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tos femininos pode-se notar o fascínio que mulheres-boneca representavam como
seres artificiais, sem personalidade. A tecnologia funciona nesse caso como um meio
de criar figuras femininas que se pode controlar. No caso das vamps mecânicas, o
medo do descontrole da máquina se confundia com o medo da sexualidade feminina
numa determinada época.
Alguns autores identificam uma certa tipologia presente em representações
femininas, admitindo variações de acordo com a cultura e a época na qual estão inse-
ridas. Randazzo (p.83) acredita que existiram papéis ou um “sentido do feminino”
que agruparia determinadas características próprias do comportamento e da repre-
sentação de mulheres. Isto é por ele nomeado de mitologias culturais. Segundo sua
abordagem, elas poderiam se dividir em mitologias femininas e mitologias masculi-
nas. Haveria, então, imagens universais em conformidade com uma essência femini-
na, que seria ao mesmo tempo norteadora da identidade feminina como também a
própria manifestação dessa natureza. Este modo de analisar as representações femi-
ninas baseou-se nos estudos do psicanalista Carl Jung sobre o gênero, que se calca
em tipos, os quais ele denomina arquétipos, divididos em masculinos e femininos
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.
Segundo Randazzo, os arquétipos femininos foram utilizados na publicidade com a
tentativa de criar identificação com o público-consumidor que se desejava atingir. Produtos
que estariam associados a valores como o lar e a família estariam utilizando o arquétipo da
“grande mãe”, por exemplo; ao contrário, produtos através dos quais a beleza e a sensuali-
dade feminina era o valor a ser atingido, utilizariam o arquétipo da “mulher fatal”, no qual a
mulher é tida como objeto sexual.
Esse tipo de abordagem, no entanto, parece se mostrar insuficiente para definir iden-
tidades de gênero, por se ancorar em mitos de caráter essencialista, a partir dos quais acredi-
ta-se encontrar regras únicas definidoras do feminino. As identidades de gênero parecem
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Não nos interessa aqui pensar a validade da idéia de arquétipos como características ontológicas dos
gêneros, tal como se apresenta na concepção original de Jung, mas, como referências culturais que são
−
através de diferentes modos e meios
−
preservadas, transmitidas e, de certa maneira, cristalizadas em
diferentes momentos, em diferentes culturas, acabando por dar o entendimento do que são o “masculino”
e o “feminino” nos contextos em questão. A sugestão é de que por trás da idéia de arquétipo encontram-
se, de forma mais ou menos condensada, as fantasias, os desejos, as apreensões, o imaginário mesmo, de
um determinado grupo social acerca dos gêneros, os quais, não raramente, são tomados como “naturezas”
masculinas e femininas. Em síntese, ao se recorrer à idéia de arquétipos aqui, o que se busca é capturar o
imaginário decantado de uma época acerca de suas crenças em relação aos gêneros, tomando tais crenças
como produções históricas e, portanto, sempre cambiantes, apesar de soarem para aqueles que nelas crê-
em como permanentes e imutáveis.