Analisar as condições de trabalho do Intérprete de LIBRAS em sala-de-aula na
Educação Superior.
2. O procedimento para coleta de dados seo questionário para levantamento de
indicadores sociais, entrevista, levantamento bibliográfico, análise de fontes legais e
de indicadores sociais – dados do Censo, IBGE, MEC e INEP.
3. Os benefícios esperados são:
Contribuir para o desenvolvimento de práticas educacionais que ajudem o
aluno surdo a se inserir na sociedade;
Propiciar a reflexão sobre as condições de trabalho do Intérprete educacional,
visando melhorias e superação de dificuldades;
Colaborar com a produção de referenciais sobre a história do Intérprete de
LIBRAS no Brasil;
Repensar a prática pedagógica na Educação Superior de forma a superar
barreiras didáticas.
4. O desconforto e o risco esperado é o mínimo possível uma vez que os
participantes não serão identificados e as informações usadas somente pelo
pesquisador;
5. A minha participação neste projeto tem como objetivo colaborar para a
organização do atendimento a alunos surdos e para o trabalho do Intérprete de
LIBRAS em sala-de-aula da Educação Superior.
6.
Tenho a liberdade de desistir ou de interromper a colaboração nesta pesquisa no
momento em que desejar, sem necessidade de qualquer explicação.
7. Os resultados obtidos durante este estudo serão mantidos em sigilo, mas concordo
que sejam divulgados em publicações científicas, desde que meus dados pessoais
não sejam mencionados;
8. Poderei consultar o pesquisador responsável (acima identificado), sempre que
entender necessário obter informações ou esclarecimentos sobre o projeto de
pesquisa e minha participação no mesmo.
9. A minha desistência não causará nenhum prejuízo à minha saúde ou bem estar
físico.
10. Tenho a garantia de tomar conhecimento, pessoalmente, dos resultados parciais e
finais desta pesquisa.
Declaro que obtive todas as informações necessárias e esclarecimento quanto às
dúvidas por mim apresentadas e, por estar de acordo, assino o presente documento
124
em duas vias de igual teor (conteúdo) e forma, ficando uma em minha posse.
Campinas , __ de ____________ de 2007.
_________________________________
_______________________________
Diléia Aparecida Martins
Pesquisador Responsável pelo Projeto
Sujeito da pesquisa e/ou responsável
Testemunhas:
________________________________ _______________________________
Nome: Nome:
Telefone: Telefone:
125
ANEXO II
QUESTIONÁRIO
1) Você é:
( ) Mulher ( ) Homem
2) Qual sua Idade? ___
3) Qual o seu estado civil?
(A) Solteiro(a).
(B) Casado(a).
(C) Separado(a)/desquitado(a)/divorciado(a).
(D) Viúvo(a).
4) Quantos irmãos você tem?
(A) Nenhum.
(B) Um.
(C) Dois.
(D) Três.
(E) Quatro ou mais.
5) Quantos filhos você tem?
(A) Nenhum.
(B) Um.
(C) Dois.
(D) Três.
(E) Quatro ou mais.
6) Como você se considera?
(A) Branco(a).
(B) Negro(a).
(C) Pardo(a) / mulato(a).
(D) Amarelo(a) (de origem oriental).
(E) Indígena ou de origem indígena.
7) Como se deu sua escolarização?
(A) Toda em escola pública.
(B) Toda em escola privada (particular).
(C) A maior parte do tempo em escola pública.
(D) A maior parte do tempo em escola privada (particular).
(E) Metade em escola pública e metade em escola privada (particular).
8) Que tipo de curso de ensino médio você concluiu?
(A) Curso Normal no ensino regular
(B) Profissionalizante técnico
(C) Profissionalizante de magistério
(D) Supletivo.
126
9) Formação acadêmica
(A) Pós-graduação - Doutorado
(B) Pós-graduação - Mestrado
(C) Pós-graduação – Especialização
(D) Graduação
10) Você desenvolve ou já desenvolveu alguma atividade de pesquisa?
