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PATRÍCIAMARIASEGERDECAMARGO
ACONSTRUÇÃODAVERIDICÇÃODODISCURSO
DASPETIÇÕESINICIAIS:
MecanismosSemióticoseEstratégiasRetóricasparaaPersuasão.
PORTOALEGRE
2006
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UNIVERSIDADEFEDERALDORIOGRANDEDOSUL
INSTITUTODELETRAS
PROGRAMADEPÓS-GRADUAÇÃOEMLETRAS
ÁREA:ESTUDOSDALINGUAGEM
ESPECIALIDADE:TEORIASDOTEXTOEDODISCURSO
ACONSTRUÇÃODAVERIDICÇÃODODISCURSO
DASPETIÇÕESINICIAIS:
MecanismosSemióticoseEstratégiasRetóricasparaaPersuasão.
PATRÍCIAMARIASEGERDECAMARGO
ORIENTADORA:PROFª.DRª.MARIADAGRAÇAKRIEGER
DissertaçãodeMestradoemTeoriasdoTextoe
doDiscurso,apresentadacomorequisitoparcial
para a obtenção do título de Mestre pelo
Programa de Pós-Graduação em Letras da
UniversidadeFederaldoRioGrandedoSul.
PORTOALEGRE
2006
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ÀsminhasfilhasDaniela
eGabrieladedicomeuesforço.
CommeuspaisAlmiroeZita
repartominhaconquista.
AGRADECIMENTOS
ÀProfessoraDra.MariadaGraçaKrieger,porqueme
ensinouque“sabertemquesercomsabor”etevea
compreensãoeapaciêncianecessáriasparaqueomeu
processodeaprendizagemserealizasse.
AosmeusamigosdaUERGS,especialmente,aoProfessor
Daudt,àBeatriz,àFabiane,aoCelmareaoRicardo,que,
comtalentosdiferentes,meapoiaramefizerampartedessa
trajetória.
ÀMarleneCruz,psicólogaeamiga,queacompanhameus
processosdetransformação.
“Ao escrevermos como evitar que
escrevamos sobre aquilo que não
sabemos ou que sabemos mal? É
necessariamente neste ponto que
imaginamos ter algo a dizer. Só
escrevemos na extremidade de
nosso próprio saber e nossa
ignorânciaequetransformaumno
outro.”
(GillesDeleuze)
RESUMO
Este trabalho inscreve-se nos estudos relacionados às teorias do texto e do discurso e tem
comofocodeinvestigaçãoalinguagemjurídicaaplicadanoprocessojudicial.Porisso,dentre
asdiversaspeçasqueconformamumprocessojudicialoptou-sepeloestudodapetiçãoinicial,
textoqueoinicia.Oestudoutilizacomosuportesteóricosasemióticadeorigemfrancesa,
fundadaporAlrgidasJulienGreimas,ealgunselementosdaretóricaclássicadeAristóteles
propostos na Arte Retórica, e elementos da nova retórica nascida dos estudos de Chaïm
Perelman&LucieOlbrechts-TytecanoTratadodaArgumentação.Àluzdessespressupostos
teóricos,procura-sedescreveraestruturadapetiçãoinicial,considerandoaspectosdosplanos
narrativoediscursivo,esteúltimodirecionadoàidentificaçãodoselementosqueconstroema
veridicçãododiscurso,istoé,asmarcasdeixadasnosenunciadosresponsáveispelacriaçãode
efeitosde sentido verdade. Paraatingir esse objetivotraça-se um percurso de trabalho que
inicia com a descrição da teoria semiótica francesa considerando o seu lugar de inserção
dentreasteoriasdotextoedodiscursoeoseumodeloteórico-metodológico.Após,segue-se
a descrição, em linhas gerais, da retórica clássica aristotélica bem como dos estudos de
Perelman&TytecanotextoTratadodeArgumentação–anovaretórica.Sãoapresentados,
ainda, estudos semióticos do Direito, com o fim de evidenciar a aplicação da semiótica
francesa na área jurídica. Na seqüência explica-se o que é o processo judicial, a fim de
contextualizarneleapetiçãoinicial.Opróximopassoconsisteemapresentarapetiçãoinicial
sob seus aspectos legais, representação gráfica e organização narrativa. A partir do plano
narrativo verifica-se que o discurso das petições iniciais tem como finalidade essencial
orientar o julgamento do juiz, razão porque são textos que apresentam um caráter
essencialmentemanipulatório.Porisso,aúltimaetapadotrabalhoconsisteemdescreveros
recursos utilizados pelo enunciador, no plano discursivo, para a construção da verdade do
discurso das petições. Nesse sentido, constata-se que a verdade corresponde à força de
persuasão,configuradaapartirdeprojeçõesenunciativasnosenunciadosenoencadeamento
deesquemasargumentativos.
Palavras-chave: linguagem jurídica – petições iniciais – semiótica – efeitos de sentido –
veridicção-retórica-persuasão-argumentação.
ABSTRACT
This paper is related to text and discourse theories and it is focused on juridical language
appliedinjudicialtrial.Thatiswhy,amongseveralpartsthatformajudicialtrial,thestudyof
initialpetitionwaschosenanditintroducesthispaper.Thisstudyhasastheoreticalsupport
theFrenchSemioticsfoundedbyAlrgidasJulienGreimas,alongwithsomeelementsfromthe
Aristotle’s classical rhetoric, proposed in the Art of Rhetoric, and from the new rhetoric
originated from Chaïm Perelman & Lucie Olbrechts-Tyteca’s studies in the Treaty of the
Argumentation. In the light of these theoretical presuppositions, the structure of the initial
petition is intendedto bedescribed, consideringnarrative and discursive aspects,the latter
focusedontheidentificationofelementsthatbuildthediscourseveridiction,thatis,themarks
leftinutterancesresponsibleforthecreationofmeaningandtrutheffects.Inordertoachieve
that aim, a work course that starts with the description of the French Semiotics Theoryis
delineated, considering its insertion place among text and discourse theories and its
theoretical-methodologicalmodel.Afterwards,thereisadescriptionofAristotle’sclassical
rhetoricaswellasofPerelman&Tyteca’sstudiesinthetextTreatyoftheArgumentation–
thenewrhetoric.SemioticstudiesofLawarepresentedaimingatevidencingtheapplication
ofFrenchSemioticsinthejuridicalfield.Then,thereisanexplanationofwhatajudicialtrial
is,aimingatcontextualizingtheinitialpetitioninit.Thenextsectionconsistsofpresenting
theinitialpetitionunderitslegalaspects,graphicrepresentationandnarrativeorganization.
Fromthenarrativeplan,itischeckedthattheessentialgoalofthediscourseofinitialpetitions
is to guide the magistrate’s judgment; that is why they are texts with an essentially
manipulating aspect. For this reason, the final part of this paper consists of describing the
resources used by the speaker, in the discursive plan, in order to build the truth of the
petition’sdiscourse.Inthissense,itisfoundthatthetruthcorrespondstopersuasionstrength,
madeupfromutteranceprojectionsinutterancesandinargumentativeschemeenjambment.
Keywords:juridicallanguage–initialpetitions–Semiotics–meaningeffects–veridiction–
rhetoric–persuasion–argumentation.
LISTADEILUSTRAÇÕES
Figura1.....................................................................................................................................20
Figura2.....................................................................................................................................31
Figura3.....................................................................................................................................31
Figura4.....................................................................................................................................32
Figura5.....................................................................................................................................53
Figura6.....................................................................................................................................65
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................................12
1ATEORIASEMIÓTICAFRANCESA ................................................................................15
1.1Históricoepressupostosgerais...........................................................................................15
1.2Asemióticafrancesacomoteoriadotexto.........................................................................17
1.2.1Onívelfundamental.........................................................................................................19
1.2.2Onívelnarrativo ..............................................................................................................22
1.2.3Oníveldiscursivo ............................................................................................................25
2ARETÓRICACLÁSSICAEANOVARETÓRICA ..........................................................34
2.1AretóricadeAristóteles .....................................................................................................34
2.1.1AestruturadaracionalidaderetóricaemAristóteles.......................................................36
2.1.1.1Dostrêsgênerosdaretórica..........................................................................................37
2.1.1.2Doslugarescomunseespecíficosdaargumentação ....................................................37
2.1.1.3Dasprovasretóricas......................................................................................................38
2.2AnovaretóricadePerelman&Tyteca...............................................................................42
2.2.1AestruturadaracionalidadedanovaretóricaemPerelman............................................42
2.2.1.1Astécnicasargumentativasdeassociação....................................................................45
3ODIREITOÀLUZDASEMIÓTICA .................................................................................48
3.1Apetiçãoinicialeoprocessojudicial ................................................................................58
3.2Aorganizaçãonarrativadaspetiçõesiniciais.....................................................................65
4ACONSTRUÇÃODAVERIDICÇÃODODISCURSODASPETIÇÕESINICIAIS:OS
MECANISMOSSEMIÓTICOSEASESTRATÉGIASRETÓRICASPARAA
PERSUASÃO ...........................................................................................................................71
4.1Procedimentosmetodológicos ............................................................................................71
4.2Amanifestaçãodiscursivadasestruturasnarrativas...........................................................73
4.3AsprojeçõesdaenunciaçãoeasprovasafetivasdeAristóteles.........................................78
4.4Asligaçõesargumentativasnosfundamentosjurídicos .....................................................82
4.5Síntese.................................................................................................................................91
CONCLUSÃO..........................................................................................................................94
REFERÊNCIAS........................................................................................................................99
ANEXOA–AçãodeDespejo ...............................................................................................104
ANEXOB–AçãoDeclaratória..............................................................................................107
ANEXOC–AçãodeExoneraçãodeAlimentos ...................................................................115
ANEXOD–AçãodeCobrançaJudicial................................................................................128
ANEXOE–AçãoMonitória..................................................................................................133
ANEXOF–AçãodeRevisãoContratual ..............................................................................138
ANEXOG–AçãoDeclaratóriaCumuladacomPedidodeAnulaçãodeLançamentos........157
ANEXOH–AçãodeRestabelecimentodeBenefícioPrevidenciário ..................................168
ANEXOI–AçãodeIndenizaçãoporDanosMoraisnoJuizadoEspecial............................184
ANEXOJ–AçãodeIndenizaçãoporDanosMorais ............................................................193
INTRODUÇÃO
Este trabalho se interessa em estudar a linguagem do Direito. Especificamente, a
linguagemdoDireitopraticadanodia-a-dianostribunaisefóruns.Amotivaçãodoestudoéo
gostopeloexercíciodaadvocacia,profissãocujaferramentadiáriaeconstanteéalinguagem
argumentativa.
J. M. Carvalho Santos (apud Silveira, 1999, p. 27) emociona quando diz que a
missãodoadvogadoédasmaisnobres.Exigecompetência,dignidade,honradezebravura
moraldapartedequemsepropõeadesempenhá-laÀsvezestocaàsraiasdosublimeessa
missão,quandovisaàdefesadosfracos,quandoéexercidagratuitamenteemproldodireito
de pessoas miseráveis, quando traduz a irrestrita dedicação à causa da liberdade e da
democracia.Comoquerqueseja,ésemprenobreaprofissão,cujoexercíciooutracoisanão
visasenãofazertriunfarodireito,averdadeeajustiça.
Sob tal motivação, propõe-se aqui o estudo da linguagem jurídica aplicada ao
processojudicial,especificamenteaodiscursodaspetiçõesiniciais.Justifica-sedesdelogoa
escolhadessapeçaparafinsdeestudo,porquealémdeseroatoqueinícioaoprocesso
judicial,éoatodoqualderivamtodososoutrospraticadosaolongodoprocesso,eaqueleque
determina o conteúdo da sentença judicial. Por tais razões, Edmundo Dantes Nascimento
atribuiimportânciaabsolutaàpetiçãoinicial.
Oestudo aqui propostotem o desejoao menos decontribuir paraa expansão dos
estudos ligados ao discurso argumentativo jurídico, já que os estudos de linguagem nessa
área,alémdenãoseremnumerosos,restringem-seaosmanuaisqueseocupamemensinaros
requisitos legaisde formadas peças processuais, conhecimento, semdúvida, indispensável
àqueles que praticam ou estudam o Direito, mas que nada trabalham sobre o discurso,
elementoque,efetivamente, cumpreafunção persuasivaquea linguagemdo Direitopede.
Além do que, nas disciplinas de Língua Portuguesa, lecionadas nos cursos de Direito,
13
geralmente o estudo restringe-se às regras gramaticais, como forma de oferecer melhor
embasamentoparaoalunodeDireitoaprimorarasuaredação.Noquetocaàscaracterísticas
particulares das peças processuais, normalmente, o trabalho fica restrito ao conteúdo dos
manuaismencionados.
A investigação que ora se propõe adota como pressupostos teóricos para
embasamentodosestudosdaspetiçõesiniciaisateoriasemióticafrancesadeArlgidasJulien
Greimas,aproximadaaospressupostosdaretóricaclássicadeAristóteles,explicitadosnaArte
Retórica, e da nova retórica do Tratado da Argumentação de Chaïm Perelman e de Lucie
Olbrechts-Tyteca.
Opropósito do estudo éultrapassarasestruturasformais indicadaspela leipara a
construção das petições iniciais, para adentrar na investigação da organização interna das
peças, considerando os elementos do discurso responsáveis pela criação dos sentidos que
conformamapersuasão.Aintençãoéadeentendercomoessestextosfazemparadizeroque
dizem.Quemeios,querecursoseestratégiaselesutilizamnasuaconstruçãoparacumprirseu
programa.
Ainvestigaçãodivide-seemquatrocapítulos:oprimeiroseocupadadescriçãoda
teoriasemióticafrancesa,considerandoseuspressupostosteórico-metodológicosdistribuídos
emtrêsplanosdeanálise:ofundamental,onarrativoeodiscursivo.
O segundo capítulo preocupa-se em apresentar os aspectos epistemológicos da
retóricaclássicadeAristóteles,reabilitadaporPerelman&Tytecaapartirdosanossessenta.
Na esteira do trabalho de Perelman serão utilizados os esquemas argumentativos que ele
apresentanoTratadodaArgumentação.
Nacontinuidade,noterceirocapítuloserãoapresentadosalgunsestudosdeaplicação
semióticaaoDireito,nasconcepçõesdeCharlesSandersPeirceedeArlgidasJulienGreimas,
visandoenfatizaraúltima,porqueosuporteteóricodestetrabalho.Nomesmocapítuloainda
será explicado o que é o processo judicial, a sua conceituação e requisitos e, logo após a
petiçãoinicial.Depoisdeabordarosrequisitosdeformadaspetiçõesiniciais,serádescrita,
aindanoterceirocapítulo,asuaorganizaçãonarrativa.
Noquartoeúltimocapítulo,serãoanalisadososrecursossemióticoseasestratégias
retóricasparaaconstruçãodaveridcçãododiscursodaspetições.Importaesclarecerquea
veridicção é entendida neste trabalho como as inscrições discursivas que se empenham na
realização do programa de persuasão visado. Para tanto, primeiro será descrita a
transformaçãodasestruturasnarrativasemdiscursivas,ouseja,comoasestruturasnarrativas
se manifestam no plano discurso. Que elementos discursivos recobrem as estruturas
14
narrativas. Seguindo adiante, serão analisadas as projeções enunciativas no discurso e os
efeitos que elas produzem. Nesse momento será estabelecida uma relação com as provas
subjetivas afetivas de Aristóteles, paraidentificar os efeitos argumentativos queproduzem.
Por fim,serão identificados e descritos os esquemas que conformam os encadeamentos de
idéias,eaforçadevalidaçãododiscursoquetaisligaçõesprojetam.
Impende ainda salientar que o objetivo do trabalho não é apresentar qualquer
modelo,classificaçãooupredomíniodeargumentosunssobreosoutros,mas,simplesmente,
identificarasestruturasqueparticipamdaconstruçãodaveridicçãododiscursodaspetições.
Ressalta-senovamente,aintençãosingeladecontribuirparaosestudosdalinguagem
argumentativajurídica,aomenosnosentidodefazerinteressaraampliaçãodosestudosnessa
área.
1ATEORIASEMIÓTICAFRANCESA
1.1Históricoepressupostosgerais
Retomandobrevementeahistória,Saussureaotomaralínguacomoobjetodeuma
ordem interior da linguagem e enunciar as primeiras propriedades lingüísticas, as quais,
futuramente,possibilitariamasistematizaçãodetodaequalquerlinguagem,atravésdoestudo
dossignossobumapartedaciênciadenominadasemiologia,inscreveualingüísticaentreas
ciênciasteoremáticas,aexemplodamatemática,servindoseusconceitosdeteoria-pilotoàs
ciênciassociais
(Hénault,2006).
SeguindoessequadroconceitualeaconstânciadasleisapresentadasporSaussure,o
dinamarquêsLouisHjelmslevdeucontinuidadeàsdescobertasdomestregenebrino,massob
umaconcepçãológico-teóricaprópria.Eleincluiu aabordagemdoplanodeconteúdo,que,
paraSaussure, correspondia à fala e, por essa razão,não podia confundir-secom alíngua,
únicoobjetodalingüística.
A partir da definição de signo, Hjelmslev teorizou a solidariedade existente entre
doistermos,relaçãoemqueumnãopodeserdefinidosemooutro.Suateoriaestabeleceu
umarelaçãohierarquicamentesuperiordosdoisplanosqueconformamqualquerlinguagem,o
plano de conteúdo e o plano de expressão, em relação aos pares substância e forma, que
organizamtaisplanos.
O trabalho do dinamarquês voltou-se para uma engenharia supernormatizada da
produçãoedaanálisedasignificação.Paraele:
Desse modo, constituir-se-ia, em reação à lingüística tradicional, uma
lingüísticacujaciênciadaexpressãonãoseriaumafonéticaecujaciênciado
conteúdonãoseriaumasemântica.Talciênciaseria,então,umaálgebrada
língua que operaria a partir de grandezas não denominadas – isto é,
denominadas arbitrariamente, sem que existissem para elas designações
naturais–equesóadquiririamdesignaçõesmotivadasporsualigaçãocoma
substância(Proleg,apudHénault,2006,pp.101-102).

É no prolongamento dessa linha lógico-teórica de Saussure e de Hjelmslev que a
semióticafrancesadeA.J.Greimasseinscreveu.Omodelosemiológicopropostoporeleno
finaldosanos60,comoquadradosemiótico,deuorigemaumateoriadefeiçõesalgébricas,
concebendoasváriaslinguagensutilizadaspelasociedadecomosistemasdesignificaçõesque
emergemdarelaçãodeoposiçãoentreosseuselementos(Krieger,1990,p.17).
16
Outro postulado de Greimas, inspirado no trabalho do russo V. Propp sobre a
Morfologia do Conto Maravilhoso - que, utilizando o campo da prosa e da narrativa
estabeleceu trinta e uma funções como uma sucessão de enunciados narrativos - é a
reestruturação dessas funções, deslocando o domínio delas para o dos actantes. A
originalidadedateoriaGreimasianafoi,justamente,acriaçãodeummodeloactancial,apartir
doentendimentode queanarrativapossui umenunciado-espetáculopermanente, garantido
porumadistribuiçãoúnicadepapéis.
Ampliandoocampodaspesquisassemióticasque,atéentão,limitavam-seaoestudo
danarratividadepresenteemrelatosfigurativosdoscontos,romancesemitos,Greimaseseu
grupodeestudospassaramaestudaranarratividadecompostadepercursoscognitivos,cujo
valorcentraléumsaber,presenteemdiscursosabstratosecomplexos.
Àbasedeumaepistemologiacomcaracterísticadeumametodologiaaxiomatizada,
vinculada à prática, a semiótica define-se como uma teoria geral da significação e não do
signo,quevisadescreverascondiçõesdeproduçãoedeapreensãodossentidossubjacentesa
toda e qualquer linguagem, verbal ou não-verbal, ou seja, independentemente da forma de
expressão.
Suaepistemologiafundaummétododeanáliseapartirdaorganizaçãodoplanode
conteúdo, haja vista que é lá que se produzem as significações. O princípio metodológico
adotadopelateoriaéodopercursogerativodasignificação,queconsisteemumadisposição
ordenada de etapas sucessivas pelas quais passa a significação para enriquecer-se e, de
simpleseabstrata,tornar-secomplexaeconcreta(Floch,2001).
Opercursogerativodasignificaçãopodeserrepresentadoàmaneiradeumcorte:na
superfície,amanifestação,ondeoconteúdoencontraasrestriçõesimpostaspelaexpressãoe,
sobessasuperfície,ascamadasdasestruturassêmio-narrativasediscursivas.
Asuperfícieéondeficamasestruturastextuais,limitadaselinearizadaspelosistema
de linguagem. Sob a superfície encontram-se as camadas das estruturas fundamentais,
narrativas e discursivas, que, somadas à superfície, exprimem os três modos de existência
semiótica:avirtualidade,aatualizaçãoearealização.
Asestruturasfundamentaisenarrativas,denominadasdesêmio-narrativas,sãoasda
significação em suas virtualidades, disponibilizadas por um sistema de significação. As
estruturas discursivas são as atualizações das virtualidades, através das escolhas do
enunciador, e as estruturas textuais as que realizam a significação na reunião do plano do
conteúdoaodaexpressão,concretizandoamanifestação(Floch,2001).
17
Atreladoaesseprincípiometodológicoestáodeanáliseimanente,hajavistaquea
teoria,aopreverumpercursogradativodeconstruçãodosentidoreconhecequetodoobjeto
semiótico apresenta-se como uma máscara, que esconde as leis que regem a produção da
significaçãoequedeverãoserencontradas.
1.2Asemióticafrancesacomoteoriadotexto
Asemióticafrancesaéumadentreoutrastantasteoriasqueseocupadotexto.Ela
consideraotextoumsistemasignificantequereúneumplanodeexpressãoeumplanode
conteúdo.
Apartirdoplanodeconteúdo,essateoriaassumeatarefadeexplicaroqueotexto
dizecomoodiz,tratandodeexaminarosprocedimentosdeorganizaçãotextuale,aomesmo
tempo,osmecanismosenunciativosdeproduçãoederecepçãodotexto(Barros,1994,p.8).
Paracumprirsuatarefaasemióticadeslocaesforçosparaapesquisadasestruturas
queultrapassamaorganizaçãodafrasedopontodevistadasintaxetradicional,estabelecendo
regras lógico-semânticas para a identificação de um quadro formal do discurso. A
metodologiautilizadaparaaanálisedessasestruturaséopercursogerativodasignificação,
composto de três níveis, o fundamental, o narrativo e o discursivo, os quais serão
apresentadosumaum.
A verificação dos procedimentos de organização textual envolve estruturas dos
níveis fundamental e narrativo e refere-se à análise das articulações gicas e semânticas
realizadasno eixodas estruturassêmio-narrativas. Paraasemióticatodo discursonasce de
umaoposiçãosemânticafundamentalepossuiumprincípioorganizador,anarratividade.
Anarratividadeévistacomoasucessãodetransformaçõesdeestadosquealteram
uma realidade e que, encadeadas, geram um grande esquema permanente. Esse esquema
pressupõe um modelo actancial do qual fazem parte os pares sujeito-objeto, destinador-
destinatárioeadjuvante-oponente.
O eixo central de toda ação narrativa são os actantes sujeito e objeto, que,
semioticamente,existemumparaooutro,ligadosporumarelaçãodedesejo,poisosujeitoé
um “ser querente” e o objeto um “ser querido”. O par destinador-destinatário encontra
justificativa na inscrição do objeto no eixo da comunicação, porque, como mensagem
objetivada,requeratransmissãoentreeles.Porúltimo,darelaçãosujeito-objeto,articulada
pelo desejo, extrai-se o par actancial adjuvante-oponente, em virtude de duas funções
distintas: a que consiste em ajudar com uma ação no sentido do desejo ou facilitando a
18
comunicação; a que, contrariamente, cria obstáculos quer à realização do desejo quer à
comunicaçãodoobjeto.
Utilizandoessemodeloactancialasemióticapostulaquetodanarrativacompõe-se
deumesquema–princípioinvariante–quepermiteconsiderá-loumconceitooperatório.Ele
éconstituídodetrêsgrandespercursos:odamanipulação,daaçãoedasanção,assumidos,
respectivamente, pelos actantes destinador-manipulador, sujeito operador e destinador-
julgador.
O esquema narrativo foi construído a partir das três provas organizadoras da
narrativaapresentadasporPropp: aqualificadora,adecisivaeaglorificadora. Tais provas,
presentes nos contos, permitem fazer uma correlação à história do homem no mundo, que
buscaarealizaçãoatravésdaexecuçãodeseusatos,osquaisdependemdesuaqualificaçãoe
quelheatribuemoreconhecimentopeloolhardooutro.
No entanto, sobre a organização narrativa à base dessas três provas proppianas
Greimas(apudCourtés,1979,pp.14-15)menciona:
Astrêsprovas,parafalarsomentedelas,sucedem-se,efetivamente,umasàs
outras, mas não existe nenhuma necessidade lógica de que a prova
qualificadora seja seguida de uma prova decisiva ou de que esta seja
sancionada:quantosexemplosdesujeitoscompetentesquenuncapassamà
ação,quantasaçõesmeritóriasnuncareconhecidas.
O autor esclarece que é no agenciamento lógico reconhecido a posteriori, à
semelhançadodesenvolvimentodoorganismogenético,queaintencionalidadedodiscurso
narrativo se revela. A leitura às avessas instala uma ordem de pressuposição. O
reconhecimentodoheróipressupõeaaçãoheróica;esta,porsuavez,pressupõeaqualificação
suficiente do herói. É por isso que o percurso da significação é chamado gerativo: a
constituiçãodosentido–desdeaarticulaçãominimalatéaquelasquevãoestarreunidasao
plano de expressão – é um desenvolvimento lógico, construído a posteriori pela análise
(Floch,2001).
Osmecanismosenunciativosdeproduçãoederecepçãodotextocorrespondemàs
estruturasdesignificaçãodopatamardiscursivo.Essasestruturasrecobremasubjetividadedo
enunciadoreas relaçõesintersubjetivas queeleestabeleceno processode comunicação.O
examedasestruturasdiscursivaspermiteaapreensãodosvaloresdosujeitodaenunciação,do
temadacomunicaçãoedomodocomooenunciadorserelacionacomoenunciatário.
Importanteressaltarque,paraateoriafrancesa,acomunicaçãohumanaétidacomo
umaaçãomanipulatória,umaaçãodohomemsobreohomem,ratificandoaconcepçãodeque
todo equalquer discurso possui afinalidade de persuadirseudestinatário. Por isso, paraa
19
semiótica,acomunicaçãonãosedefinecomomeratransmissãodeumamensagem,mascomo
umfazer-crernoquefoidito.
Em face disso, ela investiga os procedimentos que recobrem a enunciação,
permitindo chegar-se ao enunciador e à leitura do discurso pretendida. Para essa teoria a
comunicação humana baseia-se em uma relação de natureza contratual entre as partes
envolvidas no processo, porque baseada em trocas realizadas entre sujeitos, cada qual
subjetivado por experiências, conhecimentose valores adquiridos anteriormente. Assim, os
procedimentos adotados pelo enunciador requerem o seu desdobramento em enunciador e
enunciatário, a fim de que possa construir o seu discurso de forma a ser lido, nas suas
intenções, pelo enunciatário. Destarte, a semiótica não reconhece um discurso como mais
verdadeiro que outro, mas analisa os procedimentos e os mecanismos utilizados pelo
enunciadorparadotarodiscursodeefeitosdesentido,poisacrençadoenunciatárioéoque
atribuiaeleoestatutodeverdadeiro.
Opercurso gerativo de sentido, composto pelasestruturas dos níveisfundamental,
narrativoediscursivonão corresponde aumarupturaemetapas.As significaçõesmínimas
extraídas das operações do nível fundamental, na passagem para o nível narrativo
transformam-se em sujeitos e objetos que, organizados sob um esquema de ações são
tematizados e figurativizados pelo sujeito da enunciação, no nível discursivo. Por isso, a
semióticaassumeopercursogerativocomoumagradativaconstruçãodesentidos,apartirdas
significações virtualizantes e atualizantes do conteúdo, que se realizam na superfície, pela
manifestação no plano de expressão. Esse enriquecimento gradativo de sentidos será
explicadocomaapresentaçãodecadaumdosníveisquecompõemopercursogerativo.
1.2.1Onívelfundamental
Ao menos por preocupação de inteligibilidade, podemos imaginar que o
espíritohumano,para chegaràconstruçãodos objetosculturais(literários,
míticos, pictóricos, etc.), parte de elementos simples e segue umpercurso
complexo,encontrando,emseu caminho, tanto restrições a quetemdese
submeter,comoescolhasquepodefazer(Greimas,1975,p.126).
O vel fundamental é o lugar em que as estruturas de significação o vistas na
formamaissimpleseabstrata.Éopatamarondeasignificaçãomínimadotextoéextraídada
apreensão das relações lógicas e da organização estrutural estabelecida entre termos
investidossemanticamente.Éafaseondesãodefinidasascondiçõesmínimasdeexistência
do objeto semiótico, em virtude das operações dedutivas que ocorrem sobre o conteúdo
20
semânticoequepossibilitamaidentificaçãodaestruturaelementardasignificação.Diz-se,
porisso,queasestruturasfundamentaistêmnaturezalógico-semântica.(Krieger,1990).
A significação mínima emerge de relações opositivas binárias estabelecidas entre
termos de uma mesma categoria semântica. A partir de operações lógicas de asserção e
negação,quegeramrelações decontrariedade,decontradiçãoede implicação,asemiótica
concebequeumtermosomentesignificaapartirdarelaçãodeoposiçãoqueestabelececom
outro.
Os traços distintivos constitutivos de uma determinada categoria semântica e suas
relações podem, visualmente, ser representados através do quadrado semiótico. Para
demonstrarasoperaçõespossíveis,isolamosacategoriasemânticaquedefineasexualidade
de um indivíduo, tema discutido em uma das petições examinadas, e estabelecemos as
seguintesrelaçõesnoquadradosemiótico:
Figura1
O esquema acima mostra uma possibilidade de organização dos termos que
compõem a categoria semântica que representa a sexualidade; ele permite demonstrar a
projeçãodasoperaçõesedasrelaçõespossíveisentreeles.Aoperaçãodenegaçãogeratermos
contraditóriosentresi,que,porisso, nãopodem coexistir;aoperaçãode asserção,porsua
vez,reúnetermosdoseixosdoscontrários,quepodemmuitobemcoexistir(Floch,2001).
As relações são estabelecidas a partir de dois eixos: dos contrários e dos
subcontrários,que,entresi,estabelecemumarelaçãodecontradição,ondeanegaçãodeum
produzaafirmaçãodooutro.
21
Noexemplo,nacomposiçãodaidéiadeheterossexualotermo“feminino”,emuma
operação de disjunção com o termo “masculino” estabelece a relação de contrariedade.
Tomadosozinho, “feminino” possuium traçoque “não-feminino”não possui, constituindo
comestearelaçãodecontradição.Anegaçãode“não-feminino”afirmaotermo“feminino”.
Este,porsuavez,coexistindoemumarelaçãodepressuposiçãorecíprocacomoseuoposto
“masculino”e, portanto, emuma relaçãode conjunção,possibilita a significaçãodo termo
complexoheterossexual.
Courtés(1979,p.73)mencionaqueesseéoeixodocomplexo,porqueelegeraum
termo(nocaso,heterossexual)quesubsumeoutrosdois(masculino-feminino).Jáoeixodos
subcontrários dá origem a um termo neutro (homossexual), porque seus dois termos em
oposição(não-feminino–não-masculino)produzemanegaçãosimultâneadosdoiscontrários
(feminino – masculino): nem um nem outro; se a conjunção de “feminino” e “masculino”
define o termo heterossexual, a conjunção de “não-feminino” e “não-masculino” poderá
expressarotermohomossexual.
É importante ressaltar que as operações realizadas através do quadrado, também
estabelecemumarelaçãodeforia
1
entreostermos,conduzindoossentidosfuturosaserem
construídos nas etapas seguintes. Tatit (2001, pp. 17-18) adota o modelo semiótico
desenvolvidoporGreimaseseugrupodeestudoseafirmaestardeacordocomosautoresque
entendem que, no plano fundamental,os valores constituem-se como matrizes das funções
narrativas, das modalidades, da espacialidade e temporalidade, que serão devidamente
consolidadasnosestratosdesuperfíciedopercursogerativo.Elecompreendequeoprocesso
de enunciação abrange toda a extensão do percurso, de modo que, já no nível profundo
iniciam-seasescolhasdosvaloresassumidospeloenunciador.
Asignificaçãomínima do texto é determinadaporumsistema devaloresextraído
dasrelaçõesdialéticasentreostermosdeumamesmacategoriasemântica,quetranspassará
todo o texto: no nível narrativo torna-se um valor em disputa e, no discursivo, o tema da
comunicaçãoeosvaloresassumidospelosujeitodaenunciação.
A relevância desse patamar, portanto, representado visualmente pelo quadrado
semiótico, é que ele permite prever os percursos de sentido e as posições logicamente
presentes,aindanãoexploradas(Floch,2001).Essasoperaçõesoportunizamaidentificação

1
 Tatit (2001, 17) explica que “a foria vem gradativamente ocupando o lugar teórico da noção de timia
(“disposição afetiva fundamental”), embora nem sempre com muita felicidade. De todo modo, além da
motivação morfológica inegável quando aparece subsumindo os termos euforia e disforia, foria contém o
semema“conduzir’queapresentamelhorrendimentosintáxicoqueotermotimia”.
22
dasrelaçõesexistentesentretermosdeumamesmacategoriasemânticae,conseqüentemente,
oreconhecimentodossentidosmínimosqueserãoenriquecidosnasetapassubseqüentes.
1.2.2Onívelnarrativo
Asintaxenarrativadeveserpensadacomoumespetáculoquesimulaofazer
dohomemquetransformaomundo.Paraentenderaorganizaçãonarrativa
de um texto, é preciso, portanto, descrever o espetáculo, determinar seus
participanteseo papelquerepresentamnahistoriazinhasimulada(Barros,
1994,p.16).
As estruturas narrativas, juntamente com as estruturas fundamentais, compõem o
nívelsêmio-narrativodopercursogerativodesentido.Taisestruturasemergemdasrelações
estabelecidasnonívelfundamental,tornando-semenosabstratas.Asoposiçõesresultantesdas
operações do nível fundamental tornam-se objetos que, revestidos de valores, passam a
circularentresujeitos.
Essaetapaéolugardeinserçãodesujeitosqueoperamtransformaçõesdarealidade,
através das relações que estabelecem com objetos e, por isso, identificada como etapa de
antropomorfização. É o patamar mais desenvolvido da teoria francesa, a qual considera a
narratividade – uma ou várias transformações, cujos resultados são junções, isto é, quer
conjunções, quer disjunções dos sujeitos com os objetos (GR, apud Courtés, 1979) - o
princípioorganizadordetodoequalquerdiscurso.
Asintaxenarrativaorganiza-seapartirdedeterminadoselementos–osactantes–e
do engendramento de enunciados elementares – enunciados de estado e enunciados de
transformação, que geram uma organização de conjunto. O eixo central dessa organização
sãoosactantessujeitoeobjeto,que,semioticamente,existemumparaooutro,ligadospor
umarelaçãodedesejo.Aposiçãodejunçãoentreeles–conjuntivaoudisjuntiva-defineo
enunciadodeestado.Jáaaçãodosujeito,alterandooestadojuntivocomoobjeto,defineo
enunciadodetransformação.
Anarrativaévistacomoumasucessãodetransformaçõesdeestados,descritaspelos
enunciados de transformação regendo os de estado. O encadeamento desses enunciados
elementares gera a unidade mínima da sintaxe narrativa, o programa narrativo (PN). A
semióticaconcebequeasrelaçõesintersubjetivasmarcamoprincípiopolêmicosobreoqual
repousa a narrativa. Isto, em função do elo – o desejo – que ligaum sujeito a um objeto.
23
Quandodoissujeitosdisputamomesmoobjeto,doisprogramasnarrativossãoconfrontados,
instaurandoumheróieumanti-heróidanarrativa.
Oencadeamentodosprogramasnarrativosestabeleceumesquemacanônico,amaior
unidade sintática da organização narrativa, que serve de modelo de análise e de
previsibilidadedosdesdobramentosdasaçõesemdistintasnarrativas.
O esquema narrativo é um modelo invariável formado por três percursos: o da
manipulação, da ação e da sanção, assumidos, respectivamente, por um destinador-
manipulador,umsujeitooperadoreumdestinador-julgador.
Osujeito operadorassume aposição centralno esquemae équem realiza o fazer
transformador.Asuaaçãoperformantecorrespondeaofazerpragmáticoheróicodoscontos
que,naorganizaçãonarrativadePropp,equivaleàprovadecisiva.
Opercursodosujeitoenvolvedoisprogramas:odeperfórmanceeodecompetência,
relacionadosporpressuposição,poispararealizaraaçãoosujeitodeveestaraparelhadocom
a competência necessária, que ele adquire através de um processo de qualificação. Essa
aquisiçãotemorigemnacombinatóriadasmodalidadesquerer/deverfazereoupoder/saber
fazer.Paraagirosujeitotemquequereroudeverfazercomotambémpoderousaberfazer.É
importantesalientarquetantooprogramadeperfórmancecomooprogramadecompetência
podeserbemoumalsucedido.
Aexecuçãodoprogramadecompetênciadefine outro papelactancialdoesquema
narrativo,odestinadormanipulador.Éeleoresponsávelpeladoaçãodacombinatóriamodal
acimaaosujeito,capacitando-oàrealizaçãodaaçãoperformante.Éporissoquesuaposição,
noesquema,antecedea dosujeito operador,revelandoaprovaqualificante.Opercursoda
manipulaçãoéodadoaçãodecompetência,porquequalificaosujeitooperadorpararealizara
ação.
Odestinador-manipuladorliga-seaosujeitodofazernãoporumarelaçãodedesejo
sobreomesmoobjeto,maspelodesejodeagirsobreodestinatário,impondo-lheseusvalores
eestabelecendo-lhecompromissos.Essarelaçãoevidenciaumadesigualdadehierárquica,pois
omanipuladorassumelugareminstânciasuperior,deondeemanamasregraseosvalores.
Paraasemiótica,todofazeréprecedidodeumamanipulação,que,dopontodevista
dateoria,nãoénegativa,poisissoratificaaassimetriaquefundaoprocessodecomunicação
humana:ohomemagesobreohomem,natentativadeimporoseusistemadevalores.
Ainteraçãoentredestinadoredestinatário,deoutrolado,revelaabasecontratualde
toda narrativa, princípio que fundamenta a comunicação humana. Para a semiótica, as
24
relaçõesdecomunicaçãosãopautadasporumprincípiopolêmicoereguladasnaformadeum
contrato,oqualdefineobrigaçõessociais.
Por tais razões, a narrativa é vista sob dois aspectos: como uma sucessão de
transformações de estados entre os actantes e como uma seqüência de cumprimento e
rompimento de contratos assumidos entre um destinador e um destinatário, no interior do
processodecomunicação.
Amanipulaçãopodeserpropostaaosujeitodediferentesmaneiras.Omanipulador
podeapoiar-senaprópriacompetênciacomopodeapoiar-senojuízoquefazdodestinatário.
No primeiro caso, o manipulador, modalizado pelo próprio poder-fazer e direcionado a
valorespositivosexerceamanipulaçãoportentação,levandoodestinatárioaumquerer-fazer.
Todavia,envidadoavaloresnegativos,quecaracterizemumaameaça,manipulaodestinatário
porintimidação,impondo-lheumdever-fazer.
Apoiado no juízo positivo do destinatário, o manipulador, modalizado pelo saber-
fazer,agirásobreaqueleporsedução,levando-oaoquerer-fazer;contrariamente,apoiadoem
umjuízonegativododestinatário,agirácomomesmoatravésdaprovocação,levando-oao
dever-fazer.
Assim,opercursododestinadormanipuladorétambémodadoaçãodecompetência.
Alémdeeleserafontedevaloresdosujeitoéelequemdoaaomesmoacompetênciamodal
quedeterminasuaação.Enquantoosujeitodofazertransformaasuaposiçãoemrelaçãoao
valoralmejado,omanipuladortransformaosujeito,atravésdaproposituradecontratosque
visam à aceitação. O manipulador tenta compartilhar com o destinatário um determinado
sistemadevalores,ratificandoentreelesumarelaçãodenaturezacontratual.
Aúltimapartedoesquemanarrativo,correspondenteàprovaglorificante,érealizada
pelopercursododestinador-julgador.Opapeldodestinador-julgadoréodeavaliaraaçãodo
sujeito, verificando se os compromissos assumidos com o manipulador foram cumpridos.
Após o julgamento, o destinador emite uma sanção, que expressa um juízo positivo ou
negativo sobre a ação do sujeito. O fazer do julgador reafirma o fundamento da
intersubjetividadeestarpautadapeloprincípiocontratual,porqueasaçõeshumanasvêem-se
reguladaspelaobrigação,pelodeverdecumprirasregrasordenadorasdavidasocial(Krieger,
1990).
Paraarealizaçãodesuatrajetória,odestinador-julgadorrealizaseupercursoemduas
etapas: a primeira corresponde ao fazer interpretativo e, a segunda à formulação do juízo
epistêmico.
25
Ofazerinterpretativo é cognitivoe,por isso,pararealizá-loojulgador convocao
quadrodascategoriasveridictórias,compreendidopelasoperaçõesgicasopositivasentreos
estados“ser” e “parecer”. Tais operações resultam ao julgador apossibilidade de chegar à
interpretação da ação do sujeito como: falsa, quando conjunge o não-parecer ao não-ser;
verdadeira,quandoháconjunçãoentreosereoparecer;mentirosa,medianteaconjunçãodo
pareceraonão-ser;secreta,quandoconjungeonãopareceraoser.
A formulação do juízo epistêmico corresponde à emissão de uma sanção. Se o
resultado da interpretação da perfórmance do sujeito for positivo, a sanção também será
positiva. Caso seja negativo, o sujeito receberá uma sanção negativa. A sanção pode ser
cognitiva,maspodeestender-separaocampopragmático.Exemplodissoéquandoojulgador
determinaaosujeitoumarecompensaouumapunição.
1.2.3Oníveldiscursivo
No patamar discursivo os esquemas narrativos são assumidos pelo sujeito da
enunciação,querevesteasestruturasnarrativascomelementosquedefinempessoas,tempoe
espaço,transformando-asemdiscurso.Odiscursoéoprodutodaenunciaçãodeumsujeito
queassumeapalavraedizalgoaalguémeaenunciaçãoéainstânciaquepovoaoenunciado
(com marcas) de pessoas, de tempos e de espaços (Fiorin, 2005, p. 56). A enunciação é,
portanto,umainstânciapressupostapeloenunciado,quemedeiaatransformaçãodosactantes
narrativosematorespersonalizados,quedesdobramasaçõesnarrativasnotempoenoespaço.
Dopontodevistasemiótico,osujeitodaenunciaçãoéreconhecidopelasmarcasquedeixano
enunciado.ÉimportanteressaltarqueédeÉmileBenvenistequeasemióticatomaanoçãode
constituição do discurso pela enunciação, assim como a de que o discurso é portador de
marcasenunciativas.
Asemióticapostulaquetododiscursobuscapersuadirseudestinatáriodaverdadedo
dizer que constrói e, por tal razão, o enunciador produz seu discurso visando à adesão do
enunciatário. Assim, o discurso define-se, ao mesmo tempo, como objeto produzido pelo
sujeitodaenunciaçãoecomoobjetodecomunicaçãoentreumdestinadoreumdestinatário
(Barros, 1954, p. 54). Nessa perspectiva a teoria francesa procura identificar e explicar os
empreendimentos do sujeito da enunciação para a criação dos efeitos de sentido que
constituemosmeiosparaoalcancedacomunicação.
Assim,noplanodiscursivo,sãoanalisadasduasrelações.Aprimeira,arelaçãodo
enunciadorcomodiscurso,considerandoasprojeçõesdaenunciaçãonoenunciado,descritas
26
pelo conjunto de procedimentos que compõem a sintaxe discursiva e pelos componentes
semânticosdiscursivosresponsáveispelageraçãodesentido.Aoutrarelaçãoéaestabelecida
entreoenunciadoreoenunciatário,soboestatutodaveridicção,queconsideraosefeitosde
sentidoproduzidospelasmarcasdiscursivas,comafinalidadedeconvencerseudestinatário
desuaverdade.
No estudo da relação do enunciador com o discurso é importante revisar alguns
pontos desenvolvidos por Émile Benveniste, porque é na sua teoria da enunciação que a
semióticabuscaconceitosparaintegraraoseumodelodeanálisenoplanodiscursivo.
ParaBenvenisteaenunciaçãoédefinidacomoocolocaremfuncionamentoalíngua
por um ato individual de utilização. Foi o primeiro autor a inserir as noções de sujeito e
referêncianalingüística.Estruturalistainfluenciadopelalingüísticadesuaépoca,baseadanos
estudos de Ferdinand de Saussure, que primava pela exclusão do sujeito, Benveniste
interessou-sepelo estudoda línguacomo sistema,mas adicionandoa essesistema o uso a
partirdadicotomialíngua/discurso.
No texto “Semiologia da Língua” (1969), inserido em Problemas de Lingüística
GeralII,eleabordaasubjetividadenalinguagemaomencionardoismodosdesignificaçãoda
língua:osemióticoeosemântico.Enquantoosemióticodizrespeitoàsignificaçãodossignos
nointeriordosistemaemquesesituam,pelarelaçãodeoposiçãoqueestabelecementresi,a
significaçãosemânticaresultadaatividadedolocutorquecolocaalínguaemação[...].O
critério utilizado é o da comunicação para definir a palavra como unidade de operações
sintagmáticasqueserealizamnoníveldafrase(Flores;Teixeira,2005,pp.31-32).Estesdois
últimos autores enfatizam a diferença com relação à referência nos dois modos de
significação, haja vista que no semiótico está ausente e no semântico ela é definidora do
sentido porque este se caracteriza pela relação estabelecida entre as idéias expressas
sintagmaticamentenafraseeasituaçãodediscurso.Dissodecorreque,aoproporumnível
designificadoqueenglobareferênciaaosinterlocutores,Benvenisteapresentaummodelode
análisedaenunciaçãoemqueosinterlocutoresreferemeco-referemnaatribuiçãodesentido
àspalavras.
2
Aessanoçãodesubjetividadealia-seadiscussãosobreaestruturadosistema
pronominalpessoalnaenunciação.
Em Problemas de Lingüística Geral I, na parte intitulada O Homem na Língua,
através de textos escritos entre os anos de 1946 e 1964, o lingüista opõe os pronomes da

2
Flores & Teixeira esclarecem que os termos “frase” e “palavra” no contexto das reflexões de Benveniste
adquiremosentidoamplode“discurso”oude“línguaemação”enãoosentidocanônicodadopelasteoriasdo
léxicooudasintaxe.
27
primeira,segundaeterceirapessoaverbal,atribuindoa‘eu/tu’acondiçãodepessoaea‘ele’
a condição de não-pessoa. Através dos textos Estrutura das relações de pessoa no verbo
(1946), A natureza dos pronomes (1956) e A Subjetividade na Linguagem (1958), ao
promoverumareflexãosobreaspessoasverbaisemdiversasnguas,Benvenisteconcluique
acategoriadepessoapertencerealmenteàsnoçõesfundamentaisenecessáriasdoverboe
sustentaqueumateorialingüísticadapessoaverbalsópodeconstituir-sesobreabasedas
oposições que diferenciam as pessoas, e se resumirá inteiramente na estrutura dessas
oposições.Olingüistaadota,então,comocritériodeclassificaçãodospronomespessoaisoda
subjetividade,entendidacomooatoquetornaumlocutorcapazdeseproporcomosujeito.
NassuaspalavrasEudesignaaquelequefalaeimplicaaomesmotempoumenunciadosobre
o‘eu’:dizendo‘eu’nãopossodeixardefalardemim.Benvenistetambématribuiacondição
depessoaaopronomepessoal‘tu’,namedidaemquequandoumlocutordizeudirige-sea
alguém,constituindoum‘tu’.Assim,tuénecessariamentedesignadoporeuenãopodeser
pensadoforadeumasituaçãopropostaapartirdo‘eu’;e,aomesmotempo,euenunciaalgo
comoumpredicadodetu.Destarte,épelaoposiçãoentreeuetuquetaisformasconstituem-
sepessoaisreciprocamente,poispelainversibilidadeeuaodizereuconstituiumtu,que,ao
tomar a palavra, torna-se eu. Há que se considerar, todavia, que a única “realidade” das
formas ‘eu/tu’ é a instância do discurso, instância presente que as contêm, já que não são
categoriasobjetivamentenomeadas,masvazias,tãosomentepreenchidasquandoeudiz‘eu’
da instância lingüística, propondo, nesse momento, um ‘tu’. Aí estão para o lingüista,
respectivamente, os fundamentos da subjetividade e da intersubjetividade: a categoria de
pessoa presente na língua, que capacita o locutor a tornar-se sujeito e, a constituição do
alocutário,que,diantedapossibilidadedoprocessodeinversibilidade,tambémécapacitadoa
tornar-sesujeito.
Apartirdessescritériosdesubjetividadeedeintersubjetividadeparaaclassificação
dospronomespessoais,Benvenistevêumadisparidadeentreospronomeseu/tueaterceira
pessoa,fatoqueolevaaquestionaralegitimidadedesteúltimocomo‘pessoa’.Anaturezado
pronome‘ele’édiferentede‘eu/tu’,poisnãoseconstituinainstânciaenunciativa,alíngua
lhe prevendo um conceito. Contrariamente às duas primeiras pessoas que, a cada ato de
enunciação são únicas, ‘ele’ pode ser uma infinidade de sujeitos ou nenhum; é forma não
pessoaldaflexãoverbal,namedidaemquenãodesignanadanemninguém,alémdoquea
terceirapessoaéaúnicapelaqualumacoisaépredicadaverbalmente.
Além das categorias de pessoa eu/tu, o lingüista refere outras palavras de classes
diferentes que adquirem referência pela via do sujeito. Aí estão as categorias de espaço e
28
tempo concomitantes ao processo enunciativo, através dos advérbios ‘aqui’ e ‘agora’ e de
outros termos correlatos que se alinham no mesmo paradigma, tais como hoje, ontem,
amanhã.AfirmaBenvenistequeapróprialínguarevelaadiferençaqueexisteentreosplanos
da instância de discurso e os tempos e lugares históricos: aqui/lá - agora/então - hoje /no
mesmo dia – ontem/na véspera – amanhã/no dia seguinte – há três dias/três dias antes.
Sintetizando, a teoria da enunciaçãopostula que estaé o atosingular irrepetível,que, pela
utilização da língua, torna o locutor um sujeito, o qual constitui referência para outras
palavrasqueexpressamasuarealidadediscursiva.
Écombasenessespressupostosdateoriabenvenistianaqueasemióticaexaminaas
projeções da enunciação no enunciado e os efeitos de sentido resultantes, descrevendo-as
atravésdosprocedimentosdenominadosdebreagemeembreagem.Essasoperaçõespermitem
ao analista identificara aproximação ou o distanciamentoda enunciação ao enunciado e a
construçãodareferencializaçãodepessoa,tempoeespaçonodiscurso.
Conforme Greimas & Courtés (apud Krieger, 1990, p. 25), a debreagem é um
mecanismo de expulsão do eu-aqui-agora, elementos sincreticamente situados na instância
enunciativa,umlugarsemioticamentevazioesemanticamentecheio.Ateoriafrancesaprevê
doistiposdedebreagem,quegeramdiferentesefeitosdesentido:aenunciativaeaenunciva.
Adebreagemenunciativa,tambémchamadadeenunciaçãoenunciada,expulsa,dodiscurso,
ascategoriaseu-aqui-agorada enunciação,fazendoapareceroeu-aqui-agoradoenunciado.
Essascategoriasdereferencializaçãodoenunciadosimulamasdaenunciaçãoe,porisso,são
reconhecidas como um ‘não-eu’, um ‘não-aqui’ e um ‘não-agora’. Com a debreagem
enunciativaosujeitodaenunciaçãoconfereaoseudiscursoumefeitodesubjetividade.
A debreagem enunciva também expulsa as categorias de pessoa, de espaço e de
tempodaenunciação,masinstalandonoenunciadoa‘não-pessoa’(ele).Esseafastamentoda
enunciaçãocria,contrariamente,umefeitodeobjetividade.Odiscursocientíficoexemplifica
bemosefeitosdadebreagemenunciva,poissuaimpessoalidadecriaailusãodequeaciência
falaporsimesma,garantindosuaverdade.
Adebreagemtambémpodeserutilizadainternamentenodiscurso.Oeu”instalado
no enunciado pode cedera palavra a um interlocutor, quese insere nafala a partirde um
diálogo.Essaintervençãodiretadevozproduzoefeitoderealidadedoacontecimentofictício
narrado.
O mecanismo de embreagem opõe-se ao da debreagem, operando o retorno das
formas da enunciação, anteriormente, debreadas. A embreagem promove o efeito de
apagamento das marcas do discurso e traz à tona a enunciação. Daí conclui-se que a
29
embreagem nunca pode ser total, pois promoveria o apagamento de todas as marcas do
discurso.Omesmonãoocorrecomadebreagem,quegeradiscursostotalmentedebreados.
Asestruturasdiscursivassão,pois,complexas.Oselementoseasrelaçõesatéaqui
examinadosnãocomportamformasimples.Atemporalidadediscursivaemumtextoaporta
diferentestempos,poisotempodaenunciaçãoedoenunciadonuncaéomesmo.Issotambém
ocorrecomrelaçãoàscoordenadasespaciais:oespaçodaenunciaçãonãocoincidecomodo
enunciado.Quantoaossujeitos,tododiscursocomportaumsujeito-enunciador,responsável
pelaemissãodamensagem,umsujeito-enunciatárioouoreceptoreosujeitodoenunciado
(Nascimento,C.2003,p.20).
Enquantoosmecanismosdasintaxepermitemdesvelarapresençadeumsujeitoda
enunciação e as ilusões enunciativas que ele cria no discurso, os recursos de natureza
semântica, adotados pela semiótica, permitem a identificação de ilusões de realidade
produzidastambémpelosujeitodaenunciaçãonoepelodiscurso.
Asemânticadiscursivaconstitui-sedetemasedefigurasque,imbricados,conferem
coerência aos discursos. Na gradativa geração de sentidos, os valores perseguidos por um
sujeito no nível narrativo, no patamar semântico discursivo são disseminados na forma de
percursostemáticosabstratos,quepoderãoreceberrevestimentosfigurativos.
Barros (1994, p. 68) explica que tematizar um discurso é formular os valores de
modoabstratoeorganizá-losempercursos.Emoutraspalavras,atematizaçãoéarepetição
dedeterminadostraçossemânticosqueremetemavaloresabstratoseque,pelarecorrênciano
discurso,constroemacoerênciadele,ouseja,aspossibilidadesdeleituraqueeleoferece.As
possíveisinterpretações,fundadasnasescolhasrealizadaspelosujeitodaenunciação,revelam
os valores deste último. Assim, para o exame dos percursos temáticos e da coerência do
discursoénecessáriodeterminarostraçossemânticosqueneleserepetem.Essareiteraçãoéa
condiçãoparaadeterminaçãodaisotopiadotexto.
Afigurativização,por sua vez,é o procedimentosemântico deanálise das figuras
que recobrem os percursos temáticos abstratos, atribuindo-lhes traços de revestimento
sensorial.Apartirdorevestimentofigurativodovalornarrativotematizado,todoopercurso
do sujeito é figurativizado. Denomina-se ancoragem pessoal, temporal e espacial a
concretizaçãodosactantesedastransformaçõesnarrativas,atravésdeatoresedemarcadores
figurativosdetempoedeespaço.Aoatorpodeserconferidoumnome,enquantootempoeo
espaçopodemserconcretizadosatravésdefigurasqueindicammomentoelocalderealização
dastransformaçõesnarrativas.Taisrecursos,utilizadospelosujeitodaenunciação,levamo
30
enunciatário a reconhecer figuras do mundo que o cercam, direcionando-o à crença na
veracidadedodiscurso.
Mas,paraasemiótica,odiscursotambémédefinidocomoobjetodecomunicação
entreumdestinadoreumdestinatário,razãoporqueateoriapropõe-seaexaminarumaoutra
relaçãonoâmbitodiscursivo:aestabelecidaentreoenunciadoreoenunciatário,fundadaem
umprincípioargumentativo-persuasivoeregulamentadaporumabasecontratual.
Repisa-sequeacomunicação,naconcepçãosemiótica,correspondeamaisqueuma
transmissãodemensagemdeumemissorparaumreceptor.Aquiacomunicaçãoéentendida
como a transferência de um saber, que implica um fazer crer, justificando a natureza
persuasivadodiscurso.Greimasafirmaqueosujeitodaenunciaçãoproduzumdiscursoque
manifesta o efeito de sentido verdade (apud Sobral, 2005, p. 126). Isto é, a verdade é um
efeito produzido por recursos que o enunciador utiliza para fazer o discurso parecer
verdadeiro; o enunciador constrói a veridicção do discurso para que ele seja aceito pelo
enunciatário.
Todavia,apersuasãosomenteserealizacomaadesãodoenunciatárioàsproposições
que lhe são feitas. É a ele que cabe interpretar o discurso e emitir um juízo final de sua
veracidade ou falsidade. Diante disso, entre enunciador e enunciatário se estabelece uma
relação de troca em que ao primeiro cabe o fazer persuasivo e, ao último, o fazer
interpretativo. É essa troca que permite a realização da comunicação, cujo objeto de
efetivaçãoéodiscurso.
Oenunciador,exercendoamanipulação,constróioseudiscursodemodoaconduzir
ainterpretaçãodoenunciatário;seufazerbaseia-senaveridicção,istoé,nadisseminaçãode
marcasno discurso, que produzem efeitos de sentido. O discurso é, portanto, um lugarde
inscrição de verdades e de falsidades, desveladas pelo enunciatário no percurso da
interpretação.Destarte,asemióticaentendequenãoexistemdiscursosverdadeirosoufalsos,
masdiscursosquerevelamefeitosdesentidoverdadeoufalsidade,resultantesdasescolhasdo
sujeitodaenunciação.
Como o papel do enunciador é o fazer persuasivo, a sua ação possui natureza
manipulatória,ouseja,édirecionadaparaofimdeinfluenciaraopiniãodeseudestinatário.
Deoutrolado,comoofazerinterpretativoficanasmãosdoenunciatárioeestenãoéumpólo
vazio, mas um sujeito que possui valores, conhecimentos e experiências adquiridos
anteriormente,que certamenteserãosopesadosnopercursodeinterpretação,oexercícioda
manipulação requer uma representação das expectativas do enunciatário. Nessa esteira, o
sujeito da enunciação, ao tratar da veridicção, desdobra-se em enunciador e enunciatário.
31
Assim como o fazer persuasivo, o fazer interpretativo requer um exercício cognitivo do
enunciatário,poisaestecabeaavaliaçãodasmarcasdeveridicçãoespalhadasnodiscursoe,a
partirdelas,aformulaçãodojuízoepistêmico.Portaisrazõesopercursodainterpretaçãoé
realizadopeloenunciatárioemduasetapas.
Naprimeira, a daveridicção, ele convoca as modalidadesveridictórias, colocando
emoperaçãoosesquemasdaaparênciaedaimanência,afimdeformularasuaavaliação.O
quadrado semiótico coloca em operação tais categorias que, a partir do jogo do ‘ser do
parecer’, possibilita a determinação do discurso como verdadeiro ou falso, secreto ou
mentiroso.
Figura2
A segunda etapa da interpretação é a epistêmica, para a qual são convocadas as
modalidadesepistêmicas.Essasmodalidadesarticulamosesquemasdocrer-ser’edo‘não
crer-ser’. As operações que o enunciatário realiza, utilizando a oposição desses esquemas
levam-noàcertezaouàincerteza,àprobabilidadeouàimprobabilidadedodiscurso.
Figura3
32
Para a adesão ou não ao discurso, o enunciatário também pode valer-se das
modalidadesaléticas,quearticulamosesquemas‘dever-ser’emoposiçãoa‘devernão-ser’;
essas modalidades postas em articulação desvelam a necessidade ou a contingência, a
possibilidadeouaimpossibilidadedodiscurso.
Figura4
A relação estabelecida entre enunciador e enunciatário, orientada pela troca entre
persuasãoeinterpretação,evidenciaaconcepçãosemióticadequeacomunicaçãoseefetiva
sobreasbasesdeumcontratoimplícitoentreosparticipantes.Anoçãodecontratoadvémdo
fatodequeacomunicaçãodaverdaderepousaemumaestruturadetrocasubjacente,suporte
da interação entre os protagonistas do discurso (Sobral, 2005, p. 127). Esse contrato é
denominadoenunciativooudeveridicçãoepossuinaturezafiduciária,namedidaemqueos
participantesdoprocesso comunicativoprecisam deummínimodeconfiança umno outro
paraqueacomunicaçãoseestabeleça.
De outro lado, a manipulação que orienta o fazer do enunciador no sentido de
influenciar o fazer do enunciatário, impondo-lhe os seus valores, ratifica a concepção
semiótica de que as relações intersubjetivas repousam sobre um princípio polêmico. Tal
princípioéoquegeraanecessidadedeorganizaçãoederegulamentaçãodasrelaçõessociais
sobaformadocontratodeveridicção.
Retomando,asemiótica define-secomo umateoriageralda significação,quevisa
descrever as condições de produção e apreensão dos sentidos que determinada linguagem
constrói,apartirdoplanodeconteúdo.Talteoriaadotaoprincípiodequeossentidossão
construídosatravésdeumpercursogerativo,metodologicamente,distribuídoemtrêsetapas
sucessivas:afundamental,anarrativaeadiscursiva,cadaqualorganizadaporumasintaxee
umasemântica.Atreladoaesseprincípiogerativodesentidoestáodaanálisedaimanência,
33
considerandoqueaconstruçãogradativadossentidos,pormeiodedeterminadasestruturas,
requerarevelaçãodasleisqueregemoprocessodesignificação.
Noníveldiscursivo,patamarenfatizadonestapesquisa,asintaxeoportunizaaanálise
deduasrelações,apartirdadescriçãodemarcasdiscursivas:adoenunciadorcomodiscurso
e a do enunciador com o enunciatário, considerando que o discurso, além de produto da
enunciação, é objeto de comunicação, esta entendida como a transmissão de um saber por
meio de um fazer-crer. É sob esses aspectos desvelados pela veridicção, que as petições
iniciaisserãoanalisadas.Contudo,serãoimportadossubsídiosdaretórica,pelasmotivações
explicitadasnapróximaseção.
2ARETÓRICACLÁSSICAEANOVARETÓRICA
Como visto no capítulo anterior, a veridicção do discurso – entendida como as
marcas que criam efeitos de sentido verdade – é evidenciada no nível das estruturas
discursivas. No entanto, sobre as estruturas discursivas Krieger (1990, p. 48) refere que
emboraasemióticaconcebaqueoenunciadoracioneumcomplexoprogramadepersuasão
paraobteraadesão,nãoexaminouextensivamenteosrecursosquepodemdotarumdiscurso
demarcasdeveridicção.
Assim, considerando que a retórica clássica de Aristóteles, reavivada nos anos
sessenta nos estudos de Chaïm Perelman e Lucie Olbrechts-Tyteca, investiga os modos
empregados nos discursos sociais para a geração da persuasão, torna-se possível, neste
trabalho,umaaproximaçãocomasemiótica,comvistasàanálisedaconstruçãodaveridicção
dosdiscursosdas petiçõesiniciais. A retórica,assimcomoa semiótica,vêno discursoum
produtodaenunciaçãocomofimdeproduzirapersuasão.Alémdisso,enquantoasemiótica
postula a existência de um contrato enunciativo a fundamentar as relações de troca
comunicativaentreodestinadoreodestinatáriododiscurso,aretóricapostulaanecessidade
dacomunhãodeespíritosentreooradoreseuauditório,paraqueapersuasãosejaalcançada.
A semiótica prevê como recurso à manipulação do destinatário o desdobramento do
enunciadorem enunciatário, assemelhando-se ao fundamento da retórica que prega,paraa
persuasão, a necessidade do conhecimento do orador de seu auditório. Nessa medida a
retóricaadquirecaráterdescritivosemelhanteàsemiótica,podendoserconcebidacomouma
teoria do discurso persuasivo. Krieger (1990, p. 59) menciona sobre a Arte Retórica de
Aristótelesqueporprecisaredescreverosmodosdeproduçãodediscursospersuasivos,[...]
éconcebidacomoumateoriadodiscursopersuasivo.
Destarte,porquenestetrabalhoserãoaproveitadosconceitosdaretóricaclássicade
AristótelesetécnicasdeargumentaçãodanovaretóricapropostaporChaïmPerelmaneLucie
Olbrechts-Tyteca,este capítulo é dedicado à apresentação,em linhas gerais, dos princípios
básicos que norteiam a Arte Retórica de Aristóteles e a nova retórica do Tratado de
ArgumentaçãodePerelman&Tyteca.
2.1AretóricadeAristóteles
A Arte Retórica de Aristóteles tem como objeto a análise da arte de produzir
discursos persuasivos ou argumentações. Definida por ele como a faculdade de ver
35
teoricamenteoque,emcadacaso,podesercapazdegerarpersuasão,aretóricatemcomo
escopoinventariarosprincípiosgeraisqueconformamaargumentação,demodoaultrapassar
as preocupações máximas com a divisão dos discursos em suas partes naturais e com as
paixõesqueelesdevemproduzir.Oprincípioaristotélicobaseia-senaartedasprovas,ouseja,
nasescolhasdashabilidadesaptasapersuadiroauditório.
Rohden(1997,p.68),combaseemestudosdeMédéricDufour,DavidRoss,Pierre
Aubenque,IngemarDüring,GiovanniRealeeQuintínRacionero,aludequeemumdiálogo
perdidodeAristóteleschamadoGrillo-escritoem360-358porocasiãodamortedeGrillos,
filho de Xenofonte, quando muitos retores atenienses, dentre os quais Isócrates (aluno de
Górgias), dedicaram a Grillos elogios - ele criticou a retórica como mera instigadora
irracional.Aristótelesteriaafirmadoquearetóricanãopossuíaobjetivoetodaartedeveriater
oseu.
Berti (2002, p. 169) refere que nessa época Aristóteles contava com vinte e dois
anos,cincoanosapósseuingressonaAcademiadePlatão,sendoesteoseuprimeirodiálogo.
Informação posterior do epicurista Filodemo sobre um curso de retórica que teria feito no
interiordaAcademia,considerando-aumaartedignadeserensinada,documentaointeresse
de Aristóteles pelo assunto. Além do que ele teria realizado uma coletânea de tratados de
retórica que circulavam em seu tempo, chamada Coletânea das Artes, na qual expunha o
tratadodoretorTeódotosnaobraintituladaAArtedeTeódotos.BertireferequeAristóteles
jámencionavaotermoarteparaindicaroensinodaatividadedosretores.

Assim,apartirdeumanovaconcepçãodaretóricacomoaartedacomunicaçãoe
nãomaiscomo umpuroencantamentoousugestãoemotiva, Aristótelesinseriu-adentreas
formasderacionalidade, classificadaspor elesob três aspectos:asciênciasteoréticas,cujo
objetoéosaber,asciênciaspráticas,quetratamdasaçõeshumanaseasciênciaspoiéticas,
que têm por objeto a produção de uma obra exterior ao agente. A arte coincide com as
ciênciaspoiéticasouprodutivas,eisque,conformeexplicaotextodaÉticaaarteconcerneao
virasereéoinventar(totekhnázein),istoé,oestudar(theoréin)dequalmodovêmaser
algumascoisasquepodemserenãoser,mascujoprincípioestánaquelequeproduzenão
noproduto(1140a10-14)(apudBerti,2002,p.158).
Para Aristóteles a arte coincide com as ciências produtivas, definidas como
capacidadesacompanhadasderaciocínio.Sãoopostasàsciênciasteoréticaspelofatodeterem
por objeto a forma de um produto. O caráter da racionalidade da arte é constituído pelo
inventar, pelo estudar de que modo vem a ser alguma coisa. Aristóteles ao mencionar a
utilidadedaretóricadizquesuatarefanãoconsisteempersuadir,masemdiscernirosmeios
36
de persuadir a propósito de cada questão, como sucede com as demais artes. Como uma
formaderacionalidade,aartepossuiasuaverdade.
Berti(2002,p.171)mostraqueAristótelesestabeleceumparalelismoentreoinício
do tratadosobre a retórica eo início dotratado da dialéticano Tópicos, evidenciandoque
ambasapresentamamesmaestruturalógica.Quantoaocarátertécnicoaretóricaconstitui-se
pelosaberusarbemasprovas,pelosmodosdecausarcrençae,adialética,pelosaberusar
bem as argumentações. A retórica e a dialética não apenas ensinam, respectivamente, a
persuadireaargumentar,mastambémfazemveràquelequeasusacomosãoascoisas”,
istoé,“overdadeiroeofalso”.Ambascaracterizamumademonstração:adialéticapormeio
desilogismosdialéticos,baseadosempremissasdeopiniãoearetórica,apartirdomesmo
tipode premissas, pormeio deentimemas,uma espéciedesilogismo.É Aristótelesquem
afirmaqueaRetóricanãodeixadeapresentaranalogiascomaDialética,poisambastratam
de questões que de algum modo são da competência comum de todos os homens, sem
pertenceremaodomíniodeumaciênciadeterminada.
Noentanto,aanalogiaentrearetóricaeadialéticanãoserestringeàestruturalógica.
Assimcomonadialética,aracionalidaderetóricaderivadepremissasquerefletemopiniões
comuns.Ambasbaseiam-seemumaverdaderelativa,fundadanoverossímil,naquiloqueé
geralmente aceito, e não em verdades absolutas e universais, como no caso das ciências
teoréticas.Oraciocínioretóricopreocupa-seemexaminarocarátermaisoumenosplausível
deumatesepeloconfrontocomocorpodeopiniõesqueelasuscita.
2.1.1AestruturadaracionalidaderetóricaemAristóteles
Conforme já mencionado, a racionalidade retórica constitui-se de premissas
prováveis,emrazãodanaturezadasaçõeshumanas,apoiadassobrejuízosquenãoprocedem
do necessário. Racionero explica queo âmbito do raciocínio quecorresponde à ação– e,
paralelamente,àconvicção–versasobreosistemadeopiniõesestabelecidas(=oplausível)
esobreoqueaconteceamaioriadasvezes(=oprovável)(apudRohden,1997,p.93).
SegundoRohden(1997,p.118),aArteRetóricaécompostadetrêspartes:asprovas,
oqueconcerneaoestiloeàordemnaqualsedevedisporaspartesdodiscurso.Comoeste
trabalho recorre às provas retóricas definidas por Aristóteles, a esta parte ficará restrito,
limitando-seaexplicitaroselementosqueaelasestãorelacionados,quaissejam,osgêneros
dediscurso,oslugaresdeargumentaçãoeostrêstiposdeprovasdescritasporAristóteles.
37
2.1.1.1Dostrêsgênerosdaretórica
Aristótelesdefine trêsgêneros dediscursos, considerando que três sãoos tipos de
ouvintes. Quando o discurso trata de deliberações sobre o futuro, a exemplo de uma
assembléia,seugêneroéodeliberativoeoouvinteéumjulgador.Afinalidadedetalgênero
discursivo é o de deliberar sobre o útil ou o prejudicial, recomendando o melhor ou
desaconselhandoopior.Odiscursoquesepronunciasobreopassado,cujoouvinteéumjuiz,
constituiogênerojudiciário.Afinalidadedodiscursojudiciárioéojustoouoinjustoeelese
prestaaacusaroudefender.Oterceirogêneroéoepidíctico,cujoouvinteéumespectador
quesomentesepronunciasobreacapacidadeoratóriadaquelequefalaesuafinalidadeéo
beloouofeioeseprestaparalouvaroucensurar.Cada gênerotemseutempopróprio-o
deliberativoofuturo,ojudiciárioopassadoeoepidícticoopresente-etodososouvintes,de
algum modo, são juízes. Sob esses três gêneros, opiniões são apresentadas e defendidas,a
partir de premissas verossímeis, eis que fundadas sobre o contingente e não sobre o
necessário.
2.1.1.2Doslugarescomunseespecíficosdaargumentação
As opiniões apresentadas e defendidas sob a forma de argumentação partem de
premissas,asquais,porsuavez,partemdelugares,ostopoi,cujanoçãoenvolveopreferível
paraaspessoas,ouseja,aquiloquerepresentaumaopiniãocomumatodosoumesmoàmaior
parte. Alguns desses lugares são comuns a todos os gêneros ou pelo assunto ou porque
representamrelaçõeslógicasentretermos.
Daspaixões,porexemplo,extraem-seassuntosqueconformampremissascomunsa
todotipodeargumentação,porquelugaresqueauxiliamooradoradisporsobreoânimodos
ouvintes.Deoutroladohálugaresdeondeseextraempremissascomunsatodososgêneros,a
partirdedeterminadosraciocínios,taiscomooslugaresdoscontrários,domaisedomenos,
daanalogiaproporcionaldassituações.Aristótelesdáosseguintesexemplosdesseslugares,
respectivamente:
Vistoaguerraseracausadosmalesatuais,épelapazquedevemosremediá-
los(A.R.,p.153).
Desde que os Deuses não sabem tudo, muito menos os homens (A.R., p.
154).
38
Sejulgaisqueascriançasdeelevadaestaturasãohomens,decretareisqueos
homensdepequenaestaturasãocrianças?(A.R.,p.156).
Assimcomohálugaresdeondeseextraempremissascomunsaostrêsneros,há
lugares de onde se extraem premissas específicas a cada um. Os lugares específicos, por
exemplo, relacionados ao gênero deliberativo comportam os assuntos sobre os quais
repousam as argumentações: finanças, guerra e paz, proteção do território, importação e
exportaçãoealegislação.Reboul(2000,p.52)apresentaosseguintesexemplosdelugares
particularesdogênerojudiciário:considera-sequeninguémignoraalei;umaleinãopode
serretroativa.
2.1.1.3Dasprovasretóricas
Aristóteles afirma que o domínio da arte retórica depende do conhecimento dos
meiosqueelautilizaparaatingiroseufim,assimcomoemtodasasartes.NosTópicosI,3
eleafirmaque:
Estaremoscabalmentedepossedométodoquandoestivermosnumaposição
semelhante àquela na qual estamos relativamente à retórica, à medicina e
outrasartestais,istoé,quandoconcretizamosnossodesígniocomtodosos
meiosdisponíveis,poisnemoretóricotentarápersuadirnemomédicocurar
mediantetodoexpediente,masseumououtronãoomitirnenhumdosmeios
disponíveis,diremosqueelespossuemaciêncianumgrauadequado.
Esses meios retóricos são as provas, sobre as quais Aristóteles estabelece uma
diferençaentreasqueoindependentesdaarteeasquedestadependem.Asprimeirassão
provaspré-existentesaométodoedelenãodependem,aexemplodasconfissõesobtidassob
tortura, testemunhos, contratos e outros escritos. As provas que dependem da arte são
inventadaspelooradorapartirdométodoeapresentadaspormeiododiscurso.Taisprovas
estão relacionadas com os três elementos constitutivos do discurso: a pessoa que fala, o
assuntodequesefala,aquemsefala.Elassãodenaturezaracionalouafetiva.
Entreasprovasfornecidaspelodiscurso,distinguem-setrêsespécies:umas
residemnocarátermoraldoorador;outras,nasdisposiçõesquesecriaram
no ouvinte; outras no próprio discurso, pelo que demonstra ou parece
demonstrar(A.R.,p.33).
Grimaldi(apudRohden,1997,p.87)afirmaqueométododaretóricarefere-seàs
provasporpersuasão,aspísteis.Omesmoautordistinguetrêssignificaçõesnotermopístis:o
estadodeconvicçãoouconfiançasubjetivaqueresultadeumraciocínio;ométodopróprioda
39
artequeproduztalestadodeconfiançamedianteareduçãodoargumentoretóricoasuaforma
lógica(entimemaeexemplo);asfontesdeenunciados(êthos,páthos,logos)dondeprocedem
asproposiçõespersuasivas.
Asprovasrelacionadasaooradorsãochamadasdeprovasmorais,porquepersuadem
pelocaráter–éthos-queooradortransmiteaosouvintespormeiododiscurso.Odiscursoé
dito de tal modo que torna o orador digno de fé, pois as pessoas honestas inspiram mais
confiançaecommaiorrapidezsobreasquestõesemgeral.Masocaráterdooradorconstitui-
se em prova moral desde que tenha sido criado pelo discurso e não provenha da sua
personalidade já conhecida. Reboul (2000, p. 48), referindo-se à prova moral, reafirma o
princípioaristotélicodequearetóricaseprestaaoverdadeiroeaojusto,aoesclarecerque
éthoséumtermomoral,“ético”,equeédefinidocomoocarátermoralque
ooradordeveparecerter,mesmoquenãootenhadeveras.Ofatodealguém
parecersincero,sensatoesimpático,semoser,émoralmenteconstrangedor;
noentanto,sertudoissosemsaberparecernãoémenosconstrangedor,pois
assimasmelhorescausasestãofadadasaofracasso.
Aristótelesafirmaquenasquestõesemquenãohápossibilidadedeobtercertezae
queseprestamà dúvida,essaconfiançarevesteparticularimportância.(A.R.,p.33)Para
Aristótelesooradordeveparecerdotadodetrêsqualidadesparainspirarconfiança:prudência,
virtude e benevolência. A primeira confere a ele a justeza de suas opiniões, a segunda a
expressãodoquelheafigurabomeaterceiraamelhordeterminação.
As provas relacionadas aos ouvintes são aquelas que os levam a experimentar as
paixões - páthos. Tais provas predispõem o auditório, porque nele suscita determinadas
paixões como a alegria, a dor, o ódio. Segundo Aristóteles as paixões são as causas que
introduzemmudançasnosjuízos.Ensinaelequeseo
btémapersuasãonosouvintes,quandoo
discurso os leva a sentir uma paixão, porque os juízos que proferimos variam, consoante
experimentamosafliçãooualegria,amizadeouódio(A.R.,33).
Sobre o páthos Reboul (2000, p. 48) explica que é o conjunto de emoções e
sentimentosqueooradordevesuscitarnoauditório,atravésdapsicologiadaspaixões,aqual
Aristóteles dedica boa parte da Arte Retórica, para descrevê-las – cólera, medo, piedade,
dentreoutras–eosdiversoscaracteresdosouvintes,segundoacondiçãosocial.Trêsaspectos
relacionados às paixões devem ser considerados para a persuasão: em que disposições o
ouvinteéincitadoadeterminadapaixão;contraquemoouvintesedispõe;quaisascausasque
provocamdeterminadapaixão.Essaprovanãoserelacionamaisaocaráterqueooradordeve
assumir,masaocaráterpsicológicodosdiferentespúblicosaosquaisooradordeveadaptar-
se.Ambassãoafetivas,todaviaumadizrespeitoaooradoreaoutraaoauditório.

40
Sobre as provas afetivas Racionero (apud Rohden, 1997, p. 103) conclui que são
enunciadosquefuncionamcomopremissasdeumraciocíniológico.Eleatribuiaosrecursos
emotivos não a condição de elementos auxiliares e secundários à persuasão, como quer a
interpretaçãotradicional,justificandoqueousodeenunciadosemocionaiscomopremissasde
umraciocíniológicoéoquepermiteaAristótelesampliarocampodaretórica.
Asprovasdenaturezaracionalsãoaquelascompreendidasnodiscurso,pelasquaiso
própriodiscursodemonstraouparecedemonstrar;dizrespeitoàargumentaçãopropriamente
dita e evidencia o aspecto dialético da retórica, que, conforme Reboul (2000, p. 49),
AristótelesretomainteiramentedosTópicos:
Como em Tópicos, distingue dois tipos de argumentos, o entimema, ou
silogismobaseadoempremissasprováveis,queédedutivo,eoexemplo,que
a partir dos fatos passados conclui pelos futuros, e que é indutivo. As
premissas prováveis dos entimemas o: ou verossimilhanças como por
exemploqueumfilhoamaopai,ouindíciosseguros,comoporexemploque
uma mulher que aleitava teve um filho, ou indícios simples, como por
exemploqueapresençadecinzaindicaquehouvefogo.

Assim,oargumentodedutivoprópriodaretóricaéoentimema,umtipodesilogismo
simplificado,quenãoapresentatodasaspremissas,aexemplodossilogismosanalíticos.Os
entimemaspartemdepremissasverossímeis,extraídasdelugarescomuns,conformejávisto
no subitem anterior. Segundo Rohden (1997, p. 91) o entimema é o silogismo retórico
arraigadonomundodavida.
Berti(2002,p.182)referequeadiferençadoentimemaemrelaçãoaosilogismoé
queesteúltimopartedepremissasjáextraídasdeargumentaçõesanterioresequesupõemum
encadeamento entre si, enquanto o entimema é voltado para ouvintes que não estão em
condiçõesdeenvolvercomumúnicoolharmuitaspassagense,porisso,deraciocinarapartir
de coisas distantes. Por tal razão o entimema tem menos premissas que o silogismo,
suprimindoaquelasjáconhecidaspelosouvintes.
Sobreaestruturadoentimema,Aristótelesdefineque
compõe-sedeproposiçõespouconumerosasemuitasvezesmenosdistintas
doqueosilogismocompleto,pois,seumadasproposiçõeséconhecida,não
émisterenunciá-la:oouvinterestabelece-aporsipróprio.Porexemplo,para
exprimirqueDorieutriunfounumconcurso,cujoprêmioéacoroa,bastará
dizerquesaiuvencedoremOlímpia.Quantoaacrescentarque,emOlímpia,
ovencedorrecebeumacoroa,éinútil,porquetodaagenteosabe.
Krieger(1990,p.65)explicaqueessaimplicitaçãodeconteúdosindicaainteração
entreosinterlocutoresemtermosdeconhecimentocomumdomundosócio-culturalqueos
circunda.
41
Oargumentoindutivoretóricoéoexemplo.SobreeleAristótelesesclarecequenão
sebaseianarelaçãodaparteparaotodo,nemdotodoparaaparte,nemdotodoparaotodo,
massimnarelaçãodaparteparaaparte,estabelecendoumarelaçãocomumaregrauniversal.
Paracompreendê-lotraz-seumexemplodadoporAristóteles:
Quandoduasproposiçõesestãocompreendidasnomesmogênero e umaé
mais conhecida que outra, temos um exemplo. Suponhamos que se diz:
Dionísio aspirava à tirania, visto que reclamava uma guarda; com efeito,
Pisístrato, que cogitava de se apossar do poder, requisitou uma guarda e,
depoisdeaobter,exerceuatirania.TeágenesfezoutrotantoemMégara;em
suma, todos os casos análogos conhecidos servem de exemplos para
Dionísio, emborase ignoreainda se ele reclama uma guarda pelo mesmo
motivo. Ora, todas essas proposições particulares se relacionam com a
seguinte proposição universal: quem reclama uma guarda tem na mira a
tirania.
A partir desse exemplo, Reboul (2000, p. 155) mostra que o argumento indutivo
retóriconãopermiteprovarqueumaproposiçãoéuniversal,porqueaconclusãonãosesegue
necessariamente,masgeralmente.Oexemploéumainduçãodialéticaquevaidofatoaofato,
passando por uma regra subentendida.No exemplode Dionísio, há um elo de causalidade
entre guarda e tirania na cidade grega, o que não retrata a tirania no geral.  Todavia, o
argumentoindutivoretóricoserveparatornarplausívelumaregra,apartirdefatospassados:
“todoaspiranteàtiraniapedeumaguardapessoal”.Esseefeitoprovocadopeloargumento
indutivoémanifestadoporAristótelesnosTópicos(VIII,2),quandoelediz
Cabe aventar todas as proposições verdadeiras em muitos casos e para os
quais não haja objeção alguma ou, de qualquer modo, nenhuma que
transpareçaàsuperfície,poisseaspessoasnãopodemvercasosnosquaisa
proposiçãonãoéválida,elasaadmitemcomoverdadeira.
Assim, enquanto do entimema, raciocínio dedutivo, extrai-se uma conclusão
necessária,doexemplo,raciocínioindutivo,segue-segeralmenteumadeterminadaconclusão.
Retomando, para o domínio da arte é preciso conhecer as três classes de provas
consideradaspersuasivas:asracionais,quecompreendemosraciocíniosdedutivoeindutivo;
easafetivas,queseapóiamemcaracteresmoraisenaspaixões.
Salienta-sequearetóricaaristotélica,sobessaestrutura,alémdeatribuirimportância
aoconhecimentodoauditórioparaosdiscursospersuasivos,atravésdoexamedasdiferentes
emoçõeseconvicçõespeculiaresaosdiversos tiposdeouvintes, tambémreconheceuquea
retóricaemsimesmaémoralmenteneutra,podendoserusadaparaobemouparaomal.
42
2.2AnovaretóricadePerelman&Tyteca
Aretóricaexerceugrandeinfluênciasobreaculturaromana,pelaimportânciacapital
que era atribuída à prática judicial e, enquanto o império romano persistiu ela e seus
praticantes eram alçados a um patamar de grande importância. Com a queda do império
romanoaretóricainiciouseudeclínio,permanecendoesquecidaporlongoperíodo.
No século XIX ela foi definitivamente rejeitada pela corrente do positivismo, em
nomedaverdadecientífica.
A partir dos anos sessenta, Perelman insurge-se contra a ditadura cartesiana da
evidência,odogmatismodasciênciaseasreduçõespositivistas(Monteiro,C.2003,p.9)e
parteparaumapropostademudançadoparadigmadarazãoteóricaparaodarazãoprática
aplicável aos campos da ação humana. Buscando fundamentos na tradição aristotélica,
Perelman promove a reabilitação da retórica. Em 1958, com a edição do Traité de
l’Argumentation:LaNouvelleRhétorique,elaboradocomacolaboraçãodeLucieOlbrechts
Tyteca,acategoriaretóricaéreinseridanopensamentocontemporâneo,comautilizaçãoda
expressão lógica do preferível para designar uma racionalidade que rejeita a dicotomia
racional-irracional e associa-se a uma preferência justificada que promove um sentido à
liberdadehumana(Söhngen,2003,p.57).
2.2.1AestruturadaracionalidadedanovaretóricaemPerelman
NoTratadodaArgumentação:anovaretórica,PerelmaneTytecatrabalhamcomo
paradigmadarazão prática,paraaqual aracionalidadedopensamento édeterminadapelo
consentimentogeral.Arazãopráticaoperacomocritériodarazoabilidadeparaaaprovação
dasargumentaçõeseapresenta-sevinculadaàidéiadejustificação.Aracionalidadedasações
éauferidapelajustificaçãodasescolhas,procedimentoinerenteàscontrovérsiasemgeral,que
demandaumaargumentaçãoracional.
A nova retórica postula que o domínio da argumentação é o do verossímil, do
plausíveledoprováveleatribuiumpapelessencialaoauditório.Nessesentidoelaretomaa
lógica retórica e dialética aristotélica e busca analisar argumentos que visam ao
convencimento, por meio da persuasão. Segundo Perelman & Tyteca, o objetivo de toda
argumentaçãoéprovocarouaumentaraintensidadedeadesão,deformaquedesencadeienos
ouvintesaaçãopretendidaouumadisposiçãoparatal.Daíaconclusãodequeanovaretórica
tratadanaturezamanipulatóriadaargumentação,poisvênoargumentanteodestinadorque
43
intentafazercomqueodestinatáriodesuacomunicaçãorealizeaaçãovisadaouquetenha
disposição para realizá-la. Sob tal concepção dois aspectos são enfatizados: as noções de
auditórioedeacordoprévio.
A argumentação pressupõe sempre a interação entre o orador e o auditório, este
último representado pelo conjunto daqueles que o orador quer influenciar através de sua
argumentação. Por isso, a primeira condição para que a argumentação tenha o êxito
pretendido reside nas imagens que o argumentante faz de seu auditório. Nesse sentido a
diferença substancial entre a nova retórica e a retórica aristotélica reside na concepção de
auditório universal elaborada por Perelman & Tyteca, que institui a racionalidade
argumentativaquepropõem.DeacordocomMonteiro(C.2003,p.63):
O modelo de argumentação racional perelmaniano é aquele que é
desenvolvido diante de um auditório universal, da mesma forma como o
imperativocategóricodeKantpretendevalerparaacomunidadedeespíritos
razoáveis. A argumentação filosófica é o exemplo a ser seguido para a
argumentação racional. O discurso filosófico caracteriza-se principalmente
porsedirigiraoauditóriouniversal.Comefeito,ofilósofo(orador)dirige-se
ao auditório universal, que é fictício, e que é uma representação de seu
próprio ambiente. Esse caráter contingente da argumentaçãoéumaspecto
importantenopensamentodePerelmanedefineocaráterhistóricoepessoal
detodaaçãoargumentativa.
Portanto,segundoosautoresdoTratadodaArgumentação,oauditóriouniversaléa
construçãoidealeimagináriaqueooradorelaboradeseuambiente.
Naverdade Perelman &Tyteca propõemtrês tipos de auditórios racionais: aquele
formadopelatotalidadedepessoasrazoáveisao qualnomeiamuniversal;osegundotipoé
aquelequeseformamedianteodiálogocomumsóinterlocutore;oterceirotipoéconstituído
porumsósujeitoqueargumentaconsigomesmo.ExplicaMonteiro(C.2003,p.63)queesses
dois últimos só são considerados racionais se encarnarem a racionalidade ampliada do
auditório universal. Ela justifica que para Perelman o auditório universal é uma norma da
argumentaçãoobjetiva.
Comoosobjetivosdeumaargumentaçãorepousamnaobtençãoouintensificaçãoda
adesão dos destinatários às teses oferecidas, sua eficácia está na capacidade de provocar a
disposiçãoparaaaçãonosouvintes.Eessaeficáciaédeterminadapelaadaptaçãodoorador
aoauditório,queporsuavez,estárelacionadaaoraciocínioqueeleutilizacomopontode
partida, baseado em teses já admitidas pelo auditório. O consentimento do auditório sobre
determinadas premissas decorre da fundamentação delas em valores e questões do senso
comum.Essefundamentobuscadonosensocomumdoauditórioéochamadoacordo.
44
Considerando que a argumentação visa transferir a adesão das premissas para as
conclusões, os acordos recaem não somente o conteúdo daquelas, mas também sobre a
maneiracomoosraciocíniossedesenvolvem.Oacordopodeserapreciadosobtrêsordens:
emrelaçãoaoconteúdodaspremissas,emrelaçãoàescolhadaspremissas,quantoaomodo
deapresentaçãodaspremissas.
Osobjetosdeacordosãoclassificadosemdoisgrupos:oprimeirorelaciona-secomo
realeinclui fatos,verdadesepresunções;osegundogruporelaciona-secomopreferívele
engloba valores, hierarquias e lugares do preferível. Os elementos do primeiro grupo são
objetivos e, por si sós, impõem-se ao auditório universal. Todavia, sob o ponto de vista
argumentativopodemserrefutadospelaapresentaçãodeoutrosfatoseverdadesconflitantese
excludentes. As presunções são consideradas tão seguras quanto os fatos e as verdades
quandoelasoferecembasessuficientesparaassegurarumaconvicçãorazoável.Osvalores,as
hierarquiaselugaresdopreferívelsãoobjetosqueestãorelacionadosaacordoscaracterísticos
deauditóriosparticulares.
A concepção de existência desse acordo entre orador e auditório assemelha-se ao
postuladosemióticodocontratoenunciativoentreosinterlocutores,queestabeleceocrédito
napalavradooutroe,porconseguinte,viabilizaacomunicação.
Sobessespressupostosteóricos,oobjetoespecíficodoestudodePerelman&Tyteca
noTratadodaArgumentaçãosãoastécnicasdiscursivasquepermitemprovocarouaumentar
aadesãodosespíritosàstesesapresentadas.Suateoriavisacaracterizarasdiversasestruturas
argumentativas capazes de provocar ou aumentar a adesão dos espíritos. Nesse sentido, as
técnicas assumem a função de descrever os recursos discursivos que determinam o fazer
persuasivo.
Os autores do Tratado da Argumentação apresentam os esquemas argumentativos
sobdoisaspectos:aquelesqueestabelecemumasolidariedadeentretesesadmitidaseasque
visam à adesão do auditório, que caracterizam argumentos de ligação, e os esquemas que
rompem uma solidariedade admitida, dissociando noções por uma incompatibilidade, que
caracterizamargumentosdedissociação.
Entendemosporprocessosdeligaçãoesquemasqueaproximamelementos
distintosepermitemestabelecerentreestesumasolidariedadequevisa,seja
estruturá-los, seja valorizá-los positiva ou negativamente um pelo outro.
Entendemosporprocessosdedissociaçãotécnicasderupturacomoobjetivo
dedissociar,deseparar,dedesunirelementosconsideradosumtodo,oupelo
menosumconjuntosolidáriodentrodeummesmosistemadepensamento.
Adissociaçãoterá o efeitodemodificartalsistemaao modificar algumas
dasnoçõesqueconstituemsuaspeçasmestras(Perelman;Tyteca,2002,p.
215).
45
Osargumentosdeassociaçãosãodistribuídosemtrêscategorias,conformeoobjeto
doacordo,istoé,seesteérelacionadocomopreferíveloucomoreal,poiséestarelaçãoque
define a categoria do argumento. Para cada tipo de categoria argumentativa Perelman
apresentadiferentesargumentos,considerandoasdiferentesoperaçõesdeligaçãorealizadas
entreaspremissas.
Oobjetivodestetrabalhoéodeidentificarasdiferentescategoriasargumentativas
utilizadas nas petições, como meios de alcançar a persuasão. Por tal razão, limita-se nesta
seçãoàapresentaçãodelas,deixandodelistaroextensoroldeargumentoscontidosemcada
uma,masapenascitandoalgunsexemplos.
2.2.1.1Astécnicasargumentativasdeassociação
Considerandoanecessidadeeaomesmotempoadificuldadedeooradoradaptarseu
discurso à pluralidade de auditórios, a fim de persuadir a partir de acordos baseados em
premissas já conhecidas e aceitas, os autores da nova retórica propõem técnicas que
constituemmodos dedesenvolverraciocíniosqueauxiliemaadesãoou aintensificaçãoda
adesãoàstesesoferecidas.
Perelman&Tytecaadvertemqueparaaapresentaçãodetaistécnicasénecessáriaa
individualização das articulações discursivas em esquemas argumentativos, embora façam
partedeumúnicodiscurso.Esclarecemelesodesejodeanalisaresquemasdeargumentos
paraosquaisoscasosparticularesexaminadosservemapenasdeexemplos,quepoderiam
sersubstituídospormiloutros(2002,p.212).
OsautoresdoTratadodaArgumentaçãoagrupamosargumentosdeligaçãosobtrês
categorias:os argumentos quase-lógicos,os argumentos fundados na estrutura do reale os
argumentosquefundamaestruturadoreal.
Os argumentos quase-lógicos são esquemas formais que aparentam basear-se em
princípioslógicoscomo,porexemplo,odeidentidadeentretermos.Taisargumentosvisam
persuadir através de raciocínios formais de tipo lógico ou matemático. O esquema formal
serve de molde à construção de um argumento que visa tornar os dados comparáveis,
semelhantes ou homogêneos. As reduções da argumentação a esses esquemas apelam para
estruturas lógicas tais como contradição, identidade total ou parcial, transitividade ou para
relaçõesmatemáticasdotipo:relaçãodapartecomotodo,domenorcomomaior,relaçãode
freqüência. Os autores ressaltam que um mesmo argumento pode ser compreendido e
analisado diferentemente por diferentes ouvintes e que as estruturas lógicas podem ser
46
consideradasmatemáticaseinversamente.Perelman&Tytecaexplicamqueodiscursoéum
atoque,como tal,pode ser objetodeumareflexãodoouvinte. Nessestermos,enquanto o
orador argumenta o ouvinte ficará inclinado a argumentar espontaneamente acerca do
discurso,afimdedeterminarocréditoquelhedevadar.Assim,oouvintealémdeperceber
osargumentosasuamaneiraétambémautordenovosargumentosespontâneos,aindaque
nãoexpressos,queintervirãonamodificaçãodoresultadofinaldaargumentação.
Os argumentos fundamentados na estrutura do real utilizam tal estrutura para
estabelecerumasolidariedadeentrejuízosadmitidoseaquelesquesebuscapromover,através
deligaçõesdesucessãooudecoexistência.Trata-sedecolocaremevidênciaasolidariedade
entreelementosdiversos,atravésdedeterminadasligações,paratornarsolidáriaaopiniãoque
jáeraaceitasobreumdeles.Assim,seumdoselementosdoargumentogozadeumaopinião
deprestígio,aoserassociadoaoutroelementodiverso,sobreesteúltimoprocuraestendera
mesma opinião. É da ligaçãoargumentativa que se extrai o efeito pretendido. Perelman &
Tytecaesclarecemquenãosetratadeumadescriçãoobjetivadoreal,masamaneirapela
qualseapresentamasopiniõesaeleconcernentes(2002,p.298),expressasatravésdefatos,
verdades ou presunções. Os argumentos que aplicam ligações de sucessão unem um
fenômenoasuasconseqüênciasou asuascausas,aopassoqueosargumentosqueaplicam
ligações de coexistência unem uma pessoa a seus atos, um grupo aos indivíduos que dele
fazempartee,emgeral,umaessênciaesuasmanifestações.
Nocasodosargumentosfundamentadosnaestruturadoreal,osautoreselucidamque
o significado atribuído à ligação argumentativa no discurso encarado como realidade vai
variarconformeoquedeladizooradoreconformeasopiniõesdoouvinteaesserespeito.Ao
mesmotempoemqueooradorpretenderproduzirumefeitocoercivoatravésdeumaligação
argumentativa,oouvintepoderejeitá-loporacharaligaçãoinsuficientementefundamentada.
Os argumentos que fundamentam a estrutura do real são aqueles que promovem
ligações com o particular, visando à generalização de uma opinião, ao reforço de uma
regularidadejáestabelecida,aoincentivoàimitação.Sãoargumentosquegeneralizamaquilo
queéaceitoapropósitodeumcasoparticularoutranspõemumaopiniãodeumdomínioa
outro.Sãoosargumentosbaseadosnoexemplo,nomodeloenailustração.
Concluindo,oTratadodaArgumentaçãodescreveraciocíniosconstruídosatravésde
procedimentos de associação e de dissociação, utilizados como meios de construção de
convicções. Cabe retomar que esses meios estão vinculados ao conteúdo das premissas
articuladas, que buscam fundamento no consentimento como forma de justificação das
escolhasqueconformamalógicadopreferível,parasolucionarascontrovérsiasemgeral.
47
Parafinalizarestecapítuloreitera-seque,partindodoprincípiodequeafinalidade
da veridicção é a adesão, justifica-se a ampliação da análise dos efeitos de realidade e de
enunciação produzidos por recursos semióticos nas petições iniciais, para a análise dos
recursosdepersuasãoobtidosatravésdasprovasretóricassubjetivas,moraisedemonstrativas
da Arte Retórica, bem como dos recursos argumentativos retóricos do Tratado da
Argumentação,aplicadosnaspetiçõesiniciaisvisandoàadesãoouàintensificaçãodasteses
apresentadas.
3ODIREITOÀLUZDASEMIÓTICA
Esta dissertação baseia-se na teoria semiótica francesa para propor o estudo do
discursodaspetiçõesiniciais,peçasprocessuaisqueinstauramosprocessosjudiciais.
Antes de esclarecer o que é o processo judicial e a petição inicial, bem como a
relaçãoqueestaguardacomaquele,serãoapresentadosalgunsestudossemióticosaplicados
aoDireito.Oprimeiro,naconcepçãosemióticadeCharlesSandersPeircee,osoutros,soba
concepção semiótica de Arlgidas Julien Greimas. O intuito aqui é demonstrar algumas
aplicaçõesdasemióticanaáreajurídicabemcomoestabelecer,emgrandeslinhas,adiferença
entreessasduasconcepções,unicamenteapartirdasaplicaçõesaquitrazidas.
No livro Semiótica do Direito, Clarice Von Oertzen de Araújo (2005) retoma
elementosestruturaise conceitosformulados pelosestudos delinguagem e lingüísticaeos
utilizapararelacionaroDireitoPositivoàlínguaemsuassimilaridadesefunçõescogentesna
regulamentaçãodasrelaçõesinterpessoais.Elapropõeumestudodocódigonormativocomo
umsistemadecomunicaçãoentredestinadoredestinatários,queutilizaalinguagemverbal
paraatransmissãodemensagensdestinadasàregulamentaçãodascondutassociais.
A autora toma o Direito Positivo como um sistema de linguagem, artificialmente,
elaboradoefazumparaleloentreoseufuncionamentoeodosistemadalinguagemverbal,
utilizando, como parâmetro, elementos lingüísticos. Com isto, visa demonstrar como os
fenômenos jurídicos podem ser estudados na condição de fenômenos semióticos, na
perspectivasígnicapropostaporCharlesSandersPeirce.
SuaanálisepartedeumaconcepçãosimplesdoDireito,tomando-ocomoumsistema
denormasquetemcomoobjetivoregulamentarcondutashumanasemsociedadepara,apartir
do modelo comunicativo teorizado por Roman Jakobson, possibilitar o entendimento das
normasjurídicascomomensagensenviadaspelolegisladoraosdestinatários.Trataassimo
Direitocomoumsistemadesignosquevisaàcomunicaçãodepadrõesdeconduta.
Araújoesclarecequeovocábulodireitoéambíguo,porquepodeserempregadosob
diferentesacepções.Paraadelimitaçãodoestudoapresentaduasdimensõeslingüísticas,sob
as quais o Direito é concebido como discurso. A primeira dimensão é representada pela
linguagemprescritivadecondutas,dotadadeimperatividade,easegundaéametalinguagem
da primeira. A linguagem prescritiva corresponde ao Direito Positivo, ou seja, às leis
positivadas, e a metalinguagem à Ciência do Direito, uma distinguindo-se da outra pela
identificaçãodaquelacomDireito-objetoedestacomDireito-ciência.
49
Esses dois sistemas, Direito Positivo e Ciência do Direito, relacionados por
diferentes substratos lingüísticos, refletem a relação intersistêmica linguagem-
objeto/metalinguagem. Todavia, tal relação também pode ser apreendida na relação intra-
sistêmicadoDireitoPositivo,apartirdaorganizaçãohierárquicadospreceitosnormativose
doscritériosparaainterpretaçãodalinguagemprescritiva,focodotrabalhodaautora.
Os princípios gerais do Direito, por exemplo, operacionalizam a função
metalinguagem,namedidaemqueorientamacriaçãoeaaplicaçãodenormasjurídicasde
menor hierarquia, porque se definem como supracritérios. A autora também exemplifica a
aplicação dessa mesma relação linguagem-objeto/metalinguagem no processo judicial,
instrumentoutilizadoparaoexercíciodeumdireitonoJudiciário:
Um procedimento administrativo ou judicial, seguindo todas as etapas
recursais previstas e permitidas pelo sistema de Direito Positivo, ilustra
fielmente como se desenvolve a relação linguagem-objeto/metalinguagem.
Uma sentença, ao decidir em primeira instância sobre a procedência ou
improcedênciadopedidoformuladonaaçãoproposta,tomaapetiçãoinicial,
assimcomotodaaargumentaçãoexpendidapelaspartesprocessuais,como
linguagem-objeto.Naseqüência,aoserformuladoorecursointerpostopela
partevencidaemprimeirograu,estetomaráasentençamonocráticacomo
linguagem-objeto. O acórdão que decide sobre o cabimento e oméritodo
recurso o toma como objeto-linguagem e tem, em relação ao recurso
interposto,umcarátermetalingüístico.Eassim,sucessivamente,osexames
jurisdicionaisdaseqüênciaderecursos,cujainterposiçãoforpermitidapelo
processo civil pátrio,constituirão, sucessivamente, novos pares relacionais
delinguagem-objeto/metalinguagem(2005,p.24).
AautoraaindaaproximaaorganizaçãodosistemadelinguagemdoDireitoPositivo
ao sistema da língua, através das relações sintagmáticas e paradigmáticas teorizadas por
Saussure.Entendeelaqueosdoiseixosestãonaorganizaçãoenodesempenhodosistema
normativo.
As operações no eixo da seleção podem ser representadas pela elaboração das
normasjurídicas,queselecionam,deacordocomovalorsocialmenteatribuído,ascondutas
queserãoobjetoderegulamentaçãonormativa.Aincidênciadeumanormajurídicaaocaso
concreto também é considerada operação no eixo do paradigma, pois exige a seleção da
normaaplicávelaocasosubmetidoàapreciação.
Ofuncionamentodoeixosintagmáticopodeserdemonstradopeloprocessojudicial,
pois,napetiçãoinicial,oadvogadoteráquerealizaracombinaçãoentreodireitomaterial,
istoé,odireitosubstancialdaaçãoeoprocedimentoadequadoparaseuexercício,sobpena
de,emfazendoumacombinaçãoinadequada,receberumasanção.Oartigo295,incisoV,do
50
Código de Processo Civil prescreve o indeferimento da petição inicial quando o tipo de
procedimentoescolhidonãocorresponderànaturezadacausa.
Deformageral,seconcluiqueaperspectivasemióticausadaporAraújobaseia-sena
classificação de signos conformados em sistemas, que estabelecem relação de significação
pelaoposiçãoquefazemunsaosoutros.
Estetrabalho,porquesoboprismadequeodiscursodaspetiçõesiniciais,quemais
adiante serão explicadas, se presta à intermediação de relações interpessoais e, como tal,
instauraumprocessodecomunicaçãoentreumdestinadoreumdestinatário,tambémsevale
dasemiótica.MasdasemióticadeorigemfrancesaconcebidaporAlgirdasJulienGreimas,
que trabalha as relações actanciais estruturadas em um percurso gerativo de sentidos,
conformejáapresentadonoprimeirocapítulodestetrabalho.
É nessa perspectiva francesa que Eric Landowski (1992) propõe uma abordagem
semiótica do Direito, com o objetivo de desenvolver um princípio de inteligibilidade
unificado do conjunto de aspectos que revestem o fenômeno jurídico, complexo e
diversificado,comosesabe,quealémdasregrasdodireitopositivo,englobatodoumleque
de “fatos jurídicos” (geradores de efeitos de direito), de “atos” (criadores de direito) e de
“práticas”,notadamenteinterpretativas(1992,p.57).
Landowski,antes,estabeleceadiferenciaçãodasemióticafrancesa,quenãodetecta
ou classifica objetos-signos, mas que tem como objeto a significação, cujo programa de
trabalho envolve dar conta, com a ajuda de modelos, das condições de apreensão e de
produção de sentido, independentemente do lugar e das formas de manifestação do objeto
posto em análise. É sob esse prisma que ele se reporta à esfera jurídica: encarando seu
conjuntodeelementoscomoportadordesignificação,emrazãodedeterminadascondições,
que permitem situá-lo em um nível de conceitualização mais global. O autor, baseado em
aspectos da sintaxe narrativa, mostra que o jurídico, enquanto linguagem, possui uma
gramáticanarrativasubjacente.
Oatosemióticodesignaumfazerqualquereconsistenafunçãosintáticalogicamente
pressupostapelapassagemdeumestadoparaoutrodistinto.Essefazer,noplanojurídico,é
revestidopeloatojurídico,queprecededeumavontadeeseguedeumefeito,equecolocaos
sujeitosdedireitoemrelação,instaurando,noplanosemiótico,ummodeloactancialeuma
sintaxemodalqueintegramoesquemanarrativocanônico.
Umsabertransmitidoporumsujeitoaoutro,umdeverquealguémimpõeoutenta
imporaoutro,ospoderesqueossujeitosatribuem-semutuamenteeoquererqueunsfazem
nascer aos outros, no plano semiótico, são valores modais que circulam no âmbito da
51
comunicação, pela manipulação dos envolvidos. Essas determinações diferenciam papéis e
ajustamasrelaçõesintersubjetivas.
O ato jurídico sobreposto pelo ato semiótico, ao mesmo tempo, reproduz a sua
estruturaformaletransformaumasituaçãojurídica,alterandoumestadopelaconjunçãoou
disjunção entre sujeitos e valores objetivos ou modais. A conjunção pode ocorrer pela
atribuição transitiva do valor de um sujeito para outro ou por um ato reflexivo, este
caracterizandoumaapropriação.Nessemesmosentidoéaprivação,ouseja,decorredeato
transitivodeumsujeitooudeumatoreflexivo,que,nestecaso,configuraumarenúncia.
Landowskiexemplificataisrelaçõesapartirdealgunsatosjurídicospraticadosem
direitopúblico:
Assimsedá,entreoutrascoisas,comas“decisões”unilateraisconhecidas
emdireito público,tipicamente analisáveis comoatribuiçõestransitivasde
valores modais (da ordem do poder-fazer: serão as “prerrogativas”
decorrentes, por exemplo, da colação de um grau ou da obtenção de um
alvarádeconstrução,e/oudaordemdodever-fazer:as“sujeições”ligadasa
uma concessão de serviço público), mas também, eventualmente, como
verdadeiras apropriações, de modo reflexivo, operadas em benefício do
poderpúblicoeconcernentesàcirculaçãodevaloresobjetivos,muitomais
doquemodais(a“desapropriação”emrazãodeutilidadepública);etambém
das“convenções”jáevocadascomoformasdedoaçãorecíproca;ouaindade
atos mais particulares, talcomo os atos “abdicatórios” do direito privado,
que se deixam notoriamente descrever como privações, objetivas também
nesse caso (mais que modais), efetuadas de modo reflexivoetc. (1992, p.
67).
As relações intersubjetivas, comandadas pelas modalizações, levam a um modelo
actancial do Direito que comporta dois tipos de relações. As primeiras, definidas no eixo
horizontal, determinam a trajetória do sujeito do fazer versus o sujeito de estado e do
destinadormandatário(manipulador)versusodestinadorjudicador;assegundas,noeixoda
verticalidade, que definem relações hierárquicas entre um destinador epistemológico, um
destinadoraxiológicoeossujeitosdedireitos.
Alei,no sentidoderegradeDireito, provémde um procedimentotranscendental,
cujafinalidadeéconferirumsentidoformuladoemtermosdeônticos-obrigatório,proibido,
permitido–aosfenômenosquerevestemosatossociaispelaracionalidadejurídica,através
dodiscursodoDireito.
Namedidaemqueasignificaçãojurídicadoqueossujeitosfazeméditaporuma
instânciaenunciadoraque ostranscende,os sujeitos,daautonomia passamaheteronomia
3
.

3
AurélioBuarquedeHolandaFerreiradefineotermoheteronomiacomoacondiçãodapessoaoudogrupoque
recebedeumelementoquelheéexterior,oudeumprincípioestranhoàrazão,aleiaquesedevasubmeter.
52
Essainstânciasuperior, porquedetermina asaçõesdos sujeitos, em relação aeles ocupa a
posiçãohierárquicadeactantedestinador.
LandowskichamaatençãodequeoDireito,noqueserefereàsrelaçõesactanciaise
actoriais, adota o princípio da desconcentração, distinguindo, em geral, para cada papel
actancialumactorialcorrespondente.Mencionaqueasdecisõesjurisprudenciaisevidenciam
essenão-sincretismo,atravésdoadágio“ninguémpodeseraomesmotempojuiz(sujeitodo
fazerdecisional)eparte(sujeitodeestado)”.Omesmoéverificávelnoscontratos,emquea
distinção dos papéis actanciais é traduzida no plano actorial pela reciprocidade da relação
entredoisatores,cadaumassumindoemrelaçãoaooutroopapeldesujeitotransformadorde
estado.Essamesmatendênciaserepetenosatoslegislativosquecriamdireitosaossujeitos
emgeral,impessoalmentedefinidos.Oprincípiodonão-sincretismotambéméreveladono
fatojurídicoligadoàresponsabilidade,jáqueoautordofatoéaquelequecriaodanoeque
teráoestadomodificadopelaaçãojurídicadavítima,sujeitodofazer.
AsopçõesqueoDireitoefetuaeasrestriçõesqueeleimpõeevidenciamadistinção
entreaclassedosatosvirtuais,quepertencemàordemjurídica,eadosatosque,nãoentrando
paratalordem,simplesmentenãotêmexistênciajurídica.
A elaboração cognitiva das normas gramaticais, que determinam a construção
ulteriorderegrasjurídicaspropriamenteditas,compõeonúcleodateoriadoDireito.Édessa
instância que emanam as normas de segundo grau que regem a enunciação das regras de
primeirograu.Landowskiidentificaessainstânciasuperiorcomodestinadorepistemológicoe
a instância a ela subordinada, a qual enuncia as regras de vida em sociedade, de caráter
obrigatório, de destinador axiológico. Enquanto a competência epistemológica seleciona
formas gramaticais gerais que tornam possível a existência de objetos jurídicos, a
competência axiológica define-se pela atribuição de valores jurídicos a determinadas
ocorrênciasdosesquemassintáxicosreconhecidospelonívelepistemológico.Noâmbitoda
ordem jurídica, epistemologicamente preestabelecida, conforma-se a ordem legal,
axiologicamentedeterminada.Aidentificaçãodessespapéispermiteaapresentaçãodelinhas
mestrasdoesquemanarrativopelaintegraçãodoselementosapontadosumaum.
Landowski esclarece que, no Direito, duas são as possibilidades de posições
enunciativasaxiológicas.Aquelaqueestatuivaloresaoselementosaindavirtuais,atravésde
enunciadosapriori,emqueoactanteaparecenaposiçãodedestinadormandatário,portanto,
um manipulador; e aquela que, através de enunciado a posteriori, determina um valor a
elementos realizados pelos sujeitos. Na primeira situação, o destinador assume a
53
competêncialegislante epodesertraduzido pelolegislador;nasegunda, surgemas figuras
actoriaisdojudicador.
Considerando essas relações, o autor apresenta um esquema narrativo do Direito,
representadonasuahorizontalidadeeverticalidade,daseguinteforma:
Figura5
As flechas verticais representam as relações hierárquicas intra-sistêmica em que o
metadestinadorestabeleceoscritériosgramaticaisaodestinadorque,porsuavez,emfunção
dacompetênciaaxiológicaestatutáriaouocasional,determinaaclassedeatoressociais,cuja
situaçãooucujosatosostransformamemsujeitosdedireito.Asflechashorizontaisindicam
essaduplaorientaçãoprospectivae retrospectivadasintervençõesdo destinador axiológico
emrelaçãoaossujeitosdefazer,estesequivalentementeprogramadose/ousancionadosem
virtudedasregrasdedireitoenunciadaspelodestinadordemodolegislantee/oujudicante.
Todavia,Landowskiafirmaqueessaestruturanãoéestáticaelinearesimdinâmica,
jogando consigo mesma internamente e, por isso, funcionando à base de outros princípios
complementares:
Assim, vimos delinear-se até agora, sem muita dificuldade, o sistema de
dependênciasinter-actanciaisque,denívelemnível,levaporpressuposições
sucessivas atores sociais, sujeitos de um fazer referencial qualquer, a
“Sujeitosdedireito”,constituídoscomotaispelasubmissãodesuasrelações
mútuas à regra de direito editada por um “Destinador” – ele próprio
colocado,porsuavez,dopontodevistadasuacompetênciaenunciativa,sob
a dependência do Metadestinador “epistemológico”. Mas a estrutura
estratificada não poderia ser puramente estática. Intuitivamente, sentimos
bemqueeladevedecertomodo“jogar”consigomesma(1992,p.76).
No eixo horizontal, as estruturas actanciais são constantes, enquanto os papéis
actoriaisrespeitamaumprincípiodepermuta.NãosóemDireito,mastambémnele,qualquer
uma das posições pode ser ocupada por diferentes atores, desde que as relações actanciais
encontrem, na superfície, a sua tradução actorial. Isso quer dizer que qualquer ator tem
54
vocaçãoparaocuparqualquerumadasposições,podendo,inclusive,ocuparmaisdeuma.O
queoDireitoexclui,emvirtudedoprincípiodonão-sincretismoéaaniquilaçãodeumpapel
actancial pela acumulação actorial. Isso demonstra que a gramática do Direito tem como
tópico as relações intersubjetivas e não os termos que ela une, diferenciando-se de outras
gramáticasnormativasque,porexemplo,soboregimedeumaleimoraltemcomoobjetoos
comportamentosdossujeitos.
No plano vertical, o dispositivo actancial de base, constituído pelas relações de
subordinaçãodossujeitosqueagemàsinstânciasmandatáriae/oujudicadorareduplicam-se
por um princípio de recursividade, criando cadeias de pressuposições dependentes que se
entrecruzam,atravésdeelos.Landowskiexplicaqueatramajurídicadecorredofazerouato
jurídico em jogo, pois, enquanto transformador de estado, pressupõe uma competência
delegadapelodestinadormandanteeadmiteumasançãoexercidapelodestinadorjudicador,
relaçãoesta,aque,recursivamente,seaplicamasmesmasinstânciasdestinadoras.
De fato, atribuir (enquanto mandante) uma competência a um sujeito, ou
sancionar (enquanto judicador) seu fazer, é também, é mesmo por
excelência,transformarsituaçõesjurídicas,e,portantoexercerumfazernão
menos estritamente “jurídico”. Por conseguinte, consideradas como
destinadorasemrelaçãoaossujeitosqueelasvisamnumprimeironível,as
instâncias “legislantes” e “judicadoras” deverão elas mesmas ser
consideradas,porsuavez,comosimplessujeitosdefazeremrelaçãoanovas
instâncias destinadoras previsíveis nos níveis imediatamente superiores
(1992,p.80).
Issoquerdizerquetodomandanteteráseuprópriomandantee,simetricamente,todo
judicadorpoderásersancionado,damesmamaneiraquetodomandantepoderá,noexercício
desuafunção,sersancionadoetodojudicadorremetidoaostermosdomandatoquedelimita
oexercíciodasuafunçãojudicadora.Comessemodelo,Landowskireafirmasuaintenção,a
partir de conceitos da semiótica geral, de compreender como o jurídico concilia os
imperativosdeordemedemovimento.
Greimas(1981),emcolaboraçãocomLandowski,aoanalisaraLeidasSociedades
Comerciais da França, também traça alguns aspectos gerais da gramática jurídica, mas
ultrapassando o plano das regras gramaticais para o nível de uma semântica jurídica. Ele
defineodiscursojurídicocomoumsubconjuntodetextosquefazempartedeumconjunto
maisvastoconstituídodetodosostextosmanifestadosnumalínguanaturalqualquer,nãosó
porqueimplicaumaorganizaçãoespecíficadesuasunidades,mastambémporquepossuiuma
conotaçãoparticular.O autor afirmaqueépossível distinguirodiscursojurídico deoutros
discursosnãosóatravésdesuasestruturasgramaticais,mastambémdaslexicaisrecorrentes.
55
Enquantoarecorrênciaaumconjuntoderegrasgramaticaisinferequeodiscursojurídicoé
produzido,quantoàforma,porumagramáticajurídicadistintadagramáticadalínguanatural
na qual se manifesta, a recorrência lexical permite postular a existência de um dicionário
jurídicoautônomo,quedeterminaumuniversosemânticojurídico.
Por essas razões, as manifestações discursivas que remetem à gramática e à
semânticajurídicaconformamumasemióticajurídica,poisostextosqueaelapertencemsão
produtos de uma gramática e a manifestação de um universo semântico particular. A
semióticajurídica tem seuestatuto nas regrasgramaticais do Direito aplicadasao universo
jurídicopresente,sobaformadeumnívelreferencialassumidoporumdiscursolegislativo.
Nesse sentido, Greimas esclarece que o discurso jurídico parece ser sempre
contaminado de uma duplicidade, porque se desenvolve sobre dupla isotopia: a primeira
correspondeaosenunciadosperformativosenormativosdodiscursolegislativoe,asegunda,
apresenta-sesobaformadediscursoreferencial,queelaboraacoberturadiscursivadomundo
social.RefereGreimasque:
Freqüentemente confundidos num mesmo texto jurídico, os dois níveis
discursivos são assim as únicas “realidades” que se apresentam à análise
semântica: as dependências de uma isotopia em relação à outra, suas
interferênciasmútuas,constituempelocontrárioumaproblemáticaestrutural
cujaelucidaçãopermiteemcertamedidadefiniraespecificidadedodiscurso
jurídicoenquantotal(1976,p.74).
Oautormostraqueasrelaçõesentreaduplaisotopiaocorremnaordemdoparecer
semióticoedosersemiótico.Aremessaconstantedodiscursolegislativoàssignificaçõesdo
discursoreferencial,comoseestefosseanterioràquele,odiscursolegislativonãopassandode
umafalasobreascoisascujaexistênciaéevidente,estabeleceumapressuposiçãológicada
ordemdoparecersemiótico,pois,defato,éodiscursolegislativoqueselecionaelementos
referenciaisnalínguanatural,conferindo-lhesoestatutodenívelreferenciale,operandoseu
fechamento em relação às significações circundantes, integra-os no discurso jurídico.
Portanto, na ordem do ser semiótico, o nível legislativo em Direito é anterior e se acha
pressupostopelonívelreferencial.
Greimas ainda refere que o discurso jurídico, na condição de discurso conotado,
criadordeumconjuntodeefeitosdesentido,constituiadimensãosimbólicaautônomaquedá
contadosdiscursosjurídicosedasinstituiçõesdeDireito.
InteressaaquimencionaraexplicaçãodeconotaçãotraçadaporBarthes(1964).Ele
explica a conotação como dois sistemas de significação imbricados um no outro, mas,
também,desengatadosumemrelaçãoaooutro.Opontodeinserçãodoprimeirosistemano
56
segundoéoquedeterminaaconotação;oprimeiro,constituindoosignificantedosegundo.
Seguindo a semiótica conotativa de Hjelmslev, Barthes mostra que a conotação resulta da
relaçãoentredoissistemas,oprimeiroconstituindooplanodadenotação.Assim,alinguagem
articulada, por exemplo, poderia ser o primeiro sistema que, formado por signos –
significantes e significados, planos de conteúdo e expressão – do sistema denotado,
constituiriaossignificantesdeconotaçãodalinguagemjurídica.
Noqueserefereaodiscursojurídico,Greimaspostulaqueaconotaçãopodetrazerà
compreensão as aparências mitificantes do discurso jurídico, cujo conjunto de conotações
vagasassumidaspelo leitor– incompreensão,respeito,ameaçaimplícita- confereaotexto
sua“juridicidade”,permitindoclassificá-lo,semqualquerreferênciaprecisaaoseuconteúdo
comoumdiscursojurídico,distintodeoutrosdiscursoscomparáveis.
Quanto aos aspectos gramaticais, comparando a gramática jurídica com outras,
Greimas aponta algumas particularidades dessa gramática. A primeira, diz respeito à
explicitaçãodasregrasqueaconformam:
[...] enquanto a gramática das semióticas está freqüentemente implícita,
subjacenteaosdiscursosqueproduz(éocaso,porexemplo,docódigode
boas maneirasà mesa), agramáticajurídicapretendeserexplícitaeexibe
ostensivamenteocorpodessasregras(1976,p.77).
As regras que constituem o corpo da gramática jurídica conformam dois tipos de
enunciados fundamentais vinculados a grades modais. O primeiro tipo são os enunciados
qualificativos, vinculados à modalidade do ser, que atribuem existência aos objetos do
Direito. Para o Direito a existência nasce do dito do dizer do legislador: só o que é
explicitamenteditopossuioestatutodeexistente(1976,p.78).Éacategoriadoditoversuso
não-ditoquefundaaconstruçãoarbitráriaeexplícitadagramáticajurídica,cujocritérioéo
explícito.
O outro enunciado fundamental é da ordem modal do fazer. São enunciados
funcionaisquefixamaesferaoperacionaldoobjetosemióticojáchamadoàexistência.São
enunciados que regulamentam o conjunto previsível de comportamentos. Enquanto os
enunciadosqualificativosanunciamossereseascoisasàexistência,osenunciadosfuncionais
atribuem aos seres e às coisas funções precisas delimitadas por regras prescritivas e
proibitivas.
As relações entre esses dois tipos de enunciados levam à outra particularidade da
gramáticajurídica em relação aoutras gramáticas, com basenaprática jurídica. Embora o
sistemajurídicoinstaureumaordemdomundodeformaconvencionaleexplícita,atravésde
57
enunciadosqualificativosefuncionais,osdiscursosjurídicosnãosãoimutáveis,massempre
renovados pela recorrência à verificação da validade da linguagem instituída, através da
prática jurídica. Das relações entre os dois elementos que revelam a semiótica jurídica, a
gramáticaeasemânticaespecíficas,extrai-sequeaproduçãojurídicaimplicaatransformação
do conteúdo virtual assemântico em conteúdo jurídico semântico, a partir da utilização da
forma gramatical. A prática jurídica, por sua vez, faz a verificação da validade dessa
linguageminstituída,transformandoosenunciadosagramaticaisemenunciadosgramaticais,a
partirdasemanticidade jurídicado conteúdodesses enunciados.Diferentemente,asoutras
gramáticas testam sua validade ou através de uma metalinguagem que busca estatuir a
coerênciainternadeseusconceitoseregrasoupelacomparaçãodosenunciadosengendrados
pelagramáticacomassuasformascanônicas.
Concluindo, a partir dos estudos semióticos aplicados ao Direito e ao discurso
jurídico, aqui mostrados, é possível distinguir diferentes concepções teóricas, através dos
postuladosdePeirceedeGreimas.Naconcepçãopeirciana,oDireitoPositivo,representado
pelas normas jurídicas, é assumido como um código composto de mensagens normativas
enviadaspelolegisladoraosdestinatários.ODireitoétomadocomoumsistemadesignos,
cuja finalidade é a comunicação de padrões de conduta. Sob esse prisma, as relações
analisadassãoasquedizemrespeitoàorganizaçãohierárquicadospreceitosnormativos,que
define critérios para a interpretação da linguagem prescritiva. Diferentemente, à luz do
modelo greimasiano, o Direito é concebido como um conjunto de ações ou fazeres que
colocamossujeitosdedireitoemrelação,sobaformadeummodeloactancialpermanente.A
semiótica jurídica tem seu estatuto na aplicação da normatização do Direito ao universo
jurídicopresenteNessecaso,sãoasrelaçõesactanciaisque,progressivamente,naformade
umpercursogerativodesentidos,conformamprocessosdeinfluênciadossujeitosunssobre
osoutros,conceituandoacomunicaçãonãocomomeroprocessodetransmissãoerecepçãode
umcódigo,mascomoumfazer-crerqueresulteemumfazer-fazer.
Sobaluzdomodelosemióticofrancêsgreimasiano,estadissertaçãovolta-separao
estudo das relações que determinama organização narrativa ediscursivaque engendram a
significaçãododiscursojurídicodeaplicaçãodoDireito,naspetiçõesiniciais.
58
3.1Apetiçãoinicialeoprocessojudicial
Conformejámencionado,oobjetodeestudosemióticodestetrabalhoéodiscursode
aplicaçãodoDireito,realizadoapartirdaanálisedepetiçõesiniciais,quesãotextosformais
previstosemlei.
Aspetiçõesiniciaissãoinstrumentoslegaisparaainstauraçãodoprocessojudicial.
Paraa compreensãodo que são as petições iniciaisé oportuno oentendimento do que é e
comofuncionaoprocessojudicial.Comessafinalidadeéqueseapresentanestesubitemo
percurso do que se chama pretensão, no sentido jurisdicional, até a formação do processo
judicial,para,após,explicarasparticularidadesdaspetiçõesiniciais,objetodeanálisedeste
trabalho.
RobertAlexy(2001)aoreportar-seaodiscursojurídicocomoumcasoespecialdo
discursopráticogeralreferediferentestiposdediscussõesjurídicas,quepodemimplicarentre
outrastantasodebatesobreadogmáticalegal,osdebatesnotribunal,tratamentosjurídicosde
questõeslegais,discussões legais entre estudantes ouentre juristas ou advogados ouainda
entrepessoasjuridicamentequalificadasnaindústriaouadministração,queassumemaforma
de argumentos legais. Há diferenças entre essas formas de discussão, pois algumas delas,
comoasnegociaçõesnotribunaleasdeliberaçõesjudiciaissãoinstitucionalizadasenquanto
outras,diversamente,não;algumasdessasformasexigemumaconclusãodentrodeumlimite
detempoenquantooutras,taiscomoasdiscussõesdogmáticas,nãosãolimitadasnotempo;
algumas resultam em decisões comprometedoras ao passo que outras somente sugerem ou
estabelecem críticas a decisões. Todavia, o traço comum que essas formas têm é a
argumentaçãojurídica,estacaracterizadapeloseurelacionamentocomaleiválida,umavez
quenocontextodadiscussãojurídicanemtodasasquestõesestãoabertasaodebate.Portanto,
éumadiscussãoqueocorrecomlimitações.
Nesse sentido, Alexy refere que a extensão e os tipos de limitações são muito
diferentesentreessasformas:
Amaislivreemenoslimitadaéadiscussãodotipocientíficojurídico.Os
limites são maiores no contexto de um processo. Aqui os papéis são
desigualmentedistribuídos,aparticipaçãodoacusadonãoévoluntária,ea
obrigaçãodedizeraverdadeé limitada.Oprocessode argumentaçãotem
limitenotempoeéreguladopelasleisprocessuais.Aspartessãoinstruídas
a se guiar pelos próprios interesses. Com freqüência, talvez mesmo seja
comum,elasnãosepreocupamcomchegaraumresultadojustooucorreto,
masantesaumresultadoquesejavantajosoparasimesmas(2001,p.212).
59
ConsiderandoessaspalavrasdeAlexysobreadiversidadedediscussõesjurídicas,as
quaisocorrematravésdodiscurso,evoltandoàsreflexõesde Landowskisobreasrelações
actanciais no Direito, que prevêem as ações de um destinador legislador e/ou de um
destinador judicador, pode-se pensar em uma divisão do discurso jurídico em dois
subconjuntos:osdiscursosdeproduçãodoDireito,quefundamasatividadeslegislantesde
produçãode normas jurídicas e os discursos de aplicação do Direito, que fundamentamas
práticasjurídicassobdiferentesformas.Dentreessasúltimaslocaliza-seoprocessojudicial,
instrumentoatravésdoqualsedesenvolveaatividadejurisdicional.
E, nas palavras de Moacyr Amaral dos Santos (1997, p. 11)o processo é uma
operaçãopormeiodaqualseobtémacomposiçãodeumalide.Taldefiniçãoqueparecetão
simples,naverdade,envolveumacomplexidadedeconceitosdenaturezajurídica.
A lide é o confronto de interesses entre dois sujeitos direcionados a um mesmo
objeto,cujapretensãodeumdosinteressadoséresistidapelooutro.Éoconflitodeinteresses
qualificadopor uma pretensão resistida. Oprocesso é o conjunto de atos coordenadosque
visam à composição da lide. Compor a lide significa resolvê-la de acordo com os
mandamentosdaordemjurídica,respeitadosostermosdavontadedalei.
Os atos constitutivos do processo e nele realizados resultam de atividades dos
sujeitos titularesdos interessesem conflito edoórgão jurisdicional. Tais atosocorrem em
umadeterminadaordem,ditadapelofimaquevisam:acomposiçãodalideatravésdeumato
jurisdicional. Eles sucedem-se de uma forma coordenada, uns causando os outros até o
esgotamento da atividade jurisdicional, com obediência a princípios e normas legais. O
processo, portanto, como sistema de atos, se rege por princípios e leis, constituindo um
fenômenoquesesituanocampododireito(1997,p.13).Denomina-sedireitoprocessualo
sistemadeprincípiosenormaslegaisqueregulamoprocesso,disciplinandoasatividadesdos
sujeitos interessados e do órgão jurisdicional. Assim, o processo é o instrumento utilizado
paraoexercíciodafunçãojurisdicionalatribuídaaoPoderJudiciário.
Como meio de exercício da atividade jurisdicional, esse instrumento requer uma
ação, a partir da ocorrência de um conflito. Assim, diante da lide surge ao prejudicado o
direito à prestação jurisdicional do Estado, cujo papel é fazer atuar a vontade da lei. Esse
direitodeprovocaçãodoórgãojurisdicional,subjetivoedecaráterpúblico,édenominado,
juridicamente,dedireitodeação.
ComoaoEstadointeressaamanutençãodaordemjurídica,éseudeverprovidenciá-
laquandoprovocado.Portalrazão,ojuizqueserecusaraoexercíciododeverjurisdicional,
quando solicitado, eis que é delegado do Estado, dará causa à responsabilidade judicial.
60
Destarte,o direito de ação é um direito contra o Estado. Siqueira Ferreiraesclarece que a
expressãodireitocontranãosignificasempreconflito deinteresses,mas simexistênciade
credorededevedor(apudAmaral,1997,p.15.)emoutraspalavras,DireitocontraoEstado
significaqueesteúltimoéobrigadoemfacedotitulardodireito.
Taiscircunstâncias ratificamtanto o esquemanarrativo proposto por Landowski –
emdireitoasrelaçõesdesubordinaçãodossujeitosqueagemàsinstânciasmandatáriae/ou
judicadora reduplicam-se por um princípio de recursividade, criando cadeias de
pressuposições dependentes que se entrecruzam, através de elos – como o postulado de
Greimasdequeodiscursojurídicopossui,alémdeumagramática,umdicionárioparticular
quedácontadeumasemânticajurídica.
A ação é, assim, o direito de pedir a prestação jurisdicional ao Estado, quando o
direitodeagiréconfiguradoemumcasoconcreto.Taldireitoémanifestadonapretensãoque
umsujeitoformulaeparaaqualrequeratutelajurisdicional.Oórgãojurisdicional,porsua
vez,deveráproferirumadecisãosobreapretensãoformulada,acolhendo-aounão,tutelando-
aounão.
Contudo, como dito anteriormente, o Direito estabelece uma ordem baseada em
limites e restrições. Por isso, o direito de agir encontra-se subordinado a três condições e,
faltandoqualquerumadelas,declaradaseráacarênciadeaçãodopostulante,ficandooórgão
jurisdicionaldispensadodedecidiromérito,ouseja,odireitosubstancialpostulado.
A primeira das condições da ação é a possibilidade jurídica do pedido, que diz
respeito à existência de conexão entre o interesse pretendido e a tutela abstrata do Direito
normativo.Emoutraspalavras,considerandoasduasisotopiasdodiscursojurídicopropostas
porGreimas,odiscursoreferencialquerecobreointeressepretendidodeveráencontrarasua
seleçãoanteriorpelodiscursojurídiconormatizado.Asegundacondiçãoéointeressedeagir,
quenãoseconfundecomointeressesubstancialtutelado,masneleencontraosuporteparaa
ação.MoacyrAmaraldosSantosreferequeoquemoveaaçãoéointeressenacomposição
dalide(interessedeagir),nãoointeressenalide(interessesubstancial).Aterceiracondiçãoé
aqualidadeparaagir,quecondizcomalegitimidadedequemofaz.Alegitimaçãodefine-se
pelatitularidadedointeressecontido napretensão.Portanto, sãotitulares paraagir,ativa e
passivamente,ostitularesdosinteressesemconflito.
Aação, portanto, éo que suscita o processo, instrumento formalque estabelece a
relaçãoprocessualentresujeitostitularesdeinteressesemoposição.Retomando,aaçãoéa
invocaçãodaatividadejurisdicional,atravésdoprocessojudicial,quesedesenvolveemuma
sériedeatosformaisquevisamaoalcancedeumadecisão.
61
ComooDireitoéfeitodeprincípioseregras,odesenvolvimentodoprocesso-as
atividades dos sujeitos interessados e do órgão jurisdicional - também é disciplinado
legalmenteporumsistemadeprincípiosenormaslegais.
Nessaesteira,aaçãodosujeitodedireitoiniciacomumtextoformalendereçadoao
órgão jurisdicional, onde é explicitada sua pretensão e fundada a relação jurídica litigiosa,
que, por sua vez, instaura o processo judicial. O texto formal que dá origem ao processo
judicialédenominadopetiçãoinicialou,simplesmente,inicial.
ApetiçãoinicialéumtextoformalprevistopelosistemaprocessualdoDireitoe,por
isso,normatizadonoCódigodeProcessoCivilBrasileiro,noartigo282eseusincisos
4
.Serão
apresentadosaquiosrequisitosqueainformambemcomosuaestrutura.Todavia,antesdisso,
aborda-seum aspectorelacionado àlinguagem, eisque ésobrepressupostosda linguagem
queestetrabalhoancora-se.Assim,oportunassãoaspalavrasdeAnnaMariaBeckerMaciel
(2001,p.119)que,sobreotextojurídico,diz:
Otextojurídicorepresentaoespaçodeconcretizaçãodalinguagemjurídica
manifestadaemmúltiplasformasdeacordocomafinalidadeeascondições
doeventocomunicativo.Detalmultiplicidade,decorremdiferentestiposde
textos orais e escritos, produzidos por diferentes autores e dirigidos a
distintosdestinatáriosparaatenderadiferentesobjetivos.
AmesmaautoracolocaalinguagemjurídicasobaconcepçãodebasedeAustin,de
quealínguanãoéutilizadasomenteparadescreverumestadodecoisas,mastambémpara
realizarações,demodoquenaenunciaçãocoexistemumdizereumfazer,noçãoqueconfere
especificidadeàlinguagem jurídica.Utilizandotalperspectiva,apesquisadorareferequeo
núcleodoatodaquelequefalaemnomedaleiéconstituídoporumverboperformativo,isto
é,umverboquerealizaumaaçãoquandoproferido.
Comefeito,apetiçãoinicialéoinstrumentoqueformalizaaaçãodeumsujeitoem
facedeumapretensãoaopassoquefundaoprocessojudicial.Poressarazãoéquenaparte
preambularégeralmenteutilizadooperformativopropor,verboqueestabeleceoatoqueestá
sendo praticado: a propositura da ação de um sujeito de direito, em busca da tutela
jurisdicional.
Geraldo Stélio Martins (1997) em ensaio que trata dos elementos estruturais da
petiçãoinicialressaltaqueestaconstituioinstrumentoconcretopeloqualoautormanifesta,

4
Art.282.Apetiçãoindicará:
I–ojuizouotribunal,aqueédirigida;IIosnomes,prenomes,estadocivil,profissão,domicílioeresidência
doautoredoréu;III–ofatoeosfundamentosjurídicosdopedido;IV–opedido,comsuasespecificações;V–
ovalordacausa;VI–asprovascomqueoautorpretendedemonstraraverdadedosfatosalegados;VII–o
requerimentoparaacitaçãodoréu.
62
peranteo magistrado, oseu desejo de acionar determinadapessoa,expondo sua pretensão,
comoobjetivodereceberaprestaçãojurisdicional.
MoacyrdosSantosAmaraldizqueépormeiodapetiçãoinicialqueoautorformula
asuapretensão,fundamentando-a,pedindoaojuizumaprovidênciajurisdicionalqueatutele.
Dizomesmoautorsobreainicial:
Apresentadaaojuiz,ousimplesmentedistribuídae,pois,propostaaaçãodá
ainicialnascimentoaoprocesso.Éoatoinicialdoprocesso,edoqualos
demaisatosderivamesesucedememdireçãoàsentença.Petiçãoiniciale
sentença são os atos extremos do processo. Aquela determina o conteúdo
desta.Aquela,oatomaisimportantedaparte,quereclamaatutelajurídica
do juiz; esta, o ato mais importante do juiz, a entregar a prestação
jurisdicionalquelheéexigida(1998,p.130).
Omesmoautoraindaressaltaqueapretensãopressupõeumsujeitopassivo,contra
quemouemfacedequemoautorpedeatutelajurídica.
EdmundoDantesNascimento(1992,p.205)atribuiimportânciaabsolutaàpetição
inicial, já que da feitura da petição inicial depende o êxito positivo na demanda, o que
evidenciaoaspectoargumentativo-persuasivodapeçaprocessualemquestão.Descritapela
lei processual, especificamente, no artigo 282 do Código de Processo Civil Brasileiro, a
petição inicial possui requisitos necessários que, não observados, podem acarretar o seu
indeferimento,deixandodeseinstauraroprocessojudicial.
Em primeiro lugar, na sua formulação, ela deverá indicar o juízo a que compete
apreciar a demanda, de acordo com a legislação constitucional e processual, as quais
estabelecem a distribuição de competência de jurisdição dentro dos vários órgãos
jurisdicionais.
Arelaçãojurídicainstaura-secomoprocesso,constituídapelojuizeaspartes,estas
últimas em posições antagônicas, em situação de conflito. As partes, em geral são
denominadasde autore réu, oprimeiro o quepedea prestaçãojurisdicional e, osegundo,
aquelecontra quem é proposta ademanda. Ressalte-seque as partes podem receberoutras
denominações,conformeaaçãoprocessualqueestásendopraticada.Nocasoderecursode
apelação,porexemplo,oparativo/passivo,respectivamente,édenominadoapelante/apelado;
no recurso de agravo, agravante/agravado; na ação de embargos de terceiro,
embargante/embargado;naaçãodeexecução,exeqüente-executado.
O conceito de partes pode ser identificado em sentido material e processual. No
primeiro sentido, as partes são os sujeitos da relação material, ou seja, os titulares dos
interesses opostos. No sentido processual, as partes são os sujeitos do processo, que nem
63
semprecoincidemcomossujeitosdarelaçãomaterial.Todavia,paraserparteemqualquer
dosdoissentidosénecessáriotercapacidade.Acapacidadematerialéconferidaaosujeitoda
relaçãomaterialepossuem-natodososserescapazesdedireitoseobrigações.Acapacidade
processualéadeestaremjuízoealeiprocessualaconfereatodosqueseachamnoexercício
deseusdireitos.Há,portanto,aí,aconsonânciadaleicivilcomaprocessual,namedidaem
queaspessoasqueestãonoexercíciodosatosdaleicivil,estãocapacitadasaestaremem
juízo.
Dentreos elementos que constituema capacidade processual está a representação,
pois muitas pessoas com plena capacidade civil e processual somente podem exercer seus
direitos e obrigações por meio de mandatários. Exemplo de tal situação são as pessoas
jurídicas de direito privado que, comparecem em juízo, necessariamente, através de seus
representantes. O mesmo ocorre com as pessoas jurídicas de direito público ou com as
pessoasconsideradasabsolutamenteincapazespeloCódigoCivil.
Mas,Moacyrdos SantosAmaralrefereumoutrotipo derepresentaçãonosistema
processual, relacionada à capacidade postulatória, sem a qual não é possível nem a
constituição nem o desenvolvimento da relação processual: a representação da parte no
processo,porpessoalegalmentehabilitadaapostularemjuízo.NadefiniçãodeCalamandrei
(apudAmaral,1997,p.132)odireitodepostularemjuízoéopoderdetratardiretamente
como juiz, de expor-lhe diretamenteos pedidos e as deduções das partes. Destarte, para
postularemjuízo,aparteinteressada,alémdacapacidadeprocessualnecessitadacapacidade
postulatória,que,no sistemalegalbrasileiro é,emregra,privativadeadvogados.Assim, a
parte exprime a sua capacidade postulatória representando-se, no processo, por meio de
advogado,aquemconferemandato.Noentanto,parte,narelaçãoprocessual,éorepresentado
enãoomandatário.
Outros requisitos da petição inicial são os fatos e os fundamentos jurídicos do
pedido.Éatravésdaexposiçãodosfatosedosfundamentosquetransparecemascondiçõesda
ação:apossibilidadejurídicadopedido,alegitimaçãoparaagir,ointeressedeagir.Apósos
fatoseosfundamentoséavezdopedido.Opedidoéoobjetodaaçãoedoprocesso.Segundo
Pontes de Miranda (apud Amaral, 1998, p.132) o pedido deve ser concludente: estar de
acordocomoqueseexpõe,comacausadepedir.
Na petição inicial ainda deverão estar indicadas as provas com as quais o autor
pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados, pois é dele o ônus de provar suas
afirmações.Outro requisitoindispensável é o requerimentopara a citação do réu, já que a
partir da citação é que será completada a constituição da relação processual. Por fim, na
64
inicial, deverá ser atribuído um valor para a causa, ainda que ela não possua um valor
econômico.Talexigênciaéjustificadaporváriasrazões:ovalordacausadeterminaojuízo
competenteouotipodeprocedimentoprocessualquedeveráserseguido;servedebaseparaa
fixaçãodataxajudiciáriaedebaseparaocálculodascustasedespesasdoprocesso;ovalor
dacausaexpressaovalordopedido.
Apetiçãoinicial,alémdosrequisitosdeconteúdopossuirequisitosdeforma.Elase
apresenta em uma disposição gráfica padronizada. O quadro a seguir mostra sua estrutura
formalgráfica.
EXMO.SR.DR.JUIZDEDIREITODA______VARACÍVELDACOMARCADE_____________________/RS

espaçoparadespachodojuiz(aproximadamente10cm)
PREÂMBULO(qualificaçãodasparteseindicaçãodaaçãoproposta)
......, brasileiro, separado judicialmente, engenheiro mecânico, residente e domiciliado na cidade
....., na Av. ..... nº..., Bairro ...., por seus procuradores firmatários, vem, respeitosamente, à
presença de Vossa Excelência, propor AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS, de acordo
com a Lei 5.478/68 e art. 273 do CPC, em face de ..., brasileira, separada judicialmente, residente
e domiciliada na cidade de ...... na Rua ....., ...., Bairro ..., pelos motivos fáticos e jurídicos a
seguir expostos.
DOSFATOS
1. Orequerenteseparou-sejudicialmentedarequeridaem16deoutubrode1991,
comtrânsitoemjulgadodasentença,nadatade31deoutubrode1991,conformefls.10v.,11e11v.,dosautosdaAção
deSeparaçãoConsensual,sobon.º.......,quetramitouna......VaraCíveldestaComarca.
...............
DOSFUNDAMENTOS
5.Asituaçãoemtelasepõeexatamentecomoprevêaletraclaradosartigos399,400e401
doCódigoCivile471daLeiProcessual,sendoinadiávelsuaaplicaçãoparaofimdeexoneraroRequerentedahámuito
desnecessáriaobrigaçãoaqualimpelido.
6.ComobemlecionaoprofessorSergioGilbertoPorto,inDoutrinaePráticados
Alimentos,........
DOPEDIDO
ANTEOEXPOSTO,comfundamentonosartigos273,I,282eseguintesdoCódigode
ProcessoCivil,REQUER:
a)acitaçãodaRequeridaparaque,querendo,contesteostermosdapresenteação,sobpenaderevelia;
b) a produção de todas as provas em direito admitidas, em especial, o depoimento pessoal da requerida, a oitiva de
testemunhasejuntadadedocumentos;
c)Ojulgamentodeprocedênciadapresenteação,sendoexoneradooRequerentedopagamentodasparcelasalimentares.
DáàcausaovalordeR$7.483.50(setemil,quatrocentoseoitentaetrêsreaisecinqüenta
centavos),equivalenteadozeprestaçõesalimentícias.
....................,........de...................de2006.
65
p.p.XXXXXXXXXXXXXXX p.p.XXXXXXXXXXXXX
OAB/RSXXXX
 OAB/RSXXXX
Figura6
3.2Aorganizaçãonarrativadaspetiçõesiniciais
Conformevistonoitemanterior,apetiçãoinicialéumapeçaprocessualformaldo
Direitoque servepara instauraroprocessojudicial, instrumentoformado peloconjunto de
atoscoordenadosparaacomposiçãodeumconflito,quandoodireitodeagirdeumsujeitoé
configuradoemumcasoconcreto.Tambémjáfoivistoqueparapostularemjuízo,aparte
interessada, além da capacidade processual necessita da capacidade postulatória, que, no
sistema legal brasileiroé, em regra,privativa aos advogados. Daí resultaque, nas petições
iniciais, cabe ao advogado configurar, perante o Judiciário, a pretensão de um sujeito de
transformarumarealidade,cujarealizaçãodependedaatividadejurisdicional.
O discurso do advogado nas petições consiste em evidenciar três aspectos: a
pretensão resistida do sujeito que representa, em virtude do confronto dos interesses deste
último com os de outro sujeito; a incidência de uma certa norma jurídica que indique a
solução da controvérsia, o pedido de solução da controvérsia. Para isso ele combina três
ações:anarrativadeumacontecimento,cujoassuntosejaobjetoderegulamentaçãojurídica;
aseleçãodanormajurídicaqueregulamentaoobjetodanarrativa;opedidodeprocedênciada
ação,diantedacombinaçãodosfatoscomafundamentaçãojurídica.Portanto,o
discursodas
petiçõesconciliafatosefundamentosjurídicos,ouseja,umconteúdoinformativoepreceitos
normativosdaordemjurídicaestabelecida,comafinalidadedeobtençãodeumresultado.
Constata-se disso que o discurso das petições iniciais visa, ao mesmo tempo,
provocarofazerdojuizpelodevereinfluenciarsuadecisãopelosaberqueaeletransmite,
condições que investem o narrador do discurso das petições no papel de um destinador
manipulador, cujo destinatário manipulado é o juiz da causa. Com efeito, a prestação
jurisdicional é uma prerrogativa dos sujeitos que diante de um conflito sintam-se
prejudicados, ao passo que é um dever do Estado quando provocado, através de seus
delegados,osjuízesdedireito.Assim,odiscursodaspetiçõesporsisójácolocaojuizem
conjunçãocomodeverdeprestarjurisdição.
Noentanto,comoditoporMoacyrdosSantosAmaralapetiçãoinicialeasentença
sãoosdoisatosextremosdoprocessoemqueaqueladeterminaoconteúdodesta.Porisso,a
manipulaçãodoadvogadonãoserestringeàprovocaçãodojuizparaodeverfazer,maspara
saber fazer, orientado pelo conteúdo da petição inicial com os seus respectivos pedidos.
66
ConformeaspalavrasdeEdmundoDantesdoNascimentoorarepisadas(1992,p.205),da
feituradapetiçãoinicialdependeoêxitonademanda.
Opercursodamanipulação pela doaçãodeum saber iniciananarrativa dosfatos,
com a seleção que o advogado realiza daquilo que, em um acontecimento, adquire maior
relevância para estabelecer uma relação com a regra jurídica que justifique o pedido do
resultado almejado. Dessa forma, ao narrar os fatos, propositadamente, ele enfatiza
determinadosaspectosdaocorrência,deixandodedarrelevânciaaoutros.Assim,emalgumas
petiçõeséenfatizadooestadodoautore,emoutras,acondutadapartecontrária;também
pode ser dada relevância ao objeto disputado pela partes antagônicas ou ser enfatizadas
determinadas relações entre as partes litigantes, que remetam à normatização jurídica
selecionadaparaafundamentaçãodopedido.
A petição do anexo B, por exemplo, visa à declaração do juiz de
inconstitucionalidadedeumaleiinferioradispositivosconstitucionais,queobrigavaosujeito
daaçãojudicial,duranteumperíodoanterioraopresente,aorecolhimentoemduplicidadedo
mesmo tributo, gerando-lhe um crédito passado. A pretensão do autor é obter uma
determinação judicial que lhe possibilite, no presente, compensar débitos tributários
constituídosnopassado.Portalrazão,nanarrativadosfatos,oadvogadoempenha-separa
ressaltardadosquecomprovemorecolhimentoemduplicidadeeoconseqüentecrédito.
2. Recolhia até 2003, mensalmente, a título de imposto sobre produto
industrializado(IPI),0,5%(meioporcento)sobreofaturamento,conforme
preceituaoart.5º,parágrafo2º,daLei9.317/96.
Prevêoartigo:
"Art.5º(...)
§2ºNocasodepessoajurídicacontribuintedoIPI,ospercentuaisreferidos
nesteartigoserãoacrescidosde0,5(meio)pontopercentual".
3. Assim, enquanto tributada pelo SIMPLES, além de recolher
mensalmente o valor, a título de IPI, efetuava, também, o pagamento de
referidoimpostoemcomprasdeprodutosparautilizarnafabricaçãodeseus
transformadores.
Diantedisso,noperíodode1999até2003tem,emcréditodeIPI,aquantia
de R$ 25.203,86 (vinte e cinco mil duzentos e três reais e oitenta e seis
centavos), sem qualquer atualização e não se computando o crédito de
mercadoriasisentas,nãotributáveisousujeitosàalíquotazerodeIPI.
Ressalte-se que este crédito resta comprovado com os relatórios anexos
(Doc.05),emqueestãodiscriminadososnúmerosdasNotasFiscais,adata,
ofornecedor,ovalordaNotaFiscal,opercentualdoIPIerespectivovalor
docréditodoIPI.
67
Talfatoéincontroverso,restandoratificadopelascópiasdasNotasFiscais
(Doc.06).
Salienta-se que foram acostadas apenas algumas cópias, sendo que a
integralidadeeooriginalencontram-senasdependênciasdaAutora,desdejá
colocando-asàdisposiçãodessejuízo,casoentendernecessário.
4. Em que pese a possibilidade de compensação dos créditos do IPI
prevista na Carta Magna, à Autora não foi permitida a utilização do
abatimento,emvirtudedeseroptantedoSIMPLES.
Ou seja, entre 1996 e 2003 houve a superposição do tributo, fato esse
expressamentevedadopelaConstituiçãoFederal.
NapetiçãodoanexoD,afinalidadeéobteradevolução,daparteantagônica,deum
valoraelapagoequivocadamente,sobofundamentojurídicodequequempagouofezpor
erroeaquelequerecebeuenriqueceudeformailícita,eisquerecebeuoquenãoeraseu.Todo
atoilícitopressupõeamá-fé.Comointuitodedemonstrá-la,aonarrarosfatosoadvogado
enfatizaasdiversasatitudesdoautor,semresultado,paraoportunizaradevoluçãodaquantia,
indevidamente,recebida:
3.Verificado o equívoco o demandado foi comunicado atravésde cartas e
telefonemas, contudo não se interessou em devolver o dinheiro sacado
indevidamente.
4.Foi enviado ao demandado uma guia de reposição -GRP - FGTS,
solicitando o pagamento da quantia de R$ 4.634,85, sendo R$ 4.525,78
referente a parcela a repor, sacada indevidamente, R$ 54,62 referente a
correçãomonetáriaeR$63,45referenteamulta,(doc.04).
5.Destaque-se que em 13/03/2003 foi enviada uma correspondência ao
demandado explicando a situação e solicitando a devolução dos valores
sacadosindevidamente,contudo,nãohouvesequerumretornoporpartedo
mesmo(doc.05).
OutroexemploéodoanexoI,emqueaproposituradeaçãovisaàindenizaçãopor
danos morais, em razão de discriminação de um homossexual em uma loja de roupas
femininas. O narrador fundamenta o pedido em dispositivos da Constituição Federal e do
Código de Defesa do Consumidor. Assim, ao narrar os fatos ele enfatiza atitudes do
proprietáriodaloja,partecontrárialitigante,nãosóemrelaçãoàfigurapessoaldoautor,mas
também no que se refere à relação de superioridade econômica em relação ao sujeito
ofendido.Asatitudesligadasàimagempessoaldoautorqueremdemonstraraviolaçãodasua
imagem e dignidade, ambas protegidas por dispositivo constitucional. A ênfase dada às
atitudesnegativasdo sujeitoantagônico,nointerior deseuestabelecimentocomercial,visa
criararelaçãodehipossuficiênciadoautoremrelaçãoaoopositor,ouseja,deinferioridade
68
econômica, condição para invocar a proteção jurídica oferecida pelo digo de Defesa do
Consumidor:
1. Oautoréhomossexualefoivítimadedanosmoraisediscriminação
nointeriordoestabelecimentodademandada.
Paraasurpresadodemandanteoproprietárioimpediuqueomesmo
ingressasse no vestiário, alegando que a loja não vendia produtos para
pessoascomooautorequeovestiárioeradestinadosomenteàmulheres.
2. Ante a insistência do autor em experimentar duas calças, o
proprietáriosolicitouàumafuncionáriaqueoacompanhasseatéooutrolado
daavenida,numoutroestabelecimentocomercialdesuapropriedade,pois,
segundoeste,láhaviaum"localadequadoapessoascomooAutor".
Como as calças não serviram o Autor solicitou um número menor,
entretanto,oproprietáriodissequenãoiriavenderascalçasaoautor,posto
queeraumalojafemininaenãoexistiaprodutosmasculinosavenda.
Novamente, o proprietário colocou o autor em situação vexatória,
afirmando que não venderia roupas ao Autor, porque era uma loja de
produtosfemininos!
4. Extremamenteconstrangidoehumilhado,oAutorsaiudaloja,SEM
OPRODUTOQUEDESEJAVAADQUIRIR,emvirtudedepreconceitodo
proprietáriodoestabelecimentoquesenegouemvenderprodutosaomesmo.

Aênfasedadaa determinadosaspectosna narrativados fatos corroborao estatuto
manipulatóriodofazerdoadvogado,namedidaemqueéelequemcolocaemjogoosvalores
que serão repassados para o julgamento do juiz. É o advogado que determina o valor dos
valores.
Amanipulaçãopelosaber,tambéméevidenciadapelaescolhadasnormasjurídicas
que serão aplicadas ao caso concreto, dentre o universo de possibilidades que o Direito
oferece. Retomando o exemplo do anexo I, ação indenizatória por danos morais, os fatos
servemdereferênciaparaasnormasjurídicasescolhidas,porquepresentificamelementosque
serão explicitados na fundamentação jurídica. A relação de hipossuficiência criada pela
narrativadosfatosredundaránafundamentaçãojurídicaemdispositivosdoCódigodeDefesa
doConsumidor,quejustificaráopedidodeindenizaçãocombasenareferidalei.Autilização
dessa normatização é uma escolha do advogado, pois o mesmo poderia fundamentar a
ocorrênciaapenasnaConstituiçãoFederale,somente,com base nela,requererareparação
dosdanos.Porisso,amanipulaçãoimplicatantoaseleçãodeaspectosimportantesdosfatos
comoaseleçãodanormajurídicae,ainda,acombinaçãoqueéestabelecidaentreessesdois
aspectos,poisumdeveredundarnooutroparaaformulaçãodeumpedidocoerente.
Destarte,constata-sequeoadvogadoincumbe-sedeestabeleceraojuizqualéofato,
qualanormaqueaeleaplicadaevidenciaumavontadedaleiecomoojuizdeveproceder
parafazervaleravontadedalei.RetomandooexemplodapetiçãodoanexoB,daqualse
transcrevealgumasseqüências,vê-sequenodiscursodosfatosoadvogadoapresentaofato
69
da constituição de um crédito tributário em um determinado momento, em razão do
recolhimentodomesmotributoemduasoperaçõesdiferentes.Nafundamentaçãojurídica,ele
afirma quais os dispositivos constitucionais evidenciam a vontade da lei quanto ao
recolhimentodoreferidotributoe,nosrequerimentosfinais,atravésdospedidos,eleorienta
aojuizquaisasmedidasquedeverãosertomadasparaquesejasatisfeitaavontadedalei:
I-DOSFATOS
[...]
2. Recolhia até 2003, mensalmente, a título de imposto sobre produto
industrializado(IPI),0,5%(meioporcento)sobreofaturamento,conforme
preceituaoart.5º,parágrafo2º,daLei9.317/96.
3. Assim, enquanto tributada pelo SIMPLES, além de recolher
mensalmente o valor, a título de IPI, efetuava, também, o pagamento de
referidoimpostoemcomprasdeprodutosparautilizarnafabricaçãodeseus
transformadores.
Diantedisso,noperíodode1999até2003tem,emcréditodeIPI,aquantia
de R$ 25.203,86 (vinte e cinco mil duzentos e três reais e oitenta e seis
centavos), sem qualquer atualização e não se computando o crédito de
mercadoriasisentas,nãotributáveisousujeitosàalíquotazerodeIPI.
II-DODIREITO
5. AConstituiçãoFederalestabeleceemseuart.153,IV,§3º,II,anão-
cumulatividadedoIPIeapossibilidadedecompensaçãodovalordevidoem
cadaoperaçãocomomontantecobradonasanteriores.
[...]
Anteoexposto,REQUER:
Aofinal,sejaaaçãojulgadatotalmenteprocedentecomvistasà:
[...]
d.1) Declaração de inconstitucionalidade do art. 5º, §5º da Lei n.º
9.317/1996,porferiropreceitodanão-cumulatividade(art.153,IV,§3º,II,
daCF/88);
d.2) Declaração da possibilidade de compensação dos créditos do IPI,
devidamenteatualizados
,desdeoanode1999até2003,comoutrostributos
federais;
d.3) Declaraçãodapossibilidadedecompensaçãonashipótesesemquea
aquisição de matérias-primas, insumos, produtos intermediários e material
de embalagem estão cobertas pela isenção, não-tributação ou sujeição à
alíquota zero, e a operação seguinte, relativa ao produto industrializado,
ensejouorecolhimentodoIPI;
70
Sintetizando,nesteitemprocurou-seevidenciaraspectosrecorrentesnaorganização
narrativadodiscursodas petiçõesiniciais.Nessesentido constata-sequeo advogado é um
destinadormanipulador,cujodestinatárioéojuizdedireito.Atravésdodiscursodaspetições
o destinador manipulador estabelece o compromisso do destinatário de prestar jurisdição,
colocando o mesmo em conjunção com o dever fazer. No entanto, além da atribuição do
compromissodofazerjurisdicionalomanipuladorqualificaseudestinatárioparaaexecução
doprogramanarrativoprevisto.Talqualificaçãoocorrepormeiodeumsaber,evidenciado
pelasorientações queo narrador ofereceao narratário sobrea vontade da lei eo modo de
satisfazê-la, mediante a seleção e combinação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, que
resultamemumpedidocerto.Assim,verifica-senodiscursodaspetiçõesiniciaisopercurso
damanipulação.
Opercursodamanipulação,noplanodiscursivoérevestidoporestruturaserelações
argumentativas,cujoefeitopretendidoéaadesãodosdestinatáriosaodiscursoenunciado.O
próximocapítuloédedicadoàanálisedoselementosqueconformamoaspectoargumentativo
daspetições,paraoalcancedoseufimporexcelência,apersuasão.
4ACONSTRUÇÃODAVERIDICÇÃODODISCURSODASPETIÇÕESINICIAIS:
OS MECANISMOS SEMIÓTICOS E AS ESTRATÉGIAS RETÓRICAS PARA A
PERSUASÃO
4.1Procedimentosmetodológicos
Retomandoalgunsaspectosdateoriasemiótica,elapostulaquetododiscurso,além
de produto da enunciação é objeto de comunicação, determinando a interação entre um
destinador e um destinatário. Para a semiótica a comunicação não significa a simples
transmissãodeumamensagem,masrevela-seemumprocessocognitivomanipulatórioem
que o destinador procura influenciar o destinatário à aceitação dos valores que quer lhe
transmitir.Dessaforma,ainteraçãoentredestinadoredestinatáriodacomunicaçãoconfigura
um exercício de persuasão, realizado através de determinadas estruturas discursivas. Tais
estruturas correspondem às marcas de veridicção, ou seja, às marcas inseridas no discurso
com o fim de criar efeitos de sentido para a obtenção do sucesso almejado; para que o
discursopromova sua aceitação, adesãoou mesmo aintensificaçãoda adesãopor partedo
destinatário. Destarte, a veridicção corresponde às projeções no discurso responsáveis pelo
fazerpersuasivo.
Namedidaemqueaspetiçõesiniciaisorientamtodoofazerjurisdicional,inclusive
indicando o conteúdo da sentença, elas adquirem a função primordial de criar meios de
persuasão. Por isso, a veridicção, neste trabalho, é entendida como a ação de persuadir,
reveladapelasmarcaseestratégiasadotadaspeloenunciadornoseudiscursoparaarealização
dasuapretensão:influenciaroenunciatárionaformulaçãodesuaconvicção.
Por tais razões, nesta seção pretende-se descrever as condições de produção do
discurso das petições iniciais que permitem o cumprimento do seu objetivo essencial de
persuadir. A análise procura contemplar os aspectos argumentativos discursivos que
evidenciam como o discurso constrói os sentidos para a formação da convicção do
enunciatário.
Considerandoqueaspetiçõesconfiguram-seemtextosextensos,foramselecionadas
dez peças para objeto de análise. Cabe mencionar que no início da seleção pensou-se em
adotar critérios que restringissem as peças ou pelo tipo de sentença pedida, por exemplo,
condenatóriaoudeclaratória;ouporáreadeatuaçãodoDireito,taiscomocivil,comercial,
tributário, família; ou por área e assunto, como petições para ajuizamento de ação de
exoneraçãodealimentos,fundamentadaspeloDireitodeFamília,umdosramosdoDireito
72
CivilBrasileiro.Todavia,verificou-sequeasregularidadesdiscursivasqueproduzemefeitos
persuasivosnodiscursodaspetiçõessãoestruturasqueestabelecemrelaçõesargumentativas,
as quais independem do assunto ou da área do Direito ou do tipo de sentença pleiteada.
Assim, visando demonstrar esse aspecto, procedeu-se contrariamente, selecionando-se dez
petições que contemplam assuntos, áreas, tipos de sentenças e ritos processuais diferentes.
Fazempartedoconjunto,petiçõesparaoajuizamentode:açãodedespejo,açãodeclaratória,
ação de exoneração de alimentos, ação de cobrança, ação monitória, ação de revisão
contratual, ação ordinária declaratória cumulada com pedido de anulação de lançamentos,
açãoderestabelecimentodebenefícioprevidenciárioeduasaçõesdeindenizaçãopordanos
morais,sendoqueumaajuizadaperanteajustiçacomumeaoutraperanteojuizadoespecial
cível.
Paraaanálisedaconstruçãodaveridicçãododiscursodaspetiçõesforamusadosos
mecanismosidentificadospelomodeloteórico-metodológicodasemióticafrancesa,noplano
das estruturas discursivas. Todavia, considerando que a semiótica não examinou
extensivamenteosrecursosquedotamumdiscursodemarcasdeveridicção,recorreu-seàs
estratégiasargumentativasretóricas.
A análise foi distribuída em três etapas. Primeiro buscou-se identificar a
transformaçãodasestruturasnarrativasemdiscursivasesuasmarcasdeveridicção.Emoutras
palavras, buscou-se apreender o modo de dizer o discurso dos fatos e dos fundamentos
jurídicosparaacriaçãodeefeitosdepersuasão.
No segundo momento foram analisadas as relações enunciativas no discurso das
petições, com a finalidade de apreender os efeitos de sentido provocados a partir das
projeçõesdaenunciaçãonosenunciados.Aindanessaetapaestabeleceu-seumarelaçãodos
efeitosdesubjetividadediscursivaencontradoscomasprovasretóricasafetivasidentificadas
porAristóteles,paraaverificaçãodosefeitosargumentativosqueelasproduzem.
Na terceira e última etapa, foram descritos tipos de argumentos identificados no
discurso, a partir dos esquemas argumentativos descritos por Perelman & Tyteca, e seus
efeitosargumentativosparaaformaçãodaconvicçãodoenunciatário.
Cabe ressaltar que a pesquisa não tem como objetivo criar categorias ou uma
classificaçãodeargumentosencontrados,fornecerummodelo,nemmesmoindicarquaisos
esquemasargumentativosmaisfreqüentesnaspetições.Oestudoselimitaadescrevercomoo
discurso das petições iniciais é organizado do ponto de vista narrativo e discursivo, e que
recursos e estratégias utiliza para cumprir sua função primordial de persuadir o seu
73
destinatárioaformularaconvicçãoquedeseja,apartirdeelementosidentificadosnostextos
analisados.
4.2Amanifestaçãodiscursivadasestruturasnarrativas
Viu-se no capítulo anterior que a organização narrativa do discurso das petições
contemplaopercursodamanipulação,cujasaçõesdonarradorparacumpriroseuprograma
consistememevidenciaraonarratário,atravésdacombinaçãodosfatosedosfundamentos
jurídicos,qualavontadedaleie,atravésdopedidocertoformulado,comosatisfazê-la.
A estrutura narrativa das petições, composta de fatos e fundamentos jurídicos, no
planodiscursivorevelaasduaspartesqueodiscursocomporta,segundoaArteRetóricade
Aristóteles: o assunto e a demonstração, a primeira parte uma operação de exposição e, a
segundaparte,aprova.
NaesteiradanovaretóricadePerelman,osfatoseosfundamentostambémrevelam
asduaspartesdaestruturaargumentativa:osfatosevidenciamoacordo,istoé,aspremissas
que servem de embasamento à argumentaçãoe, os fundamentos jurídicos, a argumentação
propriamentedita.
Assim,noplanodiscursivo,osfatoseosfundamentostransformam-senasaçõesdo
enunciadordenarrareargumentarpelodiscurso.Miranda(2006,p.48)distingueumaaçãoda
outra, a partir do critério de progressão adotado pelo enunciador no seu discurso. Ela
menciona que na argumentação o enunciador encadeia idéias através de uma progressão
lógica,enquantonanarrativadosfatos,eleencadeiainformaçõesatravésdeumaprogressão
baseada no componente temporal. Entre as ações de narrar e argumentar o enunciador
estabeleceumarelaçãoargumentativa,namedidaemqueahistóriacontadaservedepremissa
paraasuaargumentação.Assim,osfatoscorrespondemaoobjetodoacordosobreoqualserá
desenvolvidaaargumentaçãopropriamentedita; elesrepresentamafundamentaçãosobrea
qualsebuscaoconsentimentoinicialdoauditórioparaaadesãoouaintensificaçãodeadesão
aumatese.Ressalte-sequenanarrativadosfatosincluem-seostrêselementosindicadospor
Perelmancomoobjetosdeacordo,istoé,osfatos,asverdadeseaspresunções.
Nessaesteiraanarrativadosfatosdevelevaroenunciatárioàcrençanaquiloqueestá
sendocontado.Osfatosdevemimpor-seatodos.Portanto,oconteúdoinformativodaparte
narrativadaspetiçõestemcomofimexpressarumarealidadequeintentaouaaceitaçãooua
intensificaçãodaaceitaçãodetodos.
74
Nodiscursodaspetições,parafazer-crernasuanarrativa,oenunciatáriolançamão
dealgunsrecursosidentificadospelasemióticanoníveldasemânticadiscursiva,quecriam
efeitos de realidade e, por conseguinte, a disposição para a adesão aos fatos. O recurso
identificado com maior freqüência, nesse sentido, é o componente temporal. Nas petições
analisadas,anarrativa dosfatos ancoraosacontecimentosemdatas, emperíodos, em uma
progressãocronológicaparacriaroefeitodeacontecimentoreal,passíveldaverificaçãode
todos.
Noexemploabaixoaorganizaçãodosacontecimentosemordemcronológica,aliada
a uma descrição figurativa, produz o efeito de realidade incontroversa, criando no
enunciatário a disposição para a adesão, a qual vai sendo intensificada pela progressãono
tempo:
Dohistóricodamoléstiaapresentadapelaautora:
a)Em01/01/2002aautoracomeçouaapresentarsintomasdedepressão
grave, e por tal razão fazia tratamento medicamentoso com ‘verotina’ e
‘olcadil’,noentanto,apresentavapoucamelhora.Foiconcedidoobenefício
auxílio-doença à autora em razão da mesma apresentar incapacidade
laborativa,deacordocomoart.71doDecreto3048/99.
b) Em 23/12/2003 o médico perito do INSS, Dr José dos Santos* (CRM
XXXXX)verificouapermanênciadaincapacidadelaborativadaautoraem
razãodadoençaapresentadapelamesma,classificadapeloCIDdeF322.
c) Em26/01/2004omédicoperitodoINSS,Dr.JosédosSantos*(CRM
XXXXX)constatounovamenteaincapacidadelaborativadaautoraemrazão
da doença apresentada pela mesma, classificada pelo CID de F322 e no
exame físico verificou que a autora estava deprimida com tratamento
regular,mascompoucasperspectivas.
d)Em04/05/2004amédicaperitadoINSS,Dra.CarmemdeAssis*(CRM
XXXX)constatoua permanênciadaincapacidadelaborativada autoraem
razãodoCIDF322(anteriormentedescrito)epeloCIDF40.1.
e) Em 07/07/2004 o médico perito do INSS, Dr. Mário Rocha* (CRM
XXXX)constatouapermanênciadaincapacidadelaborativa.
f)Em16/11/2004omédico peritodoINSS,Dr.RicardoCardoso*(CRM
XXXX) verificou a permanência da patologia da autora, persistindo na
incapacidadelaborativa.
g)Em13/01/2005omédicoperitodoINSS,Dr.ArnaldoSilveira*(CRM
XXXXX),verificoua permanênciadaincapacidade laborativa da autora e
informou que a mesma está aguardando vaga para internação
psiquiátrica.
h)Em16/03/2005omédicoperitodoINSS,Dr.ManuelAntônioPereira*
(CRM XXXXX) constatou a incapacidade laborativa da autora, e junta o
atestado do médico psiquiátrico CREMERS XXXXX do dia 11/03/2005
75
transcrevendo:“...nãoapresentacondiçõesdeexercerassuasatividades
profissionais por período indeterminado (...) depressão severa e
ansiedade. A mesma não tem respondido adequadamente aos
tratamentos instituídos. Não apresenta condições de exercer suas
atividades profissionais e considero a possibilidade de internação
psiquiátricaparaamesma”.
i) Em01/06/2005omédicoperitodoINSS,Dr. Antônio Barbosa*(CRM
XXXXX)verificouapermanênciadaincapacidadelaborativadaautora.
j) Em08/08/2005o médicoperitodoINSS,Dr.Lauro Machado*(CRM
XXXX), considerou que persiste a incapacidadelaborativada autorae no
examefísicorelataqueaautoraestá“fóbica,angustiada,empânico.Não
consegueficarsozinha,teminsônia,ficaisolada,nãotoleraconversações
nem dosfamiliares. Não consegue vaga para hospitalização do H.E.P.
Temduastentativasdesuicídiocomusodedrogasamaisecomousode
gás”.
l) Em 06/10/2005 o médico perito do INSS, Dr. João da Silva* (CRM
XXXX)noexamefísicorealizadocomaautorarelatouqueamesmasofre
de “encefaléia, palpitação, medo de sair na rua, falta de ar, trêmula,
tonturas,insônia,irritabilidade,nãotemmaisvontadedeviver,humor
deprimido”.Ainda,juntouatestadodomédicoCREMERS00000dodia
19/09/2005 o qual foi transcrito: “atesto para todos fins de perícia
médicajunto ao INSS que a pacienteSusanadaSilva*nãoapresenta
condições de exercer as suas atividades profissionais por tempo
indeterminado. Sugiro aposentadoria da mesma devido F31.4 e F40.0
CID10.Atualmenteestáemusodelítio,lamotrigia,cebrilinefrontal.”
(videAnexoH)
Transcreve-se um trecho de outra petição, cuja indicação do início e do fim do
interregnotemporaltornarealaafirmaçãoanterior,oquelevaoenunciatárioàaceitaçãodo
fato:
Nosúltimosoitomeses,deagostode2002amarçode2003,nãohouve
pagamentodosalugueres,istoé,deixouoinquilinodedepositarnacontado
AutorasquantiasdevidasnaformaconvencionadanacláusulaSEGUNDA
(doc.n.º3).
Nesseoutroexemplo,aancoragemdofatoemumadatacertaeemmarcadores
deespaçocriaoefeitodeprovadoacontecimento.Nessecaso,oefeitoderealidadetraduz-se
em efeito argumentativo, porque intensifica a aceitação da ocorrência como realidade por
forçadeumademonstração:
Em 25 de maio de2005, por ocasião do programa“COMENTÁRIOS*”,
levadoaoarpelaemissoraderadiodifusãoré,onomedoautorfoialvode
comentáriosincluindocitaçãoe leitura de publicaçãoocorrida no jornal
“FUXICO*”noespaçodenominado“BERLINDA*”,fl.15,cópiaanexa
(doc. 2), nos quais houve divulgações não autorizadas de informações
pessoaisdorequerente.
76
Nojornal“FUXICO*”,naColuna“BERLINDA*”,fl.15,publicaçãode
25demaiode2005,foramseguintesasinformaçõespublicadas,“inverbis”:
EmAlegrete*temummotoristacujosaláriosóémenorqueodoprefeitoe
davice.EmabriloservidorpúblicoAugustoPereira*recebeu,emsalário
líquido,R$2.750,00.Jáavice-prefeitarecebeuR$3.380,00eoprefeito,R$
6.613,00.(videAnexoJ)
Segue outro exemplo que se assemelha ao anterior, ou seja, cujo efeito criado
pelosmarcadoresdetempoedeespaçoéodeprovademonstrativadofato,intensificandoa
adesãoaoacordo:
O requerente separou-se judicialmente da requerida em 16 de outubro de
1991, com trânsito em julgado da sentença, na data de 31 de outubro de
1991, conforme fls. 10v., 11 e 11v., dos autos da Ação de Separação
Consensual, sob o n.º XXXXXXX, que tramitou na Segunda Vara Cível
destaComarca.(videAnexoC)
Oexemploseguinte mostra ooposto. Os marcadores detemporalidade auxiliama
criaçãodeumefeitoargumentativoexplicativo,que,porsuavez,produzoefeitoderealidade
daocorrência,visandoàaceitaçãodofato:
Explica-se.Em21/11/2002foiefetuadoumcréditojudicialdeR$8.536,71
deJAMeR$853,67dejurosdemora.
Em09/12/2002foiefetuadoumcrédito,equivocadamente,novalordeR$
7.295,84.
Em 17/12/2002 o ora demandado, titular da conta, efetuou um saque no
valordeR$16.811,76(dezesseismiloitocentoseonzereaisesetentaeseis
centavos),gerandoumsaldodevedordeR$7.350,73.(videAnexoD)
No entanto, não são somente os componentes discursivos que indicam tempo e
espaçoqueconferemaodiscursodaspetições,napartedanarrativadosfatos,oaspectode
realidade dos acontecimentos. Referências a pessoas, a documentos, a coisas, também
produzem efeitos argumentativos de realidade, de modo a provocar a aceitação dos fatos.
Essesrecursossemostramrecorrentesnasdiferentes peçasprocessuaisanalisadas.Seguem
algunsexemplosdisso:
Aautorafoisurpreendidaporatodemanifestailegalidadeeabusodepoder,
praticadospeloDr.JosédosSantos*,médicoperitocredenciadodoINSS
(Cód.000000),epeloChefe da AgênciadoINSSde XXXXXXX(RS),
comosepodeverificaradiante.(videAnexoH)
Alocaçãorefere-seaestacionamentodeautomóveisououtrafinalidade,em
instalações facilmente removíveis e que o integrem o imóvel (cláusula
TERCEIRA).
77
Alocaçãofeitaporumprazode1ano,prorrogáveisautomaticamente,oque
vem,atéagora,acontecendo(cláusulaQUARTA).
Os impostos e taxas que incidem no imóvel são de responsabilidade do
locatário,agoraRéu(cláusulaQUINTA).(videAnexoA)
Emmeadosdoanode2001,emdataquenãosabeprecisar,aAutoraaderiu
juntoàAdministradoraRequeridaaumcontratoparaautilizaçãodoCartão
de Crédito Mastercard - N° XXXX XXXX XXXX XXXX, o qual foi
sendorenovadonodecorrerdoperíodo,lhefacultandoodireitoàcomprade
mercadorias e/ou prestação de serviços em estabelecimentos comerciais
conveniados.(videAnexoF)
Constata-se,portanto,quenapartedanarrativadosfatoséfreqüentearecorrênciado
enunciador a determinados recursos semânticos para dotar seu discurso de marcas de
realidade. Os efeitos de realidade correspondem a efeitos argumentativos porque criam a
disposição para a aceitação dos fatos, atribuindo-lhes a condição de premissas de
argumentação. Os fatos narrados nas petições adquirem, assim, o caráter de argumentos e
revelammarcasdoexercíciodepersuasãodoenunciadoredeinterpretaçãodoenunciatário.
Salienta-sequeosefeitosderealidadedosfatoscriadospelasmarcasdiscursivasde
tempo,espaço,pessoas,figurasnosenunciadoscriamumoutroefeitoqueintegraoprojeto
manipulatóriodoenunciador.
Rodriguez (2005) menciona que o aspectode progressãono tempo empregadono
discursodanarrativadosfatoscontribuiparaacriaçãodeumefeitopuramenteinformativo.
No entanto, ele afirma que os fatos sempre carregam um ponto de vista implícito, já que,
comoqualquerdiscurso,éumacriaçãocognitivahumanaconstruídaemconformidadeauma
interpretaçãopessoal.Eéessepontodevistapessoalnãoexplicitadoqueconduzeprovocaà
aceitação de uma tese, pois a revelação da intenção do enunciador a enfraqueceria, pelo
comprometimento da mesma com pontos de vista. Os segmentos da petição abaixo
exemplificamautilizaçãodorecursodaprogressãotemporalparacriar,simultaneamente,os
efeitosderealidadeedeinformação,deixandotranspareceraintençãodecaracterizaramá-fé
daparteré,semdizê-la,parafazerapareceratesedapráticadeumatoilícito.
Em 17/12/2002 o ora demandado, titular da conta, efetuou um saque no
valordeR$16.811,76(dezesseismiloitocentoseonzereaisesetentaeseis
centavos),gerandoumsaldodevedordeR$7.350,73.
Verificado o equívoco o demandado foi comunicado através de cartas e
telefonemas, contudo não se interessou em devolver o dinheiro sacado
indevidamente.
Assim, em 07/03/2003 a ora demandante bloqueou a conta SP
0000000000/11111111,hajavistaqueocontratodetrabalhonãofoiextinto.
Diantedisso,em12/03/2003foramefetuadasamortizações,totalizandoR$
78
2.902,67 (dois mil novecentos e dois reais e sessenta e sete centavos),
restando um saldo devedor no valor de R$ 4.525,78 (valor sem qualquer
correçãooujuros).
Foienviadoaodemandadoumaguiadereposição-GRP-FGTS,solicitando
o pagamento da quantia de R$ 4.634,85, sendo R$ 4.525,78 referente à
parcela a repor, sacada indevidamente, R$ 54,62 referente à correção
monetáriaeR$63,45referenteàmulta,(doc.04).
Destaque-se que em 13/03/2003 foi enviada uma correspondência ao
demandado explicando a situação e solicitando a devolução dos valores
sacadosindevidamente,contudo,nãohouvesequerumretornoporpartedo
mesmo(doc.05).
Impendesalientarquehouveumpagamento(depósito)indevidonacontado
demandado e, por sua vez, um enriquecimento ilícito ao mesmo, pois
recebeu o que não era seu. Aumentou seu patrimônio indevidamente,
devendo,portanto,devolveraquiloquesacouindevidamente.
Nossocódigocivildisciplinatantoopagamentoindevido(arts.876a883),
quantooenriquecimentoilícito(arts.884a886).(videAnexoD)
Anarrativadosfatosaparentaterumconteúdomeramenteinformativo,porquesua
funçãoéadeesclarecerasituaçãoquevaiconduziraargumentação.Entretanto,Rodriguez
(2005, p. 89) afirma que obviamente não se trata de conteúdo informativo puro, porque
contaminadopelaconstantevontadedoargumentantedepersuadir,aindaqueomomentoseja
odeinformar.
A argumentação propriamente dita, que, na organizaçãonarrativa corresponde aos
fundamentosjurídicos,porconfigurarumencadeamentodeidéiasenãodeinformaçõescomo
nanarrativadosfatos,recorreaesquemasdeencadeamentoslógicosparaaobtençãodaforça
argumentativa.Oúltimoitemdessecapítulotratarádedescreverosdiferentesesquemasde
ligaçõesargumentativasencontradasnaspetições.
4.3AsprojeçõesdaenunciaçãoeasprovasafetivasdeAristóteles
Analisando-seasprojeçõesenunciativasnodiscursodaspetições,verifica-sequea
narrativa é, predominantemente, projetada sob a forma de debreagem enunciva. Os
enunciadosabaixomostramoocultamentodasformasenunciativaseaprojeçãodaterceira
pessoanodiscurso:
AdemandanteécredoradademandadanaquantiadeR$4.729,42(quatro
milsetecentosevinteenovereaisequarentaedoiscentavos),calculadosaté
adatade13demaiode2003(doc.01).(videAnexoD)
79
A empresa foi constituída no ano de 1996, conforme faz certo o contrato
socialoraacostado(Doc.02),sendoque,desdesuaconstituiçãoestásediada
noDistritoIndustrialdestacidade,noendereçosuprareferido.(videAnexo
G)
O autor é homossexual e foi vítima de danos morais e discriminação no
interiordoestabelecimentodademandada.(videAnexoJ)
A Constituição Federal estabelece em seu art. 153, IV, § 3º, II, a não-
cumulatividadedoIPIeapossibilidadedecompensaçãodovalordevidoem
cada operação com o montante cobrado nas anteriores. Veda também, a
utilização de tributo com efeito de confisco (art. 150, inciso IV). (vide
AnexoB)
Oart.273doCódigodeProcessoCivildispõesobreapossibilidadedeque
seja antecipada a tutela para, no caso em questão, seja restabelecido o
benefíciocancelado.(videAnexoH)
Ossegmentostranscritosevidenciamqueanarrativanaterceirapessoaproduzum
efeito de objetividade ao discurso, afastando-o do sujeito enunciador. Tal efeito gera a
aparênciadevinculaçãododiscursoaosfatoseaosfundamentosjurídicosenãoaosujeito
queoproduz.Esseefeitodeobjetividadefazcomqueodiscursoassumaagarantiapelasua
verdade.Observem-seossegmentosabaixo:
Acontecequeo“trailer”veioasercercadoporumaconstruçãodealvenaria,
construção esta não autorizada pelo Autor e contrária à disposição da
cláusulaQUINTA,letrab.(videAnexoA)
Recolhia até 2003, mensalmente, a título de imposto sobre produto
industrializado(IPI),0,5%(meioporcento)sobreofaturamento,conforme
preceituaoart.5º,parágrafo2º,daLei9.317/96.
Prevêoartigo:
Art.5º(...)
§2ºNocasodepessoajurídicacontribuintedoIPI,ospercentuaisreferidos
nesteartigoserãoacrescidosde0,5(meio)pontopercentual.(videAnexoB)
As mercadorias foram devidamente entregues consoante atestam os
comprovantesdeentregademercadoriaemanexo,semqualqueroposiçãoda
Demandada.(Doc.03).(videAnexoE)
Osjurosestãolimitadospelalegislaçãopátriaa1%aomês,sendoquetal
limitaçãonão sefixatão-somentepeladiscussãodaauto-aplicabilidadedo
artigo192,§3ºdaConstituiçãoFederalmas,sim,emfacedasdisposições
contidasnoLeideUsuraenosarts.1.062e1.063doCódigoCivil.(vide
AnexoF)
Osefeitosdecorrentesdaobjetividadedodiscursoargumentativodaspetiçõespodem
ser explicados recorrendo-se a elementos retóricos. Para a retórica aristotélica, as provas
argumentativas são criadas pelo orador, de acordo com o seu talento pessoal. Aristóteles
80
(apudReboul,2000,pp.47-49)definecomoinstrumentosdepersuasão(pisteis)oéthos,o
páthos e o logos. Os dois primeiros, recursos manipulatórios baseados na afetividade e, o
último,narazão.Oéthoséumaformadeargumentarbaseadanaafetividadedooradoreo
páthosnaafetividadedoauditório.
Aspetiçõesrevelamapredominânciadaargumentaçãosoboefeitodeobjetividade
discursiva.Noentanto,cumpremostrarqueemalgumaspeças,certossegmentosmostrama
descontinuidadedodistanciamentodasformasenunciativas,pelorecursoàembreagem,com
o intuito de produzir o efeito inverso, ou seja, o de subjetividade do discurso. Tal
procedimentotambémseinscrevenoprogramadepersuasãodoenunciador.
Nesses espaços discursivos os enunciados são atrelados ao narrador, delegado do
actanteenunciador,comomeiodecriarargumentosdeordemafetiva.Ofazer-crerébuscado
oupelocréditoqueodiscursoprovocaemfunçãodacondutaéticadonarradorreveladano
discursooupelasemoçõesqueodiscursosuscitanoseudestinatário.
Nos segmentos transcritos os questionamentos assumidos pelo narrador possuem
umaintençãoquedeveserlidapelodestinatáriododiscurso.Nesseexemploamanipulação
pelo recurso à subjetividade opera-se a partir de emoções que o enunciador provoca no
enunciatárioatravésdeperguntaslançadasnomeiododiscursoquenãodizemrespeitoaos
fatosnarradoseque,porisso,nãorequeremrespostasetêmafinalidadeúnicadeinfluenciar
aaçãododestinatáriopelaaceitaçãodeumaopiniãoqueoenunciadorquerfazê-loaceitar:
A demandada é ainda mulher jovem, pois conta com apenas 45 anos de
idade e, não se pode esquecer que à época da separação contava com 35
anos,idadecomaqualasmulheresaindatêmplenascondiçõesdeadentrar
nomercadodetrabalhoatravésdoestudoedoesforçopessoal.
Aos45anos,apóslongavidadeociosidade,podeaindaademandadanum
arroubodeorgulhoeamorpróprioexoneraroex-companheiroeseusfilhos
deserumpesoemsuasvidas.
Qual será a espécie de sentimentos que movem, ou melhor, deixam
inerte,umajovemex-esposaquesimplesmenteesperasentada,todosos
mesesodepósitodeR$1.513,21,atítulodepensão?Qualaexpectativa
de vida desta mulher, que sequer se preocupa com o bem estar dos
filhos?
Podeimaginarademandadaqualovalordoesforçodespendidoporum
trabalhador médio para receber 7,56 salários, ou seja, R$ 1513,21?
Quantos,afinal,serãoospensionistasdoINSSquerecebemestevalorde
R$1.513,21,semtercontribuídomuitobem,aolongodetodaumavida
detrabalhoparaaqueleinstitutoprevidenciário?(videAnexoB)
81
Asperguntasrealizadasnãovisamàsrespostas,mas,unicamente,afetarasemoções
doenunciatárioparaprovocaraaceitaçãodeumatese:anecessidadedesereceberalimentos
com fundamento no merecimento, como a representação do justo. Aristóteles, no segundo
livrodaArteRetórica,aofalarsobrecomoinfluenciaroânimodosjuízestratadaspaixões.
Dentreelaselemencionaaindignaçãocomoumlugardocontrário,poiséumaemoçãoque
suscitaacompaixão.Ejustificaqueaspaixõessãoascausasqueintroduzemmudançasem
nossosjuízos(A.R.,p.97).
Arelaçãoquefundamentajuridicamenteaexoneraçãoourevisãodealimentoséo
binômio necessidade versus possibilidade. Nos termos do artigo 400 do Código Civil
Brasileiro,osalimentosdevemserfixadosnaproporçãodasnecessidadesdoreclamanteedos
recursosdapessoaobrigada.Estabelecidososalimentosdeacordocomessaregralegal,para
revisá-losoudelesexonerar-sedeveserrespeitadaaregralegalestabelecidanoartigo401do
mesmoDiplomaLegal,queprescrevequese,fixadososalimentos,sobreviermudançana
fortunadequemossupre,ounadequemosrecebe,poderáointeressadoreclamarao
juiz,conformeascircunstâncias,exoneração,redução,ouagravaçãodoencargo.Ocorre
que o discurso anterior aos questionamentos afirma que a alimentada persiste na mesma
situaçãoeconômicapordezanos.Assim,oqueoenunciadorpretendeéaaceitaçãodeuma
opiniãodiferentedaquelaconhecidaeaceitaportodosnaexpressãodalei.Oqueelevisaé
criarumadisposiçãopara influenciarseudestinatárioquanto à alteração de umparadigma.
Nesse sentido, a prova subjetiva funciona como argumento. No exemplo dado, a prova é
apoiadanopáthos,argumentopsicológicocujafinalidadenãoédemonstraresimafetarpara
influenciaraaçãodoenunciatário.
Os exemplos a seguir mostram os efeitos argumentativos baseados no éthos. No
segmento extraído do anexo C, o enunciador atribui um efeito de verdade a seu discurso
atravésdoargumentoexplicativoacompanhadodemarcasreferenciais.Odiscursoverdadeiro
assumidopelosujeitotornaasuacondutaverdadeira,elementoresponsávelpelacriaçãode
disposiçãodeaceitação.Asmarcasdeverdadeinscritasnodiscursocriamoefeitodemarcas
deverdadedoagirdosujeito,que,porsuavez,inspiraaconfiançadoauditórionoquediz.
Veja Excelência que o autor não é profissional liberal e não conta com
possibilidades de ganhos extras mensais. Sua renda como engenheiro da
XXXXXX, (doc. 10) num primeiro momento, parece bem razoável e,
inclusiveacimadospadrõesmédiosnormais. Mas deve-seobservarqueo
saláriolíquidodoautorédeR$4.007,19,enumamatemáticabemsimples
vemos que para o pai sustentaros dois filhos, sendo um universitário e a
outravestibulanda,bemcomoasipróprio,sobraumaproporçãobemmenor
doqueaquecabeàex-mulher,senãovejamos:(videAnexoC)
82
Noexemploaseguir,onarradorassumeapalavraeatribuiumefeitodeverdadeao
seu discurso, através de uma ligação de causa e conseqüência que estabelece entre os
enunciados,levandooenunciatárioaumaconclusão.Ademonstraçãodofatopormeiodeum
raciocíniológicogeraaodiscursooefeitodeverdade,queseestendeàcapacidadedosujeito
queorealiza.Talefeitoéodespertaaconfiançadoauditório.Osujeitoasseguraaverdadedo
discurso.
Ora,Excelência,fazendo-seumraciocíniológico,chega-seàconclusãode
que a Autora não teria incorrido em mora, e conseqüentemente, pago
qualquervaloratítulodemulta,seaAdministradoraRétivesseobservadoa
legislação em vigor e não cobrado juros abusivos, o que está a exigir a
readequaçãodoscálculosapósaapreciaçãodamatériapeloPoderJudiciário.
(videAnexoE)
4.4Asligaçõesargumentativasnosfundamentosjurídicos
Retomando a organização narrativa das petições, viu-se que elas compõem-se dos
fatosedosfundamentosjurídicosque,noníveldiscursivocorrespondemànarrativadosfatos
eàargumentaçãopropriamentedita.
Odiscursodafundamentaçãojurídicacorrespondeaosargumentosconstruídospara
a defesa da tese extraída da narrativa dos fatos. Para Aristóteles argumentar é demonstrar
atravésdeprovas,asquais,nasuaconcepção,dividem-seemlógicasouafetivas.Adefinição
das provas em lógicas ou afetivas guarda relação com os efeitos de objetividade ou de
subjetividadereveladospelodiscurso,medianteasprojeçõesenunciativasnoenunciado.
No discurso da fundamentação jurídica das petições foram detectadas provas de
caráter afetivo e provas de natureza lógica. As provas afetivas foram mostradas no item
anterior.Asprovasdenaturezalógicaconfiguramligaçõesargumentativasrealizadasentreos
enunciados,quegeramefeitosdeadesãoporconduziremaumadeterminadaconclusão.
Os enunciados abaixo, extraídos do anexo B demonstram como as idéias são
encadeadas,deformaalevaroenunciatárioaumaação,medianteoraciocíniológico.Para
explicar-setalencadeamentoosenunciadosforamnumerados.
Observa-se que os enunciados identificados pelo número (1) funcionam como as
premissasdaconclusãoevidenciadanoenunciado(2).Ofatodeaempresateroptadopelo
SIMPLES(forma consolidada de recolhimentodetributação) e terficado vinculadaa essa
modalidade no período de 1999 a 2003, determinou o pagamento de IPI (imposto sobre
produtos industrializados) no momento de recolhimento do SIMPLES bem como quando
compravamatériaprimaparaafabricaçãodeseusprodutos.
83
Oenunciado(2),porsuavez,estabeleceumarelaçãodecausadoenunciado(3),ou
seja,orecolhimentodoIPInaformadescritaéacausadaconstituiçãodocréditoidentificado
noenunciado(3).
Ocréditoconstantenoenunciado(3)éofatoquepassaafuncionarcomopremissa
deargumentaçãodosenunciadosseguintes,identificadossobonúmero(4).
Osenunciadosidentificadossobonúmero(4)apóiamaargumentaçãonahierarquia
devaloresentreasleisparavalidaranormaconstitucional.Dessemodoécriadoumefeitode
incompatibilidadeentreosdispositivosinfraconstitucionaiseosdispositivosconstitucionais,
quedeterminaaaçãodeescolhadefazerprevalecerounãoumadelas.
(1) Desde sua constituição até o ano de 2003, inclusive, foi optante do
SIMPLES(Doc.03).
Em2004foiexcluídadoSIMPLES,passandoasertributadapeloLUCRO
REAL(Doc.04).
Recolhia até 2003, mensalmente, a título de imposto sobre produto
industrializado(IPI),0,5%(meioporcento)sobreofaturamento,conforme
preceituaoart.5º,parágrafo2º,daLei9.317/96.
Prevêoartigo:
"Art.5º(...)
§2ºNocasodepessoajurídicacontribuintedoIPI,ospercentuaisreferidos
nesteartigoserãoacrescidosde0,5(meio)pontopercentual".(grifamos)
(2) Assim, enquanto tributada pelo SIMPLES, além de recolher
mensalmente o valor, a título de IPI, efetuava, também, o pagamento de
referidoimpostoemcomprasdeprodutosparautilizarnafabricaçãodeseus
transformadores.
(3) Diantedisso,noperíodode1999até2003tem,emcréditodeIPI,a
quantiadeR$25.203,86(vinteecincomilduzentosetrêsreaiseoitentae
seiscentavos),semqualqueratualizaçãoenãosecomputandoocréditode
mercadoriasisentas,nãotributáveisousujeitosàalíquotazerodeIPI.
(4) Há na legislação do SIMPLES dispositivo legal (art.5º, §5º, Lei
9.317/96)vedandoocrédito.
Rezaoartigo:
Art.5º(...)
§5º A inscrição no SIMPLES veda, para a microempresa ou empresa de
pequeno porte, a utilização ou destinação de qualquer valor a título de
incentivo fiscal, bem assim a apropriação ou transferência de créditos
relativosaoIPIeaoICMS.
Entretanto, dúvida nãohá de que o artigo emcomento é inconstitucional,
poisaAutorarecolhia,mensalmente,0,5%deseufaturamentoatítulodeIPI
84
quandodopagamentodoSIMPLESepagavaoIPIemtodasascomprasde
matéria-prima,insumoseprodutosintermediários.
AlegislaçãodoSIMPLESpermiteàUniãoacumulatividadedotributo,
fazendo-o incidir em cascata, fato este vedado pela Constituição
Federal!
Uma vez que a empresa, por estar inscrita no SIMPLES, pagava 0,5%
mensal sobre seu faturamento a título de IPI, torna-se imprescindível
conferirapossibilidadedecompensação,sobpenadeafrontarospreceitos
constitucionaisdanão-cumulatividadeedavedaçãoaoconfisco!
O princípio da não-cumulatividade, insculpido no artigo 153, § 3º, II, da
Constituição Federal, deve ser observado em todas as etapas do processo
produtivo.
Se eliminada a possibilidade de aproveitamento do crédito de IPI em
empresasnoSIMPLES,estar-se-áanulandootratamentoprivilegiado,poisa
alíquota do tributo recairá sobre a totalidade do valor do produto
industrializadoenãosomentesobreovaloragregado.
Ademais, afronta-se, cabalmente, a Constituição Federal, porque
estaremospermitindoacumulatividadedotributoeoefeitocascatado
mesmo.
Outro exemplo mostra um esquema argumentativo baseado na operação de
comparaçãoentretermos.Acomparaçãomanipulaatravésdoefeitodemedidaqueproduz,
haja vista colocar dois objetos sob avaliação, um em relação ao outro. Observem-se os
segmentos:
Trata-sedaLeiMunicipaln.º2727/85,de11.12.1985(Doc.03).
EssaleialterouaLeiMunicipaln.º2162/81,de03.04.1981(Doc.04).
Aleianteriorpreviaemseuart.5º:
"Art.5º-FicamisentosdoImpostoPredialeTerritorialUrbano(IPTU)edo
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) pelo prazo de 10
(dez)anos,asindústriasqueseinstalaremnoMunicípio.
§1º - A isenção deste artigo aplica-se às indústrias estabelecidas no
Municípiodesdeoanode1977."
Contudo,aLeiMunicipaln.º2727/85,vigenteatéapresentedata,emseu
artigo1º,estabelece:
"Art. 1º  - O Artigo 5º e parágrafos da Lei Municipal n.º 2162/81, de
03.04.1981,passamavigorarcomaseguinteredação:
'Art.5º-FicamisentasdoImpostoPredialeTerritorialUrbano(IPTU)edo
ImpostoSobreServiçosdeQualquerNatureza(ISSQN),peloprazodedez
(10) anos, a partir de sua instalação, as indústrias que se instalarem no
Distrito Industrial e em áreas permitidas pelo Plano Diretor vigente no
Município.
85
§1º-Aisençãoquetrataesteartigoaplica-seàsindústriasestabelecidasno
DistritoIndustrial,apartirde1977.
§2º-Vetado'".(Grifamos)
Desdelogo,caberessaltarqueasLeisMunicipaisposterioresnãorevogaram
amatéria,hajavistaquealeioraemcomentorefere-seespecificadamente
as indústriasque se instalam noDistrito Industrial, não na cidade de
XXXX,istoé,trata-sedeumaleiespecíficaenãogenérica,gozandode
hierarquia superior às normas gerais que eventualmente tenham sido
promulgadas.
Ademais,pelapesquisanalegislaçãomunicipalconstata-seque,nenhumalei
posterior,alterouoartigodaLeiemtela.
Há leis posterioresconferindo incentivos às empresasque se instalam na
cidade,inclusiveaisençãonopagamentodeIPTUeISSQN,entretanto,são
leis que instituem programas de desenvolvimento industrial para a
cidade,comoéocasodaLei3200/89(alteradapelasLei4250/99eLei
4648/03).
Frise-se que, essas leis não são específicas ao Distrito Industrial, pois
dispõem a respeito de programas e incentivos ao desenvolvimento
econômicoesocialdoMunicípio.
Já a Lei n.º 2727/85 é específica ao Distrito Industrial deste Município,
visando ao incentivo de instalação de indústrias nesta localidade.” (vide
AnexoG)
A idéia de medida é evidenciada pela comparação entre os critérios
generalidade/especificidadeelevaàconclusãodasuperioridadedaespecificidadeemrelação
àgeneralidade,quecorrespondeàvalidadedaleiespecífica.Aconclusãodavalidadedalei
específica funciona como uma das premissas de um silogismo, que leva o destinatário à
seguinteconclusão:
Comisso,épossívelconcluirque:
aLeisupracitadaestáemplenovigor;
a Empresa, constituída em 1996, está desde então sediada no Distrito
Industrial;
LogonãopodeaDemandadaexigiropagamentodeISSQNeIPTUaté
oanode2006.
Os argumentos de natureza lógica produzem um efeito de verdade pela
demonstração. E é da demonstração que retiram sua força argumentativa de adesão. São
argumentosqueseassemelhamàlógicamatemática,osquaismanejamapersuasãoatravésde
operaçõesderaciocínio,queconduzem,necessariamente,aumadeterminadaconclusão.Esse
éumdostiposdeargumentosusadosnafundamentaçãojurídica.
86
Háoutrostiposquetambémrevelamesquemasdeassociação.Todavia,asligações
sãoestabelecidasentreosenunciadosouelementosinscritosneles,masquenãoconformam
relações matemáticas do tipo anterior. Esses argumentos persuadem a partir de um valor
escondidoquefazemaparecerapartirdeumaligaçãoargumentativa,masquenãorefleteuma
demonstraçãológica.ComalgunssegmentosextraídosdoanexoF,busca-seevidenciaresse
aspecto.
A condição de hipossuficiência da Requerente ao contratar com a Ré é
visível,eisqueàAutoranãofoifacultadonenhumtipodediscussãoacerca
das cláusulas que norteiam o contrato revisando, e porque a Requerida,
devido ao seu poderio econômico, impôs à Contratante seus interesses
econômicos.
Destarte,evidenciadoestáqueocontratofirmadoentreaspartesestásujeito
às normas do Código de Defesa do Consumidor, pois as empresas
Administradoras de Cartões de Crédito são enquadradas como empresas
prestadorasdeserviçoe,poroutrolado,quemutilizaocartãoédenominado
consumidor.
Odiscursodoprimeiroparágrafovalidaaafirmaçãodarelaçãodehipossuficiência
existente,apartirdonexodeconseqüênciaqueestabelececomosenunciadosqueretratamos
fatos, ou seja, a realidade: a relação de hipossuficiência é a verdade resultado da falta de
discussãodascláusulascontratuaisedaimposiçãodosinteresseseconômicos.Oargumento
revelaovalordeverdadedaafirmaçãoapartirdaligaçãocomoselementosdarealidade.
A ligação do segundo parágrafo ao primeiro reflete uma conclusão. A verdade
reveladanoparágrafo anteriorservede justificaçãoà conclusão. Funciona, portanto, como
umapremissa.
Outrotipo de argumentoencontrado com freqüência no discursodos fundamentos
jurídicoséoargumentodeautoridade.Consisteemosujeitododiscursoutilizarafirmações
de uma pessoa, cujo valor está no prestígio que ela detém e não na própria afirmação. A
influênciadautilizaçãodessetipodeargumentosobreoenunciatáriodecorredequemdisse
talcoisa.Todavia,alémdainfluênciapeloprestígiooargumentopodeinfluenciarpelovalor
explicativoquereforçaoupromovenaconsciênciadodestinatário.Seguemalgunsexemplos
dessetipo:
Importante,pois,sefaz destacaraslições de Claudia LimaMarques,cuja
autoridadenoassuntoépublicamenteconhecida,inverbis:
“A lei brasileira de 1990, ou CDC, trouxe efetivamente uma importante
mudança no regime dos contratos de consumo, aí incluídos os contratos
envolvendocréditoaoconsumidor,sejamdiretamenteafetadosaaquisição
de um produto, ao fornecimento de um serviço, sejam outros tipos não
87
vinculadosdecrédito,comoosserviçosfornecidosporempresasdecartões
decréditoousimilareseinstituiçõesbancáriasnomercadobrasileiro”.
Dos ensinamentos da Eminente Doutrinadora, extrai-se a lição de que o
CDCéperfeitamenteaplicávelaosserviçosfornecidosporAdministradoras
deCartãode Crédito,aexemplodoqueocorrenocasoemapreço. (vide
AnexoF)
[...]
O eminente jurista Carlos Alberto Bittar, faz os seguintes apontamentos
sobreoscontratosdeadesãoeseuregimejurídico:
Considera-se de adesão o contrato que, nascido por força do dirigismo
econômicoedaconcentraçãodecapitaisemgrandesempresas,emespecial
nos campos de seguros, financiamentos bancários, vendas de imóveis, de
bensduráveiseoutros,temaparticipaçãovolitivadoconsumidorreduzidaà
aceitação global de seu contexto, previamente definido e impresso, em
modelos estandardizados, com cláusulas dispostas pelos fornecedores ou
resultantesderegulamentaçãoadministrativa,oudasuacombinação.Nesses
ajustes,emquenemsempresãofacilmentelegíveisouinteligíveisostermos
levam-nosaacolher-muitasvezessemaleituradodocumentoimpresso,ou
do formulário correspondente, ou sem meditação a respeito do real
significadodascondiçõesneleestampadas-oconteúdointegraldaavença,
predisposto pelo fornecedor para simples assinatura do público, na
efetivaçãodonegócio(eatémesmoapósfirmadoocontrato).(videAnexo
F)
[...]
OeminentejuristaJoséRogérioCruzeTucci,leciona:
A ação monitória pode ser conceituadacomo meio pelo qual o credor de
quantiacertaoudecoisadeterminada,cujocréditoestejacomprovadopor
documento hábil, requerendo a prolação de provimento judicial
consubstanciado, em última análise, num mandado de pagamento ou de
entregadecoisa,visaaobterasatisfaçãodeseudireito.(videAnexoE)
Oargumentoassociadoàleiinfluenciaaformulaçãodaopiniãodoenunciatárioem
funçãodovalordeverdadequeelapossui.Alei,nessesentido,éumamarcadeveridicção,
porque produz o efeito de sentido verdade da afirmação. Os excertos abaixo servem para
mostraresseaspectodaargumentaçãojurídicanaspetições:
A Constituição Federal estabelece em seu art. 153, IV, § 3º, II, a não -
cumulatividadedoIPIeapossibilidadedecompensaçãodovalordevidoem
cadaoperaçãocomomontantecobradonasanteriores.
Veda,também,autilizaçãodetributocomefeitodeconfisco(art.150,inciso
IV).
Alémdisso,dispõeoart.49doCTN,inverbis:
Art. 49. O imposto é não-cumulativo, dispondo a lei de forma que o
montantedevidoresultedadiferençaamaior,emdeterminadoperíodo,entre
88
o imposto referente aos produtos saídos do estabelecimento e o pago
relativamenteaosprodutosneleentrados.
Parágrafoúnico-Osaldoverificado,emdeterminadoperíodo,emfavordo
contribuinte,transfere-separaoperíodoouperíodosseguintes.
Apesar da existência de expressa vedação constitucional e do Código
TributárioNacional,essenãovemsendooprocedimentoadotadopelaora
demandadaemrelaçãoàempresasoptantespeloSIMPLES.(videAnexoB)
[...]
AprópriaLeimaior,sábiaeimperiosa,emseuTítuloII,CapítuloI,oqual
dispõesobreosDireitoseDeveresIndividuaiseColetivos,porintermédio
deseuart.5º,X,preceitua:
Art.5º-Todossãoiguaisperantealei,semdistinçãodequalquernatureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidadedodireitoàvida,àliberdade,àigualdade,àsegurançaeà
propriedade,nostermosseguintes:
[...]
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da
indenizaçãopordanomaterial,moralouàimagem;
[...]
X -são invioláveis a intimidade, a vida privada, ahonra e a imagemdas
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrentedesuaviolação;
[...]
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de
sentençapenalcondenatória.(videAnexoJ)
São freqüentes, também, nos discursos das petições iniciais, a fundamentação
jurídica nos casos particulares expressos nas decisões jurisprudenciais. A jurisprudência
nessescasoséassociadaaodiscursocomoumargumentoqueotornaválido.Ajurisprudência
setornaumamarcadeveridicção.
Noexemploabaixo,avalidaçãodaafirmaçãofeitanodiscursodecorredarelaçãode
semelhançaqueestabelececomoparticularassociado.Adisposiçãoqueoargumentocriaéo
da regra de justiça, cujo princípio manipulatório decorre do precedente. A adesão ao
argumentolevasituaçõessemelhantesaumtratamentosemelhante.
Tendooréuconcedidoobenefíciosomenteatéadatade06/10/2005,muito
embora a autora continue a sofrer os males da moléstia, em todos os
aspectos, necessário se faz que o restabelecimento se faça a partir do
primeirodiaseguinte,ouseja,apartirde07/10/2005,oquejáconsagrado
pelajurisprudência,conformeseverifica:
89
Se a alta médica foi dada indevidamente pelo INSS, pois a moléstia da
autora impunha a continuidade dos benefícios previdenciários, o termo
inicialdobenefícioéodiaposterioràreferidaaltamédica.(Ap.547.311,
10ªCâmara,rel.JuizSoaresLevada,j.em19/05/1999)(videAnexoH)
Noexemploseguinteocasoparticulartambémvisavalidarafundamentaçãojurídica
dadaaodiscurso.Noentanto,nãoapartirdeumasemelhançaderelação,masusandoocaso
particularcomoexemploparacriaraaceitaçãodeumaopiniãosobreaqualnãoháacordo.
Nessesentido,ocasoparticularéassociadoparabuscaradesãoàgeneralizaçãodeumaregra.
Noexemplotrazido,oenunciadoraindareforçaacriaçãodedisposiçãoàadesão,recorrendo
tambémaoelementodeautoridade,poisressaltaoprestígiodosdebatedores:
Certamenteademandadadeveimaginarqueoex-maridoéumaespéciede
órgãoprevidenciárioequelhevaisustentarparaorestodeseusdias.Parece
esquecer a demandada que o mundo de hoje não comporta mais esta
dependênciaeconômica,entrehomememulher,aindamaisnocasodeex-
marido e ex-mulher, quando ela tem idade e condições de adentrar no
mercadodetrabalho.
A expor esse posicionamento de forma mais elucidativa, se coloca a
seguinte discussão, travada entre os eminentes desembargadores do
egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sergio
Fernando de Vasconcellos Chaves e Maria Berenice Dias, quando do
julgamento da Apelação Cível n. 597182971, onde prevaleceu o
entendimentodequeascondiçõesextralegais,comocomportamentodo
alimentado,sesobrepõemàquelasmeramenteformais,ditadasemtítulo
executivojudicial,nãosemostrandoplausívelaextensãodobenefício,
alémdomoralmentedevido,ipsislitteris(cópiaacórdãoemanexo):
DR.SERGIOFERNANDODEVASCONCELLOSCHAVES-RELATOR
- V. Exa. Permite uma observação? Ao fixar alimentos, quando da
separação, ele não deve ter contraído dever eterno, nem se propôs a
substituir um órgão previdenciário e sustentá-lo pelo resto da vida. Ele
admitiu que ela necessitava circunstancialmente. Os alimentos são
necessariamentetransitórios.Émútuaassistência,ouseja,assistênciaem
situaçãoexcepcional.
DESA.MARIABERENICEDIAS-Nãoestáescritoemnenhumaleique
os alimentos são transitórios; os alimentos são devidos enquanto há
necessidade.
DR.SERGIOFERNANDODEVASCONCELLOSCHAVES-RELATOR
-Então,semprequealguémnãoqueiratrabalhar,vaiternecessidade.
[...]
PORMAIORIA,NEGARAMPROVIMENTOAOAPELO,VENCIDAA
EM.DESA.MARIABERENICEDIAS,QUEOPROVIA,EMPARTE.
O que resulta cristalino é a sua desnecessidade, sem sombra de dúvida
configuradaincasu.Nestesentido,confira-seaementadadecisão,inverbis:
90
Exoneração de alimentos. Procede a ação exoneratória pois ausente a
necessidade. Os alimentos mostram-se convenientes para a alimentanda e
não uma necessidade. Ela pode e deve trabalhar. Descabe eternizar a
obrigaçãoalimentária,poisavidaédinâmicaeaninguémédadoodireito
delocupletar-secomotrabalhodosoutros.Oinstitutodosalimentosnãose
prestaafomentaroócioeacondiçãoparasitária.Odireitoaalimentosnão
representa, para a mulher, uma isenção legal do dever de trabalhar e de
buscaroprópriosustento,nemdáaohomemcondiçãodeescravo.Mostra-se
ética e juridicamente insustentável a pretensão da alimentanda em ver
prorrogado ad eternum o seu direito ao ócio remunerado. Recurso
desprovido por maioria. (Ap. Cív. 597182971, 7ª CC, TJRGS, Rel. Des.
SergioFernandodeVasconcellosChaves,j.19/11/97).(videAnexoC)
Porfim,háaindaoutrassituaçõesemqueajurisprudênciaservedefundamentopara
intensificaravalidadedodiscursoenunciado.Ocasoparticular,nessassituaçõeséusadosob
aformadeilustraçãododito.Oefeitoqueproduzéoestearoureforçarumaopiniãojáaceita.
Nessesentido,ajurisprudênciaéumargumentoqueintensificaaadesãodoenunciatário.Os
segmentosabaixomostramesseaspecto:
Outrossim, seja por fundamento constitucional ou por questão de ordem
infraconstitucional, oTribunaldeJustiça do Rio Grandedo Sul, inclusive
com fundamento no art. 51, IV, da Lei 8.078/90, reiteradamente tem
decididoqueasAdministradorasdeCartãodeCréditosubmetem-seaoteto
de12%aoano,referentementeaosjuros,noquesãoexemplosasrecentes
decisõesabaixotranscritas:
REVISÃO CONTRATUAL. CARTÃO DE CRÉDITO. CONTRATO DE
ADESAO. CDC. INCIDENCIA. JUROS REMUNERATORIOS. LIMITE
EM12%AOANO.CLAUSULA-MANDATO.ABUSIVIDADEFRENTE
ASDISPOSICOESDOCODIGODOCONSUMIDOREANATUREZA
DO INSTITUTO DO MANDATO. ADMINISTRADORA QUE NAO SE
INSERENACONDICAODEINSTITUICAOFINANCEIRA.ADEMAIS,
NOS CONTRATOS ONDE O REPASSE DE JUROS ENSEJAR
ONEROSIDADE EXCESSIVA AO CONSUMIDOR, APLICA-SE O
DISPOSTO NO ART. 51, IV, DO CDC, QUE COMINA PENA DE
NULIDADE AS CLAUSULAS ABUSIVAS. A PROCEDENCIA DA
REPETICAODEINDEBITOINDEPENDEDAPROVADOERRO(ART.
42, PARAGRAFO UNICO, DO CDC). PARA EVITAR O
ENRIQUECIMENTO ILICITO, HA DE SE DAR, NO ENTANTO, DE
FORMA SIMPLES, NAO EM DOBRO. SENTENCA DE
IMPROCEDENCIA. PROVIMENTO, EM PARTE, DA APELACAO
CIVEL DA AUTORA. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70000975946, SEXTA
CÂMARACÍVEL,TRIBUNALDEJUSTIÇADORS,RELATOR:DES.
OSVALDOSTEFANELLO,JULGADOEM03/10/01).InCDJurisSíntese
Millennium.PortoAlegre:Síntese,Mai-Jun/2002.Nº35.(Grifonosso).
CARTÃO DE CREDITO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO.
INCIDENCIA DO CDC. O CONTRATO DE CARTAO DE CREDITO
NAO PODE ESCAPAR DA POSSIBILIDADE JURIDICA DA
REVISIONAL DOS CONTRATOS EM GERAL, DENTRO DOS
PRINCIPIOS DO CODIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, POIS
TRATA-SEDESERVICODECREDITONOMINADONOARTIGO3º,§
91
2ºDOCDC.JUROSREMUNERATORIOS.MESMOSENDOLIBERADA
ACONTRATACAODOSJUROSREMUNERATORIOS,FACEANAO
AUTO-APLICABILIDADE DO ARTIGO 192 § 3º DA CF, NOS
CONTRATOS ONDE SE VERIFICAR A ABUSIVIDADE E/OU
EXCESSIVA ONEROSIDADE AO CONSUMIDOR, APLICAR-SE-A O
DISPOSTONOARTIGO51,INC.IVDOCDC,COMADECLARACAO
DENULIDADEDARESPECTIVACLAUSULACONTRATUAL.JUROS
LIMITADOS A 12% AO ANO. CAPITALIZACAO DOS JUROS. A
CAPITALIZACAO DOS JUROS SO E POSSIVEL NAS SITUACOES
EXCEPCIONADAS PELA SUMULA 93 DO STJ, E NOS SALDOS
NEGATIVOS DE CONTA-CORRENTE, DEVENDO SER AFASTADA
DO PRESENTE CONTRATO EM REVISAO. REPETICAO DE
INDEBITO.POSSIVELAREPETICAOSIMPLES,INDEPENDEMENTE
DE COMPROVACAO DE ERRO, APOS PREVIA COMPENSACAO.
APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº
70001241488, DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DES. ANA BEATRIZ ISER, JULGADO
EM23/05/01).InCDJurisSínteseMillennium.PortoAlegre:Síntese,Mai-
Jun/2002.Nº35.(videAnexoF).
4.5Síntese
A análise da construção da veridicção do discurso das petições iniciais partiu do
pressupostodequeaspetiçõessãopeçasprocessuaisqueservemparainstauraroprocesso
judicialequedesempenhamafunçãodeorientarocursodoprocessobemcomooconteúdo
dasentença.Porisso,sãodiscursosquetêmcomofunçãoessencialinfluenciaraformulação
da convicção de seus destinatários. Para que esse fim seja alcançado, são necessários
exercícioscognitivos,naconstruçãododiscurso,paraarealizaçãoefetivadapersuasão.
Entendendo, portanto, que as petições são discursos construídos para persuadir,
buscou-seidentificardequemodo,comquerecursos,apartirdequeestratégiascognitivas
taisdiscursosexercitamsuafunção,considerandoasmarcasencontradasnosseusenunciados.
Apartirdosfundamentosteórico-metodológicosdasemióticafrancesa,identificou-
seantesdetudoqueosdiscursos,noplanodanarrativa,paracontaredefendersuahistória,
organizam-seemfatosefundamentosjurídicos,osquais,noplanodiscursivo,traduzem-sena
narrativa dos fatos, assumida pelo sujeito do discurso, e na argumentação jurídica
propriamentedita.
Seguindo esse percurso, analisou-se primeiro o discurso da narrativa dos fatos,
identificando-se elementos discursivos semânticos - marcadores de tempo, de espaço, de
pessoaedefiguras–quedotamodiscursonarrativodeefeitosderealidade,atribuindo-lhesa
condiçãodefatos,oque,noplanodaestruturaretórica,sãopremissasdeargumentação.
92
Após, passou-se à identificação das projeções enunciativas feitas no discurso e os
efeitosqueelasproduzem.Nessesentidoconstatou-seopredomíniodeprojeçõesnaformade
debreagensenuncivase,porconseguinte,dosefeitosdeobjetividade.Taisefeitosrevelamum
discursoatreladoaosfatoseaosfundamentoscomomeiodeexpressarasuaverdade.
Observou-seemalgumassituaçõesarecorrênciaàembreagem,comaretomadadas
estruturas enunciativas, que conferem ao discurso o efeito de subjetividade, atrelando o
discurso ao seu sujeito. Nesses casos observou-se a relação do efeito de subjetividade
discursivacomasprovasafetivascategorizadasporAristóteles,identificadasnodiscursodas
petiçõessobdoisaspectos:quandoosujeitododiscursoassumeapalavrapara,atravésdeum
argumentopsicológico,afetaroenunciatárioenelecriarumadisposiçãoparaaaceitaçãode
uma opinião, através da mudança de um juízo de valor pela emoção; ou quando o sujeito
assumeapalavraeatravésdemarcasqueinscrevenosenunciados,projetaefeitosdeverdade
noseudiscursoquelheatribuemumacondutaéticaresponsávelpelaconfiançaquedesperta
noenunciatárioe,comisso,influenciaaaceitaçãodeseudiscurso.Impendesalientarqueno
primeirocasooexercíciodepersuasãoérealizadosobreoenunciatárioe,nosegundo,apartir
damoraldoenunciador,inscritanoseudiscurso.Entende-seassim,queessasprovasrevelam-
se premissas de argumentação e como são meios de persuasão criados pelo discurso,
adquiremaforçadeveridicção.
Por fim, passou-se à verificação dos encadeamentos de idéias, os esquemas
argumentativos que, sob determinadas operações de associação cognitiva, influenciam o
raciocíniodoenunciatárioparaasuacrençanodiscurso.
Constatou-se a recorrência a variados tipos de esquemas. Foram identificados
esquemas que comportam ligações gicas de natureza matemática, e que por isso criam
efeitosdedemonstraçãocomoformadeinfluenciaraadesão.
Também foram encontrados esquemas cujas ligações não são de natureza lógica
matemática, mas que atribuem força de verdade a determinados valores que surgem de
relações de sucessão do tipo causa e efeito - entre termos de um mesmo plano, ou de
relações de coexistência entre termos pertencentes a realidades desiguais, como pessoas e
atributos. Neste último caso inclui-se o argumento de autoridade, que atribui valor ao
discurso,emrazãodoatributodequemodiz.
Outrotipodeesquemaidentificadonaspetiçõeséaassociaçãodocasoparticularao
particular, evidenciando o argumento de indução. Tais associações são evidenciadas pelo
recursodeassociaçãododiscursoàjurisprudência.Essasligaçõessãorealizadasdediferentes
maneiras,produzindoefeitosdiversos.
93
Verificou-se a associação da jurisprudência sob a forma de analogia, ou seja, por
umarelaçãodesemelhançaentreosparticulares;aassociaçãodajurisprudêncianaformade
exemploeaassociaçãodajurisprudêncianaformadeilustração.Osefeitosdecadaesquema
diferem. No caso da relação de semelhança, o efeito redunda na crença de que situações
semelhantespedemaçõessemelhantes.Oexemplobuscageneralizarumaregra,paratorná-la
aceitaeailustraçãointensificaouesteiaacrença,porqueratificaaquiloquejáéaceito.
Conclui-se assim, que para a construção da veridicção do discurso das petições o
enunciador aciona um complexo programa de ações cognitivas interligadas, visando ao
cumprimento do seu projeto de persuasão. E esse sujeito enunciador, no sistema jurídico
brasileiro,éoadvogado.Assim,encerrando-seestecapítulocomumareflexãosobrearelação
doadvogadocomoseudiscurso,busca-seafinalizaçãonaspalavrasdeReboul(2000,p.24):
Emoutraspalavras,obomadvogadonãoéaquelequeprometeavitóriaaqualquercusto,
masaquelequeabreparaasuacausatodasasprobabilidadesdevitória.
CONCLUSÃO
Fazendouma retomada detudo oque foidito epensado,o projetodesse trabalho
resume-seàanálisedascondiçõesdeproduçãoedeapreensãodossentidosemdiscursosque
utilizam uma forma e uma linguagem própria, o discurso das petições iniciais, peças
processuais hábeis, pelo sistema jurídico brasileiro, ao ajuizamento de ações judiciais.
Conformeditonaintrodução,ointeresseporesseestudonasceudogostopelaprofissãoda
advocacia,motivando,assim,abuscadeenriquecimentosobreofuncionamentodalinguagem
argumentativajurídicautilizadanodia-a-dia.Aintenção,desdeoinício,eraadeencontrar
umaformadedesvendarofuncionamentodeumdiscursoquepareciatãotécnicoerepetitivo.
Essaaparência,jánoinício,dificultouaseleçãodostextosparaanálise,poisolhadossobos
aspectos do Direito, tais como o tipo de sentença pleiteada, área de atuação, assunto, rito
processual,nenhumapossibilidadedeseleçãoporcategoriaencontrava-se.Então,depoisde
muitosolhares,chegou-seàconclusãodequetaisaspectosnãointerferiamnaconstruçãoena
organizaçãododiscurso.
Efoinessemomentoqueasemióticaearetórica,aproximadas,tornaram-semuito
produtivasparaacompreensãodostextos,poisapartirdeseuspressupostoscomeçou-sea
identificarosdiversoselementosdacomposiçãotextual,sejanoníveldanarrativaounonível
discursivo,quepermitemdesvendaraaparênciadarepetiçãodasformas,revelandoosentido
deexistênciadessaspetições.
Sobtalpontodevista,aindaquealguémpossaobjetarsobreosresultadosaquese
chegou,entendendo,talvez,pelasuainsuficiência,sente-sequeaperfórmancedoprograma
narrativopropostofoirealizada.Obviamente,quenosentidodeter-sealcançadoresultados,
independentemente de sua avaliação, pois aquilo que no início parecia tão difícil -
compreender-seofuncionamentodalinguagemdostextosanalisadosouemoutraspalavras–
95
entender como eles fazem para dizer o que dizem, foi alcançado. Retoma-se então, agora,
todoocaminhodaanáliserealizadaeosresultadosencontrados.
A análise procura contemplar os aspectos argumentativos discursivos que
evidenciam como o discurso constrói os sentidos para a formação da convicção do
enunciatário. Considerando que as petições configuram-se em textos extensos, foram
selecionadasdezpeçasparaobjetodeanálise,independentementedaáreadoDireito,dotipo
de rito processual, do tipo de ação e de sentença, pois verificou-se que as regularidades
discursivas que produzem efeitos persuasivos no discurso das petições são estruturas que
estabelecemrelaçõesargumentativas,asquaisindependemdoassuntooudaáreadoDireito
ou do tipo de sentença pleiteada. Assim, visando demonstrar esse aspecto, procedeu-se
contrariamente, selecionando-se dez petições que contemplam assuntos, áreas, tipos de
sentençaseritosprocessuaisdiferentes.Fazempartedoconjunto,petiçõesparaoajuizamento
de:açãodedespejo,açãodeclaratória,açãodeexoneraçãodealimentos,açãodecobrança,
açãomonitória,açãoderevisãocontratual,açãoordináriadeclaratóriacumuladacompedido
de anulação de lançamentos, ação de restabelecimento de benefício previdenciário e duas
açõesdeindenizaçãopordanosmorais,sendoqueumaajuizadaperanteajustiçacomumea
outraperanteojuizadoespecialcível.
Paraaanálisedaconstruçãodaveridicçãododiscursodaspetiçõesforamusadosos
mecanismosidentificadospelomodeloteórico-metodológicodasemióticafrancesa,noplano
das estruturas discursivas. Todavia, considerando que a semiótica não examinou
extensivamenteosrecursosquedotamumdiscursodemarcasdeveridicção,recorreu-seàs
estratégiasargumentativasretóricas.
A análise foi distribuída em três etapas. Primeiro buscou-se identificar a
transformaçãodasestruturasnarrativasemdiscursivasesuasmarcasdeveridicção.Emoutras
palavras, buscou-se apreender o modo de dizer o discurso dos fatos e dos fundamentos
jurídicosparaacriaçãodeefeitosdepersuasão.
No segundo momento foram analisadas as relações enunciativas no discurso das
petições, com a finalidade de apreender os efeitos de sentido provocados a partir das
projeçõesdaenunciaçãonosenunciados.Aindanessaetapaestabeleceu-seumarelaçãodos
efeitosdesubjetividadediscursivaencontradoscomasprovasretóricasafetivasidentificadas
porAristóteles,paraaverificaçãodosefeitosargumentativosqueelasproduzem.
Na terceira e última etapa, foram descritos tipos de argumentos identificados no
discurso, a partir dos esquemas argumentativos descritos por Perelman & Tyteca, e seus
efeitosargumentativosparaaformaçãodaconvicçãodoenunciatário.Ressalta-senovamente
96
queapesquisanãoimpôscomoobjetivocriarcategoriasouumaclassificaçãodeargumentos
encontrados, fornecer um modelo, nem mesmo indicar quais os esquemas argumentativos
mais freqüentes nas petições.O estudose limita a descrever como o discursodas petições
iniciais é organizado do ponto de vista narrativo e discursivo, e que recursos e estratégias
utiliza para cumprir sua função primordial de persuadir o seu destinatário a formular a
convicçãoquedeseja,apartirdeelementosidentificadosnostextosanalisados.
Parachegar-seaosresultados,partiu-sedopressupostodequeaspetiçõessãopeças
processuaisqueservem parainstauraroprocessojudicial e quedesempenhamafunção de
orientarocursodoprocessobemcomooconteúdodasentença.Porisso,sãodiscursosque
têmcomofunçãoessencialinfluenciaraformulaçãodaconvicçãodeseusdestinatários.Para
queessefimsejaalcançado,sãonecessáriosexercícioscognitivos,naconstruçãododiscurso,
paraarealizaçãoefetivadapersuasão.
Entendendo, portanto, que as petições são discursos construídos para persuadir,
buscou-seidentificardequemodo,comquerecursos,apartirdequeestratégiascognitivas
taisdiscursosexercitamsuafunção,considerandoasmarcasencontradasemseusenunciados.
Apartirdosfundamentosteórico-metodológicosdasemióticafrancesa,identificou-
seantesdetudoqueosdiscursos,noplanodanarrativa,paracontaredefendersuahistória,
organizam-seemfatosefundamentosjurídicos,osquais,noplanodiscursivo,traduzem-sena
narrativa dos fatos, assumida pelo sujeito do discurso, e na argumentação jurídica
propriamentedita.
Seguindo esse percurso, analisou-se primeiro o discurso da narrativa dos fatos,
encontrando-se elementos discursivos semânticos - marcadores de tempo, de espaço, de
pessoaedefiguras–quedotamodiscursonarrativodeefeitosderealidade,atribuindo-lhesa
condiçãodefatos,oque,noplanodaestruturaretórica,sãopremissasdeargumentação.
Após, passou-se à identificação das projeções enunciativas feitas no discurso e os
efeitosqueelasproduzem.Nessesentidoconstatou-seopredomíniodeprojeçõesnaformade
debreagensenuncivase,porconseguinte,dosefeitosdeobjetividade.Taisefeitosrevelamum
discursoatreladoaosfatoseaosfundamentoscomomeiodeexpressarasuaverdade.
Observou-seemalgumassituaçõesarecorrênciaàembreagem,comaretomadadas
estruturas enunciativas, que conferem ao discurso o efeito de subjetividade, atrelando o
discurso ao seu sujeito. Nesses casos observou-se a relação do efeito de subjetividade
discursivacomasprovasafetivascategorizadasporAristóteles,identificadasnodiscursodas
petiçõessobdoisaspectos:quandoosujeitododiscursoassumeapalavrapara,atravésdeum
argumentopsicológico,afetaroenunciatárioenelecriarumadisposiçãoparaaaceitaçãode
97
uma opinião, através da mudança de um juízo de valor pela emoção; ou quando o sujeito
assumeapalavraeatravésdemarcasqueinscrevenosenunciados,projetaefeitosdeverdade
noseudiscursoquelheatribuemumacondutaéticaresponsávelpelaconfiançaquedesperta
noenunciatárioe,comisso,influenciaaaceitaçãodeseudiscurso.Impendesalientarqueno
primeirocasooexercíciodepersuasãoérealizadosobreoenunciatárioe,nosegundo,apartir
damoraldoenunciador,inscritanoseudiscurso.Entende-seassim,queessasprovasrevelam-
se premissas de argumentação e como são meios de persuasão criados pelo discurso,
adquiremaforçadeveridicção.
Por fim, passou-se à verificação dos encadeamentos de idéias, os esquemas
argumentativos que, sob determinadas operações de associação cognitiva, influenciam o
raciocínio do enunciatário para a sua crença no discurso. Constatou-se a recorrência a
variadostiposdeesquemas.Foramidentificadosesquemasquecomportamligaçõeslógicas
de natureza matemática, e que por isso criam efeitos de demonstração como forma de
influenciar a adesão. Também foram encontrados esquemas cujas ligações não são de
naturezalógicamatemática,masqueatribuemforçadeverdadeadeterminadosvaloresque
surgemderelaçõesdesucessão–dotipocausaeefeito-entretermosdeummesmoplano,ou
derelaçõesdecoexistênciaentretermospertencentesarealidadesdesiguais,comopessoase
atributos. Neste último caso inclui-se o argumento de autoridade, que atribui valor ao
discurso,emrazãodoatributodequemodiz.Outrotipodeesquemaidentificadonaspetições
éaassociaçãodocasoparticularaoparticular,evidenciandoo argumentodeindução.Tais
associaçõessãoevidenciadaspelorecursodeassociaçãododiscursoàjurisprudência.Essas
ligações são realizadas de diferentes maneiras, produzindo efeitos diversos. Verificou-se a
associaçãodajurisprudênciasobaformadeanalogia,ouseja,porumarelaçãodesemelhança
entreosparticulares;aassociaçãodajurisprudêncianaformadeexemploeaassociaçãoda
jurisprudência na forma de ilustração. Os efeitos de cada esquema diferem. No caso da
relaçãodesemelhança,oefeitoredundanacrençadequesituaçõessemelhantespedemações
semelhantes. O exemplo busca generalizar uma regra, para torná-la aceita e a ilustração
intensificaouesteiaacrença,porqueratificaaquiloquejáéaceito.
Sobre os esquemas argumentativos apresentados, é importante que se diga que
Perelmanaoapresentá-losjustificaquesãoexemplosondepodemserencaixadosmiloutros.
Masalertaque,aoconfigurarumesquemaemumaanálise,nãohácomoseafirmarqueo
pensamentorealdooradoredeseusouvinteséconformeoesquemadiscernido,poisaopasso
queépossívelpercebersimultaneamentemaisdeumaformadeconceberaestruturadeum
argumento,odiscursoéumatoquepodeserobjetodeumareflexãodapartedoouvinte.Por
98
isso,enquantoooradorargumentaoouvinteargumentatambém,paradeterminarocrédito
quelhedevedar.
Comisso,oquesequerdizeréqueosresultados,quantosaosesquemasencontrados
neste trabalho, são hipóteses de ligações argumentativas que podem ser utilizadas para
explicar ou para atuar no Direito, não devendo ser tomados como um esquema formal
inflexívelquepermiteoencaixededados.Osesquemasmostrampossibilidadesdeligar-se
idéiasparaqueelasproduzamefeitos.
Entende-se que para o exercício da advocacia ou para o magistério do Direito, o
entendimento de tal aspecto é de suma importância, porque representa a possibilidade do
verdadeirodebatedialéticojurídicoe,comisso,oencontrocomarazãofilosóficadoDireito-
arealizaçãodajustiça-enãoaconstanterepetiçãodeformasdiscursivascristalizadas.
Porfim,entende-sequeesteestudoabreapossibilidadedemuitosoutros,namedida
em que se limita à identificação e descrição de algumas formas que compõe a linguagem
argumentativa.ConformeaspalavrasdeReboul(2000,p.24)sobrearetórica,noessencial,é
aartedeacharosmeiosdepersuasãoquecadacasocomporta.
Portanto,numpróximoestágio,talvezhajaanecessidadedeselecionarpetiçõesde
acordocomasformasimpostaspeloDireitopara,emumestudosuportadopelospressupostos
daretórica,procurar-sedescreverquaisesquemasargumentativosproduzemmelhoresefeitos
emrelaçãoàsformasespecíficasanalisadas.
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ANEXOE–AçãoMonitória
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ANEXOJ–AçãodeIndenizaçãoporDanosMorais
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