39
sociabilidade e introduzindo novos padrões estéticos, seja como elemento de
comunicação visual, pode-se constatar que esta, a moda, na condição de objeto da
pesquisa em história, carece não apenas de reconhecimento enquanto campo de
saber, mas também de revisão teórico-metodológica.
Uma certa marginalidade da moda nos estudos acadêmicos
parece ter comprometido o avanço da discussão no sentido de repensar algumas
questões que precisam ser pontuadas quando se pretende proceder à compreensão
da dinâmica da moda. Nesse sentido, domina o cenário da produção historiográfica
obras com abordagens reducionistas que, ora limitam-se à crônica linear e
cronológica das variações sucessivas que afetam o vestuário, ora adotam um
enfoque que vincula a moda exclusivamente às estratégias de distinção sócio-
econômica e sexual
59
.
Assunto bastante privilegiado pela tradição sociológica
60
e,
concomitantemente, relegado ao universo das frivolidades, a moda, no âmbito de
uma história cultural, deve ser pensada ao lado de outras linguagens da esfera da
cultura, pois, assim como estas, também a moda é uma forma de expressão dos
valores que moldam uma época e, desta feita, fala-nos acerca da sociedade que a
produziu. Contudo, a moda, do mesmo modo que ocorre com outras modalidades
objetos, discurso político, comportamento, etc.), o que permite defini-la como o “império do efêmero”
(LIPOVETSKY, Gilles. O império do efêmero: a moda e seu destino nas sociedades modernas. São Paulo:
Companhia das Letras, 1999.). Uma outra conotação refere-se exclusivamente ao vestuário, uma vez que este
constitui-se no domínio arquetípico da moda e num meio estratégico para a compreensão deste fenômeno.
Salvo indicação em contrário, no seio deste trabalho o termo “moda” é empregado neste segundo sentido.
59
Acredito que análises como as presentes em LAVER, James. A roupa e a moda: uma história concisa. São
Paulo: Companhia das Letras, 1989 e em BOEHN, Max von. La moda: historia del traje en Europa – Desde
los orígenes de cristianismo hasta nuestros días. Barcelona: Salvat Editores, 1945, constituem-se num ponto
de partida seguro para o desenvolvimento de estudos que tenham como proposta uma reflexão que parta do
princípio de que a moda e o vestuário são instâncias de representação da realidade. A observação que faço é
quanto ao risco de ceder a uma concepção de história que dissocia práticas e representações e,
conseqüentemente, impossibilita uma nítida problematização e compreensão do fenômeno.
60
Cf., entre outros e a título de exemplo, VEBLEN, Thorstein. A teoria da classe ociosa. São Paulo:
Pioneira, 1996. No Brasil, também Gilberto Freyre sublinhava o fato da moda ser um assunto “[...]
antropológica, psicológica, sociológica, estética, eticamente complexo. [...] Frívolo coisa nenhuma: em vários
de seus aspectos, gravemente complexo.” (FREYRE, Gilberto. Modos de homem e modas de mulher. Rio
de Janeiro: Record, 1986, p. 28)