91
diante do mundo, e a este modo Elliott chama de niilismo
223
normal. Mais a frente
examinaremos que, embora a justificação moral não seja possível dentro dos moldes
científicos de justificação, o principialismo, conforme entendemos, ‘justifica’ as ações
através de princípios que partem da própria prática, pois se baseiam na experiência das
ações moralmente aceitas, ao menos na sociedade ocidental, de modo que os princípios
da autonomia, beneficência, justiça e não-maleficência nos permitem concluir que tipos
de ações são mais adequadas em determinados casos. Na verdade, o principialismo não é
um modelo científico de como agir moralmente, nem pretenderíamos que fosse, visto o
que nos mostra Wittgenstein sobre isto, mas na necessidade de uma justificação moral,
os princípios atendem, de certo modo, nossa necessidade de defender porque agimos de
uma forma e não de outra. Ou seja, ao invés de os casos clínicos serem resolvidos
através da mera aplicação algorítmica de regras, ou de adotarmos um particularismo que
trata cada caso de uma forma diferente, temos assegurado, através dos princípios, a
observância de vários fatores envolvidos em um caso, e não uma aplicação mecânica de
regras, de modo que o principialismo contempla todas as necessidades apontadas pelas
outras propostas para a tomada de decisões em casos clínicos.
As necessidades apontadas por Elliott, James Nelson e Little, por exemplo,
fazem referência à fragilidade das regras, problematizam que uma teoria ética possa
resolver nossos dilemas, mas percebemos que, embora tragam interessantes discussões,
ainda são um tanto quanto vagos quanto ao que fazer em bioética, em como agir. Afinal,
seja como particularista, niilista
224
ou propondo um julgamento especializado, ainda não
resolvemos os dilemas clínicos, pois essas posições podem nos levar a atitudes
arbitrárias, ou a um ceticismo quanto à aplicabilidade das regras (o que não cremos ser a
posição de Wittgenstein), visto que cada caso tem particularidades que podem não estar
previstas pela regra.
No capítulo 1, vimos a preocupação de James Nelson com um julgamento
especializado, que seria um julgamento onde os exemplos e a virtude teriam grande valia
na aplicação das regras. Neste mesmo capítulo vimos as críticas de Little a teorias éticas
generalistas, e um defesa do particularismo moral. Com as idéias de Elliott a respeito de
223
Embora o termo ‘niilismo’ tenha sido consagrado por Nietzsche, o uso que Elliott faz desse termo toma
outros rumos. Para Nietzsche o niilismo seria uma espécie de “crença na descrença”, ou uma negação da
verdade ou validade dos valores e morais existentes, onde a liberdade da vontade superaria estes valores,
dando origem ao que o autor chama de super-homem (Nietzsche, 2001). Por outro lado, para Elliott, a
expressão ‘niilismo normal’ se refere à percepção das diferenças quanto à moralidade e a percepção de que
nossos valores não são “os corretos”, o que nos levaria a respeitar os valores e crenças de cada forma de
vida, e não a negá-los.
224
O niilismo normal será examinado na seção que segue.