(A) Sim
(B) Não
11) Qual o grau de escolaridade de sua mãe?
(A) Nenhuma escolaridade.
(B) Ensino Fundamental de 1ª a 4ª série.
(C) Ensino Fundamental de 5ª a 8ª série.
(D) Ensino Médio.
(E) Superior.
12) Qual o grau de escolaridade de seu pai?
(A) Nenhuma
(B) Ensino Fundamental de 1ª à 4ª série
(C) Ensino Fundamental de 5ª à 8ª série
(D) Ensino Médio
(E) Superior
13) Você mora em imóvel:
(A) Próprio
(B) Alugado
(C) Cedido
14) Itens e serviços disponíveis na residência:
Não
Sim
Se SIM:
Quantidade
(campo aberto)
Televisão
Rádio
Computador
Laptop
Carro
DVD
Vide-cassete
Geladeira
127
Freezer
Aspirador de pó
Microondas
Máquina de lavar roupa
Cômodos
Banheiro
Empregada mensalista
Outros
15) Você freqüenta o médico preferencialmente na
(A) Rede pública
(B) Rede particular
(C) Convênios tipo seguro saúde
(D) Convênio coberto pela Instituição de Ensino Superior
16) Você é favorável ou contrário à privatização do bem público?
(A) Favorável
(B) Contrário
(C) Não sei
17) Você vai ao cinema:
( ) SIM ( ) NÃO – passe para a próxima questão
Se SIM:
(A) Mais ou menos uma vez por semana
(B) Mais ou menos três vezes por semana
(C) Mais de três vezes por semana
(D) Não vou ao cinema.
18) Você assiste a espetáculos teatrais?
( ) SIM ( ) NÃO passe para a próxima questão
Se SIM:
(A) Mais ou menos uma vez por semana
(B) Mais ou menos três vezes por semana
(C) Mais de três vezes por semana
(D) Não vou ao teatro.
19) Você assiste a Shows musicais e/ou concertos e/ou dança?
( ) SIM ( ) NÃO passe para a próxima questão
Se SIM:
(A) Mais ou menos uma vez por semana
(B) Mais ou menos três vezes por semana
(C) Mais de três vezes por semana
128
(D) Não assiste a Shows musicais e/ou concertos.
20) Você lê livros?
( ) SIM ( ) NÃO - Passe para questão 23
Se SIM:
21) Quantos livros você lê em um ano?
(A) No máximo dois.
(B) Entre três e cinco.
(C) Entre seis e oito.
(D) Oito ou mais.
22) Você escolhe um livro para ler pelo:
(A) Assunto
(B) Autor
(C) Capa e apresentação
(D) Recomendação de amigos
(E) Divulgação pelos meios de comunicação
23) Você lê jornal?
( ) SIM ( ) NÃO passe para a próxima questão
Se SIM com que freqüência?
(A) Diariamente.
(B) De 1 a 2 vezes por semana.
(C) Somente aos finais de semana.
(D) De 3 à 5 vezes por semana
(E) Raramente (1 vez por mês).
(F) Nunca.
24) Você ouve rádio:
( ) SIM ( ) NÃO passe para a próxima questão
Se SIM com que freqüência?
(A) Menos de uma hora semanal
(B) De 1 a 3 horas semanais
(C) De 3 horas até 10 horas semanais
(D) Mais de 10 horas semanais
25) Você assiste TV?
( ) SIM ( ) NÃO passe para a próxima questão
Se SIM com que freqüência?
(A) Menos de 1 horas semanal
(B) De 1 a 3 horas semanais
(C) De 3 até 10 horas semanais
(D) De 10 até 20 horas semanais
(E) Mais de 20 horas semanais
26) Você utiliza computador?
( ) SIM ( ) NÃO Passe para a questão 27
Se SIM com que freqüência acessa a internet?
(A) Diariamente
(B) De 1 a 2 vezes por semana
129
(C) Somente aos finais de semana
(D) De 3 a 5 vezes por semana
(E) Raramente (1 vez por mês)
(F) Nunca
27) Qual é a carga horária aproximada de sua atividade remunerada?
(A) Não exerço atividade remunerada.
(B) Trabalho eventualmente.
(C) Trabalho até 20 horas semanais.
(D) Trabalho mais de 20 horas semanais e menos de 40 horas semanais.
(E) Trabalho em tempo integral – 40 horas semanais ou mais.
28) Situação funcional
(A) Voluntário
(B) Contrato CLT temporário
(C) Contrato CLT Efetivo
(D) Autônomo
(E) Estagiário
29) Nível de ensino que tem predominantemente atuado:
(A) Educação Superior
(B) Ensino fundamental de 1ª à 4ª série
(C) Ensino fundamental de 5ª à 8ª série
(D) Ensino Fundamental - Escolas Especiais
(E) Igrejas
(F) Associação de surdos, FENEIS, CBS e etc.
(G) Congressos e eventos
(H) Jurídico
SE NÃO ESCOLHER A ALTERNATIVA A PASSE PARA A QUESTÃO 31
30) A quanto tempo você trabalha como Intérprete de LIBRAS na Educação
Superior?
(A) Há cerca de 1 e 2 anos.
(B) Há cerca de 3 e 4 anos.
(C) Há cerca de 5 e 6 anos.
(D) Mais de 6 anos.
31) Você foi contratado com o cargo/função:
(A) Pedagogo
(B) Professor
(C) Intérprete de LIBRAS
(D) Outros
32) Você possui:
(A) Possui LER - Lesão por Esforço repetitivo
(B) Doenças crônicas ocasionadas pelo trabalho de Intérprete
(C) Terapia psiquiátrica e/ou psicológica
(D) Outros
130
33) As relações com seus colegas de trabalho são em média:
(A) Ótimas
(B) Boas
(C) Regular
(D) Más
(E) Péssimas
34) Você prática esportes?
(A) Sim
(B) Não
35) Como é seu conhecimento de língua inglesa?
(A) Sou proficiente.
(B) Leio, escrevo e falo bem.
(C) Leio, escrevo e falo razoavelmente.
(D) Leio e escrevo, mas não falo.
(E) Leio, mas não escrevo nem falo.
(F) Praticamente nenhum.
36) Como é seu conhecimento de língua espanhola?
(A) Sou proficiente.
(B) Leio, escrevo e falo bem.
(C) Leio, escrevo e falo razoavelmente.
(D) Leio e escrevo, mas não falo.
(E) Leio, mas não escrevo nem falo.
(F) Praticamente nenhum.
37) Como é seu conhecimento de Língua Brasileira de Sinais?
(A) Sou proficiente.
(B) excelente
(C) Muito boa
(D) Boa
(E) Regular
(F) Insuficiente
(G) Nenhum
38) Como é seu conhecimento em Língua Portuguesa?
(A) Sou proficiente.
(B) Excelente
(C) Muito boa
(D) Boa
(E) Regular
(F) Insuficiente
(G) Nenhum
39) Se submeteu ao Exame Nacional de Proficiência para Tradução e
Interpretação LIBRAS-Língua Portuguesa?
(A) Sim e fui aprovado
(B) Sim e fui reprovado
131
(C) Não
40) Qual a sua religião?
(A) Católico
(B) Protestante
(C) Espírita
(D) Outra religião
(E) Sem religião
41) O seu contato com surdos ocorre e/ou ocorreu por meio de:
(A) Parente próximo (pai, mãe e irmão)
(B) Parente próximo por casamento
(C) Colega de sala
(D) Vizinho
(E) Feneis; Associações de surdos e Intérpretes.
(F) Colega de trabalho
132
ANEXO I
II
IMAGENS DO BLOG
Ilustração 1 – Primeira página do blog: apresentação e cadastro
133
Ilustração 2 – Segunda página do blog: termo de Consentimento Livre e
Esclarecido
134
Ilustração 3 – Terceira página do blog: questionário
135
Ilustração 4 – Quarta página do Blog: Agradecimento
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
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Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo