Download PDF
ads:
UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA
ESCOLA DE BELAS ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS
Linha de Pesquisa: Processos Criativos nas Artes Visuais
MARIA DA CONCEIÇÃO ANDRADE SOUZA
terraTerra:
um movimento poético com o barro cozido
Salvador
2009
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
MARIA DA CONCEIÇÃO ANDRADE SOUZA
terraTerra:
um movimento poético com o barro cozido
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Artes Visuais, Escola de Belas Artes, Universidade
Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do
grau de Mestre em Artes Visuais.
Área de Linguagens Visuais Contemporâneas, linha de
Processos Criativos nas Artes Visuais.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Virgínia Gordilho Martins
(VigaGordilho)
Salvador
2009
ads:
Universidade Federal da Bahia. Escola de Belas Artes
S 729 Souza, Maria da Conceição Andrade.
Terra-terra: um movimento com barro cozido/ Maria da Conceição Andrade
– 2009.
150 f.: il.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Virgínia Gordilho Martins.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal da Bahia. Escola de Belas
Artes. 2009.
1. Cerâmica. 2.Arte contemporânea. I. Martins, Maria Virginia Gordilho.
II. Universidade Federal da Bahia. Escola de Belas Artes. III. Título.
CDU – 738
CDD –
MARIA DA CONCEIÇÃO ANDRADE SOUZA
terraTerra:
um movimento poético com o barro cozido
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Artes Visuais, Escola de Belas Artes, Universidade
Federal da Bahia, como requisito parcial para obtenção do
grau de Mestre em Artes Visuais.
Salvador,
__________________________________________________
Maria Virgínia Gordilho Martins
Doutora em Artes pela Universidade de São Paulo (USP)
__________________________________________________
Mariela Brazón Hernández
Doutora em Artes Visuais pela Universidade Federal do
Rio de Janeiro (UFRJ)
__________________________________________________
Norma Grinberg
Doutora em Artes pela Universidade de São Paulo (USP)
Dedico esta pesquisa àqueles que vêem a Terra no céu...
Agradecimentos
Agradeço a Deus pelo curso de mestrado e a meus pais pelo carinho e apoio de sempre.
A minha orientadora VigaGordilho pela dedicação constante e confiança em meu trabalho.
Aos colegas do mestrado, da turma 2006, pelo acolhimento e por me incentivarem a
participar da seleção neste mesmo ano, e, aos da turma 2007, por trocas e
compartilhamento.
Aos professores da EBA por minha formação artística e a toda a equipe do PPGAV pelo
apoio.
Ao Prof. Juarez Paraíso por sua escuta e incentivo na pesquisa; à Profa. Mariela Brazón
Hernández e à Profa. Norma Grinberg, professoras da Banca, que também contribuíram
com observações pertinentes; às Profas. Nanci Novaes e Rosilda Sá por suas indicações
para pesquisa sobre o procedimento cerâmico na contemporaneidade.
A Capes pela concessão de bolsa por um ano.
A Beth Silva por nossas leituras, de grande ajuda no início do projeto.
A Elisa Jampietro pelo suporte na sonorização dos objetos e a Emília Biancardi por me
fazer acreditar no potencial sonoro das proto-estrelas.
A Carla Piaggio por sua ajuda precisa nas referências e diagramação desta dissertação.
A Albano Oliveira, Matilde Matos e Claudine Toulier pela realização da Exposição
GerminandoEstrelas e a Organização Silveira por seu patrocínio.
A Murilo Ribeiro pela concessão da pauta no Palacete das Artes para realização da Exposição
terraTerra.
A Laís Andrade, minha filha e companheira, responsável pela fotografia e projeto
gráfico de toda a pesquisa; a Paulo, meu filho, sempre presente nas montagens e
desmontagens.
A Osvaldo, meu marido, por ter me ensinado a ver
a Terra no céu e a ouvir as estrelas...
“[...] temos realmente a impressão de que o sonhador que
modela segue melhor os interesses do devaneio íntimo do
que o sonhador que contempla.”
GastonBachelard
O sonhador que modela segue melhor os interesses do
devaneio íntimo porque apreende seus sonhos, modela-
os, materializa-os, deixa de contemplá-los em sua solidão
ao oferecê-los à contemplação alheia. Reúne em si mesmo
as condições de modelador e contemplador?
Reflexãodaautora
Resumo
A pesquisa investiga, de forma prático-teórica, o processo de confecção de objetos
cerâmicos, enquanto signos de uma linguagem visual universal, através da qual o
homem se encanta e canta sua concepção de universo. Uma linha imaginária visual-
sonora, portanto, liga o procedimento cerâmico que se faz com terra — argila — ao
planeta Terra, considerando fazeres poéticos regionais e universais. Esta linha torna-
se eixo da imaginação para o movimento incessante entre cosmovisões ameríndias e
devaneios contemporâneos. Enquanto as experimentações cerâmicas tornam-se
sementes, proto-estrelas e outras formações cósmicas, constelações de obras-estrelas
são traçadas para visualizar e analisar o gesto criativo por método associativo e
processual como em redes de criação. Tomo Gaston Bachelard como filósofo
norteador desta pesquisa porque é esclarecedora sua análise da ação do modelador,
daquele que, com imaginação e vontade, trabalha com a maciez e resistência das
massas cerâmicas. Faço aproximações e distanciamentos com obras de artistas
pesquisadores nas áreas de artes visuais e música: Norma Grinberg, Eriel Araújo,
Ana Maria Tavares, Walter Smetak, Susan Rawcliffe, Márcia Xavier, Gabriel Orozco,
Amélia Toledo, Celeida Tostes e Delma Godoy. As reflexões e a prática no atelier
apontaram caminhos e possíveis respostas para questões que envolvem o
procedimento cerâmico e a arte contemporânea. Os resultados que abraçam o
diálogo com o espectador para conquista de novos conhecimentos, interligados a esta
dissertação, foram apresentados em duas exposições individuais: Germinando
Estrelas, onde foram instalados objetos sonoros, as Protoestrelas, na EBEC Galeria
de Arte, em 2007, e terraTerra, onde se pode perceber uma atmosfera cósmica com as
obras Granulações, Sítiocósmico, Protoestrelas, Cantosdojoãodebarro e Caco
cipóno sótão do Palacete das Artes Rodin Bahia, em 2009, em Salvador.
Palavraschave: cerâmica, sonoridade, movimento, cosmos e arte contemporânea.
Abstract
This research investigates, under a practical-theoretical approach, the crafting of
ceramic objects as signs of a universal visual language, through which we are
enchanted and chant our conception of the universe. Thus, an imaginary visual-
resonant line links the ceramic process of molding earth [clay], to planet Earth,
considering regional and universal poetic techniques. This line becomes an axis of
imagination for the incessant movement between Amerindian cosmovisions and
contemporary reveries. While ceramic explorations become seeds, protostars and
other cosmic formations through an associative and procedural method, star-works
constellations are traced to visualize and analyze the creative gesture, as in networks
of creation. Gaston Bachelard was my guiding philosopher in this research for his
analysis on the handiwork of a modeler who, with imagination and will, works with
the softness and resistance of ceramic masses is enlightening. I observe from near
and afar the works of investigative artists in the areas of visual arts and music, such
as Norma Grinberg, Eriel Araújo, Ana Maria Tavares, Walter Smetak, Susan
Rawcliffe, Márcia Xavier, Gabriel Orozco, Amélia Toledo, Celeida Tostes and Delma
Godoy. Reflections and practices in the atelier indicated paths and possible answers
to questions involving ceramic procedure and contemporary art. The results
interconnected to this dissertation, involving dialogue with the spectator for the
attainment of new knowledge, were presented in two individual exhibitions:
GerminatingStars, an installation with sonant objects, Protostars,at EBEC Galeria de
Arte in 2007, and earthEarth, where Granulations, CosmicSite,Protostars, Chants
of the Ovenbird and FragmentVine, created a cosmic atmosphere in the attic of
Palacete das Artes Rodin Bahia, in 2009, in Salvador.
Keywords: ceramics, sonority, movement, cosmos and contemporary art.
9
10
Introdução
Lembro-me de, criança ainda, em férias na ilha de Itaparica, ver o saveiro que vinha
de Maragogipinho
1
carregado de cerâmica colorida se aproximar da ponte e partir...
Depois, na venda da Praça da Quitanda, comprávamos os caxixis para brincar de
cozinhado no quintal. Mas para onde ia o saveiro? Foi pensando naquelas travessias
que fui traçando meu caminho, fortalecendo essa antiga amizade com o barro cozido,
com as técnicas aprendidas na Escola de Belas Artes (EBA) da Universidade Federal
da Bahia (UFBA) e com o trabalho diário desenvolvido em atelier, atenta à minha
Bahia, por quase vinte anos (fig.01). Cada vez mais interessada nas questões
materiais e simbólicas do fazer da cerâmica, como “sonhador que modela”
2
,
aproximei as palavras terra e Terra, para conceituar esta dissertação de mestrado.
fig. 01. Imagens que situam a gênese da pesquisa: caxixi
e xilogravura da artista, Bahianinha, 1963.
1 Cidade produtora de cerâmica localizada no Recôncavo Baiano, às margens do Rio Jaguaripe.
Desde o início do séc. XVIII, lá são produzidos: vasos, bilhas, porrões, moringas e caxixis, utensílios
em tamanho reduzido para brinquedos de criança.
2 O trabalho do “sonhador que modela” é analisado por Gaston Bachelard como decorrente do
movimento entre vontade (força contra a matéria) e imaginação (imagens da intimidade) em suas
obras: ATerraeosDevaneiosdaVontade e ATerraeosdevaneiosdoRepouso, obras escritas em 1948.
Consultar Apêndice A — Dados biográficos — para breves informações sobre vida e obra de
Gaston Bachelard e outros pensadores, artistas e pesquisadores indicadores de reflexão nesta
dissertação.
11
Assim, em primeira instância, quero definir os conceitos dessas palavras na junção:
terra-Terra. A primeira, com a inicial minúscula, refere-se à argila, barro, cerâmica e é
com este significado que é usada nesta pesquisa. A outra, com inicial maiúscula,
remete-nos a nosso planeta. Contudo, uma e outra estão estreitamente ligadas, pois a
cerâmica tem participado do desenvolvimento de inúmeras culturas há milênios, tem
garantido a sobrevivência material e espiritual do homem. Assim, sob essa reflexão
inicial e com as mãos na terra e olhos voltados para a Terra, investiguei o processo do
barro cozido na produção de objetos cerâmicos, considerando fazeres regionais e
universais, como signos de linguagem visual, através da qual também expresso uma
visão de mundo inserida em uma poética visual- sonora.
Considerando, portanto, que cozinhar a terra transformando-a em cerâmica é uma
ação histórica universal, pontua-se que aqui na Bahia temos registros e exemplares
de produções locais feitas desde o período pré-colonial até a atualidade nos mais
diversos estilos e graus de sofisticação técnica, incluindo peças vindas do Reino no
período colonial. Deter o olhar sobre este significativo acervo levou minha produção
cerâmica, do final dos anos 90 até 2004, a ser conceituada com grafismos e elementos
inspirados nessas tradições locais: a indígena tupiguarani, a colonial de origem
européia e parte da produção rural baiana do final do século XX e início do XXI. Essa
última, a produção rural, trouxe-me a percepção do uso da forma, dos elementos
compositivos, dos materiais usados e do processo de confecção como linguagem para
expressar a visão de cada grupo. Cada comunidade apresentava-me seu discurso
singular em meio a tendências similares. Ao tomar conhecimento de produções
cerâmicas de outras comunidades rurais brasileiras e estrangeiras, notava em todas
elas traços em comum no geometrismo gráfico, no acabamento pictórico e até no
processo de confecção quando havia registro.
12
Esta pesquisa de campo previamente realizada
3
foi a base para relacionar nossa
produção cerâmica regional direcionada pelos mestres-artesãos, criadores de
padrões, com a experimentação do artista contemporâneo. Isso porque, através da
arte, investigamos nosso mundo e o universo em busca de conhecimento e auto-
conhecimento e nos comunicamos através de signos em diferentes linguagens desde
a pré-história. A arte de se expressar através da terra deixou registros de
coletividades desaparecidas e nos fala das necessidades humanas, de utilitárias a
lúdicas, religiosas, narrativas da vida e anunciadoras de idéias e visões.
Em paralelo à referida pesquisa da cerâmica regional, dediquei-me, há alguns anos, à
leitura da história da astronomia: como o homem investigava o movimento dos
astros celestes, como se descobriu a Terra e desenvolveu conhecimentos científicos
do Universo, motivada pela emoção de observar estrelas, planetas e seus satélites,
com um telescópio
4
, de um pequeno observatório astronômico que temos em casa.
Assim, alimentando-me do eterno gesto do homem simples e sensivelmente
perceptivo que transforma a terra em artefato cerâmico
5
com grande sabedoria, e,
expandindo o olhar em direção ao céu e à pesquisa em arte, passei a refletir sobre as
interligações entre três distintos fazeres humanos: o do mestre-artesão nas
comunidades rurais, o do artista contemporâneo em seu atelier globalizado
6
, e o do
astrônomo, observador do céu, hoje
7
. Nesta conjuntura, fiz os seguintes
questionamentos: não busca cada um deles, de sua forma, expressar uma visão de
mundo? Não são essas visões de mundo e conceitos, elaborados a partir de
percepções particulares, imagens que se busca focar ao longo da história humana?
3 Consultar Apêndice B — Documentação da pesquisa de campo.
4 Do tipo refletor com espelho parabólico de oito polegadas (203 mm) e distância focal de um metro.
5 Como manifestação estética do homem, necessária, através do fazer cotidiano.
6 Atentar para novas experiências que implicam no artista executar a obra nos mais diversos
lugares, a depender de seu processo criativo.
7 Levando-se em conta que o astrônomo dispõe também de alta tecnologia para executar suas
pesquisas.
13
Não são elas impermanentes à medida que conquistamos novos conhecimentos?
Acredito que assim também é o percurso humano individual, seres mutantes que
somos, como num processo de transformação de substâncias argilosas em cerâmica,
apresentando mudanças durante o processo. Essas inquietações levaram-me a buscar
possíveis respostas no percurso da pesquisa.
Passei a verificar, portanto, que meu processo criativo é movido por
questionamentos e impulsos, relacionando a vontade de trabalhar a terra, sólida e
maleável, a devaneios internos no exercício do fazer criador e transformador. Para
essa síntese, a da imaginação e vontade, Gaston Bachelard nos chama a atenção
quando nos fala do “sonhador que modela”
8
, a partir de seu mundo interior; e
percebi que os conceitos desse filósofo, que tomei como referência nesta pesquisa, são
norteadores de reflexões que nos apontam para a universalidade humana, de forma
tão natural quanto a que assumimos ao participarmos, hoje, da grande rede de
comunicação verbal, visual e sonora, predita utopicamente por Arthur C. Clarke em
1945
9
.
Então, fazendo-se uma reflexão sobre nosso momento contemporâneo, é preciso
considerar o movimento generalizado de comunicação em rede, no qual vivemos,
que direciona características similares à arte contemporânea, como afirma Anne
Cauquelin
10
. Hoje, a presença do artista e da obra na web é fundamental, a
velocidade de produção é exigida pela estrutura da comunicação, onde se fazem
necessários os apoios publicitários. Isto vem acompanhado da indeterminação do
todo na desconstrução de técnicas, na não-distinção entre os tradicionais gêneros e na
experimentação das possibilidades dos materiais. Surge a arte tecnológica, a arte
8 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad. Maria Ermantina Galvão. 2 ed. São Paulo : Martins Fontes, 2001, p. 82-83.
9 Consultar Apêndice A — Dados biográficos.
10 CAUQUELIN, Anne. Arte Contemporânea: uma introdução. Trad. Rejane Janowitzer. São Paulo :
Martins Fontes, 2005, p. 73, 148-151. Consultar Apêndice A — Dados biográficos.
14
interativa e processual e também valorizam-se os processos de criação das obras
inerentes a elas.
Naturalmente assim, em nosso dia-a-dia, estabelecemos conexões múltiplas,
relacionamos vivências e compartilhamos imagens e emoções. De forma semelhante,
processos criativos na arte também se dão através de redes de conexão, “cuja
densidade está estreitamente ligada à multiplicidade das relações que a mantém”,
como nos explica Cecília Salles
11
. Dessa forma, quanto maior o número de conexões
estabelecidas, mais complexas são as redes de criação.
Tomei, então, como metodologia de pesquisa a prática no atelier dialogando com
textos filosóficos de Gaston Bachelard, além de pontuar aproximações e
distanciamentos com obras de outros artistas: Norma Grinberg e Eriel Araújo, no
despertar da pesquisa, focando a atenção para o trabalho com a terra; Walter Smetak,
Susan Rawcliffe e Ana Maria Tavares, nas reflexões da sonoridade. Márcia Xavier foi
selecionada como referência para questões de vistas aéreas e Gabriel Orozco na
construção do pensamento visual. Uma obra de Amélia Toledo foi escolhida para
pensar numa linha sonora e Celeida Tostes para rever conceitos relacionados ao joão-
de-barro. Finalmente, Delma Godoy
12
foi considerada na observação da relação
homem-cosmo.
Para melhor compreender e visualizar a construção do pensamento em processo
criativo, adotei também como procedimento metodológico o traçado de um
fluxograma em formato de uma espiral, que pontua a linha do tempo do percurso
artístico — a expansão da poética. Este parte de uma obra significativa feita em 1989
e realça a produção construída durante o mestrado, de 2006 a 2009. Nessa espiral
11 SALLES, Cecília Almeida. Redesdecriação: construção da obra de arte. São Paulo : Horizonte. 2006,
p. 17. Consultar Apêndice A — Dados biográficos.
12 Consultar Apêndice A — Dados biográficos para todos esses artistas citados nesse parágrafo.
15
diagramei quatro constelações
13
para designar os agrupamentos das obras cerâmicas
realizadas, às quais chamo nesta dissertação de obras-estrelas ou estrelas-obras. Essas
constelações relacionam-se às idéias de origem, direção de movimento, exercício do
gesto criativo e agregação de conhecimento na reflexão.
A compreensão de meu percurso artístico relacionado ao gesto criativo — que tem
uma origem, busca uma direção, passa pelo exercício do caos-cosmo na construção
das obras e precisa de uma reflexão para a introjeção de conceitos trazidos nas
imagens (fig.02) — aconteceu ao cursar a disciplina Teoria e Técnica de Processos
Artísticos, ministrada pela Profa. Maria Virgínia Gordilho Martins
14
, ainda como
aluna especial do Programa de Pós Graduação em Artes Visuais (PPGAV), em 2006.
Foi um me dar conta, nos exercícios da
referida disciplina, ao produzir as obras:
Alfabedo, GrãodeTerras e Oceânico. A
visualização desse trajeto através do
diagrama ao lado decorreu também de
leituras sobre criatividade e processo
quando fazia um curso de Pós-graduação
latosenso em Arteterapia Junguiana.
criativo em livro de Fayga Ostrower
15
,
Nesse curso, tive oportunidade de refletir sobre o material — terra — e suas
fig. 02. Percurso artístico analisado e
diagramado em 2006.
considerações simbólicas, a projeção de imagens interiores no processo de
modelagem e a expansão de consciência que pode ocorrer com a leitura delas. Em
paralelo à busca de compreensão desse processo no trabalho criativo, passei a assistir
13 Constelações são grupos de estrelas interligadas por linhas imaginárias formando signos visuais.
Ao longo desta dissertação, como recurso metodológico, essas constelações são sempre grafadas
em negrito e as obras cerâmicas da autora são sempre grafadas em negrito itálico.
14 VigaGordilho, também Artista Visual e orientadora desta pesquisa.
15 OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 16. ed. Petrópolis : Vozes, 2002. Consultar
Apêndice A — Dados biográficos.
16
na televisão a série científica Cosmos, de Carl Sagan
16
, exibida nos anos oitenta e que
foi relançada em DVD pela Abril Cultural. Essas duas experiências embasaram-me
para identificar a origem — o ponto de partida do meu processo criativo, a terra e
meu entorno cultural — e a direção — a Terra fazendo parte do céu, planeta solto no
espaço, como todos os outros astros que observo com o telescópio e a olho nu, no
reconhecimento de constelações traçadas há milênios pela humanidade.
Durante esta pesquisa de mestrado, buscando respostas para os questionamentos
Ao cursar as primeiras disciplinas do curso de mestrado, fui, paulatinamente,
que surgiam no diálogo da prática com a teoria, fui levada também à leitura de
estudos antropológicos, com registros de mitos ameríndios acerca da origem da
cerâmica feitos por Claude Lévi-Strauss
17
e à leitura de artigos etnográficos, sob a luz
da arqueoastronomia, sobre o nascimento da astronomia e os traçados das
constelações, publicados numa Edição Especial da Scientific American Brasil
18
. Fez
parte, então, do processo criativo interagir com os nós da rede cultural que
caracteriza nosso momento, interligando diversos saberes no exercício da reflexão.
Isto significa para Cecília Salles, já referenciada nesta introdução, “simultaneidade de
ações, ausência de hierarquia, não linearidade e intenso estabelecimento de nexos”
19
.
acrescentando aos objetos produzidos vários elementos capazes de gerar sonoridade,
ampliando assim o diálogo com o observador contemporâneo. Esta ação denota estar
atenta ao processo de produzir cerâmica na prática de atelier e à sonoridade que o
acompanha, desde o acrescentar água à terra seca, passando pelo bater da massa
16 Consultar Apêndice A — Dados biográficos.
17 Consultar Apêndice A — Dados biográficos.
18 NOGUEIRA, Salvador. De olho no céu. GRECO, Alessandro. Nascimento da astronomia.
SCHAEFER, Bradley E. A origem das constelações gregas. AFONSO, Germano. Mitos e estações
no céu tupi-guarani. In SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL, v. 14, Etnoastronomia. São Paulo :
Ediouro, 2006. (Edição Especial).
19 SALLES, Cecília Almeida. Redesdecriação: construção da obra de arte. São Paulo : Horizonte. 2006,
p. 17.
17
sobre a mesa, até chegar à retirada da peça do forno, quando testamos sua
integridade fazendo-a soar com os nós dos dedos.
Para atingir o objetivo de produzir formas diferentes, com propósitos também
diferentes e explorando algumas das inúmeras possibilidades de interferência com a
matéria, várias técnicas construtivas foram desenvolvidas e testadas
20
. Além dessas
técnicas construtivas usadas para a produção de peças cerâmicas, montagens em
espaço aéreo com cabo de aço foram feitas com sucesso e a inclusão do uso de acrílico
e a projeção de sombras foram necessários para explorar visualmente conceitos
desejados.
Com essas características pode-se situar esta pesquisa na interdisciplinaridade
contemporânea, e sua relevância instaura-se justamente na ampliação da compreensão
do procedimento cerâmico como gerador de processos associativos na construção do
pensamento, com circulação e intercâmbio de informações. Esta dissertação como
resultado de pesquisa prático-teórica em Artes Visuais, onde conceitos são construídos
e conhecimento técnico analisado com eles, justifica-se na área da cerâmica, pois em
relação a ela como linguagem artística na contemporaneidade pouca bibliografia
existe. Há, sim, fartura de compêndios técnicos.
Assim, ao longo de todo o trajeto da pesquisa, o intuito foi o de compreender o
processo de uma poética do barro cozido como resultado de movimento entre
imaginação e vontade, a imaginação ativista, que sonha e trabalha a matéria, como nos
descreve Gaston Bachelard
21
em relação aos devaneios do sonhador que modela, e,
para isso, a pesquisa focou outros objetivos específicos. Por isso, em cada subitem dos
capítulos 2 e 3, uma obra-estrela foi tomada como referência para reflexões técnicas e
conceituais inerentes ao processo da pesquisa, como: refletir sobre as características da
20 Consultar Apêndice C — Procedimentos cerâmicos.
21 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad. Maria Ermantina Galvão. 2. ed. São Paulo : Martins Fontes, 2001, p. 40.
18
terra e as sensações ao interagir com ela; buscar entender o processo criativo com esse
material e a sonoridade que o envolve; resgatar lendas e mitos a respeito da origem da
cerâmica e pensar a força da imaginação que sustenta sua prática, interligando fazeres
regionais e universais e ainda evidenciar o pensamento sensível ativado durante todo
o percurso da pesquisa prática que implica nos nexos estabelecidos.
Então, esta dissertação observa a seguinte ordenação de conteúdos elaborados à
medida que a pesquisa se desenvolvia, com a produção das obras e leitura dos textos,
pontuando-se questões e reflexões:
No capítulo 1 — Traçando constelações — abordo, de forma sucinta, o contexto
histórico onde se deu a expansão do procedimento cerâmico como linguagem
contemporânea, englobado dentro das práticas escultóricas como concepção ampliada.
Nesse contexto, justifico e analiso meu percurso artístico, apontando obras
significativas até ingressar no curso de mestrado, quando desenvolvi, em coerência
com as primeiras, aquelas que nortearam a pesquisa. Então agrupei-as em quatro
constelações, como primeiros pontos de luz, de brilhos diferentes, a clarear meu
caminho. Esses quatro grupos de estrelas-obras sugerem conceitos relacionados com
os momentos em que elas, as obras, surgiram, entre 1989 e início de 2007: Pororoca,
conjunto de obras que nascem do gesto da quebra de limites, do rompimento de
padrões, no exercício do caos-cosmo; Sigma, obras que chegam com a expansão do
conhecimento relacionando pesquisa com possíveis respostas; Aurora,asque narram
as tradições da cerâmica da Bahia, nossas origens, e Monções, obras-estrelas que
direcionam o movimento do fazer criativo para o espaço aéreo. Assim, como lembrete
da espiral traçada no já citado fluxograma (págs. 36 e 37), que pontua a linha do tempo
do percurso artístico, foi inserido um elemento visual espiralado à paginação deste
capítulo, sinalizando ao leitor que neste ponto da pesquisa visualizei na expansão da
poética o traçado das constelações. Também aqui introduzo questionamentos acerca
do procedimento cerâmico que buscam ser clareados ao longo da pesquisa.
19
Olhando-se mais uma vez esse fluxograma, a linha espiral crescente descreve um
movimento rotacional com raios cada vez maiores e passa pelas mesmas regiões,
recorrentemente, em pontos progressivamente mais afastados do centro, ou seja, da
origem do percurso artístico. Com isso, os conceitos das constelações ampliam-se
nos capítulos 2 e 3 e acumulam significados sem deixar para trás os primeiros
conteúdos, aqueles de que trato no capítulo 1. Assim, foram inseridas à paginação
desses capítulos as miniaturas das constelações, conforme a obra-estrela em análise
no texto.
O capítulo 2, intitulado terra-Terra, constitui a espinha dorsal da pesquisa, pois a
partir da análise de quatro obras construídas durante o mestrado, pertencentes cada
uma delas a uma das constelações, pude fazer um movimento imaginário da terra à
Terra, interligando o sonhador que modela com o sonhador que contempla. Assim,
em Aurora falo do trabalho com a terra, trago reflexões matéricas, também como
origem para a poética, além de minhas origens culturais, observando a produção da
obra GrãodeTerras, 2006; em Pororoca pontuo questões referentes ao processo de
dispersão-ordenação do gesto criativo envolvidas com a sonoridade, pesquisada com
a confecção das Protoestrelas, 2007.A sonoridade, portanto, é novo elemento que se
conecta ao conceito desta constelação — o exercício do caos-cosmo; em Monções
trato da imaginação de modo mais profundo, relacionada à musicalidade visual e às
lendas e mitos sobre a origem da cerâmica. É, aí, em Monções, que a imaginação
ganha força para o movimento de conquistar a Terra, com a obra Sítiocósmico, 2007.
Na constelação Sigma, com a consciência expandida pela elaboração do Cacocipó,
2008, discorro sobre o conhecimento adquirido através da produção de imagens e a
construção do pensamento visual, então de forma mais nítida. Também neste
capítulo, discorro sobre a primeira exposição individual que apresentou resultados
práticos desta pesquisa — Germinando Estrelas, na EBEC Galeria de Arte, em
setembro de 2007.
20
O capítulo 3 — A linha imaginária — acompanha a produção de mais três obras:
ORecôncavopor um fio, 2008, obra-estrela agregada à constelação Aurora; Cantos
dojoãodebarro, 2009, ainda da constelação Sigma; e Granulações , 2009, alongando
o riscado imaginário da constelação Monções. Com essas obras-estrelas, todas
produzidas para ser instaladas em espaço aéreo, amplio reflexões sobre a imaginação
como motor para a criação poética. Essa referida linha torna-se eixo, eixo da
imaginação, onde se dá o movimento incessante entre terra e Terra, aí considerando
muitas dualidades, entre elas os mitos ameríndios e suas atualizações, fatos e sonhos,
sons e impressões visuais, avançando então com esse movimento em duas direções, a
da extroversão e a da introversão, pois as imagens poéticas exercem essa
ambivalência. Parafraseando ainda Gaston Bachelard, a extroversão relaciona-se com
os devaneios ativos, que nos levam a agir sobre a matéria, num movimento para fora.
A introversão tem a direção inversa, nela os devaneios fluem para dentro, para o
repouso e as certezas da intimidade. Sendo assim, faço também, neste capítulo,
reflexões conceituais, formais e sonoras dessas três últimas obras produzidas durante
o mestrado e que também integraram a Exposição terraTerra, em abril de 2009, no
sótão do Palacete das Artes Rodin Bahia, ponto mais alto da antiga Mansão do
Comendador Bernardo Martins Catharino, como resultado final plástico desta
pesquisa. Neste lugar intimista, onde naturalmente volta-se para dentro, com
alternância de penumbra e focos de luz e com as obras feitas com terra, em oposição,
pudemos levar nosso olhar para fora, para a Terra cósmica.
Nas reflexões finais, que chamo de Reflexões do contemplador, faço comentários
sobre o sonhador que contempla, não passivamente, mas que exerce o exercício da
contemplação de forma também dinâmica, permitindo-se a ativação da memória, o
contágio das emoções, a abertura para dúvidas e novas investigações. Assim,
comento possíveis respostas para os questionamentos apresentados no capítulo 1,
especialmente a respeito do procedimento cerâmico como exercício para atender às
21
necessidades do homem contemporâneo, envolvendo então o sonhador que modela e
contempla, atenta à pesquisa em arte como vertente do conhecimento hoje.
Os apêndices foram criados para atender às necessidades de registro e melhor
entendimento de informações pesquisadas: breves dados biográficos, vida e/ou obra,
de pensadores, artistas e pesquisadores indicadores de reflexão desta dissertação, no
Apêndice A; documentação da pesquisa de campo, junto às comunidades rurais
baianas de Maragogipinho e Rio Real, no Apêndice B e descrição dos recursos
técnicos construtivos utilizados na produção das obras realizadas, no Apêndice C.
Isto por considerar essas informações úteis para outros possíveis pesquisadores, sem
prejudicar o corpo principal da dissertação, seus três capítulos.
Nos anexos trago catálogos, convites e informações da mídia das exposições de que
participei durante todo o percurso desta pesquisa, apresentando ao público em geral
seus resultados práticos parciais.
23
1Traçandoconstelações
Considerando a importância do diálogo entre pintores e ceramistas no século XX
para a trajetória da cerâmica como linguagem artística, principalmente após a
Segunda Guerra Mundial, tomo esse período como ponto de partida de referências
históricas para compreender e refletir sobre a produção contemporânea de objetos,
esculturas,instalaçõese outras manifestaçõesquetenhamnoprocedimentocerâmico
umaescolhaparticulareintencionalmenteconsciente.
Entãoaintroduçãodessespintores,principalmentePicassoeMiró
22
(fig.03e04),no
universodacerâmicafoiimprescindívelparasuarenovação,atravésdeinvestigação,
experimentação, sobreposição de peças e outras transformações que quebraram seu
caráter tradicional e repetitivo. A trajetória da cerâmica arraigada ao serviço
cotidiano ou como procedimento técnico de esboço ou modelo ou, ainda, como
suporte para a pintura pôde tomar novo rumo. Rompendose essas barreiras, os
conceitos de utilitária e decorativa foram assim progressivamente substituídos por
outros,comoosdeidentidadeeliberdade,passandooprocedimentocerâmicoentão
asertomadotambémcomoveículodasubjetividadedoartista.

