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CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GERAIS
Mestrado em Educação Tecnológica
Lílian Dayse Fróes Tavares
TRABALHO PRESCRITO E TRABALHO REALIZADO:
CONFRONTAÇÕES DE SABERES NO TRABALHO DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA FÍSICA EM UMA USINA SIDERÚRGICA
Belo Horizonte (MG)
2010
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Lílian Dayse Fróes Tavares
TRABALHO PRESCRITO E TRABALHO REALIZADO:
CONFRONTAÇÕES DE SABERES NO TRABALHO DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA FÍSICA EM UMA USINA SIDERÚRGICA
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em
Educação Tecnológica do Centro Federal de Educação
Tecnológica de Minas Gerais CEFET/MG, para
obtenção do título de Mestre em Educação Tecnológica.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Aparecida da Silva
Belo Horizonte (MG)
2010
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FICHA CATALOGRÁFICA
Tavares, Lílian Dayse Fróes
T231t Trabalho prescrito e trabalho realizado: confrontações de saberes no trabalho de pessoas
com deficiência física em uma usina siderúrgica / Lílian Dayse Fróes Tavares. Belo
Horizonte, 2010.
158f. : Il.
Orientadora: Maria Aparecida da Silva
Dissertação (Mestrado) – Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais,
Curso de Educação Tecnológica
1. Trabalho. 2. Educação. 3. Pessoas com deficiência. I. Silva, Maria Aparecida da. II.
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais. Curso de Educação Tecnológica.
III. Título.
CDU: 376
Lílian Dayse Fróes Tavares
TRABALHO PRESCRITO E TRABALHO REALIZADO:
CONFRONTAÇÕES DE SABERES NO TRABALHO DE PESSOAS COM
DEFICIÊNCIA FÍSICA EM UMA USINA SIDERÚRGICA
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em
Educação Tecnológica do Centro Federal de
Educação Tecnológica de Minas Gerais
CEFET/MG, como requisito parcial para obtenção
do título de Mestre em Educação Tecnológica.
____________________________________________________
Profª. Drª. Maria Aparecida da Silva – CEFET/MG – Orientadora
____________________________________________________
Prof. Dr. José Geraldo Pedrosa – CEFET/MG
______________________________________________
Prof. Dr. Antônio de Pádua Nunes Tomasi – CEFET/MG
____________________________________________________
Profª. Drª. Daisy Moreira Cunha – UFMG
Belo Horizonte: 13 de agosto de 2010.
AGRADECIMENTOS
A construção do conhecimento não é um processo solitário, mesmo que eventualmente pareça
sê-lo. Muito do que somos, como vemos o mundo e de como agimos nele é resultado de um
processo de interação que ocorre entre nós e todos aqueles que, de alguma forma, se fizeram
presentes em nossa vida.
Agradeço, de início, a todas as pessoas denominadas com deficiência, que sempre me
instigaram e inspiraram, em especial as que conheci durante a realização desta pesquisa.
Pessoas que dividiram comigo momentos tristes, felizes, esperançosos, descrentes,
desconfiados, mas que confiaram em mim, permitindo-me, mais que realizar a pesquisa,
conhecer um pouco de cada uma e admirá-las. A essas pessoas, meus exemplos de superação,
muito obrigada!
Agradeço às empresas que consentiram na realização da pesquisa, e a todos os seus
empregados. Expresso a minha gratidão pela confiança e por terem gentilmente me recebido.
Aproveito a oportunidade para parabenizá-las pelo apoio à pesquisa científica!
Agradeço à Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG) pelo fomento a
esta pesquisa, por meio da concessão da bolsa de estudos, e à Viação Sertaneja, pela valiosa
ajuda material.
Ao CEFET/MG, a minha gratidão por possibilitar que esta pesquisa se realizasse. A todos os
professores e funcionários, o meu agradecimento. Sou especialmente grata aos professores:
Maria Rita Neto Sales Oliveira e João Bosco Laudares, atenciosos pareceristas do projeto de
pesquisa e da validação da entrevista; Antônio de Pádua Nunes Tomasi, por aceitar compor a
banca de defesa desta dissertação, e José Geraldo Pedrosa, por quem tenho grande admiração
e carinho, pela amizade e pelas incontáveis contribuições, inclusive no projeto de pesquisa, na
validação da entrevista e por aceitar participar da banca de defesa desta dissertação. Agradeço
ao Fábio Vasconcelos, a todos os colegas de curso e aos de orientação.
Para a minha orientadora Maria Aparecida da Silva, dispenso um especial agradecimento, por
ter me escolhido em um grande desafio de orientação. À senhora, o meu reconhecimento pela
persistência, carinho, tolerância e cuidados; por vir até onde eu estava, por várias vezes,
mesmo estando em incontáveis páginas à minha frente, fazendo-me refletir, aceitando a
realização da pesquisa com o tema do meu interesse e fazendo-me enxergar os inúmeros
desafios de uma pesquisa científica.
À professora Daisy Moreira Cunha, agradeço pela leitura atenta do projeto de pesquisa, por
aceitar o convite de compor a banca de defesa e pelas valiosas contribuições! À Vanessa
Alves, pela disponibilidade e gentil presteza com materiais teóricos.
Às pessoas sempre presentes, que me acolheram, apoiaram e com as quais dividi angústias,
limitações, horas de choro e também sorrisos e conquistas, em especial: Anderson Fortunato,
Priscila Tavares, Germana e familiares, Luciana Tavares e ao Alisson Marques, incentivador
da realização deste curso, meu agradecimento por toda contribuição!
O agradecimento eterno aos meus pais e à minha irmã, pessoas especiais cujo amor, presença
e apoio eu sinto e preciso em todos os momentos. Pela confiança e incentivo durante os
momentos mais difíceis da pesquisa e da minha vida. Por tudo o que me ensinaram com
imenso amor e dedicação, aprendizados maiores do que quaisquer outros encontrados em
salas de aula. Obrigada por tudo! Eu os amo muito!
Dedico um agradecimento especial ao Renato Froes, companheiro nesse e em outros projetos
de vida, pelo amor, acolhimento, dedicação, orientações e conselhos, sem os quais
provavelmente esta dissertação não teria sido finalizada. Obrigada por fazer com que eu
encontrasse a paz, em meio a tantas turbulências!
Ao meu cunhado Geraldo Sousa e à Rosana Froes, a quem chamo carinhosamente de minha
cunhasogrinha, pela prontidão em me ajudar, pelas indicações certeiras, atenção, carinho e
amizade.
À Helenice Cunha e à Ordália Pires, pela disponibilidade, leituras atentas desta dissertação e
pelas melhorias propostas.
Por fim, agradeço a Deus que, em todos os momentos, conspirou a meu favor, guiando meus
passos, mesmo quando eu não os podia compreender, para que eu estivesse no lugar certo, na
hora certa, encontrasse as pessoas certas e, assim, tudo se fez possível.
A vocês, eu dedico esta dissertação.
RESUMO
Esta dissertação é produto de pesquisa realizada em uma usina siderúrgica de Minas Gerais,
visando verificar as relações entre os saberes prescritos e os construídos no trabalho por
pessoas com deficiência física. Norteou a sua realização indagações sobre as relações entre os
saberes prescritos e os construídos no trabalho, por pessoas com deficiência física em uma
usina siderúrgica de Minas Gerais. Na coleta de dados, agruparam-se os documentos
disponibilizados pela empresa, para que se pudesse conhecer, além do campo da pesquisa, os
valores, a organização, os processos de trabalho e as prescrições que perpassam os trabalhos
de seus empregados, dentre os quais os sujeitos da pesquisa. Para a coleta de dados, foram
utilizadas as técnicas de observação nos locais de trabalho, os procedimentos dos
denominados método do sósia e autoconfrontação simples e entrevistas semiestruturadas. A
análise dos dados orientou-se em algumas categorias, tais como contradição e mediação, além
de se utilizar também da abordagem ergológica do trabalho. Como sujeitos da pesquisa, foram
escolhidos cinco empregados da empresa, com deficiência física, ocupantes de cargos e de
setores diferentes entre si. Dois deles apresentam monoparesia, dois apresentam membros
com deformidades congênitas e o outro, tetraplegia. Os resultados da pesquisa destacam o
papel fundamental dos sujeitos da pesquisa nos processos de exploração capitalista, o que se
manifesta por meio das resistências que desenvolvem ou, contraditoriamente, no repasse
indiscriminado dos saberes que constroem em seus trabalhos, o que se manifesta por meio de
suas submissões e colaborações para a continuidade de tais processos de exploração. Os
resultados sugerem ainda que os sujeitos da pesquisa se mostraram mais criativos à medida
que se distanciavam das prescrições, e não ao reproduzi-las rotineiramente. Em face da
prescrição explícita de que as normas devem ser seguidas, parece existir outra, implícita e
incentivada por programas desenvolvidos na empresa, de que os sujeitos da pesquisa devem
construir novos saberes e repassá-los, por meio desses programas. Com isso, entende-se que
o incentivo, por parte da empresa, a certo distanciamento das prescrições, no intuito de
serem construídos novos saberes sobre os processos de trabalho, sem que ela seja
devidamente responsabilizada, caso aconteçam imprevistos indesejados pelos quais tenha que
se responsabilizar. Conclui-se que existem relações de divergências, e também relações de
convergências entre os saberes prescritos e os construídos por pessoas com deficiência física
em seus trabalhos e que estes se estabelecem como forma de mediar o desenvolvimento dos
trabalhos dos sujeitos da pesquisa.
Palavras-chave: Trabalho. Educação. Saberes. Pessoas com deficiência.
ABSTRACT
This dissertation is the result of research done in a metallurgical plant in Minas Gerais state,
seeking to examine the relationship between prescribed knowledge and the one built at work
by physically handicapped people. Its accomplishment was guided by questions about the
relationship between prescribed knowledge and the one built at work, by physically
handicapped people in a metallurgical plant in Minas Gerais. During data collection,
documents made available from the company were gathered, so that one could know, besides
the field of the research, the organization, the working processes and prescriptions to the
employees including the subjects of the research. Techniques for observation at work,
procedures of the so called “double’s method” and “simple self-confrontation”, and semi-
structured interviews were used. Data analysis was based in some categories, such as conflict
and mediation, and also use the approach ergological work. Five physically handicapped
employees of the company were chosen as subjects of the research, in different positions and
departments. Two of them got monoparesia, other two have members with congenital
deformities and another one is quadriplegic. Research results put in relief the fundamental
role of the research subjects in capitalism exploitation process, which manifests itself in
resistances they develop or, contradictorily, passing indiscriminately the knowledge they
build at their work on, which manifests itself into their submission and collaboration to
continuity of such exploitation process. Results still suggest that, suggest the subjects of the
research show themselves more creative in proportion to the distance they are from the
prescriptions, and not when they reproduce them as a routine. In opposition to the explicit
prescription that rules must be followed, there seems to be another, implicit and stimulated by
programmes developed in the company, that the research subjects should build a new
knowledge e pass them on, using those programmes. Then, one understands that there is the
encouragement, from the company, not to follow strictly the prescriptions, in order to build a
new knowledge about working processes, without it taking due responsibility, in the case of
something unexpected and undesirable happens. One conclude there are relationships of
divergence, and also relationships of convergence between prescribed knowledge and the one
built by physically handicapped people at their work and those establish themselves as a way
of mediating the development of the research subjects.
Key-words: Work. Education. Knowledge. Physically handicapped people.
ILUSTRAÇÕES
Figura 1 – Organização do Trabalho. ............................................................................. 44
Figura 2 – Diagrama Organizacional.............................................................................. 45
Figura 3 – Interação entre os Componentes da CIF. ...................................................... 89
Gráfico 1 – Empregados Efetivos – PNE – Tipos de Deficiência. ................................. 42
Gráfico 2 – Pessoas com Deficiência Empregadas em 2007 – Tipos de Deficiência. ... 88
Quadro 1 – Definição de Tarefa e de Atividade. ............................................................ 35
Quadro 2 – Algumas Características do Modelo de Organização Taylorista. ................ 77
Quadro 3 – Algumas Características do Modelo de Organização Fordista. ................... 78
Quadro 4 – Algumas Características do Modelo de Organização Toyotista. ................. 79
Quadro 5 – Tipos de Deficiência Física ......................................................................... 91
Quadro 6 – Sugestões dos Sujeitos da Pesquisa. .......................................................... 130
Quadro 7 – Principais Renormalizações Realizadas pelos Sujeitos da Pesquisa. ........ 131
TABELAS
Tabela 1 – Empregados Efetivos com Deficiência Física – Gênero. ............................. 43
Tabela 2 – Empregados Efetivos com Deficiência Física – Faixa Etária. ...................... 43
Tabela 3 – Empregados Efetivos com Deficiência Física – Data de Admissão. ............ 43
ABREVIATURAS E SIGLAS
ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas
APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
Art. – Artigo
Cap. – Capítulo
CCQ – Círculos de Controle da Qualidade
CEFET/MG – Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
Cf. – Confira
CID – Classificação Internacional de Doenças
CIF Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde ou Classificação
Internacional de Funcionalidade
CIPA – Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
CLT – Consolidação das Leis do Trabalho
DPI – Disabled Peoples Internacional
DORT – Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho
EJA – Educação de Jovens e Adultos
EPI – Equipamento de Proteção Individual
ERP – Enterprise Resource Planning
ET – Educação Tecnológica
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INMETRO – Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial
INSS – Instituto Nacional do Seguro Social
ISO – International Organization for Standardization
JIT – Just-In-Time
LER – Lesões por Esforços Repetitivos
MES – Ministério da Educação e Saúde
MTE – Ministério do Trabalho e Emprego
MTIC – Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio
NR – Norma Regulamentadora
OIT – Organização Internacional do Trabalho
OMS – Organização Mundial de Saúde
ONG – Organização Não Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
OSC – Organizações das Sociedades Civis
PEA – População Economicamente Ativa
PNE – Pessoas com Necessidades Especiais
PNEA – População Não Economicamente Ativa
PO – Procedimento Operacional
PQT – Programa de Qualidade Total
RAIS – Relação Anual de Informações Sociais
RH – Recursos Humanos
SENAI – Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESMT – Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho
SFIT – Sistema Federal de Inspeção do Trabalho
SIG – Sistema Integrado de Gestão
SIT – Secretaria de Inspeção do Trabalho
SST – Segurança e Saúde do Trabalho
TI – Tecnologia da Informação
TPM – Total Productive Maintenance
TQC – Total Quality Control
TQM – Total Quality Management
UERJ – Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais
UFU – Universidade Federal de Uberlândia
UFV – Universidade Federal de Viçosa
UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas
12
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 13
2 SITUANDO A PESQUISA E A EMPRESA .................................................................................. 18
2.1 A Pesquisa........................................................................................................................................18
2.1.1 A Escolha do Tema, Pessoas com Deficiência e Legislação Brasileira .................................... 18
2.1.2 Apresentação da Pergunta Problema...........................................................................................23
2.1.3 Objetivos ...................................................................................................................................... 24
2.2 Método e Técnicas ......................................................................................................................... 24
2.2.1 Procedimentos Metodológicos – Notas Introdutórias ................................................................ 24
2.2.2 Sobre as Técnicas Utilizadas ....................................................................................................... 26
2.2.2.1 A Coleta dos Dados
................................................................................................................ 26
2.2.2.2 A Coleta de Documentos
....................................................................................................... 27
2.2.2.3 As Observações das Atividades no Contexto da Pesquisa
............................................... 28
2.2.2.4 As Entrevistas
......................................................................................................................... 29
2.2.2.5 O Denominado Método do Sósia
......................................................................................... 31
2.2.2.6 A Denominada Autoconfrontação Simples
........................................................................ 32
2.2.2.7 A Análise dos Dados - Conceitos, Método e Técnicas de Análise – Notas Introdutórias
.................................................................................................................................................. 33
2.3 A Empresa Pesquisada.................................................................................................................. 37
2.3.1 Os Caminhos da Pesquisa – Aspectos Gerais ............................................................................. 38
2.3.2 Dados Relativos ao Quadro de Empregados .............................................................................. 42
2.3.3 A Organização do Trabalho ........................................................................................................ 44
3 DEFICIÊNCIA, TRABALHO E TÉCNICAS DE CAPTAÇÃO DE SABERES: ASPECTOS
CONCEITUAIS E HISTÓRICOS .................................................................................................. 54
3.1 A (D)Eficiente História das Pessoas com (D)Eficiência ............................................................. 54
3.1.1 Denominações e Formas de Tratamento .................................................................................... 54
3.1.2 Contexto Sócio-Político ............................................................................................................... 59
3.2 Trabalho e Identidade na Sociedade Capitalista ........................................................................ 65
3.3 Modelos de Organização................................................................................................................ 76
3.3.1 Breve Exposição dos Modelos de Organização........................................................................... 76
3.3.2 Considerações sobre Competências e Técnicas de Captação e de Apropriação de Saberes no
Modelo de Organização Toyotista ............................................................................................. 80
4 CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA ............................................................ 87
4.1 Deficiência Física ........................................................................................................................... 87
4.2 Processo de Seleção e Critérios de Escolha dos Sujeitos da Pesquisa ....................................... 92
4.3 Quem são os Sujeitos da Pesquisa ................................................................................................ 95
5 CONFRONTAÇÕES DE SABERES NO TRABALHO: ANÁLISE CONSTRUÍDA COM OS
SUJEITOS DA PESQUISA ........................................................................................................... 102
5.1 As Renormalizações como Forma de Mediação entre Prescrito e Realizado: Confrontando
Discursos, Conteúdos e Situações ............................................................................................. 102
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................ 134
REFERÊNCIAS..................................................................................................................................140
APÊNDICES........................................................................................................................................150
Apêndice A – Termo de Consentimento da Pesquisa ..................................................................... 150
Apêndice B – Roteiro da Entrevista Semiestruturada ................................................................... 152
13
1 INTRODUÇÃO
A pesquisa apresenta como tema pessoas com deficiência e trabalho. Teoricamente,
insere-se no âmbito do debate sobre Trabalho e Educação. Empiricamente, tem como foco os
saberes prescritos e os construídos no trabalho de pessoas com deficiência física, em uma usina
siderúrgica de Minas Gerais.
A delimitação do tema se deu, primeiramente, como forma de abranger o interesse da
pesquisadora em ter como sujeitos da pesquisa pessoas com deficiência. Questões acerca de
suas inserções no mercado formal de trabalho também foram preferidas. Por meio de
levantamento bibliográfico, que incluiu livros, teses, dissertações e artigos científicos,
constatou-se o que foi produzido no meio acadêmico-científico. A realização dessa revisão
de literatura teve como finalidade o conhecimento das abordagens utilizadas e as lacunas
existentes, para se abarcar questões que ainda se apresentavam incipientes, sobre o tema.
Conforme ressalta Alves-Mazzotti,
A validação do conhecimento gerado pela pesquisa, a aprovação de sua confiabilidade
e relevância pela comunidade acadêmica, exige que o pesquisador se mostre
familiarizado com o estado atual do conhecimento sobre a temática focalizada, de
modo que ele possa, de alguma forma, inserir sua pesquisa no processo de produção
coletiva do conhecimento. Tal preocupação favorece o diálogo com aqueles que se
interessam pela mesma temática, além de permitir a cumulatividade e aplicabilidade
dos resultados (ALVES-MAZZOTTI, 2006, p. 02).
Com o intuito de subsidiar conhecimentos sociais e científicos sobre o tema proposto,
que julgou-se necessário o desenvolvimento desta pesquisa. Acreditou-se que a sua realização
pudesse contribuir tanto para a compreensão das relações estabelecidas entre os saberes que
perpassam os trabalhos de pessoas com deficiência física, em uma usina siderúrgica, quanto
para o melhor entendimento de como estes se relacionam com os demais contextos, dentre os
quais, o político, o social e o econômico.
No aspecto geral, a pesquisa realizada buscou estudar um tema que poderia ser
considerado como contemplado, pois com o refinamento do material científico encontrado
durante a realização do levantamento bibliográfico, atribuiu-se relevância a duas pesquisas na
íntegra, sendo elas de autoria de Batista (2002) e Freitas (2007). Contudo, ao se estreitar o
olhar, voltando-o para as especificidades propostas, acreditou-se ainda ser pertinente a sua
realização.
14
A análise da questão certamente poderia ser feita de muitas maneiras. A forma
particular pela qual se estabeleceu o estudo, pautando-se em categorias como mediação,
contradição, reprodução e historicidade, bem como se utilizando da abordagem ergológica do
trabalho, definiu-se tanto pelo fato de se considerar a ergologia como uma abordagem que
contribui para mostrar que em toda situação de trabalho uma tentativa de renormalização,
quanto pelas categorias escolhidas que permitem, na medida do possível e junto à abordagem
ergológica, reflexões na perspectiva de totalidade, enxergando a realidade social como um todo
complexo com a articulação de suas partes constituintes, reconhecendo o caráter transitório de
todas as coisas e compreendendo que este movimento é marcado, dentre outros, pela mediação
e pela contradição. A inscrição desta discussão na visão proporcionada tanto pelas categorias
citadas, quanto pela ergologia do trabalho não é fortuita. A produção no campo da deficiência
padece, muitas vezes, de uma leitura abstrata, pouco permeável aos determinantes mais amplos,
que se fazem sentir na prática social. É um limite que precisa ser enfrentado, para que se
responda, efetivamente, aos desafios impostos pelo sistema vigente. Acredita-se, desta forma,
na importância que a discussão proposta tenha, particularmente no momento histórico em que a
sociedade se afligida, de um lado, por legislações específicas quanto à inserção de
determinados grupos de pessoas no mercado formal de trabalho e, de outro, pelo que alguns
autores, como Antunes (2002), vêm chamando de a crise do trabalho ou a crise estrutural do
capital. Daí a necessidade de se estabelecer uma relação entre o que é particular e o que é
universal, entre pessoas com deficiência e a sociedade capitalista na sua conformação atual.
Vale salientar, nesta dissertação, a consciência da tensão em torno do conceito de
trabalho no modo de produção capitalista e do caráter precário e predatório, propugnado por
autores que o tratam como princípio educativo, tendo em vista a perspectiva da formação
omnilateral do ser humano. Tem-se, também, consciência da discussão sobre a forma de
organização do trabalho, com vistas na produção de mais-valia e, por conseguinte, da
exploração do trabalhador inserido na hierarquia da divisão do trabalho, do sofrimento ao qual
pode estar submetido, do peso das atividades laborais na formação da sua subjetividade e da
prevalência da dimensão inalienável, no que tange às suas escolhas no desenvolvimento do
trabalho. A realização de recortes, nesta dissertação, não nega tais tensões, tampouco as
desconsidera. No entanto, explicita-se que não se teve como objetivo, o aprofundamento de tais
questões.
A pergunta que instigou a realização da pesquisa foi: quais as relações entre os saberes
prescritos e os construídos no trabalho de pessoas com deficiência sica em uma usina
siderúrgica de Minas Gerais? O objetivo que norteou a construção deste estudo foi o de
15
verificar as relações entre os saberes prescritos e os construídos no trabalho de pessoas com
deficiência física. Para a sua consecução, buscou-se analisar o ideário histórico que permeia a
questão; estabeleceram-se relações entre o discurso e a prática; iluminou-se o campo empírico
com base em um referencial teórico marcado pela visão, dentre outros, da contradição; e
debateu-se o caso singular estudado sob esta ótica.
Estabelecidos os elementos do problema de pesquisa e o seu objetivo geral, definiu-se
como campo da pesquisa ou campo de análise (QUIVY; CAMPENHOUDT, 1998), uma usina
siderúrgica, situada no estado de Minas Gerais.
Tendo em vista a definição do campo de
análise, restava ainda circunscrevê-lo
“no espaço, geográfico e social, e no tempo”
(QUIVY;
CAMPENHOUDT, 1998, p. 156), o que pode ser constatado no subitem 2.3, em que se
buscou descrever a empresa estudada. Com relação ao tempo, por esta pesquisa enfocar
situações de trabalho, considerou-se como fundamental o momento de sua realização, além de
levar-se em conta os fatores passados, na medida em que as relações em foco puderam ser melhor
compreendidas por meio de sua evolução histórica. Os dados foram coletados entre os meses de
novembro de 2009 e março de 2010.
O universo selecionado se constituiu de pessoas com deficiência física, empregadas na
empresa escolhida como campo de pesquisa, totalizando 52. A amostragem para este estudo
compreendeu 5 pessoas.
A coleta de dados teve início com o agrupamento do maior número de publicações e de
documentos disponibilizados pela empresa, contendo as descrições de cargos e procedimentos
operacionais dos cargos ocupados pelos 52 empregados com deficiência física. Como técnicas
de coleta de dados nos locais de trabalho dos sujeitos da pesquisa, utilizou-se dos denominados
método do sósia e autoconfrontação simples
, de observações e de entrevistas semiestruturadas.
Os detalhes de como foram utilizadas e o porquê de se ter optado por tais técnicas encontram-se
no subitem 2.2.
A análise dos dados se deu buscando ter em vista categorias como mediação,
contradição e totalidade e o que Schwartz (2000) denominou
ingredientes da competência
. A
confrontação realizada entre os resultados encontrados em todas as etapas da pesquisa teve
como finalidade verificar a existência de contradições, de aproximações e de distanciamentos
entre os saberes pesquisados.
C
om o intuito de preservar os informantes e a empresa, foram utilizados, como
recurso de anonimato, nesta dissertação, letras e algarismos romanos diferenciadores. Foram
definidos quatro grupos de informantes, a saber:
a
) sujeitos da pesquisa;
b
) demais
empregados da empresa pesquisada;
c
) informativos publicados pela empresa;
d
) documentos
16
internos. Os sujeitos da pesquisa, por sua vez, foram classificados em: sujeito da pesquisa I;
sujeito da pesquisa II; sujeito da pesquisa III; sujeito da pesquisa IV; e sujeito da pesquisa V.
Os trechos transcritos preservaram exatamente a forma como foram expressos pelos
informantes.
Ainda que concordando com Januzzi (1985), quando esta assinala que a variação
terminológica – no caso das pessoas com deficiência – é uma constante e mais parece destinada
a minimizar a forma pejorativa com que essas pessoas são percebidas socialmente, cumpre
esclarecer que a nomenclatura adotada neste estudo pessoa com deficiência foi utilizada,
em respeito e referência à forma pela qual representantes desse grupo de pessoas, com o apoio
da Organização das Nações Unidas (ONU) escolheram, em 2006, para serem identificadas por
suas especificidades.
Consta nesta dissertação, além desta introdução, o Capítulo 2, intitulado Situando a
Pesquisa e a Empresa. Neste, encontram-se a justificativa da pesquisa, as principais leis
brasileiras no que diz respeito aos direitos das pessoas com deficiência no trabalho, a pergunta
problema, os objetivos e, com maior riqueza de detalhes, os procedimentos metodológicos e a
caracterização da empresa, campo da pesquisa em questão.
No Capítulo 3, denominado Deficiência, Trabalho e Técnicas de Captação e de
Apropriação de Saberes: Aspectos Conceituais e Históricos, discutem-se, inicialmente, algumas
questões teóricas sobre a história das pessoas com deficiência; suas formas de denominação e
tratamento, pela sociedade; e a questão da identidade manipulada pelos modelos de
organização capitalista, realidade que perpassa a sociedade de maneira geral, não somente as
pessoas com deficiência. Explicitam-se, de maneira resumida, considerações sobre
competências e as principais características consideradas para esta pesquisa, de cada um dos
modelos de organização capitalista. E, baseando-se em Franzoi (2009), busca-se explicitar as
técnicas utilizadas pelo capitalismo para captar e se apropriar dos saberes dos trabalhadores,
nas empresas que adotam o modelo flexível de produção.
No Capítulo 4, Os Sujeitos da Pesquisa: Situando Conceitos, Critérios e
Particularidades, explicita-se o tipo de deficiência escolhido para a realização da parte mais
específica da investigação, os critérios de seleção dos sujeitos da pesquisa e quem são eles, os
tipos de deficiência física e algumas das suas implicações.
No Capítulo 5, Confrontações de Saberes no Trabalho: Análise Construída com os
Sujeitos da Pesquisa, apresentam-se e analisam-se os dados da pesquisa de campo. Os saberes
prescritos e os construídos pelos sujeitos da pesquisa em seus trabalhos são confrontados
visando estabelecer as suas relações.
17
Nas Considerações Finais são tratadas, de forma sucinta, as principais reflexões e
discussões ocorridas nos capítulos precedentes, a partir do resgate dos objetivos propostos.
Além disso, são apontadas lacunas que se caracterizaram como limitações da pesquisa e as
indicações de estudos futuros, reveladas durante e após a realização da pesquisa.
Para finalizar, apresentam-se as Referências e os Apêndices, que apresentam o Termo
de Consentimento da Pesquisa e o Roteiro da Entrevista Semiestruturada.
18
2 SITUANDO A PESQUISA E A EMPRESA
2.1 A Pesquisa
2.1.1 A Escolha do Tema, Pessoas com Deficiência e Legislação Brasileira
A realização de estudo aprofundado sobre o tema pessoas com deficiência
1
e trabalho
decorre do fato de a pesquisadora, nas vivências do trabalho como psicóloga educacional de
instituições de ensino especial
2
, ter constantemente se deparado com os desafios, as
dificuldades e os questionamentos quanto à inserção e à permanência de jovens e adultos com
deficiência no mercado formal de trabalho
3
. Informações foram obtidas antes da seleção para o
mestrado em Educação Tecnológica (ET), por meio do contato com empresários, colegas de
trabalho de pessoas com deficiência, professores de educação profissional de escolas especiais,
noticiários, reportagens, leituras e estudo da legislação. Tais informações possibilitaram, por
um lado, a percepção do quão elevado é o número de pessoas com deficiência em nosso país e,
por outro, o conhecimento de que o Brasil possui avançado aparato legal para assegurar os
direitos das pessoas com deficiência no mercado formal de trabalho, mas que as empresas têm
encontrado dificuldades em contratá-las e/ou mantê-las em seu quadro permanente de
empregados. Essas informações iniciais foram fundamentais na elaboração do plano inicial de
pesquisa que, após a realização das leituras e estudos indicados nas orientações do mestrado,
foi reelaborado e transformado no projeto de pesquisa, aprovado pelo colegiado do Mestrado
em Educação Tecnológica.
Duas vertentes de preocupação com o que foi expresso anteriormente existência de
avançada legislação brasileira e elevado número de pessoas com deficiência provocaram a
necessidade de ir além da percepção. Com o objetivo de situar o leitor, realizaram-se estudos
1
A nomenclatura pessoa com deficiência é utilizada nesta dissertação, em respeito e referência à forma pela qual
representantes desse grupo de pessoas, com o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU) escolheram, em
2006, para serem identificadas por suas especificidades.
2
A Educação Especial se ocupa do atendimento e da educação de pessoas com deficiência em instituições
especializadas.
3
Cf. Memorial desenvolvido nos Seminários de Orientação do Mestrado em Educação Tecnológica do Centro
Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (CEFET/MG), sob orientação da Profª. Drª. Maria Aparecida
da Silva (2008/2009).
19
envolvendo as duas vertentes, o que possibilitou a elaboração de comunicações e artigos
4
,
apresentados pela pesquisadora em eventos, e uma síntese, que será apresentada nos parágrafos
que se seguem.
As transformações sociais e econômicas das últimas décadas têm proporcionado intenso
debate sobre o caráter excludente das economias capitalistas. Diante da exclusão, as mudanças
sócio-econômicas vêm acompanhadas do grande desafio – ou paradoxo – de inclusão da
crescente População Economicamente Ativa
5
(PEA). Segundo a Organização Mundial de
Saúde (OMS) (apud BRASIL, 2007a, p. 10), existem aproximadamente 650 milhões de pessoas
com deficiência no mundo, o que representa uma de cada dez pessoas. Dessas, 82% vivem
abaixo da linha da pobreza nos países do terceiro mundo, o que corresponde a 426 milhões de
pessoas de acordo com a Organização das Nações Unidas (2007). Estima-se que 386 milhões
de pessoas com deficiência em todo o mundo tenham as condições nimas de se integrarem à
população economicamente ativa, embora, muitas vezes, estas sejam erroneamente
consideradas parte da População Não Economicamente Ativa (PNEA).
No Brasil, de acordo com o Censo 2000
6
do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (apud
BRASIL, 2007a, p. 09), residem cerca de 24,6 milhões de pessoas com
deficiência, o que significa 14,5% da população. Dessas, 15,22 milhões tinham entre 15 e 59
anos, e 15,14 milhões tinham condições de integrarem o mercado formal de trabalho. Naquele
ano, porém, 51% estavam empregadas, o que corresponde a 7,8 milhões de pessoas. Desse
contingente, 10,4% possuíam carteira de trabalho assinada, o equivalente a 2,05% do total. A
pesquisa revelou que 23% das pessoas com deficiência em idade de trabalhar sobreviviam com
uma renda mensal de até um salário mínimo.
4
Sujeitos da Educação de Jovens e Adultos (EJA): relação com o conhecimento escolar e experiência profissional
(CEFET/MG, 2010); Relações entre os Saberes Prescritos e os Construídos por Jovens e Adultos com
Deficiência em suas Atividades de Trabalho (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2009). Profissionalização de
Jovens e Adultos com Deficiência: relações entre prescrito e real (UERJ, 2009); Profissionalização de Jovens e
Adultos com Deficiência: dos primórdios à contemporaneidade (UNICAMP, 2009); Identificação e Qualificação
de Pessoas com Deficiência como Estratégias de Argumentação (UFV, 2009); Relações entre Saberes Prescritos
e Saberes Construídos por Jovens e Adultos com Deficiência em suas Atividades de Trabalho (UFMG, 2009);
Relações entre os Saberes Prescritos e os Construídos por Jovens e Adultos com Deficiência em suas Atividades
de Trabalho (CEFET/MG, 2009); Inserção de Jovens e Adultos com Deficiência no Mercado de Trabalho
(CEFET/MG, 2008); Profissionalização de Pessoas com Deficiência: tensões entre o prescrito e o real (UFU,
2008).
5
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2008), a População Economicamente Ativa
compreende o potencial de mão-de-obra com que pode contar o setor produtivo. O limite superior do intervalo
de idade pode ser considerado como 59 anos ou, ainda, como 65 anos, tendo em vista o aumento nas taxas de
sobrevivência no Brasil. Devido à disponibilidade das informações, nesta dissertação, ela engloba as pessoas
com idade entre 15 e 59 anos de idade.
6
Embora os dados do Censo 2000 do IBGE tenham sido questionados por autores como Sassaki (2003), acredita-
se que os mesmos se mantenham como principal referência.
20
Segundo Pastore (2000, p. 07), “apesar do Brasil possuir uma das maiores populações
de pessoas com deficiência do mundo, possui, também, uma das menores taxas de participação
desses cidadãos no mercado de trabalho”. Ainda segundo este autor, “nos países mais
avançados, a proporção de pessoas com deficiência no mercado formal de trabalho fica entre
30% a 45% do total de trabalhadores”.
Atualmente, o Brasil conta com ampla legislação sobre o direito de acesso de jovens e
adultos com deficiência no mercado formal de trabalho, seja em instituição privada seja em
instituição pública. Alguns dos principais documentos existentes são: Convenção nº. 159/1983,
da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil por meio do Decreto
Legislativo nº. 51, de 28 de agosto de 1989; Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 Decreto nº. 129, de 22 de maio de 1991; Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990; Lei nº.
8.112, de 11 de dezembro de 1990; e Lei nº. 8.213, art. 93, de 24 de julho de 1991.
A Convenção 159/1983 visa “assegurar medidas adequadas de reabilitação profissional
e promover às pessoas com deficiência, em igualdade de oportunidade com as demais pessoas,
emprego no mercado formal de trabalho” (BRASIL, 2004, p. 114). Trata-se de seu
recrutamento e acesso ao emprego, da manutenção do posto de trabalho, da ascensão
profissional e das condições seguras e salubres de trabalho. A Constituição Federal/1988 “veta
a discriminação no tocante a salários e critérios de admissão para os trabalhadores com
qualquer tipo de deficiência” (art. 7, XXXI) e “institui a reserva de 20% de cargos e empregos
públicos para pessoas com deficiência” (art. 37, VIII) (BRASIL, 2004, p. 159). A Lei nº.
8.069/1990 “dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, e outras providências”
(BRASIL, 2004, p. 45), assegurando, no art. 66, ao adolescente com deficiência, o trabalho
protegido
7
.
A Lei nº. 8.112/1990 “dispõe sobre o Regime Jurídico dos Servidores Públicos
Civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais” (BRASIL, 2004, p. 47). De
acordo com seu art. 5°, § 2º.,
Às pessoas portadoras de deficiência
8
é assegurado o direito de se inscrever em
concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a
deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% das
vagas oferecidas no concurso (BRASIL, 2004, p. 47).
7
“O trabalho protegido, assim como a oficina protegida, é o ambiente onde são realizadas atividades laborais,
dentro de uma escola especializada ou uma Organização da Sociedade Civil (ou Organização Não
Governamental/ONG), podendo ou não ser remunerada. Modalidade de educação profissional prevista no
Estatuto da Criança e do Adolescente, cap. V, art. 66 e 88” (BATISTA, 2002, p. 244-245).
8
As expressões originais são reproduzidas nesta dissertação, em cumprimento às normas da Associação Brasileira
de Normas Técnicas (ABNT).
21
Por fim, mas não menos importante, a Lei nº. 8.213/1991 Lei de Cotas define que
“empresas com 100 ou mais empregados são obrigadas a preencher de 2% a 5% dos seus
cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas com deficiência habilitadas” (BRASIL, 2004,
p. 55).
Quanto à atuação profissional de pessoas com deficiência Freitas reflete que as
condições físicas, bem como as decorrentes das relações sociais no trabalho, podem tanto
contribuir quanto obstruir as possibilidades de desempenho.
A mesma pessoa que é considerada severamente deficiente em um ambiente pode ser
menos em outro. Além disso, o grupo de pessoas
com deficiência é muito
heterogêneo, com características muito distintas. Contudo, é um grupo que enfrenta
barreiras comuns para sua participação efetiva na sociedade, particularmente em
termos de discriminação oriunda da percepção das pessoas com deficiência e de
estruturas de acesso aos diferentes espaços sociais (FREITAS, 2007, p. 27).
Depreende-se dessa argumentação que uma pessoa pode tornar-se mais ou menos
deficiente, dependendo das condições físicas e das de natureza sócio-cultural que lhes são
oferecidas. Nesse sentido, é possível afirmar que são vários os determinantes do maior ou
menor grau de desempenho
9
.
Embora o parâmetro utilizado para que uma pessoa seja considerada com deficiência
ainda não seja um consenso estabelecido em todas as legislações, as características que
possibilitam a inclusão nas leis e nas cotas são determinadas legalmente. No Brasil, existem
duas normas internacionais devidamente ratificadas, com
status
de leis nacionais. São elas: a
supracitada Convenção nº. 159/1983 e a Convenção Interamericana para a Eliminação de Todas
as Formas de Discriminação Contra as Pessoas Portadoras de Deficiência, também conhecida
como Convenção de Guatemala. Esta foi ratificada pelo Decreto nº. 3.956, de 8 de outubro de
2001. Ambas conceituam deficiência para fins de proteção legal como “uma restrição física,
mental, sensorial ou múltipla, que incapacite a pessoa para o exercício de atividades normais da
vida e que, em razão desta incapacitação, a pessoa tenha maior dificuldade de inserção social”
(BRASIL, 2004, p. 232).
O Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999, que regulamenta a Lei nº. 7.853, de 24
de outubro de 1989, “dispõe sobre a Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de
Deficiência, consolida as normas de proteção e outras providências(BRASIL, 2004, p.
196). Esse Decreto determina a deficiência, para efeitos legais, como “toda perda ou
9
Condições de trabalho, natureza do trabalho, adaptações, influências dos contextos do meio ambiente físico e
social, das diferentes percepções culturais e de atitudes em relação à deficiência, disponibilidade de serviços e de
legislação, dentre outras.
22
anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere
incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser
humano” (BRASIL, 2004, p. 196). E assegura com mais detalhes as especificidades nimas
para se considerar enquanto deficiência.
o Decreto nº. 5.296, de 02 de dezembro de 2004, traz consideráveis alterações no
enquadramento das deficiências, anteriormente estipuladas. Esse Decreto regulamenta a Lei nº.
10.048, de 8 de novembro de 2000, e a Lei nº. 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que
“estabelecem normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade” (BRASIL,
2004, p. 92-94). O decreto possui 72 artigos que primam por “assegurar as condições de
acessibilidade arquitetônicas, urbanísticas, de transportes, de comunicação e informação, além
de incorporar a importância das ajudas técnicas
10
como área de conhecimento” (BRASIL,
2006a, p. 223).
Também é de se destacar a Instrução Normativa nº. 20, de 26 de janeiro de 2001, da
Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Esta
medida “dispõe sobre os procedimentos a serem adotados pelos Auditores Fiscais do Trabalho,
quando da fiscalização do trabalho das pessoas portadoras de deficiência nas empresas”
(BRASIL, 2004, p. 399). No entanto, por falta de regulamentação dos parâmetros para
gradação da multa administrativa, essa norma somente começou a ser cumprida a partir de
outubro de 2003, quando o Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria 1.199/2003,
que fixou os parâmetros para a gradação da multa administrativa. Esta portaria pode ser
considerada uma prática punitiva, pois determina a aplicação de multas às empresas que não
cumprem as determinações legais. Contudo, de acordo com o Sistema Federal de Inspeção do
Trabalho (SFIT) (2008), com as ações fiscais que ocorreram de 2005 a 2007, 55.078 pessoas
com deficiência foram contratadas no mercado formal de trabalho, em todo o Brasil. No mês de
agosto de 2008, foram 1.990 contratações. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em seu
art. 3º, determina que:
Não pode ser considerada relação de trabalho a ser abatida na cota legal, em nenhuma
hipótese, o trabalho realizado por pessoas com deficiência em oficinas terapêuticas e,
quando ausentes os requisitos caracterizadores de vínculo empregatício, nos moldes
celetistas, o trabalho realizado em oficinas de produção (BRASIL, 2004, p. 137).
10
São consideradas ajudas técnicas os equipamentos ou recursos que garantem a interface entre a pessoa e o seu
entorno. São meios indispensáveis à autonomia e à integração de pessoas com deficiência. Destinam-se a
compensar a deficiência ou a atenuar-lhe as consequências e a permitir o exercício das atividades cotidianas e a
participação na vida escolar, profissional e social. Podem ser, por exemplo, próteses ou órteses (BRASIL,
2007b, p. 01).
23
Ao examinar a legislação brasileira, grandes avanços são percebidos quanto aos direitos
de acesso de jovens e adultos com deficiência não no mercado formal de trabalho. No
entanto, muito a percorrer para que sejam alcançados os seus acessos e as suas
permanências. A Lei de Cotas, por exemplo, sem dúvida alguma favorece a inserção de pessoas
com deficiência no mercado formal de trabalho, mas somente ela, possivelmente não
conseguirá promover transformações sociais mais significativas no tocante a discriminações,
preconceitos, entre outros problemas sociais, culturais e políticos.
A legislação sobre os direitos das pessoas com deficiência constitui-se mecanismo das
políticas de ação afirmativa
11
, que trazem novo desafio para as organizações de trabalho.
Diante das mudanças nos processos produtivos, com introdução de novas tecnologias e novas
formas organizacionais, responsáveis pela redução do número de postos de trabalho,
produzindo mais com menos força de trabalho; dos processos de divisão internacional do
trabalho que, segundo Pochmann (2001), “afetam o emprego nos países periféricos”; e da
permanente necessidade de requalificação de trabalhadores para assumirem novos postos de
trabalho, as empresas se veem obrigadas a ressignificar as concepções que têm sobre as
possibilidades de trabalho de/para pessoas com deficiência.
2.1.2 Apresentação da Pergunta Problema
Diante do exposto no subitem anterior, acreditou-se ser necessário interrogar e
compreender sobre os saberes com os quais pessoas com deficiência precisam lidar no
cotidiano do trabalho, em uma empresa de Minas Gerais. Assim, a pergunta que esta
dissertação visa refletir é: Quais as relações entre os saberes prescritos
12
e os construídos no
trabalho
13
de pessoas com deficiência física
14
em uma usina siderúrgica de Minas Gerais?
11
“Por política de ação afirmativa entende-se um conjunto de políticas específicas para membros de grupos sociais
atingidos por formas de exclusão social que lhes negam um tratamento igualitário no acesso às diversas
oportunidades” (ALVES; GALEÃO-SILVA, 2004, p. 22).
12
“Aquilo que se recomenda praticar; norma; preceito; regra; determinação” (HOUAISS, 2008). Os saberes
prescritos remetem a tudo aquilo que é definido de maneira antecipada e dado ao trabalhador para definir,
organizar e regular o seu trabalho. Nesta dissertação, os saberes prescritos podem dizer respeito: ao conteúdo
das leis brasileiras, aos saberes científicos e técnicos multidisciplinares, às normas empresariais, aos manuais e
às instruções técnicas, às normas de utilização, às regras de gestão, aos procedimentos ou padrões operacionais
(visam normatizar o como fazer), às descrições de cargos (visam normatizar o que fazer) e demais normas
implícitas (subentendidas) ou explícitas (escritas e/ou enunciadas formalmente), entre outros, como o ideal a ser
seguido e realizado. Cf. subitem 2.2.2.7.
13
Nesta dissertação, os saberes construídos no trabalho referem-se aos saberes construídos especialmente a partir
da prática, decorrentes também da experiência, em relações sociais de produção. Podem ser construídos de
24
Justifica-se que a elaboração desta questão de pesquisa se baseou nas leituras realizadas
durante as fases de levantamento bibliográfico, revisão da literatura e construção do projeto de
pesquisa, entre os meses de março de 2008 e maio de 2009, de acordo com o cronograma
apresentado no projeto de pesquisa. Destacaram-se, neste sentido, as ideias apresentadas por
Schwartz (2000), Guérin et al. (2001) e Cunha (2005).
2.1.3 Objetivos
Esta pesquisa teve como objetivo geral verificar as relações entre os saberes prescritos e
os construídos no trabalho de pessoas com deficiência física em uma usina siderúrgica de
Minas Gerais. Tendo como foco os sujeitos da pesquisa, visou-se alcançar os seguintes
objetivos específicos:
a)
Verificar as apropriações dos saberes prescritos.
b)
Verificar o teor das mudanças realizadas em relação aos saberes prescritos.
c)
Confrontar os saberes prescritos com os construídos no trabalho.
d)
Identificar o tipo de relação estabelecida entre os saberes prescritos e os construídos
para atenderem às exigências do trabalho.
2.2 Método e Técnicas
2.2.1 Procedimentos Metodológicos – Notas Introdutórias
A pesquisa adotou algumas categorias, tais como contradição, mediação, totalidade e
práxis e utilizou, também, da abordagem ergológica do trabalho. Isso porque a reflexão das
relações entre os saberes que envolvem o trabalho de pessoas com deficiência física permite
identificar alguns dos espaços onde as aproximações e/ou os distanciamentos operam, no caso,
forma individual ou coletiva. São os saberes denominados por Franzoi (2009, p. 191), como: “saber prático”,
“saber informal” ou, ainda, “qualificações tácitas”. Cf. subitem 2.2.2.7.
14
Tipo de deficiência escolhido para a realização da pesquisa. Cf. subitem 4.1.
25
os espaços das normas e dos valores. O debate de normas e de valores e a definição de um
contexto para a sua precipitação identificam e conferem especificidade à abordagem ergológica
do trabalho.
Considerou-se que a atividade de um empregado em um determinado momento é
“resultado de um compromisso complexo levando em consideração inúmeros fatores”
(GUÉRIN et al., 2001, p. 47), quais sejam: os objetivos definidos pela empresa; os meios de
que dispõe para a realização do trabalho; as características do ambiente físico e social; os
saberes que a pessoa traz consigo; os valores que mobiliza, entre outros.
A atividade, no contexto desta dissertação, é o
que
a pessoa faz para atingir os
objetivos da tarefa, é o resultado de uma síntese entre a tarefa (objetivos, resultados
esperados, meios oferecidos, exigências
requeridas) e o ser humano que a executa (sua
história, experiência, formação, saúde sica
e mental). A atividade
é ainda
o modo como o
ser humano, em uma situão de trabalho, relaciona-se com: a organizão do trabalho;
os outros empregados; os objetivos propostos; os meios fornecidos para realizá-los; as
variabilidades; as informões; a identificação dos sinais
;
a interpretação; e a decisão do que
fazer a cada instante
de
execução da tarefa. A atividade
é,
portanto, o resultado de um
trabalho de
ree
laboração e reorganização da tarefa por
parte
dos empregados
(renormalização).
Os valores e os saberes que envolvem o trabalho – coletivos e individuais – são,
segundo Cunha (2005, p. 09-10), “como substâncias que, em permanência, se desenvolvem,
transformam, aprendem e, eventualmente, se aplicam nas atividades de trabalho, configurando-
se no que são chamadas competências
15
”. As atividades de trabalho são também cenários onde
a reatualização das múltiplas experiências adquiridas, memorizadas, apropriadas
16
e
exteriorizadas acontecem. Elas refletem as aprendizagens provenientes de todas as experiências
de formação vivenciadas.
No entanto, quanto à avaliação de competências e à sua dimensionalização em situação
de trabalho, que se ressaltar a dificuldade de tais intentos, por se tratarem de processos de
cunho também subjetivos. Segundo Schwartz (apud CUNHA, 2005, p. 10), seis
ingredientes
heterogêneos
17
compõem as competências da atividade e, em razão de suas especificidades, não
15
Cf. subitem 3.3.2.
16
Vygotsky propõe a teoria da apropriação em contraposição à teoria da interiorização. Os dois processos se
diferenciam na medida em que a apropriação é um processo de reconversão dos artefatos em instrumentos, é um
verdadeiro processo de recriação histórica e não de assimilação passiva (CLOT, 2006, p. 24).
17
Tais ingredientes da competência dizem respeito, basicamente, às normas antecedentes; variabilidades e
microvariabilidades; capacidade e propensão para articular, dialeticamente, as competências no trabalho;
26
devem ser avaliadas, mensuradas ou dimensionadas da mesma maneira e pelos mesmos
instrumentos. Cada um dos ingredientes aponta para aprendizagens múltiplas que têm origem
na experiência de trabalho, e/ou aí se manifestam na forma de capacidades e habilidades,
quando os responsáveis por desempenhar determinadas atividades são confrontados a
situações-problema. Tais ingredientes interagem dinamicamente ante os desafios, no instante
em que as competências são requisitadas.
2.2.2 Sobre as Técnicas Utilizadas
2.2.2.1 A Coleta dos Dados
Segundo Laville e Dionne (1999), muitas são as fontes de informações em uma pesquisa
.
Os dados podem ser adquiridos por meio de consultas a documentos, da
observação e/ou de
entrevistas. “É importante que o pesquisador lance mão de mais de uma fonte de evincia, por
meio de métodos variados de coleta, definindo tal
escolha em função da natureza do fenômeno e
[...] de suas preocupações de pesquisa”
(LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 175).
Conforme explicitado anteriormente, para esta pesquisa foram utilizadas as três
possibilidades de fontes destacadas: consulta a documentos da empresa, observações e
entrevistas semiestruturadas. Os denominados
todo do sia
e
autoconfrontação simples
também foram utilizados. Para a autorização da pesquisa e da coleta de dados, realizou-se um
primeiro contato com a gerência e a superintendência de Recursos Humanos (RH) da empresa.
Em seguida, as gerências das áreas onde trabalham as pessoas pré-selecionadas para o estudo
foram contatadas e, por sua vez, os possíveis sujeitos da pesquisa. A seguir, encontram-se
detalhadas cada uma dascnicas utilizadas para a coleta de dados e os procedimentos de análise.
implicação no trabalho; a relação com o saber; competência para gerir e criar sinergias entre individualidades e
coletivos de trabalho. Cf. Capítulo 5.
27
2.2.2.2 A Coleta de Documentos
A coleta de documentos publicações da empresa e documentos internos utilizados
para compor as prescrições seguiu as recomendações de Yin (2005). Levou-se em consideração
que as fontes de informações foram produzidas com objetivos e públicos específicos, podendo
refletir concepções de quem as concebeu, além de seus conteúdos não estarem imunes às
próprias concepções da pesquisadora, necessitando, portanto, de análises mais cuidadosas. Para
tanto, buscou-se identificar principalmente os elementos recorrentes, ainda que o interesse não
fosse a sua quantificação. Levou-se em consideração, alguns procedimentos de pesquisa
destacados por Franco (2008), para a realização da análise dos conteúdos, tanto dos documentos
prescritos, quanto dos dados obtidos com a pesquisa de campo, a saber: unidades de análise;
organização da análise; e categorias de análise, todas elaboradas de acordo com os objetivos da
pesquisa. Destaca-se que algumas categorias de análise foram pensadas antes do
desenvolvimento da pesquisa, no entanto, preferiu-se não defini-las a priori, deixando-as
emergirem, “[...] sendo criadas à medida que surgem nas respostas, para depois serem
interpretadas à luz das teorias explicativas” (FRANCO, 2008, p. 54).
Os documentos institucionais de interesse desta pesquisa foram definidos de acordo
com os seus objetivos. No entanto, puderam ser analisados somente os publicados pela empresa
e os documentos internos que foram disponibilizados para análise. Acreditou-se que a análise
de documentos institucionais pudesse fornecer importantes elementos para melhor
compreensão da organização do processo de trabalho, das prescrições e, por conseguinte, do
trabalho realizado. O conhecimento de toda prescrição disponível, relativa ao trabalho dos
sujeitos da pesquisa, foi necessária para que se pudesse promover confrontações entre essas
normas antecedentes e o trabalho realizado. Dentre os documentos internos analisados estão o
organograma, o código de ética, as descrições e os documentos dos programas desenvolvidos,
materiais de treinamentos, descrições de cargos, Procedimento Operacional (PO), relatórios de
sustentabilidade, discursos e relatórios de reuniões
, cartilhas e vídeos institucionais
.
28
2.2.2.3 As Observações das Atividades no Contexto da Pesquisa
Após a coleta de prescrições, foram realizadas observações das atividades dos
empregados escolhidos como sujeitos da pesquisa, em seus locais de trabalho. De acordo com
Guérin et al. (2001, p. 143), “uma apreensão da atividade de trabalho que ultrapasse as
representações parciais dos diferentes atores na empresa implica na coleta de informações no
momento do exercício efetivo dessa atividade”,
o que justifica a opção pela observação,
considerando que a análise da atividade se volta para um trabalho em um dado momento, em
condições que são específicas.
As observões foram realizadas, de acordo com a disponibilidade dos entrevistados.
Ainda que não se intentasse restringi-las, listaram-se alguns itens previamente, seguindo as
recomendações de Guérin et al. (2001, p. 154-164), a saber:
a)
Deslocamentos;
b)
Direção do olhar;
c)
Comunicações;
d)
Posturas;
e)
Gestos;
f)
Sequências;
g)
Interações;
h)
Observações em termos de tomadas de decisão;
i)
Dimensão coletiva: número de pessoas no local de trabalho, distância entre essas
pessoas, escala temporal;
j)
Condições de trabalho;
k)
Domínio de saberes e habilidades básicas;
l)
Capacidades básicas para desenvolver os seus trabalhos;
m)
Competências e/ou habilidades e saberes específicos relativos ao campo
profissional;
n)
Renormalizações.
As estratégias utilizadas pelos sujeitos da pesquisa para administrarem a distância entre
o que é prescrito para a realização de seus trabalhos e o que realmente necessita ser feito para
29
que estes sejam realizados, leva à necessidade de se pesquisarem as situações concretas onde
tais renormalizações se efetivam.
2.2.2.4 As Entrevistas
A atividade de uma pessoa não se compõe somente daquilo que é apreensível
pela observação, é algo mais complexo. Abrange, entre outros, o “uso de si” (SCHWARTZ,
1998) que demanda arbitragens e envolve valores, saberes e competências. Segundo Faïta (2002,
p. 53), “é provável até que a pretensão de conhecer em detalhe as situações de trabalho seja
amplamente ilusória”. Mesmo sabendo que não seriam apreendidos todos os aspectos da
situação de trabalho, pretendeu-se aproximar ao máximo do que seriam as atividades de trabalho
dos sujeitos da pesquisa. Para tanto,
optou-se nesta pesquisa, pela realização conjunta de
entrevistas, acreditando ser insuficiente a abordagem dos sujeitos da pesquisa em
situação de
trabalho, por meio de uma única técnica.
Ao mesmo tempo em que a observação se mostra como “uma ferramenta potente”
(GUÉRIN et al
.
, 2001, p. 164) para apreender as variabilidades inscritas na realização de uma
atividade de trabalho, Cunha (2005) considera-a paradoxalmente limitada aos sentidos,
principalmente à visão e à audição. A atividade não se reduz somente ao que é manifesto, mas
envolve também dimensões como saberes e valores, dimensões que não são facilmente
apreensíveis. Dessa maneira, os dados das observações realizadas serviram como ponto de
partida para momentos de verbalizações com os empregados pesquisados, seja por meio das
entrevistas seja na denominada
autoconfrontação simples
18
.
Segundo Thiollent (1982), as entrevistas são consideradas técnicas complementares de
obtenção de dados, permitindo a ampliação da análise, pois possibilita uma investigação mais
criteriosa sobre o problema estudado. Optou-se, então, pela realização de entrevistas
semiestruturadas. A vantagem deste tipo de entrevista consiste em maior flexibilidade na coleta, de
forma que haja uma conservação mínima da padronização das perguntas, pois, muitas vezes, o
entrevistador reformula perguntas e, a mesmo, acrescenta outras, a fim de garantir o
entendimento do
entrevistado e a maior clareza sobre a resposta dada. Também a ordem das
18
Optou-se por manter tal termo, ainda que se tenha a consciência de que este possa ser questionado, pelo fato de
o sujeito da pesquisa ser confrontado às observações de seu trabalho, por meio das percepções de outra pessoa,
no caso, as da pesquisadora, não se configurando uma autoconfrontação, mas sim, a confrontação de ideias e/ou
de pontos de vista, por parte da pesquisadora e do sujeito observado.
30
questões e as possibilidades de respostas o são
impostas, como ocorre em questionários.
Esse procedimento faculta ao entrevistado seguir sua própria linha de raciocínio, facilitando a
interação entre entrevistador e entrevistado, potencializando a profundidade da coleta e a
possibilidade de que as respostas reflitam o que o entrevistado realmente pensa. Conforme
Laville e Dionne, o recurso da entrevista
[...]
permite a exploração dos conhecimentos das pessoas, mas também de suas
representações, crenças, valores, sentimentos e opiniões [de forma que] a flexibilidade
adquirida permite obter dos entrevistados informações muitas vezes mais ricas e
fecundas, uma imagem mais próxima da complexidade de situações, fenômenos ou
acontecimentos (LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 190).
Como desvantagem, reconhece-se que a flexibilidade revela perda de uniformidade tanto
nas perguntas quanto nas respostas, podendo gerar grandes diferenças, de forma que a
“generalização será, todavia, delicada e exigi cuidado e prudência por parte do pesquisador”
(LAVILLE; DIONNE, 1999, p. 190).
Concebeu-se um roteiro de entrevista
19
único para todos os sujeitos da pesquisa. Os
objetivos definidos para as entrevistas estiveram atrelados ao contexto
da pesquisa
. Foram
realizadas questões de caráter exploratório, com as quais foi possível conhecer um pouco da
trajetória pessoal de cada sujeito da pesquisa. Foram realizadas também questões de
explicitação, onde se focalizou a fala dos sujeitos da pesquisa acerca da descrição do
desenvolvimento de seus trabalhos, tal comoo realizados.
As entrevistas foram gravadas e o tratamento dos dados buscou ser cuidadoso, a partir
da transcrição minuciosa das falas dos entrevistados, a fim de promover maior fidedignidade aos
dados coletados e uma análise mais confiável. Para Schrader (1978, p. 80), a pesquisa tem como
caractestica “a necessidade
indiferente do método escolhido
de induzir um processo
social de interação para obter
informações”. No caso de entrevistas, este mesmo autor adverte
quanto às inibições a que o entrevistado está
sujeito, como de ordem cultural, social e psíquica.
Também o entrevistador está sujeito a emitir comunicação verbal e não-verbal com base em suas
concepções e, mesmo em reação ao entrevistado, de forma a interferir no processo. Portanto,
coube à pesquisadora contar com essas interferências e buscar formas de minimizá-las.
“Movimentar dentro das expectativas tanto dos investigadores quanto dos entrevistados é uma
tarefa que o entrevistador precisa primeiramente aprender” (SCHRADER, 1978, p. 128). Além
das dificuldades que podem aflorar na interação, este autor adverte também quanto às
expectativas e ao entendimento do entrevistado quanto ao objetivo da pesquisa. Neste sentido,
19
O Roteiro da Entrevista Semiestruturada encontra-se no Apêndice B.
31
tomou-se como providência a elaboração de um Termo de Consentimento de Pesquisa
20
, onde
constam informações sobre a pesquisa, os contatos da pesquisadora e o aceite por parte dos sujeitos
da pesquisa.
As entrevistas, além de se constituírem em momentos de elucidação de elementos
suscitados pelas observações, foram também, segundo Alves e Cunha (2008, p. 05), momentos
que pretenderam proporcionar aos empregados com deficiência física uma saída do lugar
comum de sujeito da pesquisa e uma passagem ao papel de parceiro na sistematização de um
saber acerca do seu próprio trabalho”.
2.2.2.5 O Denominado Método do Sósia
Conforme Alves e Cunha (2008), a partir dos anos de 1960, começaram a surgir estudos
que se referiam diretamente à possibilidade de confrontar o trabalhador ao seu discurso. Nesse
contexto, destacam-se os exercícios de instrução ao sósia, desenvolvidos na Itália, nos anos de
1970, onde Oddone, Rey e Briante (1981) faziam a seguinte proposição a um operário voluntário:
“Suponha que amanhã eu o substitua no seu trabalho. Quais são as instruções que você deverá
me passar para que ninguém perceba a substituição?”. Na continuidade do procedimento,
delimitava-se uma sequência de trabalho para ser focalizada nos detalhes de como fazer e não de
por que fazer, visando aumentar o conhecimento do trabalhador sobre o valor da sua atividade.
Apoiados nas instruções ao sósia de Oddone, o psicólogo Yves Clot propôs o método do
sósia, e o linguista Daniel Faïta, a autoconfrontação cruzada, que são métodos de
autoconfrontação que buscam tornar o processo de confrontação uma ferramenta útil na
compreensão das situações de trabalho em sua complexidade. Acredita-se que tal método
possibilite a aproximação do que seja a situação de trabalho, por meio da observação (notas de
campo), contraposta ao que o trabalhador pensa que faz nessa mesma situação (comentários e
entrevistas). Para Alves e Cunha (2008), é o trabalhador quem exercita a confrontação de si
mesmo, diante do seu trabalho, ainda que o faça guiado pelas percepções da pesquisadora.
Ao adotar esses métodos de autoconfrontação, instaurou-se um diálogo que pôde
evidenciar aspectos até então não evidentes sobre os trabalhos realizados pelos sujeitos da
pesquisa. Acreditou-se que a possibilidade de olhar para o próprio trabalho revelasse aos
20
O Termo de Consentimento de Pesquisa encontra-se no Apêndice A.
32
sujeitos da pesquisa saberes dos quais eles mesmos não tivessem a consciência de que
construíram com as suas atividades.
As instruções realizadas pelos sujeitos da pesquisa foram
gravadas e transcritas.
Posteriormente, os sujeitos da pesquisa foram apresentados a trechos destacados das anotações
do caderno de campo, dos documentos coletados na empresa e de suas instruções e puderam
comentá-las. Com este
exercício, acredita-se que os sujeitos da pesquisa
tiveram a
oportunidade de um contato social consigo mesmo, pois puderam se colocar em um lugar de
estranhamento em relação a si próprio, ao se verem diante da necessidade
de instruir uma
pessoa sobre os seus trabalhos (ALVES; CUNHA, 2008, p. 06). D
e acordo com Clot (1998,
p. 181), a
possibilidade de estabelecer um diálogo consigo mesmo, por meio dos diálogos
com o outro, “leva o trabalhador a
estranhar as suas próprias experiências, redescobrindo-as.
Uma vez redescobertas, eles se veem diante da possibilidade de reorganizá-las sob outro ponto
de vista”. Assim, acredita-se que, ao se verem diante da necessidade de enumerar as suas ações,
em seus locais de trabalho, os sujeitos da pesquisa tenham se deparado com a possibilidade de
olhar para os seus próprios trabalhos, de outra forma, resgatando os detalhes de suas ões e,
possivelmente, ressignificando-os e refletindo sobre os mesmos.
2.2.2.6 A Denominada Autoconfrontação Simples
Esta técnica é
considerada por Alves e Cunha (2008, p. 08) “a produção de discursos
referentes à
atividade observada”. O sujeito da pesquisa, em situão de trabalho, é
confrontado às percepções de outra pessoa sobre o seu trabalho
no caso, às percepções da
pesquisadora. Abre-se espaço para que se produza um discurso (
explicativo, narrativo, ou
responda às questões propostas pela pesquisadora), a fim de avaar na produção de significados
sobre os trabalhos observados. Os comentários realizados durante esta atividade tamm foram
registrados. O tipo de autoconfrontação utilizada na pesquisa foi a simples. Diferente da
autoconfrontão cruzada, ela envolve diretamente apenas o sujeito pesquisado e a pesquisadora.
A autoconfrontação é mais um recurso por meio do qual a pesquisadora buscou se
aproximar do trabalho realizado pelos sujeitos da pesquisa. Para Wisner (1987, p. 79), “o que
diz o operador sobre o seu trabalho é de importância considerável na análise da atividade”. No
entanto, Faïta e Vieira (2003, p. 128) alertam: “aquilo que o trabalhador diz de sua atividade
não deve tomar o lugar de sua atividade real”. No momento da autoconfrontação, a pesquisadora
se preocupou em manter o debate sobre a atividade. É fundamental a manutenção do processo
33
dialógico, aproveitando ao máximo todas as oportunidades de relacionar os enunciados
produzidos e o que eles revelam efetivamente. A pesquisadora buscou atentar-se ao seu papel,
ao seu lugar no processo de autoconfrontação, não se deixando confundir com o lugar do
observado.
As transcrições das entrevistas e conversas com os empregados com deficiência física,
os documentos da empresa e também as notas de observação foram partes essenciais dos
documentos submetidos a confrontações simples. De acordo com Clot et al. (2001), o
trabalhador, diante das anotações sobre o seu trabalho, diz aquilo que faz ou que teria ou não
podido fazer. À pesquisadora coube a pontuação dos discursos dos sujeitos da pesquisa,
procurando levá-los à compreensão da relação entre o realizado e o o-realizado, igualmente
constitutivo da atividade. O uso desse recurso implica um distanciamento que permite ao
trabalhador se ver de um lugar exterior a si próprio e de confrontar formas de fazer e de dizer.
Acredita-se que, por meio desta técnica, os sujeitos da pesquisa puderam reolhar, repensar e
reelaborar elementos das suas atividades de trabalho.
2.2.2.7 A Análise dos Dados – Conceitos, Método e Técnicas de Análise – Notas
Introdutórias
Os termos
saberes prescritos
e
trabalho prescrito
, no contexto desta pesquisa, são de
ordens afins e, conforme descrito em nota, no subitem 2.1.2, referem-se a tudo aquilo que é
estabelecido de maneira antecipada, definindo, organizando e regulando o trabalho. Schwartz
(2000) denomina-os
normas antecedentes
e diz que estas são formadas pelo conjunto da tarefa,
das condições determinadas e dos resultados antecipados, que ao mesmo tempo limita,
constrange, autoriza e orienta. Remetem também, nesta dissertação, ao conteúdo das leis
brasileiras, às normas e saberes científicos e técnicos multidisciplinares, às normas
empresariais e jurídicas, aos manuais e às instruções, procedimentos e regulamentos das mais
diversas ordens, tudo o que se encontra anterior à realização do trabalho, como o ideal a ser
seguido. Para este tipo de saber, não se atentou apenas ao conhecimento das regras escritas e as
advindas da direção da empresa e da legislação brasileira. Buscou-se atentar também para as
regras não escritas, criadas pelos sujeitos da pesquisa ou pelo coletivo de trabalhadores, para
atingir metas e condutas, mesmo que estas transgridam outras normas e condutas. Segundo
Souza-e-Silva,
34
Atribuir à prescrição o estatuto de norma antecedente permite compreendê-la como
compondo um conjunto de direcionamentos sobre o trabalho, que inclui os escritos
explícitos e todas as outras formas que participam da definição da atividade. Trata-se
de normas externas à atividade
e, portanto, não constituem um prescrito direto do
trabalho, mas impõem princípios não negociáveis (SOUZA-E-SILVA, 2007, p. 03).
Já os saberes construídos no trabalho referem-se aos saberes especialmente construídos a
partir da prática, decorrentes também da experiência, em relações sociais de produção.
Conforme Souza-e-Silva, são os
Conhecimentos advindos da dimensão experimental, concreta, prática, conjuntural de
cada situação de trabalho, isto é, o aqui e agora investido, mediado por singularidades,
com seus objetos e ambientes particulares. Trata-se da experiência de cada
trabalhador, de sua história, de seu saber acumulado, individual e/ou coletivamente
(SOUZA-E-SILVA, 2007, p. 03).
Baseando-se nos estudos de Alves (2009), pautados no referencial teórico relativo aos
campos da Ergologia
21
(SCHWARTZ; DURRIVE, 2007) e da Ergonomia da Atividade
22
(GUÉRIN et al., 2001), ressalta-se que existe certo distanciamento entre os saberes prescritos e
os saberes que são construídos no desenvolvimento do trabalho; e também, entre o trabalho
prescrito e o trabalho realizado (o que os empregados com deficiência física, escolhidos como
sujeitos da pesquisa, efetivamente realizam em seus locais de trabalho, a partir das
renormalizações). De acordo com Guérin et al. (2001), a ergologia convida a tirar
consequências da distância inevitável entre o prescrito e o realizado, que marca a fundação da
ergonomia da atividade. Esse espaço que vai do prescrito ao realizado é marcado por
variabilidades e imprevistos nas situações de trabalho, bem como por saberes e valores aos
quais as pessoas recorrem ao lidar com tais variabilidades e imprevistos.
Conforme Schwartz (2000), toda atividade é afetada pela infiltração do pessoal, do
histórico, da experiência, dos saberes de cada um, adquiridos no meio particular de vida e de
trabalho. No que se refere aos saberes construídos, essa história define os diversos modos de
comportamento admissíveis no exercício de um trabalho, as variáveis aceitáveis, questionáveis
ou ultrapassadas na maneira de trabalhar e constitui uma memória que permite melhor afrontar
o curso dos acontecimentos nas diferentes situações de trabalho. Nas palavras de Sousa-e-Silva
21
Abordagem que busca apreender o trabalho como atividade humana, entendida como um momento de vida e de
saúde, que sintetiza, cruza e nutre tudo aquilo que pode se apresentar de maneira dual: corpo/espírito,
individual/coletivo, privado/público, imposto/desejado, dentre outros.
22
A ergonomia da atividade ou, ergonomia de língua francesa, se difere da ergonomia americana por não se
pautar exclusivamente em um trabalho sobre os postos de trabalho e os dispositivos técnicos, voltando-se para
as situações de trabalho e para o ser humano em atividade (ALVES, 2009, p. 55).
35
(2007, p. 03), “para ter sucesso em sua atividade, os profissionais mobilizam essa história,
modificando-a, refazendo-a e renovando-a sem cessar, pois ela constitui, ao mesmo tempo, a
memória viva do trabalho”. Para a ergologia, se a distância entre o prescrito e o realizado no
trabalho é inevitável, é nessa distância que se inscrevem as renormalizações. A própria
obediência às normas antecedentes é uma escolha.
Baseando-se em Guérin et al. (2001) e Oliveira (2005), considera-se que o trabalho é
composto pela prescrição (os objetivos, as metas e o que a organização oferece para a sua
execução tarefa) e pela maneira que o trabalhador executa a tarefa a ele determinada
atividade. Desta forma, têm-se:
Definição de Tarefa e de Atividade
Tarefa
Tipo, quantidade e qualidade da produção por unidade de tempo, junto aos meios
necessários para a sua realização, determinada a um posto de trabalho, a um
trabalhador ou a um grupo de trabalhadores. É constituída por:
Organização (condutas, métodos de trabalho, instruções);
Tudo o que o trabalhador tem que fazer e como deve fazer, junto aos
objetivos a serem atingidos, as especificações do resultado a obter
(normas de qualidade, quantidade, manutenção);
Os meios fornecidos (condições da matéria-prima, máquinas e
equipamentos, experiência e formação exigidos do trabalhador,
composição da equipe de trabalho);
Condições necessárias para a execução do trabalho (ambiente físico e
humano, tempo, ritmo, cadência da produção);
Resultado antecipado, fixado em condições determinadas.
Atividade
É o como a tarefa é executada é a própria realização da tarefa. Fruto da
integração entre:
Tarefa;
Ser humano que executa a tarefa (história de vida, experiência, formação,
cultura, estado de saúde física e mental, dentre outros).
É fruto da capacidade do trabalhador de decidir, por exemplo, quais fins e critérios
são mais ou menos valorizados, na execução da tarefa; como se relaciona com os
ambientes e por quais razões desenvolve esta ou aquela estratégia; como o
trabalhador estrutura temporalmente o seu trabalho. É, portanto, o resultado da
reelaboração e reorganização da tarefa, por parte do trabalhador.
Quadro 1: Definição de Tarefa e de Atividade.
Fonte: Adaptado de Oliveira (2005).
Para Schwartz (2000, p. 42), “a atividade não é somente reavaliação de instruções,
procedimentos e modos operatórios, mas também o retratamento à prova da experiência, dos
valores vindos de fora”. Sobre este aspecto, Oliveira (2005) destaca a complexidade como
36
principal característica da atividade humana e ressalta a importância de se verificarem as
diferentes visões sobre a mesma. Buscou-se, neste intuito, realizar a triangulação
23
.
Em uma situação de trabalho bem equilibrada, existem condições para que aconteçam
renormalizações, por parte dos trabalhadores. Nessas situações, segundo Oliveira (2005, p. 36),
“as chances de acontecer o adoecimento e o acidente do trabalhador durante o processo
produtivo são menores”. Mas nas condições de trabalho em que existem poucas possibilidades
de interferências dos trabalhadores e onde as suas autonomias não são reconhecidas, resta
pouca margem de manobra na execução da tarefa, principalmente quando surgem
variabilidades no processo. De acordo com este mesmo autor:
Não sendo permitida a interferência nos objetivos, metas, equipamentos e meios de
trabalho, resta ao trabalhador utilizar-se do que ainda lhe sobra algum domínio: o seu
próprio corpo. É com a alteração de suas posturas, com as torções de seus braços,
ombros e cintura e com a sua mente, que o trabalhador consegue vencer os
constrangimentos que lhe o impostos por esses postos de trabalho inadequadamente
projetados ou por essas organizações que não lhes reconhecem capacidades humana
ou de cidadania. As regulações acontecem individualmente, com a alocação de
movimentos e posturas pelos operadores, no posto de trabalho, como em vel de
regulações do próprio processo produtivo, pelos supervisores de produção e de
qualidade. Outros exemplos de regulações coletivas são as ações dos Sindicatos dos
Trabalhadores, da Inspeção do Trabalho, do Ministério Público e, hoje em dia, dos
consumidores (OLIVEIRA, 2005, p. 36-37).
Nesse sentido, considera-se que para conhecer a atividade de uma pessoa, é necessário
adentrar o local em que esta se desenvolve, confrontar as situações de trabalho, ir ao encontro do
que seja a atividade ali desenvolvida. Nessa perspectiva, Alves (2009) sugere que a atividade
deve ser vista como algo em movimento, composta pelo trabalho desejado; por normas que a
antecedem; e também por normas que se reconstroem na dinâmica interação entre: saberes
prescritos, o ser humano,
enquanto ser omnilateral
que constrói saberes a partir de suas
atividades, e trabalho realizado
que é sempre, em alguma medida, singular, não podendo ser
totalmente antecipado ou enquadrado.
A análise da atividade, nessa perspectiva, deve ser realizada junto aos sujeitos da pesquisa,
em
regime de cooperação. Necessita-se, portanto, d
a instauração de um diálogo que viabilize a
aproximação do meio em que se a atividade, o situar dessa atividade no tempo e no espo
em que ela acontece, e a melhor compreensão de como os sujeitos da pesquisa constroem e
reconstroem os seus trabalhos.
Para partir da aparência do objeto de estudo e chegar à sua essência adotou-se, como
procedimento de análise, algumas categorias, conforme as destacadas por Cury (1987):
23
Cf. subitem 4.2.
37
historicidade, hegemonia, práxis, totalidade, reprodução e, principalmente, contradição e
mediação. Justifica-se esta escolha na medida em que importa a desmistificação da aparência
dos fenômenos para chegar à sua essência, ao seu cerne, desvendando o mundo concreto, as leis
do fenômeno, descobrindo seu movimento interno, revelando, por trás da aparência, a essência.
Tendo sido explicitadas as categorias utilizadas nesta dissertação e alguns dos conceitos
advindos da ergologia, passa-se a explicar a utilização dos ingredientes da competência
(SCHWARTZ, 2000), no intuito de servirem como base para a análise dos dados obtidos com a
pesquisa de campo. Ressalta-se que a confrontação de tais dados levou em consideração a ideia
de Kosik (1976) de que as categorias servem de critério de seleção e organização da teoria e
dos fatos a serem investigados e que, a partir da finalidade da pesquisa, fornece-lhe o princípio
de sistematização que lhe conferirá sentido, cientificidade, rigor, importância.
Na análise dos dados, procurou-se considerar a situação como um todo: falas, ações,
gestos, hesitações, ênfases atribuídas às expressões e mesmo os silêncios, contribuíram para, junto
aos demais dados e as teorias, desencadear reflexões sobre as relações estabelecidas entre os
saberes prescritos e os construídos pelos sujeitos da pesquisa, em seus trabalhos.
Ressalva-se que o conteúdo dos documentos utilizados para composição das prescrições
do trabalho dos sujeitos da pesquisa foi estudado, analisado e utilizado durante todo o processo
de pesquisa em campo. No entanto, os documentos não foram transcritos nesta, em
cumprimento à exigência da empresa de se manter, ao máximo, o sigilo dos seus conteúdos.
Foram descritas apenas as partes indispensáveis ao entendimento desta dissertação, uma vez
que também não se tem o intuito de descrever o passo a passo do desenvolvimento de cada uma
das técnicas empregadas. Estas foram utilizadas para a obtenção dos dados da pesquisa e das
informações necessárias.
2.3 A Empresa Pesquisada
Considera-se que os elementos abordados neste subitem a
presentam peculiaridades que
devem ser conhecidas. Antes da descrição da organização do trabalho na empresa escolhida como
campo da pesquisa, fez-se uma breve contextualização sobre os caminhos da pesquisa.
Posteriormente, são apresentados aspectos gerais sobre a empresa e o seu quadro de
38
empregados, com base em informações fornecidas por informantes (grupos
a
,
b
,
c
,
d
)
24
.
2.3.1 Os Caminhos da Pesquisa – Aspectos Gerais
No intuito de ter como campo de pesquisa uma empresa que disponibilizasse os dados
necessários para a realização desta pesquisa, foram selecionadas, inicialmente, 3 possíveis
empresas. A primeira, do setor de mineração, foi preterida nos primeiros contatos, quando as
inúmeras imposições burocráticas e hierárquicas inviabilizaram a autorização para a coleta de
suas prescrições. A segunda, do setor supermercadista, concedeu autorização formal de
pesquisa e foi acompanhada entre os meses de março de 2009 e outubro de 2009. Esta se
constitui em uma rede de lojas, sendo destaque nas cidades em que atua. No mês de março de
2009, ela era formada por 19 lojas, distribuídas em 9 cidades de Minas Gerais. Tinha em seu
quadro efetivo cerca de 2.000 empregados. Em junho de 2009, havia 97 empregados com
deficiência contratados, dos quais 50 deles trabalhavam na cidade escolhida para realização da
pesquisa e 16 apresentavam a deficiência predefinida para o estudo.
Comercializava cerca de 11.000 itens de mercearia, básicos, perecíveis,
hortifrutigranjeiros, açougue, padaria, bazar, limpeza, perfumaria, entre outros. Alguns dos
fatores que motivaram a pré-escolha dessa empresa para a realização da pesquisa foram: ser
uma empresa destaque na área em que atua, com grandes perspectivas de crescimento; ter
registro de empregados com deficiência desde 1999; entre outros. Os fatores principais que
fizeram com que também fosse preterida foram: não aceitação da pesquisa por parte de seus
possíveis sujeitos e a inviabilização de dados importantes – prescrições.
A terceira empresa, escolhida como campo da pesquisa, situa-se no estado de Minas
Gerais. Atua no setor siderúrgico há mais de 50 anos e é considerada uma das maiores
produtoras de aço do país
25
. Além da usina sidergica, também integram o grupo no Brasil
duas subsidiárias: uma empresa mineradora e uma empresa florestal, responsáveis pelo
fornecimento de matéria-prima para a produção do aço minério de ferro e carvão vegetal,
respectivamente –, sendo este último usado em substituição ao coque, como termo-redutor, no
processo de fabricação. No âmbito das tecnologias organizacionais, a empresa introduziu,
dentre outros, o princípio da eliminação do desperdício, por meio do programa 5S e também
24
Cf. Introdução.
25
Caracterização fundamentada em documentos institucionais e em Maciel (2008).
39
com a adoção do
just-in-time
26
, definido por Humphrey (1990, p. 03) como “a produção da
quantidade certa, com a qualidade correta, no momento preciso em que foi requerida”.
Segundo informante (grupo
d
)
27
,
[...] o carvão produzido na florestal é transportado até a usina de forma racional e
planejada através do sistema
just-in-time
de agendamento de entrega, visando otimizar
os estoques de matéria-prima, além de reduzir significativamente o trânsito de
caminhões nas estradas e a movimentação no interior da usina (Informante grupo
d
).
É de origem europeia, e no ano 2000, passou a integrar uma
joint venture
28
com um
grupo também europeu, de nacionalidade distinta. Nessa época, o novo grupo passou a
controlar mais de 50% das ações da empresa, mas ainda havia grande participação acionária do
grupo
que controlava a empresa até então. Foi a partir desta gestão que brasileiros
passaram a
ocupar cargos de direção na empresa, anteriormente ocupados por executivos
estrangeiros. Muitas mudanças em relação à gestão e à cultura da empresa comaram a ser
efetivadas, tendência que se aprofundou no período seguinte, quando, em 2005, o grupo
majoritário adquiriu o controle acionário da
joint venture
.
Em época mais recente, ocorreu outra
joint venture
entre o grupo controlador e uma
empresa multinacional, também de origem distinta. A empresa em estudo tem participação
ativa na sua implantação
e administração.
A unidade do grupo, situada no Brasil, destaca-se como principal fabricante do seu
produto, no cenário nacional. O grupo se destaca também como um dos principais produtores
mundiais, no seu ramo de atuão.
A usina integrada ocupa uma área de aproximadamente 3 milhões de metros quadrados.
Segundo informante (grupo
d
), “é um dos complexos siderúrgicos mais modernos e bem
equipados do mundo, possuindo capacidade para produzir cerca de 600 mil toneladas de seu
produto por ano”. Composta por 2 altos-fornos, 1 aciaria, 2 laminações, 2 unidades de têmpera
e revenimento, 1 trefilaria, 1 planta de acabamento e 1 forja, c
alculavam, na época, que os
26
O
just-in-time
(JIT) visa produzir ou operar de acordo com os requisitos do cliente, sem desperdício,
imediatamente após o pedido. Algumas das técnicas diretamente associadas a este são as de redução do
tamanho do lote ou da remessa; força de trabalho flexível; trabalho à prova de erros; redução de tempo de
preparo; e contêineres padronizados. Algumas expressões são geralmente utilizadas para traduzir aspectos da
filosofia
just-in-time
: eliminação de estoques; eliminação de desperdícios; manufatura de fluxo contínuo, dentre
outros.
27
Com o intuito de preservar os informantes, foram utilizados, como recurso de anonimato, nesta dissertação,
letras diferenciadoras. Foram definidos quatro grupos de informantes. O grupo
d
se refere aos documentos
internos da empresa.
28
“Celebração de um contrato entre duas ou mais empresas, que se associam, criando ou não uma nova empresa
para realizar uma atividade econômica produtiva ou de serviços, com fins lucrativos” (MIRANDA; MALUF,
2009).
40
investimentos realizados na contínua modernização e diversificação na linha de produção
teriam ultrapassado o valor de 3,5 bilhões de dólares.
A empresa possuía, em setembro de 2009,
3.868 empregados próprios, distribuídos
entre a usina, a empresa florestal e a empresa mineradora.
Ligada à empresa, existe também
uma fundação, responsável por
diversos projetos sociais das empresas do grupo, nas áreas de
saúde, educação, cultura, esporte e lazer. Seu maior objetivo, segundo informante (grupo
c
)
29
,
[...] volta-se à qualidade de vida de seus empregados e familiares. Responde pelo
plano de saúde dos empregados e seus dependentes por meio da gestão da
operadora do plano de sde, parceira da empresa, e também possui uma empresa
responsável pela alimentação e gestão dos refeitórios dentro da usina. Realiza projetos
voltados para a comunidade, principalmente nos entornos das empresas do grupo, no
Brasil (Informante grupo
c
).
A empresa funciona durante 24 horas, em três turnos: o turno central ou horário
administrativo, de 7:45 às 17:53; o horário denominado
zero hora
, que compreende o período
entre 23:45 e 08:15; e o horário de 15:45 a 00:15. Na área de produção, os trabalhos são
realizados em turnos rotativos variáveis de acordo com o setor e o cargo ocupado. Embora
mantenham o mesmo horário de trabalho, possuem dias de folga alternados folgas flutuantes
de tipos diversos, tais como: 6X2/5X2 ou 5X2/6X1, o que significa que trabalham 6 dias,
folgam 2 / trabalham 5 dias, folgam 2; ou trabalham 5 dias, folgam 2 / trabalham 6 dias, folgam
1. Com tais folgas flutuantes, existem aqueles empregados que raramente tiram folga aos finais
de semana, passando a denominá-los, por vezes, de “meio final de semana”.
A empresa é enquadrada no grau máximo de riscos
grau IV
, classificação que é de
responsabilidade do Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT). O
objetivo deste serviço, segundo Luz (2009, p. 01), é “promover a saúde e proteger a integridade
do trabalhador no local de trabalho”
.
Portanto, a avaliação dos estabelecimentos é realizada de
acordo com o grau de risco da atividade principal e o número de trabalhadores. Esse serviço faz
parte do sistema de gestão da empresa, utilizado para desenvolver e implementar a Segurança e
Saúde do Trabalho (SST) e para gerenciar os seus riscos. Como a empresa é enquadrada no
grau de risco IV, diariamente são discutidos temas envolvendo o maior valor implícito da
empresa, ou seja, o da segurança. Em face dos inúmeros fatores vulneráveis, grande ênfase é
dada à análise comportamental dos empregados, assim como às situações e condições
inseguras.
29
Com o intuito de preservar os informantes, foram utilizados, como recurso de anonimato, nesta dissertação,
letras diferenciadoras. Foram definidos quatro grupos de informantes. O grupo
c
se refere aos informativos
publicados pela empresa.
41
Um diferencial desta empresa, diante das demais procuradas para a realização da
pesquisa, é o fato de desenvolver programas específicos voltados para a inclusão de pessoas
com deficiência e para a reabilitação de seus profissionais. Supõe-se que a elaboração desses
programas tenham se dado principalmente em cumprimento à Lei nº. 8.213/1991. Acredita-se
que o programa voltado para a reabilitação profissional:
a)
Apresente grande ênfase na empresa em virtude do elevado grau de riscos e número
de acidentados;
b)
Vise manter as experiências e os saberes adquiridos no cotidiano de trabalho, pelos
empregados afastados, ainda que no desempenho de outras funções;
c)
Objetive a manutenção da imagem de empresa socialmente responsável, recebendo,
inclusive, premiações pelos programas.
As características descritas motivaram a escolha dessa empresa como campo de
pesquisa, junto ao fato de apresentar maior mero de empregados, inclusive com o tipo de
deficiência predefinido para o estudo deficiência física –, o que consequentemente viabilizou
a escolha dos possíveis sujeitos da pesquisa em um universo mais amplo de possibilidades. Tal
escolha prendeu-se ainda à importância do setor no cenário nacional, um dos mais tradicionais
e
competitivos do país, de atuação crescente em mercados mundiais, além de constituir-se
como base para diversos outros tipos de indústria, como construção civil, automobilística,
naval e petrolífera. Baseou-se também no entendimento de que esta é uma empresa
representante ou característica do setor em que atua, em termos de longevidade no mercado,
natureza do controle acionário, produtividade, lucratividade, inserção no mercado mundial e
exposição a desafios competitivos crescentes. O cririo da tipicidade é considerado como
fundamento lógico para a definição de casos únicos por autores como Yin (2005) e Quivy e
Campenhoudt (1998). Outro fator determinante nesta escolha relacionou-se à maior facilidade de
acesso da pesquisadora a esta empresa, tendo boa receptividade da pesquisa, sendo, portanto,
uma escolha intencional. Em vista disso, soma-se o critério de acessibilidade, segundo
definição de Vergara (2000).
42
2.3.2 Dados Relativos ao Quadro de Empregados
No mês de setembro de 2009, a empresa apresentava em seu quadro de empregados
efetivos 3.868 pessoas. Destes, 72% eram mensalistas, o que corresponde a 2.785 empregados,
e 28%, ou 1.083, eram horistas. Do total de empregados efetivos, 171, ou 4%, estavam
enquadrados, pela empresa, como PNE (Pessoas com Necessidades Especiais). A empresa
subdividia este número de empregados pelo tipo de deficiência apresentada, conforme ilustra o
Gráfico 1.
Gráfico 1 – Empregados Efetivos – PNE – Tipos de Deficiência.
Fonte: Dados da pesquisa (2009).
A Tabela 1 apresenta o número de empregados efetivos com deficiência física, por
gênero.
43
Tabela 1
Empregados Efetivos com Deficiência Física – Gênero.
Empregados Efetivos com Deficiência Física – Gênero
Gênero N %
Masculino 44 85
Feminino 8 15
Total 52 100
Fonte: Dados da pesquisa (2009).
A Tabela 2 apresenta a faixa etária em que se encontram os empregados efetivos com
deficiência física.
Tabela 2
Empregados Efetivos com Deficiência Física – Faixa Etária.
Empregados Efetivos com Deficiência Física – Faixa Etária
Faixa Etária N %
21–30 Anos 17 33
31–40 Anos 24 46
41–50 Anos 11 21
Total 52 100
Fonte: Dados da pesquisa (2009).
Outro dado que se faz necessário apresentar se refere às datas de admissão dos
empregados com deficiência física, na empresa, conforme mostra a Tabela 3, a seguir.
Tabela 3
Empregados Efetivos com Deficiência Física – Data de Admissão.
Empregados Efetivos com Deficiência Física –
Data de Admissão na Empresa
Mês/Ano N %
Abril/2004 14 27
Junho/2004 36 69
Agosto/2004 1 2
Agosto/2008 1 2
Fonte: Dados da pesquisa (2009).
44
2.3.3 A Organização do Trabalho
Este subitem foi elaborado no intuito de apresentar os aspectos organizacionais
observados na empresa, campo da pesquisa. De acordo com Teixeira (2005), compreende-se a
organização do trabalho como o processo de estabelecer relações entre as pessoas e os recursos
disponíveis, tendo em vista os objetivos que a empresa, como um todo, se propõe a atingir.
Desta forma, tem-se:
Figura 1: Organização do Trabalho.
Fonte: Elaboração da autora (2010).
Onde, as funções correspondem a um tipo de atividade laboral que pode ser identificada
e se distingue de qualquer outra, e a departamentalização é o processo que consiste em agrupar
funções semelhantes (ou relacionadas) ou atividades principais em unidades de gestão. De
acordo com Teixeira (2005), dentre as razões que podem levar as empresas a procederem à
departamentalização das atividades ou funções, estão o volume de trabalho; o agrupamento de
funções similares; a separação de funções para evitar conflitos de interesses; as necessidades de
controle de funções não semelhantes; e, mais especialmente, o aumento da produtividade e, por
conseguinte, do lucro. Ainda segundo Teixeira (2005), entre os tipos mais frequentes de
departamentalização, destacam-se por: funções; produtos; clientes; áreas geográficas; e as
formas combinadas de departamentalização. Na empresa em questão, a departamentalização
acontece com formas combinadas, destacando-se principalmente as por funções, produto e por
área geográfica.
Ao departamentalizar a empresa, delegam-se, entre outras coisas, poderes, autoridade e
responsabilidades. O que pode levar os gestores à delegação de poderes são a rapidez na
Objetivos da Empresa
Funções/Tipo de atividades
Departamentalização
45
tomada de decisões, o que evita maior burocratização gerada pelas relações hierárquicas; o fato
de permitir o treino e o desenvolvimento pessoal de gestores, na prática; o aumento do nível de
motivação, à medida em que as pessoas a quem são delegadas responsabilidades as encaram
como confiança nas suas capacidades e se esforçam em corresponder à confiança depositada;
conduzir a decisões e a trabalhos mais assertivos; e permite desempenhar tarefas e funções mais
complexas (TEIXEIRA, 2005).
Baseando-se no modelo hierárquico, a empresa apresenta como estrutura
organizacional
30
duas diretorias, uma financeira e uma de produção. Toda parte administrativa
desta empresa está subordinada à diretoria financeira e as áreas de processo produtivo
encontram-se subordinadas à diretoria de produção. Essas diretorias, por sua vez, estão
subordinadas à diretoria geral do grupo. A Figura 2 apresenta, de forma resumida, o diagrama
organizacional.
Figura 2 – Diagrama Organizacional.
Fonte: Dados da pesquisa (2009).
30
De acordo com Teixeira (2005), a estrutura organizacional diz do conjunto de relações formais entre os grupos e
os indivíduos que constituem a organização. Define as funções de cada unidade e os modos de colaboração
entre todas, e é normalmente representada por meio de diagrama organizacional, organigrama ou organograma.
46
Por se tratar de uma empresa de grande porte e pela forma como é organizada, foi
possível identificar características de 3 tipos de estruturas, baseadas em Teixeira (2005):
a)
Estrutura funcional: baseada na divisão do trabalho e delegação de autoridade e
responsabilidade a partir de funções clássicas da gestão – financeira, produção,
comercial, pessoal, entre outras –, onde cada um dos departamentos é chefiado por
um gestor.
b)
Estrutura divisionária: a forma de organização apoiada na divisão das tarefas com
base na diversidade de produtos, serviços, mercados ou processos da empresa. Cada
divisão tem os seus próprios especialistas que, geralmente, estão organizados em
departamentos. As divisões, cada uma delas com os seus próprios produtos e
serviços, são relativamente independentes.
c)
Estrutura em rede: constituída por uma rie de fábricas, com certa independência.
São ligadas umas às outras, por meio do Sistema Integrado de Gestão (SIG)
31
, do
que resulta o planejamento da produção.
O controle do tempo é realizado, primeiramente, pelo cartão individual de ponto.
também certo controle negociável do período de almoço, que é de uma hora. Este controle
aparentemente se como forma de organizar as áreas para que a produção não pare. O
controle do tempo, no desenvolvimento das tarefas, varia de acordo com as áreas, as funções,
as demandas dos clientes internos e externos, dentre outras.
No caso da empresa em estudo, conforme é possível visualizar na Figura 2, cada
subordinado tem um superior a quem reportar, no caso, o seu superior imediato. Embora a
cadeia de comando hierárquica seja a predominante, a unidade de comando dentro das fábricas
permite uma melhor coordenação e entendimento do que se espera de cada pessoa em sua
função, visando a evitar possíveis conflitos com a paridade entre autoridade e responsabilidade.
A gestão do trabalho na empresa mostra-se descentralizada. Verifica-se um elevado
grau de delegação da autoridade pelos gestores de nível superior aos gestores de nível inferior.
No complexo siderúrgico é como se existissem várias fábricas dentro de uma mesma
31
Benac, Mendes e Santos (2005, p. 01) definem o SIG como “uma ferramenta de tecnologia da informação
concebida para integrar os processos empresariais”. Para tanto, todas as transações realizadas o registradas e
armazenadas, de forma centralizada, para que os dados extraídos do sistema possam ser transformados em
informações rápidas, precisas e adequadas.
47
fábrica, existindo até relações de clientes internos, onde uma fábrica produz matéria-prima para
outras. A gestão de uma fábrica interna, apesar de estar subordinada às diretorias gerais de
produção e financeira, são administradas com certa autonomia e independência. Algumas
dessas fábricas têm foco no cliente interno, e todas visam ao cumprimento das metas da
empresa e o cliente final. Por se tratar de uma gestão descentralizada, é necessário que as
informações geradas pelas fábricas sejam unificadas. Com o objetivo de dar visão da totalidade
da empresa para a alta diretoria, servindo como ferramenta de apoio para tomadas de decisões,
bem como para tornar corporativas as informações, a unificação é realizada a partir do SIG.
De acordo com informante (grupo
d
), o Sistema Integrado de Gestão visa à melhoria
contínua de todos os processos desempenhados. Objetiva planejar, controlar e fornecer suporte
a todos os processos operacionais, produtivos, administrativos e comerciais da empresa. Visa
integrar todas as operações dentro da organização, eliminando o retrabalho e inconsistência das
informações, em virtude da existência de diferentes sistemas computacionais, com bases de
dados distintas. Elimina também as interfaces necessárias à comunicação dos diversos sistemas,
anteriormente utilizados pela empresa, e facilita a obtenção de informações gerenciais.
Segundo outro informante (grupo
d
), “no ano 2000, com a necessidade de integrar os
sistemas corporativos e especialistas foi implantado, como planejamento estratégico, o SIG ou
Enterprise Resource Planning
(ERP)”. Este sistema de gestão visa principalmente à garantia de
cumprimento das metas e à padronização de suas práticas e de seus processos. Segundo o
mesmo informante, tal implantação trouxe para a empresa “maior sinergia de esforços e a
adoção de melhores práticas de gestão”. Resumindo, consiste em um conjunto de partes
interligadas para atingir um objetivo específico, que é produzir resultados.
O próprio SIG fornece ferramentas para o monitoramento de desempenho e para a
verificação da correta aplicação de suas diretrizes. São elas: o
Total Quality Management
(TQM
32
) e o Modelo de Gerenciamento
33
. Este corresponde a uma ferramenta que estabelece o
modelo de gerenciamento para todas as unidades da empresa, em nível mundial. Por meio do
programa, a empresa institui os comitês diretivos e os grupos de melhoria contínua, que são
responsáveis pela implementação do planejamento estratégico das empresas, respeitando os
requisitos normativos dos sistemas de gestão. Além dessas ferramentas, a empresa desenvolve
um programa que estabelece metas de redução de custo, controle de formação de preços e
aumento da rentabilidade por meio do foco em produtos de maior valor agregado. Esse
32
O TQM, Programa de Qualidade Total (PQT) ou Gestão da Qualidade Total é a ferramenta que permite que os
objetivos estratégicos da empresa sejam transformados em planos de ação, pelas áreas operacionais.
33
No intuito de preservar o nome que a empresa atribui, de forma particular a esta ferramenta, optou-se por
modificá-lo, nesta dissertação.
48
programa indica mecanismos de controle dos planos de economia, de retorno dos investimentos
e de acompanhamento das ações de gerenciamento de custos e preços.
De acordo com Guimarães (2006b), por meio dos Círculos de Controle da Qualidade
(CCQ)
34
, objetiva-se o envolvimento do trabalhador no processo produtivo, estimulando formas
de organização do trabalho e de tomadas de decisão que, supostamente, aumentariam o saber e
a satisfação dos trabalhadores. Seus princípios norteadores são marcados pela presença de um
forte conteúdo ideológico, traduzido na exigência de atitudes e valores fundamentados em
ideias que remetem à legitimidade, cooperação, harmonia. Esse conteúdo ideológico
desenvolve um sentimento de pertencimento, comprometimento e orgulho por fazer parte da
empresa, pelos trabalhadores, sem ganhos materiais. Atinge-se, assim, não somente o aspecto
objetivo, mas também o subjetivo – sua consciência de classe, sua organização e os seus
valores (GUIMARÃES, 2006c).
A empresa não se utiliza do
kanban
35
, empregando, para o controle da corrida
36
, um
número gravado no próprio produto. Esse número remete a dados importantes no sistema, tais
como o tipo de aço com que foi produzido, e serve de referência durante todo o processo de
produção.
Além do Modelo de Gestão, do TQM e das estratégias supracitadas, a empresa
desenvolve outros programas, todos com objetivos bem definidos e com a efetiva participação
dos seus empregados. Segundo informante (grupo
b
)
37
,
Vários dos programas assemelham-se aos de uma empresa, fundada por um francês,
reconhecida como líder mundial em segurança industrial, saúde ocupacional e
proteção ao meio ambiente, como parte integrante de sua excelência nos negócios. [...]
Esta empresa tem ainda como um dos pontos considerados fortes a política de
interação com a comunidade (Informante grupo
b
).
Destacam-se aqui os que a pesquisadora pôde, de alguma forma, acompanhar durante a
pesquisa de campo e que foram considerados mais relevantes às reflexões e análises da
pesquisa. Ressalta-se que, no intuito de preservar o nome original dos programas, estes foram
substituídos por nomes afins, tanto na exposição que se segue quanto nos depoimentos dos
sujeitos da pesquisa e demais grupos de informantes, ao longo desta dissertação.
34
Ferramenta de gestão, junto ao
Just-in-time
,
Kaizen,
dentre outras (CATTANI; HOLZMANN, 2006).
35
De acordo com Franzoi (2006), o
kanban
“constitui-se de cartões que indicam a quantidade de matéria-prima
necessária ou de peças intermediárias a serem produzidas para se cumprir a estação de trabalho seguinte. [...]
funciona como chamada para a quantidade a ser produzida pelas unidades anteriores, fazendo com que a
produção seja acionada do fim para o início” (FRANZOI, 2006, p. 173).
36
Produção de aço por batelada (TAYLOR, 2000).
37
Com o intuito de preservar os informantes, foram utilizados, como recurso de anonimato, nesta dissertação,
letras diferenciadoras. Foram definidos quatro grupos de informantes. O grupo
b
se refere aos demais
empregados da empresa pesquisada – retirando os sujeitos da pesquisa, que constam de grupo diferente.
49
Aplicação da Melhoria Contínua:
com intuito de aplicar a melhoria contínua, grupos
são formados e se reúnem periodicamente. Ferramentas de soluções de problemas são
utilizadas para propor ações de melhorias nos indicadores estratégicos da empresa, como:
segurança, meio ambiente, qualidade, custos, produtividade e satisfação de clientes. Segundo
informante (grupo
c
), “a principal fonte de identificação de oportunidades de melhoria surge
com o plano TQM”. Os grupos para desenvolvimento da melhoria contínua são formalizados
junto à superintendência de controle e ferramenta da qualidade. As etapas percorridas para
análise e solução de problemas desses grupos são: definir, medir, analisar, implementar,
verificar e padronizar. Por meio dos grupos de melhoria contínua, os empregados participam da
aplicação das ferramentas de gestão, do cumprimento do planejamento estratégico e do
acompanhamento dos indicadores de performance. Este é o principal instrumento de
implementação da melhoria contínua dos processos operacionais da empresa, que têm como
objetivos reduzir custos, garantir a qualidade dos produtos e assegurar a segurança no ambiente
de trabalho.
Comunicação em Grupo:
de acordo com um informante (grupo
d
), este programa
estabelece diretrizes para assegurar que informações úteis de Segurança e Saúde Ocupacional
sejam comunicadas aos empregados e demais partes interessadas, bem como para ouvi-los
sobre esses assuntos. Aplica-se a todas as áreas ligadas ao processo industrial. As reuniões para
comunicações em grupo são encontros coordenados pela gerência de primeira linha
38
, com os
seus subordinados. Os temas são definidos nas reuniões de segurança da superintendência ou
gerência e podem ser baseados em relatórios de investigações de acidentes e incidentes,
inspeções planejadas e procedimentos. Também podem ser sugeridos pelos setores de
Segurança do Trabalho ou Medicina do Trabalho, ou definidos nas reuniões de segurança da
superintendência, reuniões da alta administração, Comissão Interna de Prevenção de Acidentes
(CIPA) ou pelos próprios empregados. Outras informações do Sistema Integrado de Gestão
podem ser divulgadas nessas reuniões, desde que não prejudiquem o foco principal.
Nas reuniões de segurança são definidos os gerentes de primeira linha que devem
desenvolver os temas escolhidos. São pessoas treinadas e preparadas para o desempenho dessa
tarefa.
As reuniões podem ser diárias, semanais, quinzenais ou mensais, desde que o tempo
total, no mês, dedicado para comunicações em grupo não seja inferior a 40 minutos por
empregado, e pelo menos 80% do pessoal da área participe. Um informante (grupo
d
) destaca a
38
Esta gerência engloba engenheiros, supervisores, encarregados, líderes, técnicos e outros cargos com funções de
liderança.
50
importância da participação do superintendente ou do gerente do setor, quando possível, para
que estes “avaliem e mostrem os seus comprometimentos”. As reuniões são registradas no
Formulário Registro do Treinamento, no SIG. Assuntos pendentes são acompanhados em
reuniões de segurança. A gerência de primeira linha procura manter informados os empregados,
sobre as providências tomadas. Segundo informante (grupo
b
), esse programa
[...] é uma prática ao mesmo tempo preventiva e defensiva por parte da empresa, onde
ela oferece e mostra oferecer os equipamentos necessários, treina e mostra que treina a
todos os empregados. Portanto, se não utiliza EPI ou outro equipamento de forma
adequada, é porque não quer e não porque não tinha acesso ou não sabia como usar
(Informante grupo
b
).
Portanto, juridicamente falando, ao acontecer um acidente, a empresa pode justificar e
comprovar, por meio das listas de presença, principalmente à
International Organization for
Standardization
(ISO
39
), que os empregados são treinados, todos têm acesso aos
Equipamentos
de Proteção Individual (EPI), de uso obrigatório na empresa, e que devem ser utilizados de
acordo com as necessidades de cada área.
Programa 5S
: segundo seus princípios, este programa “busca melhorar a rotina de
trabalho por intermédio da conscientização com relação à ordem, limpeza, saúde e
autodisciplina nos postos de trabalho”. Este programa tem um papel destacado na reelaboração
contínua dos valores que são entendidos como constitutivos da cultura organizacional da
empresa e, por conseguinte, norteadores do perfil de trabalhador que deve ser desenvolvido no
decorrer da formação profissional. De acordo com Barbosa (2009, p. 05), “o 5S contribui
significativamente para a padronização de comportamento dos trabalhadores da empresa”.
Programa de Inclusão de Pessoas com Deficiência no Trabalho:
segundo informante
(grupo
c
), o objetivo deste programa é “possibilitar a inserção da pessoa com deficiência,
promovendo seu desenvolvimento profissional através do reconhecimento do seu potencial e
talento”.
Na época de sua elaboração, em 2002, a empresa contava com 4.265 empregados
efetivos, sua meta era ter 213 empregados com deficiência habilitados ou reabilitados
contratados. O diagnóstico na empresa foi realizado por um centro de integração, instituição
que oferece cursos profissionalizantes para pessoas com deficiência. Segundo informante
(grupo
d
), representantes desta instituição avaliaram os postos de trabalho, fazendo visitas às
39
A
International Organization for Standardization
ou Organização Internacional de Padronização é a maior
instituição no desenvolvimento e na concessão de padrões técnicos. É uma organização o-governamental,
estabelecida em 1946 para desenvolver padrões mundiais de promoção do crescimento equitativo do comércio
internacional. Os representantes máximos oficiais da ISO, no Brasil são o Instituto Nacional de Metrologia,
Normalização e Qualidade Industrial (INMETRO) e a ABNT.
51
áreas, após estudarem os documentos que descrevem os cargos. Foram realizadas palestras de
sensibilização, com jogos e dinâmicas de grupo, objetivando refletir sobre o processo de
inclusão e vencer as barreiras atitudinais. Algumas mudanças no ambiente de trabalho foram
feitas a partir de projetos planejados de acordo com as demandas mais urgentes na época, tais
como: construção de rampas, de banheiros adaptados e colocação de corrimãos de escadas. A
contratação dos empregados com deficiência se deu, segundo este mesmo informante, “a partir
de um mutirão para recrutamento e seleção. Indicações de empregados da empresa também
foram aceitas e avaliadas”. A comprovação das deficiências, bem como das condições das
pessoas, aconteceram por meio de laudo médico, emitido pelo médico do trabalho da empresa
ou outro médico, atestando enquadramento legal do(a) empregado(a) para integrar a cota, de
acordo com as definições estabelecidas na Convenção nº. 159 da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), Parte I, art. 1; Decreto nº. 3.298/1999, arts. 3º. e 4º., com as alterações dadas
pelo art. 70 do Decreto nº. 5.296/2004. Este laudo especificava o tipo de deficiência e
necessitou-se de autorização expressa do(a) empregado(a) para ser utilizado pela empresa,
tornando pública a sua condição.
Programa de Participação Acionária
: segundo informante (grupo
c
), o programa tem
como objetivos principais: “possibilitar que os empregados se beneficiem, como investidores,
da performance das ações; reforçar, entre os empregados, o sentimento de pertencer ao grupo; e
aumentar o percentual do capital do grupo controlado por seus empregados”.
Nota-se que a
própria empresa explicita seus interesses em tornar os seus empregados acionistas do grupo,
visando motivá-los e assim obter melhores resultados.
Programa de Prevenção de Acidentes:
este programa utiliza uma metodologia
bastante semelhante à da proposta desta pesquisa, mas, ainda que os objetivos também sejam
parecidos, os focos são diferentes. O programa tem como princípios: observar, pensar e agir.
Objetiva levar alguns empregados a observarem a realização do trabalho de outros, os seus
comportamentos, condições e situações de risco, a refletirem juntos sobre o observado, e a agir
conforme conclusão da conversa. Ao mesmo tempo em que incentiva a observação dos pontos
positivos, durante a realização do trabalho, incentiva também a identificação e reflexão dos
pontos negativos.
Programa de Reabilitação Profissional:
segundo informante (grupo
c
), este programa
objetiva “reabilitar o empregado, integrando-o de forma equilibrada e harmônica, respeitando
suas diferenças e limitações, proporcionando impactos em todos os sistemas e promovendo
melhores condições de vida”. Desde 2002, segundo informante (grupo
d
), a reabilitação
profissional vem ocorrendo da seguinte forma: o pedido de reabilitação é enviado pelo
Instituto
52
Nacional do Seguro Social (INSS) ou parte de demanda interna; a definição do novo posto
de trabalho; treinamentos são realizados durante alguns meses na nova função; o certificado de
reabilitação profissional é emitido pela empresa, junto ao INSS; o acompanhamento do
empregado é realizado periodicamente por equipe especializada da empresa; são realizados
também encontros para discussões de temas diversos, abrangendo código de ética, saúde e
segurança.
Programa de Relacionamento Interpessoal:
este programa foi elaborado em 2002.
Visa a uma alternativa de relação, comunicação, negociação e decisão. Busca também, segundo
informante (grupo
c
), “transpassar as relações de papéis e hierárquicas, firmando-se na relação
pessoal”. Neste programa, as relações exigentes são consideradas prioritárias e pressupõem o
reconhecimento do outro enquanto diverso, enquanto alteridade. De acordo com o mesmo
informante,
O autoconhecimento, a humildade, a simplicidade, a autonomia e, sobretudo, a
soberania, possível a partir da liberdade e da independência, devem ser assumidas
pelas pessoas como valor e ação efetiva. Requer consideração e conscncia de si e
do outro, evitando, assim, automatismos, conveões e preconceitos nas relações e
tomadas de decisão. Busca sustentar-se na cooperação, sendo entendida também como
meio que possibilita e catalisa a criatividade e a inovação, mediada pela cooperação
(Informante grupo
c
).
De acordo com este programa, o comportamento diante dos colegas de trabalho, bem como
para com todos os envolvidos clientes, gerência, fornecedores deve ser baseado em seus
princípios.
Programa de Sugestões:
programa que incentiva a participação dos empregados em
melhorias nos processos produtivos. É o meio pelo qual as ideias individuais são analisadas e
implementadas, compondo as atividades de cumprimento das metas da empresa. Bonificações
são concedidas aos empregados que colaboram com as ideias efetivadas.
Reuniões Diárias de Segurança
: diariamente, antes de iniciarem seus trabalhos,
empregados das áreas se reúnem com o intuito de discutirem temas relacionados à segurança no
trabalho. Os temas são diversificados, e cada área pode optar pelo tema. Percebeu-se que,
mesmo nas áreas onde os facilitadores da segurança elaboravam cartilhas com possíveis temas
diários, os responsáveis pelo programa priorizavam discutir temas relacionados aos
comportamentos e/ou condições inseguras que estavam acontecendo no momento ou que eram
mais frequentes naquelas áreas.
53
Além destes, destacam-se: o programa que visa à preparação para a aposentadoria; o
programa que objetiva facilitar a comunicação, por meio de quadros com informações
corporativas; e o programa para promoção da integração, da saúde e do comportamento seguro.
54
3 DEFICIÊNCIA, TRABALHO E TÉCNICAS DE CAPTAÇÃO DE SABERES:
ASPECTOS CONCEITUAIS E HISTÓRICOS
Neste capítulo serão discutidas algumas questões teóricas que se colocam a partir das
seguintes indagações: Quem são as pessoas com deficiência física? Como elas foram
denominadas e tratadas ao longo da história da humanidade? De que forma a identidade dessas
pessoas, enquanto pessoas com deficiência são influenciadas pelo sistema vigente e por seus
modelos organizacionais?
3.1 A (D)Eficiente História das Pessoas com (D)Eficiência
3.1.1 Denominações e Formas de Tratamento
A história das pessoas com deficiência é permeada pelo que Carmo (1989) identificou
em sua tese: a sociedade as criam, as “recuperame as discriminam. A ideia que se tem sobre
deficiência e, mais especialmente, sobre pessoas com deficiência, modifica-se historicamente, à
medida que as condições sociais são alteradas pela própria ação humana, gerando novas
necessidades na sua relação com o meio social. É possível formular uma análise desta
condição, no âmbito do modelo de produção e de organização vigente, buscando a
compreensão dos mecanismos socialmente construídos, ao longo dos tempos, para identificar e
assumir posições diante das diferenças, ou dos que simplesmente não atendem às exigências de
seu tempo.
Objetiva-se, pois, refletir neste subitem, os termos utilizados para se referir às pessoas
com deficiência e como estes refletem pensamentos e ações, como efeitos no âmbito social.
Acredita-se que a forma de tratamento deferido às pessoas com deficiência, como são
designadas e tratadas, refletem os pontos de vista, os valores e mesmo os preconceitos sociais,
pois, como afirmaram Austin (apud CHARAUDEAU, 2008, p. 73): “as palavras não apenas
significam, mas também fazem coisas”, e Charaudeau (2008, p. 74): “a linguagem é um meio
de representação do pensamento e da sociabilidade”. Portanto, entende-se que as concepções de
55
deficiência são modos de pensamento, os quais se estruturam a partir de matrizes de
interpretação
40
predominantes e que refletem ações e comportamentos sociais.
Para a abordagem do tema proposto neste subitem, considera-se prudente fazer recortes.
Ainda que concordando com a premissa de que todo recorte pressupõe, necessariamente,
escolha, e que esta é sempre sujeita a contestação, optou-se por utilizar a reconstrução histórica
como auxílio à compreensão das formas predominantes de conceituações e tratamentos das
deficiências. Tendo-se como base de interpretação social a história, acredita-se ser possível
certa visão de totalidade. E, por meio deste recurso, delinear a matriz interpretativa
espiritual/religiosa, que colaborou para moldar e legitimar a distinção das pessoas com
deficiência.
A opção pela análise histórica se deve à possibilidade de retirar a questão da deficiência
de uma perspectiva baseada em estereótipos e recolocá-la na dimensão das relações, em que a
deficiência é revestida de significações específicas. A escolha da matriz interpretativa
espiritual/religiosa se deve à sua relevância histórica, na medida em que se propõe estudar as
denominações e tratamentos dados às pessoas com deficiência. Para Freitas e Marques (2007a),
a matriz da deficiência como fenômeno espiritual advém da visão que prevaleceu durante
séculos na sociedade, a de que as deficiências teriam origens metafísicas. Acreditava-se que as
deficiências advinham de “manifestação de desejos ou castigos divinos, gerando a segregação e
contribuindo para o surgimento de sentimentos de caridade em relação às pessoas com
deficiência” (FREITAS; MARQUES, 2007a, p. 61).
As visões, opiniões e formas de tratamento dispensadas às pessoas com deficiência, ao
longo da história, são distintas e polêmicas. O “raro”, o “deficiente”, o “excepcional” sempre
chamou a atenção do ser humano (BIANCHETTI, 1998; JANNUZZI, 2004; SASSAKI, 2005;
GUGEL, 2007; FREITAS, MARQUES, 2009). Na tentativa de entender as diferenças, a
humanidade buscou as mais diversas explicações. Na pré-história, por exemplo,
[...] o homem primitivo praticava a trepanação, abertura de um orifício no crânio,
realizado para permitir que espíritos malignos escapassem do corpo. É de supor,
portanto, que o homem pré-histórico tivesse uma concepção demonológica da
natureza e a origem dos desvios mentais (TELFORD, 1976, p. 21).
40
As matrizes de interpretação o modelos de interpretações sociais acerca da deficiência, destacadas por Freitas
e Marques (2007b), como tendências no tratamento das pessoas com deficiência, ao longo do tempo. São como
instrumentos intelectuais, utilizados para compreender determinada realidade. Apresentam diferentes origens
históricas e são formas de interpretação da deficiência ainda presentes na contemporaneidade. Podem ser
identificadas por meio de seus modelos explicativos sobre a deficiência e de seu impacto na inserção das
pessoas com deficiência.
56
De acordo com Telford (1976), os filósofos gregos deram uma importante contribuição
ao serem, provavelmente, os primeiros a considerarem a mente e seu funcionamento, por meio
de uma concepção naturalista. É ainda na Antiguidade clássica que a eliminação das pessoas
com deficiência intelectual ou com doença mental foi justificada, de acordo com as exigências
sociais da época. As diferenças entre as pessoas, assim como as expectativas do grupo social
em relação aos seus membros, tornaram-se mais claras. Desde cedo, fazia-se necessário
preparar as crianças para que, no futuro, exercessem um determinado papel na sociedade. À
medida que algumas se mostravam incapazes de satisfazer as necessidades sociais, eram
excluídas, uma vez que, com suas diferenças, poderiam significar uma ameaça à sociedade.
Destaca-se, no parágrafo seguinte, a forma com que a separação feita entre as crianças
consideradas saudáveis e as consideradas doentes, era justificada.
Nós matamos os es danados, os touros indomáveis, degolamos as ovelhas doentes
com medo que infectem o rebanho, asfixiamos os recém-nascidos mal constituídos;
mesmo as crianças, se forem débeis ou anormais, nós as afogamos; o se trata de
ódio, mas da razão que nos convida a separar das partes sãs aqueles que podem
corrompê-las (SÊNECA apud MISÈS, 1977, p. 13).
Esse tipo de justificativa modificou-se de acordo com o contexto histórico. À medida
que o Cristianismo se difundia, ocorriam profundas mudanças na forma de encarar as pessoas
com deficiência. Elas passaram a ser reconhecidas como seres possuidores de alma e, então,
provocar sua morte passou a ser considerado pecado. Além disso, a caridade deveria ser
praticada indiscriminadamente, pois todos os seres humanos eram filhos de Deus, criados à sua
imagem e semelhança e, ajudá-los, era como se estivessem ajudando o próprio Deus (SÃO
MÁXIMO, 2003).
Essa nova visão trouxe, no entanto, uma profunda contradição que parece ter sido
identificada por Santo Agostinho (354-430 d.C.), provavelmente o primeiro autor cristão a
escrever sobre o tema. Para ele, as pessoas com deficiência estavam, na realidade, expiando os
pecados, sejam os seus ou os de seus antecedentes, sendo também responsáveis pelas suas
deficiências. Acerca da contradição, numa concepção diversa do Antigo Testamento, onde os
infortúnios, em geral, são tratados como uma manifestação dos castigos divinos, o Novo
Testamento trata as deficiências também como uma possibilidade de manifestação das obras de
Deus (MISÈS, 1977).
No século XIII, apesar de vestígios da existência de algumas leis de proteção e de
cuidados, as práticas de extermínio ainda podiam ser encontradas com a justificativa de que
pessoas com deficiência estavam possuídas por espíritos do mal. Nem todas, no entanto, eram
57
vistas assim porque, dependendo dos sintomas apresentados, poderiam ser consideradas
profetas como exemplificado a seguir.
Certos sintomas eram considerados obra do demônio, mas por outro lado alguns
estados eram interpretados como transes extáticos em que as profecias indicavam uma
possessão mais divina do que demoníaca. Os possessos demoníacos eram tratados por
exorcismo e fórmulas mágicas (TELFORD, 1976, p. 23).
Na Idade Média, as atitudes do Cristianismo em relação às pessoas com deficiência
também revelaram ambiguidade, gerando ora acolhida ora exclusão. Por um lado, eram vistas
como merecedoras de castigos por pecados cometidos (ou pelo pecado original), pois o corpo
marcado pelo estigma denotava a ação do mal, eram excluídas e isoladas, vagando à margem
da cidade. Por outro lado, os cristãos se preocupavam com a salvação da alma dos sofredores,
por isso abrigavam-nos em mosteiros, quando abandonados pela família. Além disso, a virtude
da caridade era valorizada e a prática do amor ao próximo poderia ser concretizada no ato de
dar esmolas “aos miseráveis”, entre os quais “cegos, coxos, anões, dementes e mutilados”,
como são denominados em textos bíblicos (LEVÍTICO 21, 17-20, 1989).
No Renascimento, de acordo com Misès (1977, p. 16-17), além das visões supracitadas,
destacavam-se, por meio de literaturas romanceadas, tanto “os idiotas” quanto “os loucos”,
através da figura do “bobo da corte”. As possibilidades de expressão que tais pessoas ofereciam
eram exploradas sem constrangimento nas “festas dos tolos”. Este autor destaca que “os
chamados monstros não o são para Deus, que na imensidade de sua obra a infinidade das
formas que ele compreende”.
Mais ou menos na mesma época, encontra-se a maldição de Lutero (1483-1546) que, ao
se deparar com uma criança tida como “anormal”, sugeriu ao príncipe que mandasse afogá-la.
Com seu intentoo acatado, apelou para que os cristãos rezassem para que “aquele ser
sobrenatural” morresse. Lutero justificou sua atitude da seguinte forma: “tais seres nada mais
são do que uma massa de carne sem alma. Faz parte do poder do diabo corromper as pessoas
dotadas de razão e de alma quando ele as possui. O diabo ocupa nesses seres o lugar da alma”
(MISÈS, 1977, p. 17).
Segundo Pessoti (1986, p. 83), com a Reforma Luterana, “o deficiente, além de
repulsivo e castigado por Deus, é um ser que merece ser castigado também pelos homens”.
Curiosamente, no outro extremo ideológico, a Contra-Reforma toma como terapia e pedagogia
eletivas para os comportamentos aberrantes a tortura, o exorcismo e a flagelação. Freitas e
Marques (2007a, p. 68) explicam que “durante a Inquisição, todo portador de deficiência que
58
fosse reconhecido por ser uma encarnação do mal (pecado) era destinado à tortura e à
fogueira”.
No início do século XVI, surgem não apenas novas formas de tratamento, mas também
a busca de compreensão do que vinham a ser os distúrbios mentais. Isso decorreu do fato de
“alguns médicos levantarem objeções aos maus tratos de que eram vítimas os possuídos.
Paracelso (1493-1541) defendia o uso da Medicina no tratamento das aberrações mentais, em
vez de exorcismo e palavras mágicas” (WEBER apud TELFORD, 1976, p. 23).
Para Freitas e Marques (2007a, p. 68), “até a época do Iluminismo, a segregação da
pessoa com deficiência em instituições apartadas da sociedade tornava-se a materialização da
contradição castigo-caridade”. Outra ação social decorrente dessa matriz de interpretação era a
exposição pública das pessoas com deficiência, as quais ficavam dependentes da compaixão,
caridade ou pena das pessoas. A dimensão humana das pessoas com deficiência começou a
ser reconhecida mundialmente no século XVIII.
No Brasil, as primeiras afirmações das influências ambientais no desempenho das
pessoas com deficiência surgiram em meados de 1690. Contudo, somente a partir do século
XIX começaram a surgir tentativas de educação em instituições especializadas. Nessas
primeiras instituições, as formas de tratamento eram precárias, de completa segregação nas
colônias ou classes especiais desestruturadas. Entretanto, não se deve deixar de ressaltar a
existência de trabalhos educacionais diferenciados, para as épocas em que foram
implementados, como os desenvolvidos, por exemplo, por Pestalozzi (1746-1827), Maria
Montessori (1870-1952), Helena Antipoff (1892-1974) e pela Associação de Pais e Amigos dos
Excepcionais (APAE) (1954). Embora muito criticados, consideram-se as suas importâncias e
contribuições, na medida em que foram os primeiros a se interessarem concretamente pela
educação de pessoas com deficiência. Carmo (1989) e Jannuzzi (2004) consideram que, até por
volta de 1970, a educação das pessoas com deficiência, no Brasil, não contou com legislação
que promovesse os seus efetivos envolvimentos na esfera social.
Na matriz de interpretação da deficiência como femeno espiritual, a pessoa com
deficiência está excluída da possibilidade de inclusão por meio do trabalho; sua única
contribuição é a prestação de pequenos serviços na instituição em que ficava asilada. Desse
modo, pessoas com deficiência foram completamente excluídas das possibilidades de acesso
aos saberes contemporaneamente considerados como fundamentais para a inclusão no mercado
formal de trabalho: os saberes escolares, que poderiam fornecer, dentre outros, o
preenchimento do quesito grau de instrução; e o que Kuenzer (1985, p. 55) chamou
“conhecimentos não produzidos na escola, mas no interior das relações sociais e no trabalho, na
59
atividade prática e produtiva”, o que lhes proporcionariam oportunidades de preencher a
exigência da experiência profissional.
Contrariando à ideia de Aristóteles (384-322 a.C.), que afirmava ser “mais fácil ensinar
a um aleijado a desempenhar uma tarefa útil do que sustentá-lo como indigente”
(ARISTÓTELES apud VALTECIDES, 1992, p. 21), a manifestação dessa matriz de
interpretação espiritual sobre a deficiência ainda pode ser observada na atualidade. Batista
(2004) argumenta ser comum que as pessoas com deficiência sejam nomeadas anjos,
principalmente as crianças. Mantoan (2004, p. 98) afirma que muitas pessoas associam
professores, pais e todos os que trabalham com essas pessoas, a “seres abnegados, santificados
em vida, servidores do bem”. Freitas e Marques (2007a, p. 68) destacam “a facilidade de se
deparar com a exposição pública das pessoas com deficiência sujeitando-se à caridade,
principalmente nos grandes centros urbanos”.
A partir do exposto, torna-se perceptível o tipo de tratamento que foi dispensado às
pessoas com deficiência, ao longo do tempo. Da mesma forma, é possível compreender quais
oportunidades foram dadas a essas pessoas, entre outras, quanto ao acesso à educação, ao lazer,
ao trabalho, quanto à oportunidade de serem cidadãs, de terem direito a terem direitos e de
poderem viver na sociedade, enquanto seres humanos que são. Percebe-se como a visão e o
tratamento dispensados a essas pessoas, pela sociedade, colaborou para a construção de uma
cultura, muitas vezes, preconceituosa e estigmatizadora (Cf. GOFFMAN, 1988), reforçando o
seu caráter excludente. Conforme ilustra a afirmação de Platão (428-347 a.C.): “quanto aos
filhos de sujeitos sem valor e aos que foram mal constituídos de nascença, as autoridades os
esconderão, como convém, num lugar secreto que não deve ser divulgado” (PLATÃO apud
CARVALHO, 1997, p. 14). Visões culturais semelhantes a esta foram passadas e repassadas às
diversas gerações, e ainda hoje colaboram para que a sociedade continue a criar, a “recuperar”
e a discriminar pessoas com deficiência.
3.1.2 Contexto Sócio-Político
A aplicação da legislação de cunho compensatório para pessoas com deficiência
enfrenta barreiras decorrentes de uma história de preconceitos, equívocos e dúvidas,
principalmente sobre a capacidade dessas pessoas. Bahia (2006) afirma que na relação
deficiência e trabalho,
60
[...] foram reforçadas as idéias de incapacidade e de improdutividade das pessoas com
deficiência, restando para elas, então, as alternativas da esmola e mendicância. Na
Idade Média fala-se, inclusive, na profissão de esmolecer
41
. De modo que as pessoas
com deficiência que não se enquadrassem nessa realidade estariam, automaticamente,
excluídas (BAHIA, 2006, p. 19).
A preocupação em se “aproveitar os inválidos” no trabalho é encontrada na literatura
nas primeiras décadas do século XX, em 1964, por Henry Ford, no livro
Os Princípios da
Prosperidade
, ao afirmar que
Um cego ou um mutilado é capaz, colocado num posto conveniente, de efetuar o
mesmo trabalho e ganhar o mesmo salário que um homem normal. Ainda que não
revelemos preferência pelos inválidos, temos demonstrado que são capazes de ganhar
salários completos (FORD, 1964, p. 82-83).
Percorrendo os períodos da história, por meio de literaturas específicas, evidenciam-se
teorias e práticas sociais segregadoras, inclusive quanto ao acesso ao saber. Poucos eram os que
podiam participar dos espaços sociais nos quais se transmitiam e se criavam saberes. Pessoas
com deficiência, vistas como “doentes e incapazes” (FRASSON; PIETROCHINSKI;
SCHULMEISTER, 2008, p. 01), sempre estiveram em situação de desvantagem, ocupando, no
imaginário coletivo, a posição de alvos da caridade popular e da assistência social, e não de
pessoas de direitos sociais, entre os quais os direitos à educação e ao trabalho.
De acordo com Freitas e Marques (2009), a legalização do trabalho das pessoas com
deficiência está ancorada em duas formas de interpretação principais: a baseada numa visão de
caridade, que se apoia no esquema de cotas de emprego e que tem no modelo médico sua forma
privilegiada de compreensão, como um atributo individual, resultado de uma patologia; e outra,
que defende o modelo social, com forte ênfase nos direitos, e que define a deficiência ou
desvantagem como produto das limitações causadas pelos impedimentos e barreiras sociais.
É possível que as conquistas, a partir da Revolução Francesa (1789-1799), tenham sido
o início da consolidação da concepção de cidadania, por meio da proclamação dos princípios
universais
Liberté, Egalité, Fraternité
”, da autoria de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778).
Entretanto, supõe-se que no século XIX o poder blico era indiferente às políticas sociais.
Acredita-se que a temática somente tenha sido colocada na pauta das preocupações coletivas,
exigindo-se do Estado um papel mais atuante, no século XX, mais precisamente após a
Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando aumentaram significativamente o número de
41
Pedir esmolas.
61
ocorrências de deficiências físicas e sensoriais (visual e auditiva). É a partir de então que
medidas relacionadas à proteção e à inclusão das pessoas com deficiência começaram a ser
pensadas, em termos de políticas públicas. Vale lembrar que, nessa época, o Brasil é governado
por Getúlio Vargas (1930-1945), período considerado como divisor de águas na história
brasileira, em virtude das inúmeras alterações ocorridas no país, tanto de cunho social, quanto
econômico. Durante esse governo, foram criados novos ministérios, como o Ministério do
Trabalho, Indústria e Comércio (MTIC) e o Ministério da Educação e Saúde (MES). Grandes
avanços na legislação trabalhista brasileira aconteceram e perduram atualmente. Com a Lei de
Sindicalização, que vinculava os sindicatos brasileiros ao presidente, buscou-se estabelecer
vínculos emocionais com o povo. Assim, o governo populista acabava por estimular a divisão
de classes e grupos, o que resultou em embates entre o povo organizado e o governo. É
principalmente a partir desse período, através de pressões de movimentos sociais, que o
governo começa a se ‘preocupar’ com a participação mais efetiva das pessoas com deficiência
na sociedade, no que tange à educação, reabilitação, profissionalização e inserção no mercado
de trabalho. Ações estatais compensatórias de cunho assistencial passam a ser elaboradas,
munindo os então desvalidos com direitos implantados e construídos de forma coletiva.
De acordo com Bahia (2006, p. 20-21), com o governo de Juscelino Kubitschek (1956-
1961), os brasileiros passaram a viver uma fase de estabilidade política e desenvolvimento
econômico, com indústrias voltadas para a produção de bens de consumo duráveis, financiadas
pelo capital internacional, “o chamado desenvolvimento associado, baseado numa indústria
internacionalizada”. Este período é marcado pelo desenvolvimento, com a implantação da
indústria automobilística, a chegada das multinacionais e o surgimento de muitos empregos.
Entre os anos de 1969 e 1974, o Brasil foi governado por Emílio Garrastazu Médici.
Esse período ficou conhecido como os
Anos de Chumbo
da ditadura, decorrente da
violentíssima repressão promovida contra movimentos sociais e opositores do regime militar de
orientação comunista e, por Milagre Brasileiro, em função do grande crescimento econômico
do país. O período de 1974 e 1979 foi governado por Ernesto Geisel. Nessa mesma época, no
contexto mundial, o sistema fordista
42
de produção, até então predominante nos países centrais,
entra em crise. Segundo Batista (2002, p. 93), “paralelo ao padrão fordista, o modelo
econômico keynesiano tinha a proposta de garantir mais empregos para conseguir maior
consumo. Assim, para tal proposta, o Estado elaborou programas públicos comprometidos com
42
O fordismo tem como características, dentre outras, a produção barata e em massa, objetivando o consumo
generalizado. Este sistema possui uma economia de escala, com maior controle técnico. É marcado por uma
gestão mais verticalizada e com uma grande divisão do trabalho (GUIMARÃES, 2006a).
62
o pleno emprego”. As políticas keynesianas promoveram, conjuntamente com a reformulação
do papel do Estado, maior segurança socioeconômica aos trabalhadores e, portanto, menor grau
de exclusão social (POCHMANN, 2001).
A crise dos anos de 1970 minou o modelo fordista, constituindo um novo cenário. Essa
crise foi consequência de um conjunto de fatores. Segundo Harvey (2005, p. 135), “os
problemas no fordismo começaram nos Estados Unidos, em meados de 1960, época em que
houve uma queda da produtividade e da lucratividade, o que acarretou numa redução do poder
norte-americano e aceleração da inflação”. Foi adotado um conjunto de processos que
solaparam o compromisso com o fordismo. “Em consequência, as décadas de 70 e 80 formam
um conturbado período de reestruturação econômica e de reajustamento social e político”
(HARVEY, 2005, p. 140). Após a crise do fordismo, a terceirização e as práticas de
subcontratação foram difundidas no Brasil. Assim, segundo Batista,
As novas práticas de gestão, intensificadas pela reestruturação produtiva, apesar de,
muitas vezes, representarem retrocesso nos direitos conquistados pelos trabalhadores,
têm proporcionado acesso do trabalhador portador de deficiência ao mercado de
trabalho, via terceirização. A pessoa portadora de deficiência passa a ser aceita e a
fazer parte do mercado de trabalho pela via da terceirização e da subcontratação.
Algumas cooperativas são criadas através da mão-de-obra das pessoas portadoras de
deficiência e seus familiares, muitas vezes por intermédio das OSCs
43
. Muitas dessas
OSCs especializadas, que realizam a educação profissional da pessoa portadora de
deficiência, utilizam o subcontrato e a terceirização para realizar prestação de serviços
nas suas oficinas protegidas
44
. Geralmente são transferidas para essas oficinas as
tarefas que exigem baixa qualificação (BATISTA, 2002, p. 98-99).
Acredita-se, no entanto, que, ao contrário do que está exposto na última citação, as
pessoas com deficiência não tenham sido, na realidade, aceitas pelo mercado de trabalho via
terceirização e subcontratação, mas sim, utilizadas como mão-de-obra não qualificada e,
portanto, mão-de-obra barata, por meio das chamadas oficinas protegidas e dos subempregos.
A partir da década de 1980, surge a chamada
responsabilidade social
. Como uma das
consequências diretas ou indiretas da globalização econômica e dos modelos de produção,
passa a ser uma prática adotada pelas empresas, com o intuito de fortalecer sua imagem
idealizada. O modelo de produção flexível trouxe a obrigação de inovação constante do produto
a fim de se atenderem às exigências da economia em permanente mutação. As ações sociais das
empresas surgem, muitas vezes, como parte das ões que agregam valor ao produto,
possibilitando a identificação do consumidor com o que é adquirido.
43
Organizações das Sociedades Civis (o mesmo que Organização Não Governamental/ONG).
44
“Oficina protegida é o ambiente onde são realizadas atividades laborais, dentro de uma escola especializada ou
uma Organização da Sociedade Civil, podendo ou não ser remunerada. Modalidade de educação profissional
prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, cap. V, arts. 66 e 88” (BATISTA, 2002, p. 244-245).
63
Num mundo altamente competitivo, não são apenas os produtos, mas a imagem
corporativa que tem caráter essencial, não somente em termos de
marketing
como no
tocante a levantar capital, realizar fusões e obter vantagens no campo da produção de
conhecimento, das políticas governamentais e da promoção dos valores culturais. O
patrocínio corporativo das Artes, de universidades e de projetos filantrópicos é o lado
prestigioso de uma escala de atividades que inclui tudo, de perdulárias brochuras,
relatórios sobre empresas e promotores de relações públicas a escândalos desde que
se mantenha constantemente o nome da empresa diante do público (HARVEY, 2005,
p. 152).
Assim, supõe-se que a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho faça
parte de um dilema das organizações, pois o fato de uma empresa desenvolver ações sociais
não significa que ela esteja realmente sensibilizada com as questões sociais. E, se existe essa
real preocupação com o social, a empresa não pode deixar de ser competitiva ou de gerar
lucros, até por uma questão de sobrevivência. Consequentemente, essas ações são
contrabalançadas para garantir a sobrevivência da empresa e a efetivação das ações sociais.
Segundo Therborn (2000), sob o aspecto econômico da globalização, a adoção do
mecanismo de produtividade, pelos empresários, cria oportunidades somente para os mais bem
preparados. Esse modelo exige mobilidade e atualização permanente, e aqueles que não
conseguem acompanhá-lo têm as suas chances anuladas. Diante desse quadro, pode-se afirmar
que as chances das pessoas com deficiência são nimas, pois as atuais oportunidades de
qualificação e atualização para esse grupo são ínfimas. No aspecto político, Therborn (2000)
afirma que o poder de ordem estatal é que define a distribuição igual ou desigual do sistema
social. Na ordem global, o Estado é pressionado para adotar medidas corretivas para as
desigualdades criadas. Neste sentido, a ação global combinada é realizada, principalmente, por
meio das ações da ONU, quando esta organização opera na defesa dos direitos humanos e das
minorias. No aspecto sócio-cultural da globalização, de acordo com Therborn (2000), existe
uma grande valorização da mídia e da imagem. A comunicação de massa cria uma linguagem
universal, com expressões reconhecidas em quase todo o mundo, em função da maior difusão
do conhecimento e da criação de identidades padronizadas, com os mesmos valores e formas
simbólicas. “Esse padrão de modelo e de imagem valoriza o que é considerado belo e
harmonioso, excluindo a pessoa com deficiência” (BAHIA, 2006, p. 17). No entanto, as
organizações são submetidas às exigências de assumir determinadas atitudes e valores globais.
O desenvolvimento de ações voltadas para o social e de ações consideradas éticas dentro das
empresas correspondem a uma das consequências deste processo de globalização. Dentre as
ações sociais e éticas, destaca-se a valorização da diversidade nos ambientes de trabalho. Esse
64
conceito é ampliado e passa a ser uma exigência mundial, o que pode favorecer a contratação
da pessoa com deficiência.
No que diz respeito à origem da legislação voltada para as pessoas com deficiência,
supõe-se que, além de emergirem como expressões do processo de refuncionalização
45
das
demandas dos movimentos sociais das décadas anteriores a 1980, e também nelas, ser ainda
resultante das pressões de organismos internacionais, tais como a ONU e a OIT.
Em 1962 nos Estados Unidos e em 1979 no Brasil, emergiram movimentos em defesa
dos direitos das pessoas com deficiência. Surge, a partir daí, o conceito de
“equiparação de oportunidades”. Este conceito foi elaborado, disseminado e defendido
contundentemente pelo próprio movimento (BAHIA, 2006, p. 22).
Segundo Batista (2002, p. 65), a busca por igualdade e defesa da pessoa com deficiência
ganha força internacional, quando da definição da expressão “equiparação de oportunidades”,
através da Declaração de Princípios de 1981, elaborada pela
Disabled
Peoples Internacional
(DPI)
46
. No mesmo ano, a ONU declarou 1981 como o “Ano Internacional das Pessoas
Deficientes”. Batista destaca que,
Em 1991, a resolução 45/91 da ONU sustenta a necessidade de desenvolver políticas
públicas e sociais voltadas para a efetivação dessa equiparação de oportunidades nas
escolas, nos locais de trabalho, nas repartições públicas, nos logradouros públicos, nas
edificações, etc. (BATISTA, 2002, p. 66).
Segundo as Normas de Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência,
elaborada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em sua 48ª sessão de 20 de dezembro de
1993, “essas normas implicam um forte compromisso moral e político em nome dos países-
membros para agir com vistas à equiparação de oportunidades para pessoas com deficiência”
(ONU, 1993, p. 01-02). em junho de 1994, uma nova ação da ONU reforça a necessidade da
inclusão, através da Declaração de Salamanca. Em 1999 foi elaborada a Carta para o Terceiro
Milênio, aprovada em 9 de setembro, em Londres, pela Assembleia Governativa da
Organização
Rehabilitation
Internacional
47
. A Carta para o Terceiro Milênio defende um
45
Por refuncionalização entende-se “o mecanismo utilizado pelas instituições sociais do capitalismo de, apesar dos
antagonismos entre capital e trabalho, e de sua dinâmica calcada na contradição, tentar recuperar a dissidência,
isto é, apreender o que ameaça e contesta sua estrutura e trazê-lo para dentro do sistema pela via da cooptação”
(SILVA, 1994, p. 01).
46
“DPI é uma Organização o-Governamental, sem fins lucrativos, dos Estados Unidos, criada por pessoas com
deficiência” (BATISTA, 2002, p. 65).
47
“Esta organização foi fundada em 1992, com 200 organizações filiadas e atuando em 90 países. Ela promoveu
várias ações que causaram impacto na qualidade de vida das pessoas portadoras de deficiência. Uma dessas
ações, junto com a ONU e demais organizações, foi a implementação das Normas sobre a Equiparação de
Oportunidades para Pessoas com Deficiência” (BATISTA, 2002, p. 67).
65
mundo onde as oportunidades iguais para as pessoas com deficiência se tornem uma
consequência natural de políticas e leis sábias que apoiem o acesso a – e a plena inclusão em
todos os aspectos da sociedade. A Declaração Internacional de Montreal sobre a Inclusão
(2001) foi aprovada pelo Congresso Internacional Sociedade Inclusiva, definindo que “o acesso
igualitário a todos os espaços da vida é um pré-requisito para os direitos humanos universais e
liberdades fundamentais das pessoas” (BATISTA, 2002, p. 61); e afirmando que o esforço
rumo a uma sociedade inclusiva “é a essência do desenvolvimento social sustentável”. Esses
documentos foram elaborados e aprovados ao longo das últimas décadas e, de acordo com
Batista (2002, p. 67), “redefiniram, esclareceram e firmaram a noção de inclusão das pessoas
com deficiência”, introduzindo novos conceitos e exigindo dos países-membros a
implementação de políticas e planejamento necessários para viabilizar a inclusão.
O interesse em incluir a pessoa com deficiência nos diversos âmbitos sociais, tanto em
relação à sua efetiva participação na esfera sociocultural, quanto no que tange aos seus direitos
de cidadania, por parte de diversos países, foi justificado por Jannuzzi (2004, p. 138) como “em
prol do desenvolvimento, a fim de torná-los úteis à sociedade, como constava desde 1969 na
Declaração sobre Desenvolvimento e Progresso Social (Assembleia Geral da ONU) e na
Resolução nº. 2.542 (XXIV)”. Entende-se a tentativa, por parte dos órgãos estatais e
empresariais, de recuperar as lutas e bandeiras dos movimentos sociais, com o intuito de
redirecioná-las aos seus fins, refuncionalizando-as, isto é, distorcendo a sua primitiva
orientação e subordinando-as à sua lógica.
3.2 Trabalho e Identidade na Sociedade Capitalista
Embora não seja o objeto desta dissertação, considerou-se relevante para o contexto
refletir a identidade no âmbito da sociedade capitalista, demonstrando de que forma esta se
encontra subjugada ao sistema vigente e aos seus modos de produção e de gestão
organizacional. Também, porque se considera que as características pessoais, o singular, se
assim pode ser denominado, mantêm íntima relação com as atividades dos seres humanos, em
especial, nesta dissertação, ao serem expressas no trabalho realizado por pessoas com
deficiência física. Expressões que surgem na forma peculiar, com que desenvolvem os seus
trabalhos, nas escolhas realizadas, nos valores que influenciam as suas decisões. E ainda, com
intuito de fundamentar a inserção das pessoas com deficiência no mercado formal de trabalho,
66
como força de trabalho e, sob esta condição, submetidas às mesmas lógicas que as demais
pessoas, no processo produtivo. Nesse sentido, concorda-se com Segabinazzi (2006), ao
considerar identidade e trabalho como uma articulação advinda de uma tradição que confere ao
papel social expressividade na constituição da identidade. Com Lima (2010, p. 06), por este ter
identificado a ocupação profissão – como o papel escolhido por um “número significativo de
pessoas” para a definição da identidade pessoal. E, em concordância com Goffman (1988), por
seus estudos representarem um rompimento com o costume de atribuir somente ao indivíduo a
causalidade das suas ações, e pela expressiva descrição realizada sobre a situação social, onde
se torna imperativo para o Estado e suas instituições classificar as pessoas, para depois
encontrar o seu lugar na sociedade e, particularmente, no sistema produtivo.
Com as contradições na sociedade feudal, engendrou-se um longo período de crise,
marcado por guerras e crises ideológicas. Era a transição para um novo modelo de organização,
o capitalismo. O ser humano, a sociedade e o mundo deixaram de ser vistos unicamente como
determinações de forças divinas, passando a ser concebidos como realidades individuais,
dotadas de lógica particular. Com base nessas transformações, passou-se a compreender os
comportamentos humanos, suas capacidades e incapacidades como determinações de leis
naturais. A deficiência seria, então, compreendida a partir dessa perspectiva. Segundo
Lancillotti,
Era segregado todo aquele que, em virtude de suas incapacidades naturais, o era
livre da dependência do outro e tampouco participava do processo de produção e
acumulação de riqueza. Não sendo capaz de se realizar como força produtiva, passou
a se inscrever na sociedade como alheio às relações concretas estabelecidas entre os
seres humanos. À medida que as contradições do capital, ao longo do século XX,
impuseram novas exigências, ampliou-se a margem daqueles considerados
divergentes do modelo social. As transformações sociais imprimiram a demanda por
novas habilidades, entre elas, a capacidade de ler, escrever e calcular em níveis
básicos (LANCILLOTTI, 2003, p. 49-50).
Se a partir da Idade Média a questão orgânica era definidora da condição da deficiência,
no século XX isto se modificou. Pessoas incapazes de aquisições acadêmicas passaram a ser
também consideradas pessoas com deficiência, por não atenderem às expectativas culturais
emergentes. Assim, a visão da deficiência enquanto uma condição histórica pôde, mais uma
vez, ser reforçada, pois em todos os tempos, de uma forma ou de outra, algumas deficiências
foram identificadas e essas pessoas foram discriminadas em seu grupo social. A discriminação
enquanto convenção sociocultural foi, segundo Lancillotti (2003), uma das questões definidoras
da aparente incapacidade de algumas pessoas frente às atividades educacionais, de trabalho,
dentre outras, assim como também do caráter de permanência da deficiência. Esse seu caráter
67
de permanência foi pautado não pela presença e pelo reconhecimento da diferença, mas por
suas consequências nas possibilidades de participação na construção coletiva da sobrevivência
e reprodução social. O trabalho, neste sentido, constitui-se a condição histórica fundamental
que define e caracteriza o que é ser humano (MARX, 1983). É a condição maior para distinção
entre as pessoas consideradas com ou sem deficiência. Na relação entre ser humano e trabalho,
a identidade ganha destaque, principalmente ao se tratar da identidade forjada (Cf.
ENRIQUEZ, 1999), modelada pelo sistema e pelo modelo de organização vigente. Em
Segabinazzi, ela é definida como
Uma expressão subjetiva e refere-se a tudo aquilo que é vivenciado como eu em
resposta à pergunta “quem és?”, sendo apreendida através da representação de si
mesmo. A própria etimologia da palavra remete a
idem
, do latim, o mesmo. No
entanto, o conceito de identidade como é usualmente focado implica processualidade,
metamorfose. Sob esse enfoque, a identidade é um constante “estar sendo”, embora se
represente com aparência de “ser”. Refere-se a movimentos que dizem respeito tanto à
singularidade humana quanto a particularidades de grupos, segmentos, estratos,
classes, culturas. É um conceito cujo entendimento exige que se superem dicotomias,
pois sua compreensão envolve, ao mesmo tempo, o igual e o diferente, o permanente e
o mutante, o individual e o coletivo (SEGABINAZZI, 2007, p. 02).
Depreende-se que a palavra identidade não comporta uma única definição. A identidade
inscreve-se em um contexto conceitual amplo, implicando abordagens diferenciadas, e é
definida pela Psicologia, Antropologia, Filosofia, Sociologia, entre outros campos do saber
(GOFFMAN, 1988; PALANGANA, 1998; GIDDENS, 2003; SEGABINAZZI, 2006).
Entende-se também que, apesar de sua etimologia demandar permanência, sua usualidade não
tolera referir-se a algo estático, que o próprio ser humano e as relações advindas deste não o
são. Portanto, para efeito desta dissertação, considera-se identidade o conjunto de caracteres
próprios e exclusivos com o qual se pode identificar e diferenciar as pessoas entre si; é de
ordem processual, plena de movimento e historicidade, não podendo ser pensada à distância da
totalidade social. Como afirma Segabinazzi (2007, p. 06), “como o eu é produto social, não
pode ser compreendido fora do contexto em que se forma”.
Marx fornece as ferramentas para se compreender a sociedade capitalista, plena de
contradições e em constante movimento. É sobre a categoria trabalho que Marx e Engels
fundamentaram o processo de formação do ser humano, evidenciando que este esteve em
posição de fazer história a partir do momento em que passou a criar meios para assegurar sua
própria subsistência. Para eles,
O primeiro pressuposto de toda existência humana e, portanto, de toda história, é que
os homens devem estar em condições de viver para poder fazer história. Mas, para
68
viver, é preciso antes de tudo de comer, ter habitação, vestir-se e algumas coisas mais.
O primeiro ato histórico e, portanto, a produção dos meios que permitam a satisfação
destas necessidades, a produção da própria vida material (MARX; ENGELS, 1993, p.
39).
Marx permitiu compreender que a ação consciente e voluntária do ser humano, com
base em um plano predeterminado, é o que o diferencia dos animais. E que é no processo de
manutenção da vida, em interação com a natureza, que o ser humano passou a transformá-la
pela sua atividade e, ao transformar a natureza, transformou a si mesmo. Considerando
indissociável a relação entre vida social e práxis, entra em cena o trabalho e as relações sociais
de produção, pois, como afirma Palangana,
O indivíduo se forma e se transforma no trabalho e nas relações sociais de trabalho.
Somente na história de vida prática dos homens cabe pensar a individualidade, que
constitui o indivíduo, que o singulariza, que o distingue, mas ao mesmo tempo, não se
encerra nele. Os traços, os caracteres físicos e psíquicos são deste ou daquele
indivíduo, porque são sociais, ou seja, porque pertencem aos homens de uma
determinada época e lugar. Assim sendo, a individualidade é, inseparavelmente, social
e individual, objetiva e subjetiva, fundada no modo como a sociedade se organiza,
produz, se relaciona e na espécie de poder instituído (PALANGANA, 1998, p. 07).
A partir dessas análises, percebe-se que é também no trabalho, por meio das relações
sociais de produção, que a pessoa vai sendo constituída. Sobre esse aspecto, Segabinazzi (2007,
p. 02) diz que “a articulação entre identidade e trabalho vem de uma tradição que confere ao
papel social expressividade na constituição da identidade”.
Desde o início, o trabalho é uma atividade social que requer cooperação entre as
pessoas, supondo uma divisão técnica dos afazeres. Disposições naturais, necessidades, acasos
também foram destacados por Marx e Engels (1993), com a conceituação de divisão natural do
trabalho
48
. Quando a economia era somente de troca, o produto do trabalho tinha apenas valor
de uso, a pessoa era detentora e, muitas vezes, até mentora dos meios de produção. Podia criar
e reconhecer-se no processo de criação.
De acordo com Lancillotti (2003, p. 53-54), na sociedade capitalista, a atividade
humana transforma-se, paulatinamente, até se constituir em trabalho alienado a partir da divisão
do trabalho e da propriedade privada. Como faces de uma mesma totalidade contraditória, por
um lado implica a alienação do trabalho e, por outro, na apropriação do seu produto. Para Marx
(1983), a divisão do trabalho expressa os meios de segmentação da sociedade, gerando uma
48
A divisão natural do trabalho pode ser entendida como “quando a atividade já não é dividida voluntariamente,
mas sim de forma natural” (MARX; ENGELS, 1993, p. 19). E, de forma natural, neste caso, carrega o sentido
de “consoante aos dotes físicos (o vigor corporal, por exemplo), as necessidades, o acaso, o gênero, a idade,
etc.” (MARX; ENGELS, 1993, p. 16).
69
relação de exploração da classe burguesa sobre o proletariado, promovendo a sua alienação, por
meio da propriedade privada dos meios de produção. Quando a atividade humana se apresenta
dividida, surge o ser unilateral. O capitalista, por sua vez, também unilateral, usufrui de
produtos que não foram resultantes de sua própria atividade. Mas, como o dinheiro na
sociedade capitalista é o bem supremo, ele pode ser tudo o que seu capital pode comprar.
Assim sendo, é também um homem incompleto, uma vez que suas qualidades humanas se
constroem a partir da expropriação do trabalho alheio.
O trabalho objetivado, que se transforma em capital, ao ser concentrado, aumenta o
poder do capitalista e a miséria do trabalhador, que troca sua força de trabalho por um salário
que lhe permite reproduzir-se
49
enquanto trabalhador. Encontra-se, ao final, de posse do mesmo
valor de troca, acreditando que esta troca se estabelece no âmbito da circulação simples.
Entretanto, o capitalista extrai ganhos de seu trabalho, retira mais valores de troca do que havia
aplicado na origem. Isto se deve ao caráter extraordinário da mercadoria trabalho, a única que
engendra mais valor de troca do que o necessário à sua reprodução. reside o segredo do
capital. A jornada de trabalho implica um tempo de trabalho necessário à reprodução da força
de trabalho. O trabalhador produz o valor dos meios de subsistência de que necessita para se
manter como trabalhador. Contudo, esta jornada envolve um tempo maior do que o tempo de
trabalho necessário. O trabalho excedente, produzido nesse tempo, é apropriado pelo
capitalista, é a fonte de onde ele extrai a mais-valia
50
.
Em face disso, com a implantação e a consolidação do sistema capitalista, o produto do
trabalho passa a ser mercadoria. Um valor financeiro lhe é acrescido, e o seu valor de uso é
deslocado para o consumidor final. Como concebe Segabinazzi,
É a sobrevivência que significado ao trabalho. O trabalho concreto, aquele que
envolve o produtor e o produto numa relação tal que a produção é como um
prolongamento da pessoa do produtor, reconhecendo-se em sua obra, passa a ser um
trabalho abstrato, em que a produção é qualitativamente igual, pois, seja o que for
produzido, o valor de troca igualará tudo pelo nivelador comum – o preço – e o
produto do trabalho será todo dirigido para o mercado. Esse sistema de produção
capitalista provocou a ruptura das relações imediatas entre os homens, em que o outro,
o o-eu, o é mais o significante da afirmação do eu, mas apenas o concorrente
(SEGABINAZZI, 2007, p. 05).
49
A reprodução, neste sentido, diz respeito “à produção e à criação de condições pelas quais ela pode continuar
ocorrendo” (BOTTOMORE, 2001, p. 319). De acordo com Marx (1983), todo processo social de produção é,
ao mesmo tempo, um processo de reprodução.
50
Segundo Bottomore (2001, p. 227), a mais-valia é o valor produzido pelo trabalhador que é apropriado pelo
capitalista sem que um equivalente seja dado em troca”.
70
Na nova estrutura social, o controle passa a ser mediado diretamente pelas relações
sociais de produção e indiretamente pelo Estado. A autossuficiência do produtor individual vai
desaparecendo e, com ela, a referência maior de si mesmo. A identidade que se desenvolve e se
expressa por meio da atividade laborativa é cerceada e, no que resta dela, é cada vez mais
padronizada. A prática produtiva, com o advento da divisão do trabalho em toda a sua extensão,
ou seja, em seus aspectos econômicos, políticos, técnicos, culturais, torna-se a base social mais
profunda e mais geral que influencia a essência do processo de fragmentação da individuação.
Ao atribuir aos trabalhadores parte do trabalho, permite-se que eles se exercitem, se expressem
e se identifiquem apenas nessa fração do todo. Cria-se a condição material para que os
trabalhadores se diferenciem sem, contudo, deixar de ser semelhantes, uma vez que são todos
regidos pelas mesmas relações. Tomasi reforça a idéia de que
O indivíduo [...] produzido nas relações sociais nas quais se encontra inserido, insiste
em guardar suas diferenças em relação aos outros, [...] exige uma proximidade, uma
intimidade com suas subjetividades, seus saberes, seus valores, suas crenças e seus
princípios, que motivam e dão materialidade às suas ações no cotidiano (TOMASI,
2004, p. 11).
Ao cooptar prioritariamente a força física do trabalhador, a sua força intelectual e as
suas habilidades gerais são inibidas, uma vez que não se enquadram na unilateralidade da
prática produtiva. As habilidades específicas e a rapidez no manejo dos instrumentos de
trabalho ganham cada vez mais espaço. Nesse processo, a identidade é modificada. A
percepção, a sensibilidade, a concentração, a atenção, enfim, as faculdades humanas são
moldadas de acordo com a tarefa empreendida. Consumida por uma função parcial, a pessoa
detém um conhecimento também parcial, desenvolvendo uma limitada capacidade de
compreensão. Ela perde a competência para conceber e atuar no processo produtivo por
completo. Ao alienar-se do domínio do processo de produção em sua totalidade, a consciência
individual é privada da principal referência para o auto-reconhecimento; a identidade perde o
parâmetro de formação.
Braverman (1987), no livro
Trabalho e Capital Monopolista: a degradação do trabalho
no século XX
, estudou os processos de trabalho da sociedade capitalista e o modo específico
pelo qual eles são constituídos pelas relações de propriedades capitalistas. A partir dele, é
possível compreender os interesses da constituição e da manutenção da divisão do trabalho e da
exploração da força de trabalho na sociedade contemporânea, da seguinte maneira: o controle
sobre o processo de trabalho, que antes era do trabalhador, passa das mãos deste para as mãos
do capitalista, pois os trabalhadores (proprietários da força de trabalho), separados dos meios
71
com os quais a produção é realizada, podem ter acesso a eles vendendo a sua força de
trabalho ao empregador (que atua como capitalista). O trabalhador, sem alternativa, se vê
obrigado a fazer o contrato de trabalho. O que o trabalhador vende e o que o capitalista compra,
não é uma quantidade contratada de trabalho, mas a força para trabalhar por um período
contratado de tempo. No entanto, como a lei do mercado é produzir mais do que se consome,
prolongando o tempo de trabalho e/ou se utilizando de outras estratégias – trabalho excedente –
para gerar a mais-valia, o trabalhador passa a trabalhar mais, e sem obter o devido retorno
financeiro.
Mediante a compra da força de trabalho, o capitalista “incorporou o próprio trabalho,
como fermento vivo, aos elementos mortos constitutivos do produto, que lhe pertencem
igualmente” (MARX, 1983, p. 154). Nesse sentido, Lancillotti (2003, p. 54) considera a força
de trabalho “mercadoria comprada, passível de consumo apenas quando acrescida de meios de
produção”.
O produto do trabalho, portanto, pertence ao capitalista, pois se trata de um
processo estabelecido entre coisas de sua propriedade.
Ao vender a força de trabalho, o poder de decisão sobre ele é limitado, no sentido de
que se deixa de ser dono do próprio desenvolvimento, de experienciar todo sentimento,
capacidade e desejos fora da contingencialidade da ordem posta. Toda força criadora é
colocada a serviço do trabalho heterônomo, que busca torná-la unilateral. Na sociedade da
produção em massa, excepcionalmente, o trabalho coincide com as potencialidades de quem o
executa. O trabalhador é posto à margem do que ele produz, de alguns saberes necessários ao
processo produtivo e do controle desse processo. O cumprimento de funções preestabelecidas
iguala as pessoas, minando as particularidades e moldando-as em série. Como objeto do
trabalho alienado, para sobreviverem, se despersonalizam.
Nos tempos considerados modernos, o trabalho passa por diferentes formas de
organização. Em cada período, verificam-se mudanças na forma de gerir o trabalho e no
processo de produção. Contudo, tais transformações não ficam restritas ao campo do trabalho,
uma vez que afetam a vida em sociedade, alteram hábitos, necessidades, valores, conceitos,
habilidades físicas e intelectivas, enfim, o modo de ser.
Quando a ordem manufatureira começa a se estabelecer, o agrupamento de diversos
trabalhadores independentes, executores de ofícios variados, sob o controle de um mesmo
capitalista. Como os artífices não executam mais projetos concebidos de forma individual,
para alcançar a sua forma final, o produto precisa passar pelas mãos de vários trabalhadores.
Acompanhando o processo de divisão do trabalho, as ferramentas vão, aos poucos, sendo
adaptadas às funções específicas. Por essa via, estabelece-se a materialidade que, de um lado,
72
favorecerá o acúmulo de riquezas, facultando a existência da maquinaria; de outro, o
aprofundamento da miséria física e espiritual, desencadeando um estado de sujeição e
degradação do ser humano que se acentuará nos estágios seguintes do capitalismo. Sobre
esse aspecto, compreende-se, em Marx (1983), que na manufatura o acúmulo de capital e o
aumento da força produtiva em sociedade equivalem ao empobrecimento material e espiritual
do trabalhador tomado individualmente.
Com o surgimento da maquinaria, gradativamente, o trabalhador, que antes manipulava
somente uma ferramenta, é substituído pela máquina. Sua propriedade maior, a sua força de
trabalho, vai se tornando supérflua. Nesta relação ser humano/máquina, o trabalhador é cada
vez mais comandado pelo complexo mecânico: a forma de se movimentar, as habilidades
adquiridas, os hábitos requeridos, o ritmo da atividade, enfim, são todos ditados pela máquina.
Nesse processo, o trabalhador é convertido a mero apêndice do processo produtivo. Na
manufatura e no artesanato, o trabalhador dispunha de ferramentas. Na fábrica, ele é quem tem
que se dispor à máquina. No primeiro, é o trabalhador que executa e impõe o movimento e o
ritmo ao meio de trabalho; no segundo, é necessário que ele se ajuste e acompanhe ambos. Na
manufatura, os trabalhadores fazem parte de um mecanismo vivo. Na fábrica, tem-se um
mecanismo morto, que independe do trabalhador e ao qual ele é admitido como suplemento
vivo.
Com o advento da manufatura e, sobretudo, da industrialização, o trabalho torna-se uma
atividade cada vez mais abstrata. O trabalhador, além de perder o conhecimento e o controle
sobre o processo produtivo, perde o controle sobre o próprio tempo e espaço. Ao padronizar o
produto, as máquinas padronizam o próprio ser humano.
A implantação da automação colabora com o capital à medida que aumenta o acúmulo
de riquezas. Gera, também, grande preocupação quando começam a surgir os prejuízos,
advindos dos sérios danos provocados aos trabalhadores. Assim, com o tempo, a produção em
grandes séries homogêneas vai sendo substituída pela especialização flexível, respaldada por
um expressivo desenvolvimento tecnológico alavancado pela microeletrônica. Da sociedade
industrial, nasce a chamada automação flexível. E, segundo Palangana,
Nas indústrias automatizadas, em lugar de energia física, requer-se do trabalhador
habilidades cnicas e mentais: aptidões da cabeça mais do que das mãos; do gico
mais do que do artífice; dos nervos mais do que dos músculos; do piloto mais do que
do trabalhador braçal; do cnico de manutenção mais do que do operador
(PALANGANA, 1998, p. 119).
73
O trabalho automatizado, flexível e integrado requer novas capacidades do trabalhador,
porém todas elas são desenvolvidas dentro dos marcos definidos pelo mercado. A identidade,
assim como a individualidade, continua a não ter espaço nem tempo para se realizar como tal.
Nota-se um apelo às capacidades intelectuais que, no entanto, permanecem sendo formadas e
orientadas a partir de necessidades alheias ao próprio trabalhador. Nada foge ao controle
capitalista. Segundo a mesma autora, é ilusório o pensamento segundo o qual
Com a automação flexível superar-se-ia a alienação do trabalho inerente à acumulação
taylorista/fordista. Tais alterações não eliminam o caráter abstrato do trabalho, não
conciliam concepção e produção, não devolvem ao trabalhador o conhecimento do
processo produtivo por completo, muito menos a autonomia sobre o objeto para criá-
lo e recriá-lo (PALANGANA, 1998, p. 111).
A sociedade contemporânea, além do modo de produção e consumo, dispõe dos meios
de comunicação e do sistema educativo para formar com vistas à padronização e à adaptação.
Se a esfera do trabalho muito não é um ambiente de realização da individualidade, fora
dele também não o é. O gerador central, que define a forma e o ritmo da esfera espaço/tempo
para a vida, continua sendo o espaço/tempo da produção. Nada é modificado, senão para
atender às necessidades do mercado”
(PALANGANA, 1998, p. 115).
E o trabalho que se afasta
desse fim não garante a sobrevivência de quem o executa. Conforme destaca Gorz,
Se todo mundo tomasse consciência de que virtualmente não mais problema de
produção, mas apenas um problema de distribuição ou seja, de partilha equitativa
das riquezas produzidas e de distribuição equitativa por toda a população do trabalho
socialmente necessário –, o sistema social atual teria graves dificuldades para se
manter (GORZ, 1980, p. 216-217).
Mas em uma sociedade onde o estilo de vida é totalmente ditado, inclusive a falta de
consciência de tal situação enquanto problema, manter o sistema vigente é prática diária. A
sociedade se caracteriza cada vez mais como uma sociedade de coisas descartáveis, com
processo de trabalho e produtos dominantemente voláteis e efêmeros para dar conta do ciclo
produção/consumo, de acordo com as conveniências do mercado. Palangana ilustra tal
afirmação:
No círculo dos descartáveis estão desde copos, talheres, guardanapos, embalagens,
material de higiene até conceitos, valores, formas de relacionamento, estilos de vida,
etc. Com o lixo, descartam-se modos de pensar e de ser. [...] As razões que se
propõem justificar a (ir)racionalidade consumista escapam à experiência individual.
Daí que, tal experiência, por si só, não permite mais analisar coisa alguma,
transformou-se em nota de pé de página da história (PALANGANA, 1998, p. 137).
74
O sucesso material da produção deixa pessoas maravilhadas, a ponto de não perceberem
o domínio do poder impessoal sob o qual se encontram subjugadas. Disciplinada para satisfazer
necessidades que lhes são estranhas, para executar um trabalho que se tornou abstrato, a
consciência é incapaz de resguardar a si mesma, de ter objetivos próprios, de calcular com base
numa linha de raciocínio que não seja a dominante. Assim,
Em meio à rapidez com que as mudanças se processam, o indivíduo não mais
reconhece seu ambiente de individuação, não sabe da sua ppria identidade. É difícil
manter o sentido de continuidade histórica, que serve de referência à formação da
identidade, diante do fluxo de efemeridades da acumulação flexível (PALANGANA,
1998, p. 138).
Com a Revolução Industrial, amplia-se de maneira significativa a capacidade social de
produção e, contraditoriamente, limita-se a dos seres humanos. O trabalho, na sua totalidade, se
apresenta como um conjunto abstrato. De concreto, restou a tarefa fracionada e repetitiva que
lhe cabe executar. Diga-se, um concreto tão estreito e desconectado que pouco pode oferecer à
consciência e à formação de seres singulares. As mudanças de hábitos, valores e costumes,
experienciadas em primeira mão pelos trabalhadores do chão de fábrica, aos poucos invadem
todas as camadas da população.
Ao longo das transformações sociais capitalistas, a identidade é minada e enquadrada,
de modo que restam duas classificações: ou se é trabalhador ou se é capitalista. Das relações
de produção decorre uma autoridade absoluta do capital sobre as pessoas, da qual ninguém
consegue se furtar, independentemente da hierarquia social. A submissão é destino geral; é
condição indispensável para que o processo de trabalho se molde à mercantilização.
Depreende-se que a identidade é a ntese expressiva das representações do eu e do
mundo em que as pessoas estão inseridas. E que assim como a identidade individual, a
formação da identidade coletiva é um processo histórico e contínuo. Processo este que vem
sendo compulsoriamente guiado pelo sistema econômico vigente. Segundo Linhart (2007),
“não há praticamente uma grande empresa [...] que não se tenha lançado em campanhas
participativas para engajar todos os assalariados, independentemente de seu nível hierárquico
ou de sua função” (LINHART, 2007, p. 116).
Ideologias impostas nos vários estágios de desenvolvimento da sociedade produziram
pessoas adequadas aos seus princípios. Essas estruturas ideológicas sociais fomentaram e ainda
fomentam estruturas psicológicas voltadas à objetificação e reificação da subjetividade. No
processo de formação da identidade, essa mesma estrutura cultural domina a individualidade.
75
Pensada historicamente, a reestruturação dos processos produtivos possibilita uma
concreta compreensão da fragmentação que permeia as formas de expressão individual na
contemporaneidade e, consequentemente, o desvanecimento da identidade. Isto posto, é
possível perceber que as chances de o indivíduo se desenvolver em todos os sentidos, nesta
sociedade, são praticamente nulas. Os hábitos, o pensamento, as habilidades, os padrões de
comportamento e os desejos pessoais são manipulados por necessidades e interesses externos.
As condições objetivas para que a pessoa possa agir, pensar e criar por livre e espontânea
vontade, ou seja, independentemente de necessidades e critérios impostos por outrem, são
consumidas.
Pode-se afirmar, então, que a sociedade capitalista se transforma ao longo de sua
história. E, nesse processo, junto às demandas ditadas por modelos de produção e de gestão, vai
cercando a pessoa e moldando-a ao seu modo. Com base em funções parceladas e movimentos
repetitivos durante um longo tempo, o trabalho fragmenta os saberes, mecaniza as habilidades
físicas e, mais tarde, coopta, além destas, também as habilidades mentais. Sob o controle das
relações capitalistas, a pessoa é subjugada ao tempo-espaço da produção que, visando satisfazer
as necessidades do consumo, aniquila as condições propícias à formação da consciência
emancipada, da individualidade e, consequentemente, da identidade.
Embora no toyotismo aconteça a inversão das tentativas de se extinguir a criatividade
do trabalhador ao incentivo para tal, ocorrendo também o explícito reconhecimento do valor
que os saberes informais têm, por parte das organizações, a consciência, a criatividade e demais
propriedades mentais dos trabalhadores permanecem subjugadas às amarras do sistema vigente.
À medida que são desenvolvidos programas de captação desses saberes, o seu uso é revertido
em benefício de quem deles se apropria. Tais características melhor detalhadas nos subitens
que se seguem provocam um estado de desidentidade na classe trabalhadora em relação aos
próprios produtos de seu trabalho. De acordo com Gounet,
Por trás do novo tipo de agenciamento da linha de produção subsistiria a necessidade
imperiosa da subsunção da subjetividade real operária à lógica do capital, através de
um tipo de inserção engajada dos trabalhadores no processo de produção, aumentando
suas responsabilidades quanto aos bons resultados do processo produtivo, e
promovendo, por conseguinte, uma intensificação da exploração do trabalho
(GOUNET, 1999, p. 12-13).
Embora moldadas pelos processos produtivos capitalistas, a identidade e a
individualidade do trabalhador não são extintas. Conforme afirma Canguilhem (2001, p. 120):
“todo homem quer ser sujeito de suas próprias normas”. Persistem, nos trabalhadores, os
76
anseios em se expressar enquanto seres de subjetividade, de criatividade, de anseios de
realização, de seres que carregam para a relação trabalho prescrito e trabalho realizado seus
valores, saberes em constante evolução, necessidades, construções e histórias de vida. Tanto
persistem em se expressar, que são construídas e reconstruídas artimanhas para as suas
captações, no sistema vigente. Se com os modelos de organização capitalista, segundo Abreu
Neto (2005, p. 220), “o saber torna-se um instrumento que se pode separar do trabalho e até
ser-lhe oposto”, resta verificar, conforme reflete Franzoi (2009, p. 195), “se os trabalhadores
têm consciência do tamanho de seu patrimônio”.
3.3 Modelos de Organização
3.3.1 Breve Exposição dos Modelos de Organização
O Taylorismo, ou Organização Científica do Trabalho, é o modelo de administração
desenvolvido, a partir do final do século XIX, pelo engenheiro fabril estadunidense Frederick
Winslow Taylor (1856-1915), considerado o pai da administração científica. Fundamenta-se na
ideia de que o trabalhador tende, como uma forma de burla, ao ócio e à lentidão no trabalho, o
que impede a elevação da produção. Taylor tinha como objetivo eliminar o tempo improdutivo
do trabalhador, bem como aumentar o ritmo de trabalho ao ponto em que se supunha que ele
pudesse ou devesse suportar (GUIMARÃES, 2006a; ANTUNES, 2002).
Com a intensificação da produção em massa e a difusão do taylorismo, amplia-se a
separação entre o planejamento e a execução do trabalho, concentrando-se todo o primeiro nas
mãos da gerência. Essa forma de organização do trabalho passa a exigir uma nova estrutura de
controle sobre o desempenho das tarefas. Há a criação de um departamento voltado para o
planejamento, e surge uma nova organização funcional, através da divisão da gerência por
funções. O planejamento de cada aspecto do processo produtivo passa a ser feita pelas
gerências, em departamentos específicos.
Se antes a organização do trabalho garantia aos trabalhadores o controle dos processos
de trabalho, ritmos e intensidade, no taylorismo, trabalho e trabalhador tendem a ser dominados
77
em todas as suas formas. Destacam-se, a seguir, algumas das principais características do
modelo de organização taylorista
51
:
Algumas Características do Modelo de Organização Taylorista
Análise do trabalho e estudo dos tempos e movimentos: objetiva a isenção de movimentos inúteis, para
que haja menores gastos de energia e executem de forma mais simples e rápida as funções,
estabelecendo um tempo médio;
Controle: de tempo e de movimentos (cronômetro);
Mecanização da produção: repassa o saber do trabalhador para a máquina, sempre que possível;
Estudo da fadiga humana: a fadiga predispõe o trabalhador à diminuição da produtividade e perda de
qualidade, acidentes, doenças e aumento da rotatividade de pessoal;
Estrutura: hierarquizada;
Implantação das técnicas de gerenciamento da produção e do trabalho: enfrenta a resistência dos
trabalhadores, dificultando as propostas do modelo;
Divisão do trabalho: social e hierárquica; as especialidades do trabalhador são separadas, tornando as
atividades fragmentadas, repetitivas, monótonas e desprovidas de sentido;
Separação entre a concepção e a execução do trabalho: à gerência cabe o trabalho de pensar, de decidir
o processo de produção em operações limitadas, de tal forma que se limite ao trabalhador a execução
daquilo que foi prescrito e determinado pela chefia;
Desenho de cargos e tarefas: desenhar cargos é especificar o conteúdo de tarefas de uma função, o como
executar, e as relações com os demais cargos. O trabalho é constituído de tarefas prescritas;
Plano de incentivo salarial: incentivos salariais e prêmios por produtividade; o trabalhador é incentivado
monetariamente, pagando-o por peça produzida ou hora trabalhada;
Seleção e treinamento: definir um perfil adequado à tarefa a ser executada, com apoio de profissionais
das áreas de psicologia e serviço social;
Condições de trabalho: o conforto do trabalhador e o ambiente físico ganham valor, não porque as
pessoas merecem, mas porque são essenciais para o ganho de produtividade;
Padronização: aplicação de todos científicos para obter a uniformidade e reduzir os custos;
padronização de métodos, ferramentas e tarefas; instrumentos adaptados à tarefa; intensificação da
produção em massa;
Supervisão funcional: os trabalhadores do chão de fábrica o supervisionados por especialistas, e não
por uma autoridade centralizada, de modo a garantir supervisão a cada trabalhador separadamente,
tendo como suporte o controle, a punição e as regras;
Homem ecomico: o homem é motivel por recompensas salariais, econômicas e materiais;
Relações humanas: as relações entre os trabalhadores são rompidas; o bom trabalhador o discute as
ordens, nem as instruções, faz o que lhe mandam fazer;
Influências: a empresa é vista como um sistema fechado, isto é, os indivíduos não recebem influências
externas. O sistema fechado é mecânico, previsível e determinístico;
Saberes: o capital passa a se apropriar dos saberes dos trabalhadores, dentre eles as suas estratégias de
burla, para buscar formas de se evitá-las.
Quadro 2: Algumas Características do Modelo de Organização Taylorista.
Fonte: Autores Diversos. Cf. Nota de Rodapé 51.
De acordo com Dejours (1992), a autonomia no trabalho é perdida. Aliena-se o
trabalhador do conteúdo de seu esforço produtivo e restringe a capacidade de utilizar a
criatividade.
51
Baseado em autores, tais como: Zilbovicius e Marx (1983); Salerno (1991); Gounet (1999); Cacciamale e Britto
(2002); Antunes (2002; 2003); Bernardo (2004); Abreu Neto (2005); Guimarães (2006a); Holzmann (2006);
Lima (2006), dentre outros.
78
Idealizado no início do século XX pelo empresário estadunidense Henry Ford (1863-
1947), fundador da
Ford Motor Company
, o fordismo é um modelo de organização
caracterizado especialmente por:
Algumas Características do Modelo de Organização Fordista
Produção: em massa, em série, homogênea, estandardizada (padronização de produtos); automação das
fábricas, possibilitando aumento da produção;
Fluxo: contínuo, progressivo; fluidez do trabalho;
Tempo de produção: redução do tempo ocioso, determinado pelo fluxo da linha de montagem, fixando o
trabalhador ao seu posto e estabelecendo o conceito de tempo imposto;
Custos: redução de custos de produção e de venda; diminuição de desperdícios;
Ritmo: aumento do ritmo de trabalho; intensificação da exploração; racionalização das operações a
gestos simples e repetitivos;
Economia: em grande escala;
Organização: estratégia abrangente, com intensa mecanização; uso de máquinas-ferramentas
especializadas, linha de montagem, esteira rolante;
Implantação das técnicas de gerenciamento da produção e do trabalho: enfrenta a resistência dos
trabalhadores, dificultando as propostas do modelo;
Relações humanas: concentração de trabalhadores no mesmo espaço fabril, favorecendo laços de
solidariedade e lutas coletivas;
Competitividade: ganho de escala;
Estrutura: fábrica verticalizada; altos investimentos; grandes instalações;
Gestão: centralizada e hierarquizada;
Estrutura: departamental, com postos de trabalho e linhas de montagem;
Divisão do trabalho: crescente divisão do trabalho; parcelamento das tarefas, resultando na
desqualificação do trabalhador; trabalho fragmentado, com divisão entre concepção e execução. O
trabalho de concepção, ao contrário do de execução, tornou-se qualificado, sendo realizado de maneira
isolada;
Controle/Disciplina: moldada pela padronização, cronometragem das tarefas e normatização dos
processos mecânicos, das máquinas e das linhas de produção. Trabalho interligado e cadenciado pela
esteira, sob controle da direção da empresa. Integração mecânica do trabalhador.
Quadro 3: Algumas Características do Modelo de Organização Fordista.
Fonte: Autores Diversos. Cf. Nota de Rodapé 51.
O trabalho passa por um processo de desumanização, e o trabalhador é convertido em
apêndice das máquinas e das ferramentas, possibilitando aos capitalistas maior exploração do
trabalho. O trabalhador fica impossibilitado de regular o seu trabalho, constituindo-se um
cenário altamente agressivo à sua saúde (ANTUNES, 2002; GUIMARÃES, 2006a).
Ao final da década de 1960 e início dos anos 1970, os modelos taylorista e fordista de
organização passaram a dar sinal de esgotamento, em face do comprometimento estrutural do
capital, enunciado pela queda na produtividade e nas margens de lucro, pela crise do petróleo,
pela paralisação da economia e pelas lutas dos trabalhadores pelo controle social da produção
(ANTUNES, 2002; BERNARDO 2004; ABREU NETO, 2005). Nas palavras de Bernardo,
[...] as pequenas e obscuras lutas cotidianas permitiram que a mão-de-obra, cada vez
mais habituada a lidar com os métodos da grande indústria, se mostrasse capaz de
79
controlar na prática os ritmos impostos aos seus gestos. Taxas de absenteísmo
crescentes, atrasos e imobilizações cnicas das cadeias de montagem, quantidades
significativas de produtos defeituosos, tudo isso revelava a sabotagem do sistema de
trabalho. Se décadas atrás os engenheiros de produção haviam sido capazes de anular
a iniciativa dos trabalhadores, a situação agora invertera-se em grande medida,
ficando comprometida a eficácia social das formas de aplicação do taylorismo até
então adotadas (BERNARDO, 2004, p. 79).
Desse modo, diante do que Antunes (2002, p. 31) nomeou ser a “necessidade de
reorganização do capital e de seu sistema ideológico e político de dominação”, o engenheiro
Taiichi Ohno (1912-1990) idealiza um modelo de organização atrelado à demanda do mercado,
o modelo japonês
52
. Tendo em vista a oferta de produtos variados, condiciona-se a produção ao
consumo, reduzindo a necessidade de grandes estoques. Culmina também na redução do quadro
de pessoal, fazendo com que os trabalhadores suportem as variações da demanda, resultando
em uma fábrica flexível (ANTUNES, 2002; HOLZMANN, 2006). Dentre as principais
características deste modelo, destacam-se:
Algumas Características do Modelo de Organização Toyotista
Produção: flexível e tecnológica, com a invasão da tecnologia da informação, automação, da robótica e
da microeletrônica no ambiente de trabalho; produção enxuta, excluindo toda forma de desperdício;
racionalização do trabalho na perspectiva da hegemonia do capital na produção. Busca desenfreada do
lucro (mais-valia). As crises financeiras impedem o desenvolvimento da produção em massa;
Organização do trabalho: flexível, inclusive na produção; trabalho organizado em lulas e equipes de
trabalho; favorece a desmobilização sindical;
Gestão: participativa; incentiva a criatividade; reconhece o valor do saber do trabalhador sobre o
processo produtivo;
Relações humanas: emprego de técnicas participativas e de integração dos trabalhadores;
Estrutura: horizontal da produção (cadeia); baseada em ferramentas contemporâneas, tais como:
Just-in-
time
, Kanban, Kaizen, 5S, CCQ,
Total Productive Maintenance
(TPM),
Total Quality Control
(TQC),
terceirização e subcontratação;
Ritmo: aceleração do ritmo de trabalho; intensificação da exploração; precarização do trabalho;
crescimento lento;
Divisão do trabalho: especialização flexível; polivalência e multifuncionalidade do trabalhador; o
modelo japonês não ameaça a separação fundamental entre concepção e execução do trabalho,
assegurada dentro do modo de produção capitalista;
Controle/Disciplina: integração orgânica do trabalhador; necessidade de maior e constante qualificação;
escassez de oportunidades de trabalho.
Quadro 4: Algumas Características do Modelo de Organização Toyotista.
Fonte: Autores Diversos. Cf. Nota de Rodapé 51.
Cabe lembrar que a variação das atividades desenvolvidas pelos trabalhadores, presente
no modelo japonês, é um importante recurso ergonômico de prevenção às Lesões por Esforços
Repetitivos (LER) e ao Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho (DORT)
(ANTUNES, 2003).
Quanto à subjetividade do trabalhador, Gounet ressalta:
52
Também denominado como toyotismo, ohnismo ou, ainda, sistema ou modelo de acumulação flexível.
80
A operação de subsunção da subjetividade operária pela lógica do capital é algo posto
e reposto pelo modo de produção capitalista. que é sob o toyotismo que a captura
da subjetividade operária adquire o seu pleno desenvolvimento, um desenvolvimento
real e não apenas formal (GOUNET, 1999, p. 10).
Este mesmo autor ressalva que não o toyotismo, mas “todos os modos de gestão da
produção, em maior ou menor proporção, estão preocupados com o controle do elemento
subjetivo no processo de produção capitalista” (GOUNET, 1999, p. 09). De acordo com
Kuenzer (2006), no modo de acumulação flexível, que combina modos de organização e de
gestão do trabalho tayloristas-fordistas, existe significativa mudança na compreensão sobre as
competências para o trabalho, conforme é apresentado no próximo subitem.
3.3.2 Considerações sobre Competências e Técnicas de Captação e de Apropriação de
Saberes no Modelo de Organização Toyotista
Conforme discutido, as condições oferecidas colaboram para alterar os níveis de
(d)eficiência das pessoas. Da mesma maneira, colaboram para o melhor ou pior desempenho na
realização de suas tarefas, fazendo com que a pessoa se torne mais ou menos competente. Pode
até mesmo ‘fabricar’ pessoas com deficiência, dependendo das condições oferecidas, tanto de
forma imediata, quanto ao longo do tempo, como nos casos de postos de trabalho inadequados
ou de profissionais que necessitam de reabilitação.
Para a compreensão do conceito de competência, utilizado nesta dissertação, é
necessário, primeiramente, o estabelecimento dos conceitos de habilidade, saber e atitude. Esta
perspectiva é traçada a partir de Borges (2009), sobre os estudos de Lazzarotto (2001). Segundo
este autor, quando a pessoa executa uma tarefa com facilidade, com menor esforço, tendo
capacidade para repetir, considera-se que tem uma habilidade. O conceito de habilidade está
relacionado com a forma de executar as tarefas, de agir, de pensar e na aplicação de saberes.
A atitude compreende a intencionalidade para assumir determinados comportamentos e
consequentemente, certas reações. Ao contrário do comportamento, a atitude é persistente no
tempo, porém, ela pode ser mudada quando a pessoa sofre pressão. A atitude produz um
comportamento persistente e é composta por três componentes ou polaridades principais. Em
concordância com Schwartz (2000), o primeiro se relaciona com os princípios e valores aos
quais a pessoa se vê convocada em um meio de trabalho particular; o segundo remete ao afetivo
81
ou à motivação, enquanto capacidade de apropriação dos saberes; e o terceiro se relaciona com
o comportamental ou ao grau de apropriação das dimensões históricas, singulares e coletivas de
cada situação de trabalho.
O saber engloba a conexão que a pessoa faz a partir das informações, considerando
causas e efeitos entre conceitos, problemas e significados. Lazzarotto (2001) conclui que
competência significa a capacidade de integrar saberes, habilidades e atitudes como
instrumentos para agir em determinada situação. Ao que Perrenoud (1999, p. 07) complementa:
“competência é a capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada
em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles”. Com esta conceituação, a integração entre
competência e os distintos tipos de saberes é explicitada: “as competências mobilizam
conhecimentos, põem os conhecimentos em relação, e em ação”.
Portanto, a competência depende da ação da pessoa em um dado contexto e o modo que
essa ação é avaliada por um terceiro. Depende da opinião e da forma que a situação é
vivenciada pelas pessoas envolvidas no processo. Consequentemente, o saber agir de uma
pessoa pode ser reconhecido como competente em determinada situação e, em outro contexto,
pode não ter a mesma avaliação. A competência no âmbito desta dissertação refere-se,
especialmente, ao domínio dos saberes necessários à realização do trabalho e à capacidade de
utilizá-los e de renormalizá-los nas diversas situações.
Compreende-se, a partir da leitura de Kuenzer (2002; 2006), que o conceito de
competência apresenta um caráter transitório, modificando-se conforme os modelos de
organização capitalista e que, embora apresentados como universais, referem-se a uma
modalidade específica de trabalho: o reestruturado. Assim, a autora ressalta que
Com o modelo de acumulação flexível, a forma de conceber a competência remete,
necessariamente, à capacidade comunicativa, à criatividade e à educação continuada.
[...] Neste modo de conceber a categoria competência a partir das demandas da
acumulação flexível, é importante destacar que não desaparece a relevância do
conhecimento tácito em nome da supremacia do conhecimento científico, mas sim se
re-estabelece a dialética entre teoria e prática, passando a competência a assumir
dimensão práxica (KUENZER, 2006, p. 21).
Ainda seguindo a linha de raciocínio de Kuenzer (2002; 2006), para o desenvolvimento
de competências nas formas tayloristas/fordistas de organização e gestão do trabalho bastava a
prática. No toyotismo, a clareza de que a formação teórica é necessária, porque, em tese,
melhora as condições de atuação. Contudo, conforme Lazzarotto (2001) e Schwartz (2000),
existem outros fatores que intervêm na capacidade de enfrentar situações de risco, que
extrapolam a dimensão cognitiva, tais como as exemplificadas por Kuenzer:
82
Disposição para atuar, a estabilidade emocional, a capacidade de atuar em situações de
estresse, o comprometimento com o coletivo, e assim por diante. E ainda, mantendo-
se a discussão no domínio cognitivo, está presente a capacidade para articular a
situação a ser enfrentada com outras situações que contiveram elementos similares,
bem como a capacidade para articular conhecimentos teóricos a conhecimentos
práticos, reafirmando a compreensão de que a simples existência de conhecimentos,
sejam eles de qualquer ordem, não é suficiente para desencadear ações competentes. E
estas competências estarão tão mais presentes, quanto mais ricas forem as
experiências vividas, os conhecimentos adquiridos, o acesso a informações, e assim
por diante (KUENZER, 2002, p. 06).
Hirata (1993, p. 13) refere-se ao surgimento do “novo paradigma de produção
industrial, apresentado como alternativa à produção em massa fordista” e destaca características
deste modelo de organização que levam as empresas a adotarem instrumentos de captação de
saberes.
As características da organização do trabalho da empresa que adota o modelo japonês
em ruptura com o taylorismo e o fordismo são essencialmente o trabalho cooperativo
em equipe, a falta de demarcação das tarefas a partir dos postos de trabalho e tarefas
prescritas a indivíduos, o que implica num funcionamento fundado na polivalência. O
trabalhador multifuncional passa a não ter a visão parcial e fragmentada, mas uma
visão de conjunto do processo de trabalho em que se insere (HIRATA, 1994, p. 130).
No entanto, as modificações se restringem aos interesses empresariais fazendo com que
os empregados repassem os seus saberes aos demais e à própria empresa e, assim, esta não
fique desfalcada, caso este empregado falte, tire férias, seja demitido. Para Bernardo (2005, p.
07), este processo trata da concomitante “formação de trabalhadores e apropriação dos seus
saberes”, que compreende a qualificação da força de trabalho, de modo a aproveitar cada vez
mais a capacidade intelectual dos trabalhadores.
Quanto ao aspecto dúbio e a lentidão no processo de ruptura para com as características
dos modelos taylorista e fordista de organização e a implantação das técnicas japonesas, Leite
(1994, p. 37) afirma ser esta “a forma com que vem ocorrendo a sua implantação no parque
industrial brasileiro como um todo”. A autora afirma também que a difusão do modelo japonês
no Brasil “vem sendo significativa e é um dado inquestionável” e lembra que “existem autores
que apostam que a organização japonesa do trabalho se apresentaria mais como um fordismo
híbrido” do que um modelo puro. Para Gounet,
Ao assumir um valor universal, o toyotismo passou a mesclar-se, em maior ou menor
proporção, a suas objetivações nacionais (e setoriais), com outras vias de
racionalização do trabalho, capazes de dar maior eficácia à lógica da flexibilidade. É
83
por isso que a instauração do toyotismo articula, em seu processo, uma
continuidade/descontinuidade com o taylorismo/fordismo, a via predominante de
racionalização pretérita do trabalho (GOUNET, 1999, p. 04).
De acordo com Coriat (1993, p. 53), no toyotismo é produzida a “desespecialização
operária, com a substituição dos operários parcelares por operários polivalentes, os
profissionais plurioperadores”. Tumolo destaca ser esta uma das consequências de um dos
pilares do toyotismo:
O primeiro [pilar] é a autonomação e a autoativação, que provocam, de um lado, a
desespecialização e a polivalência operária e, de outro, a intensificação do trabalho,
que constituem as duas faces de um mesmo e único movimento; e o segundo é o
just-
in-time
e o método kanban (TUMOLO, 1997, p. 334).
Sobre a questão da desqualificação, Antunes (2002, p. 213-214) reflete: “o que parece
ocorrer é uma alteração qualitativa bipolar: num extremo há maior qualificação do trabalhador;
no outro houve intensa desqualificação, como nos ramos mineiro e metalúrgico”. Este autor
chama a atenção para uma metamorfose no universo do trabalho que, variando por áreas e
setores de atuação, configura o processo de contradição qualificação/desqualificação.
No taylorismo, o saber é concebido como produto acabado, podendo ser transferido. No
modelo japonês, ele é visto como um processo que se em ato e que não finda. No
taylorismo, o saber do trabalhador também sempre foi reconhecido, tanto que os capitalistas
buscaram se apoderar dele. A diferença está no fato de se acreditar que, a partir do momento
em que fosse transformado em padrão, nada mais restaria deste saber ao trabalhador. Dessa
forma têm-se, como diferencial no modelo japonês, a explicitação do reconhecimento desse
saber e a sua legitimação pelo capital. Conforme explicita Franzoi,
A partir dessa consciência, calcada na concepção do conhecimento enquanto processo
contínuo, o chão de fábrica ganha espaço privilegiado enquanto instância de
aprendizado contínuo. Se o taylorismo fez o movimento do chão de fábrica para o
setor de engenharia, o Modelo Japonês, de posse dos instrumentos que o taylorismo
lhe forneceu, faz o movimento contrário (FRANZOI, 2009, p. 193).
Decorre disso uma prática empresarial que se desdobra em várias ações, todas elas
interligadas. Na visão de Franzoi (2009, p. 193), a produção da qualidade, pregada pelo modelo
japonês, implica duas formas de utilização do saber dos trabalhadores: a primeira visa à
normatização e à padronização de condutas anteriormente utilizadas e requer a absorção dos
saberes que os trabalhadores constroem, por parte da gerência a que estão submetidos; a
segunda visa ao desenvolvimento de melhorias constantes e requer o desenvolvimento desse
84
saber pelos próprios trabalhadores. Esta autora enfatiza que, no taylorismo, a necessidade da
gerência é o de se apropriar do saber sobre o processo de trabalho, o qual era completamente
desconhecido por ela. No modelo japonês se instaura o saber que o taylorismo propicia à
gerência sobre o processo de trabalho, sendo possível utilizar-se de instrumentos para o
desenvolvimento dos saberes dos trabalhadores, com a garantia de que este desenvolvimento se
dê na direção e nos limites impostos pelo capital.
O saber do trabalhador, contudo, está apenas potencialmente à disposição do capitalista:
quando o capitalista compra a força de trabalho, durante determinado tempo, compra, de certa
forma também, o saber que vai se desenvolver durante esse período, o que possibilita a
transformação desta força de trabalho em trabalho. Não compra, porém, a subjetividade do
trabalhador. A captação de saberes ocorre, muitas vezes, por meio da observação do trabalho,
nos locais em que estes se realizam. No entanto, como os saberes não podem ser totalmente
absorvidos apenas pela observação, o modelo japonês cria instrumentos para a sua absorção.
Um deles é o
Kaizen
53
, que abarca desde soluções para organizar melhor um ambiente de
trabalho, aumentar a segurança, diminuir o tempo de preparação, eliminando muitas das
operações, até processos que podem ser considerados de alta complexidade no processo
produtivo. As melhorias sugeridas podem racionalizar o trabalho, sem que isso implique
intensificação. Podem também significar melhoria no local de trabalho, que também acarretam
aumento da produtividade, sem corresponder a aumento de salário.
O empregado, que também visa às melhorias em seu local de trabalho ou no processo
produtivo, dispõe do seu saber a troco de bonificações. Todavia, as sugestões são avaliadas sob
o ponto de vista do capital, não do trabalhador. Além disso, são efetivadas as sugestões que,
de alguma forma, interessam aos capitalistas, ficando a cargo da gerência sua organização e
efetivação.
Kuenzer baseando-se em Zarifian (2001, p. 135), afirma que
uma mudança de eixo nas relações entre trabalho e educação, a partir da mediação
da base microeletrônica com seus impactos nas formas toyotistas de organizar o
trabalho, que se evidencia a partir da mudança na natureza do trabalho, que deixa de
significar fazeres, para passar a significar intervenção quando os equipamentos ou
sistemas apresentam comportamento anormal que exige atuação qualificada do
trabalhador (KUENZER, 2006, p. 21).
Acredita-se que esta questão vai mais além, pois o que se espera hoje dos empregados é
antes o saber identificar e o saber prevenir os problemas, do que somente o saber intervir
53
Na empresa, campo da pesquisa, o Kaizen funciona por meio do Programa de Sugestões e da Aplicação da
Melhoria Contínua, explicitados no subitem 2.3.3.
85
quando eles acontecem. Não descartando, entretanto, que os imprevistos sempre poderão
acontecer e, para isso, as empresas fazem com que seus empregados sejam constantemente
submetidos a treinamentos e a cursos de qualificação, para que se tornem competentes na busca
por efetivas soluções.
O toyotismo também tende a incentivar a participação crescente dos trabalhadores nos
projetos de produtos e de processos de produção, motivando-os a apresentarem sugestões que
permitam seu aperfeiçoamento. Isso não deixa de ser um novo patamar de apropriação, tal
como Marx (1983) destaca que ocorreu na manufatura e grande indústria, onde os capitalistas
se apropriavam das forças produtivas que derivam da cooperação e da divisão do trabalho.
Segundo Castro,
O aumento da qualificação da mão-de-obra é vital para viabilizar os ganhos de
produtividade e de qualidade virtuais nas novas tecnologias, ampliando os benefícios
da introdução da automação microeletrônica. No plano micro, deve-se avaliar o papel
de instituições formadoras como o SENAI, de modo a ampliar a oferta de treinamento.
No plano macro-social, a política de emprego deve viabilizar políticas de re-
treinamento (CASTRO, 1993, p. 25).
Os saberes dos trabalhadores não desaparecem com a implantação de novas tecnologias,
em particular com as de base microeletrônica, “mas mudam de qualidade, passando a exigir
maior aporte de conhecimentos científicos que não podem ser obtidos somente através da
prática, senão através de cursos sistematizados” (KUENZER, 2006, p. 24). Assim, como mais
uma forma de manter o saber do empregado sob controle do capital, não raramente eles têm
acesso apenas ao que lhes são repassados nos treinamentos e demais cursos oferecidos pela
empresa, podendo, desta forma, ser transmitido somente o que convém. o se descartam, com
isso, as demais formas de acesso aos saberes.
No que se refere à organização e ao controle da produção, destacam-se a adoção de
técnicas de gestão e planejamento que buscam produzir a um menor custo, reduzindo o nível de
estoque e aumentando o grau de controle da gerência sobre o processo produtivo como um
todo; e a preocupação em tornar o aparelho produtivo flexível para melhor capacitá-lo a
responder às variações do mercado. Quanto às mudanças na estratégia de mercado, salienta-se a
ênfase na qualidade do produto como fator de diferenciação. É importante enfatizar que a
microeletrônica tem viabilizado, parcial ou totalmente, as transformações ocorridas nas
indústrias mundiais em termos de organização e controle da produção, estratégia de mercado e
processo de fabricação.
Bernardo afirma ser
86
[...] impossível aumentar as qualificações da força de trabalho sem prolongar o tempo
de formação dos trabalhadores, e as instituições de ensino são insuficientes para este
fim, porque as inovações tecnológicas continuam a ocorrer depois de cada pessoa sair
da escola. Os capitalistas encontraram-se perante uma situação paradoxal. Como
manter os trabalhadores atualizados e adestrados sem comprometer os horários de
trabalho? O problema foi solucionado mediante a conversão dos ócios em processo de
qualificação da força de trabalho. (BERNARDO, 2005, p. 07).
Ao refletir o papel do ócio no processo de formação e de qualificação para o trabalho, o
autor citado destaca que é durante os momentos de lazer que as pessoas adquirem a capacidade
de lidar com as organizações temporais complexas indispensáveis aos atuais processos de
trabalho. Nesses momentos, muito mais que nas escolas ou nas empresas, as pessoas adquirem
e assimilam os saberes indispensáveis para fazer progredir a produtividade na era da tecnologia
eletrônica. Ao invés de constituírem uma fuga à exploração, os lazeres tornaram-se uma parte
indispensável dos mecanismos da mais-valia. O computador, por exemplo, instrumento
destinado ao trabalho, serve também de meio de divertimento. “Todas as formas eletrônicas de
lazer constituem, por si só, uma forma de adestramento da força de trabalho, o que significa
que as pessoas passam alegremente a maior parte dos seus ócios adquirindo habilitações que as
tornam mais produtivas” (BERNARDO, 2005, p. 07).
O fato de os computadores e outros instrumentos eletrônicos servirem tanto de meio de
trabalho como de meio de divertimento permitiu que o tempo, “substância do capitalismo”
(BERNARDO, 2005, p. 07), não seja mais tempo livre, nem mesmo nos dias de folga ou
durante as atividades de lazer. É o tipo de exploração, identificada por Bernardo (2005, p. 04),
que vai além do exercício da propriedade, a chamada “exploração pelo exercício do controle”.
Pinto (1960, p. 110) sugere que “o modo pelo qual o ser humano o mundo tem como
uma das causas condicionadoras a natureza do trabalho que executa e a qualidade dos
instrumentos e processos que emprega”. Reflete ainda que o primeiro passo para a constituição
da autoconsciência crítica do trabalhador está em fazê-lo observador consciente de sua
realidade, “destacando-o desta e levando-o a refleti-la, deixando de ser apenas o seu
participante inconsciente (e por isso incapaz de discuti-la)” (PINTO, 1991, p. 99). Hirata
(1994) e Franzoi (2009) indicam que, se os saberes dos trabalhadores têm a capacidade de
alimentar e equacionar as estratégias empresariais, podem também ser utilizados para o seu
desenvolvimento e, desta forma, para renegociarem as suas condições frente à desigual
distribuição do capital.
87
4 CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS DA PESQUISA
4.1 Deficiência Física
Dentro do universo de diversificação existente na área da deficiência humana, optou-se
pelo estudo da deficiência física. Entre os motivos que levaram à escolha deste tipo de
deficiência, incluem-se as informações do Ministério do Trabalho e Emprego (BRASIL, 2008)
acerca da inserção de pessoas com deficiência no mercado formal de trabalho, por meio dos
dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS). De acordo com os números
divulgados, referentes ao ano de 2007, do total de 37.600.000 vínculos empregatícios formais,
348.800 estavam sendo ocupados por pessoas denominadas, pelas empresas empregadoras,
com
necessidades especiais
, o que representa menos de 1% do contingente de empregos formais no
Brasil. Os tipos de deficiência encontrados no total de 348.800 empregados com necessidades
especiais, são apresentados no Gráfico 2. Os dados encontrados na empresa escolhida para
realização da pesquisa também se tornaram fatores de motivação, que o universo de pessoas
com deficiência física mostrou-se amplo
54
.
Justifica-se que a exclusão dos demais tipos de deficiência da parte mais específica
desta pesquisa foi motivada única e exclusivamente pela necessidade de limitação do número
de pessoas a serem escolhidas como sujeitos da pesquisa. Tem-se claro, no entanto, que as
pessoas com deficiência – independentemente do tipo de deficiência –, são, muitas vezes,
discriminadas e marginalizadas, em especial nas relações sociais de produção.
Diferentes sistemas defi
nem
deficiência
de acordo com as suas próprias
necessidades e regulações, conforme explicitado no subitem 2.1.1 e, desta forma, a
indefinição conceitual permanece.
Nubila e Buchalla (2008, p. 03) destacam que “p
ara
quem certifica a condição, para fins de acesso a vários tipos de benefícios
, a questão
apresenta-se de modo constante: q
uem é e quem não é elegível?”.
54
Cf. subitem 2.3.
88
Gráfico 2: Pessoas com Deficiência Empregadas em 2007 – Tipos de Deficiência.
Fonte: Adaptado de Brasil (2008).
Quando é necessário o entendimento acerca de quem é a pessoa com deficiência física,
não perante a legislação brasileira, mas para as empresas e para as próprias pessoas, no
âmbito social, bem como a sua forma de interação, organização e luta nesta sociedade de
classes, parece uma tarefa fácil, considerando apenas a concepção comum e corrente de
deficiência física. No entanto, torna-se uma tarefa difícil, na medida em que se busca um
dimensionamento que ultrapasse os limites, por exemplo, da aparência física, e penetre no
âmago da questão, sugerida por Carmo (1989): o entendimento da deficiência baseada em suas
amplitudes históricas, culturais, políticas, sociais, econômicas, entre outras.
A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde,
cuja sigla
oficial é CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade) (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL
DE SAÚDE, 2003b),
é o modelo que concebe a incapacidade como resultante da
interação
entre a disfunção apresentada pela pessoa (orgânica e/ou da estrutura do corpo),
a limitação de suas atividades e a
restrição na participação social, e dos fatores
ambientais que podem atuar como
facilitadores ou barreiras para o desempe
nho das
atividades e da participação. De acordo com a OMS,
89
A CIF não é, de forma alguma, uma classificação de pessoas. Ela é uma classificação
das características de saúde das pessoas dentro do contexto das situações individuais
de vida e dos impactos ambientais. A interação das características de saúde com os
fatores contextuais é que produz a incapacidade. Assim, os indivíduos não devem ser
reduzidos ou caracterizados apenas em termos das suas deficiências, limitações da
atividade, ou restrições na participação (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE,
2003b, p. 215).
A CIF baseia-se, portanto, numa abordagem biopsicossocial
.
Assim, na avaliação
de uma pes
soa com deficiência, esse modelo destaca-se do biomédico, baseado no
diagnóstico
etiológico da disfunção, evoluindo para um
modelo que incorpora três
dimensões: a
biomédica, a psicológica (dimensão indivi
dual) e a social. Nesse modelo,
cada nível age
sobre os demais e sofre as suas ações, todos influenciados pelos fatores
ambientais.
Farias e Buchalla destacam que
O reconhecimento do papel central do meio ambiente no estado funcional dos
indivíduos, agindo como barreiras ou facilitadores no desempenho de suas atividades
e na participação social, mudou o foco do problema da natureza biológica individual
da redução ou perda de uma função e/ou estrutura do corpo para a interação entre a
disfunção apresentada e o contexto ambiental onde as pessoas estão inseridas
(FARIAS; BUCHALLA, 2005, p. 06).
Figura 3: Interação entre os Componentes da CIF.
Fonte: Adaptado de OMS (2003b).
Outra característica que este modelo comporta é a complementaridade com a
Classificação Internacional de Doenças (CID-10) (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE
SAÚDE, 2003a).
A
s con
dições ou estados de saúde propriamente
ditos (lesões,
doenças, distúrbios, etc.) são
classificados principalmente na CID-10, que fornece um
modelo basicamente etiológico,
embora tenha uma estrutura com diferentes
eixos ou
grandes linhas de construção, tais como
o anátomo-funcional, o anátomo-patológico, o
90
clínico e o epidemiológico
. A funcionalidade e a incapacidade
associadas ao estado
geral de saúde são classi
ficadas na CIF. De acordo com Farias e Buchalla (2005), a
informação sobre o diagnóstico, acrescido da funcionalidade, fornece um quadro mais
amplo sobre a saúde da pessoa, pois, por exemplo, duas pessoas com a mesma
condição de saúde podem
ter diferentes níveis de funcionalidade, e duas
pessoas com o
mesmo nível de funcionalidade não têm necessariamente a mesma condição de saúde
.
Canguilhem (1982, p. 159) afirma que “a saúde é uma margem de tolerância às
infidelidades do meio” e completa que o ser humano somente concorda que está com saúde
quando está “não apenas adaptado ao meio e às suas exigências, mas também normativo, capaz
de seguir normas de vida”. O termo
infidelidade
foi utilizado no sentido figurado, mas não
deixa de marcar o caráter relacional do entendimento sobre o meio. A infidelidade do meio,
neste sentido, é justamente história do sujeito, a contingência de suas transformações. E a
margem de tolerância que caracteriza a saúde advém da indeterminação inicial dos limites à
normatividade.
Esta visão de saúde também é considerada nesta dissertação, na medida
em que
trabalhar nunca é um fazer neutro em relação à saúde. [...] Através das diferentes
relações estabelecidas entre o indivíduo e seu trabalho, a saúde é implicada no mais alto nível”
(DEJOURS, 1993, p. 99). Dessa maneira, ainda segundo Dejours (1993), ao trabalhar
atravessado por processos de saúde, doença e subjetivação –, tanto se pode caminhar pelo
sofrimento patogênico, para o adoecimento, como também tomar o rumo, via um sofrimento
criador, para o prazer, tornando-se o trabalhar um importante operador de saúde.
A Declaração dos Direitos das Pessoas Deficientes, elaborada em 1975 e aprovada pela
Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, definiu a pessoa com deficiência física
,
“aquela incapaz de assegurar, por si mesma, total ou parcialmente, as necessidades de uma vida
individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência, congênita ou não, em suas
capacidades físicas” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, 1975). O art. do Decreto
nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999, que regulamenta a Lei Federal . 7.853, de 24 de
outubro de 1989, assim define a deficiência física:
Alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano,
acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de
paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia,
triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia
cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades
estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções
(BRASIL, 2006a, p. 177).
91
Esta última conceituação de deficiência física será a considerada nesta dissertação, junto
aos fatores de influências destacados pela CIF. O Quadro 5 apresenta, de forma resumida, os
tipos de deficiência física considerados na Lei nº. 7.853/1989.
Tipos de Deficiência Física
Tipo Definição
Paraplegia
Perda total das funções motoras dos membros inferiores
Paraparesia
Perda parcial das funções motoras dos membros inferiores
Monoplegia
Perda total das funções motoras de um só membro (inferior ou posterior)
Monoparesia
Perda parcial das funções motoras de um só membro (inferior ou posterior)
Tetraplegia
Perda total das funções motoras dos membros inferiores e superiores. Compromete
também as funções fisiológicas.
Tetraparesia
Perda parcial das funções motoras dos membros inferiores e superiores
Triplegia
Perda total das funções motoras em três membros
Triparesia
Perda parcial das funções motoras em três membros
Hemiplegia
Perda total das funções motoras de um hemisfério do corpo (direito ou esquerdo)
Hemiparesia
Perda parcial das funções motoras de um hemisfério do corpo (direito ou esquerdo)
Ostomia
Abertura obtida por procedimento cirúrgico que tem o objetivo de proporcionar uma
comunicação entre dois órgãos ou entre uma víscera e a parede abdominal, com o
objetivo de desviar os efluentes (fezes ou urina) para o exterior. No exterior estes
resíduos orgânicos são coletados por bolsas especiais.
Amputação
ou Ausência
de Membro
Perda ou ausência total ou parcial de um determinado membro ou segmento de membro
Paralisia
Cerebral
Lesão de uma ou mais áreas do sistema nervoso central, tendo como consequência
alterações psicomotoras, podendo ou não causar deficiência mental
Nanismo
Forma de hipodesenvolvimento corporal acentuado, atribuível a causas diversas, e que
pode ou não apresentar desproporcionalidade entre as várias porções constituintes do
corpo
Membros com
Deformidade
Congênita ou
Adquirida
Membro com ‘má’ formação de natureza inata ou adquirida
Quadro 5: Tipos de Deficiência Física.
Fonte: Adaptado de Brasil (2001).
Considera-se necessário problematizar ainda o termo
(d)eficiência
, utilizado no título do
subitem 3.1 e ao longo desta dissertação. Embora esse termo possa ser comumente relacionado
às ideias de incompletude, incapacidade ou até mesmo de ineficiência, como exemplificado
anteriormente: pessoa “incapaz de assegurar, por si mesma, total ou parcialmente, as
92
necessidades de uma vida individual ou social normal, em decorrência de uma deficiência,
congênita ou não, em suas capacidades físicas” (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS,
1975), aqui remete, além das especificidades físicas dos sujeitos da pesquisa, a aspectos que se
relacionam mais com o âmbito das habilidades e das competências, especialmente às
relacionadas ao corpo. Conforme definição de saúde, para Canguilhem (1982), onde esta
remete à capacidade de fazer face às infidelidades do meio, acredita-se que esta visão também
valha para o termo (d)eficiência, na medida em que é o mesmo corpo, o corpo “com
(d)eficiência física”, que enfrenta, experimenta, se forma e se usa em todas as situações da vida
social (SCHWARTZ, 1996). Esta problematização busca reestabelecer a discussão de que uma
pessoa é considerada com mais ou menos deficiência, dependendo das condições que lhes são
oferecidas.
Se o estabelecimento das diferenças entre as pessoas foi e é criado pelas próprias
pessoas, nos processos culturais, históricos, sociais, entre outros, principalmente nos
econômicos e, sendo que no modelo de produção capitalista, de acordo com Carmo (1989, p.
19), “a grande diferença existente entre pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência, no
caso do trabalho, repousa na capacidade produtiva e participativa deste processo”, a indagação
permanece: No trabalho, quem são as pessoas com deficiência?
4.2 Processo de Seleção e Critérios de Escolha dos Sujeitos da Pesquisa
Segundo Minayo (2004, p. 101), o que deve orientar a definição de uma amostra de
pesquisa é menos a representatividade numérica, do que o “aprofundamento e abrangência da
compreensão
sobre o fenômeno em estudo”. A amostra deve levar à reflexão das múltiplas
dimenes, pois sua validade está exatamente na capacidade de objetivação empírica do
objeto em estudo. Minayo recomenda o uso de critérios básicos para a amostragem.o eles:
(a) definir claramente o grupo social mais relevante para as entrevistas e para a
observação; (b) não se esgotar enquanto
não delinear o quadro empírico da pesquisa;
(c) embora desenhada inicialmente
como possibilidade, prever um processo de
inclusão progressiva encaminhada pelas descobertas do campo e seu confronto com a
teoria; (d) prever uma triangulação (MINAYO, 2004, p. 102).
A autora destaca ainda que este tipo de amostragem
93
(a) privilegia os sujeitos sociais que detêm os atributos que o investigador pretende
conhecer; (b) considera-os em número suficiente para permitir certa reincidência das
informações, porém o
despreza informações ímpares cujo potencial explicativo
tem que ser levado em
conta; (c) entende que na sua homogeneidade fundamental
relativa aos atributos, o
conjunto de informantes possa ser diversificado para
possibilitar a apreensão de
semelhanças e diferenças; (d) esforça-se para que a
escolha do
locus
e do grupo de observação e informação contenham o conjunto das
experiências e expressões que se pretende objetivar com a pesquisa
(MINAYO, 2004, p.
102).
A partir dessa consideração, foram definidos quatro grupos de informantes:
Grupo
a
: sujeitos da pesquisa;
Grupo
b
: demais empregados da empresa pesquisada;
Grupo
c
: informativos publicados pela empresa;
Grupo
d
: documentos internos.
Objetivou-se, com a formação de tais grupos, atribuir relevância a todas as fontes de dados
disponíveis. Consideraram-se informações, neste contexto, os depoimentos e comentários sobre os
(e dos) sujeitos da pesquisa, de seus locais de trabalho e do desenvolvimento de suas atividades,
publicações da empresa, o contdo dos documentos internos com os quais a pesquisadora teve
acesso durante a realização da pesquisa, dentre outros.
Buscou-se, para a definição destes grupos, atentar para as recomendações de Minayo
(2004) quanto à definição de amostragens. O critério “d” sobre a triangulação dos dados,
conforme exposto, referiu-se, nesta pesquisa, à própria definição dos grupos de informantes de
tal forma que os dados pudessem ser confrontados. Acreditou-se que o critério a”, referente
à escolha do grupo social relevante para a pesquisa, tenha sido atendido mediante a forma de
escolha dos sujeitos da pesquisa, bem como pelo agrupamento dos demais informantes,
considerando-os relevantes à pesquisa. Os critérios “be “crelativos, respectivamente, ao
não esgotamento da amostra até o delineamento do quadro empírico da pesquisa e à previsão de
inclusão de outros respondentes diante dos dados coletados, por sua natureza mais contextual e
dinâmica, mostraram-se improcedentes nesta pesquisa, não tendo sido necessária a inclusão de
novos informantes.
O processo de seleção dos sujeitos da pesquisa aconteceu do seguinte modo: a
pesquisadora teve acesso à lista dos 52 empregados classificados, pela empresa, como “tipo I –
deficiência física”, não incluindo, portanto, os empregados reabilitados que, para a empresa, em
seus registros escritos, consta grupo diferenciado. Optou-se, inicialmente, por ter como
possíveis sujeitos da pesquisa, 5 empregados efetivos, participantes do programa voltado para a
94
inclusão de pessoas com deficiência no trabalho, das quais 4 são do sexo masculino e 1 do sexo
feminino. A seleção desses empregados, como possíveis sujeitos da pesquisa, não contou com
prévio conhecimento sobre quem eram as pessoas, pela pesquisadora. Foram selecionados a
partir de critérios predefinidos, a saber:
a)
Ser participante do programa voltado para a inclusão de pessoas com deficiência no
trabalho, desenvolvido pela empresa;
b)
Trabalhar no horário administrativo, de 8:00 às 18:00, entre segunda-feira e sexta-
feira, dias e horários em que a pesquisadora obteve autorização de entrada e
permanência na empresa;
c)
Ter autorização e liberação por parte da gerência responsável pelo acolhimento da
pesquisa na empresa e pela gerência direta do empregado em questão;
d)
Aceitar formalmente participar, enquanto voluntário, da pesquisa;
e)
Estar enquadrado, pela empresa, no tipo I – deficiência física;
f)
O posto de trabalho ser acessível à pesquisadora, para que ela pudesse e tivesse
autorização para permanecer, durante as atividades de observação e de instrução ao
sósia, junto ao empregado;
Após esta primeira seleção, restaram 38 empregados. Como os setores em que se
encontram os empregados com deficiência variam muito, assim como também os cargos que
ocupam, optou-se por escolher possíveis sujeitos da pesquisa que estivessem em áreas e
fábricas diferentes, com o intuito de conhecer melhor todo o processo de produção e os
trabalhos desenvolvidos por alguns dos empregados com deficiência, nestes locais da empresa.
Justifica-se que a escolha por 4 sujeitos do sexo masculino e 1 do sexo feminino se deu,
unicamente, como forma de se ter certa representação da predominância masculina, tanto no
grupo de pessoas com deficiência física, quanto na empresa como um todo
55
, principalmente
nas áreas de produção. E que, como o intento desta dissertação não o as discussões sobre
gênero ou sexualidade, optou-se por se utilizar de tais termos, referindo-se ao que consta nos
documentos legais das pessoas envolvidas.
A lista dos possíveis sujeitos da pesquisa passou, primeiramente, pela gerência de
recursos humanos. De posse da lista, o responsável pela função entrou em contato com os
55
Dados apresentados com detalhes na Tabela 1.
95
gerentes das áreas, coordenadores ou supervisores, via telefone e/ou
e-mail
. Todos consentiram
que os possíveis sujeitos da pesquisa participassem das atividades propostas para a pesquisa.
Os sujeitos pré-selecionados foram contatados via telefone pela pesquisadora.
Agendaram-se dias e horários convenientes para as partes, para que a proposta de pesquisa
fosse apresentada e os seus possíveis sujeitos aceitassem ou não participar das atividades,
enquanto voluntários. Apresentados o plano de pesquisa e o termo de consentimento, todos
concordaram em participar, assinando o termo e obtendo cópia do documento. A pesquisadora
agendou com os sujeitos da pesquisa e, por meio das conversas durante a observação de seus
trabalhos e de entrevistas complementares, foi possível construir as suas caracterizações,
conforme é descrito no próximo subitem.
4.3 Quem são os Sujeitos da Pesquisa
Com o intuito de preservar os informantes, foram omitidos dados pessoais que
pudessem identificá-los ou, quando extremamente necessário, escritos de forma mais genérica,
nesta dissertação. Os sujeitos da pesquisa foram classificados em:
Sujeito da pesquisa I;
Sujeito da pesquisa II;
Sujeito da pesquisa III;
Sujeito da pesquisa IV;
Sujeito da pesquisa V.
As suas caracterizações foram realizadas baseando-se em: descrições pessoais gerais,
algumas das exigências de seus cargos, os seus locais de trabalho e algumas das atividades
desenvolvidas. Ainda (e somente) no intuito de evitar a identificação dos informantes, utilizou-
se, em todo o texto, o gênero masculino para se referir a eles, exceto em algumas partes, ao se
referir diretamente ao sujeito da pesquisa III. Dessa maneira, são apresentados, a seguir, os
sujeitos da pesquisa.
96
Sujeito da Pesquisa I
: sexo masculino, 39 anos, solteiro, trabalha no setor de
lingotamento contínuo. Foi contratado em 01/06/2004, como operador de produção IV, mesmo
cargo ocupado atualmente. Seus locais de trabalho são a área e a cabine do lingotamento
contínuo. Nesta cabine, trabalha junto a outros operadores de produção, utilizando-se de
computadores e monitores para o acompanhamento e para as intervenções no processo de
produção. Nas áreas são realizadas atividades diversas, que envolvem inúmeros riscos. Assim
como os demais sujeitos da pesquisa, trabalha no horário administrativo, de 7:45 às 16:15,
havendo diferença deste horário apenas para o caso do sujeito da pesquisa V. Trabalha ainda
com o revezamento 6X2/5X2, tendo, como todos os empregados, intervalo de 1 hora para
almoço. Segundo este sujeito da pesquisa, a sua deficiência se localiza na perna e no pé
esquerdos, tratando-se de sequelas provenientes da poliomielite (paralisia infantil) que teve
quando tinha 8 meses de idade, caracterizando um quadro de monoparesia. Explicou que os
músculos da sua perna ficaram atrofiados e que, por isso, “anda arrastando a perna”. Tem
ensino médio completo (cursado em escolas públicas), curso técnico em enfermagem (cursado
em instituição particular), e atualmente estuda eletromecânica, em curso promovido pela
empresa, em parceria com o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI).
Antes de ser admitido na empresa, trabalhou como despachante e cobrador no transporte
coletivo; como enfermeiro em um hospital; como cuidador, em uma instituição de educação
infantil; em uma mercearia própria; e também vendeu fraldas de sua própria fabricação.
Relatou sempre ter trabalhado e que, quando se via sem emprego, arrumava “bicos” e, assim,
conseguia se manter. Disse que o trabalho “é uma vida à parte dentro da minha vida e uma
serve à outra”. Acerca da Lei nº. 8.213/1991, disse: “Conheço a Lei, é muito boa, já que precisa
ser assim, né!”. E relatou considerar que a sua contratação, pela empresa, só aconteceu pela
existência desta lei, embora saiba ser “totalmente capaz”.
O sujeito da pesquisa I demonstrou, durante todo o tempo de realização da pesquisa, ser
comunicativo, curioso, interessado, brincalhão e ter bom relacionamento com os colegas. Disse
que o seu atual trabalho exige muita atenção, concentração, raciocínio, responsabilidade e
criatividade. Comentou que, embora nunca tenha se acidentado na empresa, está exposto a
muitos riscos, citando como exemplos os ruídos de alta frequência, a radiação, os campos
eletromagnéticos, o excesso de calor e de poeira, e os riscos com a maquinaria e de quedas.
Relatou não conhecer toda a empresa e, quanto ao processo de produção, ter apenas noção de
todo o processo, embora possa falar que conheça todos os processos do setor em que trabalha.
97
Sujeito da Pesquisa II
: sexo masculino, 28 anos, solteiro, trabalha na oficina central de
manutenção. Seu local de trabalho encontra-se em um galpão onde ficam diversos
equipamentos e máquinas de grandes proporções dispostos em fileiras e sem qualquer tipo de
divisão entre os postos de trabalho, a não ser as demarcações feitas no chão por onde se deve
circular, quando necessário. Neste seu primeiro emprego no mercado formal de trabalho, foi
contratado para o cargo de torneiro I, em 01/06/2004, para operar o torno convencional. No
entanto, desde o início trabalha com a furadeira radial. Trabalha com revezamento 5X2/6X1.
Este sujeito da pesquisa relatou possuir deficiência na perna e no pé esquerdos, uma vez que o
seu não possui todos os dedos e “uma perna é maior que a outra, devido à formação”,
caracterizando-se em um quadro de membros com deformidades congênitas. Explicou que estas
deficiências possibilitaram a sua entrada no programa de inclusão de pessoas com deficiência,
da empresa. No entanto, durante a observação de seu trabalho, disse ter também grande
dificuldade para enxergar com o olho esquerdo, que já foi avaliado por profissionais, e o uso de
lentes corretivas não ajudariam no seu caso, por ser mais uma deficiência inata, de perda
progressiva. Apresenta ainda mordida cruzada e grande dificuldade de dicção, problemas pelos
quais colegas de trabalho, inclusive o coordenador da área, acreditavam ser a razão de sua
inclusão no programa: “ele entrou no programa porque tem problema para se comunicar. Não
entendemos quase nada do que ele fala” (Informante grupo
b
). Tem ensino médio completo,
cursado em escolas públicas, e qualificação em tornearia pelo SENAI. Disse que pretende
cursar engenharia.
Relatou ter feito muitas tentativas, frustradas, de inserção no mercado formal de
trabalho, antes de ser contratado pela empresa. Disse ter se acidentado uma vez na máquina em
que trabalha, que é muito perigosa. Segundo a própria avaliação, o seu trabalho é cansativo,
exigindo muito esforço, principalmente por ter que permanecer em durante todo o tempo e
pelo ritmo de trabalho ser intenso, justificando ser assim o pelo fato de ter alguém
controlando o que faz, mas por desenvolver um trabalho com movimentos repetitivos, que
necessitam de força, habilidade manual, atenção, concentração, responsabilidade, criatividade e
raciocínio. Foi observado que este sujeito da pesquisa não considera estar exposto a ruídos de
alta frequência no local de trabalho, embora esteja e se utilize, inclusive, dos EPIs para evitar a
exposição aos riscos. Durante a realização da pesquisa foi possível observar que este sujeito se
mostra mais reservado, conversando apenas com quem se aproxima para este fim, concentra-se
na realização de suas atividades e preocupa-se em atender às normas. Relatou nunca ter lido a
Lei de Cotas, mas sabe do que trata e que, embora seja muito competente no que faz, acredita
98
ter sido contratado somente pela existência da lei. Disse não conhecer toda a empresa e os seus
processos de produção.
Sujeito de pesquisa III:
sexo feminino, 31 anos, solteira, contratada em 12/04/2004.
Trabalha com revezamento 6X2/5X2, na cabine de controle da matéria-prima, ocupando o
cargo de operadora de produção III. Nesta cabine, trabalha junto a outros operadores,
monitorando e pesando as cargas dos caminhões com minério de ferro e carvão vegetal,
utilizando-se dos sistemas operacionais. Segundo este sujeito da pesquisa, possui deficiências
inatas na mão e no esquerdos. “São más formações. Não tenho os dedos da mão esquerda e,
no meu pé, tenho apenas dois”, o que configura em um quadro de membros com deformidades
congênitas. Cursou o ensino médio em escolas públicas, e o ensino superior, em Gestão de
Recursos Humanos, em instituição particular. Comentou que a empresa e o seu trabalho são
bons, mas que não está totalmente satisfeita com o cargo que ocupa, uma vez que terminou a
graduação e pretende conseguir algo na área em que se formou. Mencionou que, antes de ser
contratada pela empresa, enfrentou muitas dificuldades e não via oportunidades de trabalho no
mercado formal; que somente nos últimos anos, após a Lei de Cotas ter sido efetivamente
implantada, as vagas vêm surgindo e sendo divulgadas. Citou, inclusive, o fato de algumas
empresas nas quais deixara seu currículo anteriormente, sem ter obtido retorno, passarem a
ligar com certa frequência para divulgar os seus processos seletivos. Disse ter trabalhado
como secretária em uma clínica dentária e como agente de saúde. Durante a pesquisa
demonstrou ter habilidade no desenvolvimento de suas atividades, ser comunicativa e se
esforçar em manter o bom relacionamento no ambiente de trabalho. Classifica o seu trabalho
como monótono, repetitivo e exaustivo, por exigir que passe todo o tempo sentada, na frente do
computador e demais equipamentos, pelo ritmo ser intenso e cansativo, exigindo concentração,
responsabilidade, atenção e habilidade manual. Relata não conhecer toda a empresa e todo o
processo de produção, embora perceba que a empresa venha incentivando visitas às áreas.
Sujeito de Pesquisa IV:
sexo masculino, 44 anos, casado, contratado em 01/06/2004
para o cargo de preparador de ferramentas I. Atualmente ocupa o cargo de preparador de
ferramentas III, com revezamento 5X2/6X1. A cabine da ferramentaria, onde trabalha, é uma
sala que fica no setor de trefilaria. Permanece tanto em pé, quanto sentado, pois necessita lançar
dados de controle no computador e nas fichas físicas dos empregados, preparar e distribuir as
ferramentas de trabalho e os EPIs. Segundo o sujeito da pesquisa, quando criança teve
poliomielite, ficando vários anos sem andar. Após seções diárias de fisioterapia conseguiu
99
andar “com ajuda de muletas e de uma órtese especial que ia da cintura até os joelhos”,
podendo dispensá-las apenas no início da adolescência. Anda com certa dificuldade,
“mancando e arrastando a perna direita”. Apresenta monoparesia, mas diz que sempre teve “fé
e acreditava que voltaria a andar”, que a sua condição hoje não o atrapalha em nada e que é
muito agradecido por ter conseguido voltar a andar. Conta com entusiasmo, inclusive, sobre a
solidariedade de um amigo:
Sempre vou na casa dele e ele sabe que eu tenho dificuldade de subir e descer os
degraus da escada, ! E eram muitos na entrada principal. o que ele fez: ele
construiu uma rampa com corrimãos do lado da escada, sem eu ver. No dia do meu
aniversário ele fingiu que não tinha lembrado, mas me convidou para ir até a sua casa.
Cheguei lá, vi a rampa e ele disse que a construiu para que eu tivesse melhores
condições de acesso a casa dele. Nossa senhora, eu até chorei, porque nesse meu
tempo de vida o que eu sempre vi foi muita discriminação e muita gente indiferente
com as necessidades dos outros (Sujeito da pesquisa IV).
Este sujeito da pesquisa tem ensino médio completo, cursado em escolas públicas e diz
que pretende fazer o curso técnico de ferramentaria. Tem carro próprio adaptado, mas diz
utilizar e gostar do transporte oferecido pela empresa, ainda que este não tenha adaptações.
Mostrou-se bastante desconfiado e receoso durante a realização da pesquisa,
principalmente ao ser solicitado a assinar o Termo de Consentimento de Pesquisa e na atividade
de instrução ao sósia. Por diversas vezes a pesquisadora precisou explicar os objetivos da
pesquisa e que a atividade de instrução ao sósia não passava de uma técnica. No entanto,
mostrou-se também interessado e dedicado em colaborar em todas as etapas.
Relatou não estar exposto a riscos dentro da cabine, a não ser o de quedas. Comentou
que o seu trabalho exige saberes que não são repassados, pois depende muito da observação e
da avaliação pessoal que se faz das condições das ferramentas e dos EPIs. Está satisfeito com o
seu trabalho que, “embora não exija muita criatividade, eu sempre me utilizo dela para
melhorar os locais de trabalho”. Disse considerar impossível conhecer toda a empresa, por ela
ser muito extensa, mas que tem boa noção de todo o processo produtivo e que a empresa tem
promovido mais visitas às diversas áreas, com os empregados inclusive, nas demais empresas
do grupo no Brasil.
Comentou que nunca teve dificuldades em encontrar emprego, embora percebesse não
ter divulgação de trabalho para pessoas com deficiência, como acontece hoje. Sempre trabalhou
em oficinas mecânicas e que nem estava procurando outro emprego, quando o avisaram da
seleção na empresa. Procurou saber do que se tratava, participou do processo e foi contratado.
Sobre a Lei nº. 8.213/1991, considera-a importante e que “ajuda muito, mas que as pessoas com
100
deficiência precisam estudar, ter formação, dedicação e muita responsabilidade!”. Acrescentou
ainda que “embora seja uma obrigação, trouxe nova visão à sociedade, no sentido de que hoje
podemos entrar na sociedade de uma forma mais digna, coisa que não acontecia antes”.
Sujeito da Pesquisa V:
sexo masculino, 37 anos, solteiro, contratado em 12/04/2004.
Trabalha na superintendência de Tecnologia da Informação (TI), tendo o cargo de planejador
júnior. A sala onde trabalha é ampla, com divisórias nos postos de trabalho, mas possibilitando
a visão de todos os empregados. Localiza-se no segundo andar do mais novo prédio
administrativo da empresa, que possui melhores condições de acessibilidade física que os
demais. Segundo este sujeito da pesquisa, trabalha meio período desde quando foi contratado,
para poder estudar e cuidar melhor da saúde. Disse que, ao ser contratado, estava na graduação,
tendo optado por trabalhar apenas meio período, recebendo salário proporcional. Atualmente
frequenta outro curso superior, desta vez a distância, o que é mais cômodo, que não precisa
se locomover. Trabalha no horário administrativo, geralmente no período vespertino, com
folgas aos finais de semana.
Adquiriu a sua deficiência aos 22 anos, quando passava um final de semana com os
colegas do curso de medicina veterinária, em um sítio. Ao pular na piscina, bateu a cabeça no
fundo e desmaiou. Ao acordar, na beirada da piscina, não sentia o seu corpo. Tornou-se
tetraplégico. No seu caso, consegue movimentar, embora com muita dificuldade, sem força e
sem movimentos finos, os braços e a mão direita. Apresenta espasmos
56
nas pernas, com
movimentações involuntárias. Tem curso superior incompleto em Medicina Veterinária; curso
superior completo em Governança de TI; curso superior em Sistemas de Informação, em
andamento; Pós-Graduação em Estatística; e Pós-Graduação em Gestão de TI.
Relata que antes de ser contratado pela empresa, trabalhou durante 3 anos e meio na
empresa de um primo, também em meio horário. A empresa fabrica uniformes escolares e ele
ocupava o cargo de operador de micro. No entanto, pediu demissão ao decidir voltar a estudar.
Na mesma época em que passou no vestibular, participou do processo seletivo na empresa em
que está e foi contratado. Na mesma época também foi chamado para assumir um cargo público
de um concurso que havia feito, mas preferiu permanecer na empresa, por esta lhe oferecer,
segundo o próprio sujeito da pesquisa, “melhores condições financeiras e pelo fato do cargo ser
melhor”.
56
“Contração súbita, de duração variável, podendo haver movimentação involuntária” (FERREIRA, 2004).
101
Disse desconhecer a nº. Lei 8.213/1991. No entanto, após ser comentada pela
pesquisadora, disse ter ouvido sobre ela, estranhando apenas o fato de ser do ano de 1991:
“Nossa, mas ela é de 91? Levaram tanto tempo assim para se adaptarem?”. Fala que o seu
trabalho oferece riscos ergonômicos, mas que os principais são advindos da sua própria
condição, por permanecer sentado a maior parte do tempo e não poder deitar-se quando
necessita.
“Não posso falar que conheço toda a empresa, pelo fato de não ter visitado todas as
áreas, mas tenho boa noção do processo produtivo como um todo, pelo fato do meu trabalho
exigir interação com todas as áreas da empresa”. Quanto ao ritmo de trabalho, considera-o
tranquilo; tem as exigências de prazos, mas somente pelo fato de outras pessoas necessitarem
de seus relatórios para dar prosseguimento em reuniões e decisões. Relatou ainda a necessidade
de cumprir determinadas metas mensais e anuais. Expressou ter autonomia para decidir as
prioridades e as formas de realização de seu trabalho, desde que o realize corretamente e no
tempo solicitado. Em virtude de suas condições físicas, relata necessitar de um acompanhante
durante 24 horas; tem carro próprio, adaptado.
102
5 CONFRONTAÇÕES DE SABERES NO TRABALHO: ANÁLISE CONSTRUÍDA
COM OS SUJEITOS DA PESQUISA
5.1 As Renormalizações como Forma de Mediação entre Prescrito e Realizado:
Confrontando Discursos, Conteúdos e Situações
Utilizando-se da abordagem ergológica do trabalho, buscou-se pensar os ingredientes da
competência (SCHWARTZ, 2000), junto aos dados obtidos com a pesquisa de campo.
Acredita-se que tais ingredientes sirvam como base para a análise dos dados. As normas
antecedentes e as renormalizações foram consideradas principais norteadoras das análises,
devido ao objetivo geral da pesquisa e pelo fato de elas estarem, respectivamente, relacionadas
às noções de trabalho prescrito e de trabalho realizado, podendo ser consideradas uma
ampliação desses conceitos. Expõe-se, a seguir, a forma com que foram considerados, nesta
dissertação, os ingredientes da competência (SCHWARTZ, 2000) e as suas respectivas relações
com os dados obtidos.
As
normas antecedentes
(SCHWARTZ, 2000) referem-se à antecipação de sequências,
neutralizando a dimensão conjuntural da situação de trabalho. Segundo Schwartz (2002), as
normas antecedentes configuram-se a partir dos objetivos da atividade, das regras impostas ao
trabalhador, dos saberes transmitidos, necessários para a realização do trabalho, das formas
previstas e/ou prescritas de sua realização, além das condições oferecidas para a realização do
trabalho.
Por meio das técnicas de observação, instrução ao sósia, autoconfrontação simples e da
entrevista semiestruturada, foi possível perceber que, embora os sujeitos da pesquisa afirmem
conhecer e ter acesso aos documentos contendo os procedimentos operacionais, ao serem
solicitados a falar sobre eles, sem tê-los em mãos, expressam-se de maneira simplificada e sem
muitos pormenores. Conforme afirma Wisner (1987, p. 82): “a imagem operatória
57
do
trabalhador em geral é simplicada. [...] Em todo caso, é indispensável conhecer a imagem
operatória de uma pessoa se quisermos observar o seu trabalho”. Sobre este aspecto, Cunha
afirma:
57
De acordo com Wisner (1987, p. 81), a imagem operatória é a imagem funcional que o trabalhador possui do
dispositivo sobre o qual trabalha. É a partir desta imagem que o trabalhador colhe informações, decide, segue
uma estratégia e age, ou deixa o processo prosseguir.
103
O fato de inúmeras vezes não ser possível explicar o que se faz não significa ausência
de regras implícitas, de atividade conceitual, de conhecimentos acompanhando essas
escolhas e gestões das situações. Essas escolhas são ancoradas em sínteses de uma
multiplicidade de elementos difíceis de serem explorados, ordenados, verbalizados
(CUNHA, 2007, p. 06).
Deve-se reconhecer que os documentos contendo as prescrições para os trabalhos são
extensos e possuem grande riqueza de detalhes, tornando-se difícil falar sobre os seus
conteúdos na íntegra, estando na situação supracitada. Nota-se que tais documentos contêm,
inevitavelmente, inúmeros termos técnicos. Portanto, para a melhor compreensão, por parte da
pesquisadora, do que estava sendo solicitado aos sujeitos da pesquisa, tornou-se necessário o
esclarecimento de tais termos, o que foi feito pelos próprios sujeitos da pesquisa, com eventuais
colaborações de seus colegas de trabalho. Tais esclarecimentos sugerem que os sujeitos da
pesquisa conhecem as prescrições para os seus trabalhos e que dominam os conceitos ali
relacionados.
Sobre as prescrições advindas da empresa escolhida para a realização da pesquisa, um
informante (grupo
b
) afirmou que
Os documentos de descrição de cargos e procedimentos operacionais o os mesmos
para qualquer empregado, seja ele com deficiência ou o. O que é necessário avaliar
são as condições de cada pessoa para realizar o que está sendo solicitado, da forma em
que está sendo solicitado. Se consideramos que é inviável uma pessoa realizar alguma
das tarefas, se isso a expõe a um grau mais elevado de risco, por exemplo, repassamos
a tarefa a quem está apto a desenvolvê-la (Informante grupo
b
).
A partir dessa fala, pode-se inferir que a empresa apresenta ou mesmo somente passa a
visão de certa prudência em relação à aplicação das prescrições, concebendo a necessidade de
se considerar as particularidades de cada pessoa, suas capacidades e limitações, ajustando o que
for necessário para o bom desempenho das tarefas atribuídas a cada cargo. Ressalta-se,
entretanto, que, em certas situações, mesmo as pessoas que apresentam maior dificuldade para
desempenhar determinadas tarefas necessitam executá-las. Como exemplo, cita-se o caso do
sujeito da pesquisa V. Para o seu cargo, exige-se a realização de uma tarefa relacionada à
gestão de ativos de TI, em que são exigidas avaliações técnicas nos locais onde se encontram os
equipamentos. Como este sujeito da pesquisa apresenta dificuldade de acesso a algumas áreas,
advinda tanto da sua condição física, quanto da estrutura arquitetônica de tais áreas, ele
realiza as visitas quando outras pessoas, também tecnicamente aptas, não estão disponíveis.
Cumpre-se, assim, uma das exigências do seu cargo por meio da cooperação de sua equipe, que
também tem o seu trabalho realizado, com a colaboração do sujeito da pesquisa. Conforme
104
pôde ser percebido pelos depoimentos dos seus colegas de trabalho, estes não se importam de a
equipe redistribuir as tarefas, em função da maior dificuldade de acesso do sujeito da pesquisa
V às áreas. Este caso exemplifica a questão da renormalização coletiva do trabalho, por meio
da construção coletiva de saberes, uma vez que o modo de realização dos trabalhos nem sempre
obedece rigorosamente às prescrições da empresa, sendo redefinidos pela equipe.
Os recursos e serviços denominados tecnologias assistivas
58
muitas vezes funcionam
como literais extensões do corpo (d)eficiente. As tecnologias de base microeletrônica, no geral,
também colaboram para que as pessoas com algum tipo de deficiência possam se adaptar
melhor ao mundo dos então sem deficiência, no que diz respeito à ampliação da comunicação,
mobilidade, aprendizagem, controle de seu ambiente, trabalho e inclusão. Na empresa, embora
algumas adaptações tenham sido feitas, quando da contratação dos empregados com
deficiência, outras sejam constantemente sugeridas e/ou realizadas pelos próprios sujeitos da
pesquisa, e estes, no geral, considerem, segundo dados obtidos com a entrevista
semiestruturada, que as condições de trabalho na empresa são boas, foram encontrados
dificultores para o bom desempenho dessas pessoas e, consequentemente, para o
desenvolvimento dos seus trabalhos. Dificultores estes que podem gerar, inclusive, sobrecargas
de trabalho nocivas à saúde, além de possíveis acidentes. São exemplos destes:
a)
A falta de rampas e de corrimãos nos locais de trabalho do sujeito da pesquisa I, o
que dificulta ainda mais a sua locomoção;
b)
O fato de as normas de segurança exigirem que o sujeito da pesquisa II permaneça
em pé em seu local de trabalho, durante todo o tempo;
c)
O caso do sujeito da pesquisa III que contava, em seu posto de trabalho, com uma
cadeira com características inadequadas à sua baixa estatura, fixa e sem regulagens
59
;
d)
A falta de rampas e de corrimãos nos locais de trabalho do sujeito da pesquisa IV, o
que dificulta a sua locomoção, bem como colabora para eventuais acidentes de
trabalho;
e)
A porta da sala onde o sujeito da pesquisa V trabalha é inadequada às suas
necessidades, exigindo que outra pessoa esteja disponível para abri-la e fechá-la toda
vez que ele precisa transpô-la.
58
No Brasil, encontram-se terminologias diferentes que aparecem como sinônimos de tecnologia assistiva, tais
como: ajudas técnicas, tecnologia de apoio, tecnologia adaptativa e adaptações.
59
Ressalva-se, no entanto, que esta cadeira foi trocada por um modelo considerado adequado pela empresa,
durante o período de realização da pesquisa de campo.
105
Este último ponto ressaltado denota um empecilho que transgride, inclusive, a
Lei n
o
.
10.098, de 19 de dezembro de 2000, que conceitua acessibilidade como
A possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia,
dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e
dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com
mobilidade reduzida (BRASIL, 2006b, p. 113).
Para efeitos da lei supracitada, considera-se barreira “qualquer entrave ou obstáculo que
limite ou impeça o acesso, a liberdade de movimento e a circulação com segurança das
pessoas” (BRASIL, 2006b, p. 113). Tais barreiras podem ser classificadas como “barreiras
arquitetônicas na edificação”, que são as existentes “no interior dos edifícios públicos e
privados”.
As adaptações destacadas são necessárias para que os sujeitos da pesquisa consigam
desenvolver, da melhor forma, os seus trabalhos. Fazem parte das condições de trabalho
oferecidas pela empresa: meios, instrumentos, maquinaria, ambiente, ritmo, dentre outras
funcionando como mediadoras para o trabalho a ser realizado e, consequentemente, como
estratégias para o melhor rendimento físico e aumento da produtividade. Evitam-se, assim,
indenizações por acidentes e lesões, perda de um empregado em determinado posto de trabalho
para o qual tem experiência e saberes, dentre outros interesses empresariais. Com o fato de os
sujeitos da pesquisa, sem exceção, afirmarem que as condições de trabalho na empresa são boas
mesmo estando expostos aos riscos eminentes e iminentes advindos da natureza do trabalho
que realizam, terem consciência deles e relatá-los, conforme exemplificado com as suas falas, a
seguir – e que não são necessárias mais adaptações – ainda que tenha sido observado o
contrário –, foi possível constatar a “visão naturalizada” (Cf. LIMA, 2006) que têm de
seus trabalhos, parecendo desconsiderar a possibilidade de existirem recursos técnicos e
melhores condições de trabalho.
O meu trabalho oferece muitos riscos: queimadura por projeção ou por contato;
quedas em altura; lugares mais altos; quedas de materiais em ponte rolante; de carga
suspensa; aqui tem muita escada; é muito calor quando estou na área do lingotamento
e frio na cabine; lido com radiação; campos eletromagnéticos. Não tem como ser
diferente (Sujeito da pesquisa I).
Se a broca quebra, em alta rotação, é muito perigoso! Já aconteceu comigo várias
vezes, mas elas o vieram para cima de mim. Gosto nem de pensar! Acidentei na
máquina uma vez e quase perdi um dedo! [...] Fico chateado quando furo mais que
precisava na peça, tem que mandar para o soldador tentar recuperá-la. Isso
acontece, na maioria das vezes, quando tem broca empenada. Prejudica o trabalho.
[...] Tem muito esforço físico também. Ficar em o dia inteiro é horrível! Por vezes,
como te falei, “dou uma voada”, sento um pouco, mas sempre longe do pessoal. É
muito tempo de ! (Silêncio) Já perguntei na reunião de segurança, se poderiam
106
colocar uma cadeira, mesmo que eu não trabalhasse sentado, nem ficasse o tempo
todo nela. Isso já tem tempos, não me responderam nada (Sujeito da pesquisa II).
Na área estou exposta a muita poeira! Na sala tem os problemas ergonômicos, porque
trabalho sentada o tempo todo. Tenho que movimentar, mas é de um lado para o outro,
para alcançar os equipamentos. Pessoal da ergonomia fala para levantar de tempos em
tempos, mas é tão corrido, não dá para parar a fila de caminhões na pesagem. [...]
Estou exposta a todos os riscos, porque mesmo não estando nas áreas, se acontece
algo em maior proporção, pode atingir todos nós (Sujeito da pesquisa III).
Calor eu não estou exposto não, lá fora, porque aqui tem ar condicionado. Mas não
pensa que é por minha causa não. É porque ajuda na manutenção das ferramentas
(Risos). [...] Aqui na área tem muito ruído de alta frequência, riscos com a maquinaria
e com as ferramentas, que podem, inclusive, caírem, quebrarem, prenderem e puxarem
as pessoas (Sujeito da pesquisa IV).
Por trabalhar na área administrativa, não vejo grandes problemas. O prédio em que
trabalho é o mais novo da empresa. Construíram ele pensando nessas questões,
fizeram rampas de acesso, plataforma elevatória. [...] Ah, também o banheiro. Tenho
um exclusivo para mim, para ter privacidade, já que faço cateterismo
60
. As adaptações
nele são as barras e o lavatório, o restante é igual. O que pode ocorrer comigo são
quedas, fora os riscos ergonômicos do trabalho e os gerados pela minha condição. Se
eu o cuido, se não dou uma levantadinha assim de lado (Demonstra como faz), de
vez em quando, dá escaras
61
(Sujeito da pesquisa V).
Compreende-se que estas visões naturalizadas dos trabalhos e das condições que são
oferecidas dos riscos a que estão expostos, da falta de melhores adaptações dificultam a
própria busca por mudanças na realidade do trabalho. Como disse o sujeito da pesquisa I: “O
ser humano tem a capacidade de se acostumar com as situações”. Ou um informante (grupo
b
):
Aí está o perigo, pois as pessoas que trabalham expostas aos riscos, acabam se
acostumando com os sinais que são dados, anunciando possíveis acidentes. As pessoas
depois de um tempo expostas a esses ruídos, não permanecem mais em estado de
alerta, o que pode facilitar a ocorrência de acidentes no trabalho (Informante grupo
b
).
Compreende-se também que os sujeitos da pesquisa, provavelmente, tiveram como
parâmetro de comparação, quanto às suas atuais condições de trabalho, os seus passados com
tentativas frustradas de inserção no mercado formal de trabalho, o que pode colaborar para o
estabelecimento e para a permanência da condição de “assujeitamento consentido” (Cf.
BARBOSA, 2009). Um exemplo pode ser dado a partir da fala do sujeito da pesquisa II:
60
Cateterismo intermitente é um método para promover o esvaziamento da bexiga por meio da introdução de uma
sonda na uretra, que deve ser retirada assim que a bexiga estiver vazia. De acordo com Yuan (2009), o
procedimento deve ser realizado a intervalos regulares, normalmente com frequência de quatro vezes por dia.
Isso se faz necessário pelo fato de pessoas com tetraplegia desenvolverem uma disfunção denominada bexiga
neurogênica, que é a perda da função normal da bexiga urinária provocada pela lesão de uma parte do sistema
nervoso.
61
“Crosta resultante da mortificação de tecido, devido a causas diversas: compressão ou traumatismos repetidos”
(FERREIRA, 2004).
107
Antes de entrar nesta empresa, eu “fazia bico”. Capinava lotes e fazia jardins. Não
ganhava quase nada e trabalhava muito, no sol e na chuva. Fiz rias tentativas e
ficava frustrado por não conseguir. Teve lugar que eu sabia que tinha vaga para minha
formação e já na portaria, as pessoas falavam que não tinha, não deixavam nem entrar!
Imagino que pelo preconceito. (Silêncio) É, pode ser mesmo por preconceito
(Ênfase dada à palavra preconceito), pois eu fui, falaram que não tinha vaga, no
mesmo dia um colega meu, que tem a mesma formação foi e foi contratado. Neste
caso, olharam só a aparência, não me deixaram nem mostrar que poderia desempenhar
bem a função, não me deixaram nem conversar! Aí, eu o corri atrás deste também
não, não queria trabalhar com quem não me quisesse. Em muitos ambientes eu notava,
e ainda noto, que as pessoas me olham diferente. Olham muito, sabe? Ficam
reparando, me sinto excluído e rejeitado! Seja pelo olhar, pela conversa, mas quando
percebo que a pessoa não está satisfeita comigo, por eu ter uma deficiência, oh, vou
embora! (Faz gestos com as mãos, dando ênfase à sua fala) Ninguém precisa aceitar
isso, não a esse ponto! [...] Aqui é diferente. Gosto do pessoal, não fazem gracinhas
comigo, e gosto do trabalho também, é muito melhor que “fazer bico”, aí nem fico
reclamando “as coisa” com eles, dá pra despistar (Sujeito da pesquisa II).
A introdução das novas tecnologias no trabalho, principalmente as de base
microeletrônica, são, muitas vezes, alvo de preocupação. No entanto, acredita-se que as
tecnologias, em si não se configuram um problema, especialmente no caso de pessoas com
deficiência física, pois muitas vezes funcionam como adaptações ou como outros meios de
trabalho. O problema parece residir no uso que se faz de tais tecnologias e no tipo de relação
estabelecida para com as mesmas. Sobre este aspecto, chama-se a atenção para a fala de um
informante (grupo
b
):
No meu cargo, preciso lidar com dois tipos de situação, que envolvem a mesma
probletica: se eu solicito a compra de maquirio mais moderno para a área,
preciso justificar isso à empresa que, como sabemos, visa prodão, lucro, então
acabo tendo que diminuir pessoas na área de prodão para justificar a compra do
maquinário, que é caro. Olho para as pessoas que trabalham comigo, as que
reclamam ou mesmo questionam as condições de trabalho, a maquinaria e penso
comigo: ou continua assim, ou acabao mandando você ou um colega de trabalho
embora. Eu acabo me sentindo responsável pelo desemprego dessas pessoas e a
mesmo pelo meu. Assim é o sistema (Informante grupo
b
).
Ressalta-se que na mesma área em que trabalha este informante, o sujeito da pesquisa II
não conta, em seu posto de trabalho, com uma talha, e que a ponte rolante, que poderia atendê-
lo, fica constantemente ocupada com a movimentação de peças maiores e/ou mais pesadas. O
sujeito da pesquisa reconhece que, para a sua segurança, deveria esperar a ponte rolante ficar
liberada para poder utilizá-la, mas, no intuito de não se mostrar ocioso, prefere carregar as
peças que consegue até a mesa, para dar continuidade ao seu trabalho e, desta forma, acredita
poder manter o seu emprego, conforme explicitado em sua fala:
108
pedi para colocarem uma talha aqui, aporque quando eu estava no estágio de
treinamento, ficava naquela outra máquina ali, onde tem talha. Sem ela é complicado,
você está vendo aí, as peças são grandes, pesadas, suas formas não são certinhas, o
todas diferentes, podem cair e não dá para carregar de qualquer jeito, além do peso,
algumas podem cortar. Tinha que esperar a ponte rolante, mas se for esperar para cada
peça, vou ficar é esperando a tarde toda! Sempre trabalhei aqui e nunca falaram em
colocar a talha. Também prefiro não ficar falando, insistindo. me falaram que com
maquinaria nova aqui, podem mandar gente embora. Eu o quero perder o emprego
(Sujeito da pesquisa II).
Por meio principalmente das histórias de vida, compartilhadas com a pesquisadora, foi
possível perceber o tipo de relação que os sujeitos da pesquisa estabelecem com as suas
deficiências. Coincidentemente ou não tais tipos de relação se mostraram semelhantes
dependendo da variável tipo de deficiência física. Assim, os sujeitos da pesquisa que
apresentam deficiências decorrentes de sequelas de poliomielite sujeitos da pesquisa I e IV
demonstraram, especialmente por meio de seus discursos, encararem a deficiência de forma
natural ou até mesmo como uma conquista por terem voltado a andar. “Não me importo de ter
uma pequena deficiência na perna, afinal poderia ser muito pior e não é. Não me vejo sem ela,
é minha, faz parte do meu corpo” (Sujeito da pesquisa I). “Agradeço a Deus todos os dias, por
ter me permitido voltar a andar. Eu poderia não conseguir ou precisar de muletas, mas
arrasto um pouco a perna, isso é uma bênção para mim!” (Sujeito da pesquisa IV). O sujeito da
pesquisa V, que adquiriu a tetraplegia aos 22 anos, relatou que, nos primeiros anos após o
acidente, viveu momentos de intensa desilusão, mas que o tempo e a maturidade ajudaram-no a
perceber que poderia ter uma vida melhor se encarasse a sua condição de forma diferente da
que vinha encarando e lutasse por uma vida mais digna, dentro de suas capacidades e
limitações. E os sujeitos da pesquisa que apresentam deficiências congênitas sujeitos da
pesquisa II e III relataram grandes dificuldades em lidar com as diferenças, sobretudo as
físicas e no ambiente escolar quando crianças:
Era bom aluno, tinha bom comportamento, boas notas, nunca fui de fazer bagunça.
os colegas, “zoavam”, olhavam diferente, falavam palavras que me faziam mal. Não
conversavam comigo. Eu chegava para conversar, todo mundo desviava. Trabalho em
grupo? Era sempre martírio! Tinha que fazer sozinho e tirava notas ótimas! Sabe
aquelas feiras de cultura que tem nas escolas? A minha sala ia fazer trabalho na área
de biologia, sobre corpo humano. Foram divididas as turmas, queria ficar em um
grupo, não deixaram. Falei com a professora, ela disse que eu precisava entrar em um
grupo de qualquer jeito! Conversou com a turma, me senti muito mal! Ninguém se
manifestou! Mesmo assim, ela insistiu que eu entrasse em um grupo. Eu disse que o
ia entrar desse jeito, que podia fazer sozinho, que achavam que eu o era capaz. A
professora então me mandou fazer uma maquete. Eu perguntei: “Mas maquete,
professora? Maquete não é de casas, carros, ruas?” Ela falou: “Pode ser, mas no caso,
você vai fazer uma maquete do coração”. Pensei: “Poxa vida, como vou fazer uma
maquete do coração? É muito difícil!”. Cheguei em casa sem saber o que fazer!
Olhava coração nos livros, coração fechado, coração aberto. Conversei com meu pai,
ele também pesquisou. Peguei isopor, cortei 40 por 40, argila, cartolina e meu pai
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falou para eu colocar mangueirinhas fininhas para artéria. A professora ficou boba! Os
meninos queriam entrar no “meu grupo(Falando ironicamente). Também não deixei!
Fiz sozinho porque o me deixaram participar com eles! A professora tinha
estipulado 10 pontos, me deu os 10 e mais 5, por ter feito sozinho, com dedicação e
qualidade. Em toda sala eu era mais sozinho. Nunca tive amigo na escola, nenhum que
quisesse estar comigo. Hoje em dia mesmo, tem muitas coisas que quero conversar,
não tenho ninguém. Tenho meus pais, mas tem coisas que quero conversar com outras
pessoas e não tenho essas pessoas. Meus irmãos sempre tiveram vergonha de mim.
Tomei muito “coro” por querer ter amigos, me ajudou a ficar ainda “mais pra
baixo”! Perto de casa, tem muita companhia, mexem com coisa que não pode.
Também, não bebo, os outros querem isso! Não tenho paciência, não saio com
gente assim, fico na minha mesmo. [...] Hoje eu me aceito melhor (Sujeito da pesquisa
II).
As minhas experiências escolares foram as piores possíveis! Nossa! Muito ruins
mesmo, gosto nem de lembrar! Passei por momentos de muita introversão,
principalmente no ensino fundamental. As professoras tentavam me fazer sentir bem,
era pior, tentavam me incluir nas brincadeiras e chamava a atenção, eu não gostava,
sentia-me constrangida. (Hesitação) Hoje sei que faziam isso para o meu bem, mas
nossa! Era muito ruim, minha auto-estima vivia embaixo! As meninas gostavam de
mim, escondia a minha mão e estava tudo bem. Quando descobriam a minha mão, que
ela é assim, nossa! Elas se afastavam, ficavam de cochicho. Até hoje quando saio na
rua, preciso me preparar para os olhares e para as perguntas indiscretas. Muita gente
nem me conhece, quer saber de tudo, mas isso eu entendo. Se gostam de mim bem, se
não gostam, já tenho resposta: eu não me importo com essas pessoas mais. Antes
usava blusa de frio para esconder, podia estar o calor que tivesse! O foi sempre
mais fácil esconder, uso tênis. Então, a hoje, colegas de infância quando me
encontram perguntam se eu sofri algum acidente, se aconteceu alguma coisa com a
minha mão, porque eu sempre escondia, muitos nem sabiam como era a minha mão!
Hoje não escondo mais. Tenho uma vida normal. Mas demorei a aceitar e ficava muito
ruim, principalmente quando as pessoas falavam naquele sentido: “poxa, uma menina
tão linda nascer assim?” Me passava um sentimento de pena e de dó. Era horrível!
(Sujeito da pesquisa III).
Durante a realização da pesquisa observou-se também a existência da visão espiritual da
deficiência, por parte de alguns informantes (grupo
b
), manifestando-se, principalmente, sob
forma de crenças e de ações de caridade. Compreendendo que são inúmeros os fatores que
colaboram para o estabelecimento da relação da pessoa com o próprio corpo, ressalta-se que as
realidades destacadas foram percebidas a partir dos sujeitos desta pesquisa, não sendo, de
forma alguma, regra para os demais casos.
Em relação à concepção das prescrições para um dado tipo de trabalho, Leplat e Hoc
(1998, p. 169) destacam que “toda descrição implica certo modelo de sujeito”. Em virtude
dessa premissa, sobre as experiências e os saberes exigidos quando da contratação dos
empregados com deficiência, observou-se que a empresa foi menos rigorosa do que se fosse
contratar pessoas sem as deficiências incluídas na Lei nº. 8.213/1991. Como a empresa
contratou os empregados com deficiência mais ou menos na mesma ocasião, como mostra a
Tabela 3, inclusive na mesma época em que o Ministério do Trabalho e Emprego passou a
aplicar as multas gradativas às empresas que não cumpriam a legislação, teve que selecionar
110
entre os empregados com deficiência que apresentavam conhecimentos ou mesmo habilidades
para ocupar algum cargo, ainda que não apresentassem experiência. Ao confrontar as
prescrições para os cargos dos sujeitos da pesquisa com as condições em que estes se
encontravam, quando das suas contratações, observou-se que nenhum possuía a experiência
exigida, embora alguns tivessem cursos em áreas próximas às atualmente ocupadas (sujeitos da
pesquisa II, III, V) e todos possuíssem a escolaridade mínima exigida.
No cotidiano de trabalho, observou-se que essa estratégia de flexibilização, utilizada
quando das suas contratações, não se aplica. Empregados com deficiência são tratados da
mesma forma, estão sujeitos às mesmas normas, inclusive de segurança, têm os mesmos
benefícios, desempenham todas as tarefas para as quais estão habilitados, precisam ter as
mesmas responsabilidades, seus desempenhos são avaliados nas mesmas condições e são
demitidos ou promovidos da mesma forma que os demais empregados. Mesmo assim,
contrariando o que foi observado, no geral, e o que os demais sujeitos da pesquisa relataram, o
sujeito da pesquisa II, quando indagado se ele percebe alguma diferença no tratamento ou na
segurança do trabalho que poderiam ser atribuídas ao zelo em decorrência de suas condições
físicas, relatou: Imagino que sim. Percebo diferença na forma de me tratarem, tratam com
muita delicadeza e receio! Precisariam ter cuidado sim, mas em outros aspectos, como nas
necessidades individuais e somente o essencial”. Exceção esta que pode ser entendida pelas
próprias diferenças entre as pessoas, seja por uma questão de percepção, seja por esta pessoa
necessitar de mais cuidado em algum aspecto, seja pelo fato de algumas pessoas serem
naturalmente mais cuidadosas para com as outras, ou mesmo por não terem conhecimento das
necessidades, dificuldades e condições do sujeito da pesquisa em questão.
Quanto ao desempenho de tarefas para os quais estão habilitados, destaca-se a iniciativa
da empresa em dar oportunidade ao sujeito da pesquisa III de ocupar um cargo melhor, quando
da sua contratação. Por possuir os dedos de apenas uma das mãos, poderia ser considerada não
habilitada para certos cargos, inclusive para este, onde se trabalha com o computador. No
entanto, o setor de Recursos Humanos concedeu a este sujeito da pesquisa um período de
experiência no cargo e a oportunidade de optar em trabalhar neste ou em outro cargo,
considerado mais simples e/ou mais apropriado à sua deficiência. O sujeito da pesquisa III
optou por tentar o cargo onde se trabalha com o computador, e rapidamente desenvolveu
habilidades manuais.
Outro aspecto esclarecido durante as entrevistas semiestruturadas foi sobre o tratamento
dispensado aos sujeitos da pesquisa, na empresa. Os sujeitos da pesquisa I e II disseram apenas
que sempre foram bem tratados e recebidos. O sujeito da pesquisa V disse que tem um bom
111
tratamento por parte de todos e expressou ser comum para ele as perguntas, os olhares curiosos
e até mesmo o excesso de cuidados. E os sujeitos da pesquisa III e IV falaram sobre esta
questão com mais detalhes:
No início, os colegas de trabalho tiveram muita resistência. Tive dificuldades iniciais
do cargo, era tudo muito novo para mim, mas acredito que para todo mundo quando
começa em algo totalmente novo, é assim, né! Sofri preconceito duplo no início: pela
deficiência e por ser mulher. tinha eu de mulher na área. Quando entrei, tiveram
que remanejar um senhor para outro lugar. disseram que eu estava “tomando o
lugar de um pai de família”, acredita? Quer dizer que estou tomando lugar de pai de
família, certo! É ruim me sentir assim, mas pergunto: estava mesmo “tomando lugar”
de alguém ou também tenho que ter meu espaço, ter oportunidade, ser alguém na
vida? Também quero me casar, ser “mãe de famíliae aí? Tenho ou não direito? Sou
pior que alguém? Sou melhor? Não! preciso da minha oportunidade. Hoje vejo que
muita coisa que eu achava que era preconceito, era construção minha, não dos outros.
Mas ainda acontecem coisas que chateiam, como aquele dia, lembra? (Sujeito da
Pesquisa III)
O fato citado, ao final, por este sujeito da pesquisa, aconteceu enquanto a pesquisadora
realizava as observações de seu trabalho. A pesquisadora encontrava-se sentada, ao lado deste
sujeito da pesquisa, em seu posto de trabalho, quando este recebeu um telefonema. O sujeito da
pesquisa permaneceu calado por alguns breves segundos e, depois, como em um desabafo,
disse de forma bastante tensa: “Quem disse isso? Pede para ele vir aqui agora conversar
comigo!”. Desligado o telefone, o sujeito da pesquisa explicou que havia ocorrido o seguinte:
um motorista teve o peso de seu caminhão calculado erroneamente, pelo sistema, e disse que
aquilo aconteceu pelo fato de estarem na cabine, “duas mulherzinhas batendo papo” (no caso, o
sujeito da pesquisa e a pesquisadora). O motorista, precisando passar novamente pela balança,
foi chamado pelo sujeito da pesquisa, que disse que gostaria de conversar com ele. Em tom de
voz sério, porém, de forma educada, expressou a sua chateação pelo ocorrido, da seguinte
forma:
Estou aqui com o mesmo propósito seu, trabalhando. O senhor não sabe o que está se
passando aqui dentro, quais são as minhas funções e o que pode ocorrer com os
equipamentos. O caminhão é pesado pelo sistema, que pode ter falhas, acontece de
vez em quando. Então, eu não concebo que o senhor possa simplesmente falar para os
meus colegas de trabalho que aconteceram erros porque tinham “duas mulherzinhas
aqui batendo papo”. Isso desmoraliza o profissional, e no caso, desmoraliza é o
senhor, porque aqui dentro, todo mundo me conhece, sabe como eu realizo o meu
trabalho e o que estamos fazendo aqui. queria que o senhor soubesse disso. Mas eu
peço desculpas, pelo inconveniente, em nome da empresa (Sujeito da pesquisa III).
Esta fala, acerca de uma situação vivenciada junto à pesquisadora, exemplifica o que o
sujeito da pesquisa relata ter passado, e passar, por trabalhar em uma área predominantemente
112
masculina da empresa. Também exemplifica a forma com que reage, diante de uma situação de
variabilidade, na realização de seu trabalho. Sobre o tratamento recebido na empresa, o sujeito
da pesquisa IV relatou:
Minha aceitação na empresa foi boa, fui muito bem recebido! No início, as pessoas
estranharam um pouco, mas logo acostumaram. Estranharam, porque tiveram que
fazer mudanças na empresa. Rampas, corrimão, elevador para um colega nosso,
banheiro, mudaram pessoas de função. Tinham os olhares diferentes, mas não sei se
eles que nos olhavam ou se nós, eu, por exemplo, que olhava para eles de forma
diferente, né! (Sujeito da pesquisa IV).
Acredita-se que esta reflexão expressa o que acontece em alguns casos tidos como de
discriminação, não ocorrendo propriamente o ato de discriminar, advindo da outra pessoa, mas
a manifestação da percepção que a própria pessoa tem sobre si, sobre a sua deficiência, dentre
outras variáveis. Em conformidade com Gomes,
[O ato de discriminar] reflete a cultura, diz respeito às vivências concretas dos
sujeitos, à variabilidade de formas de conceber o mundo e às particularidades e
semelhanças construídas pelos seres humanos ao longo do processo histórico e social.
[...] Os homens e as mulheres, por meio da cultura, estipulam regras, convencionam
valores e significações que acabam servindo de critérios de aceitação, próprios e para
as outras pessoas. Por meio da cultura eles podem se adaptar ao meio, mas também o
adaptam a si mesmos e, mais do que isso, podem transformá-lo (GOMES, 2003, p. 01-
02).
Entende-se, portanto, que o modo de ver o mundo e a si próprio, as apreciações de
ordem moral e valorativa, os diferentes comportamentos sociais e pessoais são produtos de uma
herança cultural, resultado da operação de determinada cultura. Acredita-se, portanto, que esses
sejam exemplos de valores pessoais que se manifestam nas relações humanas, incluindo as do
ambiente de trabalho.
Como já citado, os documentos contendo os saberes prescritos para o trabalho dos
sujeitos da pesquisa apresentam razoável riqueza de detalhes. No entanto, alguns deles
encontram-se desatualizados, tendo sido um deles, inclusive, revisado pelo próprio empregado,
ocupante do cargo em questão, enquanto a pesquisadora realizava a observação do seu trabalho.
Os documentos apresentam descrições de procedimentos que não são mais utilizados,
demonstrando que, embora a prescrição “Manter-se atualizado quanto a novos procedimentos e
processos inerentes à sua área de atuação” (Informante grupo
d
), valha para todos os
empregados, isso dificilmente acontece na prática, uma vez que os novos procedimentos
operacionais nem sempre são formalmente divulgados e/ou documentados pelos responsáveis.
113
Contradição esta que reflete no desempenho de todos os empregados, submetidos a tal
prescrição, não sendo oferecidos os meios adequados para a sua realização.
A partir do exposto no parágrafo anterior, acredita-se que a empresa venha adotando
determinadas técnicas que visam à captação e à apropriação dos saberes construídos pelos
denominados “trabalhadores do conhecimento”
62
, principalmente para fazer com que estes se
tornem novos padrões a serem seguidos característica do modelo de organização toyotista.
Notou-se que as prescrições consideradas prioritárias para a empresa não são propriamente os
documentos escritos, contendo o que os empregados devem fazer e como devem fazer –
característica do modelo taylorista de organização –, mas sim, as prescrições implícitas, tais
como segurança, qualidade e produtividade. Durante as atividades de observação, foi possível
perceber, especialmente nas áreas de produção, que o escrito pouco ajuda quando o que se
precisa solucionar são problemas que interrompem o processo produtivo. Se for preciso, são
contratadas empresas prestadoras de serviços, inclusive estrangeiras, empregados são chamados
fora de seus horários de trabalho, enfim, utilizam-se de todos os recursos para que o problema
seja solucionado com maior brevidade e o processo produtivo retome os objetivos
preestabelecidos. Diante dessas situações de variabilidade, foi possível perceber diferenças na
postura dos empregados, tanto quanto ao interesse em aprender com as empresas contratadas
para solucionar os problemas, quanto ao que fazem com as informações e conhecimentos.
Conforme relata um informante (grupo
b
):
Na minha equipe existem aqueles que aprendem e não repassam os conhecimentos,
pode ser o que aprendeu com os profissionais das outras empresas, o conteúdo de
algum congresso ou treinamento. Mas tem os que fazem questão de anotar, apresentar,
discutir e documentar. Tem equipe que exige essa postura e eu acho certo, afinal quem
está pagando para ter acesso a este conhecimento é a empresa. O conhecimento deve
ser compartilhado (Informante grupo
b
).
Sobre este aspecto, foi possível observar melhor as posturas dos sujeitos da pesquisa I e
V. O primeiro, em uma situação de variabilidade que interrompeu o processo de produção,
acompanhou todas as medidas adotadas para a resolução do problema, perguntando,
questionando e prestando esclarecimentos. Após observar o trabalho da empresa contratada,
que solucionou os problemas em seu setor, solicitou a marcação de uma reunião com toda a sua
equipe, na qual ele expôs e discutiu os principais fatos observados. o sujeito da pesquisa V,
62
Forma como a empresa denomina os seus empregados. Segundo informante (grupo
b
), “são as pessoas que
trabalham na empresa, nas diversas áreas, as que verdadeiramente conhecem e fazem a nossa realidade, desta
forma, são também as que mais m condições para contribuírem para as melhorias dos diversos processos, por
isso, as chamamos assim”.
114
participou de um treinamento externo, representando a sua equipe. Neste, a pesquisadora pôde,
inclusive, participar como sua acompanhante. Foi observado que este sujeito da pesquisa,
durante a primeira reunião da equipe após o treinamento, utilizou-se de falas e de saberes
apreendidos no treinamento, sem repassar o conteúdo ou citar a sua participação para os
integrantes da equipe. Entende-se que as diferentes posturas assumidas possam refletir a
relação que tais sujeitos estabelecem entre os seus saberes e as suas equipes de trabalho. No
caso, relações de competição ou de cooperação entre os integrantes das equipes. Também que a
relação com o repasse de seus saberes, especialmente aos kaizens, possa estar relacionada à
ideia de manutenção do emprego ou à de promoções. Acredita-se que as relações que estes
estabelecem para com os riscos a que estão expostos, com a segurança e mesmo para com os
tipos de saberes pesquisados influenciem na forma de se relacionarem com os seus saberes.
A empresa, campo da pesquisa em questão, não parece negar o trabalho como forma de
produção de conhecimentos, até pela expressão da qual se utiliza: “trabalhadores do
conhecimento”. Também, por parte dos sujeitos da pesquisa, a ideia de mais qualificação
formal parece não afetar a concepção que têm sobre a realização de suas atividades atuais,
que todos, sem exceção, afirmam que estão aptos a disputar, com igualdade, com qualquer
pessoa, o seu cargo em outra empresa. Ao avaliarem os seus próprios trabalhos e os das
equipes, expressaram-se:
Sou capaz sim. Tenho capacidade, experiência, conhecimentos. A minha equipe de
trabalho, a mesma coisa. O trabalho de um, depende da boa execução do outro, é um
trabalho individual, mas que faz parte de um todo, é mesmo uma equipe. Precisamos
nos relacionar bem, nos comunicar sempre, se alguém tem dificuldade em alguma
coisa comunica, pede ajuda e assim vamos vendo o que fazer (Sujeito da pesquisa I).
A Lei ajuda, mas tenho condições. Sou muito competente no que faço. Meu trabalho,
em si, é individual, embora faça parte do todo. Mesmo assim, pessoal troca ideias nas
reuniões e isso é importante (Sujeito da pesquisa II).
Ah, sim! Eu me considero apta a disputar com qualquer pessoa, o meu cargo em outra
empresa. Adquiri experiência no que faço. Procuro ser correta com as minhas ações e
com os colegas. Passo a maior parte do tempo aqui, temos que nos relacionar bem
para que o trabalho saia da melhor forma (Sujeito da pesquisa III).
Nas mesmas condições, porque eu aperfeiçoei o que faço. Muita gente tem o
conhecimento teórico, mas não tem a vivência do trabalho. Trabalho sozinho, mas
todo mundo ajuda, conversamos sempre (Sujeito da pesquisa IV).
Certamente. O trabalho que desenvolvo depende de conhecimento, de experiências
muito bem consolidadas e venho construindo isso, junto à minha equipe (Sujeito da
pesquisa V).
Os sujeitos da pesquisa sentem-se aptos, por meio da experiência adquirida, acreditando
que se fossem disputar o mesmo cargo, em outra empresa, os saberes que construíram com a
115
experiência do trabalho seriam um diferencial frente a outros candidatos. Esse fato demonstra
que os sujeitos da pesquisa reconhecem o valor dos saberes que possuem, o que parece ainda
reforçar ou resgatar a auto-estima de cada um deles. Tais posturas remetem ao que Schwartz
(2000) denomina
competência para gerir e criar sinergias entre individualidades e coletivos de
trabalho
. Para o autor citado, este ingrediente está sempre presente em trabalhos coletivos,
sendo necessário para assegurar a complementaridade dos diversos componentes da
competência. Pressupõe avaliar a si mesmo, suas competências e as dos colegas de trabalho, a
fim de ajustar as estratégias coletivas de ação.
A
relação com o saber
, que se caracteriza pelo desejo de maior qualidade no trabalho,
favorecendo o esforço de aprendizagem necessário para buscar conhecimentos, indispensáveis
para tanto, é mais um dos ingredientes da competência de Schwartz (2000). Para a sua
exemplificação, tem-se o caso do sujeito da pesquisa V que, segundo ele, busca nos estudos,
mesmo com suas dificuldades pessoais, formas de se aperfeiçoar para o trabalho, que é o que
lhe proporcionou ter uma vida melhor após se tornar tetraplégico, deixando-o, inicialmente,
sem perspectivas e sem vontade de viver.
Após o acidente, eu me via sem condições para o estudo e para o trabalho, sem
perspectivas, sem vida. A oportunidade de trabalhar em uma empresa como esta me
trouxe novamente a motivação para aprender, para voltar a me relacionar com as
pessoas, encarar a vida de frente e dizer a ela que eu posso enfrentar os desafios
diários, sentir produtivo e satisfeito comigo mesmo. Ainda tenho muita dificuldade e
muitas delas vou continuar a ter, mas busco superá-las a cada dia, seja percebendo
uma forma melhor de fazer algo, seja para tentar coisas que antes eu não conseguia.
No meu trabalho mesmo eu me deparo com isso a todo instante, sinto que preciso
estudar mais e mais e é isso que me faz sentir vivo. Gosto de vencer os desafios do
trabalho, assim eu me sinto motivado a vencer os da vida (Sujeito da pesquisa V).
O cargo ocupado por este sujeito da pesquisa requer constantes atualizações que, por
sua vez, são oferecidas pela própria empresa, por meio de treinamentos internos e externos.
Observou-se, no entanto, que a exigência de constante atualização se de forma menos
intensa nos cargos que desempenham tarefas, consideradas pelo próprio sujeito da pesquisa (II),
como “mais simples e repetitivas”. “Treinamentos são raros para o meu cargo. Só participo das
reuniões de segurança e do programa de inclusão, que é onde falam de normas,
comportamento, motivação [...] Também não estou estudando desde que tirei o curso técnico”
(Sujeito da pesquisa II). no caso do sujeito da pesquisa V, a percepção da necessidade de se
aperfeiçoar é tamanha que ele acaba por buscar tais saberes também em cursos extras, no
116
intuito de atender a todas as prescrições do seu trabalho, bem como visando à sua ascensão
profissional. Segundo suas palavras, “penso que devemos estar prontos para quando uma
oportunidade surgir, por isso me dedico, buscando sempre estar atualizado”. Sobre este aspecto
Gounet e Invernizzi destacam:
Não é apenas o fazer e o saber operário que são capturados pela lógica do capital, mas
a sua disposição intelectual-afetiva que é constituída para cooperar com a lógica da
valorização. O operário é encorajado a pensar pró-ativamente, a encontrar soluções
antes que os problemas aconteçam (GOUNET, 1999, p. 19).
A emergência de novos requisitos de formação, que se refletem em treinamentos
técnicos mais formalizados - face à tradicional formação
on the job
que, contudo, não
perdeu importância - e no aumento do nível de escolarização dos trabalhadores,
evidenciando que algumas capacidades cognitivas - e também aspectos disciplinares -
aprendidos na escola, tornaram-se relevantes para a produção (INVERNIZZI, 2000, p.
04).
O sujeito da pesquisa I, ao ser indagado se já contribuiu com sugestões de melhorias nos
processos produtivos da empresa ou no seu próprio trabalho, respondeu:
contribuí com algumas, mas não as levei ao programa de sugestões da empresa. As
ideias que tenho, discuto em reuniões com a minha equipe e as transformamos em
padrão, caso a sua avaliação seja positiva. Fazemos assim aqui, as fábricas m esta
autonomia. Queremos apenas melhorar os processos e melhorando, melhora para mim
também. Se eu for levar as ideias para o programa, eles demoram demais para avaliar
se procede ou não para então poder ser efetivado e eu receber alguma bonificação. Ao
que, se eu discutir aqui mesmo, com a equipe que está na área comigo no dia-a-dia,
que também avalia se procede ou não e chegarmos à conclusão de que procede, é
efetivado rapidamente e melhora logo para todos nós. [...] Como somos nós que
sabemos como fazer, uma vez no padrão, está documentado, daí tem o padrão que nos
apoia (Sujeito da pesquisa I).
Constatou-se também, por meio desta fala, que este sujeito da pesquisa, junto à sua
equipe, reescreve os documentos dispostos em suas áreas, como forma de se resguardarem
quanto à realização de seu trabalho. Esse fato caracteriza também mais uma renormalização
coletiva do trabalho, que a equipe parece adotar uma estratégia própria de avaliar e
implementar os saberes construídos que julgam viáveis, sem repassá-los aos kaizens. Acredita-
se que, de certa forma, a renormalização realizada boicote os seus integrantes, na medida em
que deixam de receber as bonificações concedidas pela empresa a quem faz sugestões que são
implementadas. Acredita-se também que estes se beneficiam estrategicamente dos saberes que
são construídos, melhorando os processos ao seu favor e mantendo os seus saberes apenas entre
os integrantes da equipe.
Outra forma de apropriação dos saberes construídos pelos empregados, utilizada pela
empresa, é presumida por Saviani (1994):
117
Penso que, se antes ocorreu a transferência de funções manuais para as máquinas, o
que hoje está ocorrendo é a transferência das próprias operações intelectuais para as
máquinas. Por isso também se diz que estamos na “era das máquinas inteligentes”. Em
consequência também as qualificações intelectuais específicas tendem a desaparecer,
o que traz como contrapartida a elevação do patamar de qualificação geral (SAVIANI,
1994, p. 164).
Os saberes construídos são transformados em sistemas automatizados, dando às
máquinas a capacidade de tomar decisões de acordo com as variações dos processos. O sujeito
da pesquisa III relatou ter participado de entrevistas para a elaboração de um
software
que
visava à automatização das balanças de matéria-prima. Esta pesquisa tinha foco na apropriação
de saberes dos empregados envolvidos diretamente com o processo de pesagem, para
transformá-los em sistemas automatizados. O sujeito da pesquisa I também exemplificou:
Tinha uma atividade do meu cargo que foi transformada em sistema automatizado,
otimizou o processo e reduziu o custo no processamento de corridas. Antes da
implantação do sistema, eu observei que dava para estimar a temperatura ideal do
distribuidor
63
para receber o aço líquido e iniciar o processo de lingotamento. Para
isso, eu levava em consideração alguns parâmetros do processo, como vazão de gás,
estado do distribuidor e temperatura do aço líquido. A partir desses dados, eu
calculava o tempo que o distribuidor deveria permanecer no aquecimento. Hoje, o
sistema coleta e calcula esses dados de forma instantânea e confiável (Sujeito da
pesquisa I).
A ênfase dada ao produto final, por parte da empresa, parece ser maior que a dispensada
ao processo de produção, com a priorização do atendimento ao cliente externo em termos de
prazos e de qualidade, buscando ainda a integração das várias atividades da empresa, desde a
produção até as vendas. O fato de, recentemente, começarem a desenvolver determinados
treinamentos no setor de Recursos Humanos, onde cada fábrica interna apresenta um analista
responsável, é exemplo disso. Esses treinamentos têm como conteúdo principal a exibição de
vídeos gravados nas empresas clientes, apresentando as suas estruturas físicas e de pessoal, as
dinâmicas organizacionais e de produção, falando sobre a necessidade do produto que
adquirem da empresa pesquisada e o que elas vêm encontrando de problemas nesses produtos.
Após a exibição, são expostos os problemas e as possíveis áreas a que se relacionam. Assim,
todos os profissionais discutem maneiras para amenizar tais problemas, levantando a
necessidade de treinamentos nas áreas e da conscientização de todos os envolvidos, para a
efetiva resolução. Tal busca ao atendimento às exigências das empresas clientes demanda ainda
o debate de valores, seja entre os valores da empresa cliente e os da empresa fabricante ou entre
estes e os valores do sujeito que participa do processo de produção.
63
Componente da máquina de lingotamento contínuo, que distribui o aço para as lingoteiras.
118
Outro aspecto que chama a atenção é o fato de algumas reuniões, que antes eram
desenvolvidas em cada fábrica, serem realizadas em conjunto. A pesquisadora foi convidada,
pelo sujeito da pesquisa I, a participar da primeira reunião de segurança, sob responsabilidade
do setor de lingotamento, integrada aos demais setores da empresa. A proposta com esta
integração é a de que todos os empregados das diversas áreas tomem consciência dos riscos a
que estão expostos na empresa e possam discutir sobre os problemas enfrentados em cada área,
podendo colaborar para solucioná-los. Entende-se que, desse modo, os empregados também
passam a ter melhores noções sobre o processo produtivo como um todo, podem começar a
contribuir para as suas melhorias e terem os seus saberes, mais uma vez, apropriados.
Investigando alguns conhecimentos que apresentam sobre a empresa e os seus
processos:
a)
Todos afirmaram não conhecer toda a usina;
b)
Todos souberam falar qual é o principal produto produzido na empresa. Três deles
sujeitos da pesquisa I, IV, V especificaram maior número de produtos e com mais
detalhes;
c)
Todos souberam responder qual é a principal empresa cliente. Um deles sujeito da
pesquisa IV – relatou também os demais clientes externos;
d)
Apenas o sujeito da pesquisa IV relatou conhecer todo o processo de produção. Os
demais comentaram conhecer apenas algumas áreas, especificando-as.
O sujeito da pesquisa IV, por exemplo, afirma ter adquirido o conhecimento de todo o
processo de produção a partir dos programas desenvolvidos na empresa, que visam despertar o
interesse dos empregados pelos seus processos. Também, com intuito de despertar os seus
interesses quanto à posição da empresa no mercado mundial, foi implantado o programa de
participação acionária e o de participação nos lucros e nos resultados. Assim, o próprio
empregado passa a se atualizar quanto a esta questão, a se motivar e a se empenhar em alcançar
as metas preestabelecidas.
A criação ou mesmo a manutenção da imagem idealizada de empresa socialmente
responsável, que quebra preconceitos e valoriza as diferenças, foi destacada por dois dos
sujeitos da pesquisa. Um deles – sujeito da pesquisa V – relatou que permitiu que a sua imagem
fosse pintada na parede do novo prédio administrativo da empresa. Ao levar a pesquisadora
para conhecê-la, disse ter gostado muito de ver a sua imagem junto aos demais empregados e
que “foi bom contribuir para que a empresa seja bem vista por incluir um cadeirante também na
119
pintura” (Sujeito da pesquisa V). o sujeito da pesquisa I expressou a sua percepção sobre o
programa de inclusão de pessoas com deficiência da empresa, afirmando que “ele não serve
para cumprir lei, serve para mostrar que estão preocupados com as questões sociais” (Sujeito da
pesquisa I).
Ainda sobre as prescrições escritas, que servem para todos os cargos e que podem ser
analisadas, destacam-se as seguintes:
a)
“zelar pelas condições de higiene e organização em seu posto de trabalho, efetuando
limpeza das máquinas, equipamentos e ferramentas utilizadas, bem como guardando-
as nos locais e de forma apropriada”;
b)
“obedecer irrestritamente às normas da empresa, quanto aos aspectos de qualidade,
segurança, controle ambiental e comportamento, utilizando adequadamente
uniformes, EPIs, padrões normativos e condutas pessoais, no local de trabalho e em
toda a área da usina”.
Acerca dessas prescrições, foi possível observar que, dependendo do ritmo de trabalho,
nem sempre as salas, cabines de operação e/ou áreas de produção permanecem organizadas. No
caso do sujeito da pesquisa IV, por exemplo, o ritmo intenso de trabalho, principalmente no
início e no final dos expedientes, muitas vezes o impede de realizar as suas tarefas de acordo
com o desejado, acumulando caixas de ferramentas no chão, por entre as prateleiras, para
posterior organização. Esta situação que, embora agilize a realização do atendimento aos
demais empregados, atrapalha o seu deslocamento, favorecendo a ocorrência de um acidente.
Essa prescrição tem como reforço o senso de organização ditado pelo programa 5S: “identificar
e arrumar tudo, para que qualquer pessoa possa localizar facilmente o que precisa e a
visualização seja facilitada”. O sujeito da pesquisa IV, durante a realização da autoconfrontação
simples, justificou que, executando o seu trabalho da forma como é solicitado nas prescrições,
o ritmo ficava comprometido, nos horários em que os demais empregados mudam de turno,
precisando esperar a entrega das ferramentas e dos EPIs, enquanto organizava o que lhe era
entregue. Então, passou a pedir aos empregados que estivessem finalizando os seus
expedientes, para colocarem as caixas de ferramentas em um canto da sala, para a sua posterior
organização. Esta organização passou a ser realizada fora dos horários de recebimento e de
entrega das ferramentas. De acordo com as suas palavras: “fazendo assim, mesmo sendo
diferente do que pedem, agilizo o trabalho do pessoal e consigo cumprir a meta do tempo,
estabelecida pela minha chefia, coisa que não conseguia antes”. Tal renormalização na forma
120
de realizar o seu trabalho colaborou também para que uma tarefa, em que encontra dificuldade,
seja realizada por seus colegas, que “as caixas com as ferramentas são pesadas” e puxá-las
pela rampa que acesso à sala “sem ter bom apoio nas duas pernas é mais complicado”.
Assim, os empregados responsáveis pelas caixas passaram a deixá-las dentro da sala, a fim de
que este sujeito da pesquisa possa conferi-las.
Embora a prescrição exija a utilização de todos os equipamentos de proteção de forma
correta para cada área, eventualmente acontece de determinadas deficiências físicas
dificultarem o seu uso. O sujeito da pesquisa I, por exemplo, utiliza bota de proteção de couro e
borracha, com cadarços, enquanto nas áreas em que trabalha é exigido a bota de couro sem
cadarço, com bico de ferro. O caso foi discutido por profissionais da área de Saúde e Segurança
do Trabalho, que chegaram ao consenso de que a utilização do calçado diferenciado, no caso
deste sujeito da pesquisa, poderia lhe expor a riscos menores do que a utilização do calçado
comumente considerado como o mais apropriado para a área, que este é mais pesado e
dificultaria a sua locomoção, principalmente nas áreas de maiores riscos. Neste caso, houve a
modificação na prescrição do calçado que, geralmente, é utilizado como o que proporciona
maior segurança em seus postos de trabalho, ocasionada por sua deficiência física.
Quanto “aos aspectos de qualidade, segurança, controle ambiental e comportamento [...]
padrões normativos e condutas pessoais, no local de trabalho e em toda a área da usina”,
entende-se que, embora existam programas voltados à conscientização dos empregados em
todos estes aspectos e pesquisas e estudos com intuito de melhorar os processos e amenizar as
reclamações dos clientes quanto aos produtos fornecidos, não como obrigar ninguém a ter
interesse e mesmo conhecimento sobre determinado assunto. Este aspecto remete ao que
Schwartz (2000) denomina
implicação no trabalho
, que se manifesta por meio do sentido
atribuído ao próprio trabalho, da consequente implicação da pessoa com a tarefa a ser
desempenhada, com as soluções e o interesse em encontrar soluções para os problemas
enfrentados em seus trabalhos. Não é algo imposto por normas ou por objetivos a serem
alcançados, e este autor acredita que o significado atribuído ao próprio trabalho influencia as
demais formas de manifestação. Portanto, para exemplificar o sentido positivo que os sujeitos
da pesquisa demonstraram atribuir aos seus trabalhos, cita-se o relato do sujeito da pesquisa II,
que associa o fato de ter a “auto-estima muito melhor hoje”, à sua contratação pela empresa.
Segundo este sujeito da pesquisa
Hoje mantenho a casa praticamente sozinho. Moro com mais 5 irmãos mais novos e
com os meus pais. o meu pai recebe salário em casa, que é da aposentadoria.
alguns anos ele sofreu um grave acidente, quando voltava do trabalho e acabou se
121
aposentando por invalidez. Nessa época, meus pais tentaram fazer com que eu me
aposentasse também. Meus irmãos falavam que eu era bobo, sentiam vergonha de
mim. Ainda bem que não deu certo. Eu não sou bobo nem inválido, mas acabava me
sentindo assim. Hoje estou aqui, trabalho e gosto do que faço. Quando comecei a
trabalhar nesta empresa, meus irmãos perceberam que eu o sou motivo de vergonha,
porque eles não têm deficiência e não conseguem bons trabalhos como este meu. [...]
Hoje eu não largo o meu trabalho por nada. Gosto do desafio diário que o meu
trabalho me proporciona. Gosto de tentar arrumar jeito de resolver as coisas, de fazer
o trabalho dar certo, mesmo que seja difícil. Gosto de chegar ao fim do dia e saber que
eu consegui finalizar algo que era complicado. Ficar em casa sem ter o que fazer é
muito ruim, faz pensar coisas que não se deve. Trabalhar é um meio de me sentir útil,
de ver que eu não sou bobo nem inválido. Me sinto produtivo, assim não caio em
caminhos errados, posso pagar as minhas contas e as da casa e isso é muito
importante! (Sujeito da pesquisa II).
Segundo o sujeito da pesquisa III, o seu atual trabalho significou, principalmente, a sua
“independência financeira”. No entanto, em um momento de reflexão, acrescentou:
“independência financeira mesmo porque hoje trabalho mais, não tempo para mais nada!
Mesmo assim, prefiro não ser livre pelo trabalho, do que não ser livre por não tê-lo, ficando
presa aos outros para tudo na vida” (Sujeito da pesquisa III). Esta fala remete à dicotomia
liberdade/sujeição no trabalho, onde as relações de dominação acabam por levar o ser humano
a uma condição desumana. Este sujeito da pesquisa relatou ter mudado a sua vida para poder
atender às exigências do seu trabalho, especialmente no início, e que, com o tempo, percebeu
que acontecia também o inverso, mudava a sua forma de se relacionar com o trabalho, para
poder dar conta da sua vida.
Como trabalhava no turno de zero hora e as folgas também eram flutuantes, eu não
dava mais conta de me encontrar com o meu noivo. Ele trabalhava durante o dia, nas
folgas eu precisava estudar, estava na graduação e também pegava as apostilas dos
treinamentos para tentar entender o trabalho, que não era fácil de entender no início.
Não teve como, meu noivado acabou, tinha que deixar de ir na casa da minha mãe e
de sair com os amigos. Tinha a preocupação de me dedicar excessivamente ao
trabalho, porque eu tive muita dificuldade de conseguir um bom emprego e com a
deficiência poderia não encontrar outro assim. Com o tempo, consegui mudar o
horário de trabalho e hoje até me acostumei com as folgas flutuantes, mas faço o que
posso para não ocupar o tempo que tenho em casa, com assuntos do trabalho, como
fazia antes (Sujeito da pesquisa III).
Sobre essa relação com o trabalho, Antunes (2003) destaca que o que vem ocorrendo é a
desconfiguração do ser social, por meio das modernas formas de escravidão. O ser humano, se
não toma consciência de que precisa mudar certas posturas impostas pelo capital, não consegue
minimamente exercer o seu direito de livre arbítrio, ainda que esteja, de todo modo, sempre
sujeito às imposições do capital. Na expressão do autor:
122
O capitalismo promove a redução das necessidades do ser social que trabalha e a
desqualificação biológica do indivíduo, a tal ponto que o resultado do trabalho é um
produto alheio ao trabalhador que o produz, é a alienação do ser social, da perda de
identidade própria e do sentido da vida entendida como o fim da classe que trabalha
para viver e o surgimento da classe que vive para trabalhar (ANTUNES, 2003, p.
113).
Conforme verificou Franzoi (2009), a relação que o empregado estabelece para com o
seu trabalho é um elemento importante para se entender a disposição que ele apresenta em se
dispor do seu patrimônio – os seus saberes – entregando-os aos capitalistas. Por meio da fala do
sujeito da pesquisa I, foi possível inferir o tipo de relação que este sujeito da pesquisa
estabelece para com o seu trabalho:
Muita gente até brinca me chamando de doido, porque tenho a minha deficiência,
trabalho rodeado de riscos e gosto do meu trabalho. Mas gosto mesmo é do que
aprendo aqui, no dia-a-dia, acho que justamente por ser uma área que preciso lidar
com os riscos, preciso observar sempre, estar atento, verificar se estou fazendo tudo da
melhor forma, ainda mais que sou curioso. Acredito que nem que fosse para voltar a
trabalhar na profissão que sou formado, deixaria isso aqui. Enfermagem muita gente
sabe, pode fazer curso e trabalhar, mas o que faço são poucas pessoas que sabem
desenvolver e não adianta correr atrás de cursos, continuarão a não saber como fazer o
que eu faço. São quase seis anos aqui. Me sinto muito realizado no trabalho, ainda
bem, porque é onde passo a maior parte do tempo (Sujeito da Pesquisa I).
Com esta fala é possível perceber que o desafio diário, proporcionado tanto pelos riscos
do seu trabalho, quanto pela sua complexidade, aumentados pelo fato de se ter uma deficiência
física, leva este sujeito da pesquisa a se sentir motivado em continuar a exercê-lo. Motivação
que não sentiu trabalhando em sua área de formação, que parece se sentir mais valorizado
ocupando um cargo em que “existe a dificuldade de se encontrar pessoas com experiência e
conhecimentos”, como as que pôde adquirir nos seis anos em que trabalha na empresa. Ainda
sobre o envolvimento com os seus trabalhos, destaca-se nas falas dos sujeitos da pesquisa II e
IV, o interesse em desenvolvê-los da melhor forma e o orgulho ao falar deles:
Me preocupo muito em fazer o meu trabalho com qualidade (Sujeito da pesquisa II).
Gosto do meu trabalho, aí quando as pessoas me perguntam o que que eu faço na
empresa, respondo prontamente que eu faço o que todas as pessoas utilizam todos os
dias, mesmo sem saber! (Sujeito da pesquisa IV).
Com a proposta de desenvolvimento da instrução ao sósia, foi possível perceber com
maior clareza a forma com que cada um dos sujeitos da pesquisa se relaciona com os seus
trabalhos, como o encaram, o grau de dificuldade que atribuem ao desenvolvimento de cada
tarefa, os valores atribuídos, as projeções que são feitas e as percepções que têm quanto ao
123
desenvolvimento de seus trabalhos por outra pessoa, dentre outros aspectos. Inicialmente, os
sujeitos da pesquisa expressaram-se da seguinte forma:
O meu trabalho, o que eu faço, não é complicado. Complicadas o as coisas
específicas que m na área do lingotamento contínuo. É uma realidade distante de
qualquer coisa que vemos por aí, para assustar com tudo, porque é muito calor,
muito frio, muito barulho, estamos expostos a riscos fatais! Não sei se você assustou
com isso aqui, mas agora que observou o trabalho, acho que conseguirá entender
bem (Sujeito da pesquisa I).
O meu trabalho é muitonfase à expressão) fácil! [...] Não é desconsiderando o valor
do meu trabalho não, mas a única coisa que você tem que ver é se conta da rotina
dele. E é cansativo também. No mais, vou explicar como faço e você vai aprender
rapidinho! (Sujeito da pesquisa II).
Nossa, mas o meu trabalho é tão simples! No início pode até parecer difícil, mas é
porque não é o que você faz, se fizesse todos os dias, veria que é a mesma coisa todo
dia! Ainda que aconteçam situações diferentes, é bem rotineiro. Você vai pegar de
primeira! (Sujeito da pesquisa III).
Ah, não é me gabando não, Lílian, mas isso daí num tem jeito! Vonão vai fazer
meu trabalho, vai? (Risos, com desconfiança). [...] Sei não, é faz de conta mesmo?
[...] Ah, então vou te falar como faço (Sujeito da pesquisa IV).
As atividades que desenvolvo requerem muitos conhecimentos teóricos e práticos.
Conhecimentos anteriores ao seu desenvolvimento (Sujeito da pesquisa V).
A manutenção ou a mudança da opinião apresentada sobre os seus próprios trabalhos,
quando da instrução ao sósia, as reações e os comentários, quando em contato com os relatórios
elaborados pela pesquisadora sobre as suas atividades, durante a autoconfrontação simples,
serviram tanto para validar ou rejeitar o ponto de vista apresentado pela pesquisadora, quanto
para se justificarem, conforme exemplificado nos discursos a seguir:
É muita coisa, não é? Por isso que te falei que o adianta a pessoa fazer um curso
e vir trabalhar aqui. Tem muita coisa que se aprende fazendo, quebrando a cabeça,
tentando mesmo. Não dá para ser diferente! [...] Essa parte do uso da pantufa é o
seguinte: usamos na tentativa de manter a cabine limpa, que vamos e voltamos da
área toda hora. Mas o pessoal da segurança do trabalho agrada muito dela não, nem
eu. (Risos) Olha aqui, é fácil escorregar com ela neste piso. Com a minha deficiência
na perna então, posso nem pensar em usar! (Sujeito da pesquisa I).
O meu trabalho é mesmo assim. Daí que falo que se deve levar a sério também o
trabalho que julgamos simples, não é mesmo? Sempre julguei o meu trabalho simples,
mas foi nele que a quina tomou o controle e eu me acidentei. Também é esse
trabalho simples que muita gente tem dificuldade em desenvolver sem ter os
conhecimentos que precisa. Não dá para chegar aqui sem conhecimento algum e
querer operar a máquina, ainda mais por ela ser perigosa. [...] É, também tem que
saber interpretar o que está sendo pedido para cada peça, como voescreveu aqui,
tem que saber qual é a melhor ferramenta para cada caso, saber da rotação [...] Ainda
não voltei ao assunto, mas posso fazer isso na próxima reunião de segurança. Como
que eu não posso sentar, se nas outras máquinas, a do pessoal que trabalha sentado,
tem que levantar de tempo em tempo? (Sujeito da pesquisa II).
124
Interessante que quando você me perguntou a primeira vez o que eu fazia aqui, eu te
falei de maneira simples e em poucas palavras, né! Acho que nem eu sabia que eu
fazia tudo isso que você colocou aqui, da forma que você colocou. No geral, eu
concordo com o que você escreveu. Acho que a única coisa que preciso justificar
mesmo é porque saí sem o rádio transmissor e os colegas ficaram reclamando que não
conseguiam falar comigo. É o seguinte, eu não concebo a ideia de levar o rádio
transmissor para o banheiro. Essa prática já é comum entre os homens. falei com
eles que o levo e não levo mesmo, imagina! E por mim, eles também o levavam,
é errado levar, dá para esperar a pessoa voltar pra podermos falar com ela [...] Tudo o
que eu fiz está anotado aqui. A gente não tem nem noção que faz tanta coisa num
dia, né! Embora eu tenha feito tudo “nos conformes”, né, Lílian! Grava isso aí...
(Risos) não é igual pegar o padrão operacional e ler.tudo escrito do que eu fiz, dia,
hora, como fiz... Com tantas coisas listadas, da forma que você anotou, parece até que
meu trabalho valorizou. Vou pegar essa lista! Com ela dá até para pedir um aumento
pro chefe! (Risos) (Sujeito da pesquisa III).
E eu tava mesmo pensando que você queria vir aqui trabalhar no meu lugar. (Risos)
[...] Sempre faço isso! Procuro mesmo verificar as condições em que os colegas
chegam para trabalhar. Uma vez, um colega aqui da área chegou para trabalhar e veio
pegar suas ferramentas. Ele trabalha com uma ferramenta muito perigosa, que requer
bastante atenção. A pessoa tem que estar muito concentrada naquilo que está fazendo.
E ele aparentava estar com problemas pessoais. Conversei um pouco com ele e sugeri
que era melhor ele conversar com o supervisor e ir embora. E foi o que ele fez. Nisso,
pode ser que tenhamos evitado um acidente. [...] Falei para você não fazer nada a mais
do que estava escrito no PO, mas eu acabo fazendo, ! (Risos) (Sujeito da pesquisa
IV).
Naquele dia acabou que eu te expliquei com a tela aberta somente alguns programas.
Mas o que você queria entender, a forma que eu realizo o meu trabalho, é isso
mesmo (Sujeito da pesquisa V).
Anteriormente a esses relatos, durante a instrução ao sósia, os sujeitos da pesquisa II e
IV, principalmente, instruíram de forma contrária às reflexões apresentadas. O sujeito da
pesquisa II, sobre o fato de ter que permanecer em na máquina durante todo o expediente,
disse:
É cansativo mesmo, mas é como te falei, você precisa seguir as normas, caso contrário
vai se acidentar ou provocar o acidente de um colega. E se arrumar jeito de ficar
sentada então, vai parecer que o está fazendo nada, vão te mandar embora daqui.
[...] Se for sentar, faz como te falei, finge que vai ao banheiro, despista e senta no
vestiário um pouco. Não para mudar muita coisa trabalhando nisso aqui não,
mudam as peças, o resto tem que ser rotina mesmo! (Sujeito da pesquisa II).
O sujeito da pesquisa IV, diferentemente do que refletiu quando da autoconfrontação
simples, instruiu que nada deveria ser feito além do que consta nos procedimentos
operacionais, e que as tarefas deveriam ser desempenhadas conforme tal documento. “Você vai
fazer tudo do jeito que tá escrito no PO. Nada além disso!” (Sujeito da pesquisa IV).
Wisner (1987) destaca a importância do conteúdo do discurso dos trabalhadores para
que se possa conhecer melhor as suas estratégias e evolução. Acredita-se que o fato de os
empregados com deficiência física, sujeitos da pesquisa, poderem reolhar as suas atividades,
por meio do olhar e das percepções da pesquisadora, possibilitou-lhes refleti-las, vislumbrando
125
os seus fazeres, a dimensão e o valor de seus trabalhos. A fala do sujeito da pesquisa III, de que
não leva o rádio transmissor para o banheiro, exemplifica ainda o fato de que os valores
pessoais afetam as escolhas também no desenvolvimento do trabalho.
Sobre as
variabilidades e microvariabilidades
com as quais os sujeitos da pesquisa se
deparam no cotidiano do trabalho, Schwartz (2000) diz que elas envolvem a incorporação da
historicidade que atravessa as situações de trabalho, pelo empregado. E também que as
singularidades das situações não são tratadas de maneira uniforme por aqueles que as vivem.
Tendo em vista este ingrediente, destaca-se um fato ocorrido com o sujeito da pesquisa III.
Num dos dias em que a pesquisadora acompanhava o trabalho deste sujeito, o trânsito de
caminhões ficou intenso nas filas de pesagem de matérias-primas e houve também o aviso de
que faltavam carvão e minério de ferro para o alto forno. Notou-se então que o sujeito da
pesquisa, responsável pela pesagem desses materiais passou a adotar uma maneira diferente de
pesar os caminhões. Durante a instrução ao sósia, instruiu:
Se o trânsito ficar intenso e tiver faltando matéria-prima, vobusca no histórico do
caminhão as taras anteriores e lança a média entre elas como tara atual para que o
pare a produção. o é todo mundo que faz isso e nem pode fazer sempre, caso
contrário nem precisaria muito da gente aqui, mas percebi que resolve o problema da
produção e que calcula bem (Sujeito da pesquisa III).
Observou-se ainda que o sujeito da pesquisa, que deveria registrar a placa do caminhão
a ser pesado, retirando tal informação pelo monitor de vídeo, também o faz por meio da
informação verbal do caminhoneiro. Na autoconfrontação simples, alegou realizar tal
prescrição de maneira diferente da regra pelo fato de, algumas vezes, o caminhão chegar muito
sujo de poeira, o que torna sua placa ilegível.
Os fatos relatados nos últimos parágrafos, assim como outros citados neste capítulo,
remetem ao ingrediente da competência, que Schwartz (2000) denomina
capacidade e
propensão para articular, dialeticamente, as competências no trabalho
. Tal competência se
mostra na decisão oportuna de confrontar as prescrições e os casos particulares. Outro exemplo
é dado a partir do sujeito da pesquisa II que, visando realizar o seu trabalho, precisa por vezes
burlar algumas de suas exigências. Conforme explicitado, a Segurança do Trabalho exige
que ele permaneça durante todo o tempo em pé, no seu posto de trabalho. Seu corpo, porém,
não suportando tal intento, faz com que o sujeito da pesquisa, às vezes, finja ir ao banheiro,
apenas para poder sentar-se por alguns minutos. Neste caso, parece acontecer um tipo
contraditório de burla à prescrição, pois, ao deixar de cumpri-la, o sujeito da pesquisa cumpre
outra prescrição, a da Ergonomia que, inclusive, parece vir sendo ignorada na área – a de que a
126
pessoa que trabalha em pé deve se sentar durante alguns minutos, de tempos em tempos.
Conforme observou Pinto (1960, p. 69), “é na relação entre homem e utensílio que se apresenta
o grau de domínio que o sujeito tem sobre o objeto, ou, inversamente, o grau de subordinação
que a situação lhe impõe”. Nesses casos, é possível perceber que, mesmo com as limitações
físicas, os sujeitos da pesquisa conseguem lidar ou mesmo se adaptar às prescrições, sem
deixarem de utilizar os saberes que constroem para dar conta das situações de trabalho.
Como explicitado no subitem 2.3.3, e também indicado brevemente neste capítulo, a
empresa possui dois programas que visam captar as sugestões de melhorias, por parte dos seus
empregados (
Kaizen
). Para incentivar tal prática, a empresa possui um sistema de recompensas
que premia o empregado ou o grupo temático que colabora com as ideias implementadas. No
programa de sugestões individuais, podem participar apenas os empregados, de todas as áreas,
que não ocupam cargos de nível superior. Para os demais, os que ocupam cargos de nível
superior, a empresa compreende que dar sugestões de melhorias seja uma prescrição implícita,
não necessitando receber bonificações. A única exceção acontece para os empregados que são
convidados a participar dos grupos, colaborando diretamente com as áreas que visam melhorias
na qualidade, segurança, produtividade, custos, meio ambiente, satisfação dos clientes, dentre
outros. Com isso, a empresa explora, além dos saberes dos empregados com cargos de nível
médio, os saberes dos empregados com cargos de vel superior, de forma coletiva e
estratégica, abrangendo todas as áreas. As bonificações e os demais prêmios concedidos pela
empresa dependem do grau de importância que esta atribui à sugestão. Podem ser desde
pequenas quantias em dinheiro, pequenos passeios, a viagens ao país onde se encontra a
matriz do grupo, convidando os próprios empregados, componentes do grupo de sugestões, a
exporem sua idéia, ou ainda maiores quantias em dinheiro.
Embora o acesso aos dados dos kaizens não tenha sido permitido para esta pesquisa, por
seus responsáveis na empresa, foi possível perceber pelos depoimentos dos empregados a
disponibilidade com que repassam os seus saberes. Os Kaizens encontram literais
colaboradores – como passaram a ser denominados os empregados/trabalhadores – ansiosos em
dar as suas sugestões. Os sujeitos da pesquisa, de maneira geral, atribuem motivos diversos a
este fato como, por exemplo, a busca por melhorias, a premiação, o entendimento de que isso
possa lhes garantir o emprego ou promoções. Com exceção do sujeito da pesquisa I, que
demonstra ter certa consciência de que, contribuindo com sugestões aos kaizens, tem os seus
saberes apropriados pela empresa, todos demonstraram estar sempre atentos ao que poderia
servir de sugestão aos programas, conforme se verifica em suas falas:
127
Agindo assim, a minha equipe não deixa de fazer uso da nossa experiência e a
empresa mesmo, também ganha com isso. Precisamos da empresa da mesma forma
que as outras pessoas, mas pelo menos nós conseguimos nos beneficiar com as nossas
ideias, o deixando todas as decisões nas mãos da equipe avaliadora (Sujeito da
pesquisa I).
Ainda não contribuí com nenhuma sugestão. Fico receoso de perceberem isso de
forma negativa, de acharem que não estou seguindo o que pedem [...] (Sujeito da
pesquisa II).
Essa sua pergunta acabou de me dar uma ideia! Vou verificar se posso passar como
sugestão! [...] Eu participava do grupo de sugestões que visa à redução da emissão de
particulados e gostava muito, mas me tiraram. Acho que foi porque tinha gente daqui
da área que podia contribuir mais que eu no grupo (Reflete) (Sujeito da pesquisa III).
Estou aperfeiçoando outra sugestão, mas como ainda não coloquei pro programa, não
posso divulgar. Mas tem a ver com a organização, mais propriamente com uma forma
de agilizar a entrega das ferramentas e EPIs. [...] Acho que passei do nível I para o III,
assim direto, porque o meu coordenador percebeu o meu interesse com o trabalho e
com a empresa e sabe que continuarei sempre motivado (Sujeito da pesquisa IV).
Esta é a tarefa que eu mais gosto. É com ela que acabo tendo ideias para levar ao
grupo de sugestões (Sujeito da pesquisa V).
Em face disso, torna-se evidente o interesse da empresa em se apropriar dos saberes de
seus empregados, dada a adoção e a manutenção dos kaizens. Por parte dos empregados,
especialmente dos sujeitos desta pesquisa, tal interesse se evidencia ao colaborarem com a sua
manutenção, repassando os seus saberes. Outra forma como a empresa demonstra reconhecer e
se utilizar dos saberes dos seus empregados, dentre eles os sujeitos da pesquisa, é o fato de
terem delegado a eles a responsabilidade de repassarem a rotina das atividades desenvolvidas
em seus postos de trabalho, aos empregados da nova empresa do grupo.
A invisibilidade de alguns tipos de deficiência física ou mesmo o seu desconhecimento
chamou a atenção durante o primeiro contato da pesquisadora com o coordenador de uma área.
Por ter explicitado que a pesquisa seria realizada com empregados com deficiência física, do
programa de inclusão da empresa, o coordenador estranhou o fato de a pesquisadora
demonstrar interesse em ter, como sujeito da pesquisa, um de seus subordinados. “Ele é do
programa, mas não tem deficiência física não. Ele não consegue é falar, a gente não entende o
que ele fala. Você não quer fazer a pesquisa com outra pessoa aqui?” (Informante grupo
b
). A
pesquisadora insistiu pedindo-lhe a liberação desse empregado para participar da pesquisa, pois
tinha sido selecionado. A pesquisa foi consentida pelo coordenador e, ao ter o primeiro contato
com o empregado, pôde-se constatar que, realmente, ele apresenta dificuldade na fala, mas que,
com certo esforço e interesse, viabiliza-se a sua comunicação. Este empregado aceitou
participar, enquanto sujeito da pesquisa, dizendo:
128
Pra te falar verdade, num gosto desse treco de pesquisa não! Mas você respeita a
dificuldade que eu tenho pra falar, você pede para eu falar de novo, quando não me
entende. É muito ruim quando uma pessoa não entende o que eu falo e finge que
entendeu. Sei que tenho dificuldade de falar e eu pergunto muito se a pessoa entendeu,
quando penso que pode não ter entendido. Eu não me importo de repetir quantas vezes
precisar, mas acontece muito ‘deu’ perguntar se a pessoa entendeu e ela: “ah, tá”, “tá
bom”, “pois é”. Nossa (Risos com constrangimento), responde coisas nada a ver!
Prefiro que ela me peça para falar de novo do que demonstrar tanto desinteresse
assim! Entendo que deve ser ruim não entender o que falo, entendo o lado da pessoa
de achar que eu possa achar ruim dela ficar pedindo pra repetir, mas olha , eu
preciso me esforçar para falar com a pessoa, porque não é ela que tem dificuldade
de me entender, eu também tenho para conseguir falar com ela e acontece uma coisa
assim. É muito descaso, né!? (Sujeito da pesquisa II).
Percebeu-se, durante toda a realização da pesquisa, a questão que este sujeito faz de ser
e de se fazer compreendido. Quando a pesquisadora se encontrou pessoalmente com o
coordenador, este se expressou: “falei com você que ele não tinha nada físico, mas eu verifiquei
na lista do programa e tem sim. Aqui na área ninguém imaginava que ele tinha algo na perna e
no pé, só conseguíamos perceber mesmo o seu problema na fala” (Informante grupo
b
).
Acrescentou: “Preciso até avisar o pessoal da segurança, porque pode ser que ele precise de
alguma coisa diferente, ele já falou sobre ficar de pé tempo todo na máquina, deve ser por isso.
Vamos analisar se podemos fazer algo para ele” (Informante grupo
b
). Este exemplo demonstra
a necessidade de um trabalho de conscientização mais efetivo, principalmente quanto às
necessidades e condições físicas, pelos responsáveis diretos deste sujeito da pesquisa, que
passaram mais de 5 anos desconhecendo-as, o que possivelmente contribuiu para a sua
exposição a condições desfavoráveis no trabalho.
O cargo deste sujeito da pesquisa impõe que as prescrições para o seu trabalho sejam
seguidas corretamente, principalmente por motivos de segurança, que a máquina com que
trabalha oferece muitos riscos para si e para os outros. Pelo que pôde ser observado e também
constatado por meio das atividades de autoconfrontação simples e da entrevista
semiestruturada, este sujeito da pesquisa não contribuiu com nenhuma sugestão ao programa e
foi possível perceber apenas duas renormalizações em seu trabalho: uma que se refere à
segurança e à qualidade e, outra, que é a forma que encontrou de se ausentar do posto de
trabalho, visando suportar as condições que lhes são impostas. O próprio cargo e as condições,
principalmente de segurança, parecem lhe oferecer poucas oportunidades de criação e de
renormalização. Quando apresentado às observações de seu trabalho, pareceu se justificar:
Bem dizem que para se obter algo que nunca
teve
,
é preciso fazer algo que nunca fez,
se eu não fizer ou mesmo não puder fazer diferente do que faço todos os dias, do que
sabem que é bom e melhor fazer, dificilmente conseguirei novas construções no meu
trabalho e chegarei somente até onde os outros chegaram. Gosto do que faço, tem os
129
seus desafios, mas ainda vou estudar engenharia, gosto de poder fazer coisas
diferentes (Sujeito da pesquisa II).
O maior número de sugestões dadas aos programas partiram dos sujeitos da pesquisa em
que, constantemente, se podiam observar alterações na forma de realização das tarefas, frente
ao prescrito. A partir desta constatação, pôde-se inferir que os sujeitos da pesquisa eram mais
criativos na medida em que fugiam às prescrições, e não ao reproduzi-las. Ou ainda, que
fugiam às prescrições justamente por serem pessoas mais criativas e/ou que não conseguem se
adaptar facilmente às rotinas de trabalho.
Apresentam-se a seguir, no Quadro 6, as sugestões dadas pelos sujeitos da pesquisa aos
kaizens. No Quadro 7, expõem-se as principais renormalizações realizadas pelos sujeitos da
pesquisa em seus trabalhos.
Sugestões dos Sujeitos da Pesquisa
Sujeitos
da
Pesquisa
Organização
Custos
Produtividade
Segurança
Qualidade
Satisfação dos
Clientes
Meio Ambiente
Outros Tipos
I
II
III
Colocação de
mais
computadores na
sala e contratação
de mais um
operador;
Colocação de
persianas na
cabine, evitando o
sol nos
empregados e nos
equipamentos.
Instalação da botoeira para
acionar a liberação do
caminhão, na balança;
Nos dias em que a botoeira
estava em manutenção,
utilizou-se de uma
vassourinha para sinalizar
a liberação do caminhão.
IV
Informou ter uma
sugestão em
processamento,
sobre
organização, mais
propriamente com
uma forma de
agilizar a entrega
das ferramentas.
Colocação de rebarbas nas
mesas, evitando que as
ferramentas caiam.
Carrinhos para
carregar as caixas de
ferramentas;
Colocação de rampa
por onde as
ferramentas
poderiam deslizar
diretamente da mesa
para os carrinhos;
Colocação de
antiderrapante na
chapa por onde os
carrinhos são
puxados.
V
Divisão de um
instrumento de
coleta de dados
Retirada dos
estagiários das
pesquisas de
Campanha de
doações de livros às
escolas carentes;
130
em duas etapas;
Padronização das
entrevistas por
objetivo e
armazenamento
dos dados.
satisfação;
Reforma de uma
praça próxima à
usina.
Criação de uma
biblioteca no bairro;
Exposição de artes
nos corredores do
prédio
administrativo.
Quadro 6: Sugestões dos Sujeitos da Pesquisa.
Fonte: Dados da pesquisa (2009/2010).
Principais Renormalizações Realizadas pelos Sujeitos da Pesquisa
Sujeitos
da
Pesquisa
Organização
Custos
Produtividade
Segurança
Qualidade
Satisfação dos
Clientes
Meio Ambiente
Outros Tipos
I
Estimar a temperatura
ideal do distribuidor para
receber o aço líquido e
iniciar o processo de
lingotamento. Para isso,
levava em consideração
alguns parâmetros do
processo, como vazão de
gás, estado do distribuidor
e temperatura do aço
líquido. A partir desses
dados, calculava o tempo
que o distribuidor deveria
permanecer no
aquecimento;
Ainda que não conste nos
documentos de prescrição,
este sujeito da pesquisa
busca verificar,
diariamente, se os
produtos utilizados em sua
área, disponíveis no setor
de estoque, existem em
quantidade suficiente ou
se é necessário repor o
estoque, alertando o setor
de compras.
Não utiliza a pantufa na
cabine no intuito de
evitar possível acidente.
II
Forma que arrumou para
poder se sentar às vezes,
sem ser percebido.
Engate rápido: quando a
peça necessita de
muitos furos, coloca a
rotação mais lenta, de
acordo com o diâmetro
do furo.
III
Do tempo, com a
priorização das tarefas;
Reaproveitamento de tara.
Registra a
placa do
caminhão
também por
meio da
informação
verbal do
caminhoneiro,
131
quando ela
está ilegível no
monitor de
vídeo.
IV
Do tempo, com a
priorização da entrega das
ferramentas, sobre as dos
EPIs;
Deixa a sala
desorganizada enquanto
realiza as entregas, para
posterior organização;
Deixa os demais
empregados colocarem as
suas caixas de ferramentas
dentro da sala.
Ainda que os demais
empregados solicitem
certos tipos de EPI e de
ferramentas, o sujeito
da pesquisa investiga
para saber se o que está
sendo solicitado é
mesmo o mais
apropriado;
Nem sempre se utiliza
dos equipamentos de
medição (paquímetro e
micrômetro) para
avaliar as ferramentas,
utilizando-se somente
da inspeção visual;
Busca averiguar as
condições em que os
demais empregados
chegam à empresa para
poderem trabalhar com
ferramentas e máquinas
perigosas.
V
Como o sujeito da
pesquisa consegue estimar
as pessoas que geralmente
não respondem às
pesquisas internas, quando
necessário enviar para
elas, envia também para
outras pessoas que sabe
que geralmente
respondem, evitando não
ter retorno.
Retirar as
impressoras dos
departamentos,
deixando apenas
uma para uso de
todos;
Criação de cotas
de cópias e
impressão.
Trabalha no
computador
com o mouse
de lado, o que
facilita a sua
utilização.
Quadro 7: Principais Renormalizações Realizadas pelos Sujeitos da Pesquisa.
Fonte: Dados da pesquisa (2009/2010).
Nota-se, por meio do Quadro 6, que os sujeitos da pesquisa parecem estar atentos aos
valores implícitos da empresa, na medida em que as suas sugestões são, em sua maioria,
voltadas às melhorias dos procedimentos. Quanto à primeira renormalização listada do sujeito
da pesquisa I, no Quadro 7, ressalva-se que, embora não tenha sido levada como sugestão ao
programa, a empresa a transformou em sistema automatizado.
Observou-se que praticamente inexistem formas de organização coletiva dos
empregados na empresa. O que se percebe são apenas algumas equipes de trabalho que
apresentam maior vínculo entre os seus integrantes e que se organizam. Do mesmo modo, o
enfraquecimento dos sindicatos e demais movimentos que visam à defesa dos interesses da
132
classe trabalhadora característico do modelo de organização toyotista –, foi relatado pelos
sujeitos da pesquisa que se mostraram insatisfeitos por terem descontadas em suas folhas de
pagamento as taxas referentes aos sindicatos. Não evidenciaram a necessidade de participação
ou mesmo de compreensão do papel deste, enquanto forma de organização coletiva.
Demonstraram não ter o interesse ou mesmo a motivação para participarem, alegando a
satisfação com o emprego e com a empresa, fato este que remete à ideia de que a educação
política, dentro da empresa, aconteça de forma a desmotivar as práticas sindicalistas.
Quanto ao cenário sindical atual, Antunes (2003) destaca que as propostas de troca dos
direitos e benefícios pela manutenção do emprego e do subemprego predominam. Para isso,
este autor justifica existir a cooperação dos sindicatos no que diz respeito à flexibilização nas
formas de contratação e de remuneração. Conforme destaca Kuenzer:
É o reconhecimento do valor adquirido na prática que determina a necessidade de sua
negação, uma vez que a consciência desse valor pelas classes trabalhadoras pode ser o
primeiro passo para a inversão das relações hegemônicas, de modo a favorecer o
trabalhador (KUENZER, 1985, p. 141).
Conforme demonstrado neste capítulo, percebeu-se certo grau de compreensão, por
parte de um dos sujeitos da pesquisa (I), das relações concretas de exploração existentes na
empresa. Todos apresentaram ter uma visão naturalizada das condições de trabalho, repassando
os saberes construídos, muitas vezes de forma não estratégica, e colaborando com a reprodução
e mesmo com as melhorias das formas de exploração dos seus trabalhos e saberes, em troca de
vantagens, de bonificações. Não se utilizam, portanto, dos seus saberes como forma de
reivindicação de melhorias das suas condições de trabalho e de vida. Desse modo, mais uma
vez se ressalta o fato de os empregados com deficiência estarem sujeitos às mesmas leis do
capital.
Faz-se necessário explicitar que, embora os sujeitos da pesquisa se mostrassem
disponíveis e interessados nas atividades propostas pela pesquisadora, eles, sem exceção, em
alguns momentos ficaram apreensivos, seja diante de alguma pergunta feita, seja em face das
suas reflexões pessoais, ou mesmo pelo fato de ter no local de trabalho uma pesquisadora por
intermédio do setor de Recursos Humanos. As perguntas explícitas e, por vezes iminentes, mas
sufocadas por breves segundos de silêncio, eram ou apenas pareciam ser: “Você não vai
colocar isso na pesquisa, vai?”; “Isso vai ser divulgado para o meu chefe?”; “Quem vai
ler/ouvir isso?”. Identificou-se, com isso, um possível fator de limitação da pesquisa.
Acredita-se que a relação estabelecida entre os saberes prescritos e os construídos no
trabalho, entre os saberes práticos e os teóricos, desempenha importante papel no processo de
133
constituição da identidade do trabalhador. A forma como ele capta esta relação contribui para
definir o seu comportamento, aceitando em maior ou menor grau a sua condição subalterna, os
critérios de valores do seu trabalho, os critérios de salário e promoções, submetendo-se e/ou
discutindo, negociando e reivindicando.
Ainda que, em muitos momentos, os sujeitos da pesquisa tenham demonstrado não ter
consciência de todas as formas de exploração a que estão submetidos; a empresa conceda
bonificações em troca do repasse de saberes; ou ainda pague indenizações pelas condições
insalubres a que estão expostos muitas delas advindas da própria natureza do trabalho –, ela
não pode comprar valores pessoais, construções de conhecimentos, subjetividades, corpos e
principalmente vidas.
134
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa permitiu identificar aspectos estabelecidos nas relações entre os trabalhos
que são prescritos e os que são realizados por pessoas com deficiência física, em situações de
trabalho. No que tange à suposição inicial de pesquisa, evidenciou-se a sua confirmação na
medida em que os saberes contidos nas prescrições para os trabalhos dos sujeitos da pesquisa
mostraram-se insuficientes para abarcar toda a complexidade que envolve as suas realizações.
Quanto ao primeiro objetivo específico traçado na pesquisa, que se preocupava em
verificar a apropriação dos saberes prescritos por parte dos sujeitos da pesquisa, foi possível
perceber, por meio do conhecimento do conteúdo das prescrições dos seus trabalhos e das
demais técnicas utilizadas na pesquisa de campo, que todos dominam tanto os conceitos
relacionados aos seus trabalhos, quanto as suas formas de realização. Evidenciou-se ainda que
os sujeitos da pesquisa utilizaram-se dos saberes prescritos e construídos de maneiras
diferentes, dependendo principalmente das relações estabelecidas com os seus trabalhos,
equipes de trabalho, os riscos a que estão expostos, a manutenção do emprego e os tipos de
saberes pesquisados.
Com o segundo objetivo específico, buscou-se verificar o teor das mudanças realizadas
em relação aos saberes prescritos para atenderem às exigências de seus trabalhos. Com o
alcance deste objetivo, foi possível perceber que os sujeitos da pesquisa se mostravam mais
criativos à medida que se distanciavam das prescrições e não ao reproduzi-las rotineiramente.
Não se desconsiderou a possibilidade de que os sujeitos da pesquisa que mais se distanciavam
das prescrições fossem justamente aqueles que são mais criativos e, dessa forma, apresentassem
dificuldade em se adaptar às prescrições e às rotinas de trabalho.
Para atender ao terceiro objetivo específico, foram confrontados os saberes prescritos
com os construídos pelos sujeitos da pesquisa, em seus trabalhos, constatando-se, que:
a)
Baseando-se nos ingredientes da competência de Schwartz (2000), os sujeitos da
pesquisa se mostraram competentes na realização de seus trabalhos, uma vez que
mesmo as atividades onde encontram maior dificuldade são realizadas por eles
mesmos, com as adaptações ou com o desenvolvimento de suas habilidades, ou
ainda pela renormalização feita por sua equipe, pela própria iniciativa, de redistribuir
as tarefas entre os empregados componentes da equipe, atendendo às
responsabilidades de todos.
135
b)
A compreensão de que, repassando as sugestões aos kaizens, têm os saberes
captados e apropriados pela empresa; que esta implementa somente os saberes que
lhe proporcionam um retorno maior que o investido na realização da sugestão
aquelas que trazem maior produtividade, reduzem os custos, mas nem sempre
significam melhorias nas condições de trabalho foi percebida em apenas um dos
sujeitos da pesquisa.
c)
O trabalho insalubre e rotineiro de outro sujeito da pesquisa, junto à difusão da visão
de que, ao se adquirirem novos equipamentos e máquinas mais modernas, pode-se
dispensar empregados no setor, parece ter colaborado para que ele não tenha levado
as suas sugestões ao programa, ainda que tenha realizado significativas
renormalizações em seus processos de trabalho.
d)
Quanto às deficiências físicas dos sujeitos da pesquisa, foi possível perceber que
pouco interferem na realização de seus trabalhos, pois eles ocupam cargos para os
quais estão aptos e possuem como postos de trabalho locais que, de uma forma geral,
podem ser considerados adequados às suas necessidades salvo algumas exceções
especificadas no Capítulo 5. Também que o trabalho em colaboração com os demais
integrantes da equipe favorece o desenvolvimento de suas tarefas, principalmente
quando são verificadas as facilidades e as dificuldades de cada um com ou sem
deficiência física – e são redistribuídas adequadamente as tarefas a serem realizadas.
e)
Os sujeitos da pesquisa demonstraram que foi com as dificuldades que encontraram
as oportunidades de superar as suas limitações físicas e de criar modificações nas
prescrições para atenderem às exigências de seus trabalhos.
Com o último objetivo específico, que visou identificar o tipo de relação estabelecida
entre os saberes prescritos e os construídos para atenderem às exigências do trabalho,
evidenciou-se como ponto central, a contradição. Constatou-se que tanto as relações de
convergências, quanto as de divergências, identificadas entre os saberes pesquisados,
funcionam como forma de mediar a realização dos trabalhos dos sujeitos desta pesquisa.
Mediação pelo fato de as renormalizações serem realizadas para o atendimento das exigências
do trabalho. Contradição porque a empresa exige que as prescrições sejam seguidas, mas ao
136
mesmo tempo visa captar e se apropriar dos saberes que são construídos pelos empregados, em
situação de trabalho. Ainda que, caracteristicamente, no modelo de organização toyotista, as
prescrições ganhem menor destaque que nos modelos de organização taylorista/fordista, estas
continuam a ganhar espaço, desta vez, como forma de resguardar tanto os profissionais da
segurança, quanto a própria empresa. Assim, acredita-se que, no modelo de organização
toyotista, certo grau de burla às formas de realização do trabalho funcione como uma
prescrição implícita. Ou ainda, como uma maneira de a empresa ‘se ausentar’ das
responsabilidades assumidas pelos que ‘fogem ao seguimento’ das prescrições. Cumpre
explicitar que nos programas de segurança, realizados diariamente na empresa, uma lista de
presença que assume múltiplas funções, uma das quais a de resguardar os profissionais da
segurança e a empresa, caso aconteça algum acidente, pois eles têm como comprovar que os
empregados estão cientes dos riscos que cada atividade impõe, bem como das prescrições para
a realização de cada uma delas. No entanto, quando uma sugestão é dada, após um empregado
ter experimentado fazer diferente do que pede a prescrição, a empresa muitas vezes adota tal
saber, premiando o empregado e se apropriando do novo saber.
Finalizando este estudo, pôde-se concluir também que os sujeitos da pesquisa, de
maneira geral, atribuíram motivos diversos ao fato de renormalizarem os seus trabalhos e/ou
repassarem ou não os seus saberes aos kaizens. Citaram, por exemplo: a busca por
melhorias, a premiação, o entendimento de que isso possa lhes garantir o emprego ou
promoções, dentre outros. No entanto, durante a realização da pesquisa prevaleceram as
sugestões e renormalizações relacionadas diretamente à organização do trabalho, à diminuição
dos custos e ao aumento da produtividade. Conclui-se com isso que, ao buscarem a manutenção
do emprego, as promoções ou os prêmios concedidos pelo programa, os sujeitos da pesquisa
deixam de lado a busca por melhores condições de trabalho, sendo eles mesmos quem sugerem
melhorias nos processos de trabalho que podem ser utilizadas a favor do capital, em busca do
aumento do lucro, sem muitas vezes melhorar os processos de trabalho para eles próprios.
O fato de a empresa transformar as reivindicações em sugestões de melhorias, seguindo
o modelo de organização toyotista, parece ser mais uma estratégia para que elas sejam ou não
acatadas sem maiores conflitos. o conflito de valores e de interesses, quando as equipes
avaliam as sugestões levadas aos programas da empresa (kaizens). Conforme a pesquisa
realizada, são sugeridas melhorias do ponto de vista (interesses e valores) dos empregados e as
equipes as avaliam conforme os valores e interesses da empresa.
Ainda que a visão naturalizada de seus trabalhos e dos riscos que os envolvem tenha
sido constatada, não se pode afirmar que as burlas às prescrições sejam realizadas de forma
137
irresponsável. Observou-se que os sujeitos da pesquisa preocupam-se com as normas de
segurança, com a própria integridade física e com a dos demais empregados. E todos estão
cientes dos riscos a que estão expostos, considerando-os, assim como a segurança, uma norma
implícita de seus trabalhos.
Embora a existência de programas voltados à inclusão de pessoas com deficiência no
trabalho e para as suas reinserções na empresa possa ser considerado um avanço, verificou-se a
necessidade de trabalhos mais efetivos, especialmente no que diz respeito à conscientização das
equipes quanto às limitações e às possibilidades de cada um de seus integrantes em seus postos
de trabalho.
Observou-se que os programas de inserção e de reabilitação de pessoas com deficiência
na empresa, além de viabilizarem o cumprimento da legislação vigente, colaboram para
difundir a imagem idealizada de empresa socialmente responsável. Mesmo que a investigação
sobre as razões que dificultam as empresas na contratação e/ou manutenção de pessoas com
deficiência em seus quadros de empregados efetivos não tenha sido foco desta pesquisa,
constatou-se que a cota legal, da empresa pesquisada, não está sendo devidamente preenchida.
Os modelos de organização influenciam diretamente a realização do trabalho, assim
como também a relação estabelecida com os saberes. A empresa passa a não reconhecer o
potencial que os saberes construídos pelos empregados apresentam, como geradores de
sistemas automatizados e de prescrições, como também a criar artimanhas para captá-los e se
apropriar deles.
Os objetivos específicos buscaram atender ao objetivo geral da pesquisa, que foi o de
verificar as relações entre os saberes prescritos e os construídos no trabalho de pessoas com
deficiência física, em uma usina siderúrgica de Minas Gerais. A pesquisa apontou a
necessidade de uma problematização do termo
deficiência
, uma vez que, o que para muitos
pode denotar deficiência, especialmente no sentido que adquire comumente de ineficiência,
revela eficiência para outras pessoas, em outras condições ou situações de trabalho. Constatou-
se que os sujeitos da pesquisa tinham certa preocupação em retirar o foco das suas deficiências
físicas, mostrando as suas habilidades e competências.
Como limitações desta pesquisa apontam-se o período de realização da pesquisa de
campo, o que levou à opção de reduzir o número de sujeitos da pesquisa e, consequentemente,
o alcance da análise; o fato de o campo de atuação da empresa e das atividades dos sujeitos da
pesquisa se distanciarem dos conhecimentos prévios da pesquisadora, o que dificultou as suas
capacidades perceptivas; a não disponibilização de todos os dados necessários à pesquisa, por
parte da empresa; por não ser o foco principal da pesquisa, o debate Trabalho/Educação não foi
138
contemplado devidamente até o presente momento, o que se acredita poder ser feito
posteriormente; as burocracias impostas pelas empresas quanto à realização da pesquisa;
questões conceituais, tais como o de trabalho real, competência, saberes, conhecimentos e
método do sósia; também a permanência do termo autoconfrontação, ainda que se tenha a
consciência de que esta foi mediada pela pesquisadora. Reconhece-se que o fato de se ter uma
pessoa pesquisando os seus trabalhos, por intermédio do setor de Recursos Humanos da
empresa, pode ter influenciado de alguma forma as respostas e/ou os comportamentos.
Cumpre justificar ainda o fato que impossibilitou a realização da pesquisa com o
‘público’ definido anteriormente à escolha da empresa como campo de pesquisa jovens e
adultos com deficiência. A rede de supermercados contava apenas com jovens com deficiência;
a usina siderúrgica possui apenas adultos com deficiência. Isso se torna mais um dado a ser
investigado, uma vez que, além da diferença na faixa etária, encontraram-se também diferenças
na contratação pelo tipo de deficiência nestas duas empresas. Maior número de pessoas com
deficiência física contratadas na usina siderúrgica, e de pessoas com deficiência intelectual na
rede de supermercados, junto à ausência de pessoas com deficiência intelectual na usina.
O estudo se limitou nas suas particularidades, não podendo, assim, servir de modelo a
toda e qualquer empresa, impossibilitando generalizações, uma vez que os sujeitos envolvidos,
os seus ambientes, postos de trabalho, natureza e condições de trabalho são os principais
elementos determinantes da configuração da pesquisa realizada. Tomados em seu conjunto, os
resultados apresentados não podem ser generalizados, sugerindo-se a ampliação da pesquisa.
No entanto, espera-se que, de alguma forma, a realização desta pesquisa tenha
colaborado com certo índice de hipóteses e de dados, despertando o interesse no
aprofundamento de pesquisas e de teorias críticas que levem a uma prática mais crítica,
construtiva e transformadora, principalmente quanto à reprodução da cultura preconceituosa e
discriminatória às quais submetemos as pessoas excluídas, dentre as quais pessoas com
deficiência. Diante dessas considerações, foi possível identificar algumas recomendações para
pesquisas futuras sobre o tema investigado. Acredita-se ser necessária a replicação desta
pesquisa em outras empresas do setor
siderúrgico, sujeitas a desafios semelhantes, sem se
desconsiderar a presença de culturas,
histórias e configurações internas distintas. Também a
ampliação da aplicação da pesquisa nos setores supermercadista e siderúrgico, bem como a sua
realização em empresas de setores diferentes aos realizados e com outras áreas de atuação
dos sujeitos da pesquisa, além de tentar evitar a ocorrência das limitações encontradas nesta.
Embora se tenha a consciência de que os casos citados e analisados nesta dissertação
sejam casos particulares, situados no tempo e no espaço 5 empregados com deficiência física
139
em seus postos de trabalho em uma usina siderúrgica de Minas Gerais –, acredita-se que alguns
dos aspectos encontrados possam refletir e/ou serem o reflexo de situações enfrentadas por
pessoas com deficiência física em outras empresas, ainda que em realidades e situações de
trabalho diferentes, pois, com a síntese, também se compreendem os nexos existentes entre as
diversas partes e entre cada parte com o todo.
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150
APÊNDICES
Apêndice A – Termo de Consentimento da Pesquisa
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Por meio deste termo de consentimento livre e esclarecido, o(a) senhor(a) está sendo
convidado(a) a participar da pesquisa intitulada Relações entre os Saberes Prescritos e os
Construídos no Trabalho de Empregados com Deficiência Física da (Nome da empresa
ocultado somente na dissertação). A pesquisa é desenvolvida por mim, Lílian Dayse Fróes
Tavares, e por minha orientadora, Profª. Drª. Maria Aparecida da Silva, como parte do curso de
Mestrado em Educação Tecnológica do Programa de Pós-Graduação em Educação Tecnológica
do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET/MG.
O objetivo dessa pesquisa é verificar as relações entre os saberes prescritos e os construídos nas
atividades de trabalho de empregados com deficiência física da (Nome da empresa ocultado
somente na dissertação). O processo de coleta de dados envolverá os empregados escolhidos
para realização da pesquisa, os seus empregadores e colegas de trabalho, todos voluntários, e
serão gravadas em formato digital (MP3) e, posteriormente, transcritas pela pesquisadora. Em
qualquer momento, o(a) senhor(a) poderá solicitar esclarecimentos sobre a metodologia de
coleta e análise dos dados através do telefone (Número ocultado somente na dissertação) ou
pelo
e-mail
: (Ocultado somente na dissertação). Não haverá nenhum desconforto e riscos para
o(a) senhor(a) durante o desenvolvimento da pesquisa. Caso o(a) senhor(a) deseje se recusar a
participar, tem total liberdade para fazê-lo sem qualquer constrangimento.
A privacidade dos participantes da pesquisa, bem como da empresa (Nome da empresa
ocultado somente na dissertação) será garantida através do anonimato dos instrumentos de
coleta de dados. Todos os nomes de participantes da pesquisa serão substituídos por códigos
cuja correspondência com os nomes dos participantes não será divulgada em nenhuma
hipótese. O(A) empregado(a) participante poderá ter acesso às transcrições de suas entrevistas,
bastando para isso solicitá-las à pesquisadora.
Esta pesquisa não trará nenhum benefício direto e imediato ao(à) empregado(a), mas poderá
contribuir com o avanço dos conhecimentos sobre pessoas denominadas ‘com deficiência’, no
mercado formal de trabalho. Os resultados desta pesquisa poderão tornar-se públicos por meio
de dissertação, congressos, encontros, simpósios, revistas especializadas, dentre outros.
Se o(a) senhor(a) estiver suficientemente informado(a) sobre os objetivos, características e
possíveis benefícios provenientes da pesquisa, bem como dos cuidados que a pesquisadora irá
tomar para a garantia do sigilo que assegure a privacidade quanto aos dados confidenciais
envolvidos na pesquisa, assine este termo de consentimento livre e esclarecido, em duas vias de
igual teor, das quais uma ficará em seu poder e outra em poder da pesquisadora.
Obs.: A pesquisa está devidamente autorizada pelos responsáveis legais da
(Nome da
empresa ocultado somente na dissertação)
.
151
Consentimento de Participação em Pesquisa
Eu li o presente documento e entendo que eu sou livre para aceitar ou recusar a minha
participação na pesquisa supracitada. Eu concordo que os dados coletados para o estudo sejam
usados para os propósitos acima descritos. Eu entendi a informação apresentada neste
termo de
consentimento livre e esclarecido
. Eu tive a oportunidade para fazer perguntas e todas as
minhas perguntas foram respondidas. Eu receberei uma cópia assinada e datada deste Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido.
______________________, ________ de __________________ de __________.
___________________________________________________________________
Nome completo do(a) empregado(a) da (Nome da empresa ocultado somente na dissertação)
Carteira de Identidade: ______________________ CPF: ________________________
____________________________________________________________________
Assinatura do(a) empregado(a) da (Nome da empresa ocultado somente na dissertação)
Lílian Dayse Fróes Tavares
Graduada em Psicologia
s-Graduada em Educação Especial Inclusiva
Mestranda em Educação Tecnológica – CEFET/MG
Tel.: (Ocultado apenas na dissertação)
E-mail
: (Ocultado apenas na dissertação)
Profª Drª Maria Aparecida da Silva
Professora – CEFET/MG - Orientadora
Tel.: (Ocultado apenas na dissertação)
E-mail
: (Ocultado apenas na dissertação)
152
Apêndice B – Roteiro da Entrevista Semiestruturada
Dados pessoais
1.
Sexo:
( ) Masculino
(
) Feminino
2.
Qual sua idade?
( ) 25 a 30 anos
( ) 31 a 35 anos
( ) 36 a 40 anos
( ) 41 a 45 anos
3.
Estado civil:
4.
Filhos:
( ) Sim
( ) Não
Quantos? Apresenta(m) alguma deficiência?
Trabalho – Prescrição
5.
Requisitos/saberes prescritos básicos para o cargo:
a.
Escolaridade:
b.
Experiência:
c.
Saberes específicos/cursos:
d.
Habilidades:
e.
Outros saberes exigidos para o cargo:
f.
Outros saberes que não são exigidos, mas que são considerados importantes:
g.
Teve que fazer cursos específicos para o desempenho da função?
h.
Buscou cursos por conta própria ou foram dados/exigidos pela empresa?
6.
Quais são as descrições do seu atual cargo?
7.
Quais os procedimentos operacionais atribuídos ao seu atual cargo?
8.
Como teve contatos com tais documentos?
9.
Quais das descrições de cargo e/ou do procedimento operacional não são compatíveis
com a sua deficiência?
10.
Quais as atividades (ou formas de desenvolvê-las) descritas nesses documentos não são
realizadas por você? Por quê?
11.
Quais atividades você desempenha que não constam nesses documentos? Por que as
realiza? Quem as delegou a você? Por quê?
153
12.
Quais as exigências das atividades que realiza?
a.
Postura estática (parado) ( ) sim ( ) não
Sentado ou em pé?
b.
Movimentos repetitivos ( ) sim ( ) não
c.
Força ( ) sim ( ) não
d.
Habilidade manual ( ) sim ( ) não
e.
Concentração ( ) sim ( ) não
f.
Esforço visual ( ) sim ( ) não
g.
Outros tipos de esforços ( ) sim ( ) não
h.
Atenção ( ) sim ( ) não
i.
Memória ( ) sim ( ) não
j.
Raciocínio ( ) sim ( ) não
k.
Responsabilidade ( ) sim ( ) não
l.
Criatividade ( ) sim ( ) não
m.
Ritmo intenso ( ) sim ( ) não
n.
Outras. Quais? Explicar:
13.
Qual(is) a(s) exigência(s) que a empresa fez durante o processo de admissão?
14.
Qual(is) a(s) diferença(s) nos processos de seleção dos empregados incluídos no
programa de inclusão de pessoas com deficiência e os processos de seleção para os
demais empregados?
15.
A sua carga horária de trabalho, o seu salário e benefícios são iguais aos dos demais
empregados da empresa? (Por quê?)
16.
Em que ocasião(ões) você se utiliza dos equipamentos de proteção individual e/ou
coletiva?
17.
Quais EPIs são recomendados para a sua área/setor?
a.
Luvas ( ) sim ( ) não
b.
Máscaras ( ) sim ( ) não
c.
Protetor auricular ( ) sim ( ) não
d.
Capuz ( ) sim ( ) não
e.
Óculos ( ) sim ( ) não
f.
Botina ( ) sim ( ) não
g.
Perneira ( ) sim ( ) não
h.
Jaleco jeans ( ) sim ( ) não
i.
Capacete ( ) sim ( ) não
j.
Outros
18.
Como podem ser evitados os riscos do seu trabalho? (Para você e para os colegas de
trabalho.)
154
Local de trabalho
19.
Que adaptações foram necessárias no(s) local(is) de trabalho, em decorrência da sua
deficiência?
a.
Maquinaria/equipamentos:
b.
Posto de trabalho:
c.
Adequações de tarefas:
d.
Adequações do tempo de trabalho:
e.
Adequações acerca da organização do trabalho:
f.
Adequação da geografia da empresa:
20.
Que outras adaptações ainda são necessárias? Por quê?
Atualização
21.
O que faz para manter-se atualizado(a) para com os assuntos e as exigências do seu
trabalho?
22.
Que possibilidade de crescimento profissional você vê na empresa? Você já teve?
23.
Por quais treinamentos você passou na empresa?
Motivação
24.
Qual(is) o(s) principal(is) fator(es) de motivação para o trabalho?
25.
Como você percebe que o seu trabalho é valorizado na empresa?
26.
Você recebe adicionais, tais como:
a.
Insalubridade ( ) sim ( ) não
b.
Periculosidade ( ) sim ( ) não
c.
Penosidade ( ) sim ( ) não
d.
Tempo de serviço ( ) sim ( ) não
e.
Hora-extra ( ) sim ( ) não
f.
Outros ( ) sim ( ) não. Quais?
27.
O que no seu trabalho é importante para a sua formação humana?
28.
Qual o significado que o trabalho tem para você? Em qual(is) situação(ões) você
deixaria de trabalhar? Você se sente realizado(a) com o seu trabalho?
155
Inserção
29.
Como aconteceu a sua entrada nesta empresa?
30.
Antes da entrada na empresa, vofez outras tentativas de inserção no mercado formal
de trabalho? Quais as dificuldades enfrentadas?
31.
Para qual cargo você foi contratado(a)? Sempre trabalhou no mesmo cargo?
32.
Por qual(is) deficiência(s) você foi incluído(a) no programa de inclusão de pessoas com
deficiência da empresa?
33.
Como foi a sua aceitação na empresa?
34.
Você considera que o cargo para o qual foi admitido(a) na empresa e no programa de
inclusão de pessoas com deficiência é/era compatível com a sua deficiência?
Dificuldade
35.
Quais dificuldades tem ou teve para realizar o seu trabalho?
36.
Em uma escala de 1 a 10, como você classifica o nível de esforço para o
desenvolvimento de suas atividades de trabalho?
37.
Com quais preocupações, ansiedades, angústias, frustrações você se depara na
realização do seu trabalho? Quais as suas causas?
38.
Que transporte utiliza para ir e voltar do trabalho? Existe algum tipo de adaptação nesse
transporte? Qual?
39.
Você percebe alguma diferença na segurança do trabalho que podem ser atribuídas ao
zelo por causa de suas condições físicas?
Variabilidade
40.
Quando alguma coisa não sai conforme o que deveria ser feito, o que acontece?
(Verificar histórias a contar sobre as variabilidades/microvariabilidades).
Saberes construídos
41.
Quais procedimentos e técnicas foram criados por você para desempenhar as suas
atividades?
42.
Você contribuiu com alguma sugestão para a melhoria do seu trabalho ou de algum
processo da empresa? Qual(is)? Esta sugestão foi elaborada de forma individual ou em
grupo?
156
Rotina de trabalho
43.
Como é utilizado o tempo durante a jornada de trabalho? (Tem liberdade de horário para
fazer pausas para almoçar, levantar-se, sentar-se, beber água, utilizar o banheiro, etc.?).
44.
Quais providências precisa tomar antes de se ausentar do posto de trabalho? (Tipo
alguém substituí-lo(a) no posto de trabalho).
45.
De que modo as folgas flutuantes interferem na sua vida social?
46.
Quais as exigências quanto ao ritmo de trabalho? De que forma são reguladas? Por
quem ou pelo quê?
47.
Quais os riscos encontrados no desenvolvimento de suas atividades cotidianas de
trabalho? Explicar todas as situações.
a.
Encontra-se submetido a:
b.
Ruído ( ) sim ( ) não
c.
Campo eletromagnético ( ) sim ( ) não
d.
Calor ( ) sim ( ) não
e.
Poeira ( ) sim ( ) não
f.
Gases tóxicos ( ) sim ( ) não
g.
Riscos com a maquinaria ( ) sim ( ) não
h.
Quedas ( ) sim ( ) não
i.
Outros. Quais?
48.
O que é mais perigoso no desenvolvimento do seu trabalho? (Que gera mais riscos).
49.
Já sofreu algum acidente?
( ) sim
( ) não
a)
Onde?
( ) no trabalho atual
( ) trabalhos anteriores
b)
Registrou?
( ) sem registro
( ) com registro
c)
Houve afastamento?
( ) sem afastamento
( ) com afastamento
d)
O que ocorreu?
( ) queda
( ) corte
( ) queimadura
( ) intoxicação
( ) trajeto
( ) doméstico
( ) choque elétrico
( ) explosão
( ) Outros. Quais?
157
Relação com a empresa
50.
Conhece toda a empresa?
51.
Conhece todo o processo de produção?
52.
Tem curiosidade em conhecer toda a empresa e todo o processo de produção?
53.
Quais os espaços já foram visitados?
54.
Sabe o que é fabricado na empresa? (O quê?).
55.
Tem conhecimento de quem são os principais clientes externos da empresa? (Quais
são?).
56.
Quais modificações você faria na situação das pessoas com deficiência no trabalho?
57.
Quais as modificações que você faria no setor e na área onde trabalha? E na empresa?
Organização do trabalho
58.
Há possibilidade de flexibilização em seus dias e horários de trabalho?
59.
Existe liberdade para definir as formas de realização das suas tarefas?
60.
Considera o seu trabalho indispensável para a continuidade de um processo produtivo?
De qual(is)? Existe integração com outros empregados? Como acontece esta
integração?
61.
O seu trabalho pode ser considerado:
a.
Individual ( ) sim ( ) não
b.
Em equipe ( ) sim ( ) não
c.
Executa uma tarefa ( ) sim ( ) não
d.
Executa mais de uma tarefa ( ) sim ( ) não
e.
Repetitivo ( ) sim ( ) não
f.
Monótono ( ) sim ( ) não
g.
Dinâmico ( ) sim ( ) não
h.
Exaustivo ( ) sim ( ) não
i.
Realizador ( ) sim ( ) não
j.
Insalubre ( ) sim ( ) não
k.
Saudável ( ) sim ( ) não
l.
Perigoso ( ) sim ( ) não
m.
Criativo ( ) sim ( ) não
n.
Outros. Qual(is)?
62.
Participa do sindicato dos metalúrgicos? Quais os interesses você defende? Existe
alguma relação entre a sua participação (ou não participação) no sindicato e a sua
deficiência?
158
Mudanças advindas do trabalho
63.
Quais perspectivas o trabalho proporcionou?
Relações sociais de produção
64.
Como você vê as relações sociais desenvolvidas durante a realização do seu trabalho?
Legislação
65.
Você conhece a Lei Federal nº. 8.213/1991? Qual a sua opinião sobre ela?
66.
De que maneira esta lei influenciou sua entrada na empresa?
Relação com a deficiência
67.
Você se considera apto a disputar com qualquer pessoa o seu cargo em outra empresa?
Por quê?
68.
Você considera diferente o trabalho realizado por pessoas com e sem deficiência na
empresa? Por quê?
Educação
69.
Qual a sua escolaridade?
70.
Tipo de escola em que estudou/estuda (pública/particular...):
71.
Como foram as suas experiências escolares?
72.
Estuda atualmente? Especifique:
História de vida - Relação com a deficiência
73.
Em virtude da sua deficiência, é necessário o auxílio de outra(s) pessoa(s) para o
desenvolvimento do seu trabalho?
74.
Você considera que o trabalho foi/é importante para a (re)construção de sua identidade?
Lazer
75.
Das atividades de lazer existentes na empresa, de qual você participa ou já participou?
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