fig.03.PabloPicasso.“Vaso
Mulher”,1947,terracota.
(GAUTHIER,1982,p.89)
fig.04.JoanMiró.“Muro”,1968,
cerâmica.
(GAUTHIER,1982,p.159)

22PicassoporSuzanneRamié(Madoura),naFrançaeMiróporJosepArtigas,naEspanha.
24
Com a ida de ceramistas europeus atuantes neste processo renovador da cerâmica
para os EUA, no período de guerras, intensificouse a influência entre culturas.
Sendoassim,investidas renovadorascomoasdeAntoniCumella(fig.05),eArcádio
Blasco, na Espanha, de Lucie Rie e Hans Cooper (fig. 06), na Inglaterra,
potencializaramse a contribuição revolucionária de Peter Voulkos (fig. 07), então
influenciado pelo gesto e o improviso, bem como o acaso da action painting de
Pollock. Assim, Voulkos recuperou técnicas ancestrais a exemplo do raku japonês
23
como técnica do “deixar acontecer” e passou a liderar a cerâmica vanguardista,
juntamenteaRudyAutionosEstadosUnidosdaAmérica.
  
fig.05.Antoni
Cumella.“Painel”,
1980,grès.
(GAUTHIER,
1982,p.167)
fig.07.PeterVoulkos.“Prato”,1963,grès.
(GAUTHIER,1982,p.155)
fig.06.HansCoper.
“Pote”,1975,grès.
(GAUTHIER,1982,
p.147)
A cerâmica adentrava então um campo cada vez mais experimental e híbrido, na
mistura de materiais e procedimentos técnicos. E como trabalhar com novas técnicas
amplia o leque de possibilidades, sucederamse outras trocas e influências
internacionais entre artistas ceramistas e artistas que nunca haviam experimentado o
procedimentocerâmico,comoasqueaconteceramentreLucioFontana(fig.08),pintor
e escultor argentinoitaliano, e a geração de Pompeo Pianezzola e Nino Caruso (fig.
09),escultoresemcerâmica,ambositalianos;eentreHansSpinner,ceramistaalemão,e
AnthonyCaro,escultorin glês, AntoniTàpies,pintorespanhol,emuitosoutros.

23 Em que as peças cerâmicas são queimadas em temperatura baixa e removidas do forno em estado
incandescente, para serem introduzidas num recipiente com de serra (ou outro material que
favoreçaumaatmosferaredutora).Istoprovocaefeitosdecoloraçãoque fogemaocontroledoartista.
25

fig.08.LucioFontana.“Pêraebananas”,1938,
faiança.
(GAUTHIER,1982,p.90)
fig.09.NinoCaruso.
“Coloumns”,1989,terracota.
(NINOCARUSO,2009)
Novas conquistas vieram com o advento do Minimalismo
24
e da Land Art
25
e a
ampliaçãodoconceitode escultura.Obrasligadas aLand Artcomo“Sala deTerra”,
1968, de Walter de Maria, e “Observatório”, 1977, de Robert Morris, direcionaram
também os procedimentos cerâmicos para os caminhos da instalação como
“Enfangada”, 1980, de Pere Noguera, “Altos e baixos”, 1985, de Silveira e
Abbondanza(fig.10),e“Field”,1991,deAnthonyGormley(fig.11).

fig.11.AnthonyGormley.“Field”,1991.
Instalaçãodeterracota.
(FRIGOLA,2006,
p.17)
fig.10.SilveiraeAbbondanza.“Altose
baixos”,1985,faiança.
(18ªBIENALDESÃO
PAULO,1985,foto:ConceiçãoFernandes)

24 Movimento das artes visuais que representou o ápice das tendências reducionistas na arte
moderna, o minimalismo surgiu em Nova York no fim da década de 1960. Caracterizouse pela
extremasimplicidadedeformasparaseobterumefeito“puro”emoposiçãoàpersonalizaçãodo
ExpressionismoabstratoeaoconsumismoevulgaridadedoPop.
25 A Land Art, também conhecida como Earth Art ou Earthwork referese a obras de artistas
conceituais, que a partir da década de 1970, passaram a intervir fora das galerias, expandindo a
arteparaimensasescalas.Trabalhavamcomapaisagememgeral,tambémaurbana,ohorizonte,
aformaçãodoterreno,otempoeaerosão.
26
Alémdisso,osearthworkspossibilitaramexpressõesprocessuaiscomoasdeMendieta
eGoldsworthy(fig. 12)e,finalmente,as intervençõesartísticasemespaçopúblicode
AngelGarraza(fig.13),ElisabethMacDonaldeBernardDejongheentreoutros.

fig.12.AndyGoldsworthy.“Claywall”,
2004.Contraçõesdaargila.
(FRIGOLA,
2006,p.16)
fig.13.AngelGarraza.“Sítioselugares”,2000.
ParquedeAbandoibarra(Bilbao,Espanha).
(FRIGOLA,2006,p.16)
Assim, técnicas tradicionais da cerâmica foram desconstruídas e processos
fenomenológicos, evidenciados, criandose para cada conceito uma técnica,
transitandoseentre oobjeto e oprocesso, semdistinção, e sepassou afazer usoda
argilatantoquantodacerâmicacomomeiodeexpressão.
Sob essas perspectivas de uso do procedimento cerâmico, investigo a arte
contemporâneabrasileiraeencontro,emseuespaçodeslimitadoeplural,dialogando
com o circuito internacional, obras diversificadas. Cito então, em primeiro lugar,
CeleidaTostes(fig.14),cariocafalecidaem1995,quefezumaexperiênciapioneirade
transmutação através do barro com a performance “Passagem”, em 1979, e seguiu,
como artista pesquisadora, construindo uma obra inovadora “Aldeia Funarius
Rufus”, 1981; “O Muro”, 1982; “Guardião”, 1986; “Gesto arcaico”, 1992, etc., tendo
participado de exposições, bienais e encontros com outros artistas em diversos
países. Por outro lado, observo a obra escultural do pernambucano Francisco
Brennand (fig. 15), tecnicamente perfeita, espalhada por vários lugares públicos do
Brasil,além deseugrandeacervonoMuseu/OficinadaVárzeaemRecife,ondeestão
enfileiradosseus“PássarosRoca”;“Oovocósmico”ecentenasdemulheres,homens
27
ebichosmitológicos quevemproduzindoapartirdosanos1970.Eainda, emoutra
direção, revisitandose a produção do argentinobaiano Reinaldo Eckenberger (fig.
16) em exposições aqui em Salvador, encontrase em linguagem híbrida, uma obra
transgressora e cheia de ironia. Ele apropriase de bibelôs cerâmicos, montaos,
transformaos numa outra condição conceitual, num cenário de fantasmas e
fantasias.
 
fig.14.CeleidaTostes.
Guardiões”,1986,
técnicamista.
(ENCICLOPÉDIA...,2009)
fig.15.Brennand.“Pássarosroca”,
2002,grès.Curitiba,PR.
(OLHARES...,2009)
fig.16.Eckenberger.
“Oestragacasamento”,
2007,porcelanae
cerâmica.
(ECKENBERGER,
2008,p.27)
Umaoutravertenteestárelacionadacomartistasqueutilizamváriaslinguagenspara
expressaremse:Ana MariaMaiolino(fig. 17), italianaradicada noBrasil,nadécada
de 1990 por influência do artista argentino Vict or Grippo, produziu obras
tridimensionais,comcimento,gesso,argilaecerâmica;AntônioDias,paraibano,em
permanente desafio com o convencional na pluralidade de materiais, usa cerâmica
emobjetosebarroemtécnicasmistas;CarmelaGross(fig.18),paulista,tambémcom
trabalhos em distintos meios e suportes, usou a cerâmica, na criação de facas,
conjunto de lâminas de cerâmica em sua passagem pelo European Ceramics Work
Centre na Holanda; e ainda entre outros está Geórgia Kyriakakis, baiana, mas que
vive em São Paulo, que joga com o equilíbrio dos materiaise na 23a. Bienal
Internacional de São Paulo fez uma instalação, “Cerâmicas”, 1996, composta por
cerâmicaepapelqueimado.
28

fig.17.AnaMariaMaiolino.“Cerâmica
Raku”,1997,raku.
(LIMA,2005,p.84)
fig.18.CarmelaGross.
“FacasBrancas”,1994,porcelana.
(CARMELAGROSS,2009)
Ainda selecionando referências, aqui no nordeste hoje, alinho as pesquisadoras em
arte:ChristinaMachado(fig.19),doParáradicadaemRecife,que,em2003articulou
ogrupodepesquisaemcerâmicaCorgo,e,ultimamente,emtrabalhoscomousodo
procedimentocerâmico,escolheanaturezahumanacomofocoprincipaldeinteresse,
alémdeteropúblicointeragindoefazendopartedaobra;aescultoraNanciNovais
(fig.20),baiana,professoradaEBA,UFBA,doutorandadaUniversidadePolitécnica
deValencia,Espanha,fazendoopçãopelacerâmicacomolinguagememumdeseus
trabalhosmaisrecentesparainterferiremespaçopúblico,umcastelodoséculoXIna
cidade de Denia na Espanha; e Rosilda (fig. 21), paraibana, professora da
Universidade Federal da Paraíba, que com suas investigações sobre limite como
matérias diferentes se encontram, a argila e o metal em suas instalações, abraça o
públicocomseusamplexos,estabelecendoconexõesmatéricasesimbólicas.
 
fig.19.ChistinaMachado.“Pé,Mão,
Sensação”,2008,resultadodeoficina/
vivência.
(Imagemcedidapelaartista)
fig.21.RosildaSá.“Nexos”,
iniciadaem2004,terracota,
arame,cobre,pregos.
(SÁ,
2005,p.3)
fig.20.NanciNovais.
“Espaçosvisíveisespaços
dememória”,2006,grès,
espelhoeferro.
(Imagem
cedidapelaartista)
29
Como contribuição reflexiva para o desenvolvimento desta pesquisa de mestrado,
destaco dois outros artistas brasileiros: Norma Grinberg, pois esta artista tem, no
caminholúdicode montagensmodulares,alguma aproximaçãocom opercursoque
venho construindo a partir de agrupamentos de peças semelhantes entre si em
instalações. Observo assim seus “Vôos”, “Rotativas”, “Onduladas e “Babel”, 2006,
enquantodirecionotrabalhosparaocuparespaçosaéreos.Ressalto,contudo,queuso
uma diversidade de formas e passei a instalar as obras em espaço aéreo tendo os
cabos distendidos na horizontal. Além da obra de Grinberg (fig. 22), seleciono a
pesquisafenomenológicadeErielAraújocomopontodepartidaparareflexõessobre
a impermanência da imagem no procedimento cerâmico (fig. 23), nem sempre as
mesmas que faço, mas com pontos em comum, a partir das quais imagino,
poeticamente,outrasassociaçõesmaisamplas,porserestapesquisainterdisciplinar.
 
fig.22.NormaGrinberg.
“Babel”,2006,grès.
(Imagemcedidapelaartista)
fig.23.ErielAraújo.“ContrAÇÃO”,2001,
argilaefragmentosdeterracota.
(Imagem
cedidapeloartista)
Então,édentrodessecontextohistóricodoespaçocontemporâneoplural,incluindoa
opçãointencionaldeutilizaçãodoprocedimentocerâmicocomolinguagem,queme
coloco com a pesquisa terraTerra, transformando argila em cerâmica, matérias
conceitualmente plenas para expressar reflexões do “sonhador que modela, com
onirismoativo”
26
,unindoseassimimaginaçãoevontadeefazendoseomovimento
dodevaneioparaaaçãoconstrutivaereflexivaaomesmotempo.

26 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.40.
30

Dessa forma, então, modelo e estruturo a cerâmica num processo cíclico, em que
acrescentarcor ereferências históricas,vigiara secageme submetêlaà queima têm
sido, para mim, um caminho em espiral que passa por pontos afins, mas em
diferentes momentos. Esse trajeto tem sido quebrar o limite de mim mesma, de
espaçotempoprotegidoemumnúcleoindividuale,poderiaaté dizer,expandirme
com a cerâmica inicialmente, para compreender o próprio círculo familiar;
posteriormente,meuterritório,aBahiaesuastradiçõesculturais.
Emparaleloaesseprimeiroprocessodeexpansão,olharaluae asestrelas,guardar
na memória a emoção da conquista da lua pelo homem, acompanhar o progresso
tecnológicoqueseseguiuecompartilharcomoutrosumtelescópiomedirecionaram
aleiturasnocampodaastronomia,eestanoçãodohomemcomoserquesepercebe
em seu entorno maior trouxe também grandes contribuições para meu trabalho
poéticopormeiodeprocedimentocerâmico.
Sob essas vivências, surgiu outro questionamento: A que exigências da vida
contemporâneaobarrocozidoresponde?Buscandopossíveisrespostasnaatualização
de conceitos e procedimentos de experimentação para o fazer cerâmico foi que me
apresenteiaomestradodoPPGAVdaEscoladeBelasArtesdaUFBA.
Assim, em atividade de seleção para a disciplina Teoria e Técnica de Processos
Artísticos, assisti a uma interessante palestra da Profa. Maria do Carmo Nino, da
Universidade Federal de Pernambuco, sobre exposiçã o do Projeto MAMÃE
27
, num
espaço abandonado, meio em ruína, em frente ao Museu de Arte Moderna Aloísio
Magalhães (MAMAM) em Recife, da qual havia participado com a obra “Olho
Mágico” em 2003. Esta comunicaçã o provocoume a associação da obra da citada
27 Um trabalho de site specific de Mozart Santos e o grupo Quarta Parede que foi a criação de um
ambiente,umainstituição,oMAMÃE MUSEUDEARTEMODERNAÉAMÃE.Nesseespaço,
emfrenteaoMuseudeArteModernaAloísioMagalhães(MAMAM)emRecife,puderamexporos
artistas que desejaram fazêlo, desde aqueles que mostravam o primeiro trabalho e artistas que
naquelemomentoestavamnaBienalInternacionaldeSãoPaulo.
31
pesquisadora, com a obra Limite (fig. 24), que havia criado em 1989 e com a qual
participei pela primeiravezde uma exposiçãocoletiva.Aobra “Olho gico”, 2003,
uma porta em madeira estrategicamente instaurada num ambiente marginal, para
“se brechar” na instituição oficial em frente, o MAMAM na qual, à altura da
interseção de suas diagonais, foi inserido um dispositivo de olho mágico, através de
quesetinhaacessoaoreferidomuseu, fezmelembrarLimite,1989,pelainstalaçãode
umpontocentr alvitalquetudoamplificaatravésdavisão,numsuportequeimpedea
passagem.Foijustamentecomessaanalogiacriadaecomanecessidadedeexpansão
de visão e espaço, que se atualiza ciclicamente no caminho percorrido, que decidi
revisarmeupercursoapartirdessemencionadoano.

fig.24.Limite,1989.
E por isso rememorei este primeiro trabalho, Limite, 1989, feito a partir da
experimentação: estando no atelier, reciclando pedaços de barro manuseados e
deixados de lado, havia me deparado com uma placa fina bem seca; precisava
partilaparacolocarem umabaciacomáguae,ao primeirogolpe,comoauxíliode
umpequenomartelo,quebreiaepareiaí.Tinhaencontradoaimagemsignificativa.
Foi verdadeira a reflexão que daí se desencadeou: a necessidade premente de
quebrarlimitesebuscarnovosespaços.
Aproximei a intensidade desse gesto e suas implicações de mudança a um outro
experimentado em 2006, ao fazer Oceânico (fig. 25ab), trabalho realizado para
32
participaçãoemumaintervençãocoletivaemsítioespecíficonasRuínasFratelliVita,
enquanto aluna especial da disciplina Teoria e Técnica de Processos Artísticos, do
mestrado do PPGAV da UFBA, ministrada pela Profa. Maria Virgínia Gordilho
Martins. Contudo esta obra, Oceânico, não foi definida por um único gesto, de um
instante de ação minha, mas resultou da possibilidade de abrir um diálogo num
longo processo (fig. 26), em que o comportamento da matéria, fragmentação
espontânea sob determinadas condições físicas, ditou as normas. Recolhi o que me
foi dado, elaborei e dei nova ordem, refletindo e identificando tudo isso com o
próprio processo criativo, o se deixar levar pela fragmentação e pela dispersão, o
fazerescolhas,interferireoperarumaconfiguração
28
.
Foram então as obras Oceânico e Limite aproximadas (fig. 25a), pois sinalizaram
momentos iniciais de ruptura em ciclos diferentes, por isso mesmo, de forte carga
significativa e que alimentaram econtinuam alimentando novas investidas. Como se
podeobservarnasíntesevisualdopercursoartísticoantesdomestrado,napágina37,
aquelas obras exibem formas exatas, construídas num processo de dominar a terra
comprecisão.emOceânico(fig.25b),quebreiamarras,deixeiaconteceroprocesso,e
estefoiumimportantemomentode aberturaparaapesquisaqueseiniciava.

fig.25a.OceâniconasRuínasFratelliVita,2006eLimite,detalhe.

28 EHRENZWEIG,Anton.Aordemocultadaarte.Trad.LuísCorção.2.ed.RiodeJaneiro:Zahar,1977.
p.1089.
34
fig.26.Recort edeimagensdoprocesso criativonaelaboraçãodaobraOceânico,2006.
ConsultarApêndic e CProcedimentoscerâmicos.
35
Aprofundando reflexões sobre o percurso artístico antes e durante o curso de
mestrado e buscando uma forma de tornálo visualmente claro num fluxograma,
reconhecieprojeteinopercursooriscadodeumdeslocamentoemespiral(fig.27ab),
comolinha dotempo,num espaçoàs escuras, dadasas característicasimprevisíveis
do processo criativo e compreensão do exercício da criatividade
29
. Como os
navegadoresdosmaresemconquistadaTerra,tenhoasestrelasameguiar,estrelas
quesãomeuprópriotrabalho,obrasestrelasqueagrupoemconstelações.
Citando Alberto Deleurue
30
, que nos diz que “[...] as constelações não passam de
agrupamentos arbitrários de estrelas... não sendo exagero afirmar que são apenas
fruto da nossa imaginação”, lembro o artista inglês Simon Evans e sua obra “The
Universe”,2002,(fig.28),expostana27ªBienaldeSãoPaulo,em2006umdesenho
deuma concepção pessoal de universo,constelações por ele imaginadas commuito
humor. Assim podemos dar forma a grupos de estrelas ligandoas com linhas
invisíveiseimaginárias.
fig. 28. Simon Evans. “The Universe”, 2002, técnica mista sobre papel, detalhe.
(27ª BIENAL DE SÃO
PAULO,2006,foto:LaísAndrade)

29 ComonosdizFaygaOstrower,“acriatividade,comoaentendemos,implicaumaforçacrescente;
elasereabastecenosprópriosprocessosatravésdosquaisserealiza.umarenovaçãoconstante
do potencial criador.” OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. 16. ed. Petrópolis :
Vozes,2002,p.27.
30 DELERUE, Alberto. Rumo às estrelas: Guia prático para observação do céu. Rio de Janeiro : Jorge
Zahar,2004,p.16.
36
fig.27a.Síntesevisualdopercursoartísticoduranteapesquisadomestrado.
37
fig.27b.Síntesevisualdopercursoartísticoantesdomestradoimagensdasobrasemdetalhe.
38

Então, considerando que a
humanidade tem povoado o céu
de signos
31
, feitos à sua própria
imagem, envolvendo grafismos e
lendas hoje pesquisados pela
arqueoastronomia e a antropolo
gia, penso que as constelações são
signos de grande beleza, surgidas
em um longo processo criativo
coletivo, como o defendido por
Robert Filliou
32
, nos anos 60, com “imaginação” e “inocência” (fig. 29). Este artista
sustentava que imaginação e inocência são as únicas ferramentas de que
necessitamos para sermos criativos. Assim acredito terem sido diagramadas as
constelaçõesaolongodascivilizações.
fig29.RobertFilliou.“CaixadeFerramentaemCriação
Permanente”,1969,Caixadeferramentas,néon,paus
demadeira.
(WALTHER,2005,p.522)
Também munida dessas ferramentas para realizar a pesquisa do mestrado, tracei
quatro constelações de obrasestrelas, as quais denomino de Pororoca, Sigma,
Aurora e Monções (fig. 27ab, p. 3637), nomes relacionados a movimentos da
Natureza e do homem, de acordo com os momentos em que as obras foram
produzidas. Esses momentos são etapas do gesto criativo que tem uma origem,
uma direção, o exercício do caoscosmo e uma reflexão para a introjeção de
conceitos. Assim sendo, o ponto de partida do percurso, a obra Limite, como
31 “Asconstelaçõesassíriasforamtransmitidasaosbabilônios,comopartedeumaherançacultural,
por sua vez adotada pelos gregos. As constelações destes foram incorporadas pelos romanos,
árabesepelascivilizaçõeseuropéias...Oconjuntooficialde88constelaçõesfoiadotadopelaUnião
Astronômica Internacional em 1922”. SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL, Etnoastronomia. v. 14.
SãoPaulo:Ediouro,2006.(EdiçãoEspecial),p23e16.
32 Integrante do grupo Fluxus que traduzia uma atitude diante do mundo, do fazer artístico e da
cultura quese manifestanas mais diversas formas de arte: música, dança, teatro, artes visuais,
poesia, vídeo,fotografiaetc. Evidenciavama criatividade do cotidiano, que envolvia atividades
como fazer jogos, inventar objetos, produzir poemas inclusive no Instituto para a criatividade
permanente,projetadoporFilliou.
39
abordei anteriormente, pertence à mesma constelação que Oceânico. A esta
constelaçãochameiPororoca[Dotupiporo’roka,ger.deporo’rog,‘estrondar’].
33
À constelação Pororoca pertencem quatro estrelas,
duas das quais se formaram antes do início do
mestrado:Limite,1989eHistórias decadadia,2002
(fig.27b).Essasobras melevarama quebrarlimites,
sem me ater às conseqüências, e tentar aprender a
jogar com novas possibilidades a cada dia, mesmo
que tivesse que me arrebentar como um macaréu em Oceânico, 2006, terceira obra
estrela
34
, para depois, então, amortecer em direção ao rio, expandir a consciência e
capacidade de integração e ação. Esse processo de romper com o estabelecido e se
deixarlevarintuitivamentepelomanusearecozinharobarro,dentrodeumdiálogo
orientadopeloquesequermodelareoqueanaturezadomaterialimpõe,pensoser
oexercíciodocaoscosmodogestocriativo.
Amortecendo a Pororoca e com maior clareza de
consciência e capacidade de ação, à medida que se
introjeta os resultados das obras, surgiu a
constelaçãoreferenteàexpansãodessaconsciênciae
capacidade de ação, à qual dei o nome de Sigma
35
,
onde se reflexão e agregação de conhecimento,

33 “Éum macaréu,uma onda de arrebentaçãoque vem do mar, que ocorre àfoz dorioAmazonas,
de alguns metros de altura, com grande efeito destruidor e forte estrondo e que amortece à
medidaqueavançaemdireçãoaorioquevememsentidooposto.”FERREIRA,AurélioBuarque
deHolanda.NovoDicionáriodaLínguaPortuguesa.RiodeJaneiro:NovaFronteira,1975,p.1117.
34 Aquartaestrelaobradestaconstelação,Protoestrelas,serátomadaparareflexãonocapítulo2.
35 Sigma[Dogr.Sigma,pelolat.sigma]S.m.Letradoalfabetogrego,correspondenteaonossoesse.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro :
Nova Fronteira, 1975, p. 1299. Sigma também é símbolo universal matemático para designar
somatório.SOARES,Márcio.Cálculoemumavariávelcomplexa.RiodeJaneiro:IMPA,2007,p.64.
40

poiscomonosdisseopintorPaulKlee“AArtenãoreproduzovisível,mastorna
o visível”
36
, a arte, portanto, revela novas imagens para o homem, antecipando o
desenvolvimento de conceitos. Expansão foi também a mola propulsora de meu
movimento para o mestrado, e busquei desenvolver trabalhos que despertassem
maior envolvimento com o observador e uma possibilidade de comunicação mais
efetiva, mais aberta à troca de idéias, percepções e sensações. Nesta constelação
agrupei cinco estrelasobras, das quais duas são anteriores ao mestrado: Ponto de
Vista,1991eTerras,2005(fig.27b).
Nessas obrasestrelas reconheci a possibilidade de dialogar com pontos de vista
diferentes fortalecendo o elo entre arte e vida, e de, possivelmente associar a
identificação com a terra e a prática do onirismo ativo no fazer cerâmico com
ferramentas para buscar respostas a inquietações e questionamentos. Isto me trouxe a
sensação de crescimento. Esta sensação foi retomada de forma muito nítida em 2007,
comaproduçãodasSementescantantes(fig.30),noiníciodomestrado,quando percebi
que a comunicação mais efetiva que procurava estabelecer com o observador poderia
estar numa sonoridade associada aos objetos. As Sementes cantantes
37
surgiram
naturalmente depois dos ruídos da fragmentação em Oceânico, da reflexão sobre sua
forma,elementoseconceitosenvolvidosnasconexõesculturaisestabelecidas.
E porque o caminhar com o procedimento cerâmico tem sido diário, desde a
graduação em Artes Plásticas, na Escola de Belas Artes da UFBA e tem envolvido
estudo, muita experimentação técnica, pesquisa bibliográfica e de campo de
produçõescerâmicasdiversas,fizumamatriz(fig.31)degrafismosregionais baianos
usadosnasproduções cerâmicasdofinal doséculo XX,dasseguintescomunidades:
36 PARTSCH,Suzanna.Klee.Trad.CasadasLínguas.Colónia:Taschen,1993,p.16.
37 As Sementes cantantes foram expostas no evento Três Marias no Extudo, Restaurante Extudo,
marçode2007.ElasconstituematerceiraformaçãoestelardaconstelaçãoSigma;aquarta,Caco
cipó,seráabordadanocapítulo2eaquinta,Cantosdojoãodebarro,nocapítulo3.
41
MonteSanto,Bazaê,RioRealeMaragogipinho,aosquaisjunteiosdetradiçãotupi
guaranidequesetemregistro.
38

fig.30.Sementescantantes,2007.
A partir dessa matriz produzi estrelasobras que compõem a constelação Aurora
39
,
que relacionei com as histórias da cerâmica na Bahia. Contudo, para as obras
produzidas de 2007 a 2009, durante esta pesquisa de mestrado, considerei
grafismosdasproduçõesdeRioReal,Maragogipinhoedatradiçãotupiguarani.

38INSTITUTODEARTESANATOVISCONDEDEMAUÁ.CerâmicaPopularis.Salvador,1994,p.3046.
39 Aurora. [Do latim aurora.] S.f. Princípio, origem, começo. FERREIRA, Aurélio Buarque de
Holanda.NovoDicionáriodaLínguaPortuguesa.RiodeJaneiro:NovaFronteira,p.161.
42
42
43
fig.31.MatrizdegrafismospraticadosnaBahia,1996.
44
Então,três dasseisobrasestrelasde Aurora
revelaramnossaBa hiacerâmicaantesdeeu
iniciar o mestrado: Azuleiro baiano, 1999;
Discursos, 2001 e Al tear, 2001 (fig. 27b). A
partir de las e da noção de origem te nho
identificado questões a refletir envolvendo
meu fazer e o fazer cerâmico dos mestres
artesãosdascomu nidadesrurais:oquenosune?Repetimosomesmoprocessode
cozinhar o barro em busca de expansão e conhecimento? Respondem a nossos
anseioshoje?
a quinta estrela
40
desta constelação chamase Sussurro Real, 2007 (fig. 32) . Foi
comointegrantedogrupodepesquisaMAMETO
41
Matéria,MemóriaeConceitoem
Poéticas Visuais Contemporâ nea s, como aluna regular do mestrado, mas ainda no
primeiro semestre, que produzi a referida obra, a qual participou da exposição
Banco a memória, como atividade de pesqui s a dess e grup o. Nessa obra, eu banco a
memóriade D. MariadaGraça louceiradacomunidadede CarroQuebrado, Rio
Real,BA,criadorade certopadrãofloralemre le vo,ho jequ as e emextinção.
Encaixeientãoumaréplicadotalrelevo,de10cmdediâmetro,nocentrovazadode
um círculo de acrílico de 48 cm, como tampa na boca de um pote em tamanho real
em visão superior, com o contorno do acrílico simbolizando o bojo do pote. Atei,

40 A quarta obraestrela desta constelação, GrãodeTerras, será analisada no capítulo 2 e, a sexta, O
Recôncavoporumfio,nocapítulo3.
41 Grupo de pesquisa credenciado pelo CNPq, liderado pela Professora da UFBA Maria Virgínia
GordilhoMartins. Anteriormente chamado de MCM, o grupo foi renomeado e reestruturadoem
novembro de 2008. MAMETO (banto significa os mais importantes na hierarquia religiosa
congoangola)atuana pequisa práticoteórica da MAtéria em trânsito com a MEmória, na busca
dedefiniçãodeconceiTOscomoelementosinerentesaoprocessocriativoemPOÉTICASVISUAIS
CONTEMPORÂNEAS. Os resultados m sendo apresentados em ações artísticas, na realização
deoficinasemcomunidadeseemcursosdeextensão.
45
ainda, à base do relevo, um delicado chocalho, como um sussurro. Na instalação
dessaobra,em queatransparência do acrílicoe os fragmentosde barroem queima
baixapodemnos reportaràpresença/ausênciadaproduçãodeD.MariadaGraça,
atentei para sua sombra projetada na parede, elemento esse que sinalizou
possibilidadesdemaisinvestigação,emumnovotrabalho.
fig.31.SussurroReal,2007.
Enfim,aconstelaçãoMonções
42
chegoumecomoconceitodedireçãodemovimento
ampliado metaforicamente de tais ventos. Vento é movimento na direção do fazer,

42 Monções.[Doar.mauasin]“ventoperiódicotípicodosuledosudestedaÁsia,quenoverãosopra
do mar para o continente e, no inverno, sopra do continente para o mar”. FERREIRA, Aurélio
BuarquedeHolanda.NovoDicionáriodaLínguaPortuguesa.RiodeJaneiro:NovaFronteira,p.939.
46

ordenar, refazer, como nos diz Ostrower
43
,
da nossa condição de homo faber, de nossa
necessidade cotidiana da prática artística,
prenunciadanoestudodemuralOhomeme
ouniverso,em 1991(fig. 27b),qu e sinalizaa
direção do experimentar para conhecer,
comooshomensquesededicamàs ciências,
doconhecerparasairdolugar,navegar,voar,conqu istar.Poris soadireçãoépara
fora, para a Via Láctea em naves espaciais como no citado mural, planando e
voando com os Albedos, 2001 (fig. 27b), e projetandose para cima em Al fa bedo,
2006(fig.33) .
Dessas três estrelasobras
44
, a última formouse no início mestrado, Al fa bedo, e
integrouaExposiçãocoletivaGuardares
45
,naGaleriaCañizares,em2006.Alfabedo
movimentase em busca da luz dos albedos
46
, sinalizando o ressurgimento de
espaçosinternosluminososquepontuamaconexãoentreaspartesdaformafechada
queogerou equedireciona otodoparao alto,num impulsovertical.Nocentroda
obra, trouxe parte dos grafismos dos Albedos, 2001, acrescidos de sugestões de
órbitaseraios,interferênciashumanasabstratasquenosajudam nomapeamentodo
céu. Para lá, a partir daquele momento, poderia navegar com a essência de minha
infância e a memória dos saveiros que passavam em Itaparica, vindos de
Maragogipinho.
43OSTROWER,Fayga.Criatividadeeprocessosdecriação.16.ed.Petrópolis:Vozes,2002,p.9.
44 A quarta obra pertencente à constelação Monções, Sítio cósmico, será tomada para reflexão no
capítulo2eaquinta,Granulações,nocapítulo3.
45AtividadedogrupodepesquisaMAMETO,eventoorganizadoparaaaberturado15ºEncontroda
AssociaçãoNacionaldePesquisadoresemArtesPlásticas,emSalvador.
46Albedoastron.Relaçãoentrea luzrefletidapelasuperfíciedeumplanetaousatéliteealuzque
aquele ou este recebe do Sol. Albedos série de trabalhos feitos em 2001, com os quais busquei
formasmaisleveselivres,quasevôos,iluminadospordetalhesdegrafismosemcoresvibrantes.
47
fig.33.Alfabedo,2006.
48

Na fase inicial do percurso da pesquisa, portanto, produzi quatro obras: Oceânico,
2006;Sementescantantes ,2007;SussurroReal,2007eAlfabedo,2006,quatroobras
estrelas relacionadascom outrasmais antigas, por seus conceitos, iniciando assim o
riscado das respectivas constelações: Pororoca caoscosmo; Sigma reflexão;
AuroraorigemeMonçõesdireção.Aelasagregueioutrasestrelasobras,quese
formaram durante esta pesquisa, tomandoas para reflexão, uma por uma, nos
capítulossubsequentes.Com aformação dasconstelações relacionadasao processo
dogestodo“sonhadorquemodela,comonirismoativo”,conscientizeimedequeo
novorumoapontadopeloexercíciodofazerordenarrefazercarregaaverdadeda
origeminseridanopróprioprocessocriativo:aobraéconstruídacomaterraereflete
os valores culturais inerentes a seu povo. Assim, continuei no exercício da
compreensão do caráter humano da vontade que nos leva a cozinhar o barro, em
buscadeoutraspossíveisrespostas.
Então,norteandoocaminhodapesquisa,estãoasobrasagrupadas,obrasestrelasde
váriasmagnitudes:porseubrilho,querelacionocomimportânciadentrodoprocesso
criativo, com maior ou menor capacidade de interferir na criação de novas obras, e
porsuadistâncianotempoemqueseformaram.Elasmesegredaminformações,me
perguntamcoisas,edecertocintilamecantamnasnoiteslimpas...
Quanto a obras de outros artistas que demarcam o contexto histórico e pontuam
avançosnaHistóriadaArte,tomoascomoestrelasdeoutrasconstelações,“estrelas
na noite”
47
das pinturas de Leonardo Celuque, pintor baiano, com quem fiz as
primeirasaulasdedesenho.
47 CELUQUE, Leonardo. In: ADAIR, Maria. (Coord.) ArteArte Salvador 450 anos. Segundo da série
CadernosdeArte.Salvador:AtelierMariaAdair,1998,p.19.
50
2terraTerra
Tum,tum...pa,pa...xi....
Assiméaterra,aTerraéassim...
Vida,movimento,som,ofazererefazerdiário:cavaraterra,bater,peneirar,misturar,amassar,dar
forma,grafitar,cozinhar,expressar,cantar...
Ohomemcantaavida,oquesentenoqueouveevê...
eouvenaTerra,eouvedaTerra...asestrelas
Assimtemsido,assimé...
Tumpa,paxi...
Reflexãopoéticadaautora
Este capítulo encerra o esqueleto estrutural desta dissertação, daí ter este título
terraTerra.Comoapesquisaaquidiscorridateveopontodepartidanasatividades
deatelier,digoquefoiobservandooprocessodetransformarterraemobjetodearte
através de procedimento cerâmico, estruturandose formas, texturas, cores, ritmos
expressivos e submetendo estas formas estruturadas a condições ambientais
necessárias de calor progressivo, misturandoas a outros materiais em suas
montagens,queosquestionamentosgeraramreflexões.Porisso,ogestocriadorque
Gaston Bachelard descreve como movimento de trabalho e devaneio, imaginação
ativa
48
, precisa ser descrito, refletido e compreendido como fio condutor de todo o
processo do trabalho. Processo que é gerador de conhecimento, formador de uma
idéiademundo,éterratrazendoavisãodeTerra.
Desse modo a cerâmica representa para mim o refazer de cada dia, o exercício de
reflexão e compreensão do presente, dentre as inúmeras possibilidades de
transformação que este material a terra me oferece. É a escolha feita pelas
48 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.40.
51
características deste material plástico, “matéria como centro de sonhos”
49
, matéria
primitiva, que me permite conhecer o mundo e conhecerme, pois “os objetos da
terranosdevolvemoecodenossapromessadeenergia”
50
.
Assim sendo, no movimento espiral de expansão da poética, durante mais giros
recorrentesaosmesmospontos,asconstelaçõesAurora,Pororoca,MonçõeseSigma,
quevinhatraçandocomobrasestrelas,sinalizaramme,respectivamente,apresença
de GrãodeTerras, Protoestrelas , Sítio Cósmico e Cacocipó, até 2008, que são
então tomadas neste capítulo, para análise de observações técnicas diferentes,
geradoras de idéias e de imagens do processo criativo de f orma renovada e
ampliada.
49 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.55.
50 Idem.Ibidem.p.7.
52
2.1Aurora
“Todaformanascedaterra,aterraproduzformasvivas.”MirceaEliade
A terra resistente, que abrando com água, que manipulo, sonho, vejo e escuto
enquantomodelo,imbricadaàterraondenasciecresci,éasementedotrabalho.Para
aprofundarasreflexõesqueaconstelaçãoAuroraencerra,tomoaobraestrelaGrão
deTerras (fig. 34), uma pequena obra feita em 2006 para participar da instalação
coletiva processual e itinerante Afetos roubados no tempo
51
. Um grão, uma semente
construída com nova técnica experienciada no atelier durante a pesquisa, mas
conceitualmente ligada a obra Terras, 2005 (fig. 27b, p. 37), e que carrega consigo
traços de grafismos utilizados pelas comunidades rurais produtoras decerâmica de
MaragogipinhoeRio Real.Tomoapela cargasemântica deseunome, incluindono
conceito de origem questões reflexivas do procedimento cerâmico que viabiliza o
nascimentodapoética.
Diznos Gaston Bachelard que “[...] o verdadeiro modelador sente, por assim dizer,
animarse sob seus dedos, na massa, um desejo de ser modelado, um desejo de
nascer para a forma”
52
; e Álvaro Gouvêa complementa que o barro é “massa para
receberamatériadohomememaçãoe paixão”
53
.Modelar,observo,éumaaçãoque
51 Estainstalaçãocoletivaagrupaeaproximaemparespequenosartefatos,objetosafeto,criadospor
730 artistas e artesãos de vários países do mundo, dispostos em 365 módulos, observandose
nessas junções suas analogias ou antagonismos matéricoconceituais. Foi idealizado por
VigaGordilho que assina a curadoria com as artistas Célia de Vilier (sul africana) e Suzana de
Azevedo (pernambucana). Esteve por duas vezes exposta em Salvador em 2005 e 2007 (No
Conjunto Cultural da Caixa, com catálogo); em Pernambuco, Alagoas e São Paulo em 2006.
Seguirá para Valencia, na Espanha e Pretória na África do Sul. Teve artigo publicado na revista
Cultura Visual: arte e memória na América Latina, do PPGAV da EBA, UFBA, em novembro de
2007econtemploutrêsbolsistasPIBIC.
52 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.8081.
53 GOUVÊA,ÁlvarodePinheiro.SoldaTerra:ousodobarroempsicoterapia.SãoPaulo:Summus,
1989.(NovasBuscasemPsicoterapia,v.38),p.55.
53
envolve todo o sujeito: mãos, braços, todo o corpo e os sentidos, olhos, ouvidos
atentos,todosvoltados para a massa,parapercebêla,dialogar com suamaciez que
cede e com sua solidez que resiste. Para o processo de confecção de obras por
procedimentocerâmico, precisodosar aforça em cadaação: cortar,bater, enformar,
texturar, alisar, agregar, vazar, colorir, grafitar, fazer soar, cozinhar, para extrair do
informe,úmido,frio,agraçaeimaginarapoesia.
fig.34.GrãodeTerras,2006.
54
ionalidade.
E, recorrentemente, pego um bloco de argila ou massa cerâmica
54
pronto para uso,
em condições ideais de umidade (relação terraágua), e, para modelar o Grãode
Terras,procedidaseguinteforma(fig.35):olheiedividioblococomoauxíliodeum
fiode nylon, observeia forma,imaginei tendênciasdeformas possíveisparaomeu
objeto,entãobatioblococontraamesa,observeioresultado,acrescenteifragmentos
de argilas de cores diversas e fui empurrando e batendo e jogandoo contraa mesa
oucontraochãoeparandoacadamovimento,olhandoeprocurandodescobrirnele
umaexpressãosignificativa,acrescentandocorese/oucomeçandotudodenovoaté
encontrarme com a forma, total ou parcialmente. Quando parte do bloco me
encantou, me surpreendeu, estudei a possibilidade de, interferindo o mínimo
possível com cortadores e facas, dar uma solução aceitável; este foi o primeiro
momento. Assim o digo para melhor entendimento do processo de produção da
obra,quedividiemetapasàsquaisdenomineidemomentos.
Então, após uma pausa para o bloco adquirir um pouco mais de resistência, com a
evaporação parcial da água (relação terraáguaar), o segundo momento foi aquele
em que estudei onde cortálo para vazálo por dentro, para adaptar a forma que
queriaàestruturaquepodiaterparaqueimar.Depoisorestaureidamelhormaneira
possível.Atéaqui,oobjetoemprocessoconstrutivotinhaformaeestrutura.
Noterceiromomento, procureiler,dentro daslimitaçõesdecorese contrastesentre
elas, que não são permanentes
55
, nas linhas e manchas e pontos, depressões e
avanços de algum relevo, as possibilidades de complementação do desenho a ser
feito a pincel com engobes
56
na bidimensionalidade, com interferência para o
desenhodotododapeçaemsuatridimens
54 Misturadeingredientesminerais,ondeaargilaéocomponentemaisimportante,paraconfecção
depeçascerâmicas.
55 Àmedida quea água evapora,temosasmais variadasimpressõese contrastes de cor. depois
daqueimaéqueelastornamseevidenteseplenas.
56 Misturas de argila líquida, óxidos ou corantes e outros componentes que podem ser aplicadas
sobrepeçascerâmicasparatingilas.ConsultarApêndiceCProcedimentoscerâmicos.
55
fig.35.RecortedeimagensdoprocessocriativonaelaboraçãodaobraGrãodeTerras,2006.
ConsultarApêndic e CProcedimentoscerâmicos.
56
Em um quarto momento, a peça foi levada ao forno elétrico (relação terraágua‐
arfogo), onde foi submetida à queima, à temperatura de 980° C, em atmosfera
oxidante.
Finalizando as etapas, o último momento foi o de abrir o forno e olhar, m anusear,
escutareleroresultadoatentamente,gastartempocomoprevistoeoimprevistodo
resultado para reconhecer nele a intimidade da autoria, pois nos diz, ainda,
Bachelard que “a imagem é o ser que se diferencia para estar certo de vir a ser”
57
,
portanto,nãooédeimediato.
Desse modo, revendo o procedimento que é utilizado para se transformar terra em
cerâmica no fazer artístico, confirmo que esse se assemelha a trafegar na escuridão,
em que imprevisibilidade e impermanência são dificuldades a superar a todo
momento: trabalhase com cor, resistência, peso e tamanho em mutação o tempo
todo,paradepoisdaqueimavisualizarmosoresultadodotrabalho,decadadecisão
edecadainterferência.
Por isso retomo aqui a obra “ContrAÇÃO”, 2001, de Eriel Araújo, (fig. 23, p. 29)
exposta no Centro Cultural Correios. Integrou a obra a seguinte frase escrita com
argila sobre a parede:ʺA transformação, muitas vezes, é inerente ao homem e as
coisas,poisaespontaneidadedamutaçãoexistentenamatériapercorre otemposob
o olhar humano; e este, por sua vez, se apropria desta para criar novas
possibilidades, transferindo suas inquietações internas a um desenho realizado de
suasaçõesquecorroboramparaoentendimentoda TERRA.ʺAcreditotambémsera
espontaneidadedamutaçãoexistentenamatériaargila,barroquenestadissertação
chamo de terra que desperta no homem a imaginação e a vontade, reunidas no
57 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.21.
57
“onirismo ativo” segundo Bachelard. Ao trabalhar poeticamente com a terra, o
homemprocuraentenderseeconheceromundo.
Igualmente reflito sobre o questionamento acerca da resposta do barro cozido às
exigências da vida contemporânea e penso que essa resposta pode estar justamente
na possibilidade do movimento da matéria e do homem com ela, em ões, contra
açõesecontraçõesdamassacerâmica.DiscordocontudodeErielAraújoquandoele
não considera a transformação maior, que se com o barro na queima, uma
performanceespontâneadomaterial
58
.Aesserespeito,vejonatransformaçãodeseu
caráterplásticoparanãoplásticoarespostaespontâneadaargilaaocalor.Ecomessa
transformaçãomaiorohomemcria,reinventaseeatualizasenacontemporaneidade,
mas mantendo a terra / Terra como sua casa, sua proteção até em viagens siderais.
Permitindome o pensamento em rede na construção de obras, como explica Cecília
Salles
59
, lembro aqui a grande tragédia que assistimos pela TV, em 2003, da nave
Columbia
60
,porfaltadessaproteção,quandoumaplacacerâmicacomRCC(siglapara
carbonocarbonoreforçado)desuacamadadeisolamentotérmico sedesprendeu.
Necessáriosefaz,ainda,analisaraquiamatériaterrosa,argilaoubarro,componente
básico das massas cerâmicas que uso, pois, “com a expansão do termo escultura, a
partir dos anos sessenta, que a libera de códigos modernos, ela passou a ocupar
outros lugares, incluindo o processo, a vivência da experiência, as sensações que se
58ConsiderandosequeeleafirmaissoemsuadissertaçãodemestradoMUTAÇÃO:umapossibili
dadedodevirinstauradonamatéria,p.58.
59 SALLES,CecíliaAlmeida.Redesdecriação:construçãodaobradearte.SãoPaulo:Horizonte,2006,
p.23.
60 AotentaratravessaraatmosferadaTerranoretorno,momentodegrandeaquecimentopeloatrito,
semadevidaproteçãocerâmica,anavesuperaqueceuetanquesdecombustívelexplodiram.“The
debris struck the leadingedge of the left wing on the number 8 reinforced carboncarbon (RCC)
tile,damagingthe Shuttleʹsthermal protection system(TPS).”SPACEShuttle Columbia disaster.
In: NEWSPAPER ARCHIVE. Space shuttle Columbia disintegrates. Sábado, 1 fev. 2003. Disponí
vel em: <http://www.newspaperarchive.com/Articles/SpaceshuttleColumbiadisintegrates.aspx>.
Acessoem:7abr.2008.
58
despregamdomomento,assimcomodomaterialempregado”
61
.Eéjustamenteisso
que estou trazendo nesta dissertação: a reflexão do processo feito, a narração da
experiênciarealizada,adescriçãodopensamentovisualconstruídoeasconexõesem
rede de criação estabelecidas.Portanto, em meio ao uso do procedimento cerâmico,
venho vivenciando ciclicamente o contato com a solidez da terra, com a emoção da
águaquelheconfereplasticidade,comaliberdadedo arquelhepermitedesidratar
para a transformação definitiva do fogo, num processo de combustão e luz, que
registramomentosvividoscomotantosnavida.
Esta matéria tão nossa permiteme experimentar as dicotomias que abaixo inseri
virtualmente sobre a imagem de uma peça cerâmica, em que testei a aplicação de
engobevermelhocomóxidodeferroemváriasintensidades:
Assimsendo,pontuoqueaterratemsidodoce,frescaaotato,erigorosatambém,ao
ensinarme a ler na imprevisibilidade e na impermanência, fazendome decidir a
cada interferência no processo cerâmico com um misto de intuição e técnica. Tem
61 SIELSKI,IsabelaMendes.OBarronaArte:umaquestãodelimites.ENANPAP,15,2006,Salvador.
Anais Eletrônicos ... Salvador : ANPAP, 2006. Disponível em: <http://www.unifacs.br/anpap/
autores/181.pdf>.Acessoem:8out.2006.
59
exigido reflexão sobre os resultados depois da queima, quer tenham sido eles os
esperados, quer tenham surpreendido apontando novos caminhos. Hoje tenho
pretensões menos dominadoras, permitindome abrir um diálogo com ela,
imaginandotendênciasemvezdeexatidão,ajudandomenosatos deescutarefalar,
facilitandomeareadaptaçãoàrealidadedacomunicaçãopluraldehoje.
Além disso, dentre os conceitos de “desconstrução, efemeridade, apropriação,
deslocamento, hibridização, impermanência e desmaterialização, tão estreitamente
ligados à arte contemporânea que têm sido impulsionados pela matéria”
62
,
questionome se não dialogo com desconstrução
63
na observação do processo do
fazer a terracota, técnica atemporal e universal. Pois criar implica também
desmanchar, anular formas construídas, deixar morrer possibilidades no percurso
em detrimento daquela escolhida. Aqui, a desconstrução é analítica enquanto
transformo a efemeridade do material eternamente reciclável em material imutável,
atenta à impermanência da imagem ao longo de seu processo de fixação. Ora
apropriome de códigos gráficos de comunidades populares rurais como referência
cultural e ora inspirome neles num recorrente exercício de recriação. Quanto ao
hibridismo
64
,possodizerquemisturoo barrocozidoaaço,estanho,areia,acrílicoe
nylon na montagem e instalação das obras, como elementos estruturadores,
formadorestambémdeconceitoequefazempartedesualinguagem.
62 WANNER, Maria Celeste de Almeida. (In) Materialidade e a Desconstrução das Técnicas Tradi
cionais19601970.CulturaVisual:revistadoMestradoemArtesVisuaisdaEscoladeBelasArtes.
Salvador:EDUFBA,v.1,n.7,2005,p5556.
63 “As linguagens visuais contemporâneas quebraram com o conceito único e desconstruíram suas
técnicas,misturandoasentresiouforadelas”.ApudIbidemp.56.
64“Ohibridismonasarteséaimpossibilidadedeconceituarumacriaçãoartísticacomopertencentea
uma única vertente, categoria ou cultura, decorrente do ilimitado experimentalismo da artecon
temporânea.Pensandonoquecomumenteseestabelececomoartesplásticas,nãomaislimites
entrepinturaedesenho,açãoeperformance,objetoeescultura,instalaçãoesitespecificwork”.NET
PROCESSO arte contemporânea. Disponível em: <http://www.oktiva.net/oktiva.net/1321/nota/
54863>.Acessoem:3jun.2009.
60
Enfim, ainda de forma reflexiva, retomo a imagem do GrãodeTerras e a posição
queassumiunaexposiçãoitineranteAfetosroubadosnotempo,fazendoparcomaobra
de Anindita Dutta, da Índia (fig. 36), uma casa. A terra então, no movimento do
procedimento cerâmico, pode tornar‐ se momento e espaço de acolhimento para a
criaçãopoéticaaçãoeimaginação.
fig.36.ParGrãodeTerras,2006“SemTítulo”,AninditaDutta,2006.
61
2.2Pororoca
“Agentesabebemaquiloquenãoentende.”JoãoGuimarãesRosa
Umapossívelinterpretaçãoparaestetrechoseriaadequeoescritorfaladoprocesso
criativo,quenãoseexplicaracionalmente,massesabedeleporqueeleédiáriopara
quem lida com o fazer poético. Retomo, então, o sonhador de Bachelard. Não o
“sonhadordanoite”,poisnosonhoohomemépassivo,maso“sonhadorativo”,no
sentido da quele que “experimentando no trabalho de uma matéria essa curiosa
condensaçãodasimagensedas forças,viveasíntesedaimaginaçãoedavontade”.
65
Explicanos Bachelard que, no trabalho criador com a matéria, o homem se realiza
como imaginação dinâmica, provocado pela resistência da matéria
66
. A esta
resistência correspondem os elementos que resistem no inconsciente. Este embate é
geradordecriaçãoporqueéqueasimagenssãoreveladas.
Essas duas forças, então, imaginação e vontade no trabalho com a terra, buscando
vencer essas resistências, determinam um tipo de experiência que é típica da
constelação que denomino de Pororoca. Na construção das obras desta constelação,
observei a mistura de sensações de aventura, medo, imensidão que inquieta e que
expande,queapontaparaodesconhecidoporconhecer,quedilataavisibilidade,que
rompebarreirascomoumgritoqueestrondaparadentroeparafora.
Assimsendo,consideropertinenterefletirsobreaobraProtoestrelas,2007(fig.37ab),
eseuprocessocriativo(fig.38).Tratasedeumainstalaçãodecercadequarentaobje
tossonorosconstruídosporprocedimentocerâmico,queforamdispostosdaseguinte
forma: parte deles sobre superfície horizontal metálica com areia como sementes a
serdeixadasagerminar,eparte suspensosemcabodeaçoocupandooespaçoaéreo
da galeria, como estrelas em formação, todos, contudo, podendo ser apreciados e
manuseados pelo blico, gerando sons diversos, na exposição Germinando Estrelas,
realizadanaEBECGaleriadeArte,emsetembrode2007.
65 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.20.
66 Idem.Ibidem.p.25.
62
fig.37a.Protoestrelas(vistadiagonaldainstalação),2007.VercatálogonoAnexoA.
63
fig.37b.Protoestrelas(vistafrontaldainstalação).
64
fig.38.RecortedeimagensdoprocessocriativonaelaboraçãodaobraProtoestrelas,2007.
ConsultarApêndic e CProcedimentoscerâmicos.
65
AsProtoestrelasfizeramumeloentre
aidéiadesementequeserompeem
presença de intenso calor como as do
CerradoBrasileiro
67
enovasestrelasno
céu,protoestrelas, formadascom libe
ração de grande energia e também em
altíssimastemperaturas.
.
Para fazer as Protoestrelas, objetos
cerâmicos capazes de produzir algum
soma partir da inserção estratégicade
grafismos coloridos referentes à
cerâmicapopular baiana, outra técnica
construtiva tornouse necessária. Para
facilitar a vibração e ressonância de
som, precisei criar nova forma, bem
bojuda, que fiz com massas cerâmicas
em diversas cores, mas que ainda
pudesse sugerir a idéia de semente
vista daqui e, poeticamente, de
qualquerpartedonossogloboterrestre
comoestrelasemformação.
.
fig.39a.Protoestrelas,detalhesfuncionaisdos
grafismosparasonorizaçãocomcordaesopro.
Entãomodeleicincoformasmatrizesparaformadegesso.Nestasformasdeiestrutu
ra a todos os objetos, com amplo espaço interno livre, podendo produzir som por
sopro, percussão ou cordas. Fiz pesquisa junto à coleção de instrumentos musicais
67 RecebidaprofessoraVigaGordilho,emauladomestrado,umexemplardessas
sementescomoelementoprovocativo,propulsordeprocessocriativoequege
routambémoGrãodeTerraseasSementescantantes.
66
tradicionais de Emília Bian cardi, 
etnomusicóloga baiana, investigando a
construção de instrumentos sonoros
populares cerâmicos ou não. Desen
volvi por procedimento cerâmico: um
sistema para sopro: rasgo–conduto
interno–vazado–furinhos–bojo; instalei
elementos funcionais para percutir:
ranhuras para fricção, vazados que e
vocam os udus, instrumentos primi
tivoscombojoefuros,quasetambores;
inserielementostambémcerâmicosnos
bojos, das mais variadas formas para
chocalhar; e, finalmente, para vibrar
cordas inclui delicados tarugos para
funcionar como tarraxa, na fixação e
distensãodasmesmas(fig.39ab).
Voltando ao macaréu, à Pororoca
brasilei ra, temos um movimento de
águas que se percebe visualmente e
por audição. Ainda lá, no rio Amazo
nas, vão os surfistas
68
fazer campeo
natos enquanto outr os sofrem seus
danos. Faço então um a analogia entre este macaréu e a c orrida por sensações
contemporâneas. Ana Mae Barbosa , educadora e historiadora de arte brasileira,
considera que o conceito de apreciação na atualidade é concebido como um
fig.39b.Protoestrelas,detalhesfuncionaisdos
grafismosparasonorizaçãocompercussão.
68 Ossurfistasbuscamnos momentos de cheia aproveitarasimensas ondas quechegama atingir6
metrosdealtura.
67
processodecolagememontagemestética,baseadanãoapenasnapercepçãovisual,
mas na percepção de mundo por meio de todos os sensores corporais.
69
Cada vez
mais, na contemporaneidade, as linguagem se sobrepõem numa busca de
percepções sinestésicas: “Como se provou, o contemporâneo é feito da soma e
nãodasubtração”.
70
Busquei então conhecer o trabalho de outros artistas que usam linguagem visual
sonora.RessaltodentreelesAnaMariaTavares,WalterSmetakeSusanRawcliffe.A
primeiraartista,segundoAgnaldoFarias,“constróiobjetoseinstalações(fig.40)que
nos alertam, além da malea
bilidade das noções de tempo e
espaço,sobreavidaocultadetudo
queexiste”.Eleaindaexplicaquea
artista nos traz à ambivalência do
termo naturezamorta, “que tanto
aponta para o caráter imóvel das
coisasrepresentadasquantoparao
fato de que possuem uma vida
silenciosa”
71
. O observador, então,
percorrendo suas imensas insta
lações, vivenciamse em relação a
objetos e linguagens do cotidiano, interligados a espelhos, a elementos sonoros
e a móveis em aço inox, que fazem a ponte entre a realidade cotidiana e sua
dimensãoenigmática.
fig.40.An aM.Tavares,“Numinosum ”,2004,açoinox,
água,plotagemempoliéster,espelhoepeçasono ra,144m².
(LIMA,20 05,p.71)
69 AMARAL,Lílian.Fronteirasdo Visível Arte Públicana AvenidaPaulista:UmEstudoInter
vençãonaCidadedeSãoPaulo.ENCONTRODAANPAP,15,2006,Salvador.Anais...v.1.Salva
dor:UNIFACS,2007,p.572.
70 MORAES,Angélicade.PercursoatualdaartenoBrasil.LIMA,NairBarbosa(Org.).BrazilianartVI.
SãoPaulo:JCEditora,2005,p.23.
71 FARIAS,Agnaldo.AnaMariaTavares.LIMA,NairBarbosa (Org.).Brazilianart VI.oPaulo: JC
Editora,2005,p.66.
68
Quanto a Walter Smetak, músico, este
produziu mais de cem instrumentos
musicais (fig. 41), feitos a partir de
coisas simples: cabaças e ferro velho
72
,
que denominou “plásticas sonoras”,
explicando que o objeto visível se
identifica nas artes plásticas com o som
concreto. Paulo Dourado, em catálogo
da exposição “Plásticas Sonoras”
73
,
relaciona os objetos de Smetak com
instrumentos e objetos da Índia e dos
índiosbrasileiroseinformaque

fig.41.WalterSmetak,“Amem”,altura103cm,
datadesconhecida.
(PLASTICASSONORAS,1988)
[...] as plásticas sonoras, ao contrário dos instrumentos tradicionais, não
permitem nem estimulam o desenvolvimento de uma técnica virtuosística
doexecutante.Osprimeirostoquesesgotamquasequetodasaspossibilida
des sonoras do instrumento.Estes são mais dirigidos à criatividade do que
aoestudo.
o trabalho de Susan Rawcliffe, pesquisadora de sonoridades primevas, está mais
inserido na área musical. Seu objetivo é criar instrumentos cerâmicos para música
experimental. São instrumentos complexos e virtuosamente elaborados, que serela
cionamemaparênciacomflautas,ocarinas,apitos,trompetesefoles.Aartistaconse
gueemitirsonsexóticosepotentestambémemsuasesculturassonoras(fig.42).
Procurando relacionar o trabalho das Protoestrelas, unicamente construídas por
procedimento cerâmico, com obras dos artistas pesquisados na plasticidade
sonoridade, identifico nos trabalhos de Ana Maria Tavares, Walter Smetak e Susan
72 WALTERSmetak.In:ENCICLOPÉDIAdaMúsicaBrasileira:erudita,folclórica,popular.2.ed.São
Paulo:Art,1998,p.748749.
73 EstaexposiçãofoiorganizadapelaFundaçãoGregóriodeMatos,em1988.
69
Rawcliffe traços em comum e também de distanciamento. Em comum, destaco a
observaçãode AnaM.Tavaresdeque osobjetospossuemumavidasilenciosa,mas
que pode vir a se manifestar através da
sonoridade na relação e manuseio com o
observadorpoisaproduçãoruralaqueasproto
estrelassereferemestãosilenciadas,caminhando
para a desvalorização e extinção
74
, mas ainda
podem se fazer presentes para o observador.
Com relação às “sonoras visuais” de Smetak,
digoqueasprotoestrelastambémesgotamsuas
possibilidades sonoras aos primeiros toques.
QuantoaotrabalhodeSusanRawcliffe,vejo que
usamos a mesma matéria: argila, e a mesma
técnica: o procedimento cerâmico, na construção
deobjetossonoros.
fig.42.“SoundSculpture”,Susan
Rawcliffe,cerâmica,datadesconhe
cida.
(ARTAWAKENING,2008)
TraçosdedistanciamentoentreasprotoestrelaseasobrasdeAnaM.Tavaresestão
naintençãodareflexãosobreoenigmadosambienteseobjetosnelesinseridos,com
os quais convivemos na contemporaneidade, os materiais e dimensões usadas.
Quantoaos objetos de Smetak e deRawcliffe, digo que não tenhointençãode fazer
instrumentosmusicais,nemcomcerâmicanemcomoutrosmateriais.Meuobjetivoé
o de que a cerâmica que produzo poeticamente, inspirada na produção rural do
RecôncavoBaiano,alémdesereportaraseusbelose característicosgrafismos,cante
também sua beleza e suas mágoas, soe contando suas histórias e grite sua
necessidadedeserpresençanacontemporaneidadeuniversal.Paratervisibilidadeé
precisotervoz!
74 “ORecôncavoainda épovoadodegentesimples,heterogênea,que conservaa potencialidadede
transformaraterravermelha“tauá”emtinta.Entretanto,todoesseuniversomatéricoesempro
cessodeaculturação”.GORDILHO,Viga.CantosContosContas.Salvador:P55Edições,2004,p.75.
70
Otrabalho criativo,então, para mim,temessesmomentossimilaresaodapororoca,
de estrondar, de ver e soar, um processo visualsonoro e que, durante o
procedimento cerâmico, ainda envolve mais uma sensação, a de calor / luz na
queima, na transformação definitiva da matéria que nos traz a nitidezdasformas e
cores. Por isso, atenta à lenda Como nasceram as estrelas, transcrita por Clarice
Lispector
75
,quediz:
“quecuruminsfamintosencontraramummilharale,aosefartaremalémda
conta, corriam da punição de suas mães subindo em cipós cada vez mais
altos. As mães, assustadas, tentando alcançálos, subiram e cortaram os
cipós.Elasviraramonçasaocaíremnaterra,eoscuruminstransformaram
seemlindasestrelasnocéu.”
contraponhoaminhaidéiaparaaorigemdasestrelas.Ameuver,nosespelhamosno
céucomoestrelasquandoexperienciamosoprocessodeprepararobarroeaquecêlo.
Transformandoo em cerâmica, realizamos uma ação geradora de corpos celestes,
ondeoaquecimentodeflagraacriação.
75 LISPECTOR,Clarice.Comonasceramasestrelas.RiodeJaneiro:Rocco,1999,p.89.
71
2.3Monções
“Assimcomonossosolhossãofeitosparaaastronomia,também
nossosouvidosofeitosparaosmovimentosdaharmonia.”Platão
Platão fala, em uma das interpretações possíveis para esse trecho, de ouvido s e
movimentos estéticos, portanto, sonoridade na visualidade, na harmonia do que é
belo
76
. Então, intuitivamente levada a manter a sonoridade desenvolvida com as
Protoestrel as, atenta à leitura das estrelasobras, às su as linhas definidoras de
formas e grafismos, detendome a observar as Seme nt es cantantes, estrela da
constelação Sigma, citada no capítulo 1 desta dissertação, uma de las , a Quase
cítara (fig. 44), cantoume possibilidades de expansão. Suas cordas inspiradas em
grafismotu p i guarani
77
(fig.43),imag ine iasprolongandosemaisemaissaindoda
peçaeadentrandooespaço.
fig.43.“Grafismoindígenatupiguarani”. 
fig.44.Quasecítara,2007.
76 Descreveu Platão a noção de música das esferas o Sol e os planetas girando nos céus em
proporções harmônicas. Esta idéia foi retomada por Kepler em seu livro As harmonias do mundo.
FERRIS, Timothy. O Despertar na Via Láctea : uma história da astronomia. Trad. WaltensirDutra.
RiodeJaneiro:Campus,1990,p.48.
77 GrafismocatalogadocomoAmuatáouIpirapé,escamadepeixe,emVIDAL,Lux(Org.).Grafismo
indígena:estudosdeantropologiaestética.oPaulo: EDUSP, 1992,p.123. Usadopelos Asurini,
índiostupiguarani,localizadosemTocantins.EstemesmografismofoiregistradoemINSTITUTO
DE ARTESANATO VISCONDE DE MAUÁ. Cerâmica Popularis. Salvador, 1994, p. 17, como
grafismodecorativodebordasusadonaBahiaprécolonial,detradiçãotambémtupiguarani.
72
fig.45.Recortedeimagensdoprocessocriativonaelaboraçãodaobratiocósmico,2007.
ConsultarApêndic e CProcedimentoscerâmicos.
73
Preciseifazernovaspesquisas té c n ic as (fig. 45) para podermanterlinhasoriundas
de grafismos da história da cerâmica relacionados à sonoridade das Proto
estrelas transformandose em cabos de aço para sustentar no ar a estrelaobra
Sítio cósmico, 2007 (fig. 46) buscando uma musicalidade visual. O caminho foi,
portanto, le r as constelações mais uma vez, ima ginar , investigar no atelier com a
terra,curiosamenteleroutrostextosparaalimentaraimaginaçãoe,aí,concluirque,
com es te movimento de trabalho, imaginação ativa, cheguei à Terra, afinal de
contas, es ta é feita de terra e águ a, materiais básicos das massas cerâmicas. Cita
BachelarddeCharlesLouisPlilippe:
Quando um operário vence uma matéria, é capaz de tra nsformála, é a
naturezainteiraqueévencidaeéahumanidadeinteiraqueévencedorana
batalha de um dia. Então,uma meditação da oficinaampliaseatéchegara
umameditaçãodouniverso”
78
.
Para construir o Sítio cósmico
79
, trabalhei com placas bem grossas, de quatro
centímetros de espessura e massa bem resistente. Recortei as placas com faquinha
afiada, quando haviam desidratado um pouco, delineando doze pe ça s qu e se
encaixameexibemumaformaque assemelhaseadoprimeiromapeamentodaVia
LácteaporHerschel,noséculoXVIII,formaencantadoraparamim(fig.47).Depois,
dividiasaomeio,cadauma,emsuasespessuras,eescaveibastantepordentropara
terpeçasleves,com espaçolivreparaapassagemdecabosdeaço.Paraproduziras
doze peças experimentei, assim, uma técnica construtiva que exigiu planejamento,
cuidado e vigilância na secagem, para que não rachassem nem deformassem ou
empenassem.
78 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.49.
79 EstaobraintegrouaExposiçãocoletivaMatériapresente,naGaleriaCañizares,julho2007,resultan
teda disciplinaLaboratório deInvestigaçãoTridimensionaldo curso demestradodo PPGAVda
EBA, UFBA, ministrada pelos Profs. Alberto Olivieri e Juarez Paraíso e foi premiada no Salão
NacionaldeCerâmica,CuritibaPR.
74
fig.46.SítioCósmico,2007.
75
Damesmaforma, afuraçãopor onde entrame saemos cabos tambémfoi estudada
para que tivesse grafismo e cabos de aço coincidindo na mesma altura, para que
fossemestes continuidade daquele, transferindo,assim, a sonoridade dos grafismos
das Protoestrelas para uma musicalidade visual imaginária, como a descrita por
Platão e, posteriormente, Kepler a música das esferas. Assim conhecida, esta
expressãofazreferênciaàconcepçãodouniversocomoummecanismoperfeitamente
organizado segundo regras que podiam ser apresentadas tanto matemática como
musicalmente.
80
fig.47.PrimeiromapeamentodaViaLácteaporHerschel,séc.XVIII.(FERRIS,1990 ,p.117)
tendoaspeçasqueimadasemfasedeprimeiramontagemnoatelierparaadequar
alturas e inclinações dos cabos, espessura dos mesmos, buchas, distensores e
ferramentasdeauxílio,aindabuscandoonomedaobra,elesurgiucomolugar,nosso
lugar no espaço. Durante uma pesquisa na internet sobre o nome que se formou
Sítio cósmico encontrei um texto do escritor e economista chileno Patrício Vidal
Walton,quedefinesítiocósmicocomoumrealismomágico,umarealidadeconcreta,
80 “Aprocura de ligaçõesentre as diversasáreas dopensamento atrasoumuitasvezes o avanço da
ciência,mas tambémfoi odesejo de encontrar tais ligações queacaboupor ser a base emocional
que conduziu alguns cientistas a resultados importantes, como aconteceu com Kepler, ao tentar
compreenderamúsicadasesferasapartirdomovimentodosplanetas.”PORTALdoastrônomo.
SIMÕES, Carlota. A Música das Esferas. Dispo ní vel em: <http://www.portaldoastronomo.org>.
Acessoem:18jun.2007.
76
a cidade de Valparaíso
81
, em seu país. Esta pequena cidade situada na costa do
Pacífico,dizele,provocaumacascatadeemoçõesesentimentosdesordenados,uma
misturadeesperançaedesolação,e,porissomesmo,temvalidadoaimaginaçãode
pintores e poetas. Embora seja um local real, Valparaíso, porto e paraíso turístico,
possibilitaaveracidadedaslendas.
Sendo assim, atenta ao barro que se modela e se cozinha no processo criativo,
transformando as re des de associação entre informações de variados saberes em
espaço alargado, em sítio ampliado, sítio cósmico, faço referência aqui à lenda
indígena transcrita por Clarice Lispector Como nasceram as estrelas
82
que
alimentou minha imaginação ao produ zir as Protoestrelas, 2007, e ao mito
ameríndio de Aôho
83
, que ClaudeLévi Strauss transcreveu em sua ob ra A oleira
ciumenta,1985,motivode reflexãoparaaobraCacocipó,2008.Ambasashistóri as
tratam de origem: origem da s estrelas, a primeira; e origem da cerâmic a,
asegunda.
Por isso, com permissão do realismo mágico do Sítio cósmico, estabelecendose
nexos no diálogo com conhecimentos de outras áreas, passase às cosmologias, que
sãoteoriasdomundo,comonosdizAracyLopesdaSilva
84
:
“São os temas míticos, que narram aventuras e seres primordiais, em
linguagemfabulosa masconstruídacomimagensconcretas,captáveispelos
sentidos; situadas em um tempo das origens mas referidas ao presente,
encerrando perspectivas de futuro e carregando experiências do passado.
Assim,complexossãoosmitos.”
81 VALPARAÍSO,PatrimoniodelaHumanidad.Disponívelem:<http://www.idiomayoleporte.com/
valparaiso.htm>Acessoem:12jun.2007.
82Conferirp.70.
83Conferirp.81.
84 GRUPIONI,LuísDoniseteBenzi(Org.).CatálogoÍndiosnoBrasil.Brasília:MinistériodaEducação
edoDesporto,1994,p.75.
77
Sendoassim,osmitossãotransmitidosdegeraçãoemgeraçãocomotesourocultural,
poisparaa“consciênciamítica,tudodevetertidoasuaorigem.Seestaorigemficou
encoberta pelo tempo, ainda assim pode ser recuperada pela imaginação. A
experiênciacotidiananossinalizaarepetiçãodasorigensnosciclosdavida.Eéisto
quenosinteressa,porissoosmitossãoperenes.”
85
Aimaginação,portanto,inventae
reinventa,éfontederenovaçãoeperpetuação.
Os grafismos como linguagem foram contextualizados na constelação Aurora,
misturasdeorigenseatualizações,cosmovisões
86
denossascomunidadesrurais.a
constelação Monções reúne visões cósmicas variadas, saberes humanos ordenados
comimaginação,traçosdecosmologias,expressaspoeticamente.
Ainda atenta ao tio cósmico, à sua
relação conceitual com a cidade chilenade
Valparaíso,acidadelitorâneaqueinstal ada
entreencostasrochos aseomar exibeuma
paisagem muito particular: entre os
diversos pontos da parte baixa e alta
ascensores, que se tornaram ícones de sua
cultura
87
(fig. 48). Estes elevadores, que
lembram nosso exemplar em Salvador, o
PlanoInclinadoGonçalves,em semelhante
posição, correm sobre trilhos, deslizando em fortes cabos de aço. Associações visuais
daísurgemcomaobraestrelaSítiocósmicoquetambémseapói anosmesmoscabos.
fig.48.EduardoCouve,MainandAuxiliary
Cables”,AscensorArtilería,CerroArtilería,
2002.
(COUVE,2003,p.66)
85GRIMAL,Pierre.DicionáriodaMitologiaGregaeRomana.Trad.VictorLabouille.4.ed.RiodeJanei
ro:BertrandBrasil,2000.p.3.
86 Podemosconferir ao visitar essas comunidadesque o ceramista popular desenvolve seu próprio
saber,repetepadrõesehábitosdesuastradiçõesmiscigenadas,indígenaeuropéia,resignificando
sua idéia de mundo e de si mesmo, de forma o simples, com o material que tem no quintal:
sementes e seixos, ferramentas improvisadas, paêta, e, lasca de pindoba seca com fiapos de
algodãoouaindapalhadecoqueiroepelodegatocomopincel.
87 COUVE,Eduardo.ValparaísoAscensores.PuntaArenas:FantásticoSurBirding,2003,
p.5.
78
Portanto, suspenso no ar, do Sítio cósmico,e para ele,temos visões sem nitidez de
detalhes, poucas linhas sugeridas em meio a manchas e salpicos de cor, além de
sugestões de um mapeamento com linhas que se cruzam em seu entorno. Em um
canto,doladodireitodafaceàmostranafig.49umúnicoelementográficopodeser
focado, simbolizando a conexão com o espaço individual e regional. Essaaparência
desfocada,commanchas,áreasdecornãodelineadas,ameuver,trazemonãoexato,
o nãoracional, a imaginação humana, sobre a qual diz Bachelard: “a consciência
imaginantecriaeviveaimagempoética.”
88

fig.49.Sítiocósmico,detalhe.
88 BARBOSA,Elyana.GastonBachelard:oarautodapósmodernidade.Salvador:EDUFBA,1996,p.34.
79
E desse pontodevista, do
nãoexato, do nãoracional,
do realismo mágico, obser
vei semelhança entre o Sítio
cósmico e obras de Márcia
Xavier: “Neurônio Venoso”,
2004 (fig. 50) e “Baía de
Guanabara, 2005, obras que,
segundo Kátia Canton, “são
instrumentos emblemáticos
de um mundo instável, irônicos trompe d’oeils, estranhos sistemas visuais que
prometem a penetração em uma realidade feita de fábula, refeita pelos excessos da
midia.”
89
Contudosualinguagem criadaapartir defotografias alteradasporefeitos
deluzeespelhamentosdiferemuitodaminha.Aindaquesuasimagenspassempor
processosoutrosmidiáticos,eeutambémosuseemfasedeprojeto,minhasimagens
estão no paradigma préfotográfico, na “vontade contra a matéria”, e as suas, no
fotográfico,segundoLúciaSantaella
90
emseusestudossemióticos.

fig.50.MárciaXavier“NeurônioVenoso”,alumínioeimagem
embacklight,30x45cmØ,2004,detalhe.
(LIMA,2005 ,p.269)
Com todas essas questões pontuadas digo que a estrelaobra Sítio cósmico que
pertence a Monções, constelação referente a ventos imaginários que sopram na
direção da expansão para fora e para cima, abraça a Terra no trabalho com a terra.
Estaexpansãoparaforaatingeemoposiçãoomundointerior,criandoumalinhade
ligação,comoos cabosdosascensores deValparaíso, e,sendo assim,crescenasduas
89 CANTON, Kátia. Márcia Xavier. In: LIMA, Nair Barbosa (Org.). Brazilianart VI. São Paulo : JC,
2005,p.266.
90 Lúcia Santaella explica, em seu estudo semiótico, os três paradigmas da imagem ao longo da
história humana: préfotográfico,onde, artesanalmente o homem plasma o visível, a imaginação
visual e mesmo o invisível em formas bi ou tridimensionais; fotográfico, onde as imagens são
produzidas por conexão dinâmica, com uma máquina de registro; e pósfotográfico, em que as
imagens são inteiramente calculadas por computação, as imagens infográficas. SANTAELLA,
Lucia;NÖTH,Winfried.Imagem:cognição,semiótica,mídia.SãoPaulo:Iluminuras,2006,p.157.
80
direções: para fora e para dentro. Penso, então, que seria esse movimento nas duas
direções que motiva também os mestres oleiros nas comunidades rurais, como a
todososhomensquepraticamaimaginaçãoativa.PoisnosdizBachelard:
Defato,podesesentiremação,emmuitasimagensmateriaisdaterra,uma
sínteseambivalentequeunedialeticamenteo“contra”eo“dentro”,emos
tra uma inegável solidariedade entre os processos de extroversão e os pro
cessosde introversão...a imaginaçãonadamais é senãoosujeitotranspor
tadoàscoisas.
91
Portanto, cada um, à sua maneira, dentro de sua visão de mundo, pode se ver nas
imagensqueproduzcomterraeimaginaçãonoprocedimentodobarrocozido.
91 BACHELARD,Gaston.ATerraeos DevaneiosdoRepouso. Ensaiosobreasimagens daintimidade.
Trad.PauloNeves.SãoPaulo:MartinsFontes,2003,p.2.
81
2.4Sigma
“Asimagens,umavezcriadas,sãoeternas.”HerbertRead
UmavezcriadooSítiocósmico,elepassouaserespaçoconquistado, conhecimento
técnico e intelectual adquirido, a cada leitura, a cada reflexão que pode gerar, pas
sando a ser também ponto de partida para outras imagens poéticas. Isto digo para
fraseandoHerbertRead,quesustentaateoriadequeasimagens,frutodoimaginário
humano,precedemsempreaidéianodesenvolvimentodaconsciênciadohomem.
Nesta constelação, Sigma, imagino que as estrelasobras cintilam agregação de
conhecimento e este me conduziu a Cacocipó, 2008 (fig. 51), como referência para
estudo da construção do pensamento visual com o procedimento cerâmico. Caco e
cipósãopartesintegrantesdessaconstruçãoque,emminhasreflexões,resgataomito
deAôho,transcritoporClaudeLéviStrauss:
[...]osolealua,entãohumanos,viviamnaterra,edividiamumacasaea
mesma mulher, Aôho. Esta gostava que o sol quente a abraçasse, mas
receava o contato com a lua, cujo corpo era frio. Sol resolveu fazer ironia
com esta diferença. Lua sentiuse vexada e subiu ao céu trepando por um
cipó; ao mesmo tempo, soprou o sol e eclipsouo. Com os dois maridos
ausentes, Aôho julgouse abandonada. Subiu ao céu levando consigo um
cestocheiodeargila.Lua,paralivrarsedeladefinitivamente,cortouocipó
queuniaosdoismundos.Amulhercaiucomocesto,aargilaespalhousena
terraondeagoraéapanhadaaquieacolá.
92
ApanharaargilaaquinaBahiaouemoutrolugarqualquerdoplaneta,para comela
dialogarpoeticamente,darforma,estruturálaedarlheresistência,éumgestodiário
que, muitas vezes, aproximase daquele do modelador de que Bachelard nos fala:

92 STRAUSS,ClaudeLévi.Aoleiraciumenta.Trad.JoséA.B.F.Dias.Lisboa:Edições70,1987,p.21.
82
fig.51.Cacocipó,2008.
83
“Omodelador, quandoo seguimosem seupróprio sonho, a impressãodehaver
ultrapassado a região dos signos para abraçar uma vontade de significar. Não
reproduz, no sentido imitativo do termo: produz. Manifesta um poder criador.”
93
Assim penso que o “sonhador que modela” reúne cacos, forma ao fracionado,
conferindolheduranteoprocessoresistência,expressãoprópriaebagagemhistórica
paraalçarvôoemmovimentodeexpansão.
PorissoCacocipótomouumaformamodular,feitadepedaços,cacosestruturados,
imaginados a partir de diagrama gerado pela geometria fractal o triângulo de
Sierpinsky
94
. Relacionei esta ferramenta do conhecimento científico, que gera
imagens digitais de forma recursiva, com uma imagem viva do momento
contemporâneo: fragmentado, complexo, tecnológico, interativo, global, com a qual
pudeatualizaromitodeAôhoedirecionaroolharpara tentarcompreenderobarro
cozidocomolinguagemhoje.
EcomootriângulodeSierpinskygeramódulostriangulareseasformastriangulares
são aptas a voar, o Cacocipó estruturouse em espaço aéreo, em cabos de aço. Foi
um grande desafio técnico (fig. 52) dar forma e posicionar os diversos módulos em
sua exatidão. Para isso, lancei mão de ferramentas que o computador oferece:
softwares vetoriais, como o CorelDRAW e o AutoCAD, para ter formas e medidas
precisas(fig.53)nodesenvolvimentodasmatrizesquegeraramasformasdegessoe
tambémparaplanejarasfuraçõesdepassagemefixaçãodoscabos.
93 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.8283.
94OtriângulodeWaclawSierpinski(18821969)foicriadoem1916,emboraotermoFractal,dolatim
fractus,quebrado,fracionado,tenhasidocriadoem1975,porBenoitMandelbrot,paradescrever
ageometriacomquebuscavarepresentarasreaisformasdanatureza.Asprincipaispropriedades
dosfractaissão:autosemelhançaidentificadaquandoumaporçãodeumafigurapodeservista
comoumaréplicadotodo,numaescalamenor;complexidadeinfinitaoprocessodegeraçãode
uma figura fractal é recursivo; e dimensão trabalha com quantidades fracionárias. Revista
Brasileira de Ensino de Física. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&
pid=S180611172008000200005&lng=pt&nrm=iso>.Acessoem:05nov.2008.
84
fig.52.Recort edeimagensdoprocesso criativonaelaboraçãodaobraCacocipó,2008.
ConsultarApêndic e CProcedimentoscerâmicos.
85
fig.53.Cacocipó,estudodemedidasdoprojeto.
As formas de gesso tiveram a função de facilitar a produção de peças no mesmo
formatoemquatrotamanhosdiferentes,masmantendoamesmaproporçãoentreos
lados,epermitiram,comousodemassabemplásticaedegranu lometriafiníssima,
obterse módulos leves e resistentes. Lembro aqui a bela obra de Norma Grinberg
desenvolvida a partir de um módulo durante alguns anos, uma extensa criação
lúdica, produzida com barbotina em formas de gesso. A reprodução não foi
utilizada, em nenhum dos casos, para uma simples repetição, mas para a
multiplicação de peças com as quais podese expandir a criatividade. Contudo, a
técnica construtiva escolhida por mim, não foi a produção com barbotina, mas a de
agregação de pedaços de massa para levar até o fim a idéia de cacos que se juntam
para ganhar força e se firmar em espaço aéreo, justamente nos cipós, como conta o
mito,deondeAôhocaiueespalhouaargila.
86
Aindacomopráticadepesquisaqueparte dofazerno ateliereemparalelobusca o
diálogo com obras de outros artistas, selecionei o trabalho de Gabriel Orozco como
ponto de reflexão para ampliação do conceito desta constelação, Sigma, lugar e
momento de expansão da consciência. E como nos diz Bachelard que o modelador
quer significar, penso que para isso ele constrói um pensamento visual. Disso
tambémnosfalaGabrielOrozcoapartirdesuaexperimentaçãocomoprocedimento
cerâmico.Na fig. 54, seuma referência visualdo trabalho que ele mostrounaXI
Documenta, em 2002, e que também registrou em vídeo Clay works by Gabriel
Orozco”(trabalhos de Gabriel Orozco com argila), e sobre o qual também
disponibilizouentrevistanainternet
95
ThinkingwithClay”(Pensandocomaargila).
fig.54.GabrielOrozcoemprocessocriativo.(OROZCO,200 9)
Emsualongaentrevistaelenosexplicaoobjetivodotrabalhofeitoamanipulação
de uma certa quantidade de argila específica, porosa, e a relação dela com seu
próprio corpo, com uma mesa e algumas esferas num local carregado de conceitos.
Comissoeletrouxequestõesderitmodeação,delógicadeumaatividade,deforma
final determinada pelas ações do processo construtivo, ou seja, do movimento que
determina a forma dos objetos, da ativação do pensamento e da memória, das
95 OROZCO, Gabriel. Disponível em: <http://www.pbs.org/art21/artists/orozco/index.html#>. Acesso
em:15jan.2009.
87
sensações e reflexões da mente desencadeadas pela ação do processo, além de nos
falardecomplexidadeeuniversalidadedosvasosproduzidosporváriascivilizações.
Com isso penso que, para compreender a importância do procedimento cerâmico
para o homem, considerar essa contribuição de Orozco é tão importante quanto
observar o fazer diário da cerâmica como trabalho expressivo de um determinado
grupo, como o da comunidade rural de Maragogipinho ou Rio Real na Bahia por
maisdedoisséculos,ouestudaraobraimpactanteproduzidaporCeleidaTostesno
RiodeJaneiro,apartirdosfinaisdadécadade1970,ouaindavoltarmosnotempoe
avaliarmosa quebra do fazerrepetitivo dacerâmica por PabloPicasso no atelier de
Suzanne Ramié (Madoura) tornando esse procedimento como linguagem possível
dentro do amplo campo de expressão da arte contemporânea. De forma mais ou
menosconsciente,oestaríamostodossem nossotempo/espaçoemummesmo
movimento?Ummovimentooscilanteentreaçãodocorpoedamente.
Nessecaso,revendooprocessocriativonoatelier,percebiqueemprimeirainstância
quebreiemcacos,parainvestigaroprocedimentocerâmico,aquelescaxixiscomque
brinquei na infância. Desse modo queria também poder resgatar o verdadeiro
devaneio, e, na percepção saudosa da inocência que mais facilmente nos conduz a
imaginação,tentavarestauraratravésdoconhecimento,namontagemcuidadosada
técnica de agregação, o que se quebrava em meu entorno sem minha intenção e
tambémpedaçosdoquenãose abala,queresiste.Para issouseiemcontrapartida o
que cede, a massa mais amolecida, a barbotina, que é fluida e agregante, e que
justamenteporsuanaturezaplásticaune,estabelecevínculos,cola.
Experimenteiassim,maisumavez,oquecadamestreartesão,artistaouhomemtem
feitocoletarofracionado, agregarcadapartepacient ement e, verificarsuaintegridade
esintetizartudonumaformacoesa,querevelaouoabertamentesuahistória.Então
tornoalembrarBachelardquenosrevelaque“ohomemquetrabalhacomtalpaciên
88
ciaésustentado,aomesmotempo, porumarecordaçãoeumaesperança,eénas po
tências afetivas que se deve buscar o segredo de seu devaneio.”
96
E fui lembrando e
revisando aquilo que por vezes me pareciamais claro,eagregando e apertando com
aquiloquenãocompreendia,comoseofizessepelaprimeiravez,oudefinitivamente,
masoquevenhorepetindoemcadapeçacerâmicapormaisdevinteano s .
Epercebiaamatériaemminhamãoaterra,quenomeanossoplanetaTerra,e
viaocéu,eligavaosdoiseosseparava.ViaaTerraazuladaeocéuavermelhado,via
aTerraceleste.Efuimisturandoassensaçõesepercepçõespessoaisàsreferênciasdo
conhecimento humano, como nos explica Cecília Salles nas relações das redes de
criação, quando nos diz: “A criação como processo relacional mostra que os
elementos aparentemente dispersos estão interligados; a ação transformadora
envolveomodocomoumelementoinferidoéatadoaoutro.”
97
Omodo então como os elementosforam interligados, descrevooassim: comouma
colagemmatéricadesensações,percepçõeseidéias.Estasforaminterligadasenquan
to agregava os cacos: as sensações, com o repetir do trabalho milenar de recolher o
fracionadopara restaurarseno desfazer,refazer; aspercepções ao relacionar,trans
formar tudo isso na obraestrela Cacocipó; as idéias ao sintetizar o seu conceito.
EaindabuscandoacontribuiçãodeFaygaOstrower
98
recolhiessetrecho:
Alcança ndo áreas recônditas de nosso inconsciente, articulando e
trazendoas ao consciente (intuiçã o), a percepção mobiliza todo nosso ser
sensível, a ssociat ivo, inteligente (razão), imaginativo e cria tivo. .. Assim,
emnosso perceberformamsecontinuamentepartes e totalidades e novas
partesenovastotal i dades”.
96BACHELARD,Gaston.APsicanálisedoFogo.Trad.PauloNeves.3.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,
2008,p.48.
97 SALLES, Cecília Almeida. Redes de criação: construção da obra de arte. São Paulo : Horizonte.
2006,p.35.
98OSTROWER,Fayga.Asensibilidadedointelecto.9.ed.RiodeJaneiro:Elsevier,1998.p.7377.Nesta
citaçãoaspalavras(intuição)e(razão)sãosinalizaçõesdaautora.
89
fig.55.Cacocipó,2008,de talhe.
90
E foi assim que liguei os nós em rede, colando sensações, percepções e idéias,
formando partes e totalidades e visualizando o pensamento em imagens no
procedimentocerâmico.Depoisdaobraprontapercebimaisclaramenteadualidade
devisõesdasfacesinternaeexternadaobranumarevelaçãodointeiro(fig.55).
Comessasreflexões,ampliaramseentãoaquineste capítuloasquatroconstelações
Aurora,Pororoca,MonçõeseSigmaquenãoapenastêmiluminadoofazerpoético
naescuridão,mastrouxeramquestõesgeradasepercebidasnoprocessocriativodas
estrelasobras GrãodeTerras, Protoestrelas, Sítio cósmico e Cacocipó. Assim, o
fazer poético com o procedimento cerâmico foi dividido em quatro momentos para
análise: o trabalho com a terra em Aurora; a dispersãoordenação da criação,
relacionada a sonoridade, em Pororoca; a imaginação, interligada a musicalidade
visualealendasemitossobreaorigemdacerâmica,emMonçõeseaconstruçãodo
pensamento visual em Sigma. Mesmo se distinguindo em partes, são as quatro
constelações componentes de um processo: o fazer poético do barrocozido, que
repercuteemnossasvidaseaprofundanossaexistênciacomforma,someluz.
92
3Umalinhaimaginária
“Seumapessoanãoconseguirimaginarcoisas,nãoasconseguefazer,equalquercoisaquese
imagineéreal.”AlexanderCalder
Umalinhaimagináriacomoasquedefinemconstelaçõespercorreocaminhodaterra
àTerra;tornaseeixodeligaçãoentreamatériaprimordial,omaisíntimoserenosso
planeta, o espaço externo que ocupamos. Da mesma forma, esta linha reconhecese
naimaginaçãocomomotordacriaçãopoéticaecontinuaseupercursoligandomitos
a suas atualizações, visibilidade a sonoridade e ações a pensamentos visuais no
procedimentodobarrocozido.
Refletindo então sobre o que nos diz Alexander Calder, tomo como ponto de
observaçãoataliscadepindobasecacomunsfiozinhosdealgodãoo“insope”que
DonaNitinhamedeuemRioReal
99
eacreditoestardiantedeumpincel.Masnãoé
umpincelqualquer,éamaisprecisaferramentacom quesefazemosgrafismosem
tabatinga, na comunidade de Carro Quebrado, que trazem memórias anteriores à
chegadadohomem português.Comaajudadessepincel(fig.56),devaneiostornam
seosexpressivos“bordados”dalouçadeRioReal.
fig.56.Insope.
Vejonaconfecçãodesteobjetoprimitivoalinhaquetraceipoeticamentetornadareal
como ferramenta facilitadora para a criação e recriação de padrões gráficos
milenares. É a própria imaginação materializada, como eixo que aponta para a
extroversãoeaintroversãoemdireçõesopostas,emalcanceinfinito.
99ConsultarApêndiceBDocumentaçãodapesquisadecampo.
93
3.1Oeixodaimaginação
“Quantomaisamatériaé,emaparência,positivaelida,
maissutilelaboriosoéotrabalhodaimaginação.”Baudelaire
Acreditase que não nada mais positivo e sólido que a terra a argila que se
amacia com água. Para o sonhador que modela o gesto criativo é intenso,
apaixonado.E,comoinovarenvolvedialogarcomoirreal,nummovimentooscilante
queretomaoreal,buscandoseodevirdessaoscilaçãoquedistanciaeune,recorroa
observações de VigaGordilho sobre o Recôncavo Baiano. Ela nos chama a atenção
para a pluralidade além da unidade em cada par de contrários que surgem das
histórias dessa nossa região: “Histórias de grandeza e de miséria, que explicita seu
campo de convergência através de bipolaridades: mentematéria, saciedadefome,
fantasiarealidade.”
100
AovisitarascomunidadesruraisdeproduçãocerâmicanaBahia,essascontradições
também me chamaram a atenção. As peças vermelhoalaranjadas que se instalam
nas feiras com suas cores vibrantes de vida, de sangue e de terra, encerram
histórias de fome e dificuldades. Deime conta de que esses artesãos se alimentam
muito mais de suas fantasias do que de pão e que a imaginação é o eixo que os
mantémdepé.
Então tomo aqui para investigação a estrelaobra O Recôncavo por um fio, 2008
(fig. 57a), que passou a integrar a constelação Aurora por seu tema relacionado ao
fazer cerâmico de nossas origens culturais, desde quando a prática indígena
tupiguaranimisturouseatradiçõeseuropéiasaquiimpostas.
100GORDILHO,Viga.CantosContosContas.Salvador:P55Edições,2004,p.71.
94
fig.57a.ORecôncavoporumfio,2008.
95
ORecôncavoporumfio,quetrazaforçacriativa,aqualporséculosfoiresponsável
por manifestações verdadeiramente expressivas e dignas de sustentar um grupo
coeso,podeservistotambémporumoutropontodevista.Aambigüidadedalíngua
portuguesa nos aponta uma outra versão: o que está por um fio está quase
desaparecendo,morrendo,oquetambéméverdadeeprecisaserrevistosenãose
valoriza,desaparece.
Essas reflexões conceituais somaramse à técnica de bater blocos de terra, como a
descritaparaaconfecçãodeGrãodeTerra,2006(fig.34),nosegundocapítulodessa
dissertação.Mas,comoapesquisacaminhaeainquietaçãopelonovovaiapontando
outros caminhos, comecei a bater os blocos contra superfícies côncavas para criar
formas bojudas além das achatadas. Assim desenvolvi blocos de formas diferentes,
escaveiospordentroeosfureiparaapassagemdocabodeaçoofiodoimaginário
doRecôncavo,ouainda,alinhaquetambémconduzminhapoética.
fig.57b.ORecôncavoporumfio,2008.
96
Nenhumgrafismofoiacrescentado,quisdeixaramatériadialogarcomformas,cores
e um pouco da luz que o estanho pode nos oferecer sugerindo pluralidades,
possibilidades visuaissonoras na linha distendida. À meia altura do cabo de aço,
instalei um exemplar antigo, usado até furar, de uma moringa vinda de
Maragogipinho, como mais um elemento provocador de reflexão, com toda sua
históriaaliconcentrada,aindasinalizandoapossibilidadedemoringasdaprodução
popular conterem e refrescarem a água com que se pode matar a sede na
contemporaneidade.
Integrando,em 2008,aBienaldoRecôncavoemSãoFélix,BA,noCentroCultural
Danneman, O Recôncavo por um fio teve suas extremidades fixadas em pontos
dissimulados (fig. 58): a inferior, dentro do poço cavidade funda, sem luz, para
atingir um lençol aqüífero na praça central do referido centro cultural; a outra
ponta,juntoàestruturaemqueseapóiaotelhadonosegundopiso,pontomaisalto
possível. Assim sendo, a linha de aço e terra percorreu uma trajetória oblíqua em
relaçãoaoquadradodapraça,ligouáguacomar,escurocom luz,eteveocéucomo
fundo(fig.57b),navisãodebaixoparacima.

fig.58.TrajetóriadeORecôncavoporumfionoCentroCulturalDanneman.
97
Maisumavezpodesecontemplarterrae céu,introversãoeextroversãoligadospela
ação do “sonhador que modela”, pois nos explica Bachelard
101
que “animado por
belezaprometidas”avontade,ohomemé“convidadoaagirsobreamatéria”,para
a ação extrovertida o trabalho, que, em contraação, o leva a uma introversão, ao
repouso. “Afinal todas as imagens se desenvolvem entre os dois polos, vivem
dialeticamenteseduçõesdouniversoecertezasdaintimidade”,eleconclui.
E foi com esse movimento então de dentro para fora, de fora para dentro, da terra
para o céu, do céu para a terra, da visibilidade para a sonoridade que nos traz de
volta a visibilidade, com a pesquisa em andamento, que, ao visitar a Exposição
Poética da Percepção, de curadoria de Paulo Herkenhoff, no Museu Oscar Niemeyer
em Curitiba, selecionei a obra “Gambiarra”, 1969 (fig. 59), de Amélia Toledo para
pontuarumareflexãojuntoaobraestrelaORecôncavoporumfio.
fig.59.AméliaToledo.“Gambiarra”,1969,fiodenyloneconchas.
(EXPOSIÇÃOPOÉTICADAPERCEPÇÃO,MuseuOscarNiemeyer,Curitiba,20 08,Foto:LaísAndrade)
101 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.67.
98
Gambiarraérampadeluzeserefletoresnoteatro,élinhadelâmpadasmuitousada
em festas populares aqui na Bahia. De forma então inesperada para mim, a obra
“Gambiarra”,1969,também conhecidapor“Ostrassonoras”ésemelhanteaumvaral
de fio de nylon que tem penduradas as partes abertas das conchas, que ao serem
tocadas produzem um agradável som. Portanto a artista usou a arquitetura das
conchasparaformaruminstrumentomusicalnatural.
OfatodessaobradeAméliaToledoprovocarsimultaneamenteaaudiçãoevisãodo
espectador é um ponto de aproximação com O Recôncavo por um fio. Contudo, a
musicalidade desta última pode ser percebida poeticamente, o que se constitui
então em ponto de distanciamento, embora algumas peças cerâmicas enfiadas ao
cabodeaçocontenhamelementosprovocadoresdesom.Mastambémousopopular
dagambiarraeaproduçãopopulardacerâmicavoltamaseencontrarnomovimento
do eixo da imaginaçã o e a se distanciar nos elementos que a natureza oferece: as
conchaseobarro.Somenteesteúltimopassapeloprocessodemodelagemequeima.
Portanto a ambivalência das imagens poéticas e do processo criativo para gerálas
provocam o movimento do qual estamos falando nesta pesquisa, o movimento que
a imaginação e a vontade reunidas no “onirismo ativo” nos habilita a realizar, a
todosnós,mestresartesãoseartistas,assimacredito.
99
3.2Osmitosameríndios
“DiantedecertaspeçasdacerâmicadaBahia,tãoelegantesdeperfiletãoricasdedecoração,pensase
nossuntuososmodelosmexicanoseperuanos,etemseaimpressãodequeaaltacerâmicadoPacífico
estendeuatéoAtlânticoosderradeirosfilamentosdesuasraízes.”CecíliaMeireles
E foi assim que, pesquisando a cerâmica popular de comunidades rurais baianas,
volteime para os mitos ameríndios que, em diversas versões, nos falam da origem
dacerâmicaedesuaspeculiaridades.
Fuitambémdirecionadaparaaleituradessamitologiaaoverprojetadanaparededo
Forte de Santa Maria do Monte Serrat a estrelaobra Sussurro Real, 2007 (fig. 31).
Fragmentosdeterracozidaemqueimabaixaquedisperseisobreodiscocircularde
acrílico, com o intuito de sugerir a cerâmica de Rio Real fragmentada, partida, em
risco de extinção, espalharamse sob o foco de luz como o delicado bordado em
tabatinga sobre tauá, característico desse local. Relacionei a leitura dessa projeção
comaleituraquesefazdeconstelaçõesnocéu,emmaisummomentodeexpansão
associativa
102
. Entendi que o homem escreve suas histórias e cosmovisões em
imagens poéticas e mitológicas, assim como projeta seus signos no céu. A esse
respeitonosdizAracyLopesdaSilva,que
[...]símbolos,sentimentos,concepçõesematériasseencontramesemesclam
no universo do mito e da cosmologia, permeando vida e pensamento,
sociedadeenatureza,dandosentidoàexperiênciahumananomundo.
103
Então encontrei nos mitos que estreitam terra e céu forças subterrâneas e celestes,
serpentesepássarosasconcepçõesdacerâmica.Essapressupõepassarpeloprocesso
de queima, pela transformação do fogo, com todos os seus riscos, pois a posse do
fogo resultou de combates cósmicos. O oleiro ou oleira, nos diz Claude Lévi
102 SALLES, Cecília Almeida. Redes de criação: construção da obra de arte. São Paulo : Horizonte.
2006,p.122.
103
In:GRUPIONI, LuísDonisete Benzi (Org.). Catálogo Índios no Brasil. Brasília: Ministérioda Educação edo
Desporto,1994,p.76.
100
Strauss
104
,temumpapeldemediadorentreasforçasterrestres ecelestesnãoapenas
namitologiaamericana.
A partir daí, então, nova obra surgiu uma série de quatro módulos, em formato
referenteàsProtoestrelas,sementes secularesdas tradições tupiguarani e européia
que aqui foram hibridizadas. Esses módulos foram cortados em placas de
poliestirenocristal,poisatransparênciasugeree,emcontrapartida,amenizaaforma.
A intenção foi ressaltar e fortalecer os grafismos da tradição cerâmica baiana que
tracei com a solidez dos fragmentos de terra cozida. Assim, esta obra, Cantos do
joãodebarro,2009(fig.60ab),foiinstaladacomoauxíliodefiosdenylonecabode
açoemespaçoaéreodosnichoslateraisdosótãodoPalacetedasArtesRodinBahia.
Com ela projetei no chão do sótão as constelações alusivas aos referidos grafismos
comoauxíliodeprojetoresdeluzquente.Alémdisso,preenchitodooambientecom
as constelaSONS, sons dos grafismos gravados em áudio a partir de uma
manipulaçãodasProtoestrelas.
Seuscantos,portanto,foram sonscerâmicosproduzidosporpercussãoesopro,além
dedesenhospontuadosporfragmentosdeterracozida:aPalmaeaVoluta,(fig.60a)
relacionadosàtradiçãoeuropéia,eoutrosdoisaquechameideTumpaeCaminho
deestrelas,(fig.60b)quefazemmençãoàstradiçõesindígenasbaianas.
Cheguei ao joãodebarro através dos registros de Claude LéviStrauss, que se
referenciaa elecomoopássaroque ensinouohomem aseroleiro.Dessaforma,esta
obraestrelafoiagregarseàconstelaçãoSigmaporsuascaracterísticasdeexpans ãode
conhecimento.Elaéresultadodepesquisafeitaapartirdaprojeçãodosfragmentosdo
Sussurro Real,que também relacionei a pedacinhos de barro que o pássaro prepara,
comsuasalivaenzimasqueligamedãoforçaaobarro,parafazersuacasa.
104 STRAUSS, Claude Lévi. A oleira ciumenta. Trad. José AntônioB.F.Dias. Lisboa : Edições 70,
1987,p.19.
101
fig.60a.CantosdojoãodebarroVoluta(superior)ePalma(inferior),2009.
102
fig.60b.CantosdojoãodebarroCaminhodeestrelas(superior)eTumpa(inferior),2009.
103
AindasegundoLéviStrauss, osmitosameríndiosqueserelacionamcom ofazerda
cerâmicaestabelecemumlaçoentreolariaeciúme
105
.Apassagemquemeinspirouo
Cacocipó é uma história de ciúme entre Sol, Lua e Aôho, que tem como
conseqüênciaofracionadodaargilaportodooplaneta.Depoiseleressaltaqueaave
NoitibóéciumentaequeaaveForneiro,oJoãodebarro,émestreoleiro.
Tudo isso ele conclui através de deduções empíricas interpretações antropo
mórficas de anatomia e hábito s destas aves. E como o Noitibó está, nos mitos,
relacionado à origem da olaria em sentido figurado, Strauss, com suas
observações, inferênciasempíricas,ju lgamentos analíticos e sintéticos,raciocínios
explícitos e implícitos, transforma a presença metafórica em presença de sentido
próprio quando conclui que, desaparecendo fisicam ente o Noitib ó, reconhece no
Forneiroo “Noitibó invertido”
106
. O noitibó então deixa a argila, a matéria prima
da olaria, aos hum anos, que o seu contrário, o joãodebarro, é capaz de
trabalhar.
Aqui também temos os opostos, o noitibó e o joãodebarro, em espelho, como a
extroversão e a introversão, o real e o irreal, o mito e a atualização, tudo em
movimentonoexercíciodaimaginação.
105 STRAUSS, Claude Lévi. A oleira ciumenta. Trad. José AntônioB.F.Dias. Lisboa : Edições 70,
1987,p.36.
106 OshábitosdoForneiroestãoemoposiçãodiametralaosdoNoitibó:onoitibóosseuspios
durante alguns meses do ano, à noite, sobretudo quando lua, enquanto o forneiro é
prodigiosamenteloquaz;onoitibónãoconstróininho,põeosovosdiretamentenosoloousobre
uma pedra, o forneiro, ao contrário, constrói um ninho de barro, notável pelo tamanho e a
execução,sobreumramodeárvore;onoitibónosmitosestáassociadoaociúmeconjugal,acasal
desunido, porém quanto ao forneiro, ma rido e mulher colaboram na construção do ninho.
STRAUSS,ClaudeLévi.Aoleiraciumenta.Trad.JoséAntônioB.F.Dias.Lisboa:Edições70,1987,
p.2064.
104
Com imaginação e estabelecendo também conexões em rede no processo criativo,
CeleidaTostesmontou,emtrêsedições,ainstalação“AldeiaFunariusRufus”,grupo
de casas de joãodebarro, arrumadas em forma de espiral, fazendo referência à
disposição das habitações nas aldeias dos índios Xavantes (fig. 61). A pesquisa da
referida artista envolveu: o estudo químico da liga do barro da casa do pássaro;
a organização do trabalho que macho e fêmea, juntos, realizam para construir sua
moradiae procriare oconfronto entre ”osdois ceramistas: ojoãodebarro comsua
tecnologiagenéticaeelacomsuatecnologiaconquistada”
107
.
fig.61.CeleidaTostes.“AldeiaFunariusRufus”,1983,cerâmica.(ENCICLOPÉDIA,2009)
A reflexão sobre o trabalho do joãodebarro é um ponto de aproximação entre
“AldeiaFunarius Rufus”, 1981, e Cantosdojoãodebarro, 2009. Contudo, meu foco
de atenção recaiu poeticamente para seu canto, o diálogo que macho e fêmea
estabelecemaoconstruirseuninho,alémdeinstalaraobraemespaçoaéreo,comoos
pássarosofazem,empontosmuitoaltosdeárvores(fig.62).
107 Edições da “Aldeia Funarius Rufus: Em 1981, participando do Projeto ArcoÍris, do INAP
FUNARTE, mostra que itinerou por Brasília, Cuiabá, Manaus e ainda outras cidades, com os
trabalhos premiados no IV Salão Nacional de Artes Plásticas; em 1983, foi exposta no Solar
Grandjean de Montigny, Rio de Janeiro, numa versão compacta da exposição coletiva
internacional‘Arquitetura de Terra’, vinda do Centro George Pompidou, na França; e em 1984,
nas montagens da exposição ‘Arquitetura de Terra’, no Museu de Arte Moderna do Rio de
Janeiro(MAM–RJ)edeSãoPaulo(MAM–SP).SILVA,RaquelMartins.OrelicáriodeCeleidaTostes.
RiodeJaneiro:FundaçãoGetúlioVargas,2006,p.4546.
105
fig.62.Casadojoãodebarro,bemnoaltodeumaárvore,numhortoem
LaurodeFreitas,BA.
(Foto:OsvaldoAndrade)
Então, o mito ameríndio sinalizoume buscar conhecer o oleiro que canta ao
renovarse. Com cantos cerâmicos renoveime, ao também contemplar os grafismos
projetados no chão do sótão. los assim foi como ver as estrelas do céu na terra.
E,emdireçãooposta,lossólidosemmatériaterrosasuspensosemespaçoaéreofoi
como ver a Terra no céu, que sintetizo no movimento terraTerra, terra terrestre e
Terraceleste,percepçõesdo“sonhadorquemodelaecontempla”.
106
3.3Atualizações
“Somentequandoasrelaçõessemodificamapontodecriarumabismointransponívelentrea
situaçãoexterioreasformasderepresentaçõesantigaséqueselevantaoproblemageralacercada
cosmovisãodeprincípio:comoasformasderepresentação,quedeveriamsegurarofluxodaenergia
instintiva,devemseorientareseadaptardeformanova.”CarlG.Jung
Asatualizaçõesentãofazemseporinsight?Racionalmenteissonãosedá,éoquenos
explica Jung
108
, pois é justamente o fato do homem moderno se reconhecer
conscientementequeofazsentirseseparadodesuanaturezainstintiva.
Bachelardnos aconselha a ação do“bem sonhar”, “de sonhar permanecendofiel ao
onirismo dos arquétipos enraizados no inconsciente humano,”
109
para melhor
compreendermos o caráter primitivo psiquicamente fundamental da imaginação
criadora, que tem funções diferentes da reprodutora. Segundo ele, cabe àquela, a
criadora,afunçãodoirreal,psiquicamentetãoimportantequantoafunçãodoreal.
Tragoentãoaquiparareflexãouminsighttornadoimagem,umsite,umsítiocósmico,
um espaço alargado por “realismo mágico”, como explica Patrício Vidal Walton
110
.
EsseinsightentãoseconcretizounosótãodoPalacetedas ArtesRodinBahia(fig.63),
pisosuperiorda mansãodafamília deBernardo MartinsCatharino
111
,emSalvador,
108 JUNG, C. G. Presente e Futuro. Trad.Márcia de Cavalcante. 4. ed.Petrópolis:Vozes,1999,p.
3233.(ObrasCompletasdeC.G.Jung,v.X/1.).
109 BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade: ensaio sobre a imaginação das forças.
Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001,p.2.
110VALPARAÍSO,PatrimoniodelaHumanidad.Disponívelem:<http://www.idiomayoleporte.com/
valparaiso.htm>.Acessoem:12jun.2007.Conferiressaabordagemnasp.7576destadissertação.
111EstaresidênciaparticulardoiníciodoséculoXX,1912,projetodeRossiBaptista,arquitetoitaliano
que se radicou na cidade do Salvador foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Artístico e
CulturaldoEstadodaBahiaIPAC.FoiselecionadaparaabrigaroMuseuRodinBahiatambém
pelo fato de guardar uma relativa semelhança com o Hotel Biron, local onde está instalado o
MuseuRodinParis(edificaçãodoséculoXVII).OestiloEcléticodocasarãobaianoguardafortes
referênciasarquitetônicasfrancesaseoprojetoarquitetônicoparaaadaptaçãodopalaceteàssuas
novas funções como museu foi feito pelos arquitetos Marcelo Ferraz e Francisco Fannucci,
discípulos de Lina Bo Bardi. JORNAL DA MÍDIA. Palacete histórico pronto para receber o
Museu Rodin Bahia. Disponível em: <http://www.jornaldamidia.com.br/noticias/2006/12/18/
Bahia/Palacete_historico_pronto_para_re.shtml>.Acessoem:16mar.2009.
107
enquanto abrigou a Exposição terraTerra, em abril de 2009. Este espaço pode ser
percebido como um lugar tomado por uma atmosfera cósmica, com alternância de
espaços vazios em penumbra e corpos cerâmicos semiiluminados pendentes de
estruturasaéreas.Integraramestaexposiçãoasseguintesobras:Granulações,Proto
estrelas,Cantosdojoãodebarro,CacocipóeSítiocósmico.
fig.63.Sótãosinalizadonacoramarela,navistalateraldaMansãoMartinsCatarino,interligadaàSala
de Arte Contemporânea, complexo onde funciona o Palacete das Artes Rodin Bahia.
(PROJETO
INSTITUCIONAL,2007)
Com essa atmosferacósmica,observei que aobra produzida em 2007, Sítiocósmico,
tensionadoentredoispilareslogoàentrada,àesquerda,comsuabagagemconceitua l
eformalreferênciaàformadoprimeiromapeamentodaViaLácteasintetizavaem
sua ambivalência este sítio no sótão, este lugar sustentado pela imaginação, em cujo
eixo movimentamse fatos e sonhos, sons e impressões visuais, mitos e suas
atualizações, ões extrovertidas e percepções introvertidas, terra e Terra. Neste sítio
pensoquehabitaohomemqueinteragecomaterra:o“sonhadorquemodela”.
Dessa forma, ainda com Bachelard como norteador do fundamento teórico da
pesquisa,tragodesuaobraAPoéticadoEspaçoumaalusãosuaaErichNeumann:
[...] que todo ser intensamente terrestre e a casa é um ser intensamente
terrestre registra apesar disso os apelos de um mundo aéreo, de um
mundoceleste.Acasabemenraizadagostadeterumaramificaçãosensível
ao vento, um sótão que tem barulhos de folhagem... A casa conquista sua
parceladecéu.Temtodoocéucomoterraço.
112
112 BACHELARD,Gaston.A PoéticadoEspaço.Trad.AntôniodePáduaDanesi.SãoPaulo:Martins
Fontes,1993,p.6768.
108
Sob esta citação, explico a escolha do espaço expositivo para a apresentação do
resultadoplásticodestapesquisaumlugaralto,embuscadomundoceleste,para,
portanto, em site specific, instaurar um sítio que é cósmico. Esse sótão de espaço
amplo cerca de 180m² tem revestimento em madeira e telhado mansarda
abrigando nichos. Em seus pilares de sustentação as obras foram fixadas e, na área
central do sótão, às vigas, foi amarrada uma estrutura espiralada (fig. 64) de onde
penderam grãos cerâmicos em cabos de aço, as Granulações, 2009 (fig. 65), uma
instalação que ocupou o volume de 78m³. Esta estrelaobra veio ampliar a
diagramaçãodaconstelaçãoMonções,queexprimedireçãodaminhapoéticaedesta
pesquisa, orientada por movimento oscilante de ventos. Com esta obra, que esteve
localizada no centro da exposição terraTerra (fig. 66), deslocouse o mundo aéreo
para mais perto de nós, como uma impressão captada poeticamente por lente
fotográficazoom.
fig.64.Estruturaespiraladaembarrachatadeaço1½ʺx3/16ʺpresaàsvigas(destaquecomlinha
branca)efixaçõesdoscabosdeCacocipóempilar.
109
fig.65.Granulações,2009.
110
fig.66.Expografia: a‐Granulações
b‐Sítiocósmico
c‐Protoestrelas
d‐Cacocipó
e‐Cantosdojoãodebarro
As Granulações, então envolvendo o observador por inteiro, que podia caminhar
entre seus grãos, seguindo o percurso dos dois braços da grande espiral pensada a
partir de imagens captadas pelo telescópio espacial Hubble, pode nos fazer refletir
sobre um movimento ainda maior e sempre crescente, além dos que venho falando
nesta dissertação: o do pesado para o lev e . Pois esses grãos foram modelados em
paperclay(fig.67),massacerâmicaconstituí dadeargilaepapel,emformasdegesso
que tiveram como matrizes torrões de barro como são extraídos dos barreiros. Na
queima, os fragmentos de papel desaparecem, obtendose assim peças porosas e
consequentementemaisleves.Alémdisso, adistribuição daspeçasnoespaçofoide
grande abrangência, mas, em contrapartida, os fios com os grãos cerâmicos foram
dispostosnumritmoquemostravaleveza.
111
fig. 67. Recorte de imagens do processo criativo na elaboração da obra Granulações, 2009.
Consultar Apêndice C — Procedimentos cerâmicos.
112
Paraconstruiresta obra,fizcercadecentoevintetorrõesdeterra,emoitotamanhos
diferentes, que foram enfiados e fixados em cabos de aço fino em alturas diversas,
estudadasvirtualmentenossoftwarescorelDRAWeAutoCAD.Esseprojetoespacial
levou em conta as dimensões do espaço expositivo largura, profundidade e
direitodo sótão eo fluxode circulaçãodo observador.Asmedidas dasalturas de
cada fio de grãos foram reajustadas à medida que o AutoCAD nos permitia
visualizar o projeto de disposição da obra de diversos pontos de vista (fig. 68). No
entanto,avisãocompletadaobraprontaaconteceunamontagemdaexposição.
fig. 68. Vistas do projeto em AutoCAD.
No CorelDRAW foram definidas as alturas dos grãos em cada cabo de aço,
obedecendo a um eixo imaginário transversal à linha de terra (fig. 69), assim, um
braçosubiaemdireçãoaotelhadoenquantoooutroseaproximavadochão(fig.70).
Esse eixo imaginário é recorrente, está sempre presente na ação comandada pelo
“onirismoativodosonhadorquemodela”dequenosfalaBachelard.
113
fig.69.Eixoimagináriotransversalàlinhadeterra,projetoemCorelDRAWparaobraGranulações.
fig. 70. Braços opostos da espiral de Granulações.
Refletindo sobre as palavras granulação e grão, quanto a partículas que formam
massas e texturas
113
, podese relacionar também as mesmas com as dimensões de
pequeno e grande. Granulações e grãos existem em dimensões diversificadas numa
escala que se estende do micro ao macro no Universo. Assim, tanto em conceito
como em cor e solução formal, esta obra, Granulações, do centro do espaço
expositivo, interligouse às outras obras, pontuando no sítio cósmico a presença de
uma grande espiral galáctica que dialogava com fragmentos, cacos, sementes
estrelas,cipós,constelações,luzes,penumbras,sombrasesons,dasoutrasobras.
113 “Granulação: aspecto da textura de uma rocha quanto ao tamanho de seus componentes.
Grão: S.m. quantidade mínima de qualquer coisa; semente de cereais e algumas outras plantas.
Adj.Apocopada de grande”.FERREIRA,AurélioBuarquede Holanda.NovoDicionário daLíngua
Portuguesa.RiodeJaneiro:NovaFronteira,1975,p.698.
114
fig. 71. Obras: Sítio cósmico, Proto-estrelas, Caco-cipó e Cantos do joão-de-barro vistas através das Granulações.
115
Buscando ainda o diálogo com obra de outro artista, aponto “Ventania”, 2006
(fig.72),deDelmaGodoy,pesquisadorademateriaisterrososecerâmicos.Elaassim
defineseutrabalho
114
:
“Nomeutrabalho,associoamaterialidadecomosomdosilênciodaforma.
Procuro, através dela, o ponto exato de um início, totalmente atemporal.
Acredito,queacriaçãodonossoUniverso,partiudestesilêncio.Visualizoo
caminho do vento esculpindo, silenciosamente, através dos milênios,
paisagensemundos.Tentometransportarpara esse caminho.Voucriando
erosõessuperpostas,queseencaixamcomoumabrincadeiralúdica,ondeo
olharencontraestetrabalhomudo.Inerteeaomesmotempoesvoaçante.ʺ
fig.72.Delma Godoy.“Ventania”,200 6.Terrarefratária,40cmde
diâmetro.
(DELMAGODOY,2009)
VejoaproximaçãoconceitualentreestaobraeGranulações,assimcomocomaidéia
da constelação Monções. “Ventania” referese a ambivalências cósmicas, a um
trabalhoqueaomesmotempoéinerteeesvoaçante.Assim,possodizerqueeleestá
deacordocomogestodo“sonhadorquemodelacomonirismoativo”.Contudo,esta
sua obra, dentre muitas outras, foi montada sobre uma base, não em espaço aéreo,
nãoenvolvendotambémsonoridadenemluminosidadecomoasobrasinstaladasna
exposiçãoterraTerra.
114DELMA GODOY. Disponível em: <http://www.delmagodoy.com/POR/index.html>. Acesso em:
21jan.2009.
116
Então, quanto ao uso de uma iluminação que contribuísse para uma impressão
cósmica no sótão, relato que esta foi montada considerandose a temperatura de
cor
115
daslâmpadas utilizadas,aemissão deluzesde coresfriasequentes.Sobre as
Granulações foram instalados projetores de luz fria, trabalhandose na escala do
brancoaoazulvioletaalémdedoisfocosdeluznegra,queemiteraiosultravioletae
permite que o corpo iluminado irradie, devolva maior quantidade de luz,
aproximando os grãos de estrelas e outros corpos siderais que observamos no céu.
Sobre as outras obras, os projetores emitiram luz quente, luz em tons de amarelo a
alaranjado,aproximandoessasobrasdaterra,dochãoedoprocedimentocerâmico.
Refletindoentão sobre a ação dohomem coma terra neste sítio, atravésdetécnicas
milenares que constituem o procedimento cerâmico poético, teci o seguinte
comentário: não seria este um jeito particular e coletivo de encontrarse consigo
mesmo?Porqueo homempreparasuamassaideal comágua eoutroscomponentes
mineraise/ouorgânicos,e,comessamatériadaterra,queémaciaeresistente,sonha
eseexpressa, forma,ouveseussons,criaoutrosemovesedaãodocorpopara
sensaçõesepercepçõesdesuamente.
Assim,tornandopossívelo “realismomágico”,o sítiocósmico emoutro lugar além
deValparaísonoChile,estãoàdisposiçãoostorrõesdeterraanosprometerbelezas
em deveneios, e a linha o cipó, o eixo da imaginação, que sustenta esses
movimentos do “sonhador que modela e contempla” em busca de conhecimento e
115“Quandofalamosemluzquenteoufria,nãoestamosnosreferindoaocalorfísicodalâmpada,e
simaotomdecorqueelaaoambiente.Aoamanhecer,osoltemumtommaisavermelhado,
maisquente;àmedidaqueodiavaipassando,sualuzvaificandomaisamarelaatésetornarbem
branca;depoisvoltaaficaralaranjadanofinaldodia.Observasequeestefenômenomilhares
deanosvemregulandoavidadanossaespécie.Naslâmpadas,estatemperaturadecorémedida
emgrausKelvin(K),eéestagrandezaqueexpressaaaparênciadecordeumaluz.Quantomaior
forestenúmero,ouseja,quantomaisaltaforatemperaturadecor,maisfria,ma is branca,indo
na direção do azul violeta é a cor da luz emitida, quanto menor, mais quente, mais amarela.”
LuminotécaTemperaturadecorAKARI.Disponívelem:<http://www.akarilampadas.com.br/
informacoes/temperaturadecor.php>.Acessoem:16jun.2009.
117
atualização de formas de representação na adaptação do homem à vida. Esse
devaneio imbricado com a ação, “onirismo ativo”, pode ser praticado em particular
ouem grupoe garante acapacidade daterra comomaterial /linguagemexpressiva
no espaço da arte contemporânea e ainda como elo para um possível encontro do
homemconsigomesmo,ecomseuentorno,aterraeaTerra.
118
Reflexõesdocontemplador
No decorrer desta pesquisa práticoteórica, ao produzir as obrasestrelas que
formaram as constelações Pororoca, Sigma, Aurora e Monções, e gravar em áudio
outrasconstelaSONS, refletindo sobretodo oprocesso criativo,oraassumiaopapel
demodelador,ora ocupavao lugardocontemplador. Essaalternânciadepapéisou
até,àsvezes,acúmulodelesfoiquepossibilitouapercepçãodalinhaimagináriaque
percorreu o caminho da terra à Terra. Penso então, como Gaston Bachelard, que o
sonhador que modela segue melhor os interesses do devaneio íntimo porque
apreende seus sonhos, modelaos, materializaos com a ação do “onirismo ativo”.
Mas, ao partilhar com o observador o resultado de seu movimento, reúne em si
mesmoascondiçõesdemodeladorecontemplador.
Assim sendo, é como contemplador que agora pontuo resultados decorrentes dos
nexosestabelecidosnarededoprocessocriativo,movimentoqueenvolveu:pesquisa
matérica em meio a impermanência de imagens observadas no procedimento
cerâmico modelagem, secagem e queima; sonorização de objetos; leituras de
bibliografia interdisciplinar; reflexões e montagens de exposições. Com essas ações
procurei, através de uma poética com o barro cozido, expressar minha visão de
mundo, atenta a outras visões de artistas, mestresartesãos e astrônomos, cada um
em busca de suas imagens de forma mais nítida, operando focos para conquistar
novosconhecimentos.
Fui percebendo durante o percurso da pesquisa que o barro cozido responde às
motivaçõesdohomememinterferircomaterra,porsuascaracterísticasdemacieze
resistência,quepermiteousoeexperimentaçãodetécnicaseformasinfinitas.Além
disso, o processo de recolher, estruturar e cozinhar o barro pode ainda revelar
imagenseemitir sonse tambémcaminharcom aimaginaçãohumana, sustentando
119
se em espaço aéreo. Permite a atualização de mitos ameríndios sobre sua própria
origem e pode dialogar com materiais acrílico, aço, estanho, areia, madeira, etc
transitando no hibridismo contemporâneo. Atende a montagens mais complexas,
envolvendo som e luz, para traduzir nosso momento globalizado, embora
fragmentado e aparentemente caótico. Isto tudo porque, com a terra, podese colar
sensações, percepções e idéias. Portanto, o procedimento cerâmico responde não
às necessidades da vida contemporânea, mas também às necessidades da arte
contemporânea.
Acredito então que o movimento com o barro cozido pode continuar a pe rcorrer a
trajetóriadohomemcomavida,ligando:açõesdocorpoparaamente;doparticular
parao coletivo; do antigo paraonovo; do sonho para o fato; davisibilidadepara o
som; do opaco para o transparente, no diálogo com o acrílico; do terrestre para o
aéreo,no diálogocom o cabodeaço; dopesadopara oleve eda terrapara aTerra.
Todos os movimentos contrários também são possíveis e estão na ambivalência das
imagens geradas com o procedimento cerâmico. Dessa forma o exercício da
contemplação deve ser também dinâmico, permitindose a ativação da memória, o
contágiodasemoções,aaberturaparadúvidasenovasinvestigações.
120
121
122
123
124
Referências
ADAIR, Maria. (Coord.) ArteArte Salvador 450 anos. Segundo da série Cadernos de
Arte.Salvador:AtelierMariaAdair,1998.
AKARI Lâmpadas Especiais. Luminotéca. Temperatura de cor. Disponível em:
<http://www.akarilampadas.com.br/informacoes/temperaturadecor.php>.
Acessoem:16jun.2009.
ARGAN, Giulio Carlo. Arte moderna: Do iluminismo aos movimentos
contemporâneos.SãoPaulo:CompanhiadasLetras,1992.
ART AWAKENING Online Gallery for the Visual and Performing Arts. Susan
Rawcliffe. Disponível em: <http://www.artawakening.c om/soundworks/price.html>.
Acessoem:7abr.2008.
BAALTESHUVA,Jacob.AlexanderCalder.Köln:Taschen,1998.
BACHELARD, Gaston. A Poética do Espaço. Trad. Antônio de Pádua Danesi. São
Paulo:MartinsFontes,1993.
BACHELARD, Gaston. A Psicanálise do Fogo. Trad. Paulo Neves. 3. ed. São Paulo :
MartinsFontes,2008.
BACHELARD, Gaston. A Terra e os Devaneios da Vontade:ensaio sobre a imaginação
dasforças.Trad.MariaErmantinaGalvão.2.ed.SãoPaulo:MartinsFontes,2001.
BACHELARD,Gaston.ATerraeosDevaneiosdoRepouso:ensaiosobreasimagensda
intimidade.Trad.PauloNeves.SãoPaulo:MartinsFontes,2003.
BARBOSA, Elyana. Gaston Bachelard: o arauto da pósmodernidade. Salvador :
EDUFBA,1996.
BORDADOS em tauá: cerâmica de Rio Real. Texto de Letícia Vianna e Raul Lody.
Pesquisa de Letícia Vianna, Maria José Chaves Ramos, Raul Lody e Ricardo Gomes
Lima.RiodeJaneiro:Funarte,CNFCP,2001.(SaladoArtistaPopular;94)
BRITES & TESSLER. O meio como ponto zero: Metodologia da Pesquisa em Artes
Plásticas.PortoAlegre:UFRGS,2002.
125
CARMELA GROSS. Disponível em: <http://www.carmelagross.com.br>. Acesso em:
21jan.2009.
CASTELÃOLAWLESS, Teresa. Dualidades e Singularidades da Prática Científica e da
ImaginaçãoPoética.IIColóquioBachelard:CiênciaeArte.Palestrainaugural.Salvador:
UFBA,mar. 2008.
CAUQUELIN, Anne. Arte Contemporânea: uma introdução. Trad. Rejane Janowitzer.
SãoPaulo:MartinsFontes,2005.
CHITI,JorgeFernández. Cursode EsculturaCeramica yMural enlarealidadartisticade
hoy.BuenosAires:Condorhuasi,1989.
COSMOS Carl Sagan. Produção da Super Interessante. São Paulo : Abril Cultural,
2005.5dvds.(Ediçãocomemorativados25anosdoprogramatelevisivoCosmos.)
COUVE,Eduardo.ValparaísoAscensores.PuntaArenas:FantásticoSurBirding,2003.
CULTURAVISUAL.RevistadoMestradoemArtesVisuaisdaEscoladeBelasArtes.
Salvador:EDUFBA,v.1,n.7,2005.
DELERUE, Alberto. Rumo às estrelas: Guia prático para observação do céu. Rio de
Janeiro:JorgeZahar,2004.
DELMA GODOY. Disponível em: <http://www.delmagodoy.com>. Acesso em: 21
jan.2009.
DEMASI,Domenico.CriatividadeeGruposCriativos.RiodeJaneiro:Sextante,2003.
DUMARESQ Galeria de Arte. Christina Machado. Disponível em: <http://
www.dumaresq.com.br>.Acessoem:21mai.2009.
ECKENBERGER Catálogo de exposição no Palacete das Artes Rodin Bahia.
CuradoriaDimitriGanzelevitch.Obras19652008.Salvador:P55,2008.
EHRENZWEIG,Anton.Aordemocultadaarte.Trad.LuísCorção.2.ed.RiodeJaneiro:
Zahar,1977.
ENCICLOPÉDIA da Música Brasileira: erudita, folclórica, popular. 2. ed. São Paulo: Art,
1998.
126
ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural Artes Visuais. Disponível em: <http://www.itau
cultural.org.br>.Acessoem:21maio2009.
ENANPAP, 15, 2006, Salvador. Anais Eletrônicos ... Salvador: ANPAP, 2006.
Disponível em: <http://www.unifacs.br/anpap/autores/181.pdf>. Acesso em: 8 out.
2006.
ENCONTRO DA ANPAP, 15, 2006, Salvador. Anais ... v. 1. Salvador : UNIFACS,
2007.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio
deJaneiro:NovaFronteira,1975.
FERRIS, Timothy. O Despertar na Via Láctea: uma história da astronomia. Trad.
WaltensirDutra.RiodeJaneiro:Campus,1990.
FRIGOLA,MariaDolorsRosi.CerâmicaArtística.Trad.RitaSilva.Lisboa:Estampa,
2006.
GABBAI,Miriam(org.).Cerâmica:artedaterra.SãoPaulo:Callis,1987.
GAUTHIER, Serge; PRÉAUD, Tamara. La Céramique: art du XX siècle. Fribourg :
OfficeduLivre,1982.
GEORGIA KYRIAKAKIS. Disponível em: <http://www.georgiakyriakakis.com.br>.
Acessoem:21jan.2009.
GORDILHO,Viga.CantosContosContas.Salvador:P55,2004.
GOUVÊA, Álvaro de Pinheiro. Sol da Terra: o uso do barro em psicoterapia. São
Paulo:Summus,1989.(NovasBuscasemPsicoterapia,v.38).
GRIMAL,Pierre.DicionáriodaMitologiaGregaeRomana.Trad.VictorLabouille.4.ed.
RiodeJaneiro:BertrandBrasil,2000.
GRUPIONI,LuísDoniseteBenzi(Org.).CatálogoÍndiosnoBrasil.Brasília:Ministério
daEducaçãoedoDesporto,1994.
HAWKING,Stephen.OsGêniosdaCiência:sobreosombrosdegigantes.Trad.Marco
Mariconi.RiodeJaneiro:Elsevier,2005.
127
HUBBLE 15 anos de descobertas. Produção Scientific American Brasil. São Paulo :
ESA/Duetto.1dvd.
INSTITUTO DE ARTESANATO VISCONDE DE MAUÁ. Cerâmica Popularis.
Salvador,1994.
JORNAL DA MÍDIA. Palacete histórico pronto para receber o Museu Rodin Bahia.
Disponível em: <http://www.jornaldamidia.com.br/noticias/2006/12/18/Bahia/Palace
te_historico_pronto_para_re.shtml>.Acessoem:16mar.2009.
JUNG,CarlG.(Org.).OHomemeseusSímbolos.Trad.MariaLúciaPinho.5.ed.Riode
Janeiro:NovaFronteira,[196?].
JUNG, C. G. Presente e Futuro. Trad. Márcia de Cavalcante. 4. ed. Petrópolis :
Vozes,1999.(ObrasCompletasdeC.G.Jung,v.X/1.).
LECHTE, John. Cinquenta Pensadores Contemporâneos Essenciais do Estrutu
ralismoàPósmodernidade.Trad.FábioFernandes.RiodeJaneiro:Difel,2003.
LIMA,NairBarbosa(Org.).BrazilianartVI.SãoPaulo:JC,2005.
LISPECTOR,Clarice.Comonasceramasestrelas.RiodeJaneiro:Rocco,1999.
MATTOS,SôniaMissagia.Artefatosdegêneronaartedobarro.Vitória:Edufes,2001.
NET PROCESSO arte contemporânea. Disponível em: <http://www.oktiva.net/
oktiva.net/1321/nota/54863>.Acessoem:3jun.2009.
NEWSPAPER ARCHIVE. Space shuttle Columbia disintegrates. Sábado, 1 fev. 2003.
Disponível em: <http://www.newspaperarchive.com/Articles/SpaceshuttleColu mbia
disintegrates.aspx>.Acessoem:7abr.2008.
NINO CARUSO. Sculptures. Disponível em: <http://www.ninocaruso.it/Pg4
sculptures.htm>.Acessoem:21mai.2009.
NORMA GRINBERG. Disponível em: <http://www.normagrinberg.com.br>. Acesso
em:10set.2008.
OLHARES Fotografia online. Disponível em: <http://br.olhares.com/obra_do_escul
tor_pernambucano_francisco_brennand_foto2624473.html>.Acessoem:21mai.2009.
128
OROZCO, Gabriel. Disponível em: <http://www.pbs.org/art21/artists/orozco/index.
html#>.Acessoem:15jan.2009.
OSTROWER,Fayga.Asensibilidadedointelecto.9.ed.RiodeJaneiro:Elsevier,1998.
OSTROWER,Fayga.Criatividadeeprocessosdecriação.16.ed.Petrópolis:Vozes,2002.
PARTSCH,Suzanna.Klee.Trad.CasadasLínguas.Colónia:Taschen,1993.
PEREIRA,CarlosJosédaCosta.ACerâmicapopulardaBahia.Salvador:Universidade
daBahia,1957.
PLASTICAS SONORAS Walter Smetak. Catálogo de exposição organizada pela
FundaçãoGregóriodeMatos.Salvador,1988.
POÉTICADAPERCEPÇÃOQuestõesdafenomenologianaartebrasileira.Catálogo
de exposição itinerante São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba. Curadoria Paulo
Herkenhoff.SãoPaulo:Neoband,2007‐2008.
PORTAL do astrônomo. SIMÕES, Carlota. A Música das Esferas. Disponível em:
<http://www.portaldoastronomo.org>.Acessoem:18jun.2007.
PROJETO INSTITUCIONAL. Museu Rodin Bahia CORTE. Disponível em: <http://
www.vitruvius.com.br/institucional/inst149/inst149.asp>.Acessoem:10nov.2007.
REVISTABRASILEIRADEENSINODEFÍSICA.Disponívelem:<http://www.scielo.
br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S180611172008000200005&lng=pt&nrm=iso>.
Acessoem:05nov.2008.
REVISTACIDADENOVA,n.8.SãoPaulo:CidadeNovaEditora,1991.
SÁ, Rosilda. Amplexos. Folder de exposição no Centro Cultural de São Francisco.
CuradoriaMariadoCarmoNino.JoãoPessoa:JB,2005.
SALLES, Cecília Almeida. Redes de criação: construção da obra de arte. São Paulo :
Horizonte.2006.
SANTAELLA, Lucia; NÖTH, Winfried. Imagem: cognição, semiótica, mídia. São
Paulo:Iluminuras,2006.
SCIENTIFIC AMERICAN BRASIL. Etnoastronomia. v. 14. São Paulo : Ediouro sob
licençadaScientificAmerican,Inc.,2006.(EdiçãoEspecial).
129
SILVA,RaquelMartins.OrelicáriodeCeleidaTostes.RiodeJaneiro:FundaçãoGetúlio
Vargas,2006.
SOARES,Márcio.Cálculoemumavariávelcomplexa.RiodeJaneiro:IMPA,2007.
STRAUSS, Claude Lévi. A oleira ciumenta. Trad. José Antônio B. F. Dias. Lisboa :
Edições70,1987.
THE1945ProposalbyArthurC.ClarkeforGeostationarySatelliteCommunications.
Disponível em: <http://lakdiva.org/clarke/1945ww/>. Acesso em : 26 de janeiro de
2009.
VALPARAÍSO, Patrimonio de la Humanidad. Disponível em: <http://www.idioma
yoleporte.com/valparaiso.htm>.Acessoem:12jun.2007.
VIDAL, Lux (Org.). Grafismo indígena: estudos de antropologia estética. São Paulo :
EDUSP,1992.
WALTHER,IngoF.(Org.).ArtedoséculoXX.Trad.IdaBoavida.v.2.Köln:Taschen,
2005.
130
APÊNDICEADadosbiográficos
ARAÚJO, Eriel é artista visual, professor mestre da Escola de Belas Artes (EBA)
daUniversidadeFederaldaBahia(UFBA),doutorandonoInstitutodeArtesda
UniversidadeFederaldoRioGrandedoSul. SuapesquisademestradoMutação:
uma possibilidade do devir instaurado na matéria e suas reflexões acerca de
manipulações matéricas diversas, dentre elas a argila e a cerâmica e suas
possíveis poéticas, pretenderam provocar no fruidor de suas obras memórias
perdidasnotempo.
BACHELARD, Gaston (18841962) epistemólogo francês, filósofo da ciência e
teóricodaimaginação.Professordehistóriae filosofiadaciêncianaSorbonneaté
1954, membro da Academia das Ciências Morais e Políticas da França, foi
laureado com o Grande Prêmio Nacional de Letras. Sua filosofia pode ser
considerada como uma crítica ao positivismo, materialismo, realismo e
formalismo. Fez reflexões profundas acerca das duas vias percorridas pelo
homem,a onírica e a intelectual, arte e ciência. Defendeu entreoutras a idéia de
querazãoeimaginaçãofazempartedeumpensamentodinâmico.Ambas,razãoe
imaginação podem exercer uma função de criação. Em sua obra A Terra e os
DevaneiosdaVontade,1948,Bachelardanalisaformasdaimaginação,emparticular
as imagens relacionadas aos temas da matéria, movimento, força e sonho, bem
comoasimagensassociadasaofogo,água,areterra.Paraeleaimaginaçãoémais
fundamental que a imagempercepção, por seu caráter criativo. Considera a
imaginação como motor do conhecimento, com sua função verdadeira de líder
psíquica. Segundo Elyana Barbosa, autora da obra GASTON BACHELARD: o
arautodapósmodernidade,Bachelardinvestigouincessantementecomoseinstaura
onovo.Tambémporissofoiconsideradopormuitosofilósofodaruptura.
131
CLARKE, Arthur Charles (19172008) inventor britânico e escritor de ficção
científicapreviu,em1945,osatélitegeoestacionáriocomofuturaferramentapara
desenvolver as telecomunicações. Essa matéria foi publicada na revista Wireless
Worldemoutubrodaqueleano,comotítulo:CanRocketStationsGive Worldwide
RadioCoverage?”Vinteanosdepois,osatéliteIntelsatI,instaladonumaórbitaque
passouaserconhecidacomoórbitaClarke,deuinícioatransmissõesdeprograma
detelevisãoporsatélite ecomtodoodesenvolvimentotecnológicoqueseseguiu
chegouse a internet, à rede de comunicações verbal, visual, sonora que nos
interligaatodosnaTerra.
CAUQUELIN, Anne doutora e professora emérita de filosofia da Université de
Picardie, na França. É autora de ensaios sobre arte e filosofia, dos quais se
destacamTeoriasdaArte,AristóteleseArteContemporânea:umaintrodução.
GODOY,Delmaartistaplásticaparanaense.Temexploradoacerâmicapormaisde
20 anos numa pesquisa por materiais novos e formas cósmicas. Trabalha com
diversostiposdemateriaiscerâmicos,encontradosemdiversoslugares doBrasil
etestadosemváriastemperaturas.Osresultadosalcançadossãoterrasrefratárias
de cores e texturas novas. Mais recentemente, tem também intensivamente
pintadoetrabalhadoemesculturasdeferro.
GRINBERG,NormadoutoraemArtespelaUniversidadedeSãoPaulo(USP),1999,
Professora do Departamento de Artes Plásticas da Escola de Comunicações e
Artes (ECA). Desenvolve pesquisas nas áreas de artes plásticas, escultura
cerâmica,instalaçãoe design.NormaGrinberg,emmeioaoutrasobras,emuma
pesquisaqueduroualgunsanos,partiudeumúnicomóduloe,comele,elaborou
movimentos de multiplicação, decomposição e recomposição, criando em
contextos diversos esculturas, painéis e instalações, que sugerem caminhos
ondulantes, vôos, formas animais e humanas. Em 2006, impulsionouos numa
132
montagem vertical em “Babel”. Em 2008, desenvolveu novo trabalho, em seu
estilolúdico,limpoesintético,“BrazilianPantanal”,durantesuaestadanaChina.
OROZCO, Gabriel mexicano, cidadão do mundo, morando e trabalhando em
diversos lugares, artista visual de muitas linguagens. Trabalha com escultura,
desenho, fotografia, video, intalações, etc.Interage com o espectador deslocando
coisasdocotidianooureportandoseàsatividades,aotrabalhodohomem.
OSTROWER, Fayga (19202001) polonesa, radicada no Rio de Janeiro, gravadora,
pintora,teóricadaarte,professora.Suaproduçãoinicialemxilogravuraapresenta
temática predominantemente social. Depois desenvolveu uma vasta obra
geométrica abstrata. Escreveu várias obras sobre sua experiência como arte
educadoraesobreoprocessocriativo.
RAWCLIFFE, Susan compositora, instrumentista e artista americana, criadora de
instrumentos musicais de sopro: flautas, ocarinas, apitos, trombetas, didjeridu e
esculturassonorasemcerâmica.Pesquisadoradesonsprimevos,doperíodopré
hispânicona Américanasculturas Olmeca,Maia,Zapoteca, Azteca,eoutras. Ela
produz cópias de antigos e contemporâneos instrumentos cerâmicos de sopro e
criaoutros,osquaisexecutacommaestria.Temfeitoapresentações eworkshops
internacionalmenteeescritoartigosdesuaspesquisas.
SAGAN,Carl(19341996) Cientistaeastrônomoamericanoassimcomocríticodas
pseudociências. Conhecido por seus esforços pela popularização da ciência.
Legounos um formidável acervo de obras, dentre as quais figuram clássicos
como:Cosmos,quefoitransformadoemumasériedetelevisãoacompanhadapor
maisdemeio bilhãode pessoasemtodo omundo,e pelaqual recebeuoprêmio
EmmyeOsDragõesdoÉden,peloqualrecebeuoprêmioPulitzerdeLiteratura.
133
SALLES, Cecília Almeida doutora em Lingüística Aplicada e Estudos de Línguas
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professora titular do
Programa de PósGraduação em Comunicação e Semiótica da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo e coordenadora do Centro de Estudos de
Crítica Genética. Atua na área de Comunicação em: comunicação, processos de
criação,semiótica,críticagenéticaeartes.
SMETAK, Walter (1913, ZuriqueSuiça 1984, SalvadorBA), instrumentista,
professor de violoncelo e de improvisação na UFBA e compositor. Veio para
Bahia em 1957. Produziu mais de cem instrumentos musicais feitos a partir de
coisas simples: cabaças, madeira, cordas, tubos de PVC, latas, ferro velho e
qualquer outro material que estivesse a seu alcance. Em 1966, participou da I
BienalNacionaldeArtesPlásticasemSalvador,comsuaspeçasplásticassonoras.
Autordoslivros:RetornoaoFuturo(1982)eSimbologiadosInstrumentos(2001).
Deixou os discos: “Walter Smetak”, Philips, produzido por Caetano Veloso e
Roberto Santana (1973); e“Interregno”, patrocínio da Fundação Cultural do
EstadodaBahia(1980).
STRAUSS,ClaudeLéviumdosgrandespensadoresdoséculoXX,completou100
anosem2008.Etnólogoefilósofofrancês,seusestudosforamfundamentaispara
o desenvolvimento da antropologia. O estudioso jamais aceitou a visão histórica
da civilização ocidental como privilegiada e única. Sua crença de que as
características humanas são as mesmas em toda parte surgiu nas incontáveis
viagensquefezaoBrasilenasvisitasatribosindígenasdasAméricasdoSuledo
Norte. As contribuições mais decisivas do trabalho de LéviStrauss podem ser
resumidas em três grandes te mas: a teoria das estruturas elementares do
parentesco, os processos mentais do conhecimento humano e a estrutura dos
mitos. Publicou A Oleira Ciumenta, em 1985, obra em que analisa mitos
americanos,inclusiveosrelativosàorigemdacerâmica.
134
TAVARES,AnaMariadoutoraemartespelaUniversidadedeSãoPaulo,professora
da Escola de Comunicação e Artes dessa Universidade, a artista e pesquisadora
atua no circuito da arte brasileira e internacional, desde os anos 80. Busca
compreender sob a ótica da fenomenologia a experiência do homem
contemporâneo.
TOLEDO, Amélia é artista visual de uma vasta obra com diversos materiais,
desde colagens datadas de 1958, passand o por jóias, objetos, escultu ras e
pinturas das décadas seguintes, até as obras mais recentes feitas com rochas e
formaç õe s cristalinas.Tambémpro fe s s o ra em div ers asFaculdades em SãoPaulo
enoRiodeJaneiro.
TOSTES,Celeida(19291995)artistacariocaquesemdúvidaalgumaprovocouuma
revolução na cerâmica brasileira, tanto em seu trabalho individual, abordando
novos temas do universo feminino, como na ação pedagógica, no Parque Lage e
naUniversidadeFederaldoRiodeJaneiro.Alémdisso,desenvolveuumtrabalho
de produção cerâmica com a comunidade do Morro do Chapéu Mangueira,
utilizando então a arte como instrumento social. Esse grupo de homens e
mulheres passou a participar de seu trabalho na realização de obras de grande
porte.
XAVIER, Márcia graduada pela Fundação Álvares Penteado, leciona no Instituto
Tomie Ohtake. Participou de bienais, salões e exposições no Brasil e no
estrangeiroerecebeuváriosprêmios.
135
APÊNDICEBDocumentaçãodapesquisadecampo
A pesquisa de campo de produções populares em comunidades rurais na Bahia foi
realizada em Maragogipinho, vila do Município de Aratuípe, às margens do Rio
Jaguaripe, no Recôncavo Baiano, em 2002, e na cidade de Rio Real, à margem
esquerda do rio Itapicuru, a nordeste do Estado da Bahia, onde o Rio Real faz a
divisacomoestadodeSergipe,em2004(fig.73)
116
.
fig.73.Localizaçãodascidadesvisitadas.

116Fotosdesteapêndice:LaísAndrade.
13
6
6
Fui
apr
a
dire
ç
ede
nos
d
feit
a
gra
n
com um
a
zível,àb
e
ç
ãoao“P
o
ondepar
t
d
oislados
a
s com gr
a
n
decomu
n
grupo d
e
e
iradorio
.
o
rto”(fig.
7
t
iamossa
v
docamin
h
a
des de b
a
n
idadepro
d
e
ceramis
t
.
Atravess
a
7
4),onde
d
v
eiroseca
h
o,apres
e
a
mbu e c
o
d
utorade
t
as e alu
n
a
ndoapr
a
d
escarrega
m
noascom
e
nçadeol
a
o
bertas co
m
“louçade
b
n
as do at
a
çadaIgr
e
m
lenhae
aproduç
ã
a
rias(fig.7
5
m
palha
d
b
arro”.
elier a
M
e
jinha,des
b
arro,qu
e
ã
odacom
u
5
)numad
d
e coqueir
o
M
aragogipi
n
cemosem
e
vemdos
u
nidade
117
.
isposição
l
o
e telhas
n
ho, loca
l
frentee
m
arredores
,
Observei
,
l
abiríntica
,
. Era um
a
l
m
,
,
,
a
Pud
e
ho
m
ped
r
mai
s
cili
n

117
E
fig.7
4
fig.7
6
e
mosaco
m
m
ens e m
u
r
egulhose
s
magra.
C
n
drosque
v

E
ntão,em
4
.“Porto”,
R
6
.Amassad
o
m
panhart
o
u
lheres: o
amassav
a
C
om a m
a
v
ãoparao
 
2002,apro
d
R
ioJaguarib
e
o
r.
o
doopro
c
amassad
o
a
umenor
m
a
ssa pr
o
torno.

d
uçãoeraes
c
e
.

c
essodap
r
o
r (fig. 7
6
m
ebloco
d
o
nta, o e
m

c
oadaemca
m
fig
fig
r
odução,
q
6
) sobre
u
d
emassa,
m
m
polador
(
m
inhões.
.75.Olaria.
.77.Empol
a
q
uetemta
r
u
ma base
m
isturad
e
(
fig. 77) f
a
a
dor.
r
efasdifer
de made
i
e
argilam
a
a
zia as pe
l
e
ntespar
a
i
ra catav
a
a
isgorda
e
l
as, largo
s
a
a
e
s
13
7
7
Alg
u
prat
o
mes
m
estr
u
ama
ou
p
u
nstornei
r
o
s, fruteir
m
os, era
m
u
turadas,
c
relo
118
,qu
e
p
lástico,u
m
r
osmodel
a
as, morin
g
m
peduai
s
c
omeçava
e
ficalara
n
m
aatualiz
a
a
vampeç
a
g
as, etc (
f
s
acio
n
o trabalh
o
n
jaforted
e
a
ção(fig.8
a
sdiversas
f
ig. 78).
O
n
ados co
m
o
das mu
l
e
poisdaq
u
0).
:grandes
p
O
s tornos,
m
os pés
l
heres. As
u
eima,ef
a
p
otes,por
r
ou rodas,
(fig. 79).
brunideir
a
ziamob
r
r
ões,bilha
montado
s
Estando
as passav
a
r
unimento
s,panelas
,
s
por ele
s
as peça
s
a
m o tau
á
comseix
o
,
s
s
á
o
Dep
com
flor
e

118
M
a
119
M
q
fig.7
8
çand
o
fig.
8
ois disso,
talisca d
e
e
s,volutas
,

M
assalíquid
a
a
indacruas,
o
M
assalíquid
q
ueengobe.
T
8
.SrGalego
o
alevantar
u
8
1.D.Genári

aplicava
m
e
palha d
e
,
eespirais
 
a
de barro r
i
o
mesmoqu
e
adebarro
b
T
abatingata
come
u
mpote.
ariscandoa

m
os dese
n
e
coqueir
o
commui
t

i
coem óxid
o
e
engo be,co
n
b
ranco, com
mbémépal
a
fig.79.
T
palma.
n
hos em t
a
o
e pêlo
d
t
afluidez
e

o
deferroa
m
n
tudo,tauáé
aqualsepi
n
a
vradeorig
e
T
ornopedua
l
f
e

a
batinga
119
d
e gato, t
r
e
domínio
t
m
arelo,com
a
palavrade
o
n
tasobre pe
e
mindígena
,
l
.
f
ig.82.Mori
n
e
sperandoa
. Com a
a
r
açavam r
a
t
écnico(fi
g
fig.80.Bru
n
a
qual sepi
n
o
rigemindíg
e
ças cerâmic
a
,
usadanaz
o
n
gasempro
queima.
a
juda de
p
a
pidamen
t
g
s.81e82)
n
ideiras.
p
incel feit
o
t
e palmas
,
.
n
tasobrepeç
e
na,usadan
a
a
saindacru
a
o
narural.
cessodesec
a
o
,
a
gem
ascerâmica
s
a
zonarural.
s
a
s,o mesm
o
o
13
8
8
Ain
d
gol
g
chu
m
cost
u
len
h
que
i
d
a como
a
g
a era apli
m
boe ág
u
u
ma com
e
h
a, no esti
l
i
madores,
q
a
cabament
o
cada com
u
a.É muit
o
e
r aliment
o
l
o “forno
q
ueopera
v
o
para as
p
pincel, u
m
o
tóxico e
n
o
s prepar
a
de capela
v
amosfo
r
p
anelas r
a
m
tipo de
n
ocivota
n
a
dos ness
a
”, servia
m
r
nos(figs.
8
a
sas destin
vidrado
c
n
topara q
u
a
s panelas
m
à comu
n
8
4e85).
adas às
m
c
ru, feito
c
u
emo apl
i
(fig. 83).
O
n
idade e
e
m
oquecas
d
c
om barro
,
i
cacomo
p
O
s grande
e
ram os h
d
a Bahia,
a
,
óxido d
e
p
araque
m
s fornos
à
o
mens, o
s
a
e
m
à
s
Ant
e
em
s
e d
e
vin
d
tem
J
o
Mar
Ros
a
a tr
a
arte
s
sua
l
fig.
8
vitri
f
e
sdeira
M
s
uabarrac
a
e
outros a
r
d
odeet
e
sido hom
o
e Maria
agogipinh
a
lindaMo
t
a
dição da
s
ãosjoven
s
l
inguage
m
8
3.Panelasp
r
f
icadascom
g
M
aragogi
p
a
naFeira
r
tesãos da
e
raulade
enageado
(fig. 87),
q
o, além d
o
t
ta,suade
c
expressã
o
s
,fazendo
m
deorige
m
r
ontas
g
olga.

p
inho,
j
áh
a
deSãoJo
a
comunid
a
cerâmica
c
por suas
c
q
ue pa
s
o
s azulejo
s
c
oradoraf
o
de sua
c
umnovo
t
m
.
fi
g
c
o
a
viaconh
e
a
quim,em
a
de. Na b
a
c
omomes
c
riações:
o
s
saram p
a
s
em cerâ
m
avorita(fi
g
c
omunida
d
t
rabalho,
m
g
.84.Forno
d
o
munidade.
 
d
a
f
a
f
ig.85.Mori
n
a
queima.
n
gaspronta
s
s
,após
e
cidooM
e
Salvador,
a
rraca ta
m
tre.Hoje,j
o
boibilha
a
ra o do
m
m
ica pint
a
g
.88).Me
s
d
e. em
m
assemn
e
e
streartes
ã
ondesão
m
bém se
p
áoctogen
á
e a mori
n
m
ínio colet
i
a
dos com
t
s
treVitori
n
2002, visi
t
e
nhumco
m
ã
oVitorin
o
vendidas
s
p
odia com
p
á
rio,Mest
r
n
gamulh
e
i
vo da Ce
t
auá e tab
a
n
oinovou
t
ei outras
m
prometi
m
o
Moreira
,
s
uaspeça
s
p
rar barr
o
r
eVitorin
o
e
r (fig. 86)
,
râmica d
e
a
tinga po
r
emantev
e
olarias d
e
m
entoco
m
,
s
o
o
,
e
r
e
e
m
13
9
9
Ent
ã
Ent
ã
indí
g
atin
g
eur
o
pon
t
torn
des
d
lá.
E
port
Visi
t
Rio
refe
r
Niti
n

120
P
121
E
S
s
e
S
fig.
8
mor
i
ã
o, em
g
ena, em
g
ir 800°
C
,
o
peus. Os
t
ilhados i
n
ou “uma
d
eosécul
o
E
letambé
m
uguesa.
t
ei Rio Re
a
Real
121
. F
u
r
ido proje
t
n
ha,Áure
a

P
EREIRA,C
a
E
sseprojeto
f
S
olidária,co
m
s
egundoae
n
e
m parceria
S
ecretariad
e
8
6.Boibilha
e
i
ngamulher
.
Maragogi
p
peças tor
n
,
em forn
o
motivos
n
dígenas.
S
indústria
o
XVIII,co
m
m
nosdiz
q
_
a
l assesso
r
u
i à comu
n
t
o. co
n
a
,SilaeM
a
 
a
rlosJoséd
a
f
oidesenvo
l
m
oobjetiv
o
n
tãopreside
n
com o Ce
n
e
Patrimônio
,
e

.

p
inho te
m
n
eadas po
r
o
s coberto
s
florais e
S
egundo
C
de louça
m
origem
n
q
ueoscax
_
________
_
r
ada por
M
n
idade de
n
heci as s
e
a
riadaGr

a
Costa.ACe
r
l
vidopelo P
r
o
de“revital
i
n
tedoCons
e
n
tro Nacion
a
,
Museuse
A
fig.8
7
João,
m
se o us
o
r
homens
s
, melhori
a
arabesco
s
C
arlos
J
os
é
de barro
n
otrabal
h
ixismin
i
_
________
_
M
ilena Ma
c
Carro Qu
e
guintes l
o
aça.Logo
r
âmicapopul
a
r
ogramaAr
t
i
zarsaberes
e
lho,RuthC
a
a
l de Folclo
r
A
rtesPlástic
a
7
.Produção
d
emprocess
o
o
da taba
t
oleiros, s
u
a
s mui
t
s
ibéricos
é
da Cost
a
assim o
h
oindígen
a
i
aturasde
_
________
_
c
edo, inte
g
ebrado, q
u
o
uceiras:
M
àentrada
d
a
rdaBahia.
p
t
esanatoSol
i
efazeresa
m
a
rdoso.OP
r
r
e e Cultur
a
a
sdoMinist
é
d
opadrão
o
desecage
m

m
.
fig.88
Hotel
RioV
e
.Azulejosn
o
CatarinaPa
r
e
rmelho,Sal
v
o
Cafédo
r
aguassú,
v
ador.
t
inga sobr
e
u
bmetidas
t
os anos i
m
mistura
m
a
Pereira
12
0
rganizada
a
muit
o
louçagra
n
e
o tauá
a queima
m
plement
a
m
se aos
r
0
, Marago
g
pelos po
o
tempoex
n
desão
tradiçã
o
que dev
e
a
das pelo
s
ecorrente
s
g
ipinho s
e
rtugueses
,
e
rcidopo
r
deorige
m
o
e
s
s
e
,
r
m
_
______
g
rante do
P
u
e estava
s
M
aria do
C
d
acomun
i
P
rojeto C
e
sendo ass
i
C
armo, L
i
i
dadeenc
o
e
râmica d
e
i
stida pel
o
i
vramento
,
o
ntreium
a
e
o
,
a
p
.57e77.
i
dário,do C
o
m
eaçadosde
r
ogramaArt
e
a
Popular/F
u
é
riodaCult
u
o
nselhoda
C
seperdere
m
e
sanatoSoli
d
u
narte, com
u
ra,Govern
o
C
omunidad
e
m
notempo
d
árioopero
u
recursos d
a
o
Federal.
e
u
a
140
Igrejinhadecoradaporelascomgrafismosdatradiçãolocal,emtavermelhorico
emóxidodeferrovermelhosobreparedecaiada(fig.89).

fig.89.Igrejinhalocal. fig.90.Silaesuamãe,MariadaGraça.
Todas,comexceçãodeMariadaGraça(fig.90)quenãotrabalhavamais,estavam
morandocomsuasfamíliasemcasasnovas,limpas,arejadas,juntoàsquaistambém
haviam sido construídas suas oficinas (figs. 91 e 92) onde podiam trabalhar, em
melhores condições, dentro de um terreno amplo onde cada qual tinha seu forno à
lenha,beneficiamentodoreferidoprojetodoGovernoFederal.

fig.91.Livramentoemsuaoficina. fig.92.Aureaemsuaoficina.
em Carro Quebrado, as louceiras produziam potes, potes de três bojos,
porrões, moringas, moringas em form a de pitanga e de galinha, mealheiros,
“puxandoàmão”,comatécnicadoacord elamento,sentadasaochão(figs.93,94e
95).Diziam:“Poteepurrãosefaznochão”.Íamsobrepondoosrolosdemassa,
feitacomobarroquetraziam daLagoadoSalgado,eíamapertandoealisandode
formamuitoperfeita.
14
1
1
Em
cab
a
e u
m
esta
v
obr
u
attal
e
apli
c
A a
r
cim
a
com
nov
e
ver
m
fig.
9
faze
n
fig.9
6
suas ofici
n
a
çaque
m
m
a vasilh
a
v
aestrutu
r
u
nimento
e
a compta,
c
arosgraf
i
r
rumação
a
não que
b
telhas o
u
e
a doze
h
m
elho int
e
9
3.DoCarm
o
n
doumpote
6
.Tauá.

n
as, cada
m
noquint
a
a
com ág
u
r
ada,apli
c
comase
m
com um
i
smos,ou
o
das peças
b
rasse as
d
u
cacos de
h
oras, ma
e
nso, mui
t
o
.

uma me
a
l,eafac
a
u
a para o
r
c
amotau
á
m
entede
m
fragment
o
srendilh
a

no forno
d
e baixo.
O
louça p
s não se
a
t
o bonita
s
figs.94e9
5
bojoscom
Graça.At
u
mostrou
s
a
rústicad
e
r
eajuste d
a
á
(fig.96).
Q
m
ucanãeu
o de pan
o
a
doscom
t

precisava
O
forno c
i
edaços de
a
tingia m
a
s
, tinham
5
.D.Nitinh
a
decoraçãoe
m
u
almente
p
fig.97.P
a
pindoba
v
s
uas ferra
m
e
feira,par
a
a
umidad
e
Q
uandoh
a
savamoi
n
o
ou algo
t
abatinga
(
ser cuida
d
i
rcular ab
e
peças qu
e
a
is que 5
0
pouca re
s
a
eavarieda
d
m
relevo,pa
d
p
roduzidop
o
a
êta(a),sem
e
v
erde(c)ei
n
a
c

d
edemorin
g
d
rãocriado
p
o
rNitinha.
g
asepoted
e
p
orD.Mari
a
e
três
a
da
m
entas: a
a
ajudare
m
e
da peça.
a
viaseca
d
n
sope,tali
s
dão enrol
(
fig.97).
“paêta”,
p
m
afazero
Depois
q
d
oumpou
s
cadepin
ado na p
o
p
edaço d
e
largo
b
oj
o
q
ue a peç
a
co,fazia
m
dobaseca
,
o
nta, par
a
e
o
a
m
,
a
b
d
d
e
ntedemuc
u
n
sope(d).
u
(b),
d
osa, par
a
e
rto (fig. 9
8
e
bradas.
A
0
C. As
s
istência
a
a
que o p
e
8
) era ent
ã
A
queima
d
peças qu
e
a
impact
o
e
so das d
e
ã
o cobert
o
d
urava d
e
e
eram d
e
o
. Quand
o
e
o
e
e
o
14
2
2
que
b
que
b
pri
m
aco
r
sob
r
b
ravam, v
m
itivo, dir
e
r
delament
o
r
etauá;ea
iase que
e
tamente
o
; feita po
queimaa
a queima
relaciona
d
r mulher
e
céuabert
o
era insu
f
d
o à tradi
ç
e
s ao chã
o
o
.
f
iciente. T
o
ç
ão indíg
e
o
; a decor
a
o
do o pr
o
e
na: a téc
n
a
ção pont
i
o
cediment
o
n
ica de p
r
i
lhada em
o
era
b
e
m
r
odução
tabating
a
m
a
Mas
eur
o
com
u
com
99),
b
us
c
(fig.
pag
o
Inst
i
Qu
a
part
i
Pop
u
cola
b
Nac
i
Mu
n

122
A
123
T
p
fig.9
haviata
m
o
péia, que
u
nidade,
ercializaç
ã
e também
c
avamno
v
100).Esta
o
não co
m
i
tutodeA
r
a
ndo estiv
e
i
ciparda
e
u
lar, no
M
b
oraçãod
o
i
onal de
n
icipalde
R

A
oshomens
T
ratase de
u
p
olíticapar
a
8.Fornode
D
m
bémapre
també
m
que vinh
ã
odas peç
a
apresent
a
v
ospadrõe
s
cerâmica
d
m
pensava
o
r
tesanato
V
e
lá, algu
m
e
xposição
B
M
useu d
e
o
Conselh
o
Folclore
e
R
ioReale
 
cabiaat
a
u
ma autarq
u
a
osetorarte
s
D
oCarmo.

sençadef
l
m
se misc
i
a se ma
n
a
s,conser
v
a
va renov
a
s
vazados
d
ificilmen
t
o
esforço
e
V
isconded
e
m
as delas
B
ordados
e
Folclore
o
daCom
u
e
Cultura
oInstitut
o

a
refadeextr
a
u
ia da Secre
t
s
analnaBa
h
fi
g
tr
a
l
oresera
m
i
genou ao
nt
endo a
v
avaastra
d
a
ção com
a
einversão
t
eeraven
d
e
investim
e
e
Mauá
123
,
ainda re
c
emTauá:
Edson
C
u
nidadeS
o
Popular/
C
o
Mauáde
a
irobarro.
t
aria do Tr
a
h
ia.
g
.99.Produç
a
dicional.
m
agens,ris
c
fazer dos
duras p
e
d
içõespas
a
produçã
o
dascores
:
d
idanasfe
i
e
nto. Era
e
deSalvad
o
c
ordavam
cerâmica
d
C
arneiro,
n
o
lidáriaap
o
C
NFCP,
d
Salvador
B
a
balho e
ã
ãomais

fig.10
0
0
.Novospa
d
d
rões.
c
adasoue
m
indígena
s
e
nas, dad
a
sadasde
m
o
de Do C
a
:
cordop
o
i
rasdoint
e
e
ntão esco
a
o
r,Bahia.
m
relevo
s
. A prod
u
a
a dific
u
m
ãeparaf
i
a
rmo e A
u
o
texcord
o
e
rior,por
q
a
da com
a
influênci
a
u
ção dess
a
u
ldade d
e
i
lha
122
(fig
.
u
rinha qu
e
o
grafism
o
q
ueovalo
r
a
ajuda d
o
a
a
e
.
e
o
r
o
a ida ao
R
d
eRioRe
a
n
o Rio d
e
o
iadapelo
d
a FUN
A
B
A,emm
a
R
io de Ja
n
a
l,naSala
e
Janeiro
R
SEBRAE,
A
RTE, da
a
io/junho
d
n
eiro par
a
doArtist
a
R
J, com
a
doCentr
o
Prefeitur
a
d
e2001.
a
a
a
o
a
ã
o Social; é
o
o
órgão qu
e
e
coordena
a
a
143
144
145
146
147
ANEXOACatálogoda ExposiçãoGerminandoEstrelas
148
ANEXOB CatálogodaExposiçãoterraTerra
149
150
151
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo